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2018

Henrique CorreiaÉlisson Miessa

REFORMA TRABALHISTA

Manual da

Comentários artigo por artigo

Lei 13.467/2017O QUE MUDOU?

2ª edição

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CAPÍTULO 1

GRUPO ECONÔMICO (ART. 2º DA CLT)

Lei nº 13.467/2017

(Reforma Trabalhista)Antes da Lei nº 13.467/2017

Art. 2º Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

§ 1º Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profis-sionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.

§ 2º Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídi-ca própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsá-veis solidariamente pelas obrigações decor-rentes da relação de emprego.

§ 2º Sempre que uma ou mais empresas, ten-do, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, con-trole ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer ou-tra atividade econômica, serão, para os efei-tos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.

§ 3º Não caracteriza grupo econômico a mera identidade de sócios, sendo necessárias, para a configuração do grupo, a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes.

⊗ Dispositivo sem correspondência na antiga redação.

1. CONCEITO DE EMPREGADOR

O conceito de empregador não sofreu alteração pela Reforma Trabalhista. De acordo com o texto da norma, é considerado empregador a empresa, individual ou coletiva, que, ao assumir os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

O empregado não divide os riscos da atividade econômica com o empregador. Assim sendo, momentos de crise mundial, baixa produtividade, vendas abaixo das expectativas não autorizam o empregador a reduzir ou descontar salários de seus

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empregados. Não poderia ser diferente, pois as empresas não estão obrigadas a dividir os lucros com seus trabalhadores, logo, os prejuízos também não poderão ser repartidos. A responsabilidade exclusiva da empresa pelos prejuízos ou fracasso do empreendimento é chamada princípio da alteridade.

1.1. Empregador por equiparação

Outro ponto importante trata do empregador não só como empresa, mas tam-bém da contratação de empregados por profissionais liberais, associações recreativas, entidades sem fins lucrativos etc. A CLT utiliza-se do termo empregador por equi-paração, ou seja, também são empregadores as igrejas, o advogado que contrata secretária, a cooperativa que contrata telefonista, o condomínio de apartamentos etc.

2. GRUPO ECONÔMICO

Esse instituto foi alterado pela Reforma Trabalhista – Lei nº 13.467/2017. Ocorre grupo econômico quando as empresas estão ligadas entre si, ou seja, quando há “empresa-mãe e empresas-irmãs”.1 Nesse caso, cada uma dessas empresas possui personalidade jurídica própria, isto é, CNPJ próprio, quadro de pessoal próprio, exerce atividades econômicas diversas etc. Ressalta-se que a CLT não exige um documento ou prova específica para configuração do grupo econômico. Essa prova será feita levando em conta a análise do caso concreto, como utilização do mesmo imóvel, mesmo recursos humanos para contratação dos empregados etc.

A consequência jurídica do reconhecimento do grupo econômico é a existência da responsabilidade solidária entre as empresas, ou seja, se uma delas não quitar os débitos trabalhistas, as demais são responsáveis integralmente pela dívida.

Outro aspecto importante para caracterizar o grupo empresarial é a finalidade lucrativa, ou seja, o grupo deve exercer atividade econômica. Assim, a união de pessoas jurídicas que não explorem a atividade econômica, por exemplo, hospital universitário e faculdade de medicina, não acarretará a formação do grupo eco-nômico para fins trabalhistas, consequentemente não haverá a responsabilidade solidária entre elas.

Com a aprovação da Reforma Trabalhista, a nova redação do § 2º do art. 2º da CLT estabelece o reconhecimento de duas formas de grupo econômico:

– Grupo econômico por subordinação: Essa modalidade já era prevista na redação anterior do dispositivo em apreço. No caso, o grupo pode ser formado

1. “No caso do grupo econômico, uma figura em ziguezague, quase em formato das árvores genealógicas que aprendemos com as ciências biológicas (empregado-empregador em linha reta e empregador com as empresas-irmãs e com a empresa-mãe, se houver, dele se ramificando).” SILVA, Homero Batista Mateus da. Curso de Direito do Trabalho aplicado, v. 1: Parte Geral. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. p. 142.

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na hipótese de existência de hierarquia entre as empresas. Para a prova de formação do grupo econômico por subordinação, é indispensável, portanto, demonstrar que há uma relação de controle entre uma ou mais empresas em relação às demais integrantes.

– Grupo econômico por coordenação: A Reforma Trabalhista inovou ao pre-ver a possibilidade de formação de grupo econômico por coordenação. De acordo com o novo dispositivo, mesmo que as empresas guardem cada uma sua autonomia, estará configurado o grupo econômico.

Conforme prevê o § 3º do artigo em apreço, contudo, não há caracterização do grupo econômico apenas pela mera identidade de sócios entre as empresas, sendo necessária a demonstração do preenchimento de três requisitos:

a) interesse integrado;b) a efetiva comunhão de interesses; ec) a atuação conjunta das empresas integrantes.

Note-se, portanto, que o grupo pode ser formado entre empresas que guardam autonomia em relação às outras, desde que seja demonstrada a coordenação, a atuação conjunta entre elas. Nesse mesmo sentido, o TST2 já havia decidido que a presença de sócio comum entre empresas não é suficiente para a configuração do grupo econômico. Nesse sentido, veja o Informativo nº 83 do TST no final destes comentários.

É importante destacar o posicionamento apresentado na 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho3 que prevê a necessidade da distribuição dinâ-mica do ônus da prova ao empregador quando houver a presença de sócio comum. Apesar de não haver o reconhecimento do grupo econômico pela simples existência de sócios em comum, a presença de sócios em comum sugere forte indicativos de que esse grupo possa existir. Tendo em vista que o empregador tem maior aptidão para provar a inexistência do grupo econômica, o juiz pode determinar que o ônus da prova ao empregador (teoria dinâmica do ônus da prova):

Enunciado nº 5 da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho. Grupo econômico trabalhista. Distribuição racional do ônus da provaI. A lei 13.467/2017 reconheceu expressamente a figura do grupo econômico trabalhista por coordenação (art. 2º, §2º) e estabeleceu requisitos subjetivos (interesse integrado e comum) e objetivos (atuação conjunta) para a caracteri-zação do grupo, a serem verificados no caso concreto pelo juízo (art. 2º, §3º);

2. Informativo nº 83 do TST (confira o texto integral ao final dos comentários deste artigo).

3. Nos dias 9 e 10 de outubro de 2017, foi realizada a 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho, organizada pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – ANAMATRA, que teve a Reforma Trabalhista como temática. Vale ressaltar que os Enunciados da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho não apresentam caráter vinculativo, mas expressam o posicionamento de parte da seara trabalhista nas questões envolvendo a Reforma Trabalhista.

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II. Nas hipóteses restritas de aplicação do parágrafo 3º do artigo 2º da CLT, a mera identidade de sócios entre as empresas integrantes, embora não baste à caracterização do grupo econômico, constitui indício que autoriza a inversão ou redistribuição do ônus da prova, nos termos do art. 818 § 1º da CLT, com redação dada pela Lei 13.467/2017. Incumbe então ao empregador o ônus de comprovar a ausência de interesses integrados, da comunhão de interesses e/ou da atuação conjunta das empresas. Aplicação dos princípios da aptidão para a prova e da paridade de armas em concreto (isonomia processual).Para fixação veja o quadro abaixo4:

De nossa opinião, entendemos que o estabelecimento do grupo econômico por subordinação e coordenação de forma expressa na legislação trará maior segurança jurídica ao retirar a discussão apenas do âmbito doutrinário e jurisprudencial, evi-tando a tomada de decisões contraditórias entre as partes. Além disso, a alteração não trará prejuízos aos trabalhadores, pois permite a expansão do conceito de grupo econômico para as empresas que atuam em coordenação de interesses.

É importante destacar que a CLT não exige nenhum documento que prove a hierarquia ou a coordenação entre as empresas, o que torna indispensável o trabalho realizado pelos órgãos de proteção do trabalhador. Caberá à Justiça do Trabalho, na análise de cada caso concreto, decidir, pelo conjunto probatório apresentado, se as empresas integram ou não o grupo econômico.

Em sendo verificada a violação aos direitos indisponíveis do trabalhador, cabe igualmente ao MPT a atuação na demonstração de eventual formação de grupo econômico, para viabilizar a responsabilização solidária entre as empresas e asse-gurar o pagamento das obrigações trabalhistas.

2.1. Grupo econômico rural

A Lei nº 5.889/1973 – Lei do Rural – já previa o grupo econômico rural, com redação similar à nova redação dada ao art. 2º, § 2º, da CLT:

Art. 3º, § 2º, Lei nº 5.889/1973: Sempre que uma ou mais empresas, embora tendo cada uma delas personalidade jurídica própria, estiverem sob direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico ou financeiro rural, serão responsáveis solidariamente nas obrigações decorrentes da relação de emprego.

Já era possível, portanto, a formação de grupo econômico por subordinação e por coordenação na relação de emprego rural. Com a aproximação entre os dispositivos e a igualdade de direitos prevista entre empregados urbanos e rurais

4. A tabela foi retirada do livro Reforma Trabalhista – Questões Objetivas e Discursivas. Autores: Gus-tavo Bezerra Muniz de Andrade, Henrique Silveira Melo e Rodrigo Peixoto Medeiros. Coordenação: Henrique Correia e Élisson Miessa. 2017. Editora JusPodivm.

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Cap. 1 • Grupo Econômico (Art. 2º da CLT) 59

surge o questionamento se o novo § 3º do art. 2º da CLT poderia ser estendido também aos rurais.

Tendo em vista que o art. 1º da Lei nº 5.889/1973 prevê a aplicação subsidiária da CLT naquilo que for compatível, entendemos que a previsão de que a mera iden-tidade de sócios das empresas não é suficiente para a formação do grupo econômico rural, devendo também ser demonstrado os requisitos de interesse integrado ou de atuação conjunta entre as empresas. Trata-se de dispositivo que traça de forma mais objetiva os requisitos para que os empregados rurais possam demonstrar a formação do grupo econômico.

2.2. Contrato único

Se o empregado for contratado por uma das empresas, mas seu trabalho estiver sendo aproveitado pelas demais, por exemplo, no período da manhã trabalha para empresa A, e, à tarde, presta serviços para a empresa B, do mesmo grupo, terá um único contrato de trabalho, ou seja, sua carteira de trabalho não será assinada pelas duas empregadoras, mas por apenas uma delas. Assim sendo, mesmo prestando serviços para duas empresas, a jurisprudência do TST tem entendido tratar-se de empregador único, ou seja, o grupo é o empregador:

Súmula nº 129 do TST. A prestação de serviços a mais de uma empresa do mesmo grupo econômico, durante a mesma jornada de trabalho, não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de trabalho, salvo ajuste em contrário.

Ao tratar o grupo como empregador único, surgem outras consequências jurídicas5, como listadas a seguir. Aliás, essa qualidade de considerar o grupo em-pregador único é chamada, por alguns autores, de responsabilidade solidária ativa:

a) garantir condições uniformes de trabalho a todos os empregados do grupo econômico, independentemente de a qual empresa ele preste serviços, possibi-litando o pedido de equiparação salarial (art. 461, CLT);b) o enquadramento sindical dos empregados será de acordo com a atividade preponderante do grupo econômico, e não da empresa para qual o trabalhador presta serviços;c) possibilidade de transferência de empregados entre as empresas do grupo (art. 469, CLT);d) o pagamento efetuado pelas demais empresas do grupo terá natureza salarial (Súmula nº 93, TST);e) o empregado terá de cumprir as ordens dadas pelas demais empresas do grupo, pois todas serão consideradas empregadoras;f) acesso temporis, ou seja, o tempo de serviço prestado às empresas do grupo é computado;

5. DELGADO, Maurício Godinho. Curso do Direito do Trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 392.

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g) a prestação de serviços ao grupo, mesmo que a empresas diferentes, superiores à jornada normal, gerará o pagamento de horas extras6;h) em relação à existência de contratos sucessivos às empresas do grupo, haverá a prescrição parcial de 5 anos, para pleitear verbas trabalhistas7.

Importante ressaltar que a própria Súmula nº 129, no fim de sua redação, traz uma exceção ao contrato único. É possível, de acordo com a jurisprudência do TST, que as partes celebrem contratos simultâneos de trabalho. Nesse caso, o empregado teria sua CTPS assinada por duas empresas do grupo (dois contratos de trabalho), sem que isso acarretasse prejuízo ao trabalhador. Exemplo: empregado trabalha, no período da manhã, na função de telefonista em uma empresa do grupo. No período da tarde, presta serviço como ascensorista a outra empresa do grupo. Nesse caso, havia possibilidade de contratos de trabalho diferentes entre empresas do mesmo grupo.

2.3. Aspectos processuais

Por fim, a jurisprudência do TST, com base na tese do empregador único, não tem exigido a presença de todas as empresas na fase de conhecimento do processo judicial, desde que se tenha comprovado a existência8 do grupo econômico. A ausência de uma ou algumas empresas do grupo não impede que elas sejam exe-cutadas e, consequentemente, obrigadas a pagar os débitos trabalhistas das demais. É o que se denomina responsabilidade solidária passiva. O TST cancelou a Súmula nº 205, que exigia a presença de todas as empresas no polo passivo da reclamação:

Súmula nº 205 do TST. Grupo econômico. Execução. Solidariedade (cancelada). O responsável solidário, integrante do grupo econômico, que não participou da relação processual como reclamado e que, portanto, não consta no título executivo judicial como devedor, não pode ser sujeito passivo na execução.

Nesse sentido, a interessante Súmula nº 46 do TRT da 1ª Região estabelece que o reconhecimento do grupo econômico permite a responsabilização das demais empresas na fase de execução:

Súmula nº 46 do TRT da 1ª Região. Comprovada a existência de grupo eco-nômico entre as executadas, a responsabilidade solidária pode ser declarada na fase de execução.

6. E-ED-RR-29065-2000-012-09-00.6.

7. E-RR-619969-29.1999.5.02.5555.

8. “Contudo, prevalecendo significativa controvérsia sobre a existência do grupo econômico, somente ultrapassável por meio de complexa investigação probatória, o instrumento jurídico hábil a vencer tal desafio será, sem dúvida, o processo de cognição trabalhista, com as amplas prerrogativas de alegação, defesa e provas que lhe são inerentes.” DELGADO, Maurício Godinho. Curso do Direito do Trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 393.

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Cap. 1 • Grupo Econômico (Art. 2º da CLT) 61

Com a modificação da redação final do art. 2º, § 2º, da CLT que passou a prever a responsabilidade solidária “pelas obrigações decorrentes da relação de emprego” ao invés da antiga redação que estabelecia essa responsabilidade “para efeitos da relação de emprego”, surgiu a discussão acerca da possível incompatibilidade da figura do empregador único no grupo econômico. A discussão pode ser resumida em duas teorias9:

1) Teoria restritiva: Nesse caso, sustenta-se que a responsabilidade pelas obri-gações prevista na nova redação dada pela Lei nº 13.467/2017 restringe-se tão somente à solidariedade passiva, não podendo as demais empresas do grupo aproveitar o trabalho do trabalhador que presta serviços a uma delas;2) Teoria ampliativa: Para essa teoria, a Reforma Trabalhista não modificou a figura do empregador único, pois as obrigações decorrentes da relação de emprego não se resumem a obrigações de pagar quantia em decorrência do ina-dimplemento. Além dessas, todas as empresas do grupo econômico estão sujeitas às obrigações de fazer e de não fazer decorrentes da relação de emprego, que compreendem inclusive a obrigação de assegurar que os trabalhadores tenham condições adequadas no meio ambiente de trabalho com respeito às normas de saúde e segurança do trabalho. Entendemos que essa teoria é mais adequada, pois todas as obrigações e não apenas decorrentes do inadimplemento das verbas trabalhistas estendem-se às demais empresas do grupo. Dessa forma, permanece a teoria do grupo econômico como empregador único.

A seguir, serão abordados os impactos do reconhecimento do grupo econômico na terceirização de serviços.

2.4. Grupo econômico e terceirização

Com os novos parâmetros de configuração do grupo econômico, surge a discussão acerca da possibilidade de reconhecimento de grupo econômico na ter-ceirização de serviços entre empresa contratante e empresa prestador de serviços a terceiros. Há posicionamento que defende a existência de grupo econômico na terceirização de atividade-fim. Nesse caso, sustenta-se que a Reforma Trabalhista consagrou a possibilidade de terceirização da atividade-fim. Com isso, há presunção relativa da existência de interesse integrado entre empresa contratante e empresa prestadora de serviços.

Com o preenchimento do requisito do art. 2º, § 3º da CLT, estaria configurado o grupo econômico por coordenação entre essas empresas, o que teria como conse-quência a responsabilidade solidária pelas obrigações trabalhistas. Por outro lado, defende-se que a previsão de responsabilidade subsidiária prevista no art. 5º-A, §

9. GEMIGNANI, Tereza Aparecida Asta; GEMIGNANI, Daniel. Grupo econômico e sucessão trabalhista: o que muda com a Reforma Trabalhista. IN: MIESSA, Élisson; CORREIA, Henrique. A Reforma Traba-lhista e seus impactos. Salvador: Juspodivm, 2018. p. 48

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5º, da Lei nº 6.019/1974, seria aplicada tão somente à hipótese de terceirização da atividade-meio, pois não haveria interesse integrado entre as empresas.

De nossa opinião, entendemos que a celebração de contrato de terceirização lícita impede a configuração de grupo econômico. A Lei de Terceirização – Lei nº 6.019/1974 – é expressa ao atribuir responsabilidade subsidiária da contratante em relação aos débitos trabalhistas da empresa prestadora de serviços. Por se tratar de uma relação de trabalho especial regida por legislação específica sobre o tema, há prevalência sobre a aplicação dos dispositivos da CLT.

Além disso, a relação entre empresa contratante e empresa prestadora de ser-viços é contratual com data específica para seu término. Não há necessária atuação integrada entre as empresas, podendo no desenvolvimento de suas atividades buscar interesses diversos e, às vezes, inclusive conflitantes, ainda que no desenvolvimento da atividade-fim.

IMPACTOS DA REFORMA TRABALHISTA

• Grupo econômico por subordinação e coordenação. A Reforma Trabalhista al-terou a redação do § 2º do art. 2º da CLT e acrescentou seu § 3º, para prever a possibilidade de reconhecimento de duas formas de grupo econômico: por su-bordinação e por coordenação. Dessa forma, há formação de grupo econômico se houver relação de hierarquia entre as empresas integrantes ou, mesmo com certa autonomia, se houver demonstração de interesse integrado, efetiva co-munhão de interesses e atuação conjunta das empresas. A mera existência de sócios comuns não assegura o reconhecimento do grupo econômico.

• Antes da Reforma Trabalhista: A antiga redação do dispositivo estabelecia que o grupo econômico era formado quando uma empresa tivesse o controle, direção ou administração de outra. A previsão apenas do grupo por subordinação e a omissão quanto ao grupo por coordenação trazia grande discussão na doutrina e na jurisprudência.

LEI Nº 5.889/1973 – LEI DO RURAL

Art. 3º Considera-se empregador, rural, para os efeitos desta Lei, a pessoa física ou jurídica, proprietário ou não, que explore atividade agro-econômica, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou através de prepostos e com auxílio de empregados.

§ 1º Inclui-se na atividade econômica referida no caput deste artigo, além da exploração industrial em estabelecimento agrário não compreendido na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1º de maio de 1943, a exploração do turismo rural ancilar à exploração agro-econômica.

§ 2º Sempre que uma ou mais empresas, embora tendo cada uma delas personalidade jurí-dica própria, estiverem sob direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico ou financeiro rural, serão responsáveis solidariamente nas obrigações decorrentes da relação de emprego.

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Cap. 1 • Grupo Econômico (Art. 2º da CLT) 63

SÚMULAS E ORIENTAÇÕES JURISPRUDENCIAIS DO TST

Súmula nº 93 do TST. Bancário.

Integra a remuneração do bancário a vantagem pecuniária por ele auferida na colocação ou na venda de papéis ou valores mobiliários de empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico, se exercida essa atividade no horário e no local de trabalho e com o consenti-mento, tácito ou expresso, do banco empregador.

Súmula nº 129 do TST. Contrato de trabalho. Grupo econômico.

A prestação de serviços a mais de uma empresa do mesmo grupo econômico, durante a mesma jornada de trabalho, não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de trabalho, salvo ajuste em contrário.

Súmula nº 239 do TST. Bancário. Empregado de empresa de processamento de dados.

É bancário o empregado de empresa de processamento de dados que presta serviço a banco integrante do mesmo grupo econômico, exceto quando a empresa de processamento de dados presta serviços a banco e a empresas não bancárias do mesmo grupo econômico ou a terceiros.

SÚMULAS DOS TRIBUNAIS REGIONAIS DO TRABALHO

Súmula nº 46 do TRT da 1ª Região. Comprovada a existência de grupo econômico entre as executadas, a responsabilidade solidária pode ser declarada na fase de execução.

Súmula nº 9 do TRT da 13ª Região. Grupo econômico. Configura a existência de grupo econômico a relação de coordenação jurídico trabalhista dos entes empresariais envolvidos.

ENUNCIADOS DA 2ª JORNADA DE DIREITO MATERIAL E PROCESSUAL DO TRABALHO10

Enunciado nº 5. Grupo econômico trabalhista. Distribuição racional do ônus da prova

I. A lei 13.467/2017 reconheceu expressamente a figura do grupo econômico trabalhista por coordenação (art. 2º, §2º) e estabeleceu requisitos subjetivos (interesse integrado e comum) e objetivos (atuação conjunta) para a caracterização do grupo, a serem verificados no caso concreto pelo juízo (art. 2º, §3º);

II- Nas hipóteses restritas de aplicação do parágrafo 3º do artigo 2º da CLT, a mera identi-dade de sócios entre as empresas integrantes, embora não baste à caracterização do grupo econômico, constitui indício que autoriza a inversão ou redistribuição do ônus da prova, nos termos do art. 818 § 1º da CLT, com redação dada pela Lei 13.467/2017. Incumbe então ao empregador o ônus de comprovar a ausência de interesses integrados, da comunhão de interesses e/ou da atuação conjunta das empresas. Aplicação dos princípios da aptidão para a prova e da paridade de armas em concreto (isonomia processual).

10. Vale ressaltar que os Enunciados da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho não apresentam caráter vinculativo, mas expressam o posicionamento de parte da seara trabalhista nas questões envolvendo a Reforma Trabalhista.

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Enunciado nº 8. Cadeia de fornecimento e responsabilidade civil objetiva do poder econo-micamente relevante

Cadeia de fornecimento. Responsabilidade civil objetiva do poder economicamente relevante por violações aos direitos fundamentais da pessoa do trabalhador. Devida diligência para a promoção de Trabalho Decente. Obrigação de reparar os danos experimentados pelo trabalhador, independentemente de culpa.

Enunciado nº 9. Responsabilidade solidária das empresas que atuam em cadeia produtiva global ou nacional

Subordinação estrutural. Grupo econômico. Responsabilidade solidária das empresas que atuam em cadeia produtiva nacional ou global, por interpretação dos parágrafos 2º e 3º do artigo 2º da CLT, acrescentados pela Lei 13.467/2017.

Enunciado nº 10. Grupo econômico. Integração. Conceito do direito empresarial. Base societária, obrigacional e pessoal

Não configurado o grupo econômico na forma do novo art. 2º, § 2º, da CLT, com a redação dada pela Lei 13.467/2017, é possível a integração do direito, na forma do art. 8º da CLT (especialmente considerando sua nova redação), para abarcar situações não disciplinadas pela nova legislação trabalhista. O grupo econômico pode ter natureza societária, obrigacional ou pessoal, bastando apenas a atuação coordenada, conjunta ou coligada das sociedades empresárias. Assim, como tal concepção destina-se à defesa da ordem econômica e da livre concorrência, com mais razão ainda deve ser aplicada à defesa das verbas trabalhistas.

INFORMATIVOS DO TST

Existência de sócios comuns. Grupo Econômico. Não caracterização. Ausência de subordinação.

O simples fato de duas empresas terem sócios em comum não autoriza o reconhecimento do grupo econômico, pois este, nos termos do art. 2º, § 2º, da CLT, pressupõe subordinação à mesma direção, controle ou administração, ou seja, exige uma relação de dominação interempresarial em que o controle central é exercido por uma delas (teoria hierárquica ou vertical). Na hipótese, ressaltou-se que, não obstante as empresas em questão terem os mesmos sócios, uma delas é voltada para o mercado imobiliário, enquanto a outra atua no ramo de segurança e transporte de valores, bem como importação e exportação de equipamentos eletrônicos, não guardando, portanto, qualquer relação entre os respectivos objetos comerciais a indicar laços de direção entre elas. Com esse entendimento, a SBDI-I, em sua composição plena, por maioria, conheceu dos embargos interpostos pela reclamante, por divergência jurisprudencial, vencidos os Ministros Horácio Raymundo de Senna Pires, relator, Antonio José de Barros Levenhagen, Brito Pereira e Aloysio Corrêa da Veiga, que não conheciam do apelo. No mérito, também por maioria, a Subseção negou provimento ao recurso, vencidos os Ministros Lelio Bentes Corrêa, Augusto César Leite de Carvalho, José Roberto Freire Pimenta e Hugo Carlos Scheuermann, que davam provimento aos embargos para restabelecer a decisão proferida pelo TRT que, adotando a teoria horizon-tal ou da coordenação, entendeu configurado o grupo econômico porque existente nexo relacional entre as empresas envolvidas, pois, além de terem sócios em comum, restou demonstrado que houve aporte financeiro dos sócios de uma empresa na outra. TST-E--ED-RR-214940-39.2006.5.02.0472, SBDI-I, rel. Min. Horácio Raymundo de Senna Pires 22.5.2014 (Informativo nº 83).

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CAPÍTULO 6

TERCEIRIZAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL

(DECRETO Nº 9.507, DE 21 DE SETEMBRO DE 2018)

1. INTRODUÇÃO

No dia 21 de setembro de 2018, o Presidente da República Michel Temer editou o Decreto nº 9.507/2018, que dispõe sobre a execução indireta, mediante contrata-ção, de serviços da administração pública federal direta, autárquica e fundacional e das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União.

A publicação do Decreto no Diário Oficial ocorreu no dia 24/09/2018. Entre-tanto, foi estabelecido período de “vacatio” para essa norma, que somente entrará em vigor depois de decorridos 120 dias de sua publicação (art. 18, Decreto nº 9.507/2018), em 22/01/2019.

A execução indireta de que trata o referido decreto corresponde à contratação de empresas para a prestação de serviços da Administração Pública. Dessa forma, verifica-se que a terceirização no setor público passou a ser regulamentada pelo Decreto nº 9.507/2018, pois, nesses casos, o serviço não é prestado diretamente pelo Estado, mas por uma empresa terceirizada. Com isso, foi revogado o Decreto nº 2.271/1997, que tratava sobre o tema.

Referido decreto modificou as bases da terceirização na Administração Pública Federal, mas, na visão desse autor, a regulamentação via decreto fere o princípio da legalidade. Até o momento de elaboração desse material, não houve declaração da ilegalidade do dispositivo e, por isso, será comentado nos moldes como foi publicado.

2. IMPACTOS DAS LEIS Nº 13.429/2017 E 13.467/2017 NA TERCEIRIZA-ÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Com a promulgação das Leis nº 13.429/2017 e 13.467/2017, que passaram a regulamentar a terceirização no âmbito das empresas, surgiram diversas discussões quando ao alcance dessas novas leis no âmbito da Administração Pública.

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É importante salientar que o foco da nova disciplina legal foi a regulamentação do trabalho temporário e da terceirização nas empresas. Portanto, as leis não foram criadas para aplicação na Administração direta, autarquias e fundações públicas por não se equipararem às empresas privadas. Além disso, há previsão constitucional estabelecendo a necessidade de concurso público para provimento dos cargos e empregos públicos criados. Nesse sentido:

Art. 37, da Constituição Federal. A Administração Pública Direta e Indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Mu-nicípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.

Tendo em vista que a Constituição Federal é hierarquicamente superior à legislação ordinária, seja na forma quanto no conteúdo, entendemos que as dis-posições da nova legislação do trabalho temporário e terceirizado não excluirão a necessidade de concurso público para a investidura em cargo ou emprego público. Nesse sentido, o Enunciado nº 75 da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho1 determina que a Lei nº 13.467/2017 não serve como marco regulatório para a Administração Pública, direta ou indireta:

Enunciado nº 75 da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho. Terceirização: Abrangência.A Lei 13.467/2017, ao alterar a Lei 6.019/74, tanto no tema da contratação tem-porária quanto da terceirização de serviços, não serve como marco regulatório para a Administração Pública direta ou indireta, em razão do disposto no art. 37, caput, e incs. II e IX, da Constituição Federal.

Além disso, há posicionamento no sentido de que as atividades típicas e cen-trais do Estado não podem ser terceirizadas, como a segurança pública, cargos do Poder Judiciário, do Ministério Público, cargos de fiscalização, Tribunal de Contas e de agências reguladoras. Nesses casos, permanece, sem dúvidas, a exigência do concurso público e da relação direta com a Administração Pública.

Em resumo, se já existe cargo ou emprego público criado por lei, não é possível a terceirização pela Administração Pública. Por outro lado, recentemente, o STF

1. Nos dias 9 e 10 de outubro de 2017, foi realizada a 2ª Jornada de Direito Material e Processual do �

que teve a Reforma Trabalhista como temática. Vale ressaltar que os Enunciados da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho não apresentam caráter vinculativo, mas expressam o posicionamento de parte da seara trabalhista nas questões envolvendo a Reforma Trabalhista.

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Cap. 6 • Terceirização na Administração Pública Federal 1369

no julgamento da ADIn nº 1.923/DF,2 decidiu que a Lei nº 9.637/1998, que regu-lamenta as denominadas organizações sociais, é constitucional. Uma das formas previstas atualmente para ampliação da participação do setor privado consiste na transferência dos recursos públicos a um particular que atua em colaboração com o Poder Público. É nesse contexto que surgem as organizações sociais, que terão suas atividades voltadas ao desenvolvimento tecnológico, do ensino, pesquisa e proteção do meio ambiente, da cultura e saúde.

Trata-se, portanto, de verdadeira possibilidade legalmente permitida à Adminis-tração Pública repassar a um terceiro a prestação de serviços públicos essenciais ao Estado, como a saúde e educação. Ocorre, na prática, a terceirização da atividade-fim do Estado, que consiste em assegurar o bem-estar social. Esses serviços públicos de-veriam ser prestados diretamente pelo Poder Público sem nenhum intermediário, ou ainda mediante permissão, autorização ou concessão de serviço público. Entretanto, a prestação direta ou a concessão de serviço público não ocorrem. Com a decisão do STF, a terceirização da atividade-fim do Poder Público criada pela instituição das organizações sociais tornou-se legal.

3. TERCEIRIZAÇÃO NO DECRETO Nº 9.507/2018

Em sentido contrário ao nosso posicionamento e ao manifestado pela doutrina, o Decreto nº 9.507/2018 ampliou significativamente a possibilidade de terceirização na Administração Pública federal, que não ficará apenas restrito às atividades-meio.

Cabe ressaltar que as disposições do Decreto da terceirização no serviço pú-blico atingem toda a Administração Pública federal direta e indireta. Dessa forma, a terceirização será possível nos órgãos da Administração Pública direta, como nas autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista controladas pela União:

Art. 1º do Decreto nº 9.507/2018: Este Decreto dispõe sobre a execução indi-reta, mediante contratação, de serviços da administração pública federal direta, autárquica e fundacional e das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União.

O Decreto nº 9.507/2018 não estabeleceu as hipóteses em que será permitido o uso da terceirização. Nesse sentido, o art. 2º do diploma infralegal apenas pre-vê que o Ministro de Estado do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão deve estabelecer os serviços que serão preferencialmente objeto de execução indireta mediante contratação.

Em que pese as hipóteses expressamente permitidas não tenham sido regula-mentadas, os art. 3º, 4º e 5º do decreto ocuparam-se por apresentar os serviços da Administração Pública federal que não podem ser objeto de terceirização. Note-se,

2. ADIn nº 1.923/DF: Relator: Min. Ayres Britto. Data de julgamento: 16/04/2015.

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portanto, que a regra prevista no decreto é a possibilidade de terceirização das atividades, desde que respeitadas as vedações contidas nos dispositivos do próprio decreto. Nesse sentido, as vedações podem ser divididas em:

a) Vedações para a Administração Pública direta, autárquica e fundacional (art. 3º);b) Vedações para as empresas públicas e sociedades de economia mista (art. 4º);c) Vedações de caráter geral (art. 5º)

3.1. Vedações para a Administração Pública direta, autárquica e fundacional

O art. 3º do Decreto nº 9.507/2018 prevê as hipóteses cuja execução indireta dos serviços é proibida, sendo, portanto, vedada a terceirização na Administração direta, autárquica e fundacional. Ressalta-se que essas entidades são pessoas jurí-dicas de direito público, cujo regime jurídico de direito administrativo assegura prerrogativas e restrições em relação à iniciativa privada para a busca pelo interesse público. As restrições previstas foram as seguintes:

a) Serviços que envolvam a tomada de decisão ou posicionamento institu-cional nas áreas de planejamento, coordenação, supervisão e controle: essa vedação tem o intuito de assegurar que os serviços que envolvam a tomada de decisão dos órgãos e entidades devem ser executados di-retamente pela Administração. Somente os agentes públicos podem ser responsáveis pela tomada de decisões, pois tem o dever de atuar na busca do interesse público, enquanto as empresas têm como finalidade o lucro de suas atividades;

b) Serviços que sejam considerados estratégicos para o órgão ou a entida-de, cuja terceirização possa colocar em risco o controle de processos e de conhecimentos e tecnologias: novamente, evita-se a possibilidade de terceirização em áreas estratégicas para o órgão ou entidade que possam interferir na busca pelo interesse público. Cabe ressaltar, entretanto, que esses serviços compreendem um conceito jurídico indeterminado, devendo ser definido em cada caso concreto pela Administração Pública;

c) Serviços que estejam relacionados ao poder de polícia, de regulação, de outorga de serviços públicos e de aplicação de sanção: todas as ativi-dades estatais relacionadas ao poder de polícia ou poder disciplinar para aplicar sanções também devem ser destinados exclusivamente aos agentes públicos, sendo vedada a terceirização;

d) Serviços que sejam inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou da entidade, exceto disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal: se o órgão ou entidade da Ad-ministração Pública possuir quadro de pessoal, não é possível a terceiri-zação dessas atividades. Exemplo: Se a entidade pública prevê a carreira

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Cap. 6 • Terceirização na Administração Pública Federal 1371

de Analista ou Técnico em seus quadros de carreira, não poderá delegar essas atividades às empresas terceirizadas, devendo contratar agentes públicos por meio de concursos público de provas ou de provas e títulos conforme dispõe o art. 37, II, da Constituição Federal. O dispositivo, no entanto, excepciona dessa regra o cargo extinto, total ou parcial, ou quando permitido expressamente por lei.

Por sua vez, a regra é distinta para os serviços auxiliares, instrumentais ou aces-sórios dos serviços mencionados anteriormente, pois poderão ser terceirizados para as empresas mediante contrato. Nesse caso, no entanto, fica vedada a possibilidade de transferência de responsabilidade para a realização de atos administrativos ou da tomada de decisão para a empresa contratada:

Art. 3º do Decreto nº 9.507/2018: (...)§ 1º Os serviços auxiliares, instrumentais ou acessórios de que tratam os inci-sos do caput poderão ser executados de forma indireta, vedada a transferência de responsabilidade para a realização de atos administrativos ou a tomada de decisão para o contratado.§ 2º Os serviços auxiliares, instrumentais ou acessórios de fiscalização e con-sentimento relacionados ao exercício do poder de polícia não serão objeto de execução indireta.

Atenção: Os serviços auxiliares, instrumentais ou acessórios de fiscalização e consentimento relacionados ao exercício do poder de polícia não podem ser terceirizados. Exemplo: não é possível terceirizar o serviço de aplicação de multa de trânsito pelo Estado.

3.2. Vedações para as empresas públicas e sociedades de economia mista

A definição do conjunto de atividades que serão passíveis de terceirização pelas empresas públicas e sociedades de economia mista será realizada pelo seu Conselho de Administração ou órgão equivalente.

As vedações à terceirização (execução indireta) são distintas para as empresas públicas e sociedades de economia mista. Essas entidades são denominadas em-presas estatais e são criadas para atuar no mercado junto com a iniciativa privada. Dessa forma, o regime jurídico a elas aplicado assemelha-se ao regime privado, com algumas restrições. Assim, o art. 14 do Decreto nº 9.507/2018 estabelece que essas empresas estatais devem seguir os mesmos parâmetros das sociedades privadas naquilo que não contrariar o seu regime jurídico:

Art. 14 do Decreto nº 9.507/2018: As empresas públicas e as sociedades de economia mista controladas pela União adotarão os mesmos parâmetros das sociedades privadas naquilo que não contrariar seu regime jurídico e o disposto neste Decreto.

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De acordo com o art. 4º do Decreto nº 9.507/2018, fica vedada, a princípio, a terceirização dos serviços que demandem a utilização, pela contratada, de pro-fissionais com atribuições inerentes às dos cargos integrantes de seus Planos de Cargos e Salários. Assim, um banco público que tem um cargo de escriturário previsto em planos de cargos e salários não poderá terceirizar as atividades desen-volvidas por esses escriturários.

No entanto, o próprio artigo prevê uma exceção a essa vedação. Admite-se a possibilidade de terceirização dos serviços desenvolvidos pelos empregados públicos, quando não forem respeitados os princípios administrativos da eficiência, da economicidade e da razoabilidade, tais como na ocorrência de, ao menos, uma das seguintes hipóteses:

I – caráter temporário do serviço;II – incremento temporário do volume de serviços;III – atualização de tecnologia ou especialização de serviço, quando for mais atual e segura, que reduzem o custo ou for menos prejudicial ao meio ambiente; ouIV – impossibilidade de competir no mercado concorrencial em que se insere.

Por exemplo, se a empresa pública estiver enfrentando problemas para competir no mercado concorrencial, poderá terceirizar suas atividades ainda que se refiram às atividades desenvolvidas por seus empregados públicos nos termos de seu plano de cargos e salários.

As situações de exceção referente ao caráter temporário do serviço e ao incremento temporário do volume de serviços poderão estar relacionadas às especificidades da localidade ou à necessidade de maior abrangência territorial.

Entretanto, os empregados da contratada que tenham atribuições semelhantes àquelas da Administração Pública somente poderão desenvolver os serviços contra-tados. Não é possível, portanto, ampliar as atribuições dos terceirizados. Por fim, a vedação da terceirização não se aplica aos cargos extintos ou em processo de extinção.

Note-se, portanto, que o Decreto nº 9.507/2018 ampliou significativamente a possibilidade de terceirização nas empresas estatais, pois até mesmo as atividades inerentes dos empregados públicos poderão ser objeto de execução indireta quando preencherem algum dos requisitos dispostos nos incisos I a IV do art. 4º.

3.3. Vedações de caráter geral

O art. 5º do Decreto nº 9.507/2018 trouxe, por sua vez, restrições à tercei-rização que se aplicam tanto à Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, quanto às empresas públicas e às sociedades de economia mista controladas pela União.

Nesse sentido, fica vedada a contratação de empresa terceirizada cujo adminis-trador ou sócio com poder de direção tenha relação de parentesco com:

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Cap. 6 • Terceirização na Administração Pública Federal 1373

a) detentor de cargo em comissão ou função de confiança que atue na área responsável pela demanda ou pela contratação; oub) autoridade hierarquicamente superior no âmbito de cada órgão ou entidade.

Essa vedação tem o intuito de preservar o interesse público, pois evita que o detentor de cargo de confiança ou a autoridade hierarquicamente superiora possam utilizar seu cargo para beneficiar ilegalmente as empresas de seus parentes.

Para facilitar a memorização do assunto, segue quadro sistematizado sobre as vedações da terceirização na Administração Pública:

Vedações à terceirização no setor público

Administração

direta, autárquica

e fundacional

Empresas públicas

e sociedades de

economia mista

Vedações de

caráter geral

É proibida a terceirização nos:

1) Serviços que envolvam a tomada de decisões

2) Serviços estratégicos do órgão ou entidade pública

3) Serviços relacionados ao poder de polícia, de re-gulação, de outorga de serviços públicos ou de aplicação de sanção

4) Serviços desenvolvidos pelos servidores públicos conforme previsão no pla-no de cargos do órgão ou entidade.

Exceção ao item 4) Cargos extintos ou previsão em lei – possibilidade de terceiriza-ção

É proibida a terceirização em serviços que demandem a utilização, pela contratada, de profissionais com atribui-ções inerentes às dos cargos integrantes de seus Planos de Cargos e Salários.

Exceção: é possível a ter-ceirização dessas ativi-dades quando não forem respeitados os princípios administrativos da eficiência, da economicidade e da razoa-bilidade:

I – caráter temporário do ser-viço;

II – incremento temporário do volume de serviços;

III – atualização de tecno-logia ou especialização de serviço; IV – impossibilidade de competir no mercado con-correncial em que se insere.

- É proibida a contratação com pessoa jurídica cujo ad-ministrador ou sócio com poder de direção tenha pa-rentesco com:

1) detentor de cargo em co-missão ou função de con-fiança que atue na área responsável pela deman-da ou pela contratação; ou

b) autoridade hierarquica-mente superior no âmbito de cada órgão ou entida-de.

4. NORMAS ATINENTES AO INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO E AO CONTRATO

O Decreto nº 9.507/2018 também estabeleceu regras que deverão se observa-das na licitação e nos contratos firmados para a execução indireta dos serviços. As contratações deverão ser precedidas de planejamento e o objeto definido de forma precisa no instrumento convocatório da licitação e no contrato. Ressalta-se que

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é permitida a adoção de padrões de aceitabilidade e nível de desempenho para a aferição da qualidade esperada na prestação dos serviços.

Essas disposições interessam prioritariamente ao Direito Administrativo. No entanto, há disposições que estabelecem vedações e disposições contratuais obrigatórias desses contratos de terceirização que afetam as relações de trabalho terceirizado na Administração Pública.

4.1. Vedações

Nesse sentido, de acordo com o art. 7º, II, do Decreto nº 9.507/2018, é proibi-da a caracterização do objeto da contratação como fornecimento de mão de obra. Assim, é importante diferenciar a terceirização dos serviços da intermediação de mão de obra.

A intermediação de mão de obra está presente no trabalho temporário. Nela, a empresa prestadora de serviços possibilita que um trabalhador temporário preste serviços em outra empresa, denominada tomadora. O temporário presta os serviços ao lado de outro empregado da tomadora. Por outro lado, a terceirização compreen-de a transferência de um serviço ou atividade específico de uma empresa a outra, ou seja, não se busca apenas um trabalhador para substituir outro que entrou em férias, por exemplo, mas, na terceirização, há verdadeira delegação de um setor da empresa para que outra possa atuar com seus próprios empregados terceirizados. Nesse sentido, surge a obrigação de que a empresa de prestação de serviços a ter-ceiros preste serviços determinados e específicos.

Além disso, o art. 7º, III e IV, do Decreto estabelecem a proibição do reembolso de salários pela contratante (Administração Pública) e a vedação à existência de pessoalidade e subordinação direta dos empregados da contratada aos gestores da contratante. Note-se que os trabalhadores terceirizados quando prestam seus serviços na contratante, permanecem subordinados à sua empregadora, no caso a empresa prestadora de serviços. Dessa forma, a terceirização estará descaracterizada se os salários dos terceirizados forem pagos pela Administração Pública ou se houver pessoalidade ou subordinação desses trabalhadores em relação aos agentes públicos.

Cabe destacar que, ainda que descaracterizada a terceirização de serviços, não é possível o reconhecimento do vínculo de emprego entre o terceirizado e a Adminis-tração Pública, pois a Constituição Federal exige a realização de concursos públicos:

Súmula nº 331, II, do TST – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). Art. 37 da Constituição Federal. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)

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Cap. 6 • Terceirização na Administração Pública Federal 1375

II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

4.2. Disposições contratuais obrigatórias

Além de prever vedações ao contrato de terceirização firmado com a Admi-nistração Pública Federal, os art. 8º e 9º do Decreto nº 9.507/2018 estabelecem cláusulas que devem constar obrigatoriamente nesses contratos. As cláusulas obri-gatórias são as seguintes:

Art. 8º: Os contratos de que trata este decreto conterão cláusulas que:I – exijam da contratada declaração de responsabilidade exclusiva sobre a quitação dos encargos trabalhistas e sociais decorrentes do contrato;II – exijam a indicação de preposto da contratada para representá-la na execução do contrato;III – estabeleçam que o pagamento mensal pela contratante ocorrerá após a comprovação do pagamento das obrigações trabalhistas, previdenciárias e para com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS pela contratada relativas aos empregados que tenham participado da execução dos serviços contratados;IV – estabeleçam a possibilidade de rescisão do contrato por ato unilateral e escrito do contratante e a aplicação das penalidades cabíveis, na hipótese de não pagamento dos salários e das verbas trabalhistas, e pelo não recolhimento das contribuições sociais, previdenciárias e para com o FGTS;V – prevejam, com vistas à garantia do cumprimento das obrigações trabalhistas nas contratações de serviços continuados com dedicação exclusiva de mão de obra:a) que os valores destinados ao pagamento de férias, décimo terceiro salário, ausências legais e verbas rescisórias dos empregados da contratada que partici-parem da execução dos serviços contratados serão efetuados pela contratante à contratada somente na ocorrência do fato gerador; oub) que os valores destinados ao pagamento das férias, décimo terceiro salário e verbas rescisórias dos empregados da contratada que participarem da execução dos serviços contratados serão depositados pela contratante em conta vinculada específica, aberta em nome da contratada, e com movimentação autorizada pela contratante;VI – exijam a prestação de garantia, inclusive para pagamento de obrigações de natureza trabalhista, previdenciária e para com o FGTS, em valor correspondente a cinco por cento do valor do contrato, limitada ao equivalente a dois meses do custo da folha de pagamento dos empregados da contratada que venham a participar da execução dos serviços contratados, com prazo de validade de até noventa dias, contado da data de encerramento do contrato; e

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1376 MANUAL DA REFORMA TRABALHISTA – Élisson Miessa e Henrique Correia

VII – prevejam a verificação pela contratante, do cumprimento das obrigações trabalhistas, previdenciárias e para com o FGTS, em relação aos empregados da contratada que participarem da execução dos serviços contratados, em especial, quanto:a) ao pagamento de salários, adicionais, horas extras, repouso semanal remu-nerado e décimo terceiro salário;b) à concessão de férias remuneradas e ao pagamento do respectivo adicional;c) à concessão do auxílio-transporte, auxílio-alimentação e auxílio-saúde, quando for devido;d) aos depósitos do FGTS; ee) ao pagamento de obrigações trabalhistas e previdenciárias dos empregados dispensados até a data da extinção do contrato.

Note-se, portanto, que o novo decreto trouxe inúmeras cláusulas obrigatórias que tem como principal objetivo assegurar que a empresa terceirizada (contratada) efetue corretamente o pagamento dos salários e demais encargos trabalhistas de seus empregados. Nesse sentido, o pagamento mensal realizado pela Administração Pública (contratante) somente ocorrerá depois de comprovado o pagamento das obrigações trabalhistas. Assegura-se também o direito da Administração Pública rescindir unilateralmente o contrato de execução indireta dos serviços na hipótese dos direitos trabalhistas não terem sido cumpridos.

No caso de não cumprimento das obrigações trabalhistas, previdenciárias e de FGTS, a contratante comunicará o fato à contratada e reterá o pagamento da fatura mensal, em valor proporcional ao inadimplemento, até que a situação esteja regula-rizada. Não havendo quitação das obrigações em até 15 dias, a contratante poderá efetuar os pagamentos, o que não configura vínculo com a Administração Pública:

Art. 8º, § 1º, Decreto nº 9.507/2018: Na hipótese de não ser apresentada a documentação comprobatória do cumprimento das obrigações trabalhistas, previdenciárias e para com o FGTS de que trata o inciso VII do caput deste artigo, a contratante comunicará o fato à contratada e reterá o pagamento da fatura mensal, em valor proporcional ao inadimplemento, até que a situação esteja regularizada.§ 2º Na hipótese prevista no § 1º e em não havendo quitação das obrigações por parte da contratada, no prazo de até quinze dias, a contratante poderá efetuar o pagamento das obrigações diretamente aos empregados da contratada que tenham participado da execução dos serviços contratados.§ 3º O sindicato representante da categoria do trabalhador deve ser notificado pela contratante para acompanhar o pagamento das verbas referidas nos § 1º e § 2º.§ 4º O pagamento das obrigações de que trata o § 2º, caso ocorra, não configura vínculo empregatício ou implica a assunção de responsabilidade por quaisquer obrigações dele decorrentes entre a contratante e os empregados da contratada.

Além disso, o art. 9º do Decreto nº 9.507/2018 passou a exigir que a contratada apresente dados e informações que viabilizem a fiscalização do cumprimento das

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Cap. 6 • Terceirização na Administração Pública Federal 1377

obrigações trabalhistas pela Administração Pública, inclusive aquelas atinentes à normas coletivas aplicáveis à categoria profissional. Nesse caso, a empresa terá que informar:

a) o quantitativo de empregados vinculados à execução do objeto do contrato de prestação de serviços, a lista de identificação destes empregados e respectivos salários;b) o cumprimento das obrigações estabelecidas em acordo, convenção, dissídio coletivo de trabalho ou equivalentes das categorias abrangidas pelo contrato; ec) a relação de benefícios a serem concedidos pela contratada a seus empregados, que conterá, no mínimo, o auxílio-transporte e o auxílio-alimentação, quando esses forem concedidos pela contratante.

Há, ainda, previsão de direitos trabalhistas a que a Administração Pública não estará vinculada ao pagamento para os empregados terceirizados da contratada. São eles:

1) Participação nos lucros e resultados da empresa contratada (PLR);2) Verbas de matéria não trabalhistas ou de direitos não previstos em lei, tais como valores ou índices obrigatórios de encargos sociais ou previdenciários;3) Preços para os insumos relacionados ao exercício da atividade.

5. LEGALIDADE E DISCUSSÕES FUTURAS SOBRE O NOVO DECRETO Nº 9.507/2018

A nova regulamentação da terceirização na administração pública federal por meio de decreto presidencial poderá ser questionada quanto ao respeito ao prin-cípio da legalidade, pois a norma infralegal não poderia regulamentar o assunto sem base legal.

Da nossa parte, entendemos que diversos pontos são ilegais pois inovam assuntos não tratados em lei. Entretanto, como há presunção de legitimidade e legalidade do ato administrativo até que ocorra seu questionamento judicial, optamos por tratar dessas principais inovações.

Além disso, o novo decreto apenas estabelece as hipóteses em que a terceiri-zação é vedada, enquanto o antigo Decreto nº 2.271/1997, que regulamentava o assunto, determinava expressamente as hipóteses passíveis de terceirização. Dessa forma, poderão surgir questionamentos quanto ao alcance e limites da terceirização no setor público.