Memorial do Convento - caracterização de personagens e simbologia

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Memorial do Convento - Personagens⇨ Memorial do Convento é uma narrativa histórica que entrelaça personagens e

acontecimentos verídicos com seres conseguidos pela ficção.⇨ O facto de personagens fictícias (Baltasar e Blimunda) actuarem juntamente com

personagens reais permite que os limites entre a realidade e a ficção se misturem, tornando as

primeiras mais verosímeis.

 

D. João V

§   Amante dos prazeres humanos, a figura real é construída através do olhar crítico do

narrador, de forma multifacetada:

é o devoto fanático que submete um país inteiro ao cumprimento de uma promessa

pessoal (a construção do convento, de modo a garantir a sucessão) e que assiste aos

autos-de-fé;

é o marido que não evidencia qualquer sentimento amoroso pela rainha,

apresentando nesta relação uma faceta quase animalesca, enfatizada pela utilização

de vocábulos que remetem para esta ideia (como a forma verbal" emprenhou" e o

adjectivo "cobridor");

é o megalómano que desvia as riquezas nacionais para manter uma corte dominada

pelo luxo, pela corrupção e pelo excesso;

é o rei vaidoso que se equipara o Deus nas suas relações com as religiosas;

é o curioso que se interessa pelas invenções do padre Bartolomeu de Gusmão;

é o esteta que convida Domenico Scarlatti a permanecer em Portugal;

é o homem que teme a morte e que antecipa a sua imortalidade, através da sagração

do convento no dia do seu quadragésimo primeiro aniversário.

 

D. Maria Ana Josefa 

§   A rainha representa a mulher que só através do sonho se liberta da sua condição

aristocrática para assumir a sua feminilidade. D. Maria Ana é caracterizada como uma

mulher

passiva,

insatisfeita,

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que vive um casamento baseado na aparência, na sexualidade reprimida e num falso

código ético, moral e religioso.

§   A transgressão onírica é a única expressão da rainha que sucumbe, posteriormente, ao

sentimento de culpa. A pecaminosa atracção incestuosa que sente por D. Francisco, seu

cunhado, conduzem-na a uma busca constante de redenção através da oração e da confissão -

COMPLEXO DE CULPA.

§   A rainha vive num ambiente repressivo, cujas proibições regem a sua existência e para a

qual não há fuga possível, a não ser através do sonho, onde pode explorar a sua sensualidade.

§   Consciente da virilidade e da infidelidade do marido (abundam os filhos bastardos), D.

Maria Ana assume uma atitude de passividade e de infelicidade perante a vida.

 

Baltasar Sete-Sóis 

§   Baltasar Mateus é um dos membros do casal protagonista da narrativa.

§   Representa a crítica do narrador à desumanidade da guerra, uma vez que participa na

Guerra da Sucessão (1704-1712) e, depois de perder a mão esquerda, é excluído do exército.

§   Construído enquanto arquétipo da condição humana, Baltasar Sete-Sóis é um homem

pragmático e simples, que assume o papel de demiurgo, o deus criador, na construção da

passarola (ao realizar o sonho de Bartolomeu de Gusmão).

§   Participa na construção do convento e partilha, através do silêncio, a vida de Blimunda

Sete-Luas.

§   Sucumbe às mãos da Inquisição.

 

Blimunda Sete-Luas

§   Blimunda é o segundo membro do casal protagonista da narrativa. Mulher sensual e

inteligente, Blimunda vive sem subterfúgios, sem regras que a condicionem e escravizem.

§   Dotada de poderes invulgares, como a mãe, escolhe Baltasar para partilhar a sua vida,

numa existência de amor pleno, de liberdade, sem compromissos e sem culpa.

§   Blimunda representa o transcendente e a inquietação constante do ser humano em relação

à morte, ao amor, ao pecado e à existência de Deus.

§   O seu dom particular (ecovisão, ou seja a capacidade de ver por dentro) transfigura esta

personagem, aproximando-a da espiritualidade da música de Scarlatti e do sonho de

Bartolomeu de Gusmão.

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§   Ao visualizar a essência dos que a rodeiam, Blimunda transgride os códigos existentes e

percepciona a hipocrisia e a mentira.

 

Padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão

§   O padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão representa as novas ideias que causavam

estranheza na inculta sociedade portuguesa.

§   Estrangeirado, Bartolomeu de Gusmão tornou-se um alvo apetecido da chacota da corte

e da Inquisição, apesar da protecção real.

§   Homem curioso e grande orador sacro (a sua fama aproxima-o do padre António

Vieira).

§   Bartolomeu de Gusmão evidenciou, ao longo da obra, uma profunda crise de fé, a que as

leituras diversificadas e a postura "antidogmática" não serão alheios, numa busca incessante do

saber.

§   A sua personagem risível - era conhecido por "Voador" - torna-o elemento catalisador do

voo do passarola, conjuntamente com Baltasar e Blimunda.

§   A tríade corporiza o sonho e o empenho tornados realidade, a par da desgraça, também

ela, partilhada (loucura e morte, em Toledo, de Bartolomeu de Gusmão, morte de Baltasar Sete-

Sóis no auto-de-fé e solidão de Blimunda).

 

Domenico Scarlatti

§   Scarlatti representa a arte que, aliada ao sonho, permite a cura de Blimunda e possibilita a

conclusão e o voo da passarola.

 

O Povo 

§   O verdadeiro protagonista de Memorial do Convento é o povo trabalhador. Espoliado,

rude, violento, o povo atravessa toda a narrativa, numa construção de figuras que, embora

corporizadas por Baltasar e Blimunda, tipificam a massa colectiva e anónima que construiu, de

facto, o convento.

§   A crítica e o olhar mordaz do narrador enfatizam a escravidão a que foram sujeitos

quarenta mil portugueses, para alimentar o sonho de um rei megalómano ao qual se atribui a

edificação do Convento de Mafra.

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§   A necessidade de individualizar personagens que representam a força motriz que erigiu o

palácio-convento, sob um regime opressivo, é a verdadeira elegia de Saramago para todos

aqueles que, embora ficcionais, traduzem a essência de ser português:

GRANDES FEITOS, COM GRANDE ESFORÇO E CAPACIDADE DE

SOFRIMENTO

 

Em suma 

 Considerando que a estrutura narrativa do romance está assente no conflito motivado pela

construção do Convento de Mafra, verificam-se os seguintes papéis:

⇨ Antagonistas: classe dominante/ opressora (clero e nobreza) Vs. povo, a classe

dominada/ oprimida; ao longo da obra, os primeiros acabam por ser rebaixados e

ridicularizados, enquanto que o Povo é valorizado pelo narrador.

⇨ Mediadores do Conflito: Baltasar, Blimunda, membros do povo; Padre Bartolomeu,

membro do Clero; Domenico Scarlatti, aristocrata e músico.

A imagem da vida real é dada em permanente contraste com a vida dos verdadeiros heróis

do romance: o par real reflecte a visão histórica da época que se caracterizava pelo excesso, a

riqueza, a corrupção, a sexualidade reprimida e subordinada ao falso código cerimonioso e

moral religioso, perdendo, assim, a sua “grandeza real”.

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Simbologia de Memorial do Convento

 Dimensão Simbólica

 

CONVENTO DE MAFRA

 

 

 

PASSAROLA

 

 

 

BLIMUNDA

 

NÚMERO SETE

 

 

 

SOL

 

       D. João V, que surge na obra como um monarca libertino e vulgar (contrariando a História, que o consagra como «o Magnânimo») manda construir um monumento que é símbolo da ostentação régia, da opressão e da vaidade dos poderosos.

       Representa o sacrifício dos operários que construíram esse monumento, a exploração e miséria do povo que nele trabalhou.

       Traduz a harmonia entre o sonho e a sua realização. Graças ao sonho, foi possível juntar a ciência, o trabalho artesanal, a magia e a arte, para fazer a passarola voar.

       Representa a liberdade, a alternativa a um espaço de repressão, intolerância e violência (Inquisição / Despotismo Iluminado).

       Com o seu poder de visão, compreende as coisas sobre a vida, a morte, o pecado e o amor.

       O olhar de Blimunda é o olhar da «História» que o narrador exercita, denunciando a moral duvidosa, os excessos da corte, o materialismo e hipocrisia do clero, as injustiças da Inquisição, o terror, o obscurantismo de uma época, a miséria e as diferenças sociais.

 

       Sete são as vezes que Blimunda passa em Lisboa, em demanda de Baltasar. Esse número regula os ciclos da vida e da morte na Terra e pode ligar-se à ideia de felicidade, de totalidade, de ordem moral e espiritual.

       Associado a Baltasar e ao povo, sugere a ideia de vida, de renovação de energias (o povo trabalha até à exaustão no convento, Baltasar constrói uma máquina, mesmo depois de decepado).

       Como o Sol, que todos os dias tem de vencer os guardiães da noite

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LUA

 

 

COBERTOR

 

 

COLHER

(mitologia antiga), também Baltasar vence as forças obscuras da ignorância e da intolerância ao voar.

       Símbolo do ritmo biológico da Terra, traduz a força vital que é representada pelas vontades recolhidas por Blimunda para fazer voar a passarola.

       Associada a Blimunda, lembra o seu mágico poder de «ver às escuras», embora este esteja condicionado (só vê o interior das pessoas em jejum e quando não há quarto de lua).

 

       Trazido da Holanda pela rainha, torna-se símbolo da separação que marca o casamento de conveniência do casal régio. Exprime a frieza do amor, a ausência do prazer, os desejos insatisfeitos.

 

       Quando partilhada, é um símbolo da aliança, do compromisso sagrado que vai unir para sempre as duas personagens populares. Exprime o amor autêntico, a atracção erótica e apaixonada, a vivência plena do prazer.

 

Informação retirada de:

http://esjapportugues.blogs.sapo.pt/7166.html