Maquiavel e Hobbes - Individuo

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    O lugar do indivduo em Maquiavel e Hobbes

    O italiano Maquiavel e o ingls Thomas Hobbes comumente surgem atrelados emvrias obras por um lao intelectual: a defesa da centralizao poltica, da monarquiaabsoluta, em ltima instancia. No entanto, diferenas de poca, local, vivncias, formaofilosfica acabam por revelar pensamentos tambm dspares. Os dois autores celebram apaz, a ordem, a segurana, o entusiasmo da obedincia. Mas trilham diferentes caminhosargumentativos. Assim, aponta-se introdutoriamente para os objetivos desse estudo: fazeruma anlise que contraste a obra maquiaveliana e hobbesiana usando como parmetros anoo de indivduo, o uso operacional do conceito de razo de estado, bem como o cenrioe as circunstncias de suas angstias e reflexes.

    Pudssemos ns, vestidos como convinha Maquiavel penetrar no mundo dosantigos ou de posse do mecanicismo hobbiano penetrar a solido de sua torre de marfim,teramos muito mais a dizer sobre esses dois autores fundadores da cincia polticamoderna, geniais inventores de vrios paradigmas do estado moderno e at mesmodemocrticos. No entanto, a paixo, o brilho e o distinto envolvimento desses doisestudiosos despertam, ainda hoje, desejos, apetites e averses. Aqui um sopro de luz

    que no trouxe mais claridade, se no a esse que escreve, marcado pelo desejo doconhecimento, pelo apetite da gr-loucura que a razo e paixo arrebatadora pela gnesedo homem/mundo modernos.

    Maquiavel (1469 1527) nascido em Florena na pennsula itlica conheceu osparticularismos daquela rea, as lutas fratricidas entre suas cidades-estados e os ataquesconstantes das poderosas monarquias centralizadas Frana e Espanha. O fracionamentointerno, os ataques externos, as lutas constantes foram para Maquiavel a ambincia polticacruel que, no entanto, despertavam sua ateno e seu desejo mais profundo acentralizao da pennsula. A vida poltica cedo o trouxe a arena de discusses e reflexes secretrio do governo Savonarolla (1494-1498), desempenhou funes pblicas tambm nogoverno de Piro Soderini (1502-1512). Nesse tempo conheceu regies da Europa (Frana,Sua...) e chegou a trabalhar como embaixador. A volta do aristocrtico governo dosMdicis em 1512 provocou sua queda e seu exlio em San Casciano. Solido, estudo dos

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    antigos, a atrao pela arte do governo, a escrita de vrias obras, tais como: Sobre a arteda guerra, Discursos sobre a primeira dcada de Tito Lvio e O Prncipe. Em umacarta a seu amigo Vettori, embaixador de Florena em Roma, confessa:Definho nestasolido, e no posso continuar assim por muito tempo sem cair na misria e no desprezo.

    Desejaria, pois, que os senhores Mdicis consentissem em empregar-me, nem que fosse

    para mover um rochedo. Durante os quinze anos em que tive ocasio de estudar a arte do

    governo, no passei meu tempo dormindo ou me divertindo... (As grandes obras polticas,p.23). Compreende-se pois, a dedicatria de O Prncipea Loureno de Mdicis, duque deUrbino, sobrinho de Leo X. Homem arguto, esprito genial de seu tempo a Renascena(sculos XIII, XIV, XV) tambm acometeu Maquiavel em outro campo artstico apoltica, a guerra, o estado. Inaugurava uma cincia do estado, independente de

    consideraes morais. Rompendo com a tradio medieval que partia da verdade reveladapara deduzir o real, Maquiavel propunha um mtodo que cortava com as explicaestranscendentais e ticas dos fenmenos polticos. Pensava os homens e o poltico comorealidades naturais e portanto, sujeitas a explicaes naturais. A viso maquiavelianaatrelada aos postulados do renascimento associa realidade experimentao, razo induo, mtodo observao, objetivo compreenso e poltica a amoralismo dos meios.Misto de realismo, empirismo e utilitarismo, a obra maquiaveliana faz o elogio davirilidade, da astcia, da fora e do valor individual renovado de um homem a estticarenascentista pupula em palavras, mtricas, prazeres, desejos e formas. O secretrioflorentino, o homem poltico, o autor renascentista, a escrita realista, o aficcionado pelahistria, o delator da fortuna, o revelador da virt o autor que aponta o nascimento doum, do indivduo to intrnseco aos nossos dias tudo remete, nos aproxima e distanciade Maquiavel. Na mesma carta Vetori, confessa:

    Deponho entrada as roupas enlameadas de todo dia, visto-me

    como para apresentar-me nas cortes e perante os reis... Vestido como

    convm, penetro nas cortes antigas dos homens de outrora, que me recebem

    com amizade; a seu lado encontro o nico alimento que me prprio e para

    o qual nasci. Sem falso pudor, ouso conversar com eles e perguntar-lhes as

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    causas de suas aes; e to grande a sua humanidade que me

    respondem... (As grandes obras polticas, p.23)

    Thomas Hobbes (1580 1679) viveu predominantemente no sculo XII, marcadopelas dissenses religiosas, queda dos monarcas absolutos ( os Stuarts, no caso ingls),crise econmica e ao mesmo tempo a contemporaneidade das obras de Descartes, Newton,Kepler e Bacon, ou seja, o impacto da revoluo cientfica e seus paradigmas racionalismo, empirismo e mecanicismo.

    Fugiu da Inglaterra em 1640 temendo a guerra civil que acabou por interromper,derrubar a monarquia de Carlos I e instaurar o protetorado puritano de Cromwell (1649-1658). Exilado na Frana, escreve De civeem 1642 e O Leviat em 1651. O prprio

    Hobbes admitia que o temor e eu somos irmos gmeos confisso de amor paz,tranqilidade, ordem e de horror s discusses polticas e religiosas que tanto ecoavam naInglaterra, encontrando espao nas universidades e produzindo no s o sectarismopuritano, mas o surgimento de dezenas de seitas: levelers, diggers, ranters...Assim, define-se o esprito letrado de Hobbes: atemorizado, solitrio, distante da vidapblica e da prpria universidade, ainda que seus estudos sobre o mecanicismo, ageometria, o empirismo, o racionalismo e o materialismo fossem profundos. O filsofo, oestudioso do movimento, o contratualista, o solitrio homem da torre de marfim, oatemorizado pela morte, o amante da paz, da ordem, da razo, do clculo, doarquindividualismo, do estado... To prximo e to distante de Maquiavel, revelava-se. Jna introduo de O Leviat detecta-se sua viso de mundo:

    ... a arte do homem pode fazer um animal artificial... Mais ainda, a

    arte pode imitar o homem, obra-prima racional da natureza. Pois

    justamente uma obra de arte esse grande Leviat que se denomina coisa

    pblica ou Estado (commonwealth), em latim civitas, o qual no mais do

    que um homem artificial, embora de estatura muito mais elevada e de fora

    muito maior que a do homem natural, para cuja proteo e defesa foi

    inventado...(O Leviat, p.5)

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    Tanto Maquiavel quanto Hobbes so arquiindividualistas, o que alis era umproduto da poca moderna em formao. O individualismo crescente , afinal de contas, umtrao caracterstico dos sculos XVI e XVII. Os dois preocupavam-se com a independnciado homem, com o isolamento de seu semelhante e em consequ6encia disto, a obra deHobbes chega a suscitar a questo da origem da sociedade poltica. Mas nesse tempo deescrita faz-se necessrio esclarecer que a maneira e o local onde vem e inserem a noo deindividualismo desigual. Maquiavel imaginava uma espcie de heri individual, umhomem excepcional dotado de virt, astcia, fora, carcereiro da fortuna, e desta forma,criador do Estado. O indivduo de Maquiavel era o grande lder, um homem singular capazde infundir sua virtude em todos os outros, quando quisesse construir ou remodelar umaordem poltica. O indivduo , em ltima instancia, o fundador do estado, uma

    personalidade fora do comum dotada de um saber superior que lhe faculta os meiosextraordinrios para a organizao do reino ou da repblica. Existe pois, o indivduo e amassa amorfa. J Hobbes, entendia que os homens eram naturalmente iguais. Em suaspalavras:

    Por mais que seja mais forte que o outro, ou mais forte de esprito,

    olhando o homem como um todo, as diferenas so muito pequenas. Desse

    modo, se um indivduo capaz de matar com fora, por ser forte de corpo, o

    outro pode matar o mais forte atravs da maquinao ou aliana com os

    outros que sofrem o mesmo mal. H uma igualdade de ao possvel. Os

    homens no obtm prazer nessa relao de igualdade.(O Leviat, p.14)

    Para resolver essa contradio lgica, segundo Hobbes, no era necessrio ser bomou corajoso, bastava um pouco de engenhosidade, de inteligncia. partindo da premissade que o medo da morte tambm igual para todos, que a razo humana constata o absurdo

    da guerra e busca da paz. A razo de todos para inventar e produzir efeitos- omecanismo hobbiano. O estado obra pois, de todos os indivduos e no de um como emMaquiavel. O indivduo de Hobbes autor dos atos do soberano porque o ltimo representante. O homem um ser de artifcio e inveno. O indivduo e sua vontade so o

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    fundamento da legitimidade poltica. esse individualismo que est na origem de seuabsolutismo, pois:

    Hobbes nos sensibiliza para o fato de que, se preciso haver algo

    como um indivduo, ou seja, um ser cuja vontade s pertence realmente, de

    fato e de direito,a ele mesmo essa vontade s pode encontrar uma regra fora

    dela prpria, numa outra vontade; base do poder soberano. (Histria

    intelectual do liberalismo, p.54)

    Com esse argumento individualista Hobbes estruturou o argumento central de OLeviat produto da arte, do artifcio humano que soube unir, reduzir a uma s pessoa

    uma multido de indivduos, todos eles representados no frontispcio de sua obra.Em suma, pode-se dizer que enquanto Maquiavel mostrava-se pessimista em certo

    sentido em referncia ao homem, mas otimista quanto ao excepcional, Hobbes semprepessimista e seu pessimismo se estende a todos os seres individualizados.

    Esse tom pessimista em relao aos homens tanto h em Maquiavel quanto emHobbes. exatamente essa discusso a respeito da natureza humana am Maquiavel e doestado de natureza em Hobbes que acaba por explicar o individuo dotado de virt,isolado da massa amorfa para o primeiro e a prpria noo do contratualismo que h nosegundo. Em toda sua obra, Maquiavel afirmava que os homens so sempre os mesmos,que a natureza humana imutvel, ou seja, os homens so maus. Desta forma,a scircunstncias histricas tem por trs de si um quadro inalterado: a natureza humana m,egosta, cobia, voraz e competitiva. Ao tentar compreender o que torna possvel adominao, Maquiavel aponta para a virt de um homem (o saber atuar de acordo com anecessidade) que age atravs da vontade fora, chicoteia a sorte (fortuna) e estdissociada da massa amorfa. a ao do um o prncipe que tem a fora e a astcia

    como as chaves da vitria e a mentira e o assassinato como regras do jogo, impondo assima ordem num mundo de criaturas ms, invejosas e dissimuladas.

    Hobbes em O Leviat, apresenta uma forma muito particular de ver o estado denatureza. Os homens eram para ele naturalmente iguais nesse estado,a guerra de todoscontra todos. No havia um poder que mantivesse o respeito. No h indstria porque seu

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    fruto incerto, no h navegao nem uso de mercadorias importadas, o cultivo da terra precrio, no h arte nem letras, muito menos construes. Existe a incerteza do estadonatural. Com isso no h sociedade. Assim, a passagem do estado de natureza, visto comoum estado de guerra, se d a partir de um pacto recproco de todos os homens com todos oshomens, instaurando um poder comum. H necessidade de estabelecer um poder comumporque o acordo entre a multido impossvel e aponta-se ainda para a idia de que estepoder no pode ser transitrio, pois as mudanas contnuas geram instabilidade. Arealizao desse pacto resulta na instituio de um estado (transformao da multido emcorpo poltico). Assim no h em hobbes o entendimento desse pacto como sendoabsolutista, j que vem do consentimento de todos. Uma vez estabelecida esta transfernciapor parte de cada indivduo do seu direito total pessoa nica, d-se a irrevogabilidade.

    Esse terceiro elemento s pode ser destitudo quando no mais consegue oferecerproteo e a os indivduos procuraro outro protetor. Assim Hobbes fundou nestecontrato uma soberania absoluta e indivisvel.

    Mas dentro de modelos to severos, qual o lugar da liberdade individual? ParaMaquiavel ela existe e se faz necessria na pessoa do prncipe, que usando de sua astcia,virt e sabedoria no se prende a valores ticos e morais para o cumprimento de seudever sublime a manuteno da ordem. O exerccio de sua liberdade, a adoo demtodos rgidos de governo, a eficaz utilizao do medo pelo prncipe, a arte de governarpela fora e sabedoria so requisitos bsicos para um bom governo, para o exerccio doindividualismo. J em Hobbes, em funo de sua concepo bem mais plural sobreindivduo, o exerccio dessa liberdade registra-se de forma mais ampla e diferenciada.Existe a possibilidade de revogar o pacto, quando o soberano garantir a vida, a paz e, porextenso, no reduzir o medo condio bsica a partir da qual o estado foi criado.Ressalta-se ainda a possibilidade da ao individual no silncio da lei, quando o soberanono prescreveu nenhuma norma. evidente que se trata neste ltimo caso de uma liberdade

    varivel, conforme tenha parecido mais proveitoso ao soberano. Por exemplo: A liberdadede comprar, vender e concluir entre si outras espcies de contratos, de escolher suaresidncia, seu alimento, sua profisso, de educar seus filhos como melhor lhe parea ecoisas semelhantes.(O Leviat, P.79). Aponta-se ainda para o fato de que o gigantecoroado (O Leviat) no tem como penetrar no indivduo interno; s governando os atos

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    exteriores dos homens. Os coraes, o pensamento e a crena escapam ao controle doestado. Os apetites particulares, promove seu clculo de dor e prazer e isto est fora docontrole do bomgoverno. A paz, bem supremo, nasce do conformismo exterior.

    Tanto para Maquiavel quanto para Hobbes havia uma forte justificao objetivapara ao fato de que a criao de uma eficaz autoridade seria condio indispensvel paraque o estado pudesse instituir a ordem e a paz dada a natureza humana em Maquiavel e aconcepo do estado de natureza em Hobbes. Assim, os dois autores acabam por instituir anoo de razo de estado. Esta tradio pressupes que a segurana do estado umaexigncia de tal import6ancia que os governantes podem agir de forma severa e utilizarmtodos que considerarem imperativos. Por outras palavras, a razo de estado aexigncia de segurana do estado que impe aos governantes determinados mtodos de

    atuar. (Dicionrio de poltica, p.1066)Assim, os tericos da razo de estado defendem a necessidade do monoplio da

    fora por parte do Estado, fundamentando seu argumento numa viso realista edesencantada da natureza humana, ou seja, na convico de que sem uma autoridade centralcapaz de impor a ordem, a sociedade cair inevitavelmente numa anarquia, inibindo apossibilidade do progresso moral, econmico e civil. Mas deixemos a forma, acontundncia e a sonoridade da escrita de Maquiavel e Hobbes, melhor traduzirem:

    Bendita crueldade, se mata em germe as desordens, plenas de

    assassinatos e pilhagens, que uma piedade excessiva provocaria! Proteger

    primeiro a sociedade, eis onde reside a verdadeira clemncia do estado.

    Tudo que se considera o resultado. Pense o prncipe em conservar sua

    vida e seu estado; se o conseguir, todos os meios que tiver empregado sero

    julgados dignos e louvados por todo o mundo; o vulgar sempre seduzido

    pelo xito; e no o vulgar que faz todo mundo?(O Prncipe, p.97)

    ... Evitar as rotas obscuras da sedio, buscar o grande caminho da

    paz - assegurada pela submisso autoridade. A autoridade o que se

    preserva.(O Leviat, p.131)

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    Talvez a melhor encarnao do iderio da razo de estado no mundo modernoeuropeu tenha sido o cardeal Jean Richelieu, ministro de Luis XIII entre 1610 e 1641, poisreprimiu toda desobedincia ao rei, buscando a salud pblica contra os interessesparticulares. Em seu discurso datado de 1624, afirmara:

    Eu prometo a vossa majestade de empregar todo meu esforo e

    toda autoridade para arruinar o partido huguenote, rebaixar o orgulho dos

    grandes, reduzir todos seus sditos a seus deveres e elevar seu nome junto

    s naes estrangeiras ao ponto onde ele deveria estar. Imediatamente

    quando aprouver a vossa majestade me dar lugar na conduo de seus

    negcios, eu me propus a no esquecer nenhuma coisa que pudesse

    depender de minha indstria para facilitar os grandes desgnos que eletinha, to teis a este estado quanto glorioso a sua pessoa .(Oeuvres ducardinal de Richelieu, em LOPES, Marcos Antnio. A imagem da realeza,p.27).

    Mas, afinal, o que faz das obras de Maquiavel e Hobbes elos to fortes nacompreenso deste mundo que se pretende ps-moderno? No h dvidas de que aresposta, por tudo que j foi apresentado, seria longa: autoridade, razo de estado,segurana pblica, relao igreja-estado... Mas um aspecto aqui ser recolocado com maiornfase a questo do indivduo. certo que a histria do termo individualismo relativamente simples. Tocqueville foi um dos primeiros a utilizar este vocbulo, que apresentado como um neologismo no segundo captulo de A democracia na Amrica.Para Tocqueville, ele significa a renncia dos interesses pblicos em favor da esferaprivada. Trata-se da substituio da comunidade nica pela infinitude de clulasautnomas, uma conseqncia do esprito igualitrio que reina na democracia. O horizonte

    do individualismo, portanto, a solido. Mas o termo adquiriu tambm um sentido maisamplo, segundo o qual ele descreve a ideologia de uma sociedade que toma o indivduocomo seu valor primeiro. Neste sentido mais amplo e mais positivo o individualismo temsido a tnica dominante da moderna sociedade ocidental desde o renascimento. nessaltima concepo que nos deparamos com Hobbes e Maquiavel. Certo que entre o

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    indivduo excepcional de Maquiavel o prncipe e os indivduos hobbianos que emdesordem e guerra, criaram o gigante coroado o Leviat h diferenas.Independentemente do lugar reservado a este o indivduo criava-se ali uma marcaindelvel de nossos tempos: o um, o particular, o tomo social; ainda que hoje muito maisprximo da solido e do egosmo, j apontados por Tocqueville.

    Seus espritos fundadores do individualismo foram vitais at mesmo para afundao dos maiores mitos do individualismo moderno europeu. Afinal, o DoctorFaustus (1592) de Marlowe no um homem que aspira ao conhecimento absoluto a fimde obter o poder absoluto e indiferente aos meios, promove o pacto com Metistfeles? Quedizer do Dom Quixotede Cervantes (1615) que repudia o mundo e confunde desejo comrealidade, paixes e apetites? Como compreender Dom Juan Tenrio(1616), personagem

    da obra de Tirso de Molina que deseja seduzir mulheres e empregar quaisquer meios? E,por fim, no Robinson Cruso(1719) de Defoe uma celebrao da autonomia, dacapacidade racional de superar adversidades? Todos tornaram-se personagens edificantes,atraentes, sedutores. Todos celebram o indivduo, percebido como sujeito de direito epossuidor de um valor irredutvel. Maquiavel e Hobbes forneceram a base, a literaturamoderna deu o tom.

    E quanto a ns, ps-modernos? Vivenciamos num misto de solido e egosmo,amparados na expresso liberdade. Chamamos de ideologia o que h muito se fixou comocomportamento, como mentalidade; legitimamos como atributo da democracia, exercciosalutar da diferena. Exteriorizamos as arestas desse sto aparentemente ventilado,disfaramos a difcil trajetria que nos atrela ao poro do egosmo. Maquiavel e Hobbesapontam, celebram e explicitam. Nesse sentido, resgata-se o j colocado: to distantes e toprximos deles hoje estamos... Talvez j estejamos devidamente trajados econfortavelmente instalados em outra espcie de torre de marfim.

    BIBLIOGRAFIA

    01 BOBBIO, Norberto. Dicionrio de poltica. 2v. 9ed. DF, NUB, 1991. 1318p.

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    02 CHATLET, F. Histria das idias polticas. 1ed. RJ, Zahar, 1980. 158p.

    03 CHEVALIER, J. As grandes obras polticas de Maquiavel a nossos dias. 8ed. RJ, Agir1993. 342p.

    04 HOBBES, Thomas. Leviat ou matria, forma e poder de um estado eclesistico ecivil. 2ed .SP, Abril Cultural, 1979. 419 p.

    05 LOPES, Marcos Antonio. A imagem da realeza. 1ed. SP, tica, 1994. 88p.

    06 MACHIAVELLI, N. O prncipe. 31ed. RJ, Ediouro, 1999. 164p.

    07 MANENT, Pierre. Histria intelectual do liberalismo. 1ed. RJ, Imago, 1990.178p.

    08 WEFFORT, Francisco (org.). Os clssicos da poltica. 1ed. SP, tica, 1991.232p.