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CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DA BAHIA / CEFET-BA Maurício Santos da Silva Práticas cooperativistas em cooperativas de trabalho: um estudo de caso em Salvador Salvador / BA 2005

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CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DA BAHIA / CEFET-BA

Maurício Santos da Silva

Práticas cooperativistas em

cooperativas de trabalho: um estudo

de caso em Salvador

Salvador / BA

2005

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MAURÍCIO SANTOS DA SILVA

Práticas cooperativistas em cooperativas de

trabalho: um estudo de caso em Salvador

Monografia apresentada ao Curso de Administração com habilitação em Administração Hoteleira, do Cefet-Ba como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Administração. Orientadora: Profa. Tatiana Dias Silva

Salvador

2005

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AGRADECIMENTOS

A Deus, como uma força superior que rege a vida de todos os seres vivos e

sempre esteve ao meu lado norteando meus passos.

Sou muito grato à minha família. Sem dúvidas é o alicerce mais forte da minha

vida. Sempre me deram força e incentivo em todos os sentidos, notadamente

minha mãe e meu pai, que me proporcionaram todas as chances e oportunidades

para alcançar mais esta etapa.

À Professora Tatiana Dias Silva que, com sua competência, responsabilidade e

conhecimento, foi essencial para a conclusão deste trabalho.

Aos meus amigos que deixaram suas contribuições e saudades e aos que

atualmente fazem parte do meu cotidiano me proporcionando boa companhia e

acolhimento.

A todos os meus professores que sempre foram os responsáveis por meu

aprendizado e conhecimento ao longo da minha vida e aos quais eu sempre tive

uma relação de amizade, carinho e respeito.

Enfim, agradeço a todos que de alguma forma colaboraram para o meu

enriquecimento profissional, pessoal, social, humano. A todas as pessoas que

passaram pela minha vida: Obrigado.

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“O cooperativismo é uma das ferramentas mais importantes para o Brasil

conquistar um desenvolvimento mais equilibrado, justo e igualitário”.

Luís Inácio Lula da Silva

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RESUMO

Este trabalho teve como objetivo analisar as práticas cooperativistas de uma específica cooperativa de trabalho em Salvador à luz do que determinam as regras e padrões que definem o funcionamento devido de uma cooperativa, notadamente os Princípios Cooperativistas, verificando o seu cumprimento nestas práticas. Para a consecução dos objetivos utilizou-se de uma metodologia quantitativa com várias técnicas de pesquisa: questionário, entrevista, observação participante. Através da análise dos resultados foi possível afirmar que a cooperativa objeto deste estudo atua como uma “falsa cooperativa” em suas práticas cooperativistas em sua filial em Salvador. Palavras-Chaves: Cooperativismo, Práticas cooperativistas, Princípios Cooperativistas, Falsas cooperativas, Cooperativas de trabalho.

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SUMÁRIO

LISTA DE TABELAS............................................................................ 5

LISTA DE FIGURAS............................................................................ 6

1. INTRODUÇÃO ................................................................................ 9

2. MARCO TEÓRICO ......................................................................... 12

2.1. Histórico do cooperativismo................................................ 13

2.2. Cooperativismo no Brasil.................................................... 14

2.2.1. Evolução legislativa do cooperativismo.................... 16

2.3. Conceito de cooperativismo................................................ 18

2.4. Princípios Cooperativistas................................................... 20

2.5. Classificação das cooperativas........................................... 22

2.5.1 Quanto à forma lega de constituição.......................... 22

2.5.2 Quanto ao objeto social............................................. 23

2.6. Cooperativas de trabalho..................................................... 26

2.7. Contexto atual do mundo do trabalho –

reestruturação produtiva....................................................... 27

2.7.1. Economia solidária.............. ..................................... 31

2.7.2. Falsas cooperativas............. ..................................... 35

3. ESTUDO DE CASO ........................................................................ 39

3.1. A Cooperativa X................................................................... 41

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4. METODOLOGIA............................................................................... 44

4.1. Técnicas de pesquisa....................................................... 44

4.1.1. Questionário aos cooperados..................................... 45

4.1.2. Entrevista à Cooperativa X........................................ 46

4.1.3. Observação participante............................................ 47

4.1.4. Análise de documentos............................................. 48

5 – RESULTADOS E ANÁLISE.......................................................... 49

6. CONCLUSÃO................................................................................. 65

REFERÊNCIAS.................................................................................. 71

APÊNDICE......................................................................................... 74

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LISTA DE TABELAS

TABELA 1 – Modelo das práticas cooperativistas à luz dos Princípios

Cooperativistas .......................................................................................... 40

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Organograma da Cooperativa X............................................... 43

Figura 2 – Gráfico 1 – Conhecimento sobre a Cooperativa X.................... 51

Figura 3 – Gráfico 2 – Motivação para a adesão à uma cooperativa......... 51

Figura 4 – Gráfico 3 – Conhecimentos gerais sobre o cooperativismo (Escala de

Likert).......................................................................................................... 52

Figura 5 – Gráfico 4 – Conhecimentos sobre os Princípios cooperativistas (Escala

de Likert) .................................................................................................... 52

Figura 6 – Gráfico 5 – Estatuto da Cooperativa......................................... 55

Figura 7 – Gráfico 6 – Diretoria da Cooperativa......................................... 55

Figura 8 – Gráfico 7 – Participação em encontros realizados pela

cooperativa.............. ................................................................................... 56

Figura 9 – Gráfico 8 – Participação na gestão da cooperativa.................... 56

Figura 10 – Gráfico 9 – Qualificação profissional (responsável)..................62

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1 – INTRODUÇÃO

Trabalho, segundo a definição consagrada no Dicionário Aurélio (1998),

é a aplicação das forças e faculdades humanas – sejam físicas ou intelectuais –

para alcançar determinado fim. A atividade laboral se confunde com a história do

homem desde quando se tem notícia de sua existência. Das primeiras

organizações de trabalho dos primórdios da raça humana, passando pela divisão

racional do trabalho advinda da Revolução Industrial, até a reestruturação

produtiva pela qual passa a sociedade contemporânea, com o advento da

economia solidária, a atividade trabalhista norteia a vida do homem no decorrer da

sua evolução.

As últimas décadas foram marcadas pelo agravamento das

adversidades para os trabalhadores com uma perceptível tendência da economia

à exclusão social, demonstrada pela redução drástica dos postos de trabalho e

das altas taxas de desemprego. Além da escassez de postos de trabalho, existe

também o problema da precarização das relações do trabalho com o subemprego,

terceirização da força de trabalho, falta de assistência social aos trabalhadores e

cada vez menor existência de vínculos entre as empresas e os empregados.

Apesar do aumento da produtividade e maior especialização da

produção em geral (notadamente no ramo da indústria), o desenvolvimento

tecnológico da atividade do trabalho, com a substituição do homem pela máquina,

é um dos maiores responsáveis pelo contexto de desemprego estrutural bem

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como da precarização do trabalho, percebido na sociedade contemporânea,

fato ressaltado por ARAÚJO e LIMA (1998). A reestruturação econômica e

produtiva pela qual passa o Brasil hoje advém deste cenário de crise da forma

tradicional do trabalho, com a flexibilização das relações trabalhistas através de

novas formas de organização, de gestão da produção, de gestão de políticas

sociais, vínculos e posicionamentos (hierarquia) no âmbito organizacional.

Como resultado deste citado contexto de crise socioeconômica, do

emprego (desemprego, subcontratação), surge a economia solidária como

movimento originado da busca por novas formas de organização e arranjos

produtivos e econômicos nas sociedades capitalistas. O cooperativismo é a

principal ferramenta para a aplicação, na prática, dos conceitos e ideologias da

economia solidária, com seus Princípios Cooperativistas de autogestão, ajuda

mútua, autonomia; com o objetivo de otimização do esforço comum e divisão

eqüitativa e justa dos produtos deste esforço coletivo.

A prática cooperativista é uma das atividades da economia que mais

crescem no Brasil. Segundo dados da Organização das Cooperativas Brasileiras

(OCB, 2003), em 1990 existiam 751 cooperativas em todo o país. Hoje são 7.355

com cerca de seis milhões de cooperados. Prova deste crescimento é que nos

últimos dez anos ingressaram mais de 3.600 cooperativas no mercado de trabalho

associado; acompanhando uma tendência mundial: a da capacidade das pessoas

se organizarem cada vez mais exercendo a prática cooperativista como uma

ferramenta da economia solidária. Ainda conforme esta pesquisa da OCB, em

2003 existiam 2.024 cooperativas de trabalho no Brasil com aproximadamente 315

mil cooperados registrados nelas demonstrando, assim, que o cooperativismo de

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trabalho é o ramo de atuação (dentre os treze ramos definidos pela OCB) que

tem maior participação na prática cooperativista brasileira.

Apesar dos ideais de uma iniciativa social com autogestão, distribuição,

socialização do trabalho, ajuda mútua e repartição dos resultados; o

cooperativismo também pode ser usado de forma espúria através da atuação de

falsas cooperativas. Com a justificativa da busca desenfreada pelas vantagens

competitivas no mercado de trabalho incrementada pela presença marcante da

concorrência, as empresas passaram a utilizar cada vez mais da subcontratação e

terceirização (LIMA, 1998) como ferramentas de redução dos custos operacionais,

encargos sociais, empresariais, obtendo de forma progressiva uma desvinculação

trabalhista.

Além disso, alguns empresários se aproveitam dos vários benefícios

obtidos por fazer parte de uma iniciativa social – tal qual o cooperativismo é

caracterizado – para criar e controlar empresas disfarçadas em um arcabouço de

cooperativas conhecidas como “cooperfraudes”, “coopergatas”, dentre outras

denominações burlando o que determinam a legislação cooperativista brasileira e

principalmente os Princípios Cooperativistas em suas práticas cooperativistas.

Os Princípios Cooperativistas são considerados como a principal

referência da prática cooperativista no mundo, norteando a atuação dos

cooperados e o funcionamento das cooperativas. Estes princípios tratam

praticamente de todas as práticas cooperativistas definindo a adesão dos

membros, a gestão, a participação (tanto econômica quanto na política de

decisões), a formação, especialização dos seus associados, bem como a

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participação da cooperativa no seu ambiente (comunidade) e com outras

cooperativas dentro do movimento do cooperativismo.

Esta pesquisa, em forma de estudo de caso, consiste na análise das

práticas cooperativistas da filial da Cooperativa X em Salvador, à luz do que

determinam os Princípios Cooperativistas – definidos como as linhas orientadoras

através das quais as cooperativas levam seus valores à prática – e na legislação

cooperativista brasileira vigente1, a qual define a Política Nacional de

Cooperativismo (e que é inspirada nestes Princípios) dentro das limitações

inerentes a este estudo e à metodologia e técnicas de pesquisa definidas. Esta

análise será feita através de um modelo referencial de funcionamento (criado com

base nestes padrões referenciais citados, notadamente os Princípios

Cooperativistas) das práticas cooperativistas comparativamente com a atuação

percebida da Cooperativa X nesta cidade, como parte do instituto do

cooperativismo, na prática.

O nome da cooperativa – à qual o autor desta pesquisa faz parte –

objeto deste estudo de caso, foi alterado por solicitação dos membros associados

a esta, como condição para a colaboração e participação da pesquisa, e por este

trabalho não ter caráter investigativo nem de denúncia e sim de análise das

práticas e atividades cooperativistas desta referida cooperativa.

2 – MARCO TEÓRICO

1 A legislação cooperativista brasileira vigente é representada pela Lei n.º 5. 764 decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República em 16 de Dezembro de 1971 com a adequação(atualização) desta legislação vigente ao novo Código Civil (Lei nº10406, de 10 de Janeiro de 2002). Esta legislação, como todas as outras primícias que norteiam o funcionamento de uma cooperativa, é inspirada nos Princípios Cooperativistas.

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No marco teórico será explicitada a evolução histórica e legislativa

da prática cooperativista, tanto no Brasil como no mundo, o conceito de

cooperativismo, os Princípios Cooperativistas, a classificação, tipologia geral, as

peculiaridades das práticas cooperativistas das cooperativas de trabalho – que é o

ramo de atuação da Cooperativa X, sujeito em questão – bem como uma breve

análise da reestruturação produtiva dentro do contexto da economia solidária,

explicitando o contexto atual do mundo do trabalho, para dar o embasamento

necessário a este estudo de caso.

2.1. Histórico do Cooperativismo

Em seu livro “Uma Utopia Militante” (1998), Paul Singer explica num

contexto passado na Grã-Bretanha, dentre outros aspectos, uma das “origens” do

cooperativismo datada do século XVIII. O próprio Paul Singer explica que o grande

movimento cooperativo começou com o líder e autor chamado Robert Owen que

propunha formar comunidades, onde as pessoas pudessem se agrupar numa

aldeia, exercendo uma atividade em comum, produzindo o que fosse possível e

dividindo igualitariamente tudo o que fosse ganho, entre eles próprios.

Deste processo embrionário, as cooperativas de produção e de trabalho

surgem efetivamente com o trabalho industrial e o movimento operário no século

XIX. O movimento cooperativista fundou-se inicialmente com os socialistas

utópicos, com propostas de autogestão do trabalho como reação defensiva ao

desemprego e às condições vida e de trabalho dos operários industriais. Com

princípios democráticos e igualitários, propunha o associativismo no trabalho ainda

dentro do capitalismo ou como forma de superar o capitalismo.

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Em 1844 é que se dá o referencial histórico do surgimento e

atuação consciente das cooperativas no mundo com o surgimento da Rochdale

Society of Equitable Pionner na cidade de Rochdale, perto de Manchester,

Inglaterra, uma cooperativa de consumo de operários da industrial têxtil que se

expandiu rapidamente e, em 1850, abriu uma outra cooperativa de produção

industrial, um moinho, e em 1854 uma tecelagem e fiação.

Este movimento se expandiu rapidamente e, em 1852, foi criada, na

Inglaterra, a lei das Sociedades Industriais e Cooperativas que passou a regular

as relações das cooperativas com o Estado. Em 1895, em Genebra, foi criada a

Aliança Cooperativa Internacional que ratificou os princípios de Rochdale como a

adesão voluntária e livre de seus membros; a gestão democrática; a participação

econômica dos membros na criação e controle do capital; educação e formação

dos sócios; intercooperação no sistema cooperativista.

Esta Aliança Cooperativa existe até hoje agregando as cooperativas de

consumo ao norte da Inglaterra, as cooperativas operárias francesas, que

chegaram ao seu auge em 1848 e as cooperativas de crédito rural alemãs. Ainda

segundo Paul Singer (1998), não existem dados que possam dizer exatamente

qual é o país de origem do cooperativismo, porém a criação desta Aliança na

Inglaterra é um consenso entre os demais autores do marco oficial do

funcionamento consciente e deliberado do cooperativismo.

2.2. Cooperativismo no Brasil

Analisando a temática no contexto brasileiro, existem várias vertentes

que dão conta da origem histórica do cooperativismo no Brasil. Para Diva Pinho

(2003), em seu livro “O Cooperativismo no Brasil – da Vertente Pioneira à Vertente

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Solidária”, esta origem se dá ideologicamente no contexto da colonização

portuguesa, quando foi criada uma cultura de cooperação com práticas de ajuda

mútua, organização e divisão da produção. Apesar de principiante e de forma

inconsciente, estabeleceu as bases do cooperativismo no Brasil. Diva Pinho, nesta

obra citada, observa que a República dos Palmares foi uma das “sementes” do

cooperativismo brasileiro com os ideais de trabalho em comum em uma aldeia

com divisão igualitária dos dividendos obtidos entre todos os membros.

Porém, o marco da prática conscientemente cooperativista percebido

no Brasil é datado de 27 de Outubro de 1889 com a criação da Sociedade

Cooperativa Econômica dos Funcionários Públicos de Ouro Preto (PINHO, 2003).

Esta sociedade foi criada como uma iniciativa de trabalhadores livres oriundos da

abolição da escravidão. A Sociedade Cooperativa de Ouro Preto visava à criação

de uma espécie de banco sob a forma de sociedade anônima, porém esse

movimento não passou de um grande ideal.

O início do século XX, com o surgimento da primeira cooperativa de

crédito do Brasil, em 1902, no Rio Grande do Sul, é considerado como a época de

referência do início da atividade cooperativista no Brasil, na forma de cooperativas

de consumo, na área urbana, inspirada em modelos trazidos por imigrantes

estrangeiros (sindicalistas e, até mesmo, anarquistas) e alguns idealistas

visionários brasileiros. Posteriormente, em 1907, surgiram as primeiras

cooperativas agropecuárias, em Minas Gerais, criadas com o objetivo de eliminar

os intermediários da comercialização agrícola. O cooperativismo agrícola é hoje

um dos mais consolidados no sistema de trabalho associado.

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O Estado pioneiro no cooperativismo no Brasil foi o Rio Grande do

Sul (PINHO, 2003), através de colonos alemães – representados pelo Padre

Theodor Amstad - no ano de 1902, com a criação da já citada cooperativa de

crédito, em Linha Imperial, hoje conhecida como Nova Petrópolis. Os imigrantes

italianos, liderados por De Stefano Paterno, começaram no ano de 1906 na cidade

de Lageado, também no Rio Grande do Sul.

O instituto do cooperativismo tem a representação mundial pela Aliança

Cooperativa Internacional (ACI); no âmbito nacional, esta função cabe à

Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e no nível estadual pelas

Organizações das Cooperativas Estaduais (OCE). Na Bahia, a Organização das

Cooperativas do Estado da Bahia (OCEB), fundada em 16 de junho de 1970, é

responsável pela representação do sistema cooperativo. O Presidente Luís Inácio

Lula da Silva divulga, dentro das suas propostas de governo, que pretende propor

alterações para atualizar a lei das sociedades cooperativas de 1971 (OCEB).

Na Bahia, o primeiro registro do cooperativismo na Junta comercial foi

da Sociedade Cooperativa de Responsabilidade Ltda – Caixa Econômica Popular,

no ano de 1914. Porém, só na década de 30, com um dirigente público do

Governo especializado na divulgação e fortalecimento do cooperativismo – o

engenheiro agrônomo Waldick Cardoso de Moura – a prática cooperativista teve

força na Bahia, impulsionada pela criação das cooperativas de consumo e

escolares (OCEB).

Nos anos 60, foi criada a Superintendência do Desenvolvimento do

Nordeste, que fomentou o cooperativismo com a criação de um Departamento

específico para esta atividade. Atualmente o órgão responsável pela gestão do

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cooperativismo é a Coordenação de Cooperativismo criada, em 1999, pela

Secretaria de Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária.

2.2.1. Evolução legislativa do cooperativismo

A evolução do cooperativismo brasileiro foi acompanhada pela evolução

legislativa, com a promulgação de Leis e Decretos no decorrer deste processo. O

ano de 1903 é considerado o ano de referência legislativa com a primeira menção

judiciária de cooperativas no Brasil, conforme ensina Igor Matos (2005), pelo

Decreto 9792:

“Artigo 10: A funcção dos syndicatos nos casos de organisação de caixas ruraes de credito agrícola e de cooperativa de producção ou de consumo, de sociedade de seguros, assistência, etc., não implica responsabilidade directa dos mesmo nas transacções, nem dos bens nella empregados. Ficam sujeitos ao disposto no nº8, sendo a liquidação de taes organizações regida pela lei commum das sociedades civis.” (SIC), (grifo nosso).

Esta norma serve como referência da existência das cooperativas,

porém não trata do seu funcionamento, tampouco sua definição. Em 1907, o

Decreto 1.637 instituiu formas de constituição das cooperativas, criou os

sindicatos profissionais, estabeleceu tipos de cooperativas (anônimas, em nome

coletivo ou em comandia).

Finalmente, em 1932, formou-se o marco legislativo do cooperativismo

no Brasil, dando formalização legal às cooperativas e às suas práticas

cooperativistas. Este Decreto reafirmou vários itens que são respeitados até hoje,

tais como: singularidade de votos, faculdade de agregação de cooperativas

mediante federalização e variabilidade do capital social (PINHO, 2003).

2 Todos os Artigos e Capítulos referentes à legislação brasileira citados aqui neste estudo de caso, estão disponíveis no endereço eletrônico www.planalto.gov.br na internet.

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Este Decreto foi revigorado em 1938 quando foram incluídos novos

dispositivos o que complementou as normas cooperativistas, tendo como

destaque o advento da fiscalização estatal. Em 1969, foi criada a Organização das

Cooperativas Brasileiras (OCB) através da unificação da União Nacional das

Associações Cooperativistas (UNASCO) e da Associação Brasileira de

Cooperativas (ABCOOP). Depois, na evolução legal do cooperativismo, esta

entidade, em 1971, seria representante do sistema cooperativista brasileiro e

órgão técnico-consultivo do governo.

Finalmente, em 16 de Dezembro de 1971, foi decretada pelo Congresso

Nacional e sancionada pelo Presidente da Republica a Lei nº5.764 que define a

Política Nacional do Cooperativismo, institui o regime solidário das sociedades

cooperativas e outras providências, estabelecida como o “estatuto do

cooperativismo” sendo a legislação vigente até hoje no Brasil. Está disposto no

Capítulo 1 desta Lei:

Da Política Nacional de Cooperativismo Art. 1° Compreende-se como Política Nacional de Cooperativismo a atividade decorrente das iniciativas ligadas ao sistema cooperativo, originárias de setor público ou privado, isoladas ou coordenadas entre si, desde que reconhecido seu interesse público. Art. 2° As atribuições do Governo Federal na coordenação e no estímulo às atividades de cooperativismo no território nacional serão exercidas na forma desta Lei e das normas que surgirem em sua decorrência. Parágrafo único. A ação do Poder Público se exercerá, principalmente, mediante prestação de assistência técnica e de incentivos financeiros e creditórios especiais, necessários à criação, desenvolvimento e integração das entidades cooperativas.

2.3. Conceito de Cooperativismo

O cooperativismo foi idealizado para atuar como uma forma alternativa

de arranjo produtivo e econômico a fim de beneficiar, conforme os ideais de

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Robert Owen, a todos com os seus valores de ajuda mútua, de democracia e

de igualdade. Porém, desde o seu surgimento, surgiram denúncias de atuações

de falsas cooperativas como artimanhas de empresários e donos da gestão da

força do trabalho, para pagarem menores salários, minimizarem os encargos

sociais e empresariais.

Cooperativismo analisado de uma forma doutrinária, como a reunião de

um conjunto dogmático de princípios que compõem a doutrina (RODRIGUES,

2002), é um sistema econômico-financeiro que objetiva a transformação e

consolidação social. A sociedade cooperativa é a reunião de pessoas para a

realização de atividades econômicas em comum através de uma organização

coletiva e democraticamente controlada, que busca, em conjunto e mediante

objetivos comuns, a obtenção de melhorias de condições de vida e de renda dos

integrantes do grupo.

A prática cooperativista é definida como a unidade essencial, a

ferramenta principal da socioeconomia solidária (NUNES, 2003). Neste contexto, o

cooperativismo pode ser entendido como o movimento mundial com o objetivo de

instituir uma sociedade igualitária, livre e fraterna, através da organização social e

econômica da comunidade em termos democráticos, para atender suas reais

necessidades, remunerando adequadamente o trabalho de cada um dos sócios-

cooperados. É o cooperativismo, então, mais uma doutrina, um sistema ou forma

de livre associação que, baseado em valores e princípios de auto-ajuda, busca

benefícios sócio-econômicos para seus participantes.

Juridicamente, conforme Melo (2001), as cooperativas podem ser

definidas como uma instituição de natureza mercantil ou civil, de várias pessoas,

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constituídas para prestar serviços aos associados, com o objetivo de melhorar

as condições econômicas e profissionais de seus associados.

Enfim, para efeito de entendimento desta pesquisa, em forma de estudo

de caso, é bastante definir cooperativas através do que estabelecem os Princípios

Cooperativistas e a legislação cooperativista brasileira vigente com uma reunião

do que estabelece a literatura utilizada no esforço desta pesquisa. Cooperativas

são sociedades simples, de pessoas, para o exercício de uma atividade

econômica, sem objetivo de lucro, não sujeitas a falência, diferenciando das

demais sociedades pelo cumprimento dos Princípios Cooperativistas advindos da

primeira organização reconhecidamente cooperativista datada de 1844 em

Rochdale, Inglaterra.

2.4. Princípios cooperativistas

Os princípios cooperativistas são as linhas orientadoras através das

quais as cooperativas levam os seus valores à prática (OCB).

Princípio Cooperativista nº 1 – Adesão voluntária e livre – As cooperativas são organizações voluntárias, abertas a todas as pessoas aptas a utilizar os seus serviços e assumir as responsabilidades como membros, sem discriminações de sexo, sociais, raciais, políticas e religiosas. Princípio Cooperativista nº 2 – Gestão democrática e livre – As cooperativas são organizações democráticas, controladas pelos seus membros, que participam ativamente na formulação das suas políticas e na tomada de decisões. Os homens e as mulheres, eleitos como representantes dos demais membros, são responsáveis perante estes. Nas cooperativas de primeiro grau os membros têm igual direito de voto (um membro, um voto); as cooperativas de grau superior são também organizadas de maneira democrática. Princípio Cooperativista nº 3 – Participação econômica dos membros – Os membros contribuem eqüitativamente para o capital das suas cooperativas e controlam-no democraticamente. Parte desse capital é, normalmente, propriedade comum da cooperativa. Os membros recebem, habitualmente, se houver, uma remuneração limitada ao capital integralizado, como condição de sua adesão. Os membros destinam os excedentes a uma ou mais das seguintes finalidades:

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1 . Desenvolvimento das suas cooperativas, eventualmente através da criação de reservas, parte das quais, pelo menos será, indivisível. 2 . Benefícios aos membros na proporção das suas transações com a cooperativa. 3 . Apoio a outras atividades aprovadas pelos membros. Princípio Cooperativista nº 4 – Autonomia e independência – As cooperativas são organizações autônomas, de ajuda mútua, controladas pelos seus membros. Se firmarem acordos com outras organizações, incluindo instituições públicas, ou recorrerem a capital externo, devem fazê-lo em condições que assegurem o controle democrático pelos seus membros e mantenham a autonomia da cooperativa. Princípio Cooperativista nº 5 – Educação, formação e informação – As cooperativas promovem a educação e a formação dos seus membros, dos representantes eleitos e dos trabalhadores, de forma que estes possam contribuir, eficazmente, para o desenvolvimento das suas cooperativas. Informam o público em geral, particularmente os jovens e os líderes de opinião, sobre a natureza e as vantagens da cooperação. Princípio Cooperativista nº 6 – Intercooperação – As cooperativas servem de forma mais eficaz os seus membros e dão mais -força ao movimento cooperativo, trabalhando em conjunto, através das estruturas locais, regionais, nacionais e internacionais. Princípio Cooperativista nº 7 – Interesse pela comunidade – As cooperativas trabalham para o desenvolvimento sustentado das suas comunidades através de políticas aprovadas pelos membros.

Os valores de ajuda mútua, responsabilidade, democracia, igualdade,

eqüidade e solidariedade são levados à prática com o cumprimento dos Princípios

Cooperativistas os quais norteiam as práticas cooperativistas deste tipo de

sociedades em seu funcionamento.

As cooperativas que não atuam em conformidade com essas regras e

padrões de funcionamento podem fazer o uso deturpado do instituto do

cooperativismo com vários fins, como obter vantagens competitivas no mercado

de trabalho, diminuir os encargos empresariais, reduzir os vínculos trabalhistas,

obter redução de carga tributária em suas atividades, além de uma série de outros

benefícios obtidos por fazer parte do movimento do cooperativismo, caracterizado

como uma iniciativa social em âmbito geral.

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“Cooperfraudes”, “coopergatas”, “cooperativas pragmáticas” (LIMA,

1998) e “pseudocooperativas” são, dentre outras, denominações dadas às

empresas (normalmente prestadoras de serviço) disfarçadas de cooperativas que

atuam desta forma ilegal quanto à legislação cooperativista brasileira e incoerente

quanto aos Princípios Cooperativistas.

2.5. Classificação das cooperativas

Está disposto na Lei nº 5764/71:

“Artigo 5° - As sociedades cooperativas poderão adotar por objeto qualquer gênero de serviço, operação ou ativi dade, assegurando-se-lhes o direito exclusivo e exigindo-se-lhes a obrigação do uso da expressão "cooperativa" em sua denominação.”

Assim, para a análise das práticas cooperativistas da Cooperativa X em

Salvador, é suficiente utilizar o tipo de classificação reconhecida pela legislação

brasileira e usada por vários dos autores especialistas no tema, tais quais: LIMA

(1998), MAUAD (2001), MELO (2001).

Esta classificação normalmente é feita quanto à forma legal de

constituição – que vai definir de que maneira a cooperativa deve ser tratada

juridicamente, bem como a proporção de sua representatividade – e quanto ao

objeto social que define a atividade fim deste tipo de sociedade, ou seja, a sua

finalidade, o seu ramo de atuação na economia, a natureza das suas atividades

desenvolvidas.

2.5.1. Quanto à forma legal de constituição

Baseado na interpretação do disposto nos Artigos 6º, 7º, 8º, 9º e 10º, da

Lei nº5764/71, as cooperativas podem ser classificadas da seguinte maneira

quanto à forma legal de constituição:

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1. Cooperativas Singulares

São as sociedades constituídas com, no mínimo, 20 pessoas físicas,

sendo permitida a admissão de pessoas jurídicas apenas com atividades

econômicas iguais ou relacionadas com as das pessoas físicas. Podem, também,

ingressar nessa sociedade outras sociedades sem fins lucrativos, atendidos aos

requisitos legais e estatutários.

2. Cooperativas Centrais ou Federações de Cooperativas

São as cooperativas cujos associados são cooperativas singulares. São

constituídas com, no mínimo, três cooperativas singulares, podendo, em caráter

excepcional, aceitar a adesão de membros individuais.

O objetivo dessas sociedades, conforme dispõe o Artigo 8º, do estatuto

do cooperativismo, é o de “organizar, em comum e em maior escala, os serviços

econômicos e assistenciais de interesse das filiais, integrando e orientando suas

atividades, bem como facilitando a utilização recíproca dos serviços”.

3. Confederações de cooperativas

São as constituídas com, no mínimo, três federações de cooperativas

ou cooperativas centrais, podendo ser cooperativas de ramos diferentes.

O objetivo das confederações de cooperativas, conforme dispõe o

Artigo 9.º da citada lei, é o de “orientar e coordenar as atividades das filiais, nos

casos em que o vulto dos empreendimentos transcender o âmbito de capacidade

ou conveniência de atuação das centrais e federações”.

2.5.2. Quanto ao objeto social

Existem treze ramos de atuação das cooperativas registrados e

reconhecidos pela OCB: agropecuário, consumo, crédito, educacional, especial,

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infra-estrutura, habitacional, mineral, produção, saúde, trabalho, turismo e

lazer, transporte de cargas e passageiros. Segundo números da própria OCB

obtidos na última pesquisa, realizada em 2003, as principais sociedades

cooperativas são as agrícolas, as de consumo, de crédito, as cooperativas

habitacionais e a cooperativa de trabalho, também denominada cooperativa de

profissionais ou, ainda, cooperativa de serviço. Assim são classificadas as

principais cooperativas quanto ao objeto social: (MAUAD, 2001), (MELO, 2001),

(OCB).

?? Cooperativas agrícolas: Também conhecidas como cooperativas de

produtores agrícolas, têm como associados os trabalhadores ou os pequenos

produtores do campo ou da “cidade”. Têm como objetivo maximizar o lucro desses

trabalhadores ou produtores, eliminando a figura do empresário que, de outra

forma, teria significativa participação na cadeia produtiva até o consumo final.

Levam ao mercado consumidor, com maior poder de negociação, o resultado do

trabalho desses pequenos produtores.

?? Cooperativas de consumo: Estas sociedades cooperativas têm por

atividade principal as operações de compras de produtos de primeira necessidade

com o objetivo de vendê-los aos cooperados, no atacado ou no varejo. Objetivam,

como as demais, eliminar o intermediário e os especuladores, sempre visando a

vantagens econômicas aos associados.

Este ramo do cooperativismo normalmente é composto por empregados

de grandes grupos empresariais. Sua constituição normalmente ocorre por

iniciativa das administrações das empresas. A gestão dessas cooperativas, quase

sempre com participação distante dos cooperados, se dá com a contratação de

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empregados exclusivamente para esse fim. Podem ser conhecidas também

como cooperativas fechadas, à medida que a admissão dos associados quase

sempre é restrita aos empregados ou pessoas ligadas à empresa ou ao grupo

econômico que as constituiu.

?? Cooperativas de crédito: As cooperativas de crédito também têm

por objetivo eliminar o intermediário só que no caso específico na captação de

recursos, nos investimentos e na concessão de empréstimos, fazendo do tomador

e do investidor, não raro, uma só pessoa.

?? Cooperativas mistas: As cooperativas mistas combinam as

atividades de crédito e as de consumo citadas; podem ser conhecidas como

cooperativas de produção e consumo.

?? Cooperativas habitacionais: As cooperativas habitacionais são

constituídas com o objetivo de proporcionar, exclusivamente a seus associados, a

construção e aquisição de imóveis, bem como a manutenção, administração e

construção de conjuntos habitacionais para o seu quadro social.

?? Cooperativas de trabalho: A primeira definição reconhecida pelo

instituto do cooperativismo no Brasil de cooperativas de trabalho é obtida do

disposto no Decreto lei n.º 22.232, de 19/12/32:

“Art. 24. São cooperativas de trabalho aquelas que, constituídas entre operários de uma determinada profissão ou ofício ou de ofícios vários de uma mesma classe, têm como finalidade primordial melhorar os salários e as condições de trabalho pessoal de seus associados e, dispensando a intervenção de um patrão ou empresário, se propõem contratar obras, tarefas, trabalhos ou serviços públicos ou particulares, coletivamente por todos ou por grupos de alguns”.

Esse conceito denota a devida atuação das práticas cooperativistas das

cooperativas de trabalho, idealizada desde o processo de surgimento, porém é

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limitado e insuficiente para o entendimento e análise das suas práticas

cooperativistas na atualidade, sendo necessário um maior aprofundamento neste

aspecto.

2.6. Cooperativas de trabalho

O objetivo das cooperativas de trabalho é melhorar os ganhos de seus

associados, assim como as condições de trabalho destes. Entende-se por

associado o trabalhador da mesma profissão ou não, porém, de uma mesma

classe, ou seja, trabalhadores com identidade de interesses em razão de sua

atividade laboral. O associado de uma cooperativa de trabalho é dono do capital

do empreendimento cooperativo e autogestor dos negócios em comum.

As cooperativas de trabalho agem, perante seus associados, como

tomadores de serviços de autônomos, já que eles contribuem como se assim o

fossem. O trabalhador associado à cooperativa de trabalho, ou de qualquer outro

ramo, que assim presta serviços a terceiros, é segurado obrigatório da Previdência

Social como autônomo, como está disposto no Decreto Federal n.º 2.172, de

5/03/97.

Os profissionais cooperados não são empregados da cooperativa.

Também a elas não prestam serviços. Pelo contrário, as cooperativas é que são

constituídas (até mesmo juridicamente) para prestar serviços aos sócios-

cooperados, à medida que agenciam os serviços a serem prestados por estes,

aproximando tomador e prestador dos serviços. No âmbito dessa tríplice relação –

cooperativa/cooperado/tomador do serviço – não há qualquer vínculo de emprego

como dispõe o Art. 90 da lei nº 5764/71 e o art.422 da Consolidação das Leis

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Trabalhistas (CLT). Normalmente nas cooperativas de trabalho, é que se

percebe relação de vínculo entre o associado e o cliente da cooperativa chegando

a ponto do sócio-cooperado passar mais tempo na empresa tomadora de serviço

do que na cooperativa.

As cooperativas de trabalho são classificadas de várias maneiras

segundo os autores especialistas no tema. Com base na interpretação do que

afirma alguns deles, tal como Marcelo Mauad (2001), as cooperativas de trabalho

podem ser definidas tipologicamente como:

?? Cooperativas de produção e de serviços: nelas os associados detêm

a posse dos meios e demais fatores de produção e serviços.

?? Organizações comunitárias de produção: existe produção coletiva,

também com a detenção dos meios de produção pelos membros componentes da

organização, só que com fins solidários e distributivos dos ganhos entre a

comunidade e os seus membros.

?? Cooperativas de mão de obra: estas cooperativas, ao contrário das

demais, destinam-se à disponibilização de mão de obra para as empresas através

da terceirização dos serviços.

A Cooperativa X, uma cooperativa de trabalho de profissionais de

informática, pode ser definida, segundo esta classificação, como cooperativa de

mão de obra por prestar serviços a diversas empresas de variadas áreas de

atividade fornecendo serviços de informática no mercado de trabalho associado,

como será descrito posteriormente na caracterização da cooperativa, objeto deste

estudo de caso.

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2.7. Contexto atual do mundo do trabalho – reestruturação produtiva

O mundo do trabalho sofre constantes mudanças e estas alterações

têm ligação direta com a estruturação econômica e produtiva dos países

(notadamente os capitalistas). Não só as nações com a atividade econômica em

desenvolvimento, como também os países considerados desenvolvidos

economicamente e tecnologicamente, sofrem os efeitos destas contingências. Nos

últimos anos, estas transformações têm apontado para uma tendência de

reestruturação produtiva, através de novos arranjos econômicos representados,

entre outros, por exemplo, pela economia solidária.

O cenário atual do mundo do trabalho convive num contexto de

desemprego estrutural (tanto nas grandes cidades como na área urbana) na

quase totalidade dos países em desenvolvimento e em alguns países

industrializados. Outro aspecto percebido na sociedade atual é a precarização das

relações de trabalho (LIMA, 1998). Cada vez mais é crescente o número de

empregos temporários, subempregos, postos de serviços, terceirização,

subcontratações, enfim; proporcionando a necessidade da busca por formas

alternativas de estruturação da produção, bem como flexibilizações no cenário

econômico-social.

As causas para a crise estrutural de desemprego no mundo são as

mais diversas (e até mesmo divergentes) e de variadas origens, tais como

políticas, econômicas, sociais, culturais. Porém, a participação dos avanços

tecnológicos é um aspecto de consenso entre boa parte dos autores3 como

3 NUNES (2003), LIMA (1998), ARAÚJO & LIMA (1998), MELO (20001).

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responsável pelo agravamento do desemprego. Inicialmente com a

substituição do homem pela máquina – agravada, nos dias atuais, pela difundida

robotização, notadamente na indústria – em âmbito geral, e a proliferação do auto-

serviço e prestação de serviços virtuais, com o advento da internet, estes avanços

tecnológicos são associados, também, a inovações organizacionais e influindo em

boa parte das estatísticas de desemprego em todo o mundo.

Neste âmbito de crise do emprego formal/tradicional, com “carteira

assinada”, uma parcela significativa da força de trabalho mundial se desloca para

formas alternativas de geração de renda como saída para este contexto

desfavorável. Estatisticamente, NUNES (2003 apud GIDDENS,1996) e FIORI

(2002) informam que 70% da população mundial exercem atividade alternativa à

economia formal, atuando em micro empresas, pequenos empreendimentos,

trabalho autônomo, quase sempre com baixa remuneração e quase nenhuma

proteção social nas relações trabalhistas. Ainda segundo estas estatísticas,

aproximadamente um bilhão de pessoas está sem emprego no mundo; isso

representa aproximadamente quase um terço da massa de trabalhadores do

planeta.

As empresas (e os empresários) apresentam como justificativa para

esta política de subcontratação e conseqüente precarização das relações de

trabalho a necessidade de se manter firme no mercado de trabalho cada vez mais

competitivo, principalmente no setor de prestação de serviços, além da

padronização dos produtos e serviços prestados aos clientes. Porém, o que se

percebe na prática é que este aumento da subcontratação/terceirização

representou impulso à proliferação de formas precárias de trabalho, já que as

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práticas vinculadas são geralmente sinônimos de baixa remuneração e de

descumprimento das obrigações legais por parte das empresas, ou resultam na

ampliação do mercado de trabalho informal.

Terceirização de mão de obra significa transferência de algumas etapas

que fogem à atividade fim da empresa, no seu processo de produção e/ou

prestação de serviços, para outras empresas especializadas nesta produção e/ou

na prestação destes serviços. As condições de trabalho da mão de obra

terceirizada normalmente se constituem de baixa remuneração, relações

informais, inexistência de vínculos empregatícios, ausência de benefícios sociais o

quanto possível. Cada vez mais as empresas fazem uso desta prática por estarem

diretamente ligadas à redução de custos com salários e encargos sociais bem

como da transferência para terceiros (daí vem o nome) das contingências do

mundo do trabalho.

Na América Latina, estes aspectos são percebidos de forma realçada,

com o enfraquecimento do trabalho assalariado, formal, de “carteira assinada”,

gerado pela reestruturação econômica, e incrementado pela desregulação social,

criando novas formas de organização produtiva e econômica (CASTRO, 1997).

Isto se dá por se tratar de um conjunto enorme de nações ainda em

desenvolvimento econômico, numa região definida como subcontinente em

comparação com a Europa e a América Anglo-saxônica, por exemplo.

Dentro da América Latina, o Brasil segue o representado pelo âmbito

geral. Nos anos 80, o trabalho formal – em suas características de proteção ao

trabalhador, idealizadas por Getúlio Vargas – teve considerável agravamento por

influência de fatores macroeconômicos, com o crescimento progressivo do

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trabalho sem contrato formalizado e por conta própria em detrimento do

trabalho assalariado (MATTOSO, BALTAR, 1997).

Nos anos 90, o cenário econômico brasileiro apresentava recessão

econômica e abertura comercial dilatada pela política cambial que deu

embasamento ao Plano Real. Com a redução das exportações e aumento da

concorrência, as empresas, a fim de reduzir os custos, demitiram boa parte do seu

quadro de funcionários e utilizou em grande escala, capacidades de trabalho

externas (SINGER, 1999), ajudando a aumentar o número já significativo da

subcontratação e conseqüente precarização do trabalho no país.

O contexto atual do mundo do trabalho, portanto, aponta para a

institucionalização e aplicação em grande escala e de forma progressiva do

movimento da economia solidária, através da reestruturação econômica, como

uma alternativa real e social de geração e distribuição de renda para os

trabalhadores carentes de proteção social e emprego, tornando-se cada vez mais

“donos” e gestores da força do seu trabalho.

Nos empreendimentos solidários o cooperativismo é a prática mais

reconhecida dos arranjos produtivos e econômicos. Com as adversidades

originadas pelas transformações econômicas recentes, a multiplicação de

cooperativas (especialmente as de trabalho) no Brasil no âmbito da reestruturação

produtiva é entendida como uma solução alternativa ao desemprego (TESCH,

1996). Além do sentido de reação a este clima econômico adverso do capitalismo

o crescimento do trabalho em cooperativas pode proporcionar ajuda mútua,

solidariedade, melhores possibilidades de renda e de vida entre os setores mais

frágeis do contingente da população excluída.

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2.7.1. Economia Solidária

Economia solidária, movimento econômico e social do qual o

cooperativismo é parte integrante, consiste, basicamente, em uma alternativa à

maneira formal de produção econômica – que tem como alicerce a relação

patrão/empregado – com bases solidárias, sociais, assistencialistas, visando à

diminuição da subordinação, exploração do trabalhador e valorizando a

autogestão e a “posse”, o controle da força de trabalho exercido pela própria

massa trabalhadora.

Esta “nova economia” vem crescendo e se difundindo cada vez mais;

prova disso está em dados datados de 2003 da Secretaria Nacional de Economia

Solidária (SENAES), informando a presença de cerca de 25 mil empreendimentos

solidários em todo o Brasil. Além da SENAES, existe no Brasil a Agência de

Desenvolvimento Social (ADS-CUT), criada com o objetivo de articular processos

de desenvolvimento local a partir de trabalho e renda, economia solidária e

empreendimentos de autogestão.

A economia solidária – de forma geral também conhecida como

economia social, economia dos setores populares, economia da dádiva, economia

social, economia do trabalho, socioeconomia (NUNES, 2003) – surgiu no mundo

como movimento não só de alternativa ao desemprego, até porque este é um

aspecto estrutural e amplo, mas também como alternativa da subordinação que a

economia capitalista proporciona aos seus trabalhadores.

A disputa entre a economia solidária e a economia capitalista existe no

plano ideológico, nas diferenças percebidas nos conceitos e pressupostos de cada

uma, porém, na prática “elas” tentam conviver lado a lado no mercado de trabalho,

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inclusive com interações e associações como incentivos de instituições

privadas ao fomento de empreendimentos solidários normalmente percebidos em

instituições públicas como implantação de Incubadoras Tecnológicas de

Cooperativas Populares (ITCPs) também em faculdades particulares; por

exemplo.

Na prática, no contexto atual do mercado de trabalho associado, a

economia solidária é representada por organizações de produtores em forma de

autogestão, com igualdade de direitos de todos os associados; a propriedade do

capital deve ser comum, distribuída de forma igualitária, assim como sua gestão

deve ser democrática. A economia solidária pode ser representada como uma

ferramenta contra a pobreza e a exclusão social, já que a maioria dos

empreendimentos solidários tem caráter de geração e distribuição de trabalho e

renda proporcionando aumento da remuneração dos participantes de uma forma

coletiva e melhor qualidade de vida estendendo estes benefícios às suas famílias.

Aqui no Brasil, nas décadas de 80 e 90, o movimento da economia

solidária obteve maior expressão através do surgimento de vários movimentos

políticos e sociais como reação à crise do desemprego no país. Nesta

época,também surgiram as primeiras ITCPs em várias universidades brasileiras

(SANTIN, 2003).

Outro momento que representa um marco neste movimento solidário na

forma de reestruturação produtiva foi o Fórum Social Mundial em Porto Alegre cujo

tema era “um outro mundo é possível” e que deu embasamento ao Fórum

Brasileiro de Economia Solidária com o tema “uma outra economia acontece”,

discutindo como é possível instituir outra forma de organizar a economia com o

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objetivo de geração e distribuição de trabalho e renda, preenchendo uma

lacuna social e histórica – desde a colonização – e que coloca o Brasil nas

primeiras posições de desigualdade econômica e social no mundo.

Uma prática solidária percebida no Brasil nos últimos anos é a

associação de empreendimentos e ações solidárias a programas institucionais de

distribuição de renda já desenvolvidos no país. Neste caso, a função da economia

solidária é tentar auxiliar essas pessoas a exercerem e controlarem suas próprias

atividades econômicas, que as sustentem, a fim de que elas não precisem deste

assistencialismo no futuro. Ações associadas a programas institucionais como o

Fome Zero e o Bolsa-Família ajudam a população excluída a obter capital próprio,

além de encorajá-las a começar a acreditar e perceber que o controle da sua

própria força de trabalho pode dar certo e se desvincular das condições de

subemprego e subcontratação a que são submetidas.

A prática cooperativista é totalmente inserida nos propósitos da

economia solidária. Para Patrícia Santin (2003) – coordenadora de um importante

programa solidário de geração de renda na cidade de São Paulo – em seu Artigo

“As Cooperativas Populares de Bases Solidárias”, a cooperativa é a unidade típica

de produção da economia solidária. Para as pessoas pobres, no contexto atual de

desemprego, fazer parte de uma cooperativa é poder se beneficiar da geração de

renda gozando dos mesmos direitos que todos os outros cooperados,

expressando livremente suas opiniões, sendo respeitado e ouvido pelos demais

membros, participando ativamente da tomada de decisões desta sociedade,

influindo nas decisões sobre o presente e futuro do empreendimento e

vivenciando um processo de resgate de cidadania.

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Apesar do cooperativismo ser a maior expressão desta nova forma

de economia mundial, além das cooperativas, existem outras organizações que

também são parte integrante da economia solidária como grupos de produção de

alimentos, reciclagem, trabalhadores organizados em prestação de serviços, de

trocas solidárias, de compras coletivas, de educação popular, de cooperativismo

popular, de desenvolvimento local, iniciativas de produção rural alternativa (como

a agricultura familiar), e iniciativas de microfinanças solidárias. Estes são

igualmente exemplos de práticas autogestionárias que têm gerado trabalho e

renda de forma sustentável a um grande número de pessoas alijadas do processo

tradicional de geração e distribuição de renda (NUNES, 2003).

2.7.2. Falsas cooperativas

A crise estrutural do desemprego e a conseqüente precarização das

relações de trabalho na sociedade contemporânea são alguns dos aspectos mais

importantes no contexto atual do mundo do trabalho. O cooperativismo está

inserido neste cenário econômico e produtivo como a maior expressão da

economia solidária através de manifestações econômicas associativistas com

gestão coletiva e democratização da produção, geração e distribuição de trabalho

e renda.

Desde o início da prática cooperativista no mundo surgiram queixas de

possíveis atuações incoerentes, na contramão do movimento solidário, em relação

ao verdadeiro instituto do cooperativismo representado pelos Princípios

Cooperativistas, com o objetivo de reduzir custos e encargos sociais e trabalhistas

(LIMA, 1996).

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O surgimento do cooperativismo de trabalho pode ter ajudado à

utilização deturpada do cooperativismo, pois a terceirização da mão de obra,

através das cooperativas de trabalho, facilita a criação em larga escala de

cooperativas ilegítimas criadas sob incentivo dos subcontratantes ou como

resultado da falência de empresas, com o fim de obter vantagens competitivas no

mercado de trabalho. O controle destas cooperativas normalmente é feito pelos

fundadores ou pela empresa disfarçada de empreendimento solidário,

determinando seu funcionamento, bem como sua estrutura interna (estrutura

funcional, organograma).

A vantagem competitiva buscada de forma desenfreada pelas

empresas é sinal do aumento considerável da concorrência no mercado de

trabalho. Um dos motivos para este crescimento é a padronização nos processos,

na produção e prestação de serviços; incrementada pelos institutos de certificação

e padronização das atividades das empresas visando à qualidade. Neste contexto

competitivo, obter mão de obra especializada, sem ônus trabalhistas (13º salário,

férias, FGTS), vínculos sociais (planos de saúde, práticas de recursos humanos),

com baixa remuneração e ainda fazer parte de um sistema de iniciativa social,

com todos os seus benefícios legislativos, é um leque de vantagens e proveitos

desejado por muitos empresários. Todos estes ganhos podem ser proporcionados

pela prática espúria do cooperativismo.

A atuação incoerente dessas cooperativas de trabalho no mercado de

trabalho associado representa uma contradição nos termos da reestruturação

econômico-produtiva do mundo capitalista. O funcionamento destas empresas

fraudulentas está inserido num contexto de precarização das relações de trabalho

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e desemprego, ou seja, deveriam servir como uma alternativa a esse

processo adverso, porém, contraditoriamente, em conseqüência deste cenário, a

proliferação das cooperativas no Brasil, notadamente das de trabalho, vem

proporcionalmente com as suspeitas de práticas espúrias do cooperativismo.

Assim, ao invés de uma evolução em busca da institucionalização de um novo

modelo de arranjo produtivo e econômico solidário e justo, a prática cooperativista

espúria pode levar o mercado de trabalho a um agravamento da subcontratação e

subjugação da força da massa trabalhadora mundial com a falta de alternativas e

soluções para desviar deste quadro adverso.

Um dos motivos pelos quais as cooperativas de trabalho são as mais

analisadas em suas práticas cooperativistas é o caráter de vínculo trabalhista

quase sempre percebido nas suas atividades, apesar do disposto no Parágrafo

único do Artigo 442 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) adicionado pela

Lei 8.949 de 1998: “qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade

cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem

entre estes e os tomadores de serviços daquelas”; nas “pseudocooperativas”

normalmente é percebido vínculo já que se tratam de produção e/ou prestação de

serviços fixos com horários de entrada e saída preestabelecidos em contrato.

Portanto, qualquer prática cooperativista em que seja percebida a

existência de vínculo com os sócios-cooperados está contrariando a prática devida

do cooperativismo conforme definido na legislação cooperativista brasileira.

Normalmente, no cooperativismo de trabalho, o cooperado passa mais tempo na

empresa tomadora de serviço do que na própria cooperativa e assim, nas

cooperativas fraudulentas, é percebido vínculo trabalhista, não com a cooperativa,

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mas com a empresa tomadora do seu serviço, contrariando, assim o que

estabelece a legislação e os Princípios Cooperativistas.

Assim, as cooperativas de trabalho são acusadas de camuflar a

prestação de mão de obra exercida na prática por meras “empresas”

intermediadoras da prestação de serviços, com o objetivo de benefício dos

tomadores de serviços sob o falso pretexto da criação de postos de trabalho e da

modernização do direito do trabalho, além da vantagem competitiva sobre as

demais empresas prestadoras de serviço terceirizado.

Redução de encargos empresariais, isenção de taxas, condições

especiais de empréstimos bancários, facilidade de acesso a contratos de obras

públicas, assim como incentivos a processos de recuperação de empresas falidas

para manter empregos, mostram como são favoráveis o surgimento e expansão

da falsa atividade cooperativista dentro do cooperativismo de trabalho.

Estas empresas disfarçadas em um arcabouço de cooperativas atuam

de forma falsa dentro do instituto do cooperativismo normalmente na subordinação

dos cooperados, no desconhecimento e falta de participação na política de tomada

de decisões das cooperativas (assembléias, reuniões, estatuto) pelos membros,

na não divulgação do devido funcionamento das cooperativas, bem como de seus

princípios e valores, na adesão dos associados. Enfim, destoam em boa parte do

que é estabelecido pela legislação e principalmente pelos Princípios

Cooperativistas que são os referenciais mais importantes na verdadeira atuação

das cooperativas em suas práticas.

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39

3 – ESTUDO DE CASO

O estudo do caso específico da Cooperativa X em Salvador trata da

análise da atuação desta referida cooperativa em suas práticas cooperativistas na

cidade de Salvador, comparativamente com as normas e regras estabelecidas

pelos Princípios Cooperativistas e pelo governo (através da legislação

cooperativista brasileira), como padrão de funcionamento das cooperativas no

mercado de trabalho associado.

Os Princípios Cooperativistas, como fora anteriormente citado, são as

normas por meio das quais as cooperativas põem em prática seus valores. Ajuda

mútua, responsabilidade, democracia, igualdade, eqüidade e solidariedade são

alguns dos valores e normas postos em prática com o cumprimento dos Princípios

Cooperativistas – que tratam da adesão dos associados, do controle da

cooperativa, da participação econômica dos membros, da autonomia da

cooperativa, da qualificação dos cooperados, e da interação da cooperativa com

outras e com a comunidade – dão embasamento para o legítimo funcionamento

das cooperativas em suas práticas cooperativistas.

Entende-se por práticas cooperativistas todas as práticas no exercício

das atividades cotidianas de uma cooperativa em suas relações com todos os

seus públicos, tais como os cooperados, o poder público (federal, estadual,

municipal), os parceiros, clientes, a própria cooperativa (presidência, diretoria), a

sua comunidade, outras cooperativas, as associações e entidades

representativas, outros empreendimentos solidários; por exemplo.

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40

Para a compreensão destas práticas na Cooperativa X em

Salvador, será analisada uma tabela com o devido funcionamento desta

cooperativa, comparativamente com o que determinam os Princípios

Cooperativistas. O objetivo desta tabela é associar as práticas cooperativistas em

cooperativas de trabalho com o que determinam estes Princípios para dar

embasamento à pesquisa propriamente dita deste trabalho científico em forma de

estudo de caso.

Princípios Cooperativistas

Práticas Cooperativistas em Cooperativas de Trabalho

Adesão voluntária

Qualquer pessoa pode se associar a uma cooperativa desde que tenha conhecimento da responsabilidade como membro e cumpra os dispostos nos Princípios Cooperativistas, bem como no estatuto da cooperativa. Não poderá haver qualquer discriminação de sexo, social, racial, política e religiosa, quanto à adesão de membros à cooperativa.

Gestão democrática

A participação dos cooperados deve ser ativa; eles devem conhecer o funcionamento, o estatuto da cooperativa, ser informados e convocados para assembléias, reuniões, eleições e demais encontros. Todos os membros têm igual direito de voto na política de tomada de decisões das cooperativas.

Participação econômica dos membros

A divisão dos lucros deve ser eqüalitária e proporcional à produção de cada membro da cooperativa. A destinação das sobras deve ser clara e prioritariamente com o propósito de desenvolvimento da cooperativa e em benefício aos sócios através de redistribuição, ao final de cada exercício, na proporção de suas transações com a cooperativa.

Autonomia e independência

O controle (gestão) da cooperativa deve ser feito exclusivamente pelos seus membros. A autonomia da cooperativa e o controle dos sócios devem ser respeitados nas relações com os possíveis clientes/parceiros.

Educação e formação

Nas cooperativas de trabalho os cooperados devem estar sempre atualizados e especializados em sua área de atuação e a cooperativa é uma das responsáveis pela formação e qualificação profissional dos cooperados. É de responsabilidade da cooperativa e dos seus associados, notadamente os mais experientes, divulgar e informar ao público em geral os benefícios e os fundamentos do movimento do cooperativismo.

Intercooperação

As cooperativas podem se unir em confederações, centrais e federações para obter melhores contratos e maior força no mercado de trabalho associado.

Interesse pela comunidade

As cooperativas de trabalho podem interagir com a comunidade a qual fazem parte através de ações sociais, econômicas e fomento à geração, distribuição e autogestão do trabalho e renda.

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Tabela 1 – Modelo das práticas cooperativistas à luz dos Princípios Cooperativistas. Elaborada pelo autor. 3.1. A Cooperativa X

A cooperativa X é uma cooperativa de profissionais de informática com

mais de 20 mil cooperados registrados em todo o Brasil. No ramo de tecnologia da

informação, esta referida cooperativa é uma das maiores do mundo em número de

cooperados, clientes, força e experiência no mercado de trabalho associado; foi

pioneira na área de informática no Brasil com atuação voltada ao setor de serviços

e terceirização de mão de obra cooperada, com negócios e agentes no Brasil e no

exterior.

A cooperativa foi formada no ano de 1980 através da reunião de ex-

funcionários de uma empresa federal brasileira de prestação de serviços em

tecnologia da informação. A matriz da Cooperativa X fica localizada na cidade do

Rio de Janeiro, com escritórios e filiais espalhados em todo o país: Salvador;

Aracaju; Belo Horizonte; Brasília; Curitiba; Fortaleza; Florianópolis; Porto Alegre;

Recife; São Paulo.

A organização interna da cooperativa é definida por unidades de

negócios autônomas; estas unidades são conhecidas na sua atuação por Projetos.

Sua estrutura matricial facilita a organização e distribuição dos trabalhos entre os

cooperados por projetos e cada projeto é vinculado ao cliente respectivo. Cabe à

cooperativa o papel de gerenciá-los e com os recursos dos esforços individuais

dos cooperados reunir condições de tecnologia e poder de marketing para

administrar os contratos com estes clientes, efetivando, assim, a representação

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jurídica de vários trabalhadores autônomos e proprietários da sua força de

trabalho na prestação de serviços de informática.

Em Salvador; área de interesse deste trabalho, a filial da Cooperativa X

foi fundada em Julho de 1997 devido ao aumento da demanda de serviços

solicitados por empresas à matriz no Rio de Janeiro. Assim, percebeu-se a

necessidade da implantação de uma filial da cooperativa X na cidade de Salvador.

Apresenta hoje cerca de 500 cooperados registrados com um número aproximado

de 400 cooperados em atividade distribuídos em todos os vários projetos da

cooperativa de trabalho em empresas tomadoras de serviços terceirizados na área

de informática.

Segundo um dos Coordenadores de Projetos e responsáveis pela

Diretoria da Cooperativa aqui em Salvador (e um dos fornecedores destes dados),

este número não é exato devido à rotatividade dos cooperados em atuação fixa

num determinado Projeto (empresa), pelo razoável rodízio de associação e

desassociação de cooperados da Cooperativa em Salvador, bem como da

existência de alguns Projetos de trabalho temporários.

Como em todas as cidades com atuação da Cooperativa X, em

Salvador a distribuição dos trabalhos é feita segundo uma organização por

unidades de negócios autônomos baseada em projetos de terceirização de mão

de obra. Esta organização se dá através de projetos específicos para cada cliente

e dentro destes projetos são organizadas unidades de trabalho denominadas de

células funcionando como “mini cooperativas” – que fazem parte de uma estrutura

maior, global – com a distribuição de todo resultado econômico produzido entre os

cooperados de cada célula específica. Se a cooperativa “fornecer” a mão de obra

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cooperada para o Governo Estadual, por exemplo, poderá haver uma célula

para as escolas estaduais, outra para as autarquias estaduais e assim

sucessivamente e todas estas células farão parte de uma estrutura maior

denominada “Projeto Governo”. Neste caso, a remuneração dos cooperado será

obtida da produção deles dentro deste projeto e da sua referida célula.

A produção do cooperado é definida pela hora trabalhada de cada

membro em suas atividades profissionais nos seus respectivos projetos/células.

Sendo assim, a Cooperativa X em sua filial em Salvador se apresenta no mercado

de trabalho associado de cooperativas de trabalho tal qual uma representação

jurídica de um grupo de trabalhadores autônomos (os cooperados) reunidos de

forma associada como parte integrante de uma cooperativa nacional cuja matriz

fica localizada na cidade do Rio de Janeiro.

A Cooperativa X apresenta uma organização de distribuição dos

trabalhos através de unidades regionais e específicas, denominadas de projetos

(como já foi citado) e apresenta uma estrutura interna matricial para facilitar esta

distribuição; como pode ser visualizado, na prática, através do seu organograma

abaixo.

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Figura 1 – Organograma da Cooperativa X. Documento fornecido pela Diretoria da Cooperativa.

Desse modo, os trabalhos solicitados à Cooperativa pelos clientes são

distribuídos por projetos/células aos cooperados conforme as funções de cada

cooperado registradas na cooperativa; estas funções são definidas de acordo com

as qualificações e especificações profissionais de cada membro. De acordo com

este critério, por se tratar de uma cooperativa de profissionais de informática, o

sócio-cooperado pode ser classificado em suas funções por digitador, operador,

técnico, programador, analista de sistemas, consultor de tecnologia da informação,

analista de projetos, coordenador de projetos. Através destes critérios é que são

definidos os profissionais que serão encaminhados para os projetos/células de

clientes da cooperativa.

4 – METODOLOGIA

Foi utilizada uma metodologia quantitativa, com as técnicas de pesquisa

elencadas direcionadas aos públicos que se relacionavam de diferentes formas e

objetivos com a referida cooperativa, para a consecução dos objetivos desta

pesquisa. Desta forma esta pesquisa ou de analisar o cumprimento das práticas

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cooperativistas pela Cooperativa X em sua filial em Salvador, à luz do que

determinam os Princípios e a legislação cooperativista brasileira.

4.1. Técnicas de Pesquisa

Nesta pesquisa, em forma de estudo de caso da filial da Cooperativa X

em Salvador, foram aplicadas as seguintes técnicas: 1) questionários aos

cooperados; 2) entrevista com um dos responsáveis pela diretoria da cooperativa

(Coordenador de Projetos) em Salvador; e 3) observação participante, a fim de

analisar a relação da cooperativa com os cooperados. Quanto à relação da

cooperativa com os outros públicos em suas práticas cooperativistas, foram

analisados documentos pertinentes às atividades da cooperativa (estatutos,

registro de convocações para reuniões, encontros), além dos contratos desta

sociedade com seus parceiros/clientes, bem como outros documentos e

informações apropriados.

4.1.1. Questionário aos cooperados

O questionário usado foi do tipo heterogêneo apresentando vários tipos

de questões e direcionamentos para coleta de dados com perguntas fechadas,

perguntas dicotômicas, perguntas de múltiplas respostas, perguntas de fato,

perguntas de ação, perguntas com a escala de Likert de cinco pontos (MARCONI;

LAKATOS, SAMARA; BARROS, 1986, 1997). A técnica para apresentação e

ordem das perguntas utilizada foi a “técnica do funil” (MARCONI, LAKATOS, 1986)

que indica posicionar as questões iniciando pelas mais genéricas – como dados

pessoais e profissionais – até as mais específicas para coletar os dados e

informações procuradas. Assim, didaticamente, o questionário apresentou as

perguntas separadas conforme os temas abordados: “Dados Pessoais”, “Dados

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Profissionais”, “Informações e conhecimentos sobre a cooperativa e o

cooperativismo” e “Práticas cooperativistas” (APÊNDICE A).

Os questionários foram disponibilizados a cooperados de todos os

níveis hierárquicos, funções, cargos e setores da cooperativa em questão em

atuação em Salvador. Porém, o seu público alvo era os cooperados com no

mínimo um ano de registro na Cooperativa X e em atividade atualmente prestando

serviços a empresas tomadoras de serviço à cooperativa X – através da

representação jurídica já citada. Este público foi delimitado, pois com os

cooperados com menos de um ano e/ou que não estejam trabalhando pela

cooperativa atualmente não seria possível verificar o cumprimento de Princípios

como a participação em Assembléias anuais e a participação econômica dos

membros.

Do total de questionários preenchidos pelos sujeitos que concordaram

em responder, três foram descartados, por não se encaixarem nas exigências

para fazer parte do perfil procurado e definido do público alvo desta pesquisa;

totalizando 52 o tamanho da amostra considerada neste estudo de caso. A

amostra, por não abranger todos os cooperados e pelo seu caráter opcional (o

sujeito responde se quiser) é considerada aleatória e por adesão. Todavia, é uma

amostra representativa, pois garantiu uma proporcionalidade entre todos os

setores e níveis da referida cooperativa, por contemplar um percentual destacável

(em torno de 10%) da amostra total, além da utilização de todos os recursos

disponíveis e da limitação inerente neste instrumento de coleta de dados

correspondente à dependência da disposição do entrevistado em responder às

perguntas do questionário (GÜNTHER, 2003).

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O questionário foi usado para verificar as práticas cooperativistas à

luz dos Princípios que tratam das relações da cooperativa com os cooperados:

Adesão voluntária, Gestão democrática, Participação econômica dos membros e

Educação e formação (Tabela 1).

4.1.2. Entrevista à Cooperativa

A entrevista com um dos responsáveis (Coordenador de Projetos) pela

diretoria da Cooperativa X em Salvador foi baseada inicialmente em um roteiro

contendo 12 itens previamente estabelecidos (vide Roteiro de Entrevista À

Cooperativa. APÊNDICE B), mas que se desenvolveu numa conversa informal e

longa de aproximadamente três horas de duração – na qual o autor da pesquisa,

como entrevistador, pôde obter respostas satisfatórias para os itens definidos e

demais informações a respeito da filial da Cooperativa X em Salvador.

Conforme estabelecido no roteiro de entrevista, os itens abordaram

todos os aspectos que diziam respeito às relações da cooperativa com os seus

públicos em suas práticas cooperativistas. Os itens tratam da origem da

cooperativa; se a cooperativa faz parte de Federações, Confederações; os dados

dos cooperados, quantidade, escolaridade, qualificação profissional, adesão,

participação em Assembléias; como são obtidos os trabalhos e como é feita a sua

distribuição; qual é a destinação das sobras; como é a estrutura funcional da

cooperativa e, finalmente, como ela participa na qualificação dos cooperados, na

comunidade e com outras cooperativas.

Para verificar o cumprimento dos Princípios Cooperativistas pela filial da

Cooperativa X em Salvador em suas práticas cooperativistas, a entrevista à

cooperativa foi usada como instrumento de coleta de dados a respeito de todos os

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Princípios Cooperativistas, já que se trata da investigação da posição da

cooperativa em suas relações com todos os seus públicos (Tabela 1).

4.1.3. Observação participante

Na observação participante, o observador se coloca na posição e no

nível dos outros sujeitos também verificados na pesquisa que compõem a situação

a ser observada (RICHARDSON, 1999). Através desta técnica, verificou-se com

mais precisão o cumprimento dos Princípios Cooperativistas pela cooperativa,

objeto deste estudo de caso em suas práticas cooperativistas em Salvador. Esta

observação se processou no período de 10 (dez) meses consecutivos em que o

autor da pesquisa passou trabalhando na prestação de serviços terceirizados a

uma empresa utilizando os serviços da cooperativa como uma representação da

sua força autônoma de trabalho.

A observação participante é definida pela participação do próprio autor

da pesquisa na análise das práticas cooperativistas da Cooperativa X em

Salvador, por ser também membro registrado e em atividade numa empresa

tomadora de serviço sobre representação jurídica da referida cooperativa. Nesta

técnica, o observador pode aferir sobre a atuação da cooperativa no seu

relacionamento com os membros, em suas práticas cooperativistas, no seu caso

específico podendo representar a parcela deste público (que é o público-alvo

desta pesquisa) e aferir sobre os Princípios Cooperativistas que tratam destas

relações tais quais foram investigados pelos questionários: Adesão voluntária,

Gestão democrática, Participação econômica dos membros e Educação e

formação (vide Tabela 1).

4.1.4. Análise de documentos

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A análise de documentos e demais informações da cooperativa,

proporcionou acesso a dados apropriados advindos da leitura e interpretação de

alguns documentos referentes às atividades da cooperativa. A análise dos

documentos com informações pertinentes da cooperativa (convocação para

encontros, reuniões, assembléias; estatuto da cooperativa) e dos contratos com as

empresas clientes da Cooperativa X não obteve o êxito total esperado, pois

quanto aos contratos o acesso não foi amplo nem pelas empresas clientes nem

pela própria cooperativa. Porém, este entrave não prejudicou a verificação do

cumprimento dos Princípios Cooperativistas relacionados a esta técnica

(Participação econômica, Gestão democrática e Autonomia e independência), pois

o acesso “parcial” a estes documentos e a aplicação dos outros métodos citados

foi suficiente para esta verificação.

O autor da pesquisa teve total acesso ao estatuto da cooperativa nesta

análise ficando, inclusive, com uma cópia disponibilizada a ele após solicitação a

uma das responsáveis pela diretoria da sociedade em Salvador.

Além dos documentos referentes às atividades cooperativistas das

relações com os associados, foram analisados alguns documentos que tratam dos

aspectos legais definidos como normas e padrões pela legislação cooperativista

brasileira a serem cumpridos por todas as cooperativas em funcionamento no

Brasil: registro na Junta Comercial, no Ministério da Fazenda e obter CNPJ,

possuir cadastro dos cooperados como contribuintes do INSS e ter a

documentação de todos os associados cooperados como sócios.

Enfim, os métodos para alcançar os resultados e a consecução dos

objetivos desta pesquisa foram fundamentados nas técnicas de pesquisa acima

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descritas: questionário, entrevista, observação participante e análise de

documentos, usadas para verificar o cumprimento do que determinam os

Princípios Cooperativistas pela Cooperativa X em suas práticas cooperativistas em

Salvador (Tabela 1).

5 – RESULTADOS E ANÁLISE

Na seqüência do estudo do caso, apresentam-se aqui os resultados e a

discussão dos produtos obtidos da reunião das técnicas de pesquisa citadas,

aplicadas no campo, para a consecução do objetivo deste estudo: o de analisar o

cumprimento (ou não) dos Princípios Cooperativistas pela filial da Cooperativa X

em suas práticas cooperativistas em Salvador.

A apresentação desta análise se dará, conforme citado, com base na

tabela comparativa entre os Princípios Cooperativistas e as práticas

cooperativistas (Tabela 1) e nos dados obtidos pelas técnicas de pesquisa

definidas para a análise de cada Princípio como fora explicitado na Metodologia.

Princípio Cooperativista nº1 – Adesão voluntária e livre

Para analisar o cumprimento desta primícia pela referida cooperativa,

que trata do processo de adesão de todos os associados à cooperativa e os

aspectos relacionados a este procedimento, foram usadas, na pesquisa de campo,

as seguintes técnicas: Entrevista à cooperativa, Questionário com os cooperados

e Observação participante, justamente por tratar-se de uma prática cooperativista

relacionada com a atitude inicial (entrada) dos cooperados.

Na entrevista à cooperativa o Coordenador de Projetos da filial da

referida cooperativa afirmou que a adesão à cooperativa normalmente se dá

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através do “boca a boca”, ou seja, os sócios registrados divulgam e informam

aos parentes, amigos da existência da cooperativa e da possibilidade de trabalho

em um sistema de autogestão no mercado de trabalho associado. Porém,

segundo alguns dos dados obtidos do questionário de pesquisa (Figura 2 –

Gráfico 1), 66,67% dos cooperados informaram terem tomado conhecimento da

cooperativa através da indicação de uma empresa, e 46,67% responderam que o

fator motivador para ingressar em uma cooperativa foi a “sugestão de uma

empresa” (Figura 3 – Gráfico 2).

Esses dados do questionário aliados a informações obtidas da

entrevista e da observação participante podem inferir a existência da prática de

indicação das empresas tomadoras de serviços a interessados em trabalhar em

sua instituição a ingressarem na referida cooperativa, utilizando a representação

jurídica prestada por ela.

Figura 2 – Gráfico 1 – Conhecimento sobre a cooperativa

C o m o v o c ê t o m o u c o n h e c i m e n t o d a C o o p e r a t i v a X ?

6 , 6 6 %

2 6 , 6 7 %

6 6 , 6 7 %

J o r n a i s , r e v i s t a s , i n t e r n e t

0 , 0 0 %

A m i g o s

I n d i c a ç ã o d e u m a e m p r e s a

O u t r o s

J o r n a i s , r e v i s t a , i n t e r n e t

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Figura 3 – Gráfico 2 – Motivação para a adesão à uma cooperativa

No que diz respeito à discriminação – outro aspecto correspondente ao

Princípio da Adesão voluntária e livre – no processo de adesão à cooperativa, não

foi detectado por nenhuma das técnicas de pesquisa observadas neste Princípio,

qualquer resquício de distinção social, racial, sexual, religiosa, política, neste

procedimento.

Cerca de 40% da referida amostra que respondeu ao Questionário de

Pesquisa discordaram que “têm bons conhecimentos sobre o cooperativismo, o

objetivo da formação de uma cooperativa e o histórico deste movimento” (Figura 4

– Gráfico 3); apenas 33,33% concordaram com a afirmação “conheço todos os

Princípios Cooperativista e sei como uma cooperativa deve atuar em suas práticas

com base nestes princípios” (Figura 5 – Gráfico 4) e 73,33% dos entrevistados

afirmaram não conhecer o estatuto da cooperativa (Figura 6 – Gráfico 5) .

Por que você decidiu participar de uma cooperativa?

40,00%Subemprego0,00%

13,33%

46,67%

Desemprego

Subemprego

Desejo pessoal

Sugestão de uma empresa

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Figura 4 – Gráfico 3 – Conhecimentos gerais sobre o cooperativismo (Escala de Likert)

Figura 5 – Gráfico 4 – Conhecimentos sobre os Princípios cooperativistas (Escala de Likert)

Assim, percebe-se que boa parte da amostra representante dos

cooperados da Cooperativa X em atuação em Salvador não tem conhecimentos

suficientes sobre a natureza, os benefícios e as obrigações por participarem de

uma iniciativa social tal qual o cooperativismo é definido. Além disso, com esta

análise é possível perceber que a grande maioria do público investigado não sabe

da sua responsabilidade individual e coletiva como membro da cooperativa, nem

das suas devidas atuações neste contexto por desconhecerem o que está

disposto no seu estatuto, que é o documento responsável por reunir os ditames do

Conheço todos os Princípios Cooperativistas e sei como uma cooperativa deve atuar em suas práticas, com base nestes princípios

16,67% 17,31%

15,38%

17,31%

33,33%

Concordo

Concordo parcialmente

Nem concordo nem discordo

Dicordo parcialmente

Discordo

Tenho bons conhecimentos sobre o cooperativismo, o objetivo da formação de uma cooperativa e o histórico deste movimento

13,33%

20,00%

7,69%

25,65%

33,33%

Concordo

Concordo parcialmente

Nem concordo nem discordo

Dicordo parcialmente

Discordo

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funcionamento da cooperativa e dos seus cooperados baseados na legislação

e nos Princípios Cooperativistas.

Através da técnica da observação participante, verificou-se que durante

o processo de adesão dos membros à Cooperativa X em Salvador é aplicado um

teste de informática para que assim seja estabelecida a função do sócio dentro

das especialidades pré-definidas pela cooperativa (digitador, operador, técnico,

programador, analista de sistemas, dentre outras) em conjunto com a análise do

currículo do sujeito que se propõe a tornar-se membro da cooperativa.

Princípio Cooperativista nº2 – Gestão democrática e livre

No caso deste princípio, além das técnicas usadas para a verificação do

primeiro princípio (Entrevista, Questionário, Observação participante), que são

referentes à participação dos sócio-cooperados, o autor também utilizou a Análise

de documentos, para verificar o registro de convocações, atas, pautas de

reuniões, encontros, assembléias da cooperativa em Salvador e da participação

dos seus membros.

Na entrevista à cooperativa, um dos responsáveis pela diretoria da

Cooperativa X em Salvador respondeu que a estrutura funcional da cooperativa

(diretoria, presidência, organograma), a escolha destes gestores, bem como as

políticas de tomadas de decisões pertinentes ao funcionamento da cooperativa

são obtidas nas Assembléias anuais realizadas pela cooperativa. A convocação

para essas assembléias é feita aos cooperados via correio eletrônico e com a

publicação de um comunicado no jornal de maior circulação da cidade, conforme

está disposto no seu estatuto.

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Todas as assembléias e demais processos decisórios da Cooperativa X

são realizados no Rio de Janeiro onde fica localizada a sede da cooperativa. Para

a participação dos cooperados registrados e atuantes em Salvador (e em toas as

outras cidades fora do Rio de Janeiro), são criados “Grupos Seccionais4” onde são

reunidos delegados e procuradores representantes dos cooperados que residem a

mais de 50KM (cinqüenta quilômetros) da sede da cooperativa com tantos votos

quantos sejam os componentes do grupo que o elegeu delegado, conforme está

disposto no estatuto da cooperativa e que foi analisado pelo autor da pesquisa.

Os gráficos abaixo, elaborados a partir da tabulação dos dados obtidos

dos Questionários de Pesquisa, confirmam o desconhecimento dos cooperados de

aspectos importantes para a sua atividade como membros de uma cooperativa,

como a composição da Diretoria e o estatuto da sua cooperativa. A justificativa

dada pelo diretor da cooperativa respondendo à entrevista é que os cooperados

atuantes em Salvador apresentam tradicionalmente pouco interesse em participar

da gestão da cooperativa, mesmo sendo esta participação ativa dos membros nas

atividades decisórias da cooperativa uma das práticas mais importantes para a

caracterização do devido funcionamento de uma cooperativa dentro do que

dispõem os seus Princípios.

4 Conforme estabelece o estatuto da cooperativa, os grupos seccionais serão compostos, exclusivamente, de cooperados no gozo de seus direitos sociais e se constituirão, em caráter permanente, com igual número de componentes.

Você sabe quem compõe a Diretoria da Cooperativa X em Salvador?

25,00%

75,00%

sim

não

Você conhece o estatuto da Cooperativa X?

26,67%

73,33%

sim

não

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Figura 6 – Gráfico 5 – Estatuto da Cooperativa Figura 7 – Gráfico 6 – Diretoria da Cooperativa

Contraditoriamente à falta de interesse ter sido apontada como motivo

para a falta de atuação dos membros no controle da cooperativa, alguns dados –

representados abaixo nos Gráficos 7 e 8 – revelam que 58% informaram nunca

terem sido convocados para reuniões, assembléias e que apenas 25% dos

entrevistados assumiram não ter interesse em participar da gestão da cooperativa

– salientando que esta amostra é composta por cooperados com no mínimo um

ano de associação na referida cooperativa e em atuação no mercado de trabalho

atual como cooperados.

Assim, são representados graficamente abaixo alguns dos dados

respondidos pelos cooperados através de questionários quanto à participação em

assembléias, encontros e na gestão propriamente dita da cooperativa.

Figura 8 – Gráfico 7 – Participação em encontros realizados pela cooperativa

Com que freqüência você participou de assembléias, reuniões, encontros da cooperativa X nos últimos cino anos?

15%

40%

40%

Duas vezes0%

4%

Uma vez

Duas vezes

Três ou mais vezes

Nunca fui convocado

Já fui convocado, mas nuncaparticipei

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Voce acha que tem espaço para sugerir na gestão (controle) da Cooperativa X

Sim12%

Não63%

Não me interesso

25%

Sim

Não

Não me interesso em participarda gestão da cooperativa

Figura 9 – Gráfico 8 – Participação na gestão da cooperativa

Pode ser verificado através da análise dos dados do questionário de

pesquisa representados graficamente acima que, apesar de uma parcela razoável

dos membros reconhecerem não demonstrar interesse em sugerir e participar na

gestão da cooperativa, é quase um consenso que a cooperativa não dá espaço

para o cooperado influenciar na sua gestão.

Quanto à participação dos cooperados observados nesta pesquisa em

encontros da cooperativa, pode-se perceber que a grande maioria nunca

participou de um evento deste tipo, sendo que uma parcela significativa (40%)

sequer foi convocada sendo o local “não era em Salvador” e a “falta de tempo” as

justificativas mais usadas pelos entrevistados para não terem comparecido a

nenhum destes encontros. Segundo a opinião da filial aqui em Salvador, dada em

entrevista, a diretoria já tentou algumas vezes reunir o maior número possível de

membros em reuniões e encontros, mas sempre teve dificuldade em obter um

número significativo de pessoas presentes.

Assim, pode-se perceber que a falta de participação do cooperado na

gestão da filial da cooperativa X em Salvador se dá por falta de conhecimento das

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práticas devidas do cooperativismo e da importância em participar da política

de tomada de decisões da cooperativa, bem como da diretoria da cooperativa que

não se mostra aberta à participação dos seus membros e não fomenta a

divulgação da necessidade de sua participação e de seu conhecimento a respeito

do movimento do cooperativismo. Esta falta de conhecimento percebida entre os

membros da referida cooperativa é de responsabilidade da cooperativa que tem

como obrigação proporcionar a facilidade de acesso, de participação, de sugestão

– em toda a política de tomada de decisões – ao máximo possível a todos os

cooperados como estabelecem todos os padrões e normas definidas como

ditames para o funcionamento correto de uma cooperativa no Brasil.

Durante o período em que o autor analisou as práticas cooperativistas

da referida cooperativa através da observação participante (dez meses), foi

convocado uma vez, por e-mail, para a Assembléia Geral Ordinária anual – com

quinze dias de antecedência – a ser realizada no Rio de Janeiro. O autor da

pesquisa, como membro da cooperativa, não foi convidado ou solicitado para

participar do grupo seccional para representação nem para eleger procuradores

e/ou delegados representativos ao seu voto nesta Assembléia – ou em qualquer

outro encontro por nenhum dos prepostos estabelecidos como representantes da

Diretoria da cooperativa X em Salvador.

Princípio Cooperativista nº 3 – Participação econômica dos membros

Nas práticas cooperativistas relacionadas a este Princípio, a divisão das

sobras dos resultados dos exercícios deve ser de forma igualitária e proporcional

aos membros com base em sua produção de trabalho cooperado. Não deve ser

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percebido qualquer vínculo entre o cooperado na prestação de serviços, nem

com a cooperativa de que faz parte, muito menos com a empresa tomadora de

serviço.

Os trabalhos realizados pelos membros da Cooperativa X atuantes em

Salvador através da terceirização de serviços na área de informática são obtidos e

distribuídos com base em projetos compostos por células, como já foi explicitado

nesta pesquisa. Segundo o diretor da cooperativa entrevistado, a remuneração

aos cooperados é obtida exclusivamente da produção de todo o grupo de

cooperados que faz parte de cada projeto e o critério usado para esta distribuição

é a quantidade de horas trabalhadas por cooperado em cada célula, podendo o

membro atuar em várias células e projetos o quanto for possível pela sua

disponibilidade e competência profissional.

Ainda com base na entrevista, observou-se que as sobras líquidas dos

exercícios nos últimos três anos foram distribuídas proporcionalmente entre todos

os associados da Cooperativa X conforme as suas horas trabalhadas registradas

pela referida cooperativa.

Utilizando-se da técnica de observação participante, o autor pôde

perceber que o processo de remuneração dos membros da cooperativa ocorre em

um contexto bem parecido com o que é estabelecido normalmente na relação

tradicional entre empresa e empregado com, inclusive, utilização inadequada de

termos tais quais “salário” e “contra-cheque” – pelos cooperados e pela própria

cooperativa, através de seus representantes.

Vários motivos podem ser atribuídos a esta atuação indevida percebida,

todavia a análise obtida da observação participante e até mesmo de alguns outros

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itens dos dados dos questionários denota que este fenômeno está mais

relacionado com a falta de conhecimento do público alvo desta pesquisa quanto

aos pressupostos – origem, objetivos, normas, funções – do movimento do

cooperativismo ao qual os membros de uma cooperativa são parte integrante.

Foi percebida, também na observação participante, uma espécie de

vínculo entre o cooperado e a empresa tomadora do seu serviço terceirizado, pois

é de responsabilidade da empresa o controle e registro da entrada e saída dos

“funcionários” cooperados – hierarquicamente – sendo este registro o critério

usado para a contabilização da produção e para a remuneração dos cooperados

ao final de cada exercício mensal; contrariando, assim a citada lei nº 5764/71.

Princípio Cooperativista nº 4 – Autonomia e independência

A relação entre a cooperativa e seus clientes/parceiros, segundo o

posicionamento da cooperativa através de um dos seus diretores, é de total

autonomia e independência na obtenção dos trabalhos, na distribuição e na

discussão do melhor preço pago pela produção aos trabalhadores cooperados por

hora trabalhada. Outro aspecto relevante na autonomia percebida na atuação da

Cooperativa X é a experiência e a valorização do nome desta cooperativa no

mercado de trabalho associado, por tratar-se de uma cooperativa de profissionais

de informática com mais de 20 mil cooperados registrados em todo o Brasil

atuando há 25 anos, com negócios e agentes no Brasil e no exterior.

O diretor da Cooperativa X afirmou que após participar ativamente da

discussão quanto aos trabalhos, projetos e preço da remuneração aos cooperados

– tal qual uma “representação jurídica que trabalha em nome dos seus

associados” – todas as outras atividades envolvidas nas relações entre o

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cooperado e a empresa tomadora de serviço terceirizado de informática são

de responsabilidade da empresa tais quais: políticas de Recursos Humanos;

controle das horas trabalhadas dos cooperados com determinação prévia de

horário de entrada e saída; avaliação da qualidade do serviço prestado, bem como

da qualidade do “funcionário” cooperado nas atividades da empresa.

A análise destas informações da entrevista permite perceber mais uma

vez a caracterização de relação formal – de empresa e empregado na atuação da

Cooperativa X em Salvador – com relação aos serviços prestados pelos seus

membros em uma empresa numa das suas práticas cooperativistas, contrariando

as normas e regras estabelecidas como padrões de funcionamento de uma

cooperativa no mercado de trabalho associado.

A análise dos contratos estabelecidos entre a filial da Cooperativa X em

Salvador e os clientes/parceiros, como já foi citado anteriormente na metodologia;

não foi concluída com êxito, pois o autor da pesquisa não teve acesso à leitura

aprofundada destes contratos, apenas obteve a informação – por um dos

representantes da diretoria da cooperativa – de que estes termos eram elaborados

com base nos pressupostos do estatuto da cooperativa e nas primícias da

legislação cooperativista brasileira vigente, sempre com a preocupação de afirmar

a autonomia da cooperativa no mercado de trabalho associado.

Princípio Cooperativista nº 5 – Educação, formação e informação

As cooperativas devem promover a educação e formação dos seus

membros, para que eles possam atuar de forma eficaz para o desenvolvimento

das suas cooperativas. No caso específico das cooperativas de trabalho, esta

formação está diretamente relacionada com a qualificação profissional dos

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cooperados em sua área de atuação. No que diz respeito à educação e

formação, as cooperativas; com base neste Princípio, devem educar os seus

membros e incentivá-los a divulgar os benefícios e os fundamentos do movimento

do cooperativismo ao público em geral.

Com base nas respostas dos cooperados aos questionários de

pesquisa percebe-se que apenas 20% (Figura 10 – Gráfico 09) indicaram a

Cooperativa X como a principal responsável pelo pagamento e/ou incentivo à sua

formação, especialização e qualificação profissional. A análise destes dados em

conjunto com a observação participante permite inferir que nos últimos anos não

tem sido prioridade para a filial da Cooperativa X em Salvador o investimento dos

resultados financeiros produzidos pelos associados na formação dos mesmos, ou

que os cooperados não fazem uso dos serviços da cooperativa em qualificação e

especialização profissional; verificando-se, assim, um número significativo de

membros que buscam outras alternativas para obter atualização profissional em

sua área de atuação.

Figura 10 – Gráfico 9 – Qualificação profissional (responsável)

Ultimamente, quem tem sido o principal responsável pelo pagamento e incentivo à sua formação profissional

Você mesmo47%

Iniciativa privada

20%

Sociedade (ONGs)

0%

A Cooperativa de trabalho

20%

Governo13%

Você mesmo

Governo

Sociedade (ONGs)

A Cooperativa de trabalho

Iniciativa privada

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Salientando que, conforme informação da diretoria da cooperativa, a

destinação das sobras dos resultados de cada exercício é definida nas

Assembléias, as quais os cooperados atuantes em Salvador não têm participação

significativa como fora explicitado na análise do Princípio cooperativista nº2.

Em resposta à já citada entrevista, um dos responsáveis pela diretoria

da cooperativa aqui, em Salvador, informou que a referida cooperativa

disponibiliza várias possibilidade de incentivo a cursos de especialização e

profissionalização, através de parcerias, convênios, promoções e, até mesmo,

bolsas completas em várias instituições não só de ensino e qualificação

profissional, como também de planos de saúde e entretenimento. Ainda como

resposta à entrevista, foi afirmado que a cooperativa pode financiar parcialmente e

até integralmente cursos de pós-graduação, mestrado, MBA, na área de

informática (ramo de atuação da cooperativa), tendo o entrevistado sido –

segundo o próprio – beneficiário de um financiamento deste tipo. Não ficou claro

na entrevista quais são os critérios estabelecidos pela cooperativa para a

promoção destes benefícios.

Durante o período de observação participante, o autor não percebeu

interesse dos responsáveis pela gestão (diretoria) da filial da cooperativa em

Salvador em financiar e/ou incentivar os seus membros à sua formação,

especialização e qualificação profissional. Além disso, o autor confirmou a

existência de parcerias e convênios com as instituições de educação, saúde,

lazer, comércio disponibilizados em sua página na internet. Porém, não foi

percebido, também conforme esta análise, iniciativas significativas entre os

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membros observados em requerer este tipo de incentivo e investimento na

própria qualificação profissional junto aos diretores da Cooperativa.

Quanto à divulgação do movimento do cooperativismo pela filial da

Cooperativa X em Salvador, não foi verificado, em nenhuma das técnicas de

pesquisa utilizadas, participação significativa da referida cooperativa nesta

divulgação até mesmo confirmada pela sua diretoria que afirmou não ter a

cooperativa tradição de participar da informação à sociedade sobre a natureza e

as vantagens do cooperativismo.

Realmente, as cooperativas de trabalho, em suas práticas

cooperativistas, não são as maiores divulgadoras do movimento do

cooperativismo na sociedade e comunidade de que fazem parte. Esta função

normalmente cabe às cooperativas mais relacionadas à economia solidária com

ideais assistencialistas, sociais e solidários por natureza.

Princípio Cooperativista nº 6 – Intercooperação

As cooperativas podem se reunir em grupos a fim de que possam

trabalhar em conjunto fortalecendo o movimento do cooperativismo, melhor

servindo aos seus cooperados como uma representação jurídica dos mesmos. No

caso específico do cooperativismo de trabalho, as federações, centrais e

confederações de cooperativas podem dar mais força às sociedades reunidas no

mercado de trabalho e poder de negociação de preços da remuneração dos

trabalhadores cooperados, bem como na obtenção e distribuição dos trabalhos de

prestação de serviços podendo concorrer com empresas privadas estabelecidas e

fortalecidas pelos programas de marketing no mercado de trabalho.

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A cooperativa X é registrada Federação das Cooperativas de

Trabalho (FETRABALHO), que representa as cooperativas de trabalho junto aos

órgãos públicos e privados e tem como finalidade buscar maiores benefícios, lutar

por uma legislação adequada, regulamentar o ramo, coibir perseguições e

desenvolver novos negócios, promovendo a intercooperação entre as suas

filiadas. Esta instituição fortalece a cooperativa e ajuda a garantir a sua autonomia

no mercado de trabalho, representando-a junto aos órgãos públicos e privados e

objetiva para proporcionar os melhores serviços aos associados na distribuição e

obtenção dos trabalhos organizados por projetos.

Princípio Cooperativista nº 7 – Interesse pela comunidade

As cooperativas devem trabalhar para o desenvolvimento das suas

comunidades, através de ações sociais, econômicas e fomento à geração,

distribuição e autogestão do trabalho e renda.

Na entrevista o Coordenador de Projetos da filial da Cooperativa X em

Salvador afirmou que normalmente a referida cooperativa tem ações isoladas em

todo o Brasil de atividades sociais voltadas para a comunidade em que está

inserida. No caso específico da representação aqui em Salvador, ultimamente ela

participou como parceira de um evento organizado por uma cooperativa do ramo

de operadoras de planos de saúde com a participação de outras cooperativas de

Salvador, para a divulgação da prática da atividade física como hábito entre as

pessoas contra o sedentarismo, a fim de obter melhores condições de saúde e

vida.

Aspectos Legais

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Os aspectos legais essenciais para o reconhecimento jurídico de

qualquer cooperativa em funcionamento no Brasil, conforme a legislação

cooperativista brasileira, a serem observados na técnica de Análise de

Documentos (registro na Junta Comercial, no Ministério da Fazenda e obter CNPJ,

possuir cadastro dos cooperados como contribuintes do INSS e ter a

documentação de todos os associados cooperados como sócios) foram conferidos

durante o desenvolvimento da referida técnica de pesquisa tendo sido cumpridos

em sua quase totalidade, já que apenas o cadastro dos associados estava

desatualizado quanto à quantidade de membros em atuação.

6. CONCLUSÃO

Com base na análise da fundamentação conceitual e teórica e das

informações e dados obtidos da aplicação das técnicas de pesquisa de campo

como ferramentas de observação direta, nos é permitido concluir que a referida

cooperativa – uma cooperativa de profissionais de informática – em sua filial em

Salvador, não cumpre todos os Princípios Cooperativistas em suas práticas e

atividades cooperativistas. Foi verificado, então, que a maioria dos Princípios

Cooperativistas não é cumprida em sua totalidade: Adesão voluntária; Gestão

democrática; Participação econômica; Educação, formação e informação.

Na adesão dos trabalhadores à Cooperativa X, percebemos que os

cooperados não têm conhecimento de se tratar de uma cooperativa com suas

primícias de autogestão, distribuição e controle da sua força de trabalho e renda,

sendo normalmente motivados a essa filiação pela sugestão de uma empresa

tomadora de serviço. Ainda neste processo, o cooperado normalmente não tem

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acesso ao estatuto da cooperativa, o que se constitui numa falha grave, já

que, conforme determinam os padrões do legítimo funcionamento de uma

cooperativa, todos os associados devem conhecer e ter a cópia do estatuto e

regimento interno da cooperativa.

Dessa forma, na associação à Cooperativa X, normalmente fica para o

associado uma falsa impressão de se tratar de mais uma relação formal de

trabalho entre empresa e empregado sem as proteções sociais, patronais,

salariais e vínculos empregatícios, características inerentes desta forma tradicional

de contratação e produção de trabalho do capitalismo.

Este fenômeno ocorre pela falta de interesse da cooperativa em

informar ao seu novo membro da sua natureza, funções, objetivos, origens e do

caráter de iniciativa social tal qual o cooperativismo é caracterizado e desinteresse

também do cooperado em tomar a iniciativa da busca por entender os ditames e

pressupostos da associação em que acaba de se filiar e ser parte integrante de

um movimento maior que a abrange.

Na gestão da cooperativa, objeto deste estudo de caso é que se tem

registro do mais significativo descumprimento dos parâmetros do devido

funcionamento de uma cooperativa, já explicitados. Neste caso, a grande maioria

não conhece o estatuto da cooperativa nem a composição de sua diretoria,

significando; dessa forma, que não tem nenhum acesso às decisões e interesses

da cooperativa em suas atividades, além da insignificante participação destes

membros nas assembléias e demais encontros.

No caso do descumprimento deste Princípio, o maior problema é de

ordem geográfica, pois toda a política de tomada de decisões da referida

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cooperativa é votada decidida e em sua sede localizada na cidade do Rio de

Janeiro, impossibilitando, assim, a presença e a participação dos cooperados da

filial em Salvador mesmo quando convocados para estes encontros. Para nossa

análise, a solução para esta prática incoerente do cooperativismo seria a

implantação de uma cooperativa independente nesta cidade devido à demanda e

potencialidade dos serviços cooperados prestados aqui ou estabelecimento de

representações realmente significativas dos cooperados atuantes em Salvador.

Porém, apesar da Cooperativa X em Salvador não oferecer abertura

para participação na discussão de atividades, práticas e diretrizes, discussão dos

preços de trabalho, contratos de parcerias, mais uma vez foi percebido

desinteresse por parte dos associados desta vez em participar da gestão da

cooperativa, por vários motivos tais quais a ignorância, o comodismo, a precaução

até a necessidade imposta pelo contexto atual do mundo do trabalho de

desemprego e falta alternativas para esta situação.

Por se tratar de uma cooperativa de trabalho de profissionais de

informática, a qualificação e atualização profissional dos associados deve ser

constante. É neste contexto que verificamos nesta análise o não cumprimento do

Princípio da Educação, formação e informação em sua totalidade, pois apenas

uma pequena parcela atribuiu à referida cooperativa de trabalho a

responsabilidade pela sua especialização profissional. Todavia, percebemos que é

disponibilizada pela diretoria da Cooperativa X em Salvador uma série de

possibilidades de convênios e até mesmo bolsas de incentivo a esta

especialização faltando uma maior divulgação destas possibilidades aos

cooperados e maior abertura da cooperativa com os seus sócio-cooperados para

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que estes tenha acesso a estas e demais informações pertinentes ao seu

trabalho cooperado.

Quanto ao aspecto da informação e divulgação do movimento do

cooperativismo também tratado neste Princípio, não existe, por parte da

Cooperativa X, nenhuma prática definida de divulgação e informação à sociedade

sobre os benefícios e a natureza do movimento cooperativismo tal qual uma

iniciativa social e de acesso a todos, verificando; assim; um descumprimento desta

norma de funcionamento em uma de suas práticas cooperativistas. Normalmente,

porém, no mercado de trabalho associado, não é prática freqüente das

cooperativas de trabalho serem as maiores divulgadoras do cooperativismo

ficando esta função comumente para as cooperativas solidárias, sociais,

assistencialistas, por natureza.

No caso dos princípios da Intercooperação e do Interesse pela

comunidade, a cooperativa vem atuando de forma satisfatória quanto ao que é

definido pelas primícias destes Princípios em suas práticas cooperativistas.

Quanto à legislação cooperativista brasileira vigente, todos os

documentos referentes aos aspectos legais, conforme descritos na Metodologia,

foram conferidos, sendo a cooperativa registrada, também, na FETRABALHO,

como fora explicitado no tópico “Resultados e análise”.

Os motivos para o descumprimento ou o cumprimento “parcial” dos

Princípios Cooperativistas pela cooperativa X em Salvador são basicamente a

falta de interesse maior da cooperativa em atuar na prática conforme os padrões

definidos pelos Princípios; a limitação da condição de filial de uma sede localizada

em outro estado dificultando o cumprimento de algumas destas normas, a falta de

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conhecimento dos cooperados quanto ao devido funcionamento de uma

cooperativa (por falta de divulgação da própria cooperativa); a falta de interesse

dos cooperados em buscar entender e conhecer os pressupostos e normas

definidos neste movimento; bem como o contexto atual de desemprego,

subemprego, precarização do trabalho que pode inibir os cooperados de tentar

questionar ou solicitar mais representatividade no controle da cooperativa.

Enfim, após a análise dos dados e informações citadas e explicitadas

no decorrer deste trabalho, podemos afirmar que a Cooperativa X pode ser

definida como uma “falsa cooperativa”, porém não é possível afirmar o interesse

proposital pelo uso espúrio do movimento do cooperativismo, tratando-se de uma

empresa “camuflada” de cooperativa a fim de obter as citadas vantagens

competitivas e sociais, porque os dados são insuficientes para afirmar este intuito

de burlar a legislação e não contundentes juridicamente e também por não ser

este o interesse de pesquisa que é analítico e não investigativo ou de denúncia.

Esta caracterização foi percebida sim pelo descumprimento de alguns

dos Princípios Cooperativistas de uma forma em que podem entrar em

conformidade através de mudanças de atitudes e práticas tais como: uma maior

divulgação aos cooperados sobre a natureza do movimento do cooperativismo,

maior participação (iniciativa de um modo geral) dos associados, maior

possibilidade de participação dos cooperados cedida pela cooperativa, bem como

investimento na qualificação profissional dos trabalhadores cooperados da

Cooperativa X em Salvador.

Faz-se necessário ressaltar as limitações inerentes a um trabalho

científico em forma de estudo de caso, por tratar-se de uma realidade

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representada por uma determinada amostra inserida em um contexto

específico e predeterminado. Com base nestas limitações, o autor da pesquisa

sugere novos estudos com base na verificação dos Princípios Cooperativistas em

cooperativas de trabalho em atuação em Salvador, notadamente nas cooperativas

que apresentam relações de filiais e matriz localizadas em outro estado, ou

cidade, para que possam ser percebidas (ou não) as mesmas peculiaridades

identificadas neste estudo proporcionando, assim, mais referência a este tema.

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APÊNDICE

APÊNDICE A – Questionário de Pesquisa Solicito ao Senhor (a) a gentileza de responder a este questionário de pesquisa, referente a um trabalho monográfico do Curso de Administração do CEFET/BA. Este questionário é de caráter analítico, seu resultado será usado apenas para fins de pesquisa e não é necessária identificação. Desde já agradeço a sua colaboração. Dados Pessoais Idade: ( )18 a 25 ( )26 a 35 ( )36 a 45 ( )46 a 55 ( )mais de 56 Sexo: ( ) M ( )F Estado Civil: ( )Solteiro ( )Casado ( )Outros Escolaridade: ( ) Fundamental ( ) 2º Grau incompleto ( ) 2º Grau completo ( ) Superior incompleto ( ) Superior completo

( ) Pós-graduação / mestrado Dados Profissionais 01) Além desta Cooperativa, você fez ou faz parte de outra Cooperativa? ( ) Não ( ) Sim. Caso sim, qual:__________________________________________

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02) Há quanto tempo você faz parte da atual Cooperativa? ( ) 1 Ano ou menos ( ) 2 Anos ( ) 3 Anos ( ) 4 Anos ( ) 5 Anos ( ) 6 Anos ou mais 03) Como você tomou conhecimento da Cooperativa? ( ) Amigos ( ) Jornais, revistas ( ) Internet ( ) Indicação de uma empresa ( ) Outro:_______________________________________ 04) Por que você decidiu participar de uma cooperativa? ( ) Desemprego ( ) Subemprego ( ) Desejo pessoal ( ) Sugestão de uma empresa Informações e conhecimentos sobre a cooperativa e o cooperativismo 05) Você participou da fundação da cooperativa? ( ) Sim ( ) Não 06) Você sabe qual é o endereço da sua cooperativa? ( ) Sim ( ) Não 07) Você conhece o estatuto da cooperativa? ( ) Sim ( ) Não 08) Você sabe quem compõe a Diretoria da Cooperativa? ( ) Sim ( ) Não 09) Marque, na escala a seguir, sobre a sua posição quanto às seguintes afirmativas: ?? Tenho bons conhecimentos sobre o cooperativismo, o objetivo da formação de uma

cooperativa e o histórico deste movimento: ( ) Concordo ( )Concordo Parcialmente ( )Nem concordo nem discordo ( )Discordo parcialmente ( )Discordo ?? Conheço todos os Princípios Cooperativistas e sei como uma cooperativa deve atuar em

suas atividades e práticas com base nestes princípios: ( )Concordo ( )Concordo Parcialmente ( )Nem concordo nem discordo ( )Discordo parcialmente ( )Discordo Práticas Cooperativistas 10) Com que freqüência você participou de assembléias, reuniões, encontros da cooperativa nos últimos cinco anos? ( ) Cinco ou mais vezes ( ) Quatro vezes ( ) Três vezes ( ) Duas vezes ( ) Nunca fui convocado ( ) Já fui convocado, mas nunca participei. Porque:_______________________ 11) Como você se atualiza em sua área de trabalho?

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( ) Faço cursos de especialização e formação e estou atualizado. ( ) Não fiz cursos ultimamente, mas me considero atualizado na minha atividade profissional. ( ) Estou desatualizado, mas pretendo melhorar minha qualificação profissional o quanto antes. ( ) Estou desatualizado e não considero este aspecto um problema na minha atividade profissional. 12) Ultimamente, quem tem sido o principal responsável pelo custeio (pagamento) e incentivo à sua formação e especialização, profissional?. ( ) Você mesmo ( ) Governo (organizações institucionais, cursos públicos, iniciativa social). ( ) Sociedade( Organizações não-governamentais, outros empreendimentos solidários). ( ) A Cooperativa de trabalho de que você faz parte. ( ) Família (pais, maridos, esposas, parentes próximos, amigos). ( ) Iniciativa privada (empresas através de parcerias, bolsas. 13) Você acha que tem espaço para sugerir na gestão da cooperativa? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não me interesso em participar da gestão da cooperativa APÊNDICE B – Roteiro de Entrevista à Cooperativa Esta entrevista é parte de uma pesquisa de campo. É um trabalho acadêmico, analítico e restrito ao estudo a que se propõe. Agradeço à Cooperativa pela colaboração ao responder a esta entrevista. O autor. MAURÍCIO SANTOS DA SILVA COOPERATIVA:_____________________________________________________ ENTREVISTADO(A):_________________________________________________ FUNÇÃO:___________________________________________________________ TEMPO NA COOPERATIVA:__________________________________________ 1- Como e quando começou a Cooperativa, o entrevistado participou da fundação e por que montou uma cooperativa de trabalho? 2- A cooperativa faz parte de alguma associação com outras cooperativas tais como Federações e Confederações? 3-Dados dos cooperados: quantidade, quantidade em atuação, remuneração média, qualificação profissional, nível de escolaridade. 4- Como, normalmente, se dá o processo de adesão à cooperativa?

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5- Ainda quanto aos cooperados, na média, quantos participam das Assembléias, encontros e outras reuniões? 6- Como são obtidos as demandas de trabalhos pela cooperativa e como funciona a relação entre a cooperativa e seus parceiros/clientes? 7- Qual é a destinação das sobras? 8- Como é que funciona a distribuição do trabalho entre os cooperados? 09- Como é a estrutura funcional da cooperativa (diretoria, presidência, organograma) e como estes gestores são escolhidos? 10- Qual é a participação desta cooperativa na qualificação profissional dos seus membros? 11- Ultimamente a cooperativa têm participado e/ou idealizado parcerias e ações com a comunidade a qual faz parte? 12- Outras solicitações e informações que ocorrerem.