MERCADO Rum não, cachaça - Mania de · PDF fileuma bebida genuinamente...
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12 _www.engarrafadormoderno.com.br Engarrafador Moderno
A expectativa dos fabricantes em relação ao aumento
nas exportações de cachaça, a partir do reconhecimento
e venda do produto nos Estados Unidos como
uma bebida genuinamente brasileira
MERCADO
Rum não,cachaçacachaça
Por Nani Soares
13ABRIL/13
vadas da cana-de-açúcar, o que era
muito difícil a partir da classifica-
ção como rum. Assim, mais do que
apenas saborear uma boa caipiri-
nha, os consumidores de outros
países saberão exatamente qual o
destilado usado na receita original
do drink. A expectativa então, é
que as vendas aumentem exponen-
cialmente e saia da casa de 1%,
percentual ainda baixo diante do
potencial da categoria.
De acordo com dados do Minis-
tério do Desenvolvimento, Indústria
e Comércio Exterior (MDIC), em 2012
ça" como de origem exclusivamente
brasileira e respeitando o nome com
o qual foi batizado na terra natal.
Para os brasileiros, que se encar-
regaram de dar outros apelidos ca-
rinhosos à bebida, como branquinha
e pinga, a mudança não traz um re-
flexo direto. Para os fabricantes, no
entanto, é um importante passo para
consolidar a bebida no cenário inter-
nacional e torná-la mais competiti-
va. Além de agregar valor e contri-
buir para uma melhor divulgação, o
reconhecimento vai evitar eventuais
confusões com outras bebidas deri-
Nascida quase por aca-
so nas senzalas brasi-
leiras e originalmente
uma bebida de baixa
qualidade, a cachaça
se prepara para assu-
mir um novo posicionamento no mer-
cado global de destilados. O acor-
do firmado em 2012 garantindo ao
Brasil o uso de direitos exclusivos
da denominação "cachaça" nos Es-
tados Unidos finalmente sai do pa-
pel e vira uma realidade. A partir do
dia 11 de abril, o produto deixou de
ser comercializado como "rum bra-
sileiro", legitimando a marca "cacha-
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as exportações de cachaça atingiram
US$ 12 milhões, totalizando 8,1 mi-
lhões de litros enviados ao exterior.
O principal mercado foi a Alemanha,
que somou US$ 2,3 milhões, segui-
do dos Estados Unidos, com US$ 1,8
milhão. Apesar da segunda posição,
em 2012 o mercado americano regis-
trou aumento nas vendas de 23,3%
em valor e 35,1% em volume, em
comparação com o ano anterior.
Embora a medida mais imediata
seja abolir o termo "brazilian run" dos
rótulos frontais dos produtos expor-
tados para os Estados Unidos, os
fabricantes só sentirão efetivamen-
te os resultados da mudança no mé-
dio prazo, a partir do incremento dos
investimentos em marketing e da ex-
pansão do produto no mercado ame-
ricano, um dos maiores importado-
res ao lado de Alemanha, Paraguai
e Bolívia.
Apesar das boas oportunidades
no mercado externo, esta não deve-
rá ser a única prioridade para os fa-
bricantes, segundo Vicente Bastos
Ribeiro, presidente da Diretoria Exe-
cutiva do Instituto Brasileiro da Ca-
chaça (Ibrac), que assegura que os
esforços serão também para elevar
o consumo no mercado doméstico,
afastando de vez o preconceito.
"Este reconhecimento significa um
enorme passo, tendo em vista o por-
te do mercado norte-americano, para
evitar que a cachaça vire uma deno-
minação genérica como a vodca. A
estratégia das empresas produtoras
para alavancar a competitividade in-
clui a elevação dos patamares de
qualidade e investimentos mercado-
lógicos", esclarece o executivo, res-
saltando que o maior objetivo era tor-
nar a cachaça um produto distinto,
como o saquê japonês, a tequila me-
xicana e o uísque escocês.
“
”
Tendo em vista o porte
do mercado americano, o
reconhecimento vai evitar que a
cachaça vire uma denominação
genérica, como a vodca
Vicente Bastos Ribeiro, do Ibrac
15ABRIL/13
Ele explica também que o reco-
nhecimento vale para qualquer ca-
chaça produzida no Brasil, sejam as
chamadas cachaças industriais (ou
de coluna) ou artesanais (de alambi-
que). "Independente dos métodos de
destilação ou segmentos de preço,
a expectativa no médio prazo é que
todo o setor seja beneficiado", com-
pleta Ribeiro, que prevê um aumen-
to de 15% nas exportações este ano.
A vitória nos Estados Unidos e a
quebra de paradigmas no próprio
mercado brasileiro (estima-se um
crescimento avançado da cachaça
nos últimos cinco anos, especial-
mente na versão Premium) não afas-
tam os desafios que ainda se dese-
nham no setor. A distribuição ainda
constitui um problema, sobretudo
para pequenos fabricantes, mas a
maior dificuldade está relacionada
ao combate à informalidade. Medi-
das efetivas que contribuam para a
valorização da bebida, tanto em ter-
mos de elevação do padrão de quali-
dade quanto de uma melhora na per-
cepção dos consumidores, também
ainda são necessárias, o que pode
ser favorecido a partir da recente
entrada de grandes players interna-
cionais, segundo Ribeiro, o que deve
auferir ganhos como dinamismo e re-
novação ao setor.
Efeito dominó
Para Vitória Cavalcanti, diretora de
Comércio Exterior da Pitú, o reconhe-
cimento da tipicidade da cachaça te-
rá desdobramentos positivos no mer-
cado internacional e no próprio merca-
do interno. Antes a cachaça era obri-
gada a competir com o rum, uma be-
bida consolidada no segmento de des-
tilados e fabricada por diversos paí-
ses, mas sem nenhuma tradição his-
tórica no Brasil. O termo cachaça tam-
Setor exportou 8,1 milhões
de litros de cachaça em 2012
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bém vai garantir que o produto vendi-
do seja obrigatoriamente produzido
no País e de acordo com os padrões
oficiais de identidade e qualidade, ini-
bindo a venda de outros destilados
"genéricos". De quebra, o reconheci-
mento ainda serviu de incentivo para
outros países reconhecerem bebidas
típicas de seus países.
"Este reconhecimento abre opor-
tunidades para que outros países fa-
çam o mesmo. O México já se pro-
nunciou ao Itamaraty que quer reco-
nhecer a cachaça em acordo bilate-
ral e a Colômbia também já reconhe-
ceu", revela a executiva.
Antes comercializados em um
mercado restrito, os produtos de
qualidade superior passaram a ser
um dos focos da Pitú a partir de
1998, com o lançamento da Pitú
Gold. As versões Premium serviram
para rejuvenescer a categoria, levan-
do-a para um público formador de
opinião. Também contribuíram para
elevar as versões mais populares,
promovendo a evolução técnica e
mudando a imagem dessas versões,
mas principalmente, serviram para
demonstrar a qualidade do produto
e garantir um melhor posicionamento
da cachaça no segmento de desti-
lados, avalia a executiva. "Este movi-
mento de premiunização coloca a
cachaça em evidência, trazendo be-
nefícios diretos para todas as ver-
sões", ressalta. Ela admite, no en-
tanto, que o movimento ainda é tí-
mido e a maior parte do volume ven-
dido está concentrada em versões
populares.
Segundo Vitória Cavalcanti, o
mercado está favorável ao consumo e
justamente por isso o setor está mais
competitivo. Assim, independente do
porte do player é preciso buscar es-
tratégias para garantir um bom desem-
penho em ambos os mercados, do-
méstico e internacional. E nos dois há
barreiras a serem vencidas.
Se por aqui o desafio é quebrar o
paradigma quanto ao preconceito
em relação ao bebedor de cachaça,
em outros mercados a missão é ou-
tra. "Nossa principal dificuldade é tor-
nar o produto conhecido, já que o
mercado internacional de cachaça é
ainda muito pequeno. O Brasil expor-
ta apenas 1,2% do que produz. Tra-
balhamos para ensinar o que é o pro-
duto e como consumi-lo, pois o que
vende cachaça no exterior ainda é a
caipirinha. O reconhecimento deve
mudar essa percepção", diz.
Fundada em 1938 em Vitória de
Santo Antão (PE), a Pitú é uma das
mais tradicionais do setor e mantém
uma produção intensa: são 30.000
latas/ hora, 18.000 garrafas de 600
ml/hora e 43.000 litros/hora. Em
2012, o volume de vendas foi de 90
milhões de litros de cachaça. A em-
presa foi uma das primeiras a enva-
sar o aguardente de cana em recipi-
ente metálico, tipo lata de latão, an-
tecessora da embalagem de alumí-
nio, além de produzir embalagens
comemorativas em datas como Car-
naval, São João, réveillon e Copa do
17ABRIL/13
Mundo. O próximo lançamento será
uma versão em lata de 710 ml, pre-
visto para ocorrer ainda este ano.
Vitória destaca que os principais
avanços foram no controle de quali-
dade do produto, tanto em linha
como acabado, bem como no au-
mento da capacidade dos tanques
de aço inox, atualmente em 30 mi-
lhões de litros. A Pitú é a única em-
presa de aguardente a ter todos os
tanques de estoque em inox, segun-
do a executiva.
Atualmente, a empresa exporta
seus produtos para países como Ale-
manha, Angola, Austrália, Canadá,
Chile, Índia, Líbano, Áustria, Portu-
gal, Espanha, França, Dinamarca,
Noruega, Hungria, Turquia e Re-
publica Tcheca.
Novos investimentos
Um dos pontos favoráveis do re-
conhecimento da cachaça nos Es-
tados Unidos é a possibilidade de
colocar a bebida no grupo de desti-
lados mais consumidos do planeta,
ao lado de vodca, uísque, gim e
tequila. Para isso, os fabricantes con-
tam com o crescente interesse de
grandes grupos mundiais de bebi-
das, capazes de injetar quantias vul-
tosas não só na divulgação do pro-
duto, mas na expansão dos parques
industriais.
Em 2011, o Grupo Campari, res-
ponsável por marcas como Dreher,
Cynar, Drury's e Old Eight, adquiriu
por US$ 26 milhões a Sagatiba, ca-
Nos Estados Unidos
houve aumento de
35,1% no volume de
vendas em 2012
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chaça Premium líder no País. Em
2012, um pouco depois do anúncio
do acordo entre Brasil e Estados
Unidos acerca do reconhecimento
da cachaça, foi a vez do Grupo Dia-
geo, fabricante do uísque Johnnie
Walker, adquirir por cerca de R$ 900
milhões a Ypióca, cachaçaria cea-
rense com mais de um século de
atuação. A expectativa é que a
Diageo aumente as exportações do
produto e coloque a cachaça na dis-
puta direta com a tequila.
Atualmente, os olhares do mer-
cado estão voltados para as Indús-
trias Reunidas de Bebidas Tatuzi-
nho Três Fazendas (IRB), fabrican-
te das cachaças Velho Barreiro e
Tatuzinho, que também estaria sen-
do assediada para a venda, inclusi-
ve pela Pernod Ricard, que já man-
tém as cachaças Janeiro e São Fran-
cisco. Ainda que a venda não se
concretize num primeiro momento,
o fato é que a entrada de gigantes
do setor de bebidas deve dinami-
zar a categoria
Com um mix variado de aguarden-
tes, que inclui de versões populares
a produtos extrapremium, como a edi-
ção desenvolvida em comemoração
aos 160 anos da empresa, composta
com malte e envelhecida por seis
anos em tonéis de carvalho, a Ypióca
atua no mercado internacional há
mais de quatro décadas. As primei-
ras exportações foram, respectiva-
mente, para Alemanha, Estados Uni-
dos, Dinamarca e Itália. Atualmente,
a empresa está presente em mais de
40 países, nos cinco continentes.
Apesar do cenário internacio-
nal animador e do poder de
fogo que agora possui, a
Ypióca vai se manter aten-
ta também ao mercado
nacional. O Ceará ainda
concentra a maior par-
te das vendas, o que
faz a Diageo optar por
uma estratégia mais
agressiva, visando
aumentar as ven-
das em outras re-
giões do País.
Ainda assim, a empresa não de-
ve deixar passar a oportunidade de
expandir a atuação em outros merca-
dos e promover as diferentes formas
de consumo da bebida, que fora do
Brasil ainda é associada apenas à
caipirinha. A meta é ganhar compe-
titividade e alavancar a cachaça en-
quanto destilado de qualidade.
"Existe uma grande oportunida-
de de ampliar a percepção do poten-
cial da bebida, que pode ser apre-
ciada em muitos outros drinks e tam-
bém utilizada na culinária", explica
Eduardo Bendzius, diretor de Mar-
keting e Vendas da Ypióca. Sem re-
velar detalhes, ele garante que já es-
tão sendo elaboradas campanhas e
ações em PDVs para estimular a valo-
rização da categoria, mas mantém
segredo quanto às futuras ações de
divulgação no exterior.
O executivo ressalta que a cacha-
ça é uma bebida de muita personalida-
de e com uma história muito rica. A
Ypióca, por sua vez, dispõe de um
portfólio amplo e capaz de agradar a
diferentes paladares. O reconhecimen-
to vem em boa hora, pois permitirá à
Diageo manter um processo de educa-
ção dos consumidores brasileiros que,
segundo ele, estão redescobrindo
a cachaça. Ao mesmo tempo, vai
garantir uma melhor apre-
sentação do produto em outros
mercados. "Com a grande vi-
sibilidade que o Brasil
tem conquistado no ex-
terior, acreditamos que
cada vez mais os pro-
dutos considerados
ícones nacionais irão
despertar o interes-
se e conquistar es-
paço na cesta dos
estrangeiros", es-
clarece.
Cada vez mais os produtos
considerados ícones nacionais
despertarão o interesse
dos estrangeiros
“
Eduardo Bendzius,
da Ypióca”
19ABRIL/13
Com um volume de vendas de
60 milhões de litros em 2011 e fatu-
ramento em torno dos R$ 300 mi-
lhões, a Ypióca cresceu 5% em volu-
me e 21% em valor de acordo com
os últimos dados Nielsen. "Estamos
em um processo de valorização e
reconhecimento desse produto. Nos-
sa expectativa é continuar conquis-
tando consumidores e ajudar na va-
lorização da categoria como um to-
do", completa o executivo.
Melhor apresentada
Darleize Barbosa, gerente de
exportação da Cia. Müller de Bebi-
das, dona da marca 51, explica que
essa foi apenas a primeira batalha a
ser vencida no processo de valoriza-
ção da cachaça, mas isso é apenas
o começo. Segundo ela, o processo
já ocorre há cerca de 10 anos e o
objetivo era não só garantir os direi-
tos como um produto nacional, mas
certificar a qualidade da bebida ante
outros destilados mundiais. Para is-
so, o reconhecimento nos Estados
Unidos, ainda a principal porta de en-
trada para o mercado externo, é o
primeiro passo.
O grande problema da bebi-
da no exterior é a falta de co-
nhecimento, explica Darleize, o
que prejudica sobremaneira o
consumo e, claro, as expor-
tações. Até mesmo ações
de divulgação acabam não
atingindo os resultados es-
perados em virtude da difi-
culdade do consumidor es-
trangeiro em saber exatamen-
te o que é a cachaça. No caso
do mercado americano, o mai-
or entrave era o simples fato
de a bebida ser derivada da
cana-de-açúcar, o que a co-
locava no mesmo grupo de
outras bebidas do gênero.
Obrigados a atender a es-
pecificação de "brazilian run", os fa-
bricantes brasileiros não só tinham
que competir com outras bebidas
produzidas na chamada "região do
rum", que engloba principalmente o
Caribe, como não podiam fazer cam-
panhas de divulgação adequa-
das sobre o produto, o que dimi-
nuía a competitividade.
Todo esse imbróglio envol-
vendo o rum e a cachaça dava
margem para que a caipiri-
nha, praticamente o cartão
de visitas da bebida brasi-
leira, pudesse ser formula-
da com outros destilados,
fugindo da fórmula original
e impedindo um melhor de-
sempenho dos fabricantes
nacionais no exterior.
Mesmo no mercado eu-
ropeu, onde a atuação é
mais madura e a cachaça
é parcialmente conhecida
como um produto brasilei-
ro, o desempenho ainda
está longe do ideal. Isso
porque o consumidor europeu não é
tão aberto a experimentações como
o brasileiro e precisa ser estimula-
do. O primeiro passo para desper-
tar o desejo nesse consumidor é
apresentar adequadamente a cacha-
ça, afirma Darleize, explicando exa-
tamente o que é a bebida, como é
feita e qual a origem.
"Era muito difícil para o consumi-
dor americano entender o que era a
cachaça, já que havia essa divergên-
cia. Levamos anos tentando fazê-los
entender, o que exigiu um trabalho
árduo e sério. A nova denominação
vai garantir o posicionamento corre-
to no mercado internacional e ajudar
a melhorar a entrada do produto tam-
bém na Europa, especialmente por-
que o europeu precisa conhecer bem
o produto para se dispor a experi-
mentar", garante, explicando que
quando provam gostam e ficam mui-
to curiosos porque geralmente não
sabem o que é. "Em ações de de-
gustação, a cachaça branca é a pre-
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ferida em coquetéis, enquanto a
envelhecida é apreciada pura".
Apesar das perspectivas, a exe-
cutiva diz que uma real mudança no
setor só será sentida a partir do fi-
nal de 2013. O Brasil está em evidên-
cia, garante ela, o que abre boas
oportunidades para o País. Nesse
sentido, a primeira e grande oportuni-
dade será a Copa do Mundo no pró-
ximo ano, mas os resultados depen-
derão exclusivamente de um bom
trabalho a ser realizado pelos produ-
tores brasileiros junto aos turistas.
Embora ainda estejam em estado
de graça com o reconhecimento, mui-
tos fabricantes podem desanimar se
ficarem esperando um resultado ime-
diato. Para Darleize, essa é apenas
a primeira etapa de um trabalho lon-
go e que deve resultar no aumento
do volume e valorização da bebida
sim, mas não no curto prazo, especi-
almente porque mudar a imagem de
um produto e educar determinado
público sobre ele leva tempo.
"Os eventos esportivos são uma
força adicional e vão ajudar o País
como um todo. No caso da cachaça
vai agregar e ajudar na valorização.
Entretanto, o aumento no volume de
vendas só ocorrerá à medida que o
produto ficar mais conhecido interna-
cionalmente. Conhecimento é a pala-
vra-chave da próxima fase", salienta.
Dificuldade de penetração
Se de um lado estão os grandes
conglomerados de bebidas, na ou-
tra ponta estão os fabricantes arte-
sanais, que produzem em menor es-
cala e têm mais limitações. E é jus-
tamente este grupo que se mantém
um tanto cético em relação a mudan-
ças mais profundas no setor.
O Ibrac estima que haja 4 mil mar-
cas e em torno de 40 mil produto-
res, sendo que 99% desse total é
composto por microempresas. Mes-
mo exportada para mais de 60 paí-
ses, em 2012 a base exportadora foi
composta por pouco mais de 90
empresas, responsáveis por expor-
tar um total de 8,06 milhões de litros
de cachaça, totalizando uma recei-
ta de US$ 14,99 milhões.
Alexandre Bertin, da Cachaçaria
Sapucaia, com sede em Pindamonhan-
gaba (SP), vê com bons olhos o reco-
nhecimento do produto no mercado
americano, mas diz que ainda é cedo
para avaliar com precisão. Isso por-
que somente as empresas que con-
tam com uma estrutura de distribuição
montada nos Estados Unidos passa-
rão por mudanças imediatas e só no
médio prazo a situação do setor como
um todo será evidenciada.
Classificando a cachaça como um
dos produtos "do momento", Bertin
acredita que apenas parte dos brasi-
leiros ainda tem preconceito em re-
lação a cachaça, mas mesmo este
grupo deve ser vencido pela maio-
ria, especialmente após os eventos
esportivos nos próximos anos. Como
o brasileiro ainda tem tendência a
valorizar o que vem de fora, a postu-
ra dos estrangeiros em relação à
bebida vai contribuir com o consu-
mo dos próprios brasileiros.
Se a expectativa é de que a vin-
da do consumidor estrangeiro favo-
reça todos os fabricantes, conseguir
uma boa atuação no mercado exter-
no até lá não é uma tarefa assim tão
fácil. Segundo Bertin, as dificulda-
des para atuar no mercado externo
são muitas e vão desde a falta de
Cachaça Sapucaia: dificuldade
para entrar no mercado americano
em virtude da falta de arrojo
dos importadores
Cachaça Sapucaia: dificuldade
para entrar no mercado americano
em virtude da falta de arrojo
dos importadores
21ABRIL/13
comunicação coordenada e adequa-
da entre os próprios fabricantes até a
dificuldade natural de penetração na-
quele mercado. "Falta arrojo dos im-
portadores estrangeiros para pesqui-
sar e investir em novas marcas", diz.
Por aqui, o problema assume propor-
ções ainda maiores, especialmente
quando se trata das esferas gover-
namentais: a ilegalidade muitas ve-
zes ocorre porque as exigências para
o pequeno fabricante de alambique
são as mesmas impostas às grandes
indústrias, garante o empresário.
A Sapucaia utiliza distribuidores
especializados, mas a maior parte
dos clientes é atendida diretamente.
Bertin explica que o mercado distri-
buidor está acostumado com as ope-
rações das grandes empresas e mes-
mo com o avanço das cachaças
artesanais ainda é difícil encontrar
parceiros financeiros. "No nosso ca-
so, o maior desafio é a distribuição
dos produtos, onde não conseguimos
ter a capilaridade das marcas indus-
triais. Se tivéssemos essa capacida-
de faríamos grandes avanços com
nossas marcas, uma vez que o pro-
duto é conhecido e tem a qualidade
que todos desejam", ressalta.
A própria relação entre os fabri-
cantes poderia ser diferente e contri-
buir com o crescimento da catego-
ria. Produtores de cachaça industrial
poderiam comprar o produto de ca-
chaçarias menores, por exemplo. Ao
invés disso, a estratégia adotada pela
maioria foi desenvolver produtos o
mais próximo possível das cachaças
artesanais, o que levou ao surgimento
de várias versões "ouro" da tradicio-
nal cachaça de coluna, embora a per-
cepção dos consumidores não seja
de mudança na qualidade. Para
Bertin, essa é uma tentativa de atrair
o consumidor habitual de cachaças
artesanais, mas este está cada vez
mais informado e atualmente tem
condições de avaliar a qualidade, re-
putação e histórico das marcas.
"Precisamos mudar um pouco
nossa mentalidade de grande esca-
la de produção. Não produzir menos,
mas sim aproveitar melhor a produ-
ção de tantos pequenos produtores
espalhados pelo Brasil que muitas
vezes não têm para onde vender. É
muito mais uma questão de treina-
mento, logística e parceria do que
de produção. Para quem já tem um
público massivo me parece bastan-
te difícil mudar o produto ou ajustá-
lo para atingir outro público, mais
exigente", conclui.
No mercado desde 1933, a Ca-
chaçaria Sapucaia mantém as mar-
cas Senzala e Sapucaia, está nas
versões Florida Cristal, Florida Ouro,
Tradicional, Reserva da Família e
Real, chegando a esperar até 18
anos para engarrafar algumas de-
las - todas envelhecidas em barris
de carvalho e outras madeiras no-
bres. Com capacidade para produ-
zir 300 mil litros anualmente, a em-
presa registrou crescimento de 30%
em 2012 e espera repetir o número
este ano.