Marketing Varejo A2 avancos logisticos varejo_nacional

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63 Administraçªo da Produçªo e Sistemas de Informaçªo RAE - Revista de Administraçªo de Empresas Sªo Paulo, v. 38, n. 4, p. 63-71 AVAN˙OS LOG˝STICOS NO VAREJO NACIONAL: O CASO DAS REDES DE FARM`CIAS RESUMO: O artigo descreve as conquistas realizadas na logística do varejo farmacêutico nacional nos últimos anos. As farmácias organizaram-se em redes; melhoraram seu aspecto visual; muitas operam 24 horas; usam fórmulas sofisticadas, teoricamente corretas, na gestão de estoques; dispõem de softwares avançados; operam depósitos racionalizados, por vezes automatizados; as entregas às lojas são diárias; o código de barras facilita o controle dos produtos. Subsistem problemas que impedem a obtenção de autêntico just in time e de falta-zero: dificuldade de prever a demanda; limitação da capacidade dos bancos de dados para registrar dados relativos a 5.000 apresenta- ções em 100 lojas; entrosamento precário entre os setores de vendas e compras na empresa; freqüência e rapidez ainda insuficientes de reposição dos produtos no depósito e nas lojas; existência de numerosos medicamentos de baixo giro. Recomendações são apresentadas para a remoção desses entraves e o advento do sonhado Supply Chain Management. ABSTRACT: This paper describes recent logistics developments observed in retail operations of pharmaceutical products in Brazil. Most pharmacies restructured themselves in chains. They improved their physical appearance. Some operate full-time. They rely upon advanced software and use refined formulas, based upon the best theory, to manage inventories. The central storage areas are well administered; a couple of them are automated; deliveries to stores are made daily; bar coding helps controlling product flow. A score of problems still hampers the obtainment of an authentic just in time result and a real zero-shortage situation: data bases lack capacity to register all the necessary information concerning 5,000 different items in 100 outlets; barriers persist between sales and purchasing departments; deliveries by suppliers to the central store are not as frequent and quick as desirable, so are deliveries to retail stores; harmful to efficiency is the presence of quite a number of low turnover, slow moving medicaments. Recommendations are offered in order to foster the still remote implementation of the dreamed Supply Chain Management. Claude Machline Professor Emérito da EAESP/FGV. José Bento C. Amaral Júnior Professor do Departamento de Administração da Produção e de Operações Industriais da EAESP/FGV e Consultor de Empresas pelo GVconsult/EAESP/FGV. PALAVRAS-CHAVE: logística, distribuição de medicamentos, varejo farmacêutico nacional, cadeia de supri- mentos, redes de farmácias, Supply Chain Management. KEY WORDS: logistics, distribution of pharmaceutical products, Brazilian drug retailing, drugstore chains, Supply Chain Management. Out./Dez. 1998

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Texto - Estudo de caso

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AVANÇOS LOGÍSTICOS NO VAREJO NACIONALAdministração da Produção e Sistemas de Informação

RAE - Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 38, n. 4, p. 63-71

AVANÇOS LOGÍSTICOS NOVAREJO NACIONAL: O CASO DAS

REDES DE FARMÁCIAS

RESUMO: O artigo descreve as conquistas realizadas na logística do varejo farmacêutico nacional nos últimos anos.As farmácias organizaram-se em redes; melhoraram seu aspecto visual; muitas operam 24 horas; usam fórmulassofisticadas, teoricamente corretas, na gestão de estoques; dispõem de softwares avançados; operam depósitosracionalizados, por vezes automatizados; as entregas às lojas são diárias; o código de barras facilita o controle dosprodutos. Subsistem problemas que impedem a obtenção de autêntico just in time e de falta-zero: dificuldade deprever a demanda; limitação da capacidade dos bancos de dados para registrar dados relativos a 5.000 apresenta-ções em 100 lojas; entrosamento precário entre os setores de vendas e compras na empresa; freqüência e rapidezainda insuficientes de reposição dos produtos no depósito e nas lojas; existência de numerosos medicamentos debaixo giro. Recomendações são apresentadas para a remoção desses entraves e o advento do sonhado SupplyChain Management.

ABSTRACT: This paper describes recent logistics developments observed in retail operations of pharmaceutical productsin Brazil. Most pharmacies restructured themselves in chains. They improved their physical appearance. Some operatefull-time. They rely upon advanced software and use refined formulas, based upon the best theory, to manage inventories.The central storage areas are well administered; a couple of them are automated; deliveries to stores are made daily;bar coding helps controlling product flow. A score of problems still hampers the obtainment of an authentic just in timeresult and a real zero-shortage situation: data bases lack capacity to register all the necessary information concerning5,000 different items in 100 outlets; barriers persist between sales and purchasing departments; deliveries by suppliersto the central store are not as frequent and quick as desirable, so are deliveries to retail stores; harmful to efficiency isthe presence of quite a number of low turnover, slow moving medicaments. Recommendations are offered in order tofoster the still remote implementation of the dreamed Supply Chain Management.

Claude MachlineProfessor Emérito da EAESP/FGV.

José Bento C. Amaral JúniorProfessor do Departamento de Administração da

Produção e de Operações Industriais da EAESP/FGV eConsultor de Empresas pelo GVconsult/EAESP/FGV.

PALAVRAS-CHAVE: logística, distribuição de medicamentos, varejo farmacêutico nacional, cadeia de supri-mentos, redes de farmácias, Supply Chain Management.

KEY WORDS: logistics, distribution of pharmaceutical products, Brazilian drug retailing, drugstore chains, SupplyChain Management.

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Numerosas empresas nacionais de vare-jo têm efetuado nos últimos anos apreciá-veis avanços na área logística. Novas técni-cas de gestão de estoques, automação dodepósito, computação e telecomunicaçõesvêm sendo usadas como resposta à competi-ção acirrada que determina, por seleção na-tural, as empresas que sobreviverão. É obje-tivo deste trabalho relatar algumas realiza-ções que os autores, por força de sua parti-cipação em projetos de consultoria, tiveramocasião de presenciar na logística de varejo.O artigo trata especificamente da distribui-ção de medicamentos na rede farmacêutica.Espera-se contribuir para a divulgação de“boas técnicas logísticas” aplicadas ao co-mércio nacional e debater problemas quecontinuam constituindo desafios à obtençãode serviços mais eficientes e de melhor qua-lidade.

PANORAMA ATUAL DO VAREJOFARMACÊUTICO

Os clientes não podem ter deixado deperceber as alterações recentes ocorridas nocomércio farmacêutico. Uma constataçãoóbvia é a formação de numerosas redes defarmácias, que deixaram de ser lojas isola-das. A população notou também que algu-mas farmácias permanecem abertas 24 ho-ras; muitas ostentam requintes de elegância;o arranjo físico se afasta do que dominava

nas antigas “pharmácias” e boticas: os me-dicamentos são dispostos de forma compac-ta em prateleiras abertas, no fundo e nas la-terais, enquanto o centro da loja está repletode gôndolas de cosméticos e artigos de higi-ene pessoal. À semelhança dos supermerca-dos, o caixa é computadorizado. Além dasmelhorias que saltam aos olhos, outrasproezas de automação comercial ocorrematrás da cortina: um software liga o caixa aocomputador central da rede, atualizando o fa-turamento e o estoque, em tempo real, sem-pre que entra ou sai mercadoria da loja.

A CADEIA DE SUPRIMENTOS

A Figura 1 representa a cadeia de supri-mentos, que se estende desde os fornece-dores de matérias-primas (fármacos) até oconsumidor final, passando pelos fabrican-tes (laboratórios), que entregam medica-mentos diretamente às redes ou, indireta-mente, por meio de distribuidores. O seg-mento institucional (hospitais, centros desaúde, secretarias públicas estaduais e mu-nicipais de saúde), ao lado das farmácias,constitui importante mercado. As farmá-cias compram também produtos de higienepessoal e cosméticos, em geral, diretamen-te dos fabricantes.

Os fabricantes e distribuidores entregamos medicamentos ao depósito central da rede,que estoca os produtos e os aloca às lojas. A

Fabricantes(laboratórios)

Fornecedores dematérias-primas

Farmácias(redes e independentes)

Distribuidores

Mercado institucional(hospitais, centros de saúde)

Paciente

Consumidorfinal

Figura 1 - Cadeia de suprimentos da área farmacêutica

© 1998, RAE - Revista de Administração de Empresas / EAESP / FGV, São Paulo, Brasil.

* Este trabalho foi apresentado no I SIMPOI� Simpósio de Administração da Produção,Logística e Operações Industriais, realizadona EAESP/FGV, em setembro de 1998.

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AVANÇOS LOGÍSTICOS NO VAREJO NACIONAL

Figura 2 representa a cadeia logística que pre-valece no setor farmacêutico.

A margem de contribuição da cadeia, dolaboratório até o consumidor final, é de 30%.O distribuidor, dentro desses 30%, opera commargem de 14,62%, e a farmácia, com18,0%. O mercado institucional é abasteci-do com produtos de uso restrito a hospitais,entregues em embalagens hospitalares.

Compra de distribuidores constitui a prin-cipal opção para as farmácias independen-tes, que não movimentam o volume mínimonecessário para aquisição direta do fabrican-te. O prazo de entrega do fabricante é de doisa cinco dias úteis, enquanto o do distribui-dor é de um a dois dias. O distribuidor entre-ga uma gama de milhares de apresentações,enquanto cada laboratório produz e distribuimenos de 100 itens.

LOGÍSTICA DA ÁREAFARMACÊUTICA

Definições tradicionais de logística en-contram-se em Ballou1 e Novaes &Alvarenga.2 Os avanços indicados pertencemao estrito campo da logística ou constituemalgo mais?

Em 1986, o Council of LogisticsManagement (CLM) definiu logística da se-guinte forma: “é o processo de planejamen-to, implementação e controle do fluxo efici-ente e eficaz de matérias-primas, estoques deprodutos semi-acabados e acabados, bemcomo de fluxos de informações a eles relati-vo, desde a origem até o consumo, com o pro-pósito de atender aos requisitos dos clientes”.3

À medida que as empresas integram seusesforços para oferecer aos clientes mais quea entrega da mercadoria no local e na horacertos, pode-se falar de Supply ChainManagement (SCM), definido, peloInternational Center of Competit iveExcellence, em 1994, como sendo: “(...) aintegração dos processos do negócio desdeo usuário final até os fornecedores originaisque proporcionam os produtos, serviços einformações, a fim de agregar valor para ocliente”. 4 Definições semelhantes encon-tram-se em Johnson5 e Saunders.6 Embora,hoje, o esforço cooperativo dos membrosda cadeia seja diminuto, ele se faz sentir nasáreas de promoção de vendas e de lançamen-to de novos produtos, momentos esses emque o entrosamento entre fabricante e rede éindispensável – e, nesses casos, pode-se iden-tificar, ainda que restrito, um procedimentointegrado, que é a chave do SCM.

O Efficient Consumer Response (ECR),conceito recém-lançado e atualmente emvoga, confere, como o SCM, primazia ao tra-balho conjunto dos parceiros, em vez de elesse dedicarem a empreender ações isoladasou até antagônicas.7

Nas ações típicas de ECR inserem-se asseguintes iniciativas:• gerenciamento de categorias: integração

de fornecedores e varejistas na definiçãode uma estratégia comum para o desen-volvimento mercadológico de uma linhade produtos;

• gestão partilhada da demanda e reposi-ção automática do produto no ponto-de-venda, a partir de informações fornecidaspela loja, por meio de EDI (ElectronicData Interchange - Intercâmbio Eletrô-nico de Dados);

• paletização padronizada da carga.Uma dificuldade invocada pelas redes

farmacêuticas para justificar a falta de maiorentrosamento com os fornecedores é a pul-verização do mercado de medicamentos. Naindústria e no varejo farmacêuticos, as fati-

Depósito centralda rede

Distribuidor

Consumidor final

Farmácias da rede

Figura 2 - Cadeia logística na rede farmacêutica

Fabricantes(laboratórios)

Fornecedores dematérias-primas

1. BALLOU, Ronald H. Logísticaempresarial, transporte, administraçãode materiais, distribuição física.Traduzido por Hugo T. Y. Yoshizaki da 2a

ed. de Basic business logistics, 1987.São Paulo: Atlas, 1993. p.17.

2. NOVAES, Antônio Galvão N.,ALVARENGA, Antônio Carlos. Logísticaaplicada, suprimento e distribuição. SãoPaulo: Pioneira, 1994. p.64.

3. COOPER, Martha C., LAMBERT,Douglas M., PAGH, Janus D. Supply ChainManagement: mais do que um novo nomepara a Logística, Parte I. Traduzido do TheInternational Journal of LogisticsManagement, Logística Moderna, n.54,jan.-fev. 1998, p.17-20.

4. Idem, ibidem.

5. JOHNSON, G., SCHOLES, K. Exploringcorporate strategy: text and cases. 3.ed.Englewood Cliffs, N. J.: Prentice-Hall,1993. p.30.

6. SAUNDERS, Malcolm. StrategicPurchasing and Supply ChainManagement. London: PitmanPublishing, 1994. p.107.

7. ECR: os primeiros resultados,Logistiques Magazine, maio 1997.Reproduzido em Logística Moderna,n.17, jan.-fev. 1998, p.6-12.

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Dias

Nível doestoque

Estoque máximo MEncomenda

Depósitocentral

LR

R = Intervalo entre revisõesL = Prazo de entrega

Figura 3 - Sistema de revisão periódica no depósito central e na loja

Nível doestoque

Estoque máximo MEncomenda

Estoque de segurança B

Loja

LR

Estoque de segurança B

as de mercado de cada empresa não passamde 5%. Nem a febre de macrofusões que atin-giu o mercado farmacêutico chegou a alte-rar essa fragmentação. Ao contrário do queocorre no segmento de supermercados, ne-nhuma empresa industrial ou comercial éforte o bastante no ramo para exercer lide-rança sobre seus fornecedores ou clientes earmar uma vigorosa cadeia de suprimentos.

PROGRESSOS REALIZADOS

Os progressos mais significativos obti-dos na distribuição de produtos farmacêuti-cos no País foram realizados ao longo dequatro dimensões:

Gestão racional de estoques

Foram instalados nas redes sistemasavançados de gestão de estoques, baseadosem fórmulas clássicas, teoricamente corre-tas sob o ponto de vista estatístico.

Recorre-se geralmente ao sistema deno-minado de “revisão periódica”, que permiteencomendar, num mesmo pedido, toda a lis-ta de produtos de um fabricante.

Os pedidos que, anos atrás, eram colocadosmensalmente, o são agora semanal ou bissema-nalmente, o que reduz em 75% ou 87,5% oestoque operacional do depósito central.

O estoque de segurança do depósito é cal-culado cientificamente, baseando-se em da-

dos quantitativos referentes ao atraso possí-vel de entrega do fornecedor e ao aumentoda demanda em relação à demanda média.

O reabastecimento é efetuado visando aatingir um nível desejado do estoque, deno-minado estoque máximo, cujo cálculo levaem conta o intervalo entre revisões periódi-cas e o prazo de entrega.

Como previsão da demanda toma-se a mé-dia de venda do produto nos três meses anteri-ores. É ajustada por um fator que permite con-siderar a influência de efeitos sazonais.

O sistema depósito-lojas possui dois es-tágios de estoque, o que aumenta a comple-xidade dos cálculos. Em cada loja existemum estoque de segurança e um estoque má-ximo, cujos valores são computados pormeio de fórmulas semelhantes às emprega-das para o depósito central.

Os distribuidores, por sua vez, utilizamfórmulas similares para gerir seus estoques.

A Figura 3 representa esquematicamenteos principais elementos do sistema de revisãoperiódica do depósito central e de uma loja.

Uso de softwares de gestão deestoques

As redes de farmácias usam intensamen-te softwares de gestão de estoques, desen-volvidos por seus setores de informática, porempresas especializadas ou ainda adaptadosde programas comerciais. As primeiras ge-

Dias

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AVANÇOS LOGÍSTICOS NO VAREJO NACIONAL

rações desses sistemas eram baseadas emcomputadores centrais. Foram em sua maio-ria convertidas para operar em microcom-putadores ligados em rede. Todas as farmá-cias são ligadas ao servidor central porteleprocessamento. Os bancos de dados de-vem possuir considerável capacidade paraarmazenar na memória informações relati-vas a uma dezena de parâmetros de gestão,em centenas de farmácias, para milhares deprodutos, dos quais é preciso conhecer asvendas e os estoques, dia a dia, durante os12 meses anteriores.

Racionalização das operações dodepósito central

Os depósitos centrais das redes de farmá-cias e das distribuidoras operam há anos comarranjo físico racional, instalações adequa-das e equipamentos modernos de transporteinterno, objetivando rapidez, qualidade eminimização dos custos.

As funções básicas são o recebimento dosengradados dos fornecedores, a separaçãodos pedidos destinados às lojas (picking), aexpedição e o transporte das mercadorias àsfarmácias.

O picking é efetuado de acordo com oprincípio de uma linha de montagem. Umcontentor vazio é colocado na extremidadede uma esteira rolante, ao longo da qual ope-radores, consultando listas de separação, re-tiram os itens de prateleiras dispostas de umlado a outro da esteira. No outro extremo dacorreia transportadora, o contentor, preenchi-do com os itens destinados à loja específica,é removido e transferido por outra esteira,em direção à área de expedição; nesta, oscontentores são agrupados por lojas, emboxes numerados, carregados em veículos(caminhonetes ou peruas) e transportados àslojas, nas quais as mercadorias são conferidase dispostas nas prateleiras.

Certos depósitos contam com um sistemade picking automatizado. Embora o investi-mento inicial seja da ordem de um milhão dedólares, estima-se que seu tempo de recupe-ração seja de menos de um ano, por força daseconomias de pessoal proporcionadas pelaautomação, bem como pela redução do tem-po de ciclo e a eliminação de erros.

O funcionamento eficiente do depósito re-quer a capacidade de processar e transmitir ins-tantaneamente informações relativas a entra-

das e saídas de mercadorias e emitir documen-tos tais como listas de separação, romaneios,notas fiscais de entrega às lojas, etiquetas deidentificação dos produtos e outros.

Duas técnicas próprias da indústria farma-cêutica – a numeração dos lotes e a codificaçãode barras – têm facultado a rastreabilidade decada item e facilitado o controle dos estoquesao longo da cadeia de operações.

Entregas às lojas

A quarta vertente de progressos situa-sena entrega às lojas. Os maiores desafios con-sistem na utilização plena de carga dos veí-culos, na sua roteirização, na administraçãoda frota e dos motoristas, para a qual existea opção de terceirização, e, acima de tudo,na batalha contínua contra o congestiona-mento de trânsito, as restrições à circulaçãoe ao estacionamento das viaturas. Parcelaconsiderável da luta logística é travada ànoite e passa despercebida, mas, sem o sa-crifício do pessoal, em geral mal reconheci-do, não se pode pretender a entrega dos pro-dutos certos na hora e na loja certas, todosos dias do ano, que é a condição básica parase ganhar o cobiçado prêmio representadopelo just in time.

PROBLEMAS REMANESCENTES ERECOMENDAÇÕES

Listam-se a seguir os obstáculos que têmsido observados com maior freqüência nasoperações logísticas das redes farmacêuticas.Recomendações são apresentadas.

Previsão da demanda

É difícil prever a demanda de milharesde itens, um a um. Para a maioria dos produ-tos, farmacêuticos e cosméticos, o métodopreferido pelas redes consiste em utilizar,como demanda diária do próximo mês, amédia da demanda diária dos três meses an-teriores. Importantes exceções referem-se aoscasos seguintes:• produtos marcadamente sazonais, por

exemplo, antigripais, loções protetoras,repelentes;

• promoções, freqüentes nos artigos de per-fumaria e higiene pessoal;

• lançamentos de novos produtos, que che-gam à casa de centenas anualmente.

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Conhecem-se técnicas para calcular o fa-tor sazonal de um produto, que se reproduzde um ano a outro e permite reduzir a mar-gem de subjetividade da previsão. Todavia, obanco de dados não possui sempre a capaci-dade de memória necessária para essa finali-dade, e o pessoal de vendas confia mais noseu julgamento do que num frio número. Pro-moções e lançamentos serão bem-sucedidosse a previsão da demanda tiver sido efetuadacom razoável margem de acerto e se venda ecompra tiverem sido bem sincronizadas. Casocontrário, faltarão ou sobrarão produtos aolongo da cadeia de suprimentos, desde o for-necedor até a loja.

Além disso, há um considerável númerode produtos cujo desvio-padrão é igual ousuperior à sua média diária de vendas.

Recomenda-se dispor de bancos de da-dos potentes e aperfeiçoar a metodologia deprevisão da demanda utilizada na empresa.

Entrosamento entre os setores devendas e compras

Quando a rede de farmácias é organizadano formato tradicional, em departamentos se-parados de compras e vendas, os subsistemasde compras e de estoque do depósito centralsão monitorados pelo setor de compras en-quanto o de vendas é comandado pela áreacomercial. Observa-se certo desencontro na-tural entre os dois subsistemas. O setor decompras deveria em princípio receber seusimpulsos do setor de vendas, mas este últimomostra dificuldades para prever a demanda,reagir às suas oscilações e transmitir as in-formações corretas e completas em tempohábil à área de compras. O ingente númerode produtos agrava os problemas.

Obstáculos de comunicação existem den-tro da própria área comercial, entre direto-ria, assessoria, gerências regionais e gerên-cias de lojas. Notam-se também entraves nacomunicação entre informática e os setoresoperacionais.

Esforços devem ser multiplicados no sen-tido de romper as barreiras entre os departa-mentos, através de reuniões, formação deequipes interdepartamentais, seminários ereforço da liderança. Uma alternativa seriaadotar um esquema de organização matricial,por linhas de produtos, comandadas por ge-rentes responsáveis pelas vendas e comprasde sua categoria.

Obtenção de informações gerenciaisconfiáveis

Embora os conceitos de cobertura de es-toque e nível de serviço sejam conhecidosda maioria dos executivos e a despeito dosesforços envidados para compilar as esta-tísticas desses indicadores, não é fácil umarede de farmácias apresentar dados regula-res, confiáveis e relevantes sobre giro doestoque e faltas de produtos. Os softwaresnão são montados para esse fim e os diver-sos setores da empresa, quando computamessas informações gerenciais, não obtêmresultados comparáveis. O setor de conta-bilidade tem sua maneira de calcular os es-toques, o de vendas, outra, o de compras,uma terceira, e assim por diante. O índicede faltas de produtos, no depósito e nas lo-jas, apresenta problemas de conceituação eobtenção. A gravidade das faltas deveria sermensurada pela margem de contribuiçãoperdida, nos dias em que os estoques dosprodutos estão zerados, ainda que esse cál-culo seja trabalhoso.

Rapidez na reposição dos produtos

O estoque de segurança do depósito cen-tral e das lojas, que é mantido para se preve-nir contra atrasos na reposição e flutuaçõesda demanda, é função crescente dos prazosde entrega do fornecedor ao depósito e dodepósito às lojas.

Se, por exemplo, forem necessários cincodias para reabastecer a loja, o estoque de se-gurança da loja será cerca de 5**0,5 = 2,24maior do que se o prazo de entrega fosse deum dia. A redução do tempo de entrega é umaforma eficiente de reduzir os estoques de se-gurança, que constituem parte apreciável dosestoques totais do depósito e das lojas.8

Compensa investir num sistema que nãoconstitua um gargalo para o processamentorápido de substancial volume de dados. Paraum mix de 5.000 itens e uma rede de 100lojas, trata-se de processar diariamente500.000 transações.

O reabastecimento diário da loja deveser efetuado repondo no dia D + 1 o que fornecessário para o ressuprimento do estoqueda loja em conseqüência das vendas ocor-ridas no dia D.

O reabastecimento diário, no depósito, detoda a gama de produtos, causaria na prática

8. HADLEY, G., WHITIN, T. M. Analysis ofinventory systems. Englewood Cliffs, N.J.: Prentice-Hall, 1963. p.152-3; BUFFA,Elwood S., MILLER, Jeffrey G.Production: inventory systems, planningand control. 3.ed. Homewood, Ill.: RichardD. Irwin, 1979. p.135; MONKS, Joseph G.Administração da Produção. São Paulo:McGraw-Hill, 1987. p.299, traduzido porLauro Santos Blandy de Theory andProblems of Operations Management,1985.

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AVANÇOS LOGÍSTICOS NO VAREJO NACIONAL

um aumento insustentável de serviço. No en-tanto, deve-se cogitar em efetuar reabasteci-mento bissemanal, negociando nesse senti-do com os fornecedores.

Coexistência de excessos e faltas deprodutos

É corriqueira a ocorrência simultânea deexcessos de estoque e falta de produtos numsistema de varejo: alguns itens sobram emalgumas lojas, outros faltam nestas e em ou-tras lojas. Uma profusão das mais variadascausas – atrasos de um fornecedor, pane dacomputação, encalhe numa promoção, falhanum lançamento – provoca consideráveis dis-túrbios na rede. Ainda que cada produto, in-dividualmente, possua 99,99% de probabili-dade de ser perfeitamente gerenciado, a pro-babilidade de não ocorrer nenhum excessonem falta numa rede de 100 lojas, com umsortimento de 5.000 apresentações, é ínfima(1,92 x 10-22). Recentemente, numa rede de100 farmácias, observaram-se, no mesmoperíodo, um estoque de 54 dias (10 no de-pósito e 44 nas lojas) e faltas de cerca de10% dos itens da linha em algumas lojas re-levantes.

Uma situação freqüente é a falta dos pro-dutos de grande procura e a sobra dos itensde baixo giro. Da mesma forma, lojas de in-tenso movimento carregam menos de 20 diasde estoque, enquanto as menos ativas osten-tam coberturas de 60 ou mais dias.

Se, naquela rede, o estoque total fossereduzido dos atuais 54 dias para factíveis33 dias, a redução do estoque correspon-deria a US$ 9 milhões, e o principal bene-fício, proveniente da liberação do capital degiro, montaria a US$ 3,2 milhões anuais. A

redução das faltas pela metade, por sua vez,aumentaria a margem de contribuição emUS$ 2,7 milhões por ano. Para tanto, é ne-cessário identificar e combater cada um damiríade de empecilhos que se antepõem àeficiência da gestão logística.

Os produtos éticos de baixo giro

Os produtos éticos de baixo giro com-prometem os esforços de contenção do es-toque. São cerca de 2.000 especialidadesmedicamentosas pouco receitadas. Seu pre-ço é elevado. Por motivos sociais, algumasredes consideram ser sua obrigação manteruma ou duas unidades de cada um dessesmedicamentos em todas as suas lojas. Emfarmácias típicas que adotam essa diretriz,verificou-se que esses itens contribuem com45% a 75% do valor total do estoque de pro-dutos farmacêuticos, o que levaria a con-cluir pela necessidade de se alterar a estra-tégia em foco.

Inexiste uma definição consensual do quevem a ser um produto de baixo giro. À guisade ilustração, a Tabela 1 reproduz a termi-nologia empregada por uma rede (com pe-quenas adaptações nas classes e na nomen-clatura, necessárias para maior clareza naexposição).

A venda de um produto de baixo giropode ser considerada, estatisticamente,como um evento raro; sua demanda obede-ce à distribuição de Poisson e não à distri-buição normal. Na primeira, ao contrário daúltima, o desvio-padrão é grande em rela-ção à média, o que resulta numa dispersãoconsiderável e, em conseqüência, numa co-bertura elevada, conforme se pode verifi-car na Tabela 2.

(2)

até 0,009

de 0,01 a 0,049

de 0,05 a 0,12

de 0,12 a 1

acima de 1

(1)

1. Baixíssimo giro

2. Muito baixo giro

3. Baixo giro

4. Médio giro

5. Alto giro

(3) @ @ @ @ @ 30 x (2)

até 0,3

de 0,3 a 1,5

de 1,5 a 3,6

de 3,6 a 30

acima de 30

Tabela 1 - Classificação dos produtos éticos de baixo giro utilizada numa rede de farmácias

Observação: pequenas adaptações foram efetuadas em relação à classificação usada pela rede. Notexto, designamos como de baixo giro as categorias 1, 2 e 3.

Média mensal de venda

na loja (em unidades)

Média diária de venda

na loja (em unidades)

Nomenclatura da classe

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Na distribuição de Poisson, o desvio-padrão é igual à raiz quadrada da demandamédia. Se este for inferior a 1, o desvio-padrão torna-se proporcionalmente conside-rável, como se vê na coluna (4), e a cobertu-ra do estoque, aproximadamente igual ao va-lor da coluna (5), avoluma-se.

A solução recomendável para a reduçãodos estoques dos produtos de baixo giro émantê-los somente nas lojas de maior mo-vimento, às quais os clientes que os procu-ram seriam referenciados. Uma alternativaé prometer entregá-los em poucas horas aosclientes, por meio de mensageiro que os re-tiram das lojas que os mantêm em estoque.

Outros problemas de gestão

Problemas adicionais enfrentados pelasredes de farmácias são mencionados a seguir:• Redes que comercializam produtos far-

macêuticos não registrados no Minis-tério da Saúde tendem a ser mais bemsucedidas do que as de estrita posturaética. A vigilância sanitária deveria sermais atuante.

• Fórmulas corretas de gestão de estoque,que empregam o conceito de desvio-padrão da demanda, são de processa-mento trabalhoso e demorado, mesmopor computadores modernos. Ademais,o pessoal de operação não as entendenem as aceita. Ou se expliquem essasfórmulas aos usuários, ou simplifi-quem-nas, valendo-se de fórmulas apro-ximadas, ainda que menos corretas.

• O pessoal de vendas reclama de qualquerfalta de produto nas lojas, mas não de ex-cesso de estoque. A pressão exercida levaa autorizar os gerentes da loja a solicitarremessas extras, o que leva a prejudicar o

bom funcionamento do sistema e a aumen-tar substancialmente os estoques.

• Nas redes em que inexiste um esquemade incentivo aos funcionários, não se deveesperar motivação para aumentar as ven-das e reprimir a elevação excessiva dosestoques.

• É recomendável manter um sistema quepermita a transferência dos produtos en-tre lojas, bem como o recolhimento dosmedicamentos cujo prazo de validade seaproxima da expiração.

• A redução dos estoques dos produtosfarmacêuticos libera espaço nas lojas,que deve ser preenchido por artigos deperfumaria e higiene pessoal, a fim dea loja não parecer vazia. Embora essesitens sejam mais baratos que os produ-tos éticos, o efeito final é o aumentodesnecessário do estoque. Gôndolas eestantes abarrotadas são consideradasimprescindíveis para causar impacto vi-sual no cliente.

• Uma sombra escurece as perspectivas dosegmento: o “ticket” médio por cliente defarmácia em São Paulo é de apenas US$ 12.Esse reduzido faturamento limita seria-mente o pleno florescimento do setor.

CONCLUSÃO

O ramo de varejo farmacêutico realizouna última década consideráveis progressos degestão, destacando-se a formação de redes, autilização de aprimorados sistemas computa-dorizados de gestão de estoques em tempo reale a racionalização das operações de seu de-pósito central.

Apesar dos avanços obtidos, não se al-cançam ainda o almejado just in time nem adesejada falta-zero e, muito menos, o Supply

(2)

Demanda

diária média

d

0,009

0,05

0,12

1

(1)

Categoria

Baixíssimo giro

Muito baixo giro

Baixo giro

Médio giro

(3) Öd

Desvio-padrão da

distribuição da

demanda diária

sssss

0,095

0,224

0,346

1

Tabela 2 - Cobertura de estoque de produtos de baixo giro

(4) = (3) / (2)

Coeficiente de

variação

sssss /d

10,5

4,5

2,9

1,0

(5) = 2 x (4)

Cobertura de

estoque

2sssss /d

21

9

5,8

2

Page 9: Marketing Varejo A2 avancos logisticos varejo_nacional

RAE • v. 38 • n. 4 • Out./Dez. 1998 71

AVANÇOS LOGÍSTICOS NO VAREJO NACIONAL

Chain Management ou o Efficient ConsumerResponse, que pressupõem entrosamento en-tre fornecedor, farmácia e cliente final.

Antes de atingir esses ideais, há que sesolucionar problemas organizacionais inter-nos, de relacionamento e comunicaçãointerdepartamentais, de treinamento de pes-soal, de previsão de demanda e de capacida-de computacional.

APÊNDICE I

Quick Response � PharmaceuticalDistributor

� Operando há mais de 70 anos no mercado suíço,

a Galenica Distribution atende, atualmente,

10.000 itens (pico de 180.000) de pedidos por

dia, percorrendo 22.000 km por dia, dispondo

para tanto de 150 vans.

� Possuindo ainda 9.000 sku, a Galenica,

mediante a adoção e implantação das

observações feitas neste paper para o mercado

nacional, atende às solicitações de reposição de

produtos dos seus clientes em 12 horas.

� De posse de uma postura gerencial proativa e de

operações integradas e sincronizadas, a

Galenica passou de 30.000 itens manuseados

por dia para 75.000.

� Sem nem mesmo explorar o maior distribuidor de

produtos farmacêuticos norte-americano -

McKensson -, a resposta rápida, no caso da

Galenica, permitiu-lhe obter preços mais

competitivos, maior flexibilidade e disponibilidade

de produtos.

Fonte: Business Advantage, Sweden, January 1998.

APÊNDICE II

A indústria farmacêutica9

9. Exame, n.13, jun. 1998.