Medellín: Igualdade para a vida

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Crescimento desordenado, pobreza, desigualdade social e violência são os grandes desafios de Medellín. Nos últimos anos, a cidade colombiana está a levar a cabo uma transformação urbana e social que faz dela uma das urbes mais atraentes da América do Sul.

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Edição #04JANEIRO/FEVEREIRO 2015

VIVER BARCELONA A histórica cidade desenvolve hoje alguns dos projectos mais inovadores lado a lado com património de séculos.

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SAÚDE DIGITAL, PACIENTES AUTÓNOMOSA tecnologia é actualmente uma ferramenta de excelência para melhorar os cuidados de saúde. mHealth marca a tendência.

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SMART TRAVEL 2014: PARTILHAR O NORDESTEPoderá a economia de partilha ser a solução para o desenvolvimento do turismo e território do Nordeste Transmontano?

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IGUALDADE PARA A VIDA Medellín está a dar nas vistas por todo o mundo graças à forte transformação urbana e social que está a levar a cabo.

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06 DIGIZENS Um espaço para o cidadão digital.

10 TENDÊNCIAS PARA 2015 Seis especialistas apontam as principais tendências para o ano de

2015 na área das cidades inteligentes.

16 SERVIÇOS SELF-SERVICE PARA MUNÍCIPES Matosinhos implementou uma plataforma inteligente para gestão

dos serviços municipais.

20 ENTREVISTA Steve Lewis Paredes: Portugal é prioridade para a Living PlanIT.

32 BARCELONA CONECTADA AO FUTURO A Cisco transformou o districto de Born numa montra de soluções

Internet of Everything.

34 400 CIDADES EM CONGRESSO Em Novembro, 400 cidades de todo o mundo estiveram presentes

no Smart City Expo World Congress.

40 APP_ME Uma selecção de aplicações para o dia-a-dia.

44 CURSOS ON-LINE, UMA TENDÊNCIA PARA FICAR? Qual o futuro dos cursos on-line abertos e em larga escala

(MOCC)?.

48 OPINIÃO Inês Mourão Climate Smart Cities de Lima a Paris.

50 TURISTAS DIGITAIS PELO CENTRO DE PORTUGAL A região Centro do país está a aproveitar as potencialidades

da aplicação Just in Time Tourist para promover o turismo.

54 ENTREVISTA Sandra Baer “As redes sociais são uma força mobilizadora”.

60 OPINIÃO João Paulo Fernandes O papel das empresas tecnológicas nas smart cities.

66 ENTREVISTA Nick Hall “É importante que os visitantes estejam sempre conectados”.

70 À PROCURA DE TERRITÓRIOS INTELIGENTES Enquanto o Estado português quer promover a criação de valor

e a capacidade inovadora, as autarquias nacionais pedem maior coerência e inteligência nas decisões do Governo.

74 CRIAR RIQUEZA, SEM ESGOTAR RECURSOS Quase 200 pessoas estiveram participaram na conferência

“Cidades Inteligentes, Cidades do Futuro”.

76 OPINIÃO Ricardo Rio Braga, a perspectiva de uma comunidade inteligente e sustentável

84 ENTREVISTA Marco Painho e Vítor Santos “As cidades têm de ter uma política de abertura dos seus dados”.

92 OPINIÃO Elsa Nascimento A Importância do correto encaminhamento para reciclagem e

tratamento dos REEE fora de uso.

94 A DOIS PASSOS DOS RESÍDUOS ZERO Em São Francisco, a meta para 2020 é que acabar com todo o lixo

que não possa ser reaproveitado.

96 LAVAGEM ECOLÓGICA... NÃO INCLUI ÁGUA A lavagem de carros sem água já permitiu poupar 2,5 milhões de

litros de água em Portugal.

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Pantone Process Black

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C8 M0 Y0 K20

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MEDELLÍN

IGUALDADE PARA A VIDA

FILIPA CARDOSO

Medellín é a segunda maior cidade da Colômbia. Acom-panhando a realidade sul-americana, Medellín tem vi-vido, nas últimas décadas, atormentada pela desigual-dade social, pobreza e violência. Um cenário com o qual a alcaldía (câmara municipal) não se conforma e, em-penhada em reverter a situação, tem reunido esforços para reabilitar o “lar” das mais de 2,4 milhões de pes-soas que vivem em Medellín. Uma transformação ur-bana que envolve praticamente todos os sectores e que passa por fazer de Medellín “uma cidade para a vida”.“Como sociedade, trabalhamos para ter uma sociedade inclusiva a nível social, distributiva economicamente, democrática a nível político e sustentável do ponto de vista ambiental”, explica à Smart Cities Aníbal Gaviria, que está no governo da cidade desde 2012. “E vamos pe-lo caminho correcto”, afirma o alcaide (presidente da câmara municipal), ilustrando com dados concretos: “o desemprego em Medellín diminuiu, até agora, durante o nosso mandato, 24%, apresentando o nível mais baixo dos últimos 18 anos. A diminuição do abandono escolar nestes três anos de governo é de 17%, o índice mais bai-xo em mais de dez anos. Actualmente, a cidade apresen-ta os níveis mais baixos de pobreza, pobreza extrema e desigualdade dos últimos 11 anos (uma redução de 56% na pobreza e de 63% na pobreza extrema). Adicional-mente, Medellín regista o Índice de Desenvolvimento Humano mais alto e o menor índice de desigualdade nos últimos dez anos”.Face a estes resultados, não admira que a cidade esteja a dar nas vistas um pouco por todo o mundo: em Barcelo-na, foi uma das protagonistas do último Smart City Ex-po World Congress; o Wall Street Journal, o Urban Land Institute e o Citigroup atribuíram-lhe o título de “cidade mais inovadora do mundo”; e a Rockfeller Foundation incluiu-a entre as suas Cidades Resilientes.

Mas como se transforma uma das 50 cidades mais violentas do mundo numa cidade para a vida? “Bons go-vernos sucessivos e sintonizados, apoio do sector priva-

do, da academia, das organizações sociais e, no geral, o trabalho de uma cidade participativa e comprometida” foram, segundo Gaviria, os motores da “metamorfose física e social” que se vive em Medellín. Como princi-pal tarefa, o governo elegeu a irradicação da violência e a promoção da resolução pacífica de conflitos, com base no respeito pela vida. Os homicídios na cidade es-tão, segundo explica o governante, ligados a dinâmicas territoriais e de delinquência. Actualmente Medellín tem o nível de homicídios mais baixo dos últimos 35 anos, fruto do trabalho conjunto e coordenado entre a administração municipal e os organismos de seguran-ça e justiça, que “permitiram reforçar acções dirigidas a desarticular as estruturas criminais e os grupos delin-quentes em zonas estratégicas, no sentido da consoli-dação territorial através de um aumento do número de quadrantes, câmaras de vídeo vigilância, equipamentos tecnológicos e apoio logístico”, conta o responsável. Em 2013, Medellín era a 38ª cidade mais violenta, com 38 homicídios por cada 100 mil habitantes, o número de mortes violentas foi reduzido em 2014, estimando-se que seja de 28/100 mil.

CINCO PRINCÍPIOSCompreender o actual cenário da cidade obriga-nos a recuar aos anos 20. Afirmando-se como um território atractivo, no Valle de Aburrá, Medellín viu, desde essa altura, a sua população aumentar exponencialmente: de 91 mil habitantes para os actuais mais de 2,4 milhões. À medida que a população ia aumentando, o crescimen-to urbano foi, ao longo do século XX, pintando o vale e as suas encostas de prédios e mais prédios, muitas ve-zes construídos em zonas informais de risco. Com os novos habitantes, instalaram-se também problemas de pobreza, de desigualdade e de violência, que são hoje os maiores desafios para a alcaldía.

O modelo para alterar essa realidade tem como ba-se cinco princípios: não-violência, transparência, par-ticipação, inovação e resiliência. Todos os propósitos e decisões do governo da cidade devem ter como base

“Continuamos a ser uma sociedade extremamente desigual e a padecer de uma incapacidade dolorosa de conviver, que se manifesta numa violência que nos golpeia como cidadãos e nos trava como sociedade”.

Crescimento desordenado, pobreza, desigualdade social e violência são os grandes desafios de Medellín. Nos últimos anos, a cidade colombiana está a levar a cabo uma transformação urbana e social que faz dela uma das urbes mais atraentes da América do Sul.

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ERRADICAR A VIOLÊNCIA E A DESIGUALDADEANÍBAL GAVIRIA, ALCAIDE DE MEDELLÍN

A construção de infra-estruturas integradas de trans-porte público, como o metro, os cabos aéreos [te-leférico], os autocarros articulados e os eléctricos, projectos como os Parques del Rio Medellín, Cintu-rón Verde e as UVA, assim como o desenvolvimen-to de obras físicas e sociais em zonas vulneráveis, a redução dos índices de criminalidade e a construção de equipamentos e espaços culturais são alguns dos factores que mostram esta transformação e atraem os olhos do mundo. Com a execução de projectos, como a construção das 20 UVA, a cidade continua a apostar na educação como ferramenta fundamen-tal para alcançar uma mudança social profunda que vença a violência e supere as desigualdades. Para além de consolidar um cenário para continuar a en-caminhar as crianças, os jovens e as famílias para uma cultura de resolução pacífica dos conflitos, o que nos satisfaz mais é o facto de continuarmos a fortalecer a acção da força pública, para que esta, em conjunto com os organismos de justiça, tenha uma maior capacidade para atacar os fenómenos delin-quentes e as actividades criminais que têm assolado a nossa cidade durante tanto tempo. Conseguimos consolidar uma institucionalidade pú-blico-privada muito forte que gera uma mistura mui-to interessante e que nos permite captar iniciativas privadas e levá-las ao público. Trabalhamos com ba-se no conceito de inovação aberta, onde as pessoas podem dar ideias nos seus bairros, através das Jor-nadas de Vida, que juntam os cidadãos em redor das suas dinâmicas diárias e encontram alternativas para as resolver. As diferentes intervenções e boas prá-ticas que Medellín tem vindo a executar são aptas para replicar-se noutras cidades e países.O nosso mandato de governo na superação das pro-fundas desigualdades recebeu o Prémio “Colômbia Líder”, o que, enquanto alcaide, me traz muita sa-tisfação. Este reconhecimento reafirma a nossa filo-sofia de governo: “a Igualdade é o caminho, a Vida é a meta”.O desenvolvimento em Medellín faz-se em duas di-recções: o reconhecimento dos seus progressos ur-banísticos e sociais, e a motivação para erradicar decididamente a violência e a desigualdade. Os re-

conhecimentos que recebemos nos últimos anos e o que implicam não mudam as duras realidade de outras décadas e não devem, de nenhuma forma, ocultá-las ou minimizá-las. Devemos aproveitá-los em dois sentidos: reconhecer os nossos progressos e reconciliar-nos com o que temos de positivo e com o que foi conseguido; motivarmo-nos a enfrentar jun-tos, com toda a força e determinação, a violência e a desigualdade. Estes reconhecimentos internacionais permitiram-nos mostrar os progressos da cidade em aspectos, como o sistema integrado de transporte, a contribuição das Empresas de Serviços Públicos (EPM) no desenvolvimento e os novos equipamen-tos urbanísticos para a educação e cultura, mas também a melhoria dos indicadores de segurança e os projectos presentes e futuros da cidade, con-solidando-se como uma referência mundial de ino-vação, empreendimento e desenvolvimento.Com respeito à diminuição do número de homicí-dios que se registou, paulatinamente devo dizer que é uma redução significativa, embora o facto de um único homicídio ser, por si, só uma tragédia. Temos de continuar a trabalhar para que os dias sem mortes violentas se multipliquem na cidade.Apesar disto, ainda nos falta muito caminho a per-correr. Continuamos a ser uma sociedade extrema-mente desigual e a padecer de uma incapacidade dolorosa de conviver, que se manifesta numa vio-lência que nos golpeia como cidadãos e nos trava como sociedade.

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estes cinco temas, explicou Aníbal Gaviria no World Ur-ban Forum 7, organizado pela UN Habitat em Abril de 2014, em Medellín.

Os esforços para a transformação de Medellín re-flectem-se numa série de programas e projectos de de-senvolvimento urbano e social. No combate à desigual-dade, a principal ferramenta é a educação e a cultura. Nesta área, Medellín quer ser uma “cidade escola”, apostando no urbanismo pedagógico, no qual todas as infra-estruturas ensinam algo à população. O exem-plo mais claro são os Parques Biblioteca. Melhorar a educação básica faz parte das prioridades da cidade, o que se reflecte num aumento da taxa bruta de escola-rização para o ensino básico, de 24,2% em 2004 para 87,6% em 2013. Paralelamente, é importante tornar o

ensino superior mais atractivo, o que levou à criação de bolsas para jovens com menos recursos financeiros, estando também prevista a construção de duas novas universidades.

Aliado ao urbanismo pedagógico, o desenvolvimen-to urbano segue, de acordo com o alcaide, o princípio da qualidade. “Espaços e equipamentos públicos de qualidade”, esclarece Gavira. Por toda a cidade, surgi-ram 20 “unidades de vida articuladas”, chamadas UVA, “transformações urbanas nos bairros para proporcio-nar o encontro do cidadão, fomentar o desporto, o re-creio, a cultura e a participação comunitária”. No caso da UVA de los Sueños, um velho reservatório de água foi transformado num destes espaços comunitários, mas, na cidade, outros projectos ganham também protago-nismo, como o Parque del Rio Medellín, cujo objectivo é despoluir o rio, recuperar a zona envolvente e devol-vê-los à população.

Entre as prioridades máximas para a cidade colom-biana estão os meios de transporte. A cidade desenvol-veu um modelo de gestão educacional e social para a rede de metro, que promove o bom uso e respeito por este modo de transporte – La Cultura Metro. A utili-zação do teleférico como meio de transporte público e das escadas rolantes nas colinas da cidade são hoje imagens de marca da cidade, tendo sido determinantes para melhorar a mobilidade em Medellín.

Uma cidade para a vida não se quer sem inclusão e bem-estar. E, por isso, Medellín tem implementado programas que vão desde a melhoria das condições de saúde da população, de atenção à educação, ao combate ao narcotráfico e à toxicodependência ou ainda iniciati-vas para a igualdade de género. Um dos mais emblemá-ticos é o Medellín Solidaria, cujo objectivo é melhorar a qualidade de vida das famílias que vivem em condi-ções de pobreza extrema, estimulando a sua autonomia e dando-lhes oportunidades de inclusão social através de programas, projectos e serviços públicos e privados das organizações municipais e nacionais. Até agora, a iniciativa já ajudou mais de 238 mil pessoas.

Como não podia deixar de ser, o desenvolvimento económico faz também parte dos objectivos desta cida-de colombiana. Neste aspecto, Medellín pretende dis-tinguir-se também pela ciência, tecnologia e inovação. Muito em breve, terá o seu próprio bairro de inovação, cujo planeamento envolve o desenvolvimento e reabi-litação de cerca de um milhão de metros quadrados na próxima década. O Medellínnovation District situa-se na zona Norte da cidade, onde residem actualmente perto de 12 mil habitantes e existem 1800 postos de trabalho. Em 2023, estima-se que esses números as-cendam, ambos, aos 28 mil. SC

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