Manual Cardiogeratria

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Manual de Cardiogeriatria Programa de Educação Médica Continuada LIBBS 1ª Edição

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Programa de Educação Médica Continuada LIBBS

1ª EdiçãoEsta primeira edição do Manual de Cardiogeriatriatem como objetivo principal discutir, de forma objetivae eminentemente prática, a partir da avaliação daliteratura mais atualizada sobre o tema e da grandeexperiência dos autores médicos envolvidos, osprincipais tópicos relacionados ao diagnóstico etratamento das doenças cardiovasculares em idosos.Pretende-se também que ela sofra revisões periódicasa cada dois anos, que visam incorporar o enormevolume de informações científicas, que tem crescidode forma exponencial nos últimos anos.Creio que todos os autores convidados, aos quaisagradecemos a dedicação e vibração com queabraçaram a idéia, esperam que ela possa contribuirpara a melhora cada vez mais significativa do aten-dimento oferecido ao idoso cardiopata em nosso país.

Manual de Cardiogeriatria

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Manual de CardiogeriatriaCopyright© 2002 – Jairo Lins Borges

Proibida a reprodução total ou parcial deste livro, por qualquer meio ou sistema,sem prévio consentimento da editora, ficando os infratores sujeitos às penas

previstas em lei. Todos os direitos desta edição reservados a:

Lemos Editorial & Gráficos Ltda.Rua Rui Barbosa, 70 – Bela VistaSão Paulo, SP – CEP 01326-010

Telefax: (0xx11) 3371-1855Home-page: http://www.lemos.com.br

E-mail: [email protected]: Paulo Lemos

Diretor-superintendente: José Vicente De AngeloProdução editorial: Márcia Muniz da Mata e Sandra Regina dos Santos Santana

Diagramação: Rogério RichardRevisão: Companhia Editorial

Produção gráfica: Altamir França

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Impresso no Brasil2002

Borges, Jairo Lins/CoordenaçãoManual de Cardiogeriatria/ Jairo Lins Borges –São Paulo : Lemos Editorial, 2002.

Vários autores.Apoio: Libbs Farmacêutica Ltda.ISBN 85-7450

1. Manual de Cardiogeriatria I. Título

CDD-6161

Índice para catálogo sistemático:

1. Cardiogeriatria: Cardiologia: Medicina 6161

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Autores

Felício Savioli NetoMédico-Chefe do Serviço de Cardiogeriatria do Instituto DantePazzanese de Cardiologia de São Paulo.

Hélio M. MagalhãesDiretor Médico do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia de SãoPaulo.

Jairo Lins BorgesMédico do Serviço de Cardiogeriatria do Instituto Dante Pazzanesede Cardiologia de São Paulo. Médico Coordenador do Projeto.

Stela Maris GrespanMédica do Serviço de Cardiogeriatria do Instituto Dante Pazzanesede Cardiologia de São Paulo.

Marcelo Chiara BertolamiMédico-Chefe do Serviço de Dislipidemia do Instituto DantePazzanese de Cardiologia de São Paulo.

Otavio Rizzi CoelhoChefe da Disciplina de Cardiologia da FCM – Unicamp.

Willian CirilloMédico-Assistente de Cardiologia do HC – Unicamp.

Osvaldo Massayoshi UetiMédico-Assistente de Cardiologia do HC – Unicamp.

Fernando Abarca SchellineProfessor-Assistente e Chefe da Enfermaria de Cardiologia do HC –Unicamp.

Humberto PierriMédico do Serviço de Cardiogeriatria do Instituto do Coração doHCFMUSP.

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João B. Serro-AzulMédico do Serviço de Cardiogeriatria do Instituto do Coração doHCFMUSP.

Marcia Regina Pinho MakdisseMédica do Setor de Cardiogeriatria da Universidade Federal de São Paulo.

Antonio Carlos Pereira BarrettoProfessor Associado da USP. Diretor do Serviço de Prevenção eReabilitação do Instituto do Coração (InCor) – HCFMUSP.

Zilda MeneghelloMédica-Chefe do Serviço de Valvulopatias do Instituto DantePazzanese de Cardiologia de São Paulo.

José Luiz SantelloCardiologista. Doutor em Nefrologia pela FMUSP. Assistente da Ligade Hipertensão do HCFMUSP.

André d’AvilaMédico da Unidade Clínica de Arritmia e Marca-Passo do Institutodo Coração (InCor) – HCFMUSP.

Anísio PedrosaMédico da Unidade Clínica de Arritmia e Marca-Passo do Institutodo Coração (InCor) – HCFMUSP.

Leandro ZimermanMédico do Serviço de Cardiologia do Hospital das Clínicas de PortoAlegre, RS.

Dalmo Antonio Ribeiro MoreiraChefe da Seção Médica de Eletrofisiologia e Arritmias Cardíacas doDepartamento de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanesede Cardiologia de São Paulo.

Cecília Maria Barroso QuaglioMédica Responsável pela Unidade de Anticoagulação do Serviço deValvulopatias do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia de SãoPaulo.

Michel BatlouniDiretor do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia de São Paulo.Professor de Pós-Graduação em Cardiologia da FMUSP. Livre-Docente de Clínica Médica da FMUFGO.

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Apresentação

A cardiogeriatria é uma especialidade razoavelmente nova no âmbitoda cardiologia clínica. Ela tem funcionado na prática como um “enorme”grupo de pesquisa, que procura integrar cardiologistas, clínicos e geriatrasdo mundo inteiro, interessados em entender e tratar melhor as doençascardiovasculares e suas formas de manifestação, muitas vezes peculiarese atípicas ou silenciosas, no paciente idoso. Ao mesmo tempo, contribui,de forma indiscutível, para a valorização e a dignificação do idoso, emum contexto mundial cada vez mais voltado para a tecnologia e acapacidade de ação produtiva, características muito ligadas a populaçõesmais jovens.

Deve-se sempre ter em mente, no entanto, que, por sua grandeexperiência e conhecimento acumulados, os idosos muito têm a contribuirpara o desenvolvimento de um mundo melhor e menos árido. Quandopoderíamos classificar um indivíduo como idoso? Após a aposentadoria,por exemplo? Do ponto de vista prático, talvez mais para efeito de pesquisaclínica, estabeleceu-se que idosos são aqueles que ultrapassaram a linhadivisória cronológica dos 65 anos. Alguns, no entanto, já falam em 75 ou80 anos como o momento do limiar da senilidade. Aspectos ligados àintegração e expectativa pessoal em relação à vida, ao grau deindependência individual, à aparência biológica, à função cognitiva e àqualidade de vida do idoso parecem mais importantes que a frieza de umcorte cronológico que fatalmente contém em seu bojo elevada carga desubjetividade. Cada vez mais, são oferecidos ao idoso procedimentosdiagnósticos e terapêuticos invasivos, inclusive, visando reduzir amorbimortalidade das doenças cardiovasculares, consideradas de longeas que mais afligem e dizimam esse segmento populacional. Tudo isso,no entanto, deve ser regido por elevado grau de bom senso, respeitando-sesempre o direito de escolha do paciente e de seus familiares.

Esta primeira edição do Manual de Cardiogeriatria tem comoobjetivo principal discutir, de forma objetiva e eminentemente prática, apartir da avaliação da literatura mais atualizada sobre o tema e da grande

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experiência dos autores médicos envolvidos, os principais tópicosrelacionados ao diagnóstico e tratamento das doenças cardiovascularesem idosos. Pretende-se também que ela sofra revisões periódicas a cadadois anos, que visam incorporar o enorme volume de informaçõescientíficas, que tem crescido de forma exponencial nos últimos anos.

Nosso país é tão rico em pesquisadores e escritores médicos comelevado grau de excelência nessa área que muitos nomes de destaquenacional e internacional não foram incluídos neste compacto manual.Isso, no entanto, só vem enobrecer a medicina brasileira, celeiro farto degrandes talentos.

Todos os colegas que acessarem este manual prático estão convi-dados a participar de suas atualizações, mediante críticas e suges-tões, que poderão ser encaminhadas pelo endereço eletrô[email protected]

Creio que todos os autores convidados, aos quais agradecemos adedicação e vibração com que abraçaram a idéia, esperam que ela possacontribuir para a melhora cada vez mais significativa do atendimentooferecido ao idoso cardiopata em nosso país.

Por fim, gostaríamos de agradecer ao laboratório Libbs Farmacêuticaque eticamente, por meio de seu programa de educação médicacontinuada, patrocinou a publicação deste manual prático, jamaisinfluenciando o conteúdo científico da obra ou o direito de cada autormanifestar seu pensamento, de forma livre e irrestrita.

Jairo Lins BorgesCoordenador do Projeto

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Índice

1 - O Envelhecimento e o Sistema Cardiovascular

Alterações vasculares ...................................................... 14Alterações cardíacas ....................................................... 14Alterações autonômicas .................................................. 15Referências bibliográficas ............................................... 17

2 - Doença Coronária Crônica no IdosoIntrodução ....................................................................... 19Importância e epidemiologia .......................................... 22Diagnóstico ...................................................................... 23Estratificação de risco ..................................................... 24Fatores de risco............................................................... 26Tratamento clínico ........................................................... 29Tratamento intervencionista ............................................. 35Referências bibliográficas ............................................... 41

3 - Fatores de Risco para Doença Coronáriaem Idosos

Referências bibliográficas ............................................... 54

4 - Peculiaridades da C ardiopatia IsquêmicaAguda no Idoso

Manuseio e evidências clínicas ....................................... 59Técnicas de revascularização do miocárdio .................. 61Conclusão ........................................................................ 62Referências bibliográficas ............................................... 63

5 - Doença Arterial Periférica em IdososAterosclerose periférica ................................................... 67Doença de pequenos vasos ............................................ 72

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Fenômeno de Raynaud ................................................... 73Referências bibliográficas ............................................... 74

6 - Hipertensão Arterial no IdosoEpidemiologia .................................................................. 75Aspectos fisiopatológicos ................................................ 76Peculiaridades clínicas .................................................... 77Considerações terapêuticas ............................................ 78Principais medicamentos ................................................ 80Conclusões ...................................................................... 83Referências bibliográficas ............................................... 83

7 - Hipotensão e Síncope no IdosoSíncope ............................................................................ 87Classificação .................................................................... 90Avaliação diagnóstica ...................................................... 94Tratamento ....................................................................... 97Medidas gerais ................................................................ 97Tratamento específico ..................................................... 97Referências bibliográficas ............................................... 99

8 - Insuficiência Cardíaca nos IdososFisiopatologia ................................................................ 102Diagnóstico .................................................................... 106Tratamento ..................................................................... 106Tratamento medicamentoso ......................................... 108Digital e diuréticos ......................................................... 108Inibidores da enzima conversora e antagonistas

dos receptores da angiotensina II ............................ 110Betabloqueadores ......................................................... 113Considerações finais ..................................................... 114Referências bibliográficas ............................................. 115

9 - Valvulopatia no IdosoIntrodução ..................................................................... 119Estenose aórtica ............................................................ 120Insuficiência mitral ......................................................... 124Insuficiência aórtica ....................................................... 126Estenose mitral .............................................................. 127A escolha da prótese ..................................................... 129

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Profilaxia da endocardite ............................................... 130Referências bibliográficas ............................................. 132

10 - Disfunção Renal no Paciente CardiogeriátricoAvaliação da função renal ............................................. 136Preservação da função renal:

estratégias gerais ..................................................... 137Referências bibliográficas ............................................. 143

11 - Tratamento das Arritmias Cardíacasno Paciente Idoso

Introdução ..................................................................... 145Bradiarritmias ................................................................ 146Taquiarritmias ................................................................ 148Tratamento farmacológico ............................................ 149Tratamento não-farmacológico ..................................... 153Diretrizes do DAEC para ablação por

cateter das arritmias cardíacas ................................ 154Taquicardia sinusal inapropriada .................................. 155Taquicardia atrial ........................................................... 155Ablação da junção AV ................................................... 156Fibrilação atrial .............................................................. 156Flutter atrial .................................................................... 157Taquicardia por reentrada nodal ................................... 158Síndrome de Wolff-Parkinson-White e outras vias

acessórias da condução atrioventricular .................. 158Taquicardia ventricular idiopática .................................. 160Taquicardia ventricular com

cardiopatia estrutural ................................................ 160Diretrizes do DAEC para o implante do cardioversor-

desfibrilador automático ........................................... 161Prevenção primária ....................................................... 162Prevenção secundária ................................................... 162Referências bibliográficas ............................................. 164

12 - Fibrilação Atrial em IdososIntrodução ..................................................................... 169Apresentação clínica ..................................................... 170

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Sinais e sintomas ........................................................... 171Tratamento ..................................................................... 172Restabelecimento do ritmo sinusal ............................... 172Controle da resposta ventricular ................................... 174Tratamento da fibrilação atrial paroxística .................... 174Tratamento da fibrilação atrial persistente .................... 175Anticoagulação precedendo a

cardioversão da fibrilação atrial ............................... 177Prevenção de recorrências ........................................... 178Tratamento da fibrilação atrial permanente .................. 180Referências bibliográficas ............................................. 181

13 - Anticoagulação Oral no Paciente IdosoIntrodução ..................................................................... 185Tromboembolismo ........................................................ 185Complicações hemorrágicas ........................................ 187Mecanismo de ação dos anticoagulantes orais ............ 188Anticoagulantes orais .................................................... 188Monitorização ................................................................ 189Controle ambulatorial .................................................... 189Indicações ..................................................................... 190Índice terapêutico.......................................................... 190Interações medicamentosas ......................................... 191Dieta ............................................................................... 191Definição do risco anual de eventos

tromboembólicos ...................................................... 192Manuseio perioperatório ................................................ 193Manuseio de pacientes com valores

elevados de INR ....................................................... 193Conclusão ...................................................................... 193Referências bibliográficas ............................................. 195

14 - Farmacologia e Terapêutica Cardiovascularno Idoso

Alterações farmacocinéticasrelacionadas à idade ................................................ 198

Alterações farmacodinâmicasrelacionadas à idade ................................................ 202

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Fármacos cardiovasculares .......................................... 204Glicosídeos digitálicos ................................................... 204Diuréticos ....................................................................... 205Bloqueadores beta-adrenérgicos ................................. 206Antagonistas dos canais de cálcio ................................ 207Nitratos .......................................................................... 208Inibidores da enzima conversora

da angiotensina ........................................................ 208Agentes fibrinolíticos ...................................................... 209Fármacos hipolipemiantes ............................................ 209Fármacos antiarrítmicos ................................................ 210Princípios e recomendações para a

terapêutica farmacológica no idoso ......................... 211Referências bibliográficas ............................................. 213

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Capítulo 1

O Envelhecimentoe o Sistema

CardiovascularFelício Savioli Neto

Hélio M. Magalhães

A expectativa de vida média do brasileiro vem aumentandosignificativamente nos últimos anos, proporcionando um maior númerode idosos na população geral. Assim, neste inicio de século, o Brasilcomeça a apresentar tendências de envelhecimento populacional1. Entreas doenças com maior incidência nessa população, as patologiascardiovasculares são as mais freqüentes. Aproximadamente 50% dospacientes atendidos em ambulatório de cardiologia são idosos, e cercade 50% dos idosos atendidos em ambulatório de geriatria apresentampelo menos uma cardiopatia. Portanto, antes de conhecermos aspeculiaridades das principais cardiopatias que acometem a populaçãogeriátrica é fundamental o conhecimento sobre as alteraçõescardiovasculares observadas com o processo natural de envelhecimento.Tais alterações, apesar de muito bem estabelecidas na literatura,apresentam intensidade com grande variação individual, proporcionandouma freqüente dissociação entre as idades biológica e cronológica. Assim,é comum observarmos pacientes cronologicamente idosos, masfisiologicamente jovens e vice-versa. Não obstante, identificar o momentono qual o adulto torna-se idoso é uma missão praticamente impossível,pois o processo de envelhecimento é contínuo e sem limites definidos,além de, ser acompanhado de alta prevalência da doença arterial coronáriae de importantes alterações no estilo de vida. A freqüente intersecçãoentre esses três fatores estabelece nosso grande desafio: identificar as

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alterações próprias do envelhecimento. Por outro lado, nem sempre épossível diferenciar os efeitos fisiológicos do envelhecimento sobre osistema cardiovascular daqueles provocados por cardiopatias e/ou estilode vida sedentário.

O objetivo deste capítulo é descrever as principais alterações car-diovasculares observadas com o processo natural de envelhecimento, naausência de cardiopatias ou influências de estilo de vida, adotando comodefinição de idoso todo indivíduo com idade ≥ 65 anos.

Alterações vascularesCom o avançar da idade as grandes artérias tornam-se mais rígidas,

suas paredes mais espessas e suas formas mais alongadas e dilatadas. Aperda progressiva de tecido elástico, o acúmulo de tecido conjuntivo e odepósito de cálcio são as principais razões para tais alterações2. Conse-qüentemente se observa importante redução na distensibilidade parietaldas grandes artérias, em especial a aorta, clinicamente evidenciada peloaumento na velocidade de propagação da onda de pulso3. O enrijecimentodas grandes artérias promove elevação dos níveis de pressão sistólica(dentro dos limites normais), aumento da impedância aórtica e subse-qüente aumento na espessura da parede ventricular esquerda2. Entre asidades de 20 e 80 anos observa-se um acréscimo de 25% a 30% nosníveis de pressão sistólica4, correspondendo aproximadamente aoacréscimo de 1 mmHg por ano em homens e mulheres com idades até70 anos, e 1,2 mmHg nas mulheres com mais de 70 anos5. A pressãodiastólica não sofre modificações significativas com o envelhecimento.Berman et al., estudando os efeitos do envelhecimento sobre o sistemacardiovascular, observaram um acréscimo de 30% na espessura daparede ventricular esquerda, na oitava década de vida, e aumento nodiâmetro da aorta ascendente, na ordem de 9% por década4.

Alterações cardíacasO processo natural de envelhecimento está associado ao aumento da

pós-carga acompanhado de discreto aumento na espessura da paredeventricular esquerda, porém, com índices ecocardiográficos mantendo-sedentro dos limites da normalidade (< 11 mm)6. Estudos necroscópicos eecocardiográficos demonstraram que o aumento na espessura do septo

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e da parede livre do ventrículo esquerdo é de apenas 0,3 mm por década,entre os 30 e 70 anos7,8.

O espessamento da parede ventricular associado à progressiva perdade miócitos e subseqüente substituição destes por tecido fibroso sãodeterminantes para o aumento na rigidez ventricular. Assim, com adiminuição da complacência e subseqüente aumento da pressão diastólicado ventrículo esquerdo, observa-se aumento nas dimensões do átrioesquerdo2. Do ponto de vista funcional, aumenta-se a importância daparticipação atrial no enchimento ventricular. Assim, o impacto do processonatural de envelhecimento sobre a função cardiovascular está direcionadoàs propriedades diastólicas do coração (Tabelas 1 e 2).

O estudo da função diastólica é realizado de forma indireta, geralmentepelo eco-doppler-cardiograma, através de seis diferentes índices. Spiritoet al. estudaram esses índices em 86 voluntários, com idades entre 20 e74 anos e concluíram que o índice que melhor se correlacionou com oavançar da idade foi a velocidade do fluxo diastólico máximo final9. Arelação tempo–velocidade de enchimento ventricular inicial (E) e final(A) é significativamente menor nos idosos, quando comparada com osmais jovens10.

A função sistólica não é comprometida pelo processo natural deenvelhecimento. Gerstenblith et al., através da ecocardiografia, estudarama função sistólica de 105 indivíduos saudáveis, com idades entre 25 e 84anos e concluíram que a fração de ejeção do ventrículo esquerdo não sealterava com o avançar da idade6.

Alterações autonômicasOs níveis plasmáticos de adrenalina e noradrenalina aumentam com

a idade. A hiperatividade simpática promove dessensibilização progressivados receptores adrenérgicos cardíacos e vasculares, comprometendo osmecanismos contra-regulatórios. Assim, os idosos apresentam respostanormal ao estímulo alfa-adrenérgico e atenuada ao estímulo beta-adrenérgico (Tabela 3).

Durante esforço físico, o aumento da freqüência cardíaca é menosintenso do que nos jovens. Nos idosos, a resposta cardiovascular diantedo esforço físico é parecida com aquela observada nos jovens sob efeitode drogas betabloqueadoras.

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Tabela 2Modificações funcionais

Tabela 3Modificações autonômicas

Tabela 1Envelhecimento cardiovascular

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Referências bibliográficas1. Ministério do Planejamento e Orçamento. Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística – IBGE. Anuário Estatístico do Brasil. Grupos Populacionais Específicos.Rio de Janeiro, 1996, vol. 56, pp.2-612-72.

2. Lakata EG. Cardiovascular system. In: Masoro EJ (ed.). Aging. Handbook ofphysiology. Oxford University Press, 1995, pp. 413-74.

3. Nichols WW, O'Rourke MF, Avolio AP, Yagin-Uma T, Murgo JP, Pepine CJ, ContiCR. Effects of age on ventricular-vascular coupling. Am J Cardiol 1985;55:1179-84.

4. Berman ND. Geriatric cardiology Lexington, MA: The Collamore Press, DCHealth&Co,1982, pp. 1, 111, 205.

5. Landahl S, Bengtsson C, Sigurdsson JA et al. Age-related changes in blood pressure.Hypertension 1986;8:1044-9.

6. Gerstenblith G, Fredericksen J,Yin FCP et al. Echocardiographic assessment of anormal adult aging population. Circulation 1977;56:273-8.

7. Kitzman DW, Scholz DG, Hagen PT et al. Age-related changes in normal humanhearts during the first 10 decades of life. Party II (maturity): a quantitative anatomicstudy of 765 specimens from subjects 20 to 99 years old. Mayo Clinic Proc1988;63:137-46.

8. Gardin JM, Henry WL, Savage DD et al. Echocardiographic measurements innormal subjects: evaluation of an adult population without clinically apparentheart disease. Journal of Clinical Ultrasound 1979;7:439-47.

9. Spirito P, Maron BJ. Influence of aging on Doppler echocardiographic índices ofleft ventricular function. Br Heart J 1988;59:673.

10. Bryg RJ, Williams GA, Labovitz AJ. Effect of aging on left ventricular diastolicfilling in normal subjects. Am J Cardiol 1987;59:971.

11. Pfeifer MA et al. Differential changes of autonomic nervous system function withage in mam. Am J Med 1983;76:249.

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Capítulo 2

Doença CoronáriaCrônica no Idoso

Jairo Lins BorgesStela Maris Grespan

IntroduçãoA doença coronária crônica (DCC) constitui um sério problema de

saúde pública1 nos países ocidentais. Sua incidência tem se elevado, àmedida que aumenta o número de idosos (≥ 65 anos), o maior contingentepopulacional portador dessa afecção. A angina do peito, sua manifestaçãomais expressiva, está presente em cerca de 50% dos casos. Nos últimosanos, a partir do melhor conhecimento de sua fisiopatologia, tanto otratamento farmacológico quanto o intervencionista da DCC evoluíramconsideravelmente. Todo esse avanço tecnológico permitiu ao pacienteidoso experimentar grande benefício em termos de redução de morbimortali-dade dessa síndrome clínica, que apresenta elevado potencial de gravidade.

A angina estável crônica se caracteriza por dor ou desconforto naface anterior do tórax, com irradiação para mandíbula, ombros, membrossuperiores ou região dorsal, desencadeada ou agravada por esforço físicoou estresse emocional e aliviada pelo afastamento do agente precipitanteou pela utilização de nitroglicerina sublingual.

O diagnóstico de angina do peito é fundamentalmente clínico e suapresença indica, como regra, a existência de lesão aterosclerótica signi-ficativa (≥ 70%), envolvendo pelo menos um vaso coronário epicárdicomaior. A dor precordial pode, no entanto, apresentar etiologia não rela-cionada à doença aterosclerótica coronária (DAC), sendo, por vezes, atri-buída a condições cardiovasculares outras, como: cardiomiopatia hipertró-fica, valvulopatias e hipertensão arterial sistêmica (HAS) não controlada.

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A lesão aterosclerótica coronária, mesmo quando inaparente ao estudocinecoronariográfico, pode ser responsável por espasmo coronário oumodificações do tônus desses vasos, levando ao surgimento de crisessúbitas de dor precordial e à variabilidade do limiar anginoso.

Com freqüência, o médico é confrontado com a necessidade de estabe-lecer o diagnóstico diferencial entre angina do peito, precordialgia atípicae dores de origem não relacionada ao sistema cardiovascular. O pacienteidoso costuma apresentar alterações osteomusculares e gastroesofágicas,facilmente confundidas com manifestações da DCC. Deve-se ter em men-te que essas condições clínicas podem, inclusive, coexistir com a doençaisquêmica coronária. Os estudos clássicos de Diamond e Forrester2 nadécada de 1970 demonstraram que a avaliação cuidadosa permiteestabelecer, com elevado grau de certeza, o risco de existência de DAC(Tabela 1), a partir da análise das características clínicas da dor e devariáveis simples como idade e sexo. Observa-se que com o aumento daidade, mesmo dores consideradas atípicas apresentam maior correlaçãocom DAC. Muitas vezes, no entanto, esses sintomas não são valorizadospelo paciente ou mesmo pelo médico, chegando a ser consideradoscaracterísticos do processo natural de envelhecimento.

A isquemia silenciosa (IS) é encontrada em 20% a 50% dos idosos3-

5, sendo identificada normalmente através do teste ergométrico (TE) ouda eletrocardiografia dinâmica (Holter). Estima-se que 80% dos episódiosisquêmicos sejam silenciosos15. A IS constitui um marcador de risco futurode eventos coronários maiores (morte ou infarto do miocárdio).Constituem fatores de risco para IS: idade avançada, DAC estabelecida,hipertrofia ventricular esquerda (HVE), obesidade e doença ateros-clerótica de membros inferiores (MMII).

Tabela 1Probabilidade de existência de DAC em pacientes sintomáticos, de acordo com a idade

e o sexo (combinação de dados de Diamond e Forrester, com o estudo CASS)Angina típica Precordialgia Dor torácica de origem

atípica não-cardiovascularIdade (anos) Homem (%) Mulher Homem (%) Mulher Homem (%) Mulher

30-39 76 26 34 12 4 240-49 87 55 51 22 13 350-59 93 73 65 31 20 760-69 94 86 72 51 27 14

Doença Coronária Crônica no Idoso

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Fatores de comorbidade, como anemia, hipertireoidismo, obesidade,insuficiência cardíaca (IC) descompensada, infecções, febre e doençade Paget óssea, aumentam a atividade adrenérgica e podem promoverdesequilíbrio entre a oferta e o consumo miocárdico de oxigênio,precipitando episódios anginosos ou simulando agravamento da doença.A identificação e correção desses fatores, muitas vezes é suficiente pararestaurar a condição de estabilidade e permitir a manutenção do tratamentoclínico convencional.

A classificação da angina do peito da Sociedade Canadense de Cardiolo-gia6 (Tabela 2) é utilizada na prática clínica para definir a gravidade eprogressão da DCC. Dor precordial precipitada apenas por esforços maioresque os habituais está em geral relacionada a melhor prognóstico, enquantoo aparecimento de angina em repouso, a mínimos esforços ou em caráterprogressivo, constitui marcador de maior gravidade.

A doença aterosclerótica não-coronária inclui a doença cerebrovas-cular e a doença arterial periférica de MMII. Sua presença é mais comumno idoso e, em geral, está associada a processo aterosclerótico maisgeneralizado, com elevada incidência de DAC, mesmo entre pacientesque não apresentem indícios clínicos de DCC. Estudo desenvolvido naCleveland Clinic 14 demonstrou que a realização de cinecoronariografia

Doença Coronária Crônica no Idoso

Tabela 2Classificação da angina do peito da Sociedade Canadense de Cardiologia (CCS)

Classificação da CCS Perfil clínico Capacidadefuncional(em METS)

Classe I Atividades habituais não provocam dor. 7A dor surge apenas aos grandes esforços,como correr ou carregar peso.

Classe II A dor provoca apenas discreta restrição 5da capacidade de efetuar atividadeshabituais.

Classe III A dor provoca grande limitação da 2capacidade de efetuar atividades habituais.

Classe IV A dor é extremamente limitante, < 2surgindo em repouso ou impedindo aexecução de atividades básicas, comoalimentar-se, trocar-se ou tomar banho.

MET – Unidade metabólica de consumo de O 2; 1 MET = 3,5 ml/kg/min (equivalente a permanecer sentado einativo). Ver Anexo II.

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rotineira em pacientes que iam submeter-se a cirurgia vascular periféri-ca eletiva permitiu identificar a existência de algum grau de envolvimentoaterosclerótico coronário em 90% dos casos e a presença de doençatriarterial grave em 28% dos pacientes avaliados.

Importância e epidemiologiaAlgo em torno de 60% dos casos de infarto agudo do miocárdio

(IM) ocorrem em pessoas com idade ≥ 65 anos, dos quais 30% envolvempacientes com idade superior a 75 anos7,8. A mortalidade hospitalar porIM é três vezes maior no idoso. Cerca de 80% das mortes decorrentesde IM ocorrem em pacientes idosos9. A morbidade do IM é tambémelevada em idosos, resultando com freqüência em limitação decapacidade funcional, disfunção ventricular esquerda e IC.

Eventos coronários maiores são duas a três vezes mais freqüentesem pacientes que apresentam IS, sobretudo quando esse sinal clínicoocorre em pacientes com IC ou arritmias ventriculares. Desse modo, aidentificação de IS em idosos reveste-se de grande importância clínica eprognóstica.

A mortalidade da DAC (Figura 1) eleva-se exponencialmente, com oavançar da idade, tanto no sexo masculino quanto no feminino. Pacientes

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Figura 1 – Mortalidade média da DAC, por idade e sexo, nos Estados Unidos em1993. 1997 Heart and Stroke Statistical Update. Dallas (Texas), American HeartAssociation, 1996.

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idosos coronariopatas apresentam também maior prevalência de doençamultiarterial e níveis mais rebaixados de fração de ejeção do ventrículoesquerdo (FEVE)10.

Diagnóstico

Embora a angina clássica de esforço seja uma forma comum de mani-festação da DCC no idoso, ela pode não ser detectada, mesmo em fasesavançadas da doença, devido à elevada prevalência de sedentarismonessa faixa etária e à coexistência de doenças incapacitantes, tanto doponto de vista funcional quanto do cognitivo. Por essa razão, os quadrosisquêmicos agudos (angina instável, infarto ou morte súbita), são comfreqüência, a primeira forma de manifestação de DAC no idoso.

Em muitos casos, no entanto, a dispnéia de esforço, devido a efeitosisquêmicos sobre as funções sistólica e/ou diastólica do miocárdio, podeser a forma de apresentação da DCC no idoso. Essa condição é conhecidaclinicamente como equivalente anginoso.

Em estudo clínico de avaliação de pacientes idosos com DAC docu-mentada, a angina do peito foi encontrada isoladamente em 25% a 43%dos casos; a dispnéia isolada em 8% a 25% dos casos e a combinaçãode angina e dispnéia em quase 50% dos pacientes11.

A IS é também uma forma de manifestação freqüente da doença emidosos12, sobretudo em presença de fatores como: HAS, tabagismo, diabe-tes melito (DM) e entre pacientes que utilizam antiinflamatórios não-hormonais regularmente. O elo comum entre essas associações pareceser uma alteração da capacidade de percepção da dor.

A isquemia miocárdica pode manifestar-se na forma de descompen-sação aguda de IC13 ou como edema agudo de pulmão, sobretudo empresença de HAS e de alterações eletro ou ecocardiográficas compa-tíveis com o diagnóstico de HVE.

Arritmias cardíacas, sintomáticas ou não, embora consideradas inespe-cíficas, podem estar relacionadas à doença isquêmica coronária no idoso,podendo levar, inclusive, à morte súbita, mesmo antes da identificaçãode sua etiologia.

O exame físico freqüentemente é considerado normal. A presençade bulhas acessórias, sopros e de indícios clínicos de insuficiência cardícaou de lesões ateroscleróticas em outros leitos vasculares, pode levar àsuspeita de DAC crônica.

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O eletrocardiograma e o ecocardiograma simples podem fornecersubsídios valiosos para a avaliação diagnóstica e prognóstica da DACmanifesta ou latente. Com freqüência, pode-se identicar, através dessesexames, a existência de áreas isquêmicas ou necróticas do miocárdio,mesmo em idosos assintomáticos ou sem diagnóstico estabelecido deDAC. A radiografia simples de tórax permite a visualização da área car-díaca, da presença de calcificação ou dilatação da aorta e da situação dacirculação pulmonar, bem como a identificação de derrame pleural, forteindicador da existência de IC.

Estratificação de riscoPacientes idosos com diagnóstico estabelecido ou sob suspeita de

apresentarem DAC crônica podem ser mantidos em tratamento clínico,sem que haja necessidade de indicação de estudo angiográfico coronárioinvasivo. Os excelentes índices de sensibilidade e especificidade dosmétodos não-invasivos de diagnóstico atualmente disponíveis (Tabela3) permitem estabelecer com segurança o diagnóstico e prognóstico dadoença, na grande maioria dos casos.

Uma vez estabelecido o diagnóstico clínico de DAC crônica estável,o passo seguinte deve ser a definição imediata do prognóstico que podeser obtido com facilidade pela realização de exames não-invasivos dediagnóstico. São indicados normalmente o TE simples e os métodos deimagem que utilizam técnicas de medicina nuclear ou ecocardiografia,associadas ao TE simples ou à indução farmacológica de respostavasodilatadora coronária ou isquêmica do miocárdio. Embora acrescentem

Tabela 3Sensibilidade e especificidade dos exames não-invasivos utilizados

no diagnóstico da DAC16,17

Método diagnóstico Sensibilidade Especificidade No de No de(média) % (média) % estudos pacientes

TE simples 68 77 132 24.074CPM planar 79 (70-94) 73 (43-97) 6 510CPM por técnica 88 (73-98) 77 (53-96) 8 628de SPECTEcocardiograma de 76 (40-100) 88 (80-95) 10 1.174estresseTE – Teste ergométrico; CPM – Cintilografia de perfusão miocárdica; SPECT – Tomografiacomputadorizada por emissão de fóton único.

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informações importantes, quando comparados ao TE simples, porpermitirem a localização específica e a avaliação da extensão da áreaisquêmica miocárdica em risco, além de poderem avaliar in loco aresposta do ventrículo esquerdo ao agente provocador de isquemia, osmétodos de imagem não parecem superiores ao TE simples, quando seconsidera a importante questão da relação custo–efetividade16, excetoquando o paciente não tiver condições de deambular na esteira ou operfil do ECG de repouso (Tabela 4) não permitir a interpretação con-fiável do comportamento do segmento ST.

A interpretação do TE simples como positivo ou negativo, baseando-seapenas na análise isolada do comportamento do segmento ST do ECG,constitui simplificação perigosa e deve ser evitada. Outras informaçõesimportantes são acrescentadas pela avaliação dos seguintes dados: capa-cidade funcional do paciente, ocorrência de manifestações clínicas du-rante a prova e análise de parâmetros hemodinâmicos, como comporta-mento da pressão arterial, da freqüência cardíaca e do duplo produto(PAS x FC), indicador indireto do consumo miocárdico de O2.

Recentemente, um estudo publicado pela Duke University18, que avalioupacientes com diagnóstico de DAC estabelecida, concluiu que parâmetrosextraídos do TE convencional permitem o estabelecimento do risco deocorrência de eventos coronários maiores nos próximos quatro anos.Construiu-se uma equação simples, baseada no tempo total de esforçodesenvolvido na esteira (convertido em número de METS), no grau deinfradesnivelamento do segmento ST durante o exame e na presença ounão de dor típica durante a prova. O resultado (Tabela 5) é dado emnúmero absoluto e representa o que os autores denominaram escore deTE da Duke University.

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Tabela 4Indicações para realização preferencial de exames não-invasivos que utilizam

método de imagem na avaliação diagnóstica e prognóstica da DCC1

• Bloqueio de ramo esquerdo ao ECG de repouso.• Síndrome de pré-excitação ao ECG de repouso.• Ritmo de marca-passo artificial.• Infradesnivelamento do segmento ST > 1 mm ao ECG de repouso.• Paciente incapacitado para deambular na esteira ergométrica.• DAC estabelecida e passado de revascularização miocárdica.

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Um escore de TE ≥ 5 indica excelente prognóstico nos próximosquatro anos (sobrevida: 99%; mortalidade anual: 0,25); escore de TE< -10, indica risco elevado de evento coronário maior (sobrevida: 79%;mortalidade anual: 5%).

O estudo cinecoronariográfico, embora possa prestar-se a esclareci-mento diagnóstico em situações específicas, deve ser indicado apenas,como regra, quando se tem elevado grau de certeza da necessidade derealização de um procedimento terapêutico invasivo (angioplastia oucirurgia de revascularização miocárdica). Pacientes que após estratifica-ção não-invasiva de risco (Tabela 6) apresentem mortalidade anual ≥3% são candidatos ideais para cinecoronariografia. Fica claro, no en-tanto, que esse não deve ser encarado como um modelo matemáticofechado, mas como um princípio geral de orientação, útil para ajudar adefinir a melhor decisão a ser tomada, em cada caso.

As recomendações da ACC/AHA e o nível de evidência paraindicação de estudo cinecoronariográfico em pacientes portadores deDCC estável estão apresentados na tabela 7.

Fatores de riscoO impacto dos fatores de risco para DAC aumenta com a idade. O

controle desses fatores parece revestir-se de importância ainda maiorno idoso. Os fatores de risco modificáveis mais importantes são: HAS,dislipidemia, DM, sedentarismo, obesidade e tabagismo.

A pressão arterial sistólica (PAS) eleva-se progressivamente com oavançar da idade. Sabe-se hoje que a hipertensão sistólica isolada temmaior correlação com risco de doenças cardiovasculares que a elevaçãoda pressão diatólica (PAD). Pacientes com idade > 65 anos, com níveisde PAS > 180 mmHg, têm aumento de três a quatro vezes no risco dedesenvolver DAC, em comparação com níveis de PAS < 120 mmHg.

Tabela 5Escore prognóstico de TE da Duke University

Escore de TE = Tempo total de esforço – 5 x infradesnivelamento – 4 x índice(convertido em METS) do segmento ST ao TE de angina

MET – Unidade metabólica de consumo de O 2; 1 MET = 3,5 ml/kg/min.Índice de angina – 0: ausência de dor ao TE; 1: dor típica ao TE; 2: dor típica que obriga à suspensão do TE;TE – Teste ergométrico.

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Tabela 6Mortalidade média anual da DAC1 avaliada pela estratificação não-invasiva de risco

Nível de risco Perfil do parâmetro avaliadoElevado (mortalidade • Disfunção ventricular esquerda grave emanual ≥ 3%) repouso (FEVE < 35%).

• Escore de TE da Duke University ≤ -11.• Disfunção ventricular esquerda grave ao

esforço (FEVE < 35%).• Defeito extenso de perfusão à CPM (sobretudo

se envolve a parede anterior).• Múltiplos defeitos de perfusão à CPM, de

extensão moderada.• Defeito extenso e fixo de perfusão à CPM, com

dilatação do VE ou aumento da captaçãopulmonar de tálio.

• Defeito moderado de perfusão à CPM, comdilatação do VE ou aumento da captaçãopulmonar de tálio.

• Alteração localizada da contratilidademiocárdica ao ecocardiograma de estresse,envolvendo > 2 segmentos e surgindo combaixas doses de dobutamina (≤ 10 mg/kg/min)ou com FC baixa (< 120 bpm).

• Evidência ecocardiográfica de isquemiamiocárdica extensa.

Médio (mortalidade • Disfunção ventricular leve a moderada emanual > 1% e < 3%) repouso (FEVE entre 35% e 49%).

• Escore de TE da Duke Universityentre ≥ -10 e < 5.

• Defeito moderado de perfusão à CPM, semdisfunção do VE ou hipercaptaçãopulmonar de tálio.

• Alteração localizada de contratilidademiocárdica ao ecocardiograma de estresse,envolvendo ≤ 2 segmentos.

Baixo (mortalidade • Escore de TE da Duke University ≥ 5.anual ≤ 1%) • Defeito discreto de perfusão à CPM ou

captação miocárdica normal de tálio.• Contratilidade normal do VE ao ecocar-

diograma de estresse, ou alterações discretasde contratilidade, limitadas ao ecocardiogramade repouso.

FEVE – Fração de ejeção do ventrículo esquerdo; CPM – Cintilografia de perfusão miocárdica; TE – Testeergométrico; VE – Ventrículo esquerdo; FC – Freqüência cardíaca.

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Tabela 7Recomendações da ACC/AHA1 para cinecoronariografia*

em portadores de angina estável crônicaClasse I • Paciente com angina limitante (classe III ou IV da CCS), apesar de

estar em uso de medicação plena.• Paciente considerado de risco elevado (mortalidade anual ≥ 3%)

pela estratificação não-invasiva de risco.• Paciente com DCC que sobreviveu à parada cardiorrespiratória ou

apresentou arritmia ventricular grave.• Pacientes com DCC e indícios clínicos de ICC.• Paciente com características clínicas que indiquem alta

probabilidade de doença isquêmica coronária grave.Classe IIa • Paciente com disfunção ventricular significativa (FEVE < 45%), em

classe I ou II da CCS, com isquemia demonstrável por examenão-invasivo, mas considerado de risco baixo ou médio pelaestratificação não-invasiva.

• Paciente que persiste com prognóstico indefinido apósestratificação não-invasiva.

Classe IIb • Paciente em classe I ou II da CCS, com função ventricularpreservada (FEVE > 45%) e com nível de risco baixo ou médio àestratificação não-invasiva de risco.

Classe III • Paciente em classe I ou II da CCS, que responde ao tratamentofarmacológico e que não apresenta evidência de isquemia aosexames não-invasivos.

• Paciente que não aceita tratamento intervencionista.*Ver Anexo I; CCS – Sociedade Canadense de Cardiologia; FEVE – Fração de ejeção do ventrículo esquerdo;DCC – Doença coronária crônica; ICC – Insuficiência cardíaca congestiva.

Níveis diastólicos > 105 mmHg elevam esse risco em duas a três vezes,em relação a PAD < 75 mmHg19.

Os níveis séricos de colesterol começam a cair aos 65 anos na mulher eaos 50 no homem. Cerca de 20% dos homens e 40% das mulheres idosasapresentam hipercolesterolemia. A relação colesterol total/HDL-colesterolconstitui importante marcador de risco para DAC no idoso20. Níveis elevadosde triglicérides, no entanto, parecem apresentar associação independentecom risco de DAC apenas no sexo feminino21. Grandes estudos clínicos queutilizaram estatinas na prevenção secundária de eventos cardiovascularesmaiores demonstraram benefícios em idosos com idade até 75 anos22.

A prevalência de DM em idosos é da ordem de 12% a 13%. A grandemaioria dos diabéticos, com idade > 70 anos, apresenta DM tipo II ounão-insulinodependente. O DM dobra o risco de DAC e, quando coexistecom dislipidemia, eleva esse risco em 15 vezes23.

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Entre 30% e 50% dos idosos não praticam atividade física regular-mente. O exercício físico regular eleva o HDL-colesterol, ajuda a con-trolar a obesidade, a dislipidemia, a glicemia e a HAS. O estudo deFramingham24 demonstrou que mesmo atividade física moderada podeter efeito protetor contra eventos coronários maiores.

O controle da obesidade ajuda a melhorar o perfil metabólico do idosoe a reduzir os níveis de pressão arterial.

A prevalência do tabagismo em idosos é de cerca de 15% no sexomasculino e 11,5% no feminino. No estudo CASS, pacientes com idade> 70 anos, com DAC estabelecida, que continuaram a fumar apresentaramrisco três vezes maior de sofrer um evento coronário grave42.

Os novos fatores de risco encontram-se sob intensa investigação nomomento atual; não existem informações suficientes para permitir umadefinição exata de seu papel na DAC do paciente idoso. Níveis elevadosde homocisteína não são incomuns no homem idoso e têm forte correlaçãocom elevação da prevalência de doença coronária e cerebrovascular25.O eventual papel da depressão e do isolamento social, como fator derisco para DAC, também está sendo investigado em vários estudosclínicos.

Tratamento clínicoMuitos pacientes idosos portadores de DCC devem ser mantidos

apenas em tratamento clínico, que deve seguir critérios rigorosos, deacordo com a literatura atual1,26,27.

Os medicamentos utilizados no tratamento farmacológico da DACcrônica estável podem ser agrupados em duas classes:

• Agentes farmacológicos que reduzem eventos coronários maiorese têm, portanto, influência direta na redução da morbimortalidadeda doença. São eles: antiagregantes plaquetários; betabloqueadoresapós infarto do miocárdio ou na presença de IC; hipolipemiantes;insulina e antidiabéticos orais; inibidores da enzima de conversãoda angiotensina (ECA).

• Agentes farmacológicos que controlam as manifestações isquêmicase anginosas da doença, melhorando a qualidade de vida do paciente,aumentando sua capacidade funcional e ajudando a evitar anecessidade de tratamento intervencionista. São eles: betablo-queadores senso lato; nitratos; antagonistas de canais de cálcio;

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trimetazidina e novos agentes (ranolazina e nicorandil), nãodisponíveis em nosso meio.

Apresentaremos a seguir, orientações sobre a utilização de cada umadessas classes farmacológicas específicas:

Antiagregantes plaquetários – Publicado em 1995, o estudo dos“trialistas” representou uma revisão sistemática da literatura disponívelaté o ano de 1990 sobre agentes antiplaquetários. Recentemente28, omesmo grupo da Universidade de Cambridge ampliou essa avaliação,que passou a incluir 200 mil pacientes analisados. Foram incluídos estudosque compararam o ácido acetilsalicílico (ASA) com placebo ou outrosagentes antiplaquetários. O objetivo principal do estudo foi avaliar o riscode eventos cardiovasculares maiores, definidos como: infarto domiocárdio, acidente vascular cerebral (AVC) não-fatal ou morte de origemcardiovascular. Observou-se redução de 22 eventos maiores (p = 0,0005),para cada 1.000 pacientes portadores de angina estável crônica queutilizaram antiagregantes plaquetários. O ácido acetilsalicílico em dosesbaixas (75 mg a 150 mg/dia) constitui, de acordo com esse documento, oagente antiplaquetário de primeira escolha na DCC. O clopidogrel podeser utilizado como alternativa apenas em caso de intolerância ou contra-indicação ao ASA. O estudo SAPAT 29, considerado um clássico naavaliação de antiplaquetários na angina estável crônica, incluiu mais de2.000 pacientes com idade média de 67 anos. O ASA, na dose de 75 mg/dia foi testado contra placebo. Após seguimento médio de 50 meses,ficou demonstrado que os pacientes que utilizaram ASA (Figura 2)obtiveram redução de 34% (p = 0,003) no risco de ocorrência de eventoscoronários maiores.

Betabloqueadores – Os betabloqueadores constituem agentes deprimeira escolha no controle das manifestações isquêmicas e anginosasda DCC. São também capazes de reduzir o risco de IM, morte súbita ea mortalidade global de pacientes que já sofreram IM, sejam eles idososou jovens30-32.Em idosos, utilizam-se preferencialmente agentes hidrofílicoscomo atenolol e nadolol, por apresentarem menor incidência de reaçãoadversa sobre o sistema nervoso central, efeito colateral comum nessafaixa etária. Portanto, após IM, o uso regular de betabloqueadores torna-semandatório. Em pacientes com diagnóstico de IC, secundária amiocardiopatia dilatada ou disfunção sistólica do VE, o uso regular debetabloqueadores específicos (carvedilol, metoprolol e bisoprolol)

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Figura 2 – Estudo SAPAT.

Número de pacientes sob risco em cada braço do tratamentoObjetivos principais – gráfico cumulativo (ASA = ácido acetisalicílico)

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demonstrou reduzir eventos cardiovasculares maiores e também deveser considerado obrigatório. O carvedilol foi o agente mais avaliado naIC e apresenta excelente perfil de flexibilidade posológica. Deve seriniciado na dose de 6,25 mg/dia, visando atingir progressivamente a doseplena (50 mg/dia).

Hipolipemiantes – O uso regular de estatinas está indicado paratodos os pacientes portadores de DCC, que não conseguirem atingir níveisde LDL colesterol < 100 mg/dl, através das medidas não-farmacológicas.Os fibratos estão indicados para pacientes que persistirem com níveis detriglicérides elevados, o que normalmente se acompanha de redução doHDL-colesterol.

Diabetes – O controle do DM exige a redução da glicemia de jejum,da pós-prandial e da hemoglobina glicada; o tratamento intensivo temdemonstrado correlacionar-se à redução do risco de complicações tantomicro quanto macrovasculares da doença.

Inibidores da ECA – Os inibidores da ECA foram recentementeavaliados em um grande estudo clínico denominado HOPE33, que incluiu

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quase 10 mil pacientes com idade ≥ 55 anos e diagnóstico de doençaaterosclerótica estabelecida (coronária, cerebrovascular ou de MMII) ediabéticos com mais um fator de risco para DAC. Esse estudo,considerado um marco histórico da medicina, demonstrou que a utilizaçãoregular de ramipril na dose de 10 mg/dia reduzia em 22% (p = 0,001) orisco de eventos cardiovasculares maiores. Observou-se também reduçãodo risco de desenvolvimento de IC e DM. A figura 3 demonstra osprincipais achados desse estudo. Portanto, a utilização regular deinibidores da ECA torna-se mandatória em pacientes portadores de DCC.

Nitratos – Os nitratos constituem os medicamentos mais utilizadosem todo o mundo no momento atual, no tratamento das manifestaçõesisquêmicas e anginosas da DCC. Além de eficazes e seguros, são muitoversáteis, combinando-se facilmente com betabloqueadores e antagonistasde cálcio. O mononitrato de isossorbida de liberação prolongada (LP)apresenta diversas vantagens sobre as formulações convencionais denitratos. A comodidade da dose única diária facilita a vida do idosocoronariopata, obrigado muitas vezes a utilizar vários medicamentos

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Figura 3 – Principais resultados do estudo HOPE.

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simultaneamente, em regimes posológicos complexos. O mononitrato LPnão induz desenvolvimento de tolerância e apresenta amplo espectroposológico (30 mg a 240 mg/dia). Estudo recente34, desenvolvido no ReinoUnido (Tabela 4), incluiu 1.212 pacientes que foram acompanhados por6 meses e demonstrou que o mononitrato de isossorbida LP, na dose de60mg/dia, foi superior às formulações de nitrato de liberação rápida,reduzindo em 35% o número de crises de angina e aumentando em 50%o índice de adesão ao tratamento.

Uma situação razoalvelmente freqüente na prática clínica é o controleinadequado dos sintomas da DCC, pela utilização de agentesantianginosos isolados ou em combinação, o que pode ou não indicarprogressão da doença e necessidade de investigação invasiva. Importanteestudo clínico desenvolvido no Reino Unido35, incluiu 1.014 pacientesque apresentavam controle inadequado da angina do peito, apesar depoderem utilizar betabloqueadores, antagonistas de cálcio e nitratos deliberação rápida, isoladamente ou em combinação. Após um período de15 dias, em que o tratamento pôde ser intensificado, o mononitrato LP(60 mg/dia) foi acrescentado ao regime posológico adotado ou substituiunitratos de liberação rápida em uso. O mononitrato de isossorbida LPreduziu de 10 para menos de 5 o número de crises anginosas semanais epermitiu que o número de pacientes que passaram a poder realizar suasatividades habituais sem restrições aumentasse em 60%. Os principaisresultados desse estudo estão apresentados na figura 4.

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Tabela 8Resultado da análise comparativa entre mononitrato de isossorbida

LP e nitratos de liberação rápidaItem aferido Mononitrato de Melhora percentual pela

isossorbida LP p utilização do mononitrato(odds ratios) de isossorbida LP

Índice de mobilidade 0,83 < 0,001 17%Efeitos colaterais 0,99 0,85 -No de ataques anginosos 0,64 < 0,001 36%No de ataques anginosos 0,65 0,006 35%entre 8 e 10 horas da manhãBem-estar psicológico 0,87 0,036 13%Aderência ao tratamento 0,50 < 0,001 50%Angiology 1997;48:855-63.

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Figura 4 – Redução do número de crises de angina/semana (A) e aumento (%) donúmero de pacientes que passaram a grau funcional II da CCS após a introdução domononitrato de isossorbida LP.

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Antagonistas de cálcio – Os antagonistas de canais de cálcio podemser divididos em dois grupos: agentes não-diidropiridínicos (verapamil ediltiazem), medicamentos que têm perfil de ação algo similar ao dosbetabloqueadores e podem ser utilizados em substituição a algo seme-lhante, em caso de intolerância ou contra-indicação aos betabloqueadores;agentes diidropiridínicos (nitrendipina, anlodipina, nifedipina, etc.), queapresentam algumas vantagens sobre os não-diidropiridínicos: têm menorefeito inotrópico negativo, não atuam inibindo a atividade do nó sinusalou a condução AV e podem ser combinados mais facilmente com betablo-queadores, para controle sintomático da DAC crônica.

Tratamento intervencionistaPacientes idosos portadores de DCC costumam apresentar impor-

tantes fatores de comorbidade, envolvimento de múltiplos vasos coronáriose maior comprometimento do VE, o que aumenta o índice de complicaçõesdos procedimentos intervencionistas. Podem, no entanto obter grandebenefício dessa modalidade de tratamento.

Os principais objetivos do tratamento invasivo são: prevenir eventoscoronários maiores, decorrentes de alterações clínicas definidas comode alto risco, e melhorar a qualidade de vida e a capacidade funcional depacientes que não obtiveram controle sintomatológico satisfatório, atravésdo tratamento farmacológico.

Tanto as técnicas de intervenção percutânea quanto a cirurgia derevascularização miocárdica (RM) evoluíram muito nos últimos anos etêm demonstrado resultados bastante satisfatórios no tratamento da DACdo idoso no momento atual36-39. Os índices de sucesso alcançados nãoparecem diferentes dos obtidos em pacientes mais jovens.

A angioplastia transluminal coronária (ATC) apresenta algumasvantagens, que podem ser consideradas importantes na DAC do idoso.São elas: realização rápida e fácil, ausência de necessidade de anestesiageral ou toracotomia, baixos índices de morbimortalidade e recuperaçãoimediata, permitindo a rápida retomada da atividade normal. Apresentatambém algumas desvantagens: maior incidência de necessidade dereintervenção, maior dificuldade de alcançar revascularização completae de abordar lesões mais complexas ou difusas. As tabelas 9 e 10 apresen-tam as principais indicações para ATC na DCC e o nível de evidência darecomendação.

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Tabela 9Recomendações e nível de evidência do ACC/AHA40 para ATC* em pacientes com

DCC estável, assintomáticos ou em classe funcional I da CCSGrau de recomendação Perfil do pacientee nível de evidênciaClasse I Não-diabético, em classe I da CCS ou com isquemiaNível de evidência: B silenciosa, com lesão em 1 ou 2 coronárias (abordáveis

por ATC e responsáveis por extensa área de isquemiamiocárdica) e com baixo risco de desenvolvercomplicações.

Classe IIa Mesmo perfil da classe I, porém o(s) vaso(s)Nível de evidência: B com lesão aterosclerótica provoca(m) isquemia

miocárdica de extensão média.Classe IIb Classe I da CCS ou com isquemia silenciosa, comNível de evidência: B lesão em ≥ 3 vasos (abordáveis por ATC com alta

probabilidade de sucesso e responsáveis por isquemiamiocárdica moderada ou extensa) e com baixo risco dedesenvolver complicações.

Classe III Classe I da CCS, que não preenchem os requisitos dasNível de evidência: C classes I, IIa e IIb acima citadas ou com as seguintes

características: lesão coronária responsável porisquemia miocárdica de pequena extensão; ausência deisquemia detectável objetivamente; lesões complexas ede difícil abordagem por ATC; sintomas discretos eprovavelmente não relacionados à DAC; lesão detronco de coronária esquerda; lesão obstruindo < 50%do diâmetro luminal; risco elevado de desenvolvercomplicações.

*Ver Anexo I.

A cirurgia de RM apresenta como vantagens em relação à ATC sualonga durabilidade e a alta probabilidade de conseguir promoverrevascularização miocárdica mais completa. Suas desvantagens são:morbimortalidade imediata mais elevada, período de convalescençaprolongado e custo operacional elevado. A tabela 11 apresenta as principaisindicações da cirurgia de RM da ACC/AHA41.

Como se pode observar, existe sobreposição de indicações entre acirurgia de RM e a ATC, quando confrontamos as duas diretrizes, originadasdas mesmas instituições40,41. Como regra geral, quanto maior a extensãoe complexidade das lesões coronárias, bem como o número de vasosenvolvidos e o grau de disfunção ventricular esquerda, maior anecessidade de indicação cirúrgica. Pacientes idosos, uni ou biarteriais,com lesões favoráveis à abordagem por ATC (sempre que possível,

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Tabela 10Recomendações e nível de evidência do ACC/AHA40 para ATC*

em pacientes com DCC, em classe funcional II a IV da CCSGrau de Perfil clínico e nível de evidênciarecomendaçãoClasse I Paciente com uma ou mais lesões significativas (≥ 70%), em um

ou mais vasos coronários passível(is) de abordagem por ATCcom alta probabilidade de sucesso e responsável(is) porisquemia miocárdica de média ou grande extensão, com baixorisco de desenvolver complicações. Nível de evidência: B.

Classe IIa Paciente com lesões focais em pontes de veia safena ou comlesões coronárias múltiplas, considerado de alto risco paracirurgia de revascularização miocárdica. Nível de evidência: C

Classe IIb Paciente com uma ou mais lesões coronárias, de difícilabordagem por ATC ou responsável(is) por isquemia miocárdicade pequena extensão. Paciente com lesão aterosclerótica de 2 ou3 vasos, com envolvimento importante do terço proximal dadescendente anterior e disfunção do VE ou em tratamento dediabetes. Nível de evidência: B.

Classe III Paciente sem evidência objetiva de infarto ou isquemiamiocárdica, que não foi submetido a tratamento farmacológicoanteriormente ou com as seguintes características:Área de miocárdio em risco de pequena extensão.Lesão(ões) coronária(s) de difícil abordagem por ATC.Risco elevado de desenvolver complicações.Lesão(ões) responsável(is) por obstrução < 50% do diâmetroluminal.Nível de evidência: C.Lesão importante de tronco de coronária esquerda.Nível de evidência: B.

*Ver Anexo I.

incluindo colocação de stents), devem preferencialmente ser submetidosa essa modalidade de tratamento.

A idade per se não constitui contra-indicação para procedimentoterapêutico intervencionista, porém, sobretudo tratando-se de pacientemuito idoso (≥ 80 ou, segundo alguns autores, ≥ 84 anos), devem-seconsiderar rigorosamente as condições clínicas do paciente e a relaçãorisco–benefício de todas as modalidade de tratamento atualmentedisponíveis. Em todos os casos, no entanto, independentemente deconsiderações técnicas, por mais elegantes e fundamentadas que sejam,a decisão do paciente e de seus familiares deve ser sempre respeitada eacatada.

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Tabela 11Recomendações do ACC/AHA41 para cirurgia de RM* em pacientes com DCC estável

Grau de Perfil clínicorecomendaçãoClasse I Lesão significativa de tronco de coronária esquerda (TCE).

Lesão significativa (≥ 70%), considerada tronco-equivalente,envolvendo 1/3 proximal de DA e Cx.

Paciente triarterial, sobretudo com FEVE < 50%.Lesão significativa do 1/3 proximal de DA, em paciente uni oubiarterial, com FEVE < 50% e/ou isquemia miocárdica degrande extensão, detectável objetivamente.

Lesão significativa de 1 ou 2 vasos coronários, semenvolvimento do 1/3 proximal de DA, mas com isquemiamiocárdica de grande extensão, detectável objetivamente eestratificação não-invasiva classificada como de alto risco.Angina de difícil controle, apesar de uso pleno do tratamentofarmacológico e risco cirúrgico aceitável. Se a dor for atípica,deve-se proceder à investigação não-invasiva de isquemiamiocárdica.

Classe IIa Lesão significativa do 1/3 proximal de DA, em paciente uni oubiarterial, que não preenche os critérios da classe I acima citada.Lesão significativa de 1 ou 2 vasos coronários, semenvolvimento do 1/3 proximal da DA, mas com isquemiamiocárdica de moderada extensão, detectável por métodonão-invasivo de diagnóstico.

Classe IIb Lesão significativa de 1 ou 2 vasos coronários, semenvolvimento significativo do 1/3 proximal de DA, que nãopreenche os critérios das classes I e IIa acima citadas.

Classe III Lesão significativa de 1 ou 2 vasos, sem envolvimento do 1/3proximal de DA, em pacientes com sintomas leves,provavelmente não relacionados à DAC ou que não foramanteriormente submetidos a uma tentativa de controle portratamento farmacológico e apresentam isquemia miocárdicade pequena extensão ou não-demonstrável por métodonão-invasivo de diagnóstico.

Lesões coronárias consideradas limítrofes (50% a 60%), nãoenvolvendo o tronco da coronária esquerda e sem isquemiadetectável por método não-invasivo de diagnóstico.

Lesões coronárias consideradas não significativas (< 50%).DA – Coronária descendente anterior; Cx – Coronária circunflexa; * Ver Anexo I.

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Doença Coronária Crônica no Idoso

Anexo IClassificação da recomendação e do nível de evidência de procedimentos diagnósticos eterapêuticos, de acordo com o estipulado pela American Heart Association (AHA) e

pelo American College of Cardiology (ACC)Classe I – Condição para a qual há evidência favorável e/ou concordância geral deque o procedimento ou o tratamento é benéfico, útil e efetivo.Classe II – Condição para a qual as evidências são conflitantes ou as opiniões sãodivergentes/controversas acerca da utilidade/eficácia do procedimento ou tratamento.Classe IIa – O peso da evidência ou da impressão clínica é favorável à utilidade/eficácia.Classe IIb – A utilidade/eficácia do procedimento/tratamento não parecemestabelecidos pela evidência/impressão clínica.Classe III – Condição em que há evidência ou concordância geral de que oprocedimento/tratamento não é útil/efetivo e, em alguns casos, pode serprejudicial.

Níveis de evidência:A – Dados derivados de múltiplos estudos randomizados envolvendo grande

número de pacientes.B – Dados derivados de poucos estudos randomizados ou que incluíram

pequeno número de pacientes ou ainda análise cuidadosa de estudos não-randomizados ou registros observacionais.

C – Quando a base primária para a recomendação se baseou em consenso deespecialistas.

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Anexo IIIProtocolos mais usados em teste de esforço

Bruce Gasto Ellestadenergético

V Inc T METS V Inc Tmph % mn mph % mn1,7 10 3 4 1,7 10 32,5 12 3 7 3,0 10 23,4 14 3 9 a 10 4,0 10 24,2 16 3 12 5,0 10 25,0 18 3 15 5,0 15 2

mph – milhas por hora; T – tempo; mn – minutos; METS – Unidade, metabólica de consumo de O 2.

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Doença Coronária Crônica no Idoso

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Capítulo 3

Fatores de Risco paraDoença Coronária

em IdososMarcelo Chiara Bertolami

A população idosa é a que mais tem crescido nos últimos anos. Diantedas medidas preventivas e terapêuticas que a medicina moderna temdisponibilizado para um número cada vez maior de pessoas, essecrescimento tende a aumentar cada vez mais. A doença ateroscleróticacoronariana (DAC) é bastante prevalente entre os idosos, sendo a maiorcausa de morbidade e mortalidade nos indivíduos acima de 65 anos.Apesar da alta prevalência de doença anatômica (70% por estudos denecrópsia 1 ), somente 10% a 20% das pessoas acima de 65 anosapresentam diagnóstico de DAC ativa. A razão dessa discrepância entreas prevalências anatômica e clínica nos idosos é desconhecida, podendoser, pelo menos em parte, devida à falta de dados específicos sobre aDAC em idosos, à doença diagnosticada erroneamente, à alta prevalênciade doença silenciosa, à pouca atividade física e ao subtratamento dosfatores de risco nas faixas etárias mais elevadas.

A importância do conhecimento dos fatores de risco que predispõemà DAC reside no fato de que a possibilidade de intervenção sobre elespode trazer benefícios na prevenção primária ou secundária da doença.Muitos deles são importantes também na gênese da doença ateroscleróticade outros territórios, particularmente cerebral, desencadeando o acidentevascular cerebral isquêmico ou os episódios de isquemia cerebraltransitórios, além da isquemia dos membros inferiores. Entretanto, a

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interferência dos fatores de risco é diferente de acordo com o territórioem questão. As dislipidemias e o tabagismo influeciam mais sobre acirculação coronária; na circulação cerebral a maior influência decorreda hipertensão arterial, enquanto que na circulação periférica há influênciaprincipalmente do diabetes melito e do tabagismo. A razão dessasdiferenças permanece, até o momento, desconhecida.

Enquanto a importância dos fatores de risco para DAC está bemestabelecida para as populações de jovens e adultos, muita discussãoexiste se esses fatores permanecem importantes após os 65 anos. Entende-seque à medida que os indivíduos vão envelhecendo, o fator de risco idadevai tendo cada vez mais influência. Embora o risco relativo dependentede cada fator de risco vá diminuindo com o envelhecimento, o riscoabsoluto aumenta. Dessa forma, em muitas situações, a importância dedeterminado fator de risco é maior entre os idosos do que entre os maisjovens, o que leva a maior benefício para essa faixa etária, com o controledesses fatores de risco.

A DAC é uma doença multifatorial, embora muitas vezes possaaparecer em pessoas sem qualquer fator de risco evidenciável. Dessaforma, a investigação sobre outros fatores de risco, denominados “novos”ou “emergentes”, é amplamente justificada. Este é o caso da Lp(a), dahomocisteína, do fibrinogênio, dos fatores inflamatórios (particularmentea PCR ultra-sensível), entre outros.

A maioria dos estudos de prevenção da DAC por meio da atuaçãosobre fatores de risco analisou intervenções isoladas sobre um únicofator de risco. Isso se deveu principalmente à necessidade do estabe-lecimento de causalidade entre o fator de risco e a doença coronária.Entretanto, na prática clínica, muitos pacientes apresentam múltiplosfatores de risco em conjunto (exemplo clássico é o da síndromemetabólica), sendo que a atuação sobre eles deve ser feita de formaabrangente, podendo trazer benefícios maiores que os mostrados pelosestudos de intervenção unifatorial.

Outro aspecto importante que cabe analisar é que, enquanto na prevençãosecundária os estudos são muito sugestivos de benefícios da intervençãosobre os fatores de risco, na prevenção primária muitas dúvidas ainda sãocolocadas. Assim, para idosos isentos de manifestações da DAC, deve-selevar em conta, na decisão da intervenção ou não, não apenas a idadecronológica dos indivíduos, mas principalmente a idade biológica. Desse

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modo, muitos idosos poderão ser submetidos à intervenção sobre eventuaisfatores de risco que apresentem, porque têm perspectiva de vida livre dedoença, bastante apreciável. Por outro lado, para casos de idosos portadoresde demência ou limitações importantes à qualidade ou ao tempo de vida,não seria justificável a adoção de medidas preventivas.

A seguir, são analisados dados sobre os principais fatores de riscopara DAC em idosos e como intervir sobre eles.

Hipertensão arterial – É o fator de risco mais importante em idosos.É discutida em outro capítulo deste manual.

Tabagismo – O tabagismo é um problema comum em idosos e estáassociado com aumento significativo do risco de desenvolvimento dedoença cardíaca. No Systolic Hypertension in the Elderly Program(SHEP), por exemplo, fumantes ativos tiveram 73% de aumento no riscode DAC2. Os mecanismos pelos quais o consumo do tabaco aumenta aprevalência da aterosclerose ainda não são completamente entendidos,sendo várias as propostas: o fumo está associado à piora do perfil lipídico(aumento dos triglicérides e diminuição do HDL-colesterol) e à insulino-resistência; radicais livres presentes no cigarro danificam os lípides,resultando em partículas lipoprotéicas oxidadas e pró-aterogênicas; ofumo produz diminuição da paraoxonase, enzima associada à HDL queprotege as lipoproteínas da modificação oxidativa; o fumo produz ativaçãodo sistema nervoso simpático, o que leva ao aumento da freqüência car-díaca e da pressão arterial.

Atenção tem sido dada aos fumantes passivos, uma vez que estudostêm mostrado que eles também apresentam maior prevalência de eventosateroscleróticos3.

Estudos observacionais indicam que a interrupção do fumo é benéficapara ambos os sexos e em todas as faixas etárias4.

Técnicas comportamentais e farmacológicas podem ser empregadasno manuseio da interrupção do vício. Particular sucesso tem sidodemonstrado com o emprego da nicotina (goma, transdérmica, inalaçãoou spray nasal) e/ou da bupropiona.

Dislipidemias – Tem havido alguma controvérsia sobre a importânciada hiperlipidemia como fator de risco para eventos coronarianos em idososacima dos 70 anos2,5,6. Entretanto, há evidências de que, enquanto o riscorelativo referente às dislipidemias diminui com a idade, o risco absolutoaumenta significativamente, justificando medidas de atuação para

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tratamento. Não é comum encontrarem-se idosos apresentando grandesdesvios lipídicos. Nessa faixa etária, deve ser dada especial atenção paraa possibilidade de hiperlipidemias secundárias, particularmentehipotireoidismo, diabetes e insuficiência renal crônica.

Da mesma forma que em populações mais jovens, o primeiro passopara o tratamento das dislipidemias envolve modificações do estilo devida, particularmente em relação a alimentação, atividade física eabandono do tabagismo. Os idosos, em geral, não apresentam grandesdesvios alimentares; no entanto, têm grande dificuldade em implementarmudanças de hábitos alimentares. Da mesma forma, a implementação daatividade física regular não é simples, mas deve sempre ser tentada,mesmo com exercícios leves, desde que regulares. Nos cuidadosalimentares para controle da hipercolesterolemia é importante adiminuição do consumo de alimentos ricos em gorduras saturadas e emcolesterol, além do aumento do consumo de frutas, vegetais, legumes ecereais. Para tratamento da hipertrigliceridemia deve ser feita restriçãode gorduras, açúcar e doces, massas e álcool.

Não existem, até o momento, estudos de intervenção sobre os lípidesséricos que tenham abrangido exclusivamente populações de idosos.Entretanto, três grandes estudos clínicos envolvendo o tratamento lipídicoem idosos até os 75 anos de idade com DAC conhecida (prevençãosecundária) resultaram em redução significativa da morbidade emortalidade cardíaca e da incidência de acidente vascular cerebral eisquemia cerebral transitória 7,8,9. Entre os idosos de um desses estudos, o4S, por exemplo, o tratamento com sinvastatina reduziu a mortalidadepor todas as causas em 34%, a mortalidade por DAC em 43%, os eventoscoronários maiores em 34% e o número de procedimentos de revas-cularização miocárdica em 41%7.

Embora o tratamento de idosos acima dos 75 anos com medicamentoscomo as estatinas seja seguro e eficaz10, ainda não existem dadosdefinitivos acerca dos benefícios do tratamento de tais indivíduos.Entretanto, como o risco absoluto de DAC aumenta dramaticamente coma idade, tanto em homens como em mulheres, o número absoluto depessoas que se beneficiarão com a diminuição da colesterolemia deveser maior entre idosos. Recentemente, foram apresentados em congressoda Associação Americana de Cardiologia, mas ainda não publicados, osresultados parciais do estudo HPS11 (Heart Protection Study), que ana-

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lisou pouco mais de 20 mil pessoas consideradas de alto risco car-diovascular, nas quais a prescrição de estatinas não seria consideradamandatória, nem contra-indicada. No grupo de indivíduos que utilizou asinvastatina, na dose de 40 mg/dia, durante 5 anos, houve reduçãosignificativa da morbidade e da mortalidade cardiovascular e global. Esseestudo abrangeu um número considerável de idosos até 80 anos (5.805,o que correspondeu a 28% da população estudada), sendo que osbenefícios obtidos pelo tratamento nesse grupo etário foram semelhantes(ou até maiores) que os do grupo mais jovem.

São limitados, até o momento, dados sobre o tratamento medicamentosoda dislipidemia na prevenção primária da DAC em idosos. Entretanto,mais de 50% dos idosos, morrem em decorrência de doençacardiovascular. Parece, portanto, razoável a consideração do tratamentomedicamentoso em alguns idosos que têm alto risco, tais como os queapresentam níveis de LDL-colesterol ≥ 160 mg/dl, apesar das medidasdietéticas adequadamente implementadas.

As III Diretrizes Brasileiras sobre Dislipidemias e Diretriz dePrevenção da Aterosclerose do Departamento de Aterosclerose daSociedade Brasileira de Cardiologia 12 recomendam que na prevençãosecundária da DAC em idosos devem ser seguidas as mesmasrecomendações que para indivíduos mais jovens. Entretanto, como naprevenção primária, os dados ainda são escassos; os casos devem seravaliados individualmente.

Estudos em andamento, como o PROSPER (the Prospective Studyof Pravastatin in the Elderly at Risk), trarão novas evidências. Esseestudo, que deverá terminar em 2002, avalia o tratamento com pravastatinana prevenção de eventos cardiovasculares em 5.800 idosos (homens emulheres entre 70 e 80 anos), com DAC preexistente ou com alto riscopara DAC.

Diabetes melito – O diabetes ocorre em aproximadamente 20%das pessoas acima dos 70 anos de idade. Entretanto, a associação entreo aumento do risco cardiovascular e o diabetes de aparecimento tardionão é tão forte como para o de aparecimento precoce. Como exemplo, orisco relativo conferido pelo diabetes em um coorte de homens jovensacompanhados no MRFIT foi de aproximadamente 3 vezes. Emcomparação, estudos em idosos encontraram risco relativo mais baixo,de aproximadamente 2 vezes2,13.

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Os efeitos do controle adequado da glicemia em idosos são incertos.Um estudo Finlandês de 229 pacientes entre 65 e 74 anos, portadoresde diabetes tipo II, encontrou que a mortalidade cardiovascular de 10anos foi significativa e linearmente associada ao controle glicêmico,independentemente do modo de tratamento14 . Entretanto, outrosestudos verificaram que o melhor controle glicêmico de pacientesportadores de diabetes do tipo II levou à diminuição do desen-volvimento da doença microvascular, mas não da macrovascular. Esseachado faz com que se recomende o melhor controle possível dosoutros fatores de risco eventualmente presentes (hipertensão, disli-pidemia, tabagismo, obesidade, sedentarismo), na prevenção da DACem diabéticos.

Sedentarismo – É o fator de risco mais prevalente em idosos porta-dores de doença cardiovascular (cerca de 70% a 90% de acordo com aidade avaliada). O combate ao sedentarismo é realizado pela atividadefísica programada, o que pode diminuir o risco de desenvolvimento deDAC por vários mecanismos, entre os quais destacam-se: aumento dosníveis séricos de HDL-colesterol, redução dos triglicérides, diminuiçãoda pressão arterial, do peso corpóreo, da resistência à insulina e melhorada distribuição de gordura corpórea. Acima de tudo, a atividade físicatraz melhora da qualidade de vida em idosos.

Ainda se discute a melhor forma de atividade física a ser imple -mentada entre idosos e qual produz mais benefícios. Recomendam-se,em geral, pela facilidade de execução, caminhadas regulares, comaumento gradual da velocidade e da distância percorrida. Recentementedestacou-se, no programa de atividade física, a impor tância deexercícios de resistência, particularmente para a população acima dos65 anos de idade15.

Obesidade – Embora não tenha sido demonstrado que a obesidadecontinua sendo fator de risco claro para o desenvolvimento da DAC emidosos, aumento importante de peso e obesidade abdominal continuam ainfluenciar adversamente todos os fatores de risco maiores. Muitasevidências ligam a obesidade abdominal à: insulino-resistência, deterioraçãoda tolerância à glicose, dislipidemia e hipertensão arterial, sendo que todos,de forma independente, predispõem à ocorrência de DAC. A intervençãosobre o excesso de peso pode levar à melhora dos outros fatores derisco associados. Entretanto, até o momento, não estão disponíveis estudos

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mostrando que a intervenção sobre o peso corpóreo é eficaz na prevençãoprimária ou secundária da DAC16.

Menopausa – Embora muitos estudos observacionais sugiram que otratamento de reposição estrogênica, implementado após a menopausa,traga benefícios sobre a morbidade e mortalidade cardiovascular, por váriosmecanismos, estudos randomizados e controlados por placebo, nãoconfirmam essa hipótese. Assim, no estudo HERS17 (Heart and Estrogen/Progestin Replacement Study), o tratamento com estrógeno e progesteronatrouxe, no primeiro ano, maior chance de processos embólicos e decolecistopatia calculosa no grupo tratado, sem benefícios sobre eventoscardiovasculares no período analisado (pouco mais de 4 anos). Discute-sese a continuidade do tratamento por maior tempo não teria possibilitado averificação de benefícios com a reposição hormonal (RH). Assim, arecomendação das Diretrizes Brasileiras sobre Dislipidemias e Diretriz dePrevenção da Aterosclerose do Departamento de Aterosclerose daSociedade Brasileira de Cardiologia 12 é a de não se iniciar a RH comfinalidade de prevenção primária da DAC. Para pacientes que têm outrasindicações de RH, como prevenção de osteoporose e tratamento defogachos, entre outros, o tratamento pode ser mantido. Na prevençãosecundária, se a mulher já vem fazendo uso, a RH pode ser mantida, masnão deverá ser iniciada nas que forem virgens de tratamento.

Fatores de risco emergentes – Não existe consenso sobre quando deveser incluída a avaliação dos novos fatores de risco para DAC. Os métodosainda não são totalmente padronizados e não estão disponíveis na maioriados laboratórios de análises clínicas. Tem sido sugerido o estudo dessesfatores em pacientes portadores de DAC que não pode ser explicada pelapresença de outros fatores de risco e em indivíduos que apresentemantecedentes familiares importantes de DAC, sem que, no entanto, sejamidentificados fatores de risco capazes de justificar tal problema.

Lp(a) – A lipoproteína(a) assemelha-se à LDL, mas, diferentementedesta, apresenta, ligada à apo B100, única apoproteína do LDL, umaoutra apoproteína denominada apo(a). Essa proteína tem grandesemelhança estrutural com o plasminogênio, o que confere à Lp(a), alémde capacidade aterogênica (pela similaridade com a LDL), propriedadetrombogênica. Seus níveis séricos são determinados principalmente porfatores genéticos, o que dificulta a resposta às medidas terapêuticas,tanto não-farmacológicas (dieta e atividade física) como farmacológicas.

Fatores de Risco para Doença Coronária em Idosos

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Diante de níveis aumentados de Lp(a) (> 30 mg/dl), como a respostaterapêutica em geral é muito ruim, recomenda-se a intervenção agressivasobre outros eventuais fatores de risco presentes. Os estudos que têmavaliado a importância da Lp(a) como fator de risco para DAC em idosostêm mostrado resultados controversos18,19,20,21,22 . Não existem até omomento estudos de intervenção sobre a Lp(a) na prevenção da DAC.

Homocisteína – A hiper-homocisteinemia tem sido apontada comofator de risco independente para DAC. Está associada freqüentementeà dieta pobre em folato e vitaminas B12 e B6. Como os idosos geralmentetêm baixa ingesta de folhas vegetais, cereais, produtos de trigo e laranjas,habitualmente têm deficiência dessas vitaminas. O aumento da homo-cisteinemia resultante parece estimular o crescimento das célulasmusculares lisas, dificultar a regeneração endotelial e aumentar atrombogênese. Dados do estudo de Framingham indicam que aumentodas concentrações de homocisteína é encontrado em 29% dos idosos,que 10% da doença cardiovascular pode ser atribuída à elevação dahomocisteína e que dois terços dos idosos com tal elevação têm poucaingestão de vitaminas B23. Embora os níveis de homocisteinemia sejamfacilmente restabelecidos pela reposição adequada na alimentação e/ousuplementos vitamínicos, faltam dados mostrando a eficácia dessa atuaçãona prevenção da DAC24.

Fibrinogênio – Os níveis séricos de fibrinogênio tendem a aumentarcom o envelhecimento e também são mais elevados em portadores dehipertensão arterial, diabetes, obesidade e em fumantes. Níveisaumentados de fibrinogênio, mesmo na faixa superior da normalidade,estão associados com aumento do risco de DAC, acidente vascularcerebral, mortalidade cardiovascular e global25. Como o fibrinogênio étrombogênico, aumenta a agregação plaquetária e parece ser marcadorinflamatório, é de especial importância em idosos, uma vez que estesprovavelmente apresentam lesões ateroscleróticas avançadas, propensasà instabilização. O controle da fibrinogenemia por medidas higiênicas e/ou por medicamentos parece promissora, embora ainda faltem evidênciasda eficácia dessa atuação.

Fatores inflamatórios – Vários fatores inflamatórios têm sidoestudados quanto à possível capacidade de prever eventos cardiovas-culares. Entre eles, o que mais tem acumulado dados é a proteína Creativa (PCR), determinada por métodos de alta sensibilidade. Entre-

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tanto, se os níveis plasmáticos de PCR predizem risco aumentado deDAC futura, além das informações fornecidas pelos fatores de riscotradicionais, somente poderá ser determinado após estudos prospectivosenvolvendo grande número de indivíduos. Não se sabe se o seu papelse aplica aos idosos, sendo que no estudo de Pirro et al. 26, oacompanhamento de 2.037 indivíduos do sexo masculino saudáveis eseguidos por cinco anos, níveis aumentados de PCR foram significativae independentemente associados com aumento do risco de DAC nogrupo mais jovem (< 55 anos), mas não nos acima dessa idade.

Conclusão – Embora ainda faltem dados conclusivos sobre a importânciade cada um dos fatores de risco no desenvolvimento e na evolução da DACem idosos, seu combate tem sido recomendado como forma de prevençãoprimária ou secundária nos indivíduos de faixas etárias mais elevadas e queapresentem boas perspectivas de qualidade de vida adequada.

Fatores de Risco para Doença Coronária em Idosos

Anexo IGraus de recomendações e níveis de evidência adotados pela

Sociedade Brasileira de CardiologiaGraus de recomendações DefiniçãoA – Definitivamente recomendada Sempre aceitável e segura

Definitivamente útilEficácia e efetividade comprovadas

B – Aceitável Aceitável e segura, clinicamente útil,mas não confirmado definitivamentepor estudo randomizado amplo oupor meta-análise

B1 – Evidência muito boa Considerado tratamento de escolhaB2 – Evidência razoável Considerado tratamento opcional

ou alternativoC – Inaceitável Clinicamente sem utilidade, pode

ser prejudicialNíveis de evidência DefiniçãoNível 1 Estudos randomizados amplos

e revisõesNível 2 Pelo menos um estudo randomizado

ou meta-análisesNível 3 Estudos de pequenas sériesNível 4 Recomendações de grupos de

especialistas em diretrizes ououtras reuniões

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Capítulo 4

Peculiaridades daCardiopatia

Isquêmica Agudano Idoso

Otavio Rizzi CoelhoWillian Cirillo

Osvaldo Massayoshi UetiFernando Abarca Schelline

A expectativa de vida da população brasileira tem aumentadoconsideravelmente nas últimas décadas, acompanhando uma tendênciamundial1,2. A doença arterial coronária é mais prevalente, seja em homensou mulheres, com o aumento da faixa etária.

No município de Campinas, as doenças do aparelho circulatório sãoa principal causa de óbito, correspondendo a 37% nas mulheres e 28%nos homens, considerando-se todas as faixas etárias. Acima dos 70 anos,respondem por 35% nos homens e 45% nas mulheres3. Assim, podemosconcluir que a cardiopatia isquêmica no idoso constitui uma questão funda-mental para a saúde pública em nossa sociedade.

Como a aterosclerose é uma doença progressiva, estimava-se que osfatores de prevenção teriam menor importância no idoso. Muitos trabalhospublicados na literatura evidenciam que esse é um conceito errado. Osfatores de risco modificáveis para doença aterosclerótica coronária (DAC),insuficiência cardíaca congestiva (ICC) e doença arterial periférica (DAP)são virtualmente os mesmos, tanto no jovem quanto no idoso4.

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Sabemos que o tratamento da hipertensão e o abandono do tabagismopor exemplo adicionam qualidade de vida e longevidade.

A hipertensão arterial é muito prevalente no idoso e, até recentemente,seu tratamento era considerado polêmico. A hipertensão arterial sistólicaisolada, definida como pressão arterial sistólica > 140 mmHg e diastólica< 90 mmHg, é a forma mais freqüente de hipertensão nos pacientesidosos, ocorrendo aproximadamente em 60% dos indivíduos5. Essa formade hipertensão era considerada “fisiológica”, sendo decorrente da perdade elasticidade da aorta e de seus ramos arteriais. O estudo SHEP(Systolic Hypertension in the Elderly Program) comprovou que otratamento da hipertensão arterial sistólica isolada do idoso reduz eventoscardiovasculares: sobretudo a insuficiência cardíaca congestiva e oacidente vascular cerebral e, possivelmente, a incidência de IAM6.

Em relação ao tabagismo, alguns estudos como o The U.S. NursesStudy apontaram-no como fator de risco independente para eventoscoronários na população jovem e idosa8. Mesmo que ainda haja algumacontrovérsia sobre o benefício do abandono do tabagismo e a incidênciade DAC, é bem estabelecida a relação do cigarro com o aumento daincidência de câncer de pulmão9.

O diabetes do tipo II tem aumentado sua prevalência na população senil edobra o risco de DAC, podendo aumentá-lo em até 15 vezes quando combinadoà hiperlipidemia no idoso10. Por sua vez, a dislipidemia, mesmo não tendo amesma relevância que no jovem, ainda é um forte preditor de DAC noidoso, sobretudo a relação colesterol total/HDL11. Ainda em mulheres acimade 70 anos, para um mesmo nível de colesterol de 240 mg/dl ou superior, orisco da cardiopatia isquêmica pode aumentar em até 10 vezes nadependência da associação com outros fatores de risco (Figura 1).

Existe uma proporção significativa de pacientes sem sintomas (isquemiasilenciosa). Confrontando-se os dados de autópsia em pacientes acima de80 anos, dos quais mais da metade apresenta DAC anatomicamenteexpressiva14, apenas 20% desses pacientes apresentam evidências clínicasde doença arterial coronária 15. Corroborando esses dados, cerca de umterço dos infartos agudos do miocárdio (IAM) não é diagnosticado nosidosos, pois muitos são totalmente silenciosos. Esse fato não pode sersubestimado, já que o IAM tem pior prognóstico no idoso16.

A hipertrofia ventricular esquerda e as alterações difusas derepolarização no eletrocardiograma são marcadores de isquemia no idoso.

Peculiaridades da Cardiopatia Isquêmica Aguda no Idoso

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e se a associam a maior risco de evento coronário agudo, ICC e acidentevascular cerebral (AVC).

Manuseio e evidências clínicasO infarto agudo do miocárdio (com ou sem supradesnivelamento do

segmento ST) e a angina instável são mais prevalentes no idoso.É bem estabelecido que a mortalidade do IAM aumenta com a idade.

No estudo GUSTO-I6 com 41 mil pacientes infartados tratados comestreptoquinase ou r-TPA, a mortalidade intra-hospitalar foi de 3% parapacientes < 65 anos; de 9,5% entre 65 e 74 anos; de 19,6% entre 74 e 85anos e de 30,3% para pacientes > 85 anos19. Além de maior mortalidade,o idoso apresenta maior comorbidade por doenças pulmonares, renais,hepáticas ou diabetes, por exemplo. Também são mais freqüentescomplicações decorrentes do IAM como insuficiência cardíaca, roturacardíaca e choque cardiogênico20.

Figura 1 – Risco de cardiopatia coronariana com determinados valores de colesterol,segundo o nível de outros fatores de risco. Baseado no estudo de Framingham para oacompanhamento de mulheres de 70 anos de idade.Col – colesterol; PA – pressão arterial; COL-HDL – lipoproteína de alta densidade;OGS – fumantes; INTOL. GLUC – intolerância à glicose; ECG-HM – evidênciaeletrocardiográfica de hipertrofia ventricular esquerda.De Kannel WB e Cobb J. Framingham study: risk factors in the cohort aged 65 andolder. In: Lewis B, Mancini M$, Farnaro E (eds.). Prevention of coronary heartdisease in the elderly. London: Current Medical Literature, 1991, pp. 8.

Peculiaridades da Cardiopatia Isquêmica Aguda no Idoso

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A terapêutica fibrinolítica nessa população deve ser considerada,analisando-se a relação custo versus benefício.

No idoso, apesar do maior risco, obtém-se também maior benefício.Observou-se redução absoluta na mortalidade, de 3,5% nos pacientes comidade > 65 anos comparada a 2,2% nos pacientes mais jovens21.

Por outro lado, a trombólise farmacológica aumenta o risco desangramento cerebral com a elevação da idade do paciente.

No estudo ISIS III e no International Study, a incidência de AVC empacientes infartados e com idade > 70 anos foi acentuadamente maior,quando comparada à de pacientes jovens: 2,3% versus 0,6% no ISIS IIIe 2,1% versus 0,9% no International Study22,23. Mesmo em uma análiseestatística mais rigorosa, considerando as covariantes, o risco corrigidode AVC no idoso foi 2,72 vezes maior do que no jovem.

No estudo GUSTO24 (Tabela 1) os dados apresentados comprovamque o risco de AVC ou hemorragia intracraniana foi maior na populaçãoidosa. A incidência de hemorragia intracraniana foi maior no grupo tratadocom rt-PA, quando comparado ao grupo estreptoquinase. E a mortalidadedo AVC no paciente jovem infartado foi de 40%, metade do valorencontrado em octogenários.

Estudos mais recentes com trombolíticos incluiram uma maiorporcentagem de mulheres e de idosos (> 75 anos). Isso resultou emmaior incidência de hemorragia intracraniana. Por exemplo: a incidênciade hemorragia intracraniana inicialmente de 0,7%, se elevou para 0,8%a 0,9%25. De todos os trombolíticos, a estreptoquinase, sem heparina,provocou menor incidência de hemorragia intracraniana e por essa razãopoderia ser mais indicada na população senil.25 Aliás, o uso preferencialda estreptoquinase em relação ao t-PA é recomendado pela SociedadeBrasileira de Cardiologia nos pacientes acima de 75 anos de idade26.

Por outro lado, o estudo GUSTO-I demonstrou redução de mortalidadeem pacientes infartados, com idade < 85 anos, submetidos a trombólisecom infusão acelerada de T-PA. Essa redução da mortalidade se manteveaté um ano de seguimento27.

Infelizmente, os idosos recebem menos trombolíticos compara-tivamente aos mais jovens, por demora ao acesso hospitalar e possivel-mente pelo medo do risco de complicações28,29.

Já está consagrado o uso do ácido acetilsalicílico (ASA) e de betablo-queadores no tratamento da cardiopatia isquêmica aguda do idoso com

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ou sem supradesnivelamento do segmento ST. O ASA foi utilizado em10.018 pacientes acima de 65 anos, após IAM, com redução de 22% damortalidade no trigésimo dia 30. Os betabloqueadores também reduzem amortalidade de pacientes infartados acima de 65 anos, mesmo naquelesportadores de diabetes melito do tipo I, doença pulmonar obstrutivacrônica e história pregressa de ICC31.

Também está comprovado que o uso de inibidores da enzima deconversão da angiotensina previne o remodelamento ventricular esquerdoe reduz a mortalidade em pacientes idosos portadores de ICC após oIAM32.

A heparina tem sido recomendada para o tratamento das síndromescoronárias agudas, reduzindo a incidência de IAM quando adicionada aoASA. Entretanto, faltam estudos específicos no idoso em relação ao usode heparina não fracionada e inibidores da glicoproteína IIbIIIa33.

Técnicas de revascularização do miocárdioI – Angioplastia

De maneira geral, na cardiopatia isquêmica, o sucesso imediato daangioplastia no idoso é comparável ao do jovem. Entretanto, observa-semenor resposta clínica e maior incidência de complicações cardíacas nospacientes acima de 80 anos34,35. Na fase aguda da isquemia coronáriasem supradesnivelamento do segmento ST, diversos estudos (nenhumespecificamente no idoso) não conseguiram demonstrar superioridade daangioplastia em relação ao tratamento convencional, exceto em pacientescom isquemia persistente ou recorrente, a despeito do tratamento clínico36.Nos pacientes idosos portadores de IAM com supradesnivelamento dosegmento ST, a angioplastia foi capaz de restaurar o fluxo coronário daartéria relacionada ao infarto em 90% dos pacientes (TIMI-III)25.

Tabela 1C GUSTO – Acidente cerebrovascular pelo grupo tratado e idade

Grupo estreptoquinase Rt-PA acelerado Razão (95% IC)Idade ≤ 75 n = 17.804 n = 9.039AVC 1,08% 1,20% 1,21 (0,88-1,42)AVCH 0,42% 0,52% 1,24 (0,86-1,78)Idade > 75 n = 2.358 n = 1.297AVC 3,05% 3,93% 1,30 (0,90-1,87)AVCH 1,23% 2,08% 1,71 (1,01-2,88)IC – intervalo de confiança.

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Análise retrospectiva evidenciou mortalidade de 2% em pacientesinfartados de alto risco (infarto anterior ou taquicardia na apresentaçãoinicial) e com idade > 75 anos, tratados por angioplastia. Esse mesmogrupo apresentou mortalidade de 10% quando submetido à terapêuticatrombolítica convencional37. A maior mortalidade do grupo que recebeutrombolítico se deveu, provavelmente, à maior incidência de hemorragiacerebral.

II – Cirurgia de revascularização do miocárdio Considerando-se o progresso das técnicas de angioplastia adicionado

à colocação de stent intracoronário, a revascularização cirúrgica domiocárdio tem sido reservada para pacientes com doença ateroscleróticadifusa e mais grave. Isso acaba impactando a morbimortalidade, sobretudoda população acima de 75 anos38. O idoso tem incidência maior decomplicações, como insuficiência renal e AVC, além de necessidade deventilação mecânica mais prolongada38,39.

O estudo BARI (Bypass Angioplasty Ravascularization Investi-gation) randomizou 709 pacientes com idade entre 65 e 80 anos, portadoresde DAC múltipla, submetidos a angioplastia ou revascularização cirúrgicado miocárdio40. A mortalidade da angioplastia no trigésimo dia foi de 0,7%contra 1,1%, em relação à da cirurgia de revascularização do miocárdio. Amortalidade em cinco anos foi de 91,5% para cirurgia e de 89,5% paraangioplastia nos mais jovens e de 85,7% e 81,4%, respectivamente, nosidosos.

Novas modalidades de revascularização, como a cirurgia “minima-mente invasiva”, que não utiliza técnica extracorpórea, e a utilização destents coronários constituem avanços tecnológicos que minimizam osriscos dos procedimentos terapêuticos invasivos, mesmo na fase agudada DAC41,42.

ConclusãoOs autores defendem uma mudança de paradigma no tratamento dos

pacientes idosos portadores de cardiopatia isquêmica aguda. É nossoentendimento que devemos oferecer todos os recursos de diagnósticos eterapêuticos atualmente disponíveis, no intuito de prolongar e melhorar aqualidade de vida desses pacientes.

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Sabemos do desafio imposto pela maior dificuldade diagnóstica, pelomaior risco de complicações das modalidades terapêuticas clínicas eintervencionistas, mas, indiscutivelmente, a medicina tem muitos recursosa oferecer a essa população, e os dados da literatura confluem para aobtenção de índices de sucesso muito próximos dos encontrados empopulações mais jovens.

Não podemos permitir que preconceitos impeçam ou retardem omelhor tratamento do paciente idoso com síndrome isquêmica coronáriaaguda. Na rotina diária, devemos preservar o bom senso e o espíritohumanitário ao lidar com o paciente idoso, tão fragilizado no momento dadoença.

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Peculiaridades da Cardiopatia Isquêmica Aguda no Idoso

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Capítulo 5

Doença ArterialPeriférica em Idosos

Humberto Pierri

Aterosclerose periféricaOs problemas arteriais periféricos aumentam sua freqüência com a

idade e a doença aterosclerótica é a causa mais comum entre idosos.Tabagismo e diabetes melito são os fatores exacerbantes mais comuns.

Como a circulação arterial periférica pode ser facilmente abordada,o exame físico torna-se fundamental para orientar o diagnóstico e otratamento. Exames laboratoriais ajudam a confirmar o diagnóstico equantificar a extensão da doença.

A doença arterial periférica pode ser definida como a redução dosuprimento de sangue arterial para as extremidades.

I – Etiologia e fisiopatologiaA progressão da doença arterial aterosclerótica relaciona-se com a

idade e desenvolve-se paralelamente com a aterosclerose das artériascoronárias e cerebrais. O processo patológico inicia-se muitos anos antesdo aparecimento dos achados clínicos e seu desenvolvimento é lento einsidioso.

Os fatores de risco para doença arterial periférica incluem tabagismo,diabetes melito, hiperlipidemia, hipertensão arterial, policitemia, históriafamiliar, hiper-homocisteinemia, idade e ooforectomia precoce. Doençasque elevam os valores do hematócrito podem aumentar a resistência àcorrente sangüínea e à força de cisalhamento exercida contra a parededos vasos, resultando em lesão intimal. Essa lesão promove a formaçãodo ateroma. Diabetes melito mal controlado e hiper-homocisteinemia

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levam à agressão da camada íntima e ao aparecimento e crescimento deateromas.

Não está claro o quanto o tabagismo pode lesar a parede arterial,entretanto, o monóxido de carbono e outros componentes do fumo muitoprovavelmente são tóxicos à íntima. A nicotina é um agente vasoconstritordireto e, portanto, reduz o fluxo distal. A freqüência de amputação demembros é dez vezes maior naqueles que continuam fumando, após oaparecimento da oclusão arterial, do que nos que abandonam o tabagismo.

II – Sinais e sintomasA maior parte dos idosos portadores de insuficiência vascular periférica

é assintomática. Deve ocorrer pelo menos 70% de obstrução do lúmenarterial para que haja manifestação clínica.

O sintoma mais específico e freqüente da doença arterial periférica éa claudicação intermitente (dor, aperto ou fraqueza dos músculosexercitados). A claudicação ocorre durante caminhada (nunca com opaciente sentado ou em posição ortostática), forçando o paciente a parar,pois andar torna-se muito doloroso. O alívio ocorre cerca de cinco minutosapós o repouso. A dor quase sempre é referida como aperto intenso napanturrilha; se a oclusão for no trecho aortoilíaco a dor será referida noquadril ou nas nádegas.

A claudicação, freqüentemente, ocorre para a mesma distânciapercorrida. Entretanto, situações como frio, vento, aclives e caminhadasrápidas podem reduzir essa distância. O uso de bengalas ou muletas nãomelhora as distâncias percorridas, porque a função muscular estápreservada até que ocorra hipoxia.

Sintomas menos específicos como palidez cutânea, parestesias,sensação de frio e dor em repouso estão relacionados com a circulaçãocutânea dos pés. Essas sensações, quando ocorrerem durante movimento,relacionam-se com máxima vasodilatação das arteríolas musculares edesvio de fluxo da pele para os músculos. Sensação de frio que aumentourecentemente ou que ocorre em apenas um membro bem comoparestesias após o sono podem sugerir insuficiência arterial. Entretanto,é muito comum que indivíduos idosos sintam mais frio, sem que isso seassocie com insuficiência arterial, mas com vasoconstrição periférica.

Idosos sedentários que não caminham o suficiente para claudicarpodem apresentar-se com dor no pé em repouso ou mesmo gangrena.

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Dor no pé em repouso é sintoma muito perigoso e indica que a circulaçãoestá reduzida a menos de 10% do normal. Essa dor pode ser em queimaçãoou na forma de sensação parestésica e tipicamente piora à noite,prejudicando a qualidade do sono.

A gangrena aparece primeiramente como uma equimose, seguida porenegrecimento e mumificação da parte envolvida. Em pacientes comneuropatia, em geral devido ao diabetes melito, pode desenvolver-segangrena sem dor.

As feridas podem apresentar-se com muita dificuldade de cicatrização,e a pele fica propensa a rachaduras, que podem evoluir para celulite ouinfecções profundas.

Na síndrome de Leriche, a bifurcação aortoilíaca começa a se ocluir,porém as artérias distais freqüentemente estão normais. Os sintomassão claudicação referida no quadril e impotência sexual, secundárias àhipotensão arterial das ilíacas. Essa síndrome não é freqüente nos idososporque eles costumam apresentar lesões ateroscleróticas difusas emultiplas áreas de oclusão.

III – DiagnósticoA ausência de pulsos periféricos sugere fortemente presença de

oclusão arterial. O pulso tibial posterior está sempre presente em pessoassadias, embora possa ser difícil palpá-lo em pacientes com edema oumaléolos proeminentes. A artéria pediosa está ausente em 5% das pessoassadias. A poplítea é de difícil palpação e as femorais são de fácil acesso.

A determinação da força do pulso é subjetiva e depende da pressãode pulso, da idade do paciente e da sensibilidade do examinador. Com aidade, os pulsos de artérias patentes tendem a se tornar mais proeminentes,devido à perda de musculatura e tecido elástico, o que predispõe aoaparecimento de ectasias. A subida da onda de pulso é mais importanteque sua amplitude. Sopros ouvidos sobre a artéria femoral indicam doençaaortoilíaca.

A ultra-sonografia com Doppler pode ser utilizada para permitir acessoaos pulsos arteriais, porém não prova que o fluxo seja adequado.

A pressão nas pernas é considerada baixa, quando for menor que aobtida nos membros superiores.

Diferenças de temperatura entre os dedos de cada pé e mudanças nacoloração da pele são achados importantes; para determinar mudanças

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de coloração, o examinador deve elevar o pé acima do nível do coraçãopor vinte segundos e depois colocá-lo em posição pendente; palidez pormais de trinta segundos ou coloração violácea (rubor) que aparece apósvinte segundos, indica que o fluxo está reduzido abaixo de 10%. O ruborpode demorar até 1 a 2 minutos para alcançar seu máximo; é maispronunciado nos dedos e pode se estender ao longo das pernas. Nasisquemias mais intensas, os pés apresentam-se com palidez cutâneamesmo em repouso na horizontal. Palidez ou rubor prolongados, quandoassociados com dor em repouso, são péssimos sinais. Gangrena eulceração, particularmente de dedos, calcanhar e maléolo medial, sugeremdoença arterial extensa.

O perfil lipídico e a dosagem de homocisteína devem ser aferidos.A insuficiência arterial periférica deve ser diferenciada de outras

doenças que causam sintomas semelhantes. Estreitamento do canalmedular no nível da coluna lombar, que é muito prevalente entre idosos,pode mimetizar claudicação. Entretanto, os sintomas são percebidos tantoem repouso quanto durante caminhadas, podendo piorar quando ospacientes estão sentados; a dor costuma irradiar-se para as extremidades.Na neuropatia diabética, a dor pode ser igual à da insuficiência arterialperiférica, mas geralmente é bilateral. É muito freqüente sua associaçãocom insuficiência arterial periférica que leva à parestesia e à palidez.

IV – TratamentoNos pacientes assintomáticos, a terapia consiste em medidas preven-

tivas envolvendo cuidados com os pés, caminhadas freqüentes e controledos fatores de risco. Os pacientes devem ser avisados para evitar posiçõesque diminuam o fluxo sangüíneo, como cruzar as pernas quando estiveremsentados.

Nos sintomáticos deve-se aconselhar as mesmas medidas recomen-dadas aos assintomáticos. Quando ocorrer claudicação, os pacientesdevem descansar e reiniciar a marcha assim que possível.

Os resultados de terapia medicamentosa em pacientes com claudi-cação intermitente são controversos. A pentoxifilina foi a primeiramedicação aprovada para tratamento desse sintoma, pois, diminuindoa viscosidade sangüínea e aumentando a flexibilidade das hemácias,levaria à melhora do fluxo nas arteríolas e capilares. Os resultadosclínicos e os estudos de acompanhamento clínico são desalentadores.

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Até o momento, não há medicação que mude a história natural da claudi-cação intermitente.

O mais efetivo tratamento para claudicação intermitente é aintervenção invasiva para implante de pontes ou colocação de stents.Entretanto, esses procedimentos devem ficar reservados para asobstruções aortoilíacas ou quando há sintomas importantes.

O risco da cirurgia deve ser pesado contra os potenciais benefícios.Uma cirurgia malsucedida pode piorar a situação clínica do paciente se acirculação colateral for seccionada durante o procedimento. Fatores comoestado geral do paciente, idade, estilo de vida, doenças associadas elocalização da lesão devem ser considerados.

Angiografia para determinar necessidade de procedimento cirúrgicosó deve ser realizada quando a cirurgia está sendo seriamente conside-rada. A cirurgia só será bem-sucedida quando o leito distal permitir bomfluxo. Cirurgias realizadas em pacientes com lesões proximais são as demelhores resultados. Pacientes com lesões aortoilíacas apresentampermeabilidade em cinco anos de aproximadamente 90%. Nas lesõesfemoropoplíteas, essa taxa está entre 60% e 70%, quando a lesão estáacima do joelho; lesões no nível ou abaixo do joelho apresentam piorestaxas de patência. Em enxerto femorotibial distal, está abaixo de 50%.

A angioplastia percutânea com colocação de stent é alternativa à cirurgia,quando as lesões forem curtas e localizadas nos segmentos aortoilíaco efemoral. Embora seja procedimento simples e realizado com anestesia local,as complicações (ruptura arterial e embolização distal) podem requerercirurgia de urgência. Portanto, o paciente que será submetido a esseprocedimento deve reunir condições para a cirurgia clássica.

Nos pacientes com intensa isquemia na posição de pé, os sinais deisquemia cutânea são indicadores da necessidade de enxertos arteriaisque podem aliviar dores incapacitantes e evitar amputações. Quando háplacas de gangrena, principalmente em dedos, deve-se aguardar sua totaldelimitação, porque a auto-amputação do dedo pode levar a melhorcicatrização proximal. Úlceras isquêmicas podem cicatrizar, se o fluxoao seu redor for melhorado; debridamento químico ou cirúrgico e utilizaçãode soluções anti-sépticas estão preconizados. Imersão do pé em água natemperatura corpórea ajuda a curar lesões infectadas.

Idosos que não tenham apresentado perda tecidual ou dor em repousonão devem ser submetidos à cirurgia.

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Procedimentos de baixo risco podem ser utilizados, como o enxertofemorofemoral abaixo da área pélvica, o que pode evitar amputação,quando a doença for unilateral. A taxa de patência nesse caso é semelhanteà obtida pelos enxertos aortofemorais. Enxertos axilofemorais podemser úteis quando a doença for bilateral; nesse caso, a taxa de patência éde aproximadamente 50%.

A presença de lesões múltiplas não contra-indica a cirurgia, pois oaumento de fluxo pode favorecer o aparecimento de circulação colateralao redor das lesões mais distais.

Doença de pequenos vasosPode ser definida quando há isquemia cutânea, com áreas de cianose

ou necrose em pés ou mãos, que apresentam circulação adequada.Em idosos, pode ocorrer devido a crioglobulinemia, criofibrinogenemia,

policitemia, coagulação intravascular disseminada, trombocitose essencial,vasculite induzida por medicações, síndrome do anticorpo anticardiolipina,esclerodermia ou embolia com origem em aneurisma, no coração ou emplacas de ateroma.

I – Sinais, sintomas e diagnósticoOs pacientes apresentam, geralmente, um dedo cianótico ou gangrenado

e podem desenvolver várias lesões em extremidades. Ocasionalmente,esses achados podem acometer a mão ou o pé por inteiro.

Em pacientes com doença aterosclerótica periférica, piora clínicasúbita das mãos ou dos pés, ou desenvolvimento de cianose ou necroseem extremidades previamente bem perfundidas, pode indicar doença depequenos vasos. Quando há envolvimento da mão, especial atenção deveser dispensada na sua investigação, pois as extremidades superioresfreqüentemente são poupadas, mesmo de doença aterosclerótica emestado avançado.

No exame físico, deve-se procurar aneurisma de aorta abdominal,femoral, poplítea e subclávia.

A avaliação laboratorial deve incluir: leucograma, contagem de pla-quetas, coagulograma, teste para crioproteínas, anticorpo anticardiolipina,anticorpo antinuclear e anticoagulante lúpico.

O eletrocardiograma e o ecocardiograma devem ser realizadosquando há suspeita clínica de aneurisma de ventrículo esquerdo. A ultra-

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sonografia é útil para o diagnóstico de aneurisma de aorta abdominal eda artéria poplítea. O diagnóstico de fratura de placa de ateroma deveser feito por exclusão.

Ocasionalmente, os êmbolos manifestam-se pelo aparecimento delivedo reticularis.

II – TratamentoDoenças diagnosticadas devem ser exaustivamente tratadas. Os

aneurismas devem ser tratados cirurgicamente. Anticoagulação por longosperíodos deve ser iniciada naqueles com aneurisma de ventrículo esquerdo;antiagregantes plaquetários devem ser dados para aqueles que tiveremembolização devida a placas de ateroma. Não há, até o momento, trata-mento adequado para pacientes com anticorpo anticardiolipina. A varfarinapode ser efetiva, visando taxa de INR entre 2 e 3. Para todos os pacientescom doença de pequenos vasos deve-se ter cuidado extremo comdesidratação, que compromete o fluxo sangüíneo, por aumentar aviscosidade do sangue.

Fenômeno de RaynaudSíndrome que se caracteriza por palidez cutânea ou cianose intermi-

tente decorrentes de vasoespasmo periférico.

I – Sinais, sintomas e diagnósticoA exposição ao frio ocasiona embranquecimento ou cianose de mãos,

pés e, algumas vezes, de nariz e orelhas. Essa palidez é seguida de umafase eritematosa quando os pacientes entram em ambientes aquecidos.Os episódios podem ser assintomáticos ou produzir vários graus de dor,palidez e sensação de frio. Muitos idosos podem apresentar essefenômeno mesmo quando a temperatura não se apresenta muito fria. Osindivíduos afetados apresentam mãos e pés frios, mesmo em ambientescom temperaturas elevadas. Se os episódios forem freqüentes e prolon-gados pode ocorrer esclerodactilia.

Sintomas bilaterais começando após os 40 anos de idade freqüen-temente estão associados com hipertireoidismo, lúpus induzido pormedicações, crioglobulinemia, criofibrinogenemia, doença de aglutinaçãoinduzida pelo frio, esclerodermia e síndrome de CREST (Calcinose,Raynaud, disfunção Esofageana e Telangiectasia).

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O tratamento é freqüentemente conservador; o paciente deve serorientado a utilizar roupas quentes e a evitar o frio. Se o fenômeno forcausado por esclerodermia, o tratamento deverá ser mais rigoroso, poisos episódios podem causar danos decorrentes de redução de fluxo paraos rins e o coração, levando à alteração da contratilidade cardíaca. Nessecaso, a utilização de nifedipina três vezes ao dia tem sido consideradaprocedimento seguro e efetivo.

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Capítulo 6

HipertensãoArterial no Idoso

João B. Serro-Azul

EpidemiologiaA pressão arterial sistólica aumenta progressivamente com a idade,

enquanto a diastólica atinge seus maiores níveis entre os 50 e 60 anos deidade1. Estudos epidemiológicos demonstraram que a elevação da pressãoarterial aumenta a morbimortalidade cardiovascular, mesmo na terceiraidade2,3. De fato, a ocorrência de doenças cardiovasculares triplica emhipertensos idosos, quando comparada à observada em normotensos damesma idade3. Os riscos estão relacionados tanto à hipertensão arterialsistólica quanto à diastólica, porém, a pressão sistólica, em idades maisavançadas, passa a ter maior importância na incidência de acidentevascular cerebral, no desenvolvimento de hipertrofia ventricular esquerda(HVE) e de insuficiência cardíaca.

A hipertensão arterial tem incidência mais elevada com o progredirda idade, chegando a acometer mais da metade da população geriátrica,sendo mais expressiva no sexo feminino e na raça negra. Entre suasmodalidades, destaca-se a hipertensão sistólica isolada, encontrada em7% dos indivíduos entre 60 e 67 anos de idade e que atinge 25% dosnonagenários4. Com efeito, nas últimas décadas o aumento da populaçãode indivíduos com idade superior a 80 anos e o risco relacionado àelevação da pressão sistólica denotam a importância dessa forma dehipertensão.

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Aspectos fisiopatológicosO envelhecimento associa-se a um aumento significativo da carga

imposta pelo sistema vascular ao trabalho cardíaco. Essa sobrecarga édecorrente do processo degenerativo que ocorre na parede das grandesartérias (rotura e perda de fibras de elastina, deposição de cálcio e decolágeno, espessamento da parede vascular e diminuição da elasticidade),com conseqüente redução da complacência arterial e aumento davelocidade de propagação das ondas de pressão5. Desta última resulta oretorno mais precoce das ondas refletidas da periferia às artérias centrais,e conseqüentemente, essas ondas refletidas deixam de retornar no períododiastólico do ciclo cardíaco, determinando uma amplificação da pressãosistólica, responsável pelo desenvolvimento de hipertensão sistólica ede HVE no indivíduo idoso.

Alterações ateroscleróticas na região dos seios carotídeos podemreduzir a sensibilidade dos barorreceptores, o que poderia explicar a maiorvariabilidade da pressão arterial no idoso e é, provavelmente, uma dascausas da redução dos reflexos posturais que o predispõe à hipotensãoortostática.

As respostas do sistema alfa-adrenérgico permanecem inalteradas coma idade6; entretanto, as do sistema beta-adrenérgico, nitidamente declinam,devido à redução do número e/ou da sensibilidade dos receptoresespecíficos7, e a conseqüente elevação da norepinefrina plasmática. Oaumento da resistência vascular, observada nos gerontes hipertensos, podeser relacionado à menor vasodilatação promovida pelos receptores beta-adrenérgicos, associada à normalidade do sistema constritor alfa. Assim,a idade relaciona-se a um desvio do equilíbrio do sistema adrenérgicopara o lado do efeito alfa-adrenérgico.

Os idosos hipertensos são mais sensíveis à sobrecarga de sódio eapresentam atividade plasmática da renina reduzida, o que sugere poucainfluência do sistema renina-angiotensina no aumento da resistênciavascular periférica. Os baixos níveis de renina e sua menor atividadepodem estar relacionados com o declínio da atividade do sistema beta-adrenérgico que governa sua liberação. Além disso, a hialinização dasarteríolas aferentes renais chega a tornar o aparelho justa-glomerularmenos responsivo aos estímulos para produzir renina. Também é possívelque a liberação de renina esteja suprimida pelo maior acúmulo de sódio.

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Os níveis plasmáticos de aldosterona estão elevados em alguns idososhipertensos8, entretanto, não se sabe se esse aumento estaria relacionadocom maior atividade mineralocorticóide, contribuindo para o estadohipertensivo.

Os efeitos das alterações ateroscleróticas sobre o endotélio vascularpodem contribuir para a elevação da pressão arterial no idoso. O endotéliolesado continua a produzir fatores constritores como endotelina,tromboxane e angiotensina II, porém não produz fatores relaxantes, comoo óxido nítrico e a prostraciclina, resultando em aumento da resistênciaperiférica.

Peculiaridades clínicasA aferição da pressão arterial dos idosos deve ser feita com as mesmas

cautelas observadas para os mais jovens. Cumpre enfatizar que costumamser necessárias múltiplas avaliações, pois é sabido que a variabilidade dapressão arterial aumenta com a idade9. Deve-se considerar a possibilidadede presença do chamado “buraco auscultatório”. Evita-se esse erro coma precaução de insuflar o manguito até níveis de pressão arterial nosquais há o desaparecimento do pulso à palpação.

A pseudo-hipertensão é um artefato decorrente do endurecimento dasparedes das artérias periféricas e resulta numa falsa estimativa da pressãoarterial à esfigmomanometria. Esse diagnóstico é sugerido em indivíduoscom níveis pressóricos elevados e ausência de lesão em órgãos-alvo;geralmente são idosos que apresentam artérias dos braços calcificadas, oque pode ser identificado à palpação e/ou ao exame radiológico. Apesquisa do sinal de Osler (constatação de artérias palpáveis quando oesfigmomanômetro encontrar-se insuflado em nível superior ao da pressãosistólica)10, pode identificar a pseudo-hipertensão.

A variabilidade da pressão arterial está aumentada entre idosos, o quedepende da redução dos barorreflexos. De modo geral, pode-se dizer quequanto mais elevada a pressão arterial, principalmente a sistólica, maiorserá essa condição. Quanto à variabilidade da freqüência cardíaca, verifica-se habitualmente que é menor, correspondendo à diminuição da modulaçãoparassimpática do coração, uma das características do envelhecimento.

O idoso apresenta predisposição à hipotensão ortostática que estáassociada a aumento na incidência de quedas (de morbidade expressiva,dependente de fraturas ósseas e hematomas subdurais), de doença

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cerebrovascular e de infarto do miocárdio11. Entre as causas predispo-nentes destacam-se: menor eficiência dos mecanismos reguladores dapressão arterial (barorreceptores e renais, por exemplo); uso mais fre-qüente de medicamentos (diuréticos, tranqüilizantes, vasodilatadores,betabloqueadores); maior ocorrência de doenças crônicas (diabetes melito,insuficiência cardíaca, doença vascular cerebral). A prevalência dehipotensão ortostática aumenta com a idade e com o nível de pressãosistólica, podendo atingir cerca de 30% dos indivíduos com mais de 75anos12. Nos participantes do estudo Systolic Hypertension in the ElderlyProgram (SHEP), a hipotensão ortostática foi encontrada em cerca de16% dos indivíduos. Outro estudo observou hipotensão ortostática,definida como queda na pressão sistólica acima de 20 mmHg, em 27%de idosos hipertensos não tratados, sendo que um terço deles relataramsintomas de tonturas ou escurecimento visual13. No referido estudo, asmedidas de pressão arterial pela monitorização ambulatorial de pressãoarterial (MAPA) não identificaram os pacientes com hipotensãoortostática. Em conclusão, a hipotensão ortostática é freqüente entreidosos e sua detecção pode exigir múltiplas aferições da pressão arterialnas posições supina e ortostática.

A hipertensão do “jaleco-branco” (elevação da pressão arterial noconsultório do médico, em contraste com verificações domiciliares normais)é freqüentemente observada nos idosos e pode ser diagnosticada pela MAPA.Realmente, observou-se que 42% dos idosos com hipertensão sistólicaisolada, participantes do estudo SHEP, apresentavam pressão “normal” àMAPA14. Em nossa experiência, esse achado foi constatado em 47% dosidosos com diagnóstico de hipertensão sisto-diastólica no consultório 15.

Embora a maior parte dos casos de hipertensão arterial no idoso sejaessencial, a possibilidade da etiologia secundária deve ser lembrada, emparticular a renovascular, de origem aterosclerótica, quando a hipertensãoarterial for de início recente, acelerada ou refratária a tratamento,mormente em portadores de arteriopatia periférica.

Considerações terapêuticasOs benefícios do tratamento da hipertensão arterial em idosos estão

bem definidos. Vários trabalhos têm demonstrado redução na morbidadee mortalidade cardiovascular associada à redução dos níveis pressóricos,tanto sistólicos quanto diastólicos16-23.

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A definição e o algoritmo do tratamento da hipertensão arterial noidoso não diferem em relação ao jovem. Considera-se normal o achadode níveis de pressão sistólica inferiores a 140 mmHg ou diastólicainferiores a 90 mmHg, conforme as Diretrizes do Comitê deCardiogeriatria da Sociedade Brasileira de Cardiologia (Tabela 1).

A coexistência de hipertensão arterial e outros fatores de risco é comumno idoso. Ademais, o aumento da idade representa, por si só, maior riscopara o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Portanto, con-siderando-se que na associação de fatores de risco, a probabilidade deeventos cardiovasculares cresce exponencialmente, a atuação combinadasobre a hipertensão arterial e outros fatores de risco presentes deve serimperiosa no indivíduo idoso, especialmente na vigência de doençaaterosclerótica manifesta. São considerados fatores de risco maiores otabagismo, a dislipidemia e o diabetes melito.

Deve-se avaliar as lesões em órgãos-alvo, com destaque para o coração(HVE; doença aterosclerótica coronária; insuficiência cardíaca), o cérebro(episódio isquêmico transitório ou acidente vascular cerebral), os rins,as artérias periféricas e a retina.

Com base nessas informações, os pacientes podem ser classificadosem três grupos:

Grupo A – sem fatores de risco e sem lesões em órgãos-alvo.Grupo B – presença de fatores de risco (não incluindo diabetes melito)e sem lesão em órgãos-alvo.Grupo C – presença de lesão em órgãos-alvo, doença cardiovascularclinicamente identificável e/ou diabetes melito.A conduta inicial na maioria dos hipertensos deve consistir em

determinar modificações no estilo de vida, como redução da ingesta de

Tabela 1Classificação diagnóstica da hipertensão arterial

Pressão arterial Pressão arterial Classificaçãosistólica (mmHg) diastólica (mmHg)

< 85 < 130 Normal85-89 130-139 Normal limítrofe90-99 140-159 Hipertensão leve (estágio 1)

100-109 160-179 Hipertensão moderada (estágio 2)> 110 > 180 Hipertensão grave (estágio 3)< 90 > 140 Hipertensão sistólica isolada

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sódio, controle do peso corpóreo e adesão a atividades físicas. A introduçãoimediata de drogas anti-hipertensivas deve ser considerada nos casos dehipertensão arterial acentuada, acelerada, ou maligna, e na evidência decomprometimento importante de órgãos-alvo. O emprego de anti-hipertensivos deve considerar não apenas os níveis de pressão arterial,mas também os fatores de risco cardiovascular associados e a presençade lesões em órgãos-alvo (Tabela 2).

O esquema medicamentoso deve ser individualizado. O tratamentomedicamentoso objetiva atingir níveis de pressão arterial inferiores a140 mmHg x 90 mmHg. Reduções abaixo de 130 x 85 mmHg podem serúteis em situações específicas, como em pacientes diabéticos. Entretanto,a intensidade e a persistência do tratamento dependerá da resposta,levando-se em conta a tolerabilidade aos medicamentos, que pode variarde paciente para paciente. Entre as drogas anti-hipertensivas deve-se darpreferência aos diuréticos tiazídicos, aos beta-bloqueadores (propranolol,atenolol) e aos antagonistas dos canais de cálcio (nitrendipina efelodipina), pois esses tiveram sua eficácia comprovada – no controle dapressão arterial e na redução da morbimortalidade – em estudos contro-lados. Outros medicamentos podem ser iniciados como primeira opção,considerando-se as comorbidades.

Principais medicamentosDiuréticos – São eficazes como monoterapia no tratamento da hiper-

tensão arterial do idoso e têm comprovada eficácia na redução da morbi-mortalidade cardiovascular. Devido ao seu baixo custo e à comodidade

Tabela 2Decisão terapêutica baseada nos níveis de pressão arterial e na estratificação do riscoPressão arterial Grupo A Grupo B Grupo CNormal limítrofe Modificações no Modificações no Modificações no

estilo de vida estilo de vida estilo de vida*Hipertensão leve Modificações no Modificações no Terapêutica

(estágio 1) estilo de vida estilo de vida** medicamentosa(até 12 meses) (até 6 meses)

Hipertensão Terapêutica Terapêutica Terapêuticamoderada e grave medicamentosa medicamentosa medicamentosa(estágios 2 e 3)

* Terapêutica medicamentosa deve ser instituída na presença de insuficiência cardíaca, insuficiência renal oudiabetes melito.

** Pacientes com múltiplos fatores de risco podem ser considerados para a terapêutica medicamentosa inicial.

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posológica, têm sido agentes muito utilizados. Podem ocasionar efeitosindesejáveis como hipovolemia, redução do fluxo sangüíneo renal,hipocalemia, hiperglicemia, hiperuricemia e elevações dos níveis séricosde colesterol. Atualmente, admite-se que os efeitos colaterais atribuídosaos diuréticos podem ser minimizados com o emprego de doses menores(12,5 mg a 25 mg diários de hidroclorotiazida ou clortalidona, porexemplo), sem prejuízo de sua eficácia. Os tiazídicos e derivados sãopreferidos no tratamento a longo prazo da hipertensão arterial, enquantoos que atuam na alça de Henle são mais empregados na vigência deinsuficiência cardíaca e renal. Quando não houver contra-indicações,como em caso de insuficiência renal, sua associação com poupadoresde potássio é indicada para os cardiopatas, especialmente aqueles emuso de digitálicos.

Betabloqueadores – São eficazes como monoterapia em apenas50% dos idosos, atingindo cerca de 80% quando associados aos diuréticos.Reduzem a morbimortalidade cardiovascular e são particularmente úteisnos hipertensos portadores de insuficiência coronária e arritmias. Deve-se evitar seu uso em portadores de pneumopatia e vasculopatia periférica.

Bloqueadores de canais de cálcio – São agentes eficazes comomonoterapia e não causam distúrbios no metabolismo de lípides e decarboidratos. A nitrendipina foi utilizada nos estudos SYST-EUR e SYST-China22,23 (Tabelas 3 e 4), reduzindo a morbimortalidade cardiovasculare cerebral em idosos portadores de hipertensão sistólica isolada. Sãodrogas especialmente indicadas na hipertensão arterial associada à

Tabela 3The Systolic Hypertension in Europe Trial (SYST-Eur)

• 4.695 pacientes, com idade igual ou acima de 60 anos, com hipertensão sistólicaisolada.

• Estudo multicêntrico, duplo-cego, randomizado, placebo-controlado, comseguimento médio de 2 anos.

• Nitrendipina (10 mg a 40 mg) como tratamento inicial.• Associação de enalapril e hidroclorotiazida se não houvesse resposta satisfatória ao

tratamento inicial.• No grupo que recebeu tratamento ativo houve redução de:

• 42% de acidentes vasculares cerebrais totais;• 44% de acidentes vasculares cerebrais não-fatais;• 26% de eventos cardíacos fatais e não-fatais;• 31% de eventos cardiovasculares fatais e não-fatais.

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coronariopatia, devido a seu efeito antianginoso. Seus principais efeitoscolaterais são: cefaléia, taquicardia reflexa, rubor facial e edema periférico(nifedipina, nitrendipina, felodipina e nicardipina); constipação intestinale bradiarritmia (verapamil e diltiazem); retenção urinária em pacientescom prostatismo.

Inibidores da enzima de conversão da angiotensina – Atuam ini-bindo o sistema renina-angiotensina-aldosterona e elevando as taxasplasmáticas das cininas e prostaglandinas, substâncias dotadas de açãovasodilatadora. São especialmente indicados na coexistência de insuficiênciacardíaca congestiva. Podem ser úteis, ainda, nos hipertensos diabéticosportadores de nefropatia, por reduzir a proteinúria e preservar a funçãorenal. Os efeitos adversos, como tosse seca, chegam a limitar seu emprego.Podem causar insuficiência renal nos indivíduos com estenose da artériarenal, ou hipotensão arterial importante, nos portadores de hipertensãorenovascular.

Antagonistas do receptor da angiotensina II – São drogasque antagonizam a ação da angiotensina II por meio do bloqueioespecífico de seus receptores AT-1. São eficazes como monoterapia,no tratamento do paciente hipertenso. São úteis principalmente nacoexistência de insuficiência cardíaca e quando o uso dos inibidoresda enzima de conversão da angiotensina é dificultado pela ocorrênciade tosse.

Vasodilatadores – Esse grupo inclui os bloqueadores dos receptoresalfa-1-pós-sinápticos (prazosina) e os de ação direta sobre a musculatura

Tabela 4The Systolic Hypertension in China Collaborative Group (SYST-China)

• 1.253 pacientes, com idade igual ou acima de 60 anos, com hipertensão sistólicaisolada.

• Estudo multicêntrico, duplo-cego, randomizado, placebo-controlado comseguimento médio de 2 anos.

• Nitrendipina (10 mg a 40 mg) como tratamento inicial.• Associação de captopril e hidroclorotiazida se não houvesse resposta satisfatória

ao tratamento inicial.• No grupo que recebeu tratamento ativo houve redução de:

• 38% de acidentes vasculares cerebrais totais;• 58% na mortalidade por acidente vascular cerebral;• 39% na mortalidade total;• 39% na mortalidade cardiovascular.

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lisa arteriolar (hidralazina). Não são boas opções como monoterapia ini-cial, mas podem ser utilizados nos casos de hipertensão refratária aotratamento convencional, ou quando há insuficiência cardíaca associadae não se pode utilizar inibidores da enzima de conversão ou antagonistasdo receptor da angiotensina II (devido a alterações renais, por exemplo).Podem causar retenção hídrica e taquicardia reflexa.

Simpatolíticos de ação central – Reduzem a atividade simpáticado sistema nervoso central e determinam vasodilatação periférica. Sãoparticularmente indicados nos hipertensos portadores de insuficiênciarenal, pois não reduzem a filtração glomerular, e de hipercolesterolemia,pois reduzem a fração LDL. Costumam ser associados à diuréticos porquepromovem retenção de sódio e água. Seu emprego é restrito devido aosefeitos colaterais freqüentes, como hipotensão ortostática, depressão,sonolência e impotência sexual.

ConclusõesO tratamento da hipertensão arterial no idoso, inclusive da sistólica

isolada, está associado a nítidos benefícios em termos de morbimortalidade.Seu planejamento deve ser fundamentado em apurado diagnóstico,verificação da presença de outros fatores de risco, avaliação docomprometimento de órgãos-alvo e presença de comorbidades. Nessecritério deve prevalecer o estado clínico sobre os achados meramentetensionais. A redução almejada da pressão arterial deverá ser lenta egradual, a fim de evitar quedas tensionais que possam acarretar hipofluxoem órgãos vitais. Análise conjunta com as condições socioeconômicasirá determinar a melhor opção terapêutica, objetivando-se, especialmente,uma boa adesão à prescrição.

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Hipertensão Arterial no Idoso

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Capítulo 7

Hipotensão eSíncope no Idoso

Marcia Regina Pinho Makdisse

Hipotensão e síncope são comuns nos idosos e estão diretamenterelacionadas à ocorrência de quedas não acidentais. As quedas estão entreas causas mais freqüentes de atendimento de idosos nos pronto-socorrose podem resultar em significante morbidade e comprometimento dacapacidade funcional desses pacientes.

Na prática clínica, hipotensão e síncope estão diretamente relaciona-das. Em mais da metade dos idosos atendidos com queixas de síncope,quedas, hipotensão ou vertigem observa-se superposição de sintomas ediagnósticos. A hipotensão ortostática, por exemplo, é causa de síncopeem 20% a 30% dos idosos. Em estudo realizado em uma clínica desíncope, observou-se que apenas 20% dos idosos apresentavam queixade síncope isolada, na maioria dos casos havia superposição entre síncope,quedas e vertigem e entre os diagnósticos de hipotensão ortostática,síndrome do seio carotídeo e síndrome vasovagal, sugerindo uma etiologiacomum a todas essas entidades clínicas1.

SíncopeÉ um sintoma caracterizado por perda súbita e transitória da cons-

ciência, associada à perda do tônus postural e recuperação espontânea. Aincidência de síncope aumenta com a idade, atingindo níveis de 6% aoano nos idosos, com recorrência de 30%2. Em um estudo de prevalênciade sintomas em idosos, a ocorrência de síncope, nas mulheres, aumentoude 3% entre 65 e 69 anos de idade para 13,6% após os 85 anos e de 0,8%para 13,4%, respectivamente, entre os homens3.

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FisiopatologiaOs episódios de síncope resultam basicamente da interrupção

transitória do fluxo sangüíneo cerebral. No idoso, caracteriza-se por sermultifatorial. Os principais fatores que predispõem à síncope estãodescritos na tabela 1.

O enrijecimento arterial gera aumento da pós-carga e a alteração dorelaxamento ventricular resulta em redução da velocidade de enchimentodiastólico, havendo necessidade de maiores pressões de enchimentoventricular e maior contribuição da contração atrial para a manutençãodo débito cardíaco. Reduções na pré-carga, provocadas por mudançapostural (ortostatismo), medicamentos, perdas de volume e período pós-prandial, reduzem a pressão de enchimento ventricular e resultam emqueda do débito cardíaco, podendo levar à síncope. A redução dasensibilidade reflexa barorreceptora dificulta a resposta vascular aoepisódio de hipotensão, tornando o idoso menos capaz de manter o fluxosangüíneo cerebral por meio do aumento da freqüência cardíaca e dotônus vascular4,5.

O fluxo sangüíneo cerebral diminui com a idade e o limiar de auto-regulação cerebral está desviado para níveis mais elevados de pressãoarterial, tornando o idoso mais suscetível à isquemia cerebral duranteepisódios de hipotensão arterial6 . Dificuldades em manter o volume

Tabela 1Principais fatores que predispõem o idoso à síncope

I. Alterações cardiovasculares1. Enrijecimento arterial2. Aumento da rigidez e redução da complacência ventricular3. Redução do enchimento diastólico do VE4. Aumento da pressão arterial sistólica

II. Alterações do sistema nervoso autonômico1. Redução da sensibilidade reflexa barorreceptora2. Aumento dos níveis de catecolaminas

III. Redução do fluxo sangüíneo cerebralIV. Dificuldade em manter o volume circulante efetivoV. Maior prevalência de hipertensão sistólica (HSI)VI. Maior prevalência de fibrilação atrialVII. Doença ateroscleróticaVIII. ComorbidadesIX. Medicamentos

Hipotensão e Síncope no Idoso

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circulante efetivo, devido à menor capacidade renal de conservação desódio, níveis plasmáticos reduzidos de renina e aldosterona e redução daresposta da sede à hiperosmolaridade plasmática, também são fatoresimportantes5.

Além das alterações decorrentes do processo de envelhecimento, amaior prevalência de hipertensão sistólica isolada, fibrilação atrial,doenças crônicas (média de 3,5 por paciente) e de polifarmácia, predis-põem o idoso à síncope. A suspensão de medicações cardiovasculares,em uma clínica de síncope, levou à melhora dos sintomas iniciais em78% dos idosos, não tendo havido necessidade de reintrodução de nitratosem 77%, de anti-hipertensivos em 69% e de antiarrítmicos em 36% doscasos7. A tabela 2 mostra os principais medicamentos relacionados àsíncope.

Tabela 2Medicamentos que podem levar à síncope

1. Diuréticos2. Vasodilatadores

• Antagonistas de cálcio• Inibidores da enzima conversora da angiotensina• Hidralazina• Prazosina

3. Outros anti-hipertensivos• Alfa-metildopa• Clonidina

4. Antianginosos• Antagonistas de cálcio• Betabloqueadores• Nitratos

5. Antiarrítmicos• Amiodarona • Quinidina• Disopiramida • Procainamida• Encainida • Sotalol• Flecainida

6. Digital7. Outros medicamentos

• Antidepressivos tricíclicos • Fenotiazinas• Barbitúricos • Haloperidol• Cetoconazol • Inibidores da monoaminoxidase• Cisaprida • Sildenafil• Eritromicinas • Teofilina

Hipotensão e Síncope no Idoso

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ClassificaçãoAs principais causas de síncope estão descritas na tabela 3.

I – Síncopes cardíacasArritmias cardíacas – Tanto as bradiarritmias quanto as taquiarritmias

podem causar síncope. A doença do nó sinusal e a taquicardia ventricularsão as arritmias mais encontradas em idosos com síncope, sendoresponsáveis por 22% dos casos8. No Brasil, a doença de Chagas é umacausa de síncope comum nas regiões endêmicas.

Doença valvar – A estenose aórtica é a doença valvar mais relacionadaà síncope do idoso e ocorre em cerca de 25% dos pacientes com estenoseaórtica sintomática. Ao contrário dos pacientes mais jovens, nos quais oepisódio de síncope ocorre geralmente após esforço físico, os idosospodem apresentar síncope em repouso e em situações de estimulaçãovagal ou perdas de volume. Insuficiência mitral e estenose mitral emfase avançada podem mais raramente levar à síncope9.

Miocardiopatia hipertrófica obstrutiva – A síncope nos pacientescom miocardiopatia hipertrófica obstrutiva pode ser conseqüência da

Tabela 3Causas de síncope

I. Síncopes cardíacas1. Arritmias cardíacas2. Doença valvar3. Miocardiopatia hipertrófica obstrutiva4. Doença arterial coronária5. Mixoma atrial6. Tromboembolismo pulmonar7. Aneurisma dissecante da aorta

II. Hipotensão ortostáticaIII. Síncopes reflexas

1. Vasovagal ou neurocardiogênica2. Hipersensibilidade do seio carotídeo (HSC)3. Situacional4. Hipotensão pós-prandial5. Neuralgias

IV. Doenças cerebrovasculares e psiquiátricas1. Acidentes vasculares cerebrais/ataque isquêmico transitório2. Síndrome do roubo da subclávia3. Doenças psiquiátricas

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obstrução do fluxo na via de saída do ventrículo esquerdo ou de arritmiascardíacas, especialmente a taquicardia ventricular. Fatores que aumentemo grau de obstrução na via de saída do ventrículo esquerdo, tais comotaquicardia, uso de vasodilatadores, digital e diuréticos, podem predisporos pacientes à síncope6.

Doença arterial coronária – A prevalência de síncope comomanifestação clínica de infarto agudo do miocárdio aumenta com a idade,podendo ser o único sintoma referido. Esteve presente em 13,4% dospacientes em uma série que avaliou as manifestações clínicas de infartodo miocárdio em idosos, tendo sido mais prevalente entre os mais idosos(8,8% < 70 anos e 18% ≥ 85 anos)10.

Mixoma atrial – Pode causar síncope devido à redução do débitocardíaco provocada pela obstrução da valva atrioventricular. Acomete oátrio esquerdo em mais de 80% dos casos e se caracteriza por sintomas esinais (dispnéia, síncope e sopro) de instalação abrupta e que se alteramcom a mudança de posição do paciente11.

Tromboembolismo pulmonar – Pode ocorrer síncope em até 15%dos pacientes com tromboembolismo pulmonar maciço, devido àinsuficiência ventricular direita12.

Aneurisma dissecante da aorta – A ocorrência de síncope em 4% a5% das dissecções de aorta está freqüentemente associada à ruptura daaorta proximal, resultando em tamponamento cardíaco13.

II – Hipotensão ortostáticaÉ a causa da síncope em 20% a 30% dos idosos. É definida como a

queda da pressão arterial sistólica maior que 20 mmHg, medida 1 a 3minutos após a mudança da posição supina para o ortostatismo. Estápresente em cerca de 11% a 33% dos pacientes idosos, porém, entreos idosos saudáveis que não usam medicamentos, a prevalência caipara 6%, sugerindo que o fator etário isoladamente não é suficientepara levar à hipotensão ortostática14. A hipotensão, comumente, resultada interação entre alterações dos mecanismos reguladores da pressãoarterial, secundárias ao processo de envelhecimento e de condiçõesassociadas (medicamentos, comorbidades, disfunção autonômica ouda soma desses fatores)15. A maior prevalência de hipertensão arterialsistólica no idoso também contribui para o aparecimento de hipotensãoortostática16.

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As causas mais comuns de hipotensão ortostática estão descritas natabela 4. As causas primárias são mais raras e devem ser lembradas nospacientes que apresentam hipertensão supina com hipotensão posturalmarcante, na ausência de outras condições ou medicações associadas àhipotensão postural. A causa secundária mais comum de síncope é ainduzida por medicamentos, principalmente diuréticos e vasodilatadores17.

III – Síncopes reflexasVasovagal ou neurocardiogênica – É mais comum em jovens.

Durante o episódio de síncope, ocorre inicialmente aumento da pressãoe da freqüência cardíacas, seguidas de hipotensão e bradicardia deinstalação abrupta, com recuperação espontânea18. A síncope vasovagalestá comumente associada a sintomas de atividade autonômica e humoral,tais como palidez, náuseas, vômitos e sudorese, mas, pode ocorrer naausência desses sintomas. Ocorre geralmente em indivíduos semcardiopatia e fatores desencadeantes (dor intensa, medo, estresseemocional, punção venosa, ortostatismo prolongado, calor,instrumentação, etc.) são identificáveis na maioria dos casos12.

Hipersensibilidade do seio carotídeo (HSC) – Caracteriza-sepor hipotensão e bradicardia exageradas em resposta à massagem do

Tabela 4Causas de hipotensão ortostática

I. Primárias: falência autonômica1. Hipotensão ortostática primária (falência autonômica pura)2. Atrofia sistêmica múltipla (síndrome de Shy-Drager)3. Doença de Parkinson

II. Secundárias1. Hipovolemia2. Medicações (ver Tabela 2)3. Cardíacas (ver Tabela 3)4. Hipertensão sistólica isolada5. Repouso prolongado no leito6. Neuropatias periféricas (diabetes, amiloidose, etc.)7. Doenças do sistema nervoso central (AVC ou tumor do hipotálamo ou

mesencéfalo)8. Metabólicas (deficiência de vitamina B12)9. Endocrinológicas (diabetes insipidus, insuficiência adrenal,

hipoaldosteronismo)10. Doença vascular periférica (grandes veias varicosas)

Hipotensão e Síncope no Idoso

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seio carotídeo. É freqüente em idosos, podendo atingir níveis de até 46%nos pacientes que procuram atendimento devido a quedas e/ou síncopesinexplicadas. A prevalência de síncope no grupo-controle foi de 13%19.Os episódios de síncope podem ser causados por fatores que exerçampressão sobre o seio carotídeo (colarinho apertado, movimentos abruptosdo pescoço, fazer a barba, etc.), patologias cervicais (linfadenomegalias,tumores de cabeça e pescoço) e uso de medicamentos (alfa-metildopa,digital e propranolol).

Situacional – É a síncope que ocorre durante ou imediatamenteapós eventos específicos, tais como micção, evacuação, deglutição outosse. Está freqüentemente associada à hipotensão ortostática. Ospacientes que apresentam síncope relacionada à deglutição, de modogeral apresentam doença estrutural do esôfago (divertículo, espasmo,estenose, acalasia). O diagnóstico deste tipo de síncope é sugerido pelaanamnese5.

Hipotensão pós-prandial – Ocorre durante ou até 1 hora após arefeição e está relacionada ao desvio de sangue para os vasos es-plâncnicos. A combinação de refeições quentes, ricas em carboidratose posição ortostática, esteve associada à hipotensão sintomática, em22% dos idosos funcionalmente independentes, em um estudo re-cente20.

Neuralgias – Os episódios de síncope associados à neuralgia dotrigêmeo ou do glossofaríngeo, geralmente estão associadas à bradicardia,provavelmente secundária à estimulação vagal intensa6.

IV – Doenças cerebrovasculares e psiquiátricasAcidente vascular cerebral/ataque isquêmico transitório – Rara-

mente causam síncope. Sua ocorrência sugere isquemia originada nacirculação vertebrobasilar6.

Síndrome do roubo da subclávia – A síncope é secundária à estenoseda artéria subclávia e desvio do fluxo da artéria vertebral ipsilateral parasuprir o fluxo sangüíneo para o membro superior. Raramente causasíncope. Deve ser suspeitada quando existe diferença na pressão arterial≥ 20 mmHg e na intensidade dos pulsos entre os braços21.

Doenças psiquiátricas – Ansiedade generalizada, ataques de pânicoe depressão maior podem estar relacionadas à sincope, principalmenteem pacientes mais jovens22.

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Avaliação diagnóstica

I – Avaliação inicialInclui história, exame físico e eletrocardiograma. Se bem realizados,

a história e o exame clínico podem levar ao diagnóstico etiológico em38% a 50% dos casos23,24.

História clínica – Se possível, os dados devem ser coletados com opaciente e com a testemunha, pois amnésia retrógrada pode ocorrer ematé um terço dos idosos com síncope1. Deve-se interrogar a respeito daposição em que o paciente se encontrava na hora da síncope, a forma decair, a duração do episódio, se foi precedido por sintomas (palpitações,dispnéia, dor torácica, sudorese, dor na face ou pescoço, etc.), a presençade fatores precipitantes (movimentos do pescoço, mudança postural, ativi-dade física, evacuação, micção, deglutição, tosse, pós-prandial, estresseemocional) e antecedentes de cardiopatia, doença neurológica ou meta-bólica, medicações em uso e ajustes recentes na medicação e recorrênciada síncope25.

Exame físico – Deve ter como objetivo confirmar ou excluir alteraçõescardíacas, neurológicas e hipotensão ortostática.

1. Pressão arterial – Recomenda-se medir a pressão após 5 minutosna posição supina, e 1 a 3 minutos após assumir a posiçãoortostática. Redução ≥ 20 mmHg na pressão sistólica inicial ouredução da pressão sistólica abaixo de 90 mmHg caracterizam ahipotensão ortostática, independente da presença de sintomas25.A resposta pressórica a mudanças posturais pode ser variável,podendo ser necessárias medidas em ocasiões diferentes para seestabelecer o diagnóstico, principalmente se a função autonômicaestiver preservada e as medidas forem tomadas à tarde. Ward eKenny, avaliando idosos com hipotensão postural sintomáticadocumentada, observaram reprodutibilidade das medidas depressão, em apenas 67,5% dos pacientes. A reprodutibilidade foimaior no período da manhã e em todos os pacientes queapresentaram hipotensão postural, a queda dos níveis sistólicosocorreu nos primeiros 2 minutos15.

Deve-se ainda verificar a pressão arterial nos dois braços. Assimetriasna intensidade dos pulsos ou nos níveis de pressão > 20 mmHg, sãosugestivos de dissecção da aorta ou síndrome de roubo da subclávia.

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2. Exame do sistema cardiovascular – Observar a presença dearritmias, sopros cardíacos ou carotídeos, sinais de insuficiênciacardíaca, grandes veias varicosas.

Exame neurológico – Buscar basicamente sinais neurológicos focais.Eletrocardiograma (ECG) – Inespecífico na maioria dos casos,

porém, quando está alterado, torna-se um preditor independente parasíncope cardíaca. Deve-se observar alterações de ST, ondas Q patológicase duração do intervalo QT. O ECG é diagnóstico de síncope devida àarritmia, na presença de bradicardia sinusal < 40 bpm, bloqueiossinoatriais, pausas sinusais repetidas > 3 segundos, bloqueios atrioven-triculares (Mobitz II ou total), alternância entre bloqueio de ramo direitoe esquerdo, taquicardia supraventricular paroxística ou taquicardiaventricular e disfunção de marca-passo25.

II – Avaliação complementarLaboratorial – Glicemia, eletrólitos, hemograma e função renal. Nos

casos suspeitos, solicitar sorologia para doença de Chagas.Massagem do seio carotídeo (MSC) – Está indicada nos pacientes

com mais de 40 anos de idade, nos quais a avaliação inicial não identificoua causa da síncope. Está contra-indicada nos primeiros três meses apósinfarto do miocárdio, acidente vascular cerebral ou ataque isquêmicotransitório. Nos pacientes que apresentam sopro carotídeo, deve-se realizarultra-sonografia com Doppler das carótidas. Se estenose significativa (>70%) for observada, evita-se o procedimento. O exame deve ser realizado,preferencialmente, em mesa de teste de inclinação. O paciente devepermanecer na posição supina por 5 minutos, com monitorização contínuade eletrocardiograma e pressão arterial não invasiva. A massagem devedurar no máximo 5 segundos, com intervalo de 1 minuto entre os lados.Diagnostica-se hipersensibilidade do seio carotídeo quando os sintomassão reproduzidos durante ou imediatamente após a MSC. A resposta podeser cardioinibitória (assistolia ≥ três segundos), vasodepressora (queda napressão arterial ≥ 50 mmHg) ou mista. Caso a MSC seja negativa bilate-ralmente, repete-se o procedimento com inclinação de 700, aumentando-se a sensibilidade do teste26. As complicações neurológicas da MSC sãoincomuns e transitórias (0,14% a 0,45%)27,28.

Ecocardiograma – É importante para o diagnóstico de cardiopatiaestrutural, especialmente estenose aórtica e mixoma atrial, e para estra-

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tificação de risco. Está indicado nos pacientes com suspeita de síncopecardíaca25.

Holter – Está indicado nos pacientes com cardiopatia estrutural esintomas freqüentes, quando a probabilidade de se identificar uma arritmiaé maior. No idoso, a interpretação dos resultados torna-se mais difícildevido à alta prevalência de arritmias assintomáticas. Correlação positivaentre alteração eletrocardiográfica e sintomas, ocorre em 2% a 15% dospacientes. Quando houver suspeita diagnóstica e o Holter não detectararritmias, os monitores de eventos com memória circular, que podempermanecer com o paciente por tempo prolongado, podem aumentar ematé 25% a chance de diagnóstico29.

Teste ergométrico – Está indicado nas síncopes induzidas porexercícios, na suspeita de doença coronária e de arritmias desencadeadaspelo esforço. A ocorrência de síncope durante o exercício, sugere síncopecardíaca e na fase de recuperação, síncope reflexa25.

Teste de inclinação (tilt table test) – É útil no diagnóstico da síncopevasovagal, da hipersensibiliade do seio carotídeo e da hipotensãoortostática. Está indicado, principalmente, nos idosos sem cardiopatia ecom síncope inexplicada. O teste pode ser potencializado com o uso demedicações tais como isoproterenol, adenosina e nitratos. Nos idosos,devido ao risco maior de complicações, recomenda-se evitar o uso dedrogas provocativas. O teste é positivo se ocorrer síncope. Observam-setrês tipos de resposta. A mista, quando a freqüência cardíaca (FC) diminui,mas permanece > 40 bpm ou cai < 40 bpm por < 10 segundos semassistolia > 3 segundos. A cardioinibidora, na qual a FC cai abaixo de 40bpm por > 10 segundos ou assistolia > 3 segundos. A vasodepressora,quando há queda isolada da pressão arterial (a FC reduz-se em menos de10% do valor de pico). As contra-indicações ao teste são: estenose aórticaou mitral grave, cardiomiopatia obstrutiva e obstruções críticas dascoronárias ou carótidas30,31.

Estudo eletrofisiológico (EEF) – Pode ser indicado quando aavaliação inicial sugere arritmia como causa da síncope (presença decardiopatia estrutural, alterações eletrocardiográficas, palpitaçõesprecedendo a síncope). É útil para identificar e guiar o tratamento detaquiarritmias, disfunção do nó sinusal e doença do sistema de condução.Tem valor prognóstico. Os pacientes com síncope inexplicada e EEFnão diagnóstico, apresentam baixo risco de morte súbita6,25.

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Monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA) – Podeser útil para documentação de hipotensão pós-prandial e suspeita dehipotensão provocada por medicamentos.

Tomografia de crânio e eletroencefalograma – Estão indicados,respectivamente, nos pacientes com alterações neurológicas focais equando há suspeita de epilepsia 25.

Avaliação neurológica e psiquiátrica – Não deve ser recomendadade rotina. Devem ser encaminhados os pacientes com sintomas sugestivosde síncope psicogênica ou antecedente de doença psiquiátrica, falênciaautonômica, síndrome de roubo cerebrovascular e acidente vascularcerebral25.

TratamentoO tratamento da síncope depende de sua etiologia. No idoso, no

entanto, por seu caráter multifatorial, medidas gerais devem ser instituídascom o intuito de prevenir a recorrência e reduzir a morbidade relacionadaà síncope.

Medidas geraisReavaliação das medicações prescritas – Duspender qualquer

medicação cujo benefício terapêutico não esteja claro; rever a necessidadede manter nitratos, antiarrítmicos e hipotensores; ajustar doses de medicaçõescardiovasculares, especialmente diuréticos e vasodilatadores; evitar uso devários hipotensores em um mesmo horário e no período pós-prandial.

Controle das comorbidades – Corrigir anemia, hipovolemia,diabetes, etc.

Mudanças de hábitos – Evitar: movimentos bruscos do pescoço,colarinhos apertados, mudanças posturais abruptas, ortostatismoprolongado, refeições copiosas e ricas em carboidratos. Estimular: ingestãohídrica e de fibras, evitando-se o esforço da evacuação; uso de meiaselásticas e atividade física regular.

Tratamento específicoSíncopes cardíacas – As taquiarritmias devem ser tratadas com

antiarrítmicos, ablação por cateter (procedimento que tem se mostrado seguromesmo em octogenários)32 e/ou desfibrilador implantável. Se não for possível

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reverter a fibrilação atrial, iniciar medicações para controle da freqüênciaventricular e anticoagulação oral de baixa intensidade (INR 2-3), na ausênciade contra-indicações. Nas bradiarritmias, o primeiro passo deve ser suspendermedicações que possam causar bradicardia (digital, betabloqueadores,antagonistas do cálcio, antiarrítmicos). Não havendo melhora, indica-se marca-passo atrial ou dupla-câmara por serem mais fisiológicos. A ocorrência desíncope em pacientes com estenose aórtica grave está associada à reduçãoda sobrevida média em dois anos e constitui indicação para troca valvar. Amiocardiopatia hipertrófica pode ser tratada com medicamentos(betabloqueadores ou verapamil) e nos casos mais graves, implante de marca-passo dupla-câmara ou cirurgia estão indicados 5,6,25.

Hipotensão ortostática – O tratamento inicial consiste emsuspender ou ajustar a dose dos medicamentos que possam causarhipotensão e repor a volemia. Recomenda-se elevar a cabeceira da camaà noite (> 100) para permitir exposição gravitacional durante o sono,mudanças posturais lentas, uso de meias elásticas e atividade físicaprogramada. Nos casos muito sintomáticos, tratamento medicamentosocom fludrocortisona (0,1 mg, 2 vezes ao dia) ou midodrina (2,5 mg a 10mg VO, 3 vezes dia) pode ser instituído. A terapia medicamentosa pode,entretanto, agravar a hipertensão supina25.

Síncopes reflexas – Na síncope vagal, deve-se inicialmenteidentificar e evitar os fatores desencadeantes. Os betabloqueadores sãoas drogas mais utilizadas e agem através da inibição da ativação dosmecanoceptores cardíacos, devido à redução da contratilidademiocárdica. Os mais utilizados têm sido o atenolol, o propranolol e ometoprolol. A eficácia dos betabloqueadores, no entanto, tem sidoquestionada em estudos prospectivos controlados. Outros medicamentos,tais como fludrocortisona, paroxetina, midodrina e teofilina, também têmsido utilizados. Testes de inclinações repetidos (tilt training) podem serúteis na prevenção de recorrência da síncope5,6,25.

Nos idosos com hipersensibilidade do seio carotídeo, o implante demarca-passo dupla câmara deve ser o tratamento de escolha, quando aresposta à MCE for cardioinibitória 33. Na forma vasodepressora, asuspensão de vasodilatadores (se possível), a correção da volemia e ouso de vasoconstritores, podem ser úteis.

Nas síncopes situacionais, o tratamento consiste em evitar ou modificaro evento deflagrador da síncope. Na síncope pós-miccional, recomenda-se

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postura protegida (urinar sentado) e evitar ingerir grandes quantidadesde líquido à noite. Na relacionada à evacuação, regularizar o hábitointestinal com maior ingestão de líquidos, fibras e, se não for suficiente,regularizadores intestinais. Na síncope provocada pela tosse, tratar acausa da tosse e, se necessário, utilizar antitussígenos. Ingerir alimentossólidos em pequenas porções e evitar líquidos muito gelados, ajudam aprevenir a síncope relacionada à deglutição5,6,25.

Na hipotensão pós-prandial, recomendam-se refeições fracionadas,com baixo teor de carboidratos, evitando-se álcool, exercícios físicos eadministração de vasodilatadores, após as refeições principais20.

Doenças cerebrovasculares e psiquiátricas – A síncope por roubosvasculares deve ser tratada através de angioplastia ou cirurgia. Os casossuspeitos de síncope psicogênica devem ser encaminhados ao psiquiatra.

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Capítulo 8

InsuficiênciaCardíaca nos Idosos

Antonio Carlos Pereira Barretto

Os pacientes idosos estão mais sujeitos à insuficiência cardíaca (IC)do que os mais jovens, como confirmam os dados epidemiológicos. Noestudo de Framingham, por exemplo, a IC foi observada em cerca de 1%dos pacientes com menos de 55 anos de idade e naqueles com mais de 85anos, em 30%1.

Assim, a IC tem sido motivo crescente de estudo, porque vem setornando mais freqüente e, também, por suas implicações sociais,pois aumenta a mortalidade dos portadores, além de reduzir a suaqualidade de vida. Ao lado disso, aumenta as despesas de Saúde Pú-blica, assim como as do paciente, pois provoca um crescimento ex-pressivo das hospitalizações. A IC é a causa mais comum de hos-pitalização no idoso2.

Os dados do estudo DIG, que arrolou mais de 8.000 pacientes,documentam essas informações. Dividindo-se a casuística em cincogrupos, aqueles com idade inferior a 50 anos, os com idade entre 50 e 59anos, os com 60 a 69 anos, os com 70 a 79 anos e aqueles com mais de80 anos, pode-se observar um aumento progressivo da incidência de mortee de hospitalizações por insuficiência cardíaca, com o aumento da faixaetária 3 (Figura 1). Esses achados, comuns a vários estudos com idosos,têm várias causas, como a própria fisiopatologia do comprometimentocardíaco, embora contribua muito a presença de doenças associadas, quesão muito mais freqüentes com o aumento da idade e que agregam fatoresagravantes à evolução dos pacientes.

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Os dados brasileiros apontam para a mesma direção. No estudo EMI4,embora a IC não tenha sido a principal causa de consulta dos idosos emambulatórios (cerca de 10%), foi a maior causa de hospitalização (31%),inclusive de urgência (18%). Em levantamento que realizamos no InCor,observamos que cerca de 10% das internações foram decorrentes dequadros de IC5. Pudemos constatar que nesses pacientes, a mortalidadeentre os idosos foi maior, em decorrência da associação de múltiplosfatores agravantes, como fibrilação atrial, pneumonia, insuficiência renal,diabetes, etc. (Figura 2). Pudemos também verificar que os idosospermaneceram internados por mais tempo (o período médio de internaçãodos idosos é de 24 dias e dos jovens, de 15 dias) para a compensação daICC e o controle dos vários diagnósticos associados6.

FisiopatologiaO comprometimento cardíaco do geronte é rico em peculiaridades

fisiopatológicas com implicações clínicas. Um aspecto bastanteinteressante é o tipo de comprometimento cardíaco, pois o geronte

Insuficiência Cardíaca nos Idosos

Figura 1 – Gráfico mostrando aumento das hospitalizações e da mortalidade com oaumento da idade (dados do estudo DIG).

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apresenta, para a mesma intensidade de manifestação clínica, menorgrau de disfunção sistólica, menor dilatação ventricular e maior grau dedisfunção diastólica. Os estudos de IC em idosos identificaram pacientescom função sistólica preservada em 30% a 50% dos casos7. Quando sedividem os pacientes por faixas etárias, a freqüência de IC com funçãosistólica normal é maior com o aumento da idade, sendo de 22% nasidades de 70 a 74 anos, 34,1% na faixa de 75 a 84 anos e 49,1% nasidades acima de 85 anos8. No estudo DIG, a disfunção diastólica maisque dobrou de freqüência, passando de 8,2% entre os com menos de 50anos para 19,5% entre os com mais de 80 anos (Figura 3)3. Apesar docomprometimento miocárdico ser, em média, maior entre os jovens, ataxa de mortalidade aumenta com a idade, tanto nos que apresentamdisfunção sistólica como nos que têm disfunção diastólica. Entretanto,os pacientes com disfunção diastólica têm menor mortalidade que oscom função sistólica mais preservada (Figura 4)3.

Esse achado valoriza a fração de ejeção como forma de avaliar odesempenho ventricular global; por outro lado, tanto nos idosos como

Insuficiência Cardíaca nos Idosos

Figura 2 – Gráfico mostrando maior número de diagnósticos secundários com oaumento da idade, em pacientes internados por insuficiência cardíaca.

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Insuficiência Cardíaca nos Idosos

Figura 3 – Dados do estudo DIG mostrando o aumento da incidência de pacientescom disfunção diastólica entre os pacientes mais idosos.

Figura 4 – Dados do estudo DIG mostrando aumento da mortalidade para os maisidosos, sendo que os com disfunção diastólica apresentam menor mortalidade.

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entre os mais jovens, a classe funcional tem se mostrado excelente fatorprognóstico, sendo melhor preditor de mortalidade que a fração de ejeçãoe o consumo de oxigênio8. Embora se deva avaliar a fração de ejeção detodos os pacientes, pois a presença de disfunção sistólica identificapacientes de pior prognóstico, os sintomas identificam com maior acuráciaos pacientes que terão pior evolução.

A estimulação neuro-hormonal, ao lado de um mecanismocompensatório, tem tido seu papel valorizado em portadores de IC, poisa manutenção de níveis elevados de estimulação tem sido reconhecidacomo fator perpetuador de falência cardíaca e como indicador prognósticoda doença9-11. Com a instalação da disfunção sistólica, o aumento daestimulação neuro-humoral tem papel fundamental como mecanismocompensatório. O aumento dos níveis dos neuro-hormônios de efeitovasodilatador, como o fator atrial natriurético, facilitando a função car-díaca, mantém o paciente compensado. À medida que aumenta o danomiocárdio e a própria estimulação neuro-humoral, passam a predominaros efeitos dos neuro-hormônios com efeito vasoconstritor, que induzemao aumento da resistência periférica e dificultam a função cardíaca,provocando um ciclo vicioso de piora progressiva da doença.

Ao lado de melhorar o desempenho cardíaco e ser muitas vezes ofator capaz de manter pacientes compensados, o aumento precoce dofator atrial natriurético vem sendo valorizado como um marcador precoceda presença de IC10,12,13. No Brasil, já temos hoje kits de dosagem queauxiliam no diagnóstico diferencial da IC, freqüentemente difícil nosidosos12,13. Devemos dosá-lo, por exemplo, para o diagnóstico diferencialda dispnéia do idoso ou mesmo no diagnóstico diferencial do edema. Seos níveis de BNP se encontrarem aumentados, a causa mais provávelpara os sintomas será a insuficiência cardíaca; se os níveis estiveremnormais, devemos continuar a investigação e valorizar outras causas(doença pulmonar, insuficiência renal).

No idoso com IC, assim como no idoso sadio, os níveis denorepinefrina são maiores que nos jovens. Esses dados documentam quenos idosos a resposta neuro-hormonal não difere qualitativamente daobservada nos mais jovens; entretanto, os níveis mais elevados podemexplicar a pior evolução que os idosos costumam apresentar.

O papel da idade no comportamento neuro-humoral foi analisado noestudo SOLVD, que detectou, nos portadores de disfunção sistólica

Insuficiência Cardíaca nos Idosos

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severa (fração de ejeção < 35%), um aumento de norepinefrina e dofator atrial natriurético, redução dos níveis de renina e estabilidade dosníveis de arginina/vasopressina, em função do aumento da idade9.

Em resumo, entre pacientes com IC, os idosos apresentam, para omesmo grau de sintomatologia, menor grau de dilatação das câmarasventriculares, menor disfunção sistólica, maior intensidade de disfunçãodiastólica e níveis mais elevados de catecolaminas e de fator atrialnatriurético.

DiagnósticoO diagnóstico da IC no idoso nem sempre é fácil, não só pela diferença

na forma de manifestação, como também pela comorbidade, que é umachado usual. As manifestações clínicas da IC nos idosos freqüentementediferem das encontradas entre os mais jovens. O diagnóstico é dificultadopela influência dos hábitos ou pela presença de condições concomitantesque podem mimetizar ou mascarar a IC14,15, à medida que causem, porexemplo, tosse crônica, náusea, vômitos, fadiga, dispnéia, estertores debase ou edema. Por outro lado, no idoso, a IC pode exteriorizar-se pormanifestações atípicas que incluem distúrbios do sono, do paladar e atéalterações comportamentais.

O sinal clínico mais sensível para o diagnóstico da IC é a ausculta deestertores crepitantes nas bases pulmonares (sensibilidade de 44%) e omais específico, a estase jugular (especificidade de 97%)2.

Com a difusão da dosagem do BNP, poderemos cada vez mais utilizaresse método para o diagnóstico diferencial de muitos casos, descartando-sea IC naqueles com níveis baixos de BNP10,12,13.

Uma vez diagnosticada a IC, torna-se fundamental caracterizar o tipoe o grau de comprometimento cardíaco. No idoso, muitas cardiopatias,destacando-se a doença arterial coronária e a estenose aórtica valvar,podem evoluir de maneira silenciosa, tornando sua identificaçãofundamental para uma orientação correta. É defensável, portanto, solicitar,para todos os idosos portadores de IC, estudo ecocardiográfico bidi-mensional, para auxílio diagnóstico, etiológico, funcional e prognóstico16.

TratamentoO tratamento do idoso não difere substancialmente, quando

comparado ao proposto para pacientes mais jovens. Devemos tomar o

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cuidado de não nos deixar guiar pela idade para contra-indicar certascondutas, por as considerarmos de risco, e deixar de oferecer aos idososo benefício que elas poderiam promover.

Os principais objetivos do tratamento são aliviar os sintomas, prevenirhospitalizações e possivelmente prolongar a sobrevida.

A orientação terapêutica deve inicialmente tentar identificar se épossível corrigir causas desencadeantes ou agravantes de IC, como porexemplo hipertensão arterial, insuficiência coronária, valvulopatia,infecções, embolismo pulmonar, ingestão excessiva de sal, arritmiascardíacas, anemia e uso de antiinflamatórios não-hormonais (AINH).Entre idosos, é freqüente a não adesão ao tratamento ou uma confusãona tomada dos medicamentos, desencadeando ou agravando o quadro. Aorientação quanto à dieta e à restrição de sódio deve considerar que,freqüentemente, alterações do paladar levam a um maior consumo desal. A prescrição dos medicamentos deve levar em conta a tendência àmenor eliminação e à interação de drogas, pois em geral várias delas sãoutilizadas concomitantemente.

Gostaria de apontar, por exemplo, o papel dos AINH entre as causasde descompensação cardíaca. Em estudo recente, pôde-se observar quea principal causa de hospitalização entre idosos foi a descompensaçãodesencadeada pelo uso de AINH. Um dado importante a se considerar,quando da prescrição desses medicamentos, é o tempo de ação, pois osAINH de ação prolongada foram os que mais provocaram esses eventos17.

Apesar de o tratamento básico do idoso não diferir do prescrito aosmais jovens, algumas peculiaridades devem ser ressaltadas.

Pelas características próprias dos mais idosos, são muitas as razõespara maior necessidade de internações5,18,19. Recentemente, demonstrou-seque pacientes não casados ou sozinhos descompensam mais, fato tambémmuito freqüente entre os idosos20. Isso ressalta a falta de estrutura social,que freqüentemente transforma o idoso em um problema familiar, o queleva a família a procurar os hospitais como solução. Em nossa experiência,o abandono do idoso em casa é fator importante para pior evolução, e,mais freqüentemente que desejaríamos, temos tido dificuldade para daralta para os idosos, pois os familiares não os querem em casa, alegandonão ter condições de tratá-los adequadamente. Referem não ter quemos faça companhia durante o dia, fato que provoca um círculo vicioso,pois esses pacientes, em casa, não receberão a medicação adequada e

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retornarão com maior freqüência ao hospital. No Hospital Auxiliar deCotoxó, pudemos observar que uma das principais causas de reinternaçãoé a não tomada da medicação da maneira prescrita6.

Documentada a importância da assistência domiciliar, um estudoanalisou o papel de visitas da equipe médica à casa dos pacientes eobservou melhora da classe funcional e redução do número dehospitalizações. Nesse estudo, 42 pacientes idosos (média de idade de78 anos) foram visitados por clínicos e uma equipe de paramédicos, emcasa, pelo menos uma vez por semana. Com a implantação do serviço,houve redução do número de internações, de 3,2 para 1,2/ano, e do númerode dias internados, de 26 para 6 dias por ano. Paralelamente, a atividadefísica diária, avaliada em um escala de 1 a 4, passou de 0,7 para 1,4.Portanto, o apoio aos idosos pode proporcionar, além de melhora clínica,redução nos gastos médicos20.

Tratamento medicamentosoPelas evidências até hoje acumuladas, o tratamento medicamentoso

do idoso deve ser feito de maneira semelhante ao realizado para os maisjovens. Assim, o tratamento da IC, baseado na prescrição de digital,diuréticos e no bloqueio neuro-hormonal (inibidores da enzima conver-sora, espironolactona e betabloqueadores), é também acompanhado deboas respostas, como redução das manifestações clínicas, da necessidadede hospitalização e pelo aumento da sobrevida, entre os idosos. Nasformas assintomáticas, previne o aparecimento da doença.

A afirmação de que o tratamento deve ser semelhante, está baseadanos achados dos vários estudos clínicos. Embora o número de estudosespecíficos para a população idosa seja pequeno até hoje, devemosconsiderar que, na maioria dos grandes estudos multicêntricos, não houveexclusão dos idosos de sua casuística, e na análise dos resultadosprocurou-se verificar se a idade influenciava a resposta, constatando-seque os gerontes respondem de maneira semelhante aos mais jovens.

Digital e diuréticosA utilidade dos digitálicos é óbvia em portadores de IC com fibrilação

atrial, para controle da freqüência cardíaca e redução dos sintomas. Sendoessa arritmia mais freqüente entre os idosos, um percentual significativode pacientes tem indicação precisa para sua prescrição.

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O papel da idade na evolução e na resposta à digoxina foi objeto deanálise específica no estudo DIG21. Esse estudo mostrou que a prescriçãode digoxina não modifica a sobrevida dos portadores de IC, mas seuemprego crônico induz a uma maior estabilização dos pacientes, que, naevolução, apresentam menor número de descompensações e internações.Nesse estudo, cerca de 27% dos pacientes tinham mais de 70 anos, e naapresentação original21 a idade não foi apontada como fator agravantepara o emprego desse medicamento; os efeitos benéficos do digitalcontinuaram a ser observados, reduzindo as hospitalizações em geral eas decorrentes de falência cardíaca, independente da idade dos pacientes.

Vale ressaltar que a idade deve ser considerada como um risco paraintoxicação digitálica. Quanto à intoxicação digitálica, o estudo DIGmostrou dados interessantes, que documentaram a dificuldade de seudiagnóstico. Destacou-se que manifestações muitas vezes atribuídas àintoxicação digitálica poderiam ser decorrentes da própria idade, e nãoda ação do digital3. Embora tenha sido observado um aumento do númerode casos suspeitos de intoxicação digitálica, esse aumento também foiobservado entre os que foram tratados com placebo.

Outro ponto importante no momento da prescrição do digital aos idososé valorizar a concomitância de outras doenças, como alterações renais(redução da velocidade de filtração glomerular), que predispõem àintoxicação, fato que nos leva a sempre prescrever digital com maiscuidado, nesses pacientes.

Outra medicação indispensável no tratamento da IC é o diurético. O seuvalor é tão grande que não se admite planejar estudo com grupo-controlesem diuréticos. Seu uso adequado é fundamental, recomendando-se doseselevadas para os pacientes com IC avançada19. Tentativas de suspensão dessesagentes resultam quase sempre em descompensações mais freqüentes.

Nos idosos, a prescrição deve ser mais cuidadosa, pela presençafreqüente de insuficiência renal e maior suscetibilidade à desidratação,que podem exacerbar a disfunção renal e causar hipotensão postural,levando a quedas e fraturas. Considerando esses problemas eventuais,sua utilidade é enorme nos idosos, especialmente porque a disfunçãodiastólica é mais freqüente nessa faixa etária e também porque osdiuréticos são muito eficazes para controlar a sintomatologia da IC.

Os resultados do estudo RALES documentaram a importância de sebloquear especificamente a aldosterona, que, apesar de ter seus níveis

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reduzidos no início do tratamento com inibidores da ECA, torna a elevar-secom a continuação do tratamento, por escape22 . A prescrição daespironolactona para pacientes com IC tratados com digital, diuréticos einibidores da ECA induziu uma redução expressiva na mortalidade e nonúmero de hospitalizações. A idade não modificou essa resposta, nãohavendo diferença quando se comparou o resultado entre pacientes comidade maior ou menor que 67 anos. Houve inclusive uma tendência paramelhor resultado entre os pacientes mais idosos22.

Inibidores da enzima conversora e antagonistasdos receptores da angiotensina II

O bloqueio do sistema renina-angiotensina pelos inibidores da ECAou pelos antagonistas dos receptores da angiotensina II, é a base domoderno tratamento da IC.

Os inibidores da ECA tiveram seus beneficios demonstrados em todasas fases da insuficiência cardíaca. Nas formas sintomáticas, têm papelfundamental na redução dos sintomas e na estabilização clínica, reduzindoas internações e a mortalidade. Nas formas iniciais ou nos portadores dedisfunção ventricular assintomática, previne a progressão da doença ouo aparecimento da IC23-27. Considerando que os benefícios da droga seacentuam com o aumento do número de alterações, seria de se esperarque realmente os inibidores da ECA demonstrassem melhores resultados(ou tendência para) entre os idosos.

Nos estudos com inibidores da ECA, os idosos não foram excluídos,nem contemplados de forma específica. No estudo CONSENSUS23, porexemplo, em que a idade média dos pacientes foi de 70 anos, a idade nãomodificou as respostas ao medicamento, permitindo concluir que osinibidores da ECA podem e devem ser empregados nos gerontes, comIC classe III/IV da NYHA.

Nos estudos SAVE, AIRE e TRACE, também se procurou verificar sea resposta diferia conforme a idade. Nos três estudos, os mais idososapresentaram mais eventos. Nos estudos SAVE24,25 e AIRE26, os efeitos dotratamento se assemelharam aos observados entre os pacientes mais jovens.No estudo SAVE, a redução de mortalidade foi de 8% entre pacientes commenos de 55 anos, 13% entre os com idades entre 56 e 64 anos e 25%entre pacientes com mais de 65 anos (Figura 5). Essas diferenças, contudo,

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Figura 5 – Gráfico mostrando a maior mortalidade nos idosos e o maior benefício deredução desta com o emprego dos inibidores da enzima conversora. Dados do estudoSAVE.

não atingiram nível de significância estatística, sugerindo que a respostaaos inibidores da ECA é uniforme, em função da idade25. No estudo AIRE,a mortalidade foi reduzida acentuadamente entre os pacientes com maisde 65 anos (cerca de 38% versus cerca de 5%). No estudo TRACE27,contudo, os resultados foram opostos, com maior benefício entre ospacientes com menos de 65 anos (38% versus 17%).

Apesar da controvérsia, os estudos clínicos parecem demonstrar queos inibidores da ECA são mais benéficos nos idosos do que nos pacientesmais jovens.

No entanto, apesar de todas essas evidências, o uso de inibidores daECA é menor que o esperado28, e com doses menores que as desejadas. Éimportante ressaltar que em nenhum dos grandes estudos com inibidoresda ECA a idade foi identificada como fator de intolerância à droga ou àsdoses preconizadas. Num desses estudos, o objetivo foi verificar a reduçãoda insuficiência mitral em portadores de miocardiopatia dilatada, peloemprego de inibidores da ECA; esse estudo mostrou que os melhoresresultados foram obtidos com 100 mg de captopril e que doses de 25 mgnão surtiram efeitos significativos29. Vale ressaltar que a idade médiados pacientes incluídos foi de 70 anos.

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No estudo ATLAS, o papel da dose foi especificamente analisado eobservou-se haver uma tendência de redução de mortalidade com dosesmais elevadas, além de redução significativa das hospitalizações, entreos pacientes que receberam doses plenas30. A resposta foi semelhanteentre os pacientes com idades acima ou abaixo de 70 anos, documentandoque também aos idosos as doses plenas devem ser prescritas.

Dessa forma, também para os idosos, a obtenção dos efeitos desejadosdepende do emprego de doses plenas, valendo enfatizar que não dispomosde evidências de que doses pequenas sejam eficazes; sabemos que, mesmoem nosso meio, doses plenas da droga são bem toleradas5.

Os antagonistas dos receptores da angiotensina II (RAII) são umafamília mais nova de drogas, de efeito muito semelhante aos inibidoresda ECA, diferenciando-se por provocar menos efeitos colaterais (tosse);esses agentes foram especificamente testados em pacientes idosos, nosdois estudos ELITE31,32. O estudo ELITE II mostrou não haver diferençasquanto à mortalidade, entre pacientes tratados com inibidores da ECAou antagonistas dos RAII. Esse estudo mostrou não haver diferençasignificativa na resposta dos pacientes com idade superior ou inferior a70 anos.

Os estudos ELITE mostraram também que as duas drogas utilizadas,losartan e captopril, são igualmente bem toleradas pelos idosos, masque os antagonistas dos RA II provocaram menos efeitos colaterais.Mesmo em relação à deterioração da função renal (uma preocupaçãode muitos clínicos sobre esse possível efeito dessas duas famílias dedrogas), os estudos ELITE mostraram não haver diferença entre essasduas classes de medicamentos e que essa deterioração não é muitofreqüente, mesmo com o uso de doses plenas; confirmou-se, porém,que devemos ser mais cuidadosos com os mais idosos, pois a creatininase eleva mais freqüentemente em pacientes acima de 70 anos (11%versus 8,4%).

O conjunto desses estudos permite concluir que os inibidores da ECAsão tão ou mais efetivos nos idosos, em comparação aos pacientes maisjovens; portanto, os gerontes devem receber prescrição dessas drogas.Doses plenas são bem toleradas pela maioria dos idosos e são maiseficazes que doses baixas. Nos pacientes intolerantes aos inibidores daECA, devemos prescrever os ARA II, que também são eficazes nospacientes idosos.

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BetabloqueadoresCrescem as evidências de que os betabloqueadores modificam a

história natural da IC. Os estudos US-Carvedilol, MERIT-HF, CIBIS-IIe COPERNICUS demonstraram, de maneira indubitável, o valor dessasdrogas no tratamento da IC, tanto na estabilização clínica, reduzindohospitalizações, quanto, especialmente, por mudar a malignidade dadoença, reduzindo sua alta mortalidade33-36. Seu uso, associado aosinibidores da ECA, reduz a mortalidade em cerca de 35%; esse benefícioé pelo menos o dobro do observado nos estudos que utilizaram apenasinibidores da ECA.

Apesar da documentação de todos esses benefícios, a prescrição debetabloqueadores na IC continua um assunto polêmico e os clínicos, emgeral, não os prescrevem.

A idéia de que betabloqueadores são contra-indicados para pacientescom IC vem do tempo das aulas de fisiologia na Faculdade de Medicina,uma vez que se trata de droga inotrópica negativa. O receio de prescrevê-los tem razão de ser, pois, se utilizados de início em doses altas, realmenteagravam a situação clínica dos pacientes. Entretanto, quando são iniciadosem doses baixas (carvedilol 3,125 mg, 2 vezes ao dia; metoprolol, 25mg/dia), promovem o bloqueio dos efeitos deletérios da hiperatividadesimpática e reduzem a toxicidade dela resultante, bem como os efeitosdeletérios da adrenalina sobre o coração e a periferia, melhorandosubstancialmente a evolução dos pacientes.

No entanto, é importante lembrar que os betabloqueadores devem seriniciados em doses baixas e aumentados paulatinamente, até se atingiras doses que se mostraram eficazes nos grandes estudos (25 mg, 2 vezesao dia de carvedilol ou 200 mg de metoprolol ao dia).

Embora a idade não tenha sido objeto de um estudo específico, paraavaliar o benefício do tratamento com betabloqueadores, em todos osestudos realizados, procurou-se verificar se essa resposta era diferentenos mais idosos. A resposta, embora sem diferença estatisticamentesignificativa, parece menos expressiva entre pacientes com idade maisavançada. No estudo US Carvedilol33, a redução de mortalidade foi de70% entre pacientes com idade inferior a 59 anos e de 62% entre os commais de 59 anos. No estudo MERIT-HF34, a redução de mortalidade nãofoi significativa entre os mais idosos e foi significativa entre aqueles que

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estavam no tercil inferior e no intermediário. No estudo COPERNICUS36,a redução de mortalidade foi significativa entre pacientes com menos de65 anos, mas não naqueles com mais de 65 anos.

Esses dados devem ser analisados com cuidado, pois é possível queessa menor resposta detectada possa estar relacionada à inclusão de ummenor número de pacientes idosos.

A prescrição de betabloqueadores entre idosos deve ainda levar emconsideração que eles apresentam com maior freqüência bradicardia ebloqueios atrioventriculares, situações nas quais essa prescrição deveser cuidadosa, embora não constituam contra-indicação, a priori.

Pelos resultados até hoje apresentados, os betabloqueadores devemtambém ser prescritos aos idosos, embora os benefícios possam ser menosexpressivos que os observados nos mais jovens.

Devemos também lembrar que a prescrição dessas drogas deve serbastante cuidadosa entre os idosos, pois esses apresentam maiscomorbidades, como quadros de bronquite e claudicação intermitente, oque pode dificultar sua prescrição.

Considerações finaisEmbora a terapêutica da IC venha evoluindo, nas formas avançadas

a IC continua sendo uma doença maligna, e preveni-la pode ser a melhorforma de mudar a história natural dessa doença.

Reduzir a incidência de coronariopatia por meio do controle dos fatoresde risco, principalmente a hipertensão arterial, considerando que ainsuficiência coronária é a principal causa de IC, é medida fundamentalpara sua prevenção.

Mesmo nos muito idosos, o controle da hipertensão resulta em menornúmero de casos de IC na evolução37,38. No estudo SHEP, o controle dahipertensão sistólica com diuréticos reduziu em 50% os casos de IC38.

Outro ponto muito importante é a avaliação da causa da IC (corona-riopatia e/ou valvulopatia). A idade por si só não deve ser uma contra-indicação para cirurgia, pois o controle da isquemia ou a redução dasobrecarga hemodinâmica que a insuficiência coronária ou a valvulopatiapromovem, podem modificar substancialmente a função cardíaca e,também a qualidade e a quantidade de vida dos idosos. No momentoda indicação, deve-se considerar com cuidado a idade biológica dopaciente, pois poderíamos deixar de oferecer esse benefício para muitos

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pacientes com idade numericamente avançada, mas ainda muito ativose impossibilitados de manter suas atividades, em decorrência daslimitações promovidas pela doença. Para esses pacientes, a cirurgianão terá o mesmo risco que teria nos pacientes realmente debilitados eenvelhecidos.

É muito importante ressaltar que, quanto ao tratamento medicamentosopropriamente dito, para se obter os resultados desejados, a otimizaçãodos medicamentos se torna fundamental. Nas formas avançadas de IC éfundamental o emprego de doses corretas de diuréticos, inibidores daECA e betabloqueadores 39,40. Grupos clínicos especializados notratamento de pacientes graves vêm demonstrando que o emprego dedoses corretas de diuréticos e inibidores da ECA é fundamental paramanter o paciente compensado. Muitas vezes, a otimização do tratamento,incluindo suporte social adequado, permite melhorar a qualidade de vidadesses pacientes.

É importante enfatizar ainda a importância da assistência global aopaciente idoso, pois para muitos seria fundamental, ao lado da prescriçãocorreta dos medicamentos, orientar a família ou o seu cuidador sobre anecessidade da administração correta dos medicamentos, da orientaçãodietética e da manutenção da situação funcional, pois muitos idosos nãomais apresentam condições de, sozinhos, controlar a medicação e mesmosuas atividades básicas20. A assistência a esses idosos mantém sua boaqualidade de vida por mais tempo.

A imunização dos idosos (> 64 anos) com IC, realizada em 1991 e1992, resultou na redução de 37% na freqüência de hospitalizações porIC, o que levou a uma redução dos custos de 43%, em relação aos anosde 1990 e 19912.

O tratamento do paciente idoso é mais complexo que o dos pacientesmais jovens, pois, ao lado da orientação do tratamento propriamentedito, devemos observar cuidadosamente as doenças associadas e tambémse a orientação será seguida pelo paciente, ou se seria indispensável umaorientação à família, caso contrário, não obteremos os resultados dese-jados.

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Capítulo 9

Valvulopatia no IdosoZilda Meneghello

IntroduçãoA insuficiência cardíaca (IC) congestiva tem prevalência superior a

5% na população entre 65 e 75 anos e de 10% a 20% na faixa etáriaacima de 80 anos. É uma doença multifatorial. Suas causas mais comunsno idoso são: hipertensão arterial sistêmica (HAS), doença ateroscleróticacoronária (DAC), e a lesão valvar, que cada vez mais desempenha papelimportante1.

Embora qualquer tipo de lesão valvar possa estar presente nos idosos,as mais comuns são a valvulopatia aórtica calcificada e a insuficiênciamitral por prolapso de valva mitral (PVM), devido à doença mixomatosa.Outras causas como isquemia, falência ou ruptura de músculos papilares,calcificação do anel mitral, endocardite infecciosa (EI) e dissecção daaorta ascendente podem estar presentes com menor incidência.

Uma peculiaridade importante na população geriátrica é a presençafreqüente de comorbidades como DAC, HAS, doença pulmonarobstrutiva crônica (DPOC), doença cerebrovascular (DCV), doençaarterial periférica (DAP), diabetes melito e insuficiência renal2-4. Essasassociações exercem influência no diagnóstico das lesões valvares, nasdecisões terapêuticas, nos procedimentos corretivos das valvulopatias eno prognóstico dessa população5,6.

Assim, o estabelecimento da gravidade da doença pode estar dificultadoou até não ser reconhecido. Por exemplo, a ausculta de uma quarta bulha(B4), em paciente jovem com hipertrofia ventricular esquerda (HVE) eestenose aórtica, é um sinal que sugere gravidade hemodinâmica. No idoso,no entanto, a B4 está freqüentemente presente sem evidência de estenoseaórtica, principalmente em pacientes com HAS de longa duração. Devemossalientar que em idosos o pulso periférico apresenta amplitude maior, devidoà diminuição da elasticidade da aorta e à transmissão da onda de pulso

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com maior velocidade. Isso pode mascarar o pulso parvus et tardus daestenose aórtica e o pulso em “martelo d’água” da insuficiência aórtica.

Por outro lado, os sopros cardíacos são extremamente comuns napopulação geriátrica, com prevalência de 60%; entretanto, a maioria delesnão apresenta implicações clínicas importantes. Resultam, em geral, deespessamentos valvares relacionados ao envelhecimento ou de regur-gitação mitral discreta, secundária à disfunção de músculo papilar, devidoa doença coronária ou miocardiopatia, hipertensiva ou idiopática.

O tratamento clínico do paciente idoso é semelhante ao do mais jovem7.No idoso, mesmo com lesão valvar discreta, é comum encontrar-sefibrilação atrial (FA). Essa condição representa risco para tromboem-bolismo e AVC isquêmico. Por isso, a anticoagulação deve ser indicada,a não ser que exista contra-indicação absoluta8.

Os pacientes idosos com doença valvar geralmente representam umdesafio para o cardiologista, não só do ponto de vista diagnóstico comoterapêutico. A decisão de se encaminhar um paciente idoso comregurgitação ou estenose valvar significativa para cirurgia cardíaca podeser difícil e deve ser individualizada, devido à diversidade de problemasencontrados nessa faixa etária. Geralmente, o paciente com menos de70 anos tem mortalidade e morbidade similares à do indivíduo mais jovem,desde que tenha um problema semelhante. Entretanto, nessa faixa deidade existe uma maior prevalência das comorbidades descritasanteriormente, o que pode levar ao aumento da mortalidade cirúrgica.Nos pacientes com idade ≥ 75 anos, principalmente na presença de DACconcomitante, a mortalidade cirúrgica é maior e a sobrevida menor4,6,9.

Assim, o objetivo da cirurgia valvar no idoso difere do indivíduo maisjovem. O importante é aliviar sintomas, melhorar a capacidade física e aqualidade de vida, mais do que prolongá-la. Nessa faixa etária, os pacientesapresentam maior comprometimento valvar e, na grande maioria dasvezes, a troca da válvula é necessária. Por esses motivos, as decisõesdevem ser individualizadas, contemplando as expectativas e decisões dopaciente. Uma exposição clara e paciente sobre os riscos e benefíciosda cirurgia deve sempre ser feita.

Estenose aórticaA estenose aórtica é a lesão valvar mais freqüente no idoso. A etiologia

degenerativa é a mais comum nessa idade; ocorre por um processo de

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calcificação das valvas e incide mais freqüentemente a partir da sextadécada de vida. Estudos têm mostrado que ela é devida ao estressemecânico prolongado sobre uma valva que apresenta alguma alteraçãoinflamatória, com infiltração de macrófagos e linfócitos T. A fibrose e acalcificação iniciam-se na base da valva e progridem para as bordas dosfolhetos, porém, as comissuras estão freqüentemente abertas e a estenoseresulta, geralmente, de rigidez das cúspides. Em um estudoecocardiográfico de população geral, 2% das pessoas com idade superiora 65 anos apresentaram estenose aórtica calcificada e 29%, algum graude esclerose valvar, definido como espessamento irregular dos folhetos,porém sem estenose. Acredita-se que este seja o processo inicial da doença.O diabetes e a hipercolesterolemia são fatores de risco para seu desenvol-vimento. Por sua vez tem-se verificado que tanto a esclerose da valvaaórtica como a estenose aórtica calcificada estão associadas a fatoresde risco para ateroesclerose coronariana, como tabagismo, hipertensãoe redução dos níveis de HDL-colesterol. Estudos têm mostrado que aesclerose aórtica aumenta o risco de morte cardiovascular e de infartodo miocárdio10.

I – Classificação da estenose aórticaA valva aórtica tem área de abertura de 2,6 cm2 a 3,5 cm2. É necessária

uma redução até um quarto do seu diâmetro normal para que ocorramalterações importantes. Não há uniformidade na quantificação da gravidadeda estenose aórtica, porém, com base em dados hemodinâmicos e nahistória natural, classificamos a estenose aórtica como discreta quando aárea valvar for > 1,5 cm2 (> 0,9 cm2/m2) e grave quando for < 1 cm2

(< 0,6 cm2/m2). Áreas entre 0,75 cm2 e 1 cm2 pertencem a uma zonacinzenta, na qual alguns casos de estenose crítica podem ser incluídos,apesar de serem classificadas como lesão moderada por muitos autores.Gradientes acima de 50 mmHg, na vigência de débito cardíaco normal, sãoconsiderados importantes. O gradiente transvalvar está diretamenterelacionado à quantidade de fluxo através da valva. Assim, pacientes comestenose grave e débito cardíaco baixo, como acontece, por exemplo, nadisfunção ventricular, apresentam pequenos aumentos do gradiente sistólico.Na estenose aórtica ocorre aumento da contratilidade atrial, que contribuipara o enchimento ventricular. Na perda dessa contração, como acontecena fibrilação atrial, o paciente apresenta deterioração clínica rápida.

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II – História natural e sintomatologiaOs principais sintomas da estenose valvar aórtica são dispnéia, dor

torácica e síncope. Apesar de o paciente permanecer assintomático porlongo período, a média de sobrevida após o início das primeiras mani-festações clínicas é de 2 a 3 anos, sendo de 5 anos para precordialgia, de3 anos para síncope e de 1,5 ano para IC. Provavelmente, a sobrevida émenor no paciente idoso.

III – DiagnósticoO diagnóstico se faz através da história clínica, do exame físico e de

exames complementares. O sinal mais comum da estenose aórtica é osopro sistólico de ejeção que se irradia para o pescoço11. Esse sopro,mais evidente nos idosos, é melhor audível em área aórtica, desaparecendosobre o esterno e reaparecendo em área apical e assemelha-se ao soprode regurgitação mitral. Essas características são conhecidas comofenômeno de Gallivardin.

Embora uma estimativa razoável da gravidade da lesão possa serobtida através do exame físico, o ecodopplercardiograma permite umaavaliação mais acurada do gradiente transvalvar e da área da valva. Aecocardiografia é também útil na avaliação da hipertrofia ventricularesquerda e na estimativa da fração de ejeção do ventrículo esquerdo(FEVE).

Geralmente, a gravidade da estenose aórtica pode ser bem avaliadaatravés de técnicas não-invasivas e o cateterismo cardíaco deve sersolicitado quando há discrepância entre a clínica e os exames comple-mentares ou visando avaliar a presença de DAC associada, ou aindapara a realização de cinecoronariografia em todos os casos encami-nhados para correção valvar cirúrgica.

IV – TratamentoRecomenda-se profilaxia para EI em todos os pacientes com estenose

aórtica.No tratamento da HAS, deve-se manipular cuidadosamente agentes

anti-hipertensivos, uma vez que várias das drogas utilizadas podem agirdesfavoravelmente na estenose aórtica.

A lesão discreta, de modo geral, apresenta progressão lenta nopaciente mais jovem; no idoso, entretanto, pode evoluir mais rapidamente.

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Os pacientes devem ser avaliados uma vez por ano e orientados a procuraro clínico se surgir algum sintoma. O ecocardiograma deve acompanhara consulta para avaliação de eventual progressão da doença.

A lesão moderada pode ser acompanhada clinicamente, a cada seismeses a um ano, devendo o paciente evitar grandes esforços no dia-a-dia.O ecocardiograma pode ser feito anualmente ou se houver mudança desintomatologia ou do quadro clínico. Aconselha-se a troca valvar cirúrgicaem pacientes desse grupo que necessitem cirurgia de revascularizaçãomiocárdica ou outra correção valvar.

Os pacientes assintomáticos apresentam boa sobrevida quandomantidos em tratamento clínico. A relação risco–benefício não favorecea indicação cirúrgica nesses casos, porque há sempre o risco inerenteà intervenção e às complicações da prótese e do uso de anticoagulantes.Quando, mesmo em pacientes assintomáticos, a lesão valvar for gravejustificam-se avaliações mais criteriosas e com menor intervalo de tempo.Pacientes oligossintomáticos, com área valvar < 0,4 cm2/m2 de superfíciecorporal (< 0,80 cm2), hipertrofia septal >15 mm, bloqueios fascicularesao eletrocardiograma ou episódios de taquicardia ventricular nãosustentada devem ser considerados para tratamento intervencionista(Tabela 1). Nos pacientes com lesão grave e sintomas inquestionáveis,a cirurgia deve ser indicada. Mesmo em octagenários, a expectativade vida foi maior com a cirurgia (5,1 anos) que com o tratamento clínico(1,6 ano)12.

Qualquer grau de disfunção ventricular em pacientes assintomáticoscom estenose aórtica justifica a cirurgia. Entretanto, deve-se questionarse a disfunção ventricular pode ser atribuída a outra etiologia.

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Tabela 1Estenose aórtica – Recomendações para cirurgia

Lesão grave sintomáticaLesão grave assintomática

• Disfunção sistólica do VE• Alterações eletrocardiográficas graves – Bloqueios fasciculares,

Episódios de taquicardia ventricular não sustentada,Área valvar < 0,8 cm2, hipertrofia septal ( > 15 mm)

Lesão moderada/grave assintomática – apenas se for necessária cirurgia para outrascondições cardíacas associadas

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V – Valvotomia por cateter balãoNa estenose aórtica calcificada, a valvotomia aumenta a área valvar,

mas apresenta índice de reestenose de 60% em seis meses13. A valvotomianão é alternativa à troca valvar; sua indicação está restrita ao pacientemuito idoso e sintomático, por exemplo, que entre em edema agudo depulmão. Nessa situação, o procedimento pode melhorar o débito cardíaco,a perfusão dos órgãos periféricos e reduzir a pós-carga em grau suficientepara permitir a troca valvar em um segundo momento. Também podeser útil em pacientes que não são candidatos à cirurgia devido acomorbidades e que são internados freqüentemente com IC congestiva.A valvotomia por balão pode manter esses pacientes fora do hospital porum período variável de tempo e melhorar a sua qualidade de vida.

Insuficiência mitralI – Etiologia

A insuficiência mitral discreta, sem indicação cirúrgica, é freqüente.Pode ser devida à disfunção de músculo papilar ou à calcificação doanel mitral, principalmente nas mulheres, com prevalência de 18% entre62 e 70 anos e de 89% após os 91 anos. Nos homens com idade acimade 62 anos, a prevalência de calcificação é de 47%4-6. Raramente estápresente refluxo importante na calcificação do anel mitral. Grandesdepósitos de cálcio no anel mitral podem ulcerar e embolizar, afetar osistema de condução e provocar bloqueios cardíacos, ou tornar-se sítiopara EI. Nessa idade, os refluxos de maior intensidade são devidos aoPVM. Nesses casos, é comum a ruptura espontânea de cordastendíneas, levando à insuficiência mitral grave e à IC1,9. Os casos agudospodem também ocorrer na presença de síndromes coronárias agudas,decorrentes de insuficiência de músculo papilar ou de ruptura decordoalha tendínea.

II – DiagnósticoAs manifestações clínicas da doença estão relacionadas a dispnéia

progressiva, fraqueza, tosse, edema de membros inferiores e, eventual-mente, palpitações. Em casos agudos, os sintomas se revestem deapresentação mais dramática, com quadros de IC congestiva aguda, comintensa dispnéia, sudorese e, eventualmente, estados hipotensivos.

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Os achados de exame físico se relacionam à presença de sopro sistó-lico em foco mitral, de intensidade variável. Deformidades torácicas,comuns nessa idade, tais como cifose ou cifoescoliose, podem modificarictus, bulhas e sopros.

O ecodopplercardiograma é exame de importância no diagnóstico dainsuficiência mitral, podendo ajudar a quantificá-la, analisar sua etiologiae repercussão hemodinâmica. O ecocardiograma transesofágico podeser necessário, devido à deformidade torácica, comum nessa faixa etária.Como se trata de sobrecarga de volume, o ecocardiograma avalia a funçãoventricular através de índices. No atual estágio de desenvolvimento, aecocardiografia permite que essa técnica seja suficiente para o diagnósticoe a quantificação da insuficiência mitral, na maioria dos casos. A solicita-ção de cateterismo cardíaco segue a mesma orientação dada para aestenose aórtica.

III – TratamentoO tratamento clínico na insuficiência mitral aguda é indicado até a reali-

zação do procedimento de correção cirúrgica definitiva, dependendo daintensidade das manifestações hemodinâmicas. Em casos de maiorcomprometimento, como no edema agudo de pulmão, pode-se recorrer aoemprego de vasodilatadores venosos (por exemplo, nitroprussiato de sódio),aminas vasopressoras e até ao balão intra-aórtico. Inibidores da enzima deconversão da angiotensina podem ser usados na insuficiência mitral crônicagrave para a redução da pós-carga. Entretanto, como nos pacientes maisjovens, há necessidade de mais estudos clínicos para que se demonstre aeficiência dos vasodilatadores no tratamento da insuficiência mitral14. Comona estenose aórtica, a profilaxia da EI está recomendada.

Pacientes com insuficiência mitral discreta e moderada devem seravaliados anualmente. Devem ser orientados a procurar o clínico, sesurgir algum sintoma. O ecocardiograma deve acompanhar a consulta,para avaliação da progressão da doença.

Pacientes sintomáticos com lesão grave devem ser encaminhados àcirurgia, a despeito do tratamento clínico instituído. Em pacientes assinto-máticos com lesão grave, a cirurgia pode ser considerada quando houverdisfunção de ventrículo esquerdo ou se houver indicação para realizaçãode cirurgia de revascularização miocárdica (Tabela 2). Entretanto, osresultados não são tão animadores como na estenose aórtica, devido à

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multiplicidade de etiologias, com destaque para a insuficiência coronária.A sobrevida após cinco anos de troca valvar mitral associada à revascu-larização miocárdica, é de apenas 50%15. Os resultados são melhorespara plastias mitrais (mortalidade operatória de 4% e tardia de 6%, após25 meses). Acima de 75 anos de idade, o risco cirúrgico está aumentado.

Insuficiência aórtica A insuficiência aórtica tem incidência bem menor que a da estenose

e normalmente costuma ser discreta ou, às vezes, moderada. Sua etiologiaé devida a HAS, alterações degenerativas da valva aórtica ou alteraçõesaneurismáticas da aorta ascendente.

Em uma casuística de pacientes idosos com insuficiência aórticaque foram submetidos a tratamento cirúrgico, a etiologia reumática foia causa em 39% dos casos, a doença da aorta em 28%, a alteraçãoisolada da valva aórtica, incluindo doença reumatóide, em 22% e a EIem 11%16.

I – DiagnósticoOs achados clínicos característicos na insuficiência aórtica são o sopro

cardíaco e as modificações de pulsos periféricos. O sopro é diastólico,em decrescendo, aspirativo e é melhor audível no rebordo esternalesquerdo ou no foco aórtico. Em casos de maior gravidade, tanto aintensidade como a duração do sopro podem estar reduzidas. A análisedos pulsos periféricos pode oferecer dificuldades nos idosos e apresentaralterações de amplitude, devido à perda de elasticidade das grandesartérias.

O raio X de tórax pode ser importante para a avaliação de váriosdados, entre os quais a dilatação aneurismática da aorta ascendente,principalmente quando analisada em projeções oblíquas e de perfil.

O ecodopplercardiograma é importante para elucidação diagnóstica,para avaliação da gravidade da lesão e também para o acompanhamento

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Tabela 2Insuficiência mitral – Recomendações para cirurgia

Lesão grave sintomáticaLesão moderada/grave assintomática

• Apenas se for necessária cirurgia para outras condições cardíacas associadas

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de portadores de insuficiência aórtica. Ele avalia a função ventricularatravés de índices.

Índice de volume diastólico final > 150 ml/m2 ou diâmetro diastólicodo ventrículo esquerdo (VE) > 70 mm e índice do volume sistólico final >60 ml/m2 ou diâmetro sistólico > 55 mm e FEVE < 0,55 associam-se adisfunção ventricular17-20. Esses índices, importantes na avaliação deindivíduos mais jovens, servem apenas para indicar um acompanhamentoclínico mais cuidadoso nos idosos. A decisão cirúrgica baseia-se maisprecisamente no aparecimento de sintomas.

O acompanhamento ecocardiográfico em casos de disfunçãomoderada deve ser anual; nos assintomáticos com lesão grave, a cadaseis meses. O cateterismo cardíaco deve ser solicitado quando hádiscrepância entre a clínica e os exames complementares, para avaliarpresença de DAC, ou para a realização de cinecoronariografia,necessária em todos os casos encaminhados para a correção valvarcirúrgica.

II – Tratamento clínicoO tratamento clínico está reservado para o paciente assintomático,

com insuficiência aórtica moderada a grave e com FEVE preservada. Amelhor opção é o emprego de inibidores da enzima de conversão daangiotensina. Outras opções são os vasodilatadores e os antagonistasdos canais de cálcio20.

III – Tratamento cirúrgicoO tratamento cirúrgico deve ser considerado nos pacientes sintomá-

ticos, a despeito do tratamento clínico instituído. Na lesão moderada agrave, a intervenção cirúrgica deve ser indicada apenas se for necessáriacirurgia para outras condições cardíacas associadas.

Quando a insuficiência aórtica está associada a aneurisma de aortaascendente ou dissecção da aorta, a colocação de um tubo ascendente,com suspensão da valva aórtica pode ser feita, com bom índice desucesso a longo prazo21 (Tabela 3).

Estenose mitralA estenose mitral é mais rara entre idosos. Apresenta as mesmas

manifestações clínicas encontradas no paciente mais jovem (ICC e AVC

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por fenômeno embólico, principalmente em presença de fibrilação atrial,comum nessa situação).

A etiologia da estenose mitral é atribuída a seqüela de febre reumá-tica e sua sintomatologia, em geral, inicia-se na terceira e quarta décadasde vida; por esse motivo, é rara na população geriátrica. Pode resultartambém de intenso processo de calcificação do aparelho valvar mitral.

I – DiagnósticoOs sintomas, quando presentes, se caracterizam por dispnéia e tosse,

eventualmente hemoptise e edema de membros inferiores. Ao examefísico, pode-se constatar ritmo de fibrilação atrial; seus achados maiscaracterísticos estão associados à presença de B1 hiperfonética e aoruflar diastólico em foco mitral. Convém salientar que, como resultadode grau mais intenso de calcificação da valva mitral em pacientes idosos,é comum uma menor expressão dos achados auscultatórios.

Deformidades torácicas, comuns nessa faixa etária, tais como cifoseou cifoescoliose, podem modificar ictus, bulhas e sopros.

O eletrocardiograma e a radiografia do tórax são importantes e podemidentificar sobrecarga ventricular, congestão pulmonar e ritmo defibrilação atrial.

O ecocardiograma é de grande importância na avaliação inicial e noacompanhamento do paciente com estenose mitral. A valva mitral normaltem área de abertura de 4,5 cm2 . Classificamos a estenose mitral comodiscreta quando a área valvar for > 1,5 cm2 e grave quando < 1 cm2.Áreas entre 1 e 1,5 cm2 são consideradas lesões moderadas. O ecocar-diograma também nos fornece o estado anatômico do aparelho valvarmitral através da análise de sua mobilidade, do grau de espessamento, da

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Tabela 3Insuficiência aórtica – Recomendações para cirurgia

Lesão grave sintomáticaLesão grave assintomática

• Disfunção sistólica VE (FEVE em repouso < 0,50)• Dilatação acentuada do VE (DSF > 55 mm; DDF > 75 mm)

Lesão moderada/grave• Dissecção da aorta ascendente• Dilatação aneurismática da aorta ascendente (> 50 mm)• Necessidade de cirurgia para outras condições cardíacas associadas

DSF – Diâmetro sistólico final; DDE – diâmetro diastólico final.

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calcificação e do acometimento do aparelho subvalvar mitral. Cada umdesses elementos recebe graduação que varia de 0 a 4; assim, pode-seestabelecer um escore ecocardiográfico conhecido como escore deWilkins, que varia de 0 a 16. Além disso, pode-se verificar o gradientetransmitral, a pressão da artéria pulmonar e o diâmetro das câmaras,bem como a presença de trombo no átrio esquerdo ou no apêndice atrial.Eventualmente, há necessidade do ecocardiograma transesofágico.

II – Tratamento clínicoA profilaxia da EI deve ser instituída. O tratamento do portador de

estenose mitral visa aliviar sintomas congestivos através do emprego dediuréticos. Em ritmo sinusal e na ausência de contra-indicações, o uso deagentes betabloqueadores pode ser útil. A digoxina é utilizada para ocontrole de freqüência cardíaca, em pacientes em ritmo de fibrilaçãoatrial. Nesse caso, o emprego de anticoagulantes está indicado, sempreque não houver contra-indicação absoluta e as condições socioeconô-micas, culturais e geográficas permitirem a anticoagulação com segurança.

III – Tratamento intervencionistaNos pacientes com lesão discreta ou moderada sem hipertensão arterial

pulmonar, o acompanhamento deve ser anual, com controle clínico eecocardiográfico. Nos pacientes sintomáticos com lesão grave, ecocar-diograma com escore de Wilkins favorável (até 8), sem trombo em átrioesquerdo ou contra-indicação para seu emprego, a realização de valvo-tomia percutânea deve ser o método de escolha para o tratamento.Entretanto, na população de idosos, o achados de valvas com escoreecocardiográfico favorável é mais raro. A cirurgia está indicada nopaciente sintomático que não possa ser submetido à valvotomia percutâneaou que necessite de outros procedimentos cirúrgicos, principalmente derevascularização miocárdica. Em paciente oligossintomáticos, que evo-luam com hipertensão arterial pulmonar, fibrilação atrial ou episódio detromboembolismo transitório, a cirurgia deve ser considerada (Tabela 4).

A escolha da próteseNa escolha da prótese para o idoso (Tabela 5), devem-se considerar

dois aspectos importantes: a menor durabilidade das biopróteses e apossibilidade de sangramentos, pela obrigatoriedade do uso de

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anticoagulantes quando se implanta uma prótese mecânica. Como noidoso a expectativa de vida é menor, justifica-se a colocação de valva detecido. Esse tipo de prótese é menos sujeito a falência nesse grupo etário.Porém, com a maior longevidade da população atualmente observadapode-se, às vezes, optar pela implantação de uma prótese mecânica.Como regra geral, escolhe-se a bioprótese quando houver menorexpectativa de vida, geralmente em indivíduos com mais de 70 anos.Nos pacientes com menos de 70 anos, deve-se dar preferência àbioprótese se a valva a ser substituída for a mitral. Alguns estudos têmrevelado que a bioprótese em posição mitral tem durabilidade maior. Aprótese mecânica poderá ser escolhida quando houver maior expectativade vida, geralmente na faixa etária abaixo de 70 anos, em condiçõesideais de anticoagulação ou por decisão do paciente. Vários autoresindicam preferencialmente a colocação rotineira de próteses biológicasem posição aórtica, em pacientes com idade ≥ 60 anos.

Profilaxia da endocarditeOs idosos com doença valvar representam um grupo de pacientes

com risco moderado a elevado para EI. De acordo com a última diretrizda American Heart Association, pacientes de alto risco para EI são

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Tabela 4Estenose mitral – Recomendações para cirurgia

Lesão grave sintomáticaLesão moderada/grave assintomática

• Com evolução progressiva da hipertensão arterial pulmonar ou episódiosisquêmicos transitórios

• Na necessidade de cirurgia para outras condições cardíacas associadas

Tabela 5Recomendações do tipo de prótese valvar cardíaca no idoso

Bioprótese• Menor expectativa de vida• < 70 anos e posição mitral• Decisão do paciente

Prótese mecânica• Condições ideais para uso de anticoagulante• Maior expectativa de vida• Decisão do paciente

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aqueles com próteses valvares e endocardite infecciosa prévia. De riscomoderado são os que têm PVM com refluxo e lesões valvares em geral.Na população geriátrica, cerca de 75% dos casos de EI ocorrem navigência de doença estrutural subjacente, de natureza degenerativa. Emseguida, por ordem de frequência, a infecção se dá nos pacientes comPVM, principalmente quando associada à regurgitação mitral e nos quetêm eletrodo de marca-passo. Os principais eventos predisponentes à EIsão: procedimentos dentários, instrumentação (cistoscopia), debridamentode úlceras de decúbito, cirurgias gastrintestinais infectadas, cirurgias dotrato biliar, cirurgia de próstata, catéteres infectados, entre outros.

A profilaxia da EI em nossa instituição é baseada nas recomendaçõesda American Heart Association, com pequenas modificações, e estãoresumidas nas tabelas 6 e 722.

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Tabela 6Profilaxia recomendada para procedimentos geniturinário e gastrintestinal

Condição Agente Dose ModoPaciente de Ampicilina Adulto: 2 g IM/IV, 30 minutosalto risco Criança (não antes do proce-

exceder 2 g): 1 g dimento, 6 horasdepois

Gentamicina Adulto: 1,5 mg/kg IM/IV, dentro dos(Adulto: não 30 min do início

exceder 120 mg) do procedimentoCriança: 1,5 mg/kg

Alto risco e Vancomicina *Adulto: 1 g **IV, iniciar 1 horaalérgico a Criança: 20 mg/kg antes e encerrar a

ampicilina/ infusão 30 minamoxicilina após o procedimento

Gentamicina Adulto: 1,5 mg/kg IM/IV, 30 min antesCriança: 1,5 mg/kg do procedimento

Paciente com Ampicilina Adulto: 2 g lM/IV, 30 min antesrisco moderado Criança: 50 mg/kg do procedimento

Amoxicilina Adulto: 2 g VO, 1 hora antesCriança: 50 mg/kg do procedimento

Risco moderado Vancomicina Vide acima* Vide acima**e alérgico

à penicilinaFonte: Dajani et al. JAMA 1997;277(22):1794-1801. Adaptado pelo Instituto Dante Pazzanese deCardiologia de São Paulo – Setor de Valvulopatias e CCIH.

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Valvulopatia no Idoso

Tabela 7Profilaxia para procedimentos dentário oral, esofagiano e em aparelho respiratório

Condição Agente Dose ModoClássica Amoxicilina Adulto: 2 g Via oral (VO),

Criança: 50 mg/kg 1 hora antesdo procedimento

Paciente não-apto Ampicilina Adulto: 2 g IM/IV, 30 min a tomar Criança: 50 mg/kg antes do

medicamento VO procedimentoPaciente alérgico Clindamicina Adulto: 600 mg

à penicilina Criança: 20 mg/kg VO, 1 hora antesdo procedimento

Azitromicina/ Adulto: 500 gclaritromicina Criança: 15 mg/kg

Paciente não-apto Clindamicina Adulto: 600 mg IV, 30 min antesa med. VO e alér- Criança: 20 mg/kg do procedimentogico à penicilina

Fonte: Dajani et al. JAMA 1997;277(22):1794-1801. Adaptado pelo Instituto Dante Pazzanese deCardiologia de São Paulo – Setor de Valvulopatias e CCIH.

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Valvulopatia no Idoso

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Capítulo 10

Disfunção Renalno Paciente

CardiogeriátricoJosé Luiz Santello

Há notáveis similaridades entre os rins e o coração. São órgãos querecebem cerca de 20% do débito cardíaco; há interdependência funcionalentre ambos, de forma que a falência de um leva à disfunção do outro;dependem tanto do fluxo sangüíneo quanto de pressão arterial, possuemelevado matabolismo e suas disfunções, isoladamente, são fortespreditores de mortalidade cardiovascular e global.

No paciente geriátrico, há uma faceta diferente nesse binômio einterdependência: a redução simultanêa da reserva funcional dessesórgãos, tornando-os mais suscetíveis às agressões mútuas e aos agentese patologias exógenas.

Em decorrência da redução contínua da reserva funcional renal, háaspectos específicos, nos modelos de estudos empregados para comprovaros benefícios de determinada intervenção, em idosos com disfunção renal.Em termos de nefroproteção e preservação da função renal, os estudosavaliam como alvo terapêutico não o desfecho fatal – usual em cardiologia– mas o percentual de pacientes que foram para diálise ou ainda o temponecessário para que a creatinina dobre seu valor inicial1,2.

Em conseqüência da intrincada interdependência, há várias formaspara elaborar este documento. Poderíamos avaliar a disfunção renalprimária no paciente cardiogeriátrico, analisar a redução de sua reservafuncional e a suscetibilidade renal diante das patologias que acometemos idosos cardiopatas ou ainda – e esta foi a forma escolhida – optar por

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Tabela 1Fatores que afetam os resultados da avaliação da função renal

1. Redução da perfusão renal (hipotensão, hipertensão renovascular)2. Desidratação ou redução do volume extracelular3. Uso de antiinflamatórios não-esteróides4. Consumo habitual de proteínas e carga protéica aguda (aumentam Clcr)5. Controle glicêmico em diabéticos6. Nível da pressão arterial e classe de anti-hipertensivos em uso

Clcr – Clearance de creatinina.

considerar as mais importantes situações em que o cardiologista deveconsiderar uma abordagem global do paciente, porém com enfoqueespecífico na preservação da função renal.

Avaliação da função renalO desafio inicial, e ainda relevante, é considerar os instrumentos

disponíveis para quantificar a função renal3. Sua avaliação é importantepara: determinar o início da doença, seu prognóstico, ajustar doses demedicamentos e interpretar sintomas e sinais da disfunção renal3. Emboraa maneira mais adequada e acurada de medir a função renal, seja oclearance de creatinina, muitas vezes sua utilização pode ser difícil naprática clínica. Há inegáveis dificuldades na coleta de urina entre osidosos, perdas involuntárias e problemas urinários que dificultam a coletaadequada de urina, em intervalos longos. Além disso, massa muscular,sexo, idade e outros fatores podem interferir na quantificação da funçãorenal. Ressalte-se que a melhor maneira de avaliar diretamente a filtraçãoglomerular é a realização do clearance de creatinina, contudo existemalternativas para inferir a filtração glomerular4,5.

Foram avaliadas pelo menos 10 equações que tentaram obter dacreatinina mensurada no plasma uma estimativa do real clearance decreatinina, empregando alguns índices e parâmetros de correção.

Devemos também considerar fatores exógenos que interferem naquantificação. A tabela 1 apresenta alguns fatores que podem afetar afiltração glomerular além dos já citados, e devem ser lembrados tantona quantificação direta quanto na estimativa calculada da filtração glo-merular.

Dentre as equações que procuram predizer o clearance de creatinina,a mais largamente usada é a equação de Cockcroft-Gault de 19764, mas

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há outras equações que podem ser aplicadas à beira do leito com índicepreditivo adequado3. Selecionamos duas equações para serem empregadasna prática diária (Quadro 1) que utilizam apenas as quatro operaçõesaritméticas e por não necessitarem calculadoras e que são convidativaspara a prática médica diária 5.

Preservação da função renal:estratégias gerais

Sempre há condições de empregar um raciocínio clínico, visando apreservação da função renal que, de antemão, sabe-se decrescer pro-gressivamente no envelhecimento normal do homem. Por isso, é precisoestabelecer como meta o emprego de estratégias documentadas cienti-ficamente que podem evitar o grande número de complicações renais,observado nos pacientes cardiogeriátricos6,7.

Há subsídios científicos, bem comprovados, para estratégias que visema preservação da função renal, na presença de: a) hipertensão arterial, aqual isoladamente é o principal fator de risco para desenvolvimento dedisfunção renal8 e cujo controle acompanha-se de redução do risco dedesenvolvimento de insuficiência renal terminal (Figura 1); b) a presençade diabetes melito é igualmente determinante; o controle da pressãoarterial e da glicemia está associado à redução do risco9,10; c) a presençade disfunção renal é marcador de pior prognóstico11 ; d) o uso de drogas,como antiinflamatórios não-hormonais (AINH) e contrastes radiológicos,confere maior risco de disfunção renal na presença de nefropatia préviae diabetes12; e) para níveis moderados de disfunção renal, as repercussõescardíacas costumam ser marcantes; f) na prática clínica, há usualmenteuma miríade de fatores desencadeantes; nos idosos, essa situação é amais prevalente.

Disfunção Renal no Paciente Cardiogeriátrico

Quadro 1Modelos lineares para a estimativa da filtração glomerular

Cockcroft-GaultClcr = [(140- idade) x Peso x “F”] / 72 x Cr-plonde: Cr-pl = creatinina plasmática (mg/dl), F = 1 para homens e 0,85 para mulheresToto (AASK study): Clcr (ml/min/1,73 m2)Homens: = - 0,30 x (idade - 52) + 105 / Cr-pl + (peso - 86)Mulheres: = - 0,29 x (idade - 52) + 88 / Cr-pl – 0,77 x (BMI – 30)Por exemplo: Homem de 80 anos, Cr = 2,0, peso 65 kg = 23 ml/min para 1,73 m2.

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I – Hipertensão arterial no idoso sem disfunção renal A prevalência de hipertensão arterial aumenta com a idade, alcançando

até 50% da população septuagenária 13. Praticamente todas as classesde drogas já foram usadas e aprovadas em idosos hipertensos nãocomplicados, sendo consideradas eficazes na redução da morbi-mortalidade, de forma genérica. Nessa população, o objetivo terapêuticoadequado para preservar a função renal, é manter a pressão arterialabaixo de 140/90 mmHg6. Na presença de hipertensão sistólica isolada,os bloqueadores de canais de cálcio foram as drogas mais testadas ecomprovadas na prevenção de eventos cardiovasculares. A hipertensãosistólica também tem valor preditivo de pior prognóstico renal7,14. Osestudos mostraram que o supracitado alvo terapêutico tem sido alcançadocom duas ou mais drogas anti-hipertensivas. Não há comprovação deque nesses pacientes – idosos e hipertensos não complicados – algumaclasse de anti-hipertensivos seja melhor que as outras, quando o foco éexclusivamente a manutenção da função renal. Nesse segmento, ou seja,na prevenção primária da disfunção renal, o alvo, ainda hoje, continuasendo o controle dos níveis pressóricos15.

Figura 1 – Risco relativo para diversas apresentações da doença aterosclerótica nopaciente hipertenso.

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II – Diabetes em idosos cardiopatas. O desafio dealcançar o alvo terapêutico

Esse tópico aborda as estratégias preventivas indicadas no segmentode pacientes mais suscetíveis de desenvolver doença renal terminal,sendo o que mais cresce, numericamente, no mundo. Em decorrência,mais pressão exerce sobre as finanças da saúde pública; além disso,representam um enome custo social para a comunidade9.

Como os pacientes idosos diabéticos são também usualmentehipertensos, coronarianos e vasculopatas, apresentam em decorrênciadessas associações alta morbimortalidade. Por isso, tem sido o grupo depacientes “eleitos” para comprovar se determinada intervenção farma-cológica promove preservação da função renal remanescente e, tambémdemonstra benefício na redução da morbimortalidade global (Tabela 2).As recomendações obtidas desses estudos podem ser agrupadas edenominadas estratégias de prevenção primária, em pacientes de altorisco cardiovascular e renal15. A maioria dos grandes estudos clínicos,centralizados em pacientes hipertensos contemplou uma amostra grandede pacientes com as características supracitadas. Dessa forma, nessegrupo de pacientes, há maiores comprovações de efeitos favoráveis devárias intervenções farmacológicas.

Tabela 2História natural da nefropatia diabética

Inicial Hipertrofia Aumento do GFR 95% IDDM 30% NIDDMglomerular (clearance de normotenso hipertenso

creatinina)1 a 5 anos Espessamento Aumento 95% Excreção Microalbuminúria

da memb. do GFR alb. normal presentebasal glom.

5 a 15 anos + Expansão Aumenta 30% HAS, 70% commesangial albumina 30% a 80% alb. albumina

urinária + urina urinária eHAS 75% com

HASMais de 20 Esclerose Decréscimo 60% 100%anos = nodular GFR envolvimento envolvimentonefropatia renal renalDisfunção Colabamento Clearance 40% com Cl 40% com Clrenal glomerular < 15 ml/min < 15 ml/min < 15 ml/minterminal

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Os estudos UKPDS16 e DCCT10 demonstraram que os controlespressórico e glicêmico, respectivamente, podem reduzir complicaçõescardiovasculares e renais. Demonstrou-se que para pacientes hipertensosdiabéticos poder-se-ia reduzir a incidência de eventos, se fosse alcançadoo alvo pressórico de aproximadamente 130/80 mmHg, independente daidade do paciente7. Também tem sido repetidamente demonstrado queidosos diabéticos hipertensos e proteinúricos beneficiam-se dos inibidoresda ECA2,17. Mais recentemente, estudos empregando bloqueadores doreceptor de angiotensina – RENAAL e PRIME – mostraram que essesfármacos também são nefroprotetores19, nesse grupo de pacientes17 ,mesmo na vigência apenas de microalbuminúria 18.

No entanto, o maior desafio clínico continua sendo a politerapianecessária para alcançar o alvo pressórico, empregando-se todas asdrogas disponíveis; mas, se possível clinicamente, não deixar de bloquearo sistema renina angiotensina aldosterona (RAA). À semelhança dorecomendado para a preservação da função miocárdica no pós-infarto,as doses nefroprotetoras dos inibidores da ECA ou dos bloqueadores dosreceptores de AII devem ser médias ou altas2.

III – Estratégias recomendadas para pacientes idososcom disfunção renal instalada

A presença de disfunção renal instalada é um potente marcador deeventos cardiovasculares, caracterizando seu portador como de alto riscopara eventos cardiovasculares5,26.

Esse grupo de pacientes contempla aqueles cuja estratégia estábaseada na prevenção secundária, ou seja, os que já têm disfunção renalinstalada, para os quais o objetivo é postergar ao máximo a diálise. Háduas séries de estratégias, dependendo da disfunção renal instalada: aprimeira, vista anteriormente, é bloquear o sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) e a segunda, indicada na maioria dos casos, é reduzira proteinúria. Há estudos mostrando que se as perdas diárias de proteínana urina excederem três gramas, o prognóstico é nitidamente diferentedo de perdas inferiores a 1 g/dia 20 (Tabela 3).

Já se demonstrou que a intervenção baseada no controle pressóricoestrito21 – alvo: 125 e 75 mmHg para as pressões sistólica e diastólicarespectivamente – associada ao bloqueio simples ou combinado doSRAA22, reduz tanto a macro como a microproteinúria, levando a um

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menor decréscimo do clearance de creatinina/mês e, portanto, o temponecessário para chegar à diálise será alongado. Essas observações foramdocumentadas tanto em diabéticos como em não-diabéticos23,24.

Uma questão prática é saber qual o limite mínimo de clearance decreatinina, para o qual há real benefício do bloqueio do sistema RAA.Não há resposta definitiva, mas o bom senso recomenda evitarintervenções farmacológicas nesse sistema, quando o clearance decreatinina estiver abaixo de 20 ml/min, uma vez que a adminstração deIECA – mas provavelmente não de bloqueador de receptor deangiotensina II – acompanha-se de redução aguda da filtraçãoglomerular17, podendo agravar a síndrome urêmica, já em fase lenta deinstalação. Mesmo quando a disfunção renal é leve, há necessidade deseguimento inicial dos níveis plasmáticos de potássio.

É importante ressaltar que quanto maior o tempo de controle efetivoda pressão arterial e da proteinúria, melhor o prognóstico, em termos depreservação da função renal (Tabela 3). Outras intervenções tambémsão úteis, como a restrição proteica quando a disfunção renal formoderada/severa (clearance aproximado de 20 ml/min a 25 ml/min)25.

IV – Estratégias para preservar agudamentea função renal

O desenvolvimento dos meios diagnósticos e terapêuticos cardiovas-culares tem ampliado o universo de pacientes submetidos a intervenções

Tabela 3Prognóstico de diferentes níveis de proteinúria e efeito do ramipril

em pacientes com proteinúria (REIN)Proteinúria 24 horas (g)

3,0 a 4,5 4,5 a 7,0 > 7,0n = 87 n = 48 n = 31

Percentual dos pacientes evoluindo parainsuficiência renal dialítica

Ramipril 22 25 25Placebo 40 48 70

Declínio na filtração renal por mês(ml/min/mes por 1,73 m2)

Ramipril 0,50 0,55 0,54Placebo 0,70 1,00 1,50

Adaptado de Kidney International 2000;58(5):2093-101.

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e a exames contrastados. Além disso, cerca de 7% a 10% dos idosostêm diabetes26 e um percentual grande apresenta graus variados dedisfunção renal. Como fator agravante, muitos pacientes são submetidosà intervenção – cineangiocoronariografia – após disfunção aguda doventrículo esquerdo, o que potencializa a nefrotoxicidade dos meios decontrates.

Essencialmente, todos os meios disponíveis são mais ou menosnefrotóxicos, porém os meios não iônicos apresentam muito menortoxicidade. Em várias séries comparativas identificou-se o pacientediabético com disfunção renal ou o portador só de disfunção renal comocandidato a receber meios de contraste não-iônico, como instrumentoefetivo na prevenção de disfunção renal aguda.

Entre os procedimentos clássicos, a hidratação reconhecidamente éa estratégia que melhor previne a instalação de insuficiência renal aguda,com menor custo. Há indícios de que o uso de N-acetilcisteína, por viaoral, seria altamente promissor na prevenção da vasoconstrição renalque se segue ao uso de contrastre iônico e hiperosmolar.

V – Disfunção renal instalada em pacientes idososvasculopatas

Pacientes idosos vasculopatas são considerados de risco paraapresentar doença isquêmica coronária. A presença de disfunção renalé um potente marcador de pior prognóstico global e terapêutico26. Noentanto, é preciso lembrar que cerca de 5% a 10% dos pacientes idososvasculopatas que são encaminhados para diálise de longo prazoapresentam nefropatia isquêmica, causada por aterosclerose da aorta,comprometendo o suprimento sangüíneo renal. Os índícios dessa situaçãosão: disfunção ventricular, hipertensão arterial severa e perda rápida defunção renal, entre outros marcadores clínicos e laboratoriais28.

Também deve ser lembrado que os gerontes podem apresentarinsuficiência renal aguda pela associação entre contraste, hipotensão,uso de antiinflamatórios e infecção subjacente.

VI – Disfunção renal terminal e repercussõescardiovasculares em idosos

Durante longo período de perda lenta e progressiva de função renal,mecanismos adaptativos mantêm a homeostase praticamente intacta.

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No entanto, com níveis em torno de 30ml a 35 ml de clearance decreatinina, já ocorre hipervolemia na maioria dos casos e isso constituium grande fator para agravar eventual disfunção ventricular.

Também nessa faixa de filtração glomerular, a eritropoiese estáreduzida e observa-se queda de 1 a 3 pontos (g/dl) na concentração dehemoglobina no sangue, agravando a disfunção ventricular e, even-tualmente, precipitando crises anginosas.

No entanto, o maior marcador que altera precocemente a homeostaseglobal de idosos com disfunção renal é a hipertensão arterial, muitasvezes o elo inicial da investigação médica, que termina por identificar –às vezes tardiamente – a presença de disfunção renal, como estáexemplificado na tabela 2.

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Disfunção Renal no Paciente Cardiogeriátrico

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Capítulo 11

Tratamento dasArritmias Cardíacasno Paciente Idoso

André d’AvilaAnísio Pedrosa

Leandro Zimerman

IntroduçãoEm linhas gerais, o tratamento das arritmias cardíacas no idoso segue

as recomendações sugeridas para adultos jovens. A grande diferençareside em dois fatos. Em primeiro lugar, a prevalência de algumas formasde arritmia, tal como a fibrilação atrial, está aumentada em pacientesacima de 65 anos. Além disso, o uso de drogas antiarrítmicas apresentaalgumas peculiaridades, pois esses pacientes muito freqüentemente, jáutilizam outros fármacos, têm alterações de memória e apresentampropensão para presença de alterações hepáticas e renais, podendorequerer ajustes na dose comumente indicada de antiarrítmicos.

Esses fatos são relevantes, pois há um aumento progressivo dapopulação de idosos. Atualmente, os idosos representam cerca de 12%da população dos Estados Unidos e Reino Unido; estima-se que essaporcentagem dobre nos Estados Unidos até 2030. Os idosos, portanto,representam um importante contingente de pacientes que procuramatendimento cardiológico e suas características inerentes precisam sermelhor conhecidas, principalmente porque os efeitos do envelhecimentosobre o aparelho cardiovascular, muitas vezes interferem nos conceitosde normalidade atribuídos à população jovem.

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As modificações do sistema cardiovascular conseqüentes ao envelhe-cimento possivelmente relacionadas ao aumento da prevalência dearritmias no idoso são:

• Modificações na vasculatura arterial sistêmica, na sensibilidade dosbarorreceptores e nos níveis de norepinefrina.

• Fibrose do nó sinoatrial concomitante à diminuição do número decélulas geradoras do estímulo elétrico. Estima-se que acima dos 75anos, essa redução seja de até 90%.

• Degeneração e fibrose do esqueleto fibroso do coração e porçãosuperior do septo ventricular, bem como fibrose e calcificação dosanéis valvares mitral e aórtico, e adjacências.

• Alterações microscópicas do nó atrioventricular e tronco comumdo feixe de His que provocam distúrbios da condução do estímuloelétrico a esse nível.

• Substituição das fibras dos fascículos do ramo esquerdo e porçõesdistais do sistema de condução por tecido fibroso, a partir da sextadécada.

• Aumento da massa ventricular esquerda, mesmo na ausência dehipertensão arterial sistêmica e obesidade; diminuição do númerode fibras miocárdicas, com hipertrofia das células remanescentes edepósitos intersticiais de substância amilóide, lipofuscina, tecidoelástico, fibras colágenas e lipídios.

• Dilatação atrial, mesmo na ausência de doença cardíaca subjacente.• Incapacidade de modulação autonômica adequada da freqüência

cardíaca.• Diminuição da resposta dos beta-receptores, com conseqüências

sobre o cronotropismo, inotropismo e vasodilatação periférica.

Bradiarritmias

I – Doença do nó sinusal (DNS)A incidência da DNS aumenta com a idade, em função das

modificações do nó sinoatrial, do tecido perinodal e do controle neu-rogênico da FC, provocados pelo envelhecimento. Entretanto, em idososassintomáticos não portadores de doença cardíaca a bradicardia severaé incomum.

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

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Os distúrbios funcionais do nó sinusal são as principais causas demorbidade no idoso, sendo responsáveis por até 52% dos implantes demarcapasso nessa população.

As mais freqüentes anormalidades eletrocardiográficas documentadasnesses pacientes são:

a) bradicardia sinusal persistente;b) pausas sinusais;c) síndrome bradi-taquicárdica.A evolução clínica da disfunção do nó sinusal no idoso, em geral, é

benigna. A expectativa de vida não se modifica quando comparada aosnão portadores do distúrbio, na mesma faixa etária.

A associação de sintomas comprovadamente relacionados à disfunçãodo nó sinusal (doença do nó sinusal) tem importância clínica porque implicaem terapêutica específica. O implante de marca-passo melhora aqualidade de vida dos portadores da doença do nó sinusal, sem, contudo,modificar a longevidade de seus portadores.

II – Hipersensibilidade do seio carotídeo (HSC)A hipersensibilidade do seio carotídeo (HSC), disfunção autonômica

que em geral se manifesta através de modificações funcionais do nósinusal, é causa freqüente de pré-síncope e síncope nos idosos.

As formas conhecidas de HSC são:a) cardioinibitória: três segundos ou mais de assistolia;b) vasodepressora: queda da PA de 50 mmHg ou mais;c) forma mista: combinação de a e b.A prevalência da HSC é controversa. Morley et al., em 1985,

documentaram a síndrome em cerca de 14% dos pacientes submetidosà investigação de causas de síncopes recorrentes.

A distinção entre as formas de resposta da HSC é importante porquetem implicações terapêuticas bastante diversas. Sabe-se que a formacardioinibitória responde satisfatoriamente ao implante de marca-passoatrioventricular. Ao contrário, estudos clínicos com a fludrocortisona emportadores da forma vasodepressora, tem demonstrado boa respostaterapêutica.

III – Bloqueios átrio e intraventricularesA prevalência do bloqueio atrioventricular aumenta com a idade,

embora o prognóstico e as repercussões clínicas não pareçam diferir

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

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da população jovem. É alta a prevalência de bloqueio atrioventricular(BAV) de 1o grau em idosos assintomáticos e sem cardiopatiasubjacente. O BAV de 2o grau Mobitz I não é incomum, porém tempouco significado clínico. Defeitos avançados da conduçãoatrioventricular têm baixa prevalência em idosos saudáveis e aumentasignificativamente (2,5 a 3 vezes) na presença de cardiopatia. Aincidência de distúrbio de condução intraventricular também aumentacom a idade: cerca de 10% a 14% dos idosos são portadores de bloqueiofascicular, permanente ou intermitente. A maioria, assintomática e semcardiopatia subjacente.

Na presença de cardiopatia, o bloqueio intraventricular, sobretudo obifascicular, representa índice preditivo de pior prognóstico

Taquiarritmias

I – Taquiarritmias supraventricularesExtra-sístoles atriais isoladas, em pares e em salvas de até cinco

batimentos são comuns (10% a 30%); são de evolução benigna em idososnão-portadores de doença cardíaca, ativos e assintomáticos. Não sãoconsideradas, portanto, de significado clínico.

As taquicardias atriais aumentam a prevalência com a idade,principalmente aquelas provenientes do átrio direito, da região da cristaterminalis. Por sua vez, episódios de taquicardia relacionados à presençade vias acessórias da condução atrioventricular (síndrome de WPW)raramente ocorrem exclusivamente em idosos. Na verdade, cerca de10% das vias de condução anterógrada tendem a desaparecer no decorrerda vida. Ao contrário, a prevalência de taquicardia por reentrada nodaltende a aumentar com a idade. O flutter atrial é outra arritmia cujaprevalência aumenta com a idade, pois tende a associar-se a doençacardíaca estrutural cuja incidência também está aumentada na populaçãoidosa.

II – Taquiarritmias ventricularesA incidência de arritmias ventriculares aumenta com a idade. Estudos

de monitorização eletrocardiográfica ambulatorial, demonstram que 80%das pessoas acima dos 60 anos apresentam arritmias ventriculares. Amaioria dos autores considera que as arritmias ventriculares, mesmo dealta complexidade, não interferem no prognóstico de seus portadores na

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ausência de doença cardíaca estrutural. Ao contrário, a taquicardiaventricular não sustentada, em pacientes com disfunção ventricularesquerda, piora o prognóstico consideravelmente. Na presença de infarto,a mortalidade aumenta com o incremento de sua freqüência ecomplexidade. Siegel et al. descreveram maior incidência de arritmiaventricular em pacientes hipertensos, com mais de 60 anos de idade ehipertrofia ventricular ao ecocardiograma.

Arntz et al. demonstraram distribuição monofásica das taquicardiasventriculares malignas em pacientes com mais de 65 anos, em contrastecom a distribuição bifásica (picos matutinos e noturnos) dos mais jovens.Esse comportamento sugere a presença de diferentes fatoresdesencadeantes nos dois grupos e a importante influência do sistemanervoso autonômico, muito alterado no idoso.

Tratamento farmacológicoDe modo geral, o emprego das drogas antiarrítmicas no idoso segue

os mesmos critérios de indicação para pacientes mais jovens. Asprincipais variáveis consideradas são: presença de sintomas, funçãocardíaca e risco de morte súbita. As diferenças na terapêutica do idosoreferem-se, sobretudo, à posologia, porque a farmacodinâmica e afarmacocinética das drogas estão modificadas. As causas dessasmodificações são:

• alterações do sistema gastrintestinal;• mudança na massa corporal;• diminuição da quantidade de proteínas plasmáticas;• diminuição do fluxo sangüíneo e alterações das funções do fígado e

rins.Aos antiarrítmicos são atribuídos, atualmente, severos efeitos adversos

arritmogênicos (pró-arritmia), que ameaçam a vida desses pacientes.Considerando-se que, nos idosos, tais efeitos parecem incidir em maiorescala, deve-se observar a seguintes regras:

1) Documentar através do eletrocardiograma a arritmia, da maneiramais precisa e minuciosa possível.

2) Determinar a etiologia da arritmia e tentar identificar causasreversíveis, tais como: isquemia miocárdica, distúrbios hidro-eletrolíticos, metabólicos, infecções, anemia, embolia pulmonar,hipertireoidismo e outros.

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3) Registrar o eletrocardiograma com freqüência para acompanhara evolução da doença e da terapêutica.

4) Eliminar drogas capazes de induzir ou acentuar as arritmiascardíacas, tais como: digital, simpaticomiméticos, antidepressivostricíclicos, anti-hipertensivos e outros.

5) Adequar a posologia de acordo com a resposta clínica eeletrocardiográfica, considerando, se necessário, a dosagemplasmática da droga.

Também é importante avaliar o efeito pró-arrítmico de outras drogasfreqüentemente utilizadas em pacientes idosos. Nesse particular, éimportante ressaltar o uso do cisaprida, droga utilizada há mais de 10anos como agente pró-cinético, que facilita ou restaura a motilidade dotrato gastrintestinal, indicada para casos de refluxo gastroesofágico emadultos e crianças, dispepsia funcional, gastroparesia diabética e compossível ação no tratamento da síndrome do cólon irritável. Devido à suasuperioridade no tratamento dessas doenças quando comparada a outrasdrogas, como metoclopramida e antagonistas de receptores histamínicosH2, a cisaprida tornou-se medicamento de uso freqüente na prática clínica.Os primeiros estudos não evidenciaram nenhuma ação sobre o tecidocardíaco. Porém, no final da década de 80, surgiram relatos esporádicosde episódios de arritmia nitidamente relacionados ao uso da cisaprida e,em 1996, já haviam 34 relatos de ocorrência de torsades de pointes emusuários da droga. Em 23 desses pacientes houve nítida correlação entreo uso da cisaprida e o prolongamento do intervalo QT. Dentre essespacientes, houve 4 mortes e 16 casos de sobreviventes de parada cardíaca.

A análise desses casos permitiu concluir que a utilização de drogasque inibem a ação da enzima hepática citocromo P450 3A4 eleva o nívelsérico da cisaprida. Em função de sua ação bloqueadora dos receptoresserotoninérgicos e dos canais de K+ da membrana celular cardíaca, acisaprida prolonga a duração do potencial de ação da fibra cardíaca,comparável às drogas do grupo III de Vaughan-Williams, de forma dose-dependente, podendo ainda elicitar a ocorrência de pós-despolarizaçõesprecoces. Desse modo, deve ser evitada a utilização da cisaprida comdrogas que inibam a ação do citocromo P450, como cetoconazol,fluconazol, itraconazol, miconazol, eritromicina, claritromicina outroleandomicina, ou drogas que aumentem o intervalo QT, como os anti-arrítmicos do grupo III, antidepressivos trcíclicos e alguns anti-histamínicos.

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A restrição ao uso deve ser extensivo a portadores de síndrome do QTlongo congênito, pacientes com antecedentes de arritmias, cardiopatias,ou para portadores de insuficiência renal crônica.

Discutiremos, a seguir, aspectos peculiares dos medicamentosantiarrítmicos mais comumente utilizados em nosso meio, eparticularidades que envolvem seu uso nos idosos.

Drogas de classe I – A quinidina é eficaz no tratamento de arrítmiassupraventriculares. Apresenta excelentes resultados na reversão dafibrilação atrial a ritmo sinusal, sobretudo quando associada a digitálicosem doses baixas, no idoso. Efeitos colaterais ocorrem em cerca de umterço dos idosos, sendo os mais comuns: diarréias, náuseas, vômitos,zumbidos, vertigens, distúrbios visuais, cefaléia e confusão mental. Oefeito mais grave é a síndrome do QT longo adquirido, capaz de provocararritmias fatais (torsades de pointes). Em idosos com função ventricularcomprometida, essa droga está contra-indicada, pois costuma provocarmodificações no débito cardíaco e na pressão arterial, além de aumentaro risco de morte súbita.

Procainamida, a exemplo da quinidina, é eficaz tanto na terapêuticadas arritmias supra como ventriculares, com efeitos eletrofisiológicosmuito semelhantes. O efeito inotrópico negativo discreto resulta em boatolerabilidade, mesmo em presença de disfunção ventricular. Anorexia,náuseas, diarréia, prurido, hipotensão e distúrbios da condução intraven-tricular são os efeitos colaterais mais freqüentes. Sua administração épreterida no idoso por causa da curta meia-vida em relação às outrasdrogas.

Disopiramida tem efeitos antiarrítmicos semelhantes aos da quinidinae procainamida. Entretanto, sua indicação é limitada em idosos, porquetem ação inotrópica negativa acentuada e potente efeito anticolinérgico,o que potencializa distúrbios urinários presentes em grande parte dessespacientes.

Lidocaína deprime a automaticidade, sobretudo das fibras de His-Purkinje, diminuindo o período refratário, assim como o das célulasventriculares. Tem pouca ação sobre as células atriais e, por sofrerimportante metabolização hepática, é efetiva apenas por via parenteral.

A meia-vida de eliminação, em adultos jovens, é de 1,3 hora e, emidosos, 2,3 horas. A concentração terapêutica sérica varia de 1,5 a5 mcg/ml. Hepatopatia, insuficiência cardíaca ou infarto do miocárdio

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recente podem reduzir o clearence da droga e a meia-vida plasmáticapode atingir 4 ou 6 horas, e, por isso, recomenda-se a redução da posologiaem 30% a 50% nos idosos. Efeitos adversos, como tonturas, zumbidos,diplopia, confusão mental, letargia, disartria, tremores e convulsões, sãomais freqüentes em idosos.

Propafenona provoca depressão da velocidade de condução em todosos tecidos cardíacos, além de atividade betabloqueadora. Não existemestudos conclusivos a respeito de seu comportamento no idoso. Nestes,os efeitos adversos mais freqüentes são gastrintestinais, cefaléia etonturas. Os efeitos pró-arrítmicos, síndrome do QT longo, bloqueioatrioventricular infra-His e bradicardia severa são os mais freqüentes.

Mexiletina tem propriedades eletrofisiológicas muito semelhantes àsda lidocaína, com mínimos efeitos hemodinâmicos. É efetiva no controlede extra-sistolia ventricular, atua moderadamente na terapêutica dataquicardia ventricular sustentada polimórfica e pouco na monomórfica.Ao contrário da lidocaína, apresenta baixa metabolização hepática, sendoque, 90% da dose oral administrada atinge a corrente circulatória. Temsido utilizada em maior escala nos idosos, porque não modifica ou atémelhora a condução atrioventricular, freqüentemente lentificada nessespacientes Os efeitos adversos mais freqüentes são neurológicos egastrintestinais, ocorrendo em 30% a 50% dos pacientes que fazem usocrônico da droga.

Drogas de classe II – Os idosos têm sensibilidade diminuída a essesagentes, porque apresentam receptores beta-adrenérgicos com baixaresponsividade, embora demonstrem níveis séricos da droga, cerca deduas vezes maior que os jovens, para a mesma dose administrada32.

Drogas de classe III – Amiodarona tem alta eficácia terapêuticanas arritmias atriais e ventriculares do idoso, embora se tenha poucoconhecimento de suas características farmacocinéticas nesse grupo depacientes. Os efeitos adversos geralmente são dose e duração-depen-dentes, sendo os mais freqüentes: prurido, eritema, fotossensibilidade;microdepósitos de cristais na córnea; hipo ou hipertireoidismo; alteraçõestransitórias de enzimas hepáticas e reações extrapiramidais. Fibrosepulmonar intersticial (pneumonite amiodarônica) representa o mais graveefeito adverso da droga, incidindo em até 5% dos pacientes que fazemuso crônico da droga. Não se tem conhecimento de que tais reaçõesindesejáveis ocorram em maior intensidade no idoso.

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O sotalol é eficaz no tratamento das arritmias ventriculares esupraventriculares. Além dos efeitos de classe III, tem ação beta-bloqueadora e apesar da pequena experiência clínica, parece ter eficáciaantiarrítmica satisfatória nos idosos, sem apresentar os efeitos colateraisprovocados pelos betabloqueadores clássicos.

Drogas de classe IV – O principal representante dessa classe, compropriedades antiarrítmicas é o verapamil. Estudos recentes demons-traram que essa droga converte a ritmo sinusal, cerca de 80% dastaquicardias supraventriculares, 30% dos episódios de flutter atrial e16% das fibrilações atriais. Assim, quando usado por via venosa, overapamil é um agente de primeira escolha para reverter episódios detaquicardia paroxística supraventricular e lentificar a resposta ventriculardurante outras taquiarrítmias supraventriculares, como o flutter e afibrilação atrial. No idoso, o verapamil tem sido utilizado com sucessopara o tratamento de arritmias ventriculares e de arritmias induzidas aoexercício, apesar destas serem menos comuns nos idosos31. Efeitoscolaterais sérios são raros, mas hipotensão severa, bradicardia e assistoliaforam documentadas no idoso, sobretudo quando associada ao uso debloqueadores betadrenérgicas.

Os digitálicos têm como principal indicação no idoso a fibrilação atrialcom alta freqüência ventricular. A intoxicação digitálica é mais freqüentenos pacientes acima de 65 anos e é facilitada por hipocalemia ehipomagnesemia. Freqüentemente ocorre em níveis plasmáticos abaixodo limite de toxicidade; suas manifestações mais comuns são, no idoso:arritmias cardíacas, manifestações digestivas, neurológicas e disfunçãosexual.

Tratamento não-farmacológicoDe janeiro de 2000 a março de 2002, 235 pacientes com mais de 65

anos realizaram procedimentos eletrofisiológicos no Instituto do Coraçãodo Hospital das Clínicas de São Paulo, para ablação ou diagnóstico dealgum distúrbio do ritmo cardíaco a saber: 78 pacientes para oesclarecimento de sintomas, 35 foram submetidos à ablação por cateter,de taquicardia ventricular sustentada, 33 por taquicardia por reentradanodal, 20 por flutter atrial, 17 por fibrilação atrial paroxística, 18 pacientesrealizaram ablação de via acessória, além de 17 pacientes com taquicardiaatrial e, outros 17 realizaram ablação do nó atrioventricular.

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Tanto o resultado inicial como a longo prazo, bem como as complicações,não foram diferentes das observadas em adultos jovens. Por essa razão,as indicações para ablação de taquiarritmias sustentadas em pacientesidosos, segue as mesmas regras da população mais jovem. Na verdade, oimpacto sobre a qualidade de vida dos idosos é muito importante, porqueos pacientes podem ficar curados sem o uso e os efeitos colaterais dasdrogas antiarrítmicas; a indicação no idoso, ao contrário da impressão geral,a meu ver, deve ser feita o mais rápido possível. Da mesma forma, diversosestudos que avaliaram o resultado do implante de desfibrilador em idosos,mostraram as mesmas taxas de morbimortalidade durante a realização doprocedimento e de sobrevida nos primeiros anos, que a observada empacientes mais jovens. Nesse sentido, as diretrizes para ablação por cateterformuladas durante o último Consenso do Departamento de Arritmia eEletrofisiologia Clínica (DAEC) da SBC, podem auxiliar o médico na tomadade decisão, conforme exposto a seguir.

Diretrizes do DAEC para ablação porcateter das arritmias cardíacas

A ablação por cateter utilizando energia de radiofreqüência revolu-cionou o tratamento das arritmias cardíacas. As lesões produzidaspor essa forma de energia são bem delimitadas medindo de 4 e 6 mm,o que permitiu modificações bem controladas do substratoarritmogênico. Por essa razão, o número de procedimentos de ablaçãovem aumentando progressivamente. Cerca de 15.000 procedimentossão realizados por ano nos Estados Unidos. A ablação por catetermelhora a qualidade de vida dos pacientes tratados, a um custo menordo que o tratamento medicamentoso. O sucesso do procedimento,bem como suas complicações, varia conforme a arritmia a ser tratadae a experiência do laboratório de eletrofisiologia onde o procedimentoesta sendo realizado. Complicações são pouco freqüentes e asocorrências mais comuns são: bloqueio AV total, tamponamentocardíaco por perfuração cardíaca durante a manipulação de cateteresintracavitários e as relacionadas ao acesso vascular. Complicaçõesmais graves, como acidente vascular cerebral, lesão valvar grave,oclusão coronária e morte relacionada ao procedimento, são maisraras e podem ocorrer em 0,2% dos pacientes.

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

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Taquicardia sinusal inapropriadaTaquicardia sinusal inapropriada é uma entidade caracterizada por uma

freqüência cardíaca em repouso > 100 bpm e/ou resposta exagerada dafreqüência cardíaca (>100 bpm) a mínimos esforços. O eixo e a morfologiada onda P são iguais aos do ritmo sinusal. A ablação por radiofreqüência temcomo objetivo a redução da freqüência cardíaca em torno de 30%, duranteinfusão de isoproterenol e/ou atropina, sendo a ablação total do nó sinusal eimplante de marca-passo, raramente recomendada. Dezesseis por centodos pacientes necessitam de marca-passo por disfunção sinusal após a ablação,e 32% dos pacientes apresentam sintomas recorrentes.

Recomendação B2 nível 2Taquicardia sinusal inapropriada sintomática refratária a drogas.

Recomendação CTaquicardia sinusal inapropriada assintomática.

Taquicardia atrialAs localizações mais comuns das taquicardias atriais são a crista

terminalis e o orifício das veias pulmonares. Embora a taquicardia atrialafete menos de 10% dos pacientes com taquicardia supraventricular,quando incessante, pode gerar taquicardiomiopatia. O sucesso da ablaçãovaria de 75% a 95% com recorrência de 5% a 20%.

Recomendação A nível 2Taquicardia atrial sintomática de difícil controle farmacológico.Taquicardia atrial com taquicardiomiopatia.

Recomendação B1 nível 2Taquicardia atrial sintomática.Taquicardia atrial incessante ou recorrente controlável com antiarrítmi-

cos, quando o paciente opta pelo tratamento não-farmacológico.

B2 N2Taquicardia atrial incessante ou recorrente assintomática e sem

evidência de taquicardiomiopatia.

Recomendação C N4Taquicardia atrial de causa transitória e reversível.

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

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Ablação da junção AVO controle da resposta ventricular em taquiarritmias atriais refratárias

ao tratamento é de grande importância devido à presença de sintomas eao possível desenvolvimento de taquicardiomiopatia. Nos casos em quenão se consegue obter a cura da taquiarritmia atrial e o controle adequadoda freqüência cardíaca, a ablação da junção atrioventricular e implantede marca-passo é uma alternativa eficaz. Pode haver retorno da conduçãopela junção em 5%. Em até 3% dos pacientes ocorre morte súbita apósa ablação. Na ausência de miocardiopatia, a sobrevida de pacientes comfibrilação atrial submetidos à ablação do nó AV é similar a da populaçãogeral.

Recomendação A N2Taquiarritmias atriais sintomáticas, com desenvolvimento de taquicar-

diomiopatia ou gerando terapias inapropriadas do CDI, em que os métodosterapêuticos, farmacológicos ou não, foram incapazes ou não puderamser usados para restauração/manutenção do ritmo sinusal ou controle dafreqüência ventricular.

B2 N3Permitir a otimização do intervalo AV em pacientes com estimulação

cardíaca artificial.

Recomendação CControle da freqüência ventricular com drogas bem toleradas pelo

paciente.

Fibrilação atrialConsiderando os riscos potenciais e ainda o curto tempo de acom-

panhamento dos resultados, a ablação da fibrilação atrial (FA) deve serreservada aos casos sintomáticos, que se apresentam refratários às drogasantiarrítmicas. Os pacientes com maior chance de se beneficiar da ablaçãosão aqueles com coração estruturalmente normal, que apresentam arritmiasupraventricular freqüente ao Holter, sob forma de batimentos repetitivosou extra-sístoles isoladas freqüentes, alternando com paroxismos de FAde curta duração.

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

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Até os resultados a longo prazo da ablação da FA serem melhorconhecidos, a ablação por cateter da FA deve ser restrita a centros dereferência.

Recomendação B2 nível 3FA paroxística, sintomática e de difícil controle farmacológico, em

pacientes com átrio esquerdo normal e na ausência de condiçõesmetabólicas potencialmente correlacionadas à arritmia*.

Recomendação B2 nível 4FA paroxística e freqüente, de difícil controle farmacológico, em

pacientes com cardiopatia estrutural.

Recomendação C nível 4Primeiro episódio de fibrilação atrial.Trombo intracardíaco ou contraste atrial espontâneo intenso ao

ecocardiograma.Contra-indicação à anticoagulação sistêmica.Cardiopatia com indicação cirúrgica durante a qual a fibrilação atrial

pode ser tratada concomitantemente.

Flutter atrialO flutter atrial é um circuito macrorreentrante que pode ocorrer em

ambos os átrios. A forma mais comum é a que ocorre no átrio direito edepende da condução em torno do anel da valva tricúspide. A criação deuma linha de bloqueio entre o anel da tricúspide e a veia cava inferior(istmo cavotricuspídeo) elevou o índice de sucesso da ablação para 95%,com recorrência de 5%.

Recomendação A nível 2Flutter atrial comum recorrente com sintomas claramente relacionados

à arritmia.

Recomendação B2 nível 4Flutter atrial assintomático.

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

* Doença sistêmica debilitante ou potencialmente correlacionada à arritmia; tireotoxicose,uremia, pericardite, intoxicação alcoólica aguda, doença pulmonar obstrutiva crônica,tromboembolismo pulmonar.

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Pacientes assintomáticos com flutter e fibrilação atrial com freqüênciaventricular controlada.

Taquicardia por reentrada nodalA taquicardia reentrante nodal (TRN) é a forma mais comum de

taquicardia paroxística supraventricular (regular). A TRN geralmente ocorreem pacientes com coração normal, apresentando-se como palpitaçõesregulares paroxísticas, associada ou não a síncopes. A ablação porradiofreqüência da via lenta é o tratamento curativo de eleição com sucessovariando de 94% a 99%. As recidivas variam entre 3% e 7%. Ascomplicações mais freqüentes são o bloqueio AV total que, dependendo dasérie, pode variar de 0,5% a 4%. Complicações, como lesões vasculares,derrame pericárdio, tamponamento cardíaco e morte, ocorrem em menos de0,1% dos pacientes.

Recomendação A nível de evidência 2Pacientes sintomáticos com TRN recorrentes.

Recomendação B-1 nível de evidência 2Dupla via nodal com eco nodal, registrado pelo EEF em paciente com

documentação eletrocardiográfica.Taquicardia sustentada induzida no EEF durante ablação de outra

arritmia.

Recomendação B-2 nível de evidência 3Dupla via nodal com eco nodal, registrado pelo EEF em paciente com

suspeita clínica, mas sem documentação eletrocardiográfica.

Recomendação C nível de evidência 4Achado de dupla via nodal com ou sem eco no EEF sem suspeita

clínica de TRN.

Síndrome de Wolff-Parkinson-White e outras viasacessórias da condução atrioventricular

Existem diferentes tipos de vias acessórias que são conexõesmusculares anômalas entre o átrio e o ventrículo. Uma grande variedadede taquiarritmias pode ocorrer nos pacientes com vias acessórias. Algu-

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

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mas dessas taquicardias são bem toleradas, porém outras podem levarà degeneração hemodinâmica, insuficiência cardíaca e morte súbita.Na dependência das características eletrofisiológicas da via acessória,a morte súbita pode ocorrer mesmo em pacientes assintomáticos. Aablação por radiofreqüência é a terapia de eleição com sucesso de89% a 97% na dependência da localização da via. A recorrência dacondução pela via acessória, após uma ablação, ocorre em apro-ximadamente 5% a 12% dos casos, e esses pacientes podem sersubmetidos a nova intervenção, sem aumento do risco. Embora amortalidade do procedimento seja de apenas 0,1%, outras complicaçõespodem ocorrer e estão relacionadas a localizações específicas, tal comosugerido a seguir:

1) Bloqueio AV total: (0,2% a 0,6%): geralmente ocorre nas viasantero-septais e médio-septais, podendo raramente ocorrer emvias póstero-septais.

2) Infarto agudo (0,06%) do miocárdio, por aplicação inadvertidadentro da circunflexa ou por dissecção de uma artéria coronária.

3) Perfuração cardíaca e tamponamento (0,1%).4) Acidente vascular encefálico, ou acidentes isquêmicos transi-

tórios (0,1%).5) Lesão valvar mitral ou aórtica (0,15%).6) Complicações arteriais e venosas (0,5%) no local da punção.7) Complicações secundárias à exposição a RX.

Recomendação A nível de evidência 2Paciente com pré-excitação ventricular que já tenha apresentado um

episódio de taquiarritmia.Taquicardia sustentada mediada por via anômala induzida no EEF

durante ablação de outra arritmia.

Recomendação B1 nível de evidência 3Assintomático com pré-excitação ventricular e profissões de risco

(piloto, motorista profissional de coletivos, etc.)Assintomático com período refratário anterógrado da via acessória

< 270 ms e período refratário ventricular < 220 ms.

Recomendação B2 N4Pré-excitação ventricular assintomática.

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

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Recomendação C N3Pré-excitação ventricular assintomática de baixo risco quando a

localização da via acessória estiver associada com risco aumentado delesão no sistema de condução.

Taquicardia ventricular idiopáticaA taquicardia ventricular idiopática ocorre preferencialmente na via de

saída do ventrículo direito e próximo ao fascículo póstero-inferior do ramoesquerdo em pacientes com coração estruturalmente normal. Apesar demorte súbita ser rara, esses pacientes são freqüentemente sintomáticos,necessitando de terapia antiarrítmica. Com o advento e desenvolvimentodas técnicas de ablação de focos arrítmicos com cateter, esses pacientespodem, em situações bem definidas, ser beneficiados com esseprocedimento. O índice de sucesso da ablação das taquiarritmias ventri-culares idiopáticas é de cerca de 85%. A recorrência é de aproximadamente15%. As complicações são incomuns e sua incidência e distribuição nãosão superiores às relatadas em taquicardias supraventriculares.

Recomendação A N2Pacientes sintomáticos, TVS de VD e de VE refratária ao tratamento

medicamentoso ou quando houver intolerância às drogas.

Recomendação B1 N4Pacientes sintomáticos com TVNS refratárias ao tratamento medica-

mentoso, ou quando houver intolerância às drogas.

Recomendação B2 N3EV da via de saída de VD, de difícil controle medicamentoso.Pacientes sintomáticos que não desejem usar medicação.

Recomendação C N3Pacientes assintomáticos com taquicardia monomórfica não susten-

tada ou extra-sístoles.

Taquicardia ventricular comcardiopatia estrutural

A taquicardia ventricular (TV) ocorre na grande maioria dos casosassociada à cardiopatia orgânica, constituindo uma complicação grave

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

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que pode levar a óbito. As TV podem se apresentar clinicamente sob asformas sustentadas (duração > 30 segundos ou com manifestaçõesclínicas que exijam sua interrupção imediata) e não sustentadas. O sucessoda ablação por cateter da TV depende em última instância dascaracterísticas do substrato, da tolerabilidade da arritmia induzida e daexperiência do grupo responsável pela realização do procedimento. Demaneira geral, o sucesso da ablação oscila entre 40% a 80%. Do pontode vista da relação custo/benefício, o tratamento ablativo, pelo menosquando realizado com cateteres irrigados, é superior a amiodarona.

Recomendação A nível de evidência 3Taquicardia ventricular incessante.Taquicardia ventricular recorrente requerendo terapêuticas freqüen-

tes do CDI.Taquicardia ventricular tipo ramo-a-ramo.

Recomendação B-1 nível de evidência 2Taquicardia ventricular sustentada recorrente bem tolerada sem

controle farmacológico.

Recomendação B-2 nível de evidência 2Taquicardia ventricular sustentada mal tolerada sem controle

farmacológico.Taquicardia ventricular não sustentada, sintomática, sem controle

farmacológico.Taquicardia ventricular sustentada recorrente bem tolerada

Recomendação CTaquicardia ventricular polimórfica secundária a distúrbios elétricos

primários tal como Sindrome do QT Longo, Síndrome de Brugada, etcou aquelas ocorrendo durante eventos deflagadores reversíveis, tais comoisquemia miocárdica aguda e distúrbios hidroeletrolíticos.

Taquicardia ventricular não sustentada assintomática.

Diretrizes do DAEC para o implante docardioversor-desfibrilador automático

O cardioversor e desfibrilador automático implantável (CDI) é aterapêutica mais efetiva para evitar a morte súbita em pacientes com

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

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taquiarritmias ventriculares. Várias séries clínicas e os ensaios pros-pectivos randomizados concluídos (AVID, MADIT, MUSTT) mostraramde modo convincente que em casos selecionados o CDI é superior àsdrogas antiarrítmicas na redução da morte súbita cardíaca e melhora dasobrevida. Os avanços tecnológicos simplificaram o implante do CDItornando-o parecido com o do marca-passo (MP) antibradicardia. Issojustifica o aumento dos implantes de CDI em todo o mundo.

A utilização dos CDI, para manter uma relação custo/benefícioapropriada, requer diretriz adequada às condições de saúde e socioeco-nômicas da população. Estas recomendações são transitórias, já que oavanço tecnológico e a finalização de diversos ensaios prospectivosrandomizados em curso (SCD-HeFT, MADIT II, DEFINITE,BEST+ICD, IRIS, DINAMIT) poderão expandi-las ou modificá-las.

Prevenção primáriaA prevenção primária ou profilaxia da parada cardíaca com CDI deve

ser considerada nas seguintes condições:

Recomendação B1TVNS com IM prévio, disfunção ventricular esquerda (FE ≤ 40%)

com TVS/FV indutível com estimulação ventricular programada.(nível 2)

Recomendação B21) Cardiomiopatia hipertrófica assimétrica com uma ou mais das

seguintes características: síncope prévia, presença de TVNSsintomática, história de morte súbita na família e espessura doVE > que 30 mm (nível 3).

2) Síndrome de Brugada assintomática com história familiar de mortesúbita e alterações eletrocardiográficas espontâneas (nível 3).

3) Insuficiência cardíaca com classe funcional da NYHA II-III, deorigem isquêmica, com disfunção ventricular com FEVE ≤ 40%,TVNS espontânea e indução de TVS/FV no EEF (nível 3).

Prevenção secundáriaA prevenção secundária ou profilaxia da recorrência da parada

cardíaca com CDI pode ser considerada nas seguintes condições:

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

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Recomendação A1) Parada cardíaca devido à taquicardia ou fibrilação ventricular de

causa não reversível, com FEVE ≤ 35% (nível 2).2) Taquicardia ventricular sustentada espontânea, de causa não

reversível, com FEVE ≤ 35% (nível 2).

Recomendação B11) Parada cardíaca devido à taquicardia ou fibrilação ventricular de

causa não reversível, com FEVE > 35% (nível 2).2) Taquicardia ventricular sustentada espontânea, de causa não

reversível, com FEVE > 35% se refratária a outras terapêuticas(nível 2).

3) Síncope de origem indeterminada com indução de taquicardiaventricular sustentada, hemodinamicamente instável ou fibrilaçãoventricular, clinicamente relevante, quando o tratamentomedicamentoso não é efetivo, tolerado ou preferido (nível 2).

4) Síncope recorrente em portadores de síndrome do QT longocongênito apesar do uso de betabloqueador (nível 3).

5) Síncope associada à síndrome de Brugada com alteraçõeseletrocardiográficas espontâneas ou induzidas (nível 4).

Recomendação B21) Síncope de origem indeterminada em pacientes com miocar-

diopatia dilatada idiopática, com FEVE ≤ 35% e estimulaçãoventricular programada negativa (nível 3).

2) Sintomas graves atribuídos a taquiarritmias ventriculares susten-tadas em pacientes esperando transplante cardíaco (nível 4).

Recomendação C1) Pacientes com taquiarritmias ventriculares devidas a causas

transitórias (fase aguda de infarto do miocárdio) reversíveis(distúrbio hidreletrolítico, drogas) ou curáveis (Wolff-Parkinson-White, taquicardia ventricular em coração normal) (nível 2).

2) Taquicardia ventricular incessante (nível 4).3) Expectativa de vida < 1 ano por outras condições clínicas (nível 4).4) Doença psiquiátrica passível de agravamento pelo implante/

utilização do CDI (nível 4).

Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

Page 163: Manual Cardiogeratria

164

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Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

Anexo IGraus de recomendações e níveis de evidência adotados pela

Sociedade Brasileira de CardiologiaGraus de recomendações DefiniçãoA – Definitivamente recomendada Sempre aceitável e segura

Definitivamente útilEficácia e efetividade comprovadas

B – Aceitável Aceitável e segura, clinicamente útil,mas não confirmado definitivamentepor estudo randomizado amplo oupor meta-análise

B1 – Evidência muito boa Considerado tratamento de escolhaB2 – Evidência razoável Considerado tratamento opcional

ou alternativoC – Inaceitável Clinicamente sem utilidade, pode

ser prejudicialNíveis de evidência DefiniçãoNível 1 Estudos randomizados amplos

e revisõesNível 2 Pelo menos um estudo randomizado

ou meta-análisesNível 3 Estudos de pequenas sériesNível 4 Recomendações de grupos de

especialistas em diretrizes ououtras reuniões

Page 164: Manual Cardiogeratria

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Tratamento das Arritmias Cardíacas no Paciente Idoso

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Capítulo 12

Fibrilação Atrialem Idosos

Dalmo Antonio Ribeiro Moreira

IntroduçãoA fibrilação atrial (FA) é a taquiarritmia supraventricular mais comum

na clínica1,2 e sua incidência aumenta com a idade2-4. Em um estudo deFramingham, envolvendo 5.191 indivíduos de ambos os sexos (idadeentre 30 e 62 anos), com seguimento de 22 anos, a incidência global deFA foi de 2%5. A presença de cardiopatia estrutural aumenta a incidênciade FA, de três a cinco vezes5; a cardiopatia reumática aumenta oito vezesa chance de aparecimento de FA no homem e 27 vezes na mulher4. Napopulação geral, a hipertrofia ventricular esquerda (HVE), alteraçõesinespecíficas da repolarização ventricular ao eletrocardiograma, diabetesmelito (DM) e hipertensão arterial sistêmica (HAS) são condições queestão associadas a 70% dos casos de FA, em indivíduos que ainda nãodesenvolveram cardiopatia 5. As variáveis ecocardiográficas que mais seassociam a maior risco de FA são: sobrecarga atrial esquerda, redução dafração de encurtamento e aumento da espessura da musculaturaventricular6.

A FA no idoso pode complicar a evolução clínica de outras doençasassociadas, como a insuficiência cardíaca (IC), além de aumentar anecessidade de consumo de medicamentos, para seu controle. Essaarritmia é causa de lesão cerebral silenciosa, particularmente da substânciabranca, secundariamente a episódios de microembolia cerebral,responsáveis pela instalação de quadros demenciais precocemente. Ainstalação aguda da FA pode diminuir subitamente a perfusão sangüínea

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cerebral, podendo causar quadros sincopais e acidentes graves nessapopulação. Por essas e outras razões, esse distúrbio do ritmo cardíacodeve ser diagnosticado precocemente, deve-se restabelecer o ritmo sinusale realizar a prevenção de recorrências.

Apresentação clínicaDe acordo com a forma de apresentação, a FA pode manifestar-se

das seguintes maneiras: a) paroxística; b) persistente ou crônica;c) permanente. A forma paroxística caracteriza-se por episódiosrecorrentes, com duração variável (poucos minutos até 24 a 48 horas) epode evoluir, num período que varia de 2 a 15 anos, para a forma crônica7.A forma persistente, a mais comum na clínica, é aquela na qual aprevenção das recorrências, com fármacos antiarrítmicos, torna-senecessária. A forma permanente é refratária a várias tentativas dereversão e o objetivo do tratamento dessa condição é apenas o controleda resposta ventricular, acompanhado ou não de anticoagulação.

Quanto à origem, podem ser definidas três categorias clínicas para aFA: a) originada em corações normais; b) secundária a cardiopatias;c) causada por distúrbios sistêmicos ou específicos (Tabela 1). A impor-

Tabela 1Causas de fibrilação atrial

Originada em coração normalIdiopáticaInfluências autonômicas (vagal e simpática)ÁlcoolAnti-histamínicosSimpaticomiméticosChá, cigarro, caféHipóxia pós-anestesia geralProcessos infecciosos (pneumonia, septicemia)

Secundária à cardiopatiaCardiopatia reumáticaHipertensão arterialInsuficiência coronarianaPós-operatório de cirurgia cardíacaMiocardiopatiasMiocardites

Secundária a processos específicosHipertireoidismo

Fibrilação Atrial em Idosos

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tância dessa classificação se baseia nas diferentes formas de abordagemterapêutica, na freqüência de complicações e, conseqüentemente, noprognóstico.

Vários são os mecanismos de origem da FA no idoso. Comoconseqüência do próprio envelhecimento, ocorre aumento da espessurada musculatura ventricular, acompanhada de redução de sua complacênciae aumento da pressão diastólica final. Essas alterações podem sersecundárias ao aumento do trabalho cardíaco, causado pela redução dacomplacência da raiz da aorta, que por sua vez é secundária ao processoaterosclerótico. Além disso, é comum o aparecimento de calcificação dosistema de condução cardíaco e do aparelho subvalvar mitral. O aumentoda pressão diastólica final do ventrículo esquerdo, que repercuteretrogradamente no átrio esquerdo, associado ao aumento da pressãointra-atrial, além da calcificação do sistema de condução, causalentificação da condução do impulso elétrico e alteração do períodorefratário do tecido atrial. O surgimento de ectopias atriais nesse substratoacarreta o desencadeamento de FA. Doenças associadas, tais como HASou quadros de miocardiopatia idiopática, aumentam o risco deaparecimento da arritmia.

O prolongamento do tempo de condução atrial e o aumento do volumeatrial podem ser facilmente demonstrados pelo aumento da duração dasondas P ao eletrocardiograma.

Sinais e sintomasOs idosos podem apresentar FA sem qualquer sintoma. Nessa

condição, a arritmia é descoberta em exame de rotina ou quando eles sãosubmetidos a avaliação para tratamento de outras doenças.

A IC é a forma de apresentação mais comum. A causa desse quadroé a taquicardiomiopatia secundária a episódios freqüentes de taquicardia,ao longo tempo de evolução da arritmia. Por outro lado, a freqüênciacardíaca rápida pode encurtar o tempo de diástole ventricular, dificultandoainda mais o esvaziamento atrial e causando dispnéia aos esforços. Emoutras situações, a sintomatologia dependerá da associação dessa arritmiacom outras cardiopatias até então sem qualquer manifestação clínica,como ocorre na estenose valvar mitral. A redução do débito cardíaco eda pressão arterial, provocada pela freqüência elevada ou muito lenta,associada a aterosclerose cerebral, estenose aórtica ou estenose mitral,

Fibrilação Atrial em Idosos

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contribui para os quadros sincopais. Nos casos de taquicardias rápidas, ahipotensão arterial, juntamente com o déficit funcional dos sistemas quecontrolam a pressão arterial, pode culminar em síncope em pacientesidosos.

A FA não relacionada a valvulopatia é a precursora mais importantede acidente vascular cerebral (AVC) em idosos, aumentando seu riscode 7% em idades entre 50 e 59 anos para 36% em idades entre 80 e 89anos8. Em levantamento epidemiológico, a FA não valvar foi responsávelpor até 45% dos casos de acidente vascular cerebral secundário a emboliade origem cardíaca8. A FA é, portanto, fator de alto risco, independentede outras doenças associadas, para a ocorrência de AVC. Crisesconvulsivas em pacientes com FA crônica, assintomáticos, sem qualqueroutra causa aparente, faz levantar a hipótese de infartos cerebrais pequenossecundários a tromboembolismo silencioso9,10. De 35% a 37% dospacientes com FA crônica têm sinais tomográficos de infarto cerebraldevido a tromboembolismo silencioso2.

TratamentoO tratamento da FA deve ser realizado por causa da morbidade

associada e tem, basicamente, três objetivos: a) aliviar os sintomas;b) prevenir tromboembolismo; c) prevenir IC. As formas de tratamentopreconizadas são: a) reversão ao ritmo sinusal com cardioversão químicaou elétrica; b) prevenção de recorrências; c) controle da respostaventricular associada ou não à anticoagulação crônica, caso não se consigao restabelecimento do ritmo sinusal. A conduta terapêutica deve serindividualizada, atendendo às condições particulares de cada caso e aforma de apresentação da arritmia. É importante ressaltar que a únicamodalidade terapêutica definitivamente comprovada por estudoscontrolados e estatisticamente adequados é a que se refere a anticoagu-lação para prevenção de tromboembolismo.

Restabelecimento do ritmo sinusalA decisão de se restabelecer o ritmo sinusal depende de diversos

fatores, entre os quais se destacam: a) índice de sucesso da reversão,química ou elétrica; b) prevalência de complicações de ambos osprocedimentos; c) tolerância ao uso de antiarrítmicos para manutenção

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do ritmo sinusal; d) risco de efeito pró-arrítmico dos agentes antiarrítmi-cos; e) presença de sinais e sintomas que alterem o ritmo de vida dopaciente; f) duração da arritmia; g) risco de recorrências.

Teoricamente, o restabelecimento do ritmo sinusal reduz o risco detaquicardiomiopatia e tromboembolismo e dá ao paciente a sensação debem-estar. Não há evidência de que o risco de embolia periférica sejareduzido com a normalização do ritmo cardíaco, pois a formação detrombos pode ser secundária à cardiopatia subjacente. Entretanto, algunsestudos que analisam a evolução clínica de pacientes portadores dedisfunção do nódulo sinusal que evoluíam com FA, depois de tratadoscom marca-passo definitivo, demonstram redução acentuada do risco deembolia periférica, concomitantemente à redução do risco de apare-cimento da arritmia. Essa é uma evidência de que a prevenção da arritmiapode reduzir o risco de complicações embólicas.

Qual a aplicabilidade prática da conduta de se reverter a FA e mantero ritmo sinusal? Tanto a cardioversão química quanto a elétrica, associadaà anticoagulação, são procedimentos nem sempre aplicáveis à maioriados centros de tratamento de pacientes idosos. Não há uniformidade naconduta quando se refere a pacientes com FA, nem mesmo quando seconsidera a especialidade médica envolvida com o tratamento (clínicogeral, cardiologista ou geriatra)11 . Existe receio quanto ao risco dehemorragias relacionadas à anticoagulação. Nesse último caso citam-seas questões do uso incorreto do anticoagulante, do controle inadequadoda faixa terapêutica do medicamento (atividade de protrombina ou INRnão compatível), da falta de centros treinados no controle do uso deanticoagulantes, etc. Provavelmente, o maior risco de o idoso vir acomplicar com a anestesia geral reduz o ímpeto dos clínicos em indicara cardioversão elétrica. Os efeitos colaterais dos medicamentosantiarrítmicos e, muitas vezes, sua ineficácia em reverter a FA ou mantero ritmo sinusal fazem com que o médico desista da cardioversão químicae opte apenas pelo controle da freqüência cardíaca. Com relação aopaciente, o fato de estar assintomático ou não, de se conhecer o tempode duração da arritmia, além de se “achar” que as chances de reversãoou manutenção do ritmo sinusal são baixas, levam o clínico a optar pelotratamento mais ou menos “agressivo”.

A grande dificuldade do tratamento da FA não é a reversãopropriamente, mas a manutenção do ritmo sinusal após a cardioversão.

Fibrilação Atrial em Idosos

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Entretanto, só se definirá essa última condição, caso seja tentado orestabelecimento do ritmo sinusal. Por essa razão, alguns autoresconcordam que se deve tentar pelo menos uma vez a cardioversão daFA naqueles em que tal conduta nunca foi tentada anteriormente12.

Controle da resposta ventricularA redução da resposta ventricular obtida com medicamentos ou com

ablação da junção atrioventricular e implante de marca-passo definitivo,melhora a performance ventricular e a capacidade física ao esforço13; orisco de embolia periférica, contudo, permanece. A manutenção commedicamentos para reduzir a freqüência ventricular apresenta grandeaplicabilidade prática, pois pode ser feita ambulatorialmente e seu sucessopode ser avaliado através da clínica, o que inclui anamnese, exame físico,eletrocardiograma e Holter de 24 horas, além do teste ergométrico. Agrande dificuldade, entretanto, fica por conta do controle da anticoagulaçãocrônica.

O controle da resposta ventricular como forma de tratamento clínicoestá indicado nas seguintes condições: a) quando a opção de reversão aoritmo sinusal for afastada; b) quando as chances de manutenção do ritmosinusal pós-cardioversão são pequenas (como por exemplo, nos casos deFA de longa duração [> 24 meses]); c) em indivíduos bradicárdicos,quando há o risco de ritmo sinusal muito lento, tornando o paciente maissintomático, situação em que a FA é o ritmo de escolha; d) quando houverintolerância do paciente em tomar medicamentos para manutenção doritmo sinusal após a cardioversão.

Tratamento da fibrilação atrial paroxísticaNa forma paroxística, existe sempre a possibilidade da reversão espon-

tânea. Em um estudo que envolveu pacientes de varias faixas etárias, areversão da FA ocorreu em até 48 horas em cerca de 70% dos casos, prin-cipalmente em indivíduos não-cardiopatas14. Por essa razão, indicam-seapenas sedação, repouso e controle da resposta ventricular commedicamentos que reduzem a freqüência cardíaca. Verapamil epropafenona não devem ser administrados a pacientes com disfunçãoventricular ou sinais clínicos de IC, devido ao alto risco de agravamentodo distúrbio hemodinâmico. Há relatos da rapidez de ação, eficácia e

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segurança do diltiazem administrado por via venosa, sobre a redução daresposta ventricula r, mesmo em pacientes com insuficiência cardíacamanifesta15,16. A amiodarona é outra opção nessa condição, podendo atémesmo promover reversão da arritmia, embora esse último efeito nãoseja estatisticamente diferente da ação do placebo17. O digital administradopor via venosa demora cerca de duas horas para exercer efeito pleno, oque torna sua utilização pouco prática. Além disso, ele não é eficaz quandoo nível plasmático de catecolaminas está elevado18.

É importante salientar que controle da resposta ventricular nãosignifica redução da freqüência cardíaca. Quedas significativas dafreqüência ventricular ou mesmo freqüências elevadas podem reduzir odébito cardíaco, comprometendo o estado hemodinâmico do paciente.

Em casos de IC clinicamente manifesta, além do controle da respostaventricular, a compensação do distúrbio hemodinâmico com diuréticos,inibidores da enzima de conversão da angiotensina e betabloqueadores(carvedilol, por exemplo) é fundamental para o sucesso do tratamento.

Tratamento da fibrilação atrial persistenteNão há qualquer evidência atual que indique que os pacientes com

essa forma de FA devam ser submetidos à cardioversão química ouelétrica. Por essa razão, não há uniformidade no que se refere aotratamento da FA persistente. Alguns estudos, entretanto, demonstraramque a reversão e a manutenção do ritmo sinusal apresentam bonsresultados quando os pacientes são assintomáticos, a duração da arritmiaé menor que 1 ano e os pacientes não apresentam disfunção ventricularou cardiopatia clinicamente manifesta19. Esses achados, entretanto,diminuiriam acentuadamente a aplicabilidade prática dessa conduta,restringindo-a a uma minoria de pacientes com esse perfil.

Quando se opta pela cardioversão ao ritmo sinusal, sempre quepossível, deve-se identificar e remover a causa da FA (embolia pulmonar,pericardite, hipertireoidismo, infecção pulmonar, desidratação e distúrbioseletrolíticos são as mais comuns). Em alguns casos essa conduta é sufi-ciente para a restauração do ritmo sinusal.

I – Cardioversão elétricaÉ o método de escolha para a reversão da FA hemodinamicamente

instável. Deve ser realizada com o paciente internado e sob anestesia

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geral; o ritmo cardíaco, a pressão arterial e a saturação de oxigêniodevem ser monitorizados. O índice de sucesso da reversão da FA aoritmo sinusal é de até 94% com esse método20. A administração deantiarrítmicos, previamente à cardioversão elétrica, não aumenta oíndice de sucesso do procedimento, podendo até mesmo aumentar olimiar de desfibrilação elétrica, como é o caso quando se utilizaamiodarona21 .O uso de digital não contra-indica a cardioversão elétrica,e não é necessária sua suspensão, previamente ao procedimento, anão ser nos casos em que se suspeite de intoxicação digitálica. O riscodessa complicação aumenta quando o digital é usado concomi-tantemente à quinidina ou a amiodarona, ou quando ocorre hipopo-tassemia em pacientes em uso de diuréticos.

Não há qualquer estudo que indique o protocolo mais eficaz paracardioversão elétrica da FA, entretanto, de acordo com um estudomulticêntrico e prospectivo sobre o tratamento da FA, realizado no Estadode São Paulo, ficou claro que cargas iniciais de 200 joules revertem amaioria dos casos de fibrilação atrial22.

II – Cardioversão químicaÉ um método simples, prático, menos oneroso e pode ser realizado

ambulatorialmente. Pode ser tentada com medicamentos antiarrítmicos,preferencialmente dos grupos IC ou III. Devido aos riscos de efeitoscolaterais sérios, os fármacos do grupo IA têm sido cada vez menosutilizados com esse objetivo, embora a quinidina continue sendo o agentemais prescrito nos Estados Unidos para esse propósito. Apesar dessefato, há estudos demonstrando que quinidina e verapamil associadosapresentam eficácia que varia de 50% a 60% na reversão química da FAao ritmo sinusal, com manutenção desses fármacos, por um período deaté 2 anos23. Em pacientes com FA de recente começo, propafenona nadose de 600 mg restabelece o ritmo sinusal em até 87% do casos24.

Em nossa experiência, a reversão química da FA ambulatorialmente,utilizando amiodarona ou quinidina, apresentou sucesso global de 61%(80/132 pacientes com FA com duração > 15 dias)25. O índice de sucessofoi semelhante para os dois agentes (58% para amiodarona; 63% paraquinidina, p = NS). Esses resultados não foram influenciados por idade,sexo, tempo de duração da arritmia, tamanho de átrio esquerdo ou estadoda função ventricular25.

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Ainda não está estabelecido de forma definitiva qual antiarrítmicodeve ser utilizado primeiramente para a reversão da FA. Provavelmente,todos apresentem índices de sucesso equivalentes e a decisão pela escolhadeve ser baseada em critérios clínicos, na experiência de quem prescreveo medicamento e no risco de efeitos colaterais26. Embora sem o respaldode estudos randomizados com número adequado de pacientes, algunsautores recomendam a seguinte conduta: a) em indivíduos cardiopatasou com IC, a droga de escolha é a amiodarona; b) em indivíduos não-cardiopatas, são recomendados sotalol, propafenona, disopiramida,amiodarona e, finalmente, quinidina27 .

Anticoagulação precedendo acardioversão da fibrilação atrial

Uma das complicações mais temidas em pacientes com FA é otromboembolismo periférico. Os pacientes de maior risco para osurgimento de trombos intracavitários são aqueles com: a) história préviade AVC ou isquemia cerebral transitória; b) idade acima de 75 anos;c) HAS; d) IC congestiva; e) DM.

Quando a FA tiver duração maior que 2 dias ou for de duraçãodesconhecida, está indicada a anticoagulação profilática antes dacardioversão, química ou elétrica. O período de administração damedicação é de no mínimo 15 dias com o INR entre 1,5 e 2,0 emindivíduos acima de 75 anos, ou entre 2,0 e 3,0 naqueles abaixo dessafaixa etária. Valores superiores aumentam o risco de hemorragia cerebralem pacientes idosos. Somente após esses requisitos terem sido satisfeitosé que se deve iniciar o processo de cardioversão. Indivíduos com históriaprévia de AVC sem seqüelas ou apenas com seqüelas discretas podemsubmeter-se à anticoagulação, visando a cardioversão da arritmia. Nessescasos, deve-se aguardar a resolução do quadro isquêmico, com diminuiçãodo déficit motor, ou pelo menos duas semanas após o evento agudo,quando o paciente apresentar-se estável.

O anticoagulante deve ser mantido por pelo menos 30 dias após acardioversão. Essa é a fase em que a recuperação da atividade mecânicaatrial está ocorrendo e, portanto, ainda existe risco de formação de trombo,principalmente no apêndice atrial esquerdo.

Embora não esteja definitivamente estabelecido, os pacientes sem osfatores de risco anteriormente mencionados e com FA de duração menor

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que 2 dias podem submeter-se à cardioversão sem anticoagulação prévia.Nos casos em que a FA tenha duração desconhecida, a conduta deveser a anticoagulação preventiva.

A utilização do ecocardiograma transesofágico, não autoriza acardioversão sem anticoagulação prévia, se nenhum trombo ou contrasteespontâneo, for encontrado. Sugere-se que se inicie a anticoagulação e,assim que o INR entrar na faixa terapêutica, proceda-se a cardioversão.A manutenção posteriormente deve ser feita pelo período de 30 dias. Naverdade, a conduta de se utilizar o ecocardiograma transesofágico visaapenas abreviar o tempo de anticoagulação antes da cardioversão.

Não se recomenda a cardioversão em pacientes que apresentemcontra-indicação à anticoagulação. Essa população inclui pacientes comhistória prévia recente de úlcera péptica hemorrágica, AVC hemorrágico,dificuldade em entender o processo de anticoagulação e que, portanto,não têm condições de fazer uso correto da medicação, risco de trauma-tismo craniano ou história de convulsões. Nesses casos, a administraçãode ácido acetilsalicílico, parece ser a conduta mais razoável.

Prevenção de recorrênciasA prevenção de recorrências não é necessária para pacientes em

que a causa da arritmia foi identificada e removida. Isso acontece emcasos de consumo excessivo de álcool ou relacionados a estresse físicoe emocional. A terapêutica antiarrítmica só está indicada em casos derecorrências freqüentes, um sinal de que ainda estão presentes asalterações eletrofisiológicas atriais que tendem a cronificar a arritmia.

Para pacientes em que uma causa não puder ser identificada, devemser administrados antiarrítmicos, visando a prevenção de recorrências,após a cardioversão. O período de utilização dos fármacos depende dafreqüência prévia de episódios e da presença de fatores de risco pararecorrências, como, por exemplo, cardiopatias. Os pacientes com maiorrisco são aqueles com HAS, estenose mitral e miocardiopatia dilatadaou hipertrófica, que se acompanhem de grandes aumentos do átrioesquerdo1. Não há qualquer estudo que estabeleça a conduta, nos casosde indivíduos que apresentem FA pela primeira vez e sejamassintomáticos. Empiricamente, eles podem fazer uso de medicamentospor um mês apenas, tempo no qual a incidência de recorrência é maior.Em caso de novas recorrências, o uso da medicação deve ser prolongado,

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pois já se apresenta um dado clínico que sugere tendência para outrascrises. Pacientes assintomáticos, mas que apresentem elevada freqüênciade extra-sístoles atriais ao Holter de 24 horas, devem ser tratadoscronicamente, pois essa arritmia pode ser gatilho para o surgimento denovas crises.

Para assegurar o sucesso do tratamento medicamentoso na preven-ção de recorrências, os antiarrítmicos devem ser administrados na doseterapêutica máxima tolerada, devendo-se mudar o esquema somentequando se comprovar o reaparecimento da arritmia em duas ou trêsocasiões. O sucesso terapêutico é determinado pela redução do númerode recorrências e não pelo reaparecimento de apenas um episódio.

Os antiarrítmicos mais empregados para prevenção de recorrênciassão: sotalol, propafenona, disopiramida e amiodarona e, menos freqüen-temente, quinidina, devido aos riscos de efeitos colaterais e pró-arrítmi-cos. Quinidina, disopiramida e sotalol têm eficácia semelhante28, aopasso que, a propafenona é ligeiramente superior à quinidina29. Aamiodarona, entretanto, parece ser o agente antiarrítmico mais eficaz,com índices de sucesso de 79% a longo prazo30. A duracão da FA (< 1ano) parece ser o principal fator que influencia o sucesso terapêuticocom este agente.

Devem ser evitados fármacos que deprimem a função ventricular empacientes com IC, porque podem aumentar o risco de recorrências ou achance de efeito pró-arrítmico. Nesse grupo, destacam-se: disopiramida,propafenona, sotalol e verapamil. O risco de pró-arritmia aumenta empacientes com disfunção ventricular, isquemia miocárdica, arritmiasventriculares complexas, na presença de desequilíbrio eletrolítico eintervalo QT longo. Quinidina e disopiramida estão contra-indicadas emhomens com hipertrofia prostática.

A FA paroxística secundária à influência vagal deve ser tratada commedicamentos do grupo I (disopiramida ou propafenona). Nessespacientes, devem ser evitados digital ou betabloqueadores, que tendem aaumentar o risco de recorrências ou o tempo de duração das crises. Se aFA for causada por hiperatividade simpática, pode-se tratar com sotalol,amiodarona ou propafenona.

De maneira geral, a maioria dos medicamentos falha na prevençãode recorrências em pacientes com FA crônica com duração maior que1 ano, mas, seguramente, o índice de recorrências é maior quando nenhum

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antiarrítmico é administrado. Por essa razão, a administração de fármacosapós a reversão ao ritmo sinusal deve ser uma conduta a ser seguidanesses pacientes. A decisão de se repetir a cardioversão após umarecorrência depende de cada caso. Nossa conduta tem sido a reversão,se o intervalo entre a primeira e a segunda crise for de pelo menos seismeses. Casos de períodos mais curtos devem ser avaliados indivi-dualmente, pois a não-utilização correta de medicamentos ou a retençãohídrica por dieta incorreta (abuso do consumo de sal, por exemplo) podemser fatores potencialmente arritmogênicos, não indicando necessariamenterefratariedade ao tratamento. Nessa situação, nova tentativa de car-dioversão parece razoável.

Tratamento da fibrilação atrial permanenteNos casos de FA permanente, ou seja, aquela refratária aos métodos

de cardioversão, os objetivos do tratamento devem ser: a) controle daresposta ventricular; b) prevenção de tromboembolismo periférico;c) prevenção de IC.

A redução da freqüência cardíaca pode ser obtida com fármacos quebloqueiam parcialmente a condução pelo nódulo atrioventricular taiscomo: digital, verapamil ou diltiazem, betabloqueadores e amiodarona.Os agentes que deprimem a função ventricular, tais como verapamil,diltiazem e betabloqueadores, devem ser evitados em pacientes com IC.Quando, no entanto, forem utilizados, devem ser associados ao digital.Se, mesmo com a medicação administrada, a freqüência cardíacapermanecer elevada, devem ser pesquisadas outras causas, tais como:IC, tireotoxicose, desidratação, hipotensão arterial, hipóxia ou estadosinfecciosos. Descartadas essas possibilidades, se o controle da respostaventricular não tiver sido obtido pela otimização da medicação, deve-seoptar pelo tratamento não-farmacológico, que consiste na indução debloqueio atrioventricular, através de ablação com cateter e implante demarca-passo definitivo. Vários estudos já demonstraram a eficácia dessaconduta, principalmente pela redução da sintomatologia e pela melhorada performance da função ventricular1,13.

Estudos recentes demonstraram que a evolução clínica de pacientescom FA crônica com freqüência cardíaca controlada e anticoagulados,em comparação com aqueles que foram submetidos à cardioversão aoritmo sinusal e fazem uso de medicação para a prevenção de recorrências,

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não apresenta diferença significativa no que diz respeito à sintomatologiae à qualidade de vida31. Informações relacionadas à sobrevida dessesdois subgrupos de pacientes, bem como à incidência de AVC hemorrágico,entretanto, deverão estar disponíveis muito em breve, com a publicaçãodos resultados do estudo AFFIRM32.

I – Anticoagulação crônicaEstá indicada para os pacientes com os fatores de risco já mencionados.

Naqueles sem fatores de risco e idade abaixo de 65 anos, a utilização deácido acetilsalicílico é uma opção que pode ser seguida. A conduta nessaforma de apresentação clínica da FA, não difere daquela condição naqual se preconizou a anticoagulação, visando a cardioversão.

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Capítulo 13

Anticoagulação Oralno Paciente Idoso

Cecília Maria Barroso Quaglio

IntroduçãoO mundo vive hoje uma revolução demográfica. Nos Estados Unidos,

o número atual de idosos (> 65 anos) é de 30 milhões; estima-se que em2020 alcance 50 milhões1. Esse crescimento é também observado namaioria dos países. Como conseqüência, 30% das pesquisas em saúdesão direcionadas a essa população. Isso se deve ao aumento inevitávelda freqüência de doenças cardiovasculares e pulmonares nessa faixaetária. O paciente idoso apresenta risco elevado de complicaçõestromboembólicas, que resultam em aumento significativo de morbidadee mortalidade. Os anticoagulantes orais são a base do tratamentopreventivo do tromboembolismo; entretanto, vários estudos demonstraramque o idoso apresenta maior risco de complicações hemorrágicas pelouso desses medicamentos. Desse modo, a decisão pela utilização ou nãode anticoagulantes orais deve ser individualizada; devem ser consideradostambém fatores, como: condição socioeconômica, função cognitiva,probabilidade de adesão ao tratamento e risco de sangramento, emcomparação com os possíveis benefícios da terapia antitrombótica.

TromboembolismoA fibrilação atrial (FA) é a arritmia mais prevalente entre os idosos.

Estudos epidemiológicos demonstraram que 70% dos pacientes com FAtêm entre 65 e 85 anos de idade2 (Figura 1).

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Tabela 1Índice anual de AVC, estratificado por idade e fatores de risco4

Características Índice Índice Redução Redução NNTdos pacientes evento evento risco risco

anual anual relativo absolutoplacebo varfarina

Idade < 65 anos, sem FR 1,0% 1,0% 0 0 InfinitoIdade < 65 anos, 1 ou + FR 4,9% 1,7% 68% 3,2% 31Idade 65-75 anos, sem FR 4,3% 1,1% 74% 3,2% 31Idade 65-75 anos, 1 ou + FR 5,7% 1,7% 70% 4,0% 25Idade > 75 anos, sem FR 3,5% 1,7% 51% 1,8% 56Idade > 75 anos, 1 ou + FR 8,1% 1,2% 85% 6,9% 14FR – fatores de risco (hipertensão arterial, diabetes, AVC ou AIT prévio); NNT – número necessário para tratar.

A idade avançada constitui fator de risco independente para acidentevascular cerebral (AVC) e embolia sistêmica, em pacientes com FA nãovalvar2. Uma meta-análise de seis grandes estudos randomizados avaliou opapel dos anticoagulantes orais na prevenção de tromboembolismo edemonstrou que, de acordo com o princípio da intenção de tratar, oanticoagulante oral é considerado altamente eficaz em diminuir o risco deocorrência de todos os tipos de AVC (isquêmico ou hemorrágico), com reduçãode 61% (95% IC 47% a 71%) quando comparado ao placebo3 (Tabela 1).

Esses estudos demonstraram claramente os benefícios do uso de anti-coagulantes orais na prevenção de fenômenos tromboembólicos em

Figura 13 – Prevalência de FA em dois estudos epidemiológicos: Framingham HeartStudy e Cardiovascular Health Study.

Framingham – estudo de Framingham; CHS – Cardiovascular Health Study.

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pacientes com idade superior a 65 anos, considerados de alto risco porserem portadores de FA crônica de origem não valvar. Recentemente sedemonstrou que a manutenção do INR (Índice de NormalizaçãoInternacional) entre 2 e 2,5, nessa população específica, reduz o risco decomplicações hemorrágicas. Em caso de intolerância ou contra-indicaçãoaos anticoagulantes orais, deve-se optar pelo ácido acetilsalicílico, nadose de 325 mg/dia.

Complicações hemorrágicasA complicação mais freqüente dos anticoagulantes orais é o

sangramento. A incidência de sangramento está diretamente relacionadaà intensidade da anticoagulação. Com a recomendação atual de se manteríndices mais baixos de anticoagulação, reduziu-se muito a incidência desseevento, que tem elevado potencial de gravidade. Pacientes em uso deanticoagulantes orais apresentam índices anuais médios de sangramentomaior (necessita hospitalização, transfusão ou resulta em morbidadesignificativa, como, por exemplo, sangramento intra-articular ou cerebral),entre 0,9% e 2,7%; o risco médio anual de sangramento fatal varia de0,07 a 0,7%5.

Condições associadas a aumento do risco de sangramento5:• Idade > 65 anos.• Idade > 75 anos e FA associada.• Antecedente de sangramento gastrintestinal.• Fatores de comorbidade:

hipertensão arterial;doença cerebrovascular;doença cardíaca grave;insuficiência renal.

• Maior fragilidade vascular e endotelial.Por sua vez, os fatores que aumentam o risco de sangramento em

idosos em uso de varfarina são6:• História de acidente vascular cerebral.• História de sangramento gastrintestinal.• Fatores de comorbidade:

insuficiência renal;infarto do miocárdio recente;anemia grave.

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• Fibrilação atrial.• Intensidade da anticoagulação.• Duração da anticoagulação (o risco é mais elevado nos primeiros

90 dias de tratamento).• Indicação da anticoagulação (o risco é maior em pacientes com

tromboembolismo venoso e/ou AVC isquêmico).• Uso concomitante de alguns medicamentos.• Idade avançada (?).A idade avançada constituiria, portanto, fator de risco tanto para

fenômenos tromboembólicos quanto para episódios hemorrágicos.Para se obter resultados favoráveis pela terapia anticoagulante, três

fatores devem ser analisados. Esses fatores estão intimamente interligadose, na ausência de algum deles, a indicação do anticoagulante oral deveser repensada. São eles:

1) Conhecimento multidisciplinar sobre anticoagulação oral (meca-nismo de ação, tipos de anticoagulantes, indicações do uso, faixaterapêutica ideal, dieta, interações medicamentosas, manuseioperioperatório, etc.).

2) Condições de monitorização efetiva do anticoagulante.3) Adesão do paciente ao tratamento.

Mecanismo de ação dos anticoagulantes orais

Os anticoagulantes orais exercem sua ação através da inibição dacarboxilação dos fatores de coagulação II, VII, IX e X (dependentes davitamina K)7. Essa inibição resulta na síntese de formas biologicamenteinativas dessas proteínas de coagulação. Por outro lado, eles tambéminibem a carboxilação (vitamina K dependente) das proteínas C e S, quesão anticoagulantes naturais e, desse modo, apresentam efeito pró-coagulante potencial8.

Anticoagulantes orais

Os anticoagulantes orais ou antagonistas da vitamina K mais am-plamente utilizados são os derivados cumarínicos. Os principais repre-sentantes dessa classe são a varfarina e a femprocumona. Suas caracte-rísticas estão apresentadas na tabela 2.

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Devido à meia-vida mais curta, a varfarina proporciona maior segu-rança, sendo preferencialmente recomendada para utilização em idosos.

MonitorizaçãoO exame laboratorial mais utilizado para mensuração dos efeitos do

anticoagulante oral é o tempo de protrombina (TP). Entretanto, o valordesse teste pode variar muito devido à utilização de diferentes tipos detromboplastinas tissulares pelos diversos laboratórios, o que faz variarconsideravelmente a sensibilidade desse exame na avaliação da respostaao anticoagulante. Para solucionar esse problema, a Organização Mundialde Saúde (OMS) desenvolveu uma tromboplastina de referênciainternacional e recomenda que o TP deve ser expresso através do índicede normalização internacional (INR). A conversão do TP para o INR éfeita através da seguinte fórmula 13:

INR= (TP paciente )ISI

(TP médio normal)ISI = medida da responsividade da tromboplastina utilizada na redução

dos fatores dependentes da vitamina K.INR = tempo de protrombina que deveria ser obtido se a tromboplastina

da OMS, que por definição é igual a 1, fosse utilizada para avaliar o TP.Desse modo, a monitorização do nível de anticoagulação deve, atual-

mente, ser expressa através do INR.

Controle ambulatorialFase inicial6:• Iniciar varfarina na dose de 5 mg/dia, durante 3 dias (não se deve

utilizar dose de ataque), e solicitar o INR no quarto dia; se necessário,fracionar a dose para encontrar o INR adequado; após isso, ocontrole deve ser semanal até a obtenção dos níveis adequados daanticoagulação (faixa ideal).

Tabela 2Perfil dos principais anticoagulantes disponíveis no Brasil

Perfil do agente Varfarina FemprocumonaNome comercial Marevan Marcoumar

Meia-vida de eliminação 20 a 60 horas9 4 a 6 dias11

Pico de resposta 72 a 96 horas10 5 a 7 dias12

Anticoagulação Oral no Paciente Idoso

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Após estabilização6:• Controle mensal do INR (pacientes idosos).

IndicaçõesA eficácia clínica dos anticoagulantes orais está bem estabelecida e

se fundamenta em grandes estudos clínicos randomizados. As principaisindicações clínicas desses agentes são7,14:

• Prevenção primária e secundária do tromboembolismo venoso.• Prevenção de embolia sistêmica em pacientes com FA, portadores

de próteses valvares biológicas ou metálicas ou com idade > 65 anos.• Prevenção de infarto agudo do miocárdio em pacientes com doença

arterial periférica.• Prevenção de AVC, reinfarto ou morte, em pacientes com infarto

agudo do miocárdio.• Prevenção de infarto do miocárdio em pacientes do sexo masculino,

considerados de alto risco para eventos tromboembólicos.

Índice terapêuticoOs índices de INR recomendados para a manutenção do nível

terapêutico ótimo (ideal) da anticoagulação oral, em função das diversasindicações desses agentes, estão apresentados na tabela 326,13,14.

Tabela 3Índice do INR recomendável para as diversas condições clínicas

Indicações INRProfilaxia da trombose venosa

2,0 e 3,0

Tratamento da trombose venosaTratamento do tromboembolismo pulmonarPrevenção de embolia sistêmica

• Próteses valvares biológicas• IAM (para prevenção de embolia sistêmica)*• Doença valvar cardíaca• Fibrilação atrial• Próteses metálicas em posição aórtica

(de duplo disco e na ausência de fatores de risco)**Próteses valvulares metálicas 2,5 a 3,5* Pacientes com: disfunção grave de ventrículo esquerdo, insuficiência cardíaca congestiva, antecedente de

tromboembolismo prévio, trombo mural e fibrilação atrial.** Fatores de risco: fibrilação atrial, disfunção grave de ventrículo esquerdo, tromboembolismo prévio e

indicadores de hipercoagulabilidade.

Anticoagulação Oral no Paciente Idoso

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Interações medicamentosasÉ elevado o risco de interações medicamentosas, quando se utilizam

anticoagulantes orais. Muitos medicamentos podem alterar o perfilfarmacodinâmico desses agentes, através da inibição de sua absorçãoou via interferência na síntese dos fatores de coagulação dependentesda vitamina K (efeito sinérgico). As principais formas de interaçãomedicamentosa estão descritas na tabela 413,15.

Existem diversos relatos na literatura, sobre interação entre outrosfármacos e anticoagulantes orais; desse modo, é prudente que, ao seiniciar qualquer medicamento novo, seja feito controle adequado do INR.

DietaA vitamina K contida nos alimentos pode alterar o efeito terapêutico

dos anticoagulantes orais. Desse modo, deve ser mantida dieta constantee ingestão equilibrada de alimentos ricos nessa vitamina. Após a estabi-lização da dose do anticoagulante oral, o ideal é que a ingestão diária devitamina K não ultrapasse níveis em torno de 250 µg16.

A quantidade de vitamina K dos alimentos pode apresentar flutuações,por influência de vários fatores, o que foi demonstrado por diversos estudosclínicos. No Setor de Anticoagulação do Instituto Dante Pazzanese de Car-diologia de São Paulo são adotadas as seguintes orientações (Tabela 5) 16,17,18.

Tabela 4Interação entre anticoagulantes e medicamentos utilizados na prática clínica

Potencializam o efeito dos Efeito neutro Antagonizam o efeito dosanticoagulantes anticoagulantes

Amiodarona Antiácidos BarbitúricosParacetamol Atenolol Carbamazepina

Metronidazol Famotidina ColestiraminaTrimetropim-sulfametoxazol Fluoxetina Rifampicina

Cimetidina Metoprolol ClordiazepóxidoCefalosporinas Ranitidina

Eritromicina NaproxenoFluconazolEritromicina

FenitoínaVitamina E (altas doses)

Fármacos que potencializam o efeito anti-hemostático: aspirina, antiinflamatórios não-hormonais, ticlopidinae carbenicilina.

Anticoagulação Oral no Paciente Idoso

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Definição do risco anual de eventostromboembólicos

Para definição do manuseio de anticoagulantes orais, deve-seclassificar os pacientes em três grupos: alto, médio ou baixo risco anualde tromboembolismo. Incidência > 6% ao ano é considerada elevada, oque justifica tratamento mais agressivo. Incidência entre 2% e 6% éconsiderada de médio risco e os pacientes podem beneficiar-se tanto douso de anticoagulantes orais como de antiagregantes plaquetários. Quandoessa incidência é < 2% ao ano, é considerada de baixo risco e os pacientespodem ser dispensados do tratamento com anticoagulantes orais. Essesdados estão apresentados na tabela 619.

Tabela 6Risco anual de eventos tromboembólicos de acordo com o perfil clínico

Alto risco Médio risco Baixo riscoCâmaras cardíacas EM com FA e/ou FA não-valvar FA isolada e idade(trombo de fibrina)* TE prévio e/ou AE grande IAM de parede anterior, nos < 60 anos

FA crônica ou primeiros 3 meses Aneurismaparoxística (valvar) crônico de VE

Terapia Trombos intracavitáriosACO (INR – 2,0 a 3,0) ACO (INR – 2,0 a 3,0) (Nenhuma)

Próteses cardíacas Mecânica Bioprótese, até o Bioprótese, após o 3 o mês(trombo de fibrina Posição aórtica** 3o mês de POe plaquetas)* Fator de risco** Bioprótese, com fator de riscoTerapia ACO (INR – 2,5 a 3,5) ACO (INR – 2,0 a 3,0) (Nenhuma)TE venoso Fase aguda até o 3 o mês após 3 o mês,(trombo de fibrina) Heparina após 3 o mês, com fator de risco sem fator de riscoTerapia ACO (INR – 2,0 a 3,0) (Nenhuma)EM – estenose mitral; FA – fibrilação atrial; AE – átrio esquerdo – TE – tromboembolismo; ACO –anticoagulante oral; IAM – infarto agudo do miocárdio; VE – ventrículo esquerdo; PO – pós-operatório;*Principais componentes do trombo.**Associar antiagregante plaquetário.

Anticoagulação Oral no Paciente Idoso

Tabela 5Influência do perfil dos alimentos no uso de anticoagulantes

Alimentos que raramente devem Fígado (de qualquer animal)ser ingeridosAlimentos que devem ser ingeridos com Couve, salsa, espinafre, acelga, agrião,cuidado (diariamente, em pequena alface, brócolis, cebolinha, couve-flor,quantidade) escarola, ervilha, grão-de-bico, lentilha,

repolho, soja, chás de folhas verdesAlimentos que podem ser ingeridos Alimentos não listados acimalivrementeA ingestão ocasional de bebidas alcoólicas não parece interferir no controle daanticoagulação oral.

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Manuseio perioperatórioPacientes em uso de anticoagulantes orais, que necessitem submeter-se

a algum tipo de procedimento cirúrgico, devem seguir as orientaçõescontidas na tabela 720.

Tabela 7Manuseio da suspensão de anticoagulantes antecedendo

procedimentos intervencionistasTipo de procedimento Pré-operatório Pós-operatórioProcedimentos Paciente de Suspender ACO até Reiniciar ACO no mesmoinvasivos alto/médio INR < 2,0 dia ou no primeiro POBiópsia com baixo risco Administrar heparina* SC Manter heparina até 24 arisco de sangramento 48 horas ou INR = 2,0 a 3,5

Paciente de Reduzir ACO até INR Retornar dose ACObaixo risco entre 1,7–1,9 no PO imediato

Pequenas cirurgias Manter ACO na faixa terapêutica(ex.: extração dentária)Grandes cirurgias Suspender ACO 3 a 5 Reiniciar ACO no 1o ou

dias antes do 2a dia de PO*procedimento Retornar com heparina 6 aou até INR < 1,5 12 horas após e manter

Biópsia com risco Administrar heparina até 24 a 48 horas ou INR =aumentado de SC (não administrar 2,0 a 3,5sangramento nas últimas 12 horas)Cirurgia de emergência Plasma fresco IV Avaliar sangramento e

Vitamina K IV INR para:Fatores de coagulação, heparina SC ese necessário reinício de ACO

ACO = anticoagulante oral; PO = pós-operatório; IV = intravenoso; SC = subcutâneo.* Dose de heparina SC não-fracionada: 10.000 UI de 12 em 12 horas; dose enoxaparina SC 40 mg/dia.

Anticoagulação Oral no Paciente Idoso

Manuseio de pacientes com valoreselevados de INR

Pacientes em uso de anticoagulantes orais, que cursem com elevaçãosignificativa do INR, devem seguir as orientações contidas na tabela 86.

ConclusãoOs estudos têm demonstrado que a orientação adequada do paciente

e a criação de clínicas de anticoagulação, multidisciplinares eespecializadas apresentam melhores resultados, em termos de controle

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do INR, o que contribui claramente para a redução da incidência decomplicações hemorrágicas em pacientes idosos21. O Instituto DantePazzanese de Cardiologia de São Paulo possui um serviço deanticoagulação em que atualmente controla 4.171 pacientes, 35% (1.455)dos quais, com idade > 65 anos; desses, 152 com idade > 80 anos. Umaavaliação recente desse último subgrupo, com seguimento médio de 34meses, demonstrou ocorrência de baixos índices de tromboembolismo(0,05 paciente/ano) e de complicações hemorrágicas (0,2 paciente/anocom sangramento maior).

De modo geral, o uso de anticoagulantes orais em idosos deve seguiralgumas estratégias que visam reduzir o risco de sangramento22:

Tabela 8Manuseio da elevação excessiva do INR pelo uso de anticoagulantes

Situação clínica CondutaINR acima da faixa terapêutica, Suspender a dose e reavaliar: causas associadasporém < 5, na ausência de (uso de medicamentos, modificação da dieta, etc):sangramento ou em presença de reduzir a dose até cessar a causa; sem fatoressangramento menor* associados: reduzir a doseINR entre 5 e 9, na ausência de Suspender a dose por 1 ou 2 dias e reavaliar:sangramento ou em presença de pacientes com baixo risco de sangramento esangramento menor* com causa associada: reduzir a dose até cessar

a causa e monitorar o INR com maior freqüência.Na ausência de fatores associados, reduzir a dosee monitorar o INR com maior freqüência –pacientes com alto risco de sangramento,administrar vitamina K (1,0 mg a 2,5 mg VO)

INR > 9, na ausência de Suspender ACO, monitorar o INR esangramento ou em presença de administrar vitamina K (3 mg a 5 mg VO)sangramento menor*INR > 9 e com sangramento Suspender ACOmaior** (ou INR > 20) Administrar vitamina K (10 mg, IV lentamente)

Se necessário (urgência), plasma fresco econcentrado de complexos protrombínicos

Sangramento com risco de vida Suspender ACOAdministrar plasma fresco ou concentrado decomplexos protrombínicos e vitamina K (10 mg,IV lentamente)

Retorno do ACO após altas doses de vitamina K: introduzir heparina até que o INRatinja a faixa terapêutica.* Sangramento menor = sangramento não-fatal; consiste primariamente de epistaxes e equimoses.** Sangramento maior = necessita intervenções como hospitalização ou transfusão sangüínea; ou ainda

resulta em morbidade significativa, como, por exemplo, sangramento intra-articular ou cerebral.

Anticoagulação Oral no Paciente Idoso

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• Não utilizar dose de ataque.• Identificar e evitar interações medicamentosas.• Aconselhar os pacientes sobre a importância de uma dieta consistente

e equilibrada em vitamina K.• Identificar pacientes com fatores de comorbidade que possam

interferir no controle da anticoagulação oral.• Avaliar no início do tratamento com anticoagulante, a probabilidade

de adesão ao tratamento e ao controle do INR.• Inscrever (quando possível) o paciente em clínica especializada em

anticoagulação oral.• Reavaliar periodicamente a relação risco/benefício do uso do

anticoagulante oral.Em face do risco elevado, tanto de tromboembolismo como de san-

gramento, inerente ao idoso (sobretudo com idade > 75 anos), a decisãosobre a indicação ou não de anticoagulantes orais nesse subgrupopopulacional deve basear-se na avaliação do risco estimado detromboembolismo e de complicações hemorrágicas, considerando-setambém, fatores outros como: situação socioeconômica, adesão aotratamento, qualidade da monitorização laboratorial do INR e,possivelmente, existência de equipe multidisciplinar especializada nocontrole da anticoagulação oral.

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Anticoagulação Oral no Paciente Idoso

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Capítulo 14

Farmacologia eTerapêutica

Cardiovascularno Idoso

Michel Batlouni

Idosos consomem proporcionalmente cerca de três vezes maismedicamentos que indivíduos mais jovens1. Não apenas o tratamentomedicamentoso é comum em idosos, como o uso simultâneo de múltiplasdrogas é a regra, ao invés de exceção, predispondo à ocorrência deinterações medicamentosas. Como as doenças cardiovascularesconstituem a principal causa de morbidade e mortalidade na populaçãogeriátrica2, e como os distúrbios psicológicos são freqüentes, fármacoscardiovasculares e psicoterápicos são os mais comumente prescritos nessapopulação (55% e 11%, respectivamente)3,4. Tais fármacos tendem aapresentar índice tóxico-terapêutico relativamente baixo. Alteraçõesfarmacológicas, larga flutuação dose-resposta, reações atípicas às drogas,prescrições inadequadas e não-observância apropriada dos esquemasterapêuticos podem contribuir para a maior toxicidade medicamentosano idoso5. Ademais, em relação a diversas novas drogas, os conhecimentossão incompletos na população geriátrica, devido à sua exclusãovirtualmente sistemática dos ensaios terapêuticos, ao menos atérecentemente, seja pela própria limitação da idade aos critérios deinclusão, seja pela presença de doenças associadas6. Por todas essas

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razões, efeitos colaterais, reações adversas e interações medicamentosastendem a ser mais comuns e mais importantes no idoso5,7. Apro-ximadamente 19% das admissões hospitalares de pacientes geriátricossão devidas a reações adversas a drogas8,9 .

Em qualquer idade, e particularmente no idoso, a terapêutica racionaldeve basear-se em diagnóstico(s) preciso(s), para a seleção das drogasmais apropriadas a cada caso. Entretanto, vários fatores podemobscurecer o diagnóstico nos pacientes geriátricos, como dificuldadede expressar os sintomas, distúrbios de percepção, manifestações atípi-cas das doenças, e dificuldade em distinguir os sinais patológicos dasalterações associadas ao envelhecimento e em diferenciar os sintomasde eventuais co-morbidades.

A utilização apropriada de medicamentos na população geriátricarequer o conhecimento das alterações fisiológicas do envelhecimento edos efeitos das doenças concomitantes, que podem influenciar afarmacocinética e a farmacodinâmica, a resposta terapêutica e tóxica àsdrogas, de forma clinicamente importante10,3,4,7,11-16. A falta de atençãocuidadosa na seleção, posologia e monitorização das drogas nessapopulação pode induzir ao benefício terapêutico incompleto e à altaincidência de reações adversas. Isto é particularmente significativo paraas drogas cardiovasculares, muitas das quais têm índice tóxico-terapêuticoestreito. Como as idades cronológica e biológica freqüentemente nãosão comparáveis, e como existem grandes variações entre os idosos nasrespostas farmacocinética e farmacodinâmica, é difícil estabelecergeneralizações.

Fatores sócio-econômicos e a não-observância adequada da prescriçãosão causa importante da falha terapêutica em qualquer idade, eparticularmente nos idosos. Polifarmácia, esquemas terapêuticos com-plicados, distúrbios visuais, auditivos ou mentais, falta de compreensão,ausência de auxílio de familiares ou afins são alguns dos muitos fatoresque contribuem para a não-observância do tratamento.

Alterações farmacocinéticasrelacionadas à idade

À medida que o paciente envelhece, alterações graduais nafarmacocinética e nos efeitos das drogas induzem à maior variação

Farmacologia e Terapêutica Cardiovascular no Idoso

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interindividual das doses requeridas para um determinado efeito. Asalterações farmacocinéticas resultam de modificações da composiçãocorpórea e da função dos órgãos envolvidos na eliminação das drogas(Tabela 1).

Entre as alterações farmacocinéticas mais significativas no idoso,incluem-se:

1. Redução da água corpórea total, tanto em termos absolutos comoem porcentagem do peso corpóreo, de 10% a 15% entre os 20 e os80 anos17,18. A massa muscular e a massa celular média diminuem,enquanto a proporção de gordura aumenta com a idade17,18.

2. Redução da concentração da albumina plasmática de 15% a 20%,em comparação a indivíduos com idade abaixo dos 40 anos. Alémda redução primária da albumina, a hipoalbuminemia nos idosospode resultar de causas secundárias, como hepatopatia crônica,infecções, infarto do miocárdio, redução da síntese e/ou aumentodo catabolismo protéico e eliminação excessiva de proteínas. Aredução dos níveis plasmáticos de albumina e outras proteínas

Tabela 1Alterações fisiológicas do envelhecimento que interferem na farmacocinética

AbsorçãoRedução da produção de ácido gástricoAumento do pH gástricoRedução da motilidade gastrintestinalRedução do fluxo sangüíneoRedução da superfície de absorção

DistribuiçãoDiminuição da massa muscular totalAumento da proporção de gordura corpóreaDiminuição da proporção de águaDiminuição da albumina plasmáticaAumento da α1-glicoproteína ácidaAlteração relativa da perfusão tissular

MetabolismoRedução da massa hepáticaRedução do fluxo sangüíneo hepáticoRedução da capacidade metabólica hepática

ExcreçãoDiminuição do fluxo sangüíneo renalDiminuição da taxa de filtração glomerularDiminuição da função tubular renal

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determina aumento da fração livre da droga, acima do previsto emcondições normais19 e, conseqüentemente, efeitos farmacológicosmais intensos para qualquer dose administrada, com maiorpotencialidade de efeitos colaterais.

3. Metabolismo – Fármacos são eliminados do organismo por doismecanismos principais: metabolismo e excreção renal. Emboraalgumas sejam excretadas quase completamente inalteradas, amaioria sofre transformação metabólica mais ou menos acentuada(biotransformação). O processo ocorre principalmente no fígado.O envelhecimento pode comprometer a atividade metabólicahepática em conseqüência da redução do fluxo sangüíneo, volumee massa, e da atividade enzímica.O fluxo sangüíneo hepático, o mais importante determinante doclearance para muitas drogas, diminui com a idade (cerca de 40% dos25 aos 70 anos)20. Em conseqüência, drogas com elevado clearancehepático e perfil de eliminação fluxo-dependente, como propranolol,verapamil e lidocaína, têm depuração reduzida e permanecem por maistempo na circulação sem sofrer biotransformação, em idosos 21.A massa hepática e o número de células funcionantes diminuem apartir da quinta ou sexta décadas da vida. Porém, como o fígadotem grande reserva de massa celular e de função, é pouco provávelque essa alteração influencie o metabolismo de medicamentos deforma clinicamente significativa. Ademais, a atividade dos sistemasenzímicos responsáveis pelo metabolismo de drogas, especialmenteas enzimas microssomais induzíveis envolvidas em mecanismos deoxidação e redução (enzimas citocromo P450), declina no idoso22.Os mecanismos de conjugação mantêm-se relativamente bem.Contudo, dados conflitantes foram relatados e pode haver variaçõesconsideráveis entre indivíduos da mesma faixa etária.As alterações do fluxo sangüíneo e da atividade enzímica hepática,isoladamente ou em associação, resultam habitualmente em aumentoda meia-vida plasmática e podem retardar a velocidade deeliminação de drogas lipofílicas do organismo. Entre as drogascardiovasculares eliminadas predominantemente por metabolismohepático incluem-se: lidocaína, encainida, tocainida e quinidina;propranolol, metoprolol, pindolol e labetalol; hidralazina, prazosina,minoxidil, metildopa, clonidina e captopril; verapamil, diltiazem e

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nifedipina; nitroglicerina e dinitrato de isossorbida; varfarina e outroscumarínicos.

4. Excreção – Alterações da estrutura e da função renais ocorremcom o envelhecimento, mesmo na ausência de nefropatia 23,24. Entrea quarta e a oitava décadas, os rins perdem cerca de 20% a 25%de sua massa, com maior comprometimento da córtex do que damedula. O número de glomérulos e de células tubulares tambémdeclina com a idade, com grandes variações individuais4. Alteraçõesglomerulares fibróticas e tubulares degenerativas, além de vas-culares, podem ocorrer após os 70 anos4. O fluxo sangüíneo renaldeclina progressivamente (cerca de 1% ao ano) após os 50 anos,em parte devido à redução e à redistribuição do débito cardíaco23.A velocidade de filtração glomerular também reduz-se grada-tivamente com a idade: de 100 ml a 120 ml/min aos 40 anos, para 60ml a 70 ml/min aos 85 anos. Paralelamente, diminui a capacidadeexcretora tubular.

Apesar da diminuição da velocidade de filtração glomerular no idoso,a creatinina sérica pode permanecer normal porque sua produção diminuidevido à redução da massa muscular corpórea. Em conseqüência, valoresnormais de creatinina sérica no idoso não indicam, necessariamente,filtração glomerular normal. Avaliação do clearance da creatinina refletemelhor a função renal nessa faixa etária.

Alterações da função renal relacionadas à idade representamprovavelmente o principal fator responsável pela elevação dos níveisplasmáticos das drogas e por seu acúmulo no idoso, especialmente semais de 60% da dose é excretada pelos rins. Isoladamente, taisalterações podem antecipar a necessidade de redução das doses em30% ou mais na população geriátrica, sobretudo das drogas eliminadasprimariamente pelos rins. Entre as drogas cardiovasculares comclearance renal elevado incluem-se digoxina, procainamida e seumetabólito N-acetil-procainamida, disopiramida, atenolol, nadolol esotalol e a maioria dos inibidores da enzima conversora da angiotensina,exceto fosinopril e benazepril.

Os conhecimentos sobre a farmacocinética, importantes tanto naprescrição medicamentosa do idoso como também em qualquer faixaetária, não prescindem da observação clínica cuidadosa (relação dose–resposta) para o ajuste posológico em cada caso.

Farmacologia e Terapêutica Cardiovascular no Idoso

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Alterações farmacodinâmicasrelacionadas à idade

A função cardiovascular global, na maioria dos indivíduos idosos sadios,é adequada para satisfazer as necessidades corpóreas de pressão e fluxoem repouso25-27. A freqüência cardíaca em repouso não se altera com aidade, porém a pressão arterial sistólica aumenta moderadamente, dentrodos limites normais para a faixa etária 25,26. Essa alteração de pressãoocorre no final da sístole e é causada por aumento da rigidez arterial e daimpedância (pós-carga). A espessura parietal ventricular esquerdaaumenta discretamente com a idade, devido ao aumento do tamanho dosmiócitos26. Essa hipertrofia modesta é processo adaptativo eficaz paramanter o volume cardíaco e a função de bomba normais25,26. A velocidadede enchimento ventricular esquerdo no início da diástole declinaacentuadamente (cerca de 50%) entre os 20 e 80 anos26. Entretanto, ocorreaumento compensatório do enchimento diastólico tardio em idosos,devido sobretudo à maior contribuição da contração atrial esquerda paramanter o enchimento ventricular. Em conseqüência, a função diastólicaglobal pode permanecer inalterada. Apesar do aumento da pressão arterialsistólica com a idade, o volume sistólico final e a fração de ejeção doventrículo esquerdo, em repouso, não se alteram significativamente25,27.

O desempenho normal do coração do idoso como bomba (débitocardíaco) em presença de rigidez arterial aumentada é conseguido poralguns mecanismos de adaptação: moderada hipertrofia ventricularesquerda, sístole prolongada, aumento do átrio esquerdo e da contribuiçãoatrial ao enchimento ventricular25-27.

As alterações farmacodinâmicas cardiovasculares mais consisten-temente estabelecidas no idoso relacionam-se ao sistema nervosoautônomo27,28,29. Virtualmente todos os estudos mostraram níveisplasmáticos basais mais elevados de noradrenalina e adrenalinacirculantes em idosos do que em adultos jovens25,27,30. O aumento dafreqüência cardíaca pela administração em “bolo” de agonistas beta-adrenérgicos, como isoproterenol, diminui com a idade31,32. De outra parte,a administração de dose igual de propranolol a adultos jovens e idosos,embora resulte em níveis plasmáticos maiores nestes, provoca menorredução da freqüência cardíaca durante exercício físico, no idoso33. Tantoa dilatação arterial como venosa declinam, também, com o envelhe-

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cimento, em resposta à estimulação beta-adrenérgica do sistemacardiovascular durante o exercício32. O declínio da dilatação arterialdurante o exercício, associado a alterações estruturais dos grandes vasosrelacionados à idade, pode contribuir para o aumento da impedânciavascular26. Ademais, a diminuição da eficiência da modulação beta-adrenérgica dos mecanismos de acoplamento excitação-contração podeexplicar, em parte, a redução da reserva miocárdica com a idade avan-çada25,26.

Resultados conflitantes foram relatados sobre as causas da regulaçãoinferior do sistema beta-adrenérgico no idoso. Alguns estudos mostraramredução da densidade dos beta-receptores do coração senescente34,35,enquanto outros não observaram esse fenômeno36,37. Tem sido admitidacomo mais provável a alteração em nível pós-receptor.

Diferentemente das respostas dos receptores adrenérgicos beta-1,as dos receptores beta-2 parecem pouco afetadas, pois a broncodilataçãoe os efeitos metabólicos mediados por esses receptores não variamsignificativamente com a idade33,38. Os estudos sobre o sistema alfa-adrenérgico no idoso forneceram alguns resultados controversos, poréma resposta da vasculatura permanece inalterada25.

O número dos receptores colinérgicos muscarínicos diminui com aidade39,40. A atropina provoca menor aumento da freqüência cardíaca napopulação geriátrica e a estimulação vagal bradicardia menos acentuada41,o que depõe a favor de resposta atenuada dos receptores colinérgicosassociada ao envelhecimento.

A função (sensibilidade) dos barorreceptores, que também envolve osistema nervoso simpático, encontra-se deprimida nos idosos,aumentando a potencialidade de hipotensão ortostática. O retardo no inícioda taquicardia e na vasoconstrição reflexa em resposta à redução maisou menos brusca da pressão arterial pode causar tontura, lipotímia, síncopee quedas, e acentuar os efeitos da hipotensão ortostática induzida poragentes anti-hipertensivos. De outra parte, a função barorreflexacomprometida, observada na maioria dos idosos, pode permitir o uso devasodilatadores, como hidralazina, sem a necessidade de outras drogaspara atenuar a taquicardia reflexa.

A atividade do sistema renina-angiotensina encontra-se atenuada nosidosos, observando-se níveis plasmáticos baixos de angiotensinogênio, reninae angiotensina I. Em contraste, os níveis miocárdicos do RNA do

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angiotensinogênio e da enzima de conversão da angiotensina encontram-seregulados superiormente no ventrículo esquerdo42.

Fármacos cardiovascularesEmbora a idade seja um dos mais importantes fatores a influenciar a

morbidade e a mortalidade, idosos têm sido habitualmente excluídos dosgrandes ensaios clínicos terapêuticos a longo prazo, relacionados àsobrevida e à qualidade de vida, devido à dificuldade de selecionarpacientes nessa faixa etária que preencham os critérios rígidos de inclusão.Assim, o número de pacientes com idade acima de 70 anos nesses ensaiosé relativamente pequeno. Nos últimos anos, porém, idosos vêm sendoincluídos em grandes ensaios a longo prazo, sobretudo relacionados aotratamento da hipertensão, do infarto agudo do miocárdio (fibrinolíticos eantitrombóticos), da fibrilação atrial (anticoagulantes e antiplaquetários)e da prevenção secundária da doença aterosclerótica coronária (estatinas).Entretanto, a prescrição da terapêutica cardiovascular na populaçãogeriátrica é, ainda, em grande parte, baseada em ensaios a curto prazo,estudos observacionais ou análise de subgrupos de grandes ensaios.

Glicosídeos digitálicosO coração senescente responde menos aos efeitos inotrópicos dos

glicosídeos digitálicos, sem redução concomitante dos efeitos tóxicos;ao contrário, idosos são mais suscetíveis à intoxicação digitálica43.

Como a digoxina é excretada primariamente pelos rins (cerca de 85%na forma inalterada), o declínio da filtração glomerular no idoso podereduzir em até 40% o clearance da droga e aumentar proporcionalmentea meia-vida plasmática44. A redução do volume de distribuição, devido àdiminuição da massa muscular corpórea, associa-se à maior concentraçãomiocárdica para a mesma dose; a menor ligação protéica resulta em maiorproporção de droga livre. As alterações da função renal representam,porém, o fator mais importante que influencia a farmacocinética dadigoxina no idoso45.

A intoxicação digitálica é mais freqüente na população geriátrica. Osseguintes fatores podem estar envolvidos: menor resposta inotrópicapositiva; maior sensibilidade do miocárdio à droga, provavelmente emconseqüência da depleção miocárdica de potássio e magnésio; com-

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prometimento da função renal (digoxina) ou hepática (digitoxina); ehipopotassemia 46.

A depleção de potássio resulta habitualmente da terapêutica diurética,porém deve ter-se em mente que a ingestão de potássio por idososaparentemente sadios situa-se freqüentemente abaixo dos níveisrecomendados, devido à seleção de alimentos com baixo teor desse íon.O magnésio também depleta-se durante a terapêutica diurética e aexperimentação animal tem demonstrado que arritmias induzidas pordigitálicos podem ser corrigidas pela administração de magnésio.

A monitorização dos níveis séricos da digoxina representa métodoracional para manutenção dos limites terapêuticos e orientação daposologia, porém não exclui a observação clínica de cada caso,relacionada aos efeitos terapêuticos e tóxicos. Em verdade, os sinaisclínicos são tão ou mais importantes que os níveis séricos da droga paraavaliar a toxicidade. A dose diária de digoxina no idoso não deveultrapassar 0,25 mg e habitualmente situa-se ao redor de 0,125 mg. Empresença de insuficiência renal, as doses devem ser ainda menores. Abeta-metildigoxina, na dose diária de 0,1 mg, é boa opção.

DiuréticosIdosos utilizam comumente diuréticos na terapêutica da hipertensão

arterial e da insuficiência cardíaca e são mais propensos a desenvolverreações adversas a esses medicamentos13,15. Importante complicação daterapêutica diurética em idosos é a depleção de volume, à qual são maisvulneráveis pelos seguintes fatores: redução da água corpórea total e dovolume plasmático; declínio da capacidade de concentração nos túbulos,à medida que a massa renal diminui; ingestão de líquidos muitas vezesinsuficiente; perdas adicionais, que podem ocorrer por febre, vômito oudiarréia. A depleção volumétrica acentua a redução do débito cardíaco,induzindo a manifestações como astenia, fadiga, apatia, alteraçõespsíquicas, hiperazotemia e hipotensão ortostática. Quando a contraçãodo volume plasmático é muito rápida, e sobretudo em pacientes quepermanecem a maior parte do tempo na cama ou na poltrona, a hipotensãoortostática é mais acentuada e pode acarretar tontura, queda e até mesmosíncope.

Diuréticos que depletam potássio (tiazídicos e de alça) podem provocarhipopotassemia no idoso, devido ao fato de a ingestão dietética de potássio

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tender a estar reduzida e a absorção gastrintestinal do íon poder estardiminuída. A redução da massa muscular pode baixar adicionalmente asreservas totais de potássio do organismo. Diuréticos poupadores depotássio (espironolactona, triantereno e amilorida) podem provocarhiperpotassemia, especialmente em idosos com insuficiência renal. Ouso prolongado de espironolactona, sobretudo em associação comdigitálicos, induz freqüentemente ao aparecimento de ginecomastia.Idosos são mais predispostos também a apresentar hiponatremia,favorecida pela redução da velocidade de filtração glomerular – umaalteração da função renal inerente ao processo de envelhecimento.

A administração de diuréticos à população geriátrica deve iniciar-secom doses pequenas, aumentadas gradativamente, monitorizando-se aresposta terapêutica e as reações adversas, inclusive eletrolíticas emetabólicas. A depleção de volume deve ser prevenida pela reposiçãoadequada de líquidos, e a de potássio pela suplementação dietética emedicamentosa. A adição de diurético poupador de potássio é con-veniente, na ausência de insuficiência renal. Tiazídicos e clortalidonaexercem efeitos menos intensos e mais prolongados e são, em geral,melhor tolerados do que diuréticos de alça; devem ser preferidos notratamento a longo prazo da hipertensão arterial. Diuréticos de alça(furosemida e bumetanida) são mais úteis em presença de insuficiênciacardíaca ou renal, por sua eficácia mesmo em presença de níveis baixosde clearance da creatinina.

Bloqueadores beta-adrenérgicosAs respostas cardiovasculares, tanto aos agonistas como aos anta-

gonistas beta-adrenérgicos, são atenuadas em idosos; paradoxalmente,reações adversas aos betabloqueadores são mais freqüentes nessa faixaetária4,7,13,47-49. Em geral, para a mesma dose de betabloqueadoradministrada, os níveis plasmáticos são mais elevados e a meia-vida deeliminação prolongada, em idosos50. Em conseqüência, as doses dessesmedicamentos na população geriátrica devem ser menores e menosfreqüentes do que na população geral.

Os efeitos colaterais gerais dos betabloqueadores – astenia, fadiga,letargia, depressão, distúrbios do sono, broncoespasmo – e os relacionadosao aparelho cardiovascular – bradicardia, bloqueio atrioventricular (BAV),depressão miocárdica e distúrbios da circulação periférica – são mais

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acentuados em idosos. Os betabloqueadores cardiosseletivos (metoprolol,atenolol, acebutolol), por bloquearem em menor grau os receptores beta-2, e os providos de atividade simpaticomimética intrínseca – ASI –(pindolol e mepindolol) são menos propensos a causar broncoespasmo edistúrbios da circulação periférica e mascaram menos a reação hipo-glicêmica aos antidiabéticos. Os agentes hidrossolúveis (nadolol, atenolole pindolol) parecem apresentar menores efeitos colaterais relacionadosao sistema nervoso central do que os lipossolúveis (propranolol emetoprolol), que atravessam a barreira hematoliquórica.

Como regra, o tratamento betabloqueador no idoso deve ser iniciadoem doses pequenas, aumentadas gradativamente, de acordo com a respostaterapêutica, os efeitos colaterais e as reações adversas. Alguns betablo-queadores mais recentes, como o carvedilol, que são também alfablo-queadores, possuem perfil hemodinâmico mais favorável51. Esses agentesnão alteram o débito cardíaco e reduzem concomitantemente a resistênciaperiférica total, características que podem ser mais benéficas napopulação geriátrica.

Antagonistas dos canais de cálcioOs antagonistas dos canais de cálcio são amplamente empregados

no tratamento da insuficiência coronária em suas diversas modalidadesclínicas, da hipertensão arterial e das taquiarritmias supraventriculares52,53. Idosos requerem doses relativamente menores de antagonistas doscanais de cálcio para alcançar os mesmos benefícios terapêuticos.

Como a hipertensão arterial no idoso associa-se a aumento daresistência vascular periférica e renal e essa alteração hemodinâmica édependente, em última instância, do aumento da concentração de cálciona musculatura lisa arteriolar, os antagonistas dos canais de cálcio sãoparticularmente úteis nessa circunstância53. Paralelamente, essescompostos aumentam o fluxo sangüíneo nos territórios coronário, cerebrale renal, mais suscetível de comprometimento na população geriátrica.Esses agentes não exercem efeitos deletérios na função pulmonar, nometabolismo de glicose, lípides e ácido úrico, o que os torna mais atrativosem pacientes com comorbidades associadas, freqüentes em idosos53.

Os efeitos colaterais dos antagonistas dos canais de cálcio em idosossão similares aos observados em outras faixas etárias52,53, com algumascaracterísticas especiais. Astenia, fadiga muscular e edema periférico

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(sobretudo com nifedipina) são mais freqüentes. Nifedipina provoca menoraumento reflexo da freqüência cardíaca e maior tendência à hipotensãoortostática em idosos do que em indivíduos mais jovens. Verapamil ediltiazem, em doses elevadas, podem favorecer a ocorrência debradicardia, bloqueio atrioventricular e depressão miocárdica, sobretudoem indivíduos predispostos. Obstipação é mais suscetível de ocorrer,particularmente com verapamil.

NitratosOs nitratos têm sido largamente utilizados em pacientes idosos, na

terapêutica aguda e profilática da angina do peito, em todas as suasformas clínicas, e da insuficiência cardíaca refratária ao tratamentoconvencional. As doses empregadas não diferem importantemente dashabituais, porém deve ser lembrado que idosos são mais vulneráveisaos episódios de tontura, fraqueza e hipotensão ortostática provocadospor esses medicamentos, especialmente após administraçãosublingual54,55. É recomendável, pois, utilizar inicialmente doses menores,aumentando-as gradativamente, conforme a resposta terapêutica e osefeitos colaterais.

Inibidores da enzima conversorada angiotensina

Embora os hipertensos idosos tenham níveis de renina plasmáticabaixos, os inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA) sãoeficazes nessa faixa etária 56,57, especialmente quando combinados comdiurético. São úteis também no tratamento da insuficiência cardíaca, emadição a digitálicos e diuréticos e no pós infarto do miocárdio, sobretudoassociado à disfunção ventricular esquerda. Os inibidores da ECA nãoprovocam efeitos significativos no sistema nervoso central, fadiga,alterações do sono ou da função sexual. Ademais, não exercem influênciasadversas no metabolismo lipídico, melhoram a resistência à insulina58 esão renoprotetores, tanto no diabetes tipo I como no tipo II59. Os inibidoresda ECA podem ser administrados a idosos com broncoespasmo, diabetesmelito, insuficiência cardíaca e/ou renal, gota, cardiopatia isquêmica,dislipidemia e vasculopatia periférica. São bem tolerados e têm incidênciarelativamente baixa de reações adversas60. O efeito colateral mais fre-

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qüente (até 20% dos casos) é tosse seca irritativa, provavelmente devidaao acúmulo de bradicinina e prostaglandinas.

Em idosos, as doses de inibidores da ECA devem ser menores do queem adultos jovens e o tratamento iniciado com doses baixas, aumentadasgradativamente, especialmente se o paciente estiver em uso de diurético.

Os antagonistas dos receptores AT 1 da angiotensina II apresentamas vantagens dos inibidores da ECA, sem as reações adversas classe-específicas desses medicamentos, como tosse, angioedema e reaçõescutâneas.

Agentes fibrinolíticosNão obstante a idade seja importante fator de risco de mortalidade

em pacientes com infarto agudo do miocárdio, os primeiros ensaios comtrombolíticos excluíram os idosos devido ao risco de hemorragia.Entretanto, ensaios posteriores mostraram redução do risco em idosostratados com diferentes trombolíticos61 . A análise do subgrupo depacientes com 70 anos ou mais no estudo ISIS-2 revelou nítido benefícioda estreptoquinase versus placebo. A taxa de mortalidade nessa faixaetária foi 15,8% e 23,8%, respectivamente (p < 0,001). Resultadossimilares foram observados no Intervention Mortality Study comAPSAC e no Anglo-Scandinavian Study of Early Thrombolysis(ASSET) com o ativador tissular do plasminogênio recombinante (rt-PA)62. No ensaio GUSTO, foram incluídos mais de 4.000 pacientes com75 anos ou mais63. O rt-PA foi ligeiramente mais eficaz que a estre-ptoquinase nesse grupo. A terapêutica fibrinolítica permanece subutilizadaem pacientes idosos devido à preocupação de que o risco de hemorragiaintracraniana suplante o benefício potencial do tratamento63. Embora hajapequeno aumento do risco de complicações hemorrágicas em idosossubmetidos à terapêutica trombolítica (ISIS-2, GUSTO), a mortalidade éreduzida em cerca de 20%, indicando a utilidade desses agentes napopulação geriátrica62-64.

Fármacos hipolipemiantesO conceito de que, no idoso, o controle dos fatores de risco, em

particular as dislipidemias, não seria fundamental foi modificado nosúltimos anos. Sendo a doença aterosclerótica altamente prevalente após

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os 60 anos de idade, em ambos os sexos, qualquer redução de risco temimportante repercussão na morbidade e na mortalidade65. Embora o papeldo colesterol como fator de risco cardiovascular diminua com a idade,permanece como importante preditor de doença arterial coronária. Estudosclínicos recentes de prevenção primária e secundária sugerem que aredução expressiva do LDL-colesterol em idosos diminui significa-tivamente a morbidade e a mortalidade.

As recomendações para o tratamento farmacológico das dislipidemiasem idosos são as mesmas que as dos adultos em geral. Os inibidores dahidroximetilglutaril coenzima A redutase (vastatinas) são as drogas deprimeira escolha na terapêutica da hipercolesterolemia, pela segurançae pela eficácia já demonstradas. Os demais hipolipemiantes podem serusados, levando-se em consideração a maior possibilidade de efeitoscolaterais. Para a hipertrigliceridemia, o tratamento segue os mesmosprincípios que o do adulto jovem65.

No Scandinavian Simvastatin Survival Study (S4)66, que incluiu 4.444pacientes com cardiopatia isquêmica, o subgrupo constituído de pacientescom 60 anos ou mais, tratado com sinvastatina, apresentou também reduçãosignificativa de eventos coronários importantes, em comparação complacebo (21% versus 28,3%; risco relativo 0,71; p < 0,0001).

Fármacos antiarrítmicosO tratamento das arritmias cardíacas em idosos é semelhante, na

maioria dos aspectos, ao de pacientes mais jovens; as diferençasrelacionam-se sobretudo à posologia 4,13. Ao tratar uma arritmia no idoso,os seguintes cuidados devem ser observados: 1) estabelecer diagnósticoeletrocardiográfico preciso e repetir o exame com constância suficientepara acompanhar a evolução da doença e da terapêutica; 2) determinara etiologia da arritmia e tentar estabelecer causas subjacentes ou secun-dárias corrigíveis, como distúrbios eletrolíticos e do metabolismo ácidobásico, hipoxemia, infecções, anemia, embolia pulmonar, hipertireoidismo,toxicidade medicamentosa; 3) eliminar fármacos de induzir ou acentuararritmias cardíacas, como, por exemplo, digitálicos, aminas simpa-ticomiméticas e antidepressivos tricíclicos, além de fumo e álcool;4) basear a titulação posológica na resposta clínica, nas alteraçõeseletrocardiográficas e na monitorização da concentração sangüínea dadroga. Esta última é útil para determinar a observância do tratamento,

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verificar se uma dose subterapêutica é responsável pela ausência deresposta ou se a droga não é eficaz nos limites terapêuticos, confirmar aexistência de toxicidade suspeitada pela clínica e alterar as doses empresença de doença hepática ou renal e de interações farmacológicas. Amaioria dos ajustes posológicos que necessitam ser feitos no idoso podeser descrita em termos farmacocinéticos. Entretanto, a possibilidade dealterações farmacodinâmicas relacionadas à sensibilidade dos receptorestissulares deve ser considerada.

Princípios e recomendações para aterapêutica farmacológica no idoso

A farmacoterapia segura e eficaz na população geriátrica é um desafio,mesmo para os médicos familiarizados com a farmacologia clínica, devidoaos múltiplos fatores que afetam a terapêutica medicamentosa nessa faixaetária. A observância de alguns princípios e recomendações é extre-mamente útil para a elaboração de esquemas terapêuticos adequados àpopulação geriátrica, no sentido de obter a eficácia desejada, minimizarreações adversas e evitar interações medicamentosas9,67-70.

1. As alterações fisiológicas, metabólicas e estruturais inerentes aoprocesso de envelhecimento, bem como doenças associadas,influenciam a farmacocinética e a farmacodinâmica, a respostaterapêutica e as reações adversas às drogas, com importantesimplicações para o manuseio clínico. O conhecimento dessasalterações é fundamental no tratamento cardiovascular do idoso.

2. Idosos podem apresentar manifestações atípicas às doenças ereações terapêuticas e tóxicas atípicas às drogas.

3. É essencial a avaliação clínica global do paciente idoso, inclusivedas funções hepática e renal, responsáveis maiores pelo metabolismoe pela excreção das drogas. Elaboração diagnóstica precisa éimperativa para decidir sobre a real necessidade da medicação.

4. Há lugar tanto para a polifarmácia como para o nihilismo tera-pêutico, no tratamento do idoso. Medidas não-farmacológicas,aconselhamento afetivo, apoio sociofamiliar devem sempre serconsiderados.

5. Drogas com índice tóxico-terapêutico baixo devem ser evitadas,quando possível. Preferir fármacos com o melhor índice custo–

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efetividade, sobretudo quando há necessidade de medicaçãomúltipla. Drogas que provocam reações adversas significativasdevem ter a dosagem reduzida ou ser substituídas. Medicamentosclaramente ineficazes, ou que se tornem desnecessários, devemser suprimidos.

6. Ajustes posológicos devem ser feitos para a maioria dos medi-camentos quando prescritos a idosos, particularmente nos trata-mentos a longo prazo. Em geral, as doses no idoso são 30% a50% menores do que no adulto jovem. A presença de hepatopatia,nefropatia e/ou outras comorbidades pode implicar doses aindamenores.

7. Como regra, iniciar com doses baixas, aumentadas gradati-vamente, e aguardar maior período de tempo para observar aresposta terapêutica desejada, antes de alterar o esquemaposológico. O dictum “comece baixo e vá devagar” é abordagemprudente.

8. Embora para a maioria das drogas haja correlação linear entre adose administrada e a concentração plasmática, pode ser difícil epor vezes perigoso generalizar. Em certas ocasiões, essa correlaçãosomente é observada acima de determinado nível. Em outras,aumento acentuado da concentração plasmática pode ocorrer compequenos aumentos da dose administrada. A determinação daconcentração plasmática da droga auxilia na titulação posológica,porém não prescinde da observação clínica cuidadosa do paciente.A avaliação precisa dos efeitos terapêuticos e colaterais é o melhorguia para o ajuste das doses.

9. O esquema terapêutico deve ser tão simplificado quanto possível,em relação ao número de medicamentos e à freqüência das doses.Comumente, a terapêutica múltipla não pode ser evitada.Entretanto, cada droga adicionada aumenta a potencialidade deefeitos adversos, de interações medicamentosas, de não-obser-vância da prescrição, bem como o custo do tratamento. Por vezes,porém, a administração de uma combinação de drogas pode servantajosa para o sinergismo terapêutico e a redução das reaçõesadversas. Lembrar que bebidas alcoólicas, tabagismo, dieta eoutros medicamentos não prescritos podem contribuir parainterações medicamentosas.

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10. Utilizar todos os recursos que favoreçam a observância dotratamento. Ineficácia terapêutica impõe verificação daobservância e/ou reavaliação diagnóstica, antes da introdução demedicação alternativa. Idosos requerem supervisão médicaperiódica, inclusive reavaliação do esquema terapêutico, sobretudoquando se utilizam múltiplas drogas.

11. A possibilidade de que drogas sejam, na realidade, a causa dasqueixas do paciente idoso deve ser sempre lembrada.

12. O objetivo do tratamento de algumas doenças crônicas no idosonem sempre é curar, porém estabilizar o processo mórbido, aliviaros sintomas e manter a capacidade funcional e intelectual, bemcomo a qualidade de vida, no mais alto nível possível.

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Programa de Educação Médica Continuada LIBBS

1ª EdiçãoEsta primeira edição do Manual de Cardiogeriatriatem como objetivo principal discutir, de forma objetivae eminentemente prática, a partir da avaliação daliteratura mais atualizada sobre o tema e da grandeexperiência dos autores médicos envolvidos, osprincipais tópicos relacionados ao diagnóstico etratamento das doenças cardiovasculares em idosos.Pretende-se também que ela sofra revisões periódicasa cada dois anos, que visam incorporar o enormevolume de informações científicas, que tem crescidode forma exponencial nos últimos anos.Creio que todos os autores convidados, aos quaisagradecemos a dedicação e vibração com queabraçaram a idéia, esperam que ela possa contribuirpara a melhora cada vez mais significativa do aten-dimento oferecido ao idoso cardiopata em nosso país.

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