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  • OUTROS ENSAIOS

  • Ferreira de Arajo, ponte entreo Brasil e Portugal

    ELZA MINUniversidade de So Paulo

    RESUMO: TEM-SE EM VISTA CHAMAR A ATENO PARA A FIGURA UM TANTO ESQUECI-

    DA DE FERREIRA DE ARAJO E PARA A INTENSA AO CULTURAL POR ELE EXERCIDA

    ATRAVS DAS PGINAS DA GAZETA DE NOTCIAS DO RIO DE JANEIRO (1875-1900).

    ESTE JORNAL, ALM DE VIA DE ACESSO A INTERPRETAES DO DESENVOLVIMENTO

    SOCIO-CULTURAL BRASILEIRO NO LTIMO QUARTEL DO SCULO XIX, PODE TAMBM SER

    VISTO, DADA A EXPRESSIVA PARTICIPAO NELE MANTIDA POR ESCRITORES PORTUGUE-

    SES, COMO UM ESPAO PRIVILEGIADO PARA A CONSIDERAO DAS RELAES CUL-

    TURAIS BRASIL/PORTUGAL NESTE PERODO.

    RESUMEN: SE PRETENDE LLAMAR LA ATENCIN HACIA LA FIGURA UN TANTO OLVIDADA

    DE FERREIRA DE ARAJO Y HACIA LA INTENSA ACCIN CULTURAL POR L EJERCIDA A

    TRAVS DE LAS PGINAS DE LA GAZETA DE NOTCIAS DE RO DE JANEIRO (1875-1900).

    ESTE PERIDICO, ADEMS DE VA DE ACCESO A INTERPRETACIONES DEL DESARROLLO

    SOCIO-CULTURAL BRASILEO EN EL LTIMO CUARTO DEL SIGLO XIX, PUEDE TAMBIN

    SER VISTO, DADA LA EXPRESIVA PARTICIPACIN EN L MANTENIDA POR ESCRITORES

    PORTUGUESES, COMO UN ESPACIO PRIVILEGIADO PARA LA CONSIDERACIN DE LAS

    RELACIONES CULTURALES BRASIL/PORTUGAL EN ESTE PERODO.

    PALAVRAS-CHAVE: FERREIRA DE ARAJO; PERFIL INTELECTUAL; GAZETA DE NOTCIAS,

    RELAES CULTURAIS BRASIL/PORTUGAL; IMPRENSA BRASILEIRA (1875-1900)

    PALABRAS-CLAVE: FERREIRA DE ARAJO; PERFIL INTELECTUAL; GAZETA DE NOTCIAS; RELA-

    CIONES CULTURALES BRASIL/PORTUGAL; IMPRENTA BRASILEA (1875-1900)

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    Um resgate necessrio

    Para termos bem presentes o prestgio e o papel de fundamental impor-tncia desempenhado na imprensa brasileira pela Gazeta de Notcias, no lti-mo quartel do sculo XIX e incios do sculo XX, bem como da intensa aocultural exercida atravs de sua pginas por seu co-fundador, co-proprietrioe redator-chefe, Ferreira de Arajo, bastaria evocar as palavras de OlavoBilac (colaborador regular da folha carioca desde abril de 1890), por ocasioda inaugurao de um monumento erigido em memria de Ferreira de Ara-jo, em 1905, cinco anos aps a sua morte:

    Se j temos, ns, os que escrevemos, um pblico, pequeno, mas inteligente,

    devemo-lo, em grande parte, a esse mestre exemplar, que, num tempo em que

    a imprensa diria ainda era um luxo caro, decidiu coloc-la ao alcance de todos,

    barateando-a, e popularizando-a.

    Foi ele quem chamou ao jornal a gente moa, que se ensaiava nas letras. Na Gazeta

    de Notcias, que possua a colaborao preciosa de Machado de Assis, de Ea de

    Queirs e de Ramalho Ortigo, comearam a aparecer os rapazes cheios de

    talento, mas ainda sem nome, que daquelas colunas se impuseram ao pblico [...]

    Foi tambm na Gazeta que os pintores, os escultores, os msicos encontraram

    sempre defesa, amparo, propaganda. Ferreira de Arajo adorava todas as artes[...]1

    Nas pginas da Gazeta de Notcias, entre os textos de homenagem a Ferreirade Arajo, por ocasio de sua morte, a maioria deles ainda por resgatar, seinclui o depoimento cheio de admirao de Machado de Assis, sob forma decarta a Henrique Chaves, com data de 21 de setembro de 1900, hoje recolhi-do em livro2, em que se l:

    [...] Agora que ele se foi, podemos avaliar bem as qualidades do homem. Esse

    polemista no deixou um inimigo. Pronto, fcil, franco, no poupando a ver-

    1 Crnica, Kosmos, Rio, 1905, p.3, reproduzido em BILAC, Olavo, Vossa Insolncia: crnicas. Anto-nio Dimas, org.. So Paulo, Companhia das Letras, 1996, p.187-9.2 MACHADO DE ASSIS, J.M. Obra Completa. Rio, Aguilar, 1962,v.3, p.1019-1021.

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    dade, no infringindo a cortesia, liberal sem partido, patriota sem confisso,

    atento aos fatos e aos homens, cumpriu o seu ofcio com pontualidade, largue-

    za de nimo e aquele estilo vivo e conversado que era o encanto dos seus

    escritos. As letras foram os primeiros ensaios de uma pena que nunca as esque-

    ceu inteiramente. O teatro foi a sua primeira seduo de autor.

    Vindo imprensa diria, no cedeu ao acaso, mas prpria inclinao do

    talento. Quando fundou esta folha, comeou alguma cousa que , trazendo vida

    nova ao jornalismo, ia tambm com o seu esprito vivaz e saltitante, de vria

    feio, curioso e original. J est dito e redito o efeito prodigioso desta folha,

    desde que apareceu; podia ser a novidade, mas foram tambm a direo e o

    movimento que ele lhe imprimiu.[...]

    Nos incios da dcada de 80, no tempo em que Mariano Pina que substi-tuiu Guilherme de Azevedo, era correspondente da Gazeta de Notcias emParis (1880-1882) e em que Ea de Queirs comeava a publicar em suaspginas as Cartas de Inglaterra (1880-1882), nelas tambm j encontra-mos, para citar apenas alguns, Valentim Magalhes, Machado de Assis,Domcio da Gama, alm do j citado Ramalho Ortigo, com suas CartasPortuguesas, e que ali realizou , em 1878, o que hoje chamaramos de co-bertura da Exposio Universal de Paris, textos que depois integraram ovolume Notas de viagem.

    Alis, foi a convite de Ferreira de Araujo que Ramalho Ortigo visitou oBrasil em 1887, vindo a So Paulo em 3 de outubro, onde chegou na Estaodo Norte para contatos e visitas, e onde o esperava o poeta Olavo Bilac, con-forme dados registados no jornal A Provncia de S. Paulo (hoje O Estado de SoPaulo). No Rio, participou da inaugurao do Gabinete Portugus de Leitura ,tendo sido o seu discurso reproduzido em rgos de imprensa brasileiros. Avisita de Ramalho teve, assim, um carter nitidamente institucional: era umvisitante ilustre, atuando como representante das letras portuguesas no Brasil.

    Retomando o fio, se de um lado, como j lembrado, se fez notrio o empe-nho de Ferreira de Araujo em prol de uma democratizao da imprensa,mediante o barateamento do jornal (a Gazeta, quando de seu aparecimentoem 2 de agosto de 1875 custava 40 ris o nmero avulso, que passou a servendido diretamente ao pblico) e tambm o seu apoio a toda uma geraoliterria e artstica nacional, de outro, os prprios nomes anteriormente cita-

    DaianeRealcedemocratizao da imprensa

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    dos, a que se poderia juntar ainda, pelo menos os de Jaime Batalha Reis e deOliveira Martins, este ltimo responsvel pelos balanos dos anos de 1886 a1888 e 1890, relativamente Europa, do contas do estreito relacionamen-to que manteve com escritores portugueses, atravs da Gazeta.

    Numa espcie de gesto reivindicatrio, parece-me relevante e oportunoque se resgate a figura um tanto esquecida de Ferreira de Arajo, e que seveja a Gazeta, no apenas enquanto suporte da produo de um Ea, de umMachado, que responsvel por perto de 500 crnicas (1883 a 1897), masenquanto um projeto jornalstico brasileiro, articulado s bases de reflexode seu editor-redator, exibindo direcionamentos de sua ao scio-cultural frente da publicao, num tempo em que os jornais, muito mais at do quehoje, nos revelavam talvez mais flagrantemente particularidades das socie-dades que os produziam. Assim sendo, acreditamos que a Gazeta possa servista como uma via de acesso privilegiada a interpretaes do desenvolvi-mento scio-cultural no Brasil oitocentista e espao onde relaes culturaisBrasil/Portugal tm lugar.

    No que diz respeito ao primeiro aspecto evocado, lembremo-nos que, nosanos 70 e 80 do sculo XIX, o Brasil vivia uma poca politicamente agitada,em que se discutia nosso futuro como nao, cujos ecos ressoam nas pginasdo jornal carioca. Alis, a coluna de Ferreira de Arajo Cousas Polticas(1883-1885) nos fornece elementos para apreender e discutir o engajamentoda Gazeta nos debates polticos e sociais prioritrios nesse perodo. Revela,por outro lado, a inegvel propenso de Ferreira de Arajo para o humor,com a procura da nota cmica, e respectivas estratgias discursivas, Noestranha, assim, a grande admirao sentida por Ea de Queirs, de quemfoi grande amigo. Em ambos, a mesma f e adeso ao riso que peleja, parausar uma expresso queirosiana.

    Tambm ser este o ingrediente bsico na contribuio de Ferreira de Ara-jo para a seo Balas de Estalo, publicada de 1883 a 1886, em que figuracom o pseudnimo de Lulu Snior. Entre os colaboradores da referida seocontamos ainda com Henrique Chaves, Machado, Valentim Magalhes, to-dos eles tambm com pseudnimos.

    Presentemente, no obstante as diferenas entre as tradies historiogr-ficas, marcante em todas elas o interesse pelo resgate de trajetrias singu-lares. Nota-se, tambm, que um nmero significativo de historiadores pro-

    DaianeRealceprojeto jornalstico da GN

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    cura pensar a articulao entre as trajetrias individuais examinadas e oscontextos nos quais estas se realizaram como uma via de mo dupla, semcair nem no individualismo exacerbado ( como nas biografias tradicionais,do tipo a vida dos grandes vultos) nem na determinao estrutural estri-ta3. Esta a orientao que vimos seguindo. Esclarea-se, ainda, que no tra-ado de nosso perfil intelectual de Ferreira de Arajo estamos procurandocompreender o dilogo por ele estabelecido com a produo intelectual eartstica de seu tempo e buscando uma avaliao de seu papel como agentecultural. Assim sendo, seus posicionamentos em face da literatura e da crti-ca, suas relaes com as artes, esto sendo buscados em seus prprios escri-tos, em testemunhos de contemporneos, correspondncias, papis pesso-ais, artigos sobre o jornalismo do perodo e histrias da imprensa.

    Uma janela para o mundo: a rede de correspondentes estrangeiros

    A Gazeta primava pelo cuidado extremo com que mantinha sua rede decorrespondentes (na Frana, na Itlia, na Alemanha, em Portugal),despendendo , para tanto, somas considerveis, conforme ecos encontradosnas cartas de Elsio Mendes ( um de seus diretores), Ea e Batalha Reis,depositadas na Biblioteca Nacional de Lisboa. E na qualidade de corres-pondentes que, na literria Gazeta, como a chamaram, se inscreve um rolilustre de intelectuais e escritores portugueses que de Londres, de Paris, deLisboa, enviam suas matrias para o Rio de Janeiro. Tal fato traz como con-seqncia, como dissemos no incio, que a Gazeta de Notcias, no ltimo quar-tel do sculo XIX, se constitua num espao privilegiado para o estudo dapresena portuguesa na nossa imprensa peridica, bem como para o estudodas relaes literrias Brasil/Portugal.

    Assim que, em 1880, Guilherme de Azevedo, o poeta celebrado de AlmaNova, mudou-se para Paris, para ali desempenhar as funes de corresponden-te do referido jornal carioca, cargo em que permanece at 1882. Por essa altu-

    3 SCHMIDT, B.B. Construindo biografias...Historiadores e Jornalistas, in Estudos Histricos.Indivduo,Biografia, Histria. Rio de Janeiro, Fundao Getlio Vargas Editora, v.10, n.19, 1997, p.3-21

    DaianeRealceportugueses

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    ra, Ea de Queirs ali comeava a publicar as suas Cartas de Inglaterra e ValentimMagalhes, Machado de Assis e Domcio da Gama eram alguns dos brasileirosque ento tambm assinavam colaboraes. Da Frana, Guilherme de Azeve-do enviou para publicao, 28 Cartas de Paris, 8 Crnicas de Paris, boaparte delas reproduzidas no Dirio da Manh, de Lisboa, alm de numerososCorreios de Frana, que eram publicados sem assinatura.4 Com a sua morte,Mariano Pina substituiu-o na funo, de 1882 a 1886 .

    De Portugal, vinham as j mencionadas Cartas Portuguesas de RamalhoOrtigo. Como correspondente em Lisboa, Ramalho assinou mais de 500matrias na Gazeta, de 1879 a 1915 ( com intervalos), sendo aproximada-mente 200 ainda inditas em livro.5

    Voltando-nos agora para Jaime Batalha Reis, observamos que ele colabo-rou na Gazeta de Notcias desde 8 de fevereiro de 1892 at 18 de fevereiro de1896, incluindo-se a maioria das matrias produzidas (que aparecem compseudnimos e, algumas, sem assinatura) no terreno das artes e especial-mente da msica, de que era grande conhecedor, alm das que, j reunidasem livro, correspondem a uma viso da Inglaterra, onde foi correspondentepara o jornal do Rio.6

    Alis, foi da Inglaterra que estabeleceu a ponte com o Brasil, primeiroatravs da Gazeta e depois pela via diplomtica (Batalha foi cnsul em Lon-dres de 14-05-1898 a 27-03-1911). Por este canal, realizou contatos, fezamigos, teve oportunidade de obter livros e discutir autores, compartilharimpresses e inteirar-se de um Brasil pensante e literrio. Foram os amigosbrasileiros, com quem conviveu assiduamente durante 4 ou 5 anos, que lhedespertaram o interesse pelo pas e pela literatura brasileira. Em seu esplio,depositado na Biblioteca Nacional de Lisboa, encontram-se os ecos de umaconvivncia prxima com Joaquim Nabuco, Graa Aranha, Domcio da Gama,

    4 Joo Carlos Zan, em sua dissertao de mestrado, Guilherme de Azevedo na Gazeta de Notcias,defendida na USP (rea de Estudos Comparados de Literaturas de Lngua Portuguesa) em 1998,coligiu e preparou uma edio anotada desse material.5 Joo Carlos Zan levantou e vem estudando essas colaboraes, para sua tese de doutoramento, emelaborao, a ser apresentada na USP, com o ttulo de Ramalho Ortigo e o Brasil.6 REIS, Jaime Batalha. Revista Inglesa. Crnicas, org., introd. e notas de Maria Jos Marinho. Lisboa,Publicaes D.Quixote / Biblioteca Nacional, 1988.

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    Eduardo Prado, Tristo da Cunha, Magalhes Azeredo, Alusio de Azevedo,Cardoso de Oliveira e Manuel de Oliveira Lima7.

    Em 1904, nasceu seu projeto de apresentao e discusso, pela imprensaportuguesa, da literatura e da cultura brasileiras que denominou: O descobri-mento do Brasil intelectual pelos portugueses do sculo XX 8. O processo de recep-o da literatura brasileira v-se, em Batalha Reis, centrado na questo daimagem que faz do pas, do povo sendo este um fator que antecede, permeiae at mesmo direciona o dilogo crtico que estabelece com os textos deautores brasileiros.

    Quanto a Ea de Queirs, alm de A Relquia, dos dois ltimos captulos deOs Maias, das Notas e recordaes e de algumas cartas de Fradique Mendese de uns poucos contos, publicou ele, atravs das pginas da Gazeta de Notcias,58 textos de imprensa completos, estampados em 116 nmeros do jornal, de1880 a 1897 (embora com intervalos), hoje reunidos num s volume na ediocrtica das suas obras9. Ea foi ainda o mentor e o responsvel pela criao doSuplemento Literrio daquela folha Rio de Janeiro, o primeiro do gnero queno Brasil se editou. De toda a sua produo jornalstica, a mais representativa, sem dvida, a que se registra na Gazeta e que constitui o que se pode consi-derar a obra jornalstica do autor, pensada e elaborada tendo em vista o pbli-co brasileiro, por meio de um mesmo e nico veculo.

    Uma imagem do pas e do brasileiro se inscreve, sem dvida, nesses textosjornalsticos. Mas uma imagem esgarada, fragmentria, pouco ntida, pro-jetada por um olhar que nunca deixou de ser eminentemente eurocntrico.Assim, tanto o Brasil de Ea , como o de Batalha Reis um Brasil entrevisto.

    Voltando a Mariano Pina, antes mencionado, tenha-se em conta quefocaliz-lo , de certo modo, encarnar e reunir, numa s figura, trs pontosque so importantes para o exame das relaes Brasil/Portugal no ltimoquartel do sculo XIX: a considerao da Gazeta de Notcias como rgo queacolhe e irradia uma forte presena portuguesa na imprensa brasileira do

    7 Esta correspondncia, por mim preparada, ser publicada brevemente.8 V. REIS, Jaime Batalha. O descobrimento do Brasil intelectual pelos portugueses do sculo XX,org.,pref., e notas de Elza Min. Lisboa, Publicaes D.Quixote, 1988.9 QUEIRS, Ea de. Textos de imprensa IV (da Gazeta de Notcias), edio de Elza Min e NeumaCavalcante. Lisboa, Imprensa Nacional / Casa da Moeda, 2002, 685p.

    DaianeRealceEa

    DaianeRealceimagem do Brasil

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    perodo; o fato de ser Paris um ponto de encontro entre intelectuais e diplo-matas portugueses e brasileiros, sobretudo no ltimo decnio do sculo XIX;a criao de revistas ilustradas para circulao simultnea nos dois pases.

    De fato, se Mariano Pina (1860-1899) destacou-se no jornalismo portugus,emprestando sua colaborao a vrias publicaes lisboetas: Dirio do Comr-cio, Dirio da Manh, Dirio Popular, Nacional, Correio Nacional, Espectro, no nos-so caso, interessam especialmente duas funes por ele desempenhadas nomundo da imprensa e que atestam sua relao com o Brasil: uma , j referida,a de correspondente em Paris da Gazeta de Notcias, do Rio, de 1882 a 1886 eoutra, a de criador de A Ilustrao: revista de Portugal e do Brasil (1884-1892),publicada em Paris at 20 de Outubro de 1890 e em Lisboa apenas na faseterminal (o ltimo nmero de 1 de Janeiro de 1892).

    A Ilustrao est entre outras publicaes peridicas que se produzirampara distribuio simultnea em Portugal e no Brasil, veculos importantesde divulgao de matrias de autoria de escritores e intelectuais de ambos oslados do Atlntico, irmanados pela lngua comum e freqentemente unidospelos laos de uma convivncia amiga mantida na Frana ou mesmo, maisamplamente, na Europa (que repercute em cartas e outros documentos dapoca). Outras revistas do gnero a destacar seriam: Dois Mundos (1877-1881) de Salomo Saragga; A Revista (1893) dirigida por Jos Barbosa e Jor-ge Colao; a Revista Moderna (1897) do brasileiro Arruda Botelho10

    A Ilustrao: revista de Portugal e Brasil teve largo mbito de difuso, chegan-do a uma tiragem de 16.000 exemplares. Publicou-se quinzenalmente emParis at 20 de outubro de 1890 e em Lisboa apenas na fase terminal (oltimo nmero de 1 de janeiro de 1892).11 Das relaes de A Ilustrao com

    10 Alexandra Alba Picone Jardim apresentou, em 2000, na rea de Estudos Comparados de Literaturasde Lngua Portuguesa da USP, uma dissertao de Mestrado em que estuda esta publicao, sob o ttulo:A Revista Moderna (1897-1899): uma publicao brasileira em Paris.11 Na verdade, o mapeamento das colaboraes brasileiras na publicao revela uma presenaquantitativamente diminuta, predominantemente constituda pela publicao de poemas, exceo feita aalguns contos de Domcio da Gama ( com quem Pina convivera em casa de Ea), Artur Azevedo, DuqueEstrada e Valentim Magalhes, de quem Mariano Pina se valeu para conseguir colaboraes para a suarevista, e que em 1896 publicaria em Portugal, pela Parceria Pereira, o volume A Literatura Brasileira.Dentre os poetas, Olavo Bilac vem de longe frente, mas ali tambm figuram Lus Guimares, Gonal-ves Crespo, Lus Murat, Lus Delfino, Silvestre Lima.

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    a Gazeta de Notcias, dei contas no artigo Mariano Pina, a Gazeta de Notciase A Ilustrao: histrias de bastidores contadas por seu esplio.12

    Para finalizar, gostaria de apontar que , se Marialva Barbosa13, enfatiza acolaborao de literatos brasileiros, chamando a ateno para a colaboraode Machado de Assis, mas tambm para as crnicas de Olavo Bilac e ArturAzevedo e para as Cartas Literrias de Raul Pompia, Silva Jardim e AdolfoCaminha, meu intuito ressaltar a presena portuguesa em suas pginas.

    Num e noutro caso, no entanto, concretiza-se o destaque dado literatu-ra, j anunciado no prospecto de lanamento, onde se l: alm de um folhe-tim romance, a Gazeta de Notcias todos os dias dar um folhetim da atualida-de. Arte, literatura, teatros, modas, acontecimentos notveis, de tudo a Ga-zeta de Notcias se prope a trazer ao corrente os seus leitores.

    Examinar as linhas mestras dessa publicao que , num tempo de mudan-as radicais no Brasil, rene uma constelao de colaboradores dos dois la-dos do Atlntico, considerando de modo particular a contribuio portugue-sa, assim como traar o perfil intelectual de seu animador, agente cultural, ejornalista no mais amplo sentido do termo, Ferreira de Arajo, so tarefas aque nos propomos em nosso projeto em processo, desenvolvido na rea deEstudos Comparados das Literaturas de Lngua portuguesa da Universidadede So Paulo e de que apresentamos breve notcia.

    Do ponto de vista da crtica a autores brasileiros, na seo Crnica, Mariano Pina focaliza aCasa de Penso de Alusio de Azevedo, para cujo enquadramento recorre a Ea e a Flaubert. LouisUlbach, em 1887, assina um artigo de comentrio geral a que intitula A Literatura no Brasil. Odiscurso de Ramalho Ortigo por ocasio da inaugurao do Gabinete Portugus de Leitura do Rio deJaneiro, antes referido, vem integralmente transcrito nas pginas da revista, bem como o artigo polmicode Eduardo Prado, publicado na Revista de Portugal de Ea de Queirs, Destinos polticos do Brasil.Acompanha-o uma nota do editor em que, prevendo que o artigo iria certamente levantar grandediscusso na imprensa do Imprio, pela crueza da anlise e pela frieza das observaes, procuraenfatizar que o autor se nos revela como um crtico e como escritor de primeira ordem, manejando naperfeio a lngua portuguesa. Ea de Queirs, anos depois, em 1898, na Revista Moderna, embelssimo artigo, procurou contemporizar a veemncia dos ataques de Prado, explicando-os pelo amorao passado, pelo medo de desaparecimento do velho Brasil12 Revista da Biblioteca Nacional, Lisboa. S.2.vol.7, 1992, p. 23-61, reproduzido em MIN, Elza, Pginasflutuantes. Ea de Queirs e o jornalismo no sculo XIX. Cotia, SP, Ateli Editorial, 2000, p. 195 - 242.13 BARBOSA, Marialva. Os donos do Rio. Imprensa, Poder e Pblico. Rio de janeiro, Vcio de Leitura,2000.

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