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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR IMPETRANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO IMPETRADO: JUIZ DE DIREITO DA 1.ª VARA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ, por seus Promotores de Justiça em exercício junto à Promotoria de Justiça de Execução Penal e Corregedoria de Presídios da Comarca de Fortaleza, com fundamento no art. 5.°, inciso LXIX, da Constituição Federal, da Lei n.º 12.016/2009 e art. 32, inciso I da Lei n.º 8.625/93, interpõe o presente MANDADO DE SEGURANÇA com pedido liminar contra ato do Excelentíssimo Senhor Luiz Bessa Neto, Juiz de Direito da 1.ª Vara de Execução Penal e Corregedoria de Presídios da Comarca de Fortaleza, oriundo de decisão proferida nos autos do processo de execução

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ

PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR IMPETRANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO IMPETRADO: JUIZ DE DIREITO DA 1.ª VARA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO

CEARÁ, por seus Promotores de Justiça em exercício junto à Promotoria

de Justiça de Execução Penal e Corregedoria de Presídios da Comarca de

Fortaleza, com fundamento no art. 5.°, inciso LXIX, da Constituição

Federal, da Lei n.º 12.016/2009 e art. 32, inciso I da Lei n.º 8.625/93,

interpõe o presente MANDADO DE SEGURANÇA com pedido liminar

contra ato do Excelentíssimo Senhor Luiz Bessa Neto, Juiz de Direito da 1.ª

Vara de Execução Penal e Corregedoria de Presídios da Comarca de

Fortaleza, oriundo de decisão proferida nos autos do processo de execução

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penal n.º 0049350-34.2008.8.06.0001, o que o faz com supedâneo nas

razões fático-jurídicas abaixo relacionadas:

DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DA ADEQUAÇÃO E DO CABIMENTO DO MANDAMUS.

A legitimidade ad causam do Ministério Público

para a impetração de mandado de segurança, por intermédio dos Promotores

de Justiça oficiantes na Vara de Execução Penal e Corregedoria de Presídios

da Comarca de Fortaleza, exsurge da expressa previsão legal do art. 32,

inciso I, da Lei n.º 8.625/93.

Por força do citado dispositivo legal, tem o

Promotor de Justiça legitimidade para impetrar o mandamus perante os

tribunais locais, iniciando, na segunda instância, esta ação impugnativa

autônoma, cabendo, a partir de então, aos titulares do cargo de Procurador

de Justiça, acompanhá-la no desdobramento da função ministerial. Eis o

teor da mencionada regra, in verbis:

“Art. 32. Além de outras funções cometidas na

Constituição Federal e Estadual, na Lei

Orgânica e demais leis, compete aos

Promotores de Justiça, dentro de suas esferas

de atribuições:

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“I - impetrar habeas corpus e mandado de

segurança e requerer correição parcial,

inclusive perante os Tribunais locais

competentes”.

Disposição idêntica foi repetida no art. 75, inciso

I, da Lei Complementar Estadual n.º 72, de 12 de dezembro de 2008, o qual

dispõe:

“Art. 75. Além das atribuições previstas nas

Constituições Federal, Estadual e demais Leis,

compete aos Promotores de Justiça exercer as

atribuições do Ministério Público junto aos

Órgãos jurisdicionais de primeira instância,

competindo-lhes ainda:

“I – impetrar habeas corpus, mandado de

segurança e de injunção e requerer correição

parcial, inclusive perante os Tribunais

estaduais”.

O extinto Tribunal de Alçada Criminal do Estado

de São Paulo pontificou:

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“Pacífica a legimatio ad causam e a plena

capacidade postulatória do Promotor de Justiça

para impetrar mandado de segurança

diretamente na instância superior, quanto mais

havendo violação de direito líquido e certo

carente de amparo legal, e a presença do fumus

boni juris e periculum in mora” (TACRIM/SP,

Rel. Ribeiro Machado, in RT 648/296).

No mesmo diapasão, tem-se julgado oriundo do

Superior Tribunal de Justiça, guardião da inteireza dos termos contidos na

legislação federal:

“MANDADO DE SEGURANÇA.

IMPETRAÇÃO POR PROMOTOR DE

JUSTIÇA JUNTO A TRIBUNAL LOCAL. I. O

art. 32, inc. I, da Lei n° 8.625, de 12.02.1993

(Lei Orgânica Nacional do Ministério Público)

admite às expressas que o Promotor de Justiça

impetre mandado de segurança perante os

Tribunais locais. (STJ, RMS 5.370-9/SP, 4.ª

Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, in DJU

29.05.1995).

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Ao mais, vislumbra-se plenamente adequado o

remédio heróico para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida.

Com efeito, é pacífico o entendimento segundo o

qual é cabível mandado de segurança contra ato judicial de qualquer

natureza, quando violador de direito líquido e certo, e não exista

possibilidade de coibição eficaz pelos recursos comuns. Mesmo que

previsto o recurso, mas sendo este destituído de efeito suspensivo, autoriza-

se o uso concomitante do mandamus para obstar a ilegalidade, conferindo-

lhe aludido efeito.

De fato, não há outro meio adequado para

impugnar, eficazmente, a decisão ilegal, porquanto o agravo em execução,

nos termos do artigo 197 da Lei da Execução Penal, é destituído de efeito

suspensivo.

Especificamente sobre a legitimidade do

Ministério Público para propor mandado de segurança visando à concessão

de efeito suspensivo no agravo em execução, há que se considerar que,

dentre as funções ministeriais, encontram-se aquelas que visam tutelar a

coletividade, devendo ser-lhe reconhecidas não só a legitimidade como a

própria capacidade postulatória em feitos desta natureza.

Deitando luzes sobre a questão, os Tribunais de

Justiças vaticinaram em acórdãos vazados nos seguintes termos:

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“MANDADO DE SEGURANÇA. EFEITO

SUSPENSIVO A RECURSO QUE NÃO O

TEM. AGRAVO DO ART. 197 DA LEP.

PRESENÇA DOS REQUISITOS

AUTORIZATIVOS. CONSEQUENTE

CONCESSÃO DAQUELE EFEITO A

TÍTULO EXCEPCIONAL. Nada impede a

concessão de segurança para,

excepcionalmente, atribuir-se efeito suspensivo

ao agravo a que se refere o art. 197 da Lei nº

7.210/84 (Lei de Execução Penal), desde que

postos à mostra os requisitos do fumus boni

iuris e do periculum in mora, o que não atrita

com a Súmula 267 do Sumo Pretório” (TJMG,

4.ª Câmara Cível, Rel. Des. Hiparco Immesi, p.

em 04/04/2002).

“MANDADO DE SEGURANÇA.Impetração

por Promotor de Justiça buscando a concessão

de efeito suspensivo a recurso de agravo em

execução interposto contra decisão que,

aplicando a Lei n.° 9.714/98, que deu nova

redação ao art. 44 do Código Penal, substitui a

pena privativa de liberdade imposta

definitivamente a condenado por tráfico de

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entorpecente por pena restritiva de direitos.

Decisão teratológica. Ordem concedida” (TJSP,

4ª Câm. Crim, MS n.° 276.920-3, Rel. Des.

Passos de Freitas, j. em 20.04.1999).

“MANDADO DE SEGURANÇA. Legitimidade

ativa do Ministério Público para impetração.

Cabimento contra ato judicial passível de

recurso para a este emprestar efeito suspensivo

quando não o tiver e a execução do decisum

venha acarretar danos de difícil reparação.

Segurança concedida” (TJDFT, Câmara

Criminal, MS n.º 673196/DF (88368), Rel. Des.

Otávio Augusto. j. 21.08.1996, in DJU

29.10.1996, p. 19.357).

“MANDADO DE SEGURANÇA.

IMPETRAÇÃO PELO MINISTÉRIO

PÚBLICO, QUE TEM LEGITIMIDADE

ATIVA, VISANDO À OBTENÇÃO DE

EFEITO SUSPENSIVO EM RECURSO EM

SENTIDO ESTRITO CONTRA DECISÃO

CONCESSIVA DE PRISÃO CAUTELAR

DOMICILIAR. OCORRÊNCIA. O Ministério

Público tem legitimidade ativa para impetrar

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mandado de segurança visando à obtenção de

efeito suspensivo em recurso em sentido estrito

contra decisão concessiva de prisão cautelar

domiciliar. (TACRIMSP, 8.ª Câmara,

Mandado de Segurança nº 350.288/1, Rel.

Ericson Maranho. j. 16.12.1999).

Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça tem

confirmado o entendimento ora demonstrado, conforme se depreende do

aresto abaixo trasladado:

“PENAL. PROCESSUAL PENAL.

MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO

PARA DAR EFEITO SUSPENSIVO A

AGRAVO. ATO DE RELATOR. LIMINAR.

HABEAS CORPUS. I. O pedido de habeas

corpus é contra a liminar deferida pelo Relator,

não se podendo ingressar no mérito do

mandado de segurança, sob apreciação pelo

Tribunal estadual. II. Presentes o fumus boni

iuris e o periculum in mora, é de se deferir

liminar em mandado de segurança, visando dar

efeito suspensivo a recurso de agravo. III.

Constrangimento ilegal não configurado. IV.

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Habeas corpus conhecido, pedido deferido”

(RSTJ, 107/331).

Com efeito, não poderia ser outro o entendimento

a ser abraçado, haja vista que é plena a capacidade postulatória do

Ministério Público no processo penal, notadamente nas hipóteses em que

age como dominus litis.

Ora, se a Promotoria de Justiça pode requerer

diligências, se pode manifestar recurso contra decisão que não agasalha a

pretensão que deduziu, pode, à evidência impetrar ação de segurança contra

decisório judicial nas hipóteses em que o writ se apresente como substituto

de recurso.

O tratadista JULIO FABBRINI MIRABETE, em

sua festejada obra sobre a execução penal, ensina, litteratim:

“Não concedeu a lei ao agravo em execução o

efeito suspensivo sob o fundamento teórico de

que, como regra geral, não haverá dano

enquanto se aguarda a decisão do recurso

atacável interposto pela parte. Entretanto,

apesar da orientação em geral de que, sendo o

despacho atacável por meio de recurso próprio,

incabível é o mandado de segurança, tem-se

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admitido que, presentes o fumus boni iuris e o

periculum in mora, deve-se admitir o mandamus

impetrado pelo agravante para dar efeito

suspensivo ao agravo em execução” (autor cit.,

in Execução Penal. 11ª Ed.,Editora Atlas, São

Paulo, 2004, p. 820).

DOS FATOS

O sentenciado ELISMAR MENDES

GONÇALVES, qualificado na inclusa guia de recolhimento que instrui o

presente mandamus, foi condenado à pena de 08 (oito) anos e 02 (dois)

meses de reclusão, pelo cometimento do hediondo crime de tráfico ilícito de

entorpecentes, catalogado no art. 33 c/c art. 40, inciso I, da Lei n.°

11.343/2006.

O delito foi perpetrado no dia 02 (dois) de

fevereiro do ano de 2007, vale dizer, já sob a vigência da Lei n.° 8.072/90,

sujeitando o sentenciado aos rigores do citado diploma legal.

Durante o cumprimento de sua pena, fixada

inicialmente no regime fechado, pleiteou, através de seu procurador, a

progressão do regime prisional, obtendo o benefício de progressão para o

regime semiaberto em data de 20 (vinte) de julho próximo passado.

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Posteriormente, ingressou com pedido de

homologação de trabalho externo, o que após a averiguação de praxe e

constatação da veracidade da proposta de emprego e capacidade

empregatícia da empresa, mereceu parecer favorável do Ministério Público,

sendo que o sentenciado ELISMAR MENDES GONÇALVES deveria

permanecer com a obrigação de recolhimento ao cárcere nos dias feriados

e finais de semana.

Não obstante a regra legal, o mm. Juiz da 1ª. Vara

de Execução Penal desta Comarca de Fortaleza, ora autoridade apontada

como coatora, deferiu o trabalho externo pleiteado, ao mesmo tempo em

que concedeu ao Sr. ELISMAR MENDES GONÇALVES a prisão

domiciliar, a qual sequer foi objeto de pedido formulado pela defesa do

sobredito apenado, tendo isentado este completamente de cumprir sua pena

com o recolhimento nos períodos de folga como determina a legislação

pertinente (cópia anexa).

Sabe-se da existência nesta comarca de Fortaleza

de unidade prisional para recolhimento dos sentenciados em regime

semiaberto, a saber: o IPPOO I, o qual, inclusive, abrigava o sentenciado

ELISMAR MENDES GONÇALVES até a concessão de trabalho externo e

prisão domiciliar conferida ao mesmo pela autoridade impetrada.

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Inconformado, interpôs o Ministério Público, a

tempo e modo, o competente agravo em execução, nos moldes do art. 197,

da Lei 7.210/84 (cópia anexa), que, contudo, não goza de efeito suspensivo,

motivo pelo qual, em defesa da sociedade, impetra-se a presente ordem, a

fim de se atribuir o necessário efeito suspensivo à referida via recursal, até o

julgamento do apelo, evitando-se que o Sr. Elismar Mendes Gonçalves

esteja cumprindo (sic) sua pena, sem que haja qualquer obediência aos

mandamentos legais contidos na Lei de Execução Penal.

DO DIREITO

Visa-se pela execução fazer cumprir o comando

emergente da sentença penal condenatória, e na execução penal, assim

como na aplicação da lei penal, o magistrado está jungido pelo principio da

legalidade.

A matéria referente à prisão domiciliar encontra-se

regulada no art. 117 da Lei nº 7.210/84, e sua concessão restringem-se às

hipóteses ali previstas. Dispõe o referido artigo:

“Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento

do beneficiário de regime aberto em residência

particular quando se tratar de:

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“I – condenado maior de 70 (setenta) anos;

“II – condenado acometido de doença grave;

“III – condenada com filho menor ou deficiente

físico ou mental;

“IV – condenada gestante”

Como se viu, o rol de hipóteses é taxativo,

numerus clausus.

Dessa forma, entende o Ministério Público, por ser

o rol de hipóteses do art. 117 taxativo – numerus clausus - não ser cabível a

concessão, da forma como estipulada na decisão interlocutória que

concedeu ao sentenciado Elismar Mendes Gonçalves o beneplácito da

prisão domiciliar em razão da superlotação da colônia agrícola ou industrial

ou de casa de albergado, ou mesmo, pela precariedade dos estabelecimentos

prisionais existentes e a esse fim destinadas.

Cediço que a crise instalada na execução penal não

se restringe à situação dos sentenciados, refletindo, também, na segurança

pública.

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A parcela ordeira da população, que financia com

o pagamento de impostos, taxas etc, a estruturação de um sistema que

idealiza, busca e não atinge, é também atingida, vítima do medo, do crime e

também da inércia/ineficiência dos poderes instituídos, ineficazes ante a

incontida ascensão do império em que reina absoluta a ilicitude penal.

Nesse ponto, oportuno citar dois elementos

pinçados de um rol de fatores que Rui Stocco denominou ‘causas

supralegais de impunidade’: o ‘sistema prisional inadequado em todo o

país’ e a ‘carência de penitenciárias, casas de detenção e institutos penais’.

Nesse azo, dúvida não resta de que a impunidade

conturba o estrato social ao transitar em todas as suas camadas, permeando,

trespassando e rompendo sua formação moral e enfraquecendo sua

estrutura.

Se a permanência em residência particular do

condenado à pena no regime aberto, sem qualquer controle ou fiscalização

por parte da Administração, já significaria a total impunidade pelo crime

praticado, acarretando graves prejuízos à defesa social, mais ainda no caso

sob exame, em que a autoridade impetrada concedeu o benefício da prisão

domiciliar ao sentenciado Elismar Mendes Gonçalves, sem justificar em

que consiste a excepcionalidade da medida, olvidando-se de que descabe

prisão domiciliar em cumprimento de pena no regime semiaberto.

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Nesse sentido, tem-se o escólio lapidar do saudoso

JULIO FABBRINI MIRABETE:

“A prisão domiciliar foi introduzida no Brasil

pela Lei n.° 5.256, de 6-4-1967, para recolher o

preso provisório à própria residência nas

localidades onde não houver estabelecimento

adequado ao recolhimento dos que têm direito

à prisão especial. Com introdução do regime

aberto na legislação penal, efetuada pela Lei n°

6.416, de 24-5-77, e diante da inexistência de

locais adequados para o cumprimento da prisão

albergue, os aplicadores da lei penal

depararam-se com penosas alternativas:

admitir o alojamento noturno em celas

superlotadas das cadeias públicas; não

conceder o regime, embora o sentenciado

estivesse em condições de adequar-se a ele; ou

conceder a prisão domiciliar, com o

recolhimento em sua própria residência. Não

havendo o Poder Público diligenciado para a

construção de estabelecimentos destinados ao

regime aberto em todas as comarcas, juízos e

tribunais passaram a conceder a chamada

‘prisão albergue domiciliar’, transformada em

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verdadeiro simulacro da execução da pena pela

inexistência de qualquer controle ou

fiscalização na obediência das condições

impostas. A prisão albergue domiciliar passou,

assim a ser forma velada de impunidade, de

que os juízes lançavam mão em último recurso,

na impossibilidade de o benefício ser desfrutado

em local adequado.

“Com a finalidade de evitar a concessão

indiscriminada de prisão domiciliar, fato que

contribuiu para o descrédito do regime aberto,

com graves prejuízos à defesa social, a Lei de

Execução Penal destinou-a exclusivamente aos

condenados que estejam nas condições especiais

previstas expressamente, distinguindo as duas

espécies de prisão em regime aberto: a prisão

albergue e a prisão domiciliar. Dispõe o art. 117

dispõe que "somente” se admitirá o

recolhimento domiciliar em residência

particular quando se tratar de condenado que

esteja em uma das situações estabelecidas no

referido dispositivo, e esclarece a exposição de

motivos da lei que o regime aberto, salvo essas

exceções, "não admite a execução da pena em

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residência particular” (autor cit., in Execução

Penal. 9.ª Edição, Editora Atlas, São Paulo, p.

381).

O Supremo Tribunal Federal assim já se

pronunciou sobre o tema em tablado:

“HABEAS CORPUS. PRISÃO ALBERGUE

DOMICILIAR. INEXISTÊNCIA, NA

COMARCA, DE CASA DE ALBERGADO. (...)

O Plenário do Supremo Tribunal decidiu que o

benefício da prisão-albergue só poderá ser

deferido ao sentenciado ‘se houver’, na

localidade da execução da pena, Casa de

Albergado ou outro estabelecimento que se

ajuste às exigências legais do regime penal

aberto. A impossibilidade material de o Estado

instituir Casa do Albergado não autoriza o

Poder Judiciário a conceder a prisão-albergue

domiciliar fora das hipóteses contempladas,

‘em caráter estrito' no art. 117 da Lei de

Execução Penal. (...) A norma legal

consubstanciada no art. 117 da Lei de Execução

Penal instituiu situações subjetivas de

vantagem, que apenas beneficiam aqueles

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sentenciados cujas condições pessoais estejam

nela previstas. Constituindo regra de direito

singular, torna-se ela inextensível e inampliável

a situações outras que lhe sejam estranhas. As

normas legais positivadoras do regime penal

aberto revestem-se de conteúdo programático e

só incidirão plenamente, inclusive para efeito

de deferimento do benefício da prisão-albergue,

a partir do momento em que se torne

materialmente possível, com a existência de

Casa de Albergado ou de estabelecimento

similar, a execução da pena nesse regime”

(STF, in RT 731/500).

Com efeito, se é verdade que, por conta de

deficiência estrutural do sistema carcerário, aos sentenciados não se pode

obrigar o cumprimento de pena em regime mais gravoso do que aquele a

que estejam condenados, também é verdade que é defeso ao magistrado

estender o alcance da prisão domiciliar a hipóteses não previstas na lei,

mais ainda no caso em apreço em que o sentenciado condenado por crime

de tráfico ilícito de entorpecentes, equiparado a crime hediondo, cumpre

pena no regime semiaberto.

Certamente, decisões de tal natureza contribuem

para a sensação de impunidade no meio social, haja vista a indevida

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substituição da pena privativa de liberdade em prisão domiciliar, sem

observância das disposições legais alusivas à matéria.

Ademais, registre-se que não há qualquer

fiscalização eficiente que garanta o cumprimento da pena dos sentenciados

que hoje cumprem reprimenda no regime semiaberto e que foram

contemplados com a prisão domiciliar nos moldes em que concedeu a

autoridade coatora.

Ora, a inexistência do estabelecimento adequado

não impede que o condenado cumpra sua pena no estabelecimento

existente, no regime a que faz jus, nos moldes previstos pela legislação

pertinente.

Em síntese, a questão nuclear do vertente

mandamus cinge-se à discussão quanto à possibilidade de deferimento da

prisão domiciliar sob o argumento de superlotação dos presídios e

consequente escassez de condições dignas propiciadas pelo Estado, ou seja,

fora dos casos elencados no art. 117 da LEP, que estabelece seu cabimento

nas hipóteses de condenado maior de setenta anos, acometido de doença

grave, condenada com filho menor ou deficiente ou, ainda, em se tratando

de gestante.

Trazendo à colação precedente do Órgão

Colegiado do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, infere-se

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que a alternativa adotada pelo mm. Juiz impetrado não encontra respaldo

jurídico:

“EXECUÇÃO. PRISÃO DOMICILIAR.

LOTAÇÃO DE PRESÍDIO. HIPÓTESE NÃO

CONTEMPLADA. CASSAÇÃO. O agravado

não se enquadra em qualquer dos itens do

artigo 117 da mesma legislação: ele não é maior

de setenta anos, não está gravemente doente e

não é mulher nas condições dos itens III e IV. A

concessão da prisão domiciliar teve como base a

superlotação do presídio da comarca. O

Supremo Tribunal Federal, a quem cabe zelar

pelo cumprimento da Constituição, já decidiu,

em sessão plenária, que o benefício da prisão-

albergue só poderá ser deferido ao sentenciado,

se houver, na localidade de execução da pena,

casa do albergado, ou outro estabelecimento

que se ajuste às exigências legais do regime

penal aberto. A impossibilidade material de o

Estado instituir casa do albergado não autoriza

o Poder Judiciário a conceder a prisão-albergue

domiciliar, fora das hipóteses contempladas, em

caráter estrito, no art. 117 da LEP.

Excepcionalmente, aceitam-se a concessão do

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benefício na forma deferida. Não é caso. Aqui,

chama-se a atenção que a punição do apenado

está longe de terminar (27 de agosto de 2013), é

decorrente da prática de vários crimes

acontecidos entre os anos de 2005 a 2007. Além

disso, em 31 de março de 2009 fugiu e

permaneceu vários meses foragido, sendo

recapturado em julho. DECISÃO: Agravo

ministerial provido. Unânime” (TJRS, 7.ª

Câmara Criminal, Agravo n.º 70036054500,

Rel. Des.: Sylvio Baptista Neto, j. em

20/05/2010).

Efetivamente, descabe conferir elasticidade ao rol

previsto no art. 117 da Lei de Execução Penal, não havendo como estender

indiscriminadamente as hipóteses de cabimento da prisão domiciliar a todos

os casos em que o sentenciado cumpre reprimenda em regime semiaberto.

Por óbvio que tal questão diz respeito diretamente

às políticas de investimento da Administração Pública para que sejam

atingidos os objetivos da pena, sendo de conhecimento geral que os

estabelecimentos são desprovidos de condições adequadas, o que,

contudo, por si só, não gera direito ao cumprimento da reprimenda no

domicílio do condenado, inviabilizando por inteiro o Direito Penal

enquanto instrumento de controle social.

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Embora a doutrina e a jurisprudência reconheçam

a possibilidade de se estender de forma criteriosa o benefício da prisão

domiciliar a hipóteses não previstas pelo dispositivo, no caso dos autos o

Juiz da 1.ª Vara de Execução Penal da Comarca de Fortaleza deixou de

justificar em que consistia a excepcionalidade, considerando

exclusivamente a pessoa do sentenciado, da concessão do benefício da

prisão domiciliar ao Sr. Elismar Mendes Gonçalves, nem mesmo atentando

para o fato do mesmo cumprir a pena no regime semiaberto, o qual é

incompatível com a benesse da prisão domiciliar, nem mesmo para a

natureza do crime praticado, tráfico ilícito de entorpecentes.

Dessa forma, a se dar guarida ao decisum

concessivo de prisão domiciliar ao sentenciado ELISMAR MENDES

GONÇALVES, estar-se-á permitindo que o mesmo, efetivamente, deixe de

cumprir a reprimenda penal que lhe foi aplicada depois de todo o desenrolar

do devido processo legal, contribuindo, sobremaneira, para a sensação de

impunidade e insegurança no seio da sociedade.

Nessa esteira de raciocínio, veja-se decisão do

Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:

“AGRAVO EM EXECUÇÃO. PRISÃO

DOMICILIAR. SUPERLOTAÇÃO DOS

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PRESÍDIOS. INDEFERIMENTO. A prisão

domiciliar tem cabimento nas hipóteses do art.

117 da LEP. Embora a doutrina e a

jurisprudência reconheçam a possibilidade de

se estender de forma criteriosa o benefício a

hipóteses não previstas pelo dispositivo, o caso

dos autos não se reveste de excepcionalidade

que justifique a sua concessão. A alegação de

precárias condições das casas prisionais não

determinam, por si só, a possibilidade de prisão

domiciliar Questão relacionada às políticas da

Administração Pública” (TJRS, 7.ª Câm.

Crim., 70041423062/RS, Rel. Des. Naele Ochoa

Piazzeta, data de julgamento: 28/04/2011, data

de publicação: DJ 04/07/2011).

Assim, não obstante a polêmica que o tema

encerra, não se pode concordar com a concessão da prisão domiciliar fora

dos casos legais, pois trata-se de verdadeiro simulacro de cumprimento

da pena, sem qualquer fiscalização estatal, o que contribui,

decisivamente, para o descrédito de todo o sistema jurídico-penal e dificulta

a reinserção do condenado ao convívio social.

Por outro lado, a ausência momentânea de vagas

para o cumprimento de pena no regime semiaberto ou aberto não autoriza a

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concessão da prisão domiciliar fora das hipóteses expressamente previstas

em lei.

Os julgados abaixo colacionados corroboram a

pretensão deduzida pelo Ministério Público. Seja demonstrado, pois:

“A concessão de prisão domiciliar restringe-se

às hipóteses previstas no art. 117, da Lei de

Execução Penal, não sendo suficiente, para

tanto, a ausência de estabelecimento adequado

para o cumprimento da pena em regime

aberto." Ementa parcial (TJMG, 2.ª Câm.

Crim., RAG 000.271.473-1/00, Rel. Des. José

Antonino Baía Borges, j. 10.04.2003).

“Destinar-se o condenado por roubo

qualificado (com emprego de armas), em

regime prisional semiaberto, a cumprir pena

em sua própria residência, sem qualquer

controle ou fiscalização, sob a alegação de

inexistência de Casa do Albergado ou Colônia

Agrícola Industrial na Comarca, significa

simplesmente instituir a total impunidade. Só se

admite a prisão domiciliar nas estritas hipóteses

do art. 117 e incisos da Lei 7.210/84. Recurso

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conhecido e improvido” (TJMG, 1.ª Câm.

Crim., RAG 000.329.090-5/00, Rela. Desa

Márcia Milanez, j. 29.04.2003).

“EXECUÇÃO PENAL. AGRAVO. REGIME

PENITENCIÁRIO. CONDENAÇÕES A

SEREM CUMPRIDAS EM REGIME SEMI-

ABERTO E ABERTO. PRISÃO

DOMICILIAR. INADMISSIBILIDADE.

INOCORRÊNCIA DE QUALQUER DAS

HIPÓTESES PREVISTAS NO ART. 117 DA

LEP. A Lei de Execução Penal destinou a

prisão domiciliar exclusivamente aos

condenados que estejam nas condições especiais

previstas expressamente no seu art. 117.

Inteligência da Súmula 28 da jurisprudência

predominante nesta 1.ª Câmara Criminal.

Recurso a que se nega provimento’ (TJMG, 1.ª

Câm. Crim., RAG 000.305.736-1/00, Rel. Des.

Tibagy Salles, j. 27.05.2003).

“EXECUÇÃO PENAL. PENA DE

RECLUSÃO. PRISÃO DOMICILIAR.

PRESSUPOSTOS. INEXISTÊNCIA. LEP,

ART. 117. BENEFÍCIO DO TRABALHO

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EXTERNO. CONCESSÃO DE OFÍCIO.

Somente é admissível o cumprimento de pena

em residência particular se o condenado

beneficiário do regime aberto, enquadra-se em

uma das situações previstas no art. 117, da Lei

de Execução Penal” (STJ, 6.ª Turma, HC nº

17035-SP, Relator Min. Vicente Leal, in DJ

11/03/2002, p. 281).

“HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL.

REGIME ABERTO. AUSÊNCIA DE CASA

DE ALBERGADO NO LOCAL DE

CUMPRIMENTO DA PENA. PRISÃO

DOMICILIAR. IMPOSSIBILIDADE. I. A Lei

de Execução Penal traz em caráter estrito em

seu art. 117, as hipóteses em que se permitirá a

um condenado a regime aberto cumprir sua

sanção em domicílio particular. II. A

impossibilidade material do Estado instituir

casa de albergado não autoriza de forma

alguma o poder judiciário a conceder a prisão-

albergue domiciliar fora das hipóteses

enumeradas no artigo supracitado. III. Ordem

conhecida e denegada à unanimidade de votos

(TJMA, 2.ª Câm. Crim., HC 019457/2003 -

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(47.160/2003), Rela. Desa. Nelma Celeste Sousa

Silva Sarney Costa, j. 13.11.2003).

Em verdade, o Ministério Público concorda com

aqueles que defendem que uma boa saída para o caso em tela, para se evitar

o ‘estado de impunidade’ consagrado pela restituição prematura da

liberdade como no caso em análise, mas, ao mesmo tempo, não se desviar

da finalidade da pretensão executória, seria a de se ajustar as condições do

regime semiaberto para cumprimento da reprimenda por parte do paciente

em algum estabelecimento penal, permitindo-se, se for o caso, o trabalho

externo, bem como a freqüência de cursos.

Digno de nota que, recentemente, a autoridade

impetrada editou as Portarias n.° 004/2011 e 006/2011, mediante as quais

concedia prisão domiciliar a todos os condenados primários em

cumprimento de pena no regime semiaberto, o que mereceu pronta

intervenção do Ministério Público que através do writ n° 0005717-

68.2011.8.06.000 questionou a ilegalidade das referidas Portarias, em razão

do teor das mesmas ferir de morte o disposto no art. 117, da Lei de

Execução Penal e legislação penal aplicável à espécie.

Cumprindo-nos informar que a Desa.

FRANCISCA ADELINEIDE VIANA, relatora do mandamus junto ao

Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, concedeu a liminar pleiteada,

suspendendo os efeitos das Portarias n°s 004/2011 e 006/2011, inclusive,

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emprestando-lhe efeito ex tunc, de modo a suspender a prisão domiciliar a

presos no regime semiaberto e que tenham por fundamento as referidas

Portarias (cópia anexa).

DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO

O artigo 67 da Lei 7.210/84 estabelece que o

Ministério Público fiscalizará a execução da pena, oficiando no processo

executivo.

Dessume-se daí que o Ministério Público, na

qualidade de custos legis, possui o direito líquido e certo de exigir que a

execução penal obedeça aos ditames da Lei.

Na hipótese vertente, o juiz da execução,

arvorando-se na qualidade de legislador positivo, invadiu a esfera de outro

poder, ao conceder a prisão domiciliar no regime semiaberto, quando a

hipótese somente é de ser deferida no caso de cumprimento de pena no

regime aberto e nos casos excepcionais previstos no art. 117, da Lei de

Execução Penal.

Decidindo desta forma, a autoridade coatora feriu

direito líquido e certo do Ministério Público no tocante à correta execução

da pena.

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Entendimento diverso implicaria em interpretação

verdadeiramente contra legem, como, lamentavelmente, ocorreu na hipótese

impugnada pela via recursal adequada.

DA LIMINAR

Presentes se encontram os requisitos do art. 7º,

inciso III, da Lei 12.016/2009, necessários ao deferimento da medida

liminar ora pleiteada.

Deveras, a manutenção da decisão guerreada até o

julgamento do agravo em execução já interposto acarretará graves prejuízos

à execução penal, haja vista que o preso continuará a cumprir a pena,

ilegalmente, em prisão domiciliar, fora do rol taxativo do art. 117 da Lei de

Execução Penal.

Aguardar o julgamento do recurso próprio – ao

qual a lei não confere efeito suspensivo - importará na manutenção de uma

intolerável ilegalidade, razão por que, para salvaguardar o aludido direito

líquido e certo do Ministério Público, enquanto órgão incumbido pela

fiscalização da execução penal, violada pela decisão ilegal, revela-se

imprescindível a concessão da segurança, inclusive liminarmente,

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conferindo-se efeito suspensivo ao recurso aviado no curso da execução

penal.

Ademais, mister ponderar que o provimento

ulterior do agravo poderá prejudicar a própria recuperação do sentenciado, o

qual, após permanecer em prisão domiciliar, poderá ser novamente

regredido para o regime fechado, além de contribuir para o já insustentável

sentimento de impunidade reinante no País.

E o periculum in mora é indubitável, no momento

em que, com a concessão de prisão domiciliar para o condenado em

questão, que praticou crime de tráfico de droga, equiparado a hediondo,

estará a sociedade, como um todo, sujeita aos seus efeitos, qual seja, o

convívio regular com este, podendo sofrer as eventuais conseqüências dele.

Presente, pois, o primeiro requisito exigido para a

concessão da liminar, qual seja, o periculum in mora.

Por seu turno, o fumus boni juris consubstancia-se

no próprio dispositivo legal, que, expressamente, prevê a prisão domiciliar

somente nas hipóteses previstas no art. 117 da Lei de Execução Penal, o

que, frise-se, não é o caso dos autos, visto que o Sr. Elismar Mendes

Gonçalves cumpre pena atualmente no regime semiaberto, por conseguinte,

não se enquadra em nenhum das hipóteses previstas no art. 117, já referido,

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o qual contém rol taxativo para concessão de prisão domiciliar a

condenados que cumprem pena no regime aberto.

DO PEDIDO

Em razão de todo o exposto, o Ministério Público

requer:

i) a concessão de medida liminar, conferindo-se ao

agravo em execução, já interposto junto à 1.ª Vara de Execução Penal e

Corregedoria de Presídios, o necessário efeito suspensivo, para o fim de

sustar, desde já, os efeitos da r. decisão proferida pela autoridade coatora,

que concedeu ao sentenciado Elismar Mendes Gonçalves a prisão

domiciliar, não obstante o mesmo cumprir pena em regime semiaberto,

determinando os recolhimentos nos dias de folga e feriados;

ii) seja, posteriormente, notificada a autoridade

coatora para prestar as informações que entenda necessárias, nos termos do

art. 7º, inciso I, da Lei 12.016/2009;

iii) seja o presente mandado de segurança

processado na forma da lei e, ao final, concedida a segurança, conferindo-se

efeito suspensivo ao agravo em execução já interposto, para fins de que a

decisão do juiz a quo, que concedeu a prisão domiciliar ao preso Elismar

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Mendes Gonçalves, nos autos da ação de execução penal n° 0049350-

34.2008.8.06.0001, seja suspensa até o julgamento do mencionado recurso.

Embora inestimável, dá-se à causa o valor de R$

200,00 (duzentos reais), exclusivamente para efeitos fiscais.

Nestes Termos,

Pede Deferimento.

Fortaleza-CE, 02 de setembro de 2011.

HUGO VASCONCELOS XEREZ JOSÉ EVILÁZIO ALEXANDRE DA SILVA Promotor de Justiça Promotor de Justiça SANDRA VIANA PINHEIRO Promotora de Justiça

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PEÇAS QUE INSTRUEM O MANDADO DE SEGURANÇA, TODAS EM CÓPIA: 1. Guia de Recolhimento; 2. Denúncia; 3. Sentença condenatória de primeiro grau; 4. Parecer ministerial e decisão do Juízo da 1ª. Vara de Execução Penal desta Comarca de Fortaleza; 5. Pedido de autorização de trabalho externo; 6. Parecer do Ministério Público; 7. Decisão concessiva da prisão domiciliar; 8. Intimação do Ministério Público; 9. Agravo em execução já interposto.

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR IMPETRANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO IMPETRADO: JUIZ DE DIREITO DA 1.ª VARA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO

CEARÁ, por seus Promotores de Justiça em exercício junto à Promotoria de

Justiça de Execução Penal e Corregedoria de Presídios da Comarca de

Fortaleza, com fundamento no art. 5.°, inciso LXIX, da Constituição

Federal, interpõe o presente MANDADO DE SEGURANÇA com pedido

liminar visando cassar os efeitos das Portarias n.° 004/2011 e 006/2011,

datadas respectivamente de 22/06/2011 e 28/07/2011, ambas expedidas pelo

senhor Juiz de Direito da Vara de Execução Penal e Corregedoria de

Presídios, Luiz Bessa Neto, um dos juízes responsáveis pela execução penal

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nesta Comarca de Fortaleza em razão de as ditas portarias serem nulas,

abusivas e ilegais, pelas seguintes razões abaixo relacionadas:

DOS FATOS E DO DIREITO

O Excelentíssimo Magistrado Luiz Bessa Neto, titular

da 1.ª Vara de Execução Penal e Corregedoria de Presídios deliberou, por

intermédio da Portaria n° 004/2011 (cuja cópia segue anexa), em extinguir o

regime semiaberto nesta Comarca de Fortaleza, determinando que a partir 21

de junho de 2011, todos os sentenciados primários, indiscriminadamente,

que estivessem cumprindo pena no regime semiaberto, passassem a cumprir

suas reprimendas em prisão domiciliar.

Posteriormente, o mesmo juiz editou a Portaria n.°

006/2011, datada de 28 (vinte e oito) de julho deste ano de 2011, em que

esclarece que somente teriam direito a gozar o “benefício emergencial”, os

sentenciados primários e desde que os crimes por eles praticados não fossem

hediondos ou a eles equiparados.

Entretanto, e não obstante o conhecimento e a

preocupação do autor das Portarias atacadas por meio do presente writ, em

relação aos problemas enfrentados pelo sistema prisional da Comarca de

Fortaleza, tal questão não pode ser deliberada de modo genérico e abstrato

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pelo Poder Judiciário, cuja função não se confunde com a do Poder

Legislativo, encarregado de editar normas genéricas para toda a população.

Visa-se pela execução fazer cumprir o comando

emergente da sentença penal condenatória, e na execução penal, assim como

na aplicação da lei penal, o magistrado está jungido pelo principio da

legalidade.

A matéria referente à prisão domiciliar encontra-se

regulada no art. 117 da Lei nº 7.210/84, e sua concessão restringe-se às

hipóteses ali previstas. Dispõe o referido artigo:

“Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário

de regime aberto em residência particular quando se

tratar de:

I - condenado maior de 70 (setenta) anos;

II - condenado acometido de doença grave;

III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou

mental;

IV - condenada gestante”.

Como se viu, o rol de hipóteses é taxativo, numerus

clausus.

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Dessa forma, entende o Ministério Público que não é

cabível a concessão, da forma como estipulado por meio das Portarias

atacadas, de prisão domiciliar em razão da inexistência de colônia agrícola

ou industrial ou de casa de albergado, ou mesmo, pela precariedade dos

estabelecimentos prisionais existentes e a esse fim destinadas.

Cediço que a crise instalada na execução penal não se

restringe à situação dos sentenciados, refletindo, também, na segurança

pública.

A parcela ordeira da população, que financia com o

pagamento de impostos, taxas etc, a estruturação de um sistema que idealiza,

busca e não atinge, é também atingida, vítima do medo, do crime e também

da inércia/ineficiência dos poderes instituídos, ineficazes ante a incontida

ascensão do império em que reina absoluta a ilicitude penal.

Nesse ponto, oportuno citar dois elementos pinçados

de um rol de fatores que Rui Stocco denominou ‘causas supralegais de

impunidade’: o ‘sistema prisional inadequado em todo o país’ e a ‘carência

de penitenciárias, casas de detenção e institutos penais’.

Nesse azo, dúvida não resta de que a impunidade

conturba o estrato social ao transitar em todas as suas camadas, permeando,

trespassando e rompendo sua formação moral e enfraquecendo sua estrutura.

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Se a permanência em residência particular do

condenado à pena no regime aberto, sem qualquer controle ou fiscalização

por parte da Administração, já significaria a total impunidade pelo crime

praticado, acarretando graves prejuízos à defesa social, mais ainda no caso

sob exame, em que as Portarias editadas pelo Douto Juízo da Vara de

Execução Penal e Corregedoria de Presídios da Comarca de Fortaleza,

estendem o benefício da prisão domiciliar, indistintamente, a todos os

condenados primários em cumprimento de pena no regime semiaberto, sem

atentar para a análise do caso individual, notadamente, a natureza do crime

levado a efeito pelos beneficiários do “benefício emergencial”.

Nesse azo, Julio Fabbrini Mirabete (in Execução

Penal, 9ª edição, Editora Atlas, p. 381):

“A prisão domiciliar foi introduzida no Brasil pela Lei

n° 5.256, de 6-4-1967, para recolher o preso provisório

à própria residência nas localidades onde não houver

estabelecimento adequado ao recolhimento dos que

têm direito à prisão especial. Com introdução do

regime aberto na legislação penal, efetuada pela Lei n°

6.416, de 24-5-77, e diante da inexistência de locais

adequados para o cumprimento da prisão albergue, os

aplicadores da lei penal depararam-se com penosas

alternativas: admitir o alojamento noturno em celas

superlotadas das cadeias públicas; não conceder o

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regime, embora o sentenciado estivesse em condições

de adequar-se a ele; ou conceder a prisão domiciliar,

com o recolhimento em sua própria residência. Não

havendo o Poder Público diligenciado para a

construção de estabelecimentos destinados ao regime

aberto em todas as comarcas, juízos e tribunais

passaram a conceder a chamada ‘prisão albergue

domiciliar’, transformada em verdadeiro simulacro da

execução da pena pela inexistência de qualquer

controle ou fiscalização na obediência das condições

impostas. A prisão albergue domiciliar passou, assim a

ser forma velada de impunidade, de que os juízes

lançavam mão em último recurso, na impossibilidade

de o benefício ser desfrutado em local adequado.

“Com a finalidade de evitar a concessão

indiscriminada de prisão domiciliar, fato que

contribuiu para o descrédito do regime aberto, com

graves prejuízos à defesa social, a Lei de Execução

Penal destinou-a exclusivamente aos condenados que

estejam nas condições especiais previstas

expressamente, distinguindo as duas espécies de prisão

em regime aberto: a prisão albergue e a prisão

domiciliar. Dispõe o art. 117 dispõe que "somente” se

admitirá o recolhimento domiciliar em residência

particular quando se tratar de condenado que esteja

em uma das situações estabelecidas no referido

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dispositivo, e esclarece a exposição de motivos da lei

que o regime aberto, salvo essas exceções, "não admite

a execução da pena em residência particular.”

Na jurisprudência de nossa Excelsa Corte a questão

da prisão-albergue domiciliar assim vem sendo vista:

“Habeas corpus. Prisão albergue domiciliar.

Inexistência, na comarca, de Casa do Albergado. (...)

O Plenário do Supremo Tribunal decidiu que o

benefício da prisão-albergue só poderá ser deferido ao

sentenciado ‘se houver’, na localidade da execução da

pena, Casa de Albergado ou outro estabelecimento que

se ajuste às exigências legais do regime penal aberto. A

impossibilidade material de o Estado instituir Casa do

Albergado não autoriza o Poder Judiciário a conceder

a prisão-albergue domiciliar fora das hipóteses

contempladas, ¿em caráter estrito' no art. 117 da Lei

de Execução Penal. (...) A norma legal

consubstanciada no art. 117 da Lei de Execução Penal

instituiu situações subjetivas de vantagem, que apenas

beneficiam aqueles sentenciados cujas condições

pessoais estejam nela previstas. Constituindo regra de

direito singular, torna-se ela inextensível e inampliável

a situações outras que lhe sejam estranhas. As normas

legais positivadoras do regime penal aberto revestem-

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se de conteúdo programático e só incidirão

plenamente, inclusive para efeito de deferimento do

benefício da prisão-albergue, a partir do momento em

que se torne materialmente possível, com a existência

de Casa de Albergado ou de estabelecimento similar, a

execução da pena nesse regime” (STF in RT 731/500)

(ementa parcial).

Se é verdade que, por conta de deficiência estrutural

do sistema carcerário, aos sentenciados não se pode obrigar o cumprindo de

pena em regime mais gravoso do que aquele a que estejam condenados,

também é verdade que é defeso ao magistrado estender o alcance da

prisão domiciliar a hipóteses não previstas na lei, mais ainda no caso em

apreço em que o faz mediante a edição de portarias, sem qualquer

observância ao caso concreto em que se outorgará o dito ‘benefício

emergencial’, reformando, sem qualquer interposição de recurso, a sentença

proferida pelo juízo da condenação e contribuindo para a sensação de

impunidade no meio social, haja vista a indevida substituição da pena

privativa de liberdade em prisão domiciliar, sem observância das disposições

legais alusivas à matéria.

Ademais, registre-se que não há qualquer fiscalização

eficiente que garanta o cumprimento da pena dos sentenciados que hoje

cumprem reprimenda no regime semiaberto.

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Ora, a inexistência do estabelecimento adequado não

impede que o penificado cumpra sua pena no estabelecimento existente, no

regime a que faz jus, nos moldes previstos pela legislação pertinente.

Em síntese, a questão cinge-se à discussão quanto à

possibilidade de deferimento da prisão domiciliar sob o argumento de

superlotação dos presídios e consequente escassez de condições dignas

propiciadas pelo Estado, ou seja, fora dos casos elencados no art. 117 da

LEP, que estabelece seu cabimento nas hipóteses de condenado maior de

setenta anos, acometido de doença grave, condenada com filho menor ou

deficiente ou, ainda, em se tratando de gestante.

Trazemos à colação, nesse sentido, precedente do

Órgão Colegiado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

"EXECUÇÃO. PRISÃO DOMICILIAR. LOTAÇÃO

DE PRESÍDIO. HIPÓTESE NÃO CONTEMPLADA.

CASSAÇÃO. O agravado não se enquadra em

qualquer dos itens do artigo 117 da mesma legislação:

ele não é maior de setenta anos, não está gravemente

doente e não é mulher nas condições dos itens III e IV.

A concessão da prisão domiciliar teve como base a

superlotação do presídio da comarca. O Supremo

Tribunal Federal, a quem cabe zelar pelo

cumprimento da Constituição, já decidiu, em sessão

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plenária, que o benefício da prisão-albergue só poderá

ser deferido ao sentenciado, se houver, na localidade

de execução da pena, casa do albergado, ou outro

estabelecimento que se ajuste às exigências legais do

regime penal aberto. A impossibilidade material de o

Estado instituir casa do albergado não autoriza o

Poder Judiciário a conceder a prisão-albergue

domiciliar, fora das hipóteses contempladas, em

caráter estrito, no art. 117 da LEP. Excepcionalmente,

aceitam-se a concessão do benefício na forma deferida.

Não é caso. Aqui, chama-se a atenção que a punição do

apenado está longe de terminar (27 de agosto de 2013),

é decorrente da prática de vários crimes acontecidos

entre os anos de 2005 a 2007. Além disso, em 31 de

março de 2009 fugiu e permaneceu vários meses

foragido, sendo recapturado em julho. DECISÃO:

Agravo ministerial provido. Unânime” (Agravo Nº

70036054500, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de

Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado

em 20/05/2010).

Efetivamente, descabe conferir elasticidade ao rol

previsto no art. 117 da Lei de Execução Penal, não havendo como estender

indiscriminadamente as hipóteses de cabimento da prisão domiciliar a todos

os casos em que o sentenciado cumpre reprimenda em regime semiaberto.

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Por óbvio que tal questão diz respeito diretamente às

políticas de investimento da Administração Pública para que sejam atingidos

os objetivos da pena, sendo de conhecimento geral que os

estabelecimentos são desprovidos de condições adequadas, o que,

contudo, por si só, não gera direito ao cumprimento da reprimenda no

domicílio, inviabilizando por inteiro o Direito Penal enquanto instrumento

de controle social.

Embora a doutrina e a jurisprudência reconheçam a

possibilidade de se estender de forma criteriosa o benefício em pauta -

prisão domiciliar - a hipóteses não previstas pelo dispositivo, no caso dos

autos o Juiz da 1.ª Vara de Execução Penal e Corregedoria de Presídios da

comarca de Fortaleza editou as Portarias n.° 004/2011 e 006/2001, deixando

de analisar cada hipótese isoladamente e, por conseguinte, de verificar, caso

a caso, a excepcionalidade que justifique a concessão da benesse, vez que o

fez de forma indiscriminada a todos os condenados primários e que estejam

em gozo do regime semiaberto.

Dessa forma, a se dar vigência às malsinadas

Portarias, farpeadas pelo presente mandamus, estar-se-á permitindo que, em

caso de condenados, desde que primários, e que tenham praticado crimes

revestidos de violência contra a pessoa, como por exemplo, homicídio

simples e roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo e concurso de

pessoas, deixem de cumprir as reprimendas penais, aplicadas depois de todo

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o processamento do devido processo legal, contribuindo, sobremaneira, para

a sensação de impunidade e insegurança no seio da sociedade.

Nessa esteira de raciocínio, vejamos decisão do

Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. PRISÃO

DOMICILIAR. SUPERLOTAÇÃO DOS

PRESÍDIOS. INDEFERIMENTO. A prisão domiciliar

tem cabimento nas hipóteses do art. 117 da LEP.

Embora a doutrina e a jurisprudência reconheçam a

possibilidade de se estender de forma criteriosa o

benefício a hipóteses não previstas pelo dispositivo, o

caso dos autos não se reveste de excepcionalidade que

justifique a sua concessão. A alegação de precárias

condições das casas prisionais não determina, por si

só, a possibilidade de prisão domiciliar Questão

relacionada às políticas da Administração Pública”

(70041423062/RS , Relator: Naele Ochoa Piazzeta,

Data de Julgamento: 28/04/2011, Sétima Câmara

Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia

04/07/2011)

Assim, não obstante a polêmica que o tema encerra,

não se pode concordar com a concessão da prisão domiciliar fora dos casos

legais, pois trata-se de verdadeiro simulacro de cumprimento da pena,

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sem qualquer fiscalização estatal, ressalte-se, fato que contribui para o

descrédito de todo o sistema jurídico-penal e dificulta a reinserção do

condenado ao convívio social.

Por outro lado, a ausência momentânea de vagas para

o cumprimento de pena no regime semiaberto ou aberto não autoriza a

concessão da prisão domiciliar fora das hipóteses expressamente previstas

em lei.

Sobre o tema, o Ministério Público ainda salienta:

"A concessão de prisão domiciliar restringe-se às

hipóteses previstas no art. 117, da Lei de Execução

Penal, não sendo suficiente, para tanto, a ausência de

estabelecimento adequado para o cumprimento da

pena em regime aberto." Ementa parcial (TJMG -

RAG 000.271.473-1/00 - 2ª C.Crim. - Rel. Des. José

Antonino Baía Borges - J. 10.04.2003).

“Destinar-se o condenado por roubo qualificado (com

emprego de armas), em regime prisional semiaberto, a

cumprir pena em sua própria residência, sem

qualquer controle ou fiscalização, sob a alegação de

inexistência de Casa do Albergado ou Colônia

Agrícola Industrial na Comarca, significa

simplesmente instituir a total impunidade. Só se

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admite a prisão domiciliar nas estritas hipóteses do

art. 117 e incisos da Lei 7.210/84. Recurso conhecido e

improvido” (TJMG - RAG 000.329.090-5/00 - 1ª

C.Crim. - Relª Desª Márcia Milanez - J. 29.04.2003).

“EXECUÇÃO PENAL - AGRAVO - REGIME

PENITENCIÁRIO - CONDENAÇÕES A SEREM

CUMPRIDAS EM REGIME SEMI-ABERTO E

ABERTO - PRISÃO DOMICILIAR -

INADMISSIBILIDADE - INOCORRÊNCIA DE

QUALQUER DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO

ART. 117 DA LEP - A Lei de Execução Penal destinou

a prisão domiciliar exclusivamente aos condenados

que estejam nas condições especiais previstas

expressamente no seu art. 117. Inteligência da Súmula

28 da jurisprudência predominante nesta 1ª Câmara

Criminal. Recurso a que se nega provimento" (TJMG

- RAG 000.305.736-1/00 - 1ª C.Crim. - Rel. Des. Tibagy

Salles - J. 27.05.2003).

"EXECUÇÃO PENAL. PENA DE RECLUSÃO.

PRISÃO DOMICILIAR. PRESSUPOSTOS.

INEXISTÊNCIA. LEP, ART. 117. BENEFÍCIO DO

TRABALHO EXTERNO. CONCESSÃO DE

OFÍCIO. - Somente é admissível o cumprimento de

pena em residência particular se o condenado

beneficiário do regime aberto, enquadra-se em uma

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das situações previstas no art. 117, da Lei de Execução

Penal". Ementa Parcial (STJ, HC nº 17035-SP, 6ª

Turma, Relator Min. Vicente Leal, Fonte: DJ DATA:

11/03/2002 PG: 00281).

“HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL.

REGIME ABERTO. AUSÊNCIA DE CASA DE

ALBERGADO NO LOCAL DE CUMPRIMENTO

DA PENA. PRISÃO DOMICILIAR.

IMPOSSIBILIDADE. I - A Lei de Execução Penal traz

em caráter estrito em seu art. 117, as hipóteses em que

se permitirá a um condenado a regime aberto cumprir

sua sanção em domicílio particular. II - A

impossibilidade material do estado instituir casa de

albergado não autoriza de forma alguma o poder

judiciário a conceder a prisão-albergue domiciliar fora

das hipóteses enumeradas no artigo supracitado. III -

Ordem conhecida e denegada à unanimidade de votos

(TJMA - HC 019457/2003 - (47.160/2003) - São

Bernardo - 2ª C.Crim. - Relª Desª Nelma Celeste Sousa

Silva Sarney Costa - j. 13.11.2003).

Em verdade, o Ministério Público concorda com

aqueles que defendem que uma boa saída para o caso em tela, para se evitar

o ‘estado de impunidade’ consagrado pelas Portarias guerreadas, mas, ao

mesmo tempo, não se desviar da finalidade da pretensão executória, seria a

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de se ajustar as condições do regime semiaberto para cumprimento da

reprimenda por parte do paciente em algum estabelecimento penal,

permitindo-se, se for o caso, o trabalho externo, bem como a freqüência de

cursos.

Referida solução, aliás, vem sendo adotada com total

êxito pela Vara de Execuções Criminais desta Comarca, e plenamente aceita

pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

“HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL.

CUMPRIMENTO DE PENA EM REGIME MAIS

GRAVOSO DO QUE AQUELOUTRO ESTABELECIDO

NO DECRETO CONDENATÓRIO. INEXISTÊNCIA DE

VAGAS. ADEQUAÇÃO AO COMANDO DA

SENTENÇA. ORDEM DENEGADA. I. O regime imposto

na sentença deve informar a sua execução, não

importando, contudo, em constrangimento ilegal o tempo

de permanência necessário à transferência do condenado

do estabelecimento próprio da prisão provisória para

aqueloutro ajustado ao regime decretado na condenação

imposta. II. Tal tempo deve subordinar-se ao princípio da

razoabilidade, que faz injustificável transferência que se

retarde por mais de 30 dias. III. Compete ao Juiz, à luz da

norma insculpida no artigo 66, inciso VI, da Lei de

Execuções Penais, que lhe reclama zelo pelo correto

cumprimento da pena, decidir sobre a questão da

inexistência de vaga ou de estabelecimento adequado,

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adotando providência para ajustamento da execução da

pena ao comando da sentença. IV. Em se mostrando zeloso

o Magistrado na execução da sentença, ajustando o

cumprimento da pena ao regime adequado, ainda diante da

ausência de vaga no estabelecimento próprio, não há falar

em constrangimento a ser reparado pelo remédio heróico.

V. Ordem denegada” (STJ - HC 21599/MG - 6ª Turma -

Rel. Min. Hamilton Carvalhido - Decisão Unânime - j.

18/12/2002 - DJU 17/03/2003, p. 290).

Ademais, não bastassem todos os vícios já apontados

e a ausência de juridicidade de todos os fundamentos em que se sustentam os

atos inquinados, o simples fato de extinguir o regime semiaberto na comarca

de Fortaleza, instituindo indiscriminadamente a prisão domiciliar não só é

ilegal, por negar vigência ao Código Penal, que prevê como sendo três os

regimes de cumprimento da pena (artigo 33 do Código penal), bem como

nega vigência à Lei de Execução Penal, que prevê a concessão de prisão

domiciliar em casos específicos, possuindo, para tanto, um rol taxativo

(artigo 117 da Lei de Execução Penal).

De mais a mais, as Portarias ora farpeadas também

criam a situação esdrúxula de reformar, sem qualquer interposição de

recurso, a sentença penal condenatória que aplicou a pena privativa de

liberdade, ao se conceder ao sentenciado a falaciosa prisão domiciliar sobre

a qual não há qualquer fiscalização por parte do Estado.

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De se entender, pois, que as Portarias n.° 004/2011 e

006/2011 deram ao artigo 117 da Lei da Execução Penal um alcance que

este efetivamente não tem, alem de negar vigência ao artigo 33 do Código

Penal, na medida em que revoga tacitamente o regime semiaberto aos

condenados primários ao criar uma espécie anômala de ‘prisão domiciliar’.

Registre-se, ainda, que já ocorreu caso de concessão

de prisão domiciliar a condenada por tráfico ilícito de entorpecentes – crime

equiparado a hediondo, como se pode observar da decisão em anexo

proferida nos autos da ação de execução penal n° 85-36.2011.8.06.0136/0,

tudo isso com fundamento na Portaria n° 004/2011, tendo sido a aludida

decisão, devidamente, agravada pelo Ministério Público e reformada pelo

juiz sentenciante (ver documento em anexo).

Ademais, observa-se que o ato praticado pelo

Impetrado não tem o caráter da jurisdição, pois configura um ato

administrativo (Portaria). Neste sentido, temos uma situação que viola a

hierarquia das normas, pois, segundo a pirâmide kelseniana, temos no

vértice da mesma a Constituição; logo abaixo temos as leis e na base

piramidal temos as normas infra-legais.

No caso in comento, o ato administrativo praticado

pelo Impetrado (Portarias) violou a Lei de Execução Penal, conforme já

demonstrado supra, fato este que é inaceitável, configurando, inclusive, um

ato teratológico.

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O Ministério Público entende, portanto, que o

Impetrado, na condição de Juiz de Execução Penal, poderia, NO CASO

CONCRETO E NO EXERCÍCIO DA JURISDIÇÃO, interpretar a LEP no

sentido de possibilitar eventual prisão domiciliar para os casos de

condenados em regime semiaberto. Entretanto, é inadmissível que o

Impetrado, NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO ADMINISTRATIVA, ignore a

LEP e o CPB e CRIE UMA NOVA MODALIDADE DE CUMPRIMENTO

DA PENA PARA OS APENADOS EM REGIME SEMIABERTO.

Igualmente de tomo destacar que as Portarias, cuja

nulidade e ilegalidade pretende a Promotoria de Justiça sejam declaradas,

contém em seu nascedouro erro formal que a eiva de mácula insanável, na

medida em que ao conceder prisão domiciliar para todos os presos em

regime semiaberto, sem qualquer audiência com os demais Juízes de Direito

das Varas de Execução Penal, com a Corregedoria Geral e com a Presidência

do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, a autoridade,ora coatora, incidiu

em erro ao tratar da questão de forma isolada e pessoal, alijando os demais

protagonistas, incluindo entre tais o Ministério Público, o Poder Legislativo

e o Poder Executivo, a também deliberar sobre a atual situação dos

estabelecimentos prisionais localizados no território cearense.

Nesse aspecto, especificamente em relação ao Poder

Judiciário, confirmando a participação da Corregedoria Geral e do próprio

Tribunal de Justiça em questões como a de que ora se trata, o parágrafo

único do art. 72 da Lei Estadual n.º 12.342/94 (Código de Divisão e de

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Organização Judiciária do Estado do Ceará estabelece que a Corregedoria

Geral de Justiça, quando das correições, ‘observada a falta de higiene,

segurança ou aparelhamento, representará ao Tribunal de Justiça para a

adoção das providências indispensáveis’.

Outro argumento a corroborar a iniciativa pessoal e

subjetiva do Juiz de Direito da 1.ª Vara de Execução Penal e Corregedoria de

Presídios é afirmar que, apesar de já haver outros 2 (dois) magistrados

titulares com atuação na área de execução penal quando da elaboração dos

atos inquinados de ilegalidade, nenhum dos juízes assinou as multicitadas

Portarias.

Deitando luzes sobre a questão ora apresentada, o

Conselho Nacional de Justiça, nos autos do PCA n.º 200810000002397, de

relatoria do Conselheiro Jorge Antonio Maurique, pontificou:

“O problema, portanto, é macro, sistêmico, mundial e

complexo, não apenas restrito aos estabelecimentos

prisionais do caso em tela e, à toda evidência, não

sendo resolúvel por meio de medidas isoladas, sejam

adotadas por magistrado, em sua atividade

fiscalizatória e correcional da execução penal, seja por

parte deste Conselho, em seu papel de controlador dos

referidos atos. Para um problema de tamanha

grandeza, faz-se mister soluções igualmente complexas

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e tomadas com suporte de um número maior de

pessoas e instituições. Se há algo de errado com o

sistema, é necessário que este sistema seja alterado; o

que não se pode permitir é que este mesmo sistema

seja subvertido em sua ordem, sob pena de que seja

instaurada uma situação de desordem, de

antidemocracia e de supressão do diálogo institucional.

Em resumo, incorre-se no risco de se inviabilizar o

próprio sistema prisional, por pior que seja seu

modelo atual, ainda mais por que praticamente não há

no Brasil estabelecimento carcerário que não tenha

excedido seus limites. É infelizmente a triste realidade

que se atesta diariamente nos noticiários nacionais e

nas atividades correcionais judiciais.

(...)

“Por outra banda, não é de competência isolada do

Poder Judiciário a definição das políticas públicas

atinentes à administração penitenciária, não podendo,

ainda, se imiscuir nos assuntos pertinentes ao Poder

Executivo, sob pena de violar o princípio da separação

dos Poderes (art. 2º da CF/88). A questão é

fundamentalmente de eleição de prioridades

governamentais de competência do Poder Executivo,

cuja efetivação possui seus mecanismos próprios no

atual regime democrático. Qualquer invasão dessa

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competência poderia criar situação de conflito que

eventualmente poderá redundar em usurpação dos

critérios de oportunidade e conveniência privativos da

Administração. É ela que detém o planejamento de

curto, médio e longo prazo, na busca da melhor

acomodação dos presos, não se mostrando razoável

desconsiderá-los mediante tomada de medidas graves

e de enorme repercussão no sistema como um todo,

como ocorre no caso de uma interdição prisional”

Quanto ao mais, não bastasse o vício da iniciativa das

Portarias guerreadas pelo presente writ, imperioso registrar que não é dado

ao Poder Judiciário expedir portaria cujos paradigmas são completamente

diversos daqueles estipulados no Código Penal e na Lei de Execução Penal.

Com efeito, é inolvidável que quando da expedição de

qualquer portaria – ato tipicamente regulamentar, de cunho infralegal – deve

haver obediência estrita aos ditames constitucionais vigentes e aos limites e

requisitos estabelecidos nas leis que regulamentam a matéria, não havendo

qualquer espaço para subjetivismo.

Sobre a impossibilidade de o Poder Judiciário

estabelecer atos normativos, inaugurando a ordem jurídica, sem qualquer

parâmetro constitucional e legal, o Desembargador Amaral e Silva pontifica:

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Não é atribuição do Judiciário ditar normas de caráter

geral, mas decidir, no caso concreto, a aplicação do

Direito Objetivo. Juiz não é legislador, não elabora

normas de comportamento frente às regras de conduta

da vida social. Essas geralmente decorrem do processo

legislativo, reservado pela constituição a outra órbita.

(in Estatuto da Criança e do Adolescente comentado. São

Paulo, Malheiros, 1992, p. 450)

DO DEFERIMENTO DA LIMINAR REQUESTADA

Por todo o exposto, considerando a flagrante

ilegalidade das Portarias n° 004/2011 e 006/2001, vez que contrariam

frontalmente o artigo 117 da Lei de Execução Penal, dando ao citado

dispositivo um alcance que efetivamente não possui, além de criar uma nova

modalidade, anômala, de prisão domiciliar, extinguindo tacitamente o

regime semiaberto e o regime aberto aos condenados primários, requer o

Ministério Público seja deferida liminarmente o sobrestamento dos efeitos

das Portarias n° 004/2011 e 006/2011, da lavra do Excelentíssimo Senhor

Juiz Luiz Bessa Neto, a fim de torná-las sem efeito, inclusive, devendo a

liminar ter efeitos ex tunc em relação às concessões de prisão domiciliar a

condenados em regime semiaberto por força das referidas Portarias.

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Nesse azo, o requisito do fumus boni iuris resta

configurado por meio da ilegalidade manifesta dos atos ora guerreados.

Por sua vez, o periculum in mora se manifesta por

meio da insegurança no meio social, acaso os sentenciados do regime

semiaberto sejam postos em liberdade, sem qualquer fiscalização por parte

do poder público.

Nesse contexto, o cumprimento de pena no regime

domiciliar, mesmo que em desconformidade com normas legais ínsitas na

Lei de Execução Penal e Código Penal, acarretará a extinção da pena, razão

pela qual se mostra urgente a cassação dos efeitos das Portarias nos casos em

que a mesma já foi aplicada, bem como nos casos futuros, de forma a

garantir o cumprimento da pena privativa de liberdade como determinado

em lei.

DO PEDIDO

Em razão de todo o exposto, requer o Ministério

Público:

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i) seja a presente ação admitida, concedendo-se a

liminar requerida (art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009) para cassar os efeitos

das Portarias objurgadas que extinguiram o regime semiaberto na comarca

de Fortaleza e determinaram que todos os apenados primários sob este

regime passassem a cumprir suas reprimendas em prisão domiciliar e, ao

final, a concessão definitiva da segurança.

ii) seja notificada a autoridade coatora para que preste

as informações de estilo, na forma do art. 7º, inciso I, da Lei nº 12.016/2009.

Dá-se à presente causa o valor de R$ 1.000,00 (hum

mil reais).

Fortaleza, 05 de agosto de 2011.

SÍLVIO LÚCIO CONRADO CORREIA LIMA JOSÉ EVILÁ ZIO ALEXANDRE DA SILVA Promotor de Justiça Promotor de Justiça SANDRA VIANA PINHEIRO HUGO VASCONCELOS XEREZ Promotor de Justiça Promotor de Justiça

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EXMO. SR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA/CE Autos Processuais. nº 2000753-78.2000.8.06.0001 O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ, pelos Promotores de Justiça que esta subscrevem, no uso de suas atribuições legais, inconformado com a decisão de fls. 151/153 dos autos, que deferiu ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA prisão domiciliar, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência interpor AGRAVO EM EXECUÇÃO, com fundamento no art. 197 da Lei nº 7.210/84. Requer que, recebido este, já com as inclusas razões, possa Vossa Excelência retratar-se, revogando a prisão domiciliar concedida. Assim não entendendo, aguarda-se o regular processamento do recurso e seu encaminhamento ao Egrégio Tribunal de Justiça deste Estado. Para a formação do instrumento, seguem em anexo os seguintes documentos: 1) Guia de Recolhimento de fls. 04/05 dos autos; 2) Denúncia de fls. 06/08 dos autos; 3) Sentença condenatória de primeiro grau de fls. 19/24 dos autos; 4) Parecer ministerial de fls. 135 dos autos; 5) decisão do Juízo da Vara de Execução Penal desta Comarca de Fortaleza de fls. 137 dos autos; 6) Pedido de autorização de trabalho externo de fls. 147 dos autos; 7) Decisão concessiva do trabalho externo e da prisão domiciliar de fls. 151/152 dos autos; e 8) Certidão da Secretaria da Vara de Execução Penal. Termos em que Pedem deferimento. Fortaleza/CE, 02 de setembro de 2011. HUGO VASCONCELOS XEREZ JOSÉ EVILÁZIO ALEXANDRE DA SILVA Promotor de Justiça Promotor de Justiça SANDRA VIANA PINHEIRO Promotora de Justiça

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Autos Processuais nº 2000753-78.2000.8.06.0001 Execução Penal Agravante: Ministério Público do Estado do Ceará Agravado: ASSIS PEREIRA DA SILVA RAZÕES DE AGRAVO EM EXECUÇÃO E. Tribunal C. Câmara DD. Procurador de Justiça O sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, devidamente qualificado nas peças que instruem o presente recurso, foi condenado à pena de 17 (dezessete) anos de reclusão, pelo cometimento do crime de latrocínio (art. 157, § 3º, parte final, c/c art. 29, todos do Código Penal). É o que se infere da cópia da r. sentença condenatória de fls. 19/24 dos autos proferida pelo Juízo da Comarca de Acopiara. Muito embora tenha cumprido pouco mais de 1/6 (um sexto) de sua condenação, no curso da execução penal, o sentenciado pleiteou a progressão de seu regime prisional, tendo obtido

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progressão para o regime semiaberto em data de 01/12/2010, consoante decisão de fls. 137 dos autos da execução penal n° 2000753-78.2000. Posteriormente, a Defensora do sentenciado ingressou com pedido de homologação de trabalho externo, consoante se vê às fls. 147 dos autos. O Douto Juízo da então Vara Única de Execução Penal e Corregedoria de Presídios, olvidando-se da atividade fiscalizatória do cumprimento da pena por parte do Ministério Público, deixou de abrir vista dos autos a fim de que o pedido fosse analisado pelo Ministério Público. Na seqüência, através do decisum de fls. 151/152 dos autos, o Douto Juízo da então Vara Única de Execução Penal e Corregedoria de Presídios desta Comarca de Fortaleza, sem ao menos determinar fosse averiguada a veracidade da oferta de emprego e a capacidade empregatícia da empresa, concedeu autorização para que o latrocida ASSIS PEREIRA DA SILVA exercesse atividades laborais junto à LIVRARIA E PAPELARIA ENCONTRO DOS LIVROS, bem como extra petita concedeu ao mesmo o beneplácito da prisão domiciliar, dispensando o sentenciado de se recolher junto ao estabelecimento prisional nos dias de folga. Sabe-se que a prisão domiciliar, segundo dispõe o art. 117, da LEP, é prevista para presos em cumprimento de pena no regime aberto e nas hipóteses excepcionais previstas em seus incisos, não contemplando a Lei de Execução Penal e a legislação penal pertinente a prisão domiciliar para sentenciados que cumprem pena no regime semiaberto. Assim, o MM. Juiz de Direito prolator da decisão de fls. 151/152 dos autos, ora agravada, contrariando frontalmente o citado dispositivo legal, entendeu por deferir o benefício da prisão domiciliar ao sentenciado e autorização para o trabalho externo, não obstante, não houvesse sido elaborado nem mesmo mandado de averiguação, nem tivesse sido oferecido o parecer do Ministério Público. Inconformado, interpõe o Ministério Público, a tempo e modo, o presente agravo em execução, a fim de obter a reforma da r. decisão impugnada, nos moldes da lei. Sustenta o ilustre magistrado que subscreve a r. decisão impugnada, em resumo: “Ante ao exposto, tendo em vista a data da oferta, concedo o Trabalho Externo ao apenado Assis Pereira da Silva, posto satisfazer as exigências legais, bem como, excepcionalmente, a prisão domiciliar, devendo permanecer recolhido à sua residência nos finais de semana e feriados e no período noturno nos dias úteis, isto é, dias de trabalho, em razão da interdição do AMANARI, publicada no DJ n° 213, em 16/11/2009”. Com tais argumentos (contrários à lei), concedeu ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, o beneplácito da prisão domiciliar, não obstante a sua condenação por crime hediondo e sem apresentar qualquer justificativa para a excepcionalidade da medida concedida ao sentenciado em comento. Salienta-se, inicialmente, que o pedido formulado pelo reeducando, por intermédio de sua procuradora, invocara, única e exclusivamente, a homologação de trabalho externo, no entanto,

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indo muito mais além, o então Juízo da Vara de Execução Penal e Corregedoria de Presídios concedeu ao latrocida ASSIS PEREIRA DA SILVA o benefício da prisão domiciliar, desobrigando-o de qualquer recolhimento em estabelecimento prisional. Visa-se pela execução fazer cumprir o comando emergente da sentença penal condenatória, e na execução penal, assim como na aplicação da lei penal, o magistrado está jungido pelo principio da legalidade. A matéria referente à prisão domiciliar encontra-se regulada no art. 117 da Lei nº 7.210/84, e sua concessão restringem-se às hipóteses ali previstas. Dispõe o referido artigo: “Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de: I - condenado maior de 70 (setenta) anos; II - condenado acometido de doença grave; III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; IV - condenada gestante”. Como se viu, o rol de hipóteses é taxativo, numerus clausus. Dessa forma, entende o Ministério Público que não é cabível a concessão, da forma como estipulada na decisão interlocutória que concedeu ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, o beneplácito da prisão domiciliar em razão da interdição do AMANARI, posto que atualmente o IPPOO I acolhe os sentenciados em cumprimento de pena no regime semiaberto. Cediço que a crise instalada na execução penal não se restringe à situação dos sentenciados, refletindo, também, na segurança pública. A parcela ordeira da população, que financia com o pagamento de impostos, taxas etc, a estruturação de um sistema que idealiza, busca e não atinge, é também atingida, vítima do medo, do crime e também da inércia/ineficiência dos poderes instituídos, ineficazes ante a incontida ascensão do império em que reina absoluta a ilicitude penal. Nesse ponto, oportuno citar dois elementos pinçados de um rol de fatores que Rui Stocco denominou ‘causas supralegais de impunidade’: o ‘sistema prisional inadequado em todo o país’ e a ‘carência de penitenciárias, casas de detenção e institutos penais’. Nesse azo, dúvida não resta de que a impunidade conturba o estrato social ao transitar em todas as suas camadas, permeando, trespassando e rompendo sua formação moral e enfraquecendo sua estrutura.

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Se a permanência em residência particular do condenado à pena no regime aberto, sem qualquer controle ou fiscalização por parte da Administração, já significaria a total impunidade pelo crime praticado, acarretando graves prejuízos à defesa social, mais ainda no caso sob exame, em que a Autoridade impetrada concedeu o benefício da prisão domiciliar ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, sem justificar em que consiste a excepcionalidade da medida,olvidando-se que descabe prisão domiciliar em cumprimento de pena no regime semiaberto. Nesse azo, Julio Fabbrini Mirabete (in Execução Penal, 9ª edição, Editora Atlas, p. 381): “A prisão domiciliar foi introduzida no Brasil pela Lei n° 5.256, de 6-4-1967, para recolher o preso provisório à própria residência nas localidades onde não houver estabelecimento adequado ao recolhimento dos que têm direito à prisão especial. Com introdução do regime aberto na legislação penal, efetuada pela Lei n° 6.416, de 24-5-77, e diante da inexistência de locais adequados para o cumprimento da prisão albergue, os aplicadores da lei penal depararam-se com penosas alternativas: admitir o alojamento noturno em celas superlotadas das cadeias públicas; não conceder o regime, embora o sentenciado estivesse em condições de adequar-se a ele; ou conceder a prisão domiciliar, com o recolhimento em sua própria residência. Não havendo o Poder Público diligenciado para a construção de estabelecimentos destinados ao regime aberto em todas as comarcas, juízos e tribunais passaram a conceder a chamada ‘prisão albergue domiciliar’, transformada em verdadeiro simulacro da execução da pena pela inexistência de qualquer controle ou fiscalização na obediência das condições impostas. A prisão albergue domiciliar passou, assim a ser forma velada de impunidade, de que os juízes lançavam mão em último recurso, na impossibilidade de o benefício ser desfrutado em local adequado. “Com a finalidade de evitar a concessão indiscriminada de prisão domiciliar, fato que contribuiu para o descrédito do regime aberto, com graves prejuízos à defesa social, a Lei de Execução Penal destinou-a exclusivamente aos condenados que estejam nas condições especiais previstas expressamente, distinguindo as duas espécies de prisão em regime aberto: a prisão albergue e a prisão domiciliar. Dispõe o art. 117 dispõe que "somente” se admitirá o recolhimento domiciliar em residência particular quando se tratar de condenado que esteja em uma das situações estabelecidas no referido dispositivo, e esclarece a exposição de motivos da lei que o regime aberto, salvo essas exceções, "não admite a execução da pena em residência particular.” Na jurisprudência de nossa Excelsa Corte a questão da prisão-albergue domiciliar assim vem sendo vista: “Habeas corpus. Prisão albergue domiciliar. Inexistência, na comarca, de Casa do Albergado. (...) O Plenário do Supremo Tribunal decidiu que o benefício da prisão-albergue só poderá ser deferido ao sentenciado ‘se houver’, na localidade da execução da pena, Casa de Albergado ou outro estabelecimento que se ajuste às exigências legais do regime penal aberto. A impossibilidade material de o Estado instituir Casa do Albergado não autoriza o Poder Judiciário a conceder a prisão-albergue domiciliar fora das hipóteses contempladas, ‘em caráter estrito' no art. 117 da Lei de Execução Penal. (...) A norma legal

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consubstanciada no art. 117 da Lei de Execução Penal instituiu situações subjetivas de vantagem, que apenas beneficiam aqueles sentenciados cujas condições pessoais estejam nela previstas. Constituindo regra de direito singular, torna-se ela inextensível e inampliável a situações outras que lhe sejam estranhas. As normas legais positivadoras do regime penal aberto revestem-se de conteúdo programático e só incidirão plenamente, inclusive para efeito de deferimento do benefício da prisão-albergue, a partir do momento em que se torne materialmente possível, com a existência de Casa de Albergado ou de estabelecimento similar, a execução da pena nesse regime” (STF in RT 731/500) (ementa parcial). Se é verdade que, por conta de deficiência estrutural do sistema carcerário, aos sentenciados não se pode obrigar o cumprindo de pena em regime mais gravoso do que aquele a que estejam condenados, também é verdade que é defeso ao magistrado estender o alcance da prisão domiciliar a hipóteses não previstas na lei, mais ainda no caso em apreço em que o sentenciado foi condenado por crime de latrocínio. Certamente, decisões de tal natureza contribuem para a sensação de impunidade no meio social, haja vista a indevida substituição da pena privativa de liberdade em prisão domiciliar, sem observância das disposições legais alusivas à matéria. Ademais, registre-se que não há qualquer fiscalização eficiente que garanta o cumprimento da pena dos sentenciados que hoje cumprem reprimenda no regime semiaberto e se encontram gozando do benefício da prisão domiciliar. Ora, a inexistência do estabelecimento adequado não impede que o sentenciado cumpra sua pena no estabelecimento existente, no regime a que faz jus, nos moldes previstos pela legislação pertinente. Em síntese, a questão cinge-se à discussão quanto à possibilidade de deferimento da prisão domiciliar sob o argumento de superlotação dos presídios e consequente escassez de condições dignas propiciadas pelo Estado, ou seja, fora dos casos elencados no art. 117 da LEP, que estabelece seu cabimento nas hipóteses de condenado maior de setenta anos, acometido de doença grave, condenada com filho menor ou deficiente ou, ainda, em se tratando de gestante. Trazemos à colação, nesse sentido, precedente do Órgão Colegiado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: "EXECUÇÃO. PRISÃO DOMICILIAR. LOTAÇÃO DE PRESÍDIO. HIPÓTESE NÃO CONTEMPLADA. CASSAÇÃO. O agravado não se enquadra em qualquer dos itens do artigo 117 da mesma legislação: ele não é maior de setenta anos, não está gravemente doente e não é mulher nas condições dos itens III e IV. A concessão da prisão domiciliar teve como base a superlotação do presídio da comarca. O Supremo Tribunal Federal, a quem cabe zelar pelo cumprimento da Constituição, já decidiu, em sessão plenária, que o benefício da prisão-albergue só poderá ser deferido ao sentenciado, se houver, na localidade de execução da pena, casa do albergado, ou outro estabelecimento que se ajuste às exigências legais do regime penal aberto. A impossibilidade material de o Estado

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instituir casa do albergado não autoriza o Poder Judiciário a conceder a prisão-albergue domiciliar, fora das hipóteses contempladas, em caráter estrito, no art. 117 da LEP. Excepcionalmente, aceitam-se a concessão do benefício na forma deferida. Não é caso. Aqui, chama-se a atenção que a punição do apenado está longe de terminar (27 de agosto de 2013), é decorrente da prática de vários crimes acontecidos entre os anos de 2005 a 2007. Além disso, em 31 de março de 2009 fugiu e permaneceu vários meses foragido, sendo recapturado em julho. DECISÃO: Agravo ministerial provido. Unânime” (Agravo Nº 70036054500, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado em 20/05/2010). Efetivamente, descabe conferir elasticidade ao rol previsto no art. 117 da Lei de Execução Penal, não havendo como estender indiscriminadamente as hipóteses de cabimento da prisão domiciliar a todos os casos em que o sentenciado cumpre reprimenda em regime semiaberto em razão da interdição do AMANARI. Por óbvio que tal questão diz respeito diretamente às políticas de investimento da Administração Pública para que sejam atingidos os objetivos da pena, sendo de conhecimento geral que os estabelecimentos são desprovidos de condições adequadas, o que, contudo, por si só, não gera direito ao cumprimento da reprimenda no domicílio, inviabilizando por inteiro o Direito Penal enquanto instrumento de controle social. Embora a doutrina e a jurisprudência reconheçam a possibilidade de se estender de forma criteriosa o benefício em pauta - prisão domiciliar - a hipóteses não previstas pelo dispositivo, no caso dos autos o Juízo da então Vara Única de Execução Penal da Comarca de Fortaleza, deixou de justificar em que consistia a excepcionalidade da concessão do benefício da prisão domiciliar ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, nem mesmo atentando ao fato do mesmo cumprir a pena no regime semiaberto, o qual é incompatível com a benesse da prisão domiciliar, além do mais para a natureza do crime pelo mesmo praticado, ou seja, o crime de latrocínio. Dessa forma, a se dar guarida ao decisum concessivo de prisão domiciliar ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, estar-se-á permitindo que o mesmo, efetivamente, deixe de cumprir a reprimenda penal que lhe foi aplicada depois de todo o desenrolar do devido processo legal, contribuindo, sobremaneira, para a sensação de impunidade e insegurança no seio da sociedade. Nessa esteira de raciocínio, vejamos decisão do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: AGRAVO EM EXECUÇÃO. PRISÃO DOMICILIAR. SUPERLOTAÇÃO DOS PRESÍDIOS. INDEFERIMENTO. A prisão domiciliar tem cabimento nas hipóteses do art. 117 da LEP. Embora a doutrina e a jurisprudência reconheçam a possibilidade de se estender de forma criteriosa o benefício a hipóteses não previstas pelo dispositivo, o caso dos autos não se reveste de excepcionalidade que justifique a sua concessão. A alegação de precárias condições das casas prisionais não determinam, por si só, a possibilidade de prisão domiciliar Questão relacionada às políticas da Administração Pública” (70041423062/RS ,

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Relator: Naele Ochoa Piazzeta, Data de Julgamento: 28/04/2011, Sétima Câmara Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 04/07/2011) Assim, não obstante a polêmica que o tema encerra não se pode concordar com a concessão da prisão domiciliar fora dos casos legais, pois se trata de verdadeiro simulacro de cumprimento da pena, sem qualquer fiscalização estatal, ressalte-se, fato que contribui para o descrédito de todo o sistema jurídico-penal e dificulta a reinserção do condenado ao convívio social. Por outro lado, a ausência momentânea de vagas para o cumprimento de pena no regime semiaberto ou aberto não autoriza a concessão da prisão domiciliar fora das hipóteses expressamente previstas em lei. Sobre o tema, o Ministério Público ainda salienta: "A concessão de prisão domiciliar restringe-se às hipóteses previstas no art. 117, da Lei de Execução Penal, não sendo suficiente, para tanto, a ausência de estabelecimento adequado para o cumprimento da pena em regime aberto." Ementa parcial (TJMG - RAG 000.271.473-1/00 - 2ª C.Crim. - Rel. Des. José Antonino Baía Borges - J. 10.04.2003). “Destinar-se o condenado por roubo qualificado (com emprego de armas), em regime prisional semiaberto, a cumprir pena em sua própria residência, sem qualquer controle ou fiscalização, sob a alegação de inexistência de Casa do Albergado ou Colônia Agrícola Industrial na Comarca, significa simplesmente instituir a total impunidade. Só se admite a prisão domiciliar nas estritas hipóteses do art. 117 e incisos da Lei 7.210/84. Recurso conhecido e improvido” (TJMG - RAG 000.329.090-5/00 - 1ª C.Crim. - Relª Desª Márcia Milanez - J. 29.04.2003). “EXECUÇÃO PENAL - AGRAVO – REGIME PENITENCIÁRIO - CONDENAÇÕES A SEREM CUMPRIDAS EM REGIME SEMI-ABERTO E ABERTO - PRISÃO DOMICILIAR - INADMISSIBILIDADE - INOCORRÊNCIA DE QUALQUER DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ART. 117 DA LEP - A Lei de Execução Penal destinou a prisão domiciliar exclusivamente aos condenados que estejam nas condições especiais previstas expressamente no seu art. 117. Inteligência da Súmula 28 da jurisprudência predominante nesta 1ª Câmara Criminal. Recurso a que se nega provimento" (TJMG - RAG 000.305.736-1/00 - 1ª C.Crim. - Rel. Des. Tibagy Salles - J. 27.05.2003). "EXECUÇÃO PENAL. PENA DE RECLUSÃO. PRISÃO DOMICILIAR. PRESSUPOSTOS. INEXISTÊNCIA. LEP, ART. 117. BENEFÍCIO DO TRABALHO EXTERNO. CONCESSÃO DE OFÍCIO. - Somente é admissível o cumprimento de pena em residência particular se o condenado beneficiário do regime aberto, enquadra-se em uma das situações previstas no art. 117, da Lei de Execução Penal". Ementa Parcial (STJ, HC nº 17035-SP, 6ª Turma, Relator Min. Vicente Leal, Fonte: DJ DATA: 11/03/2002 PG: 00281). “HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. REGIME ABERTO. AUSÊNCIA DE CASA DE ALBERGADO NO LOCAL DE CUMPRIMENTO DA PENA. PRISÃO DOMICILIAR. IMPOSSIBILIDADE. I - A Lei de Execução Penal traz em caráter estrito em seu art. 117, as

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hipóteses em que se permitirá a um condenado a regime aberto cumprir sua sanção em domicílio particular. II – A impossibilidade material do estado instituir casa de albergado não autoriza de forma alguma o poder judiciário a conceder a prisão-albergue domiciliar fora das hipóteses enumeradas no artigo supracitado. III - Ordem conhecida e denegada à unanimidade de votos (TJMA - HC 019457/2003 - (47.160/2003) – São Bernardo - 2ª C.Crim. - Relª Desª Nelma Celeste Sousa Silva Sarney Costa - j. 13.11.2003). Em verdade, o Ministério Público concorda com aqueles que defendem que uma boa saída para o caso em tela, para se evitar o ‘estado de impunidade’ consagrado pela restituição prematura da liberdade como no caso em análise, mas, ao mesmo tempo, não se desviar da finalidade da pretensão executória, seria a de se ajustar as condições do regime semiaberto para cumprimento da reprimenda por parte do paciente em algum estabelecimento penal, permitindo-se, se for o caso, o trabalho externo, bem como a freqüência de cursos. Referida solução, aliás, vem sendo adotada com total êxito pela Vara de Execuções Criminais desta Comarca, e plenamente aceita pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça: “HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. CUMPRIMENTO DE PENA EM REGIME MAIS GRAVOSO DO QUE AQUELOUTRO ESTABELECIDO NO DECRETO CONDENATÓRIO. INEXISTÊNCIA DE VAGAS. ADEQUAÇÃO AO COMANDO DA SENTENÇA. ORDEM DENEGADA. I. O regime imposto na sentença deve informar a sua execução, não importando, contudo, em constrangimento ilegal o tempo de permanência necessário à transferência do condenado do estabelecimento próprio da prisão provisória para aqueloutro ajustado ao regime decretado na condenação imposta. II. Tal tempo deve subordinar-se ao princípio da razoabilidade, que faz injustificável transferência que se retarde por mais de 30 dias. III. Compete ao Juiz, à luz da norma insculpida no artigo 66, inciso VI, da Lei de Execuções Penais, que lhe reclama zelo pelo correto cumprimento da pena, decidir sobre a questão da inexistência de vaga ou de estabelecimento adequado, adotando providência para ajustamento da execução da pena ao comando da sentença. IV. Em se mostrando zeloso o Magistrado na execução da sentença, ajustando o cumprimento da pena ao regime adequado, ainda diante da ausência de vaga no estabelecimento próprio, não há falar em constrangimento a ser reparado pelo remédio heróico. V. Ordem denegada” (STJ - HC 21599/MG - 6ª Turma - Rel. Min. Hamilton Carvalhido - Decisão Unânime - j. 18/12/2002 - DJU 17/03/2003, p. 290). Digno de nota que, recentemente, a Autoridade impetrada havia editado as Portarias n°s 004/2011 e 006/2011, mediante as quais concedia prisão domiciliar a todos os condenados primários em cumprimento de pena no regime semiaberto, o que mereceu pronta intervenção do Ministério Público que através do writ n° 0005717-68.2011.8.06.000 questionou a ilegalidade das referidas Portarias, em razão do teor das mesmas ferir de morte o disposto no art. 117, da Lei de Execução Penal e legislação penal aplicável à espécie. Cumprindo-nos informar que a Exmª. Srª. Desª FRANCISCA ADELINEIDE VIANA, Relatora do mandamus junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, concedeu a liminar pleiteada, suspendendo os efeitos das Portarias n°s 004/2011 e 006/2011, inclusive,

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emprestando-lhe efeito ex tunc, de modo a suspender a prisão domiciliar a presos no regime semiaberto e que tenham por fundamento as referidas Portarias (cópia anexa). Como se vê, mostra-se totalmente equivocado o entendimento esposado pelo MM Juiz de primeiro grau, na medida em que contrário à lei, à doutrina e à jurisprudência contemporâneas. Lado outro, causa espécie perceber como alguns segmentos da sociedade - inclusive através de autoridades constituídas - parecem relegar a memória da vítima e a dor dos respectivos parentes a um segundo plano, voltando seus olhos, com exclusividade, para o autor do crime, como se fosse uma vítima "do sistema". Sem perder de vista a natureza dos fatos que ensejaram a condenação do sentenciado e na esperança de que a memória da vítima não fique limitada a um frio RELATÓRIO DE NECRÓPSIA, confia o Ministério Público, enquanto defensor da sociedade e detentor de uma procuração moral da família da vítima, que o Poder Judiciário do Estado do Ceará, a exemplo das hipóteses análogas trazidas à colação, haverá de exigir o cumprimento da pena do reeducando nos termos da lei. Vale dizer, no regime semiaberto, mantendo a obrigação do recolhimento ao cárcere nos dias de folga, assim entendidos, os finais de semana e feriados. Agindo assim, em estrita consonância com a ordem jurídica vigente, evitar-se-á o que o autor Edílson Mougenot Bonfim, com seu costumeiro brilhantismo, denomina de "crime moral contra as famílias das vítimas": "E que regressão, e que paradoxo quando falamos em progresso...É bem verdade que antigamente a lei de Talião determinava: ´oculum pro oculo, dentem pro dente...´...Depois, as engrenagens da sociedade foram girando, e o conceito e a finalidade da pena, cambiante, foi sofrendo alterações, chegando-se, primeiro, a um apogeu, a um tal ponto de recrudescimento, de dureza, a uma tamanha barbárie, como aquela da Idade Média, das torturas, da inquisição, da fogueira, que a pena não conhecia limites e era desmedidamente aplicada. Depois, veio o chamado período iluminista, e o homem começou a questionar a idéia de pena cruel, sem medida, sem critério. Começou a queda. Se antes dera-se o excesso, depois veio a vacilação, e a pena, hoje, para muitos casos, ouso dizer, é tão pequena, que pena, pena mesmo, tenho é das vítimas, da sociedade, eis que as penas, muitas delas, extremamente desproporcionais aos delitos praticados, porque fracas, perderam qualquer força intimidativa que poderiam ter, já não tendo o condão de obstar, pela ameaça de sua aplicação, a ação do criminoso que se direciona ao ilícito...Então, a legislação foi se tornando ano a ano mais doce, mais ´pro reo´, e qual seria o limite, ou o ponto de parada? Pergunto-me se já não estaria agora havendo um excesso contrário...Antes dava-se o excesso de pena, a supressão de direitos e garantias individuais, agora o excesso de perdão; excesso de piedade, contra quem age sem nenhuma piedade. Excesso de blandícia, mesmo diante de quem corrói os laços da fraternidade social destilando o ódio ácido do crime...Antes o Estado respondia com um verdadeiro crime contra o criminoso, dada a inexistência de limites até éticos às penas aplicadas; agora, responde com um verdadeiro ´crime moral´contra as famílias das vítimas, que entregaram ao Estado o chamado ´jus puniendi´, na esperança de que este efetivamente puniria, mas, muitas vezes, tragadas pela dor, as famílias enlutadas são obrigadas a assistir à impunidade do malfeitor, e sentem-se logradas..." (trecho extraído da obra "No Tribunal do Júri", editora Saraiva).

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Segundo a clássica lição de Rui Barbosa, o sistema do controle difuso pode ser condensado em única regra: “A inaplicabilidade do ato inconstitucional do Poder Executivo, ou Legislativo, decide-se, em relação a cada caso particular, por sentença proferida em ação adequada e executável entre as parte” (Cf. Atos inconstitucionais (1893), Campinas: Russel, 2003, p. 102). Assim, enquanto não for modificado o disposto no art. 117, da Lei de Execução Penal com previsão de prisão domiciliar apenas para sentenciados em cumprimento de pena no regime aberto e em casos excepcionais, a vigência desse preceito persiste, nada impedindo, pois, que os juízes e tribunais o apliquem, mesmo porque as decisões do Supremo Tribunal Federal, ainda que reiteradas, só terão efeitos vinculantes em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário, quando as mesmas vierem a ser sumuladas, ou seja, aprovadas por decisão de dois terços e seus Ministros (Constituição da República, art. 103-A). Por derradeiro, vale mencionar a célebre frase de Rui Barbosa em discurso proferido perante a turma de 1920 da Faculdade de Direito de São Paulo, que ficou conhecido como Oração aos Moços - “Devemos tratar iguais com igualdade e desiguais com desigualdade na medida que se desigualam”. Justifica-se portanto o tratamento mais rigoroso ao infrator dos crimes hediondos. Ante o exposto, requer o Ministério Público seja o presente agravo em execução conhecido e, no mérito, provido, reformando-se a r. decisão de primeiro grau, a fim de que seja indeferida a prisão domiciliar e restabelecida a obrigação de recolhimento do sentenciado nos dias de folga junto ao estabelecimento prisional para presos em cumprimento de pena no regime semiaberto. Termos em que Pedem deferimento Fortaleza/CE, 02 de setembro de 2011. HUGO VASCONCELOS XEREZ JOSÉ EVILÁZIO ALEXANDRE DA SILVA Promotor de Justiça Promotor de Justiça SANDRA VIANA PINHEIRO Promotora de Justiça

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