MMA-Vulnerabilidade Ambiental-Desastres Naturais Ou Fenomenos Induzidos

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Ministrio do Meio Ambiente

VULNERABILIDADEAMBIENTALDesastres naturais ou fenmenos induzidos?

Organizao Rozely Ferreira dos Santos

COORDENADORA GERAL Rozely Ferreira dos Santos EQUIPE TCNICA Cristina Q. T. Maffra Marcelo Mazzola Mrcia Bertolo Silvia Regina da Costa Gonalves Rosngela de Assis Nicolau AGRADECIMENTOS Ao ex-Secretrio de Qualidade Ambiental Victor Zular Zveibil e ao Diretor de Qualidade Ambiental Rudolf de Noronha pelo estmulo na conduo dos trabalhos; As imagens desta publicao foram gentilmente cedidas por: Fundao Casa da Cultura de Marab, Defesa Civil de Salvador, Nelson Amaral Eustquio, Andr Luiz Lima, Myriam Abdon, Associao Guardi da gua, Antonio Scarpinetti, Juca Matins/Olhar Imagem, L.T.B.Rizzo, Instituto Geolgico-IG/SP, Instituto de Pesquisas Tecnolgicas- IPT/SP, IPA/FURB, Comisso Geolgica e de Recursos Naturais do Canad, Oscar de Moraes Cordeiro Netto, Jornal A Regio, Prof. Luis Klering (Terra Gacha), Embrapa Semi-rido, Funceme, SOS Mata Atlntica. Agradecimentos especiais s contribuies dos pesquisadores Ruth Maria Bianchini de Quadros e Jos de Andrade Raiol.

A Elaborao dos documentos que compe esta publicao so da inteira responsabilidade de seus autores.

Catalogao na Fonte Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis

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Vulnerabilidade Ambiental / Rozely Ferreira dos Santos, organizadora. Braslia: MMA, 2007. 192 p. : il. color. ; 29 cm. Bibliografia ISBN 978-85-7738-080-0 1. Conservao da natureza. 2. Planejamento ambiental. 3. Impacto ambiental. I. Ministrio do Meio Ambiente. II. Secretaria de Recursos Hdricos e Ambiente Urbano. III. Ttulo. CDU(2.ed.)502.03

PREFCIO

ivemos em paisagens cada vez mais povoadas e as cidades encontram-se em constante ampliao. muito comum ver reas naturais serem substitudas por reas urbanas ou agricultura e entrecortadas por rodovias, dutos ou linhas de transmisso. Todos os empreendimentos voltados para a vida do homem, via de regra, se sobrepem aos espaos e arranjos antes formados pelos elementos naturais, interferindo, de maneira contundente, nas relaes e dinmicas antes estabelecidas. Este fato facilmente constatado pelo rastro de degradao e pelo comprometimento das funes ecolgicas que hoje observamos. As relaes espaciais da cidade com as reas naturais so cada vez maiores e vm criando um ambiente de discusso sobre formas e estratgias para conter o processo histrico de perda de biodiversidade e de recursos naturais. Essas novas proposies no so to fceis de serem gerenciadas. O primeiro ponto a ser enfrentado que, historicamente, no se consideravam as variveis necessrias para garantir a conservao dos recursos naturais, muitas vezes entendidos como recursos ilimitados. As exigncias ambientais, relacionadas tanto ao equilbrio do meio quanto qualidade de vida do Homem, pressupem a manuteno de mecanismos que muitas vezes no so vistos como relevantes no processo de povoamento e urbanizao. Para compreender a importncia das paisagens necessrio reconhecer fraes de tempo muito maiores do que a histria do Homem e empreender uma leitura sistmica que considere os resultados sinrgicos dos diferentes elementos de composio do meio. necessrio reconhecer que cada pequena poro de territrio apresenta um conjunto prprio de respostas frente s mudanas ambientais e diferentes formas de uso e ocupao. Uma importante lio da leitura de paisagem que toda e qualquer situao desastrosa sempre precedida por uma mudana. O ambiente dinmico. Isto significa que uma situao de equilbrio sempre pode, de forma abrupta ou gradual, ser transformada em uma situao de no equilbrio. A questo responder em que medida as alternativas de uso e ocupao da terra esto contribuindo ou induzindo essa transformao que pode resultar em um evento desastroso para o Homem. Uma floresta de encosta de montanha, por exemplo, pode ser desmatada, fragmentada e degradada para construo de um ncleo urbano e, como conseqncia, a eroso ser acelerada, uma rea poder ser inundada, uma parte da encosta poder sofrer deslizamento e assim por diante. O captulo 1 mostra que essas situaes no Brasil so muito mais comuns do que se pensa. Muitas delas, que se manifestam como desastres para o Homem, podem ser evitadas quando percebemos a paisagem como uma frao do espao que recebe foras naturais propulsoras que, por sua vez, acionam processos decorrentes. Os captulos 1 e 2 conduzem a idia de que, para alcanar uma melhor qualidade ambiental, a tomada de deciso sobre proposies corretas de uso e ocupao da terra deve sempre considerar a questo: em que medida o uso e ocupao da terra est contribuindo ou induzindo para a ocorrncia de uma transformao indesejada? No captulo 3, podemos verificar que as diferentes formas de uso podem ser observadas por seus padres e estruturas. Cada padro representa um conjunto prprio de exigncias e condies de uso. A paisagem, dentro do seu comportamento dinmico que associa diferentes padres, apresenta mecanismos e condies especficas. Quando o objetivo evitar ou minimizar a ocorrncia de um impacto negativo de grande magnitude, como a eroso e assoreamento (captulo 4), necessrio, em primeiro lugar, perceber os principais padres, mecanismos e fatores condicionantes que a paisagem apresenta, para depois tomar decises sobre o seu controle. Vamos agora voltar a lembrar que, medida que o Homem vai ocupando espaos, os padres vo se alterando. Cada nova composio impulsiona novas linhas de evoluo, novos mecanismos e novos condicionantes. Portanto, primordial reconhecer os fatores indutores das transformaes passadas que interferiram na atual dinmica do local avaliado. Os mecanismos e condicionantes originados pelas foras da natureza se

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apresentam por variaes de longas datas e explicam a formao de paisagens. Cada uma delas apresenta uma determinada vulnerabilidade a ao humana, devido s caractersticas e funes de seus componentes. Entretanto, necessrio ter em mente que componentes como o clima, a composio do modelado terrestre, as caractersticas e propriedades dos terrenos so elementos do sistema que no podem ser facilmente alterados pelo Homem. Em uma escala maior, os efeitos da ao humana podem ser muito mais sentidos pelo prprio Homem do que pela Natureza. Nada melhor para ilustrar esse fato como apresentar o comportamento da gua em diferentes escalas de observao e em diferentes nveis de interferncia (captulo 5). Alis, importante ressaltar que em estudos de paisagem a gua e a vegetao (captulo 10) representam elementos fundamentais para entender a dinmica e a vulnerabilidade de um territrio, em funo de suas sensibilidades s condies impostas. O captulo 10, por exemplo, descreve como a vegetao pode expressar, atravs da observao de suas caractersticas estruturais e funcionais, a qualidade do ambiente e o seu papel controlador, seja em nvel de indivduo, de comunidade, de ecossistema ou de bioma. Evidencia como a vegetao, ou o sistema em que est inserida, reage distinta e rapidamente a variaes de diferentes grandezas. Em sntese, as diversas alternativas de uso e ocupao das terras sobre diferentes terrenos, sejam observados em macroescala ou em microescala, podem induzir, direta ou indiretamente, desastres ou situaes indesejveis ao Homem. Elas costumam alterar a dinmica da paisagem, modificando a capacidade do meio em responder aos processos naturais. Se no podemos evitar determinadas foras e fenmenos da Natureza, por outro lado, podemos modificar, para melhor, as formas como as intervenes humanas atuam na paisagem. Este o caminho de debate que os captulos 4 a 9 adotaram para explicar os fenmenos de eroso, de enchentes, de deslizamentos de encostas, de desertificao e de arenizao que, em determinadas situaes, se transformam em desastres. Estes captulos evidenciam que, para cada desastre, h causas e conseqncias ambientais e sociais, cuja severidade e risco dependem intimamente do grau de interferncia inadequada que o Homem fez dentro do seu espao. Eles tambm mostram que os desastres podem ser maiores diante de certas situaes de agravo ou atenuados mediante certas medidas preventivas ou mitigadoras. Os autores relatam que a sociedade, diante da possibilidade de um desastre, lana mo das mais diversas formas ou mecanismos de soluo. So descritos recursos tecnolgicos, medidas estruturais, instrumentos legais, mecanismos institucionais ou participao pblica. A pergunta permanente nesses captulos : qual a medida ou qual o conjunto de medidas ideal para evitar que o desastre ocorra? Obras civis para sua conteno? Leis? Participao pblica? Independentemente do fenmeno avaliado, a resposta sempre caminha na direo da necessidade do conhecimento e do reconhecimento da importncia da vulnerabilidade do meio em que se vive. Todos os captulos lembram que a vulnerabilidade do sistema e os desastres ambientais nunca dependem de um nico fator ou varivel, mas de um conjunto deles, que determinam as condies do meio. Desta maneira, eles conduzem concluso que, para tomar decises em um territrio, mesmo que sob a perspectiva de um nico fenmeno, necessrio compreender a intrincada rede de componentes, variveis e funes que determinam o fenmeno e compem a paisagem. Essa uma tarefa complexa, pois exige uma leitura criteriosa baseada em conhecimentos multidisciplinares. Alm disso, exige uma compreenso simultnea de aspectos naturais e humanos historicamente polarizados. nessa direo que o captulo 9, abordando o planejamento, evidencia as estratgias que permitem uma viso integrada tanto das condies do meio como das aes ou medidas selecionadas em um processo de tomada de deciso. Na verdade, esse captulo final s vem reforar o que todos os outros evidenciaram, ou seja, que a proposio de solues eficientes para deter ou a evitar desastres s vlida se a tomada de deciso for feita a partir de uma base cientfica slida e viso interdisciplinar sobre o meio planejado, somado compreenso de que no somos capazes de deter os fenmenos naturais. Os autores

SUMRIO

Prefcio..................................................................................................................................................................................................... 3 Apresentao......................................................................................................................................................................................... 7 Captulo 1 - As razes dos desastres em territrio brasileiro......................................................................................... 9 Captulo 2 - Paisagens, condicionantes e mudanas........................................................................................................13 Captulo 3 - Usos da terra e sua influncia sobre a qualidade ambiental...............................................................23 Captulo 4 - Eroso e assoreamento..........................................................................................................................................39 Captulo 5 - O uso da terra e a dinmica hidrolgica .......................................................................................................59 Captulo 6 - Deslizamentos de encostas .................................................................................................................................75 Captulo 7 - Enchente e inundao............................................................................................................................................95 Captulo 8 - Drenagem urbana................................................................................................................................................. 107 Captulo 9 - Desertificao e arenizao ............................................................................................................................. 123 Captulo 10 - Vegetao, vulnerabilidade e qualidade ambiental ......................................................................... 143 Captulo 11 - Planejamento da paisagem........................................................................................................................... 165 Glossrio ............................................................................................................................................................................................. 176 Referncia Bibliogrfica .............................................................................................................................................................. 180 Autores................................................................................................................................................................................................. 190

APRESENTAO

om o objetivo de apoiar as cidades brasileiras no aperfeioamento da gesto ambiental urbana, o Ministrio do Meio Ambiente, em parceria como o Ministrio das Cidades e com o PNUMA - Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente e o UN-HABITAT - Programa das Naes Unidas para os Assentamentos Humanos, concebeu o projeto Estratgia de Apoio Gesto Ambiental Urbana. Este projeto visa inserir nos instrumentos urbansticos a varivel ambiental de maneira contundente. Foram escolhidos municpios com diferentes caractersticas espaciais e ambientais, para a execuo de projetos-piloto. Nestas cidades, as equipes tcnicas locais exercitaram a elaborao de seus Planos Diretores de Desenvolvimento Municipal ao mesmo tempo em que se dedicavam aos estudos preparatrios da Avaliao de Vulnerabilidades Ambientais, do Relatrio GEO Cidades e das Consultas Urbanas, sempre acompanhados pelos tcnicos dos Ministrios do Meio Ambiente e das Cidades e das duas agncias da ONU parceiras. Neste estreito contato entre os tcnicos das Prefeituras e dos Ministrios confirmou-se a relevncia da avaliao das vulnerabilidades ambientais no planejamento municipal e no ordenamento do espao urbano. Questes como deslizamentos, inundaes, desertificao, eroso e assoreamento produzem grandes impactos no cotidiano da populao, gerando significativas perdas ambientais e financeiras, tanto pblicas como privadas. Neste processo, constatamos a carncia de material tcnico disponvel sobre o tema voltado especificamente para os interesses e necessidades dos gestores municipais. Desta lacuna surgiu o livro Vulnerabilidade Ambiental. Encontramos na Professora Rozely Ferreira dos Santos, da rea de Recursos Hdricos, Energticos e Ambientais da Faculdade de Engenharia Civil da UNICAMP, a organizadora ideal para a conduo desta publicao, tanto em sua concepo geral, como na escolha de especialistas de todo o pas para a redao dos captulos e para a homogeneizao dos contedos. Inicialmente, todas estas aes foram coordenadas pela equipe da Diretoria de Gesto Territorial da Secretaria de Qualidade Ambiental do Ministrio do Meio Ambiente. Com a nova estrutura regimental do Ministrio, editada em maio de 2007, foi criada a Secretaria de Recursos Hdricos e Ambiente Urbano, com um especfico Departamento de Ambiente Urbano, que a partir de ento o responsvel pela conduo da poltica ambiental urbana e pela definio de estratgias para a implementao de programas e projetos em temas relacionados com a avaliao e a mitigao de vulnerabilidades e fragilidades ambientais em reas urbanas, e com o desenvolvimento e aperfeioamento de instrumentos locais e regionais de planejamento e gesto que incorporem a varivel ambiental. Em um passado recente os temas aqui abordados eram encarados estritamente como fenmenos naturais, de previso incerta e inconstante, no incorporados ao processo de planejamento das cidades. Esta publicao explicita a importncia da ao antrpica na agudizao destes processos e traz para dentro da administrao municipal a discusso sobre a possibilidade de se trabalhar na mitigao de suas causas e na preveno de suas conseqncias. Estamos certos que os gestores pblicos municipais e demais interessados no tema encontraro neste livro uma importante ferramenta para a compreenso destas vulnerabilidades e para a melhoria da qualidade ambiental das cidades brasileiras. Thelma Krug Secretria de Mudanas Climticas e Qualidade Ambiental Eustquio Luciano Zica Secretrio de Recursos Hdricos e Ambiente Urbano

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CAPTULO IAS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIROCristina Q.T. Maffra & Marcelo MazzolaAS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EMTERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO ASESO USO DE CANOAS DURANTE AS ENCHENTESFONTE: FUNDAO CASA DA CULTURA DE MARAB

CAPTULO 1

AS RAZES DOS DESASTRES EM TERRITRIO BRASILEIRO

uem j no se pegou diante de notcias de terremoto ou tsunami dizendo: que desastre!? Ns facilmente reconhecemos o fenmeno porque fazemos uma relao direta do acontecimento com todo tipo de acidente funesto, que fatal para o homem ou que resulta em algum tipo de desgraa. Sabemos que os prejuzos podem ser tanto para o Homem quanto para o meio que ele faz parte. Quem j no se pegou diante de notcias de terremoto ou tsunami na sia dizendo: pelo menos no Brasil ns no temos esses problemas? verdade. Terremotos, tsunamis e erupes vulcnicas no ocorrem no Brasil ou, pelo menos, no existe uma tendncia natural para que tais fenmenos ocorram, dadas as caractersticas da crosta terrestre do nosso pas. Porm, ser que estamos livres da ocorrncia de desastres naturais? Segundo a base de dados internacional sobre desastres da Universidade Catlica de Louvain, Blgica, entre 2000 e 2007 mais de 1,5 milhes de pessoas foram afetadas por algum tipo de desastre natural no Brasil. Os dados tambm mostram que, para este mesmo perodo, ocorreram no pas cerca de 36 grandes episdios de enchentes, secas, deslizamentos de terra e o prejuzo econmico gerado por esses eventos estimado em mais de US$ 2,5 bilhes. Esses exemplos demonstram que desastres naturais afetam, sim, o Brasil. Porm, eles no so de origem tectnica, como o caso de terremotos, tsunamis ou derrames vulcnicos. No nosso pas os desastres tendem a estar relacionados a fenmenos climticos, potencializados pela ao do homem. Avalia-se que, no Brasil, os desastres naturais mais comuns so as enchentes, a seca, a eroso e os escorregamentos ou deslizamentos de terra (figura 1.1). Eles so responsveis por um nmero elevado de perdas humanas e materiais todos os anos (figura 1.2). Um panorama interessante que se obteve sobre a incidncia de desastres naturais no Brasil dado pela Pesquisa de Informaes Bsicas Municipais -

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FIGURA 1.1

Principais desastres naturais no Brasil entre 2000 e 2007

FIGURA 1.2

Deslizamento de terra, Barro Branco Salvador, 1996 Fonte: Defesa Civil - Salvador

MUNIC, realizada pelo IBGE em 2002 e publicada em 2005. Essa pesquisa, que enfoca a tica do gestor municipal, mostra que no Brasil os maiores desastres relacionam-se a inundaes, escorregamentos e eroso e que ess es processos esto fortemente associados degradao de reas frgeis, potencializada pelo desmatamento e ocupao irregular.

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Os dados revelaram que cerca de 50% dos municpios brasileiros declararam ter sofrido algum tipo de alterao ambiental nos 24 meses anteriores pesquisa e, dentre estes, cerca de 16% sofreram com deslizamento de encosta e 19% com inundaes. Outro fenmeno enfocado a alterao da paisagem causada pela eroso do solo, resultando em voorocas, ravinas e deslizamentos (captulo V). Os dados da pesquisa mostraram tambm que, dos municpios que sofrem com deslizamento de terra, 25% associam esse fenmeno degradao de reas protegidas e ocupao irregular de reas frgeis, outros 34% atriburam como causa o desmatamento. No caso dos municpios com problemas de inundao, aproximadamente 25% atriburam o fato degradao de reas protegidas e ocupao irregular de reas frgeis e 30% ao desmatamento. Em sntese, de acordo com as informaes obtidas pela MUNIC, processos como deslizamento de encostas, inundaes e eroso esto fortemente associados degradao de reas frgeis, potencializada pelo desmatamento e ocupao irregular (figura .1.3). Esse tipo de informao conduz os pesquisadores a concluir que no Brasil h uma relao muito estreita entre o avano da degradao ambiental, a intensidade do impacto dos desastres e o aumento da vulnerabilidade humana. Na verdade, arriscamos dizer que a degradao ambiental aumenta a possibilidade de ocorrncia de perigos naturais e, freqentemente, ocorre a possibilidade do perigo se transformar em uma situao previsvel, geradora de desastres, causando danos s pessoas. Um exemplo comum desse fato ilustrado pela Estratgia Internacional para Reduo de Desastres (ISDR, 2003): ...as inundaes dos rios e lagos so agravadas pelo desmatamento pois o desmatamento e o mau uso do solo potencializam processos erosivos e assoreiam os rios, rios assoreados tendem a causar inundao. Buscando garantir a funo ambiental e evitar que reas potenciais se transformassem em reas de risco, a legislao ambiental prev a existncia de reas de preservao permanente ao longo de rios, lagos e lagoas, em encostas ngremes e topos de morro, so as chamadas APPs. Essas reas, naturalmente mais suscetveis a processos como inundaes e escorregamentos, esto protegidas legalmente, inclusive em reas urbanas. Porm, o que se observa que a dificuldade do acesso terra e moradia em reas urbanas, associada a baixa atuao do poder pblico levou a um quadro de ocupao irregular dessas reas, especial-

FIGURA 1.3

Vooroca no Municpio de Ivinhema - MS Foto: Nelson Amaral Eustquio/MMA.

mente nos grande centros urbanos. E neste contexto a degradao ambiental possui um vnculo estreito com a realidade de pobreza da populao urbana e do no acesso terra, tornando a populao de baixa renda a mais vulnervel a desastres naturais. H que se pontuar, porm, que no somente o quadro de desigualdade ao acesso terra o nico responsvel pela degradao ambiental. O desrespeito legislao, muitas vezes motivado pela especulao imobiliria, o mau uso do solo, o desmatamento tem gerado um quadro de degradao responsvel pela potencializao a processos de risco. Desta forma, fundamental que a estratgia para reduo de desastres, sob a tica do desenvolvimento sustentvel, enfoque proposies no sentido de fortalecer polticas de ordenamento territorial com nfase na gesto ambiental, concomitantes a polticas de acesso habitao, s polticas de combate ao desmatamento e de combate degradao de reas ambientalmente vulnerveis, aes estas que atuariam diretamente na preveno a desastres. Em suma, o uso imprprio dos recursos naturais, a ocupao de reas com maior suscetibilidade natural e o desmatamento so, no Brasil, os principais fatores que potencializam a ocorrncia de desastres naturais. Porm, havendo vontade poltica, haver um gerenciamento apropriado, ou seja, que respeita a legislao, os planejamentos e planos ambientais existentes. Nessa direo, poder ser criada uma ferramenta de gesto valiosa, que contribui para a reduo dos impactos sobre o bem-estar da populao. No somos somente ns, brasileiros, que pensamos assim. A comunidade internacional vemVULNERABILIDADE AMBIENTAL

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nas ltimas dcadas reconhecendo que estudos sobre desastres e risco devem estar fundamentados e relacionados a problemas ambientais. Recentes estudos elaborados para os relatrios do Painel Intergovernamental sobre Mudanas Climticas IPCC sugerem que, potencializado pelas atividades antrpicas, haver aumento de temperatura mdia global entre 1,4 a 5,8 C at o final deste sculo. Isso poder levar acelerao do ciclo hidrolgico, gerando intensificao de eventos extremos. Com isso, eventos como deslizamento de terra, inundaes e vendavais podem tornar-se mais freqentes e

intensos, principalmente nas regies sul e sudeste do Brasil, enquanto o quadro de desertificao pode agravar-se na regio nordeste. com base nessas consideraes que os captulos seguintes foram construdos objetivando oferecer um contedo integrado, que verse sobre vulnerabilidade ambiental e desastres comuns em territrios brasileiros, frente a diferentes interferncias humanas. Talvez este apoio conceitual possa auxiliar alguns tomadores de deciso na formulao de propostas e aes referentes gesto dos seus territrios .

LEITURAS RECOMENDADASInstituto Brasileiro de Geografia e Estatstica IBGE, 2005. Pesquisa de Informaes Bsicas Municipais - MUNIC, Rio de Janeiro. OFDA/CRED, 2007. International Disaster Database. (http://www.em-dat.net). Universidade Catlica de Louvain, Bruxelas, Brgica. Secretaria Nacional de Defesa Civil (SEDEC) disponibiliza diversas publicaes sobre desastres disponveis em: (http://www.defesacivil.gov.br/ publicacoes/publicacoes.asp)

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CAPTULO 2PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANASRozely Ferreira dos Santos & Vernica Sabatino Caldeyro

PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES PAISAGENSE MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS MUDANAS CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS PAISAGENS, CONDICIONANTESDESMATAMENTO EM SANTA CATARINAFONTE: ADAPTAO DO ARTIGO DESMATAMENTO http://paginas.terra.com.br/lazer/staruck/desmatamento.htm

CAPTULO 2

PAISAGENS, CONDICIONANTES E MUDANAS

planeta Terra vem construindo sua histria a mais de 3.500 milhes de anos. uma histria longa e complexa, repleta de constantes transformaes capazes de evidenciar uma sucesso de estados que se alternam entre situaes de no-equilbrio e equilbrio, resultando em diferentes paisagens. Uma paisagem , ento, a expresso de processos compostos de uma seqncia de mudanas que ocorreu em uma determinada frao de tempo (figura 2.1). As mudanas ocorreram e ainda ocorrem, desencadeadas pela ao de agentes naturais em um passado distante e agentes naturais e humanos no tempo presente. A paisagem que vemos hoje um retrato dos acontecimentos do passado e, sem dvida, no ser a mesma no futuro. A gua da chuva e vento, por exemplo, so agentes naturais que podem estar neste instante intervindo na paisagem que voc v, desagregando e carregando gros da superfcie de um solo para acumular em outro local (figura 2.2). Quando essa transformao causada pelos agentes se manifesta no tempo e no espao, reconhecida pela simples observao ou pelo conhecimento cientfico, chamamos o fato de fenmeno, desta forma, eroso, inundao, enchente, desertificao e arenificao so fenmenos, ora resultantes exclusivamente de agentes naturais, ora acelerados ou induzidos pelas aes humanas. Cada um desses fenmenos citados pode ser descrito pelo seu prprio processo

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e a cada estado que se identifica nesse processo ns chamamos de evento. Eventos no ocorrem na mesma velocidade, mas podem ocorrer no mesmo espao. essa combinao infinita, originada de milhes de anos, que voc pode, neste momento, observar andando na regio onde mora.

FIGURA 2.1

A espiral do tempo e a contnua mudana do espao por meio de processos ou uma seqncia de estados que podem ser observados na paisagem.

FIGURA 2.2

Exemplo de um fenmeno: a eroso. 14 |

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2.1 PAISAGEM NATURAL, PAISAGEM MODIFICADA E ELEMENTOS DE TRANSFORMAO

FIGURA 2.3

Se no houvesse o movimento das placas tectnicas, quantos continentes teramos? Quantos diferentes pases e povos? Que tipos de vegetao, quais e quantas espcies da fauna e da flora?

A Terra sofreu a influncia, desde seus primrdios, de diversos processos e fenmenos, uns lentos, outros muito violentos, que em conjunto definiram o desenho atual das nossas paisagens terrestres. No princpio a evoluo do mar e da terra foi resultado da ocorrncia de fenmenos e processos naturais. Foi a ao de vulces, as ocorrncias de terremotos, as ondas ssmicas, os maremotos, o movimento das placas tectnicas e as mudanas climticas (figura 2.3). O espao antes da presena do homem j se mostrava dinmico em constante remodelao e reestruturao. Entre 4.000 e 500 milhes de anos os processos existentes definiram na superfcie terrestre a sua compartimentao geral, basicamente a modelao da topografia terrestre. Hoje, por exemplo, no temos vulces em territrio brasileiro, mas sabemos que no passado eles ocorriam em profuso. Temos indcios de manifestaes vulcnicas no norte e centro-oeste do pas h cerca de 3 bilhes de anos atrs, sendo que na era Mesozica ocorreu um dos maiores eventos vulcnicos da Terra, o vulcanismo da Bacia do Paran. A atividade vulcnica no Brasil cessou ao redor de 10 milhes de anos, mas nas ilhas ocenicas o vulcanismo se estendeu at tempos geolgicos mais recentes. No

passado, alm do vulcanismo, geleiras, chuvas, altas temperaturas e ventos agiram no territrio brasileiro, gerando uma grande variedade de formas de relevo e tipos de rocha e solo (figura 2.4). Desta forma, quando estamos frente a uma cadeia de montanhas, jazida de carvo, mancha de terra roxa, fonte de gs natural ou de petrleo, na verdade estamos observando uma composio e modelado que foi iniciado e estruturado por processos que ocorreram durante milhes e milhes de anos atrs.

FIGURA 2.4

Serra do mar So Paulo

Carvo mineral Santa Catarina

Serra e jazida de carvo so resultados de um longo processo na natureza.VULNERABILIDADE AMBIENTAL

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Por volta de 60 milhes de anos atrs temos os primeiros indcios de vida no planeta, que surge nesse universo de plancies, mares e montanhas (figura 2.1). Antes da deriva das placas continentais, a vegetao que cobria o territrio brasileiro era contnua s terras africanas. Aps a separao dos continentes, grupos de plantas e animais passaram a ser restritos a determinadas reas geogrficas, como uma resposta as novas condies territoriais, formando o que chamamos de grupos endmicos que, por sua vez, se reuniam em Domnios, ou seja, uma extenso territorial onde predominam feies morfolgicas, climticas, biolgicas e condies ecolgicas semelhantes. Desta forma, pressupe-se que a evoluo das plantas e dos animais tinha um tronco biolgico nico que se ramificou atravs do tempo. Foram inmeras as transformaes, como respostas aos eventos de glaciao e perodos de clima seco. Desta forma, ao longo de milhes de anos, as florestas retraram dando lugar a vegetao caracterstica do clima semi-rido (caatinga), expandiram-se novamente ocupando o espao que antes dominavam, porm, tantas geraes haviam passado sem contato, que as espcies que nelas viviam antes da separao, haviam se tornado to distintas a ponto de constiturem espcies isoladas. O aquecimento fez com que as Florestas de Araucria, que dominavam parte do estado de So Paulo, se confinassem ao sul do pas. Enfim, as mudanas geomorfoclimticas induziram, sucessivamente, a transformao das paisagens para chegar na forma que hoje conhecemos como Biomas, que incluem expresses como a Floresta Amaznica, o Cerrado, a Caatinga, o Pantanal ou a Mata Atlntica, melhor descritos no captulo 10 deste livro. Por sua vez, a vegetao passou a ter um papel decisivo na distribuio das chuvas, umidade do solo e volume dos rios. Tantos milhes de anos em constante mudana para criar esta fantstica diversidade de formas e vidas que hoje podemos constatar! Tantos redutos e refgios de flora e fauna gerados num constante vaivm de variaes ambientais naturais, em freqentes condies de desequilbrio e equilbrio! Costumamos dizer que as sucessivas composies foram induzidas por distrbios. Porm, o que se entende por distrbio? Distrbios so eventos, que ocorrem em um tempo e um espao e que significativamente alteram a estrutura e as funes das paisagens. Desta forma, no passado ocorreram vrios distrbios, de pequenas a grandes 16 |

propores, de mnimos a catastrficos, de curta a longa durao e, nessa poca, originrios das foras da natureza (figura 2.5).

FIGURA 2.5

Evoluo

Evoluo

Distrbios causam transformaes. Uma transformao pode ser produto de um evento especfico (causa principal), ou ser a causa central, combinar-se com outros eventos, ou mesmo ser resultado do conjunto de vrios eventos.

2.2 PAISAGEM NATURAL E PAISAGEM MODIFICADAOs primeiros indcios dos antepassados do humano no planeta so cerca de 4 milhes de anos e do gnero homem aproximadamente 1.8 milhes de anos. Ele caminhou atravs dos continentes, caando e coletando outros seres vivos. A data de chegada dos caadores coletores na Amrica do Sul permanece imprecisa, mas existem muitos indcios que ocorreu na ltima glaciao, h cerca de 13 mil anos. Luzia, o primeiro representante do gnero humano encontrado no Brasil, na regio de Lagoa Santa, em Minas Gerais, viveu h aproximadamente 11.500 anos atrs. Comparado com o tempo da Terra, podemos dizer que o homem um elemento de insero bastante recente na paisagem brasileira. Esse homem teve um processo de interao com a natureza interferindo tanto em paisagens de floresta como plancies do interior. Alguns autores defendem, por exemplo, a tese de que alguns animais de grande porte do Cerrado brasileiro foram extintos por uma matana excessiva efetuada pelos recm-chegados caadores. O que isso significa? Significa que a chegada do homem modificou os tempos de mudana e interferiu nos processos e nas situaes de equilbrio e desequilbrio. Existem indcios de que o homem freou o avano secular da floresta pela ao do fogo para afugentar e atrair caa, mais tarde para abrigar os agricultores itinerantes e as aldeias dos ndios. Sabemos, por exemplo, que grandes clareiras produzidas no passado foram o produto de queimada da floresta, realizada no s para o cultivo agrcola, mas tambm com estratgia de defesa dos ndios tupis nos Campos de Goitacs. Porm, em toda a histria do territrio brasileiro, nada se compara com as interferncias resultantes das formas de ocupar esse espao a partir da chegada dos portugueses. Desde ento, um novo elenco entra em cena, com alta capacidade de estimular eventos e intensificar o ciclo de distrbios. Eroso? Esse fenmeno j existia h milhes de anos, mas a velocidade em que ocorreu o desmatamento, desnudando o solo, provocou nesses ltimos 500 anos o assoreamento de muitos e muitos rios. Inundao? Tambm j existia, mas a ocupao desenfreada das margens acabou resultando em enchentes catrastficas. Deslizamentos de encostas? Ocorrem naturalmente, mas cada vez mais esto se expandindo e colocando em risco a prpria vida humana. Estamos tentando aqui evidenciar que o homem brasileiro, em to pouco tempo conseguiu transformar e extinguir paisagens, exterminando grupos endmicos inteiros gerados e especializados ao longo dos milhes de anos (figura 2.6). O homem ento gera impactos ambientais, ou seja, conseqncias indesejadas ou que comprometem o equilbrio e o estado existente de um ambiente, em virtude do tipo, da intensidade e da velocidade de promover mudanas por meio de suas atividades. Muitas vezes, basta olhar as condies em que se encontra um territrio, os tipos, a estrutura e a forma de manejo das atividades humanas que facilmente conduzimos interpretao dos impactos existentes.

FIGURA 2.6

Deslizamentos naturais e induzidos pelo homem. | 17

VULNERABILIDADE AMBIENTAL

Quando provocamos uma perturbao, a resposta do meio pode ser bastante diferente em funo das caractersticas locais naturais e humanas, ou seja, cada frao de territrio tem uma condio intrnseca que, em interao com o tipo e magnitude do evento que induzimos, resulta numa grandeza de efeitos adversos. A essa condio chamamos de vulnerabilidade. Se conseguirmos observar e medir as relaes entre caractersticas de um meio, eventos induzidos e efeitos adversos estaremos, na verdade, medindo a vulnerabilidade ambiental de uma rea. Para entender vulnerabilidade devemos considerar duas outras questes: a persistncia, que a medida do quanto um sistema, quando perturbado, se afasta do seu equilbrio ou estabilidade sem mudar essencialmente seu estado e a resilincia, ou seja, a capacidade de um sistema retornar a seu estado de equilbrio, aps sofrer um distrbio (figura 2.7). Em um territrio de baixa persistncia e baixa resilincia provavelmente a vulnerabilidade alta e, neste caso, quase sempre provocamos danos irreparveis. Quando ocorre um evento adverso, sbito, de alta magnitude sobre um terreno de alta vulnerabilidade,

FIGURA 2.7

Persistncia e resilincia de uma paisagem. Como medir?

muito provavelmente estaremos diante de uma calamidade. Dizemos que ocorreu um desastre ou acidente quando se constata um acontecimento calamitoso, seja para o homem, seja para a Natureza, geralmente repentino, que ocasiona grandes prejuzos de ordem humana, material ou ambiental. O desastre , ento, o resultado de um ou mais eventos adversos sobre um espao vulnervel que podem ser de origem natural ou provocado pelo homem. Sua medida pode ser obtida pela observao da interao entre a magnitude da interferncia e do evento adverso, sendo vulnerabilidade do sistema constatada pela dimenso ou intensidade dos prejuzos ou danos causados (figura 2.8). Se medirmos os danos ou prejuzos potenciais, provenientes de um desastre, expressos em probabilidade estatstica de ocorrncia e de intensidade ou grandeza das conseqncias previstas, estaremos medindo o risco, conforme pretendem demonstrar os captulos seguintes que tratam dos principais fenmenos causadores de catstrofes no Brasil. Neste sculo reconhecemos o papel decisivo do homem que, com suas aes e atividades, induzem efeitos e atuam sobre a vulnerabilidade do meio nas mais diversas propores. No Brasil, temos inmeros exemplos de como essa atuao, nos ltimos 500 anos, transformou-se em desastres (captulo I). inacreditvel como em to pouco tempo de existncia conseguimos transformar e extinguir paisagens inteiras, exterminando grupos endmicos gerados e especializados ao longo dos milhes de anos (figura 2.9). As conseqncias tm sido drsticas tanto para a Natureza quanto para o homem. Como diz o ditado, somos homens de sete instrumentos, capazes de realizar diversas atividades de diferentes ordens, como profissional, artstica ou cultural. Hoje, todos

FIGURA 2.8

Quando ocorre um desastre ? Uma relao entre a magnitude do evento e a vulnerabilidade do espao. 18 |

FIGURA 2.9

As Florestas de Araucria, Mata Atlntica e Cerrado so exemplos de domnios que resistiram as mudanas geoclimticas, mas no esto resistindo velocidade de transformao do homem.

os lugares esto subordinados condio do homem em utilizar a paisagem. Isto cria uma diversidade enorme de manifestaes de estrutura no espao, como a implantao de uma casa, a utilizao do solo para a agricultura, a criao de um parque, um plo industrial ou um centro urbano. Desta forma, com essa complexidade de possveis aes sempre provocaremos efeitos, sempre induziremos eventos.

A pergunta que devemos fazer : como

interferir na direo certa? Como atuar para que a evoluo continue na direo da qualidade do meio, tanto para o homem como para todos os outros seres vivos?

VULNERABILIDADE AMBIENTAL

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2.3 A QUALIDADE AMBIENTAL DA PAISAGEMAmbiente a soma das condies que envolvem, do condio de vida, sustentam e mantm relaes de troca com os seres vivos em um territrio. Sem ambiente no h vida. Portanto, no h dvida de que necessitamos nos responsabilizar pela qualidade ambiental, ou seja, devemos garantir o conjunto de condies que de uma forma interativa assegurem as necessidades e a sobrevivncia dos seres vivos. Medir a qualidade ambiental fazer um juzo de valor sobre o estado dos atributos do meio (como gua, ar, solo) em relao sua influncia ou sua capacidade de atender s condies necessrias para a vida num determinado espao e tempo. Quem compreende esse conceito, sabe que no pode interpretar qualidade ambiental de um determinado ambiente de forma limitada ou reducionista. Sabe que no pode adotar uma viso puramente econmica ou puramente social ou puramente de preservao da natureza. Uma viso que considere apenas um aspecto reduzida porque no leva em considerao o sistema, a organizao, a heterogeneidade ou a complexidade do lugar. No considera a dinmica de funcionamento do espao em que vivemos. O ambiente em que vivemos formado de sistemas, que podem ser descritos como um conjunto de elementos que mantm relaes entre si. Assim, o solo, a gua, a vegetao, os campos agrcolas so elementos estruturais do meio que mantm relaes entre si por meio de fluxos e ciclos (figura 2.10). As ligaes entre os elementos do sistema resultam em um grau de organizao, num certo espao e num determinado tempo. Quando interferimos com nossas atividades em um dado elemento estrutural, ns desencadeamos alteraes por toda cadeia a que esse elemento pertence e podemos alterar a organizao. Em outras palavras, o estado de um elemento condicionante e determinante do estado de outro elemento, e, assim, sucessivamente. Alm disso, importante perceber que, em um meio, os elementos podem estar preferencialmente ligados em conjuntos pequenos, que novamente se agrupam formando conjuntos maiores e assim por diante (figura 2.11). Em suma, no meio em que vivemos podemos observar vrios sistemas, que podem ser formados de subconjuntos (subsistemas), com vrios graus de organizao entre eles e com diversos elos de ligao funcional. nessa condio que usamos o termo complexidade do meio, ou seja, quando podemos constatar uma

FIGURA 2.10

FIGURA 2.11

Os elementos componentes do meio em que vivemos trocam matria e energia, por meio dos ciclos e fluxos que ligam os elementos estruturais de um sistema ambiental. 20 |

Os elementos componentes do meio podem estar mais estreitamente ligados em subconjuntos e os subconjuntos ligados entre si.

heterogeneidade de elementos estruturais e ligaes funcionais de diversas ordens de intensidade dentro e entre os subsistemas. Algumas vezes, a heterogeneidade medida pela quantidade de elementos que compem o sistema pequena numa dada regio, mas ele apresenta um amplo espectro de respostas quando sofre um distrbio. por isso que precisamos observar a diferena entre sistema complexo e sistema de comportamento complexo. Desta maneira, quando estamos planejando o nosso ambiente, devemos, pelo menos, perguntar: em que ponto do sistema estamos interferindo? Se provocarmos uma perturbao em uma dessas ligaes qual a conseqncia para a cadeia? E se essa ligao for frgil? Qual a relao entre esses elos da cadeia, a persistncia e a resilincia do meio que eu planejo? Qual o grau de desorganizao que eu estou induzindo? um sistema de comportamento complexo? Quanto mais um sistema ou subsistema se afasta do equilbrio que ele alcanou em milhares ou milhes de anos, mais imprevisvel ou maior o nmero possvel de respostas sua interveno. Os sistemas com comportamento complexo tm uma longa histria que no pode ser esquecida. um erro no considerar as inmeras opes de mudanas que ocorreram ao longo de sua trajetria. comprometedor no perceber que hoje esse sistema deve estar em pleno exerccio da evoluo. Todos os sistemas so temporariamente estveis e nossas aes tm acelerado as alternncias de estado, tornando os sistemas cada vez mais instveis e mais imprevisveis, muitas vezes resultando em desastres.

Como ento devemos agir? Primeiro, reconhecendo que devemos respeitar os caminhos e as velocidades da evoluo. Na histria da Terra a chegada do homem muito recente, herdamos as paisagens terrestres como um territrio de convvio e atuao. Sem dvida, nosso objetivo no fazer parte da histria da Terra como interventores agressivos dos caminhos que ela traou. Pelo contrrio, devemos observar que as paisagens representam um patrimnio coletivo, que deve permanecer como herana dos seres que a habitam, possibilitando a continuidade da histria evolutiva. Para chegar a tal estado de integrao com o meio em que vivemos onde seriamos, verdadeiramente, seres componentes da Natureza, fazendo parte da sua histria, sinrgicos sua evoluo, necessrio reconhecer um segundo passo. Devemos considerar a importncia do conhecimento sobre a composio, a estrutura, a organizao e a complexidade dos atuais sistemas, imprescindvel para se atingir qualidade ambiental. Nesse caminho, a busca passa a ser fazer uso e no consumir a paisagem, estabelecendo um caminho de equilbrio por meio de aes e atividades que faam elos compatveis com os elementos do sistema e com a sua resilincia. Em sntese, quanto mais ns nos integrarmos aos sistemas naturais dentro de seus caminhos no tempo e no espao, mais facilmente ser estabelecida a comunicao entre ns e o planeta em que vivemos.

LEITURAS RECOMENDADASSANTOS, R.F. 2004. Planejamento Ambiental: teoria e prtica. So Paulo: Oficina de Textos, 184p. SANTOS, J. E. dos; CAVALHEIRO, F.; PIRES, J. S. R.; OLIVEIRA, C. H. & PIRES, A . M. Z. C. R. 2004. Faces da Polissemia da paisagem - ecologia, planejamento e percepo. So Carlos: RiMa, 409p. TURNER, G. M.; GARDNER, R. H.; ONEILL, R. V. 2001. Landscape ecology: in theory and practice - pattern and process. New York: Springer-Verlag, 401p.

VULNERABILIDADE AMBIENTAL

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CAPTULO 3USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTALSueli ThomazielloUSOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTALPAISAGEM EM DOISTEMPOS: A VRZEA DO CARMO EM SO PAULOFONTE: Abranches, V. (2003)

CAPTULO 3

USOS DA TERRA E SUA INFLUNCIA SOBRE A QUALIDADE AMBIENTAL

captulo anterior pretendeu evidenciar que se quisermos diminuir os riscos de acidentes melhorando a qualidade ambiental necessrio observar a estrutura da paisagem, a sua organizao e complexidade. preciso ter um olhar crtico sobre a configurao da paisagem, tanto em relao aos componentes naturais quanto queles resultantes de aes e atividades humanas. Essa tarefa no simples, pois uma paisagem formada por inmeros componentes, desde indivduos microscpicos at indivduos com alta capacidade de apropriao e controle sobre o seu meio, como o homem. Ela est sob a influncia de fatores fsicos, qumicos, biticos, sociais e culturais. So tantos os fatores que dificilmente podemos compreend-los em sua totalidade. O homem desenvolveu grande capacidade de apropriao e transformao do meio em que vive, utilizando o quanto o meio possa lhe oferecer, mas no desenvolveu, concomitantemente, a conscincia e o conhecimento necessrios a respeito das limitaes desse espao, usando-o, e muitas vezes, de forma descontrolada e desmedida. As formas como se d a ocupao do espao urbano ou rural no Brasil tm provocado sucessivos e inmeros problemas ambientais, como a degradao da cobertura vegetal, perda da biodiversidade, obstruo e alterao da rede de drenagem, transmisso de doenas por veiculao hdrica, acmulo de lixo, contaminao de solo e gua, poluio do ar, gua e solo, perda de terras produtivas, desencadeamento de processos erosivos, entre tantos outros. As conseqncias so desastrosas, como enchentes, deslizamentos, assoreamentos de rios, voorocas, desertificaes e arenizaes, conforme descrevem os captulos deste livro. importante ressaltar que esses so apenas alguns exemplos do que o homem pode provocar ao prprio meio em que vive, e quase sempre se esquecendo que dele depende a sua existncia.

O

Para representar a forma e o grau que utilizamos o meio em nosso prprio proveito, so usados termos como: uso, ocupao e apropriao do espao. Mais importante que compreender as diferenas entre os significados destes termos entender que toda alterao sobre o meio provocar tambm uma modificao na configurao espacial da paisagem. Isto significa dizer que, via de regra, haver uma resposta do prprio meio para cada alterao sofrida. a simples reao dos componentes da paisagem alterao sofrida e que tiveram o seu equilbrio afetado que, posteriormente, poder ocorrer um rearranjo destes mesmos componentes, resultando em uma situao diferente da anterior. Dessa forma, podemos afirmar que toda paisagem possui uma dada configurao espacial e temporal em funo do arranjo e das inter-relaes de e entre todos os seus componentes (captulo 2). Se um ou mais desses componentes modificado, obviamente, a configurao espacial tambm ser alterada, e ns teremos uma nova estrutura de paisagem a ser estudada. As noes de qualidade ambiental compreendem uma idia de harmonia entre o homem e o meio e de bom funcionamento. O arranjo na paisagem resultante do uso da terra indica um conjunto de funes vividas pela populao de um municpio, por exemplo, que pode sobrepujar as funes ecolgicas. Uma melhor qualidade ambiental s ser obtida quando o processo de ocupao e de interferncias dos usos humanos for considerado harmnico com os arranjos e funes imprescindveis das dinmicas naturais. Para entender os principais aspectos dessa complexidade necessrio reconhec-los, sendo os exerccios de interpretao da paisagem um caminho produtivo para orientar as futuras intervenes.

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3.1 O RECONHECIMENTO DA PAISAGEM POR MEIO DE TCNICAS DE LEITURA ESPACIALEm estudos da paisagem, um dos primeiros questionamentos a ser formulado : do que composta a paisagem em questo? Observe a figura 3.1 e tente responder ao questionamento. So os componentes que predominam na paisagem que, normalmente, so identificados primeiramente. A figura 3.1 mostra uma paisagem simples que apresenta componentes tanto naturais como construdos, organizados no espao. Contudo, uma anlise mais detalhada poder aumentar o grau de informao sobre a mesma paisagem. Alm dos primeiros componentes observados (construes, vias de acesso, colinas e rvores) nota-se uma significativa variedade de formas, tamanhos, cores e propores de cada um dos objetos ou componentes presentes. Da mesma forma, possvel perceber que existe uma organizao ou um arranjo espacial especfico entre estes componentes e a interao que cada um estabeleceu entre si e entre os demais. Neste momento, podemos inserir novas investigaes: como esta paisagem poderia ser descrita? Qual o grau de informao que pode ser extrado dela? Quais interaes entre seus componentes podem ser formuladas? Em uma nica paisagem possvel desenvolver diversas anlises, que variam em funo do que se quer observar: o objetivo de estudo e, primordialmente, da escala em que ela observada. Os itens seguintes trataro especificamente sobre esses dois aspectos: escala e objetivo em estudos da paisagem. 1.1 Observando a paisagem em escala A anlise sobre uma paisagem ser mais ou menos complexa em decorrncia da escala espacial e temporal escolhida para desenvolv-la. Esse fenmeno fica claro quando fazemos um exerccio de interpretao e de representao de uma paisagem. Ao analisarmos uma paisagem, a depender da escala usada e do objetivo, os mesmos componentes podem se mostrar em forma e tipos diversificados, assim como pode variar o grau de importncia que cada componente exerce sobre o meio. A escala de anlise de uma paisagem definida como a representao da extenso de um territrio e da unidade mnima de representao espacial na qual a informao obtida, ela pode ser indicada de forma grfica ou numrica.

FIGURA 3.2 A, B E C

FIGURA 3.1 - PAISAGEM A

Configurao de uma paisagem. Foto: Andr Lus Lima

Diferentes escalas de anlise conduzem a identificao de diferentes componentes e arranjos espaciais. Fonte: www.fantasyarts.net/Van_Gogh_Irises.htmVULNERABILIDADE AMBIENTAL

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As figuras apresentadas na seqncia (3.2.a a 3.2.c) ilustram o efeito da anlise sobre a paisagem realizada em diferentes escalas. Toda paisagem est inserida em um contexto especfico. A escolha da escala espacial e temporal est estritamente relacionada com os processos ambientais que se pretende compreender. Ao comparar a Paisagem A (figura 3.1) com a Paisagem B (figura 3.3) observamos que a segunda apresenta um nmero bem maior de componentes. A poro territorial representada pela Paisagem B tambm maior que a A. No entanto, o detalhe das construes, por exemplo, assim como a altura e o porte das rvores se tornam menos perceptveis na B. A possibilidade de identificar ou perceber maiores ou menores detalhes em uma imagem dado pela sua resoluo espacial. As propores territoriais reais cobertas pelas paisagens A e B so diferentes, ao passo que o tamanho de cada imagem representada o mesmo; o que significa dizer que os seus componentes no espao esto representados em dimenses espaciais distintas, ou seja, possuem escalas de representao diferentes. No se deve confundir resoluo espacial com escala. Resoluo espacial pode ser entendida como a capacidade que uma imagem tem em proporcionar um nmero x de informaes visveis com qualidade em uma dada dimenso espacial (pixel ou clula). Quanto maior o nmero de informao percebido na imagem maior a sua resoluo espacial. A ttulo de ilustrao, com o intuito de diferenciar escala de resoluo espacial, pensemos que se a altura da torre da igreja est representada na foto por uma medida de um centmetro e ela mede na realidade 20 metros, pode-se dizer que cada unidade de medida na foto equivale a 20 na realidade, considerando a converso de unidade de medida, neste caso, de metro (medida real) pra centmetro (medida representada). Dessa forma, 1 cm equivale a 20 metros, seria a escala de representao da foto. J a resoluo espacial desta mesma imagem dada pelo nmero mximo de informao que visvel com qualidade em uma rea definida, por exemplo, dentro de um quadrante ou uma clula de um por um centmetro. Como j mencionado, a escala espacial um dos aspectos mais importantes na elaborao de um mapeamento geogrfico ou o instrumento mais importante na leitura de mapas quando se quer interpretar e compreender paisagens. A mesma impor26 |

FIGURA 3.3 - PAISAGEM B

Dimenses espaciais: altura, comprimento, profundidade. Foto tirada de em um mirante da cidade de Paraibuna/SP Foto: Andr Lus Lima. tncia possui a escala temporal. Todo processo observado em uma paisagem faz parte de um contexto histrico e a sua correta compreenso depende do recorte que lhe dado. A paisagem B pode ser melhor compreendida se considerado o incio da sua ocupao e das mais significativas alteraes ocorridas na regio do alto curso do rio Tiet, dando origem atual paisagem fragmentada. Pela sua complexidade, toda paisagem possibilita mltiplas leituras e entendimentos. Mas a temtica de interesse ou o objetivo de estudo que determinam os recortes necessrios, tanto da escala espacial como temporal e ainda no detalhamento da anlise que ser dado. A escolha das informaes e da escala de trabalho pode variar mesmo quando se trabalha com uma nica paisagem com objetivos de estudo diferentes. De forma geral podemos dizer que a finalidade de um mapeamento comunicar de forma objetiva e espacialmente um conjunto de informaes. Assim sendo, o intrprete da paisagem (utilizando imagem de satlite, de radar ou fotos areas) no pode simplesmente dispor nem escolher de forma aleatria as

O IBGE, DSG (Diretoria de Servios Cartogrficos do Exrcito Brasileiro), DHN (Diretoria de Hidrografia e Navegao) e ICA (Instituto de Cartografia Aeronutica) compem o Sistema Cartogrfico Nacional.

informaes a serem representadas. Antes de iniciar a interpretao de uma paisagem, deve-se ter claro que a sua leitura um instrumento que tanto interfere como valida a comunicao da informao. Sendo assim, escolhas como a escala da anlise espacial, tipo de material usado e perodos representados so aspectos primordiais que iro determinar a qualidade do resultado obtido. Existem regras, padronizaes e convenes cartogrficas que devem ser observadas e usadas para todo produto a ser gerado. Em funo dessa qualidade uma questo importante refere-se a padronizao da classificao para a caracterizao da paisagem. Usando o exemplo dado na figura 3.3, ou Paisagem B, sua interpretao obteramos a malha urbana como o componente de maior destaque. A malha urbana, bem como campos agrcolas, campos de pastagem, vias de acesso, portos e aeroportos so componentes classificados como uso e ocupao da terra. A classificao depende do intrprete, dos objetivos e da escala em que se trabalha. 1.2 Obtendo a informao da paisagem Ao extrair da Paisagem B os seus principais componentes obtm-se um mapeamento, grosso modo, com a seguinte representao: Na sua interpretao, poderamos tecer observaes sobre o relevo predominante, sobre o sistema FIGURA 3.4

se destacam onde h um menor grau de ocupao humana e, conseqentemente, de interferncia e alterao da superfcie terrestre e de seus elementos naturais. O arranjo espacial observado representa uma forma de ocupao bem caracterstica das cidades brasileiras, quando uma populao se acomoda e se desenvolve no fundo de vales ou ao longo de cursos fluviais. Em sua forma mais primitiva, a busca por este tipo de ocupao, prxima a rios, tem o objetivo nico de obter os benefcios de um sistema hdrico, como a proximidade de alimento, de terras frteis, de transporte, de dessedentao de homens e animais, entre outros.

QUADRO 3.1 Elementos do Meio Fsico identificados nos mapas do IBGE Meio Fsico Bacias Sub-bacias Hidrografia Relevo Pontos Culminantes

Principais componentes da Paisagem B. de drenagem, sobre a fisionomia vegetal e sobre as formas de ocupao. Caractersticas predominantes do meio abitico e bitico, em suas condies naturais, como o relevo, o sistema hdrico e a vegetao

Quando descrevemos as formas do relevo, sua evoluo e o sistema de drenagem associado, estamos nos referindo ao aspecto mapeado como meio fsico ou abitico de uma paisagem. Alm destes dois componentes, o meio fsico deve compreender informaes sobre clima, geologia, tipos de solos, topografia e declividade. O quadro 3.5 exemplifica um conjunto de componentes bsicos que caracterizam o meio fsico que, normalmente, so utilizados em mapeamentos que consideram a padronizao estabelecida pelo IBGE para todo o territrio brasileiro. O fundamental em estudos da paisagem saber reconhecer claramente de que forma cada uma das informaes obtidas sobre o meio abitico pode ajudar a compreend-la. Como se do as interaes do homem com o meio natural? Como ele se apropria destes recursos? Quais as conseqncias resultantes? O que pode ser modificado e melhorado? Estes so os questionamentos que devem conduzir a reflexes cuja questo central a busca pela qualidade ambiental, muito mais do que saber quantas manchas de solo | 27

VULNERABILIDADE AMBIENTAL

diferentes ou tipos de relevo ocorrem em um determinado espao. Por ltimo, a paisagem B tambm apresenta, alm dos componentes do meio humano e fsico ou abitico, manchas de vegetao. A imagem em questo, no nos permite chegar ao nvel de identificao das espcies vegetais, mas possvel se definir algumas caractersticas sobre a sua disposio espacial. Associada s manchas de vegetao tem a fauna, ambos iro compor o aspecto mapeado como meio bitico de uma paisagem. Dessa forma, em estudos da paisagem, h de se considerar a existncia de diversos componentes passveis de mapeamento e que, de forma geral, compem trs meios distintos em sua forma de anlise: (a) fsico ou abitico, (b) bitico e (c) social, econmico e cultural, que resultam nas diferentes tipologias identificadas como usos e ocupao da terra. O IBGE padronizou para todos os seus produtos cartogrficos um nico sistema de categorizao ou de classificao de legendas. Da mesma forma trabalham outros rgos federais e estaduais oficiais que tambm geram produtos cartogrficos (cartas e mapas) dessa ordem. Alm do IBGE temos a EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria), o IPT (Instituto de Pesquisas Tecnolgicas), o IGC (Instituto Geogrfico e Cartogrfico), entre outros. Todos eles possuem um sistema de classificao de legendas que segue o padro e a legislao federal sobre cartografia. Isso significa que estas convenes cartogrficas devem ser observadas sempre que um mapa for elaborado. Podemos extrair de uma nica paisagem uma grande quantidade de informaes, considerando todos os seus aspectos e, principalmente, a complexidade que a envolve. Em estudos da paisagem, podemos analisar dentro do aspecto do meio fsico, por exemplo, sua geologia, tipos de solo e de relevo, sistema hdrico, alm de algumas caractersticas climticas. A pergunta que deve ser feita : qual a importncia de cada informao para o meu estudo? Reconhecer a sua importncia para o caso dado o primeiro passo para refletir a forma como a informao deve ser representada geograficamente ou por meio de mapas. Onde devo buscar minha informao e qual a escala compatvel com a proposta apresentada? So outras questes que devem ser pensadas e planejadas. comum encontrarmos casos nos quais a conservao de importantes fragmentos florestais est associada, simplesmente, a relevos com fortes declividades ou a solos no produtivos. 28 |

Da mesma forma, comum encontramos indivduos de caf e de araucrias no meio a florestas densas e em baixas altitudes, que se explicam apenas pela associao s formas de ocupao da regio e dos tipos de economias que predominaram em uma determinada poca na mesma regio. Estas simples situaes, que tambm so comuns, mostram a importncia de se identificar corretamente qual informao deve ser considerada, assim como o recorte temporal que deve ser dado para cada caso de estudo de paisagens. A ttulo de ilustrao, a figura 3.5 traz alguns exemplos de mapeamentos temticos elaborados para o Parque Nacional da Serra da Bocaina SP/RJ e Campinas. A preocupao deste estudo foi desenvolver um planejamento ambiental para a unidade de conservao, tendo como principais objetivos a sua conservao e manuteno. O recorte temporal dado teve incio ainda no ciclo do ouro, quando caminhos feitos com enormes fragmentos de rocha foram abertos no meio da Floresta Atlntica, trazendo o ouro das Minas Gerais para o litoral fluminense e definindo a forma de ocupao regional.

MAPEAMENTO: conjunto de procedimentos para a obteno de cartas e mapas de qualquer natureza.

FIGURA 3.5

Classes de declividade

Bacia hidrogrfica

Geomorfologia

Vegetao e fauna

Pedologia

Uso e Ocupao da terra e cobertura vegetal

Mapas temticos elaborados na rea do Pq. Nacional da Serra da Bocaina(SP/RJ) e Campinas (SP) fonte: MMA, 2001 e Petrobrs, 2003.

A figura seguinte (figura 3.6) mostra em detalhe as classes definidas para o mapa de uso e ocupao da terra elaborado tambm para a cidade de Campinas. Convenes cartogrficas oficiais no consideram apenas as classificaes temticas, mas cores,

smbolos e texturas usados para a representao grfica de cada componente da paisagem mapeada. Os mapas temticos, como ilustrado anteriormente, trazem informaes detalhadas sobre cada meio de anlise, seja o abitico, bitico ou o scio-cultural, estudado na

FIGURA 3.6

Classes de uso, ocupao e cobertura vegetal definidos pelo intrprete. Fonte: Petrobrs, 2003VULNERABILIDADE AMBIENTAL

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paisagem. Estas informaes, quando sobrepostas, traduzem expresses da paisagem, seja por meio de sua vulnerabilidade ou de seu potencial ao uso.

1.3. A configurao da paisagem e sua compreenso Identificar e mapear os componentes de uma paisagem um exerccio primordial em estudos de paisagem, que vai alm do reconhecimento das grandes manchas de uso e ocupao da terra e de sua diferenciao com as manchas de vegetao. preciso entender, por exemplo, que manchas de vegetao, mesmo parecendo homogneas em uma primeira observao, compreendem indivduos com diferentes portes, alturas, cores e tons de cores e quando reunidos podem compor nmeros incontveis de

conjuntos vegetacionais fisionomicamente distintos. A figura 3.7 um exemplo de uma paisagem brasileira, inserida no Pantanal, que rene uma grande variedade de tipos de rvores, arbustos e gramneas, evidenciando nessa regio uma grande diversidade vegetal. As fotos referem-se a um pequeno trecho de bacia hidrogrfica do baixo curso do rio Taquari, no Pantanal brasileiro, cuja complexidade pode ser inferida numa escala abrangente de imagens de satlite. Os agrupamentos de diferentes espcies vegetais de tamanhos, portes e cores diversos, criam fisionomias distintas, de: cerrado e cerrado, capo de cerrado, cerrado com acuri, campo e mata ciliar, campo com capes de cerrado, campo alagado com cerrado, campo, campo com capes de cerrado e acuri e campo alagado.

FIGURA 3.7

As fotos referem-se a um pequeno trecho de bacia hidrogrfica do baixo curso do rio Taquari, no Pantanal brasileiro, cuja complexidade pode ser inferida numa escala abrangente de imagens de satlite. Os agrupamentos de diferentes espcies vegetais de tamanhos, portes e cores diversos, criam fisionomias distintas de: cerrado e cerrado, capo de cerrado, cerrado com acuri, campo e mata ciliar, campo com capes de cerrado, campo alagado com cerrado, campo, campo com capes de cerrado e acuri e campo alagado. 30 |

FIGURA 3.8 - CONTINUAOBACIA HIDROGRFICA DO RIO TAQUARI Vegetao

Fa: Floresta Aluvial (Mata, mata ciliar) Fs: Floresta Semidecdual Submontana (Mata) Cs: Floresta Decidual Submontana (Mata) Sd: Savana Florestada (Cerrado) Sa: Savana Arborizada (Cerrado, Cerrado Aberto) Sg: Savana gramneo - Lenhosa (Campos)

Sd + Sa: Florestada-Arborizada Sd + Sg: Florestada + Gramneo-Lenhosa Sa + Sd:Arborizada + Florestada Sg + Sd: Gramneo-Lenhosa + Florestada Sa + Sg: Arborizada + Gramneo-Lenhosa Sg + Sa: Gramneo- Lenhosa + Arborizada

Fa: Vegetao com inuencia uvial e/ou lacustre S/F: Savana/Floresta Estacional Semidecidual (mata) F/PA: Floresta Estacional Semidecidual/Formaes pioneiras S/PA: Savana/Formaes pioneiras (Cerrado, Campo sujo) S/F: Savana/Floresta Estacional Semidecidual (mata) Uso: Pastagens Cultivadas e reas Agrcolas

Quando Myrian Abdon, em 2004, objetivou representar essa cobertura vegetal por meio da interpretao de uma imagem do satlite americano Landsat 5, ela obteve um mapa complexo, colorido e, provavelmente de difcil execuo, frente as dificuldades de representar a diversidade existente.

De forma semelhante, em uma malha urbana podemos extrair agrupamentos humanos que tenham caractersticas similares. Assim, teremos conjuntos ou sries de tipologias de construes, baseadas, por exemplo, no formato, no tamanho, no tipo de material usado ou ainda no tempo de construo. Sempre que extramos da paisagem componentes com tipos diferentes e os agrupamos segundo similaridades estruturais (tamanho, porte, altura, nmero de pavimentos, idade ou cores presentes) estamos analisando a composio e a estrutura da paisagem, ou seja, a forma como os seus componentes esto dispostos no espao. Por exemplo, estaremos informando a estrutura da floresta, a partir do porte e da altura das rvores, ou a estrutura de uma rea urbana, a partir do tamanho, forma e idade das construes.

ESTRUTURA: a representao morfolgica dos elementos da paisagem. Informa sobre a sua distribuio espacial e pode ser representada por manchas, contnuas ou descontnuas, lineares ou fragmentadas, podendo ser relacionada a sua funo ecolgica.

Assim, em estudos da paisagem, alm de se identificar os seus componentes, temos que caracterizar a sua estrutura. Analisar a paisagem e extrair dela componentes com comportamentos similares um passo importante para ouvir o que a paisagem tem a nos dizer e a entend-la. Por exemplo, um conjunto de casas similares na forma, no tamanho, na distribuio dos espaos, cores e tipo de material de construo usado, permite supor que um grupo de pessoas se aglutinou naquele espao por ter em comum a mesma condio econmica e/ou social e/ou cultural e/ou de origem. Conseqentemente, a forma de usar aquele espao e de se apropriar dos recursos locais ter suas peculiaridades. De forma semelhante ao que ocorre com as tipologias de construo clssicas que atendem finalidades especficas, como industrial, comercial, residencial e religiosa, verificamos que as cidades modernas tambm possuem um alto grau de diferenciao e especializao interna, mostrando este fenmeno na forma como se organizam no espao. Os grupos sociais e culturais se renem em espaos especficos e do origem a novas tipologias de uso.

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perfeitamente possvel identificar bairros ou vilas que apresentam padres residenciais e de ocupao similares, determinados por caractersticas culturais, sociais e econmicas. Neste caso, visvel como a estrutura urbana define as suas funes. Podemos extrapolar esta anlise sobre os espaos urbanos para os rurais e veremos facilmente que a forma como as atividades rurais so organizadas e agrupadas mostram uma estrutura espacial diferenciada da urbana, tambm com funes especficas. O mesmo pode ser dito para os fragmentos naturais. A figura 3.8 uma reproduo da foto da figura 3.3, destacando os fragmentos de vegetao existentes na paisagem. Como j observado anteriormente, a ocupao tpica desta paisagem no fundo do vale, modificando o seu relevo original, causando a impermeabilizao do solo e alterando o sistema natural de drenagem, tambm provocou uma fragmentao da paisagem original. Este processo deu origem a uma nova paisagem, cujo predomnio a malha urbana, com a presena de poucos fragmentos florestais rodeando-a. Os fragmentos A e B, como mapeados, representam as nicas manchas que restaram da matriz original, ou seja, a Floresta Atlntica, originalmente existente nesta regio. So fragmentos de fundo de vale, vegetao ciliar e de encosta, que a populao local esqueceu de ocupar. As outras reas verdes (C e D) constituem jardins e praas, seja na frente da Igreja Matriz, no centro da cidade ou uma fileira de rvores acompanhando o rio canalizado ao longo da cidade (mais uma prtica comum de apropriao do meio pelo homem).

CORREDOR: so pores territoriais na paisagem, lineares, extensas, contnuas e relativamente estreitas, com a funo de se conectar com outros fragmentos da paisagem.Mesmo estruturalmente diferentes, os fragmentos que existem nesta paisagem podem possuir inter-relao entre si. Por exemplo, supe-se que as manchas D e E, apesar de serem praas e jardins, podem servir como reas de descanso, pouso ou at de nidificao de aves, adaptadas a ambientes urbanos. No entanto, falta nesta paisagem corredores que pudessem conectar os fragmentos entre si. Cada um dos componentes mapeados em uma paisagem possui dinmicas prprias e est associado a outros componentes, sejam naturais (biticos e fsicos) ou humanos. Isto significa dizer que eles esto constantemente em interrelao e coexistncia.

FRAGMENTO: parte de um todo, em ecologia da paisagem refere-se a um remanescente de um ecossistema natural, isolado em funo de barreiras antrpicas ou naturais. uma poro aparentemente homognea, com rea reduzida e no linear, que se apresenta como um segmento disposto de forma isolada ou desconectada na paisagem, pois se distingue das unidades vizinhas.

1.4 Relao entre tipos e formas de uso e ocupao e desastres induzidos pelo homem. A anlise espacial, sob qualquer foco ou interesse, seja poltico, social, econmico ou ecolgico, nunca deve ser feita a partir de uma nica condio ou sob um nico aspecto, ou incorre-se num grave erro de concluir uma relao casusta, de simples causa e efeito. Um processo erosivo, por exemplo, pode ter sido causado por uma ao antropognica (ou induzido pelo homem), como a retirada da cobertura vegetal e a conseqente exposio do solo ou um corte de terreno para abertura de estrada, mas a sua intensidade e a magnitude tm relao com as condies naturais do meio, como declividade, vulnerabilidade do terreno, tipo de solo e relao entre o volume de gua precipitada, infiltrada e escoada. Os demais captulos deste livro enfatizam essa condio, de que um grande nmero de componen-

FIGURA 3.8

A B

D E

C

Quais so e como se comportam os fragmentos desta paisagem no espao? 32 |

tes e fatores funcionais se encadeia na paisagem e uma dada ao de origem humana pode desencadear um desastre antropognico, interferindo nos elos entre os componentes e no equilbrio do meio. importante reforar que um desastre pode ser mais ou menos intenso e mais ou menos catastrfico porque outras condies, no necessariamente antropognicas, intensificaram os resultados causados pela ao humana. Sendo assim, a intensidade das respostas s aes desencadeadoras de um desastre poder variar em funo do conjunto de condies, fatores e agentes de controle intrnsecos e extrnsecos quele espao. Uma mesma ao humana, como a interrupo de um leito fluvial, reproduzida em duas paisagens estrutural e funcionalmente diferentes, resultar em respostas diversas, variando em intensidade e magnitude. Uma anlise cuidadosa a partir da sobreposio de mapas temticos, previamente elaborados, de uma paisagem, pode auxiliar grandemente na compreenso das repostas dadas pelo meio diante de uma interveno. Essa anlise pode contribuir, inclusive, para que desencadeamentos catastrficos possam ser evitados, por meio de cruzamentos entre variveis de interferncias e de respostas. Se as respostas do meio s aes antropognicas desencadeadoras de desastres se do de inmeras formas, toda ao humana deve ser precedida de estudos cautelosos de impacto e de planejamentos adequados a cada realidade e contexto. Nesse sentindo, necessria tambm a previso de medidas minimizadoras dos efeitos negativos. Apesar das vrias formas e meios existentes hoje para se evitar desastres humanos, a humanidade, de forma geral, no tem sido capaz de dedicar cuidados devidos com o intuito de alcanar este objetivo. Segundo a Doutrina Brasileira de Defesa Civil, a CODAR, o conjunto de Desastres Humanos Relacionados com Ecossistemas Urbanos e Rurais (CODAR HS.E/CODAR 22.1) resultante da ausncia de preocupao com a proteo do meio ambiente ao se promover o incremento da produo agrcola; o desenvolvimento das indstrias de minerao; o desmatamento descontrolado; o incremento do transporte motorizado; e o crescimento desordenado das cidades e das reas rurais sem maiores preocupaes com o zoneamento e o uso racional do espao geogrfico (Brasil, 2004). Com esta preocupao, pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria (EMBRAPA) e a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)

elaboraram o Mapeamento Fotogrfico da Bacia Hidrogrfica do rio Taquari (BHRT), em MG e MS. Este estudo aponta algumas situaes que resultaram em desastres em funo da ao humana em ambientes complexos. As figuras 3.9 a 3.11 ilustram alguns dos resultados deste estudo, por meio de uma srie de aes que desencadearam processos como eroso, assoreamento e inundao. Nesta paisagem, a formao de grandes processos erosivos possui origem antropognica. Trata-se de solos altamente vulnerveis sobre relevos erosivos, que sofrem constante manejo para o pastoreio. A atividade de pastagem intensa, no dado o tempo necessrio para o descanso e a recomposio do solo. Em uma paisagem diferente desta, ou apenas menos vulnervel, provavelmente o efeito fosse

Entender que as respostas do meio s aes antropognicas desencadeadoras de desastres se do de inmeras formas um grande passo para entender que toda ao humana deve ser precedida de estudos cautelosos de impacto e de planejamentos adequados a cada realidade, assim como deve haver previso de medidas minimizadoras dos efeitos negativos.

menos catastrfico. Some alta vulnerabilidade do terreno (solo e relevo) a total ausncia de vegetao que poderia proporcionar por meio das suas razes uma maior resistncia da camada superficial do solo. Outro fator que intensifica a eroso so aes como constantes desmatamentos, queimadas e abertura de estradas, sem os devidos cuidados com o sistema de drenagem das guas pluviais. O cenrio resultante destes processos no poderia ser diferente, afinal todas as aes presentes so inadequadas sobre uma paisagem naturalmente vulnervel. As sries seguintes ilustram outras situaes, que alteram drasticamente as condies naturais de um ambiente. Observe que as caractersticas do meio fsico e bitico em cada uma das paisagens so diferentes, ocorrem variaes no tipo de solo, de relevo, de declividade e de cobertura vegetal. Apesar da alta vulnerabilidade do terreno o resultado desastroso dessas intervenes sobre o meio poderia ser evitado ou minimizado, adotando algumas medidas simples, como: evitar a total exposio do solo, manter parteVULNERABILIDADE AMBIENTAL

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FIGURA 3.9

Sobre relevo erosivo tabular e solo Podzlico Vermelho-Amarelo eutrfico: vooroca em rea de superpastagem com profundidade de 5 metros, alcanando larguras maiores de 60 metros, atingindo a estrada BR 060, no vilarejo Pontinha do Coxo, no municpio de Camapu (MS). Foto: Rozely Santos

Sobre relevo erosivo convexo e Areias Quartzosas licas: eroso no alto da serra Preta, no municpio de Alto Araguaia (MT). Foto: Myriam Abdon.

Sobre relevo erosivo convexo e Areias Quartzosas licas: vooroca em rea de pastagem, no afluente do crrego Tigela, no municpio de Alcinpolis (MS), alcanando 25 metros de profundidade, 20m de largura e 2 Km de comprimento. Foto: Myriam Abdon.

Tipos de processos erosivos desencadeados por manejo inadequado do solo para implantao de pastagem e de abertura de vias de acesso. da cobertura vegetal natural, escolher locais menos declivosos para o corte de terreno, evitar a concentrao de guas pluviais e outros. Todos esses processos podem ocorrer naturalmente, em funo de condies especficas, mas na grande maioria dos casos eles so provocados. Os exemplos citados ilustram desastres em reas rurais, que tambm ocorrem na rea urbana. A urbanizao um dos processos mais impactantes sobre o meio natural, a comear pela poluio dos recursos hdricos, a degradao dos mananciais, o uso humano desmedido de gua, a retirada da mata ciliar ao longo dos rios, a total impermeabilizao do solo, a canalizao e a retificao dos cursos fluviais, provocando a ampla artificializao da drenagem em rea urbana. No bastasse esta completa artificializao dos rios que atravessam as reas urbanizadas, via de regra, as reconhecidas APPs (reas de Preservao Permanente), protegidas por Lei Federal, so usadas para construo de loteamentos irregulares, depsitos de lixo, receptores de esgoto e outras instalaes e aes adotadas pela sociedade moderna. A conseqncia, por exemplo, pode ser a presena de algumas das doenas transmitidas por veiculao hdrica, seja por vrus, bactrias,

FIGURA 3.10

Assoreamento no ribeiro Camapu, com depsitos de sedimentos nas margens em torno de 3 metros de altura. Solo Podzlico Vermelho-Amarelo eutrfico (PVe1) em relevo erosivo aguado (Da25). Sub-bacia do rio Coxim, municpio de Camapu/MS. Foto: Rozely Santos

Inundao na plancie do ribeiro Futuro com presena de espcies arbreas mortas, devido ao assoreamento e obstruo de drenagem pela estrada. Solo Podzlico Vermelho-Amarelo lico (PVa12) em relevo erosivo tabular (Dt13). Sub-bacia do rio Taquari, municpio de Alcinpolis/ MS. Foto: Rozely Santos

Inundao em rea de nascente do rio Coxim devido obstruo de drenagem, com espcies arbreas mortas. Latossolo Vermelho-Escuro lico (LEa3) em relevo erosivo (Dep). Sub-bacia do rio Coxim, municpio de So Gabriel DOeste/MS. Foto: Rozely Santos

Situaes de inundao e assoreamento desencadeados por usos da terra inadequados e alterao na drenagem. 34 |

FIGURA 3.11

Desmatamento na nascente ou drenagem preferencial com rvores grandes de rea de transio cerrado e floresta (FS). Solo Podzlico Vermelho-Amarelo eutrfico (PVe1) em relevo erosivo aguado (Da25). Sub-bacia do rio Coxim, municpio de Camapu/MS. Foto: Myriam Abdon

rea queimada recentemente. Areias Quatzosas licas (AQa11) em relevo erosivo (Dep). Sub-bacia do rio Coxim, municpio de Rio Verde de Mato Grosso/MS. Foto: Rozely Santos

Desmatamento de cerrado. Areias Quartzosas licas (AQa3) em relevo erosivo tabular (Dt12). Sub-bacia do rio Jauru, municpio de Costa Rica/ MS. Foto: Myriam Abdon

Situaes de desmatamento e queimadas desencadeados para implantao de agropecuria. Fonte: Abdon et al., 2004.

protozorios ou fungos, como: febre tifide, clera, amebase, shigelose ou dessenteria bacilar, hepatite infecciosa, leptospirose, gardase, dengue, febre amarela, malria, ascaridase, salmonelose, escabiose, pediculose, tracoma, conjuntivite, esquistossomose, filarose ou ancilostomase. Enfim, ao longo deste captulo pretendeuse mostrar que para cada arranjo espacial de uso e ocupao da terra sobre um determinado tipo de terreno com um certo grau de vulnerabilidade ambiental e com atividades de manejo prprio da regio podemos identificar um conjunto especfico de problemas ambientais. A seguir algumas imagens de cidades brasileiras (figura 3.12). Cada uma delas ilustra a forma como tratada a questo ambiental em nossa realidade. No podemos esquecer que o planejamento do uso e ocupao das terras em reas urbanas e rurais competncia municipal e a gesto ambiental integrada deve ser prioridade em toda gesto municipal. O Plano Diretor o principal instrumento que um municpio dispe para organizar o seu territrio, as suas atividades e usos da terra, tambm o meio para se atingir a desejada qualidade de vida para as populaes. Com o Estatuto da Cidade (Lei 10.257 de 2001), que estabelece as diretrizes gerais da poltica urbana, so definidas tambm as bases para a elaborao do Plano Diretor. O Estatuto representa um ganho para a gesto ambiental

urbana que o direito de preempo. Seu objetivo facilitar a aquisio de reas para a realizao de projetos de interesse pblico, como a implantao de reas de proteo ambiental, de reas verdes e de preservao de prdios e de reas de interesse cultural e ambiental, podendo evitar, por exemplo, a especulao imobiliria. O uso de cada um dos instrumentos para a gesto urbana deve considerar a gesto ambiental integrada. Os cuidados adotados durante este processo devem ter o mesmo enfoque que o nosso olhar sobre uma paisagem: cada elemento identificado deve ser compreendido como parte de um todo, pois a falta de integrao no planejamento da paisagem poder resultar em efeitos catastrficos ao meio, afetando diretamente a qualidade de vida de todos.

reas de Preservao Permanente (APP) so reas protegidas pela Lei 4.771 de 1965. No caso das margens fluviais, as APPs so definidas, por esta mesma lei, em funo da largura do rio.

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FIGURA 3.12

Cenrios atuais das aes desencadeadoras de desastres humanos. 1.5. A histria de uma paisagem A paisagem escolhida para ilustrar cenrios criados ao longo do tempo e que resultaram em desastres humanos tem o carter nico de orientar para uma mudana de paradigma. Toda ao humana sobre uma paisagem tem que vir acompanhada de um cuidadoso estudo das provveis conseqncias desencadeadas por ela, bem como de alternativas mitigadoras dos impactos. So tantas as situaes de catstrofes que a humanidade tem sido causadora e vitima ao mesmo tempo, que existe a necessidade emergente de se obter algum aprendizado e evitar que outras e piores aconteam. Neste sentido, tomaremos como exemplo uma histria que aconteceu em um lugar to prximo e do qual estamos inseridos. Qual melhor cenrio para ilustrar as respostas do meio dadas s alteraes da dinmica das reas de inundao dos rios, seno o histrico rio Tiet? (figura 3.13). Segundo o Plano de Manejo do Parque Estadual Nascentes do Tiet (Unicamp, 2004), o rio Tiet foi registrado cartograficamente pela primeira vez em 1748, no mapa de DAnville e recebeu antes diversos nomes. Os primitivos nomes do rio podem ser encontrados nos antigos relatos e mapas da poca da fundao da cidade. Muitas corruptelas e variaes tais como Anhembi, Agembi, Aiembi, Anem by, Aniembi, Anhambi, Niembi e outras tantas designaes so comuns nos antigos documentos. O Tiet corta o estado de So Paulo no sentido transversal de sudeste a noroeste. Com mais de 1.100 km de extenso ele desgua no rio Paran, contribuindo para a Bacia do rio do Prata. Hoje, o principal curso dgua paulista e foi o principal condutor de interiorizao do estado de So Paulo, ainda nos sculos XVI e XVII. A importncia do rio Tiet para o Brasil, em particular para So Paulo, evidente ao se analisar as vrias referncias feitas a ele e sua expanso para o interior do territrio. Com indicae