Manual Mediação e Autocomposição

189
Manual de Autocomposição Judicial

description

MANUAL MEDIAÇÃO

Transcript of Manual Mediação e Autocomposição

Manual de

Autocomposio

Judicial

Conselho Nacional de Justia

Organizadores:Andr Gomma de Azevedo e Roberto Portugal Bacellar

Manual de

Autocomposio

Judicial

2007

Estudos em Arbitragem, Mediao e Negociao Vol 4 / Andr Gomma de Azevedo, Ivan Machado Barbosa (orgs.) Braslia: Gruposde Pesquisa, 2007.E82a302 p.ISBN85-89929-02-71. Resoluo alternativa de disputas 2. Arbitragem 3. Mediao 4.Negociao. I. Azevedo, Andr Gomma deCDU 347.918

Sumrio:11 Agradecimentos0

Prefcio

0

Introduo

0

1. Panorama do Processo de Conciliao

0

2. A Sesso de Conciliao

0

3. Rapport - O Estabelecimento de uma Relao de Confiana

0

4. O Controle sobre Processo

0

5. A concluso da Conciliao (Ferramentas para provocarmudanas)

0

6. A Conciliao e o Processo Judicial

0

7. Qualidade em Processos Autocompositivos

0

8. Consideraes Finais

AgradecimentosAs idias apresentadas neste Manual de Tcnicas Autocompositivas decorrem do trabalho voluntrio de vrios autores que em conjuntoaceitaram o desafio de elaborar um manual com enfoque predominantemente pragmtico. No podemos deixar de registrar nossa gratido, pelagenerosa contribuio, aos demais autores: Aiston Henrique de Souza,Paulina DApice Paez, Juliano Zaiden Benvindo, Vilson Malchow Vedana,Ivan Machado Barbosa, Fbio Portela Lopes de Almeida, Otvio AugustoBuzar Perroni, Daniela Maria Cordua Bson, Vinicius Prado, Gustavo deAzevedo Trancho, Cntia Machado Gonalves Soares, Isabela Seixas, Henrique de Arajo Costa, Francisco Schertel Ferreira Mendes, Artur Coimbrade Oliveira, Maysa Massimo, Clarissa Menezes Vaz, Juliana Nicola Kilian,Srgio Antnio Garcia Alves Jr, Breno Zaban Carneiro, Guilherme LimaAmorim e Michelle Tonon Barbado.Registramos nossos agradecimentos aos revisores, que comoinstrutores de tcnicas autocompositivas em seus respectivos tribunaisapresentaram sugestes de aperfeioamento do presente texto: HenriqueGomm Neto e Carla Novelli. [INSERIR NOMES].O presente manual resultado do esforo conjunto iniciado em2001 no Grupo de Pesquisa e Trabalho em Arbitragem, Mediao e Negociao da Faculdade de Direito da Universidade de Braslia, com a colaborao de magistrados do Tribunal de Justia do Distrito Federal e Territrios, do Tribunal de Justia do Estado do Paran, do Tribunal de Justia doDistrito Federal e do Tribunal de Justia do Estado da Bahia. A partir docurso de formao de multiplicadores em tcnicas autocompositivas, realizado pelo Conselho Nacional de Justia em agosto de 2006 concebeu-se aidia de elaborar um guia ou manual que reunisse, de forma condensadae simplificada, a teoria relativa s tcnicas autocompositivas para uso porconciliadores, nos termos do art. 277 1 do Cdigo de Processo Civil edo art. 2 da Lei 9.099/1995. Assim, temos a satisfao de apresentar este7

Manual de Conciliao Judicial, uma obra simples mas pioneira no seuintuito de aperfeioar a aplicao de processos autocompositivos. importante salientar que este manual apresenta apenas um,entre vrios modelos de conciliao. Segue-se assim, uma seqncia depassos, tcnicas e ferramentas a serem seguidas e adotadas pelos conciliadores. Com intuito de reunir a informao em ordem lgica e quetambm permita a fcil consulta, dividimos o manual em quatro segmentos. No primeiro momento, apresentamos uma viso geral do processode conciliao e de seu posicionamento dentre as formas de resoluo deconflito. A segunda seo busca explicar detidamente cada uma das fasesdo processo de conciliao. A seo que se segue desenvolve as tcnicasnecessrias conduo da conciliao.Criamos este manual para atender, especificamente, as necessidades dos conciliadores que atuam no mbito do Poder Judicirio. Noentanto, acreditamos que as habilidades nele contidas podem ser proveitosamente empregadas em outras esferas. Entre elas, destacamos questes comunitrias, acadmicas, familiares e corporativas. O nosso intuito,portanto, no apenas melhor capacitar os conciliadores judiciais, comotambm estimular uma cultura de resoluo de conflitos por meio de comunicaes que efetivamente realizem os interesses das partes ao mesmotempo em que estimula a compreenso mtua. Isto porque, essencialmente, o objetivo da lei, do direito e da prpria existncia do Poder Judicirio a pacificao social.

Braslia, 8 de maro de 2007Andr Gomma de Azevedo e Roberto Portugal BacellarOrganizadores

8

Prefcio

9

Conselho Nacional de Justia

IntroduoOs Juizados Especiais foram concebidos para que neles houvesse especfica ateno aos mecanismos autocompositivos como forma deemprestar maior efetividade ao ordenamento jurdico processual. Istoporque, deontologicamente, os Juizados Especiais seguiram experinciaestrangeira bem sucedida na qual se estabeleceram juizados de pequenascausas como forma de assegurar maior acesso justia e principalmente,para que este acesso seja melhor na perspectiva do prprio jurisdicionado. Nesse sentido, um dos componentes axiolgicos do acesso justiaque mais impulsionou essa corrente foram as inquietaes de muitos juristas, socilogos, antroplogos, economistas, cientistas polticos, e psiclogos1, entre outros, que se mostravam patentemente insatisfeitos com omodelo existente. Nessa ocasio foi levada em considerao a insatisfaoacerca dos elevados custos de soluo de conflitos, decorrentes, inclusive,dos elevados valores de honorrios advocatcios e das custas processuais. Outro fator que significativamente influenciou esse movimento foia busca por formas de soluo de disputas que auxiliassem na melhoriadas relaes sociais subjacentes. Isto porque j existiam mecanismos deresoluo de disputas (e.g. mediao comunitria), quando da publicaodos primeiros trabalhos em acesso justia2, que apresentavam diversosresultados de sucesso3, tanto no que concerne reduo de custos comoquanto reparao de relaes sociais.Vale frisar que a mediao enquanto elemento caracterstico dosjuizados de pequenas causas nos Estados Unidos fortemente influenciou olegislador brasileiro a ponto de este incluir a conciliao no nosso sistemados juizados especiais. Todavia, a autocomposio prevista pelo legisladorbrasileiro na Lei n 9.099/1995 se distinguiu significativamente daquela pre1 CAPPELLETTI, Mauro e GARTH Bryant. Acesso Justia. Porto Alegre: Ed. Srgio Antonio Fabris, 1988. p. 8.2 Cf. SANDER, Frank E.A.. Varieties of Dispute Processing, in The Pound Conference, 70 Federal Rules Decisions 111,1976 e CAPPELLETTI, Mauro e GARTH Bryant. Access to Justice: The Worldwide Movement to Make Rights Effective. AGeneral Report, Milo: Ed. Dott A. Giuffre, 1978.3 Cf. AUERBACH, Jerold S.. Justice without Law?. Nova Iorque: Ed. Oxford University Press, 1983.

11

vista no modelo norte-americano4 em razo da menor nfase s tcnicas e aoprocedimento a ser seguido5 bem como ao treinamento (e.g. nos juizados depequenas causas em Harlem, NY, os mediadores recebem curso de 60 horasaula exclusivamente sobre tcnicas de negociao e mediao) e, atualmente,ao maior componente restaurador (ou transformador) das mediaes. Sobreesse componente, os professores Robert Baruch Bush e Joseph Folger no livro The Promise of Mediation: Responding to Conflict Through Empowerment andRecognition6, sustentam que devem ser considerados como objetivos da autocomposio e, indiretamente, de um sistema processual, a capacitao (ouempoderamento) das partes (i.e. educao sobre tcnicas de negociao) paraque estas possam, cada vez mais, por si mesmas compor seus futuros conflitos. Desta forma, se proporciona ao jurisdicionado efetivos meios de aprendizado quanto resoluo de disputa, obtendo-se tambm o reconhecimentomtuo de interesses e sentimentos o que proporciona uma aproximao realdas partes e conseqente humanizao do conflito decorrente dessa empatia.Esta corrente, iniciada em 1994 por Baruch Bush e Folger, costuma ser referida como transformadora (ou autocomposio transformadora)7.Zamorra Y Castillo sustentava que o processo rende, com freqncia, muito menos do que deveria em funo dos defeitos procedimentais, resulta muitas vezes lento e custoso, fazendo com que as partesquando possvel, o abandonem8. Cabe acrescentar a esses defeitos procedimentais o fato de que em muitos casos, o processo ao tratar exclusivamente daqueles interesses juridicamente tutelados exclui aspectos do4 Cabe registrar opinio do um dos organizadores deste trabalho, o Juiz Roberto Portugal Bacellar, segundo a qual sesustenta implicitamente que a Lei de Juizados Especiais no Brasil prev um sistema de mediao forense (ou paraprocessual) e que cabe ao operador do direito implementar a mediao como processo autocompositivo no sistema dosJuizados Especiais (BACELLAR, Roberto Portugal, Juizados Especiais A Nova Mediao Paraprocessual, So Paulo:Ed. Revista dos Tribunais, 2004).5 Sendo a mediao um processo caracterizado pela flexibilidade procedimental, h divergncia na doutrina sobre seuprocedimento. Exemplificativamente, John W. Cooley, aposentado juiz federal norte-americano e professor das Faculdadesde Direito da Universidade de Loyola e da Universidade Northwestern, divide o processo de mediao em oito fases: i)iniciao, momento no qual as partes submetem a disputa a uma organizao pblica ou privada ou a um terceiro neutroem relao ao conflito, para que seja composta; ii) preparao, fase na qual os advogados se preparam para o processo,coletando um conjunto de informaes, tais como os interesses de seus clientes, questes fticas e pontos controversos;iii) sesso inicial ou apresentao, momento no qual o mediador explica a natureza e formato do processo de mediaoaos advogados e partes; iv) declarao do problema, quando as partes, por j estarem debatendo acerca da disputaabertamente, delimitam os pontos controversos que devero ser objeto de acordo; v) esclarecimento do problema, fasena qual o mediador isola as questes genuinamente bsicas em disputa buscando melhor relacionar os interesses daspartes com as questes apresentadas; vi) gerao e avaliao de alternativas, momento no qual o mediador estimulaas partes e advogados a desenvolver possveis solues para a controvrsia; vii) seleo de alternativas, estgio no qualas partes, diante das diversas possibilidades desenvolvidas na fase anterior, decidem quanto a soluo; viii) acordo,momento no qual o mediador esclarece os termos do acordo a que tiverem chegado as partes e auxilia na elaboraodo termo de transao (COOLEY, John W, A advocacia na mediao, Braslia: Ed. UnB, 2000).6 BARUCH BUSH, Robert et al. The Promise of Mediation: Responding to Conflict Through Empowerment and Recognition.So Francisco: Ed. Jossey-Bass, 1994.7 v. YARN, Douglas E. Dictionary of Conflict Resolution. So Francisco: Ed. Jossey-Bass Inc., 1999. p. 418.8 ZAMORRA Y CASTILLO. Processo, Autocomposio e Autodefensa. Cidade do Mxico: Ed. Universidad Autnoma Nacionalde Mxico, 1991. p. 238.

12

Conselho Nacional de Justia

conflito que so possivelmente to importantes quanto ou at mais relevantes do que aqueles juridicamente tutelados.Quanto a esses relevantes aspectos do conflito, Morton Deutsch,em sua obra The Resolution of Conflict: Constructive and Destructive Processes9 apresentou importante classificao de processos de resoluo dedisputas ao indicar que esses podem ser construtivos ou destrutivos. ParaDeutsch, um processo destrutivo se caracteriza pelo enfraquecimento ourompimento da relao social preexistente disputa em razo da formapela qual esta conduzida. Em processos destrutivos h a tendncia de oconflito se expandir ou tornar-se mais acentuado no desenvolvimento darelao processual. Como resultado, tal conflito frequentemente torna-seindependente de suas causas iniciais10 assumindo feies competitivasnas quais cada parte busca vencer a disputa e decorre da percepo, namais das vezes errnea, de que os interesses das partes no podem coexistir. Em outras palavras, as partes quando em processos destrutivos deresoluo de disputas concluem tal relao processual com esmaecimentoda relao social preexistente disputa e acentuao da animosidade decorrente da ineficiente forma de enderear o conflito.Por sua vez, processos construtivos, segundo Deutsch, seriamaqueles em razo dos quais as partes concluiriam a relao processualcom um fortalecimento da relao social preexistente disputa. Para esseprofessor, processos construtivos caracterizam-se: i) pela capacidade deestimular as partes a desenvolverem solues criativas que permitam acompatibilizao dos interesses aparentemente contrapostos; ii) pela capacidade das partes ou do condutor do processo (e.g. magistrado ou mediador) a motivar todos os envolvidos para que prospectivamente resolvamas questes sem atribuio culpa; iii) pelo desenvolvimento de condiesque permitam a reformulao das questes diante de eventuais impasses11e iv) pela disposio das partes ou do condutor do processo a abordar,alm das questes juridicamente tuteladas, todas e quaisquer questesque estejam influenciando a relao (social) das partes. Em outros termos, partes quando em processos construtivos de resoluo de disputasconcluem tal relao processual com fortalecimento da relao social preexistente disputa e, em regra, robustecimento do conhecimento mtuoe empatia.9 DEUTSCH, Morton. The Resolution of Conflict: Constructive and Destructive Processes. New Haven: Yale University Press,1973. Cabe destacar que trs captulos desse trabalho foram traduzidos e podem ser encontrados na obra AZEVEDO,Andr Gomma. Estudos em Arbitragem, Mediao e Negociao. Vol. 3. Braslia: Ed. Grupos de Pesquisa, 2004.10 DEUTSCH, Ob. Cit.. p. 351.11 DEUTSCH, Ob. Cit. p. 360.

13

Assim, retornando ao conceito de Zamora Y Castillo, processualista mexicano do incio do sculo XX, o processo [judicial], de fato, rendecom freqncia menos do que poderia, em parte por que se direciona, sobseu escopo social12, pacificao fazendo uso, em grande parte, de mecanismos destrutivos de resoluo de disputas a que esse autor mexicanodenominou defeitos procedimentais. Diante disso, pode-se afirmar queh patente necessidade de novos modelos que permitam que as partespossam, por intermdio de um procedimento participativo, resolver suasdisputas construtivamente ao fortalecer relaes sociais, identificar interesses subjacentes ao conflito, promover relacionamentos cooperativos,explorar estratgias que venham a prevenir ou resolver futuras controvrsias13, e educar as partes para uma melhor compreenso recproca14.A discusso acerca da introduo de mecanismos que permitamque os processos de resoluo de disputas tornem-se progressivamenteconstrutivos necessariamente deve ultrapassar a simplificada e equivocada concluso de que, abstratamente, um processo de resoluo de disputas melhor do que outro. Devem ser desconsideradas tambm soluesgeneralistas como se a conciliao ou a mediao fossem panacias paraum sistema em crise15. Dos resultados obtidos no Brasil, conclui-se queno h como impor um nico procedimento autocompositivo em todoBrasil ante patentes diferenas nas realidades fticas (fattispecie16) em razo das quais foram elaboradas.A experincia, aliada pesquisas metodologicamente adequadas17, tem demonstrado que o que torna um procedimento efetivo depende das necessidades das partes em conflito, dos valores sociais ligados squestes em debate e, principalmente da qualidade dos programas. Umrecente trabalho do instituto de pesquisa RAND constatou que no houvevantagens significativas para a mediao quando comparada ao processoheterocompositivo judicial e concluiu que esses resultados insatisfatriosdecorreram de programas que no foram adequadamente desenvolvidos12 C f. ZAMORA Y CASTILLO, Niceto Alcal. Processo, Autocomposio e Autodefensa. Cidade do Mxico: Ed. UniversidadAutnoma Nacional de Mxico, 1991 e DINAMARCO, Cndido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. So Paulo:Ed. Malheiros, 8. ed., 2000.13 RHODE, Deborah L.. In the Interest of Justice: Reforming the Legal Profession. Nova Iorque: Oxford University Press,2000. p. 132.14 BARUCH BUSH, Robert et al.. The Promise of Mediation: Responding to Conflict Through Empowerment and Recognition,. So Francisco: Ed. Jossey-Bass, 1994.15 H diversas situaes em que a mediao ou a arbitragem no so recomendados como demandas que versem sobreinteresses coletivos ou que requeiram elevado grau de publicizao (e.g. Aes Civis Pblicas decorrentes de danosa sade causados pelo uso do amianto como isolante trmico).16 Cf. CARNELUTTI, Francesco. Diritto e Processo. n. 6. p. 11 apud DINAMARCO, Cndido Rangel. Nova Era do ProcessoCivil. So Paulo: Malheiros, 2003. p. 21.17 V. RHODE, Ob. Cit. p. 132.

14

Conselho Nacional de Justia

para atender os objetivos especficos que os usurios de tal processo buscavam. Esses projetos examinados pelo Instituto RAND tiveram, comoconclui essa pesquisa, insuficiente treinamento de autocompositores eoportunidades inadequadas para a participao dos envolvidos18.Segundo a professora Deborah Rhode19, a maioria dos estudosexistentes indica que a satisfao dos usurios com o devido processolegal depende fortemente da percepo de que o procedimento foi justo.Outra importante concluso foi no sentido de que alguma participao dojurisdicionado na seleo dos processos a serem utilizados para dirimirsuas questes aumenta significativamente essa percepo de justia. Damesma forma, a incorporao pelo Estado de mecanismos independentese paralelos de resoluo de disputas aumenta a percepo de confiabilidade (accountability) no sistema20.Em suma, constata-se que o sistema autocompositivo estatal, comocomponente importante do ordenamento jurdico processual, est se desenvolvendo independente de uma equivocada orientao de que o sistemajurdico processual somente evolui por intermdio de reformas procedimentais impostas em alteraes legislativas. Com o desenvolvimento debem sucedidos projetos piloto em autocomposio forense e a releitura dopapel autocompositivo nos juizados especiais21, conclui-se que possvelo desenvolvimento de processos construtivos sob os auspcios do Estado.Naturalmente, isso somente ocorrer se (seguindo as concluses alcanadasa partir da pesquisa elaborada pelo Instituto RAND) houver: i) adequadoplanejamento do programa de autocomposio forense considerando a realidade ftica da unidade da federao ou at mesmo da comunidade; ii)adequado treinamento de mediadores; e iii) adequada oportunidades paraque as partes possam diretamente participar do processo.Diante da significativa contribuio de Morton Deutsch ao apresentar o conceito de processos construtivos de resoluo de disputas, pode-se afirmar que ocorreu alguma recontextualizao acerca do conceitode conflito ao se registrar que este um elemento da vida que inevitavelmente permeia todas as relaes humanas e contm potencial de contribuir positivamente nessas relaes. Nesse esprito, se conduzido constru18 H ENSLER, Deborah. R. Puzzling over ADR:Drawing Meaning from the RAND Report , Dispute Resolution Magazine. n.8, 1997. p. 9 apud RHODE, Deborah. Ob. Cit. p. 13319 Ob. Cit. p. 135.20 L IND e TAYLOR. Procedural Justice. 64-67, 102-104; Stempel, Reflections on Judical ADR, 353-354 apud RHODE,Deborah, Ob. Cit. p. 135.21 Cf. BACELLAR, Roberto Portugal. Juizados Especiais: A Nova Mediao Paraprocessual. So Paulo: Ed. Revista dosTribunais, 2004.

15

tivamente, o conflito pode proporcionar crescimento pessoal, profissionale organizacional22. A abordagem do conflito no sentido de que este pode,se conduzido com tcnica adequada, ser um importante meio de conhecimento, amadurecimento e aproximao de seres humanos, impulsionarelevantes alteraes quanto a responsabilidade e tica profissional.Constata-se que, atualmente, em grande parte, o ordenamento jurdico processual, que se dirige predominantemente pacificao social23,organiza-se, segundo a tica de Morton Deutsch, em torno de processosdestrutivos lastreados, em regra, somente no direito positivo. As partes,quando buscam auxlio do Estado para soluo de seus conflitos, frequentemente tm o conflito acentuado ante procedimentos que abstratamentese apresentam como brilhantes modelos de lgica jurdica-processual contudo, no cotidiano, acabam por frequentemente se mostrar ineficientesna medida em que enfraquecem os relacionamentos sociais preexistentesentre as partes em conflito. Exemplificativamente, quando um juiz de direito sentencia determinando com quem ficar a guarda de um filho ou osvalores a serem pagos a ttulo de alimentos, pe fim, para fins do direitopositivado, a um determinado litgio, todavia, alm de no resolver a relao conflituosa, muitas vezes acirra o prprio conflito, criando novasdificuldades para os pais e para os filhos24. Torna-se claro que o conflito,em muitos casos, no pode ser resolvido por abstrata aplicao da tcnicade subsuno. Ao examinar quais fatos encontram-se presentes para emseguida indicar o direito aplicvel espcie (subsuno) o operador do direito no pode mais deixar de fora o componente fundamental ao conflitoe sua resoluo: o ser humano.O presente manual tem o propsito principal de apresentar de forma direta e simplificada tcnicas autocompositivas (em sentido amplo) aserem adotadas por conciliadores. Ademais, com uma orientao voltadaa melhoria contnua dos servios autocompositivos prestados por conciliadores, apresentamos tambm alguns mecanismos que podem proporcionar a melhoria dos seus resultados. Optou-se por no adotar umarecomendao do que uma boa conciliao ou um bom conciliador poisacredita-se que bom conciliador aquele que se importa com o jurisdicionado a ponto de se dispor a buscar a melhoria contnua no uso deferramentas e de suas tcnicas autocompositivas.22 Cf. DEUTSH, Morton. The Handbook of Conflict Resolution: Theory and Practic., So Francisco: Ed. Jossey-Bass,2000.23 Grinover, Ada Pelegrini et alii. Teoria Geral do Processo. So Paulo: Ed. Malheiros 18. ed., 2001. p. 24.24 C f. COSTA, Alexandre A.. Cartografia dos mtodos de composio de conflitos, in AZEVEDO, Andr Gomma, Estudosem Arbitragem, Mediao e Negociao. Vol. 3. Braslia: Ed. Grupos de Pesquisa, 2004.

16

Conselho Nacional de Justia

Panorama do Processo de ConciliaoPanorama do Processo de ConciliaoEscopo da ConciliaoO ProcedimentoA Formao do Conciliador

17

18

Conselho Nacional de Justia

Panorama do Processo de ConciliaoA partir de uma compreenso mais ampla de autocomposio, possvel afirmar que, em certo sentido, todos ns somos conciliadores oumediadores. Afinal, em algum momento de nossas vidas, j interviemosnuma discusso entre duas pessoas no trabalho, em famlia ou em nossasrelaes de amizade, auxiliando-as a negociarem uma soluo. Assim, todos ns temos alguma experincia intuitiva na resoluo de conflitos pormeio do uso da conciliao.A conciliao sobre a qual tratamos nesse manual, contudo, no a que denominamos de conciliao informal ou inuitiva. Nosso enfoqueser, pelo contrrio, a conciliao tcnica. Podemos definir esse tipo de conciliao como sendo Um processo composto por vrios atos procedimentaispelo qual um terceiro imparcial facilita a negociao entre pessoas em conflito, as habilita a melhor compreender suas posies e a encontrar solues que se compatibilizam aos seusinteresses e necessidades.Dentro do quadro geral de formas de tutela de interesses, a conciliao considerada, por vrios processualistas25, como sendo um mtodoautocompositivo de resoluo de disputas. Cabe registrar que a autocomposio pode ser direta (ou bipolar) como na negociao ou indireta (outriangular) como na conciliao ou na mediao. No que tange auto-

25 E .g. ZAMORA Y CASTILLO, Niceto Alcal. Processo, Autocomposicin e Autodefensa. Cidade do Mxico: Ed. UniversidadAutnoma Nacional de Mxico, 1991. CARREIRA ALVIM, Jos Eduardo. Elementos de Teoria Geral do Processo. So Paulo:Ed. Forense, 2. ed. 1993 ou GRINOVER, Ada Pellegrini et. Alii. Teoria Geral do Processo. So Paulo: Ed. Malheiros 18. ed.1993.

19

composio indireta (ou tambm chamada de autocomposio assistida26)vale registrar que para fins deste manual a mediao definida como umprocesso no qual se aplicam integralmente todas as tcnicas autocompositivas e no qual, em regra, no h restrio de tempo para sua realizao.Por outro lado, a conciliao, para fins deste manual, pode ser definida como um processo autocompositivo ou uma fase de um processoheterocompositivo no qual se aplicam algumas tcnicas autocompositivase no qual h, em regra, restrio de tempo para sua realizao.Cabe registrar que alguns autores distinguem a conciliao damediao indicando que naquele processo o conciliador pode apresentaruma apreciao do mrito ou uma recomendao de uma soluo tida porele (conciliador) como justa. Por sua vez na mediao tais recomendaesno seriam cabveis.Considerando que o propsito do presente manual consiste emtransmitir tcnicas autocompositivas ao leitor consideramos que no sorecomendadas sugestes de acordo ou direcionamentos quanto ao mritonem mesmo em conciliaes. Isto porque h tcnicas autocompositivasque podem ser utilizadas para evitar que se desenvolva a conciliao desta forma. Vale registrar ainda que no se considera legtimo o adiantamento ou a previso de qual sentena ser prolatada em determinada disputacomo forma de estimular as partes a um acordo. Isto porque tal orientaoviola os princpios da ampla defesa e do devido processo legal previstosna nossa Constituio da Repblica no art. 5 , LIV e LV.Cabe mencionar que existem vrias formas de se proceder a umaconciliao. Conforme a atuao do conciliador, que pode ter uma participao maior ou menor na resoluo do conflito. O modelo que apresentamos neste manual possui os seguintes traos principais.Os sujeitos do processoDas partes. Na prtica dos conciliadores a quem se direciona estemanual, as partes envolvidas comparecero sesso de conciliao emuma das etapas do processo judicial (conciliao endoprocessual ou judicial). Entretanto, as partes possuem a opo de no se manifestarem26 C f. COSTA, Alexandre Arajo. Mtodos de composio de conflitos: conciliao, conciliao, arbitragem e adjudicao,in AZEVEDO, Andr Gomma de (Org.). Estudos em Arbitragem, conciliao e Negociao. Vol. 3. Braslia: Ed. Gruposde Pesquisa, 2004.

20

Conselho Nacional de Justia

durante a conciliao e, se optarem pela discusso de suas questes coma outra parte e dessas discusses no resultar em um acordo, o termo deaudincia redigido ao final da discusso conter apenas disposies comas quais elas tenham concordado expressamente. Nada ser feito contra asua vontade e o conciliador deve destacar que, nesse sentido, a participao das partes voluntria.Representantes legais. A interpretao da Lei 9.099/1995 conduzao entendimento de que as partes cujos interesses esto em disputa devemcomparecer pessoalmente, podendo ou devendo ser assistidas por advogado. Faculta-se a assistncia por advogado nas causas de at 20 salriosmnimos e, nas causas de valor superior, a assistncia obrigatria27. OsJuizados Especiais Federais, por outro lado, tratam da representao e nomais da assistncia, embora sempre seja possvel que as partes se faamacompanhar de advogado, quer isso seja imprescindvel ou no. O advogado exerce um importante papel que o de apresentar solues criativaspara que se atendam aos interesses das partes bem como o de esclarecerquais os direitos de seus representados. Um advogado que tenha o seu valorreconhecido pelo conciliador tende a ter um comportamento cooperativo.Conciliador. O conciliador uma pessoa selecionada para exercero munus pblico de auxiliar os litigantes a compor a disputa. No exercciodessa importante funo, ele deve agir com imparcialidade e ressaltar spartes que ele no defender nenhuma delas em detrimento da outra.O conciliador, uma vez adotada a confidencialidade, deve enfatizar quetudo que for dito a ele no ser compartilhado com mais ningum, excetuado o supervisor do programa de conciliao (se houver) para eventuais elucidaes de algumas questes. Observa-se que uma vez adotadaa ferramenta da confidencialidade, o conciliador deve deixar claro queno as comentar o contedo das discusses nem mesmo com o juiz. Istoporque, o conciliador deve ser uma pessoa com que as partes possam falarabertamente.Co-facilitador. Apesar de no ser uma forma de conciliao prevista explicitamente na lei, entendemos que possvel a atuao conjunta dedois conciliadores em especial em fase de treinamento dos conciliadores.Essa forma de conduo da conciliao possui as vantagens prprias deum trabalho em equipe permitindo que os conciliadores percebam commais facilidades as oportunidades de melhorias na aplicao de tcnicasautocompositivas.27 BACELLAR, Roberto Portugal. Juizados Especiais a nova mediao paraprocessual. So Paulo: Revista dos Tribunais,2003.

21

Juiz. O juiz deve procurar conciliar as partes a qualquer momentoem que entender que tal orientao ser produtiva. Durante a sesso privada (ou sesso individual) conduzida pelo conciliador, no entanto, o juizdeve ter cautela quanto ao grau de sua interferncia. Isso no implica queele no deva orientar os conciliadores a adotar determinadas tcnicas e,de forma geral, sobre o modelo de conciliao a ser adotado. Todavia, nodeve o magistrado sugerir que conciliadores exeram presso para alcanarem acordo ou adiantar posicionamentos jurdicos que seriam eventualmente postos em sentenas judiciais.EstruturaFlexibilidade procedimental. A conciliao composta por diversos atos a serem seguidos pelo conciliador. Apesar de ser til ter umaestrutura a seguir, o conciliador no est adstrito a uma ordem especficae tem a liberdade de flexibilizar o procedimento conforme o progressodas partes ou a sua forma de atuar. A partir de determinadas refernciastcnicas cada conciliador vai desenvolver seu prprio estilo.Sesses individuais. O conciliador possui a prerrogativa de realizar sesses individuais com as partes conforme considerar conveniente. Por reconhecer a importncia de comunicao confidencial entre aspartes e o conciliador, a Lei do divrcio, em seu captulo 3 2, fazexpressa meno possibilidade de sesses individuais. A Lei de Juizados Especiais no faz expressa meno a essa possibilidade todavia,dos prprios propsitos desta Lei pode-se afirmar que implicitamenteh esta autorizao.Tom informal. Entende-se ser mais produtivo se os conciliadoresno se apresentarem como figuras de autoridades. A autoridade do conciliador obtida pelo nvel de relacionamento que ele conseguir estabelecercom as partes. O uso de um tom de conversa, sem maiores formalidadesestimula o dilogo. A informalidade que defendemos no significa, contudo, que todos envolvidos na sesso de conciliao no precisem se preocupar com uma adequada postura profissional. Assim, informalidade epostura profissional so valores perfeitamente compatveis.

22

Conselho Nacional de Justia

Escopo da ConciliaoUm conflito possui um escopo muito mais amplo do que simplesmente as questes juridicamente tuteladas sobre a qual as partes estodiscutindo em juzo. Distingue-se, portando aquilo que trazido pelaspartes ao conhecimento do Poder Judicirio daquilo que efetivamente interesse das partes. Lide processual , em sntese, a descrio do conflitosegundo os informes da petio inicial e da contestao apresentados emjuzo. Analisando apenas os limites da lide processual, na maioria dasvezes no h satisfao dos verdadeiros interesses do jurisdicionado. Emoutras palavras, pode-se dizer que somente a resoluo integral do conflito (lide sociolgica) conduz pacificao social; no basta resolver a lideprocessual aquilo que foi trazido pelos advogados ao processo se osverdadeiros interesses que motivaram as partes a litigar no forem identificados e resolvidos28.Alm do problema imediato que se apresenta, h outros fatoresque pautam um conflito, tais como o relacionamento anterior das partes, as suas necessidades e interesses, o tipo de personalidade das partes envolvidas no conflito, os valores das partes e a forma como elas secomunicam. Muitos desses fatores considerados secundrios por algunsoperadores do direito esto, na verdade, na origem do conflito e por issodevem ser levados em conta na soluo do problema.A conciliao deve levar em considerao aspectos emocionais durante o processo e ao conciliador no caber decidir pelas partes, mas asconduzir a um dilogo produtivo, superando barreiras de comunicao afim de que as partes encontrem a soluo.28 BACELLAR, Roberto Portugal. Juizados Especiais a nova mediao paraprocessual. So Paulo: Revista dos Tribunais,2003.

23

BenefciosUm benefcio frequentemente mencionado Empoderamento daspartes. Empoderamento a traduo do termo em ingls empowerment, que significa a busca pela restaurao do senso de valor e poder daparte para que essa esteja apta a melhor dirimir futuros conflitos.Oportunidade para as partes falarem sobre seus sentimentos emum ambiente neutro.Compreenso do ponto de vista da outra parte por meio da exposio de sua verso dos fatos, com a facilitao do conciliador.Possibilidade de administrao do conflito de forma a manter orelacionamento anterior com a outra parte .Celeridade do processo de conciliao.Apesar das indiscutveis vantagens, a conciliao tende a no produzir os seus resultados satisfatrios se certos requisitos mnimos noestiverem presentes no conflito. Dessa maneira, para que a conciliaopossa produzir os seus aspectos benficos, preciso que, dentre outrosfatores, as partes queiram uma soluo e esforcem-se para alcan-la; queas partes cujos interesses esto sendo discutidos compaream sesso deconciliao e que as partes sejam capazes de honrar os compromissos assumidos. Contudo, sendo atendidos os requisitos mnimos, a conciliaoadapta-se a quase todos os tipos de conflito.

24

Conselho Nacional de Justia

O Procedimento comum que os manuais de Direito Processual Civil faam distino entre processo e procedimento. Nesses textos se indica que o processopossui uma fora que justifica e direciona a prtica dos atos do procedimento, sua manifestao extrnseca, a fim de alcanar a composio dalide submetida ao poder jurisdicional. como se o processo fossem trilhosque asseguram a prtica sucessiva e lgica dos atos do procedimento.Essa conceituao adapta-se lgica da conciliao. Na esfera daconciliao, o processo, tem como finalidade a soluo de um conflito pelas partes que dele so parte e a superao, em definitivo, dos fatores quelevaram ao conflito. O procedimento consiste nos passos que o conciliadorsegue com intuito de alcanar essa finalidade.O presente manual adota, exemplificativamente, o procedimentoabaixo esquematizado para a realizao das conciliaes:Inicio da conciliaoNessa etapa o conciliador apresenta-se s partes, diz como prefereser chamado, faz uma breve explicao do que constitui a conciliao,quais so suas etapas e quais so as garantias. Deve perguntar s partescomo elas preferem ser chamadas.Reunio de InformaesAps uma exposio pelas partes de sua verso dos fatos, a qualo conciliador, dentre outras posturas, ter escutado ativamente, haver25

oportunidade do conciliador elaborar perguntas abertas que lhe auxiliaro a entender os aspectos do conflito que estiverem obscuros.Identificao de questes, interesses e sentimentosDurante essa fase, o conciliador far um resumo do conflito utilizando uma linguagem positiva e neutra. H significativo valor nesse resumo pois ser por meio dele que as partes sabero que o conciliador estouvindo as suas questes e as compreendendo. Alm disso, o resumo feitopelo conciliador impe ordem discusso e serve como uma forma derecapitular tudo que foi exposto at o momento.Esclarecimento das controvrsias e dos interessesCom o uso de determinadas tcnicas, o conciliador formular, nessa fase, diversas perguntas para as partes a fim de favorecer a elucidaodas questes controvertidas.Resoluo de questesTendo sido alcanada adequada compreenso do conflito duranteas fases anteriores, o conciliador pode, nessa etapa, conduzir as partes aanalisarem possveis solues.Registro das solues encontradasNessa etapa, o conciliador e as partes iro testar a soluo alcanada e, sendo esta satisfatria, redigiro um acordo escrito se as partes assimo quiserem. Em caso de impasse, ser feita uma reviso das questes einteresses das partes e tambm sero discutidos os passos subseqentesa serem seguidos.Vale registrar que todos os estgios aqui sucintamente descritossero desenvolvidos no captulo seguinte.

26

Conselho Nacional de Justia

A Formao do ConciliadorUm conciliador, a fim de ter uma atuao efetiva, deve possuircertas habilidades. Isso no significa que apenas pessoas com um perfilespecfico possam atuar como conciliadores. Pelo contrrio, o processo deconciliao flexvel o suficiente para se compatibilizar com diversos tiposde personalidades e maneiras de proceder. Assim, entende-se que apesarde ser mais eficiente selecionar conciliadores com base em suas caractersticas pessoais, as habilidades autocompositivas so tambm adquiridaspor intermdio de um adequado curso de tcnicas autocompositivas.Existem habilidades que um conciliador precisa possuir para conduzir a conciliao - o que no equivale a afirmar que existe um conciliador perfeito. Existe, isso sim, um padro ideal ao qual os conciliadoresdevem almejar, em um processo contnuo de aperfeioamento e ateno aindicadores de qualidade. Acima de tudo, o conciliador deve buscar o seuaperfeioamento tcnico e amadurecimento profissional.Em consonncia ao que foi indicado anteriormente, pode-se destacar, dentre as caractersticas de um bom conciliador, as seguintes:Capacidade a aplicar diferentes tcnicas autocompositivas de acordo com a necessidade de cada disputa.Capacidade de escutar a exposio de uma pessoa com ateno,utilizando de determinadas tcnicas.Capacidade de inspirar respeito e confiana.Capacidade de estar confortvel em situaes em que os nimosestejam acirrados.27

A pacincia.Capacidade de afastar seus preconceitos por ocasio da conciliao.A imparcialidade.Possuir empatia, isto , ser capaz de colocar-se no lugar do outro,sem, contudo, tomar partido.A gentileza e respeito no trato com as partes.Um treinamento deve ensinar aos futuros conciliadores como utilizar as tcnicas e ferramentas dos processos de conciliao para desenvolver essas habilidades. Naturalmente, apenas a prtica ir assegurar plenodomnio delas. importante destacar que mesmo o domnio absoluto dashabilidades e a perfeita manifestao das caractersticas desejveis nogarante um resultado favorvel pois o processo, em sendo das partes, delas depende para ser bem sucedido.

28

Conselho Nacional de Justia

A Sesso de ConciliaoPreparaoA Sesso de AberturaReunindo InformaesIdentificando Questes, Interesses e SentimentosComo Estimular Mudanas de Percepes e AtitudesSesses IndividuaisSesso Conjunta FinalA Construo do AcordoOrientando a Discusso

29

30

Conselho Nacional de Justia

Observaes PreliminaresO processo de conciliao, como qualquer outro referente a mtodos de resoluo de controvrsias, apresenta como propriedades a presena do contraditrio, permitindo-se, pois, que todos os participantespossam atuar de modo tentar resolver o conflito. Na etapa de conciliaofica evidenciado que o que se busca, sobretudo, que as prprias partescheguem soluo. Por isso, diz-se que a conciliao um mecanismoautocompositivo, isto , a soluo no dada por um terceiro. Difere, tambm, pela informalidade. De fato, na conciliao o processo vai se amoldando conforme a participao e interesse das partes. Pode-se, dizer, pois,que se trata de um mtodo autoconstrutivo, isto , que vai se construindosegundo o envolvimento e a participao de todos interessados na resoluo da controvrsia. um processo, portanto, com peculiaridades. Todavia, deve-seentend-lo como uma continuidade, isto , todo o seu desenvolvimento se efetua sem que se visualize uma compartimentalizao em etapas.Embora seja possvel verificar diferentes fases do processo, no mbito daconciliao, em rigor, o que se verifica um caminhar altamente varivelconforme o envolvimento pessoal das partes no processo. Dessa forma,pelo seu prprio cunho informal, no se pode estipular, com preciso, queo processo ir se desenrolar de um determinado modo.Nesse contexto, dividimos o processo de conciliao em cinco fases: i) declarao de abertura; ii) exposio de razes pelas partes; iii) identificao de questes, interesses e sentimentos; iv) esclarecimento acercade questes, interesses e sentimentos; e v) resoluo de questes. Assimcompreendido, o estudo das diferentes etapas do processo conciliatrioque se est a iniciar neste captulo assim apresentado unicamente parafins didticos. A prtica no processo conciliatrio, afinal, tem demons31

trado que todas as etapas a seguir descritas orientam-se de modo muitomais fluido. No h, portanto, compartimentalizao e, sim, descrio depossveis etapas que podero ocorrer.Ainda assim, recomenda-se, ao menos, que se tente seguir, com ascautelas devidas, a seqncia logo adiante apresentada, salvo se a controvrsia estiver demonstrando ser melhor seguir por outros caminhos. Enfim, conforme se vai adquirindo experincia, o conciliador saber manejartais etapas do processo de modo to natural que poder melhor adequlas s questes controvertidas. Um bom conciliador, em rigor, sabe faz-losem que as partes nem sequer percebam que esto caminhando para umoutra etapa do processo.

32

Conselho Nacional de Justia

Preparao

Como se PrepararO conciliador deve buscar se centrar no caso em questo, conversando, se possvel, com eventual co-facilitador.Embora seja interessante j ter, de antemo, uma compreenso doproblema que ir ser detalhado durante a conciliao, pois, assim, tornase possvel prever estratgias a serem empregadas, usualmente, porm,nas conciliaes que seguem os parmetros da lei 9099/1995, aplicadasnos Tribunais dos Estados e Regies, os conciliadores somente obtm informaes acerca da controvrsia no prprio processo conciliatrio. Nestecaso, portanto, bastante til formular-se uma classificao dos conflitosusuais, tais como conflito de trnsito, vizinhana, conflito familiar, conflito decontrato inadimplido, sistema financeiro, pois, assim, o conciliador, ao menos,antes de chamar as partes para dar incio ao processo, ter uma vaga noo de como poder atuar.A conciliao um processo bastante dinmico, em que as formalidades so frequentemente colocadas em segundo plano. Afinal, o que sedeseja , na medida do possvel, fazer com que as partes saiam satisfeitasda conciliao. Por isso, o conciliador deve se sentir relaxado e se esforarem compreender a possibilidade de xito nesse mecanismo.Estar no local da conciliao antes do horrio marcado fundamental. Assim, o conciliador ir se sentir mais calmo, tranqilo e, ao mesmo tempo, poder melhor revisar suas tcnicas, estratgias e ferramentasque deseja empregar durante a sesso. V at a sala, veja se est tudo em

33

ordem, confira se h cadeiras suficientes e perceba outros detalhes relevantes conforme orientaes a seguir.Como Proceder Anteriormente Chegada das PartesH certas dicas de atuao precedentes chegada das partes quepodem auxiliar o conciliador na consecuo do xito no processo de conciliao. Antes das partes chegarem o que deve ser bem considerado, umavez que comum que as partes mais nervosas cheguem com dez a quinzeminutos de antecedncia devem ser efetuados alguns ajustes, tais como:Preparar o local em que ser realizada a conciliao: mesa, iluminao, temperatura ambiente, privacidade, gua, caf, local para a realizao das sesses privadas (se necessrio) ou de espera, materiais deescritrio, entre outros;Revisar todas as anotaes feitas sobre o caso e, se possvel, memorizar o nome das partes (e como talvez possam preferir ser chamadas)29.Muitas vezes, somente ser possvel saber o nome das partes j durantea conciliao. Assim, uma vez descobertos os nomes e as preferncias,anot-los de grande utilidade.Caso haja co-facilitador, conversar com ele sobre como iro trabalhar em conjunto e como ser feita a apresentao do processo de conciliao na sesso de abertura; importantssimo que j se prepare o local para a realizao desesses privadas e aquele em que a parte ficar esperando enquanto a sesso privada se realiza. O conciliador deve organiz-lo de modo a deix-loconfortvel.Encontrando-se com as PartesQuando as partes chegarem sesso de conciliao, o conciliadordeve cumprimentar cada uma delas e tentar fazer com que se sintam calmas e confortveis, mas no deve conversar demasiadamente, ultrapassando um certo grau de objetividade. Deve tomar cuidado, tambm, emno transparecer estar direcionando mais ateno a uma das partes do29 N a prtica j foi possvel perceber que algumas pessoas no gostam de ser chamadas pelo primeiro nome, a exemplo deMaria Carolina que preferiu ser chamada de Carolina e Joo Roberto que preferiu ser chamado apenas de Roberto.

34

Conselho Nacional de Justia

que outra, conversando, por exemplo, ou se portando mais amigavelmente com uma delas. Caso isso venha ocorrer, provavelmente uma daspartes ter uma impresso de que o conciliador est sendo parcial. omo organizar o posicionamento e a localizao das partes Cmesa durante a conciliaoA forma como as partes iro se sentar durante a sesso de conciliao transmite muito mais informaes do que possa imaginar. Trata-sede uma forma de linguagem no verbal, que deve ser bem analisada a fimde perceber o que as partes podem esperar da conciliao e como elas irose comportar nesse ambiente. A forma como ser organizada a posiofsica das partes dever diferir conforme o nmero de partes, o grau deanimosidade entre elas, o tipo de disputa, o patamar cultural e a prpriapersonalidade dos envolvidos. Desse modo, independentemente do fatode haver um nico conciliador ou estar sendo auxiliado por outro ou outros, h de se seguir alguns conselhos, sempre oportunos para um melhordesenvolvimento do processo de conciliao.Dessa forma, importante que o posicionamento das partes sejarealizado de modo que todos consigam ver e ouvir uns aos outros, comotambm participar das discusses. Uma segunda observao diz respeito necessidade de se apartar qualquer aspecto que possa transparecer alguma animosidade entre as partes. Assim sendo, de preferncia, as partesdevem se sentar em posies no antagnicas (opostas). Um dos objetivosda conciliao tentar evitar um sentimento de rivalidade, o que, no casoda disposio das mesas, melhor conseguido ao no colocar as partes defrente uma para a outra, mas, sim, lado a lado, no caso de mesa retangular,ou em posio eqidistante, no caso de mesa circular. Ademais, deve-sefrisar que as pessoas que representam uma parte devem conseguir se sentar juntamente com ela, caso assim o desejem.O posicionamento do conciliador em relao s partes tambm degrande importncia, j que a qualidade imparcialidade, aptido e liderana,em muito, pode ser transmitida consoante tais aspectos. Dessa maneira, oconciliador deve se posicionar de modo eqidistante em relao s partes.Quanto liderana, seu posicionamento deve se efetuar de modo a conseguir administrar e controlar todo o processo30. No caso de co-conciliao,uma preocupao prtica encontra-se na facilidade de comunicao que30 L iderana qualificada que no pressupe qualquer hierarquia, mas induz credibilidade e confiana. Sobre esse assuntocf.. HUNTER, James C, O Monge e o Executivo, Ed. GMT, 2004.

35

tero os co-conciliadores de ter entre si. Assim, importante que os conciliadores se sentem prximos um do outro.O conforto tambm uma qualidade essencial ao processo de conciliao. O sentimento de desconforto, de fato, representa um inconveniente deveras acentuado ao alcance do xito no processo, uma vez queas partes deixaro de se preocupar com a controvrsia em si, deslocandoa sua preocupao para algo bastante improdutivo conciliao. Dessemodo, todos devem se sentir fisicamente confortveis, concentrados e seguros, e o ambiente dever transparecer conforto e privacidade e, por isso,no deve ser nem to grande nem to pequeno.Outros fatores ambientais como a cor das salas, msica ambientee aromas igualmente podero ser teis para melhorar a sintonia das salasutilizadas para a recepo das partes e conciliao de seus conflitos.Para uma melhor visualizao da aplicao prtica de como melhor organizar a posio das partes durante a conciliao, sero apresentados a seguir alguns exemplos de diagramas, tendo como base a existnciade dois conciliadores. A existncia de co-facilitadores, todavia, no acarreta a necessidade de alteraes no caso de um nico conciliador, pois, emprincpio, no caso de co-facilitao, os conciliadores devem ficar prximosum do outro. Quanto s partes, haver uma de duas pessoas (um casal,por exemplo) e outra com uma nica pessoa.1. A Mesa RedondaIgualitrio a Mesa Redonda.

P2P2

CCP136

A mesa redonda apresenta a importantevantagem de permitir dispor as partes demodo eqidistante tanto entre si, comoem relao ao conciliador, o que, por umlado, retira o cunho de rivalidade que podeser transmitido pelo posicionamento daspartes e, por outro, facilita a comunicao,j que as partes podem olhar uma para aoutra sem ter de movimentar a cadeira.Ademais, a mesa redonda permiteacomodar melhor os participantes eafasta a idia de qualquer hierarquia entreos participantes.

Conselho Nacional de Justia

2. Mesa RetangularMesa Retangular.

C

P2

C

P1

P2

Os conciliadores se sentam em umdos lados da mesa, ficando de frentepara as partes. Essa disposiocria a sensao de autoridade doconciliador. Tem a vantagem decolocar as partes lado a lado, o queretira o sentimento de rivalidade que transmitido pelas tradicionais mesasde julgamento nos Tribunais. Emboraas mesas retangulares no sejam toadequadas quanto s redondas, essadisposio a mais indicada paramesas retangulares pois permite quese mantenha uma eqidistncia entretodos os participantes.

3. Sem o Emprego da MesaProximidade a organizao de sala.

C

P2

C

P2

Em outras circunstncias, oconciliador pode querer encorajaras pessoas a deixarem de lado suacouraa ao retirar a mesa e colocaras cadeiras mais prximas entre si,criando, desse modo, um ambientemais informal.

P1

37

38

Conselho Nacional de Justia

A Sesso de Abertura

PropsitoA Sesso de abertura tem como propsito apresentar s partes oprocesso de conciliao, explicando-lhes como ele se desenvolve, quais asregras que devero ser seguidas, sempre no intuito de deix-las confortveis com o processo em si, como tambm de evitar futuros questionamentos quanto a seu desenvolvimento., exatamente, na fase de abertura que o conciliador firma sua presena e a figura de condutor do processo. Para tanto, deve ele se portarde forma a dar s partes o sentimento de confiana em sua pessoa, comotambm de imparcialidade, sendo til, desse modo, que, ao conversar,olhe para cada uma das partes de modo equilibrado e calmo. O conciliador, portanto, deve agir como um educador do processo de conciliao ecomo definidor do tom que dever ser apresentado durante seu desenvolvimento.A fase de abertura, ademais, tem um forte objetivo de fazer comque as partes adversrias se habituem a sentar, uma ao lado da outra, emum mesmo ambiente.H de se concluir que a fase de abertura etapa fundamental doprocesso de conciliao apresenta o propsito de deixar as partes a pardo processo de conciliao, estabelecer um tom ameno para o debate dasquestes por elas suscitadas, fazer com que o conciliador ganhe a confiana das partes e, desde j, explicitar as expectativas quanto ao resultado doprocesso que se est a iniciar.

39

Deve-se, no entanto, desde j, apresentar uma crtica a certos autores que no consideram importante essa etapa do processo. Como seperceber nas explanaes posteriores, na fase de abertura que as partestero conhecimento do processo e das regras que sero aplicadas, razopela qual, se qualquer infringncia s regras ocorrer ao longo da conciliao, essa explicao prvia poder sempre ser lembrada s partes paraque voltem a atuar em conformidade ao que foi anteriormente estipulado.Essa tcnica, por exemplo, muito til quando se verifica que as partesesto se interrompendo constantemente. Nesse caso, relembrar s partesque elas concordaram, na fase de abertura, a no interromper a outra um caminho vivel e, ao mesmo tempo, no agressivo de se retomar anormalidade.Como Iniciar a Sesso de AberturaA sesso de abertura no deve se prolongar demasiadamente para conciliaes judiciais recomenda-se uma declarao de abertura deaproximadamente 3 (trs) minutos. Nessa fase da conciliao, embora inicial, as partes, normalmente, ainda esto muito nervosas e inquietas, o quedificulta a sua captao de informaes. Recomenda-se, ento, a utilizaode um tom de voz ameno que possa transmitir s partes que conflitosintegram qualquer relao humana e que s partes cabe naturalmente asoluo desses conflitos ainda que assistidos por algum que tenha conhecimentos tcnicos para auxili-los.O conciliador, mesmo que apresente as diversas regras que devero ser seguidas durante todo o processo, no deve acreditar que aspartes iro lembr-las e segui-las sempre. Por isso, qualquer imprevistoque venha a ocorrer durante a sesso, apenas relembre s partes como taisquestes suscitadas devem ser solucionadas.Caso haja mais de um conciliador, fundamental que, j nessa fase,tenham eles anteriormente se preparado no modo como cada um deveratuar. interessante que eles dividam, entre si, as informaes que seroapresentadas s partes ou, ento, seja estabelecido que um realizar toda aapresentao e o(s) outro(s) apenas complete(m) um aspecto ou outro. Dequalquer modo, uma diviso equnime recomendvel, pois dificultaro direcionamento do dilogo das partes, de preferncia, a apenas um dosconciliadores, como tambm permitir uma melhor visualizao pelaspartes da harmonia do trabalho por eles realizado. Para as partes, se nose apresentar equnime a diviso da apresentao, provvel que fique a40

Conselho Nacional de Justia

impresso de que aquele que realizou a maior parte da apresentao irpresidir todo o processo.A seguir, sero apresentados alguns tpicos que devero ser trabalhados durante a sesso de abertura. Evidentemente, tais tpicos deveroser adaptados realidade da conciliao. Desse modo, o conciliador deveempreg-los de modo a melhor se enquadrarem em seu estilo de atuar.Cumprimentos e Palavras de EncorajamentoAntes de dar incio conciliao propriamente dita, recomendvel que o conciliador d as boas-vindas a cada uma das partes presentes.Caso haja alguma pessoa que jamais tenha se encontrado previamente, de todo conveniente repetir o nome do(s) conciliador(es) e de cada umadas partes.O conciliador deve anotar o nome de cada uma das partes em seubloco de anotaes, a fim de evitar futuros e graves empecilhos durante o processo. Afinal, deve-se evitar uma situao em que a parte percebaque o conciliador se lembrou do nome de uma das partes e se esqueceudo da outra. Do mesmo modo, no se pode esquecer de perguntar comoas pessoas envolvidas gostariam de ser chamadas. Cordialidade e intimidade devero se adequar vontade das partes durante o processo.Mesmo que as partes j tenham participado de outra conciliao,deve-se ter sempre como premissa que elas devem ser lembradas das regras de conduta da conciliao. Por isso, o conciliador deve sempre fazeruma declarao de abertura e estar sempre disposto a tirar dvidas bemcomo saber lidar com qualquer reclamao, quanto ao processo, que possa ser sustentada por algum.Antes de iniciar a explicao do processo em si, muito importante apresentar algumas palavras de encorajamento. Por isso, interessanteo conciliador elogiar o esforo de cada uma das partes de tentar resolverseu conflito ou dificuldade utilizando a conciliao. Ao mesmo tempo,ele deve afirmar s partes que o processo de conciliao, em situaes semelhantes a que elas esto passando, por sua experincia, tende a lograrxitos bastante expressivos, uma vez que, alm de solucionar o problema particular, tambm consegue fazer com que as partes saiam satisfeitascom o processo e, possivelmente, consigam manter um relacionamentoposterior satisfatrio. Pode assim ele se expressar:41

Devo elogi-los, desde j, por estarem empregando esforos para tentarresolver suas questes por meio da conciliao, que, felizmente, em situaes semelhantes a que vocs esto passando, tm obtido bastante sucesso.Propsito da conciliao e Papel do conciliadorNessa etapa, o conciliador deve se apresentar como um auxiliar efacilitador da comunicao entre as partes. Seu objetivo desde j deveser explicitado no induzir ningum a um acordo que no lhe satisfaa.Pelo contrrio, o que se deseja que as partes, em conjunto, cheguem a umacordo que as faa sentir contentes com o resultado. Ao mesmo tempo, oconciliador deve dizer que buscar fazer com que elas consigam entender suas metas e interesses e, desse modo, possam construtivamente criare encontrar suas prprias solues. Um exemplo de como o conciliadorpode se expressar o seguinte:Meu papel, neste processo, de auxili-los na obteno do acordo. Trabalharei, portanto, como um facilitador da comunicao, buscando compreenderseus interesses e descobrir as questes presentes. Em hiptese alguma, irei induziralgum a algo que no deseje. O importante nesse processo que vocs construam,em conjunto, o entendimento necessrio. importante dizer s partes que o conciliador no juiz e, porisso, no ir proferir julgamento algum em favor de uma ou outra parte.Ademais, deve ele frisar a sua imparcialidade e confiana no sucesso daconciliao que est em curso. Um exemplo de como se expressar:Devo lembr-los que no sou juiz e, portanto, no irei prolatar nenhuma deciso em favor de uma ou outra parte. Minha atuao, portanto, ser desenvolvida demodo imparcial, sempre no intuito de auxili-los a terem uma negociao eficiente.Caso o conciliador faa parte de alguma instituio que tem convnio com o Tribunal cabe indicar s partes de qual instituio ele fazparte e a razo de ele ter sido escolhido para mediar o conflito. Por fim, interessante dizer s partes que, em geral, estas buscam no processo deconciliao tambm um meio para aperfeioar seu relacionamento. Umexemplo de como se expressar:Alm de auxiliar na resoluo do conflito, devo lembr-los que a conciliao, em geral, pode ser um interessante meio para aperfeioar o relacionamentodas partes.42

Conselho Nacional de Justia

Formalidades e LogsticaO conciliador deve dar s partes o tempo necessrio para que analisem e revisem qualquer formulrio de participao que, eventualmente,seja necessrio para dar prosseguimento ao processo de conciliao.Se conveniente o que quase sempre tratando-se de conciliaojudicial o conciliador pode desde j fazer uma previso da durao dasesso de conciliao, com base em sua experincia ou na poltica institucional do tribunal. Todavia, deve ele ter em mente que cada caso temsuas particularidades e, se a conciliao, eventualmente, durar mais doque as partes tinham se programado, estas ou os seus advogados podemse ressentir disso. Naturalmente, tratando-se de conciliaes judiciais htambm a questo de pauta pois uma conciliao que se atrasa afeta todas a demais conciliaes na pauta daquele(s) conciliador(es).Para um adequado desenvolvimento de tcnicas autocompositivas,sugere-se que o tempo mnimo planejado para cada conciliao seja de 30(trinta) a 45 (quarenta e cinco) minutos. Isto porque em conciliaes realizadas em menos de 15 (quinze) minutos o conciliador somente tem tempopara se apresentar, ouvir resumidamente s partes e apresentar uma proposta de soluo que se considera, como indicado anteriormente, umaforma excessivamente precria de se conduzir uma autocomposio.ConfidencialidadeO conciliador deve buscar adeso das partes para a adoo da confidencialidade31 que se estabelecer acerca de todos os fatos e situaesnarradas por elas durante o processo de conciliao. fundamental explicar que o(s) conciliador(es) manter(o) em segredo tudo o que for, naconciliao, apresentado, salvo vontade conjunta das partes em contrrio.Caso alguma das partes tenha alguma preocupao ou receio que essaconfidencialidade possa no ser mantida, o conciliador deve adiantar spartes que ela poder ser inserida como parte de seu acordo. Um exemplode como se expressar:Devo lembr-los de que tudo o que for aqui dito ser mantido em segredo.Assim, como conciliador no posso ser chamado a servir como testemunha do queser dito aqui em um eventual processo judicial.31 A confidencialidade tem sido uma das ferramentas fundamentais para desvendar os verdadeiros interesses, por issorecomenda-se sua adoo sempre que isso seja possvel.

43

Sobre o ProcessoO conciliador deve explicar brevemente como a conciliao se desenvolver, enfatizando, logo no incio, que cada um dos participantester a sua vez para se expressar sem interrupo. importante adiantars partes que devero evitar realizar interrupes nas explanaes de cadauma, mesmo que tal fato seja difcil, uma vez que todos tero a possibilidade de tambm manifestar as suas opinies e relatos dos fatos. Umaforma interessante de se manifestar a respeito:Peo-lhes, para que tudo corra de forma eficiente durante o processo deconciliao, que cada um respeite a vez do outro falar, mesmo que seja difcil. Afinal, todos tero tambm a sua oportunidade de se manifestar.O conciliador precisa enfatizar algumas caractersticas do processo de conciliao, sobretudo a sua informalidade e sua orientao a resoluo de lides sociolgicas, afirmando que o enfoque central da comunicao ser a realizao dos interesses das partes e no a produo oudiscusso de provas ou teses jurdicas. interessante o conciliador descrever as suas expectativas em relaos partes. Desse modo, deve ele afirmar que o desejvel que todos trabalhem conjuntamente para tentar alcanar uma soluo controvrsia, comotambm destacar que todos devem escutar, com ateno, s preocupaes emanifestaes de cada uma das partes, como tambm suas perspectivas.Desde j, deve o conciliador abordar a participao e o papel doadvogado, de outros conselheiros, se houver necessidade. Por fim, caberessaltar que o emprego de um esforo no intuito de resolver as questesdos clientes presentes na conciliao se mostra essencial eficiente atuao da advocacia na conciliao. Uma forma de se manifestar a respeito:Agradeo a presena dos advogados pois notamos que bons advogadosso muito importantes na conciliao na medida em que auxiliam as partes a encontrar novas e criativas solues s suas questes bem como asseguram aos seusclientes que estes no abriro mo de nenhum direito que desconheam ter.Desejo de ProsseguirAps explicar o processo, o conciliador deve verificar se h alguma questo ou preocupao quanto conciliao. Para um melhor desen44

Conselho Nacional de Justia

volvimento futuro da conciliao, no pode ele se esquecer de perguntars partes se elas esto de acordo com as regras apresentadas. Assim, oconciliador ter esse artifcio posterior para corrigir qualquer ato que sejacontraproducente para a conciliao.O passo seguinte perguntar, ento, se as partes desejam continuar com a sesso e somente deve partir para a etapa seguinte com aafirmao de cada uma das partes. Um exemplo de como o conciliadorpoder se expressar:Vocs esto de acordo com as regras que apresentei previamente? Halguma observao que vocs desejam fazer? Alguma dvida?Uma Lista de VerificaoOs diversos passos que devem ser seguidos nessa fase inicial daconciliao podem ser sintetizados em uma lista que facilitar bastante otrabalho do conciliador. de todo conveniente que, ao dar incio conciliao,se tenha sempre presente essa lista para se lembrar de cada um dos aspectos quedevem ser ditos s partes quanto ao desenvolvimento do processo.

1. Apresente-se e apresente as partes Anote os nomes das partes e os utilize no correr da conciliao Recorde eventuais interaes anteriores entre o conciliador e aspartes2. Explique o papel do conciliador No tem poder de deciso No um juiz Imparcial Facilitador Ajuda os participantes a examinar e a expressar metas einteresses3. Descreva o processo de conciliao Informal (nenhuma regra de produo de prova) Participao das partes bem como dos advogados Oportunidade para as partes falarem Possibilidade de sesso privada (ou sesso individual)4. Busque adeso para que seja assegurada a confidencialidade Explique eventuais excees45

5. Descreva as expectativas do conciliador em relao s partes Trabalhar conjuntamente para tentar alcanar uma soluo Escutar sem interrupo Explicar suas preocupaes Escutar a perspectiva da outra parte Tentar seriamente resolver a questo Revelar informaes relevantes s outras partes6. Confirme disposio para participar da conciliao7. Comente sobre o papel dos advogados8. Descreva o processo a ser seguido Tempo Logstica Regras bsicas para conduo do processo Partes tm a oportunidade de falar Sesses privadas ou individuais Quem ir falar primeiro Perguntas?Exemplo de abertura de conciliaoA seguir, ser apresentado um exemplo, inspirado naquele usadoem cursos de mediao na Faculdade de Direito da Universidade de Braslia, de aplicao dessa lista de verificao acima indicada.Boa tarde, meu nome Carlos. [Caso se trate de uma conciliao conjunta, o co-facilitador tambm deve se apresentar e o meu nome Teresa.] Vocspodem me [ou nos] chamar pelo primeiro nome mesmo. Gostaria de dar as boasvindas conciliao. (Apresente os demais presentes supervisores, estagirios,observadores, etc. e solicite permisso para a presena de todos durante a conciliao, menos dos supervisores cuja permisso decorre de sua funo)Confirmando seus nomes: a Sra. se chama Natalia Souza e o Sr. FelipeBasso, correto? Como gostariam de ser chamados? ...Algum de vocs j participou de uma conciliao? Apesar de j teremparticipado de uma conciliao antes, gostaramos de explicar qual o nosso modode trabalho pois conciliadores adotam mtodos de trabalho distintos.

46

Conselho Nacional de Justia

Vamos tomar alguns minutos para explicar o processo de conciliao eos papis de todos os envolvidos. (Co-facilitador) e, eu temos formao e experincia na rea de conciliao. Estamos aqui por nossa livre vontade porque acreditamos que a conciliao geralmente o melhor meio de resolver diferenas. Aconciliao um processo no qual ns, conciliadores, trabalharemos com vocs(ou senhores como eles preferirem ser chamados) para ajud-los a resolver a situao que os trouxe at aqui. Cada um de vocs ter a oportunidade para exporsuas preocupaes para ns e para as demais partes. Ns queremos ajud-los aesclarecer seus prprios objetivos e preferncias; trabalhar com vocs na avaliao de opes; ajud-los a tomar decises eficientes considerando suas situaesparticulares e tambm oferecer a oportunidade para compreender o ponto devista da outra parte.Gostaria assegur-los de que ns no nos reunimos previamente comqualquer um de vocs antes desse nosso encontro. Sabemos muito pouco acercada situao que os trouxe at aqui. Permaneceremos imparciais ao longo de todoo processo. Nosso trabalho no decidir quem est certo ou errado, mas sim entender suas preocupaes e auxilia-los a desenvolver solues que atendam adequadamente seus interesses. No somos juzes. No estamos aqui para decidir porvocs ou pression-los a chegar a alguma concluso ou alcanar algum acordo sevocs no estiverem preparados para tanto.Uma vez que cada um de vocs tenha tido a oportunidade de explicar suaposio, trabalharemos de modo a ajud-los decidir o que fazer em relao s questes enfrentadas nesse nosso encontro. Um acordo formal apenas um dos desfechos possveis da conciliao. Os resultados dessa sesso dependem de vocs.A nossa experincia tem mostrado que a forma mais produtivade estruturar nosso trabalho , primeiramente, ouvir cada um de vocssobre a situao que os trouxe at aqui. Faremos perguntas para quepossamos melhor compreender suas preocupaes. A partir de ento,iremos sugerir que vocs se concentrem no futuro para resolver a situao pendente e para estabelecermos maneiras pelas quais vocs iro interagir futuramente. Se vocs alcanarem um acordo, ns podemos, sedesejarem, firm-lo a termo para que assinem. Parece-lhes que o modode conduo da conciliao aqui esboado atende suas necessidades?Existem algumas diretrizes que nos auxiliam a trabalhar demaneira efetiva com vocs.Durante a conciliao, cada um de vocs ter oportunidade parafalar. Como temos aproximadamente 40 minutos para cada conciliao,47

pedimos que tentem apresentar suas perspectivas em aproximadamente5 ou 10 minutos. Acreditamos ser til que cada parte oua atentamentea outra, de modo que cada parte possa falar tudo que tem a dizer semser interrompida. Vocs concordam em evitar interromper a outra parteenquanto ela estiver falando? Ns fornecemos papel e caneta para quevocs tomem notas enquanto ouvem a outra parte. Em regra, pedimoss partes que anotem especialmente dois tipos de dados os fatos novosque tenham tido conhecimento somente aqui na conciliao e os fatosque vocs acreditam que a outra parte ainda no compreendeu ou queforam objeto de uma falha de comunicao.Nossa segunda diretriz diz respeito confidencialidade. Garantimos que no comentaremos com qualquer pessoa de fora do processode conciliao sobre o que for dito durante a conciliao. Portanto, sintam-se vontade para falar abertamente acerca de suas preocupaes.Durante o processo, poderemos considerar conveniente falarcom vocs individualmente - chamamos isto de sesso privada ou sesso individual - e se desejarem falar conosco em particular, por favor,avisem-nos. Caso nos reunamos com vocs individualmente, qualquercoisa que vocs nos contem e que voc no querem que seja compartilhado com a outra parte ser mantido em sigilo.Alguma questo sobre o processo?Natalia, voc props a demanda, certo? Geralmente, comeamos com a pessoa que solicitou a conciliao. Desta forma, Felipe, ouviremos Natalia primeiro e, em seguida, voc ter oportunidade de falar.Certo? Natalia, voc poderia, por gentileza, contar-nos o que a trouxeat aqui?Considerando que na maior parte dos tribunais no Brasil o nmero de conciliadores bastante restrito, recomendamos que se estabeleauma meta de apresentar a declarao de abertura em menos de 5 minutos.Cabe ressaltar que possvel proceder com uma adequada declarao deabertura em cerca de 3 minutos.Vale mencionar ainda que a declarao de abertura estabelece otom de comunicao eficiente que se pretende imprimir na conciliao.Assim, se para um conciliador em fase de aprendizado a declarao deabertura antes descrita e exemplificada possa parecer excessivamente longa, para as partes - que normalmente se encontram no incio da audincia48

Conselho Nacional de Justia

de conciliao em um estado anmico mais agitado - uma declarao emtom calmo e moderado as auxiliar a utilizar um tom mais sereno para seexpressarem.Costuma-se afirmar que nenhum conflito resolvido na mesmasintonia em que foi gerado.

49

Reunindo Informaes

PropsitoO processo de reunir informaes tem o objetivo de dar a todos conciliador(es) e partes a oportunidade de ouvir o relato dos fatos eoutras percepes de cada uma das pessoas envolvidas. Os conciliadores,por meio das informaes, conseguem ter uma viso geral dos fatos e, aomesmo tempo, captar j algumas questes e interesses envolvidos. Ademais, cada uma das pessoas tem a oportunidade de explicar seu ponto devista e expressar seus sentimentos sem interrupes ou quaisquer outrosimpedimentos.Pode-se afirmar que ser ouvido adequadamente significa ser levadoa srio e ser respeitado. Nesta fase de reunio de informaes o conciliadordeve no apenas registrar as questes, os interesses e os sentimentos daspartes, mas tambm deve certificar-se de que estas se sentiram ouvidas.Manuteno de um Tom Educado e PacienteNo processo de reunio de informaes, o conciliador tem a oportunidade de manter um clima sereno, respeitoso e educado, em que aspartes podem escutar a outra e conversar aberta e francamente. Nessafase, portanto, o conciliador deve apenas ouvir atentamente s partes oque far com que uma parte escute a outra. Caso o conciliador note queh interrupes este pode lembrar a regra bsica das partes no se interromperem apresentada na declarao de abertura. O papel do autocompositor , afinal, administrar as interaes entre as partes para que estassejam eficientes.50

Conselho Nacional de Justia

O conciliador dever escutar atentamente tudo o que for apresentado pelas partes, utilizando-se dos mais variados recursos que sero vistos mais adiante.A Escolha de Algum para IniciarAntes de passar a palavra s partes, essencial j estabelecer umcritrio que define quem dever iniciar o relato dos fatos e suas percepes. Para tanto, o melhor a se empregar um critrio objetivo, explicitandotal fato da seguinte maneira: em nossas conciliaes, sempre quem moveu aao d incio a essa fase ou, simplesmente, em nossas conciliaes, semprequem se senta direita comea relatando o que deseja. Alguns autores afirmam que perguntar s partes pode ser uma boa alternativa, embora talfato possa gerar, logo no incio da sesso, um certo grau de desconfortocaso surja uma discusso quanto a esse ponto. Assim, recomenda-se queesta opo no seja objeto de negociao pelas partes a experincia temindicado que se mostra mais conveniente que o conciliador indique queminiciar a reunio de informaes.Como se Desenvolver a Reunio de InformaesNesse momento, o conciliador deve explicar s partes como se darincio reunio de informaes, dando, em seguida, a cada pessoa a oportunidade para falar o que deseja. No momento em que ir passar a palavraa uma das partes, o conciliador deve evitar termos, tais como verso ou pontode vista, pois soa como se o que a parte tem a dizer no seja bem verdadeiro(i.e.. conte-nos sua verso ou qual seu ponto de vista sobre os fatosapresenta a possibilidade da parte interpretar essas frases como um prejulgamento do conciliador de que este no acredita na veracidade do que aparte tem a dizer). Uma alternativa simples seria dizer: voc pode nos relataro que ocorreu? ou ento o que tem acontecido e como isso tem lhe afetado?A Proteo do Tempo de Cada Pessoa FalarNota-se com freqncia que aqueles que esto apenas escutandono consigam se conter e, ento, interrompam o outro. Neste caso, suavee educadamente, o conciliador deve corrigir esse ato. Assim, ele estardemonstrando coerncia e tcnica, uma vez que est bem administrandoa sesso ao zelar por uma eficiente forma de comunicao.51

Caso o conciliador perceba que alguma das partes est bastanteansiosa para dizer algo ou bastante nervosa em razo do que a outra parteesteja relatando, o melhor a fazer apenas reassegur-la que ela ter tempo para tambm se expressar.Para as pessoas que no conseguem ficar caladas, como antes indicado, o conciliador deve relembrar as regras que haviam sido anteriormente expostas pelo(s) conciliador(es) e aceitas pelas partes. Bastadizer: Joo, como ns havamos anteriormente concordado, cada um ter asua vez para se expressar. muito importante, para o sucesso da conciliao,que cada pessoa respeite a vez da outra. Eu sei que , muitas vezes, difcil ouviralgo e ficar calado. Nesse caso, peo que voc faa suas anotaes e apresentetudo o que deseja na sua oportunidade de falar que vir logo a seguir. Outraforma, tambm bastante interessante, apenas corrigir com linguagemcorporal (e.g. com o olhar) de modo no repressivo ou agressivo. Aoassim proceder, o conciliador no quebra a dinmica do relato da parteque o estiver apresentando.Caso as interrupes continuem ocorrendo muito embora o conciliador as tenha tentado impedir corrigindo as interrupes nos momentosem que estas primeiramente ocorreram, nada impede que ele possa ser umpouco mais firme e direto, porm, cauteloso para no gerar uma reaode antagonismo com as partes. O conciliador, por exemplo, pode se manifestar da seguinte maneira: Joo e Maria, vejo que estas questes so muitoimportantes para vocs no fosse assim, vocs no estariam se interrompendodesta forma. Ao mesmo tempo, no vejo como essas interrupes vo nos auxiliara melhor resolver essas questes. Posso contar, daqui para frente, que vocs noiro mais se interromper? . Agradea e retorne a ouvir a outra parte.O Cuidado ao Fazer PerguntasDa mesma forma que as partes devem se respeitar no que atine no interrupo da outra parte, quando ela estiver se expressando, oconciliador tambm dever ter bastante cuidado se necessrio for interromp-la para efetuar alguma pergunta. Nessa fase da conciliao, o quese deseja ouvir acima de tudo, no perquirir pequenos detalhes, que, talvez, sejam mais bem trabalhados na etapa seguinte, que se desenvolveraps terem sido reunidas as informaes necessrias de todas as partes.Por isso, deve-se perguntar apenas o essencial. O conciliador, afinal, embora seja o administrador e organizador da conciliao, mostra-se tambm como o modelo de comunicao para os participantes.52

Conselho Nacional de Justia

Como Fazer as Pessoas se Dirigirem ao conciliadorSobretudo quando os nimos se acirram, quando as partes comeam a discutir no meio da explanao da outra, importante relembrars partes que elas devem se dirigir ao conciliador e, no, a outra parte.Afinal, muito difcil algum ficar calado quando algum lhe dirige umapergunta direta ou lhe ataca. O seguinte exemplo til para saber comoproceder em tais situaes:Maria: No foi voc que tentou entrar em minha casa e levar os meusfilhos, sem nem sequer ter me avisado antes?Joo [interrompendo]: Esses filhos tambm so meus e, por isso, possomuito bem ir v-los e sair para passear com eles quando eu bem entender!Conciliador: Joo, ainda a vez da Maria. Maria, voc pode explicar asituao para mim. importante ressaltar que com a experincia adquirida, caso, no curso do relato ocorram confirmaes (elementos positivos em que uma parteconcorda em parte com a outra) e dilogos respeitosos, caber ao conciliadorapenas acompanhar a conversa e depois retomar a seqncia prevista.Terminando as Exposies das PartesSe no houvesse restries de tempo em conciliaes, o ideal seria deixar as partes se manifestarem pelo tempo que quisessem. Todavia,considerando as restries de recursos humanos (i.e. nmero de conciliadores) faz-se necessria a recomendao de que as partes apresentemsuas perspectivas em 5 ou 10 minutos. Caso haja alguma pessoa que sejaexcessivamente detalhista ou que se estenda alm do prazo estipuladona declarao de abertura recomenda-se que o conciliador, polidamente,se desculpe pela falta de tempo e pea parte que busque concluir suaexplanao. Um exemplo prtico de como agir: Joo, lamento no termosmais do que 45 minutos para esta conciliao vejo que estamos com o tempo umpouco premido - posso lhe pedir para tentar concluir sua explanao nos prximosminutos?

53

O ResumoAps o conciliador ter perguntado ltima das partes a se manifestar se deseja dizer algo mais, deve ele fazer um resumo de toda acontrovrsia at ento apresentada, verificando as principais questespresentes, como tambm os interesses subjacentes juntamente com aspartes. Recomenda-se que no se faa o resumo logo aps apenas umadas partes ter se manifestado, pois, ao assim proceder, o conciliador poder dar a entender outra parte que est endossando o ponto de vistaapresentado. Esse resumo de suma importncia, uma vez que d umnorte ao processo de conciliao e, sobretudo, centraliza a discusso nosprincipais aspectos presentes. Para o conciliador, trata-se de uma efetivaorganizao do processo, pois se estabelece uma verso imparcial, neutrae prospectiva (i.e. voltada a solues) dos fatos identificando quais so asquestes a serem debatidas na conciliao e quais so os reais interesses enecessidades que as partes possuem. Para as partes, trata-se de um mecanismo que auxiliar a compreenso das questes envolvidas sem que hajaum tom judicatrio ao debate. Cabe registrar que por meio do resumo oconciliador dever apresentar uma verso que implicitamente demonstreque conflitos so naturais em quaisquer relaes humanas e que s partescabe a busca da melhor resoluo possvel diante do contexto existente.Esta demonstrao implcita de que conflitos so naturais e que as partesno devem se envergonhar por estarem em conflito. Esta ferramenta comumente denominada de normalizao32.Ademais, o resumo faz com que as partes percebam o modo eo interesse com que o conciliador tem focalizado a controvrsia, comotambm possibilita ao conciliador testar sua compreenso sobre o que foiindicado. Ao trazer ordem discusso, possvel, com ele, melhor visualizar os progressos at ento alcanados.O conciliador, no entanto, dever ter a cautela ao relatar s parteso resumo, uma vez que qualquer incoerncia ou exposio que no sejaneutra pode gerar a perda de percepo de imparcialidade que o conciliador comeou a adquirir com a declarao de abertura. Desse modo,recomenda-se que conciliadores anotem os principais aspectos que cadauma das partes expressou identificando questes, interesses, necessidades e sentimentos - e, ao relatar sumariamente tais aspectos, busquemapresentar organizadamente e de modo neutro e imparcial tais informaes s partes.32 E .g. BARUCH BUSH, Robert et al. The Promise of Mediation: Responding to Conflict Through Empowerment and Recognition. 2. ed. So Francisco: Editora Jossey-Bass, 2005.

54

Conselho Nacional de Justia

A tcnica de resumo, embora normalmente seja associada a essaetapa do processo, pode ser normalmente empregada em etapas posteriores. Por exemplo: i) aps uma troca de informaes relevantes; ii) aps aspartes terem implicitamente sugerido algumas possveis solues controvrsia; iii) para lembrar s partes seus reais interesses. De igual formaa tcnica de resumo pode ser utilizada para apaziguar os nimos na eventualidade de o conciliador ter se descuidado a ponto de permitir que acomunicao se desenvolva de forma improdutiva. Na fase de resoluo de questes a tcnica de resumopode servir tambm para ressaltar a apresentao de uma proposta implcita indicada por uma das partes. Note-se o usodesta tcnica no exemplo a seguir:Jorge: no pretendo pagar nada para o Tiago afinal eleno terminou de pintar as paredes da cozinhaConciliador: Jorge, posso interpretar que o que voc estdizendo no sentido de que pagar o Tiago se ele terminar de pintaras paredes da cozinha?.Como Empregar a Tcnica do ResumoUma vez analisadas as vantagens da tcnica de resumo, o passoseguinte entender como se deve fazer o emprego deste instrumento.Para introduzir um resumo, interessante apresentar, previamente, expresses, tais como: deixe-me ver se compreendi o que vocs disseram; se euentendi bem, vocs mencionaram que...; deixe-me sintetizar o que eu entendi detudo o que foi at dito at agora; em resumo....Ao apresent-lo, o conciliador deve ter sempre como pressuposto a necessidade de enfatizar apenas o que for essencial para os fins daconciliao. Seu trabalho, portanto, centra-se em filtrar as informaes etrabalh-las de modo a afastar todo aspecto que possa ser negativo para osucesso do processo, tal como a linguagem improdutiva e a agressividadena apresentao de uma questo. Dever focalizar as questes, interesses,necessidades e perspectivas.Aps apresentado o resumo, importante se certificar de que o resumo esteja de acordo com que as partes pensam e, caso no esteja, deve-

55

se dar a oportunidade para correes. Assim, basta perguntar: Vocs estode acordo com essa sntese dos fatos? H algo que queiram acrescentar?.Terminada a apresentao do resumo e feita a certificao quantoao seu contedo com as partes, o conciliador deve dar andamento conciliao de imediato, formulando, por exemplo, alguma pergunta, casoentenda que se pode passar para a prxima fase da conciliao com aspartes ainda reunidas ou, ento, explicar que se dar prosseguimento ssesses individuais.O Que Fazer em Seguida?A conciliao, aps terminada essa fase de reunio de informaes,pode se desenvolver de diversas formas. A doutrina em conciliao, combase na experincia prtica, trabalha com mecanismos distintos de desenvolver o processo. O que se propor, neste guia, um mecanismo quetem se demonstrado bastante eficiente, uma vez que adapta o processo situao em que se encontram as partes.Desse modo, o conciliador dever, com base nas questes apresentadas, nas necessidades, nos sentimentos e nos interesses manifestadosna fase de reunio de informaes, escolher dois caminhos possveis: seele verificar que as partes esto se comunicando eficazmente (esto demonstrando compreenso recproca, apresentando sugestes, quebrando impasses, etc), ele parte diretamente para a fase de esclarecimento dequestes, interesses e sentimentos que ser seguida pela fase de resoluode questes com as partes ainda reunidas mesa, uma vez que, ao assimproceder, h uma grande possibilidade das partes, por sua prpria vontade e manifestao, chegarem a um consenso.Se as partes no estiverem se comunicando de forma eficiente, jque verificado um alto grau de animosidade, interesses equivocadamentepercebidos (em teoria autocompositiva se denominam os interesses percebidos equivocadamente pelas partes de interesses aparentes), dificuldadede expresso de uma ou mais partes (e.g. algum se sente intimidado,ameaado ou apresenta dificuldade de se expressar) ou ainda h sentimentos que precisam ser propriamente discutidos para que uma partepossa ter uma percepo mais neutra do contexto em que se encontra, omelhor caminho seguir para a sesso individual, em que o conciliadorir debater todas as questes, interesses, necessidades e sentimentos comcada parte individualmente.56

Conselho Nacional de Justia

Nada impede, porm, que se continue em sesso conjunta ao iniciar a fase de esclarecimento de questes, interesses e sentimentos bemcomo se adentre a fase de resoluo de questes para, posteriormente, ehavendo necessidade, se seguir para sesso individual. Todavia, a experincia tem demonstrado que, ao assim conduzir a conciliao, corre-se orisco de despender tempo desnecessariamente.Desse modo, se as partes no se comunicam de forma eficiente, desaconselhvel continuar, em sesso conjunta, o processo de conciliaopois a animosidade pode, no caso de se permanecer em sesso conjunta,se acirrar ou mesmo desorganizar o processo, desarmonizando as realizaes at ento atingidas. Se estabelecidas sesses individuais em taiscasos, o conciliador, que estar em contato mais direto com a parte, podeconseguir auxilia-la a perceber os interesses reais os interesses mtuos edas questes apresentadas e, portanto, possibilitar o surgimento de propostas de acordo pela prpria parte. Por outro lado, se as partes esto secomunicando eficazmente, pode ser improdutiva a sesso individual oumesmo contraproducente por despender tempo desnecessariamente.A seguir, sero trabalhadas as questes, interesses e sentimentose a forma de anlise nas sesses individuais e conjuntas. Uma vez encerradas as sesses individuais, por exemplo, o passo a seguir a realizao de uma nova sesso conjunta, na qual se iniciar a fase de resoluode questes, em que as partes iro debater sobre os possveis acordos e,eventualmente, seguir para um debate sobre o resultado do processo deconciliao e confeco do termo de acordo.Vale relembrar a ressalva no incio deste captulo feita: o processode conciliao desenvolve-se, na verdade, de modo muito mais natural doque se pode aparentar ao analisar cada uma de suas etapas. A diviso daconciliao nas fases de: i) declarao de abertura; ii) exposio de razespelas partes; iii) identificao de questes, interesses e sentimentos; iv)esclarecimento acerca de questes, interesses e sentimentos; e v) resoluode questes, tem, unicamente, propsito didtico.

57

Identificando Questes, Interesses e Sentimentos

PropsitoA identificao de questes, interesses e sentimentos ocorre durante a maior parte do processo de conciliao. Todavia, durante a fase deexposio de razes pelas partes deve o conciliador registrar quais so osas questes controvertidas, quais os interesses reais das partes e quais sentimentos eventualmente devem ser debatidos (em eventuais e pontualmente recomendadas sesses individuais) para que a conciliao cheguea bom termo mesmo que no haja acordo. Com o resumo o conciliadorapresenta a forma com que identificou as questes, os interesses e os sentimentos. Naturalmente, as partes debatero o contedo desse resumo oque nada mais do que a fase seguinte esclarecimentos acerca das questes, interesses e sentimentos. Durante esse perodo, tanto os conciliadores como as partes iro discutir as informaes que ainda necessitam dealgum complemento e, ao mesmo tempo, conseguir melhor compreenderquais so as principais questes, necessidades e, tambm, possibilidades.Trata-se de uma fase em que as partes tero a oportunidade, portanto, para falar abertamente fazendo uso de linguagem apropriada - eexpressar seus sentimentos e crenas, como tambm fazer perguntas. Parao conciliador, uma fase rica na captao de novas informaes.O esclarecimento de interesses, questes e sentimentos uma etapa essencial e preliminar que auxiliar as partes a avanar no processode conciliao em direo a um eventual acordo, uma vez que, ao menostacitamente, as partes comeam a perceber as perspectivas e necessidadesda outra parte. Com base em tais constataes, as partes so capazes, portanto, de tentar solucionar questes particulares quando da elaboraodo acordo58

Conselho Nacional de Justia

Neste tpico, ser abordada a identificao e esclarecimento deinteresses, questes e sentimentos utilizando-se uma sesso conjunta, quedeve ser empregada quando as partes se comunicam eficazmente, comoanteriormente analisado.Expressando sentimentosEm todo o processo de conciliao, diversos sentimentos iro sermanifestados: ressentimento, dio, frustrao, inveja, cimes, medo, mgoa, amor, entre outros. Nesse caso, o conciliador deve identificar os sentimentos para que a parte sinta-se adequadamente ouvida e compreendida.Importante tambm ressaltar que sempre de grande utilidadevalidar sentimentos, indicando s partes que o conciliador identificou, emum tom normalizador, o sentimento gerado pelo conflito. Todavia, caberegistrar que a validao de sentimentos somente deve ocorrer em sesses conjuntas se as duas partes compartilharem o mesmo sentimento(e.g. imagino que ambos devem estar bastante aborrecidos e at frustrados com oesforo que fizeram para serem bem compreendidos e ainda ter ocorrido esta sriede falhas de comunicao). Em regra, a validao de sentimentos ocorreem sesses i