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Horizontes de Esperança EDUCAÇÃO MORAL E RELIGIOSA CATÓLICA Manual do Aluno Apoio na Internet em www.emrcdigital.com

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Horizontes de Esperança

EDUCAÇÃO MORALE RELIGIOSA CATÓLICA

Manual do Aluno

Apoio na Internet em www.emrcdigital.com

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Horizontes de EsperançaManual do Aluno 9.º ano

Educação Moral e Religiosa Católica

SUPERVISÃO E APROVAÇÃOCOMISSÃO EPISCOPAL DA EDUCAÇÃO CRISTÃ

D. Tomaz Pedro Barbosa Silva Nunes (Presidente)

D. António Francisco dos Santos

D. Anacleto Cordeiro Gonçalves Oliveira

D. António Baltasar Marcelino

Mons. Augusto Manuel Arruda Cabral (Secretário)

COORDENAÇÃO E REVISÃO GERAL Jorge Augusto Paulo Pereira

EQUIPA DE REDAÇÃOFernando Augusto Teixeira Moita (Coordenação de Ciclo)

António José Melo Cordeiro

 José Luís Pinto Dias

Maria Margarida Antunes Santos Portugal

REVISÃO GRÁFICAMaria Helena Calado Pereira

GESTÃO EXECUTIVA DO PROJETO E DIREÇÃO DE ARTEID Books – I-Zone Interactive Media

Ricardo Santos

TIRAGEM

ISBN978-972-8690-55-7

DEPÓSITO LEGAL

EDIÇÃO E PROPRIEDADEFundação Secretariado Nacional da Educação Cristã – Lisboa, 2011

Quinta do Cabeço, Porta D – 1885-076 Moscavide

Tel.: 218 851 285; Fax: 218 851 355; E-mail : [email protected]

Todos os direitos reservados à FSNEC

IMPRESSÃO

Gráca Almondina

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Apresentação

Aos alunos e às alunas de Educação Moral e Religiosa Católica

Um livro é o resultado de muito trabalho de quem o produziu: um ou maisautores. Por isso, deve ser acolhido com respeito e tratado com cuidado.Qualquer que seja o seu estilo, contém uma mensagem, interpela o leitor edesperta a sua imaginação.

Um livro escolar é um instrumento para a aprendizagem dos alunos. É sempreeducativo. Transmite informações ligadas aos conteúdos dos programasde ensino, contém interrogações e propostas de trabalho, e convida aoestudo. É para se usar na aula e fora dela. É um companheiro de viagem parao percurso anual de cada um na escola. Só assim, tornando-se um objetofamiliar, que se utiliza com frequência, o livro escolar facilita o progresso naaquisição e desenvolvimento de competências.

Os manuais de Educação Moral e Religiosa Católica, quer se revistam daforma de um volume por ano de escolaridade quer se apresentem comoconjuntos de fascículos, têm todas estas caraterísticas.

Convido os alunos e as alunas a receberem-nos com interesse e entusiasmo,mas, sobretudo, a utilizarem-nos para proveito do seu crescimento humanoe espiritual. Deste modo, e com a ajuda indispensável dos vossos professoresou professoras de Educação Moral e Religiosa Católica, podeis melhor fazeras vossas opções e elaborar um projeto de vida sólido e com sentido.

Que Deus vos ilumine e ajude na caminhada de ano escolar que ides iniciar.

Bom trabalho!

D. Tomaz Pedro Barbosa Silva NunesBispo Auxiliar de Lisboa

Presidente da Comissão Episcopal da Educação Cristã

Horizontes de Esperança

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O início da vida humana

A vida humana – Um valor a defender

Atentados à vida e à sua dignidadeValorizar a vida

Dar a própria vida pelo outro

10

14

2235

45

Unidade 1 A dignidade da vida humana

Índice

Unidade 2 Deus, o grande mistério

A questão da existência de Deus

Representações da divindade no politeísmo

Deus na Bíblia

Representações de Deus na arte

Deus: o oceano sem margens

Solidariedade e fraternidade

51

67

72

78

82

86

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A religiosidade

Hinduísmo

Budismo

Tauismo

Confucionismo

Valores éticos comuns às grandes tradições religiosas

Diálogo inter-religioso

95

99

108

114

119

127

135

Unidade 3 As religiões orientais

Projetar o futuro

Projeto de vida e vocação

A felicidade como projeto

A construção de uma sociedade justa e solidária onde

todos possam ser felizesA felicidade na relação com os outros: assumir valores

éticos fundamentais

A vocação de Abraão e a descoberta do Deus único

O projeto de Paulo: a descoberta de Cristo como eixo

orientador da vida

144

150

158

162

166

175

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Unidade 4Projeto de vida

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unidade 1

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unidade 1 7

Nesta unidade vamos refletir sobre: 

• O início da vida humana

• A vida humana, um valor a defender

• Alguns atentados à vida e à sua dignidade

• A valorização da vida: tornar-se próximo de quem precisa

• A promoção da dignidade humana: dar a vida pelo outro

UNIDADE LETIVA 1

A dignidade da vida humana

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unidade 1

Olá!

Com certeza já ouviste falar de mim. Sabes que tenho um carinho especial

pelo teu país, que visitei cinco vezes.

Chamo-me Karol Józef Wojtyła e quando fui eleito papa, a 16 de outubro de

1978, escolhi o nome João Paulo II.

Nasci em Wadowice, uma pequena cidade perto de Cracóvia (Polónia), a 18 de

maio de 1920. Era o mais novo de três lhos. Os meus pais chamavam-se Karol

 Wojtyła e Emilia Kaczorowska. A minha mãe faleceu em 1929, tinha eu nove

anos; o meu irmão mais velho — Edmund — em 1932 e o meu pai em 1941. A

minha irmã Olga morreu ainda antes de eu ter nascido.

Fui batizado logo em criança e aos nove anos z a primeira comunhão. Aos

dezoito, recebi a conrmação e matriculei-me na Universidade de Cracóvia e

numa escola de teatro — uma das minhas grandes paixões.

Quando as forças de ocupação nazi fecharam a Universidade, em 1939, tive de

ir trabalhar numa fábrica de produtos químicos, de modo a evitar a deportação

para a Alemanha.Por volta dos meus vinte e dois anos, senti vocação para o sacerdócio e

ingressei no seminário de Cracóvia. Fui ordenado presbítero no dia 1 de novembro

de 1946, já a guerra havia terminado. Nos anos que se seguiram, continuei a

estudar e também fui professor. Em 1958, recebi a ordenação episcopal. Como

 bispo, participei nos trabalhos do Concílio Vaticano II (1962-1965).

Escolheram-me para apresentar esta unidade letiva sobre a dignidade da

 vida humana por ter sido a temática que mais me preocupou e que mais me fez

reetir, escrever, falar e viajar ao longo de toda a vida.

Sempre que tinha oportunidade alertava as pessoas com quem me encontrava

para o inestimável valor da vida humana, a riqueza que cada ser humano — único

e irrepetível — signica para o outro e para o mundo.

Desejo sinceramente que a reexão que vais fazer ao longo desta unidade

letiva te ajude a reconhecer o bem e a beleza de cada pessoa.

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unidade 1 9

João Paulo II exerceu a sua ação como papa de forma incansável; dedicou todasas suas energias a percorrer o mundo, revelando o seu amor por toda a humanidade.Efetuou cento e quatro viagens apostólicas a cento e vinte e nove países. Visitouhospitais, prisões, bairros pobres, leprosarias… chamando a atenção para a beleza da vida e da pessoa humana.

O seu amor aos jovens impulsionou-o a iniciar, em 1985, as Jornadas Mundiaisda Juventude. E a sua atenção para com a família deu origem aos encontros mundiaisdas famílias, iniciados em 1994.

Realizou numerosas beatificações e canonizações para dar a conhecer diversosexemplos de santidade que servissem de estímulo às pessoas do nosso tempo, valorizando aqueles que souberam dar a vida pelos outros.

Escreveu e publicou inúmeros documentos oficiais, como, por exemplo, asencíclicas.

Nos últimos dias da sua vida, já muito debilitado, foi aconselhado pelos médicosa ir para o hospital. Sabendo que ia falecer, preferiu morrer em casa.

Faleceu no dia 2 de abril de 2005. Desde essa noite até ao dia 8 de abril, momento

em que se celebraram as exéquias, deslocaram-se mais de três milhões de peregrinosà basílica de São Pedro para lhe prestar homenagem.

Doc. 1O valor incomparável da pessoa humanaA Igreja sabe que o Evangelho da vida, recebido do seu Senhor, encontra

um eco profundo e persuasivo no coração de cada pessoa, crente e até nãocrente.

Mesmo por entre diculdades e incertezas, todo o ser humanosinceramente aberto à verdade e ao bem pode chegar a reconhecer o valorsagrado da vida humana desde o seu início até ao seu termo e armar odireito que todo o ser humano tem de ver plenamente respeitado esteseu bem primário. Sobre o reconhecimento de tal direito é que se funda aconvivência humana e a própria comunidade política.

 João Paulo II, O Evangelho da Vida

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unidade 1 11

metade do número de cromossomas de um ser humano. Estas células são denominadasgâmetas: o ovócito e o espermatozoide. Fenómenos semelhantes estão na origem detodos os mamíferos e de outros seres vivos pertencentes a outras espécies. Quando osdois gâmetas se aproximam, envolvidos por um ambiente biológico caraterístico decada espécie, após uma fase de reconhecimento, segue-se a penetração do material

genético do espermatozoide no ovócito e a formação imediata de uma barreira namembrana celular que bloqueia a penetração de novos espermatozoides. A partirdesse momento, o zigoto tem todas as caraterísticas genéticas de um ser humano.

A fusão dos dois gâmetas inicia o ciclo vital de um novo ser humano. O seu

corpo terá um desenvolvimento autónomo, contínuo e progressivo a partir dasfases mais primordiais, seguindo um percurso que está inscrito nos seus genes.A realização deste programa está sujeita às condições que são caraterísticas de cadaser vivo: dependência estrita das condições do ambiente em que vive, de uma nutriçãoadequada e de fatores como a doença ou a exposição a agressões.

O zigoto é, sem dúvida nenhuma, um ser vivo com caraterísticas genéticashumanas. Mas não é consensual que seja uma vida humana. De facto, o momentoa partir do qual se inicia a vida humana ainda está sujeito a debate. As posições sãomuito díspares. Vamos descrever apenas as principais perspetivas.

Para alguns, a vida humana tem o seu início quando ocorre a nidação, porque,nos estádios anteriores, as células que vão constituir o ser humano ainda nãose diferenciaram; para outros, a vida humana só se inicia quando começa aatividade cerebral, por analogia com a morte, que é determinada pela paragem dofuncionamento do cérebro. Outros defendem que o início da vida humana ocorrequando a atividade cerebral emite ondas tipicamente humanas, porque é este aspetoque distingue o ser humano dos outros animais. Outros, ainda, só estão dispostos areconhecer o ser humano a partir do momento do parto, porque o feto só assumepersonalidade jurídica quando nasce para a sociedade.

Muitos, no entanto, defendem que a  vida humana tem início no momento da

fecundação, porque o desenvolvimento de um ser humano é um processo contínuoque não permite identificar com precisão saltos de qualidade. É também esta a

posição da Igreja Católica.

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unidade 12

FECUNDAÇÃO

O gâmeta masculino (espermatozoide) e o gâmetafeminino (ovócito) unem-se formando o zigoto(embrião unicelular). É o início de uma nova vida.

Três a quatro dias após a fecundação, o blastócito,resultante das divisões do zigoto, implanta-se naparede do útero e dá origem ao embrião.

BLASTÓCITO A CAMINHO DO ÚTERO

DUAS SEMANAS

As primeiras células do cérebro estão completamenteformadas. Começam a constituir-se as estruturasprecursoras das membranas fetais e da placenta.

QUATRO SEMANAS

O embrião tem cerca de 5 milímetros. O coração jácomeçou a bater. Cabeça, boca, fígado e intestinoscomeçam a tomar forma.

A VIDA HUMANA NO ÚTERO

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unidade 1 13

SEIS SEMANAS

O cérebro coordena movimentos de músculos e deórgãos; é possível medir a atividade cerebral atravésde eletroencefalograma. Todos os vinte dentesde leite estão presentes. Os olhos ainda estão naparte lateral da cabeça e a face apresenta fendascerradas onde surgirão a boca e o nariz. Mede trezemilímetros.

Adaptado de http://vida.aaldeia.net/desenvolvimentoembrionario.htme de Embryo and Fetus in http://www.wprc.org/fetal.phtml

DEZ SEMANAS

Todas as partes do corpo do feto são sensíveisao toque. Se a palma da mão for tocada, afasta-adecididamente. O feto brinca e chupa no dedo.A face tem feições marcadamente humanas. Medecerca de quatro centímetros.

DOZE SEMANAS

Os músculos começam a desenvolver-se e os órgãossexuais a formar-se. Começam também a constituir--se as estruturas ósseas e as pálpebras. Podem serobservados movimentos espontâneos e mostrauma personalidade especíca. Mede cerca de setecentímetros.

VINTE SEMANAS

Distingue-se o rosto de um feto do de outro.As glândulas sudoríferas desenvolvem-se e a peleexterior passa de transparente a opaca.Música muito alta leva o bebé a tapar os ouvidose uma luz muito forte colocada sobre o abdómen damãe leva-o a tapar os olhos.

VINTE E OITO SEMANAS

Ainda estará mais oito a doze semanas no ventrematerno a crescer, mas já é capaz de nascer(prematuro) e sobreviver fora do útero.

OITO SEMANAS

Todos os órgãos estão formados e a funcionar,exceto os pulmões. As impressões digitais estão aaparecer. As palmas das mãos são sensíveis ao toque.Traços faciais, membros, mãos, pés, dedose unhas são visíveis. O feto mostra resposta reexaa estímulos. Mede vinte e cinco milímetros.

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unidade 14

A vida humana – Um valor a defender

De entre todos os valores, a vida humana é o valor primordial, sendo este o pontode partida de todos os direitos da pessoa. Como poderíamos, por exemplo, exigir quese fizesse justiça a alguém se lhe negássemos o direito de existir? Se a vida humananão estiver assegurada, é simplesmente impossível a realização dos outros valores.A solidariedade, a verdade e a bondade só têm razão de ser se estiverem relacionadascom a defesa da vida humana. É por isso que a vida é o valor primordial, sem o qualnão poderiam existir os restantes valores.

Uma vez que o ser humano é — em variadas situações — agredido, negado e violentado, ficando a vida humana seriamente comprometida, a humanidadeelaborou «códigos» que têm como objetivo defender expressamente a vida humanae a sua dignidade.

Age de tal modo que trates a humanidade, tanto na tua pessoa como na dooutro, sempre e ao mesmo tempo, como um fim e nunca simplesmente comoum meio.

Immanuel Kant, filósofo do século XVIII

A dignidade da vida humana é um valor partilhado pelas várias civilizações, que, deuma ou de outra forma, a entendem como um dom a respeitar e a preservar. Emboraos registos históricos e culturais documentem vários acontecimentos sangrentos edesumanos, muitos foram aqueles que entregaram a sua existência pessoal à defesado valor inalienável da vida humana.

O juramento de Hipócrates foi adaptado na Declaração de Genebra da AssociaçãoMédica Mundial (1948), texto que tem sido utilizado em vários países na solenidadede receção dos médicos recém-formados e contém os princípios deontológicos da

prática da medicina.

pócrates nasceu noculo V a.C., na Grécia.edicou-se ao estudo e

atividade da medicina,mpreendendo a suaão como um serviçovida. É considerado oai da medicina». O seuramento «prossional»arcou toda a história daedicina no Ocidente.

Saber +

Immanuel Kant

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unidade 1 15

Asaph Judaeus foium médico judeu que

viveu provavelmenteentre os séculos VI eVII, na Mesopotâmia,tendo realizado os seusestudos em Alexandria.Defendia que a práticada medicina se destinavaaos que tinham elevadasqualidades tanto a nívelintelectual como a nívelde caráter.

Saber +Doc. 2

 Juramento de Hipócrates Juro por Apolo médico, por Esculápio, Higia e Penacena, e ponho por

testemunho todos os deuses e todas as deusas, cumprir segundo as minhaspossibilidades e razão o seguinte juramento: aplicarei os medicamentos parabem dos doentes segundo o meu saber e nunca para seu mal. Não darei umremédio mortal ou um conselho que leve à sua morte. Tão pouco darei auma mulher uma poção que possa destruir a vida do feto. Conservarei puraa minha vida e a minha arte.

 Juramento de AsaphCuidem de não matar nenhum homem com a seiva de uma raiz. Não

deem poção alguma a mulher grávida por adultério para que possa abortar.

Não aceitem o suborno para fazer mal ou para matar. Não ajudem o malvadonem derramem sangue inocente. Tão pouco confecionarão veneno paramatar.

Esperança Pina, A Responsabilidade dos Médicos

Doc. 3Associação Médica — Declaração de GenebraNo momento de ser admitido entre os membros da prossão médica, tomo

o compromisso solene de consagrar a minha vida ao serviço da humanidade.Guardarei respeito absoluto pela vida humana desde a conceção; mesmoperante ameaças não admitirei fazer uso dos meus conhecimentos médicoscontra as leis da humanidade. Faço solenemente estas promessas, livremente,sob palavra de honra.

Esperança Pina, A Responsabilidade dos Médicos

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unidade 16

A finalidade da Declaração Universal dos Direitos Humanos  é defender adignidade humana. Quando nesta se referem os direitos, liberdades e garantias doser humano, apresenta-se a vida como um valor primordial inviolável.

A pessoa desenvolve-se num contínuo processo de autorrealização pessoal esocial, mas esse facto não altera nem diminui a sua constante dignidade. A noção de

dignidade humana é a base dos textos fundamentais sobre Direitos Humanos.

Este documento foi proclamado a 10 de dezembro de 1948, após a Segunda GuerraMundial — um conflito internacional no qual a dignidade humana foi severamentehumilhada —, e continua a exprimir o grito humano de libertação de todas as formasde opressão. No humanismo dos seus artigos, manifesta-se o sonho de uma sociedadeonde todos possam ser felizes, qualquer que seja a sua condição. Esta chama temiluminado o mundo inteiro, incluindo o processo de construção europeia.

A Constituição da República Portuguesa, a lei fundamental de Portugal,reconhece a dignidade da pessoa humana, da qual decorrem os outros direitos(cf. artigo 1.º), e afirma que a vida humana é inviolável, proibindo a pena de morte

(artigo 24.º).

Doc. 4Declaração Universal dos Direitos HumanosO reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família

humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento daliberdade, da justiça e da paz no mundo.

Artigo 1.º: Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidadee em direitos. Dotados de razão e consciência, devem agir uns para com osoutros em espírito de fraternidade.

Artigo 2.º: Todos os seres humanos podem invocar os direitos e asliberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma,nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opiniãopolítica ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento,ou de qualquer outra situação.

Artigo 3.º: Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurançapessoal.

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unidade 1 17

A Carta dos DireitosFundamentais da UniãoEuropeia foi proclamadasolenemente peloParlamento europeu,pelo Conselho europeu epela Comissão europeia.Formalmente adotada emNice, a 7 de dezembro de2000, a Carta representaum compromisso político,sem efeitos jurídicosobrigatórios.

No Tratado de Lisboa ,a Carta é investida deforça obrigatória atravésda introdução de umamenção que lhe reconhecevalor jurídico idênticoao dos Tratados. Parao efeito, a Carta foiproclamada pela segundavez em dezembro de 2007.

Saber +Doc. 5

Carta dos Direitos Fundamentais da União EuropeiaPreâmbuloOs povos da Europa, estabelecendo entre si uma união cada vez mais

estreita, decidiram partilhar um futuro de paz, assente em valores comuns.Consciente do seu património espiritual e moral, a União baseia-se nos

valores indivisíveis e universais da dignidade do ser humano, da liberdade, daigualdade e da solidariedade.

Artigo 1.ºA dignidade do ser humano é inviolável. Deve ser respeitada e protegida.

Artigo 2.º1. Todas as pessoas têm direito à vida.2. Ninguém pode ser condenado à pena de morte, nem executado.

Artigo 3.º1. Todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua integridade física e

mental.2. No domínio da medicina e da biologia, devem ser respeitadas,

designadamente:

  • a proibição das práticas eugénicas, nomeadamente das que têm por 

nalidade a seleção das pessoas;  • a proibição de transformar o corpo humano ou as suas partes,

enquanto tais, numa fonte de lucro.

Artigo 4.ºNinguém pode ser submetido a tortura, nem a tratos ou penas desumanos

ou degradantes.

http://eur-lex.europa.eu/pt/treaties/index.htm

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unidade 18

Tu és especial

No início de uma conferência, um famoso orador mostrou uma nota de vinte

euros, e perguntou:

— Quem deseja esta nota?A maior parte da assembleia ergueu as mãos.

O conferencista amarrotou-a e voltou a perguntar, enquanto a exibia:

— Quem está ainda interessado nela?

A maior parte da assembleia voltou a erguer as mãos.

Então, deixou-a cair no chão e pisou-a violentamente. Depois, pegou nela,

suja e amarrotada, e perguntou de novo:

— E agora? Ainda há alguém que a queira?

E mais uma vez as mãos se ergueram.

— Meus amigos — continuou o conferencista —, seja o que for que eu faça com

esta nota, a maior parte das pessoas permanecerá interessada nela, porque,

apesar do seu aspeto, não perde valor. Limpa ou suja, amarrotada ou não, valerá

sempre vinte euros. Mas, como podem calcular, não vim aqui para vos falar

de questões nanceiras. Acontece muitas vezes, na vida pessoal, que somos

amarrotados, humilhados e conspurcados por decisões que tomamos ou por

circunstâncias que não dependem da nossa vontade. Quando tal sucede, sentimo-

-nos profundamente desvalorizados ou mesmo insignicantes. Mas, aconteça

o que acontecer, seja qual for a forma como nos sentimos, nunca perderemos

objetivamente o nosso valor nem a nossa dignidade. Quer estejamos sujos ou

limpos, diminuídos ou inteiros, nada nos pode roubar o que verdadeiramente

somos. É que o valor das nossas vidas não reside fundamentalmente no que

fazemos ou sabemos, reside sobretudo no que somos. E todos somos especiais,

porque únicos e irrepetíveis. No meio das adversidades da vida, não nos

esqueçamos disto!

Autor desconhecido

A vida — dádiva de Deus

Na perspetiva judaico-cristã e islâmica, Deus é a origem da vida. É nele que seencontra a plenitude da vida, em toda a sua perfeição, a qual não conhece início nemterá ocaso. O ser humano é um ser vivente porque recebeu de Deus a vida como um dom

inestimável. A vida é, pois, o primeiro dom de Deus. Todo o crente sente que tem paracom ele uma enorme dívida de gratidão. Nada fez para merecer existir e, contudo, Deusquis que existisse. Por isso, através da oração, agradece a Deus esta dádiva fundamental.Mas a melhor maneira de a agradecer é cultivá-la e respeitá-la, como quem cuida damaior prenda que alguma vez lhe tenha sido oferecida. É por isso que o respeito pela vida faz parte do Decálogo, a lei fundamental da Bíblia: «Não matarás».

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unidade 1 19

Doc. 6Dignidade humana

A história da humanidade é testemunha de como o ser humano abusou, eabusa ainda, do poder e das capacidades que lhe foram conadas por Deus,dando lugar a diversas formas de discriminação injusta e de opressão paracom os mais fracos e os mais indefesos. Os atentados quotidianos contraa vida humana; a existência de grandes áreas de pobreza, onde as pessoasmorrem de fome e de doença, excluídas dos recursos cognitivos e práticos,que muitos países possuem em abundância; um progresso tecnológico eindustrial que cria o risco concreto de uma queda do ecossistema; o usodas investigações cientícas no âmbito da física, da química e da biologiapara ns bélicos; as numerosas guerras que ainda hoje dividem povos eculturas infelizmente são apenas alguns sinais eloquentes de como o serhumano pode fazer mau uso das suas capacidades e tornar-se o pior inimigode si mesmo, perdendo a consciência da sua alta e especíca vocação decolaborador da obra criadora de Deus.

Paralelamente, a história da humanidade manifesta um real progresso nacompreensão e no reconhecimento do valor e da dignidade de cada pessoa.Assim, por exemplo, as proibições, jurídico-políticas, e não apenas éticas,das diversas formas de racismo e de escravidão, das injustas discriminaçõese marginalizações das mulheres e crianças e das pessoas doentes ou comgrave deciência são testemunhos evidentes do reconhecimento do valorinalienável e da intrínseca dignidade de cada ser humano e sinal de um

progresso autêntico.A Igreja sente o dever de, com coragem, dar voz a quem a não tem. O seu

é sempre o grito evangélico em defesa dos pobres do mundo, de quantossão ameaçados, desprezados e oprimidos nos seus direitos humanos.

Congregação para a Doutrina da Fé, Dignitas Personae

Bhagavad-Gita éconhecido como Canção

do Senhor . Reverenciadopor budistas e hindus,é um dos pilares daliteratura sagrada mundial.Compreende duzentos ecinquenta mil versículosque descrevem a grandeguerra entre o Bem e oMal.

Saber +Doc. 7

O valor da vida humana no HinduísmoEu não desejo matar os meus professores, tios, lhos, avós, sogros, netos,

cunhados e outros parentes que estão prestes a matar-nos, ó Krishna.Ó Senhor Krishna, que prazer há em matar os nossos primos? Por matar

os nossos semelhantes nós iremos incorrer num crime e, consequentemente,num pecado. Portanto, nós não mataremos os nossos primos. Como podealguém ser feliz depois de matar os seus parentes, ó Krishna?

De qualquer modo, eles estão cegos pela ambição e não veem maldadena destruição da família ou pecado por traírem os seus amigos.

Bhagavad-Gita

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unidade 10

Doc. 8A vida humana no Alcorão

Ó vós que credes, sede rmes na distribuição da justiça, mesmo contravós mesmos, vossos pais e vossos parentes, trate-se de ricos ou indigentes.Deus vela sobre todos. (4, 135)

Quem matar uma pessoa sem que esta tenha matado outra ou tenhaespalhado a corrupção sobre a Terra seja julgado como se houvesse matadotoda a humanidade e quem a ressuscitar seja recompensado como se tivesseressuscitado toda a humanidade. (5, 32)

Dai o que é justo ao próximo, ao pobre e ao viajante. (17, 26)

Não mateis os vossos lhos por temor da miséria. O seu assassínio é umagrande falta. (17, 31)

Deus é compassivo, misericordioso para com os homens. É ele quem vosdá a vida, depois vos faz morrer e depois vos restituirá à vida. (22, 65-66)

Recorda-te de quando o teu Senhor disse aos anjos: «Eu vou criar um serhumano de barro. Quando o tiver modelado e lhe tiver insuado parte domeu Espírito, caí perante ele, prostrados!». (38, 71-72)

Todos os crentes são irmãos. Fazei a paz entre os vossos irmãos e temei aDeus. Talvez recebais misericórdia. (49, 10)

DEFESA DA VIDA HUMANA — UM PERCURSO

Mandamento

do Amor (Jesus)Séc. I

 Juramento deHipócrates

Séc. V a. C.

Preceitos de

BudaSéc. V a. C.

DecálogoSéc. XIII a. C.

Bhagavad-GitaSéc. IV a. C.

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unidade 1 21

Estátua de Buda

Mircea Eliade

Jean Delumeau

D. U. D. H.1948

Constituiçãoda RepúblicaPortuguesa

1976

Carta dos DireitosFundamentais daUnião Europeia 

2000

AlcorãoSéc. VII

Doc. 9Vida… no Budismo

Tudo o que existe no mundo possui uma alma, não só o ser humanoe os animais, como também as plantas, as pedras, as gotas de água, etc.O respeito pela vida é o primeiro (e o mais importante) mandamento budista.Por essa razão é que, ao andar, deve o monge varrer diante de si para nãocorrer o risco de matar algum animal pequeno. A doutrina budista proclamao respeito absoluto pela vida humana.

Mircea Eliade, História das Ideias e Crenças Religiosas

O crente budista, para conseguir a salvação, tem cinco mandamentosa cumprir: não matar, não roubar, não mentir, não cometer adultério e nãosaborear bebidas inebriantes.

História Universal Comparada (Resomnia Editores)

Para o Budismo não existem fronteiras: as ideias de pátria, de nação,de cor, de pureza da raça, etc. são consideradas ilusórias, já que segundo adoutrina do ciclo dos renascimentos não se renasce todas as vezes no mesmopaís ou na mesma cor de pele. Se todos os seres humanos são migrantes nãohá qualquer razão para se baterem por causas passageiras. Ainda por cima,o primeiro preceito do Budismo consiste em abster-se de matar seres vivos.

 Jean Delumeau, As Grandes Religiões do Mundo

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unidade 12

Atentados à vida e à sua dignidade

O aborto

A vida é um bem inestimável. Mas a história da humanidade está repleta de

contínuos atentados à vida humana e de brutais violências contra o ser humano.

Tal acontece porque cada pessoa é, em si mesma, um ser dividido. No seu coração

habitam o bem e o mal. Por imperativos egoístas ou por condicionalismos sociais,

aprisiona, por vezes, a liberdade e a dignidade dos outros.

Se é verdade que «a medida do amor é amar sem medida» — princípio que tem

sido testemunhado por muitas pessoas de bem —, também é verdade que muitos

não se deixaram transformar pela beleza da vida. E o preço a pagar tem sido

excessivo.

palavra «aborto» —ão nascido» — provémlatim abortus , quenica privação ( ab )nascimento ( ortus ).ortus , derivadoaboriri  , designa

mbém crepúsculo,saparecimento e morte.

Saber +O aborto consiste na expulsão — voluntária ou involuntária — de um embrião ou

de um feto quando o mesmo não tem condições de vida fora do útero.O aborto pode ser espontâneo  (involuntário) ou induzido  (provocado volun-

tariamente).São vários os fatores que podem originar um aborto espontâneo. O desenvolvi-

mento anormal do embrião ou do feto, problemas no útero, diabetes sem controlo ealterações hormonais são alguns dos fatores possíveis. Também o consumo excessivode tabaco, álcool e drogas, como a cocaína, pode ocasionar o aborto espontâneo.

A expressão eufemística «Interrupção Voluntária da Gravidez» (IVG) designa

oficialmente o aborto induzido.

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unidade 1 23

TIPOS DE ABORTO

ABORTO

ESPONTÂNEOINDUZIDO

(químico ou cirúrgico)

VOLUNTÁRIO

Violação

Mãe adolescente

Falta de condições económicas

Bebé não desejado

TERAPÊUTICO

Malformações congénitas

Perigo de vida da mãe

Se aceitarmos que a vida humana tem o seu início no momento da fecundação,torna-se evidente que realizar uma interrupção voluntária da gravidez é atentarcontra a vida de um ser humano.

O aborto induzido pode ser realizado através de medicamentos — aborto

químico — ou através de técnicas cirúrgicas — aborto cirúrgico — como a sucção,a dilatação ou a curetagem.

O aborto químico é realizável apenas durante as primeiras doze semanas degravidez. Consiste na administração de medicamentos que provocam a expulsãodo embrião. Nos casos em que o aborto químico não se revela eficaz, recorre-se atécnicas cirúrgicas.

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unidade 14

Consequências do abortoEmbora o aborto realizado adequadamente não implique graves riscos para a

saúde da mulher até às dez semanas, o perigo aumenta progressivamente para alémdesse tempo.

Entre as possíveis complicações fisiológicas do aborto destacam-se as hemor-ragias, as infeções, as lacerações cervicais, as perfurações uterinas, o aumento dapossibilidade de uma nova gravidez terminar em aborto espontâneo ou em partoprematuro e a esterilidade. Estas consequências surgem com maior frequência noaborto mais tardio.

Entre os eventuais efeitos psicológicos sobressaem sentimentos de culpa, baixaautoestima, impulsos suicidas, hostilidade, frigidez, frustração e depressão.

Até 1984, o aborto era legalmente proibido em Portugal.A Lei n.º 6/84, de 11 de maio, veio permitir a realização da interrupção voluntária

da gravidez até às doze semanas nos casos de perigo de morte ou de grave perigo paraa saúde física ou psíquica da mulher e nos casos de gravidez resultante de violação; eaté às dezasseis semanas nos casos de doença grave ou malformação fetal.

A Lei n.º 90/97 alargou os prazos de permissão do aborto até às vinte e quatrosemanas nos casos de malformação ou de perigo de doença incurável do nascituro;e até às dezasseis semanas nos casos de crime contra a liberdade e autodeterminaçãosexual (violação).

A Lei nº 16/2007 introduziu, nas primeiras dez semanas de gestação, a legalizaçãoda interrupção voluntária da gravidez por opção da mulher, ou seja, sem a necessidade

de apresentar qualquer outra justificação.

Legislação portuguesa sobre o aborto

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unidade 1 25

Todos os códigos penais das civilizações antigaspuniam severamente aprática abortiva.O primeiro Estado domundo a liberalizaro aborto foi a UniãoSoviética de VladimirLenine, em 1926; osegundo foi a Alemanhade Adolf Hitler, em 1935.Ainda na década de 30, oaborto foi legalizado naIslândia, na Dinamarca ena Suécia. Após a Segunda

Guerra Mundial foilegitimado em quase todoo mundo.Atualmente, desde aIrlanda, que proíbe oaborto, a alguns Estadosnorte-americanos, que opermitem até aos novemeses e a simples pedidoda mulher, existemlegislações de toda aespécie, revelando que

na base destas leis nãoestão critérios cientícosnem critérios moraisuniversalmente aceites.Enquanto alguns paísesalargam o âmbito doaborto, verica-se tambémuma inversão legislativa:a Polónia tornou a proibiro aborto e alguns Estadosnorte-americanos reetemsobre a urgência de orestringir.

Saber +Argumentos a favor e contra o aborto

Quase ninguém é a favor do aborto. A maior parte das pessoas consideram-noum mal a evitar. A polémica situa-se sobretudo no combate ao aborto clandestino.Realizado sem quaisquer condições de salubridade, tem provocado inúmeras mortese graves problemas de saúde às mulheres que a ele recorrem. Alguns consideramque a única maneira de erradicar esta calamidade é liberalizar o aborto voluntárioem unidades de saúde com condições médicas adequadas. Outros pensam que estanão pode ser a solução e advogam maior controlo e fiscalização com vista a erradicaro aborto clandestino. Mas o problema não se coloca só a este nível. Para alguns, oaborto é simplesmente uma opção da mulher, no uso da sua liberdade, que deve serreconhecida legalmente.

Os «defensores do aborto», favoráveis à livre escolha da mulher, baseiam-se nosseguintes argumentos:

• A defesa da dignidade da mulher exige que se lhe reconheça o direito a tomar asdecisões que entender a respeito do seu próprio corpo.

• Nenhuma mulher deve ser obrigada a levar por diante uma gravidez indesejada.Caso contrário, as crianças nascidas contra a vontade das mães poderiam nãoser suficientemente amadas nem tratadas com o respeito que lhes é devido.

• Há situações que exigem uma intervenção médica com consequências abortivaspara que a saúde física e psíquica da mulher seja salvaguardada.

• O aborto clandestino humilha a mulher e tem efeitos sobre a sua saúde e a sua vida.

• Não há evidência de que o embrião ou o feto sejam uma vida humana, emsentido pleno, e mesmo que o fossem a dignidade da mulher deve prevalecer.

Por outro lado, os «objetores do aborto», normalmente designados por «pró--vida», avançam com os seguintes argumentos:

• A vida humana é um valor inalienável e primordial. O aborto é um atentadocontra a vida humana. Logo, é inaceitável.

• Todos os seres humanos têm igual dignidade, independentemente da idade, dograu de desenvolvimento físico ou mental, da saúde, da etnia… Abortar porqueum feto sofre de malformações ou por outro motivo qualquer é considerarmenos dignas determinadas pessoas.

• Há soluções alternativas, eticamente aceitáveis, para o caso de uma gravidez

indesejada: por exemplo, a adoção.

Mesmo para os que rejeitam a prática abortiva, é aceitável que se intervenhamedicamente quando a vida da mulher corre sérios riscos, ainda que daí resulte amorte do feto, porque nestes casos não há intenção de matar um ser humano, mas desalvaguardar a vida da mulher.

Para que o aborto seja excluído ou reduzido ao mínimo, todos defendem apromoção do planeamento familiar e a adoção de medidas socioeconómicas de apoioàs famílias e às mães solteiras, bem como a educação sexual dos jovens.

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unidade 16

O ABORTO EM DEBATE

A FAVOR CONTRA

A mulher tem direito a tomar as decisõesque entender a respeito do seu própriocorpo.

 O embrião e o feto não são um ser humano.

É humilhante para a mulher ser levadaa tribunal por abortar. Passa a serduplamente vítima.

Não se podem desprezar as diculdadeseconómicas e sociais de educar um lhonão desejado.

 A despenalização é necessária para resolvero problema do aborto clandestino.

As mulheres têm direito de abortar emcondições de segurança. O aborto só éperigoso quando é feito sem condiçõesde higiene e por pessoal incompetente.

O primeiro direito da criança é ser desejada.

 A penalização do aborto não eliminao aborto.

E nos casos dramáticos em que o bebé édeciente, em que há perigo para a saúdepsíquica da mãe, em que a gravidez decorreude uma violação, ou nos casos em quea família é demasiado pobre?

O embrião é um ser distinto do corpomaterno. A mulher não tem o direitode tomar decisões sobre a vida do lho.

O embrião é um ser humano, pois nãohá pessoa que não passe pelas fasesembrionária e fetal.

 Há soluções jurídicas em que o abortocontinua a ser proibido, mas a mulher,mesmo que o cometa, não é penalizada.Pelo contrário, as clínicas clandestinas e ostécnicos envolvidos deverão ser penalizados.

Os problemas sociais e económicosresolvem-se com apoios adequadose não com o aborto.

 A lei não deve permitir o que estáeticamente errado só porque o Estado nãoconsegue ou não quer resolver os problemas,usando os meios adequados. Legalizar o queestá mal não elimina o mal: torna-o bom aosolhos das pessoas.Além disso, o aborto clandestino continuaráa existir, se não houver scalização por partedo Estado.

 O aborto não pode ser um direito, porqueestá em causa o valor da vida de outrem.Devem ser criadas condições para que todospossam ter lhos com dignidade.

O primeiro direito da criança é o direitoà vida.

 Isso é verdade, mas não é razão sucientepara o legalizar. A lei serve para regularo comportamento das pessoas em sociedadee para defender os seus direitos.

 Não se resolve uma diculdade, fazendouso de qualquer meio. Os meios usadostêm de ser eticamente corretos.O valor da vida humana é superior a outrosvalores, como a situação económica,a integridade mental ou física da criançae a saúde psíquica da mulher.

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unidade 1 27

Doc. 10Três razões médicas para ser a favor da vida intrauterina1 – Uma mulher normal, com uma gravidez normal e com um feto em

desenvolvimento, normal, não é uma pessoa doente. Por isso, ao médicoapenas cabe uma intervenção de vigilância que, em muitos países, é feitapor enfermeiras especializadas e o médico só é chamado a intervir quandohá risco de doença e a gravidez passa a ser classicada como gravidez derisco. Portanto, destruir um feto em desenvolvimento não é um ato médico,porque a gravidez não é uma doença. Nenhum médico o pode praticar emcircunstância nenhuma.

2  – E se a mulher grávida pedir o abortamento ao médico, invocandomotivos sociais ou económicos e declarando que não pode suportar maiso estado de gravidez? O médico terá de lhe responder que não pode dar

satisfação ao seu pedido porque a função que lhe cabe desempenharcomo médico e a sua competência especíca só podem estar ao serviço dodiagnóstico e tratamento de doentes.

Se a causa do pedido de abortamento não é uma doença mas umacarência nanceira ou um abandono e marginalização social, é às estruturasde proteção e segurança social e familiar que compete eliminar as causas dopedido de abortamento. Se o médico acolhesse o pedido e praticasse o crimedo abortamento, ofendendo as disposições do seu código de deontologia,não iria resolver nada; os ditos motivos sociais ou económicos cariam namesma ou piores do que estavam antes do abortamento. Este teria sido

um crime inútil e deixava a porta aberta para novo pedido de abortamentoalgum tempo depois.

3 – O médico não pode praticar o abortamento não só por estas duasrazões, mas ainda por outras de natureza médica. O médico sabe que estaintervenção abortiva sobre o corpo da mulher grávida, além de provocar,obviamente, a morte do feto, tem riscos importantes para a mãe, tanto noato de fazer o abortamento como no futuro, no que se refere à sua saúdegeral e à sua saúde sexual. Mesmo o chamado «abortamento seguro» podecomplicar-se com infeção uterina e das trompas, com septicemia, comesterilidade pós-abortamento, com depressão moderada ou grave; em casos

raros até com suicídio da mãe.Cabe ao médico, contudo, acolher as mulheres que se zeram abortar,sem qualquer discriminação, tratar as alterações patológicas de que sofram,físicas ou psicológicas, e promover a informação necessária para que aquelapessoa não volte a encontrar-se na situação que a levou a fazer-se abortar.

Daniel Serrão, http://aborto.aaldeia.net/ 

(09/12/2009)

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unidade 18

Proteger a vida

A Igreja católica afirma que o direito à vida é inviolável e que a vida humana deveser respeitada e protegida desde o momento da conceção; por isso, rejeita as práticasabortivas. Porém, tal como Jesus condenava o pecado mas absolvia o pecador, também

a Igreja condena o aborto mas manifesta enorme compreensão pelas mulheres queo praticaram. São inúmeras as instituições católicas de apoio às mulheres e à vida.

Doc. 11Vida humana — um bem a protegerA vida humana deve ser respeitada e protegida, de modo absoluto, a partir

do momento da conceção. Desde o primeiro momento da sua existência,

devem ser reconhecidos a todo o ser humano os direitos da pessoa, entre osquais o direito inviolável de todo o ser inocente à vida.

«Antes de te formar no ventre materno, Eu te escolhi; antes que saíssesdo seio da tua mãe, Eu te consagrei» (Jr 1, 5). «Tu conhecias já a minha alma enada do meu ser Te era oculto, quando secretamente era formado, modeladonas profundidades da Terra» (Sl 139, 15).

A Igreja armou sempre o erro moral de todo o aborto provocado.O aborto e o infanticídio são crimes abomináveis.

A colaboração formal num aborto constitui falta grave. A Igreja punecom a pena canónica da excomunhão este delito contra a vida humana. Não

pretende, deste modo, restringir o campo da misericórdia. Simplesmente,manifesta a gravidade do crime cometido, o prejuízo irreparável causado aoinocente que foi morto, aos seus pais e a toda a sociedade.

Catecismo da Igreja Católica , 2270-2272

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unidade 1 29

Doc. 12Democracia e abortoQuando a lei, votada segundo as chamadas regras democráticas, permite

o aborto, o ideal democrático, que só é tal verdadeiramente quando reco-nhece e tutela a dignidade de toda a pessoa humana, é atraiçoado nas suaspróprias bases: Como é possível falar ainda de dignidade de toda a pessoahumana, quando se permite matar a mais débil e a mais inocente? Emnome de qual justiça se realiza a mais injusta das discriminações entre aspessoas, declarando algumas dignas de ser defendidas, enquanto a outrasesta dignidade é negada? Deste modo e para descrédito das suas regras, ademocracia caminha pela estrada de um substancial totalitarismo. O Estadodeixa de ser a «casa comum», onde todos podem viver segundo princípiosde substancial igualdade e transforma-se num Estado tirano, que presume

poder dispor da vida dos mais débeis e indefesos, como a criança ainda nãonascida, em nome de uma utilidade pública que, na realidade, não é senão ointeresse de alguns.

 João Paulo II, O Evangelho da Vida

Combater o aborto pela adoção

Nós estamos aqui hoje porque fomos amados por Deus, que nos criou, e pelos

nossos pais, que nos aceitaram e gostaram sucientemente de nós para nos

darem a vida. A vida é o maior dom de Deus, que criou um mundo sucientemente

grande para todas as vidas que ele deseja que nasçam. Só os nossos corações

é que não são sucientemente grandes para as desejar e aceitar. Como seria

 bonito se todo o dinheiro utilizado para encontrar formas de matar pessoas fosse

utilizado, em vez disso, para as alimentar, acolher e educar!

Temos demasiadas vezes receio dos sacrifícios que devemos fazer. Mas onde

há amor, há sempre sacrifício, e quando amamos até nos fazer doer, há sempre

alegria e paz. Com o aborto, está a dizer-se ao pai que ele não precisa de assumirqualquer responsabilidade pelo lho que trouxe ao mundo. E é muito provável

que esse mesmo pai possa colocar outras mulheres perante a mesma situação

difícil. Assim, o aborto conduz a mais abortos.

Estamos a combater o aborto pela adoção — cuidando da mãe e adotando a

criança. Salvámos milhares de vidas. Por favor, não matem os bebés. Entreguem-

-mos. Estou disposta a receber qualquer bebé que pretendam fazer abortar e a

entregá-lo a um casal que o amará e será amado por ele. Só na nossa casa de

Calcutá salvámos mais de três mil crianças de abortos. Estas crianças trouxeram

muito amor e alegria aos seus pais adotivos e, por sua vez, cresceram no meio do

amor e da alegria. Para mim, as nações que legalizaram o aborto são as nações

mais pobres.

Teresa de Calcutá, Discurso na Conferência Internacional

sobre População e Desenvolvimento 

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unidade 10

Doc. 13Canção Inocente

Menino: queres ser meu mestre?— Contigo tinha tanto que aprender!

A ser casto, sem querer;a ser bom, sem o saber;

a ser alegre, sem termotivos para o ser.

Menino: queres ser meu mestre?— Deixa o teu arco aí. Vem-me ensinar

a sorrir e a conar;a ter esperança e a perdoar;a esquecer e a chorar…

Menino que brincas no jardim:— Tu sim,podias ser um mestre para mim!

Carlos Queiroz, «Boletim Cultural», Na Rota das Palavras

O preconceitoO preconceito funda-se num juízo preconcebido, injustificado e irracional.

Manifesta-se geralmente em atitudes discriminatórias relativamente a determinadas

pessoas, lugares ou tradições que, pelo simples facto de serem diferentes, sãoconsiderados destituídos de valor. Indica, portanto, desconhecimento e ignorânciarelativamente ao outro que é desconsiderado. Em geral, a ignorância produz o medodo que se desconhece e conduz à adoção de comportamentos defensivos que podemmanifestar-se desde a simples indiferença até à violência explícita. O outro cuja verdadeira natureza se ignora é entendido como uma ameaça, como um potencialinimigo que deve, por conseguinte, ser combatido ou mesmo eliminado.

O ponto de partida do preconceito é uma generalização injustificada, chamadaestereótipo. Por exemplo: «todos os ciganos são ladrões», «todos os brancos sãoarrogantes», «os espanhóis não são de fiar»…

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unidade 1 31

O preconceito é sempre uma atitude errada e imoral, porque não se baseiaem nenhuma justificação racional, mas na ignorância e no medo que essedesconhecimento provoca em nós. O preconceito conduz ao autoritarismo, àdiscriminação, à marginalização e à violência.

É possível identificar preconceitos de ordem religiosa, económica, política, cul-

tural, étnica, racial… Os Egípcios, por exemplo, mantiveram os Hebreus naescravidão durante mais de quatro séculos. Os Persas, no tempo do apogeu do seuimpério, consideravam-se superiores ao resto da humanidade. Também os Romanos,os povos germânicos ou os Normandos, entre outros, tinham o mesmo conceito desi próprios. Os Gregos consideravam bárbaros todos os povos que não falassem oidioma grego; para os Romanos eram bárbaros todos os povos que não falavam latim.Para os Europeus, os Africanos e os Índios das Américas eram selvagens e pagãos.

De uma forma geral, ao longo da história da humanidade, os estrangeiros foramsendo desconsiderados, identificados com o inimigo e submetidos à fúria do ódio,apenas pelo simples facto de pertencerem a um grupo étnico ou cultural diferente. Edesse estereótipo decorreram as guerras, a violência entre povos e a morte de muitos

seres humanos, vítimas do preconceito dos mais fortes.

O racismo

O racismo é uma forma de pensar (uma ideologia) e de agir fundada numpreconceito. Acredita-se que alguns indivíduos ou grupos, pelo simples facto depossuírem determinadas caraterísticas físicas hereditárias, bem como certo tipode manifestações culturais, são seres inferiores. O racismo baseia-se em opiniõespreconcebidas e injustificadas segundo as quais as diferenças biológicas entre osseres humanos lhes atribuem um estatuto superior ou inferior. De acordo com estaideologia, os seres humanos não têm todos o mesmo valor nem são todos dotadosda mesma dignidade. O valor depende da sua pertença a determinados gruposraciais. O racismo pretende justificar a escravidão, a opressão, o domínio de unspovos sobre outros, o genocídio contra um grupo, uma etnia…

O racismo afirma a necessidade de um grupo social dominante, seja emtermos económicos seja numéricos, se distanciar de outros grupos que, por razõeshistóricas, possuem tradições ou comportamentos diferentes. O grupo dominanteconstrói um mito (um estereótipo) sobre os outros grupos e com base nessa ideiapreconcebida nega-lhes a liberdade ou mesmo o direito à existência.

Ser racista é desprezar o outro em nome da sua pertença a um grupo que se

distingue pela cor da pele ou por outras caraterísticas físicas, normalmenteassociadas ao uso de uma língua própria, à prática de uma religião diferente,etc. Os racistas utilizam sempre argumentos de ordem irracional para justificar ahierarquização entre as pessoas.

Cícero, lósofo romano, já dizia que «os homens diferem pelo saber, mas sãoiguais na sua aptidão para o saber». As diferenças entre as pessoas ou os gruposhumanos não justificam que se lhes atribua um valor diferente. Ser pobre ou rico,pertencer a um país ou a outro ou ter determinada cor de pele não retira nemacrescenta dignidade e valor às pessoas.

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unidade 12

m pleno século XX,partir de 1948, narica do Sul, o regime

o apartheid mantevepopulação africanab o domínio de

m povo de origemropeia. Este regime

olítico racista chegouseu termo quando,

or pressão mundialapós a libertação deelson Mandela, foramnvocadas as primeiras

eições para um governo

ultirracial de transição,m abril de 1994.

Saber +Doc. 14

Identifcação com a espécie humana

Na nossa história mais remota, os indivíduos mantinham obediênciaem relação ao seu grupo tribal direto, todos ligados por consanguinidade.À medida que o tempo foi passando, a necessidade de comportamentocooperativo — na caça de animais corpulentos ou de grandes manadas,na agricultura e no desenvolvimento das cidades — agregou os sereshumanos em grupos cada vez maiores.

Hoje, um instante particular na história de quatro mil milhões e meio deanos da Terra e na história de vários milhares de anos da espécie humana,a maioria dos seres humanos tem a sua principal delidade para com anação-estado.

Muitos dirigentes visionários idealizaram uma época em que a

delidade de um ser humano individual não será para com a sua nação--estado particular, raça ou grupo económico, mas para com a espéciehumana como um todo, quando o bem-estar de um ser humano de outrosexo, raça, religião ou crença política a dez mil milhas de nós nos for tãovalioso como o de um nosso irmão ou vizinho. A tendência é nesta direção,mas é angustiantemente lenta.

Adaptado de Carl Sagan, As Ligações Cósmicas

O nazismo

A seguir à Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a Alemanha foi obrigada aassinar, em 1919, o Tratado de Versalhes, que lhe impunha pesadas obrigações por serresponsável pelo conflito bélico. Esta situação, acompanhada da crise económica quegerou, em poucos anos, vários milhões de desempregados, conduziu a conflitos sociais.Surgiram, neste cenário político e económico, partidos ultranacionalistas. Um dessespartidos chamava-se Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães (Partido

Nazi) e era liderado por Adolf Hitler.

Milhões de desempregados e grupos dominantes descontentes passaram a acreditarnas promessas de Hitler de transformar a Alemanha num país rico e poderoso. Naseleições de 1932, o Partido Nazi conseguiu obter a maioria dos votos. O  führer  (líder,chefe) iniciou uma propaganda alienante, recorrendo à violência policial para implantaruma cruel ditadura.

O povo alemão, como todos os outros, era bastante miscigenado (mistura de váriasraças e etnias) e, portanto, não havia propriamente uma «raça pura» cujos traços físicosfossem inteiramente distintos do resto da humanidade. Mas a propaganda nazi defendiaa pureza racial do povo alemão e a sua superioridade em relação a todos os povosexistentes à face da Terra. Um sentimento de hostilidade e aversão dirigido a pessoas,culturas e religiões não dominantes fez-se sentir de forma violenta. Defensores daxenofobia (medo e hostilidade aos estrangeiros) e da ideologia racista, implementaram

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unidade 1 33

formas de discriminação com vista a «purificar» o povo alemão de todo o contágio quepudesse tornar-se um obstáculo à manutenção da «raça pura ariana».

A sede de poder de Hitler não tinha limites. Invadiu e anexou vários paíseseuropeus, dando origem à Segunda Guerra Mundial. Contudo, de entre todos os povos,alguns foram vítimas de um ódio especial: os judeus. O grande objetivo de Hitler era

a extinção do povo judeu (a «solução final»). Por isso, confinou a população judaicaa guetos, sujeitou-a à deportação em massa e isolou-a em campos de concentração,onde, para além de ser sujeita a trabalhos forçados, vivia em condições degradantes edesumanas, era permanentemente torturada e utilizada como cobaia em experiênciascientíficas. Estas experiências tinham por objetivo melhorar artificial e cientificamentea «qualidade» da população alemã. Estima-se que cerca de seis milhões de judeus foram vítimas do nazismo. A este genocídio chama-se geralmente «holocausto».

Mas o ódio de Hitler não se confinava apenas ao povo judeu. Incluía tambémos militantes comunistas, os homossexuais, os ciganos, os deficientes motores, osdeficientes mentais, os ativistas políticos, as Testemunhas de Jeová, crentes de Igrejascristãs que se lhe opuseram, sindicalistas, doentes psiquiátricos, etc. Enfim, não se

circunscrevia apenas àqueles que pertenciam a etnias consideradas pelo nazismo comoindignas de existir, abrangendo igualmente todos os que se opuseram à sanguináriaideologia nazi.

Entre muitos outros exemplos de oposição corajosa ao nazismo, podemos destacarDietrich Bonhoeffer, pastor da Igreja luterana; Alfred Delp, padre jesuíta; NikolausGross, beaticado por João Paulo II; o padre Augustinus Rösch, provincial da Bavierae o conde Peter Yorck. Rejeitaram formalmente o culto nazi a Hitler assinando aDeclaração de Bremen, em 1934, onde se arma que «Jesus Cristo, e não homem algumou Estado, é o nosso único Salvador». Auxiliaram vários judeus a fugir da perseguiçãoe combateram ativamente o regime de Hitler. Todos eles foram detidos e assassinados.

A palavra «Holocausto»(em grego antigo:òλόκαυστον, òλον [todo] + καυστον [queimado])tem origens remotasem sacrifícios e rituaisreligiosos da Antigui-dade, em que plantas eanimais (e até mesmoseres humanos) eramoferecidos às divindades,sendo completamentequeimados durante oritual. Assim, holocaustoquer dizer cremação dos

corpos.

Dietrich Bonhoeffer nasceu a 4 de fevereiro de 1906, em Breslau (Alemanha), no seio deuma família muito conceituada (o pai era um distinto neuropsiquiatra). Estudou Teologia naUniversidade de Tubinga e mais tarde na Universidade de Berlim. Desempenhou a funçãode pastor luterano na comunidade evangélica alemã em Barcelona e, em 1930, partiu paraNova Iorque para ensinar no Union Theological Seminary. Em 1931 iniciou a sua carreiracomo professor de Teologia na Universidade de Berlim, tendo sido ordenado ministro daIgreja luterana. A 1 de fevereiro de 1933, dois dias após a nomeação de Hitler como

chanceler, foi interrompida a emissão radiofónica de Bonhoeffer no momento em quedenunciava o totalitarismo. Em 1934, ajudou a organizar a Igreja confessante, que constituiuuma resposta crítica ao nazismo e à restante Igreja luterana que se sujeitara a Hitler.Em 1936 foi proibido de ensinar na Universidade de Berlim e a Gestapo encerrou o seminárioda Igreja confessante. Em 1938 iniciou os contactos com os adversários de Hitler. Em 1939deslocou-se a Inglaterra e aos Estados Unidos para partilhar os seus receios a respeito donazismo. Contra a vontade dos seus amigos, regressou à Alemanha porque «Não tereio direito de participar na reconstrução da vida cristã na Alemanha depois da guerra, senão viver com o meu povo as provações do tempo presente». Em 1940 acusou «a Igrejade se manter calada quando deveria gritar porque o sangue inocente brada aos céus».Em 1943 foi encarcerado na prisão berlinense de Tegel, acusado de auxiliar judeus ede participar na resistência ao nazismo. Em 1944 foi transferido para o cárcere daGestapo em Berlim. Após um julgamento sumário, foi executado em Flossenburg(Alemanha), a 9 de abril de 1945.

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Dietrich Bonhoeffer

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unidade 14

Alfred Delp  nasceu a 15 de setembro de 1907, em Mannheim (Alemanha), lho de paiprotestante e mãe católica. Em 1926 ingressou na Companhia de Jesus e em 1937 foiordenado padre católico. Em 1941 foi designado reitor de uma igreja em Munique. Para alémde anunciar o Evangelho, auxiliou judeus a escaparem à perseguição nazi. A oposição demuitos jesuítas ao nazismo levou alguns à prisão e limitou o seu campo de ação. O superior

provincial da Companhia de Jesus na Baviera, padre Augustinus Rösch, e o padre AlfredDelp integraram o movimento de resistência antinazi, na linha do que Delp proclamava:«se houver um pouco mais de verdade e luz no mundo pela ação de um ser humano,a sua vida já ganhou sentido». A partir de 1942 reuniam-se regularmente com o grupoclandestino para desenvolver o modelo de uma nova ordem social após a queda do nazismo.Depois de terem falhado o golpe contra a vida de Hitler a 20 de julho de 1944, uma comissãoespecial da Gestapo prendeu todos os conhecidos membros da resistência. Delp foiencarcerado em Munique, a 28 de julho de 1944, embora não estivesse diretamente envolvidono golpe. Foi transferido para a prisão de Tegel, em Berlim, julgado, em conjunto com outrosmembros da resistência, e condenado à morte por alta traição, uma vez que tinha participadono movimento de resistência antinazi. A pena foi executada a 2 de fevereiro de 1945.

Nikolaus Gross nasceu a 30 de setembro de 1898, na Alemanha, e foi mineiro, como o seupai. Prosseguiu os seus estudos à noite até se tornar secretário da juventude da AssociaçãoCatólica dos Trabalhadores Mineiros. Em 1926 tornou-se editor de um jornal diário, órgãoocial do movimento católico dos trabalhadores. Aí desenvolveu a sua atividade crítica aonazismo. Depois de ter sido suspenso, o jornal foi denitivamente encerrado pelo regimenazi. Gross assumiu a liderança do movimento católico dos trabalhadores em Dusseldorf, oque lhe permitiu realizar muitas viagens e programar atividades de resistência ao nazismo,discutindo com outros companheiros alternativas ao regime nazi. Na sequência do ataquefalhado à vida de Hitler (20 de julho de 1944), Gross foi feito prisioneiro a 12 de agosto de1944. Em 15 de janeiro de 1945 foi condenado à morte e a 23 de janeiro do mesmo ano foidecapitado em Berlim.

Alfred Delp

Nikolaus Gross

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unidade 1 35

A obra monumental da história da humanidade tem sido conseguir que acooperação entre as pessoas se sobreponha à competição e sobretudo ao ódio. A éticahoje dominante nas sociedades democráticas exige o respeito pela pessoa e pelos seus

direitos, garantindo o exercício da liberdade e o reconhecimento fundamental dos valores da igualdade e da fraternidade, que excluem quaisquer discriminações.Mas há situações que, pela sua complexidade, levantam dúvidas quanto à maneira

correta de atuar.

Valorizar a vida

Doc. 15Cuidar da vida até à morte

A revelação bíblica mostra-nos a existência humana como resultado dabondade divina, isto é, como um dom que suscita em nós gratidão e não nosdispensa da responsabilidade de cuidar dele. Para o crente, a vida não está àinteira disposição de quem quer que seja, não é arbitrariamente disponível,mas tem de ser respeitada como a condição básica de realização pessoal.A vida humana é prévia a qualquer projeto pessoal, por isso ninguém é senhorabsoluto da sua própria vida e muito menos senhor da vida dos outros.

A convicção de que só Deus é o Senhor da vida não retira ao ser humanoa sua responsabilidade de procurar as melhores opções para cuidar da vidaque tem diante de si. Cada pessoa deve ser respeitada como sujeito da suaprópria existência e nunca simplesmente como objeto do qual se possa

dispor arbitrariamente.

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unidade 16

Outras situações de agressão à vida, não levantando dúvidas, persistem nassociedades modernas, constituindo um apelo à consciência de todas as pessoas.

Tornou-se dominante uma conceção de autonomia em que a liberdadeindividual é elevada a direito absoluto. O ser humano atual quer não só serprotagonista da sua própria história, mas ter nas mãos todos os processosda sua vida. É neste sentido que parece aliciante poder antecipar a morte ou

prolongar o processo de morrer, de acordo com o que no momento for tidocomo mais vantajoso.

As novas possibilidades que nos são oferecidas pela medicina tambémtornam mais complexas as situações com que nos deparamos no âmbito doscuidados de saúde e do acompanhamento a doentes terminais.

A estes fatores circunstanciais acresce o facto de o próprio processo demorrer se ter transformado. Na maior parte das vezes morre-se em hospitaisou centros clínicos, nos ambientes anónimos e frios das instituições.O sofrimento associado a longas doenças terminais causa uma insegurançaadicional e diversos fatores contribuem para que os moribundos vivam uma

solidão preocupante.A obrigação moral de garantir à vida humana uma especial proteção está

testemunhada em preceitos primordiais da humanidade, com expressõesdiversas em todas as culturas, e codicada no mandamento bíblico doDecálogo: «Não matarás» (Dt 5,17). O respeito por este imperativo écertamente incompatível com qualquer forma de agressão direta à vidahumana, sempre que ela não ponha em causa a existência de outras pessoas.

 Nota pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa

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unidade 1 37

Doc. 16Idosos vítimas de crime

Nos últimos anos aumentaram as queixas de violência contra idosos. O au-mento da esperança média de vida, a par com o enfraquecimento dos sistemas deproteção social, coloca-os numa situação de grande fragilidade. É urgente mudarmentalidades e recuperar o respeito pelo saber de experiência feito.

Com o aumento da esperança de vida prevê-se que o número de pessoascom mais de sessenta anos duplique até 2015, passando de 542 milhões em 1995para 1200 milhões nessa data. A Organização Mundial de Saúde (OMS) receiaque este aumento, associado a uma certa quebra de laços entre gerações e aoenfraquecimento dos sistemas de proteção social, venha a agravar as situações deviolência.

Dados da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) revelam que,

nos últimos anos, se vericou um aumento de 20,4% do total de pessoas idosasvítimas de crime.

Por defeito tendemos a associar imediatamente o termo violência a maustratos físicos, no entanto, o âmbito da violência contra os idosos assume muitosoutros contornos tão ou mais graves do que a agressão física, tais como agressõespsicológicas, privação de cuidados adequados, abandono, desvalorização dasua personalidade e experiência, usurpação e administração indevida dos seuspróprios bens.

Igualmente associados à problemática dos idosos, a APAV tem recebidovários pedidos de apoio, por parte de prossionais de saúde, no sentido

de minimizar as consequências das situações dos idosos abandonados emhospitais e desenvolver estratégias para que essas situações aconteçammenos frequentemente. «Familiares que acompanham os seus doentes idososfornecem contactos errados ao hospital. Chegada a hora da alta, quando ohospital tenta entrar em contacto com eles, não consegue porque os dados sãofalsos. Estas situações não são pontuais, acontecem muito frequentemente ereetem a intenção nítida de abandonar os idosos», alerta Helena Sampaio.

A sociedade atual tem vindo a tratar muito mal os idosos, desvalorizando--os constantemente. Os ritmos de vida, as exigências prossionais e a falta demedidas especícas para o desenvolvimento de recursos para integração e

proteção dos idosos acabam por potenciar uma cultura em que os mais velhossão postos de parte por não corresponderem aos padrões sociais de beleza,dinheiro e consumo.

É preciso recuperar a importância do papel do idoso para a comunidade eassegurar ou reforçar a formação dos técnicos que trabalham diretamente comeles em casas de repouso e lares.

Se antigamente os mais velhos eram respeitados, tidos como fonte desabedoria, hoje a permanente falta de tempo e a busca incessante pela novidadeignora a sua experiência de vida. Esta é uma atitude que nos cabe alterar e queespelha também a nossa fuga perante o inevitável envelhecimento.

Vânia Machado, Família Cristã  , fevereiro de 2009

 

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unidade 18

Doc. 18Aumenta o número de dadores de órgãosO ano de 2008 registou um aumento signicativo de dadores de órgãos

inscritos nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde. Este acréscimotraduziu-se num aumento de 12,5% em relação ao ano anterior. Portugal

passou de uma taxa de 23,9 para 26,7 dadores por milhão de habitantes.Se temos um familiar ou amigo que precisa de um órgão para viver ou

melhorar a sua qualidade de vida e nós temos dois e podemos dispor de um,porque não?

Os estudos realizados comprovam que no seguimento da doação nãohá problemas para a saúde do dador e que, por ter maior acompanhamentomédico, vive até mais anos do que o não dador.

 Adaptado de http://www.asst.min-saude.pt/Paginas/asst.aspx 

Autoridade para osServiços de Sangue e da

Transplantação

Doc. 17Doação de órgãos

A doação de órgãos é uma forma peculiar de testemunho da caridade.Numa época como a nossa, com frequência marcada por diversas formas deegoísmo, torna-se cada vez mais urgente compreender quanto é determinantepara uma correta conceção da vida entrar na lógica da gratuidade.

De facto, existe uma responsabilidade do amor e da caridade quecompromete a fazer da própria vida uma doação aos outros, se quisermosverdadeiramente realizar-nos a nós próprios. Como nos ensinou o Senhor Jesus, só aquele que doa a vida a poderá salvar.

Bento XVI, novembro de 2008

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unidade 1 39

Doc. 19Quando um Homem Quiser

Tu que dormes à noite na calçada do relentoNuma cama de chuva com lençóis feitos de ventoTu que tens o Natal da solidão, do sofrimentoÉs meu irmão amigoÉs meu irmão.

E tu que dormes só no pesadelo do ciúmeNuma cama de raiva com lençóis feitos de lumeE sofres o Natal da solidão sem um queixumeÉs meu irmão amigoÉs meu irmão.

Natal é em dezembroMas em maio pode ser.Natal é em setembroÉ quando um homem quiser.Natal é quando nasce uma vida a amanhecerNatal é sempre o fruto que há no ventre da mulher.

Tu que inventas ternura e brinquedos para darTu que inventas bonecas e comboios de luar

E mentes ao teu lho por não os poderes comprarÉs meu irmão amigoÉs meu irmão.

E tu que vês na montra a tua fome que eu não seiFatias de tristeza em cada alegre bolo-reiPões um sabor amargo em cada doce que eu compreiÉs meu irmão amigoÉs meu irmão.

 José Carlos Ary dos Santos, As Palavras das Canções

Vitral da Natividade

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unidade 10

 Parábola do bom samaritano

Um certo doutor da Lei, que queria experimentar Jesus, levantou-

-se e fez-lhe esta pergunta:

— Mestre, que devo eu fazer para ter direito à vida eterna?26Jesus respondeu:

— Que diz a Escritura acerca disso e como a entendes tu?27E ele disse:

— Ama o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a alma,

com todas as forças e com todo o entendimento. E ama o teu próximo

como a ti mesmo.28Jesus comentou:

— Respondeste bem. Faz isso e terás direito à vida.29Mas o doutor da Lei, querendo justificar-se, disse a Jesus:

— E quem é o meu próximo?30Então Jesus respondeu:

— Ia um homem a descer de Jerusalém para Jericó. Caíram sobre ele

uns ladrões, que lhe roubaram roupa e tudo, espancaram-no e foram-se

embora deixando-o quase morto. 31 Por casualidade, descia um sacerdote

 por aquele caminho. Quando viu o homem, afastou-se para o outro lado.32Também por lá passou igualmente um levita que, ao vê-lo, se afastou

também. 33Entretanto, um samaritano, que ia de viagem, passou junto dele

e ao vê-lo teve pena. 34 Aproximou-se, tratou-lhe os ferimentos com azeite

e vinho e pôs-lhe ligaduras. Depois, colocou-o em cima do seu jumento,levou-o para uma pensão e tratou dele. 35No outro dia, deu duas moedas

de prata ao dono da pensão e disse-lhe: «Cuida deste homem e, quando eu

voltar, pago-te tudo o que gastares a mais com ele.»36Jesus perguntou então ao doutor da Lei:

— Qual dos três te parece que foi o próximo do homem assaltado pelos

ladrões?37E ele respondeu:

— O que foi bom para ele.

Jesus concluiu:

— Então vai e faz o mesmo.

Lc 10, 25-37

25

Na história do bom samaritano, Jesus afirma a dignidade da vida humana,qualquer que seja a sua proveniência, e revela a natureza de uma religião autêntica,que consiste não apenas na adesão a determinadas crenças ou na prática de algunsrituais, mas fundamentalmente numa vida orientada pelo princípio do amor aopróximo.

Chegada do Bom Samaritano,por Gustave Dore

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unidade 1 41

Um doutor da Lei interroga Jesus sobre o que deve fazer para alcançar a  vida

eterna. É a questão central da vida humana: Como alcançar a plenitude da vida,a felicidade sem limites? Mas, na boca do doutor da Lei, é também uma perguntaarmadilhada, porque pretendia apanhar Jesus em falso e conseguir matéria para ocondenar.

Jesus, porém, devolve-lhe a pergunta, conduzindo-o à Lei de Moisés, e o escribarecita o preceito do amor a Deus e ao próximo, tal como estava formulado emDt 6, 4 e Lv 19, 18. Vendo a sua síntese aprovada, o doutor da Lei acrescenta outraquestão muito discutida: «E quem é o meu próximo?» No tempo de Jesus, não haviaconsenso entre os mestres a respeito desta questão: o próximo será apenas o quepertence ao meu grupo étnico, à religião onde me insiro, ao grupo social de que façoparte? Jesus, no entanto, tinha uma perspetiva muito diferente da que era geralmentedefendida. É precisamente para explicar a sua interpretação que conta a «parábolado bom samaritano».

Para uma melhor compreensão desta parábola convém ter presente que Judeus

e Samaritanos eram dois povos que viviam separados por razões históricas. Arelação que estabeleciam era extremamente conflituosa. Os Judeus desprezavamos Samaritanos, por serem o resultado da miscigenação entre Israelitas e outrospovos estrangeiros e, para além disso, consideravam-nos hereges (partidários deuma religião semelhante à dos Judeus mas com algumas diferenças consideradasessenciais). Por outro lado, os Samaritanos retribuíam aos Judeus o mesmo desprezo.

A parábola situa-nos na estrada de cerca de trinta quilómetros que desce dacidade santa de Jerusalém para a cidade de Jericó. Era um itinerário perigoso, cheiode contracurvas e ravinas, onde facilmente se escondiam salteadores.

Ora «um homem» não identificado (pelo contexto, depreende-se que é um judeu,pois veio de Jerusalém) foi assaltado por bandidos e deixado caído na berma da estrada.

Trata-se, portanto, de um homem ferido, abandonado, a reclamar ajuda urgente.

O Bom Samaritano, por Uptton Clive

A Parábola é um recursoliterário muito utilizadopor Jesus. Trata-se deuma narrativa ctíciaconstruída a partir deambientes reais, como objetivo de iluminarum ensinamento éticoou religioso e provocaruma transformação de

comportamentos.

Os doutores da Lei ouescribas eram peritos nainterpretação da Lei deMoisés, cujo cumprimentoprocuravam impor aopovo.

Os sacerdotes , no tempode Jesus, eram ministrossagrados encarregues

de oferecer diariamentesacrifícios no Templode Jerusalém. Além dastarefas cultuais, competia--lhes a instrução do povoem assuntos religiosos e aadministração dos bens doTemplo.

Os levitas eramauxiliares dos sacerdotes,constituindo uma espéciede baixo clero.

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unidade 12

Pela estrada passaram sucessivamente um sacerdote e um levita que o ignoraram.Nada se diz a respeito das razões que levaram estes homens a não prestar ajuda aomoribundo. Talvez o medo de serem também eles assaltados, ou a preocupação coma pureza legal (que proibia que tocassem num cadáver), ou a pressa, ou a simplesindiferença diante do sofrimento alheio. Apesar dos seus conhecimentos religiosos,não se sentem animados por qualquer espécie de sentimento de misericórdia! Elessabem tudo sobre Deus, lidam diariamente com o culto divino, mas, afinal, nadasabem a respeito da sua verdadeira natureza: o amor e a vida em plenitude. A suareligião resume-se a um conjunto de ritos estéreis, cerimónias faustosas e solenes,

contudo sem a densidade espiritual que só o amor pode oferecer.Pela estrada passou, finalmente, um samaritano. Um estrangeiro, um inimigode Israel e da sua religião, um infiel às tradições judaicas antigas, um homem que vivia, sob a ótica dos Judeus, longe da salvação e do amor de Deus. No entanto, foiele quem parou — sem medo de correr riscos ou de adiar os seus interesses pessoais— para cuidar do homem estendido na berma da estrada. O samaritano poder-se-iater deixado conduzir pelo ódio entre os dois povos. Porém, a sua atitude marcou adiferença. Cheio de compaixão, aproximou-se do homem caído, desinfetou-lhe asferidas com vinho, atenuou-lhe as dores com azeite, levou-o para a estalagem e aindapagou para cuidarem dele. Apesar de ser um estrangeiro e de pertencer a outro gruporeligioso, deixou-se guiar pela atenção ao outro, independentemente do seu grupo de

pertença, por um coração repleto de amor e, portanto, cheio de Deus.

A PALESTINA

NO TEMPO DE JESUS

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Dan

Rafna

Canaina

Dion

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Gadara

Gerasa

Adabá

Siquém

AlexandreionGadara

Filadélfia

Hesebon

Madebá

Dibon

Maqueronte

Pella

Dotan

Apolónia

Antipatris

Jope

Lida

Jámnia

Azoto

Azeca

Jericó

Gálgala

HerodionGal

Laquis

Bersabé

Aroer 

Adoraim

Hebron  Hifcania

Massada

Arad

Betânia

Belém

Gaza

Rafia

Ascalon

Alalon

Emaús

Efraim

Arimateia

Abila

Betsaida

Cesareia de Filipe(Panias)

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B  A T  A N  E  I  A 

A U RA N Í T I D

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G  A U  L A N  Í   T  I  D  E  

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Corozaim

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Cafarnaum

Caná   Magdala

Tiberíades

Nazaré

Naim

CesareiaCitópolis

Lago

deGenesar et

M ont e  Tabor   R i o  J a r m

 u c

M ont e  He r mon

P   l   a  n  í   c  i   e   d   e   E   

s  d   r  e  t   o  n  

 SA MA R IA

D  E  C  Á  P  O  L E  

   R   i  o   J  o  r   d   ã  o

Rio J aboc

Sebaste

(Samaria) Monte Ebal 

Monte Garizim

Monte Carmelo

 J  U  D  E  IA

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DesertodeJudá

Jerusalém

R i o   Ar  n o  n  

0 10 20 30 40 50

km

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       T

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- Território sob a dependência do Procurador romano

- Tetrarquia de Herodes Antipas

- Tetrarquia de Filipe

- Província romana da Síria

- Decápole

- Territórios independentes

O Bom Samaritano,por autor anónimo

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unidade 1 43

Ao eleger como modelo um samaritano, Jesus ultrapassa as expetativas do doutorda Lei, dado que o herói da história não é quem seria de esperar, mas, pelo contrário,alguém que despertava os piores sentimentos: um excluído, um estrangeiro, um sermenor.

Toda a parábola se centra na ideia de que o amor não tem qualquer espécie de

limite, é universal, estende-se a todas as pessoas, porque todas são portadoras damesma dignidade. E é sobretudo aquele que precisa do nosso auxílio que constituio nosso próximo. O critério do amor concreto não é a pertença étnica, religiosa ououtra, mas a necessidade das pessoas que se cruzam connosco no percurso da vida.

Com este desao — «vai e faz o mesmo» — Jesus desloca totalmente o centro daquestão. Não se trata de saber quem é o nosso próximo, porque toda a criatura humanao é; trata-se, isso sim, de saber como nos tornamos próximos do outro. A narrativainverte os papéis e coloca o próximo não do lado daquele que deve ser amado, masdaquele que deve amar. O doutor da Lei esperava um esclarecimento teórico, porémfoi remetido para a sua responsabilidade de praticar os mandamentos. O amor aopróximo não é assunto de debates teóricos, de definições abstratas e de discussões

sem fim, na preocupação de delimitar as fronteiras do campo do amor, identificandoo próximo a incluir ou a excluir. O amor ao próximo é sinónimo de disponibilidadepara ajudar qualquer pessoa que precise, seja amiga ou inimiga, conhecida oudesconhecida, da mesma etnia ou de qualquer outra; significa reconhecer em todos eem cada um a dignidade de ser pessoa.

A pergunta inicial era: «Que fazer para ter direito à vida eterna?» A conclusão éóbvia: para alcançar a felicidade é preciso amar a Deus e tornarmo-nos próximos dosque necessitam da nossa ajuda. Trata-se, portanto, de fazer com que o amor percorraas duas coordenadas fundamentais da existência: a vertical (relação com Deus) e ahorizontal (relação com os outros).

O Bom Samaritano,por Van Gogh

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unidade 14

O Bom Samaritano, por autor anónimo

Doc. 20Estrada de Jericó

Na longa estrada de JericóUm homem sofre e eu vou passar

Vou apressado, vou em missãoMas bate triste meu coração

Se eu penso em mim, tu fcas só

Se eu penso em ti, seremos nós

A tua dor vai acabarE eu mais seguro vou caminhar

Seremos dois a enfrentarA longa estrada de JericóNão temerei, não temerásOs salteadores que espreitam lá

Se eu penso em mim...

E na cidade de JericóVamos jantar amor e pãoE quem nos vir, há de pensarVale sempre a pena estender a mão

Fernando Fonseca

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unidade 1 45

Ao longo da história, encontramos vários testemunhos de pessoas que, com todaa dignidade, foram capazes de entregar a sua própria vida em prol dos outros. GianaBeretta Molla é um exemplo radical de sacrifício da própria vida em benefício da vidade outrem.

Dar a própria vida pelo outro

Doc. 21Mãe de FamíliaGianna Beretta Molla  (1922-1962), médica italiana, casada e mãe de

quatro lhos, foi proclamada santa pela Igreja católica.Fruto do seu matrimónio com Pietro Molla nasceram quatro crianças:

Pierluigi, Mariolina, Laura e Gianna Emanuela. Na última gestação, aos 39anos, descobriu que tinha um broma no útero. Foram-lhe apresentadas trêsopções: retirar o útero doente, o que ocasionaria a morte da criança, abortaro feto ou, a mais arriscada, submeter-se a uma cirurgia de risco e preservar agravidez. Não hesitou! Disse: «Salvem a criança, pois tem o direito de viver eser feliz!» Submeteu-se à cirurgia no dia 6 de setembro de 1961.

Gianna Beretta

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unidade 16

Alguns dias antes do parto, sempre com grande conança em Deus,disponibilizou-se para sacricar a sua vida se essa fosse a condição parasalvar a do lho: «Se tiverem de decidir entre mim e o meu lho, nenhumahesitação: exijo que escolham a criança. Salvem-na». Deu entrada, para oparto, no hospital de Monza, na Sexta-feira Santa de 1962. No dia seguinte,21 de abril de 1962, nasceu Gianna Emanuela. Gianna Beretta morreu no dia28 de abril seguinte.

Foi beaticada no dia 24 de abril de 1994, no Ano Internacional da Família,e canonizada no dia 16 de maio de 2004, recebendo do papa João Paulo IIo sugestivo título de «Mãe de Família». Na cerimónia estiveram presentes oseu marido, as lhas Gianna Emanuela e Laura e o lho Pierluigi.

Adaptado de http://www.vatican.va/ (14/12/2009)

Três Idades da Mulher, por Gustav Klimt

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unidade 1 47

Perspetivas de futuro

A prática dos  valores éticos  — como o respeito, a tolerância, a paciência,

a solidariedade, o carinho, a dedicação, o diálogo, a justiça… — é essencial aoreconhecimento efetivo da dignidade da vida humana.

Numa sociedade marcada pelos valores económicos, que atribui maior impor-tância ao ter do que ao ser, em muitas situações parece prevalecer a importância daaquisição e manutenção de bens materiais em detrimento da defesa do valor essencialque é a pessoa humana. Todos os dias vemos, ouvimos e lemos notícias em que seatenta contra a dignidade da vida humana por razões insignificantes: uma discussãomotivada pela simples e natural diferença de opiniões ou a disputa acerca de umapropriedade. E a violência gera sempre mais violência.

Num processo de desculpabilização, encontramos atenuantes que pretendem«explicar» os nossos desvarios em momentos de mau humor: a desestruturaçãofamiliar, a pobreza, o desemprego, o deficiente acesso à educação ou à saúde, ausênciade perspetivas de futuro, incapacidade para sonhar ou para nos empenharmosfortemente na realização dos nossos sonhos. E apesar de não constituírem justificaçõespara os nossos comportamentos desumanos, são motivos que nos põem à mercê dosnossos piores instintos. É, pois, essencial ter um projeto de vida que nos abra as portasao futuro, à mudança, ao crescimento interior, à realização pessoal, profissional efamiliar. E simultaneamente acreditar que somos capazes de construir e concretizaresses projetos, enquanto nos esforçamos por fazê-lo.

Cada pessoa vale por si mesma. Não porque alguém a ama e lhe quer bem, ou

porque é reconhecida pelos demais ou pelo Estado (embora, por ser pessoa, mereçaser amada e respeitada por todos). É por causa do valor inalienável de cada pessoa quetodos têm direito a ser reconhecidos e valorizados, sobretudo os mais vulneráveis, osque se sentem excluídos e aqueles cuja voz não é escutada pela sociedade.

Onde não há reconhecimento da dignidade, não há humanidade. Daí que adignidade humana exija a responsabilidade de cada um pelo seu próximo.

Não pode haver paz verdadeira sem respeito pela vida.

João Paulo II

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unidade 28

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unidade 2 49

Nesta unidade vamos refletir sobre:

• A questão da existência de Deus

• O ateísmo, o agnosticismo e a adesão confiante

• As razões para acreditar na existência de Deus

• A fé como acolhimento e confiança no sentido da vida

• As representações da divindade no Antigo Egito e no

politeísmo greco-romano• Deus no Antigo e no Novo Testamentos

• Deus na arte

• A bondade e imensidão infinita de Deus

• Solidariedade e fraternidade: testemunhos de vidascom sentido

UNIDADE LETIVA 2

Deus, o grande mistério

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unidade 20

Olá!

O meu nome é Teresa. Sou conhecida por Teresa de Lisieux e por Teresinha

do Menino Jesus.

Nasci em 1873 no norte de França. A minha mãe, Zélia, partiu para o céu

quando eu tinha quatro anos; estabeleci então uma forte ligação à minha irmã

Pauline, que se tornou a minha segunda mãe. Depois, mudámo-nos — o meu pai,

Luís, eu e as minhas três irmãs — para Lisieux.

Os meus pais eram profundamente religiosos. Todos os dias rezavam e tudo

era feito para que se cumprisse a vontade de Deus. As minhas irmãs entraram

no Carmelo (convento das irmãs carmelitas) e eu senti, ainda adolescente, um

amor profundo por Deus. Tornar-me freira foi o caminho que escolhi para viver

esse amor.

Com 16 anos entrei no convento. Na vida rotineira e tranquila que incluía

momentos de oração e trabalhos domésticos, descobri a «pequena via», a via

do amor que se revela nas pequenas coisas do dia a dia. Deixei que Deus me

envolvesse com o seu amor intenso e apaixonante, ele que é a origem do amor,que é o próprio Amor. Simplesmente deixei-me conduzir por Deus. Entregava-

-me a todas as atividades com generosidade, como se fosse o próprio Deus a

pedir-me que o fzesse. Era a ele que eu servia. Esta descoberta trouxe-me uma

felicidade imensa, que pensei não existisse. Desejava que todos experimentassem

esse amor.

Sei que vives num tempo e numa época onde o amor de Deus é muito

necessário. Nesta unidade ousa fazer a descoberta radical de Deus, do Amor que

existe no teu coração e no abraço dos que precisam de ti.

Teresa de Lisieux morreu na noite de 30 de setembro de 1897, com apenas 24anos.

Em 1920, foi declarada santa e mais tarde doutora da Igreja por causa dos seusbelíssimos escritos, sobretudo a História de uma Alma, onde descreve o seu percursoespiritual de encontro com Deus.

Por causa do seu amor universal e do desejo profundo de que todos os sereshumanos encontrem Deus, foi proclamada padroeira dos missionários, aqueles queanunciam Deus e partilham com os mais pobres uma vida simples. A festa de SantaTeresinha do Menino Jesus celebra-se a 1 de outubro.

Compreendi que só o amor faz agir os membros da Igreja. Compreendique o amor encerra todas as vocações e que o amor é tudo, abraça todos ostempos e todos os lugares… Numa palavra, o amor é eterno… encontrei aminha vocação: o Amor!

Teresa de Lisieux

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unidade 2 51

A questão da existência de Deus

A questão de Deus é uma questão humana fundamental. De uma forma ou deoutra, todas as pessoas, questionando-se sobre si mesmas, sobre o sentido das suas

 vidas, acabam por levantar a questão de Deus.A procura do Transcendente, da Divindade, do Sagrado, é uma realidade humana

e universal. Sujeitas às mais variadas situações existenciais, como a experiência dosofrimento, da finitude, da ausência de sentido, ou, pelo contrário, a experiênciado encontro, da verdade, da felicidade, as pessoas acabam por se interrogar sobre aexistência de Deus.

O ser humano é um ser religioso. Desde sempre todos os povos procuram respostasàs questões profundas da existência humana: Qual a origem de todas as coisas? Qualo destino último de toda a realidade? Fará sentido a vida humana perante a morte?Poderemos esperar o triunfo do bem sobre o mal?

Perante interrogações como estas, Deus surge como a origem primeira e o fim

último, no qual se encontra a bondade sem limites e a esperança de uma felicidadesem ocaso.

Deus Pai, por Artus Quellinus

POSIÇÕES FACE À EXISTÊNCIA DE DEUS

Os ateus armamque não

Os agnósticosdeclaram que não

sabemOs crentes

acreditam que sim

Deus existe?

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unidade 22

O ateísmoAteísmo é uma palavra de origem grega composta por dois elementos: a (negação)

+ theos (deus), e significa literalmente «sem deus». É uma posição filosófica que negacategoricamente a existência de Deus ou de qualquer divindade.

Há vários tipos de ateísmo: desde o ateísmo teórico, que consiste na afirmaçãocategórica da não existência de Deus, até ao ateísmo prático.

Mesmo o ateísmo teórico tem muitas variantes. De um modo geral, radicanuma conceção materialista da realidade (nada há para além daquilo que se podeobservar, ou seja, do mundo material). Alguns consideram que o sofrimento humanoé insuperável e a existência de Deus é incompatível com o facto de haver sofrimento.Têm uma conceção pessimista da vida (Schopenhauer). Para outros, a vida é tãoabsurda, por causa do sofrimento e sobretudo da morte, que Deus não pode existir(Sartre). Outros ainda, consideram que Deus é uma projeção dos desejos humanos(Freud) ou um instrumento de fuga diante da tragédia da vida (Nietzsche). Há ainda

outros que, não conseguindo provas para a existência de Deus (pelo menos, provascientíficas), não estão dispostos a aceitar a sua existência. Para estes, o métodocientífico é o único que nos pode aproximar da verdade.

O ateísmo prático é a atitude das pessoas que vivem sem qualquer referência aDeus, indiferentes à questão do sobrenatural. Vivem como se Deus não existisse, enão se interessam pelas questões teóricas relacionadas com esta problemática.

thur Schopenhauer 788-1860), lósofoemão, escreveuma vasta obraentuadamentessimista, da qual sestaca O Mundo como

ntade e Representação.

Saber +

O ateísmo é uma opção filosófica de quem se assume responsável pelosseus atos e pela sua forma de viver, de quem dá valor à sua vida e à dos outros,de quem cultiva a razão e confia no método científico para construir modelosda realidade e de quem não remete as questões do bem e do mal para sereshipotéticos, nem para a esperança de uma existência após a morte.

Associação Ateísta Portuguesa, in http://www.aateistaportuguesa.org/

edrich Nietzsche 

844-1900), lósofoemão, escreveu, entreuitas outras obras,sim falava Zaratustra.

cou conhecido porr declarado a «morteDeus» na civilização

idental.

gmund Freud (1856-

939), fundador da

icanálise, foi um médicourologista austríaco. Aa teoria de que somosovidos pelo inconscientevolucionou a psicologia.an-Paul Sartre (1905-

980), lósofo francêsistencialista, acreditavae os intelectuais tinhamdesempenhar um

pel ativo na sociedade.or isso, apoiou causas

olíticas de esquerda comua vida e a sua obra.cusou o prémio Nobelliteratura em 1964.

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unidade 24

O agnosticismoAgnosticismo  é uma palavra de origem grega, composta por dois elementos:

a  (negação) +  gnose  (conhecimento), e significa literalmente «ignorância»,«desconhecimento». É uma teoria filosófica que afirma a impossibilidade de o ser

humano conhecer Deus, sendo, portanto, impossível pronunciar-se sobre a suaexistência. O agnosticismo opõe-se ao teísmo (crença na existência de um deuspessoal) por considerar que o conhecimento humano não tem qualquer possibilidadede aceder a Deus e opõe-se ao ateísmo porque também não encontra razões paranegar pura e simplesmente a sua existência. É, pois, uma atitude cética, na qual adúvida leva o ser humano a suspender o juízo acerca de Deus.

Para muitos agnósticos, é impossível ao entendimento humano conhecer Deus,porque ele se encontra para além das possibilidades dos métodos empíricos decomprovação científica.

Tenho consciência do sagrado, do mistério que há no ser humano, e não vejopor que não confessar a emoção que sinto diante de Cristo e do seu ensinamento…sinto grande respeito diante de Cristo, mas não creio na sua ressurreição.

Albert Camus, escritor francês do século XX

Não sou um ateu total, todos os dias tento encontrar um sinal de Deus, mas

infelizmente não o encontro.

José Saramago, escritor português

Virou-se para Deus minha alma triste!Amortalhei na Fé o pensamento,E achei a paz na inércia e esquecimento…Só me falta saber se Deus existe!

Antero de Quental, poeta português do século XIX

José Saramago

Antero de Quental

Albert Camus

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unidade 2 55

Fernando Pessoa

Doc. 23Da Existência de Deus

Os argumentos relativos ao problema da existência de Deus têm sidoviciados, quando positivos, pela circunstância de frequentemente sequerer demonstrar, não a simples existência de Deus, senão a existênciade determinado Deus, isto é, dum Deus com determinados atributos.Demonstrar que o universo é efeito de uma causa é uma coisa; demonstrarque o universo é efeito de uma causa inteligente é outra coisa; demonstrarque o universo é efeito de uma causa inteligente e innita é outra coisaainda; demonstrar que o universo é efeito de uma causa inteligente, innitae benévola outra coisa mais. Importa, pois, ao discutirmos o problemada existência de Deus, nos esclareçamos primeiro a nós mesmos sobre,primeiro, o que entendemos por Deus; segundo, até onde é possível umademonstração.

O conceito de Deus, reduzido à sua abstração denidora, é o conceito deum criador inteligente do mundo. O ser interior ou exterior a esse mundo,o ser innitamente inteligente ou não — são conceitos atributários. Commaior força o são os conceitos de bondade, e outros assim, que, como jánotamos têm andado misturados com os fundamentais na discussão desteproblema.

Demonstrar a existência de Deus é, pois, demonstrar (1) que o universoaparente tem uma causa que não está nesse universo aparente comoaparente, (2) que essa causa é inteligente, isto é, conscientemente ativa.

Nada mais está substancialmente incluído na demonstração da existênciade Deus, propriamente dita.

Reduzido assim o conteúdo do problema às suas proporções racionais,resta saber se existe no raciocínio humano o poder de chegar até ali, e,chegando até ali, de ir mais além, ainda que esse além não seja já parte doproblema em si, tal como o devemos pôr.

Fernando Pessoa, Ideias Filosófcas

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unidade 26

Doc. 24Todos são crentes

Todos os seres humanos estão conscientes do innito e da eternidade. Aúnica diferença que existe entre eles é saber até que ponto essa consciênciaabala cada indivíduo considerado isoladamente. Um acredita num deuspessoal acima das coisas e das pessoas, o outro acredita no seu próprioquerer como no seu deus, uns são humildes, outros revoltam-se, e todos —seja qual for o comportamento individual de cada um —, todos são crentes.

Arthur Schnitzler, Espírito e Religião

O Filho Pródigo,por Hans Feibusch

Arthur Schnitzler

Doc. 25O sofrimento de DeusQuando os meus lhos eram pequenos e eu pensava por eles e decidia

por eles, tudo era fácil e somente a minha liberdade estava em causa. Maschegado o momento em que eu pensei que o meu papel consistia emhabituá-los a escolhas progressivas, notei que a inquietação se instalavaem mim. Ao deixar os meus lhos tomar decisões e, portanto, correr riscos,

aceitava, ao mesmo tempo, o risco de ver surgir outras liberdades paraalém da minha. Se, muitas vezes, continuei a escolher em vez dos meuslhos, era, tenho de o confessar, para lhes poupar o sofrimento provocadopor uma opção que eles iriam talvez lamentar, mas era também, e talvezmais, para não experimentar a prova de um desacordo entre a sua escolhae aquilo que eu teria desejado que eles zessem. Isto signicava falta deamor da minha parte, porque agindo deste modo desejava essencialmentepôr-me ao abrigo de um possível sofrimento, o sofrimento que experimenteisempre que os meus lhos optaram por um caminho diferente daquele queme parecia o melhor para eles. Foi assim que comecei a perceber que Deus

«Pai» possa sofrer. Nós somos seus lhos. Ele quer que sejamos livres nonosso crescimento e o innito do seu amor impede-o de exercer qualquerconstrangimento. O seu amor puro, sem qualquer traço de cálculo, implica,desde o princípio, a aceitação do sofrimento inerente a esta liberdade totalque ele quer para nós.

François Varillon, O sofrimento de Deus

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unidade 2 57

A adesão confante

Cristo Redentor,Rio de Janeiro, Brasil

Doc. 26FéAs orações dos homensSubam eternamente aos teus ouvidos;Eternamente aos teus ouvidos soemOs cânticos da terra.

No turvo mar da vida,Onde aos parcéis do crime a alma naufraga,

A derradeira bússola nos seja,Senhor, tua palavra.

A melhor segurançaDa nossa íntima paz, Senhor, é esta;Esta a luz que há de abrir à estância eternaO fúlgido caminho.

Ah! Feliz o que pode,No extremo adeus às coisas deste mundo,Quando a alma, despida de vaidade,

Vê quanto vale a terra;

Quando das glórias friasQue o tempo dá e o mesmo tempo some,Despida já, — os olhos moribundosVolta às eternas glórias;

Feliz o que nos lábios,No coração, na mente põe teu nome,E só por ele cuida entrar cantando

No seio do innito.

Machado de Assis, Crisálidas

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unidade 28

A impossibilidade de demonstrar de forma evidente a existência de Deus nãoimplica que não haja razões que sustentem a fé  na sua existência. Deus não énenhuma hipótese absurda ou irracional. Bem pelo contrário. Mas sendo alguém queexiste para lá do universo, não se confundindo com nenhum objeto do mundo, nãoé possível utilizar os métodos das ciências para verificar a sua existência. Nenhum

telescópio pode observar Deus, porque ele não se encontra em nenhum ponto douniverso e, simultaneamente, encontra-se em todos os pontos do universo, porque épura presença espiritual.

Se pudéssemos compreender Deus totalmente, ele deixaria de ser Deus — oinfinito, o eterno, o absoluto — e passaria a ser um objeto limitado do mundo em que

 vivemos, que nós poderíamos manipular a nosso bel-prazer. É por ser infinito queDeus está sempre para lá de todas as nossas capacidades de compreensão, de todas asnossas teorias. Ele é o mistério absoluto que nós podemos apenas entrever, mas nãodecifrar inteiramente. O que não significa que não possamos encontrar razões paraacreditar nele.

E que razões serão essas? Já vimos que não são demonstrações. São apenas aspetos

que nos convidam a aceitar que toda a realidade tem um sentido último, dado porDeus. Eis algumas delas.

Ao olharmos o universo  e a sua espetacular organização, ao verificarmos quefunciona a partir de leis matemáticas que as ciências têm desvendado, ao observarmoscomo a matéria se tem organizado até atingir formas tão complexas de vida como ainteligência humana, perguntamo-nos porque é que o universo é assim tão ordenadoe não uma realidade caótica, sem qualquer sentido. Se o universo tivesse surgidopor acaso, o mais provável é que fosse um caos. A ordem matemática do universoe a evolução para formas cada vez mais organizadas e complexas é um convite a

acreditarmos que tudo o que existe foi fruto da ação de um ser infinito e inteligente.

Galáxia de Andrómeda

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unidade 2 59

Por que razão havemos de fazer o bem e evitar o mal? Será que os valores moraissão criados pela liberdade humana ou são anteriores a ela? Ou seja, os valores morais

são relativos ou absolutos? Dependem da vontade de cada ser humano ou impõem--se à sua consciência como um apelo necessário? Se Deus não existir, os valores sãorelativos; cada pessoa pode criar, a partir da sua liberdade, os seus próprios valores

morais e conduzir a vida de acordo com eles. Haveríamos de confundir valoresmorais com interesses pessoais. Cada pessoa haveria de conduzir a sua vida a partirdos seus caprichos, mesmo que isso tivesse como consequência prejudicar os outros.Também não haveria forma de julgar o seu comportamento, porque os valores moraisdependeriam da vontade de cada pessoa e não de um padrão universal que tornasse os

 valores absolutos e independentes da liberdade criadora de cada um. A necessidadede termos valores éticos válidos para todos é um convite a acreditarmos em Deus.Só assim valores como a justiça, a bondade, a verdade, a honestidade podem serpontos de referência absolutos, independentes dos interesses de cada indivíduo.

Ao longo da história da humanidade, muitas pessoas foram vítimas da maldade

de outras. A sua existência parece não ter feito sentido porque não puderam realizarminimamente a sua aspiração à felicidade. E uma vez que muitas delas morreramsob a ação injusta de outras, já não é possível que lhes seja feita justiça. Esta realidadeterrível é mais um convite a crer num Deus que pode garantir a justiça para além

da morte, por forma a que a existência dessas pessoas possa ganhar um novo einesperado sentido, ou seja, que o seu sofrimento não tenha sido em vão.

Todas as pessoas hão de morrer. A experiência de finitude é universal. Mas amorte é um absurdo porque põe limites insuperáveis ao desejo de eternidade e defelicidade que habitam o coração humano. Sobretudo, achamos ainda mais absurdaa morte daqueles que amamos. Deus é a resposta a este desejo de eternidade e defelicidade sem limites. Se Deus existir, podemos esperar que a vida e o amor sejam a

última realidade para o ser humano, e que a morte, o nada e o esquecimento eternonão sejam a última palavra para a vida humana. Acreditar em Deus é confiar que a

 vida humana tem um sentido que ultrapassa os poucos anos que vivemos.Estas razões, entre muitas outras possíveis, tornam a fé em Deus uma realidade

com sentido. A fé não é, portanto, uma atitude irracional; traduz-se na confiançaem Deus e num consequente compromisso de vida. Acreditar em Deus é acolher e

confiar no sentido último da vida.

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unidade 20

Fé , por Hendrik Goltzius

A fé  acontece quando alguém, em contacto com uma tradição religiosa, faz aexperiência de encontro com a presença de Deus.

Crentes e não crentes fazem as mesmas experiências de finitude, do dever moral,da liberdade, do sentido e da ausência dele, bem como da morte. O que distingueo crente do não crente é a interpretação que cada um faz dessas experiências.

O crente é, por definição, otimista. Transporta Deus para a compreensão da pessoa eda história atribuindo-lhe um sentido definitivo. O não crente, negando Deus, nega apossibilidade de a vida, a história e o universo terem um sentido definitivo.

Só existe um problema: voltar a descobrir que existe uma vida do Espírito,a única que satisfará o homem. É urgentíssimo falar aos homens… Necessitamtanto, tanto de Deus.

Antoine Saint-Exupéry, escritor francês do século XX

Criaste-nos para ti, Senhor, e o nosso coração está inquieto enquanto nãorepousar em ti.

Santo Agostinho, bispo do século IV

Hoje Deus é verdade! Passem para cá papel e tinta. Se preferem, escrevereia sangue esta notícia: Hoje, Deus é verdade como o Sol.

Sebastião da Gama, poeta português do século XX

Para que serve crer?Vemos claramente para que serve não crer: para estar apenas sobre a Terra,

que é a menos estável de todas as moradas, e para nunca ouvir, em resposta àsperguntas que o coração coloca, outra voz senão a própria.

André Frossard, jornalista e escritor francês do século XX

A fé é um ato de coragem, na confiança radical, sem acesso à plena certezaracional. Mas o crente tem a convicção de que acreditar em Deus é maisrazoável do que não acreditar.

Anselmo Borges, padre português, filósofo e teólogo contemporâneo

Achar que o mundo não tem um criador é o mesmo que afirmar que umdicionário é o resultado de uma explosão numa tipografia.

Benjamin Franklin, cientista e escritor americano do século XVIII

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unidade 2 61

Roger Garaudy 

Doc. 27Será que precisamos de Deus?

Sim, temos, de facto, necessidade de Deus, presença em cada um de nósda exigência de procurar o sentido da vida, de ser responsável por descobri-loe por realizá-lo.

Precisamos de Deus para tomar consciência da unidade da vida, dessamesma vida que anima a subida da seiva nas árvores e nas ores e a palpitaçãodo sangue no coração dos seres humanos.

Temos necessidade de Deus cuja presença em nós se manifesta pelapossibilidade permanente de não nos abandonarmos à passividade masde assumirmos a responsabilidade de participar na pilotagem da criaçãocontinuada da vida.

Exaltante liberdade de escolher entre a ascensão e a queda, entrea invenção de formas novas e mais ricas de vida, ou a resignação a umadecadência que conduz à destruição do planeta Terra.

A esta liberdade, uns chamam dom de Deus que nos criou à sua imagem;outros recusam-se a chamar «Deus» a essa transcendência para não aconfundir com exterioridade, como se Deus estivesse fora de nós decidindosobre o nosso futuro à maneira de um soberano.

Mas a necessidade de Deus é a maior necessidade da nossa época. Estáem jogo a sobrevivência da humanidade e o seu sentido.

O Deus de que temos necessidade não é esse ser exterior e superior anós, que reina «lá em cima», à maneira de um monarca mais poderoso do

que todos os outros. Menos ainda esse Deus de que só a nossa comunidadedeteria a verdadeira imagem. Nem esse Deus parcial e tribal que nos teriaeleito e nos daria o poder de excluir e aniquilar outros povos.

O Deus de que precisamos é esse Deus uno e total, presente em todosnós e cuja unidade é a única que pode dar sentido a todas as coisas comoseu m último e único.

É o Deus autenticamente transcendente, isto é, que não pode ser medidopelo ser humano e do qual nenhuma comunidade religiosa pode possuir averdade total.

Deus é essa presença que está em  nós sem ser de  nós. Não podemos

captá-lo nem pelos nossos sentidos nem pelos nossos conceitos, masnão podemos rejeitar os seus apelos e exigências sem nos mutilarmos dadimensão especicamente humana da nossa vida.

Tal é a fé perene e universal: a armação do sentido da existência, daunidade do mundo, da criação divina da vida. Para se ser humano tem-senecessidade dessa fé, seja qual for o nome que se dê ao Deus ao qual ela sedirige e mesmo que se lhe recuse esse nome.

Adaptado de Roger Garaudy, Será que precisamos de Deus?

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unidade 22

Doc. 28Aos Olhos Dele

Não acredito em nada. As minhas crençasVoaram como voa a pomba mansa,Pelo azul do ar. E assim fugiramAs minhas doces crenças de criança.

Fiquei então sem fé; e a toda a genteEu digo sempre, embora magoada:Não acredito em Deus e a Virgem SantaÉ uma ilusão apenas e mais nada!

Mas avisto os teus olhos, meu amor,Duma luz suavíssima de dor…E grito então ao ver esses dois céus:

Eu creio, sim, eu creio na Virgem SantaQue criou esse brilho que m’ encanta!Eu creio, sim, creio, eu creio em Deus!

Florbela Espanca, A Mensageira das Violetas

Florbela Espanca

O Cântico de Maria,por James Tissot

Doc. 29Deus existe?!Durante uma conferência, um professor universitário lançou o seguinte

desao:— Tudo o que existe será obra de um Deus criador?Vários alunos ensaiaram uma resposta:

— Sim!O professor objetou:— Se foi Deus quem criou tudo, então também o mal é obra dele. Partindo

do princípio de que as nossas obras são um reexo de nós mesmos, se Deuscriou o mal é porque é mau. Ora a ideia de um Deus mau é contraditória.Logo, Deus não existe.

Um silêncio profundo fez-se sentir diante de tal argumento e o professorregozijava-se por ter provado mais uma vez que a fé era um mito.

Então, outro estudante levantou a mão e disse:— Professor, o frio existe?

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unidade 2 63

— É lógico que o frio existe ou por acaso nunca sentiste frio?O rapaz respondeu:— De facto, o frio não existe! Segundo as leis da física, o que consideramos

frio, na realidade é a ausência de calor. Todo o corpo ou objeto é suscetívelde estudo quando possui ou transmite energia; o calor é o que faz comque este corpo tenha ou transmita energia. O zero absoluto é a ausênciaabsoluta de calor, todos os corpos cam inertes, incapazes de reagir, mas ofrio não existe. Nós criámos este conceito para descrever o que sentimos naausência de calor.

— E existe a escuridão? — insistiu o estudante.O professor respondeu:— Parece que sim.— Novamente comete um erro. A escuridão também não tem existência

própria. A escuridão na realidade é a ausência de luz. A luz é passível de

ser investigada, a escuridão não! Até podemos decompor a luz branca nasvárias cores que a compõem, com os seus diferentes comprimentos deondas. A escuridão não! Um simples raio de luz atravessa as trevas e iluminaa superfície sobre a qual incide. Como pode saber quão escuro está umespaço determinado? Com base na quantidade de luz presente nesse espaço,não é assim? O conceito de escuridão desenvolveu-se para descrever o queobservamos na ausência de luz.

Finalmente, o jovem perguntou ao professor:— O mal existe?— Basta observarmos o mundo com atenção para nos confrontarmos

com crimes e violência por todo o lado. Tudo isso é manifestação do mal.O estudante respondeu:— Na realidade, o mal não existe, pelo menos não existe por si mesmo.

O mal é simplesmente a ausência do bem. Tal como o frio e as trevas nãoexistem por si mesmos, o mal é um conceito que o ser humano utiliza paradescrever a ausência do bem ou de Deus. Por isso, Deus não pode ter criadoo mal. A fé, o bem ou o amor são realidades existentes, à semelhança docalor e da luz. O mal, pelo contrário, é mera manifestação da ausência deDeus, ou seja, é o resultado da ação do ser humano quando este expulsaDeus do seu coração.

Autor desconhecido

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unidade 24

Doc. 30As condições para o encontro com Deus

Deus não aparece a um olhar vago, a uma pessoa distraída, a um indivíduoperdido na diversão. O encontro com Deus tem lugar no próprio centro dapessoa.

Deus também não aparece a um olhar anónimo, caraterístico da pessoamassicada. O Deus que dá o seu nome ao revelar-se, chama o ser humanopelo seu nome próprio e exige que esteja desperto para a sua condição depessoa.

Também um olhar supercial não basta para o entender. Esse olhar queapenas se contenta com o como e o quê, sem chegar jamais ao porquênascido do espanto e do encantamento, fruto de uma reexão profunda.

Deus não aparece a um olhar que apenas se preocupa com o útil, oprático, o para quê; que tudo ordena a um sujeito reduzido à utilização e aoprazer, e que, por isso, se converte num olhar obsessivo e angustiado.

Nem, nalmente, a um olhar dominador como o do indivíduo puramentetécnico, que tudo manipula, que se passeia pelo mundo fazendo e desfazendoe que se mostra incapaz de contemplar.

A redescoberta de Deus exige de nós uma cura lenta de sossego, deconcentração, de interiorização, de contemplação, de disponibilidade,de gratuidade, de despojamento, de liberdade interior, de criatividade;necessitamos de um longo período de reabilitação para o espiritual…

Começa a haver encontro com Deus e redescoberta da religião quandoum ser humano pessoalmente adulto reconhece a realidade transcendente,reconhece-a como pessoal e põe nela a sua salvação denitiva.

 J. M. Velasco, La Religión en nuestro tiempo

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unidade 2 65

Uma história de fé

Conhecem a parábola do pai misericordioso que tinha dois flhos? O mais

novo resolveu um dia sair de casa, mas o mais velho permaneceu sempre junto

do pai. Pois bem, tenho sido uma espécie de irmão do flho pródigo.Na verdade, não me lembro de não ter tido fé. Desde que me conheço que me

entendo como cristã. É que nasci numa família católica, comecei a frequentar

muito cedo os grupos juvenis da paróquia e todos os meus amigos mais íntimos

eram cristãos.

Como é que Jesus entrou na minha vida?

Foram os testemunhos da minha família, dos padres, dos catequistas, dos

amigos e até dos colegas não crentes, que me levaram a deixá-lo entrar.

De início eu não percebia nada. Ia à igreja porque os meus amigos estavam

lá e sempre nos divertiamos. Em boa verdade, frequentava a igreja porque era

o único sítio onde os meus pais me deixavam ir sozinha. A um dado momento

comecei a interessar-me pelas coisas de Deus e a sentir um desejo irresistível

de o conhecer melhor. E foi assim, sem grandes sobressaltos, que Jesus se

introduziu na minha vida. Não vi nenhuma luz misteriosa nem ouvi qualquer

espécie de trovão inexplicável! Apenas fui sentindo que nunca estava sozinha,

havia uma constante presença amiga na minha vida.

Por volta dos 12 anos comecei a frequentar um movimento católico que me

marcou defnitivamente. Embora o abandonasse ao fm de três anos por me

sentir desenquadrada, tenho de reconhecer que foi nele que aprendi a encontrar-

-me com Deus. Aos 14 anos fui a Coimbra, a uma assembleia desse movimento, e

aí tive a minha primeira experiência consciente de oração e de comunhão com

Deus e com os outros. Não sei dizer como foi. Há coisas que não se explicam.

 Vivem-se. Apenas sei que encontrei Jesus e que nele achei um sentido pleno para

a minha vida.

Doc. 31A aventura de DeusNão posso duvidar de que tudo aquilo que eu amo neste mundo —

as árvores, as rosas, os pássaros, o aparecimento de um sorriso, a vida doespírito — é ainda muito mais amado por Deus. Mas tudo aquilo que eu nãoposso amar — o mal que faço aos meus irmãos e aquele que eles me fazem amim, a injustiça, a miséria, a fome, a sede, a doença que ataca, corrói, afastae desagrega — será contemplado serena e passivamente por Deus, porquea perfeição da sua natureza imortal o impede de vibrar? Prero nem dizernada a respeito da criança que é torturada ou do inocente que é humilhado!

A obra criadora é uma aventura. Deus aventurou-se, arriscou. Abriu àhumanidade um caminho de liberdade, com todos os perigos inerentes.

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unidade 26

E se Deus continua a criar agora, é agora que ele se aventura, que aceitaa eventualidade — a realidade — das lágrimas e do sangue. E não só dasnossas lágrimas e do nosso sangue! Não só das lágrimas e do sangue deCristo! Poderia o Criador pôr-se de fora nesta questão tão crucial? Nãoexistirá, no âmago do Espírito puro, alguma coisa desconhecida que sejaanalogicamente comparável às nossas lágrimas e ao nosso sangue?

François Varillon, O sofrimento de Deus

Ícone de Cristo

Verbo de Deus

Queres saber de que corSão os sonhos de DeusVolta a olhar o mundoPela primeira vez. (bis)

Pois o Verbo de DeusAcampou entre nós. (bis)

Queres saber o lugarDa morada de DeusVolta a olhar o HomemPela primeira vez. (bis)

Pois o verbo de DeusAcampou entre nós. (bis) 

Doc. 32 

Queres saber o segredoDo coração de DeusVolta a olhar o amorPela primeira vez. (bis)

Pois o Verbo de DeusAcampou entre nós (bis)

Entre nós…

Letra: Tolentino Mendonça.Música: Nuno Filipe Pereira.Hino Diocesano para a JornadaMundial da Juventude, 2000.

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unidade 2 67

O ser humano sempre procurou uma resposta para os grandes enigmas que oinquietam e ao mesmo tempo o deslumbram: o sentido e o fim da vida, a origem dobem e do mal, o que há para além da morte…

A busca da felicidade é uma luta constante na qual as pessoas se empenham compaixão. E, consciente ou inconscientemente, todos procuramos a Verdade, o Bem, a

Beleza e a Paz como fins supremos, nos quais encontramos a plenitude.

Representações da divindade no politeísmo

Pintura de Osíris e Horo localizada no túmulo

do rei Seti I, Vale dos Reis,Tebas, Egito

Doc. 33A busca sincera e honesta da verdade

O crente, o agnóstico, o ateu, em vez de se excluírem, devem encontrar-se eenriquecer-se mutuamente num conito dialógico de razões, e, por paradoxalque pareça, num diálogo sincero e aberto, concluirão que há entre eles muitomais sintonias do que poderiam supor à primeira vista. Quantos crentes, porexemplo, não carão surpreendidos ao ler em S. Tomás de Aquino que osaber da fé, não podendo ser evidente, convive com a dúvida, a opinião, asuspeita…

Fé religiosa e dúvida não se excluem.Por outro lado, é bem possível que também ateus e agnósticos aceitem

que há um Mistério inominável que a todos envolve…O que deve unir crentes e não crentes é a busca honesta e sincera da

verdade e o combate generoso por uma humanidade melhor, mais solidáriae feliz.

Anselmo Borges, Janela do (In)Visível 

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unidade 28

Desde tempos imemoriais que a noção da existência de Deus não só povoa amente humana, como pertence à linguagem da humanidade de todas as épocas e

latitudes. Interrogar-se sobre o mistério de Deus é questionar-se sobre o mistério dosentido da vida humana e do mundo, bem como da relação entre eles.

A procura do transcendente por parte do ser humano começa no início dahumanidade. De facto, os vestígios mais antigos que conhecemos da vida dos homensprimitivos (pinturas rupestres, túmulos, imagens…) denotam que a religiosidade é

um elemento comum a todos os povos, para quem a existência do Sagrado é umarealidade próxima e imprescindível.

As representações da divindade que aparecem em diferentes épocas nas diversasculturas manifestam que «o ser humano é naturalmente religioso» (Aristóteles). Seolharmos para as antigas culturas, em todas elas encontramos elementos religiososcomuns: sacerdotes, lugares sagrados (altares, templos), objetos sagrados (sinaisreligiosos, instrumentos de culto), tempos sagrados (festas, romarias), rituais,histórias sagradas. Além disso, as manifestações religiosas organizam a vida socialdos povos e marcam o ritmo do tempo.

A religião na civilização egípcia antigaO Antigo Egito foi uma civilização que prosperou ao longo do rio Nilo desde

cerca de 3100 a.C. até ao século I d.C. É evidente que durante este longo período areligião egípcia foi sofrendo alterações mais ou menos significativas.

O Egito conhecia o culto de certos animais: o gato, o gavião, o crocodilo, a íbis,o escaravelho, o boi, etc. E os deuses assumem traços destes animais sagrados. É porisso que eram representados sob estranhas formas, meio animais, meio humanas.

Muitos deuses estavam ligados às forças da natureza: o poder do Sol, a Lua ouas cheias do rio Nilo, entre outras. Estas forças eram representadas sob a forma deanimais: o falcão, por exemplo, representava o Sol.

Para além de se relacionarem com as forças da natureza, outras caraterísticasestavam associadas aos deuses. O deus de cabeça de íbis (Tote) era o deus da escrita edos escribas; Khunm, divindade com cabeça de carneiro, havia criado o ser humanona sua roda de oleiro, etc.

Alguns deuses eram associados a determinadas cidades, embora o seu culto se

espalhasse posteriormente por todo o Egito. Por exemplo, o culto ao deus Ámon eraoriginário da cidade de Tebas.

Há, ainda, um conjunto de divindades ligadas a pessoas concretas, realmenteexistentes. Neste conjunto, insere-se o culto do faraó que, para além de ser o filho dodeus-Sol, tinha também as mais altas funções sacerdotais.

Interessante é a referência a «deus» que parece ter sido um poder divino, universale sem nome, que controlava o universo e defendia o bem contra o mal. Uma espéciede divindade originária e suprema.

De 1375 a 1350 a.C., o faraó Amenófis IV (Akhenaton) impôs a todo o Egito omonoteísmo. O culto de Áton — o disco solar — passou a ser o único permitido. Estareforma religiosa não foi duradoura. Por motivos diversos, após a morte do faraó, oculto dos outros deuses rapidamente regressou.

Aristóteles

Stonehenge

Templo de Karnak, Egito

Pirâmides, Egito

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unidade 2 69

Doc. 34Alguns deuses do Antigo Egito

Rá , deus-Sol, o grande deus do estado do Antigo Egito. Rei dos deuses,pai da humanidade e protetor dos reis e dos mortos.Ámon , inicialmente deus da fertilidade, era o rei dos deuses, patrono dos

faraós; mais tarde identicado com o deus-Sol, Amón-Rá.Osíris. Conta a lenda que o rei Osíris tinha sido assassinado pelo seu

irmão Seth, que espalhou as partes do corpo por todo o país. A irmã-esposade Osíris, Ísis, reuniu o seu corpo e teve dele um lho, o deus Horo, quevenceu Seth e ressuscitou o pai. Osíris tornou-se, portanto, o governante domundo além-túmulo. É, por isso, o deus da fertilidade e da vegetação. Maistarde, tornou-se o deus supremo do Egito, ao lado de Rá, bem como rei e juiz dos mortos.

Ísis , deusa lunar, rainha dos deuses, a grande deusa-mãe, deusa doscereais e da fertilidade.

Horo , deus do Baixo Egito, com cabeça de falcão. O deus do céu e doSol.

Áton , deus do Sol. Durante um curto período tornou-se o deus único.Anúbis , deus dos mortos, guardião de túmulos e de cemitérios.Hátor , deusa do céu. Mais tarde transformou-se na deusa-vaca, na deusa

do amor e da dança, senhora do mundo subterrâneo e das estrelas.Khnum , antigo deus egípcio do Alto Nilo. Criador dos deuses, dos

homens (a partir do barro) e da água. Inicialmente, deus da fertilidade.

Tote , deus da Lua, com cabeça de íbis. Mais tarde, deus da aprendizageme da sabedoria, o inventor da escrita.

Sebek , deus da água e também personicação do mal e da morte, comcabeça de crocodilo. Mais tarde identicado com Rá.

Sekhmet , deusa sanguinária com cabeça de leoa. Tornou-se deusa daguerra.

Seth  personica a ambição e o mal e é considerado o deus dastempestades. Violento e perigoso, foi o assassino de Osíris.

Estátua do deus Anúbis

Pormenor do relevo de Osíris no Templo de Philae, Aswan, Egito

Trono: Horo e Seth

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unidade 20

A religião dos gregos e dos romanosOs gregos praticavam uma religião politeísta. Antes de haver deuses, havia o Céu

e a Terra que criaram os Titãs, gigantes de força descomunal. Os Titãs foram os paisdos deuses clássicos e foram por estes destronados.

Os deuses eram imortais mas possuíam caraterísticas semelhantes aos sereshumanos: ira, bondade, egoísmo, compaixão, ciúme, fraqueza, força, vingança…As principais divindades habitavam o Monte Olimpo, de onde decidiam a vida dosmortais, embora estivessem submetidos ao destino. Zeus era a divindade supremado panteão. Os gregos acreditavam que os deuses desciam do monte sagrado para serelacionarem com as pessoas. Os heróis eram filhos de divindades e de seres humanos.

Cada cidade  da Grécia Antiga possuía um deus protetor e cada divindaderepresentava uma força da natureza  ou um sentimento humano. Poseidon, porexemplo, era o representante dos mares e Afrodite a deusa da beleza e do amor. Areligião e mitologia gregas serviam para explicar fenómenos da natureza e transmitir

conselhos para a vida.Ao invadir e dominar a Grécia e o império helénico, os romanos  adotaram eadaptaram o panteão grego, modificando apenas o nome dos deuses. Assim, osdeuses do panteão romano têm sensivelmente as mesmas funções dos deuses gregos.

Para além dos doze deuses do Olimpo, havia ainda uma infinidade de outrasdivindades, algumas de grande importância, como Dioniso (Baco) e Deméter (Ceres).

 Apolo ao cuidado das ninfas, por François Girardon, Versailles, França

Poseidon

Monte Olimpo, Grécia

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unidade 2 71

OS DOZE DEUSES DO OLIMPO GREGO E DO PANTEÃO ROMANO

NOME GREGO FUNÇÃO NOME ROMANO

Zeus

Poseidon

Hades, Plutão

Héstia

Hera

Ares

Palas Atena

Febo Apolo

Afrodite

Hermes

Artemisa

Hefesto

Rei dos deuses e dos seres humanos. Tambémdeus do céu e do clima.

Inicialmente denominado «o que faz tremer aTerra», o causador dos terramotos, será, mais

tarde, o senhor dos mares.

Deus do mundo subterrâneo.

Deusa da lareira, símbolo do lar.

Mulher de Zeus. Protetora das mulheres,do casamento e do nascimento.

Violento e conituoso deus da guerra.

Deusa da guerra e dos artíces.

Deus dos rebanhos, dos arqueiros, da música,da profecia e da medicina. Era também deusdo Sol.

Deusa do amor, da beleza e da fertilidade.

Mensageiro dos deuses, protetor doscomerciantes.

Deusa da caça e da juventude.

Deus do fogo, dos vulcões, dos metais,da metalurgia e dos artíces.

 Júpiter

Neptuno

Plutão

Vesta

 Juno

Marte

Minerva

Apolo

Vénus

Mercúrio

Diana

Vulcano

Estátua de Eros em Piccadilly Circus, Londres, Inglaterra

Estátua de Ares, deus da guerra

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unidade 22

Deus na Bíblia

No Antigo Testamento, a afirmação do monoteísmo é essencial. Insiste-se nainvisibilidade puramente espiritual de Deus. A proibição da adoração de imagens,para além de ser um imperativo do Decálogo («Não faças para ti imagens esculpidas,

representando o que há no céu, na terra ou nas águas»), está também relacionadocom a natureza misteriosa e transcendente  de Deus, que não é nenhum objetodo mundo nem pode ser representado como tal. Ele é um Deus santo, totalmentedistinto do resto do universo. Por isso, Israel não identifica Deus com as forças danatureza, apesar de estas poderem ser uma manifestação da sua ação.

Nos textos bíblicos, Deus aparece descrito muitas vezes com caraterísticasantropomórficas: atribuem-se-lhe formas e sentimentos da pessoa humana. De facto,como poderia o ser humano falar de Deus senão recorrendo àquilo que ele conhece?Esta maneira metafórica de abordar Deus é, pois, uma tentativa de desvendar umpouco a sua natureza misteriosa.

A presença de Deus na Bíblia é descrita como uma presença pessoal, com quemIsrael pode conversar, em quem pode confiar e a quem deve obedecer. Como umaespécie de legislador, Deus impõe-lhe a sua vontade num código de leis — cujasregras centrais se referem tanto ao culto como à conduta ética de vida — e promete--lhe a sua presença protetora e benfazeja, caso cumpra os mandamentos expressosnesse código. O não cumprimento da sua vontade implica o castigo de Deus ou operdão de Israel, se este se arrepender. Esta é a substância da aliança entre Deus eo seu povo.

Deus intervém na história humana para se revelar, expondo-se à compreensão eadesão ou à recusa das pessoas. Ele não é um Deus distante, que nada tem que vercom o destino de Israel, mas um Deus presente e atuante. A sua atuação expressa-

-se desde logo na ação criadora, mas também na constante solicitude com que vaiacompanhando a história humana.

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unidade 2 73

Desde a sua origem, o povo de Israel sentiu e desenvolveu a ideia de que tinhasido eleito por Deus de entre todos os povos da Terra. Deus estabeleceu com eleuma aliança que havia de marcar toda a sua história. Por isso, o Deus de Israel é umDeus nacional. No entanto, pouco a pouco, vai-se desenvolvendo a consciência deque, sendo o único Deus existente, é também o Deus de todos os povos, um Deus

universal (cf. Jonas).Em determinados momentos da história de Israel, Deus foi identificado com umguerreiro que lutava ao lado de Israel contra os seus inimigos, ao mesmo tempo quese manifestava protetor e libertador do povo perante a prepotência dos impérios(Êxodo).

Na história de Israel encontra-se claramente a ideia de uma evolução na

experiência de Deus: de uma formulação muito elementar que se aproxima dasconceções das religiões politeístas dos povos com que Israel contactava, evolui-separa o monoteísmo absoluto e, sobretudo, para a compreensão de um Deus que é paie mãe, misericordioso e indulgente.

No Antigo Testamento, podemos, pois, ler textos que expressam uma imagem

positiva de Deus e textos que lhe atribuem caraterísticas claramente negativas. Estadupla face de Deus está relacionada com a evolução religiosa que Israel foi fazendo aolongo do seu percurso histórico, purificando a ideia de Deus dos elementos negativos.

 Jonas,por Giovanni Lorenzo Bernini

Tribos de Israel reunidas em torno da Arca da Aliança no deserto do Sinai , após o Êxodo do Egito,por Escola alemã, século XVII

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unidade 24

A importância do nome: o tetragrama «YHWH»

Tudo o que existe tem existência para nós, porque tem um nome pelo qual oconhecemos. O nome não existe apenas para designar e distinguir as coisas e aspessoas, mas é, essencialmente, um elemento definidor da identidade. Dar um nome,

nas civilizações antigas, significava dominar ou atribuir determinadas caraterísticasou funções a alguém. Se se conhece o nome de uma pessoa, pode exercer-se influênciasobre ela.

O nome designa de tal forma a identidade e a função que determinados cargos ourelações de pertença exigem que se mude o nome da pessoa (como acontece com opapa), querendo significar uma mudança radical de vida.

Assim sendo, o nome de Deus havia de designar a sua identidade. Contudo, estaé-nos fundamentalmente desconhecida, porque Deus é o grande mistério. É por issoque a questão do nome de Deus é tão importante no Antigo Testamento. E não existeapenas um nome, apesar de um deles ser o mais importante, mas uma multiplicidadede nomes, cada um dos quais põe em evidência uma caraterística de Deus.

Foi a revelação do principal nome divino feita a Moisés (séc. XIII a.C.) no MonteSinai que suscitou toda a epopeia da libertação do Egito.

Por respeito para com Deus, os israelitas não pronunciavam o nome de Deusque tinha sido revelado a Moisés no Monte Sinai («YHWH», «Aquele que é» ou«Aquele que está presente»). Em vez dele, pronunciavam outros nomes que aparecemigualmente na Bíblia: El (Deus), Elohim (Deus), Adonai (Meu Senhor), El-Shaddai(Omnipotente), etc.

«YHWH», mais do que uma simples definição, é a indicação de uma presença.Quer dizer que Deus não abandona Israel à sua sorte; torna-se conhecido no encontroe na relação que estabelece com cada um e com o povo.

Israel vê no tetragrama «YHWH» o símbolo do mistério da vida íntima da

divindade; é o nome próprio de Deus, ou seja, a sua identidade, razão pela qual nãoera pronunciado.

Eu sou aquele que é

Moisés disse a Deus:— Quando eu disser aos israelitas que o Deus dos seus

antepassados me enviou para junto deles, eles vão perguntar-me como é que ele se chama. Que é que eu lhes digo?

14Deus disse então a Moisés:— EU SOU AQUELE QUE É. E dirás também aos israelitas: AQUELE

QUE É foi quem me enviou a vocês.15Deus disse ainda a Moisés:— Dirás isto aos filhos de Israel: «O Senhor, o Deus dos vossos

antepassados, o Deus de Abraão, Isaac e Jacob foi quem me enviou paravos falar.» Este é o meu nome para todo o sempre. Este é o nome quetodas as gerações futuras usarão para me invocar.

Ex 3, 13-15

13

itral de Moisés com as Tábuasda Lei, Viena, Áustria

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unidade 2 75

O Deus de Jesus CristoJesus Cristo acreditava no único Deus do Antigo Testamento: o Deus criador,

omnipotente e juiz. Contudo, introduziu alterações substanciais na imagem deDeus. Se o Antigo Testamento lhe atribuía caraterísticas positivas e simultaneamentenegativas, Jesus vem purificar definitivamente a imagem de Deus.

Ele é inequivocamente um Deus bom que se torna presente no amor e na salvaçãooferecida a todas as pessoas. Para Jesus, Deus é pai, não apenas dos que cumprem a leide Moisés, dos que lhe prestam culto, dos que conduzem a vida de forma honesta, dosque pertencem ao povo de Israel, mas igualmente dos estrangeiros, dos perdidos, dospecadores, dos delinquentes, dos desprezados, dos marginalizados. Não porque aproveo comportamento imoral, mas porque ama a todos com amor infinito, como um pai

ama o filho desencaminhado, e se dispõe a acolhê-lo na bondade do seu coração.

Vitral Ressurreição de Jesus, França

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unidade 26

Na mensagem de Jesus, não se trata de um Deus que esteja ao serviço do poder,que esteja do lado da violência, que decida de forma arbitrária, salvando apenasquem bem entender, que anule a liberdade do ser humano. Trata-se de um Deusprofundamente interessado em resgatar o ser humano dos seus medos, das suasfrustrações, das suas debilidades, tornando-se o garante de uma vida em plenitude,

fundada no amor e na solidariedade.Mas muitas pessoas continuam a querer que Deus se torne presente nas suas vidasa partir dos seus critérios mesquinhos: alguns imaginam um deus que sirva de baseao exercício tirânico do poder; outros creem num deus guerreiro, que promova a

 violência e a destruição dos inimigos; outros ainda, concebem um deus abstrato, semrelação com a vida concreta das pessoas… Alguns gostariam de dispor de Deus deacordo com os seus interesses pessoais, muitas vezes medíocres: um deus mágico queinterviesse milagrosamente sempre que o invocassem. Mas nada disto correspondeao Deus que Jesus Cristo pregou e em quem confiou.

Tendo em conta todas estas conceções de Deus, em que Deus acreditamos?Os cristãos, tal como Jesus, acolhem a companhia de um Deus que lhes oferece

confiança, os liberta dos seus medos e dos seus egoísmos e os leva a servir os outros.

Zeus no Museu Nacionalde Arqueologia, Atenas

Doc. 35Representações de DeusDeus terrível — É um Deus de quem se tem medo. As pessoas cumprem

a sua lei para evitar o castigo eterno que cairia implacavelmente sobre elasse transgredissem os seus mandamentos.

Deus burocrata — É um Deus que não olha ao coração nem tem emconta as intenções da pessoa. Preocupa-se apenas com o cumprimento deformalidades exteriores: que as pessoas assistam à missa todos os domingos

e festas de guarda, que cumpram os ritos prescritos pelas leis da Igreja, queguardem o jejum e a abstinência nos dias indicados, etc.

Deus distante  — É um Deus que habita um lugar inacessível ao serhumano e não se ocupa com as necessidades das pessoas.

Deus salva-vidas ou tapa-buracos — É um Deus a quem se recorreapenas quando as coisas correm mal ou não têm solução aparente.

Deus desmancha-prazeres  — É um Deus que proíbe tudo aquilode que o ser humano gostaria. Um Deus que se diverte ao ver as pessoasfazerem sacrifícios como privar-se de comida, do sono ou de uma distração,apenas com o objetivo de morticar o corpo e dar-lhe glória.

Deus Pai — É um Deus que não quer a morte do pecador, mas que seconverta e viva. Um Deus que «faz que o Sol se levante sobre os bons e osmaus e faz cair a chuva sobre os justos e os pecadores» (Mt 5,45). É um Deusque ama os seus lhos tal como eles são. E como qualquer bom pai da Terra,também mostra a sua preferência pelos mais pequenos e pelos mais frágeis.

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unidade 2 77

Pietà, por Miguel Ângelo,Basílica de São Pedro, Roma

José Régio

Doc. 36Ignoto Deo

Desisti de saber qual é Teu nome,Se tens ou não tens nome que Te demos,Ou que rosto é que toma, se algum tome,Teu Sopro tão além de quanto vemos.

Desisti de Te amar, por mais que a fomeDo Teu amor nos seja o mais que temos,E empenhei-me em domar, nem que os não dome,Meus, por Ti, passionais e vãos extremos.

Chamar-Te amante ou pai…, grotesco enganoQue por demais tresanda a gosto humano!Grotesco engano o dar-te forma! E enm,

Desisti de Te achar no quer que seja,De Te dar nome, rosto, culto, ou igreja…— Tu é que não desistirás de mim!

 José Régio, Biografa

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unidade 28

Representações de Deus na arteA arte, em geral, e a arte sacra, em particular, tem um profundo sentido espiritual,

uma vez que revela o sentido oculto da vida e do universo.Todas as formas de arte são extensões da obra criadora de Deus, o primeiro e

eterno artista. O universo inteiro é uma grande obra de arte. Mas, para além danatureza, podemos observar a maravilha da criação artística de Deus em nós mesmos.A pessoa humana é a tela. Com a sua livre cooperação, Deus vai desenhando a obrade arte que é a vida humana. Quando analisamos um quadro descobrimos a mão doartista, intuímos qual foi a sua ideia e o que quis pintar. Da mesma maneira, podemosdescobrir a mão de Deus na obra de arte que é cada pessoa. Damo-nos conta de quenada é fruto da casualidade ou da fatalidade; tudo depende simultaneamente da forçacriadora e amorosa de Deus e do livre consentimento humano.

O apelo de Van Gogh continua, pois, pertinente: «Procura compreender o quedizem os artistas nas suas obras-primas, os mestres sérios. Aí está Deus».

iconografa (do gregokon , imagem + graphia ,

crita) é uma forma deguagem visual queiliza imagens parapresentar determinadoma. A iconograa estudaorigem e a formação dasagens. A palavra íconeer dizer literalmente

magem». Na sua origem,verdadeiro sentido de

one é o de uma imageme nos leva a Deus.

Saber +

Génesis: a criação, por Iola Spafford

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unidade 2 79

O catalão Antoni  Placid Gaudí  i Cornet (1852-1926) foi arquiteto e um dosmaiores símbolos da cidade de Barcelona. Artista modernista e cristão convicto, quis

que a sua obra principal — a igreja da Sagrada Família, em Barcelona — exprimissea grandeza, a harmonia e a vitalidade do Criador. Gaudí dedicou quarenta anos dasua vida a esta obra monumental.

Gaudí pretendeu com a sua obra elevar a alma humana a Deus. É quase impossívelpassar pela extraordinária igreja da Sagrada Família como um simples turista; poiseste templo é um sinal luminoso da presença de Deus, a revelação explícita da fé numDeus vivo e próximo.

O peregrino, em permanente busca de si mesmo e de Deus, contempla esta obraartística para nela fazer a experiência de encontro com o sagrado. A arte de Gaudíé um apelo à conversão do coração, abrindo-o àquele que é o autor da beleza. Aesplêndida igreja coloca a pessoa diante de Deus e interpela-a a compreender a sua

 vida à luz da realidade eterna e transcendente, ou seja, do próprio mistério de Deus.

Fresco búlgaro de Deus Pai; Deus fala a Moisés a partir da sarça ardente, por Sandro Botticelli; A mão de Deus ou a criação, por AugusteRodin; Batismo de Cristo, por Andrea del Verrocchio e Leonardo da Vinci.

Catedral da Sagrada Família

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unidade 20

Doc. 37O Absoluto do Ser— Deus não é bom?— Não, para falar com propriedade, Deus não é bom: é. Bom, mau, são

pobres palavras que se aplicam a um conjunto de regras respeitantes aalguns pormenores da nossa vida material. Porque é que Deus seria limitadopelas nossas pobres palavras e valores? Não, Deus não é bom. É mais doque isso. É a forma mais rica, mais completa, mais poderosa do ser. E pensoque a contemplação do ser não podia ser possível se Deus não lhe tivesse

dado anteriormente o seu estado. Deus é a criação. É pois um princípioinextinguível, não orientado, a própria vida. Lembrem-se das palavras: «Eusou aquele que é». Nenhuma outra palavra humana compreendeu e relatoumelhor a forma divina. Intemporal, não, nem sequer intemporal e innita. Oprincípio. O facto de que há qualquer coisa no lugar onde não havia nada.

— Mas então, Deus não tem necessidade…— E até mesmo para lá de toda a expressão. Se quiser, eu sou Deus. Você

existe. Portanto, é Deus. Você não pode existir de outro modo. Se você nãofosse Deus, não existiria.

— Um panteísmo, de certa maneira?— Não, porque não se trata de louvar Deus em todas as coisas. Deus é

exterior e se eu lhe dizia que você é Deus, que eu sou Deus, não era para lhedar a ideia de que, em minha opinião, Deus seria uma espécie de corpo nointerior do qual nós vivemos. Não, eu queria apenas insinuar uma espécie deanalogia entre as duas palavras da frase. Sendo o Ser, de certa maneira, umadimensão própria, tão relativa mas tão real como o tempo e o espaço. E Deussendo o absoluto desta dimensão, como o innito é o absoluto do espaçoe o eterno o absoluto do tempo. De facto, o absoluto do Ser é também oabsoluto do espaço e o absoluto do tempo. Eis porque Deus é neste pontoinimaginável para os pobres espíritos dos homens.

Adaptado de J.-M. G. Le Clézio, A Febre

 A Santíssima Trindade, por autor anónimo

Saber +an-Marie Gustave Leézio (Nice, 13 de abril 1940), que assina

M.G. Le Clézio , escritoranco-mauriciano,cebeu o Nobel deteratura em 2008.

Jean Marie Gustave Le Clézio

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unidade 2 81

Doc. 38Se eu quiser falar com Deus

Se eu quiser falar com DeusTenho que car a sósTenho que apagar a luzTenho que calar a vozTenho que encontrar a pazTenho que folgar os nósDos sapatos, da gravataDos desejos, dos receiosTenho que esquecer a dataTenho que perder a conta

Tenho que ter mãos vaziasTer a alma e o corpo nus

Se eu quiser falar com DeusTenho que aceitar a dorTenho que comer o pãoQue o diabo amassouTenho que virar um cãoTenho que lamber o chãoDos palácios, dos castelos

Sumptuosos do meu sonhoTenho que me ver tristonhoTenho que me achar medonhoE apesar de um mal tamanhoAlegrar meu coração

Se eu quiser falar com DeusTenho que me aventurarTenho que subir aos céusSem cordas p’ra segurarTenho que dizer adeusDar as costas, caminharDecidido, pela estradaQue ao ndar vai dar em nadaNada, nada, nada, nadaNada, nada, nada, nadaNada, nada, nada, nadaDo que eu pensava encontrar

Canção de Gilberto Gil

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unidade 22

Deus: o oceano sem margens

 A grandeza de Deus 

 Por muito que digamos, muito nos ficará por dizer; mas o resumode todo o nosso discurso é este: Deus está em todas as coisas.28Que podemos nós para o glorificar? Sendo o Todo-Poderoso,

está acima das suas obras. 29O Senhor é terrível e soberanamente grande,o seu poder é maravilhoso. 30Glorifiquem o Senhor e exaltem-no, quanto puderem, porque ele será sempre maior. Bendigam o Senhor, exaltem-nocom todas as forças, não se cansem, porque jamais chegarão ao fim. 31Quemo viu a fim de o poder descrever? Quem é capaz de o louvar como ele é,em toda a sua grandeza? 32Bem numerosas ainda são as suas obras ocultas, pois é muito pouco o que sabemos das suas obras. 33O Senhor fez todas ascoisas e deu sabedoria aos que vivem virtuosamente.

Sir 43, 27-33

27

livro de Ben Sira (Sir)também chamadolesiástico (do latimclesiasticus liber  , que

gnica «o livro da igreja» «da assembleia»). O

ome que hoje se adotaen Sira) coincide comnome do seu autor, seja, Jesus Ben Sira Sirácide. Trata-se de

m crente judeu que,o nal da sua vida, quisgar uma espécie destamento espiritual

gerações futuras. Nou livro reforça a ideiadelidade à religiãoIsrael, confrontada

quele tempo com onsamento e civilização

os gregos (helenismo).oi escrito em hebraicoor volta do ano 180 a.C.traduzido mais tardera grego pelo neto de

sus Ben Sira.

Saber +

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unidade 2 83

O texto pretende sublinhar a grandeza e o mistério de Deus. Das suas palavrasdepreende-se que não pode haver um discurso acabado sobre Deus, porque alinguagem humana é limitada e incapaz, por isso, de revelar plenamente a suanatureza.

Fica o resumo do autor: «Ele está em todas as coisas» e, simultaneamente, acima

de todas as coisas; é Todo-Poderoso, soberanamente grande, invisível e, de certomodo, desconhecido, dada a sua grandeza humanamente incompreensível.As suas obras são de dois tipos: por um lado, a criação  do universo e do ser

humano, bem como a dádiva da sabedoria para que cada um possa conduzir a vidapelo caminho da virtude, e, por outro lado, uma infinidade de obras inteiramentedesconhecidas ao ser humano.

Por tudo isso, o autor convoca os crentes ao louvor de Deus, uma vez que ele,apesar de estar para lá do mundo, se relaciona com o ser humano.

Deus protetor e amigo

O Senhor é meu pastor

O

Senhor é meu pastor: nada me falta.2Em verdes prados me faz descansare conduz-me a lugares de águas tranquilas.

3

Conforta a minha alma e leva-me por caminhos retos, honrando o seu bom nome.4 Ainda que eu atravesse o mais escuro vale,não terei receio de nada  porque tu, Senhor, estás comigo. A tua vara e o teu cajado dão-me segurança.5 Preparaste-me um banquete à frente dos meus inimigos.Recebeste-me com todas as honrase encheste a minha taça até transbordar.6De facto, a tua bondade e o teu amoracompanham-me ao longo da minha vida.E na tua casa, Senhor, morarei para sempre.

Sl 23

1

Este salmo é um poema-oração que canta a confiança e a fé em Deus. Deus é oPastor que guarda, orienta e conduz as pessoas. Nele os crentes encontram refúgio e segurança. Daqui nasce a convicção de que Deus é uma presença fiel e protetora.

Para se entender esta representação de Deus é importante ter presente a vidade um pastor da época. Os pastores não eram proprietários de grandes rebanhos,mas de um pequeno número de ovelhas, das quais cuidavam com carinho, já queconstituíam o seu património material. Era costume, entre os pastores, juntar à noite

Vitral do Bom Pastor

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unidade 24

 Apelo à justiça e à santidade 

Jeremias recebeu do Senhor uma ordem 2 para ir à porta dotemplo e lá proclamar a seguinte mensagem:«4Não acreditem quando vos disserem: “É o templo do Senhor!

É o templo do Senhor! É o templo do Senhor! Estamos em segurança!” Pois isso é uma ilusão!

5Se na verdade mudarem a vossa maneira de viver e agir e forem justos

uns para com os outros; 6se não oprimirem os estrangeiros, os órfãos e asviúvas e não matarem ninguém inocente nesta minha terra; se deixarem de prestar culto a outros deuses, para vossa desgraça; 7se de facto mudarem,hei de deixar-vos viver neste lugar, na terra que, de há muito, dei aosvossos antepassados, para sempre.

8 Porém, vocês confiam em palavras mentirosas, que não valem nada;9roubam, matam, cometem adultério, proferem falsos juramentos, oferecemincenso ao deus Baal e adoram a deuses que antes não reconheciam; 10Vêmà minha presença, ao meu templo, e dizem: “Estamos em segurança!” edepois vão continuar a praticar essas coisas abomináveis! 11 Pensam que omeu templo é um covil de ladrões e que eu não vejo o que vocês fazem?».

Jr 7, 1-2.4-11

1

os seus pequenos rebanhos num curral comum, guardados por vigias. A voz de cadapastor era identificada pelas respetivas ovelhas, que se reuniam à volta do seu guiapara uma nova pastagem. Esta imagem era usada para exprimir a relação do povo deIsrael com Deus, uma vez que Israel escuta a voz do seu Pastor e a ele confia a sua

 vida.A aridez das terras era uma realidade com a qual se confrontavam os pastores.

Preocupados com a satisfação dos seus rebanhos, percorriam grandes distânciaspara encontrar prados verdejantes. Tal como o pastor enfrentava a aridez das terras,a escuridão da noite («vale tenebroso») e os perigos que ameaçavam os rebanhos,

assim Deus é aquele que tranquiliza o seu povo com a sua presença, no meio dasadversidades da vida. Apenas reclama uma atitude: que as suas ovelhas nele depositema sua confiança, o escutem e sigam.

O salmo apresenta ainda uma segunda imagem de Deus: a do líder que acolhe

o fugitivo no deserto, perseguido pelos seus inimigos. É na tenda de Deus que eleencontra refúgio e vê salvaguardada a sua segurança e a sua dignidade.

Em síntese, o salmo 23 reforça a ideia da bondade de Deus que protege e acolheo ser humano frágil e orienta cada pessoa pelos caminhos da retidão. Deus é umapresença atuante, amiga, solidária e segura, em quem se pode confiar.

Profeta Jeremias, por Frederick James Sheilds

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unidade 26

Solidariedade e fraternidade

A solidariedade faz parte da identidade do próprio ser humano, enquanto seraberto e atento aos outros, ao mundo e a Deus. A relação com os outros manifesta--se em experiências de encontro e de diálogo interpessoais. A solidariedade decorre

deste encontro com um «tu» com quem nos cruzamos e relacionamos. Sempre quese ignora esta dimensão altruísta, dá-se espaço ao egoísmo e à solidão e perde-se umaoportunidade para construir relações interpessoais marcadas por laços fraternos,das quais nascem frutos de amizade, comunhão e cooperação, valores que tornam apessoa humanamente mais rica e mais autêntica.

São Vicente de Paulo nasceu em 1581, numa aldeia do sul da França. Destacou--se, desde cedo, por uma notável inteligência e sentido religioso da vida. EstudouTeologia na Universidade de Toulouse e foi ordenado sacerdote.

Confrontado com tanta pobreza em contraste com a riqueza de poucos, Vicentecomeçou a distribuir bens aos pobres e a fazer visitas aos enfermos nos hospitais.

Naquele período, a Marinha francesa estava em expansão e, para resolver oproblema da mão de obra necessária para o remo, era costume a condenação àsgalés. Vicente empenhou-se nesta missão, lutando por mais dignidade para estesprisioneiros, que viviam em condições sub-humanas.

Vendo o abandono espiritual dos camponeses, fundou a Congregação da Missão,para evangelização do «pobre povo do interior».

Inspirado pelo seu amor a Deus e aos mais desamparados, São Vicente de Pauloconcretizou muitas obras de amor e solidariedade. A sua vida é uma história de doaçãoaos irmãos indigentes e de amor a Deus. O pai dos pobres inspirou as ConferênciasVicentinas, fundadas por António Frederico Ozanam e seus companheiros, em 1833,que, espalhadas pelo mundo inteiro, vivem permanentemente o amor a Deus na

ajuda aos mais carenciados.

São Vicente de Paulo

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unidade 2 87

Aristides de Sousa Mendes do Amaral e Abranches nasceu em 1885 em Cabanas

de Viriato, Carregal do Sal, licenciou-se em Direito e, depois de ter exercido funçõesdiplomáticas em várias cidades, foi nomeado cônsul em Bordéus (França).

As forças nazis de Hitler tinham entrado em Paris e uma multidão de pessoasfugira para o sul, esperando deixar a França. O destino era Bordéus, onde um vistoportuguês podia assegurar-lhes uma passagem até Portugal, que era um país neutro;dali talvez pudessem obter uma passagem para a América.

No entanto, Salazar tinha ordenado às embaixadas portuguesas que não emitissempassaportes ou vistos a determinados grupos de pessoas, entre os quais os judeus e osexilados políticos portugueses. Aristides de Sousa Mendes, com grande compaixão,decide desobedecer às ordens de Salazar concedendo vistos de forma indiscriminadae gratuita a cerca de trinta mil pessoas, de modo a salvar o maior número possívelde refugiados das mãos sanguinárias do nazismo. Cerca de dez mil desses refugiadoseram judeus. Parece ter proferido a seguinte frase: «Tenho de salvar estas pessoas,quantas eu puder. Se desobedeço a ordens, prefiro estar com Deus e contra os homens,que com os homens e contra Deus».

Posteriormente, Aristides segue para Bayonne e depois para Hendaye e Irun.Durante dias e dias anda de um lado para o outro, salvando pessoas nas estradas dosul de França, nas estações de caminhos de ferro, conduzindo mesmo um grupo decentenas de refugiados através dos Pirenéus, a pé e de automóvel.

O Alto Comissariado para os Refugiados da Sociedade das Nações calculou quenesse verão de 1940 tenham entrado em Portugal quarenta mil refugiados. Na sua

casa em Cabanas de Viriato, recebeu dezenas de refugiados.Como consequência da sua desobediência ao governo, foi chamado a Lisboa,demitido das funções diplomáticas e proibido de exercer a profissão de advogado.Teve de vender todos os seus pertences pessoais para alimentar a sua família. Morreuna penúria em 1954.

Em 1967, em Nova Iorque, o Yad Vashem, organização judaica para a recordaçãodos mártires e heróis do Holocausto em Israel, homenageou Aristides de SousaMendes com a sua mais alta distinção: uma medalha comemorativa com a inscriçãodo Talmude: «Quem salva uma vida humana é como se salvasse o mundo inteiro».Disseram então: «Como judeus salvos por um homem justo, é nossa obrigaçãorecordar a sua vida, a bondade de um homem que, contra tudo e todos, na sua época,

lesou a si mesmo para salvar outras vidas».

• Se procurardes a Deus, encontrá-lo-eis por toda a parte… na pessoa dopobre.

• Como ser cristão e ver o seu irmão aito, sem chorar com ele? É viver semcaridade, é ser cristão de pintura, é não possuir nada de humanidade, éser pior que os animais.

São Vicente de Paulo

Salazar

Aristides de Sousa Mendes

Judeus após a PrimeiraGuerra Mundial

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unidade 28

Em 1987, o presidente da República Portuguesa, Mário Soares, conferiu-lhe, atítulo póstumo, a Ordem da Liberdade. Em 1989, a Assembleia da República e oGoverno português procederam, finalmente, à reabilitação oficial de Aristides deSousa Mendes.

Hoje, continuamos a precisar de outros Aristides que lutem por um mundomelhor e mais justo para todos.

Ângelo Giuseppe Roncalli — papa João XXIII, o «Bom Papa» — nasceu em 1881numa aldeia do norte de Itália de uma família humilde e numerosa de trabalhadoresagrícolas. Devido ao clima religioso da família e à fervorosa vida paroquial, Ângelosentiu o chamamento para ser padre.

Ordenado sacerdote, foi professor e, em 1915, quando a Itália entrou na PrimeiraGuerra Mundial, tornou-se capelão militar dos soldados feridos que regressavam dalinha de combate.

Por causa da sua capacidade de diálogo e da sua humildade, foi escolhido paraser diplomata do Vaticano, ou seja, representante do papa em vários países. Cultivourelações respeitosas com todos, num espírito de tolerância e acolhimento. Mantevepermanentemente na sua vida diplomática uma atitude de simplicidade evangélica,inclusive nos assuntos mais complexos.

Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), salvou muitos judeusconcedendo permissão de trânsito como embaixador do Vaticano.

De 1953 a 1958, Ângelo Roncalli foi patriarca de Veneza.A 28 de outubro de 1958, foi eleito papa, escolhendo o nome João (XXIII), em

homenagem a São João Evangelista.Foi um papa empreendedor, corajoso, simples e cordial. Recebeu pessoas de todas

as nações e crenças; cultivou um extraordinário sentimento de acolhimento paracom todos. Sustentava-o um profundo amor a Deus e aos outros. Os seus gestosirradiavam a paz de quem confia profundamente em Deus.

Visitou e confortou crianças gravemente doentes internadas em hospitais. Numa visita a uma cadeia conseguiu criar um ambiente familiar e comovente ao apresentar-

-se aos reclusos dizendo «sou Ângelo, vosso irmão (…) aqui [na prisão] estamos

Casa onde viveu Aristides de Sousa Mendes, Cabanas de Viriato, Viseu

Papa João XXIII

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unidade 2 89

na Casa do Pai (…) pus os meus olhos nos vossos olhos, coloquei o meu coração junto ao vosso coração». Com as suas palavras e os seus gestos simples, conseguiutransmitir a misericórdia de Deus para com os prisioneiros.

Preocupou-se com a condição social dos trabalhadores, dos pobres, dos órfãos edos marginalizados.

Preocupado com o afastamento da Igreja em relação à sociedade, foi oimpulsionador de uma grande reforma na Igreja Católica. Convocou, para surpresade muitos, o Concílio Vaticano II (1962-1965), visando a renovação da Igreja e dasua relação com o mundo, através da recuperação da mensagem originária de JesusCristo (o regresso às fontes).

No final de um discurso afirmou: «Agora ao voltarem para casa encontrarão as vossas crianças. Deem a cada uma delas um beijo ou uma carícia e digam-lhe: “Esteé o beijo do papa”. Talvez as encontrem com alguma lágrima por enxugar. Tenhamuma palavra de consolo para todos aqueles que sofrem. Saibam os aflitos que o papaestá com os seus filhos, sobretudo nas horas de tristeza e de amargura. E peço-vos:

 vamos amar-nos uns aos outros, sempre cheios de confiança em Cristo que nos ajudae nos escuta.»

Papa João XXIII visita a prisão Regina Coeli, Roma

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unidade 20

Charles Eugène de Foucauld  nasceu em 1858 em Estrasburgo, França. Ficouórfão de pai e mãe em 1864. Frequentou a Escola Militar. Herdeiro de uma enormefortuna, delapidou-a rapidamente no jogo e em excentricidades. Participou noexército francês e percorreu a Argélia e Marrocos em projetos de investigação para aSociedade Francesa de Geografia.

Uma prolongada reflexão sobre a vida espiritual conduziu-o a uma conversãosúbita que o fez ingressar num mosteiro. Ordenado sacerdote em 1901, regressouà Argélia e levou uma vida isolada do mundo numa zona de tuaregues. Aprendeu alíngua, estudou a gramática, os cantos e as tradições dos povos do deserto do Saara.

A decisão que levou Charles de Foucauld a viver com os tuaregues, os pobresnómadas do deserto, foi motivada pelo seu total despojamento, amor radical eentrega aos outros. Os tuaregues chamavam-no «marabuto branco», isto é, o homemde oração ou o homem de Deus. Através da sua vida, manifestou a presença de Deus,completamente comprometido com os pobres.

Foi assassinado por assaltantes em 1 de dezembro de 1916. O papa Bento XVIbeatificou-o a treze de novembro de 2005.

Doc. 39Oração do AbandonoMeu Pai,Eu me abandono a ti,Faz de mim o que quiseres.O que zeres de mim,

Eu te agradeço.Estou pronto para tudo, aceito tudo.Desde que a tua vontade se faça em mimE em tudo o que tu criaste,Nada mais quero, meu Deus.

Nas tuas mãos entrego a minha vida.Eu te a dou, meu Deus,Com todo o amor do meu coração,Porque te amoE é para mim uma necessidade de amor dar-me,Entregar-me nas tuas mãos sem medidaCom uma conança innitaPorque tu és…Meu Pai!

Charles de Foucauld

A exemplo de Jesus que se fez pobre e por todos ofereceu a sua vida, o esvaziamentode Charles de Foucauld é o processo de diminuição pessoal para que Deus possa

intervir e agir na história dos povos e das pessoas.

Charles Eugène de Foucauld

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unidade 2 91

Doc. 40Crescer ou DecrescerTudo o que não cresce, decresce e arrisca-se a desaparecer. Este parece

ser um princípio básico da vida. Não há meio-termo, ninguém ca de foradesta realidade. Se deixo de investir numa relação, ela não se aguenta; se nãodou continuidade à minha formação, deformo-me inevitavelmente, e por aí

fora… E quem não continua a investir na fé e no amor, corre o risco de perderambas as coisas.

Padre Vasco Pinto de Magalhães, Não Há Soluções, Há Caminhos

Doc. 41Oração para obter o entendimento do silêncio de DeusConcede-nos que nos lembremos sempre que tu também falas quando

te calas. Enquanto esperamos a tua vinda, dá-nos também esta conança: Tucalas-te por amor e também falas por amor. Assim, quer te cales, quer fales,és sempre o mesmo Pai, o mesmo coração paternal, quer nos guies com a tuavoz, quer nos eduques com o teu silêncio.

Kierkegaard, lósofo e teólogo dinamarquês do séc. XIX

Na sua vida, o protagonista que sempre aparece e age através da sua pessoa é opróprio Deus. Emprestou sua própria vida a Deus, uma vida não retida, mas doada.«Quem guarda a própria vida para si, perde-a, mas quem a entrega, ganha-a».

• O sangue derramado e oferecido de todo coração é um sangue que revela,numa linguagem universal, o amor universal de Deus.

• Logo que descobri que existe Deus, entendi que não podia fazer outracoisa a não ser viver por ele: a minha vocação religiosa começa no exatomomento em que despertou a minha fé.

Charles de Foucauld

Kierkegaard

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unidade 32

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unidade 3 93

Nesta unidade vamos refletir sobre:

• A religiosidade oriental

• O Hinduísmo• O Budismo

• O Tauismo

• O Confucionismo

• Valores éticos comuns às grandes tradições religiosas

• O diálogo inter-religioso

UNIDADE LETIVA 3

As religiões orientais

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unidade 34

Olá!

Chamo-me Tenzin Gyatso, mas sou mais conhecido por Dalai Lama .

Nasci a 6 de julho de 1935, no Tibete, e sou líder religioso do Budismo tibetano.

Sou considerado a décima quarta reencarnação do Bodisatva  da Compaixão e,

como tal, o líder do povo tibetano.

Tenho-me comprometido com a paz, procuro estabelecer o diálogo e difundir

a compaixão como atitude fundamental na relação entre as pessoas e as

sociedades.

Em 1959, quando o Tibete foi invadido pela República Popular da China, fui

obrigado a abandonar o meu país. Disfarcei-me de soldado e, na companhia de

familiares, atravessei a fronteira da Índia para não ser capturado pelos chineses.

 Vivo numa peregrinação ininterrupta pelo mundo, apelando à necessidade

de se implementar a paz e os direitos humanos, em especial no Tibete. Luto pela

independência do Tibete — no respeito pelos direitos do povo tibetano — e pela

concórdia entre as nações, recorrendo sempre a métodos pacícos, de acordo

com a doutrina e a prática da não violência que Mahatma Gandhi defendeu. Foi--me atribuído o Prémio Nobel da Paz em 1989. Este prémio chamou a atenção

mundial para a causa do Tibete e, ao mesmo tempo, provocou um enorme

embaraço no regime totalitário de Pequim.

Nesta unidade, que vai alargar o teu conhecimento sobre as religiões orientais,

procura assumir uma posição pessoal face ao universo dos valores positivos que

as religiões propõem.

Dalai Lama é reconhecido em todo o mundo como líder espiritual do Tibete e

 já recebeu mais de cem títulos honoris causa, mas os governos de muitos dos paísesque visita evitam contactos oficiais com ele para não ferirem a sensibilidade e osinteresses da China.

Cidadão planetário, manifesta especial interesse pela convivialidade e pelacooperação. Neste sentido, apela a que cada pessoa trabalhe não só em benefício de siprópria, mas sobretudo em prol da humanidade como um todo.

Afirma que a responsabilidade é a chave para a sobrevivência do ser humano e amelhor garantia de realização dos valores universais, incluindo a paz.

palavra «Dalai » signicaeano e a palavra «Lama»

gnica mestre o gr.itas vezes tradz-sealai Lama por Oceano debedoria.

pós a morte de malai Lama , os mongesocram descobrir o renascimento, a saencarnação em otrara histórica, a qalssa a assmir a fnçãochea.

odisatva [Ser ( sattva ) debedoria ( bodhi  )] é massoa sábia qe ensinas otros os benefíciosvirtde e da sabedoria.

Saber +

0 400 Km

C h i n a   Pequim

Paquistão

Índia

Índia

Laos

Myanmar 

Taiwan

Hong KongMacauVietname

RússiaRússia

Coreiado

Norte

Mongólia

Rio

Yangtzé

Rio Amarelo

ShangaiTibete

Nepal

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unidade 3 95

A religiosidade

Perguntaram a Dalai Lama:— O que mais o surpreende na humanidade?E ele respondeu:— Os homens; porque perdem a saúde para juntar dinheiro, depois

perdem o dinheiro para recuperar a saúde. E por pensarem ansiosamente nofuturo, esquecem-se do presente de tal forma que acabam por não viver nemo presente, nem o futuro. E vivem como se nunca fossem morrer e morremcomo se nunca tivessem vivido. Só existem dois dias no ano em que nada podeser feito: um chama-se ontem e o outro chama-se amanhã; portanto hoje é odia certo para amar, acreditar, fazer e principalmente viver.

O primeiro pressuposto da religião é que existe uma realidade suprema einacessível  ao ser humano, a que geralmente se chama Deus. Esse ser supremo,

diferente e distinto do que nos rodeia, não é parte do mundo natural. Todavia, asreligiões acreditam poder encontrá-lo através da experiência de certas pessoas ou dacontemplação do mundo natural. Esta manifestação do sagrado, quando acolhida,provoca na pessoa uma atitude religiosa. Na verdade, para que exista religião, nãobasta haver um deus que se manifeste; é preciso que a pessoa dê o seu assentimento,real e permanente, orientando a sua vida para o ser supremo. Tal atitude religiosamanifesta-se de diferentes modos:

• Acorrendo a certos lugares, como templos, santuários ou espaços naturais;• Participando em ritos, festas e cerimónias;• Escutando «deus» no silêncio da sua consciência, através da oração e da

contemplação;

• Comportando-se segundo aquilo que se considera corresponder à vontade de Deus.

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unidade 36

Doc. 42A religião

E m velho sacerdote disse: «Fala-nos da religião.»E ele responde: «Porventra tenho e falado de otra coisa?Porventra não é religião tdo aqilo qe é m espanto e ma srpresasempre renovada na alma, até qando as mãos talham a pedra o armamo tear? Qem é capaz de separar a fé dos ses atos, o a sa crença dasocpações?

«Qem é capaz de estender as horas diante de si dizendo: “Isto paraDes, isto para mim, isto para a alma, isto para o corpo?”

«Todas as vossas horas são asas qe batem através do espaço de m ea otro e.

«A vida de todos os dias é o vosso templo e a vossa religião. Aoentrarem nele levem convosco todo o vosso ser. Porqe em sonho nãopodem erger-se acima daqilo qe levaram a bom termo nem cair maisbaixo do qe os vossos fracassos.

«E tomem convosco todos os homens. Porqe em adoração não podemvoar mais alto do qe as sas esperanças, nem descer mais baixo do qe ose desespero.

«E se qerem conhecer a Des, não se preocpem em resolver enigmas.Olhem antes à vossa volta e vê-lo-ão brincando com os vossos lhos.Olhem para o espaço e percebê-lo-ão caminhando nas nvens, estendendoos braços no relâmpago e descendo na chva. Vê-lo-ão sorrindo nas ores,

depois levantar-se e agitar as mãos nas árvores.»

Khalil Gibran, O Profeta

Festival Internacionalde Cultura Confuciana,

Qufu, China

Kahlil Gibran

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unidade 3 97

A experiência do sagrado  constitui um dos principais aspetos da vivênciahistórica da humanidade. Toda a pessoa procura a verdade que dê sentido, significadoe finalidade à existência pessoal e coletiva. A religião é a via mais universal pararesponder a esta necessidade. Todas as religiões propõem respostas para as perguntasque inquietam continuamente o espírito humano. Desde sempre, a pessoa parece

ter organizado a sua vida quotidiana e o mundo em que vive segundo princípios dereligiosidade. A religião ocupou sempre um lugar central na organização social eurbanística.

Desde o aparecimento da escrita que o ser humano registou as suas crençasreligiosas em placas de argila, monumentos, tiras de papiro ou pergaminho. Algunsdesses registos foram elevados à condição de textos sagrados  por determinadascomunidades de crentes. Neles refletem-se muitas das mais profundas questões a queo ser humano sentiu necessidade de responder: a criação do mundo e da humanidade,a morte, a vida para além dos limites temporais, a imortalidade, a organização emanutenção do universo, os valores e os princípios a partir dos quais se organiza a

 vida humana, as angústias, os desejos e as esperanças da humanidade…

Os textos sagrados apareceram num contexto, numa época e para um determinadogrupo humano, tendo sido produzidos para serem lidos e entendidos por essacomunidade concreta. Por isso, o redator teve de usar a língua compreendida nesselocal e as ferramentas culturais e religiosas de que essa população dispunha.

Mas a religião não se circunscreve a textos. Manifesta-se também através de rituaissagrados — conjunto de comportamentos individuais ou coletivos, materializadosem gestos e palavras sagradas que põem o crente ou a comunidade dos crentes emcontacto com a divindade. O ritual assume uma dimensão tão importante como opróprio texto.

A melhor religião é a que mais te aproxima de Deus, do Innito. É aquela que te

faz ser melhor: mais compassivo, mais sensível, mais desapegado, mais amoroso,

mais humanitário, mais responsável, mais ético… A religião que conseguir isso

de ti é a melhor religião.

Dalai Lama 

As grandes civilizações da Índia e da ChinaA Índia  foi um dos grandes berços da civilização humana. Estudos recentes

evidenciam que a cultura harappiana (primeira civilização da Índia) era tãodesenvolvida como a mesopotâmica e que os indianos de então dominavam técnicasavançadas para aquele período da história. Esta civilização caraterizava-se poramplas cidades extraordinariamente arquitetadas, com edifícios complexos de váriosandares, com cisternas de água pluvial e sistemas sofisticados de drenagem.

Foi nesta civilização de artesãos particularmente habilidosos (com destaque paraa olaria e para as técnicas de fundição a mais de 930° C) que surgiu o Código de Manu 

— a mais antiga compilação de leis existente.

 A Torá, os cinco primeiros livrosda Bíblia hebraica,

Tomar, Portugal

Estátua de Brama

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unidade 38

A civilização sínica (chinesa) é outra das mais antigas civilizações. Desenvolveu-seao longo das margens dos rios Amarelo e Azul (Yangtzé) desde tempos imemoriais.A sua principal caraterística foi sempre, pelo menos até ao século XIX, a transmissão

da cultura milenar. Sociedade tradicional, a China considerava que a melhor formade viver não consistia em modernizar-se, mas em repetir os padrões do passado. Daía manutenção do cultivo de cereais, da escrita ideográfica, da importância da famíliaou do culto dos antepassados. Por outro lado, os chineses foram sempre férteis nacapacidade de invenção: a tecelagem da seda, a tinta, o chá, a pólvora, os foguetes, ofósforo, a bicicleta, o leme, a bússola, o ábaco, o papel, a caneta, o compasso, os óculos,o jogo de xadrez… É ainda de referir, a título de exemplo, que, vários séculos antesde Cristo, os chineses já usavam carvão de pedra, petróleo e gás como combustíveis,conheciam astronomicamente os eclipses do Sol e da Lua e possuíam sismógrafospara identificação e registo de tremores de terra.

A religiosidade oriental, sobretudo de origem indiana, é introvertida e mística;refletindo-se numa espiritualidade meditativa e contemplativa, sempre em busca doautoconhecimento.

Para esta religiosidade é indispensável respeitar não apenas os semelhantes,mas também, e talvez na mesma ordem de importância, todos os seres animados einanimados, uma vez que a divindade está presente em tudo o que existe ou com tudose identifica (panteísmo). A harmonia com a natureza é uma caraterística central do

imaginário religioso oriental.

0 400 Km

China  Pequim

Paquistão

Índia

Laos

Myanmar Taiwan

Hong KongMacauVietname

Nepal

Rússia

Cazaquistão

Rússia

Coreiado

Norte

Mongólia

Rio

Yangtzé

Rio Amarelo

  G   r  a

 n d  e   M

 ur a l   h  a  

Shangai

Ma r 

da

China

Oceano

Pacífico

Tibete

BANGLADESH

M YA N M A R

0 400 Km

N  E  P  A L 

C H I N A

AFEGANISTÃO

SRI

LANKA

      R            i

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   I  n d  o

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Islamabad

Peshawar 

Lahore

Bombaim

Karachi

PAQUISTÃO

Í N D I A

Nova Deli

Calcutá

O c e a n o Í n d i c o

Mar da Arábia

G o l fode

Bengala

Goa

Diu  Damão

Colheita do arroz na China

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unidade 3 99

Hinduísmo

A religiosidade principal da Índia, o Hinduísmo, é um fenómeno que englobaa totalidade da vida. Mais do que uma religião, é um conjunto de religiões ou detendências religiosas, reunindo uma enorme variedade de crenças e cultos. Tem umaideia vaga de um Deus superior, que se manifesta em múltiplas divindades, e umaideia muito bem definida da salvação individual, que se alcança através das açõesrealizadas por cada um, através da contemplação, ou através do amor absoluto a Deus.

Para o Hinduísmo, cada ser humano possui uma alma individual (atman = eu)que antes de atingir a Alma Universal (Brama = Deus) deve purificar-se de tudo oque o diminui e adquirir o conhecimento necessário, através de uma série sucessiva

de vidas terrenas. No decurso de cada uma dessas vidas todo o ser humano praticaações. Se forem boas, redimem-no do mal cometido anteriormente e conduzi-lo-ãoao nirvana (a salvação para lá do ciclo de reencarnações); se forem negativas, obrigá--lo-ão a consecutivas reencarnações e a experiências de sofrimento. Ao contrário doque muitos pensam, o objetivo de todo o hindu é escapar ao ciclo de reencarnaçõesque submetem o ser humano às condições negativas da vida terrena.

Em princípio, ninguém se torna hindu; é-se hindu por pertencer a um meiosocial. Mesmo que não se acredite nos deuses, é-se hindu enquanto não se forafastado da comunidade. Ser hindu é, pois, uma relação de pertença a uma sociedade,participando num certo número de valores e de práticas. Ao contrário, ninguém setorna hindu senão por uma espécie de consenso da sociedade, o que é muito raro.

Hinduísmo é o nomeqe o mndo ocidentalatribi a m conjnto decrenças, losoas e ritaisadotados pelo povo qevivia nas margens do rioIndo. O nome pelo qal osatóctones denominavama sa própria cltra éSanatana-Darma (EternaLei).

Saber +

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unidade 30

comnidade hindsenvolve-se emrtgal a partir de 1975,mo conseqênciadescolonização de

oçambiqe.ndada em 1982,ssociação da

omunidade HinduPortugal , com cercanovecentos sócios,

presenta os qinzel hinds residentes noís. O se objetivo éeservar a sa identidade

promover a integraçãosociedade portgesa.

s cerca de onze milnds qe vivem na áreaetropolitana de Lisboaeqentam o se templodicado a Radha Krishna.

Saber +

Templo hindu em Lisboa

Símbolo

Origem e evolução

O símbolo do Hinduísmo é o Om. É a sílaba sagrada, constituída por três caracteressânscritos (língua sagrada do Hinduísmo), correspondentes às letras A-U-M, que sepronuncia numa única emissão de som: «OM ». É o som mais sagrado e a origem de

todas as orações.Graficamente é um  yantra  (diagrama composto por formas geométricas

concêntricas, considerado uma representação do ser humano e do universo), masquando se pronuncia é um mantra (sílaba, palavra ou frase pronunciada segundoprescrições rituais, tendo em vista uma finalidade mágica ou o estabelecimento deum estado contemplativo).

Representa o Trimurti, ou seja, as três formas da única divindade: Brama, Vixnu

e Xiva.

A existência do Hinduísmo antecede os registos históricos e as suas origensperdem-se no tempo. A mais antiga evidência de uma religião na Índia data doNeolítico (cerca de 7000 a.C.).

A forma atual do Hinduísmo surgiu a partir dos Vedas, após 1700 a.C., quando astribos arianas (provenientes da Ásia Central) se instalaram na Índia e submeteramas populações autóctones.

O Hinduísmo, que não tem fundador, é o resultado de uma evolução aglutinantedos cultos védicos (indo-europeus) com os cultos autóctones do vale do Indo.

A religião védica  centra-se nos deuses, nos sacrifícios e nos sacerdotes. Noperíodo primitivo do Hinduísmo, salienta-se o politeísmo. A superabundância dedeuses e de nomes divinos provoca muitas vezes a confusão entre os próprios crentes

Í n d i a

Nova Deli

Caxemira

    P   a   q    u    i   s    t    ã

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   M  y  a  n  m

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ChinaAfeganistão

Nepal

Bangladesh

SriLanka

R    i            

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a  n j  e  s

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d     o   

Mar Árabe

Baíade Bengala

0 400 Km

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unidade 3 101

da religião hindu. Aos deuses oferecem-se, em sacrifício, animais e vegetais, visandoobter favores. Os sacerdotes, embora não formem ainda uma casta à parte, detêmparticular importância nesta sociedade.

Com o passar do tempo, a linguagem dos Vedas tornou-se arcaica, pelo que eranecessário interpretá-los. Assim nasceram, entre 1000 e 800 a.C., os livros chamadosBrâmanes.

A religião bramânica divide a sociedade hindu em quatro castas  (atualmentemuito subdivididas e fragmentadas): os Brâmanes  (sacerdotes), os Cxátrias 

(guerreiros), os Vaixias  (artífices) e os Sudras  (servos). No fim da escala estão osPárias, gente excluída e marginalizada que não pertence a nenhuma casta.

É também na época bramânica que se desenvolve a ideia de karma  (herançadas incarnações anteriores e destino: castigo ou recompensa), em conformidadecom o cumprimento do darma  (lei, deveres). Também a crença na reencarnação(transferência da alma para outro corpo, após a morte) e no nirvana (libertação dasreencarnações e integração na eternidade) se desenvolveram neste período.

Darma é a consciência de pertencer a um universo organizado e, consequentemente,a obrigação moral de aceitar o seu lugar na vida. Para os hindus, uma correta práticado darma  tem um efeito favorável sobre o karma, o que permite a cada indivíduorenascer numa casta e num plano de existência mais elevado, aproximando-se, deste

modo, do objetivo final, o nirvana.

Livros sagrados e textos de referênciaAs Escrituras hindus, chamadas Shastras  («Instruções» ou «Tesouros do

Conhecimento»), dividem-se em dois grupos: Shruti  («Escutado; Revelado») —textos ouvidos diretamente de Deus — e Smriti («Memória») — textos que contêmexplicações sobre os Shruti.

Peregrinos no rio Ganges

Sudras

Vaixias

Cxátrias

Brâmanes

Párias

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unidade 32

O Mahabharata é o texto mais extenso da literatra hmana. Foi escrito pelo sábio Vyasaatravés da clarividência e axílio do des Ganesha. Trata da gerra entre os clãs Krs ePandavas, ses primos. Tdo começa com m jogo de dados onde o líder dos Pandavas perde

o reino qe governava e é obrigado a exilar-se com os ses qatro irmãos. Passado o períodode exílio, os irmãos regressam para reconqistar o reino sendo axiliados pelo grande sábioSri Krishna, considerado ma encarnação divina. O capítlo mais importante do Mahabharata 

é Baghavad Gita («Canção do Senhor») onde Krishna descreve o sistema do Yoga a Arjna,se amigo e discíplo.O otro épico, o Ramayana , foi escrito pelo sábio Valmiki. Ramayana pode ser tradzidopor «Veíclo da Virtde». Conta a história do príncipe Rama (o sétimo avatar o encarnaçãodivina) qe vê a sa esposa Sita ser raptada pelo demónio Ravana e realiza ma enormeempreitada para a libertar. O Ramayana é recheado de histórias onde a lealdade, a devoção ea amizade são exaltadas.Tantras  são ensinamentos qe visam o conhecimento perfeito e indicam formas de opraticar no dia a dia. O objetivo é a aqisição de poderes psíqicos de atodomínio. Sutras são preceitos na forma mais abreviada e sintética possível; são textos condensados na formade aforismos.

Saber +

Os Vedas  constituem o corpo central dos textos Shruti. Foram escutadosdiretamente por sacerdotes piedosos, que os transmitiram em sânscrito, a línguasagrada. Os Vedas são compostos por quatro livros: o Rig-Veda («Saber dos Hinos»),dedicado aos rituais e ao louvor das divindades; o Yajur-Veda («Saber das Fórmulas

Sacricatórias»), dedicado aos preceitos sacriciais; o Sama-Veda  («Saber dosCânticos»), manual para formação dos cantores nos sacrifícios; e o  Arthava-Veda

(«Saber do Sacerdote do Fogo»), todo dedicado a fórmulas mágicas e mantras.Fazendo ainda parte dos Shruti, destacam-se os Brâmanes  («Interpretações

dos Sacerdotes»), que tratam das normas dos rituais, os  Aranyakas  («Textos da“Floresta”»), rituais para os ascetas que viviam isolados nos bosques, e os Upanishads,textos que introduziram a atitude contemplativa, a busca da mudança interior atravésda renúncia às coisas do mundo.

Derivados dos textos Shruti surgiu um conjunto de outras escrituras de caráterinterpretativo (Smriti): os grandes épicos ( Mahabharata, no qual se inclui o célebreBagavadgita, e o Ramayana), os Puranas (crónicas), os Darmasastras (códigos deleis), os  Nitisastras  (ética), os Sutras  (regras aforísticas relacionadas com rituais,filosofia, ética, etc.), os Ágamas (coleções de doutrinas como os Tantra e Yantra) e osDarsanas (escolas filosóficas como Yoga, Samkhya e outros).

Shruti Smriti

Shastas, Escrituras hindus

Leitura de texto sagradonum ritual hindu

Sri Krislina e Radha uma árvore durante uma

tempestade, Kangra, Índia

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unidade 3 103

Princípios fundamentaisO princípio fundamental no Hinduísmo é a retidão. Aquilo que, de facto,

importa é a conduta correta. Na verdade, não se pode separar a ética da religião.Talvez, por isso, a Índia seja possuidora de um dos menores índices de criminalidade

no mundo, apesar da sua imensa população de quase mil e duzentos milhões depessoas que vivem numa condição económica muito precária.

O Hinduísmo possui um conjunto de leis (sastras) que norteiam o agirdos crentes: os quatro pilares e os  três grandes princípios. O principal e maisimportante conjunto de leis está no Mana-darma-sastra, conhecido popularmentecomo Código de Manu.

Doc. 43Quatro pilares1.  Artha diz respeito ao conjnto de regras qe têm por objetivo tratar

da riqeza económica, da distribição de bens e valores, da administraçãoda riqeza do país, dos impostos, etc. O hind tem obrigação de procrarsstento, para si e para a sa família.

2. Darma constiti a parte religiosa, bem como o exercício do qe hojemodernamente chamamos Direito. Saliente-se qe no Código de Man,certamente o mais antigo grpo de regras sociais e civis existentes, não há avingança de sange. O hind tem obrigação de cmprir os deveres religiosos,

morais e sociais.3. Kama refere-se à atividade do gozo dos sentidos; à arte e à estética.Neste sentido, música, dança, pintra, escltra e tdo o qe diz respeitoao prazer estético, gstativo e tátil, em geral, está dentro deste conjnto deregras disciplinadoras da sociedade. O hind tem obrigação de procriar paracontinar a linhagem.

4. Moksha é m conjnto de regras qe tem por nalidade promovera libertação do eterno retorno da alma sbmetida às condições adversasdeste mndo. O hind tem obrigação de procrar a atorrealização e alibertação do ciclo de reencarnações. Há, essencialmente, três caminhos delibertação: a via da ação ( karma ) desinteressada, amorosa e gratita; a via dacontemplação (  jnana ) qe pretende alcançar a identicação com a divindade;e a via do afeto ( bhakti  ), do amor absolto a Des e do dom gratito de Desao ser hmano (é o caminho do yoga ).

Adaptado de Swami Krishnapriyananda Saraswati, http://www.gita.ddns.

com.br  (18/02/2010)

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unidade 34

Doc. 44Três grandes princípios1.  Ahimsa é o princípio base qe origina, fndamenta e norteia todos

os otros princípios. Fico poplarmente conhecido como «não violência»,devido à notável condta de Mahatma Gandhi, na ocasião da libertação daÍndia do domínio inglês. A não violência não se resme apenas à não agressão

física, mas consiste igalmente em tratar os otros tal como gostaríamosde ser tratados. É por isso qe se entende a opção da grande maioria dosindianos pelo vegetarianismo, ma vez qe matar ma criatra apenas parasatisfação pessoal seria m ato de violência, qe tem conseqências ftras,pela lei do karma.

2. Karma signica literalmente «ação», o «trabalho», designando tdoaqilo qe fazemos no mndo. A ideia fndamental é qe não há açãosem reação, ma vez qe tdo está interligado na natreza material oPrakriti . Na natreza material tdo fnciona como ma espécie de rede oteia, de modo qe não podemos agir nm lado sem qe o otro responda

interativamente, de algm modo, à ação qe foi realizada. Há m sentidocorreto na ação praticada, pelo qe qalqer modicação nesse sentidocasará efeitos negativos.

3. Samsara é o princípio da reencarnação. Signica «retorno» ao mndomaterial. O Karma condiciona a nossa vida ftra, mas voltamos ao mndomaterial porqe desejamos tal retorno. Somos responsáveis pelo nossodestino, na medida em qe o constrímos através das nossas ações.

Adaptado de Swami Krishnapriyananda Saraswati, http://www.gita.ddns.

com.br  (18/02/2010)

Mahatma Gandi

Hindus realizam ritual para adorar deus Xiva

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unidade 3 105

Ritos e costumesO principal rito hindu consiste na adoração da divindade. No panteão hindu

sobressaem três divindades maiores: Brama, o deus criador de todas as coisas e parao qual tudo regressa; Vixnu, o deus conservador; e  Xiva, o deus destruidor. Esta

tríade forma o Trimurti. Mas o monoteísmo parece sobressair em muitas correntes.Os muitos nomes dos «deuses» não serão mais do que manifestações do único SerSupremo.

Ao longo dos tempos as divindades incarnam assumindo individualidadesdiversas.

No mito da criação hind,Brama — o criador —nasce de ma or delóts, ainda sob a formade botão, qe crescia nombigo de Vixnu. Depoisde o mndo ter sidocriado por Brama , Vixnu 

acordo, governando-odrante o período dociclo cósmico kalpa , m«dia de Brama», qe tema dração de qatro mil edzentos milhões de anosterrestres.

Os altares das casashinds têm sempre matoalha branca, símbolo de

m plano diferente; maimagem da divindade darespetiva devoção, qeassim se torna presente;ores, instrmentosmsicais e tas coloridaspara transmitir alegria;ma vela, qe representao fogo divino e o podercriador; ma taça decristal, símbolo daabóbada celestial qe atraios espíritos protetores; epratinhos de oferendasà divindade: a ága dagenerosidade, os carvõesda força mental, ervas oincenso como alimentoespirital, ma tigela comterra e algmas moedassobre ela.

Saber +

Saber +Os atos, públicos ou privados, da vida dos hindus revestem-se de caráter

sagrado e devem obedecer a rituais precisos. «Façam tudo como sendo umaoferenda para Mim ou para Brahma» (Bagavadgita, 5.10). Neste texto, Krishna

(Brama personificado) afirma que todas as coisas devem ser feitas como se fossemum ato religioso, tendo em mente que por detrás de tudo está a vontade suprema dadivindade (da qual o ser humano é apenas mero instrumento). Quando a submissãoà divindade se perde surgem todos os problemas no mundo material.

Na maior parte das casas hindus há um altar doméstico onde se presta cultoindividual e em família e se mantém o contacto direto com a divindade.

Brama Vixnu Xiva

Oração a Xiva

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unidade 36

Todo o hindu deve rezar pelo menos duas vezes por dia, de preferência ao nascer eao pôr do sol. A oração consiste essencialmente em recitar mantras — fórmulas quasemágicas que unem a pessoa aos deuses e produzem uma transformação interna. Aoconcentrar-se na repetição do som do mantra, a mente fica clara, tranquila, livre detodo o tipo de pensamentos impuros e pronta para uma meditação mais profunda.

Os hindus também frequentam os templos onde fazem oferendas à divindade. Acerimónia no templo, com rituais precisos é presidida por um ou vários sacerdotes.Os templos hindus baseiam-se no desenho dos  yantras. O  yantra  mais simples éum círculo inscrito num quadrado, por sua vez inscrito num retângulo, cujas quatrosaídas representam as quatro direções do universo.

Doc. 45Os templos hindusA grande diferença dos templos hinds relativamente a otros lgares

santos de otras religiões é sa inerente alegria. Nos templos hindsnão impera o sentimento de grande respeito, próprio do bdismo, nem asobriedade da mesqita, nem o recolhimento da igreja cristã, onde o rídoé considerado m elemento pertrbador. No templo hind tdo são lzes,cores, música, rídos e comida. É a atividade da vida. O rito de aproximaçãoa Des spõe respeito, mas não temor. Ningém se ofende nem se irritapela vitalidade das crianças, mesmo qe elas corram e gritem. Não existeo silêncio, não se exige sobriedade nas cores das vestimentas, não se exigepontalidade, nem homogeneidade no rito. As pessoas podem rezar a

qalqer hora e há total liberdade na maneira de comnicar com a divindade.

Rosane Volpatto, http://www.rosanevolpatto.trd.br/mantras1.html

(18/02/2010)

Templo hindu, Pearland, Texas

Templo hindu, Deli, Índia

Hindus e visitantes numa

elebração realizada no TemploBatu Caves, Selangor, Malásia

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unidade 3 107

As festas  têm grande importância no Hinduísmo. Além de representarem adimensão comunitária da vida religiosa, manifestam o desejo pessoal de alimentaruma relação íntima com o sagrado e de nela permanecer para se purificar.

São inúmeras as festas hindus (cerca de quarenta por ano) e variam de região pararegião. As mais importantes são:

• O Festival das Cores (Holi), celebração nacional do início da primavera e do anonovo, em março. Durante esta festa as barreiras sociais são ignoradas e membrosde diferentes castas lançam tinta colorida uns sobre os outros.

• O Festival do deus Xiva, em março.• O Festival de Krishna, em agosto.• O Festival das Nove Noites para a deusa Durga, em setembro ou outubro.• O Festival das Luzes (Diwali), dois dias em outubro ou novembro, em que se

comemora a destruição das forças do mal.

O Hinduísmo não tem propriamente uma cidade sagrada, mas Benares, banhadapelo rio Ganges, ou Rishikesh, nos Himalaias, são lugares de peregrinação de fiéis de

todas as regiões da Índia.

De acordo com a tradiçãohind, fndamentadano Rig-Veda , a vaca é o

animal mais sagrado daÍndia. Acredita-se qe avaca transporta o des

 Xiva e controla os sesimplsos, por isso, o gadobovino é mais sagrado doqe os próprios brâmanes.Matar o ferir ma vacana Índia é crime pnidocom prisão. As vacasmorrem de velhice e têmaté hospitais próprios. O

gado bovino é, contdo, degrande importância paraa economia indiana qerpela riqeza do leite e dosexcrementos, com amplastilizações (inclsivamenteem ritais de pricação),qer pelo trabalho qedesempenha na agricltra.Entre otros animaisconsiderados sagradospelos indianos destaca-se

o rato, qe transportaGanesh , o des dasabedoria e do intelecto.Algns hinds, porém,condenam a sacralizaçãodos animais.

Saber +

A oração salvou-me a vida. Sem a oração teria cado muito tempo sem fé. Ela

salvou-me do desespero. Com o tempo, a minha fé aumentou e a necessidade de

orar tornou-se mais irresistível… A minha paz muitas vezes causa inveja. Ela

provém da oração. Eu sou um homem de oração. Como o corpo se não for lavado

ca sujo, assim a alma sem oração se torna impura.

Mahatma Gandhi, mestre hindu do século XX 

Banho no rio Ganges, por Valentine Cameron Prinsep

Estátua de deus Xiva comuma vaca, animal sagrado

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unidade 38

Budismo

O Budismo é, essencialmente, um caminho de aperfeiçoamento espiritual. O seucaráter aberto e não dogmático, bem como o facto de poder prescindir da ideia de umdeus transcendente leva muitos investigadores a considerá-lo uma filosofia ou uma

forma de vida e não tanto uma religião.A salvação não é, portanto, dádiva gratuita de uma divindade, mas conquista doser humano. O objetivo do Budismo é ajudar as pessoas a encontrar o caminho paraa iluminação (que é o signicado da palavra «Buda»), no qual se atinge o estadode nirvana — total serenidade e libertação em relação a qualquer forma de desejo,erradicando assim as causas de todo o sofrimento.

A noção de karma — boas e más ações que recebem a adequada recompensa oucastigo, quer na vida presente, quer através de uma longa sucessão de vidas, por meioda reencarnação — constitui a pedra de toque da doutrina budista.

SímboloA figura de Buda, sentado em postura de lótus, tal como estaria no momento

da sua iluminação, impôs-se como representação universalizada do Budismo, maso símbolo do Budismo é a Roda da Lei. Uma espécie de leme com oito pontos querepresenta o movimento cíclico do tempo. As duas hastes em cruz indicam as Quatro

Verdades; as duas hastes na diagonal completam as oito pontas e indicam o Caminho

das Oito Vias.

Leitura dos ensinamentosde Buda

Roda da Lei, Templo Jokhang,Tibete

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unidade 3 109

Origem e evoluçãoO Budismo surgiu na Índia, por volta do ano 500 a.C., como consequência dos

ensinamentos de Sidarta Gautama.O fundador do Budismo, sobre o qual existem várias lendas, nasceu em Lumbini,

no norte da Índia (atualmente território do Nepal), por volta do ano 566 a.C. eterá morrido aos oitenta anos. Príncipe do reino Shakya, Sidarta Gautama foiprimorosamente educado segundo os princípios do Hinduísmo. Insatisfeito com a

 vida que levava, aos vinte e nove anos abandonou a família por forma a encontraruma resposta para o sentido da existência humana e a libertação do sofrimento queo nascimento, a velhice e a morte trazem consigo.

A procura iniciou-se através de uma vida austera, cheia de privações, numafloresta, vivendo como asceta. Alguns anos depois, percebeu que não era esse ocaminho que o haveria de conduzir à verdade. Por isso, enveredou pelo chamado«caminho do meio», entre o fausto do palácio real da sua família e a miséria ascéticaem que vivera nos últimos anos. Com 35 anos, enquanto meditava debaixo de umafigueira nas margens de um afluente do Ganges, teve uma experiência religiosa deiluminação que o marcou para toda a vida. É neste momento que se torna «Buda»,ou seja «iluminado». Sidarta inicia então as suas pregações, atraindo numerososdiscípulos e fundando comunidades monásticas.

A pregação de Sidarta, rejeitando os sacrifícios da religião védica bem comoa própria autoridade dos Vedas, constituía um corte radical com toda a religiãotradicional. Além disso, o facto de ter ultrapassado a barreira das castas e de ter saídodo quadro geográfico do Hinduísmo (a Índia) permitiu a afirmação do Budismo comoforma religiosa autónoma. No século III a.C., o imperador chinês Asoka converteu--se ao Budismo, transformou-o em religião oficial do Estado e enviou missionários

por toda a parte, permitindo a expansão do Budismo na China.Depois de várias vicissitudes históricas, o Budismo sofreu múltiplas cisões.

Atualmente, as principais divisões do Budismo são o Teravada  (Hinayana  —Pequeno Veículo) e o Maayana (Grande Veículo). Entre os muitos grupos Maayana,contam-se o lamaísmo, no Tibete, e o zen, no Japão. O Teravada, predominante nosudeste da Ásia, carateriza-se pela vontade de regressar aos ensinamentos originaisdo Buda, repropondo a vida mendicante e contemplativa como via para quebrar ociclo da samsara  (morte e renascimento). O Maayana, predominante no norte daÁsia, acentua Buda como princípio eterno e essência de todas as coisas; exorta todosa alcançarem o nirvana e a tornarem-se Bodisatva, iluminados que dedicam a suaexistência a ensinar aos outros o caminho da libertação.

Estátua de Buda, Alemanha

Festival Budista de janeiro,Bodhgaya

Dalai Lama e monges budistas,Bodhgaya, Índia

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unidade 30

Textos de referência

Princípios fundamentais

O texto fundamental do Budismo é o célebre Sermão de Benares, no qual, depois daIluminação, Sidarta Gautama identificou o grande mal do mundo — o sofrimento — eindicou o Óctuplo Caminho como meio para o ultrapassar e atingir a paz e a serenidade.

Este discurso, base de todos os ramos do Budismo, faz parte do Sutra-Pitaka.A doutrina budista está consagrada no Tripitaka (Triplo Cesto de Flores): o cesto

dos discursos — Sutra-Pitaka — que agrupa os ensinamentos do próprio Sidarta,coligidos por Ananda, um dos seus discípulos mais próximos; o cesto da disciplina— Vinaya-Pitaka —, que reúne as regras das comunidades monásticas; e o cesto dasreflexões sobre a doutrina — Abidarma-Pitaka —, que contém textos filosóficos queinterpretam e esclarecem as escrituras anteriores.

Além do Tripitaka, o Budismo Mahayana reconhece ainda outros textos sagrados.

O Budismo baseia-se nas quatro nobres verdades pregadas por Sidarta Gautama:1. A vida é sofrimento, insatisfação, mal-estar, frustração e imperfeição, tanto do

ponto de vista físico como emocional e mental.2. As causas do sofrimento são a ignorância (desconhecimento da unidade do

eu e do mundo), que leva à separação entre o sujeito e tudo o que o rodeia e aoegocentrismo do desejo possessivo e da aversão.

3. A solução só se encontra na cessação do sofrimento (nirvana) pela negação dassuas causas.

4. A via que leva à cessação do sofrimento tem três aspetos: a ética (não prejudicar

nenhum ser vivo e agir para o bem de todos); a meditação (libertar a mente de tudoo que for negativo e cultivar estados mentais positivos como o amor e a compaixão);e a sabedoria  (o conhecimento de que todas as coisas são ilusórias e não podemsatisfazer o ser humano; pôr a sua vida ao serviço da libertação dos outros seres). A

 via da libertação realiza-se, na prática, através do Óctuplo Caminho.Sidarta Gautama constatou que a vida humana é incompleta, insegura, cheia de

insatisfações e de limitações; daí a primeira verdade: «O nascimento é sofrimento, oenvelhecimento é sofrimento, a morte é sofrimento, estar ligado àquilo de que nãogostamos é sofrimento, separarmo-nos do que amamos é sofrimento, não obter o queambicionamos é sofrimento».

Para poder curar o sofrimento, é preciso saber qual a sua causa. Na segunda verdade, Buda revela que o sofrimento é causado pela ignorância que leva ao egoísmoe ao desejo ou apego em relação às coisas do mundo, como se delas pudéssemoscolher a felicidade ou à aversão em relação aos outros. Como a satisfação plena nuncaé alcançada, existirá sempre uma sensação de descontentamento e de sofrimento.

A terceira verdade deriva da segunda. Se a causa do sofrimento é o desejoegoísta, a sua cura consiste na libertação do desejo. Sidarta Gautama acredita quese nos libertarmos dos interesses pessoais e nos dedicarmos à vasta extensão da vidauniversal, passando de uma atitude egoísta ao altruísmo, ao amor e à compaixão poderemos ultrapassar o sofrimento.

A quarta verdade mostra como alcançar a libertação. A pessoa pode tornar-se

altruísta, livre e sem sofrimento através das oito práticas.

Tripitaka, Mandalay, Burma

A Roda de Dharma

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unidade 3 111

Doc. 46O Caminho ÓctuploCompreensão Correta: conhecer as Qatro Nobres Verdades de modo

a conhecer as coisas como elas realmente são e, conseqentemente, qerer

libertar-se do sofrimento e ajdar os otros seres a fazerem o mesmo.

Pensamento Correto: desenvolver a bondade amorosa, não tendomá vontade em relação aos otros e não qerendo casar o mal; não seravarento e não ser egoísta.

Fala Correta: abster-se de mentir, de falar em vão, de sar palavras draso calniosas, dizer a verdade, ter fala constrtiva, harmoniosa, conciliadora.

Ação Correta: abster-se de matar, robar e ter ma condta sexal

egocêntrica qe provoqe sofrimento nos otros, promover a vida, praticara generosidade.

Meio de Vida Correto: evitar qalqer ocpação qe prejdiqe osdemais, olhar os otros com amor, compaixão e alegria e praticar a ética, apaz, o esforço, a concentração e a sabedoria.

Atenção Correta: praticar a atodisciplina para obter a qietdee atenção da mente, de maneira a evitar estados mentais malécos edesenvolver estados mentais sadáveis.

Meditação Correta: desenvolver completa consciência de todas as açõesdo corpo, palavra e mente, através da contemplação da natreza verdadeirade todas as coisas.

Visão Correta: contemplar a transitoriedade, a fgacidade, ainterdependência e a vacidade de todos os seres e fenómenos, agindo deacordo com esta visão.

Cf. Pinto et alii, Religiões. História, Textos, Tradições.

Mulher budista reza num altar

Templo budista,Sarnath, Índia

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unidade 32

Ritos e costumesAlguns grupos de budistas não acreditam na existência de qualquer divindade,

outros têm uma visão politeísta; mas nenhuma corrente budista presta culto ouadoração a um Deus criador pessoal. A religiosidade dos budistas manifesta-se,

sobretudo, através da veneração das relíquias, das estátuas de Buda e das peregrinações.Os locais ligados à vida de Buda são considerados lugares sagrados e constituem

os mais importantes pontos de peregrinação budista: Lumbini, cidade onde Sidartanasceu; Bodhgaya, onde Sidarta atingiu a iluminação; Sarnath, onde Sidarta realizouo seu primeiro sermão; Kusinagara, onde Buda morreu e foi cremado; e várias outrascidades por onde as suas cinzas foram espalhadas.

Em todos estes locais existem templos  de especial importância para o mundobudista, nomeadamente, o templo de Maya Devi, mãe de Buda, em Lumbini e o temploMahabodhi (templo do Grande Despertar) em Bodhgaya. O templo budista chama-sepagode. As stupas (relicários onde se guardam restos mortais dos grandes mestres)estão no centro dos objetos de devoção dos pagodes. Inicialmente, a arte budista nãorepresentava Buda; a sua existência era indicada com outros símbolos como a roda ou aárvore da iluminação. Posteriormente, começaram a fazer-se estatuetas representandoBuda. Estando o budismo dividido em vários ramos e alargando-se a vários países e

culturas, a imagem de Buda varia e difere de país para país.

0 400 Km

Lumbini

Dharamshala

Sankisla

Kaushabi

Sravasti

Sanchi   Bodhgaya

Sarnath

NalandaRajgir 

Udaigiri

RatanagiriAjanta Ellora

Kanheri

Nagarjuna Konda

Kusinagara

Rumlek

Tawang

Calcutá

Tabo

Ladakh

Delhi

Goa

Diu   Damão

   P  A  Q    U   I  S   T   Ã  O

CHINA

N E P AL 

ÍNDIA

dade onde Dalai Lama nasceu

Templo budista Mahabodhi,Bodhgaya, Índia

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unidade 3 113

Os festivais budistas são calmos, sem agitação e sempre com a preocupação decriar muitos espaços de silêncio, propícios à meditação. As principais festas budistassão as que celebram os grandes momentos da vida de Sidarta Gautama, como onascimento, a iluminação e o ingresso no estado de nirvana.

A festa do aniversário do nascimento de Buda, também conhecida por festival

das flores (Hanamatsuri), celebra-se entre abril e maio (a data varia de acordo como país e a tradição budista). Nesta cerimónia oferecem-se flores a Sidarta Gautama ebanha-se uma estátua de Buda ainda criança numa espécie de chá. Este ato simbolizaa limpeza da mente, contaminada pelos maus caminhos, e a renovação dos bonspropósitos de vida.

A festa do aniversário da iluminação do Buda  é comemorada quase sempre aoito de dezembro. Nesta solenidade recorda-se os quarenta e nove dias que SidartaGautama passou debaixo da árvore da iluminação, com o propósito de ajudar todoo budista a atingir também a iluminação. Este dia significa o início da libertaçãouniversal da humanidade do sofrimento e da ignorância. Os budistas acreditam quenesta data as suas ações são cem mil vezes mais poderosas do que nos outros dias.

A festa do aniversário do nirvana do Buda (Parinirvâna) celebra-se quase semprea quinze de março. A cerimónia centra-se sobre uma imagem, normalmente dedimensões gigantescas, que representa o Buda deitado num bosque. Ao celebrar odia da morte e da entrada de Sidarta Gautama no nirvana, os budistas recordam a suamissão de também cada um deles chegar ao estado perfeito, no qual a mente e o corpoficam livres de toda a ilusão do mundo, não voltando a reencarnar. Enquanto tal nãoacontecer, os seres humanos ficam sujeitos ao doloroso ciclo de reencarnações.

Outra festa budista importante é a do Higan, termo que signica «a outra margem».Celebra-se duas vezes por ano, nos equinócios da primavera e do outuno, em que odia e a noite têm igual duração. Chegar a Higan significa atravessar o rio da existênciapelo caminho do Buda, para alcançar a margem do nirvana; significa também trazerpara a própria vida a normalidade e a harmonia da natureza representada pelaevolução do Sol. Durante as cerimónias de uma semana, dá-se ênfase à reflexão sobrea generosidade, a disciplina ética, a paciência, o esforço alegre, a concentração e asabedoria, que conduzem à «outra margem».

Na liturgia budista são ainda de assinalar os Dias de Uposatha (dias de observânciareligiosa). Tal como Sidarta ensinou, são «dias para a puricação da mente poluída».Não há um calendário preciso e abrangente dos dias de Uposatha, pois cada correnteou escola budista estabelece o seu próprio calendário. Normalmente há quatro diasde Uposatha por mês. Nestes dias de intensa reflexão e meditação, os leigos vão aosmosteiros e, juntamente com os monges, entoam cânticos e meditam com o propósito

de adquirirem a paz e a serenidade.

Enquanto existir o espaço

Enquanto aí existirem seres

Possa eu também permanecer

Para dissipar a dor do mundo

Shantideva, mestre budista do século VIII

Cremação budista

Monges budistas

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unidade 34

Tauismo

O Tauismo é uma doutrina filosófico-religiosa  e um conjunto de práticasreligiosas. Enquanto filosofia foi formulada inicialmente no século VI a.C. por LaoTsé e desenvolvida, desde então, por inúmeros mestres.

Enquanto religião, incorporou o pensamento filosófico dos mestres tauistas,absorveu muitos elementos da religiosidade popular chinesa, da escola  yin-yang  —que concebe a ordem natural à luz dos dois aspetos do Tau —, da escola dos Cinco

Elementos (metal, madeira, água, fogo e terra) — substâncias físicas que representamforças cósmicas — e sofreu influência tanto do Confucionismo como do Budismo.Baseia-se num sistema politeísta de crenças que assimila os antigos elementosmísticos e enigmáticos da religião popular chinesa, como o culto dos antepassados,os rituais de exorcismo, a alquimia e certas práticas mágicas.

A filosofia tauista realça a integração do ser humano na realidade cósmicaprimordial e tem um caráter eminentemente contemplativo.

Símbolo

O Tai Chi é o símbolo tauista e representa o mundo visível. Nele está figuradoo princípio criador: o Tau origina o Um, o que pressupõe o Dois, a dualidade. Ainteração entre esta dualidade gera o Três, o Tai Chi. O universo visível está emmovimento, em constante mutação, representado no Tai Chi em rotação, em formade peixes.

Neste símbolo estão representados o Yin e o Yang , as duas forças fundamentaisda mutação. O princípio Yin é o feminino, o não material, a Lua, a noite, a sombra,o frio, o negativo, a passividade contemplativa. O Yang , simultaneamente oposto ecomplementar, é necessário ao equilíbrio. Corresponde ao masculino, ao material, aoSol, ao dia, à luz, ao calor, ao positivo, à atividade. Para manter a harmonia e a ordemno universo e dentro do corpo, é importante manter constantemente o Yin e o Yang  em plena harmonia.

Lao Tsé , por George Harrap

Ying-yang, símboloda harmonia e dualidade

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unidade 3 115

Origem e evoluçãoA religião primitiva da China consistia na divinização das forças da natureza e

na crença acerca da relação entre a conduta humana e os fenómenos e leis naturais. Océu (Tian) era a morada dos deuses e dos ancestrais, que podiam proteger ou castigar.

Era do céu que vinha o poder dos imperadores, considerados «lhos do céu». Dassuas virtudes dependia a continuidade do seu governo.

De acordo com os registos históricos mais credíveis, Lao Tsé («Velho Mestre»),foi o fundador do Tauismo. Lao Tsé terá nascido por volta do ano 604 a.C., na regiãode Chou.

Monte TaishanÉ o monte mais mítico esagrado para os chineses,relacionado com a criação.Sita-se a sl da cidadede Jinan, no centro daprovíncia de Shandong eestende-se por mais de200 km.Local onde se contemplaa perfeita harmoniada paisagem natral éfonte de inspiração paraos artistas. Foi lgar deperegrinação imperial

drante mitos anos. É mícone natral das antigascivilizações e crençaschinesas.

Saber +

A vida e morte do mestre Lao Tsé estão envolvidas em mitos e lendas e, porisso, o que dele se diz nem sempre é claro e com fundamento histórico credível. Osensinamentos de Lao Tsé foram desenvolvidos posteriormente pelos seus discípulos,destacando-se Chuang Tsé e Lu Tsu.

No século II, por obra de Chang Tao-lin, surgiu a Seita do Mestre Celeste. O seufundador pretendeu abolir as práticas demoníacas e instaurar a verdadeira ortodoxia.Rejeitou os sacrifícios de animais, oferecidos aos espíritos dos antepassados,substituindo-os por ofertas de vegetais cozidos. Na cura das doenças, introduziu anecessidade de os doentes confessarem os seus pecados. Organizou os seus seguidoresem comunidades com sacerdotes e sacerdotisas que representavam o Tau na Terra.

A seita da Verdade Perfeita, que se desenvolveu durante os séculos XIII e XIV,influenciada pelo Budismo, criou mosteiros onde vivem monges celibatários. O

 jejum, a abstenção do álcool e as técnicas da meditação são centrais.O Tauismo posterior introduziu ainda a esperança no regresso de Lao Tsé,

 venerado como santo que há de instaurar um reino de paz e justiça para todos ospuros.

Embora não se tenha transformado numa religião universal, o Tauismo percorreuos tempos até aos nossos dias, contando atualmente com mais de uma centena de

milhões de seguidores, sobretudo na China, Coreia, Taiwan e Hong Kong.

Monge tauista no sagradoMonte Hua, Huayin, China

Lao Tsé

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unidade 36

Livros sagrados e textos de referência

Princípios fundamentais

O cânone tauista  é composto por inúmeras obras que incluem a literaturatradicional chinesa, as obras dos grandes mestres (Lao Tsé, Chuang Tsé, entre outros)e ainda obras originalmente confucianas, budistas e até cristãs. Muitos textos estão

escritos numa linguagem hermética, esotérica, só compreendidos pelos iniciados.Destas muitas obras, realçamos três textos. O I Ching   — o confuciano Livro

das Mutações, um dos clássicos e mais importante livro da cultura chinesa — é abase do pensamento dos antigos mestres tauistas e confucianos e fundamenta todosos ensinamentos destas tradições. O tratado atribuído a Lao Tsé Tau Te Ching   —Livro do Caminho e da Virtude, em que se apresenta, de forma filosófica e muitoenigmática, o caminho para se viver em harmonia. A terceira obra é o Nan Hua Ching  — o Livro da Flor do Sul.

e acordo com maadição, Lao Tsé, evitandocriosidade das pessoas,rá comprado m animalma carroça como meio

transporte discretora sair das fronteirasChina. Tendo sido

conhecido por mcial, este pedi-lhee registasse os sessinamentos antes dertir para qe não serdessem no tempo.

pesar de contrariado, Lao

é cede perante tantasistência e nasce assim

m dos mais profndosenigmáticos textos daeratra chinesa, o TauChing.

Saber +

Lao Tsé, o grande mestre, cultivou e aprofundou dois conceitos chineses antigos:o Tau e o Te. Tau  é o primeiro princípio imutável que rege o universo, a ordem eharmonia do mundo, de onde tudo provém. É o fundamento a partir da qual brotamou são criadas todas as coisas. Por vezes é identificado com a divindade suprema,embora não uma divindade pessoal, que está para além de todas as capacidadeshumanas de compreensão, não podendo ser apreendido pela mente humana. E nestacondição o Tau é o modelo de todo o comportamento humano, a via da salvação.E esse caminho consiste na renúncia ao mundo e aos seus valores, bem como aosprazeres da vida. Por sua vez, o Te é a força vital, o poder de levar o Tau a realizar-se

em todas as coisas.Dos conceitos de Yin e Yang  resulta um outro princípio importante para a tradiçãotauista: o princípio da bipolaridade. Antes de qualquer existência, estava o Tau. Estedeu origem ao Yin e Yang , as forças em movimento e equilíbrio. O caos e a desordemnaturais e sociais são frutos do desequilíbrio destes dois elementos. A pessoa deveaprender a equilibrar o seu yin e yang  a fim de viver em harmonia com o Tau.

A procura da longevidade e da imortalidade sempre foi um elemento essencialno Tauismo. Só a busca da perfeição, ou seja, a harmonia com o Tau, é caminhoadequado para a obtenção da imortalidade. A sobrevivência após a morte era crençageneralizada no Tauismo e em todo o mundo religioso chinês. O tauista espera numa

 vida de felicidade para além deste mundo decadente, solicitando a ajuda de poderes

sobrenaturais que resgatem o ser humano da sua condição imperfeita.Por influência do Budismo, o Tauismo integrou nas suas doutrinas a crença na

reencarnação e inseriu os Bodisatvas no seu panteão.O Tauismo acredita na existência de uma hierarquia de deuses, incluindo seres

humanos divinizados, submetidos à autoridade do deus supremo. Inicialmente,o deus supremo era Tai-i  (Grande Uno). Depois, desenvolveu-se a ideia de umatrindade divina, os Três Puros: o Primeiro Celeste, o Precioso Celeste e o Caminhoe a sua força celeste (Tau-te). Cada uma destas divindades representa um aspeto doTau inefável e transcendente.

Estátua do Bodisatva Guan Yu

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unidade 3 117

Ritos e costumesO mestre tauista busca a imortalidade. As práticas religiosas que pretendem

alcançar este objetivo são de dois tipos: a alquimia exterior e a alquimia interior. Aprimeira consiste na busca do elixir (físico) da imortalidade. Embora nunca tenha

sido encontrada tal substância, estes processos levaram ao desenvolvimento dafarmacologia e medicina chinesas, oferecendo também uma série de rituais para curardoenças. Como formas complementares de procura de uma vida longa e saudável,desenvolvem práticas higiénicas, a ginástica, as artes marciais, bem como uma vidaascética, prescindindo da ingestão de várias comidas e bebidas até, teoricamente,poder viver apenas do ar e da saliva.

A alquimia interior consiste num conjunto de práticas de meditação, associadasa exercícios de  yoga, esvaziando o coração de todas as distrações externas econtemplando a luz interior que habita cada ser humano. Esse processo permiteao crente dialogar com os deuses que moram no próprio corpo humano, obtendoassim ajuda para curar as doenças, expulsar os espíritos malignos e alcançar um elixirinterior que o levará à obtenção de um corpo etéreo e imortal. A meditação pretendeigualmente fundir os dois princípios opostos  yin  e  yang   que contribuem para a

descoberta da energia primordial — Chi — que permeia e sustém a vida. Trata-se deencontrar o verdadeiro eu e alcançar uma maior harmonia com o cosmos, bem comoa união gradual com o Tau.

Mas não bastam as práticas descritas para aproximar o crente dos deuses e fazernascer um novo eu. É preciso igualmente conduzir uma vida com base nos  valoresmorais, cumprindo boas ações e submetendo-se aos cerimoniais de penitência pelospróprios pecados. O crente procura caminhar sem rancor, ódio ou inimizades esem anseios desnecessários. Vive com paz no coração e com liberdade em relaçãoao mundo. Valoriza o despojamento de todas as coisas materiais, mas também umaatitude de impassibilidade em relação à doença e à cura, à vida e à morte. Só assimpoderá renascer no crente um novo corpo imortal que o libertará da sua condição de

imperfeição.

A trindade tauista,Foshan, China

Estátua de Lao Tsé,Fujian, China

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unidade 38

O Tau que pode ser expresso não é o próprio Tau.

O nome que lhe queremos dar não é o seu nome adequado.

Sem nome é o princípio do céu e da terra.

Com nome é a mãe de todos os seres.

Lao Tsé

Os tauistas entoam mantras, cantos sagrados e orações e desenvolvem algunsrituais específicos:

• Rituais exorcistas para expulsão dos espíritos malignos, em casos de doença.• Cerimónias do Ano Novo chinês, com danças de dragões e fogos de artifício

para expulsar os demónios.

• Rito de renovação cósmica, no solstício de inverno, relembrando o renascimentocósmico.• Rituais salvícos, pouco antes da colheita de outono, com procissões de lanternas

para libertar as almas dos defuntos ainda prisioneiros de uma espécie de infernointermédio; nos quais são oferecidos alimentos cozidos e crus, vinho e fruta,incenso e fogo.

A cura dos enfermos passa também pela confissão dos seus pecados. O doenteescreve as suas culpas, apresentadas depois pelos sacerdotes ao céu, nos cumes dosmontes; à terra, enterrando-os; ou aos rios, mergulhando-os nas águas.

Como preparação para as cerimónias religiosas, os crentes devem preparar-se

com jejuns, espírito de despojamento de todas as preocupações e de reconciliação.Entre os sacerdotes que dirigem as cerimónias também há adivinhos e espíritas

que dão conselhos, explicam a influência maléfica dos astros, contactam com osespíritos dos antepassados, fazem exorcismos e curas. Mas os sacerdotes que praticamos rituais como expressão de meditação e alquimia interna gozam de maior respeito.

Os rituais religiosos praticados pelos monges são acompanhados por cânticos,música e ofertas de incenso.

Caminho para chegar ao cumeda sagrada montanha Song

Shan, Henan, China

Monge caminha no interior deum templo Templo tauista na montanha Lishan, Xian, China

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unidade 3 119

Confucionismo

O Confucionismo é essencialmente uma doutrina política e ética, apesar de terigualmente uma dimensão religiosa. É uma filosofia moral baseada no racionalismopragmático. O valor que atribui ao estudo, à ordem, à consciência política e ao

trabalho marcou profundamente a civilização chinesa desde a antiguidade até aosdias atuais. O culto da natureza e dos antepassados, bem como a afirmação do amor,da justiça, da sinceridade e da reverência são caraterísticas fundamentais destesistema filosófico-político-religioso.

O Confucionismo teve sempre continuidade histórica e é ainda hoje praticadonão só na China e na Ásia, como em diversos países americanos e europeus.

SímboloEmbora não apresente um símbolo específico, o Confucionismo adotou o mesmo

símbolo tauista Tai Chi, simbolizando as forças em movimento e em equilíbrio doYin e Yang .

Origem e evoluçãoO Confucionismo foi fundado pelo sábio Kung Chiu, conhecido por Confúcio 

(em chinês K’ung-fu-tzu, Mestre Kung, donde deriva o nome Confucius, em latim,e Confúcio, em português). Nasceu por volta do ano de 552 a.C., na cidade de Tsou,no Estado de Lu, atual província de Shantung. Pouco se sabe da sua origem social eda sua família. Tudo o que nos chegou a este respeito é lendário. Provavelmente, a

sua origem social era humilde, pois o cargo mais elevado que ocupou, por volta dos

Ying-yang

Confúcio

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unidade 30

cinquenta anos, é comparável ao de um comissário de polícia. Visitou também muitosEstados feudais à procura de um soberano que precisasse dos seus ensinamentos, masnunca encontrou nenhum. Na velhice, dedicar-se-ia à formação dos seus discípulos,bem como à música e à poesia.

Confúcio foi muito provavelmente um homem religioso  que acreditava no

Céu como Deus pessoal, cuja vontade se manifestava no universo de valores éticos.Por oposição à religiosidade tradicional chinesa, a sua visão é fundamentalmentehumanista e racionalista. Deus não age de forma arbitrária. Há uma ordem racionalno mundo. Agir de acordo com essa ordem ética é cumprir a vontade do Céu.

mbora não haja certezaanto ao dia doscimento de Confúcio ,asiáticos, em geral,memoram o aniversário

20 de setembro, diam qe, em Taiwan, poremplo, é feriado ocial.também o Dia dosofessores em memóriaConfúcio, cjo gosto ermanente interesse pelonhecimento fez dele

m exímio mestre. Desde84, a China comnista

mbém celebracialmente este dia.

Saber +

Confúcio viveu numa época em que a China passava por grandes turbulênciaspolíticas e sociais. Esta situação preocupou-o, procurando respostas e soluções. ParaConfúcio, só uma reforma baseada na moral poderia restituir a ordem e a justiça aopaís.

Tendo percebido que a desordem e desarmonia sociais tinham como causas apobreza e a ignorância, ensinou e defendeu que a solução passava pelo ensino e pelaeducação  das classes inferiores, que englobavam a grande maioria da sociedade

chinesa.Escola confuciana,Fuzhou, China

Confúcio, por Escola Chinesa

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unidade 3 121

Livros sagrados e textos de referênciaFoi nos textos tradicionais chineses que Confúcio foi beber a sabedoria e os

princípios que fizeram dele um mestre da moral, em especial da moral política. Amelhor fonte histórica para os ensinamentos de Confúcio está no livro dos Diálogos.Mas o cânone da sabedoria e ensinamentos confucionistas centra-se nos cinco livrosclássicos.

• I Ching (Livro das Mutações), o mais antigo de todos os escritos.• Shu Ching  (Livro da História), que versa sobre a organização política e reúne

factos dos tempo dos antigos reis sábios chineses.• Li Ching   (Livro dos Rituais ou da Etiqueta), no qual se apresenta uma visão

social e em que se descrevem os rituais ou cerimónias relacionados com a vida

social e o governo das instituições morais e religiosas da dinastia Chou.• Shih Ching  (Livro dos Poemas), onde estão registados trezentos e cinco poemas

simples e realistas da vida camponesa e cortesã. Sendo este uma espécie deantologia poética redigida na sua maioria entre os séculos X e VII a.C., crê-se tersido Confúcio quem selecionou os textos.

• Ch’un Ch’iu (Anais da Primavera e do Outuno), onde estão registadas asmemórias dos acontecimentos ocorridos entre 722 e 481 a.C. no estado de Lu,onde nasceu Confúcio.

Posteriormente, foram elaborados vários comentários que passaram a integrarsecundariamente o cânone confuciano.

Princípios fundamentaisHá cinco tipos de relações: a relação entre soberano e ministro, entre pai e filho,

entre marido e mulher, entre irmãos e entre amigos. As três relações familiares sãoo modelo para as outras. A sociedade confuciana entende-se como uma grandefamília: todos os seres humanos são irmãos. Os deveres que servem de base aestas relações são a lealdade, o respeito e o cuidado dos outros, provendo às suasnecessidades. Nesta hierarquia de relações, é também valor importante a obediência aos superiores. Sendo este um dos aspetos mais conservadores do Confucionismo.

A doutrina confucionista atraiu muitos seguidores. Meng-Tzé (Mêncio, 371-289a.C.) e Hsun-Tzu (Xung, 300-230 a.C.) foram dois notáveis pensadores confucianos.

Ao contrário do Tauismo, esta doutrina estava inteiramente voltada para osproblemas do mundo; propunha a bondade como valor essencial para a condutahumana, em harmonia com a sociedade e com o universo. Foi, por isso, adotada como

religião oficial da China desde a sua unificação, no século I a.C., pela dinastia Han, atéà proclamação da República em 1911, época em que teve de enfrentar as primeirasdificuldades: foi considerada conservadora e associada às estruturas feudais, entãoultrapassadas. A perseguição dos confucionistas agravou-se após a ascensão doscomunistas ao poder, em 1949, e sobretudo durante a Grande Revolução CulturalProletária (1966-1976) levada a cabo por Mao Tse Tung.

O Confucionismo continua ainda hoje a atrair muitos seguidores para lá dasfronteiras da China, principalmente no Japão, na Coreia do Sul e em Singapura.

Leitura do livro das Mutações,por Escola Chinesa

 Mêncio, por Escola Chinesa

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unidade 32

O princípio fundamental do confucionismo é a humanidade  ( jen), a justaorganização das relações humanas. Está associada à lealdade, antes de mais emrelação à própria consciência, e à reciprocidade (respeito e estima pelos outros). O jen, como virtude universal, traduz-se na bondade, compaixão e amor pelos outros.O sábio ama todas as pessoas, o que o leva a ajudar o próximo de acordo com as suasnecessidades. As relações familiares de amor e respeito são modelo para as relaçõescom todas as pessoas, desenvolvendo o espírito de solidariedade social. A regra deouro na sua formulação negativa é armada claramente pelo Confucionismo: «Não

faças aos outros o que não queres que te façam».Para Mêncio, o Céu (Deus) habita o coração do ser humano. Por conseguinte,conhecer-se a si mesmo é conhecer o Céu. O ser humano, homem e mulher,receberam do Céu o dom da vida e todas as propriedades inatas à natureza humana,sobretudo a faculdade do discernimento moral. A perceção do que é justo e do que éerrado é comum a todos os seres humanos e distingue-os dos animais. Há, portanto,uma igualdade fundamental entre todos os seres humanos, independentemente dasclasses sociais. Todos os seres humanos têm a capacidade de atingir a perfeição.

A natureza humana  é originariamente boa. O mal moral — o pecado — é oafastamento do bem, uma perversão da natureza humana. A educação confucianapretende interiorizar o sentido da responsabilidade moral, inseparável da consciência

de culpa.O ser humano sobrevive à morte através da sua alma intelectual que ascende ao

mundo superior, enquanto a sua alma animal desce com o corpo ao sepulcro.O jen estende-se também ao âmbito da política. O governo da sociedade deve ser

benévolo, feito de persuasão moral, no qual o soberano dá exemplo de integridadepessoal e de dedicação desinteressada ao povo. O poder político é legitimado pelomandato do Céu. Portanto, os maus governantes, não agindo de acordo com a vontadede Deus expressa nos valores éticos, podem ser depostos. Mêncio defende mesmo adoutrina da rebelião. A morte sangrenta de um tirano justificar-se-ia plenamenteuma vez que não mereceria governar. O bem do povo está, portanto, em primeirolugar. No entanto, ao longo dos séculos, o Confucionismo foi sendo usado pelospoderosos de forma conservadora para legitimar as várias formas de poder político.

Alunos aprendem costumes

dicionais confucionistas numaescola, Chunghak-dong

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unidade 3 123

Ritos e costumesO Confucionismo também atribui importância aos rituais sociais e religiosos: o

culto dos antepassados, a veneração do Céu como Senhor Supremo e os rituais sociaisde decência. Contra um ritualismo vazio, Confúcio põe em evidência a necessidade

de esses rituais serem acompanhados por uma justa disposição interior, para que senão tornem rituais exteriores sem qualquer significado espiritual.

O culto do Céu é a principal caraterística da religiosidade chinesa. Anterior aopróprio Confúcio foi por ele integrada na sua visão da vida. Só muito recentementeeste culto oficial desapareceu.

A partir da dinastia Han (206 a.C.-220 d.C.), desenvolveu-se um complexo cultoestatal com grandes rituais presididos pelo imperador para honrar o Céu, a Terra,os seus antepassados imperiais, etc. Pouco a pouco, o centro do culto tornou-se opróprio Confúcio, divinizado.

A meditação confuciana pretende conduzir ao incremento da natureza moraldo ser humano, sem excluir também a possibilidade da experiência mística deidentificação com a divindade.

O culto aos antepassados  é um elemento básico do Confucionismo, herdadodo passado. A veneração dos antepassados demonstra gratidão e respeito. Osconfucionistas prestam culto aos seus antepassados através da veneração das suasimagens e da oferta de comida e vinho. O culto é feito em santuários domésticosou em altares nos templos. A prática da piedade filial (Hsaio) ou seja a lealdade edevoção dos membros familiares mais novos para com os mais velhos constituíao ideal confucionista. Nas últimas décadas, o culto exterior dos antepassados tem

 vindo a desaparecer.A doutrina confucionista influenciou a cultura chinesa tanto na veneração dos

ancestrais como no conceito de piedade filial. Esta influência refletiu-se também naarte e na arquitetura chinesas. Nas casas, por exemplo, era reservado um lugar centralpara o altar dos antepassados.

Os rituais mais importantes são os da vida familiar, destacando-se o casamento e os funerais.

Meditação numa sala de aulatradicional, Chunghak-dong

Estátua de Kwan Kung,deus da riqueza

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unidade 34

Doc. 47O templo do céu: harmonia entre o céu e a terra

Hoje não existe imperador. Não existe m Filho do Cé, qe aqi,no centro do niverso, do país, da cidade, possa, através da oração e dosacrifício, ser mediador entre a Terra e o Cé. Ter-se-á acabado para sempreo «Cé» sobre Peqim, sobre a China, sobre o mndo?

Acredito qe não. Também na China a religião não morre e para amaioria dos chineses o Cé permanece ainda m grande símbolo primordial.

As pessoas simples veem nas catástrofes natrais, como as inndações,m «sinal do Cé» pelo facto de os homens haverem destrído a harmoniaentre o Cé e a Terra.

Mas também, como sempre, mitas pessoas instrídas veem no cévisível o símbolo do invisível, do misterioso, do sagrado e do divino.

De facto, toda a tradição losóca da China foi ma bsca da nidadeentre o Cé e a Terra. E mesmo hoje as pessoas ainda procram, na China, aharmonia entre o Cé e a Terra: entre o Cé e a natreza ameaçada, entre oCé e os seres hmanos ameaçados. Procram a harmonia na sociedade e aharmonia entre os próprios seres hmanos.

Hans Küng, Religiões do mundo. Em busca dos pontos comuns.

• Quando vires um homem bom, tenta imitá-lo; quando vires um homem

mau, examina-te a ti mesmo.

• A preguiça caminha tão devagar, que a pobreza não tem diculdade em a

alcançar.

• A humildade é a única base sólida de todas as virtudes.

• Para conhecermos os amigos é necessário passar pelo sucesso e pela

desgraça. No sucesso, vericamos a quantidade e, na desgraça, a qualidade.

• Não te preocupes com os que não te conhecem, mas esforça-te por seres

digno de ser conhecido.

Confúcio

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unidade 3 125

 QUADRO SÍNTESE DAS RELIGIÕES ORIENTAIS

HINDuÍSMO BuDISMO TAuISMO CONFuCIONISMO

Origem

Fundador

Livro sagrado

Símbolo

Deus

Princípios 

fundamentais

ÍndiaSéc. XVIII a.C.

Vedas , etc.

Om

Brama , Vixnu e Xiva sãoos mais importantes

• Divisão social em castas• Reencarnação• Visa a libertação do

ciclo de reencarnações(nirvana) através daobservação do darma 

e da consecção de mbom karma.

ÍndiaSéc. VI a.C.

SidartaGatama

Sutra-Pitaka , etc.

Roda da Lei

• Politeísmo• Nenhm des

• Reencarnação• Visa a libertação dociclo de reencarnações

• Baseia-se nas qatroverdades e no caminhodas oito regras

ChinaSéc. VI a.C.

Lao Tsé

Tau Te Ching , etc.

Yin Yang

Tau , trindade e otros

• Bsca do Caminho,da harmonia pessoalcom o Tau

• Princípio da inação• Bsca da imortalidade• Valorização do indivído

ChinaSéc. VI a.C.

Confúcio

I Ching , etc.

Yin Yang

Cé e otros

• Procra da harmoniapessoal e social• Respeito e clto pelos

antepassados• Valorização das relações

familiares e sociais• Armação do princípio

da hmanidade• A benevolência, o

altrísmo e o amor aopróximo como viasda perfeição

• A ordem social sobrepõe-seao indivído

   w   w   w .   m   a   p   s   o     f   w   o   r     l     d .   c   o   m

Cristianismo

Predominância

Islamismo

Budismo e Tauismo

Hinduísmo

Budismo

Judaísmo www.mapofworld.com

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unidade 36

Doc. 48Um não à confrontação. Um sim à harmonia étnico-religiosa

Em mitos países da Ásia existem tensões, conitos e ltas étnico- -religiosas. Mas aqi, nesta peqena e estreita cidade-estado de Singapra,milhões de pessoas das mais diferentes cltras e religiões convivem demaneira pacíca: chineses, malaios, indianos, ocidentais — no mesmo blocode apartamentos, no mesmo escritório. Aqi não são tolerados os getos.uma prova de qe a lta das cltras não constiti em absolto manecessidade natral.

Mas como essa convivência pacíca há de ser possível? Desde a fndaçãodo Estado, em 1965, o governo observa o programa de ma política deeqilíbrio mlticltral e harmonia religiosa: as diferentes religiões possemdireitos igais e a lei pne com rigor qalqer instigação ao ódio o à divisão.

Os críticos dizem qe o sistema presidiário de Singapra não é bastantedemocrático. Mas Singapra não é m estado totalitário e o qe mantémessa sociedade nida não é a reglamentação. São os valores básicos comns,qe chegaram mesmo a ser estabelecidos por decisão parlamentar, mas qe,para a maioria das pessoas daqi, são evidentes, como os chamados «valoresasiáticos»:

• A comnidade vem antes do indivído.• Mas a comnidade respeita e apoia o indivído.• A família é a pedra fndamental da sociedade.• Os problemas devem ser resolvidos por consenso e não por confrontação.

• A harmonia étnico-religiosa deve ser favorecida.É claro qe esses valores básicos não foram inventados qando o Estado

foi criado. Pelo contrário, sbstancialmente eles são provenientes da grandetradição chinesa. E precisamos recar mito na história chinesa, se qisermoscompreender o presente de Singapra e da China na sa complexidade.

Hans Küng, Religiões do mundo. Em busca dos pontos comuns.

ans Küng , padretólico, teólogo eósofo, nasce na Síça

m 19 de março de 1928.i professor de Teologia

m Tbinga (Alemanha)consltor teológico nooncílio Vaticano II.

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Cidade de Singapura, Malásia

Templo confuciano,Kunming, China

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unidade 3 127

 Valores éticos comuns àsgrandes tradições religiosas

Todas as religiões defendem princípios, regras e valores éticos. Por vezes, umamáxima, uma declaração ou um imperativo resumem o essencial dos deveres moraisque devem orientar a conduta humana.

As religiões oferecem recursos éticos para que todos possam viver em harmoniacom a própria consciência, com os outros, com a natureza e com Deus. Promovem,

assim, a sabedoria e a santidade de vida. São muitas as pessoas que por todo o mundode forma pública ou silenciosamente procuram traduzir estes valores nas váriassituações da vida quotidiana.

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unidade 38

Não façam nada aos outros que,se fosse feito a vocês, vos causassemágoa.

Mahabharata (Hinduísmo)

Não magoem os outros comaquilo que vos magoa a vocês.

Buda (Budismo)

Quem é bom não discute. Quemdiscute não é bom.

Lao Tsé (Tauismo)

Aquilo que vos é odioso, não ofaçam aos outros.

Hillel (Judaísmo)

Aquilo que não desejas para ti,não o faças aos outros.

Confúcio (Confucionismo)

Nenhum de vocês é um crente atéquerer para o seu vizinho aquiloque quer para si.

Maomé (Islamismo)

Ama o próximo como a ti mesmo.Jesus (Cristianismo)

Xiva

Abraão

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unidade 3 129

O aforismo moral «Não façam aos outros o que não desejam que os outros vosfaçam» é chamado a regra de ouro e existe, com formulações diferentes, em muitasreligiões. Jesus formulou-a de maneira positiva: «Façam aos outros o que desejamque os outros vos façam», para indicar que o bem não se limita a excluir o mal, masimplica um compromisso sério e objetivo na construção de relações verdadeiramente

humanas. Trata-se de agir de forma desinteressada, sem intenção direta de obterqualquer recompensa pessoal. Só quem faz o bem de forma gratuita imita a bondade,o amor e a ternura de Deus por todas as pessoas.

O amor cristão não está orientado apenas para um grupo específico depessoas. É universal e inclui os próprios inimigos. Para Jesus, esta atitude reflete ocomportamento de Deus que «é bom até para as pessoas ingratas e más.» E concluiJesus: «Sejam bondosos como o vosso Pai é bondoso» (Lc 6, 35-36).

Doc. 49HinduísmoAqeles qe na Terra tiverem ma boa condta terão m renascimento

agradável: tornar-se-ão sacerdotes, gerreiros o mercadores. Mas aqelesqe na Terra tiverem ma condta errada terão m ma renascimento: serãocães, porcos o sem casta.

Upanishads 5,10

Ícone de Jesus Cristo

Brâmane reza junto ao rioGanges, Varanasi, Índia

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unidade 30

Doc. 50Budismo

A via do meio evita os dois extremos. É ilminada, condz a ma visãoclara, é fonte de sabedoria e condz à paz, à ilminação, ao nirvana.O qe é a via do meio? É a nobre via das oito virtdes: reta fé, reta

decisão, reto discrso, reta ação, reta vida, reto esforço, reto pensamento,reta concentração.

Primeiro Discurso de Buda

De minha livre vontade carrego todos os sofrimentos de todos os seresvivos. Oso enfrentar o sofrimento onde qer qe ele se encontre, em cadaânglo do niverso, porqe não devo privar o mndo da raiz do bem. Estodecidido a car em qalqer condição de desconforto por séclos innitospara alcançar a salvação de todos os seres.

Compêndio de Doutrina de Buda

Como ma mãe cida do lho,Do se único lho, todos os dias,Assim todos os seres vivosA mente hmana deve abraçar.Amizade sem limites para todo o mndo,

Na sa mente o homem deve cltivar,Sem obstáclo, sem ódio e sem maldade.Nnca neste mndo o ódioSe vencerá com o ódio.Vence-se apenas com o amor e com a paz:É a lei eterna.

Da Vida das Virtudes de Buda

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unidade 3 131

Sacerdote tauista pratica artes

marciais no Templo Clingyang,Chengdu, China

Doc. 51Tauismo

A bondade sprema é como a ágaqe a tdo benecia e não rivaliza com ningém.O se coração é profndo.A sa dádiva é generosaA sa palavra é el.O se governo é em perfeita ordem.Cmpre a sa missão.Age oportnamente.Por não rivalizar com ningémé irrepreensível.

Tau Te Ching, Cap. 8

O cé sbsiste e a terra dra.Por qe sbsiste o cé e a terra dra?Porqe ambos não vivem para si mesmos.Eis o qe os faz drar.

O santo coloca-se atrás;é por isso colocado à frente;esqece o próprio e

e o se e é conservado.E porqe é desinteressadoos ses próprios interesses são preservados.

Tau Te Ching, Cap. 7

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unidade 32

Doc. 52Confucionismo

O Mestre disse:— Sem bondade o ser hmano não pode sportar a adversidade, nem teráprosperidade. Riqeza e scesso é o qe cada pessoa deseja; mas para os obterdeve transpor a via e a eles deve rennciar. Pobreza e obscridade é o qecada pessoa detesta; mas para os evitar deve transpor a via e deve aceitá-las.O ser hmano qe não pratica a bondade, não é digno desse nome.

O Rei pergnto:— Qe devo fazer para ter o apoio do me povo?O Mestre responde:— Aproxima-te das pessoas com dignidade e respeito. Mostra carinho

para com os idosos, bondade para com os jovens. Promove o qe é digno eedca os ignorantes.

Pensamentos Escolhidos de Confúcio , 4.2

Eis os mes três tesoros. Defende-os e garda-os!O primeiro é a piedade, o segndo a moderação,O terceiro a recsa de ser o primeiro de todos os seres debaixo do cé.Só qem tem piedade e compaixão é verdadeiramente corajoso;Só qem é moderado sabe verdadeiramente ser sábio;Só qem recsa ser o primeiro consege ser o primeiro de todos.

Livro da Vida , 67 — atribído a Tz Ss

Doc. 53 Judaísmo

12 Respeita o te pai e a ta mãe, para qe vivas mitos anos na terra qeo Senhor, te Des, te vai dar.

13 Não mates.14 Não cometas adltério.15 Não robes.16 Não faças ma acsação falsa contra ningém.

Êx 20, 12-16

Estátua de Confúcio,Ho Chi Minh, Vietname

Rapaz a ler a Torá no Bar -

-Mitzvah, Paris, França

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unidade 3 133

Ó homem, o Senhor já te revelo o qe estava bem; o qe ele exige de tié qe pratiqes a jstiça, qe sejas el e leal e qe obedeças hmildementea Des.

Miq 6, 8

Então eles hão de converter as sas espadas em arados e as sas lançasem foices. Nenhm povo levantará a espada contra otro povo nem voltarãoa ser treinados para a gerra.

Is 2, 4b

12 Mas a sabedoria, de onde é qe vem? Onde ca a fonte da inteligência?28

A sabedoria é respeitar a Des,a inteligência consiste em evitar o mal.

 Job 28, 12.28

Doc. 54IslamismoO te Senhor não te abandono nem te odeia.A otra vida é melhor qe a primeira.O te Senhor te cmlará e carás satisfeito.Não te encontro órfão e te amparo?Não te encontro errante e te gio?Não te encontro pobre e te enriqece?Por isso, não maltrates o órfão;E o mendigo não o evites.Diz a todos qe o Senhor é bom!

Alcorão 93, 3-10

Sejam bondosos com os vossos pais, com os vossos parentes, com osórfãos, os necessitados, os companheiros de viagem, os viajantes e osescravos. Des não ama os presnçosos e os soberbos.

Alcorão 4, 36

Isaías, por S. Allen

Grande Mesquita de Meca,Arábia Saudita

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unidade 34

 Amem os vossos inimigos, 

por James Tissot

Doc. 55Cristianismo

Disse Jess:— 3 Felizes os qe têm coração de pobres, porqe é deles o Reino dos

cés! 5 Felizes os hmildes, porqe terão como herança a terra prometida!7 Felizes os qe tratam os otros com misericórdia, porqe Des os tratarácom misericórdia também! 9 Felizes os qe procram a paz entre os homens,porqe Des lhes chamará ses lhos!

Mt 5, 3.5.7.9

Disse Jess:— 44 Tenham amor aos vossos inimigos e peçam a Des por aqeles qe

vos persegem. 46 Se amarem apenas aqeles qe vos amam, qe recompensapoderão esperar de Des?

Mt 5, 44.46

16 Nós sabemos e acreditamos qe Des nos ama. Des é amor: aqeleqe vive no amor, vive em Des e Des nele.

20 Se algém diz qe ama a Des, mas tem ódio ao se irmão na fé, é mmentiroso. De facto, aqele qe não ama o se irmão, a qem vê, como

pode amar a Des, a qem não vê? 21 O mandamento qe Jess nos deixo éeste: aqele qe ama a Des deve também amar o se irmão.

1Jo 4, 16.20-21

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unidade 3 135

Diálogo inter-religioso

O diálogo entre as religiões é essencial para a criação de um mundo mais fraternoe solidário, bem como para a cessação de todos os conflitos com motivação religiosa.

Consciente disto, a Igreja Católica, em conjunto com cristãos de outras Igrejas e

crentes de outras religiões, tem contribuído para o diálogo entre todas as confissõesreligiosas. Mas só é possível dialogar se se aprender a apreciar os aspetos positivos dasoutras crenças religiosas.

Doc. 56A Igreja e as religiões não cristãsDesde os tempos mais remotos até aos nossos dias, encontra-se nos

diversos povos certa perceção daqela força oclta presente no crso dascoisas e acontecimentos hmanos; encontra-se por vezes até o conhecimentoda divindade sprema o mesmo de Des Pai. Perceção e conhecimentoesses qe penetram as sas vidas de profndo sentido religioso. Assim, noHinduísmo , os homens perscrtam o mistério divino e exprimem-no coma fecndidade inexarível dos mitos e os esforços da penetração losóca,bscando a libertação das angústias da nossa condição qer por meio de certasformas de ascetismo, qer por ma profnda meditação, qer, nalmente,pelo refúgio amoroso e conante em Des. No Budismo , segndo as sasvárias formas, reconhece-se a radical insciência deste mndo mtável epropõe-se o caminho pelo qal os homens, com espírito devoto e conante,

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unidade 36

possam alcançar o estado de libertação perfeita o atingir, pelos própriosesforços o ajdados do alto, a sprema ilminação. De igal modo, asoutras religiões  qe existem no mndo procram de vários modos ir aoencontro das inqietações do coração hmano, propondo caminhos, isto é,

dotrinas, normas de vida e também ritos sagrados.A Igreja Católica nada rejeita do qe nessas religiões existe de verdadeiro

e santo. Olha com sincero respeito  esses modos de agir e viver, essespreceitos e dotrinas qe, embora se afastem em mitos pontos daqelesqe ela própria sege e propõe, todavia, reetem não raramente m raio daverdade qe ilmina todos os homens.

Exorta, por isso, os ses lhos a qe, com prdência e caridade, pelodiálogo  e colaboração  com os segidores de otras religiões, dandotestemnho da vida e fé cristãs, reconheçam, conservem e promovamos bens espiritais e morais e os valores sociocltrais qe entre eles se

encontram.

Não podemos invocar Deus como Pai comum de todos , se nos recsamosa tratar como irmãos algns seres hmanos, criados à sa imagem. De talmaneira estão ligadas a relação da hmanidade a Des Pai e a sa relaçãoaos otros homens ses irmãos, qe a Escritra arma: «qem não ama, nãoconhece a Des» (1 Jo 4,8).

Não tem, portanto, fndamento toda a teoria o modo de proceder qeintrodza entre pessoas o entre povos qalqer discriminação qanto àdignidade humana e aos direitos qe dela derivam.

A Igreja reprova, por isso, como contrária ao espírito de Cristo, toda eqalqer discriminação o violência praticada por motivos de raça o cor,condição o religião. Conseqentemente, o Concílio pede aos cristãos qe,observando ma boa condta no meio dos homens (1 Ped. 2,12), vivam empaz com todos , de modo qe sejam na verdade lhos do Pai qe está noscés.

Cf. Concílio Vaticano II, Declaração Nostra Aetate , 2 e 5

m Concílio é manião geral de bispos mndo inteiro para

etir e tomar decisõesbre a vida da Igreja e aa relação com o mndo.Concílio Vaticano IIi convocado pelo papaão XXIII e decorre de62 até 1965. A partir1963 esteve sob a

esidência do papa Palo Introdzi inúmeras

formas tanto na vidaterna da Igreja como na

rma como a Igreja seaciona com o mndo.

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Concílio do Vaticano IIna Basílica de São Pedro,

Vaticano, Roma

Papa João Paulo II reunido

com representantes de outrasreligiões, Assis, Itália

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unidade 3 137

Sucessor de Paulo VI, João Paulo II, prosseguiu o diálogo com o vasto leque dasreligiões não cristãs. Entre as inúmeras reuniões que teve com chefes e representantesde diversas religiões, é de salientar o encontro na cidade de Assis, a 27 de outubrode 1986, que, pela primeira vez na história, reuniu não apenas os cristãos de váriasconfissões, mas também representantes das diversas religiões não cristãs, para emconjunto rezarem pela paz no mundo.

No dia 24 de janeiro de 2002, o papa João Paulo II juntou duzentos líderes de

 várias confissões religiosas em Assis, para mais um dia de oração pela paz. Cardeaiscatólicos, imãs muçulmanos, rabinos judeus, monges budistas, sikhs, bahais, hindus emembros de religiões tradicionais africanas estiveram entre aqueles que se reunirampara a oração.

João Paulo IIe líderes judeus

Papa Bento XVI e Abdullah II,

rei da Arábia Saudita

Cimeira Inter-religiosa daPaz, Assis

Doc. 57Diálogo e Missão

Nas tradições religiosas não cristãs existem «coisas boas e verdadeiras»,«preciosos elementos religiosos e hmanos», «formas de contemplação»,«elementos de verdade e de graça», «sementes de Cristo», «raios da verdadeqe ilmina todos os homens». Estes valores encontram-se condensadosnas grandes tradições religiosas da hmanidade. Elas merecem, portanto, aatenção e a estima dos cristãos, e o se património espirital é m ecazconvite ao diálogo , não só sobre os elementos convergentes, mas tambémsobre os divergentes.

Os grandes problemas qe atormentam a hmanidade chamam oscristãos a colaborar com os otros crentes, exatamente em razão da fé de

cada m.

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unidade 38

A nível mais profndo, pessoas radicadas nas próprias tradições religiosaspodem partilhar as sas experiências de oração, de contemplação, de fé ede compromisso, expressões e caminhos da bsca do Absolto. Este tipode diálogo torna-se enriquecimento  recíproco e cooperação  fecnda, na

promoção e preservação dos valores e dos ideais espiritais mais altos dahmanidade.

Cf. Secretariado para os Não Cristãos, A Igreja e as outras religiões:

Diálogo e Missão

Habitualmente condenamos o horror, a pobreza, que limita a potencialidadeda vida, a fome, que enfraquece o corpo humano, as disparidades económicas, que

ameaçam arruinar tantas famílias. Condenamos a desorganização social das nações, odesprezo pela justiça, que conduz muitos cidadãos para a marginalidade, a anarquia,que corrompe as nossas comunidades, a morte das crianças, causada pela violência, econdenamos igualmente as agressões e o ódio em nome da religião (fundamentalismoreligioso). Mas onde estão as soluções para todos estes problemas?

Em 1993, decorreu a reunião do Parlamento das Religiões Mundiais (em Chicago),que aprovou a Declaração de Ética Mundial. Neste documento, as principaisreligiões do mundo comprometem-se com a humanização do mundo e reafirmam osprincípios básicos para a convivência entre pessoas e entre povos.

Doc. 58Parlamento das Religiões MundiaisDeclaramos qe somos interdependentes. Cada m de nós depende do

bem-estar comm, o qe nos leva a respeitar a comnidade dos seres vivos,pessoas, animais e plantas e a preservação da Terra, do ar, da ága e do solo.

Temos ma responsabilidade individal por tdo o qe fazemos,reconhecendo qe todas as nossas decisões, ações e fracassos têmconseqências.

Devemos tratar os otros como gostamos qe os otros nos tratem.Comprometemo-nos a respeitar a vida e a dignidade, os indivídos e adiversidade, para qe toda a pessoa seja tratada com hmanidade, semexceção. Devemos promover a paciência e a capacidade de perdoar, sem nosdeixarmos escravizar por ódios ancestrais. Abrindo os nossos corações nsaos otros, devemos pôr de lado as nossas diferenças mesqinhas e abraçara casa comm da hmanidade, praticando a cltra da solidariedade.Consideremos a hmanidade como sendo a nossa família. Devemos procrarser amáveis e generosos. Não devemos viver somente para nós próprios, masprocrar servir os otros, sobretdo as crianças, os idosos, os pobres, os qe

Encontro Inter-religiosoem Aachen, Alemanha

Papa Bento XVI e

representantes muçulmanos

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unidade 3 139

sofrem, os decientes, os refgiados e os qe vivem na solidão. Ningémdeve ser considerado o tratado como cidadão de segnda classe o serexplorado. Deve haver paridade entre homens e mlheres. Não devemospermitir qalqer forma de domínio o abso.

Dispomo-nos a cltivar a não violência, o respeito, a jstiça e a paz. Nãoaceitaremos a opressão, a injúria, a tortra, o qalqer atentado contra avida de otros seres hmanos.

Temos de ltar por ma ordem económica e social jsta onde todostenham oportnidades igais para atingirmos a plena realização hmana.Devemos falar e agir com verdade e compaixão, evitando o preconceito eo ódio. Não devemos robar. Temos de ltrapassar a ganância, o desejo deprestígio, dinheiro e consmo para constrirmos m mndo de jstiça e depaz.

A Terra não poderá melhorar se não mdar primeiro a mentalidade dos

indivídos. Propomo-nos amentar a nossa perceção, disciplinando asnossas mentes por meio da meditação, da oração e do raciocínio positivo.Sem ma atitde de risco e de sacrifício não se realizará ma mdançafndamental da nossa sitação. Portanto comprometemo-nos a ltarpor esta ética global, dedicando-nos a m modo de vida qe benecie asociedade.

Adaptado de Margaret Kendall, Religiões em Diálogo

A presença da diversidade religiosa nas várias comunidades humanas lançaalguns desafios: o conhecimento, o respeito e o diálogo  inter-religioso. Isto porquenem sempre a diversidade é interpretada como factor de riqueza cultural, mas comofactor de competição e ameaça.

O grande desafio apela para o desenvolvimento de um espírito de abertura, porforma a compreendermos esta realidade diversificada, rompendo com a intolerância.O objetivo do diálogo não pode ser a dissolução da identidade singular de cadatradição religiosa.

Impõe-se hoje o imperativo de pensar no diálogo inter-religioso como meioessencial para a construção de um mundo mais pacífico, solidário, fraterno e

humano.Para que o diálogo seja possível, em primeiro lugar é necessário perceber os

limites de cada crença e reconhecer que a  verdade não é uma posse garantida,mas que resulta de uma experiência de caminhada comum, de partilha e de buscapermanente.

Não haverá paz entre as nações sem a paz entre as religiões. Não haverá paz

entre as religiões sem o diálogo entre as religiões. Não haverá diálogo entre as

religiões se não se investigam os seus fundamentos.

Hans Küng

Mohamed Loueslati

Papa Bento XVI cumprimentaum representante muçulmano

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unidade 40

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unidade 4 141

Nesta unidade vamos refletir sobre:

• A noção de projeto de vida

• Projeto de vida e vocação

• A felicidade como projeto

• A construção de uma sociedade justa e solidária ondetodos possam ser felizes

• A felicidade na relação com os outros: assumir valoreséticos fundamentais

•O projeto de Abraão: a descoberta de um Deus único

•O projeto de Paulo: a descoberta de Cristo como eixoorientador da vida

UNIDADE LETIVA 4

Projeto de vida

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unidade 42

Olá! Sou Maria, a mãe de Jesus. Ser mãe foi um dos eixos principais do meu

 projeto de vida.

Nasci em Nazaré da Galileia. De acordo com o costume judaico de então, aos

três anos os meus pais — Joaquim e Ana — levaram-me ao templo de Jerusalém

para me consagrarem a Deus. Depois ensinaram-me a conar nele.

O povo judeu esperava o Messias, o Salvador. E Deus escolheu-me para ser a

sua mãe.

Eu era ainda muito jovem quando Deus, através do anjo Gabriel me convidou

a aceitar este projeto. Abrindo o coração ao seu convite, dei-lhe o meu «sim»

incondicional. Foi então que começou a minha aventura no mistério da vontade

de Deus.

Não penses que foi fácil! Eu não tinha absoluta certeza do que me estava a

acontecer. Foram momentos particularmente difíceis de dúvida e perplexidade.

Mas a graça de Deus estava em mim e com a sua força decidi orientar toda a minha

liberdade para a realização do projeto benevolente de Deus. Fui descobrindo

o meu futuro através de um processo interior. Fé, disponibilidade, humildade,prontidão, oração e doação foram as atitudes que marcaram todo esse percurso.

Foi assim que me tornei parte integrante da história da relação de Deus com

a humanidade: acolhi o Filho de Deus e entreguei-o ao mundo.

Nesta unidade letiva em que vais reetir sobre o teu projeto de vida, procura

estar atento aos sinais da vida e à voz da tua consciência. Não tenhas medo e

ousa dar sentido à tua própria existência. Coragem!

A Natividade, por W. L. Taylor

 Anunciação, por autor anónimo

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unidade 4 143

Doc. 59Textos do Novo Testamento que se referem a Maria• Anúncio de que será a mãe do Filho de Deus: Mt 1, 18-25; Lc 1, 26-38.• Visita de Maria à sua prima Isabel: Lc 1, 39-56.• Apresentação do Menino Jesus no templo: Lc 2, 22-38.

• Jesus aos doze anos: Lc 2, 41-52.• Felicidade verdadeira: Lc 11, 27-28.• Bodas de Caná, na Galileia: Jo 2, 1-11.• Família de Jesus: Lc 8, 19-21; Mc 3, 33-35.• Jesus entrega Maria ao cuidado do discípulo amado: Jo 19, 25-27.• Pentecostes e fundação da Igreja Cristã: At 1, 14; 2, 1-4.

Nos Evangelhos Maria faz uso da palavra por sete vezes: três dirigidasao anjo da anunciação; o Magnicat em resposta a Isabel; duas dirigidas a Jesus; e uma dirigida aos servos das bodas de Caná:

— Como é que isso pode ser, se eu sou virgem? (Lc 1, 34)— Servirei o Senhor como ele quiser (Lc 1, 38).— Seja como tu dizes (Lc 1, 38).— O meu coração louva o senhor e alegra-se em Deus, meu salvador…

(Lc 1, 46 ss)— Filho, por que nos zeste isto? O teu pai e eu temos andado aitos à

tua procura (Lc 2, 48).— Já não têm vinho! (Jo 2, 3)— Façam tudo o que ele vos disser (Jo 2, 5).

Visitação, por Evelyn De Morgan

Bodas de Caná da Galileia, por Giotto di Bondone

Em 25 de março de 1646,nas Cortes de Lisboa,D. João IV proclamouMaria Padroeira dePortugal , sob o títulode Nossa Senhora da Imaculada Conceição. Omesmo soberano ordenouque os estudantes daUniversidade de Coimbra jurassem defender aImaculada Conceição daMãe de Deus. D. João IVapenas tornou permanenteuma devoção que era já

habitual noutros monarcasportugueses: colocar oreino sob a proteção daVirgem Maria.No mundo inteiro, adevoção e o culto a Mariatêm sido expressos emtodas as formas de arte.Para além da pintura eda escultura de todos ostempos, são inúmeras asobras literárias e musicais

dedicadas à Mãe de Jesus.

Saber +

Senhora da Conceiçãode Vila Viçosa

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unidade 44

Projetar o futuro

Uma das metáforas mais utilizadas para falar da  vida  é a de um projeto  quenasce com cada pessoa e que se concretiza nas diferentes fases de crescimento, cujoobjetivo primordial é a experiência da felicidade. Associada à imagem de projetoestá também a de caminho. De facto, o projeto pessoal de vida é um apelo constantea caminhar, a libertar-se da inércia e do comodismo que a nada conduzem, parapercorrer itinerários com objetivos traçados, sendo o mais importante a realizaçãopessoal.

A palavra «projeto», por sua vez, é um termo utilizado em diferentes áreas da

atividade humana. Uma obra de engenharia, por exemplo, nasce sempre de umprojeto, que mais não é do que a concretização de ideias e intenções organizadaspara servirem determinados fins. Sintetizando: um projeto consiste na definição de

um conjunto de objetivos a atingir, bem como na planificação de estratégias e

atividades que visem atingir os objetivos propostos. Há projetos individuais e háprojetos coletivos.

A palavra «projeto» deriva do étimo latino  projicere  («lançar para a frente»),sugerindo movimento, ação, uma trajetória que se visualiza no tempo e no espaço,com um ponto de partida e outro de chegada. Envolve também a construção de algonovo e a transformação da realidade presente, sugerindo a ideia de futuro. Palavrascomo «ação», «decisão», «planificação», «objetivos», «estratégias», «realização»,

«transformação» são decorrentes do conceito de projeto e com ele relacionadas.

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unidade 46

Projeto de vida

O projeto de vida de cada pessoa ganha um significado especial porque serelaciona com o dom da vida e o valor e dignidade de cada ser humano. Pensar oprojeto de vida pessoal não pode ser equiparado aos demais projetos da atividadehumana. Tal como cada pessoa é original, única e irrepetível, também o seu projetode vida assumirá esta grandeza e importância.

 A vida pessoal não se limita a um somatório das vivências sem relação entre si. E

muito menos é o resultado de um conjunto de ações com vista à simples sobrevivência.Este tipo de ações, sendo importantes, permitem apenas que a pessoa viva e se sintamais uma entre tantas outras. Definir um projeto de vida que ultrapasse o âmbitorestrito da mera sobrevivência é um exercício que a própria existência reclama de

cada pessoa. Neste contexto assume grande relevância a capacidade humana de,no exercício da sua liberdade, tomar decisões e percorrer caminhos que dão um

sentido à sua vida. Neste itinerário pessoal, incluem-se a alegria da relação, o riscoda aventura, enveredando por caminhos ainda não percorridos, e, muitas vezes, osofrimento provocado pelos fracassos. Os objetivos que cada pessoa traça no seuprojeto de vida passam, por outro lado, pela consciência de que ninguém pode

caminhar isolado quando a finalidade última é a procura e vivência da felicidade.Tal finalidade só se alcança de mãos dadas com os outros, nossos irmãos na grandeaventura da vida.

 

Quem sou? Qual o meu lugar neste mundo? Que marca pessoal quero nele gravar?O que me faz sentir feliz? Que caminho quero percorrer? Quais as minhas qualidadese aptidões? Será que estou satisfeito com a minha vida? O que falta fazer para quea minha existência seja perfeita? Estas e muitas outras questões são tão legítimasquanto necessárias porque são já um primeiro passo na definição de um projeto de

 vida. Sem nos conhecermos a nós próprios não estaremos aptos a traçar um projetoadequado à nossa situação concreta. Encontrar as respostas para estas perguntas é,pois, um momento essencial na definição das linhas principais do próprio projetode vida. Mas essas respostas remetem para uma multiplicidade de projetos de vida

alternativos. Impõe-se, portanto, um conjunto de escolhas.

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unidade 4 147

As inquietações dos jovensO jovem vive num mundo sujeito a transformações rápidas e radicais. A

ciência e a tecnologia melhoraram as condições de vida; no entanto, persistem,escandalosamente, conflitos e dramas sociais e pessoais que provocam desilusão,medo e insegurança.

Instabilidade profissional:  são muitos os jovens que se confrontam comgrandes dificuldades escolares; com fracassos ou sonhos desfeitos que os obrigam,com frequência, a orientarem-se para uma via profissional quando ainda não estãosuficientemente amadurecidos para o fazer: com tentativas de opções profissionaismuitas vezes sem futuro.

Instabilidade afetiva: a libertinagem no modo de conduzir as relações afetivas eas suas manifestações sexuais conduz muitos jovens a aventuras de diferentes tipos,algumas das quais destroem e comprometem o seu equilíbrio emocional.

Instabilidade filosófica e religiosa: o pluralismo filosófico e religioso é tal que os

 jovens se confundem e se perdem neste emaranhado de ideias e formas de vida semsaberem em qual confiar. Os meios de comunicação social e a própria vida refletemeste pluralismo e empurram o jovem em todas as direções do pensamento filosófico,ético, político e religioso.

Instabilidade moral:  procurando uma motivação racional para os seuscomportamentos o jovem começa lentamente a descobrir o valor profundo de simesmo e dos outros. E na descoberta de si mesmo, descobre o outro como sujeito derelações interpessoais. Despontando para a maturidade e para a autonomia moral, o

 jovem desconhece, por vezes, os limites éticos do seu agir. Toma, por isso, opções noquadro do relativismo ético e moral, que podem conduzir à delinquência, ao laxismo,à recusa de relações solidárias, à negação de qualquer compromisso.

É neste processo de aspiração pela liberdade e pela autonomia que o jovem se vaiprojetando e encontrando numa atitude criativa e libertadora.

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unidade 48

Como serei daqui a vinte anos?

Bom, daqui a vinte anos… — nunca tinha pensado nisso — acho que serei

parecida com o que sou agora, mas já estarei casada e talvez já tenha sido mãe.

Sempre sonhei ter gémeos, gostava de lhes dar nomes invulgares mas bonitos.Penso que o meu marido também será da área das ciências, mas médico não, pois

não iria estar muito tempo em casa.

Gostaria de trabalhar num laboratório, descobrir a cura para doenças,

melhorar a vida das pessoas que nalgum momento mais frágil caram infetadas

e que talvez já tenham perdido a esperança. Gostaria de ser famosa devido ao

meu trabalho, de ser um exemplo para os jovens estudantes. E porque não sonhar

com o Prémio Nobel?

Julgo que não estarei em Portugal. Talvez viva nos Estados Unidos da América,

numa cidade ou então numa povoação mais calma.

A minha família deverá estar toda perto de mim. O meu pai e a minha mãeestarão a gozar a vida, a viajar pelo mundo e a cuidar dos netinhos. O meu

irmão será um artista de renome e respeitado; estará talvez casado e com lhos.

A minha irmã estará a acabar o curso ou, então, já estará a trabalhar. Neste

momento ainda não sei ao certo o que ela quererá seguir, mas decerto há de

querer enveredar por algo que tenha a ver com lmes. Seremos uma família

grande e feliz. Aos domingos encontrar-nos-emos para o almoço de família. O

Natal será sempre muito festivo e harmonioso. As crianças adorarão abrir os

presentes e o meu pai será o Pai Natal.

Hei de ter muitos conhecidos e amigos, mas terei um grupo restrito de

amigos íntimos. Dar-nos-emos tão bem que talvez saibamos tudo sobre os outros,

conhecer-nos-emos melhor do que ninguém, saberemos quando algum de nósestá bem ou mal, quando alguém precisa de ajuda. O meu marido estará incluído

neste grupo, não fosse ele o meu melhor amigo.

Para conseguir chegar onde pretendo terei decerto de conar em mim

mesma. Ninguém é cientista sem ter autoconança, ninguém ganha o Prémio

Nobel do pé para a mão. Terei de trabalhar muito, mas devido ao meu esforço

constante e honesto hei de obter a recompensa que mereço.

Adolescente de 15 anos 

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unidade 4 149

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.Fernando Pessoa

Segundo a mitologia grega,

Sísifo havia menosprezadoos deuses. Quandomorreu de velhice, osdeuses condenaram-no aum trabalho monótono,inútil e sem esperança portoda a eternidade. Sísifoteria de rolar um enormerochedo até ao cume deuma montanha. Acontecia,porém, que quando estavaprestes a alcançar o topo,a pedra rolava novamente

até ao sopé do monte.O seu esforço constanteexigia um recomeço inútile interminável.

Saber +

Sísifo

Doc. 60SísifoRecomeça…Se puderes,Sem angústia e sem pressa.E os passos que deres,Nesse caminho duro

Do futuro,Dá-os em liberdade.Enquanto não alcancesNão descanses.De nenhum fruto queiras só metade.E nunca saciado,Vai colhendoIlusões sucessivas no pomar.Sempre a sonharE vendo

Acordado,O logro da aventura,És homem, não te esqueças!Só é tua a loucuraOnde com lucidez te recomeças.

Miguel Torga, Diário , XIII

Fernando Pessoa

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unidade 40

Projeto de vida e vocação

É comum ouvirmos falar de vocação como o exercício de uma profissão: «aminha vocação é ser médico», «tens vocação para mecânico», «a minha mãe diz quetenho vocação para ser enfermeira», etc. No entanto, a vocação pessoal não se esgotano exercício de uma atividade profissional. O projeto de vida pessoal ou vocaçãorealiza-se no exercício de diversas funções, profissionais ou não, na vivência de

determinados estados de vida, na tomada de opções pessoais quanto à maneira deorientar a própria existência...O termo vocação provém do verbo latino vocare  («chamar»), remetendo para a

ideia de chamamento divino dirigido a cada ser humano, o qual inicia com a própriavida  (Deus chama-nos a existir), passa pelos  valores  e opções que assumimos,incluindo os valores éticos e religiosos, pelo estado de vida  que abraçamos (sercasado, ser celibatário entregando-se a uma causa, etc.) e, naturalmente, também pelaescolha de uma profissão.

Mas a mais básica e fundamental de todas as vocações é o chamamento de todoo ser humano a ser feliz. A necessidade e a procura de um ideal de felicidade sãouma constante na história da humanidade e de cada pessoa. Porém, a concretização

e expressão desse ideal reveste-se de formas muito diferentes.

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unidade 42

imortalidade. De qualquer coisa que não seja deste mundo.— É um raciocínio que se tem. Mas, anal, não se pode ir até ao m…— Tu nada sabes. É porque não se quer ir até ao m, que nada se alcança.

Mas é preciso sermos lógicos até ao m.— E qual é a verdade, Thibault?— Os homens morrem e não são felizes. (pausa).— Então Thibault, é uma verdade que não incomoda ninguém. Olha à

tua volta. Isso não impede as pessoas de almoçarem.— Então é porque tudo à minha volta é mentira. Mas eu quero que se

viva na verdade…Albert Camus, CalígulaAlbert Camus,

escritor e filósofo francês

A vocação é o modo concreto como damos sentido à nossa própria vida; amaneira como respondemos às nossas aspirações mais profundas, aos nossos sonhosde felicidade. Fora deste caminho, longe da nossa vocação, surgem as insatisfações eos vazios.

A vocação está sempre voltada para o futuro e vai-se realizando no presente, emcada momento da vida, por isso só estará completa na eternidade. Aqui, só temosque ir assumindo o passado, vivendo o presente com confiança e projetando o futurocom esperança.

A vocação não é obra do acaso ou do destino, nem tão pouco se trata de umaimposição que exige obediência cega; vocação é o chamamento à felicidade  que

Deus faz a cada pessoa e a resposta livre e consciente que cada um é chamado a dar.A vida sem objetivos, sem ideais, é simplesmente absurda.

Doc. 62125 AzulFoi sem mais nem menosQue um dia selei a 125 AzulFoi sem mais nem menos

Que me deu para arrancarSem destino nenhum

Foi sem graça nem pensandoNa desgraça que entrei pelo calorSem pendura que a vida já me foi duraPara insistir na companhia

O tempo não me diz nadaNem o homem da portagem

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unidade 4 153

Na entrada da autoestradaA ponte cou deserta nem sei mesmoSe Lisboa não partiu para parte incerta

Viva o espaço que me ca pela frenteE não me deixa recuarSem paredes sem ter portas nem janelasNem muros para derrubar

Talvez, um dia me encontreAssim, talvez me encontre

Curiosamente, dou por mim pensandoOnde isto me vai levar

De uma forma ou de outra há de haverUma hora para a vontade de parar

Só que à frente o bailado do calorVai-me arrastando para o vazioE com o ar na cara vou sentindoDesaos que nunca ninguém sentiu

Entre as dúvidas do que souE onde quero chegar

Um ponto preto quebra-meA solidão no olhar

Será que existe em mimUm passaporte para sonharE a fúria de viverÉ mesmo fúria de acabar

Foi sem mais nem menosQue um dia selou a 125 Azul

Foi sem mais nem menosQue partiu sem destino nenhum

Foi com esperançaSem ligar muita importânciaÀquilo que a vida querFoi com força acabar por se encontrarNaquilo que ninguém quer

Mas Deus leva os que amaSó Deus tem os que mais ama.

Trovante

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unidade 44

Se um homem não descobriu nada pelo qual morreria, não está pronto para viver.

M. Luther King

À descoberta da vocaçãoPara descobrir uma vocação que satisfaça integralmente as necessidades básicas,

culturais e espirituais é preciso estar atento aos gostos, inclinações, aptidões,inquietações e sonhos pessoais, bem como às necessidades e desafios da sociedade emque vivemos. A vocação pessoal descobre-se olhando para si e para as necessidades

do mundo. Pelo contrário, o medo, o egoísmo, o consumismo, a preguiça, etc., nãosão critérios de escolha adequados.

Olhar com lucidez para aquilo que se é, procurar ser competente no que se faz,

ser fiel às opções importantes que se tomaram, ser persistente e sereno são atitudesindispensáveis à descoberta e desenvolvimento de uma vocação.

Martin Luther King

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unidade 4 155

Doc. 63O trabalho é o amor tornado visível

Disseram-teque a vida é obscuridadee na tua fadiga repeteso que dizem os cansados.

Ora eu digo que a vidaé, realmente, obscuridade,menos onde há entusiasmo;

e todo o entusiasmo é cego,menos onde há sabedoria;

e todo o saber é vão,menos onde há trabalho;

e todo o trabalho é vazio,menos onde há amor;

e quando trabalhas com amorunes-te a ti mesmobem como aos outros e a Deus.

E o que é trabalhar com amor?

É tecer o panocom os tirados do teu coração,como se o teu bem-amadotivesse de usar esse tecido.

É construir uma casa com afeto,como se o teu bem-amado

viesse morar para essa casa.

É semear o grão com ternurae recolher com alegria,como se o teu bem-amadoviesse comer os frutos.

O trabalho é amor tornado visível.E se não puderes trabalhar com amor,

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unidade 46

A escolha de uma vocação está intimamente ligada à felicidade pessoal;contribui para a felicidade das pessoas que nos rodeiam; implica o desenvolvimento

e enriquecimento da sociedade. A vocação de cada um é sempre um projeto emconstrução. E é caminhando que se descobre o caminho.

mas apenas de forma aborrecida,mais vale abandonares o trabalhoe sentado à porta do temploreceberes esmolados que trabalham com alegria.

Porque se zeres o pão com indiferença,será um pão amargoque não matará senão metade da nossa fome.

E se esmagares as uvas de mau humor,será misturar veneno no vinho.

E ainda que cantes como os anjos,

se não amares o canto,fecharás os ouvidos do ser humanoàs vozes do diae às vozes da noite.

Khalil Gibran, O Profeta

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unidade 4 157

Há duas maneiras de nos posicionarmos na vida: deixarmo-nos conduzir porela ou sermos nós a conduzi-la. Que dignidade é a nossa se permitimos que a vidase nos imponha sem que nós nos imponhamos a ela? Que dignidade é a nossa sesomos joguetes nas mãos de influências alheias e vivemos ao sabor da propaganda eda moda ou da disposição pessoal do momento?

Ter um ideal, seguir uma vocação não é ter um fantasma ou um sonho absurdo;é a antecipação de uma realidade futura. Um ideal é uma tomada de posição frente à

 vida; é uma decisão que orienta todas as decisões. Quem tem um ideal compromete--se consigo e com os outros, constrói a sua personalidade, que não é neutra nem

indiferente perante os valores, governa a sua vida e é senhor do seu destino.

Doc. 64Aprender com o camaleãoO camaleão é um excelente professor.Observem-no de perto.Qualquer que seja a direção que escolhe, não muda. Faça o mesmo. Tenha

uma meta na sua vida e não deixe que nada nem ninguém o distraia.A cabeça do camaleão nunca mexe, mas os seus olhos mexem-seconstantemente. Não lhes escapa nada. O que signica: descubra tudo oque conseguir. Nunca pense que é a única pessoa no mundo.

Onde quer que esteja, o camaleão adapta a sua cor consoante o meio.Isto não é hipocrisia. Signica, sim, ser tolerante e também ter competênciassociais. A confrontação não leva a lado nenhum. Não nascem resultadosconstrutivos de uma batalha. Devemos sempre tentar perceber os outros.Nós existimos e devemos aceitar que os outros também existem.

Quando o camaleão se mexe, levanta as patas e hesita. Isto signicacaminhar com cuidado. Quando se mexe, agarra-se bem com a sua cauda— se perder a base, ainda se consegue agarrar. Protege a sua retaguarda. Porisso, faça o mesmo: não aja por impulso.

Quando o camaleão avista a sua presa, não a ataca com um salto, masusa a língua. Se a conseguir alcançar com a língua, melhor; caso contrário,recolhe a língua e ninguém sai prejudicado. O que quer que faça, faça-ocom cuidado. Se quiser fazer algo duradouro, seja paciente, seja bom, sejahumano.

 Amadou Hampaté Bâ

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unidade 48

A felicidade como projeto

A felicidade é a vocação fundamental do ser humano, a sua primeira inclinaçãoe o objetivo último da sua existência, para a qual apontam todos os seus esforços.

A nossa vida está repleta de decisões importantes, umas fundamentais, outrasnem tanto; umas conscientes, outras inconscientes. Mas em cada uma delas jogamosa nossa felicidade. Aquilo que somos e seremos no futuro depende das vicissitudesda vida, mas em maior grau das nossas escolhas, do que tivermos decidido ser e

fazer. Todos imaginamos como gostaríamos de ser e o que fazer da vida, ou seja,que projeto de vida queremos para nós. É, pois, este o maior projeto de cada pessoa— ser feliz. Mas quantas vezes as nossas opções concretas contradizem este grandeprojeto!

Não existe um caminho para a felicidade. A felicidade é o caminho.Mahatma Gandhi

Mahatma Gandhi

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unidade 4 159

Nas pedreiras de Carrara (Itália), encontraram um  bloco de mármore  de

extraordinárias dimensões. A pedra era tão perfeita que não quiseram quebrá-

-la. Conservaram-na inteira, pensando que alguém pudesse extrair dela algo

excecional.

Chamaram os melhores escultores, mas nenhum quis encarregar-se do

projeto. Algum tempo depois, Miguel Ângelo deparou com este enorme pedaço

de mármore. Observou a pedra e imediatamente viu que o rei David morava

no seu interior. Decidiu então trabalhar neste novo projeto. Utilizando os

instrumentos necessários, começou a extrair todos os pedaços de mármore que

encerravam a escultura. Pouco a pouco, o seu David foi tomando forma. Toda a

sua beleza, que só Miguel Ângelo conhecia enquanto esteve oculta no enorme

pedaço de mármore, apareceu, imponente, aos olhos de todos.

Também cada um de nós é um projeto: projeto de alegria, de beleza, de felicidade.Contudo, também somos nós os verdadeiros artistas (escultores) da nossa própria

 vida e da nossa felicidade. E não podemos delegar nos outros esta missão, permitindoque nos moldem a seu bel-prazer! Somos chamados a dar forma à nossa própria

 vida, fazendo as escolhas que nos tornarão livres e felizes.

Sentimo-nos atraídos por diversas realidades e valores que podem construir-nosenquanto seres humanos ou, pelo contrário, destruir-nos, apesar de nos ofereceremalgum bem-estar momentâneo. Aprender a distinguir aquilo que conduz à felicidadeautêntica e duradoura é uma tarefa urgente. Ir retirando, a pouco e pouco, o pedaço

de pedra que esconde a beleza que somos, libertarmo-nos daquilo que está a maisou que em nada contribui para a nossa plena realização, organizar a vida de maneiraconsciente, segundo uma escala de valores que nos faça crescer enquanto pessoas emtodas as suas dimensões é um trabalho sempre inacabado que durará a vida toda! Aconstrução da nossa personalidade é tarefa de todos os dias, por meio dos nossosprojetos, das nossas decisões (por mais insignificantes que possam parecer!) e dasações que realizamos.

David , por Miguel Ângelo

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unidade 40

Doc. 65Aqui me encontro

Aqui me encontro, despido de mim mesmo,tal qual o homem que busca a dignidade.

Aqui me encontro, no porto da verdade,sentindo o mundo que perde a felicidade.

Eu quero ver o sol a despontar,ter um sorriso de criança na inocência,e viver a vida é o idealque me conduz de novo à infância.

 Já não procuro o caminho inseguro,tal qual o homem que busca a dignidade.

 Já encontrei a vontade de viver,este sentido de lutar, esta vontade de ser.

Autor desconhecidoIn http://cvitamina.blogspot.com (21/04/2010)

Saber encontrar a alegria na alegria dos outros, é o segredo da felicidade.Georges Bernanos (escritor francês, 1888-1948)

Precisamos de partilhar a vida com os outros, sobretudo com aqueles que

têm projetos semelhantes ao nosso. Sendo nós os artistas da nossa existência, nãopodemos sê-lo inteiramente sozinhos! Se é verdade que cada um terá de tomar assuas decisões, só no encontro com os outros e com os seus projetos poderemosrealizar algo de efetivamente interessante no mundo, tornando possível a vivênciada felicidade. Caminhando e crescendo juntos, daremos verdadeiro sentido à nossa

 vida.

Georges Bernanos

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unidade 4 161

 A suprema felicidade da vida é termos a convicção de que somos amados.Victor Hugo (escritor francês, 1802-1885)

Doc. 66Feliz Só SeráFeliz só seráA alma que amar.

‘Star alegreE triste,Perder-se a pensar,DesejarE recearSuspensa em penar,Saltar de prazer,De aição morrer —Feliz só seráA alma que amar.

 Johann Wolfgang von Goethe, Canções

Doc. 67Ser felizPosso ter defeitos, viver ansioso e car irritado algumas vezes, mas não

esqueço de que a minha vida é a maior empresa do mundo. E que possoevitar que ela vá à falência.

Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver, apesar de todos os desaos,incompreensões e períodos de crise. Ser feliz é deixar de ser vítima dosproblemas e tornar-se autor da própria história. É atravessar desertos forade si, mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma. Éagradecer a Deus em cada manhã pelo milagre da vida.

Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos. É saber falar de simesmo. É ter coragem para ouvir um «não». É ter segurança para receberuma crítica, mesmo que injusta.

Augusto Cury, Dez leis para ser feliz

 Johann Wolfgang von Goethe,

por Joseph Carl Stieler

Victor Hugo

Augusto Cury 

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unidade 42

 A construção de uma sociedade

 justa e solidária onde todospossam ser felizes

Como seres que se realizam humanamente apenas na relação com os outros, nãoconvivemos bem com uma sociedade desonesta e imoral, onde a opção fundamentalconsiste essencialmente em obter prazer para si mesmo independentemente damaneira como lidamos com os outros. Através das nossas ações, construímos ou a

impedimos, sem dúvida, a felicidade das pessoas com quem lidamos, da mesmaforma que elas o fazem em relação a nós, através do modo como se relacionamconnosco. Temos nas nossas mãos, em cada dia, a responsabilidade de tornar a vidade alguém mais feliz.

No entanto, podemos observar muitíssimas pessoas que não têm condiçõesmínimas para se sentirem felizes, porque lhes faltam os bens essenciais, tanto os bensmateriais como, muitas vezes, os bens espirituais (o afeto, o acolhimento, a atençãodos outros, etc.).

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unidade 4 163

Doc. 68Responsabilidade solidária pelo bem comum

Criado por Deus para a felicidade, o ser humano encontra na suadedicação ao bem da comunidade em que se insere os meios para realizaressa felicidade pessoal e social. Ninguém pode car excluído dessa tarefapermanente.

A crise que atinge o nosso mundo e, em particular, o nosso país e o espaçoeuropeu em que se situa, não é apenas uma crise económica mas também, esobretudo, uma crise espiritual e moral. Entre outros aspetos, ela traduz-sena relativização de valores e princípios, na perda de conança num futuromelhor, na demissão em lutar por uma sociedade mais justa e pacíca, norefugiar-se em seguranças meramente individuais e privadas.

O ser humano entendido como pessoa em comunidade e os critériosevangélicos da construção da comunidade fundada no amor implicama urgência em despertar os dinamismos inerentes à pessoa, tais como aconança e a esperança num futuro com sentido de vida, a participaçãosolidária e o empenhamento responsável pelo bem comum.

Portugal pode ser diferente, com o contributo positivo de todos. Oscidadãos devem ter consciência da sua responsabilidade no crescimento dasociedade como comunidade.

Ao olharmos o nosso país, com os problemas que o atravessam, naperspetiva da edicação de uma sociedade solidária, identicamos algumasatitudes e linhas de comportamento, a que podemos chamar «pecados

sociais» e que exigem uma conversão à solidariedade responsável naconstrução do bem comum:

a) Os egoísmos individualistas , pessoais e grupais, sem perspetiva dobem comum mais global;

b) O consumismo , fruto de um modelo de desenvolvimento, fomentadopelos próprios mecanismos da economia, que gera clivagens entrericos e pobres e gera insensibilidade a valores espirituais;

c) A corrupção , verdadeira estrutura de pecado social, que se exprimeem formas perversas, violadoras da dignidade humana e da consciênciamoral pelo bem comum;

(…)e) A irresponsabilidade na estrada , com as consequências dramáticas

de mortes e feridos, que são atentados ao direito à vida, à integridadefísica e psicológica, ao bem-estar dos cidadãos e à solidariedade;

f) A exagerada comercialização do fenómeno desportivo , que temconduzido à perda progressiva do sentido do «jogo» como autênticaatividade lúdica, e a falta de transparência nos negócios que envolvemmuitos setores e prossionais dalgumas áreas do desporto;

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unidade 44

A nossa felicidade depende mais do que temos nas nossas cabeças, do quenos nossos bolsos.

Arthur Schopenhauer

Doc. 69O desenvolvimento humano autênticoHoje, de facto, compreende-se melhor que a mera acumulação de bens

e de serviços , mesmo em benefício da maioria, não basta para realizar afelicidade humana. E, por conseguinte, também a disponibilidade dos

multíplices benefícios reais, trazidos nos últimos tempos pela ciência e pelatécnica , incluindo a informática, não comporta a libertação de toda e qualquerforma de escravidão. A experiência dos anos mais recentes demonstra, pelocontrário, que se toda a massa dos recursos e das potencialidades, postosà disposição do ser humano, não for regida por uma intenção moral e poruma orientação no sentido do verdadeiro bem da humanidade, volta-sefacilmente contra o ser humano para o oprimir.

Deveria ser altamente instrutiva uma desconcertante vericação doperíodo mais recente: ao lado das misérias do subdesenvolvimento,que não podem ser toleradas, encontramo-nos perante uma espécie

de superdesenvolvimento, igualmente inadmissível, porque, como o

g) A exclusão social , gerada pela pobreza, pelo desemprego, pela faltade habitação, pela desigualdade no acesso à saúde e à educação,pelas doenças crónicas, que atinge particularmente as famílias maiscarenciadas, as crianças e as pessoas idosas, e determinados grupossociais.

Os «pecados sociais» têm a sua origem primeira no coração da pessoa,quando exclusivamente fechada no seu egoísmo, sem qualquer abertura aosoutros seres humanos. Podem concretizar-se em setores vitais da sociedade,como a família, a escola e os meios de comunicação social, quando sedemitem do seu papel de participar na construção do bem comum,respeitando a dignidade do ser humano. Para contrariar ou combater estes«pecados sociais» exige-se a educação nos valores , o gosto do bem comum ,a generosidade como atitude social, a paixão por um Portugal melhor.

Carta Pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa , 2003

Arthur Schopenhauer

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unidade 4 165

Doc. 70Crescimento ambivalenteTanto para os povos como para as pessoas, possuir mais não é o m último.

Qualquer crescimento é ambivalente. Embora necessário para permitir aoser humano ser mais humano, torna-o contudo prisioneiro no momento emque se transforma no bem supremo que impede de ver mais além. Então oscorações endurecem-se e os espíritos fecham-se, as pessoas já não se reúnempela amizade mas pelo interesse, que bem depressa os opõe e os desune. Abusca exclusiva do ter, forma então um obstáculo ao crescimento do ser eopõe-se à sua verdadeira grandeza: tanto para as nações como para as pessoas,a avareza é a forma mais evidente do subdesenvolvimento moral.

Paulo VI, Populorum Progressio , 19 e 20

primeiro, é contrário ao bem e à felicidade autêntica. Com efeito, estesuperdesenvolvimento, que consiste na excessiva disponibilidade de todoo género de bens materiais, em favor de algumas camadas sociais, tornafacilmente os homens escravos da «posse»  e do gozo imediato, semoutro horizonte que não seja a multiplicação ou a substituição contínuadas coisas que já se possuem, por outras ainda mais perfeitas. É o que sechama a civilização do «consumo», ou consumismo , que comporta tantos«desperdícios».

E então, eis o quadro: há aqueles — os poucos que possuem muito —que não conseguem verdadeiramente «ser», porque, devido a uma inversãoda hierarquia dos valores, estão impedidos pelo culto do «ter»; e há aqueles— os muitos que possuem pouco ou nada — que não conseguem realizara sua vocação humana fundamental porque estão privados dos bensindispensáveis.

O mal não consiste no «ter» enquanto tal, mas no facto de se possuirsem respeitar a qualidade e a ordenada hierarquia dos bens que se possuem.Qualidade e hierarquia que promanam da subordinação dos bens e das suasdisponibilidades ao «ser» da humanidade e à sua verdadeira vocação.

 João Paulo II, Sollicitudo rei socialis , 28

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unidade 46

 A felicidade na relação com osoutros: assumir valores éticosfundamentais

Ao olharmos o mundo que nos rodeia, notamos que as pessoas se comportam demaneiras muito diferentes. Aquilo que para algumas é mal, outras consideram-nobom! Cada pessoa observa e julga segundo o universo de valores que assumiu noseu projeto de vida.

Chamamos valor a tudo o que tem importância real na existência humana. Se aspessoas não têm todas o mesmo conjunto de valores, a diferença ainda se acentua maisna forma como os hierarquizam. De facto, cada pessoa estabelece uma hierarquia

de valores  — desde o que assume maior relevância até ao que se revela menosimportante — conforme a educação que teve, a época e o ambiente em que vive. Os

 valores adotados e a escala de valores respetiva constituem uma opção fundamental.Essa opção condiciona todas as nossas escolhas, decisões e comportamentos, uma

 vez que define os princípios éticos pelos quais cada pessoa se deixa orientar e o idealde realização pessoal a que aspira. É, por isso, parte integrante da personalidade decada um.

A nossa personalidade vai-se estruturando e definindo por meio das escolhas quefazemos na vida. A vida humana não está pré-determinada — não existe um destinoescrito nos astros que nos seja imposto —, somos nós próprios que a construímos,em liberdade, através das opções que tomamos dentro das circunstâncias em que

 vivemos. Sendo livres, somos plenamente responsáveis pela vida que escolhemos viver. E ser responsável implica assumir as consequências das opções tomadas (sejam

boas ou más) e saber responder por elas perante nós mesmos e perante os outros.

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unidade 4 167

Doc. 71Voltar aos valores

Um dos principais valores é o humanismo , baseado numa formação moralsólida, aberta e pluralista, cujas coordenadas não deem prioridade ao êxitomaterial, ao prazer ou ao dinheiro. Isto constitui um trabalho pessoal quecomporta os requisitos seguintes:

1. Não estimular os instintos e as paixões, mas educá-los.2. Não cair na permissividade, mas ter critérios para distinguir entre o bem

e o mal.3.  Procurar o bem coletivo e o próprio, embora sem uma concorrência

desenfreada, motivada pela sentença homo homini lupus («O homem é um lobopara o homem»).

Trata-se de conseguir um ser humano mais digno, que quer ser mais cultopara ser mais livre; construir um mundo mais cordial e compreensivo; criar umespaço mais afetivo onde se interliguem o material, o espiritual e o cultural.Tudo isto nos ajudará a obter a felicidade, sempre difícil de alcançar.

Enrique Rojas, O Homem Light

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unidade 48

Doc. 72Tipos de valores

Os valores não são coisas nem simples ideias que adquirimos, masconceitos que traduzem as nossas preferências. Existe uma enormediversidade de valores, podemos agrupá-los quanto à sua natureza daseguinte forma:  Valores éticos: os que se referem às normas ou critérios de condutaque afetam todas as áreas da nossa atividade. Exemplos: solidariedade,honestidade, verdade, lealdade, bondade, altruísmo…  Valores estéticos: os valores de expressão da beleza. Exemplo:harmonia, belo, sublime, trágico…  Valores religiosos: os que dizem respeito à relação da pessoa com atranscendência. Exemplos: sagrado, santidade, perfeição…  Valores políticos: justiça, igualdade, imparcialidade, cidadania, liberdade…  Valores vitais: saúde, força…

Hierarquização dos ValoresNão atribuímos a todos os nossos valores a mesma importância. Na

hora de tomar uma decisão, cada um de nós hierarquiza os seus valores. Ahierarquização é a propriedade que têm os valores de se subordinarem unsaos outros, isto é, de alguns serem mais valiosos do que outros. As razõesporque o fazemos são múltiplas.

http://alosoa.no.sapo.pt/10valores.htm (21/04/2010)

AÇÃO

ESCOLHA

VALORES

ÉTICOS ESTÉTICOS POLÍTICOS RELIGIOSOS

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unidade 4 169

Doc. 73Renovação de dinamismos

Apelamos a todos os cidadãos que promovam com solidariedaderesponsável a vida pública da sociedade e o bem comum da comunidade,renovando os seguintes dinamismos:

– Da esperança contra o pessimismo;– Da conança contra o derrotismo;– Da participação contra a passividade;– Do empenhamento responsável no bem comum contra o refúgio no

individualismo;– Do diálogo na procura de soluções para os problemas da nossa

sociedade contra confrontos estéreis sem perspetiva de futuro;– Da justiça e da opção pelos pobres contra as desigualdades;– Do acolhimento dos estrangeiros e dos imigrantes contra as exclusões;– Da promoção dos direitos humanos contra os atentados à dignidade

humana;– Da paz contra o terrorismo, os conitos e as guerras;– Da democracia participativa contra as ditaduras;– Da reforma das leis e instituições públicas contra as estagnações;– Do cuidado pelo ambiente contra os desastres ecológicos e comporta-

mentos irresponsáveis;– Da cultura da vida contra a cultura da morte;– Da dignidade da vida contra as doenças e destruição do ser humano;

– Da paz social contra os ambientes de crise;– Da solidariedade e da subsidiariedade contra os egoísmos e as injustiças.

Carta Pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa , 2003

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unidade 40

 A participação na construçãoda sociedadeAo longo da vida, são vários os momentos em que é necessário tomar decisões

face ao projeto vocacional, começando no ensino básico e secundário, continuandodurante a frequência universitária e prolongando-se durante a carreira pessoal eprofissional.

O exercício de uma atividade profissional poderá proporcionar maior ou menorautorrealização e felicidade. Em parte, a realização profissional depende do facto determos tomado as opções corretas no tempo em que tivemos de escolher o caminho apercorrer e a profissão pela qual haveríamos de enveredar no futuro. Uma má escolhaé uma porta aberta para a infelicidade. Por vezes até sabemos o que queremos vir afazer, só que, dominados pela preguiça, não nos esforçamos o suficiente por alcançaressa meta. E sem esforço nada de verdadeiramente duradouro se pode alcançar.

Acabamos por ficar pelo caminho. E com tal comportamento condenamos o nossofuturo. É verdade que nem tudo poderá estar perdido. É sempre possível procurarmais tarde alterar o nosso itinerário profissional. Mas se tudo for feito no momentocerto, será certamente mais fácil e gratificante.

A  participação na vida pública  é um direito de todos os cidadãos e,simultaneamente, um dever moral. Pertencendo a uma comunidade, não devemosdeixar por mãos alheias a definição dos destinos da vida pública. Somos chamados a

intervir ativamente na sua definição. Há muitas formas de intervenção: a participaçãonas eleições e nos referendos, a assunção de cargos políticos ou outros, a participaçãoem associações com vista a tornar a sociedade mais justa e humana, etc.

A solução para os problemas que vão surgindo não está, decididamente, em«cruzar os braços», adotando uma atitude passiva e permitindo que o mundo aconteçaà nossa volta sem o nosso contributo. Informar-se, formar-se e intervir, usando todasas possibilidades legítimas ao nosso alcance, contribui para o desenvolvimento dademocracia, a valorização do debate de ideias e a promoção de novos modos de vida.

A consciência da cidadania traduz o desejo de cada pessoa participar no processode tomada de decisão da comunidade ou grupo a que pertence e, assim, interferir noque considera errado, mudando políticas ou propondo alternativas. A influência dos

movimentos sociais é decisiva para provocar mudanças.

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unidade 4 171

Doc. 74Qualidades de personalidade que tornam a pessoa criativa:

• Inteligência forte. Não se trata de um elevado coeciente deinteligência, mas de inquietação, desejo de profundidade, anseiopor compreender, curiosidade, capacidade de combinar elementos eaplicar essas conexões aos problemas da vida.

• Versatilidade.  Capacidade de encontrar soluções variadas para umproblema; de descobrir analogias ocultas ou afastadas e de produzirhipóteses.

• Intuição.  Permite ir diretamente ao assunto. Implica boa dose decuriosidade, originalidade e inventividade.

• Imaginação.  A criação exige capacidade de associar, de combinar,de integrar coisas heterogéneas, distantes e díspares entre si. Umaperceção na e imaginativa é capaz de reconhecer alguns elos deligação entre os vários aspetos em estudo.

• Conança em si.  Não é possível avançar para outros caminhos senão existe conança nas metas denidas e nas próprias capacidades.O criativo valoriza-se a si mesmo. Mas não se trata de arrogância:a valorização pessoal é compatível com certa insatisfação queestimula a continuar a procurar, a experimentar e a reticar o quefor necessário.

• Independência. Supõe a armação da própria individualidade, hábitosde pensar pela própria cabeça, poder de superar os condicionalismos,

desaar os tabus mais ou menos disfarçados. Capacidade de anticon-formismo e de alguma rebeldia.

• Tenacidade. As grandes criações requerem grandes esforços.Tenacidade e paciência, não se confundem com obstinação (teimosiaque impede de ouvir os outros e de reconhecer os erros).

• Flexibilidade.  Abertura à experiência, amplitude de horizontes,disposição para reconhecer os próprios erros, tolerância àsdiculdades, poder de adaptação. A pessoa criativa opõe-se à rigideze à que se considera indispensável e infalível.

• Valor. Nada bloqueia tanto a criatividade como o medo do fracasso

e da contradição.• Decisão. Capacidade de passar da ideia à ação, do projeto à realização,

da vivência interna ao produto externo. A agressividade construtivafunciona como motor da criatividade.

• Ambição. Forte motivação para o êxito. Lança o indivíduo nos árduoscaminhos da criação transcendente.

• Autocrítica. O anticonformismo e a rebeldia não vão tão longe queanulem a recetividade, a capacidade integrativa ante as achegas e osconselhos dos colegas. É normal que o criador se interrogue de vez emquando: Vou bem? Necessito de ajuda externa?

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unidade 42

• Entrega. Nasce do amor à obra, do amor à verdade e do amor à vida.Veste-se de interesse, de dedicação, de carinho, de entusiasmo e deespírito de sacrifício.

O criador reinventa, reencontra, imagina, descobre, muda o mundo esente por ele imensa ternura e compaixão.

Adaptado de Adérito Barbosa, O Jovem e a Vocação

Doc. 75Trabalho digno, justo e reconhecidoO trabalho  é uma vocação inerente ao ser humano, é participação na

obra criadora de Deus, é realização da pessoa humana na sua dignidadeem solidariedade efetiva com os outros seres humanos. O trabalho é umadimensão fundamental da existência humana sobre a Terra.

Reconhecemos que o desemprego  e as formas precárias  de empregoatingem inúmeros cidadãos e que, segundo os princípios da justiça e daequidade, tem de haver participação de todos tanto nos benefícios comonas diculdades. Rearmamos princípios fundamentais da doutrina social

da Igreja: a economia e o capital devem estar ao serviço da pessoa humana;a competitividade tem de respeitar a dignidade humana; o mercado livredeve ter limites no sentido de respeitar as aspirações e as necessidadeshumanas essenciais; a dignidade do trabalho permite ao ser humano tornar--se mais humano; as condições de trabalho devem ter em conta os direitos eo bem-estar da família; todos os parceiros do mundo laboral, trabalhadorese empresários, são responsáveis pela produtividade; a empresa é umacomunidade de pessoas.

Carta Pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa , 2003

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unidade 4 173

O trabalho como colaboração na obra criadora de Deus

O trabalho é um bem do ser humano porque, mediante o trabalho, o ser

humano não somente transforma  a natureza, mas realiza-se também a si

mesmo como ser humano e até, em certo sentido, se torna mais humano.

O ser humano, criado à imagem de Deus, participa mediante o seu trabalho na

obra do Criador. Em certo sentido, continua, na medida das suas possibilidades,

a desenvolvê-la e a completá-la, progredindo cada vez mais na descoberta dos

recursos e dos valores contidos em toda a obra da criação.Os homens e as mulheres que, ao ganhar o sustento para si e suas famílias,

de tal modo exercem as suas atividades, que prestam conveniente serviço à

sociedade, com razão podem considerar que prolongam com o seu trabalho a

obra do Criador, ajudam os seus irmãos e dão uma contribuição pessoal para a

realização do plano providencial de Deus na história.

João Paulo II, Laborem Exercens , 9.25

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unidade 44

Doc. 76Sinais de participação solidária

Notamos que, na sociedade portuguesa, há muitos sinais positivos,imbuídos de esperança e de responsabilidade dos cidadãos, que necessitamde ser continuamente revitalizados:

a) Uma nova atitude perante os problemas, marcada pelo dinamismo daesperança, que se exprime no discernimento crítico dos problemassociais, na denúncia de todas as formas de exclusão e de egoísmo e naparticipação solidária e responsável nas soluções;

b) A tomada de consciência da sociedade como comunidade cultural ,quadro de sentido da existência e da vida dos povos;

c)  A promoção de todas as formas de educação  para a vida, para oambiente, para os valores, para a cidadania, para a democracia, para asolidariedade e para o bem comum;

d) O incremento de tantas formas de voluntariado , num autênticoespírito de solidariedade e com poder efetivo de intervenção social;

e) A responsabilidade participativa  de todos no mundo da saúde, dahabitação, da escola, da comunicação social, do emprego, da economia,da política e da justiça;

f) A busca da nova identidade portuguesa , dinâmica e em construção,aberta a outros valores e culturas, capaz de construir pontes culturaiscom outros povos;

g) A construção de uma Europa baseada nos valores culturais e espirituais,

sendo a integração na União Europeia e o fenómeno da globalizaçãodesaos constantes à comunidade portuguesa.

Na mudança civilizacional que estamos a viver, o ponto de viragem parauma nova mentalidade está inscrito no coração humano: a pessoa realiza-seplenamente na medida em que se dá livremente aos outros. Disso dependea sua felicidade: «a felicidade está mais em dar do que em receber» (At 20,35).Daí a armação do princípio, válido para os crentes e para todas as pessoasde boa vontade: «é necessário procurar não o bem de um restrito círculode privilegiados, mas a melhoria das condições de vida de todos. Somentesobre este fundamento se poderá construir aquela ordem internacional,

orientada realmente para a justiça e a solidariedade, que todos almejam».

Carta Pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa , 2003

A pessoa que nunca errou foi aquela que nunca fez coisa alguma.Michel Quoist

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unidade 4 175

 A vocação de Abraão e a

descoberta do Deus únicoAbraão viveu por volta do século XIX a.C. no Próximo Oriente Antigo. Nesse

contexto, as migrações de povos em busca de melhores condições de sobrevivênciaeram comuns. A vida destes povos, que dependia da sua harmonia com a natureza,era constantemente ameaçada por forças imprevisíveis. Incapazes de exercer qualquerinfluência sobre essas forças, os povos prestavam-lhes culto, procurando aplacar osfenómenos naturais divinizados (politeísmo). Cada grupo tribal adorava os seusdeuses exprimindo, na devoção que lhes prestava, o seu medo e as suas aspirações de

 vida. Abraão era um homem perfeitamente integrado neste ambiente: prestava cultoaos deuses que herdara do seu pai, Taré.

Porém, na sua inquietude religiosa e humana, experimentou a presença de umDeus único e invisível, que não se confundia com nenhuma força natural (monoteísmo).Tratava-se de uma presença benevolente, viva e ativa. Pouco a pouco, foi descobrindoo rosto de Alguém inteiramente diferente de todas as divindades antigas. Já não eraa divindade que dependia dos desejos e das necessidades das pessoas; era Deusquem se tornava surpreendentemente presente, agindo como quem ama, do qual aexistência humana dependia. Abraão libertou-se, desta maneira, da religião dos seusantepassados e abraçou uma nova vida espiritual fundada na relação com o Deusúnico e pessoal. Descobriu assim a sua vocação, o seu projeto de vida.  Abraão, vitral

da Escola Inglesa

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unidade 46

Vocação de Abraão

OSenhor disse a Abraão:

— Deixa a tua terra, os teus parentes e a casa de teu pai e vai para a terra que eu te vou mostrar. 2Farei de

ti um grande povo; hei de abençoar-te e tornar-te famoso. O teunome será uma bênção. 3 Através de ti serão abençoados todos os povos do mundo.

4 Abraão pôs-se a caminho tal como o Senhor lhe tinha ordenado.Gn 12, 1-4

 Abraão parte de Ur ,por William Hole

T U R Q U I A

IRÃO

LÍBANO

ISRAEL

SÍRIA

EGITO

IRAQUE

JORDÂNIA

ARÁBIA

SAUDITA

KUWAIT

PALESTINA

MonteSinai 

Cairo   Petra

Bersabeia

HebronJerusalém

Ajloun

Bosra

Damasco

AlepoAntioquia

Gaziantep   Urfa

Harran

Ur 

R    i    o  

E    

u     

f         

r    a  

t   e  s   

Nabu s

0   400 km

Abraão confiou  naquela voz misteriosa que lhe preencheu o coração e abriupossibilidades imprevisíveis. Outrora vivia sob o medo da ação de forças estranhas,às quais prestava culto para estabelecer uma relativa harmonia com a natureza epreservar a sua família de todos os seus malefícios. Agora tornara-se o confidente deDeus, sinal de bênção para todos os povos e pai de um novo povo de crentes.

Entretanto, Abraão já era idoso, tal como a sua mulher, Sara. Como seria possíveltornar-se pai de um povo se não tinha descendentes? E Abraão pôs diante de Deusessa sua perplexidade.

Itinerário de Abraão

1

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unidade 4 177

 Promessa de um filho e de uma terra 

OSenhor apareceu a Abraão e disse-lhe:

— Não temas, Abraão, vais ter uma grande recompensa.2 Abraão respondeu:

— Ó Senhor, meu Deus, que podes tu dar-me se eu vou partirdeste mundo sem filhos? 3Sabes bem que não me deste filhos e umcriado meu é que vai ser o meu herdeiro.

4Mas o Senhor respondeu-lhe:— Um filho teu é que vai ser o teu herdeiro.5Deus mandou sair Abraão para fora de casa e disse-lhe:— Olha para o céu e vê se podes contar as estrelas. Pois assim

será o número dos teus descendentes.6 Abraão acreditou em Deus e por isso Deus aceitou-o como justo.

7Deus disse-lhe mais:— Eu sou o Senhor que te fez sair de Ur para te dar esta terra

como propriedade tua.Gn 15, 1-7

E Deus cumpriu efetivamente a sua promessa. Contra toda a expetativa, Sara teveum filho a quem deram o nome de Isaac o qual haveria de ser o pai de Jacob, que, porsua vez, seria o pai dos fundadores das doze tribos de Israel.

Sara e Isaac, por Escola Inglesa

Abraão

Rúben Simeão Levi Judá Dan Neftali Gad Asser Issacar Zabulão José Benjamim

Isaac

 Jacob

1

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unidade 48

Abraão é apresentado como o modelo do crente ideal, que sabe escutar Deus eacolher os seus projetos com obediência incondicional, com confiança total. Mesmoque as propostas de Deus pareçam incompreensíveis ou que os seus desafios interfiramcom os projetos humanos, o crente ideal acolhe os planos de Deus e realiza-os comfidelidade.

O comportamento de Abraão revela, antes de mais, o lugar absolutamentecentral que Deus ocupou na sua existência. Deus é, para Abraão, o  valor máximo,a prioridade fundamental; por isso, mostra-se disposto a oferecer a Deus o domtotal e irrevogável de si próprio, da sua família, do seu futuro, dos seus sonhos, dassuas aspirações, dos seus projetos, dos seus interesses. Para Abraão, nada mais contaquando estão em jogo os planos de Deus; nem o apego à sua terra de origem, nem odinheiro, nem o poder, nem o reconhecimento social, nem o sucesso.

Na sua relação com Deus, Abraão manifesta respeito, humildade, disponibilidade,obediência, confiança, amor e fé — atitudes que o definem como crente ideal emodelo para os crentes de todas as épocas.

Abraão ensina, ainda, a confiar em Deus, mesmo quando tudo parece cair à

nossa volta e quando os caminhos de Deus se revelam estranhos e incompreensíveis.Quando os nossos projetos se desmoronam, quando as nuvens negras da violência,da opressão se acastelam no horizonte da nossa existência, quando o sofrimento nosleva ao desespero, é preciso continuar a caminhar serenamente, confiando nesseDeus que é a nossa esperança e que tem um projeto de vida plena para nós e parao mundo.

A ideia de que a obediência de Abraão a Deus é fonte de vida para ele, para a suafamília e para todos os povos do mundo deve ser uma espécie de garantia que atesta a

 validade deste caminho. Fazer de Deus o centro da própria existência e renunciar aospróprios critérios egoístas e interesses mesquinhos para cumprir os planos de Deusnão é uma escravidão, mas um caminho de acesso à vida plena e verdadeira.

 Abraão e Isaac,por autor anónimo

 Abraão, Sara e um Anjo,

por Jan II Provost

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unidade 4 179

 A jornada de Abraão, por Gustave Dore

Doc. 77PartirHá algumas pessoas que nascem com «bicho-carpinteiro» ou leveza de

borboleta que nunca «aquecem» o lugar, outras vivem presas a teias dopassado endurecidas como as pedras de um cais sem coragem para zarpar.Entre umas e outras estão aquelas que ousam responder ao apelo do futuro e,

como Abraão, conar numa voz que chama mais além. Ponho-me a imaginar:a quantos fez Deus o mesmo apelo que Abraão escutou? Como amadureceunele esta capacidade de ouvir e a coragem de trocar a certeza pela promessa,a segurança pelo risco? Como foi capaz de vencer as inúmeras vozes, dentroe fora de si, que aconselhavam a prudência e a estabilidade da vida quelevava? Já tinha idade para ter juízo! Sim, mas falou mais forte o desejo de,com Sara e a descendência prometida, passar da solidão à comunhão, do«eu» ao «nós», construir uma casa com o seu nome, ser bênção como Deuslhe prometia.

A novidade não está em Abraão partir (quantos povos sempre se

movimentaram por razões de sobrevivência, ainda hoje com tantos dramasde fome e de guerra?); está na conança  naquele que o chama. Maisimportante que o longo caminho ou a meta a alcançar, o que é nova é estadescoberta de Deus que caminha entre os homens. E imprime no coração ena vida dos que aprenderam a escutá-lo esta disponibilidade constante parapartir. O caminho de Deus com os homens é para realizar, já na história, a justiça, a paz e o amor que o próprio Deus é. Então, saber com quem se vaié mais importante do que qualquer mapa!

Vítor Gonçalves, Jornal Voz da Verdade , 17/Fev/2008 (excerto)

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unidade 40

 O projeto de Paulo: a descoberta de Cristo comoeixo orientador da vida

Paulo, originariamente Saulo, nasceu por volta do ano 8 da era cristã, em Tarso,na Ásia Menor (atual Turquia), de uma família judaica da diáspora, que observavarigorosamente a religião dos seus pais. Simultaneamente, contactou com a vida ea cultura do Império Romano. Recebeu a sua primeira educação religiosa em

Tarso tendo por base a lei de Moisés e depois foi para Jerusalém aprofundar osseus conhecimentos religiosos com Gamaliel, mestre de grande prestígio. Estudouaramaico, hebraico, grego e latim. Aprendeu ainda uma profissão manual, o fabricode tendas, que lhe permitiu sustentar-se sem depender de ninguém.

Judeu convicto, Paulo estava convencido de que o Cristianismo era uma seitanociva que introduzia alterações injustificadas à religião dos seus antepassados. Porisso, perseguia com zelo os adeptos desta nova seita. Ainda adolescente, assistiu aoapedrejamento do diácono Estêvão, o primeiro mártir da Igreja cristã. Por volta doano 35, com cerca de 30 anos, dirigiu-se a Damasco, cidade da Síria, para surpreenderum grupo de cristãos e encarcerar, em Jerusalém, os seus chefes.

No entanto, já próximo de Damasco, Paulo teve uma experiência religiosa que

iria mudar radicalmente o curso da sua vida.São Paulo,

por Miguel Ângelo

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unidade 4 181

Após o encontro no caminho de Damasco, de perseguidor dos cristãos, Paulopassou a ser o mais brilhante missionário do Evangelho.

Dedicou o resto da sua vida a Cristo, numa contínua identificação com ele aoponto de poder dizer: «para mim viver é Cristo» (Fl 1, 21) ou «já não sou eu que vivo,é Cristo que vive em mim» (Gl 2, 20).

Em três viagens missionárias, sob constantes perigos, difundiu a mensagemcristã pelo império romano, permitindo, assim, que o Cristianismo ultrapassasse afronteira do povo judeu e abraçasse todos os povos que então eram conhecidos.

  Preso por causa do seu zelo no anúncio do Evangelho, Paulo acabou por serdecapitado, de acordo com a tradição, no ano 67, na Via Ostiense, a cinco quilómetrosdos muros de Roma.

1

O encontro com Cristo

Saulo não pensava senão em ameaças de morte contraos crentes no Senhor. Por isso, foi ter com o chefe dossacerdotes 2e pediu-lhe cartas de apresentação para as

sinagogas de Damasco e para lá prender os que seguiam o caminhodo Senhor. Quer fossem homens, quer fossem mulheres, ia levá-los presos para Jerusalém.

3Mas quando ia de viagem, já perto de Damasco, Saulo viu-se derepente envolvido pelo clarão de uma luz que vinha do céu. 4Caiu por terra e ouviu então uma voz que dizia:

— Saulo, Saulo, porque me persegues?5E ele perguntou:— Quem és tu, Senhor? A voz respondeu-lhe:— Eu sou Jesus, a quem tu persegues! 6Levanta-te, entra na

cidade e lá te dirão o que deves fazer. 7Os homens que viajavamcom Saulo pararam assustados, porque ouviram a voz mas nãoviram ninguém. 8Saulo levantou-se do chão. Tinha os olhos abertosmas não via nada. Tiveram de o levar para Damasco. 9Durante trêsdias ficou sem ver e nesses dias não comeu nem bebeu.

 At 9, 1-9

Conversão de São Paulo, porNicolas-Bernard Lépicié

São Paulo,por Diego Velazquez

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unidade 42

Melita

(Malta)

Siracusa

Régio

Praçade Ápio

ITÁLIARoma

Três Tavernas

Bons Portos

Rodes

Creta

M A C E D Ó N IA

Tessalónica

BereiaSamotrácia

Quios

 M a r   N e g r o

P O N T O

B I T Í N I A

G A L Á C I AMÍSIA   ÁSIAPérgamo

Esmirna

Antioquia

Éfeso

Mileto

LÍDIA   FRÍGIA

PoteóliFilipos

Trôade

LÍCIAMira

IcónioTarso

Antioquia

Listra

DerbePerge

PISÍDIALaodiceia

Cnido

Atenas

Pátmos

M   a   r    M  e  d     i    t    e    r     r     â    n   e   o

CAPADÓCIA

     F     E     N      Í    C

     I    A

     S      Í

     R     I     A

Damasco

Ptolemaida

Samaria

Jerusalém

Alexandria

Gaza

Cesareia

SalaminaPafos

Sídon

Tiro

Jope

Chipre

   C   I   L    Í   C

   I  A

E G I T O

L Í B I A

Cirene

Corinto     A

      C

     A

                    I

     A

0   400 km

PANFÍLIA

Primeira viagemSegunda viagemTerceira viagemViagem a Roma

ão Paulo pregando em Atenas,por Rafael

As viagens missionárias do apóstolo Paulo

Doc. 78 Paulo, perfil do homem e do apóstolo que tudo centra em

 Jesus CristoPaulo de Tarso, o «décimo terceiro apóstolo», brilha como estrela de primeira

grandeza na história da Igreja.

Nas suas Cartas , vai diretamente ao essencial e fala não só da visão que tevea caminho de Damasco, mas sobretudo de revelação e de vocação no encontrocom o Ressuscitado. Dene-se explicitamente «apóstolo por vontade de Deus»,para realçar que a sua conversão não era o resultado de um desenvolvimentode pensamentos, de reexões, mas o fruto de uma intervenção divina, de umaimprevisível graça divina. A partir daquele momento, tudo o que antes constituíapara ele um valor tornou-se paradoxalmente, segundo as suas palavras, «perda elixo». A partir daquele momento, todas as suas energias foram postas ao serviçoexclusivo de Jesus Cristo e do seu Evangelho. Dedicou-se totalmente a dar aconhecer este Evangelho, literalmente «boa notícia», isto é, anúncio de graça

destinado a reconciliar a pessoa com Deus, consigo mesma e com os outros.Desde o primeiro momento ele tinha compreendido que esta era uma realidadeque não dizia respeito só aos judeus ou a um certo grupo de pessoas, mas quetinha um valor universal e se referia a todos, porque Deus é o Deus de todos.

No apostolado de Paulo não faltaram diculdades, que ele enfrentou comcoragem por amor de Cristo. Ele mesmo recorda ter agido «pelos trabalhos…pelas prisões… pelos açoites, pelos frequentes perigos de morte… três vezesfui açoitado com varas, uma vez apedrejado; três vezes naufraguei… viagenssem conta, exposto a perigos nos rios, perigos de salteadores, perigos da partedos meus concidadãos, perigos na cidade, perigos no deserto, perigos no mar,

perigos entre os falsos irmãos; trabalhos e fadigas, repetidas vigílias com fome e

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unidade 4 183

sede, frequentes jejuns, frio e nudez! E além de tudo isto, a minha obsessão decada dia: o cuidado de todas as Igrejas» (2 Cor 11, 23-28).

Como não admirar um homem como este? É claro que não lhe teria sidopossível enfrentar situações tão difíceis e por vezes desesperadas, se não tivessehavido uma razão de valor absoluto, perante a qual nenhum limite se podiaconsiderar insuperável. Para Paulo, esta razão, sabemo-lo, é Jesus Cristo, do qualele escreve: «O amor de Cristo nos impulsiona… para que, os que vivem, nãovivam mais para si mesmos, mas para Aquele que por eles morreu e ressuscitou»,por nós, por todos.

É importante que nos apercebamos de quanto Jesus Cristo possa incidir navida de uma pessoa e portanto também na nossa própria vida. Na realidade, Jesus Cristo é o ápice da história salvíca.

Paulo já não vive para si, para a sua própria justiça. Vive de Cristo e comCristo: entregando-se a si mesmo: «Quanto a mim, porém, de nada me quero

gloriar, a não ser na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo estácrucicado para mim e eu para o mundo».

A pertença radical a Cristo e o facto que «existimos n’Ele» deve infundir-nosuma atitude de total conança e de imensa alegria. De facto, devemos exclamarcom São Paulo: «Se Deus está por nós, quem pode estar contra nós?». E a respostaé que ninguém «poderá separar-nos do amor de Deus que está em Cristo Jesus,Senhor nosso». Por conseguinte, a vida cristã baseia-se na rocha mais estável esegura que se possa imaginar. E dela tiramos toda a nossa energia, como escreveprecisamente o apóstolo: «De tudo sou capaz naquele que me dá força».

Bento XVI, Excertos da Audiência Geral de 25.10.2006

São Paulo escrevendo,

por Claude Vignon

SãoPaulo na prisão,por Escola Inglesa

São Paulo, por Marco Pino

 A fé como fonte de realizaçãoA experiência religiosa  dá um significado definitivo à vida  e consistência à

esperança. Não depende apenas da nossa vontade, mas é um dom de Deus que se fazpresente na vida de cada pessoa. No entanto, depende da nossa vontade acolhê-lo no

espaço mais profundo da nossa consciência onde caminha connosco.A experiência religiosa cristã manifesta-se na relação pessoal e comunitária

com Jesus Cristo, acolhendo-o e aceitando a sua presença atuante na própria vida.O contacto com Deus torna o crente capaz de se distanciar do desejo egoísta,

pondo a sua vida ao serviço dos outros. Amar é fazer uma opção preferencial pelooutro, que não enriquece o próprio desejo egoísta mas diminui os sonhos narcisistas.É a transformação do desejo egocêntrico em doação gratuita. Por isso, a experiênciareligiosa não fecha, nem pode fechar, o ser humano em si mesmo. Abre-o ao mundoe aos outros numa constante vontade de construção de uma sociedade mais justa ehumana onde todos tenham direito a um lugar e vejam reconhecida a sua dignidade.Ter fé é abraçar o amor que Deus é e transformá-lo em doação constante aos outros

que connosco partilham a vida.

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unidade 44

Doc. 79Conheço barcos

Conheço barcos que cam no portoCom medo das violentas e temíveis correntes.

Conheço barcos que adormecem no portoPara não arriscarem o futuro ausente.

Conheço barcos que se esquecem de zarpar.Por estarem a envelhecer, temem o tempoE a solidão das vagas e o fragor do vento…Viagem que termina antes de começar.

Conheço barcos tão amarradosQue ignoram ser possível sonhar.

Conheço barcos que cam paradosPor terem receio de se desencontrar.

Conheço barcos que velejam aos pares,Afrontando o temporal quando o furacão os fustiga.Conheço barcos que arranham as vigasNas rotas abertas no corpo dos mares.

Conheço barcos que regressam ao porto,Com rombos no casco, mas dignos e fortes.

Conheço barcos que são solidáriosPorque partilharam os ventos do Norte.

Conheço barcos que transbordam de amorPorque navegaram até ao último dia. Jamais recolheram as esplêndidas velas,No seu coração habita a ousadia.

Autor desconhecidoAdaptado de emrcdigital.com (21/04/2010)

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unidade 4 185

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