Manual de direito processual civil vol. 2 - darlan barroso

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Manual de Direito Processual Civil

recursos e processo de execução

Darlan Barroso

AManole

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M a n u a l d e D i r e i t o

P r o c e s s u a l C i v i l

V o l u m e I I - R e c u r s o s e

p r o c e s s o d e E x e c u ç ã o

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M a n u a l d e D i r e i t o

P r o c e s s u a l C i v i l

V o l u m e I I - R e c u r s o s e

p r o c e s s o d e E x e c u ç ã o

D a r l a n B a r r o s o

Advogado em São Paulo, mestrando em Direitos Difusos e Coletivos e especialista em Direito Processual Civil pela

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professor de Direito Processual Civil e Prática Jurídica

na Universidade Paulista (UNIP), em cursos de pós-graduação e nos Cursos RCD

e Proordem, na preparação para o Exame de Ordeme concursos públicos. Co-autor do livro

Prática jurídica civil, publicado pela Editora Manole.

AManole

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Copyright © 2007 Editora Manolc Ltda., por meio dc contrato com o autor.

Projeto GráficoNelson Mielnik e Sylvia Mielnik

Editoração Eletrônica Acqua Estúdio Gráfico

CapaEduardo Bertolini

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Barroso, Da ria n Manual de direito processual civil, volume II:

recursos e processo de execução /Darlan Barroso. - Barueri, SP : Manole, 2007

Bibliografia.ISBN: 978-85-204-2631-9

1. Execução (Direito civil) - Brasil 2. Processo civil 3. Processo civil - Brasil 4. Recursos (Direito) - BrasilI. Título

07-4970 CDU-347.9índice para catálogo sistemático:1. Direito processual civil 347.9

2. Processo c iv il: Direito civil 347.9

Todos os direitos reservados.N enhum a parte deste livro poderá ser reproduzida, por qualquer processo, sem a permissão expressa dos editores.É proibida a reprodução por xerox.

\ è edição - 2007

Direitos adquiridos pela:Editora Manole Ltda.Avenida Ceei, 672 - Tamboré 06460-120 - Barueri - SP - Brasil Fone: (11) 4196-6000 - Fax: (11) 4196-6021 www.manole.com.br [email protected]

Impresso no Brasil Printed in Brazil

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Ao PedrOy

meu filho querido que, pela alegria estampada em seu rosto lindo,

justifica a minha vida.

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S u m á r i o

Nota do autor ao volume I I ................................................................ XVA gradecim entos..................................................................................... XVII

A brev ia tu ras........................................................................................... XIX

PARTE I - DOS RECURSOS.............................................................. 1

1 TEORIA GERAL DOS RECURSOS....................................... 3

1.1 Definição de recu rso ............................................................ 31.2 Princípios gerais dos recursos .......................................... 8

1.2.1 Princípio da tax a tiv id ad e ................................. 81.2.2 Singularidade....................................................... 91.2.3 Fungibilidade....................................................... 9

1.2.4 Princípio da vedação de reformatio

inpejus ................................................................ 141.3 Pressupostos gerais dos re c u rso s ..................................... 15

1.3.1 Subjetivos.............................................................. 16

1.3.2 Objetivos .............................................................. 161.4 Juízo de admissibilidade e juízo de méritos

recursais .................................................................................. 20

VII

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V I I I MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL DARLAN BARROSO

1.5 Desistência e renúncia ......................................................................... 241.6 Recurso na forma adesiva..................................................................... 25

1.7 Efeitos dos recursos................................................................................ 281.7.1 Efeito devolu tivo .................................................................. 28

1.7.2 Efeito suspensivo.................................................................. 321.7.3 Antecipação dos efeitos da tutela recursal..................... 321.7.4 Efeito substitutivo e efeito

impeditivo da preclusão ..................................................... 331.8 Remessa o b rig a tó ria .............................................................................. 34

1.8.1 D efin ição ................................................................................ 341.8.2 Hipóteses de obrigatoriedade do reexame...................... 361.8.3 Dispensa do reexame necessário ..................................... 37

2 APELAÇÃO..................................................................................................... 412.1 Cabimento do recurso .......................................................................... 41

2.1.1 Questões polêmicas acerca do cabimento da

ape lação .................................................................................. 422.2 Forma de in te rpos ição ......................................................................... 46

2.3 Prazo para in te rp o s ição ....................................................................... 472.4 Efeitos da ap e lação ................................................................................ 48

2.4.1 Efeito devolu tivo .................................................................. 48

2.4.2 Efeito suspensivo.................................................................. 492.5 Julgamento do mérito pelo t r ib u n a l ................................................. 52

2.6 Juízo de retratabilidade......................................................................... 552.7 Procedimento na apelação ................................................................... 56

2.8 Estrutura da petição da apelação....................................................... 582.9 Juízo de admissibilidade da apelação e a súmula

impeditiva de recurso............................................................................ 59

2.10 Saneamento de nulidades durante o processamentoda apelação ............................................................................................ 61

3 AGRAVOS....................................................................................................... 633.1 Definição e c a b im e n to ......................................................................... 63

3.2 Espécies de agravos................................................................................ 643.3 Juízo de retratabilidade......................................................................... 65

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SUMÁRIO IX

3.4 Agravos contra decisões interlocutórias deprimeira instância.................................................................................... 66

3.5 Agravo retido ........................................................................................... 663.5.1 D efin ição ................................................................................ 66

3.5.2 Cabim ento do agravo retido.............................................. 67

3.5.3 Forma e processamento do agravo r e t id o ..................... 69

3.5.4 Reiteração do agravo r e t id o .............................................. 70

3.5.5 Efeitos do agravo retido ..................................................... 71

3.6 Agravo de in strum en to ......................................................................... 72

3.6.1 Regularidade formal e formação

do in s tru m e n to ..................................................................... 72

3.6.2 Informação à prim eira in s tâ n c ia ..................................... 73

3.6.3 Recebimento do agravo no tribunal e os atos

do relator................................................................................. 75

3.7 Agravos contra decisões interlocutórias nos tr ibuna is ................. 78

3.8 Agravo regim ental.................................................................................. 79

3.9 Agravo interno ou para o órgão co leg iado ..................................... 81

3.10 Agravo de instrum ento contra decisão que nega

seguimento a recurso especial ou ex traord inário ........................ 82

4 EMBARGOS DE DECLARAÇÃO............................................................ 85

4.1 Embargos de declaração....................................................................... 85

4.1.1 Cabimento e natureza ju ríd ica .......................................... 85

4.2 Procedimento e efeito dos em bargos................................................ 89

4.2.1 Reiteração do recurso e embargos protelatórios............ 90

5 EMBARGOS INFRINGENTES ................................................................ 93

5.1 C abim ento ................................................................................................ 93

5.1.2 Procedimento dos embargos infringentes...................... 97

5.1.3 Efeitos dos embargos infringentes................................... 98

5.1.4 Divergência parcial e prazo para

demais recursos..................................................................... 98

6 RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E

PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ........ ............................... 101

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6.1 Recurso o rd in á rio .................................................................................. 101

6.1.1 Ações m andam entais de competência

originária dos tribunais ..................................................... 101

6.1.2 Causas envolvendo Estado estrangeiro ou

organismo internacional e município brasileiro

ou pessoa domiciliada no p a ís .......................................... 104

6.1.3 Procedimento e efeitos do recurso o rd in á r io ............... 1056.2 Recurso especial e recurso extraordinário ........................................ 106

6.2.1 Cabimento dos recursos ao STF e ao STJ ..................... 1086.2.2 Pressupostos recursais específicos................................... 1126.2.3 Efeitos dos recursos.............................................................. 1156.2.4 Regularidade fo rm a l............................................................ 1176.2.5 Procedimento gera l.............................................................. 1186.2.6 Interposição simultânea dos recursos especial

e extraordinário..................................................................... 1196.2.7 Juízo de admissibilidade dos recu rso s ............................ 1206.2.8 Agravo de instrum ento contra decisão que

nega seguimento a REsp ou R E ........................................ 1216.2.9 Recursos especial e extraordinário retidos ................... 1246.2.10 Repercussão geral para cabimento do R E ................... 125

6.3 Embargos de d ivergência ..................................................................... 129

7 ORDEM DOS PROCESSOS NOS TRIBUNAIS................................... 1337.1 Do recebimento e da d is tribu ição ..................................................... 1337.2 Poderes do re la to r.................................................................................. 1347.3 Julgamento do processo no tr ib u n a l ................................................. 1377.4 Julgamentos prelim inares..................................................................... 1407.5 Multa por recurso procrastinatório ................................................... 141

8 SUCEDÂNEOS RECURSAIS..................................................................... 1438.1 M andado de segurança......................................................................... 1438.2 Correição parcial.................................................................................... 1458.3 Pedido de reconsideração..................................................................... 1468.4 Ações autônom as .................................................................................. 1488.5 Reclamações aos tr ib u n a is .................................................................. 1498.6 Reclamação ao Conselho Nacional de Justiça................................. 150

MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

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SUMÁRIO XI

ANEXOS DA PARTE 1........................................................................................... 151Anexo I - Resumo dos recursos................................................................ 152Anexo II - Competência para julgamento dos recursos ................... 156

PARTE II - PROCESSO DE EXECUÇÃO E CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS ........................................................................................................... 157

9 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 1599.1 O processo de ex ecu ção ....................................................................... 159

9.2 Evolução histórica do processo de execução................................... 1629.3 Coerção do Estado - meios de sub-rogação e

tutelas específicas.................................................................................... 1659.4 Meios de execução forçada e perda da autonom ia do

cum prim ento das sentenças................................................................ 1679.5 Princípios da execução......................................................................... 169

9.5.1 Devido processo legal.......................................................... 1699.5.2 Autonomia processual......................................................... 1709.5.3 Responsabilidade patrimonial .......................................... 1709.5.4 Utilidade e adimplem ento ................................................ 1729.5.5 Princípio da especificidade................................................. 1739.5.6 Disponibilidade..................................................................... 1739.5.7 Subsidiariedade de r i to ....................................................... 175

10 ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUÇÃO................................. 17710.1 Título executivo .................................................................................. 177

10.1.1 Requisitos do título executivo ....................................... 17810.1.2 Espécies de títulos executivos.......................................... 180

10.2 Inad im plem en to .................................................................................. 19610.3 As partes do processo de execução ................................................ 19710.4 Competência para a execução .......................................................... 201

10.4.1 Competência para a ação de execução de títuloextrajudicial......................................................................... 201

10.4.2 Competência para o cum prim ento desen ten ças .............................................................................. 202

11 RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL................................................ 205

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x 11 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL DARLAN BARROSO

12 PROCESSAMENTO GERAL DAS EXECUÇÕESEM ESPÉCIES................................................................................................ 21312.1 Ritos da execução forçada ................................................................ 21312.2 Cumulação de execuções................................................................... 21512.3 Subsidiariedade de r i to s ..................................................................... 21512.4 G eneralidades....................................................................................... 216

12.4.1 Comparecimento das partes e atos atentatóriosà dignidade da Justiça....................................................... 216

12.4.2 Aspectos gerais da petição iniciale citação................................................................................ 217

12.4.3 Certidão do distribuidor................................................... 220

13 AÇÃO DE EXECUÇÃO PARA ENTREGA DE C O ISA ...................... 22113.1 Objeto e títu lo ....................................................................................... 221

13.2 Processamento....................................................................................... 222

13.3 Fluxograma do procedimento da execução paraentrega de coisa ce rta ......................................................................... 225

14 EXECUÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZEROU NÃO FAZER ......................................................................................... 227

14.1 Obrigação e título executivo ............................................................ 22714.2 Processamento....................................................................................... 22814.3 Conversão em perdas e danos e o modo de execução.................... 23114.4 Fluxograma do procedimento da execução de fazer................... 232

15 EXECUÇÃO DE QUANTIA CERTA CONTRADEVEDOR SOLVENTE.............................................................................. 23315.1 Expropriação patrim onial ................................................................ 235

15.2 Propositura da ação e citação do execu tado ................................. 23515.3 Parcelamento do débito executado ................................................ 23615.4 P e n h o ra .................................................................................................. 237

15.4.1 Ordem dos bens e procedimento da penhora................ 23715.4.2 Im penhorab ilidade ............................................................ 241

15.4.3 Substituição do bem penhorado ................................ 24615.4.4 Arresto - não-localização do executado ...................... 247

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SUMÁRIO XIII

15.4.5 Formalização da penhora - term o de depósito,avaliação e intimação ....................................................... 249

15.4.6 Expropriação dos bens penhorados.............................. 25315.5 Fluxograma da execução de quantia certa contra devedor

so lvente .................................................................................................. 260

16 EXECUÇÃO DE A U M E N T O S ................................................................ 261

16.1 Obrigação alim entar............................................................................ 26116.2 Título executivo dos alimentos ....................................................... 263

16.3 Procedimentos executórios .............................................................. 265

16.3.1 C om petência ....................................................................... 26516.3.2 Modos de execução de alim entos................................... 266

17 EXECUÇÃO CONTRA FAZENDA PÚBLICA..................................... 27717.1 Título executivo e processamento da execução forçada

contra a fazenda pública .................................................................. 278

17.1.1 Objeto dos embargos da fazendo p ú b lic a ................... 27817.1.2 Processamento dos em bargos.......................................... 280

17.1.3 Formação do p reca tó rio ................................................... 282

18 CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS ................................... 287

18.1 Natureza processual do cum prim ento das sentenças................. 28718.2 Títulos judiciais.................................................................................... 288

18.3 Reforma introduzida pela Lei n. 11.232/2005............................... 29318.4 Formas de cum prim ento das sentenças ....................................... 295

18.5 Execução provisória e execução definitiva do julgado ................ 29618.6 Competência jurisdicional para o cumprimento

da sentença.............................................................................................. 297

18.7 Liquidação de sentença....................................................................... 29918.7.1 Títulos judiciais ilíqu idos................................................ 30118.7.2 Espécies de liquidação....................................................... 30218.7.3 Liquidação por cá lcu lo s ................................................... 302

18.7.4 Liquidação por a rb itram en to .......................................... 30618.7.5 Liquidação por a r t ig o s ..................................................... 30618.7.6 Recurso cabível na liquidação ........................................ 308

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XIV MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL • DARLAN BARROSO

18.7.7 Liquidação na pendência de re cu rso ............................ 30818.7.8 Citação do devedor na liq u id ação ................................. 309

18.8 C um prim ento de obrigações de quantia c e r ta ............................ 30918.8.1 Efeitos do não-cum prim ento voluntário...................... 312

19 DEFESAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUÇÃO

E O CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS.............................................. 31519.1 Embargos do devedor......................................................................... 316

19.1.1 Origem e defin ição ............................................................ 316

19.1.2 L egitim idade....................................................................... 31819.1.3 Espécies e processamento dos embargos

do devedor........................................................................... 319

19.1.4 Embargos à execução ....................................................... 31919.1.5 Embargos à arrematação e à ad jud icação ................... 327

19.2. Impugnação ao cum prim ento de sentenças................................. 32819.2.1 Definição e processam ento.............................................. 329

19.3 Exceção de pré-executividade............................................................ 33219.4 Embargos de terceiros......................................................................... 336

20 AÇÃO DE EXECUÇÃO DE QUANTIA CERTACONTRA DEVEDOR INSOLVENTE..................................................... 341

20.1 Efeitos da declaração de inso lvência .............................................. 342

20.2 Legitimidade para a p ro p o s itu ra ..................................................... 34320.3 C om petência ......................................................................................... 34320.4 Processamento....................................................................................... 344

20.5 Arrecadação e liqu idação ................................................................... 34520.6 Extinção das obrigações..................................................................... 346

ANEXOS DA PARTE I I ......................................................................................... 349Anexo I - Cum prim ento de sentenças ................................................... 350

Anexo II - Execução de títulos extrajudiciais....................................... 351

BIBLIOGRAFIA....................................................................................................... 353

ÍNDICE REMISSIVO.............................................................................................. 357

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N o t a d o A u t o r a o V o l u m e II

Toda reforma introduzida no Código de Processo Civil nos trouxe a preocupação de elaborar um livro atualizado e com observância da doutrina.

Como sabemos, após a Emenda Constitucional da Refor­ma do Poder Judiciário (EC n. 45/2004), o Processo Civil vem sendo alvo de uma série de reformas, tudo em nome da eficiên­cia do processo e da busca da celeridade, conforme determina o princípio constitucional introduzido pela referida reforma.

A reforma vem a passos lentos alterando o Código de Pro­cesso de forma fragmentada e deixando-o como uma colcha de retalhos. As reformas não pouparam os recursos, o proces­so de execução e algumas partes da teoria geral do processo de conhecimento.

Foram introduzidas neste livro as reformas no sistema re- cursal, em especial as modificações dos agravos contra deci­sões de primeira instância e a súmula impeditiva de recursos. Além disso, o presente trabalho aborda o processo de execu­ção e a nova sistemática do cumprimento da sentença.

x v

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XVI MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

A reforma introduzida no processo de execução nos impôs a dura missão de fracionar parte dos capítulos do volume I e trazê-los para este volume. O volume I, em sua 2a edição, perdeu os capítulos da teo­ria geral dos recursos e dos recursos em espécie para receber os tópi­cos destinados à liquidação e ao cumprimento das sentenças.

O cumprimento dos títulos judiciais passou a fazer parte do capí­tulo próprio destinado à sentença, como foi alterado pela reforma da Lei n. 11.232/2005. Então, passamos os capítulos dos recursos para este segundo volume, na Parte I, ampliando a discussão desse tema tão apaixonante da processualística brasileira.

Nesta obra, na Parte II, também foi abordado o processo de execu­ção, já com as reformas do cumprimento dos títulos judiciais e da exe­cução dos títulos extrajudiciais.

Outro aspecto importante foi a revisão e ampliação das citações das súmulas do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, já que temos verificado que nos Exames de Ordem, nos con­cursos públicos e na própria vida prática do profissional do Direito, as súmulas vêm ganhando grande importância como fonte jurídica.

Procuramos incluir nas notas de rodapé as principais manifestações doutrinária e jurisprudencial sobre cada tópico, além de explicações e comentários suplementares para o entendimento da matéria.

Esperamos que, com este singelo trabalho, nossos alunos e colegas juristas possam se deparar com um manual de Processo Civil claro, ob­jetivo e atual, contendo as posições da jurisprudência e da doutrina processual, no objetivo de garantir uma processualística compromissa­da com a solução eficaz e célere dos conflitos de interesse que atormen­tam o cotidiano dos indivíduos.

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A g r a d e c i m e n t o s

Tantas pessoas passam por minha vida. Algumas deixam um carinho, outras um exemplo de vida ou uma lição eterna.

O carinho, a amizade sincera e o testemunho... são os atributos que carregam todas as pessoas que, em agradeci­mento singelo, quero lembrar sempre em minha vida e por isso são citadas neste trabalho.

Esta obra apenas teve início pelo apoio e impulso dados pela amiga Leda Pereira da Mota (in memoriam). Não consi­go iniciar e terminar um livro sem pensar no carinho que tí­nhamos em nosso convívio. Roberto B. Dias da Silva, meu sócio, amigo e muitas vezes como um irmão, também rne confiou o apoio que foi necessário a esta conquista. Aos dois, nenhum agradecimento seria compatível com aquilo que de fato mereceriam.

Não teria conseguido sem o apoio de Sandra R. Soares Barroso que, com seu carinho e compreensão, demonstrou quão grande é o nosso afeto. Minha mãe, Neide, que foi meu exemplo de vida, com sua determinação e coragem, ao mostrar que eu poderia ser capaz de decidir meu próprio destino. Meu irmão Danilo, sempre companheiro e presente.

Agradeço também à querida professora Margareth Anne Leister que, com sua filosofia, intriga-me e causa a inquie-

XVII

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XVIII MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

tação de tentar buscar o “sentido da vida” em cada dia de sobrevivên­cia neste mundo.

Meus amigos professores Juliana Francisca Lettière, Nehemias Domingos de Mello, Daniela Rosário Rodrigues, Naila Cristina F. Nucci, querida Stella Kuhlmann, e à magnífica Andrea Wild, sou grato pela sin­ceridade dos nossos laços de amizade e coleguismo profissional.

A todos os meus assistentes, com especial gratidão à Daniela Bri- ganó, pela amizade e colaboração na redação e pesquisa dos capítulos destinados à execução de alimentos e defesas contra a execução.

Ao Marco Antonio Araújo Jr, com sua inteligência fascinante, Geysa de Souza e Eila Rae, pessoas especiais em minha existência.

Os sinceros e justos agradecimentos aos amigos da Editora Manole.

Aos meus alunos e ex-alunos, já que sempre serão a motivação dos meus estudos e é com eles que eu aprendo a pensar o processo.

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A b r e v i a t u r a s

§ - parágrafo a.C. - antes de Cristo ac. - acórdãoADC - ação declaratória de constitucionalidadeADI - ação declaratória incidentalADIn - ação direta de inconstitucionalidadeAGU - Advocacia-Geral da UniãoAI - agravo de instrumentoAg. Reg. - agravo regimentalart. - artigoBAASP - Boletim da Associação dos Advogados do Estado de

São Paulo CC - Código Civil cit. - citação, citadoCDC - Código de Defesa do Consumidor CF - Constituição Federal CLT — Consolidação das Leis do Trabalho CNJ - Conselho Nacional de Justiça

XIX

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

CNMP - Conselho Nacional do Ministério PúblicoCPC - Código de Processo CivilCPI - Comissão Parlamentar de Inquéritod.C. - depois de CristoDes. - desembargadorDJ - Diário da Justiça (União)DOE - Diário Oficial do EstadoEAOAB - Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do BrasilEC - emenda constitucionalEDcl - embargos declaratóriosH C - habeas corpusj. - julgado emm.v. - maioria de votosMC - medida cautelar (ação cautelar)Min. - ministro MP - Ministério Público MS - mandado de segurança n. - númeroOAB - Ordem dos Advogados do Brasil ob. - obraop. cit. - na obra anteriormente citada p. - página Pet. - petiçãoRBDP - Revista Brasileira de Direito Processual RDA - Revista de Direito Administrativo RE - recurso extraordinário Rel. — relatorRePro - Revista de Processo (RT)REsp - recurso especialRISTF - Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal RISTJ - Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça RJTJSP - Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de

São PauloRMS - recurso em mandado de segurança ROC - recurso ordinário constitucional RSTJ - Revista do Superior Tribunal de Justiça

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ABREVIATURAS X X I

RT - Revista dos TribunaisRTJ - Revista Trimestral de JurisprudênciaSS - suspensão de segurançaSTF - Supremo Tribunal FederalSTJ — Superior Tribunal de JustiçaSTM - Superior Tribunal MilitarT. - TurmaTFR - Tribunal Federal de RecursosTJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São PauloTRF - Tribunal Regional FederalTRT - Tribunal Regional do TrabalhoTSE - Tribunal Superior EleitoralTST - Tribunal Superior do Trabalhov.u. - votação unânime

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Pa r t e IDOS R E C U R S O S

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T e o r i a G e r a l

d o s R e c u r s o s 1

1. 1 D e f i n i ç ã o d e R e c u r s o

Os recursos são remédios processuais colocados à dispo­sição das partes, do Ministério Público e mesmo do terceiro interessado para a obtenção de um novo julgamento ou uma revisão de um ato judicial, isso por um órgão jurisdicional hierarquicamente superior àquele que proferiu a decisão im­pugnada.1

Os recursos são instrumentos processuais específicos para impugnação de decisões judiciais,2 meios de se obter a revisão de um ato jurisdicional; reapreciação esta que será realizada por órgão jurisdicional colegiado e que esteja acima daquele que proferiu o ato.

Da sabedoria de Barbosa Moreira,3 entende-se como re­curso:

' Nelson Nery Junior, Princípios fundamentais: teoria gerai dos recursos, p. 177.2 Emane Fidélis dos Santos, Manuai de direito processual civil, p. 557.3 Comentários ao Código de Processo Civil, p. 231.

3

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

O remédio voluntário idôneo a ensejar, dentro do mesmo processo,

a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou a integração de decisão

judicial que se impugna.

Os recursos são interpostos dentro do mesmo processo em que se encontra o ato jurisdicional impugnado; como regra, não ensejam a for­mação de novo processo ou de outra ação. Por essa razão, podemos afir­mar que os recursos não têm natureza de ação. Não se trata de uma nova ação autônoma, mas sim de uma extensão do direito de ação do autor e do direito de defesa do réu já praticados no processo em que atuam.4

De fato, o Código de Processo Civil não concebeu os recursos co­mo ações autônomas, mas como verdadeiros incidentes processuais destinados à impugnação de atos judiciais.

Assim, podemos afirmar que os recursos no Processo Civil brasi­leiro possuem as seguintes características:

a) Remédio incidental. Os recursos são interpostos em processos em curso (conhecimento, cautelar ou de execução), sem que tenha ocor­rido o trânsito em julgado. A existência do trânsito em julgado impe­de a interposição de qualquer recurso (preclusão máxima). Como tratamos anteriormente, os recursos não representam direito de ação, mas sim de um ato ou remédio inserto em uma ação em curso.

b) Ato voluntário. Os recursos dependem de provocação da parte interessada (sucumbente), do Ministério Público ou de terceiro prejudicado. O direito de impugnação do ato judicial é faculdade dos sujeitos anteriormente mencionados, que, portanto, podem abrir mão desse direito (admitindo a desistência ou a renúncia). Por se tratar de ato voluntário, podemos afirmar que não existe recurso ex officio.5

4 Gilson Delgado Miranda & Patrícia Miranda Pizzol, Processo civil: recursos, p. 21, cor­roborados pelos entendimentos de Liebman, Carnelutti, José Frederico Marques, Nelson Nery Junior, Antonio Carlos Marcato, Barbosa Moreira, Humberto Theodoro Júnior, Vicente Greco Filho e Nelson Luiz Pinto, explicam que a natureza jurídica dos recursos é de uma extensão do direito de ação, opondo-se à corrente doutrinária exposta por Betti, que concebia o recur­so como uma verdadeira ação autônoma.

5 A previsão contida no art. 475 do CPC, o que anteriormente a doutrina denominava de recurso de ofício, como se verá no tópico próprio, não constitui modalidade de recurso, mas, tão somente, uma condição de eficácia de determinadas sentenças.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

c) Duplo grau de jurisdição. Como regra, os recursos são julgados por ór­gão hierarquicamente superior àquele que proferiu o ato impugnado.

d) Objeto de reforma ou anulação. Os recursos possuem como obje­tivo a obtenção da reforma ou a anulação do ato judicial recorri­do. Os recursos terão como fundamento a existência de um erro judicial, seja ele em relação à forma (erro in procedendo), ou, ain­da, no conteúdo da decisão (erro in judicando). Quando se tratar de erro in procedendo, o recurso terá como pedido a anulação do ato judicial; por outro lado, sendo o erro in judicando, o pedido recursal será de reforma.

e) Garantia do contraditório. Interposto um recurso, a regra é no sentido de ser dada oportunidade à parte contrária para exercer o contraditório ao pedido de reforma ou anulação do ato judicial (contra-razões ou contra-minuta).

O direito de recorrer decorre da Constituição da República como uma conseqüência da garantia de ampla defesa e do devido processo legal:

LV - aos litigantes, em processo jud ic ia l ou adm in is tra tivo , e aos

acusados em geral são assegurados o co n tra d itó rio e am pla de fe ­

sa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Em simples palavras, a Constituição concebe os recursos como conseqüência do direito de ampla defesa. Na verdade, os recursos são meios de defesa contra os atos dos magistrados, integrando a garantia do devido processo legal.

Assim, da simples leitura do dispositivo transcrito, pode-se concluir que o princípio do duplo grau de jurisdição, pelo qual se possibilita o reexame dos atos jurisdicionais, é direito individual consagrado na Carta Maior6 e integra o direito de amplo acesso ao Poder Judiciário.

6 Não comungamos com as manifestações doutrinárias que afirmam tratar-se de um princípio implícito na Constituição (ou seja, que não está previsto expressamente). A simples leitura do art. 5o, LV, da Carta Maior leva à conclusão de que está expressa na Constituição, como conseqüência da ampla defesa, a garantia de duplo grau de jurisdição. A garantia recursal está na Constituição, ficando a regulamentação desse exercício a cargo das leis infra- constitucionais. Além disso, a Constituição organizou o Poder Judiciário em graus de jurisdi­ção, inclusive outorgando, aos diversos órgãos superiores, competências recursais.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

E mais, ao estruturar o Poder Judiciário, a Constituição da Repú­blica o fez em graus de hierarquia, isso, justamente, para permitir a existência de órgãos de primeira instância, segunda instância e tribu­nais superiores, a fim de que os órgãos superiores possam, dentre ou­tras competências, rever os atos dos inferiores.

Dizer tratar-se o duplo grau de jurisdição de um direito funda­mental da Constituição da República, não importa em afirmar ser ele um direito irrestrito ou ilimitado.

Na realidade, com a utilização de expressão ampla ou geral - re­cursos - , a Constituição limitou-se a garantir o duplo grau de jurisdi­ção como extensão do direito de ampla defesa contra os atos judiciais, como meio de preservar o devido processo legal, mas deixa para a le­gislação processual a definição de quais meios podem ser utilizados pelas partes ou interessados na revisão da decisão.7

A própria Constituição, em seus arts. 102 e 105, delimita requisi­tos e restrições para o cabimento dos recursos ordinário, especial e extraordinário. Além disso, é a legislação processual a competente para regular a existência, requisitos, formas e atribuições para o processa­mento dos recursos contra as decisões judiciais, sendo certo que a ga­rantia de duplo grau de jurisdição não é ilimitada em nosso ordena­mento jurídico.8

Não obstante essa possibilidade de restrição do duplo grau de ju ­risdição, criação de requisitos e condições de admissibilidade pelas nor­

7 Pela tradicional classificação idealizada por José Afonso da Silva, podemos afirmar tra­tar-se de uma norma constitucional de eficácia contida. A esse respeito, e com base na dou­trina do referido autor, Roberto Baptista Dias da Silva (A remissão para exclusão do processo como direito dos adolescentes: uma interpretação conforme a Constituição, p. 28) cita: "As normas de eficácia contida seriam caracterizadas por também terem condições de produzir todos os efeitos desde logo - como as de eficácia plena - , mas possibilitariam a restrição de sua incidência por parte da competência discricionária do Poder Público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nelas enunciados” [grifo do autor],

8 "Os princípios constitucionais que garantem o livre acesso ao Poder Judiciário, o con­traditório e a ampla defesa, não são absolutos e hão de ser exercidos, pelos jurisdicionados, por meio das normas processuais que regem a matéria, não se constituindo negativa de pres­tação jurisdicional e cerceamento de defesa a inadmissão de recurso quando não observados os procedimentos estatuídos nas normas instrumentais.” (STF, Tribunal Pleno, Ag. n. 152.676/PR, rel. Min. Maurício Corrêa, j. 03.11.1995)

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

mas infraconstitucionais, entendemos que o direito ao recurso sempre deverá existir no processo, sob pena de ser tida por inconstitucional a lei que vedar a possibilidade de recurso, por violar a ampla defesa.

Deve ser assegurado no processo um mínimo de duplo grau de jurisdição. Não falamos em admissão de infinitas vias recursais - que, muitas vezes, são utilizadas para a procrastinação - mas que se preser­ve sempre a possibilidade de um recurso contra a decisão judicial. A supressão total de recursos no processo seria absolutamente inconsti­tucional.

A previsão do duplo grau de jurisdição tem como principal razão de existência no ordenamento brasileiro o próprio espírito do Estado de Direito, que tem verdadeira aversão aos atos de arbitrariedade, ao desmando, aos atos despóticos ou abuso de poder, ou à prevalência da vontade do agente sobre a vontade suprema da lei.

A inexistência do duplo grau de jurisdição permitiria todo e qual­quer desmando por parte dos magistrados, pois estariam eles certos de que seus atos não seriam revistos, com a sensação de que poderiam fazer a sua vontade pessoal e de seus interesses ao arrepio da vontade da lei. Evidentemente, saber que a decisão poderá ser reapreciada por ór­gão hierarquicamente superior conduz o magistrado à aplicação da boa justiça, à aplicação correta da lei.

Como bem conhecemos do ditado popular, o ser humano é abso­lutamente passível de erros, e, mesmo sem o dolo, poderá o magistra­do equivocar-se ao aplicar a lei ao caso concreto. Assim, a garantia de duplo grau de jurisdição é mecanismo para assegurar a boa justiça.9

Além disso, é próprio da natureza humana o inconformismo con­tra atos que lhe causem gravame e dificilmente aceita a primeira deci­são prejudicial que lhe é imposta. O desejo de recorrer, de ter uma segunda opinião ou chance, de obter uma revisão de um ato também passível de erro é da própria natureza humana.

A esse respeito, Humberto Theodoro Júnior, citando Gabriel Re­zende Filho, ensina:10

9 Nelson Nery Júnior, Príncípios fundamentais: teoria gera! dos recursos, p. 39.10 Curso de direito processual civil, p. 488.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Numa síntese feliz, o mesmo processualista resume a origem dos

recursos processuais em duas razões: 'a) a reação natural do homem, que

não se sujeita a um único ju lgam ento; b) a possibilidade de erro ou má-

fé do ju lgado'.

Muito se ouve falar de que os recursos são os responsáveis pela demora da prestação jurisdicional, de que existem muitos recursos no sistema processual vigente e que podem ser utilizados, pela parte ven­cida, como meio de protelar o processo.

Na realidade, pensamos que não se deve restringir o acesso recur- sal, pois justiça rápida nem sempre eqüivale à boa justiça. Mais vale a possibilidade de recurso contra todos os atos jurisdicionais, do que se permitir o erro judiciário pela equivocada compreensão dos fatos e/ou aplicação do direito ao caso concreto, ou corrupção dos profissionais do direito (advogados, promotores, magistrados, etc.), gerando a sensa­ção ao jurisdicionado de que foi injustiçado no Poder Judiciário pelo fato de sua decisão não poder ser revista por órgão superior. Acredita­mos que não será com a redução do cabimento dos recursos que se ob­terá efetividade na prestação jurisdicional, mas sim com a ampliação do acesso à justiça e da sua estrutura, para que possa ser aliviada da atual calamidade em que se encontra pelo volume de feitos em trâmite.

1.2 Pr i n c íp i o s Ge r a i s dos Re c u r s o s

Como todos os institutos do direito, os recursos também se sub­metem a princípios próprios, os quais podemos citar:

m 1.2.1 P r i n c í p i o d a Ta x a t i v i d a d e

Por esse princípio, entende-se que todas as espécies de recursos de­vem estar previstas na lei processual, ou seja, apenas será recurso o meio previsto no rol do art. 496 do Código de Processo Civil ou em legislação extravagante própria, sendo vedadas às partes a utilização ou a criação de recursos que não estejam legalmente previstos.

O Código de Processo Civil, em seu art. 496, de forma taxativa, prevê os seguintes recursos: I - apelação; II - agravo (mais adiante o

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

Código enumera diversas modalidades de agravos); III - embargos in- fringentes; IV - embargos de declaração; V - recurso ordinário; VI - recurso especial; VII - recurso extraordinário; VIII - embargos de di­vergência.

Não obstante o Código de Processo Civil, podemos citar os se­guintes recursos previstos na legislação extravagante: a) recurso contra sentença nos Juizados Especiais (art. 41 da Lei n. 9.099/95); b) embar­gos infringentes na execução fiscal (art. 34 da Lei n. 6.830/80).

Portanto, é certo afirmar que o rol com as espécies de recursos pre­visto no art. 496 e na legislação extravagante é absolutamente taxativo, não sendo consideradas como recurso as demais práticas que também são utilizadas para a impugnação ou revisão de atos jurisdicionais, como, por exemplo, os agravos regimentais (previstos nos regimentos internos), o pedido de reconsideração, o mandado de segurança, o “recurso” adesivo, a remessa obrigatória ou “recurso” de ofício e a cor­rei ção parcial, de que trataremos adiante (sucedâneos recursais).

H 1 .2.2 SINGULARIDADE

Por esse princípio, também conhecido por princípio da unirrecor- ribilidade, entende-se que, para cada espécie de decisão judicial, ape­nas é cabível uma única espécie de recurso.

A lei processual prevê um recurso adequado e próprio para cada tipo de ato judicial, devendo o recorrente valer-se do meio previsto para impugnar o ato jurisdicional atacado. A regra é no sentido de que não se admite a interposição de mais de um recurso para impugnar um único ato jurisdicional.

Tal princípio, porém, sofre algumas exceções, como nos recursos especial e extraordinário, que, como veremos em tópico próprio, podem ser interpostos contra o mesmo ato jurisdicional, cada qual para impugnar determinado vício do acórdão.

■■ 1 .2.3 FUNGIBILIDADE

Como mencionamos anteriormente, para cada espécie de ato ju ­risdicional, como regra, apenas haverá um único recurso adequado e cabível; portanto, para que o recorrente tenha seu inconformismo

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

conhecido pelo tribunal, deve interpor o recurso apropriado à impug­nação.

No entanto, em algumas situações, a parte poderá ter dúvida acer­ca da adequação recursal.

O art. 810 do Código de Processo Civil de 1939 concebia que a parte não seria prejudicada quando da interposição de um recurso no lugar de outro, desde que não houvesse má-fé ou erro grosseiro.

De fato, no sentido processual, a fungibilidade consiste na possibi­lidade de substituição de um ato por outro, a aceitação de uma coisa no lugar de outra entendida como sendo a correta. Dessa forma, a fun­gibilidade recursal pode ser entendida como a admissão de um recur­so, entendido como não correto, no lugar do meio entendido como adequado pelo órgão julgador.

A redação do Código atual não contemplou expressamente o prin­cípio da fungibilidade.

A justificativa para a supressão do comando contido no art. 810 do Código revogado foi a de que o Código atual contém um sistema re­cursal muito simplificado, sistema este que não permite a dúvida sobre qual recurso é cabível a cada espécie de ato jurisdicional, ao contrário do que ocorria com o Código de Processo Civil de 1939.

Mas tal impressão de simplicidade no sistema recursal era apenas ilusão do legislador. Na realidade, o Código em vigor contém inúme­ros casos em que ainda podemos encontrar dúvida objetiva sobre o cabimento e a adequação do recurso.

É o caso, por exemplo, do ato jurisdicional que extingue de plano a ação reconvencional. A princípio, estamos diante de uma sentença, já que põe fim à relação jurídica processual. Mas ela também pode ser entendida como uma decisão interlocutória, pelo fato de que o proces­so terá seu curso continuado para o julgamento da ação principal.

No processo de execução contra devedor insolvente, também vis­lumbramos inúmeros momentos em que a lei denomina de sentença atos que, na realidade, são tipicamente decisões interlocutórias.

Outro exemplo é o do art. 395 do Código de Processo Civil, que afirma ser sentença o ato que decide o incidente de falsidade, quando, na verdade, essa decisão muito mais se assemelha a uma decisão inter­locutória, pelo fato de ser o ato jurisdicional que aprecia questão in­

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

cidente do processo. O mesmo podemos dizer do ato que julga o incidente de impugnação à concessão da justiça gratuita. Como se lê na Lei n. 1.060/50, é ato denominado de sentença (art. 17), mas, pelo disposto no art. 162 do Código de Processo Civil, tem natureza de decisão interlocutória por ser julgamento de questão incidental.

Como se vê, mesmo no atual Código de Processo Civil vislumbra­mos situações em que a parte terá dificuldade em determinar qual o recurso adequado. Em muitos casos, nem mesmo a jurisprudência e a doutrina são pacíficas em relação ao recurso apropriado ao ato juris- dicional. Por essa razão é que, mesmo sem previsão legal expressa, a doutrina e a jurisprudência vêm admitindo a aplicabilidade do princí­pio da fungibilidade no sistema recursal vigente; princípio pelo qual o recorrente não será prejudicado pela interposição de um recurso no lugar de outro quando houver dúvida objetiva sobre a espécie de re­curso cabível.

Requisitos para admissão da fungibilidade

O primeiro requisito para a aplicação do princípio da fungibilida­de - que entendemos ser essencial - é a inexistência de erro grosseiro na verificação do cabimento do recurso.

O erro grosseiro é afastado pela existência de dúvida objetiva quan­to ao cabimento do recurso, ou seja, quando, pela natureza do ato jurisdicional (pela definição contida no art. 162 do CPC), o recorren­te não tiver certeza de qual recurso é o apropriado à impugnação do referido ato jurisdicional. Por outro lado, sendo claro o recurso cabível (não havendo dúvida), ocorrerá erro grosseiro na prática forense, o que desautoriza a incidência do presente recurso."

" Nos Encontros Nacionais dos Tribunais de Alçada, foram extraídas as seguintes orien­tações:

VI ENTA 55: "Admite-se a fungibilidade dos recursos desde que inocorrente o erro gros­seiro. Inexiste este quando há acentuada divergência doutrinário-jurisprudencial sobre qual seria o recurso próprio".

V ENTA 1: “Continua vigorante em nosso ordenamento processual civil o princípio da fungibilidade dos recursos, inaplicável, todavia, em caso de erro grosseiro e excesso do prazo previsto para o recurso cabível".

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

A esse respeito, Nelson Nery Júnior12 comenta que existem as se­guintes possibilidades de dúvidas objetivas no processo civil: a) a lei processual designa uma típica decisão interlocutória como sendo sen­tença, ou vice-versa; b) há divergência entre a doutrina e a jurispru­dência quanto à classificação de certos atos; c) o magistrado profere um ato jurisdicional no lugar de outro.

Além da necessidade de haver dúvida objetiva sobre o cabimento e a adequação do recurso, também se impõe que não se verifique má- fé da parte recorrente, já que, constatada a intenção da parte em pro- crastinar o feito com a interposição de recursos impróprios, não pode­rá ser aplicado o princípio da fungibilidade.

Por fim, a jurisprudência tem entendido que apenas será possível a aplicação do princípio da fungibilidade quando o recurso tiver sido in­terposto dentro do prazo daquele que seria o correto,13 pois, não se fazendo assim, terá ocorrido a preclusão para a interposição do recurso.

Mesmo em sentido contrário à jurisprudência dominante, enten­demos que tal requisito para a aplicação da fungibilidade recursal - ter sido interposto no prazo do recurso correto - é totalmente desneces­sário, já que, se a parte tinha conhecimento do recurso correto, não teria ela interposto o recurso errado a ponto de necessitar da fungibi­lidade recursal.

Nesse sentido, o professor Nelson Nery Júnior ensina que:14

A regra da fungib ilidade é ditada no interesse da parte, que não se­

rá prejudicada pela interposição errônea de um recurso por outro, quan-

12 Princípios fundamentais: teoria gerai dos recursos, p. 119.13 "Processual civil. Fungibilidade recursal. O princípio da instrumentalidade das formas,

aplicado à teoria geral dos recursos, induz a que se aplique a fungibilidade recursal desde que o recurso erroneamente interposto não importe em erro grosseiro, que haja dúvida objetiva quanto ao recurso pertinente, e que tenha sido lançado dentro do prazo daquele que seria o correto." (STJ, 4a T., REsp n. 151.668/SP, rel. Min. César Asfor Rocha, j. 29.06.2000, v.u.)

"Protesto contra alienação de bens. Deferimento em parte. Negativa quanto à expedi­ção de ofício para fins de averbação do protesto no registro imobiliário. Recurso cabível. Prin­cípio da fungibilidade recursal. Havendo dúvida objetiva a respeito do cabimento do recurso e tendo sido ele interposto no prazo do apelo tido como apropriado, aplica-se o princípio da fungibilidade recursal. Recurso especial conhecido e provido." (STJ, 4a T., REsp n. 86.129/MG, rel. Min. Barros Monteiro, j. 05.06.2001, v.u.)

Princípios fundamentais: teoria gera! dos recursos, p. 142.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

do houver fundada dúvida sobre o cabim ento do meio de impugnação.

Se o recorrente, convicto de que o recurso correto seria o de apelação, o

interpõe no 15o dia, por que retirar-lhe o d ire ito de assim proceder, sub-

traindo-se-lhe um terço do prazo, a pretexto de que o recurso correto se­

ria o de agravo? Em havendo os pressupostos para a aferição da dúvida

objetiva, ou da inexistência de erro grosseiro, o prazo nos afigura absolu­

tamente irrelevante. O recorrente deve, isto sim, observar o prazo do recur­

so efetivamente interposto havido por ele como correto para a espécie.

Outro aspecto que poderia gerar “resistência” à aplicação da fun­gibilidade recursal seria o argumento da diversidade de formas entre os recursos. Contudo, a diversidade de formas entre os recursos não afasta a aplicação da fungibilidade.

Nesse sentido, Marcus Vinicius Rios Gonçalves, ao abordar o pro­cedimento para a aplicação da fungibilidade, explica:15

A nova sistemática do agravo de instrumento, com a interposição

diretamente no órgão ad quem, trouxe dificuldades práticas para a apli­

cação do princípio da fungibilidade, mas não a inviabilizou.

Cumpre examinar todas as possibilidades. É possível que a parte

apele, e que o juízo a quo entenda que o correto era o agravo. Ele deve

determ inar que o agravo seja preparado e instruído com as peças neces­

sárias, e com aquelas que a parte queira juntar, e, fo rm ado o instrumen­

to, fará a remessa ao órgão ad quem. Caso o tribunal entenda, porém,

que a parte estava com razão, e que o recurso era mesmo de apelação,

o relator requisitará os autos ao juízo de origem, para que possa proce­

der ao ju lgam ento.

Caso a parte agrave, e o relator entenda que o cabível era apelação,

restituirá o instrum ento à primeira instância, para que o processo seja jun ­

tado aos autos, e processado como tal.

Como se vê, a aplicação do princípio da fungibilidade, apesar de depender de um esforço extraordinário e boa vontade por parte dos magistrados, é princípio que prestigia a boa-fé, a instrumentalidade

IS Novo curso de direito processual civil, v. II, p. 71.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

das formas, a economia processual, a prevalência do duplo grau de jurisdição e, principalmente, o afastamento da injustiça de prejudi­car a parte em razão da existência de dúvida objetiva quanto ao cabi­mento do recurso.

m 1 .2 .4 P r i n c í p i o d a v e d a ç ã o

DE REFORM ATIO IN P E JU S

A regra é no sentido de o julgamento dos recursos pelos Tribunais observar os limites da impugnação do recorrente, não sendo possível a prolação de nova decisão que seja mais gravosa do que aquela que se está impugnando.

Imaginemos que o réu tenha sido condenado ao pagamento de indenização no valor equivalente a 100 salários mínimos. Inconforma­do com a sentença, dela interpõe recurso de apelação, pleiteando a reforma da referida sentença para que não pague qualquer valor ou para que este seja diminuído. Nesse caso, por exemplo, não poderá o tribunal aumentar a condenação do réu; não é possível que no julga­mento do recurso interposto pela própria parte16 seja imposto a ela gravame maior do que aquele já contido no ato impugnado.

Em simples palavras, o próprio recorrente não poderá receber em seu inconformismo decisão mais gravosa do que a decisão de que se requer a revisão.17

Essa regra, no entanto, pode ser excepcionada quando se tratar de matéria de ordem pública. Em questões relativas às condições da ação, a pressupostos processuais ou aos requisitos de admissibilidade dos recursos,18 o tribunal poderá proferir um julgamento prejudicial à

16 Obviamente, caso ambas as partes interponham recurso, poderá haver aumento da condenação.

17 "Execução. Juros. Reformado in pejus. Multa. Súmula n. 13 da Corte. Procedentes. 1. Não pode o Tribunal, sem recurso da parte interessada, decidir contra o apelante, no caso, para reduzir a taxa de juros contratada, configurando tal julgado verdadeira reformatio in pejus, não autorizada pelo direito positivo brasileiro." (STJ, 3a T., REsp n. 210.625/MG, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 04.05.2000, v.u.)

18 Gilson Delgado Miranda & Patrícia Miranda Pizzol, Processo civil: recursos, p. 27.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

parte recorrente, já que tais matérias podem ser conhecidas de ofício e em qualquer grau de jurisdição.19

Seria o caso de, em primeira instância, o juiz ter condenado o réu ao pagamento da quantia equivalente a dez salários mínimos. Todavia, inconformado com a procedência parcial, o autor apela da sentença para obter a elevação da condenação, mantendo-se o réu conformado com sua condenação (não recorre). Por sua vez, o tribunal entende que o autor é parte ilegítima para a ação e acaba por extinguir o processo sem o julgamento do mérito (cancelando a condenação que o autor ti­nha em seu favor).

Ora, nesse caso não se poderia dizer que houve reformatio in pejus? De fato ocorreu reforma prejudicial ao recorrente, mas, por se tratar de questão de ordem pública, pode ser conhecida a qualquer momento e independentemente de provocação da parte.

1.3 Pr e s s u p o s t o s Ge r a i s dos Re c u r s o s

O exercício do duplo grau de jurisdição depende do implemento dos pressupostos subjetivos, compreendendo aqueles que estão ligados aos sujeitos da ação e outros de natureza objetiva, que são relativos ao próprio processo.20

19 “ Previdenciário e processual civil. Auxílio-acidente. Matéria de ordem pública. Per­centual. Correção de ofício. Tribunal. Possibilidade. Reformatio in pejus. Inocorrência. I - 0 benefício do auxílio-acidente, por tratar-se de matéria de ordem pública, pode ser corrigido pelo Tribunal, quando o juiz aplica percentual diverso daquele determinado em lei, mesmo em duplo grau obrigatório, não ocorrendo, no caso, reformatio in pejus." (STJ, 5a T., REsp n. 324.188/SP, rel. Min. Gilson Dipp, j. 13.11.2001, v.u.)

20 Classificação apresentada por Moacyr Amaral Santos e José Frederico Marques. Por sua vez, José Carlos Barbosa Moreira [O novo processo civil brasileiro, p. 117) adota a clas­sificação de pressupostos intrínsecos, relativos à existência do direito de recorrer (cabimento, legitimação, interesse e inexistência de fato impeditivo), e requisitos extrínsecos, concernen­tes ao exercício do direito de recorrer (tempestividade, regularidade formal, preparo). De qualquer forma, mesmo considerando as diversas classificações, os pressupostos são seme­lhantes.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

m 1 . 3 . 1 S u b j e t i v o s

São pressupostos subjetivos o interesse e a legitimidade para recor­rer, requisitos estes que não se confundem.

O interesse consiste na necessidade da parte, terceiro ou Ministério Público de obter a reforma ou invalidade do ato jurisdicional impugnado. Para a parte ou terceiro, apenas existe interesse na interposição de um recurso quando o ato lhe acarreta algum prejuízo jurídico, ou seja, quan­do a parte for sucumbente.21 O interesse recursal se justifica quando a par­te não extraiu do ato judicial impugnado tudo aquilo que poderia obter.

A legitimidade, por sua vez, compreende o vínculo entre o recor­rente e a relação jurídica processual. A esse respeito, o art. 499 do Códi­go de Processo Civil determina que estão legitimados à interposição de recursos as partes que integram o processo (autor, réu e terceiros ad­mitidos no processo como parte), o terceiro interessado (pessoa estra­nha à lide e que tenha sofrido prejuízo em razão do ato jurisdicional, demonstrando tal gravame) e o Ministério Público nos processos em que figura como fiscal da lei ou quando for parte.

■ i 1 . 3 . 2 O b j e t i v o s

a) Recorribilidade. A decisão deve comportar a interposição de re­curso.22

Por força de expressa previsão legal (art. 504 do CPC), apenas são passíveis de recursos as decisões interlocutórias, as sentenças e os acórdãos, não havendo possibilidade de interposição de qual­quer recurso contra os despachos de mero expediente.

Evidentemente, mesmo que a lei permitisse a recorribilidade dos despachos, dificilmente a parte teria interesse em sua interpo­sição, já que os despachos ordinatórios, como regra, não geram

21 O réu tem interesse em recorrer quando a ação foi extinta sem o julgamento do méri­to, já que pode pretender obter uma sentença de improcedência contra o autor, com julga­mento do mérito, o que impediria a propositura de nova ação idêntica. Da mesma forma, tem o Ministério Público interesse no recurso em ação civil pública para o fim de obter a declara­ção na parte dispositiva da sentença de que a ação foi julgada improcedente em razão da falta de provas, isso para que a ação possa ser proposta novamente e impeça a coisa julgada.

22 Encontra-se em tramitação no Congresso Nacional Projeto de Lei para limitar o cabi­mento dos recursos nos casos em que a ação estiver incluída dentre as competências do Jui­zado Especial. O texto acrescenta um parágrafo único ao art. 496 do Código de Processo Civil.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS 1 7

prejuízos às partes (caso isso ocorra, será considerado decisão in- terlocutória, e não despacho).

b) Tempestividade (art. 506 do CPC). Os recursos devem ser inter­postos dentro do prazo fixado na lei processual, sob pena de pre- clusão temporal.

Os recursos de apelação, embargos infringentes, recursos ex­traordinário, ordinário e especial são interpostos no prazo de 15 dias; os agravos internos (que serão julgados pelo próprio Tribu­nal que proferiu a decisão) serão interpostos no prazo de 5 dias; os agravos externos (julgados por outro órgão jurisdicional: agravo retido, de instrumento e agravo contra decisão denegatória de re­curso especial ou extraordinário), no prazo de 10 dias; e os embar­gos de declaração, no prazo de 5 dias. Os prazos para a resposta da parte contrária são idênticos àqueles previstos para a interposição dos recursos.

A contagem do prazo para a interposição dos recursos observa a regra comum prevista nos arts. 177 e seguintes do Código de Processo Civil, ressaltando-se que as Fazendas Públicas e o Minis­tério Público gozam de prazo em dobro para a interposição de qualquer recurso, bem como os litisconsortes representados por procuradores diferentes (arts. 188 e 191 do CPC).

Por outro lado, dispõe o art. 506 do Código de Processo Civil os termos iniciais de contagem dos prazos para a interposição dos recursos. Em síntese, podemos dizer que tem início o prazo para o recurso a partir:

a) da leitura da sentença em audiência (quando a sentença é pro­ferida em audiência e saem as partes intimadas desse ato juris­dicional);

b) da intimação das partes da decisão ou sentença, quando não forem publicadas em audiência;

c) da publicação do dispositivo23 do acórdão no órgão oficial.

73 Redação dada pela Lei n. 11.276/2005. No texto anterior constava súmula do acór­dão.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Com efeito, dentro do prazo legal, o recurso deverá ser apre­sentado em cartório ou na forma estabelecida pelas normas de organização judiciária (ou do tribunal), nos termos do parágrafo único do art. 506 do Código de Processo Civil.

c) Adequação ou singularidade. Como afirmamos anteriormente, para cada espécie de ato judicial, considerando a classificação con­tida no art. 162 do Código de Processo Civil - decisão interlocu- tória, sentença e acórdão - , existe apenas um único recurso cabí­vel, devendo a parte optar pelo recurso que for adequado ao ato impugnado.

d) Preparo (art. 511 do CPC). No momento da interposição do re­curso deverá a parte comprovar o recolhimento do preparo relati­vo ao exercício do duplo grau de jurisdição. O preparo poderá in­cluir custas (taxa judiciária) e os portes de remessa e de retorno, estes cabíveis quando os autos tiverem de se deslocar para fora do juízo. Na verdade, o porte representa o pagamento das despesas com o mero deslocamento do processo.

Ressalte-se que a questão relativa ao preparo não é única para todo o território nacional e entre os diversos órgãos de jurisdição. No âmbito das justiças dos estados,2'1 cada ente da Federação tem o poder de editar suas normas locais fixando a existência e o valor do preparo. Já em relação aos órgãos federalizados (tribunais regionais federais, Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Fede­ral), cada um deles acaba editando atos internos (regimentos, pro­vimentos ou resoluções) para a criação e alteração dos valores devi­dos a título de custas judiciais, inclusive para o preparo recursal.

Assim, havendo a imposição do preparo, a sua ausência quan­do da interposição do recurso gerará a deserção.

Mas o próprio art. 511 ressalva a imposição imediata da deser­ção quando o recolhimento do preparo tiver sido insuficiente (a menor); nessa hipótese, deverá o magistrado intimar o recorren­te para que apresente a complementação ao preparo, no prazo de

24 No Estado de São Paulo, a matéria está disciplinada pela Lei n. 11.608/2003.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

5 dias, sob pena de deserção. Antes de aplicar a deserção é dever do magistrado a intimação da parte para a complementação do preparo.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ao interpre­tar o referido art. 511 do Código de Processo Civil no sentido de que, caso o recorrente recolha as custas mas deixe de efetuar o pagamento dos portes, é hipótese que impõe ao magistrado o de­ver de conceder à parte o prazo legal para a complementação, não podendo decretar a deserção de plano.25

Por outro lado, cumpre destacar que estão liberados do reco­lhimento do preparo o Ministério Público, as pessoas jurídicas de Direito Público (União, Estados, Municípios e autarquias), bem como a parte beneficiada pela gratuidade processual (Lei n. 1.060/50).

e) Motivação. A interposição do recurso deve acompanhar a apresen­tação das razões que justificam o pedido de reforma ou invalida­ção da decisão impugnada. Não basta à parte dizer que não se con­forma com o ato jurisdicional; ela deve, também, apresentar os motivos de fato e de direito pelos quais entende necessária a revi­são do julgado.

O dever de fundamentação dos recursos também se justifica para permitir à parte recorrida que exerça o direito de contraditó­rio em razão do inconformismo levado aos autos.

f) Forma. Quando da interposição do recurso, a parte deverá obser­var a forma prevista na lei para aquela espécie de impugnação.

25 "Processual civil. Preparo. Porte de remessa e retorno. Não recolhimento. Caso de in­suficiência. Complementação subseqüentemente efetuada. CPC, art. 511. Exegese. Segundo fundamento inatacado no recurso especial. Incidência da Súmula n. 283-C, STF. I. A orienta­ção jurisprudencial mais recente da Turma é no sentido de que o porte de remessa e retorno integra o preparo do recurso, de sorte que o seu não recolhimento não autoriza de logo a apli­cação da pena de deserção, constituindo mera hipótese de insuficiência, que pode ser suprida a posteriori, como na espécie ocorreu. II. Ressalva do ponto de vista do relator. III. Fundamen­tação alusiva à aplicação da Lei n. 9.289/96 inatacada pela recorrente, atraindo o óbice da Súmula n. 283-C. STF. IV. Recurso especial não conhecido." (STJ, REsp n. 585.537/RS, rel. Min. Aldair Passarinho Junior, j. 04.08.2005, v.u.)

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2 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Note-se que cada modalidade de recurso tem uma forma procedi­mental e requisitos específicos, o que trataremos nos capítulos de cada modalidade recursal.

1 . 4 J u í z o d e A d m i s s i b i l i d a d e

e J u í z o d e M é r i t o R e c u r s a i s

A interposição de qualquer recurso impõe ao Poder Judiciário dois julgamentos distintos: a) o juízo de admissibilidade; b) a apreciação do mérito do recurso.

O juízo de admissibilidade compreende, como regra, a verificação, pelo órgão que recebe o recurso (a quo) e por aquele que detém compe­tência para julgá-lo (ad quem), da existência ou não dos pressupostos objetivos e subjetivos gerais para a interposição de qualquer recurso, bem como dos requisitos específicos da espécie de recurso utilizado.

A competência para o juízo de admissibilidade, na maioria das vezes, é outorgada tanto ao órgão recorrido, nas hipóteses em que o recurso é interposto nesse grau de jurisdição (como ocorre com a ape­lação), como também ao tribunal (juízo ad quem). No entanto, a últi­ma e definitiva manifestação acerca da admissibilidade do recurso será sempre do tribunal. O juízo a quo realiza juízo de admissibilidade como meio de economia processual, mas trata-se de um juízo precário, já que a manifestação final será do órgão ad quem.

Assim, podemos dizer que o juízo positivo do órgão a quo não impede que o tribunal profira, posteriormente, um juízo de admissibi­lidade negativo.

Por exemplo, quando da interposição do recurso de apelação, o magistrado de primeira instância (a quem compete receber esse recur­so) verificou o preenchimento de todos os pressupostos de admissibi­lidade e, conseqüentemente, determinou a remessa dos autos ao tribu­nal. Por sua vez, o tribunal constatou que o recurso fora interposto fora do prazo legal e acabou por declarar a sua intempestividade, sem que o juízo anterior vinculasse o tribunal competente para o julga­mento do mérito do recurso.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

O juízo de admissibilidade sempre terá por conteúdo uma decla­ração26 sobre os pressupostos recursais, sendo esse juízo positivo equi­valente à afirmação de que estão presentes todos os requisitos que per­mitem a apreciação do mérito do recurso. Em caso contrário, havendo juízo negativo de admissibilidade, o mérito do recurso não será conhe­cido pelo tribunal.

Ressalte-se que, como regra,27 o preenchim ento dos pressupos­tos recursais é questão de ordem pública para o processo e, p o r tan ­to, pode ser conhecido de ofício pelo juízo recorrido ou pelo tr ib u ­nal, e, ainda, esse juízo de admissibilidade pode ser realizado a qualquer tem po duran te o trâm ite do recurso, não se sujeitando à preclusão.28

Por outro lado, quando admitido o recurso (positivo o juízo de ad­missibilidade), será ele levado a julgamento de seu mérito, de seu con­teúdo; julgamento este que consiste na atividade própria dos órgãos colegiados dos tribunais: apreciação de supostos erros no ato jurisdi­cional recorrido.

É no juízo de mérito do recurso que o tribunal apreciará eventuais erros in judicando, que eqüivalem à má aplicação do direito ao caso concreto, ou mesmo à equivocada apreciação e compreensão dos fatos, ou o erro in procedendo,29 ocorrido na forma ou com inobservância de questões processuais. No primeiro caso, busca-se a reforma do ato ju ­risdicional; já no segundo, pleiteia-se a sua invalidação para que seja proferido outro em seu lugar.

26 José Carlos Barbosa Moreira (op. cit, p. 121) ensina que: "positivo ou negativo, o juízo de admissibilidade é essencialmente declaratório. Ao proferi-lo, o que faz o órgão judi­cial é certificar se estão ou não satisfeitos os requisitos indispensáveis à legítima apreciação do mérito do recurso. A existência ou inexistência de tais requisitos é, contudo, anterior ao pronunciamento, que não a gera, mas simplesmente a reconhece".

27 A regra é excepcionada pelo disposto no parágrafo único do art. 526 do Código de Processo Civil, que criou uma modalidade de pressuposto recursal no agravo de instrumento de natureza privada, já que depende da argüição e prova pela parte recorrida (não pode ser conhecido de ofício).

28 Nelson Nery Júnior & Rosa Maria de Andrade Nery, Código de Processo Civil comen­tado, p. 818.

29 José Carlos Barbosa Moreira, O novo processo civil brasileiro, p. 121.

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2 2 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

O juízo de mérito, como regra, sempre será realizado por órgão colegiado do tribunal competente. Mas, como será visto em relação a cada modalidade de recurso e no capítulo destinado à ordem dos processos nos tribunais, excepcionalmente poderá o julgamento do mérito ser realizado pelo próprio magistrado de primeira instância (nos embargos de declaração opostos à sentença e na retratação em caso de agravo) ou monocraticamente pelo relator do recurso no tr i­bunal.

Por fim, resta-nos destacar a diferença terminológica decorrente dos juízos de admissibilidade e do juízo de mérito. Na admissão recur­sal, emprega-se o termo conhecimento; portanto, em juízo positivo, o recurso será conhecido; em sentido contrário, não conhecido (conhe­ceram do recurso, não conheceram do recurso). Já no juízo de mérito recursal, há referência ao provimento do inconformismo, sendo co­muns as formas: o tribunal deu provimento ao recurso, ou, ainda, o tribunal negou provimento ao recurso.30

Assim, podemos tecer as seguintes distinções entre os juízos de admissibilidade e o juízo de mérito:

30 Flávio Cheim Jorge & Marcelo Abelha Rodrigues, "Juízo de admissibilidade e juízo de mérito dos recursos", in: Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis, v. V, p. 223.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE JUÍZO DE MÉRITO RECURSAL

ConteúdoVerificação

do preenchimento dos

pressupostos recursais

Análise da pretensão recursal (pedido de reforma ou

anulação do ato judicial

recorrido)

Competência

Juízo a quo (de forma precária).

Juízo ad quem

(de forma definitiva).A última palavra em

admissibilidade sempre será do órgão competente para

o julgamento do mérito

Como regra, compete aos órgãos colegiados

dos tribunais

Iniciativa e momento

Como regra, pode

ser realizado de ofício e a qualquer momento, por se tratar de questão

de ordem pública

Por envolver, como regra, questões privadas, depende

de provocação da parte

Terminologia

Conhecer (ou admitir).

Por exemplo: quando o tribunal conhece do recurso

significa dizer que ele passou pelo juízo

de admissibilidade

Prover.Por exemplo:

“o tribunal dá provimento ao

recurso”, o que eqüivale dizer que o ato

recorrido foi modificado

(anulado ou reformado)

Por fim, é importante destacar que as diversas reformas introduzi­das no Código de Processo Civil acabaram por criar exceções à natu­reza do juízo de admissibilidade para, em alguns casos, criar permis­sões para que o magistrado, quando do juízo de admissibilidade, proceda à verdadeira análise de mérito (como a criação da súmula impeditiva de recurso, a ser tratada no tópico da apelação), ou ainda, à invenção de pressuposto recursal de natureza privada (como ocorre no parágrafo único do art. 526 do CPC).

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2 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

1.5 De s i s t ê n c i a e Re n ú n c i a

A interposição de recurso, como decorre da própria característica de voluntariedade tratada anteriormente, é para a parte um ônus pro­cessual e não um dever ou obrigação. Isso é dizer que a parte sucum- bente, ou seja, aquela prejudicada pelo ato jurisdicional, poderá ou não interpor recurso contra esse ato, a fim de obter a sua revisão por órgão superior.

Evidentemente, como todo ônus processual, a não-interposição do recurso poderá causar prejuízo à parte sucumbente: em se tratando de uma decisão interlocutória, haverá a preclusão da matéria não impug­nada; em caso de sentença, a não-interposição de recurso de apelação acarretará o trânsito em julgado, e assim por diante.

Assim sendo, a parte sempre poderá dispor desse direito de recor­rer, inclusive com a permissão legal de renúncia ou desistência do recurso já interposto.

A renúncia ocorre antes da interposição do recurso, quando a parte manifesta ou pratica atos tendentes a expressar o seu desejo de não recorrer - da mesma forma, quando deixa transcorrer o prazo sem a interposição de qualquer recurso.

Por sua vez, a desistência representa a manifestação de não-pros- seguimento do recurso e ocorrerá sempre depois do recurso já inter­posto. Nesse caso, a parte recorrente informa ao tribunal que não dese­ja mais o julgamento do referido recurso.

Tanto a renúncia como a desistência podem ser expressas ou táci­tas. Na forma expressa, a parte manifesta o desejo de não recorrer ou a vontade de que seu recurso, já interposto, não seja levado a julgamento. Por outro lado, ocorrerá a renúncia ou a desistência tácitas quando a parte sucumbente praticar atos incompatíveis com a vontade de refor­ma ou anulação do ato que lhe prejudica - por exemplo, é o caso da parte que, vencida, cumpre espontaneamente a obrigação que lhe é imposta. Evidentemente, aquele que aceita a decisão sem reservas não tem interesse em recorrer (art. 503 do CPC).

A renúncia e a desistência recursais não dependem da anuência da parte contrária, conforme determinam os arts. 501 e 502 do Código de Processo Civil.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

1.6 Re c u r s o n a Fo r m a A d e s iv a

Na verdade, a previsão contida no art. 500 do Código de Processo Civil não trata de uma espécie de recurso, como aqueles previstos no art. 496, mas representa apenas uma forma de interposição recursal.31

Os recursos no processo civil podem ser interpostos independen­temente (cada parte interpõe o seu recurso dentro do prazo legal) ou na forma adesiva (uma parte aproveita do recurso interposto pela ou­tra para apresentar o seu inconformismo).

O recurso na forma adesiva é praticável no processo civil nas vezes em que ocorrer sucumbência recíproca, ou seja, quando ambas as par­tes forem vencidas e vencedoras (procedência parcial do pedido ou apelo).

Assim, sendo vencidos ambos os litigantes, evidentemente, cada um poderá interpor recurso contra a decisão que lhes prejudica. Cada parte recorrerá em relação àquilo que a onera no ato jurisdicional.

Vamos imaginar que o pedido do autor era para a condenação do réu em mil salários mínimos, mas o juiz arbitrou a condenação em quinhentos salários. Nesse caso, tanto o autor como o réu são vencidos na demanda, e ambos têm interesse na interposição de recurso contra a referida decisão, um objetivando o aumento e o outro, a redução.

Dessa forma, recorrendo apenas uma parte, prevê o art. 500 do Código de Processo Civil que a outra, no prazo que dispõe para res­ponder ao recurso contra ela interposto, poderá apresentar recurso próprio na forma adesiva.

A nomenclatura “adesivo” da redação do art. 500 dá a falsa im ­pressão de que a parte recorrida estivesse concordando com o recur­so interposto pelo outro litigante, mas, na verdade, a terminologia aderir emprega o significado de permitir ao litigante que não apresen­tou recurso no m omento próprio fazê-lo quando do prazo para res­posta ao recurso interposto pela outra parte.

Portanto, podemos dizer que são requisitos para a interposição do recurso na forma adesiva:

31 Marcus Vinícius Rios Gonçalves, Novo curso de direito processual civil, v. II, p. 55.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

a) sucumbência recíproca (para que ambas as partes tenham interes­se na interposição de recurso);

b) a não-interposição de recurso independente por uma das partes (se ambas as partes interpuserem seus recursos na forma indepen­dente, não haverá que se falar em recurso na forma adesiva);

c) interposição dentro do prazo para a resposta (contra-razões) ao recurso principal (art. 500 ,1, do CPC);

d) sua admissibilidade limita-se aos recursos de apelação, aos embar­gos infringentes e aos recursos especiais e extraordinários (art. 500, II, do CPC);

e) observância de todos os requisitos próprios do recurso interposto na forma adesiva.

Em relação aos pressupostos processuais, o recurso interposto na forma adesiva deverá observar todas as regras impostas para a espécie de recurso (como o recurso principal ou independente), inclusive no que se refere à forma, ao preparo, à competência para julgamento, etc. (pará­grafo único do art. 500 do CPC).32 Assim, se existe preparo para o recur­so independente, também existirá para o recurso na forma adesiva.

O que não se pode perder de vista é que o recurso adesivo é forma ou meio e não uma espécie de recurso. Portanto, sendo interposta ape­lação na forma adesiva, o recurso interposto nessa condição deverá observar todos os requisitos próprios da apelação.

Havendo a interposição do recurso na forma adesiva, teremos no processo dois recursos: o principal e o adesivo, sendo certo que aquele interposto na forma adesiva é considerado acessório do outro; e, em caso de não-conhecimento ou desistência do principal, também have­rá o não-julgamento do recurso adesivo (art. 500, III, do CPC).

Não obstante se tratar de um recurso acessório, o objeto do recur­so interposto na forma adesiva não sofre qualquer limitação em rela­ção à matéria ventilada no recurso principal.33

32 A esse respeito, STJ, REsp n. 213.813/PA, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 02.05.2000, v.u.

33 "Recurso adesivo. Limite do seu objeto. A lei não exige que a matéria objeto do adesivo seja relacionada com a do recurso principal. Precedente. Art. 500 do CPC. Recurso conhecido e provido." (STJ, 4a T., REsp n. 235.156/RS, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 02.12.1999, v.u.)

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

Vejamos uma síntese do processamento do recurso adesivo:

É importante ressaltar que o recurso adesivo deve ser apresentado em peça processual absolutamente independente das contra-razões recursais, já que o recurso interposto adesivamente tem por objetivo impugnar o ato judicial, e as contra-razões servem como manifestação da parte contra o recurso interposto pela outra.

Na verdade, o recurso adesivo terá a mesma forma e conteúdo do recurso que a parte poderia ter interposto independentemente (lá, quando intimada da decisão).

Por fim, cumpre-nos indagar uma questão interessante: um recur­so interposto na forma independente, mas intempestivo, poderia ser recebido pelo juiz como sendo adesivo caso preencha os requisitos des­ta forma recursal?

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

A jurisprudência vem sinalizando no sentido de não admitir tal conversão do recurso independente em recurso adesivo, isso por en­tender que a parte teria se valido do recurso independente e, portanto, não mais poderia se valer da forma adesiva.3'1 O uso do recurso inde­pendente gera, para a doutrina e jurisprudência, a preclusão consuma- tiva para a apresentação do recurso na forma adesiva.

1.7 Ef e it o s dos Re c u r s o s

De forma genérica, trataremos aqui da definição de todos os efei­tos passíveis de serem percebidos com a interposição de recurso, e, por sua vez, ao abordarmos as modalidades de recursos, definiremos os efeitos específicos em cada um deles.

Podemos afirmar que os recursos geram os seguintes efeitos ao pro­cesso:

■ i 1 .7 .1 E f e i t o D e v o l u t i v o

O efeito devolutivo é inerente a todas as espécies de recursos, uma vez que, interposto e admitido o recurso, será devolvida (ou transferi­da) ao tribunal a competência para o conhecimento da matéria im­pugnada pelo recorrente.

Acerca do efeito devolutivo, Cândido Rangel Dinamarco comenta que:35

Devolver significa, no glossário da técnica recursal, transferir: quando

um recurso é interposto, o ju lgam ento da causa ou de uma demanda inci­

dente é devolvido ao órgão superior, ou transferido a ele o poder de ju l­

gar. A interposição recursal tem portanto a eficácia de incluir concreta-

3,1 "Processual civil. Recurso Adesivo Substitutivo de Apelação Intempestiva. Inadmissibi­lidade. A jurisprudência não tem admitido recurso adesivo quando interposto em substitui­ção a recurso de apelação declarado intempestivo. Recurso Especial não conhecido." (STJ, REsp n. 39.303/SP, rel. Min. Assis Toledo, j. 05.12.1994, v.u.)

35 Nelson Nery Júnior & Teresa Arruda Alvim Wambier (coords.), Aspectos polêmicos e atuais dos recursos eiveis, v. V, p. 31, apud José Carlos Barbosa Moreira, Comentários ao Código de Processo Civil, p. 256-7.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

mente na competência do tribunal a causa ou o incidente em que o re­

curso houver sido interposto.

De fato, a interposição do recurso confere ao tribunal a competên­cia para o conhecimento e julgamento das questões impugnadas pela parte inconformada; competência essa que lhe é transferida do órgão jurisdicional inferior que proferiu a decisão atacada.

No entanto, a amplitude desse poder de conhecimento, a abran­gência daquilo que pode ser apreciado pelo tribunal ou os limites dessa transferência de competência jurisdicional serão diferenciados para cada espécie de recurso previsto no Código de Processo Civil.

Em alguns recursos, o efeito devolutivo será amplo, ou seja, o tri­bunal poderá conhecer de todas as matérias discutidas na instância recorrida (como, por exemplo, ocorre com a apelação); em outros ca­sos, o efeito devolutivo será restrito ou limitado, já que o poder de co­nhecimento ficará adistrito a determinadas questões (por exemplo, nos recursos especial e extraordinário, o efeito devolutivo está restrito às questões de direito, excluindo-se os fatos).

Além disso, o momento de efetivação do efeito devolutivo, ou se­ja, o tempo no processo em que essa competência de conhecimento é transferida ao tribunal, é diferente para cada espécie de recurso. Co­mo ensina Dinamarco,36 a devolução poderá ser imediata, gradual ou diferida.

Verifica-se de forma imediata o efeito devolutivo nas modalidades de recursos que são interpostos diretamente no órgão detentor de com­petência para o seu julgamento - isso ocorre, por exemplo, com os re­cursos de agravo de instrumento e os embargos de declaração. Em am ­bos os casos, o efeito devolutivo atribuído será imediato, já que os recursos são interpostos no próprio órgão que os julgará.

Por outro lado, alguns recursos geram efeito devolutivo, mas de forma gradual ou diferida. Nesses casos, o poder de conhecimento não é imediato ou automático, mas depende de outros atos ou é condicio­nado a eventos futuros. É gradual, por exemplo, o efeito devolutivo da

36 Cândido Rangel Dinamarco, in: Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis, cit., p. 32.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

apelação, dos recursos extraordinário, ordinário e especial, já que essas espécies de impugnação são apresentadas ao juízo recorrido e, após a admissibilidade, são remetidas ao tribunal para julgamento. Nota-se que o poder de conhecimento não ocorre de plano, mas fica posterga­do para momento futuro.

Em outros casos, como nos recursos retidos - agravo retido37 e re­cursos especial e extraordinário retidos38 - , esse retardamento da ocor­rência do efeito devolutivo ainda é maior, já que o tribunal apenas co­nhecerá dos recursos se no futuro forem interpostos e admitidos outros recursos; os recursos retidos sempre ficam sobrestados até a interposi­ção futura (e muito mais adiante no processo) de outra impugnação que os faça subir ao tribunal competente. Portanto, o efeito devolutivo será diferido para momento futuro do processo; não será imediato.

Independentemente do momento de sua ocorrência ou extensão de abrangência, o efeito devolutivo está presente em todos os recursos.

Mas, não se pode deixar de dizer que o efeito devolutivo decorre do princípio do dispositivo, pelo qual o Estado-juiz apenas age quando provocado, e, na esfera recursal, não é outra a regra. É devolvido ao tri­bunal o poder de conhecer a matéria que for impugnada pelas partes, aplicando-se o ditado tatwn devolutum quantutn appellatum.

| Efeito trans/ativo

A doutrina tem incluído no rol dos efeitos dos recursos o chama­do efeito translativo, pelo qual, em determinados recursos, os tribunais estariam autorizados a conhecer, mesmo de ofício, as questões de or­dem pública, independentemente de terem sido ou não alegadas pelas partes e que tenham sido discutidas na instância inferior.39

37 "Art. 523. Na modalidade de agravo retido o agravante requererá que o tribunal dele conheça, preliminarmente, por ocasião do julgamento da apelação."

38 “Art. 542. § 3o 0 recurso extraordinário, ou o recurso especial, quando interpostos contra decisão interlocutória em processo de conhecimento, cautelar, ou embargos à execu­ção ficará retido nos autos e somente será processado se o reiterar a parte, no prazo para a interposição do recurso contra a decisão final, ou para as contra-razões."

39 Nelson Nery Júnior & Rosa Maria de Andrade Nery, Código de Processo Civil comen­tado, p. 936. No mesmo sentido: Marcus Vinicius Rios Gonçalves, op. cit, p. 84.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

Na verdade, a doutrina tem divorciado o efeito translativo do de­feito devolutivo, sendo que o primeiro seria apenas a transferência de competência para conhecimento da matéria discutida na instância in­ferior levada à superior, mediante provocação da parte recorrente, en­quanto no segundo efeito, teríamos o poder atribuído aos tribunais para, no julgamento de determinados recursos, conhecer de ofício questões de ordem pública (atinentes às condições da ação e pressu­postos processuais).40

Quando falamos em efeito translativo, o tribunal está autorizado a julgar além daquilo que foi alegado pelas partes em suas razões ou contra-razões recursais, isso para julgar questões de ordem pública (que devem ser conhecidas de ofício pelo juiz, nos termos dos arts. 267, § 3°, e 301, § 4o, do CPC).

Nota-se que o efeito translativo ultrapassa até mesmo o princípio da vedação da reformatio in pejus, já que o tribunal poderá reconhecer o vício de ordem pública mesmo para prejudicar a parte recorrente, excluindo, portanto, a aplicação do princípio.

Vamos imaginar o seguinte exemplo: a parte autora recorre contra sentença que julgou parcialmente procedente o seu pedido. Na senten­ça, ela teria sido contemplada com o valor de 80, quando na verdade teria pedido 100. Apenas ela recorre e, quando do julgamento do refe­rido recurso, o tribunal constata uma eventual ilegitimidade passiva e acaba por extinguir o processo sem julgamento do mérito (nos termos do art. 267). Neste caso, o efeito translativo - que autorizou o tribunal a conhecer ex officio da ilegitimidade - gerou a reformatio in pejus.

40 "Processual civil e tributário. Recurso especial. Efeito translativo. Conhecimento de ofí­cio de questões de ordem pública (CPC, arts. 267, § 3o, e 301, § 4o). Possibilidade, nos casos em que o não enfrentamento dessas questões conduz a um julgamento sem nenhuma rela­ção de pertinência com a demanda proposta. Alegação de ofensa aos arts. 467, 515, § 1o, e 535, do CPC não configurada. Demonstrações financeiras. Correção monetária. Janeiro e fevereiro de 1989. 1. Quando eventual nulidade processual ou falta de condição da ação ou de pressuposto processual impede, a toda evidência, que o julgamento do recurso cumpra sua função de ser útil ao desfecho da causa, cabe ao tribunal, mesmo de ofício, conhecer da matéria, nos termos previstos no art. 267, § 3o e no art. 301, § 4o do CPC. Nesses limites é de ser reconhecido o efeito translativo como inerente também ao recurso especial. (...) 6. Recurso especial da Fazenda Nacional provido. Recurso especial da parte autora improvido." (STJ, REsp n. 641,904/DF, Rel. Min. Teorio Albino Zavascki, j. 13.12.2005)

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Por fim, cumpre destacar que a jurisprudência majoritária tem admitido o efeito translativo para todos os recursos, com restrições apenas para os recursos especial e extraordinário, tema que será trata­do em capítulo próprio.

■ i 1 .7 .2 E f e i t o S u s p e n s i v o

É da natureza e finalidade de todo ato jurisdicional que ele produ­za efeitos no m undo jurídico.

Assim, quando da interposição do recurso, essa impugnação pode­rá ser dotada de efeito suspensivo, ou seja, por mera interposição do recurso ou por decisão do relator, ficará impedida a execução do ato jurisdicional impugnado até que ocorra o julgamento do reclamo ou que seja revogada a suspensão.

Em algumas espécies de recursos, o efeito suspensivo é automáti­co, o que eqüivale a dizer que a simples interposição do recurso gera a suspensão de eficácia do ato jurisdicional impugnado, como ocorre em regra com a apelação. Em outros casos, o efeito suspensivo depende de decisão do magistrado incumbido de relatar o recurso e do preenchi­mento de requisitos que justifiquem a medida excepcional (a suspen­são), como se verifica no agravo de instrumento (art. 558 do CPC).

■ i 1 .7 .3 A n t e c i p a ç ã o d o s E f e i t o s

d a T u t e l a R e c u r s a l

Nos recursos de agravo de instrumento, nos termos previstos no art. 527 do Código de Processo Civil," é possível ao relator conceder ao recorrente a antecipação dos efeitos da tutela recursal. Em simples palavras, autoriza-se que o relator do recurso de agravo de instrumen­to adiante ao agravante os efeitos da decisão de mérito do recurso que apenas perceberia quando do julgamento pelo órgão colegiado.

Tal previsão legal introduzida pela Lei n. 10.352/2001 não inovou muito em nosso sistema recursal, visto que a jurisprudência e a dou­trina já concebiam a possibilidade de concessão do chamado efeito suspensivo ativo ao agravo.

41 A atual redaçáo foi introduzida pela Lei n. 10.352/2001.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

Aparentemente, a antecipação dos efeitos da tutela recursal é mais abrangente que o chamado efeito ativo.

A compreensão do efeito suspensivo ativo demanda a distinção em relação ao efeito suspensivo puro, de que tratamos anteriormente.

Vamos imaginar que, em sede de uma decisão liminar (antecipatória de tutela), o magistrado de primeira instância conceda ao autor, em des­favor de uma administradora de planos de saúde, o direito de realização de um tratamento médico. Evidentemente, o efeito suspensivo do recurso terá o condão de evitar ou impedir que essa decisão de caráter positivo (que implica uma ação) produza efeitos imediatos; ele suspende a sua exe­cução até o julgamento do mérito do recurso. Esse é o efeito suspensivo.

Agora, imaginemos, no mesmo caso, que o magistrado tenha inde­ferido a tutela antecipada (tenha dado um provimento de cunho nega­tivo). Teria eficácia o deferimento do efeito suspensivo puro? Eviden­temente que não, pois não há como se suspender algo que não foi dado, ou, ainda, a simples suspensão da decisão não trará benefícios ao autor, pois ele necessita de um provimento positivo (da concessão da antecipação pretendida e negada).

Por essa razão, a doutrina havia previsto que contra provimentos negativos se poderia atribuir efeito suspensivo ativo ao recurso de agra­vo de instrumento, isso para que o relator do recurso pudesse conceder um efeito suspensivo que suprisse o provimento negativo de primeira instância. Assim, contra um provimento negativo (de primeira instân­cia), o relator poderia conceder liminarmente um efeito positivo (ativo).

Atualmente, não há mais se falar em efeito suspensivo ativo, uma vez que ele se encontra abrangido pelo instituto da antecipação da tutela recursal, prevista no art. 527 do Código de Processo Civil para o recurso de agravo de instrumento.

mt 1 .7 .4 E f e i t o S u b s t i t u t i v o e E f e i t o I m p e d i t i v o

DA PRECLUSÃO

O ato proferido pelo tribunal em sede de julgamento do mérito do recurso tem o poder de substituir a decisão impugnada, mesmo que essa nova decisão seja para confirmar aquela recorrida, conforme pre- ceitua o art. 512 do Código de Processo Civil.

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3 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Ressalte-se que apenas a decisão que julga o mérito do recurso (para manter ou reformar o ato recorrido) é que tem o poder de subs­tituir a decisão recorrida,42 já que a decisão que não conhece do recur­so (juízo negativo de admissibilidade) apenas aprecia a existência ou inexistência dos pressupostos recursais.

Além disso, não se pode deixar de dizer que a interposição do re­curso evitará a ocorrência da preclusão e, até mesmo, a ocorrência do trânsito em julgado.

1 . 8 R E M E S S A O B R I G A T Ó R IA

■ I 1 . 8 . 1 D E F I N I Ç Ã O

A remessa obrigatória, prevista no art. 475 do Código de Processo Civil, também conhecida por reexame necessário, ou, ainda, equivoca- damente denominada recurso de ofício (recurso ex officio), representa a obrigatoriedade do duplo grau de jurisdição como condição de eficácia das sentenças proferidas contra as pessoas jurídicas de direito público.

Como regra, as sentenças proferidas contra as pessoas jurídicas de di­reito público (União, estados, Distrito Federal, autarquias e fundações pú­blicas) apenas serão acobertadas pela autoridade da coisa julgada e, conse­qüentemente, poderão produzir efeitos após a confirmação pelo tribunal.

Na realidade, não se trata de uma espécie de recurso, mas somente de um requisito formal para que as sentenças proferidas naquelas hipó­teses produzam efeitos. Não pode ser considerada como uma modali­dade de recurso pelo fato de se afastar, em muito, das características próprias da impugnação manejada pelas partes contra atos judiciais.

Na remessa obrigatória não há voluntariedade, já que, indepen­dentemente da vontade das partes ou do magistrado, deve ela ser rea­lizada. Além disso, não há contraditório quando do reexame necessário, nenhuma das partes apresenta razões ou contra-razões ao tribunal. Como sabemos, os recursos são sempre voluntários e revestidos de fun­damentação de ambas as partes.

42 Nelson Nery Júnior & Rosa Maria de Andrade Nery, op. c/t., p. 852.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

Por outro lado, não se pode denominar a remessa obrigatória co­mo um recurso de ofício, ou seja, o recurso interposto pelo juiz sem provocação das partes, isso porque não se concebe no sistema recursal a interposição de recurso sem a existência de interesse na reforma da decisão impugnada. Obviamente, o juiz não teria interesse em recorrer de sua própria decisão.

Entendemos a remessa obrigatória como uma cautela prevista na lei, segundo a qual, as sentenças proferidas contra pessoas jurídicas de direi­to público deverão ser submetidas à revisão obrigatória pelo tribunal, como uma forma de ratificação para o fim de preservar o bem público.

| ProcessamentoProferida a sentença que se enquadre em uma das hipóteses do art.

475 do Código de Processo Civil, o juiz aguardará o prazo para a interpo­sição de eventuais recursos pelas partes e, havendo ou não tais recursos, deverá encaminhar o processo ao tribunal para o reexame necessário.

Note-se que apenas as sentenças é que estão sujeitas ao duplo grau obrigatório, não havendo se falar na aplicabilidade do art. 475 quando se tratar de decisões interlocutórias ou acórdãos.

Caso o magistrado de primeira instância seja omisso no dever de remeter os autos ao tribunal, o presidente deste órgão, por provocação da parte interessada ou mesmo de ofício, poderá avocar os referidos autos, determinando ao juiz omisso que remeta o processo ao órgão superior, nos termos do § Io do art. 475 do Código de Processo Civil.

O tribunal julgará o reexame necessário com o mesmo procedi­mento adotado para o julgamento do recurso de apelação.

Quando do julgamento do reexame, o tribunal poderá reapreciar todas as questões de fato e de direito levadas à primeira instância, sendo apenas vedado agravar a condenação imposta ao ente público, nos termos da Súmula n. 45 do Superior Tribunal de Justiça.43 Em ou­tras palavras, o reexame necessário não poderá gerar reformatio in pejus contra as fazendas públicas.

43 Súmula n. 45 do STJ: "No reexame necessário, é defeso, ao Tribunal, agravar a con­denação imposta à Fazenda Pública". Súmula n. 253 do STJ: "O art. 557 do CPC, que auto­riza o relator a decidir o recurso, alcança o reexame necessário".

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

m 1 .8 .2 H i p ó t e s e s d e O b r i g a t o r i e d a d e d o R e e x a m e

O instituto da remessa obrigatória sofreu grande alteração em ra­zão do advento da Lei n. 10.352, de 26 de dezembro de 2001, que pas­sou a prever o duplo grau de jurisdição obrigatório nas seguintes hipó­teses (art. 475 do CPC):

a) sentenças proferidas contra a União, os estados-membros, o Dis­trito Federal, os municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público (inc. I);

b) sentenças que julgarem procedentes embargos à execução de dívi­da ativa da Fazenda Pública44 (inc. II).

Na redação anterior, havia a previsão da remessa obrigatória tam ­bém para as sentenças de anulação de casamento. Na realidade, com as inovações introduzidas pela Lei do Divórcio, não se justificava mais o duplo grau obrigatório na anulação do casamento.

Como se vê, nas hipóteses previstas na lei, justifica-se o reexame necessário dada a natureza do bem jurídico posto em conflito. Eviden­temente, todas as sentenças proferidas contra os entes públicos têm conseqüências diretas sobre o patrimônio público ou o interesse cole­tivo, o que, sem dúvida, legitima a cautela prevista na lei.

Além das hipóteses do art. 475 do Código de Processo Civil, tam ­bém estarão sujeitas ao reexame necessário as sentenças que:

a) extinguirem o processo sem julgamento de mérito por carência ou julgarem improcedente ação popular, nos termos do art. 19 da Lei n. 4.717/65;

b) concederem mandado de segurança, nos termos do art. 12, pará­grafo único, da Lei n. 1.533/51.

Ressalte-se que as sentenças mencionadas serão encaminhadas para o reexame do tribunal, mesmo que o ente público tenha apresen­

44 Entendemos que a previsão contida no inc. II já se encontra abrangida pela redação do inc. I, já que a sentença que julga procedentes os embargos ã execução fiscal (des- constituindo a cobrança tributária) não deixa de ser um provimento contra o ente público.

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

tado o recurso de apelação. A remessa obrigatória independe de qual­quer recurso.

■ ■ 1 . 8 . 3 D IS P E N S A D O R E E X A M E N E C E S S Á R IO

A mudança mais importante gerada pela Lei n. 10.352/2001 no ins­tituto do reexame necessário, e que representa uma grande evolução na busca da efetividade do processo, foi a inserção, no art. 475 do Código de Processo Civil, de hipóteses de dispensa do duplo grau obrigatório.

Autorizam a dispensa do reexame necessário as seguintes circuns­tâncias:

a) quando a condenação prevista na sentença ou o direito controver­tido forem de valor certo não excedente a sessenta salários míni­mos,'15 bem como no caso de procedência de embargos cuja execu­ção da dívida ativa não exceda o mesmo valor;

b) quando a sentença estiver fundamentada em decisão do plenário do Supremo Tribunal Federal;

c) quando a sentença estiver fundamentada em súmula do Supremo Tribunal Federal ou do tribunal superior competente para o julga­mento de eventual recurso.

Pelo que nos parece, foi criada mais uma espécie de súmula vincu- lante, nesse caso, imprescindível para dar efetividade aos processos em que figuram como parte os entes públicos e para diminuir a carga de autos nos tribunais, cuja matéria já se encontra pacificada.

Em se tratando do Supremo Tribunal Federal, podemos afirmar que são decisões de competência do plenário do Tribunal aquelas pro­feridas nos julgamentos dos embargos de divergência, nos incidentes de uniformização da jurisprudência; as decisões cautelares (liminares) e de mérito das ações diretas de inconstitucionalidade e constitucionalida- de, entre outras; atos estes que terão o efeito de dispensar o reexame obrigatório quando as sentenças proferidas contra as pessoas de direito

1,5 Essa previsão, também, teve como inspiração o afastamento do reexame necessário nas sentenças proferidas nos Juizados Especiais Federais, cuja competência é de até 60 sa­lários mínimos, nos termos da Lei n. 10.259/2001.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

público estiverem fundamentadas na decisão do plenário da Corte Suprema.

Curiosamente, o Superior Tribunal de Justiça vem proferindo jul­gados no sentido de afirmar não serem aplicáveis as hipóteses de dis­pensa do reexame necessário nos casos de sentenças concessivas de mandado de segurança, por entender que o mandado de segurança es­tá tratado em norma específica e, conseqüentemente, a norma geral do Código de Processo Civil não poderia alterá-la.'16

Na verdade, com o devido respeito, tal entendimento do Superior Tribunal de Justiça constitui um retrocesso e a pretensão de interpre­tar normas velhas segundo premissas ultrapassadas. O intuito da dis­pensa do reexame necessário nas hipóteses previstas no § 2o do art. 475 do Código de Processo Civil visa a diminuir o número de processos nos tribunais, na busca da celeridade e justificada pela absoluta desne­cessidade do reexame, seja pelo valor ou pela existência de jurispru­dência sumulada no sentido do julgado a ser reexaminado.

Portanto, excluir as sentenças concessivas de mandado de seguran­ça das hipóteses de dispensa do reexame necessário, como afirma a corrente majoritária do STJ, é dar ineficácia à própria celeridade pro­cessual.47

45 "Processual civil. Mandado de segurança. Remessa obrigatória. Legislação específica. Aplicação do parágrafo único, do art. 12 da Lei n. 1.533/51. Decisão mantida por seus pró­prios fundamentos. Agravo desprovido. 1. Esta Corte Superior possui entendimento pacifi­cado no sentido de ser inaplicável o art. 475 do CPC às sentenças concessivas de mandado de segurança por conter a via mandamental normas processuais próprias. 2. Agravo regi­mental desprovido." (STJ, 5a T., Ag. Reg. no REsp n. 603.986/SP, rel. Min. Laurita Vaz, j.06.12.2005, v.u.)

"Processual civil. Mandado de segurança. Reexame necessário. Não incidência do art. 475, § 2o, do CPC, introduzido pela Lei n. 10.352/2001. Princípio da especialidade. Aplicação do art. 12 da Lei n. 1.533/51. Precedentes. Inaplicável o § 2o do art. 475 do CPC, que dispen­sa a remessa necessária da sentença quando sucumbir a Fazenda Pública e o direito ou valor controvertido for inferior a 60 salários mínimos, por se tratar o feito de mandado de seguran­ça que possui legislação própria, constante do art. 12 da Lei n. 1.533/51, sendo aplicável o princípio da especialização. Recurso especial conhecido, porém improvido." (STJ, 2a T., REsp n. 786.561/RS, rel. Min. Francisco Peçanha Martins, j. 17.11.2005, v.u.)

47 No sentido de admitir a aplicação da dispensa aos mandados de segurança: "Proces­sual civil. Mandado de segurança. Direito controvertido de valor não excedente a 60 salários mínimos. Sentença concessiva do "w rit". Reexame necessário. Não-sujeição. Aplicabilidade da regra prevista no § 2o do art. 475 do CPC. 1. Em sede de mandado de segurança impetrado por Cleide Barbosa de Lima contra ato da dirigente da Diretoria Regional de Ensino de São

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TEORIA GERAL DOS RECURSOS

Paulo - Regional Leste III, em razão do tratamento diferenciado aplicado aos docentes com licenciatura plena por curso regular em relação aos docentes que, como a impetrante, obti­veram licenciatura plena através do Programa Especial de Formação Pedagógica de Docen­tes. Concedida a segurança, não foi interposto recurso voluntário, sendo remetidos os autos para fins de reexame obrigatório. 2. Foi determinado o retorno dos autos com o trânsito em julgado devido o valor controvertido não ultrapassar os sessenta salários mínimos conforme o disposto no art. 475 do CPC (Lei n. 10.352/2001). 3. O Estado de São Paulo desafiou agra­vo regimental que recebeu o seguinte julgamento: "Agravo regimental. Mandado de segu­rança. Duplo grau de Jurisdição. Inexistência de "recurso voluntário" da pessoa jurídica sucumbente. Decisão que remeteu os autos à origem por estarem presentes os requisitos pre­vistos os parágrafos 2o e 3o, do art. 475, do Código de Processo Civil, tornando desnecessá­rio o reexame necessário. Afastada a preliminar de não conhecimento do recurso, por vota­ção unânime. Agravante que se conformou com o teor da sentença, mesmo sofrendo de imediato seus efeitos. Inexistência de ilegalidade na decisão atacada. Norma processual de aplicação imediata. Aplicação subsidiária do Código de Processo Civil à Lei n. 1.533/51. Inter­pretação sistemática e teleológica da Lei n. 10.352/2001. Princípios da efetividade e da eco­nomia processual. Princípio da razoabilidade. Supremacia da natureza célere do mandado de segurança. Interesse público que deve ser considerado. Recurso desprovido, por votação ma­joritária." 4. Foi interposto recurso especial pela letra "a", indagando se a alteração introdu­zida pelo art. 1o da Lei n. 10.352/2001 no parágrafo 2o do art. 475 do Código de Processo Civil se aplica à ação mandamental. O recorrente defende a inaplicabilidade do dispositivo epi- grafado, sob o argumento de que o mandado de segurança configura ação de procedimento próprio, regulado por lei especial, que determina, sem qualquer ressalva, o reexame obrigató­rio da sentença concessiva do "w rit". 5. O legislador, por ocasião da Lei n. 10.352/2001, como intuito de reduzir as hipóteses sujeitas à remessa exofficio, alterando o art. 475 do CPC, dis­pôs que, mesmo sendo a sentença proferida contra a União, os Estados, os Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público, não se sujeitará ao duplo grau de juris­dição se a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (ses­senta) salários mínimos (§ 2o). Com essa alteração, o legislador visou conferir maior celerida­de aos processos, de forma a solucionar esse tipo de litígio com a maior brevidade possível. 6. A não-aplicação do novo texto ao mandado de segurança significa um retrocesso, pois a remessa oficial, tanto no Código de Processo Civil quanto na Lei Mandamental, visa resguar­dar o mesmo bem, qual seja, o interesse público. Em assim sendo, a regra do art. 12 da Lei n. 1533/51 deve ser interpretada em consonância com a nova redação do art. 475 do CPC, que dispensa o reexame necessário nos casos em que a condenação não for superior a 60 salários mínimos. 7. Situações idênticas exigem tratamento semelhante. Nessa linha de racio­cínio lógico seria um contra-senso falar que a ação mandamental não se sujeita à nova regra. Em especial, porque a inovação se amolda perfeitamente à finalidade do remédio heróico, que é a de proteger, com a maior celeridade possível, o direito líquido e certo, lesado ou ameaçado de lesão por ato de autoridade. 8. Recurso desprovido." (STJ, 1a T., REsp n. 687.216/SP, rel. Min. José Delgado, j. 17.02.2005, v.u.)

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A p e l a ç ã o 2

2.1 C a b i m e n t o d o R e c u r s o

O recurso de apelação é o instrumento adequado para a impugnação de sentenças, sejam elas de mérito (aquelas pro­feridas com base no art. 269 do CPC - definitivas), sejam ter­minativas (com fundamento no art. 267 do CPC), visando a obter a reforma ou a anulação do referido ato judicial.

A definição de sentença está contida no § Io do art. 162 do Código de Processo Civil, a seguir transcrito:1

Art. 162. Os atos do juiz consistirão em sentenças, de­cisões interlocutórias e despachos.§ 1o Sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei.

1 Redação dada pela Lei n. 1 1.232/2005.

4 1

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Ressalte-se que sentença é o ato processual praticado pelo juiz de primeiro grau destinado a pôr fim ao processo nessa instância de juris­dição, com ou sem julgamento do mérito da causa. Portanto, contra todo ato que importar em encerramento do processo em primeira ins­tância, o recurso cabível será o de apelação (art. 513 do CPC).

A sentença terá o efeito de encerrar o processo no primeiro grau de jurisdição, com ou sem julgamento do mérito.

■ i 2 .1 .1 Q u e s t õ e s p o l ê m i c a s a c e r c a d o C a b i m e n t o

d a A p e l a ç ã o

Como tratamos, a sentença é ato que encerra o processo no pri­meiro grau de jurisdição; assim, podemos citar algumas situações pe­culiares em que, apesar de o juiz proferir tecnicamente uma sentença, não será permitido o recurso de apelação.

a) Indeferimento liminar da reconvençãoAo receber a petição inicial da reconvenção (que é uma m oda­

lidade de ação incidental), o magistrado poderá, por falta de cabi­mento da medida, por carência de ação ou por falta de um dos pressupostos recursais, acabar por proferir sentença de indeferi­mento liminar da reconvenção, nos termos do art. 267 do Código de Processo Civil. Neste caso, estamos diante de uma sentença que, na verdade, não comporta o recurso de apelação.2

Apesar de proferir um ato nos termos do art. 267, inserindo-se, portanto, no conceito de sentença previsto no art. 162, § Io, o ato não encerrou o processo na primeira instância, ou seja, o processo continuará correndo naquele juízo para o julgamento da ação principal. Neste caso, a doutrina e a jurisprudência têm afirmado não ser cabível o recurso de apelação, mas sim o recurso de agra­vo de instrumento.

2 "Reconvenção. Indeferimento. Recurso. Agravo. Cabe agravo da decisão que indefere liminarmente a reconvenção. Precedentes. Recurso não conhecido." (STJ, REsp n. 443.175/SP, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 21.11.2002, v.u.)

"Reconvenção. Indeferimento liminar. Recurso cabivel. Cabe agravo, e não apelação, do provimento judicial que indefere liminarmente a reconvenção, ainda que por equivoco haja sido o pedido reconvencional autuado em apartado. Recurso especial não conhecido." (STJ, REsp n. 20.313/MS, rel. Min. Athos Gusmão Carneiro, j. 18.05.1992, v.u.)

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APELAÇÃO

Por outro lado, poderíamos entender também que a decisão que rejeita liminarmente a reconvenção não tem natureza de sentença. Nesse sentido, lecionam os professores Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery,3 afirmando que, ao extinguir a reconven­ção, o juiz apenas põe fim a uma das ações existentes dentro do processo, já que, com a reconvenção, um processo teria uma cu- mulação de ações (ação principal e ação reconvencional). A rejei­ção liminar da reconvenção não ensejaria a extinção do processo; portanto, para os referidos autores, estaríamos diante de uma de­cisão interlocutória e o recurso adequado, conseqüentemente, se­ria o de agravo.

Seja por um argumento ou outro, o entendimento predomi­nante é no sentido de que o recurso adequado contra a rejeição liminar da reconvenção é o recurso de agravo de instrumento e não o de apelação.

b) Exclusão incidental de litisconsorteO litisconsórcio, como já tratamos, é a pluralidade de partes

em um dos pólos da ação. Assim, imaginemos que no curso da ação o magistrado entenda que um dos litisconsortes é parte ilegí­tima. Nesta situação, não haveria outra alternativa senão a prola- ção do ato para excluir a referida parte, nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil; ou seja, pela definição dada pelo art. 162, § Io, estaríamos diante de uma sentença.

Note-se que, no caso em questão, o processo foi encerrado ape­nas em relação ao litisconsorte excluído, mas prosseguirá para as demais partes. E agora, caberá apelação ou agravo de instrumento?

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem caminha­do no sentido de afirmar ser cabível o recurso de agravo de instru­mento.'1

3 Código de Processo Civil comentado, p. 968, nota 3.4 "Processual civil. Decisão que exclui litisconsorte passivo, sem pôr termo ao processo.

Recurso cabível. Violação do art. 535 do CPC. Inocorrência. 1. A decisão que exclui do pro­cesso um dos litisconsortes, sob o fundamento de ilegitimidade passiva adcausam, é impug- nável por meio de agravo, uma vez que não põe termo à relação processual, inteligência do art. 162 e parágrafos do CPC. Precedentes jurisprudenciais. (...) 3. Provimento do recurso es­

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Na verdade, a opção pelo agravo de instrumento não se dá por uma questão teórica - já que tecnicamente estamos diante de uma sentença e, pela lei, contra sentença cabe apelação - , mas por uma questão prática, já que, se fosse interposto o recurso de apelação contra a exclusão de um litisconsorte, todo o processo seria reme­tido ao tribunal para o julgamento do referido recurso, inviabili­zando o prosseguimento do feito em relação às demais partes.

Por outro lado, o agravo de instrumento é interposto direta­mente no tribunal; assim, os autos permaneceriam na primeira instância para prosseguimento do processo em relação aos demais litisconsortes e o recurso de agravo seria julgado sem prejuízo do andamento processual.

No entanto, o próprio Superior Tribunal de Justiça tem recebi­do manifestações contrárias a esse entendimento, tendo como cer­to que o recurso cabível é o de apelação. Essa é uma das situações em que existe dúvida objetiva acerca do recurso cabível, sendo aplicável a fungibilidade recursal como medida para evitar prejuí­zo à parte recorrente, dada a insegurança da jurisprudência e a ambigüidade da legislação.

Nosso entendimento é no sentido de prestigiar o cabimento do recurso de agravo de instrumento, já que, por questões práticas, a apelação não se justificaria.

pecial, para reconhecer a inadmissibilidade do recurso de apelação interposto perante o Tri­bunal de origem, tanto mais que o princípio da fungibilidade pressupõe a tempestividade do recurso equivocadamente interposto." (STJ, REsp n. 364.339/SP, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, rel. para acórdão Min. Luiz Fux, j 20.05.2004, por maioria.)

Como se vê, o próprio Superior Tribunal de Justiça tem manifestações conflitantes. No acórdão citado anteriormente, o Ministro Humberto Gomes de Barros foi vencido por enten­der que o recurso adequado para o caso seria a apelação, como se vê na seguinte ementa (ementa do voto vencido): "Processual. Exclusão de litisconsorte passivo. Natureza da deci­são. Recurso cabível. Decisão que exclui da lide um litisconsorte passivo tem natureza de sen­tença e desafia apelação (CPC, arts. 162 e 513)."

No mesmo sentido: "Processual civil. Ilegitimidade ad causam. Exclusão da lide. Recur­so cabível. 1. Embora a ação tenha prosseguimento em relação a um dos litisconsortes, houve extinção em relação à União, quando afastada por acolhimento da preliminar de ilegitimida­de ad causam. 2. Havendo sentença terminativa, o recurso cabível é a apelação, nos termos do art. 513 do CPC. 3. Recurso Especial provido." (STJ, REsp n. 678.645/PE, rel. Min. Castro Meira, j. 12.04.2005, v.u.)

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APELAÇÃO

c) Julgamento de impugnação à Justiça gratuitaA Justiça gratuita, prevista na Lei n. 1060/50, é concedida

mediante mero requerimento e declaração da parte pobre (como tratamos no capítulo 12 do volume I). Assim, nos termos do art. 7o da citada Lei, compete à parte contrária impugnar o benefício caso a parte não esteja em situação de pobreza.

A Lei n. 1060/50, em seu art. 17, determina que cabe apelação contra o ato judicial que julgar a impugnação à concessão da gra­tuidade processual. Mas, por outro lado, para o art. 162, § 2o do Código de Processo Civil, o ato estaria classificado como decisão interlocutória, já que não geraria o efeito de extinção do processo pelos arts. 267 ou 269.

Portanto, qual o recurso cabível: agravo de instrumento ou apelação? Deve ser aplicada a regra contida no art. 17 da Lei n. 1060/50 ou a definição do art. 162 do Código de Processo Civil?

Entendemos que, apesar de a Lei n. 1060/50 afirmar ser cabível o recurso de apelação, com o advento do Código de Processo Civil e a sistemática do recurso de agravo de instrumento, não é compatível com a lógica e a prática sustentar ser cabível o recurso de apelação.

O ato que julga a impugnação à concessão da justiça gratuita não põe fim ao processo - mesmo porque a impugnação não é um processo, mas, tão somente, um incidente processual portanto, o ato judicial é mera decisão interlocutória recorrível por meio de recurso de agravo.

No entanto, acerca de tal matéria, a jurisprudência também não é pacífica. No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, órgão máximo da interpretação da lei federal, o entendimento é no sen­tido de que o recurso adequado seria o de apelação, inclusive afir­mando não ser cabível a aplicação da fungibilidade quando a parte houver interposto recurso de agravo de instrumento.5

5 "Processo civil. Recurso Especial. Omissão no julgado recorrido. Inexistência. Impugna­ção à concessão de assistência judiciária gratuita. Procedência. Agravo de instrumento. Não conhecimento. Erro grosseiro. Cabimento de apelação (art. 17 da Lei n. 1.060/50). Inaplica- bilidade do princípio da fungibilidade recursal. 1. Inexiste afronta ao art. 535 do CPC quan­do o acórdão impugnado não incorreu em omissão, contradição ou obscuridade. Os embar-

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Portanto, conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é cabível o recurso de apelação contra o ato que julgar o in­cidente de impugnação à justiça gratuita.

2.2 Fo r m a de I n t e r p o s i ç ã o

O recurso de apelação obrigatoriamente deverá conter:

a) petição de interposição, que deverá ser endereçada ao juízo recor­rido, sendo manifestado o inconformismo com a sentença proferi­da e apresentadas as razões recursais (art. 514 do CPC);

b) razões recursais, destinadas ao tribunal, nas quais o recorrente apresentará a fundamentação do apelo, as razões pelas quais en­tende que a sentença deve ser reformada ou anulada para que seja proferida outra em seu lugar.

A petição de interposição e as razões recursais são petições inde­pendentes, mas são apresentadas em conjunto e no mesmo momento processual (as razões são acostadas à petição de interposição).

gos declaratórios têm natureza, via de regra, meramente integrativa, sendo raros os casos em que a doutrina e a jurisprudência aceitam o caráter infringente. 2. Esta Corte de Uniformiza­ção Infraconstitucional firmou entendimento no sentido do cabimento do recurso de apela­ção contra sentença que acolhe impugnação ao deferimento de assistência judiciária gratui­ta, processada em autos apartados aos da ação principal, não se aplicando o princípio da fungibilidade recursal na hipótese de interposição de agravo de instrumento. Isso porque é inadmissível referido princípio quando não houver dúvida objetiva sobre qual o recurso a ser interposto, quando o dispositivo legal não for ambíguo, quando não houver divergência dou­trinária ou jurisprudencial quanto à classificação do ato processual recorrido e a forma de a- tacá-lo'." (Corte Especial, EDcl no Ag. Reg. na Red. n. 1.450/PR, rel. Min. Edson Vidigal, DJ de29.8.2005.) (cf. Ag. Reg. no MS n. 9.232/DF e Ag. Reg. na SS n. 416/BA). Incidência do art. 17 da Lei n. 1.060/50. Precedentes. (Ag. n. 631.148/MG; REsp ns. 256.281/AM, 453.817/SP e 175.549/SP.) 3. Recurso conhecido e provido para, anulando o v. acórdão recorrido, não co­nhecer do agravo de instrumento, restabelecendo a r. sentença de primeira instância." (STJ,4a T., REsp n. 780.637/MG, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 08.11.2005, v.u.)

"Processual civil. Pedido de assistência judiciária gratuita. Autos apartados. Impugna­ção. Indeferimento. Apelação. 1. O recurso cabível contra a decisão que indefere impugnação ao pedido de assistência judiciária gratuita, realizada em autos apartados, é a apelação. Pre­cedentes. 2. Recurso especial provido." (STJ, 2â T., REsp n. 772.860/RN, rel. Min. Castro Mei- ra, j. 14.03.2006, £723.03.2006, p. 160.)

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APELAÇÃO

Nesse ponto é imprescindível um alerta. A petição de interposição e as razões recursais devem ser apresentadas simultaneamente na pri­meira instância, sob pena de não-conhecimento do recurso por defi­ciência ou falta de fundamentação. O procedimento na apelação civil não se equipara ao do sistema processual penal, no qual cabe a inter­posição do recurso sem as razões, permitindo-se que sejam apresenta­das, futuramente, no próprio tribunal.

O recurso de apelação é interposto na primeira instância, razão pe­la qual a petição de interposição é dirigida ao próprio juízo recorrido, que, após a admissão do recurso e a atribuição dos efeitos em que é recebido, remeterá os autos do processo ao tribunal competente, que aí conhecerá das razões recursais.

Quando da interposição da apelação, a parte recorrente deverá comprovar o recolhimento do preparo.6

2.3 Pr a z o p a r a In t e r p o s i ç ã o

Ordinariamente, o recurso de apelação deverá ser interposto no prazo de 15 dias, contados da data da leitura da sentença em audiência ou da intimação das partes (por meio de seus procuradores), quando a decisão não tiver sido proferida em audiência (art. 506 do CPC).

Nos juizados especiais, o prazo para a interposição de recurso con­tra sentença7 é 10 dias, conforme dispõe o art. 42 da Lei n. 9.099/95.

6 "Recurso. Preparo. Justo impedimento. Cabe à parte fazer a prova do impedimento. Se não a faz, a pena de deserção não pode ser relevada. Agravo regimental desprovido." (STJ, 3a T„ Ag. Reg. n. 163.445/SP, rel. Min. Nilson Naves, j. 29.06.1998, v.u.)

"Recurso. Preparo. Deserção. Horário bancário. Ajuizada a petição de recurso no horá­rio de funcionamento do foro, a impossibilidade de recolher o preparo no mesmo dia, por­que fechada a agência bancária, constitui justo impedimento para cumprir-se o disposto no art. 511 do CPC. Recurso conhecido e provido." (STJ, 4a T„ REsp n. 177.539/SC, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 05.11.1998, v.u.)

"Preparo. Impedimento. Art. 519 do CPC. A falta de publicação do valor do preparo não é considerada como justo impedimento, previsto no art. 519 do CPC. Recurso não conhecido." (STJ, 4a T., REsp n. 89.556/SP, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 06.06.1998, v.u.)

7 Nos juizados especiais, o recurso contra sentença é inominado, já que a lei não atribui o nome de apelação.

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2.4 Ef e it o s d a A p e l a ç ã o

m 2 .4 .1 E f e i t o d e v o l u t i v o

Como todo recurso, a apelação devolve ao tribunal o poder de co­nhecimento de toda a matéria já apreciada ou submetida ao juízo de primeiro grau.

A esse respeito, dispõe o Código de Processo Civil:

Art. 515. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.§ 1o Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribu­nal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro.§ 2° Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribu­nal o conhecimento dos demais.

[...]Art. 516. Ficam também submetidas ao tribunal as questões ante­riores à sentença, ainda não decididas.

Em princípio, a superficial leitura dos dispositivos transcritos leva à falsa conclusão de que eles são contraditórios entre si. Ora o efeito é amplo (pode o tribunal conhecer de tudo), ora limitado ao recurso in­terposto pela parte.

No recurso de apelação, o efeito devolutivo é amplo, já que o tri­bunal poderá conhecer de todas as matérias discutidas em primeira instância, sejam de fato ou de direito, inclusive quando não foram apre­ciadas expressamente na sentença ou até então não decididas. Eviden­temente, o tribunal não poderá conhecer das matérias a cujo respeito já se operou a preclusão; as matérias já decididas de forma definitiva não podem ser reapreciadas no recurso de apelação.

A preclusão é o efeito processual que gera a perda de uma faculda­de ou ônus na prática de ato processual. Assim, se durante o curso do processo ocorreu a preclusão acerca de determinada matéria, quando da apelação, o tribunal não poderá reapreciá-la. Vamos imaginar que,

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APELAÇÃO

em uma audiência de instrução e julgamento, o magistrado profira uma decisão interlocutória para o indeferimento da ouvida de uma testemunha; se a parte prejudicada não houver manifestado o incon- formismo naquele momento (por meio do agravo retido), haverá a preclusão e, quando da apelação, tal matéria não poderá ser julgada pelo tribunal.

O mesmo ocorre se a questão já tiver sido apreciada de forma defi­nitiva, como, por exemplo, uma decisão interlocutória da qual o tribu­nal já tenha julgado recurso de agravo de instrumento.

Mas, não estando a matéria preclusa ou julgada definitivamente, o efeito devolutivo do tribunal é amplo.

Por sua vez, essa amplitude de conhecimento é limitada às razões ou questões articuladas pelo apelante em seu recurso (art. 515 do CPC),o tribunal apenas conhecerá da matéria impugnada, isso segundo o princípio tantum devolutum quantum appellatum.

Em outras palavras, podemos dizer que o tribunal, em tese, pode­rá conhecer de todas as questões ventiladas em primeira instância, des­de que tenham sido impugnadas (ou tratadas) nas razões ou contra- razões recursais do apelo, isso em observância ao princípio do dispositivo, pelo qual o magistrado apenas poderá manifestar-se por provocação da parte.

A doutrina tem afirmado que o efeito devolutivo da apelação pode ser classificado de duas formas: a) quanto à extensão; b) quanto à pro­fundidade. Na extensão, o efeito devolutivo é amplo, já que o tribunal, em tese, poderá conhecer de todas as matérias discutidas em primeira instância; já na profundidade, apenas poderá adentrar nas questões que tiverem sido impugnadas pela parte recorrente.

■ ■ 2 . 4 . 2 E f e i t o S u s p e n s i v o 8

A regra imposta pelo art. 520 do Código de Processo Civil é no sentido de que o recurso de apelação será recebido no duplo efeito, ou seja, devolutivo e suspensivo.

8 Encontra-se em tramitação no Congresso Nacional projeto de lei que retira o efeito suspensivo da apelação. O texto afirma que a concessão de efeito suspensivo dependerá de decisão judicial, quando houver relevância e perigo de dano.

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Dessa forma, a interposição do recurso de apelação tem o efeito le­gal de impedir a execução do julgado, ou seja, a sentença não produzi­rá efeitos senão depois de mantida pelo tribunal quando do julgamen­to do apelo.

Todavia, o próprio art. 520 prevê exceções a essa regra, citando as hipóteses em que o recurso de apelação apenas será recebido no efeito devolutivo.

Deixando de recair sobre o recurso o efeito suspensivo, a parte ven­cedora do julgado poderá promover desde logo a execução provisória. A inexistência do efeito suspensivo gera a exigibilidade imediata do tí­tulo judicial.

Conforme os incs. do art. 520 do Código de Processo Civil, não terão efeito suspensivo as apelações interpostas de sentença que:

I - homologar a divisão ou a demarcação;li - condenar à prestação de alimentos;

Evidentemente, pela própria natureza da obrigação - indispensável à sobrevivência a lei processual admite que a sentença que condena o réu ao pagamento de alimentos poderá ser desde logo executada, inde­pendentemente da pendência do julgamento do recurso de apelação.

III - (Revogado pelo art. 9 o da Lein. 1 / .232/2005)?IV - decidir o processo cautelar;V - rejeitar liminarmente embargos à execução ou julgá-los im­procedentes;

No processo de execução de títulos extrajudiciais, como será objeto de estudo no capítulo próprio, o devedor poderá se defender contra a execu­ção por meio de embargos. Os embargos do devedor têm natureza de ação e, conseqüentemente, o ato judicial que julga tal ação é uma sentença.

9 O inciso tratava da sentença de liquidação. Com a reforma do processo de execução, trazida pela Lei n. 11.232/2005, a liquidação de sentença perdeu a natureza de ação e, por­tanto, o ato judicial que julga tal incidente passou a ser decisão interlocutória. Em se tratan­do de decisão interlocutória impugnável por meio de agravo, não havia mais sentido mantero inciso no capítulo da apelação.

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APELAÇÃO

Neste caso, julgados improcedentes os embargos, ou rejeitados li­minarmente, a apelação interposta contra tal sentença não terá efeito suspensivo, com isso, o processo de execução, que estava suspenso pela oposição dos embargos, voltará a ter seu curso restabelecido.

VI - julgar procedente o pedido de instituição de arbitragem;(Inciso acrescentado pela Lei n. 9.307/96.)

Trata-se de sentença que apenas institui a arbitragem.Como sabemos, havendo o compromisso arbitrai, caso uma das

partes se recuse à arbitragem (instituição do árbitro para resolução do litígio), a parte interessada poderá ir a juízo apenas para que o judiciá­rio determine o início da arbitragem.

Portanto, a sentença que instituir a arbitragem comporta apelação apenas no efeito devolutivo (sem efeito suspensivo).

VII - confirmar a antecipação dos efeitos da tutela.10

Notoriamente, não há se falar em efeito suspensivo sobre a senten­ça que confirmar a antecipação dos efeitos da tutela (na parte em que houver a confirmação), já que a execução desses efeitos antecipatórios já teve início quando da concessão da medida liminar.

Se a apelação interposta contra a sentença confirmatória de tutela antecipada tivesse efeito suspensivo, o recurso acabaria por paralisar os efeitos da liminar anteriormente concedida.

Além do art. 520 do Código de Processo Civil, existem outras situações em que a apelação terá apenas efeito devolutivo (ficando assegurado o direito à execução provisória pela parte vencedora):

a) nas apelações de sentenças proferidas em mandado de segurança,não haverá, como regra, efeito suspensivo;11

10 Inciso inserido no art. 520 por força da Lei n. 10.352/2001." A apelação terá efeito suspensivo quando a segurança importar em equiparação, conces­

são de aumento ou extensão de vantagens a servidores públicos, nos termos da Lei n. 4.348/64.

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b) nas ações de locação, a sentença poderá ser executada provisoria­mente, mesmo estando o processo pendente do julgamento de apelação.

2 . 5 J U L G A M E N T O DO M É R IT O PELO T R I B U N A L

Outra alteração importante gerada pela Lei n. 10.352/2001 foi a introdução, no art. 515, § 3o, do Código de Processo Civil, da permis­são para o tribunal julgar as lides extintas em primeira instância sem julgamento do mérito (art. 267 do CPC), isso quando a causa versar exclusivamente sobre questão de direito e se estiver em condições de proceder ao julgamento.

Para que possamos entender essa inovação, no mínimo estranha, é necessária a análise do sistema antigo.

Antes do advento da Lei n. 10.352/2001, havendo uma sentença de extinção do processo sem julgamento do mérito, nas hipóteses do art. 267 do Código de Processo Civil, podia a parte dela interpor recurso de apelação e, caso o tribunal apurasse o erro in procedendo, anulava o ato e, imediatamente, devolveria o processo à primeira instância para que o órgão singular proferisse uma nova sentença, agora com aprecia­ção do mérito (art. 269 do CPC).

O tribunal anulava a sentença terminativa e determinava o retor­no à primeira instância para que fosse proferida uma definitiva de mérito, sob pena de haver supressão do primeiro grau de jurisdição caso houvesse o julgamento do mérito pelo tribunal.

No entanto, com o advento da reforma citada, passou a prever o § 3o do art. 515 do Código de Processo Civil:

Art. 515. [...]

§ 3o Nos casos de extinção do processo sem julgamento do méri­

to (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa

versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de

imediato julgamento.

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APELAÇÃO

Com a introdução do mencionado § 3o, versando a controvérsia apenas sobre questão de direito e estando o feito em condições de ser julgado, o próprio tribunal proferirá o juízo de mérito, não precisan­do determinar a remessa dos autos à primeira instância para que seja proferida outra em seu lugar. Em outras palavras, a própria lei auto­rizou a supressão do primeiro grau de jurisdição nas hipóteses lá de­terminadas.

Nota-se que esse dispositivo dá maior efetividade ao processo, evi­tando o retorno à primeira instância e, eventualmente, futura devolu­ção ao tribunal para julgamento de outro recurso de apelação versan­do sobre o mérito.

Ressalte-se que para o tribunal conhecer diretamente do mérito é necessário:

a) A causa versar exclusivamente sobre questão de direito. O que eqüivale a dizer as hipóteses em que a controvérsia entre as partes apenas versar acerca da interpretação e aplicação do direito, sem a existência de discussão de fatos.

b) A causa estiver pronta para julgamento. O processo encontra-se pronto para julgamento, como tratamos anteriormente, quando completa a fase postulatória: com a defesa do réu ou a decretação da revelia, e depois de encerrada a instrução.12

A redação do § 3o leva à primeira conclusão de que devem estar presentes ambos os requisitos, pelo fato de utilizar-se da expressão “e” ao ligar os pressupostos ali enumerados. Parece que o dispositivo legal quis impedir que o tribunal tivesse o poder de conhecer diretamente das questões de fato, permitindo a supressão do primeiro grau de juris­dição todas as vezes em que houvesse tão-somente controvérsia acerca da interpretação do direito.

'2 A primeira idéia que se extrai da interpretação conjunta de ambos os requisitos é que não haverá a necessidade de dilação probatória, já que a causa deve versar exclusivamente sobre questão de direito.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Na verdade, dar ao tribunal o poder de julgar diretamente ques­tões de fato (sem terem passado pela primeira instância) poderia con­duzir à grave dificuldade de conhecimento e compreensão da lide. Em primeiro lugar, por ser incumbência do juiz de primeira instância des­vendar os fatos, colher a prova processual, ouvir testemunhas e tirar a sua impressão da verdade que é levada ao processo - afinal, vige no processo civil o princípio da identidade física do juiz, pelo qual aque­le que colhe as provas é que proferirá o julgamento da causa. Além dis­so, para aproximar o juiz da prova e permitir a melhor compreensão dos fatos é que se impõe o princípio da imediação, segundo o qual toda prova passa pela pessoa do juiz.

O tribunal é órgão distante dos fatos. O colegiado, normalmente composto por três magistrados, não colheu a prova, não teve contato direto com ela; portanto, sua compreensão dos fatos pode não corres­ponder à verdade. Obviamente, a percepção direta dos fatos pelo tri­bunal (sem a intervenção da percepção colhida pelo juiz singular) poderia conduzir à falsa conclusão da verdade.

Por essa razão, a princípio, entendemos que o tribunal apenas po­derá conhecer diretamente do mérito quando não houver controvérsia acerca de fatos, quando não houver a necessidade de se apurar a diver­gência de fatos afirmados pelas partes, e a questão apenas depender da interpretação da lei abstrata.

No entanto, em uma posição mais ousada - também respeitada - , Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery comentam13 o novo dispositivo, sustentando que os requisitos podem ser alternativos, isto é, deve a causa versar sobre questão de direito, ou, quando contiver questões de fato e de direito, a causa já estiver madura para o julga­mento, isso quando a instrução já estiver encerrada. Mesmo existindo questões de fato, se o processo estiver maduro para o julgamento, o tri­bunal poderá conhecer diretamente do mérito.

13 Código de Processo Civil comentado, p. 858-9. No mesmo sentido: Teresa Arruda Alvim Wambier & Luiz Rodrigues Wambier, Breves comentários à 2 a fase da reforma do Códi­go de Processo Civil, p. 96.

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APELAÇÃO

Por se tratar de um tema absolutamente novo em nosso ordena­mento, teremos ainda muito que refletir sobre a matéria e esperar as novas manifestações doutrinárias e da jurisprudência para firmar uma posição definitiva.

2.6 JUÍZO DE RETRATABILIDADE

O juízo de retratação consiste na possibilidade de o juiz, motivado pelo recurso interposto pela parte sucumbente, reformar sua própria decisão, ou seja, o ato de retratação eqüivale à manifestação de voltar atrás ou de reconsiderar acerca de decisão anteriormente proferida.

Ao proferir a sentença, o juiz de primeiro grau encerra o seu ofí­cio jurisdicional, restando-lhe, apenas, a função de receber o recurso de apelação (juízo de admissibilidade precário) e declarar os efeitos do referido recurso. Dessa forma, após publicada a sentença, a regra é no sentido de que o juiz não mais poderá retratar-se ou modificar a sen­tença que proferiu.

Todavia, essa regra sofre as seguintes exceções:

a) Sentença de indeferimento da petição inicialO art. 296 do Código de Processo Civil faculta ao juiz a possi­

bilidade de reconsideração quando da interposição de recurso de apelação contra sentença de indeferimento da petição inicial (art. 267, do CPC).14

Assim, indeferida a petição inicial, e apelando a parte autora (evidentemente, quem tem legitimidade para tanto), o juiz pode­rá, no prazo de 48 horas, reformar a sua sentença para determinar o andamento regular do processo cuja petição inicial havia sido indeferida.

14 "Art. 296. Indeferida a petição inicial, o autor poderá apelar, facultado ao juiz, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, reformar sua decisão.

Parágrafo único. Não sendo reformada a decisão, os autos serão imediatamente enca­minhados ao tribunal competente."

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b) Sentença de improcedência proferida sem a citação do réu (art. 285-A)

O art. 285-A do Código de Processo Civil autoriza o juiz a pro- latar sentença, mesmo antes de citar o réu, quando for para julgar improcedente o pedido do autor em causa que versar exclusiva­mente matéria de direito.

Caso seja proferida sentença nessas condições, o autor poderá apelar e, neste caso, o juiz poderá se retratar, tornando sem efeito a sentença proferida para determinar o prosseguimento do feito (ou seja, determinando a citação do réu para apresentar defesa).

Na hipótese citada, a apelação do autor terá por fundamento a inaplicabilidade do art. 285-A - que permite o julgamento sem a ci­tação do réu - e, conseqüentemente, constatando o magistrado que o autor tem razão no seu apelo, poderá ele declarar sem efeito a sen­tença para que o processo seja restabelecido no seu curso comum.

c) Sentenças proferidas com base no Estatuto da Criança e do Ado­lescente

Nos procedimentos judiciais estabelecidos pela Lei n. 8.069/90 - Estatuto da Criança e do Adolescente - , por expressa determina­ção do art. 198, VII, no prazo de 5 dias e em qualquer recurso o magistrado poderá exercer juízo de retratabilidade.15

2.7 Pr o c e d i m e n t o n a A p e l a ç ã o

O processamento do recurso de apelação observará:

15 "Art. 198. Nos procedimentos afetos à Justiça da Infância e da Juventude fica adota­do o sistema recursal do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n. 5.869, de 11 de janei­ro de 1973, e suas alterações posteriores, com as seguintes adaptações: [...].

VII - antes de determinar a remessa dos autos à superior instância, no caso de apelação, ou do instrumento, no caso de agravo, a autoridade judiciária proferirá despacho fundamen­tado, mantendo ou reformando a decisão, no prazo de cinco dias;

VIII - mantida a decisão apelada ou agravada, o escrivão remeterá os autos ou o instru­mento à superior instância dentro de vinte e quatro horas, independentemente de novo pedi­do do recorrente; se a reformar, a remessa dos autos dependerá de pedido expresso da parte interessada ou do Ministério Público, no prazo de cinco dias, contados da intimação."

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APELAÇÃO

a) publicada ou intimada da sentença em audiência, a parte sucum- bente terá o prazo de 15 dias para a interposição da apelação, salvo se for a Fazenda Pública, Ministério Público ou litisconsortes com procuradores diferentes, que terão o dobro;

b) o recurso deverá conter a petição de interposição, que será ende­reçada ao juízo recorrido, e as razões recursais (fundamentação para a reforma ou anulação do julgado recorrido);

c) o recurso de apelação (petição de interposição acompanhada das razões recursais e comprovação do recolhimento do preparo) de­verá ser protocolizado ou apresentado no juízo recorrido, nos ter­mos determinados pelas leis de organização judiciária do âmbito de jurisdição em que tramita o feito;

d) interposto o recurso, o magistrado recorrido (de primeira instân­cia) realizará o juízo de admissibilidade do recurso;

e) recebido o recurso (sendo o juízo de admissibilidade positivo), o juiz declarará16 os efeitos em que é recebida a apelação (art. 518 do CPC), isso com total observância do disposto no art. 520 do Códi­go de Processo Civil;

f) o juiz determinará a abertura de vistas à parte contrária para que possa responder ao recurso, ou seja, apresentar as contra-razões de apelação, como regra, no prazo de 15 dias;

g) após a apresentação das contra-razões, poderá o juiz realizar novo juízo de admissibilidade recursal, no prazo de 5 dias,17 agora com o conhecimento das alegações da parte contrária, que poderá ter alertado a inexistência de algum pressuposto para a interposição do recurso (§ 2o do art. 518 do CPC);

h) o juiz determinará a remessa dos autos ao tribunal competente, que, segundo a ordem dos processos nos tribunais (tópico tratado adiante), terá realizado o julgamento do recurso de apelação.

16 O critério é absolutamente objetivo, conforme dispõe o art. 520 do Código de Pro­cesso Civil. Não há discricionariedade ou apreciação subjetiva para a atribuição dos efeitos do recurso de apelação.

17 Apesar de a lei estipular o prazo de 5 dias, trata-se de prazo impróprio, já que não há que se falar em preclusão para o magistrado.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Em resumo, o processamento da apelação pode ser representado da seguinte forma:

2.8 Es t r u t u r a d a Pe t i ç ã o d a A p e l a ç ã o

A petição de interposição deverá conter:

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APELACÂO

a) endereçamento ao juízo recorrido;b) qualificação do recorrente quando isso ainda não ocorreu no pro­

cesso (terceiro prejudicado recorrente); se a apelação estiver sendo interposta pela parte já qualificada no processo, fica dispensada nova qualificação;

c) manifestação do inconformismo e da interposição do recurso que está sendo interposto;

d) indicação do recolhimento do preparo e da apresentação, em ane­xo, das razões recursais;

e) indicação do local, data, assinatura, nome do advogado e seu nú­mero de inscrição na OAB.

Por sua vez, deverão constar nas razões recursais:

a) informações mínimas do processo (apelante, apelado, origem do processo, etc.);

b) saudação ao tribunal e ao órgão colegiado julgador (por exemplo, Egrégio Tribunal, Colenda Turma, etc.);

c) narrativa dos principais fatos da lide e do processo (breve resumo dos principais atos ocorridos no processo, por exemplo, síntese da ação proposta, da defesa, das provas colhidas e da sentença recorrida);

d) fundamentação do pedido de reforma ou anulação da sentença recorrida (art. 514, II, do CPC);

e) o requerimento de conhecimento e provimento do recurso para reforma ou anulação, devendo o recorrente apresentar as especifi­cações e os efeitos pretendidos no provimento recursal (art. 514, III, do CPC).

2 . 9 J U Í Z O DE A D M I S S I B I L I D A D E DA A P E L A Ç Ã O

E A S Ú M U L A I M P E D I T I V A DE R E C U R S O

Como tratamos no tópico relativo ao juízo de admissibilidade, todo recurso, antes de ter o mérito julgado pelo tribunal, passa pela verifica­

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60 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

ção dos pressupostos recursais, requisitos genéricos e os específicos de cada espécie de recurso. Assim, tradicionalmente, poderíamos definir o juízo de admissibilidade como a verificação dos pressupostos recursais.

Na apelação, esse juízo de admissibilidade é realizado em dois momentos: a) na primeira instância, pelo magistrado recorrido; b) pe­lo tribunal, quando o juízo de admissibilidade tiver sido positivo na primeira instância.

Ressalte-se que, na primeira instância, o juízo de admissibilidade é precário. Se for negativo, a parte poderá interpor agravo de instrumen­to para que o tribunal destranque o recurso não admitido na primei­ra instância. Caso passe pelo juízo de admissibilidade na primeira ins­tância, quando recebido no tribunal, terá renovada a verificação dos pressupostos recursais.

De uma forma ou de outra, a última palavra em admissibilidade da apelação sempre será do tribunal (órgão competente para o julga­mento do mérito).

Atualmente, o conceito de juízo de admissibilidade da apelação foi modificado pela Lei n. 11.276/2006, que inseriu o § Io ao art. 518, para permitir que o juiz denegue seguimento ao recurso de apelação se a sentença recorrida estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal.

Ou seja, quando da verificação da admissão da apelação, o juiz também poderá considerar o mérito recursal para negar seguimento ao apelo se o recurso estiver em desconformidade com as súmulas m en­cionadas. A reforma introduzida pela Lei n. 11.276/2006 criou a possi­bilidade de existência de súmula impeditiva do recurso de apelação.

Evidentemente, se o magistrado aplicar indevidamente o disposto no § Io do art. 518 do Código de Processo Civil, contra tal decisão caberá re­curso de agravo de instrumento, devendo o tribunal manifestar-se acer­ca da adequação do caso e do recurso às súmulas citadas na sentença.

Não se pode deixar de mencionar que a aplicação da súmula poderá ter sido equivocada ao caso concreto e, portanto, a parte vencida tem inte­resse na subida e conhecimento do recurso para obter o afastamento da súmula. Assim, não se pode negar a existência de recurso contra a decisão que deixar de receber a apelação com base na súmula impeditiva.

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APELAÇÃO

2 .10 S a n e a m e n t o de N u l i d a d e s d u r a n t e

o Pr o c e s s a m e n t o d a A p e l a ç ã o

A Lei n. 11.276/2006 introduziu no art. 515 do Código de Proces­so Civil o § 4o para permitir ao tribunal que, ao constatar no processo vício sanável, interrompa o julgamento da apelação para a realização de diligência que venha corrigir ou renovar o ato processual, nos se­guintes termos:

§ 4o Constatando a ocorrência de nulidade sanável, o tribunal po­derá determinar a realização ou renovação do ato processual, inti­madas as partes; cumprida a diligência, sempre que possível pros­seguirá o julgamento da apelação.

O referido dispositivo vai ao encontro do princípio da instrumen- talidade das formas e da economia processual, a fim de evitar ao máxi­mo a decretação de nulidade de todo o processo ou de prejuízo à parte quando for possível ser saneado e aproveitados os atos processuais válidos.

Assim, se o tribunal verificar que uma irregularidade processual po­de ser sanada, deverá conceder à parte essa oportunidade, sem a decre­tação da nulidade do processo ou dos atos processuais.

Por exemplo, imaginemos que, em primeira instância o processo não teve a manifestação do Ministério Público quando, por imposição legal, deveria ele funcionar como fiscal da Lei. Neste caso, entendemos que, apesar de se tratar de uma nulidade (por expressa previsão legal), o tribunal deverá antes de decretá-la dar a oportunidade de ser saneada.

No exemplo citado, o tribunal interromperia o julgamento da ape­lação e abriria vistas ao Ministério Público; havendo concordância e a inexistência de prejuízo às partes, poderia o processo continuar com o aproveitamento de todo o processo e sem a decretação da nulidade.

O mesmo poderia ser aplicado, por exemplo, à falta de capacidade postulatória do advogado. Seria o caso, apenas a título exemplificativo, do recurso interposto por advogado não constituído nos autos, ou ain­da recurso interposto sem a assinatura do patrono. São situações em que, antes de decretar a nulidade, o tribunal poderá dar a oportunida­de à parte para sanar o vício.

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De certo, não sendo possível na prática sanar o vício em sede de a- pelação, o tribunal deverá reconhecer a nulidade e determinar as pro­vidências cabíveis ao caso, como o retorno dos autos à primeira instân­cia ou o prosseguimento da apelação com o prejuízo decorrente do vício não sanado.

Sobre apelação e demais recursos, confira o Anexo 1 da Parte I - Resumo dos recursos, p. 152

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A g r a v o s 3

3.1 De f i n i ç ã o e C a b i m e n t o 1

O recurso de agravo tem cabimento contra decisões in­terlocutórias, ou seja, atos judiciais que apreciem questões meramente incidentais do processo.

As decisões interlocutórias não resultam no encerramen­to do processo na primeira instância - pois, se assim fossem, seriam sentenças - ou tampouco nos tribunais são proferidas por órgãos colegiados (senão seriam acórdãos).

O conceito de decisão interlocutória, atendendo à finali­dade ou ao efeito em relação ao processo, está previsto no art. 162 do Código de Processo Civil, transcrito a seguir:

Art. 162. Os atos do juiz consistirão em sentenças, de­cisões interlocutórias e despachos.

[...]

1 Teresa Arruda Alvim Wambier, Os agravos no CPC brasileiro, p. 76.

63

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

§ 2° Decisão interlocutória é o ato pelo qual o juiz, no curso do processo, resolve questão incidente.

De fato, no curso do processo, os magistrados são instados a deci­dir inúmeras questões processuais periféricas, isso como meio para conseguir chegar à apreciação do mérito da lide (na sentença). São incomensuráveis as decisões interlocutórias que podem ser proferidas em um processo, mas, apenas a título de exemplo, é interlocutório o ato que aprecia as liminares (tutela antecipada), a impugnação ao va­lor da causa, o despacho saneador, a decisão da exceção de incompetên­cia, o simples indeferimento de uma pergunta à testemunha em au­diência, entre outros.

Como se vê, são inúmeras as possibilidades de decisões interlocu­tórias no processo e, conseqüentemente, de tal ato gerar prejuízo à par­te a ponto de justificar a interposição do recurso de agravo.

3 . 2 E S P É C IE S DE A G R A V O S

O art. 496 do Código de Processo Civil, acertadamente, prevê em seu inc. II o gênero agravo, já que ele poderá ocorrer no processo por diversas formas e em momentos processuais distintos. Como sabemos, as decisões interlocutórias ocorrem durante todo o processo e por diversas vezes. Ao contrário do que se verifica com as sentenças, que são proferidas, como regra, uma única vez no processo, as decisões in­terlocutórias são diversas, pois muitas são as questões incidentais a serem resolvidas na demanda para permitir o julgamento do mérito.

Por essa razão, o atual sistema recursal admite diversas modalida­des de agravos, isso para adequar o recurso à decisão interlocutória que se pretende impugnar.

Na redação anterior ao advento da Lei n. 8.950/94, previa o art. 496 tão-somente a espécie de recurso agravo de instrumento. Todavia, com a referida reforma, corrigiu-se a deficiência terminológica para fazer constar apenas o nome agravo, o que nos leva a crer que agravo é

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AGRAVOS 65

gênero2 do qual decorrem as outras modalidades, como o agravo de instrumento, agravo retido, agravos internos, agravo contra decisão que nega seguimento a recurso especial e/ou extraordinário, adequan­do-se cada um à espécie de decisão impugnada.

Dessa forma, podemos afirmar que existem no atual sistema pro­cessual brasileiro as seguintes espécies de agravos:

m Contra decisões interlocutórias de primeira instância

Agravos C

Contra decisões interlocutórias ' proferidas nos tribunais3

3 . 3 J u í z o D E R e t r a t a b i l i d a d e

A retratação ou reconsideração consiste no poder de o próprio magistrado rever a sua decisão e sobre ela proferir novo julgamento, modificando o anterior.

Em relação às decisões interlocutórias, é pacífico o entendimento de que, interposto o recurso de agravo, poderá o magistrado se retra­tar, rever sua decisão e emitir uma nova decisão de reconsideração.

2 Nelson Nery Júnior & Rosa Maria de Andrade Nery, Código de Processo Civi!comenta­do, p. 940, nota 3 ao art. 496. Cândido Rangel Dinamarco, A reforma do Código de Proces­so CM/, p. 161.

3 No âmbito dos tribunais, quando do processamento de recursos ou ações de compe­tência originária, poderão ocorrer decisões interlocutórias, ou seja, atos proferidos monocra- ticamente pelos membros dos tribunais que possam causar prejuízo à parte. Ressalte-se que, em se tratando de ato colegiado, não será decisão interlocutória, e sim um acórdão.

Agravo retido

Agrem) de instrumento

f Agravo regimental

Agravo interno (ou para o órgão colegiado)

/ Agravo contra decisão denegatória de recurso especial ou recurso extraordinário

(art. 544 do CPC)

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Há tal possibilidade pelo fato de que, quando do pronunciamento de uma decisão interlocutória, no primeiro ou no segundo grau de ju ­risdição, o magistrado não encerra a sua função no processo.

Isso não ocorre com as sentenças ou acórdãos, uma vez que, pro­feridos esses atos judiciais, não há que se falar em possibilidade de re­tratação, dado o esgotamento da atividade do órgão jurisdicional.

Como se não bastasse a continuidade da atividade do órgão juris­dicional após proferir a decisão interlocutória, muitos dos institutos do processo civil são considerados pela própria lei como pronunciamen­tos provisórios, admitindo a sua modificação a qualquer momento, como se verifica com as decisões relativas à tutela antecipada, à conces­são da justiça gratuita, da apreciação das cautelares, etc.

Assim, sendo interposto qualquer recurso de agravo, poderá o ma­gistrado reformar sua decisão (arts. 523, § 2o e 529 do CPC).

3 .4 AGRAVOS CONTRA DECISÕES

INTERLOCUTÓRIAS DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

No curso do processo na primeira instância, contra as decisões interlocutórias poderão ser interpostos:

a) agravo retido;b) agravo de instrumento.

3.5 A g r a v o Re t i d o 4

M 3.5.1 DEFINIÇÃO

O agravo retido é espécie de agravo em que o recurso será juntado aos autos do próprio processo em que se encontra a decisão interlocu­tória e será julgado apenas quando do julgamento de eventual recurso

‘ É absolutamente errada a utilização do termo agravo de instrumento retido, pois o recurso ou será retido ou de instrumento; ambos são formas de interposição e incompatíveis entre si.

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AGRAVOS 67

de apelação. Denomina-se retido pelo fato de que o recurso não é diri­gido imediatamente ao tribunal para julgamento.

Para explicar o agravo retido, Carlos Eduardo Ferraz de Mattos Bar­roso comenta:5

Pode a parte não pretender desde logo o reexame de uma decisão in­terlocutória a ela contrária, mesmo porque não tem conhecimento de seu efetivo prejuízo na formação do convencimento do juiz. Para tanto, facul- ta-lhe a lei manifestar seu inconformismo através do agravo sob a forma retida, requerendo que permaneça ele nos autos para o conhecimento do tribunal, preliminarmente, quando do julgamento de eventual apelação.

Dessa forma, interposto o agravo na forma retida, ficará ele so- brestado, dormindo ou suspenso até que seja interposto recurso de ape­lação, quando, aí sim, o agravo retido será julgado preliminarmente a este recurso.

Como se vê, o agravo retido se opõe ao agravo de instrumento: ao passo que este é interposto diretamente no tribunal competente e terá seu julgamento imediato, o primeiro deverá ser interposto na primei­ra instância e ficará sobrestado até o futuro julgamento de um recurso de apelação. O recurso de agravo retido apenas subirá ao tribunal com eventual recurso de apelação.

À primeira vista, o leitor poderá se perguntar: para que serve esse agravo se ele apenas será julgado em conjunto com a apelação? A prin­cípio, parece que o agravo retido é inútil e ineficaz.

Na verdade, o principal efeito do agravo retido é o de obstar a pre- clusão. Devemos lembrar que, se a parte deixar de manifestar o incon­formismo contra um ato judicial, a matéria ficará preclusa e, quando da apelação, o tribunal não poderá se manifestar, salvo se for o caso de matéria de ordem pública (que não gera preclusão).

■ i 3 . 5 . 2 C a b i m e n t o d o A g r a v o R e t i d o

A sistemática dos agravos — retido e de instrumento — havia sido introduzida no sistema recursal brasileiro em 1994, quando aquela re­

5 Teoria gera! do processo eprocesso de conhecimento, p. 204.

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forma houve por bem diferenciar ambos os recursos. Na verdade, o agravo de instrumento passou a ser interposto diretamente no tribu­nal, para ter julgamento imediato, e o agravo retido, juntado aos autos da primeira instância para julgamento em conjunto com eventual re­curso de apelação.

No entanto, a regra era no sentido de que a escolha entre o agravo de instrumento e o agravo retido ficava para à livre escolha e conve­niência da parte que, dependendo do interesse recursal - se fosse u r­gente usava o agravo instrumento, caso contrário o retido se valia de uma ou outra modalidade de agravo.

No entanto, essa “liberdade” gerou grande desvirtuamento dos ins­titutos e, como regra, os advogados usavam o agravo de instrumento, independentemente da urgência. Com isso, os tribunais ficaram abar­rotados de agravos de instrumento.

Então vieram mais reformas: primeiro uma delas tentou diminuir o número de agravos de instrumento nos tribunais (Lei n. 10.352/2001), autorizando ao relator do agravo converter este recurso em retido, quan­do não se tratar de questão urgente. Mas só isso não foi suficiente.

Agora a reforma da Lei n. 11.187/2005 passou a prever o agravo reti­do como regra contra as decisões interlocutórias, conforme redação do art. 522 do Código de Processo Civil, apenas cabendo o agravo de ins­trumento nas questões de urgência ou de ineficácia do agravo retido.

Na verdade, entendemos que nada m udou com a reforma da Lei n. 11.187/2005, já que a norma apenas passou a prever expressamente aquilo que sempre esteve implícito para o cabimento dos dois agravos, ou seja, o agravo de instrumento para situações de urgência e o agra­vo retido nos casos em que se pode aguardar até eventual subida dos autos ao tribunal para julgamento de apelação.

Portanto, não sendo caso de agravo retido obrigatório, a parte re­corrente escolherá entre o agravo retido e o de instrumento valendo-se do interesse recursal.

Também não haveria que se falar em agravo retido contra a deci­são denegatória de admissibilidade da apelação ou relativa aos seus efeitos. Nesses dois casos, por questão eminentemente prática, o agra­vo deverá ser de instrumento e não o retido.

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AGRAVOS 69

Por lógica, o agravo retido apenas sobe ao tribunal em conjunto com a apelação, logo, se a decisão interlocutória for pela não admissão da apelação não se falará de agravo retido, mas sim de instrumento.

No caso da decisão que recebe a apelação e declara seus efeitos, tam ­bém não haveria que se falar em agravo retido, já que, se o juiz receber o recurso de apelação com efeito errado, ofendendo a regra do artigo 520 do Código de Processo Civil, alguma das partes estaria diante de um grave dano.6 Assim, nos casos de decisão que nega seguimento à apelação ou que declara seus efeitos, é cabível o agravo de instrumen­to e não o agravo na forma retida.

Por outro lado, por expressa previsão legal (art. 523, § 3o, do CPC), nas decisões interlocutórias proferidas em audiência de instrução e julgamento, o agravo retido será obrigatório, não tendo a parte a pos­sibilidade de utilização do agravo na forma de instrumento. E mais, deverá ser interposto imediatamente, na forma oral.

■ i 3 . 5 . 3 F o r m a e P r o c e s s a m e n t o d o A g r a v o r e t i d o

O agravo retido poderá ser interposto:

a) na forma escrita, no prazo de 10 dias, por meio de petição de inter­posição e razões recursais;

b) na forma oral, em audiência, sendo as razões recursais transcritas no termo da referida audiência.

Ressalte-se que, em se tratando de agravo retido contra decisão proferida em audiência de instrução e julgamento, será ele, obrigatoria­mente, interposto na forma oral, sob pena de preclusão. Deste modo, a parte pedirá a palavra ao juiz, imediatamente à prolação da decisão agravada para, em razões sucintas, expor os motivos de seu inconfor- mismo, constando o recurso do termo da audiência.

6 Se o juiz recebe a apelação no duplo efeito, equivocadamente, a parte vencedora fica­rá impedida de executar a sentença. Em caso contrário, se o juiz errar e acolher a apelação apenas no efeito devolutivo, a parte vencida será executada indevidamente. Em ambos os casos, a revisão do erro demanda um recurso eficaz e rápido, para evitar prejuízo à parte.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

É importante frisar que, em se tratando de audiência de concilia­ção (preliminar), se a parte desejar recorrer de alguma decisão interlo­cutória que lá possa ter sido proferida (como o despacho saneador), terá a faculdade de fazer na forma oral ou escrita.

A forma oral obrigatória é restrita às audiências de instrução e jul­gamento.

Mas, interposto na forma oral por obrigatoriedade legal, não obs­tante a omissão legal, nosso entendimento é no sentido de que o m a­gistrado deverá, em ato contínuo à interposição oral do agravo, tam ­bém conceder a palavra à parte contrária para suas contra-razões. Havendo a obrigatoriedade da interposição oral do agravo, temos que a resposta também deverá ser oral, sob pena de ser dado tratamento diferenciado às partes, violando a isonomia.

Por outro lado, sendo o agravo retido na forma escrita, será ele apresentado ao juízo de primeira instância por meio de petição de in­terposição e razões recursais. Juntado o recurso aos autos, serão abertas vistas à parte contrária para suas contra-razões (ou contra-minuta).

Seja de uma forma ou de outra, para o agravo retido não haverá preparo (parágrafo único do art. 522 do CPC).

Recebido e respondido o recurso, ficará ele sobrestado nos autos — sem qualquer andam ento - até que, no futuro, os autos sejam reme­tidos ao tribunal para julgamento da apelação e possa o agravo ser jul­gado.

m 3 . 5 . 4 R e i t e r a ç ã o d o A g r a v o R e t i d o

Como falamos anteriormente, interposto e respondido o recurso de agravo retido, ficará ele sobrestado nos autos da ação, e o recurso fi­cará dormindo no processo sem nenhum andamento.

A regra é no sentido de que o agravo retido seja apreciado prelimi­narmente quando do julgamento da apelação. Ou seja, no mesmo jul­gamento da apelação, primeiro será apreciado o agravo retido e, de­pois, caso a apelação não tenha sido prejudicada, será ela julgada pelo tribunal.

Mas, o agravo retido apenas será conhecido se a parte agravante reiterar o pedido nas razões ou contra-razões de apelação.

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AGRAVOS 7 1

É o que, nas brincadeiras do magistério universitário, chamamos de o beijo da bela adormecida. De fato, se o agravo está dormindo (so- brestado), para que seja acordado, deve a parte agravante, quando ela­borar sua apelação ou contra-razões de apelação, inserir um parágra­fo reiterando o pedido de conhecimento do agravo retido.

Ressalte-se que a reiteração de conhecimento do agravo deve ser expressa nas razões ou contra-razões de apelação, não sendo necessá­ria ou útil a reiteração da tese prevista no agravo.7

Na verdade, por uma questão prática, a reiteração serve para aler­tar o tribunal da existência de um agravo retido juntado aos autos.

Se a parte interessada deixar de reiterar o pedido de conhecimen­to do agravo retido, o tribunal entenderá que houve uma desistência tácita.

■ i 3 . 5 . 5 E f e i t o s d o a g r a v o r e t i d o

Como se deduz do procedimento do agravo retido, nota-se que ele terá somente efeito devolutivo, efeito este que ainda será diferido para momento posterior do processo, ou seja, a devolutividade ao tribunal apenas ocorrerá quando do eventual e futuro conhecimento do recur­so de apelação.

1 "Processual civil. Remessa necessária. Majoração da verba honorária. Reformatio in pejus. Impossibilidade. Agravo retido. Necessidade de reiteração nas contra-razões de ape­lação. (...) 2. 0 fato de o recorrente, nas contra-razões de apelação, insistir na tese que moti­vou a interposição de agravo retido nos autos não tem, só por si, o condão de suprir a exi­gência estampada no art. 523, § 1o, do Código de Processo Civil. 3. Recurso especial parcialmente provido." (STJ, REsp n. 264.264/BA, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 10.02.2004, v.u.)

"Inventário. Partilha. Agravos retidos reiterados pela apelante, mas não conhecidos. Art. 1.805 do Código Civil. Aplicação indevida. Reiterados os termos dos agravos retidos quando da interposição do recurso de apelação, há obrigatoriedade de apreciação dos mesmos agra­vos pelo órgão julgador. (...) Recurso Especial conhecido, em parte, e provido, a fim de que o Tribunal de origem julgue os agravos retidos e o mérito da apelação." (STJ, REsp n. 303.183/RJ, rel. Min. Barros Monteiro, j. 18.10.2001, v.u.)

"Processual civil. Agravos retidos. Reiteração em recurso adesivo. Admite-se a reitera­ção de agravos retidos em apelação adesiva." (STJ, REsp n. 25.106/MG, rel. Min. Dias Trinda­de, j. 14.12.1993, v.u.)

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

No agravo retido não há se falar em efeito suspensivo.8Aparentemente, poderíamos pensar que o recurso de agravo reti­

do não teria qualquer utilidade para o processo, já que seu efeito devo­lutivo é diferido e não há efeito suspensivo.

No entanto, esse agravo tem a importante função de obstar a pre­clusão da matéria impugnada, como já afirmamos anteriormente.

3.6 A g r a v o de I n s t r u m e n t o

A denominação “de instrumento” é empregada pelo fato de o agra­vo nessa modalidade ser interposto diretamente no tribunal compe­tente para o seu conhecimento; dependendo da formação de um novo instrumento, novos autos são formados no tribunal com as cópias do processo que tramita perante a primeira instância e no qual foi profe­rida a decisão agravada.

Assim, em vez de ser juntado no próprio processo (como ocorre com o agravo retido), o agravo de instrumento é dirigido e interposto diretamente no tribunal competente. O agravo de instrumento é re­curso muito eficaz, pelo fato de que o reexame da decisão impugnada ocorre de forma imediata e urgente.

O cabimento do agravo de instrumento ficará restrito àquelas si­tuações em que a parte demonstrar perigo de dano (urgência) ou ineficácia do agravo retido.

■ i 3 . 6 . 1 R e g u l a r i d a d e F o r m a l

e F o r m a ç ã o d o i n s t r u m e n t o

A petição de agravo será endereçada e protocolizada diretamente no tribunal competente para o seu conhecimento, devendo, obrigato­riamente, conter os seguintes requisitos (arts. 524 e 525 do CPC):

8 "Medida cautelar incidental. Efeito suspensivo a agravo retido. Descabimento. Não pode a parte, que da decisão tenha interposto agravo retido, interpor depois ação cautelar, visando agregar àquele recurso efeito suspensivo, ainda mais quando o primeiro haja sido manifestado como alternativa ao agravo de instrumento com pedido de liminar." (TACSP, Medida Cautelar n. 693.843-00/7, rel. Juiz Mendes Gomes, j. 23.04.2001, v.u.)

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AGRAVOS 73

a) a exposição do fato e do direito. Deverá o recorrente narrar os fa­tos do processo e fundamentar a pretensão de reforma ou anula­ção da decisão recorrida;

b) a fundamentação e o pedido de reforma da decisão;c) o nome e o endereço dos advogados constituídos no processo;d) cópias do processo para a formação do instrumento.

Além das formalidades com a petição, para a formação do instru­mento no tribunal, deverá o recurso ser instruído com as seguintes có­pias do processo:

a) cópias obrigatórias: procurações juntadas ao processo pelas partes, decisão recorrida, certidão de intimação da decisão recorrida (para que se possa verificar a tempestividade do recurso pelo tribunal);

b) cópias facultativas: aquelas que o recorrente considerar necessá­rias, dependendo do caso concreto.

Ressalte-se que, com exceção do agravo interposto 110 Tribunal de Jus­tiça de São Paulo, apesar de considerarmos um formalismo exacerbado, aconselha-se a utilização de cópias autenticadas, já que alguns tribunais têm manifestado tal exigência sob pena de não conhecimento do recurso.

Em relação ao preparo para a interposição de agravo de instru­mento, impõe-se esclarecer que a legislação estadual ou interna dos tri­bunais poderá exigir o recolhimento dessas custas como condição de conhecimento do recurso. Nesse caso, o agravante deverá comprovar o recolhimento das custas no ato da interposição do recurso.

M 3 .6 .2 INFORMAÇÃO À PRIMEIRA INSTÂNCIA

O art. 526 do Código de Processo Civil determina que o agravante deverá, no prazo de 3 dias, informar ao juízo recorrido da interposição do recurso de agravo de instrumento. Tal previsão serve para que o juiz de primeira instância tome conhecimento do agravo e possa exercer o juízo de retratabilidade que lhe faculta a lei (reformar sua decisão).

Além disso, as informações do art. 526 também têm por objetivo facilitar ao agravado o conhecimento das razões recursais e, por sua vez, o direito de responder o recessivo. Como sabemos, os agravos de instru­

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74 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

mento são interpostos diretamente nos tribunais que geralmente têm sede nas capitais dos estados - por essa razão a juntada do referido recur­so na primeira instância dá mais acesso ao agravado para sua resposta.

A informação da interposição do recurso deverá ser acompanhada de cópia da petição de agravo (com seus fundamentos), inclusive com a relação dos documentos (ou cópias) que instruíram o referido agra­vo de instrumento.

Acerca da obrigatoriedade do cumprimento do disposto no art. 526 do Código de Processo Civil, havia muita discussão na jurispru­dência e na doutrina, inclusive as decisões do Superior Tribunal de Jus­tiça davam conta de que tal obrigatoriedade não existia e, conseqüen­temente, o não-cumprimento do art. 526 apenas acarretaria a perda da possibilidade de retratação do magistrado de primeiro grau, mas sem qualquer prejuízo ao conhecimento do agravo pelo tribunal.

Por sua vez, a Lei n. 10.352/2001 determinou:

Art. 526. [...]Parágrafo único. O não cumprimento do disposto neste artigo, desde que argüido e provado pelo agravado, importa inadmissibi­lidade do agravo.

Infere-se, assim, que estando em vigor as alterações introduzidas pela Lei n. 10.352/2001, é obrigatório o cumprimento do disposto no art. 526 - informação ao juízo de primeiro grau da interposição do recurso no tribunal - , sob pena de não-conhecimento do agravo.

Curiosamente, nota-se que a lei processual passou a conter uma espécie de pressuposto de admissibilidade recursal de natureza priva­da, ou seja, ao contrário de todas as demais condições de conhecimen­to dos recursos, o descumprimento do art. 526 depende de argüição da parte agravada.

Pelo menos uma coisa agora é certa: o juiz relator não poderá co­nhecer de ofício a falta do cumprimento do art. 526, bem como não ocorrerá o que acontecia antes - o relator determinava que a parte agravante comprovasse, na segunda instância, que informou o juiz de primeiro grau da interposição do agravo de instrumento, enfim, um mecanismo absolutamente burocrático e ineficaz para o processo.

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AGRAVOS 75

H 3 .6 .3 RECEBIMENTO DO AGRAVO NO TRIBUNAL

e o s A t o s d o R e l a t o r

Como mencionamos anteriormente, o recurso de agravo de ins­trumento é interposto diretamente no tribunal competente; inclusive sua distribuição ao magistrado que desempenhará a função de relator do recurso é realizada de forma incontinenti (art. 527 do CPC), ou seja, o recurso é distribuído imediatamente ao entrar no tribunal, o que dá caráter de urgência e efetividade ao meio de impugnação.

Assim, recebido o recurso pelo relator, nos termos do art. 527 do Códi­go de Processo Civil (em grande parte alterado pela Lei n. 10.352/2001), poderá ele:

a) negar, liminarmente, seguimento ao recurso, nos casos do art. 557 do Código de Processo Civil, que prevê hipóteses de inadmissão do recurso por falta de observância dos pressupostos legais ou por confronto com jurisprudência dominante ou súmula. O relator também poderá negar seguimento ao agravo prejudicado, ou seja, aquele que tenha perdido o objeto (por exemplo, quando o juiz de primeira instância houver se retratado). Nesses casos, a decisão será impugnada por meio de agravo para o órgão colegiado, no prazo de 5 dias, nos termos do § Io do art. 557;

b) converter o agravo de instrumento em agravo retido, determinan­do a sua remessa à primeira instância, onde ficará acostado à ação lá em trâmite, salvo quando se tratar de pedido de urgência ou houver perigo de lesão grave ou de difícil reparação. A decisão que converter o agravo de instrumento para retido não comporta re­curso, cabendo, apenas, à parte se utilizar do mandado de seguran­ça como sucedâneo recursal9 ou pedido de reconsideração ao pró­prio relator;

c) atribuir efeito suspensivo ao recurso, nos termos do art. 558 do Código de Processo Civil, ou deferir, total ou parcialmente, a ante­cipação dos efeitos da tutela recursal, não cabendo recurso contra tal decisão; a concessão do efeito suspensivo no agravo de instru­mento dependerá que o agravante demonstre a necessidade de

9 Ver tópico 8.1.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

liminar no recurso, isto é, quando houver relevância dos funda­mentos e perigo de dano;

d) requisitar informações ao juiz da causa, que deverá prestá-las no prazo de 10 dias;

e) obrigatoriamente intimar o agravado, para que responda o recur­so no prazo de 10 dias, podendo, inclusive, juntar as cópias que entender necessárias. Poderá o agravado alegar, também, que não houve o cumprimento do disposto no art. 526 do Código de Pro­cesso Civil, isso para obter o não-conhecimento do agravo.

DIFERENÇAS ENTRE 0 AGRAVO RETIDO E 0 AGRAVO DE INSTRUMENTO

AGRAVO RETIDO AGRAVO DE INSTRUMENTO

Interposição Juízo de primeira instância (a quo) Diretamente no tribunal (aii quem)

Autuação O agravo é juntado aos autos na pri­

meira instância

0 agravo forma novos autos no tribunal

Julgamento Apenas quando do julgamento da ape­

lação

Imediato (30 dias após a intimação da

parte contrária)

Cabimento Regra contra as decisões interlocutórias

(evidentemente quando a parte puder

esperar ate o m om ento do julgamento

da apelação)

Das decisões interlocutórias passíveis de

causar dano grande ou de difícil repara­

ção à parte, ou quando não tiver utilidade

o agravo na forma retida

Efeitos 0 efeito devolutivo será diferido.

A interposição do agravo retido tem o

efeito de obstar a preclusão da matéria

Efeito devolutivo, podendo receber tam ­

bém: a) efeito suspensivo e b) tutela ante­

cipada recursal (arts. 527 e 558 do CPC)

Forma Oral ou escrita.

(O agravo será obrigatoriamente retido

e na forma oral contra as decisões in­

terlocutórias proferidas nas audiências

de instrução e julgamento)

Escrita + o instrumento.

Além da petição do recurso, a parte agra­

vante deverá apresentar as cópias necessá­

rias à formação do instrumento, nos ter­

mos do art. 525 do CPC

(cópias obrigatórias e facultativas)

Preparo Não há preparo Há preparo

Requisito espe­

cífico para

admissibilidade

0 agravante, quando da apelação ou

contra-razões, deverá reiterar o pedido

de conhecimento do agravo retido

O agravante, no prazo de 3 dias, deverá

informar à primeira instância da interpo-

siçào do agravo no tribunal

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AGRAVOS

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78 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

3.7 A g r a v o s c o n t r a De c is õ e s

I n t e r l o c u t ó r i a s nos T r i b u n a i s

Como regra, as decisões nos tribunais são tomadas por órgãos co- legiados, ou seja, órgãos formados por mais de um magistrado. É assim quando julgado o mérito do recurso; quando se leva a apelação ou o agravo de instrumento à mesa para que os magistrados competentes, após a leitura da manifestação do relator, profiram os seus votos para o julgamento do mérito recursal.

No entanto, são diversas as situações em que os magistrados dos tribunais têm autorização para a prolação de pronunciamentos mono- cráticos, excepcionando a regra de que os julgamentos nos tribunais se fazem por órgãos colegiados.

Dos exemplos mais simples desse poder, já tratamos quando da análise do juízo de admissibilidade dos recursos e dos poderes do rela­tor do recurso de agravo de instrumento. Em decisão monocrática poderá o relator negar seguimento ao recurso manifestamente inad­missível (que não preenche os pressupostos recursais), converter o re­curso de agravo de instrumento em agravo retido, etc.

Além disso, o art. 557 do Código de Processo Civil permite o jul­gamento monocrático pelo relator do recurso quando este estiver pre­judicado (não tem mais utilidade o seu julgamento) ou em confronto com a jurisprudência dominante do próprio tribunal, do Supremo Tri­bunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça.

Outro caso de decisão monocrática no tribunal é o do presidente do tribunal, ao realizar o juízo de admissibilidade dos recursos especial e/ou extraordinário.

Dessa forma, podemos afirmar que são cabíveis os seguintes recur­sos contra as decisões interlocutórias dos tribunais:

a) agravo interno (ou agravo para o órgão colegiado);b) agravo regimental;c) agravo de instrumento contra decisão que nega seguimento a re­

cursos especial e/ou extraordinário.

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AGRAVOS 7 9

3.8 A g r a v o Re g i m e n t a l

Como a própria terminologia induz, o agravo regimental é aquele previsto nos regimentos internos dos tribunais como meio de impug­nação às decisões monocráticas de seus membros (relator, presidente, etc.).

Grande parte dos regimentos internos contém previsão de agravos contra as decisões proferidas singularmente por seus membros. No Su­premo Tribunal Federal, por exemplo, o regimento interno prevê no art. 317 o cabimento do agravo, no prazo de 5 dias, para impugnar decisão monocrática do presidente do tribunal, do presidente de tu r­ma julgadora ou do relator do processo, sempre que a decisão impor­tar em prejuízo à parte.

No Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, também há a possi­bilidade de interposição de agravo regimental contra as decisões m o­nocráticas de seus magistrados, como forma de obter um reexame pelo órgão colegiado (art. 258 do RISTJ). Tal “recurso” também pode ser encontrado na maioria dos regimentos dos tribunais regionais federais e dos tribunais dos estados.

Nesse ponto, resta-nos uma pergunta: qual a justificativa legal para a existência de agravos regimentais? Ou, ainda: os tribunais teriam competência para criação, em seus regimentos, de uma modalidade de recurso?

Parece-nos que os agravos regimentais não representam, no orde­namento processual brasileiro, uma espécie de recurso. Para nós, os tribunais não têm competência para disposição acerca de matéria pro­cessual ou mesmo procedimental.

Como já tratamos anteriormente, é competência exclusiva da União, por meio do Congresso Nacional, legislar acerca de matéria processual, e de forma concorrente poderão legislar os estados e a União sobre regras de procedimentos (art. 2 2 ,1, e art. 24, IV e XI, da Constituição da República). Evidentemente, a Constituição não confe­re aos tribunais o poder de criação ou extinção de institutos proces­suais (como são os recursos).

Além disso, pelo princípio da taxatividade, apenas poderá ser con­siderado recurso o instituto previsto na lei.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Os tribunais apenas têm competência para regulamentação de sua administração e funcionalidade, não podendo intervir nas normas de natureza processual.

Então, como poderíamos classificar os agravos regimentais, já que na prática (mesmo inconstitucionais) eles existem? E mais, são válidas as decisões proferidas nesses agravos?

Na realidade, o agravo regimental não é um recurso, mas pode ser concebido como um mero pedido de reconsideração formulado ao ór­gão colegiado contra o ato monocrático do magistrado que integra o tribunal. Além do mais, por se tratar de decisão interlocutória, caberá ao tribunal - já que a última palavra sempre compete ao órgão cole­giado - ou ao próprio magistrado o poder de proferir uma decisão de reconsideração, o que nos leva à conclusão de que as decisões são abso­lutamente válidas.

Assim, não podemos conceituar o agravo regimental como recur­so, mas apenas como um mero pedido de reconsideração ao órgão co­legiado.

Atualmente, com a criação dos agravos internos (também conheci­dos como agravos para o órgão colegiado), estes sim previstos no cor­po da lei processual, os agravos regimentais perderam (ou ao menos tiveram diminuída) a sua aplicabilidade prática, já que muitas decisões monocráticas nos tribunais agora são impugnadas pelo agravo interno.

A esse respeito, Nelson Nery Júnior ensina:10

Pelo regime jurídico dado pelo CPC ao agravo interno, restou supe­rada a questão sobre a utilidade do antigo e inconstitucional agravo regi­mental. Estes agravos regimentais vêm previstos na grande maioria dos regimentos internos dos tribunais brasileiros. Essa previsão é inconstitucio­nal por ferir, frontalmente, o art. 22, I, da Constituição Federal. Com efei­to, somente ao Poder Legislativo da União (Congresso Nacional) é dado o poder de legislar sobre direito processual. E a criação de recurso é matéria de direito processual estrito. Assim, não é admissível ao tribunal, qualquer que seja a sua natureza (STF, STJ, Tribunal Superior, TRF, TJ ou TA), criar ins­titutos processuais em seus regimentos internos. O regimento interno é

'° Princípios fundamentais: teoria gerai dos recursos, p. 50.

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AGRAVOS 8 1

norma administrativa, que regula o funcionamento interna corporis do Tri­bunal, órgão do Poder Judiciário. Sempre foi inconstitucional a previsão, em regimento interno de tribunal, de agravo regimental.

3.9 A g r a v o I n t e r n o ou p a r a o O rg ão

C o l e g i a d o

Inicialmente, impõe ressaltar que, considerando a natureza de ca­da instituto, o agravo interno não se equipara aos agravos regimentais, pois, enquanto estes são previstos apenas nos regimentos internos dos tribunais, aqueles estão fundamentados no próprio Código de Proces­so Civil. Ambos possuem a mesma utilidade, qual seja: impugnar uma decisão interlocutória do tribunal, mas possuem natureza jurídica dis­tinta.

Os agravos internos, também denominados pela lei de agravo para o órgão colegiado, estão previstos no Código de Processo Civil como meio de impugnação contra as decisões monocráticas dos magistrados dos tribunais, nas seguintes hipóteses:

a) art. 532 - quando da decisão monocrática que não admitir o recurso de embargos infringentes;

b) art. 545 - ante decisão do ministro relator que não admitir ou negar provimento a agravo de instrumento interposto contra deci­são que negou seguimento a recurso especial ou extraordinário, ou mesmo reformar monocraticamente o acórdão recorrido;

c) art. 557, § Io - perante decisões do relator, em qualquer modalida­de de recurso, quando não admitir o recurso, julgá-lo improceden­te ou prejudicado em razão de confronto com súmula ou jurispru­dência dominante.

Até o advento das reformas dos recursos de agravo, também era cabível agravo interno contra as decisões monocráticas do relator que convertesse o agravo de instrumento em agravo retido ou que apre­ciasse o pedido de liminar no agravo.

No entanto, no sistema em vigor, contra tais decisões, como trata­mos no fluxograma anterior, não é cabível mais o agravo interno. Caso

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

a parte se sinta prejudicada com a decisão do relator, naquelas duas hipóteses, apenas poderá se valer de um mero pedido de reconside­ração.

Não obstante as hipóteses previstas no Código de Processo Civil, a Lei n. 4.348/64 - que dispõe acerca do procedimento no mandado de segurança - também prevê em seu art. 4o a possibilidade de interposi­ção de agravo interno contra a decisão do presidente do tribunal que conceder a suspensão da execução de liminar ou de sentença não tran­sitada em julgado em mandado de segurança. O prazo para a interpo­sição desse agravo é de 10 dias, e a sua interposição não terá efeito sus­pensivo (art. 4°)."

O procedimento para o agravo interno é muito simplificado, já que deverá ele ser interposto no prazo de 5 dias, por petição funda­mentada, e será julgado pelo órgão colegiado a que compete o julga­mento do recurso em questão.

3 .10 A g r a v o d e I n s t r u m e n t o c o n t r a

D e c i s ã o q u e N e g a S e g u i m e n t o a

R e c u r s o E s p e c i a l o u E x t r a o r d i n á r i o

O juízo de admissibilidade dos recursos especial e extraordinário compete, primeiramente, ao presidente do tribunal recorrido, ou seja, ao presidente do tribunal que proferiu o acórdão impugnado pela via excepcional.

Dessa forma, em caso de juízo negativo, ou seja, inadmissão dos recursos especial ou extraordinário, nos termos do art. 544 do Código de Processo Civil, a parte prejudicada por essa decisão poderá interpor agravo de instrumento para o Superior Tribunal de Justiça ou Supre­mo Tribunal Federal, conforme o recurso denegado.

Trata-se de típica decisão interlocutórial recorrível por meio de agravo. Todavia, esse agravo de instrumento tem processamento dis­tinto daquele que tratamos cabível contra as interlocutórias de primeira instância.

11 No âmbito do STF, o prazo para tal agravo é de 5 dias, conforme Regimento Interno.

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AGRAVOS 83

O agravo de instrumento contra decisão denegatória de recurso especial ou extraordinário será apresentado ao presidente que proferiu a decisão agravada e, após vistas e manifestação da parte contrária, os autos do agravo serão remetidos ao STJ ou STF conforme o caso.

Em especial, por se tratar de questão relativa ao juízo de admissi­bilidade dos recursos especial e extraordinário, esse tema será tratado adiante.

Sobre agravos e demais recursos, confira o Anexo I da Parte I - Resumo dos recursos, p. 152

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E m b a r g o s

d e D e c l a r a ç ã o 4

4.1 Em b a r g o s de De c l a r a ç ã o

■ 1 4 . 1 . 1 C a b i m e n t o e N a t u r e z a J u r í d i c a 1

Os embargos declaratórios constituem espécie de recur­so destinado a suprir omissão, obscuridade ou contradição em decisões interlocutórias, sentenças ou acórdãos, nos ter­mos do art. 535 do Código de Processo Civil.

A omissão a que se refere o dispositivo legal ocorre quan­do o órgão jurisdicional não se manifestou no ato embargado expressamente sobre pedido ou ponto suscitado por qualquer uma das partes. A omissão representa o julgamento citra peti- ta, ou seja, o magistrado julgou menos do que deveria ter jul­gado em relação à lide que lhe foi apresentada pelas partes (pedidos ou causa de pedir).

A contradição, por sua vez, verifica-se quando existir no ato jurisdicional pontos conflitantes ou contraditórios entre si - como, por exemplo, na fundamentação, o magistrado

Sonia Márcia Hase de Almeida Batista, Dos embargos de dec/aração.

85

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

afirma ser legítima a pretensão do autor e, quando profere o dispositi­vo, nega procedência ao pedido formulado na inicial.

Já a obscuridade é o vício do ato judicial que macula a sua com­preensão, opondo-se ao requisito de clareza que deve revestir todo ato judicial. O ato judicial deve ser claro, sem a existência de trechos ou idéias nebulosas.

Muita discussão se estabeleceu na doutrina acerca da natureza jurí­dica dos embargos de declaração, já que, na prática, é um instituto pro­cessual que muito diverge da natureza recursal, pelos seguintes aspectos:

a) os embargos de declaração são julgados pelo próprio magistrado que proferiu a decisão embargada e, ao contrário, todos os demais recur­sos têm o mérito julgado por órgão hierarquicamente superior;

b) como regra, não há contraditório nos embargos de declaração, ou seja, a parte “embargada” não é intimada para a apresentação de contra-razões ou resposta ao recurso;

c) os embargos não têm a finalidade de gerar a reforma ou anulação da decisão, mas somente de complementar ou clarear a decisão embargada.

De fato, suas características práticas induzem à conclusão de que os embargos de declaração não têm natureza recursal.

No entanto, não é essa a orientação positivada no Código de Pro­cesso Civil. O art. 496 deste Código, de forma expressa, incluiu os em­bargos de declaração no rol das espécies de recursos; portanto, sem d ú ­vida, é assim que devemos classificá-los, apesar de sua natureza. Além disso, os embargos são atos voluntários das partes para impugnar pro­nunciamento judicial, no que se assemelham aos demais recursos.

Os embargos de declaração, como determina o art. 535 do Código de Processo Civil, não se prestam para a obtenção da reforma ou modificação do ato judicial impugnado, não têm natureza infringente ou substitutiva,2 mas revestem-se da finalidade de integrar a decisão ao

2 Excepcionalmente os embargos de declaração poderão ter efeito infringente (modifi- cativo do julgado embargado), por exemplo, quando para corrigir erro material, para expur­gar decisão ultrapetita etc. De qualquer forma, não há alteração da vontade anterior do jul­gador, mas mera correção.

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EMBARGOS DE DECLARACÂO

m undo jurídico, já que os vícios de obscuridade, de omissão ou de contrariedade impedem o exercício pleno dos efeitos que se poderia ter com aquele ato.

A omissão é negativa de prestação da tutela jurisdicional; é a pres­tação incompleta da jurisdição. A obscuridade e a contradição, por sua vez, maculam o ato jurisdicional a ponto de impossibilitarem (ou ao menos tornarem difícil) a execução do comando judicial.

Assim, podemos definir os embargos de declaração como o recurso próprio para requerer “ao juiz ou juizes prolatores da sentença ou do acórdão que esclareçam obscuridade, eliminem contradição ou supram omissão existente no julgado”.3 Com a oposição dos embargos, o recor­rente almeja uma declaração do magistrado que proferiu o ato impug­nado capaz de integrá-lo que preste esclarecimento capaz de permitir a sua inteligência ou completa interpretação.

Outro ponto relevante acerca do cabimento é o objeto dos embar­gos de declaração. Afinal, que espécie de ato judicial pode ser objeto de embargos de declaração?

Pela leitura superficial do art. 535 do Código de Processo Civil, poderíamos chegar à conclusão de que os embargos de declaração ape­nas são cabíveis contra as sentenças e acórdãos, conforme expressa­mente consta do inc. I do referido dispositivo legal.

Na verdade, há muita divergência acerca do cabimento de embar­gos de declaração contra as decisões interlocutórias, justamente pelo fato de que o art. 535 não teria contemplado a referida modalidade de pronunciamento judicial.

No entanto, o inc. II do mesmo artigo afirma que cabem embar­gos declaratórios quando o órgão jurisdicional for omisso sobre ponto em relação ao qual deveria pronunciar-se, não limitando o cabimento às sentenças ou aos acórdãos. Dessa forma, entendemos cabíveis os embargos de declaração também contra as decisões. No mesmo sentido, tem-se pronunciado a jurisprudência1 do Superior

3 Moacyr Amaral Santos, Primeiras linhas de direito processual civil, p. 146.4 "Processual civil. Decisão que acolhe incidente de impugnação ao valor da causa.

Embargos declaratórios. Cabimento. Em tese. Interrupção do prazo recursal. Possibilidade. Tempestividade do ulterior agravo de instrumento. I. Em princípio, de acordo com o entendi­mento mais moderno do STJ, cabem embargos declaratórios contra qualquer decisão judicial,

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Tribunal de Justiça ao interpretar a redação do art. 535 do Código de Processo Civil.

A esse respeito, Barbosa Moreira assevera3 que:

Os embargos de declaração podem caber contra qualquer decisão judicial, seja qual for a sua espécie, o órgão de que emane e o grau de jurisdição em que se profira - não se limitando o cabimento, no primeiro grau, às sentenças, ao contrário do que pode sugerir o teor literal do art.535, inc. I (na redação da Lei n. 8.950), e muito menos às sentenças de mérito, como aparentemente resultaria da conjugação entre o capute o inc. II do art. 463.

Os embargos de declaração são relevantes - e, muitas vezes, indis­pensáveis - para a integração das decisões interlocutórias. Por exem­plo, imaginemos que uma decisão que defere a antecipação dos efeitos da tutela de uma obrigação de não fazer deixe de prever a multa pecu­niária pelo descumprimento da decisão, ou, ainda, seja a decisão in­completa em relação ao pedido do autor. Nesse caso, é fundamental a possibilidade de oposição de embargos declaratórios para suprir a omis­são que impede a eficácia plena do provimento deferido.

ainda que interlocutória. II. Caso em que os embargos de declaração mostram a eventualida­de de contradição, porquanto há, supostamente, entrechoque de conclusões entre a nature­za da ação identificada pelo juízo singular, o que aparentemente serviu de base para a fixa­ção do valor da causa, e a compreensão a respeito do mesmo tema pelo Tribunal de Justiça, no julgamento do conflito de competência envolvendo aquela mesma ação. III. Deu-se, assim, interrupção do prazo com o aviamento dos embargos e, rejeitados eles, a interposição do ulterior agravo de instrumento foi tempestiva. IV. Recurso especial conhecido e provido, para, afastada a intempestividade, determinar ao tribunal a quo o exame do agravo de instrumen­to." (STJ, 4a T., REsp n. 117.696/SP, rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, j. 21.09.2000, v.u.)

"Processual civil. Decisão interlocutória. Embargos de declaração. Cabimento. Interrupção do prazo. Agravo regimental. Admissibilidade. Doutrina. Precedentes. Recurso provido. Os embargos declaratórios são cabíveis contra qualquer decisão judicial e, uma vez interpostos, interrompem o prazo recursal. A interpretação meramente literal do art. 535 do CPC atrita com a sistemática que deriva do próprio ordenamento processual." (STJ, 4a T., REsp n. 163.222/MG, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 30.04.1998, v.u.)

"Embargos declaratórios. Decisão interlocutória. Cabimento. Os embargos de declaração são cabíveis de qualquer decisão judicial." (STJ, 3a I , REsp n. 48.727/SP, rel. Min. Cláudio San­tos, j. 23.08.1994, v.u.)

s O novo processo civil brasileiro, p. 155.

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EMBARGOS DE DECLARACÃO

Dessa forma, compartilhamos do posicionamento que admite a oposição de embargos de declaração contra todas as espécies de deci­sões - decisões interlocutórias, sentenças e acórdãos - nos casos cabí­veis pelo disposto no art. 535 do Código de Processo Civil.

4 . 2 P R O C E D IM E N T O E E F E IT O DOS E M B A R G O S

Os embargos de declaração devem ser opostos no prazo de 5 dias, seja qual for a decisão embargada ou o grau de jurisdição.

O embargante deverá opor o recurso em petição fundamentada di­rigida ao próprio órgão que proferiu a decisão embargada.6 Quando interpostos contra decisão de primeira instância, os embargos serão en­dereçados ao próprio juízo; em se tratando de decisão de tribunal, o endereçamento será para o relator do recurso ou ação (art. 536 do CPC).

Nos embargos de declaração não há o recolhimento de preparo re­cursal.

Opostos os embargos, independentemente de sua admissibilidade ou de ato judicial, terão efeito interruptivo, ou seja, a oposição de em ­bargos declaratórios tem o poder de interromper o prazo para a inter­posição de qualquer outro recurso, isso em favor de ambas as partes. Com efeito, a interrupção faz com que os prazos para os demais recur­sos apenas comecem a fluir, por inteiro, após a publicação da decisão dos embargos.7

Por exemplo, a sentença foi publicada no dia Io, segunda-feira; con­seqüentemente, a parte vencida teria até o dia 15 para interpor o recur­so de apelação. No entanto, caso sejam opostos os embargos de declara­ção, isso até o 5o dia (o prazo cairia na segunda-feira, dia 8), o prazo para a interposição da apelação será interrompido até que seja publicada a decisão dos embargos; nesse momento, começará a correr, por inteiro (15 dias), o prazo para apelação. Publicada a decisão nos embargos no dia 10 (quarta-feira), o prazo para o recurso de apelação seria no dia 25.

6 Os embargos de declaração não necessitam de petição de interposição e razões recur­sais, podem ser elaborados em petição única, já que serão julgados pelo mesmo órgão no qual são interpostos.

7 Encontra-se em tramitação no Congresso Nacional projeto de lei para que o efeito interruptivo apenas seja aplicado quando os embargos não forem protelatórios.

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Nos embargos de declaração não há a intimação da parte contrá­ria para apresentação de resposta a esse recurso, já que não têm finali­dade infringente (de reforma da decisão).

Além disso, determina o art. 537 do Código de Processo Civil que os embargos interpostos contra ato de primeira instância devam ser julgados no prazo de 5 dias e, quando de decisão do tribunal, o relator deverá apresentar os embargos para julgamento na sessão subseqüen­te. Todavia, apesar de os prazos estarem previstos na lei, são eles im­próprios, já que não há qualquer prejuízo aos magistrados que os des- cumprirem.

mm 4 .2 .1 R e i t e r a ç ã o d o R e c u r s o

E EMBARGOS PROTELATÓRIOS

A oposição de embargos declaratórios com a interrupção do prazo recursal poderia servir como artifício aos litigantes de má-fé para a procrastinação do processo. Assim, para evitar o uso indevido dos em­bargos, há determinação legal para punir o embargante que opuser embargos manifestamente protelatórios (art. 538, parágrafo único, doCPC).

A aplicação da multa pode ser de ofício, que deverá ser fixada em até 1 % sobre o valor da causa, e, no caso de reiteração, elevada ao pata­mar de 10%.

Na hipótese de ocorrer a elevação da multa, a parte apenas pode­rá interpor outro recurso, caso deposite judicialmente o valor da refe­rida multa. Ressalte-se que o disposto na segunda parte do parágrafo único do art. 538 - requisito do depósito como condição de admissi­bilidade de outros recursos - apenas se verifica quando houver a reite­ração dos embargos protelatórios e a elevação da multa (até 10% sobreo valor da causa).8

8 "Embargos declaratórios. Negativa de seguimento por decisão monocrática do relator. Agravo regimental. Admissibilidade deste condicionada ao recolhimento prévio da multa. Descabimento. Apenas na reiteração dos embargos de declaração tidos como protelatórios é que a interposição de qualquer outro recurso fica condicionada ao depósito do valor corres­pondente à multa (art. 538, parágrafo único, do CPC). Recurso especial conhecido e provi­do." (STJ, 4a T., REsp n. 271.996/MS, rel. Min. Barros Monteiro, j. 20.08.2002, v.u.)

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EMBARGOS DE DECLARACÃO

Finalmente, cumpre esclarecer que a lei processual não limita a possibilidade de oposição de embargos declaratórios. Portanto, caso seja proferida decisão nos embargos e persista a omissão (obscuridade ou contrariedade), as partes poderão opor novos embargos de declara­ção contra os embargos anteriores, o que denominamos de embargos reiterados.

1 Embargos de declaração para fim de prequestionamento

O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça fir­maram entendimento no sentido de que apenas são cabíveis os recur­sos especial e extraordinário quando o acórdão recorrido houver apre­ciado expressamente as matérias objeto dos referidos recursos (tema abordado no capítulo destinado aos referidos recursos).

Desta forma, quando a violação à lei federal ou à Constituição, que ensejam a interposição dos recursos especial e extraordinário, respec­tivamente, estiver implícita no acórdão, a parte deverá se valer dos embargos de declaração como forma de prequestionamento.

Por meio dos embargos de declaração, a parte alega a violação da lei federal ou da Constituição da República, a fim de que o Tribunal se

"Processual civil. Embargos de declaração. Reiteração de embargos protelatórios. Se­gunda parte do parágrafo único do artigo 538 do CPC. Elevação da multa imposta. Interpo- sição de novos recursos. Necessidade de depósito prévio do valor respectivo. 1. Como lecio­na Nelson Nery Junior, os embargos de declaração são considerados protelatórios toda vez em que a conduta do embargante revelar-se ofensiva ao dever de a parte proceder com leal­dade, o que acontece, como no caso dos autos, quando provoca incidentes inúteis ou infun­dados. 2. Em face da reiteração de embargos protelatórios, cumpre aplicar a segunda parte do parágrafo único do artigo 538 do CPC. 3. Embargos de declaração rejeitados, com eleva­ção da multa para 10% sobre o valor da causa, ficando condicionada a interposição de qual­quer outro recurso ao depósito prévio do valor respectivo."(STJ, 2a T„ EDd nos EDd nos EDcl nos EDcl no REsp n. 662.901/DF, rel. Min. Castro Meira j. 16.05.2006, v.u.)

"Processual civil. Recurso especial. Representação processual. Irregularidade. Procuração. Falta. Suprimento. Impossibilidade. Embargos de declaração. Reiteração. Multa. Depósito. 1. Na instância especial não há possibilidade de sanar irregularidade na representação processual (falta de procuração). Aplicação da súmula 115-STJ. 2. A falta de depósito da multa, na reite­ração de embargos, impede o conhecimento de outro recurso interposto. Inteligência do art. 538, parágrafo único, segunda parte, do CPC. 3. Agravo regimental não provido." (STJ, 4a T., Ag. Reg. no Ag. n. 469.093/MS, rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 16.09.2004)

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manifeste expressamente sobre a matéria que será discutida no recur­so especial ou extraordinário.

Desta forma, sendo opostos os embargos apenas para implemen­tar o prequestionamento, não poderá o tribunal considerá-los como protelatórios.8

Sobre embargos de declaração e demais recursos, confira o Anexo I da Parte I - Resumo dos recursos, p. 152

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8 A esse respeito, Súmula n. 98 do STJ: "Embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório".

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E m b a r g o s

I n f r i n g e n t e s 5

O recurso de embargos infringentes, cabível contra acór­dãos, foi concebido para permitir que a parte vencida em acórdão não-unânime leve a matéria divergente no referido ato colegiado a um novo julgamento.

A finalidade dos embargos infringentes é levar o acórdão não-unânime a novo julgamento, a fim de que prevaleça a te­se vencida no acórdão embargado, como se verá adiante.

5.1 C a b i m e n t o

Os embargos infringentes têm por finalidade a unifica­ção interna dos julgados dos tribunais, sendo recurso tipica­mente cabível contra acórdãos não-unânimes dos órgãos colegiados.1

' Não se confunde com os embargos infringentes previstos na Lei de Execuções Fiscais (Lei n. 6.830/80). O art. 34 da referida Lei prevê que, contra as sentenças proferidas nas exe­cuções fiscais (ou melhor, embargos do devedor em execução fiscal) de valor igual ou inferior a 50 (cinqüenta) ORTNs, somente será cabível o recurso de embargos infringentes. Neste caso, será recurso para o próprio magistrado recorrido e terá cabimento no lugar da apelação.

93

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Como sabemos, o julgamento nos órgãos colegiados - como ocor­re nos tribunais - se dá pela colheita dos votos de diversos magis­trados.

No recurso de apelação, por exemplo, o julgamento se dá pelo voto de três julgadores: do relator, do revisor e do terceiro juiz. Des­sa forma, nem sempre os acórdãos terão o seu resultado firmado pela manifestação unânime dos membros que compuseram o julga­mento.

Quando isso acontece, ou seja, houver um voto divergente, o m a­gistrado que discordou dos demais deverá redigir o seu voto (o voto vencido),2 para que a posição vencida seja parte integrante do acórdão e possa ser objeto e fundamento dos embargos infringentes pela parte prejudicada.

Assim, prestam-se os embargos infringentes para que o acórdão julgado por maioria de votos (não-unânime) seja levado a um novo jul­gamento, agora com o acréscimo de outros magistrados, com a preten­são da parte sucumbente de reverter o sentido do pronunciamento an­terior, para que, no novo julgamento, prevaleça a orientação do voto vencido no primeiro julgamento.

A redação antiga do art. 530 do Código de Processo Civil, modifi­cada pela Lei n. 10.352/2001, previa o cabimento de embargos infrin­gentes contra acórdãos não-unânimes proferidos em qualquer julga­mento de apelação ou ação rescisória, independentemente do conteúdo do julgamento.

O único requisito de cabimento era a existência de divergência nos acórdãos proferidos em sede de apelação ou ação rescisória (ação de competência originária do tribunal - art. 485 do CPC).

No entanto, o referido dispositivo legal passou a prever o recurso de embargos infringentes apenas nas seguintes hipóteses:

7 Na hipótese de não ser declarado expressamente o voto vencido - com a fundamen­tação da tese divergente - a parte interessada deverá, antes da apresentação dos embargos infringentes, opor embargos de declaração, a fim de que o magistrado vencido declare o voto e supra a referida omissão.

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EMBARGOS INFRINGENTES

' a) proferido em julgamento de apelação que houver refor­mado sentença de mérito (apelação provida para reformar a sentença de mérito);3

* b) acórdão de ação rescisória julgada procedente.

Assim, podemos afirmar que não cabem os embargos infringen-tes:'1

a) contra acórdão não-unânime que houver mantido a sentença de mérito quando do julgamento da apelação (apelação improvida);

b) contra acórdão não-unânime proferido em julgamento de agravo de instrumento;

c) contra acórdão não-unânime que reformar sentença meramente terminativa (aquelas proferidas nos termos do art. 267 do CPC);

d) contra acórdão não-unânime proferido em ação rescisória julgada improcedente;

e) a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tri­bunal Federal é no sentido de não admitir os embargos infringen- tes contra acórdão não-unânime proferido em mandado de segu­rança.5

Com a reforma introduzida pela Lei n. 10.352/2001, podemos afir­mar que houve grande redução nas hipóteses de cabimento dos em ­

3 A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem admitido os embargos infringen­te também contra acórdão não unânime proferido em sede de reexame necessário, indepen­dentemente de ter havido ou não recurso voluntário.

4 Gilson Delgado Miranda, Código de Processo Civi! interpretado, p. 1579-82.s Súmula n. 169 do STJ: "São inadmissíveis embargos infringentes no processo de man­

dado de segurança". Súmula n. 597 do STF: "Não cabem embargos infringentes de acórdão que, em mandado de segurança, decidiu, por maioria de votos, a apelação". Não obstante as súmulas mencionadas, não concordamos com tais entendimentos, já que na Lei n. 1.533/51, que trata do procedimento do mandado de segurança, a aplicação subsidiária do CPC quan­do do processamento das referidas ações mandamentais, portanto, à ação de mandado de segurança, deveríamos aplicar todas as regras cabíveis do CPC (normas que não fossem con­trárias ao disposto na lei específica).

Acórdãonão-unânim e

i

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MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

bargos infringentes. No texto antigo, tal embargo era cabível contra qualquer acórdão não-unânime de apelação ou ação rescisória; agora o é apenas dos acórdãos que modificarem a sentença de mérito ou jul­garem procedente a ação rescisória (quando não-unânimes).

Recursos especial e extraordinário contra acórdão não-unânime

Questão interessante surge no estudo dos embargos infringentes: poderia a parte não opor os embargos infringentes e utilizar-se direta­mente dos recursos especial e extraordinário?

A resposta é negativa, pois, caso as partes não apresentem os em­bargos infringentes contra a questão divergente no acórdão, a diver­gência (questão não-unânime) transitará em julgado e, portanto, con­tra ela não caberá nenhum outro recurso.

Assim, antes da interposição dos recursos especial e/ou extraordi­nário para o Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, respectivamente, quando cabíveis, deverá a parte opor embargos in­fringentes para tentar a reforma do acórdão não-unânime com base na posição vencida no julgamento anterior (voto vencido), sob pena de não-admissão dos recursos excepcionais para o STJ e STF contra a m a­téria que poderia ser objeto dos referidos embargos, dada a falta de in­teresse recursal.6

No entanto, devemos tomar um cuidado. Havendo no acórdão uma parte unânime e outra divergente (ou seja, divergência parcial), a não oposição dos embargos gera apenas o trânsito em julgado da questão divergente, ficando ainda facultado à parte vencida a interposição dos

6 Súmula n. 207 do STJ: "É inadmissível recurso especial quando cabíveis embargos infringentes contra o acórdão proferido no tribunal de origem".

"Processual civil. Agravo interno (art. 545, CPC). Apelação. Acórdão por maioria. Recur­so especial inadmitido. Decisão confirmatória da inadmissão. Necessidade dos embargos infringentes (art. 530, CPC). Súmula n. 207/STJ: 1. O julgado por maioria no julgamento de apelação contra sentença, para viabilizar a admissão do recurso especial, em face do pressu­posto de causa decidida (art. 105, III, CF), reclama a interposição dos embargos infringentes (art. 530, CPC). A trato de questão subjacente, possa ou não constituir gravame, é indispen­sável o exame recursal completo, sem a repartição no entendimento dos julgadores. 2. Ine­gável a falta dos embargos infringentes, irradiam-se os efeitos da Súmula 207/STJ, trancan­do processualmente a via especial. 3. Agravo sem provimento." (STJ, Ag. Reg. em Agravo Interno n. 210.274/SP, rel. Min. Milton Luiz Pereira, j. 31.08.1999, v.u.)

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EMBARGOS INFRINGENTES

recursos especial e extraordinário contra a parte do acórdão que era unânime e, portanto, não admitia o recurso de embargos infringentes.

■■ 5 . 1 . 2 P r o c e d i m e n t o d o s E m b a r g o s I n f r i n g e n t e s

Os embargos infringentes devem ser opostos no prazo de 15 dias, contados a partir da publicação do acórdão não unânime - seguindo a regra geral do art. 508 do Código de Processo Civil.

É possível, dependendo da legislação local ou do tribunal compe­tente, a fixação de custas de preparo para a interposição de embargos infringentes.

Em síntese, podemos dizer do procedimento dos embargos infrin­gentes:

a) a petição deve ser endereçada ao relator do recurso de apelação ou da ação rescisória, acompanhada das razões recursais (baseadas na divergência);

b) os embargos são juntados aos autos do próprio processo;c) o relator realizará o juízo de admissibilidade do recurso (art. 531

do CPC);d) caso o relator profira um juízo negativo de admissibilidade (pelo

fato de o recurso não ser cabível ou não preencher os pressupostos processuais gerais), a parte poderá interpor, contra essa decisão m o­nocrática, agravo para o órgão colegiado (agravo interno - art. 532 do CPC);

e) a norma regimental poderá estabelecer o sorteio de novo relator. Neste caso, se possível, o novo relator será escolhido entre os ma­gistrados que tiverem participado do primeiro julgamento;

f) admitidos os embargos, serão abertas vistas à parte contrária para apresentar resposta ao recurso (contra-razões) (art. 531 do CPC);

g) o processamento e o julgamento do recurso de embargos infrin­gentes serão realizados com observância do que dispuser o regi­mento interno do tribunal, conforme expressamente determina o art. 533 do Código de Processo Civil. Como regra, os regimentos internos prevêem o acréscimo de mais dois magistrados para o jul­gamento do recurso dos embargos infringentes (órgão mais quali­ficado em relação ao número de magistrados).

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■ i 5 . 1 . 3 E f e i t o s d o s E m b a r g o s I n f r i n g e n t e s

A interposição dos embargos infringentes pode acarretar os efeitos devolutivo e suspensivo.

Em relação ao efeito devolutivo, é certo que essa devolutividade no novo julgamento ficará restrita à questão não-unânime do julgamento anterior.

A parte recorrente apenas poderá fundamentar o seu inconformis- mo na pretensão do novo julgamento com base no voto vencido no acórdão recorrido. O tribunal, quando do julgamento dos embargos, apenas poderá conhecer das questões que restaram divergentes no acór­dão recorrido. As questões unânimes não serão objeto do novo julga­mento.

Já em relação ao efeito suspensivo, há se fazer uma distinção:7

a) quando os embargos infringentes tiverem sido interpostos contra acórdão proferido em ação rescisória, o recurso terá, automatica­mente, o efeito suspensivo;

b) quando se tratar de acórdão de apelação, haverá efeito suspensivo se o recurso de apelação também tiver sido recebido nesse efeito; caso contrário, em que a sentença já esteja sendo executada em razão das exceções do art. 520 do Código de Processo Civil, os em ­bargos infringentes não terão efeito suspensivo (meramente devo- lutivos).

■ ■ 5 . 1 . 4 D I V E R G Ê N C I A P A R C I A L

e P r a z o p a r a D e m a i s R e c u r s o s

Pode ocorrer de o acórdão recorrido ser unânime em determina­da parte e divergente em outra, sendo, assim, parcial a divergência.

Por exemplo, a ação versa sobre pedido de indenização por danos morais e materiais. No julgamento da apelação, todos os desembarga­dores aceitam a procedência dos danos materiais, mas apenas dois convergem quanto aos danos morais. Nesse caso, houve unanimidade

7 Nelson Nery Júnior & Rosa Maria de Andrade Nery, op. c/t., p. 897.

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EMBARGOS INFRINGENTES

em relação aos danos materiais e divergência quanto aos danos morais - um único acórdão contendo uma parte unânime e outra divergente.

O recurso de embargos infringentes apenas recairá sobre a parte divergente do acórdão.

Assim, surge outra indagação: devem ser interpostos simultanea­mente aos embargos infringentes os recursos especial e/ou extraordi­nário em relação à parte não-unânime do julgado?

A esse respeito uma alteração plausível foi introduzida pela Lei n. 10.352/2001, pois, antes da referida reforma, sendo a divergência par­cial, a parte sucumbente deveria interpor recurso próprio contra a parte unânime (especial ou extraordinário) e embargos infringentes contra a divergência, uma vez que os embargos não causavam a inter­rupção do prazo para a interposição de recurso contra a parte unâni­me. Caso a parte não interpusesse os recursos especial e/ou extraordiná­rio contra a parte unânime, esta transitaria em julgado, ficando pendente de julgamento apenas a divergência parcial em razão dos embargos in­fringentes.

Por sua vez, a nova redação do art. 498 do Código de Processo Ci­vil passou a ser a seguinte:

Art. 498. Quando o dispositivo do acórdão contiver julgamento por maioria de votos e julgamento unânime, e forem interpostos embargos infringentes, o prazo para recurso extraordinário ou re­curso especial, relativamente ao julgamento unânime, ficará so- brestado até a intimação da decisão nos embargos.Parágrafo único. Quando não forem interpostos embargos infrin­gentes, o prazo relativo à parte unânime da decisão terá como dia de início aquele em que transitar em julgado a decisão por maio­ria de votos.

Infere-se, portanto, que apenas após a publicação do acórdão pro­ferido nos embargos infringentes opostos contra a parte divergente do acórdão anterior é que terá início o prazo para a interposição dos recur­sos especial e extraordinário contra a parte unânime do julgado (en­quanto não publicado o acórdão dos embargos infringentes, não terá

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início o prazo para interposição de Recurso Extraordinário ou Recur­so Especial em relação à parte unânime). Quando da publicação do acórdão dos embargos infringentes é que terá início o prazo para a in­terposição de outros recursos contra a parte unânime, prazo este que será integral (15 dias).

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R e c u r s o s

p a r a o S u p e r i o r

T r i b u n a l d e J u s t i ç a

e p a r a o S u p r e m o

T r i b u n a l F e d e r a l 6

6 . 1 R e c u r s o O r d i n á r i o

IH I6 .1 .1 AÇÕES MANDAMENTAIS DE COMPETÊNCIA

O R I G I N Á R I A D O S T R I B U N A I S

A Constituição da República, levando em consideração determinadas pessoas que figuram nos pólos da ação, outor­gou juízos1 privilegiados para a impetração de ações manda- mentais contra determinadas autoridades, fazendo com que as referidas ações sejam de competência originária dos tribunais.

Por exemplo, são de competência originária do Superior Tribunal de Justiça as ações mandamentais contra atos de Ministros de Estado e comandantes das Forças Armadas (art. 105,1, b, da CF).

Outro exemplo, podemos citar a Constituição do Estado de São Paulo, que confere competência originária ao Tribu-

1 É comum o emprego do termo foro privilegiado, no entanto, trata-se de expressão equivocada, já que foro é relativo a local e não juízo.

101

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1 0 2 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

nal de Justiça do Estado (Órgão Pleno) para julgar os mandados de se­gurança impetrados contra atos do Governador do Estado, da Mesa da Assembléia Legislativa ou atos de Desembargadores do próprio tribu­nal. Também sabemos que a impetração de ação mandamental contra ato de juiz de direito (juiz estadual) será diretamente no Tribunal de Justiça ao qual o magistrado estiver vinculado, ou, no caso de juiz fede­ral, a ação será diretamente no Tribunal Regional Federal a que perten­cer o magistrado apontado como autoridade coatora na ação m anda­mental.

Assim, essas ações mandamentais são propostas diretamente no tribunal e, conseqüentemente, por não passarem pela primeira instân­cia de jurisdição e não terem uma sentença, não podem ser recorridas por meio de recurso de apelação. O que há, nesses casos, é tão-somen- te o acórdão que decide o mérito do mandamus.

Pelo fato de a competência ser originária dos tribunais, não have­ria para a parte qualquer recurso ordinário - no sentido de recurso comum que fizesse as vezes de apelação - como meio de impugnação da primeira decisão de mérito do processo, qual seja, o acórdão. As partes poderiam, tão-somente, interpor os recursos especial e/ou ex­traordinário, cujo âmbito de cabimento restringe-se ao conhecimento de teses jurídicas, nunca são para a apreciação de fatos.

Dessa forma, como meio de garantir o duplo grau de jurisdição nessas ações mandamentais propostas em sede de competência origi­nária dos tribunais - conferindo um recurso comum para apreciação de fato e de direito como ocorre na apelação - é que a própria Consti­tuição prevê as hipóteses de cabimento e competência para o recurso ordinário.2

No entanto, ressalte que terá cabimento o recurso ordinário quan­do o acórdão, proferido em ação mandamental de competência origi­nária do tribunal, houver denegado a segurança pretendida.3 Portanto,

2 Em razão de estar previsto na Constituição, é muito comum ser denominado Recurso Ordinário Constitucional - ROC, como forma até mesmo de diferenciá-lo do Recurso Ordiná­rio do processo do trabalho (que faz as vezes do recurso de apelação do CPC).

3 Para o professor Nelson Luiz Pinto, in: Código de Processo Civil interpretado, p. 1604, a expressão denegatória deve ser interpretada amplamente, ou seja, caberá recurso ordinário

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 0 3

o recurso ordinário, neste caso, será instrumento que apenas poderá ser utilizado pela parte impetrante (autora da ação e sucumbente pela denegação de seu pedido).

Ressalte-se que, contra a parte concessiva da ação mandamental, não é cabível recurso ordinário.

As hipóteses de cabimento do recurso ordinário são restritas àque­las previstas na Constituição da República, variando a competência de acordo com o órgão jurisdicional do qual se origina o recurso.

Recurso ordinário para o Supremo Tribunal Federal

É cabível o recurso ordinário para o Supremo Tribunal Federal (art. 102, II, a, da CF) contra acórdãos proferidos em julgamento de mandados de segurança, habeas corpus, habeas data e mandados de

ainda que a ação mandamental tenha sido indeferida liminarmente ou, por qualquer motivo, sem apreciação do mérito. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça vem firmando jurispru­dência no sentido contrário, ou seja: "Constitui erro grosseiro a interposição de recurso ordiná­rio contra decisão do relator que indefere, liminarmente, mandado de segurança (R5TJ 73/178), cabendo, portanto, agravo regimental" (RSTJ 11/191, 32/141, 32/169).

Assim, acreditamos que a melhor solução seria interposição de agravo regimental contra a decisão monocrática que indefere a ação mandamental, com isso o indeferimento liminar seria levado a julgamento pelo órgão colegiado e, conseqüentemente, seria proferido um acór­dão. Dessa forma, haveria o cabimento do recurso ordinário segundo a jurisprudência do STJ: "Não cabe recurso ordinário para o STJ de decisão singular proferida em mandado de seguran­ça" (STJ, 3a T., Recurso Ordinário em MS n. 2.586-0, rel. Min. Costa Leite, j. 24.02.1994, v.u).

"Processual civil. Mandado de segurança. Decisão monocrática. Indeferimento liminar. Recurso ordinário constitucional. Incabível. Art. 105, II, b, da carta maior. I. Inadmissível recur­so ordinário em mandado de segurança indeferido liminarmente por relator de tribunal esta­dual, cuja decisão desafiava agravo regimental (art. 39 da Lei n. 8.038/90). II. Recurso ordi­nário não conhecido." (STJ, 4a T., Recurso Ordinário em MS n. 11.371/PR, rel. Min. Aldair Passarinho Junior, j. 04.05.2006)

"Recurso ordinário em mandado de segurança. Decisão monocrática passível de recur­so. Não cabimento. Recurso não conhecido. 1. O art. 105, II, b, da Constituição Federal dis­põe que compete ao Superior Tribunal de Justiça julgar 'os mandados de segurança decididos em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos estados, do Distrito Federal e territórios, quando a decisão for denegatória', ou seja, na hipótese em que a decisão recorrida tenha sido proferida por órgão colegiado do Tribunal a quo, esgotan­do-se a instância originária. 2. Na forma estabelecida no art. 5o, II, da Lei n. 1.533/51, não cabe a impetração de mandado de segurança como sucedâneo de recurso legalmente cabível" (RMS n. 16.811/AM, 2d T., rel. Min. João Otávio de Noronha, DJU 01.02.2006.) Recurso ordi­nário não conhecido." (STJ, Recurso Ordinário em MS n. 21.472/RS, rel. Min. Felix Fischer, j. 23.05.2006)

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1 0 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

injunção decididos em única instância (em competência originária) pelos tribunais superiores (STJ, TST, STM e TSE), quando denegató- rios da segurança.

| Recurso ordinário para o Superior Tribunal de Justiça

É cabível recurso ordinário para o Superior Tribunal de Justiça (art. 105, II, b, da CF) contra acórdãos proferidos em mandados de segurança decididos em única instância (instância originária) pelos tribunais regionais federais ou tribunais dos estados e de território, quando denegatórios da segurança.

E importante frisar que apenas é cabível o recurso ordinário con­tra o acórdão denegatório de segurança; portanto, é recurso próprio da parte impetrante do mandamus. Em caso de concessão de segurança, são cabíveis apenas os recursos especial e/ou extraordinário, segundo os requisitos próprios desses recursos.4

wm 6 . 1 . 2 C a u s a s E n v o l v e n d o E s t a d o E s t r a n g e i r o

o u O r g a n i s m o I n t e r n a c i o n a l e M u n i c í p i o

B r a s i l e i r o o u p e s s o a D o m i c i l i a d a n o P a í s

O art. 109, II, da Constituição da República determina que é de competência dos juízos federais o conhecimento de ações em que figu­rem, de um lado, Estado estrangeiro ou organismo internacional e, do outro, município brasileiro ou pessoa domiciliada no Brasil.

Por sua vez, o art. 539, II, b, do Código de Processo Civil estabele­ce ser cabível recurso ordinário para o Superior Tribunal de Justiça como meio de impugnação contra as sentenças proferidas pelos juízos federais nos julgamentos relativos à competência anteriormente m en­cionada.

Portanto, podemos concluir que, nas ações em que estiver litigan- do pessoa internacional (Estado ou organismo) e pessoa domiciliada no Brasil ou município brasileiro, não haverá apelação para o TRF das

4 Caso o acórdão conceda em parte a segurança pretendida na ação mandamental, a parte impetrante poderá se valer do recurso ordinário e a parte impetrada dos recursos espe­cial e/ou extraordinário, caso sejam cabíveis. A parte impetrada nunca poderá se valer do recurso ordinário.

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 0 5

sentenças proferidas pelos juízos federais, mas caberá recurso ordiná­rio diretamente para o Superior Tribunal de Justiça.5

Das decisões interlocutórias proferidas em primeira instância pe­los juízos federais caberá o recurso de agravo de instrumento, também de competência de julgamento do Superior Tribunal de Justiça (pará­grafo único do art. 539 do CPC).

Em síntese, podemos afirmar ser cabível o recurso ordinário contra:

a) Acórdão de ação mandamental impetrada originariamente no tri­bunal, quando denegatória a segurança• Se o acórdão do mandado de segurança (denegatório) tiver como

origem um Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal, o recurso ordinário será julgado pelo Superior Tribunal de Justiça;

• se o acórdão proferido em mandado de segurança, habeas data ou mandado de injunção tiver como origem um tribunal supe­rior, o recurso ordinário será julgado pelo Supremo Tribunal Fe­deral.

b) Sentenças proferidas por juízo federal em ação em que figure como parte, de um lado, Estado estrangeiro ou organismo interna­cional e, do outro, município brasileiro ou pessoa domiciliada no Brasil• Neste caso, o recurso será julgado pelo Superior Tribunal de

Justiça.

■■ 6 .1 .3 PROCEDIMENTO E EFEITOS

d o R e c u r s o O r d i n á r i o

O recurso ordinário, tanto para o Supremo Tribunal Federal como para o Superior Tribunal de Justiça, deve ser interposto no prazo de 15 dias, contados da data da publicação do acórdão recorrido; acórdão este que tiver denegado a segurança ao impetrante, ou da sentença

5 Nesse sentido, explicam Nelson Nery Junior & Rosa Maria de Andrade Nery (op. c/f., p. 910): "As causas enunciadas na norma sob comentário são da competência originária do juiz federal de primeiro grau (CF, 109, II) e, em grau de recurso, do STJ (CF, 105, II, c, e RISTJ, 13, III). O TRF não tem nenhuma competência nessa matéria".

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1 0 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

proferida por juiz federal naqueles casos específicos de cabimento do recurso ordinário.

Ao procedimento do recurso ordinário, inclusive com relação aos requisitos de admissibilidade e efeitos de recebimento do recurso, nos termos estabelecidos no art. 540 do Código de Processo Civil, aplicam- se as regras previstas para o recurso de apelação. Tal previsão justifica-se pela grande semelhança existente entre as duas espécies de recursos.

Não obstante as normas que regem o recurso de apelação, o Có­digo de Processo Civil autoriza que os Regimentos Internos dos Tri­bunais disciplinem o procedimento para o julgamento do recurso ordinário.

Ressalte-se que o recurso ordinário tem amplo efeito devolutivo, já que permite a apreciação de todas as questões ventiladas na instância de origem, como ocorre com o recurso de apelação. No recurso ordi­nário é possível a discussão de toda matéria de fato e de direito que tenha sido argiiida na instância inferior.

6.2 Re c u r s o Es p e c i a l

e R e c u r s o E x t r a o r d i n á r i o

Os recursos extraordinário6 e especial7 são espécies de impugnação contra ato judicial que encontram sua fundamentação na Carta Cons­titucional.

6 O recurso extraordinário surgiu no Brasil logo após a proclamação da república, por meio do Decreto n. 848/1890, que, inspirado no sistema norte-americano, pretendia a exis­tência de um órgão centralizador na interpretação da lei, garantindo a supremacia das leis e da Constituição. Passou a constar no art. 59 da Constituição da República de 1891, mas sem a nomenclatura de recurso extraordinário. Foi a Constituição de 1934, em seu art. 76, 2, III, que passou a prever expressamente o recurso com o nome que conhecemos.

7 O recurso especial foi criado pela Constituição de 1988, mas como uma derivação da competência do recurso extraordinário do STF. O atual recurso especial é um desmembra­mento do antigo recurso extraordinário, já que competia ao Supremo a interpretação final da lei federal e da Constituição. A Constituição de 1967, por exemplo, em seu artigo 14, III, ou­torgava ao Supremo Tribunal Federal a competência para julgamento do recurso extraordiná­rio quando houvesse violação à lei federal ou à Constituição da República. No entanto, com

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 0 7

Ambos os recursos são meios excepcionais de impugnação de acór­dãos proferidos pelos tribunais, são instrumentos para a apreciação exclusiva de teses jurídicas, de interpretação da lei federal e da própria Constituição da República.

A esse respeito, Humberto Theodoro Júnior afirma8 que:

Além da dualidade de instâncias ordinárias, entre os juizes de primei­ro grau e os Tribunais de segundo grau, existe também, no sistema pro­cessual brasileiro, a possibilidade de recursos extremos ou excepcionais, para dois órgãos superiores que formam a cúpula do Poder Judiciário nacional, ou seja, para o Supremo Tribunal Federal e para o Superior Tri­bunal de Justiça. 0 primeiro deles se encarrega da matéria constitucional e o segundo, dos temas infraconstitucionais de direito federal. Cabe-lhes, porém, em princípio, o exame não dos fatos controvertidos, nem tam­pouco das provas existentes no processo, nem mesmo da justiça ou injus­tiça do julgado recorrido, mas apenas e tão-somente a revisão das teses jurídicas federais envolvidas no julgamento impugnado.

De fato, como ensina o mestre, os recursos especial e extraordiná­rio não se prestam para a apreciação de fatos do processo,9 mas, como regra, apenas para o reexame em relação à interpretação da lei federal pelo Superior Tribunal de Justiça, isso em matéria comum (excluindo- se a competência dos demais tribunais superiores), ou da Constituição da República, já que tal incumbência foi outorgada ao Supremo Tribu­nal Federal.

Os recursos especial e extraordinário também se revestem da fun­ção de unificação da interpretação da lei federal e da Constituição, já que vivemos em um Estado federado e que admite a existência de di­versos tribunais para cada ente que integra a federação (tribunais fede­

a Constituição de 1988, a competência foi cindida para ser atribuição do Supremo Tribunal Federal a apreciação do recurso extraordinário, em síntese, quando houver violação à Cons­tituição, e para o Superior Tribunal de Justiça o recurso especial quando houver violação às normas infra-constitucionais em matéria comum.

8 Curso de direito processual civil, p. 535.9 Súmula n. 279 do STF: "Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário".

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1 0 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

rais, no âmbito da União, e tribunais de justiça para os estados-mem- bros).10

Como sabemos, todos os órgãos do Poder Judiciário (seja qual for a instância ou esfera da federação a que pertençam) podem manifes­tar-se acerca da interpretação da lei federal e da Constituição da Repú­blica (em sede de controle difuso da constitucionalidade).

Assim, em um Estado de Direito, é justa a existência de recursos que levem ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Fe­deral questões para a unificação, respectivamente, da interpretação da lei federal e da Constituição da República. Todos os órgãos do Judiciá­rio poderão interpretar as leis federais e a Constituição, mas a última palavra acerca de tais interpretações caberá aos Tribunais citados.

wm 6 . 2 . 1 C a b i m e n t o d o s R e c u r s o s a o S T F e a o S T J

O art. 105, III, da Constituição da República prevê o cabimento de recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça, contra acórdão proferido pelos tribunais regionais federais ou pelos tribunais dos estados (tribunais de justiça) quando:

a) Contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigênciaA alínea a do art. 105, III, da Constituição assegura geral hipó­

tese de cabimento do recurso especial, ou seja, quando o acórdão recorrido houver violado tratado internacional ou lei federal.

Quando falamos em tratado, na verdade acreditamos que o constituinte se valeu de uma repetição desnecessária, já que, por expressa determinação constitucional, os tratados internacionais apenas terão eficácia no Brasil quando ratificados com força de lei (norma infra-constitucional) ou admitidos no ordenamento com eficácia de norma constitucional (como Emenda à Constituição), nos casos de tratados que versem acerca de direitos humanos e tenham sido submetidos à votação segundo os critérios para a al­teração da Constituição (art. 5o, § 3o da CF).

10 Eduardo Arruda Alvim, Recurso especial e recurso extraordinário, aspectos polêmicos e atuais dos recursos eiveis, p. 140.

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 0 9

Sendo o tratado introduzido no Brasil como norma infra-cons- titucional, não haveria a necessidade da inclusão expressa do ter­mo “tratado” na alínea a. Ademais, se for recepcionado como norm a constitucional, como tratamos anteriormente, eventual violação por acórdão será objeto de recurso extraordinário e não recurso especial.

Portanto, caso o acórdão do tribunal de justiça ou do tribunal regional federal venha a ferir a lei federal - normas infra-constitu- cionais produzidas pelo Congresso Nacional - em processos de matéria comum," caberá o recurso especial.

b) Julgar válido ato de governo local (municipal ou estadual) contes­tado em face de lei federal

A alínea b foi alterada pela Emenda Constitucional n. 45/2004, já que na redação original previa o cabimento do recurso especial no caso de acórdão que julgasse válidos lei ou ato local contesta­dos em face da lei federal.

Na atual redação, permaneceu apenas o termo ato de governo local, o que podemos entender como ato administrativo do poder executivo estadual, do Distrito Federal ou dos municípios.

Assim, se um acórdão de tribunal de justiça ou tribunal regio­nal federal prestigiar um ato de governo local em detrimento da lei federal, para preservação da norma federal, caberá recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça.

c) Der à lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuí­do outro tribunal

Nesse caso, trata-se de hipótese expressa que visa à unificação da jurisprudência dos diversos tribunais. Assim, demonstrando o recorrente que, para fatos idênticos, a lei federal foi interpretada de forma diversa por diferentes tribunais, poderá interpor o recurso especial pretendendo a unificação da jurisprudência e a prevalên­cia da interpretação que mais lhe favoreça.

" Se a violação for em matéria de jurisdição especilizada, caberá o recurso próprio para o tribunal competente. Por exemplo, sendo uma reclamação trabalhista e havendo violação à CLT (uma norma federal), caberá recurso de revista para o TST, e não recurso especial para o STJ.

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Por sua vez, o art. 102, III, da Carta Maior determina cabível recur­so extraordinário para o Supremo Tribunal Federal, como meio de im­pugnação contra decisão em única ou última instância (ou seja, de com­petência originária dos tribunais ou após o esgotamento de todos os recursos comuns cabíveis), quando:

a) Contrariar dispositivo da Constituição da RepúblicaA alínea a estabelece cabimento genérico, ou seja, em qualquer

hipótese de violação da Constituição.

b) Declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federalPelo controle difuso da constitucionalidade, sabemos que to­

dos os órgãos do Poder Judiciário estão autorizados a manifestar-se acerca da constitucionalidade das normas infra-constitucionais fe­derais.

Assim, caso um tribunal venha a reconhecer, incidentalmente, a inconstitucionalidade de uma norma infra-constitucional federal, a parte interessada no reconhecimento da constitucionalidade po­derá interpor recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal.12

c) Julgar válidos lei ou ato de governo local contestados em face da Constituição

Caso o acórdão venha prestigiar uma norma ou ato local que estejam sendo contestados em face da Constituição, a parte preju­dicada poderá interpor recurso extraordinário sustentando que a norma ou ato local contrariam a Carta Maior.

d) Julgar válida lei local contestada em face da lei federal

A alínea d do inc. III, do art. 102 da Constituição da República, intro­duzida pela Emenda Constitucional n. 45/2004, subtraiu matéria que antes

12 Súmula n. 285 do STF: "Não sendo razoável a argüição de inconstitucionalidade, não se conhece do recurso extraordinário fundado na letra c do art. 102, III, da Constitui­ção Federal".

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 1 1

era destinada ao recurso especial (na antiga redação do art. 105, III, b) e atribuiu ao recurso extraordinário. Na verdade, a EC n. 45/2004 admitiu o recurso extraordinário pelo fato de que, havendo prevalência da lei local em detrimento da lei federal, por via reflexa, poderia ocorrer violação das regras de competência estabelecidas na Constituição da República.

A princípio, a leitura do artigo poderia conduzir à interpretação de que há hierarquia entre as normas, sendo a lei federal mais importan­te que a lei local.

Mas, nesse caso, não se trata de afirmar que existe hierarquia entre a lei local e a federal, que uma se sobrepõe à outra, mas, tão-somente, caberá recurso extraordinário para verificação se ocorreu respeito às competências legislativas previstas na Constituição da República.

Até o advento da EC n. 45/2004, afirmávamos que ao Supremo Tribunal Federal, por meio do recurso extraordinário, estava atribuída a excelsa função de guarda da Constituição, já que todas as hipóteses de cabimento de recurso extraordinário previam o seu cabimento quando o acórdão houvesse, de forma direta, violado a Constituição da República.

Agora, além dessa atribuição, cabe ao Supremo o julgamento de recurso extraordinário para verificação da aplicação correta da lei local em relação à lei federal (alínea d do inc. III do art. 102), como forma de se verificar se ocorreu indireta violação à Constituição da República.

Quando o Supremo analisar qual lei deverá ser aplicada - local ou federal - estará, na verdade, aplicando as regras constitucionais de competência legislativa e garantindo a estabilidade do pacto federati­vo, nos termos dos arts. 21 (competências exclusivas da União), 24 (competências concorrentes) e 30 (competências dos municípios).

Portanto, a redação da alínea d, do art. 102, III, da Constituição é também relativo à questão constitucional.

Em relação ao cabimento dos recursos especial e extraordinário, outra diferença substancial surge em relação ao cabimento, já que o es­pecial apenas é cabível contra acórdãos dos tribunais regionais federais ou dos tribunais dos estados, justamente por essa razão é que não se admite a interposição de recurso especial contra as decisões proferidas no âmbito dos juizados especiais estaduais pelos seus respectivos colé­gios recursais. Os colégios recursais não são tribunais; portanto, mes­

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1 1 2 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

mo que o acórdão venha a ferir a lei federal (em uma das hipóteses do art. 105, III, da Constituição), não caberá recurso especial.13

Por outro lado, com relação ao recurso extraordinário, a Consti­tuição não limitou o cabimento à origem da decisão impugnada, so­mente o condicionou à existência de ofensa ao texto constitucional quando do julgamento em única ou última instância, razão pela qual é cabível o recurso extraordinário inclusive contra as decisões dos colé­gios recursais dos juizados especiais (que se caracterizam como a últi­ma instância nos juizados).14

É requisito, também, para a interposição dos recursos especial e extraordinário que a parte tenha esgotado todas as vias recursais ordi­nárias, ou seja, tenha manipulado todos os recursos cabíveis anterior­mente à interposição dos recursos excepcionais. Não poderia, por exemplo, a parte interpor diretamente recurso especial sem antes ter apresentado embargos infringentes quando estes tinham cabimento.

■ i 6 . 2 . 2 P r e s s u p o s t o s R e c u r s a i s E s p e c í f i c o s

Não obstante os pressupostos recursais genéricos a todos os recursos, a interposição dos recursos especial e extraordinário deverá observar:15

Para o recurso especial:

a) esgotamento de todos os recursos ordinários;b) que o acórdão tenha sido proferido por tribunal regional federal

ou tribunal de estado-membro;

13 Súmula n. 203 do STJ: "Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos juizados especiais".

"Recurso especial. Juizados especiais. I. Não cabe recurso especial interposto contra decisão dos colégios recursais dos juizados especiais, pois, ao contrário do previsto quanto ao recurso extraordinário, somente as decisões proferidas pelos tribunais regionais federais ou pelos tribunais dos estados, do Distrito Federal e territórios estão sujeitas à apreciação desta Corte, por meio do recurso especial. II. Agravo regimental desprovido." (STJ, 3a T., Ag. Reg. no Ag. n. 356.595/BA, rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, j. 03.04.2001, v.u.)

M Súmula n. 640 do STF: "É cabível recurso extraordinário contra decisão proferida por juiz de primeiro grau nas causas de alçada [leia-se nos embargos infringentes da lei de exe­cuções fiscais interpostos contra sentenças], ou por turma recursal de juizado especial cível ou criminal".

15 Gilson Delgado Miranda & Patrícia Miranda Pizzol, Processo civil: recursos, p. 110-28.

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 1 3

c) existência e demonstração de uma das hipóteses de cabimento do art. 105, III, da Constituição da República. O recurso não terá cabimento para discussão de fato, mas apenas das teses jurídicas fundadas nas hipóteses previstas na Constituição;

d) prequestionamento.

Para o recurso extraordinário:

a) decisão proferida em única ou última instância por qualquer ó r­gão jurisdicional; o que eqüivale a dizer que devem ter sido esgo­tados todos os meios ordinários de impugnação da decisão recor­rida;16

b) existência e demonstração de uma das hipóteses de cabimento previstas no art. 102, III, da Constituição da República;

c) prequestionamento;d) repercussão geral (argüição de relevância), requisito tratado no

item 6.2.10.

| Prequestionamento

Mas no que consiste o prequestionamento?O Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal ado­

taram o entendimento segundo o qual os recursos excepcionais apenas seriam cabíveis quando questões (ou matérias) de lei federal ou da Constituição da República, apontadas como violadas, tiverem sido apre­ciadas de forma expressa pela decisão impugnada.

16 Súmula n. 281 do STF: "É inadmissível o recurso extraordinário quando couber, na justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada".

Súmula n. 735 do STF: "Não cabe recurso extraordinário contra acórdão que defere medida liminar".

Súmula n. 733 do STF: "Não cabe recurso extraordinário contra decisão proferida no processamento de precatório".

Súmula n. 637 do STF: "Não cabe recurso extraordinário contra acórdão de tribunal de justiça que defere pedido de intervenção estadual no município".

Súmula n. 636 do STF: "Não cabe recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade, quando a sua verificação pressuponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão recorrida". Por essa súmula, podemos afirmar que não cabe recurso extraordinário quando a ofensa à Constituição se deu por via reflexa, ou seja, violada a norma infraconstitucional, ocorre a violação do princípio constitucional da legalidade.

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1 1 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

A esse respeito, em artigo17 extremamente aprofundado no tema, José Miguel Garcia Medina conceitua o prequestionamento como:

Daí haver na jurisprudência, diversas concepções acerca do que se deve entender por prequestionamento. Grosso modo, podemos sistemati­zar tais entendimentos em três grupos: a) prequestionamento como mani­festação expressa pelo tribunal recorrido acerca de determinado tema; b) prequestionamento como debate anterior à decisão recorrida, acerca do tema, hipóteses em que o mesmo é muitas vezes considerado como ônus atribuído à parte; c) a soma das duas tendências citadas, ou seja, preques­tionamento como prévio debate acerca do tema de direito federal ou constitucional, seguido de expressa manifestação do tribunal a respeito.

De fato, os tribunais, como resultado da interpretação dos arts. 105 e 102 da Constituição da República, têm exigido para a implemen­tação do requisito do prequestionamento que a matéria tenha sido dis­cutida nas vias ordinárias, ou seja, que as questões constitucionais ou de lei federal tenham sido debatidas anteriormente, bem como que tenha havido manifestação expressa na decisão recorrida dos disposi­tivos apontados como violados.

Nesse sentido, foram editadas as seguintes súmulas:

Súmula n. 282 do STF: "É inadmissível o recurso extraordinário quan­do não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada". Súmula n. 356 do STF: "O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recur­so extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento". Súmula n. 211 do STJ: "Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo".

A Súmula n. 356 do Supremo Tribunal Federal sugere que devem ser opostos embargos de declaração como forma de prequestionamen-

17 Nery Júnior & Teresa Wambier, "O prequestionamento e os pressupostos dos recursos extraordinário e especial", in: Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis, p. 276.

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 1 5

to, para fazer com que o tribunal se manifeste expressamente acerca da matéria a cujo respeito caberia recurso extraordinário ou especial.

E mais, o Superior Tribunal de Justiça chega ao ponto absurdo de afirmar na Súmula n. 211 que, mesmo havendo embargos de declara­ção, apenas estará prequestionada a matéria quando houver a manifes­tação expressa no acórdão recorrido.

Ora, se os embargos são opostos e não providos, como obrigar o tri­bunal a quo a se manifestar expressamente sobre a matéria federal ou constitucional? É comum, quando da oposição de embargos de declara­ção, o seu não-conhecimento sob a alegação de que estes não se prestam para prequestionamento, mas sim nas hipóteses previstas no art. 535 do Código de Processo Civil (omissão, contradição e obscuridade).

Tal súmula do STJ não corresponde ao entendimento do STF, já que este Supremo Tribunal entendeu prequestionada a matéria quan­do opostos os embargos declaratórios e mesmo não providos.18

De fato, como ensina Nelson Nery Júnior,19 a Constituição exige, para que sejam conhecidos dos recursos especial e extraordinário, que a causa tenha sido decidida, ou seja, que tenha sido efetivamente jul­gada pelo tribunal recorrido, não podendo ser conhecidos os recursos excepcionais quando a matéria não tiver sido apreciada de forma ex­pressa pelo tribunal a quo.

mm 6 . 2 . 3 E f e i t o s d o s R e c u r s o s

Os recursos especial e extraordinário, quando interpostos, não im­pedem a execução do acórdão recorrido, ou seja, os recursos são rece- l?idos apenas no efeito devolutivo, conforme preceitua o art. 542, § 2o do Código de Processo Civil.

Assim, a regra é no sentido de que os recursos especial e extraor­dinário não têm efeito suspensivo.

Excepcionalmente, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justi­ça tem admitido a propositura de ação cautelar, diretamente no referi­do Tribunal, com a finalidade de obter efeito suspensivo ao recurso

18 Tribunal Pleno, RE n. 219.934/SP, rel. Min. Otávio Gallotti, j. 16.06.2000.'9 Ainda sobre o prequestionamento: "Os embargos de declaração prequestionadores",

in: Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis, p. 852.

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1 1 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

especial, quando houver os requisitos do perigo de dano e da relevân­cia dos fundamentos.20

De fato, o art. 800, parágrafo único, do Código de Processo Civil de­termina que, interposto o recurso, a competência para a medida caute­lar será do tribunal. Portanto, interposto o recurso especial no tribunal de justiça ou no tribunal regional federal, havendo perigo de dano e fun­damento relevante (periculum in m oraefum us boni iuris), a parte recor­rente poderá promover diretamente no Superior Tribunal de Justiça ação cautelar para dar efeito suspensivo ao recurso especial interposto.

No âmbito do Supremo Tribunal Federal também se admite a pro- positura de ação cautelar para dar efeito suspensivo ao recurso extraor­dinário, mas, como regra, apenas tem se admitido a medida quando o recurso extraordinário houver sido admitido pelo tribunal de origem (tenha tido juízo de admissibilidade positivo).21

20 "Processo civil. Medida cautelar para dar efeito suspensivo a recurso especial. Perti­nência. 1. Tese jurídica controvertida, objeto de acertamento jurisprudencial na Primeira Se­ção, pois afetado recurso especial para esse fim. 2. Presentes os pressupostos, concede-se a cautelar para dar efeito suspensivo a recurso especial em que se discute controvertida tese em torno da denúncia espontânea. 3. Medida cautelar julgada procedente." (STJ, 2a T.# MC n. 10.171/RJ, rel. Min. Eliana Calmon, j. 06.06.2006, v.u.)

"Pedido de efeito suspensivo a recurso especial. Requisitos e natureza jurídica. Exige-se dos pedidos para atribuição de efeito suspensivo um mínimo de aparência de bom direito (fumus boni iuris) e perigo na demora (periculum in mora), que estão, direta e simultanea­mente, ligados a possibilidade de êxito do recurso especial e à necessidade de urgência da prestação recursal. O pedido de efeito suspensivo ao recurso especial não possui natureza jurídica própria de ação cautelar autônoma, tratando-se de incidente, que se exaure com o acolhimento ou rejeição do pedido (sujeito a recurso), dispensando a necessidade de citação e, em conseqüência, de condenação honorária." (STJ, 3a T, Ag. Reg. na MC n. 11.282/SP, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 16.05.2006, v.u.)

"Processo civil. Agravo regimental. Medida cautelar para dar efeito suspensivo a recurso especial. Finalidade e coerência. 1. A medida cautelar para dar efeito suspensivo ao recurso es­pecial busca, como interesse processual imediato, proteger o recurso. 2. Para merecer prote­ção, deve a parte demonstrar que a tese jurídica defendida no recurso é plausível, plausibilida- de que deve ser defendida na medida cautelar. 3. Dentro do mecanismo de proteção, não se pode admitir que o recurso especial contenha uma tese jurídica a ser examinada de forma exauriente, e a cautelar contenha tese jurídica diversa. 4. Agravo regimental improvido."(STJ, 2a T., Ag. Reg. na MC n. 11.382/PR, rel. Min. Eliana Calmon, j. 18.04.2006, v.u.).

2] "Agravo regimental na medida cautelar na ação cautelar. 2. Nas ações cautelares para concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário se exige a prévia existência de juízo de admissibilidade pelo Tribunal recorrido (Súmulas STF ns. 634 e 635). 3. Excepcionalmente a jurisprudência da Corte admite a concessão de medidas cautelares sem aquele requisito,

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 1 7

O Supremo Tribunal Federal editou a Súmula n. 634 para consoli­dar o entendimento de que “não compete ao Supremo Tribunal Fede­ral conceder medida cautelar para dar efeito suspensivo a recurso ex­traordinário que ainda não foi objeto de juízo de admissibilidade na origem”. A orientação sumulada pelo STF também vem sendo adotada pelo STJ.22

Para o Supremo, estando o recurso extraordinário pendente de juízo de admissibilidade, o pedido de efeito suspensivo e a conseqüen­te medida cautelar para emprestar o referido efeito deverão ser formu­lados ao presidente do tribunal recorrido (Súmula n. 635 do STF).23

m 6 . 2 . 4 R e g u l a r i d a d e f o r m a l

Os recursos em análise são interpostos no próprio tribunal que proferiu a decisão recorrida, por meio de petição de interposição en­dereçada ao tribunal recorrido e razões de recurso, bem como a com­provação do preparo.

Na elaboração dos recursos, devem ser observados os seguintes aspectos formais:

exposição do fato e do direito (nesses recursos não se admite a dis­cussão de fatos, mas apenas da aplicação do direito, de teses jurí­dicas acerca da interpretação da lei em relação ao fato concreto); demonstração do cabimento do recurso interposto; fundamentação do pedido de reforma, ou seja, a parte recorrente deverá demonstrar a efetiva violação à lei federal ou à Constitui­

mas isto somente quando o perecimento do direito alegado seja verdadeiramente irreversível ou a pretensão encontre inequívoco reconhecimento na jurisprudência consolidada do pró­prio STF. 4. Agravo regimental a que se nega provimento." (STF, 2a T„ Ação Cautelar n. 1.114/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 23.05.2006, v.u.)

22 "Agravo regimental. Medida cautelar. Processual civil. Efeito suspensivo. Recurso es­pecial. Juízo positivo de admissibilidade originário. Ausência. Não se conhece de medida cau­telar em que se pleiteia a atribuição de efeito suspensivo a recurso especial na hipótese em que ausente, na origem, o juízo positivo de admissibilidade recursal. Agravo regimental a que se nega provimento." (STJ, 6a T„ Ag. Reg. na MC n. 11.111/SP, rel. Min. Paulo Medina, j. 07.03.2006, v.u.)

23 Súmula n. 635 do STF: "Cabe ao presidente do tribunal de origem decidir o pedido de medida cautelar em recurso extraordinário ainda pendente do seu juízo de admissibilidade".

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1 1 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

ção da República, sob pena de não-conhecimento do recurso por deficiência de fundamentação;2,1 pedido de reforma e suas razões;quando o recurso se fundar em dissídio jurisprudencial (alínea c do inc. III do art. 105 da CF), o recorrente deverá juntar cópia au­tenticada do acórdão paradigma ou sua citação no repositório oficial,25 para comprovar a divergência da jurisprudência dos tr i­bunais (devem ser tribunais diferentes, não pode ser divergência interna do tribunal), conforme determina o parágrafo único do art. 541 do Código de Processo Civil.

■ i 6 . 2 . 5 P r o c e d i m e n t o G e r a l

Em síntese, podemos afirmar que os recursos especiais e extraor­dinários seguem o seguinte procedimento:

a) os recursos serão interpostos, no prazo de 15 dias, por petições autônomas, contendo cada um a petição de interposição, endere­çada ao presidente do tribunal recorrido, e as razões recursais. A petição de interposição e as razões são apresentadas simultanea­mente (uma acostada à outra);

b) recebidos os recursos, a própria secretaria do tribunal intimará a parte recorrida para que apresente as suas contra-razões, também no prazo de 15 dias (art. 542 do CPC);

c) após o prazo da resposta do recorrido, com ou sem a sua apresen­tação, os autos serão remetidos ao presidente do tribunal, ou ao vice-presidente conforme dispuser o regimento interno do tribu­nal, para a realização do juízo de admissibilidade do recurso;

d) não admitido qualquer um dos recursos, a parte poderá interpor agravo de instrumento ao tribunal competente para o conheci­mento do recurso cujo seguimento foi denegado (art. 544 do CPC, tema tratado adiante);

2,1 Súmula n. 284 do STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia".

25 O Superior Tribunal de Justiça divulga em seu site (www.stj.gov.br) a lista de reposi­tórios reconhecidos como oficiais.

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDER. 1 1 9

e) interpostos e admitidos ambos os recursos, serão eles remetidos pri­meiramente ao Superior Tribunal de Justiça para o julgamento do recurso especial e, depois, ao Supremo Tribunal Federal para apre­ciação do recurso extraordinário (art. 543 do CPC).

■■ 6 . 2 . 6 I n t e r p o s i ç ã o S i m u l t â n e a d o s R e c u r s o s

E s p e c i a l e E x t r a o r d i n á r i o

Havendo cabimento de recurso especial e recurso extraordinário, a parte poderá interpor, simultaneamente, ambos os recursos (por meio de petições e razões distintas).

Evidentemente, nesse caso, há uma exceção ao princípio da singu­laridade ou unirrecorribilidade, pelo qual apenas será cabível um úni­co recurso para a impugnação do ato judicial. Na verdade, um único acórdão pode ser recorrido, simultaneamente, pelos dois recursos, um para a alegação de violação da lei federal, de julgamento de competên­cia do Superior Tribunal de Justiça, o outro para reexame de eventual lesão à Constituição, de competência do Supremo Tribunal Federal.

Dessa forma, havendo a interposição simultânea dos dois recursos, os autos serão remetidos, primeiro, ao Superior Tribunal de Justiça pa­ra o julgamento do recurso especial e, depois, ao Supremo Tribunal Fe­deral para julgamento do recurso extraordinário (art. 543 do CPC).

No entanto, o relator do recurso especial poderá entender que o recurso extraordinário deva ser julgado primeiro, por conter questão prejudicial ao recurso especial (caso o recurso extraordinário seja jul­gado, poderá perder utilidade o recurso especial, recurso prejudicado); assim, os autos serão remetidos ao Supremo Tribunal Federal e, depois de seu julgamento, serão devolvidos ao STJ para julgamento do recur­so especial.

Curiosamente, prevê a lei que, recebidos os autos do STF, na forma do parágrafo anterior, poderá o ministro relator do recurso extraordi­nário não considerar que este deva ser julgado primeiro, mandando devolver os autos para o STJ para julgamento do recurso especial (§ 3o, art. 543 do CPC), ocorrendo um verdadeiro “vai-e-vem” do processo.

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1 2 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

m 6 . 2 . 7 J u í z o de A d m i s s i b i l i d a d e d o s R e c u r s o s

As hipóteses de cabimento de recursos para o STJ e STF, como vi­mos, exigem o preenchimento de requisitos específicos de cabimento, nos termos dos arts. 102 e 105 da Constituição da República, bem co­mo o preenchimento dos requisitos genéricos a todos os recursos.

A primeira análise do cabimento dos recursos especial e extraordi­nário é realizada pelo presidente do tribunal recorrido (ou outro órgão previsto no regimento interno, como vice-presidente, etc.), que pode­rá dar ou negar seguimento aos referidos recursos.

O presidente do tribunal recorrido deverá limitar-se à verificação dos requisitos para o cabimento dos recursos especial e extraordinário, não podendo entrar no mérito acerca da existência ou inexistência dos recursos. É muito comum haver decisões denegatórias sob a funda­mentação de que “não houve afronta a dispositivo constitucional” ou que “não há contrariedade à lei federal”. Na realidade, o presidente do tribunal não está autorizado a realizar essa análise de mérito, somente verifica se há ou não a alegação de violação e se a matéria foi decidida pelo tribunal recorrido.

Marcus Vinicius Rios Gonçalves, ao tratar da verificação do preen­chimento das hipóteses legais de cabimento dos recursos, comenta:26

Ao órgão a quo incumbe apenas examinar a hipotética existência de contrariedade. Se ele o fizer em concreto estará apreciando o mérito do recurso e extrapolando a sua competência. No entanto, tem-se visto com alguma freqüência a confusão entre juízo de mérito e de admissibilidade.

O ato do presidente do tribunal recorrido que, em sede de juízo de admissibilidade dos recursos especial ou extraordinário, verifica e apon­ta questões de mérito do recurso afronta competência exclusiva do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal, caben­do, inclusive, reclamação para os respectivos órgãos, nos termos dos arts. 102,1 ,1, e 105, \ ,f , da Constituição da República.

26 Novo curso de direito processual civil, v. II, p. 157.

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 2 1

Dado seguimento aos recursos (ou apenas a um deles) pelo presi­dente do tribunal a quo, serão remetidos para os tribunais competen­tes (STJ ou STF).

No entanto, caso seja negado seguimento aos recursos especial ou extraordinário, o que se faz por meio de uma decisão interlocutória, a parte prejudicada poderá interpor agravo de instrumento contra a de­cisão denegatória (art. 544 do CPC).

Ressalte-se que o juízo de admissibilidade realizado pelo presiden­te do tribunal recorrido é, na verdade, um juízo precário, já que, ao ser recebido no tribunal ad quem, o relator do recurso realizará nova veri­ficação dos requisitos de cabimento dos recursos especial ou extraor­dinário.

Ademais, sendo recebidos os recursos pelo tribunal a quo por qualquer um dos fundamentos previstos nas alíneas dos arts. 102, III, e 105, III, poderá o tribunal ad quem conhecê-los e dar provimento por qualquer outra hipótese de cabimento. Em outras palavras, a admissão por uma hipótese de cabimento não condiciona o tribunal ad quem ao julgamento apenas por aquele fundamento.27

Seria o caso, por exemplo, de o recurso especial ter sido interpos­to com fundamento nas alíneas a e c do art. 105, inc. III, da Constitui­ção da República. No entanto, o presidente do tribunal recorrido ape­nas admitiu o recurso com base no fundamento da alínea a. Por sua vez, quando do julgamento do recurso especial, se estiverem presentes os requisitos, o Superior Tribunal de Justiça poderá conhecer e julgar o recurso por ambos os fundamentos a e c (desde que cabíveis).

■ i 6 . 2 . 8 A g r a v o d e I n s t r u m e n t o c o n t r a D e c i s ã o

q u e N e g a s e g u i m e n t o a R E s p o u RE

Contra a decisão28 do presidente do tribunal recorrido, que nega seguimento aos recursos especial ou extraordinário, é cabível o recur­

27 Súmula n. 292 do STF: "Interposto o recurso extraordinário por mais de um dos fun­damentos indicados no art. 102, III, da Constituição da República, admissão apenas por um deles não prejudica o seu conhecimento por qualquer dos outros". No mesmo sentido. Sú­mula n. 528 do STF.

28 É comum o emprego da equivocada expressão "agravo contra despacho denegató- rio de recurso especial ou extraordinário". A expressão é absolutamente errada, em primeiro

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1 2 2 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

so de agravo de instrumento, que em sua forma, processamento e re­quisitos muito difere do agravo de instrumento interposto contra deci­são interlocutória de primeira instância.

Assim, podemos dizer que são características do agravo de instru­mento interposto contra decisão que nega seguimento a recurso espe­cial ou recurso extraordinário (art. 544 do CPC):

a) Deve ser interposto no prazo de 10 dias.b) A interposição será perante o presidente do tribunal recorrido,

magistrado que proferiu a decisão denegatória de seguimento do recurso. Essa modalidade de agravo de instrumento, ao contrário daquele previsto contra decisão de primeira instância, não é pro­tocolada diretamente no tribunal competente para o julgamento (ad quem), mas deve ser apresentada no órgão recorrido (a quo). Portanto, tal recurso de agravo de instrumento não será protoco­lizado diretamente no Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal.

c) Deve ser elaborado um agravo de instrumento para cada recurso denegado, mesmo que a decisão agravada seja única; isso como forma de permitir a remessa de cada agravo ao tribunal competen­te para o seu julgamento (STJ e STF).

d) Deve ser instruído obrigatoriamente com cópia do acórdão recor­rido pelo REsp ou RE; da certidão de intimação do acórdão recorri­do pelo REsp ou RE (como forma de demonstrar sua tempestivi- dade); das contra-razões do REsp ou RE; da decisão agravada (decisão denegatória de seguimento dos recursos); da certidão de intimação da decisão agravada (para comprovação da tempestivi- dade do agravo de instrumento); das procurações outorgadas aos advogados das partes; e, caso tenham sido opostos embargos de­claratórios contra o acórdão recorrido, também deverão ser apre­sentadas as cópias da petição, do acórdão de julgamento e da cer­tidão de intimação.

lugar, pelo fato de não se tratar de um despacho, mas sim de verdadeira decisão interlocu­tória, pois, como vimos, os despachos são atos meramente administrativos do processo que, como regra, não causam gravame às partes. Como se não bastasse, dos despachos, a lei não admite a interposição de recurso. Além disso, a própria lei afirma que contra a decisão cabe­rá "agravo de instrumento" e não simplesmente agravo (art. 544).

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 123

e) Recebido o agravo de instrumento, o tribunal recorrido remeterá o recurso ao STJ ou STF, dependendo do caso, sem proceder a qualquer juízo de admissibilidade.29

Observa-se que a Lei n. 10.352/2001 alterou a redação do § Io do art. 544 do Código de Processo Civil para autorizar a autenticação, pelo próprio advogado (sob sua responsabilidade), das cópias do agra­vo de instrumento contra decisão denegatória.

Recebido o recurso de agravo de instrumento no Superior Tribu­nal de Justiça ou no Supremo Tribunal Federal, o relator designado poderá (art. 544, §§ 3o e 4o, do CPC):

a) Se o acórdão recorrido estiver em confronto com súmula ou juris­prudência dominante no tribunal, conhecer do agravo para dar pro­vimento ao próprio recurso, por mera decisão singular.

b) Se o instrumento do agravo contiver os elementos necessários para o julgamento do mérito do recurso, determinar a sua conversão em recurso especial ou extraordinário, ou seja, o relator dá provimen­to ao agravo e o converte em recurso especial.

c) Não admitir o agravo de instrumento por não preencher os requi­sitos.

d) Das decisões monocráticas do relator do agravo de instrumento, caberá agravo interno (ou para o órgão colegiado), no prazo de 5 dias (art. 545 do CPC).

e) Não sendo caso das hipóteses anteriores, levará o recurso para julga­mento pelo órgão colegiado. Em caso de provimento, o tribunal po­derá requisitar ao tribunal recorrido que lhe remeta os autos do pro­cesso (contendo o REsp ou RE) para permitir o julgamento do recurso que não havia sido admitido. Caso as cópias juntadas sejam suficientes, o tribunal poderá julgar o REsp ou RE sem a necessida­de de recebimento dos autos principais, simplesmente com a conver­

29 Súmula n. 727 do STF: "Não pode o magistrado deixar de encaminhar ao Supremo Tribunal Federal agravo de instrumento interposto da decisão que não admite recurso ex­traordinário, ainda que referente a causa instaurada no âmbito dos juizados especiais".

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124 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

são do agravo de instrumento provido em recurso especial ou extraordinário, conforme o caso.

■ I 6 .2 .9 RECURSOS ESPECIAL

E E X T R A O R D I N Á R I O R E T I D O S

A reforma trazida pela Lei n. 9.756/98 introduziu no sistema recur­sal os recursos especial e extraordinário retidos, nos seguintes termos:

Art. 542. [...]§ 3o O recurso extraordinário, ou o recurso especial, quando inter­postos contra decisão interlocutória em processo de conhecimento, cautelar, ou embargos à execução ficará retido nos autos e somen­te será processado se o reiterar a parte, no prazo para a interposi­ção do recurso contra a decisão final, ou para as contra-razões.

Tal dispositivo legal impede a imediata subida dos recursos espe­cial e extraordinário para os seus respectivos tribunais de julgamento, determinando que fiquem retidos nos autos até eventual recurso con­tra a decisão final, nos seguintes termos:

os recursos especiais e extraordinários interpostos contra acórdãos de agravos de instrumento ficarão retidos nos autos do referido agravo, retornando para a primeira instância; só serão conhecidos quando da eventual e futura interposição de recurso especial ou extraordinário contra o acórdão proferido na apelação;para o conhecimento dos REsp ou RE retidos, deverá a parte inte­ressada requerer o seu conhecimento quando interpuser o recurso contra a decisão definitiva de mérito.

Nos casos em que a retenção implicar grave prejuízo à parte recor­rente ou ainda nas hipóteses em que o julgamento futuro não tiver uti­lidade, a parte agravante poderá requerer a remessa imediata ao STJ ou ao STF.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem admitido co­mo exceções à retenção obrigatória as hipóteses de recursos especial e ex­

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 2 5

traordinário interpostos contra decisões de urgência, como nos casos de liminares à antecipação da tutela, ou que importem em trancamento da ação, como a negativa de reconvenção ou denunciação à lide.30

Para requerer a subida dos autos do agravo ao tribunal superior, impedindo a retenção obrigatória do recurso, a parte poderá valer-se de ação cautelar ou mesmo do agravo de instrumento contra decisão que nega seguimento ao recurso especial e/ou extraordinário, sempre demonstrando a urgência que justifica a não retenção dos recursos.

mt 6 . 2 . 1 0 R e p e r c u s s ã o G e r a l p a r a C a b i m e n t o d o RE

A Emenda Constitucional n. 45/2004, ao acrescentar o § 3o ao art. 102 da Constituição da República, impôs como requisito de admis­sibilidade do recurso extraordinário que o recorrente demonstre a re­percussão geral da matéria, para que o Tribunal possa analisar a admis­sibilidade do recurso.

A referida emenda criou a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal negar seguimento ao recurso extraordinário quando entender

30 "Processual civil. Medida cautelar. Exceções às hipóteses de retenção do recurso espe­cial. Consoante entendimento harmonioso desta Corte, a regra que estabelece as hipóteses em que o recurso especial fica retido nos autos deve ser obtemperada para que, aplicada, não esvazie a utilidade do Recurso Especial, nem corrobore para a morosidade da prestação juris­dicional em manifesto prejuízo das partes. Enquadra-se nessa hipótese o recurso especial in­terposto contra acórdão proferido nos autos de agravo de instrumento, no qual se discute o conteúdo de decisão concessiva de tutela antecipada. Nesta situação, é recomendável, quan­do não necessário, que o especial seja desde logo processado. Em sede de medida cautelar, faz-se imperioso que o magistrado exerça um juízo perfunctório de admissibilidade do recur­so especial. Estando caracterizada a aparência do bom direito da requerente e sendo relevan­te a tese jurídica apresentada, de que é inviável a modificação da guarda, em sede de ante­cipação da tutela, quando não demonstrada a gravidade da causa que a determine, impõe-se seja a mãe reintegrada na guarda da criança até a decisão final do recurso especial, dantes retido." (STJ, 3a T., MC n. 3.645/RS, rel. Min. Nancy Andrigui, j. 02.08.2001, v.u.)

"Processo civil. Recurso especial retido na origem (art. 542, § 2o, do CPC). Tutela anteci­pada para compensação de tributos. 1. A Corte Especial já expressou entendimento de que o recurso especial, quando retido, pode ser destrancado por qualquer meio processual (manda­do de segurança, cautelar, etc.). 2. Compensação de tributo por liminar: impossibilidade. 3. Recurso provido." (STJ, 2a T., REsp n. 292.670/RJ, rel. Min. Eliana Calmon, j. 26.02.2002, v.u.)

"Se ao revés, o Tribunal a quo indefere a denunciação da lide, o recurso especial deve ser desde logo processado, porque em tal hipótese essa decisão se assimila àquela em que o juiz indefere a petição inicial e tranca a ação, tendo a natureza de uma interlocutória mista." (STJ, Al n. 268.745/SP, rel. Min. Ari Pargendler, DOU 03.11.1999, v.u.)

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1 2 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

que a matéria ou a discussão levada pela parte recorrente não tem re­percussão geral, ou seja, quando não houver relevância para toda a sociedade.

Em complemento ao dispositivo constitucional, o legislador não tardou em editar a Lei n. 11.418/2006 para criar os arts. 543-A e 543-B no Código de Processo Civil, que dispõe acerca do procedimento para verificação da repercussão geral e o modo de evitar que processos idên­ticos cheguem ao Supremo Tribunal Federal.

Parece-nos, aqui, que a Constituição criou um mecanismo de autodestruição. Pelo requisito que impõe a argüição de relevância, a ofensa à Constituição que autoriza recurso ao Supremo Tribunal Fe­deral deverá ser relevante à sociedade; caso contrário, o Supremo não analisará o recurso.

Aqui, cumpre uma reflexão do absurdo a que chegamos: se o acór­dão ofender a Constituição, mas essa ofensa não for relevante a um grupo de pessoas, não caberá o recurso extraordinário. Estamos dizen­do que se a Constituição for ofendida, mas essa ofensa lesar apenas as partes do processo, tal ato será admitido em nosso ordenamento e não caberá julgamento pela Corte Suprema, que, precipuamente, foi cria­da para ser a guardiã da Constituição.

Para nós, mesmo que isso possa significar uma visão romântica do Direito, qualquer ofensa à Constituição, mesmo que seja entre par­ticulares e não traga repercussão direta à coletividade, trata-se de ques­tão relevante e incompatível com o Estado de Direito. E mais: seremos ousados em dizer que tal requisito, imposto pela EC n. 45/2004, a- fronta diretamente a Constituição no que se refere ao Estado de Di­reito e ao acesso ao Judiciário.

Se um acórdão viola a Constituição, mesmo que sem repercussão geral, a manutenção e validade desse ato no mundo jurídico corres­ponde a uma usurpação do Estado de Direito e, pela via reflexa, toda a coletividade é atingida.

Por se tratar, no entanto, de norma que beneficia diretamente os membros do Supremo Tribunal Federal - já que terão reduzido o número de recursos para julgamento - , não acreditamos que a referi­da Corte reconhecerá a inconstitucionalidade da restrição de acesso ao Supremo apenas das questões relevantes.

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 2 7

Assim, devemos esclarecer que, quando da interposição do recur­so extraordinário, a parte deverá demonstrar a repercussão geral da matéria constitucional que pretende ver discutida pela Corte Suprema.

O que vem a ser, contudo, repercussão geral? Para uma expressão absolutamente vazia de significado, o § Io do art. 543-A do Código de Processo Civil também tenta explicar aquilo que não tem sentido. O referido dispositivo afirma ser de repercussão geral as questões rela­tivas a pontos de vista econômico, político, social ou jurídico que ul­trapassem os interesses subjetivos da causa.

A definição legal não é objetiva. Como sabemos, todas as contro­vérsias existentes têm como fundo questões econômicas, políticas, sociais ou jurídicas. Portanto, qualquer assunto poderá ser levado ao Supremo Tribunal Federal. Os termos utilizados pelo legislador são genéricos e não trazem nenhum limite concreto.

A inovação, no entanto, está no fato de que a questão objeto do recurso extraordinário deve ultrapassar o interesse das partes, ou seja, a matéria deve ter significado coletivo ou difuso, sob pena de não ter a repercussão geral. E a verificação disso - se tem ou não a repercussão geral - ficará a cargo da análise subjetiva dos membros do Supremo Tribunal Federal.

Ao apreciar o recurso extraordinário, a turma julgadora poderá decidir pela existência da repercussão geral. Nesse caso, pelo voto de quatro membros, a turma poderá reconhecer a existência da repercussão geral e deixar de remeter a questão para análise do Plenário do Tribunal.

A lei processual também afirma que presume existente a repercus­são geral quando a controvérsia do extraordinário versar sobre a ofensa à súmula ou jurisprudência dominante no Supremo Tribunal Federal.

A negativa de admissão do recurso extraordinário por ausência de repercussão geral apenas poderá se dar inicialmente pelo órgão Pleno do Supremo Tribunal Federal, impondo a Constituição que a decisão deverá ser tomada pelo voto de dois terços de seus membros (ou seja, voto de oito ministros).

Uma vez reconhecida a inexistência de repercussão geral pelo Ple­nário, porém, tal decisão valerá para todos os recursos em matéria idêntica. Os recursos pendentes de julgamento, cuja matéria seja idên­tica, não serão admitidos, salvo se houver revisão da tese.

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1 2 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

O resultado do julgamento da análise da repercussão geral será reduzido em uma súmula, a ser publicada no Diário Oficial, e valerá como acórdão.

O relator, para a formação da convicção acerca da existência ou não de repercussão geral, poderá admitir a manifestação de terceiros (repre­sentados por procurador habilitado), como típica figura de amicus curiae.

Outra questão curiosa sobre o tema é a possibilidade de sobresta- mento dos processos idênticos até que o Supremo se manifeste acerca da existência ou não de repercussão geral.

O art. 543-B determina que, quando houver multiplicidade de recursos com fundamento idêntico à controvérsia da repercussão, o tribunal de origem selecionará um ou mais recursos representativos da matéria e encaminhará ao Supremo. Os demais ficarão sobrestados até a manifestação do Supremo Tribunal Federal.

Caso o Supremo entenda não haver, para a matéria, o requisito da repercussão geral, os recursos que estavam sobrestados serão con­siderados automaticamente não admitidos. Por outro lado, caso o Supremo conheça do extraordinário (e, conseqüentemente, admita ser a questão relevante), os recursos sobrestados serão apreciados pelos tribunais (em seus órgãos próprios), para fim de julgá-los preju­dicados ou no sentido de fazer a retratação da matéria.

Em outras palavras, havendo a repercussão geral e tendo o Su­premo realizado o julgamento do extraordinário que havia subido como “amostragem”, o Tribunal de origem aplicará o resultado do jul­gamento aos recursos que estavam sobrestados.

A matéria não encontra regulamentação taxativa no Código de Processo Civil, uma vez que a própria lei admite a complementação pela norma interna do Supremo Tribunal Federal.

Por sua vez, o Supremo Tribunal Federal alterou seu Regimento Interno, por meio da emenda Regimental n. 21, para tratar da reper­cussão geral no recurso extraordinário.31

31 "Art. 1o Os dispositivos do Regimento Interno a seguir enumerados passam a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 13.................................................................................................................................V - ........................................................................................................................................

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 2 9

6.3 Em b a r g o s de D i v e r g ê n c i a

Os embargos de divergência representam recurso próprio contra acórdãos proferidos nos julgamentos dos recursos especial e extraordi-

c) como Relator, nos termos dos arts. 544, § 3o, e 557 do Código de Processo Civil, até eventual distribuição, os agravos de instrumento e petições ineptos ou doutro modo mani­festamente inadmissíveis, bem como os recursos que não apresentem preliminar formal e fundamentada de repercussão geral, ou cuja matéria seja destituída de repercussão geral, conforme jurisprudência do Tribunal.

Art. 21 .................................................................................................................................§ 1o Poderá o Relator negar seguimento a pedido ou recurso manifestamente inadmis­

sível, improcedente ou contrário a jurisprudência dominante ou a súmula do Tribunal, deles não conhecer em caso de in competência manifesta, encaminhando os autos ao órgão que repute competente, bem como cassar ou reformar, liminarmente, acórdão contrário à orien­tação firmada nos termos do art. 543-B do Código de Processo Civil.

Art. 322. O Tribunal recusará recurso extraordinário cuja questão constitucional não ofe­recer repercussão geral, nos termos deste capítulo.

Parágrafo único. Para efeito da repercussão geral, será considerada a existência, ou não, de questões que, relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, ultra­passem os interesses subjetivos das partes.

Art. 323. Quando não for caso de inadmissibilidade do recurso por outra razão, o Rela­tor submeterá, por meio eletrônico, aos demais ministros, cópia de sua manifestação sobre a existência, ou não, de repercussão geral.

§ 1o Tal procedimento não terá lugar, quando o recurso versar questão cuja repercussão já houver sido reconhecida pelo Tribunal, ou quando impugnar decisão contrária a súmula ou a jurisprudência dominante, casos em que se presume a existência de repercussão geral.

§ 2o Mediante decisão irrecorrível, poderá o Relator admitir de ofício ou a requerimen­to, em prazo que fixar, a manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, sobre a questão da repercussão geral.

Art. 324. Recebida a manifestação do Relator, os demais ministros encaminhar-lhe-ão, também por meio eletrônico, no prazo comum de 20 (vinte) dias, manifestação sobre a ques­tão da repercussão geral.

Parágrafo único. Decorrido o prazo sem manifestações suficientes para recusa do recur­so, reputar-se-á existente a repercussão geral.

Art. 325. O Relator juntará cópia das manifestações aos autos, quando não se tratar de processo informatizado, e, uma vez definida a existência da repercussão geral, julgará o recurso ou pedirá dia para seu julgamento, após vista ao Procurador-Geral, se necessária; negada a existência, formalizará e subscreverá decisão de recusa do recurso.

Parágrafo único. O teor da decisão preliminar sobre a existência da repercussão geral, que deve integrar a decisão monocrática ou o acórdão, constará sempre das publicações dos julgamentos no Diário Oficial, com menção clara à matéria do recurso.

Art. 326. Toda decisão de inexistência de repercussão geral é irrecorrível e, valendo para todos os recursos sobre questão idêntica, deve ser comunicada, pelo Relator, ao Presidente do Tribunal, para os fins do artigo subseqüente e do artigo 329.

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1 3 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL DARLAN BARROSO

nário, como meio para unificar a jurisprudência interna dos respectivos tribunais. Assim, têm cabimento os embargos de divergência quando:

a) em recurso especial, o acórdão proferido divergir do julgamento de outra turma, seção ou do órgão especial do próprio Superior Tribunal de Justiça;

b) em recurso extraordinário, o acórdão proferido divergir do ju l­gamento da outra turm a ou do plenário do Supremo Tribunal Federal.

Como bem se nota nas hipóteses de cabimento, trata-se de recur­so fundamentado em divergência da jurisprudência interna dos tribu­nais - STJ ou STF.

No STJ existem seis turmas de julgamento, cada uma integrada por cinco ministros. Assim, se o acórdão proferido pela primeira tu r­ma for divergente de outro proferido pela segunda turma, poderá ha­ver embargos de divergência para que a seção a que pertencem as duas

Art. 327. 0 Presidente do Tribunal recusará recursos que não apresentem preliminar for­mal e fundamentada de repercussão geral, bem como aqueles cuja matéria carecer de reper­cussão geral, segundo precedente do Tribunal, salvo se a tese tiver sido revista ou estiver em procedimento de revisão.

§ 1o Igual competência exercerá o relator sorteado, quando o recurso não tiver sido limi­narmente recusado pelo Presidente.

§ 2o Da decisão que recusar recurso, nos termos deste artigo, caberá agravo.Art. 328. Protocolado ou distribuído recurso cuja questão for suscetível de reproduzir-

se em múltiplos feitos, o Presidente do Tribunal ou o Relator, de ofício ou a requerimento da parte interessada, comunicará o fato aos tribunais ou turmas de juizado especial, a fim de que observem o disposto no art. 543-B do Código deProcesso Civil, podendo pedir-lhes infor­mações, que deverão ser prestadas em 5 (cinco) dias, e sobrestar todas as demais causas com questão idêntica.

Parágrafo único. Quando se verificar subida ou distribuição de múltiplos recursos com fundamento em idêntica controvérsia, o Presidente do Tribunal ou o Relator selecionará um ou mais representativos da questão e determinará a devolução dos demais aos tribunais ou turmas de juizado especial de origem, para aplicação dos parágrafos do art. 543-B do Códi­go de Processo Civil.

Art. 329. 0 Presidente do Tribunal promoverá ampla e específica divulgação do teor das decisões sobre repercussão geral, bem como formação e atualização de banco eletrônico de dados a respeito."

Art. 2o. Fica revogado o disposto no parágrafo 5o do artigo 321.Art. 3o Esta Emenda Regimental entrará em vigor na data de sua publicação."

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RECURSOS PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 1 3 1

turmas decida qual tese jurídica deve prevalecer (se da primeira ou da segunda turma do STJ). Sendo a divergência entre seções, os embargos seguirão para o órgão especial.

O mesmo ocorre no Supremo Tribunal Federal, que é composto por duas turmas e pelo Tribunal Pleno (as duas turmas reunidas); lo­go, havendo entre elas divergência no julgamento, caberá a interposi­ção de embargos de divergência para que o plenário do tribunal deci­da qual deve prevalecer.

A forma de interposição e processamento dos embargos de divergên­cia é regulada pelos regimentos do Supremo Tribunal Federal e do Supe­rior Tribunal de Justiça, conforme autoriza o parágrafo único do art. 546 do Código de Processo Civil.32

Sobre ROC, REsp, RE e embargos de divergência, confira o Anexo I da Parte I - Resumo dos recursos, p. 152

32 Súmula n. 599 do STF: "Sâo incabíveis embargos de divergência de decisão de turma, em agravo regimental".

Súmula n. 598 do STF: "Nos embargos de divergência não servem como padrão de dis­cordância os mesmos paradigmas invocados para demonstrá-las mas repelidos como não dissi­dentes no julgamento do recurso extraordinário".

Súmula n. 316 do STJ: "Cabem embargos de divergência contra acórdão que, em agra­vo regimental, decide recurso especial".

Súmula n. 315 do STJ: "Não cabem embargos de divergência no âmbito do agravo de instrumento que não admite recurso especial".

Súmula n. 168 do STJ: "Não cabem embargos de divergência quando a jurisprudência do tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado".

Súmula n. 158 do STJ: "Não se presta a justificar embargos de divergência o dissídio com acórdão de turma ou seção que não mais tenha competência para a matéria neles ver­sada".

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O r d e m d o s P r o c e s s o s

n o s T r i b u n a i s 7

O Código de Processo Civil, a partir do art. 547, regula a ordem dos processos nos tribunais, ou seja, as regras proces­suais acerca do processamento dos recursos e das ações de competência originária nos tribunais.

7.1 D o R e c e b im e n to e da D i s t r i b u i ç ã o

Recebidos os processos pela secretaria competente do tri­bunal, serão realizados o registro no protocolo e a conferên­cia da ordem de numeração das folhas, para que depois seja realizada a distribuição.

O art. 548 do Código de Processo Civil estabelece que a distribuição dos processos (com recursos ou ações de com­petência originária) se dará conforme o regimento interno de cada tribunal.

No entanto, essa regra sofreu grande alteração com o ad­vento da Emenda Constitucional n. 45/2004, que, ao intro-

133

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duzir o inc. XV no art. 93 da Constituição da República, passou a de­terminar que toda a distribuição, em todos os graus de jurisdição, seja feita imediatamente (ou de forma incontinenti).

A distribuição imediata impede que os tribunais limitem o núm e­ro de processos a serem recebidos por cada magistrado. Antes da refor­ma, muitos tribunais limitavam o número da distribuição, assim, ha­vendo a entrada de número excessivo ao limite, os tribunais acabavam represando processos. Em muitos desses tribunais, a distribuição che­gava a demorar mais de 3 anos.

Mas, agora, entrado o processo no tribunal, imediatamente a secreta­ria deverá providenciar a distribuição. Com isso, as partes desde logo tomam conhecimento dos nomes dos magistrados e, dependendo do caso, poderão pleitear a urgência ou prioridade necessária no julgamento.

A distribuição observará a regra segundo a qual os julgamentos realizados pelas turmas ou câmaras dos tribunais deverão, no mínimo, ser tomados pelo voto de três magistrados, quais sejam: o relator, o re­visor e o terceiro juiz.

Realizada a distribuição, o art. 549 do Código de Processo Civil deter­mina que os autos sejam encaminhados ao relator no prazo de 48 horas.

Nos casos de apelação, ação rescisória e embargos infringentes, o art. 551 determina que, após vindo os autos da conclusão do relator — que tem a função de elaborar uma exposição dos fatos controvertidos sobre os quais versa o recurso ou a ação rescisória (o relatório) - , os autos serão remetidos conclusos ao revisor, que, após o seu visto, requererá dia para julgamento do recurso ou da ação rescisória.

No entanto, em se tratando de processo sob o rito sumário, ação de despejo ou recurso contra sentença de indeferimento da petição inicial, o § 3o do art. 551 dispensa a atuação do revisor no processa­mento do feito no tribunal.

1 3 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

7.2 Po d e r e s do Re l a t o r

A regra é que nos tribunais as decisões sejam tomadas por órgãos colegiados e, como vimos, pela votação de três magistrados para a composição do “acórdão”.

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ORDEM DOS PROCESSOS NOS TRIBUNAIS 1 3 5

No entanto, em alguns casos, a Lei Processual passou a admitir que o relator, monocraticamente, possa proferir até mesmo decisão de m é­rito. A esse respeito, o professor Nelson Pinto, enfatiza:'

O sistema processual civil vem progressivamente, com indisfarçável objetivo de diminuir o excesso de trabalho dos órgãos colegiados, alar­gando as atribuições e os poderes do relator nas causas e nos recursos nos tribunais, bem como aumentando a força da jurisprudência dos tri­bunais superiores. O relator, que tradicionalmente apenas preparava o recurso ou a causa para julgamento, elaborando o relatório a ser lido na sessão de julgamento e verificando os pressupostos de admissibilidade, negando seguimento aos recursos inadmissíveis, ganhou novas funções e poderes, não apenas para negar seguimento ao recurso em outras hipó­teses, praticamente adentrando no próprio mérito do recurso, como tam­bém para proferir decisão de mérito, dando provimento ao recurso, ante­cipando-lhe ao pronunciamento do órgão colegiado.

Assim, com base no art. 557 do Código de Processo Civil, o relator poderá proferir as seguintes decisões:2

a) Negar seguimento ao recurso inadmissível, neste caso, o ato do re­lator importará em negar seguimento ao recurso que não preen­che os pressupostos recursais; além disso o relator poderá julgar o recurso prejudicado, quando a pretensão recursal houver perdido o seu objeto (falta de interesse recursal).

b) Negar seguimento ao recurso manifestamente improcedente ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do pró­prio tribunal, do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribu­nal de Justiça.Desta forma, havendo jurisprudência dominante - sumulada ou não - , o relator poderá julgar monocraticamente o recurso, sem submissão ao órgão colegiado. Neste caso, o legislador autorizou o

' Código de Processo Civil interpretado, p. 1658.2 A Súmula n. 253 do STJ afirma que as hipóteses do art. 557 que autorizam o relator

a julgar monocraticaticamente o recurso também se estendem ao reexame necessário.

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1 3 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

relator a realizar sozinho o juízo de mérito recursal, negando pro­vimento ao recurso,

c) Dar provimento ao recurso, quando a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça.

Na hipótese anterior (“b”), o relator poderia negar seguimento ao recurso em confronto com a jurisprudência dominante de seu tribunal ou do STF ou STJ, mas, no presente caso, a autorização é para dar pro­vimento ao recurso, acolhendo monocraticamente a tese recursal quan­do houver súmula ou jurisprudência dominante do STF ou do STJ.

Neste caso, em se tratando de tribunal de justiça ou tribunal regio­nal federal, é importante ressaltar que o relator não poderá dar provi­mento com base em jurisprudência dominante de seu próprio tribu­nal, mas apenas com base em súmula do STJ ou do STF.

Em se tratando de agravo de instrumento, como já foi objeto de estudo em capítulo próprio, o art. 527, III, do Código de Processo Civil autoriza o relator, estando presentes os requisitos do art. 558, a conce­der ao agravante o efeito suspensivo ou a tutela antecipada recursal. Como sabemos, são requisitos para tais efeitos a relevância dos funda­mentos e a existência de perigo de dano à parte.

O parágrafo único do referido artigo autoriza o relator a conceder efeito suspensivo ao recurso de apelação naqueles casos em que tal re­curso, por imposição do art. 520, apenas é recebido no efeito devoluti­vo. Havendo perigo de dano à parte e fundamento relevante, o relator poderá dar efeito suspensivo à apelação mesmo quando a lei não lhe atribui o referido efeito.3

3 "Processual civil. Sentença de rejeição dos embargos à execução. Apelação. Efeito sus­pensivo. Lesão grave e de difícil reparação. Artigo 558, parágrafo único do CPC. Aplicação. I. Apesar do art. 520 do CPC prever que a apelação interposta contra a decisão que rejeitar os embargos a execução deve ser recebida unicamente com efeito devolutivo, após a edição da Lei n. 9.139/95, o art. 558 do CPC passou a permitir a atribuição de efeito suspensivo mesmo nas hipóteses do precitado art. 520, desde que, relevante a fundamentação, possa o cumprimento da decisão representar lesão grave e de difícil reparação. II. Não obstante, a sus­pensão acima explicitada somente deve ocorrer sobre o levantamento da quantia controver­tida, uma vez que onde se reconheceu devido não se faz impositiva a incidência da regra em comento. III. Recursos especiais parcialmente providos." (STJ, 1a T., REsp n. 195.442/PR, rel. Min. Francisco Falcão, j. 21.03.2006, v.u.)

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ORDEM DOS PROCESSOS NOS TRIBUNAIS 1 3 7

Assim, vamos imaginar que, em ação de alimentos, o devedor seja condenado na sentença ao pagamento de valor exorbitante e que supe­re seus rendimentos. A parte poderá interpor seu recurso de apelação que, por determinação do art. 520, II, do Código de Processo Civil, não terá efeito suspensivo. Neste caso, o relator, excepcionalmente, com ba­se no parágrafo único do art. 558, poderá conceder o efeito suspensivo à apelação.

Mas diante da decisão monocrática do relator - seja para trancar o recurso ou para atribuir indevidamente efeito suspensivo - , o que a parte prejudicada poderá fazer?

Evidentemente, o ato do relator que nega seguimento ao recurso ou julga o seu mérito monocraticamente tem caráter de decisão inter­locutória, desafiando, assim, o recurso de agravo interno, nos termos do art. 557, § Io, do Código de Processo Civil.

Esse agravo previsto no parágrafo citado, apesar de ter o mesmo objeto e prazo, não se confunde com o agravo regimental, não obstan­te, na prática, muitos tribunais têm adotado essa nomenclatura.

O agravo interno (ou para o órgão colegiado) está previsto no Có­digo de Processo Civil, em situações específicas contra decisões m ono­cráticas nos tribunais.

Neste caso, inconformada a parte com a decisão do relator, pode­rá, no prazo de 5 dias, interpor agravo interno que será julgado pelo mesmo órgão colegiado que julgaria o recurso se ele não estivesse sido trancado monocraticamente pelo relator.

Interposto o agravo interno, como é a regra geral dos agravos, o relator poderá se reconsiderar. Mas, caso isso não ocorra, deverá ele apresentar o processo para julgamento pelo órgão colegiado.

No entanto, o uso desse agravo interno merece cuidado, já que, sen­do ele considerado infundado ou inadmissível, o tribunal poderá im­por multa de 1 a 10% sobre o valor da causa, ficando condicionada a interposição de outros recursos ao depósito da multa.

7.3 J u l g a m e n t o do Pr o c e s s o no T r i b u n a l .

Sendo admitido o recurso, seja pela decisão do relator ou por jul­gamento de agravo interno interposto contra a decisão que lhe negou

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1 3 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

seguimento no tribunal, após o visto do revisor, o processo será incluí­do em pauta para julgamento pelo órgão colegiado.

O presidente da turma ou câmara - conforme dispuser o regimen­to interno - designará dia para julgamento do recurso ou ação rescisó­ria, devendo, obrigatoriamente, ser respeitado o prazo mínimo de 48 horas entre a publicação da pauta e a data do julgamento.4

Além da publicação da pauta, no caso dos embargos infringentes e da ação rescisória, será necessária outra providência preliminar à ses­são de julgamento, já que o art. 553 do Código de Processo Civil deter­mina que a secretaria deverá expedir cópias autenticadas do relatório e distribuir a todos os magistrados que compuserem o órgão compe­tente para o julgamento referido.

Na sessão de julgamento, o presidente da turma ou câmara dará a palavra ao relator, que fará a exposição da controvérsia estabelecida no recurso ou ação rescisória. Lido o relatório, o presidente conferirá a palavra ao advogado do recorrente e, posteriormente, ao advogado do recorrido para que façam suas sustentações orais,5 pelo prazo impror­rogável de 15 minutos para cada um.6

Não caberá sustentação oral nos recursos de embargos de declara­ção e de agravo de instrumento.7

Realizada ou não a sustentação oral (caso o advogado deixe de fa­zer a sustentação oral não haverá sanção processual), o presidente dará a palavra ao relator para que profira o seu voto e, depois, colherá os votos do revisor e do terceiro juiz.

4 Súmula n. 117 do STJ: "A inobservância do prazo de 48 (quarenta e oito) horas, entre a publicação de pauta e o julgamento sem a presença das partes, acarreta nulidade".

5 O art. 565 afirma que, desejando realizar sustentação oral, os advogados poderão requerer preferência no julgamento de seu recurso ou ação rescisória, sem prejuízo das pre­ferências legais. A preferência antecipa o julgamento do recurso ou ação dentro da sessão, se a petição houver sido assinada por todos os interessados.

0 Em caso de litisconsortes com procuradores diferentes, entendemos que deverá ser con­cedido o prazo em dobro, com a aplicação do disposto no art. 191 do Código de Processo Civil.

7 O art. 7° do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil - EAOAB (Lei n. 8.906/94) - prevê que o direito de sustentação oral cabe em qualquer recurso ou tribunal. No entanto, o Supremo Tribunal Federal, na ADIn n. 1.105, suspendeu liminarmente a eficá­cia do referido dispositivo.

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ORDEM DOS PROCESSOS NOS TRIBUNAIS 1 3 9

Na sessão de julgamento, qualquer magistrado poderá requerer vistas dos autos, por uma sessão, caso não se sinta habilitado a profe­rir imediatamente o seu voto.

Colhidos os votos, o presidente declarará o resultado e designará para redigir o acórdão o relator, ou, sendo o relator vencido, redigirá o acórdão o magistrado que houver proferido o primeiro voto ven­cedor.

O acórdão é o resultado do julgamento realizado pelo órgão cole­giado. Quando da redação do acórdão, o magistrado a quem couber a função deverá observar que todo acórdão deve conter uma ementa.

A ementa do acórdão, sempre colocada em seu início, representa um resumo ou síntese objetiva da tese jurídica proclamada no julga­mento.8 Vejamos o exemplo de uma ementa de acórdão:

"Processual civil. Multa. Parágrafo único do art. 538 do CPC. Afas­tamento. Acórdão. Ementa. Falta. Interpretação dos arts. 563 e 249, § 1o, do CPC. 1. Afasta-se a aplicação da multa do art. 538 do Código de Pro­cesso Civil, por não se caracterizar o intuito protelatório dos embargos de declaração. 2. 0 art. 563 do CPC exige que o acórdão contenha ementa, não se decretando a nulidade do julgamento ante a ausência de prejuízo para a parte. Interpretação sistemática o art. 249, § 1o, também do CPC. Precedentes. 3. Recurso especial conhecido e provido em parte." (STJ, 2a T., REsp n. 119.655/MG, rel. Min. Castro Meira, j. 08.03.2005, v.u.)

Como se viu no exemplo anterior, a falta de ementa não gera a nulidade do acórdão, já que não causa prejuízo às partes; no entanto, revela má técnica do magistrado na redação do ato judicial que lhe in­cumbe.

Lavrado o acórdão pelo magistrado designado pelo presidente, no prazo de 10 dias, serão suas conclusões (podendo ser apenas a emen­ta) publicadas no órgão oficial para dar publicidade às partes.

8 A ementa conterá as palavras-chave que permitirão a pesquisa e catalogação do acórdão.

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1 4 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

7 .4 JULGAMENTOS PRELIMINARES

O art. 559 do Código de Processo Civil determina que a apelação não será incluída em pauta de julgamento antes de eventual recurso de agravo de instrumento pendente de apreciação pelo tribunal.9

A preferência do agravo sobre a apelação estabelece uma ordem lógica no julgamento, já que o julgamento do agravo, muitas vezes, poderá ser prejudicial à apelação ou alterar o seu resultado.

O mesmo se aplica ao recurso de agravo retido, já que a lei autori­za o seu julgamento na mesma sessão, mas determinando que seja apreciado primeiro o agravo e depois a apelação.

Sendo o agravo (retido ou de instrumento) e a apelação julgados na mesma sessão, sempre terá preferência o agravo.

O Tribunal Regional Federal da 3a Região firmou a prática, no mínimo curiosa, de considerar prejudicado todo o recurso de agravo de instrumento quando na primeira instância houver sido proferida sentença.

Na verdade, acreditamos que pelo excesso de trabalho esse Tribu­nal tem apreciado na maioria dos casos apenas o pedido de liminar nos agravos, concedido ou não o efeito suspensivo, o seu julgamento de­mora a ponto de ser proferida sentença na instância inferior e, em ra­zão disso, o Tribunal entende que o julgamento do agravo pelo órgão colegiado está prejudicado.

Na verdade, a redação do artigo anteriormente citado é contrário ao entendimento do Tribunal Regional Federal, já que prevê que o agravo deve ser julgado antes da apelação, mas sem o considerar pre­judicado (por perda do objeto).

Entendemos que, mesmo havendo sentença em primeira instân­cia, a parte tem interesse no julgamento do agravo de instrumento,

9 "Processo civil. Ordem de julgamento. Agravo e apelação. Se a decisão, que no âmbi­to de impugnação alterou o valor da causa, foi atacada por agravo de instrumento, o julga­mento deste prefere ao da apelação interposta contra a sentença que julgou improcedenteo pedido; sem a definição do valor da causa, não há como arbitrar os honorários de advoga­do à base dele, tal como ocorrido na espécie. Recurso especial conhecido e provido." (STJ, 3a T„ REsp n. 467.870/PI, rel. Min. Castro Filho, rel. p/acórdão Min. Ari Pargendler, j. 06.03.2003, v.m.)

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ORDEM DOS PROCESSOS NOS TRIBUNAIS 1 4 1

tanto que a própria lei estabelece seu julgamento antes da apelação pe­lo tribunal.

Por outro lado, o art. 560 determina que havendo questão prelimi­nar suscitada no recurso, tal matéria deverá ser apreciada antes do jul­gamento do mérito. Em caso de nulidade sanável, sendo possível e havendo necessidade, o tribunal interromperá a sessão e converterá o julgamento em diligência, ordenando a remessa dos autos ao juiz ou à serventia para que o vício seja sanado.

7.5 M u l t a por Re c u r s o Pr o c r a s t i n a t ó r i o

O art. 17, VII, do Código de Processo Civil indica que é litigância de má-fé o ato da parte de interpor recurso com intuito manifestamente pro- telatório, cabendo, neste caso, ao juiz ou tribunal impor à parte multa não excedente a 1% sobre o valor da causa, bem como o dever de indenizar a parte contrária pelo prejuízo que sofreu em razão do atraso no processo.10

Em se tratando de embargos de declaração, o art. 538 do Código de Processo Civil foi específico em prever a multa de 1% no caso de re­curso protelatório e, em caso de reiteração, a multa poderá ser elevada a 10%, nesta última hipótese, condicionando a interposição de outros recursos ao prévio depósito da referida multa.

Ainda especificamente, o art. 557, em seu § 2o, autoriza ao tribu­nal impor multa de 1 a 10%, quando o agravo interno - contra a deci­são do relator - for infundado ou inadmissível, condicionando a inter­posição de outros recursos ao depósito prévio da multa.

Em todos os casos, a jurisprudência do Superior Tribunal de Jus­tiça é no sentido de que, havendo a cominação de depósito prévio como condição para a interposição de outros recursos, essa regra tam ­bém se aplica aos entes públicos (fazendas públicas)."

10 O STJ entende como litigância de má-fé a interposição de recurso especial contra acórdão cuja tese já se encontra pacificada no referido tribunal. Nesse sentido: Ag. Reg. n. 280.778/PR, rel. Min. José Delgado, j. 02.05.2002, v.u.

,1 "Agravo regimental. Agravo de instrumento. Previdenciário. Processo civil. Agravo interno protelatório. Multa. Art. 557, § 2°, CPC. Necessidade de depósito prévio. Aplicabili­dade para a fazenda pública. Provimento negado. 1. A interposição de qualquer recurso, in­

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1 4 2 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

clusive o apelo especial, está condicionada ao depósito prévio da multa procrastinatória apli­cada em face do agravo regimental manifestamente infundado, consoante a previsão do art. 557, § 2o, do Código de Processo Civil. 2. A exegese da norma legal em comento leva a con­clusão que tal pressuposto extrínseco de admissibilidade, a multa protelatória, deve ser obe­decido indistintamente, inclusive pela Fazenda Pública, in casu, autarquia federal. Preceden­tes. 3. Decisão monocrática confirmada, agravo regimental a que se nega provimento." (STJ, 6d T., Ag. Reg. no Ag. n. 543.737/SP, rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. 31.08.2005, v.u.)

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S u c e d â n e o s

R e c u r s a i s 8

Além dos instrumentos previstos nos incisos do art. 496 do Código de Processo Civil e na legislação extravagante, cu­jos institutos são denominados recursos, existem no atual sistema processual civil outros meios para a impugnação de atos judiciais (sucedâneos recursais) que, no entanto, não guardam natureza recursal.

Trataremos de instrumentos que podem fazer as vezes de recurso, mas que, na verdade, não têm essa natureza proces­sual.

É importante frisar que esses instrumentos são conside­rados sucedâneos recursais pelo fato de acabarem tendo a fi­nalidade de impugnar atos judiciais, mas não são recursos.

8.1 Ma n d a d o de S e g u r a n ç a

O mandado de segurança é verdadeira ação ou garantia constitucional, que tem por objetivo afastar ato de autorida­de do Estado que esteja lesando ou na iminência de lesar di-

143

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1 4 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

reito líquido e certo, não amparado por habeas corpus (que tutela a li­berdade de locomoção) ou habeas data (para garantia do direito de in­formações pessoais em bancos de dados), nos termos do inc. LXIX do art. 5o da Carta Maior. É um instrumento utilizado para coibir atos de abusos de poder, arbitrariedades ou desmandos praticados por autori­dades.

Como se vê, o mandado de segurança não é um recurso, mas uma ação autônoma com objeto próprio fixado na Constituição.

Antes das reformas no sistema recursal (Leis ns. 8.950/94 e 9.756/ 98), o mandado de segurança era utilizado como meio de impugnação contra atos jurisdicionais, especialmente por não existirem recursos que permitissem uma tutela de urgência contra os atos dos magistra­dos - autoridades do Estado e, portanto, legitimados passivamente no mandamus.

Após a criação do recurso de agravo de instrumento - dotado de efeito suspensivo e de antecipação dos efeitos da tutela recursal - , não mais se justifica, no entanto, a impetração de mandado de segurança contra atos judiciais.1

A esse respeito, é expresso o disposto no art. 5o, II, da Lei n. 1.533/51 - que dispõe acerca do cabimento e do procedimento do mandado de segurança - , no sentido de que não se dará a segurança contra ato judicial quando houver, no sistema processual, um recurso que possa impugnar o referido ato ou quando existir via de correição.

A jurisprudência de nossos tribunais tem firmado o entendimento segundo o qual o mandado de segurança apenas é cabível como suce­dâneo de impugnação contra ato judicial quando não existir um recur­so eficaz ou correição contra o ato capaz de causar dano insuportável à parte, ou ainda, quando se tratar de um ato teratológico (absurdo ou esdrúxulo).2

1 A esse respeito, Clayton Maranhão ("Mandado de segurança contra ato judicial", in: Teresa Arruda Alvim Wambier, Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis, p. 98) explica que: "Deveras, proclama-se que a Lei 9.139/95 veio justamente para sanar o desvio da utili­zação do mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso somente no efeito devolutivo, o que tornaria lícito concluir 'que, ou não há, ou há pouquíssimas hipóteses em que ainda é cabível o mandado de segurança contra atos do ju iz '".

2 Súmula n. 267 do STF: "Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição". O plenário do STF, em decisão unânime, proferiu a seguinte deci­são: "Direito Constitucional e Processual Civil. Petição. Objeto: Declaração de Inconstitucio-

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SUCEDÂNEOS RECURSAIS 1 4 5

Podemos vislumbrar um exemplo de cabimento, excepcional, de mandado de segurança contra ato judicial. É o caso, por exemplo, do advogado que, não sendo parte em um determinado processo, requer vistas dele e tem esse direito negado pelo magistrado. Evidentemente, por ser terceiro, o advogado terá grande dificuldade para a interposi­ção de recurso, podendo, para tanto, impetrar o mandado de seguran­ça, dada a violação ao direito líquido e certo de vistas dos autos.

Outro exemplo se vislumbra contra o ato do relator que, indevida­mente, converter o agravo de instrumento em agravo retido. Neste caso, por expressa vedação legal, não é cabível nenhum recurso, portanto, havendo violação a direito líquido e certo, a parte poderá impetrar o mandado de segurança no próprio tribunal como sucedâneo recursal.

8.2 CORREIÇÃO PARCIAL

A correição é medida administrativa3 ou disciplinar4 interna do Poder Judiciário, de competência da corregedoria. O corregedor é res­ponsável pela fiscalização da regularidade dos atos dos serventuários da justiça e dos magistrados. Assim, a correição parcial é a fiscalização

nalidade de Lei. Inadmissibilidade. Legitimidade Ativa (Art. 103, incs. I a IX, da Constituição Federal). Mandado de Segurança Contra Ato Judicial: Súmula n. 267. 1. Diz o enunciado da Súmula da Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que 'não cabe mandado de seguran­ça contra ato judicial passível de recurso ou correição'. 2. No caso, cabia, em tese, Agravo Regimental contra a decisão de Ministro do STF, que negou seguimento à Petição na qual o peticionário pleiteia a declaração, em teses de inconstitucionalidade de Lei. E não foi inter­posto. 3. É certo que esta Corte, abrandando a rigidez da Súmula n. 267, tem admitido Man­dado de Segurança quando, do ato impugnado, puder resultar dano irreparável, desde logo cabalmente demonstrado" (Plenário do STF, Ag. Reg. em MS n. 22.623, rel. Min. Sydney San- ches, j. 09.12.1996, v.u.).

"Mandado de segurança. Ato passível de ataque mediante recurso. Negativa de entre­ga da prestação jurisdicional. Longe fica de configurar óbice ao alcance da prestação jurisdi­cional decisão que assenta a impertinência do mandado de segurança, porquanto dirigido contra ato judicial passível de impugnação via recurso." (STF, 2a T., Ag. Reg. n. 175.780, rel. Min. Marco Aurélio, j. 12.03.1996, v.u.)

Súmula n. 202 do STJ: "A impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona à interposição de recurso".

3 No âmbito do TRF da 3a Região, o art. 23 de seu Regimento Interno determina que é competência do corregedor relatar os processos de correição parcial.

4 Nelson Nery Júnior, Princípios fundamentais: teoria geral dos recursos, p. 64.

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1 4 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

ou vistoria, pelo juiz ou desembargador corregedor, quanto à regulari­dade administrativa de um processo específico.5

Portanto, quando não existir um recurso cabível, por exemplo, contra os despachos que geram o tumulto ou desordem das regras do processo, atos de omissão dos magistrados (como deixar de cumprir seus prazos),6 poderá a parte apresentar sua reclamação (petição des­provida de forma) comunicando ao corregedor ou ao órgão compe­tente do tribunal7 o erro in procedendo do magistrado ou dos servido­res da justiça. Ressalte-se que o corregedor não tem competência para manifestar-se acerca de erros in judicando, não sendo a correição par­cial uma espécie de recurso. A finalidade da correição limita-se às questões disciplinares e administrativas.

8.3 Pe d id o de Re c o n s i d e r a ç ã o

No caso de decisões interlocutórias, considerando que tal ato não esgota a função jurisdicional do magistrado, a parte poderá requerer a reconsideração do magistrado.

5 "Correição parcial. Não-cabimento. Inexistência de erro ou abuso na decisão atacada contra a qual cabe recurso de agravo de instrumento, não se podendo tomar como erro des­culpável a interposição da correição. Mostra-se inoportuno o expediente utilizado pelo recor­rente, o qual, aliás, tem sido pródigo na utilização de recursos, não se podendo olvidar que toda matéria suscitada para embasar sua pretensão provavelmente será objeto de apreciação por tribunal superior, tendo em vista os vários recursos de agravo retido por ele manejados. Recurso não conhecido." (TJSP, Correição Parcial n. 187.420-4/7, rel. Des. Leite Cintra, j. 23.05.2001, v.u.)

"Correição parcial. Matéria cível. Não-cabimento. Figura que deixou de existir como recurso ou como sucedâneo recursal após o advento do atual Código de Processo Civil. Cor­reição não conhecida. A correição parcial, como recurso ou sucedâneo recursal, deixou de existir a partir da vigência do atual estatuto processual civil." (TJSP, Correição Parcial n. 161.304-4, rel. Des. Oswaldo Breviglieri, j. 13.09.2000, v.u.)

6 "Correição parcial. Cabimento para evitar inversão tumultuária dos atos e fórmulas de ordem legal do processo, quando, para o caso, não houver recurso específico. Providências inúteis para o desfecho do processo, com manifesto descumprimento de acórdão desta Câma­ra. Correição parcial acolhida, com determinação." (TJSP, Correição Parcial n. 91.176-4, rel. Des. Marcondes Machado, j. 10.11.1998, v.u.)

7 A Lei de Organização Judiciária do Estado de São Paulo (Decreto n. 3/69), art. 93, outorga às Câmaras isoladas do Tribunal de Justiça a realização de correição parcial para a emenda de erros, ou abusos, que importem em inversão tumultuária dos atos ou fórmulas da ordem legal dos processos, quando não exista recurso cabível.

Page 171: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

SUCEDÂNEOS RECURSAIS 1 4 7

Na verdade, a reconsideração consiste na retratação ou no ato do juiz de voltar atrás em seu pronunciamento.

Como sabemos, o pedido de reconsideração, porém, não é recur­so e tampouco tem o efeito de interromper o prazo para a interposi­ção do recurso cabível.8

No entanto, como medida de economia processual, independente­mente da interposição do recurso, nada impede à parte de requerer ao juiz a retratação, inclusive apresentando arrazoado que justifique sua pretensão.9

O parágrafo único do art. 527 expressamente admite pedido de reconsideração contra a decisão liminar proferida no agravo de instru­mento. Note-se que tal ato não é recurso, mas visa a modificação do ato judicial que prejudica a parte.

8 "Processual civil. Pedido de reconsideração. Interrupção ou suspensão do prazo recur­sal. Inocorrência. Intempestividade. Art. 545, do CPC. Art. 258 do RISTJ. Precedentes. Agra­vo interno não conhecido. I. Consoante entendimento deste Superior Tribunal de Justiça, o pedido de reconsideração não tem o condão de suspender ou interromper os prazos recur­sais. Precedentes. II. Escoado o prazo legal para interposição do agravo interno, impõe-se não conhecê-lo, em face da ausência de requisito indispensável para sua apreciação. Precedentes. III. Agravo interno não conhecido." (STJ, 5a I , Ag. Reg. no Ag. n. 653.139/SP, rel. Min. Gil­son Dipp, j. 23.05.2006, v.u.)

9 "Processual civil. Decisão anterior irrecorrida. Pedido de reconsideração. Preclusão. Agravo de instrumento. Instrução deficiente. Dissídio jurisprudencial não demonstrado. I. Entendido pelo acórdão estadual que a decisão agravada nada mais significava que mera rei­teração de despacho anterior, irrecorrido, competia à parte fazer constar do agravo de ins­trumento o teor de ambos os atos e do requerimento que fez relativamente ao primeiro, tomado pelo tribunal a quo como pedido de reconsideração. Não o fazendo, impossível a revisão da matéria, inclusive porque, tendo-se que considerar o quadro retratado no arresto recorrido, este aplicou, com correção, o instituto da preclusão." (STJ, 2a T., Ag. n. 225.614/ MG, rel. Min. Aldair Passarinho Junior, j. 08.06.1999, v.u.)

"Processo civil. Preclusão. Predusa a questão, o pedido de reconsideração não presta para reativá-la. Agravo regimental não provido." (STJ, 3a T., Ag. n. 240.471/SP, rel. Min. Ari Pargendler, j. 26.10.2000, v.u.)

"Pedido de reconsideração em agravo de instrumento contra a inadmissão de recurso especial. Não-conhecimento. O pedido de reconsideração não está previsto na legislação pro­cessual vigente e a sua admissão como agravo pressupõe a observância do prazo previsto no art. 545 do Código de Processo Civil. Pedido não conhecido." (STJ, 4a T.# Ag. n. 423.504/RS, rel. Min. César Asfor Rocha, j. 09.04.2002, v.u.)

Page 172: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

1 4 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

8.4 A ç õ e s A u t ô n o m a s

A impugnação de decisões judiciais - sentenças ou acórdãos - po­de se dar por meio de ações autônomas, como a ação rescisória, que tem por objeto a desconstituição de sentenças de mérito transitadas em julgado, quando do preenchimento das hipóteses legais, ou a ação declaratória de nulidade (querella nulitatis insanabilis), quando o pro­cesso contiver vício ou nulidade absoluta.

Da mesma forma, a lei processual permite ao terceiro prejudicado por ato judicial de constrição indevida de bens (arresto, penhora, arre­cadação, seqüestro etc.) a possibilidade da propositura de ação de em ­bargos de terceiro contra o referido ato.

Em todos os casos citados, não se trata de modalidades de recursos, mas de verdadeiras ações autônomas, que geram outros processos e são julgadas por órgãos em sede de competência originária e não recursal.

Por fim, resta-nos a apreciação do pedido de reconsideração.Evidentemente, não se trata de um recurso, mesmo porque sua

apreciação é realizada pelo mesmo magistrado (e não por outro hie­rarquicamente superior), bem como não está previsto no art. 496 do Código de Processo Civil como modalidade de recurso.

O pedido de reconsideração pode ser visto como uma “medida atí­pica, imprópria, que não existe expressamente no direito processual vigente, sendo, na verdade, uma criação da prática forense”,10 um pedi­do da parte tendente à obtenção da revisão do ato jurisdicional pelo próprio magistrado, a fim de evitar a interposição do recurso e de ge­rar economia processual.

Na realidade, como regra, apenas as decisões interlocutórias são passíveis de pedidos de reconsideração; mesmo assim, tal possibilida­de não substitui ou supre os efeitos dos recursos, tampouco tem o po­der de impedir o curso do prazo para sua interposição.

Por exemplo, sendo proferida uma decisão negativa em pedido de reconsideração, mantendo-se integralmente o ato anterior, não se está diante de uma nova decisão interlocutória - somente teremos uma

,0 Gilson Delgado Miranda & Patrícia Miranda Pizzol, Processo civil: recursos, p. 62.

Page 173: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

SUCEDÂNEOS RECURSAIS 149

confirmação daquela já proferida. Por essa razão, a parte deverá inter­por (ou deveria tê-lo feito) recurso contra a primeira decisão; caso não o faça, ocorrerá a preclusão.11

8.5 RECLAMAÇÕES AOS TRIBUNAIS

As reclamações são medidas destinadas a garantir o respeito às com­petências ou autoridades dos tribunais (arts. 102, I, /, e 105, I, f, da Constituição).

Nesse caso, também não estamos falando de um recurso, mas de um instrumento hábil para denunciar ao tribunal (Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunais Estaduais ou Tribunais Regionais Federais) a existência de ato judicial, administrativo ou pri­vado, que desrespeite a competência ou a autoridade das decisões pro­feridas por ele.

Como exemplo, podemos citar a hipótese de um magistrado pro­ferir ato ignorando súmula vinculante ou decisão de ação direta de constitucionalidade (ADIn, ADECOn ou ADPF); nesse caso, qualquer pessoa poderá apresentar reclamação ao STF, denunciando a violação à autoridade do efeito vinculante, a fim de que o tribunal tome as pro­vidências cabíveis para resguardar sua competência e autoridade.

11 "Processual civil. Decisão anterior irrecorrida. Pedido de reconsideração. Preclusão. Agravo de instrumento. Instrução deficiente. Dissídio jurisprudencial não demonstrado. I. Entendido pelo acórdão estadual que a decisão agravada nada mais significava que mera rei­teração de despacho anterior, irrecorrido, competia à parte fazer constar do agravo de ins­trumento o teor de ambos os atos e do requerimento que fez relativamente ao primeiro, to­mado pelo tribunal a quo como pedido de reconsideração. Não o fazendo, impossível a revi­são da matéria, inclusive porque, tendo-se que considerar o quadro retratado no arresto recorrido, este aplicou, com correção, o instituto da preclusão." (STJ, 2a T., Ag. n. 225.614/ MG, rel. Min. Aldair Passarinho Junior, j. 08.06.1999, v.u.)

"Processo civil. Preclusão. Preclusa a questão, o pedido de reconsideração não presta para reativá-la. Agravo regimental não provido." (STJ, 3a T„ Ag. n. 240.471/SP, rel. Min. Ari Pargendler, j. 26.10.2000, v.u.)

"Pedido de reconsideração em agravo de instrumento contra a inadmissão de recurso especial. Não-conhecimento. O pedido de reconsideração não está previsto na legislação pro­cessual vigente e a sua admissão como agravo pressupõe a observância do prazo previsto no art. 545 do Código de Processo Civil. Pedido não conhecido." (STJ, 4a T., Ag. n. 423.504/RS, rel. Min. César Asfor Rocha, j. 09.04.2002, v.u.)

Page 174: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

1 5 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

8 . 6 R e c l a m a ç ã o a o C o n s e l h o N a c i o n a l

d e J u s t i ç a

O Conselho Nacional de Justiça, criado pela Emenda Constitucio­nal n. 45/2004, tem como função basilar a fiscalização administrativa e funcional de todo o Poder Judiciário, nos termos do art. 103-B da Constituição.

Assim, qualquer pessoa poderá apresentar, perante o Egrégio Con­selho Nacional de Justiça, reclamação contra ato judicial que venha im­portar em grave violação aos deveres da magistratura, impedimentos e atribuições constitucionais.

Evidentemente, o Conselho não detém competência para receber reclamações contra erros in judicando dos magistrados, mas possui total atribuição para fiscalizar a administração da justiça e as questões disciplinares dos magistrados.

Se um tribunal não estiver cumprindo o dever de distribuição imediata de todos os recursos ou processos (art. 93, XV da Constitui­ção) ou se estiver violando o dever de publicidade previsto constitu­cionalmente, o Conselho Nacional de Justiça poderá intervir para determinar a cessação da violação apontada.

Ressalte-se que não tem cabimento a reclamação ao CNJ para substituir recurso previsto na lei processual, mas cabe como medida de denúncia.

Page 175: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

A n e x o s d a P a r t e l

Page 176: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

ANEXO I - RESUMO DOS RECURSOS

APELAÇÃO AGRAVO DE INSTRUMENTO AGRAVO RETIDO EMBARGOS DECLARATÓRIOS

Cabimento Sentenças - art. 162, § 1°, do

CPC (terminativas ou definiti­

vas de m érito)

Decisões interlocutórias de primei­

ra instância - art. 162, § 2o, do CPC.

Q uando a decisão puder causar

prejuízo à parte ou não tiver efeito

o agravo retido

Decisões interlocutórias de primeira

instância - art. 162, §> 2o do CPC

Decisões interlocutórias, senten­

ças e acórdãos

Requisitos Requisitos genéricos dos recur­

sos (subjetivos, interesse e legiti­

midade, c os objetivos)

Requisitos genéricos.

Formação do instrumento de agravo

(com as cópias obrigatórias e facul­

tativas - art. 525 do CPC) c infor­

mações à prim eira instância no

prazo de 3 dias (art. 526 do CPC).

Somente caberá o agravo de instru ­

m ento se houver urgência

Requisitos genéricos dos recursos.

Contra as decisões interlocutórias

proferidas em audiência de instru ­

ção e julgamento, obrigatoriam ente

o agravo será retido e na forma oral

Existência de omissão, obscurida-

de ou contradição.

Contra acórdãos para efeito de pré-

questionamento de recurso espe­

cial ou recurso extraordinário

Órgão de

interposição

Juízo de 1° grau (recorrido) D iretam ente no Tribunal com pe­

tente

Juízo de 1° grau (recorrido) Oposto perante o Juízo que profe­

riu a decisão embargada

Órgão de

julgamento

Tribunal (TRFs e TJs) Tribunal (TRFs e TJs) Tribunal (TRFs ou TJs) Próprio órgão que proferiu a deci­

são ou sentença embargada

Forma Petição de interposição (ao Juí­

zo recorrido) e razões (ao Tribu­

nal), contendo qualificação das

partes, tatos, fundamentos e pe­

dido de reforma

Petição contendo:

a) a exposição do tato e do direito;

b) os fundamentos e pedido de re­

forma;

c) nome e endereço dos advogados.

Formação do instrum ento

Oral ou escrita. Obrigatoriamente se­

rá oral nas decisões proferidas em

audiência de instrução.

Não há formação de instrum ento, o

recurso é juntado aos autos da deci­

são recorrida

Petição apontando a omissão, obs­

curidade ou contradição

152 MANUAL DE DIREITO

PROCESSUAL CIVIL - DARLAN

BARROSO

Page 177: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

ANEXO I - RESUMO DOS RECURSOS (co n tin u a çã o )

APELAÇÃO AGRAVO DE INSTRUMENTO AGRAVO RETIDO EMBARGOS DECLARATÓRIOS

Juízo de admissibilidade

Realizado pelo Juízo de 1° grau e pelo Tribunal

Realizado pelo relator do recurso. Poderes do art. 527 do CPC, inclusive para converter o agravo de instrum ento em agravo retido

Realizado pelo Juízo de 1° grau no m om ento da interposição e pelo relator quando os autos forem reme­tidos ao Tribunal

Próprio órgão

Recurso contra a não-admissào

Agravo de instrum ento (10 dias) Agravo para o órgão colegiado (5 dias)

Agravo de instrumento (indeferido pelo juiz) ou para o órgào colegiado (se for indeferido pelo relator)

Agravo de instrum ento (10 dias), ou agravo interno, caso seja nega­do pelo relator

Juízo de retratabilidade

Como regra não se admite. Exceções:a) art. 296 do CPC - apenas no caso de indeferimento da petição inicial;b) sentença proferida com base no ECA;c) sentença do art. 285-A do CPC

Possível (pelo Juízo que proferiu a decisão agravada)

Possível (pelo Juízo que proferiu a decisão agravada)

Não se fala em retratação, pois é o mesmo Juízo que julga

Efeitos Regra: devolutivo e suspensivo. Exceção: apenas devolutivo - art. 520 do CPC

Devolutivo (sempre), suspensivo e tutela antecipada recursal (poderão ser requeridos - art. 527 do CPC)

No m om ento da interposição, tem efeito apenas de obstar a preclusão da matéria. No julgamento, é devolutivo

Efeito de interrom per o prazo pa­ra interposição de qualquer outro recurso

Preparo Preparo obrigatório sob pena de deserção. Exceção: art. 519 do CPC - caso o apelante prove justo im ­pedim ento

Há preparo Não há preparo Não há preparo

Prazo 15 dias (interposição e resposta) 10 dias (interposição e resposta) 10 dias (interposição e resposta) 5 dias para em bargar (não há res­posta)

Peculiaridades de cada recurso

Recebida a apelação apenas no efei­to devolutivo (art. 520 do CPC), po­derá o vencedor promover a execu­ção provisória

Art. 526 do CPC - no prazo de 3 dias, deverá inform ar o Juízo de 1° grau da interposição do agravo

Art. 523 do CPC - agravante deve requerer, nas razões ou na resposta de apelação, que o Tribunal conheça do agravo retido

Sendo o recurso julgado protela- tório, será imposta m ulta de 1%, na reiteração a m ulta será de 10%

ANEXOS DA PARTE I

153

Page 178: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

ANEXO I - RESUMO DOS RECURSOS (co n tin u a çã o )

EMBARGOS

INFRINGENTES

ORDINÁRIO

ARTS. 102, II, E 105, II, CF

ESPECIAL E/OU

EXTRAORDINÁRIO

EMBARGOS DE

DIVERGÊNCIA

Cabim ento A córdãos não-unànim es

quando: houver reformado

as sentenças de m érito ou

julgado procedente ação res­

cisória - art. 530 do CPC

Requisitos Acórdão proferido em ape­

lação ou ação rescisória

contendo divergência (vo­

to vencido)

Órgão para

interposição

Endereçado ao relator da

apelação ou ação rescisória

Órgão de

julgam ento

Pelo próprio tribunal, con­

forme dispõe cada regimen­

to interno

Do STJ para o STF, quando acórdãos deci­

didos em única instância e denegatórios

de:

- mandado de segurança, mandado de in-

ju nção, habeas cor pus c habeas data.

Dos TRFs e Tis para o STJ, quando acór­

dãos decididos em:

- m andado decidido em única instância e

denegatória a decisão;

- habeas corpiis decidido em única ou ú lti­

ma instância e denegatório.

De juízo federal para o STJ:

- de sentença em ação em que for parte

Estado estrangeiro contra municípios ou

pessoa domiciliada no Brasil.

Recurso especial - art. 105, III, CF.

Endereçado para o STJ, contra acórdão que:

a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhe

vigência;

b) julgar válido ato de governo local em face da lei

federal (alterado pela EC n. 45/2004);

c) der a lei federal interpretação divergente da que

tenha dado outro Tribunal.

Recurso ex trao rd inário - art. 102, III, CF. En­

dereçado para o STF, contra acórdão que:

a) contrariar dispositivo da Constituição;

b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou

lei federal;

c) julgar válida lei ou ato de governo local con­

testado em face da Constituição;

d) julgar válida lei local contestada em face da lei

federal (inserido pela EC n. 45/2004).

O § 3o determina que o recorrente deverá demons­

trar a repercussão geral da matéria discutida no

recurso extraordinário (EC n. 45/2004).

Acórdãos proferidos em

recurso especial e/ou

extraordinário

Quando a decisão divergir

do julgamento de outra

turma, seção ou plenário

Próprio tribunal que pro­

feriu o acórdão

Conform e determ inar o

regim ento in terno do

tribunal

Forma Petição com pedido de no­vo julgamento para que seja apreciada a divergência

Petição de interposição endereçada ao relator e razões de recurso ao ST) ou STF

Petição de interposição dirigida ao presidente do tribunal recorrido e razões de recurso ao STJ ou STF

Petição apontando a d i­

vergência

154 MANUAL DE DIREITO

PROCESSUAL CIVIL - DARLAN

BARROSO

Page 179: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

ANEXO I - RESUMO DOS RECURSOS (co n tin u a çã o )

EMBARGOS

INFRINGENTES

ORDINÁRIO

ARTS. 102, II, E 105, II, CF

ESPECIAL E/OU

EXTRAORDINÁRIO

EMBARGOS DE

DIVERGÊNCIA

Juízo de

admissibilidade

Realizado pelo relator do

acórdão divergente - art.

531 do CPC

Pelos órgãos de interposição e de ju l­

gamento

Realizado pelo presidente do tribunal no m o­

m ento da interposição e pelo relator quando os

autos são remetidos ao tribunal

Pelo relator do acórdão

embargado

Recurso contra

a não-adm issão

Agravo para o órgào cole­

giado, no prazo de 5 dias -

art. 532 do CPC

Agravo interno Agravo de instrum ento - art. 544 do CPC

(no prazo de 10 dias)

Agravo para o órgão cole­

giado

Juízo de

retratabilidade

Não é possível, deve haver

novo julgam ento

Nào é possível Nào é possível Não é compatível

Efeitos Devolutivo (apenas quanto

à divergência) e suspensivo

Os mesmos da apelação (devolutivo e

suspensivo)

Apenas efeito devolutivo, não obstando a execução

provisória - art. 542, § 2o, do CPC

Efeito devolutivo

Preparo Pode haver preparo Há preparo Há preparo, porte de remessa e retorno Nos termos do regimento

Prazo 15 dias (interposição e res­

posta)

15 dias (interposição e resposta) 15 dias (interposição e resposta) 15 dias

Observações

peculiares para

cada recurso

0 julgamento do recurso

será realizado conforme de­

terminar o regimento inter­

no do tribunal. Geralmente

com a presença de outros

magistrados

Subsidiariamente, aplicam-se as regras

da apelação ao procedim ento, ao efeito e

à admissibilidade do recurso - art. 540

do CPC

Art. 542, $ 3o, do CPC - sendo o acórdão proferi­

do em recurso contra decisões interlocutórias (agra­

vos), cautelares ou embargos à execução, o recurso

especial ou extraordinário será retido, e somente

será apreciado se reiterado no prazo da interposi­

ção do recurso contra decisão final

Para o julgamento, deve-

se observar o regimento

interno de cada tribunal

(STJ ou STF)

ANEXOS DA PARTE I

155

Page 180: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

1 5 6 M ANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Page 181: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

P a r t e II P r o c e s s o d e E x e c u ç ã o e C u m p r i m e n t o d e S e n t e n ç a s

Page 182: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso
Page 183: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

I n t r o d u ç ã o 9

9.1 O Pr o c e s s o de Ex e c u ç ã o

O legislador brasileiro empregou no vigente Código de Processo Civil o espírito de oferecer instrumentos proces­suais específicos à natureza do conflito ou da própria neces­sidade posta em juízo.

O Código prevê a existência de processos e procedimentos (ou ritos) adequados a cada modalidade de pretensão que possa ser levada perante o Poder Judiciário.

Como já tratamos, o processo é o instrumento pelo qual o Estado, por meio do Poder Judiciário, aplica o direito ao ca­so concreto, buscando pôr fim aos conflitos que perturbam a paz e a ordem social.

Não basta ao Estado dar aos jurisdicionados o direito de ação - direito de invocar a jurisdição nos moldes consagra­dos como princípio basilar do estado de direito, nos termos do art. 5o, XXXV, da Constituição também tem o dever de proporcionar mecanismos eficazes de solução dos conflitos. É obrigação do legislador infraconstitucional produzir ins­trumentos normativos que tornem pleno o direito constitu­cional de acesso à Justiça.

159

Page 184: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

1 6 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Dar acesso à Justiça é muito mais do que permitir a propositura da ação, mas eqüivale ao poder-dever de oferecer uma tutela eficiente àque­le que invoca a jurisdição.

Na busca da eficiência na prestação do provimento jurisdicional, o ordenamento processual admite as seguintes modalidades de ações:

a) processo de conhecimento;b) processo de execução;c) processo cautelar.

Ao tratarmos do estudo da teoria geral do processo, no volume I, afirmamos que o processo de conhecimento tem por objetivo a obtenção de uma sentença de mérito, ou seja, uma manifestação judicial acerca da existência ou inexistência de um direito, obrigação ou relação jurí­dica, bem como os efeitos práticos do reconhecimento do direito m a­terial invocado (tudo por meio de tutelas declaratórias, condenatórias ou constitutivas).

Como o próprio nome sugere, o processo de conhecimento tem por finalidade fazer que o Estado, por meio dos magistrados, tome co­nhecimento de uma lide com a seguinte sistemática: o autor apresenta sua pretensão (causa de pedir e pedido); o réu, por sua vez, manifesta sua defesa; são colhidas as provas; por fim, após uma cognição exau- riente, o juiz manifesta qual das partes tem razão no conflito e a quem deve ser assegurado o gozo pleno dos efeitos do direito material.

O processo de conhecimento se presta à obtenção de um título executivo que, conseqüentemente, terá a natureza judicial.

O processo de execução não se presta ao conhecimento e visa tão- somente a satisfação (ou efetivação) de um direito previamente reco­nhecido (ou conhecido) em um título. Representa o instrumento para compelir o devedor - assim reconhecido no título executivo - ao cum ­primento da obrigação ou direito manifestado em favor da outra parte (credora para o direito material, exeqüente para o processo).

Por meio do processo de conhecimento, o Estado se manifesta so­bre o direito. No processo de execução, no pleno exercício da força coercitiva, que é inerente à atividade jurisdicional, o Estado obriga o devedor à satisfação da obrigação.

Page 185: Manual de direito processual civil   vol. 2 - darlan barroso

INTRODUÇÃO 161

Na execução, forçada ou direta, o Estado age sobre a vontade do de­vedor - que resiste ao cumprimento da obrigação impondo uma tí­pica medida de coerção para satisfação do direito reconhecido.

Ao introduzir o estudo do processo de execução, Humberto Theo- doro Júnior ensina1 que: “Na ordem cronológica, a declaração de cer­teza há de preceder à realização forçada da prestação a que se refere a mesma relação jurídica litigiosa. É que, enquanto a declaração se posta apenas no plano das idéias e palavras, a execução entra na área da coa­ção, atingindo a parte devedora em sua esfera privada, no que diz res­peito ao seu patrimônio”.

Evidentemente, por se tratar de atividade estritamente coercitiva, a prática de atos executórios pressupõe a existência de certeza sobre o direito daquele que reclama a satisfação do direito. Seria injusto privar o suposto devedor de seus bens sem a existência de uma certeza. Segun­do Cândido Rangel Dinamarco, “a certeza é um objetivo na cognição e um ponto de partida na execução”.2

Na execução, o devedor não manifesta vontade, mas sofre atos coer­citivos do Estado-juiz para que seja atingido o fim do direito material. Como exemplo, podemos citar os atos de apreensão de coisas, expropria- ções ou apossamento de bens, entre outros que levem o credor ao pleno gozo de seu direito material.

Tais afirmações podem gerar uma certa confusão para aquele que depara com a dualidade processo de conhecimento e processo de execução.

A princípio, paira a falsa idéia de que o processo de conhecimento teria o poder ou força de satisfazer a pretensão daquela parte que alega um determinado direito. O sujeito que promoveu uma ação de conhe­cimento muitas vezes tem a ilusão de que a mera prolação da sentença lhe garante a fruição dos efeitos práticos do direito material.

Na maioria dos casos, a simples sentença do processo de conheci­mento não tem o poder de produzir efeitos práticos, mas depende de atos executórios para seu cumprimento, compelindo a parte vencida ao respeito do título judicial.

1 Curso de direito processual civil, v. II, p. 4.7 Cario Fumo. Disegno sistemático delle opposizioni nel processo esecutivo, apud Cân­

dido Rangel Dinamarco, Execução civil, p. 97.

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162 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

As reformas introduzidas no Código de Processo Civil tentaram dar maior efetividade ao cumprimento dos títulos judiciais. Na verda­de, as diversas reformas tiveram o objetivo de simplificar o cumpri­mento dos títulos judiciais, retirando a natureza de ação autônoma da execução, como será objeto de estudo no capítulo próprio.

A execução forçada também se justifica para compelir o devedor ao cumprimento de títulos extrajudiciais, ou seja, documentos produ­zidos fora do Judiciário e que, por força da lei, têm o poder de gerar medidas coercitivas do Estado para o cumprimento da obrigação.

9.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

do Pr o c e s s o de Ex e c u ç ã o 3

A tradição do direito brasileiro, pela grande influência das ordena­ções do reino e dos diversos códigos europeus, encontra suas bases e fundamentos no direito romano, razão pela qual é de grande impor­tância a análise da execução prevista naquela organização social.

No período primitivo do direito romano, a execução era pessoal (manus iniectio esto),4 ou seja, vigorava a regra segundo a qual o deve­dor respondia com o próprio corpo para pagamento da dívida. Além disso, nesse período a execução de obrigações tinha natureza privada e penal, conforme as regras da Lei das XII Tábuas.5

O descumprimento de uma obrigação confessada ou reconhecida por sentença tinha natureza de ofensa moral contra o credor.

Proferida a sentença pelo árbitro, o devedor teria o prazo de 30 dias para o cumprimento voluntário da obrigação. Caso não houvesse o cumprimento espontâneo, após decorrido o referido prazo, o credor poderia conduzir à força o devedor à presença do magistrado para que fossem impostas as sanções pessoais. O devedor era levado preso pelo credor (até 60 dias), até que a dívida fosse paga.

3 Moacyr Amaral Santos, Primeiras linhas de direito processual civil, v. III, p. 206-10.4 A expressão em latim significa "pôr o credor a mão em cima...", o que eqüivale ao poder

do credor sobre a pessoa do devedor. Pontes de Miranda, Tratado das ações. Tomo VIII - Ações executivas, p. 8.

■ Leonardo Greco, O processo de execução, p. 11.

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INTRODUÇÃO 1 6 3

O devedor era exibido em praça pública ou nos mercados, a fim de que a notícia de sua prisão fosse conhecida por todos. Caso o paga­mento não fosse realizado no prazo da prisão, o credor tinha o direito de tomar o devedor como escravo.

Assim, como coisa (escravo), o credor poderia vender o devedor em feiras e, caso não houvesse arrematação, poderia ser levado para venda fora da cidade; por fim, não conseguindo o credor satisfazer o crédito com a venda do corpo do devedor, poderia chegar à máxima de matá-lo. Havendo mais de um credor, os pedaços do corpo seriam re­partidos entre eles.

Em momento mais adiantado do processo romano, com o adven­to da Lex Poetelia (326 a.C.), iniciou-se um período de humanização da execução,6 mantendo-se a possibilidade da prisão, mas com a impo­sição de medidas que assegurassem a vida do devedor e o veto a atos vexatórios.

No período formulário do processo romano (período clássico), após a sentença de condenação, o credor deveria formular novo pedido ao pretor.

O devedor, por sua vez, poderia reconhecer a validade da conde­nação e sua inadimplência, ou então apresentar uma contestação à ação executiva, alegando nulidade da sentença condenatória ou outra defesa de exclusão do débito, como pagamento, transação etc., instau­rando, portanto, novo contraditório com a prolação de uma nova sen­tença. Com a nova sentença, o credor promovia novamente a ação (actio iudicati), sendo possível ao devedor reiterar a defesa ou confes­sar a dívida.

Com a confissão da dívida, na primeira hipótese anterior, o deve­dor era tido por condenado, sendo encerrada a actio iudicati, passan­do o pretor a realizar atos executivos (sobre a pessoa do devedor ou so­bre seu patrimônio).

Já no período denominado cognitio extraordinaria (305 a 565), houve o fim do desdobramento do processo romano em duas fases, e o poder jurisdicional passou a ser exercido exclusivamente pelos ma­gistrados. Logo, também a execução deixou de ser privada.

6 Leonardo Greco, op. c/f., p. 14.

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1 6 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

A execução era preferencialmente patrimonial e recaía apenas so­bre os bens do devedor necessários ao cumprimento da obrigação7 (não eram arrecadados todos os bens como nos sistemas anteriores8). A pri­são passou a ser substituída pela pignoris, que representava o ato de levar à venda os bens do devedor como forma de pagamento da dívi­da com o credor (como penhora).

Com a queda do Império Romano (já no século V) e a prevalência do domínio germano-barbárico, passaram-se a adotar as práticas judi­ciárias rudimentares desses povos, nas quais a dívida tinha a conotação moral de ofensa à pessoa do credor.

No princípio, os costumes germano-barbáricos autorizavam ao credor, sem a intervenção de nenhuma autoridade (já que não exis­tiam), apropriar-se dos bens do devedor como forma de cumprimen­to da obrigação, restabelecendo a penhora privada.

Posteriormente, mediante requerimento formulado perante auto­ridade do Estado, eram expropriados os bens do devedor; este, após sofrer a constrição, poderia ingressar com uma defesa contra a dívida.

Já na Idade Média (século XI), com o renascimento do direito ro­mano, ensina Moacyr Amaral Santos9 que a tradição romana foi com­binada com as técnicas dos germanos, dando origem ao procedimen­to denominado executio per offtcium iudicis.

Para esse tipo de procedimento, a execução deveria ser precedida de uma condenação (como se fazia no processo romano), mas dispen­sava a instauração de novo contraditório após a sentença (actio iudica- ti). Proferida a sentença, o juiz determinava os atos executórios para a expropriação de bens do devedor, com as características de presteza que havia no sistema germano-barbárico.

No direito português, as Ordenações previam a possibilidade de três procedimentos: uma ação de conhecimento para constituir a obri­gação e obter a condenação, uma execução forçada de sentenças e, ainda, outro procedimento executivo para a cobrança de determinados créditos privilegiados.

7 Bonorum distractio.8 Bonorum venditio.9 Primeiras linhas de direito processual civil, v. III.

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INTRODUÇÃO 1 6 5

No Brasil, o Código de 1939 previa as ações executivas (art. 298), como espécie de ação especial, e as ações de execução (art. 882).

As ações executivas, como modalidade de rito especial, eram con­cebidas para créditos determinados e, em regra, representados por tí­tulos extrajudiciais. Nessa ação executiva, o devedor era citado para, no prazo de 24 horas, pagar a dívida sob pena de penhora. Realizada a penhora, o réu (como era denominado), tinha o prazo de 10 dias para apresentar contestação (na própria ação), seguindo, daí em diante, pe­lo rito ordinário, ou seja, a ação executiva se transformava em verda­deiro processo de conhecimento, mas com a segurança do juízo pela penhora. Tal procedimento, em muito, lembra a actio iudicati do direi­to romano.

Já o processo de execução do Código revogado era concebido para a obtenção da satisfação das sentenças. Nesse procedimento, efetivada a penhora, poderia o devedor oferecer embargos.

O Código de Processo Civil vigente, originariamente, concebia to­da modalidade de execução como espécie de ação autônoma, ou seja: fosse o título judicial ou extrajudicial, o credor deveria se valer de uma ação de execução para a satisfação de seu crédito.

Após as inúmeras reformas, no entanto, o processo de execução autônomo ficou restrito aos títulos extrajudiciais e a poucos títulos ju ­diciais, sendo certo que as sentenças, como regra, são executadas den­tro do próprio processo de conhecimento, como será visto adiante.

9.3 Co e r ç ã o do Es t a d o - M eio s

DE SUB-ROGAÇÃO E TUTELAS ESPECÍFICAS

Executar para o Processo Civil, como já vimos, é requerer a satis­fação ou efetivação de um direito previsto em um título.

O termo “execução”, da derivação do latim exsecutio, de exsequir, tem o significado de perseguir ou de seguir até o fim. Na verdade, para o processo, a execução representa a perseguição do devedor para com­peli-lo ao cumprimento da obrigação. O Estado exerce sua atividade coercitiva sobre o devedor para forçá-lo a adimplir aquilo que deveria ter realizado por vontade própria.

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1 6 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

A coerção do Estado se dá por sub-rogação ou por tutelas específicas.A sub-rogação ocorre quando o Estado substitui o devedor no ato

necessário à satisfação da obrigação. Na verdade, quando é realizada a expropriação de seus bens (com a penhora), levado o bem à venda em hasta pública e entregue o dinheiro ao credor, o Estado nada mais fez do que substituir o devedor em uma atividade que deveria ter sido rea­lizada espontaneamente por ele - portanto, em sub-rogação.

A execução forçada por sub-rogação substitui a vontade do deve­dor no cumprimento da obrigação.

Por outro lado, o Estado poderá se valer de tutelas específicas para o fim de exercer uma pressão psicológica'0 no devedor para que ele mesmo cumpra a obrigação. As tutelas específicas atuam na vontade do devedor para que ele próprio satisfaça a obrigação. Nesse caso, o Estado não substitui o devedor nas medidas de cumprimento da obri­gação, mas lhe impõe sanções capazes de forçá-lo ao cumprimento daquilo previsto no título.

Os arts. 461 e 461-A, introduzidos pelas recentes reformas do Có­digo de Processo Civil, autorizam ao juiz, nos casos de cumprimento de sentenças ou liminares" de obrigações de fazer, não fazer ou entre­ga de coisa, de ofício ou a requerimento da parte, fixar multa diária (astreintes) ou outra medida específica que assegure o resultado práti­co da tutela equivalente ao do adimplemento.12

Na verdade, a fixação de multa diária não é uma penalidade, mas uma medida capaz de estimular o devedor ao cumprimento da obri­gação. Nesse caso, a multa atua como meio de coerção sobre a vonta­de do devedor.

É o caso, por exemplo, de um título que determina que sejam entre­gues medicamentos pelo Poder Público a determinada pessoa. Assim, por

,0 Cândido Rangel Dinamarco, Instituições de direito processual civil, v. I, p. 43.11 Diga-se qualquer medida antecipatória de tutela ou acautelatória.12 "Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou

não fazer, o juiz concederá a tutela especifica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemen­to. (...) § 5o Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equiva­lente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requi­sição de força policial."

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INTRODUÇÃO 1 6 7

se tratar de obrigação de entrega de coisa, ao dar a sentença ou liminar, poderá o juiz fixar multa diária pelo descumprimento da obrigação.13

As astreintes, do direito francês, são medidas acessórias à obriga­ção principal de fazer, não fazer ou entrega de coisa, capazes de com­pelir o devedor ao cumprimento da obrigação.

9 . 4 M e i o s d e E x e c u ç ã o

Fo r ç a d a e Pe r d a d a A u t o n o m i a

do C u m p r i m e n t o d a s S e n t e n ç a s

Como será objeto de estudo adiante, toda execução se funda em um título, ou seja, um documento capaz de expressar a existência de uma determinada obrigação.

Assim, o sistema processual brasileiro concebe a existência de duas modalidades de títulos executivos: títulos judiciais (art. 475-N do CPC) e títulos extrajudiciais (art. 585 do CPC).

Evidentemente, os títulos judiciais, como regra, são aqueles oriun­dos de processos, ao passo que os títulos extrajudiciais são provenien­tes das relações entre os particulares, mas em ambos os casos a força executiva decorre de uma expressa previsão legal.

Dependendo da modalidade de título executivo, no entanto, o ordenamento processual concebeu um modo diferente para seu cum ­primento. Vejamos:

a) Modo de cumprimento dos títulos executivos judiciais

Os títulos judiciais, como determinou a reforma introduzida pela Lei n. 11.232/2005, com inclusão do artigo 475-J do Código de Processo Civil, passaram a ser executados dentro do próprio processo de conhecimento, o que eqüivale dizer que a execução de

15 "Processual civil. Obrigação de fazer. Multa diária (astreintes). Fixação de ofício contra pessoa jurídica de direito público. Possibilidade. 1. As astreintes podem ser fixadas pelo juiz de ofício, mesmo sendo contra pessoa jurídica de direito público (IPERGS), que ficará obrigada a suportá-las caso não cumpra a obrigação de fazer no prazo estipulado. Precedentes desta Cor­te." (STJ, REsp n. 451.109/RS, rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 22.10.2002, v.u.)

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1 6 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

sentenças, como regra, não goza da natureza processual de auto­nomia.

O cumprimento das sentenças (ou acórdãos), nos termos do art. 475-J, é mera fase processual dentro do processo de conhecimento, sem autonomia de processo. Incluímos o cumprimento da sentença como uma etapa ou atribuição do processo de conhecimento:

Fase Fase Fase Fase Fase dopostulatória instrutória decisória recursal cumprimento

da sentença

Antes do advento da Lei n. 11.232/2005, toda execução - fosse de título judicial ou extrajudicial - gozava de autonomia processual.

Assim, terminado o processo de conhecimento, com a obten­ção do título executivo judicial, o credor deveria dar início a um novo processo para a execução da sentença (o que exigia nova ini­cial, nova citação etc.).

Agora, essa autonomia procedimental ficou restrita aos títulos extrajudiciais e a algumas modalidades de títulos judiciais.

Proferido um título judicial em processo de conhecimento, a sa­tisfação da obrigação se dará dentro da mesma relação processual já instaurada, sem a necessidade da abertura de uma nova ação, como era no sistema anterior.

b) Processo de cumprimento dos títulos extrajudiciais

Os títulos extrajudiciais, nos termos definidos na lei, sempre da­rão ensejo a um processo autônomo de execução (ação de execução).

O processo de execução, nos termos firmados no Livro II do Código de Processo Civil (Do Processo de Execução), representa espécie autônoma de processo, ou seja, é uma nova ação e inde­

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INTRODUÇÃO 1 6 9

pendente do processo de conhecimento instruída com título exe­cutivo extrajudicial.

9.5 Pr i n c íp i o s d a Ex e c u ç ã o

A doutrina é controvertida quanto à classificação dos princípios informativos do processo de execução. Assim, incluímos todos aqueles comentados pela maioria dos processualistas.

Além dos princípios constitucionais e gerais internos do processo civil, que já estudamos no volume I, o processo de execução também tem como base alguns princípios específicos, que veremos a seguir.

h 9 .5 .1 D e v i d o P r o c e s s o L e g a l

O devido processo legal é princípio constitucional de aplicabilidade a todas as áreas do direito e a todo o processo civil.

Quando falamos de processo de execução, no entanto, o princípio constitucional do devido processo legal assume grande relevância, ao passo que, na execução, o devedor é compelido ao cumprimento de uma obrigação, recaindo sobre ele a força coercitiva do Estado capaz de obrigá-lo ao adimplemento daquilo que deve.

A execução ou o cumprimento da sentença é típica atuação juris­dicional de restrição dos bens ou direitos do devedor. Na maioria das vezes, os atos executivos importam em restrição patrimonial ou da liberdade do devedor sobre seus bens.

Como sabemos, pela garantia do devido processo legal vige a m á­xima de que ninguém poderá ser privado de seus bens senão pela ob­servância do processo previsto no ordenamento jurídico. O credor apenas poderá restringir direitos do devedor com a observância de um processo que esteja previsto na lei, conforme estabelece o inc. LIV do art. 5o da Constituição.

É comum que o credor tente se valer de meios próprios para a sa­tisfação do crédito. Muitas vezes, o credor, por exemplo, pretende reter documentos ou coisas do devedor, ou pratica qualquer outro ato pri­vado para atingir o adimplemento da obrigação, isso tudo sem obser­var um processo previsto na lei. Vamos imaginar que um profissional

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1 7 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

liberal de posse de documentos de determinada empresa em razão de sua atividade se recuse a devolver tais documentos pelo fato de a em ­presa estar em débito com o pagamento dos honorários mensais. Nesse caso, o profissional abriu mão do processo legal - processo de execu­ção de quantia - para o exercício de uma justiça privada, acabando por ofender a previsão constitucional.

Todo ato executivo que não se fundar nos preceitos legais será arbi­trário e contra o princípio do devido processo legal. A restrição de direi­tos - com expropriação de bens ou imposição de medidas coercitivas como multa - apenas poderá se dar com a observância dos passos pre­vistos na lei, sob pena de violência ao princípio constitucional citado.

■■ 9 . 5 . 2 A u t o n o m i a P r o c e s s u a l

O processo de execução, nos moldes previstos no Livro II do Códi­go de Processo Civil, é modalidade de atividade jurisdicional que goza de autonomia em relação às demais modalidades de processos (conhe­cimento e cautelares).

A execução é uma modalidade de processo, ao lado do processo de conhecimento e cautelar, com independência procedimental.

O princípio da autonomia, com a reforma introduzida pela Lei n. 11.232/05, deixou de ser aplicado às execuções de títulos judiciais (já que a execução se opera dentro do próprio processo de conhecimen­to). Autônomo, portanto, apenas será o processo de execução de títu­los judiciais ou de títulos judiciais relativos à execução de alimentos (pelo art. 733 do CPC) ou contra a Fazenda Pública (como estabelece o art. 730 do CPC).

■■ 9 . 5 . 3 R e s p o n s a b i l i d a d e Pa t r i m o n i a l

Muitos doutrinadores, como Humberto Theodoro Júnior," deno­minam esse princípio como sendo “toda execução é real” ou “princí­pio da realidade”.

Na verdade, por esse princípio se entende que o devedor responde pelas obrigações com seus bens presentes e futuros, conforme determi­

14 Curso de direito processual civil, v. II, p. 128.

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INTRODUÇÃO 171

na o art. 591 do Código de Processo Civil. A regra, portanto, afastou a execução pessoal em preferência à execução real (sobre coisas).

A regra é no sentido de que os atos executórios devam recair sobre o patrimônio do devedor e não sobre sua pessoa.

Em casos específicos, por autorização legal, fica autorizada a res­ponsabilidade patrimonial de bens de terceiros (que não o devedor), como veremos adiante em tópico próprio.

A regra da responsabilidade patrimonial se opõe aos métodos pri­mitivos do direito romano, que admitiam a execução pessoal - o cre­dor estava autorizado a se apropriar da pessoa do devedor como forma de cumprimento da obrigação (tomá-lo como escravo, vendê-lo em praça pública ou até conduzi-lo à morte).

Ficaram, todavia, resquícios da execução pessoal dos romanos em nosso direito processual civil. Como sabemos, nos casos de débito de alimentos ou do depositário infiel, a Constituição brasileira autoriza a prisão do devedor como meio coercitivo para obrigá-lo ao adimple- mento (art. 5o, LXV1I).15

Dado o princípio da execução real é que se estabelecem algumas re­gras que preservam a dignidade da pessoa do devedor. Ressalte-se que a execução recai sobre o patrimônio, e não sobre a pessoa; portanto, os atos executórios devem respeitar a dignidade humana do devedor, até mesmo como respeito a princípio basilar da Constituição.

Por essa razão, existem institutos como: do bem de família, que veda a penhora do imóvel destinado à residência do devedor e de sua família;16 a impenhorabilidade de determinados bens essenciais à vida, nos termos

15 "Art. 5. [...] LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo ina- dimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel."

0 Pacto de São José da Costa Rica, ratificado pelo Brasil por meio do Decreto n. 678, de 06.11.1992, também prevê a proibição de prisão civil por dívidas, ressalvando tão-somen­te a possibilidade de prisão do devedor de alimentos.

16 "Processual civil. Embargos de terceiro. Execução fiscal movida em face de bem ser­vil à residência da família. Pretensão da entidade familiar de exclusão do bem da execução fiscal. Possibilidade jurídica e legitimidade para o oferecimento de embargos de terceiro. É bem de família o imóvel pertencente à sociedade, desde que o único servil à residência da mesma. Ratio essendi da Lei n. 8.009/90. 1. A lei deve ser aplicada tendo em vista os fins sociais a que ela se destina. Sob esse enfoque a impenhorabilidade do bem de família visa a preservar o devedor do constrangimento do despejo que o relegue ao desabrigo. 2. Empre­sas que revelam diminutos empreendimentos familiares, onde seus integrantes são os pró­

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172 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

do art. 649 do Código de Processo Civil (como o salário, os móveis que guarnecem a residência do devedor, o anel nupcial, fotografias de família etc.); a vedação de alienação dos bens do devedor a preço insignificante, que preservam o mínimo de dignidade da pessoa do devedor.

Caso não existissem tais garantias - que vedam a onerosidade ex­cessiva - , o devedor estaria sujeito a uma execução pessoal, já que sua dignidade e corpo estariam sacrificados para a satisfação do crédito.

m 9 . 5 . 4 U t i l i d a d e e A d i m p l e m e n t o

A execução tem por objetivo exclusivo a satisfação do direito do credor; portanto, todos os atos processuais serão praticados para esse fim. O adimplemento é o fim almejado por essa modalidade de pro­cesso.

Repita-se que, por esse princípio, deverá o magistrado indeferir a prática de atos processuais que não levam ao cumprimento da obriga­ção. O ato processual será considerado inútil quando não visar ao cum ­primento da obrigação.

prios partícipes da atividade negociai, mitigam o princípio societas distdt singulis, peculiarida­de a ser aferida cum granu salis pelas instâncias locais. 3. Aferida à saciedade que a família reside no imóvel sede de pequena empresa familiar, impõe-se exegese humanizada, à luz do fundamento da república voltado à proteção da dignidade da pessoa humana, por isso que, expropriar em execução por quantia certa esse imóvel, significa o mesmo que alienar bem de família, posto que, muitas vezes, lex dixit minus quam voluit. 4. In casu, a família foi residir no único imóvel pertencente à família e à empresa, a qual, aliás, com a mesma se confunde, quer pela sua estrutura quer pela conotação familiar que assumem determinadas pessoas jurídicas com patrimônio mínimo. 5. É assente em vertical sede doutrinária que 'A impenho- rabilidade da Lei n. 8.009/90, ainda que tenha como destinatárias as pessoas físicas, merece ser aplicada a certas pessoas jurídicas, às firmas individuais, às pequenas empresas com cono­tação familiar, por exemplo, por haver identidade de patrimônios'." (Luiz Edson Fachin, Esta­tuto jurídico do patrimônio mínimo, p. 154). 6. Em conseqüência, "(...) Pequenos empreen­dimentos nitidamente familiares, onde os sócios são integrantes da família e, muitas vezes, o local de funcionamento confunde-se com a própria moradia, devem beneficiar-se da impenhorabilidade legal" [grifo do autor]. 7. Aplicação principiológica do direito infra- constitucional à luz dos valores eleitos como superiores pela Constituição Federal, que auto­riza excluir da execução da sociedade bem a ela pertencente mas que é servil à residência como único da família, sendo a empresa multifamiliar. 8. Nessas hipóteses, pela causa peten- di eleita, os familiares são terceiros aptos a manusear os embargos de terceiro pelo título que pretendem desvincular o bem da execução movida pela pessoa jurídica. 9. Recurso especial provido." (STJ, REsp n. 621.399/RS, rel. Min. Luiz Fux, j. 19.04.2005, v.u.)

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INTRODUÇÃO 173

Nesse sentido, Humberto Theodoro Júnior afirma que não se admi­te a execução como instrumento de simples castigo ou sacrifício do devedor.17 E mais, podendo a execução ser realizada por mais de uma forma, deverá ser observado o meio menos gravoso ao devedor, confor­me preceitua o art. 620 da norma processual.

■■ 9 . 5 . 5 P r i n c í p i o d a E s p e c i f i c i d a d e

Para o ministro Luiz Fux, “o processo de execução deve recolocar o credor na mesma situação em que ele estaria se a obrigação tivesse sido cumprida voluntariamente”.18

Dessa forma, podemos afirmar que a execução deve ser específica para o fim de garantir ao credor a obtenção daquilo que teria caso a obrigação tivesse sido cumprida espontaneamente pelo devedor. A execução se fará com a preferência de outorgar ao credor o bem pre­visto no título (direito in natura).

Não sendo possível o cumprimento da obrigação na forma em que foi assumida (obrigação de fazer, não fazer, entrega de coisa), poderá, no entanto, abrir mão da especificidade para outorgar ao credor uma compensação pecuniária ou recebimento de coisa diversa daquela cons­tante do título.

■ i 9 . 5 . 6 D i s p o n i b i l i d a d e

Por esse princípio, entende-se que o credor pode dispor sobre seu direito de ação. Obviamente, o credor não está obrigado a executar seu crédito e, caso o venha fazer, poderá a qualquer momento desistir des­se direito.

O credor poderá, a qualquer momento, desistir da execução, nos termos do art. 569. E mais: a desistência poderá ser total, para obter a extinção da execução, ou parcial, apenas havendo disposição de algum ato processual executório (como a penhora ou hasta pública de certos bens).

Caso o credor exeqüente venha a desistir da execução ou de alguma medida executória, responderá ele, no entanto, pelas despesas proces­

17 Curso de direito processual civil, v. II, p. 11.18 Curso de direito processual civil, p. 986.

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1 7 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

suais praticadas (custas, perícias de avaliação etc.), inclusive aquelas adiantadas pela parte executada, independentemente de o executado ter apresentado embargos à execução.19 Caso o executado tenha constituído advogado na execução, deverá o exeqtiente responder pelos honorários advocatícios previstos no art. 20 do Código de Processo Civil.20

Desistir da execução não significa renunciar ao crédito. Ao reque­rer a extinção da execução, o credor apenas está abrindo mão do pro­cesso, sendo resguardado o crédito previsto no título, e a ação exe- cutória poderá ser novamente proposta.

Por outro lado, vem a seguinte dúvida: a desistência da execução depende de anuência do devedor executado (como ocorre no proces­so de conhecimento após a citação do réu)?

A regra é no sentido de que a desistência da execução não depen­de da concordância do devedor executado.

Caso a execução tenha sido embargada (defesa do executado que representa verdadeiro processo de conhecimento), o art. 569, parágra­fo único, do Código de Processo Civil, determina, no entanto, que para sua extinção será observado:

a) se os embargos versarem apenas sobre matéria processual, serão extintos sem a anuência do executado, mas com a imposição ao exeqüente do pagamento das custas e honorários advocatícios;

b) se os embargos versarem sobre matéria de mérito, a desistência (e a conseqüente extinção) dependerá de anuência do devedor exe­cutado, sem prejuízo da condenação ao pagamento ao reembolso

19 "Processo civil. Execução de título judicial. Embargos ã execução. Desistência antes da citação. Honorários advocatícios. Descabimento. 1. O art. 20, § 4o, do CPC (com redação anterior à MP n. 2.180/2001) prevê o cabimento de honorários advocatícios nas execuções embargadas ou não, posicionando-se o STJ no sentido de que há condenação tanto na exe­cução quanto nos embargos à execução de título judicial. 2. Entretanto, em se tratando de embargos nos quais houve desistência da ação antes da citação da embargada, não haven­do a angularização da relação processual, é descabida a condenação em honorários. 3. Recurso especial conhecido em parte e improvido." (STJ, REsp n. 686.397/MG, rel. Min. Elia- na Calmon, j. 15.02.2005, v.u.)

Súmula n. 153 do STJ: "A desistência da execução fiscal, após o oferecimento dos embargos, não exime o exeqüente dos encargos da sucumbência".

20 Carlos Alberto Carmona, in: Antonio Carlos Marcato (coord.), Código de Processo Civil interpretado, p. 1.681-2.

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INTRODUÇÃO 1 7 5

das custas e honorários advocatícios, nos termos do art. 20 doCódigo de Processo Civil.

A disponibilidade da execução não se aplica à ação civil pública e à ação popular, já que, havendo condenação, o Ministério Público terá o dever de promover a execução, nos termos dos arts. 15, da Lei da Ação Civil Pública, e 16, da Lei da Ação Popular.

■ I 9 . 5 . 7 S U BS I DI AR I E D A D E DE R l T O

O Código de Processo Civil prevê regras específicas para o proces­samento da execução, bem como dispõe sobre os ritos que serão obser­vados para a prática dos atos processuais.

Poderá, contudo, haver omissões ou lacunas nas regras do proces­so de execução; assim, determina o art. 598 do Código de Processo Civil que serão aplicadas subsidiariamente as disposições que regem o processo de conhecimento.

Por exemplo, no Livro II do Código de Processo Civil, dedicado ao processo de execução, não existem regras específicas sobre o siste­ma recursal; assim, pelo art. 598, podemos concluir que serão aplica­dos ao processo de execução os recursos previstos para o processo de conhecimento.

Outro aspecto da subsidiariedade também deve ser observado quanto ao cumprimento das sentenças. Como tratamos, a execução de sentenças deixou de ser um processo autônomo de execução para ser tratado como mera fase do processo de conhecimento.

Por expressa previsão legal, todavia, ao cumprimento das senten­ças deverão ser aplicadas, subsidiariamente, as regras relativas ao pro­cesso de execução, ou seja, quando os arts. 475-A a 475-Q forem omis­sos em estabelecer um modo específico para a satisfação das sentenças, devemos aplicar, no que não for contrário, as regras do processo de execução, conforme estabelece o próprio art. 475-R.

Ao tratar do cumprimento das sentenças, por exemplo, o art. 475-J não traz regras acerca da penhora, da avaliação ou mesmo da hasta pública; portanto, nesses pontos, devemos nos valer do regramento previsto para o processo de execução (de títulos extrajudiciais).

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E l e m e n t o s d o

P r o c e s s o d e E x e c u ç ã o

10.1 T í t u l o Ex e c u t i v o

Nulla executio sine titulo.

A execução é o processo que visa ao cumprimento de uma obrigação que esteja reconhecida em um título executivo.

Portanto, não haverá execução sem a existência de um tí­tulo executivo, vigendo a máxima que afirma ser nula a execu­ção que não for aparelhada com um título, sendo, inclusive, a exigência contida no art. 580 do Código de Processo Civil.

Assim, podemos afirmar que o título representa condi­ção abstrata1 da ação de execução. O título executivo é pres­suposto processual de existência e desenvolvimento de uma execução.

O título pode ser definido como sendo o documento que expressa a existência de uma determinada obrigação. O títu­lo executivo autoriza o credor a provocar o Estado, de forma

1 Carlos Alberto Carmona. In: Antonio Carlos Morcato (coord.). Código de Processo Civil interpretado, p. 1707.

177

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1 7 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

direta, para que exerça força sancionadora a fim de que produza seus efeitos.2

Nesse sentido, o professor Sérgio Shimura3 dá ao título executivo dois atributos: um instrumental e outro substancial: o primeiro, no sentido de expressar um documento, papel ou peça que formaliza uma obrigação; o segundo eqüivale à prova do direito material ou ao indi­cativo da existência de uma obrigação entre pessoas.

Para a promoção da execução, porém, não basta a existência de um título (ou documento) que expresse uma obrigação, mas esse papel deve estar revestido dos requisitos legais que o tornem executivo, ou seja, hábil para dar início à execução.

■ i 10 .1 .1 R e q u i s i t o s d o T í t u l o E x e c u t i v o

O título apenas terá executoriedade quando estiver revestido dos requisitos previstos no art. 586 do Código de Processo Civil - na ver­dade, são pressupostos que mais estão relacionados com a obrigação do que com a forma do documento.'1 Os requisitos previstos no art. 586 do Código de Processo Civil são inerentes ao próprio conteúdo do título (a obrigação).

Assim, podemos afirmar que a obrigação contida no título deverá ser revestida de:

a) Certeza. O título será considerado certo quando expressar a exis­tência de uma obrigação entre credor e devedor. Na verdade, pode ser extraída a certeza quando, diante do título, não existir dúvida da existência da relação obrigacional.

b) Liquidez. A liquidez está relacionada à extensão da obrigação, ou seja, a obrigação deverá estar totalmente delimitada no título. Este

2 Enrico Tullio Liebman, Processo de execução, p. 38.3 Título executivo, p. 84.4 A reforma introduzida pela Lei n. 11.382/2006 corrigiu um equívoco da redação ori­

ginal do Código de Processo Civil. No art. 586, os requisitos de liquidez, certeza e exigibilida­de estavam relacionados com o título, ou seja, com o documento ou o aspecto formal. Mas, na verdade, são requisitos relativos ao direito material. Os requisitos do art. 586 são ineren­tes à obrigação e não apenas quanto à forma. Na atual redação, os requisitos estão relacio­nados à obrigação: "Art. 586. A execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível" [grifo do autor].

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÀO 1 7 9

deve prever expressamente o quantum devido ou coisa que deverá ser entregue, ou ainda a prestação que deverá ser satisfeita pelo devedor ou a abstenção (não fazer). O título é líquido quando esti­ver individualizada a obrigação.5

Quando se tratar de quantias, o título será considerado líquido mesmo que a obtenção do valor exato dependa da realização de cálculos (como a inclusão de juros ou atualização monetária),

c) Exigibilidade. O título é exigível quando o cumprimento da obri­gação puder ser imposto pelo credor ao devedor.

Podemos afirmar que a exigibilidade tem um termo inicial e um termo final, ou seja, um momento ou causa que admite ao credor a imposição ao devedor do cumprimento da obrigação e, ainda, um m o­mento ou fato que impede o exercício desse direito de reclamação.

Termos iniciais da exigibilidadea) Vencimento (ou termo) - quando a obrigação contiver data de

vencimento da obrigação, o título será exigido após tal data.b) Advento da condição suspensiva - algumas obrigações têm sua

exigibilidade condicionada ao advento de uma condição, ou seja, a exigibilidade estará suspensa até que a condição seja implemen­tada. Como exemplo, podemos citar uma escritura na qual o donatário se compromete a ceder o uso de um imóvel quando o filho se casar. Assim, a exigibilidade de entrega do imóvel ficará suspensa até o evento casamento (condição).

• Termo finala) Adimplemento. Evidentemente, o credor não poderá exigir o

cumprimento da obrigação se ela já houver sido satisfeita. O a- dimplemento total cessa a exigibilidade.

5 O Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 233 (08.02.2000) afirmando que: "O contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extrato da conta-corrente, não é título executivo". Tal entendimento foi consolidado pelo fato de que não são líquidos (não expressam o valor exato da dívida, mas apenas o valor que foi disponibilizado ao devedor). No entanto, após a edição da Súmula, a Lei n. 10.931/2004 criou a cédula de crédito bancário, admitindo a expedição de um título decorrente do contrato de abertura de crédito.

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1 8 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

b) Causas impeditivas da exigibilidade. Prescrição. A prescrição representa a perda do direito de ação, no caso, a perda do direi­to de executar. Assim, o título não será exigível quando houver ocorrido a prescrição.

Em suma, o título é considerado exigível quando não pendente do advento de termo (vencimento) ou condição (suspensiva), ou não está sujeito a outra causa impeditiva do exercício da cobrança.6

m 1 0 . 1 . 2 E s p é c i e s d e T í t u l o s E x e c u t i v o s

O Código de Processo Civil, de forma taxativa, classificou os títu­los executivos em razão de sua origem ou procedência. O Código hou­ve por bem definir os títulos como judiciais (art. 475-N)7 ou extraju­diciais (art. 585).8

A classificação mencionada leva à inocente conclusão de que seriam títulos judiciais aqueles emanados de um provimento judicial, ou seja, um documento decorrente de uma atividade do Poder Judiciá­rio. A contrario senso, seriam extrajudiciais os títulos oriundos das rela­ções entre os particulares e sem a intervenção do Poder Judiciário.

Como veremos a seguir, alguns títulos, no entanto, fogem à nature­za da classificação apontada no Código, levando à conclusão de que a classificação não seguiu, com coerência, a natureza de cada documento.

| Títulos judiciais (art. 475-N)

a) Sentença condenatória proferida no processo civil

A sentença condenatória, considerada como aquela que impõe à parte uma obrigação,9 é documento hábil a dar início a atos executó- rios. Lembramos que, pela reforma introduzida pela Lei n. 10.232/2005,

6 Humberto Theorodo Júnior, Curso de direito processual civil, v. II, p. 31, citando Cala- mandrei e Serpa Lopes, Exceções substanciais.

‘‘ Alteração dada pela Lei n. 10.132/2005.8 Alteração dada pela Lei n. 11.382/2005.9 Mesmo nas sentenças de Improcedência ou nas meramente declaratórias ou constitu­

tivas, poderá haver um comando condenatório em razão de honorários advocatícios, multas, reembolso de despesas processuais etc.

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÂO 1 8 1

o cumprimento da sentença não gera, como regra, a instauração de nova ação.

O inc. I do art. 475-N limita-se às sentenças condenatórias, ou seja, aquelas que contenham a imposição de uma obrigação de fazer, não fazer, entrega de coisa ou pagamento de quantia - conseqüente­mente, as sentenças constitutivas e as declaratórias.

A omissão legislativa não implica a conclusão de que tais senten­ças não seriam títulos hábeis a produzir efeitos práticos, mas apenas excluiu os provimentos declaratórios e constitutivos da necessidade da execução forçada como instrumento de produção de efeitos.

As sentenças declaratórias e constitutivas, por si só, põem fim ao conflito e produzem os efeitos práticos sem a necessidade de atos exe­cutórios em face da parte contrária.

Toda sentença é capaz de produzir efeitos. Toda sentença tem natureza de título - afinal, é isso que esperam as partes - , mas a forma como esses efeitos são gerados é que terá variação em relação ao con­teúdo do comando contido no título judicial. E mais: toda sentença oriunda de um processo cognitivo pode ser considerada como título, já que manifesta a existência ou inexistência de um direito ou relação jurídica em favor de uma das partes.

O que ocorre, na verdade, é que as sentenças declaratórias e cons­titutivas produzem seus efeitos práticos independentemente de atos executórios (em cumprimento de sentença), ao passo que nas senten­ças condenatórias, caso a parte devedora não promova o cumprimen­to voluntário, o credor deverá requerer do Estado-juiz a tomada de providências sancionatórias que levem o devedor ao cumprimento da obrigação constante do título.

Repita-se que as sentenças declaratórias e constitutivas produzem efeitos independentemente de atos executórios.

Por exemplo, uma sentença que declare a paternidade produz seus efeitos imediatamente, sem que o vencedor tenha de promover uma execução. Em outro caso, agora de sentença que decrete um divórcio ou conceda uma adoção (constitutivas, portanto), os efeitos práticos são imediatos, sem a necessidade da atuação da força coercitiva do Estado sobre a vontade da outra parte para fazer respeitar o comando do título.

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1 8 2 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

As sentenças constitutivas e declaratórias possuem uma execução imprópria, que é direta e imediata, já que independe da atuação do Esta­do sobre a vontade da parte contrária com um processo de execução for­çada. Quando falamos do exemplo da declaração de paternidade, é ne­cessário lembrar que o juiz, após a prolação e o trânsito da sentença, determina a expedição de mandado para a averbação da declaração no cartório de registro civil - isso, na verdade, é um ato que fará com que o conteúdo da declaração produza efeitos e se torne público, mas, repita- se, sem que haja uma atividade do Estado sobre a parte vencida para forçá-la ao cumprimento da obrigação.

As sentenças declaratórias e constitutivas possuem atos executivos impróprios, já que não representam a atuação do Estado sobre a von­tade da parte vencida para o adimplemento do título judicial.10

b) Sentença penal condenatória transitada em julgado

A sentença penal - observe-se que a lei exige o trânsito em julgado - representa título executivo no âmbito da jurisdição civil em relação ao dever do condenado de reparar a vítima do ato criminoso.

A condenação penal faz coisa julgada no âmbito civil acerca da res­ponsabilidade civil daquele que foi condenado.

O professor Carlos Alberto Carmona" lembra que a jurisdição é una e indivisível, sendo natural que o juízo civil reconheça o poder da sentença penal condenatória para gerar os efeitos de reparação pelos danos na esfera civil.

10 Em sentido contrário, o professor Humberto Theodoro Júnior (Curso de direito pro­cessual civil, v. II, p. 68) afirma que apenas as sentenças condenatórias possuem conteúdo a ser executado, sendo que as demais admitem apenas atos de publicidade. Cândido Rangel Dinamarco (Instituições de direito processual civil, v. IV, p. 46), afirma que as sentenças decla­ratórias e constitutivas são aptas a consumar os resultados estabelecidos pelo direito e dese­jados pelo vencedor, caracterizando uma execução em sentido lato, sendo denominados atos de execução imprópria, segundo doutrina de Liebman. Para o professor José Miguel Garcia Medina (Execução civil - teoria geral e princípios fundamentais, p. 32), as sentenças declara­tórias e constitutivas não geram a necessidade de o vencedor praticar atos materiais executi­vos para a realização da ordem jurídica, pois o direito afirmado terá sido tutelado com a ema­nação da sentença.

" Código de Processo Civil interpretado, p. 1.707.

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÃO 1 8 3

De fato, se o juízo criminal profere uma sentença condenatória e tal título transita em julgado, seria impossível que um juízo civil vies­se a fazer nova cognição acerca do fato. Se o juízo criminal reconheceu o fato típico e impôs a sanção, a questão da culpa (ou dolo) fez coisa julgada, sendo vedado ao juízo cível rediscutir tal responsabilidade.

Assim, podemos ter duas situações distintas:

a) a vítima (ou seus sucessores) aguarda a prolação da sentença penal condenatória e seu trânsito em julgado, para depois, de posse de tal título, promover a direta liquidação (art. 475-A) e a execução no juízo cível, buscando a reparação dos danos oriundos do fato criminoso, ou;

b) poderá promover, independentemente da ação penal, a ação civil de conhecimento para discutir a responsabilidade civil e obter a condenação na indenização. Nesse caso, o juiz da ação civil poderá suspender a ação para aguardar o julgamento na esfera penal, por se tratar de uma questão prejudicial externa (art. 265 do CPC);12

12 "Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Ação anulatória. Hipoteca legal. Fundamentos inatacados. 1. A alegação de que inexiste sentença penal com trânsito em jul­gado não afeta o posicionamento do aresto de que a responsabilidade civil independe da cri­minal em razão de não ter sido afastada, no Juízo Criminal, a materialidade do fato ou a autoria do crime. Esse fundamento permanece inatacado. 2. O Tribunal expôs as razões de seu convencimento, em decisão devidamente fundamentada. Como acima demonstrado, esclareceu o Tribunal que a decisão que fundamenta a hipoteca legal 'é por toda escorreita de vícios' e que 'com o trânsito em julgado da sentença que determinou a especialização da hipoteca e fixou o quantum a ser indenizado, tornou-se possível a execução, não havendoo que se falar em suspensão do processo a pretexto da verificação da existência de fato delituoso' (fl. 793). Firmou o Tribunal posicionamento no sentido de que a 'responsabilida­de civil é independente da criminal, só fazendo coisa julgada no cível a decisão criminal que haja reconhecido a inexistência material do fato ou negada a autoria do ato delituoso, o que no presente caso não ocorre' (fl. 793). De omissão ou negativa de prestação jurisdicio­nal, portanto, também não padece o acórdão recorrido. 3. Agravo regimental desprovido." (STJ, 3a T., Ag. Reg. no Ag. n. 552.632/GO, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j.18.03.2004, v.u.)

"Processual civil. Liquidação de sentença penal condenatória. Responsável civil pelos danos. Ilegitimidade de parte. Carência da ação. A sentença penal condenatória não consti­tui título executivo contra o responsável civil pelos danos decorrentes do ilícito, que não fez

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1 8 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

c) a sentença homologatória de conciliação ou transação ainda que inclua matéria não posta em juízo.

A conciliação é o acordo, formulado dentro do processo, para pôr fim ao conflito mediante concessões recíprocas das partes. A transação é um negócio jurídico civil em que as partes formulam pacto para pre­venir ou pôr fim ao conflito.

Ambos os institutos versam acerca do acordo para acabar com a pendenga. A transação, porém, é instituto do direito civil, formalizado fora do processo, mas que pode ser levado ao juiz para ser homologa­do e ganhar força de título judicial.

De qualquer forma, seja qual for a denominação - proferida a sen­tença de homologação de transação ou conciliação nos termos dos arts. 269, III, e 475-N, III, do Código de Processo Civil, tal ato repre­senta título executivo judicial.

A redação do inciso é expressa em afirmar que o acordo objeto do título poderá abranger inclusive matéria não posta em juízo. Portanto, o magistrado, quando da homologação, poderá dar força executiva à vontade das partes, mesmo que a matéria não seja litigiosa (incluída no pedido, causa de pedir ou defesa).

A homologação de um acordo ou transação apenas observará as regras gerais de validade do negócio jurídico e de competência jurisdi­cional, ou seja, sendo o objeto lícito, as partes capazes e legítimas, com a observância da forma legal e sendo o juiz competente, seu poder limita-se a ratificação da vontade das partes.

parte da relação jurídico-processual, podendo ser ajuizada contra ele ação, pelo processo de conhecimento, tendente à obtenção do título a ser executado. Recurso especial provido." (STJ, 3a T„ REsp n. 343.917/MA, rel. Min. Castro Filho, j. 16.10.2003, v.u.)

"Direito civil. Responsabilidade civil. Actio civilis ex delicto. Indenização por acidente de trânsito. Extinção do processo cível em razão da sentença criminal absolutória que não negou a autoria e a materialidade do fato. Art. 1.525 do CC. Arts. 65 A 67 do CPP. Recurso provi­do. I. Sentença criminal que, em face da insuficiência de prova da culpabilidade do réu, o absolve sem negar a autoria e a materialidade do fato, não implica a extinção da ação de indenização por ato ilícito, ajuizada contra a preponente do motorista absolvido. II. A absol­vição no crime, por ausência de culpa, não veda a actio civilis ex delicto. III. O que o art. 1.525 do Código Civil obsta é que se debata no juízo cível, para efeito de responsabilidade civil, a existência do fato e a sua autoria quando tais questões tiverem sido decididas no juízo crimi­nal." (STJ, 4*1 , REsp n. 257.827/SP, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 13.09.2000, v.u.)

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÀO 1 8 5

d) Sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça13

A sentença proferida por órgão de poder judiciário de outro Estado soberano poderá produzir efeitos e ser executada no Brasil, mas apenas depois de ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Assim, o detentor do título estrangeiro, antes de se valer dos atos executórios de cumprimento da sentença (art. 475-J do CPC), deverá obter a ratificação do Superior Tribunal de Justiça, que, nos termos do procedimento previsto no art. 483 do Código de Processo Civil e do Re­gimento Interno do Tribunal, negará a ordem de exequatur quando o julgado estrangeiro ferir a soberania brasileira, em contrariedade com nossa Constituição ou regras de reserva de competências (art. 89 do CPC e Lei de Introdução ao Código Civil).

Homologada a sentença estrangeira, seu cumprimento se dará no juízo federal (art. 109, X, da CF) do local em que a obrigação deva ser cumprida ou de domicílio do devedor.

e) O formal e certidão de partilha

O formal ou a certidão de partilha são documentos originários dos processos de inventário, reconhecendo o direito de cada sucessor ou herdeiro acerca dos bens partilhados.

Assim, contendo o formal ou a certidão a existência de uma obriga­ção, tal título poderá dar início a um procedimento de cumprimento de sentença (art. 475-J).

Ressalte-se que o formal e a certidão de partilha apenas são con­siderados títulos executivos em relação àqueles sujeitos que participa­ram da relação processual de conhecimento (da ação de inventário).

| Títulos extrajudiciais

O art. 585 do Código de Processo Civil,M em um rol que permite suplementação pela legislação extravagante, prevê os seguintes títulos extrajudiciais:

13 A competência para o Superior Tribunal de Justiça foi atribuída pela Emenda Consti­tucional n. 45/2004, já que antes tal atribuição era conferida ao Supremo Tribunal Federal.

14 Redação dada pela Lei n. 11.382/2006.

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1 8 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

a) Títulos de crédito

O título de crédito, na lição de Cesare Vivante,15 “é o documento necessário para o exercício de um direito literal e autônomo nele men­cionado”. Assim, o título - de natureza particular - guarda em si, segun­do a legislação específica de cada um, a força de autorizar que o credor promova diretamente a execução em face do devedor para a exigência do cumprimento da obrigação nele contida.

Os títulos cambiais geram uma certeza da existência da obrigação, dispensando, portanto, uma sentença condenatória advinda do pro­cesso de cognição. O título, por si só, faz prova literal da relação obri- gacional.

Ressalte-se que os requisitos e a natureza jurídica de cada título de crédito estão previstos em legislação própria, mas sempre os docu­mentos devem estar revestidos de certeza, liquidez e exigibilidade em relação à obrigação.

A letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque representam, entre outros, modalidade de título cambiário, hábil a ensejar uma ação de execução em face do devedor constante no título.

Letra de câmbio: representa uma ordem dada pelo sacador ao sacado para que este pague a um terceiro (tomador) a importân­cia prevista no título, regulada pela Lei Uniforme.16Nota promissória: é promessa de pagamento, na qual o devedor se obriga a pagar ao credor determinada importância em dinheiro. Portanto, a nota promissória é emitida pelo devedor, ficando o credor como o tomador e detentor do título.Duplicatas (Lei n. 5.474/68): as duplicatas têm origem em relação de compra e venda mercantil ou prestação de serviço. Assim, o títu­lo é sacado pelo credor contra o devedor, submetendo o documen­to para o aceite deste (o título é encaminhado ao devedor para que seja subscrito por ele).

15 Tratado di diritto comerciale, apud Carlos Alberto Carmona. In: Antonio Carlos Mor- cato, Código de Processo Civil interpretado, p. 1.716.

16 Decorrente da Convenção de Genebra, ratificada pelo Brasil em 28.08.1942.

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÂO 1 8 7

Mesmo que o devedor não venha a dar o seu aceite na duplicata, terá ela, no entanto, força executiva se estiver acompanhada do com­provante de entrega da mercadoria ou prestação do serviço, e ainda se houver sido lavrado o protesto da cártula.

Repita-se que, como regra, os títulos de crédito não necessitam do protesto para que possam instruir a execução, mas tal ato formal peran­te o serviço competente será necessário quando o devedor se recusar ou, simplesmente, não houver dado o aceite na duplicata, conforme estabelece o art. 15, II, da Lei n. 5474/68.17

A exigibilidade das duplicatas, pela via executória, contra o deve­dor ou seus avalistas deverá ser exercida no prazo de 3 anos, sob pena de prescrição (art. 18 ,1, da Lei n. 5.474/68).

• Cheque: o cheque é título que expressa uma ordem do devedor para que determinada instituição financeira faça o pagamento ao credor, ou seja, uma ordem ao banco (sacado) para o paga­mento à vista de quantia à disposição do devedor (art. 3o da Lei do Cheque).

Os cheques serão emitidos nos termos previstos na Lei n. 7.357/85, determinando o art. 33 da referida Lei que o credor deverá apresentar o cheque à instituição bancária no prazo de 30 dias da data de sua emissão ou em até 60 dias, caso seja emitido fora do local do pagamen­to. Por sua vez, o art. 59 determina que o prazo de prescrição da ação

v "Duplicata de prestação de serviços. Ausência de aceite. Execução. Precedentes da Corte. 1. A jurisprudência da Corte esta assentada no sentido de que a 'duplicata sem aceite, mas pro­testada e com prova da prestação de serviços, é documento hábil para instruir a execução' (REsp n. 427.440/T0, de minha relatoria, DJ 16.12.2002; Resp n. 327.720/SP, rel. Min. Sálvio de Figuei­redo Teixeira, DJ 18.02.2002; REsp n. I40.080/T0, de minha relatoria, DJ 26.10.98; REsp n. 4.492/AM, rel. Min. Cesar Rocha, DJ 14.04.97; REsp n. 115.767/MT, rel. Min. Nilson Naves, DJ 19.04.99). Por outro lado, o impedimento do protesto por ordem judicial não causa empecilho à qualidade executiva do título. (REsp n. 27.020/PR, rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ 07.02.94.) 2. Recurso especial conhecido e provido." (STJ, 3a T., REsp n. 599.597/PR, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 18.11.2004, v.u.)

Acerca de tal julgado, é também importante ressaltar que a jurisprudência tem se mani­festado no sentido de afirmar ser possível a execução da duplicata, sem aceite, quando o pro­testo houver sido sustado por ordem judicial. Assim, a mera sustação cautelar do protesto, segundo a jurisprudência do STJ, não impede a execução.

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1 8 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

executiva dos cheques será de 6 meses da data da expiração do prazo para a apresentação.18

Debênture: as debêntures são títulos emitidos por sociedades anônimas para a captação de recursos financeiros. Assim, a sociedade devedora emite os títulos ao público para receber empréstimo de quantias, comprometendo-se no resgate em prazo determinado.19

A Lei das Sociedades Anônimas (Lei n. 6.404/76, com redação alte­rada pela Lei n. 10.303/2001), em seus arts. 53 a 79, regula a sistemáti­ca para emissão das debêntures.

b) Escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor

A escritura pública é documento lavrado perante serventuário pú­blico (tabelião). O inc. II, do art. 585, no entanto, não trata apenas da escritura pública, mas de qualquer documento formalizado ou chan­celado perante autoridade do Estado e assinado pelo devedor que reco­nheça a existência de uma obrigação, de quantia, entrega de coisa, de fazer ou não fazer.20

18 "Recurso especial. Processual civil. Execução. Cheque. Prazo prescricional. Termo ini­cial. Dissídio jurisprudencial. Súmula n. 83/STJ. Recurso não conhecido. 1. Consoante enten­dimento desta Corte, o lapso prescricional previsto no art. 59 da Lei n. 7.357/85 (de 6 meses), somente tem início a partir da expiração do prazo para apresentação do cheque (de 30 dias), independentemente de o credor havê-lo feito em data anterior. Incidência da Súmula n. 83/STJ. 2. Recurso especial não conhecido." (STJ, 4a T., REsp. n. 274.633/SP, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 19.10.2006, v.u.)

Súmula n. 600 do STF: "Cabe ação executiva contra o emitente e seus avalistas, ainda que não apresentado o cheque ao sacado no prazo legal, desde que não prescrita a ação cambiária".

19 Amador Paes de Almeida, Teoria e prática dos títulos de crédito, p. 243.20 "Processual civil. Títulos executivos extrajudiciais. Documento público. Cálculos aritmé­

ticos. Liquidez do título. Precedentes desta Corte. De acordo com o disposto no art. 585, II, do CPC, consideram-se títulos executivos extrajudiciais: 'a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas tes­temunhas; o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores'. A melhor interpretação para a expressão docu­mento público é no sentido de que tal documento é aquele produzido por autoridade, ou em

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÃO 1 8 9

c) Documento particular assinado pelo devedor e por duas teste­munhas

O documento particular é aquele elaborado pelas partes e sem a intervenção do Estado.

Assim, qualquer escrito que esteja subscrito pelo devedor e por mais duas testemunhas, terá validade de título executivo, evidente­mente, preenchendo os requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade.21

Em relação às testemunhas, o Superior Tribunal de Justiça vem se manifestando no sentido de que elas não precisam estar presente no ato ou negócio firmado entre as partes, mas apenas lançar suas assina­turas para a satisfação da forma.22

Quanto à obrigação, como ocorre com os documentos públicos, não há restrição legal, podendo o título versar sobre quantia, entrega de coisa, fazer ou não fazer.

sua presença, com a respectiva chancela, desde que tenha competência para tanto. Destarte, o contrato de prestação de serviço firmado com a administração pública é documento público, hábil a embasar a competente ação de execução. Se o contrato juntado aos autos da ação exe­cutiva revela o valor e a forma de pagamento do serviço, corroborado por notas fiscais demons­trando sua realização, perde subsistência o argumento de incerteza e iliquidez do título. Con­soante precedentes jurisprudenciais desta Corte, a simples necessidade de realização de cálculos matemáticos para se chegar ao montante real da dívida não possui o condão de retirar a liqui­dez do título. Recurso Especial provido." (STJ, 1a I , REsp n. 487.913/MG, rel. Min. José Delga­do, j. 08.04.2003, v.u.).

21 "Direito e processo civil. Contrato de prestação de serviços hospitalares. Título execu­tivo. Necessidade de prova do cumprimento da obrigação, pelo credor. Precedentes do tribu­nal. Monitoria. Via hábil à pretensão. Emenda da inicial ensejada. Recurso desacolhido. I. Por expressa dicção legal, considera-se título executivo extrajudicial o contrato particular, subscri­to por duas testemunhas. Todavia, para tornar-se hábil a instruir o processo de execução, é necessário que ele represente obrigação líquida, certa e exigível, nos termos do art. 586 do Código de Processo Civil. II. Nos casos de contrato bilateral, incumbe ao credor provar o cum­primento de sua obrigação (art. 615, IV, CPC), a fim de tornar o instrumento hábil a instruiro processo de execução como título executivo extrajudicial. III. Dependendo a apuração do valor da execução, que sejam verificados fatos posteriores à emissão do contrato, como o tempo da internação, o material utilizado ou a natureza e a complexidade dos serviços médi­cos e de enfermagem, carece o documento do requisito da certeza, tornando adequada a via da monitória." (STJ, 4â T., REsp n. 252.013/RS, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 29.06.2000, v.u.)

22 Nesse sentido: STJ, REsp n. 541.267/RJ.

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1 9 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

d) Instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores

O Ministério Público, dentre suas atribuições, tem o poder de reali­zar transação na esfera civil, em especial para assinar em conjunto com a parte interessada o denominado termo ou compromisso de ajustamen­to de conduta, nos termos do art. 5o, § 6o, da Lei da Ação Civil Pública.

Em exemplo na área do direito ambiental, podemos citar o acordo celebrado entre o Ministério Público e uma determinada empresa, no sentido de esta se obrigar ao reflorestamento de determinada área, sob pena de multa. Assim, caso o devedor não satisfaça a obrigação contida no compromisso de ajustamento de conduta, o Ministério Público promo­verá a execução de um título extrajudicial. Tal compromisso depende ape­nas da assinatura do representante do Ministério Público e do devedor.

Além disso, também representa título executivo extrajudicial qual­quer outro acordo que venha a ser assinado pelas partes e com a subs­crição do Ministério Público, da Defensoria Pública ou pelos advoga­dos das partes - nesse caso, sendo também dispensada a presença de testemunhas.

e) Contratos garantidos por hipoteca, penhor, anticrese e caução, bem como os de seguro de vida

Os contratos mencionados no inc. III do art. 585 do Código de Pro­cesso Civil, são relativos aos instrumentos de garantia, reais ou pessoais.23

f) Crédito decorrente de foro e laudêmio

O foro e o laudêmio decorrem da enfiteuse, nos termos do art. 678 do Código Civil de 1916,24 caracterizando verdadeira renda imobiliá­ria pela cessão do uso da coisa.

g) Crédito comprovado por documentos de obrigação decorren­te de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, co­mo taxas e despesas de condomínio

23 Humberto Theodoro Júnior, Curso de direito processual civil, v. II, p. 210.24 Referência prevista no art. 2.038 do Código Civil de 2002.

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÃO 1 9 1

O contrato de locação é título executivo que autoriza o locador a promover execução contra o locatário e seus garantidores (fiadores)23 para o cumprimento das obrigações de quantia decorrente do referi­do contrato, como a cobrança dos aluguéis, multas,26 taxas diversas e despesas condominiais,27 com a existência de prova escrita.28

A execução, no entanto, apenas poderá ocorrer diretamente se houver prova documental da locação e de seus encargos, para a co­brança de quantias certas, líquidas e exigíveis, sob pena de ter o loca­dor que se submeter à ação comum de conhecimento para a obtenção prévia do título judicial.

Além disso, a execução não se presta para a obtenção de obrigação de fazer, como para a desocupação do imóvel após findo o prazo da locação, já que, para isso, existe a ação própria de despejo, nos termos do art. 59 da Lei n. 8.245/91.

25 "Execução de título extrajudicial. Contrato de locação prorrogado. Ausência de anuência do fiador. Aplicação da Súmula n. 214. 1 .0 fiador somente responde por adita­mento de contrato ao qual anuiu, é o que diz a Súmula 214 ('0 fiador na locação não res­ponde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu.'). 2. Na espécie, o adi­tamento com o qual o fiador concordou ratificava o prazo para o fim da locação (9.7.93), logo o afiançador não é responsável pelas parcelas atrasadas relativas a período bem poste­rior ao termo final do contrato (jan/97 a mai/98). 3. Agravo regimental improvido." (STJ, 6a T., Ag. Reg. nos EDcl no REsp n. 727.432/SP, rel. Ministro Nilson Naves, j. 24.10.2006, DJ 20.11.2006, p. 367)

26 "Recurso especial. Locação. Execução extrajudicial. Multa por descumprimento do contrato. Impossibilidade. 1. A multa que se pode admitir como inserta no art. 585 do Códi­go de Processo Civil será apenas a referente ao aluguel do imóvel, assim mesmo, se devida e certa, à luz do contrato. 2. Recurso conhecido e improvido." (STJ, 6a T., REsp n. 302.486/RJ, rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 18.12.2002, v.u.)

27 "Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Despesas de condomínio. Execu­ção. 1. Constituindo as atas de assembléias e as convenções condominiais títulos executivos extrajudiciais, cabível é a via executiva e não o ajuizamento de ação monitória. 2. Agravo regi­mental improvido." (STJ, 3a T., Ag. Reg. no Ag. n. 216.816/DF, rel. Min. Carlos Alberto Mene­zes Direito, j. 20.04.1999, v.u.)

28 "Recurso especial. Contrato de locação. Título executivo extrajudicial. Desnecessida­de de vir acompanhado pela assinatura de duas testemunhas (art. 585, II, CPC), bastando que seja subscrito pelos próprios contratantes. Recurso conhecido e provido para ter continuida­de a execução." (STJ, 5a I , Resp n. 578.355/BA, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j.28.09.2004, v.u.)

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192 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

h) Crédito dos serventuários do Poder Judiciário, do perito, do in­térprete, ou do tradutor, quando as custas, emolumentos ou honorários forem aprovados por decisão judicial

Nesse ponto, uma crítica deve ser feita à classificação efetuada pelo legislador, já que, apesar de constar no rol do art. 585 do Código de Pro­cesso Civil, ou seja, como título extrajudicial, os créditos dos serventuá­rios da justiça deveriam estar enquadrados dentre os títulos judiciais (isso no art. 475-N), uma vez que são produzidos no âmbito do Poder Judiciário e extraídos de um processo.

Como sabemos, os custos dos atos processuais são de incumbên­cia das partes e, em nosso sistema, as despesas são adiantadas por uma parte; ao final, a parte vencida fará o reembolso daquilo que a vence­dora adiantou, nos termos do art. 20 do Código de Processo Civil.

Nesses termos, a decisão do magistrado que fixa os honorários de peritos, dos intérpretes ou tradutores autoriza que o credor extraia a certidão dos autos e promova ação de execução fundada em título extrajudicial para a satisfação do valor aprovado na referida decisão.

Em relação às custas processuais devidas ao Poder Judiciário, não há que se falar na aplicação de tal dispositivo, já que representam débi­tos que podem ser inscritos na dívida ativa do respectivo entre públi­co e executados na forma de execução fiscal.

i) Certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos esta­dos, do Distrito Federal, dos territórios e dos municípios, cor­respondente aos créditos inscritos na forma da lei

As pessoas jurídicas de direito público, por expressa determinação legal, estão autorizadas à emissão de certidão de dívida ativa em rela­ção aos créditos tributários ou outros valores devidos ao erário. Toda a receita inadimplida em favor da Fazenda Pública (da União, dos es­tados, do Distrito Federal, municípios, autarquias e fundações públi­cas) será inscrita na dívida ativa e terá a execução instruída com uma certidão expedida pela autoridade competente (da procuradoria do respectivo órgão).

O tema foi disciplinado pela Lei n. 6.830/80, que, além de dar os requisitos para a certidão da dívida ativa, também regula o processo de execução fiscal.

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÂO 1 9 3

j) Todos os demais títulos a que a lei conferir força executiva

Como se vê, o inc. VIII do art. 585 do Código de Processo Civil admite que a legislação extravagante venha a dar força executiva a ou­tros documentos além daqueles anteriormente citados.

A própria Constituição, em seu art. 71, § 3o, dá força executiva à decisão do Tribunal de Contas da União que resulta em imputação de débito ou multa.

O Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil tam ­bém prevê força executiva para dois documentos:

o contrato de honorários advocatícios (art. 24 do EAOAB);29 a certidão expedida pelo Conselho Seccional da OAB em relação a débitos de seus inscritos (como contribuições, multas ou preços de serviços fixados pela própria OAB nos termos de seus regimentos e Estatuto - art. 46, parágrafo único, do EAOAB).

Outro título previsto fora do Código de Processo Civil é a cédula de crédito bancário, regulado pela Lei n. 10.931/2004, que autoriza a formação de um título decorrente de contrato de abertura de crédito firmado pelas instituições financeiras.30

29 A jurisprudência do STJ tem se posicionado no sentido de que o contrato de honorá­rios advocatícios não depende da assinatura de duas testemunhas para que tenha força exe­cutiva, nestes termos: "Honorários de advogado. Contrato. Título executivo. Lei n. 8.906/94. 1. O art. 24 da Lei n. 8.906/94 não exige a assinatura de duas testemunhas para que o con­trato de honorários seja considerado título executivo. 2. Recurso especial não conhecido." (REsp n. 226.998/DF, 3a T„ rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 03.12.1999, v.u.)

30 "Art. 26. A Cédula de Crédito Bancário é título de crédito emitido, por pessoa física ou jurídica, em favor de instituição financeira ou de entidade a esta equiparada, representan­do promessa de pagamento em dinheiro, decorrente de operação de crédito, de qualquer modalidade.

§ 1a A instituição credora deve integrar o Sistema Financeiro Nacional, sendo admitida a emissão da Cédula de Crédito Bancário em favor de instituição domiciliada no exterior, desde que a obrigação esteja sujeita exclusivamente à lei e ao foro brasileiros.

(...)Art. 28. A Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial e representa dívi­

da em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo deve­dor demonstrado em planilha de cálculo, ou nos extratos da conta corrente, elaborados con­forme previsto no § 2°.

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1 9 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

A referida lei foi editada justamente para dar força executiva aos documentos oriundos do contrato de abertura de crédito, uma vez que a Súmula n. 233 do Superior Tribunal de Justiça havia pacificado o entendimento no sentido de que o mero contrato não tinha força de

§ 1o Na Cédula de Crédito Bancário poderão ser pactuados:I - os juros sobre a dívida, capitalizados ou não, os critérios de sua incidência e, se for o

caso, a periodicidade de sua capitalização, bem como as despesas e os demais encargos decorrentes da obrigação;

II - os critérios de atualização monetária ou de variação cambial como permitido em lei;III - os casos de ocorrência de mora e de incidência das multas e penalidades contra­

tuais, bem como as hipóteses de vencimento antecipado da dívida;IV - os critérios de apuração e de ressarcimento, pelo emitente ou por terceiro garanti-

dor, das despesas de cobrança da dívida e dos honorários advocatícios, judiciais ou extrajudi­ciais, sendo que os honorários advocatícios extrajudiciais não poderão superar o limite de dez por cento do valor total devido;

V - quando for o caso, a modalidade de garantia da dívida, sua extensão e as hipóteses de substituição de tal garantia;

VI - as obrigações a serem cumpridas pelo credor;VII - a obrigação do credor de emitir extratos da conta corrente ou planilhas de cálculo

da dívida, ou de seu saldo devedor, de acordo com os critérios estabelecidos na própria Cédu­la de Crédito Bancário, observado o disposto no § 2G; e

VIII - outras condições de concessão do crédito, suas garantias ou liquidação, obriga­ções adicionais do emitente ou do terceiro garantidor da obrigação, desde que não contra­riem as disposições desta Lei.

§ 2o Sempre que necessário, a apuração do valor exato da obrigação, ou de seu saldo devedor, representado pela Cédula de Crédito Bancário, será feita pelo credor, por meio de planilha de cálculo e, quando for o caso, de extrato emitido pela instituição financeira, em favor da qual a Cédula de Crédito Bancário foi originalmente emitida, documentos esses que integrarão a Cédula, observado que:

I - os cálculos realizados deverão evidenciar de modo claro, preciso e de fácil entendimen­to e compreensão, o valor principal da dívida, seus encargos e despesas contratuais devidos, a parcela de juros e os critérios de sua incidência, a parcela de atualização monetária ou cambial, a parcela correspondente a multas e demais penalidades contratuais, as despesas de cobrança e de honorários advocatícios devidos até a data do cálculo e, por fim, o valor total da dívida; e

II - a Cédula de Crédito Bancário representativa de dívida oriunda de contrato de aber­tura de crédito bancário em conta corrente será emitida pelo valor total do crédito posto à disposição do emitente, competindo ao credor, nos termos deste parágrafo, discriminar nos extratos da conta corrente ou nas planilhas de cálculo, que serão anexados à Cédula, as par­celas utilizadas do crédito aberto, os aumentos do limite do crédito inicialmente concedido, as eventuais amortizações da dívida e a incidência dos encargos nos vários períodos de utili­zação do crédito aberto.

§ 3o O credor que, em ação judicial, cobrar o valor do crédito exeqüendo em desacor­do com o expresso na Cédula de Crédito Bancário, fica obrigado a pagar ao devedor o dobro do cobrado a maior, que poderá ser compensado na própria ação, sem prejuízo da respon­sabilidade por perdas e danos."

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÂO 1 9 5

título executivo por falta de liquidez. Assim, a cédula de crédito bancá­rio autorizaria a promoção direta da execução com base em título exe­cutivo extrajudicial.

Nesse sentido, os professores Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery comentam que tal lei instituidora da cédula de crédito bancário padece de inconstitucionalidade por ferir os princípios cons­titucionais do devido processo legal, da proporcionalidade e da razoa- bilidade, ao passo que autoriza a instituição bancária a instruir o títu­lo com um extrato de conta produzido unilateralmente, continuando o título com a falta de liquidez.31

Ressalte-se que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, mesmo após o advento da referida lei, manteve o entendimento de que apenas o contrato de abertura de crédito (como ocorre com os contra­tos de cheque especial ou cartões de crédito), mesmo que acompanhado do extrato expedido pelo credor, não é título hábil para instruir a ação de execução, dada a falta de liquidez.32

k) Títulos extrajudiciais estrangeiros

O § 2° do art. 585 do Código de Processo Civil admite que os títu­los extrajudiciais advindos do estrangeiro possam ser executados peran­te a jurisdição brasileira, isso independentemente de qualquer homolo­gação pelo Superior Tribunal de Justiça, como se faz com os títulos judiciais proferidos por magistrados de outros Estados soberanos.

O título estrangeiro poderá ser executado no Brasil quando:

a) satisfizer os requisitos de formação exigidos pela legislação do local (país) em que foi celebrado; e

31 Código de Processo Civil comentado, p. 1068.32 "Processo civil. Recurso especial. Agravo regimental. Contrato bancário. Execução.

Abertura de crédito em conta corrente. Título executivo extrajudicial. Inexistência. Súmula n. 233/STJ. Nota promissória. Ausência de autonomia. Súmula n. 258/STJ. Desprovimento. 1. O contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado do demonstrativo do débito, não constitui título executivo extrajudicial, porquanto carece da liquidez característica dos títulos de crédito (Súmula n. 233 do STJ). Precedentes. 2. A nota promissória vinculada a contrato de abertura de crédito perde sua autonomia, em face da própria iliquidez do título que a ori­ginou (Súmula n. 258 do STJ). Precedente. 3. Agravo regimental desprovido." (STJ, Ag. Reg. no REsp n. 839.378/RJ, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 24.10.2006, v.u.)

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b) indicar o Brasil como local de cumprimento da obrigação.

Note-se que os dois requisitos são cumulativos para permitir a execução de título extrajudicial de origem estrangeira; além disso, como observância do preceito geral do art. 157, a cártula deverá estar acompanhada da tradução juramentada.33

10.2 INADIMPLEMENTO

No tópico anterior tratamos dos títulos executivos como elemen­to objetivo e requisito indispensável à propositura de uma execução ou um pedido de cumprimento de sentença; no entanto, não basta a exis­tência do título: deverá haver também o inadimplemento da obrigação para dar o interesse de agir capaz de movimentar a máquina judiciária para a prática de atos coercitivos sobre a vontade do devedor.

A esse respeito, Humberto Theodoro Júnior, ensina:34 “Não é sufi­ciente, outrossim, nem a situação de um crédito documentalmente provado, nem a situação de uma obrigação descumprida. Só a con­junção dos dois requisitos acima é que torna viável o manejo do pro­cesso de execução, ou o desenvolvimento dos atos do cumprimento da sentença.”

Portanto, podemos estabelecer que são requisitos objetivos para a execução ou o cumprimento da sentença a existência de título - líqui­do, certo e exigível - inadimplido para parte devedora, nos termos do art. 580 do Código de Processo Civil.

O devedor é inadimplente quando não satisfaz voluntariamente a obrigação exigível. O inadimplemento é pressuposto de início e desen­volvimento da execução. E mais: a inexistência de inadimplemento

33 "Processo civil. Execução. Exceção de pré-executividade. Cártula em língua estrangei­ra. Falta de tradução juramentada. Saneamento. Abertura de prazo. CPC, art. 616 .1. Em vista da instrumentalidade das formas, cumpre ao juiz abrir prazo para sanar a falta de tradução juramentada que deveria acompanhar o título apresentado à execução. Ofensa ao art. 616 do CPC caracterizada. II. Recurso especial conhecido e provido." (STJ, 3a T., REsp n. 291.099/PR, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, rel. p/acórdão Min. Antônio de Pádua Ribeiro, j. 27.11.2001, v.m.)

34 Curso de direito processual civil, v. II, p.150.

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÀO 197

gera falta de interesse em agir, levando o pleito do credor à extinção por carência de ação.

Em relação ao inadimplemento, outra questão que assume relevo versa acerca das obrigações bilaterais, nas quais uma parte apenas pode­rá exigir o cumprimento da obrigação quando demonstrar ter satisfei­ta a contraprestação.

No direito civil, tal regra é conhecida como a exceção do contrato não cumprido (exceptio non adimpleti contractus), nos termos do art. 476 do Código Civil.

Nesse caso, o art. 582 do Código de Processo Civil, confirmando o referido preceito do direito material, determina que não se processará a execução nas hipóteses em que for vedado ao credor exigir o cumpri­mento da obrigação pelo devedor, sem antes ter realizado a sua contra­prestação no pacto.

O art. 615, IV, determina ser dever do credor instruir a petição ini­cial da execução com a prova de sua contraprestação, nos casos dos contratos bilaterais.

De qualquer modo, o Código autoriza que o devedor - mesmo sem que o credor tenha cumprido a contraprestação - satisfaça a obri­gação que lhe cabe no título, para, depois, compelir o credor a também cumprir o previsto na avença. Se o devedor depositar em juízo sua obrigação, como meio de obter sua desoneração, o juiz apenas autori­zará que o credor receba a coisa após a comprovação do cumprimen­to da contraprestação.

1 0 . 3 A s P a r t e s do P r o c e s s o de E x e c u ç ã o

Neste capítulo, o objeto de estudo são os elementos subjetivos do processo de execução, já que em toda relação processual é de relevan­te importância a análise dos sujeitos que figuram nos pólos da ação.

No processo de execução, as partes são denominadas exeqüente e executada, respectivamente, representando o credor que promove a petição inicial e o devedor que é citado para o cumprimento da obri­gação expressa no título executivo.

O art. 566 do Código de Processo Civil determina que podem pro­mover a execução:

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1 9 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

a) O credor detentor de título executivo. Evidentemente, a pessoa que consta como credora no título executivo, nos termos da lei, tem legitimidade para propor a ação de execução.

b) O Ministério Público, nos casos previstos em lei. Como já tratamos anteriormente, na ação civil pública e na ação popular, atuando o Ministério Público como autor, ou quando for fiscal da lei e a outra parte permanecer inerte, terá ele o dever de promover o cumpri­mento da sentença condenatória proferida naqueles processos.

O Ministério Público também poderá promover o cumprimento de sentenças que imponham multas penais (art. 68 do CPP).

O compromisso de ajustamento de conduta, como já tratamos entre os títulos executivos, também autoriza o Ministério Público a prom o­ver a ação de execução para a satisfação da obrigação assumida pela outra parte.

Além dos legitimados do dispositivo anteriormente citado, o art. 567 também dá legitimidade aos sucessores do credor, que podem, nos seguintes casos, promover a ação ou nela prosseguir:

a) Sucessores do credor falecido. A morte do credor gera a trans­ferência de seu patrimônio para seus sucessores; portanto, nes­se caso, poderá o espólio (por seu representante - o inventa- riante), os herdeiros (legítimos ou testamentários) ou qualquer outro titular de direito na herança promover a execução do crédito em nome do falecido.

Na verdade, trata-se apenas de substituição da titularidade do cré­dito por causa mortis.

b) Cessionário. O cessionário é a pessoa que adquire o crédito do credor. Assim, trata-se de verdadeira substituição da titularida­de do crédito em decorrência de ato inter vivos.

Ressalte-se que, nesse caso, também é facultado ao cessionário não somente o direito de propor a execução, mas também o de ingressar

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÀO 1 9 9

nela quando ela já estiver em curso, independentemente da anuência do credor exeqüente.35

c) Sub-rogado. O sujeito que paga a dívida no lugar de outrem se sub-roga no direito de ser ressarcido pelo devedor, isso em decorrência de pacto entre as partes (sub-rogação convencio­nal) ou por determinação da lei (sub-rogação legal).

Vamos imaginar que o fiador seja executado diretamente pelo credor a pagar determinada dívida. Nesse caso, vindo o fiador a satisfazer o crédito em relação ao exeqüente, se torna ele credor em relação ao devedor, ou seja, se sub-rogou no crédito, podendo pros­seguir na execução agora como credor exeqüente contra o devedor originário.36

Por outro lado, há que perquirir qual será o sujeito passivo na exe­cução. A esse respeito, o art. 568 estabelece que podem figurar como executados:

a) O devedor constante do título.

35 "Processual civil. Agravo regimental no recurso especial. Cessão de créditos. Habilita­ção do cessionário no pólo ativo da execução. Art. 42, § 1o, do CPC. Consentimento da parte contrária. Inaplicabilidade. 1. Existindo norma específica no processo executivo, não se apli­cam subsidiariamente as normas do processo de conhecimento. 2. A teor do art. 567, II, do CPC, é garantido ao cessionário o direito de promover a execução, ou nela prosseguir, quan­do o direito resultante do título executivo lhe foi transferido por ato entre vivos, não se exi­gindo o prévio consentimento da parte contrária, a que se refere o art. 42, § 1o, do mesmo Código. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido." (STJ, 1a I , Ag. Reg. no REsp n. 542.430/RS, rel. Min. Denise Arruda, j. 20.04.2006, v.u.). No mesmo sentido acórdão de rela- toria da Min. Eliana Calmon, no REsp n. 687.761.

36 "Locação. Fiador que paga a dívida ao locador. Sub-rogação legal. Execução contra o locatário-afiançado. Bem de família. Penhora. Impossibilidade legal. 1. A impenhorabilidade do bem de família é regra, somente cabendo as exceções legalmente previstas. Nos termos da Lei n. 8.009/90, art. 3o, VII (incluído pela Lei n. 8.245/91, art. 82), é possível a penhora do bem de família como garantia de obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação. 2. O fiador que paga integralmente a dívida à qual se obrigou fica sub-rogado nos direitos e garantias do locador-credor. Entretanto, não há como estender-lhe o privilégio da penhorabilidade do bem de família em relação ao locatário-afiançado, taxativamente previs­to no dispositivo mencionado, visto que nem mesmo o locador o dispunha. 3. Recurso conhe­cido e provido." (STJ, 5a I , REsp n. 255.663/SP, rel. Min. Edson Vidigal, j. 29.06.2000.)

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2 0 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

b) O sucessor do devedor. Trata-se de hipótese de falecimento do devedor, situação em que a ação de execução será proposta ou prosseguirá com seu espólio, herdeiros ou demais sucessores. Evidentemente, esses substitutos do devedor apenas responde­rão até o limite da herança.

c) O novo devedor que tenha assumido a dívida no lugar do deve­dor originário, com a anuência do credor. Trata-se aqui se uma novação subjetiva passiva.37

d) O fiador judicial. Em diversos procedimentos - na maioria, co­mo ocorre na ação cautelar - o magistrado poderá exigir da par­te a prestação de uma caução. Essas garantias, por determinação legal, podem ser reais (com o oferecimento de coisas ou dinhei­ro) ou fidejussórias (com a apresentação de um fiador idôneo).

Assim, o oferecimento de caução fidejussória em processos gera um fiador judicial, aquele que, em juízo, se coloca como garantidor da dívida de outrem. Portanto, caso o devedor não pague a dívida, o fia­dor judicial poderá ser executado pelo credor.

O inc. IV do art. 568 do Código de Processo Civil apenas fez referên­cia ao fiador judicial, não incluindo o fiador decorrente de contrato. Na verdade, nem mesmo essa previsão seria necessária, já que ambos - seja judicial ou contratual - assumem a posição de devedor e, conseqüente­mente, estão previstos no inc. I do referido artigo (como devedores).

e) O responsável tributário, nos termos da legislação própria. O responsável tributário não é o devedor, mas pessoa incumbida de realizar o pagamento por expressa determinação legal. Assim, caso o pagamento não seja cumprido, o credor poderá executar diretamente o responsável tributário.

Como é do conhecimento geral, alguns tributos são retidos direta­mente na fonte de recebimento. Nesses casos, a lei específica poderá impor a um terceiro o dever de retenção do tributo e repasse ao erário;

37 Nelson Nery Júnior & Rosa Maria de Andrade Nery, Código de Processo Civil comen­tado, p. 1.054.

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÃO 2 0 1

esse terceiro assume a posição de responsável tributário e pode até ter de suportar a execução (art. 128 do Código Tributário Nacional).38

10.4 Co m p e t ê n c i a p a r a a Ex e c u ç ã o

O órgão jurisdicional - o Estado-juiz como já tratamos no volumeI deste Manual, é elemento subjetivo que integra a relação jurídica pro­cessual. O juiz é sujeito do processo, mas não é parte (não tem interesse).

A execução se dá por atividade jurisdicional, com a observância da máxima do devido processo legal e do respeito ao juízo natural, razão pela qual também existem regras de delimitação de competência para a promoção da execução forçada.

Evidentemente, a competência para a prática da execução (ou cum­primento de sentença) se dará em razão da natureza do título a ser satisfeito.

m 10 .4 .1 C o m p e t ê n c i a p a r a a A ç ã o

d e E x e c u ç ã o d e t í t u l o e x t r a j u d i c i a l

A competência para a propositura de ação de execução fundada em título extrajudicial observará a regra geral prevista no Livro I, títu­lo IV, capítulos II e III, que estabelecem as da teoria geral do processo.

Dessa forma, nos termos do art. 100, IV, d, do Código de Processo Civil, para a exigência de obrigações, determina o dispositivo que a ação deve ser proposta no local (foro) onde a obrigação deve ser satisfeita.

Portanto, se o título contiver o local de cumprimento da obriga­ção, é lá que a ação executiva deve ser proposta, independentemente do domicílio ou sede das partes, salvo se as próprias partes houverem de­signado foro de eleição no título.

Por outro lado, não prevendo o título o local de cumprimento da obrigação ou foro de eleição, aí sim será aplicada a regra geral do art. 94, ou seja, no domicílio do devedor executado.

38 "Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste Capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gera­dor da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação."

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202 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Assim, podemos concluir pela seguinte ordem de competência ter­ritorial para a propositura da ação de execução: 1) foro de eleição designado pelas partes no título; 2) local de cumprimento da obriga­ção; 3) local de domicílio do devedor executado.39

■■ 10.4 .2 COMPETÊNCIA PARA O

CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS

Devemos lembrar que a reforma introduzida pela Lei n. 11.232/2005 retirou a autonomia de ação da execução de títulos judiciais; no entanto, mesmo se tratando de uma fase processual, é necessária a existência de regras de fixação da competência para o cumprimento desses títulos.

O cumprimento da sentença - cujo rol de títulos consta do art. 475-N do CPC - observará (475-P):

ORIGEM DO TÍTULO JUDICIALCOMPETÊNCIA PARA O CUMPRIMENTO

(EXECUÇÃO)

Sentenças ou acórdão (processo originário da primeira instância)

O cumprimento se dará no juízo de primeira instância em

que o processo teve início

Acórdãos proferidos em competência originária do tribunal

O cumprimento se dará no tribunal cuja competência foi originária

Sentença estrangeira

Após a homologação pelo STJ, a sentença estrangeira será executada pelo Juízo Federal

(art. 109 da CF) do local de cumprimento

da obrigação ou, na falta deste, no local do domicílio do devedor

Sentença arbitrai Sentença penal condenatória

Será observada a regra geral de competência fixada também

para os títulos extrajudiciais

39 Nesse sentido: STJ, Conflito de Competência n. 4.404-1, j. 25.08.1993.

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ELEMENTOS DO PROCESSO DE EXECUCÃO 2 0 3

Como vimos no quadro, o juízo (e o foro) que atuou no processo na fase de conhecimento, até a prolação da sentença, é que tem com­petência para executar ou fazer cumprir o título que proferiu. Portan­to, se a ação de conhecimento (rito ordinário, sumário ou especial) tivesse início em determinado foro, lá também se daria a execução.

As regras, contudo, m udam e a reforma introduzida pela Lei n. 11.232/2005 passou a permitir a modificação da competência para o cumprimento da sentença quando o devedor houver mudado de do­micílio ou sede durante o curso da ação, ou quando os bens sujeitos aos atos expropriatórios estiverem em outra localidade.

Nesses dois casos, caberá ao credor requerer ao juízo em que se encontra o processo que remeta os autos para o cumprimento da sen­tença em outra localidade (foro), dando certa relatividade à competên­cia para o cumprimento das sentenças.

Vamos a um exemplo: uma ação de cobrança foi proposta no foro da capital de São Paulo. No entanto, durante a ação, o réu passou a residir em Fortaleza/CE, ou seus bens estão localizados em Natal/RN. Proferida a sentença, o credor poderá requerer ao juízo de São Paulo, que seria o competente para o cumprimento da sentença, que remeta os autos para Fortaleza ou Natal, dependendo de sua conveniência.

Na verdade, a possibilidade de modificação da competência du­rante a fase do cumprimento da sentença foi introduzida no ordena­mento processual civil com a finalidade de maior eficiência e celerida­de da satisfação do crédito, já que, com a transferência dos autos para o local do novo domicílio do devedor ou do local em que se encontram seus bens, serão dispensadas as expedições de cartas precatórias para a prática dos atos processuais.

Tal permissão de modificação da competência encontra-se previs­ta no parágrafo único do art. 475-P do Código de Processo Civil.

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R e s p o n s a b i l i d a d e

P a t r i m o n i a l 11

Ao tratarmos dos princípios da execução, chegamos a afir­mar que toda execução é real ou, ainda, que vige a regra da res­ponsabilidade patrimonial do devedor.

De fato, o art. 591 do Código de Processo Civil determi­na que o devedor responde pelo cumprimento da obrigação com todos seus bens, sejam eles presentes ou futuros, excluin­do apenas aqueles previstos em lei como impenhoráveis.

A regra da responsabilidade patrimonial, a princípio, se aplica basicamente às obrigações de quantia em que, não sa­tisfeita voluntariamente a obrigação constante do título, o credor movimenta a máquina judiciária para que, em subs­tituição à vontade do devedor, faça a expropriação de seus bens e, após, os transforme em dinheiro.

Nas obrigações de fazer, não-fazer ou entrega de coisa, a responsabilidade também ocorrerá, muitas vezes, quando a obrigação específica for convertida em quantia ou quan­do o credor tiver o direito de buscar a coisa demandada das mãos do devedor ou de terceiros (entrega de coisa).

Portanto, a princípio são os bens do devedor que garan­tirão a execução.

2 0 5

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2 0 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

O art. 592 do Código de Processo Civil estipula, todavia, hipóteses em que a responsabilidade patrimonial extrapola a pessoa do devedor e é transferida também a um terceiro. Além dos bens do devedor, ficam sujeitos à execução:

a) Do sucessor a título singular, tratando-se de obrigação funda­da em direito real ou reipersecutória1

As ações reais - cujo direito é da pessoa sobre a coisa - garantem ao titular do bem demandado o direito de buscar e retirar a coisa da mão de quem esteja (devedor ou terceiro).

Portanto, se a coisa litigiosa foi transferida a terceiro, terá o credor exeqüente o direito de reivindicar tal bem diretamente no patrimônio daquele sucessor. A partir do momento em que o devedor foi citado, pela regra do art. 219 do Código de Processo Civil, a coisa é tida como litigiosa e, conseqüentemente, sua alienação não produz efeito peran­te o credor.

O sucessor, ou seja, aquele que adquiriu a coisa litigiosa, também terá responsabilidade patrimonial na execução, já que o bem poderá ser perseguido pelo credor.

A inovação que a reforma deu ao referido inciso é no sentido de admitir a responsabilidade patrimonial do terceiro, seja qual for a modalidade de título executivo (judicial ou extrajudicial). Na redação anterior, o Código apenas se referia às sentenças, mas agora permite que o sucessor responda pela execução caso exista direito real do cre­dor sobre o bem objeto da obrigação.

b) Do sócio, nos termos da lei

A legislação civil e a empresarial tratam da responsabilidade dos sócios em relação aos débitos da empresa. Assim, os bens do sócio po­derão ser expropriados para quitação de débito da empresa quando houver responsabilidade solidária ou subsidiária daquele, dependen­do, portanto, da natureza de cada espécie de sociedade ou empresa.

' Redação dada pela Lei n. 11.382/2006.

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RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL 207

O art. 596 do Código de Processo Civil expressa que, como regra, os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da empre­sa, salvo nos casos previstos na legislação própria. E, caso tal responsa­bilidade exista de forma subsidiária, poderá o sócio invocar o benefício de ordem, ou seja, que primeiro sejam expropriados os bens da socie­dade para que, depois de esgotados, sejam atingidos seus bens próprios.

Nesse ponto, porém, assume importância tratarmos da desconside­ração da personalidade jurídica, situação em que o magistrado fará atos constritivos sobre o patrimônio dos sócios para quitação de dívida as­sumida pela empresa.

Como regra, nas sociedades limitadas (sociedade anônima ou sociedade limitada), os sócios respondem apenas no limite do capital social.

Havendo violação à lei ou excesso dos poderes previstos no estatu­to ou contrato social, o sócio, todavia, poderá responder com seus bens privados para o saldo das obrigações da empresa (por exemplo, a con­fusão entre o patrimônio da pessoa jurídica e da pessoa física,2 o encer­ramento e abandono do estabelecimento comercial,3 a prática de atos gerenciais não autorizados no contrato ou estatuto etc.).

2 "Civil. Locação. Desconsideração da personalidade jurídica. Confusão patrimonial. Cabimento. Súmula n. 7/STJ. Divergência jurisprudencial. Cotejo analítico. Falta. Similitude fá- tica. Falta. I. A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica dispensa a propositura de ação autônoma, podendo ser concedida incidentalmente no próprio processo de execução desde que verificados os pressupostos de sua incidência. Precedentes. II. Todavia, se o col. tribunal a quo entende suficientes as provas colacionadas aos autos para caracterizar a confusão patrimonial, infirmar essa conclusão demandaria ao reexame do conjunto fático probatório (Súmula 7/STJ). (...). Agravo regimental desprovido." (STJ, 5° T„ Ag. Rg. no REsp. n. 798.095/SP, rel. Min. Felix Fischer, j. 06.06.2006, v.u.)

3 "Sociedade comercial. Personalidade jurídica. Desconsideração. Admissibilidade. Incorporadora e construtora. Encerramento irregular das atividades. Existência, no mesmo local, de escritório de outra pessoa jurídica administrada pelos mesmos sócios. Visível intuito de não ressarcir os adquirentes das unidades autônomas que foram lesados. Recurso provi­do. Havendo prejuízo, nexo de causalidade entre a prática do ato e o dano, e pretendendo estar o responsável resguardado sob a capa de uma sociedade, esta deve ser desconsidera­da." (TJSP, Al n. 239.606-2, j. 14.06.1994)

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2 0 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

O juiz, nessas hipóteses excepcionais,'1 desconsiderará a personali­dade jurídica e invadirá o patrimônio dos sócios, ou seja, a responsa­bilidade patrimonial se estende do devedor para os bens de terceiros.

Repita-se que tal desconsideração é medida excepcional e que demanda a verificação de requisitos previstos na legislação própria de cada modalidade de empresa.

c) Do devedor, quando em poder de terceiros

Trata-se de previsão legal, do inc. III do art. 592 do Código de Pro­cesso Civil, que, na verdade, não acrescenta responsabilidade de tercei­ro, mas apenas permite a expropriação dos bens do devedor em posse de terceiros. Evidentemente, tal dispositivo é absolutamente dispensá­vel, já que, sendo o bem de propriedade do devedor, estaria presente aqui o disposto no art. 591 do referido Código.

d) Do cônjuge, nos casos em que seus bens próprios, reservados ou de sua meação respondem pela dívida

A hipótese do inc. IV do art. 592 autoriza a expropriação de bens reservados do cônjuge para pagamento de dívida contraída pelo outro. Aqui não se trata de questionar o regime de bens do casamento, já que o próprio inciso afirma ser possível a penhora dos bens reservados, isto é, aqueles da meação ou excluídos da comunhão.

Trata-se, porém, de exceção e não de uma regra geral.Então surge a indagação: em que casos os bens do cônjuge respon­

dem pela dívida firmada pelo outro?A meação ou os bens reservados do cônjuge apenas serão expro-

priados quando a dívida foi contraída em benefício da família, caben­

4 "Sociedade comercial. Responsabilidade dos sócios. Inexistência dos pressupostos. Admitida pela doutrina e pela lei a desconsideração da sociedade para atingir os bens dos sócios, a sua decretação somente pode ser deferida quando provados os seus pressupostos, o que não aconteceu no caso dos autos. Art. 10 do Dec. n. 3708/19. Recurso não conheci­do." (STJ, 4a T„ REsp n. 256.292/MG, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 15.08.2000, v.u.)

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RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL 209

do ao credor produzir tal prova no processo;5 caso contrário, não sen­do o cônjuge parte na relação obrigacional, poderá se opor à penhora de seu patrimônio (por meio de embargos de terceiros, tópico tratado nas defesas contra a execução).

e) Alienados ou gravados com ônus real em fraude de execução

O devedor, com a finalidade de frustrar o processo de execução, pode incorrer na prática de atos de alienação de domínio de seus bens, para que, no momento da expropriação (penhora), o credor exeqüen- te não logre êxito em localizar bens para transformar em dinheiro.

Para evitar prejuízo à atividade jurisdicional, o art. 592 do Código de Processo Civil determina, no entanto, que a responsabilidade patri­monial se estende ao terceiro que houver adquirido ou recebido o ônus do bem com o intuito de fraude.

Vamos imaginar que, citado no processo de conhecimento, o réu comece a vender seus bens com a finalidade de, no futuro, caso seja condenado, estar em situação de insolvência que não permita ao cre­dor receber o valor devido. Na verdade, aliena seus bens com o intuito de frustrar o processo.

Aqui, estamos diante de típica fraude ã execução, situação em que o magistrado, quando da execução do cumprimento da sentença, reco­nhecerá de forma incidental a fraude e determinará a expropriação do bem alienado.

5 "Processual civil e tributário. Execução fiscal. Embargos de terceiro. Mulher casada. Exclusão da meação. Benefício familiar. Necessidade de prova. Ônus probatório do credor. 1. Tratando-se de execução fiscal oriunda de ato ilícito e havendo oposição de embargos de ter­ceiro por parte do cônjuge do executado, com o fito de resguardar a sua meação, o ônus da prova de que o produto do ato não reverteu em proveito da família é do credor e não do embargante. Precedentes: REsp n. 107.017/MG, Min. Castro Meira, DJ 22.08.2005; REsp n. 260.642/PR, Min. Franciulli Netto, DJ 14.03.2005; REsp n. 641.400/PB, Min. José Delgado, DJ 01.02.2005; REsp n. 302.644/MG, 2a T„ rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 05.04.2004. (...) Considerando-se que a embargada não comprovou a alegação de que a sonegação do imposto devido pela sociedade representada pelo executado teria revertido em benefício da família deste, não merece prosperar o pedido do INSS, devendo ser resguardado o direito da embargante à meação do bem penhorado (fls. 57/58). 4. Recurso especial desprovido." (STJ, 1a T., REsp n. 701.170/RN, rel. Min. Luiz Fux, j. 03.08.2006, v.u.)

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2 1 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

O terceiro que adquiriu o bem em fraude à execução sofrerá a ex­propriação mesmo sem ser o devedor, já que a responsabilidade patri­monial a ele foi estendida em razão de o negócio ser fraudulento.

A fraude à execução, porém, não se confunde com o instituto deno­minado fraude contra credores, como se vê no quadro a seguir:

FRAUDE CONTRA CREDORES FRAUDE À EXECUÇÃO

Origem

legislativaDireito civil - arts. 158 a 165

Direito processual civil art. 593

ObjetoNegócio jurídico

para frustrar o crédito

Negócio tendente a frustrar a atividade

jurisdicional - a execução

Meio que o credor possui

para argüir a

fraude

Ação pauliana (ação de conhecimento

de rito ordinário ou sumário)

A fraude é reconhecida dentro

da própria execução, sem a necessidade de ação autônoma

Efeito quando do

reconhecimento da fraude

O negócio jurídico

é desconstituído e, conseqüentemente, o bem

retorna ao patrimônio do devedor

0 negócio fraudulento é tido

como ineficaz perante o credor, podendo este penhorar o bem

que se encontra com um

terceiro (adquirente)

Má-féDeve ser demonstrada

pelo credorÉ presumida

Havendo fraude à execução, o magistrado reconhecerá a ineficácia do negócio jurídico fraudulento em relação ao credor. Note-se que, ao

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RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL 2 1 1

contrário da fraude contra credores, o negócio jurídico continua válido e existente, mas não produz efeito em relação ao credor.

Nesse caso, o credor expropriará o bem alienado de forma fraudu­lenta diretamente das mãos do terceiro adquirente.

Assim, segundo o art. 593 do Código de Processo Civil, considera- se que a alienação ou oneração de bens foi estabelecida em fraude à execução:

a) Quando sobre a coisa pendia ação fundada em direito real

Nessa hipótese, o devedor foi citado (art. 219) em ação real; caso venha a alienar a coisa litigiosa, tal alienação poderá constituir fraude à execução.

b) Quando, ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência

Citado, mesmo no processo de conhecimento, será considerado em fraude à execução a alienação dos bens tendentes a gerar a insol­vência. Note-se que o fato de existir uma ação (mesmo de conheci­mento) não impede o réu de alienar bens, contanto que deixe reserva­do em seu patrimônio o suficiente para a quitação de possível dívida.

c) Nos demais casos previstos em lei, como, por exemplo, no art. 185 do Código Tributário Nacional

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Execução

forçada

P r o c e s s a m e n t o

G e r a l d a s E x e c u ç õ e s

e m E s p é c i e s

12.1 R ito s d a Ex e c u ç ã o Fo r ç a d a

A execução forçada, incluindo aqui a ação de execução e a fase de cumprimento da sentença - após as reformas que alteraram o Código de Processo Civil - , passou a ter a seguin­te classificação de ritos:

O brigação dc fazer e não-fazer —> art. 461

O brigação de entrega de coisa —» art. 461-A

O brigação dc quantia —> art. 475-J

m T ítu los judiciais (475-N )

(cum prim en to dc sentenças

<

sem natu reza de ação)

Títulos

extrajudiciais

(art. 585) (com

natureza de ação)

Exeaição de entrega de coisa (art. 621)

Execução de obrigação de fazer ou não-fazer (arts. 632 e 642)

Execução de quantia certa contra devedor solvente (art. 646)

Execução de quantia certa contra devedor insolvente (art. 748)

Títulos judiciais f Execução dc quantia contra devedor de alim entos (art. 733)(que m antiveram Io i Execução de quantia contra a Fazenda Pública (art. 730)a cxccucuu com i ’

natureza dc açào) ^ Execução de quantia certa contra devedor insolvente (art. 748)

2 1 3

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2 1 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Como já adiantamos, a autonomia processual - com natureza de ação independente - , como regra, apenas restou existente para os títu­los extrajudiciais (art. 585 do CPC), ou seja, o credor que for detentor de um título com essa natureza, deverá promover uma ação (com peti­ção inicial, autuação, citação etc.) para a satisfação de seu crédito.

As ações de execução, como também ocorre com as demais ações, possuem ritos ou procedimentos diversos tendentes a dar maior efeti­vidade à prestação da tutela jurisdicional.

Por essa razão, os processos de execução também comportam ritos e, como demonstramos no quadro anterior, a escolha do rito para a prática dos atos processuais executórios dependerá do tipo de obriga­ção a ser satisfeita.

É o credor exeqüente que, dependendo da natureza da obrigação, escolherá o rito executório mais adequado para o caso. Evidentemen­te, a utilização de procedimento executório inadequado em relação à obrigação gerará falta de interesse de agir e a conseqüente extinção do processo.

Já para os títulos judiciais, a reforma da Lei n. 11.232/2005 fez modificações radicais e retirou da execução a natureza de ação, passan­do a ser considerada apenas como mero incidente dentro do processo de conhecimento do qual se originou. O cumprimento da sentença pas­sou a ser um atributo de efeito do título judicial, sem a necessidade de instauração de nova ação (ainda que fosse nos mesmos autos).

Em capítulo próprio destinado ao cumprimento das sentenças, ficará claro que não se trata de uma ação autônoma, mas de mera fase final do processo de conhecimento (dispensando nova inicial, citação etc.).

Duas execuções que podem ser fundadas em títulos judiciais, no entanto, foram excluídas da reforma mencionada e, conseqüentemen­te, mantiveram a mesma natureza anterior. A execução do devedor de alimentos, pelo rito previsto no art. 733 do Código de Processo Civil, e a execução contra a Fazenda Pública, nos moldes do art. 730, conti­nuam tendo natureza de ação autônoma, mesmo que fundadas em títulos judiciais.

Nos próximos capítulos, serão tratadas as execuções em espécies, conforme o quadro anterior.

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PROCESSAMENTO GERAL DAS EXECUCÕES EM ESPÉCIES 2 1 5

12.2 CUMULAÇÃO DE EXECUÇÕES1

O art. 573 do Código de Processo Civil autoriza ao credor cum u­lar, em um mesmo processo, mais de uma execução, isso com a junção de mais de um título na ação ou mesmo um título contendo mais de uma obrigação, tratando-se de verdadeira cumulação objetiva de ações (diversos títulos).

A cumulação, no entanto, apenas será cabível se atendidos os seguintes requisitos:

a) todos os títulos contenham as mesmas partes (credor e devedor), caso contrário estariam diante de cumulação subjetiva;

b) o juízo seja competente para a execução de todos os títulos e obri­gações;

c) o procedimento executório seja idêntico para os títulos cumula­dos, ou seja, que todos contenham o mesmo tipo de obrigação.

Portanto, se as obrigações são de natureza distinta - uma obriga­ção de fazer e outra de pagamento de quantia - , dada a disparidade de ritos, não será possível a cumulação, devendo o credor promover me­didas independentes.

12.3 SUBSIDIARIEDADE DE RlTOS

O processo de execução, como tratamos anteriormente, possui ri­tos próprios para cada modalidade de obrigação. O procedimento na­da mais é do que a ordem legal que deve ser observada para a prática dos atos processuais para a obtenção da finalidade a que se presta a ação. Todo processo tem ritos próprios.

O legislador para o processo de execução determinou, contudo, atos processuais específicos para o cumprimento das obrigações, mas determinou ainda que, no caso de omissão, deverão ser aplicadas sub-

' Súmula n. 27 do STJ.

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2 1 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

sidiariamente ao processo de execução as regras atinentes ao processo de conhecimento.

Obviamente, não haveria necessidade de, no capítulo das execu­ções, o legislador ter repetido toda a teoria geral do processo ou aque­las regras que se aplicam a toda processualística civil.

Podemos citar diversos exemplos de aplicação subsidiária do pro­cesso de conhecimento ao processo de execução: a) as regras de conta­gem de prazos; b) as disposições gerais acerca das intimações e publi­cações; c) a sistemática recursal; d) os incidentes e as normas relativas da competência, e assim por diante.

Ressalte-se que se aplicam as regras do processo de conhecimento ao processo de execução naquilo em que a lei for omissa ou não con­tiver dispositivo em sentido contrário.

Por outro lado, ao tratar do cumprimento das sentenças, o art. 475-R determinou que se aplicam, à satisfação dos títulos judiciais - mera fase do processo de conhecimento - , em caso de omissão, as de­terminações do processo de execução.

Ao tratar do cumprimento da sentença - que, como sabemos, até a reforma de 2005 era tido como processo de execução - , o art. 475 não conseguiu esgotar o tema e disciplinar todos os atos processuais, razão pela qual se socorreu, subsidiariamente, das regras do processo de execução.

As disposições sobre o cumprimento das sentenças não tratam dos bens a serem penhorados, da arrematação, da hasta pública, do paga­mento ao credor, ou seja, todas essas omissões serão regidas pelas nor­mas do processo de execução.

12.4 G e n e r a l i d a d e s

m i 1 2 . 4 . 1 C o m p a r e c i m e n t o d a s P a r t e s e A t o s

A t e n t a t ó r i o s à D i g n i d a d e d a j u s t i ç a

É princípio geral do processo civil, decorrente inclusive dos pode­res gerais do magistrado (art. 125, IV, do CPC), a qualquer tempo e sempre que possível (tratando-se de direito disponível), tentar conci­liar as partes.

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PROCESSAMENTO GERAL DAS EXECUCÕES EM ESPÉCIES 2 1 7

Por essa razão, o inc. I do art. 599 repete tal princípio, autorizan­do o juiz, a qualquer momento do processo de execução, a convocar as partes à sua presença, em típica audiência de conciliação.

Além disso, é dever do magistrado advertir as partes de eventuais atos atentatórios à dignidade da justiça, preservando o princípio da boa-fé processual contido nos arts. 14 e 17 do Código de Processo Civil, bem como para evitar ou banir (art. 600):

a) fraude à execução;b) oposição maliciosa do devedor à execução, com o emprego de meios

ardis ou artificiosos para procrastinação do feito;c) atos de resistência ao cumprim ento de ordens judiciais.

Também considera-se ato atentatório à dignidade da justiça o fato de o devedor intimado não indicar ao juiz, no prazo de 5 dias, quais são e onde se encontram os bens sujeitos à penhora e seus respectivos valores. A ocultação de bens pelo devedor representa resistência mali­ciosa à atividade jurisdicional. Não se trata de mera ofensa à parte con­trária, mas de desrespeito à autoridade do Estado-juiz.

Reconhecendo violação à dignidade da justiça, nos termos ante­riores, o juiz fixará multa ao devedor até o montante de 20% sobre o valor da execução, sem prejuízo de outras medidas processuais (como busca e apreensão, requisição de força policial etc.), sendo que o valor da multa será exigido na própria execução e revertido em favor do cre­dor exeqüente.

De modo ingênuo, o parágrafo único do art. 601 do Código de Processo Civil faculta ao juiz relevar a multa caso o devedor se compro­meta a não mais praticar qualquer dos atos definidos como atentatórios à dignidade da justiça, mas, para isso, deverá dar fiador idôneo que res­ponda diante do credor pelo pagamento integral da dívida executada.

■ I 1 2 . 4 . 2 A S P E C T O S G E R A I S DA P E T I Ç Ã O

In i c i a l e C itação

Em se tratando de ação de execução, o credor exeqüente deverá ela­borar petição inicial, instruindo-a, obrigatoriamente, como o original do título executivo extrajudicial que lhe garante o interesse processual,

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2 1 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

bem como a demonstração que ocorreu o termo ou a condição de exi­gibilidade da obrigação (art. 614, incs. I2 e II).

Caso o título esteja retido em outros autos ou em cartório, o cre­dor poderá, no entanto, apenas fazer a indicação, aparelhando a peti­ção inicial da execução com cópia autenticada ou certidão comprovan­do a impossibilidade de exibição do original do título.

Ainda, ao elaborar a inicial da execução, caberá ao credor exeqüente:

a) Indicar a modalidade de rito executório.b) Requerer a intimação de eventual credor pignoratício, hipotecário,

anticrético ou usufrutuário, quando a expropriação do bem indi­cado pelo credor recair sobre bens onerados pelas garantias m en­cionadas.

c) Requerer as medidas acautelatórias urgentes. A previsão do inc. III do art. 615 do Código de Processo Civil leva à conclusão de que o credor, dentro da própria petição inicial da execução, poderá re­querer medidas tendentes a evitar o perecimento de direito, medi­das fundadas no perigo de dano (periculum in mora) e em relevan­te fundamento (fumus boni iures).

d) Nos casos de obrigações bilaterais, a petição inicial será instruída com a prova da contraprestação do credor.

e) Nas execuções de quantia, também competirá ao credor instruir a petição inicial da execução com demonstrativo do débito atualiza­do até a data da propositura da medida (art. 614, II).

Ressalte-se que, nos processos de execução, não há pedido de pro­cedência condenatória, mas sim um pedido de citação para cum pri­mento da obrigação. No processo de conhecimento, o autor busca a manifestação do Estado sobre a existência do direito ou relação jurídi­ca (o pedido imediato sempre será relativo à condenação, declaração ou constitutiva).

? A redação original do art. 6 14 ,1, alterada pela Lei n. 11.382/2005, tratava da exibição de ambos os títulos (judiciais e extrajudiciais). No entanto, após a reforma da Lei n.11.232/2005, que institui o cumprimento da sentença, a manutenção da redação original não fazia mais sentido.

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PROCESSAMENTO GERAL DAS EXECUCÕES EM ESPÉCIES 2 1 9

Na execução, não há mérito a ser julgado procedente ou improce­dente, mas tão-somente o interesse do credor de que o Estado-juiz im- ponha ao devedor medidas coercitivas para o cumprimento da obriga­ção. Portanto, toda petição inicial terá como pedido imediato a ordem de citação do executado, com efeitos distintos para cada espécie de rito executório (por exemplo, na execução de quantia: citação para pagar em determinado prazo etc.).

A falta de citação no processo de execução gera sua nulidade nos termos do art. 618, II, do Código de Processo Civil.

À inicial da execução, como em qualquer outra ação, o autor obser­vará os requisitos do art. 282 do Código de Processo Civil, com indica­ção da competência, preâmbulo com a qualificação completa das partes e o tipo de execução escolhida pelo exeqüente em relação à obrigação, os fatos e fundamentos jurídicos, o pedido, requerimentos e valor da causa.

Na inicial de execução não é necessário o requerimento de produ­ção de provas. Nos processos de conhecimento e cautelar, é requisito da inicial que o autor indique as provas com as quais pretende demons­trar os fatos articulados na peça. Na execução, esse requerimento é absolutamente desnecessário, já que nessa modalidade de rito não se vislumbra a possibilidade de dilação probatória. Toda prova - título executivo — está acostada à inicial.

Ao receber a inicial, o magistrado, nos termos dos arts. 284 e 616 do Código de Processo Civil, fará o juízo de admissibilidade; estando preenchidos os requisitos legais, determinará a citação do executado.

Caso a inicial contenha vício sanável, o juiz concederá prazo de 10 dias para que o exeqüente promova o aditamento da peça. No entan­to, se o vício não comportar aditamento (como uma ilegitimidade, prescrição3 etc.), o juiz de plano indeferirá a inicial.

Recebida a inicial e realizada a citação do executado, considera-se interrompida a prescrição (arts. 219 e 617 do CPC).'1

3 Que, pela redação do art. 219, § 5o, do CPC, pode ser reconhecida de ofício pelo ma­gistrado.

á A interrupção da prescrição se opera com o ato de citação, mas a contagem do prazo retroage à data da propositura da ação.

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220 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

m 12.4.3 C e r t id ã o do D is t r ib u id o r

Apresentada a petição inicial da execução, o exeqüente poderá re­querer junto ao cartório distribuidor a expedição de uma certidão do ajuizamento para permitir que o credor faça a averbação da existência da execução no cartório de registro de imóvel, registro de veículo ou de outro bem que pretenda levar à penhora ou arresto, conforme pre­visão do art. 615-A do Código de Processo Civil.5

Extraída a certidão do distribuidor e realizada a averbação no re­gistro, o credor, no prazo de 10 dias, comunicará o juiz da execução sobre tal apontamento de publicidade.

Posteriormente, se o devedor oferecer ou se a penhora recair sobre outros bens, que sejam suficientes para a quitação da dívida, o magis­trado determinará o cancelamento da averbação.

A finalidade dessa averbação é prevenir que o devedor pratique atos de fraude à execução, já que, uma vez anotado no registro do imó­vel ou do veículo que o devedor está sujeito a uma execução proposta, mesmo que ainda não citado, o terceiro que adquirir tal bem em frau­de não poderá se opor à constrição.

A averbação da execução gera a publicidade e evita que, no futuro, eventual terceiro alegue boa-fé na aquisição do bem alienado em fraude.

Antes de tal dispositivo, a fraude à execução apenas seria caracteri­zada com a citação do executado. Agora, distribuída a execução e aver­bada a certidão competente, toda alienação poderá caracterizar fraude à execução nos termos do art. 593 do Código de Processo Civil.

Evidentemente, mesmo que o § 4o do art. 615-A não firmasse de forma expressa tal direito, é de responsabilidade do credor indenizar o devedor pela prática indevida ou abusiva da averbação a que se refere o artigo. Tal reparação se dará incidentalmente em autos apartados.

Por fim, a inovação do art. 615-A, no § 5o, permite aos tribunais que editem regulamentos que disciplinem a expedição da certidão de distribuição e a conseqüente averbação no registro competente.

5 Redação dada pela Lei n. 11.382/2005.

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A ç ã o d e E x e c u ç ã o

p a r a E n t r e g a

d e C o i s a 13

13.1 Ob j e t o e T í t u l o

Essa modalidade de execução, fundada em título extraju­dicial, se presta para que o credor exeqüente force o devedor executado a lhe entregar coisa (bem móvel, imóvel ou semo- vente), certa ou incerta, que esteja em poder do devedor ou de terceiro.

Ressalte-se que tal ação executória apenas encontra cabi­mento para os títulos executivos extrajudiciais, uma vez que, quando da prolação de uma sentença condenatória de entre­ga de coisa, de ofício, o magistrado deverá conferir a tutela es­pecífica, tornando a sentença auto-executável (dispensando a propositura de uma ação autônoma de execução), nos termos do art. 461-A do Código de Processo Civil.

Por coisa certa se entende aquele bem ou objeto absolu­tamente individualizado e que não pode ser confundido com outros de seu gênero ou espécie (por exemplo, é coisa certa um veículo individualizado, com placa e chassis, não sendo possível confundi-lo com outro da mesma marca e modelo).

221

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222 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Conseqüentemente, a coisa incerta é aquela apenas delimitada por seu gênero e quantidade, mas não individualizada entre seus pares (por exemplo, a obrigação é para entregar uma vaca leiteira, não sendo deter­minado qual animal específico).

A incerteza que recai sobre a obrigação não lhe tira a condição de título executivo, já que tal escolha apenas terá como objeto a qualidade da coisa, pois o gênero e a quantidade sempre estarão previstos no título.

A única diferença e relevância em se estabelecer se a coisa é certa ou incerta é que, quando da execução, alguma das partes terá de exer­cer a escolha quanto àquilo que pende de determinação (a qualidade).

13.2 Pr o c e s s a m e n t o

Na execução para a entrega de coisa certa, o devedor será citado para entregá-la no prazo de 10 dias, sob pena da expedição de m anda­do de busca e apreensão (se se tratar de coisa móvel ou semovente) ou mandado de imissão do credor na posse da coisa (nas hipóteses de bens imóveis).

Nesse ponto, é importante consignar que está previsto como re­quisito para a apresentação de embargos pelo devedor (modalidade de defesa) que o executado faça o depósito do bem 1 nos termos do art. 622 do Código de Processo Civil.

No entanto, ao tratar dos embargos do devedor, o art. 736 - após a reforma da Lei n. 11.382/2006 - passou a admitir a defesa do execu­tado independentemente do depósito.

Desta forma, entendemos que o novo art. 736 prevalece sobre a regra antiga do art. 622 do Código de Processo Civil, não havendo mais que se falar em depósito como condição para propositura dos embargos.

' Não se admite depósito em dinheiro; deve ser depositada a própria coisa executada. Há diferença entre os termos "entrega" e "depósito". A entrega significa que o devedor não deseja discutir a execução e quer satisfazer seu débito; já o depósito é realizado para segu­rança do juízo, tendo em vista a ação de embargos do devedor.

"Execução para entrega de coisa certa. Termo de depósito. Assinatura do depositário. Irregularidade formal. Tratando-se de mera irregularidade formal, sem reclamo ou prejuízo para qualquer dos litigantes, impõe-se a realização de diligência que venha a suprir a defi­ciência. Recurso especial conhecido e provido." (STJ, 4a T„ REsp n. 85.236/MG, rel. Min. Bar­ros Monteiro, j. 22.04.1996, v.u.)

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ACÂO DE EXECUCÃO PARA ENTREGA DE COISA 223

Ao despachar a inicial, de ofício, o juiz poderá fixar multa diária por atraso no adimplemento da obrigação, podendo alterar o valor a qualquer momento, caso seja elevado ou insignificante. A astreinte, como medida semelhante àquela do art. 461 - A, tem por objetivo atuar na vontade do devedor para que a obrigação seja cumprida in natura e não substituída por quantia.

No caso de coisa incerta (determinada apenas pelo gênero e quan­tidade), verificamos duas hipóteses:

a) Se a escolha couber ao exeqüente, ele deverá fazê-la em sua petição inicial de execução. O exeqüente especificará em sua inicial de exe­cução que coisa pretende receber (a escolha apenas caberá em rela­ção à qualidade).

b) Se a escolha couber ao executado, este será citado para entregá-la já individualizada. O executado exercerá seu direito de escolha ao entregar a coisa em juízo.

Em qualquer das hipóteses anteriores, a parte contrária à escolha poderá, no prazo de 48 horas, apresentar impugnação,2 cabendo ao juiz decidir acerca do incidente processual.

Por fim, é relevante considerar que a coisa, objeto da execução, pode ter sido alienada, encontrando-se em poder de terceiros, não ser localizada ou ter sido destruída.

Nessas hipóteses, ocorrerá o seguinte:

Encontrando-se a coisa em poder de terceiro, o juiz deverá emitir mandado de busca e apreensão contra essa pessoa - art. 626 (o ter­ceiro apenas será ouvido após depositar3 a coisa).Se a coisa não for entregue, estiver deteriorada ou não for encon­trada, o exeqüente terá direito de receber o valor da coisa e perdas e danos. Não constando do título o valor da coisa, o credor prom o­verá sua liquidação e posterior execução de quantia certa - art. 627.

7 Típica decisão interlocutória passível de ser impugnada por meio de agravo de instru­mento.

3 Alguns doutrinadores afirmam que, em razão da terminologia "depósito da coisa", o terceiro poderá valer-se de embargos do devedor, bem como de embargos de terceiros, que não exigem a segurança do juízo.

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2 2 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Por fim, o art. 628 prevê que, havendo benfeitorias na coisa - rea­lizadas pelo devedor ou pelo terceiro - , o credor, se houver saldo, deve­rá depositar o valor correspondente antes de receber a coisa, cujo valor será obtido por meio de liquidação. Havendo benfeitorias em favor do credor - frutos da coisa - , ele poderá exigi-las nos autos do mesmo processo (liquidação e execução por quantia certa).

Sobre ação de execução para entrega de coisa, confira o Anexo II da Parte II - Execução de títulos extrajudiciais, p. 351

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ACÃO DE EXECUCÃO PARA ENTREGA DE COISA 225

13.3. F l u x o g r a m a d o Pr o c e d i m e n t o

d a Ex e c u ç ã o p a r a En t r e g a

de Co is a C e r t a

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E x e c u ç ã o d e O b r i g a ç ã o

d e F a z e r o u n ã o F a z e r

14.1 O b r i g a ç ã o e T í t u l o Ex e c u t i v o

A obrigação de fazer consiste em uma prestação a ser rea­lizada pelo devedor, ao passo que a de não fazer eqüivale a uma abstenção, conforme previsto no título executivo extra­judicial.

Ao comentar o art. 247 do Código Civil, a professora Maria Helena Diniz ensina que: “A obrigação de fazer é a que vincula o devedor à prestação de um serviço ou ato positivo, material ou imaterial, seu ou de terceiro, em benefício do cre­dor ou de terceira pessoa”. Por sua vez, ao tratar do art. 250 do Código Civil, a ilustre professora afirma que: “A obrigação de não fazer é aquela em que o devedor assume o compro­misso de se abster de algum ato que poderia praticar livre­mente se não estivesse obrigado para atender interesse jurídi­co do credor ou de terceiro

' Código Civil anotado, p. 283 e 287.

2 2 7

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A obrigação de fazer ou não fazer que enseja a propositura de uma ação de execução é aquela prevista em um título executivo extrajudi­cial, já que o cumprimento das sentenças com essa natureza obrigacio- nal será realizada na forma do art. 461 do Código de Processo Civil.

2 2 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

14.2 Pr o c e s s a m e n t o

Nessa modalidade de execução, o devedor executado será citado pa­ra, no prazo constante no título executivo, em sua ausência, no prazo fixado pelo juiz, prestar sua obrigação ou abster-se de determinado ato.

Evidentemente, se o prazo para cumprimento da obrigação de fazer não estiver fixado no título, a lei deixa ao critério do magistrado, que se valerá da razoabilidade e da proporcionalidade para atribuir prazo compatível com o tipo de obrigação a ser cumprida.

Assim, devemos distinguir as espécies de obrigações de fazer para depois definir as conseqüências da omissão ou recusa do devedor. A doutrina classifica as obrigações de fazer em:

Obrigação fungível: aquela que pode ser realizada pelo devedor ou por qualquer outra pessoa nas mesmas condições. Seria a hipótese, por exemplo, da contratação de uma determinada empresa para a realização de uma obra ou construção civil. Se a empresa devedora não puder realizar pessoalmente, o credor poderá se valer de outra empresa; nesses termos, a prestação não é personalíssima. Obrigação infungível: aquela que apenas terá resultado satisfatório se realizada pelo próprio devedor, com exclusão de qualquer outra pessoa. Vamos imaginar que o contratante firmou contrato com renomado arquiteto para a elaboração de um projeto específico. Nesse caso, a obrigação tem natureza personalíssima, já que interes­sa ao credor que a prestação seja feita exclusivamente pelo devedor.

No caso de obrigação fungível, se o devedor, mesmo depois de citado, não cumprir sua obrigação, o credor poderá:

a) converter a obrigação de fazer em perdas e danos, sendo realizada a liquidação da quantia e, posteriormente, o processo seguirá pelo

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EXECUCÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER OU NÂO FAZER 229

rito de execução de quantia certa contra devedor solvente (pará­grafo único do art. 633 do CPC);

b) requerer que o serviço seja prestado por terceiros, mas às custas do devedor executado.

O art. 634 do Código de Processo Civil, até a reforma da Lei n. 11.383/2005, continha sete parágrafos, cuja lei reformadora houve por bem revogá-los. Tais dispositivos tratavam de um procedimento licita- tório ou de concorrência para a contratação do terceiro que realizaria o serviço no lugar e às custas do devedor.

De fato, porém, tal procedimento havia caído em desuso, dada a difi­culdade de se realizar uma concorrência dentro dos autos para a admis­são do terceiro. Assim, se o devedor não cumprisse a obrigação fungível, na maioria das vezes o credor optava por convertê-la em perdas e danos.

Agora, com a reforma, parece-nos que a exigibilidade de concor­rência foi superada com a revogação de todos os parágrafos do art. 634.

Nessa situação, tratando-se de obrigação fungível, ficará a critério e prudência do magistrado julgar a proposta do terceiro. Autorizadas pelo juiz a proposta e a prestação do serviço pelo terceiro, o exeqüen­te adiantará o pagamento das despesas pelo trabalho e, posteriormen­te, prosseguirá a execução por quantia certa contra o devedor.

Prestada a obrigação pelo terceiro, não resta mais a obrigação a fazer, mas tão-somente a de restituição de valores; seguirá, portanto, o processo por quantia certa.

O próprio credor poderá manifestar desejo de executar a prestação ou promover sua administração; nessa hipótese, terá ele preferência em relação ao terceiro, mas o valor deverá estar em igualdade com a proposta oferecida pelo art. 637 do Código de Processo Civil.

Por outro lado, em se tratando de obrigação infungível, caso o de­vedor não a satisfaça no prazo, poderá o magistrado fixar multa diária a fim de levar o devedor ao cumprimento da obrigação personalíssi­ma, aplicando-se, subsidiariamente, o disposto no art. 461 do Código de Processo Civil.

As tutelas específicas das obrigações de fazer e não fazer, previstas no art. 461 do Código de Processo Civil, prevêem medidas acessórias para o cumprimento daquelas obrigações. Consta do rol exemplifica- tivo as seguintes medidas: multa, busca e apreensão, força policial, re­

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230 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

moção de pessoas ou coisas, desfazimento de obras, impedimento de atividade nociva etc.

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obri­gação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela especí­fica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalen­te ao do adimplemento. [grifo do autor]

O juiz tem o dever institucional de emitir uma tutela específica, com medidas que obriguem o devedor a seu cumprimento e que confira ao detentor do direito a percepção de efeitos práticos equivalentes àqueles experimentados se a obrigação tivesse sido cumprida espontaneamente.

Ressalte-se que, não constando do título executivo multa ou medi­da coercitiva para o cumprimento da obrigação quando da propositu- ra da ação de execução, o magistrado deverá, mesmo de ofício, fixar ou estabelecer a pena cominatória para obrigar ao adimplemento, nos ter­mos do art. 645 do Código de Processo Civil, nos seguintes termos:

Art. 645. Na execução de obrigação de fazer ou não fazer, funda­da em título extrajudicial, o juiz, ao despachar a inicial, fixará multa por dia de atraso no cumprimento da obrigação e a data a partir da qual será devida.Parágrafo único. Se o valor da multa estiver previsto no título, o juiz poderá reduzi-lo, se excessivo.

Repita-se que o atual sistema processual dá preferência à satisfação da obrigação in natura - como se estivesse sendo cumprida esponta­neamente pelo devedor - em detrimento de sua substituição por ato de terceiro ou pela conversão em indenização.

Se mesmo com a imposição da astreinte o devedor se recusar ao cumprimento, não restará, todavia, outra alternativa senão a de con­versão da obrigação de fazer em obrigação de quantia, apurando-se em liquidação as perdas e os danos.

Apurado o valor das perdas e danos, o processo prosseguirá como execução de quantia certa (parágrafo único do art. 638).

Na hipótese de o devedor ter descumprido a obrigação de não fazer, o credor promoverá a execução para que o juiz, em prazo razoá­

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EXECUCÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER OU NÃO FAZER 2 3 1

vel, determine o desfazimento do ato praticado (art. 642 do CPC). Ha­vendo a recusa do devedor no desfazimento, o credor requererá que o juiz mande um terceiro realizar o ato, às custas do devedor.

Evidentemente, se por questões práticas não for possível o desfazi­mento, a obrigação será resolvida em perdas e danos, sendo realizadas a liquidação e a execução da quantia nos mesmos autos.

Por fim, é importante ressaltar que, em se tratando de obrigação de fazer consistente na emissão de declaração de vontade, como a ou­torga de escritura, o credor deverá se valer de ação de conhecimento, pois, nesse caso, o magistrado conferirá, por sentença, a supressão da vontade do devedor, o que não se pode fazer em ação de execução, caso o devedor se recuse a cumprir a obrigação e declarar sua vontade.2 A esse respeito determina3 o art. 466-A:

Art. 466-A. Condenado o devedor a emitir declaração de vonta­de, a sentença, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida, [grifo do autor]

14.3 CONVERSÃO EM PERDAS

e D a n o s e o M o d o d e E x e c u ç ã o

Convertida a obrigação de fazer, não fazer ou entrega de coisa em perdas e danos, o credor exeqüente, nos mesmos autos, nos termos do art. 475-A, poderá promover a liquidação para apurar o quantum a obrigação corresponde em dinheiro.

Apurado o valor, prosseguirá o feito como execução de quantia certa. Nesse ponto, surge a indagação: será utilizado o procedimento do art.

2 "Contrato de promessa de permuta. Recusa dos réus/reconvintes em outorgar a escritu­ra definitiva. Improcedência dos motivos alegados. Execução específica. Arts. 639 e 641 do CPC. Se o devedor não cumpre a obrigação, improcedente que é o motivo embasador de sua recusa à outorga da escritura definitiva, ao credor é lícito obter a condenação daquele a emitir a manifestação de vontade a que se obrigou, sob pena de, não o fazendo, produzir a sentençao mesmo efeito da declaração não emitida. Precedentes do STJ. Recurso especial interposto pelos réus/reconvintes não conhecido; recurso dos autores/reconvindos conhecido, em parte, e providos." (STJ, 4a T., REsp n. 306.012/RJ, rel. Min. Barros Monteiro, j. 10.09.2002.)

3 Tal dispositivo, até a reforma da Lei n. 11.232/2005, estava situado no art. 641. No en­tanto, corretamente, por se tratar de um efeito ou cumprimento de sentença declaratória de supressão da vontade, foi transferido para o capítulo da sentença, atualmente no art. 466-A.

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2 3 2 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

475-J relativo ao cumprimento de sentenças ou se aplicará o processo co­mum de execução de quantia certa contra devedor solvente do art. 646?

Como sabemos, o procedimento do art. 475-J é mais célere e relati­vo ao cumprimento de sentenças, sem a instauração de novo processo de execução. Já o processo do art. 646 representa verdadeira ação autônoma.

A jurisprudência e a doutrina, dada a atualidade do tema, ainda não se manifestaram a respeito. Mas entendemos que, sendo realizada a liquidação do valor devido pelo executado, estaremos diante de um título judicial; exeqüível, portanto, nos moldes do art. 475-J.

14.4. F l u x o g r a m a do Pr o c e d i m e n t o

d a Ex e c u ç ã o de F a z e r

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E x e c u ç ã o

d e Q u a n t i a C e r t a

c o n t r a D e v e d o r

S o l v e n t e 15

Na atualidade, a maioria dos negócios jurídicos estabele­cidos entre as pessoas é atinente ao pagamento de dinheiro, obrigando-se o devedor a entregar ao credor determinada quantia de moeda corrente no país. Na verdade, também es­tamos falando de entrega de coisa, mas, aqui, essa coisa é espe­cífica: dinheiro.

O devedor responde com seu patrimônio pelas obriga­ções que contrai. Não sendo entregue o dinheiro ao credor, este se valerá do Estado para invadir o patrimônio do deve­dor, transformá-lo em dinheiro e, finalmente, entregar a quan­tia para satisfação da obrigação (o tão esperado pagamento).

O Estado atua em substituição à atividade do devedor. Devemos lembrar que aquele que é devedor deveria, em tese, por livre e espontânea vontade, transformar seus bens em di­nheiro e efetuar o pagamento ao credor.

Muitas vezes, porém, não é o que ocorre. O credor neces­sita do Estado para expropriar os bens do devedor e obter o pagamento. O Estado, com a execução, afeta o patrimônio do devedor, faz transferências forçadas de domínio de bens, en-

2 3 3

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234 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

trega o bem em dação em pagamento, extrai os frutos da coisa para amortização do débito, enfim, tudo o que for necessário para a quita­ção da obrigação.

Portanto, a execução de quantia se fará por meio de expropriação patrimonial do devedor.

E por que denominamos execução de quantia certa contra deve­dor solvente?

Já tratamos que a obrigação prevista no título, nesse caso, é neces­sariamente o pagamento em dinheiro, cujo valor é determinado ou apurado por mero cálculo aritmético. E falamos de devedor solvente, pois o credor, ao propor a ação executória, presume que o devedor tem patrimônio suficiente para saldar o que deve.

Devemos lembrar, contudo, que esse estado de solvência é uma mera presunção e não requisito para a propositura da ação, já que, na maioria das vezes, o credor apenas percebe que o devedor é insolvente no curso da execução. Após a busca de bens para penhora, é que ele saberá se o devedor é ou não solvente.

Então, qual é a diferença entre propor uma execução de quantia certa contra devedor solvente ou uma execução de quantia certa contra devedor insolvente?

A execução de quantia certa contra devedor solvente se desenvol­ve com o objetivo de expropriar bens do devedor, transformando-os em dinheiro, e, ao final, fazer o pagamento ao credor. Logo, isso signi­fica dizer que a execução contra o suposto solvente é realizada única e exclusivamente em benefício do credor. Os bens são expropriados e o dinheiro lhe é integralmente entregue.

Por outro lado, na execução contra insolvente, reconhecido que o patrimônio do devedor é insuficiente em relação às dívidas que con­traiu, todos os bens são arrecadados judicialmente, levados à venda, e o produto (o dinheiro) rateado entre todos os credores. Nesse tipo de execução o proveito é de todos os credores, por isso é denominado concurso universal.

É exatamente essa a essência da diferença entre as duas modalida­des de execução de quantia certa estabelecida no art. 612 do Código de Processo Civil.

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 235

15.1 Ex p r o p r i a ç ã o Pa t r i m o n i a l

A execução de quantia certa contra devedor solvente visa priorita­riamente à expropriação dos bens do devedor, que se dará pelas se­guintes formas (art. 647 do CPC):1

a) Adjudicação. Os bens penhorados do devedor são recebidos pelo credor como pagamento da dívida.

b) Alienação por iniciativa particular. Trata-se da venda dos bens do devedor por profissional da iniciativa privada (como os leiloeiros particulares).2

c) Alienação em hasta pública. Trata-se da venda dos bens do deve­dor pelo próprio Estado, em leilão ou praça.

d) Usufruto de bem móvel ou imóvel. Nessa modalidade, o bem do devedor não é alienado a terceiros ou para o credor, mas são colhi­dos apenas os frutos da coisa até que toda a dívida seja amortizada.3

15.2 Pr o p o s it u r a d a A ç ã o e C i t a ç ã o

do Ex e c u t a d o

Nas execuções de quantia certa é obrigação do exeqüente instruir sua petição inicial com a memória atualizada de seu crédito até a data da propositura da ação. Na petição inicial da execução, o credor exe­qüente já poderá indicar os bens do devedor sobre os quais deseja que recaia a penhora (art. 652, § 2o, do CPC).

Recebida a inicial, de plano, o magistrado fixará os honorários ad­vocatícios relativos à sucumbência na execução (art. 20 do CPC). Na hipótese de o devedor pagar a dívida no prazo legal, a verba honorária será reduzida à metade (art. 652-A, parágrafo único).

' A redação do artigo foi alterada pela Lei n. 11.382/2006.2 Antes da reforma, toda alienação era pública, não havendo que se falar em venda pri­

vada dos bens do devedor.3 A redação anterior à Lei n. 11.382/2006 falava em usufruto de imóvel ou de empresa.

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2 3 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Na execução, como regra geral, a citação é pessoal e não se admite a forma pelo correio (vedação contida no art. 222, d, do CPC), salvo nas execuções fiscais. O oficial de justiça, munido de duas vias do m an­dado executivo, citará o executado para que pague o débito no prazo de 3 dias,1 nos termos do art. 652 do Código de Processo Civil. A pri­meira via do mandado será entregue ao executado.

Realizado o pagamento integral, o juiz proferirá sentença de extin­ção da obrigação.

Não realizado o pagamento, o oficial, valendo-se da segunda via do mandado, realizará a penhora e a avaliação dos bens do devedor.5 A Lei n. 11.382/2006 trouxe para a execução de títulos extrajudiciais a mesma regra já estabelecida na reforma dos títulos judiciais (Lei n. 11.232/2005), segundo a qual a avaliação é ato contínuo à penhora, não demandando, como regra, a nomeação de perito para atribuição do valor dos bens.

15.3 PARCELAMENTO DO DÉBITO EXECUTADO

A reforma da Lei n. 11.382/2006 introduziu no Código de Proces­so Civil a possibilidade de o devedor, no prazo de 15 dias da citação, reconhecer a dívida exeqtienda e requerer seu parcelamento, nos ter­mos do art. 745-A.

No prazo de 15 dias, o executado deverá depositar em juízo (e com­provar nos autos) o valor equivalente a 30% do valor total da execu­ção, incluindo nesse valor as custas e os honorários advocatícios arbi­trados no despacho inicial.

4 No sistema anterior à reforma, o antigo art. 652 estabelecia o prazo de 24 horas para pagamento da dívida.

5 "Processual civil. Recurso especial. Ação de execução. Nomeação de bens à penhora. Intempestividade. Indicação pelo credor. Depósitos realizados em conta corrente. Penhora. Possibilidade. Quando o devedor não nomeia bens à penhora no momento oportuno, o direi­to de fazê-lo é transferido ao credor. Não se configura ofensa ao princípio da menor onero- sidade da execução para o devedor o fato de a constrição patrimonial recair sobre valores de­positados em sua conta corrente."(STJ, 3a T., REsp n. 332.584/SP, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 12.11.2001, v.u.)

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 237

Cumprida tal formalidade, o magistrado autorizará ao devedor que pague o saldo da dívida em seis parcelas mensais, com o acréscimo dos juros legais de 1% ao mês e da correção monetária.

Aprovado o parcelamento, o juiz autorizará que o exeqüente le­vante a quantia depositada e, imediatamente, determinará a suspensão dos atos executivos, ou seja, ficarão sobrestadas a penhora, avaliação e alienação dos bens do devedor enquanto o parcelamento não for inte­gralmente cumprido.

Na hipótese de o juiz não autorizar o parcelamento - caso o exe­cutado não tenha cumprido os requisitos do referido artigo - , o valor depositado pelo executado ficará retido para satisfação da execução.

Por outro lado, o inadimplemento de qualquer uma das parcelas, imediatamente, gerará a antecipação das parcelas vincendas e o pros­seguimento do processo de execução, além da imposição de multa de 10% sobre o valor das parcelas não pagas.

Evidentemente, ocorrendo a quebra do parcelamento e a retoma­da da execução, o devedor não mais poderá oferecer qualquer resistên­cia quanto ao mérito da dívida (embargos à execução), já que, para ter o parcelamento deferido, reconheceu anteriormente a procedência do débito (§ 2o).

1 5 .4 PENHORA

■ i 15.4.1 O rdem dos b e n s e p r o c e d im e n t o

d a P e n h o r a

A penhora é ato judicial de apropriação dos bens do devedor exe­cutado para a satisfação do credor.

O art. 655 estabelece o seguinte rol a ser observado pelas partes e pelo oficial de justiça quando da realização da penhora:

a) Dinheiro. Quantias em moeda que estejam em poder do devedor ou depositadas em instituições financeiras.

O próprio devedor poderá realizar o depósito de dinheiro em favor do juízo da execução, ficando assim garantida a dívida e se-

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2 3 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

guro o juízo. No entanto, caso não faça o depósito do dinheiro vo­luntariamente, o juiz poderá ordenar a penhora da quantia.

Havendo saldo em contas bancárias em nome do devedor exe­cutado (conta corrente, poupança, investimentos, etc.), o juiz or­denará a penhora da quantia existente até o limite da dívida. A pe­nhora, nesse caso, por expressa previsão legal, poderá ser realizada por meio eletrônico (penhora on-line), nos seguintes termos:

Art. 655-A. Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, re­quisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferen­cialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determi­nar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução.§ 1o As informações limitar-se-ão ã existência ou não de depósito ou aplicação até o valor indicado na execução.

A inovação tratou de respeitar o sigilo bancário, uma vez que o referido parágrafo não autoriza a obtenção da movimentação ban­cária total do devedor, mas tão-somente a comunicação de exis­tência ou não de saldo até o valor indicado na execução. A institui­ção bancária realizará o bloqueio dos valores e os transferirá como depósito em favor do juízo da execução.6

b) Veículos de via terrestre. Realizada a penhora de veículos, o juiz comunicará ao órgão responsável pelo registro do bem para que seja realizada a anotação da constrição e eventual apreensão.

6 Antes mesmo de a Lei n. 11.382/2006 passar a autorizar expressamente a penhora on­line, a jurisprudência já admitia sua realização. Nesse sentido: "Processual civil. Agravo regi­mental. Execução. Penhora sobre dinheiro. Banco. Onerosidade. Súmulas n. 83 e 7 do STJ. I. Esta Corte Superior tem fixado o entendimento que preconiza a possibilidade de a penhora recair sobre saldo existente em conta-corrente sem que ocorra ofensa ao princípio da menor onerosidade para o devedor (3o T„ Ag. Reg. no REsp n. 528.227/RJ, rel. Min. Nancy Andrighi, unânime, DJU de 15.12.2003; 3a T„ Ag. Reg. no Ag. n. 535.011/RS, rel. Min. Antônio de Pá- dua Ribeiro, unânime, DJU de 20.09.2004; 3a T„ Ag. Reg. no Ag. n. 406.229/SP, rel. Min. Hum­berto Gomes de Barros, unânime, DJU de 08.08.2005; e 4a T., REsp n. 256.900/RS, rel. Min. Barros Monteiro, unânime, DJU de 27.09.2004). (...) III. Agravo regimental desprovido". (STJ, 4a T„ Ag. Reg. no Ag. 790.672/RS, rel. Min. Aldair Passarinho Junior, j. 17.10.2006, v.u.)

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 239

c) Bens móveis.d) Bens imóveis. Procedida a penhora de bem imóvel, sendo o execu­

tado casado, o Código determina que seja intimado o cônjuge, isso para que possa, eventualmente, exercer direito sobre a meação.

Além disso, com a penhora do imóvel, o credor exeqüente re­quererá a expedição de certidão de juízo e efetuará o registro no respectivo cartório de registro de imóveis para que se dê publici­dade e o ato tenha efeito perante terceiros.7

e) Navios e aeronaves.f) Ações e cotas de sociedades empresárias.g) Percentual do faturamento de empresa executada.

Aqui, não se trata de penhora das cotas da sociedade, mas apenas de seu faturamento, compreendido como toda e qualquer receita da empresa. A legislação não trata de lucros, mas sim de faturamento.

Devemos observar, ainda, que o artigo faz referência ao termo percentual; portanto, parte do faturamento e não sua integralidade. Penhorar a integralidade do faturamento de uma empresa poderá lhe acarretar grave onerosidade e prejuízos irreparáveis. Assim, compete ao magistrado, pela razoabilidade e proporcionalidade, fixar o percentual compatível com a realidade fática do caso.s

7 "Art. 659. (....) § 4o A penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora, cabendo ao exeqüente, sem prejuízo da imediata intimação do executado (art. 652, § 4o), providenciar, para presunção absoluta de conhecimento por terceiros, a respecti­va averbação no ofício imobiliário, mediante a apresentação de certidão de inteiro teor do ato, independentemente de mandado judicial."

8 "Tributário e processual civil. Execução fiscal. Penhora sobre o faturamento da empre­sa. Matéria fática. Súmula 7/STJ. 1. Em observância ao consagrado princípio favor debitoris (art. 620 do CPC), tem-se admitido apenas excepcionalmente a penhora sobre o faturamen­to, desde que presentes, no caso, requisitos específicos que justifiquem a medida, quais sejam, (a) inexistência de bens passíveis de constrições, suficientes a garantir a execução, ou, caso existentes, sejam de difícil alienação; (b) nomeação de administrador (arts. 678 e 719, caput, do CPC), ao qual incumbirá a apresentação da forma de administração e do esquema de paga­mento; (c) fixação de percentual que não inviabilize o próprio funcionamento da empresa. Pre­cedentes: Ag. Reg. n. 593.006/PR, 1a T., rel. Min. Luiz Fux, DJ 30.05.2005; REsp n. 723.038/ SP, 2a T„ rel. Min. Castro Meira, DJ 20.06.2005. 2. Averiguar se a aplicação do princípio, em cada caso, se fez adequadamente ou não, e se a relativização da ordem da penhora era justi­ficável ou não em face daquele princípio, são investigações que exige o exame da situação de fato, incabível no âmbito do recurso especial (Súmula 07/STJ). 3. Recurso especial não conhe­cido." (STJ, 1a T., REsp n. 803.435/RJ, rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 10.10.2006, v.u.)

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O § 3o do art. 655-A determina que, para a penhora de percen­tual do faturamento da empresa devedora, o juiz deverá nomear um depositário, que submeterá à apreciação e à aprovação judicial na forma de efetivação da expropriação. Esse depositário atuará como verdadeiro administrador judicial, inclusive com o encargo de prestar contas mensalmente e de entregar os valores ao credor exeqüente para o fim de amortização da dívida.

h) Pedras e metais preciosos.i) Títulos da dívida pública da União, estados e Distrito Federal, com

cotação no mercado.j) Títulos e valores mobiliários com cotação em mercado (por exem­

plo, ações que possam ser expostas em bolsas de valores).1) Outros direitos. Qualquer outro direito existente em nome do de­

vedor poderá sofrer a penhora, como créditos existentes em ações judiciais, direitos em herança etc. Caso o direito a ser penhorado es­teja sendo objeto de processo, o juiz da execução requererá a penho­ra no rosto dos autos do processo em que se encontrar o crédito.

Ressalte-se que, se a execução versar sobre crédito que contenha garantia de hipoteca, penhor ou anticrese, a penhora recairá preferen­cialmente sobre o bem que serve de garantia. Além disso, se a coisa pertencer a terceiro, o juiz deverá determinar a sua intimação da pe­nhora.

É importante destacar que o § Io do art. 655 do Código de Proces­so Civil não estabelece a citação do terceiro garantidor na execução, mas apenas sua intimação da penhora.

Por fim, cumpre-nos esclarecer que, em se tratando de penhora de bem indivisível, a meação do cônjuge não responsável pela execução recairá sobre o produto da alienação do bem (art. 655-B).

Trata-se de inovação trazida pela reforma da Lei n. 11.382/2006, já que, no antigo sistema, apenas o percentual relativo ao cônjuge deve­dor, quando o bem fosse indivisível, seria levado à venda. Agora, por expressa previsão legal, se o bem penhorado não comportar divisão, será ele integralmente levado à hasta, e do produto da venda se garan­tirá a meação do cônjuge.

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 2 4 1

Em proteção da dignidade da pessoa do devedor - evitando san­ção e ofensa pessoal o Código estabelece limites para a penhora, considerando os bens: a) penhoráveis; b) absolutamente impenhorá- veis; c) relativamente impenhoráveis.

São absolutamente impenhoráveis (art. 649 do CPC):

■ ■ 1 5 . 4 . 2 IMPENHORABILIDADE

a) Os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujei­tos à execução.

O Código Civil permite a instituição de cláusula de inalienabi- lidade e impenhorabilidade em determinados casos, isso por ato voluntário manifestado perante a autoridade competente. Trata-se de gravame instituído sobre a coisa que a torna indisponível para alienações (instituição do bem de família, doação ou testamento com cláusula de inalienabilidade).

b) Os bens móveis que guarnecem a residência do executado, salvo aqueles de valor elevado ou que ultrapassem as necessidades co­muns correspondentes a um médio padrão de vida.9

A impenhorabilidade dos móveis da residência do devedor já era contemplada antes mesmo da reforma da Lei n. 11.382/2006, pela Lei n. 8.009/90.

Agora, porém, o legislador foi absolutamente infeliz ao ressal­var da impenhorabilidade os bens móveis com conceitos de eleva­do valor ou que ultrapassem necessidades de determinado padrão social. Trata-se de conceito legal indeterminado, dotado de grande carga de subjetividade na interpretação.

A regra geral do Direito nos ensina que toda regra restritiva de­ve ser expressa e conter um comando objetivo. Qual será a inter­pretação dada à expressão “um médio padrão de vida”? Como sa­ber qual bem é necessário a um médio padrão de vida? De fato, esperamos que os magistrados, na dura missão de tentar entender o que o legislador queria dizer (e não disse), de posse da razoabi-

9 Redação dada pela Lei n. 11.382/2006.

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242 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

lidade, interpretem a ressalva com base na garantia constitucional do devido processo legal e da isonomia.

c) O vestuário, bem como os pertences pessoais do executado, salvo se de elevado valor.

d) Os vencimentos, subsídios, soidos, salários, remunerações, proven­tos de aposentadoria, pensões, pecúlios, montepios, as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinada ao sustento da vida do devedor e de sua família, os ganhos do trabalhador autôno­mo e os honorários dos profissionais liberais. O inc. IV do art. 649 do Código de Processo Civil excluiu da penhora toda e qualquer renda alimentar ou de natureza salarial recebida mensalmente pelo devedor. A exclusão se justifica como meio de garantia da própria vida do devedor e de sua família. Se o rendimento alimentar m en­sal do devedor pudesse ser penhorado, eqüivaleria a uma pena ou castigo físico que importaria em violação da dignidade humana.

Com o mesmo intuito de defesa da dignidade humana, a p ró­pria legislação, porém, admite uma exceção à impenhorabilidade do “salário”, quando autoriza o desconto em folha de pagamento para a satisfação de débito alimentar (pensão alimentícia).

Outro problema prático tem sido a penhora on-line de contas correntes destinadas ao recebimento de verbas salariais. Os magis­trados, por deficiência no sistema informatizado de penhora, não tem como identificar a natureza da conta e, muitas vezes, acabam por bloquear valores indispensáveis à manutenção da vida.

A reforma introduziu dispositivo no sentido de determinar que compete ao executado o ônus de provar que o valor contido na conta bancária é relativo à verba alimentar, para que o magistrado realize o desbloqueio, nestes termos (art. 655-A):

§ 2° Compete ao executado comprovar que as quantias deposita­das em conta corrente referem-se à hipótese do inciso IV do ca- put do art. 649 desta Lei ou que estão revestidas de outra forma de impenhorabilidade.

Tal situação, na prática, poderá sujeitar o executado a constri- ção patrimonial que cause dano grave ou de difícil reparação. Mas,

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 243

realizada a penhora on-line em conta corrente, terá o executado que comprovar a origem salarial e alimentar do dinheiro, para que o valor lhe seja liberado.

A norma, certamente, precisa ser analisada à luz da Constitui­ção e constatada a proporcionalidade do grave em face do respei­to à dignidade humana.

e) Os livros, máquinas, ferramentas, utensílios, instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão. O dispositivo é pertinente à garantia do exercício do trabalho. A regra não se aplica ao empresário ou comerciante, mas ao profissional que depende de seus equipamentos para a sobrevivência. São impenhorá- veis, por exemplo, a máquina de costura de uma costureira, o veículo de um taxista, os móveis e equipamentos de um dentista etc.

f) O seguro de vida.g) Os materiais necessários à obra em andamento, salvo se esta for

penhora integral.h) A pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que a

família trabalhe nela.i) Os recursos públicos recebidos por instituições privadas para a

aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social.j) A quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de

quarenta salários mínimos.

O § Io do art. 649 do Código de Processo Civil estabelece que a impenhorabilidade não poderá ser alegada pelo devedor se a dívida foi contraída para a aquisição do próprio bem. Evidentemente, seria ad­mitir a má-fé do devedor, que poderia adquirir um imóvel, não pagar por isso e depois alegar a impenhorabilidade por bem de família.

Além da impenhorabilidade dos bens arrolados no art. 649 do Có­digo de Processo Civil, também é de grande importância o estudo do instituto do bem de família previsto na Lei n. 8.009/90.

Nos termos da referida legislação, independentemente de qualquer declaração ou manifestação de vontade, considera-se impenhorável o imóvel em que residir o devedor e sua família, estendendo tal vedação de expropriação aos bens móveis que guarnecem a casa (art. Io da Lei n. 8.009/90).

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244 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

A proteção contra a penhora se dá em favor da entidade familiar. Ao interpretar tal dispositivo, a jurisprudência tem dado o maior al­cance possível à expressão “entidade familiar”, para englobar não ape­nas o casamento, a união estável, mas também outras modalidades informais de família.

O Superior Tribunal de Justiça firmou jurisprudência no sentido de considerar como bem de família e, portanto, impenhorável o imó­vel no qual resida unicamente o devedor, sem a exigência de que tenha a constituição de uma família formal.10

O devedor, tendo sob penhora o bem de família, deverá, dentro da própria execução, alegar a impenhorabilidade e demonstrar a utilida­de familiar do imóvel, pois, uma vez levado o bem à venda e arrema­tado ou adjudicado por terceiros, não caberá mais a proteção da Lei n. 8.009/90."

O instituto do bem de família criado pela Lei n. 8.009/90 é de natu­reza processual (e não do direito material civil), sendo expressa a legis­lação especial em afirmar que a proteção se aplica nos processos de execução de qualquer natureza jurisdicional (civil, trabalhista, previ- denciária, fiscal ou outras).

A própria legislação extravagante menciona, no entanto, as exce­ções em que o devedor não poderá invocar a impenhorabilidade do bem de família. São elas (art. 3o da Lei):a) Em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das

respectivas contribuições previdenciárias.

,0 "Processual civil. Execução. Penhora. Bem de família. Ocupação unicamente pelo pró­prio devedor. Extensão da proteção dada pela Lei n. 8.009/90. I. Segundo o entendimento firmado pela Corte Especial do STJ (EREsp n. 182.223/SP, rel. p/ acórdão Min. Humberto Gomes de Barros, DJU 07.04.2003, por maioria), considera-se como 'entidade familiar', para efeito de impenhorabilidade de imóvel baseada na Lei n. 8.009/90, a ocupação do mesmo ainda que exclusivamente pelo próprio executado. II. Ressalva do ponto de vista do relator. III. Recurso especial conhecido e parcialmente provido, para afastar a penhora." (STJ, REsp n. 759.962/DF, rel. Min. Aldair Passarinho Junior, j. 22.08.2006, v.u.)

11 "Processual civil. Execução. Alegada impenhorabilidade de bem de família. Arrema- tação concluída. Preclusão. Lei n. 8.009/90.1. A jurisprudência desta Corte é assente em afir­mar que, arrematado o bem penhorado, impossível a invocação do benefício da Lei n. 8.009/90. II. Recurso especial não conhecido." (STJ, 4a T., REsp n. 468.176/PB, rel. Min. Aldair Passari­nho Junior, j. 20.06.2006, v.u.)

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 245

b) Pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acrés­cimos constituídos em função do respectivo contrato.

c) Pelo credor de pensão alimentícia.d) Para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contri­

buições devidas em função do imóvel familiar.e) Para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garan­

tia real pelo casal ou pela entidade familiar.f) Por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de

sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou per- dimento de bens.

g) Por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de loca­ção. Acerca de tal dispositivo, instaurou-se no Supremo Tribunal Federal a discussão acerca da constitucionalidade de tal possibilida­de de penhora do bem de família do fiador. A dúvida era se a penho­ra ofendia os preceitos constitucionais da moradia e da isonomia. No entanto, o Plenário da Corte se manifestou pela constitucionali­dade do inc. VII do art. 3 da Lei n. 8.009/90, permitindo assim a penhora do bem de família do fiador para pagamento da dívida decorrente da locação (RE n. 407.688, rel. Min. Cezar Peluso).12

Por fim, não obstante a existência de bens absolutamente impe- nhoráveis, como tratamos anteriormente, na falta de outros bens o art. 650 admite a constrição (impenhorabilidade relativa) dos frutos e ren­dimentos dos bens inalienáveis, salvo se esses recursos estiverem sendo utilizados para prestação alimentícia.13

n "Recurso. Extraordinário. Inadmissibilidade. Fiador. Locação. Responsabilidade solidá­ria pelos débitos do afiançado. Penhora de seu imóvel residencial. Bem de família. Admissibi­lidade. Inexistência de afronta ao direito de moradia, previsto no art. 6o da CF. Constituciona­lidade do art. 3o, inc. VII, da Lei n. 8.009/90, com a redação da Lei n. 8.245/91. Jurisprudência assente. Ausência de razões consistentes. Decisão mantida. Agravo regimental improvido. Nega-se provimento a agravo regimental tendente a impugnar, sem razões consistentes, deci­são fundada em jurisprudência assente na Corte." (STF, 2a T., Al no Ag. n. 585.772, rel. Min. Cezar Peluzo, j. 19.09.06, v.u.)

13 Na redação anterior à reforma, estavam incluídos no rol dos bens relativamente impe- nhoráveis as imagens e os objetos de culto religioso, quando fossem de grande valor. No

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h 15.4.3 S u b s t i t u i ç ã o d o b e m p e n h o r a d o

Citado, o devedor poderá indicar bens à penhora no prazo de 3 dias. Caso permaneça omisso, o próprio oficial de justiça fará a penhora com observância do disposto no art. 655 do Código de Processo Civil. Ade­mais, quando da elaboração de sua inicial, o próprio exeqüente pode­rá indicar os bens que pretende que sejam expropriados.

Seja realizada por quem for, sempre a penhora deverá observar a ordem estabelecida no disposto no art. 655 do Código de ritos.

Além disso, o art. 656 admite a substituição da penhora, a pedido de qualquer uma das partes, quando:

a) não obedecer à ordem legal;b) não incidir sobre os bens designados em lei contrato ou ato judi­

cial para o pagamento;c) havendo bens no foro da execução, outros houverem sido penho-

rados;d) havendo bens livres, a penhora houver recaído sobre bens já pe-

nhorados ou objeto de gravame;e) incidir sobre bens de baixa liquidez (baixo valor ou de difícil alie­

nação);f) frustrada a tentativa de alienação judicial de bem anteriormente

penhorado;g) o devedor não indicar o valor dos bens ou omitir qualquer das in­

dicações a que se referem os incs. I a IV do parágrafo único do art. 668 desta Lei.

O executado, sob pena de ter caracterizada má-fé processual e ofen­sa à dignidade da Justiça, tem o dever de indicar o local onde se encon­tram os bens. Ao indicar um bem à penhora, compete ao executado o ônus de exibir a prova da propriedade ou titularidade e ainda eventual

2 4 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

entanto, a atual redação do art. 650 não mais prevê tal exceção, o que nos leva a concluir ser possível a penhora das imagens e objetos de culto religioso. Outra questão interessante e que passou omissa pelo legislador foi a proteção aos jazigos. Como sabemos, os túmulos, muitas vezes, possuem valores altos para a aquisição e, pela simples leitura do Código de Pro­cesso Civil, chegaríamos à idéia de que tais bens podem ser penhorados. Todavia, ainda em uma contemplação da máxima constitucional de proteção à dignidade humana, temos que tais bens são absolutamente impenhoráveis, pois isso submeteria o devedor à situação vexa­tória e moralmente grave de ter expropriados os restos mortais que se encontrarem no local.

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 247

certidão de negativa de ônus (no caso de imóveis), bem como apresen­tar a estimativa do valor da coisa.

A qualquer m om ento, o devedor executado poderá requerer a substituição da penhora de bem pelo depósito de quantia a favor do juízo, ou ainda, nos termos do § 2o do art. 656, requerer a substituição por fiança bancária ou seguro garantia judicial, em valor não inferior ao do débito constante da inicial, mais 30%.

Requerida a substituição do bem penhorado, o magistrado deter­minará a oitiva da parte contrária, para que, no prazo de 3 dias, se m a­nifeste em relação ao pedido da outra. Havendo a substituição, será la­vrado novo termo de penhora.

Todas essas questões incidentais serão decididas de plano pelo juiz e assim, por se tratar de decisão interlocutária, nesse caso, terá cabi­mento o recurso de agravo de instrumento.

■ i 15.4.4 A rresto - N ã o - l o c a l iz a ç ã o do Ex e c u t a d o

O art. 653 do Código de Processo Civil estabelece que, caso o ofi­cial de justiça não localize o devedor executado para realização da exe­cução, deverá, imediatamente, proceder ao arresto dos bens do deve­dor, tantos quantos bastem para a satisfação da execução.

Não se trata de penhora, mas de arresto de bens dada a impossibi­lidade de citação do executado. Se o devedor for encontrado e citado pessoalmente, o oficial não fará arresto, mas, de plano, não cumprida a obrigação no prazo de 3 dias, realizará a penhora com observância do disposto no art. 655.

Não encontrando o devedor, o oficial realizará o arresto, também com observância do rol previsto no art. 655, já que a finalidade do arresto é, no futuro, ser convertido em penhora.

Após a realização do arresto, o oficial de justiça, no prazo de 10 dias seguintes ao ato, procurará o devedor três vezes em dias distintos. Caso seja o executado encontrado, será realizada a citação pessoal e da­da a ele a oportunidade de pagar a dívida no prazo legal ou nomear bens à penhora. Não sendo localizado, o oficial certificará o ocorrido.

Note-se que, até aqui, não sendo o devedor localizado, não houve a citação. E, como sabemos, por se tratar de um processo, esta é tida co­

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248 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

mo pressuposto de validade da relação jurídica. Por tal razão, o art. 654 do Código de Processo Civil determina que, após a efetivação do arres­to, o exeqüente deverá promover por edital a citação do executado.

Publicado o edital e expirado o prazo nele previsto, o devedor exe­cutado terá o direito de pagar a dívida nos termos do art. 652 ou indi­car novos bens à penhora; caso isso ocorra, ficará sem efeito o arresto.14 Permanecendo inerte após a citação editalícia, porém, os bens arresta­dos serão convertidos em penhora, prosseguindo a execução.

É importante esclarecer que o arresto do art. 653 do Código de Processo Civil é instituto absolutamente distinto do arresto cautelar do art. 813. A ação cautelar de arresto tem cabimento quando o devedor tenta alienar bens para frustrar uma execução de quantia, com os requisitos previstos no artigo mencionado. Já o arresto de que trata­mos neste capítulo representa um mero ato processual dentro da ação de execução, aplicável quando o oficial não localizar o executado para a citação pessoal.

Nesse ponto, poderia surgir a seguinte indagação: constatando o oficial que o devedor está se ocultando, poderia ser realizada a citação por hora certa?

O Superior Tribunal de Justiça tem se manifestado em sentido po­sitivo, já que as normas do processo de conhecimento se aplicam subsi­diariamente ao processo de execução.15 Se o oficial presumir a ocultação do executado, poderá, portanto, citar por hora certa e imediatamente proceder à penhora de bens, dispensando o arresto e a posterior publi­cação do edital.

M "Processual civil. Recurso especial. Ação de execução. Citação por edital. Compareci- mento espontâneo do devedor ao processo. Conversão do arresto em penhora. Necessidade de intimação do devedor desse ato. Embargos do devedor. Prazo. Início. - Na ação de exe­cução, ainda que determinada a citação do devedor por edital, o seu comparecimento es­pontâneo ao processo dentro dos 30 dias assinalados na publicação supre a falta de citação e torna insubsistente a citação editalícia. - Nesse caso, ainda que tenha ocorrido a conversão automática do arresto em penhora, faz-se necessária a intimação pessoal do devedor sobre tal ato processual, fluindo o prazo para oposição de embargos do devedor à execução da data da juntada aos autos da prova desse ato, nos termos do art. 738, I, do CPC." (STJ, 3a T., REsp n. 434.729/SP, rel. Min. Nancy Nadrighi, j. 17.10.2002, v.u.)

,5 "Processual civil. Recurso especial. Citação com hora certa em processo de execução extrajudicial. Possibilidade. Conforme disposto no art. 277 do Código de Processo Civil, ocor-

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 249

É importante frisar, contudo, que a citação por hora certa apenas terá cabimento se o oficial presumir que o executado está se ocultan­do; caso contrário, deverá realizar o arresto e, posteriormente, se fará a citação editalícia.

Sendo a citação ficta - seja por edital ou por hora certa nos ter­mos do art. 9o do Código de Processo Civil, o juiz, contudo, deverá nomear curador especial para atuar formalmente na defesa do execu­tado, que poderá, inclusive, oferecer embargos.16

m 15.4 .5 Fo r m a l iz a ç ã o da P e n h o r a - T erm o

DE DEPÓSITO, AVALIAÇÃO E INTIMAÇÃO

A penhora será realizada onde quer que se encontrem os bens do devedor, independentemente de expressa previsão no mandado execu- tório (art. 659, § Io, do CPC).

Sendo o bem de pequeno valor, a penhora não será efetivada se ficar constatado que o produto da alienação da coisa não será suficien­te para o pagamento das custas e despesas processuais da execução.

Em síntese, podemos afirmar que:

a) Se houver resistência no cumprimento da ordem judicial, o magis­trado poderá deferir força policial (art. 662 do CPC) e até ordem de arrombamento (a diligência para o arrombamento será cum ­prida por dois oficiais de justiça, com a presença de duas testemu­nhas - art. 661).

b) Realizada a penhora, o oficial fará a apreensão e o depósito da coisa, lavrando-se auto ou termo da diligência (art. 665 do CPC).

c) Apreendido o bem, ele ficará (art. 666 do CPC):

re a citação com hora certa quando há suspeita de ocultação por parte do réu, procurado três vezes em sua residência. Essa forma de citação é aplicável tanto ao processo de conhecimen­to, quanto aos demais processos, incluindo-se o de execução, por força da subsidiariedade prevista no art. 598 do mesmo estatuto. Recurso especial provido." (STJ, 3a T., REsp n. 673.945/SP, rel. Min. Castro Filho, j. 25.09.2006, v.u.)

16 Súmula n. 196 do STJ: "Ao executado que, citado por edital ou por hora certa, per­manecer revel, será nomeado curador especial, com legitimidade para apresentação de embargos".

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250 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

• depositado no Banco do Brasil, na Caixa Econômica Federal, em banco em que o estado-membro tenha participação ou, na falta de instituição pública, em estabelecimento de crédito ou financeiro designado pelo juiz, quando o bem se tratar de quan­tia, pedras, metais preciosos ou papéis de crédito;

• em posse do depositário judicial, no caso de móveis ou imóveis urbanos;

• em poder do depositário particular, os demais bens.

Havendo concordância do credor exeqüente, os bens poderão per­manecer com o executado, desde que este assuma o encargo de depo­sitário.17 O devedor executado não é obrigado a aceitar tal encargo.

Devemos lembrar que o depositário assume função de guardar e conservar a coisa como se fosse sua; além disso, tem o dever de fa­zer a restituição, nesse caso, por se tratar de depósito judicial, quan­do for determinado pelo magistrado. O depositário infiel pode ter sua prisão decretada como meio coercitivo para entrega do bem.

Em se tratando de depósito judicial, a prisão do depositário in­fiel poderá ser decretada dentro da própria ação de execução, nos termos do § 3o do art. 666 do Código de Processo Civil.18 A prisão apenas poderá ser decretada se o executado tiver assumido o en­cargo de depositário (Súmula n. 304 do STJ).19

17 "Execução de título extrajudicial. Arts. 664 e 665 do Código de Processo Civil. Au­sência de nomeação do depositário. Precedentes da Corte. 1. A recusa dos devedores em re­ceber o bem penhorado como depositários não configura nulidade, podendo ser suprida a nomeação do depositário nos termos do art. 666 do Código de Processo Civil. 2. Como já as­sentou a Corte, a 'ausência de nomeação no auto de penhora constitui irregularidade formal sanável, revestindo-se a nulidade da execução, declarada de ofício, na hipótese, em virtude de tal omissão, de excessivo rigor, o que não se coaduna com o princípio da instrumentalidade das formas, norteador da processualística moderna' (REsp n. 90.865/MG, rel. Min. Cesar As- for Rocha, DJ 26/10/98; no mesmo sentido: REsp n. 85.236/MG, rel. Min. Barros Monteiro, DJ 10/6/96). 3. Recurso especial não conhecido". (STJ, 3a T„ REsp n. 399.263/RS, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 29.11.2002, v.u.)

O referido parágrafo foi inserido com a reforma da Lei n. 11.382/2006; no entanto, a jurisprudência já era no sentido de que a prisão do depositário judicial infiel poderia ser decretada dentro da própria ação em que se originou o depósito, sem a necessidade da pro­positura da ação especial de depósito prevista no art. 901 do CPC.

19 "É ilegal a decretação da prisão civil daquele que não assume expressamente o encar­go de depositário judicial."

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 2 5 1

d) Intimação da penhora. Após a lavratura do termo de penhora e avaliação, o devedor será intimado do ato, isso para que possa, even­tualmente, impugnar o valor da avaliação ou requerer a substitui­ção do bem.

A intimação será realizada no mesmo momento da penhora (art. 652, § Io, do CPC), caso isso seja possível. Na impossibilida­de de ser pessoal e havendo nos autos advogado constituído, o juiz poderá determinar a intimação pelo órgão oficial de impressa.

Se o oficial, no entanto, não localizar o executado para intimá- lo e não houver advogado nos autos, ocorrerá a seguinte determi­nação (art. 652):

§ 5o Se não localizar o executado para intimá-lo da penhora, o o fi­cial certificará detalhadamente as diligências realizadas, caso em que o juiz poderá dispensar a intimação ou determinará novas di­ligências.

Intimado da penhora, o devedor terá o prazo de 10 dias para requerer a substituição do bem penhorado, nos termos do art. 668 do Código de Processo Civil, tendo cabimento o pedido desde que prove que a substituição não trará prejuízo ao exeqüente e que se trata de forma menos onerosa sobre o seu patrimônio.

Tal pedido de substituição deverá conter os seguintes requisitos (art. 668, parágrafo único): quanto aos bens imóveis, indicar as respectivas matrículas e registros, situá-los e mencionar as divisas e confrontações; quanto aos móveis, particularizar o estado e o lu­gar em que se encontram; quanto aos semoventes, especificá-los, indicando o número de cabeças e o imóvel em que se encontram; quanto aos créditos, identificar o devedor e qualificá-lo, descre­vendo a origem da dívida, o título que a representa e a data do ven­cimento; atribuir valor aos bens indicados à penhora.

Na verdade, os requisitos previstos no parágrafo único do art. 668 também deverão ser observados pelo executado quando ele nomear os bens à penhora no tríduo legal do art. 652.

e) Avaliação do bem. No ato de penhora, o próprio oficial de justiça realizará a avaliação do bem. Evidentemente, não se falará em ava­

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252 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

liação se a penhora recair sobre dinheiro, mas, nos casos dos bens previstos nos incs. II a X do art. 655 do Código de Processo Civil, a venda do bem dependerá do conhecimento do valor de mercado.

No sistema anterior à reforma, o oficial apenas era incumbido de fazer a citação e a penhora, para que, posteriormente, o juiz nomeasse um perito para apurar o valor do bem expropriado.

Agora, o mandado executório contém a ordem para que o oficial realize a citação, a penhora e a avaliação dos bens, concentrando os atos processuais para maior celeridade (art. 680 do CPC).

Essa regra, todavia, será excepcionada quando a atribuição do valor necessitar de conhecimentos técnicos específicos, situação em que o juiz nom eará um perito avaliador para, em 10 dias, elaborar um laudo, que integrará o auto de penhora (com os requisitos do art. 680 do CPC).

Por sua vez, o art. 683 do Código de Processo Civil admite a reali­zação de uma segunda avaliação quando: qualquer das partes argüir, fundamentadamente, a ocorrência de erro na avaliação ou dolo do avaliador; se verificar, posteriormente à avaliação, que houve majora­ção ou diminuição no valor do bem; houver fundada dúvida sobre o valor atribuído ao bem.

De qualquer modo, a avaliação - inclusive pelo oficial de justiça - será dispensada caso as partes acordem o valor da coisa (se o exeqüen­te aceitar a estimativa dada pelo executado quando do oferecimento do bem à penhora) ou quando o bem tiver cotação em bolsa de valores ou mercadorias, nos termos do art. 684 do Código de Processo Civil.

Na redação anterior, o Código previa, no art. 684, III, a dispensa de avaliação quando o bem fosse de pequeno valor. A reforma revogou o referido inciso, mas, por outro lado, passou a prever que não se fará a penhora quando o bem for de pequeno valor e o produto de sua ven­da, absorvido pelas despesas processuais.

Após a avaliação, as partes poderão requerer ao magistrado a ade­quação da penhora ao valor da dívida, nos termos do art. 685 do Códi­go de Processo Civil, podendo haver:

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 253

redução da penhora ou transferência para outros bens, quando o valor do bem penhorado for consideravelmente superior ao crédi­to da ação;ampliação da penhora, quando se verificar que o valor do bem apreendido não é suficiente para a quitação da dívida.

Nas duas hipóteses, as partes serão ouvidas e o magistrado decidi­rá acerca da substituição do bem ou nova penhora.

■ i 1 5 . 4 . 6 E x p r o p r i a ç ã o d o s B e n s P e n h o r a d o s

Realizadas a penhora, a avaliação e a intimação do executado, o juiz determinará o prosseguimento da execução com a adoção de medidas para a expropriação dos bens do devedor.

A reforma da Lei n. 11.382/2006 alterou o art. 647, que passa a pre­ver a expropriação dos bens do devedor na seguinte ordem: Io) adju­dicação do bem pelo credor; 2o) alienação por iniciativa privada; 3o) alienação em hasta pública.

Antes da reforma, a adjudicação apenas poderia ser requerida pelo credor exeqüente após frustrada a tentativa de venda do bem em hasta pública (leilão ou praça).

a) Adjudicação

Trata-se da faculdade conferida ao credor exeqüente de aceitar como pagamento da dívida os bens penhorados do devedor. Na verdade, em vez de receber dinheiro, como a obrigação estava originariamente fixa­da, o credor acabará recebendo uma coisa (aquela que foi penhorada).

O instituto da adjudicação equipara-se à dação em pagamento pre­vista no Código Civil.

A adjudicação, nos termos do art. 685-A do Código de Processo Civil, será requerida pelo exeqüente, com oferta de preço não inferior ao valor da avaliação.

Evidentemente, se o crédito executado for inferior ao valor da ava­liação, o credor deverá depositar imediatamente (junto com o pedido de

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2 5 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

adjudicação) a diferença do valor, sendo deferido o levantamento ao executado. Caso contrário, hipótese em que do valor de avaliação do bem seja inferior ao débito exeqüendo, o processo de execução prosse­guirá até a quitação do débito remanescente, ou seja, com nova penho­ra de bens.

Outra questão importante que surge em relação à adjudicação é o fato de a lei (art. 685-A, § 2o) dar preferência à adjudicação dos bens penhora- dos em favor do credor que tiver garantia real pelos credores concorrentes ou mesmo pelo cônjuge, descendentes ou ascendentes do executado.20

Portanto, todos esses sujeitos estão legitimados a manifestar o in­teresse na adjudicação.

Havendo o concurso de interessados na adjudicação, como, po­rém, será resolvida a preferência?

O § 3o ao art. 685-A dispõe que, no caso de existir mais de um pre­tendente, proceder-se-á entre eles uma licitação; em igualdade de ofer­ta, terão preferência o cônjuge, o descendente ou o ascendente, nessa ordem, que terão de depositar o valor. Sendo a penhora de cotas sociais procedida por exeqüente alheio à sociedade, essa será intimada, asse­gurando preferência aos sócios.

Julgadas eventuais questões incidentais, como a anteriorm ente mencionada, o juiz mandará à serventia que lavre o auto de adjudica­ção. Expedido o referido auto e assinado pelo magistrado, conside­ra-se perfeita e acabada a adjudicação, expedindo-se a competente carta de adjudicação.

Ela será o documento entregue ao adquirente do bem para que possa comprovar a aquisição e titularidade perante terceiros (por exem­plo, para registro no cartório de imóveis, transferência de veículo, etc.), cumpridos os requisitos do parágrafo único do art. 685-B.

20 Os arts. 787 a 790, revogados pela Lei n. 11.382/2006, previa a possibilidade de o cônjuge, o ascendente ou o descendente do executado fazer a remição dos bens após terem sido alienados (arrematação ou adjudicação). Esse instituto não mais existe no sistema pro­cessual, mas agora tais entes familiares poderão concorrer à adjudicação da coisa.

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 255

b) Alienação por iniciativa particular

Trata-se de inovação trazida pela Lei n. 11.282/2006, uma vez que, no sistema anterior, toda alienação deveria ocorrer em hasta pública perante o próprio Poder Judiciário.

Como já tratamos, a primeira hipótese de expropriação será a ad­judicação do bem pelo credor exeqüente, mas, se isso não ocorrer, nos termos do art. 685-C, poderá ele requerer ao magistrado que os bens penhorados sejam levados à venda por sua própria iniciativa. Nesse ca­so, o credor exeqüente assume o ônus de vender o bem penhorado.

A venda por iniciativa privada se dará por meio de corretor (ou leiloeiro) credenciado junto à autoridade judiciária (um particular ha­bilitado em juízo para a realização da venda dos bens penhorados).

Autorizada pelo magistrado a alienação por iniciativa particular, este fixará o prazo para a venda, a forma de publicidade (publicação de eventual edital ou convocação pública), o preço m ínimo (que não será inferior ao da avaliação), as condições de pagamento e garantias e a comissão de corretagem (despesas com o profissional que for rea­lizar o ato).

Havendo comprador, a alienação será formalizada por termo nos autos da execução, termo este que será assinado pelo juiz, pelo exe­qüente, pelo adquirente e, se estiver presente, pelo executado, expedin­do-se a carta de alienação do imóvel para o devido registro imobiliá­rio ou, se bem móvel, mandado de entrega ao adquirente.

O § 3o do art. 685-C autoriza aos tribunais, no âmbito de suas competências, a criação de meios eletrônicos para a venda dos bens penhorados. A concorrência para a aquisição desse bem poderá ser realizada pela Internet.21

21 Verificar art. 689-A do CPC incluído pela Lei n. 11.382/2006.

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2 5 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

c) Alienação em hasta pública

De fato, com a nova sistemática, acreditamos que a venda em hasta pública venha a cair em desuso, para, no futuro, toda alienação ser pra­ticada por iniciativa privada, que terá maior eficiência, rapidez e dimi­nuição de custos, além de retirar do Judiciário uma função que não lhe é típica (a de comércio).

Frustrada a adjudicação ou a alienação por iniciativa particular, se­rá realizada a venda do bem em hasta pública, determinando o art. 686 que ela seja precedida da publicação de edital, cumpridos os requisitos estabelecidos nos incisos do referido artigo.

O edital, porém, será dispensado quando o valor dos bens penho­rados não exceder sessenta vezes o valor do salário mínimo; nesse caso, porém, o valor da arrematação não poderá ser inferior ao da avaliação.

Na hipótese de o credor exeqüente ser beneficiário da justiça gra­tuita, a publicação do edital será realizada apenas no órgão da Impren­sa Oficial.

O edital estabelecerá o local da realização do leilão ou da praça. O executado também será intimado do dia, hora e local da alienação ju ­dicial. Caso exista advogado constituído nos autos, a intimação se dará na pessoa dele; do contrário, ela se fará pessoalmente por mandado, por carta registrada, edital ou outro meio idôneo (como a comunica­ção em rádio).

Ressalte-se, que a reforma passou a admitir que todo o procedi­m ento de hasta pública tam bém seja substituído pelo uso de meios eletrônicos, nos seguintes termos:

Art. 689-A. 0 procedimento previsto nos arts. 686 a 689 poderá

ser substituído, a requerimento do exeqüente, por alienação rea­

lizada por meio da rede mundial de computadores, com uso de

páginas virtuais criadas pelos Tribunais ou por entidades públicas

ou privadas em convênio com eles firmado.

Parágrafo único. O Conselho da Justiça Federal e os Tribunais de

Justiça, no âmbito das suas respectivas competências, regula­

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 257

mentarão esta modalidade de alienação, atendendo aos requisi­

tos de ampla publicidade, autenticidade e segurança, com ob­

servância das regras estabelecidas na legislação sobre certificação

digital.

Na hasta pública, arrematará o bem aquele que oferecer maior lan­ce, partindo-se do valor da avaliação. Arrematado o bem, o terceiro ad­quirente fará o pagamento imediatamente (com o depósito da quantia no banco oficial) ou no prazo de 15 dias, mas para isso deverá oferecer caução.

Outra novidade é que, em se tratando de imóveis, o interessado na aquisição poderá apresentar, por escrito, proposta de aquisição com parcelamento. A oferta conterá pelo menos 30% à vista, sendo o res­tante garantido por hipoteca sobre o próprio imóvel. Na proposta, o terceiro também deverá apresentar o prazo e a modalidade de quitação do saldo.

No caso de ser autorizada a arrematação com o parcelamento, os pagamentos feitos pelo arrematante pertencerão ao exeqüente até o li­mite de seu crédito, e os subseqüentes, ao executado.

Toda pessoa que estiver na livre administração de seus bens (capa­zes e solventes) poderá apresentar lance em hasta pública, salvo tutores, curadores, testamenteiros, administradores, síndicos ou liquidantes, quanto aos bens confiados a sua guarda e responsabilidade; os m anda­tários, quanto aos bens de cuja administração ou alienação estejam en­carregados; o juiz, o membro do Ministério Público e/ou da Defenso­ria Pública, escrivão e demais servidores e auxiliares da Justiça, tudo isso para a garantia de imparcialidade na expropriação dos bens.

O próprio exeqüente poderá fazer a arrematação, mas, nessa situa­ção, não estará obrigado a exibir o valor (haverá compensação dos crédi­tos). Se o valor dos bens exceder seu crédito, depositará, dentro de 3 dias, a diferença, sob pena de ser tornada sem efeito a arrematação e, nesse caso, os bens serão levados a nova praça ou leilão à custa do exeqüente.

Não arrematado na primeira hasta, o bem será levado a uma se­gunda, já previamente constante do edital. No entanto, poderá ser ven­

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2 5 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

dido por preço inferior ao da avaliação, contanto que não se trate de valor vil.

A subjetividade do art. 692 deve ser suprida pela conduta razoável dos magistrados, já que tal vedação de alienação do bem por preço insignificante ou miserável visa proteger o devedor contra uma onero- sidade excessiva na execução.22

Por fim, arrematado o bem em hasta pública, será imediatamente lavrado o respectivo termo, com a expedição da carta de arrematação em favor do terceiro adquirente. Assinado o auto de arrematação pelo magistrado, pelo arrematante e pelo serventuário, o ato será conside­rado perfeito, acabado e irretratável, mesmo que, no futuro, sejam aco­lhidos os embargos do devedor que estiverem em curso.

Caso existam embargos pendentes, no futuro o exeqüente será obrigado a indenizar o executado pelos danos causados pela execução indevida, nos termos fixados no julgado dos embargos.

A arrematação, todavia, poderá ser declarada sem efeito pelo juiz quando houver: vício de nulidade absoluta; não for pago o preço ou não for prestada a caução; o arrematante provar, nos 5 dias seguintes, a exis­tência de ônus real ou de gravame (art. 686, V) não mencionado no edi­tal; requerimento do arrematante, na hipótese de embargos à arremata­ção (art. 746, §§ Io e 2o); ou quando realizada por preço vil (art. 692).

d) Usufruto de móvel ou imóvel

O instituto do usufruto como meio expropriatório, antes da refor­ma, estava praticamente em desuso, dada a complexidade em seu pro­

22 "Arrematação. Preço vil. Peculiaridades. Precedentes da Corte. 1. A Corte tem prece­dentes no sentido de que a caracterização do preço vil deve levar em conta peculiaridades do caso concreto, muitas vezes esbarrando na Súmula n. 7 da Corte. Neste feito, levando-se em conta a realidade dos autos em que há vinculação do preço do bem com o mercado de soja, razoável o entendimento de que não está configurado o preço vil, considerada a variação do mercado e a base assim identificada a significar cerca de 60%, arrastando-se a execução por mais de uma década e sendo a arrematação superior ao valor da execução. 2. Recurso espe­cial conhecido e provido." (STJ, 3a T., REsp n. 655.367/RS, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 08.11.2005, v.u.)

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EXECUCÃO DE QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE 259

cessamento. Além disso, no sistema anterior, o usufruto de imóvel ou empresa era possível. Agora, o Código foi expresso em determinar ape­nas o usufruto de móveis e imóveis.

Cremos que, para o caso das empresas, restou regulamentada a pe­nhora de percentual do faturamento, como já tratamos anteriorm en­te, que inclusive ocorre com a nomeação de um administrador. Por­tanto, é desnecessário o instituto do usufruto para as empresas.

De fato, nos parece o meio menos gravoso ao patrimônio do deve­dor executado, uma vez que ele não perde o domínio da coisa, mas tão- somente o direito de colher os frutos ou rendimentos até que a dívida seja quitada.

Vamos imaginar que o devedor executado tenha um imóvel e que este bem esteja locado. O usufruto consistirá tão-somente na autoriza­ção judicial para que o credor exeqüente receba os aluguéis até que toda a dívida executada seja amortizada. Portanto, não há alienação do domínio, mas apenas a perda temporária do gozo do móvel ou imóvel por parte do devedor.

Requerido pelo credor e decretado o usufruto, será a decisão pu­blicada e a posse do bem imediatamente transferida ao credor, até que seja quitada a totalidade da dívida.

Para a concessão do usufruto, o juiz poderá valer-se de perito para avaliar os frutos e rendimentos do bem e calcular o tempo necessário ao pagamento da dívida, salvo se as partes concordarem acerca de tais questões.

O exeqüente usufrutuário ficará com a posse total da coisa, poden­do celebrar locação do móvel ou imóvel, ouvido o executado, ou sim­plesmente colher os frutos já existentes.

Sobre execução de quantia certa contra devedor solvente, confira o Anexo II da Parte II - Execução de títulos extrajudiciais, p. 351

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2 6 0 M A N U A L DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

1 5 . 5 F l u x o g r a m a d a E x e c u ç ã o d e Q u a n t i a

C e r t a c o n t r a D e v e d o r S o l v e n t e

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E x e c u ç ã o

d e A l i m e n t o s 16

O estudo da execução de alimentos, objeto deste capítulo, depende da prévia análise da natureza da obrigação alimentar e do título que dá origem ao processo executivo. A especiali­dade do rito de execução de alimentos encontra sua justifica­tiva na natureza da obrigação e na busca de preservação da dignidade humana.

1 6 . 1 O b r i g a ç ã o A l i m e n t a r

Em conotação jurídica ampla, podemos definir alimen­tos como “prestações que visam atender as necessidades vi­tais, atuais ou futuras, de quem não pode provê-las por si, sendo os alimentos aqueles indispensáveis à subsistência”.1

Vale dizer, entretanto, que os alimentos representam pres­tações sucessivas fornecidas por uma pessoa a outra, para que

1 Maria Helena Diniz, Comentários ao Código Civil.

2 6 1

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262 M A N U A L DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

esta tenha condições de prover suas necessidades, compreendendo ali­mentação, moradia, medicamentos, vestuário, educação, lazer etc. É o direito à vida, tanto física (sustento do corpo) como intelectual e moral (cultivo da educação).

Cumpre salientar que o dever de alimentos, por si só, não autoriza sua execução, ou seja, é necessário sua previsão em título executivo.

O direito aos alimentos possui tal importância que seu não-paga- mento implica adoção de medidas coercitivas sobre a pessoa do deve­dor inadimplente - com o decreto de prisão como se verá em tópi­co oportuno.

A obrigação de prestar alimentos foi ampliada pelo Código Civil de 2002, sendo assim devida:

a) Pelos pais, nos termos da disposição do art. 229 da Constituição Federal, ou seja, decorre do poder familiar (arts. 1.634 do CC e 22 do ECA). Na relação pai-filho, há a presunção de necessidade da criança ou adolescente.

b) O art. 1.696 do Código Civil prevê que a reciprocidade entre pais e filhos nada impede que se pleiteie dos avós os alimentos, porém, como leciona o art. 1.698 do Código Civil, os alimentos aqui assumem a característica de serem apenas complementares.2

c) No que se refere aos parentes em linha reta, a obrigação alimentar não tem limite de grau de parentesco, consangüíneo ou civil.

d) No que se refere aos parentes colaterais (art. 1.694 do CC), há o dever de alimentos limitado até o segundo grau (art. 1.697 do CC) com caráter solidário, sendo necessária a demonstração da existên­cia do binômio necessidade-possibilidade.

e) O Estatuto do Idoso trouxe grande inovação, pois nos termos do art. 12, positivou que os prestadores de alimentos ao idoso (na forma do Código Civil) são solidários e o idoso poderá optar entre os presta­dores. Não bastasse, fez previsão expressa em seu art. 14 que, diante da necessidade do idoso e impossibilidade de seus parentes, o Poder Público tem esta obrigação no âmbito da assistência social e deve ser de um salário mínimo mensal (art. 34 do Estatuto do Idoso).

2 Nesse sentido: STJ, 4a T., REsp n. 119.336/SP, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar.

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EXECUCÃO DE ALIMENTOS 263

f) Entre cônjuges e companheiros, também há o dever de alimentos e tal obrigação foi desvinculada da culpa no rompimento da relação (casamento); contudo, se aquele que pleiteia deu causa a situação de necessidade, os alimentos serão apenas os indispensáveis à sub­sistência (art. 1.694, § 2o, do CC).

1 6 . 2 T í t u l o E x e c u t i v o d o s A l i m e n t o s

Assim, indagamos: qual é a origem do título que vai aparelhar uma execução de alimentos?

Como sabemos, a propositura de uma ação de execução depende da existência de um título executivo. Quando tratamos de alimentos, não podemos deixar de falar das peculiaridades dos títulos que podem instruir e motivar a execução forçada contra o devedor. A execução de alimentos poderá se fundar em:

a) Decisão judicial que fixa os alimentos provisórios. A Lei n. 5.478/ 68, ao tratar da ação de alimentos, determina que, ao despachar a petição inicial, desde logo deverá o juiz fixar os alimentos provi­sórios, isso em clássica medida antecipatória dos efeitos da tutela (uma liminar), dentro da ação de rito especial de alimentos.

Essa decisão interlocutória que fixa os alimentos provisórios é título hábil para instruir a ação de execução contra o devedor inadimplente.

b) Alimentos definitivos fixados em sentença (ou acórdão). Ao tér­mino da ação de alimentos, nos termos da Lei n. 5.478/68, sendo procedente o pedido o juiz condenará o alimentante ao pagamen­to da pensão definitiva.

Além disso, os alimentos também podem ser decorrentes de sen­tenças ou decisões proferidas nas ações de divórcio ou de separação. Nos casos de separação ou divórcio consensuais, o juiz apenas ho­mologará a vontade das partes se houver, no acordo, previsão acer­ca dos alimentos, nos termos do art. 1.121, IV, do Código de Proces­so Civil, salvo se existir ação autônoma tratando de tal direito.

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264 M A N U A L DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Portanto, seja em ação de alimentos, divórcio ou separação, a sentença que fixa os alimentos definitivos é título executivo judi­cial hábil para a propositura da ação de alimentos.

c) Decisão judicial que concede alimentos provisionais. O art. 852 do Código de Processo Civil regula a ação cautelar de alimentos pro­visionais, ou seja, a ação proposta com a finalidade de garantir ao alimentando a prestação da obrigação enquanto durar a ação prin­cipal. Pode-se dizer que os alimentos provisionais são fixados pre­cariamente, até o julgamento da ação principal. A decisão dos ali­mentos provisionais também é capaz de ensejar a execução forçada.

d) Título extrajudicial. A Lei n. 11.441/2007 autoriza que, não haven­do menores ou incapazes e sendo amigável, a separação e o divór­cio dos cônjuges poderá se dar por meio de escritura pública. Assim, a atual redação do art. 1.124-A do Código de Processo Civil admite que, em escritura pública, os cônjuges tratem entre si dos alimentos devidos. Esse documento público que fixa os alimentos entre os cônjuges valerá, portanto, como título executivo extraju­dicial para instruir a ação de execução que tratamos.3

3 Nem se pode olvidar que o Conselho Nacional de Justiça, na Resolução n. 35, de 24.04.2007, estabeleceu em seu art. 3o que:

"Art. 3° As escrituras públicas de inventário e partilha, separação e divórcio consensuais não dependem de homologação judicial e são títulos hábeis para o registro civil e o registro imobiliário, para a transferência de bens e direitos, bem como para promoção de todos os atos necessários à materialização das transferências de bens e levantamento de valores (Detran, Junta Comercial, Registro Civil de Pessoas Jurídicas, instituições financeiras, com­panhias telefônicas, etc.)".

Até o advento da Lei n. 11.441/2007, o Superior Tribunal de Justiça apenas admitia a prisão do devedor de alimentos se a execução estivesse fundada em título judicial, conforme ementa a seguir transcrita; no entanto, com a previsão expressa do Código de Processo Civil, no art. 1.124-A, tal entendimento jurisprudencial não mais poderá ser invocado. "Habeas corpus. Título executivo extrajudicial. Escritura pública. Alimentos. Art. 733 do Código de Pro­cesso Civil. Prisão civil. 1. O descumprimento de escritura pública celebrada entre os interes­sados, sem a intervenção do Poder Judiciário, fixando alimentos, não pode ensejar a prisão civil do devedor com base no art. 733 do Código de Processo Civil, restrito à 'execução de sentença ou de decisão, que fixa os alimentos provisionais'. 2. Habeas corpus concedido." (STJ, HC n. 22.401/SP, 3á T„ rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 20.08.2002, v.u.)

Mesmo antes da reforma, a doutrina já se manifestava favoravelmente à admissão dos títulos extrajudiciais para instrução da execução de alimentos. Conforme ensinamento de Luiz Rodrigues Wambier, Curso avançado de processo civil: execução, p. 368: "se tais títulos são

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EXECUCÃO DE ALIMENTOS 265

Nesse ponto, é importante esclarecer que os alimentos decor­rentes de atos ilícitos não autorizam a propositura da execução pelo rito do art. 733 do Código de Processo Civil; a esse respeito, inclusive, o Superior Tribunal de Justiça tem se manifestado no sentido de afastar o decreto de prisão para tal modalidade de obri­gação alimentar.'1

16.3 Pr o c e d im e n t o s Ex e c u t ó r io s

m 16 .3 .1 C o m p e t ê n c i a

De acordo com o art. 100, inc. II, do Código de Processo Civil, o juízo do foro do domicílio ou residência do alimentado é competente para processar e julgar o processo de execução (como a própria ação de alimentos).

Convém salientar que a primazia do foro, em favor do alimentado, decorre das dificuldades que este enfrentaria se tivesse de se dirigir ao foro do domicílio do alimentante, o que, em muitos casos, ensejaria a obstacularização de seu direito de ação.5

Evidentemente, por se tratar de foro privilegiado, o credor de ali­mentos poderá abrir mão de tal direito para se valer da regra geral e promover a execução no local de domicílio do devedor executado, va- lendo-se, aqui, da regra prevista no art. 94 do Código de Processo Civil.

Outra questão importante acerca da competência diz respeito ao juízo. Como vimos anteriormente, na maioria das vezes, a execução de

hábeis a ensejar a execução de qualquer outra dívida (não há qualquer restrição no art. 585, II,nem mesmo quanto ao valor), não há razão para que não possam, também, versar, sobre ali­mentos, desde que reste expressamente mencionado que a obrigação assumida pelo devedor é de natureza alimentar, o exato valor da prestação e o tempo de sua duração".

4 "Habeas corpus. Prisão civil. Indenização por ato ilícito. A possibilidade de imposição de prisão civil em decorrência de não pagamento de débito alimentar não abrange a pensão devida em razão de ato ilícito. Precedentes. Ordem concedida." (STJ, HC n. 35.408/SC, rel. Min. Castro Filho, j. 19.10.2004, v.u.)

"Alimentos. Prisão. A possibilidade de determinar-se a prisão, para forçar ao cumpri­mento de obrigação alimentar, restringe-se a fundada no direito de família. Não abrange a pensão devida em razão de ato ilícito." (STJ, REsp n. 93.948/SP, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 02.04.1998, v.u.)

5 Súmula n. 1 do STJ: "O foro do domicílio ou residência do alimentando é o compe­tente para a ação de investigação de paternidade quando cumulada com a de alimentos".

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2 6 6 M A N U A L DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

alimentos terá por base um título executivo judicial; nesses termos, de­veríamos aplicar a regra do art. 475-P, II, do Código de Processo Civil, ou seja, a execução deveria se dar no mesmo juízo em que tramitou a ação de conhecimento (ação de alimentos) na primeira instância.

O juízo que prolatou o título estaria prevento para a execução. A execução de sentença, como regra, se dá no mesmo juízo que proferiu o título executivo a ser satisfeito,6 não havendo que se falar em distri­buição livre da execução.

Na prática, porém, existem julgados admitindo a modificação de tal competência, isso para que a ação de execução seja distribuída li­vremente no local de domicílio do executado, com observância à regra contida no art. 100, II, do Código de Processo Civil.7

Tendo a execução sido proposta no mesmo foro em que foi profe­rido o título, entendemos, portanto, que, por prevenção, a execução deveria ser processada no juízo da ação de cognição, aplicando a regra geral de competência para a execução de títulos judiciais.

■ i 1 6 . 3 . 2 M o d o s d e E x e c u ç ã o d e a l i m e n t o s

A execução dos alimentos poderá se dar por três formas distintas:

a) rito do art. 732 do Código de Processo Civil;b) rito do art. 733 do Código de Processo Civil;c) desconto em folha de pagamento - art. 734 do Código de Proces­

so Civil.

6 "Recurso especial. Execução. Título judicial originário de separação consensual. Com­petência. 1. É absoluta a competência funcional estabelecida no art. 575, II, do Código de Processo Civil, devendo a execução ser processada no juízo em que decidida a causa no pri­meiro grau de jurisdição. 2. Deste modo, representa maltrato á letra do dispositivo legal em referência, a execução de título em foro diverso daquele da tramitação do processo principal, com a característica fundamental de que não se cuida verdadeiramente, quanto ao feito prin­cipal, de ação de alimentos, acerca dos quais houve renúncia expressa. A execução é de títu­lo judicial originário de ação de separação consensual. 3. Recurso especial conhecido e pro­vido." (STJ, REsp n. 538.227/MT, rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 20.04.2004, v.u.)

7 "Execução de alimentos. Competência. Foro do alimentando. I - A Lei deve ser aplicada com vistas aos fins sociais a que se dirige (LICC; art. 5o). II - A execução de alimentos pode ser proposta no foro do alimentando, ainda que diverso daquele do Juízo da sentença. III - Recurso provido." (STJ, REsp n. 223.207/MG, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 18.05.2004, v.u.)

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EXECUCÃO DE AUMENTOS 267

O art. 732 do Código de Processo Civil admite que o credor de ali­mentos se utilize da execução de quantia certa contra devedor solven­te para o recebimento do crédito alimentar, valendo-se, para tanto, de atos expropriatórios do patrimônio do devedor.

Note-se que o art. 732 remete à execução de quantia certa contra devedor solvente; portanto: a) em se tratando de título executivo judicial, o processamento se dará na forma do art. 475-J do Código de Processo Civil, por ter a natureza de cumprimento de sentença; b) se o título for extrajudicial (como a escritura pública de separação e divórcio), a execu­ção dos alimentos se dará nos termos do art. 652, ou seja, com a citação do devedor para pagar no prazo de 3 (três) dias, sob pena de penhora.

Não obstante o exeqüente poder optar pela expropriação dos bens do devedor, a satisfação do crédito alimentar recebeu modalidade es­pecial de rito executório, isso no art. 733 do Código de Processo Civil, pelo qual o devedor será citado para, no prazo de 3 (três) dias, pagar o débito, provar o pagamento ou justificar a impossibilidade de fazê-lo.

É importante ressaltar que a adoção do rito do art. 732 gerará a ex­propriação do patrimônio do executado; agora, se a execução for pro­movida nos termos do art. 733, não serão realizados atos de alienação de bens para satisfação do crédito, mas a imposição da prisão como meio coercitivo para o adimplemento da obrigação.

| Prisão civil

A prisão civil8 é medida extrema - de execução pessoal - que se justifica pela urgência na satisfação do crédito. A inadimplência pode­rá acarretar até mesmo risco à vida do credor dos alimentos. Repita-se que a prisão civil admitida nessa modalidade de execução não tem na­tureza de pena (punição), mas sim de meio de gerar temor ao devedor e levá-lo ao adimplemento da obrigação.

A permissão de prisão civil do devedor de alimentos está prevista, inclusive, na Constituição da República, dentre uma das exceções de proibição à prisão civil. O art. 5, LXVII, estabelece que não haverá pri­

8 Não se trata de prisão administrativa, mas sim civil.

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268 M A N U A L DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

são civil por dívida, “salvo a do responsável pelo inadimplemento volun­tário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”.

No mesmo sentido, o art. 7o, § 7o, da Convenção Americana sobre os Direitos Humanos (Pacto de São José de Costa Rica), de 1969, ratificada pelo Brasil em 26 de maio de 1992, também admite a expedição de m an­dado de prisão em razão do inadimplemento de obrigação alimentar.

Ressalte-se que a previsão constitucional impõe que o débito ali­m entar seja voluntário, isto é, decorrente da vontade do devedor, bem como seja inescusável, o que significa dizer que o devedor não tem uma justificativa plausível para a inadimplência.

Procedimento do art. 733 do CPC

Pelo procedimento executório estabelecido no art. 733 do Código de Processo Civil, o executado será citado para, no prazo de 3 (três) dias:

a) pagar o valor executado;b) provar que o pagou;c) apresentar justificativa da impossibilidade do cumprimento da

prestação.

A primeira hipótese eqüivale ao cumprimento do mandado cita- tório para adimplemento da obrigação. Nesse caso, sendo o pagamen­to integral, o juiz extinguirá a execução pelo pagamento. Por outro la­do, se o exeqüente foi a juízo para a cobrança de dívida já paga, terá o executado a oportunidade de demonstrar que o débito inexiste e, con­seqüentemente, a execução deve ser extinta.

O interessante, porém, fica para a terceira faculdade conferida ao de­vedor, qual seja, a de apresentar justificativa dentro da própria execução.

Como tratamos, a Constituição afirma que a prisão apenas é cabí­vel no débito alimentar voluntário e inescusável. Portanto, o procedi­mento, para satisfazer o comando constitucional, tem de prever opor­tunidade para que o devedor apresente sua justificativa, para o fim de tornar seu inadimplemento escusável e evitar a prisão.

A justificativa versará apenas acerca da impossibilidade de paga­mento, como tentativa de demonstração de que o inadimplemento

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EXECUCÃO DE ALIMENTOS 269

não é voluntário, tão pouco inescusável. Apresentada a justificativa, em execução, poderá ser aberta a dilação probatória para a demonstração dos fatos alegados pelo executado em sua defesa, inclusive com a desig­nação de audiência de instrução.9

E mais, considerando o disposto no art. 125, IV, do Código de Processo Civil, é tranqüilo o entendimento no sentido de que poderá o magistrado designar audiência de conciliação na ação de execução de alimentos, isso mesmo antes de instruir o feito para julgamento da justificativa.

Assim, apresentada a justificativa, o juiz terá de proferir uma deci­são para julgá-la. Nesse ponto, surge a costumeira pergunta: qual é a natureza dessa decisão? Qual é o recurso cabível?

O pronunciamento que julga a justificativa tem natureza de deci­são interlocutória, nos termos do art. 162 do Código de Processo Civil; conseqüentemente, é passível de recurso de agravo de instrum ento.10

Ao apreciar a justificativa, o magistrado acolherá ou não os m oti­vos apresentados pelo devedor para o inadimplemento. Caso não seja acolhida a justificativa ou permanecendo o devedor omisso após a ci­tação, o juiz decretará a prisão.

Ressalte-se que a prisão não deve ser decretada de ofício pelo m a­gistrado, dependendo, portanto, de provocação da parte exeqüente ou do Ministério Público que oficia como fiscal da lei.

Nesse caso, retomamos a pergunta: caberá agravo de instrumento ou habeas cor pus7.

Ambas as medidas são cabíveis; no entanto, a parte deverá verifi­car a conveniência e a oportunidade de cada uma delas.

Como sabemos, o habeas corpus é ação mandamental cabível para afastar ato coator que viole o direito de locomoção do indivíduo. Tais medidas mandamentais sempre são fundadas em direito líquido e cer­

9 "Alimentos. Execução. Justificativa apresentada pelo devedor. Dilação probatória inde­ferida. Cerceamento de defesa caracterizado. Constitui cerceamento de defesa o indeferi­mento da designação de audiência sugerida pelo Ministério Público, a fim de facultar ao devedor a comprovação da impossibilidade do pagamento das prestações alimentícias. Recur­so ordinário não conhecido. Pedido conhecido, porém, como habeas corpus substitutivo para conceder a ordem e revogar o decreto de prisão do paciente." (STJ, Recurso em HC n. 17.116/RS, rel. Min. Barros Monteiro, j. 17.03.2005, v.u.)

10 Na execução não há que se falar em agravo retido, uma vez que tal modalidade depende de futura apelação para ser levada ao tribunal.

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270 M A N U A L DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

to, ou seja, aquele direito capaz de ser demonstrado de plano, explícito e que não depende de dilação probatória.

Assim, quando da decretação da prisão em execução de alimentos, apenas se justifica a impetração de habeas corpus se houver ocorrido violação a direito líquido e certo e não como meio de substituição do recurso de agravo de instrumento." Na hipótese de a revisão do ato ju ­dicial de decreto de prisão demandar o cotejo de elementos fáticos, que necessitem de dilação probatória, a melhor medida será a interposição do recurso de agravo de instrumento (art. 522 do CPC).

O decreto de prisão pelo art. 733 do Código de Processo Civil po­derá ser imposto pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses.

Por outro lado, o art. 19 da Lei n. 5.478/68 afirma que, para a efe­tivação da sentença ou instrução da causa, o juiz poderá decretar a p ri­são pelo prazo de 60 (sessenta) dias. Em relação à prisão para instru­ção da causa, entendemos que tal disposição não foi recepcionada pela Constituição de 1988, uma vez que a prisão civil poderá se dar apenas pela ocorrência do débito injustificado.

Em relação ao prazo da prisão, surge a problemática de definirmos se ele é de até 60 (sessenta) dias, segundo a Lei de Alimentos (art. 19) ou de até 90 (noventa) dias, pelo disposto no Código de Processo Civil.

Entendemos que, qualquer que seja a modalidade de alimentos - definitivos, provisórios ou provisionais - , deve ser aplicado o prazo pre­

" "Recurso ordinário. Habeas corpus. Execução de alimentos. Inadimplemento das pres­tações. Pendência de ação revisional. Prisão civil do devedor. Possibilidade. Alegada justificati­va pelo não pagamento. Impossibilidade de dilação probatória pela via do presente remédio heróico. Recurso improvido. Recurso improvido." (STJ, Recurso em HC n. 20.661/RS, rel. Min. Massami Uyeda, j. 06.02.2007, v.u.)"Habeas corpus. Alimentos. Execução. Prisão civil. 1. O habeas corpus, nos termos da jurisprudência da Corte, não é via adequada para o exame apro­fundado de provas e verificação das justificativas, fáticas, apresentadas em relação à situação financeira do credor e do devedor de alimentos. 2. Descabe a prisão civil em execução de ali­mentos quando pagas as três últimas prestações vencidas à data do mandado de citação e as que vencerem no curso da demanda, o que não ocorre nesta caso. 3. Ordem denegada." (STJ, HC n. 33.404/SP, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 11.05.2004, v.u.)

"Habeas Corpus (garantia constitucional) e tutela ordinária (recurso cível). Prisão civil. A previsão de agravo de instrumento como meio bastante para impedir a prisão civil do deve­dor de alimentos não lhe suprime o direito ao habeas corpus, que é garantia constitucional, insuscetível à limitações de prazo. Hipótese, todavia, em que a ordem não pode ser concedi­da, porque a execução tem como causa de pedir a falta de pagamento de alimentos relati­vos aos meses de janeiro, fevereiro e março de 2002, sem que a justificativa para o inadim­plemento tenha sido aceita pela instância cível. Recurso ordinário não provido." (STJ, Recurso em HC n. 19.521/MG, rel. Min. Ari Pargendler, j. 20.06.2006, v.u.)

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EXECUCÂO DE ALIMENTOS 271

visto no Código de Processo Civil. A afirmação de que o prazo de 60 (sessenta) dias se aplica aos alimentos definitivos, fixados nas senten­ças de alimentos (art. 19 da Lei n. 5.478/68), conduziria à situação es­drúxula de afirmarmos que, para os alimentos provisórios e provisio- nais, cuja natureza é de liminar e temporária, o prazo de prisão é de 90 (noventa) dias, e para aqueles fixados em sentença (definitivos), o pra­zo seria de apenas 60 (sessenta).

Ademais, a norm a processual codificada é específica para a execu­ção de alimentos e posterior à Lei n. 5.478/68, o que nos leva a crer que o melhor entendimento seria a prevalência do disposto no art. 733 do Código de Processo Civil; no entanto, advertimos para o fato de que a jurisprudência e a doutrina não são unânimes a esse respeito.

Para Barbosa Moreira, com cuja doutrina concordamos, a regra do art. 19 foi derrogada pela sistemática do Código de Processo,12 preva­lecendo, portanto, o prazo de 1 (um) a 3 (três) meses.

Finalmente, nos resta indagar: cumprida a prisão ficará o executa­do remido da dívida?

A resposta é negativa, pois a legislação é expressa em afirmar que o cumprim ento da prisão não exime o devedor do pagamento. No en­tanto, entendemos que não poderá ser decretada a prisão em decor­rência do mesmo período.

Cumprida a prisão, poderá o credor promover nova execução, mas agora pelo rito do art. 732 do Código de Processo Civil, com a finalidade de expropriar bens do devedor, uma vez que foi esgotada a via coercitiva da prisão.

Assim, podemos desenhar o seguinte roteiro processual:

12 O novo processo civil brasileiro, p. 261.

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272 M A N U A L DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

| Restrição no cabimento do rito do artigo 733

Como tratamos anteriormente, o rito do art. 733, ao prever a pri­são civil, é medida excepcional que se justifica pela urgência na presta­ção da tutela jurisdicional, com a finalidade de evitar dano à vida e à saúde do credor dos alimentos.

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EXECUCÃO DE AUM ENTOS 273

Assim, a jurisprudência vinha caminhando no sentido de afirmar que apenas o débito atual é que justificava a prisão do devedor. Em ou­tras palavras, caso o credor deixasse acumular longo período de débi­to, isso presumiria a falta de necessidade.

Nesse caso, havendo acumulado de débito pretérito sem cobrança, não se justificaria a prisão do devedor.

O Superior Tribunal de Justiça, em unificação desse tema, editou a Súmula n. 309 com a seguinte redação:

O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamenton da execução e as que se vencerem no curso do processo.

É importante ressaltar que tal entendimento não tem efeito vincu- lante, mas grande parte da jurisprudência tem se posicionado no sen­tido de admitir o rito especial da prisão apenas para o débito atual (três meses anteriores à propositura da execução), devendo o débito alimen­tar pretérito ser exigido por meio do procedimento do art. 732 do Có­digo de Processo.

13 A redação original da Súmula n. 309 tinha como termo inicial a citação do executa­do. No entanto, por provocação da Associação dos Advogados de São Paulo, foi proposta nova redação para evitar que o devedor ficasse retardando a citação até que pudesse pagaro valor relativo aos três últimos meses:

"Processual civil. Habeas Corpus. Ação de execução. Pensão alimentícia. Revisão de E- nunciado da Súmula do STJ. é cabível a prisão civil do alimentante inadimplente em ação de execução contra si proposta, quando, apesar de pagar as três parcelas anteriores à citação, deixa de efetuar o pagamento, ou paga de forma parcial, as parcelas que venceram no curso da execução. Proposta pela Ministra Relatora a revisão do Enunciado n. 309 da Súmula do STJ, ante a constatação de equívoco em sua redação, falha evidenciada tanto pela análise do caso sub examine, quanto pela prestimosa provocação deduzida pela Associação dos Advogados de São Paulo - AASP (Ofício n. S-170/2006) que, por este meio, laborou com notável deno- do para o aperfeiçoamento da prestação jurisdicional. Revisão do Enunciado n. 309 da Súmu­la do STJ, realizada com fundamento no art. 125, §§ 1o e 2°, do RISTJ, que passa a ter a seguinte redação: O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que com­preende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que vencerem no curso do processo. Ordem denegada." (STJ, HC n. 53.068/MS, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 22.03.2006, v.u.)

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2 7 4 M A N U A L DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Desconto em folha de pagamento

Quando o devedor for funcionário público civil (arts. 45 a 48, Lei n. 8.112/90), militar, diretor ou gerente de empresa, bem como empre­gado sujeito à legislação do trabalho (art. 734, CPC, art. 16, Lei de Ali­mentos), e também se for beneficiário do INSS (art. 115, IV, da Lei n. 8213/91), poderá o juiz determinar o desconto da pensão diretamente em folha de pagamento.

O art. 17, Lei n. 5.478/68 permite que as prestações alimentícias sejam cobradas de aluguéis de prédios e quaisquer outros rendimentos do devedor, que serão recebidos diretamente pelo alimentando ou por depositário nomeado pelo juiz.

Caso o empregador não cumpra a ordem emanada, poderá ser res­ponsabilizado por crime de desobediência, bem como arcar com o pa­gamento da obrigação que não foi descontada.

A esse respeito é importante deixar claro que o desconto em folha de pagamento apenas será cabível para as prestações vincendas.

Dos alimentos devidos no exterior

A chamada Convenção de Nova York regulamentou a homologa­ção de sentença no que se refere à execução de alimentos devidos no exterior.1'1

Aprovada pelo Decreto Legislativo n. 10, de 1958, e promulgada pelo Decreto n. 56.826, de 2 de setembro de 1965, a sentença estrangei­ra deve ser homologada no Brasil pelo STJ, modificação introduzida pela Emenda Constitucional n. 45/2004.15

14 Países participantes da Convenção: Alemanha, Alto Volta (atual Burquina Fasso), Argélia, Áustria, Bélgica, Bolívia, Camboja, Ceilão, Chile, China, Colômbia, Cuba, Dinamarca, El Salvador, Equador, Espanha, Filipinas, França, Grécia, Guatelama, Haiti, Hungria, Israel, Iugos­lávia, Luxemburgo, Marrocos, México, Mônaco, Niger, Noruega e Países Baixos.

15 "Art. 105 - Compete ao Superior Tribunal de Justiça:I - processar e julgar, originariamente:(...)i) a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequaturàs cartas roga­

tórias."

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EXECUCÃO DE AUM ENTOS 275

Cumpre ressaltar que as cartas rogatórias, expedidas em ações de ali­mentos e destinadas aos países signatários da Convenção de Nova York, devem ser transmitidas à Procuradoria Geral da República, autoridade remetente e instituição intermediária. Via de conseqüência, as cartas ro­gatórias a serem cumpridas nos países que não aderiram à mencionada Convenção devem ser dirigidas ao Ministério da lustiça, com vistas ao Ministério das Relações Exteriores, a fim de serem remetidas, via diplo­mática, aos juízos rogados.16

Sobre execução de alimentos, confira o Anexo I da Parte II - Cum pri­mento de sentenças, p. 350

16 "Competência de ação de alimentos. Art. 26 da Lei n. 5.478/68. A Justiça Federal só é competente para o processo e julgamento de ação de alimentos quando a Procuradoria Geral da República atua como instituição intermediária, nos termos previstos na Convenção aprovada pelo Decreto Legislativo n. 10/58 e promulgada pelo Decreto n. 56.826/65. Inteli­gência do art. 26 da Lei n. 5.478/68. Conflito conhecido, declarando-se a competência do MM. Juiz de Direito suscitado." (STJ, 2a Seção, Conflito de Competência n. 13.093/RJ, rel. Min. Costa Leite, j. 26.04.1995, DJ 22.05.1995, p. 14.330)

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E x e c u ç ã o c o n t r a

F a z e n d a P ú b l i c a 17

As fazendas públicas representam as pessoas jurídicas de direito público, ou seja, a União, o Distrito Federal, os Estados, os Municípios e todas as demais pessoas ligadas aos referidos entes, como as autarquias e fundações públicas. Não se enqua­dram no conceito de pessoa de direito público as empresas pú­blicas e as empresas de economia mista, já que a Constituição atribui a elas a natureza de pessoa privada.

A execução por quantia certa movida contra o devedor comum, pessoa privada, como vimos no capítulo 15, tem o ob­jetivo de expropriar os bens do devedor para satisfazer o crédi­to executado. No entanto, sobre os bens públicos não é pos­sível a utilização de procedimento expropriatório comum para a satisfação dos débitos, já que os bens públicos têm na­tureza de impenhorabilidade, razão pela qual existe a espe­cialidade do procedimento executivo.1

De fato, a Constituição da República, com a finalidade de garantir o funcionamento do Estado com seus serviços es-

1 Costa Machado, Código de Processo Civil interpretado e anotado, p. 1.256.

2 7 7

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2 7 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

senciais, não permite que os bens públicos fiquem à mercê de aliena­ções para o pagamento de dívidas.

Desta forma, o art. 100 da Constituição da República estabeleceu procedimento diferenciado para o pagamento dos créditos reconheci­dos judicialmente contra as fazendas públicas.

Evidentemente, a execução especial para as fazendas públicas, nos termos do art. 730 do Código de Processo Civil, apenas se justificam para as obrigações de pagamento de quantia, já que, para as obrigações de fazer, não fazer e entrega de coisa, previstas em títulos judiciais, será aplicado o disposto nos arts. 461 e 461-A do Código de Processo Civil.

Como se verá no presente capítulo, reconhecido o crédito contra a fazenda, será ele incluído na ordem cronológica dos precatórios.

17.1 T í t u l o Ex e c u t i v o e Pr o c e s s a m e n t o

d a Ex e c u ç ã o Fo r ç a d a c o n t r a

a F a z e n d a Pú b l i c a

A execução contra a fazenda pública, nos moldes previstos no art. 730 do Código de Processo Civil, poderá se fundar em título judicial, ou seja, aquele oriundo de um processo de conhecimento em que hou­ve a condenação do ente público ao pagamento de determinada quan­tia (art. 475-N, I, do CPC), bem como em título extrajudicial emitido pelo ente público.2

Proposta a execução, com a apresentação de petição inicial conten­do memória discriminada do débito, a fazenda executada será citada para, no prazo de 30 (trinta) dias,3 opor embargos à execução.

■ ■ 1 7 . 1 . 1 O b j e t o d o s E m b a r g o s d a F a z e n d a P ú b l i c a

Os embargos opostos pela fazenda pública à execução guardam natureza de ação e somente poderão versar sobre:

2 Súmula n. 279 do STJ: "É cabível execução por título extrajudicial contra a Fazenda Pública".

3 O prazo de 30 (trinta) dias foi atribuído pela Lei n. 9.494/97. Por uma falha legislati­va, no entanto, não houve alteração expressa do art. 730 do CPC.

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EXECUCÃO CONTRA FAZENDA PÚBLICA 279

a) falta ou nulidade da citação, se o processo correu à revelia;b) inexigibilidade do título;c) ilegitimidade das partes;d) cumulação indevida de execuções;e) excesso de execução;f) qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação,

como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à sentença;

g) incompetência do juízo da execução, bem como suspeição ou im­pedimento do juiz.

As defesas que poderão ser articuladas pela fazenda em sede de em­bargos são restritas, pois, como sabemos, em se tratando de execução de título judicial, o ente público teve a oportunidade de exercer ampla defe­sa no momento da ação de conhecimento (quando da contestação).

A primeira hipótese versa acerca da nulidade do processo de co­nhecimento por vício de citação. Caso o processo de conhecimento te­nha ocorrido à revelia, a fazenda poderá invocar, em embargos, a ine­xistência do ato citatório e, conseqüentemente, obter a inexigibilidade do título judicial por nulidade absoluta do processo cognitivo.

A inexigibilidade está vinculada ao poder de impor o adimplemen­to da obrigação e, nesse caso, havendo qualquer causa que retire tal prer­rogativa (como o pagamento, a prescrição etc.), o credor não poderá exi­gir da fazenda o cumprimento do título.

Também ocorrerá a inexigibilidade do título, nos moldes do inc. II do art. 741 do Código de Processo Civil, caso o título esteja fundado em ato ou instrumento normativo declarado inconstitucional ou constitu­cional pelo Supremo Tribunal Federal nas ações diretas de controle da constitucionalidade. Trata-se da inexigibilidade da coisa julgada que estiver em desconformidade com a interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal nos julgamento de ação direta de inconstitucionalida­de (ADIn) ou ação declaratória de constitucionalidade (ADC).

Ainda, sendo qualquer uma das partes ilegítima - verificando-se a inexistência de vínculo do sujeito com o direito material (no caso o cré­dito e o débito) a fazenda poderá embargar para ter reconhecida a carência de ação.

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280 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Havendo cumulação indevida de execuções (execuções de ritos ou sujeitos distintos), cobrança de valor superior ou coisa diversa daquela constante no título, não-comprovação do cumprimento da obrigação pelo devedor nos casos de contratos bilaterais, não-advento da condi­ção, ou mesmo quando houver ocorrido após a sentença o pagamento ou qualquer outra causa impeditiva ou extintiva da obrigação, a fazen­da executada poderá embargar para obter a desconstituição do título executado.

Contudo, em caso de execução fundada em título extrajudicial, por questão de isonomia, entendemos que os embargos da fazenda poderão versar sobre toda e qualquer matéria de fato ou de direito, como ocorrem nos embargos opostos contra execução comum de títu­lo extrajudicial, não havendo que se falar nas limitações contidas no art. 741 do Código de Processo Civil.

■ i 17.1.2 P r o c e s s a m e n t o d o s E m b a r g o s

Quanto ao processamento dos embargos, é importante ressaltar que, recebidos pelo juiz, seguirá ele pelo rito ordinário, observando a regra contida no art. 740 e seu parágrafo único. Recebidos os embar­gos, serão eles autuados em apartado e a parte contrária será intimada para apresentar impugnação no prazo de 10 (dez) dias.

Nesse ponto, é importante consignar que a jurisprudência firmou entendimento no sentido de que a ausência de impugnação aos embar­gos à execução não gera a revelia, não havendo que se falar em presun­ção de veracidade dos fatos narrados pelo autor-embargante.4

Com a oposição dos embargos, após finda ou dispensada a instru­ção, o juiz proferirá sentença.

4 "Recurso especial. Direito Processual Civil. Embargos á execução de título judicial. Ausência de impugnação. Revelia. Inocorrência. 1. A não-impugnação dos embargos do devedor não induz os efeitos da revelia, pois que, no processo de execução, diferentemente do processo de conhecimento em que se busca a certeza do direito vindicado, o direito do credor encontra-se consubstanciado no próprio título, que se reveste da presunção de vera­cidade, até porque já anteriormente comprovado, cabendo, assim, ao embargante-executa- do o ônus quanto à desconstituição da eficácia do título executivo. 2. Recurso improvido." (STJ, REsp n. 601.957/RJ, rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 23.08.2005, v.u.)

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EXECUCÃO CONTRA FAZENDA PÚBLICA 281

Ao prolatar a sentença o juiz acolherá ou rejeitará os embargos.3Outra questão relevante que surge nesse ponto é: em caso de rejei­

ção dos embargos, haverá o reexame necessário?A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se firmou no

sentido de que não se aplica o art. 475 às sentenças de improcedência ou à rejeição dos embargos opostos pela fazenda pública quando for executada.6

Caso sejam rejeitados os embargos, a sentença deverá condenar a fazenda pública ao pagamento de honorários advocatícios, nos termos do art. 20, § 4o do Código de Processo Civil. Não sendo embargada a execução, o juiz deixará de condenar a fazenda ao pagamento de hono­rários advocatícios, isso pelo fato de não ter havido resistência.7

s Nos casos de execução de título extrajudicial contra a fazenda pública, não havendoembargos, o juiz proferirá sentença para constituir o título judicial. Nesse sentido: HumbertoTheodoro Junior, Curso de direito processual civil, p. 357.

6 "Processual civil. Agravo de Instrumento convertido em Recurso Especial. Emebargos à Execução. Reexame necessário. Art. 475, II, CPC. Descabimento. A sentença que julga os embar­gos à execução de título judicial opostos pela Fazenda Pública não está sujeita ao reexame neces­sário (art. 475, II, do CPC), tendo em vista que a remessa ex officio, in casu, é devida apenas em processo cognitivo, não sendo aplicável em sede de execução de sentença, por prevalecer a dis­posição contida no art. 520, V, do CPC. Precedentes da Corte Especial. Agravo regimental des­provido." (STJ, Ag. Reg. no Ag. n. 808.057/DF, rel. Min. Felix Fischer, j. 27.02.2007, v.u.)

"Processual civil. Remessa necessária. Embargos à execução. Fazenda Pública. Inteligência do art. 4 75 ,1, do CPC, Não-aplicável. Súmula n. 83/STJ. 1. O art. 475, I, do CPC, não é aplicá­vel às sentenças julgadas improcedentes em embargos à execução propostos pela Fazenda Pública, conforme precedente desta Corte: REsp 318.861/PB; rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ 20.3.2006. 2. Em relação à divergência jurisprudencial invocada, esta Corte, como visto acima, já firmou entendimento contrário ao dos acórdãos paradigmas, o que faz incidir a Súmu­la n. 83/STJ. Recurso especial improvido." (STJ, REsp n. 499.182/AL, rel. Min. Humberto Mar­tins, j. 28.11.2006, v.u.)"Processual civil. Embargos à Execução opostos pela Fazenda Pública. Reexame necessário. Descabimento. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já fir­mou entendimento de que não é cabível o reexame necessário de sentença que julgar impro­cedente embargos à execução opostos pela Fazenda Pública. 2. Mesmo antes da entrada em vigor da Lei n. 10.251/2001, esta Corte já havia pacificado o entendimento de que não estava sujeita ao reexame necessário a sentença que julgava os embargos à execução opostos pela fazenda pública, autarquias e fundações. Precedentes. 3. Recurso especial improvido." (STJ, REsp n. 197.455/SP, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 09.11.2006, v.u.)

7 "Processual civil. Embargos de divergência em Recurso Especial. Honorários advocatí­cios. Fazenda Pública. Execução não embargada. MP n. 2.180-35/2001. 1. 'A Medida Provi­sória n. 2.180-35, que isenta a Fazenda Pública da verba honorária nas execuções não embar­gadas, não se aplica aos processos em curso antes de sua entrada em vigor, em 24.08.2001,

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282 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

M 17.1.3 FORMAÇÃO DO PRECATÓRIO

Encerrada a discussão dos embargos - sendo eles rejeitados no to­do ou em parte, ou ainda pelo fato de a fazenda ter permanecido iner­te na oposição dos embargos - , o crédito reconhecido contra a fazen­da pública será incluído na ordem cronológica dos precatórios.

Ressalte-se que, sendo os embargos parciais, ou seja, caso a fazen­da venha a apresentar insurgência apenas acerca de parte da execução, o crédito não embargado poderá ser incluído imediatamente na or­dem dos precatórios, sem que ocorra a necessidade de se aguardar o

em atenção ao princípio tempus regit actum. Precedentes da Corte Especial: EREsp n. 643.690/RS, relator Ministro José Delgado, DJ de 05.09.2005; EREsp n. 380.470/RS, relator Ministro Ari Pargendler, DJ de 15.08.2005; EREsp n. 617.807/RS, relator Ministro José Delgado, DJ de 08.08.2005; EREsp n. 463.812/RS, relator Ministro Franciulli Netto, DJ de 06.06.2005; e EREsp n. 572.562/RS, relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ de 28.03.2005.' (Corte Espe­cial, EREsp n. 421.725/RS, rel. Min. Luiz Fux, DJ 12.06.2006) 2. A Emenda Constitucional n. 32, que se incorpora ao texto da Constituição Federal, e tem força de norma constitucional, à luz do Princípio da Segurança Jurídica, manteve hígidas as Medidas Provisórias anteriores; de maneira que, a partir da data da sua vigência, 11 de setembro, não se pode mais editar Medi­da Provisória de natureza processual. 3. Deveras, a Medida Provisória n. 2.180-35 foi editada em 24 de agosto de 2001, e a execução se iniciou posteriormente; portanto, aplica-se a referi­da Medida 4. Outrossim, é cediço na Corte que: 'Agravo regimental. Embargos de divergência. Processo civil. Honorários advocatícios. Execução judicial. Início após vigência na MP n. 2.180- 35/2001. Incidência. Súmula n. 168 do STJ. Questão nova. I - A Medida Provisória n. 2.180-35, de 24 de agosto de 2001, que acrescentou o art. 1°-D ao texto da Lei n. 9.494, de 10 de setem­bro de 1997, por ter natureza de norma instrumental material, com reflexos na esfera jurídico- material das partes, é aplicada aos processos em curso, quando o aforamento da execução sub examen foi feito após o início da sua vigência. Aplicação da Súmula n. 168 do STJ." (STJ, Corte Especial, Ag. Reg. nos EDcl nos EREsp n. 49.7765/RS, rel. Min. Felix Fischer, DJ 01.08.2006) 5. Embargos de Divergência acolhidos." (STJ, EREsp n. 508.268/RS, rel. Min. Franciulli Netto, rel. Min. Luiz Fux, j. 01.02.2007)

"Fazenda Pública. Execução não-embargada. Título judicial proveniente de ação coletiva ajuizada por sindicato. Cabimento de honorários advocatícios. Não-incidência da Medida Pro­visória n. 2.180-35/2001. Precedentes da Corte Especial. Embargos de declaração. Efeitos modificativos. Excepcionalidade. 1. O entendimento da Corte Especial é que, na execução de sentença proveniente de ação coletiva ajuizada por sindicato e não embargada pela Fazenda Pública, são devidos os honorários advocatícios, afastada a aplicação do art. 1°-D da Lei n. 9.494/97, com a redação dada pela Medida Provisória n. 2.180-35/2001. 2. Embargos de declaração acolhidos com efeitos modificativos, para se negar provimento ao recurso espe­cial." (STJ, EDcl no Ag. Reg. no REsp n. 653.484/RS, rel. Min. Nilson Naves, j. 07.12.2006, v.u.)

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EXECUCÃO CONTRA FAZENDA PUBLICA 283

julgamento dos embargos. A parte incontroversa da execução poderá gerar precatório antes do julgamento dos embargos.8

Mas, afinal, o que são os precatórios?Os precatórios representam os créditos contra as fazendas públi­

cas decorrentes de decisões judiciais com trânsito em julgado.Assim, reconhecido judicialmente o crédito, o juiz da execução

requisitará ao presidente do Tribunal a inclusão do precatório na ordem cronológica. Nesse caso, o presidente do Tribunal exerce a fun­ção administrativa sobre a lista dos precatórios.9,10

Cada ente público, considerando a autonomia decorrente do pacto federativo, terá uma lista de precatórios, organizada cronologicamen­te pela data de inclusão e por ano do exercício financeiro.

A Constituição, no § Io de seu art. 100, determina que os créditos incluídos na lista até Io de julho de um ano devem ser quitados até o final do exercício seguinte.

Por determinação da Constituição, existem as seguintes modalida­des de precatórios:

8 "Agravo Regimental em Recurso Especial. Servidor. Processo civil. Execução contra a Fazenda Pública. Precatório do valor incontroverso. Expedição. Possibilidade. Nos termos do art. 739, § 2o, do Código de Processo Civil, uma vez opostos embargos contra parte do valor exeqüendo, deverá ter regular trâmite a execução da parcela incontroversa, inclusive com expedição de precatório quando devedora a Fazenda. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento." (STJ, 6a T„ Ag. Reg. no REsp n. 829.761/RS, rel. Min. Paulo Medina, j. 08.03.2007, DJ 23.04.2007, p. 325)

9 O presidente do Tribunal não tem competência jurisdicional nesse caso. A jurisprudên­cia firmou entendimento de que é competência do juiz da execução, e não do presidente do Tribunal, a requisição de precatório suplementar.

10 "Processo civil. Expedição de precatório complementar. Limitações da competência do Presidente do Tribunal de Justiça. Competência do juízo da execução. Desnecessidade de nova citação. 1. Esta Corte pacificou entendimento no sentido de que cabe ao juízo da exe­cução solucionar incidentes ou questões surgidas no cumprimento dos precatórios, eis que a função do Presidente do Tribunal no processamento do requisitório de pagamento é de índo­le essencialmente administrativa, não abrangendo as decisões ou recursos de natureza juris­dicional. 2. Havendo necessidade de expedição de precatório complementar, é inaplicável o art. 730 do CPC, que determina a citação da Fazenda Pública para, querendo, opor embar­gos. 3. Precedentes desta Corte Superior. 4. Recurso especial improvido." (STJ, 2a T., REsp n. 730.333/SP, rel. Min. Eliana Calmon, j. 17.04.2007, DJ 30.04.2007, p. 301)

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284 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

a) Alimentares, que compreendem os débitos decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefí­cios previdenciários e indenizações por morte ou invalidez, funda­das na responsabilidade civil, em virtude de sentença transitada em julgado, conforme disposto no § Io-A do referido art. 100. Os precatórios alimentares têm preferência no pagamento.

b) De pequeno valor. Cada ente público definirá aquilo que enten­de como precatório de pequeno valor (§ 3o do art. 100). No âmbito da União, para os Juizados Especiais Federais, a Lei n. 10.259/ 2001 definiu como sendo de pequeno valor os precató­rios não excedentes a 60 (sessenta) salários mínimos. Ademais, o art. 87 do ADCT fixou os valores de 40 (quarenta) salários m íni­mos para os estados e Distrito Federal, e o valor de 30 (trinta) salários para os municípios, isso até que cada ente público fixe o valor que entender cabível em sua esfera de competência. A lei definidora do precatório de pequeno valor disporá acerca da for­ma de pagamento. A Constituição veda o fracionamento dos cré­ditos para esse efeito.

c) Comum. Por exclusão, são os precatórios não definidos como ali­mentares ou de pequeno valor.

O ente público deverá prever, em seu orçamento, verba necessária ao pagamento dos precatórios, sendo tal valor consignado diretamen­te ao Poder Judiciário para que o presidente do Tribunal competente possa liberar os pagamentos aos credores.

Como já tratamos, os bens das fazendas são impenhoráveis, mas, caso ocorra o desrespeito da ordem cronológica dos precatórios, ou seja, caso algum credor seja preterido, poderá ele requerer ao presiden­te do Tribunal o seqüestro dos bens do ente público para a quitação do precatório.

A indisponibilidade dos bens públicos (impenhorabilidade), nesse caso, não se aplica quando o credor for preterido em seu direito, nos termos do § 2o do art. 100 da Constituição da República e do art. 731 do Código de Processo Civil.

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EXECUCÃO CONTRA FAZENDA PÚBLICA 2 8 5

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C u m p r i m e n t o

d o s T í t u l o s J u d i c i a i s 18

O tema acerca do cumprimento dos títulos judiciais, pela atual sistemática legislativa, encontra-se tratado no capítulo destinado “à sentença”, no arts. 475 e seguintes do Código de Processo Civil.

Assim, já tratamos do tema no volume I do Manual de direi­to processual civil, no capítulo 22. Considerando, todavia, tratar- se de tema afim ao processo de execução e muitas vezes estudado em conjunto, decidimos abordar o tema também neste volume.

18.1 N a t u r e z a Pr o c e s s u a l

do C u m p r i m e n t o d a s S e n t e n ç a s

Na sistemática originária do Código de Processo Civil, to ­da execução - de título judicial ou título extrajudicial - era tra­tada como modalidade de ação autônoma, ou seja, obtido o título judicial (a sentença), o credor deveria, dentro dos mes­mos autos, iniciar uma nova ação (com inicial, citação etc.).

2 8 7

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2 8 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

As reformas introduzidas no Código de Processo Civil, aos pou­cos, foram subtraindo a natureza de ação autônoma da satisfação dos títulos judiciais.

Dessa forma, com o advento da Lei n. 11.232/2005, a regra é no sentido de que a satisfação das sentenças se dará incidentalmente na ação de conhecimento, isto é, encerrada a cognição, a satisfação do tí­tulo se dará como uma fase processual da ação em que foi proferido.

Acerca de tal reforma, Antônio Cláudio da Costa Machado comenta:

Nesta nova sistemática, a efetivação ou a realização do comando sentenciai condenatório já não depende mais da instauração de um outro processo, o 'processo de execução' (com a citação, embargos e nova sen­tença), mas apenas da abertura sem entraves e sem solenidades, de uma simples fase do próprio processo de conhecimento condenatório durante a qual se realizará a penhora, permitir-se-á ao devedor exercer defesa (por meio de impugnação) e se praticarão os demais atos executivos tenden­tes à satisfação do crédito.1

Dessa forma, trataremos do cumprimento dos títulos judiciais como fase do processo cognitivo e não mais como modo autônomo de processo.

18.2 T í t u l o s J u d i c i a i s

A sentença do processo de conhecimento é o ato judicial pelo qual o magistrado, como regra, julga a lide e manifesta a vontade do Estado ao caso concreto, isso para impor qual das partes tem razão no confli­to. A sentença encerra o processo no primeiro grau de jurisdição, com ou sem julgamento do mérito, nos termos dos arts. 267 e 269 do Códi­go de Processo Civil.

Ao julgar procedente um pedido - portanto, o encerramento do processo com julgamento do mérito (art. 269,1, do CPC) - , o magistra­do profere tutelas condenatórias, declaratórias ou constitutivas (posi­tivas ou negativas), que, evidentemente, devem produzir efeitos em re­lação às partes contra as quais foram prolatadas.

1 Código de Processo Civil interpretado e anotado, p. 872.

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 289

O Código, por sua vez, estabelece modos de cumprimento dessas sentenças que impõem obrigações a alguma das partes. Como se verá a seguir, algumas espécies de tutelas produzem efeito imediatamente, ou seja, as sentenças são prolatadas e por si produzem efeitos, isso independentemente de um procedimento para sua execução. Outras apenas produzem efeitos após a realização de atos processuais que levem o devedor ao adimplemento - como uma execução forçada.

Os títulos executivos - inclusive os judiciais - sempre derivam da lei e, nesse caso, é o art. 475-N do Código de Processo Civil que esta­belece quais são os documentos capazes de iniciar a fase do cum pri­mento de sentença:

a) A sentença proferida no processo civil que reconheça a existência de obrigação de fazer, de não fazer, de entrega de coisa ou de paga­mento de quantia.

O inc. I do art. 475-N trata da sentença condenatória do pro­cesso civil, aquela que impõe alguma obrigação de fazer, de não fazer ou de entrega de coisa.

Assim, de início, poderíamos chegar à falsa idéia de que apenas as sentenças condenatórias teriam a natureza de título executivo judicial, não possuindo elas a mesma característica das sentenças declaratórias nem das constitutivas.

Toda sentença é um título judicial, mas apenas as sentenças con­denatórias dependem de atos processuais executórios para produ­zir efeito.

As sentenças declaratórias e as constitutivas, como regra, são au- to-executáveis ou, ainda, são títulos cuja produção de efeitos é ime­diata e não necessitam de atos executórios. Toda sentença produz efeitos, mas apenas as sentenças condenatórias dependem de uma execução com método para compelir o devedor a seu cumprimento.

Ao se proferir uma sentença declaratória de nulidade do casa­mento, esta é título de reconhecimento de um direito e produzirá os efeitos na vida prática das pessoas, mas sua execução independe de atos executórios de uma execução forçada. Para a satisfação da decla­ração, incidental e independentemente de atos a serem praticados pela parte contrária, o juiz determinará a expedição de mandado

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290 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

para que o cartório faça a competente anotação acerca da invalida­ção do casamento,

b) A sentença penal condenatória transitada em julgado.Ao transitar em julgado uma sentença penal, o juiz reconhece

a ação ou omissão praticada pelo réu e, portanto, tal declaração faz coisa julgada em relação ao dever do condenado de arcar com a responsabilização civil de sua conduta (indenização).

A esse respeito, o art. 63 do Código de Processo Penal determina:

Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promo­ver-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito de reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou herdeiros.

Note-se que, com a condenação do réu na esfera criminal, não haveria justificativa para se dar início a um processo de conheci­mento para a apuração da culpa civil, pois tal fato já fora reconhe­cido no juízo penal. Na verdade, se isso fosse possível, teríamos até mesmo a ofensa à coisa julgada.

Nesse caso, a vítima, seu representante legal ou seus sucessores poderão ingressar no juízo civil para executar a sentença penal em relação à indenização devida pelo fato criminoso.

Ressalte-se que a execução apenas poderá ser proposta contra o réu condenado na ação penal, e não contra eventual responsável civil. Por exemplo, vamos imaginar que um empregado pratica um crime de dano enquanto exerce sua atividade. Condenado, a víti­ma poderá executar a sentença contra o próprio empregado. No entanto, nos termos da legislação civil, o empregador também é civilmente responsável pelos danos gerados por seu funcionário.

Nesse exemplo, a sentença apenas poderá ser executada contra o empregado; caso a vítima deseje cobrar a obrigação do emprega­dor, deverá se valer de nova ação de conhecimento, a fim de lhe garantir todo o contraditório.2

2 "Processual civil. Liquidação de sentença penal condenatória. Responsável civil pelos danos. Ilegitimidade de parte. Carência da ação. A sentença penal condenatória não consti­tui título executivo contra o responsável civil pelos danos decorrentes do ilícito, que não fez parte da relação jurídico-processual, podendo ser ajuizada contra ele ação, pelo processo de conhecimento, tendente à obtenção do título a ser executado. Recurso especial provido." (STJ, REsp n. 343.917/MA, rel. Min. Castro Filho, DJ 03.11.2003, v.u.)

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 291

Com efeito, obtida a sentença penal condenatória, o interessa­do promoverá sua liquidação no juízo cível competente (liquida­ção por arbitramento ou artigos); caso o título não contenha o valor da indenização e apurado o referido valor, será executada a sentença para compelir o devedor ao pagamento da quantia.3

c) A sentença homologatória de conciliação ou de transação, ainda que inclua matéria não posta em juízo.

O art. 475-N, III e V, confere força executiva à sentença hom o­logatória de conciliação ou de transação, bem como a qualquer acordo extrajudicial que tenha sido homologado judicialmente.

A conciliação é modalidade de acordo realizado em juízo. As partes, por concessões recíprocas, firmam os termos da composi­ção amigável do conflito. Já a transação é negócio jurídico civil

3 "Processo civil. Recurso especial. Omissão no julgado recorrido. Inexistência. Sentença penal condenatória transitada em julgado. Posterior extinção da punibilidade pela prescrição retroativa. Execução, no juízo cível, do decisum. Possibilidade. Reconhecimento do fato ilíci­to e da autoria mantidos. Título executivo extrajudicial (art. 584, II, do CPC). 1. Inexiste afron­ta ao art. 535 do CPC quando o v. acórdão impugnado não incorreu em omissão, contradi­ção ou obscuridade. 2. O reconhecimento da extinção da punibilidade pela prescrição retroativa após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória não afasta a caracteri­zação desta como título executivo no âmbito cível, a ensejar a reparação do dano causado ao ofendido. Dispensável é a propositura de ação de conhecimento. Incidência do art. 63 do CPP e do art. 584, II, do CPC. In casu, a sentença penal condenatória transitou em julgado aos 12.12.1988 (comprovada a existência do fato e sua autoria) e a extinção da punibilidade do acusado, em razão da prescrição retroativa, regulada pela pena in concreto, somente foi declarada em 07.07.1989. Com a liquidação da sentença condenatória, iniciou-se a ação exe­cutiva, a qual merece prosseguimento. A decretação da extinção da punibilidade não impli­ca o desaparecimento do fato, que ocorreu, causando prejuízos ao ofendido, sendo devidoo ressarcimento. 3. Precedentes (REsp ns. 163.786/SP e 166.107/MG). 4. Recurso não conhe­cido." (STJ, REsp n. 722.429/RS, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 13.09.2005, v.u.)

"Direito civil. Responsabilidade civil. Actio civilis ex delicto. Indenização por acidente de trânsito. Extinção do processo cível em razão da sentença criminal absolutória que não negou a autoria e a materialidade do fato. Art. 1.525, CC. Arts. 65 a 67, CPP. Recurso provido. I. Sentença criminal que, em face da insuficiência de prova da culpabilidade do réu, o absolve sem negar a autoria e a materialidade do fato, não implica a extinção da ação de indeniza­ção por ato ilícito, ajuizada contra a preponente do motorista absolvido. II. A absolvição no crime, por ausência de culpa, não veda a actio civilis ex delicto. III. O que o art. 1.525 do Códi­go Civil obsta é que se debata no juízo cível, para efeito de responsabilidade civil, a existên­cia do fato e a sua autoria quando tais questões tiverem sido decididas no juízo criminal." (STJ, REsp n. 257.827/SP, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 13.09.2000, v.u.)

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292 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

(art. 840 do Código Civil)1 que pode ser levado ao processo para ser homologado judicialmente.

Em ambos os casos, um a vez que prevêem a existência de obri­gações, o acordo homologado judicialmente constitui título exe­cutivo judicial para exigência do cumprimento, caso não ocorra o adimplemento voluntário.

Nesse ponto, é importante ressaltar que o único requisito para a eficácia do título é a homologação judicial, não impondo a lei que a matéria prevista no negócio tenha sido objeto de controvér­sia judicial.

Para a homologação do acordo (seja conciliação, seja transa­ção), o magistrado apenas se limitará à constatação dos requisitos do negócio jurídico (art. 104 do Código Civil), não fazendo análi­se do mérito ou justiça do acordo.

E mais: estando presentes os requisitos mencionados, o juiz deverá homologar inclusive matéria que não tenha sido posta em juízo. O acordo não está limitado às alegações e aos pedidos das partes no processo.

Assim, ele poderá homologar em conciliação matéria diversa daquela posta em juízo, desde que preencha os requisitos do negó­cio jurídico,

d) A sentença arbitrai.A sentença arbitrai decorre da faculdade conferida às partes,

nas questões privadas e de direito patrimonial, de submeter a reso­lução do litígio a um árbitro, afastando com isso a jurisdição do Estado (Lei n. 9.307/96).

Com efeito, a sentença proferida pelo árbitro tem força de títu ­lo executivo em relação às partes contra as quais foi proferida.

Note-se que o árbitro terá o poder de julgar a lide - suprindo assim o processo de conhecimento na esfera judicial - , mas não poderá determinar a execução do julgado, já que isso é ato exclu­sivo de órgãos da jurisdição, que poderão exercer força coercitiva sobre a outra parte para fazer cum prir a obrigação.

4 "Art. 840. É lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante con­cessões recíprocas."

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 2 9 3

e) A sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça.

A sentença proferida por órgão de Poder Judiciário de outro Estado soberano poderá ser executada no Brasil desde que, antes, seja homologada pelo Superior Tribunal de Justiça, nos termos do art. 483 do Código de Processo Civil (competência dada ao STJ pela EC n. 45/2004).

Havendo a homologação pelo Superior Tribunal de Justiça, por força do disposto no art. 109, X, da Constituição da República, a sentença homologada será cumprida pelo juiz federal competente.

f) O formal e a certidão de partilha, em relação aos sucessores do falecido (inventariante, sucessores a título singular e universal, herdeiros que participaram do processo).

Nos procedimentos de inventário (seja comum, seja pelo rito de arrolamento), ao final da ação, havendo a partilha dos bens do falecido, o juiz homologará sua divisão e expedirá uma carta (for­mal ou certidão) em favor dos sucessores para fazer a prova da titularidade de cada bem após a partilha.

Dessa forma, entre as partes que figuraram no processo, o for­mal ou a certidão de partilha tem força de título executivo judicial, podendo constar no documento obrigações de entrega de coisa, de fazer ou de pagamento de quantia.

18.3 Re f o r m a I n t r o d u z i d a p e l a L ei n .

1 1 .232 /2005

O processo de execução foi em grande parte alterado com o adven­to da Lei n. 11.232/2005, que retirou sua autonomia no caso de senten­ças, mantendo-a apenas para os títulos extrajudiciais (art. 585 doCPC).

Pela sistemática original do Código de Processo Civil, todos os títulos - judiciais ou extrajudiciais - eram executados por meio do processo de execução, ou seja, um a modalidade de processo absoluta­mente autônoma e independente em relação ao processo cautelar e ao processo de conhecimento.

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2 9 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Assim, quando transitava em julgado uma sentença ou acórdão no processo de conhecimento, o credor, dentro dos mesmos autos, deve­ria dar início a um novo processo: o de execução. A autonomia proces­sual acarretava o ônus de ter de haver nova petição inicial, nova cita­ção e todos os demais atos de um processo autônom o e independente.

Com a reforma, a execução de sentenças (títulos judiciais) deixou de ser um processo para se tornar mera fase do próprio processo de conhecimento.

A autonomia da execução já vinha perdendo força com as reformas processuais, uma vez que, por ocasião da inserção dos arts. 461 (pela Lei n. 8.952/94) e 461-A (pela Lei n. 10.444/2002), as execuções de senten­ças que continham obrigações de fazer, de não fazer ou de entrega de coisa já não eram tratadas como espécies de processos de execução, mas simplesmente uma fase executória do processo de conhecimento.

O mesmo existia no âmbito dos Juizados Especiais, nos termos da Lei n. 9.099/95, nos quais a sentença era executada diretamente após o trânsito em julgado.

Assim, pela nova sistemática do Código de Processo Civil, pode­mos incluir a execução, agora denominada cumprimento da sentença, como mera fase do processo cognitivo.

Fase Fase Fase Fase Fase*

Fase dopostulatória saneadora instru tória decisória recursal cum prim ento

da sentença

Pelo sistema introduzido pela Lei n. 11.232/2005, as execuções dos títulos judiciais, como regra, serão diretas, sem a necessidade de um processo autônom o de execução para que a obrigação seja satisfeita.

Ressalte-se que as execuções de quantia contra as Fazendas Públi­cas (art. 730 do CPC) ou contra o devedor de alimentos pelo rito que prevê sua prisão (art. 733 do CPC) continuam na forma anterior, já que a Lei n. 11.232/2005 não alterou tais procedimentos quanto a sua natureza de ação.

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 295

18.4 Fo r m a s de C u m p r i m e n t o

d a s S e n t e n ç a s

A forma de satisfação dos títulos judiciais dependerá da espécie de obrigação contida no título executivo, ou seja:

a) obrigação de fazer ou de não fazer - cumprimento pelo disposto no art. 461 do Código de Processo Civil - , com a imposição das tutelas específicas das obrigações de fazer ou não fazer;

b) obrigação de entrega de coisa - cumprimento pelo disposto no art. 461-A do Código de Processo Civil - , também com a imposição de tutelas específicas, determinando incidentalmente a busca e apreen­são da coisa;

c) obrigação de quantia certa - cumprimento da sentença na forma do disposto no art. 475-N do Código de Processo Civil. Por sua vez, o art. 475-R afirma que se aplicam ao cumprimento da sen­tença, subsidiariamente e no que couber, as regras do processo de execução de títulos extrajudiciais.

Na verdade, desde logo, devemos esclarecer que apenas a execução de quantia certa contra devedor solvente, dos títulos judiciais, sofreu alteração pela Lei n. 11.232/2005.

A execução contra a Fazenda Pública (prevista no art. 730 do CPC) e a execução de alimentos pelo rito da prisão (conforme art. 733 do CPC), como já tratamos, não obstante versarem sobre títulos jud i­ciais, continuam a ser praticadas na forma original estabelecida pelo Código de Processo Civil, ou seja, com a autonomia do processo de execução.

Para as obrigações de fazer, de não fazer e de entrega de coisa, os arts. 461 e 461-A determinam que, quando o juiz prolatar uma senten­ça que as contenha, deverá ele, mesmo ex officio, impor ao devedor uma tutela específica capaz de garantir o adimplemento da obrigação in na- tura (tema tratado no tópico 18.1).

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296 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

18.5 Ex e c u ç ã o Pr o v is ó r ia e Ex e c u ç ã o

De f i n i t i v a do J u l g a d o

A execução definitiva é aquela fundada em título judicial transita­do em julgado (§ Io do art. 475-1 do CPC).

Por outro lado, a execução provisória ocorrerá quando o título judi­cial estiver pendente de recurso recebido apenas no efeito devolutivo.

Como sabemos, os recursos podem receber o chamado efeito sus­pensivo e, nesse caso, ele impedirá que o título judicial produza desdo­bramentos até que o recurso seja julgado. No entanto, não havendo o efeito suspensivo (recurso recebido apenas no efeito devolutivo), o credor poderá, desde logo, iniciar o cumprimento da sentença ou do acórdão.

A execução provisória - fundada em título não transitado em julga­do - é processada por conta e risco do credor exeqüente, já que, haven­do a modificação do título, fica o credor responsável por indenizar a parte prejudicada pela execução provisória (art. 4 7 5 -0 ,1, do CPC).

Além disso, considerando a possibilidade de invalidação do título (pela reforma ou anulação do recurso que está pendente de julgamen­to), a alienação de bens ou o levantamento de quantias do devedor exe­cutado dependerão da apresentação de caução pelo credor exeqüente. Tal caução servirá como garantia de indenização ao devedor, caso a exe­cução fique inexistente em razão do julgamento do recurso pendente.

A caução, no entanto, poderá ser dispensada nas seguintes situa­ções (art. 475-0, § 2o, do CPC):

a) nas hipóteses de crédito de natureza alimentar ou decorrentes de ato ilícito, até o limite de 60 (sessenta) vezes o valor do salário mínimo, se o credor exeqüente demonstrar situação de necessidade;

b) nos casos de execução provisória em que penda agravo de instru­mento interposto contra a decisão denegatória de recurso extraor­dinário (no Supremo Tribunal Federal) ou recurso especial (no Superior Tribunal de Justiça), nos termos do art. 544 do Código de Processo Civil, salvo quando da dispensa possa manifestamente resultar risco de dano grave, de difícil ou incerta reparação.

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 297

Por uma questão prática, considerando que os autos do processo possam estar nos tribunais para julgamento do recurso e, por outro la­do, a execução deva ser processada na primeira instância, a execução provisória dependerá muitas vezes da extração da carta de sentença.

Como sabemos, para o julgamento do recurso pendente (já que a execução é provisória), os autos serão encaminhados para o tribunal, mas a execução deverá ocorrer na primeira instância. Assim, para per­mitir a execução provisória, o credor necessitará da formação de novos autos (pela carta de sentença).

A formação da carta requererá a extração de cópias do processo, nos termos do art. 475-0, § 3o, do Código de Processo Civil.

A carta de sentença, pela nova sistemática, será realizada pelo pró­prio patrono da parte exeqüente, que extrairá as cópias necessárias (declarando ele mesmo sua autenticidade) e as apresentará ao juízo competente, para a execução provisória que, sendo cabível, determina­rá a autuação.

Evidentemente, quando os autos retornarem à primeira instância, mesmo havendo a pendência de recurso - como é o caso do agravo do art. 544 do CPC - , não haverá necessidade da extração da carta, sendo a execução provisória realizada dentro dos próprios autos.

18.6 C o m p e tê n c ia J u r i s d i c i o n a l p a r a

o C u m p r im e n to da S e n t e n ç a

O cumprimento da sentença, como já tratamos, é uma fase do pro­cesso de conhecimento. O cumprimento é um atributo que decorre do próprio título dentro do processo em que foi proferido.

Duas questões surgem ao tratarmos da competência para o cum ­primento das sentenças: qual é o juízo e qual é o foro?

Em relação ao órgão jurisdicional, a regra geral é que o cum pri­mento se dê no juízo cível em que a ação teve início. Ou seja, se a ação de conhecimento teve início na primeira instância, o cumprimento se dará no mesmo órgão (art. 475-P, II, do CPC); se a ação foi de compe­tência originária do tribunal, como uma ação rescisória, o cum pri­mento será realizado no próprio tribunal (art. 475-P, I, do CPC).

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298 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Note-se que, mesmo se tratando de cumprimento de acórdãos (por exemplo, um acórdão proferido em sede de apelação), se a ação teve início na primeira instância, lá se dará seu cumprimento. A execução apenas será realizada nos tribunais quando se tratar de competência originária da segunda instância ou dos tribunais superiores.

Em relação ao foro (local), não haveria grande dificuldade em sua definição, já que o cumprimento seria realizado nos mesmos autos da ação de conhecimento e, portanto, a competência de local já estaria definida.

Por sua vez, a reforma da Lei n. 11.232/2005 inovou para permitir a modificação da competência (de local) na fase do cumprimento da sen­tença. O processo correrá em um foro durante a fase do conhecimento e, quando do cumprimento, poderá ser remetido para outro foro.

Ressalte-se que a modificação é apenas de foro (local).Tal regra se encontra prevista no parágrafo único do mencionado

art. 475-P, permitindo que, nos casos de competência executória da primeira instância (inc. II), o credor exeqüente requeira ao juiz de ori­gem a remessa dos autos ao juízo do local onde se encontrarem os bens sujeitos à execução ou do atual domicílio do devedor.

A modificação da competência, nesse caso, visa a permitir a cele­ridade processual, já que, se o cumprimento da sentença ocorrer no local em que se encontram os bens objetos da expropriação ou do novo endereço do devedor, serão evitadas as cartas precatórias neces­sárias para a realização dos atos fora da comarca.

Por outro lado, a regra geral de competência anteriormente estabe­lecida não se aplica aos títulos oriundos de outros juízos, como ocorre com a sentença arbitrai, a sentença penal condenatória ou a sentença estrangeira.

Nesses casos, será observada a seguinte regra (art. 475-P, III, do CPC):

a) sentença arbitrai ou sentença penal condenatória: o cumprimento se dará no juízo cível competente segundo as regras gerais de com ­petência, ou seja, haverá livre distribuição para o juízo cível do local de cumprimento da obrigação (art. 100, d, do CPC) ou, na falta deste, no local de domicílio do devedor (art. 94 do CPC);

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 299

b) sentença estrangeira: após homologada pelo Superior Tribunal de Justiça, a sentença estrangeira será executada pelo Juízo Federal (art. 109 da Constituição da República) do local de cumprimento da obrigação (art. 100, d, do CPC) ou, na falta deste, no local de domicílio do devedor (art. 94 do CPC).

Note-se que, em ambos os casos, não havia anterior processo no juízo cível, razão pela qual haverá a necessidade de definição de nova competência por ocasião do requerimento da execução.

18.7 L i q u i d a ç ã o de S e n t e n ç a 5

Como já tratamos, as sentenças condenatórias - ou acórdãos que venham a substituí-las - são títulos capazes de permitir que o credor movimente a máquina judiciária com o objetivo de compelir o deve­dor a seu cumprimento.

Para o título ter executoriedade, porém, a obrigação deve ser líqui­da, certa e exigível.

A liquidez é requisito relacionado com a extensão da obrigação, ou seja, deve constar no título a obrigação exata a ser cumprida pelo deve­dor. A liquidez corresponde à determinação da obrigação a ser cum ­prida pelo devedor (por exemplo, a quantia exata).

Assim, podemos dizer que liquidar corresponde ao ato de encon­trar o valor ou a determinação da obrigação (de fazer, de não fazer ou de entrega de coisa) a ser cumprida pelo devedor.

Assim, toda vez que o título judicial não for líquido - não contiver a determinação da obrigação - , antes de serem realizados os atos exe­cutórios, o credor deverá promover a liquidação dessa sentença, con­forme preceitua o art. 475-A do Código de Processo Civil.

No procedimento da liquidação, a cognição apenas observará a ex­tensão da obrigação. Não se discute se o sujeito é devedor (art debeatur - se deve) - afinal, isso já foi superado na sentença ou no acórdão. Na

5 Tópico também abordado no capítulo 21 do volume I do presente Manual.

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300 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

liquidação, busca-se apenas um provimento judicial - que será integra­do ao título judicial - que se pronuncie acerca do quantum debeatur.

Pelo sistema anterior à reforma da Lei n. 11.232/2005, a liquidação da sentença era tratada a partir do art. 603 do Código de Processo Ci­vil, trazida agora para o art. 475-A do Código de Processo Civil.

O legislador tirou o tema do capítulo destinado à execução e inse­riu no tópico que trata “Da Sentença”.

A liquidação de sentença, de fato, é atributo ou reflexo da prolação que julgamos ilíquidos, devendo, corretamente, ser tratados pela legis­lação dentro das regras relativas à sentença do processo civil.

Na verdade, a reforma tirou a autonomia que existia no antigo pro­cesso de execução. Para o novo sistema, a execução de títulos judiciais deixou de ser um processo autônomo para se transformar em mera fase do processo de conhecimento.6 Assim, todos os artigos relacionados à execução das sentenças, inclusive referentes à liquidação, foram coloca­dos no capítulo da sentença.

A liquidação de sentença, no antigo Código de Processo Civil, em especial pelas modalidades de arbitramento e por artigos, era tida co­mo verdadeira ação; ou seja, após o término da ação de conhecimen­to, o credor deveria dar início a uma nova ação cognitiva, para deter­minar a liquidez do título proferido no primeiro processo.

Com a reforma, como regra, a liquidação de sentença deixou de ter natureza de ação,7 para ser tratada pelo processo civil como mero inci­dente processual preparatório ao “cumprimento da sentença”. Perden­do o processo de execução de sentenças a autonomia processual, não há mais justificativas para que a liquidação também continue sendo tratada como ação.

Com efeito, tanto o procedimento preparatório de liquidação co­mo o cumprimento dos títulos judiciais, com a reforma da Lei n. 11.232/2005, passaram a ter natureza de incidentes ou fases do proces­so de conhecimento.

6 Luiz Rodrigues Wambier, Curso avançado de processo civil, p. 98.7 Os professores Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, em seu Código de

Processo Civil anotado, 1997, p. 834, definiam: "Natureza da liquidação. A liquidação de sen­tença é ação de conhecimento, de natureza constitutiva integrativa, pois visa completar o títu­lo executivo (judicial ou extrajudicial) com o atributo da liquidez, isto é, o quantum debeatur".

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 3 0 1

■ i 18 .7 .1 T í t u l o s J u d i c i a i s I l í q u i d o s

O art. 475-N do Código de Processo Civil arrola os títulos executi­vos judiciais: a) a sentença condenatória do processo civil; a) a sentença penal condenatória transitada em julgado; c) a sentença homologatória de conciliação ou transação; d) a sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça; e) o formal ou certidão de partilha.

Cumpre destacar que, em algumas situações, essas sentenças po­dem carecer de liquidez, ou seja, quando, por ocasião da prolação do título, não foi possível ao magistrado fixar o valor do objeto da conde­nação, estipulando, na parte dispositiva do julgado, que a condenação ficaria à mercê de liquidação (por exemplo: “Julgo procedente para condenar o réu a pagar indenização ao Autor, cujo valor será apurado em liquidação”).

A falta de liquidez da sentença no processo civil pode se dar nas hipóteses em que o autor tiver formulado, em sua petição inicial, um pedido genérico, nos termos do art. 286 do Código de Processo Civil. Como sabemos, é requisito do pedido que ele seja certo e determina­do, sendo que a determinação está intimamente ligada à extensão dos efeitos práticos da tutela (a determinação do pedido mediato).

Portanto, caso o autor tenha formulado em sua petição inicial um pedido genérico, ao prolatar a sentença o juiz também poderá proferir uma sentença ilíquida.8

Evidentemente, nem todo pedido genérico conduzirá a uma sen­tença ilíquida, já que muitas vezes o valor pode ser apurado no curso da ação de conhecimento. Mas, se isso não for possível, o juiz prolata- rá uma sentença contendo apenas a tutela (no caso, condenatória) sem fixar seus efeitos práticos, que ficarão a cargo da liquidação.

Nesse ponto, uma exceção foi instaurada pela reforma, isso para determinar expressamente a proibição de sentenças ilíquidas no pro­cedimento sumário, ou seja, mesmo que o autor formule um pedido genérico, naqueles casos do art. 275, ao terminar sua função jurisdicio­nal o juiz deverá proferir sentença líquida.

8 "Art. 459. [...] Parágrafo único. Quando o autor tiver formulado pedido certo [leia-se determinado], é vedado ao juiz proferir sentença ilíquida." Desse artigo, podemos extrair a conclusão inversa: sendo formulado pedido genérico, poderá o juiz proferir sentença ilíquida.

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3 0 2 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Assim, se no rito sumário a sentença obrigatoriamente será liquida, não haverá que se falar de fase preparatória de liquidação nessa m oda­lidade de rito processual mais célere. Por outro lado, a sentença conde­natória advinda do penal também seria caso de título judicial ilíquido.

A sentença penal poderá ser executada no civil para efeito de ga­rantir à vítima a indenização pelos danos experimentados em razão do delito (responsabilidade civil ex delito).

Como regra, porém, a sentença penal não contém o valor da inde­nização ou o objeto a ser prestado a título de indenização. Portanto, antes da execução da indenização no civil, o credor deverá realizar a liquidação da sentença para apurar o valor ou a obrigação a ser pres­tada pelo devedor.

Assim, a liquidação sempre terá cabimento quando o título execu­tivo judicial não contiver a quantia ou a obrigação exata que será im ­posta ao devedor. Com a liquidação, o credor obtém um provimento judicial que complementa a sentença com o quantum debeatur.

ma 1 8 . 7 . 2 E s p é c i e s d e L i q u i d a ç ã o

O Código de Processo Civil prevê que a liquidação de sentença po­de se dar pelos seguintes meios:

a) liquidação por cálculos;b) liquidação por arbitramento;c) liquidação por artigos.

■■ 1 8 . 7 . 3 L i q u i d a ç ã o p o r c á l c u l o s

A liquidação por cálculos, mesmo antes da reforma da Lei n. 11.232/2005, já não era concebida como uma modalidade de ação (co­mo eram as demais espécies), pois em razão de reformas anteriores (Lei n. 8894/94) o sistema havia sido bastante simplificado.9

O Código de Processo Civil estabelece, em seu art. 475-B, que, na hipótese de a obtenção do valor depender apenas de meros cálculos

9 Antes da Lei n. 8.894/94, os cálculos eram realizados por contador judicial.

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 303

aritméticos, o credor elaborará a petição de execução apresentando jun­tamente uma memória demonstrativa do cálculo por ele realizado.

É uma espécie de liquidação muito simplificada, que se realiza no momento do requerimento de cumprimento da sentença. Nessas si­tuações, o credor requer o cumprimento da sentença e, no mesmo ato, apresenta as contas de seu crédito.

É importante, no entanto, ressaltar que tal modalidade de liquida­ção apenas é cabível:

a) para as obrigações de quantia;b) quando a obtenção do valor apenas depender de cálculos arit­

méticos;c) quando a sentença contiver todos os elementos necessários à ela­

boração dos cálculos (ou seja, base de cálculos e elementos a serem calculados).

Por certo, contendo a sentença todos os elementos necessários à elaboração dos cálculos, o credor requererá seu cumprimento e, na própria petição, apresentará uma memória demonstrando como obte­ve o valor total executado, atualizado até a data do início da execução.

A liquidação por cálculo é muito comum quando a obtenção depende apenas do cálculo de juros, correção monetária ou para con­versão de salários mínimos ou outro valor.

Requisição de informações ao devedor ou terceiros

O § Io do art. 475-B determina que, quando as informações neces­sárias à realização dos cálculos (valores) estiverem em poder do deve­dor ou de terceiros, o credor poderá requerer ao juiz que intime o pos­suidor das informações para que apresente tais dados ao processo a fim de permitir os cálculos.

Trata-se de requerimento prévio e preparatório para a elaboração dos cálculos.

Nesse caso, o juiz determinará que as informações sejam prestadas em até 30 dias, sob pena de:

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3 0 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

a) não sendo apresentadas as informações, será aplicada a pena de confissão e o devedor não poderá impugnar os cálculos (§ 2o do art. 475-B), caso seja ele o omisso no cumprimento da ordem;

b) caracterizar crime de desobediência, caso a ordem não seja cum ­prida pelo terceiro.

O § 2o do art. 475-B determina que, caso o devedor se recuse a pres­tar as informações, será aplicada a pena de confissão. No entanto, caso a recusa seja do terceiro, não há que se falar em confissão (apenas a parte pode confessar), mas de recusa de cumprimento de ordem judicial.

Evidentemente, a confissão não poderia ser aplicada ao terceiro, já que ele não é parte no processo. No entanto, o terceiro tem o dever de colaborar com a justiça, e sua omissão poderá caracterizar recusa ao cumprimento de ordem judicial.

Conferência pelo contador judicial

A lei processual atribui ao credor o dever de apresentar a m em ó­ria de cálculo discriminando o valor exeqüendo; em decorrência disso, caso o magistrado entenda que o valor constante da memória é supe­rior àquele previsto no título, poderá determinar a remessa dos autos ao contador judicial para realização de uma conferência.

A conferência pelo contador do juízo poderá se dar quando: a) o cálculo do credor aparentar estar excessivo; b) nos casos de assistência judiciária gratuita.

Nesse caso, se o contador judicial constatar que o valor executado é excessivo, o juiz dará a oportunidade ao exeqüente de aditar sua pre­tensão executória. Se o autor, porém, insistir no valor originariamente apresentado, a execução prosseguirá por aquele valor, mas a penhora dos bens do devedor recairá apenas com base no valor apresentado pelo contador.

Evidentemente, o cálculo prévio do contador não dá ao juiz o po­der de julgar os cálculos sumariamente, mas apenas de evitar uma pe­nhora excessiva.

A fixação do valor correto (julgando se a execução é excessiva ou não) se dará apenas se o devedor executado apresentar impugnação.

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 3 0 5

No caso de justiça gratuita, a admissão do uso do contador judi­cial para a elaboração dos cálculos se dá como medida de acesso ao Judiciário, uma vez que a parte poderia ficar prejudicada no cum pri­mento da sentença pela falta de recursos financeiros que permitam a apresentação da memória de cálculo prévia.

Vejamos o processamento do incidente:

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3 0 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

h 1 8 . 7 . 4 L i q u i d a ç ã o p o r A r b i t r a m e n t o

A liquidação por arbitramento tem lugar quando a obtenção do valor da execução depende da realização de perícia. São hipóteses em que a definição do valor dependerá da manifestação de um profissio­nal com habilidades técnicas específicas.

Por exemplo, quanto vale a indenização por um quadro de um pin­tor renomado? Quanto valeria uma indenização por um veículo de co­leção? Evidentemente, para se determinar o valor da obrigação seria necessária a participação de um perito.

O art. 475-C do Código de Processo Civil prevê que caberá a liqui­dação por arbitramento quando:

a) a sentença determinar;b) as partes convencionarem;c) a natureza do objeto a ser executado exigir.

Na modalidade de liquidação por arbitramento, pela natureza do incidente, o juiz nomeará um perito para apontar o valor da obriga­ção, fixando, desde logo, o prazo para a apresentação do laudo.

Apresentado o laudo, o juiz abrirá oportunidade para as partes se manifestarem e, sendo o caso de colheita de provas orais (esclarecimen­tos do perito ou oitiva de testemunhas), o juiz poderá designar audiên­cia de instrução.

Ao final, o magistrado proferirá decisão para fixar o valor da obrigação.

Na verdade, como sabemos, o juiz não está vinculado ao laudo pe­ricial, mas poderá fixar valor em conformidade com a livre convicção motivada, já que a perícia é apenas um meio de prova e não um ato que obriga o juiz.

m 1 8 . 7 . 5 L i q u i d a ç ã o p o r A r t i g o s

A liquidação por artigos tem cabimento quando, para a apuração do valor, for necessária a comprovação pelo credor de fatos novos.

Por fatos novos entendemos aqueles que não foram objeto de aná­lise na ação de conhecimento. Não se trata de fatos posteriores à sen­tença, mas de fatos que não foram discutidos antes da sentença.

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 307

Imaginemos que, em uma ação de indenização proposta por um consumidor lesado pelo fato de o produto apresentar alguma falha (por exemplo, um carro que apresentou defeito e gerou um acidente), o autor tenha formulado na petição inicial um pedido genérico, justifi­cado pelo fato de que os danos estão se prolongando no tempo (art. 286, II, do CPC). A ação corre e não se discute a extensão do dano, mas apenas a obrigação do réu de indenizar. Por fim, o juiz profere uma sentença fixando a condenação do réu ao pagamento de indenização, cujo valor será apurado em liquidação.

Nesse caso, será necessária a realização de uma liquidação para a apuração do quantum debeatur e conseqüentemente, para se extrair o va­lor, será necessária a comprovação de fatos novos, ou seja, quanto o con­sumidor gastou com médicos, com remédios, fisioterapia etc.

Assim, denomina-se liquidação por artigos em virtude de que o credor deverá, em sua petição, indicar os fatos que pretende provar - artigo por artigo. Na petição, o credor deverá arrolar os fatos que pre­tende provar.

Com base no exemplo anterior, poderíamos dizer que o credor faria uma petição e, por itens (ou artigos), o arrolamento dos fatos que pretende provar. Por exemplo:

O Autor pretende demonstrar que:1) Teve gastos com o pagamento de honorários de médicos, no valor

de (R$).2) Despendeu o valor de (R$) com fisioterapia.3) Despendeu o valor de (R$) para realizar o conserto do veículo.

Na verdade, ao elaborar a petição de liquidação por artigos, o cre­dor deverá enumerar (de forma articulada) os fatos novos que preten­de provar para obter o valor da condenação.

Apresentada a petição, o juiz abrirá vistas à parte devedora para que possa impugnar ou se defender desses fatos. Pode, inclusive, ocorrer a dilação probatória para a apuração dos fatos narrados pelo credor.

O art. 475-F prevê que, no procedimento da liquidação por arti­gos, o juiz deverá observar, no que couber, o procedimento comum (regras do rito sumário ou ordinário), ou seja, garantir o contradito-

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3 0 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

rio e permitir a colheita vasta de provas (com audiência, perícias, jun ­tada de documentos etc.).

Ao final, o juiz proferirá decisão julgando os fatos apresentados pe­lo credor e fixando o valor da condenação.

■■ 1 8 . 7 . 6 R e c u r s o C a b í v e l n a L i q u i d a ç ã o

As modalidades de liquidações por artigos e arbitramento consti­tuem procedimento preparatório à execução da sentença.

Pelo sistema anterior à reforma da Lei n. 11.232/2005, porém, essas duas liquidações tinham natureza de ação, ou seja, começavam com uma petição inicial (pelo art. 282 do CPC). O devedor era citado, havia a dila­ção probatória e, ao final, o juiz prolatava uma sentença de liquidação.

Conseqüentemente, no sistema revogado, sendo o ato judicial uma sentença, a parte prejudicada na liquidação poderia se valer do recur­so de apelação (que seria recebida no efeito devolutivo, conforme a redação revogada do art. 520, III, do CPC).

Com a reforma, essas espécies perderam a natureza de ação e pas­saram a ser consideradas como meros incidentes processuais.

Dessa forma, pelo sistema vigente, ao final da liquidação - apura­do o valor - o juiz proferirá uma decisão interlocutória, cabendo con­tra tal ato o recurso de agravo de instrumento, conforme previsão ex­pressa do art. 475-H do Código de Processo Civil.

h 1 8 . 7 . 7 L i q u i d a ç ã o n a P e n d ê n c i a d e R e c u r s o

O art. 475-A, em seu § 2o, admite que a liquidação de sentença pode ser realizada durante a pendência de recurso.

Proferida a sentença ou o acórdão ilíquidos, a parte credora, desde logo, poderá requerer, perante o juízo competente para o cum prim en­to da sentença, a realização do procedimento de liquidação.

Nesse caso, considerando que a liquidação será processada na ins­tância inferior e os autos encaminhados ao Tribunal para julgamento do recurso, o credor promoverá a extração das cópias necessárias à for­mação de novos autos para processamento da liquidação, como verda­deira carta de sentença.

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 309

m 1 8 . 7 . 8 C i t a ç ã o d o D e v e d o r n a l i q u i d a ç ã o

Nos casos dos títulos não oriundos do processo civil, a liquidação se dará, por questões práticas, com a formação de novos autos.

É o que ocorre, por exemplo, com a pretensão de liquidação de sen­tença penal condenatória, sentença estrangeira, sentença arbitrai etc.; nesses casos, ainda não existe processo em curso no juízo cível.

Nessas situações, a liquidação dará início a um novo processo no âmbito civil, situação em que o juiz deverá determinar a citação do devedor para contestar a liquidação, conforme determina o art. 475-N, parágrafo único, do Código de Processo Civil.

A previsão do parágrafo único é excepcional e determina que se instaure um processo de liquidação de sentença, uma vez que o deve­dor ainda não havia sido citado no juízo cível.

18.8 C u m p r i m e n t o de O b r ig a ç õ e s

de Q u a n t i a C e r t a

A execução de título judicial, como já tratamos, perdeu a autono­mia de ação, recebendo o statusde mera fase procedimental do proces­so de conhecimento.

Assim, estando o título pronto para execução - seja com o trânsito em julgado, seja após a extração da carta de sentença na hipótese de execução provisória-, a parte devedora terá o prazo de 15 (quinze) dias para cumprir voluntariamente a obrigação constante do título judicial.

A Lei n. 11.232/2005, ao modificar o processo executório de títulos judiciais, foi omissa em relação ao termo inicial desse prazo para cumpri­mento voluntário, dizendo tão-somente que, caso o devedor não cumpra a obrigação no prazo de 15 (quinze) dias, o valor será acrescido de multa.

Grande controvérsia se estabeleceu na doutrina em relação ao termo inicial desse prazo de 15 (quinze) dias.

Alguns autores, entre eles Humberto Theodoro Júnior,10 afirmam que o prazo corre independentemente de intimação da parte devedora, ou seja, estando o título judicial em condições de exigibilidade (seja pelo trânsito em julgado ou pela inexistência de efeito suspensivo no recurso,

10 Curso de direito processual civil.

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3 1 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

permitindo a execução provisória), compete ao devedor pagar esponta­neamente, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de sofrer a multa legal.

Para outra corrente doutrinária - podemos citar Daniel Amorim Assumpção Neves" - , o início da contagem do prazo sem a prévia inti­mação do devedor é inovação ou interpretação que não condiz com a realidade processual. A esse respeito, o professor Neves explica:

É exatamente nesse momento que se percebe que a celeridade pre­tendida pelo legislador ou pelo intérprete das lei deve manter os pés no chão, lembrando-se sempre da praxe forense e das dificuldades geradas na aplicação prática das normas processuais.

De fato, entendemos correta a interpretação dada pelo autor citado, já que, na prática, afirmar que o prazo para o cumprimento da sentença se dará sem a prévia intimação do devedor conduzirá à situação em que essa parte ficará em extrema desvantagem processual.

Devemos lembrar que, muitas vezes, o trânsito em julgado ou o ter­mo inicial de exigibilidade da sentença tem início nos tribunais, locais em que a parte devedora não tem acesso aos autos para fazer o paga­mento. E pior, o pagamento (com o depósito em juízo da quantia) de­ve ser realizado na primeira instância.

Pergunta-se, então: estando os autos no tribunal (ou em trânsito pa­ra as instâncias inferiores), como o devedor cumprirá o prazo de 15 dias?

Evidentemente, existirá aí uma impossibilidade prática de cumpri­mento espontâneo, razão pela qual, estando os autos na instância inferior ou extraída a carta de sentença (para a execução provisória), o devedor deverá ser intimado, mesmo na pessoa de seu advogado ou representan­te legal, para que possa ter início o prazo de 15 (quinze) dias para cum ­primento voluntário do título.

Não podemos exigir do devedor que realize a extração de carta de sentença para fazer o pagamento voluntário do título ainda sem o trân­sito em julgado. Mesmo porque a mera extração da carta de sentença, como sabemos da prática, superaria o prazo de 15 (quinze) dias.

Não seria demais exigir que, estando o título em condições de cum ­primento, o magistrado profira (na carta de sentença extraída pelo cre­

11 Reforma do CPC, p. 211-18.

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 3 1 1

dor ou nos autos do processo transitado em julgado) um despacho de “cumpra-se”, como já ocorre hoje na prática, a fim de que tal ato seja o marco do curso do prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento voluntário.

A elaboração da memória de cálculo compete ao credor, não po­dendo ser exigido do devedor o título sem que antes a parte credora apresente a memória com o valor que pretende receber.

A interpretação dada pela dispensa da intimação leva ao absurdo de permitir que o devedor venha a perder o prazo para o cum prim en­to voluntário da sentença sem que ele tenha conhecimento do termo inicial desse prazo, bem como desconheça o valor exato a ser cum pri­do, o que, sem dúvida e no mínimo, violaria a razoabilidade e a isono- mia entre as partes do processo.

Assim, repita-se, entendemos que o início do prazo depende da inti­mação da parte devedora, pelo menos com um despacho de “cumpra-se” publicado no órgão de imprensa (intimação na pessoa do advogado). Sem a intimação do devedor para dar cumprimento, não temos o termo inicial para o cumprimento voluntário do julgado e posterior aplicação da multa.12

v "Sentença. Cumprimento. Ação de cobrança de débitos decorrentes da prestação de serviços educacionais. Acordo homologado judicialmente. Descumprimento. Execução. Insur- gência contra decisão que, de ofício, determinou a intimação do devedor, mas na pessoa do seu advogado, para pagamento no débito no prazo de quinze dias, sob pena de incidência de multa e prosseguimento da execução. Pretensão à realização de intimação pessoal. Desa- colhimento, eis que a intimação pessoal prevista no § 1o do art. 475-J do Código de Proces­so Civil não se aplica à oportunidade de quitação do débito sem multa, mas à lavratura do auto de penhora e avaliação, sendo devida apenas quando o executado não tiver advogado e nem for assistido por Procurador do Estado. Multa, prevista no art. 475-J, do Código de Processo Civil, dotada de natureza processual coercitiva. Intimação pessoal do Procurador que assiste o executado, a partir da qual terá início o prazo consignado na decisão guerreada, determinada. Recurso parcialmente provido para este fim." (TJSP, Al n. 1.067.206-0/0, rel. Des. Silvia Rocha Gouvêa, j. 20.09.2006, v.u.)

"Sentença. Cumprimento. Prazo de 15 dias para pagamento previsto no art. 475-J do Código de Processo Civil. Termo inicial. Apresentação da memória de cálculo pelo credor. Inti­mação do devedor na pessoa de seu advogado. Necessidade. Em suma, o cumprimento da sentença deve ter início por provocação do credor, que por meio da apresentação da memó­ria de calculo requererá a intimação do devedor, na pessoa de seu advogado, para que efe­tive o pagamento em quinze dias, sob pena da incidência da multa de 10%. Recurso provi­do." (TJSP, Al n. 1.081.610-0/1, rel. Des. Neves Amorim, j. 12.12.2006, v.u.)

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312 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Ressaltamos, porém, que a final e última palavra a esse respeito fi­cará ainda a cargo da jurisprudência e, em especial, das decisões do Su­perior Tribunal de Justiça, ao qual compete a interpretação final da le­gislação infraconstitucional em jurisdição comum.

Em relação aos títulos oriundos de outros juízos - sentença arbi­trai, sentença penal condenatória e sentença estrangeira - , a intimação para o cumprimento deverá incluir ordem de citação, já que, nesses ca­sos, o credor estará dando início a novo processo.

h 18 .8 .1 E f e i t o s d o N ã o -c u m p r i m e n t o V o l u n t á r i o

Na hipótese de o devedor executado não realizar o pagamento no prazo de 15 dias, sobre o valor da execução será acrescida a multa de 10%.

Para o processamento do cumprimento da sentença, caberá ao cre­dor elaborar a memória de cálculo - nos termos do art. 475-B do Códi­go de Processo Civil - , com o valor atualizado e acrescido de eventuais juros até a data do requerimento de execução, solicitando a expedição de mandado de penhora dos bens do executado e avaliação pelo próprio oficial de justiça.

Assim, o oficial de justiça realizará a penhora dos bens do devedor - observando as regras de impenhorabilidade e ordem dos arts. 649,650 e 655, todos do Código de Processo Civil - e, imediatamente, realizará a avaliação dos bens, salvo se não tiver conhecimentos específicos para isso.

A avaliação consiste no ato de atribuir valor aos bens, que poderá ser realizado de plano pelo oficial de justiça. No entanto, caso a valo- ração do bem dependa de conhecimento específico, o juiz poderá de­signar perito para o arbitramento.

Realizadas a penhora e a avaliação, o devedor será intimado do ato na pessoa de seu advogado ou, na falta deste, pessoalmente (ou pelo representante legal), por correio ou mandado.

Da intimação da penhora (certidão nos autos ou juntada do m an­dado), o devedor terá o prazo de 15 dias para a apresentação de impug­nação contra a execução.

A impugnação contra o cumprimento das sentenças será tratada no capítulo 19, já que é relativa a meio de defesa contra os atos executórios.

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CUMPRIMENTO DOS TÍTULOS JUDICIAIS 3 1 3

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D e f e s a s c o n t r a o

P r o c e s s o d e E x e c u ç ã o

e o C u m p r i m e n t o

d e S e n t e n ç a s 19

O processo de execução é o instrumento pelo qual a par­te movimenta o Poder Judiciário para o fim de obter a satis­fação de um direito previamente reconhecido em um título executivo.

Com o advento das Leis ns. 11.232/2005 e 11.382/2006, a satisfação dos títulos executivos foi cindida em dois modos distintos: a) processo de execução para os títulos extrajudi­ciais; b) cumprimento de sentença para os títulos judiciais. Com isso, também houve grande alteração nos meios de defe­sa contra os atos executórios.

Assim, podemos afirmar que são cabíveis os seguintes meios de defesa contra o processo de execução de título ex­trajudicial ou para o cumprimento de sentenças:

a) ação de embargos do devedor;b) impugnação e petições incidentais;c) objeção de pré-executividade;d) outras ações autônomas.

3 1 5

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3 1 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Nos itens a seguir, trataremos de cada uma das defesas cabíveis con­tra os atos expropriatórios próprios da execução ou do cumprimento de sentenças.

19.1 E m b a r g o s do De v e d o r

m 1 9 . 1 . 1 O r i g e m e d e f i n i ç ã o

Moacyr Lobo da Costa esclarece que:

É ponto pacífico na história do Direito lusitano que os embargos,

como meio de obstar ou impedir os efeitos de um ato ou decisão judicial,

são criação genuína daquele direito, sem qualquer antecedente conheci­

do, asseverando os autores que de semelhante remédio processual não se

encontra o menor traço no dire ito romano, germânico ou no canônico,

nem nos ordenamentos jurídicos dos diversos povos de civilização ociden­

tal que se form aram em decorrência da interpenetração daqueles três

grandes sistemas, de que no fundo todos são tributários.'

No Direito romano, era inviável a utilização dos embargos do de­vedor como meio de defesa para obstar execuções indevidas, porque, na sistemática romana da actio judicati, não havia força coativa para que se invadisse o patrimônio do devedor.

Foi na Idade Média, com a criação do título executivo, de encontro aos sistemas germânico e romano, que se fez necessária a criação de um meio de defesa mais eficaz contra as execuções não fundadas. Assim, surgiram, no Direito português, os embargos, que mais tarde foram transportados para o Direito brasileiro.

No atual ordenamento processual, podemos definir os embargos do devedor como sendo a ação cabível para que o devedor possa des- constituir o título executivo objeto de uma ação de execução ou mes­mo para se opor aos atos expropriatórios.

' Origem dos embargos, p. 5.

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DEFESAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUCÃO E O CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS 3 1 7

Assim, os embargos do devedor têm natureza de ação e não ape­nas de mera defesa incidental.

Na lição de Luiz Rodrigues Wambier, os embargos do devedor re­presentam:

Instrum ento que se confere ao devedor para que possa discutir o

m érito do dire ito pretendido pelo exeqüente, bem como suscitar defeitos

na constituição e andam ento da execução, suspendendo o processo

enquanto se apreciam suas alegações.2

Na verdade, pelo fato de que o processo de execução se funda em um título executivo - documento que dá a certeza de existência da obri­gação - , não se justificaria a instauração de contraditório dentro do pró­prio processo de execução.

Assim, querendo o devedor executado se opor ao título ou mesmo contra o processo, deverá promover nova ação, cuja natureza será de conhecimento incidental3 para a desconstituição do título ou reconhe­cimento de vício no processo executório.

Os embargos não são mera resistência ao pedido do credor (como ocorre à contestação), mas, na verdade, o devedor embargante tem pretensão ativa à tutela jurisdicional desconstitutiva do título apresen­tado pelo credor exeqüente.

Portanto, podemos definir como características dos embargos do devedor:

a) autonomia processual - instaura uma nova relação jurídica pro­cessual (o executado figura como autor embargante e o exeqüen­te, como réu embargado);

b) ação de cognição ou de conhecimento, com pedido de tutela cons­titutiva negativa (ou desconstitutiva);

c) ação incidental, uma vez que, não obstante a autonomia proces­sual, tem por objeto a relação jurídica de outro processo em curso, ou seja, a ação de execução. Os embargos serão distribuídos por dependência à ação de execução.

2 Curso avançado de processo civil, p. 296.3 Humberto Theodoro Júnior, Curso de direito processual civil, p. 377.

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3 1 8 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Nesse caso, como os embargos são tratados como ação incidente, não se pode deixar de ressaltar que devem preencher todas as condi­ções da ação, bem como a observância dos pressupostos processuais.

■ i 1 9 . 1 . 2 L e g i t i m i d a d e

Como o próprio nome delimita, está legitimado à propositura dos embargos o sujeito que consta como devedor na execução, ou seja, to­da pessoa incluída no pólo passivo da ação executória.

Também se admite, no entanto, a legitimidade para propositura dos embargos ao terceiro que pretender atacar o mérito da execução - pre­tensão de discussão da dívida ou da legitimidade da obrigação - , inclu­sive naquelas hipóteses em que o art. 592 do Código de Processo Civil admite a expropriação patrimonial de bens de terceiros.

Ressalte-se que o terceiro poderá opor embargos quando for para discutir o título executivo, desde que demonstre interesse em afastar a obrigação. O sujeito que não estiver incluído no pólo passivo da execu­ção, mas que for coobrigado, também poderá opor os embargos para afastar a dívida.

Nesse caso, podemos citar o exemplo do cônjuge: caso ele pretenda impugnar a dívida, discutir a legitimidade da cobrança ou defender o bem de família, poderá se valer dos embargos do devedor. Agora, caso pretenda defender sua meação, deverá se valer de embargos de terceiros.4

Para que os terceiros possam embargar a execução, é necessário que demonstrem o interesse na desconstituição do título. Por outro lado, quando o terceiro pretender alegar a exclusão de sua responsabilidade diante da execução, o correto será a propositura de embargos de tercei­ro, que se estudará em tópico oportuno.

4 "Execução. Penhora. Mulher casada. Recaindo a penhora sobre bem imóvel, a mulher do executado deve ser intimada (art. 669, parágrafo único do CPC) e pode oferecer embar­gos à execução, podendo discutir a dívida; além disso, tem legitimidade para eventualmente opor embargos de terceiro, na defesa de sua meação. Recurso conhecido e provido." (STJ, REsp n. 83.051/RS, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 11.03.1996, v.u.)

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DEFESAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUCÃO E O CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS 3 1 9

■■ 1 9 . 1 . 3 E s p é c i e s e P r o c e s s a m e n t o

d o s E m b a r g o s d o D e v e d o r

Os embargos do devedor representam gênero de ação que com­portam as seguintes espécies:a) embargos à execução - art. 745 do CPC;b) embargos à arrematação ou à adjudicação - art. 746 do CPC.

mt 1 9 . 1 . 4 E m b a r g o s à E x e c u ç ã o

O art. 745 do Código de Processo Civil dispõe acerca dos embar­gos à execução, modalidade de ação em que o executado terá a opor­tunidade de se opor contra o processo executório para alegar qualquer matéria de fato ou de direito capaz de desconstituir a exigibilidade do título extrajudicial levado a juízo.

| Objeto dos embargos à execução

O artigo em questão traz o rol das matérias que podem ser alega­das pelo devedor, ou seja:

a) Nulidade da execução, pelo fato de o título padecer de falta de exe- cutoriedade. Como vimos, o documento ganha força executiva por expressa determinação legal (nullus titulus sine lege), nos termos do art. 585 do Código de Processo Civil e, além disso, deve conter obri­gação líquida, certa e exigível. Nesse caso, faltando previsão legal que outorgue força de título ao documento ou na ausência dos requisi­tos relativos à obrigação (requisitos relativos à substância), o execu­tado poderá alegar a nulidade da execução.

É nula a execução quando não fundada em título executivo (nulla executio sine titulo).

b) Penhora incorreta ou avaliação errônea. Citado o devedor exe­cutado e deixando ele de efetuar o pagamento, o oficial de justi­ça realizará a penhora dos bens necessários à satisfação do crédi­to e, ato contínuo, procederá à avaliação dos bens. Portanto, havendo vício nesses atos, o executado poderá apresentar os em ­bargos para reconhecer a invalidade da penhora ou a correção na avaliação.

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320 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Não obstante a lei processual afirmar ser matéria de embargos o vício da penhora, entendemos que não há impedimento para tal alegação ser exercida dentro do próprio processo de execução. O reconhecimento da nulidade ou do vício da penhora é ato inciden­tal da execução, cuja discussão é meramente processual, não rela­tiva ao mérito da obrigação.

Dessa forma, não há óbice para que o juiz reconheça dentro da própria execução, por exemplo, o defeito da penhora realizada sobre bem impenhorável, bens de terceiro ou outro vício que inva­lide a expropriação.

Não se justifica a propositura de embargos à execução apenas para obter o reconhecimento de vício de ato processual do proces­so de execução.

c) Excesso de execução ou cumulação indevida de execuções.O excesso de execução se verifica quando o exeqüente cobra

quantia superior ou exige obrigação diferente daquela prevista no título executivo.

Caso o embargante alegue o excesso de execução, ao elaborar a peti­ção inicial dos embargos, deverá indicar o cálculo do valor que entende correto, isso como requisito de admissão da petição inicial dos embar­gos, conforme preceitua o art. 739-A, § 5o, do Código de Processo Civil.

Nessa hipótese, caso o devedor embargante deixe de apresentar na inicial seus cálculos para demonstrar o excesso, o juiz rejeitará liminarmente os embargos se este for o único fundamento ou, ha­vendo outras matérias, deixará de conhecer do excesso de execu­ção pela ausência de tal requisito.

Por outro lado, também é matéria de embargos a cumulação indevida de execuções.

O art. 573 do Código de Processo Civil admite a cumulação de execuções quando: a) forem as mesmas partes (credor e devedor); b) o juiz for competente para conhecer das execuções cumuladas; c) o rito executório for idêntico para todos os títulos ou execuções. O artigo admite a cumulação mesmo que fundada em títulos distintos.

Assim, caso não sejam respeitados os requisitos do art. 573, o devedor poderá embargar para afastar a cumulação indevida de execuções.

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Dtl bSAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUCÃO t O CUMPRIMENTO Dt SENTENÇAS 321

d) A retenção por benfeitorias necessárias ou úteis, nos casos de títu­lo para entrega de coisa certa (art. 621). Se a execução for fundada em título extrajudicial cuja obrigação seja de entrega de coisa, o executado poderá embargar para requerer a retenção da coisa até que o exeqüente promova o ressarcimento do valor relativo às ben­feitorias necessárias ou úteis promovidas pelo devedor.

Nos embargos fundados no direito de retenção por benfeito­rias, duas observações são relevantes:

1) O exeqüente poderá requerer a compensação de seu débito (re­lativo às benfeitorias) com eventuais frutos experimentados ou danos gerados pelo executado na coisa. Essa situação exige que o magistrado designe perito para fazer a apuração do crédito do executado (pelas benfeitorias) e o crédito do exeqüente (pe­los frutos ou danos), para realizar a compensação. Apresenta­do o laudo, o magistrado proferirá decisão (com natureza in­terlocutória), apurando o valor da compensação (§ Io do art. 745 do CPC).

2) O juiz poderá, a qualquer tempo, imitir o exeqüente na posse, desde que este preste caução ou deposite em juízo o valor rela­tivo às benfeitorias ou que forem decorrentes da compensação anteriormente mencionada (§ 2o do art. 745 do CPC).

e) Qualquer matéria de fato ou de direito. O inc. V do art. 745 do Có­digo de Processo Civil afirma que o executado poderá alegar em embargos à execução qualquer matéria de fato ou de direito passí­veis de alegação na defesa do processo de conhecimento. Como se vê, os incisos anteriores são absolutamente dispensáveis na sistemá­tica dos embargos, já que, pelo inc. V, o rol é meramente exempli- ficativo e admite-se nos embargos a ampla defesa do devedor.

Evidentemente, nos embargos à execução de título extrajudicial não poderia haver limitação de defesa, como ocorre com a impug­nação ao cumprimento de sentença (art. 475-L). Aqui é a primeira oportunidade que o devedor tem para se defender e conseqüente­mente, como garantia do direito de contraditório e ampla defesa, não poderia o Código trazer um rol taxativo que limitasse os argu­mentos de defesa.

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322 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

Na impugnação ao cumprim ento de sentença, a matéria pode (e deve) ser limitada, como faz o art. 475-L, já que, durante o pro­cesso de conhecimento, o devedor teve a oportunidade de apresen­tar contestação com a faculdade de ampla defesa.

| Processamento dos embargos

Como já afirmamos, os embargos têm natureza de ação e, portan­to, devem observar a forma de petição inicial, com os elementos dos arts. 282 e 283 do Código de Processo Civil.

O parágrafo único do art. 736 do Código de Processo Civil afirma que os embargos deverão conter as cópias relevantes a seu julgamento, ou seja, o embargante deverá instruir a petição inicial com as cópias do processo de execução necessárias ao conhecimento da defesa. As cópias poderão ser declaradas autênticas pelo próprio advogado, já que o dis­positivo legal faz referência à regra do § Io do art. 544.

Os embargos serão apresentados no prazo de 15 (quinze) dias, contados da data de juntada do mandado de citação do executado aos autos.5 Havendo mais de um executado, a contagem dos prazos será individual e autônoma, salvo se forem cônjuges (situação em que o prazo será contado da juntada aos autos do último mandado cum pri­do).6 E mais: ao prazo dos embargos não se aplica a regra de contagem em dobro prevista no art. 191 para os litisconsortes que tiverem pro­curadores diferentes.

Ressalte-se que, pela nova sistemática introduzida pela Lei n. 11.382/2006, a propositura dos embargos independe de prévia segu­rança do juízo. O antigo art. 736 do Código de Processo Civil determi­nava como requisito para os embargos a prévia penhora ou o depósi­to da quantia devida.

A petição inicial dos embargos será distribuída por dependência ao juízo da execução. Devemos lembrar que os embargos são modali­dade de ação incidental e, conseqüentemente, o juízo da execução é prevento para a ação acessória.

5 Na sistemática anterior à Lei n. 11.382/2006, os embargos eram apresentados no prazo de 10 (dez) dias contados da data da intimação da penhora.

6 Fernando Sacco Neto etal, Nova execução de título extrajudicial, p. 213.

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DEFESAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUCÃO E O CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS 323

Os embargos serão autuados em apartado.Realizada a autuação, os autos são remetidos conclusos ao juiz para

que se proceda o juízo de admissibilidade. Nessa oportunidade, o magistra­do poderá rejeitar liminarmente os embargos quando (art. 739 do CPC):

a) intempestivos, ou seja, apresentados fora do prazo de 15 (quinze) dias previsto no art. 738 do Código de Processo Civil;

b) quando a petição inicial for inepta, nos casos do art. 295 do Códi­go de Processo Civil (vício no pedido ou na causa de pedir);

c) quando manifestamente protelatórios. Percebendo o magistrado que os embargos são destituídos de fundamento e apenas são destinados a causar o atraso do processo, deverá rejeitá-los de plano, com a imposição de multa por litigância de má-fé, não superior ao valor de 20% sobre o valor da execução (art. 740, parágrafo único, do CPC).

Evidentemente, ao tratar das hipóteses de rejeição liminar dos em­bargos, no art. 739, o legislador não excluiu as demais modalidades de extinção do processo nos termos do art. 267 do Código de Processo Civil, ou seja, a inicial poderá ser indeferida ou mesmo aplicadas as demais formas de extinção sem julgamento do mérito.

De qualquer modo, a rejeição liminar dos embargos se dará nos mol­des do art. 267 do Código de Processo Civil.

Outra questão relevante acerca dos embargos versa sobre o efeito suspensivo.

Na redação original, pelo fato de a ação depender de prévia segu­rança do juízo pela penhora ou depósito, os embargos geravam a sus­pensão da execução. No entanto, tal efeito deixou de ser automático com o advento da Lei n. 11.382/2006.

Na atual redação do art. 739-A, a regra é no sentido de que os em­bargos não terão o efeito suspensivo, ficando para a excepcionalidade a concessão pelo magistrado quando estiverem presentes, de forma cumu­lativa, os seguintes requisitos:

a) houver requerimento expresso da parte (não pode ser concedido ex officio);

b) forem relevantes os fundamentos dos embargos;

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3 2 4 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

c) o prosseguimento da execução puder causar dano grave ou de difí­cil reparação à parte (periculum in mora);

d) esteja a execução garantida por penhora, depósito ou caução (se­guro o juízo).

Na verdade, o efeito suspensivo poderá ser conferido pelo juiz em típica atividade de poder geral de cautela. A decisão acerca do efeito suspensivo, dada a natureza liminar, poderá ser revogada ou modifica­da a qualquer momento.

Havendo mais de um executado, a lei autoriza que o efeito suspen­sivo seja concedido apenas a um deles, não suspendendo a execução em relação aos demais, salvo se o fundamento for comum a todas as partes.

O efeito suspensivo não obsta que sejam realizadas a penhora e a avaliação dos bens, ficando sobrestada apenas a prática de atos de alie­nação de domínio.

Assim, recebidos os embargos, com ou sem efeito suspensivo, o magistrado ouvirá a parte exeqüente - o embargado - no prazo de 15 (quinze) dias.

O Código não foi técnico ao afirmar se a parte contrária será inti­mada ou citada para impugnar os embargos, mas, tão-somente, se va­leu da expressão “será o exeqüente ouvido”.

Entendemos que, por se tratar de ação incidental, a formação da rela­ção jurídica processual depende da citação do embargado (o exeqüente), para que, no prazo legal, possa oferecer sua impugnação aos embargos. Portanto, o ato de “ouvir” o exeqüente eqüivale à verdadeira citação.7

A doutrina tem estabelecido o entendimento de que tal ato se dê na pessoa do advogado do exeqüente, seja pessoalmente ou por publi­cação na imprensa oficial.

Intimado, o exeqüente embargado poderá apresentar impugnação no prazo de 15 (quinze) dias.

Nesse ponto, é importante indagar: caso o embargado deixe de apresentar a impugnação, haverá a aplicação dos efeitos da revelia?

7 A redação anterior falava em intimação. No entanto, a doutrina já entendia tratar-se de ato citatório. Nesse sentido: Paulo Henrique Lucon, in: Antonio Carlos Marcato (coord.), Código de Processo Civil interpretado, p. 2.089.

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A posição da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, pelo fato de haver um título executivo que reconhece a existência da obrigação, a falta de impugnação não gera a revelia nos embargos do devedor.8

Apresentada ou não a impugnação pelo embargado, a ação corre­rá pelo rito ordinário, podendo o juiz designar audiência de concilia­ção e instruir o feito nos moldes gerais do processo de conhecimento, para, ao final, prolatar sentença acolhendo ou rejeitando os embargos.

Por se tratar de ação, o ato que julga os embargos é sentença (arts.267 ou 269 do CPC), cabível, portanto, o recurso de apelação. A esse respeito, o art. 520, V, afirma que a apelação interposta contra senten­ça que rejeitar liminarmente ou julgar improcedentes embargos à exe­cução será recebida apenas no efeito devolutivo.

Vejamos a síntese do processamento dos embargos:

DEFESAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUCÃO E O CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS 3 2 5

8 "Embargos à execução. Revelia. A não-impugnação aos embargos do devedor não faz presente o efeito da revelia estampado no art. 319 do Código de Processo Civil. Recurso Especial não atendido. Unânime." (STJ, REspn. 23.177/PR, rel. Min. Fontes de Alencar, j. 23.03.1993, v.u.)

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3 2 6 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

| Embargos do devedor na execução por carta

Havendo a necessidade de citação do executado fora da comarca, o magistrado se valerá de carta precatória. Nesse caso, surge a indaga­ção: os embargos serão apresentados e julgados pelo juízo deprecado ou pelo juízo deprecante (da execução)?

A resposta está no art. 747 do Código de Processo Civil, que auto­riza a apresentação dos embargos tanto no juízo deprecante como no deprecado.

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DEFESAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUCÃO E O CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS 3 2 7

A competência para julgamento dos embargos observará, todavia, a seguinte regra:

a) se os embargos versarem sobre defeito ou vício de ato praticado no juízo deprecado, o julgamento dos embargos será realizado por esse juízo; por exemplo, vício na citação, avaliação ou penhora rea­lizada pelo juízo deprecado;

b) se os embargos forem para a discussão da execução, a competên­cia será do juízo deprecante.

■ i 1 9 .1 . 5 E m b a r g o s à A r r e m a t a ç ã o e à A d j u d i c a ç ã o

Os embargos à arrematação ou à adjudicação são modalidades de embargos do devedor, mas não se prestam para discutir a execução (o título e sua obrigação), como tratamos na modalidade de embargos anterior.

No capítulo destinado à execução por quantia certa contra deve­dor solvente, foram abordados os institutos da arrematação e da adju­dicação, ambos como modalidades de expropriação dos bens do deve­dor para satisfação do crédito executado.

A arrematação consiste na aquisição do bem por terceiro, em hasta ou alienação particular. Já a adjudicação eqüivale à entrega do bem penhorado ao credor exeqüente como meio de satisfação da obrigação. Nas duas modalidades ocorre a alienação do t>em (o bem penhorado sai da esfera patrimonial do devedor e é transferido a outro sujeito).

Aqui, trata-se de embargos de segunda fase, haja vista que se dão após a penhora e a alienação do bem expropriado.

Nesse sentido, o art. 746 do Código de Processo Civil estabelece que, no prazo de 5 dias, contados da data da arrematação ou da adjudica­ção, o executado poderá opor embargos fundamentados em nulidade da execução ou em causa extintiva da obrigação, desde que essas cau­sas sejam supervenientes à penhora.

Evidentemente, os embargos à arrematação e à adjudicação se pres­taram para a argüição de matéria superveniente aos embargos à execu­ção, entendidos, por isso, como embargos de segunda fase.

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328 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

O processamento desses embargos observará, no que couber, as re­gras pertinentes aos embargos à execução.

Apresentados os embargos, o adquirente do bem (arrematado ou adjudicado) poderá desistir da aquisição. Havendo pedido de desistên­cia, o juiz deferirá o pedido de pleno e autorizará que o adquirente faça a liberação da quantia que realizou para o pagamento da arrematação ou diferença de adjudicação (art. 694, § Io, IV, do CPC).

19.2 I m p u g n a ç ã o a o C u m p r i m e n t o

de S e n t e n ç a s

A reforma introduzida pela Lei n. 11.232/2005 retirou a autono­mia processual da execução dos títulos judiciais, tratando-a como modalidade de fase do processo de conhecimento (“fase do cum pri­mento da sentença”).

Portanto, deixando o cumprimento da sentença de ser modalidade de processo, a defesa contra tal fase também perdeu autonomia processual e, conseqüentemente, não mais é exercida por meio de ação de embargos do devedor, mas sim por um incidente denominado de impugnação.

Nesse ponto, é importante lembrar que a reforma não modificou a execução de alimentos pelo rito especial da prisão (art. 733 do CPC), que manteve a justificativa incidental, bem como não alterou a defesa da fazenda pública, que continua sendo exercida por meio dos embar­gos previstos no art. 741 do Código de Processo Civil.

Tratando-se de cumprimento de sentenças de quantia certa, porém, o devedor poderá se defender por meio de impugnação, como se verá.

Nos casos de títulos judiciais que contenham obrigações de fazer, não fazer ou de entrega de coisa, a defesa do devedor se dará por mera petição incidental no processo de conhecimento. Não se trata de im ­pugnação, como ocorre com a defesa contra o cumprimento das sen­tenças de quantia, mas de petição incidental que contenha a irresigna- ção contra o pedido de satisfação do título.9

9 "Processo civil. Cumprimento de obrigação de fazer. Sentença executiva lato sensu. (CPC, art. 461). Descabimento de embargos à execução. Defesa por simples petição, atendi­

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DEFESAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUCÃO E O CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS 329

Evidentemente, por se tratar de defesa contra título judicial, o de­vedor também não poderá fazer isso de forma ampla.

■ I 1 9 . 2 . 1 D E F I N I Ç Ã O E P R O C E S S A M E N T O

No cumprimento de título judicial que prevê obrigação de quan­tia, o devedor terá o prazo de 15 (quinze) dias para realizar o cum pri­mento voluntário. Caso isso não ocorra, o credor, nos termos do art. 475-J, requererá ao juiz a expedição de mandado de penhora, avaliação e intimação.

Realizada a penhora pelo oficial de justiça, o devedor terá o prazo de 15 (quinze) dias para apresentar sua impugnação.

Assim, a impugnação ao cumprimento das sentenças poderá ser definida como instrumento de defesa incidental disponível ao devedor nessa fase do processo.

No sistema atual, pelo fato de a execução não ter natureza de ação, também não se justificaria a manutenção da autonomia para a defesa do devedor (ação de embargos do devedor). Pelo disposto no art. 475-J, § Io,

dos os limites do art. 741. 1. Os embargos do devedor constituem instrumento processual típico de oposição à execução forçada promovida por ação autônoma (CPC, art. 736 do CPC). Sendo assim, só cabem embargos de devedor nas ações de execução processadas na forma disciplinada no Livro II do Código de Processo. 2. No atual regime do CPC, em se tra­tando de obrigações de prestação pessoal (fazer ou não fazer) ou de entrega de coisa, as sen­tenças correspondentes são executivas lato sensu, a significar que o seu cumprimento se opera na própria relação processual original, nos termos dos arts. 461 e 461-A do CPC. Afas­ta-se, nesses casos, o cabimento de ação autônoma de execução, bem como, conseqüente­mente, de oposição do devedor por ação de embargos. 3. Todavia, isso não significa que o sistema processual esteja negando ao executado o direito de se defender em face de atos executivos ilegítimos, o que importaria ofensa ao princípio constitucional da ampla defesa (CF, art. 5o, LV). Ao contrário de negar o direito de defesa, o atual sistema o facilita: ocorren­do impropriedades ou excessos na prática dos atos executivos previstos no art. 461 do CPC, a defesa do devedor se fará por simples petição, no âmbito da própria relação processual em que for determinada a medida executiva, ou pela via recursal ordinária, se for o caso. 4. A matéria suscetível de invocação pelo devedor submetido ao cumprimento de sentença em obrigações de fazer, não fazer ou entregar coisa tem seus limites estabelecidos no art. 741 do CPC, cuja aplicação subsidiária é imposta pelo art. 644 do CPC. 5. Tendo o devedor ajui­zado embargos à execução, ao invés de se defender por simples petição, cumpre ao juiz, atendendo aos princípios da economia processual e da instrumentalidade das formas, pro­mover o aproveitamento desse ato, autuando, processando e decidindo o pedido como inci­dente, nos próprios autos. 6. Recurso especial parcialmente provido." (STJ, 1a T., REsp n. 738.424/DF, rel. Min. José Delgado, rel. p/Acórdão Min. Teori Albino Zavascki, j. 19.05.2005, DJ 20.02.2006, p. 228)

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3 3 0 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

do Código de Processo Civil, o devedor poderá se defender contra o cum­primento da sentença por meio de impugnação, que será considerada incidental.

Além disso, a apresentação da impugnação, como decorre da inter­pretação legal, apenas será possível após a efetivação da penhora, o que não mais ocorre nos embargos à execução de títulos extrajudiciais.

A segurança do juízo, apesar de não estar expressa na lei proces­sual, continua sendo requisito para a admissão da defesa do devedor, já que a impugnação é apresentada apenas após a penhora nos termos do art. 475-J.

Matérias que podem ser alegadas na impugnaçãoA impugnação ao cumprimento da sentença se dá após todo o cur­

so do processo de conhecimento, ou seja, o devedor já teve ampla opor­tunidade de defesa durante o processo cognitivo e, por tal razão, a lei processual limita a defesa ao cumprimento da sentença aos seguintes motivos:

a) falta ou nulidade de citação do devedor no processo de conheci­mento, quando este correu à revelia;10

b) inexigibilidade do título;c) penhora incorreta ou avaliação errônea - o devedor poderá im ­

pugnar para alegar, por exemplo, que a penhora recaiu sobre bem impenhorável, ou ainda sobre bens de terceiros. Além disso, pode­rá também alegar erro na avaliação do bem;

d) ilegitimidade das partes;e) excesso de execução - o excesso de execução está relacionado com

o erro na memória de cálculo apresentada pelo credor exeqüente. Assim, entendendo o devedor que a execução está sendo realizada por valor superior ao do débito constante do título, poderá impug­nar apresentando o valor que entende correto (§ 2o do art. 475-L

10 Trata-se de questão de ordem pública que, a princípio, admite o conhecimento de ofício ou pode ser apresentada pelas partes a qualquer momento. Por tais razões entende­mos que o devedor poderá alegar a falta de citação no processo de conhecimento por meio de objeção de pré-executividade. 0 mesmo se aplica ao disposto no item "c" (ilegitimidade de partes). Tal tema é tratado no capítulo destinado às defesas do executado, neste volume.

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DEFESAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUCÃO E O CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS 3 3 1

do CPC). Caso o devedor impugne e deixe de apresentar suas con­tas, o juiz deverá rejeitar a impugnação liminarmente;

f) qualquer causa impeditiva, modifícativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescri­ção, desde que superveniente à sentença.

O § Io do art. 475-L afirma que eqüivale também à causa de inexi- gibilidade o título que estiver fundado em lei ou ato normativo declara­do inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou de ato normativo tida pelo Supre­mo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal.

Na verdade, o § Io retira a exigibilidade do título - desconstituin- do até mesmo a coisa julgada - se ele estiver em desconformidade com a decisão do Supremo Tribunal Federal nas ações de controle direito da constitucionalidade (ADIn, ADC ou ADPF).

| Efeito da impugnação

No sistema anterior à reforma, os embargos - mesmo quando rela­tivos a títulos judiciais - eram recebidos pelo magistrado e automatica­mente geravam a suspensão da execução em relação à parte embargada.

O art. 475-M é expresso em determinar que a apresentação da im ­pugnação, como regra, não gera a suspensão da execução, ou seja, mes­mo que o devedor impugne o cumprimento da sentença, o procedi­mento continuará seu curso normal.

Em casos excepcionais, o magistrado poderá conferir o efeito sus­pensivo à impugnação. O referido artigo autoriza a concessão do efei­to suspensivo se estiverem presentes, cumulativamente, os seguintes requisitos:

a) fundamento relevante;b) perigo de dano irreparável ou de difícil reparação ao devedor.

Parece-nos que, pela redação do art. 475-M, o juiz exercerá o poder geral de cautela e, sendo plausível a alegação da impugnação e supon­do que o prosseguimento do processo gere grave prejuízo ao devedor, poderá suspender a execução até o julgamento da impugnação.

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Seria o exemplo de o devedor juntar um comprovante de pagamen­to realizado após a sentença. Ora, nesse caso é relevante o argumento lançado na defesa e, por outro lado, o prosseguimento da execução po­derá acarretar ao devedor o prejuízo da alienação de seus bens.

O § Io afirma, porém, que ainda que o magistrado tenha atribuído efeito suspensivo ã impugnação o exeqüente poderá requerer o prosse­guimento da execução, oferecendo e prestando caução suficiente e idô­nea, arbitrada pelo juiz e prestada nos próprios autos.

Julgamento da impugnação e recursos

Deferido o efeito suspensivo à execução, o julgamento da impug­nação será realizado nos próprios autos; por outro lado, negado o refe­rido efeito, para não tumultuar o andamento da execução, o juiz deve­rá mandar autuar a impugnação em apartado à defesa do devedor.

Assim, recebida a impugnação pelo magistrado, serão abertas vistas à parte contrária para, no mesmo prazo, poder responder à impugnação e, sendo necessária a instrução (como a realização de perícia contábil etc.), o magistrado determinará a realização das provas necessárias, para que ao final possa proferir o julgamento.

Qual é a natureza do ato judicial que julga a impugnação? Estamos diante de sentença ou de decisão interlocutória? A resposta é funda­mental para a determinação do recurso cabível contra o ato.

Se o pronunciamento judicial na impugnação importar em extin­ção da execução, estaremos diante de um a sentença e, portanto, o re­curso cabível será o de apelação (art. 513 do CPC).

Por outro lado, caso o ato determine o prosseguimento da execu­ção (cumprimento da sentença), estaremos diante de uma decisão in­terlocutória e, conseqüentemente, o recurso cabível será o de agravo de instrumento (art. 522 do CPC).

19.3 Ex c e ç ã o de Pr é -e x e c u t i v i d a d e

A origem da exceção de pré-executividade no Direito brasileiro nas­ceu pelo Decreto Imperial n. 9.885, de 1888, que possibilitou ao devedor opor-se à execução por meio desse instituto, sem a obrigação de segurar

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DEFESAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUCÃO E O CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS 333

o juízo. Seguiram-se os Decretos ns. 848, de 11 de outubro de 1890, e 5.255, de 31 de dezembro de 1932, este último do Estado do Rio Gran­de do Sul, que também previa a possibilidade de se opor à execução por meio de simples requerimento nos próprios autos da execução.

Esse instituto somente ganhou notoriedade tendo em vista a omis­são legal quando, em 1966, a Cia. Siderúrgica Mannesmann, diante de diversos processos de execução, cujos títulos eram falsos, foi orientada pelo processualista Pontes de Miranda a opor-se à execução via exce­ção de pré-executividade.

Portanto, não se trata de instituto recente em nosso ordenamento processual.

Por sua vez, a doutrina atual critica a terminologia exceção. Uns entendem como correto o termo objeção, outra parte da doutrina em ­prega a expressão “exceção pré-processual”, ao passo que outros, como Camina Moreira, defendem que o vernáculo “exceção de pré-executi­vidade” está correto e bem empregado, “uma vez que exceção sempre teve o sentido de defesa, pré-executividade, em virtude da possibilida­de de defesa antes do início da atividade executor ia”.11

A esse respeito, Nelson Nery Júnior entende que a expressão “obje­ção de pré-executividade” é a mais adequada, já que o termo “exceção” sugere que se trata de matéria de defesa, não sendo, portanto, passível de ser conhecida de ofício e sujeita à preclusão.12

O professor Barbosa M oreira13 questiona severamente a impreci­são terminológica em que têm incorrido a doutrina e a jurisprudência. Sob sua bem fundamentada ótica, não haveria como se falar em exce­ção, porquanto esta tem sido ao longo dos tempos empregada para designar gênero de “defesa”, em que, a rigor, descabe a apreciação ex officio pelo juiz.

Segundo Humberto Theodoro Júnior,

Mostrando-se visivelmente nulo o títu lo executivo ou manifestamen­

te ilegítima a parte contra quem se intenta a execução, ou ainda, estan­

" Alberto Caminã Moreira, Defesa sem embargos do executado: exceção de pré-execu- tividade.

12 Nelson Nery Júnior & Rosa Maria Andrade Nery, Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor.

13 José Carlos Barbosa Moreira, O novo processo civil brasileiro, p. 185.

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334 MANUAL DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DARLAN BARROSO

do a relação processual contam inada de nulidade plena e ostensiva, cabe

o expediente que se vem denom inando 'exceção de pré-executividade',

que nada mais é do que o simples pedido direto de extinção do proces­

so, independentemente do uso dos embargos e da segurança do ju ízo .14

Dessa forma, podemos concluir que a objeção ou exceção de pré- executividade é um meio de defesa incidental, em que o executado, m u­nido de prova documental e sem a necessidade de dilação probatória, provoca o julgador dentro do processo de execução para argüir questão de ordem pública relativa às condições da ação ou a pressupostos pro­cessuais, isso sem a necessidade de embargos.

O objetivo da exceção de pré-executividade é o reconhecimento de nulidade que atinja o processo ou o título.

Se não bastasse a controvérsia estabelecida com relação à term ino­logia, não menos relevante é a questão da natureza jurídica. A maioria da doutrina tem entendido ter a exceção de pré-executividade caráter incidental, por estabelecer uma relação de causalidade entre a solução do incidente e o êxito da execução.15

Em virtude desse caráter incidental, a principal finalidade da exceção de pré-executividade é extinguir, “no nascedouro, pretensão executiva vi­ciada ou inexistente”.16 Discutindo-se a ausência da exigibilidade do títu­lo executivo, antes mesmo de seguro o juízo, vale lembrar que não se po­de iniciar ou prosseguir uma ação que não preenche os requisitos legais.

Concluímos, afinal, que a exceção de pré-executividade serve à dis­cussão, a qualquer tempo e nos próprios autos da execução, das condi­ções da ação executiva, independentemente dos embargos do devedor.

A doutrina, diante da reforma da Lei n. 11.382/2006, que dispensou a segurança do juízo para a apresentação dos embargos do devedor, tem se manifestado no sentido de que a exceção de pré-executividade teria reduzido seu âmbito de aplicabilidade.

14 Meios de defesa do devedor diante do título executivo, fora dos embargos à execu­ção: ações autônomas a exceção de pré-executividade.

15 Alberto Caminã Moreira, Defesa sem embargos do executado, p. 35.16 Luís Edmundo Appel Bojunga, "A exceção de pré-executividade", in: Revista dos Tri­

bunais, p. 156.

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DEFESAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUCÃO E O CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS 3 3 5

Na verdade, em se tratando de execução de título extrajudicial, de fato, a defesa do devedor por meio de embargos não depende mais da penhora; isso, no entanto, não descarta a possibilidade de apresentação de exceção de pré-executividade. A referida exceção ainda teria forte cabimento nas execuções fiscais (que manteve a segurança do juízo), bem como quando não for possível ou antes da apresentação dos em ­bargos do devedor.

Vamos imaginar que o devedor tenha perdido o prazo para os em­bargos do devedor. Poderia ele, nesse caso, apresentar a objeção de pré- executividade? Evidentemente que a resposta é positiva, pois, tratando-se de questão de ordem pública, o magistrado poderá conhecer a qualquer momento do curso do processo.

Portanto, mesmo com as reformas, entendemos que ainda preva­lece o cabimento da exceção de pré-executividade.

Diante disso, a objeção ou exceção de pré-executividade não tem o escopo de substituir os embargos do devedor, nem de fornecer expe­diente temerário, uma vez que não se pode conceber a discussão de m a­térias de mérito que demandem produção de provas em sede de outra ação que não os embargos à execução.

Hipóteses de cabimento e processamento

As matérias passíveis de serem alegadas na exceção de pré-executi- vidade não podem ser outras senão aquelas que incumbem ao magistra­do conhecer e declarar ex officio, ou seja, a falta de algum dos requisitos de admissibilidade da execução que gerariam a aplicação do art. 267 do CPC; falta ou vício no título executivo, art. 284 do CPC; nulidades da execução, da penhora, da arrematação, da ocorrência de prescrição (que, por força do art. 219, § 5o, poderá ser conhecida de ofício) ou da deca­dência.

Ressalte-se que terá cabimento a objeção para que o devedor ale­gue qualquer questão de ordem pública, como a falta das condições da ação ou de pressupostos processuais.

Quando de seu recebimento, diante dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, o juiz deverá conceder prazo ao exe­qüente para que ele se manifeste acerca do pedido do executado; quanto

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à fixação desse prazo, é arbítrio do magistrado, tendo em vista a ausência de dispositivo legal que regulamente a matéria - claro está que, ao ser concedido esse prazo, deverão ser observados os limites da razoabilidade.

A objeção deve ser apresentada por meio de uma petição simples, nos próprios autos do processo de execução, sendo juntados docum en­tos necessários que comprovem a matéria a ser alegada.

Diferenças entre os embargos à execução

e a exceção de pré-executividade

EMBARGOS DO DEVEDOR EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE

Natureza de ação autônoma Natureza jurídica incidental

Deve obedecer aos requisitos do art. 282 do CPC, por ter a forma de petição inicial

Não tem forma específica

Prazo preclusivo Pode ser apresentada a qualquer tempo

Podem ser exercidos todos os meios

de prova para a demonstração dos fatos narrados nos embargos

Não comporta dilação probatória

1 9 . 4 E m b a r g o s d e T e r c e i r o s

O processo, como relação jurídica, foi concebido para produzir efei­tos em relação às partes, ou seja, os sujeitos que integram a relação. No entanto, em algumas situações, os atos do juiz acabam por afetar a es­fera patrimonial de terceiros.

Como sabemos, o processo de execução cuida da expropriação pa­trimonial dos bens do devedor com a finalidade de satisfazer a obriga-

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DEFESAS CONTRA O PROCESSO DE EXECUCÃO E O CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS 3 3 7

çâo exigida pelo credor exeqüente. O processo de execução prevê, em seu bojo, uma série de atos expropriatórios, como penhora, busca e apreen­são, depósito, arrecadação etc.

A regra é no sentido de que a expropriação recaia sobre o patrim ô­nio do devedor, aquele que figura como parte na relação processual. No entanto, em algumas situações, os atos processuais expropriatórios poderão recair sobre terceiros.

Os embargos do devedor não foram concebidos como modalida­de de defesa contra o processo de execução, mas, por seu cabimento e objeto, acabam como sucedâneo de defesa daquele que, não sendo par­te no processo de execução, tem seu patrimônio invadido pela constri- ção judicial.

Humberto Theodoro Júnior ensina que:

Enquanto, na intervenção assistencial, o terceiro se introm ete em

processo alheio para tu te lar d ire ito de outrem, na esperança de, indireta­

mente, obter uma sentença que seja útil a seu interesse dependente do

sucesso da parte assistida nos embargos, o que o terceiro divisa é uma

ofensa direta ao seu d ire ito ou a sua posse, ilegitim am ente atingidos num

processo entre estranhos.17

Podemos concluir que os embargos de terceiro representam m o­dalidade de ação de conhecimento, de rito especial, na qual o que se pretende não é discutir o direito das partes em litígio, mas sim o ato estatal do juiz que indevidamente constringiu - ou ameaçou fazê-lo - bem de quem não era parte no feito. Quando de sua oposição, não se discutirá sobre o objeto da ação da qual emanou a ordem de apreen­são, mas sim sobre a exclusão do bem desta apreensão, sem questionar o direito do autor da ação primitiva.

Na lição de Nelson Nery Júnior:

Trata-se de ação de conhecimento, constitutiva negativa, de proce­

d im ento especial sumário, cuja finalidade é livrar o bem ou direito de

posse à propriedade de terceiro da constrição judicial que lhe fo i injusta­

’7 Humberto Theodoro Júnior, op. cit., p. 320.

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mente imposta em processo de que não faz parte. O embargante preten­

de ou obter a liberação (manutenção ou reintegração na posse), ou evi­

tar a alienação de bem ou dire ito indevidamente constrito ou ameaçado• a • •

de o ser.18

Em exemplo clássico, podemos citar a situação da mulher casada que, em execução proposta contra o marido, acaba tendo sua meação penhorada indevidamente. Nesse caso, não sendo parte na execução e entendendo ser indevida a invasão de seu patrimônio (a meação), po­derá se valer dos embargos de terceiros para defender sua posse ou pro­priedade contra o referido ato judicial.19

Por essa razão, podemos incluir os embargos de terceiros como meio de defesa contra o processo de execução, seguindo os requisitos e o processamento do art. 1.046 do Código de Processo Civil.

Momento e processamento dos embargos de terceiros

Por ocasião da constrição judicial ou da simples ameaça de fazê-lo, poderá o terceiro valer-se dos embargos preventivamente, cabendo des­tacar que, diante da constrição efetivada, tais embargos são admissíveis sem qualquer restrição de validade.

O prazo para a apresentação dos embargos, segundo o disposto no art. 1.048 do CPC - quando na fase de conhecimento - , será proposto a qualquer tempo; já no processo de execução de título extrajudicial, o prazo será de 5 (cinco) dias contados da arrematação, da adjudicação ou da remição.

Trata-se de competência funcional em primeiro grau; sendo assim, é absoluta:20 o mesmo juiz que determinou a apreensão será o juiz com­petente para apreciar e julgar os referidos embargos.

Quando a constrição judicial se der por carta precatória, o juiz com­petente para o julgamento dos embargos será aquele que determinou a apreensão do bem. Quando a carta precatória já tiver sido encami-

’8 Nelson Nery Júnior & Rosa Maria Andrade Nery, op. c/f., p. 1.347.19 Súmula n. 134 do STJ: "Embora intimado da penhora em imóvel do casal, o cônjuge

executado pode opor embargos de terceiro para defender sua meação".20 "Art. 108. A ação acessória será proposta perante o juiz competente para a ação

principal."