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Mesa Temática: Nuevas Cartografías de Feminismos del Sur NATIVA: FEMINISMOS NA MOBILIZAÇÃO DE MULHERES INDÍGENAS, ESTADO DE MATO GROSSO, BRASIL. Autora Profª Ms. em História - Paula Faustino Sampaio. Endereço Eletrônico: [email protected] Universidade Federal de Mato Grosso/Departamento de História. A gente achou que os homens não estavam tomando a luta como deveria ser. E nós achou que pela luta dos homens nós não ia ter chegado ao que nós temos chegado hoje. Valéria Pereira Documentário “Nativa- Movimento Feminino nas Aldeias” - 2005 Iracema, a virgem dos lábios de mel, mulher indígena jovem, casta e bela, personagem central e nome da obra do escritor José de Alencar, publicada em 1865 1 ; “Índia, seus cabelos nos ombros caídos, linda como a noite que não tem luar”, desde o ano de lançamento em 1953, pela dupla Cascatinha e Inhana 2 , cantada no cancioneiro popular do Brasil; Paraguaçu e sua irmã Moema no triângulo afetivo com Caramuru 3 , o português Diogo Alvares, no filme, gênero comédia, lançado em 2001. Na literatura indianista romântica, do século XIX, nas canção popular de meados do século XX e no filme do começo do século XXI a imagem da mulher indígena está associada a natureza, a sexualidade e ao passado. 1 ALENCAR, José de. Iracema. São Paulo: Moderna, 2011. 2 CASCATINHA E INHANA. Índia. Disponível em http://letras.mus.br/cascatinha-e- inhana/225175/. Acesso em 24/10/2014. 3 Caramuru- A Invenção do Brasil. Filme (1h28min). Diretor Miguel Arraes. Gênero: Comédia. Columbia Pictures do Brasil .Coprodução Globo Filmes. 2011.

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Mesa Temática: Nuevas Cartografías de Feminismos del Sur

NATIVA: FEMINISMOS NA MOBILIZAÇÃO DE MULHERES

INDÍGENAS, ESTADO DE MATO GROSSO, BRASIL.

Autora

Profª Ms. em História - Paula Faustino Sampaio.

Endereço Eletrônico: [email protected]

Universidade Federal de Mato Grosso/Departamento de História.

A gente achou que os homens não estavam tomando a luta como deveria

ser.

E nós achou que pela luta dos homens nós não ia ter chegado ao que nós

temos chegado hoje. Valéria Pereira – Documentário “Nativa- Movimento

Feminino nas Aldeias” - 2005

Iracema, a virgem dos lábios de mel, mulher indígena jovem, casta

e bela, personagem central e nome da obra do escritor José de Alencar,

publicada em 18651; “Índia, seus cabelos nos ombros caídos, linda como a

noite que não tem luar”, desde o ano de lançamento em 1953, pela dupla

Cascatinha e Inhana2, cantada no cancioneiro popular do Brasil;

Paraguaçu e sua irmã Moema no triângulo afetivo com Caramuru3, o

português Diogo Alvares, no filme, gênero comédia, lançado em 2001. Na

literatura indianista romântica, do século XIX, nas canção popular de

meados do século XX e no filme do começo do século XXI a imagem da

mulher indígena está associada a natureza, a sexualidade e ao passado.

1ALENCAR, José de. Iracema. São Paulo: Moderna, 2011. 2CASCATINHA E INHANA. Índia. Disponível em http://letras.mus.br/cascatinha-e-

inhana/225175/. Acesso em 24/10/2014. 3Caramuru- A Invenção do Brasil. Filme (1h28min). Diretor Miguel Arraes. Gênero:

Comédia. Columbia Pictures do Brasil .Coprodução Globo Filmes. 2011.

No entender do historiador Ronald Raminelli, os cronistas, os

viajantes, os padres da Companhia de Jesus que escreveram sobre o

Brasil e sua gente, ao longo dos séculos XVI ao XVII, apresentaram a

mulher indígena como selvagem, feiticeira, lasciva e luxuriosa. A mulher

da etnia Tupinambá foi vista, dita e mostrada pelos cronistas como a

mulher primordial da América, a nossa Eva. 4

De acordo com a historiadora Laura de Mello e Sousa, estes relatos

edenizaram a América, enquanto território, mas demonizaram os

habitantes, vistos como monstros, diabos e selvagens. No âmbito do

imaginário medieval, em transformação em função das ocupações da

América, cronistas projetaram imaginário europeu cristão sobre a

América, e, assim, afirmaram para a América “algo que, de certa forma,

já estava concebido: via-se o que se queria ver, o que se ouvira dizer.”5

Em outra leitura do passado colonial, produzida no começo do século

XX pelo sociólogo Gilberto Freyre, autor da obra Casa Grande e Senzala,

clássico da história do Brasil, as mulheres indígenas, por gera filhos para

trabalhar e povoar a terra do Brasil, submissas aos homens brancos,

foram mostradas como facilitadora da colonização, contribuindo no projeto

português de colonização e de formação da sociedade no Brasil.6 Na

interpretação do sociólogo, da mulher indígena, “da cunhãé que nos veio o

melhor da cultura indígena. O asseio pessoal. A higiene do corpo. O milho.

O caju. O mingau. O brasileiro de hoje (...) reflete a influência de tão

remotas avós.”7

Na leitura dos cronistas do século XVI, as mulheres indígenas foram

entendidas a partir da misoginia cristã católica e protestante, em seu afã

colonizador e cristianizador das populações da América. Na leitura do

4RAMINELLI, Ronald. Eva Tupinambá. In: DEL PRIORE,Mary(Org.).História das

Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 2009.p.11-44. 5SOUZA, Laura de Mello. O novo mundo ente Deus e o Diabo. In: SOUZA, Laura de Mello

e. O diabo e a Terra de Santa Cruz: feitiçaria e religiosidade popular no Brasil

Colonial. São Paulo: Companhia das Letras, 1986. P. 43. 6FREYRE, Gilberto. Casa-Grande & Senzala: Formação da família brasileira sob o

regime da economia patriarcal. 51 ed. São Paulo: Global, 2006. 7FREYRE, Gilberto. Idem. P. 16

sociólogo Gilberto Freyre, as mulheres indígenas contribuíram com sua

cultura na formação da sociedade e da cultura Brasil. Em ambas as

interpretações, as mulheres indígenas são ditas pelo olhar androcêntrico,

colonizador e patriarcal, que nega a atuação de mulheres, a diversidade

de experiências e seus papeis nas sociedades.

Este conjunto de imagens do passado colonial é recorrente sobre as

mulheres indígenas no imaginário do (as) brasileiras do século XXI, o que,

por um lado, apresenta-as como personagens coadjuvantes de um

passado distante, e, por outro lado, invisibiliza as experiências de

mulheres ao longo dos tempos.

Ademais, a historiografia brasileira, somente a partir dos anos 1980

passou a dar atenção para as mulheres enquanto sujeito da história.

Entretanto, muito há que se pensar historicamente sobre as experiências

das mulheres indígenas. Como afirma Sara Beatriz Guardia, “La

identificación de funeste y documentacións para la história de las mujeres

implica rastrear a las mujeres en la historia no a través de datos olvidados

sino más bien como um problema de relacionoes entre os seres y grupos

humanos que antes habian sido omitidas.”8

Fazer novas perguntas, buscar novas fontes e propor outros ângulos

para pensar os sujeitos femininos indígenas, estabelecendo diálogos por

meio da categoria analítica gênero, implica também problematizar a

imposição de leitura do colonizador. Romper com a leitura colonial, implica

pensar um “Un mapa en ruínas”, como metoforiza Marta Sierra, en el cual

el feminismo poscolonial está pensando justamente esas intersecciones,

esos espacios "in-between" donde se articulan las diferencias comunes y

se elaboran estrategias de identidad colectivas, como afirma Homi

Bhabba”.9

8GUARDIA, Sara Beatriz. Las mujeres en del discurso histórico de América Latina. In:

TEDESCHI, Losandro Antonio. (Orgs.) Leituras de gênero e interculturalidade. Dourados,

MS: UFGD, 2013. P. 484. 9BIDASECA, Karina; SIERRA, Marta. Políticas de lo mínimo: genealogías coloniales en los

mapas del Sur.Rev. Estud. Fem., Florianópolis , v. 22, n. 2,Aug. 2014 .Available from

Atualmente, no Brasil, conforme dados Censo populacional realizado

em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística10, dos 896.000

mil indígenas, sendo 305 etnias, as quais possuem hábitos, costumes e

línguas próprios, a metade são mulheres, observando-se, “equilíbrio entre

os sexos para o total de indígenas (100,5 homens para cada 100

mulheres), com mais mulheres nas áreas urbanas e mais homens nas

rurais.” Apesar deste contigente populacional total indígena, que

representa 0,4% da população do Brasil, existe muitos silêncios em torno

de suas vidas, presentes e passadas.

Os estudos de antropólogos, de historiadores, de demógrafos,11

entre outros, vem buscando superar os silêncios sobre a história indígena,

conquanto as dificuldade em realizá-los. Na perspecitva de gênero, os

estudos mostram o espaço político das mulheres nos percursos do

movimento indígenas na Amazônia Legal Brasileira e os dados sobre

organizações de mulheres indígenas, notadamente para a Amazônia

Brasileira12.

Para Eliane Potiguara, ao discursar sobre os povos indígenas na

Conferência Mundial contra o racismo, a discriminação racial, a xenofobia

e a intolerância Correlatas, em Durban, África do Sul, 2001, que se

organizou em Durban na África do Sul em setembro 2001, quanto à de

gênero, afirmou que “a luta tem sido dobrada pelo preconceito, pelo

desconhecimento e pelo desinteresse dos envolvidos, o que contribui para

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-

026X2014000200013&lng=en&nrm=iso>.access on 21 Oct. 2014.

http://dx.doi.org/10.1590/S0104-026X2014000200013. P. 6. 10IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Os indígenas do Censo

demográfico 2010: primeiras considerações com base no quesito cor e raça. Rio de

Janeiro,2012. Disponível em ttp://www.ibge.gov.br/home/. Acesso em 20/08/2014. 11MONTEIRO, John M.Negros da Terra: Índios e Bandeirantes Nas Origens de São

Paulo. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1994. 320 p. MONTEIRO, John M.Guia

de Fontes para a História Indígena e do Indigenismo em Arquivos Brasileiros:

Acervos das Capitais. 1. ed. São Paulo: Núcleo de Hístória Indígena e do

Indigenismo/Fapesp, 1994. 496 p.CUNHA, Manuela Carneiro da. Histórias dos Índios no

Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. 12MONAGAS, Ângela Célia Sachhi. União, Luta, Liberdade e Resistência: as

organizações de mulheres indígenas da Amazônia Brasileira. Tese. Programa de Pós-

Graduação (Doutorado) em Antropologia. UFPE. Recife, PE, 2006. 245p.

tornar invisívela situação das mulheres indígenas no Brasil. Por isso, para

falar da participação das mulheres indígenas na Conferência Mundial

contra o Racismo, há um outro histórico que não pode ser ignorado.13

Fala algo aqui.

Apesar dos preconceitos com a presença feminina no movimento

indígena e com a organização de movimento de mulheres indígenas, a

líder do Grupo Grumim, voltado a educação e produção escrita indígena,

destaca a existência de indicativas, e se coloca como mulheres indígenas

atuante na defesa dos direitos indígenas.

Segundo Maria Helena Ortolan Matos, que enfatiza o protagonismo

das mulheres indígenas em seus grupos e fora deles, antes e após

incorparar a perspectiva de gênero na agenda política recentemente,

As mulheres indígenas jamais estiveram totalmente

excluídas dos espaços etnopolíticos nos quais concepções e

práticas são definidas para lidar com os/as Outros/as (sejam

grupos de outras etnias ou agentes não indígenas em

contato). O fato de as mulheres indígenas não frequentarem

lugares públicos ou mesmo de serem limitadas quanto dele

participam, não significa que estão sendo mantidas

alienadas das tomadas de decisão coletivas sobre o destino

de seu povo. Para chegar a essa compreensão, torna-se

necessário reposicionar olhar analítico para conseguir

enxergar a diferença de perfis entre as esferas públicas e

privada quando vivenciadas nas sociedades indígenas e as

mesmas esferas quando vivenciadas nas sociedades não

indígenas. 14

13POTIGUARA, Eliane. Participação dos povos indígenas na Conferência em Durban. Rev.

Estud. Fem., Florianópolis, v. 10, n. 01,jun. 2002. Disponível em

<http://educa.fcc.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-

026X2002000100016&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 31 out. 2014. 14MATOS, Maria Helena Ortolan. Mulheres no movimento indígena: do espalo de

complementariedade ao lugar da especificidade. In: SACCHI, Ângela; GRAMKOW, Márcia

Maria. (Orgs.). Gênero e povos indígenas: coletânea de textos produzidos para o

“Fazendo Gênero 9”e para a “27ª Reunião Brasileira de Antropologia”. Rio de Janeiro,

Brasília: Museu do Índio/GIZ/FUNAI, 2012. P. 46.

Entretanto, apesar dos esforços para refletir sobre estas

problemáticas indígenas na perspectiva dos estudos de gênero, ainda há

muito que ser realizado, especialmente no que diz respeito a mostrar os

agenciamentos, os discursos e as mobilizações de mulheres indígenas

dentro do movimento indígena e em associações e movimento de

mulheres.

Anualmente, nas celebrações, nas marchas, nos atos, nas

manifestações e nos eventos no chamado “Dia Internacional da Mulher

Indígena”, em 05 de setembro, instituído no 1983, durante o II Encontro

de Organizações e Movimentos da América, em Tihuanacu (Bolívia), a

“Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o

Empoderamento das Mulheres (ONU Mulheres)” reafirma “apoio às

mulheres indígenas na busca por justiça e em defesa dos direitos

individuais e coletivos”. Nesta data, relembra-se a morte de Bartolina

Sisa, “uma mulher quéchua, esquartejada pelas forças realistas durante a

rebelião anticolonial de Túpaj Katari, no Alto Peru” em 05 de setembro de

1782.

No ensejo do dia Internacional da Mulher Indígena, a ONU-Mulheres,

afirmou que “no Brasil e nos países do Cone Sul, as mulheres indígenas

desempenharam historicamente um papel fundamental como agentes de

mudança nas famílias, comunidades e na vida do povo.” Para a ONU-

Mulheres, “É importante reconhecer as lutas, conquistas, habilidades, e

contribuições culturais das mulheres indígenas, e também sua enorme

responsabilidade na transferência de conhecimento.” 15 A ONU Mulheres

destacou também que as indígenas são essenciais em diversas economias,

trabalhando por segurança e soberania alimentar e pelo bem-estar de

famílias e comunidades.

Para Valéria Pereira, liderança da etnia Arara, ao discursar para

mulheres, de 16 etnia, no Encontro de Mulheres Indígenas na Terra

15ONU-MULHERES. ONU Mulheres apoia o dia internacional da mulher indígena.

Disponível em http://www.onu.org.br/onu-mulheres-apoia-o-dia-internacional-da-

mulher-indigena/. Acesso em 30/09/2014.

Indígena Arara, em 2005, “Nós num pode mais baixar a cabeça, a mulher

tem que aprender a se defender também.”16 Para ela,

Nós num nascemos só para carregar filhos não, nós

nascemos também para ter responsabilidade. Daqui ..

amanhã sai uma advogada, uma promotora, pode ser

uma índia também, num é só branco que tem direito

não, indío também tem, nós também somos povo, tem

sangue, tem luta, tem vida, também tem esperança.17

Frente a lógica colonial, patriarcal, machista que atribui às mulheres

os papéis de mãe e dona de casa, Valéria Pereira fala sobre deslocamento

necessário para as mulheres indígenas do presente, ou seja, indica a

possibilidade da mulher indígena ocupar funções na esfera jurídica, na

liderança e na política, brando um grito de esperança e de conclamação

das demais mulheres em nome de si e do seu povo.

O discurso de Valéria Pereira assim como discursos de outras

mulheres indígenas apresentado e disponível na rede mundial de

computadores por meio do Documentário Nativa- Movimento Feminino

nas Aldeias, de 200518, não é isolado, não é a-histórico nem individual

apenas.

O discurso de Valéria Pereira bem como das demais mulheres

indígenas apresentadas no Documentário “Nativa” nos permitir discutir a

relação entre as organizações de mulheres indígenas e os pensamentos

feministas, especificamente no Estado de Mato Grosso, o terceiro com

maior população indígena no Brasil, com o intento de problematizar os

discursos e as historicidades sobre mobilização feminina e feminista para

apresentar como tem acontecido a organização de mulheres indígenas e

16NATIVA- Movimento de Mulheres nas Aldeias. Cuiabá, MT, 2005. Documentário

(16min h 56 seg.). Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=IkA9XaGTYAM.

Acesso em 15/05/2014. 17NATIVA- Movimento de Mulheres nas Aldeias. Idem. 18NATIVA- Movimento de Mulheres nas Aldeias. Ibidem.

em que medida os discursos eurocêntrico, colonizador e patriarcal fazem-

se presente nas chamadas novas vozes dos feminismos no Brasil.

Assim, fundamentada nos estudos feministas decoloniais, entendo

que “é preciso lutar contra o machismo a partir das próprias concepções

que imperam entre os homens, dentro das comunidades indígenas a que

pertencem.”19 apresento o documentário denominado “NATIVA –

movimento feminino nas aldeias” enquanto uma das faces da organização

de mulheres indígena, ancorada nos mais diversos discursos feministas,

na sociedade brasileira, gravado no 4º Encontro de Mulheres Indígenas de

Mato Grosso, 2005.

A população autodeclarada indígena nos censos IBGE 1991, 2000 e

2010, por Unidades da Federação do Brasil e cinco grandes regiões

(Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste), demonstra crescimento

da população indígena no Brasil. Na região Centro-Oeste, no ano de 1991,

a população total era 52.735; no ano de 2000 a população era de 104.360

e no ano de 2010 a população registrada foi 130.494. Nesta região

localiza-se o Estado de Mato Grosso, cuja população indígena registrada

em 1991 foi 16.548, em 2000 foi 29.196 e em 2010 foi 42.538.

Na Terra Indígena Arara do Rio Branco, em Aripuanã – Estado de

Mato Grasso, Brasil, no ano de 2005, reuniram-se aproximadamente cem

mulheres, entre elas Valéria Pereira, cuja fala é epigrafe deste texto.

Segundo o Documentário “Nativa”, estas mulheres são representantes de

dezesseis etnias para debater problemas de suas aldeias, reivindicar mais

espaço para as mulheres nas lutas em defesa da terra e da cultura e para

mostrar os enfrentamentos que as mulheres vivenciam em seus

cotidianos, notadamentea discutir a noção de submissão e de violência

contra a mulher, uma vez as mulheres indígenas em suas singularidades

19RAGO, Margareth; Poéticas e políticas das indígenas da Bolívia. In: RAGO, Margareth;

MURGEL, Ana Carolina Arruda de Toledo. Paisagens e Tramas: o gênero entre a História

e a Arte. São Paulo: Intermeios, 2013.p. 98.

“vivem os seus próprios processos, que nem sempre coincidem com os tempos e

agendas do feminismo urbano.”20

Parte dos debates deste encontro são mostrados no documentário

“NATIVA-Movimento Feminino nas Aldeias”, com direção de José Luiz

Medeiros e Rodrigo Vargas, produzido pelo Conselho Indigenista

Missionário (CIMI) e pelo Projeto Andanças. Por meio da analíse do

discurso das mulheres contidos no documentário, cujo nome remete à

ideia de sujeito próprio do lugar, natural, autóctone, e a idéia de que as

mulheres presentes no documentário são as mulheres naturais da terra do

Brasil,é possível pensar história da organização de mulheres índigenas,

uma vez que a visibilidade das práticas de organização de mulheres

indígenas tem se dado por meio de documentário21. Segundo Marcos

Napolino, Eduardo Morettin e Mônica Hornis, o documentário vem

desempenhando papel decisivo nos debates culturais do país desde o

chamado cinema da retomada, questionando os limites das

representações , entre outros importantes debates no fazer da história. 22

O Conselho Indigenista Missionário é um organismo vinculado à

CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) cujas ações são

voltadas para povos indígenas. Criado no ano de 1972, no âmbito da

política integracionista das populações indígenas à sociedade envolvente.

O CIMI tem como objetivo de atuação definido pela Assembleia Nacional

de 1995:

Impulsionados(as) por nossa fé no Evangelho da vida,

justiça e solidariedade e frente às agressões do modelo

20SALGADO, Aída Hernandéz Castillo. Diferentes formas de ser mulher diante a

construção de um novo feminismo indígena. Disponível em

http://uniaocampocidadeefloresta.wordpress.com/2011/01/26/diferentes-formas-de-ser-

mulher-diante-a-construcao-de-um-novo-feminismo-indigena/. Acesso em 23/09/2014.

O mesmo texto pode ser encontro CEMHAL Centro de Estudos da Mulher na História de

América Latina. O CEMHAL é um Centro de Estudos Acadêmicos de Gênero com

expressão sediado no Peru. Disponível em

http://mujeresylasextaorg.wordpress.com/2007/08/08/mujeresindigenas-y-feminismo. 21Existe outros documentários como o Hiper-Mulheres e mulheres xinguanas,que em

outra oportunidade serão estudados. 22MORETTIN, Eduardo; NAPOLITANO, Marcos. KORNIS, Monica Almeira. História e

documentário. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2012.

neoliberal, decidimos intensificar a presença e apoio

junto às comunidades, povos e organizações indígenas

e intervir na sociedade brasileira como aliados (as) dos

povos indígenas, fortalecendo o processo de autonomia

desses povos na construção de um projeto alternativos,

pluriétnico, popular e democrático.23

O notório o fomento da organização do movimento indígena pelo

CIMI, e atualmente o fomento das organizações de mulheres, como

podemos notar no Documentário “Nativa-Movimento Feminino nas

Aldeias.”, indica que “a parceria com indígenas e não indígenas é buscada

para defender seus direitos e possibilitar o processo organizativo”24,

afirma a antropóloga Angela Célia Sachhi, em sua tese sobre as

organização de mulheres indígenas da Amazônia Brasileira.

Para a antropóloga, o movimento de mulheres indígenas é entendido

no sentido de exercer o papel de defesa dos direitos das mulheres,

evidenciando a exclusão das demandas das mulheres indígenas das

agendas feministas e o não diálogo entre o movimento feminista e o

movimento de mulheres indígenas.

Segundo Dominique Fougeyrollas-Schwebel, alguns movimentos de

lutas por igualdade entre homens e mulheres, a exemplo das mulheres da

2ª e 3ª Internacionais, rejeitaram a qualificação “feminista, porque

entendiam que estava marcada por fundamentos burgueses.25

Como quem tece uma rede, escrever sobre a organização de

mulheres indígenas no Estado de Mato Grosso, dando visibilidade as

tessituras em processo de produção, é deparar-se com fios diversos

fragmentados. Por meio de notícias curtas e esparsas de informativos de

23CIMI- Conselho Indigenista Missionário. Quem somos. Disponível em

http://www.cimi.org.br/site/pt-br/ Acesso em 25/09/2014. 24MONAGAS, Ângela Célia Sachhi. União, Luta, Liberdade e Resistência. Idem. P. 127 25FOUGEYROLLAS-SCHOWEBEL, Dominique. Movimentos Feministas. In: HIRATA, Helena

et all. (Orgs.) Dicionário crítico do feminismo. São Paulo: Editora UNESP, 2009. P. 144.

órgãos oficiais, como a FUNAI26, e ONG’s (Organizações não

governamentais)é possível encontrar alguns fios desta tessitura e começar

a formar o primeiro entrelaçamentos do tecido das organizações de

mulheres índigenas do Estado de Mato Grosso.

Nesta tessitura, vamos mostrar os fios possíveis no documentário

“Nativa- Movimento Feminino nas Aldeias”. O documentário inicia-se com

a apresentação de sete mulheres e suas respectivas etnias. Jocineide

(Arara), Rute (Karajá), Luciana (Munduruku), Neide (Kaioá), Urugureudo

(Bororo), Irene (Arara) e Morô (Tapirapé). Dentre estas mulheres que se

apresentam, em meio a sorrisos e timidez, algumas com os filhos nos

braços, apenas Jocineide declara-se líder de mulheres em sua aldeia. Além

dela, no decorrer dos dezesseis minutos e cinquenta e seis segundos,

conhecemos Valéria Pereira e a Cacique dos Arara Ana Anita, reconhecida

também por ter liderado a retomada as terras tradicionais dos povo Arara,

ao longos das décadas de 1980 e 1990.

Dentre as vozes das mulheres, destaca-se o discurso de Valéria

Pereira, no qual é perceptível as especificidades do encontro destas

mulheres indígenas:

Quantas mães não deixou hoje seus filhos para trás

para está aqui hoje a procurar saber como está nossas

aldeias hoje, a nossa terra, o nosso alimento? Por que a

vida nossa, o movimento de mulheres indígenas, a

nossa política indígena é essa, não é nós pegar um

arco, está na nossa boca, está no nosso coração, está

no nosso espírito, tá na nossa vontade lutar por aquilo

que nós quer. Nós achou que os homens não estavam

tomando a luta como deveria ser e nós achou que pela

luta dos homens nós nunca poderia chegar ao que nós

26FUNAÍ- Fundação Nacional do Índio. Disponível em http://www.funai.gov.br/

está chegando hoje.”27 Depoimento - Valéria Pereira

(Etnia Arara)

As falas acentuam a ideia de que as mulheres para estar ali reunidas

deixaram marido, casa e cuidado dos filhos para poder engajar-se. São

expressões que atrelam o primeiro lugar das mulheres aos cuidados com a

família.

O tema central do documentário é a mobilização de mulheres

indígenas do Estado de Mato Grosso em prol de melhores condições de

vida, de trabalho, de alimentação, de saúde, de demarcação de terras e

de não violência doméstica.

Incentivado e promovido pelo Conselho Indigenista Missionário,

CIMI, o documentário “Nativa” tem participação da missionária CIMI –

Regional Mato Grosso, Elizabeth Aracy Rondon Amarante,

missionária/CIMI. Para a missionária,

Os movimentos das mulheres indígenas que, está

sendo o 4º realmente, está sendo para nós uma

certeza sobre o papel destas mulheres indígenas. As

mulheres indígenas, às vezes muito veladamente,

muito ostensivamente, são aqueles que decidem os

rumos e o futuro de seu povo. A mulher tem uma

sensibilidade muito maior aquilo que ameaça e que fere

a gente” (...) “Estes encontros tem papel importante e

que a gente tem que investir na formação das

mulheres.” (...) “Escrever a história de uma povo a

partir da mulher, com olhos de mulher, estilo de

mulher, coração de mulher, como os rumos da

mulher.28

27NATIVA- Movimento de Mulheres nas Aldeias. Op. Cit. 2005. 28NATIVA- Movimento de Mulheres nas Aldeias. Idem.

Percebe-se no documentário “Nativa” que o CIMI fomenta o

Movimento Feminino nas Aldeias e no discurso da missionária Elizabeth

Aracy Rondon Amarante podemos pontuar três aspectos: 1. Exaltação da

atuação das mulheres nas aldeias; 2. Características própria das mulheres

que a singulariza; 3. Formação das mulheres.

Embora o discurso destas mulheres reunida no 4ª Encontro de

Mulheres Indígenas de Mato Grosso evidencie a luta por igualdade de

oportunidade entre homens e mulheres, por melhores condições de vida

para todas e todos, contra a violência nas relações conjugais, por maior

participação das mulheres nas esferas públicas, bandeiras de lutas dos

feminismos ocidentais e urbanos, não se percebe nas falas das mulheres

indígenas o uso do termo feminismo. Na fala da missionáriaElizabeth

Amarantes a ênfase é para o termo movimento de mulheres e para a

escrita de uma história no feminino, que aparece no discurso da

missionário enquanto sujeito com sensibilidade que lhe é própria.

A ausência do termo feminismo, segundo Aída Hernandéz Castillo

Salgado, tem explicação relacionada à conotação liberal e urbana, e

acrescentou colonial, do termo. Para Aída Hernandéz Castillo Salgado

embora a construção de relações mais equitativas entre

homens e mulheres tornou-se em um ponto medular na luta

das mulheres indígenas organizadas, o conceito de

feminismo não foi reivindicado dentro de seus discursos

políticos. Este conceito continua sendo identificado como o

feminismo liberal urbano, que para muitas delas tem

conotações separatistas que as afastam de sua necessidade

de uma luta conjunta com os seus companheiros indígenas.

Aqueles que chegaram ao feminismo depois de uma

experiência de militância em organizações de esquerda

sabem que a força ideológica que tiveram os discursos que

representam ao feminismo como uma “ideologia burguesa,

separatista e individualista” que separa às mulheres das

lutas por seus povos. As experiências do feminismo liberal

anglo, que de fato, partiram de uma visão muito

individualista dos “direitos dos cidadãos”, foram utilizadas

para criar uma representação homogeneizadora do

“feminismo.29

Embora não assumam diálogos com correntes de pensamento e

movimentos feministas e/ou com discursos descolonial, as mulheres do

“Nativa- movimento feminino nas aldeias” do Estado de Mato Grosso,

apontam para uma experiência singular nas aldeias de organização

comunitária de mulheres, que segundo Margareth Rago, “se opõe ao

individualismo característico do feminismo desde seu início na Europa, no

século XIX, e que sobretudo investe contr as formas de dominação

neliberal global.”30. Neste sentido, as necessidades de lutar para conseguir

a demarcação da terra ou para coibir a violência domèstica ou para

ampliar a atuação de mulheres no movimento indígenas e nos

movimentos de mulheres indígenas estabelece uma perspectiva política

própria para estas mulheres.

Levantamento realizado pela Articculación Feministas Marcosur

mapeou quarenta e três organizações de mulheres indígenas no Brasil.

Deste total, um número de vinte e cinco organizações situada-se na

Região Norte, das quais vinte no Estado da Amazôniana, e dez na Região

Centro-Oeste, sendo oito no Estado de Mato Grosso. 31

As oito organizações do Estado de Mato Grosso, 3ª maior população

indígena do Brasil, com tantas terras demarcadas, abrigando o Parque

Nacional do Xingu, são: Associação de Mulhere Indígenas da Aldeia

Formoso, Associação de Mulheres Indígenas do Povo indígenas do Carajá

– Barra do Garça, COAMI-MT – Comissão de Articulação de Mulheres

Indígenas do Mato Grosso, AOMP – Associação Oridiona das Mulheres

29SALGADO, Aída Hernandéz Castillo. Op. Cit. 30RAGO, Margareth; Poéticas e políticasd das indígenas da Bolívia. In: RAGO, Margareth;

MURGEL, Ana Carolina Arruda de Toledo. Paisagens e Tramas: o gênero entre a História

e a Arte. São Paulo: Intermeios, 2013.p. 98. 31Articculación Feministas Marcosur. Dados disponíveis em: http://www.mujeresdelsur-

afm.cotidianomujer.org.uy/joomdocs/mapeobrasil.pdf. Cf. www.mujeresdelsur-

afm.cotidianomujer.org.uy/.../mapeobrasil.pdf Acesso em 20/08/2014.

Paresi, Associação de Mulheres de Otaparé, Articulação das Mulheres

Indígenas Xavantes – Aldeia São Domingos Savio, AMINTU – Associação

de Mulheres Indígenas Terena Urbana, CONAMI – Conselho Nacional de

Mulheres Indígenas e APIB – Associação dos Povos Indígenas do Brasil.

O mapeamento realizado pela Articculación Feministas Marcosur, em

2011, com apoio da Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), que entre

suas membros tinha duas mulheres indígenas, e de entrevistas, telefones

e contatos sistematizados, mapearam oito organizações para o Estado de

Mato Grosso, sendo duas delas de abrangência nacional (CONAMI –

Conselho Nacional de Mulheres Indígenas e APIB – Associação dos Povos

Indígenas do Brasil) , uma de abrangência estadual (COAMI-MT –

Comissão de Articulação de Mulheres Indígenas do Mato Grosso) e sete de

abrangência local/aldeia/etnia.

Este levantamento nos mostrar a existência de organizações de

mulheres indígenas e abrangência, o que nos permite mais perguntas do

que respostas: quem são estas mulheres? Quando fundaram estas

associações? Quais as formas de atuação? Quais bandeiras defendem? E

tendo em vista as dificuldades destacadas no relatório para localizar e

mapear estas associações, podemos perguntar: existe outras?

Levantamento por mim realizado entre agosto e outubro de 2014

nos jornais locais, em entidades ligadas às políticas públicas para as

mulheres, à Igreja Católica, FUNAI, com páginas nas redes mundial de

computadores, relativo à questões indígenas percebemos a existência de

mais associações de mulheres indígenas no Estado de Mato Grosso, são

elas: TAKINÁ– Organização de Mulheres Indígenas e Associação

Yamurikumã das Mulheres Xinguanas.

TAKINÁ– Organização de Mulheres Indígenas aparece em

reportagem de jornais, sua própria página na rede social Facebook e nas

páginas dos Conselhos Indigenista Missionário enquanto organizadora do

Encontro Estadual de Mulheres Indígenas de Mato Grosso, 2010, da II

Assembleia de Mulheres Indígenas do Estado de Mato Grosso, em 2012, e

do XI Encontro de Mulheres Indígenas do Estado de Mato Grosso, em

2013. Especialmente a TAKINÁ– Organização de Mulheres Indígenas

aparece em notícias da Secretaria de Politicas Públicas Para as Mulheres,

dos Governos Federal, em noticiário eletrônico da FUNAI e da CIMI, o que

me permite afirma atuação permanente nos último anos.

Associação Yamurikumã das Mulheres Xinguanas aparece na página

do Instituto Catitu. O Instituto Catitu foi criado em 2009 e define-se como

“uma associação sem fins lucrativos qualificada como Organização da

Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) que propõe aos povos

indígenas novas possibilidades de expressão, transmissão e

compartilhamento de suas visões de mundo e de seus conhecimentos.” O

Instituto Catitu, apoiado pela Embaixada da Noruega,tem com uma das

linhas de atuação “fomentar ações que estimulem e ampliem o

protagonismo indígena, especialmente o das mulheres;”. Neste sentido,

“Destaca-se a formação audiovisual para povos indígenas, que resultou na

produção de aproximadamente 30 filmes – que conquistaram novos

públicos e inúmeros prêmios Brasil afora.”

O Instituto Catitu, “a ATIX (Associação Terra Indígena do Xingu),

SPDM/UNIFESP, FUNAI, o Instituto Socioambiental e a Rainforest do

Japão” objetivando fortalecer o protagonismo das mulheres da Terra

Indígena do Xingu, localizada no Estado de Mato Grosso, promoveram o

1º Encontro de Lideranças Indígenas Mulheres do Xingu, de 11 a 13 de

outubro, 2013, evento que foi filmado gerando o vídeo “Encontro das

Mulheres Xinguanas (versão em português., objetivando “divulgar as

ideias discutidas no Encontro e mobilizar parceiros para dar apoio às ações

das mulheres xinguanas.”

Apesar do levantamento da Articculación Feministas Marcosur,

constituída em 2000 no Seminário sobre Integracição Regional e de

Gênero, sob organização do “Centro de Comunicación Virginia Woolf

(Cotidiano Mujer)”, que se define enquanto “es una corriente de

pensamiento y acción política feminista que tiene como eje central de su

estrategia, promover el desarrollo de un campo político feminista a nivel

regional y global”32, com integrantes feministas da Argentina, Brasil,

Bolívia, Colômbia, Paraguiai e Peru, ao realizar os “Diálogos Inerculturais

no Brasil”, em agosto de 2011, nomear oito associações de de mulheres

indígenas para o Estado de Mato Grosso, não há referência ao Nativa-

Movimento Feminino de Mulheres, seja enquanto movimento de mulheres,

seja enquanto documentário, realizado em 2005, cujo encontro como

assevera a missionária Elizabeth Amarantes, estava em sua 4ª edição, e

como é perceptível pelos depoimentos das sete mulheres indígenas

entrevistadas no documentário, trata-se de um momento que, iniciou no

começo do século XX, e que deita raízes no movimento indígenas dos

anos 1970/80/90 pela demarcação de terras, como podemos destacar na

fala da Cacique Ana Anita sobre sua presença e liderança na demarcação

de terras do seu povo.

Embora não assumam discurso feminista, os discursos das mulheres

no documentário Nativa e mesmo as notícias de associações de mulheres

e realização de encontros e assembleias indicam atuação de mulheres

indígenas dentro e fora de suas aldeias, quase sempre com fomento de

organizações como o CIMI, o Instituto Catitu, a FUNAÍ, em que “el lugar

fronterizo donde es posible cerrar la herida colonial para que nasca una

nueva mestiza; esa cicatriz en el alma.”33

Considerações finais

Percebe-se dois momentos de organização destas mulheres. 1º

entorno das demarcações das terras; 2ª entorno de problemas como

saúde, educação, segurança alimentar, alcoolismo, violência doméstica e

32Dados disponíveis em http://www.mujeresdelsur-afm.cotidianomujer.org.uy/que-somos

Acesso em 10/08/2014. 33BIDASECA, Karina; SIERRA, Marta. Políticas de lo mínimo: genealogías coloniales en los

mapas del Sur.Rev. Estud. Fem., Florianópolis, v. 22, n. 2, Aug. 2014. Available from

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-

026X2014000200013&lng=en&nrm=iso>.access on 21 Oct. 2014.

http://dx.doi.org/10.1590/S0104-026X2014000200013. P. 6.

atuação policia delas dentro fora das aldeias enquanto representantes da

sua aldeia/etnia. Nas linhas delineadas perceber-se a tessitura de maior

participação nas decisões das comunidades e a atuação de mulheres por

meio de associações bem como a divulgação de suas ações por meio de

documentários, reportagens e redes sociais, o que visibiliza as ações.

Enquanto a missionária Elizabeth Amarante destaca o caráter

complementar entre mulheres e homens nas aldeias, Valéria Pereira,

enquanto uma voz dissonantes, aponta para um protagonismo feminino

que supera o papel até o momento atraído para o feminino. Vera não quer

ser complemento, Vera tem um discurso dissonante em relação ao da

missionária. Disso vem a indagação: Que tipo de organização de mulheres

e com que finalidade é incentivada pelo CIMI? Qual a relação destas

mulheres (16 etnias) com o CIMI? Onde começa e onde termina a

influência, se é que ela existe concretamente? Qual relação da

organização de mulheres indígenas com a defesa da tradição e

manutenção dos valores tradicionais? Até que ponto o pensamento

colonizador permanecer vigente na organização de mulheres? Estas são

questões para continuar a conhecer o universo de mulheres indígenas do

Estado de Mato Grosso.

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