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Método de Valoração Contingente: Aspectos Teóricos e Testes Empíricos Ricardo Coelho de Faria e Jorge Madeira Nogueira 1 Valorando Bens e Serviços Ambientais Com a incorporação da dimensão ambiental na análise econômica iniciam-se os estudos sobre a valoração monetária dos impactos produzidos pelo ser humano sobre o meio ambiente. Na realidade, apesar de o problema das externalidades ambientais não ser uma novidade na Economia, as tentativas de mensurar monetariamente os custos e benefícios dos impactos ambientais são relativamente recentes. A valoração econômica do meio ambiente constitui-se em um conjunto de métodos e técnicas que buscam estimar valores para os ativos ambientais e para os bens e serviços por eles gerados. Diversos são os métodos disponíveis para estimar-se o valor econômico de bens e serviços ambientais e várias são as propostas de classificá-los. Bateman e Turner (1992) propõem distingui-los pela utilização ou não das curvas de demanda marshalliana ou hicksiana. Hufschmidt et al ... (1983) fazem suas divisões de acordo com o fato do método utilizar preços provenientes: i) de mercados reais; ii) de mercados substitutos; ou iii) mercados hipotéticos. Já Pearce (1993), observando a metodologia em uso corrente na economia ambiental, afirma que existem quatro grandes grupos de técnicas de valoração econômica desenvolvidos a um nível sofisticado 2 . Já Hanley e Spash (1993) grupam -nos: i) forma direta e ii) forma indireta. Nogueira, Medeiros e Arruda (1998) comparam e analisam essas diferentes classificações, buscando compatibilizá-las. O Método de Valoração Contingente (MVC) é comum a todas essas classificações. A idéia básica do MVC é que as pessoas têm diferentes graus de preferência ou gostos por diferentes bens ou serviços e isso se manifesta quando elas vão ao mercado e pagam quantias específicas por eles. Isto é, ao adquiri-los, elas expressam sua disposição a pagar (DAP) por esses bens ou serviços 3 . Esse método busca exatamente extrair a DAP (ou DAC) de uma amostra de consumidores por uma mudança no nível do fluxo do serviço ambiental através de questionamento direto, supondo um mercado hipotético cuidadosamente estruturado. O MVC foi originalmente proposto em 1963 num 1 Faria é mestre em Economia pela Universidade de Brasília (UnB) e Nogueira é professor adjunto do Departamento de Economia da UnB e bolsista do CNPq. Este trabalho foi apoiado financeiramente pelo CNPq. 2 O primeiro grupo é formado pelas técnicas que ele chama de “abordagens de mercado convencional” que utilizam os preços de mercado ou preços sombra como aproximação, semelhantemente aos métodos dos mercados reais de Hufschmidt et al. (1983). O segundo grupo é chamado de “funções de produção doméstica (ou familiar)”. O terceiro, os “métodos de preços hedônicos”. E o quarto e último grupo são os “métodos experimentais”. 3 Existe também a disposição a receber compensação (DAC), que é o raciocínio inverso: as pessoas receberiam uma quantia monetária para tolerar determinado problema ambiental.

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Método de Valoração Contingente:

Aspectos Teóricos e Testes Empíricos

Ricardo Coelho de Faria e

Jorge Madeira Nogueira1 Valorando Bens e Serviços Ambientais Com a incorporação da dimensão ambiental na análise econômica iniciam-se os estudos sobre a valoração monetária dos impactos produzidos pelo ser humano sobre o meio ambiente. Na realidade, apesar de o problema das externalidades ambientais não ser uma novidade na Economia, as tentativas de mensurar monetariamente os custos e benefícios dos impactos ambientais são relativamente recentes. A valoração econômica do meio ambiente constitui-se em um conjunto de métodos e técnicas que buscam estimar valores para os ativos ambientais e para os bens e serviços por eles gerados. Diversos são os métodos disponíveis para estimar-se o valor econômico de bens e serviços ambientais e várias são as propostas de classificá-los. Bateman e Turner (1992) propõem distingui-los pela utilização ou não das curvas de demanda marshalliana ou hicksiana. Hufschmidt et al ... (1983) fazem suas divisões de acordo com o fato do método utilizar preços provenientes: i) de mercados reais; ii) de mercados substitutos; ou iii) mercados hipotéticos. Já Pearce (1993), observando a metodologia em uso corrente na economia ambiental, afirma que existem quatro grandes grupos de técnicas de valoração econômica desenvolvidos a um nível sofisticado2. Já Hanley e Spash (1993) grupam -nos: i) forma direta e ii) forma indireta. Nogueira, Medeiros e Arruda (1998) comparam e analisam essas diferentes classificações, buscando compatibilizá-las. O Método de Valoração Contingente (MVC) é comum a todas essas classificações. A idéia básica do MVC é que as pessoas têm diferentes graus de preferência ou gostos por diferentes bens ou serviços e isso se manifesta quando elas vão ao mercado e pagam quantias específicas por eles. Isto é, ao adquiri-los, elas expressam sua disposição a pagar (DAP) por esses bens ou serviços3. Esse método busca exatamente extrair a DAP (ou DAC) de uma amostra de consumidores por uma mudança no nível do fluxo do serviço ambiental através de questionamento direto, supondo um mercado hipotético cuidadosamente estruturado. O MVC foi originalmente proposto em 1963 num

1 Faria é mestre em Economia pela Universidade de Brasília (UnB) e Nogueira é professor

adjunto do Departamento de Economia da UnB e bolsista do CNPq. Este trabalho foi apoiado financeiramente pelo CNPq. 2 O primeiro grupo é formado pelas técnicas que ele chama de “abordagens de mercado

convencional” que utilizam os preços de mercado ou preços sombra como aproximação, semelhantemente aos métodos dos mercados reais de Hufschmidt et al. (1983). O segundo grupo é chamado de “funções de produção doméstica (ou familiar)”. O terceiro, os “métodos de preços hedônicos”. E o quarto e último grupo são os “métodos experimentais”. 3 Existe também a disposição a receber compensação (DAC), que é o raciocínio inverso: as

pessoas receberiam uma quantia monetária para tolerar determinado problema ambiental.

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artigo escrito por R. Davis relacionando economia e recreação. Durante os anos 1970 e 1980, houve um grande desenvolvimento da técnica a nível teórico e empírico4 tornando-a bastante utilizada5 pelos economistas, modernamente [Hanley e Spash (1993, p.53)]. A operacionalização do MVC acontece através da aplicação de questionários cuidadosamente elaborados de maneira a obter das pessoas os seus valores de DAP/DAC [Pearce (1993, p.116)]. Existem várias formas6 de fazer isso, que levam a suas diversas variantes: a) técnica de perguntas abertas (“open-ended”); b) técnica de “bidding game”; c) modelo de referendo; d) modelo de referendo com repetição (“follow-up”); e) contingente classificatório (“ranking”); f) atividade contingente, entre outros7. Após a aplicação desses questionários, os resultados são tabulados e submetidos a uma análise econométrica de maneira a derivar valores médios dos lances de DAP/DAC. O MVC é mais aplicado para mensuração de: a) recursos de propriedade comum ou bens cuja excludibilidade do consumo não possa ser feita8; b) recursos de amenidades9; ou c) outras situações em que dados sobre preços de mercado estejam ausentes [Hufschmidt et al. (1983, p.233)]. Dois são os objetivos do presente ensaio. O primeiro é revisar a literatura sobre o Método Valoração Contingente (MVC), o quê é feito na próxima seção do trabalho. O segundo objetivo é aplicar a variante “bidding game” do MVC na estimativa do valor econômico de um patrimônio ambiental específico: a conservação do Jardim Zoológico de Brasília. A pesquisa de campo realizada e os resultados obtidos são apresentados e analisados na terceira seção. Finalmente, na quarta e última seção do estudo são discutidas as vantagens e as limitações da variante “bidding game” do MVC na valoração econômica de bens e serviços ambientais. Método Valoração Contingente (MVC) e suas variantes O Método de Valoração Contingente (MVC) busca valorar bens públicos e/ou ambientais para os quais não há preços de mercado. Na ausência de sinais de mercado, o método se propõe, por meio de surveys, revelar as preferências do consumidor por um bem ou serviço ambiental e, com isso, captar a sua disposição a pagar pelo bem em questão. Trata-se, portanto, da criação de um mercado hipotético, construído a partir de técnicas de questionários que buscam revelar as preferências dos indivíduos pelo bem público ou ambiental. Nesse sentido, o método será tanto mais preciso quanto mais próximo do real for o mercado hipotético criado.

4 Notadamente nos EUA.

5 O MPH, o MVC é um dos métodos que apresenta maior número de trabalhos em periódicos

que tratam da valoração econômica do meio ambiente. 6 Hanley e Spash (1993, p.55) citam outras formas: cartão de pagamento e questão aberta

(máxima DAP). 7 Outras variantes do MVC são ainda identificadas em Hufschmidt et alli (1983) como, por

exemplo: jogos de trade-off, costless choice e doubled-bloud. 8 Tais como qualidade do ar ou da água.

9 Amenity resources, em inglês, tais como características paisagística, cultural, ecológica,

histórica ou singularidade.

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O importante é procurar, na medida do possível, criar um mercado hipotético que se aproxime ao máximo de um mercado real. Mitchell e Carson (1989) argumentam que, pelo menos três elementos fundamentais devem constar no questionário desenhado: 1) a pesquisa deve ser constituída de uma descrição detalhada do bem ou serviço ambiental que está sendo avaliado assim como das circunstâncias hipotéticas em que tal bem ou serviço poderá estar disponível para o entrevistado; 2) é preciso definir algum tipo de questão na entrevista que revele a disposição a pagar do indivíduo pelo bem ou serviço ambiental; 3) é preciso também levantar outras variáveis sócio-econômicas e informações adicionais que indiquem a percepção desse indivíduo com relação problema ambiental em questão. Bateman e Turner (1992, p. 133) apresentam seis distintas fases envolvendo a aplicação do MVC. A primeira fase envolve a preparação dos procedimentos a serem aplicados10. A segunda corresponde ao levantamento de dados propriamente dito, obtendo respostas para as perguntas do questionário. Na fase seguinte, calcula-se a média da DAP ou da DAC. As estimativas propriam ente ditas são realizadas na quarta fase, através da estimativa de uma curva de propostas que permite a investigação dos determinantes da DAP/DAC11. Na quinta fase feito a agregação, quando o valor econômico total é estimado a partir do valor médio. Finalmente, na sexta fase é feita uma apreciação do método (avaliação), visando verificar sua precisão e aceitabilidade. O MVC não apresenta um caminho único de construção do mercado hipotético e de estimativas do valor do meio ambiente. Este pode variar em função do modo que se propõe captar as preferências dos consumidores e o valor que eles atribuem ao meio ambiente, ou seja, o MVC pode variar de acordo com o formato do survey da pesquisa, o que pode ser dividido em dois grandes grupos: os métodos diretos e indiretos. No primeiro, estão os formatos do open-ended, bidding game e cartões de pagamento. No segundo, estão os modelos conhecidos por referendum, referendum com follow-up, contingent ranking e contingent activity. Os métodos indiretos são aqueles que fornecem apenas uma indicação da verdadeira DAP do indivíduo. A forma como as questões são desenhadas produzem um conjunto de valores que não representa, diretamente, a máxima disposição a pagar. A interpretação das respostas do survey requer, portanto, um tratamento adicional aos dados com a finalidade de se obter a verdade DAP. O referendum model foi introduzido por Bishop e Herbelin (1979) e inicia-

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Nessa etapa são definidas questões importantes como: 1) levantamento do mercado hipotético (definir se usa a DAP ou DAC); 2) definição dos estilos de questionários (questões abertas, “pegar” ou “largar”, etc); 3) levantamento de informações sobre o bem em questão (características, uso, impactos, etc); e 4) definição da forma de pagamento (taxas de entrada, tarifas, etc). 11

Essa curva relaciona DAP ou DAC com visitas (Q), renda (Y), fatores sociais como educação (S) e outras variáveis explanatórias (X); um parâmetro de qualidade ambiental também pode ser considerado (E). Assim, formalmente teríamos: DAP = f (Q, Y, S, X, E). Não existe a forma teoricamente ideal dessa função. Entretanto, se uma função log é escolhida, os coeficientes são as elasticidades. Em qualquer caso, a curva nos permite estimar mudanças na média DAP(DAC) devido a mudanças em E.

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se com a criação de um conjunto de valores possíveis que podem representar a disposição máxima do indivíduo a pagar. Desse conjunto de valores, o entrevistador escolhe, de forma aleatória, um valor e o apresenta ao entrevistado com uma pergunta do tipo: “Você estaria disposto a pagar R$X para obter uma melhora na qualidade ambiental?” Esse tipo de questionário leva a um conjunto de respostas binárias que podem ser representadas por 0 e 1. Caso o indivíduo responda sim, esta pode ser representada pelo número 1. Ao contrário, se o indivíduo não está disposto a pagar o valor que lhe foi apresentado, a resposta seria 0. Uma resposta com um número 1 significa, portanto, que a disposição máxima do indivíduo pagar pelo bem em questão é maior ou igual ao valor que lhe foi apresentado na entrevista. Por outro lado, caso a resposta seja 0, significa que a disposição máxima do indivíduo a pagar é inferior ao valor que lhe foi apresentado. O referendum com follow-up foi introduzido por Carson, Hanemam e Mitchell (1986). A proposta é melhorar o procedimento anterior oferecendo um segundo valor de maneira similar ao formato bidding game. No entanto, agora o valor é selecionado aleatoriamente. Apesar de oferecer um certo ganho em termos de eficiência, apresenta os mesmos problemas do referendum tradicional. O método de contingent ranking solicita ao indivíduo colocar em ordem de preferência um conjunto de alternativas a ele apresentado. Cada alternativa contem diferentes atributos e para cada atributo, geralmente, é conferido um determinado preço. Uma primeira aplicação desse modelo foi realizada por Beggs, Cardell e Hausman (1981). Eles usaram o método para estimar o valor das características de modelos alternativos de veículos automotores.12 Posteriormente, conforme Freeman III (1993, p. 175), Smith e Descouges (1986) utilizaram a metodologia para estimar o valor da qualidade da água. Então, foi apresentado aos entrevistados 4 alternativas com 2 atributos cada, que era a qualidade da água e uma taxa anual a ser cobrada por essa qualidade. Uma questão que se coloca é se esse tipo de metodologia é suficientemente simples para permitir o ordenamento das alternativas por parte dos entrevistados. Um conjunto de alternativas pode-se configurar em um processo demasiadamente complicado, dado o grande volume de informações apresentado. Nesse sentido, um ranking com poucas alternativas e poucos atributos seria preferível à aquela que contêm muitas alternativas com vários atributos. O modelo de contigent activity tem por objetivo estimar demanda por visitas em um local de recreação em função do custo de viagem. Então, o modelo contingent activity propõe perguntar aos indivíduos como suas visitas mudariam se os atributos ambientais forssem mudados em um determinado sentido. A mudança contingente nas taxas de visitas seriam usadas para estimar o deslocamento da curva de demanda por visitas. Mc Connel (apud. Freeman III, 1991) usou abordagem para estimar os benefícios que os indivíduos poderiam obter para visitar o New Bedford Harbor, em 12

Os entrevistados foram solicitados para colocar em ordem de preferência 16 alternativas de desenhos de automóvel, onde cada desenho apresenta -se com 9 atributos, incluindo o preço de compra do automóvel e o gasto de gasolina.

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Massachusetts, nos EUA, se a poluição fosse eliminada. Trayer (1981) questionou os visitantes de um local de recreação como suas visitas seriam alteradas caso fosse implementada uma planta geotérmica na região. Já as variações do grupo métodos diretos têm em comum a forma de se obter a DAP nos procedimentos de survey. Da maneira como é abordada a questão, a resposta do indivíduo é um valor monetário que já representa a sua máxima disposição a pagar pela melhora do parâmetro ambiental estabelecido e, consequentemente, a medida de bem-estar. Entre elas, o método open-ended é o mais simples e propõe captar o valor econômico pelo bem ou serviço ambiental perguntando diretamente ao indivíduo algo como: “Qual seria sua disposição máxima a pagar para eliminar um determinado dano ambiental?” Esse valor que o indivíduo estaria, pelo menos em tese, disposto a pagar por uma melhora ambiental ou para eliminar um dano ambiental específico pode ser interpretado como o Excedente Compensatório (EC). Então, se o questionário conseguir captar essas respostas, assim como outras variáveis sócio-econômicas como renda, grau de instrução, etc., pode-se estimar uma curva de demanda pelo ativo ambiental em questão e, com isso, o benefício auferido pelo indivíduo devido à mudança ambiental, através do cálculo do EC. Outra questão possível de ser elaborada é a seguinte: “Qual é o mínimo que você estaria disposto a receber para esquecer a melhora de um determinado bem ou serviço ambiental”? A resposta à essa questão corresponde ao valor do Excedente Equivalente (EE), isto é, o beneficio auferido pelo indivíduo que é equivalente à suposta melhora ambiental. No caso de questão aberta, não há muito mais o que fazer após a realização da pesquisa, restando basicamente a interpretação dos dados. Esses questionários geram uma série de valores que são, na realidade, as medidas de bem-estar desses indivíduos, definidas a partir dos conceitos de (EC) ou (EE), dependendo do formato da questão. Assim, para estimar o valor total da mudança ambiental pode-se, por exemplo, calcular a média da DAP/DAC auferida na amostra e multiplicar pela população total. Outra alternativa, um pouco mais sofisticada, seria usar um modelo de regressão para estimar o valor ofertado pelo indivíduo como função de sua renda e de outras variáveis sócio-econômicas. O método de bidding game foi primeiramente introduzido por Davis nos anos 60. A idéia é criar um conjunto de valores e negociá-los com os indivíduos com a finalidade e captar a disposição máxima a pagar pelo bem em questão. Desse conjunto de valores, apresenta-se, primeiramente, um valor médio ou mediano ao indivíduo e questiona-se se ele estaria disposto a pagar, digamos, R$ X para preservar ou prover uma determinada melhora na qualidade ambiental. Caso ele responda “sim”, o valor é aumentado até o ponto em que se obtém uma resposta negativa, sendo, portanto, o último valor com resposta positiva a disposição máxima a pagar. Caso contrário, se o primeiro valor apresentado ao indivíduo gerar uma resposta negativa, são apresentados

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novos valores sucessivamente inferiores até se obter uma resposta positiva. A disposição máxima pagar seria, então, esse último valor apresentado. 13 O método de cartões de pagamento difere muito pouco do bidding game e foi desenvolvido por Mitchell e Carson (apud. Mitchell e Carson, 1989). A única diferença substancial é que são apresentados cartões com diferentes valores, onde o indivíduo é solicitado a escolher aquele que representa sua disposição máxima a pagar. A interpretação dos resultados é, portanto, a mesma para o caso do bidding game e open-ended. O ganho que pode existir nesse tipo de procedimento é a eliminação do viés do ponto inicial, pois o indivíduo não é influenciado pelo primeiro valor apresentado.14 O Método Bidding Game Uma concepção básica pode ser modelada para os casos mais gerais de aplicação do bidding game, conforme apresentada em Freeman III (1993, p. 186). De acordo com esse autor, uma alternativa para estimar o valor total da mudança ambiental pode ser feita, simplesmente, multiplicando a média das DAPs observadas pela população total afetada. Outra alternativa mais sofisticada é usar um modelo de regressão para estimar o valor que o indivíduo está disposto a pagar pela oferta como função de sua renda e de outras variáveis sócio-econômicas:

bi = b (Mi, Si) onde bi é o valor observado pela mudança ambiental para o indivíduo i; Mi é sua renda e Si demais características sócio-econômicas desse indivíduo. Sendo possível quantificar precisamente uma determinada mudança ambiental, denotada por ∆q, uma outra alternativa ainda seria possível. Se ∆q puder representar cenários alternativos de qualidade ambiental, pode-se incluí-la diretamente na função oferta do indivíduo, como segue:

bi = b(Mi, Si, ∆q) onde ∆q é o cenário apresentado ao indivíduo. Diversos autores têm aplicado o método de bidding game em estudos de problemas ambientais. Knetsh e Davis (1966) compararam esse método com outras metodologias alternativas para estimativas de benefícios em áreas de recreação. Nesse estudo, os autores aplicaram o bidding game em uma área de recreação no nordeste de Maine, um local chamado Pittston Área. Foram aplicados também o método de Custo de Viagem e o método de Willingnes to Drive, como definido pelos autores.15 Esse último método tem um formato

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De forma semelhante às questões abertas, os valores respondidos pelos indivíduos representam o Excedente Compens atório ou o Excedente Equivalente, dependendo de como a questão foi abordada. 14

A definição do viés do ponto inicial decorrente do uso da avaliação contingente será apresentada na póxima seção. 15

O método de Willingness to Drive foi primeiro utilizado por Ullman e Volk (1961), como citado por Knetsh e Davis (1966).

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semelhante ao bidding game ao negociar com o indivíduo sobre qual seria sua disposição a dirigir milhas adicionais para visitar o local: Randal, Ives e Eastman (1974) usaram o bidding game para avaliar os benefícios associados com a melhora estética na região da Four Corners Interstate Air Quality Control, no sudoeste dos EUA. Essa área vinha sofrendo sérios problemas de degradação ambiental, principalmente referente à poluição do ar, decorrente da grande expansão da exploração de minas de carvão e da indústria de geração de energia elétrica. Para o processo de negociação interativa do bidding game foram apresentados três conjuntos de fotografias aos entrevistados com a finalidade de caracterizar situações distintas. O conjunto “A” foi constituído por fotos que mostram a região em 1969, caracterizada por um alto nível de degradação ambiental. O conjunto “B” mostrava a região, em 1967, um sua condição intermediária de degradação ambiental. Por fim, o conjunto “C” mostrava a região sob controle ambiental, com níveis de emissão de poluentes reduzidos a zero. Desse modo, os usuários do local solicitados a atribuírem valores monetários que eles estariam dispostos a pagar por essas mudanças ambientais, definidas pela passagem da situação A para B e B para C. Mota e Faria (1998) aplicaram o método de bidding game no Jardim Zoológico de Brasília, modificando alguns procedimentos usuais. Em primeiro lugar, em decorrência do local de estudo proposto, o bem ambiental em questão não se configura em um bem público puro, não apresentando, portanto, a natureza de não-exclusividade, já que é possível cobrar uma taxa de entrada no referido local. Uma importante implicação dessa característica é que permite tratar o ativo ambiental em questão, até certo ponto, de modo similar aos bens privados, muito embora ele não seja transacionado nos mercados convencionais. Como a visita ao Zoológico é, na realidade, um serviço ambiental factível de exclusividade, o indivíduo pode decidir sobre a escolha da quantidade de visitas que ele estaria disposto a realizar caso fosse cobrado um determinado preço. Dessa forma, foi possível modelar o comportamento do consumidor (usuário do Zoológico) como é tradicionalmente feito pela teoria clássica da demanda, bastando incluir o serviço ou o bem ambiental na função utilidade do indivíduo. Outra modificação sugerida por Mota e Faria (1998) refere-se ao conjunto de valores preestabelecidos a serem negociados no bidding game. Tradicionalmente, esses valores são criados a partir de alguma informação disponível para pesquisador. No entanto, os autores criaram esses valores de referências a partir de um survey do tipo open-ended numa primeira etapa para, um seguida, negociá-los numa segunda etapa mediante o modelo bidding game. Os Principais Vieses do Método de Avaliação Contingente O “estado das artes” do Método de Valoração Contingente é caracterizado, também, por estudos recentes que enfocam problemas relacionados com os potenciais viesses decorrentes do uso desse método. Segundo Mitchell e Carson (1989, p. 235) pode-se considerar quatro fontes de viesses no uso da

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avaliação contingente, a saber: 1) uso de cenário que incentivam o entrevistado a não responder sua verdadeira DAP; 2) uso de cenário que possuem incentivos para ajudar, indevidamente, o indivíduo a responder o questionário; 3) mal especificação do cenário mediante uma descrição incorreta e/ou incompleta de alguns aspectos relevantes; 4) desenho inadequado da amostra e agregação incorreta dos benefícios. Na primeira categoria de erros ocorre principalmente o viés estratégico e o viés do entrevistador. O primeiro refere-se aos erros decorrentes de estratégias utilizadas pelo entrevistado para influenciar decisões acerca da questão ambiental envolvida, não revelando sua verdadeira preferência. O viés do entrevistador ocorre quando o indivíduo questionado responde uma DAP diferente daquela que seria a sua verdadeira com a finalidade de agradar ao entrevistador ou, pelo menos, não causar má impressão de sua conduta. Na segunda categoria, os principais erros são o viés do ponto inicial, o de relação e o de importância. O viés do ponto inicial refere-se à influência dos resultados pelo primeiro valor apresentado ao entrevistado, o que ocorre freqüentemente no modelo bidding game. O viés de relação ocorre quando o instrumento de pesquisa apresenta informações sobre outros bens públicos ou privados, influenciando as respostas dos indivíduos. O viés de importância resulta de instrumentos de survey que indicam a importância do bem ambiental em questão, gerando uma DAP diferente daquela que seria obtida caso o indivíduo não fosse persuadido pela entrevista. Na terceira categoria, podem surgir diferentes tipos de viesses, dependendo de vários aspectos referentes à especificação do cenário apresentado no survey. O viés de especificação teórica ocorre quando o cenário especifico pelo pesquisador é incoerente com a teoria econômica. O viés de especificação da qualidade surge quando os parâmetros ambientais apresentados são interpretados de modo diferente daquele que o pesquisador deseja. O viés de especificação do contexto surge quando o indivíduo interpreta algumas situações diferentes daquela pretendida pela pesquisa como, por exemplo, referentes ao veículo de pagamento. Por fim, na última categoria, pode-se incluir o viés da escolha da população e o viés da seleção amostral. O primeiro ocorre quando a população identificada não representa adequadamente a população beneficiada ou afetada pelos custos ambientais. O viés da seleção ocorre quando a amostra selecionada não representa adequadamente as características da população a ser considerada. Esses tipos de viesses constituem-se, portanto, em potenciais erros que podem ocorrer na condução de surveys mediante a aplicação do MVC. No entanto, há um particular interesse pelo viés do ponto inicial, o qual pode ocorrer especificamente no modelo bidding game. Muitos autores têm avaliado até que ponto o viés do ponto inicial é significativo ou não. Boyle, Bishop e Welsh (1985) apresentam um modelo teórico para explicar esse tipo de erro, de maneira a testar sua significância. Para os autores, a causa geral desse provável erro é que o “bidding game”, ao apresentar o primeiro valor ao entrevistado, sugere a ele o valor do bem ambiental. O indivíduo ao não estar habituado a atribuir valor aos bens públicos, entende que o primeiro valor

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apresentado a ele é o mais adequado. Em dois outros estudos, realizados também por esses autores, os resultados confirmaram, do mesmo modo, a existência do viés do ponto inicial. Segundo Boyle, Bishop e Welsh (195, p. 189), outros atores também realizaram estudos que apresentaram evidências do viés do ponto inicial. Teste Empírico do MVC, variante bidding game Problema e hipótese Uma das questões mais relevantes sobre a aplicação do MVC bidding game é como criar os valores a serem utilizados nas questões interativas do bidding game? Tradicionalmente, tais valores são criados de forma mais ou menos arbitrária, utilizando-se apenas algumas informações disponíveis acerca do bem ambiental em estudo. Mota e Faria (1998) propuseram uma alternativa para criação desses valores. A proposta é elaborar um questionário piloto do tipo open-ended com a finalidade de criar um conjunto de valores a serem utilizados numa segunda pesquisa definitiva através da técnica bidding game. O presente trabalho, propõe-se, então, testar a plausibilidade do procedimento alternativo proposto por Mota e Faria (1998). Para isso, será aplicado novamente um questionário do tipo bidding game, sendo, agora, no formato tradicional, onde os valores a serem utilizados são criados de forma mais ou menos arbitrária e sem correspondência com as preferências do usuário. A hipóteses inicial de trabalho é: as médias dos Excedentes dos Consumidores dos dois modelos [o do presente estudo e o de Mota e faria (1998)] são significativamente diferentes. Esta hipótese pode ser testada da seguinte forma: onde µEci1 é a média dos excedentes dos consumidores calculada pelo Modelo de Mota e Faria (1998) e µEci2 é a média dos Excedentes dos Consumidores calculada pelo novo modelo apresentado neste trabalho. A diferença esperada entre essas duas médias se deve à diferença esperada no conjunto de valores criados pelos dois procedimentos: no primeiro modelo, tais valores são calculados a partir de uma pesquisa amostral do tipo open-ended, que foi realizada por uma entrevista a 526 usuários do Zoológico. No segundo, os valores de referências foram criados apenas por uma consulta a 10 especialistas na área ambiental. Como a técnica de bidding game tem apresentado o “viés do ponto inicial”, espera-se, portanto, que os diferentes valores criados pelos dois procedimentos gerem resultados diferentes. Caso esta primeira hipótese não venha a ser confirmada, tem-se uma evidência de que os dois procedimentos são equivalentes, ou seja, se os resultados não são significativamente diferentes, a criação dos valores de referência pode ser feita por qualquer um dos procedimentos. Nesse caso, o

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0 1 2

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µ µ

µ µ

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procedimento escolhido dever ser, naturalmente, de menor custo. No entanto, caso as médias sejam significativamente diferentes, surge outra questão: “Qual é o melhor procedimento?” Material e Método de Pesquisa O bem ambiental escolhido para o teste do modelo bidding game foi o Pólo Ecológico de Brasília (Jardim Zoológico). Este local constitui-se em excelente alternativa de lazer, tanto para a população do Distrito Federal quanto para as cidades circunvizinhas localizadas em seu entorno. O Zoológico apresenta espécies raras de animais e foi visitado por, aproximadamente, um milhão de pessoas entre crianças, adultos e idosos em 1997. Mota e Faria (1998) aplicaram a variante MVC Bidding Game no Zoológico em duas etapas: na primeira, foi aplicada uma pesquisa usando questões do tipo open-ended com finalidade de criar os valores de referências a serem utilizados na segunda etapa, mediante a aplicação do bidding game propriamente dito. Nessa primeira etapa, foram entrevistadas 526 pessoas aptas a responder o questionário, cuja amostra foi calculada com 95% de confiabilidade e 4,5% de erro.16 A questão básica apresentada aos entrevistados foi a seguinte: “Quanto você estaria disposto a pagar mensalmente, para ajudar na preservação do Zoológico?” O entrevistado foi informado de que tal valor não incluia os R$ 1,50 já pagos por ele para visitar o local e seria administrado por uma Instituição privada como, por exemplo, a Associação dos Usuários do Jardim Zoológico. Além dessa questão, foram levantados outros dados sócios-econômicos dos indivíduos tais como: renda, sexo, idade, local de moradia, grau de instrução, assim como outras informações complementares como os aspectos negativos e positivos do Zoológico. Os dados das DAPs foram agrupados em 11 classes de valores, sendo que os pontos médios foram ajustados para se criar os valores da referência como era pretendido.17 Na realidade, Mota e Faria (1998) inovaram esse procedimento ao criar os valores18, a serem negociados no bidding game, a partir das preferências do próprio consumidor. Portanto, com base nesses valores de referências, partiu-se para a segunda etapa da pesquisa, quanto foi aplicado o modelo bidding game propriamente dito. Nessa pesquisa foram entrevistados 1. 087 usuários do Zoológico, cuja amostra foi calculada com 95% de confiabilidade e 2,5% de erro. Além da DAP captada na entrevista, levantaram -se, também, outras variáveis sócio-econômicas dos indivíduos.

16

Os resultados dessa pesquisa foram úteis também para uma apresentação do Jardim Zoológico de Brasília em um encontro nacional de administradores de Zoológico em Salvador – BA, em maio de 1998. 17

O no de classes foi determinado pela Regra de Sturges: K = 1 + 3,3, Log n, onde K é o n

o de

classes e “n” o tamanho da amostra. A amplitude de cada classe foi calculada da seguinte forma: h = AT/K, onde “h”é a amplitude da classe e AT a amplitude total. 18

Na forma tradicional, como a técnica bidding game tem sido aplicada não há uma pesquisa preliminar do tipo open-ended apenas com a finalidade de criar tais valores de referência. Em geral, os valores de referências são estabelecidos pelo próprio pesquisador com base em alguma informação que ele disponha sobre o bem ou serviço ambiental em questão.

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Mota e Faria (1998), com base nos dados obtidos pela primeira etapa da pesquisa, iniciaram a negociação com um valor de R$ 2,00, pois este número mostrou-se mais freqüente na primeira pesquisa, representando a moda de sua distribuição amostral. A idéia dos autores é de que, se o objetivo é capturar a verdadeira DAP, nada mais sensato do que iniciar com um valor que se situa próximo à moda da distribuição amostral do primeiro survey, pois tal valor já sinaliza, de algum modo, o que as pessoas, em geral, estariam dispostas a pagar.19 Assim, somando-se, portanto, a DAP revelada pelo indivíduo ao valor de R$ 1,50 que ele já paga atualmente, obteve-se o máximo gasto que o indivíduo estaria disposto a incorrer em uma visita ao Zoológico. De outro modo, a diferença entre essa disposição máxima a gastar a taxa de R$ 1,50, pode ser interpretada como o Excedente do Consumidor(Tabela 1). Para determinar o Excedente do Consumidor, Mota e Faria (1998) estimaram uma curva de demanda por visitas no Zoológico como função do preço e da renda do consumidor. O artifício utilizado pelos autores foi somar cada valor de referências à taxa de R$ 1,50, considerando cada uma dessas somas como um preço hipotético. Em seguida, determinou-se a quantidade de usuários entrevistados que estariam dispostos a pagar tais preços hipotéticos, estabelecendo-se a relação desejada entre preços e quantidades. Para cada grupo de indivíduos que estaria disposto a pagar um determinado preço, calculou-se a renda monetária média. Estes dados estão apresentados na Tabela 2.

TABELA 1 Grupos de DAPs e valores de referência (em R$)

Classe de DAP Valores de referências (ponto médio)

0,50 –3,50 3,50 – 6,50 6,50 – 9,50

9,50 – 12,50 12,50 – 15,50 15,50 – 18,50 18,50 – 21,50 21,50 – 24,50 24,50 – 27,50 27,50 – 30,50

2,00 5,00 8,00 11,00 14,00 17,00 20,00 23,00 26,00 29,00

Fonte: Mota e Faria (1998).

19 Na segunda etapa, questionou primeiramente se o usuário estaria disposto a contribuir com R$ 2,00/mês, além dos R$ 1,50 que ele já paga, para ajudar na preservação do Zoológico e lhe garantir o direito de visita nesse local. Caso o usuário responda “sim”, o valor foi aumentado sucessivamente até se obter uma resposta negativa. Ao contrário, caso na primeira pergunta o

usuário respondesse “não”, interpretou-se que suas disposição a pagar seria zero.

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TABELA 2 Valores de referência, preço, renda média e quantidade de visitas

Valores de referência

(1)

Preço (2)

Qv (3)

Qv* (4)

Renda Média (5)

- 2,00 5,00 8,00

11,00 14,00 17,00 20,00 23,00 26,00 29,00

1,50 3,50 6,50 9,50

12,50 15,00 18,50 21,50 24,50 27,50 30,50

120 390 323 119

63 21 20 10 7 4

10

1.087 967 577 254 135

72 51 31 21 14 10

1.395,51 1.405,95 1.691,55 1.925,48 2.081,30 1.760,35 1.734,56 2.315,75 1.961,73 2.250,00 1.710,00

Fonte: Mota e Faria (1998) Notas: (1) Valores criados pela primeira etapa da pesquisa – em R$ (2) Preços hipotéticos criados a partir da soma de cada valor a coluna (1) à taxa de R$ 1,50 (3) Quantidade de usuários que declaram dispostos a pagar, no máximo, o valor

correspondente apresentado na coluna (1) (4) Quantidade de visitantes que estariam dispostos a pagar o valor correspondente

apresentado na coluna (1). Estas quantidades foram calculadas a partir da freqüência acumulada “acima de” das quantidades absolutas observadas na coluna (3)

(5) Renda média mensal (em R$) correspondente aos indivíduos da coluna (4).

No presente estudo, por outro lado, a proposta foi seguir o mesmo procedimento utilizado por Mota e Faria (198), com a finalidade de permitir as comparações pretendidas. Evidentemente, a diferença substancial entre os dois procedimentos é que neste não foi aplicado o questionário open-ended, com a finalidade de criar os valores de referências. No lugar disso, apenas consultou-se dez especialistas na área ambiental, questionando-os acerca dos valores que poderiam ser utilizados no processo de negociações com os usuários do Zoológico.20 Husfschimdt et alli (1983) afirma que alguns autores têm aplicado essa técnica também com a finalidade de estimar o valor de um determinado bem ou serviço ambiental. Os indivíduos escolhidos para responder o questionário devem ter amplo conhecimento sobre assuntos ambientais e respondem o questionário individualmente, sem comunicação com os demais elementos do grupo para evitar influências de personalidades. No questionário enviado a tais especialistas, foram incluídas informações sobre o perfil do usuário em termos de renda, grau de instrução e distribuição espacial da população, com objetivo de subsidiá-los na criação de valores de referências. Para cada especialista consultado, foram, solicitadas onze valores em R$ que, em sua concepção, pessoas com as mais diversas características como, por exemplo, gosto pelo meio ambiente, nível de renda e grau de instrução estariam dispostas a contribuir todo o mês para ajudar na manutenção e preservação do Zoológico. 20

Esta consulta trata-se da aplicação da chamada técnica Delphi, que foi desenvolvida por Dalkey e Helmar, nos anos 60, para obter opinião de especialistas em bombas nucleares, com a finalidade de se prever os danos que elas poderiam causar a um país. Desde então, técnica tem sido utilizado em previsões tecnológicas, inovações educacionais e numa variedade de outras áreas. A característica essencial da técnica é sua ênfase em desenvolver um consenso entre especialista s sobre m tópico por meio de uma série anônima de questionários enviados.

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Da mesma forma, esta contribuição não incluiria a taxa de R$ 1,50 que a pessoa já gasta para visitar o Zoológico. Os resultados da consulta estão apresentados na Tabela 3, sendo que os valores de referência foram criados a partir de um ajuste das médias dos valores respondidos pelos especialistas.

TABELA 3 Valores médios obtidos pela Técnica Delphie valores de referência

No de ordem

(1) Valores médios

(2) Valores de referência

(3) 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11

1,54 2,20 3,00 3,78 4,47 5,21 6,43 8,01 9,46 14,61 22,71

1,50 2,20 3,00 3,80 4,50 5,20 6,40 8,00 9,50

14,60 22,70

Fonte: Pesquisa de campo mediante a Técnica Delphi NOTAS: (1) ordem crescente dos calores respondidos pelos especialistas (2) Média dos valores (em R$) respondidos pelos especialistas (3) Valores de referência (em R$) criados pelos ajuste das médias em (2)

Os valores da terceira coluna da Tabela 3 foram, então, utilizados para a pesquisa de campo do presente trabalho. Note que foram solicitados onze valores aos especialistas com a finalidade de se criar o mesmo número de observações utilizadas por Mota e Faria (1998), como foram demonstradas na Tabela 2. No entanto, todos os especialistas, com exceção de apenas um, não atribuíram valores zeros, sendo que a média dos menores valores estabelecidos por cada um deles foi de R$ 1,50. Como na pesquisa de campo há indivíduos que não estão dispostos a pagar nada, isso produz, naturalmente doze observações, como demonstradas na Tabela 3. Foi desenhado, portanto, um novo survey de pesquisa contendo esses onze valores de referências para o bidding game, onde outras informações de caráter sócio-econômico também foram incluídas. Esta pesquisa foi realizada no dia 10/05/98 e a amostra foi determinada pelo mesmo critério utilizado na segunda etapa do trabalho de Mota e Faria (1998), isto é, com 95% de confiabilidade e 2,75% de erro. Com isso, foram entrevistados 1.044 usuários, cujos resultados estão apresentados na Tabela 4.

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Tabela 4 Valores de referência, preço, renda média e quantidade de visitas

Valores de Referência (1)

Preço (2)

Qv (3)

Qv* (4)

Renda Média (5)

- 1,50 2,20 3,00 3,80 4,50 5,20 6,40 8,00 9,50

14,60 22,70

1,50 3,00 3,70 4,50 5,30 6,00 6,70 7,90 9,50

11,00 16.10 24,20

246 236 105 151

23 37

101 9

25 60 22 29

1.044 798 562 457 306 283 246 145 136 111 51 29

1.182,20 1.236,90 1.374,79 1.471,27 1.513,62 1.532,82 1.585,99 1.785,55 1.870,77 1.922,21 2.012,37 2.342.48

Fonte: Pesquisa de campo – técnico de bidding game Notas: (1) Valores criados pela Técnica Delphi – em R$ (2) Preços hipotéticos criados a partir da soma de cada valor da coluna (1) à taxa de R$ 1,50 (3) Quantidade de usuários que declararam dispostos a pagar, no máximo, o valor

correspondente apresentado na coluna (1) (4) Quantidade de visitantes que estariam dispostos a pagar o valor correspondente

apresentado na coluna (1). Estas quantidades foram calculadas a partir da freqüência acumulada “acima de” das quantidades absolutas observadas na coluna (3).

(5) Renda média mensal *(em R$) correspondente aos indivíduos da coluna (4).

De posse desses dados, foi estimada uma nova função demanda por visitas ao Zoológico e o Excedente do Consumidor foi calculado. Discussão dos Resultados Designaremos como Modelo I, o modelo de Mota e Faria (1998) e Modelo II, o novo modelo elaborado neste estudo . O conceito de modelo aqui adotado não deve ficar restrito ao modelo econométrico de demanda, mas sim deve compreender todos os aspectos envolvidos nos dois procedimentos alternativos de trabalho. Isto é, desde a forma de criação dos valores de referências até as estimativas dos resultados finais. Quanto aos modelos econométricos de demanda, os resultados estão apresentados na Tabela 5, abaixo.

Tabela 5 Resultados dos Modelos Econométricos

Especificação Modelo I Modelo II Regressão LN (Qv) = - 1,84 LN(p)+1,21LN(R) LN Qv = -1,74 LN(p) + 1,16 LN (R) Teste F 373,22 2699,52 Teste T (-9,00) (17,01) (-15,36) (38,69) T – prob (0,0000) (0,0000) (0,0000) (0,0000) AR – IF(1,8) 0,3345 0,9150 Normality Chity (2)

0,7889 0,2003

Sp 0,2046 0,1111 Sr 0,07117 0,03002 SEE 0,5848 0,2592 Fonte: Mota e Faria (1998) e estimativas próprias.

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A Tabela 5 mostra que os dois modelos estimados apresentaram um bom grau de ajustabilidade aos dados observados. Os testes T e F demonstram a significância dos parâmetros β1 e β2 estimados e os testes residuais o grau de ajuste dos modelos. Antes, porém, da discussão desse resultado, apresentam-se em seguida os valores dos Excedentes dos Consumidores estimados a partir desses dois modelos de demanda. A forma como a pergunta foi abordada aos usuários do Zoológico produz um valor que, por definição, já corresponde ao Excedente do Consumidor, que é a diferença entre o máximo preço que o usuário estaria disposto a pagar por uma visita e o que ele paga atualmente. Portanto, uma primeira alternativa para o cálculo do EC per capita seria simplesmente calculando uma média dos dados observados. A alternativa utilizada foi estimar o Excedente do Consumidor pelo cálculo integral, determinado pela expressão a seguir: O termo pmax representa preço que o indivíduo estaria disposto a pagar e po o preço atual de R$ 1,50 cobrado pela visita ao Zoológico. No entanto, esses valores foram ajustados pelo modelo econométrico estimado, estabelecendo-se uma curva de demanda inversa como apresentadas nas expressões nas páginas seguintes. Assim, para o Modelo I tem -se que po = 2,62 e pmax =38,30 e para Modelo II po = 2,09 e pmax = 24,20. Os valores dos excedentes agregados das duas amostras são, respectivamente, EC1=3.065,34 e EC2 = 2.526,48 para os Modelos I e II. Neste caso, o Excedente per capita é determinado, dividindo-se pelo tamanho da amostra. O resultado para os dois modelos são os seguintes: Ê 1= 2,82 para o Modelo I (2) Ê2 = 2,42 para o Modelo II (3) No entanto, para a finalidade desde trabalho, esse procedimento não é mais adequado, pois não é possível testar a diferença entre esses dois Excedentes per capita. Os valores obtidos em não são médias, no sentido estrito do termo, mas simplesmente valores per capita obtidos pela divisão dos valores agregados dos Excedentes pelas respectivas amostras. Diante disso, utiliza-se outro procedimento para a estimativa do EC, que consiste em ajustar os preços estabelecidos através do modelo econométrico de demanda, isto é, definindo-se uma função demanda inversa. Assim, para o Modelo I calculam-se os preços ajustados pi através da seguinte expressão: Onde LN (QVi) é o logaritmo da quantidade de indivíduos que estariam dispostos a pagar até o preço pi observado. O termo LN (Ri) é o logaritmo da renda média desses indivíduos que pagariam até o preço pi. Aplicando-se o

LNLN QV LN Ri i p

(4)i

) =−−

( ) , ( ),

*1 21

184

)1();(ˆmax *

dpRpVQCE ii

p

po

i∫=

Page 16: Metodo Valoracao Contingente

16

antilog em (4) obtemos os preços ajustados pi como demonstrados na coluna 5 da Tabela 6, abaixo:

Tabela 6 Preços ajustados e Excedentes per capita

Modelo I pi

(1)

ECi

(2) Ri

(3) QVi

(4) pi

(5) ECi

(6)

1,50 3,50 6,50 9,50

12,50 15,50 18,50 21,50 24,50 27,50 30,50

0,00 2,00 5,00 8,00

11,00 14,00 17,00 20,00 23,00 26,00 29,00

1.395,51 1.405,95 1.691,51 1.925,48 2.081,30 1.760,35 1.734,56 2.315,75 1.961,73 2.250,00 1.710,00

120 390 323 119

63 21 20 10 7 4

10

2,62 2,81 3,04 7,12

10,55 13,31 15,94 25,30 28,04 38,13 38,30

1,12 1,31 1,54 5,62 9,05

11,81 14,44 23,80 26,54 36,63 36,80

Fonte: Mota e Faria (1998).

Para cada preço pi ajustado pelo modelo econométrico, se for subtraído R$ 1,50, que é a taxa atual de entrada no Zoológico, obtém-se os respectivos valores ajustados para os EC i isto é, EC i. Desse modo, tem -se uma estratificação dos Excedentes dos Consumidores observados pela amostra. Assim, por exemplo, conforme a primeira linha da Tabela 6 acima, 120 indivíduos da amostra estariam disposto a pagar até R$ 2,62 e o EC per capita desses indivíduos seria de R$ 1,12. Do mesmo modo, na segunda linha, 390 indivíduos da amostra estariam dispostos a pagar até R$ 2,81 e o EC per capita dos mesmos seria de R$ 1,31 e assim sucessivamente. Para o Modelo II estimado neste estudo, os preços ajustados são determinados pela expressão: Os valores ajustados de pi e ECi estão na quinta e sexta colunas da Tabela 7, abaixo. A interpretação é a mesma: por exemplo, na primeira linha, observa-se que 246 usuários da amostra estariam dispostos a pagar até R$ 2,09 e o EC per capita destes seria de R$ 0,59. Com estes valores dos EC per capita, estratificados por grupos de indivíduos, pode-se calcular uma média ponderada toda a amostra através da expressão (6).

LNLN Q Vi p

LN(R (5)i

i) =−

−( ) , )

,

*1 16

1 71

Page 17: Metodo Valoracao Contingente

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Tabela 7

Preços ajustados e Excedentes per capita Modelo II

P (1)i

ECi

(2) Ri

(3) QVi

(4) Pi

(5) ECi

(6) 1,50 3,00 3,70 4,50 5,30 6,00 6,70 7,90 9,50

11,00 16,10 24,20

0,00 1,50 2,20 3,00 3,80 4,50 5,20 6,40 8,00 9,50

14,60 22,70

1.182,20 1.236,90 1.374,79 1.471,27 1.513,62 1.532,82 1.585,99 1.785,55 1.870,77 1.922,21 2.012,37 2.342,48

246 236 105 151 23 37

101 9

25 60 22 29

2,09 2,52 3,33 3,93 5,06 5,32 5,91 8,73 9,39

10,75 17,50 26,91

0,59 1,02 1,83 2,43 3,56 3,82 4,41 7,23 7,89 9,25

16,00 25,41

Fonte: estimativas próprias Onde XECi é a média ponderada do Excedente do Consumidor para os usuários entrevistados e n é o tamanho da amostra. Os resultados são os seguintes: Para tessar se estas médias são estatisticamente diferentes, pode-se recorrer ao teste para a diferença entre duas médias populacionais, como segue abaixo: H0: µEci 1 = µEci 2 (9) HA: µEci1 ≠ µEci 2 Onde µEci1é a média do Excedente do Consumidor para a população do Modelo I e µEci2 é a média do Excedente do Consumidor para a população do Modelo II. Pode-se, então, usar as respectivas médias amostrais XEci1 e XEci2 como informação sobre a evidências das médias populacionais. Se a hipótese nula for verdadeira, então(µEci1-µEci2) = 0 e, portanto, o valor de (XEci1 - XEci2) raramente seria estatisticamente diferente de zero. Por outro lado, se os valores amostrais de (XEci1 - XEci2) forem muito diferentes de zero, podem ser utilizados como evidência contra a hipótese nula. Vale dizer que, esse teste da diferença das médias de duas populações requer que as respectivas amostras sejam independentes. Neste sentido, o survey elaborado para este estudo adotou o procedimento de eliminar da amostra

XECi QV

nECii= ∑ ( * )

)

(6)

XE para o Modelo IECi 1 3 56 7= , ( )X para o Modelo IIECi 2 3 37 8= , ( )

Page 18: Metodo Valoracao Contingente

18

aqueles indivíduos que já foram questionados sobre o mesmo assunto no final do ano passado, quando foi realizada a pesquisa por Mota e Faria (1998). Com isso, foram eliminados nove questionários cujas respostas indicaram que tais indivíduos já haviam respondido algum questionário sobre sua disposição a pagar para ajudar na preservação do Zoológico como pode ser visualizado na última questão do survey. Como as amostras são independentes, a covariância será zero e a variância será definida como abaixo: Onde σ1

2 e σ22 são as variâncias das duas populações e n1 e n2 os tamanhos

das respectivas amostras. Logo, quando as duas médias amostrais são as mesmas que as postuladas pelo teste de hipótese definido em (9), têm-se que:

E a variável normal padrão é definida por: No entanto, as variâncias σ2

1 e σ22 das populações não são conhecidas e

devem ser estimadas a partir da amostra, como segue: que são as estimativas não viesadas de σ2

1 e σ22 das populações.

Desse modo, a estatística Z descrita em 14, deve ser escrita como:

ZX X

X X

X X

n n

obsECi ECi

ECo ECi

ECi ECi=−−

=−

+

1 21 2

1 212

12

1

22

2

σ σ σ( )( )

Sn

EC X fr p a r a o M o d e l o Ii E C ii

n

12

1

2

1

11

1 1 41

=−

−=

∑ ( ) ( ))

Sn

EC X fr para o Modelo IIi ECii

n

22

2

2

1

11

2 152

=−

−=∑ ( ) ( )

)

ZX X

S

n

S

n

obsECi ECi=

+

1 214

12

1

22

2

( )

)10()2()1()21(2

22

1

21

nnXVarXVarXXVar ECiECiECiECi

σσ+=+=−

( ) ~ [ , ] ( )X Xn nECi ECi1 2 0 111

2

1

22

2

− +σ σ

Page 19: Metodo Valoracao Contingente

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Onde S1

2 e S22 são as variâncias estimadas como respectivamente.

Como está formulado o teste, a hipótese Ho deve ser aceita se Zobs < Ztrab e rejeitada em caso contrário. Considerando um nível de significância de 5%, isto éα=0,05, tem-se que Ztrab =± 1,96. Calculando tem-se que Zobs = 0,86 e, portanto, menor que . Ztrab Logo, a hipótese Ho é aceita. Esse resultado não era esperado como hipótese inicial de trabalho. Ou seja, esperava-se que o Modelo II produzisse um resultado significativamente diferente daquele obtido pelo Modelo I de Mota e Faria (1998). O argumento para a defesa dessa hipótese é de que diferentes valores negociados com os indivíduos produzem resultados diferentes, o que vem sendo confirmado por alguns estudos sobre o “viés do ponto inicial.” Além da diferença esperada entre as duas médias dos Excedentes dos Consumidores, esperava-se também que a equação de demanda estimada nesse trabalho, com a mesma especificação utilizada por Mota e Faria (1998), não se ajustasse tão bem aos dados observados quando àquela estimada por estes autores. Neste sentido, a argumentação utilizada para a defesa dessa hipótese inicial é de que o procedimento do Modelo I em aplicar uma pesquisa preliminar, apenas com a finalidade de se criar valores de referências, seria mais adequado, pois tais valores são produzidos a partir das preferências reveladas dos próprios consumidores e não obtidos da imaginação do pesquisador ou mesmo de especialistas. No entanto, os resultados obtidos por este trabalho não permitem a confirmação de expectativas e tornam, portanto, as argumentações iniciais questionáveis. As médias não são estatisticamente diferentes e o Modelo II se ajustou ainda um pouco melhor aos dados do que o Modelo I, quando comparados os testes T, F e os residuais. Comentário Conclusivo Neste estudo analisaram -se aspectos teóricos e empíricos do Método de Valoração Contingente (MVC), especialmente de sua variante “bidding game”. Estimou-se através desse método o valor econômico da conservação do Jardim Zoológico de Brasília, comparando-se os resultados com os obtidos em um estudo anterior (Mora e Faria, 1998). As análises desenvolvidas indicam a importância da forma na qual os valores de referências são criados para o processo de negociações interativa com os indivíduos em entrevistas. Isto por dois motivos. Em primeira lugar, é preciso enfatizar que há estudos que confirmam a existência do “viés do ponto inicial”. Ou seja, os resultados das estimativas são influenciados pelo valor escolhido a ser apresentado primeiramente nas negociações. Como o primeiro valor escolhido depende do conjunto de valores criados para o bidding game, o processo no qual é formado o referido conjunto é, e continua sendo, de extrema importância. Em segundo lugar, é preciso relativisar as conclusões deste trabalho. Dado que as médias dos Excedentes dos Consumidores dos dois modelos são estatisticamente iguais, esse resultado permite concluir apenas que há evidências de que um painel bem formado de especialistas pode substituir

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muito bem a aplicação de survey preliminar com a finalidade de criar os valores de referência. Sendo assim, a escolha do procedimento pode ser feita em função do custo de cada um. Como os dois modelos produzem resultados equivalentes, adota-se o de menor custo. Evidentemente, se os dois modelos são equivalentes, a questão de qual deles é o melhor teoricamente perde relevância. O melhor passa a ser simplesmente o de custo mais baixo. Uma questão que pode, pelo menos parcialmente, explicar a equivalência dos dois procedimentos refere-se ao tipo específico do bem ambiental considerado no estudo. Um dos problemas no uso de surveys para determinar o valor do ativo ambiental é que o indivíduo não está habituado a esse tipo de tarefa. Isto é, a princípio, ele não tem nenhuma idéia de quanto pode valer um determinado bem ambiental, já que este não é transacionado no mercado. No entanto, para o caso de bens que já possuem alguma referência, como é o caso do Zoológico, essa tarefa se torna um pouco mais fácil e o indivíduo se sente mais à vontade para atribuir um determinado valor. Desse modo, como no Zoológico já existe uma taxa de R$ 1,50 cobrada por visita, ela pode servir de referência para o indivíduo determinar sua máxima disposição a pagar. Este argumento fundamenta-se nos resultados dos dois procedimentos utilizados par a obtenção dos conjuntos de valores a serem negociados no bidding game. O uso do método open-ended, segundo Freeman III (1993, p. 170), pode produzir valores muito baixos ou muito altos, justamente pela falta de convivência do indivíduo com a questão colocada. No entanto, os dados observados pela pesquisa de Mota e Faria (1998) não revelam esse problema, já que os valores atribuídos pelos indivíduos situaram no intervalo de R$ 0,00 a R$ 30,00. Do mesmo modo, a consulta realizada junto a especialistas não produziu valores muito dispersos, cujo intervalo construído a partir das médias obtidas foi de R$ 1,50 e R$ 22,70. Essas evidências reforçam, portanto, o argumento de que para o caso de bens ambientais que já possuem algum valor de referência, a distribuição dos valores respondidos mediante questões abertas não apresentam pontos muito dispersos, concentrando-se em torno do valor que o indivíduo tem como referência. Nesse sentido, pode-se, inclusive, sugerir o uso do método open-ended, já que se trata de um procedimento mais simples e que não apresenta o problema de outliers, principal limitação desse tipo de abordagem. Bibliografia ALBERINI, A Testing Willingness to Pay Models of Discrete Choice Contingent Valuation Survey Data. Land Economics, 71 (1), 83-95. (1995). BATEMAN, l e TURNER, Kerry; Valuation of the Envinment, Methods and Techniques: The Contingent Valuation Method. In: TUNER, R. Terry. Sustainable Environmental Economics and Management; London and New York: Belhaven, 1992.

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Como demonstrado em Mota e Faria (1998), suponha uma função utilidade genérica U=U(q; X), onde q é o bem ou serviço ambiental; X é o vetor dos outros bens de mercado, isto é, X = x1, x2, ..., xn. Assim, o indivíduo maximizará sua função utilidade sujeito à restrição orçamentária:

Maxq,x U=U(q; X)

Sujeito a pqq + PX = R Onde pq é o preço do bem ambiental; q é a quantidade; R é a renda do indivíduo; P e X são, respectivamente, o vetor de preços e de quantidades dos bens de mercado. Em geral, os bens ou serviços ambientais não têm preços de mercado, sendo pq=0 na restrição orçamentária apresentada acima. No entanto, para o propósito dessa formulação, o preço pq do ativo ambiental é mantido na restrição por duas razões. Por um lado, o preço pq não é zero à medida que os indivíduos pagam uma pequena taxa de entrada ao Zoológico. Por outro lado, o pq deve ser explicitado na restrição orçamentária de justamente com a finalidade de demonstrar que este deve ser o preço que o indivíduo estaria disposto a pagar para uma dada quantidade q e dado a sua renda e os gastos em outros bens. Do problema de maximização em (4.2.1), efetua-se as condições de 1o ordem: Solucionando,(3.2.7) isto é, explicitando X e q em (3.2.8), encontra-se um conjunto de demandas ordinárias pelos bens de mercado e uma demanda ordinária específica para o bem ou serviço ambiental, como segue: Xi = xi (pq; P; R) conjunto de demandas Marshalianas para os bens de mercado, com i= 1, 2,.., n q= q (pq; P; r) demanda Marshaliana pelo ativo ambiental. Desse modo, é derivada uma curva de demanda pelo bem ambiental como função do seu preço hipotético, do preço de outros bens de mercado e da renda. Nesse estudo, porém, foi utilizado o Excedente do Consumidor como medida de bem-estar, já que não havia nenhuma avaliação referente à mudança na qualidade ambiental do Zoológico e, consequentemente, do bem-estar dos indivíduos. Desse modo, a partir da curva de demanda derivada de (3.2.7), resta calcular o Excedente do Consumidor: Sendo preço atual cobrado pela entrada no Zoológico e o maior preço que o indivíduo estaria disposto a pagar por esta mesma visita. Finalmente, P e

EC q p P r dpp

pq q

q

q= z0

*

( , , )

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R são, respectivamente, o vetor de preços dos demais bens e a renda monetária do consumidor. Logo, a quantidade de usuários do Zoológico ode ser determinada em função do preço e da renda desses usuários. A especificação econométrica utilizada por Mota e Faria (1998) foi uma demanda com logaritmo duplo do tipo: Sendo Q*vi = quantidade de usuários dispostos a paga um valor i; β1, β2 = estimativa dos parâmetros; R = renda média dos usuários; pi é o máximo valor i que o indivíduo está disposto a pagar e; ε i = termo erro. Aplicando-se logaritmo nas variáveis, tem -se: Onde as estimativas dos parâmetros β1, β2 representam os coeficientes de elasticidade preço e da renda, respectivamente.

Q vi pi Ri Knn

i∗ = ⋅β β β ε1 2 1., ... , . . ( )

LN LN LN Q pi + R*Vi 2 i= ⋅ ⋅β β1 2( )