Mário de Andrade -- O Movimento Modernista

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o MOVUIENTO MODERNIST A Manifestado especialmente pela arte, mas manchando tambem com violeneia os costumes sociais e politicos, 0 movi- mento modernista foi 0 prenuneiador, 0 pre para dor e por mui- tal partes 0 criador de um estado de espirito nacional. A transforma~1o do mundo com 0 enfraquecimento gradativo dos grande s i mpsrio s, c om a pra ti ea europeia de novos ideais po- liticos, a rapidez dos transportes emil e uma outras causas i nt er naci onai s, bem como 0 desenvolvimento da eoncieneie a me rica na e brasi lei ra, os progresses internos da tecnica e da educa~ao, impunham a cria~ao de um espirito novo e exigiam a reverificac;1oe mesmo a remodelaeao da Inteligeneia nacional. Isto foi 0 movimento modernista, de que a Semana de Arte Moderna ficou sendo 0 brado coletivo principal. Ha um me- r it o inegavel nisto, embora aqueles primeiros modemistas ... 'das cavernas, que nos reunimos em torno da pintora Anita Malfatti e do escultor Vitor Brecheret, tenhamos como que apenas servido de altifalantes de uma for~a universal e naeio- nal muito mais complexa que n6s. Fo~& fatal, que viria mesmo. Ja um critico de senso-eomum afirmou que tudo quanta fez 0 movimento modernista, far-se-ia da mesma forma sem 0 movi men to. Nao eonheeo la pal issada ma is graciosa. Porque tudo isso que se faria, mesmo sem 0 movimento moder- ni sta, seria pur a e si mpl esme nte . .. 0 movimentomodernista. Faz em vi nte a nos que re al izo u-se , n o Te atro Mu nici pal de S10 Paulo; a Semana de Arte Moderna. E todo um passado ~avel, que n10 ficou nada feio, mas que me assombra um pon eo .t ambem. Como ti ve cora gem para part ici par daqu ela bat al ha! E certo que com minhas experi~ncias artisticas muito que venho escandaliJlando a intelectuaiidade do meu pais, po- rem, expostas em livros e artigos, como que essas experieneias n10 se realizam "' ateima nobt1e. Niio estou de corpo presente, e isto abranda 0 choque da estupidez. M8Bcomo tive coragem

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o MOVUIENTO MODERNIST A

Manifestado especialmente pela arte, mas manchando

tambem com violeneia os costumes sociais e politicos, 0 movi-

mento modernista foi 0 prenuneiador, 0 preparador e por mui-

tal partes 0 criador de um estado de espirito nacional. A

transforma~1o do mundo com 0 enfraquecimento gradativo dos

grandes impsrios, com a pratiea europeia de novos ideais po-

liticos, a rapidez dos transportes emil e uma outras causas

internacionais, bem como 0 desenvolvimento da eoncieneie

americana e brasileira, os progresses internos da tecnica e da

educa~ao, impunham a cria~ao de um espirito novo e exigiam

a reverificac;1oemesmoa remodelaeao da Inteligeneia nacional.

Isto foi 0 movimento modernista, de que a Semana de Arte

Moderna ficou sendo 0 brado coletivo principal. Ha um me-

rito inegavel nisto, embora aqueles primeiros modemistas ...'das cavernas, que nos reunimos em torno da pintora Anita

Malfatti e do escultor Vitor Brecheret, tenhamos como que

apenas servido de altifalantes de uma for~a universal e naeio-

nal muito mais complexa que n6s. Fo~& fatal, que viria

mesmo. Ja um critico de senso-eomum afirmou que tudo

quanta fez 0 movimento modernista, far-se-ia da mesma forma

sem 0 movimento. Nao eonheeo lapalissada mais graciosa.Porque tudo isso que se faria, mesmo sem 0movimento moder-

nista, seria pura e simplesmente. .. 0 movimento modernista.

Fazem vinte anos que realizou-se, no Teatro Municipal

de S10 Paulo; a Semana de Arte Moderna. E todo um passado

~avel, que n10 ficou nada feio, mas que me assombra um

poneo .tambem. Como tive coragem para participar daquela

batalha! E certo que comminhas experi~ncias artisticas muito

que venho escandaliJlando a intelectuaiidade do meu pais, po-

rem, expostas em livros e artigos, comoque essas experieneias

n10 se realizam "' ateima nobt1e. Niio estou de corpo presente,

e isto abranda 0 choque da estupidez. M8Bcomo tive coragem

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232 M.iRIO DE ANDRADE

pra dizer versos diante duma vaia tao bulhenta que en nio

escutava no palco 0 que Paulo Prado me gritava da prirneira

fila das poltronas'... Como"pude fazer uma eonfereneia

sobre artes pIasticas, na escadaria do Teatro, cercado de ano·

nimos que me caeoavame ofendiam a valer! ...

o meu merito de participante e merito alheio : fui encora-jado, fui eneeguecido pelo entusiasmo dos outros. Apesar da

eonfianea absolutamente firme que eu tinha na estetiea reno-

vadora, maia que eonfianea, fe verdadeira, eu nao teria for«;atI

nem IlSicas nein morais para arrostar aquela tempestade de

achincalhes. E si aguentei 0 tranco, foi porque estava deli-

rando. 0 entusiasmo dos outros me embebedava, nio 0 meu.

Por mim, teria cedido. Digo que teria cedido, mas apenas

nessa apresen~io espetaeular que foi a Semana de Arte Mo-dema. Com ou aem eIa, minha vida intelectual seria 0 que

tem llido.

A Semana marca umadata, isso e inegavel. Mas 0 certo

e que a pre-eoneieneia primeiro, e em seguida a convic~io de

uma arte nOTa,de um espfrito novo, desde pelomenos seis anosviera se definindo no... sentimento de um grupinho de inte-

lectuais paulistas, De primeiro foi um fenomeno estritamente

sentimental, uma intui~o divinatoria, um. •. estado de poesia.

Com efeito: edueados na plistica "historica", sabeudo quando

muito da existencia dos impressionistas principals, ignorando

Cezanne, 0 que nos levou a aderir incondicionalmente a expo-si~ de Anita Malfatti, que em plena guerra vinha nos mos-

trar quadros expressionistas e cubistas' Pareee absurdo, IIl88

aqueles quadros foram. a revela~ .. E ilhados.na enehente de

escindalo que tomara a cidade, n6a,tre. ou quatro, deliravamosde btase diante de quadros que se chamavam 0 "Homem Ama-

relo"; a "Estudan.ta RWI8&",a "Mulher de CabelOliVerdes".

E a esse mesmo "HomemAmarelo" de formas tio ineditas

entio, en dedicava urn soneto de forma pamasianissima ...

Eramos assim.

Pouco depoie Menotti del Pieehia e Osvaldo de AndraM

descobriam 0 escultor Vitor Brecheret, que modorrava em Sio

Paulo numa especie de exllio, um quarto que Thetinham dado

gratis, no Palacio das Ind6strias, pra goardar os seus ealun-

gas. Brecheret nio provinha da Aleman.ha, como Anita Mal-

fatti, vinha de ROma. M as tambem importava eseurezas me-nos latinas, pois fora aluno do celebre Maestrovic. E fazia-

mos verdadeiras reveries a galope em frente da simb6lica exas-

ASPECTOS DA LITERA'ITR_\ BRASILEIRA 233

perada e estiliza«;oesdecorativas do "genio". Porque Vit~r

Brecheret, para nos, era no minimo um genio. ~ste 0 mini-

mo com que podiamos nos contentar, tais os entuslasm?,'Ja que

ele nos saeudia, E Brecheret ia ser em breve o gatilho que

faria "Paulieeia Desvairada" estourar ...

Eu passara esseano de 1920 sem fazer poesiamais, .Ti~acadernos e eadernos de eoisss parnasianas e algumas timida-

mente simbolistas mas tudo aeabara por me desagradar. Na, .minha leitura desarvorada, ja conhecia ate alguns futurlstas

de ultima hora, mas s O entao descobrira Verhaeren. E fora

o deslumbramento. Levado em principal pelas "Villes 'I'enta-

eulaires" concebi imediatamente fazer urn livre de poesias

"modernas", em verso-livre, sobre a minha eidade. Tentei,

nao veio nada que me interessasse. Tentei mais, e nada, O smeses passavam numa angfistia, numa insufieiencia feroz. Se-

ra que a poesia tinha se acabado em mimt ,.. E eu me aeor-

dava inso-frido.. A isso se ajuntavam dificuldades morais e vitais de varia

espeeie, foi ano de sofrimento muito. Ja ganhava pra viver

folgado, mas na furia de saber as coisas que me toma:a, 0

ganho fugia emlivros e eu me estrepava em cambalax~sfl~an-

ceiros terriveis. Em familia, o clima era torvo. Si Mae e

irmios nio se amolavam com as minhas "loucuras", o resto da

familia me retalhava sem piedade. E com eerto prazer ate:

esse doce prazer familiar de tel' num sobrinho ou nnm p~mo,

11m"perdido" que nos valoriza virtuosamente. En tinha

discussoes brutais, em que os desaforos nnituos nao raro che-

gavam aquele ponto de arrebentaeiio que. .. porque sera que a

arte os provoca! A briga era braba, e si nao me abatia nada,me deixava em 6dio, mesmo 6dio.

Foi quando Brecheret me concedeu passar em bronze um

gessodele que eu gostava, uma "Cabe!;a de Crist,o", ~as co~

que roupa! eu devia os olhos da eara l Andava as .vezesa-pe

pOl' nao ter duzentos reis pra bonde, no mes.modia eI? q~egastara seiscentos mil reis em livros. .. 'E seiseentos ml~reJa

era dinheiro entao. Nao hesitei : fiz mais conehavos finan-

ceiros com 0 mano, e afinal pude desembrulhar em easa a mi-

nha "Cabeca de Cristo", sensualissimamente feliz. Isso a no-

ticia eorreu num atimo, e a parentada que morava pegado,

invadiu a easa pra ver. E pra brigar. Berravam, herravam..Aquilo era ate peeado mortal l estrilava a senhora minha tia

willa, matriarea da familia. Onde se viu Cristo de traneinha ~

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!3 4 ]I .A . . I! 0 DE .A 'N DB .A D!l

era feio! medonho! Karia Luisa, V0880 filho ~ UJIl "perdido"mesmo.

Fiquei alucinado, palavra de honra, Kinha vontade erabater. Jantei por dentro, num estado inimaginAvel de eet~-lho. Depois subi para 0 meu quarto, era noitinha, na inten~ode me arranjar, sair, espairecer um boeado, botar uma bom-ba no centro do mundo. Ke lembro que eheguei A saeada,olhando sem ver 0 meu largo. Ruidos, lnses, falas abertas su-bindo d08 chof~res de aluguel, Eu estava aparentemente cal-mo, como que indeatinado. Nio sei 0 que me den. Fui atea escrivaninha, abri um eaderno, eserevi 0 titulo ' em que jamaispeDlar. , "Paulie6ia Desvairada". 0 estouro ehegara &final,depois de quase ano de a n g U st ia s. interrogativaa. Entre des-goatos, trabalhOi urgentel, dlvidu, brigas, em ponee mais -deuma semana Mtava jopdo no papel urn ea.nto bUbaro, duasvezes maior talvez do que _ que 0 trabalho de arte deu numlivro (1).

Quem teve a id~ia da Semana de Art. Kodema' Pormim nio sei quem foi, nnnea snbe, s6 p<)I"MIgarantir que niofui eu. 0 movimento, se alaatrando &O S pouees, ja' Ietornarauma es.pi'Ciede escindalo publico permanente. Ja tfnhamOfllido nossos versos no Rio de Janeiro; e numa leitura principal,em easa de Ronald de Carvalho, onde tambem estavam RibeiroCouto e Renato Almeida, numa atmosfera de simpatia, "Pauli-c~ia Desvairada" obtinha 0 consentimento de Kanuel Bandeira,que em 1919 ensaiara os ReUS primeiros versos-livres, no "Car-naval". E eis que Gra~a Aranha, celebre, trazendo da Euro-pa a IU& "Eltetiea da Vida", vai a Sio Paulo, e prooura nos

conhecer e agrupar em torno d. Bua filosofia. N68 noa riamos

um boeado da "Estetiea da Vida" que ainda ataeava eertosmodernos europeus da nO!ll&admira~io, mas aderimOi frane&-mente ao Mestre. E alguem ~ou a ideia de se fuer uma

semana de arte modems, com exposi~io de artes pl8.stieas, con-

(1) Depois ell .i.tematizaria _ t e preceMOde sep~o Dftida entre

o estado de poesia e 0 estado de ute, _ Da com~io do a meus

poemas mais "dirigido8". A. lend.. Dacioaail, por exemplo, 0 abruileira-mento linguistico de combate. Escolhldo am . tema. por meio das escitac;oes

psiquicas e fisio16gicassabidas, prepuar e esperar • chepda d o estado depoesia. Si &te chega (quantu vezes Dunea ehecou ..• ), _er &em

coaC;iode especie alguma tudo 0 que me chep ate a mio - • ".ineeridade"

do individuo. E sO em &eguida,na calma, 0 tr.balho peDOIIO e lento d.

.u te - a "sinceridade" da obra-de-ute, coletiva e fllDCional, mil

v _mais

importante que 0 individuo.

ASPECTOS DA LITERATURA BRASILElRA 235

eertos, leituras de livros e eonfereneias explicativas. Foi 0proprio Gra~a Aranha' foi Di Cavaleanti !.: Porem 0 queimporta era poder realizar essa ideia, alem de audaeiosa, dis-pendiosfssims. E 0 fautor verdadeiro da Semana de ArteModerna foi Paulo Prado. E s O mesmo uma figura como elee uma eidade grande mas provineiana como Sao Paulo, pode-riam fazer 0 movimento modernista e objetiva-lo na Semana.

Houve tempo em que se euidou de transplantar para 0

Rio as raises do movimento, devido as manifestacoes impres-sionistas e principalmente post-simbolistas que existiam entiiona capital da Republica. ExiBtiam, e inegavel, principal-mente nos que mais tarde, sempre mais euidadosos de equili-brio e espirito eonstrutivo, forma ram 0 grupo da revista"Festa". Em Sao Paulo, esse ambiente estetico so fermen-tava em Guilherme de Almeida e num Di Cavalcanti pastelis-ta, "menestrel dos tons velados" como 0 apelidei numa dedi-eatoria esdrUxula. Mas eu creio ser urn engano esse evolucio-nismo a todo transe, que lembra nomes de urn Nestor Vitor ouAdelino Magalhaes, como elos precursos. Entao seria maislogico evocar Manuel Bandeira, com 0 seu "Carnaval". Massi souberamos deste por um aeaso de livraria e 0 admiravamos,dos outros, nos, na provincia, ignoravamos at~ os nomes, por-que os interesses imperialistas da Corte nao eram nos mandar"humilhados ou luminosos", mas a grande camelote aeademica,

sorriso da soeiedade, titil de provineiano gostar.Nao, 0 modernismo, no Brasil, foi uma ruptura, foi urn

abandono de principios e de tecnieas consequentes, foi uma re-

volta contra 0 que era a Inteligeneia nacional. E muito maisexato imaginar que 0 estado de guerra da Europa tivesse pre-

parado em nos um espirrto de guerra, eminentemente destrui-dor. E as modas que revestiram este espirito foram, de inieio,diretamente importadas da Europa. Quanto a dizer que era-mos, os de Sao Paulo, uns antinacionalistas, UIlS antitradieio-nalistas europeizados, creio ser falta de subtileza eritiea, Eesquecer todo 0 movimento regionalista aberto justamente emSao Paulo e imediatamente antes, pela "Revista do Brasil"; e~uecer todo 0 movimento editorial de Monteiro Lobato; eesquecer a arquitetura e ate 0 urbanismo (Dubugras) neo-colonial, naseidos em Sao Paulo. Desta etica estavamos im-pregnados. Menotti del Picchia nos dera 0 "Juca Mulato",estudavamos a arte tradicional brasileira e sohre ela eserevia-

mos; e eanta regionalmente a cidade materna 0 primeiro livro

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'236 KAllIO DE ANDRA.DE

do movimento. :Mas 0 espirito modernista e as IUU modesforam diretamente importados da Europa.

Ora Sao Paulo estava maito mais "ao par" que 0 Rio deJaneiro, E, soeialmente falando, 0 modemismo sO podia mes-mo ser importado por Sao Paulo e arrebentnr na provincia.Havia uma diferenea grande, ja agora menos sensivel, entre

Rio e Sao Paulo. 0 Rio era muito mais internaeional, comonorma de vida exterior. Esta elaro : porto de mar e capital .do pais, 0 Rio possue urn internaeionalismo ingenito. SaoPaulo era espiritualmente muito mais modern a porem, fruto

neeessario da eeonomia do cafe e do industrialismo eonsequen-teo Caipira de serra-aeima, conservando ate agora um espiritoprovineiano servil, bem denuneiado pel a sua politiea, SaoPaulo estava ao mesmo tempo. pela sua atualidade comerciale sua industrialiaeao. em eontato mais espiritual e mais tee-nien com a ntualidade do mundo,

~ mesmo de assombrar eomo 0 Rio mantem, dentro da suamallein vibratil de eidade iutemaeional, uma (specie de rura-

lismo, urn earaeter parade tradieional muito maiores que SaoPaulo. 0 Rio e dessas cidades em que nio s6 permaneee in-dissoluvel 0 "exotismo" naeional (0 que alias e prova de vita-lidade do sen caniter), mas a interpenetraeao do rural eom 0

urbane. Coisa ja impossivel de se perceber em Sio Paulo.Como Belem, 0 Recife, a Cidade do Salvador: 0 Rio ainda euma eidade foleldriea. Em Sio Paulo 0 exotismo folcloriconao frequents a rua Quinze, que nem OR sambas que nascemnas cains de f08foro do Bar Naeional,

Ora no Rio malieioso, uma exposi.;iio como a de AnitaMalfatti podia dar rea~Oes publieitarias, mas ninguem Be dei-

xava levu. Na Sao Paulo sem malieia, eriou uma religiio.Com seus Neros tambem... 0 81"tigo "contra" do pintorMonteiro Lobato, embors fosse um chorrilho de toliees, sacudiuuma populaeao, modifieou uma vida.

Junto disso, 0 movimento modernista era nitidamente aris-tocratico. Pelo seu caracter de jogo aniseado, pelo sen espi-rito aventureiro ao sxtremo, pelo sen internacionalismo moder-nista, pelo seu naeionalismo embrabeeido, pels sua gratuidadeantipopular, pelo seu dogmatismo prepotente, era uma aristo-eraeia do espirito. Bem natural, pois, que a alta e a pequenaburguesia 0 temessem. Paulo Prado, ao mesmo tempo que

, um dos expoentes da aristocracia inteleetual paulista, era uma

das figuras principais da nossa aristoeracia tradicional. Nao

ASPECTOS DA LITERATURA BRASILEIRA 237

da ariatocracia improviuda do Imperio, mas da outra mais.. tip, justificada no trabalho leCular da terra e oriunda deqaalquer salteador europeu, que 0 eriterio monarquieo doDeua-Rei ja amancebara com a genealogia. E foi por tudoiIrto que Paulo Prado poude medir bem 0 que havia de aven-tureiro e de exereieio do perigo, no movimento, e arrisear a

... reIIpOD8&bilidadenteleetual e tradieional na aventura.Uma coisa d ... llena impo8livel no Rio, onde nio existeariatocraeia tradieional, JIl88 apenas alta burguesia riquissima,B esta nio podia eneampar um movimento que Ihe destruia 0

.-pirito coIUlervador e conformista. A burguesia nunca soubeperder, e iM o e que a perde. Si Paulo Prado, com a suaau.toridade intelectual e tradicional, tomou a peito arealizacaoda Semana, abriu a lista daa eontribuicoes e arrastou atras deIi01 BeUSpares aristocrataa e mais alguns que a sua figura do-minava, a burguesia protestou e vaiou. Tanto a burguesia de

elasse como a do espirito. E foi no meio da mais tremendaassuada, dos maiores insultos, que a Semana de Arte Moderna

abriu a segunda fase do movimento modernista, 0 periodorealmente destruidor.

Porque na verdade, 0 periodo. . . heroieo, fora esse ante-rior, iniciado com a exposi~ao de pintura de Anita Malfatti eterminado na "festa" da Semana de Arte Moderna. Duranteessa meia-dt izia de anos fomos realmente puros e l ivres, desin-

teressados, vivendo numa uniio iluminada e sentimental dasmais sublimes. Isolados do mundo ambiente, eaeoados, evita-dos, achincalhados, malditos, ninguem nao pode imaginar 0

delirio ingenue de grandeza e conveneimento pessoal com quereagimos, 0 estado de exalta.;io em que viviamos era ineon-

trol8.vel. Qualquer pagina de qualquer um de nos jogava os

outros a eomoeoes prodigiosas, mas aquilo era genial!

E eram aquelas fugas desabaladas dentro da noite, 1111

cadillac verde de Osvaldo de Andrade, a meu ver a figuramais caracteristica e dinamiea do movimento, para ir ler as

noSS&S obras-primas em Santos, no Alto da Serra, na Ilha dasPalmas. . . E 01 encontros a tardinha, em que ficavamos emexposioio diante de algum rariasimo admirador, na reda<;io

de "Papel e Tinta"... E a falange engrossando com SergioMilliet e Rubens Borba de Morais, chegados sabidissimosda Europa... E nO s tocavamos com repeito religiose, essesperegrinos .confortiveis que tinham visto Picasso e eonver-

sado com Romain Rollantl... E a adesiio, no Rio de um

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238 )( A. 10 DE A'N DBA D •

Alvaro Moreyra, de um Ronald de Carvalho. .. E 0 deseobri-

mento aasombrado de que existiam em Sao Paulo muitos qua-

dros de Lasar Segall, ja muito admirado atravcs das revistas

alernis... Tudo genios, tudo obras-primas geniais... Apt'-

nas Sergio Milliet punha um certo malestar no ineendio, com a

lSuaserenidade equilibrada... E 0 fil6s0fo da malta, Couto

de BalT08, pingando ilhas de eoneieneia em nos, quando no

meio da diseull8io, em geral limitada a bateboeas de afirmac;oesperempt6riaa, perguntava mansinho: Mas qual e 0 eriterio

que voce tern da palavra "esseneial" ou: Mas qual e 0 con-ceito que ,voce tem do "belo horrivel"' ...

~ramos uns pures, Mesmo eereados de repulsa quotidia-

na, a safide mental de quase todos nos, nos impedia qualquer

eultivo da dor. NiMOtalvez as teorias futuristas tivesaemuma

influencia liniea e benefiea sobre nOs. Ninguem pensava em

saerificio, ninguem baneava 0 incompreendido, nenhum se ima-

ginava precursor nem m8itir: eramos uma arraneada de he-

rois eonveneidos. E muito saudaveis.

A Semans de Arte Moderna, ao mesmo tempo que eoroa-

mento logieo dessa arraneada glorio.samentevivida (deseulpem,

mas,eramos gloriosos de antemao ... ), a Semana de Arte Mo-

derna dava um primeiro golpe 11apnreza do nosso-aristoera-

eismo espiritual. Consagrado 0 movimento pela aristocraeia

paulista, si ainda sofreriamos algum tempo ataques por vezes

erueis, a nobreza regional 110S {lavamio forte e. .. nos dissol-

via nos iavores da vida. Esta elaro que nio agia de easo pen-

sado, e si nos dissolvia era pela propria natureza 80 seu estado

de deeadencia. Numa fase em que ela nio tinha mais nenhu-

111aealidade vital, como eertos reis de agora, a nobreza rural

paulista s O podia nos trausmitir a sua gratuidade. Prinei-pion-so o movimento dos salOes. E vivemos uns oito anos, ate

perto de 1930, na maior orgia inteleetual que a historia artis-

tiea ~o pais registra.

Mas 11a intriga burgueHa NC811dalizadissima, a nossa

"orgia" nao era apenas inteleetual. . . 0 que nao disseram, 0

que nao se ,contou du nOMasfeatu. Champanha com eter,

vieios inventadissimes, as almofadas viraram "coxins", eriaram

toda uma semantica do maldizer. .. No entanto, quando niio

foram bailes publieos (que foram 0 que sio bailes desenvoltos

de alta sociedade), aa n0SS88festas dos salOesmoderuistas eram

. as mais,inocentes brmeadeiras de artistas que Be pode imaginar,-

MiPECTOS DA LlTEBATURA BBASlLEIRA 239

Havia a reuniio das terc;ae, a . noite, na rua Lopes Chaves.Primeira em data, essa reuniio semanal continha exeluaiva-

.. te artiBtas e preeedeu mesmo a Semana de Arte Moderna.S o b 0 ponte-de-vista intelectual foi 0 mam util dos 88100s,si

, que lie podia chamar salio Aquilo. As vezes doze, ate quinze

ani8tu, se reuniam no esttidio aeanhado onde se comia doees

tradieionais brasileiros e IIIe bebia um alcolzinho eeonomico. A

arte moderna era assunto obrigatOrio e 0 intelectualismo ta oiJltransigente e deshumano que ehegou mesmo a ser proibido

_falar mal da vida alheia! As diseussOesaleaneavam transes

,...d08,o calor era tamanho que um ou outro sentava nas jR -

aeIas (nao havia 8flSentopra todos) e assim mais elevado domi-.. va pela altura, jil que nio dominava pela voz nem 0 argu-

.ento. E aquele raro retardatario da alvorada parava de-

fronte, na esperanea de alguma briga por gosar.

Havia 0 salio da avenida Higienopolis que era 0 mais se-

leeionado. Tinha por pretexto 0 almoeo dominical, maravilha

de comida lusobrasileira. Aind. ai a conversa era estritamen-

te intelectual, mas variava mais e se alargava. Paulo Pradocom 0 aeu pessimismo fecundo e 0 seu realismo, convertia sem-

pre 0 assunto das livres eloeubraedes artistieas aos problemas

da realidade brasileira, Foi 0salio que durou mais tempo e se

dissolveu de maneira bem malestarenta. 0 seu chefe, ternan-

do-se, por sueessao, 0 patriarca da familia Prado, a easa foi

invadida, mesmo aos domingos, por um publico da alta que

nio podia compartilhar do rojio dos nossos assuntos. E a

conversa se manchava de poquer, casos de soeiedade, corridas

de cavalo, dinheiro. Os intelectuais, veneidos, foram se arre-

tirando.

E houve 0 salio da rna Duque de Caxias, que foi 0 maior,

o mais verdadeiramente 8818.0. As reunifies semanais eram a tar-

de, tambem as terc;as-feiras. E isso foi a causa das reunioes

noturnas domesmo dia irem esmorecendona rna Lopes Chaves.

A sociedade da rua Duque de Cmu era mais numerosa e

. variegada. SO em certas festas espeeiais, no salio moderno,

eonstruido nos jardins do solar e decorado por Lasar Segall,

o grupo se tornava mais coeso. Tambem al 0 culto da tradi-

C;ioera firme, dentro do maior modernismo. A cozinha, de

cunho afrobrasileiro, aparecia em almoc;ose jantares perfeitis-

simos de composic;io. E eonto entre as minhas maiores ventu-

ras admirar essamulher excepcional que foi Dona Olivia Gue-

des Penteado. A sua discr~, 0 tato e a autoridade prodigiosos

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240 It:AI\IO DE A'NDRADE

com que ela soube dirigir, manter, corrigir eM&multidio hetero-genea que se chegava a. ela, atraida pelo seu prestlgio, artistas,politicos, ri~, eabotinos, foi ineomparsvel. 0 seu salao,que tambem duron varios anos, teve como elemento principalde dissoluc;ao a eferveeeneia que estava preparando 1930. Afundac;io do Partido Demoeratico, 0 animo politico eruptivo

que se apoderara de muitos intelectuais, saeudindo-os para osextremismos de direita ou esquerda, baixara um malestar sobre81 8 reuniOes. Os demoeratieos foram se afastando. Por outrolado, 0 integralismo encontrava algumas simpatias entre aspe880U da roda: e ainda estava muito sem vfeio, muito desin-tereaado, pra aeeitar aoomodac;Oes.Sem nenhuma publicidade,mas com firmeza, Dona Olivia Guedes Penteado soube terminara08 poucos 0 seu 8&lio modernista.

o ultimo em data desses salOespaulistas foi 0 da alamedaBario de Piraeicaba, congregado em torno da pintora Tarsila.

Nio tinha dia fixo, mas as festas eram qnase semanais. Du-rou poneo, E nio teve jamais 0 encanto das reunioes que fa-

ziamos antes, quatro ou cinco artistes, no antigo atelie da admi-ravel pintora. Isto foi pouco depois da Semana, quando fixa-da na compreensiio da burguesia, a existeneia de uma ondu

revolueionaria, ela principiou nos castigando com a perda dealguns empregos. Alguns estavamos quase literalmente semtrabalho. Entio iamos para 0 atelie da pintora, brinear dearte, dias inteiros. Mas d08 tres 8&IOesaristocraticos, Tarsilaconseguiu dar ao dela uma signifieac;io de maior independen-cia, de comodidade. N08 outros dois, por maior que fosse 0

l iberalismo dos que os dirigiam, havia tal imponeneia de rique-za e tradic;io no ambiente, que nio era possivel nunea evitarum tal ou qual constrangimento. No de Tamila jamais senti-mos isso. 0 maia gost08O dos nossos salOes aristocraticos.

E foi da protec;io desses saloes que se alastrou pelo Brasilo espirito destruidor do movimento modernista. Isto e, 0 seusentido verdadeiramente espeeifieo. Porque, embora lansandoinumeros eS808e ideias novas movimentomOdemista !oi

. essencialmente .destrui or. te destruidor de nOs mesmos,porque 0 pragmatismo das pesquiMs sempre enfraqueceu a li-berdade da criac;io. Essa a verdade verdadeira. Enquantonos, OS modernistas de Sio Paulo, tinhamos ineontestavelmen-te uma repercussao nacional, eramos os bodes espiatorios dospassadistas, mas ao mesmo tempo 0 Senhor do Bonfim dosnovos do pais todo, os outros modernos de entio, que ja pre-

ASPECTOS DA LITERATURA BRASILEIRA 241

teBdiam construir, formavam nnelees respeitaveis, nio tem"'vida, mas de existencia limitada e -sem verdadeiramente ne-Dh1Dll sentido temporineo. A8f!imPlinio Salgado qne, vivendo_ Sio Paulo, era posto de parte e nunea pisou os sa lOes .

a.r.Aranha tambem, que 80Ilhava construir, fie atrapalhava_ui~ entre n6s; e nos usombrava a incompreensio ingenua

._ que a "gente seria" do grupo de "Festa", tomava a serio28 nossas blagues e arremetia contra nOs. Nao. 0 nosso sen-tido era espeeifieamente destruidor. A aristoeracia tradi-eional nos deu mio forte, pondo em evidencia mais essa ge-~ao de destino - tamMm ela ja entao autofagicamentefl8truidora, por nio ter mais uma signifieac;io legitimavel.Quanto aos aristOs do dinheiro, esses nos odiavam no principio• sempre nos olharam com deseonfianea. Nenhumsalio derieac;o tivemos, nenhum milionsrio estrangeiro nos acolheu.Oa italianos, alemies, os israelitas se faziam de mais guardado-res do bom-senso nacional que Prados e Penteados e Amarais. , .

Mas nos estavamos longe, arrebatados pelos ventos da des-

truiC;io. E faziamos ou preparavamos especialmente pela fes-ta, de que a Semana de Arte Moderna fora a primeira. Todoesse tempo destruidor do movimento modernista foi pra nostempo de festa, de cultivo imoderado do prazer. E si tamanbafestanea diminuiu por certo nossa capacidade de produeao eserenidade eriadora, ninguem pode imaginar como nos diver-times, Saloes, festivais, bailes celebres, semanas paesadas emgrupo nas fazendas opulentas, semanas-santas pelas cidadesvelhas de Minas, viagens pelo Amazonas, pelo Nordeste, ehe-gadas a Baia, passeios constantes ao passado paulista, Soro-caba, Parnaiba, ltu... Era ainda 0 caso do baile sobre osvuleoes. .. Doutrinarios, na ebriez de mil e uma teorias, -sal-

vando0

Brasil, inventando0

mundo, na verdade tudo eonsu-miamos, e a nos mesmos, no cult ivo amargo, quase delirante doprazer.

o movimento de Inteligeneia que representsmos, na suafase verdadeiramente "modernista", nio foi 0 fator das mu-daneas politieo-soeiais posteriores a ele no Brasil. Foi essen-cialmente um preparador; o criador de um estado-de espiritorevolueionario e de um sentimento de arrebentacao. E si nu-mel"OSOSos intelectuais do movimento se dissolveram na po-litica, si varios de nOs partieipamos das reunioes inieiais doPartido Demoeratieo, carece nio esquecer que tanto este como1930 eram ainda destruic;io. Os movimentos espirituais preee-

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242 MARIO DE ANDRADE

dem seiupre as mudancas de ordem social. 0 movimento social

de destruicao e que principiou com 0 P. D. e 1930. E no en-

tanto, e justo por esta data de 1930, que principia para a Inte-

ligencia brasileira uma fase mais calma, mais modesta e quoti-

diana, mais proletaria, por assim dizer, de construeao. Aespera que urn dia as outras formas sociais a imitem.

E foi a vez do salao de Tarsila se acabar. Mil noveeentos

e trinta... Tudo estourava, politicas, familias, casais de

artistas, estetieas, amizades profundas. 0 sentido destrutivo

e festeiro do movimento modernista ja nao tinha mais razao-

-de-ser, cumprido 0 seu destino legitime. Na rua, 0 povo amo-

tinado gritava: - Getfilio l Getulio L. . Na sombra, Plinio

Salgado. pintava de verde a sua megalomania de Esperado.

No norte, atingindo de salto as nuvens mais desesperadas, outro

aviso abria aSIlBdo terreno ineerto da bagaceira. Outros

abriam mas eram as veias pra manchar de enearnado as snasquatro paredes de segredo. Mas nesse vuleao, agora ativo e

de tantas esperancas, ja vinham se fortificando as belas figu-

ras mais nitidas e construidoras, os Lins do Rego, os Augusto

Frederico Schmidt, os Otavio de Faria e os Portinari e os Ca-

margo Guarnieri. Que a vida tera que imitar qualquer dia,

Nao cabe neste discurso de earacter polemieo, 0 proeesso

analitieo do movimento modernista. Embora se integrassem

nele figuras e grupos preocupados de eonstruir, 0 espirito mo-

dernista que avassalou 0 Brasil, que deu 0 sentido historieo da

Inteligeneia nacional desse periodo, foi destruidor. Mas esta

destruieao, nao apenas continha todos os germes da atualidade,como era uma eonvulsiio profundissima da realidade brasilei-

r~. C ! qu~e_c~~ esta rea:idad~ ~ue,o~Il1~vi.me!l_t()_~o_der.

nista Impos, e, a ~er ~tll~!l0_<1~ tr~ prillCl{ll~sfundamen-

tars: o 4ir~to permanents it pesquisa estetiea \~- atualizal,lao

da. intelig~ia ~tistica_brasileira 1 . e a estabilizaeiio de uma

concieneia criadora nacional.", -----~-~----~-~~" . -~ .. -'-.--~..."

Nada disto represents exatarnente uma inovaeao e de tndo

encontramos exemplos na historia artistiea do pais. A novida-

de fundamental, imposta pelo movimento, foi a eonjugaeao

dessas tres normas num todo organieo da eoneiencia coleiioa.

E si, dantes, nos distiguimos a estabilizaeao assombrosa deuma eonciencia nacional num Gregorio de Matos, ou, mais na-

tural e eficiente, num Castro Alves: e eerto que a nacionalida-

de dcste, como a nacionalistiquies do outro, e 0 nacionalismo de

ASPECTOS DA LITERATURA BRASILEIRA 243

Carlos Gomes, e ate mesmo de urn Almeida Junior, eram epi-

s6dicos como realidade do espirito. E em qualquer caso, scm-

pre urn individualismc'.

Quanto .ao dire ito dc.__esquisa esteti~'!!'_e a_1:ualiz_I).~a.QUIli-

versal da eriacao artistiea, eiilcontesta'yd que todos os movi-

mentos ~dafiiossas artes-'C menos 0 Romantismo que

eomentarei adiante) sempre se basearamno academismo. Com

alguma excepeao individual rara, -~ sem a menor repercusaao

coletiva, os artist as brasileiros jogaram sempre colonialmente

no certo. Repetindo e afeicoando esteticasja consagradas, s e

eliminava assim 0 direIfOcIe--pesquisa, e consequentemente de

atuaIi<fii(le.-Etol dentro desse academismo inelutavel que se

~am nossos maiores, urn Aleijadinho, um Costa Ataide,

Claulio Manuel, Goncalves Dias, Gonzaga, Jose Mauricio, Ne-

pomuceno, Aluisio. E ate mesmo urn Alvares de Azevedo,

ate mesmo um Alphonsus de Guimaraens.

Ora 0 nosso individualismo entorpecente se esperdicava no

mais desprezivel dos lemas modernistas, "Nao ha escolas !", e

isso tera por certo prejudieado muito a efieiencia criadora do

movimento. E si nao prejudicou a sua ac;ao espiritual sobre 0

pais, e porque 0 espirito paira sempre acima dos preceitos como

das proprias ideias , . . Ja e tempo de observar, nao 0 que um

Augusto Meyer, urn Tasso da Silveira e urn Carlos Drummond

de Andrade tern de diferente, mas 0 que tern de igual. E 0

que nos igualava, por cima dos nossos dispauterios individua-

listas, era justamente a organicidade de um espirito atualizado,

que pesquisava ja irrestritamente radicado it sua entidade co-letiva naeional, Nao apenas aeomodado it terra, mas gostosa-

mente radieado em sua realidade. 0 que nao se deu sem algu-

rna patriotice e muita falsificaeao ...

Nisto as orelhas burguesas se alardearam refartas por

debaixo da aristoeratiea pele do leaD que nos vestira. .. Por-

que, com efeito, 0 que se observa, 0 que earacteriza esse radica-

C;aona terra, num grupo numeroso de gente modernista de uma

assustadora adaptabilidade politiea, palradores de definieoes

naeionais, sociologos otimistas, 0 que os caracteriza e um eeafor-

mismo legitime, disfareado e mal disfareado nos melhores, mas

na verdade cheio de uma ciniea satisfaeao, A radieaeao naterra, gritada em doutrinas e manifestos, nao passava de urn

conformismo aeomodaticio. Menos que radicaeao, uma canto-

ria ensurdeeedora, bastante academica, que nao raro tornou-se 

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MARIO DE ANDRADE

1UD perque-me-ufanismo larvar. A verdadeira eoneieneia da

terra levava fatalmente ao nio-eonformismo e ao protesto,

como Paulo Prado com 0 "Retrato do Brasil", e os vasqueiros

"anjos" do Partido Demoeratieo e do Integralimno. E 1930

ya: SC1· tmnHm 11 '11 . nrotesto ! l\fas pn~q um nfimero vasto demodemistas, 0 Brasil Be tomou uma dadiva<do ceu. Um eeu

bastante governamental... Gra«;aAranha, sempre desaeomo-dado em nosso meio queele nio podia sentir bem, tornou-se o

exegeta desse nacionalismo conformists, com aquela frase de-

testavel de nio sermos "a cAmara mortusria de Portugal".

Quem pensava nisso! Pelo contra"rio: 0 que ficou dito foi que

nio nos incomodava nada "eoincidir" com Portugal, pois 0 im-

portante era a deaistencia do confronto e das liberdades fa1.sas;

Entio nos xingaram de "primitivistas".

o estandarte mais colorido dessa radi~io a patria foi

a pesquisa da "lingua brasileira". Mas £oi t.lve. boato falao.

Na verdade, apesar da aparincias e da bulha que fuem agora

eertas santidades de ultima hora, n68 estamos ainda atualmente

tio eseravos da gramatica luaa comoqualquer portugues, Nao1 1 & diivida nenhuma que n6s hoje sentimos e pensamos 0

quaatttm satis brasileiramente. Digo iato ate com certa malineonia, amigo Macunaima, meu irmio. Mas isso nio e 0 bss-tante para identificar a nossa expressiio verbal, muito embora

a realidade brasileira, mesmo psicol6gica, seja agora mais forte

(' insohivel que nos tempos ell' Jose de Alenear ou de Machadode Assis. E como negar que estes tambem pensavam brasi-

leiramente' Como negar que no estilo de Machado de Assis,

Juso pelo ideal, intervem um qtlid familiar que 08 diferenea

vertiealmente de nm Garret e um Ortigio' :M. si nos roman-

tieos, em Alvares de Auvedo, Varela, Alencar, Macedo, Castro

Alves,ha. unia identidade brasileira que nos parece bem maiorque a de Bras Cubas ou Bilae, e porque nos romanticos ehe-gOU-8ea um "esqueeimento" da gramatica portuguesa, que

permitiu muito maior colaboracio entre 0 ser psicol~co e suaexpressiio verbal.

o espirito m~rnista reconheeeu que si viviamos ja de

nossa realidade brMileira, eareeia reverificar nOlJ8()nstrumento

de trabalho para que nos expresMssemos com identidade.

Inventou-se do dia pra noite a fabulOlJissima"lingua brasilei-

ra". Mas ainda era eedo, e a for~a dos elementos eontrarios,

principalmente a ausencia de 6rgios eientificos adequados, re-

duziu tudo a manife~ individuais. E hoje, como nor-

ASPECTOS DA L!TERATURA BRASILEIRA

_~J.I~e de lingua eulta e eserita, estamos em situ~io inferior

eem anos atras. A ignorancia pessoal de varios fez com

8e anunciassem em suss primeiras obras, como padrOes

de brasileirismo estilistieo. Era ainda 0 mesmo

dos romanticos : nao se tratava duma superaeao da lei

JlUl8 duma 'ignorancia dela. Mas .ssim que alguns

prosadores se firmaram pelo valor pessoal admiravelpossuiam (me refiro u gcra<;io de 30), prineipiaram as

..............." de escrever certinho. E e oomieoobserver que, ho-em alguns dos nossos mais fortes estilistas surgem a cada

dentro duma expreMio ja intensamente brasileira,

_itanJlim()8 sintaxieos ridieulos. Tio ridieulos que se tomam

erros de gramatica! Noutros, esse reaportuguesa-

expressional ainda e mais preesrio : querem ser lidos

,Meml-Dilar, surgiu 0 problema eeonomieo de serem eomprados'

.. Portugal. Enquanto isso, a melhor intelectualidade lusa,

numa liberdade esplendida, aceitava abertsmente os mais exa-

~rado.s de n6s, eompreensiva, sadia, mio na mio.

Teve tambem os que, desaconselhados pela preguiea, re-

tiOlveramse despreoeupar do problema... Sao os que empre-

gam anglieismos e galieismos dos mais abusivos, mas repudiam

(fl;lalquer "me pareee" por artificial! Outros; mais eomicos

.unda, dividiram 0. problema em dois: nos seus textos escrevem

. gramatiealmente, mas permitem que seus personagens, falan-

~o.,"errem" 0 portugues. Assim, a... culpa nao. e do eseritor,e dos personagens! Ora nao h~ soluC;iomais incongruente em

.~ua apareneia eonciliatoria. Nio s o pOe em foco 0 problema

do. erro de portugues, como estabeleee um divoreio inapelavel

entre a lingua falada e a lingua escrita - bobagem bebada

pra quem souber um naco de filologia. E tem ainda as garc;asbraneas do individualismo que, embora reeonheeendo a legiti-

midade da lingua naeional, se recusam a eoloear brasileiramen-

te um pronome, pra nlioficarem pareeendo comFulano! .Estes

euslmesmados esqueeemque 0 problema e eoletivo e que, si ado-

tado por muitos, muitos ficavam se pareeendo com 0 Brasil!

A tudo isto se ajuntava quase decis6rio, 0 interesse eco-·

nomico de revistas, jornaia e editores que intimidados com algn-

ma earta rara de leitor gramatiquento ameaeando nao eomprar,

Be opoem a pesquisa linguistiea e chegam ao desplante de eorri-gir artigos assinados. Mas, morto 0 metropolitano Pedro II,

quem nunea respeitou a inteligencia neste pais!

 

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24 6 XAaro DE ANDRADE 24 7

Tudo isto, no entanto, era sempre estar com 0 problema

na mesa. A deQltencia grande foi eriarem 0mito do "escrever

naturalmente", nio tem dtivida, 0 mais feiticeiro dos mitos.

No fundo, embora nio eoneiente e deshonrosa, era uma desho-

nestidade como qualquer outra. E a maioria, sob 0 pretexto

de escrever naturalmente (ineongrueneia, pois a lingua escrita,

embora 16gicae derivada, e sempre artificial) se chafurdou na

mais antU6gics e antinatural das escritas. S-aouma lastima.

Nenhum deles deixara de falar "naturalmente" um "Esta se

vendo" ou "Me deize". M as pra escrever... com naturalida-

de, ata inventam os soeorros angustiados das conjun~oes, pra

Be aairem com um "E se esta vendo" que salva a patria da

retoriquice. E e uma delicia eonstatar que si afirmam esere-

vcr braaileiro, nio tern uma 16 frase deles que qualquer luso

nio _nasse coin integridade nacional... lusa. Se identifi-

cam Aqueledeputado mandando fazer uma lei que chamava'

de "lingua brasileira" a lingua nacional. Pronto: estava re-

solvido 0 problema! Mas como incontestavelmente sentem e

pensam com nacionalidade, isto e , numa entidade amerindio--afro-luso-latino-amer ieano-anglo-franeo-etc., 0 resultado e essalinguagem ersatz em que se desamparam - triste moxinifada

moluscoidesem vigor nem carlicter.

Nio me refiro a ninguem nio, me refiro a centenas. Me

refirn justamente aos honestos, aos que sabem escrever e pos-

suem teeniea, Sao eles que provam a inexistencia duma "lin-

gua brasileira", e que a colocac;iodo mito no campo das pes-

quisas modernistas foi quase tao prematura como no tempo de

J o s e de Alencar. E si os ehamei de inconcientemente desho-

nestos e porque a arte, comoa eieneia, como0 proletariado nio

trata apeuas de adquirir 0 bom instrumento de trabalho, mas

impoe a sua. constante reverificac;io. 0 operario nio compra

a foice apenas, tem de afia-Ia dia por dia. 0 medico nio fica

no diploma, 0 renova dia por dia no estudo. Sera que a arte

nos exime deste diarismo profissional! Nao basta criar 0 des-

pudor da "naturalidade", da "sineeridade" e ressonar a som-

bra do deus novo. Saber escrever esta muito bem; nio e me-rito, a dever primario, Mas 0 problema verdadeiro do artista

nio a esse: a escrever milhor. Toda a hist6ria do profissiona-·

Iismohumano 0 prova. Ficar no aprendido nio a ser natural :

e ser aeademieo; nio e despreocupac;io: e passadismo.

A pesquisa era ingente por demais. Oabia 80s fil6logos

brasileiros, ja· criminosos de tao vexat6rias reformas ortogd,fi-

.. patrioteiras, 0 trabalho honeeto de fomeeer &OS artistas

1Im& .eodificac;ao das tend~neiu e const8.ncias da expresaio

linguistics nacional. Mas eles reeuam diante do trabalho util,

,tio mm fAciller 08cl8saicos! Preferem a cie~inha de ex-

pIicar um erro de copista, imaginando uma palavra inexistente

11 0 latim vulgar. Oe mais avan9&d08vio ate aceitar timida-

mente que inieiar a f;rasecom pronome oblique nio e "mais".irro no Brasil. M as confesaam nio elCrever. .. Bo, pois nioIftiam "sinceros" com 0 que beberam no leite matemo. B e -beram des-hormoni08! Bolas para os fil6lop!

Caberi&&quitamWm 0 repudio dos que pesquisaram so-

bra & lingua escrita nacional... Preocupados pragmatics-

mente em ostentar 0 problema, pratiearam tais exageros detomar pra sempre·odiosa a lingua brasileira.. Eu sei: talvez

neste easo ninguem venc;a0 escritor destes Iinhas, Em pri-

meiro iilgar, 0 escritor destas linhas, com alguma,Saringite,

vai passando bem, muito obrigado. Mas e certo que jamais

exigiu lhe seguissem os.brasileirismos violentos. Si 08 prati-ticou (um tempo) foi na intenc;ao de por em angtistia aguda

uma 'ellCJ.uisaque julgava fundamental. Mas 0 problema pri-

meiro nio e aeintosamentevoeabular, e sintwco. E afirmo

que 0 Brasil hoje possue, nio apenas regionais, mas generaIi-

zadas no pals, nnmerosas tendeneias e const8.ncias sint8.xicss

que the dao natureza earaeterietlea a linguagem. Masisso

deeerto ficars. para outro futuro movimento modemista, amigo

J o s e de Alencar, meu irmio.

Mas comoradicac;aoda nossa cultura artistica A entidade

brasileira, as eompensacoes sao muito numerosas pra que a

atual hesitaeilo linguistiea se tome falha grave. Como expres-

s a o nacional, e quase incrivel 0 avan~ enorme dado pela mti-sica e mesmo pela pintura, bem como 0 proeesso do Homobrasileiro realizado pelos nossos romancistas e ensaistas atuais.

Espiritualmente 0 progresso mais eurioso e feeundo e 0 esqtie-

cimento do amadorismo naeionalista e do segmentarismo re-

gional. A atitude do espirito se transformou radiealmente e

talvez nem osm~os de a~ra possam compreender essamudan-

C;8. Tomados ao acaso, romances como os de Emil Farhat,

Fran Martins ou Telmo Vergara, ha vinte anos atris seriam

elassificados comoliteratura regionalista, com todo 0 exotismo

e 0 insohivel do "csracteristico". Hojequem sente mais isso'

A atitude espiritual com que lemos a s s e s livros nio e mais a da

eontemplaeso curiosa, mas a de uma participac;io sem teoria

 

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248 IiIA.ro DE A'ND&ADE 249

llacionalista, uma partiei~ pura e simples, niG diricida,

.expontinea.

: t i l que realidmos essa conquista magnifica da deseentra-lizalliiointelectual, hoje em contraste aberrante com outras :rna-

nifesta~Oessociais do p'" Hoje a Corte, 0 fulgor das duas

cidades brasileiras de m.ais de um milhao, niio tem nenhumsentido intelectual que niio seja meramente estatistico. Pelo

menos quanto a literatura, uniea das artes que ja aleaneou

estabilidade normal no pais. As outras sao demasiado dispen-diosas pra se normalizarem numa terra de tao interrogativa

riqueza publica como a nossa, 0 movimento modernista, pon-

do em relevo e sistematizando uma "cultura" naeional, exigiu

cia Inteligencia estar ao par do que se passava nas numerosu

Cataguazes. E si as cidades de primeira grandeza fornecem

facilita~oes publicitmaa sempre espeeialmente estatistieas, ~

impossivel ao brasileiro nacionalmente culto, ignorar um Erico

Verfssimo, um Ciro d08Anj08, um Camargo Guarnieri, naeio-

nalmente gloriosos do canto das suas provincias. Basta com-parar tais criadores com {enomenos ja hiat6ricos mas identieos,

um Alphonsus de Guimaraens, um Amadeu Amaral e os re-

gionalistas imediatamente anteriores a n66, para verificar -a

convulsso fundamental do problema. Conheeer um Alcides

Maia, urn Carvalho Ramos, urn Teles Junior' era, nos brasilei-

ros de ha vinte anos, um fato individualista de maior ou me-

nor "civilizac;iio". Conhecer um Gulhermino Cesar, um Viana

Moog ou Olivio Montenegro, hoje e uma exigeneia de "cultu-

ra". Dantes, esta exigeneia estava relegada... aos histo-

riadores.

A pratiea principal desta deseentralisacao da Inteligeneia

he fixou no movimento naeional das editoras provineianas. E

si ainda vemos 0 easo de uma grande editora, comoa Livraria

J08e Olimpio, obedecer a atrac;io da mariposa pela chama, indo

se apadrinhar com 0 prestigio da Corte, por isto mesmo ele se

torna mais comprovat6rio. Porque 0 fato da Livraria Jose

Olimpio ter cultamente publieado escritores de todo 0 paiR,

nilo a earaeteriza. Nisto ela apenas se iguala a s outras editoras

tambem cultas de provincia. urns Globo, uma Naeional, a

Martins, a Guaira. 0 que exatamente earaeteriza a editora da

rua U O Ouvidor - Umbigo do Brasil, como diria Paulo Prado

- e ter se tornado, por assim dizer, 0 orgio oficial das oseila-

(}oesideol6gicas do pais, publicando tanto a dialetica integra-

lista comoa politiea do sr. Fra.ncisco Campos.

_ .Quanto." ~quiD. do direito peruianente de peequisa~tiea, ereio nao 8er po.lftl qualquer contradi~: ~ a vit6-

ria ~ande do movimento no caJIl~ da ute. E 0 mais earae-

teristieo ~ que 0 antiaeademiamo du ge~ posteriores a daSemana de Arte Moderns, se mou exatamente naquela lei

.t~tieo-tecniea do "faser milhor", a que aludi, e nio como um

. abusivo instinto de revolta, de&truidor em principio, como foi

o do movimento modernista. Talvez seja 0 atual realmente 0.. . . . "pnmelro movimento de mdependencia d. Inteligencia brasi-

leira, que a gente possa ter como legftimo e indiscutivel. Ja

agora com todu u probabilidades de permanencia. At~ 0

Pam86ianismo, ate 0 Simbolismo, at~ 0 Impressionismo inieial

de um Vila Lobos, 0 Brasil jam.. pesquisou (como eoneieneia

eoletiva, entenda-se), n08 campos d& cria~ao es~tica. Nao

.. s i~portavamos toonicas e Mtetieas, como s O as importavamos

~epOlsde ~erta estabiliza~iiona Europa, e a maioria das vezes

Ja aeademieadas. Era ainda um complete fenomeno de colo-

nia, imposto pela n08S8escraviza~ao eeondmieo-aoeial. Piorque isso: e s s e espirito aeademieo nao tendia para nenhuma Ii-berta~8o e para uma expressao propria. E si um Bilae da

"Via Lactea" e maior que todo 0 Lecomte, a. .. culpa nao e'de BiIac. Pois 0 que ele almejava era mesmo ser pamasiano,

senhora Serena Forma.

Essa no~io do espirito de pesqriisa Mt~tica, anti-

aeademiea, porem n80 mais revoltada e destruidora, a meu ver,

.e a maior manifesta~8o de independeneia e de estabilidade na-cional que ja conquistou a Inteligencia brasileira. E como 08

movimentos do espirito precedeJIi a s manifestac;oesdas ontrasformes da sociedade, ~ facil de pereeber a mesma tendencia deliberdade e eonquista de expressiio propria, tanto na imposi~ao

do verso-livre antes de 30, como na ~'marcha para 0 Oeste"

posterior a 30; tanto na "Bagaeeira", no "Estrangeiro", na

"Negra Fu1o" anteriores a 30, como no easo da Itabira e a

nacional~8o das indnstrias pesadu, ,P06terioresa 30.

Eusei que ainda existem espiritos eoloniais (e tao Ucila

erudi~iio!) s O preocupad,os em demQnstrar que'sabem mundo a

fundo, que nas paredes de Portinari:s6enurga.m os DlUraisde'

Rivera, no atonalismo de Franciseo lIign.one sOpercebem

Sehoemberg, ou no "CicIo da Cana de A~;(icar",'0 romatn"fktwe

dos franceses. . . . .

 

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o problema nio ~ eomplexo mas seria longo dieeuti-ID aqui,Me limitarei a propor 0 dado prineipal. N6s tivemos no Bra-sil um .movimento spiritual (nio falo apenas eseoIa de arte)que f01 ab80lutamente "neeessirio", 0 Bomantismo. Insisto:nio me refiro apenaa ao romantismo literirio tio aeadenrlco. 'eomo a Importac;io inieial do modernismo artistieo, e que sepodera eomodamente datar ide Domingos Jose Goncalves deMagalhaes, como 0 nosso do expressionismo de Anita Malfatti.Me refiro ao "espiri to" romantico, ao espirito revolueionarioromantieo, que est&.na Inconfidencia, no Basilio da Gama do"Uraguai" nas liras de Gonzaga eomo nas "Oartas Chilenas"de quem os senhores quiserem. Este espirito preparou 0 esta-do revolueionario de que resultou a independeneia politiea, eteve como padriio bem briguento a primeira tentativa de linguabrasileira, 0 espirito revolueionario modemista, ta o neeessi-rio como 0 romsntieo, preparou 0 estado revolueionsrio de 30

em diante, e tambem teve como padrio barulhento a segunda

tentativa de nacionalizac;io da linguagem. A similaridade emuito forte.

Esta necessidade espiri tual , que ultrapassa a literaturaestetiea, e que diferenc;a fundamentalmente Romantismo e Mo-demismo, das outras eseolas de arte brasileiras. Estas foram

todas essencialmente aeadeuncas, obedieneiaa eulturalistas quedenunciavam muito bem 0 colonialismo da Inteligncia nacional.Nada mais absurdamente imitativo (pois si nem era imitac;io,

era escravidio!) que a eopia, no Brasil, de movimentos esteti-cos partieulares, que de forma aiguma eram universais, eomo 0

culteranismo italo-iberieo setecentista, como 0 Pamasianismo,

como 0 Simbolismo, eomo 0 Impressionismo, ou como 0 Wagne-rismo de um Leopoldo Miguez. Sio 8Uperfec~ cultura-Iistas, impostaa de eima pra baixo, de proprietario a proprie-

dade, sem 0 menor fundamento nas forc;as populares. D ' aiuma base deshumana, prepotente e, meu Deus! arianizante que,si prova 0 imperialiamo dos que com eIa dominavam, prova asujeic;io dos que com ela, eram dominad08. Ora aquela basehumana e popular du peaquillas/~tieas e faeilimo encontrarno Romantismo, que chegou meamo a retomar coletivamente

as fontes do povo e, a bem diser, criou a ciencia do folclore. Emesmo sem lembrar folclore, no verso-livre, no cubismo, noatonalismo, no prMominio do ritmo; no superrealismo mitieo,

no expressionismo, iremos encontrar eaas mesmas bues popu-lares e humanas. E ate primitivas, como a arte negra que

2 5 1

influiu na inven~ e D& tem&tiea eubista. Aaa im como 0

eultflaimo f'OmtJft..{l.fttJ, e 011eielOlicom que urn Otavio de Faria. proeeMa a decrepitude da bllJ'lUeaia, ainda do instintos e for-mas funeioD&lmente popu1area, que eneontramea 1188 mitolo-gias efclie&i1nas I&gM e nOlIKalevalu e NibelllJll08 de todosos povos. J ' um autor eaere'Yft, como eoncbuio eondenat6rla,

que" a estetica do Modernilmo f ieou. indefinivel" . . . Pois ella

e a milhor razio-de.-er do M.'odemimno1 Ele nio era umaestetica, nem. na Europa nem aqui. Bra um estado de espiritorevoltado e revolucionmo que, Iia D6s IlOI atualizou, sistema-tizando como conatiacia ci a Intelic6ncia nacional 0 direitoanti&cadimioo da pesquisa estetica e preparou 0 estado revolu-eionario daa outras manif~ aociais do pals, tamb&n fezisto mesmo no resto do mundo, profetisando estas guerras deque uma civi1iza9io nova JlI8Ceri..

E hoje 0 artista brasileiro tem diante desi uma verdadesocial, uma liberdade (infelizmente s6 estetica), uma indepen-

dencia,um direi to a s SUM inquieta~Oes e pesquillas que nio1!endopassado pelo que passaram oa modernistas da Semana,ele nem pode imaginar que conquista enorme representa.Quem se revolta mais, quem briga mais contra 0 politonalismode um Loureneo Fernandes, contra a arquitetura do Ministerioda EducaCao, contra 08 ve1'808"incompreensiveis" de um Mu-rilo Mendes, contra 0 personalismo de um Guignard'. . . Tu-do isto sio hoje manifestac;Oes normais, discutlveis sempre,mas que niio causam 0 menor escandalo publico. Pelo contra-rio, sio 08 preprios elementos govemamentais que aceitam arealidade de um Lins do Rego, de um Vila Lobos; de um Almirde Andrade, pondo-os em cheque e no perigo das predestina-

c;oes. Mas um Flavio de Carvalho, mesmo com as suas expe-riencias numeradas, e muito menos um Clovis Graciano, masum Camargo Guarnieri mesmo em luta com a incompreensioque 0 persegue, urn Otavio de Faria com a aspereza d08 c&8OS

que expOe, um Santa Rosa, jamais nao poderio suspeitar 0 aque nos sujeitames, pra que eles pudessem viver hoje aberta-tamente 0 drama que 08 dignifica. A vaia ac~, 0 insultopublico, a carta anonima, a perseguic;io financeira... Masrecordar e quase exigir aimpatia e estou a mil leguas disto.

E me cabe rmalmente falar sobre 0 que ehamei de "amali-zac;iiodainteligineia GrlUfieG braaileira". C o m efeito: nlo Be

deve confundir iIao com a liberdade da pesquil& estetica, pois

esta lida com forma, com a teemea e as representac;Oes da be -

 

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25 2 • .A_tO Da AND.ADa

leu, &0 pallO que a ute 6 muito mail larp e complexa quei I i a o , e tem uma funciooaJidade imediata lO O ia l, ~ uma profilsioe uma f6inter! IIda da vida.

A prova mail evidente desta diltingio , 0 famOlOproblemado I118UDtoem arte, no qual tanto. eseritores e filOaofOilaeemaranham. Ora nio hi duvida nenhuma que 0 _unto nio

tem a menor importineia para a intelipneia es~tiea. Chegameam.o a nio eDItir para ela. Ku a intellgeneia es~tica Be

manifesta por intermMio de uma expresaio intereasada da 80-

eiedade, que , a ute. Bata 6 que tem 1UD& fungio human&,

imediatiatae maior que a eriaPo hedonfltiea da beleza . Bdentro della funeionalidade humana da ute e que 0 usuntoadquire 111& ftlor primordial e repreaenta uma menaagem im·pl'elCindivel. Ora, como atualizaoio da inteligencia artfatieae que 0 movimento moclemiata representou papel eontradit6rioe muitu v.. IrAveJDente preeUio. '.

AtuaiI, atnal_JIHlI, UD.iveraill , originaia mesmo Porvezee em noaa peaquiaaa e criagOel, n6e, 08 participantes doperiodo milhormente c h a m a d o "moderniata", fomos, eom algu.mas exee~ Dada eonvineentes, vitim .. do nOll8Opruer davida e d~ featan9& em que nOlIdesvirilizam... 8i tudo mudA-vamos em n6s, uma eoisa no. esqueeeIDOIde mudar: a atitudeinteressada diante da vida eontempodnea. B isto era 0 prin-cipal ! M a s aqui meu peDll&lllentoBe torna tio delieadamenteeonfissional, que terminarei e.te diseuno falando mais direta-mente de mim. Que Be reeonh~ no que eu vou dizer os queo puderem.

. Nio tenho a minima reaerva em afirmar que toda a minhaobra representa uma dedi~ felil a problemas do meu tem-

po e minha terra. Ajudei eoisu, maquinei eoisas, fiz coisas,,muita eoisa I Bno entanto me BObraagora a aentenga de que.liz·muito pouco, porque tocl08 08 meU8feito. derivaram dumailusio vasta. E eu que llempre me pensei, me senti mesmo,sadiamente banhado de amor humano, ehego no declinio davida 8 eonvi~ de que faltou humanidade emmim. Meuaristocr~eismo me puniu. . )(jobu inten90es me enganaram.

Vitima do meuindividuali8mo, proellrO em vio nas minhasoDras, e tambemnas.de··muit08 coIDpanheir08, uma paino mais· teM.porAnea, uma' dor.maiaYiri" <landa. Nio tem. Tem maise uma antiquada' a_neia de realidade em muitos de n6s. Es-tourepisando o:que ja ·d iMsea· um .m~o. . . E outra eoisa

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.mio 0 respeito que tenho pelo deatino dos maia novOilBe fa·sendo, nio me levaria a esta eonfillio bastante eruel, de per-eelA'r em quue toda • miuha obra a inauficiencia do absten-cionilmo. Franeos, dirigidos, muitoa de nOs demos a s n08lUobras uma caducidade de eombate. Bltava cerro, em princ!.pio. 0 engano e que nOlIpUleDlO8eombatendo len~is super·

ficiais 4 1 ! fantasmas.. D ev erfam O i l ter inundado a caduci-dade utilitaria do nosso diseurso, de maior angUatia do tempo,de maior revolta contra a vida como esla. Em ve.: fomosquebrar vidros de janelas, diseutir modas de puseio, ou eutu-car os valores eternos, ou saeiar D08I& euriosidade na eultura,E si agora pereorro_a minha obra ja numel'Oll&e que representauma vida trabalhada, nio me vejo uma s6 vez pegar a mas-cara do tempo e esbofetea-la como ell. merece. Quando muitoUte fiz de longe umas caretas. Mas isto, a mim, nlio me.. tisfaz.

Nio m e imagino. politico de a~. Mas nos estam08vivendo uma idade politica do homem, e a isso eu tinha que

servir. Mas em sintese, eus6 me percebo, feito um AmadorBueno qualquer, falando "nio quero" e me isentando da atua-lidade por detres dasportas contemplativas de um eonvento.Tambem nio me desejaria escrevendo pAginas explosivas, briogando a pau por ideologias e ganhando 08 louros faeeis de umxilindro. Tudo isso nio sou eu nem e pra mim. Mas estoueonveneido de que deviamos ter nos transformado de espeeula-

tivos em especuladores. Ha sempre jeito de escorregar numangulo'de visio, numa eseolha de valores, no embseado dumal&grima que avolumem ainda mais 0 insuportavel das eondi-

~ atuais do Mundo. Nio. Vir8.m08 abtencionistas abate..mios e transcendentes (1). M A s por isso mesmo que Cui sin-

eerissimo, que desejei ser fecundo e joguei lealmente com todasas minbas cartas A vista, alcan~o agora esta conciencia de quefomos bastante inatuais, Vaidade, tudo vaidade ...

Tudo 0 que fizemos... Tudo 0 que eu fiz foi especial.mente uma eilada da minha felicidade pessoal e da festa emque vivemos. 1 I J alias 0 que. com deeepeao aenearada, nosexpliea histOrieamente. NOs ~ram08 08 filhos finais de umaeiviliza~lio que se aeabou, e e sabido que 0 cultivo delirante doprazer individual represa as fo~ dos homens sempre queuma idade morre. E ja mostrei que 0 movimento modernista

(1) "U u "erd.deiroa iaeoDcieDt.", como j' falel um a "ea.••

 

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loi tlaRnIidol '. KuitoI poriIIl ultr&pa"·. _ ,.. .....

...., ..... cWyI.,. fiear DO1811eapfmo. ipal..", u.o

~, embora 1ID bocado t1ll'tu~eante, 80 du ~ ~aovIL 11M .apeaar das lineer88 mten9&e boaa que dirigiram

a minha obra e a deformaram muito, na verdade, aeri que nioterei ~o apenaa, me iludindo de existir'. .. :A eerto que

eu lIleI 8 D . t ia

responaabilizado pelaa fraquezas e as dftgraoasdol hom-. :Ieerto que pretendi regar minha obra de orva-.. m aia pMrOIIOI, nja-la nu impurezu da dar, sair dolimbo "tie tNto tie l ief . . ' da minha felieidade peaoa1. Mas

pelO pr6prio exerefcio da felicidade, mas peJa p~pria altivezl8Da1lal_ima do individualismo, nio me era mall p_vel re-

nega-lOi como urn ~rro, embora eu ehegue um pouee tarde 1conTi~ da Bua meaquinhez.

A Unica obIervaolo que pode truer algoma complaeineiapara 0 que eu lui, , que eu eetava enpnado. Julgava since-

ramente cuidar ma. da vida que de m i m . . :Deformei, ningu6mnio imagina quanto, a minha obra - 0 que nio quer dUer que

si nio fizesae iaso, ela fOlIe milhor... Abandonei, traioioeoneiente a fiCOio,em favor de um homem-de-elltudo que fun-damentabnente nio sou. Mas ' que en deeidira impregnartudo quanto fuia de um valor utilitario, um valor pritieo de

vida, que fosse 8lguma co.. mais terreatre que fieoio, pruerelltetico, a beleza divine.

Mas eis que chego a a.te parldoxo irrespirbel: Tendodeformado toda a minha obra por umanti-individu8lismo diri-

gido evoluntarioso toda a minha obra nio , mais que umhiperindividullillDo' implacbel! E' melane6lieo ehegar u-8im no crepu.eulo, &emeontar com a solidariedade de Iimesmo.

Bu nio pOMO estar utilfeito de mim . 0 men puudo nio ~mais meu eompanheiro. Bu deseonfio do meu ~o.

Mudar' AcreteentU' Kas como eaqueeer que ..tou narampa dOl cineoenta anOi e que 08 meus c e a to a . . . .. j& aie

todos. .. mem6riu l I I 1 1 I C u 1 a r e I ' . . . Bs O M _ " ' . , HMa qtIGf

1&omi"itribuit _"ro, _ t & U " • . . 'i., ",. t""pufivG MOr l • •• •

o terrivel e que talvez ainda n08 .ja.mail aoertada a diIcre-0 1 0 , a virarm08 por at caeoeteil 'ot d e atualidade, macaqueando.. atuais aparmeias do mundo .. ApartDe_ que le ....do 0 ho-

mem por certo a maior perfeioio de I1l& vida. lie l'eCUSO aimaginar D8 inutilidade daa t r a c6 di u eontempor&neM. 0

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H O M O I.becilU acabari. entrepndo 08 pontos A grandeza do. u delltino.

Eu ereio que 08 moderniatu da Semana de Arte Modernanio devemos semr de ezemplo a ningum. M as podemos eer-vir de lioio. 0 homem atrav_ uma fue integralmente po-lftica da humanidade. Nunca jamais ~le foi tio "momentA-

neo" como agora. Os abstencionillD08 e 08 v81oreseternospodem fiear pra depois (1). Eapear da nossa atu81idade, danOl8a naeionalidade, da nossa univel 'll&lidade, uma eoisa nioajudim08 verdadeiramente, duma coisa nio partieipimOl: 0

amilhoramento polftico-social do homem. E esta , a esseneiamesmada nOll8&dade.

Si de algUma coisa pode valer 0meu desg6sto, a insatiafa-~o que eume eanso, que 08 outros nio sentem assim na beirado caminho, espiando a multidio paaar. Fac;am on se recusema fuer arte, ci~neiu, oficios. Mas nio fiquem apenas nisto,espiOes da vida, eamuflados em ~niC08 de vida, espiando amultidio passer, Marchem com as multidOes.

Aos espioes nunea foi necessaria eaIa "liberdade" pelaqual tanto se grita. Nos periodos de maior escravizaoio doindividuo, Grooia, Egito, artes e ciencias nio deixaram deflorescer. Sera que a liberdade e uma bobagem'... Ser'que 0 direito , uma bobagem!... A vida humana ~ que 6alguma coisa a mais que eieneias, artes e profissoes. E e nessavida que a liberdade tem um sentido, e 0 direito dos homens.A liberdade nio e um premio, e uma san~io. Que ha-de vir.

(1) Se i que e impolllVel ao homem, nem Be deve abandoDarOl nlo-rea eternoa, amor, amiude, Deus , a na tun!IIIl . Quero exatamente dize r que

numa idade humana como a que vivemos, cuidar des- valores apenas e Bendugiar neles em Jiwos de fi~o e mesmo de tecnica, e um abstencionismodeIonesto e deeoaneo como qualquer outro. Uma covardia como qualqueroutra. D e reato, a fonaa polftica cia lOCiedade e am nlor etemo ~m.