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Mestrado em Educação Pré-Escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico Relatório de Estágio da Prática de Ensino Supervisionada Fernanda Maria da Cruz Brás Cardoso setembro | 2015 Escola Superior de Educação, Comunicação e Desporto

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Mestrado em Educação Pré-Escolar e

Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico

Relatório de Estágio da Prática

de Ensino Supervisionada

Fernanda Maria da Cruz Brás Cardoso

setembro | 2015

Escola Superior de Educação, Comunicação e Desporto

© Fernanda Cardoso (2015) I

Escola Superior de Educação, Comunicação e Desporto Instituto Politécnico da Guarda

R E L AT Ó R I O D E E S T Á G I O D A P R Á T I C A

D E E N S I N O S U P E R V I S I O N A D A

Mestrado em Educação Pré- Escolar e Ensino do 1.º Ciclo do Ensino Básico

Fernanda Maria da Cruz Brás Cardoso

Setembro de 2015

© Fernanda Cardoso (2015) II

Escola Superior de Educação, Comunicação e Desporto

Instituto Politécnico da Guarda

R E L AT Ó R I O D E E S T Á G I O D A P R Á T I C A

D E E N S I N O S U P E R V I S I O N A D A

Fernanda Maria da Cruz Brás Cardoso

Mestrado em Educação Pré- Escolar e Ensino do 1.º Ciclo do Ensino Básico

Orientadora: Professora Doutora Urbana Cordeiro

Setembro de 2015

© Fernanda Cardoso (2015) III

AGRADECIMENTOS

São inenarráveis as circunstâncias que em determinados momentos cruzam as vidas de cada um de

nós. Caminhos que a vida traça e nos obriga a percorrer sem nos consultar se estamos, ou não,

prontos para aquela jornada. Mas, eis que é necessário caminhar, simplesmente caminhar para que

não se nos escape do horizonte o caminho que a tanto custo tentamos seguir. E por fim,

percebemos que no final dessa longa jornada nos espera um momento de tranquilidade indescritível

e que, afinal, outros passageiros fizeram connosco essa comprida viagem.

Aos que comigo caminharam, tanto àqueles que estiveram no banco ao lado, como aos que

esperaram pelo final da viagem, quero agora agradecer:

-À Prof.ª Doutora Urbana Cordeiro, pela sabedoria, conselhos, atenção, apoio,

disponibilidade, companheirismo e por ter aceitado ser a orientadora do meu Relatório de Estágio.

-À Prof.ª Doutora Elisabete Brito, pela orientação, sensibilidade, disponibilidade, partilha

de experiências, tolerância, sorriso calmo e encorajamento durante o desenvolvimento da Prática de

Ensino Supervisionada.

- À Prof.ª Doutora Filomena Velho, que me acompanhou na formação inicial e me prestou

toda a atenção quando no início da frequência deste Curso pedi aconselhamento, por me encontrar

indecisa no caminho a seguir.

- Os meus afetos incondicionais à Professora Esmeraldina Vicente que me aceitou como

estagiária na escola onde lecionava.

- Aos professores que aceitaram constituir o júri de avaliação deste trabalho e se revelaram

pessoas sensíveis para a temática abordada.

- Aos responsáveis pela coordenação do Mestrado, pelas informações céleres e oportunas,

sempre que foram solicitadas.

- Aos professores que lecionaram o Curso de Mestrado por terem contribuído para me

enriquecerem como pessoa e como profissional.

- À Psicóloga e Terapeuta da Fala que aceitaram ser entrevistadas.

- Aos meus alunos.

- Às colegas de turma: Ana Carolina, Ana porteiro e Susana Pires, por fazerem a “ponte”

entre a mim e a escola, quando por incompatibilidades horárias não me era possível assistir às

aulas.

- A todos os que de algum modo me ajudaram,

Muito obrigada.

© Fernanda Cardoso (2015) IV

E, at last but not the least…

A Deus: que me concedeu o dom da fé e da perseverança.

A Santo António de Lisboa, meu padrinho espiritual.

A meu marido.

A meus pais: a minha mãe que rezou por mim

e a meu pai que me acompanhou com o olhar.

© Fernanda Cardoso (2015) V

RESUMO

O Relatório de Estágio que a seguir se apresenta pretende divulgar o desenvolvimento da Prática de

Ensino Supervisionada de uma aluna do Curso de Mestrado Habilitador para a Docência em

Educação Pré-Escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico, ministrado pela Escola Superior de

Educação, Comunicação e Desporto do Instituto Politécnico da Guarda, estágio esse, efetuado na

Escola Básica da Póvoa do Mileu, na cidade da Guarda.

Tem como principal objetivo refletir sobre a realidade de uma escola de ensino regular do primeiro

ciclo, da qual faziam parte dois anos de escolaridade e na qual estavam integrados três alunos com

Necessidades Educativas Especiais. Nesse sentido é apresentado um estudo de caso sobre a

inclusão de uma aluna portadora de deficiência mental em sala de aula. O Relatório contempla três

vertentes essenciais:

-Enquadramento institucional (Organização e Administração Escolar) e caraterização

socioeconómica e psicopedagógica da turma onde foi realizado o estágio;

- Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada (reflexão auto e heteroavaliação);

- Proposta de uma prática docente relacionada com a superação do problema que deu mote ao

estudo.

Na pesquisa, agora estruturada em capítulos temáticos, sistematizam-se conhecimentos teóricos,

procedimentos metodológicos e éticos que sustentam a prática profissional. Nas reflexões,

equacionam-se complexidades, limites, condicionamentos e possibilidades de intervenção dos

docentes.

Reforça de forma impressiva e consistente, o caráter necessariamente reflexivo do agir do

professor, especificamente do professor de educação especial, e a sua forte componente ética,

mediando de forma cidadã e humanista as políticas educativas e sociais.

Os resultados da investigação aclaram fragilidades do sistema e apontam críticas ao atual modelo

de escola inclusiva, que fracassa o seu papel enquanto modelo integrador na redução das

desigualdades sociais. A pesquisa desencadeia futuras investigações que permitam produzir novo

conhecimento contextualizando-nos no âmbito educativo e social do século XXI, hoje considerado

o século da pobreza e da desigualdade social, que poderá aportar grandes desafios para a educação.

O trabalho desenvolve-se com rigor concetual, espírito científico e sentido de inovação.

Palavras-chaves: Educação, Reflexão, Inclusão, Deficiência Mental

© Fernanda Cardoso (2015) VI

ABSTRACT The Internship Report that here is presented aims to promote the development of Supervised

Teaching Practice of a student of the Enabler Master Course for Teaching in Pre School and

education in 1st cycle of basic education, taught by the School of Education, Communication and

Sports of the Polytechnic Institute of Guarda, internship performed at the Basic School of Póvoa do

Mileu, in the city of Guarda.

Its main objective is to reflect on the reality of a mainstream school of the first cycle, with two

years of schooling and in which three students with special educational needs were integrated.

Accordingly a case study is presented on the inclusion of a student with mental disabilities in the

classroom.

The report includes three main areas:

- Institutional framework (Organization and School Administration) and socio-economic and

psycho-pedagogical characterization of the class where the internship was carried out;

- Description of the supervised teaching practice process (self reflection and self assessment);

- Proposal of a teaching practice related with the resolution of the problem that set the theme forthe

study.

In the survey, now structured in thematic chapters, theoretical knowledge and methodological and

ethical procedures that support professional practice were systematized. On the reflections,

complexities, boundaries, constraints and possibilities of teachers’ interventions were considered.

It reinforces impressively and consistently, the necessarily reflective character of the act of the

special education teacher and its strong ethical component, mediating in a citizen-based and

humanist way the educational and social policies.

The research results clear up system weaknesses and point criticism of the current inclusive school

model, which fails its role as integrator model in reducing social inequalities. The research triggers

future investigations to produce new knowledge contextualizing us in the educational and social

context of the twenty-first century, now considered the century of poverty and social inequality,

which could contribute to major challenges for education. The work develops with conceptual

rigor, scientific spirit and sense of innovation.

Keywords: Education, Reflection, Inclusion, Mental Disability.

© Fernanda Cardoso (2015) VII

SIGLAS

Art.º - Artigo

CEB – Ciclo do Ensino Básico

CERCI – Cooperativa para a Educação e Reabilitação de Cidadãos Inadaptados

DEB – Departamento da educação básica

Dec. – Decreto

DM – Deficiência Mental

EB – Escola Básica

ECD - Estatuto da Carreira Docente

ME – Ministério da Educação

OCDE- Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico

OMS – Organização Mundial de Saúde

PAA – Plano Anual de Atividades

PEI – Programa Educativo Individual

PES – Prática de Ensino Supervisionada

UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância

© Fernanda Cardoso (2015) VIII

ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1: Localização geográfica da Guarda e concelhos adjacentes ............................................. 19

Figura 2: Caracterização da escola ............................................................................................... 24

Figura 3: Implicações do modelo reflexivo ao nível das atitudes dos professores .......................... 39

Figura 4: Alguns conceitos básicos da teoria de Ausubel .............................................................. 45

ÍNDICE DE GRÁFICOS

Gráfico 1: Caracterização da turma por género ............................................................................. 27

Gráfico 2: Distribuição de alunos por género e ano de escolaridade .............................................. 27

ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 1: Recursos humanos ....................................................................................................... 25

Quadro 2: Situação educativa dos alunos ...................................................................................... 29

Quadro 3: Organização do estágio ................................................................................................ 36

Quadro 4: Estratégias de reflexão ................................................................................................. 41

Quadro 5: Níveis de deficiência ou de comportamento deficitário ................................................. 98

Quadro 6: Registo das respostas às entrevistas ............................................................................ 121

Quadro 7: Descrição da situação da aluna ................................................................................... 129

Quadro 8: Relatório Técnico Pedagógico ................................................................................... 130

© Fernanda Cardoso (2015) 11

INDICE

SIGLAS ................................................................................................................................................... VII

ÍNDICE DE FIGURAS .......................................................................................................................... VIII

ÍNDICE DE GRÁFICOS ........................................................................................................................ VIII

ÍNDICE DE QUADROS ........................................................................................................................ VIII

Introdução ................................................................................................................................................. 14

Capítulo I - Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar ........................................ 18

1.1 Caracterização do meio envolvente................................................................................................... 18

1.2 Localização geográfica da escola ...................................................................................................... 23

1.3 Caraterização da escola .................................................................................................................... 24

1.3.1 Caracterização da sala de aula ....................................................................................................... 26

1.3.2Caracterização socioeconómica e psicopedagógica da turma ........................................................... 27

Capítulo II – Descrição do processo de prática de ensino supervisionada .................................................... 30

2.1 Articulação entre ciclos .................................................................................................................... 30

2.2. Funcionamento da prática de ensino supervisionada......................................................................... 35

2.3 Análise reflexiva à luz do nosso quotidiano ...................................................................................... 37

2.4 Outros pressupostos importantes na nossa prática educativa .............................................................. 44

Capítulo III – A Educação Especial e a Criança com Necessidades Educativas Especiais ............................ 56

3.1 Da segregação à inclusão ................................................................................................................. 56

3.2 Síntese histórica da evolução da educação especial ........................................................................... 58

3.3 Políticas da educação inclusiva ......................................................................................................... 60

3.4 A educação inclusiva em Portugal .................................................................................................... 63

3.4.1 Situação atual ................................................................................................................................ 66

3.4.1.1 Modalidades específicas de educação e respostas educativas especializadas................................. 68

Capítulo IV – Caminhos para a Inclusão .................................................................................................... 71

4.1 A escola inclusiva: pressupostos básicos ........................................................................................... 71

4.2 Os professores – a sua formação e o seu papel na construção de uma escola inclusiva ....................... 74

4.3 O papel das lideranças e do gestor escolar ........................................................................................ 77

4.4 Escola inclusiva e multiculturalidade ................................................................................................ 79

4.5 A importância do currículo na escola inclusiva ................................................................................. 83

4.6 O papel da ética nas políticas educativas duma escola inclusiva ........................................................ 86

Capítulo V – A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular ...................................... 91

5.1 Conceito de deficiência .................................................................................................................... 91

© Fernanda Cardoso (2015) 12

5.1.1 Definição de deficiência mental ..................................................................................................... 92

5.1.2 Diagnóstico ................................................................................................................................... 94

5.1.3 Etiologia ....................................................................................................................................... 96

5.2 Graus de deficiência mental e características de cada grupo .............................................................. 98

5.3 Características evolutivas da deficiência mental e implicações educativas ....................................... 100

5.3.1 Desenvolvimento da personalidade na pessoa com deficiência mental .......................................... 102

5.4 A abordagem educacional da criança com deficiência mental .......................................................... 103

5.5 A Educação Pré-Escolar ................................................................................................................. 105

5.6 A educação no 1.º Ciclo do Ensino Básico ...................................................................................... 106

5.7 Programas Educativos Individuais .................................................................................................. 108

5.8 O papel da família .......................................................................................................................... 110

Capítulo VI – Organização e desenvolvimento do estudo experimental ..................................................... 113

6.1 Justificação do estudo .................................................................................................................... 113

6.2 Problemática .................................................................................................................................. 114

6.3 Objetivos do estudo........................................................................................................................ 115

6.4 Opções metodológicas ................................................................................................................... 117

6.5 Técnicas de recolha de dados ......................................................................................................... 118

6.6 Apresentação e análise de conteúdo ................................................................................................ 120

6.7 Principais ilações ........................................................................................................................... 125

6.8 Limitações do estudo ..................................................................................................................... 127

6.9 Apresentação do estudo de caso ..................................................................................................... 127

6.10 Situação educativa atual ............................................................................................................... 132

Conclusões .............................................................................................................................................. 133

Referências Bibliográficas ....................................................................................................................... 136

Anexos .................................................................................................................................................... 146

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Cada ser humano trilha o seu próprio percurso de formação,

fruto do que o contexto vivencial lhe permite que seja,

fruto do que quer e do que pode ser.

Isabel Alarcão (1997)

Introdução

© Fernanda Cardoso (2015) 14

Introdução

A educação é um acto de amor, por isso um acto de coragem.

Não pode temer o debate. A análise da realidade.

Não pode fugir à discussão criadora, sob pena de ser uma farsa.

Paulo Freire (1979)

O presente trabalho desenvolve-se à volta da temática “Inclusão de alunos com deficiência mental

no 1.º CEB – Um estudo de caso”.

A escolha do tema prende-se com a conceção de educação, especificamente de educação especial,

que hoje exige novas respostas interventivas. Na generalidade dos países observa-se uma

progressiva tomada de consciência de que o atendimento das crianças e jovens que são excluídos

da escola regular e, em particular daqueles a quem é imposto um percurso educativo paralelo

segregado, constitui uma prioridade.

A grande produção de documentos de cariz científico, realizados individualmente ou por

organizações mundiais, que dão origem a orientações de política educativa a nível internacional,

expressa bem a urgência do combate à exclusão e a necessidade de serem criadas disponibilidades

e condições de operacionalização de inclusão social e escolar. Efetivamente, em termos de política

educativa, o novo paradigma assenta agora na inclusão. Como nos diz Miranda Correia (2008a) Em

Portugal, hoje em dia, quando se fala em educação, a palavra de ordem parece ser sempre

inclusão, um conceito “salva-vidas” dos alunos com necessidades educativas especiais

significativas (NEES)1” (Correia, 2008a:7).

No entanto, a experiência profissional e as constatações que efetuamos na prática educativa,

obrigam a uma mais profunda reflexão. Da mesma, surge a temática desta investigação, que

consideramos com relevância e interesse para a área da Educação.

Desta forma, vemos como preocupação central neste contexto, o ser humano, e as problemáticas

que lhe dizem respeito nas diferentes dimensões. Por consequência a criança ou jovem com

Necessidades Educativas Especiais (NEE), integra-se no grande grupo das questões do ser humano

na medida em que, sendo frágil, é alvo da intervenção de uma equipa interdisciplinar e

1 De uma forma original, Correia adota a nomenclatura NEES (Necessidades Educativas Especiais Significativas) para se referir a esta população. Mas, efetivamente, a maioria da bibliografia consultada, inclusive o próprio em obras anteriores, usa apenas a sigla NEE`s ou NEE. Nós optaremos por esta última.

Introdução

© Fernanda Cardoso (2015) 15

multidisciplinar constituída por diferentes técnicos: professores, psicólogos, assistentes sociais,

profissionais de saúde, sociólogos e outros elementos da comunidade educativa.

No seguimento da temática, articulando inúmeras ideias e situações, surgiu-nos o interesse

específico em investigar quais as representações que diferentes autores têm acerca da inclusão de

alunos com necessidade de respostas educativas diferenciadas e da forma como esta inclusão se

está a verificar. Após isso, construiu-se a seguinte pergunta:

– Quais os principais obstáculos que se colocam à escola, quando procura dar resposta a

todas as crianças – especificamente à criança portadora de deficiência mental – e como

poderemos dar o nosso contributo para minimizar esta problemática?

Decorrentes da pergunta que identificamos como questão de partida e problematizando o contexto

educativo em que a escola atual se desenvolve, emergiram questões como:

– Será, efetivamente, possível ao professor de ensino regular atender com eficácia todos os

alunos em sala de aula?

– Qual a perceção da comunidade científica em geral face à inclusão?

– Estará o modelo de escola atual adequado ao conceito de escola inclusiva?

– A criança portadora de deficiência mental, quando integrada em turmas regulares, correrá

risco de exclusão social?

– Como é perspetivado o futuro da criança portadora de deficiência mental?

– A presença de uma criança com NEE implica organização e funcionamento diferentes? Em

que aspetos?

– Qual a perceção que os técnicos especializados têm acerca do processo de inclusão?

A constituição deste corpo de perguntas, funcionaram como ponto de reflexão e referência para

posterior definição dos rumos da investigação (teórica e prática). Foi, também, com base nelas que

delineámos os objetivos, geral e específicos que apresentamos em espaço e momento próprios.

Após a clarificação dos mesmos definimos como objeto de estudo a integração de uma criança com

Deficiência Mental (DM) numa escola regular. As linhas orientadoras que subjazem ao

desenvolvimento da investigação estarão patentes ao longo de três Partes, cada uma delas

organizada na continuidade da anterior. Foram distribuídas em seis capítulos que passamos a

enunciar:

Introdução

© Fernanda Cardoso (2015) 16

A primeira Parte engloba dois capítulos. No primeiro, abordam-se aspetos da organização e

administração escolar, através de um enquadramento institucional. No segundo, descreve-se o

processo da Prática de Ensino Supervisionada (PES). São, também, apresentadas relevantes

perspetivas teóricas relacionadas com a área da Educação em geral e da Educação Pré-Escolar e 1.º

CEB, em particular.

A segunda Parte abrange três capítulos. No terceiro capítulo é dada uma visão do problema abstrato

da investigação e revistos os fundamentos do ensino inclusivo. Pela sua importância, passaremos

em revista as principais diretrizes e estratégias nacionais e internacionais produzidas nesta matéria,

fazendo-o de modo a dar-se uma visão histórica internacional (ancorada nos primórdios das

respostas educativas a estas populações) e fazendo-se também um relance do seu desenvolvimento

em contexto nacional. No quarto capítulo, analisamos uma série de pressupostos que consideramos

fundamentais para a verdadeira inclusão de todos os alunos na escola dita regular e que,

acreditamos, poderão fornecer um importante suporte ético e pedagógico à nossa prática

profissional. No capítulo quinto, são tratados os conceitos relacionados com o problema a ser

investigado relevando-se significativamente os termos deficiência mental e necessidades educativas

especiais, por serem o fio condutor desta abordagem.

Por fim, na terceira Parte, mostramos como organizámos e desenvolvemos o estudo experimental.

Esta terceira Parte, por se constituir de pontos tão interligados, apresentamo-la num único capítulo:

o capítulo sexto. Neste, é apresentada, de forma mais explícita a justificação do estudo, a

metodologia adotada e as técnicas de recolha e tratamento de dados. Procede-se, ainda, à

sistematização e apresentação dos resultados da pesquisa, fazendo-se a análise e interpretação da

informação. Identificam-se as limitações do estudo e, por fim, faz-se a apresentação do estudo de

caso propriamente dito. Por último são apresentadas as conclusões e a bibliografia.

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 17

PARTE I

Qualquer situação de ensino-aprendizagem é complexa e apresenta aspectos sociológicos,

biológicos e psicológicos diferentes de qualquer outra, pelo que os professores devem conhecer

e dominar inúmeras estratégias didácticas e complementares, para poderem fazer face às várias

situações que podem surgir (Borrás, 2001:92).

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 18

Capítulo I - Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

(…)os

edifícios escolares devem ser planeados na óptica de um equipamento integrado e ter

suficiente flexibilidade para permitir, sempre que possível, a sua utilização em

diferentes actividades da comunidade e a sua adaptação em função das alterações dos

diferentes níveis de ensino, de currículo e métodos educativos.

(LBSE, artigo 39.ºalínea a).

1.1 Caracterização do meio envolvente

Não existem dúvidas, todos o sabemos, O meio circundante é a casa, o bairro, os campos, os prados, os bosques,

as lojas e as oficinas, os monumentos e os edifícios públicos, tudo quanto o pequeno citadino ou o pequeno

aldeão vêem na vida de todos os dias (Dottrens,1974a:10).

O conhecimento das instituições assim como o seu enquadramento institucional, bem como a caraterização

socioeconómica e psicopedagógica das turmas, sem perder de vista os normativos nacionais, deverão estar na

base do planeamento para o processo de ensino e de aprendizagem.

Com base nesse pressuposto, recolhemos a informação que considerámos necessária sobre a cidade da Guarda,

localidade onde se desenrolou o nosso estágio, apresentando na figura que se segue a sua localização geográfica.

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 19

Figura 1: Localização geográfica da Guarda e concelhos adjacentes

Fonte: www.destinoportugal.pt-tur.com

A Guarda é uma cidade portuguesa, capital de distrito situada a 1056 metros de altitude, sendo a cidade mais alta

de Portugal. Tem 26.565 habitantes no seu perímetro urbano2 e uma população residente de 173 831 habitantes.

Como se pode observar, o município é limitado a nordeste pelo município de Pinhel, a leste por Almeida, a

sudeste pelo Sabugal, a sul por Belmonte e pela Covilhã, a oeste por Manteigas e por Gouveia e a noroeste por

Celorico da Beira.

Até um passado recente, cada concelho estava organizado integrando diversas freguesias. Por força da nova

reorganização administrativa do território das freguesias (Lei n.º 11-A/2013 de 28 de janeiro), as diferentes

freguesias urbanas e rurais sofreram transformações a partir das quais muitas delas foram agregadas entre si, e

outras foram mesmo extintas em função da alteração dos limites territoriais.

Decorrente dessa legislação a cidade da Guarda deixou de se subdividir em duas freguesias (Sé e São Vicente)

encontrando-se atualmente restrita a uma única: freguesia da Guarda. No que concerne à sua localização, o

concelho da Guarda encontra-se na província da Beira Alta e pertence à sub-região estatística da Beira Interior

Norte, sofrendo visivelmente a desertificação constante de um interior que, apesar de bem servido ao nível viário,

assume-se carente de infraestruturas económicas, não despertando nas famílias o interesse e garantias suficientes

para aqui se instalarem. Contudo, a cidade da Guarda com a Torre de Menagem a 1056 metros acima do nível do

mar, está rodeada de depressões, onde correm rios como o Mondego, o Zêzere e o Côa que, desde os alvores da

2 Fonte: https://ptwikipédia.org/WIKI/Guarda (acedida em 14/05/2015)

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

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Humanidade, facilitaram a vida aos seus habitantes, pela generosidade de recursos; encontrando-se numa área de

comprovada ancestralidade humana (Rodrigues, 1977). De salientar que a partir do rio Mondego, foi criada a

Barragem do Caldeirão que abastece água para toda a cidade e algumas zonas rurais.

Culturalmente, a Guarda distingue-se por ser conhecida como a cidade dos cinco “F`s"3: Forte, Farta, Fria, Fiel e

Formosa. A explicação para a curiosa adjetivação da cidade, citamo-la apenas para que o leitor mais curioso e,

eventualmente, menos informado satisfaça a sua curiosidade. No entanto, fixamo-nos no último adjetivo que aqui

enumerámos, para que, aquele que ler o nosso trabalho possa - de forma breve - criar a sua própria ideia sobre a

cidade e, também, acompanhar a nossa visão sobre a mesma. Então, a sua formusura deve-se à riqueza

paisagística, histórica e patrimonial que a caracterizam. Torna-se visível que existe na Guarda, conjuntamente

com todas as freguesias que lhe estão anexas, um vasto património cultural, com vestígios de comunidades

humanas desde tempos remotos. Nestes destacam-se: igrejas, pelourinhos, solares, cruzeiros, pontes, achados

arqueológicos e ruínas de castelos. O seu conhecimento e estudo são essenciais na tomada de consciência do

passado que, como sabemos, é de todo o interesse preservar.

Como exemplos mais significativos destacamos, alguns monumentos situados na sede do Concelho: Sé Catedral,

Igreja da Misericórdia, Igreja de S. Vicente e a Capela do Mileu (…). Sediada no mesmo espaço geográfico do

último monumento mencionado, figurando paredes meias com a referida capela, encontra-se a Estação

Arqueológica do Mileu, descoberta em Agosto de 1951, aquando de obras efetuadas pela Junta Autónoma de

Estradas.

i) Caracterização socioeconómica do concelho da Guarda

Sob o ponto de vista económico, o concelho da Guarda caracteriza-se como um concelho rural e na maior parte

das suas freguesias a agricultura e a criação de gado ocupam lugar preponderante na economia familiar de tipo

tradicional. Há, também, grupos de famílias que residindo em espaços rurais se deslocam diariamente para a

cidade para desenvolverem atividades profissionais em serviços hoteleiros ou outros afins.

De salientar que, devido à atual conjuntura económica e à nova realidade social que tem conduzido à emigração,

muitas destas atividades também deixaram de ter peso na economia local. Por outro lado, na sede do concelho

existe alguma indústria que, também se revela escassa:

Plataforma Logística de Iniciativa Empresarial (várias empresas);

Parque Industrial (várias empresas).

3 ->Forte: a torre do castelo, as muralhas e a posição geográfica demonstram a sua força; -> FARTA: devido à riqueza do vale do Mondego; ->FRIA: a proximidade à Serra da Estrela explica este F; ->FIEL: porque Álvaro Gil Cabral – que foi Alcaide-Mor do Castelo da Guarda e trisavô de Pedro Álvares Cabral – recusou entregar as chaves da cidade ao Rei de Castela durante a crise de 1383-85. Teve ainda Fôlego para combater na batalha de Aljubarrota e tomar assento nas Cortes de 1385 onde elegeu o Mestre de Avis(D. João I) como Rei; -> FORMOSA: pela sua natural beleza.

Fonte: https://ptwikipédia.org/WIKI/Guarda (acedida em 14/08/2013).

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 21

Na vida da cidade, um pouco à semelhança do que acontece no resto do país, o setor dos serviços ocupa um lugar

predominante:

Câmara Municipal – serviços municipalizados;

Conservatória: registo civil e predial;

Tribunal Judicial;

Finanças;

Notários;

Segurança Pública (Polícia de Segurança Pública, Guarda Nacional Republicana,

Policia Judiciária);

Saúde: Hospital Sousa Martins, Centros de Saúde (várias extensões), Unidade de Cuidados

Continuados e várias clínicas de iniciativa particular.

Na área da cultura e lazer relevam-se o Teatro Municipal da Guarda (TMG) e o espaço Parque Urbano do Rio Diz

(Pólis), situado na zona da Guarda Gare.

No que respeita ao setor do comércio há uma relativa diversidade de oferta (respeitante ao comércio tradicional),

que tem sofrido algum decréscimo. Por outro lado, embora limitadamente, a cidade tem também beneficiado de

alguma modernidade. Podemos destacar o Centro Comercial VIVACI, que comporta salas de cinema e o

comércio tradicional.

Como ponto de grande valorização da cidade, destacam-se as boas vias de comunicação; ligada a Espanha e ao

Distrito de Viseu pela designada A25 e ao Distrito de Castelo Branco pela A23. A nível ferroviário, possui a

Linha da Beira Baixa (encerrada para obras de modernização com abertura prevista para o ano 2020)4 e a linha da

Beira Alta que se encontra completamente eletrificada permitindo a circulação de comboios regionais, nacionais

e internacionais, constituindo "o principal eixo ferroviário para o transporte de passageiros e mercadorias para o

centro da Europa" com ligação a Hendaye (França, via Salamanca-Valladolid-Burgos).

O ar, historicamente reconhecido pela salubridade e pureza, foi distinguido pela Federação Europeia de

Bioclimatismo em 20025, que atribuiu à Guarda o título de primeira "Cidade Bioclimática Ibérica". A Guarda foi

também pioneira na rádio local, sendo mesmo a Rádio Altitude considerada a primeira rádio local de Portugal. As

suas origens prendem-se com a existência de um Sanatório dedicado à cura da tuberculose.

Toda a região é marcada pelo granito, pelo clima contrastado de montanha e pelo seu ar puro e frio que permite a

cura e manufatura de fumeiro e queijaria de altíssima qualidade. É também a partir desta região que vertem as

4 Fonte: https://ptwikipédia.org/WIKI/Guarda (acedida em 14/08/2013) 5 Fonte: https://ptwikipédia.org/WIKI/Guarda (acedida em 14/08/2013)

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 22

linhas de água subsidiárias das maiores bacias hidrográficas que abastecem as três maiores cidades de Portugal:

para a bacia do Tejo que abastece Lisboa, para a Bacia do Mondego que abastece Coimbra e para a bacia do

Douro que abastece o Porto. Existe mesmo na localidade de Vale de Estrela (a 6 km da cidade da Guarda) um

padrão que marca o ponto triplo onde as três bacias hidrográficas se encontram.

ii) Oferta Educativa

Relativamente ao ensino oficial, e em consequência da nova rede escolar, por força da legislação (Dec.-Lei n.º

75/2008 de 22 de abril) que determinou a agregação dos agrupamentos transformando-os em unidades

administrativas de maior dimensão, os anteriores agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas - Área Urbana

de Santa Clara, Escola Secundária Afonso de Albuquerque, Escola Secundária da Sé, Agrupamento de Escolas de

S. Miguel e Agrupamento de Escolas Carolina Beatriz Ângelo, foram aglomerados em dois únicos Mega

Agrupamentos: Agrupamento de Escolas Afonso de Albuquerque (e escolas adjacentes nas quais se incluem a EB

de Santa Clara e a anterior Escola Secundária Afonso de Albuquerque) e o Agrupamento de Escolas da Sé (que

integrou a EB de S. Miguel e escolas adjacentes); a Escola Carolina Beatriz Ângelo (e escolas adjacentes) e a

Escola Secundária da Sé; ficou, assim, a designar-se Agrupamento de Escolas da Sé. Para um melhor

conhecimento poderá adiantar-se que grosso modo o primeiro Agrupamento absorveu as escolas do primeiro ciclo

de áreas mais urbanas, e o segundo, as escolas de meio mais periférico ou rural.

Os alunos (jovens ou não) podem contar com o Ensino Superior – Instituto Politécnico da Guarda que tem sido,

ao longo dos anos, uma mais valia para a cidade, tanto na sua vertente cultural como económica, na medida em

que aporta uma série de infraestruturas necessárias ao seu funcionamento.

Paralelamente ao ensino oficial, a Guarda oferece hoje, aos jovens, mais oportunidades no complemento de

atividades escolares, ocupação de tempos livres, terapias e, a todos em geral, a possibilidade de participação em

atividades de índole cultural. Lembra-se a existência de alguns Centros de Estudos, Escola de Línguas, Centros de

Intervenções Psicopedagógicas (Centro de Formação Assistência e Desenvolvimento – CFAD, Núcleo

Desportivo e Cultural – NDS, Psycofoz…), Conservatório, Grupo de Teatro Aquilo, Paços da Cultura, Museu e

Piscinas Municipais, entre outros.

A par da oferta educativa da rede pública, também existem estruturas de iniciativa privada que prestam um

importante suporte educativo. No âmbito do ensino particular e cooperativo podemos mencionar Infantários, a

Cooperativa para a Educação e Reabilitação de Cidadãos Inadaptados (CERCIG) e a Escola Regional Dr. José

Dinis da Fonseca.

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 23

1.2 Localização geográfica da escola

A escola é, por excelência, o lugar onde a aprendizagem formal, dita académica, acontece. Se recuarmos aos

nossos tempos de infância e fizermos emergir da memória imagens da escola, decerto enumeraremos, num

primeiro momento: o professor, o livro, o caderno, o quadro e a escola. As gerações mais novas acrescentariam a

esta lista, seguramente, o computador. No quotidiano de cada criança estas mesmas componentes interferem,

fortemente, no desenvolvimento das suas aptidões naturais e poderão, por isso, predispor a disposição infantil

para o facto de gostar ou não gostar de ir à escola, condicionando, provavelmente, no futuro o comportamento do

adolescente e do adulto face a novas experiências de aprendizagem.

Considerando que a escola constitui uma organização em que há dependência entre a estrutura formal e as

interações produzidas (Nóvoa, 1992), e que as características organizacionais distinguem alguns aspetos que se

interligam: a estrutura física, a administrativa e a social, compreenderemos a importância e respetivas implicações

que cada um destes aspetos desempenha na vida dos alunos. É partindo desta convicção que passamos a

apresentar a escola onde realizámos a nossa Prática de Ensino Supervisionada: a Escola Básica da Póvoa do

Mileu. Esta, encontra-se localizada na rua da Escola numa zona urbana da cidade da Guarda - a já identificada

Póvoa do Mileu - que fica na periferia da cidade, a cerca de 2Km do centro.

Na antiguidade era uma área essencialmente agrícola com habitações antigas denominada, ainda hoje, de Póvoa

Velha. Atualmente, tem vindo a evoluir com a construção de grandes bairros, que servem de residência a casais

jovens. Apesar do seu crescimento, não foram criadas infraestruturas que proporcionassem bem-estar aos seus

habitantes, pois existem poucos espaços verdes e espaços adequados a práticas lúdicas e desportivas das crianças.

De certo modo, é fácil perceber pelas vivências transmitidas pelos alunos que esta ausência é compensada com a

frequência assídua do Pólis.

Esta escola pertence ao Agrupamento de Escolas da Sé. Relativamente próximo da mesma, encontra-se o Jardim

de Infância da Póvoa do Mileu com o qual tem realizado, conjuntamente, atividades pedagógicas e recreativas

devidamente planificadas no Plano Anual de Atividades (PAA) das duas instituições6. Os restantes

estabelecimentos educativos encontram-se dispersos por toda a área geográfica abrangida pelo Agrupamento

concentrando-se na cidade da Guarda, bairros periféricos e localidades rurais.

6 Informação apurada a partir do Plano Anual de Atividades da EB da Póvoa do Mileu.

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 24

1.3 Caraterização da escola

A escola é um edifício pré-fabricado; visto exteriormente não corresponde à imagem/construção mental que, de

modo mais ou menos coerente todos fomos criando relativamente a estes edifícios. É de estrutura térrea e baixa,

com uma configuração pouco assimétrica. Tem duas salas bem iluminadas, onde à data da PES, funcionavam

respetivamente 1.º/4.ºano e 2.º/3.ºano; um pequeno hall de entrada que dá acesso às duas salas e às casas de

banho. No seguimento desse hall, mas direcionando-se para as traseiras do edifício, existe um pequeno espaço

amplo onde estão, naturalmente privados, dois sanitários destinados aos rapazes, dois para as raparigas e um a

adultos. Estes, dão para um espaço onde existem quatro lavatórios.

É, também neste mesmo sitio que se encontra o telefone. Já no decurso da nossa PES foi construída, no interior

daquele espaço, uma subdivisão de áreas minúsculas que se destina a terapias e apoios especializados, prestados

a alunos com NEE.

Figura 2: Caracterização da escola

Fonte: Elaboração própria

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 25

Funciona de apoio à escola - mas localizado noutra zona próxima - um edifício onde é servida a refeição do

almoço e se desenvolvem outras atividades habitualmente designadas, Atividades de Tempos Livres (ATL),

frequentadas pelas crianças que o desejarem. No que respeita aos recursos, iremos apresentá-los subdivididos em

recursos humanos e recursos materiais.

Recursos humanos

Relativamente aos recursos humanos, é largamente reconhecida a importância que os diferentes mediadores da

orientação educativa desempenham no desenvolvimento da personalidade dos educandos, relevando na formação

dos mesmos a promoção de valores que ajudem os alunos a integrarem, de forma responsável, a comunidade a

que pertencem e a orientá-los no serviço do bem comum (Fernandes, 1990). Decorre daí o relevado interesse em

que todos os agentes educativos funcionem em estreita cooperação e harmonia.

Assim, passamos a referir, os recursos humanos que prestavam serviço na EB de Póvoa do Mileu (duas salas) à

data da realização da PES:

Quadro 1: Recursos humanos Corpo docente Técnicos especializados Pessoal auxiliar

Professora titular de turma (uma) – 1.º/4.º ano - Terapeuta da Fala -Assistente operacional

- Professora titular de turma (uma) – 2.º/3.º ano - Formadora de Língua

Gestual

- Professora de apoio educativo (uma) - Psicóloga

-Professora de atividades extra curriculares

(uma)

- Professoras de Educação Especial (duas)–

Grupo 9107

-Professoras (duas) de Educação Especial –

Grupo 9208

-Professores das Expressões (três)

(EM/EP/AFD) em coadjuvação

Fonte: Elaboração própria

7 Professora que presta apoio pedagógico personalizado a crianças com NEE, com dificuldades no domínio cognitivo. 8 Professora que presta apoio pedagógico personalizado a crianças com NEE, com dificuldades no domínio da comunicação e da linguagem.

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 26

Recursos materiais

Ao nível dos recursos materiais, podemos dizer que a escola dispunha daqueles que se podem considerar

essenciais. Incluímos nestes, equipamento informático, mobiliário e material didático. Consideramos que este

aspeto é significativamente importante na medida em que A diversidade de espaços equipados com materiais

próprios, cuja utilização seja regulada por regras adequadas às circunstâncias, promove a autonomia dos

alunos e é um recurso indispensável para por em prática a diferenciação pedagógica (Reis et al.; 2009: 68).

Respeitante ao equipamento informático, cada sala estava equipada com computador, impressora e respetivo

software educativo. Sempre que se tornava necessária a utilização do retroprojetor, o mesmo tinha de ser

previamente requisitado na EB de S. Miguel. Para lá do material já referido existiam ainda outros materiais

didáticos, jogos e livros que serviam de apoio às necessidades diárias das professoras e dos alunos, quer na

compreensão e concretização das tarefas educativas, quer na prática das atividades lúdicas. Regra geral, o

material informático era utilizado com a orientação da professora.

1.3.1 Caracterização da sala de aula

A sala de aula apresentava dimensões que poderemos considerar exíguas para o número de alunos que a

frequentavam e que poderiam ser um obstáculo à prática educativa. Como preconiza Arends (1998) A gestão da

sala de aula é, possivelmente, o desafio mais importante que os professores principiantes têm de enfrentar

(Arends,1998:186). Contudo, a experiência e o saber da professora titular de turma facilitaram a disposição dos

materiais de modo a permitir o máximo de otimização das condições existentes. Ciente de que a forma como o

espaço está organizado influencia a comunicação e a relação entre o professor e os alunos, as carteiras foram

colocadas acautelando, ao máximo, a possibilidade de que todos, à vez ou ao mesmo tempo, quando necessário,

focalizassem a atenção no professor, no quadro, ou em qualquer outro suporte essencial à prática educativa.

Para melhor organização, as carteiras foram alinhadas umas atrás das outras e os alunos foram agrupados por ano

de escolaridade, havendo o cuidado de, na proximidade com os pares, salvaguardar as caraterísticas

comportamentais de cada um e potenciar as experiências pedagógicas a que frequentemente chamamos “tutoria

de pares”. Dependendo das respostas dos alunos, ao longo do ano, sempre que necessário, foram realizados

ajustes.

Ainda no interior da sala de aula, os armários, secretárias (da professora e do computador) e mesas de apoio

foram acomodados nos espaços mais propícios. Todavia, pese embora a adequada gestão de todo o material

existente na sala de aula, tornava-se difícil circular na mesma pois o número de alunos e o mobiliário ocupavam,

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 27

inevitavelmente, o espaço. Esta situação agudizava-se nos dias de chuva pois, como já foi referido, não existia um

espaço coberto e amplo, e tornava-se por essa razão inevitável que os alunos de cada sala permanecessem no seu

respetivo espaço. Lembramos que, na sequência da realização da sala para apoio ao aluno com NEE no âmbito da

Comunicação e Linguagem, o espaço existente na zona dos sanitários, embora exíguo mas amplo, deixou de

poder ser utilizado para fins lúdicos.

1.3.2Caracterização socioeconómica e psicopedagógica da turma

As informações respeitantes a este ponto foram apuradas a partir da observação direta, dados facultados pela

professora titular de turma e dados constantes nas fichas de inscrição. A turma era constituída por um total de

dezanove alunos distribuídos, por género, da forma que a seguir se apresenta:

Gráfico 1: Caracterização da turma por género

Fonte: Elaboração própria

Para melhor perceção apresentamos a constituição da turma organizada por género e ano de escolaridade como se

pode ver no gráfico número dois:

Gráfico 2: Distribuição de alunos por género e ano de escolaridade

Fonte: Elaboração própria

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 28

No que respeita à proveniência sociocultural dos alunos, poderemos dizer que a esmagadora maioria reside na

Póvoa do Mileu e vive relativamente próximo da escola, sendo acompanhados, até à mesma, pelos pais ou avós.

Em termos gerais, os agregados familiares possuem um nível socioeconómico e cultural médio baixo, sendo

muitos deles subsidiados o que reflete, à semelhança do que se passa noutras zonas do país, a crise social que

assola a atualidade e da qual emergem, entre outras situações, famílias monoparentais e casais desempregados.

Ainda respeitante à zona de residência, excetua-se o caso de uma menina que estava institucionalizada na Aldeia

SOS.

Por outro lado, a escola da Póvoa do Mileu, revelava também a tendência multicultural que nos faz sentir hoje

“cidadãos do mundo”, pois na turma em questão, estavam integradas duas meninas de nacionalidade estrangeira:

uma brasileira e outra muçulmana.

Por força da legislação específica (Dec.-Lei n.º 3/2008 de 7 de janeiro) que reconhece a todas as crianças, sem

exceção, o direito a frequentar a escola dita regular estavam, também, integradas na turma, três crianças

portadoras de Necessidades Educativas Especiais (NEE) de caráter permanente, duas das quais tipificadas com

deficiência no domínio mental e uma terceira com deficiência ao nível da Comunicação e Linguagem, mas

também com deficiência mental. Careciam de respostas específicas de educação, beneficiando por isso de

adequações no processo de ensino e de aprendizagem ao abrigo da legislação supramencionada. Nas duas

primeiras situações os alunos eram escolarizados com as medidas educativas: Apoio pedagógico personalizado

(Art.º17.º); Adequações curriculares individuais (Art.º18.º); Adequações no processo de avaliação (Art.º20.º) e

Tecnologias de apoio (Art.º22.º). De igual modo, o terceiro aluno beneficiava de: Apoio pedagógico

personalizado (Art.º17.º); Adequações no processo de matrícula (Art.º19); Adequações no processo de avaliação

(Art.º20.º); Currículo específico individual (Art.º21.º) e Tecnologias de apoio (Art.º22.º).

Os três discentes eram acompanhados por docentes especializadas nas respetivas áreas de deficiência e técnicos

especializados, em conformidade com o que estava definido no seu Programa Educativo Individual (PEI).

Existiam, ainda, na turma, mais três alunos que apresentavam necessidades educativas diferenciadas e

beneficiavam de apoio educativo ao abrigo do Despacho normativo n.º50/2005. Estes, tinham um Plano de

Acompanhamento Pedagógico Individual e acompanhamento por parte de uma professora que prestava apoio

educativo.

Para melhor visualização dos dados apresentamos um quadro síntese onde se encontram assinaladas as

particularidades que respeitavam a cada um e que, em nossa opinião, relevam para a nossa análise. Salientamos a

existência de dois anos de escolaridade a serem lecionados na mesma sala de aula. Por razões éticas optámos por

não colocar os nomes dos alunos.

Capítulo I Enquadramento Institucional, Organização e Administração Escolar

© Fernanda Cardoso (2015) 29

Quadro 2: Situação educativa dos alunos

Ano Sexo Retenções Apoios Terapias

F M Sim Não Educativo Ed. especial Sim Não

2.º x x x 2.º x x 2.º x x 2.º x x 2.º x x 2.º x x 3.º x x x x 3.º x x x 3.º x x x x 3.º x x 3.º x x 3.º x x 3.º x x 3.º x 3.º x 3.º x x x x 3.º x x 3.º x x 3.º x x

Fonte: Elaboração própria

Sentimos que não será, aqui, descabido referir que foi este quadro de exigência de múltiplas respostas educativas

diferenciadas, prestadas por diferentes professores e técnicos, confinados a um restrito espaço físico, que deram

mote para que partíssemos para uma reflexão mais aprofundada de como gerir esta realidade educativa, atendendo

a todos, sem descurar nenhum, centrando a nossa preocupação nos mais vulneráveis: os alunos com necessidades

educativas especiais de caráter permanente.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 30

Capítulo II – Descrição do processo de Prática de Ensino Supervisionada

(…)o dizer não é apenas a expressão do pensamento, mas também a sua realização.

Do mesmo modo, o caminhar não é apenas a expressão do desejo de alcançar uma meta, mas

também a sua realização.

(Benjamin, citado em Leite e Kramer, 1999:73)

Este capítulo dedicamo-lo aos aspetos organizativos e ao desenvolvimento da PES, articulando

estes com uma forte componente reflexiva.

2.1 Articulação entre ciclos

Versando este curso de mestrado sobre os dois níveis de educação: Educação Pré-Escolar e o 1.º

Ciclo do Ensino Básico, entendemos que se justifica plenamente um momento de reflexão sobre a

articulação entre ciclos.

Esta temática adquiriu, nos nossos dias, um lugar de destaque no sistema educativo pela

necessidade de implementar espaços colaborativos e de intercâmbio entre os diversos níveis de

escolaridade, para que as transições entre si se tornem processos mais harmoniosos e promovam a

sequencialidade do processo de ensino e de aprendizagem.

Esta sequencialidade, entendemo-la como uma continuidade educativa como condição de base para

o sucesso, na convicção de que a educação é um processo que conduz ao sucesso global do

indivíduo, que deve contribuir para um desenvolvimento adequado das competências que lhe

permitam ser, num futuro próximo, um cidadão responsável, solidário e participativo, verdadeiro

agente do progresso da comunidade em que se insere.

Efetivamente, a aprendizagem é um processo contínuo e continuado do ser humano ao longo da

vida, pelo que a continuidade educativa, condição de um desenvolvimento harmonioso,

equilibrado, e de qualidade, implica uma articulação sistémica e sistemática entre os vários

subsistemas educativos, condição sina quo non a educação deixará de ter qualidade. Partindo destas

considerações gerais, passamos, de seguida, a focalizar-nos mais especificamente nos níveis de

educação abrangidos pelo nosso estudo: Pré-Escolar e 1.º CEB.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 31

Com a integração da Educação Pré-Escolar no Sistema Educativo, através da Lei 46/86 de 14 de

outubro, e do Dec.- Lei n.º147/97 de 11 de junho, que determina que a Educação Pré-Escolar seja,

hoje, considerada a primeira etapa da educação básica no processo de educação ao longo da vida, o

1.ºCEB passou de ciclo inicial e ciclo terminal, para ciclo intermédio da Educação Básica. Tal

realidade faz com que haja necessidade de uma articulação educativa entre este ciclo e a Educação

Pré-Escolar que o precede.

Tradicionalmente a viver num isolamento organizacional - embora com práticas mais ou menos

regulares de atividades pedagógicas e recreativas conjuntas - educadores de infância e professores

do 1.ºCEB encontram-se, agora, num novo modelo organizativo que os vincula a uma prática de

continuidade educativa, sustentada numa efetiva articulação de desenvolvimento curricular. Esta

nova realidade é claramente reforçada em normativos estruturantes do sistema de ensino, dos quais

salientamos o, já citado, Dec.-Lei n.º75/2008 de 22 de abril que determina que O agrupamento de

escolas é uma unidade organizacional, dotada de órgãos próprios de administração e gestão,

constituída por estabelecimentos de educação pré-escolar e escolas de um ou mais níveis e ciclos

de ensino, com vista a (…) proporcionar um percurso sequencial e articulado dos alunos

abrangidos numa dada área geográfica e favorecer a transição adequada entre níveis e ciclos de

ensino (art.º6). No mesmo sentido, também o Despacho n.º 11120-A/2010 de 06 de julho

determina: Na programação das reuniões de avaliação, devem os directores dos agrupamentos de

escolas e dos estabelecimentos de educação pré-escolar e escolas não agrupadas assegurar a

articulação entre os educadores de infância e os docentes do 1.º ciclo do ensino básico de modo a

garantir o acompanhamento pedagógico das crianças no seu percurso da educação pré-escolar

para o 1.º ciclo do ensino básico.

Deste modo, no âmbito do tema em debate neste ponto do nosso trabalho, a articulação/transição

entre ciclos reveste-se de uma particularidade que, em nosso entendimento, obriga a atenção

redobrada: estamos a referir-nos à tenra idade das crianças que frequentam estes níveis de

educação.

Na verdade, a transição das crianças do jardim de infância para o 1º CEB constitui um momento de

alguma apreensão, pese embora a preparação feita pelos educadores de infância no sentido de

proporcionar uma boa integração. Logo de imediato, verificam-se diferenças na perceção que a

sociedade cria sobre a Educação Pré-Escolar e o 1º CEB; temos como ponto de partida e de grande

diferença, o facto de a primeira etapa de educação ser facultativa e a segunda ser obrigatória.

Seguem-se, posteriormente, as aquisições a realizar. Na frequência da Educação Pré-Escolar, a

aquisição de competências é feita de forma globalizada por Áreas de Conteúdo. No 1º CEB a

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 32

enfase é colocada na aquisição de competências a nível do Português, Matemática e Estudo do

Meio duma forma mais individualizada e compartimentada. Por outro lado, a metodologia de

ensino e de aprendizagem é também diferente nos dois níveis: no primeiro, privilegia-se a relação

entre pares e o trabalho de grupo; no segundo, valorizam-se estas relações mas privilegia-se,

particularmente, a relação professor/aluno. Por sua vez, ao transitarem para o 1.º CEB, as crianças

mudam comportamentos relacionais com o professor, com os pares e com as tarefas. São

observáveis, também, descontinuidades experimentadas ao nível das regras, das posturas, do

horário e da sequencialidade das atividades, entre outras.

Estas transições e mudanças não são, necessariamente, aspetos negativos. Pelo contrário, como

sabemos, desempenham importantes papéis no processo de maturação e crescimento do ser

humano. A este propósito Castro e Rangel (2004) referem que as transições e as mudanças se

constituem como oportunidades para o crescimento pessoal, tendo em conta as continuidades e

descontinuidades que as caracterizam. No entanto, alertam para a existência de rupturas e

contradições nas práticas que se verificam nas instituições educativas que são um forte obstáculo

ao desenvolvimento das crianças (Castro e Rangel, 2004:135).

Para que a passagem seja – como se pretende – harmoniosa, obriga a uma estruturação de um

percurso educativo. A articulação entre ciclos obedece a uma sequencialidade progressiva,

conferindo a cada ciclo a função de completar, aprofundar e alargar o ciclo anterior, numa

perspectiva de unidade global do ensino básico (Lei de Bases do Sistema Educativo, 1997, Artº 8).

A possibilidade de transição de docentes entre níveis de ensino está contemplada no Estatuto da

Carreira Docente (ECD), artigo 72º alínea 2), A transição fica condicionada à existência das

qualificações profissionais exigidas para o nível, ciclo de ensino ou grupo de recrutamento a que o

docente concorre (Dec.-Lei nº15/2007:514).

Tendo como direção a concretização das metas atrás enunciadas, as Orientações Curriculares para

a Educação Pré-Escolar determinam que o educador deve proporcionar condições para que cada

criança tenha uma aprendizagem com sucesso na fase seguinte competindo-lhe, em colaboração

com os pais e em articulação com os colegas do 1º ciclo, facilitar a transição da criança para a

escolaridade obrigatória (Departamento da Educação Básica, 1997:28). Por sua vez, o professor

do 1º CEB, deve promover a integração de todas as vertentes do currículo e a articulação das

aprendizagens do 1º ciclo com as da educação pré-escolar e as do 2º ciclo (Dec.-Lei

241/2001:574).

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 33

Como temos vindo a debater, o processo educativo é cumulativo e sequencial, daí a necessidade

dos docentes prestarem especial atenção aos momentos de transição entre níveis de educação,

eliminando as descontinuidades existentes nas programações e nos métodos de ensino. Para uma

melhor operacionalização torna-se necessário, por parte dos docentes, a preocupação com a

atualização dos seus conhecimentos profissionais. Prevendo essa realidade, o próprio ECD

consagra no Capítulo II – Direitos e Deveres, o Direito à formação e informação para o exercício

da função educativa (Decreto-Lei nº 15/2007:526). Esta ideia é reforçada na mesma legislação, ao

inscrever nos deveres dos docentes a obrigação de actualizar e aperfeiçoar os seus conhecimentos,

capacidades e competências, numa perspectiva de desenvolvimento pessoal e profissional

(Idem:527).

Retomando de novo a ideia da preocupação na continuidade educativa insistimos em referir aspetos

legislativos que têm atenuado a descontinuidade entre os dois níveis de educação. Nomeamos,

nesse sentido, a publicação de enquadramento legal relativamente à Educação Pré-Escolar, Lei -

Quadro da Educação Pré-Escolar (1997), a publicação de Orientações Curriculares para a

Educação Pré-Escolar (OCEPE), e uma circular sobre a Gestão do Currículo na Educação Pré -

Escolar (2007), emitida pela Direção Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular (DGIDC).

Nestes documentos fica bem explícita a responsabilidade dos educadores e professores do 1.ºCEB a

quem compete ter uma atitude proactiva na procura desta continuidade/sequencialidade, não

deixando de afirmar a especificidade de cada etapa, porém criando condições para uma

articulação co-construída escutando os pais, os profissionais, as crianças e as suas perspectivas

(Gestão do Currículo na Educação Pré-Escolar, 2007:6). Adianta este documento que A

planificação conjunta da transição das crianças é condição determinante para o sucesso da sua

integração na escolaridade obrigatória (Ibidem). Aponta, ainda, como estratégias de articulação as

que passam não só pela valorização das aquisições feitas pela criança no jardim de infância, como

pela familiarização com as aprendizagens escolares formais (Op. Cit.:6). Como estratégias são,

também, referidos o Processo Individual da Criança (que a acompanhará na sua transição para o

1.ºCEB); reuniões envolvendo docentes, encarregados de educação e crianças, para troca de

informações sobre como se faz e aprende no Jardim de Infância e na Escola do 1º CEB;

planificação e desenvolvimento de projetos/atividades comuns a realizar ao longo do ano letivo que

impliquem a participação dos educadores, professores do 1º CEB e respetivos grupos de crianças;

organização de visitas guiadas à Escola do 1º CEB e ao Jardim de Infância de docentes e crianças

como meio de colaboração e conhecimento mútuo; troca de informação sobre o trabalho

desenvolvido no Jardim de Infância, de modo a que, o professor, ao construir o seu Projeto

Curricular de Grupo/Turma possa assegurar a continuidade e sequencialidade do percurso escolar

das crianças; troca de informações sobre a criança, o seu desenvolvimento e as aprendizagens

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 34

realizadas; partilha de informações sobre o decorrer do 1º ano na escolaridade das crianças que

transitaram do Jardim de Infância para o 1º CEB, de modo a que ao acompanhar o seu percurso, o

educador possa continuar a articular com o professor tendo em vista o sucesso escolar da criança.

O documento em questão recomenda, ainda, que os educadores participem na elaboração do

Projeto Educativo (PE) do Agrupamento/Instituição e dos Projetos Curriculares de

Estabelecimento/Escola. Deverão, igualmente, conceber e gerir o Projeto Curricular de

Grupo/Turma, inserindo-se nas linhas de orientação definidas nos projetos anteriormente referidos,

de acordo com as orientações emanadas pelo Conselho Pedagógico e em articulação com o

Conselho de Docentes, no caso da rede pública, ou com a equipa de educadores, no caso da rede

privada.

Por fim, salienta que os Projetos Curriculares de Grupo/Turma devem articular-se entre si e com os

outros níveis de ensino, o que poderá dar aso a que se verifiquem situações pontuais de trabalho em

colaboração com outros docentes em áreas especializadas, como por exemplo a música ou as

ciências experimentais, cabendo ao educador em conjunto com o outro docente, planear,

desenvolver e avaliar as actividades, nunca perdendo a perspectiva globalizante da acção

educativa na Educação Pré-Escolar (Ibidem:7).

Na conclusão deste ponto, retemos como ideia chave o importante papel que a planificação

conjunta entre os docentes destes dois níveis de educação desempenham (principalmente no último

ano de frequência do Jardim de Infância) na articulação entre ciclos, na medida em que facilita a

adaptação emocional, social e intelectual das crianças a um novo nível de ensino. Salienta-se a

participação em projetos abrangentes (onde os intervenientes pertencem aos dois níveis de

educação e se incluem as famílias) e flexíveis que permitem ir adaptando os meios aos fins,

imprimindo sequencialidade no processo de ensino e de aprendizagem.

Quanto à nossa PES propriamente dita, assumimos que não tivemos muitas oportunidades de

praticar - com atividades concretas - a articulação entre ciclos na medida em que os anos que

lecionámos (2.º e 3.º), não constituíam nem um ano inicial, nem um ano terminal.

No entanto, ao longo de todo o ano letivo colaborámos com a professora titular de turma nas

atividades que envolviam outros níveis etários e também a Educação Pré-Escolar; e, de forma

geral, tentámos sempre apelar para conhecimentos que envolviam os pressupostos que abordámos

ao longo deste ponto.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 35

Para lá disso, por força das funções profissionais que desempenhamos, Educação Especial,

acompanhamos os alunos num processo longitudinal que pode ir, ininterruptamente, desde a

Educação Pré-Escolar, até ao 2.º/3.ºCiclo ou Secundário, o que nos permite de forma direta refletir

e intervir de modo alargado sobre este assunto. Acresce a isso o facto de no presente ano letivo

desempenharmos as funções de Coordenadora da Equipa de Articulação entre Ciclos, no

Agrupamento de Escolas onde desempenhamos funções profissionais.

2.2. Funcionamento da Prática de Ensino Supervisionada

A nossa experiência profissional cruzada com ideias-chave recolhidas a partir de diferentes leituras

guiaram a narração que se segue, filtrando ideias e sugerindo o modo da respetiva articulação nas

vertentes docente de educação especial vs aluna estagiária. Na prática, a nossa experiência

profissional enquanto Educadora de Infância durante os primeiros anos de exercício e docente de

educação especial há quase duas décadas, será percetível em dois sentidos diferentes: em alguns

momentos servirá para, com base nela, ajuizarmos e tecermos comentários, quer sobre as práticas

por nós adotadas, quer sobre o sistema instituído; noutros momentos servirão para realçar

concretamente o modo como entendemos e desenvolvemos a nossa atividade educativa.

Relevantes foram, também, os vários e profícuos cursos de formação que realizámos e que

inevitavelmente servem de filtro e referência a qualquer juízo de valor ou abordagem que façamos.

Posto isto, é chegada a hora de expor a forma como se desenrolou a prática de estudos

supervisionada.

Num primeiro momento, foi-nos atribuída a escola Augusto Gil para a realização da PES. Na

mesma, ainda desenvolvemos algumas sessões de observação e também, regências. Por

incompatibilidades profissionais, especificamente relacionadas com horário de trabalho, tornou-se,

absolutamente, necessário interromper o estágio e procurar outro estabelecimento de educação mais

compatível com o nosso estatuto de trabalhador estudante. É nesse contexto que surge a já

mencionada Escola da Póvoa do Mileu. O estágio, propriamente dito, viria a iniciar-se e

desenvolver-se já no segundo período letivo.

Após devida autorização da professora supervisora e da professora cooperante, os momentos de

intervenção educativa da aluna estagiária foram articulados de modo a causar o mínimo prejuízo

possível no desempenho das suas funções profissionais e otimizar ao máximo a sua presença como

aluna estagiária e docente de educação especial minimizando o mais possível o “incómodo” que,

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 36

por vezes, a presença de tantos adultos, em sala de aula, num espaço tão diminuto poderia trazer ao

contexto educativo. Para melhor conhecimento registamos a organização do estágio que assentou

em diferentes momentos e atores, como se pode constatar no quadro que a seguir se apresenta:

Quadro 3: Organização do estágio

Planificação

Momento 1:

Definição dos momentos e

estratégias de intervenção

pedagógica.

Auscultação da Professora Supervisora;

Auscultação da Professora Cooperante;

Informação e troca de pareceres com a Professora de Apoio

Educativo;

Troca de pareceres com o nosso par pedagógico a realizar estágio na

mesma EB;

Troca de informação com as técnicas que fazem acompanhamento

aos alunos com NEE: Psicóloga e Terapeuta da Fala.

Partilha de informação com a Assistente Operacional.

Momento 2:

Informação aos alunos. Breve apresentação da situação da aluna estagiária aos alunos.

Momento 3:

Observação Turma do 2.º/3.ºano.

Momento 4:

Planificação

De acordo com a sequência das regências da Professora Titular e os

conteúdos das diferentes áreas curriculares.

Momento 5:

Reflexão/auto-avaliação

Das atividades desenvolvidas pela aluna estagiária.

Momento 6:

Hétero avaliação

Pela Professora Supervisora

Pela Professora Cooperante

Fonte: Elaboração própria

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 37

Como podemos constatar, após a delineação de importantes pontos de partida, principiámos a nossa

prática partindo da observação, analisando e refletindo; cruzando a teoria e os conceitos educativos

como suporte teórico para a adequada perceção do que pretendíamos ver, compreender e analisar.

Apesar de a turma já nos ser muito familiar (porque aí acompanhávamos dois alunos com NEE),

reconhecemos que foi profícuo um olhar mais atento, que nos permitiu apurar dados a partir de

outro ângulo. Observávamos a professora titular e admirávamos a perícia com a qual fazia a gestão

de diferentes recursos na sala de aula (a nível dos dois anos de escolaridade e a nível do espaço

físico e recursos materiais…).

No desenvolvimento da PES cada contexto determinou os respetivos intervenientes, onde o

trabalho colaborativo e o diálogo crítico e reflexivo foram uma constante. Este aspeto foi tanto

mais importante pelo facto de, como já foi referido, o espaço físico da sala ser reduzido e nos

encontrar-mos, nela, em simultâneo, com relativa frequência, muitos dos agentes educativos

previstos no quadro anterior.

O processo reflexivo propriamente dito foi norteado pelas orientações das professoras que nos

acompanharam e por um conjunto de informações construídas a partir de todas as vivências pelas

quais já passámos, nas quais se incluem diversas leituras e reflexões intencionalmente realizadas a

partir da nossa atitude introspetiva. Como se depreende, o processo desenrolou-se de forma cíclica,

ou seja, cada planificação era prosseguida da respetiva reflexão/avaliação e colocadas em Dossiê

próprio.

2.3 Análise reflexiva à luz do nosso quotidiano

A condição de professor, queiramo-lo ou não, obriga-nos a permanente reflexão. Questionamos o

nosso desempenho, questionamos as aprendizagens dos alunos – as causas que conduzem ao

sucesso, ou os fatores que levaram ao fracasso.

Este processo, que implica um profundo desenvolvimento humano e pessoal, inicia-se com a

formação inicial e, deve prolongar-se sem quebra de continuidade, para que, enquanto profissionais

de educação, possamos ser uma verdadeira mais valia para as instituições em que desempenhamos

funções. Este aspeto é tanto mais importante porque na época atual os conhecimentos são o activo

principal das organizações e (…) estes rapidamente se desatualizam (Tavares, 2011:223).

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 38

E é em toda esta envolvência, no desabrochar de capacidades reflexivas e no repensar de atitudes,

contribuindo para uma prática de ensino mais eficaz, mais comprometida, mais pessoal e mais

autêntica que enquadramos a nossa atitude de profissional reflexivo9 que, como defende Alarcão

(2001), se emoldura na conceção de escola concebida por alguns como uma organização que

continuadamente se pensa a si própria, na sua missão social e na sua organização, e se confronta

com o desenrolar da sua atividade num processo heurístico simultaneamente avaliativo e formativo.

Estas vertentes, formação, avaliação e reflexão, precedidas da observação, constituíram os pilares

em que a nossa prática pedagógica, enquanto aluna estagiária e simultaneamente enquanto docente

de educação especial, se fundamentou. Ainda que o queiramos, sendo docentes, mesmo ocupando

outro papel, não conseguiremos alhear-nos das nossas funções profissionais e a reflexão é uma

constante nas nossas atitudes. É desta reflexão e necessidade de melhorar as nossas práticas que

surge, frequentemente, a necessidade de formação. Esta atitude, tem sido suportada, teoricamente,

por importantes nomes.

Donald Schõn (1930-1997), influenciado por John Dewey, é o principal autor da corrente que

perspetiva a prática profissional, enquanto reflexiva. Esta abordagem na formação profissional veio

a ter enorme repercussão na formação de professores; baseia-se no valor da reflexão na e sobre a

ação com vista à construção situada do conhecimento profissional que apelidou de epistemologia

da prática (Alarcão, 2003:35).

A natureza construtivista está na base da abordagem reflexiva e assenta na consciência da

imprevisibilidade dos contextos de ação profissional e no entendimento da atividade profissional

como atuação inteligente e flexível, situada e reativa. Perante a imprevisibilidade que carateriza

grande parte do quotidiano profissional a competência para agir implica ciência, técnica e arte, que

se evidencia num know-how inteligente e socialmente relevante.

O processo formativo inerente a este cenário combina ação, experimentação e reflexão sobre a

ação. Segundo Zeichner (1993), Dewey define três atitudes imprescindíveis à ação reflexiva:

Abertura de espírito - Desejo de receber diversas informações provenientes de várias

fontes, admitindo possíveis erros, mesmo naquilo que acredita como certo, procurando

alternativas;

9 O conceito de profissional reflexivo foi introduzido por Schõn (1983) e expandido para o campo da docência através da caraterização do conceito de professor reflexivo.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 39

Responsabilidade - Implica a ponderação das consequências que podem advir de

determinada ação. Esta atitude responsável impõe que o professor reflita nas consequências

pessoais, académicas, sociais e políticas dos efeitos da sua ação sobre os alunos;

Empenhamento - O professor assume a responsabilidade pela sua aprendizagem,

predispondo-se a enfrentar as atividades com capacidade de renovação e energia.

Com a figura que a seguir apresentamos, pretendemos agrupar informação que nos evidencie as

implicações que o modelo reflexivo traz ao nível das atitudes dos professores. Deste modo, os

pressupostos explícitos neste modelo implicam que o professor:

Figura 3: Implicações do modelo reflexivo ao nível das atitudes dos professores

Fonte: Elaboração própria

Por sua vez, como apontam Zeichner (1993), Sá-Chaves (2000) e Alarcão (2003), a prática

refletida precisa de ser acompanhada por supervisores experientes que detenham as competências

para orientar, estimular, exigir e avaliar, sendo ao mesmo tempo treinadores, companheiros e

conselheiros. Se nos é permitido, gostaríamos de abrir um parenteses para dizer que, neste domínio,

nos congratulamos pelo facto de as nossas professoras, supervisora, orientadora e professora

cooperante se enquadrarem, largamente, nestes pressupostos.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 40

Na formação de professores reflexivos (professores que examinam, questionam e avaliam a sua

prática de forma crítica), algumas estratégias emergem como mais adequadas. Schõn (Cit. in

Alarcão, 2003), identifica três: a experimentação em conjunto; a demonstração acompanhada de

reflexão e a experiência multifacetada.

Alarcão (Ibidem), apresenta-nos também no âmbito da reflexão sobre a prática profissional

proposta por Schõn as seguintes noções:

Conhecimento na ação: Conhecimento que os professores manifestam no

momento da execução da ação. Este conhecimento é dinâmico e consiste na reformulação

da própria ação.

Reflexão na ação: O professor reflete no decorrer da própria ação, reformulando

as situações novas e imprevistas que surgem.

Reflexão sobre a ação: O professor reconstrói, mentalmente, a ação e analisa-a

retrospetivamente, tomando consciência do que aconteceu.

Reflexão sobre a reflexão na ação: Consiste numa meta-reflexão que permite ao

professor novas formas de pensar e de agir.

As estratégias formativas que Schõn preconiza incluem a verbalização do pensamento como

expressão da reflexão na ação, diálogo com a situação e envolvimento do estagiário nesse diálogo,

esclarecimentos sobre as várias contribuições que os diferentes domínios do saber podem trazer

para a compreensão e solução da problemática em questão; crítica, reformulação e apropriação de

todo um conjunto de saberes inerentes ao desempenho da profissão que o estagiário deverá

dominar.

Na prática orientada, o professor supervisor deve apoiar o confronto com problemas reais que

necessitam de tratamento, proporcionando o levantamento de hipóteses, experimentação e

verificação. Na sequência de uma pesquisa mais pormenorizada sobre o que acabamos de expor,

foi-nos possível construir o quadro de estratégias - que emergem como adequadas ao modelo

reflexivo – que a seguir apresentamos:

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 41

Quadro 4: Estratégias de reflexão

- As perguntas pedagógicas

(a reflexão introduz no

discurso do professor uma

preocupação com as

questões éticas, pessoais, e

políticas podendo suscitar

problemas no ensino),

(Smith, 1989).

Estas perguntas podem

incidir em diferentes tópicos:

Na relação professor

-aluno (questões

práticas vividas em

sala de aula);

Conteúdos (centra-se

na seleção de

recursos a utilizar,

sequência curricular,

seleção de textos e

forma de suscitar

interesse por parte

dos alunos;

Relação entre o

ensino e os

processos de

escolarização (foca

questões mais

abrangentes e que se

inserem no âmbito

da sociedade).

- Descrição: O que faço? O que penso?

- Interpretação: O que significa a minha ação?

- Confronto: Como me tornei assim?

- Reconstrução: Como me poderei modificar?

- As narrativas: Traduz-se

no relato de acontecimentos,

feito pelo professor sobre a

Segundo Holly (1991) existem três tipos de narrativa:

- Diário de bordo (é um diário objetivo);

-Diário intimo (é um relato subjetivo);

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 42

sua prática pedagógica. -Registo quotidiano (integra características dos dois tipos

anteriores, contudo mais abrangente pois permite tomar

consciência do que foi mais objetivo e subjetivo).

- A análise de casos.

- Os casos são registos de acontecimentos reais e

problemáticos da sala de aula.

- Promovem a reflexão sobre a ação, incutindo nos professores

o hábito de pararem para refletir sobre um acontecimento,

retirando ilações da sua atuação.

- Possibilita a partilha de diferentes pontos de vista sobre uma

mesma situação, na qual se incluem os conhecimentos

pedagógicos.

- A observação de aulas.

Segundo Allwright (1998), Richards (1990) e Day (1990)10, os

objetivos da observação de aulas são os seguintes:

- Promover nos formandos a capacidade de compreender os

princípios e processos institucionais subjacentes à sua prática

educativa;

- Aquisição de conhecimentos científico-pedagógicos;

- Recolher feedback sobre comportamentos de modo a intervir

na inovação do seu desempenho;

- Refletir de forma crítica sobre a sua prática;

- Passar a responsabilidade de melhorar a qualidade das

práticas do ensino do supervisor para o formando;

- Promover uma atitude investigativa.

Estrela (1994) subdivide a observação de aulas em:

- Observação naturalista (o observador regista tudo o que

ocorre dentro da sala de aula, feito durante determinado

período de tempo);

- Observação ocasional (centra-se num “incidente crítico”).

- Observação sistemática (cada comportamento individual

constitui objeto de registo).

- O trabalho de Projeto

(consiste numa metodologia

De acordo com Leite et al. (1989) tem as seguintes finalidades:

- Produzir conhecimento;

10 Allwright (1998), Richards (1990) e Day (1990), in Tavares (2012), materiais policopiados durante a lecionação da Unidade Curricular de Supervisão I. ISCE/Odivelas.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 43

que se centra no estudo de

problemas de interesse

coletivo, implicando o

envolvimento de todos os

participantes e promovendo

momentos de reflexão sobre

a ação).

-Sensibilizar para uma metodologia de resolução de problemas;

- Estabelecer relações entre teoria e prática;

- Desenvolver capacidades de investigação nos formandos;

- Implicar uma conceção ativa de aprendizagem;

- Saber observar e questionar;

- Compreender a realidade como um campo de saberes

interdisciplinar;

- Experimentar métodos e técnicas diversas;

-Desenvolver capacidades de trabalho em equipa.

- A investigação – ação

(nesta metodologia verifica-

se uma permanente

dinâmica entre teoria e a

prática, na medida em que o

professor interfere no

próprio campo de pesquisa,

analisando as consequências

da sua ação).

Tendo como suporte Nunan (1989) e Correia e Canário (s/d),

as vantagens da investigação realizada pelo professor são as

seguintes:

- Centra-se nos problemas do professor e orienta a ação para a

sua resolução;

-Desenvolve-se a partir do conhecimento acumulado pelo

professor, alargando esse conhecimento;

- Desenvolve as capacidades de observação e análise critica;

- Aproxima teoria e prática, permitindo uma melhor

interpretação do que ocorre em sala de aula;

- Ajuda o professor a articular processos de ensino-

aprendizagem;

- Facilita a participação do professor na sua própria formação;

- Desenvolve a função crítica da formação.

Fonte: Elaboração própria

A partir da reflexão sobre as suas práticas, os profissionais desenvolvem aquilo que Shõn

(1983,1987), (Cit. por Alarcão, 2003) denominou de epistemologia da prática. Considerando os

professores como co-construtores da escola, é de crer que a sua participação ativa e crítica na vida

escolar conduzirá a uma epistemologia desenvolvida a partir da co-construção reflexiva sobre a sua

missão, as suas atividades e as consequências delas decorrentes.

Foi ancorados em tudo o que acabámos de expor que desenvolvemos a nossa intervenção educativa

como aluna estagiária.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 44

2.4 Outros pressupostos importantes na nossa prática educativa

Como bem refere Dottrens (1974b), Um aluno é um ser complexo; o produto daquilo que é como

criança e do que chega a ser como aluno é uma criação fictícia e temporal da organização escolar

(Dottrens, 1974b:28).

Porque nem sempre será fácil demonstrar em plenitude, através das planificações ou reflexões, ou

mesmo através da observação direta os referenciais teóricos que influenciam as nossas práticas,

consideramos que será importante debruçarmo-nos mais especificamente - ainda que de forma

resumida - um pouco mais sobre os mesmos.

Com o objetivo de mostrar de que modo absorvemos as teorias que revisitámos e até que ponto as

leituras realizadas nos influenciaram, e, ainda, de que forma articulámos a teoria com a prática,

apresentamos alguns dos importantes pressupostos em que focalizámos a nossa Prática de Ensino

Supervisionada e a nossa atitude reflexiva.

Apesar de termos consciência da importância de que se revestem as estratégias de ensino e de

aprendizagem quando focadas em termos de estímulos, respostas e reforços positivos (sobretudo

quando direcionados para crianças de tenra idade), reconhecemos que, atualmente, no contexto

educativo as palavras de ordem são: aprendizagem significativa, mudança conceitual, ensino

centrado no aluno e construtivismo. Ou seja, acreditamos totalmente na premissa de que o

conhecimento humano é construído e a aprendizagem significativa é a pedra angular dessa

construção. Nesse sentido, um bom ensino deve ser construtivista, estar centrado no estudante,

promover a mudança conceitual e facilitar a aprendizagem significativa (Moreira, 2006). Moreira

(Ibidem), remete-nos deste modo para a Teoria de Aprendizagem Significativa de David Ausubel

(Ibidem:2006). Não sendo nova, esta teoria, é de extrema atualidade e é comumente aceite como

uma importante e válida explicação teórica do processo de aprendizagem.

O objetivo maior do ensino é que todas as ideias sejam aprendidas de forma significativa, isso

porque é somente desta maneira que as novas ideias serão “armazenadas” por bastante tempo e de

maneira estável. Além disso, a aprendizagem significativa permite ao aprendiz o uso dos novos

conceitos de forma inédita, independentemente do contexto em que os conteúdos foram

primeiramente aprendidos. Cabe, aqui, lembrar que pode conseguir-se aprendizagem significativa

tanto por meio da descoberta como da repetição. Aprendemos a partir do que já sabemos. Os

conceitos que já adquirimos, os esquemas de assimilação que já construímos, os nossos constructos

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 45

pessoais, enfim, a nossa estrutura cognitiva prévia é o fator isolado que mais influencia a

aprendizagem significativa de novos conhecimentos.

Na aprendizagem significativa o novo conhecimento nunca é interiorizado de maneira literal,

porque no momento em que passa a ter significado para o aluno entra em cena a componente

idiossincrática da significação. É no curso da aprendizagem significativa que o significado lógico

do material de aprendizagem se transforma em significado psicológico para o sujeito. Aprender

significativamente implica atribuir significados e estes têm sempre componentes pessoais;

aprendizagem sem atribuição de significados pessoais, sem relação com o conhecimento

preexistente, é mecânica, e não é, portanto, sob o ponto de vista desta teoria, significativa.

A teoria de Ausubel oferece, assim, diretrizes, princípios e estratégias que são fortemente

facilitadores da aprendizagem significativa. Moreira e Buchweitz (1993) propõe-nos sob a forma

de esquema, que a seguir se apresenta, alguns conceitos básicos desta teoria:

Figura 4: Alguns conceitos básicos da teoria de Ausubel

Fonte: Adaptado de Moreira e Buchweitz (1993)

Seguindo Ausubel (Cit. por Moreira e Masini, 2006), aprendizagem significativa é o processo

através do qual um novo conhecimento se relaciona de maneira não arbitrária e substantiva à

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 46

estrutura cognitiva do aprendiz; é o mecanismo humano, por excelência, para adquirir e armazenar

uma vasta quantidade de ideias e informações representadas em qualquer campo de conhecimento.

Nesta linha, a não arbitrariedade e a substantividade são as características básicas da

aprendizagem significativa. É importante reiterar que a aprendizagem significativa se caracteriza

pela interação entre conhecimentos prévios e conhecimentos novos, e que essa interação, como

temos vindo a sublinhar, é não arbitrária e não literal. Nesse processo, os novos conhecimentos

adquirem significado para o sujeito e os conhecimentos prévios adquirem novos significados ou

maior estabilidade cognitiva.

Neste contexto, a não arbitrariedade significa que o material potencialmente significativo se

relaciona de maneira não arbitrária com o conhecimento já existente na estrutura cognitiva do

aluno, e a substantividade significa que o que é incorporado à estrutura cognitiva é a substância do

novo conhecimento, das novas ideias; o mesmo conceito ou a mesma proposição podem ser

expressos de diferentes maneiras, através de distintos signos ou grupos de signos, equivalentes em

termos de significados (caráter não literal). Compreende-se assim, que a aprendizagem significativa

pressuponha que no processo de ensino e de aprendizagem, o conhecimento prévio do educando

interage, de forma significativa, com o novo conhecimento que lhe é apresentado provocando

mudanças na sua estrutura cognitiva. No entanto, existem condições prévias para que a

aprendizagem significativa aconteça: o material tem de ser potencialmente significativo e o aluno

tem de estar recetivo a novas aprendizagens, deve apresentar uma predisposição para aprender,

com ideias, conceitos e proposições, especificamente relevantes e adequadamente claros e

disponíveis na sua estrutura cognitiva que funcionem como pontos de “ancoragem” aos primeiros;

ou seja, terá de ter um conjunto de conhecimentos que sirvam de âncora à aprendizagem do novo

conteúdo.

Nesse sentido, como se pode apurar, a organização cognitiva do educando é relevante para a

aprendizagem de conceitos que formam um conjunto de novas relações que interagem com uma

estrutura de conhecimento específico a que Ausubel (Cit. por Moreira e Masini, 2006) denomina de

“subsunçor”; quer isto dizer que o material potencialmente significativo se relaciona de maneira

não arbitrária com o conhecimento já existente na estrutura cognitiva do aluno (princípio da não

arbitrariedade). Tal significa que, o relacionamento não é com qualquer aspeto da estrutura

cognitiva, mas sim com conhecimentos especificamente relevantes. Ainda segundo a mesma fonte

(Op. cit.; 2006), “subsunçor” é uma estrutura específica na qual uma nova informação se pode

agregar ao cérebro humano, que é altamente organizado e detentor de uma hierarquia conceitual,

que armazena experiências prévias do sujeito.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 47

Na perspetiva de que a aprendizagem é uma organização e uma integração do conhecimento na

estrutura cognitiva por meio de uma estrutura hierárquica de conceitos, Moreira (2006), citando

Ausubel, sugere o uso de organizadores como importante estratégia pedagógica para manipular a

estrutura cognitiva; ajudando o aluno a estabelecer uma ligação entre o que já sabe e aquilo que

precisa de saber caso necessite de adquirir nova informação de forma ativa ou, ainda, quando for

constatado que os subsunçores existentes na sua estrutura cognitiva não são satisfatórios e estáveis

para desempenhar as funções de ancoragem do novo conhecimento.

Estes organizadores são designados de organizadores prévios ou avançados. Assim, organizadores

prévios são materiais introdutórios, destinados a facilitar a aprendizagem de tópicos específicos ou

conjunto de ideias consistentemente relacionadas entre si. São apresentados no início das atividades

mas, precisam de ser formulados em termos familiares ao estudante, devendo, também, permitir ao

aluno o aproveitamento das características de um subsunçor, caso ele já exista.

A função do organizador prévio é, assim, potencializar a criação de relações não arbitrárias e

substantivas entre os novos conceitos e as ideias que lhes servirão de apoio na estrutura cognitiva

do aluno, através da “inserção” ou da explicitação destas ideias. Dizem-nos as fontes que temos

vindo a citar (Moreira, 2006; Moreira e Masini, 2006) que estes mecanismos (organizadores)

funcionam, utilizando o método expositivo ou comparativo, consoante as opções que o professor

fizer na sua prática profissional. Como importantes ferramentas facilitadoras de uma aprendizagem

significativa apontam-se, ainda, a condução de aulas e os mapas concetuais. Estes últimos, têm-se

revelado muito úteis, em contexto de sala de aula, no estabelecimento de ideias e conceitos.

Segundo Moreira e Masini (Ibidem), os organizadores prévios podem apresentar-se, entre outros,

sob a forma de textos, filmes, esquemas, desenhos, fotos, perguntas ou mapas conceituais, que são

apresentados ao estudante, em primeiro lugar, em nível de maior abrangência, permitindo a

integração dos novos conceitos aprendidos, tornando mais fácil o relacionamento da nova

informação com a estrutura cognitiva já existente.

À medida que o conhecimento prévio serve de base para a atribuição de significados à nova

informação, ele também se modifica, ou seja, os subsunçores vão adquirindo novos significados,

tornando-se mais diferenciados, mais estáveis. Assim, os resultados das experiências de

aprendizagem de uma pessoa vão sendo organizados em blocos hierarquizados de conhecimentos.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 48

Tendo como base estes e outros importantes pressupostos na prática pedagógica, tentámos que a

nossa PES se norteasse o mais possível pelos princípios que temos vindo a expor e que

continuamos a explanar, remetendo, agora mais especificamente para a vivência de algumas

situações concretas, respeitantes às diferentes áreas, Português, Matemática e Estudo do Meio e

também Expressões, vividas aquando da nossa intervenção pedagógica como aluna estagiária.

Seguindo as decisões da professora titular de turma demos aos alunos a possibilidade de participar

em projetos já calendarizados, promovidos em articulação com outras entidades e realizados fora

do ambiente normal das aulas, conduzindo-os na aquisição de saberes e competências várias,

estimulados por espaços e tempos de saberes múltiplos e que lhe são externos, contribuindo de

forma decisiva para um maior compromisso na sua caminhada no processo de ensino e de

aprendizagem. Deste modo, os discentes foram convidados a participar em atividades que,

estimulando o seu lado mais criativo, os solicitavam ao confronto com os saberes veiculados em

sala de aula, alargando assim as competências que lhe são veiculadas pelo professor. Pretendíamos,

desta forma, que os alunos tivessem possibilidade de operar a transferência das aprendizagens

adquiridas.

De acordo com as proposições de Ausubel (Cit. por Pelizzari: 2001), quanto mais se relaciona o

novo conteúdo com alguma estrutura cognitiva prévia relevante para o aluno, mais próximo se está

da aprendizagem significativa; a aprendizagem é mais significativa à medida que os novos

conteúdos se incorporam às estruturas do conhecimento do aluno e adquirem significado para ele

a partir da relação com o seu conhecimento anterior (Ibidem, 2001:39). Sabemos que sempre que

existe aprendizagem significativa ocorre um processo de transferência. As aprendizagens

significativas são sempre passíveis de transferir para outras situações de aprendizagem, o

conhecimento que se adquire de maneira significativa é retido e lembrado por muito mais tempo

(Op. Cit.:39), mesmo havendo alterações do meio ambiente ou do contexto. Seguindo a mesma

fonte (Ibidem:2001), Diz-se que ocorre transferência, ou transfert sempre que aquilo que

aprendemos anteriormente influencia uma aprendizagem posterior. Essa influência pode

manifestar-se de forma positiva ou negativa, considerando-se que ocorre transferência positiva

quando uma aprendizagem anterior ajuda a resolver um problema atual; em contrapartida verifica-

se transferência negativa quando uma aprendizagem anterior prejudica uma nova aprendizagem,

designando-se o facto, nesta situação específica, como interferência proactiva. Quando pelo

contrário, uma nova aprendizagem dificulta uma aprendizagem anterior, denomina-se interferência

retroativa.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 49

Nas aprendizagens significativas impõe-se a participação ativa do aluno. Pretende-se que estas

participações na aquisição de conhecimentos não sejam apenas uma repetição formulada pelo

professor, mas antes um processo interno em que cada aluno constrói o conhecimento de uma

maneira específica e individual.

Durante o nosso tempo de intervenção tivemos, também, a preocupação de que a aquisição de

conhecimentos fosse realizada partindo de conceitos chave, menos complexos que gradualmente

iriam aumentando o grau de complexidade pois sabemos que as relações entre conceitos têm uma

natureza hierárquica, vão do mais simples para o mais complicado, a partir dessa especificação, a

aprendizagem escolar passa a caracterizar-se globalmente como a assimilação a essa rede de

determinados corpos de conhecimentos conceituais, seleccionados socialmente como relevantes e

organizados nas áreas de conhecimento (Pelizzari, 2001-2002:38).

De igual modo, como válida estratégia no processo de ensino e de aprendizagem, entendemos que

o professor deve ter sensibilidade na lecionação dos conteúdos a lecionar. Esta sensibilidade deve

fazer-se sentir, em nossa opinião, particularmente, nos conteúdos/áreas onde os alunos revelem

mais dificuldades. Sendo a matemática, regra geral, uma dessas áreas, o seu ensino deve (como

acontece com outras áreas), ter conexões com a realidade dos alunos, com as suas experiências

anteriores e com os seus centros de interesse. Para uma melhor apreensão das matérias, nas

situações de aprendizagem a concretização deve ser feita através de materiais manipuláveis

(estruturados e não estruturados) que facilitem a compreensão de conceitos e das ideias

matemáticas (DEB, 2004:14). Ainda assim, diz-nos Palhares (2004) para uma boa interiorização

dos conteúdos não basta apenas compreendê-los; é também necessário que os alunos realizem

exercícios que os envolvam pois a realização de exercícios é relevante, uma vez que permitem aos

alunos uma repetição e mecanização dos conceitos que têm de aprender (Palhares, 2004:70). De

igual modo, É, também, necessário proporcionar aos alunos situações diversas que lhes permitam

desenvolver o cálculo mental, para isso, devem ser trabalhadas diferentes estratégias de cálculo

baseadas na composição de números, nas propriedades das operações e nas relações entre

números e entre operações (DEB, 2004:14).

No desenvolvimento das nossas práticas, também tivemos presente o modelo de trabalho que

envolve o Trabalho de Projeto11, enquanto método centrado na planificação e pesquisa do aluno,

onde o professor assume o papel de guia e orientador. Tomamos como exemplo a realização, pela

11 Projeto, segundo definição da UNESCO (Glossaire des termes de technologie educative), é uma atividade prática significante, de valor educativo, visando um ou vários objetivos. Implica pesquisas, a resolução de problemas e, muitas vezes, uma produção. Costuma fundamentar-se nas teorias construtivistas de Piaget e Vigotsky e nas teorias e práticas pedagógicas de Dewey, Kilpatrick e Freinet.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 50

turma, de uma maquete (no âmbito do tema «Itinerários») obedecendo a um mapa. Nesta atividade,

os alunos tiveram oportunidade de, num primeiro momento planificar indagando sobre o que

precisavam de saber e como iriam sabê-lo; depois, num segundo momento, trabalhar em pequenos

grupos para responder às questões por eles levantadas e por fim, num terceiro momento, fazerem a

apresentação do trabalho realizado, sistematização dos conhecimentos, relacionando e organizando

a informação recolhida pelos diversos grupos e também a avaliação do trabalho desenvolvido.

Estes passos enquadram-se nos três níveis de desenvolvimento do método de Trabalho Projeto

(Pires, 2009).

Sempre com o objetivo de tornar a nossa intervenção pedagógica, válida, significativa e apelativa

recorremos a técnicas de ensino diversificadas que pretendiam desenvolver as competências

previstas nas diferentes áreas curriculares e não curriculares, tendo em conta a interdisciplinaridade

e transversalidade. Nesse sentido, não nos poupámos esforços na utilização, elaboração e

preparação de materiais pedagógicos pois deve considerar-se a importância da motivação, como

elemento básico que proporciona a compreensão da aprendizagem individual e coletiva

(Borrás,2001:190).

Cientes - por um lado - do impacto que os audiovisuais têm junto dos discentes porque Os

multimédias, as suas possibilidades educativas podem aproximar os alunos da aprendizagem de

conteúdos concretos, contribuindo para o seu desenvolvimento, fomentando aspectos como a

expressão e a comunicação (Op. Cit.:138); e também porque A linguagem audiovisual aproxima-

nos de novas formas de ver e compreender o mundo e conduz-nos a uma nova maneira de

trabalhar com a informação (Ibidem:150) e - pelo outro - das dificuldades que, por vezes,

implicam no momento de serem utilizados (no nosso caso específico obrigavam à sua requisição

prévia na escola sede e traziam algum incómodo no momento de os utilizar e por essa razão se

tornavam menos utilizados em sala de aula), não hesitámos e socorremo-nos, em diferentes

momentos, das novas tecnologias da comunicação e da informação para imprimir na aula uma nova

dinâmica. A partir da projeção de filmes e de imagens, com ou sem texto, os alunos foram

convidados a ler, comentar, contar ou recontar diferente informação. Este processo foi ao encontro

da ideia de que a criança deve ser estimulada à expressão oral mediante conversas, relatos,

narrativas, etc., pois só assim usará largamente a língua em diversas situações, descobrindo o

prazer de falar com os outros, de ser ouvida e atendida, de se relacionar, de conviver (Rebelo e

Atalaia, 1978:33). Na verdade, aos professores é claramente atribuída a função de não restringir a

aprendizagem da língua aos momentos da aula de Português, mas sim aproveitar as outras áreas

para, numa perspetiva transversal, trabalhar a língua portuguesa (Valadares, 2003).

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 51

Ainda na prossecução do desenvolvimento da linguagem oral, revendo o Currículo Nacional do

Ensino Básico encontramos a iniciar as metas do currículo de Língua Portuguesa, as competências

das quais destacamos, Compreender e produzir discursos orais formais e públicos, seguida de

Interagir verbalmente de uma forma apropriada em situações formais e educacionais (DEB,

s/d:31).

Assim, a construção do discurso da criança poderá fornecer importantes elementos relevantes

quanto ao estádio de desenvolvimento em que se encontra na medida em que quando narra,

informa, esclarece, pergunta, responde, convence, o aluno inicia-se nas regras de comunicação oral,

enquanto descobre o prazer de comunicar com os outros (DEB, 2004:139). Desta forma a oralidade

permite ao aluno integrar, mas também integrar-se na comunidade que o rodeia.

Aquando de diferentes iniciativas realizadas na sala de aula, por entidades exteriores, ou de visitas

programadas a espaços existentes no meio envolvente, demos aos alunos a possibilidade de usarem

um discurso formal obedecendo a temáticas e contextos específicos. Estas competências têm como

modos de operacionalização, assumir o papel de ouvinte atento, de interlocutor e locutor

cooperativo em situações de comunicação que exijam algum grau de formalidade (Currículo

Nacional do Ensino Básico - Competências Essenciais).

Também em sala de aula, à segunda feira, desenvolvemos a rotina de relatar o fim de semana,

convidando os alunos a narrarem acontecimentos vivenciados o que nos permitiu apurar muitos

dados relativos às suas vivências familiares, sociais, culturais e inclusive emocionais. Através da

voz nós transmitimos a maior parte das nossas emoções (Andrea, 2009). Todos sabemos como é

frequente alguém que está calado, aparentemente sem nada de maior para transmitir, emocionar-se

no momento de tomar a palavra e deixar transparecer estados emocionais verdadeiramente

preocupantes. Nós vivenciámos com os nossos alunos algumas dessas situações que nos ajudaram a

perceber a existência de graves conflitos familiares e emocionais. Estes, influenciavam,

seguramente, a capacidade de aprendizagem dos alunos. Dentro do que nos foi possível, ajudámos

a regularizar as emoções e solicitámos o apoio de técnicos especializados nesse âmbito. No entanto,

nem sempre a intervenção dos técnicos é um processo fácil na medida em que obedece a uma série

de burocracias administrativas e financeiras por vezes inultrapassáveis.

Também não nos foi alheio o facto de termos na turma duas alunas de nacionalidade estrangeira;

sabemos que estes alunos podem sentir dificuldades acrescidas na compreensão e produção de

textos que respeitem as regras de concordância. De igual modo, sabemos que é objetivo da escola

corrigir assimetrias imputáveis a diferentes condições socioculturais de origem, por outro lado o

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 52

sistema educativo tem de ser capaz de lidar com a heterogeneidade social, cultural e linguística

que caracteriza a comunidade escolar da nossa sociedade (Sim-Sim, 1997:33).

Contudo, cumpre-nos dizer que não foi necessário adequarmos de forma sistemática a oralidade no

discurso na medida em que as crianças em questão estavam muito bem integradas na turma e

dominavam, com mestria, a língua portuguesa. Todavia, foi importante e necessário ter presente

diferentes noções relativas à multiculturalidade e à pluralidade de valores, particularmente quando

se aproximavam datas festivas ou abordagem de conteúdos específicos que poderiam interferir com

alunos cujos credos e práticas religiosas poderiam ser diferentes daquelas que a cultura portuguesa

tradicionalmente cultiva.

Ainda na sequência do desenvolvimento da oralidade na sala de aula, destacamos uma estratégia da

qual nos servimos frequentemente: a voz. A oralidade na sala de aula prende-se com a utilização da

voz e com a capacidade de falar, de nos fazermos ouvir. Esse aspeto aplica-se tanto a alunos como

a professores. Às crianças notamos-lhe na voz (acompanhada de outros sinais) a alegria e o

entusiasmo ou o desinteresse e a apatia. Esses dados permitem-nos, por isso, alterar estratégias e/ou

motivações; ou podemos, simplesmente, mudar o ritmo da aula sem que a criança perceba a razão

das alterações. Por outro lado, a voz do professor, quando se dirige às crianças, transmite o seu

empenho, dedicação e gosto pela atividade que realiza, ou o seu contrário. Como nos alerta

Dottrens (1974b), reportando-se à atitude do educador que deve revelar doçura e firmeza

inseparáveis uma da outra se se quer que reinem ao mesmo tempo na aula a confiança, a ordem e

o respeito pelas indicações dadas pelo professor (Dottrens, 1974b:58). Como sabemos, os alunos

“leem” as nossas expressões e comportam-se em conformidade com elas, daí a importância de

adotarmos uma atitude empenhada e meiga mas também apelativa à disciplina pois A disciplina

escolar deve considerar-se, (…) como um aspecto particular da ação educativa (Op. Cit.:61).

O facto de termos consciência desses aspetos motivou-nos a que, em todos os momentos da nossa

PES, sobretudo em contexto de sala de aula, usássemos a voz e o discurso oral como um

importante instrumento pedagógico. Contudo, sabemos que a aprendizagem formal se socorre,

obrigatoriamente, de registos escritos e que a escrita contribui, decisivamente, para o processo de

apreensão de conhecimento. Como preconiza Sim-Sim (2007) Tal como é importante que antes de

iniciar a leitura de um texto o aluno se centre nos objetivos da leitura que vai relizar e

antecipadamente se prepare para a escolha das estratégias mais apropriadas, após terminar a

leitura é fundamental que automonitorize o que compreendeu sobre o texto lido (Sim-Sim,

2007:21). Como tal, em muitos e variados momentos, solicitámos, como complemento da

aprendizagem, a redação de documentos escritos, adequando o grau de exigência ao ano de

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 53

escolaridade dos alunos. Nestes, incluímos a construção de composições escritas e a redação de

cartas a familiares e amigos, e recados, entre outros.

Desenvolvemos por parte dos alunos a capacidade de comunicação escrita. Diversificámos as

propostas de atividades apresentando-as de modo a permitir a redação de diferentes textos em

extensão, tema e natureza do suporte escrito. Quando necessário, apelámos, também à capacidade

de síntese, sabendo que para que o aluno conseguisse criar textos pequenos com sentido necessita

ter adquirido mestria linguística. Cumprimos deste modo, uma das competências estabelecidas no

domínio da expressão escrita O aluno poderá ainda desenvolver a compreensão textual, como se

referiu anteriormente, através de: competências de resumo, identificação de partes estruturais que

organizam o texto (Salema, 1997:29). Com a frequência e o sentido de oportunidade que a situação

pedagógica permitiu, realizámos, com os alunos, exercícios de avaliação das atividades

desenvolvidas e ainda exercícios de auto e hétero avaliação.

Paralelamente, nas nossas práticas tivemos em conta a importância da metacognição no processo de

aprendizagem dos alunos; não esquecendo que a metacognição foi considerada como infundida e

envolvente de todas as situações de ensino e de aprendizagem; o que significa que o

desenvolvimento da metacognição, embora possa também ser conseguido diretamente, é antes

suscitado, inspirado, estimulado, tanto através dos procedimentos metodológicos como da própria

pessoa do professor (Op. Cit.).

Nas nossas intervenções tivemos, também, em conta a noção de que cada aluno tem especificidades

e ritmos de aprendizagem diferentes. Na verdade, como também já referimos, lecionámos dois anos

de escolaridade, sendo que cada um integrava alunos que apresentavam um significativo desnível

de conhecimentos face ao ano de escolaridade que frequentavam. Por essa razão, subdividiam-se

em “subgrupos” quanto ao nível de desempenho e capacidade de aprendizagem. Este aspeto foi

tanto mais importante porque, como já tínhamos referido, tínhamos na sala de aula três alunos com

NEE, portadores de deficiência Mental (DM) dos quais um estava escolarizado com um Currículo

Específico Individual (CEI). Deste modo, legalmente, faziam parte da turma apenas dois anos de

escolaridade, mas na verdade, na prática, coexistiam na sala uma grande heterogeneidade ao nível

dos conhecimentos de que cada aluno é detentor. Sabemos que esta realidade não é exclusiva desta

escola, no entanto, também somos de opinião que há contextos institucionais que, em sequência de

um conjunto de fatores específicos, dificultam o processo de aprendizagem dos alunos (voltamos a

lembrar o importante papel que o meio envolvente desempenha no sucesso escolar).Todos estes

aspetos impeliam a que refletíssemos nesta realidade educativa.

Capítulo II Descrição do Processo de Prática de Ensino Supervisionada

© Fernanda Cardoso (2015) 54

A transferência de papeis de docente de educação especial que presta apoio pedagógico

personalizado para “professora” que rege dois anos de escolaridade, num total de dezanove

discentes, nos quais estão incluídos alunos que necessitam de apoio educativo ao abrigo de

legislação específica e alunos com NEE, também escolarizados ao abrigo da respetiva legislação

permitiu-nos sentir, intensamente, as dificuldades que aquele papel impõe. Na verdade, é nossa

obrigação dizê-lo, já em diferentes momentos havíamos refletido sobre essa realidade, sobre as

verdadeiras dificuldades que a inclusão de alunos portadores de deficiência colocam aquando da

sua integração em turmas, ditas, regulares; porém, para ilustrarmos os nossos sentimentos,

permitimo-nos usar uma expressão popular: uma coisa é ver as coisas e outra é vivê-las. Face à

população escolar que tínhamos, diferenciámos, pela positiva, sempre que foi necessário,

adaptando fichas, outros materiais de trabalho e abordagens pedagógicas. Esforçámo-nos por dar à

diferença o que a diferença exigia.

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 55

PARTE II

A educação que visa o pleno desabrochar da personalidade humana esforça-se (…) por agir sobre

as componentes desta para aumentar os poderes de que o indivíduo dispõe e que têm origem no

seu equipamento biológico, mental e afetivo (Dottrens, 1974c:31).

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 56

Capítulo III – A Educação Especial e a Criança com Necessidades Educativas Especiais

“Não há, não,

Duas folhas iguais em toda a criação,

Ou nervura a menos, ou célula a mais,

Não há, de certeza, duas

Folhas iguais”.

António Gedeão

A relação entre a educação especial e inclusão é tão estreita que nos sentimos tentados a

transcrever a afirmação de Correia (2003) dando mote ao título do seu próprio livro “A Educação

Especial e Inclusão: Quem disser que uma sobrevive sem a Outra Não Está no seu Perfeito Juízo”.

3.1 Da segregação à inclusão

A educação é hoje tida como um valor inquestionável, contudo, o que não deixa de ser significativo

é que a educação das populações especiais só venha a ser objecto de estudo do pensamento

educacional universal, a partir do séc. VIII (Vieira, 1996:15) como a seguir se verá.

Desde os alvores da Humanidade que as sociedades recorreram a práticas reguladoras face ao

“diferente”. A preocupação pela conduta que se afasta da normalidade, foi uma constante histórica,

embora nem sempre desenhada com rigor conceptual (Serra, 2002). O conceito de criança com

deficiência e o atendimento prestado a estas crianças sofreu ao longo do tempo, grandes mudanças

passando a sua compreensão, necessariamente, por uma abordagem dos grandes períodos históricos

que marcaram o percurso do seu desenvolvimento. A história da Educação Especial é feita de

exclusão, de segregação, de institucionalização de pessoas, tantas vezes com aptidões para serem

autónomas, independentes e plenamente envolvidas no mundo do trabalho e na participação social

(Baptista, 2011:35).

Nesse sentido, pareceu-nos importante dar uma visão da forma como esta evolução se processou.

Com o objetivo de situar o leitor nos acontecimentos a nível nacional e internacional, iremos

oportunamente estabelecendo um paralelismo entre Portugal e os outros países, especialmente os

que pertencem à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 57

Praticamente toda a bibliografia consultada no âmbito desta temática, converge ao aceitar que o

modo como a sociedade ao longo da História foi encarando esta população, está intimamente

ligado a fatores sociais, económicos e culturais próprios de cada época (sendo que o problema da

deficiência mental, foi o mais tardiamente atendido e severamente punido).

Bastará recordar que estas pessoas foram desde sempre objeto de tratamento especial: desde serem

consideradas como possuídas pelo demónio na Idade Média, ou produto de transgressões morais no

século XVIII, até serem tratadas como loucas e internadas em hospícios nos séculos XVIII e XIX.

Afortunadamente, um notável médico francês, Jean Marc Itard (1774-1838), veio alterar esta

ideologia, desenvolvendo importantes estudos no intuito de provar que “todo o ser humano é

educável”. Este, foi considerado por alguns como o pioneiro da história da educação especial

(Vieira, 1996).

Mais tarde, um outro seu aluno, Séguin, seguiu-lhe o exemplo. Aos trabalhos de Itard e Séguin

seguiram-se muitos outros. Porém, só na primeira metade do séc. XX é que se verificaram grandes

desenvolvimentos teóricos, em muitos campos directamente relacionados com a educação e com os

cuidados gerais prestados à pessoa com deficiência (Op. Cit.; 1996:19). Estes desenvolvimentos

tiveram como base a filosofia de pedagogos tão importantes como, Rosseau, Montessori, Decroly e

Frobel, onde é consolidada a ideia de necessidade de um ensino para todos (Veiga, 2000).

Ao longo de todo este período o conceito de criança com deficiência, sofre, como veremos, grandes

mudanças.

Orientam-se as políticas no sentido de “separação” das pessoas com deficiência ou consideram-nos

membros da sociedade, ainda que necessitando de certos apoios para nela totalmente participarem.

Basicamente as fases históricas da educação especial, seguiram esta orientação: da exclusão à

segregação; da segregação à integração e da integração à inclusão (Correia, 1999). Tal como nos

refere Pereira (1996) Ao longo do séc. XX, nos países ocidentais, a evolução dos conceitos e das

práticas relativos ao atendimento educativo de crianças e jovens com deficiência tem evoluído de

forma semelhante: da iniciativa privada à intervenção do Estado, das instituições de assistência à

criação de estruturas educativas, das políticas de segregação às medidas de integração escolar

(Pereira, 1996:3).

Portugal, embora de uma forma mais lenta e com uma abrangência menor, seguiu a mesma

tendência de outros países membros da OCDE, tendo uma evolução complexa, semeada de avanços

e recuos.

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 58

3.2 Síntese histórica da evolução da educação especial

A maioria dos autores, Pereira (1996), Afonso (1997), Bautista (1997), Bairrão (1998) e Veiga

(2000), divide esta abordagem histórica em três fases distintas com contornos bem diferenciados.

Para os ilustrar adotaremos as designações utilizadas por Veiga (2000), mencionando Jiménez

(1993) por, de entre eles, ser a abordagem mais recente.

A 1.ª Fase, dos esquecidos e dos escondidos situa-se no início deste século e prolonga a tradição

asilar e segregadora do séc. XIX. As crianças apelidadas de deficientes são vistas como

“anormais”, pelo que deviam ser protegidas, agrupando-se em instituições separadas, longe da vista

do público. O ensino é ministrado em escolas especiais, também chamadas centros médicos

terapêuticos. Em Portugal, este período manifesta-se pela criação dos primeiros asilos para cegos e

surdos, criados geralmente por iniciativa privada e com fundos próprios. É a fase que alguns

autores designam de pré-história da educação especial.

A 2.ª Fase, do despiste e da segregação vamos encontrá-la já nos anos 50 e 60 com o apogeu das

técnicas psicométricas e do modelo diagnóstico que conduz sobretudo à preocupação em classificar

e diagnosticar, em vez de educar. Neste período em que vigora a conceção da deficiência como

doença, as crianças eram classificadas através de diagnósticos complexos, para serem em seguida

segregadas em recursos educativos e terapêuticos especiais.

A comunidade científica acreditava que prestava um melhor serviço às crianças com deficiência,

protegendo-as das crianças ditas “normais”. Nesta época os médicos desempenham um papel

decisivo nos processos de avaliação, diagnóstico e colocação destas crianças nas instituições.

Contudo, as transformações sociais ocorridas após a primeira Guerra Mundial, começam a

modificar os pensamentos de então. Começa a ser aceite o direito à diferença, implementando-se a

prevenção de doenças e deficiências. Assiste-se ao desenvolvimento das preocupações educativas

com os cidadãos com deficiência e ao nascimento do movimento em defesa da integração.

Em Portugal nos anos 60, a oferta na área da educação especial das crianças e jovens com

deficiência, era muito escassa. Foi assim, que face à insuficiente resposta das instituições oficiais se

assistiu nesta década, a um movimento de organização de pais que está na base da criação de várias

instituições sociais e mecanismos de apoio a instituições particulares, no âmbito do Ministério da

Segurança social.

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 59

Paralelamente às escolas especiais, aparecem outras formas de atendimento. É o primeiro passo a

caminho da desinstitucionalização das pessoas portadoras de deficiência. Foi nesta altura que em

Portugal surgiram os centros de observação e orientação, bem como as classes especiais do

Instituto Aurélio da Costa Ferreira. Entra-se no início dos anos 70, na 3.ª Fase, de identificação e

ajuda, marcada pelo surgimento de uma nova conceção do conceito e da prática da educação

especial caracterizada, predominantemente, pela integração escolar das crianças com deficiência

em conjunto com os seus pares.

Os anos 70 marcam a generalização do conceito de normalização por toda a Europa e América do

Norte. Destaca-se em 1975 nos EUA a Public Law 94-142, “The Education for All Handicaped

children Act” que confere o direito à educação pública de todas as crianças portadoras de

deficiência dos 4 aos 21 anos. Em 1978 surge no Reino Unido o Warnock Report que vem

introduzir o conceito de Necessidades Educativas Especiais (NEE)12.Do ponto de vista político e

social, o novo paradigma assenta na conceção de que todos os cidadãos têm os mesmos direitos,

nomeadamente o direito à educação e ao ensino que se deve adaptar às suas necessidades.

Do ponto de vista científico, é contestado o papel exclusivo do diagnóstico médico para o ensino

desta população. Passa a valorizar-se a educação como forma de mudança e a integração como

forma de normalização. Neste sentido, o termo normalizar, significa aceitar a própria criança tal

como é, com a sua individualidade, reconhecendo-lhe os mesmos direitos dos outros e

possibilitando-lhes serviços que lhe permitam desenvolver ao máximo as suas capacidades.

É neste período que em Portugal a educação especial ensaia os primeiros passos (Serra, 2002). São

criadas as Equipas de Educação Especial, a primeira medida prática que veio permitir, primeiro o

apoio a crianças com deficiências motoras e sensoriais integradas no sistema regular de ensino, e só

mais tarde, a crianças com deficiência mental.

Contudo, é no início dos anos 90 que a política educativa portuguesa, através de importantes

diplomas legais, se torna mais clara quanto à responsabilização da escola na educação dos alunos

com NEE. A garantia e a gratuitidade da escolaridade obrigatória de todas as crianças, incluindo as

que apresentam deficiência e a introdução e a adequação de medidas a aplicar de acordo com as

necessidades educativas especiais, foram alguns dos aspetos contemplados na legislação que se

consideram relevantes para uma política integradora.

12 Por ser tão comummente aceite esta abreviatura, também nós nos apropriámos dela e a utilizamos ao longo de todo o documento.

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 60

Atualmente encontramo-nos naquilo que a Organização das Nações Unidas para a Educação,

Ciência e Cultura considera o limiar da 3.ª Fase – a fase de “plena cidadania” – em que a pessoa

portadora de deficiência é considerada, de facto, como pessoa com a sua autonomia, vontade,

individualidade e com um projeto de vida próprio (UNESCO, 1994). Não gostaríamos, no entanto,

de concluir este ponto, sem refletirmos conjuntamente com (serra, 2002): A educação especial é

uma inquestionável realidade em contínua evolução (Serra, 2002:49) .

3.3 Políticas da educação inclusiva

Como vimos, ao longo da História da Humanidade foram diversas as atitudes assumidas pela

sociedade, para com as pessoas com deficiência; utilizando uma terminologia mais recente, e

situando-nos no contexto educativo, diremos, para com as crianças e jovens com NEE. A

bibliografia consultada revelou-nos que a evolução do atendimento a esta população tem

prosseguido ao longo das últimas décadas um caminho centrípeto, passando das escolas especiais,

para as classes especiais, destas para as salas de apoio e finalmente para o seu enquadramento na

sala de aula do ensino regular.

Na base desta mudança esteve o desenvolvimento de uma cultura mais humanista, com a crescente

valorização dos direitos humanos e dos conceitos de igualdade de oportunidades, do direito à

diferença, da solidariedade e justiça social que lhe são inerentes (Vieira, 1996:15). Neste contexto,

começam a surgir textos, leis, conferências e declarações mundiais que mudaram o rumo da

educação para um novo paradigma: o paradigma da inclusão. Neste, a organização da educação

escolar foi marcada por marcos históricos, muitos deles já aqui anteriormente referidos, mas que

urge agora enfatizar.

Segundo Baptista (2011:43)13 O espírito de inclusão e de educação inclusiva começa a desenhar -

se com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adoptada e proclamada pela Assembleia

13 O autor (Baptista, 2011: 41-73) baliza, cinco marcos históricos fundamentais na educação inclusiva:

1- 1948: Declaração Universal dos Direitos Humanos;

2- 1975: Lei 94-142, sobre a Educação de Todas as Crianças com necessidades Educativas

Especiais (Public Law);

3- 1978: Relatório Warnock e as suas recomendações;

4- 1990: Conferência Mundial sobre Educação Para Todos;

5- 1994: Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais.

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 61

Geral das Nações Unidas em 10 de Dezembro de 1948. A partir desse passo, sob a liderança da

Organização das Nações Unidas os países, quer individualmente, quer em conjunto, souberam

construir todo um quadro normativo que pretendia a universalização teórica e prática da inclusão.

As profundas transformações nas práticas educativas permitiram a passagem de modelos mais

segregadores para modelos mais inclusivos. Na intervenção educativa, os aspectos clínicos

deixaram de ser uma prioridade, verificando-se uma ênfase maior nas capacidades e competências

da criança. Na continuidade do que anteriormente foi referido, realçamos aqui as décadas de 60 e

de 70, nomeadamente na preocupação com a igualdade de oportunidades e com a

consciencialização de que havia nas classes regulares crianças que não progrediam

satisfatoriamente (Ainscow, 1996). Surgiram então ideias novas que iriam pôr em causa as crianças

referidas como tendo NEE. Espalha-se um pouco por todo o mundo um movimento – em termos de

política de integração escolar – apoiado por fortes pressões sociais, políticas e educacionais. A

tendência é a de colocação e integração da criança com NEE na escola pública. Destacam-se aqui

as já mencionadas, Lei americana Public Law n.º 94-142 (1975) que propõe o ensino de crianças

com deficiência com os seus pares de forma universal e gratuita no ensino integrado e o Relatório

Warnock Report (1978), que propõe que a deficiência seja atendida como um contínuo de

necessidades educacionais específicas e introduz o conceito de NEE (Correia, 1999). 14

O Relatório Warnock desloca de forma clara o enfoque médico nas deficiências dos educandos,

para um enfoque na aprendizagem escolar de um currículo ou programa e sublinha ainda que,

sempre que possível as crianças com NEE devem frequentar as escolas regulares. Em consonância

com os documentos anteriores, o Relatório Warnock reforça a necessidade de uma viragem a nível

político, social e educativo. Parafraseando Serra (2002), Estas posturas tornaram-se a base de uma

profunda mudança nas orientações que até ao momento tinham presidido à organização e prática

da educação especial, que progressivamente se vai tornando extensiva e reconhecida na legislação

de muitos países (Serra, 2002:60).

No início da década de 90 realiza-se em Jomptien, na Tailândia, a Conferência Mundial sobre

“Educação para Todos” que aprovou a Declaração Mundial sobre Educação para Todos:

Satisfação das Necessidades Básicas de Aprendizagem. Esta Conferência foi organizada, em

conjunto, pelos responsáveis do Fundo das Nações Unidas para o Desenvolvimento, da

Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e do Banco

14 Miranda Correia estabelece um conjunto de definições que dizem respeito à criança com NEE: com atraso mental; surda ou hipoacúsica; cega ou portadora de visão parcial ou reduzida; com problemas motores; com outros problemas de saúde; com problemas de linguagem e fala; com perturbações emocionais; com traumatismo craniano. Define ainda se estas NEE são temporárias ou permanentes.

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 62

Mundial, com o patrocínio de diferentes Governos e Organizações. Cerca de 60 países propõem-se

elaborar programas que permitam a todos aceder à educação.

Juntamente com a Declaração, foi também concebido e aprovado um Plano de Ação, que pretendia

ser um guia para governos e organismos internacionais, com sugestões de ação direta em cada país.

Dando lugar a uma política educativa integrada decorre em 1994, em Salamanca, a “Conferência

Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: Acesso e Qualidade” organizada pelo Governo

Espanhol em cooperação com a UNESCO com a participação de 92 países, entre eles Portugal,

onde é assinada uma Declaração de princípios.

Esta Declaração situa a questão dos direitos das crianças e jovens com NEE no contexto mais vasto

dos direitos do homem e por isso, refere a Declaração Universal dos Direitos do Homem, a

Conferência Mundial sobre Educação para todos e as Normas das Nações Unidas sobre igualdade

de oportunidades para Pessoas com Deficiência. O documento acolhe as novas conceções sobre a

educação dos alunos com NEE, expressa a opção pela escola inclusiva e traça as orientações

necessárias para a ação a nível nacional e internacional, com o objetivo de implementar, uma

escola para todos UNESCO (1994).

Desta Declaração advém uma nova conceção sobre a educação de alunos com NEE pois a

designação abrange todos os portadores de deficiência, passando pelos sobredotados e incluindo

aqueles que pontualmente evidenciam dificuldades de aprendizagem em algum momento do seu

percurso escolar (Veiga, 2000:24). Neste conceito devem ainda incluir-se, crianças de populações

remotas ou nómadas, crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais e crianças de áreas ou

grupos desfavorecidos.

O texto apela ainda a todos os governos a adotar como política, o princípio da educação inclusiva,

admitindo todas as crianças - com as características, interesses, capacidades e necessidades de

aprendizagem que lhe são próprias - nas escolas regulares; por sua vez, devem estas (escolas),

desenvolver sistemas de educação planeados e com programas educativos implementados de modo

a atender adequadamente a todas estas diversidades. Surge assim o conceito de escola inclusiva

independentemente das condições físicas, sociais, linguísticas ou outras, que os alunos possam ter.

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 63

3.4 A educação inclusiva em Portugal

Portugal, embora não se assumindo predominantemente numa linha integradora, adotou, embora

tardiamente, esta nova perspetiva de integração de alunos com NEE nas escolas regulares. Numa

fase ainda um pouco remota, no início da década de 70, o Ministro Veiga Simão (1973) apresenta

uma política educativa que integrou pela primeira vez, nos objetivos da educação em geral, o

atendimento educativo de crianças, inadaptadas, deficientes e precoces (Serra, 2002).

A partir de 1975 um novo período desponta para a educação destes cidadãos. Segundo Carvalho

(2000), os movimentos internacionais que vinham proclamando os princípios da integração,

chegam ao nosso país, aclamados pelos ideais da Revolução de Abril. A Constituição da República

estabelece então que o ensino básico será universal e gratuito e todos os cidadãos terão acesso a ele.

O mesmo pode claramente, ler-se no seu Art.º74.º. Estas alterações despertam a consciência de

alterações profundas no domínio da educação especial. Mas é só em 1986, com a – já citada - Lei

de Bases do Sistema Educativo (LBSE), que as tendências integrativas são já mais visíveis

(Bairrão,1998). Nela estabelece-se um conjunto de meios destinados a concretizar o direito à

educação. Dado o relevo de que se reveste esta medida passamos à sistematização de alguns pontos

mais importantes da referida Lei, segundo Pires (1987):

a educação especial (…) integra atividades dirigidas (17.º-2):

a) Aos educandos;

b) Às famílias;

c) Aos próprios educadores;

d) Às comunidades;

• a educação especial realiza-se segundo modelos diversificados (…):

a) Em estabelecimentos regulares de ensino (…), (18.º-1);

b) Em instituições específicas (…), (18.º-2);

• a escolaridade básica para crianças e jovens deficientes deve ter currículos e programas

devidamente adaptados às características e a cada tipo e grau de deficiência (…), (18.º-

4);

• é estabelecida uma unidade de orientação de educação especial, que passa a pertencer a

um único Ministério, o Ministério da Educação (…), (18.º-7).

Decorrentes desta importante lei, são publicados vários diplomas que consagram medidas de

atuação junto de crianças com NEE. Referimos a título de exemplo apenas alguns: Despacho

Conjunto 36/SEAM/88 (cria as equipas de Ensino Especial); Dec.-Lei n.º 35/88 (veio permitir a

colocação de professores com funções de apoio a alunos com deficiência); Dec.-Lei n.º 43/89

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 64

(exige como competência da escola a deteção de necessidades educativas dos alunos e organizar e

gerir as modalidades de apoio e o encaminhamento dos alunos); Dec.-Lei n.º 35/90 de 1 de janeiro

(estipula de novo o cumprimento da escolaridade obrigatória para todos os alunos qualquer que seja

o grau de deficiência); Dec.-Lei n.º 6/2001 de 18 de Janeiro (o governo assume a garantia de uma

educação para todos, objetivo que implica conceder uma particular atenção às situações de

exclusão).

Ainda na sequência da LBSE, a educação especial foi objeto de um importante normativo legal

específico (Dec.-Lei n.º 319/91 de 23 de agosto) que vem dar corpo aos princípios consagrados na

já referida LBSE, tendo como fundamentais as orientações do seu art.º 59, isto é:

• fomentar uma igualdade de oportunidades a todas as crianças e jovens deficientes;

• permitir que as necessidades educativas especiais correspondam, no âmbito das escolas

regulares a intervenções específicas adequadas.

Como se sabe, esta tomada de posição do governo português não acontece isoladamente. De facto

ela é fruto de todo um envolvimento internacional que – tal como já foi referido – surgiu nos anos

90 em torno da escola para todos e reforça a política da educação inclusiva. Decorrente disto, este

Dec.-Lei (n.º 319/91) é nitidamente influenciado pela legislação americana e inglesa e estabelece o

regime educativo especial que consiste na adaptação das condições em que se processa o ensino-

aprendizagem dos alunos com NEE.

Subsequente a esta legislação, surgem outras medidas legais, com acentuado relevo na temática em

questão como seja, o despacho n.º 173/ME/91, que funciona como instrumento determinante para a

normalização do conceito de inclusão (Serra, 2002). Destacamos ainda a Portaria n.º 611/93, de 29

de Junho que estabelece as normas técnicas, de execução, necessárias à aplicação das medidas

previstas no, já citado, Dec.-Lei n.º 319/91, destinadas às crianças com NEE a frequentar os jardins

de infância da rede pública do Ministério da Educação. Os alunos com NEE ficam obrigados ao

cumprimento da escolaridade obrigatória pelo Dec.-Lei n.º 301/93.

Na senda destes ideais, a escola inclusiva veicula, um sistema de educação e ensino onde os alunos

com NEE (incluindo os portadores de deficiência) são instruídos com os outros, no seu ambiente de

escola regular. Ora, um programa inclusivo pressupõe serviços organizados nesse sentido. Com o

objetivo de melhor gerir e organizar as condições em que se processa o ensino-aprendizagem, surge

o Despacho Conjunto n.º 105/97 de 1 de julho, ao enunciar princípios como, centrar nas escolas as

intervenções diversificadas necessárias para o sucesso educativo de todas as crianças e jovens

(Serra, 2002). Nesta perspetiva emerge o enquadramento normativo dos apoios educativos, que se

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 65

materializa no conjunto de medidas que constituem uma resposta articulada e integrada aos

problemas e necessidades, nas e pelas escolas, de acordo com um conjunto de princípios

orientadores.

Em 1999 é finalmente publicado o Despacho Conjunto n.º 819/99, no domínio da intervenção

precoce, para crianças com deficiência ou em risco de atraso grave de desenvolvimento que ações

específicas de apoio para crianças dos 0 aos 3 anos (excecionalmente até aos 6 anos) e suas

famílias. Não deixa de ser curioso que este Despacho, que remetia para uma intervenção o mais

precoce possível no despiste de problemas da criança, seja das últimas medidas a publicar pelo

governo no âmbito da educação especial.

Atualmente estes serviços são designados por Intervenção Precoce na Infância (IPI) e têm a missão

de garantir um conjunto de medidas de apoio integrado centrado na criança, com limitações ao

nível da atividade e de participação num ou vários domínios de vida e na família. Funciona através

da atuação coordenada dos Ministérios da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, da

Educação e Ciência e da Saúde (SNIPI), conjuntamente com o envolvimento das famílias e da

comunidade. O Programa SNIPI tem como finalidade contribuir para a promoção da universalidade

do acesso aos serviços de intervenção precoce, através do reforço da rede de Equipas Locais de

Intervenção (ELI), (Portaria n.º 293/2013 de 26 de setembro). Não tanto na linha da legislação,

mas na linha dos Planos, é de referir também o Plano Nacional de Ação para a Inclusão (PNAI`s)

enquanto eixo de ação orientado para o combate às formas de pobreza e exclusão social, incluindo-

se aqui as pessoas com deficiência como um dos quatro grupos de intervenção.

Contudo, com o balanço efetuado do PNAI (2006-2008), conclui-se que o cumprimento das metas

ficou aquém do projetado pelo que, de acordo com Caleiras (2008), posteriormente, a estratégia

nacional do mesmo Plano, colocou o seu enfoque em quatro pilares específicos de intervenção

local, de entre eles, a necessidade de respostas reforçadas no apoio aos cidadãos “portadores de

deficiência”. Acolhendo o enunciado nestes pilares, foram definidas pelo governo medidas e

prioridades que pretendiam superar as discriminações e reforçar a integração dos cidadãos

portadores de deficiência, bem como dos imigrantes e de outras minorias étnicas, implementando

programas a eles direcionados.

Todavia, na prática, as medidas dirigidas a crianças/alunos com deficiência continuam a ser regidas

por instrumentos legislativos dos quais sobressai o já referido Dec.-Lei n.º 3/2008 de 7 de janeiro,

que norteia hoje de forma decisiva o atendimento às populações escolares - desde a Educação-Pré

Escolar ao Ensino Secundário - com deficiência. O mesmo, remete para os Projetos Educativos das

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 66

escolas as adequações relativas ao processo de ensino e aprendizagem necessários à resposta

educativa aos alunos que se enquadram nessa modalidade de educação. A legislação em questão

prevê, além de outras medidas, o desenvolvimento de respostas diferenciadas, orientadas para a

especificidade destas populações.

A acompanhar este processo, estarão os docentes de educação especial recrutados através da

publicação, em 2006, do Dec.-Lei n.º20/2006 de 31 de janeiro. Analisada a escola atual - no âmbito

da inclusão – sob o ponto de vista deste modelo, dir-se-ia que está atingido o desejado patamar da

“escola para todos”. Contudo, uma análise mais atenta poderá trazer-nos informação contrária,

como de seguida veremos.

3.4.1 Situação atual

A entrada em vigor do Dec.-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, permitiu que Portugal alinhasse as suas

políticas educativas, não apenas com aquilo que se constitui, hoje, como matéria largamente

consensual no seio da comunidade científica sobre esta matéria, mas também com os princípios e

recomendações contidos nos diversos tratados e declarações de direito internacional a que o Estado

Português está vinculado em matéria de necessidades educativas especiais e de não discriminação

em razão de deficiência e saúde (Declaração de Salamanca sobre Princípios, Políticas e Práticas

na Área das Necessidades Educativas Especiais, 1994, da UNESCO; Convenção sobre os Direitos

das Pessoas com Deficiência, 2007, e Protocolo Opcional, 2009, das Nações Unidas).

Depois de todo este percurso no caminho de políticas de inclusão fará sentido, continuarmos a

interrogar-nos (detendo-nos mais particularmente na “inclusão educativa”), se a inclusão será já

uma realidade, ou se pelo contrário, permanecerá ainda no horizonte das promessas? É com o

intuito de percebermos a realidade atual que passamos em revista o que alguns autores de

referência nos dizem a este respeito.

Antes de avançarmos com qualquer consideração, pensamos ser importante esclarecer que neste

ponto, apoiamo-nos em Correia (2008a) quando analisa a relação existente entre inclusão e Escola

Contemporânea e ainda em Baptista (2008, 2011), por ambos fazerem uma análise bastante crítica

da situação atual.

Começamos então por referir que o princípio da inclusão apela, para uma escola que Correia

(2008a) designa de Escola Contemporânea, que tenha em atenção a criança - todo,

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 67

proporcionando-lhe uma educação apropriada que respeite três níveis de desenvolvimento

essenciais: académico, socioemocional e pessoal. O autor reitera, ainda, o que a escola inclusiva

não deve ser, e passamos a citar: mera colocação de todos os alunos com NEES nas classes

regulares sem que um conjunto de pressupostos seja assegurado (legislação, recursos,

colaboração, etc.), (Correia, 2008a:13). Na mesma obra, Correia, continua a defesa desta ideia,

remetendo para aquilo que a educação inclusiva é sem os apoios necessários: educação

irresponsável. Aliás, Miranda Correia tem sido uma das vozes mais críticas no estado atual da

educação especial em Portugal, com atribuição direta de responsabilidades ao já referido Dec.-Lei

n.º3/2008 de 07 de janeiro. Afirma mesmo que não se coaduna com os interesses dos alunos a

quem se destina por não precisar um processo de atendimento eficaz para os mesmos. De entre

alguns dos aspetos que enumera como geradores de insucesso nas respostas a estes grupos, refere o

facto de recorrer a uma classificação (Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade

e Saúde, vulgo CIF), desaconselhada em educação. Esta classificação, volta (como já tinha

acontecido no passado), a colocar o enfoque no diagnóstico realizado na área da saúde.

No mesmo contexto, mas situando a crítica em duas questões fundamentais15, chega mesmo a

propor uma alteração significativa do documento ou mesmo a sua suspensão.

Perante esta afirmação, não será de estranhar que Correia (2008a) conclua que, no que respeita a

respostas educativas para alunos com NEE, a política seguida pelos governos, tem sido desastrosa,

culminando em atendimentos deficitários a estes alunos ou, pura e simplesmente na falta deles

(2008a:81), devendo por isso, repensar-se com urgência os serviços de educação especial.

Por sua vez, Baptista (2008), aponta críticas idênticas referindo a ausência de consenso nesta

matéria (Ibid.:2011), refere que Muitas escolas e muitos professores queixam-se de que a aplicação

da CIF como instrumento de identificação e elegibilidade das crianças com necessidades

educativas especiais deixa de fora muitas crianças, nomeadamente as que se situam na área das

dificuldades de aprendizagem (Baptista,2011:96). Acrescenta ainda que A igualdade de

oportunidades, o sucesso de todos e a inclusão continuam a ser uma miragem, ou um luzeiro

distante, que estamos ainda longe de alcançar (Op. Cit.; 2011:29).

Concluem os autores, que a inclusão não deu resposta aos problemas com que nos debatemos na

sociedade e na escola. Nas palavras de Baptista (2008; 2011) a escola inclusiva incorpora um 15 A primeira que denomina como condição restritiva e discriminatória da lei, por parecer limitar o atendimento às necessidades educativas especiais dos alunos surdos, cegos, com autismo e com multideficiência, discriminando a esmagadora maioria dos alunos com NEE permanentes (como alunos com problemas intelectuais, dislexia, disgrafias…) e a segunda que relaciona com o uso da CIF, para determinar a elegibilidade do aluno com possíveis NEE para os serviços de educação especial e posterior elaboração do programa educativo individual, sem que a investigação assim o aconselhe.

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 68

conjunto de promessas incluídas num movimento de reorganização, reestruturação e melhoria de

escola, mas que, de acordo com o seu ponto de vista, se encontra nesse mesmo estado: promessas.

Como vinha antevendo o autor (Ibidem:2008) A inclusão, o eco da democracia na educação, vem

prometendo a mudança de uma escola que existe por outra que não existe (Baptista,2008:213).

Baptista (2011) reflete ainda: A nível mundial, os objectivos estão definidos, e bem definidos. Falta

criar as condições concretas, em cada país, em cada escola, que permitam levar à prática esses

objectivos (Baptista,2011:29) e conclui este raciocínio interrogando: Que limites, que obstáculos,

que dificuldades se levantam para a realização deste desígnio? (Ibid:29).

Juntando-nos a estas preocupações, gostaríamos de indagar acerca de como poderemos contribuir,

nas escolas, por forma a esclarecer esta questão e colaborar no sentido de minimizar esta

problemática.

3.4.1.1 Modalidades específicas de educação e respostas educativas especializadas

Com a caducidade dos Dec.-Lei n.º 319/91 de 23 de agosto e n.º105/97, algumas competências a

eles inerentes transitaram (com a redação legislativa necessária) para o Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de

janeiro. Como já tem vindo a ser notificado é ele, agora, o documento estruturante que norteia os

diferentes aspetos que regem toda a dinâmica e organização da educação especial.

Este decreto determina que as modalidades e estratégias do acompanhamento a alunos com

necessidades educativas se inserem no Projeto Educativo (PE) da escola e como tal, as respostas

não se restringem a adaptações pontuais numa ou noutra sala de aula; mas pressupõem uma

abordagem global. Assim, também os apoios educativos foram redefinidos. O mesmo Decreto

reconhece que “todos os alunos têm necessidades educativas, trabalhadas no quadro de gestão da

diversidade”, mas que “existem casos que se revestem de contornos muito específicos, exigindo a

ativação de apoios especializados”16 Esses apoios especializados visam responder às necessidades

educativas especiais dos alunos com limitações significativas ao nível da atividade e participação,

num ou vários domínios de vida, decorrentes de alterações funcionais e estruturais, de caráter

permanente, resultando em dificuldades continuadas ao nível da comunicação, da aprendizagem,

16 Nestes apoios especializados, incluem-se outros que não apenas os recursos humanos na área da docência, nomeadamente psicólogos e terapeutas da fala.

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 69

da mobilidade, da autonomia, do relacionamento interpessoal (Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro),

promovendo o desenvolvimento biopsicossocial do aluno.

De acordo com a mesma legislação, estes apoios, podem implicar a adaptação de estratégias,

recursos, conteúdos, processos, procedimentos e instrumentos (Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro),

competindo às escolas, incluir nos seus PE as adequações relativas ao processo de ensino e de

aprendizagem, de carácter organizativo e de funcionamento para responder adequadamente às NEE

das crianças e jovens por forma a assegurar a sua maior participação na escola e na comunidade em

geral. Aquela legislação, estipula, no seu Capítulo II, uma série de procedimentos de referenciação

e avaliação, com vista a aferir se se está, ou não, perante uma situação de necessidades educativas

que justifiquem a intervenção dos serviços de educação especial, aconselhando o encaminhamento

do aluno para os apoios disponibilizados pela escola que melhor se adequem à sua situação

específica.

Em situação do processo merecer parecer favorável o aluno passará a beneficiar das medidas

educativas previstas no âmbito da Educação Especial, mediante a sua situação educativa. Ainda no

âmbito das respostas educativas especializadas, ao abrigo da mesma legislação, enquadram-se

também as escolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos (Art.º 23); as escolas de

referência para a educação de alunos cegos e com baixa visão (Art.º 24); as unidades de ensino

estruturado para a educação de alunos com perturbações do espectro do autismo (Art.º 25); as

unidades de apoio especializado para a educação de alunos com multideficiência ou surdocegueira

congénita (Art.º 26) e ainda no domínio da Intervenção Precoce na Infância são criados

agrupamentos de escolas de referência para a colocação de docentes (Art.º27). Tais respostas

concentram alunos com problemáticas afins, oriundos do concelho em que essas unidades estão

sediadas e ainda de outros concelhos.

Por sua vez, estas respostas reclamam as funções dos respetivos profissionais dotados de

competências específicas e vocacionados para o trabalho junto dos alunos da educação especial,

como exemplo: docentes e técnicos que exercem funções nas escolas de referência para a educação

bilingue de alunos surdos – docentes e intérpretes de Língua Gestual Portuguesa (LGP) –,

terapeutas da fala e psicólogos escolares dos Serviços de Psicologia e Orientação (SPO); para lá

disso tornam-se necessários espaços físicos selecionados mediante a natureza da problemática e a

necessidade da resposta específica.

A implementação dos apoios especializados pode compreender, ainda, a colaboração de outros

técnicos oriundos de entidades externas com as quais a escola estabelece parcerias e protocolos.

Capítulo III A educação especial e a criança com necessidades educativas especiais

© Fernanda Cardoso (2015) 70

Face ao exposto podemos concluir que O incremento de uma rede de apoios educativos, centrados

na escola e orientados para uma acção multifacetada, constitui parte de uma estratégia global de

combate à exclusão escolar e de construção de uma escola inclusiva (Vasconcelos, 1998:1).

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 71

Capítulo IV – Caminhos para a Inclusão

Ultrapassados - pelo menos teoricamente - os anteriores conceitos que apontavam como desejável a

prévia classificação dos alunos, o debate centra-se no momento, nas estratégias capazes de facilitar

esta aprendizagem a grupos de alunos em que a inevitável diversidade é considerada como um fator

de enriquecimento e de desenvolvimento (Ainscow, 1995).

Decorrente disto, a maioria dos governos europeus estão agora empenhados numa política de

inclusão, que como vimos, tem sido controversa. De facto, existe frequentemente uma carência de

clarificação entre o significado dos termos «inclusão» e «integração». Existe ainda muita

resistência na educação regular face à inclusão de jovens que desafiam o funcionamento da escola

e causam perturbações no sistema (Ainscow, 2001:111).

Os vários autores consultados são unânimes em afirmar que os caminhos para a inclusão são lentos

e complexos e que o progresso em direção às escolas inclusivas exige mudanças; deste modo, As

avaliações até agora realizadas evidenciam que a integração dos alunos com NEE na escola

regular não está isenta de problemas, e que é imprescindível realizar mudanças profundas para

conseguir escolas abertas para todos (Marchesi, 2001), (Cit. por David, 2001:95).

Estas mudanças são necessárias, tanto ao nível do sistema, como das mentalidades e exigem uma

série de pressupostos, que de forma mais ou menos evidente temos vindo a referir mas que

gostaríamos de explicitar.

4.1 A escola inclusiva: pressupostos básicos

As tendências atuais em matéria de princípios e práticas educativas - já o vimos - vão no sentido da

promoção de que a escola seja entendida como uma estrutura educativa de suporte social que se

ajuste a todos os alunos independentemente das suas condições físicas, sociais, religiosas, étnicas e

linguísticas; que responda às necessidades individuais deixando assim de ser segregadora.

Lembremo-nos que a Declaração de Salamanca, (UNESCO, 1994) realça claramente o direito de

todas as crianças a serem incluídas no sistema de educação.

Contudo, a flexibilidade que foi exigida à escola como resposta a uma população tão diversificada

implicou uma acentuada flexibilização da organização escolar, das estratégias de ensino, da gestão

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 72

de recursos e do currículo, de modo a proporcionar o desenvolvimento maximizado de todos. Mas,

como temos vindo a perceber, esta reforma nem sempre foi de fácil implementação.

Concordando com Cadima (1998) uma das maiores dificuldades que decorrem da

operacionalização dos princípios inerentes à escola inclusiva, diz respeito à concretização de um

ensino diferenciado e à planificação e gestão dos recursos humanos e técnicos, para lhe dar

coerência e viabilidade. Carvalho (2000), sublinha também esta posição, ao referir que as

mudanças conceptuais, assim como as práticas decorrentes, que sustentam uma escola inclusiva

põem à prova relações humanas e competências profissionais que enfrentam – resistências

pessoais e de grupo, criando desânimo em muitos professores, especialmente nos de apoio

educativo (Carvalho,2000:92).

No sentido de enfrentar estes desafios, realizaram-se nas últimas décadas, múltiplas investigações

(Miranda,1994; Ainscow,1997; Marchesi,2001) sobre as condições mais favoráveis ao sucesso de

aprendizagem na sala de aula; também surgiram outro tipo de estudos relacionados com novas

formas de organização da escola e tem-se procurado ainda desenvolver o aperfeiçoamento dos

professores através de estratégias capazes de implicar uma real transformação das suas conceções e

das suas práticas (Ainscow,1997).

Neste contexto vale a pena referir o Projeto da iniciativa da UNESCO “Necessidades Especiais na

Sala de Aula”, que visa o desenvolvimento de escolas inclusivas (Ainscow,1997). O mesmo, reúne

três artigos de nomes muito conceituados neste âmbito: os professores Mel Ainscow, Gordon

Porter e a professora Margaret Wang (1997). No primeiro destes artigos, Ainscow diz-nos que

tornar uma escola inclusiva não é uma tarefa fácil (Ainscow, 1997:27), mas admite que parece

existirem condições que contribuem para a sua realidade. Formula assim uma tipologia de seis

“condições” que parecem ser fatores de mudanças nas escolas:

• Liderança eficaz;

• Envolvimento da equipa de profissionais, alunos e comunidade nas orientações e

decisões da escola;

• Um compromisso relativo a uma planificação realizada colaborativamente;

• Estratégias de coordenação;

• Focalização da atenção nos benefícios potenciais da investigação e da reflexão;

• Uma equipa de valorização profissional de toda a equipa educativa.

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 73

Na realidade, os autores consultados convergem ao aceitar que as escolas não se tornam inclusivas

de um dia para outro e que, pelo contrário, necessitam de transformações profundas ao nível da sua

cultura, dos seus professores e da sua prática. Neste sentido, as escolas inclusivas, necessitam de

sociedades e políticas inclusivas, de modo a que os seus esforços possam ser impulsionados e

continuados por forças que existem antes e depois de si. Numa tentativa de complementar as

“condições” necessárias para que se construam escolas inclusivas, referimos Marchesi (2001), (Cit.

por David, 2001) que refere:

• o contexto político e social: os valores cívicos e morais da sociedade e o enquadramento

legal necessário de forma a regulamentar situações como a detecção precoce de NEE,

atenção educativa inicial, modelo de avaliação, sistema de provisão de recursos,

definição do currículo escolar, formação de professores e participação dos pais nos

processos educativos dos filhos.

• o contexto do centro pedagógico: as tendências atuais da escola para todos, que aceite as

diferenças, apoie as aprendizagens e promova uma educação diferenciada, isso

implica alterações no plano da organização e gestão curricular, no plano da formação

dos docentes e outros técnicos, numa liderança efetiva e no desenvolvimento de um

clima e de uma cultura para a inclusão.

• o contexto da sala de aula: o trabalho do professor dentro da sala de aula é fundamental

para a inclusão dos alunos com NEE. O professor deve veicular um ensino eficaz

ajustado às necessidades e possibilidades dos alunos, com estratégias de ensino-

aprendizagem que incluam, entre outras: aprendizagem cooperativa, ensino preciso,

acompanhamento individualizado, treino de competências sociais e ajustamento e

desajustamento gradual.

Ainda dando continuidade à mesma linha de pensamento, referimos Correia (1994) quando defende

que há um conjunto de características que uma escola inclusiva deve englobar. A saber: um sentido

de comunidade e de responsabilidade, liderança, padrões de qualidade elevados, colaboração e

cooperação, mudança de papéis por parte dos professores e demais profissionais da educação,

disponibilidade de serviços, parcerias com pais, ambientes de aprendizagem baseadas na

investigação, novas formas de avaliação e desenvolvimento profissional adequado. À semelhança

de Marchesi (2001, Op. Cit) também este autor (Correia:1994), considera que, para que, se fale em

inclusão, terão que considerar-se alguns pressupostos, de entre os quais enumera:

• As atitudes: tanto de profissionais como da sociedade em geral, que servirão de alicerce a

este grande edifício que se pretende construir e que é a inclusão;

• A formação: de profissionais de educação e de pais. Alerta especialmente para a formação

de profissionais ao nível inicial, especializada e contínua;

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 74

• A colaboração: grande esforço no sentido da comunidade escolar, onde todos funcionem

em parceria;

• Recursos: sejam eles humanos ou materiais. Realça aqui, que “A liderança da escola

desempenha um papel crucial na implementação de uma escola inclusiva”. Alerta para

a importância de neste contexto repensar o papel dos professores e demais

profissionais de educação.

Face ao exposto, apoiamo-nos em Correia (1994) quando refere que quando falamos em inclusão

estamos a falar numa reestruturação bastante significativa do nosso sistema, reestruturação essa

que terá fundamentalmente de apoiar-se num conjunto de pressupostos (Op. Cit:128). Baseando-

nos nas leituras realizadas destacaremos destes pressupostos aqueles que nos parecem essenciais.

4.2 Os professores – a sua formação e o seu papel na construção de uma escola inclusiva

De acordo com Pereira (1996b) a mudança para a concretização da escola inclusiva implica

alterações profundas no plano da organização e da gestão curricular, no plano da formação dos

docentes e de outros técnicos; implica ainda uma atenção especial à individualização e

diferenciação curricular e às estratégias de aprendizagem; implica, também, entender as estratégias

pedagógicas em termos de gestão e organização dos processos comunicativos e interativos entre

professor e aluno.

Na terminologia de Carvalho (2000), o professor é o principal protagonista desta mudança,

cabendo-lhe o principal papel como ponte sobre margens de um rio (Carvalho, 2000:93). Dele,

cada vez mais se espera que seja um conselheiro, um orientador com uma profunda dimensão

humana, ética, social, crítica, política e pedagógica, capaz de transformar a escola de muitos, na

escola de cada um. Decorrente disto, esta (escola) terá que se adaptar para receber e dar resposta a

todos os alunos que a frequentam de modo a que estes construam neste período da sua vida, as

bases para o seu melhor desempenho, na sociedade e em sociedade.

O papel desempenhado pelos professores nesse contexto, é relevado amiúde, por vários autores

Correia (1997), Costa (1999), Nielson (1999), Vieira e Silva (1999), Serra (2002), Pereira (2004), e

Baptista (2011). Neste sentido, vai também a opinião de Eduardo Marçal Grilo (1996) quando

refere que: o professor é o elemento essencial de qualquer projecto na escola, de qualquer

inovação, de qualquer processo de mudança. Sem os professores não há processo de inovação (…)

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 75

nem funcionamento da escola (Grilo,1996:25). De facto, não fará sentido falarmos em educação

inclusiva, se não houver da parte dos professores uma total adesão a este projeto. Nunca é demais

lembrar que o simples facto de uma criança com NEE frequentar uma escola, dita regular, não

significa por si só que haja inclusão. Mais do que aceitar a sua frequência, é necessário que a escola

centre a sua atividade na aplicação de um vasto conjunto de estratégias pedagógico-educativas que

desenvolvam todo o potencial do aluno.

A adequação da prática educativa e o estabelecimento de relações interpessoais empáticas serão

determinantes na promoção desse desenvolvimento; mas muito especificamente no que respeita aos

alunos com NEE. A este propósito Nielson (1999), professora qualificada na formação de docentes,

no âmbito desta temática diz-nos o seguinte: O meio educativo tem um enorme impacto, tanto nos

alunos com NEE como em todos os outros. No decorrer do processo de inclusão de alunos com

NEE nas classes regulares, o professor não só lhes deve transmitir sentimentos positivos como

deve também revelar-lhes afecto (Nielson, 1999:23).

Se o aluno não se sentir aceite, amado, respeitado e valorizado, que tipo de benefício lhe pode

advir, só pelo simples facto de frequentar, como todos os outros, uma escola “normal”?

Poderíamos, parafrasear Iturra (2001), (Cit. por Rodrigues, 2001), quando “veste a pele” de uma

criança que se lamenta Ai de mim (…)Como poderia ficar calmo e feliz quando os meus modelos de

vida não riem? (Iturra, 2001:71). É que, na verdade num mundo que com frequência se assemelha

tão confuso e gélido mesmo para os adultos, o que não parecerá a uma criança se se sentir

esquecida e hostilizada?

Faz por isso todo o sentido que aos professores, seja exigido o desenvolvimento de uma pedagogia

centrada na criança, atendendo a que as diferenças são normais e que por consequência, a

aprendizagem deve ser adaptada às necessidades de cada criança (Declaração de Salamanca). Deste

modo, para que se possa falar verdadeiramente em sistemas educativos regidos por princípios

integradores torna-se imprescindível repensar e adequar a prática educativa dos profissionais à

nova realidade social.

Como opinam Ainscow, (1997) e Bénard da Costa (1999), entre outros, avançar para a mudança

envolve algumas formas de turbulência que vão surgindo à medida que se introduzem alterações

nas dimensões organizacionais, psicológicas, técnicas e políticas. A questão que se coloca agora

será como capacitar os profissionais (professores de apoio e de ensino regular) para apoiar a gestão

destes períodos de turbulência e de confusão que vão surgindo à medida que se vão introduzindo

alterações no status quo da escola e dos professores. Numa primeira instância, a resposta parece

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 76

ser: apostar na sua formação, inicial e contínua. Relativamente a este aspeto, a bibliografia

consultada, diz-nos que há um grande consenso entre os autores.

Nessa interpretação, quando falamos em formação de professores, referimo-nos efetivamente, a

todos os professores, pois como escreveu Serra (2002): Houve a coragem de responsabilizar a

escola regular pela educação das crianças com necessidades educativas especiais (Serra,

2002:235); logo, todos os professores se devem encontrar preparados para assumir essa

responsabilização, procurando soluções operacionais para os problemas que surjam na sala de aula

e para a identificação de situações que mereçam especial atenção. Nessas situações destacamos,

naturalmente, os alunos que apresentem necessidades específicas de educação.

Do despiste à intervenção com crianças com patologias, decorre todo um percurso que implica um

conjunto de medidas e decisões sobre as quais o professor deve conscientemente refletir, para

evitar consequências a nível das atitudes dos técnicos e de todos os elementos envolvidos com

repercussões graves nas crianças e nas famílias (Correia, 1999).

Em suma, os professores deverão, então, ter conhecimentos para identificar e avaliar as

necessidades especiais que algumas crianças apresentam e efetuarem o planeamento e programação

de atividades educativas, intervindo diferenciadamente. Mas intervir, só, não basta. É também

necessário saber avaliar o resultado dessa intervenção, para a corrigir, se necessário. Todos estes

pressupostos, como estamos a constatar, comprometem tanto o professor de educação especial,

como o professor do ensino regular. Aliás, em muitas situações este é sem dúvida a força motriz

para desencadear um processo. Dele se espera atitudes de intervenção, que passam pela utilização

de estratégias e desenvolvimento de actividades focalizadas na diferença e individualidade,

mantendo um programa eficaz para o grupo/turma (Carvalho, 2000:46).

Baptista (2011), relevando o importante papel da formação na construção de uma escola inclusiva

(articulando-o com a avaliação formativa), afirma: É nos professores que está a solução do

problema. Muitos já estão preparados e são motores dessa mudança. Mas uma grande parte ou

resiste ou está à margem do problema (Baptista,2011:101). Após análise destes desafios que se

colocam à escola, o autor deixa uma porta aberta e diz que a experiência mostra que uma escola,

qualquer escola, com uma liderança forte e qualificada é o melhor espaço para enfrentar esses

desafios (Op. cit:102).

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 77

4.3 O papel das lideranças e do gestor escolar

Não restam, pois, quaisquer dúvidas que, para que a escola seja efetivamente inclusiva é essencial

que todos os seus profissionais possam atender todas as crianças diferentes e que os gestores

escolares saibam como modificar a organização do estabelecimento (Quintas, 2001). A história diz-

nos que a escola enquanto organização é bastante recente (Sousa, 1995). Seja como for, aceitemos

neste contexto o conceito de escola como um conjunto de atividades que são coordenadas no

tempo, nos conteúdos e no espaço para a realização de objetivos (Sanches,1996). Como qualquer

outra organização, a escola necessita de estrutura, pessoas, tecnologia e tarefas, quer de conceção,

quer de execução.

Contudo, a existência de uma matéria-prima humana, confere à escola um carácter especial. A este

propósito sublinhamos Ainscow (1996) quando afirma Acima de tudo, temos que nos lembrar que

as escolas não são simplesmente edifícios, horários e planos curriculares. Em primeiro lugar e

antes de tudo o mais, são relações e interacções entre as pessoas (Ainscow, 1996:37). Por este

motivo, é fundamental que a escola seja uma organização de facto “organizada”, “autónoma”, e

“produtiva”. Mas para que isso seja possível é necessário alguém que empreenda, apoie e estimule.

Este trabalho, compete com acrescida responsabilidade a quem exerce um papel de

administração/gestão/ liderança. Sabemos, no entanto, que agir para melhorar é em si uma tarefa

complexa e por vezes frustrante. A mudança, especialmente quando ela implica pessoas que são

levadas a adotar novas maneiras de pensar e de agir, é difícil e morosa.

Apoiando-nos em Sampaio (1998), concordamos que não se pode intervir face a um problema

escolar, sem se ter uma teoria sobre mudança (Sampaio, 1998:29). Fullan (1982), defende que

para ser atingida com êxito a mudança tem de ser compreendida e aceite pelos que estão

implicados nela. Compreensão e aceitação levam tempo e precisam de ser encorajados (Fullan,

Cit. por Ainscow 1996:35). O autor , defende, ainda, que a mudança para ser bem sucedida requer

uma combinação de pressão e de apoio: pressão para encorajar e apoio para permitir suportar as

dificuldades sentidas no processo de adaptação a novas ideias. Dando continuidade a esta posição

Ainscow (1996), fala da mudança como sendo mais um processo do que um acontecimento. Daí,

que gradualmente, se a mudança tiver êxito, o processo conduz a sentimentos de maior confiança e

aceitação pessoal.

No caso concreto da problemática em questão, para que a perspetiva da escola inclusiva possa ser

adotada por todos com êxito, torna-se necessário o envolvimento de todos os professores da escola,

pois concordando com Campos (1996) É uma mudança radical, relativamente à perspectiva

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 78

tradicional, que tem reforçado a ideia de que as crianças com necessidades especiais são da

responsabilidade de especialistas (Campos, 1996:41). Tal como a revisão bibliográfica refere, e o

nosso testemunho pessoal – pela prática pedagógica – confirma, o simples facto de uma criança

com NEE estar matriculada e frequentar a sala de aula do ensino regular, por si só não garante, que

se aderiu à mudança e está feita a inclusão. Esta, como temos estado a constatar, pressupõe

mudanças valorativas e atitudinais profundas e envolve transformações dos padrões curriculares da

escola, que convencionalmente tende a reificar os estigmas associados às pessoas com deficiência.

A mudança, pode parecer difícil, mas não é impossível. Ainscow (1997), dá-nos o seu contributo,

formulando seis “condições”, a partir de um conjunto de escolas que fizeram progressos

consideráveis em direção a políticas inclusivas:

• Envolvimento de toda a comunidade educativa nas orientações e decisões da escola.

• Compromisso relativo a planificação realizada colaborativamente.

• Estratégias de colaboração.

• Focalização da atenção nos benefícios potenciais da investigação e da reflexão.

• Política de valorização profissional de toda a equipa educativa.

• Liderança eficaz.

Baseando-nos no que acabamos de referir, não podemos ignorar que, para que se operem mudanças

contributivas no sentido de construir uma verdadeira escola inclusiva, é fundamental uma força

motriz humana com perfil e papel bem definido. Não vamos problematizar aqui a questão das

lideranças e dos gestores escolares (nem a redefinição dos seus papéis, à luz das últimas reformas

educativas), pois não é esse o nosso objetivo; mas também não poderíamos falar em escola

inclusiva, sem que – ainda que brevemente – realçássemos o contributo positivo de uma eficaz

liderança na construção desta escola.

A este propósito lembramos a afirmação de Porter (1994): A liderança administrativa é uma das

condições essenciais do sucesso de um programa educativo inclusivo (Porter,1994f:39).

Efetivamente, o papel das lideranças nesta perspetiva, com qualidade, inovadora e aberta a todos é

amplamente valorizado pelos vários autores. Reforçamos a nossa opinião transcrevendo a posição

firme de Campos (1996) quando afirma que a liderança é talvez o factor central do funcionamento

das escolas” e chega mesmo a acrescentar: As escolas que têm lideres funcionam, as que não têm

líderes não funcionam (Campos, 1996:22).

As perspetivas teóricas, mais recentes, de liderança e de escola, procuram cada vez mais,

fundamentos em domínios como os da antropologia cultural e correntes internacionalistas e

cognitivas (Sanches, 1996). Isto faz todo o sentido na medida em que a escola é cada vez mais “um

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 79

espaço de convivência intercultural”. Assim, podemos falar em “líder intercultural”, a quem

compete liderar uma escola, sentida como comunidade. Este líder, tem a difícil tarefa de superar as

antinomias derivadas de uma liderança cultural centrada na gestão de uma cultura organizacional

forte e coesa versus liderança de culturas multifacetadas (Sanches, 1996).

Nesta aceitação de escola, como espaço de valores plurais, com uma dimensão expressiva e

multicultural, parece-nos que a aceção de “líder intercultural” é aquela que melhor se adapta e que

sem dúvida é essencial à escola inclusiva que quase todos desejamos, pois ser líder intercultural

significa ter sempre presente as questões da equidade, de exclusão sócio-cultural e de

solidariedade (Sanches, 1996:27).

Nesta perspetiva, liderar uma escola, significa educar para a autonomia e para o exercício da

reflexividade crítica; contudo, embora atualmente se fale muito de educação inter/multicultural,

cremos que pouco se diz sobre liderança educativa intercultural.

4.4 Escola inclusiva e multiculturalidade

Afirmar que a nossa sociedade é marcada por uma diversidade cultural, significa reconhecer a

pluralidade de grupos sociais, étnicos e culturais que a compõem. Basta olharmos à nossa volta

para nos apercebermos que a sociedade em que vivemos é multicultural: há pessoas com a pele

mais branca, outras com a pele mais escura; os hábitos de vida são muito variados; as

manifestações religiosas, rituais culturais e outras características de alguns grupos são bastante

distintos de outros; os hábitos alimentares e as tradições culinárias são diversos (Serra, 2002).

Reconhecer que paralelamente a esta diversidade cultural existe uma outra diversidade: de género,

de capacidade orgânica ou funcional, ou de reação às situações de aprendizagem, significa que

temos de estar duplamente preparados para lidar com a diversidade. E se, face à diversidade

cultural, a proposta é a educação intercultural, face ao segundo grupo de diversidade acima

referido, a proposta é a educação/escola inclusiva. Os dois conceitos – interculturalidade e

inclusividade – não se excluem; da sua deliberada aproximação aqui feita, espera-se resulte uma

fecundação mútua (Campos, 1996:30).

Esta nova visão sobre educação e sobre o ser humano, num sentido mais abrangente – em que todo

o contexto existencial do aluno é considerado – não pode ser vista como um “fenómeno” isolado.

Evocamos a teoria ecológica de Bronefenbrenner (1979, 1996) que proporciona a compreensão de

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 80

vários sistemas de influência, desde os mais distantes até aos mais próximos, que acabam por

formar o contexto ecológico do sujeito (Bronefenbrenner, 1996).

De facto, não nos podemos esquecer que até um passado relativamente recente, o (in)sucesso do

aluno era da responsabilidade exclusiva deste (questionava-se então a sua carga genética…). Hoje,

pelo contrário tudo se questiona: as condições sociais das famílias, a escola e os conteúdos

manifestos e latentes ou inconscientes do ensino. Assim, a organização do ensino recebe

forçosamente influência dos fenómenos sociais mais vastos e abrangentes e o sistema escolar é

posto em causa:

– por razões objetivas de mau rendimento, sobretudo repetências e fracassos nas

aprendizagens fundamentais;

– pelos pais dos alunos, que se encontram frequentemente preocupados. A fadiga, a

instabilidade, o excesso de trabalho das crianças e dos pais, são denunciadas pelos

encarregados de educação, bem como casos de orientação que não conseguem corrigir

os efeitos das desvantagens sócio – económicas e culturais;

– pelos alunos, oriundos dos mais diversos meios socioculturais, para quem a escola não

é a única forma do saber. A evolução das suas relações com o mundo envolvente torna

cada vez menos aceitáveis atitudes tradicionalistas de autoridade, por vezes praticadas;

– pelos professores, cujo estatuto se desvaloriza e a quem são cada vez acometidas mais

responsabilidades.

– pelos psicólogos, psiquiatras e sociólogos que denunciam todo um rol de carências, seja

a nível pessoal, social ou escolar.

Face aos problemas e dificuldades com que se defronta a escola, e à urgência de agir que é exigida

aos professores, torna-se cada vez mais difícil a estes, terem uma prática pedagógica adequada, que

respeite as diferentes formas de olhar e trabalhar com o “outro” no processo de ensino –

aprendizagem. Em teoria diz-se que todas as crianças devem ter a mesma igualdade de

oportunidades. Contudo, A observância do princípio da igualdade de oportunidades, obriga os

sistemas político-sociais e, nomeadamente o sistemas educativos, a rever as suas atitudes e a sua

organização, de forma a respeitar toda e qualquer diversidade, individual e colectivamente

considerada (Serra, 2002:84).

Mas a observância deste princípio não parece muito clara e há quem a este propósito teça algumas

advertências; Cardoso (2002), diz-nos que: A preocupação com a realização das escolas de massa,

(…) em Portugal, fez com que o conceito de igualdade de oportunidades tenha estado demasiado

circunscrito ao acesso de todos ao sistema educativo, com pouca ou nenhuma consideração pela

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 81

igualdade de circunstâncias com que nele participa a diversidade pessoal, social e étnica dos

alunos e pelo impacto social resultante dessa participação (Cit. por Serra, 2002:84).

Defende-se ainda que ninguém, seja qual for a sua condição sócio-económica, política, cultural ou

religiosa pode ser prejudicado no que diz respeito ao acesso e aos meios necessários para conseguir

beneficiar das competências essenciais impostas pela sociedade. À sociedade em geral e à escola

em particular compete fazer cumprir este preceito, dando ao aluno a possibilidade de ser ele

mesmo, nas suas origens e na sua essência. Nessa medida, o professor não pode centrar a sua

atividade na quantidade de informação que o aluno possa recolher, mas sim na tentativa de criar

uma relação pedagógica dialogante. Neste sentido, um primeira atitude será a de aceitar e valorizar

a cultura 17 do aluno e comunicar com ele utilizando a mesma “linguagem”. O primeiro passo nesse

domínio poderia ser o da integração dessa cultura com a da instituição e não com a imposição da

cultura padrão.

Tendo como referência o que acabamos de expor, podemos dizer que, as crianças ao chegarem à

escola levam com elas diferentes “bagagens socioculturais” que são previamente determinadas pelo

meio familiar. A este propósito Serra (2002), comenta: lado a lado, nas salas de aula, estão alunos

entre os quais há significativas discrepâncias causadas por possuírem diferentes níveis de

linguagem, diferentes apoios em livros e outros materiais escolares, ambientes familiares diversos

onde existe ou não estimulação e envolvimento potenciadores de desenvolvimento (Serra, 2002:85).

Lembramos a este propósito Pierre Bourdieu e Claude Passeron (1970) para quem os modelos

culturais qualitativamente distintos das diversas classes sociais colocam as crianças oriundas de

cada uma destas classes em relações desiguais com a cultura valorizada e transmitida pela

instituição escolar.

O professor consciente e responsável, como docente e como ser humano, não pode ficar alheio a

estas questões. Impõe-se, assim, uma reflexão já, mais do que generalizada: se a cada criança

corresponde uma realidade específica que em conjunto com a carga genética faz de cada um, um

ser diferente, a nova cultura humanista não pode fundar-se na hegemonia de nenhuma imagem do

homem, mas antes no génio da diferença. Recordemos então que é nesta corrente existencialista

que a escola inclusiva alicerça as suas bases. Neste sentido, nunca é demais lembrar que a proposta

da chamada “Escola Inclusiva”, pressupõe pensar sobre novas questões que se impõem como as

identidades minoritárias, os hibridismos culturais e as diversas facetas, do chamado

multiculturalismo. 17 Moreira e Canen (1999:14) alertam que para referir-se ao multiculturalismo é necessário ter clareza de que ao termo cultura pode ser dado vários significados; neste contexto a palavra cultura evoca, o conjunto de práticas por meios das quais significados são produzidos e compartilhados em um grupo.

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 82

Bairrão e outros autores, referindo Hallahan e Kauffman (1991) salientam a analogia entre situação

de “ensino integrado” e o “ensino multicultural” e realçam que Hoje, a educação multicultural é

decisiva em educação tendo em vista a sociedade em que vivemos (Bairrão, et. al.1998:35). Neste

novo modelo de escola aberta à diferença, tenta-se que as minorias encontrem uma resposta

adequada às suas necessidades, beneficiando todos os alunos em geral, por tudo o que traz a

mudança e a renovação e pelos recursos e serviços com que a escola pode contar.

A escola inclusiva, propõe, então, uma escola que possa atender às exigências da sua “clientela”,

possua ou não deficiências. Deste modo, o enfoque inclusivo pretende lidar com as necessidades

educativas temporárias ou permanentes dos alunos conceito que engloba, desde o relatório de

Warnock, todos os tipos e graus de dificuldades que se verificam em seguir o currículo escolar

(Rodrigues, 2001:19).

Estas dificuldades, como temos vindo a analisar não se situam só ao nível das deficiências, situam-

se também ao nível do contexto sócio cultural do aluno, que pode ser muito diferente do da escola.

Com a rápida massificação do ensino, e o facto de Portugal ser um país de acolhimento para

diferentes emigrantes, as escolas públicas, acolhem hoje populações cada vez mais heterogéneas, o

que transforma a escola numa instituição multicultural nas múltiplas dimensões da diversidade –

classe social, nacionalidade, língua, etnia e religião. Serra (2002), alerta-nos para o facto de que: A

escola portuguesa é uma escola multicultural onde se encontram crianças e adolescentes de muitas

origens, culturas, cores, nacionalidades e diferentes níveis culturais. Isto constitui um desafio para

uma urgente educação intercultural (Serra, 2002:243).

Nestes contextos multiculturais, com uma ampla diversidade de públicos, surgem novos e difíceis

desafios para os agentes educativos. Assim, no currículo desenvolvido nas escolas que se

pretendam inclusivas, devem ser travadas discussões pertinentes à formação das identidades numa

perspetiva dinâmica que encare os preconceitos e estereótipos como algo com múltiplas

representações e desdobramentos a serem questionados. Então, lidar com os “diferentes” na sala de

aula, significa necessariamente romper com as conceções estereotipadas sobre grupos

marginalizados. Mas não chega apenas tolerar. É que o problema de viver e conviver com o outro,

demarcado de uma matriz racional, tem o registo profundo dos afetos. Para haver de facto inclusão

é importante eu aceitar que a cultura do outro é tão importante como a minha e é necessário eu ter a

capacidade de ver no outro, diferente de mim, a continuação de mim, sentindo que o que se passa

com os outros também me diz respeito.

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

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Nesta perspetiva, o poeta afro–americano James Weldon Jonhson que cantou e denunciou a

exclusão do seu grupo étnico pode mostrar quão necessário é o olhar multicultural no processo de

construção da educação inclusiva:

Como nos aceitarias? Assim como somos?

Nosso olhar em êxtase preso a uma estrêla?

Ou estupefacto e vazio ante o desespero?

Ascendendo ou tombando? Homens ou coisas?

(Jonhson, 1989:93).

Neste sentido, a discussão sobre a multiculturalidade se torna tão necessária na educação escolar,

porque esta impõe inter–relações entre diversas culturas e os seus variados saberes, compreendendo

o palco da vida e o palco da escola, como instâncias carregadas de complexidades; assim a

abordagem multicultural em educação, procura articular pela via da interculturalidade, saberes e

conhecimentos que estão fragmentados e dispersos entre várias culturas maioritárias e minoritárias.

A este respeito, Cortesão (2001), (Cit. por Rodrigues, 2001), chama a atenção para o facto de um

conjunto de práticas contraditórias que por vezes coexistem em muitas salas de aula e que tanto

podem ajudar a promover a confiança e a auto – estima de todos os alunos, como podem contribuir

para marginalizar e inferiorizar grupos minoritários.

Em Portugal, a prática atenta às problemáticas interculturais está ainda a ser consolidada e como

refere Cortesão (Ibidem) é importante que estejamos atentos aos riscos que corremos aquando da

abordagem desta temática e se de facto não estaremos a contribuir para uma maior “guetização” e

marginalização dos alunos desses grupos minoritários (Cortesão, 2001; Op. Cit.). Numa tentativa

de prática educativa multicultural crítica, deve recorrer-se a dispositivos de diferenciação

pedagógica que contribuam para que os grupos com que se trabalha adquiram estatuto de cidadania

na sociedade dominante, sentindo-se cidadãos iguais de facto, com direito a uma vida de

participação e interferência na organização da nossa sociedade, sem que isso implique a destruição

da sua identidade e das suas raízes culturais, para que não assistamos a um risco de exclusão, pela

inclusão.

4.5 A importância do currículo na escola inclusiva

É já comummente aceite que as necessidades educativas formam um verdadeiro continuum a que a

escola se deve ir adaptando, admitindo a diferença como uma necessidade a que é preciso dar

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 84

resposta, numa linha integradora. Neste sentido, a diversidade das pessoas e das inserções culturais

e sócio-económicas conduz-nos obrigatoriamente a uma diversidade de currículos. Por esta razão,

como refere Campos (1996), a escola inclusiva não significa currículo único, mas sim diversidade

de currículos.

Este importante papel desempenhado pelo currículo na escola inclusiva é sobejamente relevado,

por vários autores, Pereira (1998), Correia (1999), Leite (2000), Rodrigues (2001) e Baptista

(2011). De uma forma simples sintetizaremos as suas opiniões, na afirmação que se segue: O

currículo escolar transformou-se no referente básico da educação especial (Manjón, 1997), (Cit.

por Rodrigues, 2001:53). Segundo Baptista (2011) Um currículo inclusivo visa o desenvolvimento

cognitivo, emocional e criativo da criança e baseia-se nos ´quatro pilares`para a Educação no

século XXI (Unesco, 2004, Ten questions on inclusive education): aprender a conhecer, a fazer, a

ser e a viver em comum (Baptista, 2011:87).

Antes de avançarmos, parece-nos agora, bastante oportuno apresentar a definição de currículo.

Rodrigues (2001), autor muito conceituado nesta área das Necessidades Educativas Especiais,

define-o como sendo todo o conjunto de experiências planeadas proporcionadas a um indivíduo ou

grupo, (…) com vista a melhorar a sua inclusão social e a sua qualidade de vida (Rodrigues,

2001:29). Este autor adverte para a necessidade de o currículo ser flexível e respeitar os princípios

da individualização e da funcionalidade.

Baptista (2011), alerta-nos a esse respeito que o termo curricular se reveste de alguma

ambiguidade; pois em sentido amplo abrange os conteúdos, os métodos de avaliação e a

aprendizagem. Em sentido restrito, refere-se apenas aos conteúdos. Rodrigues (2001), diz-nos

ainda que o currículo escolar entendido como todas as oportunidades de desenvolvimento e

aprendizagem que, formal ou informalmente, o aluno usufrui na escola é concebido dos valores e

das práticas emanadas de conceitos tão importantes como: educação, diferença e habilitação.

De facto o currículo é o ponto de convergência e de aplicação de toda a informação, metodologias,

oportunidades e intervenções habilitativas. Mas falar de currículo em educação, não é tão simples

como possa parecer. Basta recordarmo-nos da polémica de que se revestiu a “Reforma Curricular”.

No contexto desta polémica, Formosinho (1985) teceu duras críticas ao sistema, utilizando uma

terminologia como “currículo pronto a vestir tamanho único”. Foi para fazer face a esta rigidez de

currículo que se opõe claramente à flexibilização de currículo desejável para a escola inclusiva, que

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 85

surgiu o projeto de “Gestão flexível do currículo” 18 (Despacho N.º 9590/99, de 14 de maio) que

visa promover nas escolas do ensino básico, uma mudança gradual, com vista a melhorar a eficácia

da resposta educativa aos problemas surgidos da diversidade dos contextos escolares, fazer face à

falta de domínio de competências elementares por parte de muitos alunos sobretudo assegurar que

todos os alunos aprendam mais e de modo mais significativo.

Neste âmbito, o Dec.-Lei N.º6/2001, de 18 de janeiro (que define os princípios orientadores a que

deve obedecer a organização e a gestão do currículo no ensino básico) confere à escola liberdade

para adaptar a estrutura curricular nacional aos diferentes contextos locais, permitindo assim

respeitar a diversidade de alunos. Nesta perspetiva, a escola deve ser uma organização sistémica,

correspondendo a um quadro de referência que traduz os valores, intenções e necessidades dos

elementos que a constituem. Ao organizar-se e tentar encontrar respostas para os seus próprios

problemas está a dar um sentido próprio à melhoria educativa; com vista a cumprir a sua finalidade

básica: o sucesso escolar de todos os seus alunos. Neste contexto as adaptações curriculares são a

mais importante estratégia de intervenção na resposta às necessidades educativas especiais

(Bautista, 1997:15). Referindo esta estratégia de intervenção, Correia (1999), aponta três níveis de

concretização das adaptações curriculares:

1. O primeiro é realizado pelas escolas com base numa análise detalhada das suas

características, condições e possibilidades, interesses e expectativas dos seus clientes.

2. O segundo realiza-se ao nível da turma de acordo com o seu perfil (características sócio-

económicas e culturais dos alunos, o seu grau de motivação, as expectativas e interesses).

O professor deve considerar a presença de alunos com NEE e analisar as implicações

curriculares daí decorrentes.

3. O terceiro considera cada aluno individualmente, em termos de necessidades educativas.

Para tal, o professor deve recolher o máximo de informação do aluno, suas potencialidade

e necessidades, acedendo a todo o tipo de documentos que lhe possam facultar essa

informação e realizando avaliações diagnosticas e especializadas.

As adaptações individuais devem ser realizadas de acordo com as necessidades, potencialidades e

expectativas dos alunos e ter em consideração aspetos que a investigação e a prática têm posto em

destaque relativamente às incidências específicas de alguns défices (sensoriais, motores,

intelectuais, emocionais, de comportamento), nas aprendizagens escolares. Estas adaptações

18 Entende-se por gestão flexível do currículo a possibilidade de cada escola, dentro dos limites do currículo nacional, organizar e gerir autonomamente todo o processo de ensino/aprendizagem. Este processo deverá adequar-se às necessidades diferenciadas de cada contexto escolar, podendo contemplar a introdução no currículo de componentes locais e regionais (Departamento da Educação Básica, Ministério da Educação, Despacho n.º 9590/99 de 14 de Maio).

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 86

curriculares partem, segundo os vários autores, do PE que surge como um instrumento aglutinador

que mobiliza os diferentes elementos da comunidade educativa (…) inventariando os problemas e

os modos possíveis da sua resolução (Cadima, 1998:139); o docente de educação especial tem um

papel importante no levantamento de necessidades, das situações problemáticas que a escola

identifica na elaboração do seu PE, bem como das propostas de solução a desenvolver.

Atualmente, a maior diferenciação curricular para alunos com NEE, encontra-se prevista no Dec.-

Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro, especificamente no seu Artigo 16.º, alíneas b)Adequações

curriculares individuais e e)Currículo específico individual, sendo que é menos restritiva a primeira

(na medida em que não compromete as competências previstas para o ciclo de ensino que o aluno

frequenta) e mais específica a segunda pois, pressupõe alterações significativas no currículo

comum, podendo as mesmas traduzir-se na introdução, substituição e ou eliminação dos objectivos

e conteúdos, em função do nível de funcionalidade da criança ou jovem (Dec.-Lei n.º3/2008 de 7

de janeiro).

Importante esclarecer que apesar da terminologia “currículo funcional” ter sido substituído por

“currículo específico individual”, a verdade é que são as orientações que deles provêm que, ainda

hoje, norteiam as respostas curriculares alternativas a prestar a este tipo de populações.

Alternativas, deve entender-se aqui, como resposta diferenciada. Assumindo a importância que o

currículo desempenha neste contexto, Rodrigues (2001) diz-nos que: Três aspectos assumem uma

importância particular no desenvolvimento curricular de alunos com NEE: a selecção do modelo,

a diferenciação e a funcionalidade (Rodrigues, 2001:29). As necessidades de um currículo

funcional para alunos com deficiência intelectual acentuada, parece unanimemente aceite por todos

os autores; apoiamo-nos em Rodrigues, quando fazemos esta afirmação Os currículos funcionais

têm tido uma grande disseminação e a sua aplicação tem sido feita de uma forma quase

indiscutível (Op. Cit.:31).

4.6 O papel da ética nas políticas educativas duma escola inclusiva

A ética, palavra de origem grega (ethos através do latim mos), é uma das grandes áreas em que se

divide o pensar do ser humano desde os primórdios da filosofia, na Grécia Antiga. E desde essa

origem a ética teve uma íntima ligação com a política chegando mesmo a uma quase identificação

naquele momento da Antiguidade (Caeiro; 2008). É que a ética é um conceito eminentemente

ligado ao coletivo (ao social), seja esse coletivo a corporação (o caso das éticas profissionais), a

nação ou a humanidade (onde se colocam todas as questões dos direitos humanos).

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 87

Por sua vez, a política desdobra-se em conceitos que na sua essência remetem para o empenho na

realização do bem comum, do bem da coletividade ao qual se aplica como a um propósito final.

Partindo desta articulação, entendemos que não deveríamos desenvolver o nosso estudo, sem nos

determos no papel que a ética deve ocupar nas políticas de inclusão.

Assim, invocamos o artigo primeiro da Declaração dos Direitos do Homem (1948) que refere

“todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos”. O mesmo documento,

no seu preâmbulo, precisa “o reconhecimento da dignidade a todo o ser Humano e dos seus direitos

iguais para todos” e proclama como direitos fundamentais do homem a dignidade e o valor da

pessoa humana.

Nesta perspetiva, deve o profissional ter em conta os princípios aqui expressos e por consequência

desenvolver uma prática consentânea com o quadro da nova sociedade, mas também com as ideias

de coerência filosófica e ética do ser humano. Este sentido ético só se compreende se corresponder

à sua plena utilização ao serviço, não dos “indivíduos”, mas sim das pessoas, em especial das mais

vulneráveis. Ora, se considerarmos que a nossa prática profissional se desenvolve junto destes

grupos, melhor se compreende a necessidade de no nosso estudo, não passarmos ao lado dum ponto

tão importante quanto este.

A prática do professor, mormente do professor de educação especial, tem um carácter

necessariamente reflexivo, validado com uma forte componente ética, na interiorização e procura

de modelos de bem-estar para com os sujeitos da intervenção mediando de forma cidadã e

humanista as políticas sociais. Presentemente este ponto, parece-nos tanto mais relevante que na

sociedade atual, marcada pela globalização, a ética é chamada ao debate da nova questão social.

A crise económica e mundial que aniquila o mundo atual produz o aumento de problemas sociais

tanto a nível individual como coletivo, particularmente no que respeita aos grupos dos mais frágeis,

expondo também com maior visibilidade as desigualdades sociais relativas à exclusão social. Por

outro, lado o facto de termos cada vez mais acesso à informação, associado à ampla divulgação das

novas tendências humanistas conduz a que se assista cada vez com maior frequência, por parte dos

cidadãos, a atitudes que reclamam novos direitos como penhor ao bem-estar social. E é lícito,

parece-nos, que as sociedades evoluam nesse sentido.

Neste quadro, a intervenção do professor, e volta a insistir-se, especificamente do professor de

educação especial, tem toda a legitimidade. No primeiro caso, a sua matéria prima são seres em

devir e no segundo mantém-se a primeira circunstância e acumula-se com o facto de pertencerem

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 88

aos grupos mais vulneráveis. Por outro lado, a atuação docente desenvolve-se com uma

multiplicidade de agentes que integram o processo educativo do aluno. No caso do aluno com NEE

esta interdisciplinaridade acentua-se e foi já largamente referida como uma constante no Dec. -Lei

n.º 3/2008 de 7 de janeiro. Assim, as diferentes pessoas que neste contexto desenvolvem funções,

orientam-se segundo o princípio da interdisciplinaridade, onde, naturalmente se espera que presida

não apenas, a necessidade de responder às necessidades do aluno, mas também o código da ética.

No desempenho das suas funções o profissional está obrigado a refletir sobre e para agir. Este agir,

obriga ao cruzamento e gestão de um grande conjunto de informações em que têm de se articular

uma multiplicidade de fatores que obrigam - entre muitos outros procedimentos - à relação de

confiança, e ao sigilo profissional. Lembramos que o referido Dec.-Lei (n.º3/2008), no seu Art.º2.º

ao definir os princípio orientadores que prossegue a educação especial, remete para a

confidencialidade da informação toda a informação resultante da intervenção técnica e educativa

está sujeita aos limites constitucionais e legais, em especial os relativos à reserva da intimidade da

vida privada e familiar e ao tratamento automatizado, conexão, transmissão, utilização e proteção

de dados pessoais, sendo garantidos a sua confidencialidade (ponto 5); o artigo referido termina

dizendo expressamente: Estão vinculados ao dever do sigilo os membros da comunidade educativa

que tenham acesso à informação referida no ponto anterior (ponto 6). Enquanto elemento

integrante duas equipas multidisciplinares distintas, no âmbito das nossas funções profissionais,

conhecemos bem a importância destas recomendações, assim como a importância de um

comportamento ético para com os nossos alunos e suas famílias.

Se entendermos a ética como conjunto de princípios orientadores do agir humano, aceitamos que

para realizarmos uma reflexão ética, precisamos de compreender o Homem como sujeito racional

capaz de escolher valores e ações que conduzam à liberdade entendida como um bem. Na nossa

prática pedagógica, interiorizamos bem a ideia de que como pessoas e como profissionais compete-

nos estabelecer uma apreensão global do saber e da técnica a favor do homem, numa perspetiva

ética.

Contudo, a modernidade vive atualmente numa economia de mercado assente, supostamente, no

princípio geral da igualdade de direitos; no entanto, o problema surge quando as limitações

administrativas colocam restrições que se transformam em dilemas. Cada um de nós como

trabalhador social sofre dilemas, vive dilemas profissionais. As instituições em que as pessoas se

situam têm uma política, uma cultura, que força os profissionais a inscrever as suas práticas no

interior do organismo sendo que, estes poderão, ou não, estar de acordo com o que aí se perfilha.

Poderá daqui resultar um conflito para a resolução do qual a sabedoria prática (phronesis), tão

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 89

divulgada pelo senso popular, a prudência e a virtude serão de um valor inestimável. Todos nós em

algum momento precisamos de encarnar a importante (neste contexto) personagem mítica

“Antígona”19, questionando-nos: “Como devo agir”?

Sabemos, por experiência própria que a ética não é via de dois caminhos e trilhar um caminho ético

pode ser difícil. Sobretudo situando-nos na tendência atual em que tudo se relativiza, torna-se mais

fácil viver ao abrigo dos códigos deontológicos do que das teorias éticas. Lembremo-nos que numa

perspetiva ética, o fim da ação é o que determina todo o agir, e o fim último, o mais importante é a

felicidade, aqui associada ao bem e à virtude. Nesta abordagem, não poderíamos ignorar o grande

filósofo Aristóteles. Entendia ele que, todos os homens se devem reger por esta finalidade e que

nos atos humanos devemos agir de modo a não prejudicar os outros, numa perspetiva ética e

comunicativa.

Então, nas práticas profissionais é importante acreditar no princípio do diálogo: Nem todas as

necessidades resultam em conflitos e nem todas as opiniões têm de provocar desavenças (Cunha,

1996). Isto é tanto mais importante porque não podemos ignorar que estando a escola centrada no

movimento do mundo encontra-se diretamente confrontada com as preocupações éticas que hoje

atravessam as sociedades e os indivíduos, não sendo – tal como nas outras instituições - o seu êxito

possível à margem da ética. Assim, todos estaremos de acordo se dissermos que um docente mais

ético será certamente um melhor cientista e um melhor pedagogo.

Remetendo esta reflexão para as funções específicas do docente e a sua missão enquanto educador,

este deve, não apenas trilhar um caminho ético, mas assumir a formação ética dos alunos, na

medida em que a escola tem a responsabilidade de construir a autonomia do sujeito. Referimos a

propósito, o professor Cassiano Reimão (2000): Os docentes como profissionais são sujeitos

morais que realizam a ética como referência responsável e modelos de equilíbrio transformador.

No mesmo contexto, o autor (2000) acrescenta que A profissionalidade, o sentido social e a

humanidade, serão as três “virtudes” nucleares que integrarão a ética do docente (Cit. por Brito

2005:54). A sua prática, diz, será assente em premissas como, dedicação e competência,

compromisso e responsabilidade, prática da justiça, recusa da banalização da vida. O seu

compromisso é ajudar os outros a viver com dignidade a sua humanidade, em ordem à construção

de um modelo de vida pessoal.

19 Antígona, figura da mitologia grega, do dramaturgo Sófocles, representa entre outros, ideais humanitários como justiça, piedade, leis eternas.

Capítulo IV Caminhos para a Inclusão

© Fernanda Cardoso (2015) 90

Num momento em que a tecnologia tem instrumentalizado cada vez mais o ser humano, em que a

globalização submerge a humanidade, em que apenas somos números que não temos rosto, impõe-

se cada vez mais uma postura crítica que se insurja contra esta visão, atualmente tão divulgada de

“homem - objeto”.

Nesta crise de sentido, justifica-se cada vez mais a necessidade da ética, que nos aponte uma

direção, um sentido que nos ajude a apreender a técnica e o saber a favor do homem, de modo a

que, cada um encontre as suas próprias respostas para um percurso existencial autêntico, ético,

definindo a sua identidade e autonomia. Na sociedade atual, nos nossos contextos pessoais e

profissionais, torna-se urgente revisitar a herança do grande pensador Aristóteles e tomarmos

decisões numa perspetiva ética, dirigindo-nos ao alcance de uma vida boa com e para os outros nas

instituições justas. Especificamente ao docente exige-se competência que lhe permita responder

com eficácia de resposta às solicitações do aluno e da sociedade; contudo, entendemos que o

profissional, embora devendo caminhar nessa direção, deverá fazê-lo mas sem renegar a sua

autoridade profissional.

Por fim, gostaríamos de refletir que para bem da Humanidade, revela-se importante que as

Instituições, sejam lideradas por pessoas virtuosas, de sabedoria prática, de phronesis; que saibam

liderar corretamente, sabendo o que é bom e o que convém à natureza humana em cada

circunstância. Conhecendo, como já vimos anteriormente, o importante papel que as lideranças

detêm na construção de uma escola para todos, compreenderemos a acrescida importância de que,

essa mesma escola, seja liderada por alguém íntegro que perfilhe na teoria e na prática valores

autênticos de respeito pela individualidade de todos e de cada um.

Uma liderança eficaz deve favorecer o desenvolvimento da ética individual em articulação com a

ética coletiva. Basicamente deve ter a capacidade de provocar nos seus colaboradores a adesão a

um projeto pelo qual vale a pena lutar, favorecer a participação na tomada de decisões, aprovar ou

reprovar as condutas avaliando constantemente, sempre orientado por princípios éticos.

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 91

Capítulo V – A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

A deficiência é uma de entre todas as possibilidades do ser humano, portanto, deve ser

considerada, mesmo se as suas causas e consequências se modificam, como um factor

natural que nós mostramos e de que falamos do mesmo modo que o fazemos em relação a

todas a outras potencialidades humanas (Unesco, 1977).

A deficiência é como todos sabemos, algo que, afetando profundamente o homem na sua dimensão

individual e social, não reduz a sua dimensão humana e por isso há que reclamar em nome dos

direitos do Homem, o direito à diferença.

Este direito – como temos estado a constatar – está já adquirido (pelo menos em teoria) assim como

está, também já definido o quadro de direitos/valores em que decorre a condição do cidadão com

deficiência. Ultrapassado isso, façamos agora, ainda que de relance, uma abordagem, sobre o

conceito de deficiência.

5.1 Conceito de deficiência

A revisão bibliográfica diz-nos que não é fácil apresentar um conceito, porque depende do critério,

pelo qual analisemos “a deficiência”; critério sócio-cultural, educativo, físico?

Optamos por nos apoiar em Vieira (1996) para apresentarmos uma definição. Este autor, baseando-

se na definição da Organização Mundial de Saúde - OMS - (1980), diz-nos que a deficiência é uma

perturbação ao nível do funcionamento de um órgão resultante de uma doença que o afetou e que

gera incapacidade nos desempenhos funcionais da pessoa, deixando-a em desvantagem nas suas

relações com o meio físico e social que a envolve; mas que pode ser reduzida com o auxílio de

meios adequados. No contexto educativo, estes “meios adequados” traduzem-se nas respostas que a

escola deve dar, a estes cidadãos.

Remetendo-nos agora, especificamente, para o contexto escolar, parece-nos oportuno referir um

conceito, que nos parece completo, de criança com deficiência. Moita (1993:14), citando Kirk’s

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 92

(1972), diz-nos que a definição de “criança deficiente” mais aceite internacionalmente é a seguinte:

“A criança deficiente é a criança que se desvia da média ou das crianças normais em:

– Características mentais

– Aptidões sensoriais

– Características neuromusculares e corporais

– Comportamento emocional e social

– Aptidões de comunicação

– Multi-deficiência

até ao ponto de justificar e requerer a modificação das práticas educacionais ou a criação de

educação especial no sentido de desenvolver ao máximo as suas capacidades (Moita,1993:14).

Como já tivemos oportunidade de constatar, em termos educativos, o conceito de deficiência tem

vindo a ser substituído pelo conceito de NEE, aceitando que, há uma necessidade educativa

especial quando uma deficiência (física, sensorial, intelectual, emocional, social ou qualquer

combinação destas) afeta a aprendizagem até ao ponto de serem necessários alguns ou todos os

acessos especiais ao currículo (Vieira, 1996).

5.1.1 Definição de deficiência mental

A evolução histórica do conceito de deficiência mental (DM), demonstrou que as suas definições

foram consideravelmente influenciadas por exigências sociais, culturais, políticas e

administrativas. Certo é que a definição da DM permanece controversa, apesar dos progressos

notáveis nos conhecimentos teóricos e nas práticas reabilitativas verificadas nas últimas décadas.

De acordo com Domingo e Valença (1997), (Cit. por Bautista, 1997), a DM é definida

fundamentalmente pelas correntes seguintes:

- Corrente Psicológica ou Psicométrica

Segundo esta corrente, é deficiente mental todo o indivíduo que apresenta um défice ou

diminuição das suas capacidades intelectuais (medida através de testes e expressa em termos de

Q.I.). Os principais impulsionadores desta corrente foram Binet e Simon.

- Corrente Sociológica ou Social

Esta corrente defende que o deficiente mental é aquele que apresenta, em maior ou menor medida,

dificuldades para se adaptar ao meio social em que vive e levar a cabo uma vida autónoma.

- Corrente Médica ou Biológica

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 93

De acordo com esta corrente, a deficiência mental teria um substrato biológico, anatómico ou

fisiológico e manifestar-se-ia durante o desenvolvimento (até aos 18 anos). Para Lafon (Cit. por

Bautista, 1997:210). A debilidade mental é a deficiência congénita ou precocemente adquirida da

Inteligência .

- Corrente Comportamentalista

Esta corrente põe a sua tónica na influência do ambiente sobre a DM. O défice mental é um défice

de comportamento que deverá ser interpretado como produto da interação dos quatro fatores

determinantes (fatores biológicos passados; fatores biológicos atuais; história anterior de interação

com o meio e condições ambientais presentes ou outras situações atuais).

- Corrente Pedagógica.

Esta corrente defende que o deficiente mental será o indivíduo que tem uma maior ou menor

dificuldade em seguir o processo regular de aprendizagem e por isso tem necessidades educativas

especiais, ou seja, necessita de apoios e adaptações curriculares que lhe permitam seguir o

processo regular do ensino.

Ainda segundo Domingo e Valença (1997), (Cit. por Bautista, 1997), as primeiras três correntes

aqui expostas são as mais aceites pelos diversos autores. Com base nestas, a Associação

Americana para a Deficiência Mental (AADM), apresentou em 1992, uma definição que é

atualmente a mais conceituada e segundo a qual: Deficiência mental refere-se a limitações

substanciais na funcionalidade presente. É caracterizada por um funcionamento intelectual

significativamente abaixo da média, que é concomitante com limitações em duas ou mais das

seguintes áreas das competências adaptativas: comunicação, autonomia pessoal, autonomia em

casa, competências sociais, auto-direcção, saúde e segurança, funcionamento académico, lazer e

emprego. A deficiência manifesta-se antes dos 18 anos (Reis.1999:23).

Esta nova classificação de DM, proposta pela AADM (1992), baseia-se num ponto de vista

multidimensional – requer que se descreva a pessoa com DM de um modo compreensivo e global

– e engloba três passos. É o chamado “O processo dos três passos” (Alonso, 2001), (Cit. por

Bautista, 1997):

1.º - Diagnóstico da DM (Engloba os pressupostos. É o momento do diagnóstico da

Deficiência Mental e determina a elegibilidade dos apoios).

2.º - Classificação e Descrição (identifica áreas fortes e as áreas fracas, bem como as

necessidades de apoio).

3.º - Perfil e intensidades de apoio necessários (identifica o tipo e a intensidade dos apoios

necessários para cada uma das quatro dimensões seguintes:

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 94

Na identificação de crianças com DM dá-se assim atenção a duas áreas: o funcionamento

intelectual e os comportamentos adaptativos. O funcionamento intelectual está relacionado com as

áreas académicas; a capacidade de um indivíduo resolver problemas e acumular conhecimentos e

que é medido pelos testes de inteligência. O comportamento adaptativo prende-se com as

capacidades necessárias para um indivíduo se adaptar e interagir no seu ambiente de acordo com o

seu grupo etário e cultural. Este, é hoje designado - no contexto de educação especial - como

“Perfil de funcionalidade”.

No entanto, e apesar da evolução positiva acerca do conceito de DM, os critérios da sua definição

permanecem discutíveis pelas implicações determinantes do carácter estigmatizante das

classificações. Neste âmbito parece certo que um dos objetos de estudo mais polémicos da

investigação tem sido a questão da avaliação da inteligência. Neste sentido, e de acordo com Pedro

Morato (1995) a perspetiva de classificação da Deficiência Mental (AADM), deve considerar-se

clássica uma vez que se mantém fundamentada essencialmente na perspetiva psicométrica da

inteligência (ainda que sucessivamente revista e melhorada).

Em resumo, a designação de DM estabelecida em 1992 pela AADM é hoje em dia –

indiscutivelmente – a melhor e mais completa e apresenta aspetos inovadores que implicam a

adoção de práticas pedagógicas coerentes por parte dos pais e educadores.

5.1.2 Diagnóstico

A bibliografia consultada no âmbito das NEE sublinha a importância de um bom diagnóstico,

rigoroso e válido, Vieira (1996), Contreras (1997), (Cit. por Bautista, 1997), Reis (1999) e Verdugo

(2001). No entanto, o diagnóstico na DM continua – apesar de ser objeto de estudos e preocupações

– a ser um problema; sobretudo pela dificuldade em diagnosticar uma deficiência que é

caracterizada, entre outras coisas, pela falta de uma sintomatologia específica, tanto mais difícil de

detetar, tanto mais jovem é a criança. De acordo com Reis (1999) em muitos casos, quando o atraso

mental é muito ligeiro, o diagnóstico é feito nas idades pré – escolar ou escolar, quando a criança

falha na psicomotricidade, no desenvolvimento percetivo motor, na criatividade, na expressão

gráfica, no jogo, à medida que vai havendo uma maior exigência nos processos de raciocínio

abstrato.

Não obstante toda a problemática do diagnóstico, este é necessário, para facilitar a intervenção

pedagógica; pois quanto mais tarde se puserem em prática programas de intervenção pedagógica,

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 95

tanto maior será a extensão da deficiência em questão. De acordo com Alonso (2001) um

diagnóstico válido de atraso mental deve basear-se em três critérios (em nossa opinião, baseados na

definição de DM que anteriormente apresentámos - confirmar):

1. Nível de funcionamento intelectual

Este deve ser determinado por um profissional qualificado e com experiência de trabalho com

pessoas com atraso mental, que deve realizar um exame psicológico da inteligência conceptual do

indivíduo. Em alguns casos pode ser necessária uma avaliação interdisciplinar. O funcionamento

intelectual do indivíduo é aproximadamente 70 a 75 de Q.I. ou menor.

2. Nível de competências adaptativas.

O termo “competências adaptativas” veio substituir o termo “comportamento adaptativo”. Dizia-se

que o indivíduo deve também apresentar um défice no seu comportamento adaptativo em

simultâneo com o défice intelectual. Neste sentido propõem-se dez áreas de competências

adaptativas: comunicação, independência pessoal, vida diária, capacidades sociais, utilização da

comunidade, autonomia, saúde e segurança, capacidades académicas funcionais, tempo livre e

trabalho. O diagnóstico deve referir que existem limitações significativas em duas ou mais áreas de

capacidades adaptativas.

3. Idade cronológica do aparecimento

A idade de aparecimento é inferior aos 18 anos.

Pese embora o facto de o diagnóstico da DM ainda ser um problema, parece não haver dúvidas que

a sua aplicação implica quatro pressupostos (Vieira, 1996):

1 – Uma avaliação válida tem em conta a diversidade cultural e linguística e também as

diferentes capacidades de comunicação e fatores de comportamento.

2 – As limitações no comportamento adaptativo ocorrem nos contextos e ambientes sociais

que são típicos para os colegas da mesma idade do indivíduo. Estas limitações formam o índice das

necessidades individuais de apoio.

3 – As limitações específicas em algumas capacidades de adaptação coexistem muitas

vezes com outras capacidades por vezes bastante desenvolvidas.

4 – Com os apoios adequados, durante o tempo necessário, o funcionamento da pessoa

com deficiência mental será, no geral melhorado.

No plano pedagógico, importa entre outras, reter as ideias, que:

- Qualquer diagnóstico deve ser sempre formulado como diagnóstico conjetural e de caráter

provisório;

- Os diagnósticos devem ser regularmente verificados depois de terem sido tomadas

medidas intensivas de estimulação;

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 96

- Em nenhum caso se deve considerar um diagnóstico de incapacidade de instrução ou de

educação, como se se pudesse definir um limite inferior para a capacidade de

educação.

- Um diagnóstico claro é um bom ponto de partida para ações pedagógicas interventivas,

nomeadamente, medidas pedagógicas especiais.

É também muito importante lembrar que muitas vezes, a DM aparece associada a outro tipo de

deficiência e pode ser consequência desta, sendo portanto muito importante a avaliação da criança

por parte de uma equipa multidisciplinar, apta a detetar os vários problemas do desenvolvimento

da criança. No caso de não haver dúvida e efetivamente a DM ser diagnosticada, é muito

importante a avaliação da criança (por parte da equipa multidisciplinar) no seu contexto familiar, a

fim de avaliar as causas possíveis e estabelecer um programa de intervenção/estimulação e apoio

familiar.

5.1.3 Etiologia

A DM pode ter diversas etiologias e infelizmente algumas delas ainda não estão identificadas;

contudo, poderemos com base nas leituras efetuadas, mas seguindo de forma mais próxima

Pacheco e Valencia (1997), citados em Bautista (1997), fundamentalmente, classificá-las da

seguinte forma:

1. Fatores genéticos (Intrínsecos);

2. Fatores ambientais (Extrínsecos); e

3. Fatores de causa desconhecida ou mista

1 – Fatores genéticos

Estes fatores atuam antes da gestação. A origem da deficiência está determinada por uma herança

genética. São fatores do tipo endógeno e os dois tipos mais conhecidos são:

a) Genopatias – Alterações genéticas que produzem: síndrome de Rett, síndrome de Prader –

Willi, Hidrocefalia, Espinha Bífida (e outros…).

b) Cromossomopatias – Anomalias ou alterações nos cromossomas. Podem causar:

Trimossomia 21, Trimossomia 18, Trimossomia 13 (e outras alterações como: síndrome

do Grito do Gato, Klinefelter…).

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 97

2 - Fatores Ambientais

São fatores do tipo exógeno.

Nestes fatores, as causas podem ser Biológicas ou Psico – sociais afetivas.

Dos fatores biológicos, faz-se a classificação que a seguir se apresenta, respeitando a

ordem cronológica em que eles podem acontecer:

a) Fatores pré-natais

- Atuam antes do nascimento e podem ser infeções, ingestão de substâncias

potencialmente perigosas, exposição a radiações, perturbações psíquicas ou

perturbações da tiróide.

b) Fatores peri-natais

- Estes fatores atuam imediatamente antes, durante ou após o parto – primeira semana

de vida. Alguns dos mais comuns são: prematuridade, anoxia, gravidez múltipla, idade

da mãe e traumatismo obstétrico.

c) Fatores pós – natais

- Eis alguns deles: lesões cerebrais, hidrocefalia, convulsões febris, anoxia (paragem

cardíaca…), intoxicações e fatores ambientais.

Fatores sócio afetivos

Hoje em dia não existe qualquer dúvida que os fatores sócio - económicos desfavoráveis,

favorecem o aparecimento do atraso mental. Contudo, muitas vezes é difícil estabelecer uma

relação causa – efeito, devido aos múltiplos fatores adversos.

As investigações provam que a falta de estímulos afetivos (seja por negligência,

internamentos hospitalares ou ausência de figuras parentais) pode afetar seriamente o

desenvolvimento intelectual da criança.

Fatores de causa desconhecida ou mista

Estes fatores constituem ainda hoje, motivo de estudo por parte de um grande número de

especialistas, mas apesar de todos os progressos a nível de investigação, muitas questões

estão ainda sem resposta.

Respeitante a esta problemática Reis (1991), afirma Se definir a deficiência mental é

difícil, classificar as suas causas não é mais fácil (Reis, 1991: 31).

Fazendo um comentário às tendências atuais relativamente à etiologia da DM, dir-se-á

que de alguma forma se pode diminuir o número de pessoas afetadas por este sintoma.

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 98

Para tanto são fundamentais, cuidados ao nível de:

- Prevenção genética;

- Melhoria dos cuidados obstétricos e neonatais;

- Diagnósticos pré – natais;

- Aconselhamento e planeamento familiar;

- Melhoria das condições sócio-económicas das famílias mais desfavorecidas;

- Intervenção educativa o mais precoce possível no caso em que haja suspeitas.

5.2 Graus de deficiência mental e características de cada grupo

Embora existam diferentes correntes para determinar o grau de Deficiência Mental, são as técnicas

psicométricas que mais se impõem, utilizando o Q.I. (Quociente Intelectual) para classificação

desse grau. O conceito de Q.I. é o resultado da multiplicação por cem do quociente obtido pela

divisão da I. M. (Idade Mental) pela I.C. (Idade Cronológica).

Em função do exposto, a AADM (Cit. por Morato, 1995:1) apresenta uma proposta, onde os níveis

de deficiência ou de comportamento deficitário se podem escalonar em função duma

correspondência entre o critério psicométrico e adaptativo.

Quadro 5: Níveis de deficiência ou de comportamento deficitário

Comportamento

adaptativo

Q.I.

Níveis

Ligeiro

Moderado

Grave

Profundo

Q.I. (Stanford – Binet e

Cattel)

(s. d. 16)

67-52

51-36

35-20

19-<19

Q.I. (Wechesler)

(s. d. 15)

69-50

54-40

39-25

24-<24

Fonte: Morato (1995) Adaptado

É importante referir que a abordagem psicométrica da inteligência continua a ser controversa e

motivo de extensa investigação. Inclusive há autores que consideram um outro nível que neste

quadro estaria em primeiro lugar, pois antecede todos os outros. Estamos a falar da:

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 99

Deficiência limite ou de bordeline

Este grupo foi recentemente introduzido nesta classificação e ainda não há consenso entre os

diferentes autores sobre se deverá ou não fazer parte dela.

De facto, não se pode dizer que sejam deficientes mentais, já que são crianças com muitas

possibilidades, manifestando apenas um atraso nas aprendizagens ou algumas dificuldades

concretas. Muitos dos indivíduos provenientes de ambientes socioculturais desfavorecidos

poderiam aqui ser incluídos.

- Deficiência mental ligeira

Neste grupo está incluída uma grande maioria de pessoas com deficiência que, não são claramente

deficientes mentais, mas pessoas com problemas de origem cultural, familiar ou ambiental.

Podem desenvolver aprendizagens sociais e de comunicação e têm capacidade para se adaptar e

integrar no mundo laboral. Apresentam um atraso mínimo nas áreas percetivas e motoras. Surgem,

também, algumas alterações ao nível da motricidade fina.

É na escola onde geralmente são detetadas as suas limitações intelectuais, porque apresentam

geralmente dificuldades de aprendizagem das técnicas instrumentais, mas podem chegar a alcançar

um nível escolar equivalente ao 1.º CEB.

Normalmente, não apresentam problemas de adaptação ao ambiente familiar e social.

- Deficiência mental moderada ou média

Podem adquirir hábitos de autonomia pessoal e social, tendo maiores dificuldades para os últimos.

Podem aprender a comunicar pela linguagem verbal, mas apresentam frequentemente dificuldades

na expressão oral e na compreensão dos convencionalismos sociais. Apresentam um razoável

desenvolvimento motor e têm capacidade para adquirir alguns conhecimentos pré – tecnológicos

básicos que lhes permitem realizar algum trabalho. Dificilmente chegam a dominar as técnicas

instrumentais de leitura, escrita e cálculo.

- Deficiência mental grave

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 100

Necessitam, geralmente, de proteção ou ajuda, pois o seu nível de autonomia tanto social, como

pessoal, é muito pobre. Apresentam muitas vezes problemas psicomotores importantes. Poderão

aprender algum sistema de comunicação, mas a sua linguagem verbal será sempre muito

deficitária. Podem ser treinados em algumas atividades da vida diária básicas e em aprendizagens

pré – tecnológicas muito simples.

- Deficiência mental profunda

Este grupo apresenta grandes problemas sensório – motores e de comunicação no relacionamento

com o meio. São dependentes dos outros em quase todas as funções pois as suas limitações físicos

e intelectuais são gravíssimos. Excecionalmente terão autonomia para se deslocar e responder a

treinos simples de auto – ajuda.

De uma forma complementar, será importante referir que, hoje, não faz sentido, atribuir a uma

pessoa um nível determinado segundo uma escala rígida, uma vez que a importância é dada à

forma como cada pessoa se adapta às condições de vida e às exigências do seu meio social.

Mais do que classificar as pessoas, interessa identificar os apoios de que elas necessitam para

melhorarem a sua forma de vida. De acordo com este pressuposto a AAMR (Luckasson et. al., Cit.

por Hallahan e Kauffman, 1997), apresenta os seguintes níveis de apoio:

Intermitente (Apoio apenas quando necessário, episódico);

- Limitado (Apoio durante um período de tempo determinado, para realizar uma tarefa

específica);

- Moderado (Apoio regular em alguns ambientes e sem prazo determinado);

- Difusivo (Apoio constante de alta densidade, em vários ambientes, mais intrusivo que

os anteriores).

5.3 Características evolutivas da deficiência mental e implicações educativas

Podemos considerar que a evolução global da pessoa com Deficiência Mental se processa segundo

as mesmas etapas consideradas normais no desenvolvimento e evolução de qualquer outra pessoa:

- Sensoriomotora

- Operações concretas

- Operações formais

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 101

Tal como em qualquer outro indivíduo, neste, o comportamento pessoal e social é muito variável e

não se pode, portanto, falar de características iguais em todos os indivíduos com DM.

Contudo, através de alguns estudos experimentais, foi demonstrada a existência de algumas

características que distinguem as pessoas com DM, das outras. Estas características diferenciadas

devem ser tidas em conta, pois qualquer programa educativo será condicionado por elas e se elas

forem ignoradas, podem, em muitos casos, ser um entrave para o desenvolvimento dessas crianças.

Quiroga (Cit. por Bautista, 1997), destaca como mais significativas as seguintes:

a) Físicas:

Falta de equilíbrio.

Dificuldades de locomoção.

Dificuldades de coordenação.

Dificuldades de manipulação.

b) Pessoais:

Ansiedade.

Falta de controlo.

Tendência para evitar situações de fracasso mais do que para procurar o êxito.

Possível existência de perturbações da personalidade.

Fraco controlo interior.

c) Sociais:

Atraso evolutivo em situações de jogo, lazer e atividade sexual.

Por sua vez, Sainz e Mayor (1989), (Cit. por Bautista, 1997), falam dos défices mais cognitivos nos

deficientes mentais, que segundo eles, serão:

Ativa

- Problemas de memória

Semântica

- Problemas de categorização

- Dificuldade na resolução de problemas

- Défice linguístico

- Problemas nas relações sociais

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 102

Uma outra característica a referir é que na fase, em que a criança começa a desenvolver a

linguagem, o atraso mental manifesta-se essencialmente por atraso na compreensão e expressão

verbal (Reis, 1999:30). Finalmente – seguindo o mesmo autor – lembramos que a criança com

atraso mental manifesta sempre uma lentidão na aquisição da independência nas Actividades da

Vida Diária (AVD): comer só, vestir-se e controlar os esfíncteres (Op. cit.:30).

5.3.1 Desenvolvimento da personalidade na pessoa com deficiência mental

Dottrens (1974c) define a personalidade como sendo o conjunto de caraterísticas que diferenciam

um ser humano dos seus semelhantes no plano da constituição, do temperamento, da inteligência,

do caráter, do comportamento (Dottrens, 1974c:31).

Embora, como vimos, a evolução global da pessoa com DM siga as mesmas pegadas das etapas

consideradas normais na evolução de qualquer outra pessoa, ao falar-se do desenvolvimento de um

deficiente mental, não se deve enquadrá-lo em períodos concretos de aprendizagem, tendo em

conta exclusivamente as correntes psicométricas. É então necessário realizar-se uma avaliação

cuidadosa, para o poder situar no processo geral do desenvolvimento, tendo em conta as suas

caraterísticas, realçando os aspetos positivos.

Pacheco (1993), (Cit. por Bautista, 1997), refere que o deficiente mental se depara com uma série

de dificuldades na formação da sua personalidade e que se podem classificar desta forma:

- Dificuldades psicomotoras

- Dificuldades sensoriais

- Dificuldades nas relações sociais

- Dificuldades na linguagem

Em primeiro lugar a pessoa com esta deficiência tem dificuldade em estruturar as suas

experiências; ele pode ter as mesmas capacidades percetivo motoras de qualquer outro indivíduo,

mas tem problemas em construir o seu próprio mundo dos objetos.

O segundo problema que se coloca quanto ao desenvolvimento da sua personalidade, é a sua

educação. Mas a comunicação que é necessária para que a educação possa ter lugar, pode estar

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 103

comprometida. Assim sendo, o tipo de educação que lhes dermos deve basear-se numa série de

estratégias diferentes das utilizadas normalmente com as crianças não deficientes.

Maistre (1981), (Cit. por Bautista, 1997), chama a atenção para estratégias que permitam educar

para a percepção, motricidade e linguagem e que consistirão no treino da capacidade para

efectuar as diferenciações e estruturações necessárias para que as aprendizagens escolares

possam ter significado para as crianças (Bautista, 1997:219).

A terceira dificuldade no desenvolvimento da pessoa com DM é derivada do seu reconhecimento

como pessoa. A ausência de determinados mecanismos para se afirmar como pessoa pode conduzir

a que não seja tratado e respeitado como tal.

Neste sentido, a ajuda a prestar-lhe pode, ser:

- Evitar atitudes de superproteção (da parte da família) e atitudes de discriminação (por parte da

sociedade).

- Ajudá-lo na integração do seu esquema corporal.

- Auxiliá-lo no processo de elaboração e desenvolvimento da linguagem (para que utilizando-a

se possa fazer compreender e tomar as iniciativas necessárias à sua vida em sociedade).

- Ter sempre presente a sua idade cronológica e proporcionar estratégias de forma a que nas

atividades desenvolvidas ela acompanhe – sempre que possível – os seus pares.

5.4 A abordagem educacional da criança com deficiência mental

Acreditando com Correia (2008b), que Não há criança nenhuma que não queira aprender

(Correia, 2008b:7), teremos uma ampla margem para educar a criança com deficiência mental.

Lembramos com Dottrens (1974b) que Educar significa: ex ducere! – tirar para fora de! Criar,

ajudar a viver melhor! (Dottrens, 1974b:13).

Face às abordagens que temos estado a registar, e tomando como ponto de partida a educabilidade

de todo o ser humano, incluindo as crianças e jovens com deficiência mental profunda (Vieira,

1990:90), importa agora definir etapas e traçar metas educativas no sentido de intervir o mais

adequadamente possível junto destas crianças. Segundo Fonseca (1999), (Cit. por Ferreira, 2008),

as alterações que o conceito de deficiência mental foi sofrendo, ao passar do enfoque na doença

para um enfoque na capacidade adaptativa, altera as expectativas relativas ao desenvolvimento e

ajustamento social e consequentemente acentua o aspecto educacional (Ferreira, 2008:67)

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 104

Nessa linha, poderíamos debruçar-nos sobre as diferentes etapas educativas (mais ou menos

generalizadas), que podem ser estabelecidas para potencializar ao máximo o seu desenvolvimento e

que abrangeriam desde a Intervenção Precoce para a Infância ao ensino secundário. No entanto,

para não nos alongar-mos excessivamente, não o faremos. Contudo, não poderemos deixar de

sublinhar a relevante importância que a intervenção precoce (em casa ou numa ama), representam

na educação da pessoa com Deficiência Mental, e que deve corresponder às primeiras etapas da sua

vida. É nesta fase de desenvolvimento que a ação pedagógica tem maiores hipóteses de eficácia,

pois, como sabemos, é nos primeiros anos que se estabelecem os padrões iniciais de aprendizagem

e comportamento, que vão determinar o desenvolvimento posterior. Nunca mais haverá um tal

potencial para estabelecer as formas básicas de compreensão e aprendizagem através da

experiência. As primeiras experiências são assim a matriz primária a partir da qual todo o

desenvolvimento posterior se vai gerar.

Como vimos, a primeira vez que se pensou educar uma criança com atraso mental foi com o

médico Itard que investiu na educação de uma criança “selvagem” de 11 ou 12 anos. Não obstante

o programa de tratamento intensivo com a criança, as mudanças que se operaram não

corresponderam às expectativas.

De facto, 11 ou 12 anos é já uma idade “terrivelmente tardia”, para se iniciar uma intervenção junto

de uma criança que apresenta necessidades educativas especiais. A este respeito, toda a bibliografia

consultada é convergente: O apoio educacional às crianças deficientes (ou em risco ambiental)

deve iniciar-se o mais precocemente possível. Citamos como referência Vítor da Fonseca, quando

no seu livro “Reflexões sobre a educação especial em Portugal” afirma: A estimulação e a

intervenção precoces devem iniciar-se a partir dos primeiros momento de vida (Fonseca, 1980:77).

Contudo, para não nos afastarmos dos níveis de educação em que situámos o nosso curso de

formação ficar-nos-emos pela abordagem educacional na Educação Pré Escolar e no 1.ºCEB,

apresentando uma ligeira resenha sobre ambos. Para tanto, seguimos muito de perto Pacheco (Cit.

por Bautista, 1997). Pela nossa parte, tentaremos completar esta abordagem, articulando-a com o

Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro.

Atendendo à necessidade de o ensino ser encarado numa perspetiva individualizada, de forma a

servir melhor as necessidades específicas de cada criança – mesmo sabendo que não há fórmulas –

é importante, partindo das características gerais comuns a este grupo, enunciar alguns princípios

educativos a ter em conta durante a programação e implementação de programas educativos junto

destes alunos.

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 105

Por fim, tendo sempre presente que todas as aprendizagens têm como objetivo principal o

desenvolvimento da vida futura numa perspetiva funcional, ou seja permitir uma inclusão e

participação ativa e válida na vida em sociedade visando sempre uma progressiva autonomia do

indivíduo, podemos concluir da necessidade de uma significância eminentemente prática destas

aprendizagens.

5.5 A Educação Pré-Escolar

Pelas afirmações que temos vindo a debater, afirmamos que as capacidades humanas e a

inteligência não são fixas ao nascimento, mas são moldadas até certo ponto por fatores ambientais.

O ambiente e as primeiras experiências particularmente na medida em que são, ou não,

estimulantes têm um efeito importante na capacidade da criança atingir o seu potencial.

A investigação sugere a existência de períodos críticos em que o desenvolvimento ocorre mais

rapidamente. Nestes períodos há uma maior suscetibilidade e vulnerabilidade ao efeito das

experiências no desenvolvimento e também pela mesma razão ao efeito da sua privação. As

deficiências e outros fatores de risco podem interferir com o desenvolvimento de tal forma que um

problema original não incapacitante por si só pode dar origem a deficiências secundárias muito

graves. Decorre daí, a importância que as experiências e estimulação potencialmente ricas podem

aportar à criança em idades mais novas.

Embora a Educação Pré-Escolar não seja obrigatória no nosso sistema educativo, um grande

número de crianças com idades compreendidas entre os 3 e os 6 anos, frequentam Jardins de

Infância. Como, também já foi abordado, por força da legislação existente, mormente do Dec. Lei

n.º3/2008 de 7 de janeiro, muitas crianças com DM (e/ou com outras deficiências) estão integrados

em grupos regulares de Educação Pré-Escolar e beneficiam de apoio especializado. Nesta etapa

educativa já há uma atuação pedagógica orientada e uma aprendizagem organizada.

Segundo Speck, (Cit. por Bautista, 1997) as tarefas fundamentais que a Educação Pré-Escolar deve

abranger, são:

- Estimulação e motivação para a aprendizagem e para atividades relacionais.

- Educação sensoriomotora e psicomotora.

- Treino de autonomia e hábitos de higiene.

- Educação rítmica.

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

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- Iniciação à comunicação social.

- Educação verbal elementar.

Como, também já foi referido, em Portugal, estas aprendizagens estão contempladas nas

“Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar”, documento que constitui o principal

suporte legal para as práticas pedagógicas neste nível de Educação e que contempla áreas mais

abrangentes como: Formação Pessoal e Social (decorre da perspetiva que o ser humano se constrói

em inter-acção social), Área da Expressão e Comunicação (engloba as aprendizagens relacionadas

com o desenvolvimento psicomotor: inclui domínio das expressões, domínio da linguagem oral e

abordagem à escrita, domínio da matemática) e Área do Conhecimento do Mundo (parte da

premissa que os seres humanos se desenvolvem e aprendem em inter-acção com o mundo que os

rodeia e a criança tem uma curiosidade natural em conhecer), (ME:1999).

Para as situações individuais em que se verifique – por parte das crianças – dificuldade em

desenvolver normalmente o processo de ensino-aprendizagem, o Decreto-Lei n.º3/2008 de 7 de

janeiro, estabelece - no seu Art.º 1.º (Objeto e âmbito de aplicação) - tanto para este nível de

educação como para os Ensino Básico e Secundário, a possibilidade de serem criadas condições

para a adequação do processo educativo às necessidades educativas especiais dos alunos com

limitações significativas ao nível da atividade e participação num ou vários domínios da vida

decorrentes de alterações estruturais e funcionais de caráter permanente.

Deste modo, e ao longo de todo o texto, o referido documento normativo aponta a sua abrangência

para as diferentes situações em que as crianças portadoras de NEE que frequentam a Educação Pré-

Escolar sejam beneficiadas por medidas educativas e condições de aprendizagem especiais.

5.6 A educação no 1.º Ciclo do Ensino Básico

A educação no período escolar deve investir no desenvolvimento de todas as potencialidades da

criança com deficiência, com o objetivo de a preparar para enfrentar sozinha o mundo em que tem

de viver. Neste sentido, devem ser favorecidas todas as atividades que a ajudem a adquirir as

capacidades necessárias para se desenvolver como ser humano. Speck (1978) apresenta-nos as

seguintes áreas:

- Sociabilização.

- Independência.

- Destreza.

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 107

- Domínio do corpo.

- Capacidade percetiva.

- Capacidade de representação mental.

- Linguagem.

- Afetividade.

A escolha dos objetivos e dos conteúdos dos programas de aprendizagem terá como referência o

currículo nacional para o ensino básico e dependerá da situação individual de cada criança. Speck

(Ibidem) lembra que na educação dos deficientes mentais, não podem ser esquecidos os princípios

estabelecidos por Piaget. Apresentamos, de seguida estes princípios os quais vamos reforçando

com os nossos pontos de vista:

- Princípio ativo:

Deve fugir-se do ensino meramente teórico. Para que se produza aprendizagem; a criança tem de

ser posta numa relação direta com os objetivos. Quanto a nós, aproveitamos para enfatizar a

importância da aprendizagem significativa, especificamente para estas crianças.

- Princípio de estruturação

O ensino deve ser subdividido em pequenas etapas para que seja possível à criança, avançando a

pequenos passos, alcançar os objetivos propostos. Apropriando-nos das teorias de Speck, nós

diríamos que devemos graduar a dificuldade das aquisições tornando-as mais acessíveis e positivas,

tendo sempre presente que o sucesso gera sucesso e o insucesso gera desmotivação.

- Princípio de transferência

A transferência é uma tarefa difícil, especialmente para os doentes mentais. Por isso, para que as

aprendizagens possam ser utilizadas em situações análogas, é necessário muita repetição.

Nós acrescentamos que, tendo em conta as dificuldades destas crianças em efetuar a aquisição de

conceitos abstratos bem como generalizar e transferir os comportamentos e aprendizagens

adquiridos para novas situações, é necessário que estas aquisições se processem nos contextos e

situações o mais variadas e naturais possível.

- Associação da linguagem e da ação

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 108

Para que haja associação entre o sistema de sinais verbais e a experiência em curso, toda a ação

deve estar ligada à palavra correspondente.

- Motivação para as aprendizagens sociais

Na educação dos alunos com DM é preciso criar situações positivas de aprendizagem nos aspetos

sociais e afetivos. O contrário pode afetar, acentuadamente, a disponibilidade do aluno para as

aprendizagens e logicamente os resultados a obter. Lembrar ainda que as aprendizagens processam-

se de uma forma lenta, pelo que é importante focarmos a atenção apenas nos objetivos que

realmente queremos ensinar, criar situações de aprendizagem positivas e significativas,

preferencialmente nos ambientes naturais do aluno e de uma forma o mais concreta possível, para

que este se sinta motivado e com predisposição para aprender. Em relação a estes princípios, nunca

é demais lembrar que eles são válidos em todos os níveis de ensino.

5.7 Programas Educativos Individuais

Como temos estado a verificar, os conceitos de integração/inclusão e/ou de preparação para a vida

ativa têm sido largamente discutidos e estão presentes na maioria dos técnicos que trabalham com

crianças e jovens com DM. Do mesmo modo, todos sabemos que, o futuro desses jovens e a sua

integração social passam por uma preparação cuidada e essencialmente adaptada às suas

características.

Compete aos técnicos de educação especial, e à equipa pluridisciplinar, desde muito cedo, ter em

conta as necessidades prospetivas da criança ou jovem, ou seja, preverem de forma o mais correta e

realista possível, o que, no futuro, aquele indivíduo vai necessitar para a sua plena inserção na

sociedade. Essa prospeção, numa primeira fase exige que se avalie e avaliar implica conhecer, pois

para poder decidir o que o aluno, necessitará no futuro temos que primeiramente saber o que

necessita agora.

Para reforçar esta posição parafraseamos Vieira (1996) quando afirma: Para poder decidir o que o

aluno, agora, necessita para prosseguir o seu desenvolvimento de uma forma harmoniosa,

precisamos de reunir informação sobre as realizações actuais do aluno nos diversos ambientes de

vida, as suas dificuldades específicas, o tipo e grau de deficiência e ainda sobre o seu meio

familiar e cultural, tendo sempre como referência a sua idade cronológica (Vieira, 1996: 93).

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 109

Podemos, então, dizer que em todo este processo de avaliação importa recolher todos os dados que

nos permitam estabelecer com rigor quais são as reais necessidades e competências do aluno.

Competências, não tanto em termos de potencialidades, mas de desempenhos. Aliás, como refere

Ferreira (2008)20, na actualidade, salienta-se a necessidade de avaliar fundamentalmente o

desempenho actual do aluno e não o seu potencial (Ferreira, 2008:67).

Esta tarefa tão importante e complexa não pode ser levada a cabo exclusivamente pelo docente de

educação especial. Neste processo é obrigatório o envolvimento da família e outros técnicos

(médico, psicólogo, terapeutas…) cuja formação ou informação de que dispõem complementa a do

educador/professor. Como já referimos a legislação atual (Dec.-Lei n.º3/2008) prevê, para efeitos

da sua aplicabilidade, tendo por referência o Sistema de Classificação Internacional de

Funcionalidade, Incapacidade e Saúde da OMS (CIF, 2001) a constituição de equipas

pluridisciplinares. Estas, terão um papel fundamental no processo de avaliação, planificação e

recolha de informação dos alunos com necessidades educativas especiais.

Neste processo de recolha de informação a CIF parece apresentar algumas lacunas,

nomeadamente na subjetividade da avaliação e na ausência de instrumentos específicos para

determinadas categorias. Feita a avaliação pela equipa pluridisciplinar, e ultrapassadas as medidas

necessárias e legais, mormente aferindo-se que efetivamente o aluno apresenta Necessidades

Educativas Especiais de Carácter Permanente, passar-se-á à elaboração do Programa Educativo

Individual (PEI). Nele se identifica e caracteriza o aluno (assinalando indicadores de

funcionalidade e nível de aquisições e dificuldades), se registam os fatores ambientais que

funcionam como facilitadores ou barreiras, se discriminam os objetivos gerais e específicos a

atingir, assim como estratégias e recursos a utilizar, se precisa a orientação geral do respetivo

processo educativo, se definem e registam as medidas do regime educativo especial que são

aplicadas e se determinam os momentos de avaliação do próprio PEI.

As medidas educativas expressam-se da seguinte forma:

a) Apoio pedagógico personalizado;

b) Adequações curriculares individuais;

c) Adequações no processo de matrícula;

d) Adequações no processo de avaliação;

e) Currículo específico individual;

f) Tecnologias de apoio.

20 Ferreira (2008) desenvolveu um interessante estudo sobre o processo de transição destes jovens para a vida ativa.

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 110

É importante salientar que as medidas previstas nas alíneas b) e e) não são cumuláveis entre si.

Na Educação Pré Escolar e no 1.ºCEB, aquele documento, é elaborado conjunta e obrigatoriamente

pelo docente titular de grupo ou turma, pelo encarregado de educação e sempre que se considere

necessário, pelo Departamento de Educação Especial e SPO. Carece da assinatura de todos os

participantes, assim como da aprovação do Conselho Pedagógico e homologação do Conselho

Executivo.

5.8 O papel da família

Historicamente, o papel atribuído aos pais foi mudando, de acordo com o que se foi pensando ser o

seu papel fundamental (Pereira, 1996). Atualmente, quer profissionais, quer os próprios pais

reconhecem e enfatizam o seu papel no sucesso educativo dos seus filhos, pois sabe-se que,

geralmente. Pereira (Ibidem) e outros autores, demonstraram que, o papel dos pais como

participantes ativos na educação dos seus filhos, sobretudo no caso de crianças com deficiência, é

um fator gerador de sucesso. Citando Pereira (1998), recordemo-nos que: Se queremos que o aluno

aprenda o que é necessário em situações do seu quotidiano de vida, em casa, na escola, nos seus

tempos livres, na comunidade, não é possível fazer programas sem o envolvimento das famílias

(Pereira, 1998:5). Reveste-se aqui de acrescido valor a Intervenção Precoce na Infância, que tem

como um dos principais objetivos, capacitar as famílias no sentido de melhor desempenharem o seu

papel nas interações que estabelecem com os seus filhos.

Por outro lado, também convém recordar que, frequentemente, os pais das crianças com problemas

necessitam de ajuda especial para estabelecer padrões adequados de interação com os filhos e para

lhes prestarem os cuidados e estimulação adequada.

Reconhecida a importância dos pais na educação dos seus filhos, é justo respeitar os seus direitos

que vinham sendo, desde há tempos reclamados. O Dec.-Lei n.º 319/91 recomendava “Um mais

explícito papel dos pais na orientação educativa dos seus filhos” e estabelecia formas de

participação e colaboração obrigatórias da família, havendo que cumprir estas diretivas e ampliar

os campos de cooperação (Pereira,1998). Esta autora aconselha a que os profissionais aproveitem

os “Apoios Naturais” que a comunidade oferece. Lembra ainda que os pais têm direito a ter a

possibilidade de legalmente escolher uma escola para os seus filhos. Compete aos técnicos

aconselhá-los, de forma isenta, e informá-los sobre os recursos disponíveis (Ladeira, 1999).

Capítulo V A Problemática da criança com deficiência mental na escola regular

© Fernanda Cardoso (2015) 111

O Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro, dedica todo o seu Art.º3.º à “Participação dos pais e

encarregados de educação”, iniciando no ponto número 1 com a seguinte redação: os pais e

encarregados de educação tem o direito e o dever de participar activamente, exercendo o poder

paternal nos termos da lei, em tudo o que se relacione com a educação especial a prestar ao seu

filho acedendo a toda a informação constante no seu processo. Deste modo, esta legislação plasma

e invoca claramente o papel dos pais e encarregados de educação no processo educativo do aluno.

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 112

PARTE III

O professor para poder intervir no real de modo fundamentado, terá de saber observar e

problematizar. Intervir e avaliar serão acções consequentes das etapas precedentes (Estrela,

1986).

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 113

Capítulo VI – Organização e desenvolvimento do estudo experimental

Concluída a parte do trabalho, onde foi apresentada a informação considerada relevante para o

enquadramento teórico do presente estudo, inicia-se, aqui um novo capítulo cuja finalidade

consiste, sumariamente, em:

- Delimitar e definir o problema

- Identificar os objetivos do estudo

- Fundamentar e explicitar o processo de recolha de informação

- Sistematizar os resultados e principais reflexões

6.1 Justificação do estudo

Como bem sabemos, Exige-se aos professores o conhecimento de certas estratégias que

contribuam para alcançar o grande único objetivo estabelecido: facilitar ao aluno uma

aprendizagem significativa, dentro de um clima de motivação e esforço. Porém, como nos

encontramos perante uma impressionante diversidade de alunos, uma das grandes propostas

inovadoras apostou na abertura à diversidade e no prolongamento do prazo da educação

obrigatória. Todo o professor reflete permanentemente sobre esta abertura à sociedade , a todos

os tipos de crianças, com a bagagem que trazem consigo e que é fruto da sua família e do seu

ambiente socioeconómico. Coloca-se a si próprio uma destas três perguntas, ou talvez as três:

Que tipo de estratégias didáticas serão mais adequadas para facilitar ao máximo a

aprendizagem de todos e de cada um dos alunos?

Como organizar a escola de modo a acolher um determinado aluno?

Como assegurar a atenção individual e a atenção ao grupo-classe sem prejudicar

o avanço de nenhum dos dois? (Borrás,2001: 92-93).

Considerando-se a inclusão uma política da escola globalmente entendida, a gestão dos recursos

materiais e humanos da escola permitirá rentabilizar esses mesmos recursos de forma a responder a

necessidades e problemas que possam surgir e onde possam surgir.

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 114

Embora em teoria o professor de educação especial – por força da lei - já não tenha o mesmo

estatuto de outrora (na medida em que é o professor titular de turma quem coordena o PEI, na

prática ainda é ele quem, na grande maioria dos casos, desenvolve e gere todo um conjunto de

saberes multidisciplinares e articula diretamente com os restantes profissionais .

Face ao exposto e considerando a situação educativa atual em que as nossas funções profissionais

se desenvolvem, os Mega Agrupamentos que funcionam numa ótica de redução de recursos, as

equipas multidisciplinares que integram diferentes grupos de profissionais e os saberes

multidimensionais que são exigidos aos professores titulares de turma e de apoio especializado,

considerámos pertinente que este estudo se desenvolvesse partindo de uma reflexão mais profunda

– como, aliás se foi tentando ao longo de todo o documento – sobre a prática profissional docente,

quando colocada perante grupos de alunos tão heterogéneos ao nível da idade, dos níveis de

escolaridade e das diferenças físicas e intelectuais, que partilham a mesma sala de aula; dando uma

visão mais abrangente de alguns dos problemas reais com que a escola em geral se debate no

momento de dar o seu contributo para uma escola realmente inclusiva.

Porque já em diferentes momentos da nossa vida académica e profissional realizámos estudos21 que

versavam auscultar a perceção dos professores acerca da inclusão de alunos com NEE na sala de

aula de ensino dito regular, optámos, agora, por experienciar - como também já tem vindo a ser

debatido ao longo deste documento - como aluna estagiária as dificuldades que a inclusão coloca,

para podermos, com propriedade, ajuizar e ajudar a melhorar as práticas educativas. Como

inovação na nossa prática, optámos por seguir o que o próprio coração pedia e quisemos ouvir as

opiniões de outros profissionais, especificamente técnicos especializados, hoje tão implicados no

processo educativo de alunos com NEE e que incorporam as equipas multidisciplinares. Estamos a

referir-nos a psicólogos e terapeutas da fala.

6.2 Problemática

O carácter polémico de que se revestem os debates em curso sobre as vantagens da inclusão de

crianças com NEE na sala de aula do ensino dito regular (especificamente da criança com

21 Entre outros: - Projeto Final de Curso Pós-Graduação, de Formação Especializada em educação Especial (2002). Viseu: Universidade Católica Portuguesa. - Tese de Mestrado em Ciências da Educação – Domínio Cognitivo e Motor (2011). Viseu: Universidade Católica Portuguesa.

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 115

deficiência mental), e a realidades profissionais com que nos deparamos, suscitaram em nós o

desejo de nos debruçarmos sobre esta problemática.

Tendo sempre presente que a escola inclusiva não se limita só aos professores de apoio

especializado, mas pelo contrário, cada vez mais são atribuídas responsabilidades a um conjunto de

profissionais (professor do ensino regular, encarregados de educação, técnicos especializados,

assistentes operacionais…) considerámos fundamental sair da nossa zona de conforto e

direcionarmos, também, a nossa atenção para outros grupos profissionais, eventualmente com

menos destaque do que os docentes - no plano do que frequentemente é discutido no campo

educativo - mas nem por isso menos importantes no processo de inclusão destes alunos.

Tivemos, também, presente que o comportamento dos professores no processo de ensino, não pode

ser entendido sem se ter em consideração os contextos em que se insere. De facto a sua formação,

as condições de exercício profissional e as características da população escolar são elementos

importantes no quadro em que ele se move (Pereira, 1996).

A vasta revisão bibliográfica existente na área da inclusão revelou-nos que, na verdade, muitos são

os estudiosos que teoricamente se têm debruçado sobre o assunto, o que, entendemos nós, reforça e

justifica a atualidade e pertinência do tema. Pelo sobejo de informação, tornou-se mesmo

necessário fazer uma gestão da mesma, que considerámos adequada, na medida que nos orientámos

preferencialmente por autores de referência.

Contudo, cremos que a situação se inverte se pensarmos em trabalhos de investigação prática que

versem sobre a perceção que os diferentes profissionais (não docentes) têm sobre a problemática da

inclusão, pois ficamos com a ideia que estes existem em número bastante mais limitado.

Neste contexto, as importantes leituras realizadas despertaram-nos, num primeiro momento, para a

importante questão de partida, já identificada na Introdução do presente trabalho e que, tal como foi

referido, se desdobrou automaticamente em muitas outras que vieram a constituir o papel de guia

de toda a investigação.

6.3 Objetivos do estudo

Reafirmando o nosso desejo de construir uma cultura de resistência às desigualdades e à exclusão

escolar e social, aceitamos sensatamente que, no caminho a seguir os obstáculos serão muitos, mas

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 116

não serão impeditivos de darmos o nosso contributo no sentido de os ultrapassar e destruir. Neste

sentido, o nosso primeiro objetivo é identificá-los, procurando conhecer a realidade presente, pois

concordando com Freire (1979), quando o homem compreende a sua realidade, pode levantar

hipóteses sobre o desafio dessa realidade e procurar soluções (Freire, 1979:30).

Decorrente da pergunta inicialmente identificada como questão de partida, definimos o objetivo

geral já inicialmente identificado: Sistematizar informação sobre a prática educativa na inclusão de

alunos com Necessidades Educativas Especiais - especificamente quando portadores de deficiência

mental - em contexto de 1.ºCEB.

Como objetivos específicos definimos:

Refletir sobre as orientações educativas a considerar aquando da inclusão de alunos com

Necessidades Educativas Especiais integrados na Educação Pré-Escolar e no 1.º Ciclo do

Ensino Básico;

Identificar um conjunto de pressupostos fundamentais à implementação de uma escola

inclusiva;

Reconhecer a importância da educação inclusiva face a crianças com deficiência mental;

Auscultar o modo como duas técnicas especializadas percecionam as respostas educativas

existentes ao nível do caso específico de uma aluna com deficiência mental, integrada

numa escola de ensino regular do 1.º CEB e identificar elementos facilitadores e/ou

descobrir eventuais falhas ou entraves no processo de inclusão;

Refletir sobre a eficácia das respostas educativas canalizadas para uma criança com

deficiência mental.

Decorrente disto, assumimo-nos como agentes de mudança e propusemo-nos contribuir para

melhorar a inclusão de crianças com NEE, especificamente crianças com deficiência mental, e

ajudar os professores - naquilo que estiver ao nosso alcance - a tornarem-se agentes capazes de

enfrentar a diversidade de alunos nas escolas regulares.

Através da nossa reflexão e da auscultação dos profissionais atrás referenciados, queremos dar

conta dos problemas e das questões que se colocam aos sistemas de ensino quando procuram dar

resposta a todas as crianças nas suas comunidades; e que se alarguem os limites do conhecimento

existentes sobre esta matéria.

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 117

Após a clarificação dos objetivos definimos as questões a investigar no decurso do presente estudo,

que também já foram identificadas na Introdução do nosso trabalho. As mesmas encontram a sua

fundamentação na análise e conhecimentos fornecidos pela literatura especializada.

6.4 Opções metodológicas

Esclarecendo o significado de método, invocamos Desahaies (1992), quando se refere a método

como: Actividade do espírito que se apoia tanto na capacidade de raciocínio, de julgar e de

avaliar como nos procedimentos e práticas reconhecidas da investigação (Desahaies, 1992:112).

No ponto de partida da utilização de um método, colocam-se certos problemas fundamentais de

epistemologia que não podem se ignorados. Por isso, é importante tomarmos consciência de certas

condições prévias epistemológicas dos problemas de método e recordarmo-nos delas.

Uma das constatações é que, relativamente à essência do método, este proporciona uma direcção

do pensamento. Serve de guia, mas não substitui a intervenção do sujeito (Ibidem:126).

Provavelmente qualquer que seja a abordagem metodológica, deverá procurar-se uma explicação

em que se vai das partes para o todo e do todo para as partes, para tentar compreender o fenómeno

na sua globalidade.

Consoante os critérios epistemológicos específicos, os estudos de metodologia poderão seguir duas

formas: a indução ou a dedução (Carvalho, 2002:87) à qual corresponde respetivamente o método

indutivo ou dedutivo. Pela nossa parte não esquecemos o que a bibliografia especializada nos diz:

O dualismo dedutivo-indutivo, pode ser apenas teórico porque a ciência e o método científico

verdadeiro, reúnem intimamente os dois momentos num movimento recursivo em que o indutivo se

junta ao dedutivo e vice-versa (Desahaies, 1992:126).

No caso do nosso estudo, as opções metodológicas recaíram sobre o método qualitativo que se

baseia na descrição, numa teoria fundamentada, na indução e no estudo das perceções pessoais. É,

normalmente, o mais utilizado em questões de Educação, dado que O foco da investigação

qualitativa é (…) a compreensão mais profunda dos problemas: entender o que certos

comportamentos, atitudes ou convicções escondem (…) sendo portanto menos o rigor posto na

selecção da amostra e o maior cuidado colocado na generalização dos resultados (Sêco,

1997:112).

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 118

6.5 Técnicas de recolha de dados

Entendendo técnicas como procedimentos operacionais que servem de mediação prática para a

realização das pesquisas (Severino,2007:124); precisam sempre de ser compatíveis com os

métodos e paradigmas epistemológicos adotados. Parafraseando Fortin (1996) Como a

investigação pode incidir sobre uma variedade de fenómenos, requer o acesso a diversos métodos

de colheita de dados. A natureza do problema de investigação determina o tipo de método de

colheita de dados a utilizar (Fortin,1996:240).

Antes de empreender uma colheita de dados, o investigador deve perguntar-se se a informação que

quer colher com a ajuda de um instrumento de medida em particular é exatamente a que tem

necessidade para responder aos objetivos da sua investigação. Os dados podem ser colhidos de

diferentes formas junto dos sujeitos. Cabe ao investigador determinar o tipo de instrumento de

medida que melhor convém ao objecto de estudo (Ibidem:240). Uma vez determinadas as

informações que se pretendem recolher, é necessário elaborar uma estratégia de recolha de

informações. Estratégia que por sua vez, exige o recurso a métodos de recolha de informações,

considerando-se como métodos principais (Fortin,1996:240; Ketelle, s/d:18).

- A prática de entrevistas;

- A observação;

- O recurso a questionários;

- O estudo de documentos.

Ao lado destes quatro métodos, existe um certo número de outras técnicas, utilizadas para obter

informação. No entanto, pensamos ser conveniente – antes de avançarmos – esclarecer que a

diferente bibliografia consultada, refere que para obter informação é preciso observar. Nesta

sequência, note-se á partida que na observação, é possível distinguir duas formas: a observação

direta ou indireta (Deshaies, 1992:296). Na estratégia metodológica tivemos presente que Qualquer

metodologia deve ser escolhida em função dos objectivos da investigação, em função do tipo de

resultados esperados, do tipo de análises que desejamos efectuar (Albarello et. al.; 1995:50).

No nosso caso, considerando que pretendíamos obter informação de forma relativamente acessível

e rápida que nos permitisse ser analisada (para recolher dados descritivos na linguagem do próprio

sujeito), a opção recaiu na entrevista. Nesta decisão, teve também relevante peso o nosso passado

académico em que (para lá de outros estudos), aquando da especialização em educação especial e

mais tarde realização de mestrado, recorremos – em ambos os cursos - à aplicação do questionário

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 119

como instrumento para a recolha de dados. Por esse motivo, no início deste trabalho, aquando da

tomada de decisão sobre o estudo empírico - em que refletimos sobre as técnicas a utilizar -

sentimo-nos impulsionados pela curiosidade na utilização de uma nova técnica e pelos desafios daí

decorrentes. Apoiámo-nos na convicção forte de que seria uma experiência enriquecedora.

Na elaboração da entrevista, tivemos alguns cuidados prévios, nomeadamente: teve-se em conta a

motivação sobre as finalidades da investigação, os entrevistados foram oportunamente informados

do enquadramento e pertinência do estudo, ou seja, sobre a sua utilidade científica e social e

sensibilizados para isso; respeitando no entanto que, as pessoas não são obrigadas a responder e

encarando sempre a sua colaboração como uma atitude de cortesia. Foi construído um primeiro

documento que, após conhecimento aos entrevistados sofreu ligeiras adaptações; o vocabulário

empregue foi claro, adaptado ao público visado e com fórmulas muito simples de questões. O guião

de perguntas foi organizado tendo-se o cuidado de que não fosse constituído por um “corpo” de

perguntas demasiado longo e colocando questões abertas que davam a possibilidade de os

entrevistados darem sugestões, consideradas úteis para o tema em estudo. Depois de elaborado o

guião da entrevista, procedemos à sua validação, de forma a garantir a boa compreensão das

questões e que as respostas não se afastassem significativamente dos objetivos deste trabalho.

No complemento da informação recolhida para lá da entrevista, foi ainda realizada análise

documental (materiais escritos que podiam ser utilizados como fonte de informação); observação

participante; conversas informais e diário de campo (com registo das observações diretas e

participantes efetuadas e reservadas a uso exclusivamente pessoal). Reportando-nos à entrevista

enquanto método de técnica de recolha de dados, Bell (1997), acrescentou ainda que, mediante o

recurso à entrevista, o investigador pode aprofundar motivos e sentimentos, mas, não nos

poderemos no entanto esquecer dos inconvenientes que a aplicação da entrevista pressupõe. O

mesmo autor inventariou os seguintes inconvenientes:

- O consumo significativo de tempo;

- Elevada carga de subjetividade;

- Dificuldade de interpretação de algumas respostas;

- Possibilidade de as perguntas induzirem e influenciarem as respostas.

Situando-nos no nosso estudo, o tipo de entrevista utilizada foi semidiretiva, no sentido que foi

definida por Ghiglione & Matalon (1997), uma vez que permite, partindo dum quadro de referência

já existente, alargar o conhecimento prévio de que se dispõe. Tratou-se duma entrevista orientada

por objetivos, funcionando as perguntas como tópicos para o entrevistado desenvolver, onde o

entrevistador não assume um papel diretivo, mas apenas motivador das respostas. Este tipo de

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 120

entrevista é geralmente utilizado em estudos que procuram conhecer as perceções, atitudes e

motivações dos sujeitos relativamente a determinados assuntos, contribuindo para que se revelem

os aspetos mais valorizados e de maior significação para os entrevistados.

Relativamente a outros procedimentos adotados, importa referir que as entrevistas decorreram no

final do ano letivo em que decorreu o estágio (período em que o ritmo de trabalho dos diferentes

intervenientes já havia diminuído um pouco). As entrevistas ficaram registadas em suporte escrito,

dando assim, aos entrevistados a possibilidade de clarificar, explicitar, ou desenvolver alguns

assuntos ou ideias se assim o entendessem.

6.6 Apresentação e análise de conteúdo

Tendo recorrido à entrevista para recolha de informações, pareceu-nos coerente utilizar a análise de

conteúdo como técnica de análise de dados. A análise de dados é um processo de busca e de

organização sistemático de transcrições de entrevistas (…) com o objetivo de aumentar a sua

própria compreensão desses mesmos materiais e de lhe permitir apresentar aos outros aquilo que

encontrou (Bogdan & Biklen, 1994:205).

Vala (1986), afirmou que uma das vantagens da análise de conteúdo consiste em poder incidir

sobre material não estruturado como, por exemplo, as entrevistas abertas ou semiabertas.

Recolhida a informação através das entrevistas, fizemos a exploração dos discursos de cada uma.

Hesitámos em integrar as respostas das entrevistas no corpo do trabalho (pois sabemos que existe

alguma falta de consenso relativamente a este procedimento). No entanto, entendemos que, dadas

as caraterísticas da investigação, esta poderia ser a melhor forma para explicitar o seu conteúdo. O

mesmo é apresentado no quadro que se segue:

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 121

Quadro 6: Registo das respostas às entrevistas

Questões 1.O que sabe sobre a gravidez e o historial da D. ?

Res

post

as Psicóloga Não tenho informação precisa.

Terapeuta da

Fala

Sei apenas que a D. e a irmã gémea C. nasceram da 3ª gravidez da mãe e que atualmente os pais estão separados. Desconheço qualquer

outro tipo de informação relevante.

Questões 2.Em que momento foi diagnosticada a deficiência mental? É conhecida a causa da deficiência?

Res

post

as Psicóloga

A deficiência foi diagnosticada em julho de 2012, após a realização de avaliação psicológica à aluna, no seguimento da sinalização

efetuada pela professora titular da turma. A deficiência mental é resultado de baixo desenvolvimento das estruturas ou funções mentais da

aluna, podendo haver várias causas para tal, nomeadamente a componente hereditária, a fraca estimulação ambiental.

Terapeuta da

Fala

Penso que em julho de 2012. A causa estará relacionada com questões hereditárias e ambientais (falta de estimulação).

Questões 3. Resumidamente, pode dizer quais são as principais caraterísticas evolutivas da deficiência mental?

Res

post

as Psicóloga

As crianças que apresentem deficiência cognitiva têm, comparativamente com outras crianças da mesma faixa etária, baixa maturação

intelectual. Isto pressupõe que, apesar das eventuais evoluções que apresentem, podendo fazer grandes progressos, não alcançarão o nível

de desenvolvimento considerado normativo. Não esquecer que estamos perante deficiências de carácter permanente. Ainda assim, e

dependendo do grau de deficiência, podem fazer aquisições académicas, podendo, em alguns casos, ser semelhantes ao seu grupo de pares,

tendo para tal de apresentar mais e melhor trabalho e estudo.

Terapeuta da

Fala

A deficiência mental é um problema de caráter permanente. Mesmo fazendo evoluções significativas, a nível académico, linguístico, etc, a

criança terá sempre um desenvolvimento aquém do esperado para a idade.

Questões 4.Em sua opinião, quais são as principais implicações educativas destes alunos

(neste caso específico da D.) na escola dita regular?

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 122

Res

post

as Psicóloga

No momento de planificar a intervenção educativa, pensarmos na dificuldade na linguagem, nas relações, sociais, autonomia conhecer o

estado de desenvolvimento para melhor adequar a planificação….

Terapeuta da

Fala

Uma criança com NEE na Escola Regular implica a necessidade avaliar primeiro as suas competências para depois planificar a

intervenção educativa mais adequada.

Questões 5.Considera que estão a ser utilizadas estratégias de inclusão?

Res

post

as Psicóloga

A integração destas crianças, em turmas ditas regulares, pressupõe a ideia de inclusão. Todavia, elas são em muitos aspetos diferenciadas

dos restantes colegas (ex: medidas educativas diferentes, avaliação diferente, tpc diferentes). Ao fazê-lo estamos a transmitir a ideia de que,

de alguma forma, se trata de uma criança diferente. Esta ideia facilmente é apropriada pela própria criança e pelos restantes colegas.

Assistimos assim recorrentemente, nos intervalos das nossas escolas e até dentro da sala de aula, à diferenciação e distinção destas

crianças, que muitas vezes são apenas aceites e vistas como iguais, por outros que se encontram na mesma situação. Desta forma, que tipo

de inclusão estamos nós a praticar? Serão estas crianças felizes nas escolas ditas regulares? Ou estão apenas a serem obrigadas a

conviver com tantos que consideram diferentes? Tenho muitas dúvidas em relação a este tipo de inclusão...

Terapeuta da

Fala

Penso que sim. Estar integrada numa turma regular já é uma estratégia de inclusão. No entanto tenho algumas dúvidas acerca da eficácia

desta e de outras estratégias de inclusão.

Questões 6. Pode indicar reações da criança ao ambiente na sala de aulas?

Res

post

as Psicóloga

O que muitas vezes acontece com esta criança, e outras na situação dela, é que, como não conseguem de maneira nenhuma perceber e

acompanhar a matéria lecionada, incorrem numa crescente desmotivação e desinvestimento escolar. Como são obrigadas a estar sentadas

nos seus lugares, acabam por perturbar o normal funcionamento da aula. Ou então são muitas vezes ocupadas com tarefas e exercícios

imaturos e facilitistas, que não contribuem para o seu progresso.

Terapeuta da

Fala

A desmotivação e a falta de atenção/concentração parecem ser as principais reações que a D. manifesta em contexto de sala de aula. Este

tipo de reações poderá estar relacionado com o facto de a aluna não conseguir acompanhar o grupo ao nível dos conteúdos académicos.

Questões 7.Em sua opinião, esta criança é aceite pelo grupo? Como reagem as crianças à sua presença?

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 123

Res

post

as Psicóloga

De momento, a criança ainda vai conseguindo integrar-se nos intervalos e brincadeiras (com a ajuda da sua irmã que frequenta o mesmo

ano). Todavia, já ouve os comentários depreciativos dos colegas. Com o avançar da idade, e particularmente na mudança para o 2º ciclo,

esta discrepância vai sendo cada vez mais evidente.

Terapeuta da

Fala

Penso que sim. A maioria das crianças da turma e mesmo da Escola conhece a D. desde o 1º ano, o que faz com que atualmente esteja

integrada e seja aceite pelos colegas. Todavia, a partir do 2º ciclo as dificuldades de integração das crianças com NEE aumentam.

Questões 8.O que pensa sobre os recursos humanos e materiais que são atualmente disponibilizados para os alunos com deficiência mental no

ensino regular?

Res

post

as Psicóloga

Naturalmente são insuficientes! Particularmente os disponibilizados pelo Ministério da Educação (quer o número de profissionais, quer a

carga horária que lhes disponibiliza). Felizmente, a aluna, consegue beneficiar de recursos da Seg. Social que comportam as terapias que

tem tido nestes dois últimos anos.

Terapeuta da

Fala

Penso que os recursos humanos, disponibilizados pelo Ministério da Educação, são escassos. Considero que número de alunos atribuído

por Professor é excessivo, o que faz com que o tempo semanal dedicado a cada um seja insuficiente.

Questões 9.Sabe se a resposta educativa por parte da educação especial está a ser eficaz? Se pretender, refira dificuldades e evoluções.

Res

post

as Psicóloga

Neste tipo de deficiências, é sempre muito importante o apoio individualizado, quer pelas aprendizagens promovidas, quer pelo apoio e

conforto que transmite à criança. Ainda assim, e indo ao encontro da pergunta anterior, considero insuficiente o número de horas semanais

dispensadas a cada aluno.

Terapeuta da

Fala

Acredito no bom trabalho da Educação Especial, mas como referi na questão anterior, o tempo semanal dispensado pelo Professor parece-

me insuficiente.

Questões 10.Em termos de perspetivas para o futuro, até onde pensa que poderá evoluir esta criança?

Res

post

as

Psicóloga

Como já referi, a aluna vai fazendo as suas aquisições, sempre distantes das consideradas normativas para a sua faixa etária. Neste caso

concreto, penso ser possível que domine a capacidade de escrita e leitura, mais fluentemente. Mais importante que os conteúdos

curriculares, neste caso em concreto, penso que a escola assume o importante papel de a preparar para o mercado de trabalho e para as

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 124

exigências do seu dia a dia, sendo este o trabalho a realizar futuramente.

Terapeuta da

Fala

A D. ainda pode fazer aquisições académicas que lhe permitam futuramente alguma autonomia nas atividades de vida diária. Todavia será

incapaz de desempenhar funções, no mercado de trabalho, mais exigentes a nível mental.

Questões 11.Quais as dificuldades que vislumbra no percurso escolar e de vida desta aluna?

Res

post

as Psicóloga

A discriminação do seu grupo de pares (levando a um conjunto de consequências sociais e emocionais) e a crescente desmotivação e

desinvestimento escolar por parte da aluna.

Terapeuta da

Fala

As suas competências académicas, linguísticas, sociais, entre outras, estarão sempre aquém do esperado para idade, o que pode gerar

situações de desmotivação por parte da aluna e discriminação por parte do grupo de pares e futuramente da sociedade em geral

Questões 12.Quer anotar estratégias que possam contribuir para a inclusão dos alunos com deficiência mental no sistema educativo dito

regular?

Res

post

as Psicóloga

O apoio individualizado deve ser prestado exclusivamente na sala, juntamente com a sua turma, não havendo horários diferentes para

estes alunos (exceto no caso de alunos com cei). as notas e resultados escolares devem ser transmitidos de igual forma (mesmo que realize

testes diferentes), efetuando a correção e dando nota como aos colegas de turma.

Terapeuta da

Fala

Não…

Fonte: Elaboração própria

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 125

A análise documental, para além de ter como objetivo analisar a perceção das técnicas

especializadas face á deficiência mental em particular, teve como objetivo principal analisar a sua

perceção perante a inclusão em geral. Fizemo-lo com a consciência de que, nós próprios –

enquanto docentes de educação especial – éramos colocados à prova, como se pode depreender das

questões colocadas e das falas registadas. Vemos nisso não um entrave, mas sim um fator de

enriquecimento pessoal e profissional.

6.7 Principais ilações

Como principais ilações, relativas aos dados apresentados, poderemos apontar as seguintes:

Nesta situação específica, o diagnóstico da deficiência mental foi realizado numa fase

bastante adiantada da vida da aluna, aos 9 anos.

Esta constatação foi antecipada na revisão bibliográfica: frequentemente a DM, tem um diagnóstico

tardio, o que adia a intervenção de medidas necessárias e adequadas.

Diz-nos a literatura especializada que as caraterísticas evolutivas da deficiência mental

conduzem a que, à medida que a vida da criança se desenvolve, a discrepância do comportamento

adaptativo entre ela e os seus pares se acentue. Essa é também a visão das técnicas especializadas.

A integração e inclusão de um aluno com NEE na escola regular traz implicações

educativas que obrigam a planificações individualizadas. Num primeiro momento, a criança será

avaliada, são as suas competências e limitações que determinarão o tipo de planificação. Esta

planificação individualizada conduz-nos para a diferenciação curricular, mais acentuada, sobretudo

se se tratar de uma criança com um Currículo Específico Individual (CEI). Este ponto de vista foi,

também, enfatizado na revisão bibliográfica, como tivemos oportunidade de ver.

As estratégias de inclusão não são consideradas por todos os intervenientes de igual modo.

Inclusive são questionadas as “vantagens” de determinados alunos com NEE estarem integradas em

turmas de ensino regular. Esta diferença de pontos de vista enriquece o debate e solidifica algumas

questões que viemos colocando ao longo do presente relatório e se prendem com a problemática

que subjaz ao ideal de escola inclusiva.

No que respeita à reação da aluna em sala de aula a visão das técnicas especializadas

encaminha-se no sentido de que as dificuldades em acompanhar os conteúdos curriculares poderão

conduzi-la (à D. ou a outras crianças em situação idêntica) a alguma falta de atenção e

desmotivação. Na verdade, este é um dos problemas que a inclusão coloca: atender a todos, sem

descurar nenhum. Para que nenhum se sinta esquecido. Mas este ponto de vista poderá ser um

ideal. Ideal que norteará a realidade. Contudo, na prática, é também um dos maiores problemas que

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 126

a inclusão coloca. É um dos grandes desafios com que o professor se debate. Foi também abordado

este ponto de vista durante o nosso trabalho.

No que respeita à recetividade da turma face à D., as técnicas especializadas são de opinião

que de momento, ainda é aceite pelo grupo. Salientam como importante suporte a sua irmã. No

entanto, anteveem que com a passagem para o 2.ºCiclo esta situação se altere. Por também nós

valorizarmos, sobremaneira, a aceitação destas crianças pelos seus pares, lembramos que, tal como

foi oportunamente referido, o seu PEI previa a sua participação em todas as atividades da

turma/escola.

Quando questionadas sobre os recursos técnicos e humanos disponibilizados para esta

população escolar, as entrevistadas apontam, claramente, a sua insuficiência ao nível da educação

especial quer no número (esclarecendo que há muitos alunos na proporção professor/aluno), quer

nas horas disponibilizadas (que são poucas). Uma das entrevistadas enfatiza pela positiva o papel

da Segurança Social, que complementa a escassez de recursos. Estes aspetos vêm de encontro a

alguns dos pontos de vista que temos vindo a debater: a falta de recursos adequados pode ser um

entrave à escola inclusiva e o facto de trabalharem com os alunos equipas multidisciplinares,

especialistas de várias áreas do saber, deve ser objeto de reflexão da parte da educação; razão pela

qual nos propusemos auscultar técnicos especializados em vez de docentes.

No que respeita ao papel desenvolvido por parte da educação especial, as técnicas

especializadas relevam a importância do apoio individualizado quer pelas aprendizagens

desenvolvidas quer pelo conforto que é proporcionado à criança. Ainda assim, voltam a acentuar a

insuficiência do número de horas disponibilizadas para cada aluno.

Relativamente às expetativas para o futuro da D., as entrevistadas acreditam na aquisição

de competências académicas, mas salientam a importância de a aluna ser preparada para integrar o

mercado de trabalho desempenhando funções menos exigentes ao nível mental. A preocupação

com o futuro da população escolar portadora de NEE, tem vindo a merecer atenção crescente. Isso

é visível tanto a nível de debates televisivos como da promulgação de diferentes normativos legais

(lembramos que o Art.º14.º do dec.-Lei n.º3/2008 prevê um Plano Individual de Transição, iniciado

três anos antes da idade limite da escolaridade obrigatória que promova a adequada transição para a

vida pós-escolar dos alunos que apresentem dificuldades em seguir o currículo). No entanto, é

igualmente verdade que - apropriando-nos aqui de um sentimento muito pessoal – não poderemos

deixar de refletir sobre esta questão: Se até para os jovens ditos “normais”, o mercado de trabalho

se apresenta tão exigente e pouco generoso, que possibilidades dará aos jovens portadores de

NEE?

Por fim, a entrevistada que apontou possíveis estratégias para melhorar a inclusão dos alunos com

Deficiência Mental no ensino dito regular, referiu um conjunto de estratégias que pretendem

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 127

aproximar/normalizar o máximo possível aqueles alunos, dos seus pares dando como exemplo:

ensino proporcionado em ambiente de sala de aula e procedimentos iguais aos dos seus pares no

registo das avaliações.

6.8 Limitações do estudo

Esta investigação focaliza-se num caso específico incluído no grupo de crianças que integraram o

nosso estágio. Temos consciência da particularidade e das restrições várias que envolveram este

estudo e, como tal, a análise das respostas bem como as conclusões não podem ser generalizadas,

apenas poderão servir como suporte de reflexão e, eventualmente, conduzir a melhorias nas

práticas pedagógicas. Devem entender-se, tendo em conta condicionantes de diversa natureza.

As limitações do estudo são evidentes, mas, com humildade, consideramos que não diminuem a

solidez das informações apresentadas. O primeiro grande obstáculo terá sido o fator tempo cuja

escassez hoje perturba as mais diversas classes profissionais, e os professores não escapam a esta

situação. Esta condicionante conjugada com contextos profissionais exigentes e ambientes

familiares frágeis impedem à partida que se invista num Projeto mais ambicioso.

Uma outra condicionante, decorrente da primeira, terá sido o facto de, como já foi referido, o

estudo empírico ter poucas unidades de análise. Contudo, com modéstia, teremos presente o ponto

de vista de Ghiglione e Matalon (1997), quando nos referem que não existe qualquer método que

nos assegure, em todos os casos, uma amostra absolutamente representativa. Finalmente

reconhecemos que um tratamento estatístico mais elaborado das respostas, poderia enriquecer os

resultados apurados. Ainda assim, sem dúvida, conseguimos recolher os dados que

verdadeiramente nos interessavam para o nosso estudo.

6.9 Apresentação do estudo de caso

Embora tivéssemos, ao longo do trabalho realizado, refletido globalmente sobre todos os alunos

que integravam o nosso grupo de estágio, e apesar de, como já referimos, termos integrados na sala

de aula três alunos com NEE, a nossa proposta no âmbito das entrevistas realizadas, recaiu, apenas,

num dos casos que foi escolhido aleatoriamente. Após reflexão e auscultação das técnicas

especializadas, entendemos que, em boa verdade, poderia não ser muito produtivo para a

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 128

investigação a realização de três entrevistas, às mesmas pessoas, sobre uma mesma realidade

educativa já que o contexto institucional era rigorosamente o mesmo (a mesma escola e a mesma

turma).

Por outro lado, não entrevistámos a professora titular de turma porque a classe docente não estava

diretamente prevista no contexto deste estudo de campo, pois como foi oportunamente referido, já

em trabalhos anteriores havíamos realizado investigações abrangendo a inquisição a um grande

nível de população docente (professores do ensino regular e professores da educação especial). Do

mesmo modo, aceitamos que o leitor possa questionar se não seria interessante ouvir, também,

diretamente a opinião da encarregada de educação da aluna; contudo, igualmente, este aspeto fugia,

aqui, à especificidade dos dados que pretendíamos apurar. Acresce, o facto de considerarmos como

tema para um novo estudo, a possibilidade de auscultar os encarregados de educação do nosso

Agrupamento face à inclusão dos seus educandos com NEE.

Posto isto, passamos a apresentar a D., aluna na qual se centraram as entrevistas realizadas à

psicóloga e à terapeuta da fala. Os dados constantes no Roteiro de Avaliação com referência à CIF,

o seu PEI e outros documentos anexos ao processo individual permitiram-nos realizar a sua

caraterização sob o ponto de vista da história pessoal e escolar, e do trabalho com ela realizado em

contexto académico. Proporcionamos, ainda, informações relativas à sua situação atual.22

Deste modo, cumpre-nos informar que: aquando do momento da referenciação, ocorrido em 20 de

julho de 2012, para efeitos de elegibilidade no âmbito do Dec.-Lei n.º3/2008 de 7 de janeiro, foi

realizado em conformidade com a lei, a Planificação do Roteiro de Avaliação. Mais tarde, no início

do ano letivo 2012/2013 foi elaborado para a aluna o Programa Educativo Individual. No mesmo

processo (referenciação) constavam todos os diferentes passos nele previstos: Roteiro de

Avaliação; Descrição da Situação Educativa da Aluna; O que avaliar; Como avaliar; Checklist –

Funções do Corpo; Checklist – Atividade e Participação; Checklist – Fatores Ambientais e

Relatório Técnico Pedagógico. Anexo estava, também, o relatório psicológico que serviu de

importante pedra basilar ao desenrolar do processo.

Apresentam-se de seguida uma réplica do documento Descrição da Situação da Aluna, por, neste

contexto, ter sido o primeiro a ser organizado e reunir a informação relevante para ponto de partida,

e do Relatório Técnico Pedagógico, a parte que respeita ao Perfil de funcionalidade, por sintetizar

22 Acompanhámos o percurso da aluna até ao momento atual e podemos pronunciar-nos com total conhecimento de causa.

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 129

toda a informação recolhida durante o procedimento, registar a tomada de decisão e apontar as

medidas educativas.

Quadro 7: Descrição da situação da aluna

ROTEIRO DE AVALIAÇÃO

Nome: D. Idade: 9 anos

Data de Nascimento:

Ano de Escolaridade: 3º Escola: Póvoa do Mileu

DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO DA ALUNA

A D. está matriculada no 3.º ano, mas acompanha e desenvolve conteúdos ao nível do 1.º e do 2.º

ano a Língua Portuguesa. Só agora começa a ler textos muito simples, tendo dificuldade na

identificação e aplicação de casos de leitura e escrita de palavras e frases. Estas dificuldades

refletem-se em todas as suas aprendizagens precisando de ajuda para a realização de todas as

suas tarefas.

Em Estudo do Meio acompanhou os seus pares apenas no domínio oral, mas revelou muitas

dificuldades quer na aquisição quer na aplicação de conhecimentos.

Em Matemática trabalhou alguns conteúdos do 3.ºano e outros do 2.ºano mas, revela igualmente,

muitas dificuldades, principalmente no cálculo mental, resolução de situações problemáticas e

escrita e identificação de números. Também não conseguiu memorizar as tabuadas dadas.

Apresenta ainda falta de atenção/concentração e pouco interesse pela atividades escolares.

A nível comportamental tem dificuldade no cumprimento de regras, distrai-se e distrai os colegas

causando perturbação.

Apesar de todas as suas fichas de avaliação terem sido adaptadas ao seu nível de aprendizagem,

nem sempre foi autónoma na realização das mesmas necessitando de ajuda.

Foi-lhe elaborado um Plano de Recuperação, no entanto não foi suficiente para que a D.

desenvolvesse as competências necessárias à transição de ano, tendo ficado retida no 3.ºano de

escolaridade.

Na sequência das dificuldades diagnosticadas, foi proposto no ano letivo anterior

acompanhamento pelo Perito de Orientação Escolar do Agrupamento e neste ano letivo,

Avaliação Psicológica, cujo relatório foi colocado em anexo.

Fonte: Elaboração própria

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 130

Quadro 8: Relatório Técnico Pedagógico

RELATÓRIO TÉCNICO-PEDAGÓGICO

(Por referência à CIF)

Perfil de Funcionalidade

1.Funções do corpo

Os testes psicológicos confirmam que se encontram comprometidas as seguintes funções:

Funções da orientação no espaço e no tempo; Funções intelectuais; Funções do temperamento e

da personalidade; Funções da atenção; Funções da memória; Funções emocionais; Funções da

perceção; Funções do pensamento; Funções cognitivas de nível superior; Funções mentais da

linguagem; Funções do cálculo; Funções da articulação.

Como tal, a sua problemática enquadra-se no Domínio Cognitivo.

2.Atividade e participação

Encontram-se comprometidos os seguintes qualificadores: Adquirir informação; Adquirir

conceitos; Aprender a ler; Aprender a escrever; Aprender a calcular; Concentrar a atenção;

Direcionar a atenção; Pensar; Resolver problemas; Levar a cabo uma tarefa única; Controlar o

seu próprio comportamento; Comunicar e receber mensagens escritas; Escrever mensagens;

Interações interpessoais básicas; Interações interpessoais complexas; Relacionamento formal;

Educação escolar; Vida escolar e atividades relacionadas.

3. Fatores ambientais

Os produtos e tecnologias para a educação surgem como facilitadoras, no seu

ensino/aprendizagem. Ao nível de apoio e relacionamentos, os conhecidos, professores e

membros da comunidade surgem como facilitadores. As professoras têm mantido uma atenção

especial às necessidades da aluna, colaborando e incentivando-a. O Perito de Orientação

Escolar e a Psicóloga foram um facilitador ao colaborarem no processo da aluna.

Fonte: Elaboração própria

Este Relatório Técnico Pedagógico veio confirmar a necessidade de a D. necessitar de intervenção

especializada em Educação Especial, referindo que A aluna apresenta um quadro

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 131

cognitivo/emocional complexo que se traduz em fracos desempenhos escolares. Apresenta

limitações significativas na atividade e participação principalmente ao nível da leitura, da escrita

e também do cálculo (julho/2012).

Como já foi enunciado, o Relatório apontou, ainda, as adequações a realizar no processo de ensino

e de aprendizagem, com as respetivas medidas educativas. Estas, foram :

Artigo 17º - Apoio pedagógico personalizado;

Artigo 18º -Adequações curriculares individuais (em todas as áreas);

Artigo 20º Adequações no processo de avaliação (a todas as disciplinas);

- Tipo de prova;

- Instrumentos de avaliação e certificação;

- Formas e meios de comunicação;

- Periodicidade;

- Local.

Artigo 22 º Tecnologias de apoio.

Propunha, também, que a aluna beneficiasse de turma reduzida de acordo com o disposto no ponto

2 do art.12º do Dec.Lei 3/2008, conjugado com o ponto 5.4 do Desp. nº 14026/2007 e de

acompanhamento a nível de estimulação psicológica. Estas importantes orientações foram

consideradas quando o PEI foi elaborado e implementado, no início do ano letivo seguinte, como já

foi mencionado. De igual modo, nele, foram definidos (e clarificados) os seguintes conteúdos a

desenvolver: Emocional/Comportamental; Autonomia Pessoal e Social; Leitura; Escrita e Cálculo.

O mesmo documento previa ainda que a D. participaria em todas as actividades escolares,

respeitando as suas limitações e valorizando as suas competências. Participará em todas as visitas

de estudo e passeios da sua turma, desde que mostre interesse e a Encarregada de Educação

autorize (PEI 2012/2013).

Mais tarde viria, ainda, a solicitar-se e conceder-se intervenção ao nível da terapia da fala. Por

outro lado, cumpre esclarecer que o Perito de Orientação Escolar terminou a sua intervenção a

partir do momento em que a aluna foi integrada na educação especial, sendo, assim, acompanhada

pela psicóloga. Este procedimento é habitual nos normativos da escola.

Capítulo VI Organização e desenvolvimento do estudo experimental

© Fernanda Cardoso (2015) 132

6.10 Situação educativa atual23

Como a aluna conseguiu - com as medidas educativas propostas - atingir os objetivos definidos,

não se verificou necessidade de recorrer a outras mais restritivas e no ano letivo em curso à data da

PES, a sua escolarização foi feita como já referimos, no âmbito da educação especial, nas

condições atrás previstas.

A D. revelou estar bem integrada na sala de aula e acompanhou os pares em todas as atividades

propostas para a turma. O desenvolvimento do seu plano de estudos impôs muita flexibilização e

estratégias diversificadas, bem como adequada articulação tanto da parte das discentes que a

acompanharam, como da parte da psicóloga e da terapeuta da fala. Assim, o ano letivo foi

concluído com êxito24.

Naturalmente que não foi alheio a este sucesso a postura da aluna (que tem desenvolvido atitudes

cada vez mais positivas, e tem manifestando empenho e vontade crescente em participar nas tarefas

propostas), a recetividade dos pares, o esforço e envolvimento dos diferentes agentes educativos

que ultrapassaram barreiras e acreditaram nas suas competências. Também a Encarregada de

Educação, colaborou com a escola, dentro das suas limitadas possibilidades, no desenvolvimento

do processo escolar.

Assim, relativamente à eficácia da resposta educativa encontrada, os dados demonstram que a

evolução da criança foi muito significativa, constatação esta que acompanhámos muito de perto25,

durante um longo período de tempo, e com a qual nos congratulamos profundamente. No entanto,

em nome da verdade, cumpre dizer que a implementação da diferenciação curricular, que se

manifesta imprescindível para alunos com patologias específicas e a adequada gestão pedagógica

em sala de aula, não são caminhos fáceis de percorrer.

23 A informação reporta-se a ao momento do final da PES. 24 Lembramos que podemos dar-nos a possibilidade de fazer uma avaliação de final de ano letivo porque a

conclusão da nossa PES coincidiu com o final do mesmo. 25Apesar de sabermos que esta informação ultrapassa o âmbito deste trabalho (embora acreditemos que o

leitor ficará agradado em a saber), não podemos deixar de referir que acompanhámos a aluna durante um

longo período de tempo subsequente à nossa PES e tivemos a possibilidade de acolher o feed back do seu

desenvolvimento pessoal e académico que foi muito satisfatório.

Conclusões

© Fernanda Cardoso (2015) 133

Conclusões

Como escreveu Shakespeare,

há quem diga que todas as noites são de sonhos. Mas há também quem garanta que nem todas, só

as de verão. Mas no fundo isso não tem muita importância. O que interessa mesmo não são as

noites em si, são os sonhos. Sonhos que o homem sonha sempre.

William Shakespeare

Chegados ao terminus desta caminhada, urge agora reunir as principais ideias-base que as leituras

efetuadas e o estudo empírico nos ajudaram a construir ao longo deste trabalho. No quadro das

informações recolhidas a primeira grande ilação a retirar é que a realização deste Curso de

Mestrado foi profundamente enriquecedora. Temos consciência de ter encontrado aqui uma

oportunidade singular na reflexão e aprofundamento de diferentes saberes relativamente à

Educação Pré-Escolar e ao 1.º Ciclo do Ensino Básico, dos quais, em termos de formação contínua,

temos andado bastante alheados, há que dizê-lo.

Por um lado, o Curso de Mestrado conduziu-nos para uma perspetiva crítica e reflexiva, permitiu-

nos compreender melhor o papel do professor do ensino regular e aperfeiçoar a nossa atuação

pedagógica, tendo sempre presente a realidade educativa, mormente quando na sala de aula

coexistem mais do que um ano de escolaridade e alunos com Necessidades Educativas Especiais.

Deu-nos, assim, a possibilidade de refletir “na ação” e “sobre a ação” que converge na partilha e

troca de experiencias pedagógicas entre os docentes, aproveitando e valorizando as boas práticas e

a experiência com carater prospetivo e de futuro. Neste contexto, pretende-se caminhar,

essencialmente, para uma melhoria da qualidade das Práticas Pedagógicas, na reflexão para a

“ação”, que queremos cada vez mais eficaz, através de Práticas mais profícuas, promotoras,

rentáveis e de sucesso (não só escolar, mas também de vida).

Pelo outro, ajudou-nos a firmar a ideia de que a educação inclusiva, não é um evento, mas sim um

processo; processo este que assentou as suas bases em valores de democracia, da justiça social e da

solidariedade, que desde a segunda metade do século XX impuseram, progressivamente, o

reconhecimento da educabilidade de todas as pessoas e o direito de todos à educação.

O problema consiste agora, em se encontrarem meios de organizar as escolas, e as salas de aula, de

modo a que todos os alunos – mesmo os que têm problemáticas mais complexas, como é o caso da

deficiência mental – tenham sucesso nas aprendizagens e evoluam rumo a uma plena inclusão na

Conclusões

© Fernanda Cardoso (2015) 134

escola, na sociedade e na vida. Tendo como referência este tipo de conceptualização, quisemos

também nós dar o nosso humilde contributo, fornecendo pistas sobre a forma como as condições

necessárias a uma mais adequada gestão das respostas educativas especializadas aos alunos com

NEE, podem ser criadas e/ou melhoradas. Tenhamos presente que O paradigma emergente da

inclusão assenta em ideais de Humanismo, mas também em estudos realizados por pessoas e

grupos legitimados por um conhecimento patenteado (Carvalho, 2000:16).

Neste contexto – e sem termos qualquer tipo de pretensão – é importante que também este nosso

estudo seja visto numa perspetiva em que o papel das diferentes respostas educativas seja encarado

como parte do processo de melhoramento da inclusão das crianças com NEE, e que se alarguem os

limites do conhecimento existente; especificamente no que respeita à problemática da deficiência

mental. Acreditamos que as possibilidades de concretização da escola inclusiva poderão ser

possíveis; mas reafirmamos que são problemáticas. Se não fosse assim, provavelmente não se

falaria tanto dela. Exigem mudanças e ainda há um longo caminho para percorrer, mas como nos

diz Ladeira (1999), depende de nós iniciar o processo dessa mudança que se impõe.

Situando o contributo deste nosso estudo, na moldura das informações recolhidas, e a partir dele, o

reconhecimento das dificuldades experimentadas na implementação da escola inclusiva, diremos

que, o mesmo, pode fornecer uma humilde colaboração no plano de ação para a mudança e, de fato,

conduzir à perceção do modo como a implementação das políticas inclusivas podem ser levadas a

cabo. Esta abordagem pode funcionar como indicador de necessidades, com vista à melhoria da

escola no seu todo. Como já admitimos, não se podem generalizar os dados por serem insuficientes,

contudo espera-se que (mesmo não se resolvendo o problema) se possa conduzir à discussão

esclarecida desta questão: Quais os principais obstáculos que se colocam à escola, quando procura

dar resposta a todas as crianças – especificamente à criança portadora de deficiência mental – e

como poderemos dar o nosso contributo para minimizar esta problemática?

O CNE (1999) enuncia como “um vasto conjunto de condições indispensáveis”: mudanças

jurídico-legislativas; mudanças organizativas e de gestão ao nível das escolas; mudanças ao nível

do professor e de outros intervenientes; apoio aos alunos numa perspetiva de escolarização para

todos; mudanças ao nível da natureza e da estrutura do currículo, mudanças no modelo de apoio

individual aos alunos.

Ainda na prossecução desse ideal apontamos outros caminhos que poderão constituir-se como

novos focos de estudo e surgem fruto do contributo desta investigação, mas não tiveram nela o

destaque merecido. Nomeadamente: tendo em conta a relevância que o envolvimento familiar

Conclusões

© Fernanda Cardoso (2015) 135

assume na construção da verdadeira escola inclusiva, seria interessante questionar as famílias das

crianças com NEE sobre o que pensam ser necessário para que a inclusão dos seus filhos se

processe da melhor forma possível.

Para já, concluímos este nosso trabalho acreditando que, em síntese, apontámos ideias

fundamentais a reter como moldura necessária para o desenvolvimento de uma verdadeira escola

inclusiva. Por essa via, modestamente, acreditamos que conseguimos com o nosso estudo atingir os

objetivos propostos, quer através da nossa fundamentação teórica (que deu praticamente todas as

respostas para a problemática abordada), quer com a parte prática que constituiu o estudo de

campo.

Encerramos com uma abrangente reflexão: Felizmente sob o ponto de vista teórico, existe consenso

quanto à necessidade de criar condições favoráveis à educação para todos. Na prática de entre os

muitos obstáculos que se levantam, o maior será a atual crise económica mundial (Baptista:2011).

Pela nossa parte, faremos tudo o que está ao nosso alcance para eliminar ou minimizar os

obstáculos que daí decorrerem.

E porque …

A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios.

Por isso, cante, chore, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem

aplausos.

Charlie Chaplin

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WANG, M. (1997). “Atendendo Alunos com Necessidades Especiais”. In Caminhos para as

Escolas Inclusivas, pp. 49-67. Lisboa: Instituto de Educação Inovacional.

ZEICHENER, K. (1993). A formação reflexiva de professores: ideias e práticas. Lisboa: Educa –

Professores.

Legislação

Circular n.º17/DSDC/DEPED/2007. Gestão do Currículo na Educação Pré-Escolar. Direcção-Geral

de Inovação e de Desenvolvimento Curricular.

Decreto-Lei n.º319/91 de 23 de agosto.

Decreto-Lei n.º20/2006 de 31 de janeiro.

Decreto-Lei n.3/2008 de 7 de janeiro.

Decreto-Lei n.º147/97 de 11 de junho.

Decreto-Lei n.º241/2001 de 30 de agosto.

Decreto-Lei n.º75/2008 de 22 de abril.

Decreto-Lei n.º6/2011 de 18 de janeiro.

Despacho normativo n.º50/2005 de 9 de novembro.

Despacho conjunto n.º105/97 de 1 de julho.

Despacho N.º9590/99 de 14 de maio.

Despacho n.º11120 – A/2010 de 6 de julho.

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Referências Bibliográficas

© Fernanda Cardoso (2015) 145

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Lei n.º 11-A/2013 de 28 de janeiro.

Lei n.º 49/2005 de 30 de agosto.

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Portaria n.º293/2013 de 26 de setembro.

Relatórios

Report of the Warnock Commitee of Enquiry into the Education of Handicapped Chilren Young

People (1978).

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Relatório Integral – Janeiro 2011. Pobreza e Exclusão Social. Eurobarometro.

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO (1999). Crianças e alunos com Necessidades

Educativas Especiais – Parecer nº3/99. Diário da República II.ª Série, nº40.

Anexos

© Fernanda Cardoso (2015) 146

Anexos

Entrevista Psicóloga

© Fernanda Cardoso (2015) 147

ENTREVISTA - GUIÃO

1- O QUE SABE SOBRE A GRAVIDEZ E O HISTORIAL DA D.?

2- EM QUE MOMENTO FOI DIAGNOSTICADA A DEFICIÊNCIA MENTAL? É CONHECIDA A CAUSA DA DEFICIENCIA?

3- RESUMIDAMENTE, PODE DIZER QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS CARATERÍSTICAS EVOLUTIVAS DA DEFICIÊNCIA MENTAL?

4- EM SUA OPINIÃO, QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS IMPLICAÇÕES EDUCATIVAS DESTES ALUNOS NA ESCOLA DITA REGULAR?

5- CONSIDERA QUE ESTÃO A SER UTILIZADAS ESTRATÉGIAS DE INCLUSÃO?

6- PODE INDICAR REAÇÕES DA CRIANÇA AO AMBIENTE NA SALA DE AULAS?

A P R E S E NT E E NT R E VIS TA INS E R E - S E NO ÂM BIT O DE UM

E S T UDO, C UJ A T E M ÁT IC A VE R S A A I NC L US ÃO D E AL UN OS C O M

DE F IC IÊ NC I A M E NTAL ( DM ) NO 1 . º C E B E M E S C OL AS DE E NS IN O

R E G UL AR . T E M C OM O P R INC IPAL OBJ E T I VO C ON HE C E R AS

P E R C E Ç ÕE S DOS P R OF IS S IONAIS QUE INT E RVÊ M J UNT O D E

AL UN OS C OM E S TA P R O B L E M ÁT IC A.

Entrevista Psicóloga

© Fernanda Cardoso (2015) 148

7- EM SUA OPINIÃO, ESTA CRIANÇA É ACEITE PELO GRUPO? COMO REAGEM AS CRIANÇAS À SUA PRESENÇA?

8- O QUE PENSA SOBRE OS RECURSOS HUMANOS E MATERIAIS QUE SÃO

ATUALMENTE DISPONIBILIZADOS PARA OS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO ENSINO REGULAR?

9- SABE SE A RESPOSTA EDUCATIVA POR PARTE DA EDUCAÇÃO ESPECIAL ESTÁ A SER EFICAZ? SE PRETENDER, REFIRA DIFICULDADES E EVOLUÇÕES.

10- EM TERMOS DE PERSPETIVAS PARA O FUTURO, ATÉ ONDE PENSA QUE PODERÁ EVOLUIR ESTA CRIANÇA?

11- QUAIS AS DIFICULDADES QUE VISLUMBRA NO PERCURSO ESCOLAR E DE VIDA DESTA ALUNA?

12- QUER ANOTAR ESTRATÉGIAS QUE POSSAM CONTRIBUIR PARA A INCLUSÃO DOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO SISTEMA EDUCATIVO DITO REGULAR?

MUITO OBRIGADA PELO SEU CONTRIBUTO.

Autorização

© Fernanda Cardoso (2015) 149

AUTORIZAÇÃO

Autorizo a realização das entrevistas programadas.

As entrevistas têm como objetivo a recolha de dados para a

realização de um Estudo de Caso sob o tema “Inclusão de alunos com

deficiência mental no 1.º CEB – Um estudo de caso”, no âmbito de um

Mestrado em Educação Pré-Escolar /1º Ciclo do Ensino Básico.

Em:

___/____/____

Entrevista Psicóloga

© Fernanda Cardoso (2015) 150

ENTREVISTA - PSICÓLOGA

1- O QUE SABE SOBRE A GRAVIDEZ E O HISTORIAL DA D.?

Não tenho informação precisa.

2- EM QUE MOMENTO FOI DIAGNOSTICADA A DEFICIÊNCIA MENTAL? É CONHECIDA A CAUSA DA DEFICIENCIA?

A deficiência foi diagnosticada em julho de 2012, após a realização de

avaliação psicológica à aluna, no seguimento da sinalização efetuada pela

professora titular da turma. A deficiência mental é resultado de baixo

desenvolvimento das estruturas ou funções mentais da aluna, podendo haver várias

causas para tal, nomeadamente a componente hereditária, a fraca estimulação

ambiental.

3- RESUMIDAMENTE, PODE DIZER QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS

CARATERÍSTICAS EVOLUTIVAS DA DEFICIÊNCIA MENTAL?

As crianças que apresentem deficiência cognitiva têm, comparativamente com

outras crianças da mesma faixa etária, baixa maturação intelectual. Isto pressupõe

A P R E S E NT E E NT R E VIS TA INS E R E - S E NO ÂM BIT O DE UM

E S T UDO, C UJ A T E M ÁT IC A VE R S A A I NC L US ÃO DE AL UN OS C OM

DE F IC IÊ NC I A M E NTAL N O 1 . º C E B E M E S C OL AS DE E NS IN O

R E G UL AR . T E M C OM O P R INC IPAL O BJ E T I VO C ON HE C E R AS

P E R C E Ç ÕE S DOS P R OF IS S IONAIS QUE INT E RVÊ M J UNT O D E

AL UN OS C OM E S TA P R O B L E M ÁT IC A.

Entrevista Psicóloga

© Fernanda Cardoso (2015) 151

que, apesar das eventuais evoluções que apresentem, podendo fazer grandes

progressos, não alcançarão o nível de desenvolvimento considerado normativo.

Não esquecer que estamos perante deficiências de carácter permanente. Ainda

assim, e dependendo do grau de deficiência, podem fazer aquisições académicas,

podendo, em alguns casos, ser semelhantes ao seu grupo de pares, tendo para tal

de apresentar mais e melhor trabalho e estudo.

4- EM SUA OPINIÃO, QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS IMPLICAÇÕES

EDUCATIVAS DESTES ALUNOS (NESTE CASO ESPECÍFICO DA D.) NA ESCOLA DITA REGULAR?

No momento de planificar a intervenção educativa, pensarmos na dificuldade

na linguagem, nas relações, sociais, autonomia, linguagem…conhecer o estado de

desenvolvimento para melhor adequar a planificação….

5- CONSIDERA QUE ESTÃO A SER UTILIZADAS ESTRATÉGIAS DE INCLUSÃO?

A integração destas crianças, em turmas ditas regulares, pressupõe a ideia de

inclusão. Todavia, elas são em muitos aspetos diferenciadas dos restantes colegas

(ex: medidas educativas diferentes, avaliação diferente, TPC diferentes). Ao fazê-lo

estamos a transmitir a ideia de que, de alguma forma, se trata de uma criança

diferente. Esta ideia facilmente é apropriada pela própria criança e pelos restantes

colegas. Assistimos assim recorrentemente, nos intervalos das nossas escolas e até

dentro da sala de aula, à diferenciação e distinção destas crianças, que muitas

vezes são apenas aceites e vistas como iguais, por outros que se encontram na

mesma situação. Desta forma, que tipo de inclusão estamos nós a praticar? Serão

estas crianças felizes nas escolas ditas regulares? Ou estão apenas a serem

obrigadas a conviver com tantos que consideram diferentes? Tenho muitas dúvidas

em relação a este tipo de inclusão...

6- PODE INDICAR REAÇÕES DA CRIANÇA AO AMBIENTE NA SALA DE AULAS?

Entrevista Psicóloga

© Fernanda Cardoso (2015) 152

O que muitas vezes acontece com esta criança, e outras na situação dela, é que,

como não conseguem de maneira nenhuma perceber e acompanhar a matéria

lecionada, incorrem numa crescente desmotivação e desinvestimento escolar.

Como são obrigadas a estar sentadas nos seus lugares, acabam por perturbar o

normal funcionamento da aula. Ou então são muitas vezes ocupadas com tarefas e

exercícios imaturos e facilitistas, que não contribuem para o seu progresso.

7- EM SUA OPINIÃO, ESTA CRIANÇA É ACEITE PELO GRUPO? COMO REAGEM AS CRIANÇAS À SUA PRESENÇA?

De momento, a criança ainda vai conseguindo integrar-se nos intervalos e

brincadeiras (com a ajuda da sua irmã que frequenta o mesmo ano). Todavia, já

ouve os comentários depreciativos dos colegas. Com o avançar da idade, e

particularmente na mudança para o 2º ciclo, esta discrepância vai sendo cada vez

mais evidente.

8- O QUE PENSA SOBRE OS RECURSOS HUMANOS E MATERIAIS QUE SÃO ATUALMENTE DISPONIBILIZADOS PARA OS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO ENSINO REGULAR?

Naturalmente são insuficientes! Particularmente os disponibilizados pelo

Ministério da Educação (quer o número de profissionais, quer a carga horária que

lhes disponibiliza). Felizmente, a aluna, consegue beneficiar de recursos da Seg.

Social que comportam as terapias que tem tido nestes dois últimos anos.

9- SABE SE A RESPOSTA EDUCATIVA POR PARTE DA EDUCAÇÃO ESPECIAL ESTÁ A SER EFICAZ? SE PRETENDER, REFIRA DIFICULDADES E EVOLUÇÕES.

Neste tipo de deficiências, é sempre muito importante o apoio individualizado,

quer pelas aprendizagens promovidas, quer pelo apoio e conforto que transmite à

criança. Ainda assim, e indo ao encontro da perg. anterior, considero insuficiente

o número de horas semanais dispensadas a cada aluno.

Entrevista Psicóloga

© Fernanda Cardoso (2015) 153

10- EM TERMOS DE PERSPETIVAS PARA O FUTURO, ATÉ ONDE PENSA QUE PODERÁ EVOLUIR ESTA CRIANÇA?

Como já referi, a aluna vai fazendo as suas aquisições, sempre distantes das

consideradas normativas para a sua faixa etária. Neste caso concreto, penso ser

possível que domine a capacidade de escrita e leitura, mais fluentemente. Mias

importante que os conteúdos curriculares, neste caso em concreto, penso que a

escola assume o importante papel de a preparar para o mercado de trabalho e

para as exigências do seu dia a dia, sendo este o trabalho a realizar futuramente.

11- QUAIS AS DIFICULDADES QUE VISLUMBRA NO PERCURSO ESCOLAR E DE VIDA DESTA ALUNA?

A discriminação do seu grupo de pares (levando a um conjunto de

consequências sociais e emocionais) e a crescente desmotivação e desinvestimento

escolar por parte da aluna.

12- QUER ANOTAR ESTRATÉGIAS QUE POSSAM CONTRIBUIR PARA A INCLUSÃO DOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO SISTEMA EDUCATIVO DITO REGULAR?

O apoio individualizado deve ser prestado exclusivamente na sala, juntamente

com a sua turma, não havendo horários diferentes para estes alunos (exceto no

caso de alunos com CEI). As notas e resultados escolares devem ser transmitidos

de igual forma (mesmo que realize testes diferentes), efetuando a correção e dando

nota como aos colegas de turma.

MUITO OBRIGADA PELO SEU CONTRIBUTO.

Entrevista Terapeuta da Fala

© Fernanda Cardoso (2015) 154

ENTREVISTA - TERAPEUTA DA FALA

1- O QUE SABE SOBRE A GRAVIDEZ E O HISTORIAL DA D. ?

Sei apenas que a D. e a irmã gémea C. nasceram da 3ª gravidez da mãe e que

atualmente os pais estão separados. Desconheço qualquer outro tipo de

informação relevante.

2- EM QUE MOMENTO FOI DIAGNOSTICADA A DEFICIÊNCIA MENTAL? É CONHECIDA A CAUSA DA DEFICIENCIA?

Penso que em julho de 2012. A causa estará relacionada com questões

hereditárias e ambientais (falta de estimulação).

3- RESUMIDAMENTE, PODE DIZER QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS CARATERÍSTICAS EVOLUTIVAS DA DEFICIÊNCIA MENTAL?

A deficiência mental é um problema de caráter permanente. Mesmo fazendo

evoluções significativas, a nível académico, linguístico, etc, a criança terá sempre

um desenvolvimento aquém do esperado para a idade.

A P R E S E NT E E NT R E VIS TA INS E R E - S E NO ÂM BIT O DE UM

E S T UDO, C UJ A T E M ÁT IC A VE R S A A I NC L US ÃO D E AL UN OS C O M

DE F IC IÊ NC I A M E NTAL ( DM ) NO 1 . º C E B E M E S C OL AS DE E NS IN O

R E G UL AR . T E M C OM O P R INC IPAL OBJ E T I VO C ON HE C E R AS

P E R C E Ç ÕE S DOS P R OF IS S IONAIS QUE INT E RVÊ M J UNT O D E

AL UN OS C OM E S TA P R O B L E M ÁT IC A.

Entrevista Terapeuta da Fala

© Fernanda Cardoso (2015) 155

4- EM SUA OPINIÃO, QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS IMPLICAÇÕES EDUCATIVAS DESTES ALUNOS (NESTE CASO ESPECÍFICO DA D.) NA ESCOLA DITA REGULAR?

Uma criança com NEE na Escola Regular implica a necessidade avaliar

primeiro as suas competências para depois planificar a intervenção educativa mais

adequada.

5- CONSIDERA QUE ESTÃO A SER UTILIZADAS ESTRATÉGIAS DE INCLUSÃO?

Penso que sim. Estar integrada numa turma regular já é uma estratégia de

inclusão. No entanto tenho algumas dúvidas acerca da eficácia desta e de outras

estratégias de inclusão.

6- PODE INDICAR REAÇÕES DA CRIANÇA AO AMBIENTE NA SALA DE AULAS?

A desmotivação e a falta de atenção/concentração parecem ser as principais

reações que a D. manifesta em contexto de sala de aula. Este tipo de reações

poderá estar relacionado com o facto de a aluna não conseguir acompanhar o

grupo ao nível dos conteúdos académicos.

7- EM SUA OPINIÃO, ESTA CRIANÇA É ACEITE PELO GRUPO? COMO REAGEM AS CRIANÇAS À SUA PRESENÇA?

Penso que sim. A maioria das crianças da turma e mesmo da Escola conhece a D. desde o 1º ano, o que faz com que atualmente esteja integrada e seja aceite pelos colegas. Todavia, a partir do 2º ciclo as dificuldades de integração das crianças com NEE aumentam.

8- O QUE PENSA SOBRE OS RECURSOS HUMANOS E MATERIAIS QUE SÃO ATUALMENTE DISPONIBILIZADOS PARA OS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO ENSINO REGULAR?

Penso que os recursos humanos, disponibilizados pelo Ministério da Educação, são escassos. Considero que número de alunos atribuído por Professor é excessivo, o que faz com que o tempo semanal dedicado a cada um seja insuficiente.

Entrevista Terapeuta da Fala

© Fernanda Cardoso (2015) 156

9- SABE SE A RESPOSTA EDUCATIVA POR PARTE DA EDUCAÇÃO ESPECIAL ESTÁ A SER EFICAZ? SE PRETENDER, REFIRA DIFICULDADES E EVOLUÇÕES.

Acredito no bom trabalho da Educação Especial, mas como referi na questão

anterior, o tempo semanal dispensado pelo Professor parece-me insuficiente.

10- EM TERMOS DE PERSPETIVAS PARA O FUTURO, ATÉ ONDE PENSA QUE PODERÁ EVOLUIR ESTA CRIANÇA?

A D. ainda pode fazer aquisições académicas que lhe permitam futuramente

alguma autonomia nas atividades de vida diária. Todavia será incapaz de

desempenhar funções, no mercado de trabalho, mais exigentes a nível mental.

11- QUAIS AS DIFICULDADES QUE VISLUMBRA NO PERCURSO ESCOLAR E DE VIDA DESTA ALUNA?

As suas competências académicas, linguísticas, sociais, entre outras, estarão

sempre aquém do esperado para idade, o que pode gerar situações de

desmotivação por parte da aluna e discriminação por parte do grupo de pares e

futuramente da sociedade em geral.

12- QUER ANOTAR ESTRATÉGIAS QUE POSSAM CONTRIBUIR PARA A INCLUSÃO DOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL NO SISTEMA EDUCATIVO DITO REGULAR?

Não…

MUITO OBRIGADA PELO SEU CONTRIBUTO.