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1 MECANISMOS NEURAIS DE AGRUPAMENTOS AUDITIVOS IMPONDO REGRAS À PERCEPÇÃO MUSICAL: Um estudo através das regras de “condução das vozes” J. Zula de Oliveira ABCM – 2007 Email: [email protected] [email protected] 1. Introdução Achei que seria importante estudarmos como conseguimos ouvir música. Geralmente não nos preocupamos com o como a ouvimos, ou seja: como a audição de elementos (sons e células rítmicas) que são produzidos isoladamente assumem o papel de estruturas, formando um discurso completo e cheio de significados. Como percebemos música? Quais os mecanismos neurais que nos levam a agrupar elementos em estruturas ou separar o que aparentemente está agrupado? Ao ouvir música somos afetados por rápidas e complexas mudanças de espectros acústicos, decorrentes da superposição de sons e movimentos rítmicos (ou não) provenientes de diferentes fontes sonoras. O sistema auditivo tem a tarefa de analisar estes espectros de forma a recompô-los, catalogá-los, julgar sua similaridade e diferenças, sua pertinência, ou não, de agrupamentos de uns com os outros 1 . A partir desta consideração pomos em evidência, sobretudo dois aspectos: a) O fato de ao nosso sistema auditivo ser apresentada apenas uma série de “elementos isolados” (elementos de primeira ordem, em música: elementos pré-musicais) e que através de mecanismos especiais são combinados de forma a constituir agrupamentos ou estruturas; b) Como são feitas abstrações a partir das combinações efetuadas de tal forma a permitir que o sistema perceptivo da audição elabore equivalências e similaridades em música. Para estudar os mecanismos que organizam estes dois aspectos temos que partir do estudo, tanto das dimensões do som (altura, intensidade e timbre), como das dimensões pertinentes ao ritmo (precisão, elasticidade continuidade), e determinar, para cada caso, 1 Uma idéia da forma como percebemos, constituindo um processo de inferência inconsciente, já foi proposto por Helmholtz (1909-1911/1925). A proposição de Helmholtz tem se desenvolvido até nossos dias sem que se tenha chegado ainda a um ponto final sobre o assunto.

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MECANISMOS NEURAIS DE AGRUPAMENTOS AUDITIVOS

IMPONDO REGRAS À PERCEPÇÃO MUSICAL:

Um estudo através das regras de “condução das vozes”

J. Zula de Oliveira ABCM – 2007

Email: [email protected] [email protected]

1. Introdução

Achei que seria importante estudarmos como conseguimos ouvir música.

Geralmente não nos preocupamos com o como a ouvimos, ou seja: como a audição de

elementos (sons e células rítmicas) que são produzidos isoladamente assumem o papel de

estruturas, formando um discurso completo e cheio de significados.

Como percebemos música? Quais os mecanismos neurais que nos levam a agrupar

elementos em estruturas ou separar o que aparentemente está agrupado?

Ao ouvir música somos afetados por rápidas e complexas mudanças de espectros

acústicos, decorrentes da superposição de sons e movimentos rítmicos (ou não)

provenientes de diferentes fontes sonoras. O sistema auditivo tem a tarefa de analisar estes

espectros de forma a recompô-los, catalogá-los, julgar sua similaridade e diferenças, sua

pertinência, ou não, de agrupamentos de uns com os outros1.

A partir desta consideração pomos em evidência, sobretudo dois aspectos: a) O fato

de ao nosso sistema auditivo ser apresentada apenas uma série de “elementos isolados”

(elementos de primeira ordem, em música: elementos pré-musicais) e que através de

mecanismos especiais são combinados de forma a constituir agrupamentos ou estruturas; b)

Como são feitas abstrações a partir das combinações efetuadas de tal forma a permitir que o

sistema perceptivo da audição elabore equivalências e similaridades em música.

Para estudar os mecanismos que organizam estes dois aspectos temos que partir do

estudo, tanto das dimensões do som (altura, intensidade e timbre), como das dimensões

pertinentes ao ritmo (precisão, elasticidade continuidade), e determinar, para cada caso,

1 Uma idéia da forma como percebemos, constituindo um processo de inferência inconsciente, já foi proposto por Helmholtz (1909-1911/1925). A proposição de Helmholtz tem se desenvolvido até nossos dias sem que se tenha chegado ainda a um ponto final sobre o assunto.

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quais seriam os princípios que agem efetivando os agrupamentos. É sabido que tanto o som

como o ritmo apresenta padrões muito complexos, mas que seguem determinadas regras

para que ocorram tais agrupamentos.

Os psicólogos da Gestalt (Max Wertheimer, Christian von Ehrenfels, Felix Krüger,

Wolfgang Köhler e Kurt Koffka) propuseram que os agrupamentos dos elementos

primários em configurações têm base em várias regras (ou leis) simples sitiadas no cérebro

das pessoas: as leis gestálticas (vide Anexo 1). A Fig. 1 (copiada de D. Deutsch, 1999)

ilustra algumas destas leis para estímulos visuais.

Fig 1: Ilustrações de algumas leis da Gestalt (proximidade, similaridade e boa continuação) para estímulos

visuais

Na ilustração “a” o agrupamento é feito segundo a lei da proximidade:

os elementos se agrupam segundo a proximidade de sua configuração

espacial; neste exemplo os elementos são agrupados dois a dois. No

exemplo “b” está ilustrada a lei da semelhança: esta lei nos leva a

perceber de um lado, as filas verticais formadas pelos círculos vazios

e do outro as filas formadas pelos círculos cheios. O terceiro exemplo,

o “c”, ilustra a lei da boa continuação: a percepção segue a direção

em que os elementos são mais “convenientemente” distribuídos. A percepção do observador segue o caminho

da estrutura formada por tais elementos, no exemplo o caminho de A a B e C a D.

As ilustrações acima foram feitas para estímulos visuais, mas quando aplicadas à

percepção auditiva, podem explicar como percebemos “forma” na audição de música. (vide

Gregory, 1994; Deutsch, 1975; Bregman, 1978, 1990; Narmour, 1991 1992; Huron,

1993c). Os agrupamentos efetuados em conformidade com tais leis é que efetivamente nos

permitem interpretar nosso ambiente sonoro. As leis acima ilustradas para estímulos

visuais, quando aplicadas a estímulos musicais poderiam ser ilustradas com:

� Lei da proximidade: a proximidade dos sons em música pode efetuar-se tanto

quanto à coerência na sucessão dos sons (p. ex. proximidades de tonicidade ou de

diatonicidade), como na continuidade existente entre dois ou mais sons quanto à sua

temporalidade No caso da tonicidade e diatonicidade, a razão numérica entre as

freqüências dos intervalos (melódicos ou harmônicos) formados pelos sons é o

determinante básico do “parentesco” existente entre estes sons. Desta forma, os intervalos

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do uníssono, da 8ªe da 5ª (que têm razões intervalares muito simples) não favorecem à

percepção individual dos sons que formam os intervalos e sim, tende a fundi-los.

� Lei da semelhança: agrupamentos em música quanto à semelhança podem efetuar-

se a partir, por exemplo, de formação tímbricas (iguais ou diferentes), combinações de

instrumentos de corda com instrumentos de sopro ou percussão, de repetição de notas etc.

A lei da semelhança nos possibilita o reconhecimento das “semelhanças” que dão unidade a

uma obra musical. Temas, motivos etc. que se repetem proporcionam integração à música,

direcionam a atenção, despertam um certo ludismo e conseqüente prazer (ou fruição) na

audição da obra musical.

� Lei da boa continuação: de modo geral todas as leis gestálticas ditam a maneira de

os eventos musicais serem percebidos levando em consideração os universais da música

(Carterette and Kendall, 1999)2. Mas de todas as leis a que se propõe mais como função dos

princípios gestálticos é a da boa continuação. A “continuação” é “boa” quando atende às

nossas expectativas que por sua vez são estabelecidas a partir de experiências anteriores.

Desta forma são válidas as afirmativas: nota puxa nota, inciso puxa inciso, frase puxa frase,

tema puxa tema, ritmo puxa ritmo, movimento puxa movimento, coerência puxa coerência

em qualquer nível da composição musical. Alguns exemplos: eventos musicais semelhantes

(p. ex. quanto ao timbre) provavelmente serão originados e interpretados, sensorialmente ou

virtualmente, como provenientes de uma fonte comum; podem dar origem a agrupamentos

coerentes. Por outro lado, sons dessemelhantes podem ser interpretados como provenientes

de fontes diferentes, não dando ensejo à formação de estruturas, não se conseguindo

estabelecer através deles uma “boa continuação”. Uma sucessão que muda suavemente (p.

ex., em freqüência) pode ter origem em uma única fonte, e ao contrário, uma transição de

freqüência abrupta pode refletir a presença de uma fonte diferente. É provável que

componentes de espectros complexos semelhantes que surgem em sincronia, apresentem

características que permitam agrupamentos por sua semelhança prejudicando o princípio da

percepção independente das vozes, como veremos.

2 Carterette e Kendall (1999, pg. 780) admitem como universais da música para o ser humano: a) um forte senso de estruturação musical; b) estratégias de agrupamento dos elementos auditivos (p. ex. as leis gestálticas); c) o uso de um referencial estável de afinação que pode se efetivar com perfeição no “ouvido absoluto” que algumas pessoas possuem; d) a divisão de uma oitava em graus; e) o uso de um referencial para a pulsação; f) a indução de padrões rítmicos a partir de subdivisões simétricas/assimétricas de pulsos temporais.

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Mas isto não é tudo o que se deve saber a respeito da percepção de música. Existe

ainda outra questão de fundamental importância: será que tais agrupamentos resultam da

ação de um único mecanismo neural de decisão, ou será que múltiplos mecanismos estão

envolvidos nesta tarefa, cada um responsabilizando-se por critérios de agrupamentos

diferentes? Do que já foi pesquisado há evidências psicológicas de que os subsistemas

subjacentes aos processos da percepção auditiva são vários e atendem a características

específicas tanto do som (construto espacial), como do ritmo (construto temporal). Tais

evidências nos permitem formular a hipótese de que os agrupamentos auditivos não são

efetuados por um único mecanismo neural, mas por vários que agem separadamente em

estágios diferentes, mas que interagem entre si. Desta forma o mecanismo que agrupa as

informações da altura são diferentes dos que agem sobre o timbre ou sobre a intensidade,

sobre a localização da fonte sonora etc. (Oliveira, 2002), ou sobre o ritmo e suas características.

Há evidências também de que podem surgir ilusões resultantes da forma “incorreta” das ligações

entre os diferentes eventos musicais fenômeno que D. Deutsch chamou de ilusão auditiva

(Deutsch, 1974, 1975a, 1975b, 1980a, 1981, 1983a, 1983b, 1987, 1995). Diante de tais

descobertas podemos concluir que a organização perceptual na música envolve um

processo no qual os elementos são agrupados entre si, de forma a sinalizar valores para

diferentes atributos separadamente e isto é seguido por um processo de elaboração de

síntese na qual os significados de atributos diferentes são combinados correta ou

incorretamente.

2. Como surgiram as regras que compõem as gramáticas musicais que aprendemos

ao estudar música.

Nossa exposição será feita a partir da análise das regras prescritas para a

composição de um cantus firmus (o elemento básico para a realização de um contraponto

seiscentista) e da harmonia tradicional (séculos XVIII e XIX), procurando justificar tais

regras do ponto de vista das leis da acústica, da psicofísica, da cognição, da aculturação e,

sobretudo dos processos neurológicos, levando em conta em conta as leis gestálticas e os

universais da música. Estas regras foram estabelecidas pelos mestres, seja do contraponto

seiscentista, que tem como um dos expoentes G. Palestrina (Gauldin, 1985;

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Jeppesen,1939/1963; Fux, 1725/1971; Bertucci, 1947), seja do Barroco, brilhantemente

representado por J. S. Bach (Benjamin, 1986; Parks, 1984; Tryhall, 1993), seja da harmonia

clássica e romântica, praticada com maestria por A. W. Mozart, L. van Beethoven, P.

Tchaikoswki (Hindemith, 1944; Aldwell & Schachter, 1989; Piston, 1978; Schoenberg,

1911/1978; Schoenberg, 1954/1969; Grabner, 1962, Koellreutter, 1986; Oliveira e Oliveira,

1978; Salzer, 1952), seja do contraponto atonal3, cujos criadores e expoentes são A.

Scheonberg, A. Webern, A. Berg (Fortner, 1960; Krenec, 1940).

As regras que introduzem os alunos nas gramáticas da composição musical são

muitas e não trataremos de todas elas, mas apenas das que se evidenciam. Fazemos exceção

das regras que orientam para a composição pós-tonal (geralmente escritas a priori, ao

contrário das tonais, geralmente escritas depois de terem sido comprovadas na prática).

Portanto, depois de terem sido consideradas convenientes à percepção musical. (Vide

algumas dessas regras no Anexo 2 (Regras para a prática da harmonia clássica e romântica

Anexo 3 (Regras para a composição de um cantus firmus).

3. Princípios de agrupamentos auditivos que fazem da percepção de elementos

musicais estruturas.

Neste trabalho vamos estudar os princípios que levam a percepção musical de

elementos à construção de estruturas musicais, focando as regras para a condução das vozes

ou partes. Segundo Huron (2001)4 estes princípios se resumem a 10, sendo seis, os básicos

e quatro que contribuem para a identificação dos gêneros musicais:

� Princípios básicos para a percepção musical: 1. a afinação do som segundo

audibilidade de seus harmônicos (toneness) ou diatonicidade; 2. a continuidade temporal; 3.

um mínimo de mascaramento; 4. a fusão tonal; 5. a proximidade das freqüências (ou dos

sons segundo sua diatonicidade); 6. a co-modulação do som;

� Princípios que favorecem o reconhecimento dos gêneros musicais: 7. a

sincronicidade de ataque (onset); 8. o limite de densidade; 9. a diferenciação tímbrica; 10.

a localização da fonte sonora.

3 No contraponto atonal (p. ex. dodecafônico ) nem sempre as regras são determinadas após a comprovação na prática, mas antecipadamente. 4 De quem copiamos idéias importantes para escrever este trabalho.

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Vejamos em detalhes cada um destes princípios e o seu papel no processo de

agrupar/desagrupar os elementos musicais.

1. A afinação do som a partir da audibilidade de seus harmônicos (toneness, diatonicity)

Huron (2001) sugere que o som musical quando exibe um alto grau de afinação,

desperta em quem o ouve imagens auditivas, ou seja: quando porta uma boa audibilidade de

seus harmônicos (tonicidade ou diatonicidade). Uma medida usada para conferir o grau de

afinação é fornecida pelo peso virtual desta afinação. Os sons que têm alto peso virtual de

afinação a partir da forma como são percebidos pelo ouvintte são os sons complexos

centrados na região situada entre F2 e G5 . . Sons contendo parciais

inarmônicos produzem percepção musical de afinação competitiva, evocando em função

disto imagens auditivas confusas. Este item pode estar relacionado com as propriedades

acústicas da fonte sonora, entre outros fatores.

Na natureza um som, de modo especial um som musical, nunca ocorre sozinho.

Sempre vem acompanhado de harmônicos (ou parciais) ou inarmônicos. São estes parciais

que formam seu espectro e são eles também que nos possibilitam a fusão ou a separação de

tais sons (como veremos). Para estudar a relação entre os harmônicos e a afinação de um

som tem-se que estudar sua harmonicidade (a relação harmônica que eles mantêm com a

freqüência fundamental à qual estão ligados) e a relação que este som mantém com outros

sons, da qual decorre o nível de fusão/separação entre os sons.

Frente à harmonicidade o sistema auditivo interpreta o que ouve como uma

“combinação harmônica” da qual é gerada uma única imagem sonora. Ao tocar sons em

instrumentos musicais são-nos fornecidos exemplos de como a percepção agrupa os

harmônicos. Tanto instrumentos de corda, como de sopro e outros de “afinação definida”

produzem sons cujos parciais são harmônicos, tanto mais harmônicos para a percepção

quanto mais audíveis forem estes parciais, caracterizando-se cada som pelo nível de

audibilidade de cada parcial, o que determina o espectro (o timbre) do som. Esta

característica confere ao som seu grau de “musicalidade”, sendo tanto “mais musical”

quanto mais audíveis forem seus harmônicos. A harmonicidade proporciona uma forte

impressão de fusão. Sinos e gongos, no entanto, produzem parciais que não são harmônicos

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e que nos dão uma sensação de freqüências difusas.

Huron (1991b), baseado em trabalhos anteriores seus e de outros autores, estudou a

relação entre harmonicidade e fusão espectral para música polifônica. Este gênero de

música tem como característica principal preservar a independência das vozes simultâneas

dentro da trama polifônica. Em análise de peças de J. S. Bach executadas ao teclado,

mostrou que os intervalos harmônicos eram evitados na proporção em que eles promoviam

a fusão tonal. A conclusão de Huron foi que Bach usou esta estratégia de composição com

a finalidade de otimizar a percepção das vozes individualmente. Isto parece ser mais

freqüente ainda na música polifônica seiscentista.

Na contramão do princípio da independência das vozes, compositores mais recentes,

sobretudo a partir do impressionismo musical, privilegiaram em suas composições os

elementos que favoreciam a fusão tonal. Em trabalho de experimentação com sons que

foram produzidos por instrumentos diferentes (inclusive sintetizadores e geradores de som)

tocando simultaneamente, tais instrumentos foram usados de forma a perderem sua

identidade e ao mesmo tempo produzir a impressão de um único som. Por exemplo,

Debussy e Ravel e outros representantes do impressionismo musical, em algumas peças

orquestrais fizeram bastante uso do que se poderia chamar de diluição das harmonias

(acordes quebrados, arpejos, uso de timbres semelhantes etc). Os compositores pós-tonais

como Schoenberg, Stravinsky, Webern e Varèse muitas vezes usaram estruturas altamente

individualizadas, ao que, segundo o termo de Varèse, foram chamadas de “massas sonoras”

(Erickson, 1975). Sob este ponto de vista as combinações de melodias que contêm relações

harmônicas simples oferecem uso preferencial, uma vez que não está mais sendo focada em

primeiro plano relações intervalares que favoreçam à percepção individualizada das partes

na composição de melodias, mas sim outras relações como a tímbrica ou de “massas

sonoras” (Klangfarbenmelodie).

Em estudo com a fala foi demonstrado em laboratórios que determinados padrões

no uso da fala (p. ex. quando muitas pessoas falam simultaneamente), são melhores

percebidos quando as vozes são produzidas sobre fundamentais diferentes (Rasch, 1978), o

que é fundamental para a compreensão do que se está falando. A diferença intervalar entre

as fundamentais, segundo Assmann e Summerfield (1990), Broks e Nootebohm (1982) e

Sheffers (1983) deve situar-se pelo menos em torno de um a três semitons. Além disto,

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formantes resultantes de uma mesma fundamental tendem a ser percebidos como uma

unidade perceptiva, portanto fundidos, como conseqüência de provável mascaramento,

enquanto que formantes constituídos a partir de fundamentais diferentes tendem a serem

percebidos como distintos uns dos outros (Darwin e Gardner 1986; Gardner., Gaskill, and

Darwin, 1989).

Existem ainda outros fatores que interferem nos processos de agrupamentos

(fusão/separação) na música. Por exemplo, as fontes sonoras e sua localização são um

deles. Outro: Moore, Glasberg e Peters (1986) referem-se ao fato de que quando um

componente de um complexo harmônico é desafinado em relação aos outros, ele é ouvido

como separado dos demais. Outros atributos do som também podem provocar

fusão/separação na percepção dos sons e Darwin e Carlyon (1995) sugerem serem

necessários para a realização da fusão/separação um processo de percepção grupal que

esteja envolvido com certo número de mecanismos neurais e que tais mecanismos não

usam necessariamente os mesmos critérios.

Imbricado com o princípio da “Afinação do som” poderiam estar: a) as “Leis

Gestálticas” (vide Anexo 1) de nºs 4 (Lei da Pregnância) e 6 (Lei da experiência passada ou

do fato comum); b) as “Regras para a condução das vozes na prática harmônica” (vide

Anexo 2) de nº 1 (que estabelece a tessitura de melhor audibilidade de harmônicos), nº 2

(que regula a formação dos acordes compondo-os com 3 ou 4 sons da série harmônica, bem

afinados, o que aumenta a possibilidade de audição dos harmônicos (tonicidade e

harmonicidade); nº 6 e 7 (que estabelecem sustentação dos sons comuns ou o uso de passos

pequenos diatônicos, o que facilita manter a afinação); c) as regras da composição de um

cantus firmus (vide Anexo 3) de nº 2 (que estabelece o uso dos modos litúrgicos e clássicos

como escalas a serem usadas, pois elas fazem parte de uma cultura secular e isto invoca a

afinação culturalmente definida), nº 4, 6 e 8 (que proíbem o uso de intervalos “artificiais” a

estes modos, o que poderia “facilitar” a desafinação ou mudança de campo harmônico).

2. A continuidade temporal.

A música acontece no tempo. É nele que as estruturas sonoras se formam através da

duração dos sons. Mas para que se formem é necessário que os sons sejam percebidos como

um contínuo. A partir desta continuidade é que a música é percebida e as imagens sonoras

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evocadas. São vários os fatores que interferem para que a percepção continuada seja

afetuada, sendo o principal deles a continuidade temporal, na qual a energia do som é

mantida por um certo período de tempo, estabelecendo-se um processo mental, uma espécie

de “memória ecóica” (Houtgast, 1972; Thurlow, 1957; Warren, Obusek & Ackroff, 1972),

com duração de aproximadamente 1 a 5 segundos. A “memória ecóica” desperta, a partir da

audição de sons específicos continuados, imagens auditivas, mesmo quando alguns destes

sons estão fisicamente ausentes. Para isto é necessário que os sons sejam mais contínuos,

repetitivos e suficientemente fortes.. O mascaramento5 dos sons neste particular age em

contrário à continuidade temporal. A continuidade e intermitência dos sons não devem ser

interrompidas por mais de aproximadamente 800 milesegundos (ms) de silêncio ou de outro

fato qualquer, para que a percepção do contínuo não seja quebrada. Conclui-se a partir das

pesquisas que imagens auditivas consistentes sejam evocadas a partir de sons que ou são

contínuos ou interrompidos apenas por curtos espaços de tempo (menor do que 800 ms).

A importância da relação temporal para a fusão ou separação da percepção já foi

estudada por Helmholtz em seu tratado On the Sensations of Tone (1859/1954), onde

escreve (citação de D.Deutsch, 1999 pg. 302).

Now there are many circunstances which assist us first in separating the musical tones

arising from different sources, and secondly, in keeping together the partial tones of each separate

source. Thus when one musical tone is heard for some time before being joined by the second, and

then the second continues after the first has ceased, the separation in sound. is facilitated by the

succession in time. We have a1ready heard the first musical tone by itself and hence know

immediately what we have to deduct from the compound effect for the effect of this first tone. Even

when several parts proceed in the same rhythm in polyphonic music, the mode in which the tones of

the different instruments and voices commence, the nature of their increase in force, the certainty

with which they are held and the manner which they die off, are generally slightly different for

each... When a compound tone commences to sound, alI its partial tones commence with the same

comparative stregth;. when it swells, alI of them generally swell uniformly; when it ceases, alI cease

5 A prática musical se vale de vários artifícios para evitar o mascaramento que prejudica a percepção do contínuo musical, interceptando o despertar de imagens auditivas. Alguns destes artifícios são a mescla de timbres, a forma como os sons são produzidos, ora por instrumentos de sopro, ora por instrumentos de corda, ora fortes, ora em piano etc. A invenção do pianoforte e outros instrumentos com diferentes formas de produzir os sons, os pedais de que fazem uso vários instrumentos, o uso de registros diferentes etc. colaboram para evitar o mascaramento.

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simultaneously. Hence no opportunity is genera1ly given for hearing them separately and indepen-

dently. (pp. 59—ó0) 6

.

Este item está relacionado com o tempo em música. Trata-se de um estudo diferente

do de quando os sons são produzidos ao mesmo tempo e se consideram em primeiro plano

seu aspecto espectral e a relação entre seus componentes que são o elemento fundamental

para a percepção como um todo, ou seja, de forma a constituir fusão. Na prática real ao se

executar uma música, fatores temporais entram em ação. Um destes fatores é a

sincronicidade/assincronicidade do ataque dos sons. A sincronicidade afetando a afinação

dos sons e a assincronicidade contribuindo para a percepção individual de cada som.

Quando componentes de um som complexo soam sincronizadamente, é provável que eles

tenham origem na mesma fonte sonora; ao contrário quando eles soam em dissintonia é

igualmente provável que tenham origem em fonte sonora diferente. Neste caso estamos

estudando a correspondência temporal na flutuação dos componentes. Helmholtz (1859 /

1954) afirma ser a temporalidade na ocorrência dos harmônicos que nos permite sua

separação em unidades discretas.

Imbricadas com o principio da “Continuidade temporal” poderiam estar: a) as “Leis

Gestálticas” de nº 1 (Lei da Semelhança); nº 2 (Lei da Proximidade), 3 (associada com a de

nº 1 e 2, Lei da Boa Continuação), nº 4 (Lei da Pregnância), entre outras; b) as “Regras para

6 Desta forma, há muitas circunstâncias que nos ajudam, em primeiro lugar a separar os sons musicais que

surgem de fontes diferentes e em segundo lugar a manter ao mesmo tempo os parciais dos sons de cada fonte.

Assim quando um som musical é ouvido durante algum tempo, antes de se unir a um segundo e o segundo a

continua depois de o primeiro se extinguir, a separação entre os sons é facilitada no tempo pela sucessão.

Uma vez que já temos ouvido o primeiro som musical em si e conseqüentemente sabemos o que temos a

deduzir do efeito da combinação para o efeito deste primeiro som imediatamente. Até mesmo quando várias

partes procedem no mesmo ritmo na música polifônica, o modo no qual os sons dos instrumentos diferentes e

vozes começam, a natureza do aumento deles em vigor, a certeza com que eles são segurados e a maneira fora

a qual eles se extinguem, é geralmente ligeiramente diferente para cada um... Quando um som composto

começa a soar, todos os seus tons parciais começam a soar com o mesmo em rumo comparativo. Quando

aumenta, todos eles geralmente aumentam uniformemente; quando se extinguem, todos se extinguem

simultaneamente. Conseqüentemente, nenhuma oportunidade é dada para ouvi-los separada e

independentemente. (pp. 59-ó0).

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a condução das vozes na prática harmônica” de nº 3 (que estabelece uma continuidade nos

espectros das vozes quanto às tessituras de baixo, tenor, contralto e soprano); nº 7 (que

regula a condução dos sons de forma a garantir continuidade, tanto linearmente (melodia)

como em profundidade (harmonia); nº 9 (que quebraria a continuidade do fluxo melódico,

uma vez que o cruzamento das vozes interrompe o fluxo da melodia ou harmonia

intencionada); c) as regras da composição de um cantus firmus de nº 1 (o cantus firmus é

um contínuo que é garantido pela limitação do número e duração isorítmica dos sons

usados); nº 9 (uma boa melodia tem continuidade que é definida por um ponto de partida,

um desenvolvimento, um clímax e um repouso. A regra 9 solicita isto); nº 10 (os

fechamentos criados estabelecidos na regra 10 sugerem à continuidade associada à

compensação no uso dos intervalos diatônicos).

3. Um mínimo de mascaramento

Békésy (1943/1949, 1960) e depois Skarstein (Kringlebotn, Gundersen, Krokstad, &

Skarstein, 1979) foram os precursores do que se chamou de mapa tonotópico da cóclea, ou

seja: cada freqüência tem seu ponto de ancoragem apropriado na membrana basilar, sendo

as freqüências agudas recebidas na base da cóclea e as freqüências graves no ápex. A partir

dos estudos de Békésy, outros pesquisadores (p. ex. Fletcher, 1940, 1953) têm demonstrado

que há relação entre a distância ao longo da membrana basilar e a região de mascaramento,

definindo o que se chamou de banda crítica, o limite para a ocorrência de mascaramento7.

O passo seguinte é dado por Zwicker, Flottorp e Steven, (1957) estabelecendo a largura da

banda crítica mais como algo real do que hipotético e sugerindo também a distância ao

longo da membrana basilar como uma função da totalidade da freqüência dispendida por

vários sons ou de uma banda de ruídos. Greenwood (1961b, 1990), partindo dos estudos de

Fletcher, estabeleceu que há uma relação linear que limita a banda crítica, sendo de cerca

de 1 mm a distância em que é capaz de receber as freqüências que se mascaram

mutuamente. Greenwood sugere também que os efeitos tonotópicos podem refletir-se em

aspectos da percepção de dissonâncias referenciadas como sensibilidade para dissonância,

7 Mascaramento é a diminuição da audibilidade de um som devido a presença de outro. Pode acontecer devido a presença de um som próximo em freqüência (mascaramento em freqüência ou simultâneo) sendo um deles mais forte do que o outro, ou no tempo (mascaramento temporal). O mascaramento pode ocorrer antes de um som mais forte (pré-mascaramento) ou depois (pós-mascaramento). Têm curta duração: o pré-mascaramento 20 ms e o pós- até 200 ms.

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levando-se em consideração que tanto a consonância como a dissonância podem sofrer

influencia cultural (fator de aprendizagem) e sensorial (fator inato). Vários outros

pesquisadores ainda se ocuparam com este assunto, a exemplo de Cazden (1945), Mayer

(1894), Pomp e Levelt (1965) que deram continuidade aos estudos de Greenwood quanto à

percepção de dissonância e banda crítica e a mecânica da membrana basilar. Note-se, no

entanto que muitos destes experimentos foram feitos com sons puros que em música não

são usados e que para sons complexos, os sons musicais, é fator decisivo para a sensação de

clareza da consonância ou dissonância, a região em que se situa o intervalo, lembrando que

as sonoridades mais usadas na prática musical, sobretudo harmônica, situam-se entre o F2 e

o G5, ao que se somam os efeitos da cultura e da sensibilidade humana.

Concluindo: o macaramento auditivo é um efeito acústico que limita a percepção

individualizada dos sons. A fim de minimizá-lo em algumas sonoridades verticais, as

somas de energia espectral dos sons não devem cair na banda crítica, e que para sons

complexos, determinados harmônicos devem ser dispostos mais espaçados na medida em

que o registro se torna mais grave (veja o uso da “harmonia larga” que exibe sonoridade

mais ampla do que a “harmonia estreita”).

Levando-se em consideração que a música é composta por partes (ou vozes) que

devem ser ouvidas individualmente, imbricadas com o principio do “Mascaramento”

poderiam estar: a) as “Leis Gestálticas” de nºs 1 e 4 (Lei da Semelhança, e da Pregnância

de um lado atuando como catalisadoras de agrupamentos e de outro atuando como

dispositivos de fusão dos sons que impedem a audição individual das partes); b) as “Regras

para a condução das vozes na prática harmônica” de nº 2, 3 e 4 (que estabelecem o número

e a tessitura das vozes a serem usadas na composição musical e a maneira como elas devem

ser usadas de forma a evitar o quanto possível os mascaramentos); nº 4 e 10 (que regulam o

uso de intervalos que poderiam favorecer o mascaramento: uníssonos, 8ªs e 5ªs justas); c) as

regras da composição de um cantus firmus não estão diretamente imbricadas com o efeito

do mascaramento por se tratar de desenvolvimento linear (melódico) em que o

mascaramento pode ocorrer apenas com relação a cada som em particular. No entanto

mascaramentos podem ocorrer na composição de um contraponto.

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4. A fusão tonal

A fusão tonal é a tendência a fundir em um som combinações de sons de acordo

com sua coerência. Esta fusão ocorre quando o sistema auditivo interpreta certas

combinações de freqüências como compondo parciais de um único som.(DeWitt &

Crowder, 1987). A fusão tonal é afetada, sobretudo por dois fatores: a) a razão existente

entre as freqüências dos sons componentes e b) seu conteúdo espectral. A fusão tonal

acontece com maior probabilidade quando o conteúdo espectral está em conformidade com

uma série harmônica mesmo que hipotética. E ainda com maior probabilidade quando as

freqüências dos tons componentes são compostas por razões de números inteiros e simples.

Neste caso incluem-se os uníssonos, as 8ªs e as 5ªs. Há discussões entre os pesquisadores,

no entanto, se fusão tonal e consonância tonal são o mesmo fenômeno (Bregman, 1990), ao

que parece tratar-se de uma confusão dos conceitos: “smooth sounding” e “sounding as

one” (“som que se extingue” e “sonoridade que soa como um som”). No entanto os estudos

vistos anteriormente (Greenwood, Plomp e Levelt e outros) sugerem as distâncias na banda

crítica como determinante de consonâncias e dissonâncias e que a sensibilidade está mais

afeta a esta distância do que à harmonicidade ou à fusão tonal.

Se a fusão tonal é ou não é um fenômeno desejado para a composição musical

depende da percepção musical e das intenções do compositor. Os compositores dos

períodos renascentista, barroco, clássico e romântico a evitaram não usando uníssonos, 8ªs

e 5ªs e se isto ocorre são bem menos freqüentes do que o uso de outros intervalos.

Naturalmente estes intervalos se tornam bem mais “fundíveis” num contexto musical

quando aparecem em paralelo, servindo como justificativa da proibição do uso das 5ªs, 8ªs

e uníssonos paralelos.

Tendo como base os conceitos de fusão tonal e sensação à dissonância é que os

intervalos das escalas diatônicas têm sido classificados pelos teóricos da música em

consonâncias perfeitas (uníssonos, 8ªs e 5ªs) que apresentam baixa taxa de sensação à

dissonância e alta taxa de fusão tonal, e consonâncias imperfeitas (3ªs e 6ªs maiores e

menores) que exibem baixa taxa de sensação à dissonância e também baixa taxa de fusão

tonal, e finalmente dissonâncias (2ªs e 7ªs maiores e menores, bem como os trítonos) que

exibem alta taxa de sensação à dissonância e baixa taxa de fusão tonal.

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Resumindo; a percepção de independência de tons concorrentes é enfraquecida

quando a relação de suas freqüências induz à fusão tonal. Os intervalos que mais

promovem a fusão tonal são (em ordem decrescente): o uníssono, a 8ª e a 5ª (justas).

Quando se tem o objetivo da percepção independente dos sons concorrentes, devem ser

evitados os intervalos que promovem tal fusão, a exemplo dos acima citados.

De todos os princípios da percepção musical quanto às teorias de

agrupamento/separação dos elementos musicais, o princípio da Fusão Tonal parece ser um

dos que mais se impõem. Com este princípio poderiam estar imbricadas: a) as “Leis

Gestálticas” de nºs 1, 4 e até certo ponto 5 e 6 (Lei da Semelhança, da Pregnância, do

Fechamento e do Fato Comum. De um lado atuando como catalisadoras de

agrupamentos/separações e de outro atuando como dispositivos de fusão dos sons que

impedem a audição individual das partes); b) as “Regras para a condução das vozes na

prática harmônica” de nº 1 (que delimita a tessitura onde a fusão tonal é mais susceptível e

prestando-se mais à prática da harmonia); 2 e 3 (que estabelecem o número e a tessitura das

vozes a serem usadas na composição musical e a maneira como elas devem ser usadas de

forma a favorecer/dificultar a fusão tonal); nº 4 e 10 (que regulam o uso de intervalos que

poderiam favorecer/dificultar a fusão tonal: uníssonos, 8ªs e 5ªs justas paralelas); c) as

Regras da composição de um cantus firmus de nºs 2, 4, 5, 6 e 8 (que estabelecem proibições

ao uso de intervalos que levariam à desestruturação da ambientação tonal (modal) favorável

à integração e coerência do fluxo melódico); nº 9 (um “pico culminante” - e um só –

exigido pela regra de nº 9 é um dos elementos mais integradores de uma estrutura

melódica).

.

5. A proximidade das freqüências (ou dos sons segundo sua diatonicidade e temporalidade)

Quanto à proximidade das freqüências ou dos sons podem ser considerados como

exemplo de proximidade das freqüências os trinados, dos quais distinguimos dois: a) os

que são feitos em intervalos pequenos e com muita velocidade, que provocam a sensação

de ondulação sonora e b) os que são feitos em intervalos grandes e pouca velocidade, que

provocam a sensação de uma forma específica de execução de uma melodia. Estas

formações intervalares associadas ao tempo em que são executadas têm sido assunto de

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muitos estudos, sendo os mais significativos os de Dowling (1967) e os de van Noorden

(1975).

Van Noorden mapeou a relação entre tempo e som na fusão e separação do fluxo

sonoro, sugerindo que quando o tempo é lento e/ou os sons estão próximos, a seqüência

resultante é sempre percebida como uma estrutura sonora única (o que recebeu o nome de

fission boundery - fusão de fronteira). Enquanto que se a distância entre os sons é grande

e/ou o tempo é rápido, duas estruturas sonoras são percebidas (o que ele chamou de

temporal coherence boundery - coerência temporal de fusão). E van Noorden identifica

ainda uma área fronteiriça em que o ouvinte pode perceber uma ou duas estruturas sonoras,

dependendo de sua disposição. A percepção que se tem no primeiro caso, fusão de fronteira

(fission boundery), é bem menos intensa do que a percepção que se tem no segundo caso,

coerência temporal de fusão (temporal coherence boundery).

A proximidade dos sons é também um fator que insinua o fluxo da percepção.

Estudos feitos por Dowling (1973) usando duas melodias conhecidas que se cruzavam e por

Deutsch (1975) e por van Noorden (1975) demonstraram que melodias ascendentes e

descendentes, que têm o mesmo timbre, e que se cruzam, são percebidas segundo o fluxo

induzido pela proximidade de seus intervalos. A Fig. 2 mostra esta lei da percepção.

Fig. 2 : Esquema ilustrando as duas possibilidades de percepção de trajetórias de sons que se cruzam.

Percepção “cruzada” (à direita) são mais comuns para estímulos formados por seqüências discretas de sons,

quando os timbres são idênticos.

Resumindo: pelo menos quatro fenômenos são importantes na definição da

proximidade das freqüências dos sons que determinam a fusão ou a separação do fluxo

auditivo para a percepção: a) a fusão de seqüências de sons monofônicos em perceptos

pseudopolifônicos (Miller e Heise, 1950); b) a descoberta de “degradações” do processo de

informação em tarefas temporais de fluxos cruzados (Schouten, Norman, Bregman e

Campbell e Fitzgibbons, Pollatsek e Thomas); c) a dificuldade de a percepção detectar o

fluxo auditivo quando há cruzamento de sons (Dowling, Deutsch, van Noorden); d) a

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proeminência da proximidade do som sobre a trajetória do som na continuação do fluxo

auditivo (Bregman e outros). A separação do fluxo é ainda fortemente dependente da

proximidade de sons sucessivos. Então a coerência do fluxo auditivo é mantida pela

proximidade dos sons com sons sucessivos no fluxo. O fluxo de um som básico é

assegurado quando o movimento do som está de acordo como limite de fusão (van

Noorden), (normalmente em torno de dois semitons ou menos) que têm a duração de pelo

menos 700 ms. Quando a distância entre os sons ultrapassa estes limites, mesmo assim

ainda é possível manter a percepção de um único fluxo reduzindo o tempo de duração dos

sons.

Imbricado com o princípio da Proximidade das freqüências (ou dos sons segundo

sua diatonicidade e temporalidade) poderiam estar: a) as “Leis Gestálticas” de nºs 2, 3 e 6

(Lei da Proximidade, Lei da Boa continuação e lei do Fato Comum, atuando como

“solicitadores” da boa continuação e atendimento de expectativas criadas pela experiência e

pela cultura favorecendo agrupamentos/separações no tempo e no espaço e dando (ou não)

ensejo à formação de estruturas); b) as “Regras para a condução das vozes na prática

harmônica” de nº 4, 8, 9e 10 (que delimitam o uso de intervalos que andam na contramão

da percepção individualizada das partes que favorecem o contínuo exigido pela forma

musical); c) as regras da composição de um catus firmus de nº 1 (que estabelece o uso de

valores isoritmicos favorecendo a continuidade sugerida); nºs 5, 7 e 10 (que estabelecem o

uso de intervalos que favoreçam à continuidade decorrente da proximidade das freqüências,

sem que isto implique em mascaramento).

6. A co-modulação tonal

Em 1863 Helmholtz já sugeriu que a movimentação concomitante de sons contribui

para a percepção de forma fundida dos sons que comparecem ao mesmo tempo.

Recentemente este tema foi retomado por Chowing (1980) e Bregman e Doehring (1984),

que, além de confirmarem a indicação de Helmholtz, acrescentaram novas indicações, por

exemplo, Bregman e Doehring (1984) que demonstraram experimentalmente que a fusão

tonal aumenta significativamente quando dois sons são modulados em mudanças

correlacionadas do logaritmo das freqüências e que a intensidade da fusão tonal é maior

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para os sons que mudam a freqüência, do que para os sons que permanecem na mesma

afinação.

Na prática musical este princípio se verifica. D. Huron mostrou que os compositores

da polifonia evitaram usar sons que tinham uma correlação positiva, sobretudo correlação

que implicava em movimento paralelo. Do que concluiu como princípio para a co-

modulação: a fusão perceptual de sons concomitantes e concorrentes é aumentada quando

os sons estão correlacionados positivamente e é ainda mais aumentada quando a correlação

é precisa com respeito ao logaritmo das freqüências.

Com o princípio da Co-modulação tonal, ou seja, da movimentação concomitante

de estruturas tonais, poderiam estar imbricados: a) praticamente todas as “Leis Gestálticas”

quando a relação entre as freqüências dos sons concomitantes favorecem à semelhança

entre os sons, a proximidade quanto às freqüências, à boa continuação de cada elemento em

relação ao todo, à pregnância que sintetiza a resultante das freqüências, ao fechamento

da(s) estrutura(s) formada(s) pelos intervalos, à experiência comum que induz a um

determinado paradigma da percepção; b) as “Regras para a condução das vozes na prática

harmônica” de nº 1 (que favorece à fusão das vozes quando usadas de acordo com os

determinantes que induzem à fusão); nº 4, 5, 6, 7, 9 e 10 (que regulam o uso dos intervalos

que favorecem/contrariam a fusão tonal dos sons, incentivando/restringindo a percepção

individual das partes; c) as regras da composição de um cantus firmus não estão

diretamente imbricadas com os efeitos decorrentes da co-modulação tonal por se tratar de

desenvolvimento linear (melódico), ou seja, da ocorrência de um som apenas a cada tempo.

A não ser que se pense nos efeitos lineares decorrentes do uso de sons sucessivos.

Concluímos os comentários a respeito dos seis princípios básicos para a composição

musical, tendo efetuado após cada um deles, algumas ligações entre as regras estabelecidas

para esta atividade e os princípios exigidos para que se obtenha uma audição clara e

individualizada das partes componentes da música. O propósito destes comentários foi

sinalizar o porquê de determinadas indicações e proibições nas gramáticas da composição

musical. Assim sendo o principal objetivo para a condução das vozes é criar duas ou mais

vozes (ou partes) que sejam percebidas distintamente. Uma boa condução das vozes deve

otimizar a audição das estruturas sonoras para que se ouça cada voz individualmente. Do

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que se conclui que uma boa condução das vozes requer a integração de uma audição clara

das partes individualmente e que haja uma separação clara da audição das estruturas entre

cada parte concorrente. Isto é comprovado, sobretudo por axiomas como: a audição de

estruturas coerentes é melhor quando se usa sons que evoquem imagens auditivas claras, e

que são indubitavelmente os sons complexos que evocam imagens auditivas mais claras. É

então que surgem as regras da condução das vozes que devem usar sons que evoquem

fortemente e de maneira única, sensações sonoras. Isto é conseguido de maneira eficiente

quando se usam sons harmonicamente complexos e é menos eficiente quando se usa, por

exemplo, ruídos. Em outras palavras, a tonicidade e harmonicidade são os princípios

básicos para que se consiga a integração individual das partes. Os sons que são mais

condizentes com estas exigências são os contidos próximos de 300 Hz ou mais amplamente

entre 80 e 800 Hz. Na gama do som musical a melhor tessitura para uma boa condução das

vozes está situada entre F2 e G5, região centrada no D4. A partir das imposições para uma

boa condução das vozes (ou partes) foram surgindo as regras retro indicadas e outras.

Quanto à continuidade temporal é mais eficaz usar sons continuados do que fontes com

sons interrompidos.

Na prática musical, praticamente em todo mundo, a base da produção dos sons que

são usados na música são os instrumentos musicais que produzem sons com alto nível de

audibilidade de harmônicos. Instrumentos que produzem inarmônicos (p. ex. instrumentos

de percussão) são menos usados, sobretudo na formação das vozes ou melodias.

Instrumentos de percussão de afinação definida (glokenspiels, marimbas, xilofones etc.) são

mais apropriados para produzir sons de base para as harmonias. Exemplos típicos deste

caso são os carrilhões. Sons sustentados têm melhor uso quando intercalados com pequenas

pausas ou interrupções. É preciso também evitar os mascaramentos que são prejudiciais à

audição individualizada das partes. Isto acontece quando os parciais localizam-se no âmbito

da banda crítica. A partir desta exigência formam-se regras como: em geral os sons que

compõem os acordes tonais (excluídos os clusters) devem situar-se o mais separadamente

possível, usando-se intervalos mais largos (harmonia larga) entre as vozes mais graves,

sendo isto ainda mais solicitado quando se trata de sonoridades mais graves no contexto

geral.

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Por outro lado uma boa condução das vozes é violada quando se usam sons que

induzem à fusão tonal, o que acontece quando se usam uníssonos, seguidos pelas 8ªs e 5ªs

justas que em uso paralelo são inaceitáveis.

No geral estes princípios foram respeitados pelos mestres da música desde G.

Palestrina, passando por J. S. Bach até o romantismo (fase madura de Beethoven,

Tchaikowsky etc.).

Visando a audição clara e individualizada das partes, muitas outras regras juntam-se

para conseguir este objetivo. E sintetizando o anteriormente exposto: a) usar notas

próximas priorizando os passos de segunda ou sons sustentando (vides Regras para a

composição de um cantus firmus, nºs 5 e 6 e da Prática harmônica nºs 5, 6 e 7) b) evitar

grandes saltos (Regras nºs 6, 8 do cantus firmus e nºs 8 da Prática Harmônica). Intervalos

grandes ameaçam a coesão da linha melódica, quando não forçam a abandonar o campo

harmônico (vide Regras nºs 6 e 8 do cantus firmus). Quando for inevitável o uso de

intervalos grandes, cuide-se de usar notas longas em uma ou ambas as partes que compõem

o intervalo. Esta regra se completa com uma outra que diz: c) quando existem sons comuns

em dois acordes seguidos deve-se manter a nota comum na mesma voz; d) o cruzamento

das vozes deve ser evitado, pois é um obstáculo à percepção continuada e individualizada

das vozes (vide nº 9 das Regras para a prática harmônica); e) evite-se a condução paralela

das vozes, sobretudo em uníssonos, 8ªs e 5ªs.

Quanto ao desenvolvimento das vozes ou partes instrumentais há uma

recomendação importante: faça-se uso preferencial da tessitura da voz ou instrumento que

mais os caracteriza, pois cada voz ou instrumento é mais bem caracterizado em

determinadas regiões.

7. A sincronicidade de ataque (onset)

O sétimo princípio que induz à percepção da música como estrutura refere-se ao

tempo em que ocorrem os ataques de cada voz, ou seja, o momento em que cada voz

começa. Se um compositor ao escrever para várias vozes deseja que cada voz seja ouvida

independentemente, tem que obedecer a regras estabelecidas, (mais heurística do que

formalmente), sendo uma delas evitar o ataque simultâneo das vozes. O ataque de cada voz

deve ocorrer pelo menos com 100 ms de diferença ou um pouco mais. Ou seja, a entrada

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(onset) de cada voz não deve ocorrer no mesmo instante. Como para todos os princípios a

observância deste princípio nem sempre é seguida pelos compositores. Por uma e por outra,

o que mais caracteriza a polifonia é a assincronia das entradas de cada voz. Pois, quando da

ocorrência de um intervalo que favorece a fusão tonal, a assincronia dos ataques alivia o

efeito da fusão tonal. Isto vale como uma regra que sugere usar este expediente, sobretudo

quando se usam uníssonos, 8ªs e 5ªs. Há, no entanto casos em que a sincronia é desejada

pelo compositor. Um destes casos é quando se trata de música vocal com texto, deixando-se

claro que o efeito polifônico perde em parte sua força.

Não pode ser esquecido também o papel do ritmo na composição das partes. Alguns

gêneros como danças, marchas, hinos etc. até exigem sincronia no ataque das partes (do

que resultam composições “homofônicas”), exatamente o contrário de outros gêneros como

as invenções, fugas e fugatos que por sua própria constituição estrutural exigem assincronia

de ataque na entrada das vozes.

Imbricado com o princípio da Sincronicidade de ataque (onset) das vozes podem ser

lembrados que: a) praticamente todas as “Leis Gestálticas” têm seu papel na percepção da

música a mais vozes, exigindo a assincronia na entrada delas, uma vez que isto é relevante

para estabelecer semelhanças, proximidade, boa continuação etc. favorecendo à percepção

individualizada das partes e coerência das partes para com o todo. b) as “Regras para a

condução das vozes na prática harmônica”, à maneira do contraponto, exigem para a

elaboração de uma harmonização, o preenchimento da função de cada som dentro do

acorde e do acorde dentro das cadências que pontuam o discurso musical. A sincronicidade

favorece o desempenho deste papel. As regras de nºs 5, 6, 7 e 9 podem ser associadas a este

tema; c) conquanto as regras da composição de um cantus firmus não estejam diretamente

envolvidas com a sincronicidade do ataque dos sons (o cantus firmus é uma sucessão de

sons) a realização de um contraponto polifônico (que tem como base a combinação dos

cantos firmes - canti firmi) está profundamente compromissada com a observância das

entradas assincrônicas das vozes.

8. O limite de densidade ou número de vozes ou de partes na composição.

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Na polifonia renascentista são freqüentes as peças compostas para um número

grande de vozes (são encontradas peças compostas para até 32 vozes, 8 coros mistos). Mas

será que temos um aparato neuropsicológico que seja capaz de perceber todas elas?

A “lenda popular” diz que fulano ou sicrano consegue ouvir até 6 ou 7 vozes. No

entanto, o comum “entre os mortais” é ouvir no máximo 3 ou 4 vozes, e de preferência

quando são assincronicamente distribuídas. Para as demais pessoas o resto é resto.

Fatores como ritmo e timbre diferenciados em cada voz são importantes

sinalizadores para a percepção individualizada das vozes. Em todo caso, o compositor que

deseja que cada parte de sua composição seja ouvida individualmente, terá que compô-la

preferencialmente para 3 ou 4 vozes e, no caso da orquestração dividir estas vozes em uma

instrumentação condizente que facilite a percepção de cada uma delas. Não é a toa que a

harmonia clássica é praticada de preferência a 4 vozes (tetrafonia). Todavia a composição

romântica e pós-romântica, com freqüência, desobedeceu a este princípio. Nela são

freqüentes acordes 5, 6 e mais sons diferentes, por exemplo com acordes de 9ª, 12ª

aumentada e 13ª8.

Princípio da densidade ou número de vozes ou de partes na composição é exigido,

entre outros motivos, pelas limitações do sistema auditivo humano. Constatados estes

limites, na prática, estabeleceram regras como: a) a “Lei Gestáltica” de nº 6 que afirma que

a forma como estamos acostumados a ouvir é a que predomina na audição de estruturas.

Então se trata uma lei decorrente da experiência que sugere o que podemos e o que não

podemos ouvir. b) as “Regras para a condução das vozes na prática harmônica” de nº 1, 2,

3, 4, 9 e 10 (e talvez as demais também) ditam os procedimentos que limitam a densidade

(profundidade) da música e advertem que da desobediência às limitações da percepção

surgem desperdício de material sonoro ou ambigüidades na percepção do todo; c) quanto à

aplicação das regras da composição de um cantus firmus ao princípio da densidade da

composição, a regra nº 1 (limita o número de sons) estabelece a dimensão linear da

estrutura sonora (aproximadamente 10 semibreves) e a nº 7 (que estabelece o âmbito de

uma 8ª como o intervalo favorável à percepção da estrutura melódica.

9. A diferenciação tímbrica

8 Deixando à parte os “clusters” da música pós tonal que não tem limite preestabelecido para sua abrangência.

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Depois da altura, o timbre é a propriedade do som que mais caracteriza uma linha

melódica. Na composição pós-tonal até se teve a idéia de compor melodias de timbre

(Klangenfarbenmelodie). Uma das principais características da composição dodecafônica é

a valorização do timbre. Sua diferenciação é fundamental para que ao ouvinte seja mais

fácil distinguir cada voz. Portanto se cada voz é escrita em um único timbre e sendo cada

voz escrita em um timbre diferente, a percepção das diferentes linhas melódicas é

facilitada.

Vários pesquisadores estudaram os efeitos do timbre (espectro do som) na

percepção das estruturas sonoras. Dentre eles D.Huron cita: van Noorden (1975), Wessel

(1979), Mc Adams e Bregman (1979), Bregman, Liao e Levitin (1990), Hartmann e

Johnson (1991) e Gregory (1994) ao que acrescentamos as conclusões obtidas em nossa

tese de doutorado (Oliveira 2002).

A recomendação final (que vale como um princípio) é que se um compositor

pretende escrever música na qual tem a intenção que os ouvintes ouçam cada parte

individualmente pode valer-se do princípio da caracterização de cada melodia com timbre

diferente.

Este princípio também é freqüentemente contrariado. Haja vista as composições

para instrumentos que têm timbres semelhantes, como por exemplo, os quartetos de corda

ou de sopro etc. Justificando esta contravenção outro princípio se contrapõe: o de que a

homogeneidade facilita a percepção do resultado final que gostamos de observar. Coerência

puxa coerência, semelhança puxa semelhança, uma característica puxa a outra, como

palavra puxa palavra assim também timbre puxa timbre. A razão desta homogeneidade

parece estar mais nas leis da percepção (aparato neurológico?). Já no caso da música vocal,

cada voz tem seu timbre próprio o que a torna perfeitamente diferenciada das demais vozes.

Infelizmente esta característica nem sempre é cobrada dos coralistas por alguns regentes de

coro.

Um timbre diferente é algo que chama a atenção do ouvinte direcionando-a para

este timbre. E se não tiver outro evento que seja mais importante para o fluxo da atenção é

ele que predomina no direcionamento da atenção.

Princípio da diferenciação tímbrica confere individualidade às melodias ou aos

acordes. Praticamente todas as leis getálticas, regras para a condução das vozes na prática

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harmônica” e as regras da composição de um cantus firmus concretizado na elaboração de

uma peça polifônica voltam-se para este princípio que confere sabor e especificação às

melodias. A mudança de timbre chama a atenção, direcionando-a para um determinado

fluxo, criando expectativas. Procedimentos que favorecem à percepção individualizada das

partes da música que geralmente são desejadas pelo compositor.

10. A localização da fonte sonora

Também ajuda na percepção individual de cada voz a localização das vozes,

separando-as no espaço bi- e tri-dimensional disponível.

A separação das fontes sonoras na execução das partes de uma música favorece a

percepção independente de cada parte. A origem diferente das vozes direciona a atenção de

forma que ainda é possível mantê-la em outros eventos de uma forma menos intensa ou até

encoberta, mas permanecendo todas presentes no campo da percepção.

A audição dicótica das fontes sonoras confere à música profundidade e

independência à seleção do que se ouve. Neste particular a intensidade e o timbre de cada

voz são fatores sinalizadores para a direção em que a atenção deve movimentar-se. Neste

caso o evento sonoro pode perder sua característica musical e se tornar apenas um efeito

acústico (Divenvi e Oliver, 1989), com pouca capacidade de fusão.

A aplicação do princípio de distanciamento espacial das partes é discutida por

alguns (principalmente pelos músicos atuantes). Em todo caso ela é praticada por muitos,

principalmente no caso da música atonal (Y. Xenakis, K. Stockhausen, J. Kage, M. Kagel e

vários outros compositores do século XX), em que o compositor pode intencionar juntar

efeitos sonoros (música) com efeitos sociais e de comunicação (quadridimensionalismo).

A distância entre as fontes é relativa ao efeito que se quer obter e ao espaço

disponível para isto. Geralmente os maestros diferem quanto à distância entre as partes: 5

metros é um referencial muito adotado. Há peças modernas para coral ou para orquestra

para cuja execução os maestros distribuem os músicos entre os ouvintes, mesmo com

prejuízo da audição do efeito musical total em benefício da integração social dos

assistentes, e neste caso a comunicação é feita mais pela presença do músico do que pela

música em si.

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Ao que foi dito a respeito do princípio da diferenciação tímbrica podem ser

acrescentados os efeitos da localização da fonte sonora. A localização diferente das fontes

sonoras, quando não provocam eventos extramusicais, é bem-vinda para a caracterização

das melodias através da dissociação da audição em canais distribuídos em espaços

diferentes. Praticamente todas as leis gestálticas, regras para a condução das vozes na

prática harmônica” e as regras da composição de um cantus firmus concretizado na

elaboração de uma peça polifônica, voltam-se para este princípio que confere

independência à percepção das melodias e da música como um todo. A mudança de timbre

chama a atenção, direcionando-a para um determinado fluxo; o mesmo ocorre quando

ouvimos sons provenientes de localizações diferentes. A atenção é direcionada, surgem

expectativas que podem ser atendidas ou não.

Naturalmente esta tentativa de associação das leis gestálticas e regras da harmonia e

da composição do cantus firmus com os princípios da percepção musical é empírica,

superficial e incompleta, deixando margem para discordâncias. Trata-se de uma área que

ainda exige estudos e pesquisas mais aprofundadas.

Conclusão:

Neste trabalho procuramos apresentar princípios que determinam a percepção

musical. Tais princípios geralmente estão compromissados com a organização musical da

música ocidental. Tivemos também a intenção de salientar que as regras para a composição

musical, geralmente estabelecidas empiricamente, inclusive a posteriori, têm um

fundamento neuropsicológico e/ou psicoacústico, que condizem com a prática musical.

Todavia sabe-se que nem todas estas regras são seguidas por todos, havendo transgressões

propositais ou não (sendo estas transgressões as principais responsáveis pelas inovações no

campo da criação musical, não só das gramaticais, mas também dos estilos ou estéticas).

Naturalmente trata-se de um trabalho incompleto e que deixa muitas questões sem

respostas. A música tem seus segredos que ainda não foram revelados pelos estudiosos da

acústica ou da psicoacústica, da cognição ou da psicologia, ou da sociologia cultural dos

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povos. Procuramos juntar a música como evento empírico com as justificativas que

impulsionam o ser humano a percebê-la como de fato a percebem ou a criam.

Fica ainda em aberto à discussão a questão referente aos universais da música: a

quem conferir o peso maior, se ao potencial neuropsicológico da percepção humana, ou se

ao fator sócio cultural.

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