Mauro Sayar - Rebaixamento - Valor 03 Abril 2014

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A14 | Valor | Quinta-feira, 3 de abril de 2014 Opinião Redução na classificação de risco apenas ratificou uma visão que já estava precificada. Por Mauro Sayar Ferreira No rebaixamento, ‘junk numbers’ e inconsistências Governo mostrou um retrato viesado, com números duvidosos, que não revela o roteiro para o futuro N o dia 24 de março, a agência de classifica- ção de risco Standard & Poor’s (S&P) rebai- xou a nota de crédito do gover- no federal de BBB para BBB-, me- nor nível para que o país mante- nha o grau de investimento pe- los critérios da S&P. Dada a evo- lução de outros indicadores so- bre o risco soberano, pode-se di- zer que o rebaixamento chance- lou uma situação que já se deli- neava ao longo de 2013. Tomemos, como exemplo, o risco soberano medido pelo Em- bi (do JP MorganChase). A média do Embi Brasil (Embi BR+) em ja- neiro de 2013 foi de 146 pontos bases, indicando que, em média, um investidor demandaria 1,46 pontos percentuais de juros ape- nas para cobrir o risco de calote de um título do governo brasilei- ro, já negociado em dólar. Em ja- neiro de 2014 o EMBI foi de 253. É verdade que a elevação ocor- reu em praticamente todos os emergentes em virtude de riscos globais, mas o risco Brasil subiu mais. Em janeiro de 2013, o Em- biBR+ foi 17% superior ao do Mé- xico, 33% ao do Peru e 28% ao da Colômbia. Já em janeiro de 2014, o risco Brasil foi 45% superior ao do México, 43% ao do Peru e 35% ao da Colômbia. O Credit Default Swap (CDS), espécie de seguro para cobrir si- nistros, nesse caso um calote, conta história similar. Em janeiro de 2013, a média do CDS de títu- los do governo brasileiro foi 122, contra 100 do México, 97 do Peru e 98 da Colômbia. Em janeiro de 2014 o CDS para o Brasil foi de 198, contra 100 do México, 135 do Peru e 125 da Colômbia. Como se vê, a redução na clas- sificação de risco pela Standard and Poor’s apenas ratificou uma visão que já estava precificada. Tanto é verdade que a taxa de câmbio nem mesmo se desvalo- rizou após tal anúncio. A desva- lorização foi ocorrendo ao longo de 2013, na medida em que o ris- co Brasil subia. No comunicado, a S&P expli- cou os motivos do rebaixamen- to. É mencionada a ampliação no déficit do setor público, fruto de redução da meta de superávit primário. Enfatiza a perda de credibilidade na condução orça- mentária, fruto da exclusão, ao longo dos anos, de vários itens de despesa do esforço das metas fiscais. Também é citada a cres- cente necessidade de práticas “não usuais”, como antecipação de receitas e postergação de des- pesas, para garantir o cumpri- mento das metas. Os técnicos responsáveis pela nota deixaram explícito o incômo- do com a falta de transparência nos dados fiscais e com as perspec- tivas para a economia brasileira. Tendo em vista a evolução do risco Brasil e o comunicado da S&P, seria esperada do governo uma resposta capaz de reforçar o compromisso com a meta fis- cal já estabelecida, indicando que será construída com bastan- te clareza, sem malabarismos contábeis. Seria a hora de mais bom senso e de não brigar com fatos e números. Causou, assim, surpresa (por um olhar puramente técnico) a nota para a imprensa do Ministé- rio da Fazenda (MF), divulgada em 24 de março. Em vez da postu- ra humilde, tentaram desqualifi- car a decisão de rebaixamento, taxando-a de “inconsistente com as condições da economia brasi- leira”. Utilizaram vários indica- dores, de forma pouco rigorosa, para tentar mostrar tal “inconsis- tência”. Eis alguns exemplos: A nota menciona que o investi- mento estrangeiro direto (IED) acumulou US$ 65,8 bilhões nos 12 meses encerrados em feverei- ro de 2014. Trata-se realmente de um belo retrato, condizente com uma economia que ainda oferece excelentes oportunidades de in- vestimento. Mas o filme mostra que o IED está, na melhor das hi- póteses, estagnado há três anos: US$ 66,6 bilhões em 2011, US$ 65,3 bilhões em 2012 e US$ 64 bilhões em 2013. Pior ainda, o declínio em rela- ção aos resultados nas transações correntes (TC) do balanço de pa- gamento foi incrivelmente gran- de. Em 2011, o IED era 27% supe- rior ao déficit em TC, terminou 2012 20% maior e, em 2013, foi 22% inferior. Esses números indi- cam que, enquanto em 2011 e 2012 a entrada de IED mais que compensou os resultados negati- vos em TC, em 2013 não foi capaz de financiar o déficit em TC. Segundo o Boletim Focus de 21 de março, a mediana das ex- pectativas aponta para um IED de US$ 55,8 bilhões em 2014 e um déficit em transações corren- tes de US$ 75 bilhões. Com isso, o IED fecharia o ano atual 26% infe- rior ao déficit em TC. Esses valo- res também não sugerem incon- sistência no rebaixamento. A nota do MF também mencio- na que a taxa de crescimento acumulada, desde a crise de 2008, foi de 17,8%. Contudo, o que interessa para avaliação de risco é o desempenho futuro. O passado recente pode até servir para prospecções, principalmen- te quando ocorrem mudanças, como a adoção de uma “nova matriz econômica”, e há tempo suficiente para avaliar os resulta- dos delas. Nesse sentido, o cresci- mento médio anual de 2,01%, en- tre 2011 e 2013, não indica que os analistas da S&P tenham sido inconsistentes. Até porque o me- nor crescimento resultará em menos arrecadação. Ainda que pudéssemos utilizar o desempenho acumulado do PIB, desde a crise de 2008, como boa re- ferência para construir cenários prospectivos, causou-me perplexi- dade o número apresentado pela nota oficial do MF. Isso porque 17,8% não é o crescimento acumu- lado do PIB desde a crise, mas sim quanto o PIB do 4 o trimestre de 2013 foi superior ao do 4 o trimes- tre de 2007. O crescimento acumu- lado do PIB do 3 o trimestre de 2008 ao 4 o de 2013 é 15,7%. O Mi- nistério da Fazenda computou de forma equivocada a taxa de cresci- mento acumulada. Mesmo que o cálculo estivesse correto, a base de comparação parece ter sido meticulosamente escolhida para inflar o resultado apresentado. Se tivessem com- parado o 4 o trimestre de 2013 com o 2 o de 2008 (usando índi- ces com ajuste sazonais e a ra- cionalidade para achar 17,8%), encontrariam 14%. O Ministério da Fazenda perdeu excelente oportunidade de mos- trar que o cenário prospectivo será diferente. Preferiu apresentar um retrato que em nada fala sobre o filme dos últimos anos e tampou- co revela o roteiro para o futuro. Mauro Sayar Ferreira. , professor de economia da UFMG, é PhD pela Universidade de Illinois e mestre pela USP. Trabalhou no FMI em 2004. Jornal econômico de circulação nacional, publicado desde 2 de maio de 2000 pela Valor Econômico S.A. GETTY IMAGES Duas cláusulas não encerram todo o mistério de Pasadena O s detalhes que surgem sobre a compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras tornam cada vez menos provável a hipótese de que tenha ocorrido um erro de avaliação empresarial. O fato básico é conhecido. Uma refinaria em Pasadena, adquirida pela Petrobras, terminou custando à estatal, depois de negociações obscuras e ainda não totalmente conhecidas, nada menos de US$ 1,18 bilhão, quando seus antigos donos a obtiveram por US$ 42,5 milhões. O fato de a presidente Dilma Rousseff, então presidente do Conselho de Administração, desconhecer cláusulas importantes do contrato de aquisição dos 50% iniciais, com base em um resumo de duas páginas e meio da transação, pode ser uma falha pessoal, mas é possível que não houvesse interesse em que a operação fosse examinada em seus detalhes. Há muito mais mistério nesse negócio do que as duas cláusulas que quase ninguém viu, exceto os envolvidos diretamente no assunto — o presidente da Petrobras, José Gabrielli, seu diretor da área internacional, Nestor Cerveró e o diretor de Abastecimento, Paulo Roberto Costa. Mesmo após a presidente Dilma avaliar que foi induzida a erro, com atraso de oito anos, a Petrobras só agora instalou uma comissão formal para investigar o caso. Um dos enigmas que as investigações do Ministério Público, do Tribunal de Contas da União e uma eventual Comissão Parlamentar de Inquérito podem ajudar a desvendar é o diligente esforço de diretores da Petrobras, especialmente Nestor Cerveró, para assegurar que a nova sócia, a Astra, tivesse ganhos garantidos e nenhum risco corresse, mesmo que o empreendimento não fosse bem sucedido. Concessões sempre ocorrem para que se realizem grandes negócios. No caso, o negócio se revelou péssimo e só uma parte cedeu tudo. Investigação da Comissão de Valores Mobiliários revelada pelo Valor aponta que a avaliação dos 50% restantes da refinaria que a Petrobras pretendia arrematar foi feita em menos de duas semanas pela Muse Stancil. A Petrobras pagou US$ 190 milhões pela primeira metade, indicando que a instalação de Pasadena valia US$ 380 milhões, embora a Astra tivesse dela se apoderado um ano antes por quase um décimo do valor, US$ 42,5 milhões. A Muse, nesse exíguo espaço de tempo, traçou vários cenários, onde se materializou o milagre da valorização. No fim de 2007, pouco mais de um ano após a Petrobras ter entrado como sócia, a refinaria já valia entre US$ 582 milhões e US$ 3,5 bilhões — de 13 a 82 vezes o valor pago pela Astra. Se saísse do negócio, a Astra já teria ganho na loteria e se ficasse, se sairia bem. Com a concordância da diretoria anterior da Petrobras, ela pendurou no contrato o retorno garantido de 6,9% se os investimentos para conversão a óleo pesado da refinaria não desse certo. Obteve o direito a um prêmio de 20% sobre o valor pago pela primeira metade, caso deixasse a sociedade. Uma cláusula “put” obrigava a Petrobras a comprar sua parte por pelo menos esse preço, em caso de desavença de orientação entre os sócios. Os sócios tinham uma trading para compra de combustível para a refinaria e nela a Astra ganhou o direito de ter uma “alocação especial” de US$ 172 milhões. No processo, representante da Astra explica que esse valor é um “pagamento garantido” se a receita da trading ficar abaixo de um determinado nível (“O Estado de S. Paulo”, 31 de março). Ou seja, a Astra tinha ganhos assegurados, independentemente do rumo que o negócio tomasse. Há mais. No fim de 2007, Cerveró apresentou proposta de acordo de compra, segundo ele preliminar, da metade restante da refinaria por US$ 785 milhões (Valor , 25 de março). O valor surpreendeu até mesmo os donos da Astra. O presidente da empresa nos EUA, Mike Winger, escreveu pouco antes a um diretor, segundo autos do processo, que “não ficaria surpreso se a Petrobras já tivesse se dado conta que a refinaria não vale os US$ 650 milhões que eles sinalizaram”. (“Folha de S. Paulo”, 29 de março). Com o negócio fulminado pelo Conselho de Administração em maio de 2008, o litígio judicial começou em junho, com a Astra exigindo o pagamento oferecido pela Petrobras, sob argumento de que o acordo proposto era definitivo. A Astra levou quase tudo que queria. Para José Gabrielli, presidente da Petrobras, o negócio à época não foi ruim e nada de anormal. Só investigações sérias poderão indicar se um negócio tão ruinoso deu um bom dinheiro apenas aos donos da Astra. 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Rebaixamento

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Jornal Valor --- Página 14 da edição "03/04/2014 1a CAD A" ---- Impressa por rcalheiros às 02/04/2014@19:54:49

A14 | Valor | Quinta-feira, 3 de abril de 20 14

Enxerto

Jornal Valor Econômico - CAD A - BRASIL - 3/4/2014 (19:54) - Página 14- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Opinião

Redução na classificação de risco apenas ratificou umavisão que já estava precificada. Por Mauro Sayar Ferreira

No rebaixamento, ‘junknumbers’ e inconsistências

Governo mostrou umretrato viesado, comnúmeros duvidosos, quenão revela o roteiropara o futuro

No dia 24 de março, aagência de classifica-ção de risco Standard& Poor’s (S&P) rebai-

xou a nota de crédito do gover-no federal de BBB para BBB-, me-nor nível para que o país mante-nha o grau de investimento pe-los critérios da S&P. Dada a evo-lução de outros indicadores so-bre o risco soberano, pode-se di-zer que o rebaixamento chance-lou uma situação que já se deli-neava ao longo de 2013.

Tomemos, como exemplo, orisco soberano medido pelo Em-bi (do JP MorganChase). A médiado Embi Brasil (Embi BR+) em ja-neiro de 2013 foi de 146 pontosbases, indicando que, em média,um investidor demandaria 1,46pontos percentuais de juros ape-nas para cobrir o risco de calotede um título do governo brasilei-ro, já negociado em dólar. Em ja-neiro de 2014 o EMBI foi de 253.

É verdade que a elevação ocor-reu em praticamente todos osemergentes em virtude de riscosglobais, mas o risco Brasil subiumais. Em janeiro de 2013, o Em-biBR+ foi 17% superior ao do Mé-xico, 33% ao do Peru e 28% ao daColômbia. Já em janeiro de 2014,o risco Brasil foi 45% superior aodo México, 43% ao do Peru e 35%ao da Colômbia.

O Credit Default Swap (CDS),espécie de seguro para cobrir si-nistros, nesse caso um calote,conta história similar. Em janeirode 2013, a média do CDS de títu-los do governo brasileiro foi 122,contra 100 do México, 97 do Perue 98 da Colômbia. Em janeiro de2014 o CDS para o Brasil foi de198, contra 100 do México, 135do Peru e 125 da Colômbia.

Como se vê, a redução na clas-sificação de risco pela Standardand Poor’s apenas ratificou umavisão que já estava precificada.Tanto é verdade que a taxa decâmbio nem mesmo se desvalo-rizou após tal anúncio. A desva-lorização foi ocorrendo ao longode 2013, na medida em que o ris-co Brasil subia.

No comunicado, a S&P expli-cou os motivos do rebaixamen-to. É mencionada a ampliaçãono déficit do setor público, frutode redução da meta de superávitprimário. Enfatiza a perda decredibilidade na condução orça-mentária, fruto da exclusão, aolongo dos anos, de vários itensde despesa do esforço das metasfiscais. Também é citada a cres-

cente necessidade de práticas“não usuais”, como antecipaçãode receitas e postergação de des-pesas, para garantir o cumpri-mento das metas.

Os técnicos responsáveis pelanota deixaram explícito o incômo-do com a falta de transparêncianos dados fiscais e com as perspec-tivas para a economia brasileira.

Tendo em vista a evolução dorisco Brasil e o comunicado daS&P, seria esperada do governouma resposta capaz de reforçaro compromisso com a meta fis-cal já estabelecida, indicandoque será construída com bastan-te clareza, sem malabarismoscontábeis. Seria a hora de maisbom senso e de não brigar comfatos e números.

Causou, assim, surpresa (porum olhar puramente técnico) anota para a imprensa do Ministé-rio da Fazenda (MF), divulgadaem 24 de março. Em vez da postu-ra humilde, tentaram desqualifi-car a decisão de rebaixamento,taxando-a de “inconsistente comas condições da economia brasi-l e i r a”. Utilizaram vários indica-dores, de forma pouco rigorosa,para tentar mostrar tal “inconsis -t ê n c i a”. Eis alguns exemplos:

A nota menciona que o investi-mento estrangeiro direto (IED)acumulou US$ 65,8 bilhões nos12 meses encerrados em feverei-ro de 2014. Trata-se realmente deum belo retrato, condizente comuma economia que ainda ofereceexcelentes oportunidades de in-vestimento. Mas o filme mostraque o IED está, na melhor das hi-póteses, estagnado há três anos:US$ 66,6 bilhões em 2011,US$ 65,3 bilhões em 2012 eUS$ 64 bilhões em 2013.

Pior ainda, o declínio em rela-ção aos resultados nas transaçõescorrentes (TC) do balanço de pa-gamento foi incrivelmente gran-de. Em 2011, o IED era 27% supe-rior ao déficit em TC, terminou2012 20% maior e, em 2013, foi22% inferior. Esses números indi-cam que, enquanto em 2011 e2012 a entrada de IED mais quecompensou os resultados negati-vos em TC, em 2013 não foi capaz

de financiar o déficit em TC.Segundo o Boletim Focus de

21 de março, a mediana das ex-pectativas aponta para um IEDde US$ 55,8 bilhões em 2014 eum déficit em transações corren-tes de US$ 75 bilhões. Com isso, oIED fecharia o ano atual 26% infe-rior ao déficit em TC. Esses valo-res também não sugerem incon-sistência no rebaixamento.

A nota do MF também mencio-na que a taxa de crescimentoacumulada, desde a crise de2008, foi de 17,8%. Contudo, oque interessa para avaliação derisco é o desempenho futuro. Opassado recente pode até servirpara prospecções, principalmen-te quando ocorrem mudanças,como a adoção de uma “novamatriz econômica”, e há temposuficiente para avaliar os resulta-dos delas. Nesse sentido, o cresci-mento médio anual de 2,01%, en-tre 2011 e 2013, não indica queos analistas da S&P tenham sidoinconsistentes. Até porque o me-nor crescimento resultará emmenos arrecadação.

Ainda que pudéssemos utilizaro desempenho acumulado do PIB,desde a crise de 2008, como boa re-ferência para construir cenáriosprospectivos, causou-me perplexi-dade o número apresentado pelanota oficial do MF. Isso porque17,8% não é o crescimento acumu-lado do PIB desde a crise, mas simquanto o PIB do 4o trimestre de2013 foi superior ao do 4o trimes -tre de 2007. O crescimento acumu-lado do PIB do 3o trimestre de2008 ao 4o de 2013 é 15,7%. O Mi-nistério da Fazenda computou deforma equivocada a taxa de cresci-mento acumulada.

Mesmo que o cálculo estivessecorreto, a base de comparaçãoparece ter sido meticulosamenteescolhida para inflar o resultadoapresentado. Se tivessem com-parado o 4o trimestre de 2013com o 2o de 2008 (usando índi-ces com ajuste sazonais e a ra-cionalidade para achar 17,8%),encontrariam 14%.

O Ministério da Fazenda perdeuexcelente oportunidade de mos-trar que o cenário prospectivo serádiferente. Preferiu apresentar umretrato que em nada fala sobre ofilme dos últimos anos e tampou-co revela o roteiro para o futuro.

Mauro Sayar Ferreira. , professor deeconomia da UFMG, é PhD pelaUniversidade de Illinois e mestre pela USP.Trabalhou no FMI em 2004.

Jornal econômico de circulação nacional, publicado desde 2 de maio de 2000 pela Valor Econômico S.A.

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Duas cláusulas não encerramtodo o mistério de Pasadena

Os detalhes que surgem sobre acompra da refinaria de Pasadenapela Petrobras tornam cada vezmenos provável a hipótese deque tenha ocorrido um erro de

avaliação empresarial. O fato básico éconhecido. Uma refinaria em Pasadena,adquirida pela Petrobras, terminou custandoà estatal, depois de negociações obscuras eainda não totalmente conhecidas, nadamenos de US$ 1,18 bilhão, quando seusantigos donos a obtiveram por US$ 42,5milhões. O fato de a presidente DilmaRousseff, então presidente do Conselho deAdministração, desconhecer cláusulasimportantes do contrato de aquisição dos50% iniciais, com base em um resumo deduas páginas e meio da transação, pode seruma falha pessoal, mas é possível que nãohouvesse interesse em que a operação fosseexaminada em seus detalhes.

Há muito mais mistério nesse negócio do queas duas cláusulas que quase ninguém viu,exceto os envolvidos diretamente no assunto —o presidente da Petrobras, José Gabrielli, seudiretor da área internacional, Nestor Cerveró eo diretor de Abastecimento, Paulo RobertoCosta. Mesmo após a presidente Dilma avaliarque foi induzida a erro, com atraso de oito anos,a Petrobras só agora instalou uma comissãoformal para investigar o caso.

Um dos enigmas que as investigações doMinistério Público, do Tribunal de Contas daUnião e uma eventual Comissão Parlamentarde Inquérito podem ajudar a desvendar é odiligente esforço de diretores da Petrobras,especialmente Nestor Cerveró, paraassegurar que a nova sócia, a Astra, tivesseganhos garantidos e nenhum risco corresse,mesmo que o empreendimento não fossebem sucedido. Concessões sempre ocorrempara que se realizem grandes negócios. Nocaso, o negócio se revelou péssimo e só umaparte cedeu tudo.

Investigação da Comissão de ValoresMobiliários revelada pelo Va l o r aponta que aavaliação dos 50% restantes da refinaria que aPetrobras pretendia arrematar foi feita emmenos de duas semanas pela Muse Stancil. APetrobras pagou US$ 190 milhões pela primeirametade, indicando que a instalação dePasadena valia US$ 380 milhões, embora aAstra tivesse dela se apoderado um ano antes

por quase um décimo do valor, US$ 42,5milhões. A Muse, nesse exíguo espaço detempo, traçou vários cenários, onde sematerializou o milagre da valorização. No fimde 2007, pouco mais de um ano após aPetrobras ter entrado como sócia, a refinaria jávalia entre US$ 582 milhões e US$ 3,5 bilhões —de 13 a 82 vezes o valor pago pela Astra.

Se saísse do negócio, a Astra já teria ganho naloteria e se ficasse, se sairia bem. Com aconcordância da diretoria anterior daPetrobras, ela pendurou no contrato o retornogarantido de 6,9% se os investimentos paraconversão a óleo pesado da refinaria não dessecerto. Obteve o direito a um prêmio de 20%sobre o valor pago pela primeira metade, casodeixasse a sociedade. Uma cláusula “put ”obrigava a Petrobras a comprar sua parte porpelo menos esse preço, em caso de desavença deorientação entre os sócios. Os sócios tinhamuma trading para compra de combustível paraa refinaria e nela a Astra ganhou o direito de teruma “alocação especial” de US$ 172 milhões.No processo, representante da Astra explicaque esse valor é um “pagamento garantido” se areceita da trading ficar abaixo de umdeterminado nível (“O Estado de S. Paulo”, 31 demarço). Ou seja, a Astra tinha ganhosassegurados, independentemente do rumo queo negócio tomasse.

Há mais. No fim de 2007, Cerveró apresentouproposta de acordo de compra, segundo elepreliminar, da metade restante da refinaria porUS$ 785 milhões (Va l o r , 25 de março). O valorsurpreendeu até mesmo os donos da Astra. Opresidente da empresa nos EUA, Mike Winger,escreveu pouco antes a um diretor, segundoautos do processo, que “não ficaria surpreso se aPetrobras já tivesse se dado conta que arefinaria não vale os US$ 650 milhões que eless i n a l i z a r a m”. (“Folha de S. Paulo”, 29 de março).

Com o negócio fulminado pelo Conselhode Administração em maio de 2008, o litígiojudicial começou em junho, com a Astraexigindo o pagamento oferecido pelaPetrobras, sob argumento de que o acordoproposto era definitivo. A Astra levou quasetudo que queria. Para José Gabrielli,presidente da Petrobras, o negócio à épocanão foi ruim e nada de anormal.

Só investigações sérias poderão indicar seum negócio tão ruinoso deu um bomdinheiro apenas aos donos da Astra.

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