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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE SALVADOR-BA. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, por intermédio dos Promotores de Justiça abaixo assinados, integrantes do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa - GEPAM, no uso de uma de suas atribuições constitucionais e legais, com fundamento nos artigos 129, incisos II e III, e 37, inciso II, da Constituição Federal, artigo 138, incisos II e III, da Constituição do Estado da Bahia, artigo 5 o da Lei n° 7.347/85, artigo 25, inciso IV, da Lei nº 8.625/93 – Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, artigo 72, inciso IV, da Lei Complementar Estadual nº11/96 – Lei Orgânica do Ministério Público do Estado da Bahia, bem como no art. 17 da Lei n° 8.429/92, vem, perante Vossa Excelência, propor a presente em face de JOÃO HENRIQUE DE BARRADAS CARNEIRO, brasileiro, AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COM PEDIDO LIMINAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS ,

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE SALVADOR-BA.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, por

intermédio dos Promotores de Justiça abaixo assinados, integrantes do Grupo

de Atuação Especial de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade

Administrativa - GEPAM, no uso de uma de suas atribuições constitucionais e

legais, com fundamento nos artigos 129, incisos II e III, e 37, inciso II, da

Constituição Federal, artigo 138, incisos II e III, da Constituição do Estado da

Bahia, artigo 5o da Lei n° 7.347/85, artigo 25, inciso IV, da Lei nº 8.625/93 – Lei

Orgânica Nacional do Ministério Público, artigo 72, inciso IV, da Lei

Complementar Estadual nº11/96 – Lei Orgânica do Ministério Público do

Estado da Bahia, bem como no art. 17 da Lei n° 8.429/92, vem, perante Vossa

Excelência, propor a presente

em face de JOÃO HENRIQUE DE BARRADAS CARNEIRO, brasileiro, ex-

Prefeito do Município de Salvador, pelos fundamentos de fato e de direito que

passa a expor:

I- BREVE HISTÓRICO DOS FATOSI-A) Da rejeição das contas do acionado referentes ao exercício financeiro de 2009

A prestação de contas da Prefeitura Municipal de Salvador,

AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COM PEDIDO LIMINAR DE

INDISPONIBILIDADE DE BENS,

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correspondente ao exercício financeiro de 2009, de responsabilidade do então

Prefeito João Henrique de Barradas Carneiro, ingressou no Tribunal de Contas

dos Municípios em 11 de junho de 2010. Realizadas análises setoriais, foram

expedidos Relatório Técnico e Pronunciamento Técnico apontando uma série

de irregularidades que levaram à notificação do acionado. Após referida

notificação, o acionado exerceu o seu direito de defesa, com apresentação de

petição acompanhada de farta documentação. As justificativas apresentadas

não foram suficientes para afastar todas as irregularidades detectadas, o que

foi externado no Parecer Prévio nº 943/10, constatando as seguintes

ilegalidades:

1. descumprimento do art. 212 da Constituição Federal, no

que concerne a não observância da aplicação do

percentual de 25% na manutenção e desenvolvimento do

ensino;

2. abertura de créditos suplementares por anulação de

dotações, ultrapassando o limite estabelecido na Lei

Orçamentária;

3. abertura de créditos suplementares por excesso de

arrecadação sem a comprovação, em contrapartida, da

existência de recursos disponíveis;

4. ausência de comprovação das medidas determinadas nos

Pareceres Técnicos TCM nºs 856/07, 832/08 e 788/09;

Inconformado, o acionado ingressou com Pedido de

Reconsideração (nº 17.999/10), não acolhido pelo TCM, levando a posição

quanto à rejeição das contas.

Ocorre que, alegando cerceamento de defesa, em 2011, o

ACIONADO obteve liminar concedida pela 8ª Vara da Fazenda Pública,

determinando a suspensão do julgamento das contas do exercício de 2009.

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Posteriormente, o Tribunal de Justiça reconheceu ter sido dado

ao ACIONADO pleno direito de defesa na tramitação do processo perante o

TCM, determinando o retorno do julgamento.

Em 25 de setembro de 2012, os conselheiros do TCM votaram,

mais uma vez, pela rejeição das contas do Município de Salvador, referentes

ao exercício de 2009 e, confirmando o mesmo resultado ocorrido em dezembro

de 2010 e aplicaram ao ACIONADO uma multa de R$ 5.000,00 (cinco mil

reais).

Em 13 de dezembro de 2013, a Câmara de Vereadores do

Município de Salvador acolheu o posicionamento do TCM, rejeitando as contas

deste Município, referentes ao exercício de 2009.

I-B) Da rejeição das contas do acionado referentes ao exercício financeiro de 2009

Em dezembro de 2011 o Tribunal de Contas, mais uma vez,

emitiu parecer prévio pela rejeição das contas do Município de Salvador,

concernente ao exercício de 2010.

No que concerne ao exercício de 2010, a rejeição das contas

baseou-se no Parecer Prévio nº 955/11, destacando as seguintes ilegalidades:

1. incidência no descumprimento do quanto

determinado no art. 212 da Constituição Federal,

aplicando apenas o equivalente a 20,94% da receita

resultante de impostos e de transferências na

manutenção e no desenvolvimento do ensino,

enquanto a Constituição Federal exige aplicação de

pelo menos 25%;

2. descumprimento constitucional ao quanto

determinado para aplicação em ações e serviços

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públicos de saúde, conforme disposto no inciso III,

do art. 77 do Ato das Disposições Transitórias,

aplicando apenas o equivalente a 11,82%, inferior ao

mínimo exigido de 15%;

3. reincidência quanto ao descumprimento de

preceitos estabelecidos na Lei 8.666/93 envolvendo

irregularidades em processos licitatórios, dispensas,

e em contratos celebrados, bem como contratações

com preços irrazoáveis, com valores superiores aos

estimados e ausência de comprovação de prestação

do serviço pactuado, conforme relacionados no item

4.0 deste Relatório -”Acompanhamento da Execução

Orçamentária” e constantes no Relatório Anual da 1ª

Inspetoria Regional de Controle Externo - -1ªIRCE

(fls.559/701);

4. inobservância de regras da Lei nº 4.320/64,

haja vista o cometimento de irregularidades nas

fases da despesa (empenho, liquidação e

pagamento);

5. reincidência na falta de esforços no campo da

Responsabilidade Fiscal, para promover o equilíbrio

entre receitas e despesas públicas do ente

municipal, como mostra o agravamento do quadro

nos últimos exercícios financeiros, a saber:

ocorrência de déficit orçamentário; não atingimento

das metas do resultado primário estabelecido na

LDO aprovada; saldo financeiro insuficiente para os

compromissos de curto prazo (consignações e restos

a pagar); baixa cobrança da dívida ativa; elevação

da dívida consolidada líquida, e crescimento de

gastos correntes, notadamente na contratação

temporária de pessoal e terceirizados;

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cont. Do P.P. °955/1

6. reincidência quanto ao elevado dispêndio com

o pagamento de multas e juros em razão de atrasos

no pagamento das obrigações , causando prejuízos

à municipalidade;

7. cancelamento de dívidas passivas sem

comprovação do relatório descritivo da origem dos

saldos e das providencias para baixa dos valores,

conforme Decreto Municipal nº 21.388/10 e

Resolução TCM nº1.060/05;

8. reincidência quanto a não inclusão, na LDO

de 2010 , das normas relativas ao controle de custos

e à avaliação de resultados dos programas

financiados com recursos dos orçamentos (art. 4º, I,

“e”, da Lei 101/00), pois o Parecer Prévio nº 832/08

já havia registado esta falha;

9. reincidência no que diz respeito à ausência de

providencias para que os recursos relativos à

educação e saúde passem a transitar em contas

únicas e específicas, nas formas das resoluções

pertinentes do TCM

10. reincidência quanto à ausência de

providências para a desvinculação da Controladoria

Geral do Município do âmbito da Secretaria da

Fazenda promovendo-se a sua autonomia

institucional. Os Pareceres Prévios nºs788/09,

823/08 e 934/09 já recomendaram sucessivamente a

segregação;

11. reincidência quanto a o elevado

comprometimento orçamentário com o

reconhecimento de despesas de exercícios

anteriores DEA's;

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12. ausência de medidas efetivas, inclusive

judiciais, para o cumprimento das decisões do TCM,

quanto ao pagamento de multas e ressarcimento

devidos ao erário municipal.

Percebe-se que ilegalidades apresentadas no exercício de 2009

foram reiteradas em 2010, levando, inclusive, a aplicação de multa ao acionado

no valor de R$ 549.480,30 (quinhentos e quarenta e nove, quatrocentos e

oitenta reais e trinta centavos).

Em virtude dos graves e reiterados ilícitos observados nas

contas de 2010, sob gestão do acionado, estas foram, mais uma vez, rejeitadas

pela Câmara Municipal de Salvador.

Considerando a reiteração de condutas ilícitas, nas contas

dos exercícios de 2009 e 2010, que levaram a violação de diversos princípios

administrativos por parte do ex-Preifeito, João Henrique de Barradas Carneiro,

o Ministério Público Estadual ingressou com Ação Civil Pública por Ato de

Improbidade Administrativa, pleiteando a aplicação das sanções constantes do

inciso III, do art. 12, da Lei nº 8.429/92 ao ora acionado.

II- DOS FATOS OBJETO DESTA DEMANDA

Em relação ao exercício financeiro de 2011, o Tribunal de

Contas dos Municípios, mais uma vez, opinou pela rejeição das contas do

Município de Salvador, também de responsabilidade de João Henrique,

ensejando a aplicação ao ex-prefeito de multa no valor de R$ 36.069,09 (trinta

e seis mil, sessenta e nove reais e nove centavos).

Tal posicionamento foi explicitado quando da emissão do

Parecer Prévio, expedido em 26 de março de 2012, que apontou para a

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existência de diversas ilegalidades nas contas da Prefeitura e na gestão do

acionado, que ocupou a função por dois mandatos consecutivos.

Ressalte-se que, conforme bem salientado pelo Tribunal de

Contas dos Municípios, a manifestação pela rejeição das contas da Prefeitura,

três vezes seguidas, se deu somente após reiterados alertas, advertências, ressalvas e mesmo penas pecuniárias por parte da Corte. Não havendo

mudanças no quadro fático e nas atitudes do gestor, não restou outra opção ao

TCM senão passar a se pronunciar pela rejeição das contas, tendo em vista a

omissão do acionado no que tange à adoção de providências que evitassem a

reincidência no cometimento de graves ilicitudes.

Cumpre mencionar que, como realçado pelo Parecer Prévio, a

reincidência, repetidamente constatada, revela vontade livre e consciente do

acionado em atuar de maneira ilegal, ineficaz e ineficiente, na administração

dos recursos públicos e no cumprimento da Lei, o que, certamente, não pode

restar impune.

Especificamente em relação ao ano de 2011, cumpre destacar

as seguintes ilicitudes, constantes do Parecer Prévio:

1. reincidência na violação aos princípios da moralidade e eficiência, manifestada, em relação

ao exercício financeiro de 2011, de diversas formas,

entre elas: (a) larga discrepância entre a Receita

Tributária e as Transferências Correntes,

representando estas um total de 56,1% (cinquenta e

seis vírgula um por cento) das fontes de recursos do

Município, (b) equivocado planejamento municipal no

que tange à estimativa das receitas constantes da lei

orçamentária anual, vislumbrando-se, na prática,

elevada discrepância entre o previsto e o

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efetivamente arrecadado, (c) manutenção da Dívida

Fiscal Líquida do Município em valores expressivos,

em descumprimento a recomendações constantes

do TCM, (d) manutenção do desequilíbrio das contas

municipais, traduzida no déficit financeiro no

montante de R$ 172.698.846,09 (cento e setenta e

dois milhões, seiscentos e noventa e oito mil,

oitocentos e quarenta e seis reais e nove centavos),

(e) significativo crescimento da Dívida Ativa

Tributária, que atingiu, em 31/12/2011, o elevado

montante de R$ 9.319.810.305,49 (nove bilhões,

trezentos e dezenove milhões, oitocentos e dez mil,

trezentos e cinco reais e quarenta e nove centavos),

sendo efetivamente arrecadado, no exercício em

questão, o ínfimo percentual de 1,08% (um virgula

zero oito por cento), (f) verificação de insuficiência de

recursos para a cobertura das despesas atinentes

aos Restos a Pagar, observando-se saldo negativo

de R$ 650.654.900,60 (seiscentos e cinquenta

milhões, seiscentos e cinquenta e quatro mil,

novecentos reais e sessenta centavos), quadro que,

segundo o Parecer expedido pelo TCM, veio se

agravando a cada ano da gestão e que demonstra

possível colapso financeiro do Município, (g)

manutenção da Dívida Fundada em montante

expressivo, tendo havido, inclusive, acréscimo de

2,02% (dois vírgula zero dois porcento) no valor

entre os exercícios de 2010 e 2011;

2. reincidência quanto ao elevado dispêndio

com o pagamento de multas e juros em razão de

atrasos no pagamento das obrigações, causando

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prejuízos às contas municipais;

3. violação ao princípio da razoabilidade,

manifestada na má distribuição de recursos, uma vez

que, em que pese a urgência de maiores

investimentos destinados ao atendimento das

necessidades básicas da população, que reclamam

maior atenção, a Prefeitura de Salvador despendeu a

vultosa quantia de R$ 18.489.121,69 (dezoito

milhões, quatrocentos e oitenta e nove mil, cento e

vinte e um reais e sessenta e nove centavos) para

realizar pagamentos à empresa LM Transportes,

Serviços e Comércio Ltda, que prestou serviços de

transporte de pessoal, pequenos volumes e cargas e

transporte de pessoal com cobrança de diárias, com

locação de 1.470 (hum mil, quatrocentos e setenta)

veículos, para atender às atividades dos diversos

órgãos e entidades da Administração Direta e

Indireta. Ademais, também violando o princípio da

razoabilidade, foram investidos, no exercício de

2011, R$ 13.147.684,09 (treze milhões, cento e

quarenta e sete mil, seiscentos e oitenta e quatro

reais e nove centavos) em publicidade;

4. reincidência na admissão de pessoal sem

concurso público, através de terceirização e

contratação de temporários em substituição do

quatro, havendo violação ao art. 37, II, CF. Ressalte-

se que o gasto da Prefeitura com mão de obra

terceirizada e temporária representa o expressivo

montante de 40,79% (quarenta vírgula setenta e

nove porcento) da despesa com pessoal efetivo;

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5. reincidência no descumprimento do quanto

determinado no art. 212 da Constituição Federal,

aplicando apenas o equivalente a 22,11% (vinte e

dois vírgula onze porcento) da receita resultante de

impostos e de transferências na manutenção e no

desenvolvimento do ensino, enquanto a Constituição

Federal exige aplicação de pelo menos 25%;

6. repasse de recursos a entidades civis sem

fins lucrativos, no montante de R$ 197.587.343,76

(cento e noventa e sete milhões, quinhentos e oitenta

e sete mil, trezentos e quarenta e três reais e setenta

e seis centavos), sem que tenham sido apresentadas

as respectivas prestações de contas, conforme

determinam a Resolução TCM nº 1121/05 e o art. 26

da Lei Complementar nº 101/00;

7. ausência de medidas efetivas, inclusive

judiciais, para o cumprimento das decisões do TCM,

quanto ao pagamento de multas e ressarcimento

devidos ao erário municipal. Consoante o Parecer,

apesar das reiteradas ressalvas e advertências

efetivadas, o ex-gestor se manteve inerte, reincidindo

no descumprimento ao dever de cobrança das

determinações impostas pelo Tribunal de Contas,

inclusive quanto ao recolhimento das cobranças que

lhe foram impostas. Ressalte-se que o ex-prefeito,

desconsiderando a Resolução TCM nº 1.224/05, que

disciplina a Lei Complementar nº 006/91, se

autoconcedeu parcelamento para o pagamento de

algumas das cominações que lhe foram impostas,

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em número de quarenta e oito. Observe-se que a

não efetivação de cobrança dos créditos municipais

referidos agride a Lei de Responsabilidade Fiscal.

O quadro narrado acima revela o total descaso do ACIONADO

com as contas municipais, restando evidente que o ex-gestor assumiu o risco

de todas as ilegalidades ocorridas, tendo em vista a gravidade e caráter

reiterado das mesmas.

Ressalte-se que, em que pese as inúmeras advertências e

ressalvas oriundas do TCM, ao longo dos oito anos, que esteve à frente da

gestão de Salvador, o acionado, então Prefeito de Salvador, deliberadamente

optou por não adotar qualquer providência visando sanar os vícios de gestão,

reiteradamente detectados, gerando uma situação de total desassistência no

Município de Salvador, refletida em áreas de suma importância, como

educação, saúde e infraestrutura. Tal cenário levou à instauração de Inquérito

Civil epigrafado, voltado a apurar a responsabilidade do então Prefeito de

Salvador – João Henrique de Barradas Carneiro – com fundamento na Lei nº

8.429/92, o que gerou a propositura da presente demanda.

III – INTRODUÇÃO AO PRINCÍPIO DE PERMANENTE RESPONSABILIDADE DO PREFEITO MUNICIPAL ANTE AS LEIS DO PAÍS

O ACIONADO, como é consabido, foi prefeito municipal da

Capital do Estado da Bahia desde 1º de janeiro de 2005, com término de

mandato em dia 31 de dezembro de 2012. No desempenho dessa magna

função, o prefeito municipal deve se desincumbir de inumeráveis misteres,

sempre na defesa do interesse público municipal, fazendo valer a confiança em

si depositada pelo corpo eleitoral que o elegeu, em nome de quem deve

exercer o mandato. Logo, jamais poderá se distrair e desviar-se de suas

atribuições e do mister para o qual foi eleito.

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Não por outra razão, dispõe o prefeito de ferramentas variadas

para cumprir com suas responsabilidades ante o município. Assim, domina a

administração, sendo a autoridade mais preeminente no governo local. Cabe-

lhe dirigir a administração municipal e representar o Município. Nesse sentido,

por exemplo, outorga a Lei Orgânica do Município de Salvador-BA1, calcada na

Constituição Federal, as seguintes potestades ao primeiro mandatário

municipal:

A – no âmbito da iniciativa legislativa:

Seção V Das LeisArt. 46. A iniciativa das leis complementares e ordinárias, salvo os casos de competência privativa, cabe ao vereador, Comissão da Câmara Municipal, ao prefeito e por proposta de 5% do eleitorado, no mínimo.

Art. 47. O prefeito poderá enviar à Câmara Municipal projetos de lei sobre qualquer matéria, os quais se o solicitar serão apreciados em regime de urgência, dentro de 45 dias a contar do seu recebimento.

B – no âmbito da gestão da administração

Seção IDo PrefeitoArt. 52. O Poder Executivo é exercido pelo prefeito, competindo-lhe:I - representar o Município em juízo ou fora dele;II - apresentar projetos de lei à Câmara;III - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, e

1 Doravante LOM.

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expedir regulamento para sua fiel execução;IV - vetar, no todo ou em parte, projetos de lei aprovados pela Câmara;V - baixar decretos e demais atos administrativos fazendo-os publicar em órgãos oficiais;VI - enviar à Câmara, até 30 de setembro de cada ano, projeto de lei do orçamento anual;VII - nomear seus auxiliares diretos e, em cada unidade funcional, os ordenadores de empenho, despesa e liquidação;XI - observar e fazer cumprir as leis, resoluções e regulamentos administrativos;XII - apresentar anualmente à Câmara, na abertura do período legislativo ordinário, relatório das atividades;XIII - prestar contas relativas ao exercício anterior na forma da lei;XIV - pronunciar-se sobre os requerimentos da Câmara, em até 15 (quinze) dias do recebimento da solicitação;XV - dirigir, superintender e fiscalizar serviços de obras municipais;XVI - promover a arrecadação dos tributos, preços públicos e tarifas devidos ao Município, dando-lhes a publicação adequada;XVII - administrar os bens municipais, promover a alienação, deferir permissão, cessão, ou autorização de uso, observadas as prescrições legais;XVIII - permitir, conceder ou autorizar a execução dos serviços públicos por terceiros quando não possível ou conveniente ao interesse público a exploração direta pelo Município;XIX - autorizar despesas e pagamentos de conformidade com as dotações votadas pela Câmara;

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XX - decidir sobre requerimentos, reclamações e representações;XXI - prover os cargos públicos, contratar, exonerar, demitir, aposentar, colocar em disponibilidade e praticar os demais atos relativos à situação funcional dos seus servidores, respeitado o Estatuto do Funcionário Público e as prescrições legais;

A amplitude de poderes outorgados ao prefeito reivindica,

como é próprio do regime democrático, a contrapartida de responsividade, ou

submissão a um rigoroso regime de responsabilidade. Na condição de agente

político e Chefe do Executivo municipal é responsável pelos atos que, no

desempenho de suas funções, pratica, omite-se de praticar ou faz de modo

inconveniente do ponto de vista legal. Inspirado por este princípio democrático,

a LOM estabelece o seguinte:

Art. 55. O prefeito e seus auxiliares incorrerão em crime de responsabilidade quando atentarem contra as Constituições Federal ou Estadual, a Lei Orgânica do Município, o livre exercício dos outros poderes, inclusive os direitos políticos, sociais e individuais, a probidade na administração, a Lei Orçamentária, ficando sujeito à suspensão do exercício de suas funções, à destituição e perda de mandato e a outras decisões judiciais.Art. 113. A autoridade ou servidor público que, ciente de vício invalidador de ato administrativo, deixar de saná-lo ou de adotar providências para que o órgão ou agente competente o faça, incorrerá nas penalidades administrativas de lei, por sua omissão, sem prejuízo da responsabilidade civil e criminal.

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A equação constitucional e infraconstitucional, portanto, se

estrutura de maneira lógica, dada a premissa de sua vigência em um Estado

Democrático de Direito, como o é o Brasil: os cidadãos outorgam aos seus

governantes expressivas parcelas de poder discricionário, demandando,

entretanto, a correspondente responsabilidade pela condução dos negócios

públicos. Não existe hiato nesse processo, que se concretiza segundo após

segundo, enquanto o prefeito exerce o mandato popular.

Quando o prefeito escolhe seus auxiliares diretos – secretários

municipais – utiliza-se do processo de desconcentração de poder, ou seja,

distribuição interna de competências, que pode ser comparada a uma pirâmide

em cujo ápice se situa o Chefe do Executivo, cuja posição hierárquica máxima

lhe confere o dever-poder de intervir na atuação dos seus subordinados,

cabendo-lhe, inclusive, alterar seu quadro quando incompatível com a política

de governo ou em desacordo com a ordem jurídica. Ao omitir-se desse “dever-

poder”, o prefeito assume corresponsabilidade pelos atos que afetem

diretamente a gestão municipal.

IV - OS FATOS CONFIGURADORES DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COMETIDA PELO ACIONADO

A – A GESTÃO FINANCEIRA SUJEITA À

CONSTITUIÇÃO E A NORMATIVA INFRACONSTITUCIONAL

A submissão ao ordenamento jurídico brasileiro pelo prefeito

municipal ganha relevância com respeito às normas que disciplinam o

gerenciamento de recursos públicos segundo os preceitos da ética e da boa

administração, direitos que são concernentes a todos os cidadãos. Trata-se de

normativa instrumental da proteção dos interesses materiais dos cidadãos,

objetivo último a ser atingido pela administração pública encabeçada pelo

primeiro mandatário municipal, no caso das municipalidades.

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Na esteira do conjunto de previsões constitucionais que

desenham o conceito de boa gestão, prolongou-se infraconstitucionalmente a

disciplina normativa da integridade das finanças públicas. O pano de fundo da

iniciativa legislativa visou proteger a administração pública – como meio que é,

repita-se, para a consagração dos direitos dos administrados – dos

costumeiros desatinos outrora e ainda cometido por muitos gestores

desassistidos da necessária capacidade política e gerencial e da boa-fé para o

manejo da coisa pública.

A partir dessa perspectiva é que entrou em vigência a Lei de

Responsabilidade Fiscal – Lei Complementar nº101/2000, estabelecendo

“normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal

e dá outras providências”. Esta normativa veio em linha com a Lei n.º

4.320/1964, que estatuiu “normas gerais de Direito Financeiro para elaboração

e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e

do Distrito Federal”. Constituem o arcabouço fundamental da sustentabilidade

financeira dos entes federativos, porquanto orientam a conduta dos

administradores públicos sob a pauta da legalidade, da segurança jurídica, da

estabilidade financeira e da garantia da impessoalidade das administrações,

por natureza suscetíveis à continuidade, com alternância no poder.

B - NÃO OBSERVÂNCIA DO TETO CONSTITUCIONAL DE RECURSOS APLICADOS NA MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DO ENSINO NO EXERCÍCIO DE 2011

O direito à educação recebeu da Constituição Federal proteção

muito peculiar. Assim mereceu pela sua fundamentalidade para o progresso

dos cidadãos do país. Nesse sentido, o art. 212 da Lei Fundamental

estabeleceu o seguinte:

Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os

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Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.

Sucede que este cometimento da Constituição Federal tem

dimensão que perpassa pela orientação geral de toda a estrutura

administrativa envolvida com sua concretização. Compete, pois, em caráter de

orientação, direção e supervisão, ao primeiro mandatário do município.

Em que pese a clareza do comando constitucional e a imediata

aplicabilidade de seu conteúdo, o Município de Salvador, conforme o Parecer

emitido pelo TCM-BA, aplicou, na manutenção e desenvolvimento do ensino, o

montante de R$ 570.098.773,57 (quinhentos e setenta milhões, noventa e oito

mil setecentos e setenta e três reais e cinquenta e sete centavos), equivalente

ao percentual de apenas 22,11% (vinte e dois vírgula onze por cento) da

receita resultante de impostos, porcentagem aquém, portanto, do mínimo

imposto pela Lei Maior, qual seja, 25% (vinte e cinco porcento).

Com efeito, o pronunciamento técnico registrou, inicialmente,

que o Município de Salvador aplicou o montante de R$ 500.472.005,52

(quinhentos milhões, quatrocentos e setenta e dois mil e cinco reais e

cinquenta e dois centavos) na manutenção e desenvolvimento do ensino, valor

correspondente ao percentual de 19,41% (dezenove vírgula quarenta e um

porcento) da receita do Município resultante de impostos.

A defesa do ex-gestor apresentou documentação com o

objetivo de desconstituir glosas efetivadas pela Inspetoria Regional da Corte,

que somaram R$ 116.708.360,20 (cento e dezesseis milhões, setecentos e oito

mil, trezentos e sessenta reais e vinte centavos), conforme registros existentes

no sistema de controle informatizado SIGA. Consoante o Parecer, foram

analisados detidamente os argumentos e documentos trazidos, chegando o

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Tribunal de Contas à conclusão de que poderiam ser apropriados, porque

tinham respaldo legal, recursos no valor de R$ 56.169.982,25 (cento e

cinquenta e seis milhões, cento e sessenta e nove mil, novecentos e oitenta e

dois reais e vinte e cinco centavos).

Por outro lado, as razões apresentadas não foram suficientes

para reverter as glosas efetuadas em relação a gastos com Restos a Pagar,

extraídos do mesmo SIGA, no montante de R$ 45.758.463,54 (quarenta e

cinco milhões, setecentos e cinquenta e oito mil, quatrocentos e sessenta e três

reais e cinquenta e quatro centavos), por não possuírem disponibilidade

financeira para honrá-los ou pela ausência de prestação de contas dos

recursos aplicados.

Assim, os recursos aplicados na manutenção e

desenvolvimento do ensino chegariam ao montante total de R$ 556.641.987,77

(quinhentos e cinquenta e seis milhões, seiscentos e quarenta e hum mil,

novecentos e oitenta e sete reais e setenta e sete centavos), correspondendo

ao percentual de 21,59% (vinte e um vírgula cinquenta e nove porcento) das

receitas supramencionadas.

Na fase recursal, mediante análise de farta documentação

acostada pelo ACIONADO, a Corte de Contas concluiu que poderiam ser

legalmente apropriadas, para o fim de atendimento à disposição do art. 212,

CF, despesas no montante de R$ 13.456.785,80 (treze milhões, quatrocentos e

cinquenta e seis mil, setecentos e oitenta e cinco reais e oitenta centavos).

Finalmente, portanto, aferiu-se que, na manutenção e desenvolvimento do ensino foi aplicado o montante de R$ 570.098.773,57 (quinhentos e setenta milhões, noventa e oito mil, setecentos e setenta e três reais e cinquenta e sete centavos), equivalente ao percentual de apenas 22,11% (vinte e dois vírgula onze por cento) da receita do Município resultante de impostos, não sendo cumprida,

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consequentemente, a obrigação constitucional constante do art. 212, CF, que prevê que esse percentual corresponda ao mínimo de 25% (vinte e cinco porcento).

No que concerne a tal ilegalidade não se pode afastar a

responsabilidade do ACIONADO, uma vez que, na qualidade de Chefe do

Executivo Municipal, detém o dever de fiscalização, fruto do seu poder

hierárquico, cabendo-lhe acompanhar, ao menos de forma ampla, a execução

orçamentária de cada Secretaria.

Inescusável, portanto, o descumprimento do referido

dispositivo constitucional que, sem dúvidas, tem importância fundamental para

o desenvolvimento de qualquer ente federativo, tendo em vista o caráter

essencial da educação de qualidade para os cidadãos de um país.

Ressalte-se que esta não é a primeira vez que o mandamento constitucional constante do art. 212, CF é violado pelo ACIONADO. Com efeito, nos exercícios de 2009 e 2010 também houve

violação ao referido dispositivo por parte do ex-gestor. Inclusive, a Ação Civil

Pública por Ato de Improbidade Administrativa proposta pelo Ministério Público

Estadual, em desfavor do ex-prefeito João Henrique de Barradas Carneiro, em

relação as contas do Município dos exercícios financeiros de 2009 e 2010, teve

como um de seus fundamentos justamente o descumprimento do mencionado

artigo da Lei Maior. Ademais, não se pode ignorar que, a própria Corte de

Contas advertiu o ACIONADO, por diversas vezes, alertando-o sobre as

diversas ilegalidades presentes na prestação de contas da sua gestão.

Assim, tendo-se em vista principalmente a reiteração da violação ao dispositivo, fica evidente o descaso do ex-gestor em relação aos compromissos advindos dos poderes que lhe foram outorgados, demonstrando sua ineficiência e falta de respeito com a res publica, o que configura, no mínimo um dolo eventual em relação a sua conduta,

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devendo o mesmo ser responsabilizado pelos atos de improbidade administrativa que praticou.

C – IRREGULARIDADES NA ADMISSÃO E NA DESPESA COM PESSOAL NO EXERCÍCIO DE 2011

A despesa total com o pessoal do Poder Executivo Municipal

de Salvador, incluídos os gastos da Administração Indireta, totalizou, no

exercício de 2011, R$1.544.170.246,49 (um bilhão, quinhentos e quarenta e

quatro milhões, cento e setenta mil, duzentos e quarenta e seis reais e

quarenta e nove centavos), que, corresponde a 47,10% (quarenta e sete

vírgula dez por cento) da Receita Corrente Líquida de R$3.278.749.773,08 (três bilhões, duzentos e setenta e oito milhões, setecentos e quarenta e nove

mil setecentos e setenta e três reais e oito centavos), não ultrapassando,

consequentemente o limite definido na alínea “b”, do inciso III, do art. 20, da Lei

Complementar n° 101/00.

Contudo, os quadros trazidos abaixo demonstram a

preocupante evolução de algumas despesas atinentes a pessoal:

Pessoal ativo:

2007 2008 2009

R$ 307.605.946,98 R$ 370.255.275,39 R$ 436.402.951,67

2010 2011

R$ 498.674.247,22 R$ 611.090.381,62

Fonte: Pronunciamento Técnico

Observa-se que houve um acréscimo da despesa com pessoal

entre 2010 e 2011 da ordem de 22,54% (vinte e dois vírgula cinquenta e quatro

porcento), excluindo os subsídios dos agentes políticos.

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Contratação de pessoa física ou terceirização de mão de obra:

2007 2008 2009

R$ 217.215.458,10 R$ 177.697.630,62 R$ 189.905.419,52

2010 2011

R$ 206.546.385,76 R$ 197.540.305,95

Fonte: Pronunciamento Técnico

Quanto à despesa com terceirizados, comparando-se os

exercícios de 2008 com 2009, o aumento do gasto atingiu 6,87%, enquanto de

2009 para 2010, observou-se alta de quase 9%. O cotejo entre os referidos

gastos entre 2010 e 2011 revela pequena queda, correspondente a 4%.

Contudo, tal decréscimo não compensa as elevações anteriores.

Ademais, a partir do cotejo entre os dados supramencionados,

percebe-se que grande parte da despesa com pessoal ativo é empregada na

terceirização de mão de obra, o que demonstra o elevado número de

terceirizados existentes na Administração Pública municipal. Com efeito, a

despesa com terceirizados, no exercício de 2011, equivaleu ao percentual de

32% (trinta e dois porcento) de todo o gasto com pessoal ativo do Poder

Executivo do Município de Salvador.

O vultoso número de terceirizados contratados pelo Município, em detrimento da admissão de servidores concursados, atenta contra os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, afrontando, também a regra constitucional do concurso público, expressa no art. 37, II, da Constituição Federal, que assim dispõe:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do

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Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: 

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

Acrescente-se que tramitam no Ministério Publico Inquéritos Civis que apuram a admissão irregular de pessoal, no âmbito da SECULT, através de convênios e contratos. Como exemplo, pode-se citar o Convênio nº 003/2011, firmado entre o Município de Salvador, através da SECULT, com a UNEB e a Organização Não-Governamental Pierre Bourdieu, envolvendo a contratação irregular de 1365 pessoas (Inquérito Civil nº 36/2012, SIMP Nº 003.0.29959/2012). Saliente-se que para fins da Lei de Responsabilidade Fiscal tais pessoas não entram na rubrica de Despesas de Pessoal.

É evidente que o Chefe do Poder Executivo não pode se

esquivar da responsabilidade sobre tal quadro fático, uma vez que, como

autoridade máxima do Município, possui dentre as suas atribuições

estabelecidas no inciso XXI, do art. 52 da LOM “prover os cargos públicos,

contratar, exonerar, demitir, aposentar, colocar em disponibilidade e praticar os

demais atos relativos à situação funcional dos seus servidores, respeitado o

Estatuto do Funcionário Público e as prescrições legais”.

Contratação temporária de pessoal:

2007 2008 2009

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R$ 13.005.793,00 R$ 17.638.976,74 R$ 32.434.857,20

2010 2011

R$ 50.000.000,00 R$ 51.711.793,15

Fonte: Pronunciamento Técnico

Cabe mencionar, também, a situação relativa à contratação

temporária de pessoal. Entre os exercícios financeiros de 2010 e 2011, a

despesa com temporários teve um pequeno aumento da ordem de 3,42% (três

vírgula quarenta e dois por cento). Ocorre que, se a comparação engloba o período compreendido entre os anos de 2008 e 2011, o acréscimo alcança o percentual de quase 193% (cento e noventa e três por cento).

Novamente, percebe-se a burla à regra do concurso público

insculpida na Constituição, vez que, claramente, o Município, na gestão do

ACIONADO, vinha optando por contratar temporários indiscriminadamente,

quando deveria observar a regra que prevê a utilização do certame.

D – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE ATRAVÉS DOS GASTOS EXCESSIVOS COM PUBLICIDADE

Os gastos com publicidade, despendidos no ano de 2011

atingiram o montante de R$ 13.147.684,09 (treze milhões, cento e

quarenta e sete mil, seiscentos e oitenta e quatro reais e nove centavos),

que corresponde a 0,40% (zero vírgula quarenta por cento) da Receita

Corrente Líquida.

O quadro seguinte revela os percentuais correspondentes

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aos gastos do Município com publicidade nos anos anteriores:

2006 2007 2008 2009 2010 2011

0,76% 1,06% 0,53% 0,63% 0,27% 0,40%

Conforme se observa da tabela acima, os gastos com

publicidade vinham diminuindo, alcançando o menor percentual no

exercício de 2010. Ocorre que, no ano de 2011, as despesas com

publicidade voltaram a aumentar, atingindo o percentual de 0,40%.

Quando se analisa o montante que esse percentual

representa, qual seja, R$ 13.147.684,09 (treze milhões, cento e quarenta

e sete mil, seiscentos e oitenta e quatro reais e nove centavos), percebe-

se a vultosidade dos gastos públicos com publicidade, o que revela mais

uma vez, o descaso do ACIONADO com a gestão municipal e com os

recursos públicos.

De fato, é sabido por todos a precária situação financeira

em que o Município de Salvador se encontra. Não é razoável nem

proporcional que seja gasta tamanha quantia com publicidade quando as

necessidades básicas da população reclamam melhor atendimento,

conforme bem salientou a Corte de Contas.

Considerando-se as limitações financeiras do Município,

cabe ao gestor gerir os recursos de forma mais cuidadosa do que o

normal, devendo empregar as receitas auferidas naquilo que melhor

representa o interesse público.

Por óbvio, a publicidade da atuação da gestão é atividade

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secundária, não devendo merecer maior dispêndio de recursos. A vultosa

quantia que tem sido gasta anualmente pelo Município com publicidade

revela-se desarrazoada e desproporcional, podendo ser empregada em

atividades e despesas que tenham possibilidade de levar melhorias à

população e às próprias condições estruturais do Município, que também

são deficitárias.

Ressalte-se que, em que pese o Prefeito possuir

discricionariedade administrativa na condução da gestão, a razoabilidade

e os demais princípios regentes do regime jurídico administrativo devem

direcionar, pautar e determinar a atuação do gestor, que não pode

desrespeitá-los, justificando a sua conduta com base na liberdade de

atuação que possui.

Não se pode esquecer também que o exercício de 2011

foi exatamente aquele que antecedeu o pleito eleitoral, sendo clara a

intenção da gestão municipal de tentar passar uma imagem positiva da

caótica cidade de Salvador, carente de assistência básica que deveria

ser prestada pelo Município.

Assim, não há dúvidas que o ACIONADO deve ser

responsabilizado pela prática de ato de improbidade administrativa, em

virtude de tais constatações.

E – REFLEXOS DAS IRREGULARIDADES PERPETRADAS PELO ACIONADO NA LEI RESPONSABILIDADE FISCAL

Após o exame do presente processo, restou comprovado que a

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administração municipal deve envidar esforços para manter o equilíbrio entre

as despesas e as receitas públicas, visto que foram verificadas evidências

preocupantes de desequilíbrio financeiro capazes de afetar a solvência do

Município, tais como:

- equivocado planejamento municipal no que tange à estimativa das receitas constantes da lei orçamentária anual, verificando-se, na prática, elevada discrepância entre o previsto e o efetivamente arrecadado;- manutenção da Dívida Fiscal Líquida do Município em valores expressivos, em descumprimento a recomendações constantes do TCM;- déficit financeiro das contas municipais no montante de R$ 172.698.846,09 (cento e setenta e dois milhões, seiscentos e noventa e oito mil, oitocentos e quarenta e seis reais e nove centavos);- baixa cobrança da Dívida Ativa Tributária, tendo sido efetivamente arrecadado, no exercício em questão, o ínfimo percentual de 1,08% (um virgula zero oito por cento);- verificação de insuficiência de recursos para a cobertura das despesas atinentes aos Restos a Pagar, observando-se saldo negativo de R$ 650.654.900,60 (seiscentos e cinquenta milhões, seiscentos e cinquenta e quatro mil, novecentos reais e sessenta centavos);- crescimento da Dívida Fundada, que se mantém em montante expressivo;- elevado dispêndio dos recursos municipais com o pagamento de multas e juros em razão de atrasos no pagamento das obrigações, causando prejuízos às contas.

F – DESCUMPRIMENTO DAS RESOLUÇÕES DO TCM

Observa-se, a partir do exame do Parecer Prévio emitido pelo

TCM, que a Administração Municipal não vem cumprindo integralmente as

Resoluções baixadas pelo TCM, como aliás ocorreu também nos exercícios

anteriores referentes à mesma gestão.

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Nesse sentido, pode-se mencionar o descumprimento à

Resolução TCM n. 1.121/05. Com efeito, o Município de Salvador, no ano de

2011, repassou recursos a entidades civis sem fins lucrativos, por intermédio

de convênios, acordos ajustes ou de outro instrumento congênere, sem que

tenham sido apresentadas as respectivas prestações de contas, conforme

determina a Resolução TCM n. 1.121/05 e o art. 26 da Lei Complementar n.

101/00.

Parcela muito pequena de prestações de contas foi

apresentada na fase recursal, sendo que o Pedido de Reconsideração

colacionou, embora tardiamente, prestações de contas que alcançam o valor

de R$ 422.514,43 (quatrocentos e vinte e dois mil, quinhentos e quatorze reais

e quarenta e três centavos).

Desse modo, reduziu-se o montante de repasse a entidades

civis sem fins lucrativos sem a correspondente prestação de contas para a

quantia de R$ 197.164.829,33 (cento e noventa e sete milhões, cento e

sessenta mil, oitocentos e vinte e nove reais e trinta e três centavos), valor

expressivo a demonstrar, mais uma vez, o descaso do gestor público em

relação aos compromisso inerentes à sua função.

Ademais, deve-se mencionar a situação relativa às multas e

ressarcimentos impostos pelo TCM. Nesse sentido, consoante trazido pelo

Parecer Prévio, as multas impostas pelo TCM aos gestores possuem eficácia

de título extrajudicial, por imposição constitucional, tendo o Prefeito o dever de

recolher as que tenham sido imputadas e cobrar as impostas a terceiros que

não tenham sido pagas tempestivamente.

O Município de Salvador deu sinais de que passou a adotar

algumas providências objetivando a recuperação dos créditos municipais

decorrentes de cominações aplicadas pelo TCM, por intermédio de cobranças

judiciais e extrajudiciais.

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Ocorre que, ainda assim, não há registros da adoção de

providências por parte ex-gestor em relação a numeroso elenco de

cominações, oriundas de diversos processos, listados no Parecer Prévio às fls.

49-59.

Assim, percebe-se que, apesar das inúmeras e reiteradas

ressalvas e advertências feitas pela Corte de Contas, o ACIONADO manteve

comportamento muito aquém do desejável, omitindo-se no que diz respeito à

cobrança de grande parte das multas e ressarcimentos impostos pelo TCM.

Inclusive, o ex-gestor se absteve de recolher muitas das cominações que lhe

foram aplicadas pelo Tribunal.

Além disso, ressalte-se que o ACIONADO, em

descumprimento à Resolução TCM n. 1.224/05, concedeu a si mesmo o parcelamento para o pagamento de algumas das cominações que lhe foram impostos, em número de quarenta e oito, caracterizando, portanto, mais uma ilegalidade.

IV - DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA PERPETRADA NA ESPÉCIE

Dispõe o caput do art. 37 da Constituição Federal que a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

O § 4º, do mesmo dispositivo constitucional, por sua vez,

estabelece que “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.”

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Objetivando imprimir operacionalidade à norma constitucional

supracitada, foi editada a Lei nº 8.429, de 03 de junho de 1992, (Lei de

Improbidade Administrativa), reafirmando os princípios administrativos e

especificando os atos de improbidade, cominando e mensurando as sanções

aplicáveis aos mesmos.

De acordo com as disposições desta lei especial, os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhes são afetos (art. 4º).

Como agente público, para os fins previstos na Lei, deve-se

entender todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente, ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função(art. 2º) nas entidades da administração direta, indireta ou

fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito

Federal, dos Municípios e de Território, dentre outros entes enumerados no art.

1º da Lei nº 8.429/92. Percebe-se, assim, que referido diploma legal direciona-

se a todos os agentes públicos, inclusive Chefes do Poder Executivo, já que

exercem, por eleição, mandato em um dos Poderes do Estado, adequando-se

ao conceito constante do art. 2º.

A conduta do acionado enquadra-se no art. 10, inciso IX, qual

seja, improbidade por prejuízo ao erário em virtude de “ordenar ou permitir a realização de despesa não autorizadas em lei ou regulamento”. Tal

comportamento decorre dos gastos indevidos efetivas com a contratação

irregular de pessoal, constatada a partir do cotejo entre os dados constantes na

narrativa fática, diante dos quais se percebe que grande parte da despesa com

pessoal ativo é empregada na terceirização de mão de obra. Com efeito, a

despesa com terceirizados, no exercício de 2011, equivaleu ao percentual de

32% (trinta e dois por cento) de todo o gasto com pessoal ativo do Poder

Executivo do Município de Salvador.

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Com efeito, considerando o valor de gastos havidos com contratação

temporária de pessoal no ano de 2010, que totalizou R$ 50.000.000,00

(cinquenta milhões de reais), percebe-se, em relação ao ano de 2011, um

aumento dos gastos havidos com esta modalidade de contratação para R$

51.711.793,15, o que equivale a uma diferença para maior de R$ 1.711.793,15 (um milhão, setecentos e onze mil, setecentos e noventa e três reais e quinze centavos), em apenas um ano (!), valor este que urge ser

ressarcido aos cofres públicos municipais, haja vista tratar-se de permissão

para realização de despesa não prevista em lei.

Ademais, deve-se também mencionar a deliberada falta de atuação do

ACIONADO na execução das multas impostas pelo TCM, vez que não adotou

providências em relação ao numeroso elenco de cominações, impostas pela

Corte de Contas, conforme já argumentado. Apesar das inúmeras e reiteradas

ressalvas, o ACIONADO manteve-se inerte, omitindo-se, de maneira livre e

consciente, no que diz respeito à cobrança de grande parte das multas e

ressarcimentos impostos pelo TCM. Segundo apurado pelo Tribunal o valor

referente às multas e ressarcimentos correspondente a R$ 10.528.386,14 (dez milhões, quinhentos e vinte e oito mil, trezentos e oitenta e seis reais e quatorze centavos), quantia esta que também deve ser ressarcida aos cofres públicos municipais pelo acionado.

Ressalte-se que para a incidência do art. 10, da Lei nº 8.429/92 basta a

verificação da culpa do agente público, consubstanciada na sua negligência ou

imprudência.

Incorre também o acionado no art. 11, da Lei n. 8.429/92, como já

explicitado acima, de acordo com o qual “constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições(...)”. Para

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configuração da improbidade por violação de princípios, necessário se faz a

presença do dolo, como elemento subjetivo do tipo.

V - DO DOLO DO ACIONADO

Alguns autores são incisivos em afirmar que, para incidência do

art. 11, da Lei n. 8.429/92, é necessário que o elemento subjetivo que as

motiva seja o dolo, quer dizer, necessárias se fazem a consciência da ilicitude

e a vontade de praticar o ato antijurídico2, uma vez que a Lei de Improbidade

somente admitiu ato de improbidade decorrente de conduta culposa na

hipótese do art. 10.

A atuação do administrador público é sempre voltada ao

atendimento de um interesse público. Para a sua relação com a coisa pública,

pressupõe-se que aquele possui certa especialidade dentro da sua área de

atuação, conhecendo com profundidade todas as atribuições que lhe são

conferidas. Sendo assim, não se pode comparar o dolo e culpa que rondam o

agir do cidadão comum com aqueles elementos subjetivos no âmbito da

Administração Pública.

Com efeito, pode-se afirmar que, quando se exige a presença do

dolo como elemento subjetivo necessário para incidência do art. 11 da Lei de

Improbidade, é suficiente a presença do dolo eventual, ou seja, basta que o agente tolere o resultado, consinta em sua provocação ou tenha se conformado com o risco da realização do tipo3.

Desta forma, basta que tolere a violação de princípios para

configuração do dolo, capaz de gerar a responsabilização do agente por ato

de improbidade, elencado no art. 11, da Lei n. 8.429/92. Se assim não fosse,

com toda certeza tornar-se-ia inaplicável o art. 11, uma vez que dificilmente

2 PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; e FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Improbidade Administrativa – Aspectos Jurídicos da Defesa do Patrimônio Público. São Paulo: Atlas, 1998. p. 120.3 FRANCO, Silva Alberto et al. Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 109.

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se conseguiria provar a efetiva vontade do administrador de violar os

princípios administrativos.

No presente caso é flagrante o dolo do ACIONADO na forma

eventual.

Com efeito, no que concerne às ilegalidades abordadas nesta

demanda, como a não aplicação do percentual mínimo na educação, a

ausência de cobrança das multas e ressarcimentos impostos pelo TCM, a

baixa cobrança da Dívida Ativa Tributária, o excesso de terceirização na

Administração municipal, entre outras, por certo que há o dolo eventual do

ACIONADO, pois o mesmo, ao deixar de exercer o seu poder de fiscalização

e controle sobre os agentes políticos por ele nomeados, assumiu o risco das

ilicitudes observadas.

A flagrante violação ao princípio da legalidade verificada na

espécie, constitui quebra do dever de lealdade no trato da coisa pública e,

consequentemente, ofensa ao princípio da moralidade administrativa.

Agrava-se a situação quando se observa a reiterada posição do TCM acerca da rejeição das contas municipais, bem como as inúmeras advertências e ressalvas que vinham sendo feitas pela Corte no que tange às ilegalidades relativas à gestão do ACIONADO. Desse modo, não há dúvidas de que o ex-prefeito tinha conhecimento da situação enfrentada pelo Município de Salvador e dos ilícitos que praticava, assumindo, portanto, o risco decorrente de suas atitudes.

É inegável que tudo quanto constatado e narrado nesta

demanda, além de gerar prejuízo ao erário municipal atenta contra os

princípios que norteiam o ordenamento jurídico brasileiro, necessitando de uma

resposta por parte do Poder Judiciário, no sentido de legitimar a aplicação das

sanções constantes do art. 12, inciso III, da Lei nº 8.429/92.

VI. DO PEDIDO LIMINAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS

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Pretende-se, no presente caso, a decretação da medida cautelar de

indisponibilidade de bens, prevista no art. 37, § 4º da Constituição Federal e no

art. 7º da Lei nº 8.429/92.

São requisitos das medidas cautelares o fumus bonis juris e o periculum in

mora.

Para Humberto Theodoro Júnior4, o fumus bonis juris “há de revelar-se apenas como o interesse que justifica o “direito de ação”, ou seja, o direito ao processo de mérito”. Já o periculum in mora, na lição do renomado

jurista, consiste “no fundado temor de que, enquanto aguarda a tutela definitiva, venham a faltar as circunstâncias de fato favoráveis à própria tutela”. É o “perigo da demora” na verdadeira acepção do brocardo latino.

Fábio Medina Osório5 com um entendimento mais flexível da abrangência do

periculum in mora, acolhido pelas normas processuais pátrias, entende que

este requisito “emerge, via de regra, dos próprios termos da inicial, da gravidade dos fatos, do montante, em tese dos prejuízos causados ao erário”.

A demonstração do dano ao erário na Ação de Improbidade, por si só já justifica a medida de indisponibilidade. Nesse sentido, segundo parte

dominante da doutrina, a exigência de prova, mesmo que indiciária, da

intenção do agente de frustrar-se à efetiva condenação representaria, no ponto

de vista prático, o irremediável esvaziamento da indisponibilidade, perseguida

em nível constitucional (art.37, parágrafo 4º da CF) e legal (art. 7º da Lei nº

4

? Theodoro Júnior, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Forense: Rio de Janeiro, 1993, p. 367.

5

? Osório, Fábio Medina. Improbidade Administrativa: observações sobre a Lei nº 8.429/92. Porto Alegre: Síntese, 1998, p. 236.

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8.429/92). Segundo José Roberto dos Santos Bedaque “a indisponibilidade prevista na Lei de Improbidade é uma daquelas hipóteses nas quais o próprio legislador dispensa a demonstração do perigo de dano”6.

Os fatos apurados na fase inquisitorial não deixam dúvidas quanto à lesão

causada ao erário, fruto de condutas violadoras da lei e dos princípios

administrativos praticadas pelo acionado.

Na lição de Rogério Pacheco “verificada, a partir da disciplina contida no art. 10 da Lei nº 8.429/92, a ocorrência de lesão ao erário, o acervo patrimonial do agente, presente e futuro estará sujeito à responsabilização, aplicando-se, aqui, a regra geral de que o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei (art. 591 do CPC). Também o patrimônio do extraneus que tenha auferido os benefícios da improbidade”7.

Seguindo o mesmo entendimento, dispõe acerca do tema o Superior Tribunal

de Justiça:

“1. Trata-se na origem de Ação Civil de ressarcimento de

danos ao Erário combinado com pedido liminar de

indisponibilidade de bens e exibição de documentos

contra deputados, servidores e gestores da Assembleia

Legislativa Estadual alegadamente responsáveis por

6

? Bedaque, José Roberto dos Santos. Tutela Jurisdicional Cautelar e Atos de Improbidade Administrativa in Improbidade Administrativa: questões polêmicas e atuais. São Paulo, Malheiros, 2001, p. 266.

7

? Alves Pacheco, Rogério e Garcia, Emerson. Improbidade Administrativa. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004, p. 827.

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desvios no montante aproximado de R$ 1,1 milhão (valor

histórico). (...)

2. Requerida a indisponibilidade de bens, foi ela

indeferida na origem, por ausência dos pressupostos

autorizadores. Contra a decisão, o Ministério Público

interpôs Recurso Especial – amparado na tese da

verossimilhança demonstrada documentalmente e do

periculum in mora implícito -, que foi provido pela Turma,

acolhendo-se a tese defendida.

3. Os Embargos Declaratórios, manifestamente

infringentes, não constituem instrumento adequado para a

rediscussão da matéria de mérito.

4. Não fosse isso, é assente na Segunda Turma do STJ o entendimento de que a decretação de indisponibilidade dos bens não está condicionada à comprovação de dilapidação efetiva ou iminente de patrimônio, porquanto visa, justamente, a evitar dilapidação patrimonial. Posição contrária tornaria difícil, e muitas vezes inócua, a efetivação da Medida Cautelar em foco. O periculum in mora é considerado implícito. Precedentes do STJ inclusive em Recursos

derivados da "Operação Arca de Noé" (REsp

1205119/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Mauro

Campbell Marques, Dje 28.10.2010; REsp 1203133/MT,

Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe

28.10.2010; REsp 1161631/PR, Rel. Ministro Humberto

Martins, Segunda Turma, DJe 24.8.2010; REsp

1177290/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Herman

Benjamin, Dje 1.7.2010; REsp 1177128/MT, Segunda

Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, Dje 16.9.2010;

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REsp 1134638/MT, Segunda Turma, Relator Ministra

Eliana Calmon, Dje 23.11.2009.

5. O fumus boni iuris está presente e foi demonstrado por meio da expressiva

lesividade narrada, não restando dúvida, portanto, que a pretensão de “integral

reparação de danos” será alcançada por intermédio da decretação da

indisponibilidade de bens do acionado, para o restabelecimento do status quo

ante.

A indisponibilidade de bens significa a impossibilidade de alienação dos

mesmos, visando garantir a execução da sentença de mérito que condenar o

acionado ao ressarcimento de danos provocados ao patrimônio público, dentre

outras sanções cabíveis. Ou seja, busca garantir futura execução por quantia

certa.

Diante das considerações acima esposadas, requer o Ministério Público a

concessão de MEDIDA LIMINAR de INDISPONIBILIDADE DE BENS do

acionado, inaldita altera pars, no mínimo ora apontado de R$ 12.240.179,29 (doze milhões, duzentos e quarenta mil, cento e setenta e nove reais e vinte e nove centavos), com a finalidade de que:

A. seja expedido expedição de ofícios aos cartórios de Registros de Imóveis

desta Comarca de Salvador-BA, determinando a averbação das respectivas

matrículas, da INALIENABILIDADE DOS BENS OU DIREITOS, porventura

existentes, em nome do acionado;

B. em face da possibilidade de existirem outros bens imóveis fora da

circunscrição deste município, bem como outros bens não sujeitos a registro

imobiliário, requer seja oficiada à Receita Federal a fim de que forneça cópia da

última DECLARAÇÃO DE BENS E RENDIMENTOS do acionado;

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C. seja oficiado ao Banco Central - BACEN e à Companhia Brasileira de

Liquidação e Custódia, a fim de que, nos limites do permissivo legal, sejam

alcançados pela medida acautelatória;

D. seja oficiado ao DETRAN para que conste a medida constritiva nos

possíveis veículos pertencentes ao acionado;

Nesse sentido, trazemos ainda à colação, decisão do TRF da 1ª Região8,

verbis:

“a decisão que determina a indisponibilidade de bens é medida que pode e deve, muitas vezes, ser tomada antes do exame do recebimento da inicial, antes mesmo de proceder-se a notificação (§ 7º do art. 17 da Lei 8.429/92), desde que presentes os requisitos do fumus boni iuris e periculum in mora, para acautelamento dos bens do réu, enquanto aguarda-se o desenrolar do processo. Trata-se de uma medida cautelar preparatória, não implicando cerceamento de defesa”

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aumento e diminuição de fonte.

Com efeito, a Jurisprudência do STJ estabelece que a indisponibilidade deve recair sobre o patrimônio do réu de modo suficiente a garantir o integral ressarcimento do prejuízo ao erário, levando-se em consideração, ainda, o valor de possível multa civil como sanção autônoma. Assim, a medida cautelar de indisponibilidade de bens, prevista na LIA, trata-se de uma tutela de evidência, bastando a comprovação da verossimilhança das alegações, não 8

? AG 2006.01.00.020535-3/MA, Rel. Desembargador Federal Tourinho Neto, Terceira Turma, DJ de 09/03/2007)

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existindo prejulgamento a respeito da culpa dos agentes em relação às irregularidades na decretação da indisponibilidade dos bens, não tendo a decisão caráter sancionatório. O que se busca com essa medida é a futura reparação dos danos, no momento da condenação.

VII- DO PEDIDO

Frente ao exposto e com esteio nos dispositivos legais invocados, pede o Parquet:

1. a autuação da presente ação, com os documentos e procedimentos que a instruem;

2. seja observado o rito ordinário previsto no artigo 17, caput, da Lei 8.429/92, com a notificação preliminar do acionado para que, querendo, ofereçam a defesa preliminar que tiverem, no prazo legal;

3. Após o recebimento da inicial, seja determinada a citação do acionado para, querendo, no prazo de quinze dias, contestar a presente demanda, sob pena de revelia, respondendo-a em todos os seus termos, até a decisão final;

4. A CIÊNCIA do MUNICÍPIO DE SALVADOR, para o exercício da faculdade prevista no art. 17, § 3o, da Lei 8.429/92;

5. A procedência total da ação, com a condenação dos acionados, no que couber, nas sanções previstas no artigo 12, inciso II, da Lei nº 8.429/92, quais sejam: a perda da função pública; suspensão de direitos políticos pelo prazo de cinco a oito anos; ressarcimento dos danos causados ao patrimônio público no valor de R$ 12.240.179,29 (doze milhões, duzentos e quarenta mil, cento e setenta e nove reais e vinte e nove centavos), nos termos do art. 18 da Lei nº 8429/92; pagamento de multa civil - estipulada de acordo com o que dispõe o mesmo artigo - e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

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6. Caso não seja aceita a tese de prejuízo ao erário, sejam os acionados condenados, também no que couber, nas medidas sancionatórias previstas no art. 12, III do mesmo diploma legal – diante da inconteste violação de princípios, assim: perda da função pública; suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos; pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos;

7. Sejam as intimações do autor feitas pessoalmente, mediante entrega e vista dos autos, com os benefícios inerentes aos prazos ministeriais;

8. Sejam, por fim, o réu condenado aos ônus da sucumbência, os quais deverão ser revertidos para o Fundo Especial do Ministério Público do Estado da Bahia;

9. Protesta e requer por todos os meios de prova em direito admitidos, em especial pelos depoimentos dos réus, pena de confissão, inquirição de testemunhas, apresentação de documentos em contra-prova, perícias, inspeções, vistorias, etc.

Dá-se a causa o valor de R$ 12.240.179,29 (doze milhões, duzentos e quarenta mil, cento e setenta e nove reais e vinte e nove centavos).

Termos em que,

Pedem deferimento.

Salvador, 20 de agosto de 2013.

Heliete Viana Rita Tourinho Célia Boaventura Patrícia Medrado Adriano Assis

Promotores de Justiça integrantes do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa – GEPAM