maritimidade

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Alexandre Queiroz Pereira Enos Feitosa de Araújo Antonio Tadeu Pinto Soares Junior Marília Natacha de Freitas Silva Bruno Rodrigues da Silveira Maritimidade na Metrópole: estudos sobre Fortaleza - Ceará

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  • Alexandre Queiroz PereiraEnos Feitosa de Arajo Antonio Tadeu Pinto Soares JuniorMarlia Natacha de Freitas SilvaBruno Rodrigues da Silveira

    Maritimidade na Metrpole:estudos sobre Fortaleza - Cear

  • Fortaleza2013

    Alexandre Queiroz PereiraEnos Feitosa de Araujo

    Antonio Tadeu Pinto Soares JuniorMarilia Natacha de Freitas Silva

    Bruno Rodrigues da Silveira

    Maritimidade na MetrpoleEstudos sobre Fortaleza-CE

  • M342 Maritimidade na metrpole: estudos sobre Fortaleza - CE / Alexandre Queiroz

    Pereira... [et. al.]. Porto Alegre: Liro, 2013.

    165f.

    Vrios autores: Alexandre Queiroz Pereira, Enos Feitosa de Araujo, Antonio

    Tadeu Pinto Soares Junior, Marilia Natacha de Freitas Silva, Bruno Rodrigues da

    Silveira.

    ISBN 97885.62628.77-1

    1. Geografia humana. 2. Turismo. 3. Prticas martimas. 4. Cear. I. Pereira,

    Alexandre Queiroz. II. Araujo, Enos Feitosa de. III. Soares Junior, Antonio Tadeu

    Pinto. IV. Silva, Marilia Natacha de Freitas. V. Silveira, Bruno Rodrigues da.

    CDU

    908.813.1

    Ficha catalogrfica elaborada por Jlia Agustoni Silva CRB 10/1788

  • SUMRIO

    APRESENTAO ........................................................................... 05Alexandre Queiroz PereiraCAPITULO 1A Vilegiatura Martima na Metrpole: Morfologia e Tipologias espaciais ............................................................................................... 09Alexandre Queiroz Pereira

    CAPTULO 2As polticas pblicas e os espaos tursticos no litoral da Regio Metropolitana de Fortaleza ............................................................... 47Enos Feitosa de Arajo

    CAPTULO 3Da fuga diluio: a espacializao do vilegiaturista no litoral de Fortaleza .............................................................................................. 77Antnio Tadeu Pinto Soares Junior

    CAPTULO 4Empreendimentos Tursticos Imobilirios no litoral metropoli-tano de Fortaleza .............................................................................. 99Marlia Natacha de Freitas Silva

    CAPTULO 5O Morar Permanente na localidade praiana do Icara - Ce ........................................................................................................................... 127Bruno Rodrigues da Silveira

    REFERNCIAS .............................................................................. 153

  • APRESENTAO

    No ano de 2002, aps doutorado na Universidade Paris--Sorbonne, o Professor Eustgio Wanderley Correia Dantas publicou, na capital cearense, o livro Mar Vista: estudo da maritimidade em Fortaleza. A partir de ento, inaugurou-se no Brasil uma linha de pesquisa que ampliaria a forma de compreender as cidades litorneas-martimas nos trpicos. Ao discutir as prticas martimas modernas o turismo litor-neo, a vilegiatura martima, os banhos de sol e os de mar , o Professor demonstrou a relevncia da abordagem geogrfica no entendimento de fenmenos da sociedade urbana.

    Alm da repercusso de seus escritos, Eustgio Dan-tas, ao desenvolver orientaes nos cursos de ps-graduao stricto sensu da Universidade Federal do Cear UFC vem compartilhando suas experincias e incentivando pesquisa-dores iniciantes a elaborar em estudos que buscam, em sua essncia, compreender a racionalidade nas/das transforma-es no espao urbano e litorneo. Atualmente, so inme-ros os artigos, os captulos de livro, as dissertaes e as teses que discutem o gosto social pelo mar e pelo martimo nos trpicos. O presente livro fruto desse contexto. Todos os captulos tm origem em estudos desenvolvidos no Programa de Ps-Graduao em Geografia da UFC, cujos autores so ex-orientandos do Professor.

    Expostas as filiaes tericas, preciso esclarecer que o litoral metropolitano constitui, pois, o principal foco de estu-do dos artigos reunidos neste trabalho. Segunda maior aglo-merao metropolitana do Nordeste, a Regio Metropolitana de Fortaleza RMF representa, estadualmente, um subespa-

  • o onde se concentram os principais investimentos pblicos e privados. Nesse contexto, a sua condio litornea-martima apresenta-se como condicionante diferenciada no espao--tempo atual.

    A insero do litoral metropolitano como lugar de pr-ticas martimas modernas redimensionou as hierarquias urba-nas, ao passo que atribui metrpole a captao de feixes de relaes internacionais sem passagem por metrpoles hierar-quicamente superiores (So Paulo e Rio de Janeiro). Tem-se um quadro complexo no interior da RMF. Enquanto a cidade primaz ganha relevncia, as demais municipalidades so frag-mentadas em espacialidades litorneas regidas por verticalida-des, ou seja, por fluxos de origem externa que atravessam os lugares, impondo uma nova configurao hierrquica e terri-torial.

    Diante desse cenrio mltiplo e complexo, este livro, ao investigar os efeitos da difuso da maritimidade moderna, prope-se a dar uma contribuio ao entendimento da geo-grafia urbana do espao litorneo metropolitano de Fortaleza. Assim sendo, seus cinco captulos contemplam temas varia-dos: a vilegiatura e a morfologia urbana do litoral metropolita-no; as polticas pblicas e o turismo litorneo; os vilegiaturis-tas alctone e autctone na metrpole; os novos padres de empreendimentos imobilirios relacionados s prticas mar-timas; a relao entre o morar permanente e o morar ocasio-nal nas praias metropolitanas.

    No captulo de abertura, A vilegiatura martima na me-trpole (morfologia urbana e tipologias espaciais), Alexandre Pereira apresenta aos leitores a rede de localidades litorneas inserida na RMF. O autor enfatiza os impactos promovidos pela difuso do gosto social pela estada temporria beira-

  • -mar e descreve a morfologia urbana constituda nos fronts de expanso do tecido litorneo-metropolitano.

    Desenvolvido por Enos de Arajo, o captulo As pol-ticas pblicas e os espaos tursticos no litoral da Regio Me-tropolitana de Fortaleza compreendem os fundamentos do planejamento regional/estadual e sua relao com o desen-volvimentoe a execuo de polticas pblicas voltadas orga-nizao do espao e s prticas tursticas no litoral da RMF.

    O captulo Da fuga diluio: a espacializao do vile-giaturista no litoral de Fortaleza, produzido por Tadeu Soares Junior, estabelece uma reflexo vislumbrando o contexto da primeira dcada do sculo XXI, quando se consolida a prtica da vilegiatura martima em uma metrpole como Fortaleza. O texto espacializa o vilegiaturista martimo na cidade, identifi-cando manchas multiculturais na capital cearense.

    No quarto captulo, denominado Empreendimentos tu-rsticos imobilirios no litoral metropolitano cearense, Marlia Natacha de Freitas Silva prope uma discusso acerca da es-pacializao dos investimentos estrangeiros e sua relao com as transformaes no litoral metropolitano. Para tanto, so identificados e descritos as tipologias imobilirias (e formas de propriedade) e o perfil dos novos usurios desses empre-endimentos da RMF.

    Bruno da Silveira o autor do ltimo captulo, O morar permanente na localidade praiana de Icara-CE. Em funo do turismo e da vilegiatura martima, tal localidade conheci-da historicamente por ser ncleo antigo de residncias secun-drias no Cear. Compreendendo a complexidade das prticas martimas modernas, o autor percebe um fenmeno peculiar s localidades expostas expanso imobiliria metropolitana e aponta as consequncias socioespaciais do crescimento de moradores permanentes nesse territrio praiano.

  • Ao fim desta apresentao, expressamos nossa gratido, em primeiro lugar, aos nossos familiares, pelo apoio e pela compreenso. Ao Professor Eustgio Dantas, pelo incentivo incondicional produo cientfica geogrfica. s agncias de fomento, Funcap, CNPq e Capes, pelos incentivos diretos na elaborao dos trabalhos.

    Desejamos a todos uma tima leitura!

    Os Autores.

  • CAPTULO 1A Vilegiatura Martima na Metrpole: Morfologia e

    Tipologias espaciais

    Prof. Dr. Alexandre Queiroz PereiraUniversidade Federal do Cear - UFC

    INTRODUO

    Como afirmava Santos (1997), cada lugar , sua manei-ra, o mundo. Os lugares so elementos fundamentais das re-des geogrficas, constituindoparcelas espaciais produzidas,em diferentes intensidades, pelas marcas das transformaes mundiais. Indubitavelmente, essa afirmao terica encontra no tempo presente sua maior comprovao.

    O espao litorneo metropolitano, por sua vez, inclusive pela efetivao das prticas martimas modernas, corresponde a uma rede de lugares, articulados s racionalidades locais e estrangeiras. Contudo, a rede no teria materialidade sem o rebatimento das prticas sociais nos lugares. Sabe-se que uma nica atividade no rege absolutamente um lugar, todavia, te-rica e empiricamente, admite-se que existam aes predomi-nantes ou representativas na produo desses lugares.

    Assim sendo, para interpretar a espacialidade da vile-giatura martima nos lugares praianos dos municpios me-tropolitanos de Fortaleza prope-se identificar e descrever a morfologia urbana (inclusive as infraestruturas bsicas das localidades), como tambm quantificar, localizar e detalhar os empreendimentos imobilirios relativos vilegiatura.

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    Morfologia urbana e infraestrutura bsica das localidades praianas da RMF

    No processo de metropolizao do lazer em Fortaleza, alm da capital, cidade primaz e espao irradiador das princi-pais dinmicas metropolitanas, existem outros quatro muni-cpios litorneos que sediam as espacialidades prprias dessa metropolizao: a oeste, Caucaia e So Gonalo do Amaran-te; a leste, Aquiraz e Cascavel. So esses municpios que for-mam o principal recorte socioespacial da vilegiatura martima no estado do Cear (Mapa1).

    Mapa 1 Localidades litorneas da Regio Metropolitana de Fortaleza RMF

    Fonte: DER, IPECE, IBGE, 2011.

    Com exceo da localidade porturia de Pecm, a malha urbana da faixa litornea cearense conformada por veto-

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    res convencionais, ou seja, pela predominncia do comrcio e dos servios, das habitaes permanentes, dos domiclios de uso ocasional, e dos demais empreendimentos relacionados ao turismo e vilegiatura.

    As dcadas sucessivas de ocupao resultaram numa apropriao da faixa litornea metropolitana de aproximada-mente 68 km de extenso, sendo Caucaia e Aquiraz os mu-nicpios com as maiores extenses, de 25,3 km e 17,5 km, respectivamente. Seguindo as dimenses naturais da plancie litornea cearense, as construes avanam, na mdia (mxi-ma), uma distncia litoral-continente igual a 2 km. Em termos de rea, os fragmentos urbanos litorneos alcanam valor igual a 7.020 hectares, com localidades que ocupam 70 hec-tares (Iguape) e outras, 1.000 hectares (Cumbuco e Porto das Dunas), como mostrao Quadro 1.

    Quadro 1 Extenses das ocupaes urbanas nas localidades litorneas situadas nos municpios metropolitanos de Fortaleza

    Municpio Localidade Extenso litoral (km)

    Extenso mdia do adensamento continental (km)

    rea ocupada

    (ha)Mnima Mxima

    So Gonalo

    do Amarante

    Taba 8,3 0,4 1,2

    700Pecm 7,0 0,8 2,0

    900Colnia 1,4 0,4 0,5

    100Subtotal 16,7 - -

    1700

  • Alexandre Queiroz Pereira

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    Municpio Localidade Extenso litoral (km)

    Extenso mdia do adensamento continental (km)

    rea ocupada

    (ha)Mnima Mxima

    Caucaia Cumbuco 11,0 1,0 1,81000

    Tabuba 3,8 0,8 1,3350

    Icara 3,7 1,1 1,8170

    Pacheco 2,8 0,7 1,4440

    Iparana 4,0 0,4 1,2300

    Subtotal 25,3 - -2260

    Aquiraz Porto das Dunas

    6,0 1,0 1,21000

    Prainha 3,3 0,8 1,1300

    Iguape 2,2 0,2 0,470

    Barro Preto 1,7 0,2 0,9140

    Presdio 2,0 0,4 1,1190

    Batoque 2,3 2,0 2,1270

    Subtotal 17,5 - -1970

    Cascavel Balbino 2,2 1,0 1,3220

    Barra Nova 0,7 1,0 4,0440

    Caponga 2,7 1,0 1,3 330guas Belas

    1,5 0,7 1,0

    100Subtotal 8,1 - -

    1090Total 67,6 - -

    7020Fonte: DER, Google Earth Pro, 2011.

    O tecido urbano dessas localidades pode ser classifica-do, entre outros critrios, pelas conexes e formas que elas assumem e pela densidade da rea ocupada. Com referncia ao primeiro critrio, pode-se dizer que Fortaleza representa uma ocupao em matriz e a partir dela o tecido urbano se

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    estrutura, ou se prolonga, contnua ou descontinuamente, em forma de linhas e fragmentos (ou manchas). Nesse sentido, admite-se que o nico exemplo de organizao em forma de linha o caso do litoral de Caucaia, representado pela exten-so que se inicia em Iparana e prolonga-se, ininterruptamen-te, at Cumbuco. Para os demais municpios, as localidades apresentam-se em forma de manchas simples (formadas por uma nica localidade) ou manchas compostas (formadas pelo agregado de duas ou trs localidades menos extensas). No primeiro caso, temos exemplos de Porto das Dunas, Prainha, Taba e Barra Nova. No segundo, podem-se nominar Barro Preto-Iguape-Presdio, Caponga-guas Belas e Pecm-Col-nia. preciso lembrar que mesmo um fragmento considerado simples pode ocupar rea superior aos fragmentos compos-tos, situao identificada quando se compara Porto das Du-nas ao conjunto formado por Barro Preto-Iguape-Presdio.

    Complementarmente, e tambm em funo de uma classificao morfolgica, pode-se qualificar o tecido urbano pelos nveis de ocupao dos lugares. Assim, h espaos onde o tecido urbano est consolidado ou em expanso, e outros, com ocupao rarefeita. Na primeira morfologia, incluem-se as reas com ocupao sem claro padro de distribuio assi-mtrica de lotes urbanos, mas com densidade significativa de imveis. Nessa situao esto as localidades onde se sediam ncleos originais de populaes tradicionais do litoral (Ca-ponga, Pecm, Taba, Iguape, Prainha).

    Tambm no primeiro padro morfolgico enquadram--se localidades derivadas dos loteamentos beira-mar com intensa ocupao (Porto das Dunas, Cumbuco, Icara, Tabu-ba, Presdio e Colnia). Observam-se ainda as glebas vazias, todavia abertas expanso urbana (muitas com rea superior

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    s localidades ocupadas), onde vislumbrada a instalao dos complexos imobilirios-tursticos . Na RMF existem aproxi-madamente sete setores dessa natureza: i) entre Barra Nova e guas Belas; ii) entre Caponga e Balbino; iii) entre Batoque e Barro Preto; iv) entre Presdio e Prainha (espao onde se ins-talou o Aquiraz Riviera); v) entre Prainha e Porto das Dunas (rea onde vem sendo construdo o Aquiraz Golf Village); vi) entre Cumbuco e Pecm; vii) entre Pecm e Taba (Mapa 2 e Figura 1)

    Figura 1 Esquemademonstrativo da ocupao do espao litorneo metropolitano do Cear. Fonte: Pensado pelo autor. Desenhado por Gardene Cunha.

    Uma subclassificao do primeiro padro citado pode ser construda a partir da predominncia de imveis horizon-tais e verticais nas localidades. Seguindo a metodologia do Projeto Orla (2002), quatro perfis so possveis: i) orla hori-zontal, ocupada por casas e/ou edifcios de, no mximo, trs andares (em mais de 50% da rea) ou apresentando manchas de tal tipo de construo; ii) orla verticalizada baixa, parcial-mente ocupada por edifcios de mais de trs andares (em mais de 50% da rea), no ultrapassando cinco andares ou 18 me-tros de altura; iii) orla verticalizada, caracterizada pela presen-a de edifcios, em mais de 50% da rea, com altura superior

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    s apresentadas nas orlas verticalizadas baixas; iv) orla mista, definida pela descontinuidade morfolgica, isto , quando em toda a rea urbanizada no se observa uma predominncia numrica e visual de nenhum dos tipos de edificaes apon-tados.

    Pelos critrios estabelecidos, nenhuma das localidades litorneas metropolitanas em foco pode ser considerada orla verticalizada, j que a maioria delas distingue-se como orla horizontal. Em outro contexto, a ocupao de Porto das Du-nas e Cumbuco est em transformao, saindo da condio de orla horizontal em direo supremacia de edifcios com mais de trs andares. Restritamente, Icara o nico dos lu-gares passvel de enquadramento na categoria de orla vertica-lizada baixa. Nessa paragem, mais de 50 quadras, inclusive as situadas de frente para o mar, so ocupadas por condomnios de trs, quatro e cinco andares, produzidos, em maioria, nos anos 1980, 1990 e 2000 (SILVEIRA, 2011).

    Os lugares de ocupao rarefeita concretizam-se no caso de comunidades tradicionais de pescadores as quais re-sistem s dinmicas econmicas relativas ao modelo de posse da terra, ou seja, bloqueiam as leis do valor do solo urbano, imputando terra valor cultural, simblico, tornando-a pro-priedade coletiva. De acordo com o Projeto Orla (2002), tais reas podem ser consideradas como de interesse social. Elas subvertem a lgica predominante, estabelecendo o planeja-mento com base local e elaborando restries disseminao social, econmica e imobiliria das prticas martimas mo-dernas. Batoque e Balbino so os exemplos desse modelo de ocupao na RMF.

    Definidas as formas urbanas presentes nos lugares beira-mar, torna-se significativo identificar, complementar-mente, os desdobramentos infraestruturais da insero dessas

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    reas na lgica de valorizao dos espaos litorneos, ou me-lhor, detalhar, em escala intraurbana, quais elementos funcio-nais compem e permitem os usos atribudos a esses lugares.

    Mapa 2 Vias de acesso e manchas de ocupao urbana litornea nos municpios de So Gonalo do Amarante, Caucaia, Aquiraz e Cascavel

    Fonte: Trabalho de campo. Elaborado por PEREIRA, A. Q.; ARAJO, E. F.

    O Quadro 2 exibe as estruturas fsicas e os servios b-sicos (urbanos) instalados nas 18 localidades litorneas situ-adas nos municpios de So Gonalo do Amarante, Caucaia, Aquiraz e Caucaia. Os quesitos pr-definidos foram alocados em oito categorias (sinalizao de acesso; vias; transporte co-letivo; saneamento bsico e limpeza; energia e telecomunica-es; servios pblicos bsicos; comrcio e servios privados;

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    lazer), tendo a averiguao das informaes se dado emtraba-lhos de campo durante os anos de 2010 e 2011, quando foram efetuadas observaes in loco e entrevistas com moradores e comerciantes.

    No item sinalizao, foram detectadas, ao longo das vias de acesso e nas proximidades de todas as localidades, placas indicativas do percurso correto. Contudo, para Colnia, Pa-checo, Iparana, Batoque e Balbino, observou-se nmero re-duzido de sinalizao, geralmente pontuada a poucos quil-metros das referidas localidades.

    Em relao s vias, preciso explicar que as constata-es focalizam apenas o sistema virio interno s estaes balnerias. Dessa forma, as melhores condies apresentam--se em Taba, Pecm, Cumbuco, Tabuba, Icara, Iguape e Bar-ra Nova, posto que as vias nessas localidades esto recobertas de algum tipo de pavimento (asfalto ou pedra tosca). Vale lembrar que essas praias abrigam as ocupaes mais antigas do litoral, algumas inclusive sediam distritos municipais (Ta-ba, Pecm e Iguape), tendo maior quantidade de domiclios permanentes. Nesse contexto, Tabuba constitui uma exceo. O processo de expanso dessa localidade se fez em forma de parcelamento urbano com infraestrutura prvia, o que explica a situao atual. O sistema virio se apresenta insatisfatrio em dez localidades, em decorrncia do elevado nmero de ruas constitudas unicamente de terra e/ou piarra,onde no existem condies adequadas para o escoamento superficial das guas pluviais, resultando em problemas de trafegabili-dade. As localidades nessa situao so conformadas total ou parcialmente por parcelamentos urbanos das dcadas de 1970 e 1980, perodo no qual os empreendedores imobilirios no se responsabilizavam pelo provimento das infraestruturas b-sicas (no caso o pavimento). Em se tratando desses arquti-

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    pos, no litoral metropolitano, Porto das Dunas o exemplo mais contrastante .

    No litoral metropolitano, as duas opes de transporte coletivo so rodovirias: os nibus de empresas de transpor-te e veculos menores (tipo van) de proprietrios individuais organizados em associaes e registrados no rgo regulador do trnsito. Em localidades como Colnia, Batoque, Balbino e guas Belas, as linhas de transporte tm nmero de viagens reduzido, impedindo o uso desse tipo de conduo por mo-radores e por possveis banhistas (visitantes) despossudos de automvel particular.

    O sistema de abastecimento de gua potvel e o esgota-mento sanitrio so precariedades evidentes no litoral metro-politano. Apenas em sete localidades existe sistema de abas-tecimento pblico (por encanamento). Nas demais (e mesmo nas j mencionadas), os empreendimentos tursticos, os vi-legiaturistas (proprietrios de imveis) e os moradores mais abastados tm construdo poos profundos privados. Aos moradores com menor renda resta a coleta de gua nos cha-farizes (geralmente instalados pelas prefeituras) e nas bom-bas dgua (mecanismo manual de suco de gua em poos raros). O uso desses sistemas, nada obstante, no garante a qualidade do recurso hdrico extrado,principalmente porque todos os lugares, exceo da localidade porturia de Pecm, no so atendidos por sistema de esgotamento sanitrio, o que impe o uso de fossas spticas (altamente poluidoras do lenol fretico).

    A rede eltrica um dos nicos requisitos instalados em todas as localidades,assim como tambm a telefonia fixa (exceto em Balbino). Em relao aos outros meios de comu-nicao, e sabendo que tampouco existem sistemas via cabo

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    nas localidades, as tecnologias de propagao de ondas sem fio possibilitaram a difuso da internet e da TV por assina-tura (chamados canais fechados). Com relao entrega de correspondncia, s existem postos nos lugares com maior nmero de domiclios permanentes. Em outras localidades, a ausncia desse servio se deve no efetivao de parcerias entre as prefeituras e a empresa oficial de Correios, na medida em que essas parcerias definem a instalao dos chamados postos avanados.

    No que tange aos servios pblicos bsicos (educao, sade e segurana), constatada a difuso das escolas de me-nor porte (ensino infantil e fundamental), ausentes somente em Colnia, que usa os servios de educao instalados em Pecm. As escolas bsicas (nvel mdio de ensino), de respon-sabilidade do governo estadual, situam-se em cinco localida-des (Taba, Pecm, Tabuba, Iparana e Iguape), e atendem aos alunos de comunidades do entorno.

    As denominadas unidades de sade se caracterizam como postos que sediam os servios do Programa Sade da Famlia , onde so realizados consultas e atendimentos pre-ventivos (vacinao e exames simples). Os casos de urgncia e emergncia so encaminhados para os hospitais municipais (localizadas nos distritos-sede) ou diretamente para as unida-des hospitalares de maior complexidade em Fortaleza.

    Dos servios pblicos, o que importam diretamente aos anseios dos vilegiaturistas proprietrios de segundas residn-cias so as estratgias de segurana pblica. Nesse quesito, so corriqueiras as reportagens de jornal destacando as localida-des praianas desprotegidas e potencialmente expostas s ati-vidades criminosas (principalmente, roubos e assaltos). Isso latente, inclusive nos discursos dos turistas e vilegiaturistas pioneiros. Com a instituio do programa de patrulhamento

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    (conhecido como Ronda do Quarteiro), todas as praias dis-pem atualmente desse servio. Apesar disso, em mais de dez praias foram constados sistemas privados de segurana. Em determinados casos (Porto das Dunas e Presdio), grupos de moradores e vilegiaturistas contratam empresas de vigilncia que atuam nas suas ruas e atendem aos referidos contra-tantes. A isso se incluem as aparelhagens instaladas individu-almente nas casas e nos condomnios (cercas eltricas, alar-mes sonoros, guarda-costas e sistema de cmeras). Por essas caractersticas, os procedimentos de segurana, nos lugares de vilegiatura, assemelham-se aos desenvolvidos nos diver-sos bairros das cidades e metrpoles brasileiras. O discurso e a sensao de violncia iminente orientam as prticas no lugar, inclusive a arquitetura das segundas residncias. Assim, nos novos padres, as casas e os condomnios tornam-se au-tossuficientes, atribuindo rua um papel secundrio.

    Os estabelecimentos comerciais e os servios privados das localidades podem ser considerados precrios. A rede de abastecimento de bens de consumo residencial composta por pequenas mercearias, onde so vendidos principalmente alimentos. Os pontos de comrcio de maior expresso esto instalados em Pecm, Cumbuco, Tabuba e Icara. As farmcias apresentam-se em maior nmero, mas restringem-se s para-gens que tambm so distritos municipais. Em nenhuma das paragens litorneas visitadas h agncia bancria. Os servios dessa natureza so parcialmente realizados por correspon-dentes bancrios, equipamentos eletrnicos (caixa eletrnico) e agncias lotricas. Esses estabelecimentos substitutivos no existem na totalidade das localidades, restringindo-se a Taba, Pecm, Icara, Porto das Dunas, Iguape e Caponga.

    Ainda foram registrados os chamados centros comer-ciais varejistas. Em termos explicativos, esses centros se ca-

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    racterizam por agrupamentos de pequenas lojas de merca-dorias e servios variados (incluindo os estabelecimentos anteriormente mencionados, lojas de vesturio e de utenslios domsticos, oficinas, cabeleireiros, entre outros), geralmente dispostos na rua principal da localidade, onde tambm esto a praa de lazer e o templo da Igreja Catlica (formas comuns nas localidades e nosdistritos no Nordeste).

    A estrutura ora descrita indica fenmeno contrrio tese de que o espao litorneo (e, por assim dizer, as locali-dades) tende, em funo das prticas martimas modernas, a dissipar a dependncia em relao aos outros lugares intramu-nicipais, sobremaneira o distrito-sede. Os vilegiaturistas me-tropolitanos e os alctones fazem uso das estruturas de co-mrcio e de servios urbanos da cidade primaz, e, por muitas vezes, tambm usufruem dos estabelecimentos situados nas sedes municipais. A independncia , na verdade, incoerente com as dinmicas prprias do processo de metropolizao.

    No caso do litoral metropolitano cearense, os servios e os comrcios locais diversificam-se, tanto em quantidade como em qualidade, medida que aumenta o nmero de mo-radores permanentes. Nesse contexto, Silveira (2011) consta-ta o nmero crescente de moradores permanentes em Icara (CE), descrevendo, concomitantemente, um aglomerado de comrcio e servios que se diversifica com o tempo, no eixo virio principal da localidade.

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    Quadro 2 Componentesurbanos e infraestrutura bsica das locali-dades do litoral metropolitano de Fortaleza

    Infraestrutura e demais

    componentes

    Municpios/LocalidadesS. G.

    Amarante Caucaia Aquiraz CascavelTa

    ba

    Col

    nia

    Pec

    m

    Cum

    buco

    Tabu

    la

    Icar

    a

    Pac

    heco

    Ipar

    ana

    Por

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    unas

    Pra

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    o

    Igua

    pe

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    ro P

    reto

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    bino

    Cap

    onga

    gu

    as B

    elas

    Bar

    ra N

    ova

    Sin

    . de

    aces

    so

    Sina-lizadoSinali-zao precriaSem placa

    Vias

    Terra e/ou piarraPedra toscaAsfalto

    Tran

    spor

    te nibus

    Alternativos

    San

    eam

    ento

    bs

    ico

    e lim

    peza

    gua por encana-mentoChafarizBomba dguaPooEsgota-mento sanitrioColeta semanal de lixoLimpeza com varredores

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    Infraestrutura e demais

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    Infraestrutura e demais

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    Fonte: Trabalho de campo (2010-2011). As marcaes escuras representam a existncia do quesito. Organizado pelo autor.

    Os componentes do quesito lazer,entre os anteriormen-te analisados, necessitam de um exame cauteloso, a fim de se perceber se houve, ao longo do tempo, instalao de novas estruturas atrativas de turistas e de vilegiaturistas. A tipologia

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    mais comum de espaos ditos pblicos so as praas, que abri-gam as principais festividades das localidades. Construes prximas a calades beira-mar so observadas somente em Caponga, Pecm e Taba. So equipamentos recentes, datados da primeira dcada do sculo XXI, e, no caso das duas ltimas localidades, produzidos com recursos do Prodetur/NE.

    Os espaos privados apresentam-se em maior nme-ro, estando quantitativamente ordenados da seguinte forma: barracas de praia, restaurantes, casas de espetculo e parques temticos. As barracas so estabelecimentos cones das praias cearenses. Fixas, localizam-se beira-mar, dispondo de ser-vios de gastronomia local, e, em alguns casos, de infraes-truturas de lazer aqutico (playground, piscina e tobogua). As casas de espetculo, para o caso em anlise, designam em grande maioria recintos privados e populares, onde se exi-bem, preferencialmente, grupos musicais (os ritmos comuns so o forr e o reggae). Ainda nessa tipologia podem ser in-clusas as boates. Originrias do gosto dos visitantes, esse mo-delo de casa noturna tem sua expresso quantitativa e locacio-nal reduzida a poucas praias (Porto das Dunas e Iguape). Os parques temticos resumem-se aos aquticos, sendo o Acqua Park do Complexo Beach Park o principal parque. Os demais so mais simplificados, caracterizando-se pela presena nica de piscinas e alguns tobogs, geralmente inseridos no interior de pequenos clubes e/ou hotis, como o caso dos consta-tados em Icara (Icara Acqua Play), Iparana (SescIparana), Prainha (Itacaranha Park), Presdio (Jangadeiro Hotel) e Bar-ro Preto (Marinas).

    Contextualizando o caso das praias da Inglaterra ainda no incio do sculo XX, Urry (1996) mencionava um proces-so de decadncia das primeiramente apropriadas pelas pr-ticas de lazer. Segundo o autor, as caractersticas ambientais

  • Alexandre Queiroz Pereira

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    martimas no eram mais suficientes para a manuteno das visitaes, o que exigiu um processo de modernizao base-ado na construo de atrativos (torres e parques temticos). No caso metropolitano cearense, em funo das estruturas de lazer apresentadas, possvel concluir que ainda so as ca-ractersticas naturais as principais motivaes da formao de estaes de lazer martimo. certo tambm citar que condi-es sociais dos lugares (tranquilidade, proximidade a amigos e parentes, modo de vida dos locais) tm seu papel atrativo.

    Em hiptese, essas condies tendem a transformar-se a reboque da instalao das novas tipologias de empreendi-mentos imobilirios. Todavia, vale ressaltar que esses estabe-lecimentos vm se instalando em reas perifricas aos centros tradicionais das localidades. Dessa maneira, a fragmentao socioespacial diversificar-se- em aglomerados tradicionais (ausentes em infraestrutura) e aglomerados de empreendi-mentos (autossuficientes nos vrios quesitos analisados).

    Um desdobramento da vilegiatura martima: o imobilirio para o lazer

    Os empreendimentos e demais imveis referentes s atividades de vilegiatura e turismo so marcas caractersticas das localidades em exame. Numa primeira classificao, po-dem-se distinguir dois conjuntos: os eminentemente relativos hospedagem rotativa (mais prximos ao uso turstico gen-rico) e aqueles onde a vilegiatura tambm se efetua prepon-derantemente, incluindo assim a possibilidade da aquisio da propriedade imobiliria individual.

    O trabalho de campo permitiu o reconhecimento da dis-tribuio espacial das tipologias. Os hotis e, principalmente, as pousadas, esto difundidos por todo o litoral. As excees

  • 27

    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    para a primeira tipologia so Pacheco e Balbino, e, para a se-gunda, Tabuba, Barro Preto, Batoque, Balbino e Barra Nova.

    No que concerne ao conjunto imobilirio (aberto vile-giatura), a tipologia mais tradicional, e tambm totalmente di-fundida, so os imveis unifamiliares: as conhecidas casas de praia. Por essa condio pretrita, a presena desses imveis constatada inclusive em comunidades onde, atualmente, impedida a negociao de terras e imveis (um exemplo a Reserva Extrativista de Batoque).

    Os domiclios de uso ocasional dispostos em condo-mnios demarcam a segunda gerao das formas imobilirias e organizacionais relativas vilegiatura. Como demonstrado em tpicos anteriores, essas formas primeiro instalaram-se em Icara, marcando presena tambm, j na dcada de 1980, em Pacheco e Prainha. A produo de condomnios verti-cais, geralmente instalados em reas de maior adensamento, concentra-se historicamente nas praias de So Gonalo do Amarante, Caucaia, e em parte do litoral de Aquiraz. Todavia, em termos de concentrao, as localidades mais representa-tivas so Icara, Cumbuco e Porto das Dunas. No obstante, h diferenas de padro construtivo e, por derivao, tambm de preos, entre os situados em Icara e aqueles instalados nas duas outras localidades. Na verdade, em termos constru-tivos, os espaos dinmicos contemporneos correspondem a essas ltimas localidades. Se em Icara possvel adquirir um apartamento por um custo mnimo de R$ 60 mil reais (SILVEIRA, 2011), em Porto das Dunas, conforme informa-es da Imobiliria Kalil Otoch, os apartamentos nos novos empreendimentos tm preo mnimo superior a R$ 270 mil.

    Pela rea que ocupam, os condomnios horizontais so mais restritos do que os verticais. Dessa forma, esses con-juntos imobilirios ocupam as expanses promovidas pelos parcelamentos urbanos.

  • Alexandre Queiroz Pereira

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    Segundo o censo populacional de 2010 (IBGE, 2011), dos domiclios de uso ocasional situados em Aquiraz, Casca-vel, Caucaia e So Gonalo do Amarante, cerca de 75% esto localizados nas 18 localidades litorneas destacadas. O ltimo censo tambm permite reconhecer o quantitativo de domic-lios (incluindo os ocasionais) na menor escala de agrupamen-to de dados, o setor censitrio. Assim, pelo agrupamento dos setores censitrios, torna-se possvel reconhecer os dados por localidade.

    Alm da questo espacial, outra discusso a ser realiza-da diz respeito classificao dos domiclios, estando os de uso ocasional contidos numa categoria mais abrangente, a dos domiclios no ocupados, a qual inclui tambm os considera-dos vagos. Essa ltima subcategoria de fato contribui para as imprecises no estudo do imobilirio destinado ao lazer. O imvel vago, principalmente nas localidades litorneas, , em muitos casos, um domiclio de uso ocasional em potencial, ou seja, h possibilidade de ser uma unidade recm-construda em um condomnio ou residencial prioritariamente destinado vilegiatura.

    Feitas tais observaes metodolgicas, avaliam-se os ca-sos a seguir (Grficos 1 e 2):

    i. Icara apresenta o maior quantitativo de domiclios de uso ocasional (2.245), contando ainda com 350 domiclios vagos. Nenhuma outra localidade no Cear tem maior repre-sentatividade numrica em todas as variveis analisadas, exce-to em domiclios vagos. Atendendo a uma demanda local, a produo macia de imveis nos anos 1980 e 1990 em Icara repercute at o presente, posicionando a localidade praiana entre as duas principais reas de vilegiatura do Cear. Entre-tanto, o nmero expressivo de domiclios ocupados (3.118)

  • Alexandre Queiroz Pereira

    30

    e o de populao residente (10.461, Grfico 1) demonstram que Icara agrega a duplicidade de fenmenos relacionados maritimidade moderna: o morar permanente e o morar even-tual beira-mar.

    ii. Ainda no litoral de Caucaia, Cumbuco e Tabu-ba apresentam nmeros semelhantes em relao aos domi-clios de uso ocasional, respectivamente 635 e 436. Todavia, o mais interessante a observar que, proporcionalmente, a participao dos domiclios de uso ocasional mais intensa em Tabuba do que em Cumbuco, e que essa ltima localida-de, mesmo sendo a mais turistificada do municpio, exibe, em comparao s demais localidades metropolitanas, elevados quantitativos de domiclios permanentes (1.659) e de popula-o residente (6.046).

    iii. Em Aquiraz, evidenciam-se os dois nicos ca-sos de localidades com nmero de domiclios de uso ocasional superior ao nmero de ocupados: Porto das Dunas e Presdio. Segundo as informaes censitrias, Porto das Dunas conta com 1.599 domiclios de uso ocasional e 424 ocupados. Ainda h de se considerar o nmero de domiclios vagos (378), o que pode ser explicado pelo elevado nmero de lanamentos imobilirios. Com 424 residentes, no contexto geral, sua po-pulao a quinta menor. Indubitavelmente, os processos das dcadas de 1990 e 2000 transformaram a localidade na prin-cipal estao de vilegiatura martima do Cear. Em termos prognsticos, razovel admitir que, nas prximas contagens, o nmero de domiclios de uso ocasional por ela apresentado ser o maior entre todas as localidades.

    iv. Ainda em Aquiraz, a aglomerao de Presdio constitui-se uma rugosidade importante das dcadas de 1980 e 1990. Os 754 domiclios de uso ocasional constatados so fruto desse perodo. Em termos numricos, as transforma-

  • 31

    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    es tendem a ocorrer a partir da implantao total do com-plexo turstico-imobilirio Aquiraz Riviera, situado em rea adjacente localidade.

    v. Em So Gonalo do Amarante, h certa equidade na distribuio dos domiclios de uso ocasional. Taba e Pecm contam, individualmente, com mais de 900 desses domiclios. Pecm, que atualmente agrega as funes de lazer s indus-triais e s porturias, tem um conjunto imobilirio significa-tivo, situao decorrente da formao de reas de expanso conhecidas como Colnias, em que o nmero de domiclios permanentes (1.878) e de residentes (6.907) bem superior aos apresentados por Taba. Com a industrializao da rea prxima a Pecm (da o aumento expressivo de residentes) e tambm pelo quadro atual, possvel vislumbrar que Taba se consolidar como a principal estao de vilegiatura do muni-cpio e uma das mais importantes da RMF. No quadro atual, percebe-se a proporo de quase um para um entre domic-lios de uso ocasional e ocupados. Tambm no se pode des-prezar o dado referente ao nmero de domiclios vagos (832), resultantes, hipoteticamente, das unidades recm-construdas em condomnios situados em reas de expanso (lugares de-nominados Morro do Chapu, Nova Taba e Barra Mar).

    vi. Em Cascavel, que apresenta 768 habitaes ocasionais e 217 vagas, a localidade de Caponga o caso des-tacvel. Na atualidade, guas Belas apresenta-se como rea de expanso do fenmeno construtivo de domiclios de uso oca-sional (389). De fato, os nmeros das localidades de Cascavel so os mais inexpressivosdos quatro municpios analisados.

  • Alexandre Queiroz Pereira

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

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  • Alexandre Queiroz Pereira

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    A compreenso do processo de valorizao do espao litorneo segue tendncias variadas. Nesse sentido, pensou--se em indicadores capazes de apontar as virtualidades do processo de instalao de empreendimentos. Dessa forma, pesquisou-se o banco de dados da Superintendncia Estadual do Meio Ambiente Semace, destacando a relao de licenas de instalao concedidas aos empreendimentos durante o pe-rodo entre 2004 e julho de 2011 . Esse aparato possibilitou a identificao das tipologias dos empreendimentos com posse da terra contratada e com projetos aprovados por instncias municipais e estaduais. O dado, de fato, no revela a totalida-de em funcionamento, porm indica a dinmica contempo-rnea do mercado imobilirio-turstico, tanto em relao aos modelos de empreendimentos projetados como em refern-cia s localidades litorneas em processo de transformao mediante as preferncias dos vilegiaturistas e turistas.

    Conforme os dados da Tabela 1 e do Mapa 3, percebe--se, a priori, que os empreendimentos tipo imobilirio (com possibilidade de compra de unidades) so maioria na solicita-o de licenas. Alm das unidades unifamiliares, as categorias representativas no contexto metropolitano so os condom-nios (41), os apart-hotis (34) e os complexos turstico-hote-leiros (8).

  • 35

    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    Tabela 1 - Relao das licenas de instalao expedidas pela SEMACE para empreendimentos tursticos e imobilirios, segundo tipo de em-

    preendimento e localizao (2004-jul/2011)

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    Par

    que

    tem

    tic

    o

    Pou

    sada

    Res

    ort

    No

    iden

    tifica

    do

    Aquiraz 69 3 16 8 34 - 1 4 1 25

    Cascavel 2 1 2 - - - - - - 1

    Caucaia 6 3 11 1 - - - 4 - 4

    So Gonalo do Amarante

    5 1 12 - - - - 2 - -

    Total geral 82 8 41 9 34 - 1 10 1 30

    Fonte: SEMACE, 2011.

    Sobre as informaes apresentadas, algumas questes carecem de detalhamento:

    i. os itens considerados no-identificados so aque-les onde no h indicao da finalidade do licenciamento, sen-do citada apenas a localizao da construo e o nome dos proprietrios. possvel deduzir, tambm, pelo nmero de lotes a serem ocupados, que se tratam na maioria de residn-cias unifamiliares e condomnios.

    ii. a descrio do projeto contida no banco de dados denomina o uso da maior parte dos edifcios verticais como apart-hotel, todavia, as observaes realizadas em trabalho de campo comprovaram que esses edifcios, em sua maioria, quando produzidos, so titulados como residenciais (villages) ou resorts. H descompasso entre o especificado e o publi-cizado na comercializao do empreendimento,situao essa

  • Alexandre Queiroz Pereira

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    que explica o reduzido nmero de empreendimentos auto-classificados como resorts. A localizao dessa tipologia constatada unicamente em Aquiraz, mais especificamente em Porto das Dunas.

    iii. em consonncia com os resultados obtidos me-diante observao in loco, os condomnios (residenciais mul-tifamiliares) aparecem como produto imobilirio com elevado ndice de aceitao e gerador de demanda consumidora. Nas especificaes, a forma prioritria a horizontal (unidades in-dividualizadas) com ou sem infraestrutura interna. H uma distribuio relativamente igualitria entre os municpios, com exceo de Cascavel, cujo padro imobilirio-turstico ainda no se estabeleceu com a mesma intensidade construtiva em relao aos demais municpios metropolitanos.

    iv. o quantitativo de projetos de complexos turstico--imobilirios bem superior ao dos empreendimentos que esto em construo ou em fase de comercializao. Por sua alta capacidade de consumo de espao e agregao de usos, esses complexos representam, na atualidade, o pice da hi-bridao entre a organizao das prticas de turismo e a vi-legiatura. Trazem, inclusive, novos elementos de lazer inco-muns s construes anteriormente existentes. Assim sendo, merecem consideraes mais especficas, que sero feitas ao longo deste tpico.

    v. Mesmo sendo os dados de domiclios de uso oca-sional agrupados conforme escala municipal, constata-se que a distribuio intramunicipal desigual. Ocorre, na verdade, o inverso, havendo concentrao em determinadas localidades: em Aquiraz, Porto das Dunas; em Caucaia, Cumbuco; em So Gonalo do Amarante, Taba; e em Cascavel, guas Belas.

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    Mapa 3 Quantitativo de licenas de instalao expedidas pela Semace para empreendimentos tursticos e imobilirios, segundo a tipologia e a

    localizao (2004 jul./2011).

    Fonte: Semace, 2011.

    Na definio das localizaes dos complexos de lazer, so consideradas as seguintes variveis: deslocamento (fcil acesso rodovirio, tempo de descolamento de umahora em relao ao aeroporto), infraestrutura prvia (abastecimento de gua e energia) e condies de ocupao do lugar e do entorno (proximidade a empreendimentos j consolidados, distncia em relao a ncleos tradicionais, reas pouco ou nada adensadas).

    Nos casos dos complexos situados em So Gonalo do Amarante e Caucaia, observam-se dois modelos distin-tos. O Taba Beach Resort (praia da Taba) eminentemen-te imobilirio e tem noruegueses como principais propriet-

  • Alexandre Queiroz Pereira

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    rios. O complexo mais recente, o Vila Gal Cumbuco Golf Resort, inaugurando em 2010, disponibiliza suas unidades (apartamentos e chals) apenas na condio de hospedagem tradicional,contudo h planejamento para incluir futuras eta-pas e ampliao das tipologias, conformando um complexo de lazer (turstico-imobilirio).

    H pelo menos 15 anos, para alm dos loteamentos, dos condomnios, dos flats e dos resorts com suas instalaes individualizadas (sem conexo), investidores, empresas turs-ticas e imobilirias vm planejando a produo de megaem-preendimentos agregadores de todas essas tipologias, adicio-nados, ainda, de outras estruturas inditas ao litoral cearense, como campos de golfe, por exemplo. Esses complexos, pela quantidade e extenso, ocupam reas vastas, preferencialmen-

    Municpio Empreendimento Atividades Estrutura

    Aquiraz Beach Park Sutes Imobilirio/turstico 183 apartamentos

    Aquiraz Aquaville Resort & Hotel Imobilirio/turstico498 residncias / 85

    apartamentos

    Aquiraz Oceani das Dunas Resort Turstico 133 apartamentos

    Aquiraz Beach Park Acqua Resort Imobilirio/turstico 123 apartamentos

    Aquiraz Beach Park Living Turstico 160 apartamentos

    Aquiraz Scopa Beach Resort Imobilirio 92 apartamentos

    Caucaia Vila Gal - Cumbuco Golf Resort Turstico392 apartamentos e 24

    sutes / 32 chals

    S. G. do Amarante Taba Beach Resort Imobilirio

    Apartamento/ casas frente ao mar/ casas

    duplex. 152 UHs

    Fonte: Trabalhos de Campo (jul. 2010), Setur (2009), Semace (2010).

    Quadro 4 - Resorts instalados no litoral metropolitano de Fortaleza.

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    te com uma das faces limtrofes linha de praia. No Cear, a construo de um conjunto desses empreendimentos se faz em glebas vazias, estrategicamente conservadas e situadas entre ocupaes de loteamentos e comunidades tradicionais. Pela proporo e localizao desses equipamentos (plancie litornea), obrigatria por lei federal, para obteno da li-cena ambiental para a sua construo, a elaborao dos Es-tudos de Impacto Ambiental EIA. Esses documentos, de-positados na biblioteca da instituio ambiental responsvel (no caso cearense, a Semace), contm a descrio completa do planejado para as futuras instalaes.

    Ao pesquisar, em 2010, o acervo da biblioteca da Sema-ce, foram contabilizados seis projetos dessa natureza (Quadro 5). Decerto que a existncia dos projetos no significa a sua efetivao. E mesmo os que se efetivam esto abertos a mu-danas: diminuio ou aumento dos valores investidos, alte-rao nas tipologias projetadas, redefinio dos investidores envolvidos e redirecionamento da origem da clientela-alvo. Dos projetos de complexos abaixo listados, o Aquiraz Riviera o nico plano com tipologias e investimentos j instalados.

    Quadro 5 Descriodos projetos dos complexos tursticos hoteleiros enviados Semace para obteno de licenciamento ambiental

    Empreendi-mento

    Descrio bsica Localiza-o

    Infraestrutura de lazer Unidades previstas

    Cumbuco Golfe Resort

    Contempla a cons-truo de resorts, condomnios turs-ticos de casas de ve-raneio de alto luxo, condomnio turstico simples unifamiliares e multifamiliares.

    Praia do Cumbuco, Caucaia

    Club House, hotel gol-fe, reas de diverso e lazer cultural, rea de esporte e lazer.

    04 resorts com capacidade para 250 quartos, Club House e o hotel golfe com 250 quartos, 1140 lotes unifamiliares.

  • Alexandre Queiroz Pereira

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    Empreendi-mento

    Descrio bsica Localiza-o

    Infraestrutura de lazer Unidades previstas

    Cumbuco Beach

    Resort turstico residencial

    Praia do Cumbuco, Caucaia

    Piscinas, deck, res-taurantes, bloco SPA, fitness

    960 apartamentos, (768 tipo A e 192 tipo B) distribudos em 36 blocos.

    Complexo Turstico Hoteleiro e de Desenvolvi-mento Urbano Barra do Aquiraz

    Tempo de implan-tao total 16 anos, complexo com hotis, condomnios e residncias. 04 resorts

    Porto das Dunas, Aquiraz

    Academia de tnis, academia de golfe, centro de conven-es, restaurantes, bares, clubes, parques aquticos.

    -

    Complexo Tu-rstico Dunas do Cumbuco

    Projeto dividido em 2 fases, sendo a primeira dividido em 2 etapas: 1 Construo de 956 Unidades Residen-ciais e 2 construo de um hotel com 03 pavimentos e 126 apartamentos. R$ 28.000.000,00

    Praia do Cumbuco, Caucaia

    Piscinas, restaurantes, quadras esportivas, bares, reas verdes internas.

    Casa tipo I- 408 (41m)- 03 pavimentos; Casa tipo II- 444 (50m) - 3 pavimentos; Casa tipo III- 104 (91m)- 2 pavimentos. Hotel - 126 apartamentos e 03 pavi-mentos (4.680,00m); praa pblica e centro comercial (2 pavimentos) - 2.472,00m); rea de lazer - 14.250 m (3 pavimentos).

    Brasil Real Cumbuco Resort

    Resort Turstico residencial com condomnios.

    Praia do Cumbuco, Caucaia

    Piscinas, decks, qua-dras de tnis, quadras poliesportivas, estacio-namentos, academia de ginstica, pista de ciclismo e cooper e centro comercial.

    10 condomnios com 1396 apartamentos, 16 casas e 126 flats.

    Empreen-dimento Turstico Praia Bela Resort & Village (Aqui-raz Riviera)

    rea de 279,14 h. Construo de hotis, pousadas, e residncias multifamiliares e campo de golfe (25 anos para implemen-tao total).

    Praia do Presdio, Aquiraz.

    01 campo de golfe com 18 buracos, 01 academia de golfe, 01 academia de tnis, um conjunto de quadras esportivas, 01 centro hpico,01 SPA, centro de convivncia com restaurantes, bares e lojas integrados a uma rea livre, parque natural.

    08 hotis a beira mar (4 e 5 estrelas) com aproxima-damente 250 apartamentos cada; 06 pousadas de alto padro com aproximada-mente 40 apartamentos cada; 600 bangals; que podero ser incorporados a hotelaria;800 residncias multifamiliares que tambm podero ser incorporadas a hotelaria; 615 lotes

    Fonte: EIA/RIMA, Biblioteca daSemace, fev. 2010.

    O projeto do Aquiraz Riveira indica a ocupao de 279 hectares de terra, com previso de efetivao total em 25 anos, com investimentos em valor superior a US$ 350 milhes. Para tanto, foram necessrias articulaes entre grupos investido-res e o poder pblico , principalmente na esfera estadual. No que concerne arquitetura dos investimentos privados, o em-preendimento conduzido pelo consrcio Luso-Brasileiro Aquiraz Investimentos S.A., conformado pelo empresrio

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    cearense Ives Dias Branco (proprietrio das terras) e pelos portugueses Cear Investment Fund (fundo turstico imobili-rio), Grupo Hoteleiro Dom Pedro Laguna e Solverde (divi-so de turismo do grupo Industrial Violas, com a concesso dos Cassinos do Algarve). Em contrapartida aos investimen-tos privados, o governo do estado do Cear proporcionou as infraestruturas basilares: o alargamento da CE-453, a cons-truo de um trecho rodovirio duplicado ligando a CE-453 ao empreendimento, uma linha exclusiva de abastecimento energtico e o sistema de abastecimento hdrico.

    Com obras iniciadas em 2009, a rea est totalmente cercada, o sistema virio e o zoneamento foram efetivados, os lotes residenciais traados e em estgio de comercializa-o . Em relao s estruturas de lazer, um clubhouse e um campo de golfe de 18 buracos esto finalizados. Para o setor hoteleiro, disponibilizaram-se lotes beira-mar com rea de 4 hectares. At o momento, trs desses superlotes esto ocu-pados (Figura 11): um com o j finalizado hotel de bandeira portuguesa (Dom Pedro Laguna), e outros dois com residen-ciais verticais em fase de construo: o Riviera Beach Place Golf Residence (Construtora Mota Machado) e o Manhattan Beach Riviera (Construtora Manhattan). Ainda est projetada uma srie de servios e reas comerciais capazes de transfor-mar o megaempreendimento em uma cidadela, com fortes caractersticas de autonomia em relao ao seu entorno.

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    Figura 2 Zoneamentodo Masterplan do empreendimento Aquiraz Riviera, Aquiraz-CE. (A) Localizao do Riviera Beach Place; (B) Localizao do Manhattan Beach Riv-iera. Fonte: .Acessado em 23 nov. 2011.

    Se inicialmente os planejadores indicavam que o Aquiraz Riviera visava uma clientela internacional, a partir do incio do processo de vendas inaugurou-se uma intensa campanha pu-blicitria com foco na demanda estadual, mais especificamen-te fortalezense. O volume de vendas e o sucesso desse empre-endimento, de fato, tero impacto definitivo na consolidao de outros empreendimentos que esto em forma de projeto.

    Nessa linha, outro projeto da mesma natureza apresen-ta-se em face de construo: o Complexo Turstico Hoteleiro e de Desenvolvimento Urbano Barra do Aquiraz. O empre-endimento vem sendo construdo em uma gleba de terra situ-ada entre as etapas do loteamento Porto das Dunas e a Praia da Prainha. Atualmente esto sendo construdas 490 unida-des constituintes do denominado Golf Ville, com previso de concluso para o ano de 2015. Em se confirmando a pro-duo dos empreendimentos de acordo com o planejado, trs

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    sero os campos de golfe no litoral metropolitano cearense, repetindo (nas devidas propores) ocupao semelhante estabelecida na costa portuguesa e espanhola (SAB, 1993).

    No litoral cearense, mesmo para a metrpole, a difuso dessas novas tipologias imobilirias ainda pode ser considera-da um processo embrionrio. De acordo com os corretores imobilirios entrevistados, a efetivao dos projetos iniciou--se h menos de uma dcada, aproximadamente h cinco ou seis anos. Segundo a mesma fonte, o crescimento da econo-mia nacional, o crdito facilitado para o construtor e o com-prador, a realizao de eventos internacionais (o Campeonato Mundial de Futebol FIFA 2014, principalmente) e as carac-tersticas naturais do estado so os pilares que sustentam as transformaes atuais e as aes expansionistas futuras.

    Nesse nterim, a magnitude dos empreendimentos, as-sociada sinergia econmica positiva (elevao dos nveis de confiana do mercado para a realizao de novos empreen-dimentos), so responsveis, segundo os corretores, por mu-danas efetivas no espao litorneo, entre as quais as mais citadas so a elevao da qualidade da infraestrutura viria, a valorizao do solo urbano, a redefinio da rede comercial e de servios locais e, por ltimo, o embelezamento construti-vo da paisagem. Acontece, entretanto, na maioria das locali-dades, um descompasso entre o produzido e a possibilidade de usufruto generalizado das benesses, ocorrendo assim uma acumulao privada desses benefcios.

    Pelas diversas formas de acesso aos imveis, da compra efetiva at a locao por um nico perodo, o mercado imo-bilirio local v, nos processos contemporneos, uma rela-o de complementaridade entre o turismo e a vilegiatura. Os corretores so unnimes em afirmar que no h conflito entre

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    os interesses dos vacanciers. Para a criao de um ambiente de vendas crescente, o aumento do nmero de moradores nessas reas tambm considerado benfico ao processo geral. Se o perfil socioeconmico dos potenciais moradores for similar ao dos vilegiaturistas, concebido que essa dinmica gera um equilbrio entre residentes sazonais e permanentes, possibi-litando o incremento de investimentos privados e, principal-mente, pblicos.

    Em sntese, ao confrontar os mecanismos histrico-es-paciais de produo das comunidades litorneas tradicionais com a produo dos atuais mdios e megaempreendimentos possvel constatar no espao litorneo a reunio de um ca-leidoscpio de tempos, com processos de diferentes veloci-dades. Em poucos anos, cerca de uma dcada, um nico em-preendimento dessa natureza reorganiza uma rea igual ou superior s localidades centenariamente constitudas, inclusi-ve revertendo ordem de prioridades de investimentos pbli-cos. Exemplo disso foi mencionado ao se descrever o item saneamento, em tpico anterior. Enquanto Porto das Dunas recebeu mais de R$ 40 milhes de reais para infraestrutura de saneamento, localidades com nmero superior de moradores permanentes apresentam precariedades centenrias. Em rela-o aos investimentos privados, os grandes empreendimentos so tambm capazes de gerar sinergias, ativando o interesse de proprietrios de terras locais e empresrios do setor imobi-lirio na construo de condomnios de menor envergadura, que se apoiam nas virtualidades mercadolgicas promovidas pelos complexos.

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    CONCLUSES

    J no incio dos anos 1970, inicia-se a formao do es-pao litorneo-periurbano de lazer. A partir de ento, conti-nuamente estruturou-se uma rede de lugares litorneos dispo-nveis inicialmente aos autctones e, posteriormente, tambm aos alctones.

    A anlise das condies intraurbanas das localidades litorneas metropolitanas permitiu a identificao de carac-tersticas do modelo de integrao metropolitana e suas con-sequncias: a) disponibilidade precria de servios urbanos, culminando com a criao de necessidades de acessos s se-des municipais e, principalmente, cidade primaz; b) frag-mentao espacial do tecido urbano articulada promoo de modelos urbansticos que valorizam o uso dos espaos priva-dos em detrimento do espao pblico.

    Em relao s velhas e s novas formas imobilirias pro-duzidas em funo da vilegiatura martima, podem-se desta-car as seguintes evidncias: a) quantitativo expressivo de uni-dades unifamiliares (o modelo casa de praia). Esse padro, considerado rugosidade, apresenta-se representativo e dis-seminado pela maioria das localidades litorneas (exemplos: Iguape, Presdio, Caponga, guas Belas, Pecm, Pacheco e Tabuba), principalmente pela disseminao de imveis meno-res e ausncia de sofisticao arquitetnica; b) predominncia de condomnios e resorts como novos padres imobilirios. Nessa ltima tipologia, h uma hibridao de possibilidades, formando os condo-hotis, onde as funes de condomnio e de hotel ajustam-se num mesmo empreendimento. Como demonstram os dados da Semace, a ocorrncia desses empre-endimentos concentra-se, temporalmente, na primeira dcada de 2000 e, espacialmente, nas localidades de Taba, Cumbuco-

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    -Tabuba, e, sobremaneira, em Porto das Dunas.Um novo vetor na produo do espao litorneo aber-

    to com o planejamento e a construo dos complexos tursti-co-imobilirios. Tais empreendimentos podem ser compara-dos a cidadelas do lazer, posto que ocupam reas superiores a 200 hectares (em mdia), sendo conformados por uma di-versidade de opes para a estada beira-mar. No Cear, dois esto em fase de comercializao e com obras infraestruturais prontas: Aquiraz Riviera e Golf Ville, ambos localizados em Aquiraz. Outros em fase de planejamento tm tambm loca-lizao preferencial no espao litorneo metropolitano (em destaque Caucaia e Cascavel), demonstrando, dessa forma, a primazia das relaes de integrao metropolitana para em-preendimentos desse porte.

    Com a alocao constante de recursos pblicos em in-fraestrutura no espao metropolitano e o marketing propor-cionado pela divulgao dos lanamentos imobilirios, pru-dente afirmar que a vilegiatura martima tender a manter-se concentrada no litoral da RMF. O processo se dar de forma dinmica no espao periurbano, principalmente no municpio de Aquiraz, e mais especificamente em Porto das Dunas, lo-calidade que se credencia, j na prxima contagem oficial, a superar o nmero de domiclios de uso ocasional instalados em Icara.

    Por tendncia, admite-se a continuidade do aumento da demanda por espaos de vilegiatura no litoral metropolitano, inclusive na capital,tantopor parte dos alctones (importantes nesta primeira dcada do sculo XXI) como dos autctones que usufruem dos espaos periurbanos, adquirindo imveis com padres modernos antes destinados primordialmente aos estrangeiros. Vale mencionar que tambm crescente o desejo pela vilegiatura martima (sobretudo com a compra de

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    A VILEGIATURA MARTIMA NA METRPOLE: Morfologia e Tipologias Espaciais

    imveis) por estratos scio-ocupacionais populares. De fato, observa-se que os vilegiaturistas martimos na RMF confor-mam um conjunto multiforme.

    Pelas caractersticas apresentadas, possvel constatar a complexidade dos desdobramentos urbano-metropolitanos provocados pelo simples desejo social de estar beira-mar. Poderia ser feito um melhor detalhamento desse fenmeno (nas suas mltiplas dimenses) caso o IBGE reorientasse sua pesquisa domiciliar, considerando a possibilidade de re-lacionar os domiclios de uso ocasional s caractersticas dos seus proprietrios. Complementarmente, as municipalidades litorneas deveriam elaborar bancos de dados locais para o reconhecimento dos vacanciers em seus territrios, princi-palmente dos vilegiaturistas proprietrios de imveis de uso ocasional,o que permitiria prever a intensidade dos fluxos, a sazonalidade e a frequncia. Com essa ferramenta de plane-jamento, as administraes municipais poderiam reorganizar a oferta de servios pblicos, revisar os planos diretores de desenvolvimento urbano e cdigos tributrios, assim como pleitear recursos estaduais e federais para atender s necessi-dades constatadas.

  • Alexandre Queiroz Pereira

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  • CAPTULO 2As polticas pblicas e os espaos tursticos no

    litoral da Regio Metropolitana de Fortaleza

    Prof. Ms. Enos Feitosa de Arajo

    Universidade do Vale do Acara - UVA

    Doutorando em Geografia - UFC

    INTRODUO

    As temticas que promovem os fundamentos da cin-cia geogrfica originam-se predominantemente da anlise das relaes da sociedade com o espao. Assim, nesta investiga-o apresentam-se a maritimidade (relao do homem com o mar), o turismo (relao do homem com o espao por meio do lazer) e a metrpole.

    O turismo litorneo, como uma das mais importantes prticas martimas modernas, apresenta-se como um indutor de planejamento e de desenvolvimento econmico. Articula-da com vrios agentes sociais e diversas instituies pblicas e privadas, a atividade difundida em todo o mundo e facil-mente capturada, adaptada e absorvida pela sociedade.

    O turismo mostra-se, no discurso miditico privado e estatal, como uma atividade prioritria na alocao de recur-sos e investimentos financeiros, na medida em que, segundo esse discurso, capaz de promover o desenvolvimento e di-minuir as desigualdades de renda. Notam-se, porm, ao mes-mo tempo, interesses capitalistas de agentes privados vincula-dos s variadas escalas: internacionais, nacionais e at locais.

    Nesse contexto, o litoral metropolitano nordestino

  • Enos Feitosa de Arajo

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    apresenta-se como um importante espao, especialmente em seus subespaos metropolitanos. No caso da Regio Metro-politana de Fortaleza-Cear RMF, o turismo constitui um elemento fundamental para se compreender tanto a produo espacial metropolitana como o planejamento espacial promo-vido pelos governos no Cear.

    O Estado prope aes planejadas que articulam o turis-mo e produzem, simultaneamente, formas espaciais. Diferen-temente de outros pases, que tiveram grandes transformaes decorrentes da iniciativa privada, no Brasil (principalmente na regio Nordeste) as polticas pblicas apresentam-se como as principais medidas para o desenvolvimento turstico.

    Destarte, analisam-se, nesta pesquisa, as polticas pbli-cas tursticas e a produo espacial da RMF e as dinmicas socioespaciais, no contexto cearense e metropolitano nas lti-mas trs dcadas (1990-2010).

    As Polticas do Turismo nos Espaos Litorneos da Regio Metropolitana de Fortaleza

    Vrias polticas pblicas federais e estaduais tursticas foram efetivadas principalmente na RMF, devido sua infra-estrutura e sua condio de centralidade espacial e econ-mica. O principal programa turstico na RMF o Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste Prodetur/NE, que, nas fases I, II e Nacional, promoveu investimentos em infraestrutura, gesto e planejamento turstico.

    No Prodetur I, foram investidos cerca de US$ 150 mi-lhes em todo o Cear, dos quais US$ 74,3 milhes concen-traram-se na reforma do Aeroporto Pinto Martins, na cidade de Fortaleza. Outros municpios litorneos metropolitanos,

  • As polticas pblicas e os espaos tursticos no litoral da Regio Metropolitana de Fortaleza

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    como Caucaia e So Gonalo do Amarante, receberam em torno de US$ 16,14 milhes e US$ 10,28 milhes, respectiva-mente. Ou seja, somente no litoral metropolitano de Fortale-za, o programa injetou cerca de 67% de todos os recursos do estado (ver Mapa 1).

    Mapa 1 - Total de Recursos PRODETUR para os municpios litor-neos do Cear

    Fonte: BNB , 2007. Elaborado pelo o autor.

    Os recursos destinaram-se infraestrutura bsica (prin-cipalmente construo, reforma e ampliao de estradas e sa-neamento bsico) e recuperao ambiental (construo de reas ambientais e regulamentaes) nos territrios conside-rados prioritrios pelo programa, principalmente nas localida-des litorneas. Dessa forma, o Prodetur/NE inicia uma nova diretriz do planejamento turstico do Cear.

  • Enos Feitosa de Arajo

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    O Prodetur I caracteriza-se como o divisor de guas no que concerne s polticas pblicas relacionadas ao desenvolvimento da atividade turstica em escala regional. Com aes marcantes no domnio logstico, alavanca transformaes importantes no ordenamento territorial da regio Nordeste, com nfase na sua zona costeira. (...) As capitais nordestinas em foco se aperfeioam como pontos de recepo e distribuio do fluxo turstico litor-neo, dado resultante da implantao, nessas capitais, dos aeropor-tos, portes de entrada dos turistas (DANTAS, 2010, p. 49; 55).

    O programa conseguiu fomentar mudanas significa-tivas nos fluxos e fixos metropolitanos no somente na ci-dade de Fortaleza e sua franja metropolitana, mas tambm nas principais capitais nordestinas (Natal, Recife e Salvador). Dessa forma, em 2003, inaugura-se a segunda fase do Prode-tur/NE, que promovia a descentralizao de gesto, dando mais poderes aos municpios, embora o governo estadual ain-da mantivesse a primazia perante a gesto estatal.

    No Prodetur II, o Cear recebe cerca de R$ 141 mi-lhes, bem menos que o valor aproximado de R$ 300 milhes recebido no Prodetur I. Tem-se aqui uma questo poltica re-gional, pois vrios estados que receberam menos recursos na fase anterior foram beneficiados com quantias maiores nessa nova fase.

    Assim, depreende-se que h modificaes quanto dis-tribuio de recursos: Pernambuco o estado receptor de maior quantia, de R$ 293,71 milhes; em segundo lugar vem o estado da Bahia, com cerca de R$ 174 milhes, e o Cear e o Rio Grande do Norte so os prximos da lista, com recursos de R$ 141,15 milhes e R$ 80,21 milhes, respectivamente (ver Mapa 2).

  • As polticas pblicas e os espaos tursticos no litoral da Regio Metropolitana de Fortaleza

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    Mapa 2.- Total de recursos PRODETUR I e II para os municpios litorneos do Estado do Cear.

    Fonte: BNB, 2007; BNDS, 2007. Elaboradoro pelo o autor.

    Assim, o Cear, ao receber cerca de R$ 141,15 milhes, d novamente prioridade construo de estradas, sobretudo para a ligao do litoral leste ao oeste, e ao estabelecimento de uma vinculao do Centro com a cidade de Fortaleza. Assim, o planejamento turstico passa a ter um papel fundamental em todo o litoral cearense.

    No caso cearense, no Prodetur II houve ampliao do nmero de municpios contemplados, em relao ao Prodetur I: enquanto o primeiro programa abrangia apenas sete muni-cpios, o segundo chegou ao nmero de 18. As aes refletem ainda as principais aes do Programa de Desenvolvimen-to do Turismo no Litoral do Cear Prodeturis, como, por exemplo, reforar a infraestrutura do litoral oeste do estado.

    Segundo Dantas (2009), as aes que privilegiam o li-toral oeste estadual no apenas acompanhavam a linha de

  • Enos Feitosa de Arajo

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    raciocnio inicial do Prodeturis, mas eram reflexo de outras aes posteriores, como a integrao dos estados do Piau, Maranho e Cear, e, de outro lado, no litoral leste, a integra-o Cear-Rio Grande do Norte, alm das questes recentes da Copa de 2014, da qual Fortaleza e Natal foram escolhidas como subsedes.

    Por outro lado, a RMF no recebe a maior parte dos re-cursos do Prodetur II. Apenas quatro municpios receberam recursos do Prodetur II (Aquiraz, Caucaia, So Gonalo do Amarante e Fortaleza) e apenas os municpios de Aquiraz, So Gonalo do Amarante e Fortaleza so favorecidos com recursos para obras.

    Os municpios de Fortaleza e Aquiraz foram agracia-dos com recursos para a recuperao de patrimnio histrico, principalmente no Centro Histrico, enquanto So Gonalo do Amarante contemplado com recursos para a urbanizao de orlas martimas. Assim, juntos, o litoral metropolitano de Fortaleza recebe cerca de R$ 16,5 milhes (em torno de 12% do total cearense).

    Em 2009, outra fase do programa promulgada pelo governo federal, intitulada Prodetur Nacional, de abrangn-cia nacional, diferentemente das outras fases. Alm da maior abrangncia, essa fase permitiu que as cidades acima de um milho de habitantes pudessem ter seus prprios planos go-vernamentais de turismo. Dessa forma, o Cear recebe por volta de US$ 350 milhes distribudos em US$ 250 milhes diretamente para o estado e US$ 100 milhes para o munic-pio de Fortaleza.

    Passando para os investimentos, o Cear o estado com maiores recursos, R$ 350 milhes (R$ 250 milhes para o es-tado e R$ 100 milhes para Fortaleza), seguido de Rio Grande

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    do Norte (R$ 150 milhes), Pernambuco (R$ 125 milhes), Sergipe (R$ 100 milhes), Bahia (R$ 82 milhes), Alagoas (R$ 75 milhes), Piau (R$ 50 milhes), Maranho (R$ 40 milhes) e Paraba (R$ 38 milhes), conforme Mapa 2.

    A metrpole de Fortaleza se sobressai como um dos principais destinos tursticos do Nordeste brasileiro e, com investimentos de US$ 100 milhes do Prodetur Nacional, procura cada vez mais articular os espaos urbanos e litorne-os em prol da prtica turstica, recebendo em 2014 um evento relevante no turismo internacional: A Copa do Mundo.

    Nesse contexto, as principais aes do Prodetur Nacio-nal na cidade privilegiam principalmente os espaos litorne-os, com destaque para as seguintes obras:

    a) recuperao e ampliao do sistema virio en-tre a Praia do Futuro (sudoeste da cidade) e a Beira-Mar (nor-te e principal rea turstica da cidade);

    b) requalificao da Avenida Beira-Mar com cal-ades e vias mais largas, reforando a infraestrutura da rea;

    c) capacitao de profissionais e empresrios do setor turstico;

    d) obras de conteno e aterramento de reas lito-rneas;

    e) sinalizao turstica;f) plano de marketing vinculado gesto ambien-

    tal.Nota-se que os espaos litorneos da cidade fortalezen-

    se so considerados os mais importantes no contexto tursti-co do Cear. A principal rea turstica, a Beira-Mar, privile-giada pela expanso da prpria cidade, constituindo tambm uma rea (Meireles, Aldeota e Praia de Iracema) habitacional

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    de classes mais abastadas e de interesse turstico.Fortaleza recebe mais recursos de outras polticas p-

    blicas indiretas do turismo (PAC e Copa do Mundo) pela sua relevncia no contexto espacial e econmico da regio Nor-deste. A relao metropolitano-turstica favorece o desenvol-vimento e a ampliao de infraestrutura, os servios, os em-preendimentos e os fluxos tursticos.

    Mapa 3 Investimentos doProdetur Nacional nos estados nordestinos. Fonte:Confiex, 2012.

    Fonte: CONFIEX, 2012. Elaborado pelo o autor.

    Mas o que esperar de tantas polticas pblicas tursticas na RMF? Todas elas tiveram o mesmo objetivo de promoo, de desenvolvimento e de crescimento econmico do turis-mo? Viu-se que toda poltica pblica dependia diretamente de cada contexto econmico, da viso poltica e, principal-mente, da articulao entre os governos (municipais, estadu-ais e federais).

    Ao se perceber, num cenrio regional nos anos entre

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    1980 e 1990, que o Nordeste brasileiro era detentor de um potencial turstico, sendo necessria, portanto, a consolidao do turismo, vrias aes governamentais foram realizadas no intuito de promover mudanas significativas na viso das pes-soas sobre o fenmeno turstico, desde o habitante local at o turista estrangeiro.

    O Prodetur I propiciou uma viso cada vez mais local dos planejamentos estaduais, pois os investimentos refletiam a articulao das polticas realizadas e, assim, havia um acirra-mento dos estados por um maior aporte de investimentos. Tal contexto consolidado no Prodetur II, por exemplo, no caso de Pernambuco, que consegue um maior investimento nessa fase, enquanto na fase anterior os recursos recebidos foram considerados pouco expressivos.

    Assim, as polticas pblicas do turismo na RMF so oriundas de vrias escalas governamentais (federais, estadu-ais e municipais), entre as quais se destacam o Prodetur I, II, Nacional e o PAC, principalmente pelo aporte de investimen-tos, que, juntos, investem mais de R$ 1,3 bilho no estado do Cear, e mais de R$ 10 bilhes em todo o Nordeste brasileiro.

    Tal situao leva concentrao de fluxos tursticos no litoral da RMF, capitaneada pela cidade de Fortaleza, com cer-ca de 1,34 milho de turistas/ano, chegando, conjuntamente com sua franja metropolitana principalmente em decorrn-cia dos fluxos oriundos de Caucaia e Aquiraz , ao patamar de 2 milhes de turistas/ano em 2011 (ver Mapa 4).

    Desta forma, a cidade de Fortaleza destaca-se como o principal destino turstico do Cear, e concomitante sua va-lorizao, outros municpios litorneos do tecido metropoli-tano (Aquiraz e Caucaia, principalmente) consolidam tambm com maiores fixos e fluxos. Assim, o litoral da RMF torna-se alvo de investimentos pblicos e privados em crescentes flu-xos e construo de fixos.

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    Mapa 4 Fluxos tursticos no litoral da RMF (2007-2010). Fonte: Setur/CE.

    Fonte: SETUR, 2011. Elaborado pelo o autor

    O espao turstico primrio: Fortaleza-cidade

    Fortaleza o principal centro receptor e distribuidor do turismo no Cear e na RMF. Desse modo, compreender as relaes e as dinmicas socioespaciais que ocorrem na cidade o ponto inicial e crucial de toda a anlise espacial do espao turstico metropolitano.

    Assim, para entender o turismo na RMF, parte-se da lgica espacial da cidade-metrpole de Fortaleza. As reas centrais da cidade tambm so as principais reas tursticas, concentrando grande parte dos empreendimentos tursticos (ver Mapa 5).

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    Mapa 5 reas tursticas e tendncias na cidade de Fortaleza.

    Fonte:SETUR, 2011. Elaborado pelo o autor

    a) as reas dos grandes hotis, principalmente com as multinacionais e as demais empresas de grande porte, de ori-gem nacional ou local, situam-se entre Beira-Mar, Meireles e Mucuripe. Participam de uma forma hierrquica espacial em que se concentra a maioria dos empreendimentos tursticos e dos equipamentos urbanos (restaurantes, lanchonetes, ban-cos), alm de serem palco de eventos nacionais, interna-cionais promovidos pelo poder pblico. Nessas reas esto instalados 83 empreendimentos, ou seja, 46% de todos os empreendimentos existentes em Fortaleza;

    b) as reas consolidadas com empreendimentos so consideradas aquelas adjacentes primeira tipologia citada, que formam a continuidade espacial do espao turstico mais importante de Fortaleza, a partir dos bairros Meireles e Mucuripe. O principal bairro que abrange essas reas o

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    da Praia de Iracema, que possui outros tipos de empreendi-mentos mais simples e menos sofisticados, como pequenas e mdias pousadas, alm de hotis de pequeno e mdio porte. Grosso modo, so reas secundrias tursticas da rea cen-tral de Fortaleza, mais prxima do Centro da cidade. Possuem 52 empreendimentos, correspondendo a 29% de todos os empreendimentos da cidade, e adicionadas s primeiras reas apresentadas abrangem 75% de todos os empreendimentos citadinos de Fortaleza;

    c) as reas dispersivas com empreendimentos tursticos esto caracterizadas nos bairros Mucuripe e Praia do Futuro. Essas reas so ocupadas por ncleos de empreendimen-tos e atividades tursticas, de forma dispersa e descontnua, em meio habitao popular. Assim, so reas tursticas, mas comportam ao mesmo tempo outras atividades como as co-merciais populares e as industriais. O Mucuripe e a Praia do Futuro possuem 11 e 22 empreendimentos, respectivamente; juntos, os bairros contam com 33 empreendimentos, ou seja, com 18% de todos os empreendimentos de Fortaleza, o que reflete, de certa forma, a relevncia mesmo que coadjuvante dessas reas nos fluxos tursticos;

    d) as reas de expanso so consideradas a poro oeste do litoral de Fortaleza, que abrange os bairros Centro, Gran-de Pirambu, Barra do Cear e Moura Brasil, e so caracteri-zadas pela ocupao precria de habitaes simples e popu-lares. Oriundas dos fluxos de migrantes sertanejos ainda no incio do sculo XX, essas reas so tidas pelo IBGE como aglomeraes subnormais, ultimamente assediadas por in-teresses imobilirios, pela possvel expanso de um calado (Projeto Vila do Mar). Principalmente por causa do bairro Centro, existem 12 empreendimentos mais simples e menos sofisticados nessas reas, direcionados mormente a um pbli-co menos abastado;

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    e) as reas com restries ambientais so aquelas am-biental e juridicamente protegidas na cidade: o Parque do Coc e a rea de Proteo Ambiental APA do Rio Coc, e o Parque de Sabiaguaba, localizado na poro sudeste da cidade. Pela sua beleza e caractersticas ambientais mais inex-ploradas e/ou protegidas, outra rea relevante para a expan-so dos interesses imobilirios, de tal forma que, prximo Sabiaguaba, existe o nico resort da cidade de Fortaleza, o Porto da Aldeia Resort, limtrofe entre o bairro Sabiaguaba (Fortaleza) e os municpios de Eusbio e Aquiraz.

    Assim, o turismo da cidade fortalezense predominan-temente litorneo (o Cear entra nessa mesma lgica) e agre-ga as reas centrais e j consolidadas estruturalmente no rol das principais reas tursticas. Porm, os fluxos da RMF no se resumem apenas cidade de Fortaleza, pois as outras reas metropolitanas possuem outros tipos de fluxos e demandas.

    Em outras palavras, a cidade de Fortaleza caracteriza-se pela centralidade dos servios e das decises tursticas no Ce-ar e na RMF, promovendo aes descentralizadoras voltadas principalmente ao litoral metropolitano e s adjacncias da sua tessitura urbana, agregando, de maneira crescente, mais empreendimentos tursticos.

    Os espaos tursticos secundrios: Porto das Dunas e Cumbuco

    A metfora de espaos tursticos de grandes fluxos utilizada neste tpico para se discutirem as dinmicas nos de-mais municpios metropolitanos, onde se destacam os gran-des empreendimentos tursticos. Nesse rol esto os resorts e

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    os complexos tursticos originrios principalmente de investi-mentos financeiros estrangeiros.

    Tais investimentos podem ser confirmados pelos dados de demanda de turistas, pois os municpios de Aquiraz e Cau-caia (norteados por Porto das Dunas e Cumbuco, respecti-vamente) tm aumento considervel dessa procura turstica. Caucaia passa de 215,6 mil turistas em 2007 para 307,7 mil em 2011, um aumento de 42,7%, enquanto Aquiraz passa, no mesmo perodo, de 136,1 mil para quase 290, registrando um aumento de 113%.

    As principais localidades litorneas inseridas nesses considerveis fluxos so Porto das Dunas (Aquiraz/CE) e Cumbuco (Caucaia/CE). De acordo com Silva (2006), Arajo (2009, 2011a, 2011b)