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9 REVISTA ELETRÔNICA ARMA DA CRÍTICA NÚMERO 9/MAIO 2018 ISSN 1984-4735 MARX: UMA OBRA DEDICADA À LUTA DA EMANCIPAÇÃO DO TRABALHO Osmar Martins de Souza, 1 Susana Jimenez 2 Resumo Este trabalho tem como objetivo desenvolver algumas reflexões sobre a obra de Marx e a sua relação com a luta da emancipação do trabalho. Para tal, procurou-se identificar e analisar em suas principais obras, desde as da sua juventude até O Capital, a intima vinculação que existe entre estas e a luta dos trabalhadores, tendo em vista a emancipação efetiva do trabalho frente à dominação do capital. Marx, desde as suas primeiras obras, compreendeu que não era suficiente interpretar intelectualmente a realidade, mas que o interpretar, o conhecer devia se vincar a práxis emancipadora, ou seja, devia servir para transformar radicalmente a realidade social, e que o agente principal dessa práxis emancipadora era a classe trabalhadora (o proletariado). Palavras-chave: Marx. Trabalho. Emancipação. MARX: A WORK DEDICATED TO THE FIGHT OF EMANCIPATION OF LABOR Abstract This paper aims to develop some reflections on Marx´s research and its relation to the struggle for work emancipation. In order to do so, it has been tried to identify and analyze his main works, since the ones from his yout h up to “O Capital”, the intimate link between all of them and worker´s fight considering the effective emancipation of work against capital domination. Marx, from his earliest works, understood that it was not enough to interpret reality intellectually, but that to interpret it, to know it, should be credited to emancipatory praxis, that this, it should serve to radically transform social reality and that the main point of this emancipatory praxis was the labor class (the proletariat). Keywords: Marx. Labor. Emancipation. 1 . Doutor em Educação pela Universidade Federal do Ceará- UFC. Professor da Universidade Estadual do Paraná Campus de Campo Mourão PR. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Educação pela United States International University (Estados Unidos), com pós- doutorado pela UNICAMP. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFC. E-mail: [email protected]

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MARX: UMA OBRA DEDICADA À LUTA DA EMANCIPAÇÃO DO TRABALHO

Osmar Martins de Souza,1 Susana Jimenez 2

Resumo

Este trabalho tem como objetivo desenvolver algumas reflexões sobre a obra de Marx e a sua relação com a luta da emancipação do trabalho. Para tal, procurou-se identificar e analisar em suas principais obras, desde as da sua juventude até O Capital, a intima vinculação que existe entre estas e a luta dos trabalhadores, tendo em vista a emancipação efetiva do trabalho frente à dominação do capital. Marx, desde as suas primeiras obras, compreendeu que não era suficiente interpretar intelectualmente a realidade, mas que o interpretar, o conhecer devia se vincar a práxis emancipadora, ou seja, devia servir para transformar radicalmente a realidade social, e que o agente principal dessa práxis emancipadora era a classe trabalhadora (o proletariado).

Palavras-chave: Marx. Trabalho. Emancipação.

MARX: A WORK DEDICATED TO THE FIGHT OF EMANCIPATION OF LABOR

Abstract

This paper aims to develop some reflections on Marx´s research and its relation to the struggle for work emancipation. In order to do so, it has been tried to identify and analyze his main works, since the ones from his youth up to “O Capital”, the intimate link between all of them and worker´s fight considering the effective emancipation of work against capital domination. Marx, from his earliest works, understood that it was not enough to interpret reality intellectually, but that to interpret it, to know it, should be credited to emancipatory praxis, that this, it should serve to radically transform social reality and that the main point of this emancipatory praxis was the labor class (the proletariat).

Keywords: Marx. Labor. Emancipation.

1. Doutor em Educação pela Universidade Federal do Ceará- UFC. Professor da Universidade Estadual do Paraná – Campus de Campo Mourão – PR. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Educação pela United States International University (Estados Unidos), com pós-doutorado pela UNICAMP. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFC. E-mail: [email protected]

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INTRODUÇÃO

A obra de Karl Marx, desde a sua juventude, com os seus primeiros textos, até

a elaboração de O Capital: crítica da economia política está predominante relacionada

à situação da classe trabalhadora, com as suas lutas contra a exploração capitalista

e pela organização de uma nova forma de sociabilidade, a comunista, na qual, se

superaria toda forma de exploração do homem pelo homem. Desse modo, a obra de

Marx revela que sua vida foi marcada por um forte compromisso com a luta dos

trabalhadores e pela emancipação efetiva do trabalho, porque desde cedo

compreendeu e tomou por norte, que não era suficiente compreender e interpretar

intelectualmente a realidade, mas que o compreender, o conhecer devia se vincar a

práxis, ou seja, devia servir para transformar radicalmente a realidade, e que o agente

principal dessa práxis era a classe trabalhadora (o proletariado). Por isso, trataremos

neste texto de alguns pontos que vinculam o desenvolvimento de sua obra, de sua

teoria social (de seu pensamento), com a situação e com a luta pela a emancipação

da classe trabalhadora.

1- AS PRIMEIRAS OBRAS DO JOVEM MARX E A PROBLEMÁTICA DA EMANCIPAÇÃO HUMANA

O contato com a realidade, com os problemas materiais, com os problemas da

sobrevivência ou de como sobreviver na moderna sociedade capitalista em

constituição foram fundamentais no processo de desenvolvimento do pensamento de

Marx, pois lhe permitiu tomar contato com as lutas da classe trabalhadora, criticar o

hegelianismo (de direita e de esquerda) e a partir de outras experiências teóricas,

como a do socialismo francês e da economia política inglesa, elabora a sua teoria

social, com a qual explica o modo de produção e de reprodução da sociabilidade

capitalista e a forma de sua superação, tendo o proletariado como o sujeito principal

dessa transformação (NETTO, 2009, p. 21).

Este itinerário foi descrito resumidamente pelo próprio Marx no Prefácio da

obra: Contribuição à crítica da economia política de 1859, na qual, o autor mencionou

que como redator do Jornal Gazeta Renana3, teve que tratar de problemas materiais,

3 A Rheinische Zeitung (A Gazeta Renana) foi fundada em Colônia no dia primeiro de janeiro de 1842 (MEHRING, 2013, p. 48).

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como a questão do roubo de lenha e a pobreza dos viticultores de Mosela. Sobre esse

fato, no Prefácio a Contribuição crítica da economia política de 1859, Marx afirma:

Em 1842-1843, na qualidade de redator da Rheinische Zeitung (Gazeta Renana), encontrei-me, pela primeira vez, na embaraçosa obrigação de opinar sobre o chamado interesses materiais. Os debates do Landtag [parlamento – alemão] renano sobre os delitos florestais e o parcelamento da propriedade fundiária, a polêmica oficial que o sr. Von Schaper, então governador da província da renana, travou com a Gazeta Renana sobre as condições de existência dos camponeses do Mosela, as discussões, por último, sobre o livre câmbio e o protecionismo, proporcionaram-me os primeiros motivos para que eu começasse a me ocupar das questões econômicas (MARX, 2007, p. 44).

Marx, na Gazeta Renana, ao ter que opinar sobre os chamados interesses

materiais, ou seja, sobre a lei do furto de lenha e sobre a situação de pobreza dos

viticultores de Mosela, toma posição em favor dos direitos dessa massa empobrecida

(LUKÁCS, 2009, p. 139). Ao abordar essas questões, o jovem Marx também observa

que existe uma estreita relação entre a formulação das leis e os interesses dos que

possuem o poder (a classe dominante). Isso se torna mais evidente com o fechamento

da Gazeta Renana e os dezoito (18) meses posteriores foram decisivos para o

desenvolvimento de seu pensamento (MCLELLAN, 1980, p. 70). A este respeito, José

Paulo Netto acrescenta:

Na Gazeta Renana, Marx faz a sua primeira experiência política: de um lado, percebe – ainda que de forma pouco nítida – que nos conflitos políticos estão em jogo interesses econômico-sociais colidentes e que o papel arbitral e neutro do estado é uma aparência; de outro, verifica a vacilação e a covardia da burguesia liberal, que prefere os conchavos e os acordos à luta consequente pelos seus proclamados ideais de liberalismo (NETTO, 2009, p. 19).

Entretanto, em 1842 e 1843, o jovem Marx, ainda era um democrata radical e

não havia se tornado um comunista. Desse modo, a linha principal da argumentação

de Marx nos textos da Gazeta Renana se vincula às estruturas tradicionais da filosofia

clássica e da filosofia hegeliana, segundo a qual, considera a política e o Estado

fundamental para a realização humana e a expressão da racionalidade (CHASIN,

2009, p. 49)4. A transição para o comunismo e a superação dessa forma de

4 Nos artigos de A Gazeta Renana, Marx é um adepto vibrante da linha de pensamento – clássica e de origem tão remota quanto a própria filosofia – que identifica na política e no estado a própria realização do humano e de sua racionalidade. Em outros termos, estado e liberdade ou universalidade e civilização ou hominização se manifestam em determinações recíprocas, de tal forma que a politicidade é tomada como predicado intrínseco ao ser social, e nessa condição – eterna, sob modos diversos, que de uma

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entendimento ocorreu na passagem de 1843 para 18445 e corresponde à evolução

teórico-prática que o autor alcançou entre esses anos e esta, serviu de base para o

desenvolvimento de suas pesquisas posteriores e do seu engajamento com a luta dos

trabalhadores (MANDEL, 1968, p. 16). Nesse sentido, considera José Paulo Netto:

O primeiro semestre de 1844 assinala a passagem do pensamento de Marx a um novo estágio de desenvolvimento, passagem [...] que nos revela um pensamento em trânsito da filosofia à crítica da Economia Política, no rumo da elaboração da teoria social e revolucionária (NETTO, 2015, p. 11).

No período posterior ao fechamento de A Gazeta Renana, Marx decide se

recolher ao gabinete de estudos em Kreuznach, na França, com o objetivo de resolver

as dúvidas que o assolavam em função dos chamados “interesses materiais”. Dessa

experiência na Gazeta Renana, Marx se defronta com duas constatações: os limites

da revolução burguesa e do liberalismo burguês; e da sua formação intelectual de

base hegeliana, pois esta não dava conta dos problemas histórico-concretos e que

era necessário superar essa filosofia para agir na transformação da realidade social

(NETTO, 2009, p. 20). Em face disto, no período de cerca de 15 meses que vive na

França, Marx começa a revelar o seu perfil de pensador original, no qual, faz uma

crítica radical da filosofia do direito de Hegel e empreende outros estudos, como o da

literatura francesa6 e da economia política inglesa7. Desses estudos resultam,

forma ou de outra maneira a conduziram à plenitude da estatização verdadeira na modernidade. Politicidade como atributo perene, positivamente indissociável da autêntica entificação humana, portanto constitutiva do gênero, de sorte que orgânica e essencial em todas as suas atualizações. Em suma, à época de A Gazeta Renana, Marx está vinculado às estruturas tradicionais da filosofia política, ou seja, à determinação ontopositiva da politicidade, e enquanto tal, formalmente, a uma das inclinações fortes e características do neo-hegelianismo (CHASIN, 2000, p. 132). 5 O ano de 1844 é o momento decisivo no seu percurso teórico. É nesse ano que ele (Marx) começa a lançar os fundamentos metodológicos que orientarão toda a sua obra (TONET, 2010, p. 9). Sobre isso, Bottomore acrescenta: “O período decisivo na formação da teoria social de Marx situa-se entre março de 1843, quando renunciou ao cargo de redator da Rheinsche Zeitung (Gazeta Renana), e outubro de 1844. Durante essa época, Marx escreveu uma extensa crítica da filosofia hegeliana do Estado, e publicou os seus dois ensaios – ‘Sobre a questão judia’ e ‘Contribuição à crítica da filosofia do direito de Hegel: introdução’ – nos Deustsch-Französische Jahrbücher (Anais Franco-Alemães) e redigiu os Manuscritos econômicos e filosóficos. Os aspectos mais significativos do seu desenvolvimento intelectual são, primeiro, a formulação da concepção de proletariado, e, segundo, o início de sua crítica da economia política (BOTTOMORE, 1981, p. 12-13). 6 Em Kreuznach, Marx trabalha numa revisão crítica da filosofia política de Hegel, iniciada provavelmente em março de 1842. É neste volumoso manuscrito que Marx rompe definitivamente com a ideia de estado como instituição racional. Além disso, estuda a história da revolução francesa (Ludwig, Ranke, Wachsmuth). Entre as leituras desses períodos podem ser salientadas igualmente: Roussseau, O Contrato Social; Montesquieu, O Espírito das Leis; Maquiavel, Do Estado; Th. Hamilton, Homens e Costumes da América (RUBEL, 1991, p. 25). 7De abril a Junho de 1844, Marx se dedica ao estudo da economia política e preenche vários cadernos com extratos de leitura, que são acompanhados por comentários apaixonados. Durante esse ano lerá os economistas ingleses em tradução francesa (A. Smith, D. Ricardo, J. Mill, MacCulloch), além de Boisguillebert, J. B. Say, Skarbek, S. Sismondi, E. Buret, W. Schulz, etc. (RUBEL, 1991, p. 26).

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principalmente, os seguintes textos, Crítica da filosofia do direito de Hegel –

Introdução, escrito entre dezembro de 1843 a janeiro de 1844; Sobre a Questão

judaica, escrito entre agosto e dezembro de 1843; Manuscritos Econômico-filosóficos,

escrito entre março e agosto de 1844 e Glosas Críticas Marginais ao artigo “O Rei da

Prússia e a Reforma Social” de um Prussiano, publicado nos dias 7 e 10 de agosto de

1844, no jornal alemão, de tendência democrática, Vorwärts! (Avante!). Os textos,

Crítica da filosofia do direito de Hegel – Introdução e Sobre a Questão judaica -são

publicados no número duplo dos Anais Franco-Alemães8 em fevereiro de 1844 e

marcam a inflexão intelectual de Marx, a partir da qual, passa a elaborar seu próprio

pensamento (CHASIN, 2009, p. 57). Nesta direção, Daniel Bensaïd afirma:

Os dois artigos publicados na primavera de 1844 nos Anais Franco-Alemães marcam, portanto, exatamente uma guinada na formação do pensamento crítico de Marx. Eles constituem um adeus definitivo à filosofia alemã especulativa e inauguram, no entanto, com o proletariado parisiense, o grande canteiro de obras críticas (BENSAÏD, 2010, p. 27).

Com a mudança em seu pensamento, Marx supera a filosofia especulativa

alemã, elabora uma crítica radical à concepção de Estado hegeliana, que até então,

tinha lhe servido de base em suas reflexões sobre os chamados problemas materiais.

A concepção crítica sobre o Estado e sua função na sociedade de classes elaborada

por Marx nesse período é praticamente a mesma que aparecerá em textos

posteriores, como no Manifesto Comunista, de 1848; A guerra civil na França, de 30

de maio de 1871. Sobre essa revisão crítica da filosofia política de Hegel, no Prefácio

a Contribuição crítica da economia política de 1859, Marx considera:

O primeiro trabalho que empreendi para resolver as dúvidas que me assaltavam foi uma revisão crítica da Filosofia do Direito, de Hegel, trabalho cuja introdução apareceu nos Anais franco-alemães, publicados em Paris em 1844. Minhas investigações me conduziram ao seguinte resultado: as relações jurídicas, bem como as formas do Estado, não podem ser explicadas por si mesmas, nem pela chamada evolução geral do espírito humano; essas relações têm, ao contrário, suas raízes nas condições materiais de existência, em totalidades, condições estas que Hegel, a exemplo dos ingleses e dos franceses do século 18, compreendia sob o nome de “sociedade civil”. Cheguei também à conclusão de que a anatomia da sociedade burguesa deve ser procurada na Economia Política (MARX, 2008, p. 45, grifos meus).

8 O primeiro e único fascículo dos Anais Franco-Alemães circula em Paris no fim de fevereiro. Além das contribuições de Marx e Ruge, contém o ensaio de Engels, Esboços de uma Crítica da Economia Política; os Cantos de Louvor ao Rei Luís, de Heine; Traição, poema de G. Herwegh e as cartas de Paris, de Moses Hess. Engels figura também com uma resenha do Passado e Presente, de Carlyte (RUBEL, 1991, p. 26).

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Marx observa, ainda tendo por base principal a reflexão filosófica, que as

relações jurídicas e o Estado devem ser explicados a partir das condições materiais,

a partir da realidade concreta que produz a necessidade de constituição dessas

estruturas. É também na Crítica da filosofia do direito de Hegel – Introdução, que

aparece pela primeira vez o proletariado na obra de Marx. O proletariado, pelo lugar

que ocupa na sociedade civil (capitalista), passa a ser considerado por Marx, o agente

da emancipação, ou seja, o proletariado é o sujeito essencial da transformação da

sociedade e da construção de uma nova sociedade. Neste sentido, na Crítica da

filosofia do direito de Hegel – Introdução, Marx precisa:

Na formação de uma classe que tenha cadeias radicais, de uma classe na sociedade civil que não seja uma classe da sociedade civil, de um estamento que seja a dissolução de todos os estamentos, de uma esfera que possua caráter universal porque os seus sofrimentos são universais e que não exige uma reparação particular porque o mal que lhe é feito não é um mal particular, mas o mal geral, que já não possa exigir um título histórico, mas apenas um título humano; de uma esfera que não se oponha a consequências particulares, mas que se oponha totalmente aos pressupostos do sistema político alemão; por fim, de uma esfera que não pode emancipar-se a si mesma nem se emancipar de todas as outras esferas da sociedade sem emancipá-las a todas – o que é, em suma, a perda total da humanidade, portanto, só pode redimir-se a si mesma por uma redenção total do homem. A dissolução da sociedade, como classe particular, é o proletariado. [...] Assim como a filosofia encontra as armas materiais no proletariado, assim o proletariado tem suas armas intelectuais na filosofia. [...] A filosofia é a cabeça desta emancipação e o proletariado é seu coração. A filosofia não pode realizar-se sem a supra-sunção do proletariado, o proletariado não pode supra-sumir-se sem a realização da filosofia (MARX, 2005, p. 156, grifos meus).

É em Paris que Marx tem contato como o movimento organizado dos

trabalhadores e com a luta desses trabalhadores pela transformação da sociedade o

marcam profundamente (KONDER, 2015, p. 32). Isso pode ser comprovado na Crítica

da filosofia do direito de Hegel – Introdução, na qual, Marx elege o proletariado como

o sujeito da ação de transformação da sociedade. De fato, o encontro de Marx em

Paris com a luta do proletariado, conforme Bensaïd (2010, p. 27): “é grande canteiro de

suas obras críticas”. Nesta esteira, se situa o texto Sobre a Questão judaica e as

Glosas Críticas Marginais ao Artigo “O Rei da Prússia e a Reforma Social” de um

Prussiano. Em Sobre a Questão Judaica, Marx faz uma dura crítica ao pensamento

de Bruno Bauer, na qual, expôs em termos concretos e não mais idealista, a diferença

entre emancipação política e a emancipação humana. Considera que a emancipação

política é promovida pela burguesia, é parcial, pois não suprime a exploração do

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homem pelo homem, a sociedade de classes e a emancipação humana será efetivada

pelo proletariado, será universal, porque superará a exploração do homem pelo

homem, ou seja, eliminará a sociedade de classes e realizará a emancipação real.

Em Sobre a Questão Judaica (1843), Marx critica a análise de Bruno Bauer

sobre a emancipação política dos judeus, considerando que o mesmo não resolveu

essa questão por ficar restrito ao campo meramente religioso. “Bauer formula a

questão de modo idealista, religioso e teológico” (LUKÁCS, 2009, p. 165). Ao se referir

ao posicionamento de Bauer, Marx se expressa nos seguintes termos:

Ele impõe condições que não estão fundadas na essência da emancipação política mesma. Ele levanta perguntas que não estão contidas na tarefa que se propôs e resolve problemas que deixam o seu questionamento sem resposta. Bauer diz sobre os adversários da emancipação dos judeus que: “Seu único erro foi presumirem que o Estado cristão é o único verdadeiro e não o submeterem à mesma crítica com que contemplaram o judaísmo” (p. 3); diante disso, vemos o erro de Bauer no fato de submeter à crítica tão somente o “Estado cristão”, mas não o “Estado como tal”, no fato de não investigar a relação entre emancipação política e emancipação humana e, em consequência, de impor condições que só se explicam a partir da confusão acrítica da emancipação política com a emancipação humana em geral (MARX, 2010, p. 36, grifos meus).

Marx deixa claro que a crítica de Bruno Bauer se limita ao aspecto teológico –

“vemos o erro de Bauer no fato de submeter à crítica tão somente o “Estado cristão”,

mas não o “Estado como tal” - ou seja, ele considera que o problema da emancipação

política se resolve na crítica da religião. Marx, ao contrário de Bauer, dirige sua crítica

ao “Estado como tal” e o que ele representa em termos concreto. Por isso, em Marx:

“A questão da relação entre emancipação política e religião transforma-se para nós

na questão da relação entre emancipação política e emancipação humana” (MARX,

2010, p. 38).

Para Marx, a questão fundamental não se refere à relação entre emancipação

política e religião, mas entre a emancipação política e a emancipação humana. A

emancipação política é a emancipação do Estado e não elimina as contradições da

sociedade, enquanto a emancipação humana, é a emancipação real e efetiva. Nesse

sentido, em Sobre a questão judaica, Marx argumenta:

A emancipação política do judeu, do cristão, do homem religioso de modo geral consiste na emancipação do Estado em relação ao judaísmo, ao cristianismo, à religião como tal. Na sua forma de Estado, no modo apropriado à sua essência, o Estado se emancipa da religião, emancipando-se da religião do Estado, isto é, quando o Estado como Estado não professa nenhuma religião, mas, ao contrário, professa-se Estado. A emancipação política em relação à religião não é a emancipação já efetuada, isenta de

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contradições, em relação à religião, porque a emancipação política ainda não constitui o modo já efetuado, isento de contradições, da emancipação humana (MARX, 2010, p. 38).

A emancipação política, por ser burguesa, não elimina a religião, não elimina

as contradições na sociedade, não produz a liberdade e a igualdade efetiva entre

homens, ela representa a liberdade do Estado frente à religião. A emancipação política

constituiu um avanço, mas os seus limites são evidentes e podem ser constatados

nas sociedades em que ela se realizou. Por isso, Marx é categórico: “O limite da

emancipação política fica evidente de imediato no fato de o Estado ser capaz de se

libertar de uma limitação sem que o homem realmente fique livre dela, no fato de o

Estado ser capaz de ser um Estado Livre sem que o homem seja um homem livre”

(MARX, 2010, p. 39, grifos meus).

Marx, em Sobre a questão judaica, alcança a clareza do significado da

emancipação política, ou seja, é a emancipação da classe burguesa. Ela traz apenas

a liberdade jurídica, uma emancipação formal, isto é, proclama uma liberdade que não

pode se realizar na sociedade burguesa (LUKÁCS, 2009, p. 167). A emancipação

política é o resultado da revolução burguesa, portanto, emancipação da burguesia e

não do proletariado e nem da humanidade.

A emancipação política de fato representa um grande progresso; não chega a ser a forma definitiva da emancipação humana em geral, mas constitui a forma definitiva da emancipação humana dentro da ordem mundial vigente até aqui. Que fique claro: estamos falando aqui de emancipação real, de emancipação prática (MARX, 2010, p. 41, grifos meus).

Com a emancipação política, a burguesia se efetiva como a classe dominante

(governante) com a consolidação do regime político moderno em substituição ao

Antigo Regime, o feudal9, mas isso não significou a eliminação da sociedade de

classes e nem levou a emancipação humana. A emancipação política é a forma

definitiva da emancipação humana dentro da ordem vigente, dentro da sociedade

capitalista. Por isso, Marx chega à conclusão de que o objetivo a ser buscado pelo

proletariado não é a emancipação política, mas a emancipação humana. Sobre isto,

afirma Marx em Sobre a questão judaica:

9 A emancipação política representa concomitantemente a dissolução da sociedade antiga, sobre a qual está baseado o sistema estatal alienado do povo, o poder do soberano. A revolução política é a revolução da sociedade burguesa. Qual era o caráter da sociedade antiga? Uma palavra basta para caracterizá-la: a feudalidade (MARX, 2010, p. 51, grifos meus).

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A emancipação política é a redução do homem, por um lado, a membro da sociedade burguesa, a indivíduo egoísta independente, e, por outro, a cidadão, a pessoa moral. Mas a emancipação humana só estará plenamente realizada quando o homem individual real tiver recuperado para si o cidadão abstrato e se tornado ente genérico na qualidade de homem individual na sua vida empírica, no seu trabalho individual, nas suas relações individuais, quando o homem tiver reconhecido e organizado suas “forces propres” (forças próprias) como forças sociais e, em conseqüência, não mais separar de si mesmo a força social na forma da força política (MARX, 2010, p. 54).

Portanto, emancipação política foi o resultado da revolução burguesa, da classe

burguesa. Dessa forma, ela não pode emancipar a humanidade, ou seja, não supera

a sociedade de classes, pois é fundada na particularidade e no interesse individual

(da classe burguesa). A emancipação humana, que é real e que produzirá a igualdade

efetiva entre os homens, é de outra natureza, é social, é universal e só pode ser levada

a cabo por outra classe social, o proletariado.

Marx, no texto as Glosas Críticas Marginais ao Artigo “O Rei da Prússia e a

Reforma Social” de um Prussiano, em discussão com Arnold Ruge, aprofunda o

debate entre o significado da revolução política e da revolução social. “A revolução

política é a da sociedade burguesa” (MARX, 2010, p. 51), ou seja, é a manutenção do

Estado burguês e de todas as suas contradições. Já a revolução social representa a

superação da revolução política, cujo resultado foi a emancipação política. A

revolução social tem como objetivo a emancipação humana, a humanidade

emancipada, ou seja, a sociedade comunista.

Em as Glosas Críticas Marginais ao Artigo “O Rei da Prússia e a Reforma

Social” de um Prussiano, Marx explicita de modo cortante para o protagonismo do

proletariado no processo de transformação efetiva da sociedade, com vista à

emancipação humana. “O proletariado proclama, de modo claro, cortante,

implacável e poderoso, o seu antagonismo com a sociedade da propriedade

privada” (MARX, 2010, p. 68, grifos meus). Ao Polemizar com Arnold Ruge sobre a

revolta dos tecelões da Silésia, Marx, inequivocamente diferencia o proletário da

burguesia, a emancipação humana da política e a revolução social da política. Para

ele, a revolta dos tecelões supera todas as outras revoltas anteriores dos

trabalhadores, pois traz de forma lúcida o antagonismo entre burguesia e proletariado.

Em as Glosas, Marx ressalta a natureza da revolta dos tecelões da Silésia e sua

diferença em relação às revoltas anteriores dos trabalhadores, com os seguintes

termos:

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A revolta silesiana começa exatamente lá onde terminam as revoltas dos trabalhadores franceses e ingleses, isto é, na consciência daquilo que é a essência do proletariado. A própria ação traz este caráter superior. Não só são destruídas as máquinas, essas rivais do trabalhador, mas também os livros comerciais, os títulos de propriedade, e enquanto todos os outros movimentos se voltavam primeiramente contra o senhor da indústria, o inimigo visível, este movimento volta-se também contra o banqueiro, o inimigo oculto. Enfim, nenhuma outra revolta de trabalhadores ingleses foi conduzida com tanta coragem, reflexão e duração (MARX, 2010, 68, grifos meus).

Nas Glosas, Marx explicita a contradição entre o projeto do proletariado e o da

burguesia pela contradição entre o político e o social (FREDERICO, 2009, p. 114). A

luta do proletariado deve ser social, pois a política não altera a sua condição material.

Assim, era imperativo sair do ponto de vista político para poder imprimir uma

transformação radical na sociedade (MÉSZÁROS, 2002, p. 564). Isso significa, que a

luta do proletariado não deveria ser dirigida para a conquista do poder político (o

Estado), mas para sua supressão, já que a sua existência implicava (e implica) a

manutenção da propriedade privada e da exploração do homem pelo homem.

Marx, em as Glosas, pela análise do processo histórico em curso, chega a

compreensão que o proletariado tem que buscar outro tipo de revolução, a social, pois

nos países em que a revolução política tinha se realizado, a sua condição de vida não

havia melhorado, pelo contrário, o pauperismo generalizava-se. Por isso, o

proletariado não deveria limitar à sua luta nos marcos da revolução política, pois esta

representava os interesses da burguesia. Nesse sentindo afirma:

Já demonstramos ao "prussiano" quanto o intelecto político é incapaz de descobrir a fonte da miséria social. Apenas mais uma palavra sobre essa sua concepção. Quanto mais evoluído e geral é o intelecto político de um povo tanto mais o proletariado - pelo menos no início do movimento - gasta suas forças em insensatas e inúteis revoltas sufocadas em sangue. Uma vez que ele pensa na forma da política, vê o fundamento de todos os males na vontade e todos os meios para remediá-los na violência e na derrocada de uma determinada forma de Estado. Demonstração: as primeiras revoltas do proletariado francês. Os operários de Lyon julgavam perseguir apenas fins políticos, ser apenas soldados do socialismo. Deste modo, o seu intelecto político lhes tornou obscuras as raízes da miséria social, falseou o conhecimento dos seus objetivos reais e, deste modo, o seu intelecto político enganou o seu instinto social (MARX, 2010, p. 73).

Desse modo, o instinto social do proletariado não pode ser falseado na

revolução meramente política, visto que esta leva ao fortalecimento do Estado

burguês. Para Marx, a revolução social deve ser seu objetivo máximo, porque é a

única que poderá resultar numa sociedade verdadeiramente humana, ou seja, numa

sociedade emancipada. Considera que a revolução política foi um avanço e

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necessária, mas não pode se constituir o norte da luta dos trabalhadores, pois seu

horizonte se reduz a emancipação política. Por isso, em as Glosas, Marx enfatiza:

Mas a comunidade da qual o trabalhador está isolado é uma comunidade inteiramente diferente e de uma outra extensão que a comunidade política. Essa comunidade, da qual é separado pelo seu trabalho, é a própria vida, a vida física e espiritual, a moralidade humana. A essência humana é a verdadeira comunidade humana. E assim como o desesperado isolamento dela é incomparavelmente mais universal, insuportável, pavoroso e contraditório, do que o isolamento da comunidade política, assim também a supressão desse isolamento e até uma reação parcial, uma revolta contra ele, é tanto mais infinita quanto infinito é o homem em relação ao cidadão e a vida humana em relação à vida política. Deste modo, por mais parcial que seja uma revolta industrial, ela encerra em si uma alma universal; e por mais universal que seja a revolta política, ela esconde, sob as formas mais colossais, um espírito estreito (MARX, 2010, p. 75, grifos meus).

Para Marx, a revolução política é parcial, estreita e resulta numa sociedade em

que a liberdade é meramente formal. A constatação real de que a liberdade essencial

não poder efetivar-se sob a (des) ordem humano-societária do capital, possibilita ao

proletariado não se iludir com a emancipação política (CHASIN, 2000, p. 151). Assim,

para Marx, a luta política do proletariado não é pela emancipação política, mas pela

emancipação humana, que só pode ser efetivada com a revolução social.

Uma revolução social se situa do ponto de vista da totalidade porque - mesmo que aconteça apenas em um distrito industrial - ela é um protesto do homem contra a vida desumanizada, porque parte do ponto de vista do indivíduo singular real, porque a comunidade, contra cuja separação o indivíduo reage, é a verdadeira comunidade do homem, é a essência humana (MARX, 2010, p. 76).

Por isso, o proletariado deve orientar as suas lutas políticas não com o objetivo

de chegar ao poder e colocar o Estado ao seu serviço, pois a manutenção do Estado

implica em ficar restrita aos marcos da emancipação política e em dar continuidade a

exploração e a dominação do homem pelo homem. As suas lutas políticas devem

orientar-se pela lógica da revolução social, que destruindo a máquina estatal abre

caminho para a sociedade emancipada. Desse modo, em as Glosas, Marx se opõe

radicalmente a toda tradição política ocidental, desde Platão à Hegel, ao considerar

que o Estado devia ser destruído em uma sociedade socialista (TONET, 2010, p. 11).

A esse respeito, Marx acrescenta em as Glosas:

A revolução em geral - a derrocada do poder existente e a dissolução das velhas relações - é um ato político. Por isso, o socialismo não pode efetivar-se sem revolução. Ele tem necessidade desse ato político na medida em que tem necessidade da destruição e da dissolução. No entanto, logo que tenha início a sua atividade organizativa, logo que apareça o seu próprio objetivo, a

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sua alma, então o socialismo se desembaraça do seu revestimento político (MARX, 2010, p. 78).

Portanto, para Marx, a revolução social deve se sobrepor à revolução política,

assim como a emancipação humana deve estar acima da emancipação política, pois

somente elas (Revolução Social/ Emancipação Humana) podem levar a uma

sociedade efetivamente humana, a sociedade socialista (comunista), que realmente

promoverá a superação de toda forma exploração do homem pelo homem.

As reflexões de Marx realizadas nos textos anteriores ainda tinham um

predomínio da filosofia, mas em os Manuscritos Econômico-Filosóficos, que foi escrito

no segundo semestre de 1844, a partir dos seus estudos de economia política, Marx

elaborou uma “análise bem estruturada do modo de produção capitalista, ou mais, da

forma capitalista da atividade de produção” (RANIERI, 2010, p. 14). Desse modo,

Manuscritos Econômico-filosóficos é a primeira obra de Marx no campo da economia

política e constituem o primeiro esforço do pensador alemão em criticar os dados

clássicos à luz da realidade da sociedade burguesa (MANDEL, 1968, p. 38). Nessa

perspectiva de entendimento dos Manuscritos de 1844, José Paulo Netto acrescenta:

Nos Manuscritos está o passo inicial do que constituirá a crítica da Economia Política que Marx empreende a partir de 1844 e que terá a sua perspectiva teórico-metodológica determinada ao fim de quase três lustros de pesquisa. [...] É como os manuscritos que Marx abre a grande inflexão que seu pensamento experimentará nos anos 1844-1846 – cobrindo, pois, a sua elaboração (com Engels a seu lado) até as Teses sobre Feuerbach e A ideologia alemã. (NETTO, 2015, p. 104, grifos meus).

Nos Manuscritos está o passo inicial da futura crítica da economia política de

Marx e estes, segundo Lukács (2009, p. 180) tiveram o estímulo do genial escrito de

Engels, Esboço de uma crítica da economia política, publicado nos Anais Franco-

Alemães. Por ser o passo inicial de sua crítica da economia política, os Manuscritos

tem suas limitações, como por exemplo, o problema da produção do valor e do mais-

valor. Por isso, segundo Ernest Mandel, a parte mais relevante dos Manuscritos se

refere à análise dos fundamentos socioeconômicos da alienação. Sobre isso,

acrescenta:

Marx se esforça agora por cavar mais profundamente e descobre as raízes últimas da alienação humana no trabalho alienado, isto é, na divisão do trabalho e na produção mercantil. Entre produção mercantil, divisão do trabalho e propriedade privada há uma interação constante na produção da

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alienação, mas é a divisão do trabalho que é seu ponto de partida histórico (MANDEL, 1968, p. 35).

As considerações que Marx faz em os Manuscritos de 1844, sobre a questão

da alienação humana, diferentemente de outros autores como Feuerbach, que a

reduzem ao campo religioso, Marx a situa essencialmente a partir do trabalho, ou seja,

do trabalho alienado na sociedade capitalista. Sobre essa forma de trabalho

(alienado), Marx, nos Manuscritos Econômico-Filosóficos, discorre:

O trabalhador se torna tanto mais pobre quanto mais riqueza produz, quanto mais sua produção aumenta em poder e extensão. O trabalhador se torna mercadoria tão mais barata quanto mais mercadorias cria. Com a valorização do mundo das coisas (Sachenwelt) aumenta em proporção direta a desvalorização do mundo dos homens (Menshenwet). O trabalho não produz somente mercadorias; ele produz a si mesmo e ao trabalhador como mercadoria, e isto na medida em que produz, de fato, mercadorias em geral (MARX, 2010, p. 80, grifos meus).

Essa concepção do trabalho alienado formulado em os Manuscritos por Marx,

segundo a qual, o produto do trabalho não pertence ao trabalhador (produtor), mas ao

proprietário dos meios de produção (o capitalista) e, por isso, quanto mais ele produz,

mais ele se empobrece, mais aumenta o poder objetivo do mundo das coisas (das

mercadorias, do capital) sobre si mesmo, como um poder estranhado e que o

domina10, é uma evolução fundamental na análise econômica de Marx, tanto que em

sua forma mais elaborada em sua obra de maturidade, O Capital: crítica da economia

política, as suas linhas essenciais permanecem inalteradas.

Em os Manuscritos Econômico-Filosóficos de 1844, Marx considera que a

superação da alienação humana, do trabalho estranho, da propriedade privada, passa

pela a emancipação humana, que é compreendida em sua forma econômico-social,

ou seja, como supressão do trabalho humano alienado (CORNU apud MANDEL,

1968, p. 163). Sobre essa questão, Marx, em os Manuscritos, afirma:

[...] que a emancipação da propriedade privada etc., da servidão, se manifesta na forma política da emancipação dos trabalhadores, não como se dissesse respeito somente à emancipação deles, mas porque na sua emancipação está encerrada a [emancipação] humana universal. Mas esta [última] está aí encerrada porque a opressão humana inteira está envolvida na relação do trabalhador com a produção, e todas as relações de servidão são apenas modificações e consequências dessa relação (MARX, 2010, p. 88-89, grifos meus).

10 O trabalhador produz o capital; o capital produz o trabalhador. O trabalhador [produz], portanto, a si mesmo, e o homem enquanto trabalhador, enquanto mercadoria, é produto do movimento total. O homem nada mais é do que trabalhador e, como trabalhador, suas propriedades humanas o são apenas na medida em que o são para o capital, que lhe é estranho (MARX, 2010, p. 91).

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Para Marx, a emancipação humana passa pela emancipação dos trabalhadores

(do trabalho), pois é somente por meio da emancipação do trabalho que se supera

todas as formas de opressão, visto que estas, são consequências do trabalho

alienado, do trabalho estranhado. A emancipação do proletariado significa a

emancipação de todas as outras classes, por isso, o proletariado ao abolir a si mesmo,

abole todas as outras classes e generaliza a emancipação humana (AVINERI, 1981,

p. 108). Mas a emancipação humana, econômico-social, não é decorrente de um ato

do pensamento. A emancipação humana, a sociedade emancipada (comunista)11

requer uma ação real e concreta para a sua efetivação e esta ação, segundo Marx,

deve ser levada a cabo pelo proletariado.

2- DAS OBRAS COM FRIEDRICH ENGELS À PUBLICAÇÃO DO LIVRO I DE O

CAPITAL

A colaboração entre Marx e Engels só teve início no segundo semestre do ano

de 1844, todavia ambos já haviam se encontrado na Gazeta Renana, em Colônia e

Marx, como redator dos Anais Franco-Alemães, publicou em fevereiro de 1844 dois

textos de Engels, Esboços de uma crítica da economia política e A situação da

Inglaterra. Foi entre 28 de agosto e 6 de setembro de 1844, que se iniciou a

colaboração direta entre Engels e Marx12, tendo por objetivo, a publicação da obra, A

sagrada família13, na qual fizeram um acerto de contas com o idealismo alemão e com

o jovens-hegelianos (LUKÁCS, 2009, p. 180). Sobre o sentido da obra, A sagrada

família ou A crítica da Crítica crítica contra Bruno Bauer e consortes, Jacob Gorender,

acrescenta:

Trata-se de obra caracteristicamente polêmica, que assinala o rompimento com a esquerda hegeliana. O título sarcástico identifica os irmãos Bruno, Edgar e Egbert Bauer e dá o tom do texto. Enquanto a esquerda hegeliana depositava as esperanças de renovação da Alemanha nas camadas cultas,

11 Para superar o pensamento da propriedade privada, basta perfeitamente o comunismo pensado. Para suprimir a

propriedade privada real, é preciso uma ação comunista real. A história há de trazê-la, e aquele movimento, que

em pensamento já sabemos ser um movimento que se suprime, percorrerá na realidade um processo muito mais

duro e extenso (MARX, 2015, p. 401). 12 Em setembro, quando Friedrich Engels conheceu Marx em Paris, nascia uma amizade e uma cooperação que

perdurariam pelo resto da vida. Ele proporcionou a Marx um conhecimento prático dos mecanismos do

capitalismo, além de representar uma fonte de ajuda financeira sempre à mão e uma amizade que Marx cultivou

durante toda a vida (MCLELLAN, 1975, p. 19). 13 Escrita em 1844 e publicada em princípios de 1845, A Sagrada Família foi o primeiro livro em que Marx e

Engels apareceram na condição de coautores (GORENDER, 2013, p. 20)

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aptas a alcançar uma consciência crítica, o que negava os trabalhadores, Marx e Engels enfatizaram a impotência da consciência crítica que não se tornasse a consciência dos trabalhadores. E, nesse caso, só poderia ser uma consciência socialista (GORENDER, 2013, p. 20, grifos meus).

Marx e Engels, em A sagrada família, explicitam o papel fundamental do

proletariado no processo de superação de uma sociedade assentada sob a

propriedade privada, como a capitalista, mas também destacam a necessidade de os

proletários possuírem a consciência crítica, a consciência socialista (comunista), pois

só a partir desta, poderiam empreender uma ação (uma práxis) de efetiva

transformação e supressão da sociedade burguesa. A este respeito, Marx e Engels,

em A sagrada família afirmam:

O proletariado na condição de proletariado [...], é obrigado a supra-sumir a si mesmo e com isso à sua antítese condicionante, aquela que o transforma em proletariado: a propriedade privada. [...] Em seu desenvolvimento econômico-político, a propriedade privada se impulsiona a si mesma, em todo caso, à sua dissolução; contudo, apenas através de um desenvolvimento independente dela, inconsciente, contrário a sua vontade, condicionado pela própria natureza da coisa: apenas enquanto engendra o proletariado enquanto proletariado, enquanto engendra a miséria consciente de sua miséria espiritual e física, enquanto engendra a desumanização consciente – e portanto supra-sunsora – de sua própria desumanização. O proletariado executa a sentença que a propriedade privada pronuncia sobre si mesma ao engendrar o proletariado, do mesmo modo que executa a sentença que o trabalho assalariado pronuncia sobre si mesmo ao engendrar a riqueza alheia e a miséria própria. Se o proletariado vence, nem por isso se converte, de modo nenhum, no lado absoluto da sociedade, pois ele vence de fato apenas quando supra-sume a si mesmo e à sua antítese. Aí sim tanto o proletariado quanto a sua antítese condicionante, a propriedade privada, terão desaparecido (MARX; ENGELS, 2009, p. 48-49, grifos meus).

O proletariado na condição de proletariado (de explorado), só pode abolir esta

situação, se extinguir o elemento que o torna proletariado, a propriedade privada. O

resultado do desenvolvimento econômico-político da propriedade privada traz consigo

o aprofundamento da miserabilidade física e espiritual do proletariado, como também

a consciência de que essa condição de desumanidade pode e deve ser suprassumida

pelo próprio proletariado. Nesse sentido, Marx e Engels, em A sagrada família

acrescentam:

[...] nas condições de vida do proletariado estão resumidas as condições de vida da sociedade de hoje, agudizadas do modo mais desumano; porque o homem se perdeu a si mesmo no proletariado, mas ao mesmo tempo ganhou com isso não apenas a consciência teórica dessa perda, como também, sob a ação de uma penúria absolutamente imperiosa – a expressão prática da necessidade -, que já não pode mais ser evitada nem embelezada, foi obrigado à revolta contra essas desumanidades; por causa disso o

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proletariado pode e deve liberta-se a si mesmo. Mas ele não pode libertar-se a si mesmo sem supra-sumir suas próprias condições de vida sem supra-sumir todas as condições de vida desumana da sociedade atual, que se resumem em sua própria situação (MARX; ENGELS, 2009, p. 49).

O proletariado, por se encontrar nas piores condições de vida na moderna

sociedade burguesa, expressa a desumanidade desta forma de sociedade. A sua

situação é causada por esta forma de sociedade, desse modo, a sua revolta (a sua

luta) em libertar-se dessa condição, é uma revolta (é uma luta) contra essa forma de

sociedade. Por isso, o proletariado ao se libertar das suas condições de vida

desumanas, suprimirá todas as desumanidades da sociedade burguesa.

Essas reflexões apresentadas por Marx e Engels em A sagrada família

aparecem de forma mais elaborada na obra A ideologia alemã. Esta obra foi escrita

por Marx e por Engels na passagem do ano de 1845 para o ano de 1846. Marx e

Engels, em A ideologia alemã, fazem uma autocrítica do próprio itinerário filosófico

que percorreram e acertaram as contas de forma definitiva com a antiga consciência.

Sobre isso, o próprio Marx, no Prefácio da Contribuição à crítica da economia política,

relata:

E quando, na primavera de 1845, ele também veio domiciliar-se em Bruxelas, resolvemos trabalhar em comum para salientar o contraste de nossa maneira de ver com a ideologia da filosofia alemã, visando, de fato, acertar as contas com a nossa antiga consciência filosófica. O propósito se realizou sob a forma de uma crítica da filosofia pós-hegeliana. O manuscrito [A ideologia alemã], dois grossos volumes em oitavo, já se encontrava há muito tempo em mãos do editor na Westphalia, quando nos advertiram que uma mudança de circunstâncias criava obstáculos à impressão. Abandonamos o manuscrito à crítica roedora dos ratos, tanto mais a gosto quanto já havíamos alcançado nosso fim principal, que era nos esclarecer (MARX, 2008, p. 47).

Em A ideologia alemã, Marx e Engels dirigem a crítica ao postulado

fundamental do idealismo jovem-hegeliano, segundo o qual, considerava que era

suficiente “modificar a consciência”, “interpretar diferentemente o que existe” sem

combater “de maneira nenhuma o mundo realmente existente” (LÖWY, 2002, p. 175).

Marx, nas Teses Ad Feuerbach de 184514 expõe essa crítica de forma sintética na

décima primeira tese: “Os filósofos apenas interpretaram o mundo de diferentes

maneiras; o que importa é transformá-lo” (MARX, ENGELS, 2007, p. 535). Nas Teses

14 As Teses ad Feuerbach foram escritas por Marx em meados de 1845, em Bruxelas, e encontram-se no seu livro de anotações de 1844-1847 com o título de “1. Ad Feuerbach. Foram publicadas pela primeira vez em 1888, por Engels, como apêndice do seu livro Ludwig Feuerbach e o fim da filosofia clássica alemã e com o título de “Marx sobre Feuerbach” (ENDERLE, 2007, p. 571).

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sobre Feuerbach, Marx faz um esboço das ideias fundamentais do materialismo

histórico, que alguns meses mais tarde, como Engels, seria desenvolvida em A

ideologia Alemã (MCLELLAN, 1990, p. 155). Nesta direção, o próprio Engels, no texto:

Para a história da liga dos comunistas, de outubro de 1885, atesta:

Em Bruxelas na primavera de 1845, Marx [...] já havia desenvolvido plenamente, nas linhas fundamentais, a sua concepção materialista da história, e nos pusemos então a elaborar a nova concepção em detalhe e nas mais diversas direções (ENGELS, 1996, p. 138).

Marx e Engels, em A ideologia alemã, avançam na análise materialista da

realidade15, que propicia a compreensão do processo de desenvolvimento das forças

produtivas do trabalho e dos meios de intercâmbio. Para eles, na sociedade atual

(capitalista), estas forças se convertem em forças de destruição, que se assentam na

exploração do trabalho de uma classe, o proletariado. Sobre esse processo, Marx e

Engels, em A ideologia alemã, discorrem:

No desenvolvimento das forças produtivas advém uma fase em que surgem forças produtivas e meios de intercâmbio que, no marco das relações existentes, causam somente malefícios e não são mais forças de produção, mas forças de destruição (maquinaria e dinheiro) – e, ligado a isso, surge uma classe que tem de suportar todos os fardos da sociedade sem desfrutar de suas vantagens e que, expulsa da sociedade, é forçada à mais decidida oposição a todas as outras classes; uma classe que configura a maioria dos membros da sociedade e da qual emana a consciência da necessidade de uma revolução radical, a consciência comunista, que também pode se formar, naturalmente, entre as outras classes, graças à percepção da situação dessa classe; [...] para a criação em massa dessa consciência comunista quanto para o êxito da própria causa faz-se necessária uma transformação massiva dos homens, o que só se pode realizar por um movimento prático, por uma revolução; que a revolução, portanto, é necessária não apenas porque a classe dominante não pode ser derrubada de nenhuma outra forma, mas também porque somente com a revolução a classe que derruba datem o poder de desembaraçar-se de toda a antiga imundície e de se tornar capaz de uma nova fundação da sociedade (MARX;ENGELS, 2007, p. 41-42).

15 O fato é, portanto, o seguinte: indivíduos determinados, que são ativos na produção de determinada maneira, contraem entre si estas relações sociais e políticas determinadas. A observação empírica tem de provar, em cada caso particular, empiricamente e sem nenhum tipo de mistificação ou especulação, a conexão entre a estrutura social e política e a produção. A estrutura social e o Estado provêm constantemente do processo de vida de indivíduos determinados, mas desses indivíduos não como podem aparecer na imaginação própria ou alheia, mas sim tal como realmente são, quer dizer, tal como atuam, como produzem materialmente e, portanto, tal como desenvolvem suas atividades sob determinados limites, pressupostos e condições materiais, independentes de seu arbítrio. A produção de ideias, de representações, da consciência, está, em princípio, imediatamente entrelaçada com a atividade material e com o intercâmbio material dos homens, com a linguagem da vida real (MARX; ENGELS, 2007, p. 93).

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O proletariado, a classe que carrega todos os fardos da sociedade, não desfruta

do resultado do próprio trabalho. Nesta condição, o proletariado pelo lugar que ocupa

no processo de produção, desenvolve a consciência coletiva (de classe), de que é

necessário empreender uma luta decidida, isto é, uma luta por uma revolução radical

e que culmine numa sociedade comunista. A revolução, a mudança radical da

sociedade, não se dá por um ato do pensamento, mas por um processo prático, não

qual, o proletariado derruba a atual classe dominante (a burguesia) e funda uma nova

sociedade, a comunista. Nessa mudança radical, Marx e Engels, também consideram

a necessidade de os proletários derrubarem o Estado, que é uma expressão da

sociedade de classes. Por isso, afirmam:

Os proletários, para afirmar a si mesmos como pessoas, têm de suprassumir sua própria condição de existência anterior, que é, ao mesmo tempo, a condição de toda a sociedade anterior, isto é, o trabalho. Eles se encontram, por isso, em oposição ao Estado, a forma pela qual os indivíduos se deram, até então, uma expressão coletiva, e têm de derrubar o Estado para impor a sua personalidade (MARX; ENGELS, 2007, p. 66).

Para Marx e Engels, a sociedade comunista ou o comunismo não é um ideal

pelo qual a realidade terá de se regular. O comunismo é o movimento real, que a partir

do próprio real, do próprio existe, supera o atual estado de coisas e instaura uma nova

sociedade (MARX; ENGELS, 2009, p. 52). Nesse preciso sentido, Marx e Engels, em

A ideologia Alemã, acrescentam:

O comunismo distingue-se de todos os movimentos anteriores porque revoluciona os fundamentos de todas as relações de produção e de intercâmbio precedentes e porque pela primeira vez aborda conscientemente todos os pressupostos naturais como criação dos homens que existiram anteriormente, despojando-os de seu caráter natural e submetendo-os ao poder dos indivíduos associados. Sua organização é, por isso, essencialmente econômica, a produção material das condições dessa associação; ele faz das condições existentes as condições de associação. O existente que o comunismo cria é precisamente a base real para tornar impossível tudo o que existe independente dos indivíduos, na medida em que o existente nada mais é do que um produto do intercâmbio anterior dos próprios indivíduos (MARX, ENGELS, 2007).

Na Ideologia alemã, Marx e Engels esclarecem o que é o comunismo e o

distinguiu de outros movimentos. Consideraram que o comunismo é um movimento

real (dos proletários), que a partir do existente, ou seja, das relações de produção e

de intercâmbio existente no capitalismo, fundam uma nova forma de produção (uma

nova forma de trabalho), que é submetida aos interesses dos indivíduos associados.

Essas conclusões que Marx e Engels chegam na obra, A ideologia alemã, não serão

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modificadas em obras posteriores, como por exemplo, no Manifesto do partido

comunista de 1848.

Se na obra A ideologia alemã, Marx e Engels, elaboraram os fundamentos de

uma nova concepção de história, o materialismo histórico, na obra A Miséria da

filosofia de 1847, conforme o próprio Marx, no Prefácio da Contribuição à crítica da

economia política, foram expostos pela primeira vez, de forma científica, os pontos

decisivos de sua maneira de ver (MARX, 2008, p. 47).

A miséria da filosofia é a primeira obra, na qual, Marx apresenta uma visão de

conjunto do modo de produção capitalista, desde suas origens, do seu

desenvolvimento, de suas contradições e da sua superação futura ((MANDEL, 1968,

p. 55). Para José Paulo Netto, A Miséria da Filosofia: “é o primeiro desenho do projeto

teórico a que Marx dedicará o essencial da sua vida: a análise de conjunto do modo

de produção capitalista” (NETTO, 2009, p. 31). Ainda sobre o sentido e a importância

da obra, Netto acrescenta:

Na miséria da filosofia [...] se conjugam, numa integração plena, os elementos constitutivos da evolução marxiana: o teórico-científico e o político-ideológico. De um lado, o texto mostra o desenvolvimento das pesquisas de Marx no âmbito da economia política: a crítica marxiana ao conteúdo das formulações pretensamente científicas de Proudhon é o eixo central do livro e as avaliações nele explicitadas serão reafirmadas inúmeras vezes na obra ulterior de Marx. De outro, revela o estágio político alcançado por Marx: agora com seu projeto comunista revolucionário claramente formulado, ele é levado a combater firmemente quaisquer contrafações ideológicas que possam desviar o proletariado das tarefas prático-históricas que o processo social real confere a ele (NETTO, 2009, p. 28, grifos meus).

Em A Miséria da filosofia, Marx evolui significativamente em suas pesquisas em

economia política, bem como no campo prático (político), com o projeto de construção

de uma sociedade comunista. Por meio dessa articulação profunda entre o teórico e

o prático, ou seja, entre as suas investigações no campo da economia política e a luta

do proletariado, Marx combate duramente os posicionamentos teórico-práticos, como

o de Proudhon, que atrapalham o proletariado em avançar na luta contra a sociedade

capitalista e na realização da sociedade comunista. O proletariado deve compreender

que a sua condição é resultado das relações sociais de produção capitalista e que

somente por meio da sua luta revolucionária contra a burguesia (contra o capital), é

que superaria a sua própria situação e a sociedade de classes. Nesse sentido, Marx,

em A Miséria da filosofia, afirma:

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A condição da libertação da classe laboriosa é a abolição de toda classe [...]. A classe laboriosa substituirá, no curso do seu desenvolvimento, a antiga sociedade civil por uma associação que excluirá as classes e seu antagonismo, e não haverá mais poder político propriamente dito, já que o poder político é o resumo oficial do antagonismo na sociedade civil. Entretanto, o antagonismo entre o proletariado e a burguesia é uma luta de uma classe contra a outra, luta que, levada à sua expressão mais alta, é uma revolução total (MARX, 2009, p. 191, grifos meus).

A evolução na obra de Marx não se separa do seu intenso envolvimento com a

luta dos trabalhadores (dos proletários) por uma sociedade realmente emancipada,

por uma sociedade comunista. Nesse contexto, extremamente representativo é

publicado o Manifesto Comunista16em fevereiro de 1848, que é redigido por Marx e

Engels, a pedido da Liga dos Comunistas. No Manifesto Comunista, Marx e Engels

apresentam de forma sintética a sua visão de mundo, por isso, segundo Franz

Mehring:

O manifesto é tão independente e original quanto qualquer escrito jamais foi. No entanto, não continha uma só ideia de Marx e Engels já não tivessem usado em seus escritos anteriores. Não era, portanto, uma revelação, mas uma apresentação da visão de mundo de seus autores em um espelho, cujo cristal não poderia estar mais polido e sua moldura mais justa (MEHRING, 2013, p. 156).

Dessa forma, no Manifesto Comunista, pode-se encontrar várias das ideias que

Marx e Engels já haviam desenvolvido em outras obras, porém, de forma sintética e

impactante, tendo em vista o objetivo político-revolucionário, o de contribuir com a

organização da luta dos trabalhadores (dos proletários) contra a burguesia e pela

emancipação do trabalho. Sobre o sentido do Manifesto Comunista, Heinrich

Gemkow, considera:

É a certidão de nascimento do comunismo científico e do movimento operário revolucionário internacional, em linguagem magistral, Marx e Engels resumiram nele tudo o que eles tinham adquirido de conhecimentos científicos, e o que eles mesmos e o proletariado haviam juntado de experiências práticas. Nele fizeram uma apresentação concisa, sistemática, da sua teoria: do materialismo dialético e histórico, da economia política e da doutrina da luta de classes, da edificação da sociedade socialista e comunista (GEMKOW, 1984, p. 81).

Marx e Engels, a partir da análise materialista da história, no Manifesto

Comunista, esclarecem como a sociedade se desenvolveu por meio da luta de classes

16 O Manifesto do Partido Comunista foi publicado pela primeira vez no final de fevereiro ou início de março de 1848, em Londres. Segundo Bert Andreas, é provável que o próprio Marx tenha levado os originais de Bruxelas, sua residência no exílio, para Londres, na última semana de fevereiro de 1848. O Manifesto tinha sido encomendado a Marx pela Liga dos Comunistas (COGGIOLA, 2010, p. 9).

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e, principalmente, sobre o papel fundamental que cabe à classe trabalhadora atual, o

proletariado, que consideraram a classe verdadeiramente revolucionária. Por isso,

segundo Marx e Engels, em o Manifesto Comunista:

De todas as classes que hoje se opõem à burguesia, apenas o proletariado é uma classe verdadeiramente revolucionária. As demais classes vão-se arruinando e por fim desaparecem com a grande indústria; o proletariado é seu produto mais autêntico (MARX; ENGELS, 1996, p. 76, grifos meus).

O proletariado é a classe verdadeiramente revolucionária, porque a sua

oposição em relação a classe burguesa é inconciliável na sociedade capitalista. Desse

modo, o proletariado tem uma função essencial no processo de luta por uma

sociedade comunista, não por causa da miséria em que vive, mas pelo lugar que

ocupa no processo de produção capitalista e na capacidade que tem de organizar-se

como classe e de empreender uma ação coesa que outras classes exploradas do

passado não possuíam (MANDEL, 1968, p. 25). Assim, o proletariado ao tomar

consciência do lugar que ocupa no processo de produção na sociedade burguesa e

de que a sua situação de miserabilidade e de pauperismo é gerada, é um resultado

necessário do desenvolvimento das forças produtivas capitalista, se organiza como

classe e passa a lutar coletivamente contra esse modelo de sociedade. Nessa

perspectiva, Marx e Engels, no Manifesto Comunista, enfatizam:

Os operários começam a formar coalizões contra os burgueses; reúnem-se para defender seus salários. Chegam até mesmo a fundar associações permanentes para estarem precavidos no caso de eventuais sublevações. Aqui e ali a luta explode em revoltas. De tempos em tempos os operários triunfam, mas é um triunfo efêmero. O verdadeiro resultado de suas lutas não é o êxito imediato, mas a união cada vez mais ampla dos operários (MARX; ENGELS, 1996, p. 74).

Marx e Engels entendem que a luta do proletariado não deve se restringir à

defesa dos salários ou a êxitos momentâneos (conquistas parciais), mas deve ser

destinada à superação do próprio sistema capitalista. As lutas parciais do proletariado,

por meio de suas associações (coalizões), são um instrumento para a organização

política cada vez mais ampla da classe trabalhadora contra o domínio da classe

burguesa (do capital). Por meio dessa organização, o proletariado poderia

empreender um luta radical (revolucionária) para destruir as relações de produção

burguesa e construir uma nova sociedade (a comunista), que eliminará o trabalho

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explorado (o trabalho assalariado) e se fundará no trabalho associado. Sobre esse

processo, Marx e Engels, discorrem:

Quando, no curso do desenvolvimento, desaparecem os antagonismos de classes e toda a produção for concentrada nas mãos dos indivíduos associados, o poder público perderá seu caráter político. O poder político é o poder organizado de uma classe para a opressão de outra. Se o proletariado, em sua luta contra a burguesia, se organiza forçosamente como classe, se por meio de uma revolução se converte em classe dominante e como classe dominante destrói violentamente as antigas relações de produção, destrói, juntamente com essas relações de produção, as condições de existência dos antagonismos entre as classes, destrói as classes em geral e, com isso, sua própria dominação de classe. Em lugar da antiga sociedade burguesa, com suas classes e antagonismos de classes, surge uma associação na qual o livre desenvolvimento de cada uma é a condição para o livre desenvolvimento de todos (MARX; ENGELS, 2010, p. 59).

Marx e, também, Engels compreendem que a superação da sociedade

burguesa (capitalista) não ocorreria de uma forma espontânea e que o proletariado

não se tornaria uma classe verdadeiramente revolucionária somente por sua condição

no processo produtivo, mas que para isso, era fundamental que o proletariado tivesse

a consciência de classe17, o conhecimento de como o modo de produção capitalista

funciona e da possibilidade concreta de sua supressão. Neste ensejo, Marx dedica

parte significativa de sua vida, procurando elucidar por meio dos seus estudos no

campo da crítica da economia política, os elementos essenciais da produção

capitalista, tendo em vista, que estas investigações fossem conhecidas e apreendidas

pelos trabalhadores. Por isso, além de sua atividade teórica, Marx se dedica a uma

intensa atividade política e de formação do proletariado, com a qual, procura expor os

pontos-chave dessa forma de produção, como: o trabalho assalariado, o preço, o

lucro, o capital, etc. (TRASPADINI, 2010, p. 8).

O texto, Trabalho Assalariado e Capital, que foi publicado em 1849 na Nova

Gazeta Renana18, expressa a conjugação da atividade de Marx (teórico-prática), visto

que o mesmo, foi resultado de conferências que o autor ministrou na associação

operária de Bruxelas19 em 1847, com o objetivo de dar formação política para os

17 As condições econômicas, inicialmente, transformaram a massa do país em trabalhadores. A dominação do capital criou para essa massa uma situação comum, interesses comuns. Essa massa, pois, é já, face ao capital, uma classe, mas ainda não o é para si mesma. Na luta, de que assinalamos algumas fases, essa massa se reúne, se constitui em classe para si mesma. Os interesses que defende se tornam interesses de classe (MARX, 2009, p. 190). 18 Nova Gazeta Renana, jornal publicado em Colônia sob a direção de Marx, de 1º de junho de 1848 a 19 de maio de 1849. Engels fazia parte da redação. 19 A associação dos Operários Alemães de Bruxelas foi fundada por Marx e Engels no final de agosto de 1847, com vista a dar uma formação política aos operários alemães residentes na Bélgica e a fazer

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trabalhadores. Foi em Trabalho Assalariado e Capital que Marx apresenta avanços

fundamentais na crítica da economia política burguesa, pois ao tratar da relação entre

o trabalho assalariado e o capital, está um passo em desvelar a lógica de reprodução

do capital, por meio da teoria do mais-valor (MANDEL, 1968, p. 56). Sobre a relação

entre o trabalho assalariado e o capital, Marx afirma:

A existência de uma classe que nada possui senão a capacidade de trabalho é a condição prévia necessária do capital. Somente quando o trabalho objetiva, passado, acumulado, domina sobre o trabalho vivo, imediato, é que o trabalho acumulado se transforma em capital. [...] O operário recebe meios de subsistência em troca de sua força de trabalho, mas o capitalista, em troca dos seus meios de subsistência, recebe trabalho, a atividade produtiva do operário, a força criadora por meio da qual o operário não só restitui o que consome, mas também dá ao trabalho acumulado um valor superior ao que ele anteriormente possuía. [...] O capital só pode se multiplicar sendo trocando por força de trabalho, criando o trabalho assalariado. A força de trabalho do operário assalariado só pode ser trocada por capital, multiplicando-o, fortalecendo o poder de que ele é escravo (MARX, 2010, p. 48-49).

Conforme o próprio Marx, as atividades na Nova Gazeta Renana e os

acontecimentos posteriores levam a uma interrupção em seus estudos econômicos,

que são retomados em Londres, em 1850 (MARX, 2008, p. 47). Entre o verão de 1852

e o outono de 1856, Marx interrompe o trabalho de crítica à economia política, devido

a sua atividade em publicações jornalísticas (ROSDOLSKY, 2001, p. 24). Após esse

período, o pensador alemão desenvolve e aprofunda a sua crítica da economia política

burguesa e no qual, produz os materiais preparatórios de sua grande obra, O Capital.

De acordo com Ernest Mandel:

Os Grundrisse, que constituem junto com a Contribuição à Crítica da Economia Política o ponto culminante da obra econômica de Marx, antes do Capital, representam uma soma enorme de análises econômicas. Concebidas como os trabalhos preparatórios do Capital, ou mais exatamente como um desenvolvimento da análise do capitalismo em todos os seus aspectos, de onde a obra-prima de Marx ia nascer (MANDEL, 1968, p. 104).

Os Grundrisse foram redigidos entre 1857 e 1858 e a Contribuição à Crítica da

Economia Política em 1859. Entretanto, o Livro I de O Capital só ficaria pronto em

1867, quando Marx deixa de participar do Primeiro Congresso da Associação

propaganda entre eles das ideias do comunismo científico. Sob a direção de Marx e Engels e dos seus colaboradores, a Associação tornou-se um centro legal de agrupamento dos proletários revolucionários alemães na Bélgica. Os melhores elementos da Associação faziam parte da organização de Bruxelas da Liga dos comunistas. A atividade da Associação dos Operários Alemães de Bruxelas terminou pouco depois da revolução burguesa de fevereiro de 1848 na França, em virtude da prisão e da expulsão dos seus membros pela polícia belga.

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Internacional dos Trabalhadores, pois entende que terminar essa tarefa era mais

importante para a causa (a luta) dos trabalhadores (MEHRING, 2013, p. 349). Nesta

direção, Jacob Gorender, acrescenta:

Em 1865, a redação d’ O capital foi considerada tarefa prioritária acima do comparecimento ao realizado em Genebra sem a presença de Marx. Este, a conselho de Engels, decidiu-se à publicação isolada do livro I, concentrando-se na sua redação final. Em setembro de 1867, o Livro I vinha a público na Alemanha, lançado pelo editor hamburguês Meissner (GORENDER, 2013, p. 29).

Na obra O Capital, de acordo com o próprio Marx, ele apresenta a sua

investigação completa do modo de produção capitalista e suas correspondentes

relações de produção e de circulação (MARX, 2013, p. 78). Em O Capital, Marx não

apenas elabora uma teoria crítica ou uma nova interpretação da economia política, na

qual, critica as teorias econômicas burguesas, mas, a partir da análise imanente das

leis da produção capitalista, apreendem as suas determinações e suas contradições

essenciais, tendo em vista, contribuir com a luta da classe trabalhadora para superar

este modo de produção e, ainda, na construção de uma sociedade realmente

emancipada, a sociedade comunista.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir do exposto, pode-se afirmar que a produção teórica de Marx, a sua

obra, foi dedicada essencialmente à formação dos trabalhadores, tendo por meta a

luta real da emancipação do trabalho, com a superação da exploração do homem pelo

homem na sociedade capitalista, por uma sociedade em que haja a igualdade efetiva

entre os homens, a sociedade comunista, na qual: “o livre desenvolvimento de cada

um é a condição para o livre desenvolvimento de todos” (MARX; ENGELS, 2010, p.

59).

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