Metodologias Em Design Interrelacoes 2011

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© 2011 copyright dos autores Direção Editorial/Editoria de Design: Mônica Moura Direção de Arte: Ricardo Mendonça Rinaldi Diagramação: Mariana Menin e Lívia Flávia de Albuquerque Campos Revisão: Professores Doutores - 1os autores dos artigos Capa: Ricardo Mendonça Rinaldi

A grafia dos textos foi atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, em vigor no Brasil desde 2009.

Dados Internacionais de Catalogação da Publicação (CIP)

Metodologia em design : inter-relacoes / orgs. Marizilda dos Santos Menezes, Luis Carlos Paschoarelli, Mônica Moura. - São Paulo : Estação das Letras e Cores, 2011. ISBN 978-85-60166-40-4 1. Design. 2.Ensino. 3.Método de projeto no ensino. 4. Pesquisa - Metodologia. I. Menezes, Marizilda dos Santos. II. Paschoarelli, Luis Carlos. III. Moura, Mônica CDD 001.42 371.3 760

Índice para catálogo sistemático:

Design - Metodologia Design - Processo Ensino - Metodologia Metodologia de pesquisa Estação das Letras e Cores Editora Rua Cardoso de Almeida, 788 cj. 144 – Perdizes 05013-001 São Paulo Telefax: 55 11 4191-8183 e-mail: [email protected] www.estacaoletras.com.br

Sumário Metodologias em design: Inter-relações 6 A atuação do Designer, na ergonomia: História da ergonomia, atuação do designer e os conceitos necessários para um bom ambiente de trabalho

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A utilização de conceitos de ergodesign no desenvolvimento de análise do posto de trabalho de teleatendimento 18

Análise comparativa para contribuição metodológica em design de sinalização 31

As disciplinas projetuais no curso de Design de Produto da FAAC – UNESP, Campus de Bauru 48

Atos Interdisciplinares entre Arte e Moda: Precursores 62

Avanços na avaliação do ambiente luminoso 80 Construindo uma Metodologia de Projeto: Experiência do PósDesign UFSC 90 Design de embalagem: uma reflexão sobre o ensino projetual e a sustentabilidade 110

Design no Brasil: um breve panorama do ensino 128 Design para a Experiência aplicado a Equipamentos de Mobilidade Urbana 146

Emoção & Design: Quando a Face Revela o Sucesso do Produto 162 Emoção e Design: Aspectos Teóricos e Práticos da Ciência Cognitiva no Desenvolvimento de Modelos Conexionistas para o Auxilio no Projeto de Produtos

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Estratégias de Aprendizagem e de Avaliação para o Ensino de Métodos de Design de Produto 212

Experiência Metodológica Não-Linear em Design 226 Heurística: uma Poderosa Bússola 240 Imagem Técnica: uma Abordagem Tecnológica sobre o Ensino do Design 254

Instrumentalismo Epistemológico e Metodologia Não-Linear de Projetos de Design 262

Interdisciplinaridades no Design Contemporâneo 274 Linguagens Gráfico-Verbal, Gráfico-Visual e Gesto-Visual na Educação Projetual 294

Metodologia de Análise: Livro Infantil Ilustrado e alguns Diálogos 308 Metodologia de Design de Instrumentos Manuais: Mock-Ups e Protótipos na Avaliação Ergonômica 326

O Emprego da Metodologia EWA em uma Análise Ergonômica de um Consultório Odontológico 345

Princípios Metodológicos da Coleta de Dados Biomecânicos para Avaliação de Instrumentos Manuais 360

Processo de Projeto em Design: uma Proposição Crítica 375 Questões de Design Ergonômico de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) para Trabalhadores Rurais 392

Realidade Aumentada com Retroalimentação Cognitiva: Ambientes Monitorados para Desenvolvimento de Produtos 406

Reflexões Emergentes através do Pensamento de Prigogine: o Encantamento com a Vida 424

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METODOLOGIAS EM DESIGN: I N T E R - R E L A Ç Õ E S

Marizilda dos Santos Menezes1

Luis Carlos Paschoarelli2 Mônica Moura3

A metodologia sempre esteve presente na ação e no pensamento projetual. É uma questão fundamental na área do design, desde as primeiras escolas de formação nessa área.

Com o decorrer do tempo, especialmente a partir da década de 1960, ganhou corpo um diálogo mais intenso entre as diferentes formas de metodologia e, de certa maneira, as diferentes formas de se construir e produzir conhecimentos. A metodologia científica influencia o desenvolvimento da metodologia projetual e, essas, por sua vez, associam-se e reestruturam-se para a aplicação da metodologia de ensino. Esse dialogismo possibilitou aproximações que se configuraram em inter-relações entre diferentes caminhos, visões, objetivos e propostas; e que se amplificaram na constituição e consolidação do campo do conhecimento em design.

Na contemporaneidade, cada vez mais, inter-relações metodológicas se estabelecem e resultam em novos princípios, em novas formas de aplicação das metodologias, suas atualizações e recontextualizações, visando uma melhor atuação em um mundo múltiplo, diverso, plural e repleto de complexidades.

Muitos pesquisadores e professores no Brasil têm se dedicado a essa temática, estudando e refletindo a respeito das teorias e metodologias do design. Os textos aqui reunidos analisam metodologias existentes e 1 Doutora em Arquitetura e Urbanismo, PPGDesign-UNESP, [email protected] 2 Livre-docente em Design Ergonômico, PPGDesign-UNESP, [email protected] 3 Doutora em Comunicação e Semiótica, PPGDesign-UNESP, [email protected]

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apontam outras possibilidades de aplicação, discorrem sobre as novas metodologias desenvolvidas nesses últimos tempos, discutem a integração entre elas. Nesse processo, as possibilidades e intensidades das metodologias se retroalimentam, derivando em um refletir melhor, projetar melhor, ensinar e aprender melhor.

Esse livro apresenta pesquisas, reflexões e práticas metodológicas, a partir de diversas experiências e olhares diferenciados que, ao se inter-relacionarem constroem um grande diálogo que valoriza e amplifica o Design brasileiro. Os textos são de responsabilidade de seus respectivos autores, os quais estão vinculados a Programas de Pós-Graduação Stricto Sensu em Design e Arquitetura e Urbanismo.

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A Atuação do Designer, na Ergonomia: História da Ergonomia, Atuação do

Designer e os Conceitos Necessários para um Bom Ambiente de Trabalho.

João Eduardo Guarnetti dos Santos1

Sarah Moreira Fernandes2 1 INTRODUÇÃO

O design é uma área muito abrangente, principalmente quando trata de se especializar ou direcionar em parte desta grande área do conhecimento. Por isso, este artigo irá enfocar uma área que vem se desenvolvendo e sendo estudado pelo designer, que é a ergonomia.

Para muitos autores, a ergonomia é uma ciência que estuda a interação homem- trabalho, onde necessita de um conceito amplo de diversas áreas dos conhecimentos. Vemos profissionais interagindo entre si, os que mais se destacam são os Designeres; Engenheiros; Enfermeiros; Fisioterapeutas; Advogados e entre outros.

A ergonomia, para compreende-la é necessário como ponto de partida a evolução do trabalho, que antes eram mais repetitivos e que atualmente são multifuncionais, que por sua vez tem gerado acidentes, afastamentos e problemas sérios na saúde do trabalhador. Este artigo irá mostrar uma breve introdução da história da Ergonomia, além de entender a função do designer nesta área, passando por uma breve compreensão das condições ambientais que envolvem o trabalho e o homem.

1 Doutor em Ergonimia e Segurança do Trabalho - Design Faac UNESP/Bauru 2 Mestranda pela UNESP- FAAC (Ergonomia)

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 Breve introdução sobre a história da ergonomia. O homem usa a ergonomia desde os tempos primitivos, onde o homem o homem primitivo verificou que com a fricção entre pedras promovia o fogo, onde eles adaptaram “o trabalho” a eles, que facilitou e ajudou a eficácia do mesmo. O homem ele nunca deixou de tentar se adaptar, porém com a evolução do trabalho, o homem que antes realizava atividades artesanais, passou a trabalhar longas horas em fábricas praticando atividades repetitivas. Onde surge a revolução industrial, tendo um importante para o estudo da ergonomia.

A revolução industrial contou com 2 movimentos importantíssimos, que são o Fordismo e o Taylorismo: O primeiro surgiu em 1913 por Henry Ford, onde este visava uma produtividade padronizada, ou seja, a fábrica fazia todo o processo do produto. E o Taylorismo surgiu em meados do século XX, com Frederick Taylor, este quis como objetivo absorver e lucrar com toda a força de trabalho, no processo produtivo. Estes dois processos precisavam de uma quantidade elevada de trabalhadores que cumpririam atividades repetitivas, automáticas, deixando de lado todo e qualquer serviço especializado tecnicamente para desenvolver a atividade. Estes processos visam generalizar e igualar a realização do trabalho, (Oliveira,2005).

Foi em meio a todo esse contexto que na II Guerra Mundial, devido a vários acidentes e até mortes com operadores de aviões, tanques e entre outros. Os acidentes foram provocados, pois ao ser produzido não levavam em conta o homem que iria operar. Aonde diversos profissionais de diferentes áreas se juntam para solucionar o problema, sendo assim surge a Ergonomia. Estes profissionais decidem continuar a estudar métodos agora também para a produção civil, a partir de dados levantados nas indústrias. Em meio a essa

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nova evolução, surge a primeira associação chamada Ergonomics Research Society criada em 1947, baseada em fatores humanos.

Abrantes, (2004), diz que a ergonomia deve ser como uma auxiliadora para melhorias nas empresas, tendo como objetivos. - Proporcionar a melhoria da eficiência do homem - Melhorar as questões técnicas que envolvem o trabalho para os indivíduos. - Ocasionar aos indivíduos um ambiente que produza satisfação e a moral do funcionário, aperfeiçoar a qualidade dos produtos, levando a produzir mais para a empresa. - Diminuir os afastamentos; - Diminuir acidentes e afastamentos - Proporcionar a diminuição de desperdícios relacionados aos produtos.

Os ergonomistas contribuem para o planejamento, projeto e a avaliação de tarefas, postos de trabalhos, adaptação ao ambiente de trabalho, verificação do ambiente, além de elaborar planos de melhorias segundo a necessidade do ambiente.

Pode-se dizer que a ergonomia é uma ciência que proporciona a interação de diversos profissionais, pois a uma necessidade quanto ao conhecimento de cada área, para poder ser feito um ambiente de trabalho adequado. Podemos falar então que está é uma ciência interdisciplinar. 2.2 O Designer como área atuante da ergonomia.

O designer aplica todas as normas e especificações ergonômicas para um projeto e produto tendo sempre em vista o conforto e a segurança do usuário. Quando pensamos em Design logo nos projetamos a algo sendo criado, como um produto em formas diversas, cores diversas, para chamar atenção do comprador. Porém o design é isso, mas vai muito além de tal. Por

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exemplo, na criação de pias de cozinhas, mais altas e mais funcionais; abridores de latas, mas flexíveis e entre outros.

Merino (2009), faz um relato de comparação e atuação da ergonomia junto com o design. Atualmente os designers somam seus conhecimentos em ergonomia e na parte da comunicação visual, para proporcionar soluções para problemas em objetos e produtos. Não só analisam os produtos e os modifica, como também proporciona beleza estética para os mesmos, tornando-se usualmente mais fáceis e seguros, como também “bonitos e agradáveis” a vista. Cada vez mais em sua grade curricular, os Designers, aprende a ergonomia como necessária para seu curriculum. Dentro do Design está sendo utilizado, o que pode ser chamado de Design Macroergonômico. Porém o antes de falarmos do design macroergonômico iremos falar do termo Macroergonomia.

Para Falção (2007), o profissional de designer tem que participar do projeto no que diz respeito a criação, concepção, desenvolvimento , concretização das ideias tendo como grande enfoque a recurso para as necessidades humanas. O Design tem conhecimento na área da biologia e humano. A macroergonomia surge, devido a utilização de novos tecnologias que não param de evoluir e em função disso, estuda-se a interação destas com os indivíduos e o ambiente. Sendo assim, os profissionais da ergonomia deixam de olhar um problema que aparentemente é o gerador da situação, mas sim abrangendo todas as possibilidades de problemas e propondo intervenções e melhorias no ambiente de trabalho, nas estruturas e em tudo que envolvem essa interação homem- trabalho. Sendo assim, o designer é de grande valia para a área da ergonomia, pois acompanha o seu conhecimento da grade curricular, no auxílio de um produto ou objeto adequado, tanto para a qualidade de vida do homem quanto pela sua estética.

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2.3 Os conhecimentos básicos para um ambiente adequado: Condições Ambientais. Nesta parte será enfocado de forma sucinta, a iluminação, a vibração, o ruído e a temperatura. 2.3.1 A iluminação: Para entender a iluminação, deve-se considerar o órgão do corpo humano que é estimulado por ela, neste caso é a visão. A visão, utiliza o olho, que é o órgão responsável pela visão, os raios de luz que chegam ou são refletidas através dos objetos, são convertidos em impulsos nervosos para nervo óptico. Sendo, na verdade, o ato de enxergar algo muito complexo.

De acordo com Grandjean (2005), os estágios da visão dá-se da seguinte maneira: os raios de luzes saem de um objeto e passam pela pupila, pelo cristalino e pelo interior do globo ocular, convertendo as informações na retina onde a energia luminosa passa a ser bioelétrica, passando pelas fibras do nervo óptico até o cérebro. No cérebro através dos neurônios, são gerados novos impulsos e estes controlam os olhos (pupila, a curvatura do cristalino e os movimentos feitos pelo globo ocular) tudo isso serve para que os olhos possam ficar direcionados para um objeto de forma automática.

Sendo assim todos os sinais que chegam ao cérebro formam a figura do mundo exterior. Podemos encontrar indivíduos que passam quase 8 horas diárias realizando suas atividades no ambiente de trabalho, expostos a ambientes de trabalho (frente ao computador e etc) para muitos autores isso tem sido considerado a causa de muitos desconfortos e até mesmo de patologias que causam invalidez.

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A iluminação tem suas normas, a Norma Brasileira NBR 5413, diz a respeito do limite de iluminação, mas esta varia de acordo com o tipo de trabalho e o tipo de local. A NR 17- estipula pareceres quanto à iluminação no local de trabalho. O ambiente deve seguir as seguintes afirmações abaixo e sempre utilizando os valores de iluminância da NBR 5413, como valores mínimos de iluminação local.

Os ambientes devem possuir a iluminação sendo ela natural ou artificial, geral ou suplementar , tendo como principio ser adequada ao desenvolvimento da tarefa feita no local.

O ambiente deve ter sua iluminação principal de forma igualmente difundida e difusa.

A iluminação principal deve ser feita de tal forma para não possibilitar no ambiente de trabalho ofuscamento, reflexos, sombras e contrastes acima do normal.

Em meio a todo esse contexto verificamos que em ambientes que se encontram mais o ser humano infundido, que no caso seria os trabalhos informatizados, possuem uma grande queixa geralmente que é os ofuscamentos em monitores, paredes. O ofuscamento ele pode ser dividido em dois tipos de aparecimento. Um é o direto que é quando o olho do individuo se encontra diretamente com a fonte de luz e o outro é o indireto quando há uma superfície que reflete a fonte da luz. Quando falamos do homem frente seu local de trabalho, verificamos o quanto é necessário entender, então o que promoveria um local confortável o homem, na questão de iluminação. 2.3.2 Vibração e Ruído:

Para verificarmos a vibração no corpo humano é necessário os 3 pontos primordiais: Nádegas, pés e as mãos. A direção da oscilação se dá cabeça aos pés no sentido vertical e braço e mão paralelo a essa linha. O que a

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vibração pode provocar varia de acordo com a duração e aumento com o tempo acumulado. Grandjean define a vibração como:

“ São oscilações da massa em função de um ponto fixo. No corpo humano, elas são produzidos por movimentos periódicos regulares ou irregulares de uma ferramenta ou veículo... O som é uma vibração que afeta nossas células auditivas.”

A vibração é produzida de certa forma em muitos objetos e instrumentos utilizados em nosso cotidiano e muito mais em um ambiente de trabalho. Quando verificamos o uso dos equipamentos e objetos que produzem a vibração, verificamos que o corpo reage de forma diversa a vibração, podendo este aumentar a vibração sentida ou diminuir esta. Sendo assim, encontramos nas bibliografias achadas que definem que a faixa mais sensível para o ser humano está entre 4 a 8 Hz, no sentido vertical.

A respeito do ruído é necessário fazer um breve apanhado da fisiologia do sistema auditivo.

A função da audição é a de gerar uma forma de compartilhar informações entre seres humanos, através da comunicação, além disso, ele serve como um sistema de alerta para acordar e em situações de perigo, como por exemplo, em um ambiente como de indústrias atômicas.

O ruído é algo que vem grandemente causando afastamentos e aposentadorias, o que provoca uma dificuldade financeira ao indivíduo quanto ao governo. O ruído tem provocado uma patologia conhecida chamada de PAIR que é a perda auditiva induzida pelo ruído, geralmente esta é relacionada com a exposição do indivíduo frente ao seu trabalho, porém é importante frisar que esta patologia está também em muitos casos associados ao ambiente que a pessoa vive também.

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2.3.3 A Temperatura A temperatura possui alguns princípios onde o corpo produz a troca

de calor na pele e na respiração, determinado da seguinte forma, de acordo com o autor Iida (1990) e Coutinho (2005): - Condução: Quando há uma influência mútua entre o corpo humano e objetos mais quentes ou mais frios. - Trabalho: É quando se dá para obter a taxa de energia mecânica, verificando assim o esforço desprendido no trabalho.

Sendo assim, Weerdmeester (1991) desenvolveu tal ideia em relação ao tipo de trabalho e a temperatura adequada para o desenvolvimento,

Atividades que utiliza o intelecto e é desenvolvimento na posição sentado, a temperatura do ar no ambiente deve variar de 18 à 24 graus Celsius;

O trabalho desenvolvido também na posição sentado, mas sendo seu tipo de atividade manual leve, deve variar a temperatura de 16 à 22 graus Celsius;

O trabalho manual leve mas na posição em pé, a temperatura deve variar de 15 à 21 graus Celsius

O trabalho manual pesada e na postura em pé deve ter sua temperatura variando de 14 à 20 graus;

O trabalho pesado deve ter sua variação de temperatura de 13 à 19 graus.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em meio a toda a evolução do trabalho, surgiu uma ciência que estudasse esta situação, que é a ergonomia.

A ergonomia é uma ciência que necessita do auxílio de diversas áreas do conhecimento para uma análise, por isso uma das quais se destaca é

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a do Designer. Podemos constatar isto com todo o histórico que foi relatado neste artigo, demonstrando as necessidades dessa área do conhecimento, em relação a elaboração de móveis, objetos, estruturas e entre outros, que estejam inteiramente somado a ciência que estuda o homem e a sua interação com o trabalho.

Pode-se afirmar que a ergonomia necessita muito do conhecimento do Designer com toda a sua carga de informativa.

Agradecimentos O presente artigo foi desenvolvido com o apoio da UNESP- FAAC

(Pós-graduação do Design) e pela CAPES por proporcionar um estudo mais adequado. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRANTES, ANTÔNIO FRANCISCO. Atualidades em Ergonomia. Editora IMAM-

1ª edição- São Paulo-2004. COUTINHO, ANTONIO SOUTO. Conforto e Insalubridade Térmica em Ambientes

de Trabalho. Editora Universitária UFPB. 2º Edição revista e ampliada. João Pessoa-2005

FALCÃO, FRANCIANE da SILVIA. Métodos de avaliação biomecânica aplicados a

postos de trabalho no pólo industrial de Manuas (AM): Uma contribuição para o design ergonômico. Dissertação de mestrado. Bauru- 2007

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GRANDJEAN,E; et.al. Maual de Ergonomia: Adaptando o trabalho ao homem. Editora Bookman. 5° Edição- São Paulo- 2005.

IIDA, ITIRO. Ergonomia - projeto e produção. 2ª edição. São Paulo Ed. Edgar

Blücher Ltda, 2005. MERINO, EUGÊNIO. Design e Ergonômia. Retirado do site:

http://abcdesign.com.br/artigos/design-e-ergonomia/ 21/08/2009. Oliveira, M.C. S. Pós-Fordismo e reflexos nos contratos de trabalho. Revista da

Faculdade de Direito. Universidade Federal do Paraná, v. 43, 2005. p. 5014.

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A Utilização de Conceitos de Ergodesign no Desenvolvimento de Análise do Posto de

Trabalho de Teleatendimento

João Eduardo Guarnetti dos Santos1 Mariana Falcão Bormio2

Ana Paula Silva da Costa3

1 INTRODUÇÃO

Por volta de 1990 surge no Brasil os "call-centers”, que tratam-se de empresas especializadas na prestação de serviços em inúmeros ramos da economia atual, como a telefonia, serviços de utilidade pública, bancos, indústrias, comércio, entre outros. Nos últimos 20 anos essa atividade cresceu mais de 40% , e estima-se que no ano de 2010 o país contava com cerca de 540 mil operadores, dos quais 400 mil localizam-se no estado de São Paulo, prevendo-se que até o final de 2011 esse número chegue à 450 mil, de acordo com o Sintelmark - Sindicato Paulista das Empresas de Telemarketing, Marketing Direto e Conexos (2010). A respeito das atividades desenvolvidas nesses centros, pode-se dizer que não existe uma definida e sim uma vasta possibilidade, mas que, no entanto, todas estão envoltas à grandes pressões psicofisiológicas, devido às exigências na produtividade, entrelaçadas à sistemas rígidos de trabalhos, que envolvem a manutenção do padrão estabelecido pela empresa no número de chamadas; tempo médio de duração dos atendimentos; atendimento de metas; entre tantas outras.

1 Livre docente, Docente do curso de Pós-graduação em Design da FAAC – UNESP, Bauru 2 Doutoranda em Design, Discente do curso de Pós-graduação em Design da FAAC – UNESP, Bauru 3 Doutoranda em Metodologia e Teoria do Projeto e da Cidade - UNICAMP, Discente regime especial do curso de Pós-graduação em Design da FAAC – UNESP, Bauru

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Em oposição à esse crescimento, no entanto, identifica-se um preocupante panorama frente aos trabalhadores – teleatendentes, pois na maioria das empresas, não houve o devido direcionamento de atenções à saúde do trabalhador, enquanto suas necessidades para o desempenho da função, como por exemplo com a configuração do ambiente de trabalho, ou seja, a arquitetura, associada a outros fatores como os ruídos, iluminação, térmica e os mobiliários. Esse contexto pode ser facilmente constatado ao se analisar os históricos dos trabalhadores dessa empresas, enquanto ocorrência de doenças, afastamentos e reclamações trabalhistas, sendo que em 2010 a LER / DORT — Lesões por Esforços Repetitivos/Distúrbios Osteomusculares constituem a segunda causa de afastamento do trabalho. Diante da importância do assunto em pauta, muitos estudos foram e são desenvolvidos buscando a alteração de tal panorama, seja de maneira a resolver ou minimizar tais problemas, até que em 2007 o Ministério do Trabalho brasileiro adicionou à Norma Regulamentadora 17 – NR 17, referente à Ergonomia, um anexo específico, anexo II, que estabelece exigências mínimas para a configuração do ambiente de trabalho do teleatendente/telemarketing, entretanto, existe certa resistência por parte de muitas empresas em acatar tais requisitos, seja por falta de verbas para tal adequação, ou mesmo por simples descaso. Neste contexto, esse trabalho relata alguns resultados já obtidos com o desenvolvimento de um projeto de pesquisa, que ao caracterizar e analisar os diversos tipos de mobiliários utilizados no posto de trabalho de teleatendente/telemarketing na cidade de Bauru – SP, de maneira a caracterizar a maneira como ocorre a interface do trabalhador de call-center com tais mobiliários. Para tanto, desenvolveu-se um análise ergonômica, por meio de aplicação da metodologia de check-list elaborada tendo por base a NR

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17, associada à aplicação da metodologia do Questionário Nórdico de Sistemas Osteomusculares.

2 ESTUDO DE CASO O desenvolvimento de uma análise ergonômica do trabalho busca o entendimento da interface existente entre o usuário / trabalhador X atividade desenvolvida, pois, dessa maneira torna-se possível a adequada projetação das ferramentas a serem utilizadas no processo. Utilizar-se do ergodesign, ou seja, desenvolver projetos de mobiliários e ferramentas sob os preceitos da ergonomia é atualmente algo indiscutível enquanto ganhos em produção, qualidade e segurança do trabalhador. Podendo-se comprovar tal afirmação facilmente por meio das muitas pesquisas e trabalhos desenvolvidos, tanto por parte do usuário que ao utilizar-se de mobiliário/ferramentas adequadas às suas necessidades psicofísicas otimiza seu desempenho em produção; assim como para o empregador que acaba tendo como certo o retorno financeiro gasto nesse investimento, pois seu trabalhador produz mais, e apresenta menores índices de afastamentos por doenças laborais. 2.1 Teleatendimento / Telemarketing De acordo com a NR 17, define-se o trabalho de teleatendimento/ telemarketing, como “aquele cuja comunicação com interlocutores clientes e usuários é realizada à distância por intermédio da voz e/ou mensagens eletrônicas, com a utilização simultânea de equipamentos de audição/escuta e fala telefônica e sistemas informatizados ou manuais de processamento de dados”.

Conforme citado anteriormente, nos últimos anos houve um crescimento acelerado nesse setor, que não foi acompanhado enquanto as

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devidas preocupações com o trabalhador, sendo as maiores conseqüências o elevado número de incidência de doenças como os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho – DORT, problemas vocais, problemas auditivos e adoecimentos de ordem mental e psicológica.

As doenças profissionais que mais acometem estes atendentes são as LER/DORT, caracterizando-a como a “doença das modernas centrais de atendimento teleinformatizadas” (ECHTERNACHT, 1999 apud PEREIRA, 2001 p. 16).

Algo que deve ser atentamente considerado é que esse tipo de posto de trabalho não pode ser caracterizado como serviço de digitação, o que ocorre em muitos casos, pois, o uso freqüente do computador deve-se a tarefa de abastecimento de banco de dados, leituras de documento e passagem de informações pelo acionamento de teclado (PEREIRA, 2001). 2.2 Metodologia

O desenvolvimento desse trabalhao está programado para ocorrer em etapas, sendo que a análise de cada mobiliário é feita de maneira individual e deve contér:

• Check-list estruturado tendo por base a NR 17 e seu ANEXO II - roteiro previamente estruturado, onde definiu-se pontos específicos que devem ser analisados. Foram listados 29 itens como sendo de primeira necessidade em estar em conformidade nesse tipo de mobiliário, como altura de assento, encostos, a existência de regulagens de altura e materiais utilizados na sua confecção;

• Questionário Nórdico de Sistemas Osteomusculares - desenvolvido com a proposta de padronizar a mensuração de relato de sintomas osteomusculares e, assim, facilitar a comparação dos resultados entre os estudos. Os autores desse

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questionário não o indicam como base para diagnóstico clínico, mas para a identificação de distúrbios osteomusculares e, como tal, pode constituir importante instrumento de diagnóstico do ambiente ou do posto de trabalho (PINHEIRO et.al., 2002). Sua eficácia pode ser constatada pelo fato desse questionário já ter sido traduzido para diversos idiomas na última década. A metodologia é estruturada em um questionário onde as questões estruturam-se a partir de um esquema estipulado do corpo humano, dividido em nove partes, cujas respostas são escolhidas entre as alternativas “sim” ou “não”, quanto à ocorrência de sintomas nas diversas regiões anatômicas nas quais são mais comuns. O respondente deve relatar a ocorrência dos sintomas considerando os doze meses e os sete dias precedentes à entrevista, bem como relatar a ocorrência de afastamento das atividades rotineiras no último ano;

• Medições técnicas do posto de trabalho. 2.3 Mobiliário

O mobiliário analisado foi a bancada “X”, projetada em sistema modular, que pode ser utilizada individualmente ou em associação de acordo com a demanda da empresa onde é adotada, figura 01.

Figura 01 – Vista geral adotando-se vários módulos do mobiliário “X”

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A estrutura desse mobiliário é confeccionada basicamente em MDF com 18 mm de espessura, revestido com laminado metálico texturizado e com acabamento em fita de borda de 1 mm de espessura:

- Painel frontal (largura x espessura x profundidade - 1000 x 18 x 925 mm) fixo. Esse tampo possui um dispositivo para regulagem de altura do monitor, confeccionado em aço medindo 430 mm, figura 02;

- Painéis laterais (2200 x 18 x 1300 mm), fixo. Utilizados como delimitador do posto de trabalho entre um posto e outro;

- Tampo para monitor (1000 x 650 x 18 mm), fixo; - Tampo para teclado (1000 x 249 x 18 mm), móvel, com

regulagem de altura vertical em 200mm, figura 03.

Figura 02 - Mobiliário – bancada “X”

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Figura 03: Vista painel frontal com dispositivo de regulagem de monitor

Figura 04: Vista sistema de regulagem de altura

A cadeira “Y” utilizada apresenta base giratória com apoio em cinco

patas com rodízios; assento com mecanismo de regulagem na altura vertical e sistema de amortecimento pneumático, base estofada revestida de material que permite perspiração, sem conformações na base e com borda frontal arredondas; encosto com base estofada revestida de material que permite perspiração com sistema de ajuste em altura e em sentido ântero-posterior com regulagem variando de 10º até 23º, possui forma levemente adaptada ao corpo para proteção da região lombar; apoio de braços dotado de ajuste vertical com variação de 60mm. A estrutura é produzida em componentes metálicos com tratamento anti-corrosivo, protegido por capa tipo carenagem produzida em PP (polipropileno) com espessura predominante de 1,5mm. Figura 05.

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Figura 05 – Cadeira “Y”

2.4. Análise do mobiliário em uso Desenvolveu-se dois estudos de caso, a fim de verificar a maneira como o mobiliário se apresenta enquanto ao uso destinado. Para tanto, escolheu-se dois usuários com perfis antropométricos diferentes, um que representa o percentil 5% (mínima estatura) e outro percentil 95% (máxima estatura). O usuário 01, é do gênero masculino, 31 anos de idade, com altura de 1,88m, o comprimento do braço esquerdo é de 0,79m; suas costas medem 0,53m de largura e a altura de seus joelhos relacionados ao chão é de 0,67m, figura 06.

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Figura 06: Usuário 01.

Como pode ser observado, o mobiliário atende as necessidades do

usuário ao permitir ser regulado de acordo com seu perfil antropométrico: posicionamento de monitor, teclado e assento.

Nota-se que os dois pés estão apoiados diretamente no chão, e que não existe barreiras que atrapalhem a movimentação das pernas.

A cadeira apresenta apoio para os dois braços, e mobilidade do apoio das costas.

O check-list constatou que não existe problemas no design do mobiliário e a aplicação do questionário nórdico dos sintomas músculos-esqueléticos mostrou em 100% das questões, que o usuário não apresenta dores, e está satisfeito com o mobiliário utilizado.

O usuário 02, é do gênero feminino, 21 anos de idade, com altura de 1,62m, o comprimento do braço esquerdo é de 0,70m; suas costas medem 0,41m de largura e a altura de seus joelhos relacionados ao chão é de 0,22m, figura 07.

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Figura 07: Usuário 02

O segundo caso nos mostra que, assim como constatado

anteriormente, o mobiliário atende as necessidades do usuário ao permitir ser regulado de acordo com seu perfil antropométrico: posicionamento de monitor, teclado e assento.

Os dois pés estão apoiados diretamente no chão, e que não existe barreiras que atrapalhem a movimentação das pernas.

A cadeira apresenta apoio para os dois braços, e mobilidade do apoio das costas.

Apesar do mobiliário apresentar-se satisfatório de acordo com o check-list, a aplicação do questionário nórdico dos sintomas músculos-esqueléticos mostrou que o usuário não está 100% satisfeito, pois, apresenta problemas de saúde, como pode ser observado na Tabela 01 a seguir.

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Tabela 01 – Resultados da aplicação do Questionário Nórdico dos Sintomas Músculos-esqueléticos

Ocorrência de problema de saúde nos últimos 7 dias

1 - Pescoço 4 - Punhos e mãos direito Ocorrência de problema de saúde nos últimos 12 meses

1 - Pescoço 2 - Ombro direito 4 - Punhos e mãos direito 5 - Coluna dorsal

Pode-se concluir que o quadro obtido, resulta de uma somatória de

fatores que ultrapassam o mobiliário, pois, conforme verificou-se, este possibilita as devidas adaptações necessárias.

3 CONCLUSÕES Por meio da análise ergonômica desenvolvida, foi possível chegar as seguintes conclusões relacionado ao posto de trabalho em estudo:

- Bancada “X”: o Apesar do tampo da mesa apresentar-se configurado em

duas partes: tampo monitor – medindo 1000x650mm; e tampo teclado – medindo 1000x245mm; essa divisão atende a profundidade mínima de 75 (setenta e cinco) centímetros solicitadas pela NR 17;

o Possui mecanismos de ajuste às necessidades antropométricas do usuário, enquanto controle de regulagem do posicionamento vertical da altura do tampo de apoio para o teclado, de maneira que permite o adequado

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posicionamento das pernas, possibilitando sua movimentação e o apoio direto dos pés no chão;

o O posicionamento do monitor em superfície diferente do teclado e mouse, facilita a adequação do mobiliário ao usuário. Destaca-se principalmente a eficiência do sistema adotado para suporte do monitor, fixado no painel frontal com sistema de regulagem com 430mm;

o O plano de trabalho possui bordas arredondadas; o A configuração do mobiliário, ao locar os mecanismos de

regulagem de altura nas laterais da mesa, assim como o suporte para o CPU do computador, libera um grande espaço, que possibilita às pernas movimentarem-se sem restrições.

- Cadeira “Y”: o Possui mecanismos de ajuste às necessidades

antropométricas do usuário, enquanto controle da altura do assento, de maneira a possibilitar o apoio dos dois pés diretamente no chão;

o Os apoios para os braços por serem ajustáveis em 150mm, possibilitam a adequada angulação que este precisa adotar em relação ao tronco, minimizando sobrecarga nos ombros e pulsos.

o A base da cadeira é feita com apoio em 05 pés, com rodízios adequados à resistência contra deslocamentos involuntários e que não comprometem a estabilidade do assento;

o O assento possui estofamento e revestimento com material adequado, que permita a perspiração, além de nenhum tipo de conformação e borda frontal arredondada;

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o O encosto ajustável em altura e em sentido antero-posterior, possui forma levemente adaptada ao corpo para proteção da região lombar.

Conclui-se, segundo as análises que o mobiliário conjunto bancada “X” e cadeira “Y”, destinado ao uso por teleatendentes, se adequa às exigências instituídas pela NR 17, Anexo II. Entretanto, Deve-se desenvolver uma análise mais aprofundada nesse posto de trabalho para identificar os problemas que resultarem em reclamações a respeito da saúde do usuário 02.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL – Lei n° 6515, nº 3.214 de 08 de junho de 1978 – NR – Normas

Regulamentadoras. 2011. In: SEGURANÇA E MEDICINA DO TRABALHO. 59º edição. São Paulo: Ed. Atlas, 2011.

IIDA, Itiro. Ergonomia: projeto e produção. 2º Edição verificada e ampliada.

São Paulo: Ed. Edgard Blücher, 2006. PEREIRA, Vanda Cristina Galvão. A contribuição da ergonomia no registro e

prevenção das LER/DORT em centrais de atendimento. Florianópolis, 2001. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção com ênfase em Ergonomia) Programa de Pós-graduação em Engenharia de Produção, UFSC, 2001.

PINHEIRO, Fernanda Amaral; TRÓCCOLI, Bartholomeu Torres ; CARVALHO,

Cláudio Viveiros de. Validação do Questionário Nórdico de Sintomas Osteomusculares como medida de morbidade. In: Revista de Saúde Pública 2002; volume 36(3), paginas 307-12 307.

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Análise Comparativa para Contribuição Metodológica em Design de Sinalização

Fábio Gonçalves Teixeira1

Régio Pierre da Silva2 Tânia Koltermann da Silva3

Eduardo Cardoso4 Fabiano de Vargas Scherer5

1 INTRODUÇÃO

Novas especializações no campo do design surgiram, no decorrer do século XX, em resposta às enormes mudanças culturais e econômicas que aconteceram na sociedade. Mais especificamente, o design gráfico, que trabalha com a informação, seja por meio da linguagem, da imagem ou dos símbolos, desdobrou-se em vários caminhos, entre os quais a sinalização. Esta, simplificadamente, busca fornecer a informação necessária ao usuário de um determinado espaço.

Colocam-se neste trabalho alguns conceitos sobre sinalização com o objetivo de apresentar como o design entende este campo específico e como se tem dado sua evolução. As mais diferentes denominações encontradas na bibliografia e na prática profissional demonstram o quão recente é a área assim como a confusão que a multidisciplinaridade pode causar em um primeiro momento, como demonstram também a necessidade de se estabelecer conceitos e nomenclaturas comuns. Para tanto, apresentam-se os conceitos de sinalização, señalética, wayfinding e design gráfico ambiental.

1 Doutor em Engenharia Mecânica, Professor Adjunto – Professor PgDesign UFRGS 2 Doutor em Engenharia de Produção, Professor Adjunto – Professor PgDesign UFRGS 3 Doutor em Engenharia de Produção, Professor Adjunto – Professor PgDesign UFRGS 4 Mestre em Design , Professor Assistente 5 Mestre em Planejamento Urbano, Professor Assistente

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Para uma revisão dos métodos de projeto em sinalização, estuda-se a sua classificação e seus critérios de avaliação, pois com a evolução da complexidade do projeto de sinalização, um método capaz de abarcar as diferentes etapas e conduzir para o melhor resultado, se faz cada vez mais necessário. De acordo com Uebele (2007), os projetos que fornecem um sistema gráfico completo e eficiente são capazes de dar lugar a uma identidade, transformar a natureza das áreas que eles ocupam, e, claro, fornecer orientação. Indo um pouco mais longe, os projetos que atendem os requisitos citados acima e demonstrem-se adequados em sua materialidade, embasados em conceitos sutentáveis e adequados as questões de acessibilidade, apresentam o que de melhor o campo do design pode oferecer.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 Sinalização

Segundo a SEGD - Society for Environmental Graphic Design (Sociedade de Design Gráfico Ambiental) dos Estados Unidos, dentro dos sistemas gráficos para ambientes, o processo de sinalização pode ser definido como o planejamento, projeto e especificação de elementos gráficos no ambiente construído ou natural. Estes elementos são usados para comunicar informações específicas em sistemas de identificação, informação, direção, interpretação, orientação, regulamentação e ambientação.

Segundo a ADG (2000), o design de sinalização procura otimizar, por vezes, até viabilizar, a utilização e o funcionamento de espaços, sejam eles abertos ou construídos. Embora o termo sinalização possa ser considerado muito amplo e genérico, segundo Velho (2007), ao ir se modificando ao longo dos anos, ele reflete a complexidade ao incorporar novos atributos no seu desenpenho (tais como o seu relacionamento com o ambiente, a introdução

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de uma linguagem gráfica mais expressiva e uma maior liberdade na escolha e no uso de tipografias, cores, com a introdução da informática). Assim, um projeto de sinalização pode ser caracterizado pelo resultado da combinação de vários subsistemas.

Os principais conceitos relacionados aos projetos de sinalização estão resumidos no quadro abaixo (01) para melhor entendimento a respeito das várias definições trabalhadas.

Quadro 01: Resumo dos conceitos relativos aos termos empregados em

sinalização.

Sinalização

Processo de veiculação de informações. É o principio de marcar ou sinalizar algo. Transmite informação mediante uma disposição adequada de sinais, regulamentando o fluxo de pessoas e veículos, preferencialmente antecipando a demanda. Produto de design utilizado para orientar, informar e guiar os usuários.

Señalética Sua finalidade é a informação imediata e inequívoca, direcionada a reação à mensagem. Não impõe a atenção, não provoca impacto e nem recorre a atenção estética.

Wayfinding

Voltado ao movimento orientado, utiliza-se da aplicação dos recursos da sinalização para orientar e auxiliar os usuários a chegarem em determinado destino com segurança, tornando a experiência dos mesmos agradável.

Design Gráfico Ambiental

Campo multidisciplinar que inclui o design gráfico, design de produto, arquitetura e paisagismo. Abrange questões de identidade, sinalização e wayfinding em um determinado ambiente.

Neste trabalho propõe-se o uso do termo sinalização como o

planejamento, projeto e especificação de elementos físicos e gráficos no ambiente construído ou natural, num processo de veiculação adequada de informações. Ele faz parte de algo maior, o campo do design gráfico

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ambiental, onde ambiental relaciona-se ao ambiente, ao espaço, e não a aspectos de sustentabilidade, como pode parecer em um primeiro momento. Assim, o design gráfico ambiental, do qual ainda fazem parte a ambientação e o design de exposições, configura-se como uma das especializações do design.

2.2 Metodologia

Löbach (2001) coloca que o design poderia ser deduzido como idéia, projeto ou plano para a solução de um problema, e o ato de design, então, seria dar corpo à idéia e transmiti-la aos a outros. Para Cross (1993) apud Vasconcelos (2010), a metodologia de design é caracterizada pelo estudo de princípios, práticas e procedimentos de design, com o objetivo de aprimorar a prática, apresentando uma orientação fortemente voltada ao processo.

Modelos de classificação para metodologia de design vêm sendo gerados com o intuito de padronizar os dados coletados, bem como de oferecer um acesso diferenciado a tais dados por meio de agrupamentos e classificações.

Para a análise dos métodos utilizados em projetos de sinalização, partiu-se dos estudos de Bonsiepe (1984) e lançou-se mão dos critérios de avaliação estabelecidos por Vasconcelos et al (2010): (i) atitude metodológica, (ii) estrutura das etapas, (iii) flexibilidades das etapas e (iv) presença, tipo ou ausência de feedback. A atitude metodológica pode ser classificada em descritiva, quando a metodologia apenas descreve um processo que já era anteriormente feito, ou prescritiva, quando a metodologia funciona de maneira normativa, prescrevendo métodos e passos os quais devem ser seguidos para alcançar o desenvolvimento do produto. A estrutura das etapas consiste no fluxo, se é linear ou cíclica. Já no que se refere à flexibilidade das etapas, ela pode ser classificada como contínua, quando o fluxo das etapas é necessariamente contínuo e uniforme, não permitindo retornos flexíveis e

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processos concomitantes, ou descontínua, quando o fluxo das etapas pode ser constantemente interrompido, favorecendo retornos e avanços flexíveis e até mesmo a possibilidade de processos concomitantes. Pode-se verificar aqui, também, a existência de avaliação e aprovação na passagem de uma etapa para a outra. Por fim, analisa-se a ausência de feedback, ou seja, se a metodologia não possui retornos entre suas fases, ou a existência de feedback, sendo que ele pode acontecer em determinadas fases (quando ele existe, porém é definido anteriormente pelo autor, de maneira restritiva) ou entre fases (quando apresentam-se flexíveis e favorecem retornos diversos, basicamente entre todas as fases do processo). E aqui se pode verificar, também, a ocorrência de um feedback final, ou seja, uma análise pós-implantação com o intuito de destacar pontos positivos do projeto e corrigir possíveis erros no próprio ou em futuros projetos.

A estes critérios foi acrescido um aspecto particular dos projetos de sinalização, a existência e o objetivo do manual, onde se procura saber a que ele se destina, se é um caderno de projeto ou se tem também a função de preparar a implantação, e em que fase o manual entra no projeto. Outro aspecto analisado foi a existência e a função com que aplicam-se modelos físicos (mock-ups e protótipos) e/ou virtuais ao longo do desenvolvimento do projeto.

2.3 Métodos

Os métodos utilizados neste estudo foram selecionados através da bibliografia sugerida pela SEGD que oferece uma visão norte-americana do processo. São eles: Wayshowing: A Guide to Environmental Signage Principles and Practices de Per Mollerup; Signage and Wayfinding Design: A Complete Guide to Creating Environmental Graphic Design Systems de Chris Calori; e The Wayfinding Handbook: Information Design for Public Places de David Gibson. Outros três livros sugeridos pela SEGD não foram utilizados, pois

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Environmental Graphics: Projects & Process de Wayne Hunt; Wayfinding: Designing and Implementing Graphic Navigational Systems de Craig M. Berger; e Wayfinding People, Signs, and Architecture de Paul Arthur e Romedi Passini, apesar de sua importância para a área, não apresentam uma metodologia sistematizada em suas publicações.

Além destes foram selecionados também, devido a sua importância histórica, Architectural Signing and Graphics de John Follis e Dave Hammer, uma das primeiras tentativas de sistematizar o projeto de sinalização; e a visão européia do processo, com Signage System & Information Graphics de Andreas Uebele; Signage Design Manual de Edo Smitshuijzen, e Señalética Corporativa de Joan Costa. Em ordem cronológica de publicação tem-se os seguintes métodos: John Follis e Dave Hammer (1979); Per Mollerup (2005); Andreas Uebele (2007); Chris Calori (2007); Edo Smitshuijzen (2007); Joan Costa (1989 - 1ª edição / 2007 - 2ª edição); David Gibson (2009). Neste artigo apresenta-se apenas parte do estudo, com o intuito de demonstrar a sistemática de análise.

2.3.1 David Gibson (2009)

Segundo Gibson (2009), cada projeto de sinalização tem objetivos únicos assim como exigências técnicas e funcionais distintas. Há, no entanto, etapas no processo que são comuns a todos os projetos. O esquema gráfico (figura 01) fornece um modelo geral de como a maioria dos projetos de “wayfinding” procedem. Em projetos menores algumas etapas são, por vezes, combinadas ou mesmo eliminadas. Outras vezes, algumas etapas de um trabalho têm que ser executadas simultaneamente para acomodar um cronograma corrido. Para projetos de longo prazo, pode haver pausas entre as fases, esperando que os demais profissionais envolvidos na execução da obra – arquitetos e engenheiros, por exemplo, concluam seus trabalhos para que o processo possa continuar.

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Figura 01: Fases do processo de projeto em sinalização. (Adaptado de Gibson,

2009).

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De acordo com os critérios de avaliação citados, tem-se (i) atitude metodológica prescritiva, (ii) estrutura linear dividida em 8 etapas, (iii) flexibilidade das etapas descontínua em função de que em projetos menores algumas etapas podem ser combinadas ou mesmo eliminadas; e (iv) não há presença de feedback entre as etapas intermediárias do processo, havendo apenas revisão na etapa final, antes da execução do projeto. A inspeção e avaliação do projeto implantado não prevêem feedback, somente revisão e adequações finais.

Quanto aos aspectos em particular, não apresenta o emprego do

termo “manual” e sim do termo “memoriais descritivos”, onde explicita as intenções de projeto. O autor não deixa claro se há a execução de protótipos de forma sistematizada no processo. 3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Ao analisar os esquemas metodológicos pesquisados, têm-se uma visão geral do processo conforme cada autor (quadro 02). Não obstante, é possível identificar tendências de tais esquemas quanto às classificações propostas, que possivelmente demonstram o melhor caminho a ser seguido no desenvolvimento de métodos e processos de design.

Como os métodos de projeto na área de sinalização derivam de áreas em que a sistematização do projeto encontra-se consolidada há mais tempo, e que, de certa forma, deram origem ao campo do design gráfico ambiental, como arquitetura, design de produto e design gráfico, é natural que as metodologias apresentadas aqui contenham questões ligadas a estes campos do conhecimento. Assim, pode-se notar que com o passar dos anos, os processos e métodos em design foram desenvolvendo-se e aprimorando-se, ao apresentar metodologias de esquemas prescritivos e mais maleáveis,

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mais bem adaptados aos problemas atuais, possibilitando vários retornos e apresentando fases mais detalhadas com técnicas diversas e multidisciplinares aplicadas ao processo. É importante ressaltar que o método proposto por Follis e Hammer (1979) já trazia tais questões. Nas proposições da última década, apesar das metodologias de Costa (2009) e Gibson (2009) divergirem da maioria, ao não mencionarem claramente as questões de feedback, por exemplo, observa-se o desenvolvimento de modelos essencialmente prescritivos, onde grupos que estruturam fases e etapas flexíveis ganharam espaço, com testes e verificações constantes em cada fase.

Quadro 02: Resumo da análise dos métodos de projeto em sinalização.

Este trabalho passa agora a apresentar a proposição de um

método de projeto de sinalização, que leva em consideração as análises acima dispostas, a prática profissional (acadêmica e de mercado), e também outros autores reconhecidos na área de metodologia em design como Back (2008).

Dentre a bibliografia apresentada, de acordo com alguns autores (Calori, 2007 e Gibson, 2009) nota-se a presença de grandes grupos bem definidos, tais como pré-design ou planejamento; design; e pós-design ou

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implementação. O método proposto neste trabalho foi, então, dividido em três grandes grupos: planejamento, projeto e implementação (figura 02a e 02b).

O grupo de planejamento foi dividido em contato e levantamento de dados. A fase de contato consiste na formulação do briefing por parte do cliente e do projetista e do contrato, onde deve constar o escopo e o cronograma do projeto, assim como a estimativa de custo do projeto baseada no quanto o cliente está disposto a investir, se for o caso. A fase de levantamento de dados divide-se, por sua vez, em duas etapas distintas e igualmente importantes, os dados sobre o espaço/ambiente a sinalizar e os dados sobre as informações que devem ser transmitidas. Além disso, deverão ser analisadas a hierarquia e a flexibilidade das informações a serem transmitidas, ou seja, o que é mais importante e, portanto, deve aparecer primeiro, e o que deve aparece a partir de determinado ponto.

O grupo de projeto foi dividido em pesquisa, desenvolvimento e detalhamento. A fase de pesquisa é fundamental e, partindo da problematização, divide-se em três grandes eixos – o espaço/ambiente, o conteúdo/informação e o usuário.

O espaço/ambiente trabalha com os condicionantes legais e físicos, com as análises funcionais, a contextualização com a linguagem arquitetônica e com o conhecimento dos materiais empregados.

O conteúdo/informação corresponde à quantidade e hierarquia de informação a ser transmitida levando em conta o meio de transmissão mais adequado: visual, sonore e/ou tátil. Também diz respeito ao sistema tipográfico, sinais e pictogramas e o sistema modular e formal. O conteúdo/informação ainda corresponde ao sistema de codificação dos elementos.

Para estabelecer as especificações de projeto, são identificadas, primeiramente, as necessidades dos usuários e a transformação das

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necessidades em requisitos dos usuários. Após o levantamento de requisitos dos usuários deve-se fazer uma priorização destes. A partir dos requisitos dos usuários são definidos os requisitos de projeto, considerando diversos atributos: funcionais, ergonômicos, de segurança, de confiabilidade, de modularidade, estéticos e legais, entre outros (BACK, 2008).

Estes três eixos convergem para as diretrizes de projeto, que, após conhecidos os requisitos de projeto, necessitam de uma avaliação comparativa dos produtos disponíveis no mercado (analise de similares) para verificar o atendimento dos mesmos aos requisitos dos usuários e aos do projeto. Por fim chega-se ao conceito do projeto, expressão maior das intenções do projeto.

A fase de desenvolvimento consiste nas etapas de geração de alternativas, seleção de alternativas e fechamento do sistema. Na geração de alternativas transforma-se conceitos em estudos preliminares envolvendo idéias formais com tipos de elementos, dimensões gerais, localização e custo estimado, sempre levando em consideração o desenho duas dimensões (2D) e os simulações em três dimensões (3D, físicos e virtuais).

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Figura 3a: Metodologiade projeto em sinalização – parte 01.

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Figura 3b: Metodologia de projeto em sinalização – parte 02.

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Ainda na fase de desenvolvimento, a seleção de alternativas procura, partindo dos requisitos, encontrar a alternativa que satisfaça a problematização. Tanto na geração quanto na seleção de alternativas são necessárias ferramentas que balizem as escolhas. Uma vez selecionada uma das alternativas, o fechamento do sistema corresponde à elaboração de todos os elementos de sinalização, ou seja, de toda a família de elementos – direcionais, locacionais, por exemplo. Ainda corresponde a codificação e a locação final de todos os elementos. Nesta etapa é importante a validação através de modelos físicos e virtuais, que incluem simulações não só do elementos em separado mas também de sua relação com o espaço/ambiente. Esta etapa também é submetida a aprovação antes do prosseguimento do projeto.

E a fase de detalhamento consiste no detalhamento e nas especificações de todos os elementos que compõe o sistema de sinalização proposto. Mais especificamente, corresponde a diagramação final dos elementos e suas variações e ao detalhamento do sistema técnico-construtivo e a especificações dos materiais utilizados. Esta fase é concluída com o manual de sinalização que tem a função de documentar o projeto desde o conceito, demonstrar sua configuração e possibilitar a materialização dos elementos.

O grupo de implementação foi dividido nas fases de orçamento, produção e instalação. A etapa de orçamento consiste na seleção e indicação de fornecedores qualificados para que os mesmo elaborem suas propostas de execução onde devem constar o cronograma e o orçamento. Quando for o caso, podem-se solicitar protótipos para averiguar o trabalho destas empresas, mediante remuneração. Esta etapa encerra-se com a revisão do orçamento final e considerações sobre o projeto antes da contratação da(s) empresa(s) executora(s). A fase de produção consiste na fabricação dos elementos, o que deve ser feito com o acompanhamento do projetista, através de reuniões com os envolvidos e com visitas a fábrica. E, por fim, a

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fase de instalação consiste no transporte, na montagem e na instalação de todos os elementos do projeto, o que também deve ser feito com acompanhamento.

É importante salientar a presença constante entre as etapas de aprovações e feedbacks. Esta flexibilidade permite retornar a etapas anteriores sempre que algo for detectado como errado ou não suficiente ou um novo elemento entrar no processo. Após a avaliação com cliente e usuário, parte-se para o relatório final onde devem constar as alterações feitas no manual e a inclusão de elementos adicionais, se for o caso. A existência de um feedback final, ou seja, a avaliação com cliente e usuário, permite sanar inconsistências assim como possibilita aprendizados para novos projetos. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base no estudo das diferentes conceituações e das diferentes metodologias empregadas em projetos de sinalização, pode-se encontrar diretrizes através de grupos, fases e etapas recorrentes e complementares. Em muitas referências há ainda a possibilidade de feedback e, assim pode-se formular um método que busca ser ao mesmo tempo abrangente e específico. Abrangente ao trabalhar a complexidade da reunião de diferentes contextos – o espaço/ambiente, a informação e o usuário. Também por abarcar projetos de pequeno a grande porte e seus desdobramentos, tais como contratações, orçamentos e licitações. E específico ao tratar de aspectos particulares do projeto de sinalização, tais como manual, simulações virtuais, mock-ups e protótipos.

Como sugestão para trabalhos futuros vê-se a necessidade de examinar a aplicação prática desse método para validação do mesmo. Coloca-se também a necessidade do desenvolvimento e validação de ferramentas para a geração e seleção alternativas, de forma embasada e sistemática.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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SMITSHUIJZEN, Edo. Signage Design Manual. Baden, Suíça: Lars Müller, 2007.

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UEBELE, Andreas. Signage System & Information Graphics. London: Thames & Hudson, 2007.

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VELHO, Ana Lucia de Oliveira Leite. O Design de Sinalização no Brasil: a introdução de novos conceitos de 1970 a 2000. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2007. Dissertação de mestrado.

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As Disciplinas Projetuais no Curso de Design de Produto da FAAC – UNESP,

Campus de Bauru

Paula da Cruz Landim1

1 INTRODUÇÃO

O início da prática do design e seu ensino no Brasil ocorreram, segundo COUTO, (2008) de maneira empírica, da mesma forma que nos primórdios da Bauhaus, quando grandes nomes da arquitetura e das artes plásticas em geral se reuniram com a intenção de dar uma forma e linguagem contemporânea à produção industrial.

Simbolicamente, opta-se pela afirmação de que o ensino de design no Brasil tem como marco inicial a fundação da ESDI2, que tendo em vista suas origens, remonta à Escola de Ulm (Gestalt) e antes dela à Bauhaus. Possivelmente por isto, o principal guia de nossos designers seja o Funcionalismo, característica marcante das escolas alemãs. Pois mesmo a iniciativa na década de 1950 de Lina Bo Bardi e Giancarlo Pallanti, de um curso regular de design no então Instituto de Arte Contemporânea-Museu de Arte de São Paulo – IAC-MASP, e apesar de ter durado apenas dois anos, também não escondia a influência da estética racionalista da arquitetura e do design modernos.

Por outro lado, ainda segundo COUTO (2008), seria pueril querer acreditar que o ensino do design iria surgir espontaneamente e com um modelo de ensino genuinamente brasileiro, ainda mais em meio a um período desenvolvimentista, e onde para o mercado, o modelo a ser invejado deveria

1 Professor Livre-Docente em Design de Produto pela FAAC, UNESP – campus de Bauru. Professor do PPG em Design da FAAC, UNESP – campus de Bauru. 2 http://www.esdi.uerj.br/ acessado em fevereiro 2011.

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ser o norte-americano. Mas o currículo da ESDI já havia se transformado no paradigma para o ensino de design no Brasil, e ironicamente a indústria brasileira de fato não estava lá muito interessada nos recém-formados profissionais nacionais, e o ambiente político do final dos anos 1960 não era aconselhável para um design socialmente engajado. Paradoxalmente, dez anos depois, e em função do maior incentivo financeiro dado pelo governo às áreas tecnológicas, - paralelamente aos cortes às áreas sociais e artísticas - gerou-se um boom de cursos de artes transformados em cursos de design as pressas, havendo então a necessidade de se repensar as questões curriculares, pois, “... permitu grande liberdade e originalidade aos currículos plenos dos cursos, por outro, permitiu também a criação de aberrações”.

Um país de dimensão continental como o Brasil poderia ter promovido em paralelo, durante a instituição do ensino do design na esfera local, experiências e modelos de ensinamento diferenciados, com características e ideais diversificados, como são na verdade diversas as vocações e o comportamento dos brasileiros. Os conceitos funcionalistas poderiam ter sido mantidos como referência projetual em uma escola e/ou região brasileira, outras poderiam ter se adentrado na promoção de possíveis e diferentes modelos para o design local, na busca de resultados e soluções distintas, e ainda mesmo poéticas diferenciadas.

Por outro lado, paradoxalmente, nos programas de ensino das faculdades de design do país, se adotou o modelo da tecnologia alternativa: os novos graduados, ao deixar a faculdade e ingressar no mercado de trabalho, se deparavam com um parque produtivo, já bastante desenvolvido, cujo modelo estava fundamentado na tecnologia produtiva ocidental. Os parques industriais locais vinham se equipando, e com ferramentas e maquinários próprios da produção industrial de perfil convencional, nos moldes da modernização mundial.

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Em uma nova etapa do ensino de design, posterior às experiências com tecnologia alternativa, era prática comum por parte de muitas escolas a inserção de temas projetuais que estivessem de acordo com a realidade e o contexto do parque industrial instalado nessas regiões. Tal prática, apesar de nitidamente bem-intencionada, acabava por não corresponder a realidade, contradizendo-a muitas vezes. Segundo MORAES, (1999) a rapidez de referências e informações recebidas pelos empreendedores e consumidores do Brasil e da América Latina era, antes de tudo, uma forte barreira para a prática e o sucesso desse plano de ensino.

A constante semelhança entre os resultados projetuais obtidos pelos alunos - através da solicitação de temas muitas vezes repetitivos - gerava um nivelamento mediano da qualidade dos projetos. Não obstante, os métodos projetuais permaneciam com características extremamente funcionalistas em detrimento de outros atributos importantes, como os valores reflexivos e culturais inerentes ao processo da prática em design. Repassava-se aos alunos um conceito de design cuja "função básica" era projetar produtos para produção em série pelas indústrias. Dessa forma, ensinava-se aos estudantes a importância de saber considerar e aplicar os fatores técnicos, sociais, ergonômicos, estético-formais e produtivos que, uma vez bem dosados, lhes mostrariam um caminho mais lógico e segura para o sucesso do seu projeto e para o desenvolvimento de novos produtos.

As diversas escolas existentes vinham se apoiando nesses valores e métodos projetuais como verdadeiros dogmas. Diante desse quadro, percebe-se que os estudantes eram capazes, ao final da formação escolar, de projetar um produto, ou seja, eram capazes de cumprir todas as etapas descritas nos métodos de projetação existentes no programa de ensino escolar e de seguir as metodologias projetuais determinadas pelos seus professores. Mas estariam realmente fazendo design? Na verdade, o que vinha acontecendo,

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salvo raras exceções, era a simples utilização e aplicação quase automáticas dos diversos fatores necessários a um projeto.

Os professores por sua vez, segundo MORAES, (1999) trazem para a sala de aula cases de profissionais atuantes de sucesso e com mais experiência de trabalho, utilizando-os como referência aos estudantes. Isto se reflete na limitação do ensino do design, em vez de possibilitar a diversificação e a abrangência necessária.

A ansiedade criada junto aos alunos pela aplicação dessas referências acaba por inibir o seu processo de formação. Além disso, referências personalizadas junto ao ensino de design podem proporcionar um sentimento de inferioridade por parte de muitos dos recém-formados e iniciantes, ao terem seus projetos comparados com os dos já estabelecidos e experientes profissionais atuantes no mercado.

MORAES (1999) entende que, durante um processo de ensino de design, o aspecto mais importante não seria aquele de fácil identificação - como o aspecto estético - nem de fácil aplicação - como os fatores técnicos e ergonômicos. E sim a síntese da cultura projetual, por meio dos valores reflexivos, culturais, críticos e analíticos durante o processo de projetação. Estariam os alunos preparados para situar seus produtos quanto às tipologias de uso e às tipologias formais? Seriam eles capazes de situar seus produtos quanto às referências históricas e culturais? E quanto aos aspectos reflexivos, comportamentais e humanos?

Os estudantes de design devem se habituar a usar o raciocínio reflexivo e analítico durante as fases de desenvolvimento de um projeto. E ainda, ter senso crítico sobre as reais possibilidades de aplicação de seu produto junto ao mercado consumidor e junto ao usuário. Habituar-se à aplicação de enfoques humanísticos e de valores culturais como fatores de diferenciação e como geração de novas alternativas projetuais. Caso isto não

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ocorra, correm o sério risco de se tornarem reféns dos fatores objetivos da projetação.

É tarefa dos cursos de design, - através das suas disciplinas projetuais - fazer com que os alunos, - utilizando-se de temas prévia e estrategicamente estabelecidos - pratiquem uma forma de projetação onde prevaleçam enfoques subjetivos e teóricos como elementos diferenciadores de projeto. Isso deve ocorrer até que essa prática se torne um fator natural e intrínseco do seu processo e método projetuais. Deste modo, está preparando não somente um dosador de diversos fatores e aspectos projetuais, mas um pensador para novas e diferenciadas soluções.

O aluno deve ser conduzido a abstrair-se momentaneamente do produto que vem a ser o escopo do seu projeto; ele tem de aproximar-se do contexto e da situação que envolve o tema projetual proposto. Por exemplo, não se deve pensar em uma cadeira, mas no ato de assentar; não se faz necessário pensar no copo, mas no ato de beber, não deve pensar em uma vitrina, mas no ato de expor e mostrar algum objeto, e assim sucessivamente.

Por sua vez, um projeto assim direcionado, tem maior possibilidade de apresentar soluções mais inovadoras, diferenciadas e, às vezes, até quem sabe inusitadas. Caso contrário, surgirão apenas outras cadeiras, copos e vitrinas que poderão eventualmente ser mais belas, mais funcionais ou mais atraentes, como os resultados que vemos serem obtidos junto aos métodos projetuais convencionais empregados na atualidade.

Desse modo, o estudante não receberá informações sobre o tema específico de projeto, e sim o tema genérico. Contudo, este tema genérico deve ser exposto pelo professor, de modo a possibilitar o surgimento de diversas propostas projetuais, buscando incentivar uma variação de temas específicos dentro daquele tema genérico fornecido, cabendo ao estudante programar a escolha do tema específico, de seu trabalho e de desenvolvimento projetual.

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2 AS DISCIPLINAS PROJETUAIS NO CURSO DE DESIGN DE PRODUTO DA FAAC – UNESP, CAMPUS DE BAURU

Entendendo que, projetar não é impor uma solução autoral e autoritária, mas dividir com o interlocutor a responsabilidade da troca e dar uma contribuição espontânea, que sensibilize e conquiste pela via social e estética, o objetivo das disciplinas projetuais do curso de Design de Produto da FAAC – Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da UNESP – Campus de Bauru é introduzir o aluno aos problemas espaciais, formais e estéticos do projeto, relacionando o design com a produção industrial. Ou seja, compreendendo a interdependência de atuação profissional entre o processo de criação, (projeto) e o processo de execução (indústria).

Para tanto, e para que se possam desenvolver processos que permitam criar e recriar repertórios, por meio de uma visão crítica da realidade, o aluno desenvolve projetos, de modo que exercite sua criatividade e visão espacial, desenvolvendo a metodologia relacionada ao desenho do objeto, paralelamente a aulas teórico-expositivas. Onde o usuário não é visto apenas como um ser cujas necessidades práticas precisam ser satisfeitas, alienando-o de questões sócio-culturais e eventualmente até econômicas que permeiam o imaginário do universo dos objetos cotidianos. Alguns dos resultados podem ser observados nas Figuras 01 a 05.

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Figura 01: Caixa de polietileno utilizável tanto como mobiliário como para brinquedo.

Menção Honrosa na Categoria Estudante, no “Concurso Abiplast Design 2005”. Alunos: Mariana Menin, Laura Schaer Dahrouj e Fernando Feldberg.

a b Figura 02: Prêmio Planeta Casa – Categoria Estudante” (a) Revista Casa Cláudia, São

Paulo, SP, 2003. Confeccionada com tubos de papelão. Alunos: Bruno Aburjaile Costa, Fabrício Torres, Luigi Carvalho Comine e Marília Emanuele Bill.

Mesa Travessa (b) classificada como finalista no Salão de Design Movelsul 2010 na categoria estudante, dos alunos Herissom Redi, Letícia Tescaro e Mariana Yuri.

a b Figura 03: “Concurso Masisa para Estudantes de Design”, Masisa e Centro de Design do

Paraná, Curitiba, PR, 2002. Mesa de Centro Pettia (a) da aluna Carolina O. Marques. Mesa Piano (b) 2º lugar no concurso e exposta também na Mostra “Jovens Designers”,

no Conjunto Nacional, em São Paulo, SP, da aluna Joceline Gonçalves Fernandes.

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a b Figura 04: “VIII Edição Salão Design MOVELSUL”, Bento Gonçalves, RS, 2002.

Namoradeira Oriental (a), dos alunos Fernando José Soares Silva, Luiz Carlos Bezerra, Lucindo Tomiosso Júnior, Marina Wakyama, Ricardo Shikata e Sílvio Tadeu França.

Cadeira M (b), dos alunos Eduardo Yuji Sato, Márcio Akutsu Takada e Rodrigo Ramos.

a b Figura 05: Mesa Flex (a), “4° Prêmio Liceu de Design”, Liceu de Artes e Ofícios da Bahia,

Salvador, BA, 2002. Aluno: Márcio Akutsu Takada. Gaveteiro 360° (b) “VII Edição Salão Design MOVELSUL”, MOVELSUL, Bento Gonçalves, RS, 2000. Alunos: Álvaro Ribeiro Lacerda, Fernando José Soares Silva, Lucindo Tomiosso

Júnior e Robson Avelino Santos.

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Pretende-se com isso, de acordo com Moraes, (1999) que o aluno se habitue a encontrar por si mesmo, - através de suas análises e reflexões - novas e diversificadas propostas projetuais, incentivando infinitas possibilidades de solução. Em contrapartida, a expectativa do docente junto a este modelo projetual é que os resultados alcançados permitam ao aluno desenvolver o lado reflexivo durante as fases de projetação. Ou seja, dedicar mais tempo aos aspectos críticos, analíticos, comportamentais, culturais, teóricos e subjetivos a serem aplicados nos projetos de produtos. A mera aplicação dos aspectos objetivos não deve ser mais a forma determinante de método e modelo projetual. E ainda, habituar-se aos temas diversos e genéricos, como forma de se preparar para o mercado de trabalho encontrado nas diferentes realidades dos países em via de desenvolvimento, e junto a realidade que se afirma dentro da chamada era pós-industrial.

Portanto torna-se cada vez mais difícil descrever um caminho exato e preciso para a formação de designers, se é que existe uma rota precisa. Nas palavras de Moraes (1999):

E ainda, qual plano de ensino seria o mais adequado junto às escolas que ensinam hoje esse ofício, sabendo-se que tal atividade vem recebendo influências das constantes mutações comportamentais, tecnológicas e culturais da nossa sociedade. Podemos considerar cada projeto a ser desenvolvido uma nova lição, na qual parte dos problemas a serem resolvidos não foi sequer mencionada durante os anos de formação escolar. Seria, desta forma, a escola limitada a um posto de informação teórica e cultural do design, uma vez que a verdadeira integração escola-indústria não passa de um eterno projeto? Haveria uma escola atuando como modelo? Ou um país de referência em ensino, com um caminho já percorrido com sucesso?

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3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As atividades de ensino superior em design não fazem parte de política pública de design específica, embora a parceria entre as diversas organizações – governamentais ou não - as empresas e as instituições de ensino seja estimulada em diversas metodologias. Existem hoje trezentos e trinta e um cursos de graduação em design e noventa cursos de pós-graduação latu sensu, seis mestrados e dois doutorados3.

No cenário acadêmico, alguns eventos merecem destaque: o CIPED – Congresso Internacional de Pesquisa em Design, evento bienal, com sua 6ª edição prevista para 2011; o P&D - Congresso Brasileiro de Design, realizado a cada dois anos desde 1994; o ERGODESIGN - Congresso Nacional de Ergonomia e Usabilidade de Interfaces Humano Tecnologia; o USIHC – Usabilidade de Interfaces Humano-Computador, realizado concomitantemente ao ERGODESIGN; e o NDESIGN - Encontro Nacional de Estudantes de Design, realizado anualmente desde 1991, organizado pelos próprios estudantes. Considere-se ainda a atuação das diversas associações profissionais em âmbito nacional.

O Brasil tem hoje mais de 60 faculdades de design, que se estima já terem concedido diploma a mais de 30 mil designers.

A esse gigantesco contingente somam-se outros milhares de profissionais de arquitetura, decoração e engenharia que, por causa da retração do mercado de trabalho, avançam em direção às áreas mais próximas e mais frágeis do ponto de vista de sua organização profissional.

Com o desenvolvimento da computação gráfica, ampliou-se também, de modo exponencial, a legião de amadores autodidatas, que atuam, sobretudo no atendimento às pequenas demandas por design gráfico.

3 http://www.designbrasil.org.br/portal/estudantes/index.jhtml acessado em março de 2011.

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Portanto, devemos contabilizar, no Brasil de hoje, mais de 50 mil pessoas que se julgam preparadas, ou habilitadas, para exercer a atividade de designer.

Essa oferta de design é imensamente maior que sua necessidade efetiva. Estimativas situam o percentual de profissionais atuando na área, empregados ou autônomos, entre 10% e 20% dos graduados. Embora sejam essas projeções empíricas feitas a partir da observação do aproveitamento no mercado de trabalho dos alunos recentemente graduados, pode-se tê-las como aproximação bastante confiável.

Se a oferta do design está superdimensionada em relação à demanda, isso se deve a uma série de fatores estruturais, dentre eles a pressão exercida pela sociedade para a abertura de novos cursos superiores no país, sem que exista uma correspondente possibilidade de absorção desses profissionais pelo mercado de trabalho. As Universidades, de modo geral, confundem demanda da sociedade com demanda de mercado.

O agravante nessa superpopulação acadêmica é o baixo nível de ensino do design, que contribui para dificultar a abertura de novas oportunidades de trabalho. A maioria dos professores dos cursos de design são profissionais com pouca ou nenhuma experiência real, que, após algumas tentativas frustradas de ganhar a vida desenvolvendo projetos, descobrem na atividade docente talvez a sua única possibilidade de atuação no setor. Saem da Universidade por uma porta, na qualidade de alunos recém-diplomados, e entram por outra, como professores concursados.

Com esse sistema, perpetua-se o distanciamento entre a Universidade e a realidade das empresas. Pretendem, com essa docência ingênua, ensinar design para um mundo fictício, no qual o mercado é constituído majoritariamente de grandes e modernas empresas, que estão sempre na expectativa de surgirem novos talentos para contratá-los para seus departamentos de design. Porém a realidade é bem diferente, e os prováveis clientes são pequenos ou microempresários, descapitalizados e no desespero

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da sobrevivência. Somente agora, transcorridos mais de 40 anos da criação do primeiro curso de design no Brasil, as indústrias estão começando a sentir a necessidade de investir nessa área. Antes considerado gasto supérfluo ou apenas tática mercadológica de agregação de valor a produtos, o design é visto hoje como investimento estratégico no esforço de sobrevivência das empresas.

Em um país cuja política industrial sempre teve forte conteúdo protecionista, era praticamente impedido o acesso da população aos principais produtos fabricados no exterior que tivessem similar nacional, como forma de proteger uma indústria ainda incipiente. Tendo à sua disposição consumidores cativos, por absoluta falta de opções, a indústria brasileira, quando tinha de criar um produto, preferia utilizar o expediente da cópia ou do licenciamento. Essa opção era, em princípio, mais barata, mais rápida e menos arriscada.

Durante os últimos 30 anos, o mercado para o design poderia ser resumido em dois grandes grupos. De um lado, algo em torno de mil pequenas empresas, atuando quase exclusivamente com desenho gráfico e embalagens, trabalhando para pequenas firmas demandantes, concentradas predominantemente no eixo Rio - São Paulo - Belo Horizonte - Curitiba. De outro, cerca de 20 empresas de médio ou grande porte, com seu departamento próprio de design empregando entre cinco e dez profissionais.

Esse era o mercado de design no Brasil, e as exceções apenas confirmam a regra. Apesar disso, as Universidades continuavam - e ainda continuam - formando profissionais para serem empregados. Nenhum dos cursos de design espalhados pelo país ensina os futuros designers a serem empresários e a gerenciar sua própria empresa.

A partir de 1990, esse quadro começou a mudar. Surpreendidas pela política governamental de abertura do mercado, as empresas brasileiras optaram, inicialmente, por estratégias defensivas como forma de proteger-se da concorrência externa.

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Em muito pouco tempo, as empresas conseguiram efetivamente conhecer, aprender e colocar em prática os mais avançados métodos de gestão da produção e da qualidade. Desse modo, e sem se preocupar muito com o custo social, conseguiram se certificar pela ISO 9000 mais de 1500 empresas, no curto período de seis anos. Todo esse esforço de otimização da produção, eliminação de perdas e do desperdício, redução dos insumos e da matéria-prima e aumento da produtividade não foi, contudo, suficiente para tornar os produtos brasileiros verdadeiramente competitivos no mercado internacional.

Apesar de todo o esforço, o custo final de produção ainda é muito elevado - sobretudo se comparado com o dos países asiáticos -, por causa da dificuldade de reduzir os custos dos elementos formadores de preço, tais como mão-de-obra, insumos e matérias-primas, energia elétrica, escoamento da produção, tarifas aeroportuárias e, sobretudo, carga tributária. A soma desses fatores (conhecida como “custo Brasil”) onera sobretudo as pequenas empresas, que não possuem escala de produção capaz de absorver esses encargos.

A única alternativa viável, pois é impossível competir no preço, passa a ser o oferecimento de produtos diferenciados, singulares e com elevado valor agregado. É a partir dessa constatação que as empresas descobrem que a estratégia mais eficaz de sobrevivência não é atuar na defesa, mas no ataque, utilizando práticas mais ofensivas. E o design é a arma indicada nesses casos.

Para manter um nível de eficiência competitiva, as indústrias dos setores mais dinâmicos, principalmente nos países em desenvolvimento, tiveram que se esforçar, sobretudo nos últimos dez anos, para implantar um processo intensivo de reestruturação produtiva e de reconversão industrial. Trata-se de uma nova cultura industrial baseada no trinômio qualidade, tecnologia e informação, a partir da descoberta de que o mais precioso

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patrimônio das organizações são elementos intangíveis, baseados no compromisso, na inteligência e na inovação. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COUTO, Rita Maria de Souza. Escritos sobre ensino de design no Brasil. Rio de

Janeiro, Rio Book’s, 2008. GRYNSZPAN, Flávio. A visão empresarial da cooperação com a universidade.

RAUSP, v. 34, n. 4, out./dez. 1999. LANDIM, Paula da Cruz. Design/Empresa/Sociedade. Tese de Livre-docencia

apresentada à FAAC – UNESP, campus de Bauru. 2009. MORAES, Dijon de. Limites do design. São Paulo, Studio Nobel, 1999. _______________. Análise do design brasileiro. São Paulo, Edgar Blücher,

2006. RAULIK, G. Panorama internacional das políticas de promoção e incentivo ao

design. Brasil: MDIC. 2006. VASCONCELOS, Maria Celeste Reis Lobo de & FERREIRA, Marta Araújo Tavares.

A contribuição da cooperação universidade/empresa para o conhecimento tecnológico da indústria. Perspect. cienc. inf., Belo Horizonte, v. 5, n. 2, p. 167 - 182, jul./dez.2000.

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Atos Interdisciplinares entre Arte e Moda: Precursores

Sérgio Régis Moreira Martins1 Leilane Rigatto Martins2

1 INTRODUÇÃO

Afim de melhor esclarecer as vinculações entre o design e a arte que possam corroborar para a compreensão da moda como suporte para a arte e vice-versa visando casos interdisciplinares, se faz importante uma elucidação a respeito de artistas e designers precursores destes atos interdisciplinares.

Segundo Peter Wollen, organizador do catálogo Addressing the Century: 100 Years of Art and Fashion, resultado da exposição homônima realizada na California em 1999, uma diferenciação inicial é importante a respeito do trabalho do artesão e do artista, onde o primeiro faz objetos destinados ao uso cotidiano (no qual o usuário possa usar da maneira que melhor lhe convier), e o segundo é tido como algo não-instrumental. O catálogo produto da exposição acima citada servirá de base para guiar este texto. Essa compilação acerca da exposição conta com a colaboração de vários estudiosos de moda, artistas e filósofos que tem como foco o estudo interdisciplinar das áreas de moda e arte.

1Professor Livre - Docente em Design e Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo 2 Mestranda na área de concentração “Design e Arquitetura” da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, com a pesquisa de mestrado “Moda e Interdisciplinaridade: A Construção de uma Indústria através da Arte”

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Contextualização Histórica e Principais Atos Interdisciplinares entre Arte e Moda Wollen afirma que é importante conhecer o contexto artístico no qual um trabalho de arte específico está inserido. O design de produtos e de roupas é visto tradicionalmente como algo mais artesanal do que artístico. O traço mais significante que difere a roupa de outros objetos utilitários é superado após 1850 com a ascensão de Charles Frederic Worth, conhecido como “pai da alta-costura”. O design de moda é específico e encontra dificuldades de se encaixar no quadro do design dos demais tipos de produto. Existe uma relação íntima entre a roupa e seu uso, o que distingue o design de moda dos demais desenvolvimentos de produtos.

Wollen defende que o design de moda esteve por muito tempo situado em uma escala social muito abaixo à dos pintores ou arquitetos até Worth redefinir a natureza da relação da roupa com seu uso. Considerado o pioneiro da alta-costura, tornou-se o fornecedor ideal para as pessoas que desejavam ostentar determinada condição social. Os consumidores que adquiriam essas roupas sob medida eram vistos como usuários efêmeros, uma vez que os clientes mais ricos dificilmente usavam um mesmo vestido mais que uma vez. A roupa estava ligada a dar vida à fantasia e criar um efeito teatral. De acordo com Judith Clark, na história da arte da década de vinte é impossível separar o vestir do teatro. A compreensão dessa teatralização dramática do vestir é fundamental para percorrer o caminho feito pela moda até o espaço do museu. Qualquer estudo desse período, seja ele de arte ou de moda, envolve um entendimento de como os ideais modernistas foram interpretados no teatro europeu desse período. A moda nunca esperou atingir

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o status da arte até superar sua efemeridade que estava diretamente associada à sua teatralidade. Judith Clark sustenta que o teatro e o figurino são componentes críticos de uma fusão artística interdisciplinar que começou nos anos mil e novecentos e que diretores de teatro trabalharam com artistas rejeitando a arte decorativa de caráter popular na virada do século, a fim de propor soluções visuais para o desenvolvimento de uma sociedade mecânica e urbanizada. Por volta de 1915, nos princípios do teatro modernista, o corpo desapareceu sob armações cilíndricas, quadradas ou triangulares, cobrindo a cabeça, os braços e as mãos, constringindo os atores em formas geométricas e criando movimentos rígidos. Um exemplo mais recente dado por Valérie de Givry são as roupas do estilista Thierry Mugler que tem preferência pelas formas geometrizadas do Construtivismo que lembram as esculturas de Archipenko. Foi Giacomo Balla e, em menor proporção, Depero, quem mais contribuiu para a tradução dos ideais futuristas em roupas. Marinetti, que escreveu o manifesto futurista em 1909, desvalorizava tudo o que fosse feminino. Ainda segundo Judith Clark, ele tratou a roupa feminina do período e tudo o que ela representava como uma doença. Judith Clark relata que o primeiro e o segundo manifestos sobre vestimenta, escritos por Balla em 1914, foram dedicados à vestimenta masculina, sendo a maior parte das roupas futuristas voltada para homens. Somente em 1920, foi finalmente escrito um manifesto dedicado à vestimenta feminina por Volt (Vincenzo Fani). Seu manifesto defendia que as mulheres deveriam abrir mão dos corselets em troca de roupas dinâmicas e expressivas. Ele anunciava que a moda era de certa forma futurista, constatando que era uma das formas de expressão mais imediata e de sucesso dos valores da modernidade. Num sistema de obsolescência constante, a moda se justificava como uma forma de trazer arte para o cotidiano.

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Judith Clark apóia-se no fato de a roupa ter se tornado não somente um objeto, mas um evento para os futuristas. Sua roupa podia ser agressiva, ágil, dinâmica, simples, confortável, higiênica, jovial, assimétrica, agradável e diversificada. A criação de estampas óticas gerou uma ruptura vivaz trazendo o incômodo para as ruas. O design das roupas deveria variar de acordo com o humor e o ambiente, com diferentes peças para manhã, tarde e noite. Através de acessórios modificadores, como botões, faixas e broches, o usuário poderia acrescentar um sinal visível dos seus sentimentos íntimos. Era o que os futuristas alertavam em inúmeros manifestos. Para Judith Clark, a Bauhaus e seus colaboradores – Walter Gropius, Wassily Kandinsky, Lyonel Feininger, Laslo Maholy-Nagy, Paul Klee e Oskar Schlemmer – reconhecem a possibilidade dos artistas influenciarem a produção industrial. Schlemmer converteu o Workshop da Bauhaus em um campo multidisciplinar de trabalho experimental.

Peter Wollen defende que a moda atinge o status de arte no momento em que supera a questão da efemeridade. A moda como essência encontra outros valores que não somente o da efemeridade, o que confere a ela um ar teatral, caminhando no sentido de estabelecer uma forte relação com a arte, seja utilizando os discursos artísticos para sua produção, seja utilizando seus processos. Para o artista no final do século XIX era necessária habilidade para pintar a textura de tecidos e drapeados num momento onde havia o predomínio da figura vestida nas obras de arte. O costureiro, assim como o pintor, precisava ter uma consciência especial sobre a anatomia humana e um talento diferenciado para valorizar a figura do cliente.

Peter Wollen assegura que a partir do movimento Arts and Crafts, junto com Paul Poiret, que deseja libertar suas mulheres do corselet, cresce a Reforma na Moda. O vestuário feminino tem como objetivo criar e popularizar roupas femininas mais higiênicas, com apelo estético e praticidade em seu uso e manutenção. Esse panorama do design torna menos nítida a linha que divide

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a arte da moda e cria parcerias entre artistas e designers que favorece a troca entre as disciplinas.

Mais adiante, o futurismo italiano se empenhou em criar uma nova dinâmica cultural que revolucionaria o vestir, assim como a pintura, a poesia, a arquitetura, a música, o cinema e até a gastronomia. Em 1913 Giacomo Balla desenvolveu padronagens geométricas, com cores vivas tanto para homens quanto para mulheres. Nesse mesmo período os construtivistas russos, como Stiepânova e Aleksandr Ródtchenko, também se dedicaram ao design de moda, mas com foco nas massas em detrimento da elite, segundo Peter Wollen. Varvara Stiepânova defendia expor a maneira como a roupa era costurada e seu dinamismo, expor como as peças haviam passado por máquinas de costura, como a máquina reta3, por exemplo. Stiepânova e Popova foram capazes de desenvolver tecidos inovadores e design de roupas como uma parte do seu trabalho na Primeira Fábrica de Tecidos do Estado. O Construtivismo disseminou formas geométricas para substituir as tradicionais padronagens florais russas, afere Judith Clark. Percebe-se neste momento a preocupação dada ao processo. Futuramente, essa estética geometrizante influenciaria a construção de roupas do estilista Pierre Cardin na década de 60. Para Peter Wollen, na década de vinte a alta-costura se simplifica atendendo um novo e amplo mercado além da tradicional elite, através da nova estética modernista, amplamente difundida no período. Nessa época a moda também é marcada pelo racionalismo e pelo funcionalismo que aparece nas roupas para esportes, seguindo a tendência da Reforma na Moda. Wollen diz que a roupa racionalista prezava pelo movimento, e quem liderava esse campo era Poiret com suas roupas que buscavam abolir o corselet. Anne Hollander propõe que “homem e mulher haviam atingido uma

3 A máquina reta é a principal máquina destinada à confecção de peças de roupas, utilizada principalmente em tecido plano. Possui aspecto tracejado.

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igualdade visual” pelo fato da roupa feminina, pela primeira vez, seguir o aspecto básico e minimalista da roupa masculina, logo, as mulheres eram capazes de parecer com um homem de verdade e não parecer com figuras enfeitadas e fantasiosas. Em outras palavras, a modernização significou a abolição dos devaneios de enfeites extravagantes e embustes retóricos de representação do corpo por roupas que distorciam e encobriam a forma. As roupas se tornaram racionalizadas como a estética modernista exigia. Mais adiante, no período surrealista, é apontada a questão do manequim. De acordo com Ulrich Lehmann, o manequim desconstruído tornou-se uma figura de devoção. O manequim nu reduzido a uma armadura a qual, livre de qualquer conceitualização ou modificação, poderia ser usada pelo artista para expressar os ímpetos e ansiedades básicas tanto da mulher quanto do homem. André Breton, teórico do surrealismo, e Pierre Naville, sociólogo francês, acreditavam que as grandes tensões no coletivo expressadas pela moda deveriam ser submetidas à percepção. O manequim foi transformado pelo seu contexto, de um ícone de beleza efêmera, em um exemplar de sátira boêmia. A feminilidade idealizada não é somente uma representação ou um trabalho de arte, mas parte de uma grande crítica da vida moderna. Em seu trajeto pela arte e pela moda nos anos vinte e trinta, o manequim perdeu sua inocência e, finalmente, sua importância como discurso artístico moderno.

Ainda nesse período, a designer Elsa Schiaparelli recusou o estilo modernista de Chanel da década de vinte, desenvolvendo uma tendência ao surrealismo que a cercou de artistas como Man Ray, Tristan Tzara, Hans Picabia, Jean Cocteau, Salvador Dalí e Meret Oppenheim. Schiaparelli experimentou materiais como celofane, vidro, plástico e nylon de pára-quedas trabalhando os acessórios em excesso, relata Peter Wollen.

Para Wollen, na década de cinquenta a performance de arte trouxe uma preocupação aos artistas do gênero que era inevitável: a roupa. A

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performance envolve criação de roupas, o que anteriormente correspondia a desenhar para um espetáculo de dança ou teatro, só que agora atendendo especificamente aos objetivos dos artistas, usando a roupa como uma forma de auto-expressão ou como um elemento “quase-ritual”. É comum encontrar na década de setenta, artistas japoneses e brasileiros, assim como americanos e europeus, que realizavam performances e faziam suas próprias roupas, seu próprio design. Wollen considera que os anos sessenta trouxeram outra onda de enorme mudança tanto para o mundo das artes, quanto para o da moda. Enquanto em Londres, Nova Iorque e Paris os artistas respondiam à nova cultura jovem e desenvolviam seus trabalhos paralelamente, especialmente os que se dedicavam à Pop e Op Art, houve um atraso dessa cultura jovem na Costura em Paris, que veio a acontecer somente com o trabalho de designers como Paco Rabanne e André Courrèges. Estes chamaram a atenção criando a “Era Espacial”, representada por roupas angulosas e geométricas, com contrastes de cor e, no caso de Rabanne, inovação material através de metais e novos tipos de plásticos. O´Hara observa que Paco Rabanne executou roupas com alicate ao invés de agulha e linha, o que aproxima seu trabalho do fazer artístico.

No mesmo período, em Nova Iorque, artistas iluminavam vestidos com luzes elétricas, como a artista japonesa Atsuko Tanaka. As pinturas Op e Pop Art substituíram o Surrealismo como um dos principais pontos de referência para a moda, repensando o ready-to-wear desenhado por Aleksandr Ródtchenko e Stiepânova. Nesse mesmo período houve uma volta ao Construtivismo também no âmbito da arte, com os artistas cruzando a barreira entre o avant-garde e a cultura popular, defende Wollen.

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Peter Wollen sustenta que um dos marcos da aproximação entre arte e moda deu-se em 1982, com a capa da revista nova-iorquina Artforum4 feita pelo designer japonês Issey Miyake com colaboração do artista Koshige Shochikudo que trabalhava com bambu – uma fusão de moda, trabalho manual e escultura. A revista evidenciou Miyake como o marco de um novo tipo de relacionamento entre arte e alta-costura. De acordo com Peter Wollen, formas tradicionais de arte, como pintura e escultura, perderam sua hegemonia dando espaço às instalações, à arte conceitual e a outros gêneros menos usuais de arte, que gradualmente começaram a incluir o uso de roupas. Um novo gênero começou a emergir, geralmente associado a “roupas de arte”. Ao mesmo tempo, os costureiros não somente se cercaram de artistas, como eles próprios se tornaram artistas. Nas décadas de sessenta e setenta, roupas passaram a ser exibidas como trabalhos de arte e artistas começaram a invadir novas áreas, incluindo o universo da moda, anteriormente exclusivo aos designers. Os costureiros da primeira metade do século vão impor seu estilo, que por sua vez está subordinado ao gesto. Dior desenha, Balenciaga esculpe, Lacroix acrescenta, Alaïa remove, Margiela conceitualiza, Mugler e Saint-Laurent purificam. O corpo é um suporte para a roupa e o tecido, uma superfície a ser trabalhada, como comenta Valérie de Givry. A moda de Pierre Cardin, na década de 60, vem de encontro com o gosto da época pela abstração, mais precisamente a abstração geométrica. Mas a concepção de suas formas concerne, sobretudo, aos conceitos construtivistas. Suas roupas remetem a uniformes funcionais, como aqueles feitos por Aleksandr Ródtchenko para a peça de teatro La Punaise.

Wollen diz que na década de oitenta a wearable art e a arte conceitual começaram a tomar forma em detrimento do uso tradicional da 4 Artforum é uma revista internacional, publicada mensalmente e especializada em arte contemporânea. Uma grande colaboradora e responsável por estabelecer esta revista no cenário da arte contemporânea foi a crítica de arte Rosalind E. Krauss.

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roupa, contextualizando a performance e a instalação. Artistas como Lunna Menoh e Helen Storey se viraram para o mundo da moda exibindo seu trabalho em galerias e museus. Essas artistas e designers foram frutos de um novo tipo de cruzamento estético do Arts and Crafts, que visava à união da arte com a vida e que começou a se desenvolver nesse período.

Para Wollen, os designers japoneses, em especial Issey Miyake, Rei Kawakubo (Comme des Garçons) e Yohji Yamamoto, acreditavam que não havia uma separação clara entre arte e design. Rei Kawakubo tende a ver suas roupas como elementos de um ambiente completo, reminiscências daqueles criados por Wiener Werkstätte no período do Arts and Crafts. Os japoneses também experimentaram novos materiais, como Miyake, quando empregou especialistas em seu estúdio de design para explorar as possibilidades de novos tecidos e novas tecnologias de produção, além da peça feita em bambu em parceria com Koshige Shochikudo. De acordo com Wollen, o uso experimental de materiais inusitados e excêntricos é uma das características que está ligada à arte e à alta-costura. A cerâmica, por exemplo, foi usada tanto pela artista Tiziana Bendall-Brunello, quanto por Martin Margiela, designer de alta-costura de Paris. Outros artistas e designers experimentam com borracha, aço, jornal, madeira e vidro, entre outros materiais. Há também a preocupação com a reconfiguração da forma do corpo através de provocativas “esculturas” de roupas. Georgina Godley e Rei Kawakubo desenham roupas com formas côncavas e convexas que contradizem a forma básica do corpo na coleção “Bump & Lump”. Martin Margiela ainda desenhou uma coleção para ser devorada pelo bolor, como uma forma de arte autodestrutiva. O trabalho de Margiela satisfaz conceitualmente os pontos artísticos de Marcel Duchamp. Os dois, à sua maneira, gostam de polemizar em prol dos valores estéticos tradicionais da alta-costura e da arte. A atitude de Duchamp desestabiliza pela ironia

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enquanto a de Martin Margiela questiona o significado profundo das origens da moda.

Wollen alerta para a importância de um terceiro campo que emergiu com o pós-modernismo. O campo da arte anteriormente dominado pela pintura e pela escultura foi acrescido da performance, do vídeo e da instalação que passam a ter um papel fundamental na interdisciplinaridade entre arte e moda.

Para Wollen artistas se viraram para a moda assim como designers de moda se viraram para as artes, no sentido de explorar os dinâmicos e freqüentes conflitos entre o visual e o tátil, a arte e o design, o senso da “forma pura” e do design para o uso. O diálogo entre eles ainda está se iniciando, mas sua produtividade não pode ser negada.

No mundo da moda, segundo Wollen, os desfiles se tornaram muito mais performances orientadas, às vezes envolvendo uma performance de arte, e assim encorajando o uso do vídeo, não só como um meio de registro, mas como uma mídia criativa em si. Ao mesmo tempo, artistas usam roupas relacionadas às performances com a finalidade de produzir seu próprio vídeo de arte. A estética que permeia o mundo da arte e da moda torna-se cada vez mais impermeável, como uma estética de mistura e novas mídias que continuam a se desenvolver.

Dario Caldas contribui para a questão da interdisciplinaridade abordada neste texto ao afirmar que a relação entre arte e moda passa a ganhar força principalmente a partir da década de 80, tendo como seu ápice a Bienal da Moda, evento que ocorre a cada dois anos na Europa e que prestigia os principais criadores da moda em exposições em museus antes destinados somente à arte. A primeira edição desta Bienal ocorreu em 1996, em Florença, e trouxe como tema “O tempo e a moda”. Sua segunda edição, em 1998, veio com o tema “A moda se veste de cinema”. O caso da Bienal da Moda ilustra

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bem como esse arrivismo artístico foi bem aceito e faz com que importantes exposições de moda ganhem cada vez mais espaço nos museus.

Para Caroline Evans a provocação de Max Ernst de 1919, “vamos deixar a moda existir, assim pode ser que a arte morra”, contrasta os valores duráveis da arte com a efemeridade e superficialidade da moda e coloca a questão da superação da efemeridade pela moda quando seus produtos passam a ocupar espaços nos museus. Focando nos anos 90, onde desde então a instabilidade prevalece, admitem-se obras como o vídeo “Twinkle” de Sylvie Fleurie, de 1992, onde o pé da artista é enquadrado sofregamente e compulsivamente provando e descartando uma montanha de sapatos da moda. Caroline Evans propõe um comentário irônico a respeito da convergência entre arte e moda, onde a artista, que se assume como uma socialite e uma compradora compulsiva, volta sua vida para um trabalho de arte. Evans afirma que a moda, possivelmente, tem mais a nos contar sobre a vida do que nós pensamos. Ela defende que a arte é mais econômica com relação a crenças eternas atualmente, substituindo grandes narrativas, experimentando uma lista de outras narrativas de incorporação e identidade e assumindo novas posições. Caroline Evans alerta que essas imagens contraditórias convergem para o terreno do frágil e mutável, onde o corpo humano – o qual artistas têm representado como um objeto – é traumatizado, ferido e partido. Georgina Goodley experimentou com uma série de Barbies nas quais seus corpos foram alterados com plástico antes de produzir seus vestidos biomórficos no meio dos anos oitenta. Em 1997, Rei Kawakubo, da Comme des Garçons, usou enchimentos de pena de ganso em vestidos para transformar o corpo pós-industrial em novas formas. Nascimento e morte são evocados no trabalho de Helen Storey em sua visualização do momento da vida, no começo de toda a narrativa, e nas roupas de cabelo nas quais a morte do cabelo humano

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contracena como a lembrança sempre presente de que o homem morrerá um dia. Caroline Evans conta que em 1997, no Museu Boijmans van Beuningen, o estilista Martin Margiela espirrou bolor em suas roupas para produzir uma aura de decadência. Ele inverteu duplamente o tempo da moda quando desconstruiu roupas de brechó e deu vida a elas como peças novas, somente para espirrar bolor nas mesmas conferindo a elas um caráter envelhecido. Margiela reflete uma aproximação com o modernismo que origina-se no século XIX. O tempo-moda faz parte da temporalidade da metrópole, com seu potencial para o espetáculo e renovação própria. Esse trabalho ocupa o lugar tradicionalmente tomado pela arte, ele é feito para pensar. Está nesse momento superando seu caráter efêmero. Nesse sentido, muito da arte se moveu em direção à condição de moda: Ann Hamilton, Adrian Bannon e Lesley Dill usam materiais como granola, gaze, voile e penas para evocar a efemeridade e a transitoriedade da moda, mas como um discurso de arte. Assim são os casacos de fibra de planta do artista pertencente ao movimento da Arte Povera, Adrian Bannon, que tanto o casaco quanto a fibra desaparecerão no final. Trabalho este muito parecido em seu conceito com o trabalho de 2008 de Helen Storey, entitulado Wonderland, que consiste em roupas biodegradáveis que vão sendo dissolvidas em um tanque com água à medida que a modelo Alice Dellal vai se movimentando. A matéria-prima da roupa é projetada para se dissolver em contato com a água. A arte que perecerá mostrada nesses trabalhos dá as mãos à moda que também perecerá. Caroline Evans relata que a transição da arte para a moda em particular parece estar articulada à condição pós-moderna. A mutabilidade constante da moda é um tipo de memento mori5. A mudança rápida de estilos cria uma relação com dois hábitos intelectuais dominantes da última metade

5 “Lembra-te homem de que morrerá um dia.”

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do século vinte que traduzem em algum sentido a efemeridade que permeia a moda: o pessimismo e o niilismo. Evans afirma que tanto o trabalho de Lucy Orta (suéteres ligados uns aos outros – social link), quanto o do grupo Vexed Generation, reconfiguram a experiência da cidade no século XX, dando sequência à idéia de modernidade de Baudelaire, baseada na experiência da cidade recentemente industrializada da segunda metade do século XIX. As roupas do grupo Vexed Generation apresentam um interesse na segunda metade do século XX que ilustra a experiência metropolitana — poluição, vigilância, fiscalização e o poder da polícia em prender. Segundo Walter Benjamin, a modernidade está ligada ao “choque” que ele define como um tipo de presente vívido inerente à cidade contemporânea. Na era do “sujeito design” – a “hipermodernidade”, segundo Gilles Lipovetsky – esse indivíduo representa o que agora parece claro: quando se pensava que o ciclo consumista estava completo em sua lógica narcisista, percebe-se que o design promove um ciclo de produção e consumo dotado de pouca ou quase nenhuma complexidade, sem deixar “espaço de circulação”6 para mais nada. O trabalho do estilista Hussein Chalayan que se refere à instalação. Sugere a incerta instabilidade das superfícies, segundo Evans. A falta de fé em um modelo sinaliza um período de ansiedade sobre as constantes mudanças dos fluxos dos sinais e imagens na cultura contemporânea. Se a imaginação é toda visual, não é tranquilizadora, mas traiçoeira e instável.

Para Robin Muir, William Klein, pintor abstrato e escultor da arte cinética, mostra muito de seu desprezo pela indústria da moda em 1966 em seu filme quase cômico “Qui êtes- vous, Polly Maggoo?”, onde ele cria um

6 Espaço de Circulação foi o termo cunhado em 1912 pelo jornalista Karl Krauss para designar o espaço que deve existir em um determinado ambiente para que o indivíduo se desenvolva, não fique engessado em um só estilo. Um exemplo é quando ele critica a art nouveau que impunha sua estética a todos os objetos da casa sem distinção.

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mundo fantasioso da moda, fazendo referência aos leitores de revista de moda que na década de sessenta se amontoariam ao ver “supermodelos”. Klein também ficou famoso em 1965 por seu livro New York, um olhar sobre a cidade que ele deixou para trás, focando no caos das ruas e no modo de vida lunático das cidades. Ele desenvolveu uma estética e uma variedade de técnicas que incorporaram a distorção, closes, borrados e um toque de acidental ou não-intencional. Klein trouxe suas idiossincrasias na linguagem visual para as páginas da Vogue e produziu imagens subversivas e anti-moda durante uma década, destoando das imagens produzidas décadas antes que refletiam Nova Iorque e Paris. Alexander Liberman, então diretor de arte da Vogue, lembrou os leitores que nem tudo na vida é saúde e felicidade. Ele idealiza a foto que conta uma estória, como um quadro, o que traz ao trabalho de moda um teor crítico, quase politizado. Através do trabalho da fotógrafa Deborah Tuberville, uma série de fotos de 1975 de modelos em uma ducha, uma tempestade de protestos tomou forma. As modelos estavam dispostas languidas, solitárias, em seu próprio mundo. Criou-se um cenário de alucinação, que lembrava um campo de concentração, seus corpos esvaziados de qualquer energia pareciam estar dopados como conta Robin Muir. Todas essas manifestações utilizam a moda a fim de criticá-la e assim se aproximar da arte. Com relação às convenções contemporâneas do vestir, um tema recorrente na arte é a nudez. Entwistle e Wilson asseguram que a nudez artística nunca é a nudez indecorosa, mas ela carrega consigo convenções, algumas invisíveis. Vestir é uma forma pela qual o corpo se faz visível. As autoras concordam que o vestir cotidiano é inseparável da vida, da respiração e de fazer do corpo um invólucro. Vestir o corpo e o “eu” constitui uma totalidade, e quando o vestir e o corpo são separados, como no caso de um look exposto em um museu, nós compreendemos apenas um fragmento, um instantâneo parcial do vestir. Nesse caso, nosso entendimento é limitado. Essa

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dinâmica funciona somente quando se refere a algo que não poderíamos vestir, como uma roupa num magazine ou numa boutique porque ela é transformada num objeto de fetiche. Os fotógrafos responsáveis por fetichizar produtos de moda Jurgen Teller e Wolfgang Tillmans contribuíram muito para a linguagem de moda conferindo uma certa ironia ao gênero, segundo relato de Muir. O trabalho dos dois fotógrafos é muito forte e estampa paredes de galerias de arte e revistas de moda. O clique estético de Teller configura as principais publicações de moda e é a prova de um impacto de sua fotografia. Ele tem clientes importantes desejosos por compartilhar sua visão peculiar do mundo. Em suas campanhas iniciais, como para a Jigsaw, há um relaxamento e um estilo fluido. Registros de momentos mundanos e ordinários reasseguram a familiaridade da imagem para o espectador, e podem ser observados como fatias do que chamamos de vida real. Seus modelos não posam, parecem inseguros, vulneráveis, comuns e “reais”. Teller afirma não estar interessado em peças de roupa. Sua obra, ultrapassando o gênero de moda, afirma um “Novo Realismo”, explosivo e subversivo. As obras de Teller e Tillman não são as únicas a configurar o panorama da arte e da moda. As fotos de Irving Penn ou de Tyen mostram sempre os vestidos em movimento, nunca estáticos. Os vestidos de Issey Miyake fotografados por Penn expressam o movimento à maneira dos futuristas. Eles prezavam pelo movimento: ondular, girar, surtar, marcar. Casos mais recentes que contemplam a arte e a moda sob a óptica da interdisciplinaridade são elencados por Valérie de Givry. Os vestidos bandagem de Azzedine Alaïa de 1985, que evocam os quadros lacerados de Lucio Fontana, ou as obras de Alexander MacQueen e dos irmãos Chapman, ambas provocativas, são muitas vezes aberrações que expressam a contemporaneidade do final do século XX. E como não relacionar os modelos de Rei Kawakubo com as obras de Hans Bellmer, esculturas perversas e

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amarradas, vítimas de seu carrasco, o próprio autor. Beleza convulsiva, erotismo violento ou simplesmente redenção da dor, da deformidade? Estes são só alguns exemplos. Talvez a discussão proposta neste texto sirva de base para reforçar o compromisso interdisciplinar existente entre a moda e a arte: que em algumas obras uma seja a lacuna em branco da outra a ser preenchida pelo fazer projetual do designer de moda e artístico. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS No sentido de estimular a reflexão acerca dos casos interdisciplinares aqui expostos, vale uma aproximação intencional com o cotidiano. Essa aproximação suscita questões políticas. Na dimensão política Katia Canton APUD Pélbart infere que a distância entre a arte e o cotidiano é cada vez menor. A própria noção de identidade se desloca no ambiente político que está em constante movimento. Segundo a autora, a idéia é enxergar política onde ninguém vê. Descentralizar o foco da política, explicando que ela está no cotidiano, na gestão do corpo, na sexualidade, entre outros inúmeros campos. Esse contexto tem uma dimensão política que não resume o poder a uma figura de Estado, está envolvido por mecanismos complexos que atravessam diferentes campos. Para Katia Canton APUD Jaime Spitzcovsky, os artistas encontraram no campo da atuação artística um espaço mais acolhedor que os partidos políticos. Os partidos políticos enfrentam uma crise no Brasil e no mundo, reflexo da crise das ideologias clássicas, fruto do individualismo. Segundo Katia Canton APUD Pélbart, sobre o trabalho com o grupo Ueinzz, ela afirma que o mundo capitalista não é indiferente a essa dimensão subjetiva. Hoje, consomem-se toneladas de subjetividade. Ela ainda questiona como o império capitalista se expandiria sem vender a todos a promessa de

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um modo de vida, suscitando em todos um desejo? Hoje são comercializadas cada vez mais maneiras de ver, de sentir, de pensar, de perceber, de morar e de vestir, ou seja, o que se consome hoje são formas de vida. Para finalizar, vale a reflexão a respeito da afirmação de Entwistle e Wilson, que acreditam que o corpo humano se distingue por sua característica de ser de certo modo inacabado, desnudo, vulnerável e incompleto. Dessa forma ele não seria moderno de acordo com a idéia de boa forma. A obra da artista Orlan ilustra esse corpo humano em constante mutabilidade. Ela questiona ferozmente o sistema da moda, da obsolescência constante, e critica o sacrifício para se atingir a boa forma. A idéia de boa forma aqui pode se estender à das revistas de moda que buscam impor a demanda por determinados tipos físicos em contraponto com a idéia de boa forma proposta pelo modernismo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor,

2001. CALDAS, Dario. Observatório de Sinais: Teoria e Prática da Pesquisa de

Tendências. Rio de Janeiro: Senac Rj, 2004. DÉBORD, Guy. A Sociedade do Espetáculo. Paris: Éditions Gallimard, 1992. FERRARA, Lucrécia. Design em Espaços. São Paulo: Edições Rosari, 2002. _____. Leitura sem Palavras. São Paulo: Ática, 2007. FOSTER, Hal. Design and Crime (and other diatribes). Verso. Londres: 2003. P.

13-26.

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LIPOVESTSKY, Gilles. O Império do Efêmero: A Moda e seu Destino nas Sociedades Modernas. São Paulo: Companhia da Letras, 1989.

_____. Os Tempos Hipermodernos. São Paulo: Editora Barcarolla, 2004. MORIN, Edgar. Introdução ao Pensamento Complexo. Porto Alegre: Sulina,

2005. OMRAN, MUNA. Pinturas Orientalistas – As odaliscas de Henry Matisse.

Trabalho apresentado em comunicação no IV Encontro de Literaturas e Línguas Eslavas da UFRJ, Departamento de Letras, Setor de Línguas e Literaturas Orientais, Rio de Janeiro, 2009.

WOLLEN, Peter. Addressing the Century: 100 Years of Art and Fashion. California: University of California Press, 1999.

WEBGRAFIA http://www.i2artgallery.com/expo/Bendall-Brunello/index.html http://www.tizianab-b.co.uk/

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Avanços na Avaliação do Ambiente Luminoso

João Roberto Gomes de Faria1

Adma Jussara Fonseca de Paula, Ana Clara Fernandes Lauar, Edmilson Queiroz Dias, Nélio Pinheiro,

Roberta Maura Zanon Battista, Wladimir Fernando Riehl 2 Emmanuel Guedes de Toledo, Gustavo Alexandre Resta Silva,

Devair Zanelli Junior, Ligia Carla Gabriel, Rodrigo Santana Gonçalves, Samuel Marques Bertoni3

1 INTRODUÇÃO As normas refletem o conhecimento técnico-científico da área e as

possibilidades de implementação, na época de sua edição. A Norma Regulamentadora NR-17 – Ergonomia, do Ministério do

Trabalho (BRASIL, 2002), é usada como balizadora de projetos e avaliações de ambientes de trabalho de forma geral e, em particular, das condições de iluminação, objeto de discussão neste trabalho. Diferentemente da análise das condições térmicas, onde são usados índices quantitativos relativamente complexos para estimar a qualidade do ambiente, o único parâmetro quantitativamente determinável de qualidade da iluminação é iluminância do plano de trabalho adequada à atividade visual, tendo por referência a NBR 5413 – Iluminância de Interiores. Outros parâmetros, como a uniformidade e difusão, a ausência de ofuscamento, reflexos incômodos e de sombras e contrastes excessivos ficam sujeitos à avaliação qualitativa e subjetiva de projetistas, usuários e fiscais do trabalho.

Essa lacuna se deve ao fato dos parâmetros em questão serem derivados da distribuição da luminância do ambiente, cujo cálculo envolve a

1 Doutor em Ciências da Engenharia Ambiental, professor adjunto na FAAC-UNESP 2 Mestrandos no Programa de Pós-graduação em Design da UNESP 3 Alunos especiais na disciplina Qualidade da Iluminação no Ambiente de Trabalho, do Programa de Pós-graduação em Design da FAAC-UNESP, em 2010.

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posição de cada usuário em relação às fontes de luz. A teoria que envolve grandezas derivadas da luminância é da década de 1960 (HOPKINSON, 1963) e a recomendação de seu uso como qualificadores ambientais também não é nova (LECHNER, 1990; GRANDJEAN, 1998), mas sua implementação era dificultada pela falta de instrumentação adequada.

As técnicas que facilitam a determinação da distribuição de luminâncias começaram a surgir na década de 1980, com o desenvolvimento de algoritmos para simulação computacional da iluminação. Com os avanços da informática na área de simulação da iluminação, aqueles fatores de qualidade do ambiente luminoso presentes na NR-17 derivados da distribuição da luminância podem ser hoje em dia facilmente quantificados.

Tendo em vista esse panorama, apresentam-se neste artigo algumas possibilidades de quantificar parâmetros de qualificação da iluminação presentes na NR-17, reduzindo-se, dessa forma, a subjetividade presente na avaliação do ambiente luminoso. O trabalho de origem foi desenvolvido juntamente com a turma de 2010 de alunos da disciplina Qualidade da Iluminação no Ambiente de Trabalho, do Programa de Pós-graduação em Design da UNESP, e teve por objetivo discutir novas técnicas de análise da iluminação e seu impacto na avaliação da qualidade do ambiente luminoso.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O indicador de qualidade da iluminação mais antigo é a iluminância mínima da área de trabalho. O processo e a instrumentação envolvidos na medição da iluminância são simples e baratos, baseados na integração da luz vinda de todas as direções sobre a superfície; assim, uma única medição, com um instrumento relativamente simples, o luxímetro, é suficiente para determinar o valor da grandeza. A partir de experiências onde a iluminância é medida sobre superfícies típicas de uma determinada atividade, é possível

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determinar seu valor mínimo e sua faixa de valores preferida, a partir dos quais é feita a normatização. No entanto, essa referência de qualidade fica comprometida quando as superfícies apresentam refletâncias muito variáveis, como, por exemplo, tecidos na manufatura de vestuário (BRASIL, 2002).

A iluminância no plano de trabalho é um dos fatores de qualidade da iluminação, mas não é a grandeza fotométrica determinante do processo visual: não se enxerga um objeto devido à quantidade de luz que nele incide, mas às diferentes quantidades de luz refletidas por suas superfícies na direção do observador, ou seja, à distribuição de luminâncias em sua direção. A distribuição de luminâncias do ambiente como um todo participa da sensação do ambiente visual.

O avanço nas técnicas de medição de luminâncias fez com que a atual norma sobre iluminação de espaços de trabalho internos da União Européia, DIN EN 12464-1 – Light and lighting - Lighting of work places, Part 1: Indoor work places (ZVEI, 2005), incluísse valores do índice de ofuscamento denominado Unified Glare Ratio (UGR) máximos para cada tipo de ambiente (UGRL), relacionados à atividade visual predominante. Além disso, tendo em vista a crescente utilização de fontes que emitem luz por descarga em gases e eletroluminescência, a norma indica também os valores recomendados de temperatura de cor e índice de reprodução de cor (IRC).

A base dessas ferramentas é constituída pelos algoritmos usados em software de simulação da iluminação, iniciado com o programa RADIANCE, desenvolvido no Lawrence Berkeley National Laboratory na década de 1980. Esses algoritmos possibilitam o cálculo de distribuições de luminâncias do ambiente e de índices de ofuscamento a partir de qualquer posição em seu interior e são implementados inclusive em software de projeto de iluminação. Outro algoritmo, o do formato de armazenamento de imagens HDR (high dynamic range, ou imagem de largo espectro de luminâncias, cujos pixels guardam uma relação linear com as luminâncias da cena) deu origem a

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instrumentos como o fotovideofotômetro, que capta, num ângulo visual compatível com o da visão humana, a distribuição de luminâncias, podendo calcular os índices de ofuscamento associados. A partir desse mesmo algoritmo é possível também compor imagens HDR a partir de fotos digitais (DEBEVEK e MALIK, 1997; MITSUNAGA e NAYAR, 1999; INANICI e GALVIN, 2004). Wienold et al. (2005) desenvolveram um aplicativo baseado no RADIANCE, o evalglare, para calcular índices de ofuscamento associados ao campo visual em imagens HDR geradas por programas de projeto de iluminação a partir de fotos.

Complementando as ferramentas tecnológicas, o questionário ou o formulário aplicado a usuários do objeto ou espaço em estudo (LAKATOS e MARCONI, 1991) é de grande utilidade, seja para criar valores de referência de uma variável, seja para validar os resultados da aplicação de outra técnica de avaliação.

3 METODOLOGIA

A presente pesquisa teve caráter exploratório: foram aplicadas diversas técnicas de avaliação do ambiente luminoso a um espaço com o objetivo de verificar a convergência dos resultados. Em caso positivo, a aplicação conjunta das técnicas tem a finalidade de enriquecer a análise da qualidade da iluminação.

Foi tomado por objeto de estudo um conjunto de 5 salas de aula do campus da UNESP em Bauru, as quais haviam recentemente passado por uma troca do sistema de iluminação visando reduzir o consumo de energia.

O documento básico para a realização da pesquisa foi a NR-17 – Ergonomia, complementada pela NBR 5413 – Iluminâncias de interiores, referenciada pela primeira. Finalmente, foi incorporado um terceiro documento, a DIN EN 12464-1 – Light and lighting - Lighting of work places,

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Part 1: Indoor work places, que é a norma mais atualizada para a qualificar a iluminação de um ambiente.

Para a determinação da distribuição de iluminâncias foi usado um luxímetro Lutron LX-101 e os resultados obtidos foram comparados com os valores de referência NBR 5413.

A determinação de grandezas associadas à distribuição de luminâncias: contrastes, relações de luminância e índices de ofuscamento, foi feita através de simulação computacional e através de da análise de imagens HDR compostas a partir de conjuntos de fotos das salas.

Todo o software usado no desenvolvimento do trabalho é freeware. Assim, as imagens HDR foram compostas com o programa Luminance HDR (<http://qtpfsgui.sourceforge.net/>) e sua análise foi feita com os aplicativos do Desktop Radiance (<http://radsite.lbl.gov/deskrad/>) winimage, para a geração de imagens distribuição de luminâncias com escala de falsas cores e evalglare, para a verificação do potencial de ofuscamento nos pontos a partir dos quais foram batidas as fotos. A análise da distribuição de luminâncias foi feita pela relação de luminâncias de áreas dentro do campo visual (da foto, no caso), tendo por parâmetro as recomendações expostas por Grandjean (1998).

As fotos foram obtidas com uma câmera compacta Sony DSC-S930, cuja resposta à luminância, verificada anteriormente, pode ser aproximada por uma curva de regressão linear com coeficiente de interceptação nulo; assim, para se obter as luminâncias reais numa imagem HDR, basta aplicar a ela o fator de multiplicação correspondente ao coeficiente angular da reta de regressão, através do programa bracket (<http://www.ceng.metu.edu.tr/ ~akyuz/bracket/bracket.html>). Infelizmente, o campo da lente da câmera usada não tem a abrangência do campo visual; assim, os índices de ofuscamento calculados pelo evalglare não podem ser usados, apenas a imagem com escalas de brilhos das superfícies.

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Um questionário com questões fechadas e respostas em escalas de Lickert de um trabalho anterior (FARIA, 2007) foi adaptado e aplicado a alunos nas salas estudadas, no período noturno. As impressões sobre a adequação da quantidade e da distribuição da luz e a ocorrência de ofuscamentos diretos ou por reflexão, foram comparadas posteriormente com os resultados da aplicação das demais ferramentas, de forma a verificar a coerência da avaliação como um todo.

4 RESULTADOS

A Figura 1 ilustra uma sequência típica de imagens usadas na análise das salas e a Figura 2 um exemplo de tabulação de respostas do questionário; as tabelas 1 e 2 contêm resultados derivados da iluminância e da luminância.

a)

b)

Figura 1 – a) Distribuição de luminâncias em escala de falsas cores; b) Imagem resultante do evalglare. O círculo em azul corresponde à área delimitada pelo ângulo de visão (0,15 rad) do centro de atenção no quadro negro e as cores representam a severidade do ofuscamento em ordem crescente: vermelho,

verde, azul, amarelo, magenta e ciano.

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Tabela 1 – Resultados derivados da iluminância medida para a sala-exemplo Atributo Valor Área (m²) 142,8 Iluminância mínima conforme NBR 5413 300 Iluminância média Emed (lx) 440 Iluminância mínima Emin (lx) 154 Coeficiente de uniformidade Emin/Emed (%) 35 Coef. de uniformidade mínimo na área de trabalho, cf. NBR 5413 70

Tabela 2 – Resultados derivados da luminância para a sala-exemplo,

calculados no DIALux. Valor de referência para salas de aula (EN 12464-1): UGRmax = 19

Descrição do ponto do observador na sala UGR Fundo da sala, ao centro, olhando para o centro da lousa 25 Fundo da sala, lateral esquerda, olhando para o centro da lousa 26 Primeira fila lateral esquerda, olhando para o centro da lousa 21

Figura 2 – Freqüência de respostas à questão “Qual é, na sua opinião, a

qualidade da luz nesse ambiente?” Analisando-se a Figura 1-a, algumas áreas apresentam luminâncias

muito elevadas em relação ao foco da atenção, o quadro negro; pela legenda

Sala em estudo

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de cores, verifica-se que essas luminâncias ultrapassam o limite de dez vezes a luminância do foco de atenção. A Figura 1-b evidencia aqueles resultados, indicando possíveis fontes de ofuscamento. A Tabela 1 mostra iluminâncias abaixo do mínimo desejado e com distribuição bastante heterogênea e a Tabela 2 indica valores de UGR que evidencia o ofuscamento indicado na Figura 2. Finalmente, as respostas a uma pergunta do questionário mostram que, de forma geral, os usuários não consideram a iluminação satisfatória. Assim, verifica-se que os resultados da aplicação das diversas ferramentas convergem para uma única conclusão. Nas demais salas o mesmo ocorreu, embora apontando para graus de qualidade diferentes da sala-exemplo.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora NBR-17 chama a atenção para o conforto ambiental, deva ser avaliado com a participação do trabalhador, quando se tratam de ambientes usados por uma grande quantidade de pessoas, o “trabalhador” assume uma característica de coletivo, ou seja, suas necessidades e preferências passam a ser analisadas como as da maioria de uma população de usuários. Assim, a adoção de índices torna possível a definição de parâmetros de qualidade tanto do projeto do ambiente quanto de sua avaliação pós-ocupacional.

Nesse exercício demonstrou-se que é possível usar ferramentas que quantificam e tornam objetivos indicadores de qualidade daquela norma que analisados atualmente de forma subjetiva. A implementação dessas ferramentas é simples e exige poucos recursos (a instrumentação é simples e o software é gratuito), mas fornece resultados que tornam mais seguro diagnóstico da qualidade da iluminação do local estudado.

No entanto, deve-se ressaltar que o trabalho descreve apenas os resultados encontrados em um tipo de ambiente e num único local; nesse

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sentido, pode ser entendido como um piloto que apresenta uma sistematização metodológica que deve ser repetida em outros objetos de estudo para que se possa ter certeza de sua eficiência.

Agradecimentos

Os resultados desse trabalho são frutos tardios da pesquisa realizada de 2007 a 2009 com recursos de Auxílio Pesquisa da FAPESP (proc. nº. 2005/ 00911-7), pelo qual o docente responsável mais uma vez agradece. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DEBEVEC, P. E.; MALIK, J. Recovering High Dynamic Range Radiance Maps from

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Construindo uma Metodologia de Projeto: Experiência do PósDesign UFSC

Luiz Salomão Ribas Gomez1

Diego Daniel Casas2 Leonardo Minozzo3

Magali Olhats4

1. INTRODUÇÃO

Metodologia de projeto é, em termos gerais, a organização do

trabalho que facilita o entendimento do processo de desenvolvimento da atividade de Design. “[…]é a disciplina que se ocupa da aplicação de métodos a problemas específicos concretos.” (BOMFIM, 1995) “[...] Conjunto de instrumentos de navegação que tornam mais fácil a orientação durante o processo projetual.” (BONSIEPE, 1984) “Da metodologia espera-se duas coisas: primeiro, que forneça uma série de modos de agir praticáveis; e segundo, que torne a estrutura do processo de projeto mais claro.”(FONTOURA, 2003)

Pode-se então construir uma “fórmula” para representar metodologia trazendo de Descartes o princípio fundamental:

METODOLOGIA = (métodos + técnicas + ferramentas) BOM SENSO Pensar o projeto sem a preocupação com a metodologia adequada a

sua execução, na maioria das vezes, leva o produto ao fracasso. Todos os autores, sem exceção, que tratam desse assunto, sendo eles mais ou menos rigorosos quanto ao funcionamento dela, em hipótese alguma, sugerem a execução de um projeto sem uma metodologia organizada e apresentada formalmente.

A grande dificuldade é escolher, entre os diversos autores, a

1 Gomez, Luiz Salomão Ribas, Dr.Eng, PPGDEG - UFSC 2 Casas, Diego Daniel, Mestrando PPGDEG - UFSC 3 Minozzo, Leonardo, Mestrando PPGDEG - UFSC 4 Olhats, Magali, Mestranda PPGDEG - UFSC

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metodologia de projeto que mais se adéque à forma de pensar do projetista que está à frente da atividade. Por isso, a melhor metodologia de projeto é a “PRÓPRIA”. Isto é, cada projetista deve, para melhorar o fluxo e o resultado final, organizar o seu próprio método de projeto, porém, este sempre estará relacionado ou, no mínimo, embasado em metodologias tradicionais que já foram testadas e aprovadas pelo mercado.

Como cada pessoa pensa de forma diferente, fica fácil dizer que não existe a melhor metodologia de projeto. Algumas são mais organizadas, outras nem tanto; umas mais simples, outras mais complexas; umas filosóficas, outras mais práticas. O mais importante é que cada projetista possa, dentro de suas características próprias, definir a forma que pretende desenvolver cada um de seus projetos.

A proposta da disciplinas de metodologia de projeto do mestrado em design do Programa de Pós Graduação em Design e Expressão Gráfica da UFSC é desenvolver, à partir de uma base teórica e apoiado nas experiências e expertise dos acadêmicos, uma proposta metodológica que apresente a melhor organização para o grupo de alunos naquele momento representado. Como já dito, a metodologia de projeto é individual e, mais que isso, particularizada para cada projeto, em cada trimestre que a disciplina é apresentada o resultado é diferente ou, no mínimo, diferenciado das apresentadas anteriormente.

O foco da disciplina, assim como do PósDesign UFSC, é o Design Gráfico e no semestre que este artigo foi desenvolvido a diversidade tanto formativa quanto cultural do grupo de alunos era muito grande, tendo inclusive no grupo designers e administradores de diversos lugares, inclusive com formação fora do Brasil.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 Geração da 1ª Alternativa

Nos tempos atuais, cada vez mais se busca estar sempre à frente da concorrência e em alguns pontos, até mesmo a frente dos próprios clientes. Na área do design procura-se analisar tendências e estabelecer facilidades que auxiliem as pessoas e organizações da forma mais dinâmica possível. Como escreve o estrategista de guerra Karl Von Clausewitz, necessitamos estar sempre avaliando o “campo de batalha” para que no primeiro indício de mudança das estratégias, estarmos preparados para agir de forma rápida e eficaz.

Segundo Cortella (2009):

Uma das coisas mais inteligentes que um homem e uma mulher podem saber é, saber que não sabem. Aliás, só é possível caminhar em direção a excelência se você souber que não sabe algumas coisas. Porque há pessoas que, em vez de ter humildade para saber que não sabem, fingem que sabem. Pior do que não saber é fingir que sabe. Quando você finge que sabe, impede um planejamento adequado, impede uma ação coletiva eficaz. Por isso, a expressão “não sei” é um sinal de absoluta inteligência.

Neste relato, Mario Sérgio Cortella, filósofo e professor da PUC/SP,

nos ensina que a maior virtude de um ser humano é ter consciência de não saber das coisas. O design, sendo uma atividade multidisciplinar e transdiciplinar, precisa perceber esse fato como intrínseco as suas ações cotidianas, buscando se aperfeiçoar sempre e ininterruptamente para lidar com as atividades. Até porque, como cita Bernd Schmitt, “não há indivíduos

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mais difíceis de etiquetar do que pessoas criativas”. Sendo assim, a necessidade de metodologias capazes de lidar com esses indivíduos e conectá-los ao seus clientes e demais stakeholders é um dos primeiros passos para um projeto vencedor

Na disciplina de Metodologia de projeto, lecionada no curso de mestrado da UFSC, na área de conhecimento do design e expressão gráfica, procuramos identificar variadas metodologias já existentes, estudá-las e compará-las a fim de encontrarmos semelhanças, incongruências, virtudes e defeitos, para enfim gerar uma metodologia própria da turma, considerada no caso, a mais eficiente com base em todo repertório dos alunos e com a tutoria do professor oficial da cadeira.

Iniciamos discutindo sobre os fundamentos dos termos, para termos maior certeza sobre o campo em que estávamos nos inserindo. Nesse momento falamos sobre a própria definição de metodologia, como o conjunto de instrumentos de navegação que tornam mais fácil a orientação durante o processo projetual. E a diferença desta com a definição de método, que no entendimento da turma foi classificado como a seqüência das etapas, ou o caminho a ser percorrido, os procedimentos e de como o projeto será desenvolvido.

Após estas conceituações terminológicas, passamos a discutir sobre as metodologias e autores mais conhecidos e usuais, como Baxter, Zaltman, Bonsieppe, etc., etc. Dentro de cada modelo proposto, fizemos anotações, apontamentos e fomos selecionando o que mais nos parecia extremamente necessário e útil dentro da criação da nossa própria proposta de processo.

Bonsiepe (1986) propõe uma metodologia que seqüencia-se da seguinte forma: problematização; análise (sincrônica, estrutural, morfológica, etc.); definição do problema (requisitos e estruturação do problema); geração de alternativas (diversas técnicas como brainstorming, método 635, desenhos, etc); e projeto. Baxter (1998) propõe uma metodologia composta pelas etapas

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que seguem: identificação de uma oportunidade; pesquisa de marketing; análise dos produtos concorrentes; proposta do novo produto; elaboração da especificação da oportunidade e especificação do projeto 1998). Aborda ainda um Funil de Decisão, que vai desde a missão da Empresa e chega até a oportunidade de produto. Löbach (2001) afirma que o processo de design é tanto um processo criativo como um processo de solução de problemas. O autor divide o projeto em quatro fases distintas: Análise do Problema, Geração de Alternativas, Avaliação das Alternativas e Realização da Solução do Problema. Estas etapas se entrelaçam umas às outras com avanços e retrocessos durante o processo de projeto.

Desde o início com a geração do briefing e definição do problema, até as etapas de criação, adequação e finalmente desenvolvimento e encontro de um resultado final inovador e adequado ao objetivo. A partir dessa discussão coletiva, geramos nossa primeira alternativa de processo que ficou representada da seguinte forma:

Figura 01 – Alternativa 01 Fonte: arquivo do autor

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2.2 Processo de Validação da 1ª Alternativa Após “desenhada” a primeira alternativa em uma discussão mais

empírica que fundamentada onde cada acadêmico apresentou sua forma de uso do processo metodológico de projeto, partiu-se para a sua validação científica. Sendo que desde o primeiro momento após a visualização do resultado obtido já se tinham dúvidas sobre seu efetivo funcionamento com no desenho apresentado.

Para a validação desse resultado parcial partiu-se para a fundamentação mais científica das etapas e de aplicação da proposta pelo acadêmicos e seus projetos de pesquisa, ensino ou profissional. Com a diversidade encontrada no grupo foi muito fácil e imediato encontrar qualidades e defeitos na proposta. Passaram-se quase dois meses de discussão, investigação e aplicação da alternativa até se partir para uma segunda alternativa que definiríamos com a proposta final da disciplina e se tornaria este artigo.

2.3 Geração da 2ª Alternativa

Nesse modelo de processo o início se dava a partir da análise do briefing e definição do problema do cliente, passando por uma fase de pesquisa e entrando numa etapa criativa que englobava as estratégias, inovação, criatividade e documentação do projeto. Este ciclo interno era composto ainda da co-criação e validação das alternativas através da inserção dos limites e fronteiras de projeto. Com essas etapas bem construídas, chegaríamos a um produto inovador e competitivo, que também poderia derivar para a definição de estratégias, pro-ativas ou re-ativas, o estabelecimento das metas e o acompanhamento do processo produtivo, que nos geraria expertise ou “a priori” para futuros projetos. O modelo nos pareceu interessante, porém sua apresentação visual estava confusa e apresentava algumas incongruências de direcionamento. Pois a fase de criação

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estava mal construída e ainda gerava duas saídas, ou um produto (saída esquerda), ou geração de estratégias (saída direita).

Com base nessa primeira proposta começamos a refinar e buscar dentro das metodologias existentes, que outros fatores poderíamos inserir, retirar, elevar ou diminuir para chegarmos a uma alternativa mais plausível, visualmente interessante e que gerasse um resultado mais concreto. Também testamos este processo num estudo de caso real, para avaliar sua eficácia, o que se mostrou pouco promissor.

Fizemos então uma segunda avaliação e de forma opinativa entre todos os envolvidos refinamos algumas etapas, chegando numa segunda alternativa, apresentada a seguir:

Figura 02 – Alternativa 02 Fonte: arquivo do autor

Esta alternativa estava melhor construída visual e formalmente. As

etapas estão mais bem delineadas e os processos fluem mais naturalmente.

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Realocamos algumas etapas e eliminamos outras. Porém o mais importante nesta nova alternativa, foi a inserção de uma etapa que se inicia após a entrega do projeto final, que foi chamada aqui de “A posteriori”, ou seja, tudo aquilo que foi desenvolvido em um projeto serve como referência e repertório para próximos projetos. Isso se dá através de documentação constante das etapas construtivas e principalmente dos procedimentos tomados para chegar a solução final. Esse “a posteriori”, quando do início de um novo processo projetual, se torna automaticamente “a priori” e ajuda a determinar qual a sequência de método será utilizada, pois caso estivermos trabalhando num processo já conhecido, que já temos experiência ou repertório documentado, podemos avançar até a etapas posteriores, agilizando a execução e mesmo assim contemplando todas as etapas necessárias. Estas etapas da alternativa gerada serão detalhadas nos item a seguir. 2.3.1 Etapa 01

A metodologia desenvolvida não é linear, nem rígida. Seu ponto de partida nem é sempre o mesmo. Martins defenda, “a metodologia de projeto deve ser flexível para se ajustar às variáveis ou aos condicionantes que surgem no decorrer do processo” (MARTINS, 2008, p. 80). Porem, pode-se limitar a algumas etapas primarias para o começo de um projeto. Assumindo nenhuma experiência previa relacionada ao projeto, pode-se deduzir que o projeto começa na primeira interação entre o designer e o cliente. Dois cenários foram contemplados: uma apresentação de um problema para o qual precisa-se achar uma solução através do design, ou a apresentação da situação atual onde o problema ainda não é definido.

De acordo com Munari (1997, p. 344) “O problema pode ser proposto pela indústria ao designer, segundo uma análise de necessidades, ou então proposto pelo designer à indústria. Presume-se que o problema já esteja bem definido, caso contrário é

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preciso defini-lo com exatidão, pois quando se começa de modo errado todo o trabalho é comprometido.”

A segunda proposta demostra um inicio do projeto com a definição de

problema ou um briefing e diagnóstico. Considerando que design é uma disciplina de resolução de problemas, é necessário ter um entendimento completo do problema do projeto (PHILLIPS, 2004). Para definir o problema, precisa-se fazer um “estudo cultural, histórico-geográfico, para verificar como esse aspeto em particular foi enfrentado por outros povos, noutros lugares” junto a um “estudo técnico e econômico para verificar se o mesmo problema não foi porventura resolvido total ou parcialmente em outros casos” (MUNARI, 1997, p. 344).

Na outra situação se começa com o briefing e diagnostico. O briefing é chave e precisa ser escrito para segurar o entendimento de todos envolvidos no processo criativo do projeto. Se considera como um contrato entre o cliente e o designer e defina as varias etapas entre o inicio e termino do projeto (PHILLIPS, 2004). Consiste em três elementos básicos: o objetivo do projeto, informação sobre o cliente ou a empresa, informação sobre o projeto (BORJA DE MOZOTA, 2003). Mais profundamente, Phillips (2004) propõe que inclui: um resumo e histórico do projeto, uma revisão da categoria, uma revisão do publico alvo, o portfolio da empresa, objetivos e estratégia de design, limites do projeto (tempo e orçamento), e dados de pesquisa. Sua construção envolve um dialogo entre o cliente e o designer útil para absorver e priorizar a informação delineado, e inicia a relação entre as duas partes.

Nestas duas etapas interage a “expertise” ou “a priori” de projetos

passados. Porem, esta informação previa não deveria der a única fonte. A informação obtido sobre um projeto, embora pode fornecer elementos essenciais para a visualização do projeto, não é suficiente para gerar uma solução. A criatividade vem na interpretação desta informação onde o designer

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considera toda a informação recolhida (FRASCARA, 2004). O designer deve participar em pesquisas adicionais para poder achar uma solução inovadora ao problema. 2.3.2 Etapa 02 a) Estratégia (definição objetivos estratégicos)

Com base nas informações coletadas através da etapa anterior – pesquisa – é nesse momento que os objetivos estratégicos são montados, ou seja, definem-se quais são os objetivos que ao final do processo deverão ser contemplados. É muito importante que esta etapa não seja encarada como apenas mais um passo dentro da metodologia proposta, pois a partir de agora, os delineamentos escolhidos serão prioritários para um resultado inovador e eficaz. É preciso que com base nas informações sejamos capazes de propor objetivos e ideias novas, desafiadoras e assertivas, pois escolher um objetivo estratégico pífio e sem um alto grau de novas possibilidades e inovações findará por limitar todo potencial criativo da equipe. Neumeier (2010, p87) defende esta etapa como primordial dentro do processo, quando cita que ”as empresas não fracassam porque escolhem o rumo errado. Elas fracassam porque não conseguem imaginar rumo melhor”. E ainda reforça dizendo que “os líderes sem imaginação vasculham as prateleiras de visões prontas em busca de uma visão própria, e mesmo assim perguntam-se porque a liderança que exercem não tem seguidores. Poucas pessoas sentem-se inspiradas pelo que é seguro, pelo que é fácil”. Fica claro aqui, que a definição dos objetivos estratégicos é ao mesmo tempo importantíssima e desafiadora, deve inspirar os criativos a geração de feitos surpreendentes e não pode se resumir em poucas palavras com nenhum significado instigante.

Um objetivo estratégico bem produzido servirá como elemento norteador do processo e fará com que os designers e demais envolvidos no processo de co-criação se sintam instigados a buscar excelência e condições

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inovadoras para ousar e conquistar. Estes movimentos estratégicos, segundo Kim (2005, p10) são “um conjunto de decisões e ações gerenciais que resultam em importantes produtos e serviços capazes de criar novos mercados”. Sendo assim, fica evidente que este momento também demanda envolvimento próximo dos gestores da empresa ou processo junto aos desenvolvedores do projeto (designers). Essa demanda exige que ferramentas de co-criação sejam colocadas em prática e sobre isso que falaremos na próxima etapa do processo.

Trazendo para o estudo de caso proposta até aqui, neste momento foi a etapa em que avaliamos os objetivos definidos pelo cliente e geramos coletivamente as estratégias para alcançar tais objetivos. b) Ferramentas

Por se tratar de uma metodologia de criação coletiva é imprescindível que existam mecanismos que controlem a geração de alternativas, ideias, soluções, problemas e dúvidas do grande grupo, tanto interno quanto externo. Certamente haverá um líder no processo mas no atual momento em que vivemos não é necessário que este líder apresente todas a grandes soluções. Na verdade podemos até dizer que este líder não precisa apresentar conceito algum, desde que o fluxo de informações e boas ideias seja ascendente e suave (Neumeier, 2010, p121). Mas para que isso aconteça é necessário que haja disposição coletiva em gerar novas ideias. Por isso esta etapa do processo deverá ser preenchida com ferramentas de criatividade e geração coletiva de ideias, adaptando as possibilidades de acordo com o projeto em questão.

Várias ferramentas reconhecidas no meio, como 635, SCAMPER, Brainstorming, Brainwriting, Biônica e Duplo Diamante, podem ser utilizadas, mas como citamos acima, este momento é bastante aberto para que seja inserida a ferramenta e técnica que melhor se enquadra dentro das limitações, objetivos e conduta do projeto. A única questão que não pode ser esquecida

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nesta etapa é a necessidade da geração coletiva de possibilidades. Até porque se o nosso desejo é inovar mais do que a concorrência, precisamos estudar mais do que a concorrência e fica impossível humanamente, conhecer tudo, saber tudo e estudar tudo. Precisamos cada vez mais do grupo, do coletivo, da equipe e quanto melhor for esta equipe, mais bem alinhado o projeto final se parecerá.

Segundo Kotler (1999, p.15)

Estamos passando por um período de intensas alterações sociais, transformações e mudanças e “à medida que o mundo gira em direção ao próximo milênio, tanto os cidadãos quanto as empresas ficam imaginando o que os espera. O motivo da preocupação não é apenas o fato de haver mudanças, mas sua velocidade acelerada.”

Peters (1994, p4) diz, “Haverá só dois tipos de administradores, os

rápidos e os mortos”. A bibliografia pertinente apresenta que é impossível dissociar a rapidez e a capacidade de antever mudanças, assim como de encará-las ou até ditá-las. E para conseguirmos acompanhar esta movimentação acelerada precisamos estar dispostos a cooperar coletivamente, buscar soluções em conjunto, mais rapidamente, mais efetivas e menos custosas. O grande objetivo desta etapa de uso das ferramentas é tentarmos chegar o mais próximo possível de soluções inovadoras e viáveis e a partir daí, começar a valida-las dentro dos limites de projeto.

A próxima etapa da metodologia construída dará foco exatamente nestes pontos, criar usando o potencial gerador de cada indivíduo para formar uma idéia coletiva que possa ser retirada do papel e colocada em prática com êxito.

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c) Inovação + criatividade + co-criação (Documentação projeto) Hoje em dia as empresas precisam criar processos que direcionem as

tomadas de decisões, para diminuirmos o erro e a variabilidade na prestação no serviço. Porém ao mesmo tempo queremos que estas empresas sejam inovadoras, diferentes e apresentem surpresas positivas ao mercado constantemente. Esse dilema do controle e do caos é o que motiva os designers a continuarem desenvolvendo seus projetos e sempre inovando. Ficar nesse limiar não é fácil, mas acreditamos que isso seja possível desde que tenhamos dentro da equipe ou empresa, uma boa dose de criatividade, um ambiente que propicie a inovação e um processo de gerenciamento da co-criação. Por isso nessa etapa essas três atividades se confundem num processo cíclico de retroalimentação em que ideias inovadoras que partiram da aplicação das ferramentas (etapa anterior), são validadas, recompostas e realimentadas em vários ciclos até que cheguem a um ponto ideal em termos de viabilidade, diferenciação, custo, produtividade e demais quesitos necessários.

Numa citação de Schmitt, podemos entender melhor, como essa crise relativa entre caos e organização se completa para a geração de ideias inovadoras:

“O caos é associado a um estado desorganizado de matéria primordial, anterior à criação de formas distintas e ordenadas. No Estúdio (Garage), ainda estamos ligados a esse estado primevo de criação e inspiração. O Estúdio apreende o caos. O Estúdio alimenta o caos que dá a luz uma estrela cintilante. O Estúdio tem a ver com o fluxo contínuo de novas ideias, novas tecnologias, que resultam em novos produtos e serviços. Trabalhar no estúdio é divertido, inspirador, imediato. Sentimo-nos fazendo parte do trabalho, e orgulhosos dele. O Estúdio é um lugar em que a criatividade e a inovação são a prioridade maior, do qual

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a burocracia foi banida, e no qual as novas ideias são rapidamente implementadas”. Schmitt (2004, p.21)

Durante esta etapa tudo deve ser documentado, mesmo os fracassos

e recomeços, pois tudo isso servirá como “a posteriori” para a realização de novos projetos.

A inovação é totalmente relacionada com o ambiente ao qual se está inserido, por isso, a organização do ambiente físico para geração dessas ideias deve considerar modelos próprios de construção e sustentação desse clima de geração de ideias. No livro “Nos bastidores da Pixar”, Capodagli cita que “está provado que o ambiente físico desempenha um papel vital no bem-estar, na felicidade e na criatividade das pessoas, e a Pixar com certeza adotou essa verdade”. Dentro do estudo de caso que gerou esta metodologia, praticamos a inovação dentro dos limites da academia e apesar deste ambiente pregar tal necessidade nem sempre é o melhor local para que tais acontecimentos floresçam.

Assim como a inovação, a criatividade só vem para quem a persegue. Einstein já dizia que criatividade é 99% transpiração e 1% inspiração. Mas felizmente hoje em dia já temos muito mais acesso a informações que nos propiciam maior conhecimento do mundo, repertório de acontecimentos, fatos, possibilidades e principalmente maior facilidade em ir e vir com ideias boas e não tão boas, refinando-as e lapidando-as até que cheguem a ser o “cálice sagrado” tão almejado. A metodologia que desenvolvemos integra a criatividade e validação dos resultados dentro de um processo de co-criação com os stakeholders (clientes, fornecedores e envolvidos direta e indiretamente com o projeto). E em se tratando de desenvolvimento de soluções idealizadas e impalpáveis (ao menos até essa etapa), esse processo cíclico de geração e validação se renova e vai trazendo maior segurança para o encontro de uma solução perfeita.

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Essa solução ideal estará madura quando conseguirmos chegar a um resultado que fique excelente, vendável, instigante, e principalmente, que esteja dentro dos limites estipulados no projeto (próxima etapa). 2.3.3 Etapa 03

Sem limitações, o design não pode ser criado. São elas que possibilitam a escolha do que foi gerado na fase de co-criação, determinando o que é factível de ser desenvolvido ou não. De acordo com Brown (2010), as limitações devem ser aceitas com disposição e empolgação. Para isso, o autor diz que as limitações (ou restrições de acordo com Brown) podem ser mais bem visualizadas em função de três critérios sobrepostos para boas ideias.

O primeiro critério é a praticabilidade, ou seja, o que é funcionalmente possível num futuro próximo. Por isso, o projeto deve estar de acordo com os processos passíveis de serem utilizados pela empresa, ficando claro que pouco adianta uma ideia visionária se os processos de fabricação, por exemplo, da empresa não conseguirem atingirem os resultados pretendidos. O segundo é a viabilidade, que diz respeito ao que é sustentavelmente viável dentro do modelo de negócio da empresa. Isto corrobora com o fato de que as inovações propostas devem estar de acordo com as metas pretendidas pela empresa, a fim de facilitar a aceitação delas dentro da organização. Por fim, o critério da desejabilidade, que relaciona-se com que faz sentido para as pessoas, fazendo o produto ou serviço ser desejado por elas. É sabido que um produto ou serviço inovador gera um buzz no mercado, mas, além disso, as pessoas, ou o público para o qual aquilo foi projetado, devem ter o desejo despertado para adquirir tal projeto.

De acordo com o autor, um bom exemplo disso é o Wii, que foi quando a Nintendo percebeu que seria possível criar uma experiência mais imersiva, utilizando a nova tecnologia de controle por gestos. Apesar de gráficos inferiores aos outros consoles da mesma geração, este tornou-se mais

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barato para o consumidor e fez com que a Nintendo tivesse enormes lucros, devido as melhores margens de produto obtidas.

Com os limites de projeto definidos e escolhida a alternativa que melhor insere-se nas metas e nos processos detidos pela organização, parte-se para o projeto executivo da ideia.

O projeto executivo do projeto é um plano de ação de como e o que vai ser feito para transformar a ideia num produto inovador e competitivo. Phillips (2007) diz que há várias formas de realização um plano de ação, mas é de suma importância que sejam elencados os objetivos (ou metas) que pretende-se atingir. Da mesma forma, o autor ressalta que para cada objetivo devem ser definidos critérios de acompanhamento, como tipo de abordagem realizada, que a fará, quanto tempo, etc.

O resultado final de todas as etapas do processo descrito deve ser um produto inovador e competitivo. Mas, apesar de soar óbvio, a realidade é que a maioria das organizações tende a abordar novas ideias de modo bastante diferente. Brown (2009) destaca que as novas ideias são comumente encaradas nas empresas sob três abordagens.

A primeira abordagem diz respeito às ideias incrementais, quando pegam um projeto já existente e adéquam a ele novas funcionalidades, por exemplo. Isto faz, no entanto, com que estas ideias sejam previsíveis e fáceis de serem copiadas pela concorrência. O resultado? Inúmeros e uniformes produtos que lotam as prateleiras dos estabelecimentos comerciais, deixando até o consumidor em dúvida sobre qual a melhor escolha. Uma segunda abordagem, de acordo com Brown (2009), é quando primeiro é descoberta uma nova forma de fazer algo e só depois é pensando como a nova ideia pode se adequar a um sistema de negócios existente e criar seu valor. E uma terceira abordagem é quando as organizações são orientadas pela estimativa dos desejos e necessidades humanas básicas, o que gera produtos ou serviços focados em apenas um dos elementos da tríade viabilidade, praticabilidade e

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desejabilidade. Com essas abordagens, percebe-se que as empresas tentam restringir

suas iniciativas de inovação a ideias que tenham um potencial de negócios a curto prazo. No entanto, elas podem estar trocando a inovação pelo incremento. Não que seja ruim investir em projetos incrementais, uma vez que podem garantir a base de uma empresa, mas mais do que isso, é extremamente importante investir em projetos evolucionários, que expandam a base para novas direções, tendo como resultado o que pode se chamar realmente de produtos inovadores e competitivos.

O Manual de Gestão de Design (1997) acrescenta ainda que as atividades de uma empresa só podem ser eficazes se forem constantemente renovadas, de modo a gerar-se um conflito entre a gestão que deve ter em conta as operações atuais e a necessidade de inovação. É preciso estabelecer um fio condutor, no caso o design, que ligue a inovação ao mundo da empresa que, do ponto de vista da sua organização e economia, é incapaz de absorver muitas das transformações que surgem.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A proposta deste artigo foi demonstrar as possibilidades para a construção de uma metodologia de projeto para ser usada em Design Gráfico partindo de diversas realidades e de diversas práticas já adquiridas pelos projetistas. O a priori foi levado em conta e muito valorizado para a construção do conhecimento conjunto. Todos os envolvidos no processo ampliaram seu conhecimento teórico sobre o assunto durante a discussão que foi acalorada em alguns momentos onde cada um queria defender seus princípios e suas experiências, e muito dinâmicas em todos os momentos onde a co-criação ocorreu não só como proposta metodológica mas sim em todo o desenvolvimento da que se propôs.

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Essa disciplina já foi ofertada 4 vezes no PósDesign UFSC e em cada uma delas o resultado foi diferente e de acordo com a experiência e expertise dos acadêmicos envolvidos. Nesse caso, com um grupo pequeno e muito heterogêneo em termos de formação, chegou-se a uma proposta evidentemente não linear mas com base teórica muito efetiva, onde os diversos autores investigados contribuíram para isso. Passou-se desde do método cartesiano até o design thinking para se encontrar a solução que mais se adequa-se a usar o “a priori” de cada projetista (pesquisador) na construção do “a posteriori” de cada projeto, que servirá para construir o “a priori” do próximo projeto.

Espera-se a cada trimestre em que a disciplina foro oferecida que se encontre soluções diferentes, que poderão ser lineares, cíclicas ou não lineares, mais gráficas ou mais conceituais, mais “amarradas” ou mais “soltas”, mais ou menos estruturadas. Porém , o objetivo da disciplina é ampliar o arcabouço de metodologias que podem ser adequadas a cada projeto, pela característica de cada projetista, dentro de realidades exclusivas e sempre em mutação. Para concluir vale a citação do Discurso do Método de Renè Descartes:

Portanto, meu propósito não é ensinar aqui o método que cada qual deve seguir para bem conduzir sua razão, mas somente mostrar de que modo me esforcei por conduzir a minha. Os que se aventuram a fornecer normas devem considerar-se mais hábeis do que aqueles a quem as dão; e, se falham na

menor coisa, são por isso censuráveis. (DESCARTES, 1637)

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Design de Embalagem: uma Reflexão Sobre o Ensino Projetual e a

Sustentabilidade

Régio Pierre da Silva1 Priscila Zavadil Pereira2

1 INTRODUÇÃO

Os aspectos relativos ao impacto ambiental e social de produtos e serviços são assuntos reconhecidos quanto à sua relevância nas atividades projetuais, muito embora a prática profissional e o campo educacional venham tratando efetivamente essas questões apenas nas últimas décadas. Quando se trata do Design de Embalagem, os aspectos ambientais vêm sendo abordados constantemente, pois uma das primeiras evidências é relativa ao rápido descarte das embalagens de comercialização, gerando acúmulos de resíduos pós-consumo. Conforme Brody e Marsh (1997), as embalagens são responsáveis por cerca de 65% do volume global de resíduos. Assim, apesar das iniciativas existentes em torno da reciclagem de materiais, as embalagens são responsáveis por grande parte do volume de lixo urbano.

Os produtos – artefatos, gráficos e embalagens – precisam ser bem projetados a fim de minimizar os impactos ambientais, contemplando desde a extração da matéria-prima, passando pelos processos produtivos, até o uso e o descarte. Os designers possuem a oportunidade de promover mudanças neste cenário, provendo soluções alternativas para os padrões de consumo e produção desenfreados, influenciando mudanças por meio da concepção de produtos e serviços responsáveis em termos ambientais e sociais (PAPANEK, 1995).

1 Doutor em Engenharia de Produção, professor adjunto Departamento de Design e Expressão Gráfica e professor no programa de pós-graduação em Design, UFRGS 2 Mestranda em Design – UFRGS, professora substituta no Departamento de Design e Expressão Gráfica - UFRGS

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Dessa forma, é preciso, por um lado, uma postura crítica da sociedade por meio de atitudes que recusem produtos, incluindo-se as embalagens, fabricados de modo insustentável e, por outro, soluções inovadoras por parte dos profissionais, que atendam às demandas de bem-estar sem causar degradação ao meio ambiente. Além disso, as instituições educacionais devem gerar debates sobre o papel da educação na formação dos novos profissionais, valorizando a ética e a sustentabilidade (MEDEIROS, 2001).

Assim, percebe-se a necessidade de discussão e pesquisa sobre estratégias pedagógicas no ensino projetual que promovam o conhecimento, a conscientização e, principalmente a reflexão crítica dos estudantes, futuros profissionais, sob a perspectiva da sustentabilidade, atendendo a critérios de relevância social, prudência ecológica e viabilidade econômica em sua prática de projeto e no desenvolvimento de novas soluções (SACHS, 2009). 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 A sustentabilidade no ensino projetual

O marco inicial dos modernos métodos projetuais, segundo Cross (2007), foi a Conference on Design Methods, em 1962, quando ocorreu o reconhecimento da metodologia de projeto como uma disciplina ou campo de instrução. A partir de então, o estudo dos princípios, práticas e procedimentos do design tornou-se mais efetivo, configurando uma uma metodologia do design, incluindo o estudo de como os designers pensam e trabalham, o estabelecimento de estruturas apropriadas para os processos de design, o desenvolvimento e aplicação de novos métodos e técnicas, a extensão do conhecimento e sua aplicação aos problemas de design (CROSS, 2007). Com relação ao processo de ensino-aprendizagem, a atividade projetual configura-se como um método, conduzindo os estudantes à pesquisa, reflexão, desenvolvimento, representação, estruturação e

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comunicação do projeto, organizando a busca de conhecimentos e a relação entre a teoria e a prática da atividade. Além disso, a prática projetual atual apresenta-se interdisciplinar e holística. Desse modo, é fundamental que a sua educação contemple a integração de conhecimentos, estimulando o estudante a uma reflexão crítica sobre a natureza do problema, seus significados para a área do design e para o papel do designer na sociedade, por meio do próprio processo projetual, levando o aluno a refletir sobre suas responsabilidades em relação às questões ligadas à sustentabilidade, ecológicas e sociais.

O termo sustentabilidade ambiental diz respeito às condições a partir das quais as atividades humanas não perturbem os ciclos naturais além dos limites dos ecossistemas e não empobreçam o capital natural (MANZINI, 2008). A sustentabilidade ambiental está diretamente relacionada com a sustentabilidade econômica e social, compreendendo a viabilidade financeira, geração de trabalho e renda, os princípios de justiça, responsabilidade, coesão social, identidade e diversidade cultural (MANZINI, 2008; UNEP, 2010). Assim, o design sustentável visa o desenvolvimento de projetos economicamente viáveis, ecologicamente benéficos e socialmente justos, contemplando fatores funcionais, estéticos, ergonômicos, tecnológicos, mercadológicos, antropológicos e culturais. Diante deste cenário, alguns estudos relacionados às questões ambientais no ensino do design surgiram na última década, muitos de cunho teórico, a respeito da evolução do pensamento ecológico e da sustentabilidade no contexto educacional, e outros propondo métodos, ferramentas, diretrizes, ou ainda, revelando experiências práticas da inserção da sustentabilidade no ensino do design. Clare (2001) propõe uma estrutura pedagógica na Grã-Bretanha a partir do projeto DEMI – Design for Environment Multimedia Implementation – que produziu um recurso para internet de apoio ao ensino e aprendizagem da sustentabilidade na educação superior em design. O projeto permite buscas e

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mantém referências cruzadas sobre informações ecológicas de materiais e aplicações, além de fornecer conceitos de desenvolvimento sustentável, e possui um extenso banco de dados sobre design ambientalmente responsável. O artigo explora a definição, teste e implementação de uma estrutura pedagógica através da qual se espera que os estudantes sejam envolvidos com o design sustentável, influenciando a sua prática de projeto. No Brasil, em 2002, a pesquisa de Barbosa e Soares aborda a educação do ecodesign no ensino superior e conclui que a inserção de parâmetros e diretrizes ambientais no processo projetual é uma tendência. Esta constatação foi também evidenciada por Alcântara (2003), que pesquisou o ensino das questões ecológicas no design em faculdades brasileiras, especificamente do Rio de Janeiro, recomendando que os aspectos ambientais sejam integrados às disciplinas projetuais. Em 2005, a pesquisa de Brunetti propõe uma ferramenta educacional denominada “Os doze princípios do Design Sustentável” baseada em um programa computacional, com conteúdos pedagógicos complementares aos previstos nos currículos de desenho industrial. A ferramenta foi organizada na forma de um hipertexto e disponibilizada na internet a fim de aproximar o designer dos problemas ligados à sustentabilidade, estimulando-os a buscarem alternativas sustentáveis para suas criações (BRUNETTI, 2005). No âmbito internacional, Vezzoli e Penini, em 2006, relatam uma experiência didática experimental e de pesquisa na área de desenvolvimento de sistemas sustentáveis de produto-serviço (PSS), tendo a Universidade como o local para a concepção, implantação e disseminação de soluções inovadoras. Pelo aspecto educativo, a pesquisa buscou validar o processo de aprendizagem em rede como um meio para desenvolver e promover a inovação curricular. O projeto desenvolvido, DECOS, buscou a vinculação direta dos problemas de investigação aberta com a didática experimental e a utilização da universidade como laboratório pelo qual visões sustentáveis, ideias e inovações podem ser

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projetadas e testadas para uma maior divulgação nas comunidades. A abordagem proposta considera que as universidades têm de repensar-se como lugares de formação avançada, como promotoras de cursos experimentais e laboratórios ligados a novas pesquisas para a produção de idéias sustentáveis (VEZZOLI, PENIN, 2006). Também em 2006, Ramirez apresenta um trabalho no qual pretende determinar em que medida as questões de sustentabilidade ambiental são integradas nos currículos dos programas de desenho industrial em universidades australianas. Professores e diretores de cursos de design participaram de uma pesquisa e os currículos foram analisados para determinar quais cursos abrangem os aspectos de sustentabilidade. Os resultados demonstraram que a inclusão de aspectos do desenvolvimento sustentável através dos programas de design e entre os acadêmicos ainda está começando a se consolidar. A análise comparativa das estruturas curriculares nas universidades australianas que oferecem programas de graduação em desenho industrial revelou que, em média, 12 em cada 100 créditos obtidos possuem conteúdo relativo à sustentabilidade (RAMIREZ, 2006). Já a pesquisa de Buchan, Spellberg e Blum (2007) aborda o ensino da sustentabilidade na pós-graduação, descrevendo o desenvolvimento de uma nova disciplina para curso de mestrado. A disciplina entitulada Aspectos da Sustentabilidade: uma perspectiva internacional, visa preparar os estudantes para carreiras regionais ou internacionais que envolvam a sustentabilidade e foi estruturada em um modelo que permite a adoção por outros educadores.

A respeito da inserção de parâmetros ambientais em disciplinas de graduação em design no Brasil, Duarte (2007) relata a sua experiência relativa às disciplinas de Laboratório de Design e TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) contemplando a temática ambiental. O objetivo das disciplinas é promover a compreensão da relação do design, meio ambiente e consumo, desenvolvendo projetos de produtos ou ambientes. Os projetos são divididos em seis etapas,

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sendo: (i) etapa orientada ao conhecimento de conteúdos relacionados aos problemas ambientais; (ii) aproximação com o tema e estudos de similares; (iii) desenvolvimento das necessidades projetuais, contemplando a análise de ciclo de vida do material; (iv) estudos preliminares do produto; (v) definição e desenho final do produto; (vi) projeto executivo, protótipo e memorial justificativo (DUARTE, 2007). Sobre modelos pedagógicos para o ensino do design e os conteúdos de sustentabilidade, Neves (2009) propõe o modelo de aprendizado baseado em problemas. A metodologia de aprendizagem baseada em problemas (PBL – problem-based learning) tem origem na Faculdade de Medicina da Universidade de McMaster no Canadá, na década de 60, sendo uma metodologia desenvolvida para que os alunos pudessem entrar em contato com problemas reais. De acordo com esta abordagem, o aluno deve ser capaz de encontrar em si mesmo respostas para perguntas que o inquieta. O PBL desafia o estudante a buscar o conhecimento a partir da apresentação de um problema, ao contrário dos modelos em que se trabalha primeiramente o conteúdo para a seguir apresentar o problema a fim de exercitar a teoria. A proposta visa capacitar os estudantes para a construção do conhecimento (NEVES, 2009). Ainda no contexto brasileiro, Júnior (2010) apresenta uma pesquisa na qual propõe um conjunto de diretrizes para a inserção da sustentabilidade em disciplinas de projeto em cursos de design. O autor verificou o número de cursos de design gráfico no Brasil com disciplinas relacionadas à sustentabilidade. De acordo com os dados, pouco menos da metade dos cursos pesquisados oferecem conteúdo relacionado à sustentabilidade. Sobre a forma de integração da sustentabilidade nas disciplinas, na maioria dos casos ocorre nas disciplinas de projeto, seguido pela integração durante o Trabalho de Conclusão de Curso (JÚNIOR, 2010).

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Com base neste panorama, o autor propõe diretrizes para a inserção da sustentabilidade no ensino superior de design gráfico, desenvolvidas a partir da síntese de diversas diretrizes, em grande parte dirigidas a aspectos da produção gráfica. As diretrizes foram divididas em diretrizes de projeto, aplicáveis ao ensino em disciplinas projetuais, e diretrizes de produção, com especificações direcionadas à prática profissional, que podem ser contempladas no memorial descritivo do projeto, no caso do ensino (JÚNIOR, 2010). 2.2 O ensino do design de embalagem e a sustentabilidade

A partir das pesquisas relatadas anteriormente, pode-se perceber que, na maioria dos casos, a sustentabilidade é contemplada por meio de disciplinas projetuais no ensino do Design, seja como um paradigma ou como diretrizes e princípios orientadores. Nesse sentido, torna-se relevante avaliar os principais métodos de design de embalagem utilizados para a prática e o ensino da atividade, bem como algumas pesquisas e proposições recentes sobre o assunto. Os métodos de design de embalagem tradicionalmente adotados na prática e no ensino no Brasil, tais como Bergmiller et al. (1976), Seragini (1978), Giovannetti (1995), Moura e Banzato (1997) e Mestriner (2001), além de Santos Neto (2001), Gurgel (2007) e Dupuis e Silva (2008), demonstram uma ênfase às questões técnicas e funcionais, como logística e produção, mercadológicas e econômicas. Mesmo os métodos mais completos, que equacionam os diversos fatores envolvidos no projeto de embalagem, não contemplam, de modo evidente em suas estruturas, questões relativas à sustentabilidade. Embora alguns destes autores abordem a questão ambiental, esta se apresenta como um fator externo que pode influenciar o projeto, mas não são especificadas diretrizes, ferramentas ou métodos que facilitem a sua contemplação no momento do desenvolvimento da embalagem.

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Contudo, outras propostas surgiram considerando a sustentabilidade, principalmente a ambiental, no projeto de embalagens, como, por exemplo, Brod Júnior (2004), Bucci e Forcellini (2007), Sampaio (2008), Boylston (2008) e Merino (2009). No método de Brod Júnior (2004), os fatores ecológicos são considerados nas fases projetuais e hierarquizados com relevância para balizarem as decisões de cada etapa. O foco está no desenvolvimento de soluções que possuam descarte postergado e a sustentabilidade é vista como um novo paradigma, uma doutrina que deve orientar o pensamento projetual. Bucci e Forcellini (2007) apresentam um modelo integrado com o desenvolvimento do produto, no qual ferramentas e estratégias de ecodesign são contempladas nas fases do projeto. Em Boylston (2008), observaram-se as diretrizes propostas pela Sustainable Packaging Coalition mediadas no ciclo de vida da embalagem, entretanto, sem considerar um método específico de projeto. Sampaio (2008) traz a aplicação do MEPSS – Methodology for Product-Service System – que contempla uma abordagem mais alinhada ao pensamento sustentável, saindo do foco do produto para as relações que a embalagem possui no sistema, por meio de estratégias para o desenvolvimento de produtos-serviços. Por fim, em Merino et al. (2009) tem-se um modelo flexível para adaptações de acordo com o projeto e a sustentabilidade é contemplada por meio da adoção da estratégia de Análise do Ciclo de Vida. 3 ANÁLISE DOS MÉTODOS E ABORDAGENS DA SUSTENTABILIADE

A partir do estudo dos métodos apresentados, verificaram-se as etapas contempladas em cada uma das propostas para determinar uma estrutura geral que permita visualizar o conteúdo abordado pelos autores dos métodos especialistas de embalagem. O objetivo é permitir um comparativo entre as estruturas metodológicas, conferindo suas similaridades para,

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posteriormente, verificar em quais etapas do processo projetual são contempladas diretrizes, técnicas ou ferramentas de sustentabilidade. Essa estrutura geral foi, então, sistematizada de acordo com dezesseis procedimentos comuns nos métodos projetuais de embalagem: (i) necessidade; (ii) planejamento; (iii) problematização; (iv) coleta de dados; (v) análises; (vi) estratégia; (vii) conceito; (viii) alternativas; (ix) estrutura; (x) visual; (xi) modelos; (xii) apresentação; (xiii) protótipo; (xiv) especificações; (xv) implementação e (xvi) acompanhamento. De acordo com esses dezesseis procedimentos projetuais, formulou-se uma análise visual, representada nas Figuras 1 e 2, demonstrando quais as principais estratégias, ferramentas e técnicas de sustentabilidade são adotadas pelos autores e em que momento do projeto elas são contempladas.

Após a análise e dos estudos apresentados sobre o ensino da sustentabilidade em cursos e disciplinas de Design, pode-se verificar como as questões ambientais são abordadas de acordo com os autores pesquisados.

Com base nos estudos sobre os métodos projetuais, percebe-se que as relações ecológicas da embalagem são contempladas em algumas propostas, entretanto, são poucos os métodos que orientam ações efetivas em direção à sustentabilidade. Entre os métodos de embalagem em geral, apenas dois inserem algum tipo de ferramenta ou técnica desta natureza – Seragini (1978) e Santos Neto (2001). Nestes casos, apenas são contempladas questões relativas ao ciclo de vida da embalagem na coleta de dados, mas elas não são retomadas nas fases posteriores.

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Figura 1: análise comparativa dos métodos quando à inserção da sustentabilidade no

processo projetual (primeira parte).

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Figura 2: análise comparativa dos métodos quando à inserção da sustentabilidade no processo projetual (segunda parte).

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Já nos métodos voltados às relações ecológicas, ou de sustentabilidade ambiental, nota-se que a abordagem é realizada, em sua maioria, por meio de diretrizes de projeto que visam à minimização de impactos ambientais, ferramentas e técnicas para avaliação dos impactos de materiais e processos, a fim de orientarem as alternativas a serem propostas. A sugestão da utilização da metodologia para Produtos-Serviços no design de embalagem apresentada por Sampaio (2008) é a que está mais alinhada com as necessidades da sustentabilidade, ambientais, sociais e econômicas. Com relação às pesquisas sobre o ensino, verificou-se que grande parte relata a importância de contemplar a sustentabilidade em disciplinas projetuais como diretrizes (BARBOSA, SOARES, 2002; ALCÂNTARA, 2003; JÚNIOR, 2010), enquanto outras propõem a estruturação de disciplinas específicas ou de modelos pedagógicos (BUCHAN, SPELLGERG, BLUM, 2007; DUARTE, 2007; NEVES, 2009), ou ainda ferramentas para facilitar o processo de aprendizagem (CLARE, 2001; BRUNETTI, 2005).

Assim, formulou-se uma classificação para a abordagem da sustentabilidade segmentada em: (i) ferramenta para o ensino; (ii) método para o ensino e/ou projeto; (iii) análise/reflexão, quando não há uma proposição prática; (iv) modelo pedagógico e estruturação de disciplina; (v) técnicas e/ou ferramentas para o projeto; (vi) diretrizes projetuais; e (vii) paradigma/doutrina, quando a sustentabilidade é tratada como uma filosofia para a atividade projetual. De acordo com esta classificação, os autores pesquisados que abordam a inserção da sustentabilidade no ensino do design ou na prática projetual foram organizados conforme a Figura 3.

Desse modo, conclui-se que as diretrizes projetuais e o uso de técnicas e ferramentas de sustentabilidade nos métodos de projeto são as abordagens mais encontradas. Bucci e Forcellini (2007) e Sampaio (2008) foram classificados, prioritariamente como “método para o ensino e/ou

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projeto” e, como apresentam uma estrutura metodológica voltada à sustentabilidade, contemplam também técnicas e ferramentas.

Figura 3: Classificação das abordagens da sustentabilidade. De fato, a adoção de diretrizes projetuais é uma medida prática que

permite aplicação em disciplinas diversas, bem como em diferentes métodos de design, permitindo que o estudante visualize como é possível proceder para o desenvolvimento de soluções mais sustentáveis. Todavia, de acordo com a perspectiva holística da sustentabilidade, é interessante que o ensino projetual contemple tanto medidas práticas, como técnicas, ferramentas e diretrizes, quanto a reflexão crítica do estudante, por meio de um repensar de estruturas metodológicas e pedagógicas sistêmicas.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da complexidade dos problemas que envolvem o design e a sustentabilidade, pesquisas que estudem e proponham novas abordagens projetuais para as embalagens podem contribuir para o campo metodológico do Design. Especificamente sobre o design de embalagem, ainda são poucos os estudos acerca do processo de ensino-aprendizagem considerando os fatores da sustentabilidade, visto que, de certo modo, este ainda é um assunto recente e, portanto, vem sendo tratado no contexto do Design em geral, ou para Design Gráfico e Produto.

O impacto ambiental das embalagens está diretamente relacionado com as questões sociais, as influências socioculturais, a cultura material e o território. Portanto, é um assunto complexo, que envolve uma diversidade de informações e relações no processo projetual e, assim, os métodos dirigidos ao ensino e a prática de projeto devem contemplar não apenas o desenvolvimento do produto em si, mas as interações entre ele, pessoas e territórios. Desse modo, a metodologia precisa exercer uma relação flexível e holística, condizente com a evolução dos modos de produção e da própria sociedade. Assim, a sustentabilidade necessita de um pensar projetual sistêmico, cujos métodos considerem claramente as relações envolvidas no desenvolvimento de novos produtos e serviços, propondo diretrizes e ferramentas que facilitem esse processo, fazendo com que os projetistas adotem uma postura coerente com as necessidades do mundo contemporâneo naturalmente e, sobretudo, que auxiliem a prover soluções sustentáveis e viáveis economicamente. A educação projetual revela-se fundamental neste contexto, na formação de designers éticos e conscientes de seu papel na sociedade, capazes

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tecnicamente de desenvolver soluções sustentáveis, assim como competentes para refletir criticamente sobre o assunto. Este artigo se propôs a refletir sobre estas questões, analisando as pesquisas e metodologias que tratam o assunto. Não há a pretensão de concluir ou esgotar tal discussão, mas sim de contribuir para estudos acerca de considerações para o ensino projetual do design de embalagens sustentáveis, para a identificação dos fatores relevantes a serem considerados para o desenvolvimento e utilização de metodologias projetuais aplicadas no ensino de design com foco em resultados amparados na sustentabilidade.

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Design no Brasil: um Breve Panorama do Ensino

José Carlos Plácido da Silva1

Elissandra Marson2 Lívia Flávia de Albuquerque Campos3

Margareth Sayuri Kamisaki4 Mariano Lopes de Andrade Neto5

Luis Carlos Paschoarelli6

1 INTRODUÇÃO

No Brasil ainda há muitas discussões sobre as conceituações do design, com constantes discussões sobre o termo e suas implicações como design gráfico, design de produto ou design industrial. Convencionou-se, no entanto, utilizar o termo design para denominar a atividade. Questões estas que permeiam a formação do aluno e, consequentemente, a sua atividade no mercado.

Neste artigo são observados enfoques dos cursos de design nacionais relativos aos aspectos que determinam o perfil do profissional formado. Para tanto houve um levantamento sobre o entendimento do termo design e seus aspectos históricos do seu ensino no país. Realizou-se também uma breve pesquisa exploratória sobre o número de cursos e instituições no país. E, particularmente, uma análise das Instituições públicas do Sudeste, a qual permitiu verificar suas respectivas visões sobre o design que são divulgadas e transmitidas aos egressos dos cursos.

1 Professor Livre Docente PPGDesign – FAAC - UNESP - Bauru – [email protected] 2 Mestranda em Design PPGDesign – FAAC - UNESP - Bauru – [email protected] 3 Doutoranda em Design PPGDesign – FAAC – UNESP - Bauru - [email protected] 4 Mestranda em Design PPGDesign – FAAC – UNESP - Bauru – [email protected] 5 Mestrando em Design PPGDesign – FAAC – UNESP - Bauru – [email protected] 6 Livre Docente em Design Ergonômico - UNESP - Bauru – [email protected]

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 O termo design no Brasil

Ao longo dos anos, desde sua implantação no Brasil, o termo design promoveu uma extensa discussão. Porém, antes tratado por Desenho Industrial, convencionou-se utilizar o termo Design para nomear todas as atividades relacionadas, independente da especialização. E em seu vasto campo de atuação, de acordo com ONO (2006), procura-se definir o design como uma atividade que “envolve planejamento, seleção de modos de pensamentos e valores, entende-se que o designer é co-responsável pelas relações que se estabelecem entre os artefatos e as pessoas, bem como pelas suas implicações na sociedade”.

E observa-se uma definição mais detalhada no seguinte projeto de lei:

“No projeto 3515, de 1989, apresentado pelo deputado Maurílio Ferreira Lima, constava que ‘a profissão de designer é caracterizada pelo desempenho de atividades de caráter técnico-científico, criativo e artístico, visando à concepção e ao desenvolvimento de projetos e mensagens visuais. Em design, projeto é o meio em que o profissional, equacionando de forma sistêmica, dados de natureza ergonômica, tecnológica, econômica, social, cultural e estética, responde concreta e racionalmente às necessidades humanas. Os projetos elaborados por designers são aptos à seriação ou industrialização que estabeleça relação com o ser humano, no aspecto do uso ou de percepção, de modo a atender as necessidades materiais e de informação visual” (NIEMEYER, 2000).

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Assim, a profissão ainda permanece sem uma denotação definitiva no Brasil. E, apesar de no momento empregar-se o design como consenso, nota-se também seu uso, inclusive, em áreas onde não existe trabalho conceitual e de projeto. Provocando confusão ainda maior em seu entendimento. Fato que pode ser revertido com a implantação de valores estabelecidos desde o seu ensino no país.

2.2 O ensino design no Brasil

A implantação do curso da ESDI, de acordo com Niemeyer (2000), é considerada o marco inicial do ensino de design nacional. Momento no qual se adotou como proposta de ensino o currículo racionalista semelhante ao de Ulm. Todavia, ao passo que na escola alemã concentrava a formação em design no país, na ESDI, os mentores do currículo estavam distanciados da problemática nacional, do perfil do estudante brasileiro e das possibilidades de inserção profissional destes alunos no mercado.

Sendo assim, estabeleceu-se um ensino voltado à realidade de países considerados de primeiro mundo, inadequado às necessidades nacionais.

Não houve uma mobilização suficiente relacionada ao ensino. Ocasionando que das muitas possibilidades para novas referências projetuais, como as mais variadas características e diversidades regionais brasileiras, predomina o modelo racional-funcionalista. E esta incorporação de modelos e soluções provenientes do exterior, termina por promover a dependência e valorização de outras culturas esquecendo suas próprias manifestações culturais no ensino, e por consequência, na atuação profissional.

Fatos que criaram um cenário que perdura até o início da década de 90, quando os ideais da Cultura Pós-moderna chegam ao país. Segundo Landim (2009) “os designers brasileiros por sua vez assumem o pensamento pós-moderno como uma bandeira de protesto contra o estado da arte do design

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local, que não conseguia instituir-se de maneira autônoma e definitiva, mantendo-se sempre como um modelo de esperança”. Para a autora, “no Brasil, podemos afirmar que este movimento não se prefigurou somente como sendo pós-moderno, mas também como pós-militar, pós-autoritário e de pós-austeridade”.

No entanto, apesar do momento adequado para que o design brasileiro possa expor sua insatisfação com a atual realidade inadequada ao cenário nacional, o ensino ainda emprega parte das referências racionalistas, principalmente ao pregar um modelo que aponta para a facilidade da produção industrial. Moraes (2006) sugere que um país de dimensão continental como o Brasil deveria promover experiências e modelos de ensino diferenciados acordados com as diversas vocações e comportamentos dos brasileiros.

Sendo assim, há a necessidade de se refletir sobre os currículos de cursos, pois, como Alencar (2006) recomenda,

“devemos subsidiar os alunos no desenvolvimento de uma saudável postura investigativa do projeto, refletindo, contextualizando e estruturando um tema de projeto, prospectado pela crítica num futuro distinto, uma provocação para o novo, algo diferente dos projetos desenvolvidos anteriormente”.

Atualmente a complexidade das alterações sociais, tecnológicas e

comportamentais passa a ser uma componente intrínseca ao projeto, e a capacidade de decodificá-la e organizá-la é determinante na formação dos futuros designers.

Considerações que se somam a própria indefinição da profissão, não somente em relação ao ensino, mas a própria atuação destes, sendo que os

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desafios desta formação se encontram na tarefa projetiva – entre tecnologias e materiais; e cultural – ao transmitir informações e idéias.

2.3 Os valores do design

Para os designers muitas das habilidades só podem ser conseguidas pela prática que são fornecidas, em sua maioria, pelas instituições de ensino por meio das oficinas. Além dos ensinamentos teóricos obtidos nas salas de aulas. Nos tempos atuais, a sociedade passou a exigir mais da formação destes profissionais. Eles devem ser mais sofisticados, capazes de fazerem uma reflexão crítica, e ainda criativos.

O próprio curso de Design possui em sua essência um leque de aptidões que muitas vezes são escolhidas e seguidas pelos alunos em sua futura atuação profissional.

Durante esta formação, as instituições de ensino dispõem de uma multiplicidade de disciplinas que são fornecidas no decorrer do curso, porém cada disciplina limita-se ao seu enfoque, empregando características peculiares e inconciliáveis com as demais. No entanto, elas deveriam ser como peças de um quebra-cabeça que interligadas, formariam um designer completo.

Segundo Whiteley (1998) é preciso atingir uma maior coerência entre as diversas partes da formação, a fim de permitir que as diversas qualidades e aptidões se complementem – e, até mesmo, se confrontem – de forma construtiva. A existência de habilidades de diferentes tipos deveria engendrar um senso de completitude e de compreensão na busca da interdisciplinaridade e não um senso de confusão, incoerência ou desconfiança. O autor ainda aponta alguns modelos de designers. São eles: o designer formalizado, o teorizado, o politizado, o tecnológico e o consumista.

O designer formalizado – design como uma mera questão de funcionalidade utilitária, de materiais, de métodos de construção, de forma e

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proporção. Muitas instituições continuam a preconizar uma abordagem que condena as matérias ‘teóricas’ à irrelevância, em função da chamada ‘racionalização’ do currículo ou de uma aplicação superficial do sistema de créditos.

O designer teorizado – é produto de um alinhamento com a posição pós-moderna mais extrema que decreta a ‘fusão’ total entre teoria e prática. A influência dos estudos teóricos na conceituação do design tem sido tanto necessária quanto desejável. Mas deve-se admitir que há também um impacto negativo dos estudos teóricos sobre o design e que há limitações cada vez mais evidentes, para a abrangência das abordagens teorizadas.

O designer ‘teorizado’ pode acabar sendo tão remoto e irrelevante quanto o designer ‘formalizado’.

O designer politizado – este modelo não é muito difundido, mas ocupa uma posição estratégica no que diz respeito às matérias de integração e contexto em algumas faculdades de design. Suas origens estão nas idéias defendidas pelo Construtivismo e Produtivismo russos após 1917. O modelo do designer ‘politizado’ possui algumas variantes. O designer radical do final da década de 1960 deu lugar ao designer responsável da década de 1970. O designer verde ou ecológico da década de 1980 deu lugar, por sua vez, ao designer ético da década de 1990, o qual encara todo o design como um fenômeno ligado ao consumo e, portanto ao sistema social e político do Ocidente moderno.

O designer consumista – este modelo dá ênfase à ‘relevância’ e se pretende apolítico, buscando equipar o estudante de design com aptidões e técnicas que serão úteis no desenvolvimento de trabalhos para empresas e para a indústria.

O lado ‘teórico’ deste modelo tente a rejeitar análises históricas ou ideológicas, substituindo-as por estudos de gerenciamento empresarial. Não

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há nenhuma tentativa de transmitir um contexto mais amplo que permita ao aluno desenvolver uma reflexão crítica sobre o design na sociedade.

O designer tecnológico – partem do pressuposto de que a tecnologia mais atualizada oferece, por definição, uma solução melhor e mais adequada para qualquer problema de design. Há uma tendência a esquivar-se de debates ou reflexões críticas na parte ‘teórica’ deste modelo de ensino.

O autor conclui que todos estes “modelos de designers” possuem limitações fundamentais e que é necessário desenvolver um novo modelo de ensino de design: “O designer valorizado”.

Para o designer valorizado, a teoria e a prática tenderiam a se interpenetrar e a se unir com freqüência, mas a distinção entre uma e outra não desapareceria. Fazer uma reflexão sobre a natureza do problema em termos dos seus princípios e valores implícitos e do significado destes para a área do design, para o papel do designer na sociedade e para uma sociedade que se rege pelo consumismo. No designer valorizado, pode se apontar as características essenciais para um novo valor do design, que são: criatividade, independência, inovação, sensibilidade e consciência. O designer valorizado é, em suma, aquele que possui uma compreensão crítica dos valores que fundamentam o design, mas deve ser também audaz e corajoso: disposto a defender ideais sociais e culturais mais elevados do que o consumismo a curto prazo, com a sua bagagem obrigatória de degradação ambiental. Para Withiney (1998) “O modelo do ‘designer valorizado’ ajudaria a desenvolver uma consciência mais crítica bem como um maior senso de responsabilidade.” Sendo um modelo multiface, plural e complacente, pois, é decorrência de uma unificação de sistemas de valores; não exclui necessariamente nem o conteúdo, nem os valores de nenhum dos outros modelos acima detalhados.

Moraes (2006) aponta outro tipo de designer, o chamado ‘designer Zelig’, este inspirado no filme Zelig de Wood Allen no qual o protagonista se mimetiza com o ambiente durante situações de risco, sofrendo freqüentes

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mutações. Isto nos faz perceber a necessidade de mudanças de atitude e de comportamento diante de situações diversas e inesperadas. Para a atuação do design de forma abrangente e total, o profissional deve ter flexibilidade e adequação diante de situações inusitadas, o que seria o perfil ideal de sua formação.

Pode-se assim resumir um bom profissional de design aquele que consiga reunir: capacidade criativa e intuitiva individual, uma eficiente metodologia de trabalho, um bom nível de conhecimento tecnológico e cultural e ainda, discernimento quanto à ética, humildade e espírito corporativo.

Portanto, é preciso preparar um designer mais consciente e mais humano, não apenas um designer voltado à máquina-indústria do passado. Um profissional completo, cujas limitações também devem ser consideradas, uma vez que a perfeição não seja meta facilmente atingida, deve-se caminhar rumo à humanização com todos os seus problemas e complexidades.

2.4 Objetivos

Propõe-se com esse estudo realizar uma análise quantitativa dos cursos de Design ou Desenho Industrial no Brasil e uma verificação a cerca da Região de maior concentração de cursos a fim de identificar a visão adotada por estas Instituições no que se refere aos “valores do design” transmitidos por meio das apresentações sobre a área e a profissão disponibilizadas nos sites dos cursos aos egressos e outros interessados.

3 METODOLOGIA

3.1 Objeto de Estudo

Foram analisados os dados sobre os cursos de Design e Desenho Industrial e respectivas instituições de Ensino Superior responsáveis

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cadastradas no portal do Ministério da Educação – MEC (2009). Os dados disponibilizados constituíam-se em:

• Curso/Habilitação (Diploma Conferido; Modalidade; Data de início do funcionamento do curso; Prazo para integralização do curso; Carga Horária Mínima do Curso; Regime Letivo; Turnos de Oferta; Vagas Autorizadas; Dados de Criação/Autorização; Dados de Reconhecimento);

• Instituição (Organização Acadêmica; Categoria Administrativa; Dirigente Principal; CNPJ; Mantenedora; Endereço da Sede; Telefone; e-mail; Site; Dados de Criação; Situação Legal Atual);

• Cidade/UF.

3.2 Critérios Avaliados Buscou-se verificar o total de cursos de Design ou Desenho

Industrial cadastrados no MEC (2009) e dentre estes: • O número de cursos do tipo tecnólogo e de bacharelado, cuja

classificação já constava nos dados do curso; • O número de Instituições responsáveis pela ministração

destes cursos, as quais foram organizadas em Públicas ou Privadas; • A cidade, estado e região do Brasil no qual estava localizado.

3.3 Procedimentos Considerando os objetivos propostos, procedeu-se de forma a

analisar os dados nas seguintes etapas: • Por meio da busca das palavras-chave, Design e Desenho

Industrial, no banco de dados do Ministério da Educação (2009), obtiveram-se os dados nacionais a cerca dos cursos da área no país;

• Em seguida estes dados foram organizados em planilhas eletrônicas e tabulados para uma análise inicial; Nesta análise, excluíram-se os

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cursos tangentes ao design, por se tratarem de formações diferentes do objetivo deste estudo (publicidade, fotografia, cinema, teatro, entre outros);

• Em seguida, organizaram-se os cursos oferecidos por tipo (bacharel ou tecnólogo); e localização (cidade e estado);

• Na segunda análise foi possível observar a concentração de cursos por estados e regiões;

• A fim de selecionar uma região do Brasil para estudo mais aprofundado, adotou-se como critérios de seleção o grupo de maior representatividade, ou seja, o que apresentou o maior número de cursos e instituições: a região Sudeste;

• Em seguida optou-se por avaliar apenas as instituições públicas (federais e estaduais) desta região e o tipo de curso caracterizado como bacharelado;

• Após a seleção da região, da instituição e tipo de curso, partiu-se para uma análise mais aprofundada por meio da busca da descrição dos cursos em seus respectivos sites.

4 RESULTADOS

A partir da consulta das palavras-chave (Design e Desenho Industrial), a busca no portal do MEC (2009) permitiu a visualização de 523 cursos no país. A primeira análise permitiu verificar que alguns destes cursos estavam repetidos e outros não correspondiam a nenhuma das habilitações do design, alocando-se em outras áreas como, publicidade, fotografia, cinema, teatro, entre outros. Ao fim desta análise o número de cursos caiu para 493, o número de Instituições para 257, o número de cursos bacharelado 260 e tecnólogo 233.

O Estado que apresentou o maior número (32%) de cursos de Design/Desenho Industrial foi São Paulo (159 cursos), seguido por Santa

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Catarina (55 cursos), Rio Grande do Sul (43 cursos) e Minas Gerais (39 cursos) conforme Gráfico 01.

Gráfico 01 – Número de cursos de Design/Desenho Industrial no Brasil por Estado

Os dados relacionados ao tipo de curso revelaram que em 10 dos

estados o número de bacharelado é maior que o número de tecnólogos, em 04 o número de tecnólogos é maior e em 08 são equivalentes (Gráfico 02).

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Gráfico 02 – Tipos de cursos de Design/Desenho Industrial no Brasil por Estado

O número de Instituições é maior em São Paulo (72 Instituições)

seguida de Santa Catarina (27 Instituições), Paraná (22 Instituições), e do Rio Grande do Sul (21 Instituições) conforme mostra o Gráfico 03.

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Gráfico 03 – Número de Instituições no Brasil por Estado

A região que apresenta o maior número de cursos é a Sudeste (Gráfico 04). O que coincide com a região que apresenta também o maior número de Instituições (Gráfico 05).

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Gráfico 04 – Cursos por região do Brasil.

Gráfico 05 – Instituições por região do Brasil.

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Gráfico 06 – Tipos de curso por região do Brasil.

O número de cursos do tipo bacharelado é maior na maior parte do

país, no Norte, Nordete, Sul e Sudeste conforme mostra o Gráfico 06, anteriormente.

A investigação das descrições dos cursos disponíveis nos sites das instituições permitiram observar que das 12 páginas acessadas, 02 não disponibilizavam informações sobre o curso no site. As outras 10 restantes tratavam, principalmente, da atuação profissional apresentando as capacidades do designer em sua habilitação. Quanto à área de atuação no mercado, dos textos, 06 comentavam as possibilidades, como agências de publicidade, empresas, indústrias, por exemplo. O objetivo do curso, sempre referindo-se à formar profissionais, sem aprofundar-se em como se dará essa formação, aparece em 07 das páginas pesquisadas. E apenas 02 possuíam no texto a preocupação com a explicação e definição dos termos específicos da área, como significado do termo design, por exemplo.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

De tão extensa, a discussão sobre o termo design já se encontra desgastada. No entanto, os resultados presentes nos vários estudos a este respeito raramente são aplicados. Fato que pode ser ilustrado na exposição dos cursos de design para seus futuros alunos e interessados. Responsáveis pela formação destes profissionais, as instituições, podem contribuir nesta demanda.

Uma breve pesquisa histórica permite averiguar que a distância entre a academia, o mercado e a sociedade perdura desde a implantação do ensino de design no Brasil. E que essa aproximação, não será de fácil solução. Porém, é uma situação que vem se modificando ao longo de tempo com diferentes posturas nas instituições. E assim, ao gerar um profissional que conhece os valores envolvidos na sua formação e atuação, e crítico, cria-se um designer completo.

Sendo também imprescindível comentar a respeito do grande número de cursos e habilitações em Design no Brasil. Um cenário que permite refletir em uma posição bastante otimista quanto à consolidação da profissão, bem como maiores possibilidades de discussão e desenvolvimento de um design nacional o qual deve constituir-se em uma abordagem adequada às condições sócio-culturais do país.

O grande número de cursos e instituições na região Sudeste e Sul revela um quadro de concentração em torno dos eixos de maior desenvolvimento econômico do país o que é compreensível uma vez que o design volta-se para o eixo industrial. Entretanto, mostra um que as regiões Norte e Nordeste, conhecidas pela sua riqueza cultural e de materiais naturais, apresentam-se como eixos com grande potencial de desenvolvimento de um design genuinamente brasileiro, o qual é capaz de aproveitar tais oportunidades no desenvolvimento de novas alternativas a nível industrial que

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sejam capazes de aproveitar matérias-primas ainda não exploradas, bem como ‘designs’ ainda não lapidados. O valor do design brasileiro, também, pode estar escondido no que o Brasil tem de mais característico: sua diversidade cultural e seus recursos naturais.

Havendo, porém, a necessidade de ser mais claro, em sua exposição, aproveitando-se de uma das mídias, a internet, e todas suas possibilidades de comunicação tão utilizadas na atualidade e com tendências a expansão. AGRADECIMENTOS

Este trabalho foi desenvolvido com o apoio da FAPESP por meio dos processos 09/02991-9 e 09/02125-0 e CAPES. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALENCAR, F. Uma Ação Propedêutica Para o Ensino de Design no Brasil. In: I

Congresso Internacional de Design, Arte e Novas Tecnologias: Caminhos, Intercâmbios e Fronteiras, 2006, Lisboa (Portugal). Resumos... Lisboa (Portugal): ISCE - Instituto Superior de Ciências Educativas, 2006.

DENIS, R. Uma introdução à história do design. São Paulo: Edgar Blücher, 2000. LANDIM, P. C. Design/Empresa/Sociedade. Bauru: UNESP, 2009. Tese

apresentada à FAAC - Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação - UNESP para obtenção do Título de Livre-Docente.

GOMES, L. V. N. Ensino: A linguagem do design no Brasil. Design & Interiores.

São Paulo: Projetos Editores, ano 3, n. 16, out. 1989. MORAES, D. Análise do design brasileiro: entre mimese e mestiçagem. São

Paulo: E. Blucher, 2006.

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NIEMEYER, L. Design no Brasil: origens e instalação. 3.ed. Rio de Janeiro: 2AB,

2000. ONO, M. M. Design e cultura - sintonia essencial. Curitiba: Edição da autora,

2006. WHITELEY, N. O Designer Valorizado. Arcos, v. 1, único, p. 63-75, 1998.

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Design para a Experiência Aplicado a Equipamentos de Mobilidade Urbana

Celso Carnos Scaletsky1 Filipe Campelo Xavier da Costa2

1 INTRODUÇÃO

A pesquisa abordada nesse artigo parte do conceito de design estratégico onde o design é compreendido dentro de uma visão sistêmica de um processo complexo de articulação de diversos fatores materiais e imateriais, que visam fornecer respostas a problemas mal estruturados e de caráter aberto. Esse documento descreve os preceitos teóricos que orientam o desenvolvimento de um projeto de pesquisa aplicado às temáticas de Design para a Experiência, Mobilidade Urbana e Cognição.

Designers projetam artefatos que hoje percebemos estarem muito além de objetos materiais. Ao projetarem serviços, eventos ou mesmo um novo aparelho de telefone designers estão pensando em aspectos imateriais como o significado ou as emoções que tais “artefatos” provocarão ou transmitirão aos futuros usuários. Ao conceber seus projetos, designers mobilizam diversos processos ou formas de raciocinar e de gerar idéias. O processo de projeto é um processo de construção de conhecimentos. Em alguns momentos esses conhecimentos mobilizam estruturas e meios para serem obtidos, noutros o conhecimento é obtido de forma imersa na resolução de problemas de design. Vários autores, como Gabriela Goldschmidt, John Gero, Donald Schön e outros, preocupam-se em investigar e melhor compreender os processos que conduzem a construção de conhecimentos projetuais. De forma mais específica, o desenvolvimento de processos de investigação teórica e experimental ligados à cognição, cultura de 1 Doutor em Arquitetura, Professor do Programa de Pós-Graduação em Design UNISINOS (RS) 2 Doutor em Administração, Professor do Programa de Pós-Graduação em Design UNISINOS (RS)

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projeto (e seus métodos, técnicas e instrumentos de projetação) são essenciais tanto para a pesquisa quanto para a aplicação e trabalho em todos os níveis de formação (pós-graduação, graduação e especialização).

O primeiro conceito para melhor compreender o problema dessa investigação refere-se ao conceito de Design para Experiência. O tema ganhou relevância no campo do comportamento do consumidor desde o estudo de Holbrook e Hirschman (1982). Até então, a discussão sobre a consumir não considerava explicitamente o papel dos elementos simbólicos e hedonista que os produtos e serviços poderiam ter na percepção do consumidor. Os autores destacam existe um fluxo de fantasias, sentimentos e diversão em torno dos processos de consumo que até aquele momento eram subestimados pelas organizações no desenvolvimento das suas ofertas e concepção dos seus produtos. Experiências pessoais seriam o resultado de eventos individuais, carregados de significados emocionais resultantes da interação entre o usuário e um conjunto de estímulos, seja relacionados a produtos, serviços ou comunicação.

Os artefatos projetados pelo design podem ser compreendido como tudo aquilo que é, artificialmente, feito pelo homem no sentido de resolver a um determinado problema. Nessa pesquisa tratada por esse artigo, estamos tratando de um problema do cotidiano de centenas de milhares de usuários do transporte coletivo urbano. A qualidade desses serviços no Brasil é, de maneira geral, bastante deficitária. Acidentes, falta de espaço, custo, insegurança são alguns dos aspectos que mais desagradam aos usuários do transporte público. Todos esses somam-se a uma questão de muita importância: o tempo e a sensação sempre presente de demora e atraso que pode ser percebida nos pontos de ônibus da maioria das capitais brasileiras. A questão refere-se a possibilidade de projetar experiências que melhorem as condições dessa espera, bem como a percepção do usuário quanto ao serviço de transporte. Parte-se do pressuposto que uma experiência menos desgastante pode qualificar o transporte como um todo. Para isso, são trabalhados ao menos

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três aspectos: o conceito de projeto inerente a atividade de design, o conceito de Design para a Experiência e como a proposição do uso de novas mídias como elemento propulsor dessa experiência. Ao final, espera-se mensurar o impacto do desenho dessa experiência através dessas novas tecnologias. Tanto a projetação da experiência como a mensuração de seus resultados será possível através de um espaço experimental que chamamos de Laboratório de Estudos Cognitivos no Design. Este laboratório será um espaço para experimentações e observações relacionadas aos processos de projetação e percepção de ambientes projetados. O ambiente físico desse laboratório consiste em um local para que sujeitos (definidos de acordo com um trabalho específico) possam desenvolver atividades e projetos de design que serão filmados através de duas câmeras de vídeo, microfones e um computador para armazenar os vídeos. Ao lado dessa sala, haverá um espaço aonde os pesquisadores poderão permanecer atentos às atividades, sem interferir ou perturbar o trabalho dos sujeitos que estão sendo observados. A idéia é criar um ambiente favorável ao desenvolvimento de projetos e ao mesmo tempo capturar o maior número de traços dos processos criativos por que passam designers e/ou estudantes de design no momento do ato de geração de idéias de projeto. Todos esses traços, sejam os vídeos, os diálogos ou mesmo os desenhos e textos escritos pelos sujeitos serão material de análise e interpretação utilizado pelos pesquisadores. Através de protocolos experimentais, esses dados poderão representar um importante material de pesquisa e avanço na compreensão dos processos de geração de idéias de design. Essa percepção mais abrangente que articula o chamado sistema-produto permite que, sem descuidar da especificidade que envolve a construção de determinado artefato, possamos entendê-lo como parte de um sistema que deve levar em conta uma combinação entre produto, serviço, comunicação e experiência. Nessa perspectiva, ampliam-se os fronts de observação do projeto de interface, da comunicação visual e do serviço em si. Desta forma, coloca-se a justificativa do Laboratório, e se estabelece um

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recorte para as pesquisas que se pretende conduzir – num primeiro momento. O suporte teórico e as principais questões destas pesquisas são apresentadas no item seguinte desta estudo.

2 DESIGN PARA A EXPERIÊNCIA

Pine e Gilmore (1998) apontaram que o consumo do século XXI estaria dentro da ‘economia da experiência”, ou seja, a evolução industrial do século XIX que buscava a padronização e a produção em massa, foi substituída pela customização em massa (produtos/serviços cada vez mais adaptados às necessidades e desejos individuais), que, por sua vez, passa a se caracterizar pela busca da imersão do indivíduo em experiências de consumo, ao invés de simplesmente comprar produtos ou serviços. Em economias cada vez mais dependentes de serviços, a preocupação se configura na geração de experiências baseadas na criação de ambientes que absorvam os clientes de uma forma agradável, memorável e única, sendo os serviços como palcos e os produtos como suportes (Pine e Gilmore, 1998; Schmitt, 1999). Lusch e Vargo (2006) indicam que a lógica dominante dos serviços nas economias nacionais levam a um novo papel do consumidor frente ao processo de compra e consumo. Sua postura passiva perde espaço para um indivíduo que busca a co-autoria na criação do valor de consumo. Não existe valor em ofertas até que sejam utilizados, sendo a experiência essencial para determinar esse valor. A experiência deixa de ser um elemento acessório ao processo de consumo e exerce um protagonismo na construção do valor das organizações.

A conseqüência desse processo é a mudança do papel do design, que nesse novo contexto deixa de ficar apenas no projeto de artefatos, mas no desenvolvimento de experiências ao usuário. O desafio que se impõe é ser capaz de gerar experiências que não sejam apenas cotidianas ou satisfatórias, mas extraordinárias. O psicólogo cognitivista Mihaly Csikszentmihaly aponta

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que atividades que sejam intrinsecamente motivantes3 ao indivíduo, proporcionem prazer em sua realização e levem a um estado profundo de envolvimento e alegria pessoal, são geradores do estado mental de flow (fluxo) e são imprescindíveis para a constituição de experiências extraordinárias. Nesse estado, a sensação de prazer e satisfação são considerados únicos e podem contribuir para que ocorra uma maior engajamento na realização continuada de determinada atividade. Para que ocorra flow, é necessário que exista um maior nível de desafio a ser enfrentado, que demande um alto grau de habilidades para sua execução.

Vários autores discutem sobre a natureza das experiências de consumo. Pullman e Gross (2004, p.551) indicam que são “inerentemente emocionais e pessoais”, sendo dependentes de fatores individuais como histórico cultural, experiências anteriores, humor e traços de personalidade. Forlizzi, Ford e Hanington (2003), assim como Hekkert e McDonagh (2003) indicam que as experiências são singulares, compostas de pequenas experiências relacionadas a contextos, produtos e pessoas, sendo que as próprias experiências não são projetáveis, mas apenas as situações de interação com os usuários. Por essa razão, a denominação de design para a experiência talvez seja uma expressão mais adequada para esse campo ora discutido.

O design para a experiência tem, segundo McLellan (2000), o intuito de “orquestrar” experiências que sejam funcionais, envolventes, atraentes e memoráveis. Isso demanda projetar todos os detalhes do conteúdo e do contexto para o usuário, buscando gerar satisfação emocional e prazer de uso que colabore a experiência percebida do indivíduo (Kurtgozu, 2003). O domínio do design de experiência está além da simples constituição de um 3 Motivação intrínseca caracteriza-se pela fato do indivíduo não estar focado nas recompensas de uma atividade, mas como conseqüência do envolvimento e empenho. Em contrapartida, a motivação extrínseca ocorre quando a atividade é apenas um meio para obter um objetivo externo, gerando normalmente maior tensão e estresse para sua obtenção (Cszikszentmihaly & Cszikszentmihaly , 1988).

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serviço ou um produto, mas no conjunto de atividades de projetação dos processos e sistemas envolvidos que dão suporte para a ocorrência da experiência, assim como as fases anteriores de sua construção, como todo a plena compreensão do contexto do cliente e do contexto de produção. 3 EXPERIENCIA E MOBILIDADE

O que estamos propondo nesse estudo será a investigação do impacto que a materialização de um conjunto de serviços e produtos ligados às novas mídias da informação poderá representar frente aos usuários de transportes coletivos nos momentos de espera com o intuito de provocar experiências memoriáveis e positivas.

Na contemporaneidade percebemos uma crescente demanda por projetos orientados a interação com usuários. Essas formas de diálogo aparecem cada vez mais diversas, inovadoras e fora do ambiente restrito dos computadores pessoais. O iPhone, Nintendo Wii, Microsoft Surface e até mesmo o piano interativo no metrô de Estolcomo4 são exemplos de interações nunca antes imaginadas. Tudo isso é possível graças às novas tecnologias, onde as plataformas de hardware permitem criar soluções diferenciadas e bastante diversas daquelas que costumávamos experimentar. Nesse contexto, o Design de Interação, que pode ser definido como o ramo do Design da Experiência, estuda o relacionamento entre os indivíduos e os artefatos interativos que eles utilizam. Sabemos que o ser humano preza por liberdade, é movido por emoções, relacionamentos e está em constante movimento. Segundo Lipovetsky (2007), graças às novas tecnologias, os indivíduos passaram a ter um uso do seu tempo de forma diferenciada, com práticas mais individualizadas em relação ao passado. A Internet, por exemplo, permite

4 http://www.youtube.com/watch?v=cJbNDubNKEU em 25/6/2010

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estabelecer relações com pessoas no momento em que se desejar. Isso reforça a possibilidade de interação entre os indivíduos e os ambientes em que circula.

Em muitos momentos, no entanto, os indivíduos se deslocam entre diversos lugares e enfrentam, em muitos casos, esperas forçadas. Os ônibus, trens, automóveis, as filas para adquirir produtos / serviços são exemplos de contextos aonde, muitas vezes, é dificultada a sua relação com as outras pessoas. Sua liberdade é afetada assim como seu bom humor, fazendo-o se sentir isolado, tenso e com a sensação de estar perdendo seu precioso tempo.

A pesquisa investiga as possibilidades de se projetar experiências de interação entre usuários e interfaces touch screen como forma de contribuir para que o indivíduo se conecte a uma realidade alternativa e possa, graças ao design de interação e de experiências, realizar suas tarefas de maneira mais prática, mais fácil, intuitiva e até mesmo prazerosa. Neste contexto, além de refletir sobre qual tipo de conteúdo despertaria a atenção e "encantaria" o usuário nesses momentos de espera, cabe também uma investigação sobre as diversas formas de interação entre usuários e interfaces sensíveis ao toque para se projetar de fato experiências relevantes, capazes de resgatar sua individualidade e a relação dessa com redes sociais assim outros aspectos inerentes à natureza humana, como a liberdade / mobilidade, emoção e interação. O conceito de interatividade e de interface, no entanto, é utilizado muitas vezes de forma bastante vaga, cabendo aprofundá-lo.

Em uma perspectiva mais funcional que chega através do design, trazida por Freitas (2005, p. 188):

“interfacear ou atender simultaneamente a dois ou mais pólos de um sistema de informações implica em, de um lado, cumprir com os procedimentos contidos no pólo inanimado, mas planejado e pré-definido do sistema, e de outro lado, atender a demanda de expectativas previsíveis por parte do indivíduo usuário e solicitante.”

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Portanto, pela aproximação dada pelo design, as características da interface web estão relacionadas a decisões tomadas sobre aspectos como arquitetura de informação e usabilidade que resultam em uma estrutura que atende simultaneamente um sistema pré-concebido de informações e um usuário demandante. Estas observações sobre o que caracteriza uma interface, se soam excessivamente mecânicas por aparentemente não entrarem fortemente nas implicações dos processos midiáticos como estamos acostumados a observar nos estudos de comunicação, nos quais a perspectiva da recepção é considerada mais ativamente, ao mesmo tempo são um vetor de percepção que não pudemos desconsiderar.

Dessa maneira, as percepções do design não dão conta isoladamente das questões referentes à natureza das interfaces que se mostram necessárias para seguirmos refletindo sobre nossa problematização.

É preciso conhecer algumas considerações que retomam o caminho que resgatamos por Bolter e Grusin (1999) em relação aos avanços da ordem da informatização que abriram caminho para o computador pessoal com interfaces gráficas digitais. É nesse sentido que iniciamos pela colocação de Manovich (2001) quando afirma que a linguagem – própria – das interfaces gráficas – às quais ele acrescenta o termo “culturais” – está muito ligada a elementos de outras formas culturais consagradas advindas do impresso (printed word), do cinema e das Interfaces Humano-Computador (HCI). Manovich (2001) crê que o impresso, o cinema e a HCI possuem suas modalidades específicas de organizar a informação, estruturando a experiência humana, correlacionando tempo-espaço. Assim, a facilidade de compreensão imediata da linguagem da interface resultaria do fato de que esta seria baseada em formas culturais prévias e familiares. Embora Manovich (s.d.) pareça considerar apenas a primeira parte do movimento de remidiação entre mídias, no caso, das mídias antigas para as novas, ele especulava também em entrevista que “[...] a computadorização da cultura não apenas leva a emergência de novas formas, ela redefine formas já existentes como a

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fotografia e o cinema”. Segundo Manovich (2001), houve uma libertação “física” dos elementos do impresso e do cinema, através da qual um designer digital passa a poder manipular com páginas e vídeos. Os elementos do impresso e do cinema (ou do audiovisual) conviveriam – no âmbito do usuário do computador – com outros elementos da interface homem-computador.

A liberdade que as novas mídias proporcionam, a possibilidade de inserção desses recursos em espaços públicos como pontos de ônibus é o que nos motiva a pensar que podem constituir elementos fortes para a construção de experiências favoráveis aos usuários. 4 METODOLOGIA A SER EMPREGADA

A metodologia mais empregada nas pesquisas sobre cognição em design é a análise de protocolo. Resumidamente, pede-se aos sujeitos que realizem uma atividade, que é filmada e posteriormente analisada. Ao conteúdo da filmagem dá-se o nome de “protocolo”: as ações e verbalizações do sujeito enquanto realizava a tarefa. Há diversas formas de conduzir tal análise, podendo ser variadas, por exemplo: a quantidade de sujeitos; o tempo da tarefa; a tarefa; a estimulação a falar em voz alta enquanto realiza a tarefa; a existência de uma etapa onde o sujeito verbaliza, enquanto observa a filmagem, o que estava pensando / intencionando, posterior à execução da tarefa (conhecida como “investigação retrospectiva”) e a permissão para fazer perguntas ao examinador. Nestes estudos, a maior questão é como codificar o protocolo, ou seja: como classificar, dentro de um esquema rígido, o que aconteceu durante a filmagem.

Em relação aos aspectos metodológicos, Craig (2001) faz uma importante consideração a respeito das implicações teórico / filosóficas em utilizar determinada metodologia de investigação. Numa linha de argumentação similar à de Dorst e Dijkhuis (1995) - a metodologia utilizada além de salientar aspectos diversos da atividade, reflete concepções do

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pesquisador sobre atividades de design - Craig compara as premissas teóricas por trás de importantes metodologias de pesquisa baseadas em análise de protocolos: o think aloud (ERICSSON e SIMON apud CRAIG, 2001) e a análise de conteúdo (CHI, 1997). O primeiro supõe uma relação direta entre o que sujeito fala e o que ele pensa - aquilo que o sujeito verbaliza representa o conteúdo (ou pelo menos parte do conteúdo) da memória naquele momento. Ainda nesta linha metodológica, cita-se o artigo An approach to the analysis of design protocols, de Gero e Neil (1998), que sugeriram uma forma de usar o método think aloud para analisar protocolos de design, permitindo-se criar o esquema de codificação conforme se conhece os protocolos5. Já o segundo método é orientado ao processo de resolução de problema a partir das representações externas (e não a partir da investigação de representações internas). Os protocolos são enriquecidos com rafes e ações correlatas (desvios de olhar, pausas, exame dos desenhos).

Conforme as referências desta seção é possível investigar os processos e as representações em atividades de design. Também se julga que o projeto de interfaces digitais seja uma atividade de design. Porém, esta abordagem cognitiva parece não ser empregada dentro do estudo de projeto de interface (Visser, 2009). Além disso, as pesquisas em Cognição em Design não colocaram, ao longo dos anos, o projeto de interfaces em evidência: provavelmente porque a origem dos pesquisadores desta linha remete às Engenharias e à Arquitetura e que atualmente repercute fortemente na área da Comunicação, na medida em que a emergência da web como mídia trouxe o desafio da concepção de interfaces gráficas digitais como estratégia não só essencial para as organizações, mas intensifica o processo de remidiação os meios de representação (Bolter e Grusin, 1999). Acredita-se haver espaço para a investigação do processo de projeto para sistemas digitais, não apenas para

5 Isto não está previsto na forma original do método, pois, como ele foi pensado para ferramenta de análise para resolução de problemas bem estruturados, a “árvore” que representa os desdobramentos dentro do espaço do problema já seria pré-conhecida.

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compará-los com os “casos prototípicos” da Arquitetura, Engenharia e mais recentemente da Comunicação, mas para entender como diferenças na constituição do problema e nas estratégias de busca e de transformação de estados influenciam e/ou modificam o processo.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em relação às contribuições científicas do estudo em discussão, as análises das observações que estão sendo realizadas são significativas para compreender como um projeto de design para experiências se desenrola, e se ele é divergente dos processos projetuais de outras áreas. No entanto, acredita-se que, pelo fato de esta ser uma área do design onde as regras de transformação de estado costumam ser mais claras – nos padrões de processamento de informação, descritos em Akin (1986) – pode-se esperar algumas diferenças em relação à outras áreas, como a Arquitetura. A hipótese é que estas diferenças se dêem no uso de heurísticas (as regras de transformação de estado) e na forma como os designers interagem com os sketches6. A observação feita em um contexto experimental buscará evidências destas diferenças. Ainda que a intenção não seja estabelecer fronteiras entre o que é e o que não é design, pode-se especular que, caso estas diferenças existam, a forma de ensinar projeto de experiências e projeto de interfaces deva ser investigada mais a fundo. Desse estudo, contribuições acerca do próprio processo de ensino de projeto em design devem ser identificadas e refletidas, principalmente na formação de designers que devem atuar em contextos de grande complexidade, gerando soluções inovadoras e sustentáveis.

Busca-se, igualmente, contribuir socialmente, pensando numa forma de responder de forma criativa o problema cotidiano que muitos usuários do

6 Também conhecidos como rafes: desenhos rápidos.

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transporte público passam. Espera-se, ao final deste projeto, poder mensurar a redução do tempo percebido durante as esperas dos coletivos estimulando, assim, novos comportamentos no que se refere a questão da mobilidade. Se isto se verificar, o projeto terá apresentado uma alternativa de solução para o congestionamento da vias de deslocamento e uma redução de emissão de poluentes. A pesquisa poderá contribuir para o desenvolvimento tecnológico no que tange ao projeto de interfaces digitais. O ciclo de projeto de interfaces digitais, com processos centrados no usuário, apesar de bastante conhecido, não é de dominado fora do meio academico. Como muitos dos pesquisadores deste projeto têm experiência no design de sistemas focados na experiência do usuário, a documentação do processo pode difundir estas práticas além do design, atravessando outras áreas ligadas ao desenvolvimento. Agradecimentos Ao CNPQ pelo apoio recebido para viabilização desse projeto a partir do Edital Universal 2010. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AKIN, Ö. Psychology of Architectural Design.1.ed. Londres: Pion, 1986. BAXTER, M. Projeto de produto: guia prático para o desenvolvimento de novos

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Emoção & Design: Quando a Face Revela o Sucesso do Produto

João Fernando Marar 1 Hailton Ferraz Junior 2

Rodrigo Holdschip 3 Antonio Carlos Sementille 4

Sergio Luiz Busato5

1 INTRODUÇÃO Emoção e Design, caracterizado pelo planejamento de produtos com a intenção de evocar ou antecipar a geração de certas emoções, pode ser facilitado pela compreensão dos processos emocionais (DEMIR; DESMET; HEKKERT, 2009), (DESMET, 2005). O significado das emoções e experiências dos usuários para o domínio do design tem levado a introdução de várias técnicas e ferramentas objetivando a obtenção de informações sobre as interações emocionais de usuários com produtos (BONAPACE, 2002; DEMIR, 2008). Muitas ferramentas têm sido propostas no campo da psicologia para medir as emoções de várias maneiras. Um crescente consenso sugere que as respostas emocionais envolvem a sincronização de vários subsistemas, incluindo as expressões faciais (SCHERER, 2005).

A proposta é empregar técnicas de processamento de imagem para extrair alterações no contexto da face (músculos, sobrancelhas, etc.) e utilizar 1 Doutor em Ciência da Computação, Pós Graduação em Design -FAAC- Unesp, Departamento de Computação - FC-Universidade Estadual Paulista, coordenador do Laboratório Sistemas Adaptativos e Computação Inteligente 2 Mestrando em Ciência da Computação, Pós Graduação em Ciência da Computação -FC- Unesp, Departamento de Computação - Universidade Estadual Paulista, Pesquisador do Laboratório Sistemas Adaptativos e Computação Inteligente 3 Doutorando em Design, Pós Graduação em Design -FAAC- Unesp, Pesquisador do Laboratório Sistemas Adaptativos e Computação Inteligente 4 Doutor em Ciência da Computação, Pós Graduação TV Digital -FAAC- Unesp, Departamento de Computação - FC-Universidade Estadual Paulista, Pesquisador do Laboratório Sistemas Adaptativos e Computação Inteligente 5 Doutorando em Design, Pós Graduação em Design -FAAC- Unesp, Departamento de Computação - FC-Universidade Estadual Paulista, coordenador do Laboratório Sistemas Adaptativos e Computação Inteligente

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o Sistema de Codificação de Ação Facial (FACS – Facil Action Conding System) proposto por (EKMAN, 2002) para poder inferir as emoções representadas por estas alterações.

A teoria de (EKMAN, 2002) divide a face em diferentes grupos de músculos, chamadas Unidades de Ação (AU – Action Unit) e associa estados diferentes para estes. A alteração de estados de um ou mais unidades geram um contexto que poderia ser comparado a uma gramática, onde cada unidade seria um átomo desta gramática e teria seus estados internos.

Devido à densidade do número de estados possíveis que cada átomo pode assumir e, por conseqüência, a densidade do número de estados que o contexto também pode assumir (estimado por Ekman em 10 mil combinações), um processo de inferência linearizada (eg. motor lógico de inferência) poderia resultar numa má convergência dos resultados. Portanto propõe-se a utilização de sistemas dinâmicos como redes neurais auto-organizadas para auxiliar na classificação dos estados (emoções) que a face representa.

Embora toda rede neural auto-organizada tenha um número máximo de classe para representar (HAYKIN, 2001) a importância maior é utilizar de uma arquitetura que possa convergir estados inesperados ou não aprendidos para uma das classes definidas. Assim o número de classes que a rede pode representar não é altamente importante, já que a literatura (EKMAN, 1999; RUSSEL, 1994; PLUTCHIK, 2001) define basicamente apenas seis classes de emoções chamadas primárias: raiva, nojo, tristeza, alegria, medo e surpresa. Em estudos mais recentes Ekman (2002) distingue uma sétima classe de emoção: o desprezo.

Estas expressões emocionais segundo Darvin (1872) e endossado por Ekman (1999) são inerentes à raça ou cultura, ou seja, toda pessoa nasce capaz de fazê-las e identificá-las, embora a maior parte de sua execução e/ou

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identificação seja feita de forma inconsciente. Ekamn (2002) listou os movimentos musculares da face.

Constatando assim a emoção dos usuários no instante em que manipulam certa parte característica ou propriedade do produto pode-se fazer uma pesquisa estatística, com uma amostra de indivíduos pertencentes ao mercado alvo, para levantar quais propriedades possuem um estímulo emocional médio mais elevado e verificar quais causas geram tais estímulos.

Desta forma os projetistas do produto podem coletar as principais emoções, sejam boas ou não, que seu produto e características geram em seus usuários, podendo ser emoções conscientes ou inconscientes, esta ainda mais importante de se captar do que aquela, já que emoções inconscientes praticamente não são apresentadas em um depoimento verbalizado, mas que influem fortemente na aceitação do produto.

A Neurociência (DAMÁSIO, 1996) já ressaltou a importância das emoções na tomada de decisão. Embora muito se discuta sobre o dual Razão versus Emoção, ambas estão intimamente relacionadas e muitas das decisões aparentemente racionais, como comprar um produto, são tomadas de forma instintiva baseado quase que puramente na emoção subconsciente. Portanto saber também definir os pontos que um produto pode explorar subconscientemente nas emoções do usuário é potencialmente valioso para tomada de decisão deste: comprar ou não, usar ou não.

Assim verificados os pontos fracos (que geram emoções negativas) e os fortes (que geram emoções positivas) em seus usuários, a equipe pode concentrar esforços e tomar medidas para reduzir ou eliminar os pontos fracos e exaltar os pontos fortes.

Oliveira e Jaques (2008) apresentam uma aplicação computacional que consiste na inferência das emoções de um usuário na Interação Humano-Computador utilizando o sistema de codificação facial sugerido por Ekman

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(2002). Apresentamos, porém, algumas sugestões de modificação em tal metodologia que julgamos mais apropriada para a devida convergência dos resultados para maior precisão daquela estabelecida em tal artigo.

A metodologia apresentada por Oliveira e Jaques (2008) pode ser dividida basicamente nos seguintes passos:

2 DETECÇÃO DA FACE

A primeira tarefa é detectar a face (FaD – Face Detection) dentro do contexto imagético. Para tal já é de conhecimento em processamento de imagens e visão computacional métodos eficientes de detecção de imagem sobre ambientes controlados em mídias do tipo vídeo como Haar-like Features (VIOLA & JONES, 2001). Tal método consiste na varredura de imagem à procura de padrões de sombreamento que identifiquem certas regiões da face como a região olho-direito/nariz/olho-esquerdo que, pela diferença natural de luminosidade, costuma ser predominantemente escuro/claro/escuro. 3 DETECÇÃO DAS CARACTERÍSTICAS FACIAIS

Detectada a face é preciso depois detectar as características da mesma (FeD – Feature Dectection), que compõem sobrancelhas, lábios, nariz, olhos, bochechas etc. Kobayashi e Hara (1991) apresentam em seu trabalho um sistema de identificação de emoções humanas pela classificação de expressões faciais. Tais emoções são inferidas a sobre condições lógicas parametrizadas por medidas geométricas feitas a partir de pontos na face, denominados FCP (Facial Caracteristc Point); que delimitam extremos de três características básicas: sabrancelhas, olhos e boca, conforme apresentado na Figura 5.

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Figura 5: Localização dos FCPs e parâmetros de normalização

O trabalho apresenta uma forma classificar as seis emoções básicas levando em consideração as alterações apresentadas na disposição dos 30 FCPs no dado instante comparada à suas medidas em um instante de face neutra. Após a detecção destes pontos, medidas de deformação geométricas são utilizadas em inferências lógicas para concluir a ativação ou não de uma das Unidade de Ação (AC – Action Unit) do FACS. A expressão abaixo apresenta a medida de deformação que representa a altura das sobrancelhas, onde an é o FCP n definido por sua localização como apresentado na Figura 5; e x(an) e y(an) suas coordenadas:

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Em termos literais dizemos que a altura das sobrancelhas é a média das alturas de cada sobrancelha, que por sua vez é a média aritmética das ordenadas dos pontos que a definem. Neste trabalho denotaremos por ∆x(i,j) e ∆y(i,j) a diferença entre as abscissas e ordenadas, respectivamente, dos pontos ai e aj:

As medidas que devem ser calculadas para o processamento da próxima etapa são apresentadas na Tabela 1. Embora algumas destas fórmulas possam ser simplificadas, estão apresentadas como se seguem com o objetivo didático de apresentação de como foram elaboradas.

Tabela 1 – Medidas de deformação geométrica e suas fórmulas.

Deformação Medida

Altura das sobrancelhas eb_height

Franzimento das sobrancelhas eb_frowned

Inclinação das sobrancelhas eb_slating

Distância entre sobrancelhas eb_distance

Distância entre sobrancelhas e olhos

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eeb_distance

Abertura dos olhos e_openness

Inclinação dos olhos e_slating

Abertura da boca m_openness

Medida do sorriso m_mos

Alargamento da boca m_width

Altura do lábio superior

mul_height

Altura do lábio inferior

mll_height

Porém antes das inferências lógicas serem feitas é preciso normalizar as medidas de deformação, pois a face capturada pela câmera pode estar transladada, rotacionada, muito próxima ou distante.

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4 DETECÇÃO DAS UNIDADES DE AÇÃO

A partir das medidas de deformação encontradas na etapa anterior pode-se verificar as unidades de ação presentes na face naquele instante. Kobayashi e Hara (1991) apresentam, na Tabela 2, as relações lógicas para inferência das AUs. Nela determinamos a relação lógica que, se verdadeira, indica a existência a unidade de ação na face. Usaremos a notação medida e medida_n para representar as medidas de deformação apresentadas na Tabela 1 no estado corrente e no estado neutro, respectivamente.

Tabela 2: Relações lógicas para a constatação da presença de Unidades de Ação

AU Relação lógica

1 eb_height > eb_height_n + 0.1

2 (eb_frowned < eb_frowned_n + 0.05) ^ (eb_height > eb_height_n + 0.2)

3 -

4 (eb_height < eb_height_n - 0.06) ^ (eb_distance < eb_distance_n + 0.24)

5 e_openness >= (e_openness_n - 0.05)

6 m_mos >= m_mos_n + 0.15) ^ (e_openness >= e_openness_n - 0.2) ^ (e_openness >= e_openness_n - 0.05)

7 (e_openness < e_openness_n - 0.2) ^ (eeb_distance < eeb_distance_n + 0.1)

8 -

9 (m_width < m_width_n + 0.3) ^ (e_openness < e_openness_n) ^ (eb_height < eb_height_n - 0.05)

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10 (mul_height > mul_height_n - 0.3) ^ (mll_height >= mll_height_n - 0.3) ^ (m_openness >= m_openness_n + 0.3)

11 -

12 (m_mos >= m_mos_n + 0.2) ^ (m_width > m_width_n + 0.2)

13 -

14 -

15 m_mos <= m_mos_n

16 (mul_height <= mul_height_n - 0.2) ^ (mll_height < mll_height_n - 0.5) ^ (m_openness > m_openness_n + 0.2)

17 (m_openness < m_openness_n + 0.17) ^ (mll_height < mll_height_n - 0.15)

18 -

19 -

20 (m_width > m_width_n + 0.25) ^ (m_mos < m_mos_n + 0.1) ^ (m_mos + 0.1 > 0)

21 -

22 (m_width < m_width_n - 0.8) ^ (m_openness > m_mos_n + 0.4)

23 m_openness < m_openness_n - 0.2

24 (mul_height < mul_height_n) ^ (mll_height > mll_height_n)

25 m_openness >= m_openness_n + 0.15|

26 (m_openness >= m_openness_n + 0.3) ^ (m_openness <= m_openness_n + 0.7)

27 m_openness >= m_openness_n + 0.7

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Podemos notar que este método não permite identificar as AUs de número 3, 8, 11, 13, 14, 18, 19 e 21; como se pode ver na Tabela 2. A discussão das melhorias para este método segue-se mais a frente.

5 INFERÊNCIA DA EMOÇÃO PRESENTE

Oliveira e Jaques (2008) apresentam uma arvore binária de decisões utilizada para inferir a emoção presente a partir das unidades de ação encontradas. Tal árvore pode ser vista na Figura 6.

Figura 6: Árvore de decisão para inferência de emoção baseada em AUs (OLIVEIRA;

JAQUES, 2008)

Verifica-se que esta arvore não considera, em momento algum, a existência das AUs 2, 3, 6, 8, 10, 11, 13, 14, 16 a 27 como critério de decisão. Além de tentar representar a decisão do sentimento por um modelo demasiado simplista para tal (uma arvore binária), ignora elementos fundamentais da teoria do FACS (uma série de AUs). Mais à frente discutimos esta limitação e sugerimos uma solução para ela. Porém já se pode notar que

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problemas evidentes de convergência dos resultados serão produto desta arquitetura inferencial.

6 PROBLEMAS ENCONTRADOS E METODOLOGIAS PROPOSTAS

O modelo de captação das AUs proposto por Kobayash e Hara (1991) a partir dos 30 FCPs, apresentados na Figura 6, suas respectivas medidas de deformação, apresentadas na Tabela 1, e as relações lógicas para identificação, apresentadas na Tabela 2, podem ser considerado incompleto, pois peca em dois aspectos: a cobertura dos pontos característicos e a não captação de algumas AUs pelas relações lógicas.

Segundo Ekamn (2002) existem basicamente dez regiões do rosto onde as AUs podem ocorrer: glabela, raiz do nariz, pálpebra superior e inferior, sulcos infra-orbital, infra-nasal e naso-labial, triângulo infra-orbital (bochechas), e bojo do queixo. A Figura 7 apresenta estas regiões identificadas:

Figura 7: Principais regiões de ocorrência das AUs

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A distribuição dos FCPs proposta por Kobayash e Hara (1991) não contempla as atividades ocorridas nas regiões da glabela, abertura nasal, sulco/triângulo infra-orbital e bojo do queixo. Estes pontos não utilizados nestas regiões podem levar a conclusão errada da ocorrência de certas AUs ou mesmo a não conclusão de algumas, como visto na Tabela 2, em que algumas AUs não possuem relação lógica a partir de medidas de deformação para verificar sua ocorrência.

Para resolver estes problemas pode-se adicionar novos pontos nas regiões não contempladas, suas medidas de deformação geométrica e respectivas relações lógicas para verificação da ocorrência de AUs nestas regiões. Porém um problema relevante presente na proposta de Oliveira e Jaques (2008) é a forma como estes pontos são identificados. Na proposta destes os pontos são manualmente definidos por um agente humano e posteriormente a isso é feita a analise computacional.

Este caráter semi-automático do sistema inviabiliza completamente sua aplicação, pois a definição manual de FCPs em diversos quadros do vídeo da experiência do usuário com o produto está completamente fora de cogitação. É preciso, portanto, estabelecer um método de definição dos FCPs de forma completamente automática. Que será objeto de estudo posterior deste trabalho.

6.1 Utilização de variáveis densas Outro provável limitante da convergência dos resultados é a análise de ocorrência das AUs a partir de relações lógicas booleanas; que, portanto, permitem apenas a conclusão da ocorrência ou não-ocorrência, que pode levar a conclusão incorreta do sistema. Uma possível solução para esta é a utilização de mecanismos de lógica Fuzzy que retornaria não simplesmente verdadeiro ou falso para a ocorrência de cada AU, mas sim uma medida de probabilidade entre o verdadeiro e o falso (um valor entre 0 e 1) para a possível ocorrência

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de cada AU. Estes níveis intermediários, que os conjuntos Fuzzy fornecem, podem melhorar significativamente a correta conclusão das AUs e, conseqüentemente, a correta inferência da emoção corrente. A aplicação de tais mecanismos é também objeto de estudo posterior deste trabalho. 6.2 Adoção de redes neurais para classificação das emoções O artigo de Oliveira e Jaques (2008) apresenta uma árvore binária como classificador da emoção presente. Tal classificador se mostra limitado não apenas em sua estrutura, cuja simplicidade de uma árvore pode limitar bastante no critério de decisão, mas também em sua composição, pois muitas AUs não são consideradas em nenhum passo do critério, o que pode levar a conclusões errôneas da emoção presente.

Para solucionar tal limitação sugerimos neste trabalho a adoção de um Mapa Auto-Organizável como classificador neural das classes de emoções a partir do vetor de AUs como entrada. Um dos paradigmas de redes neurais artificiais utilizados para a identificação de padrões são os mapas auto-organizáveis, propostos inicialmente por Kohonen (1934), que são grades topológicas geralmente uni- ou bidimensionais. Estes mapas utilizam um processo competitivo para decidir entre os neurônios da rede qual é o vencedor e, portanto, que responderá ao estímulo sendo ativado (Haykin,

2001). Cada mapa utiliza um vetor de entrada , onde é a dimensão

do vetor de entrada; e os pesos das sinapses serão representados por no k-ézimo neurônio do mapa. A Tabela 3 descreve os parâmetros que serão adotados no modelo proposto:

Para esta aplicação podemos usar como vetor de entrada os valores de ativação das AUs; que, como sugerido anteriormente, seriam uma variável Fuzzy dentro do intervalo [0;1] medindo sua probabilidade de

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ocorrência. Cada posição do vetor de entrada seria o respectivo valor da ocorrência de cada AU.

A partir de uma base de treinamento o mapa iria especializar regiões na identificação de cada classe de emoção e assim convergir de uma forma mais apropriada com um modelo dinâmico, ao contrário da arvore estática proposta por Oliveira e Jaques (2008).

Dependendo da dimensão do mapa e da base de treinamento, classes de emoção seriam destacadas e outras entre elas acabariam por gerar uma espécie de gradiente de emoção, em que neurônios entre o neurônio da emoção raiva e novo poderiam sugerir uma emoção híbrida quando da existência de ambas as emoções de maneira equilibrada. Este modelo dinâmico apresenta uma proximidade com a realidade muito apropriado que um modelo estático de uma árvore.

Tal modelo se apresenta apropriado considerando referências da psicologia das emoções como Plutchik (2001) que considera a complexidade da emoção como produto evolucionário das espécies. Plutchik coloca as emoções em um cone que se assemelha bastante ao cone do modelo de cores HSV, como podemos ver na Figura 8. As emoções variam em intensidade crescente do vértice até a face do cone.

Embora este modelo apresente uma segmentação evidente das emoções, na prática o limite que divide uma emoção de outra não é tão evidente e, constantemente, pode ser confundindo por qualquer pessoa. Podemos ressaltar também o trabalho de Russel (2003) sobre Núcleo Afetivo, que coloca as emoções num sistema de coordenadas em duas dimensões cujos extremos dividem-nas ente ativação-desativação e prazer-desprazer, como se pode ver pela Figura 9.

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Figura 8: Modelo circumplexo em três-dimensões da emoção (PLUTCHIK, 2001)

Figura 9: Núcleo Afetivo (RUSSEL, 2003)

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Este modelo coloca em duas dimensões a mesma verificação da presença da emoção bem como a intensidade em que se apresenta. Um mapa auto-organizável de duas dimensões com um número apropriado de neurônios poderia simular esta modelo. Porém o modelo é simétrico, coisa que não pode ser garantida por um mapa auto-organizável. Quanto mais unidades de teste de certa categoria a rede receber, mais especializada em identificar nuances daquela categoria a rede ficará. Se receber mais elementos de emoções positivas (pleasure) os neurônios especializados nestas irão se deslocar para a esquerda tomando parte das emoções negativas (displesure); tornando-se assim capaz de identificar com mais precisão as emoções positivas e suas nuances do que emoções negativas. O mesmo ocorrerá com o treinamento de emoções da alta intensidade (activation) e baixa intensidade (deactivation). A rede tenderá a uma distribuição simétrica dos neurônios à medida que a amostra de treinamento possuir proporções equilibradas das emoções e intensidades.

Este comportamento neural é bastante similar ao biológico. Podemos observar que algumas pessoas conseguem constatar variações de humor mais tênues (i.e. mais próximas da região deactivation) enquanto outras só percebem as variações mais intensas (i.e. mais próximas da região activation). Assim como algumas estão aptas a perceber sinais de emoções positivas enquanto outras tendem a perceber com mais facilidade os sinais de emoções negativas. Muito provavelmente esta aptidão particular de identificar com mais facilidade as nuances de uma ou outra extremidade fora conquistada com o “treinamento” do cérebro nas diversas experiências pessoais vividas.

Pelas razões citadas acima, seja baseado num modelo computacional mais dinâmico, seja baseado nos modelos psicológicos da literatura citada; propomos a adoção de mapas auto-organizáveis como classificadores mais apropriados para a aplicação de emoções. A elaboração deste classificador será objeto de estudo posterior deste trabalho.

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7 ARQUITETURA DO SISTEMA

O sistema proposto terá sua arquitetura dividida em três módulos principais: 7.1 Processamento de Imagem Não as técnicas e filtros utilizados para capturar e tratar a imagem, deixando-a o mais apropriada possível para que a captura dos FCPs e análise geométrica da face, no módulo seguinte, possa ser feita da melhor forma. Este módulo, devida sua natureza, será composto por funções e métodos puramente estáticos.

7.2 Análise Geométrica da Face Captura dos FCPs, já com modificações sugeridas na metodologia para melhor abranger as AUs não atendidas no método de Kobayash e Hara (1991). Cálculo das deformações geométricas e verificação da existência de AUs na imagem. O produto deste módulo será um vetor Fuzzy com as probabilidades de existência de cada AU no contexto analisado. Assim o segundo módulo apresentaria uma estrutura em parte estática, que seria o posicionamento dos FCPs, e em parte dinâmica, que seria a inferência variável Fuzzy para identificação da unidade de ação.

O desafio maior deste módulo consiste na captura dos FCPs, pois como relatado por Oliveira e Jaques (2008) isto ainda é feito de forma manual. Propomos a pesquisa de um método automático que possa capturar os FCPs com a precisão necessária para o calculo correto das deformações geométricas da face. Mesmo em um ambiente controlado o posicionamento preciso destes pontos é um desafio relevante.

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7.3 Inferência da Emoção Dado o vetor de AUs encontradas o mesmo será lançado em uma rede do tipo mapa auto-organizável bidimensional devidamente treinado, como descrito na metodologia, para que o neurônio vencedor possa indicar a emoção presente na face naquele instante. Por constituir-se basicamente de uma estrutura neural, o terceiro módulo possuirá a arquitetura mais dinâmica dos três módulos.

Será objeto de estudo se, além de inferir a emoção, a intensidade será verificada a partir da localização do neurônio no mapa, como no Núcleo Afetivo de Russel (2003) ou se será elaborada uma terceira dimensão para a intensidade, aproximando a rede neural do modelo proposto por Plutichk (2001).

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A investigação deverá produzir diversos resultados, destacando-se principalmente as seguintes produções técnicas:

• Um Ambiente Colaborativo Aumentado dirigido ao Design de Produto. • Um Banco de Dados de objetos virtuais e cenários virtuais, composta

de modelos geométricos bidimensionais e tridimensionais, e de mapas de texturas.

• A integração com um Sistema Inteligente para Seleção de Materiais. • Uma metodologia para desenvolvimento de projetos utilizando

facilidades de Realidade Aumentada. Repercussão e/ou impactos dos resultados:

• A criação de um ambiente de pesquisa em Realidade Virtual e Realidade Aumentada aliados conjuntamente com sistemas cognitivos para inferência de emoções por maio de analise de expressões faciais, voltada especialmente ao Design de Produto.

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• Produção de vários trabalhos de conclusão de curso, iniciações científicas, dissertações de mestrado e subsídios para um doutorado, nas áreas de Ciência da Computação, Desenho Industrial e Design de Produto.

• Como impactos futuros, espera-se que o trabalho possa ser desdobrado para incorporar técnicas de estereoscopia, visando aumentar ainda mais o realismo do Ambiente Colaborativo Aumentado. Além disso, com base no sistema a ser desenvolvido, espera-se que o sistema distribuído possa ser futuramente estendido à Internet, o que permitirá a participação de usuários remotos.

• Capacitação de pessoal para dar continuidade às pesquisas e desenvolvimentos na área.

• Produção de documentos científicos para a publicação. No que diz respeito as publicações, o presente projeto de pesquisa deverá subsidiar a publicação de artigos completos em anais de eventos científicos nas áreas afins, bem como, em periódicos de abrangência nacional e internacional, oriundos dos trabalhos de conclusão de curso, iniciações científicas, dissertações de mestrado e doutorado.

Agradecimentos

O presente estudo vem sendo desenvolvido com o apoio do CNPq, Processo 308275/2009-8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BONAPACE, L. Linking Product Properties to Pleasure: the sensorial quality

assessment method - SEQUAM. In: GREEN, S.; JORDAN, P. W (Eds). Pleasure with Products: beyond usability. New York: Taylor & Francis, 2002. Cap. 15, p. 190-217. ISBN 0-203-34525-8.

DAMASIO, António. O erro de Decartes , Lisboa: Pan Macmillan, 2006

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HAYKIN, Simon. Redes Neurais: princípios e prática. trad. Paulo Martings Engel

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Emoção e Design: Aspectos Teóricos e Práticos da Ciência Cognitiva no Desenvolvimento de Modelos

Conexionistas para o Auxilio no Projeto de Produtos

João Fernando Marar 1

1 INTRODUÇÃO

Os avanços científicos e tecnológicos ocorridos no final de século passado, englobando os processos produtivos, a redução dimensional dos componentes e o surgimento de novos materiais e seus processos de fabricação, vem contribuindo progressivamente para uma liberdade maior na concepção formal dos produtos industrializados. O aparecimento dos produtos eletrônicos interativos e da realidade ampliada intensificaram o debate sobre os aspectos comportamentais, psicológicos e cognitivos que envolvem o ser humano e o mundo artificial. Neste contexto cabe aos designers o desafio de encontrar formas de aliar a tecnologia à dimensão cultural, atuando como intérpretes entre a produção e os usuários. Assim, através deste enfoque que começa a delinear uma nova abordagem para o design de produtos, onde a arte, a ciência e as tecnologias possam encontrar uma posição de equilíbrio, desempenhando funções complementares e não antagônicas neste universo profissional.

1 Doutor em Ciência da Computação, Pós Graduação em Design -FAAC- Unesp, Departamento de Computação - FC-Universidade Estadual Paulista, coordenador do Laboratório Sistemas Adaptativos e Computação Inteligente

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2 CIÊNCIA COGNITIVA: INTRODUÇÃO

Ciência Cognitiva é a designação genérica para um conjunto de esforços interdisciplinares visando a compreender a mente e sua relação com o cérebro humano. Desse esforço fazem parte as seguintes grandes áreas: as neurociências, a psicologia, a linguística, a filosofia e a inteligência artificial. O projeto cognitivista é amplo o suficiente para abarcar diferentes enfoques e modelos. Devem-se distinguir alguns eixos centrais nessa comunhão de credos científicos. As Figuras 12 e 23 ilustram a grande dimensão desta área.

2 ANDLER, D. Sciences Cognitives. Encyclopaedia Universalis. Paris: Encyclopaedia Universalis France S.A, vol. 1, 65-74, 1989.

3 LE MOINE, J. – L. Genèse de Quelques Nouvelles Sciences: de l'Intelligence Artificielle aux Sciences de la Cognition. In : J. - L. Le Moine (Org.), Intelligence des Mécanismes, Mécanismes de l'Intelligence, 15-54. Paris: Fayard, 1986.

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Primeiramente, há um denominador comum histórico de reação ao behaviorismo ou comportamentalismo, doutrina psicológica e filosófica que domina a primeira metade do século 20. O behaviorismo, ao tentar elevar uma psicologia científica, procurou subtrair dela o apelo aos intermediários invisíveis: A mente e seus processos. Purificar da contaminação por entidades não-observáveis, o estudo da mente seria doravante o estudo do comportamento observável e mensurável. Entre o estímulo ambiental e a resposta comportamental poderia haver o que se quisesse, porém supunha-se que esses intermediários fossem mente ou cérebro, seriam desnecessários para explicar as leis que relacionavam o estímulo, a resposta e os condicionamentos sobre eles. O projeto ruiu, embora tenha dado frutos interessantes.

Em seu lugar surgiu, por volta dos anos 50, um reavivamento da

doutrina segundo a qual a mente é um aparato processador de informação e que basicamente manipula símbolos ou representações por meio de regras

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lógico-computacionais. Grande parte do sucesso dessa primeira grande guinada para os modelos computacionais da mente deveu-se ao aparecimento de programas de computador capazes de provar teoremas matemáticos. A mente seria, então, nessa chamada inteligência artificial simbólica, o resultado da operação computacional por meio de regras e de símbolos mentais, devidamente traduzidos em algoritmos.

Por intermédio das leis lógicas poderiam construir-se programas que simulassem as leis mentais, simples cadeias de inferências válidas. A mente nessa visão seria um programa (software) e o cérebro um meio físico (hardware), não-exclusivo, daí poder-se replicar o processo em outros meios físicos (nas máquinas).

Essa versão simbólica da inteligência artificial cedeu lugar, embora continue em franca atividade (modelando principalmente processos linquísticos), a uma classe neurofisiológica de modelos matemático/biológicos, chamados redes neurais ou inteligência artificial conexionista. Nelas não há divisão de nível entre o programa e o meio físico, e a possibilidade de aprendizado é mais consistente com o que o ser humano realiza na sua constante exposição a exemplos, a partir dos quais retira suas generalizações.

Recentemente outros modelos invadiram a cena da modelagem da mente e do cérebro sob o rótulo de ciência cognitiva. Entre eles cabe citar o uso de sistemas dinâmicos não-lineares, que podem exibir bifurcações (Teoria das Catástrofes) e caos, sistemas quânticos, que supõem haver base quântica, isto é, não algorítmica, na consciência, e também as idéias de vida artificial, com a construção de robôs que aprendam interagindo com os outros e com o meio ambiente.

Redes neurais Artificiais São arquiteturas computacionais que pretendem, no futuro, imitar o

modo de processamento de que cérebros lançam mão para resolver inúmeros problemas. Surgidas na década de 50, ficaram relativamente desacreditadas

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até os anos 80, quando passaram a constituir modelos com bases neurofisiológicas.

A classe de tipos de redes neurais dedicada a simular o pensamento e a inteligência é chamada de inteligência artificial conexionista. Sua construção real (por meio de neurônios artificiais) ou a sua simulação em computadores digitais se dá graças a três artifícios: A definição matemática do neurônio; Uma arquitetura de conexão (uma rede contendo muitos "neurônios" conectados) e Um algoritmo de aprendizagem (elemento responsável pela correção de erros da rede ). O grande elemento que distingue as redes neurais de outras arquiteturas computacionais (como o computador que usamos em nossa casa e trabalho atualmente) é que não há distinção entre software (programa) e hardware (placa e processador). Os múltiplos neurônios artificiais conectados em rede são capazes de passar por uma fase de treinamento em que, dado um determinado problema, vão aprendendo a melhor maneira de ajustar as sinapses de suas conexões de tal forma a resolvê-lo.

Esse problema pode ser, desde o reconhecimento de uma face e também as emoções contidas nela até a solução de um impasse decisório que envolva o projeto de um produto baseado em novos materiais. Como não há um conjunto de regras claras para programar um computador nestes casos, usa-se uma rede neural que vai, aos poucos, sendo treinada para imitar um profissional experiente.

Embora, as redes neurais, sejam extremamente úteis e interessantes na solução de um sem-número de problemas, elas ainda se baseiam numa visão relativamente simplista do cérebro (baseado no conhecimento cientifico e tecnologias atuais). Assim, espera-se com o desenvolvimento da ciência cognitiva e de novas tecnologias a oportunidade de criação de sistemas mais competentes e próximos a versatilidade humana, sejam uma realidade em um breve futuro.

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Consciência A consciência é um dos grandes mistérios para a ciência. Embora

povoada de idéias, sensações, emoções, vontade e liberdade, é considerada função mental dificilmente explicável em termos cerebrais. Argumenta-se que, mesmo que se explique que a sensação de dor de um indivíduo em um dado instante corresponde a um determinado padrão de funcionamento cerebral (por exemplo, o disparo de potenciais nas fibras de dor), ainda assim serão problemas diferentes: 1) a dor vivenciada pelo sujeito e 2) o disparo de corrente elétrica nas fibras nervosas. Isto ocorre, porque o sujeito sabe que sente dor e não sabe que as fibras condutoras de dor estão funcionando naquele momento (distinção entre significado e referência de uma proposição).

Para que se possa encaminhar cientificamente o problema da consciência, é preciso dividi-lo em duas ocorrências diversas: a primeira diz respeito ao modo como o cérebro produz o fenômeno da consciência; a segunda, como o indivíduo experimenta a sensação de estar consciente de algo. A ciência contemporânea tem uma boa hipótese para o modo como se dá o surgimento da consciência: populações de neurônios reunidos em pequenos grupos (assembléias) são responsáveis por detectar partes de cada objeto, cena, idéia, sensação etc. Fazem-no, gerando potenciais de ação, corrente elétrica, que funciona como se fosse um oscilador vibrando numa determinada frequência.

Em certas situações, diferentes assembléias de neurônios, representando cada uma das partes de um objeto (ou uma idéia ou qualquer outra coisa que povoe o mundo mental), entram em sincronismo, como se fosse rádios sintonizados. O problema da vivência de consciência pelo sujeito é considerado mais difícil, havendo quem acredite ser impossível resolvê-lo cientificamente. Há aqueles que acreditam que, a vivência de consciência é uma propriedade semelhante à transição de fase por que passa a água quando

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aquecida além de 100oC ou abaixo 0oC . A água evapora (ou congela) e mudam as características perceptíveis do sistema. Entretanto, tanto vapor quanto o gelo manterão inalteradas as moléculas químicas da água.

Grandes quantidades de assembléias neuronais sincronizando podem suscitar fenômeno idêntico, levando o sistema a exibir a propriedade da auto-inspeção ou consciência subjetiva. Mais ainda, essa concepção é compatível com algum grau de controle da porção cerebral consciente sobre a porção não-consciente, o que explicaria mecanicamente a vivência de vontade e de liberdade sobre a ação. 2.1 Ciência Cognitiva: As Bases Tecnológicas

Alan Turing, em 1936, concebeu a idéia de uma máquina simples que utilizava a lógica para executar cálculos. Mais adiante, Turing sugeriu a avaliação de uma máquina que simulasse o pensamento humano, implementada por Neumann com o armazenamento de um programa em memória. Com isso, as operações podiam ser preparadas e executadas internamente, sem que fosse necessário reprogramar as tarefas a cada vez que era ligado o computador.

A partir destes estudos, Claude Elwood Shannon, no final dos anos 30, formalizou o conceito da teoria da informação. Shannon considerou a utilização de duas alternativas possíveis de resposta através da ocorrência de bits (binary digit em inglês), baseado nos estados dos relés eletromecânicos, ligado e desligado. Pela teoria da informação de Shannon, a informação poderia ser reduzida, assim como os termos verdadeiro e falso do cálculo proposicional, a um dígito binário, que é a quantidade mínima de informação necessária para escolha de uma mensagem afirmativa ou negativa, 1 ou 0.

Foram os insights de Norbert Wiener que levaram Shannon à proposição de dissociação da informação e seu meio transmissor. “Informação é informação, não matéria ou energia. Nenhum materialismo que não admita

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isto pode sobreviver nos dias atuais”[1]. Posteriormente a esses fatos, Warren McCulloch e Walter Pitts, no início dos anos 40, defenderam a tese de que uma rede neural formada pelas conexões dos neurônios poderia ser modelada em termos da lógica, ou seja, um neurônio sendo ativado impulsionaria outro neurônio e isso implicaria numa proposição. Uma analogia entre neurônios e lógica poderia ser pensada em termos elétricos – como sinais que passam ou deixam de passar através de circuitos. Em função disso, a ciência da computação recorreu às pesquisas sobre neurônios e suas conexões para projetar máquinas ou programas cada vez mais parecidos com o cérebro humano.

Os primeiros movimentos da ciência cognitiva junto a era tecnológica, aconteceram em 1948, no Simpósio de Hixon (sobre mecanismos cerebrais do comportamento), realizado no Instituto de Tecnologia da Califórnia, onde a questão clássica de discussão foi a forma pela qual o sistema nervoso central controla o comportamento. Esse simpósio foi especialmente importante por dois fatores: a ligação que fez entre cérebro e o computador e o desafio implacável que lançou ao behaviorismo. O behaviorismo cuja idéia principal baseia-se na análise de condutas observáveis, ou seja, evitando conceitos “mentais”. Por não tentar explicar os processos cognitivos, o behaviorismo, demonstrou suas falhas no sentido de ser superficial, o que deu lugar ao surgimento de novas idéias. Neste sentindo, foram lançados elementos teóricos por John Von Neumman, Warren McCulloch e Karl Lashley, estabelecendo, assim, comparações sistemáticas entre o funcionamento do cérebro humano e máquinas (computador eletrônico). Mas a consolidação do reconhecimento da ciência cognitiva, por um consenso quase unânime, deu-se a partir do Simpósio sobre Teoria da Informação realizado no Instituto de Tecnologia de Massachusetts em setembro de 1956.

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2.2 Ciência Cognitiva: As Bases Filosóficas e a Teoria da Complexidade A filosofia, até a segunda metade do século XX, tinha como

pressupostos inquestionáveis a racionalidade e a objetividade. Desde Platão a mente é considerada a parte mais nobre do ser humano, e o corpo, a sensibilidade, a emoção tornaram-se obstáculos ao conhecimento. Dessa forma, até hoje ainda se suprime, em nome da consciência e do conhecimento, a dimensão erótica da existência. Foi a partir de Kant, que se estabeleceu a cisão entre cognição e os sentimentos e desejos, não como uma condição natural e necessária para o conhecimento, mas como uma supressão da dimensão erótica da existência. Tais aspectos se encontrariam ligados à tradição ascética religiosa e filosófica, da qual Kant é herdeiro, em contraste com a busca de pureza espiritual ou racional.

Ao demonstrar como o modelo de objetividade possui em sua base a desvalorização filosófica de Eros, a interpretação de emoção e desejo como poluentes tornou-se fundamental para a construção da racionalidade com base na pureza. Devido à ameaça de descontrole da racionalidade suscitada pela emoção e pelo desejo, estabeleceu-se a oposição entre Eros e cognição. Assim, a hegemonia da cognição sobre Eros não teria embasamento científico e, seria, portanto, uma relação de poder profunda com origens na religião grega ascética e no cristianismo. Somente no final do século XX é que a questão do Eros e da subjetividade tornaram-se categorias epistêmicas importantes tanto quanto a racionalidade e a objetividade, para a aquisição do conhecimento.

A imagem tradicional da cognição tende a restringi-la aos processos e produtos da mente humana. Essa imagem inclui os processos mentais superiores, tais como o conhecimento, a consciência, a inteligência, o pensamento, a imaginação, a criatividade, a geração de planos e estratégias, o raciocínio, as inferências, a solução de problemas, a conceitualização, a classificação e a formação de relações, a simbolização, a fantasia e os sonhos.

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Além desses foram acrescentados outros componentes como os movimentos motores organizados e a percepção, as imagens mentais, a memória, a atenção e o aprendizado, todas as variedades de cognição social e os usos sócio comunicativos da linguagem.

Os estudos de Varela [2] sobre psiconeuroimunologia colocam o sistema imunológico como um “segundo cérebro”, o qual regula a si mesmo e controla as reações do corpo em relação ao ambiente. A interação mente, sistema nervoso e sistema imunológico fornecem a base fisiológica para a influência das emoções sobre a saúde. Os neurocientistas estabelecem, de imediato, na mente uma igualdade entre os estados emocionais, perceptivos ou cognitivos e a atividade neural. A dicotomia cognição/emoção torna-se cada vez mais difícil de conceber, assim como a relação corpo/mente, tendo-se em vista as descobertas na Física, Biologia, Neurociências e Ciências Cognitivas. Guardadas as devidas diferenças metodológicas e epistemológicas, os recortes teóricos realizados para tentar dar conta de uma explicação mais abrangente sobre o funcionamento do cérebro e as condições de aprendizagem, demonstram em linguagens diferentes observações que podem ser complementares.

A questão da interdependência ou indissociabilidade, seja entre organismo e meio/entorno aparece mesmo que a leitura se dê sob a ótica de dois sistemas separados ou de um único sistema, onde um componente não existiria sem o outro. Logo, o que sabemos e pensamos é inseparável de nossas emoções, e interagem de maneira substancial e significativa com nossa personalidade. Cada processo tem importância vital na operação e desenvolvimento de outros processos, afetando-os e sendo afetado por eles. A mente humana não é um conjunto de componentes cognitivos independentes, mas um sistema de componentes em interação, organizado de forma complexa. A noção de imaginário surgiu como uma categoria de suma importância na atualidade, por permitir uma nova compreensão dos

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fenômenos. Como novo paradigma deve ter seus estudos cada vez mais aprofundados, pela possibilidade de compreensão de fenômenos obscuros, contraditórios e de difícil explicação. O imaginário seria, portanto, a estrutura fundamental sobre o qual todas as atividades simbólicas, as imagens, seriam geradas.

A metacognição envolve um processo recursivo que não pode ser apartado do processo imaginário, pois as imagens subjazem a qualquer processo mental. Refletir, planejar, organizar estratégias, usar o conhecimento previamente adquirido, acessar informações relevantes, tudo isto está impregnado de imagens que levam a um processo criativo. Diante da impossibilidade de separar o pensamento de sua capacidade imaginária, cogitou-se refletir sobre a questão da invenção levantada por Kastrup [3] que distingue “invenção” e “criatividade”, onde esta seria entendida como uma capacidade ou função de criação, distribuída por todos os indivíduos. Ela é entendida como uma habilidade a serviço da solução de problemas, e por conseguinte, da inteligência. A cognição seria, no sentido de suas possibilidades, criação, transformação e processualidade, mas traria em sua base a inventividade intrínseca, ou seja, a cognição seria inventiva. A idéia de invenção porta tanto o sentido do ato ou processo de criar como o sentido de seu produto, pois revela o caráter indissociável entre uma cognição inventiva e uma cognição inventada.

A teoria da complexidade de Morin [4] nos ajuda a tentar juntar as partes deste mosaico de teorias sobre a cognição e sobre o homem. Segundo Morin, terminou a era da teoria fechada, fragmentária e simplista do homem, para começar a era da teoria aberta, multidimensional e complexa. O cérebro não deve mais ser concebido como um órgão, mas como “o epicentro organizacional de todo o complexo bioantropossociológico”, pois ele é o sistema integrador/organizador central onde se comunicam o organismo individual, o sistema genético, o ambiente ecossistêmico, o sistema

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sociocultural. A complexidade do pensamento indica o paradoxo do uno e do múltiplo, na convivência inquieta e estimulante da ambigüidade, da incerteza e da desordem. Cabe ao ser humano interpretar os aspectos da ambigüidade sem desconsiderar a multidimensionalidade do real, ou seja, os vários caracteres do fenômeno. Somente com flexibilidade na concepção de ciência pode-se avançar com o conhecimento.

3 UMA PERSPECTIVA FUTURA DO DESIGN

Em geral, os projetistas fazem uso dos desenhos técnicos que contém quatro tipos de informações: a forma (e as dimensões das partes), os materiais (das partes que serão fabricadas), os processos de fabricação a serem utilizados e a maneira pela qual as partes devem ser montadas para formar o produto final.

O design não avançará, no Brasil, se ele não se tornar parte integrante e fonte das estratégias publica-privadas. É difícil imaginar um avanço expressivo do design sem que a indústria esteja numa fase produtiva de criação, no sentido mais amplo de seu desenvolvimento. A existência de políticas de fomento à indústria em geral, melhor articuladas à política macroeconômica, criam condições mais favoráveis ao desenvolvimento próprio de tecnologia e design. É necessário perceber e fomentar o caráter científico que se encontra associado a arte, a cognição, a tecnologia e inovação que emerge do Design.

Essas considerações não pretendem menosprezar a importância das questões estético-formais nos produtos industriais, afinal a história do design está fortemente ligada às vanguardas artísticas [5]. Além disso, a forma está relacionada, também, com os aspectos culturais e semânticos do produto, que vêm adquirindo cada vez mais importância no contexto do design contemporâneo. A valorização dos conhecimentos tecnológicos deve

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acontecer sem que ocorra uma desvalorização da arte no design de produto, pois a relação do design com a arte diz respeito à interpretação dos valores culturais de uma sociedade e da transmissão destes valores através da forma e da relação que o objeto estabelece com o usuário.

A forma é um dos muitos aspectos que devem ser levados em conta em um projeto e não é um fenômeno isolado. Deve ter relação direta com as outras variáveis que envolvem o produto. Não é possível, então, classificar o design como uma atividade ligada à arte ou à tecnologia, mas, isto sim, ligada à arte e à tecnologia. O design é uma atividade projectual multidisciplinar que conjuga e harmoniza conhecimentos dessas duas áreas, entre muitas outras. Assim, para a sua evolução, o Design nacional deve avançar em consonância com o Estado da Arte cientifico e tecnológico.

4 SISTEMAS INTELIGENTES

A procura por máquinas inteligentes na área de Inteligência Artificial pode seguir por dois caminhos distintos que têm como ponto de partida estudos oriundos da própria inteligência humana. O primeiro caminho corresponde à abordagem simbólica ou programada de Inteligência Artificial que é fortemente influenciada pelos estudos em Psicologia. Os trabalhos pioneiros nesta área apareceram na década de 60 com os trabalhos de John McCarthy [6], Allen Newell-Hebert Simon [7] e Marvin Minsky [8]. O segundo caminho corresponde à abordagem conexionista [9-10] que parte dos estudos de Neurofisiologia com os trabalhos pioneiros de McCulloch e Pitts [11], Hebb [12], Rosenblatt [13], entre outros.

A computação clássica baseada na arquitetura de Von Neumman não é competente, quando aplicadas a tarefas consideradas inteligentes, ou seja, tarefas que requerem uma computação distribuída, localizada e adaptativa. Um exemplo típico da ineficiência da computação clássica é encontrado nos

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processos de representação, armazenamento e processamento de imagens. Tarefas como reconhecimento de manuscritos, processamento de voz humana, modelagem de objetos 3D, reconhecimento de faces e suas emoções, entre outras, requerem novos modelos computacionais, para que sejam resolvidas eficientemente.

A pesquisa em Design é interdisciplinar nas áreas de Filosofia, Inteligência Artificial, Ciência Cognitiva, Neurociências, Teoria da Computação/Matemática Computacional, Engenharia de Software e Processamento de Imagens/Sinais, Projeto de Produto, integrando conhecimentos fundamentais, para modelar, investigar e implementar Ambientes Computacionais Inteligentes. Tal aspecto interdisciplinar, nessas áreas específicas, surge naturalmente, quando se pretende criar sistemas artificiais aplicados a tarefas que envolvem identificação de interfaces naturais entre o homem e máquinas.

Dentro das áreas mencionadas, destacam-se as seguintes contribuições:

• Filosofia: Fornece o instrumental necessário para a reflexão acerca da origem dos conceitos que orientam nosso pensamento e das práticas que dele se derivam; a reflexão sobre a realidade atual e a criação de novos conceitos que nos permitam fazer frente às mudanças ocorridas nas últimas décadas.

• Inteligência Artificial: A Inteligência Artificial conexionista provê modelos de redes neurais que são utilizados no processo de aprendizagem, comportamento inteligente e reconhecimento de padrões.

• Ciência Cognitiva: Fornece conhecimentos para permitir o desenvolvimento de aplicativos específicos, desenvolvidos com a premissa de que “se nós realmente entendermos como as pessoas adquirem

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conhecimentos, então seremos capazes de melhorar a sua formação intelectual e consequentemente o seu desempenho”4.

• Teoria da Computação/Matemática Computacional: Fornece os conhecimentos básicos em termos de especificação de modelos matemáticos, complexidade, computabilidade e técnicas de computação universal de funções.

• Engenharia de Software: É responsável pela parte de implementação dos ambientes computacionais inteligentes, utilizando técnicas de especificação formal, corretude, orientação a objetos, ambientes de prototipagem e conceitos de multimídia.

• Processamento de Imagens: Fornece a metodologia para a aquisição, representação, visualização, processamento, segmentação, extração de características e, finalmente, o reconhecimento e interpretação de imagens.

A proposta desta investigação parte do pressuposto de que o cenário internacional das pesquisas em Design mostra uma crescente demanda por atividades inteligentes, criando metáforas projetuais a partir da Biologia, Neurofisiologia, Matemática, Computação e Seleção de Materiais e seus processos de fabricação. E esta é uma das áreas do conhecimento onde o Brasil pode competir a curto e médio prazo, considerando a disponibilidade de pesquisadores, educadores, especialistas capacitados e a existência de demanda no mercado nacional e internacional.

5 NATUREZA

O estudo possui um caráter interdisciplinar nas sub-áreas de Inteligência Artificial, Ciência Cognitiva, Neurociências, Projeto de Produtos,

4 Anderson, J. (2000). Cognitive Psychology and its Implications. 4a ed. San Francisco, W.H.Freeman.

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Seleção de Materiais e Processos de Fabricação, Teoria da Computação, Processamento de Imagens e Matemática Computacional, apresentando contribuições de natureza Filosófica (Epistemologia da Inteligência), teórica ( Modelos computacionais não tradicionais, Matemática computacional) e prática (Softwares Aplicativos para auxilio ao desenvolvimento de Produtos).

6 OBJETIVOS

Investigar a dicotomia existente entre a cognição e a emoção, as descobertas realizadas em várias áreas do conhecimento comprovando a inseparabilidade de tais aspectos e seus benefícios em Projeto de Produtos

Realizar o desenvolvimento de ambientes computacionais inteligentes que possibilitem uma ampliação do domínio da aplicabilidade das máquinas em tarefas que envolvam a inteligência humana. Os diversos trabalhos que contemplam este projeto pretendem atender às necessidades de pesquisa para o desenvolvimento de ambientes computacionais inteligentes são distribuídos nas áreas de Inteligência Artificial, Teoria da Computação, Engenharia de Software e Processamento de Imagens e têm seus objetivos esperados como segue:

• Inteligência Artificial-(Redes Neurais): O desenvolvimento das pesquisas em redes neurais deve ser progressivo e uniforme nas áreas de modelagem, aplicações e implementações. Cada um destes três tópicos possui uma forte correlação com os outros, e o não desenvolvimento de um deles influência para o enfraquecimento dos demais.

1. Em modelagem de redes neurais serão necessários estudos fundamentais dos diversos modelos de redes neurais já existentes em termos de neurônios, arquiteturas e algoritmos de aprendizagem, para que se

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desenvolvam melhorias, bem como estudos que levem à elaboração de novos modelos.

2. As pesquisas em aplicações de redes neurais devem ser concentradas em problemas de compressão, identificação, classificação e reconhecimento de imagens para melhorias no desenvolvimento de sistemas digitais de Seleção de Materiais Dentro destas perspectivas, será realizada uma análise do problema de adequabilidade da aplicação de certos tipos de redes na solução de certas classes de problemas.

3. As implementações serão dirigidas para a realização de ambientes computacionais para simuladores de redes neurais e softwares aplicativos dedicados a tarefas específicas para o auxilio no desenvolvimento Projeto de Produtos . • Teoria de Computação: Os objetivos concentram-se na

definição de um modelo de especificação universal de redes neurais, relacionando paradigmas de redes que podem ser modelados nesta especificação através de modelos matemáticos, visando à liberação da necessidade de simular redes neurais em ambientes computacionais, uma vez que técnicas formais são muito mais confiáveis, embora mais difíceis de serem aplicadas em problemas reais.

• Engenharia de Software: Nesta área, o objetivo é construir um ambiente para dar suporte à realização completa de experimentos com redes neurais, investigando técnicas de especificação formal e orientação a objetos, para produzir uma descrição precisa das propriedades do software e propiciar a reusabilidade de definições e rotinas. Devido à crescente

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diversidade de neurônios e algoritmos de aprendizagem, é imprescindível um ambiente de simulação que seja flexível e que permita uma rápida incorporação de novos paradigmas.

• Processamento de Imagens/Sinais: O objetivo, ao nível de aquisição, é desenvolver um protocolo que controle todos os dispositivos envolvidos no processo de identificação/classificação das classes de padrões existentes. Ao nível de pré-processamento, o objetivo é definir rotinas específicas para filtrar os padrões adquiridos pelos diversos dispositivos de aquisição, visando uma melhor qualidade e adequabilidade do processamento. Ao nível de extração de características, o objetivo é o de implementar rotinas baseadas em técnicas tais como: momentos invariantes, análise de componentes principias, redes neurais e outras específicas, criando um objeto de características com redundância de informações que possibilite uma classificação (com certas facilidades) para os padrões. Tais características são representadas e armazenadas com padrões protótipos. Ao nível de reconhecimento, classificação e identificação, o objetivo é fazer uso de técnicas de reconhecimento de padrões, utilizando abordagens clássicas (simbólica e estatística) e Redes Neurais (sob vários paradigmas), onde os vários processos fornecerão classificações parciais para uma decisão final tomada por um classificador não linear.

Vários outros objetivos relevantes estão presentes no

desenvolvimento do trabalho, tais como: 1. Geração de um conjunto de dados que possibilitem a

aplicação de técnicas de processamento de Imagens/Sinais em características físicas de materiais, para realizar estudos comparativos em reconhecimento de padrões. Dentro das metas, está a geração de

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um conjunto de dados de materiais. em especial trataremos como estudo as madeiras.

2. Análise de propriedades fundamentais vários modelos de redes que emergem de características inerentemente diferenciadas ao nível de neurônios, arquiteturas e algoritmos de aprendizagem. Como exemplos de propriedades fundamentais temos: a generalização, discriminação, atenção seletiva, auto-organização, agrupamento, saturação, saída auto-desejada e outras.

3. Investigar a adequabilidade de diferentes técnicas, quando aplicadas na execução de diferentes tarefas, e a caracterização de parâmetros de construção das redes.

4. Realização de estudos comparativos de desempenho do reconhecimento de diferentes tipos de redes neurais e métodos clássicos de reconhecimento de padrões para variados tamanhos do conjunto de treinamento, número de funções de ativações, tempo gasto e a complexidade computacional durante a fase de treinamento, memória requisitada e outros.

5. Desenvolvimento de Material didático para o aproveitamento destes resultados no ensino, pesquisa e extensão.

7 ORGANIZAÇÃO DOS ESTUDOS Devido à interdisciplinaridade/complexidade envolvidas nesta

investigação a descrição do estudo é particionada em vários sub-estudos que se desenvolvem especificamente, para que possam ser aglutinados, criando, assim, as técnicas básicas que viabilizam a construção dos ambientes integrados, de caráter multidisciplinar que desenvolveremos neste projeto.

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7.1 Investigação de Modelos Cognitivos Baseados em Visão E Percepção: Abordagem a partir das Neurociências sobre o processo da visão.

Observação detalhada da fisiologia cerebral ligada à visão mostra diversas possibilidades através das quais os estímulos visuais podem ser percebidos pelo cérebro. Os conhecimentos das neurociências demonstram que os processos de percepção ocorrem em localizações observáveis em uma topologia cerebral. Pesquisa anterior relacionada com o tema, mostrou importantes questões sobre a visão e a percepção, tal como estudado por Roger Sperry e David Hubel, ganhadores do Nobel de medicina ou fisiologia em 1981 sobre o tema e por David Marr, neurocientista e psicólogo inglês, compiladas no livro Vision, que propõe em sua teoria uma abordagem computacional.

Os estudos a serem desenvolvidos sobre a visão focam-se na percepção de imagens com representação tridimensional, tendo como objetivo, conhecer as possibilidades do sistema visual, visando a obtenção de dados para aplicação em sistemas de realidade virtual. Produtos como visores virtuais, cinema 3D, estereogramas, TV tridimensional e os novos meios de comunicação são algumas das possibilidades de aplicação dos dados.

Como procedimentos metodológicos, serão desenvolvidos testes que através da visão controlada permitam identificar a correlação entre as configurações da visão e sua percepção pelo cérebro e pelo intelecto.

7.2 Aspectos da Emoção na Concepção de Novas Metodologias para o Design de Produtos

Em decorrência da atual similaridade dos produtos em relação as suas características técnicas, de qualidade e de valia, com mais freqüência as qualidades emocionais dos produtos têm se tornado um diferencial vantajoso. Em decisões de compra, as respostas emocionais evocadas por produtos têm se tornado um fator decisivo, pois somente os aspectos relacionados a

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funcionalidade e usabilidade do produto não são mais suficientes para satisfazer as exigências dos atuais consumidores.

O interesse pelos aspectos emocionais referentes à interação indivíduo-produto foi intensificado nos últimos anos pelo desenvolvimento de estudos multidisciplinares envolvendo diversas áreas do saber. Recentes pesquisas procuram identificar quais características dos produtos se associam a determinados tipos de emoções, tornando-se um dos temas centrais do design. Apesar desses esforços, até o presente momento, pouco se sabe sobre como as pessoas respondem emocionalmente aos produtos e quais aspectos do design ou de interação desencadeiam determinadas reações emocionais. Isso se justifica pelo fato de que, produtos podem evocar diferentes tipos de emoções, e essas por sua vez, se diferem individualmente em relação as resposta emocionais dadas para um determinado produto, o que torna o conceito de emoção abrangente, indefinido e pessoal.

Diante desse novo cenário design/mercadológico, no qual emoções desempenham importante papel na aprovação ou não de produtos, faz-se necessária um estudo dos aspectos relacionados ao design e emoção aplicados em produtos, objetivando o desenvolvimento de uma nova ferramenta capaz de identificar e dimensionar com maior exatidão as respostas emocionais evocadas por estes. Acredita-se que um instrumento capaz de possibilitar o dimensionamento das respostas emocionais possa apoiar a compreensão e a exploração das relações entre as características do design de produtos e suas subjetivas respostas emocionais, além de ser bastante motivador, dado ao seu alcance no que diz respeito as possibilidades de obtenção de sucesso no desenvolvimento de novos produtos, contribuindo para desenvolvimento de novas metodologias projetuais que incluam os aspectos emocionais dos produtos integrando-os aos aspectos de usabilidade e funcionalidade. Para tal finalidade, será realizada uma revisão bibliográfica, buscando-se o “estado da arte” do assunto em questão, identificando as características a serem

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estudadas existentes no design de produtos capazes de evocarem emoções em seus consumidores. Identificar e avaliar através da experimentação os instrumentos atuais dimensionadores de emoções, além do desenvolvimento um novo instrumento dimensionador de emoções e testá-lo.

7.3 Aspectos Cognitivos do Produto Aplicada à Seleção de Materiais e Processos de Fabricação

A partir da constatação da necessidade de diálogo entre a ciência da Engenharia de Materiais e o profissional Designer de Produtos desenvolve-se o projeto de um Sistema de Informação para Seleção de Materiais e Design de Produtos. Este sistema é composto por dois subsistemas: o Sistema Digital de Informação (SDI), e uma Coleção Ordenada de Amostras (COA), também referida por Materioteca. O sistema propõe-se como uma ferramenta de diálogo entre as ciências e consequente agente de desenvolvimento do processo de Seleção de Materiais e Processos de Fabricação (SMPF) na projetação de produtos.

Cada subsistema possui características intrínsecas de desenvolvimento e estruturação dos conteúdos específicos. O SDI caracteriza-se como unidade central de informação, distribuído, de acesso remoto via web, e metodologias específicas de SMPF. Na COA, prevalece o caráter material das amostras, pelo seu meio físico de apresentação, propiciando atividades complementares ao SDI e outras metodologias de SMPF.

Tal configuração demanda recursos distintos de comunicação entre o usuário e o sistema global. No SDI há a necessidade estruturar e organizar este ambiente de informação para ajudar o usuário a satisfazer suas necessidades de informação de forma efetiva. A Arquitetura de Informação (AI) ocupa o papel de planejar e criar os caminhos e ferramentas que possibilitarão ao usuário encontrar as informações desejadas de forma compreensível e

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confiável, através da projetação do fluxograma informacional, para que a informação certa seja acessada pela pessoa certa, no momento certo [14].

Porém, apesar dos diferentes meios de comunicação, existem características comuns de desenvolvimento em suas metodologias. Ambos são iniciados pelo reconhecimento e definição dos objetivos do usuário e de cada tipo de sistema; então a projetação do mapa de navegação para o alcance de tais objetivos, considerando que o uso do recurso de metáforas pode ser utilizado para incrementar o grau de reconhecimento do sistema pelo usuário. O terceiro passo constitui-se na elaboração das interfaces comunicativas para interação e a apresentação da informação para o usuário. Tais fases metodológicas são condicionantes como subsídios para o estabelecimento do processo de comunicação entre usuário e sistema.

Para o mapeamento do fluxo integrado dos subsistemas, SDI e COA, agregando as metodologias de SMPF, é fundamental o estudo dos processos cognitivos do usuário, inter-agente, do modelo mental do usuário em relação aos subsistemas e ao sistema integrado, das possíveis relações estabelecidas entre usuário e sistema, e dos recursos mais apropriados para a completude da tarefa com o sucesso esperado.

7.4 Aspectos da Neurociência Computacional Aplicada ao Estudo de Emoções no Projeto de Produto

O que é o cérebro? Que circuitos neuronais são ativados, que alterações químicas ou humorais ocorrem em nosso cérebro quando processamos ou armazenamos uma informação ou quando executamos um movimento voluntário ou reflexo? Como o cérebro se organizou ao longo da escala evolutiva, para determinar o nível de complexidade do raciocínio lógico, do aprendizado e da consciência dos homens? Que sistema analítico dinâmico poderia responder com precisão estes mecanismos?

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A resposta a estas perguntas constitui um dos principais tópicos de discussão na fronteira das ciências naturais e a interpretação da percepção da vida e suas origens. Qualquer que seja o nível de desenvolvimento intelectual, todo humano, se faz estas perguntas e se esforça para compreendê-las. Desde os tempos imemoriais, o problema de estabelecer as questões sobre mente e cérebro rodeiam as cabeças mais notáveis da ciência humana atraídas pela inquietude de estabelecer conhecimentos científicos e filosóficos para este binômio. Este problema de entender como o cérebro funciona e os elementos que emergem de seu funcionamento recebeu soluções diversas, conforme a época ou o grau de civilização, mas sempre foi motivos de grandes debates entre dois campos filosoficamente distintos: o da matéria e o da interação entre matéria com o imaterial.

Um exame de como a relação entre mente e cérebro poderia ser concebida parece forçar-nos a optar por dois tipos de alternativas básicas: ou os estados mentais são apenas uma variação ou um tipo especial de estados físicos (monismo); ou os estados mentais e subjetivos definem um domínio completamente diferente — e talvez à parte — dos fenômenos físicos (dualismo). A primeira sugere que existem apenas cérebros e que os estados subjetivos podem ser apenas uma ilusão a ser desfeita pela ciência. A segunda aposta na existência de algo a que chamamos "mentes" que, para alguns, só poderia ser explicado pela religião ou pela adoção de uma visão mística do mundo.

É nesse sentido que o problema mente-cérebro é também visto como um problema ontológico: é preciso saber se o mundo é composto apenas de um tipo de substância, ou seja, a substância física, e se a mente é apenas uma variação desta última, ou se, na verdade, nos defrontamos com dois tipos de substâncias totalmente distintas, com propriedades irredutíveis entre si. Por outras palavras: há duas substâncias ou uma só? Há uma realidade ou pelo menos duas? Se há duas realidades, um mundo da matéria e outro imaterial,

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de que lado devemos situar as mentes? Questões desta natureza apontam fortemente o sentido de nosso desconhecimento.

Podemos começar considerando que tipo de estratégia poderíamos adotar para abordar esse problema, nossa visão se apóia em duas questões principais:

Uma delas consiste em apostar no avanço progressivo da ciência e supor que o problema da relação mente e cérebro seja um problema empírico, ou seja, um problema científico como qualquer outro que algum dia acabará por ser desvendado. Entretanto, sob esta visão, poderemos concluir, um dia, que o cérebro é mais complexo que nossa inteligência e não seremos capazes de desvendá-lo. Um problema que ultrapassa os limites daquilo que a ciência possa vir a esclarecer.

O grande avanço da neurociência nos últimos anos e a progressiva e tentadora possibilidade de explicar a natureza do pensamento através da estrutura eletro-química do cérebro seria uma boa razão para adotar essa estratégia.

Nesta investigação, vamos nos ater ao mundo dos seres vivos possuidores de cérebro, assumindo o pressuposto materialista. Residiremos a nossa atenção ao cérebro e elegeremos a Neurociência Computacional como fonte te inspiração para a compreender e simular aspectos de emoção no âmbito de projeto de produto.

7.5 Um Ambiente Colaborativo Aumentado dirigido ao Design de Produto – Seleção de Materiais

A produtividade em Design de Produto, como em diversas áreas, depende de como, efetivamente, as idéias de projeto podem ser representadas e compartilhadas entre os membros de uma equipe de desenvolvimento. Uma forma de melhorar esta produtividade é através da aplicação das tecnologias de Realidade Aumentada (RA). Por meio do uso

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destas tecnologias, as quais podem inserir informação digital no ambiente físico de trabalho, tem-se uma promissora solução para o problema da colaboração enfrentada pelos projetistas. A RA pode inovar na forma que os designers projetam. Inovações raramente chegam completamente desenvolvidas, capazes de provocar uma rápida redução nos custos das empresas. Elas são alteradas, refinadas e reinventadas por meio da difusão do processo. É, portanto, importante que os usuários das tecnologias de RA possam ser participantes ativos neste processo de inovação. A RA tem, atualmente, sido amadurecida do campo da pesquisa pura para certas aplicações industriais práticas, mas ainda não foi implementada como ferramenta real na área de Design de Produto.

Considerando o contexto exposto, é proposto neste projeto, o desenvolvimento de um Ambiente Colaborativo Aumentado dirigido ao Design de Produto, de arquitetura modular, o qual, com base na utilização das técnicas de Realidade Virtual e RA, deverá permitir a criação dinâmica de cenários aumentados que suportem a colaboração face-a-face entre projetistas. Por meio deste sistema, uma equipe de projetistas poderá se comunicar, compartilhar e interagir com modelos tridimensionais (3D) gerados por computador.

Neste sistema, cada projetista possuirá um Head Mounted Display (HMD) com uma webcam associada, bem como rastreadores de posição. Com o uso da RA baseada em vídeo (video see-through), cada projetista poderá observar os modelos 3D, bem como os outros projetistas, participantes do mesmo ambiente. As ações realizadas por um determinado projetista sobre o modelo serão refletidas, em tempo real, aos demais. Um módulo de arbitragem será desenvolvido para permitir o correto compartilhamento de estado entre os participantes. No entanto, as ações realizadas pelos projetistas não estarão restritas aos mesmos. É interessante que o projetista que não possua o HMD possa, ainda, visualizar o ambiente. Para isto, prevê-se o uso de

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um projetor, o qual projetará em uma tela, a cena aumentada, através da perspectiva de uma câmera externa. Os objetos virtuais (que representam os elementos compartilhados no Design de Produto) serão corretamente posicionados e manipulados na cena aumentada, por meio da utilização de marcadores fiduciais passivos, definidos pelo usuário. O sistema deverá, portanto, ser capaz de gerar uma cena aumentada, para cada participante, composta de elementos reais e virtuais, coerente com a profundidade, ou seja, permitirá a oclusão entre os elementos, baseada na posição dos mesmos na cena.

Agradecimentos

O presente estudo vem sendo desenvolvido com o apoio do CNPq, Processo 308275/2009-8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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[11] McCULLOCH, W.S. e PITTS,W.(1943). A logical calculus of the ideas

immanent in nervous activity. Bull. Math Biophys, 5: 115-133. [12] HEBB,D.O..(1949) The organization of behavior. Wiley. [13] ROSENBLATT,F.(1962) Principles of neurodynamics. Spartan Books. [14] ROSENFELD, L.; MORVILLE, P.(2002) Information Architeture for the World

Wide Web. 2 ed. O´Reilly. [15] VENAYAGAMOORTHY,G.K et al (2004) Function Approximations with

Multilayer Perceptrons and Simultaneous Recurrent Networks, Conference on Neuro-Computing and Evolving Intelligence, Auckland, NewZealand, December 13-15, pp. 28-29.

[16] GOVENDER, P. et al (2004) Neural Network Based Predictions of Herbivore

Distribution Patterns in a South African Game Reserve, Neurocomputing

Metodologias em Design I N T E R - R E L A Ç Õ E S

211

and Evolving Intelligence Conference, Auckland, New Zealand, December 13 -15, pp. 77

[17] CHENNAMSETTY,N.K. et al (2004) Facial Expressions Classification Using

Learning Vector Quantization Networks, Artificial Neural Networks in Engineering Conference ANNIE 2004, St. Louis, USA, November 7 - 10.

[18] SZU, H. et al (1992) Neural networks adaptive wavelets for signal

representation and classification. Optical Engineering, pp 31: 1907-1916.

[19] ZHANG, Q. e A. BENVENISTE,A.(1992) Wavelet networks. IEEE T. on Neural

Networks, pp 3:889-898,1992. [20] FERAUD,R.,CLEROT,F.(2002) A methodology to explain neural network

classification. Neural Networks. 15(2):237-46.

212

Estratégias de Aprendizagem e de Avaliação para o Ensino de Métodos de

Design de Produto

Rita Maria de Souza Couto 1 Ana Verônica Pazmino2

1 INTRODUÇÃO

Este capítulo apresenta estratégias de aprendizagem e de avaliação com ênfase na aprendizagem significativa para o ensino de métodos de projeto para curso de graduação em design. Trata-se de estratégias que visam que os alunos das disciplinas de metodologia de projeto e projeto de produto possam aprender de forma significativa os métodos de projeto e para que o processo de projeto seja efetivamente um ato de reflexão.

2 ENSINO E APRENDIZAGEM

O professor tem um papel fundamental na qualidade do ensino, a

ação docente deve ser significativa, relevante e competente. GIL (2008, p. 19)3 menciona que “Para ministrar determinada disciplina, o professor precisa conhecê-la com profundidade bem maior do que a exigida pelo programa. Isto é importante para que ele possa ressaltar os seus aspectos fundamentais e esclarecer acerca de suas aplicações práticas”.

Para Masetto (2001, p.84)4 a qualidade da formação do profissional exige muito mais dos alunos que apenas uma reprodução das informações que

1 Doutora em Educação PUC Rio, PUC RiO 2 Doutora em Design PUC Rio, Univille SC 3 GIL, Antonio Carlos. Metodologia do ensino superior. Atlas. São Paulo, 2008. 4 MASETTO, Marcos T. Atividades pedagógicas no cotidiano da sala de aula universitária: reflexões e sugestões práticas. In Temas e textos em metodologia do ensino superior. Organizado por CASTANHO, Sergio e CASTANHO, Maria Eugenia. Papirus Editora, 83-102 pp. 2001

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eles receberam em sala da aula. Para elevar a qualidade do ensino de graduação é preciso buscar atividades pedagógicas que sejam mais eficientes e mais eficazes para colaborar com a aprendizagem dos alunos e melhorar a qualidade dos cursos.

Pimenta e Anastasiou (2008)5 mencionam que há certo consenso de que docência no ensino superior não requer formação no campo de ensinar. Para as autoras nesse conceito, o professor é aquele que ensina, ou seja, dispõe os conhecimentos aos alunos. Elas ainda comentam que na maioria das instituições de ensino superior, incluído as universidades, embora os professores possuam experiências significativas e mesmo anos de estudos em suas áreas específicas, predomina o despreparo e até um desconhecimento cientifico do que seja o processo de ensino e de aprendizagem pelo qual são responsáveis ao assumirem a docência.

O que caracteriza o exercício da docência universitária pode ser mostrada nas palavras de BENEDITO (1995, p. 120)6 “[...] o professor universitário aprende a sê-lo mediante um processo de socialização em parte intuitiva, autodidata ou, o que é pior, seguindo a rotina dos “outros”. Isto deve-se, sem dúvida à inexistência de uma formação específica como professor universitário”.

Para Gil (2008) o panorama acima se altera devido ao surgimento de uma visão mais crítica do ensino, na medida em que maior número de pessoas chega à universidade, que os cursos se tornam mais específicos e que o controle sobre a qualidade do ensino e a capacitação docente decai.

Isto conduz a percepção da necessidade do professor universitário adquirir conhecimentos e habilidades pedagógicas.

Pelo mencionado acima é que este capítulo busca oferecer estratégias de aprendizagem e avaliação sustentadas em uma teoria de 5 PIMENTA, Selma Garrido; ANASTASIOU, Léa das Graças Camargos. Docência no Ensino Superior. São Paulo: Cortez, 2008. 6 BENEDITO, Antolí Vicente et al, La Formación universitária a debate. Barcelona: Universitat de Barcelona, 1995.

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aprendizagem. A teoria da aprendizagem significativa mostrou-se adequada para o ensino de design. Pois, ela visa a aquisição de novos significados, considerando que o processo de aquisição de informações do aluno resulta numa alteração, quer das informações recentemente adquiridas, quer do aspecto especificamente relevante da estrutura cognitiva, à qual estão ligadas as novas informações, considerando que a significação é uma questão individual. A seguir é apresentado um resumo da teoria significativa para maior entendimento.

2.1 Aprendizagem significativa

Para Ausubel (2003) defensor desta teoria de aprendizagem cognitiva, o fator isolado que mais influencia na aprendizagem é aquilo que o aluno já sabe, cabendo ao professor identificar para ensinar de acordo. Nesse aspecto, novas idéias ou informações podem ser aprendidas e retidas, na medida em que conceitos relevantes estejam adequadamente claros e disponíveis na estrutura cognitiva do aluno, e funcionem como ponto de ancoragem às novas idéias e conceitos.

Para Moreira (1999), o conceito central da teoria de Ausubel é que a aprendizagem significativa é um processo por meio do qual uma nova informação relaciona-se com um aspecto especificamente relevante da estrutura de conhecimento do aluno. Ou seja, este processo envolve a interação da nova informação com uma estrutura de conhecimento específica existente na estrutura cognitiva do individuo.

Ausubel (2003) recomenda o uso de organizadores prévios que sirvam de ancora para a nova aprendizagem e levem ao desenvolvimento de conceitos que facilitem a aprendizagem subsequente. O uso de organizadores seria uma estratégia para deliberadamente manipular a estrutura cognitiva, a fim de facilitar a aprendizagem significativa. Organizadores prévios são materiais introdutórios em nível alto de abstração e generalidade apresentado

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antes do material a ser aprendido em si. A função do organizador prévio é a de ser uma ponte cognitiva entre o que o aprendiz já sabe e o que ele deve saber.

3 PLANO DE ENSINO PARA A DISCIPLINA DE METODOLOGIA DE PROJETO

As estratégias de aprendizagem e avaliação devem fazer parte de

um plano de ensino que inicia com a formulação de objetivos, ou seja, com a definição do que se espera que o aluno seja capaz de fazer após a conclusão de uma disciplina. Estes objetivos geralmente são expressos em termos do comportamento esperado dos alunos. Sendo assim, serve de diretrizes para o professor selecionar o conteúdo, escolha das estratégias de ensino, avaliação e determinação dos recursos a serem utilizados. Os objetivos definem as questões relacionadas com a aprendizagem do aluno, bem como tudo que deverá ser feito para torná-la mais fácil, e significativa.

Considerando que as estratégias de aprendizagem e avaliação se apóiam na aprendizagem significativa, se propõe como objetivo geral da disciplina de Metodologia de Projeto o seguinte: Integrar os conhecimentos relativos à metodologia de projeto de maneira a desenvolver a capacidade reflexiva do aluno no desenvolvimento de um projeto de design, de forma que ele seja capaz de realizar análise, síntese, conceituação e organização das ações realizadas ao longo do processo projetual na concepção de produtos industriais.

Os objetivos específicos estão relacionados ao comportamento esperado do aluno ao final das unidades da disciplina ou das aulas administradas. Os objetivos propostos são tanto de domínio cognitivo7 como

7 Domínio cognitivo refere-se aos objetivos ligados a conhecimentos, informações ou capacidades intelectuais (GIL, 2008, p. 46)

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de domínio afetivo8. Assim, os objetivos específicos para a disciplina de Metodologia de Projeto são:

1. Identificar os diversos métodos de projeto (técnicas e ferramentas) aplicáveis a cada fase projetual; 2. Solucionar problemas de diversas complexidades e abordagens de um projeto de design; 3. Aplicar técnicas e ferramentas de forma coerente e reflexiva em um projeto; 4. Analisar os elementos constitutivos do projeto; 5. Organizar os diversos elementos de um projeto; 6. Sintetizar os elementos de um projeto para criar soluções; 7. Desenvolver projetos em equipe; 8. Avaliar as melhores soluções; 9. Perceber a importância do trabalho em equipe; 10. Discutir sobre temas relacionados à atividade profissional; 11. Aceitar que o consenso faz parte do trabalho em equipe.

Os objetivos específicos são operacionais, ou seja, possibilitam que

ao final de cada bimestre ou semestre, possa-se verificar em que medida os mesmos foram alcançados a partir das atividades desenvolvidas pelos alunos. Dessa forma, devem ser avaliados pelo professor no final do ano. Os objetivos buscam: Incentivar a formulação de perguntas e questões que digam respeito ao aluno e que lhe interessem; Permitir ao aluno entrar em contato com situações concretas e práticas de sua profissão; Envolver o aluno como pessoa, abrangendo idéias, sentimentos, cultura, valores, sociedade, profissão; formular questões e problemas de uma maneira nova e não familiar.

8 Domínio afetivo abrange os objetivos relacionados com sentimentos, emoções, gostos ou atitudes (GIL, 2008, p. 46)

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Para incentivar a participação continua do aluno, o planejamento de ensino deve incluir as seguintes estratégias de aprendizagem: Estudo de Texto; Apresentação das tarefas do projeto e Aula expositiva dialogada. Estas estratégias serão detalhadas no seguinte item. 3.1 Estratégias de aprendizagem ou ensinagem

As estratégias de aprendizagem ou de ensinagem visam à consecução dos objetivos do planejamento de ensino. Assim, as estratégias buscam alcançar uma aprendizagem significativa por parte dos alunos.

Buscando uma maior motivação dos alunos, torna-se necessário perceber o feedback dos mesmos; identificar o nível de conhecimentos e expectativas deles. Assim, a estratégia proposta sugere a Aula Expositiva Dialogada, que se apresenta como uma forma de superar a tradicional palestra docente. A diferença em relação à aula expositiva tradicional é que a dialogada busca a participação do aluno, que terá seus comentários considerados e respeitados. Busca também um clima de empatia, respeito, cordialidade, e troca na classe. Almeja que o domínio teórico passado pelo professor possibilite a interrupção com perguntas, observações e exemplos sem que o professor perca o controle do processo. A seguir a estratégia no Quadro 1 mostrando a identificação, sua conceituação, uma descrição da estratégia e da possível forma de avaliação.

No ensino de métodos de projeto é necessário primeiro conhecer os alunos, identificar se a modalidade de aprendizagem predominante é visual, auditiva ou cinestésica, pois, dependendo do grupo de estudantes, a aula expositiva dialogada poderá precisar de elementos auxiliares para obter uma maior eficiência na aprendizagem. Isto pode ser feito por meio de questionários.

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Quadro 1 Estratégia da aprendizagem: Aula Expositiva Dialogada Fonte: Adaptado de Anastasiou (2006, p.79)9

Além de uma aula expositiva se propõe a Estratégia de aula prática.

Esta busca apresentar exemplos práticos da aplicação dos métodos de projeto no desenvolvimento de um produto. A aula visa que os alunos em equipes realizem atividades em contato com a realidade e atendendo o processo de projeto. A partir de diversos exemplos a equipe pode ver os inputs e outputs de forma que pode aplicar em seu projeto. O Quadro 2 mostra a estratégia em detalhe.

9 ANASTASIOU, Léa das Graças Camargos. Ensinar, aprender, apreender e processos de ensinagem. In. Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. / organizado por ANASTASIOU e ALVES. 6. ed.- Joinville, SC : UNIVILLE, 2006.

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Quadro 2 Estratégia da Aula Prática Fonte: da autora

O contato com a realidade concreta da aula prática propicia que o

aluno valorize a teoria. Os alunos necessitam para exercer sua profissão como designers, de uma consistente preparação teórica, vinculada à atividade prática de desenvolver projetos. Assim, junto com a Aula Prática se sugere a aplicação da Estratégia por Projetos que é considerada uma das mais completas atividades pedagógicas coletivas. A elaboração do projeto está relacionada à situação profissional do designer, a uma situação real para satisfazer as necessidades do cliente.

A estratégia identifica um problema de projeto e a partir dessa problematização os alunos em equipes devem desenvolver produtos ou serviços para solucionar o problema. Para isto, é interessante que sejam formadas equipes que devem realizar as seguintes atividades: coleta dados, análise de informações, síntese de dados, seleção de métodos a serem aplicados, busca criativa de soluções e resolução do problema de projeto.

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O trabalho em projeto é a prática profissional do designer. Aplicá-la em sala de aula permite que o aluno, fazendo parte de uma equipe, experimente uma situação próxima do real. Isto exige o trabalho em grupo, a partilha de idéias, o respeito às ideias dos outros, a busca de um consenso em prol de uma solução melhor. O quadro 3 mostra a descrição desta estratégia.

Quadro 3 Estratégia por Projeto Fonte: da autora

A estratégia acredita na capacidade criativa do aluno fundada na

análise e síntese de informações, na sua elaboração de saberes e no trabalho em equipe. Para isto, o docente deve estimular a curiosidade, evitar a preguiça mental, evitar os bloqueios mentais, auxiliar os alunos no entendimento da teoria e sua aplicação na prática, induzir a soluções criativas, estimular a apresentação oral para os colegas e produção escrita dos resultados. A forma de avaliação desta estratégia utiliza a apresentação oral, na qual os alunos em equipes apresentam o processo de realização do projeto por meio de fases, etapas, tarefas e métodos de projeto. O Quadro 4 apresenta a descrição da estratégia de apresentação oral.

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Quadro 4 Estratégia apresentação Fonte: da autora

A estratégia de apresentação desenvolve a desinibição, expressão,

crítica e criatividade. Sendo que cada equipe deve desenvolver um projeto diferente, as trocas de informações contribuem com o entendimento e a construção do pensamento projetual.

Outra estratégia de ensinagem é o Estudo de Texto que permite a construção de conceitos feitos coletivamente. Esta é uma forma de obter um retorno dos alunos, bem como dos mesmos desenvolverem o respeito pela opinião do grupo e fomentar o hábito da leitura e interpretação de textos. É habitual perceber na universidade que os alunos chegam com dificuldade de leitura e interpretação de textos, por isto recomenda-se que o texto a ser trabalhado seja escolhido depois de conhecer a turma, pois assim se o hábito de leitura não estiver interiorizado pode-se escolher um texto simples e que se refira ao campo de atuação do design. Se a turma mostra um bom hábito de leitura podem ser passados textos mais complexos. A estratégia de Estudo de Texto é mostrada do Quadro 5.

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Quadro 5 Estratégia da aprendizagem: Estudo de Texto Fonte: Adaptado de Anastasiou (2006, p.80)

Na aplicação desta estratégia, deve-se evitar dividir o texto em

capítulos e distribuí-los entre as equipes. Recomenda-se, que o texto seja lido por todos, capítulo a capítulo.

Também se recomenda evitar solicitar aos alunos a leitura do texto em sua totalidade e a elaboração de um resumo, pois esta não é uma operação mental simples e precisa do auxílio do professor.

Se a disciplina de Metodologia de Projeto é oferecida no 1º ano, sabe-se da dificuldade de leitura e interpretação por parte dos estudantes, dessa forma, os textos devem ser simples e dinâmicos. A sugestão é, por exemplo, no primeiro semestre adotar o livro A arte da Inovação do escritório da IDEO já que se trata de um texto com linguagem fácil que pode ser entendido pelos alunos que ingressam na universidade. Também porque o livro narrado em primeira pessoa conta o trabalho dentro de um escritório de design. E para o segundo semestre Gestão Estratégica do Design: Como um

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ótimo design fará as pessoas amarem sua empresa. Este livro possui também uma linguagem acessível e oferece uma visão estratégia do design o que permite que os alunos adquiram uma visão mais ampla da profissão.

3.2 Estratégias de Avaliação

As estratégias de avaliação buscam identificar o que falta aprender aos alunos para alcançar os objetivos da disciplina. A primeira estratégia proposta é uma avaliação das atividades práticas buscando identificar o que o aluno foi capaz de aprender para aplicar em situações reais. Esta avaliação deve ser realizada ao longo do semestre sempre vinculada à estratégia de projeto. Atende aos domínios cognitivo, afetivo e psicomotor no sentido dos movimentos das habilidades e comunicação não discursiva. O Quadro 6 apresenta a descrição e características da estratégia das atividades práticas.

Quadro 6 Estratégia de avaliação prática Fonte: da autora

Além da avaliação semanal das atividades práticas, propõe-se uma

avaliação bimestral por meio de provas objetivas. As questões de múltipla escolha oferecem algumas vantagens como: a de requer a capacidade de analisar as possíveis respostas, reduz a probabilidade por acaso, além de

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facilitar a correção por parte do docente. Aqui cabem também questões de certo e errado que são de preparo simples. O Quadro 7 mostra a descrição desta estratégia.

Quadro 7 Avaliação de prova objetiva Fonte: da autora

A avaliação objetiva oferece um feedback ao aluno, permite

identificar a deficiência individual e não da equipe, permite também uma comparação entre turmas. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Cabe salientar que não existe uma receita para o ensino em qualquer área ou campo de conhecimento. Por isso, as estratégias aqui propostas são um guia para o professor. Cabe a ele, pesquisar e refletir sobre o seu conhecimento, sua prática profissional, conhecer o PPP do curso, conhecer e analisar a estrutura dos conteúdos com que vão trabalhar; olhar para a realidade da disciplina, dos seus alunos, definir as melhores estratégias para alcançar os objetivos do planejamento de ensino. Cabe a ele também, selecionar e utilizar estratégias de aprendizagem e avaliação, buscar conhecimento teórico-prático dos métodos de projeto; domínio do planejamento e do desenvolvimento da prática docente-discente; criatividade e sobre tudo responsabilidade com a ação docente no campo do design.

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225

Agradecimentos A pesquisa foi realizada por meio do apoio do Programa de

Qualificação Docente da Univille e do Programa Dinter da PUC-Rio. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANASTASIOU, Léa das Graças Camargos. Ensinar, aprender, apreender e

processos de ensinagem. In. Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. / organizado por ANASTASIOU e ALVES. 6. ed.- Joinville, SC : UNIVILLE, 2006.

AUSUBEL, David P. Aquisição e Retenção de Conhecimentos: Uma Perspectiva

Cognitiva. Paralelo Editora, Portugal, 2003. BENEDITO, Antolí Vicente et al, La Formación universitária a debate.

Barcelona: Universidad de Barcelona, 1995. GIL, Antonio Carlos. Metodologia do ensino superior. Atlas. São Paulo, 2008. MASETTO, Marcos T. Atividades pedagógicas no cotidiano da sala de aula

universitária: reflexões e sugestões práticas. In Temas e textos em metodologia do ensino superior. Organizado por CASTANHO, Sergio e CASTANHO, Maria Eugenia. Papirus Editora, 83-102 pp. 2001

MOREIRA, Marco Antonio. Teorias de Aprendizagem. São Paulo: EPU, 1999. PAZMINO, Ana Veronica. Modelo de ensino de métodos de design de produtos.

Tese (doutorado)–Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Artes e Design, 2010.

PIMENTA, Selma Garrido; ANASTASIOU, Léa das Graças Camargos. Docência no

Ensino Superior. São Paulo: Cortez, 2008.

226

Experiência Metodológica Não-Linear em Design

Gilson Braviano1

Manoel Alexandre Schroeder2

1 INTRODUÇÃO O ensino de metodologia projetual costuma figurar no imaginário

estudantil como uma disciplina árida e distanciada da prática e, de acordo com Portinari (2006, p. 167), “essa característica se acentua no caso dos estudantes de Design, entre os quais predomina um perfil pragmático e pouco afeito às elaborações teóricas”. Desta forma, é contemporâneo qualquer esforço para a introdução do uso de metodologias no dia-a-dia profissional e para sua internalização, tarefa esta que passa pela desconstrução deste imaginário.

Quando se fala de metodologia em design, não se podem esquecer autores como Jones, Munari, Baxter, Bonsiepe, Bomfim e tantos outros que possuem propostas importantes, adaptadas a uma realidade de mercado mutante, devido principalmente à introdução de novas tecnologias, inclusive no ensino (GOMEZ, 2003).

Ao perceberem que o mundo não funciona exatamente como na academia, é possível que os recém-formados frustrem-se um pouco por não poderem controlar todas as variáveis do processo de design. Isto pode acontecer por uma variedade de fatores, e em se tratando de metodologia, um deles talvez esteja relacionado ao fato de os autores mais citados possuírem uma formação baseada em métodos estáticos, que privilegiam a linearidade do processo (GOMEZ, 2003).

1 Doutor em Matemática Aplicada; professor do Programa de Mestrado em Design e Expressão Gráfica da UFSC. 2 Mestre em Design e Expressão Gráfica; professor do Departamento de Desenho Industrial da UTFPR.

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Este capítulo descreve um experimento de metodologia não-linear com graduandos do Curso de Design e investiga em que medida ele muda a percepção desses acadêmicos quanto ao uso de metodologias tradicionais. 2 EVOLUÇÃO DAS METODOLOGIAS PROJETUAIS EM DESIGN

De acordo com Schroeder (2009), devido à exigência feita ao aluno de design quando da produção de textos científicos, seguindo normas de formatação padronizadas pela ABNT e o perfil pragmático característico da atividade, é comum a confusão que acontece entre até onde vão as exigências acadêmicas e científicas e onde começam aquelas de mercado ou vice-versa. O resultado final da prática projetual em design pode ou não ser uma contribuição à reflexão sobre o design, pois esta prioriza uma resposta para problemas produtivos ou de mercado. Quanto às diferenças existentes entre metodologia de projeto e metodologia científica, é importante que o aluno perceba que a motivação e a produção de conhecimento são diferentes nas duas abordagens. Não se trata de qualificar ou eleger prioridades, mas sim identificar o que se espera de uma ou de outra. O projeto não tem um compromisso intrínseco com a descoberta de algo novo, mas a pesquisa científica sim, “pois procura empreender uma constante busca de novas relações (...) não havendo o compromisso com um determinado resultado” (COELHO, 1999, p. 5).

A década de 1950 foi marcada por sinais de euforia científica, mergulhada em um clima que requeria e possibilitava simultaneamente a formulação de uma teoria determinista e racionalista do design. Não havia, até aquele ponto, uma sistemática de projeto e para se conseguir uma, foram transferidos, por analogia, os princípios da metodologia matemática ao processo de design.

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Com o passar dos anos, surgiram outras metodologias para o desenvolvimento de projetos em design e isso gerou grande dificuldade no momento de escolher qual o autor ou o método mais adequado. Nesse sentido, Gomez (2003, p. 33) afirma que “a melhor metodologia de design é a própria”. 2.1 Metodologias Projetuais Lineares

Schroeder (2009) apresenta uma síntese das Metodologias Lineares Clássicas mais difundidas na literatura, identificadas pelos seus autores: Morris Assimov (1962), Leonard Bruce Archer (1965), Bernhard E. Bürdek (1975), Siegfried Maser (1976), Bernd Löbach (1976), John Chris Jones (1978), Don Koberg e Jim Bagnall (1980), Bruno Munari (1981), Gui Bonsiepe (1984), Jorge Frascara (1988), Verônica Nápoles (1988), Norberto Chaves (1996), Mike Baxter (2000), Maria Luísa Peón (2000), Eugenio Merino (2002) e Flávio Santos (2005).

Ainda de acordo com Schroeder (2009), nessas metodologias as fases de desenvolvimento projetual são, de certa forma, semelhantes, havendo posicionamentos e abordagens diferentes, porém mantendo-se um esboço geral de problema: análise, criação e execução. As diferenças entre elas se mostram basicamente na forma de organização das fases das atividades, sendo algumas mais detalhadas, enquanto outras são organizadas de forma mais generalista.

No final da década de 1970, Paul Feyerabend (BARBOSA, 2007) introduziu o método indutivo, deslocando para o usuário o centro das metodologias do projeto. A partir disso, o processo de projetar aumentou sua complexidade, porque cada indivíduo possui necessidades de consumo diferentes, obrigando o projetista a ter novas abordagens que contemplassem esta multiplicidade de fatores, de forma holística e não-linear.

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2.2 A metodologia não-linear “4Ps do design” Gomez (2003) propôs uma metodologia não-linear denominada 4Ps

do design, onde as etapas ocorrem concomitantemente (figura 1), sempre embasadas por informações do mercado.

Os 4Ps do Design são: Posicionamento de Mercado; Problema; Proposta e Produto. O Posicionamento de mercado pode ser uma situação ou cenário real/possível para o desenvolvimento de um produto ou então um briefing claro a partir do conhecimento de um cliente ou mercado em fase de expansão. O Problema está em todo o projeto de produto, em tese, e deve basear-se em um ou mais problemas a serem solucionados para um determinado grupo de pessoas que fazem parte de um cenário conhecido. Esse problema deve gerar uma proposta de desenvolvimento para se encontrar a solução. Assim, a Proposta é o grande grupo de produtos e/ou serviços que resolvem o(s) problema(s) de projeto, sugerindo que direção tomar. O Produto é o fim último do Design e deve resolver, dentro de uma proposta coerente, um problema que afeta um grupo de usuários bem definido.

Figura 1: Método 4Ps do design: interpretação gráfica e operacional

(GOMEZ, 2003, p. 55)

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Ao contrário do que ocorre nas metodologias tradicionais, onde existe uma sequência lógica de ações, algumas vezes com retroalimentação do processo, no caso dos 4Ps do design não há um momento exclusivo para cada um dos Ps e muito menos uma sequência. As etapas ocorrem sempre concomitantemente e são embasadas em informações do mercado. O início do projeto se dá com qualquer um dos Ps, podendo inclusive ser mais de um.

Na próxima seção, descreve-se um experimento com graduandos do Curso de Design, utilizando a metodologia não-linear aqui apresentada, e analisa-se a mudança de percepção desses acadêmicos quanto à utilização de metodologias tradicionais.

3 EXPERIMENTO METODOLÓGICO NÃO-LINEAR EM DESIGN

Vinte e seis acadêmicos de uma turma regular da 6ª fase do Curso de Design Gráfico3 da Universidade Federal de Santa Catarina trabalharam na disciplina4 de Metodologia e Desenvolvimento de Projeto 3, durante um semestre. Foram divididos em nove equipes e as atividades ocorreram ao longo de dezoito semanas, sempre com quatro horas de duração, no período vespertino, às segundas-feiras.

Duas atividades específicas para o desenvolvimento de Sistemas de Identidade Visual, com grau intermediário de complexidade, foram propostas: primeiramente, para um escritório de design próprio e, após, para um cliente real. Outras atividades foram incluídas na disciplina, tais como a leitura e apresentação de capítulos de livros, aulas não-presenciais e a redação de um artigo científico.

3 Tal curso conta com oito fases e o currículo é relativamente padronizado no território nacional. 4 A disciplina onde as atividades ocorreram é a última com foco projetual antes da elaboração do TCC.

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3.1 Descrição das atividades realizadas no experimento Na primeira semana, houve a apresentação dos professores, da

disciplina, do método de trabalho e de avaliação. Foram estabelecidas as leituras obrigatórias5 para suporte teórico ao conteúdo. Foi também passado um questionário visando averiguar o nível de conhecimento dos alunos sobre as metodologias projetuais lineares e não-lineares, se eles costumavam aplicá-las na prática metodológica e se já conheciam a metodologia 4Ps do design.

Na segunda semana, realizou-se uma atividade projetual intuitiva, na qual, a partir da identidade visual do MASP (Museu de Arte de São Paulo), solicitou-se aos acadêmicos o levantamento de todas as variáveis e etapas envolvidas no processo de design, objetivando sensibilizá-los para a complexidade envolvida no processo de produção de uma identidade visual.

A introdução à metodologia de projetos lineares cíclicos e não-lineares ocorreu na terceira semana. Na quarta semana deu-se a discussão sobre a leitura do livro de René Descartes, Discurso do método, buscando desmistificar uma possível percepção sobre a inutilidade do pensamento linear em nossos dias; a ideia por trás desta leitura foi de que o pensamento linear, apesar de não ser a única forma de resolução de problemas, tem seu valor em situações específicas. Ocorreu também uma comparação das etapas citadas pelos alunos no exercício do MASP, realizado na segunda semana, apontando semelhanças e diferenças entre alguns métodos lineares.

A concepção conceitual de uma marca foi o tema da aula seguinte, cujo objetivo principal foi propiciar aos alunos chegarem ao DNA da marca para seus escritórios de design. Inicialmente, esclareceu-se aos alunos a atividade e promoveu-se um ambiente relaxado e criativo (através da projeção de um curta-metragem cômico e da apresentação de cada aluno, focando sua

5 Discurso do método, de René Descartes (capítulos 1 e 2); Sistemas de identidade visual, de Maria Luiza Peón; Das coisas nascem coisas, de Bruno Munari e As dez faces da inovação, de Thomas Kelley.

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personalidade e seus gostos). A formatação do painel semântico para cada grupo, formado em média por três alunos, passou pelas etapas de enumeração e escolha de adjetivos internamente, tendo sido definido um número máximo de sete para a proposta. Após o questionamento, por parte do professor, sobre a relevância destes termos, e a certeza da aceitação e entendimento por todos, eles recortaram imagens de revistas para representar os conceitos mais frequentes de forma visual, sempre relacionando esses conceitos à imagem proposta. Estabelecida a composição final do painel (a figura 2 ilustra um deles), realizou-se um debate sobre o percurso seguido para se obter o DNA da marca.

Figura 2: Painel semântico com os conceitos do DNA da marca para

o escritório Metra Design

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Na sexta semana houve um primeiro delineamento visual da identidade para a marca do escritório próprio, com geração de alternativas. Os alunos trouxeram material de desenho para a sala de aula e usaram o tempo para estudar formas, cores e tipías. Na semana seguinte, ocorreu a discussão do livro Sistemas de Identidade Visual, com o objetivo de sensibilizar os acadêmicos para seus elementos componentes. A turma foi cadastrada em um ambiente virtual de aprendizagem da UFSC (AVA-AD), para participação das atividades não presenciais, postagens de arquivos etc. A aula da oitava semana, usando o chat do AVA-AD, foi utilizada para orientar os alunos na formatação dos 4Ps para o escritório próprio.

A nona semana foi reservada para a apresentação, pelos alunos, do livro As dez faces da inovação. Cada equipe apresentou um capítulo e em cada apresentação houve debate.

Na décima semana, cada uma das nove equipes apresentou a identidade visual para o escritório de design próprio (ver figura 3), evidenciando os elementos que compuseram sua criação.

Figura 3: Marcas criadas na primeira fase de aplicação da metodologia 4p do design6

6 FFWD media, Dagaz branding & design, Metra Design, O Bicho da Goiaba, B-STAGE, Kiwi & Pitanga Expressão Visual, Entrelinha Projetos Editoriais, Guerrilha Comunicação e Vixen.

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Ao final da aula, foi solicitado aos alunos que iniciassem o processo de prospecção de um cliente real para a segunda proposta de projeto e trouxessem na próxima aula um briefing com o máximo de informações possíveis, para o estabelecimento do DNA da marca e dos 4Ps.

Na décima primeira semana, então, iniciaram-se os trabalhos de criação, a partir dos briefing trazidos. Ocorreu, na sequência, uma aula via AVA-AD, visando dirimir as dúvidas com relação à formatação dos 4Ps para o cliente real. Na décima terceira semana, houve a prestação de contas do estado da arte de cada proposta e ocorreram outras duas aulas utilizando o chat do AVA-AD/UFSC.

A décima sexta semana objetivou a realização de orientação final relativa à cada proposta de Sistema de Identidade Visual e forneceu-se um modelo de artigo científico para ser entregue ao final da disciplina. A apresentação final de cada Sistema de Identidade Visual proposto ocorreu na semana seguinte. Foi o momento culminante do semestre, onde pôde-se verificar a eficácia das estratégias adotadas para a conceituação e produção das identidades visuais numa situação real. A figura 4 apresenta um fragmento do manual de uso da marca criada para a empresa Tok Floral pelo escritório Metra Design (cujo painel semântico está apresentado na figura 2 e a marca compõe a figura 3). A apresentação contou com alguns clientes dos SIVs desenvolvidos. Nesta ocasião, foi passado, pelo pesquisador, o segundo questionário objetivando colher as impressões dos alunos sobre o experimento metodológico usando os 4Ps do design, com três questionamentos básicos: “Você considera a metodologia não-linear 4Ps do design útil? Explique.”; “Você pretende utilizá-la futuramente?” e “A metodologia não-linear é melhor que a linear?”.

A última aula destinou-se à finalização da redação do artigo científico, tendo como tema Metodologia Projetual.

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3.2 Mudança na percepção dos acadêmicos Os questionários aplicados no início e no final do experimento7, a

observação das atividades realizadas e o resultado dos projetos desenvolvidos permitiram identificar alguns fatores que influenciaram nas mudanças de percepção nos alunos quanto ao uso de metodologias tradicionais.

Figura 4: Fragmento do manual de uso da marca criada para a

empresa Tok Floral pelo escritório Metra Design

Esses acadêmicos já possuíam alguma experiência com design gráfico,

seja através de estágio ou de atividades como freelancer. Todos tinham conhecimento prévio de metodologias, dentre as quais citaram aquelas de Frascara, Eugênio Merino, Mike Baxter, Joaquin Redig e Gilberto Strunck.

7 Dos alunos que frequentaram a disciplina, dezoito preencheram o questionário pré-experimento e, destes, doze preencheram o questionário pós-experimento; seis, ainda, responderam somente às questões do pós-experimento. Em relação ao sexo, houve um equilíbrio na turma, com 58% de mulheres e 42% de homens. A média de idade foi de 21,3 anos, com desvio padrão de 0,28, mostrando que as idades pouco variavam.

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Somente dois afirmaram conhecerem a metodologia 4Ps do design através do TCC de um colega.

De modo geral, os alunos apontaram que nas metodologias com as quais tiveram contato há muitas etapas e regras. As respostas sobre como imaginavam o funcionamento de uma metodologia não-linear levantaram características como iteratividade, não sequencialidade, definição de pontos chave, foco no resultado e adaptabilidade.

A observação feita nas aulas pelo pesquisador apontou um grupo com bom nível técnico, sabendo executar as tarefas de desenho, criação, produção de material para apresentação com um nível satisfatório, inclusive dominando tecnologias de imagem em movimento.

Dos doze alunos que responderam aos questionários antes e após o experimento, onze disseram considerar a metodologia 4Ps do design útil. O aluno que não apresentou este posicionamento disse considerar a metodologia útil, “mas somente como ponto de partida do processo”. De acordo com Schroeder (2009b, p. 6), “tal argumento nos leva a crer que a proposta não foi inteiramente compreendida por este acadêmico.”

Dentre os adjetivos usados por eles para caracterizar este tipo de metodologia, foram citados prioritariamente a iteratividade do processo e sua versatilidade, além de respostas relativas ao processo ser natural, fácil, abrangente e também respeitar as etapas fundamentais. Com base nessas respostas, Schroeder (2009b, p. 6), afirma que “este grupo demonstrou ter desenvolvido a percepção de utilidade da metodologia 4Ps do design.”

As respostas quanto à possibilidade de uso desta metodologia no futuro, apontam para os casos de projetos mais complexos e, “em se tratando de projetos mais simples eles preferem trabalhar com métodos que já conhecem e dominam” (SCHROEDER, 2009, p. 103).

Ao serem questionados sobre a comparação entre metodologia linear e não-linear, nenhum respondente disse que a metodologia 4Ps do design é

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pior que as metodologias lineares até então utilizadas, entretanto não houve qualquer manifestação nos relatos que caracterizasse maior nível de empolgação com relação ao uso da metodologia não-linear. Schroeder (2009, p. 104) conclui que “esses acadêmicos acharam o método útil, contudo ele passa a ser mais um, ao lado de tantos outros já conhecidos. Esses alunos explicitaram sua utilidade em situações mais complexas e, dependendo do projeto, preferem usar as metodologias que dominam e se sentem mais seguros em aplicar.” 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A experiência metodológica, descrita e analisada neste capítulo, demonstrou ser eficiente na medida em que buscou promover uma visão ampliada da prática do design gráfico. Buscou trilhar um caminho metodológico, capaz de ultrapassar a racionalidade positivista do funcionalismo neste campo e o hábito arraigado da reprodução do conhecimento.

A aplicação do método 4Ps do design contribuiu para a preparação dos acadêmicos em relação ao enfrentamento criativo no âmbito dos problemas apresentados pela sociedade contemporânea, apresentando novos caminhos para o designer. A opção pelo trabalho conjunto e cooperado mostrou-se produtiva, diminuindo o grau de insegurança e possibilitando a interação das equipes em torno de objetivos comuns.

A análise dos dados indica que os alunos, após o experimento metodológico, percebem as metodologias que eles já utilizaram como sendo não todo o universo de possibilidades, mas apenas uma parte dele. Os métodos tradicionais terão sempre seu lugar na prática projetual design, principalmente em situações de baixa e média complexidade. Metodologias não-lineares mostram potencial para situações de complexidade maior, onde a

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iteratividade, flexibilidade no processo criativo, definição de pontos chave e liberdade de atuação do designer exigem maturidade e disciplina pessoais.

Agradecimentos

Ao Programa de Pós-Graduação em Design e Expressão Gráfica da Universidade Federal de Santa Catarina, onde o presente estudo foi desenvolvido e, em particular, ao professor Luiz Salomão Ribas Gomez, que disponibilizou suas aulas para a realização da experiência metodológica. REFERÊNCIAS BARBOSA, Josinaldo. Projetar não é criar, nem criar é projetar: um estudo

sobre metodologias projetuais em relação ao pensamento projetual. CEFET/PE. In: Anais do 3º CIDI: Congresso Internacional de Design da Informação. Curitiba, 2007.

COELHO, Luiz Antonio. Capítulo. In: COUTO, Rita Maria de Souza; OLIVEIRA,

Jefferson de. (Orgs.). Formas do design: por uma metodologia interdisciplinar. Rio de Janeiro: PUC/RIO, ed.2AB, 1999.

GOMEZ, Luiz Salomão Ribas. Os 4P’s do design: uma proposta metodológica

não-linear de projeto. Tese de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina, 2003.

PORTINARI, Denise B. Capítulo. In: COELHO, Luiz Antonio (Org.). Design

Método. Rio de Janeiro: PUC-RIO, 2006. p.162-168. SCHROEDER, Manoel A. Análise da percepção da aplicação de uma

metodologia não-linear em design gráfico. Dissertação de mestrado

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do Programa de Pós-Graduação em Design e Expressão Gráfica da Universidade Federal de Santa Catarina, 2009.

SCHROEDER, Manoel A; BRAVIANO, Gilson. Metodologia não-linear em design

gráfico: resultado da experimentação por alunos. In: Anais do Graphica 2009: XIX Simpósio Nacional de Geometria Descritiva e Desenho Técnico & VIII International Conference on Graphics Engineering for Arts and Design. Bauru, 2009b.

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Heurística: uma poderosa bússola

Luiz Antonio Luzio Coelho1 Candida Maria Monteiro2

1 INTRODUCÃO

Preparando o terreno

Neste artigo procuro descrever um método de pesquisa eminentemente interpretativa, na qual o campo de atuação se dá no território abstrato dos modelos teóricos, conceitos e categorias. Minha tese, como doutoranda do programa do Departamento de Artes e Design da PUC-Rio, procura entender as relações da imagem com a memória no documentário autobiográfico. Desta forma, ao contrário de uma pesquisa de campo que lida diretamente com as pessoas, muitas vezes mediada por dispositivos tais como gravadores, máquinas fotográficas ou filmadoras, aqui, o diálogo é interior e solitário. A rigor, trata-se de um diálogo travado com pensadores no plano das ideias expostas em artigos, livros, filmes e fotografias. Trata-se, desta maneira, de pesquisas que vão construir uma relação dialógica com um sistema teórico e não com pessoas. Apresento táticas metodológicas especificamente para àquelas pesquisas cujo escopo são imagens e filmes. Neste procedimento, ainda que a entrevista não seja um recurso adotado, pode-se apontar interlocutores importantes e fundamentais na correção de rumos, tais como

1 Doutor em Comunicação, Universidade de Nova Iorque. Professor no Departamento de Arte e Design DAD/PUC-Rio. 2 Doutoranda no Departamento de Arte e Design – DAD/PUC-Rio.

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os primeiros leitores, orientadores, professores e colegas também pesquisadores. Nesse contexto, todo estudo de longo prazo requer disciplina e método, necessitando de uma espécie de plano de vôo, onde é descrita a movimentação tática que visa manter o foco e o rigor analítico durante todo o percurso.

Em primeiro lugar é preciso reconhecer que a arquitetura de um trabalho da dimensão de uma tesa está permeado de desafios. Para enfrentar tais obstáculos, devemos começar pela preparação dos alicerces, garantindo um solo seguro onde será possível erguer uma produção de conhecimento consistente. Assim, da mesma forma que nosso corpo exigiria treinamento e preparo físico se fosse disputar uma maratona, o pesquisador precisa estar consciente de que sua mente será exigida para realizar um mergulho profundo em estudos e leituras. Vale destacar que o aproveitamento das leituras depende fundamentalmente de um treino diário e bem planejado. Outro aspecto importante na preparação do território de base, é a noção da dimensão de uma tese, do que se trata: se no trabalho de confecção de uma dissertação realiza-se o mapeado de um determinado assunto, espera-se, agora, um avanço no sentido de aprofundar a reflexão sobre o conhecimento levantado, promovendo uma espécie de arqueologia do saber. 3 Por analogia, é possível pensar na exploração de uma área delimitada, ou no cruzamento entre duas ou mais disciplinas, onde a cada escavação, penetramos mais fundo, tentando alcançar uma rede de significados encoberta. Com efeito, camada por camada a proposta é aprofundar a investigação, empreendendo um entrecruzando de campos de saberes diversos ou afins, elegendo autores que fundamentarão a reflexão e selecionando as ferramentas analíticas norteadoras da pesquisa. Sob esse enfoque, pode-se dizer que na dissertação 3 Título do livro de Michel Foucault onde apresenta a metodologia do seu projeto de uma arqueologia do saber, adotada em trabalhos como Histoire de la folie, Naissance de la clinique, Les mots et les choses. Tal intento propõe entender as mutações que se operam no domínio da história oficial, colocando em questão seus métodos, limites e temas.

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percorre-se um caminho no sentido horizontal, que segundo Foucault, resulta em um conhecimento de superfície, uma exploração “de causalidade simples, de determinação circular, de antagonismo, de expressão entre fatos ou acontecimentos datados”, (Foucault, 2008, p.8), enquanto que na tese o trabalho de escavação investe no sentido vertical, constituindo-se, desta forma, em um estudo denso e profundo.

Ainda no começo, na fase de preparação, é prudente repensar o tema e o recorte estipulados. Entende-se por tema da pesquisa o assunto geral que será investigado, matéria que poderá ser explorada sob diversos enfoques, seguindo uma perspectiva histórica, por exemplo, onde é possível discutir, comparar e contrapor métodos, linguagem, categorias e conceitos em relação a outros campos do saber. A escolha do tema pode ser decisiva no sentido de proporcionar originalidade ao trabalho, no meu caso, adotei um recorte transversal, onde a ideia foi explorar as relações do documentário e da fotografia fixa. Desta forma, na medida em que o solo da análise foi alterado, o contexto que normalmente é atribuído à fotografia também foi deslocado. A rigor, foi modificado o próprio suporte da imagem fotográfica, que agora passa a ser observada dentro do documentário, sendo tratada como um objeto de cena e não mais como foto. Deste ponto de vista, ao invés de examinar as imagens nos álbuns fotográficos passa-se a observar a função da foto no suporte fílmico.

A formatação do corpus da pesquisa pode ser uma etapa importante, ainda no momento preparatório, para criar envolvimento do pesquisador com o objeto de estudo escolhido. A definição de corpus utilizada aqui é derivada daquela expressa por Barthes (1992), onde o autor diz que corpus é “uma coleção finita de materiais, determinada de antemão pelo analista, com (inevitável) arbitrariedade, e com a qual ele irá trabalhar”. Nesse sentido, a definição do corpus é o momento no qual o pesquisador tem espaço para atuar como autor, há nessa seleção uma construção subjetiva, onde

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filmes, textos, artigos e autores são escolhas pessoais. Aqui é definida a estrutura sobre a qual irá erigir o seu trabalho.

Podemos dizer que a fase preparatória foi finalizada com sucesso ao percebemos que a pesquisa está invadindo todos os lugares, passa a ocupar, por assim dizer, todos os espaços mentais, dia e noite, de tal modo que as coisas com as quais entramos em contato no mundo externo acabam nos remetendo naturalmente ao estudo. Neste estado, impregnados, o que observamos nas ruas, os filmes que assistimos, a leitura do jornal diário, o mundo a nossa volta, tudo tende a se transformar em camadas de conhecimento que vão sendo acrescentadas ao estudo. Imbuir-se da pesquisa é, de certa forma, incorporar os princípios empíricos de análise, que recorrem à experiência e “cujas leis são ainda imprecisas e não podem jamais ser definitivamente asseguradas por dependerem elas de uma experiência sempre imperfeita.” (Dartigues,1992, p.19)

É nesse momento que ocorre a passagem do observador comum para a posição do analista. 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 A heurística como método estratégico

A palavra heurística deriva do grego heurísko, literalmente descobrir, e se refere a uma parte da epistemologia, de um tipo de método científico apropriado para lidar com as ciências humanas. Em oposição ao processo algorítmico, i.e., uma equação matemática, o sistema heurístico de descoberta conduz a uma verdade circunstancial, não verificável. Ora utilizada como substantivo, quando indica a ciência do descobrimento, ora como adjetivo, quando se refere as regras empregadas nas pesquisas, a heurística é uma ferramenta útil para manter a direção ao logo do caminho. A etimologia da palavra é a mesma da exclamação eureka, atribuída a Arquimedes ao

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descobrir como medir o volume de um objeto irregular utilizando água. Embora o método heurístico não seja regido pelos princípios do logos (a lógica como argumento puro), tal recurso metodológico vem sendo empregado no campo da ciência da computação e em determinados ramos da matemática como forma de buscar novas soluções na medida em que se lança mão de um recurso híbrido ao campo das ciências exatas.

A aplicação da heurística como método na pesquisa qualitativa é extremamente vantajosa sobretudo na fase exploratória, momento em que se estabelece a problemática sobre a qual será construída a reflexão. O ponto de partida desta estratégia metodológica, considera a condição ambígua e contraditória do ser humano. Tendo em vista que o conhecimento é algo em mutação, recomenda-se ao pesquisador questionar todos os dados a que tenha acesso. Aqui, o pesquisador se coloca numa posição crítica para tentar enxergar aspectos não revelados. Tal postura exige a não aceitação, a priori, do discurso estabelecido, supondo-se, assim, que este é produzido pelo ser humano, portanto, suscetível a equívocos. Do ponto de vista do design, empregar a tática da dúvida sugerida pela heurística pode levar a descobertas importantes. Se tomarmos como parâmetro a definição de Adrian Forty na qual o autor diz que o design é uma ferramenta utilizada para “disfarçar” a natureza do produto, uma postura questionadora ajudaria a entender os mecanismos envolvidos na fabricação de um objeto. É tarefa do pesquisador tomar uma posição crítica afim de acessar os sistemas de valores, saberes e significação que engendraram a existência de um produto. Este espírito indagativo pode ser estimulado acrescentando-se o instrumento da conotação, que segundo Barthes, opera-se da seguinte forma:

O que é uma conotação? Por definição, é uma determinação, uma relação, uma anáfora, um recurso que tem o poder de se referir às dimensões anteriores,

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ulteriores ou externas, a outras partes do texto (ou outro texto): não há nada para restringir essa relação, que pode ser designada de várias maneiras (função ou indício, por exemplo), contudo que não se confunda conotação e associação de ideias: esta refere-se ao sistema de um sujeito enquanto aquela é uma correlação imanente ao texto, aos textos, se preferir, é uma associação operada pelo texto-sujeito no interior de seu próprio sistema. (Barthes, 1992, p.5)

O segundo passo indicado pela heurística sugere aceitar a soberania

das informações, somente um levantamento extenso e apurado pode explicar determinados fenômenos. Encontramos, aqui, dois princípios contraditórios, o que é típico da heurística, pois o método prevê a instabilidade no caminho que leva à descoberta. Se de um lado, a recomendação é a desconfiança, de outro, deve-se acreditar nas informações obtidas. O analista adota, neste caso, uma postura hermenêutica 4 flexível, em oposição a um olhar único e conclusivo que poderia conduzir a posições precipitadas e reducionistas.

A seguir, a regra heurística propõe um afastamento, onde o analista com o intuito de ampliar seu ângulo de observação, tenta enxergar com isenção. Segundo Marshall McLuhan, é preciso olhar de fora o ambiente pesquisado para percebê-lo melhor. Tal posição não diz respeito apenas a uma visão macro, mas sobretudo, colocar-se num ponto onde é possível aumentar a percepção. Não provocar a estranheza leva a um envolvimento apaixonado, onde encontraremos somente aquilo o que procuramos, nunca, contudo, chegaremos ao que não procurávamos. O conhecimento arraigado pode

4 Chamo hermenêutica o que Barthes (1992) definiu como “um conjunto de unidades que tem a função de articular, de diversas maneiras, uma pergunta, sua resposta e os variados acidentes que podem sustentar a pergunta ou atrasar a resposta, ou também formular um enigma e levar a sua decifração.”

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embaçar a visão, desta forma, imersos na familiaridade, nos tornamos cegos de tanto ver. Para combater tal postura, é prudente exercitar a observação exterior, examinando um objeto conhecido como se fosse a primeira vez ou caminhar por ruas familiares com um olhar estrangeiro. Em resumo, a indagação é intrínseca à inovação.

2.2 Análise fotográfica

Com o intuito de seguir aplicando a estratégia heurística de análise senti necessidade de proceder um levantamento a respeito da reflexão que balizou a teoria fotográfica. Não há, contudo, no presente trabalho a intenção de dar conta da vasta reflexão sobre o tema. O intuito aqui é o de ilustrar a proposta metodológica apresentada, ao destacar momentos relevantes da teoria fotográfica, ressalto a importância de estabelecer um diálogo com os autores que construíram os fundamentos teóricos do tema escolhido. A reflexão sobre a fotografia começa com as ideias de Walter Benjamin, que em 1931 escreve o célebre texto Petite histoire de la photographie, onde discute questões técnicas e artísticas sobre a recente invenção atribuída aos franceses Joseph Nicéphore Niépce (1826) e Louis-Jacques-Mandé Daguerre (1835), pioneiros na técnica de fixar uma imagem pela ação da luz. Ainda durante os anos 30 e 40, André Bazin pensa a respeito da Ontologia da imagem fotográfica. A seguir, Roland Barthes, em La chambre claire, 1979, inaugura uma abordagem relativa a subjetividade e a percepção afetiva da imagem fotográfica. Susan Sontag, em 1977, coloca luz sobre questões estéticas e morais presentes na atividade fotográfica no livro Sobre fotografia. Henri Vanlier, Philosophie de la photographie (1983) e Jean Marie Shaeffer, L’image précare, (1987) dão uma contribuição importante de enfoque fenomenológico

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e estruturalista 5 Em 1983, finalmente a teoria fotográfica ganha uma fundamentação de abordagem histórica, L’acte photographique de Phillippe Dubois, que a partir da semiologia de Charles Sanders Peirce, trabalha o conceito de índice como algo específico do ato fotográfico. Embora todas essas correntes de pensamento tenham estado em evidência, ora de forma mais acentuada, ora menos, o importante no processo heurístico é confrontar todo tipo de pensamento existente a respeito do objeto analisado. Podemos destacar, por exemplo, o apogeu da semiologia nos anos 1980, corrente que voltava o olhar para a significação, denotação e conotação da imagem fotográfica, empreendendo desta forma uma espécie de desconstrução dos mecanismos da imagem reproduzida através da técnica. Merecem ser mencionados ainda autores como Vilém Flusser, que em Filosofia da caixa preta, (1985), propõe uma filosofia para libertar o homem do automatismo programado pelo aparelho fotográfico; a crítica e historiadora de arte Rosalind Krauss, que em O Fotográfico (1990), reflete sobre o diálogo entre as vanguardas artísticas e a fotografia, em uma análise de viés semiótico e, por fim, a obra do professor André Rouille, A fotografia: entre documento e arte contemporânea (2009), na qual discorre sobre a trajetória da fotografia em seus 170 anos até o momento atual, destacando, com efeito, uma simbiose entre arte e fotografia. Além do levantamento bibliográfico referente ao campo da fotografia, tornou-se necessário levar também em consideração a teoria sobre imagem e arte contemporânea. Nesse sentido, o escopo foi ampliado entrando em contato com o pensamento desde historiadores tradicionais como Erwin Panofsky até os mais recente como Georges Didi-Huberman. Empreendeu-se, por assim dizer, um verdadeiro “arrastão” a respeito do saber acumulado em dois campos próximos. Esforço

5 Segundo Safatle o “fundamento do estruturalismo consiste em mostrar como o verdadeiro objeto das ciências sociais não é o homem enquanto centro intencional da ação e produtor do sentido, mas as estruturas sociais que o determinam.” (Safatle, 2009, p.42)

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imprescindível na produção de conhecimento. Ao tomarmos como base as múltiplas visões, fertilizamos o território, conforme observa Deleuze, “ora, o conceito não se move apenas em si mesmo (compreensão filosófica), mas também nas coisas e em nós: ele nos inspira novos perceptos e novos afectos.” (Deleuze, 1992, p.171) Assim, é possível descobrir algum aspecto que ainda não foi abordado, uma pequena nesga onde plantamos questões sob uma nova ótica. Confirmando, nesse sentido, a mutação apontada por Foucault: “ ... a história de um conceito não é, de forma alguma, a de seu refinamento progressivo, de sua racionalidade continuamente crescente, de seu gradiente de abstração, mas a de seus diversos campos de construção e de validade, a de suas regras sucessivas de uso, a dos meios teóricos múltiplos em que foi realizada e concluída sua elaboração.” (Foucault, 2008, pp. 4 e 5) Fica claro que um conceito é elemento vivo, que ao ser apropriado ganha potência, fortalecendo sua capacidade de sustentar novos saberes.

Cabe destacar, ademais, uma parte importante na aplicação do instrumento heurístico de análise: a definição da problemática. Einstein dizia que a resolução de um problema é uma tarefa relativamente fácil, qualquer pessoa que empreenda algum esforço intelectual é capaz de dar soluções, ao contrário, muito mais complexo é equacionar uma questão. Desta forma, no mecanismo heurístico quanto mais conhecimento do território analisado, maior a possibilidade de gerar questionamento.

Para finalizar, apresento a metodologia sugerida por Dubois para analisar imagens. O autor escolhe trabalhar no ponto de interseção entre a imagem como objeto da cultura e a imagem como objeto por natureza: “Tratar o objeto imagem unicamente em termos de saber, como objeto de cultura, é também perder muita coisa. A essa posição junta-se outra – a articulação entre duas é toda a questão, todo o problema” A rigor tal abordagem se volta para a fenomenologia, i.e., um caminho aberto por Edmund Husserl (1859-1938), no qual “...o fenômeno é reabsorvido num conhecimento sistemático do ser, a

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fenomenologia husserliana se propõe fazendo ela própria, às vezes de ontologia pois, o sentido do ser e o do fenômeno não podem ser dissociados.” (Dartigues, 1992, p.3) Para tanto, Dubois toma a imagem como um fenômeno do olhar, “o olhar que se aproxima da imagem como um evento é o olhar que deve se livrar de um saber prévio sobre ela”. Chamo a atenção, contudo, para o desafio ou mesmo a impossibilidade de levar a efeito um olhar neutro. Em resumo, a ideia defendida por Dubois é a de que o analista deve ser capaz de produzir um pensamento sobre as imagens articulando três posturas: fenomenológica, estruturalista e histórica.

2.3 Análise fílmica

Tomo como princípio a ideia de que um filme é passível de leitura. Seguindo a trilha aberta por Geertz (1978), na qual define cultura como um texto formada pela combinação de diversos outros textos, pode-se considerar a produção fílmica mais um texto integrante deste tecido. Um filme torna-se, desta forma, um campo fértil de investigação, uma caixa de ressonância de valores, costumes, sínteses, visão de mundo e de uma época.

A prática analítica empregada nos filmes é originária da literatura, constituindo-se, desta forma, uma adaptação para o regime imagético e sonoro. Cabe, neste exercício, empreender um olhar crítico com o objetivo de localizar situações, desenhar contextualizações, traçar o percurso histórico, bem como identificar movimentos, escolas e tendências. A teoria da Gestalt abriu um caminho que dialoga com a forma heurística de análise. Recorrer a Gestalt leva a um conhecimento mais profundo dos fenômenos, conforme ressalta Nobert Elias:

Que o todo é diferente da soma de suas partes, que ele incorpora leis de um tipo especial, as quais não podem ser elucidadas pelo exame de seus elementos isolados.

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Essa teoria forneceu à consciência geral de nossa época diversos modelos simples, capazes de nos ajudar a fazer o pensamento avançar nessa direção, como por exemplo da melodia, que também não consiste em nada além de notas individuais, mas é diferente de sua soma, ou o exemplo da relação entre a palavra e os sons, a frase e as palavras, o livro e as frases. (Elias, 1994, p.16)

Tal exemplo poderia perfeitamente tomar um filme como modelo,

cuja menor parte, o fotograma, nos ajudaria a entender o mecanismo de constituição do todo, o filme. Tornando possível a compreensão de que “a combinação, as relações de unidade de menor magnitude – ou, para usarmos um termo mais exato, extraído da teoria dos conjuntos, as unidades de potência menor – dão origem a uma unidade de potência maior, que não pode ser compreendida quando suas partes são consideradas em isolamento, independente de suas relações.” (Elias, 1994, p. 16)

Analisar um filme sob enfoque da Gestalt significa separar, descosturar, segmentar, decompor em pedaços, como se desmontássemos um relógio para entender o seu funcionamento. Essa desconstrução ou decupagem dos filmes consiste em identificar: i) o objetivo do autor; ii) a forma como conta sua história; iii) os dispositivos empregados na narrativa; iv) os recursos sonoros; v) os enquadramentos; vi) a movimentação da câmara; vii) os cortes; viii) os elementos diegéticos;

Ao penetrarmos no interior de um mecanismo é possível perceber, com um olhar técnico, o modo de construção empregado. Este procedimento também é chamado de engenharia reversa. Após o primeiro momento de decomposição do objeto, o próximo passo é estabelecer relações dos elementos isolados com o todo.

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Em síntese, uma análise fílmica é feita em duas etapas: a desconstrução e a interpretação. A primeira, segundo Vanoye e Goliot-Lété (1994), consiste em decompor o material, separando o filme em fragmentos, obtendo-se assim todos os seus elementos constitutivos. Procedimento que serve para se tomar distância do material e examinar o filme de forma técnica. No segundo momento, trata-se de “estabelecer elos” entre as partes isoladas para compreender e deixar emergir um “todo significante”. Ao final, o pesquisador pode imprime seu olhar específico, descobrindo o que poderia estar oculto até para o próprio realizador. É fundamental respeitar os limites do objeto de análise, uma vez partindo-se do filme é necessário voltar a ele e não reconstruir um outro filme.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos séculos XV, XVI e VXII, quando a ciência moderna é

fundada a busca do homem pelo conhecimento toma um novo rumo. Durante esse longo percurso, foi possível perceber que o pensamento científico é um processo infinito e contínuo de busca, nunca chegando a verdades definitivas e conclusivas. Nesse sentido, podemos identificar as questões nos mobilizaram e marcaram o ponto inicial da pesquisa, no entanto, reconhecer o ponto final pode se tornar um momento um tanto impreciso. A rigor, uma pesquisa poderia durar a vida toda, mas chega uma hora de dar acabamento e apresentar os resultados do trabalho. A precisão do recorte pode ajudar a estabelecer esse momento. Ainda que seja difícil interromper o processo de investigação, deve-se levar em consideração que um trabalho bem planejado, sempre deixará alguma contribuição.

Lançar mão do método heurístico de investigação científica significa adotar uma bússola para nortear o caminho de uma tese, minimizando o risco de se perder o alvo durante o trajeto.

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Pode-se destacar três leis básicas na aplicação da heurística: 1. A dúvida como princípio. Recurso no qual

levantamos um questionamento a respeito de todo conhecimento estabelecido, permitido contrapor pensamentos de correntes diversas.

2. A soberania das informações. Toda descoberta parte de um solo já estabelecido, deve-se considerar o referencial teórico acumulado sobre o tema pesquisado. Esta lei contradiz a primeira, uma característica da heurística que atenta para um caminho epistemológico incerto.

3. A capacidade de estranhar o familiar. O que está em jogo aqui é o talento do pesquisador para escapar da cegueira do egocentrismo, empreendendo um olhar curioso e distinto.

Agradecimentos

O presente estudo foi desenvolvido com o apoio da bolsa de isenção da Vice- Reitoria da Pontifícia Universidade Católica.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARTHES, ROLAND. S/Z. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,1992. 177p. DARTIGUES, ANDRÁ. O que fenomenologia? Moraes: São Paulo, 1992. 81p. DELEUZE, GILLES. Conversações. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992. 226p. ELIAS, NORBERT. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Zahar, 1994. 201p.

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FOUCAULT, MICHEL. Arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008. 244p.

FORTY, ADRIAN. Objeto de desejo. São Paulo: Cosac Naify, 2007. 347p. GEERTZ, CLIFFORD. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

321p. DUAILIBI, ROBERT E DIMONSEN, HARRY,JR. Criatividade & Marketing. Marron

Books, São Paulo, 2000. 137p. DUBOIS, PHILIPPE. Entrevista à Marieta de Moraes Ferreira e Mônica de

Almeida Kornis. In Estudos Históricos, nº 34, Rio de Janeiro, 2004. SAFATLE, VALDIMIR Lacan. São Paulo, Publifolha, 2009. 88p. VANOYE, FRANCIS E GOLIOT-LÉTE, ANNE. Ensaio sobre análise fílmica.

Campinas, SP: Papirus, 1994. 152p.

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Imagem Técnica: uma Abordagem Tecnológica sobre o Ensino do Design.

André Soares Monat 1

Breno Bitarello 2 Almir Mirabeau da Fonseca Neto 3

1 INTRODUÇÃO

Vilém Flusser, ao analisar o processo fotográfico de produção de imagens, afirma que o fotógrafo:

“Pode fotografar apenas imagens que constam do programa do seu aparelho. Por certo, o aparelho faz o que o fotografo quer que faça, mas o fotógrafo pode apenas querer o que o aparelho pode fazer. De maneira que não apenas o gesto mas a própria são programados” (FLUSSER, 2008: 28).

Deste modo, neste trabalho tentaremos verificar se, por meio de uma análise das tecnologias voltadas para a produção de imagens, é possível montar um panorama relacionando o design com seus meios de produção.

O objetivo deste artigo é analisar alguns aspectos dos meios de produção de imagem, a partir dos conceitos propostos por Flusser, levantando questões relativas ao ensino do design, buscando como objetivos específicos:

• Utilizar o conceito de imagem técnica de Flusser como ponto de partida para a compreensão de questões referentes ao processo de produção no design gráfico;

• Levantar dados bibliográficos relativos às tecnologias utilizadas para produção de imagens;

• Através dos conceitos propostos, levantar questionamentos sobre o ensino do design frente às inovações tecnológicas.

1 PhD em Engenharia de Sistemas e Computação, ESDI/UERJ 2 Mestrando em Design, ESDI/UERJ 3 Mestre em Design , ESDI/UERJ

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2 CONCEITOS E DEFINIÇÕES

Inicialmente definimos alguns conceitos que permitem analisar os meios de produção de imagens. A partir dessa análise, levantaremos questionamentos em relação as atividades projetuais e essas tecnologias. Para definir os termos da questão, nos apropriaremos de alguns conceitos propostos por Vilém Flusser. Esses podem ser encontrados em diversos ensaios e artigos escritos ao longo de sua vida. Neste estudo, utilizaremos como corpus para definição dos conceitos de imagem técnica na obra de Flusser os seguintes textos:

• Vilém Flusser, Uma Introdução, textos de especialistas no trabalho de Vilém Flusser, organizada por Gustavo Bernardo.

• Mundo Codificado, compilação de textos de Vilém Flusser, organizada por Rafael Denis.

• Filosofia da Caixa Preta, ensaio que resume várias conferências feitas por Vilém Flusser.

• O Universo da Imagens Técnicas, Elogio da Superficialidade, texto onde Flusser traz aprimoramentos e desdobramentos das ideias apresentadas na Filosofia da Caixa Preta. Antes, para entendermos melhor os conceitos de imagem técnica,

apresentaremos outros três conceitos: Ferramenta, Máquina e Aparelho. Flusser acreditava que o ato de fabricar nos define, assim, ao estudarmos as fábricas, estaremos estudando o homem. Segundo o filósofo, fábrica é o local onde o homem fabrica algo. Partindo dessa premissa, Flusser apresenta uma possível divisão da história humana em quatro períodos, definidos, ou pelo modo, ou pelo instrumental utilizados para fabricar. São eles:

1. Período das Mãos, onde se fabrica em qualquer lugar. Através das mãos convertemos algo que nos é dado pela natureza. A fábrica não tem local fixo;

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2. Período das Ferramentas. O homem muda de posicionamento e passa a ser rodeado por ferramentas, que são próteses ou extensões das mãos. Neste ponto, o homem é alienado da natureza e fica rodeado pela cultura. O homem se define pela sua profissão, e parafraseando Flusser, o sapateiro faz sapatos e os sapatos o fazem sapateiro. A fábrica cerca o homem.

3. Período das Máquinas. Surge uma nova mudança de posicionamento. A máquina é uma ferramenta produzida a partir de conhecimento científico, logo é mais eficiente e mais cara, neste ponto a máquina passa a ficar no centro e o homem passa a rodeá-la. O homem é expulso de sua cultura. O homem circunda a fábrica.

4. Período dos Aparelhos. Este é o período contemporâneo, os aparelhos são teoria científica aplicada e imitam funções neurofisiológicas do homem. Por exemplo, uma máquina fotográfica simula o funcionamento da nossa visão, parte do sistema nervoso. Os aparelhos são interdependentes com o homem, e podem ser usados em qualquer lugar. Segundo Flusser, neste aspecto, seria um retorno ao ponto inicial da história do homem, onde a fábrica podia ser em qualquer lugar. O aparelho é usado por um funcionário, a pessoa que se relaciona com o aparelho. Ele procura esgotar as possibilidades que o aparelho oferece. Como o fotógrafo que tira fotos infinitamente, sem nunca esgotar as possibilidades do aparelho ou da máquina fotográfica. Ainda segundo Machado: “O funcionário lida apenas com o canal produtivo e não com o processo codificador interno” (2001: 40). O funcionário manipula aparelhos, mas desconhece total ou parcialmente seu funcionamento e mecanismo gerador de imagens.

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É importante reafirmar que os conceitos acima descritos são

proposições que o filósofo colocou na forma de ensaios, devendo ser utilizadas na forma de insights e não como deduções ou induções científicas. Não seria impensável defender a idéia de que o ato de se apropriar de material não-biológico, é inato ao homem. Ou mesmo afirmar que o fogo e outras tecnologias descobertas em períodos remotos também não foram frutos de conhecimentos que podem ser considerados científicos.

Com isso em mente, podemos apresentar os conceitos centrais para a discussão proposta por esse trabalho: imagem tradicional e imagem técnica. Segundo Flusser, “imagens tradicionais são superfícies abstraídas de volumes enquanto as imagens técnicas são superfícies construídas com pontos” (FLUSSER, 2008: 15). Ao citar pontos, Flusser se refere tanto aos pontos de nitrato de prata fixados no filme da maquina fotográfica tradicional, quanto os pixels que compõem a imagem em uma câmera digital.

Assim, devemos entender que, pelo fato das imagens técnicas serem fruto de aparelhos e consequentemente de conhecimento cientifico aplicado, elas não são “ontologicamente relacionadas as imagens tradicionais, e sim um fenômeno sem precedentes no nosso passado” (FLUSSER, 2008: 15). Elas são fruto de cálculos, ou “pequenas pedras” que apesar de não poderem ser tocadas, vistas ou imaginadas, podem ser contadas e calculadas. Depois de calculadas elas podem ser computadas e construir: “linhas secundárias (curvas projetadas), planos secundários (Imagens técnicas) e volumes secundários (hologramas)” (FLUSSER, 2008: 17).

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3 ENSINO DO DESIGN

A necessidade de conscientizar os alunos e de conduzi-los pelo caminho das competências do hoje e do amanhã requer orientações não somente teóricas, mas também práticas, ou seja, torna-se essencial a união entre educação teórica e prática. A pesquisa teórica torna-se uma questão central para a prática do design e vice versa. Desta forma é possível ampliar o campo de investigações referentes à natureza do design de modo a compreender melhor seus métodos e princípios (Buchanan, 1998). A união entre teoria e prática, assim como a ligação do design com os mais variados campos do saber, possibilita ao designer não somente mapear problemas e questões, mas também pesquisar e definir rotas para a solução destes problemas.

Deste modo, o processo de ensino do design deve refletir as necessidades humanas com foco na constante adaptação e atualização por parte do profissional. Grande parte desta atualização é baseada no acelerado desenvolvimento tecnológico que atua ativamente nas mais diversas esferas do conhecimento implicando em mudanças radicais que atuam em diversos níveis: metodológicos; conceituais; projetuais e etc. Neste contexto, o advento de tecnologias livres (open source), softwares voltados para a área do design, e dispositivos eletrônicos diversos possibilitam métodos de experimentação e exploração não convencionais ao designer que necessita estar atualizado, ou seja, de conhecimento aprofundado das novas ferramentas tecnológicas utilizadas em seu processo criativo. 4 MATEMÁTICA E PRODUÇÃO DE IMAGENS

É claro que os dispositivos tecnológicos possuem uma enorme gama de possibilidades em suas configurações originais (hardware/software), logo a

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questão não é a limitação em termos quantitativos das possibilidades, mas sim em termos de possibilidades qualitativas que dependem do potencial de manipulação das tecnologias por parte do designer. Conhecer a lógica por trás dos aparelhos permite novas modalidades de exploração e planejamento àquele que os manipula. O designer ganha robustez não só em termos de pesquisa, mas também no que toca ao desenvolvimento, inovação e resolução de problemas através de novas rotas de reflexão, criação e aplicação de idéias (Owen, 1989; Buchanan, 1998).

A produção de resultados não previstos na fase de construção do aparelho implica na necessidade de intervenção direta em sua engenharia ou programa. Trata-se de penetrar e iluminar o interior escuro da caixa preta flusseriana, conhecer sua lógica e deste modo poder atuar alterando tanto seu programa quanto suas finalidades. Nas palavras de Arlindo Machado:

“o que faz um verdadeiro criador, em vez de submeter simplesmente a um certo número de possibilidades impostas pelo aparato técnico, é subverter continuamente a função da máquina que ele utiliza” (2001: 46).

5 IMAGENS TÉCNICAS=IMAGENS DIGITAIS

De modo clarear nossa linha de raciocínio, partiremos do conceito de

imagem técnica utilizado por Flusser vinculando e aproximando este às chamadas imagens ou mídias digitais (ambas as denominações funcionam já que tais propriedades não se restringem somente à produção de imagens).

O fato de mídias digitais serem trabalhadas por intermédio do computador implica em sua representação numérica, onde não só imagem, mas também vídeo e texto dentre outros podem ser descritos matematicamente. As estruturas e dados manipulados na criação destas mídias são ferramentas lógicas baseadas em algoritmos matemáticos que permitem sua transcodificação, ou seja, através do computador, as mídias

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digitais são transformadas em dados, fator este que possibilita sua utilização nos mais diversos formatos (Manovich, 2005). Pode-se dizer que neste caso, os objetos de estudo do designer gráfico se dividem em níveis. Ao lidar com esses códigos, o designer lida ativamente com formulações matemáticas que são materializadas e externalizadas facilitando seu estudo, compreensão e manipulação.

O trânsito entre as áreas da matemática e engenharia, artes e humanidades dentre outras, possibilita ao designer um rico conhecimento integrado generalista e crítico no que toca a conhecimentos específicos do campo do design.

Desta forma, está na contramão do esperado, a atitude de cursos de graduação em Design, de abandonar ou minimizar o ensino de ciências e matemática em seus currículos.

A maior justificativa para que designers tenham este importante conhecimento técnico científico, é o desejo de retira-los de uma incômoda posição passiva frente ao desenvolvimento dos aparatos que eles mesmo utilizam.

Por exemplo, designers estão entre os maiores usuários de softwares extremamente populares para manipulação de imagens, desenho vetorial, planejamento de produções gráficas e para CAD (Computer Aided Design) de produtos. Designers também se utilizam de estações de trabalho próprias para estes softwares. O projeto e aprimoramento destes sistemas e aparatos requer a participação de designers, mas como eles poderão contribuir na concepção destes sistemas se tal concepção requer um conhecimento científico e tecnológico para os quais o designer não foi bem preparado?

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Agradecimentos O presente estudo foi desenvolvido com o apoio da FAPERJ

(Laboratório de Design da Interação – ESDI/UERJ), Processo E26/111280/2010 , do CNPq (Laboratório de História do Design Brasileiro – ESDI/UERJ) Processo 477030/2009-2, CAPES – Bolsa de Mestrado e por recursos próprios da UERJ – Bolsa PROATEC REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERNARDO, G. Vilém Flusser, Uma Introdução. São Paulo: Anna Blume, 2008. BUCHANAN, R. Education and Professional Practice in Design. Design Issues. 14

(2): 63-66, 1998. ____________. Design Research: A Disciplined Conversation. Design Issues. 15

(2): 5-10, 1999. FLUSSER, V. Filosofia da Caixa Preta. Rio de Janeiro: Hucitec, 1985. ____________. A Dúvida. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1999. ____________. Mundo Codificado: Por uma filosofia do design e da

comunicação. São Paulo: Cosac Naify, 2007. ____________. O Universo das Imagens Técnicas, Elogio da Superficialidade.

Rio de Janeiro: Anna Blume, 2008. MACHADO, A. O quarto iconoclasmo e outros ensaios hereges. Rio de Janeiro:

Rios Ambiciosos, 2001. OWEN, C. L. Design Education and Research for the 21st Century. Design

Studies. 11 (4): 202-206, 1990.

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Instrumentalismo Epistemológico e Metodologia Não-Linear de Projetos de

Design

Richard Perassi L. Sousa 1 Lucas Müller de Jesus 2

Natália Pizzetti Cardoso 3

1 INTRODUÇÃO

Este artigo trata da metodologia não-linear aplicada a projetos de Design, com base nos princípios da doutrina epistemológica instrumentalista. A teoria do conhecimento tem por base diferentes pensamentos ou doutrinas e essas se relacionam com diversas ciências e suas áreas de aplicação, auxiliando no desenvolvimento do saber humano, como resultado da interação interpessoal e da relação com o ambiente natural e social. A despeito da questão sobre o conhecimento verdadeiro, o método científico-tecnológico foi indicado como instrumento de validação dos procedimentos formais, especialmente na área de Design.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 Sobre Metodologia de Projetos em Design:

Em consequência da rápida evolução nos meios de comunicação em rede como, por exemplo, a televisão digital (TVD), a implementação de novas

1 Doutor em Comunicação e Semiótica, professor do Mestrado em Design e Expressão Gráfica (Pós-Design) Universidade Federal de Santa Catarina. 2 Mestrando de Design Gráfico na Universidade Federal de Santa Catarina 3 Mestranda de Design Gráfico na Universidade Federal de Santa Catarina

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mídias e o crescimento nas taxas de acesso a internet4 promovem o acesso ao fluxo de informações e de conhecimentos de modo cada vez mais amplo, intenso e variado. Assim, estudiosos e profissionais de diferentes campos de atuação são expostos diariamente a uma extensa quantidade de informações referentes a diversas áreas do saber que, ao serem relacionadas com suas atividades, promovem o processo de multidisciplinaridade. Tratando dessa questão, no que tange a atividade do designer, Melo Filho (2009) coloca que:

Quanto à inovação e à criatividade, o design não pode ser colocado simplesmente como uma ferramenta, mas sim um processo inovador que usa a informação e o conhecimento a respeito de arte, ciência e comportamentos sócio-culturais. Tem-se como claro, portanto, a sua ação multidisciplinar, com efetivas possibilidades de prática comum a duas ou mais disciplinas ou ramos de conhecimento, atuando em sinergia e focando um objetivo comum [...]

Percebe-se no campo de Design, o enfoque multidisciplinar como um aspecto positivo, que auxilia no método de trabalho, através de diferentes visões enriquecedoras do projeto. Isso permite um entendimento mais amplo e interrelacionado, propondo o dialogo na disciplina e nas atividades de Design, com possibilidades provenientes de outras disciplinas e áreas do conhecimento.

O enfoque multidisciplinar na área de Design não é algo muito recente, porque nos anos de 1950, isso já havia sido sugerido no contexto da Escola Superior de Design de Ulm, na Alemanha. Porém, a partir dos anos de 1990, sob o conceito de multidisciplinaridade, houve a influência da área de Artes nos procedimentos metodológicos de Design, interferindo no seu 4 De acordo com o Suplemento da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), 2008, em três anos, o percentual de brasileiros a partir de dez anos de idade que acessou ao menos uma vez a internet via computador aumentou 75,3%, passando de 20,9% para 34,8% das pessoas ou 56 milhões de usuários, em 2008.

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caráter disciplinar. Essa influência foi mais recentemente contestada por Nascimento (2008):

[...] mencione-se um dos casos muito discutidos de imiscuência de um campo externo no fazer próprio do design: a assim denominada modalidade da “artistagem”, abordagem conceitual e metodológica nitidamente errônea que insiste em tentar conformar, centripetamente, exogenamente, com patente desconhecimento de causa, a atividade projetual do design às concepções, enfoques e métodos característicos das belas artes.

As discussões acerca do que é enfoque interdisciplinar e do que é influência perniciosa na tradição metodológica da área de Design são recorrentes. Contudo, na relação entre Design e Artes, Fuentes (2009) estabelece limites à questão, sob a premissa de que Design e Arte são atividades humanas que, apesar de relacionadas ou vinculadas, são absolutamente diferentes e não devem ser confundidas.

Na passagem do século XIX ao século XX, como período de consolidação da Revolução Industrial, a área de Design foi constituída sob a base teórica racionalista-positivista, cujo modelo metodológico era o método científico. O parâmetro metodológico-científico adaptado e aplicado no campo de estudos e atividades de Design indicou-lhe o caráter técnico-científico, estabelecendo sua distinção com os campos de Arte e de Artesanato.

Mais recentemente, a partir da segunda metade do século XX, a Escola Superior de Design de Ulm é indicada como base da tradição metodológica em Design, porque marcou o amadurecimento da teoria e da metodologia de Design ainda sob a postura científica (MELO FILHO, 2009).

A metodologia científica e os métodos de aplicação situam o campo de Design no processo tecnológico, estabelecendo procedimentos lógicos e

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funcionais, que sistematizam os aspectos relacionados à inspiração e à criatividade. Além da subjetividade do designer e da intersubjetividade estética, o campo de estudos e atividades de Design considera estrategicamente as necessidades sociais, as possibilidades tecnológicas e as potencialidades mercadológicas. Tradicionalmente, as pesquisas que tratam desse assunto mostram que a metodologia e a escolha do método são imprescindíveis para o êxito do resultado final dos projetos desenvolvidos (GOMEZ, PEREIRA e SCHLEMPER, 2005).

Há uma ampla bibliografia na área de Design, que trata de metodologias e métodos. As abordagens também são diversificadas, partindo de teorias meticulosas, que indicam rigidamente o processo metodológico, até outras mais liberais que prevêem procedimentos particularizados, inclusive, considerando aspectos individuais do designer. Todavia, as diferentes propostas se caracterizam pela abordagem científica, tendo em vista a própria evolução do conceito de Ciência e dos métodos científicos.

É possível, portanto, que acadêmicos e profissionais estudem a eficácia e as implicações de diferentes abordagens metodológicas, para então eleger aquela que satisfaça as suas necessidades, contemplando as características do cliente, do produto e do usuário.

O uso do método, com base nos estudos de metodologia científico-aplicada, é característico e serve como distinção e identificação da disciplina e das atividades de Design. Isso propõe a discussão sobre o papel e a validade do método na inserção da área de Design no campo do conhecimento científico-tecnológico, sob os mesmos parâmetros indicadores do método científico. Pois, na vertente positivista, a teoria e o método científico são percebidos como o caminhos da verdade e, na vertente instrumentalista, são considerados como recursos úteis para soluções pragmáticas e circunstanciais.

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2.2 Sobre o Instrumentalismo e Método. Na área de Filosofia da Ciência, a palavra “instrumentalismo” tem

sido empregada para designar a concepção na qual os enunciados teóricos, como as leis científicas, apresentam valor metodológico e pragmático5, como bons instrumentos de predição. O “instrumentalismo semântico” propõe que os enunciados não podem ser verdadeiros ou falsos, porque são metáforas que não correspondem às coisas do mundo, mas são úteis para se fazer predições sobre estados futuros de coisas particulares. Por sua vez, o “instrumentalismo epistemológico” admite os enunciados teóricos como construtos capazes de corresponder aos estados das coisas no mundo. As duas concepções de instrumentalismo concordam, entretanto, que é necessário e mais importante o caráter instrumental dos enunciados científicos (DUTRA, 2005).

A tradição clássica em lógica considera que existem dois tipos básicos de enunciados: (1) os singulares, que basicamente tratam de um indivíduo determinado, e (2) os gerais, que tratam de indivíduos quaisquer. Há exemplos clássicos propostos por Dutra (2005): “Platão é um filósofo grego” e “Sócrates é um filósofo grego” são enunciados singulares ou particulares, mas na frase “alguns filósofos são gregos” o enunciado é geral. Sabe-se que Platão e Sócrates são filósofos e gregos, assim os enunciados singulares são verdadeiros e, a partir dos enunciados singulares, conclui-se que o enunciado geral também é verdadeiro. Mas, o enunciado geral é verdadeiro por

5 Em um sentido geral, “pragmático” significa concreto, aplicado, prático, e opõe-se a teórico, especulativo, abstrato. Daí Kant ter intitulado uma de suas últimas obras a Antropologia de um ponto de vista pragmático (1798), já que esta trata do sujeito empírico, em oposição ao sujeito transcendental, isto é, do homem em sua existência concreta. (Dicionário Básico de Filosofia).

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inferência sem permitir o acesso direto ao estado de coisas correspondente no próprio enunciado. Assim, o valor de verdade dos enunciados gerais é sempre decidido com base no valor de verdade de algum enunciado particular (DUTRA, 2005).

Considera-se que “metodologia” é o campo de estudos dos métodos em geral (JAPIASSU e MARCONDES, 2001, p. 130). Mesmo quando propostos por diferentes metodologias científicas, os métodos são basicamente sistemas de organização de procedimentos para obtenção, confirmação ou validação de enunciados particulares. Assim, na perspectiva indutiva, busca-se enunciados particulares que permitam a formulação de enunciados gerais e, na perspectiva dedutiva, busca-se confirmar a hipótese que, anteriormente, foi é apresentada como enunciado geral, por meio de evidências posteriores determinadas por enunciados particulares.

Com a evolução da Ciência e de seus métodos, houve a integração das perspectivas dedutiva e indutiva, como etapas de um mesmo processo de pesquisa. No caso da metodologia de Design, depois da visão idealista, cuja prioridade era a perspectiva dedutiva, a perspectiva indutiva e os processos integrados também foram propostos e adotados, especialmente nas metodologias não-lineares.

2.3 Instrumentalismo e Metodologia Não-linear de Projetos de Design

A metodologia não-linear de projetos de Design difere de outras metodologias estudadas na academia, cuja característica de linearidade mantém o foco do projeto no problema. Por sua vez, a estruturação não-linear sugere que o processo metodológico siga o pensamento do designer que desenvolve o projeto (GOMEZ, PEREIRA e SCHLEMPER, 2005).

A base teórica da não-linearidade é atribuída a autores como Piaget e Vygostski, porque esses defenderam a não-linearidade do pensamento humano. “Para Piaget, o desenvolvimento mental dá-se espontaneamente a

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partir de suas potencialidades e da sua interação com o meio” e de acordo com Vygostski a “relação entre pensamento e palavra acontece em forma de processo, constituindo-se em um movimento contínuo de vaivém do pensamento para a palavra e vice-versa” (BASSO, 1997, p.34). A citação a seguir é um exemplo possível da não-linearidade do pensamento, confirmando que a percepção do todo é mais abrangente do que a soma ordenada das partes. Assim, a desordem das letras não compromete a leitura do texto:

De acordo com uma pqsieusa de uma uinrvesriddae ignlsea, não ipomtra em qaul odrem as lrteas de uma plravaa etãso, a úncia csioa iprotmatne é que a piremria e útmlia lrteas etejasm no lgaur crteo. O rseto pdoe ser uma ttaol bçguana que vcoê pdoe anida ler sem pobrlmea. Itso é poqrue nós não lmeos cdaa lrtea isladoa, mas a plravaa cmoo um tdoo.6

Como exemplo, indica-se que uma proposta metodológica não-linear de projetos de Design foi apresentada como tese de doutoramento por Gomez (2004), fazendo referência a uma expressão da área de Marketing, mas numa perspectiva específica de Design. Assim, o autor propôs “Os 4 Ps do Design”, sendo esses: “posicionamento de mercado”, “problema”, “proposta” e “produto”.

Nessa proposta metodológica não é indicada uma sequência ordenada e não é indicado um momento exclusivo para que seja abordada uma etapa específica. O início do projeto acontece a partir de qualquer etapa: “posicionamento de mercado”, “problema”, “proposta” e “produto”. Inclusive, pode contemplar mais de uma etapa. As ferramentas, os métodos e as técnicas permeiam a proposta, mas devem ser pensadas como conhecimento

6 Texto encontrado na internet. Disponível em: http://www.abin.gov.br/modules/mastop_publish/?tac=Testes

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adquirido fora do processo metodológico, conforme esclarece a citação a seguir:

No uso dos “4 P’s” o mais complicado talvez seja definir por onde começar, já que se pode começar a partir de qualquer ponto do projeto ou ainda a partir de diversos pontos do projeto ao mesmo tempo. Essas afirmações demonstram a importância de um trabalho colaborativo onde, com a multiplicidade de informações e situações de mercado, a participação de diversas pessoas com opiniões diferenciadas conseguem soluções mais adequadas a realidades de mercado. (GOMEZ, PEREIRA e SCHLEMPER, 2005)

A ordenação sistemática determinou a configuração clássica do pensamento e do método científico e, também, dos métodos tradicionalmente desenvolvidos para a área de Design. Todavia, houve a evolução decorrente da transformação de diversos aspectos e fatores, a começar pela ampliação da complexidade no contexto de atuação e nos problemas propostos, indicando a necessidade de sofisticação do pensamento, dos métodos e, também, do conhecimento científico-tecnológico.

A despeito da questão ontológica sobre a natureza verdadeira ou instrumental do pensamento e do método científico-tecnológico. Especialmente na área de Design, o método é o parâmetro de coerência lógico-aplicada, que distingue os estudos e as atividades de Design do experimentalismo puro e simples, o qual pode ser avaliado apenas por critérios puramente subjetivos ou intersubjetivos, que são pertinentes e aceitos no campo de Artes, mas não são reconhecidos no campo científico-tecnológico.

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Independente de outras questões epistemológicas que também são pertinentes e relevantes, o método sistemático racional e coerente é, portanto, o instrumento útil e distintivo que qualifica o campo de Design como científico-tecnológico.

De modo geral, o instrumentalismo independente da aceitação dos filósofos sobre a possibilidade do conhecimento humano atingir a verdade absoluta. Pois, necessários são os instrumentos teórico-práticos para a configuração das teorias científicas. Esse pensamento pode ser encontrado na essência da metodologia não-linear de projeto de Design, que pretende alcançar resultados circunstanciais eficientes para o enfrentamento dos desafios indicados, durante a composição e o desenvolvimento do projeto proposto. Inclusive, isso estabelece a não-linearidade do método, permitindo a partir de etapas pré-definidas a composição de roteiros metodológicos específicos para cada situação em particular:

Mudar a idéia de se definir primeiro um problema pode parecer um pouco difícil de ser colocada, principalmente, a acadêmicos e profissionais que tiveram uma formação básica nesse sentido. Mas, se as “inteligências múltiplas” e a não-linearidade do pensamento humano forem consideradas, pode ser muito mais fácil de convencer os designers a estruturar seus projetos a partir de uma metodologia clara e adequada a cada novo desafio projetual (GOMES, PEREIRA e SCHLEMPER, 2005).

O caráter instrumental, que é adotado em oposição à idéia de proposição única e verdadeira, assinala a não-linearidade do método, também, com base na não-linearidade do pensamento humano e, ainda, na não-linearidade das teorias científicas. As descobertas e as teorias científicas não apresentam uma evolução linearmente continuada, uma vez que estudos são constantemente refeitos.

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Para tanto, muitas vezes, retroage-se a premissas propostas em momentos anteriores ao tempo de proposição das premissas que sustentaram as teorias que agora foram superadas. Assim, de maneira cíclica, novas considerações e teorias acerca de fenômenos já conhecidos são colocadas à disposição da cultura científica.

O escopo instrumentalista, assim como a estruturação não-linear, permite e incentiva a constante renovação do conhecimento, porque considera a constante revisão de pensamentos e procedimentos, gerando oportunidades de melhorias dos resultados obtidos, tanto nos estudos científicos quanto nos projetos de design.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Consciente da riqueza de informações e de conhecimentos disponível na atualidade, o campo profissional nas diferentes áreas vem se tornando cada vez mais qualificado. No campo de Design, os projetos estão mais complexos e diferenciados. Nesse contexto, além de ser elemento característico de Design, o método necessita ser pensado e desenvolvido como instrumento eficiente para enfrentar desafios intelectuais, tecnológicos e financeiros, integrando conhecimentos de diferentes áreas do conhecimento, para configurar um projeto multidisciplinar.

Aceitar a não-linearidade do pensamento humano implica também na negação da crença em um percurso metodológico único, como sendo o roteiro único e verdadeiro. A despeito da possibilidade do reconhecimento da verdade, a concepção instrumentalista se mostra pertinente na medida em que desobriga as idéias e o método de serem expressão da verdade epistemológica, indicando-os como bons instrumentos de predição de possibilidades futuras.

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Comparando-se os princípios regidos pela doutrina instrumentalista com as crenças cientificistas do positivismo idealista-ortodoxo, percebe-se que há um investimento no processo científico evolutivo e aproximativo com a realidade, sendo que essa realidade é também alterada e redefinida pelo próprio progresso científico. Isso qualifica igualmente a metodologia não-linear de projetos de Design, que propõe a configuração do método a partir dos desafios circunstanciais da realidade percebida e da realidade pretendida, prevendo ainda constantes atualizações.

Ressalta-se, entretanto, que a concepção instrumentalista não invalida ou desacredita quaisquer métodos de base científica, mesmo que sejam lineares e mais ortodoxos. Pois, de modo geral, essa concepção filosófica adota pensamentos e procedimentos como instrumentos ou recursos preceptivos da realidade, sem defini-los ou indicá-los como expressões da verdade. Portanto, deve-se estar ciente do que rege as metodologias, uma vez que devem ser cientificamente válidas e passíveis de serem adequadas ao enfrentamento dos desafios propostos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BASSO, M. V. Informática educativa e comunidades de aprendizagem.

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Interdisciplinaridades no Design Contemporâneo

Mônica Moura1

1 INTRODUÇÃO

Este artigo discorre sobre as relações entre métodos e processos no campo do design, enfocando algumas discussões e reflexões a respeito da contemporaneidade e do design contemporâneo. O que se dá a partir do exame das características e possibilidades para a constituição de processos interdisciplinares compostos pela inter-relação da metodologia de ensino, metodologia científica e metodologia projetual. Nesse sentido, reflete sobre a prática pedagógica interdisciplinar, o ensino por projeto, as dificuldades e desafios, o estabelecimento das relações dialógicas, o confronto com as políticas educacionais e com a prática docente. Apresenta as fases de desenvolvimento de uma proposta e de um processo interdisciplinar na busca pela valorização da construção do conhecimento e do pensamento projetual sintonizado com as questões contemporâneas.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 Métodos e Processos no Campo do Design

Metodologias, métodos e processos são inerentes ao design e deflagraram a necessidade, cada vez maior, da pesquisa. Atualmente, as palavras metodologia e pesquisa têm sido muito utilizadas e empregadas em diferentes conotações e para diferentes objetivos. Não se relacionam apenas à

1 Doutora em Comunicação e Semiótica. Professora Assistente Doutor em Design, Professora e Orientadora no Programa de Pós Graduação em DESIGN da UNESP - Universidade Paulista “Júlio de Mesquita Filho” | FAAC – Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação | Campus de Bauru.

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pesquisa científica, mas também dizem respeito a todo caminho de procedimentos adotados para se construir algo, seja a avaliação ou o desenvolvimento de um produto ou sistema, seja para o desenvolvimento de um software ou de um produto para mídia digital. Coelho (1999) aponta que “é perfeitamente plausível que se eleja em determinado trabalho que as etapas de um processo passem a coincidir com as etapas do método”.

A partir da década de 1960, vários autores se debruçaram sobre a questão da metodologia e, certamente, tomaram como referência a filosofia e a teoria do conhecimento científico para o desenvolvimento de uma metodologia do design. Ao nomearem o processo ou método desenvolvido como metodologia do design, esclareciam que tratava-se de outra forma de metodologia e, ao mesmo tempo, referiam-se à base formadora que era a metodologia da pesquisa científica. Proveniente da mesma base fundadora, porém diferente. Bürdek (2006) aponta que a metodologia científica abrange muito mais do que a metodologia do design. Outro exemplo nessa linha é a adoção na escola de ULM (HfG ULM) de várias disciplinas de caráter filosófico, científico e das ciências humanas (Teoria da Ciência, Semiótica, Sociologia, Antropologia, Ciência Política, Psicologia, Cibernética) que promoveram a associação das questões pertinentes à pesquisa com a configuração de produtos para a indústria.

“Com um interesse especial nas relações entre ciência e desenho, a Escola Superior da Forma abrigou o desenvolvimento de pesquisas que envolviam disciplinas científicas, visando a adoção de seus respectivos métodos no processo de criação de projeto. Entre essas disciplinas destacavam-se a cibernética, a heurística, a psicofísica, a ergonomia e a antropologia. Os debates permitiram sistematizar, por meio de agrupamentos, diversos métodos passíveis de serem aplicados no momento de desenhar os

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produtos. Havia um enfoque matemático predominante cuja intenção era acometer metodologicamente o verdadeiro processo de configuração dos produtos”. (Fontoura: 2009, online)

Maldonado e Bonsiepe (1964) afirmam que em ULM não havia uma

metodologia de validação geral do projeto de produtos, mas sim “um punhado de métodos”, sendo alguns com base na matemática.

Entre os designers, engenheiros e autores em geral que a partir da década de 1960 desenvolveram estudos de métodos visando uma metodologia do design, destacam-se, Morris Assimow (1962), Bruce Archer (1963/4), Tomás Maldonado e Gui Bonsiepe (1964), John R.M. Ager e Carl V. Hays (1964), Christopher Jones (1969), Bernhard Bürdek (1975), Siegfried Maser (1976), Bernard Löbach (1976), Bruno Munari (1981), Nigel Cross (1984, 1989), Tony Buzan (1991/2002), Norberto Chaves (1996), Mike Baxter (2000), Joan Costa (1980), Jorge Frascara (1988), entre outros.

A questão do método ou processo de design, a relação metodologia científica e metodologia do design ou metodologia do projeto ou, ainda, metodologia projetual, bem como o papel da pesquisa no campo do design são temas recorrentes e que continuam sendo estudados, investigados e propostos. Ou seja, o tema apresenta grande importância, especialmente, se visto a luz da contemporaneidade.

Se o design estabelece intensas relações com as questões culturais, sócio-políticas e econômicas nos cabem verificar os aspectos da contemporaneidade para refletir sobre as possibilidades de novas formas de métodos e metodologias projetuais.

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2.2 Contemporaneidade

Desde a pós-modernidade continuamos a viver uma intensa mudança de paradigmas, intensificadas pela aceleração do tempo e aproximação dos espaços físicos, geopolíticos e culturais. Tempos esses considerados hipermodernos. O emprego do sufixo encontra-se muito presente em nossas vidas em várias hipérboles reais: hipermercados, hipertextos, hiper vias de informação, estruturas hipermidiáticas.

Lipovetsky e Sebastien (2004) nos falam da hipermodernidade como o tempo dos exageros que povoam nosso cotidiano e potencializam as possibilidades de informação, comunicação e expressão, mas ao mesmo tempo, fragilizam o ser humano. Aprofundando essa questão da hipermodernidade, Lipovestky e Serroy (2011) trazem recentemente suas considerações a respeito da contemporaneidade, ampliando a questão, e, referem-se a ‘cultura-mundo’, indicando que:

“Com a cultura-mundo, dissemina-se em todo o globo a cultura da tecnociência, do mercado, do indivíduo, das mídias, do consumo; e, com ela, uma infinidade de novos problemas que põem em jogo questões não só globais (ecologia, imigração, crise econômica, miséria do Terceiro Mundo, terrorismo...), mas também existenciais (identidade, crenças, crise dos sentidos, distúrbios de personalidade...). A cultura globalitária não é apenas um fato; é, ao mesmo tempo, um questionamento tão intenso quanto inquieto de si mesma.” (Lipovetsky e Serroy: 2010, p.9)

Mediante essa inquietude da ‘cultura-mundo’ e perante a situação contemporânea que é plural e de uma rapidez insólita, verificamos que a abordagem do contemporâneo não é fechada e nem conclusiva, uma vez que viver ao mesmo tempo em que expressões e produções são construídas e

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reveladas, exige a incorporação da atitude da flexibilidade, tanto no estudo e na pesquisa quanto na observação e análise.

Para Barthes (1974) o contemporâneo é intempestivo, pois nos surpreende com resposta e dinâmicas inusitadas. Enquanto Agamben (2009) afirma que é verdadeiramente contemporâneo aquele que percebe e apreende seu tempo pelo deslocamento e anacronismo. Ou seja, para compreender o contemporâneo temos de nos deslocar no tempo histórico a fim de entender o que ocorre no hoje e, também, para poder observar o que não está de acordo com a época, de forma a olhar e refletir mais cuidadosamente sobre o momento atual.

“E por isso ser contemporâneo é, antes de tudo, uma questão de coragem: porque significa ser capaz de não apenas manter fixo o olhar no escuro da época, mas também de perceber nesse escuro uma luz que, dirigida para nós, distancia-se infinitamente de nós”. (Agamben: 2009, p. 65)

Esse olhar atento e cuidadoso para o contemporâneo sob a ótica do design implica em conhecer a história, analisar os produtos, acompanhar as produções, os movimentos culturais, as políticas, bem como perceber o desenvolvimento do ensino, dos estudos e das pesquisas. Mas também em observar e refletir sobre as formas diferenciadas de criação, expressão e comunicação. Os discursos construídos nas várias relações que se estabelecem na vida e na relação do homem com as atitudes, o modo de vida, os objetos e sistemas das diferentes naturezas. Refletir e analisar o ato, o processo e o método de projetar, transformar, inovar tanto os objetos contextualizados quanto os recontextualizados, dando espaço ao inusitado, ao inovador, a inter-relação entre as diferentes disciplinas e campos do conhecimento humano. Pensar o ser humano e as questões relacionadas ao viver, das mais simples às mais complexas. Pensar sobre a história do homem, suas referências e sua capacidade de adaptação ou de transformação perante as possibilidades

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midiáticas, interativas, virtuais e imateriais, bem como no objeto material e todo o seu entorno. Essas reflexões devem ser sempre pautadas e abertas às novas dinâmicas, afinal, o momento a ser observado é o presente, mas onde também deve ser incluído o passado recente e as relações históricas, visando uma melhor abordagem de análise, comparação e interpretação relacionada a produção de conhecimento, a projetação e as possibilidades de prospecções do futuro.

Essa relação de possibilidades de reflexões, leituras, análises, traduções e construção de pensamento nos torna conscientes da realidade e nos aponta algo maior que é a complexidade na qual vivemos, bem como traz uma abertura de horizontes para compreender o nosso mundo e o nosso tempo. Nessa complexidade se inserem as questões interdisciplinares e transdisciplinares, presentes tanto na questão do ensino, como no desenvolvimento de projetos e de pesquisas, indicando novos métodos e processos projetuais para o design contemporâneo. 2.3 Design Contemporâneo

Visando a melhor consideração a respeito das possibilidades de método e processos em design afeitos a contemporaneidade, cabe aqui elucidar o que se considera o design contemporâneo e apontar as principais questões pertinentes a contemporaneidade.

Bonsiepe (1992) nos lembra de que as transformações da sociedade, da cultura e da tecnologia se refletem nas mudanças do próprio conceito de design e das temáticas do discurso projetual. Entendemos como discurso projetual todo o conjunto que compreende desde a concepção e adoção da metodologia do design, o desenvolvimento e a produção do produto; seja qual for a sua natureza ou segmento; até as implicações junto ao usuário e a sociedade.

Podemos, então, inferir que o design contemporâneo é uma ação de tradução do momento presente que permite delinear o futuro. Parte da

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observação e análise do ser humano e do tempo presente no qual vivemos e do passado próximo. Nessa ação, dissemina influências na vida do homem a partir dos objetos, sistemas, serviços, métodos e processos concebidos, desenvolvidos e produzidos.

O design contemporâneo é marcado e constituído pelo rompimento de fronteiras e integração entre as diversas áreas dialógicas a esse campo, tais como a arte, a arquitetura, a engenharia, a moda, a sustentabilidade mais diretamente, e outras que parecem distantes, mas que também atuam em conjunto, tais como a medicina, a física e a biotecnologia. Inclusive, Bürdek (2006) aponta que a pesquisa genética associada à informática – bioinformática – possibilitará novas tarefas para o campo do design e até o corpo humano passará a ser objeto de design, em um futuro muito próximo.

O modo de atuação no design contemporâneo se faz principalmente por meio da noção e do sistema de coletivos. Ou seja, grupos de criação e desenvolvimento de projetos e produtos onde são relacionados diferentes saberes, provenientes de diferentes áreas de formação e atuação de seus integrantes. Essas novas formas de organização de grupos sem hierarquias reafirmam o esfacelamento do conceito de autoria e confirmam a ação interdisciplinar e as possibilidades transdisciplinares presentes na ação projetual e política. Retomando novamente Bürdek (2006), esse designer e autor afirma que na atualidade objetos e produtos adquirem novos significados e são utilizados em novas e outras situações de vida, portanto o mundo contemporâneo, que é cada vez mais complexo, não pode ser dominado pelo designer individualmente.

No design contemporâneo podemos perceber a presença das questões da diversidade, multiplicidade, confronto e visões de mundo diferenciadas, interações entre imaginários e culturas, novas construções materiais e simbólicas, multidimensionalidades, fragmentações, metamorfoses, hibridismo e consciência ambiental como elementos característicos dos discursos desenvolvidos e construídos no cotidiano.

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Também observamos que ocorre a diluição dos segmentos da área do design no sentido de um pensar o design como um todo, um campo maior e mais abrangente, incorporando atitudes e desafios políticos e sociais em busca de um pensamento projetual mais amplo e consistente.

Na contemporaneidade o design tem configuração diversa, com inúmeras possibilidades de relações e associações. É uma grande rede, um tecido repleto de significações e semioses resultantes do entrelaçamento e articulação de signos que geram linguagens diferenciadas. Essa grande rede flexível atua na esfera da informação, comunicação e expressão, produzindo diferentes níveis de conhecimento, tendo como o foco central o homem e as dinâmicas e as produções culturais que o envolvem. É um universo plural e aberto, um campo amplo e fértil que retrata e impulsiona os hábitos, estilos de vida, o viver e estar no mundo, escrevendo a história do cotidiano. 2.4 Possibilidades e Relações no Design Contemporâneo

Considerando a complexidade do momento em que vivemos, o qual não apenas influencia, mas se faz presente no campo do design, apresentamos um diagrama com algumas possibilidades de relações no design contemporâneo.

Na perspectiva do diagrama acima o Design é apresentado como um amplo campo que estabelece relações com diversos conceitos, diferentes áreas e segmentos que colaboram e se sintonizam para o desenvolvimento e a reflexão neste campo, bem como para o desenvolvimento de objetos e sistemas destinados ao homem nesses tempos múltiplos da complexidade. O Design diz respeito ao ato de projetar e conceber objetos de uso e sistemas de informação (vide Bomfim: 1999), esses por sua vez, são destinados ao homem, seja em seu papel de receptor, usuário ou interator/interagente que podem estar na categoria de clientes ou outros profissionais com os quais o designer, seu projeto e produto se relacionam.

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Figura 1: Diagrama Relações do Design Contemporâneo. Elaboração de Mônica Moura.

O campo do design diz respeito às relações com a tecnologia, mídias, métodos, propostas e/ou soluções a serem desenvolvidas a partir das percepções do mundo e das percepções sensoriais. Para expressar essas questões, o designer utiliza os processos de criação, experimentação e as características das linguagens de cada meio. Ainda, o Design se desenvolve por meio de pesquisas, desde as científicas e referenciais até as de mercado e de análise de similares junto ao usuário ou público-alvo.

A interdisciplinaridade pode ocorrer por dois aspectos. O primeiro pode ser compreendido pelo universo de relações dialógicas e de diferentes

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conhecimentos que são desenvolvidos junto a outros profissionais e segmentos que o designer necessita para o desenvolvimento de seu produto, tais como os relacionados à produção, mercado, serviços, comércio e indústria (vide Couto: 1999). Por outro lado, há uma relação interdisciplinar mais complexa que se desenvolve por meio de projetos interdisciplinares que implicam no desenvolvimento de pesquisas científicas e referenciais nas quais aspectos como subjetividade, coletividade, cultura, sociedade, política, economia e a dinâmica de mudanças da vida do homem devem ser consideradas. Portanto, diferentes saberes constroem um objeto novo que não pertence exclusivamente a nenhuma das disciplinas que o geraram ou que possibilitaram essa relação interdisciplinar (vide Barthes: 1988). O aprofundamento dessas questões e o desenvolvimento de projetos com equipes compostas por profissionais de diferentes áreas e relacionando diferentes ciências, rompendo fronteiras e divisões, sejam elas corporativas ou acadêmicas, possibilita o desenvolvimento da transdisciplinaridade.

Todas essas questões e relações são pautadas na busca do equilíbrio entre o ambiente, a qualidade de vida do ser humano e a sustentabilidade dos meios, processos e dos produtos.

2.4 Metodologia de Ensino em Design: Método e/ou Processo Interdisciplinar Chegamos à consideração de que o método ou processo

interdisciplinar é adequado ao desenvolvimento dos projetos contemporâneos na área do design a partir das constatações e resultados obtidos no desenvolvimento de uma pesquisa coletiva e de uma prática educacional que foi desenvolvida e examinada durante quinze anos2.

2 Essa pesquisa foi desenvolvida de 1994 a 2002, inicialmente, no Grupo de Estudos Design e Tecnologia que gerou projetos de pesquisa a partir de 2003 e a formação de um Grupo de Pesquisa, validado pelo CNPq em 2004, tendo permanecido ativos até 2009.

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Claro que por um lado, é muito estranho falar em interdisciplinaridade quando ainda atuamos com divisões bem delimitadas entre faculdades e departamentos, compostos por cursos seriados organizados em disciplinas e períodos/semestres. Isso, à primeira vista, nos parece uma situação estanque e impeditiva para o exercício interdisciplinar. Porém, vimos que é possível estabelecer processos interdisciplinares mesmo estando dentro dessa realidade.

Por outro lado, sabemos que tanto a educação quanto o design contemporâneo são campos de conhecimento onde a interdisciplinaridade pode e deve ser explorada amplamente. Fato que é apontado por diversos autores, tanto educadores quanto designers e pesquisadores, entre outros, Barthes (1988), Piaget (1990), Margolin (1995), Dewey (1997), Pires Ferreira (1997), Fazenda (1998), Couto (1999), Bomfim (1997 e 1999), Morin (2000), Freinet (2003) e Buchanan (2001).

A interdisciplinaridade é complexa e desafiadora, pois lida com os imprevistos típicos da mobilidade e das diversas verdades, acepções, respostas e propostas coletivas. Não se faz apenas pelo discurso, implica prática efetiva e reconstrução permanente, afinal é um ato de construção do conhecimento que ocorre por meio de um processo, de um método que não é estanque. Tanto pode ser estabelecida por um movimento das partes em relação ao todo quanto do todo para as partes e, assim, desenvolver uma produção por meio do pensamento da totalidade. É uma prática pedagógica que vai atuar no sentido de diluir a compartimentação do ensino através do trabalho em suas especificidades caminhando para a compreensão da totalidade no sentido de pensar no conjunto, no todo, em oposição ao ensino fragmentado.

É um olhar para o projeto no sentido maior e mais amplo, desenvolvido pela ação da pesquisa e por todo um conjunto constituído pela seleção e edição das informações de naturezas diversas focadas em uma temática e em um recorte que constituem o produto final. Portanto, um

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projeto interdisciplinar só poderá ser desenvolvido mediante a quebra de barreiras das questões disciplinares isoladas.

2.4.1 Método e/ou Processo Interdisciplinar no Ensino por Projeto

Uma forma de quebrar as barreiras disciplinares é trabalhar com a proposta de um projeto que envolva todas as disciplinas presentes em um semestre ou período de curso. A temática do projeto interdisciplinar deve ser tratada e enfocada em todos os conteúdos visando um processo de ensino, que também pode ser denominado ensino por projeto. Nessa situação, os professores deverão rever os conteúdos das disciplinas mediante cada proposta de projeto. Isso implica na adoção da flexibilidade do conteúdo curricular, mas não significa perder a essência do conhecimento a ser tratado na disciplina e sim na potencialização da importância dessa disciplina, tanto no projeto interdisciplinar quanto no escopo do curso em questão, uma vez que a ação do professor ao rever os conteúdos e atualizá-los constantemente permite a integração de conceitos fundamentais da disciplina às questões contemporâneas, analisando a realidade intra e extra escolar. Isso permite também ao aluno estabelecer conexões e perceber a amplitude de cada área do saber em design. Considerando aqui a importância de uma disciplina como uma área de saber na constituição da formação do designer.

Isso aponta também a redução da quantidade de trabalhos disciplinares, uma vez que o projeto interdisciplinar torna-se o maior norteador dos processos de acompanhamento, verificação e avaliação da relação ensino-aprendizagem. Mas não implica em perder a identidade da disciplina, que é o grande medo da maioria dos professores, muito menos perder a autonomia como docente. Mas sim perceber como a sua disciplina contribui e é importante para a construção de um trabalho coletivo e efetivo.

É a estruturação do conteúdo entre as disciplinas e o conhecimento universalmente produzido que se dá pela interpenetração dos conteúdos que ocorrem a partir de uma postura política-pedagógica onde o espaço da sala é

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assumido por um educador-pesquisador-orientador que supera o trabalho individual em busca da produção coletiva e interage entre os conteúdos trabalhados e o cotidiano, a partir de problematizações e questionamentos. Não é apenas a soma das disciplinas, mas o inter-relacionamento de métodos e linguagens.

Um dos aspectos mais importantes no desenvolvimento de um processo para o projeto interdisciplinar é o fato de que essa atitude vai buscar trazer para o cotidiano da sala de aula como as realidades e as verdades do nosso tempo podem ser discutidas, elaboradas e trabalhadas pelo aluno no sentido de ampliar seu repertório a partir da esfera circundante, das propostas e dos desafios eleitos.

Na relação interdisciplinar tanto o professor como o aluno são agentes, elaboram e reelaboram ideias e pesquisas, criam e desenvolvem um produto que será fonte para novas ideias e reflexões sobre o ato de ensinar e aprender, sobre o ato e o processo de criar e desenvolver, sobre o processo de conceber e projetar.

2.4.2 Método e/ou Processo Interdisciplinar e as Políticas Educacionais

Estes desafios envolvem também as políticas educacionais, pois permeiam a postura e a necessidade de um docente que tenha grande trânsito e um repertório cultural sempre renovado no movimento das novas propostas que são desenvolvidas. Portanto, a interdisciplinaridade também implica em um processo sistematizado de capacitação dos recursos humanos, do planejamento global e na definição de conteúdos fundamentais para o processo de ensino e aprendizagem.

O que significa capacitar recursos humanos. O que pode se dar a partir do incentivo para a formação de grupos de estudo, grupos de pesquisa, na organização de palestras, seminários, encontros e minicursos destinados aos docentes, com profissionais, professores e pesquisadores convidados que tragam discussões de realidades diversas daquelas vivenciadas pelos

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professores. É muito produtivo que esses profissionais convidados ao debate e a troca de experiências apresentem questões relacionadas aos temas eleitos para os projetos interdisciplinares a serem desenvolvidos. E, também, é muito proveitoso quando esse diálogo se estabelece com professores, pesquisadores e profissionais de outras áreas e de outras ciências, além da esfera específica do design.

Ainda, o incentivo aos docentes para a formação continuada é outro aspecto de grande importância e que deve permear as políticas educacionais e institucionais. O apoio para cursos de especialização lato sensu e para mestrados e doutorados na pós-graduação stricto sensu. Ações essas que permitirão uma amplitude de questionamentos e desenvolvimento de conhecimentos para a realização de novas propostas interdisciplinares e até a atuação com possibilidades transdisciplinares.

2.4.3 O Processo Interdisciplinar, o Espaço Físico e a Estrutura Pedagógica

Outro aspecto que impede sobremaneira a existência efetiva dos processos interdisciplinares é a busca do ideal de espaço físico nas instituições. Claro que, em um universo ideal, as salas de aula não deveriam ter paredes e deveriam ser configuradas como um espaço misto que associasse uma minibiblioteca; ambientes de estudo e pesquisa; ateliê, estúdio e/ou escritório de design com equipamentos e materiais adequados, como pranchetas integradas a computadores e periféricos, projetores, mesas de trabalhos coletivos, espaço para armazenamento de material do processo de desenvolvimento, grandes painéis para exposição e discussão dos trabalhos.

Também seria o mundo ideal a possibilidade de ter ao mesmo tempo vários professores atuando em conjunto com os grupos de alunos durante diversos dias da semana e na maior parte da carga horária das disciplinas e do curso. Isso é o ideal, mas se a indisponibilidade de espaço físico e de recursos financeiros nos impedirem de desenvolver uma proposta

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interdisciplinar significa que não estamos prontos para atuar com a interdisciplinaridade.

Podemos romper fronteiras físicas com o simples exercício de deslocamento entre salas, laboratórios e ateliês e essas barreiras são subvertidas no uso do espaço, mas antes mesmo disso, são rompidas pelo diálogo e pela troca de conhecimentos que se estabelece entre os professores na construção de uma proposta interdisciplinar. 2.4.4 Proposta e Processo Insterdisciplinar

Para o desenvolvimento de um processo interdisciplinar deve-se atuar diretamente no âmbito do projeto pedagógico do curso onde cabe a observação atenta das disciplinas que constituem cada período ou semestre do curso em questão, bem como relacionar as disciplinas que se desenvolvem ao longo do tempo, no decorrer do curso no caminho da formação do aluno.

Uma ação que contribui sobremaneira para estabelecer a interdisciplinaridade é analisar o conjunto dos conteúdos das disciplinas a partir do estabelecimento de eixos de ligação entre elas, tanto no sentido horizontal – disciplinas presentes em cada semestre do curso (inter-relação dos conteúdos) – quanto no sentido vertical – disciplinas desenvolvidas ao longo do curso (inter-relação do nível de profundidade e complexidade). Isso deve ser discutido com o corpo docente que integra cada período do curso em conjunto com a coordenação pedagógica, bem como com, pelo menos, um professor representante de cada período de curso para discussão dos eixos verticais de formação.

Esses são os passos essenciais para se romper ou diluir as barreiras disciplinares. Ao discutirem suas disciplinas os professores passam a perceber a relação entre elas, como cada disciplina integra e potencializa a outra disciplina, a forma como os conteúdos se entrelaçam. Dessa forma, a integração de conteúdos se dará pela proximidade, mas também nos diferentes níveis de aprofundamento e complexidade para cada proposta de

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projeto interdisciplinar a ser desenvolvido durante o tempo de formação dos futuros designers.

Feito isso, entra o processo de questionamento: de qual e como pode se desenvolver um projeto. Qual o tema condutor: quais os assuntos referentes aquele nível de desenvolvimento do conhecimento do curso; qual o produto que pode ser resultante desse processo. Esses passos não precisam seguir uma rígida sequência, muitas vezes a discussão e elaboração se iniciam pelo produto e chegam ao tema ou vice-e-versa. Esses diálogos devem ser permeados por um olhar para outras áreas, para outros campos de conhecimento que dialoguem ou confrontem de forma rica e produtiva o campo do design.

Ainda, é importante que no processo interdisciplinar se relacione a metodologia científica com a metodologia projetual, pois ambas nutrem-se e permitem ao aluno ampliar relações ao exercer a reflexão, a criação e o desenvolvimento de propostas e projetos que respondem à multiplicidade do contemporâneo. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A aplicação do processo interdisciplinar permitiu chegar a resultados significativos na formação de jovens designers que, afeitos a essa dinâmica, levaram e utilizam o método em seus escritórios e coletivos gerando ações significativas no mercado profissional. Nas relações educacionais e de ensino, a questão mais apontada como significativa pelos egressos dizia respeito à vivência desenvolvida a partir dos projetos interdisciplinares e à sua formação como agentes de um processo à luz das dinâmicas culturais.

A partir das interdisciplinaridades deu-se um movimento para a ampliação da pesquisa e propostas de ação, tendo como estrutura de possibilidades a transdisciplinaridade. Fato que foi trazido pelos próprios alunos que, mediante a experiência interdisciplinar, começaram a associar

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diferentes campos de conhecimento em seus projetos de conclusão de curso. Linguagens como a literatura, o cinema, entre outras, e questões sociais e políticas foram trazidas relacionando-se e construindo discursos e relações de amplitude e de novas propostas para o design na contemporaneidade.

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Linguagens Gráfico-Verbal, Gráfico-Visual e Gesto-Visual na Educação Projetual

Marcos Brod Júnior1

Luiz Vidal de Negreiros Gomes2 Rejane Plinski3

Katherine Kannary4

1 INTRODUÇÃO

Este texto apresenta os estágios de desenvolvimento de uma ferra-menta didática para a fundamentação da Desenhística que, conforme Medei-ros (2004, p. 133), designa “a ciência, arte e técnica de projetar desenhando”. Essa ciência é utilizada nas disciplinas de Embalagem II, Introdução ao Projeto Gráfico, Introdução ao Projeto de Produto e Projeto de Produto I da Faculdade de Design UniRitter, Porto Alegre, RS, e dos Cursos de Especialização em De-sign de Interiores e Design de Móveis da UNOESC – São Miguel do Oeste, SC.

Iniciamos o método destacando o fato de que, sob o ponto de vista didático, o professor de design de produto ou gráfico deve estar preocupado em desenvolver um método de projetação que efetivamente auxilie e ensine estudantes a desenvolverem um projeto de produto, sob o enfoque do Dese-nho industrial, claro, respeitando as capacidades e habilidades previamente adquiridas de cada um. Portanto, atualmente, classificamos os vários procedi-mentos e técnicas metodológicas de ensino de projeto (i) Metódicas (ratius) Gerais de Projetação (e.g., JONES, 1976; BÜRDEK, 2006; BAXTER, 1998); (ii) Metodologias (vias) Específicas para projetos em Desenho industrial (e.g., DREYFUSS, 2003; BONSIEPE et al., 1984; LÖBACH, 2001) e (iii) Métodos Particu-lares (methodus) de desenvolvimento para desenho de produtos, inclusive os

1 Doutor em Engenharia de Produção - Sistemas de Produção, UniRitter, RS 2 PhD Design Education, Cursos sCHDs Editora, POA-RS 3 Licenciada em Letras - Especialista em Libras, UniRitter, RS 4 Graduanda em Design, UniRitter, RS

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produtos gráficos para diversos tipos de Serviços de comunicação) (e.g., BERGMILLER et al., 1986; FRASCARA, 2006; COSTA, 1989). Tal estratégia basei-a-se na necessidade de destacar o papel de uma didática para o ensino dentro da Pedagogia do Desenho projetual, ou seja, o ramo da Praxiologia que pes-quisa e estuda saberes relativos à educação criativa e ao ensino de Desenho industrial. Com base nessa taxonomia, podemos estabelecer que a ferramenta que será apresentada, neste artigo, trata-se de um Método Especialista de Projeto de Produto, baseado no Processo Criativo (DUAILIBI; SIMONSEN Jr, 2009; GOMES, 2011).

Motivados pela necessidade de (i) ensinar projeto de produto aos estudantes possuidores de suas faculdades plenas auditivas ou não, isto é, com certos níveis de restrição; (ii) usar projetos para sistemas de comunicação visual como fundamento ao ensino orientado e sistemático, logo para o de-senvolvimento de artifícios que também eduquem o estudante criativamente e projetualmente; (iii) integrar a linguagem logográfica a outros de natureza fonográfica (gráfico-verbal) e iconográfica (gráfico-visual) (Cf. GOMES, 1998; GOMES; BROD JR, 2007; BROD JR; GOMES; MEDEIROS, 2009); já em uso para alguns procedimentos e técnicas dos processos projetual, criativo e gráfico-intelectual, de acordo com os seus três estágios.

O objetivo específico do trabalho é aprimorar uma ferramenta didá-tica para o desenvolvimento da Desenhística (MEDEIROS, 2004) a partir de um Método Especialista de Projeto de Produto, baseado na linguagem gráfico-verbal, gráfico-visual e gesto-visual. Como objetivos gerais, podemos destacar (i) estabelecer novas práticas para o desenvolvimento da Desenhística; (ii) relacionar as pesquisas teóricas em andamento à atividade projetual; e (iii) experimentar em sala de aula novas didáticas que reordenem a educação projetual e criativa para o ensino de Desenho industrial, em cursos de Design.

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2 O DESENVOLVIMENTO

Para que um conhecimento seja considerado científico é necessário mapear as todas as operações que possibilitam a sua verificação. De acordo com Gil, define-se “método” como “caminho para se chegar a determinado fim, e método científico como o conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos adotados para se atingir o conhecimento” (1999, p. 26). O método que proporcionou as bases desta investigação é aquele que esclarece os pro-cedimentos lógicos seguidos no processo de investigação. Os métodos que indicam os meios técnicos da investigação tem por objetivo, ainda conforme Gil, “proporcionar ao investigador os meios técnicos para garantir a objetivi-dade e a precisão no estudo dos fatos sociais. [...] visam fornecer a orientação necessária à realização da pesquisa social, sobretudo no referente à obtenção, processamento e validação dos dados” (1999, p. 33).

Usou-se a pesquisa exploratória e qualitativa, pois envolveu a abor-dagem de um novo problema sobre o qual se conhecia pouco, pois que nem sempre um método é adotado rigorosamente numa investigação, sendo com-binados dois ou mais métodos (GIL, 1999, p. 33).

Efetivamente podemos dizer que o Primeiro Estágio do desenvolvi-mento deste método teve início no ano de 2004, com a Dissertação de Mes-trado “Desenho-de-embalagem: o projeto mediado por parâmetros ecológi-cos”, realizada no PPGEP/UFSM. Este trabalho ordenou e arranjou as fases do Processo Criativo (GOMES, 2011) alinhando seus procedimentos e técnicas com o Planejamento de Produto Industrial (MEDEIROS e GOMES, 2003), e com métodos de projeto de produto (BAXTER, 1998; BONSIEPE et alii, 1984; BAR-ROSO NETO, 1982; BOMFIM, 1977). Uma de suas contribuições foi apresentar através de linguagem gráfico-verbal todas as Etapas, Fases, Procedimentos e Técnicas utilizadas para o desenho de projetos baseado no Processo Criativo, Figura 1.

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Figura 1. Processo Criativo, em linguagem gráfico-verbal Em 2006, com o início das pesquisas da Tese de Doutorado no PP-

GEP/UFRGS, sob a orientação da Dra. Lia Macedo (BROD JR, 2010), voltou-se o trabalho de projetação para a comunicação gráfico-visual ou desenho de co-municação (GOMES, 1996; FRASCARA, 2006), no atendimento das necessida-des de trabalhadores portadores de deficiência auditiva e analfabetos funcio-nais no chão-de-fábrica. Dessa feita, o desenvolvimento desse método de projeto entrou em seu Segundo Estágio, o desenho dos logogramas.

Acredita-se que os elementos gráfico-visuais são fundamentais para potencializar o saber. Baseamo-nos no fato de que o uso de imagens iconográ-ficas pode melhorar: o reconhecimento de situações; lembrar ações; recordar fatos e fenômenos. As representações iconográficas devem figurar entre os princípios universais a serem considerados no projeto de desenho de produto, como salientam Lidwell et al. (2003, p.110-112), ao recomendarem que, sobre o tema “representações iconográficas”, deve-se consultar: Symbol Sourcebook de Henry Dreyfuss (1904-1972), publicado em 1972. Com isso, e visando o ensino de projeto que potencialize o uso das capacidades mentais, apresenta-mos um método de projeto que faz uso de logogramas (GOMES, MEDEIROS e

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BROD JR, 2008) para identificar e comunicar as Etapas, Fases, Procedimentos e Técnicas, pelas quais estudantes devem passar durante o processo projetual, ora substituindo títulos, ora ilustrando ações criativas (Figura 2).

Figura 2. Método de Projeto ilustrado por símbolos gráfico-visuais I

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A maioria dos logogramas ilustrados aqui são convenções, e seus desenhos resultam da aplicação de elementos básicos da linguagem gráfico-visual, e dos sistemas de comunicação, seguindo princípios de percepção.

Figura 3. Método de Projeto ilustrado por símbolos gráfico-visuais II

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Logogramas, quando integrados com as etapas e procedimentos do projeto, auxiliam na percepção do momento em eles podem substituir títulos e ilustrar as ações criativas.

Figura 4. Método de Projeto ilustrado por símbolos gráfico-visuais III

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Como características gerais da comunicação pode-se dizer que as mensagens são comunicadas pelo uso de códigos convencionais, acertados previamente, constituindo um conjunto de regras que devem ser observadas para sua compreensão, e cujo suporte físico pode variar. Conforme Pignatari (1970, p. 17), “a comunicação não é apenas a resposta, mas a relação estabe-lecida pela transmissão de estímulos e pela provocação de respostas”. Esta relação é estabelecida por diversos sistemas de comunicação. Cerca de uma centena de logogramas estão classificados a partir da referência das quatro categorias de representações icônicas sugeridas por Lidwell et alii (2003, p.111): similares; exemplares; simbolizadores, arbitrários. Numa fase subse-qüente eles serão avaliados sistematicamente a partir do método do The Ame-rican Institute of Graphic Arts, considerando os aspetos “semânticos, sintáticos e pragmáticos” do signo iconográfico (1976, p.26). Este sistema é também referendado por Aicher e Krampen, quando tratam das classificações semióti-cas (1979, p.10).

No ano de 2007 a Faculdade de Design UniRitter teve a primeira ma-trícula de pessoa portadora de deficiência auditiva, na habilitação Design Grá-fico, sendo que em 2008 ela já preparava-se para cursar a disciplina de Intro-dução ao Projeto Gráfico. Com isso e somando-se o fato de que o trabalho de Tese intensificava-se, esta estudante tornou-se bolsista da pesquisa da Tese “Engenharia de Produção Inclusiva: a linguagem gráfico-verbal, gráfico-visual e gesto-visual para Atividades de Produção” (BROD JR, 2010). Podemos dizer que este momento foi crucial para o desenvolvimento do método. Atualmente há um total de 26 estudantes portadores de necessidades educacionais especiais em toda a Instituição UniRitter, sendo que destes, 9 são da Faculdade de De-sign, ou seja, uma média de 30%.

O Terceiro Estágio do desenvolvimento deste método está em an-damento ano de 2010. Todas as palavras e logogramas, apresentados nas laterais das figuras anteriores, referentes às Etapas, Fases, Procedimentos e

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Técnicas foram transformadas em sinais de LIBRAS. Para isso contamos com a consultoria da professora/intérprete certificada Rejane Plinski.

Conforme Jiménez e seus colegas autores (1993, p. 352), “uma per-centagem elevada da população surda atual carece de um nível mínimo de leitura receptiva. Para o surdo, a leitura é uma aprendizagem extremamente difícil”. De acordo com os autores acima, no ensino da leitura à pessoas porta-doras de deficiência auditiva, alguns aspectos como o vocabulário e a estrutura sintática podem ser favorecidos por uma aprendizagem precoce, se a leitura ideovisual for utilizada como via direta de acesso ao léxico. Outros números que são importantes para a construção deste problema são fornecidos pelo Instituto Paulo Montenegro, ação social do IBOPE, e a ONG Ação Educativa, ao lançar os resultados da 5a edição do INAF – Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional. Os números de 2007 indicaram que 7% da população brasileira era formada por pessoas analfabetas, ou seja, não conseguem realizar tarefas simples que envolvem decodificação de palavras e frases; 25% de alfabetiza-dos em nível rudimentar, conseguem ler títulos ou frases, localizando uma informação bem explícita; 40% alfabetizados em nível básico, conseguem ler um texto curto, localizando uma informação explícita ou que exija uma peque-na inferência; e apenas 28% alfabetizados em nível pleno, conseguem ler tex-tos mais longos, localizar e relacionar mais de uma informação, comparar vá-rios textos, identificar fontes.

O resultado dos estudos sobre a comunicação entre pessoas ouvin-tes e não-ouvintes (BROD JR, 2010) fornece uma forma inovadora de olhar para o assunto em relação às pesquisas destinadas à acessibilidade, devido à abordagem analítica proposta. Esta abordagem considera a apreensão de informações e geração de conhecimento a partir de uma perspectiva de lin-guagem gráfico-visual e gesto-visual, além da gráfico-verbal. Este tema tem sido quase sempre tratado de forma diferente na literatura. Além disso, este

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estudo apresenta o trabalho em parceria com uma estudante-não-ouvinte, o que torna a experiência mais relevante e marcante.

Nas figuras a seguir pode-se visualizar a correspondência entre as palavras, os logogramas e os sinais de Libras no Processo Criativo.

Figura 5. Sinais em Libras I para a fase de Identificação do Processo Criativo

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3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se este artigo reforçando que, no grande campo relacionado à Filosofia da Projetação, o professor precisa, antes de tudo, levar em conside-ração uma fundamentação clássica para a educação criativa e projetual de profissionais, respeitando aquelas necessidades contemporâneas do designer desenhador, e aprender a projetar academicamente. O trabalho de desenvol-vimento da ferramenta didática para ensino de projeto foi apresentado dividi-do em três estágios. Atualmente, após a criação de 210 sinais em Libras, en-contra-se em processo de desenvolvimento a cartilha que irá ilustrar a corres-pondência de cada logograma à palavra utilizada no Processo Criativo. Dessa forma, teremos um ferramental que, através da linguagem gráfico-verbal, gráfico-visual e gesto-visual, é capaz de transmitir informações necessárias para os estudantes também não-ouvintes. Além disso, após a conclusão e revisão dos sinais em Libras, as fotografias passarão por um processo de dese-nho, sendo transformadas em ilustrações, conforme orienta Bonsiepe et al (1984), a fim de preservar a identidade da intérprete e também para permitir maior mobilidade ao sistema no que tange ao tamanho dos arquivos gerados, sem falar no aspecto geral do sistema, com alta ordem geométrica.

Reforça-se, acima de tudo que quando o estudante, sistematica-mente, segue as orientações presentes na didática do professor de projeto para Desenho industrial, a quantidade de esforço é diretamente relacionada à qualidade da tarefa, produzindo uma grande quantidade de documentos pro-jetuais, termo utilizado por nós para identificar o material fruto do desenvol-vimento do projeto. A atitude academicamente disciplinar aumenta a fluência e vocabulário do aluno através de um maior número de argumentos gráfico- visuais. O futuro profissional desenhador sabe onde encontrar informações relevantes para os seus projetos, independente do tempo que irá ter para a preparação do projeto, apresentação do desenho e realização do produto.

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Metodologia de Análise: Livro Infantil Ilustrado e alguns Diálogos

Luiz Antonio Luzio Coelho1

Renata Vilanova2

1 “Modos de ver” uma ilustração

Por que estudar a literatura infantil? A melhor resposta: porque é importante e divertido. Os livros para crianças têm, e tiveram, grande influência social e educacional; são importantes tanto em termos políticos como comerciais. (HUNT, 2010)

O presente estudo representa uma proposta metodológica de leitura de ilustrações em livros infantis ilustrados. Pretende-se discutir ilustração em livro infantil brasileiro a partir de aspectos do design na contemporaneidade. As ilustrações são valorizadas no livro infantil devido à proximidade entre o universo da imagem e o universo da criança pré-alfabetizada. Segundo Coelho, a ilustração toca a sensibilidade infantil e auxilia para que representações do concreto se aproximem de relações abstratas, proporcionadas pela palavra (COELHO, 1997). Poderíamos, neste caso, considerar como pertencente ao mundo “concreto” representações gráficas de uma dada cultura, geradas a partir de uma linguagem iconográfica pré-existente. Esta linguagem possibilita um modo de ver aproximado, em um grupo específico. Por outro lado, pode-se ampliar o que Coelho denomina “relações abstratas” para o universo literário, em que tanto palavra como imagem expandem o lugar comum de uma linguagem e, por isso, particularizam os modos de ver.

1 Professor Associado PPG PUC-Rio 2 PPG PUC-Rio

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Consideramos “modos de ver” como potencialidades de leitura. Entende-se por potencialidades textos que precisam de reflexão para se transformar em representações vigentes de determinada cultura. E por texto, tudo o que se dá a ser lido. Segundo Stuart Hall, nichos de interesses em comum se formam, na contemporaneidade, a fim de aproximar indivíduos de sociedades diferentes. (HALL, 2003) No entanto, cada sociedade possui particularidades contextuais que, no caso da literatura infantil, podem sugerir alguns parâmetros visuais. No panorama de livros brasileiros, por exemplo, consideramos que um ilustrador carrega uma herança multicultural em sua gênese. Além disso, no século XX, com os avanços tecnológicos, surgiu a figura dos caricaturistas de jornais e revistas ilustradas. O próprio Monteiro Lobato selecionava caricaturistas para ilustrar seus livros. O caricaturista tem por característica principal a exacerbação de alguma qualidade ou defeito do objeto representado. Desta forma, há uma subversão da imagem estratificada, representada pelos cânones artísticos formais de perspectiva e geometria. 2 Um olhar sobre o livro infantil ilustrado, no Brasil Dos anos sessenta aos oitenta do século passado, o Brasil passou por um período de ditadura em que caricaturistas também tinham em figuras políticas e instituições alvos constantes para sua crítica política e social. Nesse período, o livro infantil brasileiro não chegou a passar pelo crivo da censura, o que lhe permitiu constituir território fértil para escritores e ilustradores. Constituiu-se, assim, em nicho de livre expressão, algo incomum em outros veículos de circulação pública à época. Casos como este, aliados a nosso multiculturalismo e aos avanços tecnológicos, permitiram ao caricaturista e ilustrador no Brasil formar leitores ávidos por mensagens múltiplas e surpreendentes. Desta forma, acreditamos que para este leitor e ilustrador, as

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imagens em livro infantil potencializam novas concepções de design, que valorizam uma multiplicidade de culturas e conceitos gráficos. Por tal viés, novas concepções de vida e sociedade podem ser atualizadas. Decidimos observar, nesta pesquisa, a questão da ilustração e leitura do livro infantil brasileiro contemporâneo, tendo por base dois cenários que entrelaçam o ilustrador, o mediador e o leitor deste tipo de livro enquanto “personas” e atores da ilustração. Tais cenários, para fins de análise, estão representados pelo diálogo entre mediador e leitor, e o “intra-dialógo” entre o ilustrador que também é mediador. Ambos os casos são apresentados a partir do processo metodológico de ilustração e leitura. Temos por mediador aquela figura que contribui com o ato de interpretação do leitor, entendido aqui como o usuário final de um livro, que, na situação de fruidor do texto e ilustração, também desenvolve sua capacidade de representar através da imagem. Nosso leitor específico é, portanto, a criança, que é o alvo dos diálogos trazidos no primeiro cenário desta pesquisa. Quanto ao ilustrador, trata-se, para nós, daquele que produz imagens representativas, quer seja profissional ou não. No segundo cenário, tratamos dos métodos de trabalho em que o ilustrador torna-se um mediador importante no diálogo que quer buscar com seus leitores. 3 Primeiro cenário: diálogo entre mãe e filha A pesquisadora Renata Vilanova, ilustradora de livros infantis inscritos no PNLD, optou pela “persona” mediadora, para dialogar com sua filha, antes mesmo desta ingressar na educação Infantil. Neste momento da pesquisa o que se esperava era observar como a criança se relacionava com o objeto livro e suas particularidades. Posteriormente, a pesquisa foi direcionada para o desenho, o ato de representar graficamente e as ilustrações em livro.

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Partimos do pressuposto que a criança, desde a formação de sua visão, constrói um olhar sobre o entorno, e por isso, a partir de seu repertório cognitivo, visita e reconhece valores simétricos, formalistas, geométricos, matemáticos, lógicos etc. Estes valores estão relacionados com objetos, ambientes, indumentária, postura etc. com que uma criança se relaciona. Desta forma, se uma determinada sociedade possui determinados tipos de arquitetura e design, isto estará registrado no repertório visual infantil pré-alfabetizado.

Rudolf Arnheim foi um dos expoentes da idéia de arte para o desenvolvimento da cognição. Sua concepção se baseia na equivalência configuracional entre percepção e cognição. Para ele, perceber é conhecer. Evidenciou que arte depende de julgamento, mas obriga a poucas regras que precisam ser conhecidas antes de se ousar desafiá-las. Estas regras são para Arnheim a gramática visual subjacente a todas as operações envolvidas na cognição como recepção, estocagem e processamento de informação, percepção sensorial, memória, pensamento, aprendizagem etc. Acusado de formalista nos anos 1980, na efervescência do Pós-Modernismo nos Estados Unidos, Arnheim, entretanto, vem sendo recuperado pelos cognitivistas, pois sua gramática visual não se comprazia apenas na forma, mas derivava de uma negociação contextual mental e se dirigia ao contexto perceptual. A princípio se trabalhava a percepção desta gramática visual só a partir da percepção do mundo fenomênico. (BARBOSA, 2006)

As primeiras perguntas formuladas para a criança estão listadas abaixo: • O quanto o objeto livro códice interfere na leitura de uma criança? • Como entender representação gráfica marcada pela passagem de

páginas? • Como entender a mesma personagem da narrativa, a cada virada de

página? • Como entender a mesma personagem em duas páginas abertas,

sendo que o que se sugere é o decorrer da narrativa?

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4 O livro

Para a primeira experiência penduramos uma corda amarrada a um livro de borracha no alto do berço da criança, até um limite em que ela pudesse tocá-lo. A criança, de três meses de idade, tocava o livro e folheava suas páginas gradativamente. Havia ali um ritual de conhecimento. Ao completar seis meses de idade, inserimos este livro (já conhecido) no banho. Notou-se que a criança já estava acostumada a virar suas páginas. 5 As ilustrações: qual é o papel de quem media uma história?

Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar. Viajaram para o Sul. Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando. Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza. E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai: — Me ajuda a olhar! (GALEANO, 2002)

Desde o nascimento de sua filha, a mediadora contava-lhe histórias, que, naturalmente, passaram a compor o repertório vivencial de quem, em dado tempo, teria começado a ligar aquele tipo de relato com o objeto que encontrava pendurado em seu berço e em sua banheira. Entretanto, foi somente após um ano de idade que a criança começou demonstrar consciência da relação entre o relato com os desenhos das personagens. Em um dos livros, dois desenhos do mesmo pato que apareciam em páginas diferentes e demonstravam uma sequência de tempo, não foram compreendidos como tal pela criança. Esta entendia que se havia o pato em

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dois lugares diferentes tratava-se de dois patos. Neste momento, a mediadora interferiu dizendo: “Não é ele fazendo outra coisa? Olha!” Ao longo dos “diálogos” entre a mediadora e leitora, e dos comentários sobre práticas narrativas na ilustração, percebemos que ao virar uma página, deixando para trás a dupla de páginas anterior, a pequena leitora entendia com mais facilidade que se tratava da mesma personagem, em outra ação. A história anterior “sumia”, entretanto havia alguns vestígios nas ilustrações que indicavam se tratar da mesma história, em outro momento. A pequena leitora iniciava um repertório de signos gráficos e, em seu primeiro ano de vida, já era possível desenhar em parceria. Desenhar com a criança, experimentar símbolos gráficos, apresentar-lhe imagens codificadas por nossa cultura, como: “pipiu”, gato, estrela, coração, peixe, nuvem, árvore, sol, lua, girafa etc., enriqueceram seu repertório gráfico. Este, aliado a fotografias dos mesmos signos gráficos, à observação do entorno e à verbalização, criaram, para cada uma das imagens, significados especiais e particulares. Foi o caso de quando, com um ano e oito meses de idade, a pequena leitora representou um pássaro como um risco para baixo, e disse: “mamãe, ó o pipio caindo!” Nesta representação ela demonstrava consciência de que aquele desenho traduzia o pássaro em movimento, e que poderia haver uma queda. Neste caso, consideramos que além da forma, o que ela representou foi uma expressão. Surgiram, então, novas questões: o que aquela criança de um ano e meio queria contar? Será que subestimamos as crianças ao querer representar esquematicamente tudo o que existe, de uma forma padronizada e dita como certa? Aquela criança demonstrava uma liberdade de pensamento que se relaciona com uma liberdade de expressão gráfica, presente em ilustrações de Roger Mello, por exemplo, e que discutiremos abaixo. Ajudava-nos a compreender relações entre arte e design.

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Ao longo da experiência de “desenhar”, percebemos a importância das figuras bem esquematizadas para que a pequena leitora – e agora também ilustradora – as identificasse, ao mesmo tempo, como uma opção representativa formada por riscos e manchas e também como expressão de suas próprias emoções. Ela poderia, desta forma, sentir-se à vontade para “rabiscar”. Percebemos que o desenho poderia, para ela, não ser a figura em si, mas uma representação de movimento, por exemplo. Revemos a liberdade excessiva da representação, e entendemos que a ilustração, neste caso, deveria tanger arte/design. Ou seja, deveria conter planejamento gráfico, ícones que representam mensagens de comunicação visual, inseridos em um suporte, mas que ousassem em liberdade e impulsionassem a imaginação do leitor. A partir desta observação, passamos a supor que uma criança pode ousar com sua imaginação desde o início de suas relações. Seria uma espécie de conhecimento prévio, adquirido nos primeiros momentos de estímulo e observação. Por este viés, mesmo que o seu raciocínio seja aprimorado ao longo dos anos, ela fica ciente que pode subverter formas. Por exemplo, quando ela vê um pássaro, este pode ser visto no céu como uma mancha preta, ou um risco, simulando um vôo. 6 Uma espécie de subversão Para entendermos subversão na linguagem gráfica, em ilustrações de livros para crianças, pensemos em dois tipos de olhar:

• de um lado um olhar “academicista”, que carrega uma visão renascentista de mundo, com a perspectiva áurea, os pontos de fuga de um quadro, composto de maneira organizada, com intuito de nos proporcionar uma sensação intencional ao observá-lo, ou seja, com

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início-meio-fim. Esta visão pode ser comparada à Sintaxe da Linguagem Visual de Donis Dondis. (DONDIS, 1997)

• de outro, um olhar livre, mas congruente, que consegue enxergar o mundo em seus meandros, veios, erros, margens pouco definidas, sem a rigidez dos cânones acadêmicos.

Se morássemos em uma caverna, talvez tivéssemos outro olhar a respeito do mundo, pois ao acordarmos veríamos linhas tortuosas formando protuberâncias, portas não simétricas, sinuosas e pontiagudas. Teríamos espaços oblíquos, com encaixes mais obtusos; usaríamos a própria estrutura da caverna como suportes para objetos, que ficariam em diferentes níveis apoiados de maneira não linear. Veríamos, talvez, menos formas geométricas e mais combinações orgânicas. Talvez a verdade é que nos forçamos (pensando na arquitetura no design) a criar um mundo de concepção renascentista, a não dizer clássica, com estruturas geometrizadas, formas lineares que se encaixam perfeitamente, módulos de uma matriz que não pode ser muito criativa porque senão desvirtua o padrão. Entretanto, não conseguimos, de fato, nas grandes selvas urbanas, conviver harmonicamente com esta linearidade. As cavernas foram viradas ao avesso, foram postas para fora de nossas casas e, na rua, deparamo-nos com bueiros, chão irregular por conta de uma tubulação de gás, fios emaranhados e desencapados que levam ductos às nossas casas, postes tortos, carros batidos, trânsito de gente (alguns até dormindo nas calçadas), fachadas caindo aos pedaços, ambulantes montando suas barracas apoiadas em beiral de canteiros, carros estacionados em curvas formando novos desenhos na rua, pedaço de galho sinalizando um bueiro aberto, faixas da prefeitura demarcando obras intermináveis, entre outros. A experiência urbana nos leva a refletir sobre as formas e formalizações que criamos para sobreviver. Vivemos nos expressando o tempo todo, e subvertendo formalizações

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vigentes, pois estas não dão conta da organicidade e da não linearidade humanas. Caso permitíssemos olhar para a nossa volta sem os preconceitos ensinados já na infância, de que “isto pode, isto não pode, isto parece ser, isto não existe etc.”, veríamos que nunca deixamos de ser oblíquos, orgânicos, informais, e que já convivemos com a diferença desde sempre, quando, por exemplo, temos que fazer uma dança magistral para poder dirigir em horário de pico. E conseguimos chegar a nossas residências: dando passagem, esperando nossa vez, contando até dez, desviando, acelerando, reduzindo, sinalizando etc. E a nossa volta todos fazem algo parecido. Ao subverter o formalismo vigente em nossa sociedade desde o classicismo, a ilustração de livro infantil brasileiro contemporâneo estimula a multiplicidade de pontos de vista, abrindo horizontes do “modo de ver” para diversas culturas. A criança não precisa mais aprender o que é uma representação instituída como real e mimese de uma imagem para depois compreender uma subversão. Isto é, a imagem sai dos parâmetros eurocêntricos para revisitar outros lugares, pessoas, relações e contextos sociais. Neste momento da pesquisa encontramos uma nova questão: quem é este ilustrador brasileiro? Não nos interessava conhecer o indivíduo ilustrador, mas sim sua obra e estilo gráfico. Portanto, decidimos dialogar com algumas ilustrações de livro infantil. 7 Segundo cenário: uma inspiração metodológica Ao trazer novas formas de representação imagética que não as da mimese e dos simbolismos conhecidos de determinada cultura, o ilustrador, em nossa opinião, pelo menos incita a curiosidade infantil (e mesmo a adulta) e estimula a percepção pelo estranhamento, pela subversão de um sistema

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vigente. Este exercício de fuga da normalidade costuma incentivar uma recuperação de códigos alternativos que nos torna autores: atualizamos representações através de nosso repertório e imaginação criativa. No caso do livro ilustrado para crianças no Brasil hoje, levantamos a hipótese de que existe um ilustrador que se utiliza de códigos formais, tanto do texto verbal quanto da imagem, para, intencionalmente, re-contextualizar e romper padrões de representação gráfica. Para isto, ele utiliza de particularidades da materialidade do livro e técnicas de ilustração e impressão como linguagem. Desta forma, uma ilustração sai do seu estado formal para, materialmente, ser o objeto representado. Assim, risco e mancha traçados funcionam como parte de história, expressando e representando sensações. Roger Mello, ilustrador e designer brasileiro, desenvolve um trabalho interessante no que diz respeito a atualizações de representações gráficas.

Ilustrador e autor de livros infantis, Roger Mello nasceu em Brasília, em 20 de novembro de 1965. Artista plástico, Roger Mello é formado em Desenho Industrial e Programação Visual, pela UERJ. No início de sua carreira, trabalhou ao lado de Ziraldo, na Zappin, e também se dedicou ao desenho animado: cursos no SENAC, na UERJ e no grupo Animation, com a equipe do National Film Board, do Canadá. Na televisão, fez as vinhetas de encerramento da novela Vamp, para a TV Globo, além de diversas participações na TV Educativa do Rio de Janeiro, nos programas Canta Conto e Um salto para o futuro. Em 2000, Maria Teresa foi destaque na estréia da série Livros Animados, do canal Futura. Roger Mello tem conquistado diversos prêmios por seus trabalhos como ilustrador, autor de livros de imagem e livros para criança, e também como dramaturgo. Em 2002, Meninos do Mangue foi o grande destaque nos concursos literários, recebendo, da Câmara Brasileira do Livro, dois Jabuti's (de Melhor Ilustração e de Melhor Livro Juvenil) e, da Fondation Espace Enfants (FEE), Suíça, o Grande Prêmio Internacional. (Blog do autor. Disponível em <capaduraemsingapura.blogspot.com>. Acesso em 06 de março de 2011)

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Em seus primeiros trabalhos, observava-se que Mello desenvolveu um traço arredondado e acolhedor, dentro de padrões do que seria ilustrar para criança, na década de noventa do século XX. Entretanto, seu estilo gráfico foi se modificando. Em a Nau Catarineta (figura 1), Mello se desprendeu da formalidade gráfica para buscar maneiras de representar uma materialidade própria do nordeste brasileiro. O grafismo rupestre se transformou em um aliado para a simplicidade das personagens. Em contrapartida, detalhes de indumentária, cores e texturas enriqueceram seus cenários.

Figura 1: capa do Livro Nau Catarineta, de Roger Mello, primeira publicação em 2004

Em João por um fio (figura 2), por exemplo, o ilustrador narrou com dramaticidade, através do branco, preto e vermelho, uma história particular. A rede, tecida ao longo da narrativa, descrevia uma trama própria da complexidade da vida, e rica em detalhes, contrastando com a personagem em estilo rupestre.

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Figura 2: capa do Livro João por um fio, de Roger Mello, primeira publicação em 2005

Em Meninos do mangue (figura 3), Mello vai ao mangue, conhece o ambiente, e digere aquele espaço em seus desenhos. Ao rupestre, aliam-se as particularidades físicas do local: plástico, lixo, cera e colagem são misturados a fim de criar uma atmosfera do que o ilustrador entendeu da história do mangue e de suas personagens.

Figura 3: capa do Livro Meninos do Mangue de Roger Mello, primeira publicação em 2001

Em Carvoeirinhos (figura 4), Mello foi conhecer a realidade dos meninos que trabalham em minas de carvão. E, de maneira muito própria, utilizou o preto e branco, aliados a detalhes em laranja e vermelho, para retratar a dramaticidade daquele ambiente e de suas personagens, criando

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histórias paralelas. Simplificou, sempre com muito movimento, as formas das personagens, esquematizando-as a tal ponto que o leitor pudesse se colocar no lugar de cada uma delas, e acrescentar detalhes a sua imagem.

Figura 4: capa do Livro Carvoeirinhos, de Roger Mello, primeira publicação em 2009

Os livros de Roger Mello levam-nos a perceber que representação gráfica pode se transformar em enunciado. Entende-se que, em seus livros, o discurso gráfico é um reflexo da voz de um povo e não só de um ilustrador contando uma história desse povo. Em sua metodologia de trabalho Roger Mello se permite viver um tempo no ambiente a ser ilustrado. Desta forma, ele utiliza a ilustração como registro antropológico de uma pesquisa. Ele acrescenta o lúdico, a expressão, os conhecimentos técnicos, mas não como observador apenas, e sim como alguém que viveu uma história. E a percebeu genuinamente. Neste caso, ilustração passa a ser representação gráfica, entendida como projeto, estudo e reflexão interdisciplinar do design. Roger Mello conta uma história visual de maneira despretensiosa e lúdica. Demonstra, graficamente, como uma imagem pode ser impregnada de valores, mensagens e subversões. Seu estilo aproxima a criança do fazer artístico e do pensar de maneira projetual, sem que ela precise passar pelas representações realistas para depois subverter representações gráficas.

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Por este viés, acreditamos que há subversão nas representações gráficas de alguns de seus livros infantis, em relação a um formalismo cultural vigente. Assim, podemos considerar esta subversão uma permissão à criança: a de poder ler ao seu jeito, sem “certo” ou “errado” instituídos. Tal a noção de liberdade de leitura que encontramos em autores como Roland Barthes, na semiologia, e Mikhail Bakhtin, em teorias da linguagem. Nossa pesquisa, portanto, ouviu as vozes de uma criança, um estilo de um ilustrador brasileiro e um mediador-designer. Neste momento, surge mais uma pergunta: como isto pode constituir um campo do design? Para responder a esta pergunta, outro item da metodologia da pesquisa foi instituído: um olhar sobre a ilustração em livros infantis no contexto atual. 8 Um olhar pós-modernista sobre uma ilustração na literatura brasileira

Como diz Homi Bhabha nossa experiência hoje é marcada pela tenebrosa sensação de sobrevivência. Vivemos um presente que não tem nome próprio, mas é designado por um prefixo acrescentado de passado. Trata-se do prefixo “pós” do pós-modernismo, do pós-colonialismo, do pós-feminismo, enfim a era do pós-tudo apocalíptico de Augusto de Campos. Queremos explicitamente ultrapassar o passado sem deixá-lo de lado.(BARBOSA, 2008)

Durante o século XX, acompanhou-se o aparecimento e evolução rápida de novas tecnologias e o advento do computador. Essas novas tecnologias proporcionaram uma mudança no modo de construir objetos e pensamentos. Elas ampliaram as possibilidades de reprodução e divulgação de livros impressos.

No início do século XX, a reprodução técnica tinha atingido um nível

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tal que começara a tornar objeto seu, não só a totalidade das obras de arte provenientes de épocas anteriores, e a submeter os seus efeitos às modificações mais profundas, como também a conquistar o seu próprio lugar entre os procedimentos artísticos.(BENJAMIN, 1955)

A partir do novo paradigma, o ilustrador do século XXI pode ilustrar com técnicas manuais, como aquarela, guache, lápis, carvão, colagem; ou com as tradicionais técnicas de gravura; ou até utilizar várias técnicas no computador; ou ainda dispor das várias possibilidades juntas, a partir da escolha de técnicas manuais, aliadas a digitalização, tratamento e finalização das imagens pelo computador. A manipulação da ilustração pelo computador sugere combinações entre técnicas. Misturadas, promovem novas possibilidades de representação. As facilidades de impressão ampliaram os horizontes de integração entre texto e ilustração, sendo que esta última pode, cada vez mais, dialogar com a palavra, criando uma maior inter-relação de linguagens e possibilidades de sentidos de um texto. A evolução tecnológica permitiu que a ilustração ficasse cada vez mais literária, sem limites, utilizando a técnica como linguagem e não apenas como possibilidade limitada de representação. Entretanto, não foi somente a evolução tecnológica que modificou o caráter narrativo das ilustrações em livro infantil. Bernard Darras defende, em um de seus textos, que a valorização da ilustração na literatura, por parte de disciplinas de literatura na educação infantil na França, com o propósito de estimular a leitura do texto verbal, abriu novas perspectivas para o ensino sobre imagem, uma delas sendo a da leitura. (DARRAS, 2006) A leitura interdisciplinar e multicultural, a apropriação, a subversão, etc. são questões abordadas nas ilustrações de livros infantis, que potencializam um indivíduo para sua humanidade, em conseqüência, humanização das tecnologias e do design. Tais questões também estimulam

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uma alfabetização cultural, abrindo caminhos para novas atualizações críticas, em relação ao contexto sócio, econômico e cultural ao qual pertencem. 9 Novos diálogos Esta pesquisa traçou um caminho que iniciou com questões levantadas acerca da ilustração em livro e de sua leitura. Tais perguntas geraram vozes que contribuíram, a partir de experiências e análises, diálogos com possíveis atores da ilustração em livro infantil. Para isto, tivemos que delimitar o grau de atuação do estudo. Olhamos para uma criança, um mediador e um ilustrador no contexto brasileiro atual. Este processo não nos deu respostas, mas nos abriu horizontes. Fez-nos compreender melhor funções estéticas da ilustração, seu papel no design e na educação da imagem. “Para Feldman, aprender a linguagem da arte implica desenvolver técnica, crítica e criação e, portanto, as dimensões sociais, culturais, criativas, psicológicas, antropológicas e históricas do homem”. (BARBOSA, 2009)

Os diálogos realizados nos ajudaram a chegar a alguns apontamentos: • A complexidade de combinações materiais entre técnicas de

ilustração e impressão, formatos, diagramação, texturas, sintaxes etc., de uma ilustração em livro infantil brasileiro contemporâneo estimula inferências pessoais do leitor, pois potencializa significações múltiplas. “Uma obra de significado único, evidentemente percebido à primeira olhada, não tem a qualidade estética de saboreo para o espectador.” (BARBOSA, 2009)

• Defendemos que a ilustração em livro para crianças é uma das interseções possíveis do conjunto design com o conjunto artes visuais. Desta forma, funcionando como uma espécie de interação, ora tende mais para um dos conjuntos, ora mais para o outro. De qualquer maneira, lhes atualiza e potencializa novas propostas de pensar a visualidade no cotidiano, de entender o

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pensamento estético como propulsor de mudanças, na medida em que o objeto livro para crianças convive com seu público em sala de aula, nas rodas sociais das livrarias, na leitura de casa.

• Acreditamos que a ilustração de livro para crianças, complexa em sua natureza narrativa, funciona como uma espécie de mola propulsora do questionamento acerca de elementos formais da visualidade, o que nos faz repensar o mundo, reler a realidade, recriar a fantasia e retirar a transparência da arte para inseri-la em um ambiente real ao qual somos atores de transformação.

Agradecimentos

O presente estudo foi desenvolvido com o apoio da Pontifícia Universidade do Rio de Janeiro. Referências bibliográficas ARNHEIM, Rudolf. Arte e Percepção Visual, uma Psicologia da Visão Criadora.

São Paulo: Pioneira Thompson Learning, 2002. BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1997. BACELAR, Jorge. 1998. A Letra: Comunicação e Expressão. ed. 1, 1 vol. Covilhã:

Estudos em Comunicação. BARBOSA, Ana Mae. A imagem do ensino da arte: anos oitenta e novos

tempos. São Paulo: Perspectiva, 2009. BARTHES, Roland. O Prazer do Texto. São Paulo: Editora Perspectiva, 2002. BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica.

In: ADORNO et al. Teoria da Cultura de massa. São Paulo: Paz e Terra, 2000.

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BERGER, John. Modos de ver. Rio de Janeiro: Rocco, 2004. COELHO, Nelly Novaes. Literatura Infantil: teoria, análise e didática. São Paulo:

Editora Ática, 1997. COLOMBER, Teresa, KÜMMERLING-MEIBAUER, Bettina e SILVA-DIAZ, Cecília

(Org.) New Directions in Picturebook Research (Children's Literature and Culture) New York: Routledge, 2010.

DARRAS, Bernard. De l’éducation artistique à l’éducation culturelle. In :

Conférence mondiale sur l’éducation artistique, développer les capacités créatrices pour le 21

siècle. UNESCO & Gouvernement du Portugal

Lisbonne, Portugal 6 - 9 mars 2006 DONDIS, Donis A. Sintaxe da Linguagem Visual. São Paulo: Martins Fontes,

1997. GALEANO, Eduardo. O livro dos abraços. Porto Alegre: L&PM, 2002. HALL, Stuart. Identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A

Editora, 2003. HUNT, Peter. Crítica, teoria e literatura infantil. São Paulo: Cosac Naify, 2010. MELLO, Roger. Meninos do mangue. São Paulo: Companhia das Letrinhas,

2003. MELLO, Roger. Nau catarineta. Rio de Janeiro: Manatti, 2003. MELLO, Roger. João por um fio. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2003. MELLO, Roger. Carvoeirinhos. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2003. PLAZA, Julio. Tradução Intersemiótica. São Paulo: Editora Perspectiva, 2003.

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Metodologia de Design de Instrumentos Manuais: Mock-Ups e Protótipos na

Avaliação Ergonômica

Luis Carlos Paschoarelli1 Danilo Corrêa Silva2

José Carlos Plácido da Silva3

1 INTRODUÇÃO

Os aspectos metodológicos que abrangem o design podem apresentar diferentes “dimensões”, sendo uma linha de estudos bastante representativa no modo como são desenvolvidos. Seu impacto pode ser analisado tanto no âmbito do conhecimento científico, quanto nas formas de aplicação tecnológica.

No âmbito da aplicação tecnológica ou, mais precisamente, no projeto de instrumentos manuais, as exigências metodológicas tornam-se mais especializadas. Neste caso, o desenvolvimento do design de instrumentos manuais deve considerar diferentes demandas em suas respectivas etapas, incluindo as solicitações mercadológicas, os aspectos ergonômicos, as características de produção, comercialização e análise de pós-uso, entre outras.

Ao analisar particularmente os aspectos ergonômicos, os métodos do design ergonômico propõem-se a atender as principais exigências da usabilidade, aplicando procedimentos padronizados e sistematizados de desenvolvimento, avaliação e validação do produto ou sistema.

O presente texto tem por objetivo apresentar uma análise sobre os métodos de Design Ergonômico aplicados no projeto de instrumentos

1 Livre-docente em Design Ergonômico, PPGDesign-UNESP, [email protected] 2 Mestrando em Design, PPGDesign-UNESP, [email protected] 3 Livre-docente em Ergonomia, PPGDesign-UNESP, [email protected]

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manuais, particularmente o desenvolvimento de mock-ups e protótipos utilizados na avaliação e validação ergonômica do produto.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 Métodos do Design Ergonômico

O design ergonômico tem como propósito a aplicação do conhecimento ergonômico no desenvolvimento de dispositivos tecnológicos, com base em métodos que permitem analisar e predizer a interação entre todos os aspectos humanos e os sistemas tecnológicos envolvidos. Para tal, faz uso de procedimentos sistematizados de avaliação de usabilidade aplicados na fase de concepção do produto (PASCHOARELLI; SANTOS, 2011).

De acordo com Stanton e Young (1999), pode-se afirmar que tais métodos procuram aperfeiçoar o desenvolvimento de produtos e sistemas, por meio da compreensão e prognóstico da interação entre os usuários de um conjunto de dispositivos tecnológicos.

Entre os métodos de design ergonômico destacam-se aqueles já discutidos por Paschoarelli e Silva (2006), cujas características envolvem a análise ergonômica da atividade como foco da problematização; a determinação de critérios ergonômicos e de usabilidade como diretrizes para o desenvolvimento do produto, bem como o “... desenvolvimento de procedimentos metodológicos de avaliação e análise do produto...”, os quais “... contribuem de forma expressiva na aplicação do Design Ergonômico, uma vez que é através desses procedimentos que se cria a oportunidade de avaliar de modo satisfatório a usabilidade do produto” (p. 210).

Quanto ao design de instrumentos manuais, a Sandvik (1997), apresenta uma proposta “científica” para o desenvolvimento deste tipo de produto, na qual se destaca a implementação de critérios ergonômicos no projeto desses equipamentos. Esse “programa” é caracterizado por 11 etapas,

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a saber: 1 - Especificações Preliminares; 2 - Análise do mercado; 3 - Revisão Científica; 4 - Projeto (desenho e prototipagem); 5 - Primeiro teste de usabilidade; 6 - Avaliação e modificação do protótipo; 7 - Segundo teste de usabilidade; 8 - Recomendações Finais; 9 - Especificações da produção; 10 - Terceiro teste de usabilidade; e 11 - Revisão/Feedback.

Destacam-se, neste método, os denominados “testes de usabilidade”, os quais permitem “... determinar critérios projetuais integralizados, contribuindo expressivamente para a operacionalização do projeto, justamente no momento de aprimoramento e validação das soluções focadas à usabilidade, garantindo este princípio já nas fases iniciais do projeto (PASCHOARELLI; SILVA, 2006, p. 2010).

2.2 Desenvolvimento de Modelagem Física

Testes de usabilidade aplicados no desenvolvimento de projetos de instrumentos manuais demonstram serem procedimentos essenciais para a avaliação e validação ergonômica do produto ou sistema. Tais testes exigem, entre outros aspectos, a manipulação do instrumento manual, então caracterizado – ou materializado – na forma de um modelo físico tridimensional: mock-up ou protótipo.

O mock-up é um modelo físico em escala real (escala 1:1), da proposta de produto, cujas dimensões e shape (forma) são fidedignos àquelas que assinalam o design proposto. Entretanto, um mock-up limita-se a estas características (dimensionais e morfológicas), não sendo considerados os materiais e sistemas funcionais do produto final.

Já os protótipos, apresentam as mesmas características dimensionais e morfológicas dos mock-ups, entretanto, são confeccionados com os mesmos materiais e sistemas funcionais do produto final, permitindo ser avaliados sob o ponto de vista da funcionalidade.

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Tantos os mock-ups, quanto os protótipos, podem ser confeccionados por processos convencionais (denominado de prototipagem convencional), ou por processos computadorizados, (denominado de prototipagem rápida), mas tudo isso é dependente de fatores projetuais, como por exemplo o orçamento do projeto, a disponibilidade tecnológica, a exigência do nível de precisão, a qualidade do protótipo/mock-up; entre outros.

De modo geral, pode-se afirmar que nas fases preliminares de desenvolvimento do produto, durante o design ergonômico de instrumentos manuais, os sistemas convencionais de confecção de protótipos e mock-ups são os mais empregados. Segundo SILVA et al. (2002), sistemas convencionais de confecção de protótipos e mock-ups possibilitam simular situações de usabilidade com um produto, e aspectos físicos similares àqueles determinados em projeto, com rapidez e sem grandes custos, permitindo a avaliação cognitiva do produto e a realização de análises ergonômicas. Para SÄDE et al. (1998), os protótipos de baixa fidelidade (ou mock-ups) “... provaram ser uma maneira eficiente de detectar problemas de usabilidade...” (p. 59-60).

SILVA et al. (2002) propõem que, somente após a otimização do projeto, quando se valida a usabilidade do produto por meio de testes com protótipos / mock-ups convencionais, é que deveriam ser confeccionados protótipos Hi-fi, por meio de modelagem virtual, os quais permitem maior precisão dimensional e, consequentemente, testar a funcionalidade e/ou outros aspectos inerentes à produção, descarte e reutilização de peças e componentes.

É importante destacar que os sistemas digitais (informatizados) de confecção de protótipos de mock-ups, podem ser plenamente utilizados em todas as fases de desenvolvimento do produto, o que é muito interessante,

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mas desde que haja disponibilidade financeira e tecnológica para a equipe projetual.

A proposta do presente texto é demonstrar que a modelagem convencional, devido às características descritas anteriormente, parece ser a melhor alternativa a ser aplicada em grande parte das situações. Isso é particularmente verdadeiro para as etapas iniciais de desenvolvimento do produto, quando se pretende utilizar mock-ups e protótipos na avaliação e validação ergonômica.

Neste sentido, serão apresentado a seguir, dois cases de modelagem física convencional – desenvolvimento de um mock-up e de um protótipo – em que foi realizado com sucesso a avaliação e a validação ergonômica dos instrumentos manuais.

3 CASES DE MODELAGEM FÍSICA CONVENCIONAL NO DESIGN DE INSTRUMENTOS MANUAIS 3.1 Confecção de Mock-ups no Design de Transdutor de Ultrassonografia

O desenvolvimento de equipamentos médico-hospitalares com base no design ergonômico é uma demanda já descrita por Akita (1991), o qual afirma que tais equipamentos se caracterizam pela elevada tecnologia e, consequentemente, usabilidade complexa. De acordo com Wihlidal e Kumar (1997), o uso de equipamentos para exames de ultrassonografia apresenta associação com a ocorrência de problemas musculo-esqueléticos em médicos ultra-sonografistas. Neste sentido, propôs-se aplicar procedimentos do design ergonômico no redesenho de um novo transdutor de ultrassonografia para avaliar as diferentes fases metodológicas de análise, redesign, simulação e produto (PASCHOARELLI et al. 2011).

Dentre essas fases, destaca-se o desenvolvimento de mock-ups virtuais e físicos, o qual se deu nas seguintes etapas: determinação dos

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requisitos projetuais, ou requisitos de usabilidade; conceituação do produto a partir de brainwriting, preconizado por Vangundy (1999) como a técnica mais eficiente enquanto número de alternativas de desenho; detalhamento do produto, ou adaptação da técnica de combinação de elementos, descrita por Kaminski (2000); adequação dimensional, atendendo a critérios antropométricos específicos da extremidade dos membros superiores; modelagem virtual e modelagem física (confecção de mock-ups).

A modelagem virtual deu-se com o software 3D StudioMax R3, que segundo Peterson (1998), possibilita modelar e controlar objetos tridimensionais virtuais no “espaço cibernético”, o que significa analisar visualmente o produto, bem como gerar futuros formatos de arquivos utilizados na prototipagem rápida e nos sistemas CAD-CAM.

Apesar de a modelagem virtual ter possibilitado a confecção de modelos Hi-fi (de alta fidelidade), a opção pelo sistema convencional deu-se pela caracterização da abordagem proposta e pelas vantagens que esse tipo de modelagem oferecia naquela etapa de desenvolvimento do produto.

Portanto, a modelagem convencional caracterizou-se pela confecção de mock-ups, ou modelos tridimensionais em escala natural, cujas características físicas e operacionais puderam ser simuladas, permitindo a verificação da usabilidade do produto na interface ergonômica.

O processo de desenvolvimento destes modelos apresentou uma sistemática particular, na qual a modelagem física iniciou-se com a confecção de pré-modelos em espuma de poliuretano (PU) (Figura 01), com o objetivo de tornar tridimensional, as propostas de desenho desenvolvidas nas etapas anteriores.

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FIGURA 01 – Pré-modelos do Mock-up 01.

A partir da análise geral das propostas apresentadas, começou-se a

definir o shape do produto, utilizando-se novamente PU, placa de fibra de madeira de média densidade (MDF), massa plástica e metal (Figura 02).

FIGURA 02 – Modelos dos primeiros mock-ups.

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O uso de PU foi necessário para modelar as peças cujas características dependessem dos aspectos antropomorfos do shape, uma vez que este material permite alcançar esta característica com qualidade excepcional. Já o MDF permitiu modelar àquelas peças caracterizadas pelo formato geométrico. A massa plástica foi empregada para revestir, proteger e garantir a textura prevista para as peças desenvolvidas, tanto em PU quanto em MDF. O metal foi empregado na peça em que se exigia a fidelidade dimensional, permitindo a análise funcional de um dos sistemas solicitados pelos requisitos ergonômicos do produto.

A partir da definição destes modelos, partiu-se para a obtenção de moldes negativos destas peças (Figura 03), utilizando-se borracha de silicone e caixas em MDF.

FIGURA 03 – Modelos negativos dos primeiros mock-ups.

A partir dos moldes com borracha de silicone, foi possível modelar

os mock-ups finais em plástico reforçado com fibra de vidro (PRFV) ou com plástico reforçado com fibra de carbono (PRFC), obtendo-se mock-ups com acabamento e dimensionamento satisfatórios (Figura 04).

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FIGURA 04 – Peças finais dos mock-ups, modeladas em PRFV (azul) e PRFC (grafite).

Após a primeira avaliação ergonômica, utilizando-se métodos de

análise biomecânica como a eletrogoniometria e a força de pressão na face palmar das falanges distais, foram confeccionados mock-ups aperfeiçoados mais adequados (Figura 05), permitindo novas avaliações biomecânicas e perceptivas, o que garantiu avaliar e validar a característica ergonômica do novo produto.

Metodologias em Design I N T E R - R E L A Ç Õ E S

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FIGURA 05 – Novos Mock-ups, utilizados na avaliação e validação ergonômica do

produto.

A partir destes mock-ups, foi possível aplicar procedimentos

sistematizados de avaliação e análise, durante as fases de desenvolvimento de produto. O seu processo de desenvolvimento caracteriza-se por um método plausível, seguro e confiável, com resultados satisfatórios, cujo reconhecimento deu-se com a classificação em segundo lugar no 3º Prêmio Werner von Siemens de Inovação Tecnológica / 2008; categoria “Ciência e Tecnologia” - modalidade “Saúde”. 3.2 Confecção de Protótipos no Design de Ferramentas para Colheita de Mudas de Plantas Ornamentais

O cultivo de mudas de flores é uma atividade com grande potencial para intervenções ergonômicas. Os processos realizados submetem os trabalhadores tanto a posturas biomecânicas extremas, como a possíveis sobrecargas de pressão na região das extremidades dos membros superiores.

O cultivo é realizado em grandes estufas e, dependendo da espécie, possui particularidades. Algumas espécies são plantadas em sacos plásticos ou vasos, apoiados em uma mesa de aproximadamente 800 mm de altura. Porém

Metodologias em Design I N T E R - R E L A Ç Õ E S

336

há outras espécies que necessitam ser plantadas ao nível do solo, o que pode submeter os trabalhadores a condições impróprias durante o processo de colheita.

Além disso, não se conhece um equipamento específico que atenda às necessidades dessa atividade, o que caracterizou a demanda para o desenvolvimento de uma ferramenta com esta finalidade. O projeto incluiu a aplicação de conhecimentos biomecânicos e ergonômicos que propiciassem um maior conforto e eficiência da tarefa.

O desenvolvimento projetual contou com a confecção de dois modelos preliminares em espuma de poliuretano (Figura 06). Esses pré-modelos caracterizaram-se como verdadeiros mock-ups (uma vez que apresentavam escala real, 1:1, e podiam ser manipulados) permitiram a correção do dimensionamento de acordo com as limitações antropométricas da mão humana; e outros ajustes físicos (morfológicos) relativos à manipulação.

FIGURA 06 – Pré-modelos preliminares esculpidos em espuma PU.

Metodologias em Design I N T E R - R E L A Ç Õ E S

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A partir das análises realizadas com os pré-modelos, definiu-se o desenho final do produto. Assim, iniciou-se a modelagem virtual dos componentes, com o auxílio do software Siemens Solid Edge ST®. Este sistema de modelagem ocorre em duas etapas: a primeira é realizada no modo part, na qual são modeladas as peças individualmente; e a segunda no modo assembly, no qual as peças são unidas por meio de relações (relationships). O modelo final em vista explodida pode ser visualizado na Figura 07.

FIGURA 07 – Vista explodida do modelo virtual no software Solid Edge ST®.

Posteriormente, o modelo foi transferido para o software Autodesk

3D Studio Max 2009®, permitindo a geração de renderização hiper-realista (Figura 08), a seleção do acabamento superficial e a aparência final do produto.

Metodologias em Design I N T E R - R E L A Ç Õ E S

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FIGURA 08 – Visualizações hiper-realistas geradas no software 3D Studio Max 2009®.

Com tais resultados, deu-se inicio novamente à modelagem física,

com a técnica de prototipagem convencional, a qual compreendeu a manufatura das peças individualmente. Como processo de confecção da carenagem, foi aplicado o vacuumforming, que consiste no aquecimento de uma placa ou filme plástico, que é conformado contra uma superfície através da ação de vácuo. É um processo largamente utilizado na indústria para a confecção de blisters para remédios e diversos tipos de embalagens.

O processo requer moldes “negativos”, criados a partir dos originais em PU (FIGURA 09A). Com esses moldes foi possível replicar as cavidades com o uso de massa plástica diluída em resina poliéster (FIGURA 09B). Posteriormente, essas cavidades foram fixadas em uma base de madeira (FIGURA 09C). Essa base foi construída em compensado laminado de 15 mm e totalmente vedada com massa plástica nas arestas e uma borracha de vedação

Metodologias em Design I N T E R - R E L A Ç Õ E S

339

no perímetro inferior da caixa, para prevenir a entrada de ar durante o processo.

FIGURA 09 – Etapas para a produção da base para vacuumforming.

Como material para a carenagem foi utilizada uma placa de

poliestireno (PS) de 2 mm de espessura. Todas as características técnicas referentes à temperatura, pressão de ar e de vácuo foram ajustados no equipamento para realizar a conformação. O processo consiste nas seguintes etapas: o forno é posicionado sobre a placa e esta é aquecida; o forno se desloca para trás e a mesa onde se apoia a superfície é acionada, subindo até que haja uma vedação na área útil de conformação; ocorre a retirada do ar entre a chapa e a superfície, resultando na conformação da placa;

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resfriamento da peça através da ventoinha localizada na parte superior da máquina; e por fim o desmolde da peça.

Todo o processo anterior resulta na obtenção de uma placa com as peças salientes e unidas pela base. Assim, foi necessário a separação das mesmas e o recorte no formato adequado para a montagem (Figura 10A). Posteriormente foi realizado o acabamento (Figura 10B) com pintura spray de base acrílica na cor amarelo, e fixadas estruturas para aparafusar as hastes metálicas, as quais faziam parte do sistema de corte (Figura 10C). O modelo final foi então montado a partir dos componentes anteriores (Figura 10D).

FIGURA 10 – Componentes e modelo final do produto.

Este modelo foi analisado com métodos de avaliação do design

ergonômico descritos por Silva e Paschoarelli (2010), particularmente avaliações com uma luva instrumentalizada com sensores FSR’s (Force Sensing Resistors) os quais permitiram verificar a distribuição das forças de pressão na face palmar da mão.

Graças ao desenvolvimento preciso do modelo, foi possível constatar melhora significativa nas cargas biomecânicas aplicadas às mãos, se comparado aos dispositivos tradicionais. Novamente o processo de desenvolvimento de modelos (mock-ups e protótipos) convencionais demonstrou ser um método plausível, prático e de baixo custo, com resultados satisfatórios, cujo reconhecimento deu-se com a seleção para a Mostra Novíssimos da Bienal Brasileira de Design de 2010, ocorrida em Curitiba – PR; e

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premiação em segundo lugar, no 9º Prêmio Alcoa de Inovação em Alumínio / 2010 – Modalidade Profissional. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O design atua como elemento de conexão entre as capacidades produtivas e tecnológicas da indústria, as diversas áreas do conhecimento e as necessidades do mercado. O desenvolvimento de um produto deve aliar de forma harmônica todos esses fatores e ponderar a participação deles em cada etapa do processo. A aplicação tecnológica do design depende cada vez mais de procedimentos metodológicos sistematizados e especializados para os mais diferentes desenvolvimentos de projetos de produtos.

O projeto de instrumentos manuais é um desses casos, cujos princípios ergonômicos devem ser priorizados para o alcance da usabilidade plena do produto. Nesse sentido, a prototipagem e a avaliação física desse tipo de produto podem contribuir significativamente para a validação do projeto de design. Ressalta-se que os métodos de prototipagem descritos não requerem tecnologias sofisticadas e, portanto, podem ser facilmente aplicados sem muitos recursos dessa natureza.

Propôs-se aqui, apresentar o desenvolvimento de mock-ups e protótipos utilizados na avaliação e validação ergonômica do produto, durante o desenvolvimento do projeto de instrumentos manuais. Dois cases foram apresentados e as técnicas e os materiais empregados caracterizam a denominada modelagem física convencional. Os resultados foram considerados satisfatórios, pois em ambos os casos a avaliação pode ser realizada com sucesso e a validação ergonômica garantiu a usabilidade dos produtos.

Apesar dos resultados apresentados aqui serem considerados satisfatórios, alguns aspectos importantes devem ser considerados com

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atenção. O primeiro deles trata das novas técnicas de modelagem virtual com prototipagem rápida, que é um sistema muito mais avançado do ponto de vista tecnológico, mas ainda com custo elevado para ser empregado nas primeiras fases projetuais, particularmente quando já se iniciam as primeiras avaliações ergonômicas do produto.

Outro aspecto que merece atenção refere-se ao fato de que o desenvolvimento da modelagem física convencional não é uma novidade entre os designers de produto, e que seu simples relato não traz contribuição expressiva. Por outro lado, a descrição dos métodos de modelagem física convencional, para a avaliação ergonômica durante o projeto de instrumentos manuais, não está completamente apresentada e discriminada na produção científica da área do design, o que demonstra uma lacuna, aqui preenchida.

O propósito deste texto foi contribuir na ampliação do conhecimento científico e tecnológico das metodologias em design.

Agradecimentos

O primeiro case apresentado foi desenvolvido com o apoio parcial da FAPESP (Processo 99/12147-7). O segundo case apresentado foi desenvolvido com o apoio da FAPESP (Processo 05/59941-2 e 06/55891-3). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AKITA, M. Design and Ergonomics. Ergonomics. 34 (06): 815-824, 1991. KAMINSKI, P. C. Desenvolvendo produtos com planejamento, criatividade e

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O emprego da metodologia EWA em uma análise ergonômica de um consultório

odontológico

José Carlos Plácido da Silva1 Eliel Soares Orenha2

Mariana Falcão Bormio3

1 INTRODUÇÃO

Quando se fala em ambiente construído, torna-se importante destacar que é a partir da maneira como ele encontra-se configurado, composição arquitetônica, formas, cores, fatores físicos ambientais (ruídos, iluminação, temperatura, entre tantos outros), mobiliário, layout; que conjugados geram condições que permitam que as atividades humanas ocorram de maneira a proporcionar saúde, segurança e bem-estar ao homem.

Neste trabalho os olhares se direcionam aos profissionais de odontologia e seu posto de trabalho. Atenção esta justificada pelos grandes índices de ocorrência de doenças identificados nesses profissionais, principalmente as do sistema osteomusculares, pois, para desenvolverem suas atividades assumem posturas que restringem seus movimentas, além de exigirem constantes torções e flexões do corpo, além de esforços e repetitividade.

Para o desenvolvimento desse estudo, estabeleceu-se uma parceria entre as Faculdades de Arquitetura, Artes e Comunicação – FAAC, campus Bauru; e de Odontologia, campus São José dos Campos; da Universidade Estadual Paulista; de maneira a tirar partido da interdisciplinaridade, enquanto troca de conhecimentos, aprofundando assim os estudos desenvolvidos nos 1 Professor Titular do Departamento de Design FAAC - UNESP, Docente do Curso de Pós-graduação em Design FAAC- UNESP 2 Doutor em Odontologia Preventiva e Social, UNESP São José dos Campos 3 Doutoranda em Design, Discente do Curso de Pós-graduação em Design FAAC - UNESP

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últimos anos, e consequentemente, alcançando resultados que gerem propostas cujas soluções atendam da melhor maneira as necessidades dos usuários do posto de trabalho odontológico.

A primeira parte do trabalho consistiu na definição das metodologias a serem utilizadas, onde optou pela adoção do Questionário Nórdico de Sistemas Osteomusculares, o protocolo Ergonomic Workplace Analysis – EWA (Análise Ergonômica do Posto de trabalho), e pelo Esquema Gráfico do ISO e FDI. O segundo passo foi à aplicação de um teste piloto, que buscou identificar se as metodologias escolhidas são satisfatórias enquanto contemplarem os itens que devem ser avaliados no posto de trabalho em questão, assim como, estipular um tempo médio gasto nesse procedimento e os materiais necessários, para desenvolver a coleta de dados efetiva.

Finalizando serão tecidas considerações a partir dos resultados obtidos.

2 O POSTO DE TRABALHO ODONTOLÓGICO

Entende-se o posto de trabalho, segundo Iida (2006, p.189), como sendo a configuração física do sistema homem-máquina-ambiente, enquanto a “unidade produtiva envolvendo um homem e o equipamento que ele utiliza para realizar o trabalho, bem como o ambiente que o circunda”.

No caso do dentista, seu posto de trabalho é definido meio a uma vasta gama de equipamentos, mobiliários e o ambiente. Pode-se dizer que diante de tal complexidade, a conjugação adequada torna-se um desafio, pois, entre outros aspectos, exige concentração e precisão de movimentos, regidos pela não existência de um posicionamento postural definido, pois, ocorre uma busca constante por um bom campo visual de trabalho diante do paciente, somado à necessidade de alcance dos instrumentos a serem utilizados. Esse contexto estabelece repetitividade de movimentos, além de rotação do tronco, flexão da cabeça forçando a musculatura cervical, escapular e tóraco-

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lombar; manutenção dos membros superiores suspensos; entre outros constrangimentos corporais. Como resposta, Rasia (2004), cita a comumente presença de dores e fadiga nas regiões cervical, escapular, lombar e em outras estruturas envolvidas na manutenção dos movimentos citados, podendo gerar lesões agudas ou crônicas nas mesmas.

Para atuar sobre essas configurações deve-se, a princípio, buscar entendê-las a fim de definir parâmetros que resultem em propostas que viabilizem o bem-estar dos sujeitos, a eficiência e a eficácia da atividade. A melhor maneira é a realização de uma Análise Ergonômica do Trabalho – AET; ou seja, caracterizar as situações reais de trabalho, sendo indispensável saber o que os trabalhadores realmente fazem como fazem e porque fazem. Para tanto, utilizam-se de medições técnicas, levantamentos dos aspectos arquiteturais e mobiliários, medições do dimensionamento e dos fatores físico-ambientais como temperatura, luminosidade, ruído; questionários e formulários; check-lists, entrevistas; observação de comportamento e usos; documentação através de imagens fotográficas e vídeos; documentação gráfica - projeto arquitetônico, croquis e simulações; realizadas de maneira técnica e subjetiva, pelo avaliador e pelo usuário.

A AET pode ser desenvolvida por meio de APO – Avaliação Pós Ocupação, que segundo Ornstein e Romero (1992), diz respeito a uma série de métodos e técnicas que diagnosticam fatores positivos e negativos do ambiente no decorrer do uso, a partir da análise de fatores socioeconômicos, de infra-estrutura e superestruturas urbanas dos sistemas construtivos, conforto ambiental, conservação de energia, fatores estéticos, funcionas e comportamentais. Uma APO compreende várias etapas: coleta ou levantamento de dados, diagnóstico, recomendações para o ambiente - estudo de caso e insumos para os novos projetos (ORNSTEIN, 1991 apud ORNSTEIN e ROMERO, 1992).

De acordo com a APO, o ambiente construído pode ser trabalhado a partir de

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Atualmente a ergonomia em sua constante busca pelo entendimento da interface homem / trabalho / ambiente, assume um papel indiscutível de importância no contexto do ambiente de trabalho mundial, facilmente comprovado pelo grande número de trabalho em franco desenvolvimento. Uma das justificativas mais consistentes para esse fato é o uso da interdisciplinaridade com outras áreas, diante do objetivo principal de entender a maneira como ocorre a relação em questão.

Rasia (2004) cita que as primeiras contribuições da Ergonomia no campo da Odontologia destinaram-se a melhorar as condições de trabalho dos cirurgiões dentistas, criando e aperfeiçoando as ferramentas, instrumentos e mobiliário utilizado por esses profissionais. E complementa destacando que o objetivo é a diminuição do estresse físico e mental, prevenindo assim as doenças relacionadas à prática odontológica, e conseqüentemente buscando uma produtividade mais expressiva. 3 METODOLOGIAS

Muitas são as metodologias existentes para o desenvolvimento de AET, para o posto em questão adotou-se o Questionário Nórdico de Sistemas Osteomusculares, o protocolo Ergonomic Workplace Analysis – EWA (Análise Ergonômica do Posto de trabalho), e pelo Esquema Gráfico do ISO e FDI. A seguir serão apresentadas informações a respeito de cada metodologia.

3.1 Questionário Nórdico de Sistemas Osteomusculares Desenvolvido com a proposta de padronizar a mensuração de relato

de sintomas osteomusculares e, assim, facilitar a comparação dos resultados entre os estudos. Os autores desse questionário não o indicam como base para diagnóstico clínico, mas para a identificação de distúrbios osteomusculares e, como tal, pode constituir importante instrumento de

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diagnóstico do ambiente ou do posto de trabalho (PINHEIRO et.al., 2002). Sua eficácia pode ser constatada pelo fato desse questionário já ter sido traduzido para diversos idiomas na última década.

A metodologia é estruturada em um questionário onde as questões estruturam-se a partir de um esquema estipulado do corpo humano, dividido em nove partes, cujas respostas são escolhidas entre as alternativas “sim” ou “não”, quanto à ocorrência de sintomas nas diversas regiões anatômicas nas quais são mais comuns.

O respondente deve relatar a ocorrência dos sintomas considerando os doze meses e os sete dias precedentes à entrevista, bem como relatar a ocorrência de afastamento das atividades rotineiras no último ano. Iida (2006) lembra que o questionário deve ser distribuído juntamente com uma carta explicativa dos objetivos do levantamento e solicitando colaboração; seguido de um bloco de caracterização do sujeito, pedindo-lhe para indicar o gênero, idade, lateralidade (se é destro, canhoto ou ambidestro). Finalmente, indica-se onde devem ser entregue os questionários preenchidos, e se faz um agradecimento pela colaboração. 3.2 EWA - Ergonomic Workplace Analysis

A metodologia EWA – “Ergonomic Workplace Analysis” - Análise Ergonômica do Local de trabalho, foi desenvolvida por Ahonem et.al. (1989); e se destaca pela importância histórica, no contexto de análise ergonômica do local de trabalho, caracterizada por abordagens subjetivas e objetivas.

Esta metodologia consiste em uma APO – Avaliação Pós-ocupação, desenvolvida por meio da aplicação de um protocolo que avalia o local de trabalho, por meio de uma abordagem ampla, que possibilita diferentes enfoques, seja de forma geral, enfocando o ambiente como um todo, ou mesmo pontual, como por exemplo o mobiliário, de maneira a não somente caracterizar fisicamente o local de trabalho, mas também a percepção do usuário e do avaliador em relação ao processo de trabalho.

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O EWA foi criado em 1984 pelo FIOH - Finnish Institute of Occupational Health (Instituto Finlandês de Saúde Ocupacional), em Helsink, tendo como autores Mauno Ahonen, Martti Launis e Tuulikki Kuorinka, e em 1989 teve sua publicação adaptada para uma versão em inglês; buscando a superação de um contexto crescente de incidência de doenças ocupacionais, por parte do governo finlandês, que colocou em vigor a lei de higiene ocupacional, que exigia unidades de cuidado higiênico dos empreendimentos; inspeção de funcionamento, condicionado ao empreendimento; e avaliação dos seus possíveis efeitos na saúde dos trabalhadores.

Considera-se, portanto, que a criação deste método foi pensada buscando uma ferramenta de análise ergonômica, capaz de captar sob diferentes aspectos do local de trabalho, material informativo que transmitisse, ao ser utilizado, informações aos profissionais (projetistas - arquitetos e designers, e especialistas da saúde) de maneira a facilitar ações como: a contratação de pessoal; realização de correções – checando a qualidade das melhorias feitas, tanto em um posto de trabalho, como nas tarefas, seja de um único posto de trabalho ou fazendo comparação de diferentes postos com o mesmo tipo de atividade; e/ou desenvolvimento de novos projetos com configurações seguras, saudáveis e produtivas para os trabalhadores.

A aplicação do EWA é utilizada para a realização de análise ergonômica detalhada do local de trabalho, por meio de itens que enfocam aspectos da fisiologia do trabalho, biomecânica ocupacional, psicológicos, higiene ocupacional, em um modelo participativo com a organização do trabalho.

3.3 Esquema Gráfico do ISO e FDI

Com o objetivo de orientar a atividade odontológica a Internacional Organization for Standardization – ISO, e a Federation Dentaire Internacionale – FDI, descreveram o sistema de trabalho para esse profissional, por meio de

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um esquema que se baseia em um relógio imaginário colocado sobre o posto de trabalho odontológico, de maneira a possibilitar a indicação da posição a ser adotada pelo dentista e seu auxiliar durante o atendimento do paciente (CUSTÓDIO, 2006).

Essa metodologia que busca uma análise ergonômica, divide o local de trabalho em áreas, onde as demarcações remetem à um mostrador de relógio, cujo centro corresponde ao eixo dos ponteiros e deve posicionar-se na boca do paciente, deitado na horizontal. A posição de 12 horas é sempre indicada pela cabeça do paciente e a de 6 horas para os pés; dividindo assim a sala em duas áreas: à direita devendo ser ocupada pela a cadeira do dentista, e à esquerda pela cadeira do auxiliar.

A partir do centro traçam-se três círculos concêntricos com raios de respectivamente 0,5; 1,0; e 1,5 metros, que estabelecem zonas de alcance. A área limitada pelo círculo de raio 0,5m denominada de zona de transferência, que abrange tudo que se transfere à boca do paciente; a área de 1,0m de raio delimita a área útil de trabalho que pode ser alcançado com o braço esticado, devem ser posicionadas as mesas auxiliares e armários fixos, prevendo as gavetas aberta; e a área do raio de 1,5m de largura seria o limite do consultório como um todo. A figura 01 exemplifica a aplicação desta metodologia.

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Figura 01: esquema gráfico ISO/FDI.

Fonte: Porto (1994, apud Custódio, 2006)). Todos os aparelhos (equipos, periféricos, bandeja auxiliar com

instrumentais e materiais necessários, armários ou gavetas de armários, suctor, terminal de computador) e o campo operatório devem estar em um plano horizontal imaginário que passa a altura do cotovelo do dentista quando ergonomicamente sentado. A tolerância de variação de altura para este plano é de até 15 cm acima do mesmo.

Um ambiente de trabalho do dentista é sua sala clínica, dessa maneira, o seu posto de trabalho deve refletir como elemento considerável na acomodação e satisfação dos pacientes e dos que nele trabalham

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4 ESTUDO DE CASO – CONSULTÓRIO ODONTOLÓGICO “LAR ESCOLA RAFAEL MAURÍCIO”

É importante relembrar, conforme citado anteriormente, que esse trabalho é parte integrante de um projeto maior, constituindo em um pré-teste para que s possa fazer as devidas adequações nas metodologias e processo de aplicação. Para seu desenvolvimento, o local escolhido foi à escola municipal “Lar Escola Rafael Maurício”, localizado na cidade de Bauru – SP, que possui um consultório odontológico, figuras 02 - 04, com a presença diária do profissional responsável, que é do gênero masculino, com idade de 30 anos. O primeiro passo consistiu no pedido de autorização da instituição enquanto permissão para o desenvolvimento da pesquisa. Após o aceite da mesma, foi definido um dia para a visita técnica, onde foram feitas as medições de ruído, iluminação e temperatura; definição do layout do consultório, registros fotográficos e preenchimento dos protocolos avaliativos pelo dentista e pelos avaliadores. O processo teve um tempo de duração de 40 minutos para sua aplicação. Lembra-se que a tabulação e análise dos resultados foram feitas fora do ambiente de estudo.

Figura 02: Planta / layout do consultório do “Lar escola Rafael Maurício” Fonte: Arquivo

dos Autores

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Figura 03: vistas internas do consultório Fonte: Arquivo dos Autores

Figura 04: vistas internas do consultório Fonte: Arquivo dos Autores

As análises dos resultados obtidos com a aplicação das metodologias

previamente definidas caracterizaram as seguintes situações: • Questionário Nórdico de Sistemas Osteomusculares:

o Configurou em 100% como não havendo ocorrência de dores em nenhuma parte do corpo do profissional, nos últimos 7 e 12 dias;

o Configurou em 100% como não havendo a necessidade do profissional em deixar de trabalhar algum dia nos últimos 12 meses, devido à ocorrência de problemas com alguma parte do corpo.

• EWA - Ergonomic Workplace Analysis

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o A análise técnica, desenvolvida sob o ponto de vista subjetivo do avaliador, Gráfico 01, classificou o ambiente como possuindo condições predominantemente regulares, em 35,75%.

Gráfico 01: Análise do avaliador

Os itens que mostraram maiores problemas foram: • Grande exigência de atenção: visto que os ciclos de trabalhos

duram, em média, 30 a 50 minutos; • Ruídos ambientais: a Norma Brasileira NBR 10152, definem que em

ambientes de consultório odontológico o ruído não deve ultrapassar 68 dB (A), este valor é corroborado pela Norma Regulamentadora do Ministério do Trabalho – NR 9. Os valores encontrados no consultório foram em média 66 dB e de 80 dB com a caneta de alta rotação ligada

• Espaço de trabalho: Área de trabalho horizontal, Altura de trabalho, Visão, Espaço para as pernas, Assento, Ferramentas manuais

• Posturas de trabalho e movimentos: Pescoço – ombros, Cotovelo – pulso, Costas, Quadril – pernas.

Pelo enfoque subjetivo e prático de uso do trabalhador, o ambiente

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foi classificado como possuindo condições regulares - 43%, Gráfico 02. Os maiores problemas apontados relacionam-se às posturas de trabalho e movimentos assumidos: pescoço – ombros, cotovelo – pulso, costas, e quadril – pernas; além da preocupação com os riscos de acidentes, que foram considerados muito grandes e muito sérios, incluindo entre eles os físicos, ergonômicos, químicos e biológicos.

Gráfico 02: Análise do usuário

• Esquema Gráfico do ISO e FDI

o Aplicando esse Sistema Gráfico, figura 08, observou-se que o posto de trabalho ultrapassa os limites demarcados como sendo ideais para o alcance do profissional, pois, o layout da clinica não apresenta concentrado como deveria para que assim facilitasse o desenvolvimento das atividades do profissional. Conclui-se assim que precisa ser feita uma remodelação na distribuição dos equipamentos dentro do local.

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Figura 05: Aplicação do esquema gráfico

5 Conclusões

Finalizando esse trabalho pode-se dizer que os resultados obtidos, enquanto processo de aplicação das metodologias, foi satisfatório e tido como viável para utilização na segunda etapa do projeto, podendo ser aplicado de maneira eficaz.

No que diz respeito aos resultados dos protocolos, pode-se dizer que não foram identificados problemas com o sistema osteomuscular do trabalhador e que, os problemas identificados com o ambiente físico podem ser facilmente corrigidos.

Espera-se que através desse trabalho tenha-se instituído as primeiras contribuições para essa linha de pesquisa. 6 REFERÊNCIAS

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Princípios Metodológicos da Coleta de Dados Biomecânicos para Avaliação de

Instrumentos Manuais

Luis Carlos Paschoarelli1 Lívia Flávia de Albuquerque Campos2

José Carlos Plácido da Silva3

1 INTRODUÇÃO

O Design Ergonômico se caracteriza pela aplicação de métodos projetuais (ERGONOMI DESIGN GRUPPEN, 1997; NORRIS; WILSON, 1997; SANDVIK, 1997; MORAES; FRISONI, 2001; PASCHOARELLI, 2003; e IIDA, 2005), cujos princípios baseiam-se na análise ergonômica da atividade e na determinação de critérios ergonômicos e de usabilidade para o desenvolvimento de produtos.

Tais métodos são descritos pela Sandvik (1997), a qual destaca os denominados “testes de usabilidade” durante o processo de desenvolvimento do produto; ou por Paschoarelli (2003, p. 124), o qual demonstra um conjunto de “procedimentos metodológicos de avaliação e análise do produto”, que pode servir de parâmetro para a análise de instrumentos manuais, entre outros estudos.

O Laboratório de Ergonomia e Interfaces (LEI) da FAAC-UNESP-Bauru desenvolveu alguns desses estudos, os quais buscaram contribuir na geração de parâmetros ao Design Ergonômico e desenvolver/aprimorar as metodologias de avaliação de sistemas, produtos e interfaces (PASCHOARELLI; GIL COURY 2000, 2002a,b; 2004a,b,c; PASCHOARELLI et al. 2006a,b;

1 Livre Docente em Design Ergonômico, PPGDesign – UNESP – BAURU, [email protected] 2 Doutoranda em Design, PPGDesign – UNESP – BAURU, [email protected] 3 Livre Docente em Ergonomia, PPGDesign – UNESP – BAURU, [email protected]

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361

PASCHOARELLI et al. 2007). Enfoques especiais têm sido direcionados à análise de aplicação de forças manuais no manejo de produtos por diferentes parâmetros e variáveis (RAZZA, 2007; DARROUJ, 2009; PASCHOARELLI, 2009; CAMPOS, 2010). Apesar disso, estudos e avaliações destinadas a fornecer requisitos para o design ergonômico de instrumentos manuais ainda são poucos e a indústria no Brasil ainda é carente de dados “funcionais” específicos da população brasileira.

Este artigo aborda os princípios, características e recomendações metodológicas referentes à coleta de dados biomecânicos de forças de preensão manual para avaliação de instrumentos manuais.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Avaliações de força são descritas desde o final do século XVII, destacando-se Edmund Regnier que em 1798 (Figura 1A) utilizou pela primeira vez o termo “Dinamômetro” (instrumento utilizado para medições da força muscular voluntária) em seu artigo "Description et usage du Dinamomètre..." (BUD; WARNER, 1998). Antes disso, Pern (1978) cita o equipamento utilizado por J. T. Desaguliers em 1763, fabricado em madeira e metal (Figura 1B), que avaliava a força muscular por meio do levantamento de um peso.

Figura 1 – A: Dinamômetros de Regnier de 1798. Fonte: Bud e Warner (1998, p. 194).B: Dinamômetro de Desagulier. Fonte: Pern (1978, p.131).

A B

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362

Hoje, a análise de aplicação de forças de preensão manual é um

assunto recorrente em áreas como a Ergonomia; Fisioterapia; Clínica Médica; Reabilitação da mão; Educação Física; Ortopedia; Fisiologia do Esporte e do Exercício, dentre outras. Nesse sentido, Dias et al. (2010) se refere à avaliação da força de preensão manual como parâmetro na prática clínica, capaz de desempenhar importante papel no controle de processos de reabilitação; na avaliação e tratamento de desordens musculoesqueléticas da mão; e na avaliação de pessoas com patologias neurológicas. A força de preensão manual é entendida como indicador geral de força e potência musculares (IKEMOTO et al., 2007).

Embora não seja possível medir a força dentro do músculo, a capacidade muscular pode ser avaliada pela medição da força aplicada em um objeto externo (SANDERS; MCCORMICK, 1993). Neste sentido, vários critérios para medida devem ser atendidos para se coletar e utilizar dados de força adequadamente, pois como ressalta Chaffin et al. (2001), a capacidade máxima de se produzir força pode variar consideravelmente entre pessoas e tarefas.

2.2 Recomendações para a coleta de dados biomecânicos A preocupação com a padronização, segurança e confiabilidade na

coleta de dados biomecânicos impulsionou diversos autores na elaboração de recomendações para a pesquisa e aplicação prática desta área do conhecimento. Os sistemas de medida devem, pelo menos, preencher os seguintes critérios biomédicos (BRAND; CROWNINSHIELD, 1981; CHAFFIN, 1982; apud CHAFFIN et al., 2001, p. 131):

• As medidas devem estimar com precisão uma função motora humana específica definível: elas devem fornecer estimativas bem correlacionadas (não influenciadas) com a função de interesse;

• Os resultados devem ser reprodutíveis sob as condições prescritas;

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363

• As medidas devem refletir os limites de função específicos, baseados na população estudada. Em outras palavras, elas devem distinguir entre os resultados normais e anormais;

• O sistema de medidas não deve alterar a função estimada; • O sistema de medidas deve ser de utilização segura; • O sistema de medidas deve ser prático – fácil de montar e utilizar,

insensível às influências externas; e • O sistema de medidas deve apresentar adequada relação custo x

benefício.

2.2.1 Procedimentos de coleta Chaffin et al. (2001, p.156) discutem que uma análise biomecânica

da atividade, frequentemente irá identificar duas ou três tarefas que exigem uma grande quantidade de força. [...] “estas tarefas podem ser simuladas, montando-se uma estrutura de teste de força que permita ao trabalhador [sujeito] assumir posturas requisitadas”.

Devido à simplicidade das medições, a força estática foi medida por vários pesquisadores. Procedimentos padrões foram desenvolvidos e reúnem especificações para que os dados sejam obtidos de forma segura, confiável e prática (CALDWELL et al., 1974; CHAFFIN, 1975;e KROEMER et al., 1994):

• O esforço deve durar entre 4 e 6 segundos; • O período de repouso: entre 30 segundos e 2 minutos; • Instruções claras e cuidadosamente estabelecidas devem ser

apresentadas com o objetivo de evitar o constrangimento do indivíduo, informar o indivíduo dos possíveis riscos envolvidos, permitir que o indivíduo controle seu intervalo de descanso – se for necessário um tempo extra; informar ao indivíduo sobre o relatório dos dados a ser emitido e das conseqüências da publicação dos mesmos;

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364

• Um feedback geral e positivo deve ser dado ao indivíduo, mas durante o teste os valores específicos de performance não devem ser divulgados para evitar a competição quando grupos de indivíduos participam de um teste em conjunto;

• Distrações no ambiente (por exemplo, temperaturas extremas, ruído e iluminação atípicos, além de expectadores) devem ser minimizadas;

• As posturas de testes, apoios e retenções devem ser padronizadas; • Deve-se relatar todas as condições do teste, dados biográficos,

sobre o indivíduo, bem como os resultados estatísticos; Outras recomendações instruem que os sujeitos devem iniciar a

contração muscular até atingir sua força máxima, em um intervalo de não mais de 2 segundos, mantendo essa força por 2 a 5 segundos (ARMSTRONG; OLDHAM, 1999; VOORBIJ; STEENBEKKERS, 2001; EDGREN et al., 2004).

2.2.2 Posicionamento dos sujeitos Ao experimentar as ações mecânicas em diversas posturas

assumidas pelos indivíduos, estudos apontam que diferenças nas forças estão relacionadas ao posicionamento durante o acionamento da interface (MITAL; SANGHAVI, 1986; HABES; GRANT, 1997; KIM; KIM, 2000). E nesse sentido, Mital e Kumar (1998) verificaram a importância da padronização das posturas durante os testes. Entretanto, Daams (1993) apresentou contribuição relevante, nos aspectos relacionados ao posicionamento dos indivíduos, ao afirmar que apesar de importantes para a reprodutibilidade das variáveis da pesquisa, as posturas padronizadas, a priori, não são representativas da realidade e podem gerar menor força que posturas livres.

Daams (1993) avaliou duas posturas, uma livre e outra a qual denominou de “funcional” (a partir das posturas livres adotadas). A conclusão do estudo foi de que a adoção de posturas livres é mais recomendada, pois,

Metodologias em Design I N T E R - R E L A Ç Õ E S

365

além de apresentarem maiores dimensões que todas as posturas padronizadas, apresentaram poucas variações entre os indivíduos. Além disso, análises de usabilidade possuem demandas diferentes se comparadas às análises clínicas, as quais podem não ser representativas da realidade de uso das interfaces.

2.2.3 Questões Éticas Paschoarelli et al. (2008) enfatiza a relevância das questões éticas

nas pesquisas científicas: “[...] objetivo da ética na pesquisa é assegurar que ninguém seja prejudicado ou sofra consequências adversas devido às atividades de pesquisa” (COOPER; SCHINDLER, 2003, p. 110,).

No Brasil, a Resolução Nº 196, de 10 de outubro de 1996, do Conselho Nacional de Saúde (CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE, 1996) regulamenta a participação de seres humanos em pesquisa. Esta resolução incorpora, sob a ótica do indivíduo e das coletividades, os quatro referenciais básicos da bioética: autonomia, não maleficência, beneficência e justiça. Visa assegurar os direitos e deveres que dizem respeito à comunidade científica e aos sujeitos da pesquisa e ao Estado (CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE, 1996). Paschoarelli et al. (2008) esclarecem ainda a importância da submissão dos projetos de pesquisa aos Comitês de Ética em Pesquisa, os quais são “[...] colegiados interdisciplinares e independentes, [...] de caráter consultivo, deliberativo e educativo, criados para defender os interesses dos sujeitos da pesquisa em sua integridade e dignidade e para contribuir no desenvolvimento da pesquisa dentro de padrões éticos” (CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE, 1996, p.2).

Deve-se destacar também, em uma pesquisa com seres humanos, a relevância do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) o qual se refere: “[...] à anuência do sujeito da pesquisa e/ou de seu representante legal,

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livre de vícios (simulação, fraude ou erro), dependência, subordinação ou intimidação, após explicação completa e pormenorizada sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos, métodos, benefícios previstos, potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar, formulada em um termo de consentimento, autorizando sua participação voluntária” (CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE, 1996, p.2).

2.2.4 Critérios de exclusão Aconselha-se serem excluídos os indivíduos que apresentem

sintoma de problema musculoesquelético nos membros superiores (PETERSEN et al., 1989; ARMSTRONG; OLDHAM, 1999; KONG; LOWE, 2005a, 2005b;); e/ou aqueles sujeitos que apresentem histórico desses problemas nos últimos seis meses ou mais (IMRHAN; LOO, 1989; YOUNG et al., 1989; NICOLAY; WALKER, 2005), pois os dados coletados com esses sujeitos podem “comprometer” o conjunto de dados que envolvam a participação de sujeitos saudáveis. Além disso, e mais importante ainda, devem ser considerados os critérios éticos envolvidos, quando da necessidade efetiva de participação destes sujeitos. Já para as pesquisas que envolvem sujeitos idosos, podem ser utilizados critérios menos rigorosos, como não possuir limitações de movimentos e/ou não apresentar doenças severas nos membros superiores (MATHIOWETZ et al., 1985; IMRHAN; LOO, 1989). Entretanto, o relato dos procedimentos deve apresentar claramente essas considerações. Cuidados éticos devem ser considerados também com essa faixa da população, bem como com outras faixas, incluindo as pessoas com capacidades específicas, crianças e/ou, sintomáticos.

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367

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo destaca a importância de serem considerados vários critérios para a avaliação de instrumentos manuais. Nesse sentido, devem ser contemplados, com redobrada atenção, os aspectos referentes à padronização dos procedimentos e critérios éticos, a fim de que os experimentos laboratoriais possam apresentar resultados consistentes e confiáveis. Um bom planejamento metodológico, a fim de assegurar a cientificidade dos procedimentos, é de importância fundamental em avaliações desse gênero.

Além disso, as pesquisa na área do design ergonômico necessitam de padronizações metodológicas, as quais chancelam a qualidade dos resultados obtidos, bem como possibilitam conhecer variáveis com maior rigor científico e tecnológico.

Agradecimentos O presente estudo foi desenvolvido com o apoio da FAPESP (Processo 05/59941-2) e CNPq (Processo 302913/2007-6).

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Processo de Projeto em Design: uma proposição crítica

Paulo Reyes1

1 INTRODUÇÃO

Este artigo é resultado de uma pesquisa que investiga processos metodológicos em design. O design será focado aqui através dos processos de projeto como forma de resolução de problemas no tempo e no espaço. Esse processo de resolução de problemas vem sendo estudado por diversos teóricos em diferentes epistemologias.

Para efeito deste artigo, construímos uma lógica de leitura que norteia toda a reflexão sobre o processo de projeto que está marcada pelas seguintes figuras: anterioridade, operando antecipadamente a resolução de problemas em uma perspectiva de otimização dos resultados; interioridade, construindo ao longo do processo uma maneira de refletir dentro da própria ação; e exterioridade, construindo um processo aberto, em uma perspectiva de sistema.

Essas três perspectivas constroem o problema seja pela definição de uma anterioridade ao corpus em estudo; seja pela ótica de uma interioridade; ou pela exterioridade como interferência ao corpus. Aqui, estão representadas por Herbert Simon (1969), Donald Schön (1998) e Niklas Luhmann (1995). O objetivo desse artigo é apresentar uma proposta de método de projeto que leve em conta aspectos relevantes dessas teorias. O modelo teórico proposto tem sido testado e está em permanente revisão ao longo das práticas de ensino e pesquisa em diferentes níveis, graduação, extensão, especialização, mestrado e em projetos oriundos de consultorias técnicas.

1 Doutor em Ciências da Comunicação, pesquisador do Mestrado em Design Unisinos

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 Processos de projeto em uma perspectiva temporal

Pensar o design com sentido de projeto sugere pensá-lo como formador e configurador de algo que não existe para resolver uma necessidade efetiva. Nessa concepção, o design resolve problemas presentes, problemas esses que ainda não receberam uma formalização. Mas além da dimensão espacial nas operações feitas pelo design, há também uma dimensão temporal. Projetar significa operar sobre algo que não existe hoje em uma perspectiva futura. Aqui se apresenta um paradoxo: a presença da ausência. Projetar, prospectar, significa construir algo nessa ausência.

Se é verdade que a necessidade de projeto surge de uma deficiência presente, é verdade também que esse objeto se estenderá por um longo tempo em um caminho incerto. Essa incerteza nos obriga a pensar o problema de projeto em uma perspectiva mais complexa a partir de vários cenários. Pode-se compreender esses cenários como uma diversidade de possibilidades futuras cujas ocorrências ainda não foram identificadas como certas. Operar com cenários é projetar futuros imaginários expressos através de histórias plausíveis nas quais se narram sequências futuras de ações e de suas consequências. Tal procedimento constitui-se como uma técnica de acerto e erro, em que o designer pode operar sobre os cenários com ocorrência mais plausíveis. Os propósitos da utilização dos cenários são os mais diversos, no entanto, aplicam-se em geral, em situações de difícil previsão. Parece contraditório, mas o que pode ser previsto não necessita de cenários, ou seja, para a previsão o fato já está dado na sua base.

Os cenários lidam com a incerteza do ambiente futuro e não com a previsibilidade evidente. Para Van Der Heijden, os cenários funcionam em situações em que exista uma incerteza estrutural. Com isso quer dizer que “os eventos não acontecem ao acaso, mas estão relacionados entre si por meio de

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uma estrutura na qual as causas provocam efeitos e um evento conduz a outro” (2009:133). Essa espécie de estrutura causal permite, em sua concepção, um vínculo da história presente com o seu futuro.

A aplicação da metodologia de projeto por cenários resgata uma dimensão sistêmica. Pensar o problema de projeto através de cenários permite que se “projete planejando” ou que se “planeje projetando”. Mas antes de avançar nessa tese, é necessário revisitar a noção de projeto em outros contextos teóricos, a fim de recuperar algumas valiosas contribuições.

2.2 Processos de projeto através de uma reflexão epistemológica

Um dos principais teóricos que refletiu sobre processo de projeto é Herbert Simon. Na sua reflexão, Simon (1981) tem o objetivo de construir uma ciência do artificial que suporte os processos de projeto. Essa concepção de projeto remete a uma noção de que os objetos artificiais efetivam um propósito ou resolvem um objetivo, quando estabelecem uma relação de três termos: “o propósito ou objetivo, o caráter do artefato e o ambiente em que ele funciona” (1981:28).

Isso significa dizer que todo artefato é construído com um propósito, evidenciando o motivo pelo qual ele foi concebido. Nesse sentido, a pergunta que tem que se fazer quando se está à frente de um artefato é: ele serve para quê? A seguir da compreensão do objetivo, é preciso pensar na estruturação do próprio artefato, nos perguntando: como ele é? O que o constitui? E, por fim, interessa saber em que condições, ou, onde ele funciona.

Dessa tríade de constituição dos artefatos, Simon propõe que se pense uma relação dual: “a estrutura do próprio artefato e o ambiente em que funciona”. O objetivo não desaparece. Nessa relação dual, ele é o próprio sentido da relação.

Nessa construção, o caráter funcionalista é evidente: o objeto serve para atender determinados requisitos que são pré-configurados pelo ambiente

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externo ao próprio objeto. Assim, a relação entre artefato e ambiente responde a uma ação linear de eficiência marcada na esfera do objetivo.

Simon propõe que se pense o artefato como uma “interface”. Essa capacidade de interface do artefato se expressa como uma mediação entre a “substância ou a organização do próprio artefato” – ambiente interno – e as “condições em que o artefato funciona” – ambiente externo. Para ele (1981:32), a principal vantagem dessa classificação entre interno e externo para a compreensão de sistemas adaptativos ou artificiais é a possibilidade de prever comportamentos no ambiente externo apenas com um mínimo conhecimento do ambiente interno.

Nessa abordagem funcionalista, a não execução da tarefa expõe o limite do artefato e a complexidade do ambiente externo, expondo as dificuldades de apreensão de contextos complexos por uma via de eficiência de resultados.

Para que essa interface tenha sucesso é necessário que se compreenda esse processo como uma simulação. Simon argumenta que “o objeto artificial imita o real voltando a mesma face para o exterior, adaptando-se a classes comparáveis de tarefas externas, na prossecução dos mesmos objetivos”. Essa artificialidade, na concepção dele, “inclui similitude perceptual, mas diferença essencial, semelhança mais evidente a partir do exterior que do interior” (1981:40).

A simulação só é possível, pois esse processo de “imitação” da realidade constitui-se em um ambiente de teste e de experimentação a partir da modelagem da situação entre os ambientes. E é óbvio que qualquer modelagem é sempre uma simplificação da realidade. Sendo assim, a simulação, através do seu modelo, é um recorte que opera por semelhança parte da realidade e nunca sobre todo o ambiente complexo.

A incerteza é um traço a considerar nos processos de simulação de um futuro possível, haja visto que ações de longo prazo caminham por uma

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trajetória pouco previsível. Como o futuro é incerto, Simon (1981:77) propõe que se utilize uma medida alternativa que é a “utilização de uma retroação para corrigir as previsões, no caso de acontecimentos imprevistos ou incorretamente previstos.” Essa atitude de retroação permite que o sistema mantenha a sua estabilidade de maneira adaptativa.

A visão de Simon sobre simulação de futuro, ou projeto, fica muito restrita quando encarada como realização de um “objetivo” ou como as coisas devam ser. Há outro caminho no processo de projeto que é a própria indefinição a priori dos resultados. Muito mais do que realização de objetivos, o projeto é processo, processo de imaginação. Como imaginação, é inventivo. Mas não é isso que Simon acredita. Há um equívoco de base fundamental para a compreensão de um processo de projeto. Eliminar do processo de projeto a imprecisão, o vago e o intuitivo, é não compreender que se o projeto fosse organizado por uma lógica já sabida anteriormente, não haveria nunca possibilidade de gerar inovação em relação ao futuro.

Quando Simon aponta para uma ciência do artificial que se estrutura a partir da relação interna e externa entre ambientes, e que, essas relações estão pautadas pela capacidade interna do artifício de resolver problemas já definidos, parece esquecer de que a ação projetual não se constitui na certeza, mas nas capacidades de operação entre interno e externo, simultaneamente. Veremos isso mais a frente em Luhmann.

A ideia de “objetivo prévio” retira o pesquisador da própria ação projetual. A ação projetual só se constitui nos recorrentes movimentos de ida e vinda entre os ambientes. Na busca por um “método de otimização” ele constrói a precisão dos resultados com um controle total de todas alternativas possíveis no processo. No entanto, a concepção de um processo aleatório que permita a dúvida, as incertezas, pode sim chegar a uma precisão dos resultados. O que Simon parece não compreender é que o processo de projeto não é determinado em todas as suas esferas.

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Para sintetizar essa postura, propomos a figura da anterioridade como forma de expressar o olhar de projeto de Simon. Para ele, todo o problema é construído com uma ação prévia, por isso, anterior. Assim, o processo de projeto se organiza em uma ação prévia de organização e previsibilidade e controle dos resultados. A retroação não funciona como uma ação recursiva de reflexão sobre os procedimentos, mas como uma ação corretiva e excludente das possíveis interferências ao processo pré-definido.

Diferentemente de Simon, Schön acredita que o processo de projeto não pode ser concebido de fora, em um movimento de anterioridade, mas na própria construção do problema, ou seja, na interioridade do processo projetual. Para Schön, utilizaremos a figura da interioridade para representar seu olhar sobre o projeto.

Schön concentra seu foco no processo de projeto já posicionando como uma situação problemática, ou seja, o “problema da definição de problemas não é bem-definido” (Schön, 2000:16). Com isso, quer dizer que a primeira tarefa que devemos encarar é essa construção do problema de projeto que se apresenta ao longo dos processos de criação.

Um dos fatores que logo vem à tona é a respeito da “criatividade” ou do “talento”. Nos processos de projeto há uma dimensão de incerteza que é definido quase como uma “caixa preta” de difícil acesso às racionalidades e aos procedimentos. Se essa dimensão é carregada de uma aura de mistério e magia, quase como algo divino, então, está fora do alcance e da competência dos mortais.

Com o objetivo de sair dessa cilada, Schön define esse “talento” como um tipo de competência que é originária de situações únicas, incertas e conflituosas. Isso significa dizer que esse tipo de conhecimento não depende da nossa capacidade de descrever o que sabemos fazer, tornando consciente o que nossas ações revelam. Para ele, “pensar o que estou fazendo’, não implica ‘ao mesmo tempo, pensar o que fazer e fazê-lo” (Schön, 2000:29).

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Aqui vemos claramente uma posição por uma interioridade do processo, diferentemente de Simon com sua anterioridade. Não só a abordagem muda, mas toda uma concepção de conhecimento que suporta essa diferenciação. Pensar de fora, a partir de uma anterioridade, significa prever todo um procedimento que deve nortear o processo em uma situação de adaptabilidade em relação às resistências do ambiente externo.

Ao contrário, em Schön, a anterioridade é um pretexto na qual deve ser recorrigida a partir das reflexões oriundas do próprio andamento do processo, construindo um conhecimento-na-ação, portanto, dentro, na sua interioridade. Esse conhecer-na-ação é, para Schön, um tipo de conhecimento que é revelado pela própria execução da ação, no momento da performance. Mesmo que sejamos incapazes de verbalizá-la, ainda assim, temos destreza na execução da tarefa.

No entanto, se somos capazes de realizar algumas tarefas com precisão, sem lançarmos mão de uma elaboração reflexiva, somos incapazes de concretizar outras com a mesma exatidão e performance. Então, diferentemente do conhecimento tácito, oriundo das práticas não reflexivas, é que se instala a reflexão-na-ação.

Esse é um conceito caro a Schön. Como base de toda sua teoria, a reflexão-na-ação é um tipo de processo de conhecimento que opera sobre tentativa e erro. Assim, a partir de um conhecimento tácito, totalmente dominado, recorremos a situações em que o conhecimento rotineiro não é suficiente para a resolução dos problemas que se apresentam.

Se o conhecimento-na-ação está tacitamente resolvido, a reflexão-na-ação é sempre um problema novo a enfrentar. No entanto, não se enfrenta um problema dessa ordem munido de teorias e certezas. Diferentemente de Simon, que o problema deve estar previamente posto, para Schön, o problema deve ser construído na ação e o método é a própria reflexão. Assim, a reflexão-

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na-ação passa a ser uma atitude critica ao conhecimento tácito oriundo das práticas cotidianas.

É a partir da ideação desse conceito – reflexão-na-ação – que Schön pensa os processos de projeto. Para ele, o processo de projeto é um tipo de construção, diferentemente de Simon, que via no projeto “um processo instrumental de solucionar problemas: em sua mais pura e melhor forma, um processo de otimização” (Schön, 2000:43). Schön critica Simon por este ignorar “as funções mais importantes do design em situações de singularidade, incerteza e conflito, em que a solução instrumental de problemas – e certamente a otimização – ocupam um lugar secundário” (Schön, 2000:43).

Na concepção dele, o designer “faz uma imagem – uma representação – de algo a ser trazido à realidade tendo ou não sido concebido primeiramente em termos visuais, espaciais ou plásticos", seja essa representação um projeto ou um plano. Esses processos de construção imagética de fazer com que coisas novas venham a existir fazem parte de um processo que envolve complexidade e síntese, considerando que nem todos os limites e variáveis são conhecidas desde sempre. Essa é a natureza de qualquer processo de design, seja projetivo ou planificado.

O papel do designer é sintetizar, designar, dar signo, a partir de situações que são incertas, mal definidas, complexas e incoerentes, e se espera que essas indeterminações passem a ser determinações, sínteses. Tais sínteses se expressam nos resultados dos cenários.

Nesses processos de busca pela síntese que Simon opera, extraindo dados da realidade na busca de uma resolução do problema e focando na otimização do processo desde fora. Em Schön, esse processo é todo interno. Enquanto a síntese em Simon é a resolução de um problema, para Schön, é a própria construção interna do problema. Não há realidade externa à realidade do projeto.

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Sendo assim, ele deixa escapar essa exterioridade como fator de interferência. Essa exterioridade é fundamental nos processos de projeto. Se a critica que recaia sobre Simon era o excesso de previsão em relação ao produto esperado, em Schön a critica recai sobre o excesso de “apaixonamento” pelo processo enquanto experiência projetiva de auto-reflexão, expressa através do seu conceito de reflexão-na-ação.

Em nenhum momento Schön fala sobre o processo de coleta de informações e sobre a operação dessas informações como elementos de interferência no processo de projeto. A própria entrada de dados, não só no início como em Simon, mas a todo o momento como uma interferência externa ao processo de projeto, poderia, e talvez seja, o fator que transformaria o processo de projeto em algo mais dinâmico e menos determinista.

2.3 Processos de projeto em uma perspectiva complexa

Uma maneira de contribuir ao sentido de design como projeto e estratégia é através da teoria da complexidade em Morin. Para Morin (2005:79) estratégia é ação; e contribuindo com Van Der Heijden, define estratégia como não sendo um “programa determinado que basta aplicar sem variação no tempo”. Ao contrário, a estratégia possibilita através de uma visão inicial, “prever certo número de cenários para a ação, cenários que poderão ser modificados segundo as informações que vão chegar ao curso da ação e segundo os acasos que vão se suceder e perturbar a ação”. Vale a pena reforçar algumas questões: cenários que “poderão” ser modificados, “acasos” que vão se suceder e “perturbar” a ação.

Com Morin, aponta-se aqui para um sistema aberto e em constante transformação; diferentemente de Simon, nem sempre determinado, pois é aberto ao acaso e ao erro; e ao contrário de Schön, a ação não só está aberta ao acaso, como deve estar em constante atrito com as perturbações externas.

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Morin aponta para uma visão que privilegia a exterioridade como ação projetiva.

Também nessa perspectiva complexa está Luhmann. Na abordagem de Luhmann (2009) para uma Teoria dos Sistemas, a ação não pode ser vista independente do sistema. Qualquer ação em qualquer âmbito só pode ser descrita sob a ótica do sistema. Assim sendo, o sistema pressupõe um espaço interno e um espaço externo em que a ação é o ato de articulação. Nesse ponto, está próximo a visão de Simon.

Para a descrição dessa relação dual (externo e interno), que Luhmann nomeia de meio e sistema, muito se utilizou a metáfora do equilíbrio. Esse “conceito pressupõe uma distinção entre estabilidade e perturbação, de tal modo que com o termo equilíbrio se enfatize o aspecto da estabilidade” (Luhmann, 2009:60). Esse foi o “erro” de Simon, operar somente com a noção de equilíbrio/estabilidade. No entanto, o que vemos em Luhman é uma inversão.

Não é pelo equilíbrio, mas no seu desequilíbrio que o sistema tende à estabilidade. Assim, “a perturbação chega a sugerir, inclusive, uma perspectiva de potencialização do sistema, na medida em que este pode ficar permanentemente exposto às alterações e continuar sendo estável” (2009:61).

Seguindo nessa linha, podemos argumentar que a ação externa funciona como uma perturbação do equilíbrio estável do sistema. Portanto, qualquer modelo que represente a realidade deve prever mecanismos de entrada e saída do sistema que funcione como um retroalimentador dentro de um paradoxo de estabilidade/perturbação. A ação que ocorre no sistema deve fazer essa relação entre meio e sistema em uma perspectiva de perturbação, construindo uma noção de sistema aberto.

Luhmann afirma que o “binômio sistema/meio é uma operação baseada em uma diferença” (2009:87). Com isso, quer dizer que no momento em que se designa algo, automaticamente se exclui o não designado. O

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designado é nomeado como “forma”. Para ele, “um sistema é uma forma de dois lados, e que um desses lados (o do sistema) pode ser definido mediante um único tipo de operador” (2009:88). Para avançar nessa relação sistema/meio, Luhmann apresenta o conceito de “acoplamento estrutural”, considerando que o “acoplamento não está ajustado à totalidade do meio, mas somente a uma parte escolhida de maneira altamente seletiva” (2009:131). Assim, só parte do meio está acoplada no sistema. Portanto, o sistema não decalca totalmente o meio. Essa distinção baseada na diferença nos possibilita a construção de um recorte da realidade investigada.

Essa diferença só é possível porque há no próprio sistema um “encerramento operativo”. Segundo Luhmann, “esse sistema opera no lado interno da forma, produzindo operações somente em si mesmo, e não no outro lado da forma” (2009:102). Com isso ele não exclui o meio, mas o posiciona para o lado externo da forma. E posicionado para fora, constrói certa autonomia em relação ao meio, tornando-se compatível com a desordem no meio ou com meios fragmentados.

As operações dentro do sistema são o cerne da teoria, pois a própria operação já faz parte da “estrutura” do sistema. “O conceito de estruturas deve ser definido mediante o conceito de expectativa. As estruturas são, pois, expectativas sobre a capacidade de conexão das operações, tanto da vivência como da ação” (Luhmann, 2009:115). Para Luhmann, diferentemente do que se possa pensar sobre estrutura, “não se constrói à imagem de uma coisa composta de elementos que possam ser reunidos. A especificidade das estruturas reside, antes, no fato de que elas constituem um processo de repetição, no sentido de que uma estrutura simula situações que entende como repetição” (2009:117).

Nessa capacidade de repetição, o sistema deve ser operado por momentos de fixação e outros de generalização. Na proposta de método a seguir, o elemento operador do sistema é a imagem (ora expressa por uma

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palavra, ora por uma figura). Essa imagem é uma espécie de decalque da realidade observada e compõe, junto com outras, um campo semântico organizados por similaridade ou oposição (fixação) e semelhança (generalização).

Nesse modelo teórico o que faz sentido no sistema se diferencia do meio, construindo uma unidade da diferença. A unidade está dada no interior do sistema, compondo um sentido que tem sua semelhança no meio externo, mas ao mesmo tempo, diferenciando-se do próprio meio. As interferências externas ao sistema estão previstas pelas diferentes entradas de informações em diversos momentos do processo.

2.4 Uma proposta de método

A partir dessas considerações apontadas anteriormente, pode-se afirmar que o projeto em design é um processo complexo que deve ser focado como um sistema aberto (Morin, Luhmann) de maneira a ser revisado em qualquer momento através da construção de múltiplos cenários. Partindo disso, apresenta-se um modelo teórico (figura 1) que tenta recuperar e expressar as premissas até aqui desenvolvidas. O modelo que segue é construído como um “sistema aberto”. Portanto, constituído de linhas de dados que servem como operadores de significação, sempre por fora do sistema, efetivando-se em síntese parciais, dentro do próprio sistema. A cada síntese parcial, parte do processo resulta em resíduo, representado no modelo pelas “fugas”. Essas fugas são reaproveitadas em outros momentos como novos dados. A intenção é que a entrada em diferentes momentos possa “oxigenar” o sistema, e diferentemente de Simon, o sistema possa ser revisado a qualquer momento no próprio processo. A seguir o modelo proposto:

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FIGURA 1: modelo dinâmico e sistêmico de projeto por cenários. Fonte: autor

Considerando a figura 1, o método parte de uma situação problema,

aqui designado como briefing – problema de pesquisa. Esse briefing nada mais é do que uma situação inicial do problema. Inicial, pois o problema deverá ser revisto em vários momentos ao longo do processo em diferentes níveis de intensidade. Essa atenção retificadora é fundamental para dar flexibilidade ao método, permitindo uma construção aberta e recursiva. Do briefing, parte-se para o levantamento de dados e informações sobre a realidade em foco. Como a intenção neste artigo é demonstrar a capacidade hermenêutica do método, optou-se por não detalhar algumas etapas de projeto, como é o caso das

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técnicas de levantamento de dados da realidade (pesquisa etnográfica, pesquisa-ação, etc.).

Considera-se, então, que há uma entrada de informações. Essas informações são representadas por imagens [fotografias ou sintetizas em palavras-conceitos]. Com a intenção de registrar os mais diversos aspectos da realidade em foco, da situação-problema, utiliza-se a técnica de elencar um número maior de imagens através de um brainstorming. Nessa representação, não se elimina nenhuma informação. Todas as imagens mentais são representadas, por palavras ou fotografias, mesmo que antagônicas ou sobrepostas. Essas imagens são oriundas de entrevistas, e/ou material bibliográfico, e/ou grupo de foco, etc.

Listadas essas imagens, elas recebem a primeira interpretação (síntese) com o objetivo de ir compreendendo melhor a realidade. Nesse momento, as imagens são reorganizadas por grau de semelhança, a fim de eliminar as sobreposições de significado. A essa organização, nomeia-se “campo semântico por similaridade”. Cada campo semântico recebe um “conceito-síntese” que melhor represente aquele conjunto de imagens. As imagens que foram excluídas a partir da síntese, ficam em uma espécie de “limbo”, devendo ser reaproveitada como uma interferência externa em outro momento do sistema.

Nessa etapa, as imagens mesmo agrupadas, aparecem de forma contraditória, pois demonstram vários aspectos da realidade social estudada. É necessário avançar no processo de classificação a fim de encontrar as oportunidades de projeto. As imagens são reagrupadas agora recebendo uma classificação valorativa. A técnica utilizada é o “swot” (strength, weakness, opportunity e threat), significando forças, fraquezas, oportunidades e ameaças. São considerados os aspectos internos do objeto em observação, identificando suas forças e fraquezas, e os aspectos externos que resultam em influência direta ou indireta a esse objeto, com as ameaças e as

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oportunidades. Esse gráfico ajuda a compreender a situação presente com vistas à identificação de oportunidades.

Como a intenção é identificar possíveis caminhos de projeto, concentra-se o foco nas imagens do segmento “oportunidades”. A partir disso, essas imagens são reorganizadas em um “gráfico de polaridades”. Esse gráfico é utilizado para a futura construção de cenários. Nesse caso, os conceitos são organizados em um “campo semântico por oposição”. Do cruzamento desses conceitos, sairão os cenários de projeto.

Considerando que o método é aberto e flexível, nessa etapa, para cada par de conceitos do gráfico de polaridades, acrescentam-se novas imagens que estão diretamente associadas ao conceito do gráfico. Tais imagens podem ser recuperadas das exclusões anteriores ou serem totalmente novas. A intenção dessa nova entrada de dados é aumentar o universo imaginário, facilitando a etapa de projeto e abrindo o sistema. Para que as imagens não sejam aleatórias, são organizadas em um “campo semântico por similaridade”, significando que elas mantenham uma relação estreita entre si e garantam um encerramento operativo (Luhmann).

Nesse processo, a cada síntese, existe sempre resíduo e fuga. Essas fugas devem reaparecer ao longo do processo como informação, alimentando assim o sistema, em um processo recursivo. Essa recursividade está próxima a Schön. No entanto, é um recursivo que é atritado por fora e não só por dentro do sistema.

Na próxima etapa do método, encaminha-se para a “construção dos cenários”. Esses cenários são projeções que lidam com a incerteza do ambiente futuro e não com a previsibilidade evidente. Por mais estranho que pareça, todos os cenários são considerados, mantendo a diversidade das ocorrências futuras. O objetivo com isso é mudar o modelo mental que organiza a realidade presente. Os cenários funcionam em situações em que exista uma incerteza estrutural. A cada cenário proposto é definido um nome e

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é relatado com uma história que é contada de forma jornalística como se fosse um relato da situação presente.

A partir de cada cenário, é desenvolvido um conceito de projeto. Devido à flexibilidade do método, sugere-se que esses conceitos de projeto sejam revisados junto ao demandante do projeto (como um novo briefing), antes de se passar para a fase de detalhamento do projeto propriamente dito. Esse processo recursivo permite um refinamento dos resultados. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O método aqui desenvolvido compreende a realidade como algo inapreensível na sua totalidade, afirmando sempre que a apreensão do objeto de estudo é sempre aproximada e nunca completa. Não ser total, não significa superficialidade. Ao contrário, esse método permite um processo de retificação, mantendo sempre o caráter aberto e construindo a estabilidade com as interferências externas, através do desequilíbrio do sistema. Um dos cuidados no desenvolvimento desse método foi o fato de prever entrada de dados em diferentes momentos e com diferentes naturezas, permitindo que as diversas fugas possam ser recuperadas como novos dados e informações externas ao sistema. Nessas entradas, abre-se o método para dois tipos de informações: dados contextuais, que servem para a melhor compreensão da realidade em foco; e dados não contextuais, que servem de estímulos de projeto, ao longo do processo, forçando a desestabilização do sistema. Para facilitar a operação dos dados e para não recair em um excesso de informações, correndo um risco de uma possível inoperância dos dados, utiliza-se os campos semânticos: ora para fazer uma síntese e estabilizar, quando o processo está muito aberto; ora para abrir e ampliar o sentido, quando o processo está próximo a um fechamento.

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Agradecimentos O presente estudo foi desenvolvido com o apoio da Universidade do

Vale do Rio dos Sinos - Unisinos. Processo PP0000003007. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FLUSSER, V. Filosofía del diseño. Madrid: Editorial Sintesis, 1999. LUHMANN, N. Introdução à teoria dos sistemas. Petrópolis: Editora Vozes,

2010. MORIN, E. Introdução ao pensamento complexo. Porto Alegre: Editora Sulina,

2005. SIMON, H. As Ciências do Artificial. Lisboa: Editora Armênio Amado, 1981. SCHÖN, D. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a

aprendizagem. Porto Alegre: Artmed Editora, 2000. VAN DER HEIJDEN, K. Planejamento por cenários: a arte da conversação

estratégica. Porto Alegre: Bookman, 2009.

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Questões de Design Ergonômico de Equipamentos de Proteção Individual (Epi)

para Trabalhadores Rurais

João Eduardo Guarnetti dos Santos1 Frederico Reinaldo Corrêa de Queiroz2

1. Introdução

Sabe-se que as atividades agrárias são fatores de grande participação no PIB (produto interno bruto) brasileiro. Existem setores da agricultura intensamente mecanizados como, por exemplo, os produtores de grãos destinados à exportação. Há ainda setores que estão em plena fase de transição, substituindo várias etapas que tradicionalmente eram executadas pelo homem por máquinas, como vem ocorrendo na produção de cana-de-açúcar. Porém ainda restam outros setores onde a mecanização não existe ou é muito discreta, como no caso da agricultura familiar.

De modo diferente do que ocorre nos centros urbanos questões de segurança do trabalhador no campo são fiscalizadas de forma parcial, visto que o foco dos órgãos responsáveis são as grandes empresas agrícolas. Estas empregam grandes quantidades de produtos químicos em diversas etapas do processo. E é fato de que quando se pensa em proteção do trabalhador rural logo vem à mente o manuseio de produtos químicos tóxicos e homens vestindo macacões e máscaras pulverizando algo. Sem dúvida alguma os fatores de risco químico são de longe os mais representativos nos acidentes fatais ou de invalidez permanente de trabalho no meio rural, mas não são apenas estes.

1 Professor Livre Docente – FEB/UNESP – Bauru e PPG Design – FAAC/UNESP-Bauru 2 Engenheiro de materiais/química e Engenheiro de segurança do trabalho, mestrando em Design, PPG Design – FAAC/UNESP-Bauru

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Há outros fatores de risco tais como ruídos de máquinas, manuseio de ferramentas cortantes, exposição à radiação solar intensa, acidentes com animais peçonhentos. Que não são muito comuns serem divulgados.

O pequeno produtor familiar é a grande vítima deste quadro, restando-lhe apenas tomar consciência dos riscos e buscar apoio nas cooperativas regionais através do apoio profissional disponível. Estes profissionais geralmente são preparados apenas para orientações muito genéricas, e apenas sobre fatores de risco de morte ou invalidez permanente, como são os casos dos manuseios de produtos químicos ou cortantes.

A segurança do trabalho é um assunto de maior importância, que não interessa apenas aos trabalhadores mas também as empresas e a sociedade em geral, pois um trabalhador acidentado, além dos sofrimentos pessoais, provoca despesas ao sistema de saúde e passa a receber seus direitos previdenciários, que são pagos por todos os trabalhadores e empresas (IIDA, 2005).

O objetivo deste artigo é apresentar uma revisão sobre os aspectos ergonômicos envolvidos no projeto de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para trabalhadores rurais e demonstrar as demandas para pesquisas e estudos nesta importante área da economia brasileira. 2. AS ORIGENS DOS EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL (EPI)

Há muito o Homem se utiliza de artifícios e objetos para sobreviver. De certo modo isto também nos permitiu chegar onde nos encontramos. Pois o atual Homo Sapiens é um animal muito frágil fisicamente se comparado com outros mamíferos.

Dentre os objetos de que nossos ancestrais criaram os mais importantes foram as vestimentas. Estas protegiam o indivíduo do vento frio, da neve, da água da chuva, do sol escaldante. Pois o indivíduo humano é

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desprovido de pele grossa (couro) ou pelagem densa, que os outros mamíferos possuem e os protegem.

Então é correto afirmar que os primeiros equipamentos de proteção individual foram as vestimentas primitivas. Que protegiam o Homem dos humores das intempéries. Desta forma fazendo seu corpo poupar energia, permitindo que seu cérebro tivesse mais recursos. E desta maneira evoluindo física e mentalmente, num ciclo virtuoso, repassando este conhecimento tecnológico aos seus descendentes. 2.1 Protegendo as mãos

O Homo Sapiens se distingue dos demais primatas por, entre outros atributos, o andar ereto permanente e a habilidade com as mãos. Esta habilidade manual em grande parte é devido à mobilidade do polegar, que permite ser opositor ao indicador, formando uma pinça.

Então é plausível que um dos primeiros equipamentos de proteção individual, específico para o trabalho, sejam exatamente as luvas. Pois estas feitas em fibras ou couro possibilitavam a proteção da pele, unhas e tendões das mãos.

Infelizmente artefatos em materiais naturais são de difícil preservação, porém há casos onde encontram-se estes itens em alguns sítios arqueológicos. No museu "El Museo Canario", na ilha de Gran Canária, Espanha há uma luva em couro dos habitantes originais da era pré-hispânica.

Esta luva, feita em couro de cabra que é excepcionalmente maleável e macio, pode ser vista ao lado de uma réplica mostrando como é seu projeto original. Um item a ser destacado é a proteção extra na base do polegar (retalho de forma quadrada), uma região muito sujeita aos desgastes, demonstrando a habilidade na extensão da vida útil do equipamento.

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2.2 Protegendo os pés Outro item muito importante da vestimenta primitiva foram os

calçados. Protegendo seus pés frágeis (sem cascos como de muitos diversos mamíferos) foi possível se deslocar sobre os terrenos escaldantes atrás de caça, ou sobre a neve durante a glaciação.

Foi a pé que o Homo Sapiens se espalhou pelos cinco continentes, e muito se deve ao fato dele ter inventado o calçado.

Um fato bem elucidativo a respeito de como nossos ancestrais se protegiam ocorreu em 1991. Neste ano na geleira dos Alpes Schnalstal Ötztal, perto Hauslabjoch na fronteira entre a Áustria e a Itália foi encontrada uma múmia preservada sob uma espessa camada de gelo. Esta múmia é chamada de “Ötzi”, em homegam ao local onde foi encontrada, em Ötztal (ou “vale de Ötz’ na língua local). Ela é a mais antiga múmia natural da Europa: um indivíduo do gênero masculino que faleceu no ano de 5.300 A.C. aproximadamente.

Esta múmia oferece uma visão sem precedentes sobre as tecnologias e hábitos do Homem do período conhecido com Idade do Cobre. Seu corpo e seus pertences, entre eles sua vestimenta completa, ferramentas e armas brancas, estavam intactos; destaca-se o calçado

2.3 Protegendo a cabeça

Desde muito tempo a cabeça humana é considerada a parte mais importante do corpo, pois é nela que se encontram o cérebro e a maioria dos órgãos sensoriais (olhos, ouvidos, nariz e língua), ficando de fora apenas o senso do tato que está por toda a pele.

Além de ser a personificação do indivíduo em si, através da imagem facial, onde os indivíduos reconhecem-se e se comunicam pelas expressões faciais. Um chapéu ou algo semelhante além de proteger contra o calor do sol

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ou da água da chuva, também é um adereço que pode valorizar as feições. Ou ainda mostrar a qual estrato do grupo o indivíduo pertence.

2.4 Protegendo os olhos

Um dos EPI mais interessante diz respeito em como o Homem protege os olhos.

Os olhos talvez sejam os órgãos sensoriais mais importantes do ser humano. E há muito o ele criou meios para protegê-los do excesso de radiação solar ou de partículas de areia ou neve projetadas pelos ventos. Não foi por acaso que os inuit (esquimós, no extremo norte da América) inventaram óculos de sol há milhares de anos.

Dias muito brilhantes sobre a neve (que reflete a luz como um espelho) podem ser fatais para seus olhos. E especialmente no verão, quando o sol nunca se põe por completo, esta exposição contínua ao excesso de radiação (luz visível) pode lesionar ou danificar permanentemente a córnea.

Os primeiros designs para “óculos” de sol consistem um uma venda recortada em couro de foca com um entalhe estreito na altura do meio das pálpebras para passagem do mínimo de luz possível.

3. A AURORA DA AGRICULTURA, A DIVISÃO DO TRABALHO E OS EPIS.

Uma vez que alguns grupos de humanos deixaram de ser nômades e começaram a se fixar em áreas onde a coleta e a caça eram abundantes.

Locais com terras férteis, onde o desenvolvimento da vegetação é permanente, proporcionam uma maior concentração de insetos e pequenos animais, pelo simples motivo da abundância de vegetação. Estes locais, por conseqüência, propiciam abundância de animais maiores para caça.

É sabido que estas regiões férteis localizam-se nas várzeas dos grandes rios ou onde haja precipitação regular. E são exatamente nestes locais

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que se originou e desenvolveu a agricultura. Regiões como o delta do rio Nilo ou na América central proporcionaram o surgimento das civilizações Egípcia e Maia respectivamente.

Isto deu origem ao trabalho especializado entre os indivíduos, ficando os mais pesados e insalubres a cargo dos escravos.

Dentre as funções técnicas da época destacavam-se as relacionadas com a preparação da terra, plantio e colheita, pois demandavam conhecimentos específicos sobre ciclo de vida, clima, manejo, etc. Valendo-se destes conhecimentos, em conjunto com ferramentas equipamentos de proteção específicos, o Homem progrediu até chegar à moderna agricultura.

Apesar disso, as aplicações da ergonomia na agricultura são relativamente recentes, se comparadas com aquelas na indústria. Os trabalhadores na agricultura são do tipo não-estruturado porque, ao contrário do que ocorre na indústria, os trabalhadores geralmente não possuem um posto fixo de trabalho e a suas tarefas são muito variáveis. Esses trabalhos em geral são árduos, executados em postura inconvenientes, exercendo freqüentemente grandes forças musculares, em ambientes desfavoráveis, sob exposição direta ao sol e intempéries. 4. FATORES DE SEGURANÇA E EPIS

É sabido por qualquer profissional de segurança do trabalho, tanto de nível superior quanto técnico, que o sucesso na prevenção dos acidentes de trabalho reside basicamente na equação “segurança = prevenção + comportamento adequado + proteção”.

Desta maneira apenas a utilização conjunta dos 3 fatores da “equação a segurança” irão prevenir da melhor maneira possível o trabalhador em caso de ocorrer um acidente.

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4.1 A normalização dos EPIs No passado a situação dos acidentes de trabalho nos centros

urbanos, através da indústria, se tornaram tão alarmantes que os governos destes países resolveram intervir. Criando regulamentos e órgãos fiscalizadores para minimizar os acidentes e proteger seus cidadãos. Pois os casos não fatais de acidentes começaram a causar prejuízos sociais.

A moderna regulação das questões de segurança do trabalho, inclusive no Brasil, engloba as atividades em todos os segmentos, tanto urbanas quanto rurais. São tomados em coesão tripartite onde comitês compostos por representações da indústria, dos trabalhadores e do governo definem e revisam as regras. Além de seguirem e fomentarem decisões de organismos supranacionais tais como a OIT (organização internacional do trabalho). 4.2 Normalização dos EPIs no Brasil.

No Brasil o órgão responsável pela normalização é a Associação Brasileira de Normas técnicas (ABNT), e órgão executivo e fiscalizador responsável é o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Não há menção nas normas sobre aspectos de design ergonômico, usabilidade ou conforto sobre EPIs. As normas apenas regulam aspectos de desempenho dos equipamentos, tais como resistência a choques mecânicos, resistência à permeabilidade, abrasão, etc.

A Norma Regulamentadora- NR-6 (Portaria GM n° 3.214, 08/06/1978; com última atualização pela Portaria SIT n.º 125, de 12/11/2009) trata da obrigatoriedade do uso de equipamentos de proteção. Seu uso deve adequado ao risco a que o trabalhador está exposto e à atividade exercida, considerando-se a eficiência necessária para o controle da exposição ao risco e o conforto oferecido.

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A Norma Regulamentadora - NR 21 (Portaria GM n.º 3.214, de 08/07/1978, com atualização pela Portaria GM n.º 2.037, de 15/12/1999), que trata do trabalho realizado a céu aberto, enfatiza a necessidade de abrigos, ainda que rústicos, capazes de proteger os trabalhadores contra intempéries. Assim, há necessidade de proteção contra insolação, calor, frio, umidade e ventos inconvenientes.

A Norma Regulamentadora – NR 31 (Portaria n° 86, 03/03/2005, com atualização pela Portaria GM n.º 576, de/11/2007) que engloba o trabalho na agricultura, pecuária, silvicultura, exploração florestal e aqüicultura, é relacionada com a saúde e segurança do trabalhador do campo. Esta Norma Regulamentadora tem por objetivo estabelecer os preceitos a serem observados na organização e no ambiente de trabalho, de forma a tornar compatível o planejamento e o desenvolvimento das atividades com a segurança e saúde e meio ambiente do trabalho.

O item 31.10.1 fala que o empregador rural ou equiparado deve adotar princípios ergonômicos que visem à adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar melhorias nas condições de conforto e segurança no trabalho.

Todas as Normas Regulamentadoras estão disponíveis no site do Ministério do Trabalho e Emprego: http://www.mte.gov.br/legislacao/normas_regulamentaDORAS/Default.asp

Apesar da utilização de EPIs poder resultar num problema para a saúde dos trabalhadores, não foi identificado laboratório independente no Brasil que esteja analisando a adequação das tecnologias de EPIs. Os laboratórios de EPIs existentes no Brasil credenciados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) se limitam a realizar testes padrões que visam principalmente aprovar (obtenção do certificado de aprovação) a comercialização e/ou produção de certos EPIs no Brasil.

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4.3 Normalização dos EPIs no mundo. Nos Estados Unidos da América, o organismo responsável pela

regulamentação e padronização dos Personal Protective Equipments - PPE´s (equipamentos protetivos pessoais) é o Occupational Safety and Helth Administration - OSHA (administração de saúde e segurança ocupacional), subordinado ao United States Departamento of Labor (departamento de trabalho dos Estados Unidos). (OSHA, 2010)

No Reino Unido (UK) o Health and Safety Executive (executivo de saúde e segurança) é o organismo responsável pela regulametação dos PPE´s. O embrião do organismo foi concebido em 1833 por 4 inspetores federais que na ocasião estavam tentando resolver questões de acidentes de trabalho com crianças que trabalhavam nas tecelagens britânicas. Em 1956 um ato regulatório introduziu garantias abrangentes de saúde, proteção e garantias dos trabalhadores agrícolas, inclusive para que crianças pudessem entrar em contato com máquinas agrícolas, equipamentos ou veículos rurais. (HSE, 2010)

Na Alemanha o Institut für Arbeitsschutz der Deutsche Gesetzliche Unfallversicherung –IFA (Instituto para a Segurança do Trabalho e Seguro de Acidentes) é o órgão responsável pela regulamentação dos Akzeptanz von Persönlichen Schutzausrüstungen – APS (acreditação de equipamentos de proteção individuais). Este órgão tem funções semelhantes à ABNT brasileira, apenas regulamentando os EPIs, e não aplicando ou fiscalizando seu uso. (IFA, 2010) 5. FATORES DE DESIGN ERGONÔMICO DOS EPIS

Um estudo interessante foi conduzido na Alemanha e apresentado em outubro de 1997 no simpósio da Berufsgenossenschaftliches Institut für Arbeitssicherheit – BIA (Instituto da comunidade profissional para a Segurança do Trabalho), que congrega os profissionais de segurança do trabalho daquele

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país. Neste simpósio foram apresentados diversos trabalhos sobre os “déficits persistentes na integração de princípios ergonômicos no projeto de EPIs”. Estes déficits de design ergonômico foram apontados como grande causa do não-uso de EPIs, inclusive com pareceres das autoridades de fiscalização européias e algumas associações dos próprios fabricantes de EPIs.

Durante o evento ficou claro o insuficiente conhecimento da ergonomia pelos fabricantes de EPIs. Foi proposta a melhora da cooperação entre os organismos de normalização da comunidade européia (CEN) e os fabricantes para assuntos ligados a EPIs. No simpósio foi apresentado o resultado de um questionário elaborado pela Associação Alemã de Engenheiros de Segurança. Baseado no retorno de 150 questionários foram observados dados muito elucidantes, permitindo aos engenheiros de segurança de trabalho uma visão diferenciada da situação a partir da perspectiva dos usuários.

As conclusões desta pesquisa resultaram no compromisso das associações européias para a padronização deste tipo de pesquisa, bem como as associações de certificação de EPIs na comunidade européia confirmaram a abordagem dos aspectos de design ergonômico nas avaliações dos EPIs a partir daquela data. (BIA REPORT 2/99, pg. 08)

Segundo Abrahão a ergonomia visa adaptar o trabalho ao homem, diferentemente de certas correntes que tentam encontrar o trabalhador ideal para uma certa tarefa, através da seleção.

Abrahão conclui que a Ergonomia é uma aliada poderosa no projeto de sistemas de trabalho agrícola balanceados, onde os trabalhadores têm suas características físicas, psíquicas e cognitivas contempladas, fazendo parte de um complexo de trabalho otimizado e produtivo.

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5.1 Efeito dos EPIs Sabe-se que 70% dos acidentes industriais são decorrentes do

stress: falta de atenção, cansaço, desmotivação. Segundo um estudo, 40% das pessoas pedem demissão ou são demitidas porque estão estressadas com o trabalho.

Um dos fatores stressantes relatados pelos trabalhadores é o uso do próprio EPI (“o epi atrapalha”, “incomoda”, “dá dor de cabeça”, “incham os pés”, “dá cãimbra”, “eu não preciso de epi, já estou acostumado sem ele”, são frases ouvidas de trabalhadores). Assim, é preciso reduzir não só o stress produzido pelo trabalho mas pelo próprio uso do EPI. (GUEIROS, Samuel ) 5.2 Stress no trabalho

Um Estudo levantou que, no aspecto psicológico, a primeira reclamação dos trabalhadores sobre os fatores que interferem no seu trabalho, é o stress, seguido de alcoolismo, uso de drogas, relacionamento conjugal e familiar, depressão e baixa auto-estima. (GUEIROS, Samuel) 5.3 Ergodesign dos EPIs

Com a moderna tecnologia ergonômica (ergodesign), o posto de trabalho não envolve mais apenas o homem e seu local de trabalho, mas inclui tudo aquilo que o trabalhador necessita para realizar suas tarefas: máquinas, ferramentas, equipamentos, mobiliário, software, sistemas de proteção de segurança, EPIS e o próprio sistema de produção. Assim, tornou-se inevitável os vínculos entre EPI e ERGONOMIA. 5.4 O ergodesign ajudando no trabalho rural

Os vínculos entre a proteção e a tecnologia ergonômica se estreitam cada vez mais, visto que o trabalhador é muito mais protegido quando as

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condições de trabalho sejam as mais favoráveis possíveis, tanto em termos de estrutura, funcionamento, mas também de conforto e motivação.

Nos postos de trabalho tradicionais considera-se apenas os aspectos antropométricos (dimensões adequadas aos usuários de uma determinada faixa de estatura) e os aspectos biomecânicos (posturas, movimentos corporais, esforços físicos, alcances visuais, etc.). (GUEIROS, Samuel)

A atuação da ergonomia, na industria moderna, não se restringe apenas a uma contribuição esporádica durante o projeto de produtos e sistemas. Esta deve iniciar-se desde a definição das especificações desses produtos e sistemas e chegar até a efetiva implementação e funcionamento dos mesmos. Além disso, realiza estudos para melhorar as condições de trabalho já existentes (IIDA, 2005). 6. O QUEPIA – PROGRAMA IAC DE QUALIDADE EM EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL NA AGRICULTURA

A falta de normas nacionais e internacionais que auxiliem na seleção de alguns EPI, bem como nos materiais utilizados na sua construção, como é o caso por exemplo das vestimentas de proteção para riscos químicos utilizadas nas aplicações de agrotóxicos, tem feito com que haja uma variação bastante grande na qualidade destes EPI chegando ao mercado.

Preocupado com tal situação é que o Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico (CEA/IAC), em parceria com a Fundação de Apoio à Pesquisa Agrícola (FUNDAG) e com fabricantes de vestimentas de proteção individual estabeleceram o Programa IAC de Qualidade em Equipamentos de Proteção Individual na Agricultura.(QUEPIA, 2009)

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7. CONCLUSÃO

Não foram encontrados estudos específicos sobre ergonomia no design dos EPIs no Brasil, mais especificamente para nos de uso para o trabalho agrário. Nota-se que a questão é preocupante, pois é comum entre os profissionais de segurança do trabalho os flagrantes do não uso de EPI pelos trabalhadores por questões ligadas ao desconforto no uso. Questão esta que passa pela inclusão dos aspectos ergonômicos no escopo do desenvolvimento, não apenas os fatores de desempenho específicos objetivando apenas os requisitos para sua homologação e obtenção do CA (certificado de análise) junto ao órgão competente.

O programa QUEPIA esta voltada mais para o estudo dos EPIs utilizados na aplicação de agrotóxicos, mas no geral a maioria dos EPIs utilizados por trabalhadores rurais são trazidos do setor industrial para o campo, sendo muitas vezes inadequados ou com menor eficiência devido a diferença de ambiente. Mesmo vendo esta diferença de ambientes, podemos notar que normas técnicas são as mesmas.

Visto que este fator não é exclusivamente nacional, inclusive com outros países há mais de uma década adotando as questões de ergodesign na concepção dos seus EPIs, nota-se que isto se deu de forma cooperativa. Ficando patente que como qualquer outro produto o envolvimento tanto de usuário quanto fabricante na sua concepção é fundamental. No caso dos EPIs uma terceira parte, a dos profissionais de segurança, também tem um peso muito importante.

Fica aberta a falta de pesquisas específicas, com uma amostra consistente, sobre a usabilidade dos EPIs pelos trabalhadores agrícolas como forma de iniciar uma investigação, que talvez seja útil para a sensibilização tanto dos fabricantes quanto dos órgãos reguladores e fiscalizadores.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABRAHÃO, Roberto Funes. A contribuição da Ergonomia para o trabalho agrícola. <www.feagri.unicamp.br/tomates/pdfs/wrktom033.pdf > Aceso em 05 de Dezembro de 2010.

BIA - Berufsgenossenschaftliches Institut für Arbeitssicherheit. Erhöhte

Akzeptanz von Persönlichen Schutzausrüstungen (PSA) durch ergonomische Gestaltung. BIA Symposium, report 2/99. Hauptverband der Gewerblichen Berufsgenossenschaften – HVBG, Deutschland, 1997

GUEIROS, Samuel. EPI, ERGONOMIA E INSALUBRIDADE: OS VINCULOS ENTRE AS NRS

6, 15 E 17 <http://www.nrfacil.com.br/blog/?p=1295> acesso em 01/10/2010

HSE - HEALTH AND SAFETY EXECUTIVE. The history of HSE. http://www.hse.gov.uk/aboutus/timeline/index.htm (Acessado em 08/Nov/2010) IFA - Institut für Arbeitsschutz der Deutsche Gesetzliche Unfallversicherung.

Geprüfte Produkte und Firmen mit QM-Zertifikat des IFA. http://www.dguv.de/ifa/de/pruef/produkte/index.jsp (Acessado em 08/Nov/2010)

IIDA, Itiro. Ergonomia – projeto e produção. 2A. edição. São Paulo Editora Edgar

Blücher Ltda, 2005. OSHA – Occupational Safety and Health Administration. PPE general

requirements. http://www.osha.gov/pls/oshaweb/owadisp.show_document?p_table=STANDARDS&p_id=9777 (Acessado em 08/Nov/2010)

QUEPIA. Qualidade em equipamentos de proteção individual na agricultura.

<http://quepia.org.br/site/duvidas.php> acesso em 01/10/10

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Realidade Aumentada com Retroalimentação Cognitiva: Ambientes Monitorados para Desenvolvimento de

Produtos

João Fernando Marar 1 Antonio Carlos Sementille2

Rodrigo Holdschip 3 Sergio Luiz Busato 4

Hailton Ferraz Junior 5

1 INTRODUÇÃO A produtividade em Design de Produto, como em diversas áreas, depende de como, efetivamente, as idéias de projeto podem ser representadas e compartilhadas entre os membros de uma equipe de desenvolvimento. Uma forma de melhorar esta produtividade é através da aplicação das tecnologias de Realidade Aumentada (RA) aliadas a sistemas cognitivos para inferência de emoções por meio de análise de expressões

1 Doutor em Ciência da Computação, Pós Graduação em Design -FAAC- Unesp, Departamento de Computação - FC-Universidade Estadual Paulista, coordenador do Laboratório Sistemas Adaptativos e Computação Inteligente 2 Doutor em Ciência da Computação, Pós Graduação em TV Digital -FAAC- Unesp, Departamento de Computação - FC-Universidade Estadual Paulista, Pesquisador coordenador do Laboratório Sistemas Adaptativos e Computação Inteligente 3 Doutorando em Design, Pós Graduação em Design -FAAC- Unesp, Pesquisador do Laboratório Sistemas Adaptativos e Computação Inteligente 4 Doutorando em Design, Pós Graduação em Design -FAAC- Unesp, Pesquisador do Laboratório Sistemas Adaptativos e Computação Inteligent 5 Mestrando em Ciência da Computação, Pós Graduação em Ciência da Computação -FC- Unesp, Departamento de Computação - Universidade Estadual Paulista, Pesquisador do Laboratório Sistemas Adaptativos e Computação Inteligente

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faciais. Com o uso destas tecnologias, as quais podem inserir informação digital no ambiente físico de trabalho, tem-se uma promissora solução para o problema da colaboração enfrentada pelos projetistas (Figura 1).

Figura 1 – Sistema Incorporado.

Quando objetos virtuais são combinados a elementos reais, gerando uma cena mista, tem-se um sistema de Realidade Misturada (RM). Este termo foi introduzido no mundo da computação por Milgram et al. (1994), representando uma variação da Realidade Virtual (RV). Pesquisas nesta área têm como objetivo básico aumentar a percepção do usuário e sua interação com o mundo real, pelo suplemento da realidade com objetos virtuais tridimensionais que pareçam coexistir no mesmo espaço (AZUMA, 2004). A utopia é a criação de um ambiente em que o usuário não consiga distinguir o mundo real do virtualmente aumentado. Na proposta de Milgram et al. (1994), que se baseia em um “Continuum de Virtualidade”, imagina-se um ambiente real, em que objetos virtuais são inseridos, para que se obtenha uma cena combinada, mas com predominância da realidade. Esse é o ponto em que se

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encontra a Realidade Aumentada (RA). Esta combinação também pode ser feita de maneira similar, inserindo-se objetos reais em ambientes sintéticos, o que, se houver predominância do virtual sobre o real, é definido como Virtualidade Aumentada (VA). A Realidade Misturada representa todo espaço de transição entre as realidades. A potencial utilização da RA, especificamente no setor do Design de Produto, pode ser examinada sob as lentes analíticas fornecidas pela literatura em tecnologias genéricas e padrões de inovações setoriais (WHYTE, 2003). A RA está sendo pesquisada pelas indústrias militares, entretenimento, médica e educação, entre outras, e pode ser considerada como uma tecnologia genérica, pois pode ser usada amplamente fora de seu setor original de produção. Segundo Rosenberg (1963), tecnologias genéricas podem ser instanciadas em aplicações similares, porém não idênticas, nos sistemas de produção complexos e idiossincráticos dos diferentes setores e indústrias. Em decorrência da atual similaridade dos produtos em relação as suas características técnicas, de qualidade e de preço, com mais freqüência as qualidades emocionais dos produtos têm se tornado um diferencial vantajoso (DESMET, 2005). O desejo em dimensionar e integrar as emoções no processo de design tem levado ao desenvolvimento de uma nova vertente de pesquisa dos fatores humanos. Pode-se definir esta nova vertente como sendo o estudo do relacionamento entre as características físicas e racionais dos produtos com suas características subjetivas e cognitivas ou influências emocionais sobre aqueles que interagem com eles. O ganho em Design decorre da utilização dos conhecimentos adquiridos necessários para se projetar produtos mais satisfatórios (LEEDS KEYWORTH INSTITUTE, 2009). A RA pode inovar na forma que os designers projetam, visto que inovações são alteradas, refinadas e reinventadas por meio da difusão do processo (VON HIPPEL, 1988). É, portanto, importante que os usuários das tecnologias de RA possam ser participativos neste processo de inovação. O

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contexto organizacional das inovações em Design difere significativamente de muitas outras formas da inovação em Manufatura (SLAUGHTER, 1998). Devido a sua natureza centrada no projeto, o entendimento dos processos de inovação em design é um fator crítico. As empresas de Design podem se envolver em uma ampla gama de projetos. Por exemplo, muitas vezes são desenvolvidos pequenos projetos, os quais podem ser extensivamente reutilizados. Nestas empresas, cada projeto individual pode requerer somente a atenção intermitente de uma equipe, e esta, portanto, pode trabalhar simultaneamente em diversos projetos, em diferentes estágios de desenvolvimento (WHYTE, 2003). Em contrapartida, outras empresas se concentram em projetos muito grandes, que por sua vez, podem envolver a colaboração de diversos especialistas de organizações diferentes durante um tempo de vida maior (GANN & SALTER, 2000). Tais projetos podem se beneficiar do reuso dos esforços de modelagem, quer pelo reuso da infra-estrutura de RA nas diferentes atividades de design sobre o inteiro ciclo de vida do projeto, quer pelo reuso em projetos similares. A RA tem, atualmente, sido amadurecida do campo da pesquisa pura para certas aplicações industriais práticas, mas ainda não foi implementada como ferramenta real na área de Design de Produto. Considerando o contexto exposto, é proposto neste projeto, o desenvolvimento de um Ambiente Colaborativo de Suporte ao Projeto de Produto e Seleção de Materiais, de arquitetura modular, o qual, com base na utilização das técnicas de RV e RA, deverá permitir a criação dinâmica de cenários aumentados que suportem a colaboração face-a-face entre projetistas. Por meio deste sistema, uma equipe de projetistas poderá se comunicar, compartilhar e interagir com modelos tridimensionais (3D) gerados por computador.

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2 AMBIENTES COLABORATIVOS DE REALIDADE AUMENTADA Os sistemas de RA vêm possibilitando experiências como a sensação de presença, envolvendo os usuários a interagir com objetos virtuais e permitindo também a colaboração nesses ambientes. Assim, esses ambientes podem oferecer aos participantes maiores informações sensitivas, onde a principal característica das aplicações de RA é criar um ambiente onde as informações do mundo virtual são utilizadas para incrementar o cenário real (AFFONSO & SEMENTILLE, 2007). A seguir, são sucintamente descritos alguns projetos que envolvem a colaboração através de ambientes de RA.

Utilizando um livro real para transpor usuários entre a realidade e a virtualidade, o projeto MagicBook (BILLINGHURST et al., 2001), utiliza a RA para visualização de objetos virtuais combinados com o mundo real e com tecnologia para suportar a colaboração, permitindo que vários usuários compartilhem o mesmo ambiente virtual. Nesse projeto os participantes podem virar as páginas do livro, olhar as figuras e ler os textos sem qualquer tecnologia adicional, mas quando utilizam dispositivos de RA, podem ver os objetos virtuais de vários pontos de vistas.

Com o objetivo de ensinar matemática e geometria, o projeto Construct3D (KAUFMANN & SCHMALSTIEG, 2003) utiliza o sistema de RA colaborativa móvel Studierstube (SCHMALSTIEG et al., 1996) para possibilitar a colaboração e a interação entre professores e estudantes. Criou-se uma solução híbrida de hardware para completar diversas interações entre professores e estudantes no cenário virtual, como a sala de aula aumentada. Neste sistema foi utilizado um notebook, um HMD com câmera e uma luva. Os usuários podem mostrar interesse nos objetos virtuais, desde que estejam usando equipamentos ligados em rede local sem fio para possibilitar a comunicação. Os estudantes movem e giram um marcador e o objeto é exibido na tela de projeção. O Construct3D possui também a solução de aula

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híbrida distribuída; neste tipo de configuração os estudantes são equipados com computadores pessoais que trabalham com RV, assistindo o processo de construção da cena virtual na tela do seu micro. Esse sistema foi construído usando uma câmera para rastrear as posições e um marcador. Os estudantes podem escolher pontos de vista individuais e manipular cópias dos mesmos objetos construídos, o professor também pode escolher e mostrar seu ponto de vista. Esse projeto apresenta o diferencial de permitir a coordenação de atividades para realização do trabalho, onde possui um módulo que permite a um participante, no caso o professor, ficar responsável por garantir que as tarefas dos demais participantes sejam realizadas na ordem e no tempo correto.

Existem também, pesquisas com RA para colaboração local, como o Shared Space (BILLINGHURST et al., 2000), que por meio de um ambiente físico com vários marcadores, e com a utilização de técnicas de visão computacional, permite a visualização das imagens virtuais alinhadas com os objetos físicos. Nesse projeto os usuários podem ver os demais suportando uma comunicação face a face, permitindo que vários usuários no mesmo local trabalhem simultaneamente em ambos os mundos, real e virtual. Desde que todos os usuários compartilhem o mesmo banco de dados de objetos virtuais, eles vêem os mesmos objetos anexados aos marcadores de todos os seus pontos de vista. O usuário pode mover e mostrar os cartões para outros participantes, bem como passar ou pedir os objetos da mesma maneira que acontece com objetos reais.

Por meio de técnicas de navegação e sistema de anotação, o projeto Outdoor Collaborative Augmented Reality (OCAR) (REITMAYR & SCHMALSTIEG, 2001), utiliza a RA para gerar anotações em determinados lugares físicos, possibilitando compartilhar informações com outros usuários. Esse sistema inclui a computação móvel, para permitir que os usuários alcancem e manipulem as informações independentes do momento e de sua posição.

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Desta forma, o usuário pode navegar em uma cidade, ao invés de utilizar mapas para conhecer o lugar, possibilitando utilizar o sistema para conhecer seu destino, combinando momentaneamente cenas do mundo real e virtual. 3 HARDWARE E SOFTWARE PARA RA Recentes avanços na tecnologia básica têm possibilitado a construção de sistemas de RA cada vez mais sofisticados. Exemplos desta tecnologia incluem displays, rastreamento, registro e calibração.

Displays - podem ser classificados nas seguintes categorias:

Head-worn displays (HWD) – são montados na cabeça do usuário, fornecendo a imagem à frente de seus olhos. Existem dois tipos: optical see-through e vídeo see-through (Figura 2);

Handheld displays – alguns sistemas de RA usam handheld display com câmera acoplada, mostrando os objetos virtuais sobrepostos aos objetos reais;

Projection displays – nesta solução, a informação virtual desejada é projetada diretamente nos objetos físicos.

(a) (b)

Figura 2 – Conceitos de (a) optical see-through (b) video see-through.

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Sensores de Rastreamento e Registro – O rastreamento preciso da posição e orientação do usuário (e/ou seu ponto de vista) é essencial para o correto registro. Para ambientes indoor (ambientes confinados), técnicas híbridas de rastreamento oferecem excelentes resultados. A utilização de marcadores fiduciais colocados em posições conhecidas no ambiente, também facilitam o rastreamento visual. Para aplicações outdoors ou móveis, o desafio é maior, pois geralmente não é prático cobrir o ambiente com marcadores. Nestas aplicações, as soluções são as mais variadas, podendo incluir híbridos giroscópios, Global Positioning System (GPS), técnicas de deadreckoning e uso de bases de dados que contenham informações sobre características naturais visíveis (e estáveis) do ambiente.

Calibração – a calibração em sistemas RA é extremamente importante na obtenção de um registro preciso. Informações como distorções, deslocamentos dos sensores, parâmetros da câmera, campo de visão e outros, são normalmente necessárias. Existem princípios bem estabelecidos para calibração de câmera e foram desenvolvidas várias técnicas manuais de calibração para RA. Com relação ao software de RA, pode-se citar, entre outros:

ARToolKit – biblioteca gratuita de funções escritas em C, para construção de aplicações RA, com base no uso de marcadores fiduciais (ARTOOLKIT, 2008);

OPENCV – biblioteca gratuita em C/C++, a qual oferece diversos algoritmos de processamento de imagens e visão computacional, para utilização em tempo real, interessantes para interfaces de RA;

OSGART - biblioteca gratuita C++ que possibilita a criação facilitada de aplicações de RA, por meio da combinação da biblioteca de rastreamento ARToolKit e da biblioteca de renderização OpenSceneGraph (OSGART, 2008).

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Conjuntamente ao uso dos softwares de RA citados, pode-se ainda ressaltar que, para a criação dos objetos virtuais a serem combinados com o mundo real, os modeladores, as bibliotecas, os formatos e as engines usados na criação de sistemas de RV também podem ser utilizados. 4 INFERÊNCIA DE EMOÇÕES POR ANÁLISE DE EXPRESSÕES FACIAIS COMO MÉTODO DE AVALIAÇÃO NO DESIGN DE PRODUTOS

Após terem sido negligenciadas por muitos anos, as emoções (DESMET; HEKKERT, 2002) têm sido um elemento integrante do discurso do design de produtos desde o final dos anos oitenta (DEMIR, 2008) e seu estudo tem sido cada vez mais importante para o domínio do design. Recentes pesquisas procuram identificar as características dos produtos que se associam a determinados tipos de emoções (IIDA; POEMA, 2006). Esse emergente interesse no design centrado no usuário tem estimulado uma mudança de foco do comportamento e cognição para as experiências afetivas do usuário na interação humano-produto (DESMET; HEKKERT, 2007). Apesar desses esforços, ainda pouco se sabe sobre como as pessoas respondem emocionalmente aos produtos e quais aspectos do design ou de interação desencadeiam determinadas reações emocionais. Isso se justifica pelo fato, de que produtos podem evocar diferentes tipos de emoções, e essas por sua vez, se diferem individualmente, o que torna o seu conceito abrangente, indefinido e pessoal (DESMET, 2002).

Design emocional, caracterizado pelo planejamento de produtos com a intenção de evocar ou antecipar a geração de certas emoções, pode ser facilitado pela compreensão dos processos emocionais (DEMIR; DESMET; HEKKERT, 2009), pois esse conhecimento pode aumentar a compreensão do que faz com que as pessoas apreciem interagir com os produtos (DESMET, 2005). O significado das emoções e experiências dos usuários para o domínio

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do design tem levado a introdução de várias técnicas e ferramentas objetivando a obtenção de informações sobre as interações emocionais de usuários com produtos (BONAPACE, 2002; DEMIR, 2008). Muitas ferramentas têm sido propostas no campo da psicologia para medir as emoções de várias maneiras. Um crescente consenso sugere que as respostas emocionais envolvem a sincronização de vários subsistemas, incluindo as expressões faciais (SCHERER, 2005).

Pesquisadores da área de Psicologia das Emoções (EKMAN, 2002) afirmam ser possível inferir as emoções instantâneas de um indivíduo através de movimentos inconscientes de músculos da face. Desta forma uma câmera que captasse a interação do usuário com o produto poderia ser utilizada para verificar a emoção que dada propriedade do objeto manipulado desperta no individuo naquele instante. Assim, por exemplo, um alargamento dos orifícios nasais, que costuma representar fúria ou impaciência, indicaria que aquela funcionalidade específica do produto desperta irritação no usuário, sendo, portanto, um ponto fraco a se corrigir. Ao contrário, um levantar de ambas as sobrancelhas, que costuma representar surpresa, estaria indicando um possível diferencial competitivo do produto, algo que o usuário não esperava deste, e, portanto, um ponto-forte que deve receber maior investimento. Neste sentido, através da captação não verbal da experiência emotiva do usuário, a equipe de desenvolvimento do produto pode concentrar esforços nos pontos mais importantes evitando o dispêndio do lançamento de um produto que não agrada o conceito geral de seu mercado alvo. Está é uma rápida e efetiva técnica que envolve analisar e vincular as propriedades físicas de um produto às respostas táteis, preênseis, termais, funcionais e acústicas dos usuários no contato com eles. O objetivo é medir e reproduzir os aspectos de agradabilidade e traduzi-los em especificações que podem ser introduzidas no processo fabril da mesma forma que os aspectos técnicos são requeridos. A proposta baseia-se na utilização destes métodos científicos com

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processamento computacional de imagens para inferir as emoções, conscientes ou não, que o produto e suas funcionalidades podem despertar em seus usuários 5 METODOLOGIA E ESTRATÉGIA DE AÇÃO

5.1 Nas questões associadas à Realidade Aumentada Pretende-se estruturar o Sistema proposto em três componentes de

software principais, como ilustrado na Figura 3, que são: Cliente, Servidor do Sistema Inteligente para Seleção de Materiais, e Servidor de Arbitragem, Realidade Aumentada e de Base de Dados de objetos 3D.

Estes componentes, por sua vez, serão compostos de diversos módulos, cada um encapsulando funcionalidades específicas.

Figura 3 – Estrutura Geral do Sistema.

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Conforme ilustra a Figura 3, o componente Cliente estará presente nos microcomputadores (desktops e notebooks) clientes associados a cada um dos usuários (projetistas). Como mostrado na Figura 4, os usuários conectados aos desktops-clientes (através dos cabos do HMD e webcam), terão, naturalmente, uma certa limitação em termos de locomoção. Para solucionar este problema, pretende-se também, utilizar pelo menos um notebook, com ligação wireless (à rede). Assim, o usuário poderá se locomover com maior liberdade (levando consigo o notebook, acondicionado em uma mochila, por exemplo). O componente Cliente será composto dos seguintes módulos principais: - Módulo de Realidade Aumentada: este módulo será responsável pela captura da imagem (via webcam), detecção e identificação de marcadores e geração da cena aumentada, a qual será exibida no visor do HMD do usuário. - Módulo de Armazenamento: proverá o armazenamento persistente de dados. Poderá ser dividido em duas categorias: permanente e temporário. Os dados permanentes deverão sempre estar disponíveis, por exemplo, os dados sobre o modelo a ser manipulado. Já os dados temporários, podem ser descartados, por exemplo, modificações no objeto que não foram aprovadas pelos demais projetistas. - Módulo de Computação: será responsável pela implementação dos cálculos necessários à geração da cena aumentada. Deverá levar em consideração as entradas realizadas pelo usuário, via dispositivo de entrada convencional (teclado e mouse), via marcadores e via mensagem. - Módulo de Comunicação: será responsável pela troca de mensagens e eventos entre os demais Clientes e Servidores. O objetivo principal deste módulo será a ordenação dos eventos entre os participantes, consultas ao Servidor do Sistema Inteligente para Seleção de Materiais e ao Servidor de Arbitragem, RA e de Base de Dados 3D, e a manutenção de uma baixa latência na comunicação.

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O segundo componente do sistema é o Servidor do Sistema Inteligente para Seleção de Materiais, o qual possuirá os seguintes módulos: - Módulo de Comunicação: permitirá a consulta dos clientes aos seus outros módulos, através da troca de mensagens. - Módulo do Sistema Inteligente para a Seleção de Materiais e Coleção Ordenada de Amostras: os serviços destes módulos já foram implementados no projeto financiado pelo CNPq, processo no. 483153/2007-9. Estes serviços deverão ser, portanto, adaptados aos requisitos do projeto proposto. Finalmente, o terceiro componente, denominado Servidor de Arbitragem, RA e de Base de Dados 3D, será composto de três módulos principais: - Módulo de Comunicação: permitirá a comunicação com os clientes com os demais módulos, através da troca de mensagens. - Módulo de Realidade Aumentada e Arbitragem: este módulo fará a captura da imagem de toda a cena, através de uma câmera principal, bem como receberá as informações relativas às interações realizadas nos computadores clientes. Com base nestas informações, gerará uma cena aumentada que será enviada ao projetor para ser exibida em um telão. Caberá a este módulo, também, a responsabilidade do controle da colaboração (arbitragem), por meio de protocolo a ser desenvolvido. Fará, ainda, autenticação dos participantes, conexão e desconexão, além do envio do estado inicial aos novos participantes. - Módulo de Interface com o usuário e Gerente da Base de Dados 3D: este módulo permitirá a interação com o usuário, o qual poderá, diretamente (via interface convencional): criar, editar, adicionar ou remover elementos de uma Base de Dados de Objetos 3D, bem como, associar os objetos 3D aos marcadores fiduciais. Como este estudo relaciona-se a outro de escopo mais amplo, sua execução sugere a decomposição em um conjunto de grupos de trabalho, a

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saber: Sistema Distribuído e Colaboração; Realidade Aumentada; e Design de Produto e Seleção de Materiais. Ao Grupo de Sistema Distribuído e Colaboração caberá a definição dos protocolos necessários ao funcionamento da infra-estrutura de comunicação e distribuição, bem como, as regras de colaboração dos objetos compartilhados (arbitragem da concorrência) e a manutenção da consistência do sistema e de suas bases de dados. Ao Grupo de Realidade Aumentada, caberá estudar e implementar a captura das imagens, detecção de marcadores, problemas de oclusão, registro, processamento de imagens, mixagem e renderização da cena aumentada, além da Interface Humano-computador (IHC) convencional. Ao Grupo de Design de Produto e Seleção de Materiais caberá realizar o levantamento dos requisitos, efetuar a coleta de dados e definir os parâmetros necessários aos modelos, segundo os requisitos oriundos do Design. Também, deverá participar da adequação dos serviços já desenvolvidos às especificações do sistema proposto. Ao Grupo de Design e Emoção caberá realizar o levantamento dos requisitos e o desenvolvimento do sistema de inferência de emoções por análise de expressões faciais como método de avaliação no design de produtos. Os resultados obtidos pelo trabalho conjunto destes grupos deverão, então, ser interpretados por especialistas em Design, Cognitivistas e em Ciência e Engenharia de Materiais, de maneira que possam ser refinados em termos de seu conteúdo informacional, visando à posterior disponibilização do Sistema.

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Agradecimentos O presente estudo vem sendo desenvolvido com o apoio do CNPq,

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Reflexões Emergentes Através do Pensamento de Prigogine: o Encantamento com a Vida

Marcelo Martel1

1 INTRODUÇÃO

O objetivo deste texto é analisar, aprofundar e compreender o pensamento científico prigoginiano a partir da exposição de seu amigo e colaborador professor Enzo Tiezzi2 explorando algumas de suas idéias sobre beleza e a ciência. O evento ocorreu durante o terceiro seminário do curso de Epistemologia aplicada à Pesquisa Científica para todos os doutorandos do Politecnico di Milano na Itália. Uma amostra sobre o raciocínio de um grande cientista que julgava a beleza fundamental para compreender o universo. Quando a metodologia científica questiona seus próprios limites de maneira pouco ortodoxa. A metodologia de pesquisa em Design, apesar de recente também pode se vacinar contra extremismos acadêmicos e relembrar que a sensibilidade ainda é fundamental.

1 Doutor em Industrial Design e Comunicazione Multimediale, Politecnico di Milano, Itália, professor Design, UniRitter; professor Arquitetura e Urbanismo PUCRS, arquiteto Museu de Ciências e Tecnologia PUCRS, Porto Alegre, RS. 2 Enzo Tiezzi, Professore Ordinario di Chimica Fisica, Università degli Studi di Siena, Dottorati di Ricerca, Politecnico di Milano, XX ciclo3a edizione Corso di formazione trasversale: Epistemologia della Ricerca Scientifica e Tecnica, 5/4/2006. Coordenadoras científicas Dra. Marisa Bertoldini e Dra Alessandra Zanelli.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 . Enquadramento do problema científico

O aprendizado de diferentes teorias do conhecimento científico é um passo tão óbvio, quanto obrigatório na formação de um pesquisador, quem cria e inova deve compreender a trajetória histórica do pensamento científico. A impostação, com discernimento, do problema é fundamental para a sua resolução e, quanto mais ampla esta capacidade, mais precisa será sua resolução.

Numa passagem do livro “O nascimento do Tempo”, Ilya Prigogine, prêmio Nobel de Química em 1977, referencia sua experiência juvenil em diferentes campos do conhecimento: “No início estava estupefato em penetrar num universo totalmente desconhecido e, talvez tenha sido justo naquele momento que fui tentado a me aprofundar: esta é exatamente o que definirei a instabilidade da adolescência”.

Curiosidade e disposição são requisitos indispensáveis no avanço do conhecimento e permitem superar os mais diversos obstáculos.

Ilustração 1 - Fotografia Fabio Colombini.

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Ilustração 2 - Galileo diante do Santo Ofício, séc. XIX pintura Joseph-Nicolas Robert-Fleury.

O termo Epistemologia ou teoria do conhecimento, numa rápida pesquisa pela enciclopédia virtual Wikipedia explica: (do grego “episteme" - ciência, conhecimento; "logos" - discurso), é um ramo da filosofia que trata dos problemas filosóficos relacionados à crença e ao conhecimento. Na origem da epistemologia está Platão, que opunha crença ou opinião ao conhecimento.

A crença é um determinado ponto de vista subjetivo. O conhecimento é crença verdadeira e justificada. A teoria de Platão abrange o conhecimento teórico, o saber que. Mas a enciclopédia complementa: há outro tipo de conhecimento, não abrangido pela teoria de Platão. Trata-se do conhecimento prático, o saber como.

Diante da possibilidade do conhecimento, o sujeito pode tomar diferentes atitudes:

Dogmatismo; atitude filosófica defendida por Descartes segundo a qual podemos adquirir conhecimentos seguros e universais, e ter absoluta certeza disso.

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Ilustração 3 - Capa original Discurso sobre o método Descartes.

Ceticismo; atitude filosófica oposta ao dogmatismo a qual duvida de

que seja possível um conhecimento firme e seguro, esta postura foi defendida por Pirro.

Relativismo; atitude filosófica defendida pelos sofistas que nega a existência de uma verdade absoluta e defende a idéia de que cada indivíduo possui sua própria verdade. Esta verdade depende do espaço e o tempo.

Perspectivismo; atitude filosófica que defende a existência de uma verdade absoluta, mas pensa que nenhum de nós pode chegar a ela senão que chegamos a uma pequena parte. Cada ser humano tem uma visão da verdade.

Japiassu3 distingue três tipos de Epistemologia:

3 JAPIASSU, Hilton F. (1975) Epistemologia - O mito da neutralidade científica, Imago, (Série Logoteca), Rio de Janeiro,188 p.

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Epistemologia global ou geral que trata do saber globalmente considerado, com a virtualidade e os problemas do conjunto de sua organização, quer sejam especulativos, quer científicos;

Epistemologia particular que trata de levar em consideração um campo particular do saber, quer seja especulativo, quer científico;

Epistemologia específica que trata de levar em conta uma disciplina intelectualmente constituída em unidade bem definida do saber e de estudá-la de modo próximo, detalhado e técnico, mostrando sua organização, seu funcionamento e as possíveis relações que ela mantém com as demais disciplinas.

2.2. A beleza e a ciência na origem do conhecimento

O tema da construção do conhecimento através da pesquisa relacionando beleza e ciência foi exposto de maneira muito original por Enzo Tiezzi. A abordagem do pensamento de Ilya Prigogine, mesmo indiretamente, enriqueceu a abordagem e a compreensão do tema individual do doutorado (Design de produtos e sistemas para o socorro de populações atingidas por catástrofes). A natureza é um complexo e harmonioso ecossistema que se torna instável quando induzido ao desequilíbrio pela ação humana. Esta instabilidade se manifesta em bruscas mudanças climáticas e físicas causando desastres naturais e transformações que sempre repercutiram na sociedade humana. Se os desastres ambientais são inerentes ao planeta, devemos ao menos entender como não agravar seus efeitos. Apesar da grande e árida distância entre campos tão diversos como o design e a física pura, é estimulante rever conceitos e noções básicas que aproximam a distância entre a física e a biologia, e, conseqüentemente, a arquitetura, o design, a vida. Nas palavras de Prigogine respondendo pergunta em 1985 durante palestra na Espanha: “Devemos começar a pensar de forma não linear, devemos

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compreender que o mundo é muito mais rico do que qualquer das possibilidades que tenhamos vivido”.

2.3. Pesquisa e liberdade

Há uma aura de seriedade e utilitarismo que cerca a pesquisa científica desde a antiguidade. Plutarco4 narrou como Arquimedes5 resolveu os problemas de Siracusa, desmascarando falsários de moedas de ouro e com seus espelhos incendiou as naves romanas que assediavam a cidade. Apesar da admiração por salvar a capital da Magna Grécia repelindo os romanos, seus cidadãos agradecidos lhe pedem que escreva um livro sobre coisas verdadeiramente úteis. Arquimedes responde secamente: sou um cientista, não me ocupo de coisas úteis, mas sim de coisas belas e delicadas.

A relação entre beleza e ciência se origina na motivação do pesquisador que através de um percurso livre, criativo e particular, tantas vezes intuitivo, desemboca em descobertas científicas. Se uma pesquisa científica deve ser livre e eclética, também é verdade que ela deve ser orientada a um objetivo, em parte flexibilizando o método científico. 6 Tiezzi

4 Plutarco (Queroneia, 46 - 126 d.C.) escritor e filósofo grego, estudou na Academia de Atenas fundada por Platão e viveu em Roma, Delfos e Atenas, sob o império romano. 5 Arquimedes (Siracusa, 287 a.C. - 212 a.C.) matemático, físico e inventor grego. O primeiro episódio refere-se o rei de Siracusa no século III a.C. que encomenda uma coroa de ouro e desconfiado de que o ourives o enganara, misturando mais prata do que o ouro maciço em sua confecção. O rei pede a ajuda de Arquimedes para descobrir a verdade sem danificar o objeto. Durante um banho Arquimedes intuiu que a quantidade de água correspondente ao seu próprio volume transbordava da banheira e assim poderia comparar o volume da coroa com os volumes equivalentes ao seu peso em prata em ouro. Bastava medir a quantidade de líquido derramado quando fossem alternadamente imersas na água. Arquimedes teria saído à rua nu, gritando "Eureka! Eureka!" ("Encontrei! Encontrei!"'). O segundo episódio ocorreu na Segunda Guerra Púnica, durante o cerco de Siracusa pela marinha romana. O incêndio de navios romanos provocado por um conjunto de escudos de bronze dos grecos que polidos como espelhos côncavos concentraram a luz do Sol nas velas e mastros. 6 O método científico é um conjunto de regras básicas para um cientista desenvolver uma experiência controlada a fim de testar e observar acontecimentos, para chegar a conclusões, de forma a relatar as suas conclusões, que, em caso de validade, serão aplicadas à ciência. O método científico consiste em fases: observação de um fato, formulação de um problema, proposta de uma hipótese, realização de uma experiência controlada para testar a validade da hipótese, análise dos resultados e conclusão.

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cita Sêneca7 que sabiamente explicava: não existem ventos favoráveis, se não se sabe para onde ir.

2.4. Os paradigmas epistemológicos

De modo simplificado, sustenta Tiezzi, a validade dos paradigmas epistemológicos modernos se baseia em Descartes8 e Pascal9. Descartes dizia: para compreender a realidade se deve dividi-la em partes, tantas quantas possíveis. Enquanto Pascal afirmava: o todo é composto pela soma das partes. Na realidade sempre se utiliza o paradigma que convém à solução do problema. Particularizando, se percebe que os sistemas vivos não obedecem a paradigmas cartesianos, mas sim pascalianos. Dentro dos sistemas vivos milhares de correlações influem simultaneamente na evolução da vida.

7 Lucius Annaeus Seneca (Corduba, 4 a.C. - Roma, 65 d.C.), filosofo, politico e dramaturgo romano. 8 René Descartes, também conhecido como Cartesius (La Haye en Touraine, 1596 - Estocolmo, 1650), filósofo, físico e matemático francês. O método de raciocínio proposto por Descartes no Discurso é composto de quatro passos: “O primeiro era o de nunca aceitar algo como verdadeiro que eu não conhecesse claramente como tal. O segundo, o de repartir cada uma das dificuldades que eu analisasse em tantas parcelas quantas fossem possíveis e necessárias a fim de melhor solucioná-las. O terceiro, o de conduzir por ordem meus pensamentos, iniciando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer, para elevar-me, pouco a pouco, como galgando degraus, até o conhecimento dos mais compostos, e presumindo até mesmo uma ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros. E o último, o de efetuar em toda parte relações metódicas tão completas e revisões tão gerais nas quais eu tivesse a certeza de nada omitir.” 9 Blaise Pascal (Clermont-Ferrand, 1623 - Paris, 1662), filósofo, físico e matemático francês

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Ilustração 4 - Segunda Guerra Púnica, os espelhos de Arquimedes durante o cerco de

Siracusa. Capa da edição latina de Thesaurus opticus, Kitab al-Manazir livro sobre ótica

persa escrito entre 1011 e 1021.

Ilustração 5 - Bélgica, selo em homenagem a Prigogine.

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2.5. Revendo conceitos básicos Alguns conceitos básicos da física devem, obrigatoriamente, ser

revisitados para um leigo compreender os conceitos e a complexidade do pensamento prigogineano.10 Prigogine analisa os sistemas vivos e os diferencia dos sistemas não-vivos por não estarem fadados a viver em máxima ordem. Partindo destes sistemas Prigogine explica a biodiversidade e explica como os sistemas vivos estão em desequilíbrio termodinâmico.

A física clássica de Clausius11 e Newton na segunda lei da termodinâmica12 explica que os sistemas materiais não-vivos tendem à desordem e à máxima entropia sendo, portanto reversíveis. Facilmente entendida com o famoso exemplo de Thomas Kuhn13: um castelo de areia que uma vez destruído não pode ter seus grãos reconhecidos. Na nova concepção proposta por Prigogine, os sistemas vivos tendem a se manter longe do equilíbrio, são irreversíveis no tempo e se auto-organizam. Como exemplo cita os 36,7 graus da temperatura do corpo humano14 enquanto vivo que, somente depois da morte, vai rápida e irreversivelmente para a máxima entropia.15

10 Entropia é uma grandeza termodinâmica associada ao grau de desordem de um sistema macroscópico. A entropia mensura a parcela de energia que não pode mais ser transformada em trabalho em transformações termodinâmicas. 11

Rudolf Julius Emanuel Clausius (1822/1888), físico e matemático alemão. Um dos fundadores da Termodinâmica, formulando os conceitos da Segunda Lei da Termodinâmica e introduzindo o conceito de entropia. 12

A Segunda Lei da Termodinâmica determina que a entropia total de um sistema termodinâmico isolado tende a aumentar com o tempo, aproximando-se de um valor máximo. Duas importantes conseqüências disso são que o calor não pode passar naturalmente de um corpo frio a um corpo quente, e que um moto-contínuo, ou seja, um motor que produza trabalho infinitamente, sem perdas por calor, seja impossível. 13

Thomas Samuel Kuhn (1922/1996), físico americano importante historiador e filósofo da ciência. 14

A Lei Zero da Termodinâmica determina que, quando dois corpos têm igualdade de temperatura com um terceiro corpo, eles têm igualdade de temperatura entre si. 15

O Termodinâmica (do grego termo que significa calor e dinâmica que significa poder) é o ramo da Física que estuda fenômenos que estão relacionados com força mecânica, energia, calor e entropia, e as leis que ordenam os procedimentos da conversão de energia. Na Física, a energia é um conceito primitivo, sem definição.

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2.6. Sistemas e conceitos prigogineanos A beleza, a auto-organização dos seres vivos só pode ser explicada

pelos sistemas16 prigogenianos. O córtex cerebral ou o crescimento de colônias de bactérias funcionam conforme as leis de Prigogine. Segundo Konrad Lorenz17: a física dos seres vivos não obedece à física clássica, um dos grandes mistérios é a longevidade diversa dos seres vivos, que pode variar de segundos, horas, anos ou até séculos, da incubação de uma bactéria à vida de uma oliveira.

A água é uma molécula maravilhosa que junto com energia é determinante para os sistemas viventes. Prigogine intui como se comportam os sistemas complexos em presença de energia, água, limalha de ferro, entre outros experimentos, e apresenta os conceitos do tempo interno e dos eventos precedentes. Einstein dizia que Deus não joga dados, que tudo está determinado. Entretanto Prigogine estudando o comportamento de diversos seres vivos como as formigas observa que há um livre arbítrio. Por exemplo, a direção que uma formiga segue para a direita ou a esquerda, supondo uma auto-organização dos seres vivos. Prigogine critica Einstein e seu paradoxo dos gêmeos separados que pela equação da velocidade da luz é contraditório para explicar o envelhecimento dos seres vivos. O espaço é reversível e o tempo irreversível. Não se pode calcular o espaço a respeito ao tempo e vice-versa. O problema da derivada de Einstein é não saber o limite de uma extremidade, o tempo futuro dos gêmeos. Prigogine preconiza o tempo interno. As leis clássicas da natureza são determinísticas e reversíveis, a termodinâmica e a entropia descrevem um evolutivo ponto de vista natural.

16 Sistema é um conjunto de elementos interconectados, de modo a formar um todo organizado. 17

Konrad Zacharias Lorenz (1903/1989), ornitologista austríaco, Nobel de medicina de 1973.

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2.7. Sistemas vivos, criação da complexidade e coevolução Os sistemas vivos são capazes de criar a sua complexidade numa

grande diferença dos sistemas físicos não-vivos, mesmo o menor ser vivo é capaz de aumentar a sua própria complexidade. Passando pela epigênese,18 pelo metabolismo entrópico e o código genético, Tiezze avança com Prigogine no conceito de coevolução, a interferência do ambiente nos seres vivos. Na Química-física evolutiva de Prigogine a incerteza termodinâmica relata o intrínseco caráter da irreversibilidade do tempo. Termodinâmica e entropia descrevem um ponto de vista evolutivo natural. Entropia segundo Prigogine é evolução, energia não.

2.8. Evolução biológica, tempo e a essência da vida

A essência da vida, a base da evolução biológica, é a mudança constante dos seres vivos a cada instante. Os processos irreversíveis criam entropia e distinguem passado e futuro. O tempo é uma propriedade da natureza e da matéria. Se Darwin diz que a natureza é evolutiva e o tempo é incancelável, se o tempo é uma propriedade da natureza e da matéria, quem guarda esta distinção entre passado e futuro? Na natureza é nos seres vivos que está armazenada a informação evolutiva. Revisando a física-química clássica. A primeira lei da termodinâmica19 somente define energia e massa, já a entropia é a grande propriedade da evolução do universo segundo Prigogine não é apenas energia ou matéria. Entropia positiva é destrutiva (poluição, desordem, resíduos, etc.) e entropia negativa é construtiva (organização,

18

Epigênese - teoria (séculos XVIII e XIX) de que a complexidade morfológica desenvolvia-se gradualmente, durante a embriologia de um simples começo num ovo essencialmente formado. A interferência de alguma força vital sobre um ovo que tinha somente o potencial (não a determinação interna) para um desenvolvimento normal. Idéia filosófica/teológica/esotérica que desde que a mente foi dada ao ser humano, este impulso criativo original foi a causa de todo o nosso desenvolvimento. 19 Primeira Lei da Termodinâmica fornece o aspecto quantitativo de processos de conversão de energia. É o princípio da conservação da energia, agora familiar: "A energia do Universo é constante". A primeira lei da termodinâmica é um axioma generalizado da natureza em relação à conservação da energia.

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ordem). Na entropia, como nas funções gol, os experimentos não são reproduzíveis. A segunda lei da termodinâmica fala de entropia com fluxos de quantidade evolutiva. Na primeira lei se trata de fluxos de quantidade conservativa, energia e matéria. Energia não tem nada a ver com informação. O mesmo fluxo de energia é capaz de criar vida ou destruição. Exemplo: 10000 joules de energia solar são capazes queimar um bosque ou de fazer florescer a primavera. Outro exemplo: uma bala de canhão pode destruir um homem ou uma parede. A parede pode ser reconstruída, enquanto a informação destruída com o homem não pode ser medida do mesmo modo como energia e matéria para reconstruir a parede. Na física clássica somente conta a energia e a matéria. A informação genética conta muito mais do que a clássica química-física entende, se eu destruo o último ser vivo de uma espécie e não apenas mais um exemplar qualquer da espécie é evidente que a perda é infinitamente maior. Um cervo recém morto e um cervo vivo se diferenciam não pela matéria ou energia, mas pela informação perdida, relações, inteligência, ecossistema interno apagado e se desintegrará como matéria em decomposição. Como calcular a entropia? Ainda não há resposta. Inventou-se um neologismo - a entropia - para distinguir o antes do depois. Prigogine e Stengers falam do tempo com maestria. O tempo, no qual estamos mergulhados, corre do passado para o futuro, tal como um rio corre de montante para jusante. Há, evidentemente, o antes e o depois. A eternidade, que gostamos de imaginar, é um mar imenso, sempre igual, onde, portanto está indefinida a diferença entre o antes e depois. O tempo ou está em todo o lado ou não está em parte nenhuma. 20

20 PRIGOGINE Ilya, STENGERS Isabelle (1990), Entre o Tempo e a Eternidade, Gradiva - Colecção Ciência Aberta, Lisboa.

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2.9. Incerteza termodinâmica e indeterminação universal Segundo a equação de Ludwig Boltzmann21 tudo passa e necessita de

um instrumento que leva certo tempo para ser medido, a incerteza termodinâmica é um conceito recente claramente ligado à entropia que Tiezzi abordou neste seminário. Quanto maior a massa de uma estrela, mais espaço ocupa e menor é o seu tempo de vida (sem explicação ainda). Os tempos de vida dos seres vivos são diversos, assim como o tempo de vida das estrelas também é diverso. Há uma indeterminação universal coligando energia, massa, espaço e tempo, não sabemos por quê. A ciência clássica continua aplicável aos sistemas estáticos, mas Prigogine introduz o conceito de evento. A ciência até hoje deu muito espaço ao espaço, ignorando o tempo. Os mapas medievais assinalavam o tempo para percorrer um percurso, dilatando um espaço representado. O tempo deveria entrar nas equações, nos projetos... Memórias são certamente mais importantes do que quilômetros. No teorema de Güler da matemática se afirma: em qualquer modo incerteza e irreversibilidade tornam um sistema insolúvel. O professor Tiezzi relembra que não se devem transpor fórmulas e equações para arquitetura, por exemplo, pois, sem o componente pessoal o resultado é desastroso. Da mesma forma muito escambo ou nenhum escambo levam à morte da biodiversidade.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao ser perguntado sobre a mensagem contida em seus livros,

Prigogine afirmou que suas pesquisas pretendiam apenas demonstrar a construção contínua do universo, caracterizada por explosões, novidades, destruições e criações. 22

21

Ludwig Eduard Boltzmann, físico austríaco. A constante de Boltzmann na Física é a constante que relaciona a temperatura e a energia das moléculas. 22 CARVALHO Edgard de Assis, Margem, São Paulo, No 17, P. 217-219, 6/2003.

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3.1. Prigogine, o poeta da termodinâmica

Em As leis do caos, publicado em 1993, Prigogine considera as cidades como o exemplo mais simples de estruturas dissipativas, ou de não-equilíbrio, que se possa conceber. Uma cidade afirma ele, não se identifica unicamente ao campo imediato em que se insere; depende de relações com campos adjacentes. Sem elas, as cidades não existiriam. O sistema de uma cidade dissipa energia, interage com o mundo exterior. Não é uma estrutura morta, funcional, portadora apenas de uma identidade local. Mesmo no nível microscópico, a cidade é matéria viva em constante auto-organização; sempre recria novos espaços-tempos, rompe na prática cotidiana a simetria das regras e padrões que a cultura pretende lhe impor. Como o universo, as cidades são uma realização de coisas possíveis. Convertido em escuta poética da natureza, o saber científico estabelece novas alianças entre homens, sociedades e naturezas.

Ciência e poesia andam juntas com Prigogine em O Fim das Certezas: “o tempo não tinha começo e nunca teria fim”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARVALHO Edgard de Assis, Margem, São Paulo, No 17, P. 217-219, 2003. DESCARTES René, Discurso sobre o método, Hemus, São Paulo, 1975. JAPIASSU, Hilton F. Epistemologia - O mito da neutralidade científica, Imago,

(Série Logoteca), Rio de Janeiro, 1975. PASCAL Blaise, Pensamentos, Globo, Porto Alegre, 1973.

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PRIGOGINE Ilya, O Fim das Certezas, Tempo, Caos e as Leis da Natureza, trad.

FERREIRA Roberto Leal, 1ª Edição, UNESP, São Paulo, 1996. PRIGOGINE Ilya, As Leis do Caos, trad. FERREIRA Roberto Leal, 1ª Edição,

UNESP, São Paulo, 2002. PRIGOGINE Ilya, STENGERS Isabelle, Entre o Tempo e a Eternidade, Gradiva,

Colecção Ciência Aberta, Lisboa, 1990. PRIGOGINE Ilya, O Nascimento do Tempo, Edições 70, Lisboa, 1999. TIEZZI Enzo, Tempos históricos, tempos biológicos, trad. Frank R. C. Ferreira e

Luiz E. de L. Brandão, Nobel, São Paulo, 1988. Definições, conceitos e dados biográficos adaptados dos originais de: www.wikipedia.org (português/italiano/inglês) Ilustração 1 – Fotografia Fabio Colombini. www.scipione.com.br/educa/galeria Ilustração 2 - Galileo diante do Santo Ofício, séc. XIX, pintura Joseph-Nicolas Robert-Fleury. http://www.nationmaster.com/encyclopedia/Galileo-affair Ilustração 3 - Capa original Discurso sobre o método Descartes. Ilustração 4 - Segunda Guerra Púnica, os espelhos de Arquimedes durante o cerco de Siracusa. Capa da edição latina de Thesaurus opticus, Kitab al-Manazir livro sobre ótica persa escrito entre 1011 e 1021. Ilustração 5 - Bélgica, selo em homenagem a Prigogine.