MINISTRO OCTAVIO GALLOTTI€¦ · nasceu do casamento de sua filha - a pranteada dona Nieta - com...

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MINISTRO OCTAVIO GALLOTTI DISCURSOS PROFERIDOS NO STF, NA SESSÃO DE 15 DE MARÇO DE 2001 POR MOTIVO DE SUA APOSENTADORIA SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL BRASÍLIA – 2004

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MINISTROOCTAVIO GALLOTTIDISCURSOS PROFERIDOS NO STF,

NA SESSÃO DE 15 DE MARÇO DE 2001

POR MOTIVO DE SUA APOSENTADORIA

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

BRASÍLIA – 2004

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Supremo Tribunal Federal

?rtinistro Octavio Ça[fotti

(])iscursos proferidos no srrp,

na sessão de 15 de março de 2001,

por motivo de sua aposentadoria.

Brasília

2004

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Ministro Octavio Gallotti

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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Ministro NELSON Azevedo JOBIM (15-4-1997), Presidente

Ministra ELLEN GRACIE Northfleet (14-12-2000), Vice-Presidente

Ministro José Paulo SEPÚLV EDA PERT ENCE (17-5-1989)

Ministro José CELSO DE MELLO Filho (17-8-1989)

Ministro CARLOS Mário da Silva V ELLOSO (13-6-1990)

Ministro MARCO AURÉLIO Mendes de Farias Mello (13-6-1990)

Ministro GILMAR Ferreira MENDES (20-6-2002)

Ministro Antonio CEZAR PELUSO (25-6-2003)

Ministro CARLOS Augusto Ayres de Freitas BRITTO (25-6-2003)

Ministro JOAQUIM Benedito BARBOSA Gomes (25-6-2003)

Ministro EROS Roberto GRAU (30-6-2004)

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SUMÁRIO

Discurso do Senhor Ministro Sepúlveda Pertence.. . . . . . . . . . . . . . . . 9

Discurso do Doutor Geraldo Brindeiro, Procurador-Geral da República . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

Discurso do Doutor Roberto Rosas, Representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil . . . . . . . . . . . 29

Palavras do Senhor Ministro Carlos Velloso, Presidente . . . . . . . . 35

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Discurso do Senhor Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE

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o Senhor Ministro Sepúlveda Pertence - Senhor Presidente, eminentes Ministros do Tribunal de ontem e de hoje; eminente Procurador-Geral da República, Professor Geraldo Brindeiro; eminente Ministro Nilson Naves, Vice-Presidente e representante do Colendo Superior Tribunal de Justiça; Senhores Ministros Paulo Gallotti, do Superior Tribunal de Justiça, Walton Alencar Rodrigues, representante do Tribunal de Contas da União, e Luciano Brandão Alves de Souza, daquela Corte; Antônio Carlos de Nogueira e Cherubim Rosa Filho, do Superior Tribunal Militar; Senhor Desembargador Edmundo Minervino Dias, Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, Senhora Juíza Terezinha Célia Kineipp Oliveira, Presidente do Tribunal Regional do Trabalho; Doutor Carlos T hompson Flores Lenz, Procurador-Chefe da Procuradoria Regional da República da 4" Região; Senhor Conselheiro Antonio Carlos Flores de Moraes, Presidente do Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro; Senhora Procuradora Regional Chefe da República no Distrito Federal, Doutora Maria Izabel Gallotti Rodrigues, que representa nesta Sessão a família de Luiz Octavio Gallotti; demais Familiares do Homenageado; Senhores Advogados, Membros do Ministério Público, Servidores da Casa, Senhoras e Senhores:

Creio, era 1Q de fevereiro deste ano, dia da plenária de reabertura das sessões do Supremo Tribunal.

Já passava do meio-dia. Voltava eu de carro pela W-3 de uma consulta médica.

Súbito, vejo na calçada uma figura inconfundível: o bom Luiz Octavio Gallotti, em roupas informais, parava tranqüila-

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mente a olhar para o interior de uma velha loja, uma daquelas poucas sobreviventes de nossos velhos tempos da Brasília ainda candanga.

A despreocupação da caminhada àquela hora testemunha-me a nova vida do amigo e colega querido -aposentado em 27 de outubro passado - já liberto do almoço às carreiras a fim de retomar - com a preguiça das férias recém­findas - o cotidiano do Tribunal.

E para nós, os que ficáramos, reafirmava a sua ausência de nosso dia-a-dia na Casa que Célio Borja costuma chamar de "o colégio interno".

À véspera do julgamento dos casos famosos - em razão das pessoas que envolvem ou da repercussão política, so­cial ou econômica que possa gerar -, a imprensa sói aperceber­se do mistério que cerca a instituição e dedicar-nos - aos Juízes do Supremo Tribunal Federal - algumas páginas que alimentem especulações e prognósticos sobre a decisão a ser tomada.

Além do breve currículo - sempre com a lembrança, insinuante, do Presidente da República responsável pela nomeação - e dos rótulos pespegados a cada um - aberto ou sisudo; recolhido ou dado à discussão veemente dos casos; técnico ou político; liberal ou conservador; reacionário ou esquerdista, às vezes com acerto, outras com pitorescas confusões -, há ensaios de descrição do nosso modo de vida e de nossos métodos de trabalho e julgamento.

Colho esta passagem de um diário de setembro de 1992 - tempo das turbulências do Caso Collor1

" Vindos de diversos Estados brasileiros, com origens bens distintas, os juízes que formam a Suprema Corte de Justiça do Brasil são, na sua maioria, homens de fino trato com as pessoas, elegantes no comportamento público. Não há vida social entre eles. Embora residam no mesmo bloco de aparta­mentos, pouco se visitam. Esse relacionamento é

1 Jornal de Brasília, 13-9-92.

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tão frio que uma biblioteca comum a todos que existe num dos apartamentos do bloco em que moram não. é usada. Eles preferem trabalhar em seus escritórios particulares do que dividir espaços com outras sabedorias. "

o quadro, em linhas gerais, é verdadeiro, ainda que o não sejam - ao menos, inteiramente - as explicações aventadas a seguir, que vão da vaidade de nós todos às supostas mágoas recíprocas geradas pelo calor de discussões anteriores: vivemos realmente uma "solidão a onze".

E a rotina dos encontros quase diários - que por vezes atravessa décadas - nem nos deixa tomar consciência -malgrado a diversidade dos caminhos percorridos e das visões do mundo - do quanto emocionalmente nos vinculam, uns aos outros, o trabalho e as dificuldades comuns, o senso e o peso das responsa­bilidades partilhadas e até a tolerância e a afetuosa compreensão de cada um com o modo de ser e as impertinências e idiossincrasias do outro. São teias de mão dupla, que o tempo acaba por tecer, com os fios nascidos da necessidade da convivência e, tantas vezes, com a freqüência dos confrontos - aqui e ali, nervosos -, mas que se acaba por descobrir despidos de toda animosidade.

Segundo a tradição - e, quiçá, a malícia de alguns candidatos -, a morte costuma ser respeitosa de nossa fugaz vitaliciedade constitucional e só raramente nos tem surpreendido.

Dá-se, pois, no comum dos casos, que somente o ritual da aposentadoria nos desperta para a percepção clara dos sentimentos da grande estima pelo colega que se retira e da perda de sua presença cotidiana, que repentinamente sofremos, por mais que fatalmente previsível e prevista.

Falo, porém, do comum dos casos.

Não falo ainda de Luiz Octavio Ga110 tti, que foge aos padrões.

A genética sabidamente o fez único na galeria dos nossos antecessores: neto de Pires e Albuquerque - figura significativa do Supremo da República Velha -, Luiz Octavio

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nasceu do casamento de sua filha - a pranteada dona Nieta -com Luiz Gallotti - que, ao cabo de passagem marcante pela Procuradoria da República e por sua Chefia, nas décadas de 30 e 40, se converteu em nome verdadeiramente emblemático do Tribunal, por todo o terceiro quarto do século findo, que viveu integralmente nesta Casa, diversas vezes, como seu líder inquestionável, em momentos difíceis.

Posto cultue veneração comovida pelos ascendentes ilustres, Luiz Octavio Pires e Albuquerque Gallotti - antes como durante o tempo em que irrepreensivelmente a honrou, como o terceiro Ministro da linhagem - jamais exibiu a arrogância tão comum dos herdeiros.

Ao contrário, marcam-lhe o perfil - desde o Gallotinho que aqui conhecemos, os pioneiros da advocacia de Brasília, e que nem as distinções do Tribunal de Contas nem as honrarias da judicatura do Supremo lograram mudar - linhas constantes de figura humana incomum pela atração imediata da estima sincera de quantos dele tiveram a fortuna da aproximação, breve que fosse.

Sua modéstia não tem a dissimulação dos vaidosos que amam ostentar-lhe as aparências; sua cordialidade constante não tem afetação; sem se dar à intimidade fácil, sabe, como poucos, dar o carinho adequado ao colega e ao amigo na hora difícil; o finíssimo bom humor rarissimamente é posto à margem para o momento, sempre passageiro, da indignação necessária; a compreensão para com as diferenças do outro - de tempera­mento, de idéias ou de crenças - tempera-lhe o diálogo com a suavidade dos sábios.

Esses componentes pessoais raros entre os vitoriosos na vida pública, dos quais se compõe este colegiado, fizeram com freqüência de Luiz Octavio Gallotti a ponte de união entre nossas ilhas de humana e conjunta solidão.

Por tudo isso mesmo, sua aposentadoria, não a sofremos de supetão, com a visão entristecida da cadeira vazia entre o dia dos seus setenta anos e o da posse de sua bem-vinda e eminente sucessora.

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Sofremo-Ia por antecipação, a cada dia em que a data fatal da inatividade compulsória se aproximava. Antevíamos, a cada momento gostoso do diálogo de Gallotti - nos raros momentos de descontração dos nossos intervalos -, a falta que breve sentiríamos dos traços singulares de sua conversa de todos os dias.

Tantas vezes, dos casos e dos tipos recordados de tempos passados - do Supremo do Rio de Janeiro às primeiras décadas de Brasília -, dos quais, desde os tempos da infância, ainda em vida de Pires e Albuquerque, as décadas vividas na companhia do velho Gallotti, Procurador e Ministro, haviam feito de Luiz Octavio a memória viva, carinhosa e bem-humorada: ele nos propiciou, com freqüência, a descoberta de que, afinal, os nossos antecessores - que nos acostumáramos a imaginar "monstros sagrados" - também eram gente . . .

De outras vezes, deliciava-nos o comentário rápido comumente irônico, mas despido de acrimônia - sobre o

fato ou o homem do dia . . . Não raro, a informação crítica da obra literária ou histórica a cuja leitura estava a reservar as poucas horas de lazer.

Perdoe-me, no entanto, Senhor Presidente, se, pelo gosto de festejar o amabilíssimo tipo humano do nosso Homenageado - além de ameaçar a tolerância do tempo -, retardei além da conta o testemunho devido das admiráveis qualidades do Juiz Luiz Octavio Ga 110 tti.

Foi-lhe pródigo o destino: às marcas singulares do homem de doce convivência somou qualidades extraordinárias de magistrado.

Certo, jamais lhe aprouve disputar as galas do voto erudito, rico de dissertações e citações doutrinárias, para os quais - se fosse do seu feitio - não lhe faltariam a sólida e sedimentada informação jurídica.

Diversamente do pai - cuja inteligência irrequieta facilmente se deixava atrair à discussão com os Pares -, a suave discrição de Luiz Octavio poucas vezes seduziu o debate oral: contrariado o seu voto de Relator, cingia-se à réplica incisiva, mas breve, antes de recolher-se ao silêncio e deixar que os outros, mais nervosos, levássemos a polêmica adiante.

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Daí, certamente partiu Francisco Rezek2 - ao saudá­lo quando da posse na Presidência da Corte -, para enfatizar a singularidade de Gallotti na composição do Tribunal e dizê-lo, com precisão e justiça, "um modelo de convivência entre a absoluta segurança de seus próprios pontos de vista, em qualquer caso, e a nenhuma preocupação de influir sobre convicções alheias, em caso algum".

No entanto, verdadeiramente, o que, sessão a sessão, mais nos encantou em seus votos foi a utilização generosa de predicados intelectuais com os quais o dotou a inteligência pródiga - capaz de distinguir sem rodeios o ponto da questão -, o domínio dos princípios e a experiência profissional diversificada e intensa, de tudo resultando - bem ao seu gosto e conforme a sua consciência do exercício da jurisdição como serviço público -um admirável poder de síntese que ele mesmo, em elogio merecido ao saudoso Décio Miranda, uma de suas mais caras admirações, reputou "a mais invejável das facetas da inteligência"3.

A permitir que essa afortunada dotação intelectual venha à luz em cada página de sua lavra, Luiz Octavio Ga//otti tem a seu serviço um estilo de elegância e limpidez incomuns na literatura jurídica, que a um só tempo lhe completa e lhe resume as qualificações.

Continuam a padecer os escritos do Fórum - em quantidade e com pertinácia tristemente desanimadoras - de um jeito pernóstico e falsamente técnico e erudito de escrever e dizer, que se compraz com arrevesar a frase mais simples e buscar - quando não inventar - o verbo mais inusitado, o substantivo mais esdrúxulo, o adjetivo mais extravagante, sempre que possível, para compor locuções metafóricas nas quais o mau gosto compete com a imprecisão.

De tais pecados inommaveis - de cuja tentação nenhum de nós pode dizer-se livre, tão repetida é, à nossa volta, a sua prática impune -, por certo jamais terá de prestar contas o aticismo da expressão da judicatura de Gallotti.

2 Discurso proferido pelo Ministro Francisco Rezek, quando da posse do Ministro Octavio Gallotti na Presidência da Corte, em 13 de maio de 1993.

3 Discurso proferido pelo Ministro Octavio Gallotti, em 9 de outubro de 1985, em homenagem ao Ministro Décio Miranda, por ocasião de sua aposentadoria.

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Da precisa0, da síntese e da elegância dos seus votos, seria apetecível recordar-lhes alguns exemplos que, com facilidade, cheguei a selecionar. Seria ademais uma forma cômoda de apropriar-me, no discurso, da beleza apurada da linguagem alheia. O tempo não me permite fazê-lo.

Cinjo-me a esse fecho precioso do seu voto vencido na ADInMC 9394, contra a identificação de uma "cláusula pétrea" na regra da anualidade tributária, já "tão esgarçada", dizia, "pelo próprio constituinte originário". E concluiu com estes dois parágrafos de antológica limpidez:

"Cabe, portanto, ressaltar que não se trata, no caso, de retirada da garantia da anualidade, em relação a tributo já por ela originariamente assinalado. Apenas de enxertar uma nova figura tributária na série majoritária dos não sujeitos ao princípio da anualidade.

Tenho ainda, em vista, nesta assentada, que a estabilidade da Constituição Federal, onde reside a finalidade inequívoca das limitações postas ao poder constituinte derivado, poderá, ao meu ver, ficar comprometida - ao invés de reforçada -, com o rigor de uma interpretação que, exacerbando essas restrições, viesse a conduzir justamente àquilo que a Constituição quis evitar, ou seja, estimular a tendência de ruptura, como um todo, do texto constitucional. 1/

Coube a Luiz Octavio Gallotti exercer a Presidência do Supremo Tribunal Federal de 1993 a 1995.

O biênio que - após a crise política que tumultuara o anterior - prenunciava serena normalidade, adequada ao modo sóbrio de ser de nosso Presidente - o surpreenderia com um dos confrontos mais bizarros entre o Poder Executivo - instigado pelo oportunismo de conselheiros menores - e o Supremo Tribunal Federal.

4 Voto na ADlnMC 939,15-9-93, Relator Ministro Sydney Sanches, DJ 17-12-93.

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Não recordarei as minúcias do episódio infeliz.

Limito-me a registrar, para a memória do Tribunal, como - violentando a sua natureza avessa a quaisquer arreba­tamentos de polêmica estéril e à exposição pessoal nos veículos da imprensa - Gallotti repeliu, "sem deixar-se submeter ao rebaixamento do nível do debate" - ao que com razão chamou de "insultos grosseiros e inaceitáveis, dirigidos à Corte e a seus Juízes, por conta de deliberação tomada no exercício de sua estrita competência constitucional". E assegurou que o Tribunal, "fiel à missão de guarda da Constituição", continuaria, como é de seu dever - e como afortunadamente continuou -, "a desempenhá-Ia, consciente de sua responsabilidade perante a Nação, a despeito da incompreensão ou do desagrado que suas decisões possam eventualmente provocar' 5.

o tom desse compromisso final identifica - no Magis­trado discreto, mas destemido, que então desempenhava a função política da Chefia do Poder Judiciário - a coerência com uma das suas poucas intolerâncias manifestas, a que votava, tanto aos juízes que "transigem com a má aplicação da lei, na prolação de sentenças populares, faiscantes de independência e multipli­cadoras de esperados elogios", quanto àqueles outros não "imbuídos da verdade de que o Poder Judiciário não é também a sede da busca ou da convalidação de conveniências fiscais ou administrativas".

Tocou-me suceder-lhe na Presidência do STF: testemunhei-lhe então o meu reconhecimento, que certamente é de todos os seus Pares, "do equilíbrio sem temores, da tolerância sem perda da autoridade, da altivez sem arrogância", com que cumprira o seu mandato.

Prazerosamente, desempenho hoje a grata missão que Vossa Excelência me concedeu, Senhor Presidente, de renovar ao colega aposentado o atestado - que a amizade não tolda -de ter honrado, como seu Ministro, as melhores tradições desta Casa, a cuja nominata se integra na altura dos saudosos ascendentes que nela o precederam.

5 STF, Relatório de 1994, p. 33.

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Rogo por mim e meus Pares à sua filha - Doutora Maria Izabel Gallotti Rodrigues - que leve a Luiz Octavio Gallottí, à sua esposa - Senhora Iara Chateaubriand Pereira Diniz GalloUi -companheira solidária de toda a vida -, com as merecidas homenagens do Tribunal, os votos de todas as felicidades no seio da família amantíssima e a certeza de seus colegas - saudosos, embora, de sua convivência diária - de que continuaremos a usufruir de sua caríssima e fraterna amizade.

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Discurso do Doutor GERALDO BRINDEIRO,

Procurador-Geral da República

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o Doutor Geraldo 8rindeiro (Procurador-Geral da República) - Excelentíssimo Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Carlos Ve//oso; Excelentíssima Senhora Ministra e Excelentíssimos Senhores Ministros desta Egrégia Corte; Excelentíssimos Senhores Ministros Aposentados, Ministros Rafael Mayer e Aldir Passarinho; Excelentíssimos Ministros e Autoridades já mencionados; Excelentíssimos Senhores Magistrados, Membros do Ministério Público, Advogados, Servidores; Excelentíssima Doutora Izabel Ga//otti Rodrigues, Filha; Ministro Walton Alencar Rodrigues, Genro; Ministro Paulo Ga//otti e demais Familiares e Amigos do ilustre Homenageado presentes nesta Solenidade; Senhoras e Senhores.

o eminente Ministro Octavio Ga//otti assumiu o cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal no dia 20 de novembro de 1984. Durante cerca de dezesseis anos, Sua Excelência engrandeceu esta Colenda Corte, enriquecendo-a com seu notável saber jurídico e sublime magistratura. Em 27 de outubro de 2000, ao completar setenta anos de idade, aposentou-se por imperativo constitucional. O Ministério Público Federal deseja associar-se à justa homenagem que lhe é prestada nesta Sessão Solene, segundo a melhor tradição da Casa.

Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil em 1953, o ilustre Homenageado foi Membro do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União durante dezessete anos - de 1956 a 1973 - e Procurador-Geral de 1966 a 1973, tendo sido ainda Ministro daquela Corte de Contas por onze anos, no período de 1973 a 1984, e seu Presidente em 1974.

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Estimado pelos Ministros e servidores desta Casa, admirado e respeitado no mundo jurídico e social, onde possui inúmeros amigos, a quem cativou por sua gentileza suprema e atitude conciliadora e amistosa, o eminente Ministro Octavio Gallotti caracterizou-se sobretudo, no exercício de sua alta magistratura neste Colendo Supremo Tribunal Federal, pela lucidez e solidez jurídica de suas convicções expressas nos votos e acórdãos que proferiu.

Ministro do Tribunal Superior Eleitoral e seu Presidente em 1991, na sua despedida daquele Tribunal, o ilustre Homena­geado foi saudado pelo eminente Ministro Célio Borja, que mani­festou lias saudades antecipadas do grande Juiz que dele se afasta", destacando entre suas qualidades morais a modéstia e a busca da verdade lide alma leve e coração alegre".

Presidente do Supremo Tribunal Federal no biênio 1993-1995, o eminente Ministro Octavio Gallotti assumiu ainda a Presidência da República em substituição ao titular por dois breves períodos, de 13 a 15 de junho e de 4 a 6 de agosto de 1994, exercendo a suprema magistratura do País com a habitual discrição e sabedoria.

Proferiu conferências e publicou artigos jurídicos na Revista de Direito Administrativo, na Revista de Direito Público, nas Revistas dos Tribunais de Contas da União, do Distrito Federal e do Rio de Janeiro, na Revista de Administração Municipal e na Revista do Serviço Público, e ainda o Relatório e Parecer sobre as Contas Gerais do Governo da República no exercício de 1974. Foi Delegado do Brasil ao III e ao X Congresso da Organização Internacional das Entidades Fiscalizadoras Superiores (Intosai), no Rio de Janeiro (1959) e em Nairobi (1980); Chefe da Delegação do Brasil e Vice-Presidente do V III Congresso da mesma Organização, em Madri (1974); Membro do Conselho Dirigente da Intosai, também em 1974, e Representante do Brasil na reunião desse colegiado em Viena (1981); Delegado do Brasil ao V Congresso Latino-Americano de Entidades Fiscalizadoras Superiores (Ilacif), em Quito (1978); Delegado do Tribunal de Contas da União ao VI Congresso dos Tribunais de Contas do Brasil, em Brasília (1970) e ao Congresso Extraordinário em São Paulo (1972). Integrou ainda o Conselho Nacional da Magistratura de 2 de abril de 1986 até a extinção do órgão pela Constituição de 1988.

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Recebeu inúmeras condecorações, como a Grã-Cruz da Ordem de Rio Branco e as do Mérito de Brasília, Judiciário do Trabalho e Militar, a medalha do Mérito da Magistratura e a Cruz do Mérito Judiciário, as duas últimas pela Associação dos Magistrados Brasileiros. Foi ainda condecorado com as insígnias do Mérito Judiciário dos Estados da Bahia, do Rio de Janeiro e de Goiás, outorgadas pelos Tribunais de Justiça daquelas Unidades da Federação, e também o Colar do Mérito do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Grande oficial das Ordens do Mérito Militar, Naval, Aeronáutico e das Forças Armadas, o ilustre Homenageado é portador também da Grã-Cruz de São José Operário e da do Mérito de Dom Bosco, respectivamente outorgadas pelos Tribunais Regionais do Trabalho da 23a e da iDa

Regiões. Recebeu ainda a Medalha Santos Dumont e a Medalha do Mérito Anita Garibaldi (categoria ouro), respectivamente conferidas pelos Governos dos Estados de Minas Gerais e de Santa Catarina. E cidadão honorário do Município de Tijucas (Santa Catarina), terra natal de seu avô paterno, Benjamin Ga110 tti, por deliberação da Câmara de Vereadores, e Comendador da Ordem do Mérito Estácio de Sá (grau máximo), por decreto do Prefeito da Cidade do Rio de Janeiro. Foi também agraciado com a medalha "Mascarenhas de Morais" pela Associação Nacional dos Veteranos da Força Expedicionária Brasileira, a "Medalha da Vitória" pela Associação dos Ex-Combatentes do Brasil e a "Medalha do Mérito Presidente Castello Branco" pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal.

Senhor Presidente, Senhores Ministros, Senhoras e Senhores,

Na Sessão Solene de posse do ilustre Homenageado na Presidência deste Colendo Supremo Tribunal Federal, em 13 de maio de 1993, neste mesmo Plenário, disse, ao saudá-lo em nome da Corte, o eminente Ministro Francisco Rezek:

"À vossa formação, Ministro-Presidente, todo radicalismo é estranho e toda obstinação supérflua. Penso que não fantasiaria a realidade se vos destacasse, na composição contemporânea do Supremo, como um modelo admirável de convi­vência entre a absoluta segurança de seus próprios pontos de vista, em qualquer caso, e a nenhuma preocupação de influir sobre convicções alheias, em

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caso algum. Leitão de Abreu citava um dia neste plenário o escritor do século passado para quem ' ... quando um homem se mostra fiel a si mesmo, tudo corre no seu sentido - governo, sociedade, o sol mesmo, a lua e as estrelas'. Tudo, afinal, conspira em favor daqueles que se conhecem e guardam fidelidade a seus princípios e propósitos. "

E o eminente Ministro Octavio Gallotti, em trecho de seu discurso como Presidente desta Colenda Corte, ao refe­rir-se à missão do magistrado e ao Ministério Público, "cuja perfeita atuação é indissociável da tarefa de julgar", nas suas próprias palavras, ponderou com notável sabedoria e grande discerni­mento:

"Mesmo quando se julgue mais bem capacitado (ética ou tecnicamente) do que o legislador, deve, porém, o juiz tomar advertência de que não foi ungido, como aquele, pelo voto popular e que não reside apenas em virtudes de discernimento pessoal (supostas ou verdadeiras) a razão do sagrado depósito, em suas mãos, da missão de julgar os semelhantes.

Predomina, nessa escolha, o princípio da separação das funções, que manda extremar o mister de julgar das atividades de legislar e governar. E assim se faz para evitar a tirania de quem faz e, simultaneamente, aplica e interpreta a lei.

Nem comporta dispensa, o atual estágio de nossa civilização, da existência de regras abstratas, previamente conhecidas, que presidam à formação das relações jurídicas, sem que fiquem estas ao sabor das normas que possam vir a ser editadas, em concreto, pelo eventual julgador dos litígios que venham a surgir. "

Invocando o pensamento do jurista argentino Sebastian Soler, Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires, lembrado em discurso do seu pai, o saudoso Ministro Luiz Gallotti, disse em seguida o ilustre Homenageado:

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"Não deslembramos, por outro lado, a advertência de Soler: o direito pode ser examinado dogmática, crítica, histórica e filosoficamente; os pontos de vista são infinitos. O que importa afirmar é que a construção dogmática não deve ser barrocamente confundida com apreciações extranormativas, com opiniões pessoais, com teorias derrogatórias da lei. Uma coisa é a lei e outra coisa nossa opinião; quando não coincidem, nada nos priva de dizer o que pensamos; mas devemos saber distinguir o que é a lei daquilo que é somente nosso desejo."

E acrescentou mais adiante:

"Essa subordinação do Juiz à vontade da lei e não à satisfação de seu desejo ou alvitre pessoais nem sempre é bem compreendida pela sociedade, atraindo, então, para o Judiciário, insatisfações que melhor seriam dirigidas às outras áreas do Poder, quando não imputadas a inelutáveis contingências do destino.

Suportá-Ias pacientemente é, porém, o nosso dever, alheios à tentação da fama e dos aplausos que, de outro modo, seria fácil conquistar, e resistindo à tentação de emitir juízos gratuitos de conveniência, muitas vezes conflitantes com outros interesses mais gerais que haviam condicionado as deliberações legislativas e os atos de Governo, segundo dados sociais e econômicos que, ao magistrado, nem sempre é dado conhecer. "

Extremamente polido e cuidadoso no trato com as pessoas, sua atitude mansa e serena, contudo, nunca impediu o ilustre Homenageado de cultivar a coragem da sensatez, do equilíbrio e da independência tranqüila, qualidades essenciais configuradoras do perfil de um grande Magistrado. A filosofia jurídica que sempre preconizou, fundada em profundas convicções éticas e morais, é ainda exemplarmente vivida no convívio com a família e os amigos. Não faltaram ao eminente Ministro Octavio Gallotti, aliás, exemplos como o de seu pai, o saudoso Ministro Luiz Gallotti, que honrou esta Suprema Corte durante quase 25

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anos e dela foi Presidente, e do seu avô materno, o Ministro Pires e Albuquerque, também Ministro deste Colendo Tribunal, ambos ex-Procuradores-Gerais da República.

Senhor Presidente,

Em carta dirigida a Vossa Excelência por ocasião de sua aposentadoria, já lida há pouco, o ilustre Homenageado reverencia, sempre com grande devoção, a memória de seu pai e de seu avô e, com a conhecida generosidade e modéstia, refere­se ao seu desempenho na Corte e ao convívio com seus eminentes Pares.

Concluo minhas palavras, Senhor Presidente, para expressar, em meu nome pessoal e no do Ministério Público Federal, a grande admiração e estima e o profundo respeito pelo eminente Ministro Octavio Ga//otti, um dos maiores Magistrados que honraram esta Colenda Corte. A sabedoria jurídica, a bondade e o senso de Justiça de Sua Excelência, a serenidade e o admirável talento como Juiz enaltecerão sempre a História do Tribunal.

Muito obrigado.

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Discurso do Doutor ROBERTO ROSAS, Representante do Conselho Federal da

Ordem dos Advogados do Brasil

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o Doutor Roberto Rosas (Representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil) -

Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal, Senhores Ministros, Senhor Procurador-Geral da República, Familiares do Ministro Octavio Gallotti, eminentes Autoridades já mencionadas pelo eminente Ministro Sepúlveda Pertence.

Se chegarmos aos primórdios coloniais brasileiros, na Casa da Torre, na vertente litorânea baiana, Garcia D'Ávila era um homem obstinado, de luta, expansionista no território e nos negócios. Era uma característica daquela dinastia, que Pedro Calmon descreveu em belo livro. Essa saga permaneceu na história, e seus descendentes mantiveram a fibra, a coragem, a luta, mas o respeito ao próximo, à justiça, e a obediência a padrões morais. Do litoral chegaram ao recôncavo baiano e ali se instalaram os Pires e Albuquerque, ornados de grandes características patriarcais e de amor ao próximo. Essa família veio à Justiça brasileira e especialmente ao Supremo Tribunal Federal e ao Ministério Público. Antônio Joaquim Pires e Albuquerque foi um grande símbolo de jurista brasileiro, como assim viu Santiago Dantas em Figuras do Direito. Representou a força de uma personalidade, a austera vida de homem público e o respeito à Justiça. Daí se entender no seu descendente Luiz Octavio Pires e Albuquerque Gallotti todo esse aparato cívico de homem centrado, polido, discreto, mas arrojado na emissão de sua opinião final. O historiador Oliveira Lima referia-se a Dom João VI - a inconstância nem sempre é fraqueza, e a incoerência muitas vezes é inteligência. Octavio Gallotti não é uma coisa ou outra, porque é constante sem fraqueza e é coerente por inteligência.

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Educara-se nos grandes princípios da moral, da ética, na fusão de dois formadores: Pires e Albuquerque e Luiz Gallotti. Deste certamente recebera a carga de afetivo, amigo dos amigos, tão exaltado com o futebol. Seguiu essas pegadas ao longo da vida, procurando ouvir, aprender e acertar.

Sua formação acadêmica deixou ecos na Faculdade Nacional de Direito, na expressão de seu antigo Mestre Haroldo Valladão, do aluno dedicado, distinto e notável no conhecimento jurídico.

A ele muito deve o Ministério Público junto às Cortes de Contas ao longo de seu exercício no Tribunal de Contas da União. Era necessário exaltar o significado do parquet naqueles tribunais, muitas vezes com os cargos ocupados por procuradores fiscais ou procuradores estaduais. Era a negação da independência do Ministério Público, e até mero arremedo, que a Constituição de 1988 superou, com a interpretação restrita desta Casa, certamente nas luzes de Luiz Octavio Gallotti. Galgou à titularidade no Tribunal de Contas da União, aperfeiçoando seus julgamentos com a grande experiência haurida naquela Casa. Assim, também, ocorreu no Tribunal Superior Eleitoral. Atento ao fato político, às características sociológicas da realidade política brasileira, com a adaptação da lei às realidades eleitorais e partidárias.

Quando se abria vaga nesta Casa, sempre houve enorme torcida para a sua transferência para cá, até que veio substituir o insigne Pedro Soares Munoz, Juiz excelso que trouxera do Rio Grande do Sul a fama do grande julgador, do conhecedor profundo do Direito e exato na aplicação jurídica. Por uma circunstância histórica, Gallotti foi substituído por outra represen­tante dos pampas, a Ministra Ellen Gracie, cedida pelos cariocas ao Rio Grande do Sul. Por todos, é uma cadeira aureolada de grandes figuras, e sua sucessora com a nobreza da formação, do conhecimento e de categoria à grande altura dos seus ante­cessores.

Octavio Gallotti manteve-se nesta Casa como sempre foi na vida pessoal e profissional, como Advogado, como MP ou Ministro do TCU - sóbrio, correto, elegante, humano e tranqüilo; com potencial técnico e profissional na dimensão das grandes figuras do mundo jurídico. Medeou sua judicatura pautado no conselho de Dom Quixote a Sancho Pança, quando este assumiu

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o governo da ilha de Barataria - achem em ti mais compaixão as lágrimas do pobre, mas não mais justiça do que as queixas dos ricos. Octavio Gallotti ouviu os pobres e sentiu as queixas dos ricos num atendimento rápido e pronto. Tudo isso transferiu à ilustre descendência na Procuradora Maria Izabel Gallotti Rodrigues, respeitável figura do Ministério Público Federal.

Entre os romanos, a deusa virtude era filha da verdade e tinha seu templo ao lado da honra. Para chegar-se à honra, passava-se pela virtude. Ele passou por todos esses templos porque sempre exercitou a virtude, a verdade e a honra, por isso os advogados, pelo Conselho Federal da OAB, saúdam e homena­geiam o Ministro Luiz Octavio Pires e Albuquerque Gallotti, incor­porando as palavras do eminente Ministro Sepúlveda Pertence.

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Palavras do Senhor Ministro CARLOS VELLOSO, Presidente

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o Senhor Ministro Carlos Velloso (Presidente) -

Senhores Ministros, Senhoras e Senhores, todo homem tem as suas marcas. A objetividade, a bondade e a modéstia são as marcas do Juiz notável que homenageamos. Objetivo, sintético, Octavio Gallotti nunca quis fazer doutrina nesta Casa, quis, sim, fazer justiça e poderia fazer doutrina, se o quisesse, porque bem anotava e anotou várias vezes o Ministro Célio Borja, seu velho companheiro de escola, e, nesta Sessão, os magníficos discursos dos eminentes Ministro Sepúlveda Pertence, do Professor Geraldo Brindeiro e do Advogado e Professor Roberto Rosas, Octavio Gallotti é Jurista maior. A sua modéstia, entretanto, o levava, sempre e sempre, a desejar fazer justiça, apenas.

Os formosos discursos aqui proferidos, que bem caracterizam a figura do notável Magistrado que homenageamos, ficarão registrados nos anais do Tribunal.

Anoto e agradeço a presença de todos os que aqui vieram. Registro a presença dos Familiares, da Doutora Maria Izabel Gallotti Rodrigues e do seu Esposo, o Ministro Walton Alencar Rodrigues, do Tribunal de Contas da União, que ora representa também o Presidente daquela Corte; do Professor Edilon Póvoa Filho e Dona Lúcia Gallotti, esta Irmã do Ministro Octavio Gallotti; do Doutor Carlos Alberto Pires e Albuquerque; do Doutor Francisco Xavier Silva Guimarães; do Doutor Renato Osvaldo Camp; do Doutor José Ramalho Brunet; do seu grande Amigo, Ministro Luciano Brandão Alves de Souza; do Doutor Lincoln Pinto da Cruz; do Doutor Hildenburgo Chatobrian Pereira Diniz; do Coronel João Aguiar Nascimento; dos Ministros Aposentados Rafael Mayer e Aldir Passarinho; do eminente Ministro Nilson Naves, que representa o Superior Tribunal de Justiça e o seu Presidente; do

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Ministro Antonio Carlos de Nogueira, do Superior Tribunal Militar que ora representa aquela Casa e o seu Presidente; do Ministro Paulo Gallotti, do Superior Tribunal de Justiça; do Ministro Cherubim Rosa Filho, do Superior Tribunal Militar; do Desembargador Edmundo Minervino, Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal; da Juíza Terezinha Célia Kineipp Oliveira, Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 10a Região; do Conselheiro Antonio Carlos Flores de Moraes, Presidente do Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro; do Doutor Carlos Thompson Flores Lenz, Procurador-Chefe da Procuradoria Regional da República da 4a Região de Porto Alegre; da Doutora Helenita Acioly, Subprocura­dora-Geral da República; do Juiz Plauto Ribeiro, do Tribunal Regional Federal da la Região; das Senhoras dos Ministros Aldir Passarinho e Rafael Mayer; enfim, de todos os que aqui vieram prestigiar esta Solenidade.

Interrompo a Sessão por dez minutos para que confraternizemos com os Familiares, Amigos do Homenageado e com as Autoridades que aqui vieram.

Está suspensa a Sessão por dez minutos.

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