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1 Materiais manipuláveis e tecnologia na aula de Matemática (versão 17-10-2004) João Almiro Escola Secundária de Tondela [email protected] Resumo Este artigo pretende compreender até que ponto é que a utilização de materiais manipuláveis e de tecnologia influenciam o contexto de aprendizagem e que constrangimentos traz ao professor a condução de aulas que envolvem a sua utilização. Para esse efeito construí quatro tarefas em que previa a utilização desses recursos, que propus aos meus alunos do 8º ano, na unidade didáctica de semelhanças. A partir de um questionário e de entrevistas aos alunos, bem como da observação das minhas aulas por dois colegas com os quais realizei reflexões conjuntas, analiso as potencialidades dessas tarefas e materiais, tendo em conta o envolvimento, o desempenho e as dificuldades dos alunos, bem como os sucessos e as dificuldades vividos por mim na condução dessas aulas. Como conclusões é de salientar um grande envolvimento e entusiasmo dos alunos na aprendizagem da Matemática, explorando situações e testando hipóteses, construindo argumentos para defender as suas ideias, para o que poderá ter contribuído a utilização dos materiais manipuláveis e da tecnologia. É de notar também a falta de autonomia e persistência dos alunos, bem como a falta de método no modo como, por vezes, “atacaram” os problemas e como encararam os obstáculos com que se iam deparando. Relativamente ao meu trabalho como professor e apesar da certeza de ter proporcionado aos meus alunos óptimas oportunidades de experimentarem Matemática, destacam-se as dificuldades que vivi na condução destas aulas organizadas em pequenos grupos, tendo-se evidenciado a importância e a necessidade de propor mais tarefas deste género aos alunos, de modo a vivenciarem mais actividades deste tipo. Introdução As indicações metodológicas para o ensino da Matemática actuais dão grande relevo à utilização de materiais manipuláveis em sala de aula, valorizando o seu papel na aquisição e construção de conceitos matemáticos em todos os níveis de ensino, desde o pré-escolar ao secundário (APM, 1988; NCTM, 1991, 1994). O mesmo se passa relativamente ao uso de meios tecnológicos, que favorecem a criação de contextos significativos, permitindo a simulação de situações e o estudo de novos problemas, facilitando uma abordagem experimental e intuitiva da Matemática, estimulando o espírito de investigação nos alunos e dando-lhe um lugar mais activo no processo de

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Materiais manipuláveis e tecnologia na aula de Matemática (versão 17-10-2004)

João Almiro

Escola Secundária de Tondela [email protected]

Resumo Este artigo pretende compreender até que ponto é que a utilização de materiais

manipuláveis e de tecnologia influenciam o contexto de aprendizagem e que constrangimentos traz ao professor a condução de aulas que envolvem a sua utilização. Para esse efeito construí quatro tarefas em que previa a utilização desses recursos, que propus aos meus alunos do 8º ano, na unidade didáctica de semelhanças. A partir de um questionário e de entrevistas aos alunos, bem como da observação das minhas aulas por dois colegas com os quais realizei reflexões conjuntas, analiso as potencialidades dessas tarefas e materiais, tendo em conta o envolvimento, o desempenho e as dificuldades dos alunos, bem como os sucessos e as dificuldades vividos por mim na condução dessas aulas.

Como conclusões é de salientar um grande envolvimento e entusiasmo dos alunos na aprendizagem da Matemática, explorando situações e testando hipóteses, construindo argumentos para defender as suas ideias, para o que poderá ter contribuído a utilização dos materiais manipuláveis e da tecnologia. É de notar também a falta de autonomia e persistência dos alunos, bem como a falta de método no modo como, por vezes, “atacaram” os problemas e como encararam os obstáculos com que se iam deparando. Relativamente ao meu trabalho como professor e apesar da certeza de ter proporcionado aos meus alunos óptimas oportunidades de experimentarem Matemática, destacam-se as dificuldades que vivi na condução destas aulas organizadas em pequenos grupos, tendo-se evidenciado a importância e a necessidade de propor mais tarefas deste género aos alunos, de modo a vivenciarem mais actividades deste tipo.

Introdução

As indicações metodológicas para o ensino da Matemática actuais dão grande

relevo à utilização de materiais manipuláveis em sala de aula, valorizando o seu papel

na aquisição e construção de conceitos matemáticos em todos os níveis de ensino, desde

o pré-escolar ao secundário (APM, 1988; NCTM, 1991, 1994). O mesmo se passa

relativamente ao uso de meios tecnológicos, que favorecem a criação de contextos

significativos, permitindo a simulação de situações e o estudo de novos problemas,

facilitando uma abordagem experimental e intuitiva da Matemática, estimulando o

espírito de investigação nos alunos e dando-lhe um lugar mais activo no processo de

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aprendizagem (APM, 1988; Mathematical Association, 1992; Ponte e Canavarro 1997;

Veloso, 1988).

Também nos documentos curriculares portugueses são várias as sugestões

metodológicas que fazem referência ao uso de materiais manipuláveis e de tecnologia

na aula de Matemática. Por exemplo, no Currículo nacional do ensino básico:

Competências essenciais (DEB, 2001), relativamente à utilização de recursos, afirma-se

que:

Materiais manipuláveis de diversos tipos são, ao longo de toda a escolaridade, um recurso privilegiado como ponto de partida ou suporte de muitas tarefas escolares, em particular das que visam promover actividades de investigação e a comunicação matemática entre os alunos... (...)

Todos os alunos devem aprender a utilizar não só a calculadora elementar mas também, à medida que progridem na educação básica, os modelos científicos e gráficos. Quanto ao computador, os alunos devem ter oportunidade de trabalhar com a folha de cálculo e com diversos programas educativos, nomeadamente de gráficos de funções e de geometria dinâmica... (p. 71)

No entanto, como refere o Relatório Matemática 2001 (APM, 1998), apesar de

nestes últimos anos ter havido tantas referências e sugestões para a utilização de

materiais manipuláveis e de tecnologia na sala de aula, são ainda muitos os professores

que não planificam o seu ensino tendo em conta essas preocupações.

Este artigo surge, assim, com a ideia de compreender até que ponto é que a

utilização de materiais manipuláveis e de tecnologia influenciam o contexto de

aprendizagem e que constrangimentos traz a um professor a condução de aulas que

envolvem a utilização desses recursos. Concretamente, pretendo reflectir sobre:

(i) as potencialidades de tarefas que envolvem a utilização de materiais manipuláveis ou software de geometria dinâmica, tendo em conta o envolvimento, o desempenho e as dificuldades apresentadas pelos alunos;

(ii) as dificuldades e os sucessos vividos por um professor quando propõe e explora em sala de aula tarefas que recorrem a esses materiais e a essa tecnologia.

Que desafios para o professor hoje?

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É actualmente reconhecido por muitos autores que o professor tem mais do que

nunca um papel essencial no currículo (Alonso, 1993; Gimeno, 2000; Roldão, 1999). Já

não se espera deles uma atitude passiva de meros executores de orientações superiores;

pelo contrário, é pedido hoje aos professores que tenham uma acção mais esclarecida e

interveniente, de modo que para cada situação tenham opiniões fundamentadas. Assim,

cabe-lhes uma responsabilidade acrescida nas opções, decisões e estratégias relativas ao

currículo, na selecção crítica e na produção de materiais curriculares, no seu

ajustamento e na sua avaliação.

Gimeno (2000) afirma que existe uma influência recíproca entre o professor e o

currículo, porque o currículo molda e orienta a actividade do professor mas, por outro

lado, é traduzido e transformado, ou seja configurado pelo professor no

desenvolvimento do próprio processo de ensino-aprendizagem. Evidenciando o papel

do professor, realça que o docente, ao desenvolver uma prática concreta de acordo com

determinados objectivos, desempenha um papel decisivo no desenvolvimento do

currículo, na medida em que decide o tipo de actividades que os alunos vão realizar, a

sequência das tarefas, o seu espaçamento e duração, a forma como realiza a avaliação,

os materiais que escolhe, as estratégias de ensino, a ponderação dos conteúdos, entre

muitos outros aspectos. Salientando este papel essencial do professor, este autor afirma

que “por muito controlada, rigidamente estruturada, ou por muito tecnicista que uma

proposta de currículo seja, o professor é o último árbitro da sua aplicação nas aulas” (p.

175).

Claro que este novo papel exige uma atitude diferente do professor, no modo

como encara a sua profissão, que vai para além do bom senso e da boa vontade

baseados na sua experiência profissional. Na verdade, são vários os autores que

defendem que a reflexão sobre as práticas pode ser o elemento chave na transformação

dos professores e das escolas (Alarcão, 1991; Oliveira e Serrazina, 2002; Pérez, 1992;

Schön, 1992; Serrazina, 1999; Zeichner, 1993). A reflexão permite que as novas ideias

tomem lugar entre as já existentes, propicia tempo para pensar e cria espaço para

conhecimento novo. A promoção da prática reflexiva permite que os professores

comecem do lugar onde se encontram, ou seja, daquilo que já sabem, para que possam

construir a partir da sua experiência, possibilitando a ocorrência de mudanças integradas

no seu contexto (Muscela, 1992). Também Serrazina (1999) defende que a reflexão

sobre as propostas curriculares e sobre as práticas pode resultar numa reorganização

substancial do ensino e numa alteração das crenças e do próprio conhecimento do

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professor, nomeadamente quando se exploram novos materiais e novas tarefas de ensino

e se encontram surpresas no modo como os alunos reagem às propostas e na forma

como os alunos aprendem e adquirem o conhecimento matemático.

Para Zeichner (1993), os professores que não reflectem sobre as suas práticas

aceitam naturalmente a realidade quotidiana das suas escolas, perdendo muitas vezes de

vista as metas e os objectivos para os quais trabalham, tornando-se meros agentes de

terceiros. Segundo este autor, para desenvolver a acção reflexiva, são necessárias

algumas atitudes, nomeadamente: (i) o desejo de ouvir mais do que uma opinião; (ii)

admitir a possibilidade de erro, mesmo naquilo que se acredita com mais força; (iii)

perguntar-se constantemente porque estão a fazer o que fazem na sala de aula; (iv)

ponderar cuidadosamente as consequências de uma determinada acção; (v) reflectir

sobre as consequências inesperadas; e (vi) perguntar-se se o que está a fazer dá

resultados.

Para Zeichner, a prática reflexiva não é fácil, pois a sala de aula é imprevisível,

com grande actividade e muitos conflitos que obrigam os professores a tomarem

decisões espontâneas a todo o momento, havendo limitações institucionais, como a falta

de tempo, alunos a mais e a pressão para cumprir um dado currículo num determinado

período de tempo. Apesar disso, afirma que mesmo com estes condicionalismos é

possível ser-se um professor reflexivo e perceber em que medida é que dirigimos o

nosso ensino para metas para as quais trabalhamos conscientemente ou se, pelo

contrário, as nossas decisões são fundamentalmente dirigidas por outros, por convenção

e autoridade, aceitamos as coisas só porque estão na moda ou porque nos dizem para as

fazermos, sem decidirmos qual o caminho certo.

O desenvolvimento curricular, o desenvolvimento dos professores e o

desenvolvimento da escola estão intimamente relacionados, sendo o seu objectivo a

melhoria das aprendizagens dos alunos e da comunidade educativa, e o seu motor

central o trabalho desenvolvido pela equipa de professores. Como diz Nóvoa (1992), as

escolas não podem mudar sem o empenhamento dos professores e estes não podem

mudar sem uma transformação das instituições em que trabalham

Hoyle e Jonh (1995) afirmam que a pedra de toque para a mudança nas escolas

está em desenvolver padrões colaborativos entre os professores. Estes autores referem

ainda que se verificam melhorias na qualidade da educação nas situações em que os

professores trabalham mais em colaboração. Reforçando a importância do trabalho

colaborativo entre professores, Serrazina (1999), acrescenta que a reflexão sobre as

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práticas pode ser potenciada se for desenvolvida num ambiente colaborativo, em que os

professores são capazes de discutir com os seus colegas sobre os seus dilemas e os seus

conflitos e principalmente sobre o que acontece nas suas aulas.

Para um professor isolado numa escola não é fácil decidir que tarefas deve

seleccionar e propor aos seus alunos, saber como as deve orientar e que questões deve

colocar, ultrapassar os medos quando experimenta coisas novas e vencer as dificuldades

que encontra na gestão das suas aulas. Mas se houver um trabalho colaborativo entre os

colegas, na discussão e troca de ideias e de experiências lectivas é possível enriquecer

as práticas e promover a inovação e a melhoria da qualidade educativa.

A selecção das tarefas: Um problema...

A selecção das tarefas é um dos muitos problemas com que os professores se

deparam, quando desenvolvem o currículo, condicionando, de certa forma, as

actividades que os alunos irão desenvolver nas aulas de Matemática, com possíveis

consequências para a sua aprendizagem. São vários os autores que realçam a

importância desta selecção. Por exemplo, para Bishop e Goffree (1986), a actividade

dos alunos será crucialmente afectada pela escolha que o professor fizer da tarefa, da

situação e do contexto, pelo envolvimento que consiga criar nos alunos e pela maneira

como venha a conduzir as actividades. Gimeno (2000), salienta que o professor, ao

seleccionar as tarefas condiciona em grande medida o currículo, porque as tarefas são os

elementos básicos reguladores do ensino; afirma, ainda, que essa escolha e planeamento

estabelecem as regras de jogo para o comportamento dos alunos dentro da aula, sendo a

forma que os professores têm de manter um certo controle sobre as condições

complexas do ambiente da sala de aula.

Para Christiansen e Walther (1986), as tarefas podem distinguir-se como fazendo

parte de um espectro entre dois pólos: rotineiras e não rotineiras. De um lado estão as

tarefas em que o processo para encontrar a solução é conhecido e se apela mais à

memorização, onde a actividade desenvolvida contribui principalmente para a

consolidação de conhecimento e de capacidades já adquiridas; e do outro, as tarefas em

que esse processo é desconhecido e em que, por isso, o aluno desenvolve raciocínios de

ordem superior e a actividade promove condições óptimas para a construção individual

de conhecimento novo. Na verdade, as tarefas podem ser simples ou complexas, podem

possibilitar o desenvolvimento de técnicas, conceitos e/ou resolução de problemas,

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podem envolver trabalho individual, trabalho de grupo ou de toda a turma ou incluir a

manipulação de materiais, tecnologia ou cálculos de papel e lápis. Em cada caso, o

essencial é compreender em que medida é que a natureza das tarefas se adequa à

intenção com que foram seleccionadas.

No entanto, as tarefas em si próprias não contêm conceitos ou estruturas

matemáticas. Pensar que determinadas tarefas têm uma espécie de garantia no que

respeita ao seu efeito pedagógico é simplificar a relação que existe entre as tarefas e

aquilo que os alunos aprendem (Christiansen e Walther, 1986). Além disso, a actividade

realizada não depende exclusivamente das tarefas propostas. Tarefas com muitas

potencialidades podem dar origem a actividades com um valor muito discutível. As

actividades realizadas estão muito condicionadas pelo modo como a tarefa é proposta,

pela forma como se organiza o trabalho na aula, pelo ambiente de aprendizagem, pela

capacidade e experiência anterior dos alunos e pelos papéis que assumem os professores

e os alunos (Ponte, 1994).

Seleccionar tarefas não é simples para os professores. É preciso ter em conta

constrangimentos como o espaço e o tempo, os manuais e os materiais de que se dispõe,

organizando os recursos e, quando necessário, aprendendo a trabalhar com ferramentas

novas. Embora exista já muito material escrito, em publicações e na Internet, os

professores ao analisarem as potencialidades educativas das tarefas, têm que tentar

perceber que tipo de actividades é que essas tarefas poderão vir a proporcionar. Este

trabalho complexo não se pode limitar à caracterização e análise das tarefas de acordo

somente com o seu grau de dificuldade e o conteúdo temático. Elas devem ser

analisadas também questionando se são apropriadas e relevantes para aqueles alunos,

verificando se existe a indicação de passos óbvios ou se é exigida uma análise lógica,

constatando se os objectos a trabalhar são ou não explícitos ou se existem indicações

sobre a forma como se explora e investiga a situação, analisando em que medida é que o

texto dá pistas ou provoca a reflexão (Christiansen e Walther, 1986).

Recursos para a sala de aula

Diversos estudos mostram que o uso de materiais manipuláveis produz maior

rendimento nos alunos do que a sua não utilização, em todas as idades e em todos os

anos da escola elementar (Suydam e Higgins, 1977; Sowell, 1989; Serrazina 1990). A

introdução de conceitos matemáticos, através da utilização de materiais manipuláveis,

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pode fazer com que a Matemática se torne viva e que as ideias abstractas tenham

significado através de experiências com objectos reais. Numa situação de aprendizagem

com materiais, os vários sentidos do aluno são chamados, através do contacto e da

movimentação, envolvendo-o fisicamente, sendo esta interacção favorável à

aprendizagem. Aprender torna-se assim num processo activo de construção do

conhecimento, com significado (Vale, 1999).

Para o aluno não é suficiente observar uma demonstração de um material pelo

professor. O aluno tem que mexer nos materiais, interpretando as suas características,

resolvendo os problemas com a sua ajuda. Como dizem Matos e Serrazina (1996), o

acto de manipular permite ao aluno experimentar e descobrir padrões e relações que são

o essencial em Matemática. Estes autores também realçam que é essencial que o aluno

tenha muito tempo e várias oportunidades para explorar os materiais. Na sua

perspectiva, isso deve acontecer não só na introdução de conceitos, mas também noutros

momentos em que os alunos se envolvem na resolução de problemas, sendo importante

que estejam disponíveis sempre que eles sintam necessidade de os utilizar.

Acrescentam, ainda, que as necessidades de concretização variam de aluno para aluno,

necessitando uns de mais tempo do que outros, o que exige uma grande atenção por

parte dos professores no modo como conduzem a realização das tarefas.

É importante salientar que a utilização de materiais não é uma garantia de uma

aprendizagem significativa, sendo o papel do professor essencial quando se quer obter

bons resultados, pois é a este que compete decidir como, quando e porquê determinado

material deve ser utilizado. Mais do que o material, o que importa é se a experiência que

o aluno está a desenvolver é realmente significativa para ele, pois aprender Matemática

fazendo-a, significa não só manipular objectos, mas também pensar e reflectir sobre a

actividade que se realizou (Serrazina, 1990).

O uso de materiais manipuláveis é um desafio para o professor, pois acrescenta

muito mais actividade e barulho às aulas e requer mais espaço e organização. É

essencial que os professores aprofundem o seu contacto com os vários materiais, pois só

adquirindo um grande à vontade no seu manuseamento é que poderão escolhê-los e

utilizá-los adequadamente com os seus alunos na sala de aula (Vale, 1999).

Segundo Hiebert e Carpenter (1992), os resultados negativos que por vezes se

verificam com o uso de materiais concretos podem ser motivados pela distância entre o

material que se está a utilizar e as relações matemáticas que é nossa intenção que eles

representem. Quanto mais próxima for essa correspondência, mais apoio contextual

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existe para os alunos construírem as relações pretendidas. Afirmam estes autores que

não há nenhuma garantia que os alunos vejam as mesmas relações nos materiais que os

adultos, mas é mais provável que as construam quando interagem com os materiais e

com os colegas quando trabalham com esses materiais. Gravemeijer (1991) chama

também a atenção para o facto de que não é o material que transmite os conhecimentos,

mas que apenas pode ajudar a resolver problemas práticos em determinados contextos.

Afirma ainda que trabalhar com materiais manipuláveis, não prepara para trabalhar sem

eles e que existe um problema na transição das ideias que surge quando se trabalha com

materiais para as ideias em termos de relações e conceitos matemáticos.

A Geometria constitui um campo propício à utilização de materiais manipuláveis,

visto que em muitas circunstâncias é indispensável a concretização de situações para

ajudar os alunos na compreensão dos problemas e dos conceitos. Na verdade, os

modelos físicos podem ser um auxiliar importante pois o contacto e manipulação das

figuras e as transformações que se vão operando com os materiais, através de uma série

de tentativas, facilitando a passagem do concreto para o abstracto, podem contribuir

para que o aluno construa conhecimento matemático mais sólido e duradouro.

Quanto à utilização dos computadores em sala de aula, já em 1988 a APM, na

Renovação do Currículo de Matemática, considerava que o computador poderia

facilitar uma abordagem experimental e intuitiva da Matemática, permitindo ao aluno

um lugar mais activo no processo de aprendizagem. Nesse documento refere-se ainda

que as novas tecnologias permitem encarar todo um novo estilo de actividades

educativas onde os alunos são encorajados a desenvolver a sua autonomia,

independência e espírito de iniciativa, esperando-se que o professor deixe de ser aquele

que tudo sabe, para passar a ser um companheiro mais experiente e com mais

entusiasmo acerca de cada assunto.

Tendo por base um grande número de investigações Fey (1991), considera que a

utilização do computador em abordagens activas e exploratórias incentiva a curiosidade,

o aumento de confiança e o gosto dos alunos pela Matemática, ajudando a criar

ambientes de trabalho em que os alunos são encorajados a fazer e testar conjecturas e a

criar e avaliar modelos matemáticos. Sistematizando o que de essencial é trazido pelas

novas tecnologias ao ensino-aprendizagem da Matemática, Ponte (1995) enumera os

seguintes aspectos: i) uma relativização da importância das competências de cálculo e

de simples manipulação simbólica; ii) um reforço do papel da linguagem gráfica e de

novas formas de representação; iii) uma atenção redobrada às capacidades intelectuais

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de ordem mais elevada; iv) um crescendo de interesse pela realização de projectos e

actividades de modelação, investigação e exploração; v) a possibilidade de envolver os

alunos em actividade matemática intensa e significativa, favorecendo o

desenvolvimento de atitudes positivas em relação a esta disciplina.

Mais concretamente, no que se refere aos programas de geometria dinâmica que

vamos utilizar neste estudo, Junqueira (1995) refere que os ambientes computacionais

gráficos para o ensino-aprendizagem da Geometria permitem realizar construções

geométricas no computador, utilizando explicitamente as propriedades das figuras,

possibilitam a manipulação directa das construções, conservando as propriedades

utilizadas. Na sua perspectiva, estas ferramentas computacionais devidamente

integradas no ensino-aprendizagem, podem constituir um veículo para aquisição de

conhecimentos, capacidades e atitudes, promovendo no aluno os processos de

aprendizagem necessários para atingir os objectivos desejados.

Segundo Canavarro (1994), os professores têm opiniões diferentes sobre o papel

que os computadores podem ter na aula de Matemática, o que de certo modo influencia

a forma como os utilizam. Para esta investigadora, os professores consideram que os

computadores podem: i) influenciar positivamente o ambiente da sala de aula, na

medida em que têm o poder de entusiasmar e motivar os alunos; ii) facilitar a realização

rápida e rigorosa de determinadas actividades habitualmente feitas à mão,

nomeadamente cálculos, gráficos e construções geométricas; iii) possibilitar a realização

de actividades de experimentação, de exploração e de investigação, dificilmente

concretizáveis ou mesmo inviáveis sem este recurso.

No entanto, para esta autora, e apesar das várias possibilidades que se nos

apresentam, tirar partido das potencialidades do computador não é por vezes tarefa fácil

para os professores. Os constrangimentos são de vária ordem e vão desde a preparação

das tarefas, à condução da aula, com as dificuldades de gestão do tempo e de

acompanhamento dos grupos. No trabalho com computadores são muitas as dúvidas que

vão surgindo, nomeadamente, saber como lidar com as descobertas não previstas dos

alunos, como conjugar o trabalho dos alunos com o computador e sem ele, como

sistematizar colectivamente os resultados obtidos com a ajuda do computador.

Assim, os computadores trazem realmente um grande desafio à nossa actividade

educativa, pois são ferramentas muito potentes, permitindo entre outros aspectos

automatizar os processos de rotina e concentrar a nossa atenção em capacidades

intelectuais de ordem superior. Contudo, esta tecnologia não vale por si só, cabendo ao

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professor um papel decisivo na criação, organização e condução das situações de

aprendizagem.

Metodologia

Tendo em conta o problema em estudo, este trabalho segue uma abordagem

qualitativa, sendo os dados recolhidos, no essencial, descritivos, e havendo uma maior

preocupação com o processo do que com o produto final (Bogdan e Biklen, 1994). O

ambiente natural constituiu a fonte directa dos dados e o principal instrumento de

recolha fui eu enquanto investigador, tendo sempre tentado que os participantes no

estudo expressassem livremente as suas opiniões sobre as questões em causa; o meu

entendimento foi também o instrumento essencial na análise dos dados.

Desenvolvi este trabalho numa unidade didáctica de Geometria – “Semelhança de

triângulos”, com os meus alunos do 8º ano, que foram os participantes no estudo. A

turma era constituída por 24 alunos, nenhum repetente, integrando um grupo muito vivo

e sempre à espera de novos desafios. Metade da turma já foi minha o ano anterior e

conheço-os bem; a outra metade, é um pouco mais passiva, integrando alunos que

apresentam algumas dificuldades na disciplina de Matemática.

A recolha dos dados foi realizada através de questionários e entrevistas aos alunos,

registos de observação das aulas efectuados por dois colegas e gravações em áudio das

reflexões conjuntas das aulas assistidas. Foram também utilizadas as resoluções das

tarefas propostas e que os alunos foram entregando no decorrer das aulas. No fim da

realização das tarefas foi passado um questionário aos alunos (em anexo), que incluiu

para além de perguntas fechadas a possibilidade de escreverem sobre o que gostaram ou

não gostaram e sobre as dificuldades que sentiram. Para complementar estes

questionários, realizei pequenas entrevistas aos alunos.

Como este estudo decorreu nas minhas aulas, estas foram assistidas por dois

colegas a que chamei Ana e Ivo, que tiraram notas sobre os aspectos que acharam mais

relevantes face ao problema em estudo. No final de cada aula, fizemos reflexões em

conjunto (a que eu chamei reflexões 1, 2, 3 e 4), gravadas em áudio, como já referi,

onde foram abordados (i) o envolvimento dos alunos na aprendizagem, os

conhecimentos e capacidades que evidenciaram, as principais dificuldades com que se

depararam; e (ii) o modo como foi lançada a tarefa aos alunos, os problemas que

surgiram na gestão da aula, e as principais dificuldades e sucessos.

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Entreguei a estes professores um documento contendo o objectivo deste estudo e

as linhas orientadoras de observação, no sentido de clarificar o que esperava da sua

participação neste trabalho. Fiz este pedido a Ana e Ivo por duas razões: i) a sua grande

experiência na utilização de materiais manipuláveis e tecnologia nas actividades

lectivas; ii) todo um passado de actividades de formação de professores e de

experiências de inovação curricular que temos realizado em conjunto, no decorrer da

nossa carreira. Penso que a sua experiência na utilização destes recursos foi evidenciada

no modo como comentaram o decorrer das aulas, o que me parece ter sido uma mais-

valia para o enriquecimento deste trabalho. Quanto ao passado que temos em conjunto,

considero ter sido decisivo para criar um ambiente de grande à vontade, que possibilitou

reflexões conjuntas, quanto a mim, relevantes e significativas. Para estes colegas, o

desafio de assistirem às minhas aulas e de poderem reflectir em grupo sobre o modo

como decorreram os trabalhos, foi uma experiência estimulante, pois puderam, através

destas observações, verem-se retratados e confrontados com muitas das suas vivências,

ansiedades e dificuldades, questionando, também, deste modo o trabalho que vão

desenvolvendo com os seus alunos, nas aulas em que utilizam materiais manipuláveis e

tecnologias.

Proposta pedagógica

Como ideias orientadoras da proposta pedagógica que defendo para as minhas

aulas, destaco a necessidade de: (i) proporcionar aos alunos a exploração de uma grande

diversidade de ideias matemáticas, num ambiente intelectualmente estimulante, no qual

experimentar e fazer Matemática sejam actividades naturais e desejadas, promovendo a

reflexão individual e em grupo, tornando-os mais aptos a analisar situações, a formular

e resolver problemas e a pensar matematicamente; (ii) valorizar a dimensão da

comunicação matemática a partir da exploração de situações problemáticas, fazendo

tentativas, errando e corrigindo esses erros, testando e construindo argumentos,

ganhando confiança na resolução de problemas cada vez mais complexos.

Claro que para levar à prática estas ideias é importante que eu assuma um papel,

não de fornecedor de informação, mas sim de facilitador da aprendizagem e orientador e

dinamizador dos trabalhos, cabendo-me o papel essencial de seleccionar as tarefas e de

criar um ambiente propício ao envolvimento e empenho dos alunos. A estes compete

uma atitude activa na resolução das tarefas, discutindo com os colegas e comigo as suas

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conjecturas, explicando e escrevendo regularmente as suas ideias, clarificando e

consolidando o seu pensamento matemático.

Tendo por pano de fundo estas linhas orientadoras, tento organizar o ensino

propondo aos meus alunos uma grande variedade de experiências de aprendizagem,

tanto no que se refere ao modo como são organizados, como ao grau de abertura das

tarefas ou mesmo no que respeita aos recursos didácticos utilizados. Na escolha e

sequência das tarefas considero o programa como orientador e o manual escolar como

base. Estes são os primeiros documentos que analiso quando preparo determinada

unidade didáctica, o que ocorre normalmente em trabalho conjunto com os colegas da

minha escola que leccionam o mesmo ano de escolaridade.

Na escola, o manual é considerado como um documento de trabalho essencial,

devido ao facto de estar na posse dos alunos desde o início do ano – é uma norma usar

prioritariamente os recursos disponíveis para evitar custos desnecessários à escola. Na

preparação de cada unidade, estudo o manual com todo o cuidado a fim de seleccionar,

de forma criteriosa, as tarefas a propor, bem como as sínteses de informação a

evidenciar junto dos alunos quando necessário.

No que se refere às tarefas, o manual do 8º ano adoptado na escola tem um

número excessivo de exercícios e de problemas fechados, tendo falta de actividades de

exploração e investigação, ou mesmo de situações problemáticas de natureza mais

aberta. Para além disso, só muito raramente é que inclui sugestões de exploração de

tarefas que apelem ao uso de tecnologia ou de materiais manipuláveis.

Aquando da selecção das tarefas, escolho as propostas de trabalho do manual que

me parecem mais desafiantes, preocupando-me se a redacção é clara e compreensível

para os alunos de cada turma e se cobrem todos os conteúdos referidos no programa,

tentando, também, que sejam o menos repetitivas possível. Depois de realizado esse

trabalho, sinto, na maior parte das vezes, a necessidade de completar esse material com

tarefas que vou encontrando noutras publicações, na Internet, ou mesmo fruto da

participação em encontros de professores ou acções de formação. Estas tarefas que

adapto costumam incluir problemas, tarefas de exploração e/ou investigação, jogos ou

projectos, apelando ao uso de recursos diversos, nomeadamente, calculadoras gráficas,

programas de geometria dinâmica ou materiais manipuláveis. Recorro também por

norma ao material desenvolvido pelos colegas que leccionaram estas unidades

didácticas no ano lectivo anterior, recriando e, por vezes, melhorando esse material que

passará, também, para os colegas do ano seguinte.

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Ao analisar o manual no capítulo de semelhança de triângulos, e depois de

constatar alguma pobreza nas suas propostas de trabalho, senti a necessidade de

construir as quatro tarefas que se encontram em anexo. O seu objectivo essencial era

proporcionar aos alunos experiências de aprendizagem que incluíssem o uso do

computador e de materiais manipuláveis, na exploração de problemas não rotineiros,

que constituíssem desafios para os alunos e em que pudessem surgir estratégias de

resolução diferentes.

Nas várias tarefas que desenvolvi em pequenos grupos, seguidas de discussão na

turma, foram colocadas algumas situações abertas aos alunos, de forma a que

formulassem e testassem conjecturas, argumentando e comunicando oralmente com os

seus colegas e comigo e apresentando por escrito as suas conclusões no final de cada

tarefa. Cada grupo de três elementos escolheu um secretário que teve como atribuição

fundamental o registo escrito das resoluções dos problemas propostos que entregou no

final de cada aula. Decidi este número de elementos do grupo tendo em atenção o

trabalho desenvolvido no computador, uma vez que grupos com mais do que três alunos

tornariam impossível o bom andamento dos trabalhos.

Os relatórios escritos foram corrigidos por mim e entregues aos alunos, tendo

esclarecido oralmente alguns aspectos que achei mais relevantes e que podiam ajudá-los

na elaboração dos relatórios seguintes. Estes trabalhos foram mais um dos elementos a

ter em conta na sua avaliação final, completando toda a informação já recolhida através

de testes, outros trabalhos já realizados e a participação nas aulas. Estas actividades

possibilitaram-me, também, observar atitudes e capacidades que noutras aulas não são

tão fáceis de observar, como a autonomia, a persistência, a comunicação oral e escrita

dos alunos e a capacidade de trabalhar em grupo.

Mais concretamente, nas tarefas 1 e 2 estavam em causa o conceito de semelhança

de figuras, bem como a relação entre as áreas de figuras semelhantes. Foram trabalhadas

com recurso ao programa de geometria dinâmica Cabri-Géomètre. Na tarefa 3,

pretendia explorar as relações entre as áreas de polígonos semelhantes e as relações

entre volumes de poliedros semelhantes. Recorri ao uso de materiais manipuláveis

nomeadamente triângulos de esponja e cubos de madeira. Com a tarefa 4, que considero

ser a situação mais aberta e em que se pretendia uma ligação ao quotidiano, coloquei um

problema aos alunos, que me pareceu possibilitar o desenvolvimento de actividades

exploratórias e talvez um pouco de natureza investigativa. Foram usados

retroprojectores, réguas e fitas métricas. Antes da realização das tarefas 1 e 2, abordei

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com os alunos o conceito de semelhança de figuras ainda que de uma forma pouco

aprofundada e à custa de poucos exemplos. Depois das tarefas 1 e 2, trabalhei propostas

do manual, previamente seleccionadas, que incluíam exercícios e problemas mais

fechados, entre os quais introduzi a realização da tarefa 3. Por fim, propus a tarefa 4

como conclusão da unidade.

As aulas

Tarefa 1

Estava um bocadinho ansioso antes desta aula. Talvez devido à minha experiência

anterior, sabia que as aulas com computadores em que um professor está sozinho com

uma turma são sempre difíceis. No entanto, tinha algumas coisas a meu favor: os alunos

eram bastante bons informaticamente, já conheciam o Cabri-Géomètre do ano anterior e

na última aula tinha-lhes mostrado os comandos essenciais do programa que iriam ser

utilizados, com um computador portátil e um projector de vídeo. A tarefa parecia-me

motivadora, mas nunca temos a certeza, pois, por vezes, a mesma tarefa é interessante

para umas turmas e outras não lhe acham “graça” nenhuma.

Os alunos entraram na sala muito agitados, o que é habitual nesta turma, pois são

muito “novitos”. Estavam muito contentes por terem saído da sua sala e terem vindo

para a sala dos computadores que eles adoram. Tive que assumir a condução da aula

com alguma firmeza, de modo a conseguir que se sentassem todos nos seus lugares,

lessem a tarefa e começassem a trabalhar.

Quanto a instruções, referi que se sentavam três alunos à frente de cada

computador, devendo um deles ficar um pouco mais recuado a fazer os registos

relativos à resolução da tarefa, incluindo os vários caminhos e dificuldades que

sentiram, para depois me entregarem no final. Relativamente à tarefa, não expliquei

mais nada. Não me pareceu que fosse necessário.

Já tínhamos constituído os grupos e combinado esta forma de trabalho na aula

anterior. Associaram-se de acordo com as suas preferências, tendo eu colocado

unicamente uma condição: não há grupos só de rapazes, nem só de raparigas. Tenho

tido experiências negativas com grupos assim constituídos, especialmente no 3º ciclo.

As condições da sala de informática são razoáveis, os alunos é que eram muitos.

Se houvesse mais intervalo entre os computadores e se estivessem em mesas separadas

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e um bocadinho maiores para que os alunos pudessem teclar e escrever ao mesmo

tempo, seria bastante melhor. Mas não nos podemos queixar. Os computadores são de

modelos recentes e todos tinham o Cabri instalado, conforme eu tinha verificado na

véspera. Estava um computador ligado a um projector que eu tinha requisitado, para o

caso de ser necessário dar alguma instrução a toda a turma, o que não foi necessário.

A primeira questão foi resolvida com muita desenvoltura por quase todos os

grupos. Alguns já não se lembravam como é que se via que dois triângulos eram

semelhantes apesar de já termos falado desse assunto na semana anterior. Como alguns

ainda se recordavam, essa informação passou rapidamente entre todos. Alguns grupos

estavam muito dependentes de mim. Não faziam nada sem me mostrar e não passavam

para a pergunta seguinte sem terem a minha opinião sobre o que tinham feito.

Aquando da planificação, eu levantei a possibilidade de conseguir acabar a tarefa

1 na primeira aula (de 90 minutos) e ainda começar a tarefa 2, mas isso não se revelou

possível. Com a pergunta 2 da tarefa 1, em que se pedia para construírem dois

quadriláteros semelhantes, que à partida parecia muito acessível, os alunos tiveram

imensas dificuldades.

Quase todos os grupos começaram a trabalhar da mesma maneira. Construíram

um quadrilátero e mediram os seus lados e os seus ângulos. Construíram um segundo

quadrilátero e fizeram o mesmo. Arrastaram um vértice do segundo quadrilátero até

conseguirem que os ângulos fossem iguais aos do primeiro e os lados proporcionais.

Depois de algum tempo, perceberam que era uma tarefa dificílima. Então o que fazer?

Houve grandes discussões nos grupos, mas sem grandes soluções. Fui sugerindo: “já

experimentaram fazer o segundo quadrilátero com os lados paralelos ao primeiro? Se

funcionou com os triângulos, pode ser que também funcione com os quadriláteros.”

Claro que não funcionava como nos triângulos. Mas era uma ajuda, pois pelo

menos os ângulos dos dois quadriláteros eram iguais, só era preciso arrastar um vértice

de modo aos lados correspondentes ficarem proporcionais. Uns com mais dificuldades

que outros lá foram construindo os quadriláteros semelhantes. Uma questão que parecia

tão simples, acabou por gerar imensas discussões e grandes dificuldades aos grupos até

conseguirem o pretendido.

Há que referir que um grupo, talvez pela sua constituição, apresentou muitas

dificuldades na resolução desta tarefa, bem como em todas as outras. Era constituído

por duas raparigas que na aula de Matemática fazem somente o que é mais rotineiro,

apresentando algumas dificuldades na resolução de problemas mais complexos. O

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terceiro elemento é um rapaz com grandes dificuldades em todas as actividades

escolares, já tendo ido algumas vezes conversar com a psicóloga da escola para se tentar

perceber o porquê das suas dificuldades de aprendizagem. Quando este grupo foi

constituído podia-se prever que não iria funcionar lá muito bem do ponto de vista da

resolução das tarefas, mas como tinha decidido não interferir na constituição dos

grupos, pouco havia a fazer a não ser estar mais atento ao modo como iriam desenvolver

os trabalhos.

Houve dois grupos que ainda começaram a resolver a tarefa 2, enquanto os

restantes acabavam a tarefa 1, fazendo os registos no relatório que tinham que me

entregar.

Cheguei ao fim da aula exausto, mas contente. Tinha tido grandes dificuldades em

dar apoio aos 8 grupos, pois as solicitações foram muitas, e eu não tive mãos a medir

pois os alunos, como já foi referido, revelaram pouca autonomia durante esta aula.

Contente, pois senti que com esta primeira tarefa os alunos desenvolveram actividades

diferentes do usual, exactamente como eu pretendia quando a criei, explorando a

situação que lhes tinha sido colocada, fazendo tentativas, discutindo Matemática,

errando e corrigindo até chegar a uma solução satisfatória.

Quanto aos relatórios, ficaram muito pobres. Já tinha sido identificado no

conselho de turma aquando da construção do plano curricular da turma que a principal

dificuldade destes alunos era a escrita. Os alunos não gostam de o fazer e apresentam

muitas dificuldades. Escrever Matemática, devido ao seu vocabulário próprio, ainda

complica mais esta actividade. Nas suas notas de observação da aula, Ana escreveu:

“Quando é necessário registar o que foram descobrindo, os alunos desanimam e

começam a brincar”. Um aluno escreveu no seu questionário: “O que menos gostei foi

quando tínhamos que fazer as conclusões para entregar ao professor”. No questionário,

mais de 40% responderam não ter gostado de escrever as conclusões.

Nos relatórios escritos que entregaram houve alguns grupos que explicaram bem

os seus procedimentos, mas de uma forma muito sintética, enquanto outros tiveram um

discurso quase imperceptível, como neste exemplo:

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Na reflexão 1, relativamente a esta aula, um primeiro aspecto que sobressai é a

própria natureza das propostas de trabalho. “Achei as tarefas engraçadas. Não são assim

tão simples como parecem à primeira vista” (Ana, reflexão 1). Ficou claro que elas

proporcionaram situações muito interessantes aos alunos. Para resolver os vários

problemas com que se deparavam, os alunos tiveram que se esforçar para descobrir o

melhor caminho, encontrando processos muito diferentes entre os vários grupos, com

uma atitude muito mais activa da que teriam se fosse uma aula centrada na exposição do

professor:

“Porque não fazes com paralelas? Paralelas como?” Houve processos diferentes, o que é engraçado, até na própria construção do triângulo semelhante o que permitiu obter construções diferentes, por tentativas. (...) Há imensas coisas que os miúdos tentam e que descobrem que não dá. Este não é o processo melhor e seguem outro, mas o professor não se apercebe de nada. (...) É muito diferente duma aula no quadro. Eles testam e seguem os seus próprios caminhos e não o do professor e são obrigados a pensar. Cada grupo seguiu o seu caminho e se fosse no quadro eles tinham que acompanhar só o que o professor estava a decidir (Ivo, reflexão 1)

O papel do computador no decorrer da aula foi outro dos assuntos debatidos,

percebendo-se que nesta aula foi um auxiliar importante e facilitador do trabalho que os

alunos tinham entre mãos. “O computador ali não foi um empecilho, não me pareceu

nada, naqueles grupos que eu observei. O computador, ali, era de facto uma ferramenta

de trabalho” (Ana, reflexão 1).

Ainda no decorrer da primeira reflexão conjunta discutimos aspectos relativos ao

professor. Um primeiro aspecto abordado teve a ver com as ajudas que fui

disponibilizando aos alunos e do tempo que lhes dei para me explicarem as suas

resoluções. No final da aula, explicava desta maneira o que tinha acontecido:

Eu sinto que a aula toda estou pressionado. Porque tenho 8 grupos para tomar conta. Quero que toda a gente, mais ou menos, chegue ao essencial e não lhes dou tempo para eles me explicaram coisas, nem para me

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responderem. (...) Se calhar devia tê-los deixado um bocadinho mais soltos. Dar tempo. Eles estragarem mais e demorarem mais. Estás a perceber? Mas pronto, eu estou com aquela ideia do tempo, do tempo, do tempo (Eu, reflexão 1).

Para terminar, concluímos que a principal dificuldade do professor era, realmente,

o apoio efectivo aos grupos de alunos, tarefa reconhecidamente difícil e complicada,

tendo ficado no ar a ideia que estas aulas deveriam ser leccionadas por dois professores

ou então só com metade da turma:

O professor tem imensas dificuldades em dar apoio eficaz e oportuno a toda a turma numa situação destas. 8 grupos é muito grupo. Apesar que 3 elementos, a trabalhar com o computador, 3, 2 é o ideal. Mas é muito complicado para o professor (Ana, reflexão 1)

Tarefa 2

Antes desta tarefa estava mais descontraído do que na anterior. A primeira aula

tinha corrido bem, pois os alunos tinham agarrado os desafios e não se tinham portado

mal. Nesta turma, por vezes, há muito barulho, havendo necessidade de chamar a

atenção de alguns alunos, especialmente os rapazes, para restabelecer o ambiente de

trabalho. Mas isso não foi necessário nem na primeira aula, nem nesta. Eles estavam

entusiasmados com os desafios, ainda que às vezes não reagindo muito bem às

dificuldades, chamando primeiro o professor, mesmo antes de terem pensado com

calma ou trocado impressões com os colegas do grupo. No questionário que lhes passei

no final, só quatro alunos responderam que não tinham gostado destas aulas com o

Cabri e só três afirmaram terem tido muitas dificuldades.

Relativamente à resolução desta tarefa, correu tudo muito bem nas três primeiras

alíneas. O pior foi estabelecer as relações entre os perímetros e entre as áreas dos vários

triângulos semelhantes e relacioná-los com as razões de semelhança. Como se pode

reparar, a proposta de trabalho tem poucas ajudas, com todos os riscos que daí podem

surgir e os alunos tiveram muitas dificuldades em organizar os dados de modo a tirarem

conclusões. Aqui tive um papel importante ao sugerir que organizassem uma espécie de

uma tabela em que colocassem os quocientes entre os vários perímetros e entre as várias

áreas dos triângulos construídos. Depois desta sugestão, logo alguns alunos começaram

a ver as regularidades numéricas e a estabelecer as relações. Daqui ao que se pretendia

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foi um passo que os mais perspicazes deram rapidamente, argumentando muito bem e

por vezes com muita destreza tanto para os colegas como para mim. Foi um momento

gratificante.

As grandes dúvidas com que fica o professor têm a ver com a ajuda dada aos

alunos: “Será que ajudei de mais? Será que devia ter ajudado menos? Será que deixei

para os alunos as contas e quem resolveu o problema fui eu? E se tivesse ajudado menos

o que é que aconteceria? Já tantos alunos estavam desanimados por não conseguirem

fazer nada!...”. Encontrar o ponto de equilíbrio é sem dúvida o mais difícil e nunca

saberemos se ajudámos de mais se de menos. Vamos ter que viver com esta dúvida.

Parecia que o pior estava ultrapassado e que o resto da tarefa seria simples.

Enganei-me. As alíneas g) e h) ainda dariam muito que falar. É curioso que isto tenha

acontecido pois se tinham chegado tão bem à relação entre os perímetros e as áreas de

triângulos semelhantes, relacionando-os com as razões de semelhança, pareceria fácil

esta aplicação. Mas não foi.

Os grandes problemas tinham a ver com o domínio das operações e com a

distinção entre a raiz quadrada e a metade e entre o dobro e o quadrado. Repare-se que

era dada a relação entre as áreas e pretendia-se a relação entre os lados. Os alunos

teriam que perceber que os lados do triângulo teriam que ser 3 vezes maiores, para a

área ser 9 vezes maior e que portanto teriam que fazer a raiz quadrada de 9 para

encontrarem a resposta pretendida. Muitos grupos achavam que tinham que dividir 9

por 2 para encontrarem a relação entre os lados, como se a divisão fosse a operação

inversa da potenciação.

Houve dois grupos que revelaram imensas dificuldades e por mais que eu ajudasse

eles não conseguiam desenvencilhar-se e estavam a ficar muito desanimados. Um dos

alunos chamou-me e disse-me: “Oh professor, eu vou ser sincero. Nós não estamos a

perceber nada disto”. Fiquei um bocado sem saber o que fazer, pois constatei que eles já

tinham desistido. Sentei-me no meio deles, à frente do computador e lá fui construindo

as tabelas que tinha sugerido e fazendo muitas perguntas, para que em conjunto

chegássemos às relações tão desejadas. Apesar de todos, uns com mais ajuda do que

outros, terem relacionado as áreas de figuras semelhantes com a sua razão de

semelhança, esta relação estava muito longe de estar bem interiorizada, como eu vim a

descobrir nas aulas seguintes.

Quanto à última construção no Cabri prevista na pergunta h) “construir um

triângulo semelhante ao [A3 B3 C], com os lados 3 vezes maiores” e que me parecia tão

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fácil, ainda levantou problemas nalguns grupos. Se repararmos com um pouco mais de

cuidado, realmente não são indicados ou sugeridos caminhos e as soluções são várias.

Os alunos apresentam sempre dificuldades quando colocados diante de situações deste

tipo. No entanto, lá foram resolvendo o problema, por vezes com alguns empurrões que

fui dando, aqui e ali. Dez minutos antes de terminar a aula, já quase todos os grupos

tinham acabado e estavam a passar a limpo o relatório para me entregar.

Para acabar a aula, decidi falar com toda a turma e tentar trocar algumas

impressões sobre o que tínhamos estado a fazer. Foi uma decisão um bocadinho

arriscada, pois os alunos já estavam cansados e não estavam nada para me ouvir. Mas

quando damos estas aulas, parece-nos importante chamar a atenção do que realmente é

essencial, pois ficamos com a sensação que “fica muita coisa no ar” e com pouca

consistência.

Pedindo a colaboração dos alunos, fui perguntando a um grupo e a outro que

relações tinham encontrado entre os perímetros e entre as áreas dos triângulos

semelhantes, tendo as propriedades essenciais sido referidas sem grandes entusiasmos.

Fiquei um pouco mais contente, pois tinha-me parecido que alguns alunos com mais

dificuldades não se tinham apercebido do que estava realmente em causa. Percebi, no

entanto, pelas expressões de cansaço de alguns alunos que teria que voltar à discussão

destes assuntos na próxima aula, pois muitos deles já não estavam a ouvir nada.

Na reflexão 2 no final da aula salientou-se que os alunos estiveram muito

envolvidos nestas tarefas nos computadores:

Eu acho que a envolvência foi muito boa. Eles estiveram mesmo envolvidos. (...) Aquelas ali [referindo-se ao grupo fraquinho] não fizeram nada, mas não desistiram. Lentamente mediram e não sei quê, compuseram,... pararam, mas pelo menos estiveram envolvidas com o programa (Ivo, reflexão 2).

Mais uma vez se notou a importância que estas actividades poderão ter para as

aprendizagens dos alunos e do modo como fazem essas aprendizagens, experimentando,

errando e discutindo. Foi referido, também, que nestas tarefas de exploração foram

desenvolvidas actividades como: organizar os dados, ter persistência, fazer conjecturas e

prová-las, e que foram indispensáveis e essenciais para o prosseguimento dos trabalhos.

Outro dos aspectos abordados, teve a ver com a autonomia que os alunos

manifestaram. A dependência dos alunos em relação ao professor foi demais evidente,

não avançando sozinhos em imensas circunstâncias. O sim ou o não do professor parece

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ser essencial para prosseguirem os seus trabalhos, não valorizando por vezes as opiniões

dos colegas:

Eu acho que se nota aqui a dependência que eles têm relativamente ao professor. É que alguns têm uma dependência muito grande, talvez em função das dificuldades que eles têm. Tu dás uma dica, passados 5 minutos fechou. Porque há grupos que de facto têm essa dificuldade. Emperram com muito facilidade. E tu por muito que tu queiras dar uma volta a 8 grupos... É completamente impossível (Ivo, reflexão 2).

Curiosamente e apesar dessa grande dependência que os alunos revelam a

trabalhar em grupo, 80% respondem no questionário que gostam de trabalhar desta

forma e nas entrevistas esclarecem:

Foi mais fácil trabalhar em grupo, porque trocamos ideias. Quando estamos a trabalhar sozinhos é mesmo só connosco e se tivermos dúvidas ninguém nos ajuda. Aprendo muito mais com os colegas do que quando estou sozinho. (...) Se estivermos errados, os colegas podem-nos corrigir e explicar-nos melhor. Até é melhor, às tantas, do que o professor a explicar (alunos, entrevista).

Contrariamente a esta visão dos alunos do trabalho de grupo, há muitos

professores que continuam a não lhe reconhecer vantagens, apesar de todas as

recomendações no sentido de diversificarem as formas de trabalho com os alunos. Este

foi outro dos aspectos analisado na reflexão 2, tendo-se apontado alguns factores que

podem contribuir para que muitos professores fujam do trabalho de grupo,

nomeadamente a falta de autonomia dos alunos, também aqui verificada, e as grandes

dificuldades registadas na condução das aulas:

Claro que eles têm que se habituar a esperar e que o professor não é imenso e não tem não sei quantos braços, nem olhos e portanto tem que dar ajuda a todos. Muitas vezes as pessoas têm dificuldade em trabalhar em grupo, exactamente por isto, porque quando se está a trabalhar e a ajudar uns, os outros estão a precisar e aquilo é um “esterco danado”, muitas vezes. Essa é uma das dificuldades que existe e por isso é que muitas vezes se foge ao trabalho de grupo (Ana, reflexão 2).

Para terminar a reflexão conjunta no fim desta aula, foi dado muito relevo à

necessidade de uma discussão no final com os alunos, para destacar os aspectos mais

importantes dos problemas que se estiveram a resolver, possibilitando a troca de ideias e

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de processos diferentes, dando mais uma oportunidade aos alunos para comunicarem.

Esta comunicação para além de importantíssima para a sua aprendizagem, pode também

ser um indicador essencial para o professor compreender até que ponto é que os alunos

acompanharam os assuntos em estudo:

Um momento de reflexão final seria mais um momento para serem eles a explicar e a falarem sobre isto, em vez de seres tu. Porque até a forma como eles organizam a comunicação que vão fazendo, dá uma ideia ao professor se eles estão a organizar bem as ideias e a relacionar bem as coisas. Se os miúdos conseguem fazer isso bem é porque entenderam muito bem o assunto e têm as ideias sistematizadas e um encadeamento lógico. Se não perceberam então não sabem falar (Ana, reflexão 2).

Tarefa 3

Antes de ir para esta aula estava muito confiante. Por um lado, porque nesta

unidade didáctica já tínhamos resolvido bastantes exercícios e problemas e, por outro,

porque esta tarefa não trazia grandes novidades, a não ser a relação entre volumes de

poliedros semelhantes. O único elemento novo eram os materiais manipuláveis que eles

nunca tinham utilizado. Já estava avisado, por um colega da escola que já tinha levado

estes materiais para a aula quando propôs esta tarefa a outra turma do 8º ano, que os

alunos se tinham distraído imenso com os materiais, sempre na brincadeira, e que

tinham tido imensas dificuldades na resolução da tarefa.

No início da aula, não dei instrução nenhuma para a realização da tarefa, pedi

apenas a colaboração dos alunos na utilização dos materiais sem brincadeiras, tendo em

conta que eles serviriam para ajudar a resolver os problemas de Matemática que eu lhes

estava a propor. Os trabalhos iniciaram-se sem problemas, apesar de ter sido para mim

uma aula de grandes surpresas. A primeira apareceu na resolução da alínea b), uma

mera aplicação do teorema de Pitágoras. Este assunto tinha sido muito trabalhado no 1º

período, tendo sido do agrado da grande maioria dos alunos que revelaram óptimos

resultados nos vários momentos de avaliação efectuados. O desempenho dos alunos foi

uma desilusão. Aconteceu o inesperado: ninguém sabia como pegar no problema e

muitos deles já nem sabiam o próprio enunciado do teorema de Pitágoras. Realmente,

eu não estava a contar nada com isso. Tinha colocado esta pergunta com o objectivo de

voltarmos a um assunto já trabalhado, mas convencido que não iria levantar

dificuldades. Pelos vistos ainda bem que o fiz, pois muitos alunos recordaram este

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resultado tão importante. Não sendo de forma nenhuma o objectivo central desta tarefa,

gastou-se cerca de 30 minutos com esta pergunta, tendo-se comprometido grandemente

o evoluir dos trabalhos que estariam previstos para terminar numa aula de 90 minutos.

A segunda surpresa surgiu na resolução da pergunta e). A relação pedida já tinha

sido trabalhada na tarefa 2, pelo que me parecia que a maior parte dos alunos chegaria

com facilidade ao seu enunciado. Não foi isso que se verificou. Houve bastantes

dificuldades na maioria dos grupos. Pensando melhor, a tarefa 2 já tinha sido

desenvolvida há cerca de um mês, por causa das férias da Páscoa, e este assunto ainda

não tinha sido abordado novamente. Por outro lado, já tinha verificado, noutros anos,

que os alunos apresentam, por vezes, grandes dificuldades na transposição das

propriedades descobertas num contexto para outro, nomeadamente quando elas são

descobertas primeiramente com a ajuda de programas de geometria dinâmica.

A pergunta 2 foi a mais difícil para os alunos. Aqui eu penso que os materiais

manipuláveis tiveram um papel essencial, pois sem eles teria sido impossível dar-lhe

resposta. Os alunos não estavam a conseguir pensar nos problemas que lhes estavam a

ser colocados e fizeram imensos losangos para conseguirem responder. Alguns até

tentaram fazer o losango de lado 10, não se apercebendo que o losango era

simplesmente a união de dois triângulos e que o trabalho com triângulos já tinha sido

feito na pergunta anterior. Só um grupo construiu uma tabela que mostra esta relação

entre os losangos e os triângulos construídos anteriormente, apresentando dificuldades

em explicar o resultado encontrado com a ajuda da tabela. Aliás, esta dificuldade de

escrita é uma constante em todos os relatórios.

A aula de 90 minutos estava a chegar ao fim e alguns grupos ainda não tinham

conseguido terminar satisfatoriamente a pergunta 2. Esta tarefa 3 tinha demorado muito

mais do que o previsto e teríamos que continuar na aula seguinte. Os alunos pediram

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para continuar o trabalho com os materiais, pois apesar de terem achado os problemas

difíceis, gostaram imenso do material, como aliás referiram no questionário e

reforçaram nas entrevistas, chegando a afirmar que é mais fácil trabalhar com as

esponjas e os cubos do que com os computadores:

Eu acho que é mais fácil, porque no computador só pode trabalhar um de cada vez e com as esponjas cada um pode tentar maneiras diferentes de conseguir e assim arranjamos mais do que uma solução e podemos discutir os problemas (aluno, entrevista).

No decorrer desta aula, alguns alunos, talvez um pouco menos interessados,

enquanto iam lançando um olho para os problemas iam brincando com os materiais

fazendo as suas figuras e construções sem darem muito nas vistas.

Na aula seguinte, a conclusão da tarefa foi relativamente rápida. Houve grupos

que terminaram a pergunta 2 e, contrariamente ao que eu esperava, fizeram todos a

pergunta 3, relativa aos volumes com muita desenvoltura. Eis um exemplo de uma

resolução:

Esta facilidade relativa talvez seja porque se tratava de uma situação semelhante à

pergunta 1 e também porque estavam a trabalhar com cubos, o que torna a visualização

relativamente fácil. Se tivesse escolhido quadrados em vez de triângulos, na primeira

parte da tarefa, seria com certeza bastante mais fácil a resolução de algumas das

questões, mas penso que não se ganharia mais por isso.

Fizemos depois, em conjunto, o ponto da situação das relações que se tinham

descoberto. Coloquei alguns exemplos no quadro para ajudar a discussão e perceber até

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que ponto é que os alunos tinham compreendido as propriedades. Para alguns não foi

assim tão fácil. Penso que esta conversa ajudou alguns alunos, em especial os que

tiveram mais dificuldades durante o desenvolvimento da tarefa. Os alunos

reconheceram (cerca de 50% nos questionários) que estes momentos são importantes

para perceberem melhor os assuntos. Todos terminaram e entregaram os seus relatórios,

tendo havido ainda tempo para corrigir algum material do manual que eu tinha marcado

para fazerem em casa.

Na reflexão 3 que fiz com o Ivo e a Ana no final desta tarefa houve ideias que

voltaram à discussão. Uma delas foi a autonomia que os alunos manifestaram, explicada

pelos professores, talvez pela falta de hábito que têm a desenvolver este tipo de

actividades:

Eles têm picos de grande envolvimento e de nenhum envolvimento. Eles dependem muito do teu “picanço”, da tua confirmação. Quando tu estás e confirmas, muito bem eles avançam. (...) É capaz de haver um bocado de falta de hábito deste tipo de trabalhos. Se eles, se calhar, se estivessem habituados sempre a fazer isto, talvez tivessem uma atitude diferente, mais autónoma (Ana, reflexão 3).

A este respeito e quando lhe foi perguntado se tinha sentido dificuldades durante

estas aulas, um aluno escreveu no questionário: “Sim, porque ao fazer o trabalho de

grupo o professor não ajuda muito (só dá dicas) e então custa mais fazer o trabalho,

tentando adivinhar”.

Outro aspecto também abordado na reflexão conjunta, foi a natureza da própria

tarefa. Todos ficaram admirados com as dificuldades apresentadas pelos alunos, na

resolução dos problemas, dificuldades estas que não eram nada previsíveis e que foram

explicadas, entre outros aspectos, por não relacionarem os assuntos com os que já

trabalharam anteriormente:

Aquela ficha tem imensos problemas para aqueles miúdos. Eu supunha que não tivesse tantos como de facto tem. Esta tarefa exige mais coisas do que por exemplo a do Cabri que eu vi, em termos de relacionar. Eles têm que organizar dados, pensar o que é importante fazer, procurar regularidades, generalizar. (...) Mostram também uma grande dificuldade em relacionar as investigações com outras já feitas anteriormente. Eles fizeram o preenchimento daquela tabela, daquilo tudo e não foram capazes de se lembrar: “eh pá, nós já fizemos isto, isto é o quadrado da razão” (Ana, reflexão 3).

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O papel dos materiais manipuláveis, foi também um aspecto debatido, realçando-

se que poder ser um factor de motivação e de interesse das actividades, mas também

pode ser um elemento perturbador, não sendo por si só uma chave milagrosa para

resolver todos os problemas da sala de aula:

O facto de os materiais poderem ser uma coisa sugestiva e que cative, se eles não conseguem avançar mesmo tendo os materiais à frente, não resolvem nada. (...) Até que ponto é que este tipo de materiais pode ser um motivo de distracção? Foi uma das coisas que eu notei em dois daqueles grupos. Era um motivo de brincadeira para eles. Às vezes brincavam quando estavam à tua espera (Ivo, reflexão 3).

Muito discutido, foi também o interesse da realização destas actividades, tendo-se

questionado até que ponto é que valia a pena investir nesta forma de trabalho, com estes

alunos, realçando-se os processos em que eles se envolveram no decorrer destas aulas:

Reparei na diversidade de estratégias na resolução de algumas questões. Aquele preenchimento da tabela teve uma cena giríssima, com dois grupos completamente diferentes. O Rui preencheu aquela tabela de uma maneira muito interessante. Em vez de preencher por linha, preencheu por coluna. E começou logo a aperceber-se da regularidade daquilo. Enquanto que os outros não estavam a olhar para o quadro todo, estavam a olhar só para a linha e era difícil tirar alguma conclusão. (...) Estes miúdos precisam de investir nisto, até para se organizaram. Aqui o que me parece importante neste caso não é o assunto que eles aprendem, mas sim os processos em que eles se envolvem e até que ponto é que aprendem a pegar nas coisas (Ivo, reflexão 3)

Constatou-se, também, que esta tarefa tinha um grande potencial, na medida em

que era susceptível de abordagens muito diferentes. Apesar de conter questões de

Geometria, levou a que muitos alunos pensassem sobretudo nas regularidades

numéricas, deixando para segundo plano o contexto geométrico dos problemas. Esta

tendência dos alunos para os números em detrimento da Geometria, que se verificou em

variadíssimas circunstâncias, parece ter a ver com todo o trabalho desenvolvido com

estes alunos nos anos de escolaridade anteriores:

Deixaram a geometria completamente e foram para as regularidades numéricas. Eles tentam sempre arredar a Geometria para o lado. Sempre para os números, é uma coisa incrível. Houve lá uma situação... Coisas daquelas que são evidentes. Aquela questão das áreas dos triângulos. Se tem 4 triângulos a área é 4 vezes a área do pequeno. Tu sabes como fez um

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grupo? Calculou a altura pelo teorema de Pitágoras em todos os casos. Meteu 4 triângulos, a altura outra vez. Tudo algebricamente (Ivo, reflexão 3)

Por último, foram mais uma vez realçadas as dificuldades dos professores na

condução deste tipo de aulas, não se apercebendo de aspectos importantíssimos como o

apoio aos alunos com mais dificuldades:

São aulas muito complicadas em que o professor anda tão atarefado que não dá conta do que se está a passar, é impossível. Andas tão aflito que não te consegues aperceber que às vezes os que estão mais calados são os que não estão a fazer nada. E isso pode ser problemático. Havia grupos completamente atrasados e os outros muito mais avançados (Ivo, reflexão 3).

A este respeito, também no questionário, 5 alunos responderam que o professor

não os ajudou sempre que precisaram e nas entrevistas realçaram que nestas aulas o

professor demora mais tempo a dar apoio a todos os alunos:

Como era trabalho de grupo, o professor tinha que estar mais tempo em cada mesa e nós quando chamávamos o professor tínhamos que esperar sempre 2 ou 3 minutos para o professor vir, enquanto que nas outras aulas não, o professor vinha logo. Há um menor apoio, mas não tem havido problema (aluno, entrevista).

Tarefa 4

Estava numa grande expectativa em relação ao modo como os alunos iriam reagir

a esta tarefa. Tenho pouca experiência a desenvolver propostas tão abertas com os

alunos e eles não estão, também, habituados. Tinha prometido a mim mesmo que iria

ajudar o menos possível, pois queria perceber de que é que os alunos eram capazes, sem

o auxílio do professor. Será que conseguiam resolver sozinhos este problema prático?

Preparei a sala com quatro retroprojectores, um para cada dois grupos, e distribuí

uma fita métrica e uma régua para cada grupo. A sala era um bocadinho apertada para

os retroprojectores, se calhar deveria ter pedido uma sala maior para desenvolver esta

tarefa. Não dei instruções nenhumas, disse somente que tinha sido a professora de

Educação Visual que me tinha pedido para lhes colocar aquele problema. Claro que

muitos deles não acreditaram.

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As reacções dos grupos foram diversas. Alguns ficaram completamente perdidos

sem saber o que fazer, outros agarraram na tarefa e começaram a tentar encontrar

caminhos. No questionário um aluno referiu: “Senti algumas dificuldades com os

retroprojectores, pois no início não sabíamos por onde começar”. Quanto ao modo

como compreenderam esta tarefa, acabei por ficar contente, pois todos os grupos

perceberam que o rectângulo projectado teria que ter a largura e o comprimento 20

vezes maiores que o inicial, para que a área fosse 400 vezes maior. Não nos podemos

esquecer que esta tarefa só foi passada no fim do capítulo e que tínhamos resolvido

vários problemas de aplicação parecidos.

A grande dificuldade que os alunos tinham era perceber a que distância é que

deviam colocar o retroprojector da parede para que os comprimentos da figura

aumentassem 20 vezes. Quase todos os grupos recortaram um rectângulo com as

mesmas dimensões da aguarela de Escher que se encontrava na tarefa 4. Projectavam,

mediam o que encontravam e depois viam quantas vezes é que as dimensões

(comprimento e largura) tinham aumentado. Rapidamente se aperceberam que não

tinham espaço na sala para aumentar as dimensões 20 vezes, pelo que tinham que fazer

cálculos para perceber a que distância é que tinham que colocar o retroprojector da

parede.

Houve um grupo que foi espectacular. Percebeu que havia proporcionalidade

directa entre a distância do retroprojector à parede e o número de vezes que as

dimensões eram ampliadas, pelo que rapidamente resolveu o problema. Outros quatro

grupos, entreajudando-se muito, foram medindo e discutindo e quando um chegava a

uma conclusão trocava logo com os outros. Aos poucos e poucos foram avançando, por

vezes com conjecturas interessantes que os outros grupos refutavam e provavam que

não estavam certas. Mas seguindo os seus caminhos, foram chegando a soluções

aceitáveis. Infelizmente, os registos que depois entregaram nos relatórios não espelham

todo o trabalho que foi desenvolvido, apresentando resoluções pouco pormenorizadas e

com explicações insuficientes, apesar de todas as recomendações que foram sendo

dadas nos relatórios anteriores. Um dos grupos que melhor trabalhou no decorrer desta

aula entregou esta resolução:

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Os outros três grupos não conseguiram avançar quase nada sozinhos. O grupo que

se tinha revelado fraquinho desde a primeira tarefa, continuou a apresentar imensas

dificuldades, não fazendo nada sem uma ajuda constante. Os outros dois grupos, foram

uma grande desilusão para mim. Brincaram muito e produziram pouco. Por várias vezes

durante a aula lhes chamei a atenção, mas nunca consegui grandes resultados. No final

da aula, fui junto deles tentar mostrar-lhes algumas soluções que os colegas dos outros

grupos tinham encontrado.

Houve alunos que não gostaram destas aulas, em média cerca de 20%. A este

respeito um aluno escreveu no questionário “Eu não gostei destas aulas, prefiro aulas

normais a fazer exercícios, acho que aprendo muito mais nas aulas a fazer exercícios e a

tirar dúvidas”. Há uma crença forte por parte dos alunos de que se percebe melhor os

assuntos a resolver os exercícios do manual, cerca de 70% responderam no questionário

concordo totalmente. No entanto, muitos alunos (em média 50%) responderam que

gostaram destas aulas, tendo um escrito o seguinte:

Eu gostei destas aulas porque foram aulas extremamente dinâmicas e divertidas. Acho que se pode aplicar o provérbio: “A brincar também se aprende”. Adorei estas aulas (aluno, questionário).

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O primeiro aspecto realçado na reflexão que fizemos no final da tarefa 4, teve a

ver com a falta de persistência que muitos alunos manifestaram no decorrer dos

trabalhos:

Isto eu já verifiquei nas aulas anteriores, que é: quando eles percebem, ou vêem alguma luz no fundo do túnel de como é que se faz eles envolvem-se e fazem. Quando estão completamente perdidos, imediatamente desligam. A importância do teu picar e de dares uma dica é essencial para despoletar o interesse e o envolvimento deles (Ana, reflexão 4)

Também discutimos os relatórios dos alunos, constatando que eles não conseguem

registar os caminhos errados, bem como os raciocínios que os fizeram desistir de uma

determinada conjectura:

O registo que fazem é sempre do que lhes parece que está correcto. Nunca registam as tentativas frustadas e porque é que mudaram. Só o que lhes parece que está bem é que vai valer. Nunca referem... Está mal não está, então é para apagar. E às vezes essas coisas eram importantes. Explicarem que tentei por aqui e não consegui (Ivo, reflexão 4).

Discutimos também que para resolver actividades mais abertas que o usual, os

alunos tinham que ter um bom método de trabalho e que este só se conseguia se todos

os professores trabalhassem nesse sentido, mesmo os de outras disciplinas e que não era

em algumas aulas de Matemática, num ano lectivo, que se ia resolver este problema.

Ana reforçou que esta dificuldade tinha muito a ver com a falta de maturidade dos

alunos:

Eles não aprendem método de trabalho sozinhos, de maneira nenhuma. Nem aprendem a fazer uma investigação sozinhos. Não basta fazer... Os miúdos têm, de facto, que ir trabalhando, ver como é que o professor pensa. Ir fazendo, para ir ganhando ou apercebendo-se de certas coisas que nem sequer lhes passa pela cabeça. Porque não têm maturidade para isso. Porque eles têm que prever e têm que ter calma e frieza, mas se não dá isto o que é que eu posso fazer. Isto é um pensamento adulto. Eles não têm idade mental, ainda, para que nós possamos esperar que eles façam isto assim (Ana, reflexão 4)

Na reflexão 4, mais uma vez se realçou o que de bom se consegue ver no trabalho

que os alunos desenvolvem com estas actividades e que é completamente diferente das

aulas tradicionais. A este respeito um aluno afirmou na entrevista:

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Os problemas são um bocadinho mais complicados do que os das outras aulas, pelo menos o do retroprojector, em que tínhamos que pensar um bocado, desenvolver, tínhamos que pensar métodos diferentes, para conseguir o método ideal para ter o resultado certo. Tínhamos que descobrir o que era para fazer primeiro. Nos manuais, as perguntas estão directas, dizem logo o que temos que fazer (aluno, entrevista).

Ficou claro, para os professores que acompanharam estas actividades, que a

Matemática envolvida foi muito mais rica, do que em aulas em que os alunos resolvem

somente exercícios repetitivos:

Há momentos espectaculares, que numa aula mais tradicional tu não tens, não vês. Nós a vê-los a construírem e a juntarem as peças do puzzle., não é. Conseguirem dar o salto a pensarem sozinhos. Faz-se o clic., de vez em quando, isso nota-se. (...) Eu acho que a Matemática envolvida é um bocado diferente de estarem a fazer exercícios repetitivos, isso não tenho dúvida nenhuma. Eles têm que relacionar, têm que conjecturar, têm que provar, têm que fazer montes de coisas que não fazem de outra maneira. Isso eu acho. O procurar regularidades, experimentar coisas, testar, “parece que é isto...” e vão ver (Ivo, reflexão 4).

Na reflexão 4 discutimos também outros aspectos que tinham mais a ver com a

condução e as decisões do professor em aulas deste tipo. Um dos assuntos abordados foi

a constituição dos grupos e o modo de a operacionalizar, não se tendo encontrado

grandes soluções: “Como é que se organizam os grupos para eles funcionarem da

melhor maneira? Juntar bons com maus, juntar maus com maus. Há sempre o reverso da

medalha. Nunca sei como constituir os grupos” (Ivo, reflexão 4).

Como o ambiente desta aula foi um bocadinho diferente, visto que os alunos

andaram todos levantados a fazer as suas medidas, arrastando os retroprojectores de um

lado para o outro, também foi abordado o barulho e alguma desordem que se verificou

na aula:

Esta questão do barulho, eu acho que é um trauma dos professores. Quando vamos para a biblioteca usar os computadores, se há um burburinho maior, é visto com maus olhos, pelos colegas, pelos funcionários - não tem controlo na turma. Há este trauma. Eu estou a dizer isto, porque eu acho que uma pessoa nem sempre sabe lidar bem ou reage bem também ao barulho dos miúdos. Neste tipo de aulas o ambiente é diferente, é mais barulhento, é mais anárquico (Ana, reflexão 4).

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Por último, também se reflectiu sobre a insegurança sentida por um professor na

condução de aulas deste tipo, o que foi indicado como uma possível explicação do

reduzido número de professores que utiliza tecnologia e materiais manipuláveis nas suas

aulas:

Eu acho que uma pessoa tem que acreditar muito nisto que está a fazer. Pois estas aulas dão muito maior insegurança quer aos alunos, quer ao professor. Enquanto o professor os vê sentadinhos, sossegadinhos e caladinhos até fica com a ideia de que eles estão a ouvir e que até estão a fazer. Tem uma noção errada de que está a controlar a aula. Neste tipo de aulas, tu ficas com a noção nítida de que não controlas rigorosamente nada. E por isso é que há menos gente a experimentar coisas destas, como é evidente (Ana, reflexão 4).

Conclusão

A partir do estudo realizado, podemos afirmar que as tarefas construídas

colocaram os alunos perante situações desafiadoras, possibilitando-lhes actividades de

organização de dados, procura de regularidades, necessidade de estabelecer relações e

encontrar generalizações. Estas tarefas proporcionam-lhes um ambiente de experiência

Matemática, em que puderam testar e provar as suas conjecturas, bem como comunicar

as suas ideias.

Os recursos utilizados parecem ter constituído um contexto motivador para os

alunos e ter contribuído positivamente para o modo como se envolveram nestas

actividades: i) o computador como ferramenta de trabalho reconhecidamente muito

potente, em especial com programas de Geometria Dinâmica; ii) os materiais

manipuláveis como auxiliar do pensamento matemático dos alunos. Ao possibilitarem

concretizações, foram auxiliares indispensáveis, não sendo, apesar de tudo, uma chave

milagrosa para todas as dificuldades encontradas no decorrer destas aulas. Estes

recursos parecem ter contribuído para um grande envolvimento dos alunos nestas aulas,

os quais manifestaram o seu gosto por estas actividades e que foi evidenciado pela sua

atitude activa e empenhada, trocando ideias com os seus colegas e com o professor,

ainda que se deparassem, por vezes, com grandes dificuldades na resolução dos

problemas.

Com os mesmos recursos podem-se desenvolver actividades muito diferentes,

pelo que podendo parecer um pormenor de pouca importância, a escolha adequada tanto

dos recursos como das tarefas a realiazar pode ser um factor importante para fomentar

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nos alunos o gosto pela Matemática. Gostar do que se faz é por vezes a chave da

resolução de muitos problemas e poderá também ser um contributo para ajudar os

alunos a encararem a nossa disciplina de outra maneira. Considero que a realização de

actividades deste tipo proporciona uma maior aproximação dos alunos à Matemática,

com consequências sobre o modo como vêem a disciplina. Foi curioso e agradável

verificar que no início do ano lectivo seguinte ao que decorreu este estudo, na ficha de

caracterização da turma, cerca de 50% dos alunos afirmaram que a Matemática era a sua

disciplina preferida.

A forma como organizei os alunos, em pequenos grupos, pode também ter sido

um factor essencial para o modo como decorreram estes trabalhos. Com esta

organização, fica claro que se espera deles uma atitude mais interveniente e responsável,

contrariamente a uma certa passividade que pode ocorrer em aulas em que o professor

conduz as actividades. Espera-se que assumam o protagonismo na resolução das tarefas,

o que pode levar a um grande empenho e entrega, comportamentos que se verificaram

muitas vezes no desenvolvimento destas aulas.

Relativamente ao desempenho dos alunos, pode afirmar-se que se envolveram

numa Matemática muito rica, explorando situações, errando e corrigindo, fazendo

tentativas e testando hipóteses, descobrindo o melhor caminho, encontrando processos

diferentes dos seus colegas, procurando regularidades numéricas e estabelecendo

relações, registando-se momentos de grande criatividade e imaginação patentes

nalgumas resoluções das tarefas que foram fazendo.

Pode afirmar-se, também, que assistimos a uma comunicação multifacetada e

muito produtiva. Os alunos discutiram com os seus colegas e comigo as suas resoluções,

tendo que argumentar oralmente e por escrito para validar as suas ideias matemáticas.

Valorizar as opiniões dos colegas e não somente a do professor é um aspecto da

comunicação que foi tentado no decorrer destas aulas e que tem de continuar a ser

trabalhado, não sendo fácil de desenvolver devido às crenças dos alunos relativamente

ao que consideram ser a Matemática válida, ou seja, a do professor e a dos manuais.

Como dificuldades dos alunos há a referir, em primeiro lugar, a sua falta de

autonomia evidenciada pela dependência da confirmação do professor para progredirem

nos trabalhos, o que se verificou em variadas situações. Podemos referir, também,

alguma falta de persistência que demonstraram ao encontrar alguns obstáculos, tendo

recorrido por vezes ao professor em primeiro lugar em vez de a si próprios e aos colegas

de grupo. Como explicação para esta falta de autonomia e persistência, parece ser

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decisiva a pouca frequência com que estes alunos desenvolvem actividades deste tipo,

não só na disciplina de Matemática, mas também nas outras disciplinas, no decorrer de

todo o seu percurso escolar. A escassa realização de actividades deste tipo nas diferentes

disciplinas, e que tem sido nitidamente insuficiente, parece também explicar a falta de

métodos de trabalho que alguns destes alunos evidenciam, no que se refere à

organização dos dados, na forma como “atacam” os problemas, no modo como reagem

aos obstáculos com que se vão deparando, sempre que são confrontados com tarefas

abertas.

Outra dificuldade, também patente no decorrer destas aulas, tem a ver com os

registos escritos produzidos pelos alunos. Os relatórios que entregaram foram, quase na

sua totalidade, muito superficiais, descrevendo de uma forma incompleta as suas

resoluções, não referindo, nem ilustrando os caminhos errados que seguiram, nem

explicando o que os levou a desistir deles, aspectos que poderiam enriquecer muito

estes registos. É uma pena que variadíssimas resoluções extremamente criativas da parte

dos alunos não tivessem sido mencionadas e descritas nos registos que foram

entregando no decorrer destas aulas.

Há também a constatar que os alunos demonstraram, por vezes, dificuldades em

relacionar os assuntos já trabalhados anteriormente com os problemas que tinham para

resolver. Os alunos evidenciaram, também, que não era um processo simples a

transposição de propriedades de um contexto para outro, nomeadamente, as

propriedades que foram descobrindo com o auxílio do Cabri-Géomètre e que, com

dificuldade, foram chamadas para a resolução das tarefas seguintes com materiais

manipuláveis. O pouco domínio de alguns conceitos já trabalhados anteriormente, em

especial no que se refere a conceitos de Geometria, contribuiu também para tornar mais

difícil a descoberta destas novas relações.

No que respeita ao professor, identificaram-se como principais dificuldades as que

se prendem com a condução destas aulas. Não é fácil orientar os alunos quando estão

organizados em pequenos grupos, deparando-se o professor com problemas muito

diferentes e variados como por exemplo: 1) prestar um apoio eficaz e oportuno a todos

os grupos; 2) escolher as melhores ajudas a prestar aos alunos; 3) dar atenção aos alunos

mais calados que por vezes são os que têm necessidade de maior apoio. Para resolver

estes problemas em nada contribui o elevado número de alunos de cada turma, que

tornam o trabalho do professor ainda mais complicado. Das discussões que tivemos no

final das aulas surgiu a sugestão destas actividades serem acompanhadas por dois

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professores, em vez de um, ou então só como metade dos alunos, com o sistema de

desdobramentos como tem funcionado até ao momento no ensino secundário. Se esta

necessidade foi reconhecida no ensino secundário ainda mais sentido teria com alunos

mais novos e por isso menos autónomos.

Gerir o tempo necessário para a resolução das tarefas, é ainda outro aspecto a ter

em conta pelo professor, na medida em que tem de atender aos vários ritmos de

aprendizagem e proporcionar aos alunos o tempo indispensável para pensarem quando

seguem os seus próprios caminhos. Não é fácil prever o tempo que uma tarefa demora a

ser realizada, nem decidir quando é que se deve parar e mudar de assunto ou de

actividade, devido aos tempos muito diferentes no desenvolvimento dos trabalhos dos

vários grupos. Aqui parece-me que a experiência tem uma palavra importante a dizer,

pois só experimentando muitas vezes é que se consegue sentir o pulso de uma turma e

decidir, naquele momento, qual a melhor solução.

O barulho que os alunos fazem quando estão a trabalhar em grupo é também um

aspecto que assusta muitos professores. Por vezes, este barulho é considerado pela

comunidade escolar (colegas, funcionários e alunos) como indicativo que o professor

não consegue controlar os alunos. Por outro lado quando desenvolvemos aulas deste

tipo há a sensação que não estamos a controlar os trabalhos e que é pouco previsível o

que irá acontecer a seguir, sensação muito diferente da que se tem quando se é o centro

da aula. Estes dois aspectos, o barulho e a falta de controlo, trazem por vezes alguma

insegurança aos professores, o que me parece ser a explicação para muitos “fugirem” às

aulas de trabalho de grupo, forma de organização privilegiada para o desenvolvimento

destas actividades.

Relativamente à planificação destas aulas, a maior dificuldade é realmente

perceber se as tarefas estão adaptadas aos nossos alunos, ou seja, se são fáceis ou

difíceis, e se eles serão cativados pelos desafios que lhes colocamos. Dúvida essa que só

se desvanece na hora, na aula, havendo por vezes tarefas que nós achamos óptimas e

que algumas turmas não consideram bons desafios e outras que até nos parecem

vulgares e que provocam um grande entusiasmo nos alunos.

A constituição dos grupos é outro problema complicado e com uma infinidade de

soluções. Nestas aulas decidi que os alunos se associassem conforme o seu gosto e tive

um grupo que trabalhou muito mal. Será que se fosse eu a decidir a constituição dos

grupos os resultados seriam mais positivos? A constituição dos grupos, não é um

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assunto fácil e exige o bom senso do professor, o conhecimento prévio dos alunos e um

grande poder de negociação com eles.

Quanto a sucessos, penso que não há nada mais gratificante do que ver os alunos

satisfeitos e muito envolvidos na resolução das tarefas, conseguindo, por vezes, fazer

aqueles “clics” no avanço dos problemas e que nos deixam entusiasmados e a pensar

que vale a pena o investimento neste tipo de actividades. Considero que os resultados

que apresento evidenciam ter havido da parte dos alunos momentos em que exploraram

uma grande diversidade de ideias matemáticas, em que experimentaram e exploraram

situações, tornando-os mais aptos a pensar matematicamente, para o que contribuíram

os recursos utilizados – o computador e os materiais manipuláveis.

De acordo com os aspectos que queria desenvolver com os meus alunos nestas

aulas, realço, também, a comunicação matemática envolvida, em que os alunos foram

capazes de conjecturar e construir argumentos para defender as suas ideias perante o

professor e os colegas, ganhando cada vez mais confiança na resolução dos problemas

que foram surgindo. Quanto ao material escrito que apresentaram, como já foi referido

anteriormente, considero que há um longo caminho a percorrer, tendo ficado

evidenciada a necessidade de criar muitas outras oportunidades para que estes alunos

expliquem por escrito as suas resoluções.

Outro aspecto, também conseguido, teve a ver com as relações que estas tarefas

permitiram estabelecer e que foram muito além daquilo que eu tinha previsto. Foi com

muita satisfação que me deparei com abordagens dos problemas realizadas pelos alunos

completamente diferentes daquelas que eu esperava, tendo resolvido problemas de

Geometria, pesquisando regularidades numéricas nas tabelas de dados que tinham

recolhido e organizado.

Considero fundamental, em termos da gestão curricular, proporcionar aos alunos

variadas oportunidades de trabalho de grupo que lhes fomentem a autonomia e a

persistência no ultrapassar dos obstáculos com que se deparam nas situações

problemáticas que têm que resolver. Aspectos estes que passam essencialmente pela

escolha das tarefas que selecciono, havendo a necessidade de propor, em cada unidade

didáctica, um número maior de tarefas não rotineiras do que aquelas que proponho

actualmente.

Não quero terminar este artigo, sem uma palavra de grande apreço pelo trabalho

que desenvolvi com os meus alunos e os meus colegas que considero ter sido muito rico

do ponto de vista do meu crescimento como professor. Infelizmente, não é todos os dias

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na nossa profissão que temos uma oportunidade, como esta, de trabalharmos em

colaboração com outros professores e de reflectirmos de uma forma tão profícua sobre

as nossas práticas lectivas.

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Anexos

Inquérito aos alunos Tarefa 1 Tarefa 2 Tarefa 3 Tarefa 4

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Escola Secundária com 3ºCiclo do Ensino Básico de Tondela

Ano Lectivo 2003/2004

Semelhança de Triângulos 8º Ano

Questionário

Durante o capítulo das semelhanças realizaste várias tarefas que não se encontravam no teu manual, nomeadamente com o Cabri-Géomètre (tarefas 1 e 2), com esponjas e cubos de madeira (tarefa 3) e com o retroprojector e fitas métricas (tarefa 4) Com este questionário pretendo conhecer a tua opinião sobre o modo como decorreram essas aulas. Responde às seguintes questões assinalando com uma circunferência o número (de 1 a 5) que melhor corresponde à tua opinião.

Aulas com Cabri-Géomètre

1. Gostei 1 2 3 4 5

2. Percebi tudo 1 2 3 4 5

3. Tive muitas dificuldades 1 2 3 4 5

Aulas com esponjas e cubos de madeira

4. Gostei 1 2 3 4 5

5. Percebi tudo 1 2 3 4 5

6. Tive muitas dificuldades 1 2 3 4 5

Aula com retroprojector e fitas métricas

7. Gostei 1 2 3 4 5

8. Percebi tudo 1 2 3 4 5

9. Tive muitas dificuldades 1 2 3 4 5

Durante estas cinco aulas

10. O professor ajudou-me sempre que eu precisei 1 2 3 4 5

11. Gostei de trabalhar em grupo 1 2 3 4 5

12. Gostei de escrever as conclusões para entregar ao professor 1 2 3 4 5

13. As discussões finais ajudaram-me a perceber melhor os assuntos 1 2 3 4 5

14. Aprendi muita coisa nova 1 2 3 4 5

15. Fiquei com muitas dúvidas 1 2 3 4 5

Discordo totalmente

Discordo ligeiramente

Não concordo nem discordo

Concordo totalmente

Concordo ligeiramente

1 2 3 4 5

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16. O que gostaste mais nestas aulas e o que gostaste menos? Explica porquê.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

____________________

17. Sentiste algumas dificuldades durante estas aulas? Indica quais.

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

____________________

Nas aulas de Matemática

18. Quando resolvo exercícios do manual percebo melhor os assuntos 1 2 3 4 5

19. É melhor trabalhar a pares do que em grupo 1 2 3 4 5

20. Em Matemática prefiro trabalhar sozinho 1 2 3 4 5

21. Aprendo melhor quando o professor explica no quadro 1 2 3 4 5

22. Compreendo melhor quando o professor me tira as dúvidas no lugar 1 2 3 4 5

23. É importante discutir ideias com os meus colegas 1 2 3 4 5

24. Aprendo quando comunico as minhas ideias a toda a turma 1 2 3 4 5

25. Escrever as conclusões é importante para pensar no que fiz 1 2 3 4 5

26. Utilizar o computador facilita a minha aprendizagem 1 2 3 4 5

27. Percebo melhor quando uso materiais manipuláveis 1 2 3 4 5

28. Acho importante utilizar a calculadora na resolução das tarefas 1 2 3 4 5

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Escola Secundária com 3ºCiclo do Ensino Básico de Tondela

Ano Lectivo 2003/2004

Semelhança de Triângulos 8º Ano

Tarefa 1: Polígonos semelhantes

(com o Cabri – Géomètre)

1. a) Constrói um triângulo [ABC].

b) Constrói outro triângulo [DEF], com os lados paralelos aos lados de [ABC].

c) Mede as amplitudes dos ângulos internos desses triângulos e os

comprimentos dos seus lados.

Que relações podes estabelecer entre estes triângulos que te permitam afirmar

que são semelhantes?

d) Qual a razão de semelhança?

e) Arrasta um dos vértices do triângulo [ABC] e verifica se as relações que

estabeleceste na alínea c) se mantêm.

2.

a) Constrói dois quadriláteros semelhantes.

b) Que razões te permitem afirmar que são semelhantes?

Explica as medições que efectuaste e as relações que encontraste que

justificam que esses quadriláteros são semelhantes.

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Escola Secundária com 3ºCiclo do Ensino Básico de Tondela

Ano Lectivo 2003/2004

Semelhança de Triângulos 8º Ano

Tarefa 2: Razões de semelhança: perímetros e áreas

(com o Cabri – Géomètre) 1. a) Constrói uma figura como a seguinte, onde:

A1 é ponto médio de [A C] e B1 é ponto médio de [B C]

A2 é ponto médio de [A1 C] e B2 é ponto médio de [B1 C]

E assim sucessivamente…

b) Todos os triângulos que fazem parte desta figura são semelhantes.

Justifica esta afirmação, efectuando se necessário algumas medições.

c) Preenche a tabela abaixo:

Triângulos Perímetro Área

[A3 B3 C]

[A2 B2 C]

[A1 B1 C]

[A B C]

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d) Consegues estabelecer alguma relação entre os perímetros dos vários

triângulos? A razão de semelhança ajuda a explicar estas relações?

e) Consegues estabelecer alguma relação entre as áreas dos vários

triângulos? A razão de semelhança ajuda a explicar estas relações?

f) Se arrastares um dos vértices do triângulo [ABC], estas relações mantêm-se?

g) Se quisesses construir um triângulo semelhante ao triângulo [A3 B3 C] mas

com a área 9 vezes maior, como é que procederias?

h) Tenta construi-lo com a ajuda do Cabri-Géomètre e mostra que a área desse

novo triângulo tem a medida que desejavas.

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Escola Secundária com 3ºCiclo do Ensino Básico de Tondela

Ano Lectivo 2003/2004

Semelhança de Triângulos 8º Ano

Tarefa 3: Razões de semelhança: perímetros, áreas e volumes

(com esponjas e cubos de madeira)

1. Vamos construir polígonos utilizando triângulos equiláteros de esponja.

Considera para unidade de comprimento o lado de um triângulo.

a) Constrói triângulos equiláteros de lado 2, de lado 3 e de lado 4.

Estes triângulos são semelhantes ao triângulo de lado 1?

Justifica a tua resposta, indicando a razão de semelhança.

b) Qual é a área do triângulo de lado 1 considerando a mesma unidade de

comprimento?

c) Preenche a tabela abaixo em que:

- R é a razão de semelhança quando partimos do triângulo de lado 1 e o

ampliamos para encontrar os restantes.

- N é o número de triângulos de lado 1 usados em cada figura.

Triângulos R Perímetro N Área

de lado 1

de lado 2

de lado 3

de lado 4

de lado 5

de lado 10

de lado 20

de lado n

e) Consegues estabelecer alguma relação entre as áreas dos vários

triângulos? Como explicas estas relações?

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f) Quanto mediria de lado um triângulo semelhante ao triângulo de lado 1 mas

com a área 144 vezes maior?

2. Constrói um losango a partir de dois triângulos de lado 1.

a) Quantos triângulos precisarias para construir outro losango semelhante

àquele em que a sua razão de semelhança fosse 3. E se a razão fosse 10?

b) Que relação encontras entre as suas áreas e a do losango inicial? O que é

que isso tem a ver com a razão de semelhança?

3. Vamos agora construir poliedros utilizando cubos de madeira. Considera

para unidade de comprimento a aresta de um cubinho.

a) Constrói cubos de aresta 2 e de aresta 3.

Estes cubos são semelhantes ao cubo de aresta 1?

Justifica a tua resposta, indicando a razão de semelhança.

b) Preenche a tabela abaixo em que:

- R é a razão de semelhança quando partimos do cubo de aresta 1 e o

ampliamos para encontrar os restantes.

- N é o número de cubos de aresta 1 usados em cada poliedro.

Cubos R Área da face Área Total N Volume

de aresta 1

de aresta 2

de aresta 3

de aresta 4

de aresta 5

de aresta10

de aresta 20

de aresta n

e) Consegues estabelecer alguma relação entre os volumes dos vários cubos?

Explica estas relações utilizando o que já aprendeste sobre razões de

semelhança?

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Escola Secundária com 3ºCiclo do Ensino Básico de Tondela

Ano Lectivo 2003/2004

Semelhança de Triângulos 8º Ano

Tarefa 4: Como fazer ampliações?

1. A professora de Educação Visual quer fazer a ampliação para papel de

cenário da aguarela que se encontra em baixo, mas colocou a seguinte

condição: a área da figura ampliada tem de ser 400 vezes maior do que a área

desta.

A professora vai fazer um acetato com a aguarela e projectá-lo, usando um

retroprojector, no papel de cenário que irá pendurar numa parede.

Mas tem um grande problema: A que distância é que deve colocar o

retroprojector da parede?

Como é que podemos ajudá-la?

Elabora um relatório que inclua a descrição das tuas pesquisas, os cálculos

que efectuaste, as tuas conjecturas e possíveis soluções para entregarmos à

professora.

(M. C. Escher, 1965)