Migração, urbanização, pendularidade e novas territorialidades.

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ABEP V Encontro Nacional sobre Migração CAMPINAS, OUT. 2007 TEMÁTICA: Migração, urbanização, pendularidade e "novas territorialidades"; TÍTULO: Urbanização, movimento pendular e migração: surgem novas territorialidades em áreas peri-metropolitanas? O caso do Rio de Janeiro Rainer Randolph, Prof. Titular, IPPUR / UFRJ, Pesquisador CNPq Pedro Henrique O. Gomes, bolsista no IPPUR, estudante de geografia na UFRJ Trabalho submetido à apresentação oral Rio de Janeiro, em agosto de 2007

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RANDOLPH, Rainer; GOMES, P. H. O.. Migração, urbanização, pendularidade e novas territorialidades. In: V Encontro Nacional sobre Migrações, 2007, Campinas. V Encontro Nacional sobre Migrações. Campinas: NEPO, 2007.

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ABEP

V Encontro Nacional sobre Migração

CAMPINAS, OUT. 2007 TEMÁTICA: Migração, urbanização, pendularidade e "novas territorialidades"; TÍTULO: Urbanização, movimento pendular e migração: surgem novas territorialidades em áreas peri-metropolitanas? O caso do Rio de Janeiro

Rainer Randolph,

Prof. Titular, IPPUR / UFRJ, Pesquisador CNPq

Pedro Henrique O. Gomes,

bolsista no IPPUR, estudante de geografia na UFRJ

Trabalho submetido à apresentação oral

Rio de Janeiro, em agosto de 2007

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1. URBANIZAÇÃO PERI-METROPOLITANA, CENTROS REGIONAIS E MIGRAÇÕES

O objeto das nossas investigações nos últimos anos tem sido o recente

processo de expansão das metrópoles brasileiras, em especial do Rio de Janeiro,

para além de fronteiras que foram delimitadas e designadas como suas “regiões

metropolitanas”. Não pretendemos questionar, no presente trabalho, as formas

dessa regionalização de uma suposta área de influência dos municípios-núcleo e da

sua institucionalização (veja algumas reflexões sobre isto em RANDOLPH/GOMES

2007a). E mesmo a pergunta a respeito do caráter e da “novidade” - ou não – dessa

expansão metropolitana para fora das regiões metropolitanas, que chamamos de

áreas peri-metropolitanas, não será perseguida no presente trabalho.

Pretendemos, aqui, explorar duas direções do aprofundamento das investiga-

ções anteriores que surgiram quando tentamos entender se nessas áreas peri-

metropolitanas se repetem, meramente, ou mesmo se acirram a lógica e a dinâmica

metropolitana; ou se surge uma nova forma de urbanização que, até, pode colocar

“em cheque” aquela da própria metrópole (vide RANDOLPH 2005, 2007a , 2007b;

RANDOLPH/GOMES, 2007b; RANDOLPH/GOMES, 2007c; RANDOLPH/ARAUJO,

Jr. 2007, RANDOLPH/LOPES, 2006).

a) Primeiro, a questão da novidade ou não da urbanização em áreas peri-

metropolitanas precisa ser abordada a partir dos resultados da expansão

metropolitana (aspecto estrutural); e aí é necessário distinguir entre dois lados: (i) é

preciso qualificar melhor o resultado das transformações que ocorrem nessas áreas

para não cair no equívoco de tomar uma semelhança apenas aparente com formas

urbanas que se observa também dentro da metrópole por garantida (vide

RANDOLPH/LOPES, 2006 e 2007); (ii) uma “novidade possível” – não afirmamos

que já exista – provavelmente tem a ver com a particularidade da inserção dos

municípios peri-metropolitanos nos seus respectivos contextos regionais. Em outras

palavras, mesmo formas de ocupação semelhantes às da metrópole nos municípios

peri-metropolitanos podem ter um significado diferente por causa da posição

diferente da cidade como um “pólo” na hierarquia ou rede de cidades.

A investigação da articulação entre processos metropolitanos e mudanças em

pólos ou centros urbanos regionais não é, obviamente, inédita; apenas como exemplo,

lembremos do trabalho de Baeninger (1994) quando estuda o deslocamento, em

São Paulo na década de 1980, do crescimento populacional da metrópole aos pólos

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regionais com uma certa distância da capital. Conforme aponta Baeninger (1998),

“as cidades pequenas e de porte médio passaram a construir uma importante fatia

do dinamismo regional com a mudança da direção e do sentido dos fluxos

migratórios”. Esse processo leva a “novas espacialidades” na medida em que é

capaz “tanto de absorver quanto de reter grande parte dos fluxos migratórios que,

anteriormente, se dirigiam às grandes concentrações metropolitanas” (BAENINGER,

1999).

Em que concerne ao estado de Minas Gerais, o desenvolvimento dos pólos regionais cria novas alternativas locacionais

com impactos evidentes no dinamismo dos movimentos migratórios. Deve-

se ainda ressaltar que a desconcentração demográfica no estado também

conta com a capacidade de retenção e atração populacional, cada vez mais

significativa, dos pequenos municípios próximos a esses pólos regionais.

Nesse sentido, percebe-se que a emergência de “novas territorialidades”

predominantemente urbanas não faz diminuir a importância do nascimento

de um novo mundo rural (UMBELINO/SATHLER, 2005).

Essa tendência mantem-se na década de 1990 conforme mostram os

resultados publicados do Censo 2000 (IBGE, 2003). o que levou a um aumento da

participação das cidades médias no aumento populacional

(VASCONCELLOS/RANGEL, 2005) .

Para o estado do Rio de Janeiro no século XXI, pressupomos que se

encontrem entre os municípios peri-metropolitanos, ou mesmo aqueles que

pertencem à franja dessa área, alguns que podem ser considerados centros

regionais e apresentam na sua dinâmica algum grau de autonomia em relação à

metrópole. Neste nosso caso, diferentemente da realidade paulista estudada por

Baeninger, esse grau é certamente mais reduzido até por causa da menor distância

desta área em relação ao núcleo da região metropolitana (no máximo 150 km). Por

isto, Castello Branco chama esses municípios de “Subnúcleos do Entorno” (2006, 8)

Portanto – lógica e ao mesmo tempo paradoxalmente -, se queremos

identificar alguma nova forma de urbanização nessas áreas, precisamos comprovar

a hipótese de que o processo de expansão metropolitana em curso fortalece (e não

enfraquece) o grau de centralidade existente de uma parte dos municípios peri-

metropolitanos.

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Vai ser preciso, então, no decorrer da nossa argumentação, mostrar que as

condições para essa hipótese são dadas; antes mesmo que se começa a discutir os

conteúdos da própria hipótese aqui apresentada.

b) Segundo, a expansão da metrópole e as transformações na sua área peri-

metropolitana estão vinculadas a diferentes formas complexas de mobilidade,

deslocamentos pendulares e migrações; eis o aspecto processual e dinâmico da

questão.

Em relação às migrações, pode-se afirmar, de uma maneira geral, que os

intensos fluxos migratórios verificados nas últimas décadas foram responsáveis por

processos de redistribuição espacial da população e da urbanização, contribuindo para a recente importância da migração intra-estadual nos

distintos espaços regionais. Assistiu-se à concentração e desconcentração

metropolitana em curto espaço de tempo, com a diversificação dos fluxos

migratórios (Baeninger, 1998).

A autora introduz a distinção entre fluxos migratórios intrametropolitano e

intra-estadual que é importante para nossa discussão. Relacionando a escala

intrametropolitana com a intra-estadual chega-se aos seguintes resultados: no

Estado do Rio de Janeiro a migração intra-metropolitana foi responsável por quase a

metade de todas as migrações intra-estaduais; já em Pernambuco, São Paulo e Rio

Grande do Sul, essas migrações perdem importância: Em Pernambuco cai para

34,3%; em São Paulo para 23 % e chega no Rio Grande do Sul a apenas 19,5%

(Baeninger, 1998). Evidencia-se, portanto, uma intensa mobilidade intra-

metropolitana da população que se concretiza, geralmente, através de seu

deslocamento do núcleo da metrópole para áreas periféricas. Em relação a São

Paulo na década de 1980, identificou-se também um aumento dos movimentos

periferia-periferia.

As migrações circunscritas às dinâmicas interioranas foram responsáveis por mais da metade dos movimentos intra-estaduais nos Estados do Pará,

Bahia, Minas Gerais e Paraná, demonstrando o recente fortalecimento

dessas áreas em termos econômicos e demográficos. Destaca-se que as

migrações no interior do Rio de Janeiro responderam por 19,0% do total da

migração do estado, indicando a consolidação dessa área (Baeninger,

1998).

A relação complexa entre movimento pendular e migração também já foi

objeto de estudos anteriores. Citando novamente como exemplo um estudo de

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Baeninger (1996), a autora encontra na sua investigação uma relação entre

migração e movimento pendular de chefes de famílias. Os migrantes mais recentes

em áreas metropolitanas são mais propensos a realizar deslocamentos pendulares

do que aqueles habitantes que permanecem há mais tempo em um determinado

lugar. Aparentemente, no caso desses migrantes, a mudança de sua residência não

os aproximou ao seu lugar de estudo ou trabalho. Pode-se arriscar, talvez, a

hipótese que na decisão sobre o deslocamento da residência o local de trabalho

teve um papel subordinado; ou por causa de imposições externas (mercado

imobiliário, renda familiar etc.), ou por razões subjetivas da busca pela proximidade

ao consumo (shopping), lazer, “verde”, segurança, tranqüilidade etc. decorrentes de

valores de consumo e entretenimento.

Apesar de não poder trabalhar explicitamente a complexidade no presente

trabalho, vale destacar que no nosso caso seria necessário, a princípio, considerar

três diferentes tipos de deslocamentos. Além dos mencionados deslocamentos

permanentes (migração) e dos deslocamentos contínuos com freqüência diária

(comutação), o entendimento da realidade peri-metropolitana ia exigir uma terceira

modalidade: os deslocamentos periódicos com uma freqüência reduzida. Como há

uma crescente penetração nas áreas peri-metropolitanas por casas de fim de

semana, os movimentos pendulares com freqüência semanal ou mesmo semestral

tem uma grande importância para a determinação das atuais características da área

peri-metropolitana. São mais importantes ainda em relação ao potencial dessa área

de ser receptor de um repentino e qualificado deslocamento em maior escala

(migração) na medida em as condições materiais (e infra-estruturais) já são dadas

em grande medida através das segundas residências desse grupo.

Em outro lugar desenvolvemos essa idéia mais aprofundamente (RANDOLPH

2005).

2. EXPANSÃO METROPOLITANA E FORMAS DE DESLOCAMENTOS – PERSPECTIVAS DE REFLEXÃO

A maior diferença da nossa investigação em relação àquelas brevemente

mencionadas no item anterior consiste no recorte ou na escala territorial o que, para

nos, introduz uma outra qualidade de questionamentos.

Nossa problemática aqui é fundamentalmente regional; buscamos entender a

expansão metropolitana através de uma investigação das áreas que tem ao menos

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uma fronteira em comum com ela. Em tese devíamos dirigir nossa atenção para

processos que fortalecem os centros regionais em torno da metrópole. Mas, por falta

de dados adequados desistimos dessa empreitada.

Por isto o que interessa aqui são os fluxos que vão se uma região para outra

ou mesmo aquelas que constituem certas “regiões” em torno das cidades médias

encontradas no entorno da metrópole. Não cabe aqui entrar num debate acerca do

termo e conceito da região.

Conseqüentemente, nossa atenção está voltada para aqueles deslocamentos

da população que partem de dentro das regiões metropolitanas e tem como destino

outras “regiões” próximas, mas não metropolitanas. Há na literatura diferentes

autores que procuram caracterizar esse processo por meio de diferentes termos

como involução urbana ou metropolitana (SANTOS, 1996), urbanização extensiva

(Monte-Mor 1994), contra-urbanização (BERRY, 1976) e, mesmo, implosão/explosão

metropolitana (Lefebvre 1999) como marco da propagação de uma “sociedade

urbana”.

Pode-se identificar duas perspectivas distintas a respeito da interpretação

desses processos de expansão. Por um lado, há aqueles que admitem o processo

de um espraiamento para além das fronteiras metropolitanas e, inclusive, identificam

o advento de uma nova geografia de cobertura global baseada na valorização das

cidades à medida que assumem um crescente número de funções globais e no

conseqüente surgimento de novas centralidades no sistema das cidades mundial

(vide p. ex. Mattos 2001). Porém, esse processo não passa, conforme o mesmo

autor, de uma “metropolização expandida, na qual, progressivamente, vão ser

ocupadas às aldeias e áreas rurais que se encontram em seu caminho,

transbordando uma e outra vez seus limites anteriores.” Mattos como muitos outros

autores – vide para o caso do Rio de Janeiro particularmente Castello Branco (2006)

- não considera essas tendências como novas, mas como uma culminação lógica e previsível de uma forma de urbanização

capitalista, que já se havia anunciado antes. E que, portanto, a partir

dessa perspectiva, o tipo de cidade que agora se está desenvolvendo

seria o resultado de um conjunto de mutações perfeitamente

compatíveis com a modalidade específica daquela urbanização cujas

origens seguramente deve se situar no momento em que se inicia a

revolução industrial (MATTOS, 2001).

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Entretanto, existe uma forma diferente de interpretar os mesmos processos.

Aguilar (2002) chega a conclusões que contradizem essa visão de Mattos a partir do

estudo do desenvolvimento econômico e da estrutura territorial metropolitana da

Cidade de México. Para Aguilar, os estudos sobre o papel das grandes cidades

dentro da economia global negligenciam o desenvolvimento das periferias

metropolitanas e, por causa disto, não conseguem identificar que a expansão

metropolitana está adquirindo uma forma diferente àquela do passado recente. Em anos mais recentes, podemos apreciar que na medida em que

diminuiu o crescimento da grande metrópole, continuou um importante

crescimento das cidades intermediárias próximas à primeira, com o qual

tem se aumentado uma marcada concentração de atividades produtivas

e de população urbana em uma ´região central´ que contém a maior

cidade do país, mas cobre um território muito mais amplo (AGUILAR,

2002).

Acrescenta ainda que as expandidas e cada vez mais difusas periferias metropolitanas ao

redor dessas grandes cidades tornaram-se sumamente importantes para

entender a natureza em mudança das mega-cidades; .... Em termos

territoriais, a mega-cidade apresenta na atualidade uma expansão mais

policêntrica através de centros e sub-centros urbanos que seguem um

padrão de rede que tende a ampliar-se ao longo das principais rodo e

ferrovias que saem em forma radial do centro da grande cidade”

(AGUILAR, 2002).

Como já anunciado antes, a perspectiva do nosso trabalho corresponde a de

Aguilar. Na medida em que não descartamos, como o citado autor, a presença de

uma nova dinâmica urbana nessas periferias fora das regiões metropolitanas,

parece-nos justificado designá-las com um nome próprio que tanto expresse sua

distinção em relação à metrópole e sua área de influência, como faça alusão que

essa realidade não possa ser entendida sem a presença da metrópole. Parecia,

então, a qualificação de “peri-metropolitana” bastante adequada para a designação

de um conjunto de municípios limítrofes às regiões metropolitanas dessas áreas

(vide RANDOLPH 2005). Na literatura, esse termo surgiu ao menos desde o início

da década de 1990 (HART 1991) em investigações fundamentalmente na Austrália

que diziam respeito às metrópoles daquele país (vide, por exemplo, MURPHY,

BURNLEY 1993; BURNLEY, MURPHY 2002). No presente ensaio, não cabe

aprofundar essa discussão (vide, por exemplo RANDOLPH/GOMES, 2007a).

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Os fenômenos e processos – migração e movimento pendular - sob

investigação precisam ser compreendidos nos seus contextos históricos. Uma breve

contextualização histórica torna-se indispensável quando se segue a argumentação

de Singer (1980; apud OLIVEIRA, 2006): Como qualquer outro fenômeno social de grande significado na vida das

nações, as migrações internas são sempre historicamente condicionadas,

sendo o resultado de um processo global de mudança, do qual elas não

devem ser separadas. Encontrar, portanto, os limites da configuração

histórica que dão sentido a um determinado fluxo migratório é o primeiro

passo para o seu estudo.

Em recente trabalho, Oliveira (2006) dedicou-se à tarefa de situar

historicamente as diferentes expressões e significados das migrações no Brasil em

cinco etapas: o período dos ciclos econômicos do país (desde a chegada dos

colonizadores até a metade do século XIX); quando da introdução da mão-de-obra

assalariada (da metade do século XIX até aos anos 30 do século XX); da integração

do mercado nacional (dos anos 1930 aos anos 1950); do desenvolvimentismo (dos

anos 1950 aos 1970) e da pós-modernidade (a partir dos anos 1980).

Para os fins do nosso trabalho, é a passagem mais recente do

desenvolvimentismo para a fase “pós-moderna” que tem maior interesse. Com

relação a esse último período o autor constata o seguinte: A explicação do fenômeno, desde da década de 80, vem circulando em

torno da desconcentração industrial/populacional, reestruturação produtiva,

redução nos volumes dos fluxos migratórios, baixa atratividade das

metrópoles nacionais, mudança no mundo do trabalho, etc. Argumentações

que ora se sustentam, ora se confirmam em parte ou são desprovidas de

sustentabilidade. O desafio que se coloca é não só entender que se vive

numa sociedade distinta da de duas décadas atrás, mas como introduzir

nas análises as mudanças provocadas por esse fenômeno. (OLIVEIRA,

2006, p. 16)

Esse desafio, talvez, possa ser explicitado quando percebemos essa última

passagem como aquela que, tendencialmente, está a caminho de superar tanto as

determinações intrínsecas à sociedade industrial do desenvolvimentismo, como a

sociedade de consumo que foi se constituindo para uma pequena, mas poderosa

minoria no Brasil a partir dos anos 1950. Se na sociedade industrial (caracterizada

por assalariamento e integração nacional de mercados – inclusive o de trabalho) os

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deslocamentos populacionais são em boa parte determinados pelas relações de

produção, na sociedade de consumo é a reprodução que assume o papel de orientar

os fluxos migratórios e movimentos pendulares. A residência daqueles que fazem

parte dessa sociedade – uma pequena, mas hegemônica parcela da população –

não está mais escolhido por razões vinculados ao mundo do trabalho; mas ao

mundo do consumo (lazer, entretenimento, tranqüilidade, segurança etc.).

A fase pós-moderna, nos preferimos chamar esse período mais recente de

transição para a sociedade urbana (LEFBEVRE, 1999), caracteriza-se pela

superação das dicotomias constituintes das fases anteriores. As migrações e os

movimentos pendulares deixam ter vínculo estreito tanto com o mundo do trabalho

como com o mundo do consumo; as oposições entre produção e reprodução,

trabalho e lazer, cotidiano e festa etc. vão ser superadas e reformatados na

sociedade urbana. Sem poder prever, hoje, as formas de mobilidade e migração que

vão ser características para essa sociedade, parece-nos plausível que as distinções

entre deslocamentos permanentes, deslocamentos contínuos (diários),

deslocamentos periódicos com uma certa freqüência e deslocamentos esporádicos

vão ser qualitativamente transformadas.

Por isto acreditamos será necessário, desde já, voltar nossa atenção a formas

de deslocamentos – como as acima mencionados periódicos semanais ou

semestrais – que possam anunciar as formas de movimentos de amanhã. É claro, e

logo isto vai ficar patente no nosso próprio ensaio, que as informações das quais

dispomos limitam a investigação dessas formas. Mesmo assim, acreditamos ser

importante, ter em mente que devemos estar preparados amanha para lidar com

esse aumento da complexidade dos fenômenos e processos..

4. MOVIMENTO PENDULAR – PERSPECTIVAS DE SUA ANÁLISE Nos fenômenos por nos investigados há uma forma de “movimento pendular”

que tem uma significativa importância para a compreensão da urbanização e de sua

especificidade que ocorre em uma grande parte dos municípios que fazem parte da

área peri-metropolitana do Rio de Janeiro. Trata-se de um movimento periódico, mas

não contínuo (diário) que pode anunciar, como acabamos de mencionar, uma nova

“sociedade urbana”. Estamos falando do movimento no fim de semana e nas férias

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que leva milhares de cariocas para as praias e montanhas ao redor da região

metropolitana.

Observa-se como essa forma de deslocamento se transforma ou num

deslocamento permanente com a mudança da residência das pessoas para suas

segundas residências ou deslocamento mais contínuo onde essa mudança não traz

consigo também o deslocamento do lugar de trabalho. Por isto começamos a

estudar tanto as migrações para lugares dentro dessa área peri-metropolitana como

os deslocamentos pendulares que podem, ambos, sem muita precisão, dar uma

idéia se aquele processo de “urbanização pós-modera” ou da transição para a

sociedade urbana já pode estar em curso.

Certamente, os dados apenas vão permitir ter uma aproximação muito

precária a esses novos fenômenos; mas, acreditamos que vale a pena mesmo

assim. Por isto vamos, no presente item, “revisitar” brevemente o conceito do

movimento pendular.

Nas palavras de Moura, Castello Branco e Firkowsi (2005), As informações sobre deslocamentos domicílio-trabalho/estudo constituem

importante referencial para a análise dos processos de metropolização e

expansão urbana. Na atualidade, verifica-se que esses deslocamentos

ocorrem entre distâncias cada vez maiores entre a origem e o destino,

revelando o avanço do processo de ocupação do espaço das aglomerações

urbanas. As centralidades dessas áreas tornam-se nítidas e permitem a

identificação de processos seletivos de uso e apropriação do espaço, com

segmentação dos locais de moradia e de trabalho.

Na tradição da Geografia Urbana esses movimentos pendulares fornecem o

fundamento para a identificação de áreas de influência ou regiões funcionais. Essas

áreas seriam, então de mercado de trabalho, econômicas e metropolitanas.

Pegando o exemplo da Região Metropolitana do Rio de Janeiro e observando os

municípios que formas sua periferia, confirma-se na seguinte TABELA 1 essa

perspectiva a partir de um relativo elevado fluxo daqueles que trabalham e estudam

fora do município onde residem.

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TABELA 1 População Residente

Deslocamento para trabalho e estudo Região Metropolitana

e municípios de residência Total Trabalhavam ou

estudavam (A)

Trabalhavam ou estudavam

no município de residência

(B)

Trabalhavam ou estudavam

em outro município da UF

(C)

Relação

(C/A) %

Região Metropolitana 10 710 109 6 789 290 5 979 468 797 039 11.74

Rio de Janeiro 5 857 738 3 779 550 3 736 228 36 275 0.96

Belford Roxo 434 394 261 823 178 535 82 917 31.67

Duque de Caxias 775 406 471 939 372 585 98 686 20.91

Guapimirim 37 952 23 558 18 924 4 622 19.62

Itaboraí 187 479 115 801 87 676 27 931 24.12

Japeri 83 278 49 772 34 052 15 665 31.47

Magé 205 824 122 905 97 558 25 154 20.47

Nilópolis 153 700 95 763 63 406 32 025 33.44

Niterói 459 430 310 408 248 666 60 917 19.62

Nova Iguaçu 920 572 563 598 424 831 137 415 24.38

Paracambi 40 474 23 934 20 712 3 170 13.24

Queimados 121 993 73 056 53 076 19 710 26.98

São Gonçalo 891 108 564 508 415 140 148 719 26.34

São João de Meriti 449 463 276 416 182 531 93 256 33.74

Seropédica 65 242 40 327 33 275 6 931 17.19

Tanguá 26 056 15 932 12 273 3 646 22.88

Núcleo Metropolitano 5 857 738 3 779 550 3 736 228 36 275 0.96 Periferia Metropolitana 4 852 371 3 009 740 2 243 240 760 764 0.25

Média dos 25% mais 32.58 Média total 22.94 Média dos 25 % menos 12.75

Com exceção do núcleo metropolitano, é claro, todos os demais municípios

da região metropolitana apresentam um índice em torno dos 20 a 30 % de

deslocamentos para fora do município (com exceção de Paracambi e, mais próximo

aos 20%, de Seropédica). O conceito de “migração pendular” é antigo na Geografia. Aparece nas

análises de Beaujeu-Garnier (1980) e Derruau (s/d), dentre outros clássicos

da Geografia Humana, com ênfase em Geografia da População. Contudo, a

perspectiva de análise do geógrafo difere da do demógrafo, particularmente

em razão da natureza da preocupação da Geografia com a espacialização

dos fenômenos.

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Entre os estudos clássicos, observa-se uma certa compreensão de que os

movimentos migratórios variam quanto à duração e à escala de

abrangência, e que aqueles de caráter cotidiano devem ser compreendidos

no contexto em que se inserem, predominantemente urbano. (MOURA,

CASTELLO BRANCO e FIRKOWSKI (2005),

Há autores para os quais nem todos os deslocamentos temporários

constituem fenômenos demográficos. Outros, por outro lado, analisam o fenômeno

dos movimentos diários no interior da discussão sobre migrações para o trabalho na

qual as migrações de temporada são destacadas. Entre os autores citados por

Moura, Castello Branco e Firkowsi (2005) não há nenuma denominação única a

essa ordem de deslocamento. Ora se referem à “migração” ora ao “deslocamento”

pendular.

Mas, conforme as autoras (2005), é importante entender que a “natureza dos

deslocamentos pendulares difere substancialmente da compreendida pelos

movimentos migratórios, embora ambos impliquem fluxos de pessoas no território.”

Excluem-se da migração os movimentos daqueles que não se estabelecem

permanentemente no local de residência. Assim, enquanto a migração envolve mudança de residência, os

deslocamentos pendulares caracterizam-se por deslocamentos entre o

município de residência e outros municípios, com finalidade específica –

nesta pesquisa, com base nas informações da amostra do Censo

Demográfico 2000, foram consideradas as finalidades de trabalho e estudo.

Além do Censo, algumas pesquisas do tipo origem/destino – OD,

particularmente as realizadas para análise e planejamento do setor de

transporte urbano, fazem levantamentos dessa condição de mobilidade.

No entanto, esse tipo de deslocamento da população mantém estreita

vinculação com os movimentos migratórios intrametropolitanos e inter-

metropolitanos (ou internos às aglomerações urbanas, sejam estas

metropolitanas ou não), como demonstram estudos sobre o tema,

apontados no item subseqüente. Com a expansão física dessas

aglomerações, as distâncias entre residência e local de trabalho/estudo

aumentam, inviabilizando ou encarecendo esse tipo de deslocamento, e

implicando – em muitos casos – a migração propriamente dita. (MOURA,

CASTELLO BRANCO e FIRKOWSKI (2005),

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5. CARACTERÍSTICAS DOS MUNICÍPIOS PERI-METROPOLITANOS: DESLOCAMENTO PENDULAR E MIGRAÇÕES

a) Deslocamentos pendulares e indícios de regionalizações na área peri-metropolitana e sua franja

Os dados na TABELA 2 em relação aos deslocamentos para estudo e tra-

TABELA 2

População residente

Deslocamento para trabalho e estudo Área Peri-Metropolitana

e municípios de residência Total Trabalhavam ou

estudavam (A)

Trabalhavam ou

estudavam no município

de residência (B)

Trabalhavam ou estudavam

em outro município da UF

(C)

Relação

(C/A) %

Área Peri-Metropolitana 809 451 526 575 489 439 35 987 6.83

Cachoeiras de Macacu 48 543 31 478 28 713 2 727 8.66

Engenheiro Paulo de Frontin 12 164 7 662 6 554 1 084 14.15

Itaguaí 82 003 51 716 44 580 7 097 13.72

Maricá 76 727 48 526 40 922 7 486 15.43

Mendes 17 278 10 876 9 271 1 506 13.85

Miguel Pereira 23 902 15 674 13 899 1 732 11.05

Petrópolis 286 527 187 732 181 769 5 612 2.99

Piraí 22 118 14 067 12 741 1 225 8.71

Rio Bonito 49 671 32 158 29 644 2 399 7.46

Saquarema 52 450 33 455 31 305 2 102 6.28

Teresópolis 138 068 93 231 90 041 3 017 3.24

Média dos 25% mais 14.47

Média total 9.59

Média dos 25 % menos 4.17

balho em outro município mostram índices bastante variados. Há aqueles municípios

onde chagam perto dos 15 pontos o que deve indicar uma vínculo bastante forte

com a região metropolitana. Há outras numa faixa em torno 6 a 9 % que devem

estar se relacionando com outro município da própria área peri-metropolitana. E tem-

se dois “centros regionais” (Petrópolis e Teresópolis) com índices baixos que

provavelmente recebem mais pessoas que alí vem para estudar ou trabalhar do que

saiam do município para estudo ou trabalho. Seriam esses os centro regionais que,

talvez, podem ser protagonistas de uma reversão das relações metrópole – periferia.

Tendencialmente, portanto pode-se distinguir uma parte dos municípios com

laços mais fortes com a metrópole cuja potencialidade de intermediação regional

Page 14: Migração, urbanização, pendularidade e novas territorialidades.

14

parece estar encerrada neles mesmos. A compreensão da importância dos outros

municípios necessita uma ampliação do universo de pesquisa para municípios

vizinhos daqueles que constituem a área peri-metropolitana – a uma “franja peri-

metropolitana” como apresentado na TABELA 3.

TABELA 3

População residente

Deslocamento para trabalho e estudo Franja Peri-Metropolitana e

municípios de residência Total Trabalhavam ou

estudavam (A)

Trabalhavam ou

estudavam no

município de

residência (B)

Trabalhavam ou

estudavam em outro

município da UF (C)

Relação

(C/A) %

Franja Peri-Metropolitana 1 482 759 950 854 866 355 79 110 8.32

Angra dos Reis 119 247 74 823 72 856 1 787 2.39

Araruama 82 798 51 747 48 868 2 848 5.50

Areal 9 899 6 559 5 800 732 11.16

Barra do Piraí 88 504 55 627 47 446 7 934 14.26

Barra Mansa 170 683 107 550 90 249 16 613 15.45

Cabo Frio 126 780 82 163 74 149 7 938 9.66

Casimiro de Abreu 22 130 15 329 13 607 1 694 11.05

Comendador Levy Gasparian 7 924 4 976 3 737 1 090 21.91

Iguaba Grande 15 089 9 329 8 302 991 10.62

Mangaratiba 24 888 16 354 14 958 1 385 8.47

Nova Friburgo 173 399 119 463 117 159 2 011 1.68

Paraíba do Sul 37 409 23 016 20 330 2 484 10.79

Paty do Alferes 24 932 15 875 14 234 1 604 10.10

Pinheiral 19 481 12 099 8 831 3 182 26.30

Quatis 10 725 6 940 5 550 1 357 19.55

Rio Claro 16 228 10 124 8 958 1 055 10.42

São José do Vale do Rio Preto 19 277 12 273 11 545 728 5.93

São Pedro da Aldeia 63 209 40 896 33 378 7 482 18.30

Sapucaia 17 150 10 440 8 843 737 7.06

Silva Jardim 21 265 13 557 12 309 1 241 9.15

Três Rios 71 964 45 717 42 264 2 806 6.14

Valença 66 293 42 382 39 500 2 429 5.73

Vassouras 31 443 20 688 19 367 1 293 6.25

Volta Redonda 242 042 152 927 144 115 7 689 5.03

Média dos 25% mais 19.29

Média Total 10.54

Média dos 25% menos 4.38

Page 15: Migração, urbanização, pendularidade e novas territorialidades.

15

Na TABELA 3 encontram-se os 16 municípios nomeados com os respectivos

dados sobre a mobilidade pendular da sua população. Uma primeira análise indica

que dois dos 16 municípios mostram altas taxas de movimento pendular por serem

vizinhos ao pólo siderúrgico-metal-mecânico importante do Médio Vale do Paraíba

do Sul (Volta Redonda e Barra Mansa); por isto, nos não os consideramos

pertencentes à franja peri-metropolitana do Rio de Janeiro.

Três municípios apresentam taxas muito baixas – pouco acima de 1 % - o que

pode significar uma relativa autonomia de seu mercado de trabalho e sistema

educacional. Essa conclusão deve, pelo menos, ser válida para Angra dos Reis e

Nova Friburgo que, neste sentido e aspecto, também se encontram fora de uma

influência mais significativa da metrópole.

Os outros municípios com taxas relativamente mais elevadas – entre 6 e 8 %

- estão vinculados a outros municípios que fazem parte da área peri-metropolitana

(Areal, Paraíba do Sul e Paty de Alferes) e a Angra dos Reis ou, de novo, ao centro

industrial do Médio Rio do Paraíba do Sul (Piraí e Rio Claro) que não mantém

vínculo mais forte com a região metropolitana.

Em termos da regionalização da área peri-metropolitana – observando aqui

com a mobilidade pendular apenas um dos critérios possíveis –, podemos constatar

que essa sua franja (sem consideração de Barra do Piraí e Pinheiral) apresenta uma

média relativamente baixa de aproximadamente 5 % da população trabalhando e

estudando fora do seu município em relação à média do grupo de municípios que

faz parte da Área Peri-Metropolitana.

Interessante ainda é uma comparação da heterogeneidade em cada grupo:

na “franja” os valores oscilam entre 1,34% e 7,66%; na área peri-metropolitana entre

2,08% e 9,92% o que mostra que os fluxos do segundo grupo são tendencialmente

maiores do que o primeiro.

Em síntese, sem puder concluir nada em relação ao surgimento de uma nova

regionalização que envolve tanto as metrópoles como seu entorno mais ou menos

imediato, temos indícios que os municípios que integram a Área Peri-Metropolitana

se caracterizam por um fluxo de trabalhadores e estudantes relativamente maiores

do que aqueles que são mais distantes ainda; que, por sua vez, estão vinculados a

determinados daquelas cidades peri-metropolitanas.

Page 16: Migração, urbanização, pendularidade e novas territorialidades.

16

Neste sentido, a Área Peri-Metropolitana pode exercer uma função de

mediação entre a metrópole e regiões mais distantes e reforçar sua posição nessa

cadeia de influências. Defendemos aqui a hipótese de que essa mediação não

corresponde mais aquela tradicional das cidades médias dentro de uma hierarquia

urbana. Mas, a comprovação dessa hipótese, certamente vai exigir investigações

mais qualitativos como estamos realizando em alguns “pontos” (municípios) em

torno da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Pois, apesar do inquestionável

mérito das pesquisas empíricas e estatísticas a respeito das transformações das

metrópoles contemporâneas – como aquela que acabamos de realizar aqui -, seu

valor parece limitado quando se encara o processo de mudança em toda sua

profundidade.

Dentro desse quadro geral das transformações que observamos aqui nos

últimos 20 a 25 anos, para avançar no entendimento dos processos, é necessário

empreender pesquisas estatísticas mais sofisticadas como aquelas como, no caso

do Rio de Janeiro, as de Castello Branco (2006) para identificar outras

características dessa rica rede de articulações em torno da metrópole do Rio de

Janeiro.

É essa potencialidade de uma certa “flexibilidade da função” - sob constância

da forma - que nos leva a chamar atenção, no final do nosso pequeno ensaio, para o

fato de que cada investigação pressupõe um certo posicionamento – muitas vezes

implícito – com relação ao seu “objeto” ou aquilo que compreende como sua

“realidade”. A problemática apresentada nesse pequeno ensaio só vai poder ser

investigada adequadamente, ao nosso ver, se a “realidade” estudada for

compreendida a partir do conceito de Lefebvre que atribui ao real uma virtualidade

própria e propõe identificar, nela mesma, seu potencial futuro – possibilidades que

se podem (ou não) tornar real (LEFEBVRE 1999, p. 16).

b) Deslocamentos permanentes e taxas de crescimentos populacional

A análise dos deslocamentos pendulares precisa ser complementada por uma

análise daqueles deslocamentos que são permanentes (migrações). Não vai ser

ainda no presente trabalho que vamos poder relacionar e articular os resultados

dessas duas análises. Mas, acreditamos que a apresentação dos índices de

migração e de crescimento populacional dos municípios peri-metropolitanos pode

contribuir para uma melhor caracterização do universo da nossa pesquisa.

Page 17: Migração, urbanização, pendularidade e novas territorialidades.

17

Já observamos anteriormente que desde a década de 1980 o crescimento

populacional se desloca dos núcleos metropolitanos para os municípios localizados

na sua periferia. Essa afirmação pode ser verificada em relação ao Ro de Janeiro e

sua área metropolitana também para a década de 1990 como mostra a seguinte

TABELA 4.

TABELA 4

Regiões de Governo Taxa média Taxa líquida de Taxa de crescimento e municípios geométrica de migração (%) vegetativo (%) crescimento anual (%) Estado 1,30 0,19 1,11 Região Metropolitana 1,12 0,06 1,06 Nilópolis -0,31 -1,41 1,10 São João de Meriti 0,60 -0,85 1,46 Niterói 0,58 -0,27 0,85 Rio de Janeiro 0,74 -0,13 0,87 Duque de Caxias 1,67 0,12 1,56 Paracambi 1,18 0,13 1,05 Tanguá 1,27 0,13 1,15 São Gonçalo 1,49 0,28 1,21 Nova Iguaçu 1,97 0,57 1,40 Belford Roxo 2,09 0,65 1,44 Japeri 2,67 0,77 1,90 Queimados 2,37 0,85 1,51 Magé 2,57 1,01 1,56 Itaboraí 3,34 1,74 1,60 Seropédica 2,48 1,74 0,73 Guapimirim 3,44 1,80 1,64 Fonte: Fundação Centro de Informações e Dados do Rio de Janeiro - CIDE.

Uma análise do comportamento dos municípios integrantes da Região

Metropolitana na TABELA 4 mostra que há aqueles cujo saldo migratório durante a

década de 90 do século passado é negativo – apesar de ainda apresentar um

pequeno crescimento anual (menos do que 1%); e aqueles cujo crescimento

populacional ainda supera 2% ao ano. Esses municípios, com exceção de Japeri e

Queimados, apresentam também taxas líquidas de migração acima de 1% ao ano e

configuram claramente uma segunda periferia dentro da periferia metropolitana.

Comparando esses dados com aqueles de municípios que pertencem tanto a

área peri-metropolitana como sua franja – vide TABELA 5 na página seguinte -,

observa-se, em relação aos números da Região Metropolitana e, particularmente, do

município do Rio de Janeiro, que há taxas relativamente altas de crescimento nas

duas regiões costeiras, em particular em alguns municípios da Região dos Lagos. A

Page 18: Migração, urbanização, pendularidade e novas territorialidades.

18

Região Serrana na sua totalidade tem um desempenho pior do que a Região

Metropolitana, mas alguns municípios mostram taxas de crescimento e

deslocamento moderadas acima da média estadual.

TABELA 5

Regiões de Governo Taxa média Taxa líquida de Taxa de crescimento

e municípios geométrica de migração (%) vegetativo (%) crescimento anual (%) Estado 1,30 0,19 1,11Região Metropolitana 1,12 0,06 1,06Rio de Janeiro 0,74 -0,13 0,87Região Serrana* 1,01 -0,13 1,14Petrópolis 1,28 0,21 1,08São José do Vale do Rio Preto 2,47 0,97 1,50Teresópolis 1,51 0,09 1,42Nova Friburgo 0,41 -0,61 1,02Sumidouro 0,99 -0,17 1,15Região das Baixadas Litorâneas 4,31 2,83 1,48Araruama 3,83 2,23 1,61Cachoeiras de Macacu 2,12 1,04 1,07Maricá 5,71 4,49 1,22Rio Bonito 1,07 -0,32 1,39Saquarema 3,68 2,47 1,21Silva Jardim 1,78 0,34 1,44Região Centro-Sul Fluminense 1,19 0,04 1,14Areal 2,08 0,43 1,65Mendes 0,45 -0,40 0,85Miguel Pereira 2,32 1,32 1,00Engenheiro Paulo de Frontin 0,09 -0,69 0,78Paraíba do Sul 1,09 0,06 1,03Paty do Alferes 1,87 0,44 1,43Pinheiral Piraí Rio Claro Três Rios 0,97 -0,37 1,35Vassouras 1,04 -0,17 1,21Região da Costa Verde 3,47 1,48 1,99Angra dos Reis 3,76 1,85 1,91Itaguaí 3,40 0,99 2,41Mangaratiba 3,72 2,35 1,37Fonte: Fundação Centro de Informações e Dados do Rio de Janeiro - CIDE.

Nota-se, assim e ainda sem muito aprofundamento, os movimentos da

população carioca e fluminense na década de 1990 (e aqueles que vieram de fora

do estado), parece que o crescimento populacional – como uma primeira e precária

aproximação ao processo de urbanização – aponta para um novo padrão territorial

Page 19: Migração, urbanização, pendularidade e novas territorialidades.

19

da ocupação urbana; há um deslocamento para áreas urbanas periféricas, tanto no

interior, como – e mais acentuadamente – na franja da Região Metropolitana.

6. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS

Lembramos que nosso ponto de partida foi o questionamento relativo a novas

formas de mobilidades e suas possíveis conseqüências para o futuro das metrópoles

no Brasil e no mundo tendo em conta que já hoje se observa sua expansão para

áreas que ultrapassam as tradicionais fronteiras das regiões metropolitanas. Não foi

a nossa intenção de encontrar e desvendar esses processos em sua concretude;

mas, desenhar um quadro mais geral no qual esse processo está se escrevendo

desde seu começo.

Os fenômenos encontrados na nossa própria investigação e em pesquisas

acerca dessa temática são apenas fracos indícios de uma realidade profundamente

alterada por uma nova qualidade da mobilidade que vem se anunciando na medida

em que a sociedade de consumo no Brasil (que abrange apenas uma parte da

população do país) vai se transformando numa sociedade urbana (pós-moderna).

A análise dos deslocamentos pendulares para além das fronteiras

metropolitanas parece um caminho promissor para avançar na compreensão destes

fenômenos com mostra um mapeamento apresentado por Castello Branco (2005) .

Na análise dos mesmos fluxos de movimentos pendulares por nos investigados,

essa pesquisadora identificou uma rica rede de articulações em torno da metrópole

do Rio de Janeiro como pode ser vislumbrado na seguinte FIGURA 1.

Essas pesquisas estatísticas precisam ser complementadas e balizadas, por

outro lado, por investigações de determinados aspectos das mudanças que são

considerados relevantes e pertencentes para caracterizar qualitativamente as

transformações que apenas estão se anunciando nas áreas peri-metropolitanas. Um

destes aspectos – parcial, mas que pode ilustrar a questão da continuidade ou

ruptura – é a investigação das próprias formas que as ocupações urbanas estão

assumindo nessas áreas peri-metropolitanas.

Page 20: Migração, urbanização, pendularidade e novas territorialidades.

20

FIGURA 1 - Espaço Urbano do Rio de Janeiro – Fluxos de Movimento Pendular excluindo a Metrópole do Rio de Janeiro; Fonte: Castello Branco, 2006: 8

A temática dos condomínios fechados, por exemplo, parece-nos oferecer uma

oportunidade para realizar estudos comparativos entre a proliferação dessa

modalidade de habitação (produto imobiliário) dentro do núcleo e mesmo periferia do

Rio de Janeiro e sua difusão nas áreas semi-rurais ou peri-urbanas nos municípios

do entorno da metrópole (vide, por exemplo, RANDOLPH/LOPES 2006). Uma outra

questão que está presente em uma boa parte dos municípios peri-metropolitanos do

Rio de Janeiro é a da segunda residência e do turismo de fim de semanas. Trata-se

aqui de formas intermitentes de ocupação de residências fora da metrópole que

podem facilmente ser transformada em permanentes; em outras palavras, onde

pode haver uma rápida mudança entre diferentes formas de deslocamentos –

inclusive podem surgir formas até então desconhecidos. As nossas pesquisas

precisam estar, senão preparadas, ao menos alertas para essa possibilidade.

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