Minho Cultura

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Page 1: Minho Cultura

Pelotas, RSDezembro,

2006

57

ISSN 1516-8832

Autores

Gustavo SchiedeckEng. Agrôn., Dr.,

Embrapa Clima Temperado,Cx. Postal 403, 96001-970,

Pelotas, RS

Márcio de MedeirosGonçalves

Eng. Agrôn., M.Sc.,Embrapa Clima Temperado,

Cx. Postal 403, 96001-970,Pelotas, RS

José Ernani SchwengberEng. Agrôn., Dr., EmbrapaClima Temperado, CP 403,

96001-970, Pelotas, RS

Minhocultura e produção de húmuspara a agricultura familiar

1. Introdução

Os agricultores sempre foram ótimos observadores da natureza edesde muito tempo aprenderam a diferenciar, à sua maneira, ossolos pobres dos solos férteis. Um dos principais elementos queajudava nessa diferenciação era a presença de minhocas: suaexistência nas áreas de cultivo era geralmente associada àsmelhores produções. Infelizmente, as modernas técnicas intensivasde preparo e manejo do solo promoveram a degradação das terras,reduzindo seus teores de matéria orgânica e, conseqüentemente, apopulação de minhocas nos campos.

Com o desgaste do atual modelo de produção agrícola apoiado nouso intensivo de insumos externos às propriedades rurais, surgiu anecessidade de uma nova forma de fazer agricultura, baseada empráticas que, além de técnica e economicamente viáveis, sejamadequadas do ponto de vista ambiental e incentivadoras daautonomia dos agricultores.

Dentro deste contexto, a Agroecologia impulsionou a produção deadubos orgânicos de qualidade e as minhocas passaram a sernovamente reconhecidas como parte fundamental no processo dereciclagem dos nutrientes nas propriedades rurais, em especialaquelas que trabalham com a integração entre plantas e animais.

Há uma série de benefícios em produzir e utilizar o húmus deminhoca ou vermicomposto. De uma forma geral, é possível fazerhúmus de qualquer material que se decomponha; logo, qualquerresíduo orgânico disponível e não aproveitado na propriedaderural pode ser utilizado. O húmus de minhoca, que nada mais é doque as excreções da minhoca, quando aplicado ao solo, atua deforma benéfica sobre suas características físicas, químicas ebiológicas, favorecendo a sua conservação e auxiliando odesenvolvimento das plantas.

A minhocultura é a criação racional de minhocas, sob condiçõesminimamente controladas, com o objetivo de produzir húmus paraadubação orgânica. Embora seja uma atividade perfeitamenteadaptada à pequena escala de produção, por sua simplicidade demanejo, a sua expansão na propriedade familiar, como fontealternativa de renda, dependerá apenas do espaço físico dominhocário e da disponibilidade da matéria orgânica e mão-de-obra.

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2 Minhocultura e produção de húmus para a agricultura familiar

Essa trabalho irá apresentar as principaistécnicas para a criação de minhocas napequena propriedade rural, com oobjetivo de obter húmus de qualidadepara a adubação orgânica, bem comorecomendar as melhores formas deutilização na horta, pomar e na lavoura.

2. A minhoca

Acredita-se que no mundo todo existammais de 8 mil espécies diferentes deminhocas. No Brasil, são conhecidas entre240 e 260 espécies, sendo sua grandemaioria minhocas nativas. Contudo, aespécie mais utilizada para a produção dehúmus no mundo todo é a Vermelha-da-Califórnia (Eisenia fetida Savigny).

A minhoca Vermelha-da-Califórnia é apreferida para a produção de húmus pois,além de se adaptar facilmente àscondições de cativeiro, apresenta umagrande capacidade de produção dehúmus e uma alta velocidade dereprodução. Esta espécie consegueconsumir diariamente o equivalente aoseu peso em matéria orgânica e produzum casulo a cada 3 a 7 dias, contendo emseu interior entre 2 e 5 novas minhocas.

Figura 1. Aspecto externo do corpo de umaminhoca, Vermelha-da-Califórnia.

Há uma crença popular equivocada deque ao cortar uma minhoca ao meio, aspartes se regeneram dando origem a duasminhocas. No primeiro anel de seu corpoa minhoca tem a boca (lado mais próximodo clitelo) e no último anel ela tem oânus, por onde é expelido overmicomposto. Dependendo do lugar

onde ocorre o corte, existe uma chance dametade anterior se regenerar e a minhocapermanecer viva, mas, com certeza, a outrametade irá morrer. A parte anterior podesobreviver por que todos os órgãos vitaisda minhoca estão próximos da boca e doclitelo. O clitelo é a região do corpo daminhoca que se parece com um colar, umpouco mais saliente, de cor mais clara eque é responsável pela formação do casuloque contém em seu interior as novasminhocas. Quanto mais distante da regiãodo clitelo for o corte, maior a chance daminhoca sobreviver. Seja como for, éimportante salientar que qualquer lesão nocorpo da minhoca é sempre prejudicial enão há benefício algum em termos deprodução de húmus ou de casulos.

Com relação à reprodução, as minhocassão hermafroditas, ou seja, possuem osórgãos sexuais masculinos e femininos nomesmo indivíduo. Entretanto, para atingirbons níveis de reprodução, a Vermelha-da-Califórnia precisa se acasalar com outraminhoca da sua espécie. Além disso, parase reproduzirem, as minhocas precisamestar na idade adulta, o que pode serverificado pela presença do clitelo bemdesenvolvido. Em geral, esta fase éatingida entre os 40 e 60 dias de vida.

As minhocas não possuem olhos nemouvidos e por isso seu sentido de direçãonão é muito bom. Sua movimentação émuito influenciada por células sensíveis àluz que existem em sua pele. Em geral,evitam a luz direta do sol, preferindo osambientes sombreados e mais úmidos.

Mesmo preferindo locais com maiorumidade, as minhocas não toleramambientes encharcados, pois suarespiração é feita pela pele. Em lugaresonde há acúmulo excessivo de água, atendência é de haver pouco oxigênio.Nestes casos, é comum vermos asminhocas saindo do solo para procurarlocais mais secos.

Os sentidos mais desenvolvidos nas

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3Minhocultura e produção de húmus para a agricultura familiar

Figura 2. Minhocário de alvenaria na Estação Experimental Cascata, Embrapa ClimaTemperado, Pelotas, RS.

minhocas são o paladar e o tato. Essessentidos são importantes, pois as ajudama localizar os alimentos que mais lheagradam, a identificar parceiros para oacasalamento e a fugir dos predadores.

3. A criação

3.1. Escolha do local e construção dominhocário

Existem vários tipos de minhocário: dosmais simples, montados apenas com asleiras de matéria orgânica no própriochão, até os mais caros, feitos comcanteiros de tijolos e piso de concreto. Épossível também aproveitar instalações jáexistentes na propriedade, como galpões e

paióis. Na Figura 2, pode-se ver umminhocário de alvenaria, construído emum galpão reformado, que era uma antigabaia de animais.

Para agricultores familiares, que nãopretendem vender comercialmente ohúmus produzido, mas apenas utilizá-lonas atividades da propriedade, o maisindicado é fazer um minhocário de baixocusto e pouca manutenção, que possaservir para produzir húmus a partir doesterco dos animais e dos restos de frutase verduras da horta da propriedade. NaFigura 3 pode-se ver um minhocário feitocom materiais simples e de fácil obtenção,provando a viabilidade deste tipo deestrutura.

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4 Minhocultura e produção de húmus para a agricultura familiar

O minhocário “campeiro” pode sermontado sobre o chão capinado, armandouma estrutura de bambus tramados, o quedispensa o uso de arames, barbantes oupregos. As laterais têm por finalidadedelimitar o espaço da criação, facilitar oescoamento da água da chuva e conter oesterco. Desta forma, a minhoca podeaproveitar melhor o material orgânicofornecido.

Este tipo de instalação precisa ser muitobem localizada, pois é necessário protegero minhocário da chuva e do sol direto.Uma alternativa é montá-lo na sombra deuma árvore, num terreno que apresenteuma leve declividade. Assim, evita-se oencharcamento da área, a lavagem dosnutrientes do húmus e a insolação diretanas horas mais quentes do dia. É desejáveltambém proporcionar uma cobertura depalha sobre o minhocário, para melhorarestas condições sempre que possível.

Figura 3. Minhocário “campeiro”, construído com bambu, na Estação ExperimentalCascata, Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS.

O tamanho do minhocário vai depender daquantidade e constância de alimentodisponível para as minhocas. Para reduziro trabalho, é importante que fiquelocalizado próximo da fonte de água e dealimento, bem como da área onde sepretende usar o húmus posteriormente.Esta é uma outra vantagem do minhocário“campeiro”: é possível montar váriasunidades em diferentes pontos dapropriedade ou mudá-lo de local sempreque necessário, acompanhando as áreasde cultivo que estão em rotação. Contudo,é importante observar que os minhocáriosao ar livre nunca fiquem próximos ariachos ou poços de água, pois o chorumedo esterco pode contaminar a água dapropriedade.

Em geral, não se recomenda fazer umminhocário com mais de 1 m de largura,porque isto dificulta o manejo do canteiro.Por sua vez, o comprimento pode variarcom o espaço e alimento disponível.

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estercos podem fermentar e elevar suatemperatura, afugentando ou mesmomatando as minhocas. O esterco deveestar semi-curtido, ou seja, é preciso fazeruma pré-compostagem antes de oferecê-loàs minhocas. Para tanto, deve-se montaruma pilha de 30 cm de altura com oesterco a ser preparado e emparelhar oseu topo. A pilha deve ser umedecidaperiodicamente para que nunca fiqueressecada externamente, evitando, porém,o escorrimento do chorume, pois, nestecaso, perde-se uma grande parte dosnutrientes. A cada 2 ou 3 dias, o monte deesterco deve ser revirado, invertendo aparte de baixo com a parte de cima. Paracertificar-se que a umidade ideal para oprocesso está sendo mantida, pode-seusar a seguinte relação: 10 L de estercodevem pesar entre 6 e 7 kg. O processo depré-compostagem do esterco pode seestender por 15 a 25 dias, conforme ascondições climáticas.

Para poder ser usado, a temperatura doesterco não deve ser superior a 30°C. Épossível ter uma idéia aproximada destatemperatura enfiando uma barrinha deferro de construção no monte de esterco,mantendo-a por um período de 30 a 60minutos. Se ao final deste tempo não forpossível segurá-la na mão, o esterco aindaestá muito quente e não deve ser usado.

O pH, parâmetro que indica a acidez, éoutro fator que pode impedir apermanência ou a sobrevivência dasminhocas no esterco, especialmentequando este for muito ácido. Na Tabela 1são apresentados os principais parâmetrosdo alimento para o desenvolvimento dasminhocas.

3.1. Alimentação e manejo do minhocário

Uma das maiores dificuldades dominhocultor iniciante é conseguir alimentode forma constante para as minhocas.Assim, antes de iniciar a construção dominhocário, é importante certificar-se dadisponibilidade e volume de alimento,para evitar a fuga ou morte das minhocasdurante determinados períodos do ano.

Independente do alimento que será dadoàs minhocas, é essencial que o mesmoesteja limpo de qualquer resíduo estranho,como pedras, pedaços de plástico ou devidro. Se o material que será fornecidoficou guardado ao ar livre, também énecessário verificar se não há neleminhocas de espécies diferentes daVermelha-da-Califórnia (compare a cor e otamanho de indivíduos adultos), aranhas,formigas ou outros insetos.

A minhoca Vermelha-da-Califórnia sealimenta de praticamente qualquerresíduo de origem animal ou vegetal.Dentre os materiais mais usados, estão osestercos e os restos de culturas. O estercobovino é o mais utilizado na produção dehúmus, por sua grande aceitação pelasminhocas e pela facilidade de ser obtidonas propriedades familiares. Também épossível usar estercos de outros animais,como porcos, aves, cavalos, ovelhas oucoelhos. Contudo, estes requerem algunscuidados adicionais antes de seremofertados às minhocas e por isso somentesão indicados para os minhocultores commaior experiência.

Ao contrário do que muitos pensam, não érecomendado alimentar as minhocas comestercos “verdes”. Neste estado, os

Tabela 1. Parâmetros biológicos das minhocas conforme as condições de temperatura,umidade e pH do alimento.

Fonte: adaptado de Turruella et al., 2002 e González et al., 2004.

Parâm etro M orte Redução de atividade

Atividade norm al

Faixa ótim a

Atividade norm al

Redução de atividade

M orte

Tem peratura ºC) < 0 0-6 7-14 15-27 28-33 34-42 > 42 Um idade (% ) < 50 70-74 75-79 80-85 86-88 88-90 > 90 pH < 5 6,0-6,4 6,5-6,8 6,9-7,9 8,0-8,4 8,5-9,0 > 9

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6 Minhocultura e produção de húmus para a agricultura familiar

Caso haja dúvida se o alimento está ounão em condições de ser fornecido àsminhocas, é possível fazer um testesimples e definitivo: coloque cerca de 300g do alimento em um recipiente (um vasofeito de garrafa PET de 2 L, por exemplo) elargue na superfície umas 10 minhocasadultas, deixando que elas própriasentrem no material. Após 24 horas, vire ovaso e conte o número de minhocas. Setodas as minhocas tiverem permanecido,é sinal que o material está pronto para serusado na alimentação, mas se houver umadiferença grande em relação ao númeroinicial de minhocas ou se as mesmasapresentarem algum sintoma estranho,como pouca movimentação ou corpoamolecido, significa que o material precisaser compostado por mais alguns dias. Esteteste deve ser repetido tantas vezesquantas forem necessárias, para se tercerteza da aceitação do alimento pelasminhocas.

Após este preparo inicial e a confirmaçãoda aceitação das minhocas, é hora deabastecer os canteiros. A forma mais fácile prática de manejar a alimentação é nosistema de camadas. Uma camada inicialde 20 cm de esterco é colocada nocanteiro juntamente com a populaçãoinicial de minhocas. Para uma camada de20 cm de altura e 1 m² de superfície,recomenda-se uma população inicial de1000 a 1200 minhocas adultas.

A segunda camada de 20 cm é colocadasomente quando a primeira tiver sido todaconsumida. Assim, as minhocas tendem amigrar da camada de baixo para a decima, onde há alimento novo.Posteriormente, esta prática facilitará aretirada das minhocas para a coleta dohúmus pronto. A colocação das camadasseguintes segue esta mesma lógica, ouseja, apenas é colocada a próxima quandoa anterior já tiver sido transformada emhúmus. Podem ser colocadas tantascamadas quantas se achar necessário,mas em geral, montes muito altosdificultam um pouco o manejo do húmus,

especialmente no controle da umidade.Neste sistema de manejo, cinco a seiscamadas de 20 cm resultarão em umapilha de húmus pronto deaproximadamente 60 cm de altura.

Durante o processo de produção dehúmus pelas minhocas, o fator maisimportante a ser observado é a umidadedo alimento. Deve-se procurar manter oesterco sempre com a umidade em tornode 80% a 85%, nunca permitindo que aumidade fique abaixo de 50%. Para fazer ocontrole da umidade de forma prática, sepega um pouco do material na mão eaperta-se: se não escorrer água, é sinalque está seco e é preciso umedecer; sesurgirem algumas gotas entre os dedos, aumidade está adequada; mas se houverescorrimento de grande quantidade deágua pela mão e braço, então se devesuspender o molhamento do minhocárioaté que a umidade retorne aos níveisindicados (Figura 4).

As minhocas gostam de ter umaalimentação diversificada. Assim, aincorporação ao esterco de resíduosvegetais existentes da propriedade, comopalhas, restos de frutas e hortaliçasimpróprias para o consumo ou sem valorcomercial, pode ser uma boa alternativa.Contudo, é preciso ter alguns cuidados,evitando que plantas doentes possam serincorporadas ao húmus queposteriormente será utilizado para adubaroutras plantas da mesma espécie ou damesma família. Também é importanteevitar o acúmulo de restos vegetais muitosuculentos, pois isto pode atrair moscas,outros insetos e até ratos, além defermentar, prejudicando odesenvolvimento das minhocas. Sempreque possível, estes resíduos devem serpicados, pois facilita a sua decomposiçãoe consumo pelas minhocas.

O agricultor familiar que possui gadoleiteiro pode utilizar a água de lavagemdos tarros e restos de farinha de milhopara enriquecer o esterco. Estes alimentos

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Figura 4. Medida prática da umidade no substrato: A) muito seco; B) muitoúmido; C) umidade adequada.

auxiliam na reprodução das minhocas eno seu ganho de peso. Mas alguns poucosalimentos devem ser evitados, comocarnes e restos de saladas com sal e óleo.Em geral, estes alimentos são prejudiciaisà respiração das minhocas, além deprovocarem a sua desidratação.

3.3. Cuidados especiais

Na maioria das vezes, o agricultor tem oesterco para o minhocário na sua própriapropriedade, o que é uma grandevantagem. Contudo, quando o esterco écomprado fora, é preciso estar atento parapossíveis problemas. Sementes de plantasinvasoras podem vir misturadas aoesterco e serem disseminadas napropriedade. Da mesma forma, asminhocas podem sofrer um estresse,apresentando mortandade ou fuga,sempre que houver a mudança brusca daalimentação ou até mesmo de estercos deanimais que receberam alimentaçãodiferenciada, como por exemplo gadocriado a pasto e gado confinado. Assim, ésempre importante conhecer aprocedência do esterco que é oferecido àsminhocas.

Outro aspecto a ser observado comatenção pelo minhocultor diz respeito aospredadores. Algumas espécies deformigas podem fazer seu ninho dentro docanteiro e se alimentar das minhocas.

Neste caso, é necessário que o ninho sejalocalizado e removido do canteirojuntamente com o húmus próximo. Não érecomendada a aplicação de qualquerproduto químico no canteiro, porém o usode borra de café, farinha de ossos ou decasca de ovo moída espalhada sobre ocanteiro podem inibir o aparecimento deformigas além de serem um complementoalimentar para as minhocas.

As sanguessugas são outros predadoresque podem causar sérios estragos nominhocário. Além de viverem emambientes semelhantes, as sanguessugassão visualmente muito parecidas com asminhocas, embora apresentem umacoloração mais alaranjada e uma maiorresistência ao esmagamento. Canteirosbem drenados podem prevenir osurgimento das sanguessugas e a cataçãoe posterior destruição é a forma maiseficaz de controle.

O minhocultor também deve estar atento àocorrência de predadores de maior porte,como ratos, sapos, rãs, aves domésticas epassarinhos, evitando sua presença comarmadilhas ou telas de proteção.

Nos minhocários ao ar livre érecomendado fazer periodicamente umaseleção de minhocas Vermelha-da-Califórnia, pois é possível o surgimento deminhocas nativas atraídas pelo esterco.

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8 Minhocultura e produção de húmus para a agricultura familiar

Sempre que possível, deve-se evitar amistura de espécies diferentes deminhocas, mantendo os índices dereprodução e a uniformidade do processode produção de húmus.

4. A coleta do húmus

Mesmo sendo grandes produtoras dehúmus, apenas 60% da matéria orgânicaconsumida pela minhoca Vermelha-da-Califórnia é transformada em húmus. Osdemais 40% a minhoca usa para seupróprio desenvolvimento e reprodução.Assim, para cada 10 kg de esterco serãoproduzidos aproximadamente 6 kg dehúmus.

Apesar desta diferença em quilos, ohúmus de minhoca é um produto muitosuperior ao esterco. As minhocasconseguem concentrar e disponibilizar nohúmus os elementos nutricionaisnecessários às plantas de forma maisrápida do que a decomposição natural doesterco. O húmus ainda possui umagrande quantidade de hormônios vegetaisimportantes para o crescimento edesenvolvimento das plantas, além deconter uma grande quantidade demicroorganismos que auxiliam nadecomposição da matéria orgânica e namicrobiodiversidade do solo.

É importante ressaltar que as minhocasnão aumentam os níveis de nutrientes nohúmus, mas apenas os tornam maisdisponíveis para as plantas. Ou seja, umesterco de baixa qualidade resultará emum húmus igualmente ruim, independenteda espécie de minhoca ou manejoadotado. Da mesma forma, ascaracterísticas químicas de cada lote dehúmus produzido poderá variar conformeo esterco da espécie animal, da sua idade,alimentação e até tipo de criação. Essavariação também é válida para os resíduosvegetais. Assim, é muito importante que ominhocultor que pretende vender húmusrealize análises periódicas do húmusproduzido, especialmente quando há trocade fornecedor de esterco ou mudança no

sistema de produção dos animais napropriedade.

O momento da coleta do húmus pode serpercebido de forma prática ao realizaruma análise visual do material nocanteiro. A coloração do húmus pronto éescura e uniforme, com um odoragradável de terra molhada e umagranulometria que lembra o pó-de-café(Figura 5). Numa observação maiscriteriosa, pode-se notar também que asminhocas diminuem de tamanho quandoo húmus está pronto, sinalizando que nãohá mais alimento no canteiro. O húmusfica pronto entre 45 e 90 diasaproximadamente, dependendo dascondições climáticas, da qualidade doalimento e da população de minhocas nocanteiro.

Para utilizar o húmus produzido, énecessário retirar as minhocas que estãonele. Ao adotar o sistema de alimentaçãoem camadas, este processo fica muitomais fácil, pois a grande maioria dasminhocas está na camada superficial docanteiro, onde recebeu a últimaalimentação. A forma mais prática derealizar esta retirada é com o auxílio deiscas. A isca nada mais é do que esterconovo colocado sobre uma rede quepermite que a minhoca atravesse embusca do alimento. Este sistema deseparação das minhocas pode ser visto naFigura 6.

A isca deve ficar sobre o canteiro por 2 a 3dias, que é o tempo suficiente para queuma boa quantidade de minhocas passepela rede. As minhocas da isca podementão ser transferidas para um outrocanteiro que se deseja iniciar. Esteprocesso deve ser repetido tantas vezesquantas forem necessárias, até omomento em que poucas minhocasapareçam na isca.

Mesmo após o uso das iscas, algumasminhocas permanecerão no húmus eoutras tantas ainda nascerão dos casulosali existentes. Isto apenas será umproblema se a intenção do minhocultor forvender húmus. Neste caso, os

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Figura 5. Aspecto do húmus de minhoca pronto para ser coletado.

interessados neste tipo de exploraçãodevem buscar as informações necessáriassobre a legislação para a comercializaçãode húmus.

O húmus usado na própria propriedadedispensa maiores beneficiamentos, comoa retirada de casulos ou o peneiramento.O ideal é que, quando pronto, o húmus

seja retirado do canteiro e armazenado emlocal sombreado e protegido da chuva,onde os microorganismos irão finalizar oprocesso de humificação da matériaorgânica. O húmus atinge sua melhorqualidade química cerca de 3 meses apóso armazenamento e começa a perder estaspropriedades a partir de 12 meses.

Figura 6. Sistema de separação das minhocas do húmus através de iscas com redes.

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5. Utilização do húmus de minhoca

Pela própria natureza, a composiçãoquímica do húmus de minhoca é muitovariável e, por ser um material comelevada carga microbiológica, suarecomendação não pode ser realizada damesma forma que os adubos mineraissolúveis. Infelizmente, muito pouco temsido feito para definir um sistema derecomendação apropriado aos adubosorgânicos que leve em conta estas

Tabela 2. Concentrações médias de nutrientes e teor de matéria seca (MS) em húmus deminhoca.

N utriente N P2O 5 K2O Ca M g M S

% (m /m ) 1,5 1,3 1,7 1,4 0,5 50

características. Na prática, agricultores epesquisadores têm proposto a utilizaçãodo húmus de minhoca a partir deexperiências locais e de resultados depesquisas em algumas culturas.

Na Tabela 2 são apresentados os teoresmédios de macronutrientes e matéria secaencontrado em amostras de húmus deminhoca e na Tabela 3 consta arecomendação de aplicação em diversasculturas.

Fonte: adaptado de Sociedade..., 2004.

Tabela 3. Recomendação para aplicação de húmus.

Fonte: adaptado de Almeida, 1999.

Cultura Plantio Cobertura Sulco O bservação

Plantas de interior, sam am baias etc.

150g por vaso 4 vezes ao ano, aum entando 30% todo ano

Roseiras e arbustos floríferos

200g por cova ou 500g por m ² de canteiro

Cobrir durante todo o plantio

M isturar com a terra da cova

Gram ados em geral 500g por m ² na preparação, em m istura com a terra

N o fim da prim avera, cobrir com 300g por m ²

Se possível

descom pactar o terreno

Frutas de clim a tem perado

400-600g por cova

1-2 kg por ano, aum entando 30% todo ano

M isturar com a terra da cova

Citros 300-500g por cova

1-1,5 kg por pé, aum entando 30%

todo ano

Fazer sulcos na projeção da copa e m isturar com a terra

M isturar com a terra da cova

Viveiros 600g por m ² de canteiro

1-1,5 kg por pé, aum entando 30%

todo ano

M isturar com a terra do canteiro

Hortaliças de folhas e legum es

100g por cova ou 600g por m ² de canteiro

Cobrir durante todo cultivo

200g por m etro linear

M ilho verde 300-400g por cova Cobrir durante todo cultivo

2 vezes durante o cultivo, 200g por m etro linear

M isturar com a terra do canteiro

Abóbora, m elão, m elancia e pepino

300g por cova Cobrir durante todo cultivo

M isturar com

a terra do canteiro

Feijão 0,5-1,0 kg por m ² 200g por m etro linear

Capineiras e pastagens

500g por m ², m isturar com solo na preparação

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11Minhocultura e produção de húmus para a agricultura familiar

É possível também aplicar o húmus naforma líquida. Esta forma pode serempregada quando se pretende realizaruma fertirrigação ou pulverização foliar eaté mesmo para evitar a disseminação desementes de invasoras que porventuravieram no esterco que foi processadopelas minhocas. Para tanto, recomenda-seutilizar o húmus já estabilizado, ou seja,aquele que ficou armazenado durante nomínimo 3 meses.

Para preparar o húmus líquido, usa-se aproporção de 1:10, onde 1 kg de húmus émisturado em 10 L de água. Se o volumede solução que se deseja preparar é de200 L, basta misturar 20 kg de húmus paramanter a proporção. Esta concentraçãopode variar, mas em geral não se usa maisdo que 2 partes de húmus para 10 partesde água. O húmus pode ser misturado emcontato direto com a água dentro dorecipiente de preparo, agitando de formavigorosa a solução, para que todo o sólidose dissolva. O húmus líquido pode serpreparado em qualquer recipiente,entretanto deve-se evitar que a soluçãofique exposta ao sol.

O processo de preparo dura cerca de 4 a 7dias, devendo a solução ser agitada pelomenos uma vez por dia durante esteperíodo, para que o máximo de nutrientese microorganismos do húmus sejaliberado na água. Um dia antes daaplicação, recomenda-se não realizar aagitação da solução, para que as partículassólidas se depositem no fundo dorecipiente e facilite o processo defiltragem. Após a filtragem, o produtopode ser aplicado diretamente, semnecessidade de diluição.

O material sólido resultante do processo,mesmo com menor teor de nutrientes,ainda pode ser usado como fertilizante eaplicado ao solo de canteiros de hortas epomares.

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Exemplares desta edição podem ser adquiridos na:Embrapa Clima Temperado

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E-mail: www.cpact.embrapa.br [email protected] edição

1a impressão (2006): 50

Presidente: Walkyria Bueno ScivittaroSecretário-Executivo: Joseane Mary Lopes Garcia Membros: Cláudio Alberto Souza da Silva, LígiaMargareth Cantarelli Pegoraro, Isabel HelenaVernetti Azambuja, Luís Antônio Suita de Castro,Sadi Macedo Sapper, Regina das Graças Vasconce-los dos Santos

Supervisor editorial: Sadi Macedo SapperRevisão de texto: Sadi Macedo SapperEditoração eletrônica: Oscar Castro

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CircularTécnica, 57