Mobilização precoce na uti uMa atualização -...

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55 MOBILIZAÇÃO PRECOCE NA UTI: UMA ATUALIZAÇÃO Early Mobilization in the Icu: An Update CLARISSA SANDERS 1 FRANCISCO OLIVEIRA 2 GRACIELE SOUZA 3 MILENA MEDRADO 4 Resumo: A fraqueza muscular tem sido descrita como complicação comum em UTI. O repouso no leito é apontado como principal fator de risco para desenvolvimento desta disfunção. Esta condição traz ao doente crítico uma série de complicações como atrofias, contraturas, atelectasias e úlceras. O objetivo deste estudo é rever a literatura sobre a importância da mobilização precoce na UTI, citando seus benefícios nos vários sistemas do corpo e mostrando as técnicas mais citadas nas publicações científicas. A pesquisa da literatura foi realizada nas bases de dados eletrônicas MEDLINE, SCIELO, LILACS, COCHANRE, GOOGLE ACADÊMICO, PUBMED entre 2007 e 2010, utilizando as palavras-chave: intensive care unit, weakness, muscle, Bed-rest, immobility, physiotherapy, modalidade de Fisioterapia, Unidade de Terapia Intensiva, deambulação precoce. Dos quarenta e seis artigos analisados, apenas trinta e quatro preencheram os critérios de inclusão. Foram selecionados estudos randomizados e controlados, observacionais, prospectivos, 1 Pós -Graduada em Fisioterapia na Terapia Intensiva - Preceptor de Estágio pelo Centro Universitário Jorge Amado. E-mail: [email protected] 2 Pós-Graduado em Fisioterapia na Terapia Intensiva. E-mail: chicofi[email protected] 3 Fisioterapeuta – Graduada pelo Centro Universitário Jorge Amado – E-mail: graciele.souza@ yahoo.com.br Fisioterapeuta – Graduada pelo Centro Universitário Jorge Amado – E-mail: graciele. [email protected] 4 Mestre em Gestão do conhecimento – UFSC; Especialista em Ergonomia aplicada à saúde do trabalhador – PUC/MG; Fisioterapeuta docente do curso de Fisioterapia do Centro Universitário Jorge Amado. E-mail: [email protected]

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Mobilização precoce na uti: uMa atualização

Early Mobilization in the Icu: An Update

CLARISSA SANDERS1

FRANCISCO OLIVEIRA2

GRACIELE SOUZA3

MILENA MEDRADO4

Resumo: A fraqueza muscular tem sido descrita como complicação comum em UTI. O repouso no leito é apontado como principal fator de risco para desenvolvimento desta disfunção. Esta condição traz ao doente crítico uma série de complicações como atrofias, contraturas, atelectasias e úlceras. O objetivo deste estudo é rever a literatura sobre a importância da mobilização precoce na UTI, citando seus benefícios nos vários sistemas do corpo e mostrando as técnicas mais citadas nas publicações científicas. A pesquisa da literatura foi realizada nas bases de dados eletrônicas MEDLINE, SCIELO, LILACS, COCHANRE, GOOGLE ACADÊMICO, PUBMED entre 2007 e 2010, utilizando as palavras-chave: intensive care unit, weakness, muscle, Bed-rest, immobility, physiotherapy, modalidade de Fisioterapia, Unidade de Terapia Intensiva, deambulação precoce. Dos quarenta e seis artigos analisados, apenas trinta e quatro preencheram os critérios de inclusão. Foram selecionados estudos randomizados e controlados, observacionais, prospectivos,

1 Pós -Graduada em Fisioterapia na Terapia Intensiva - Preceptor de Estágio pelo Centro Universitário Jorge Amado. E-mail: [email protected]

2 Pós-Graduado em Fisioterapia na Terapia Intensiva. E-mail: [email protected] Fisioterapeuta – Graduada pelo Centro Universitário Jorge Amado – E-mail: graciele.souza@

yahoo.com.br Fisioterapeuta – Graduada pelo Centro Universitário Jorge Amado – E-mail: [email protected]

4 Mestre em Gestão do conhecimento – UFSC; Especialista em Ergonomia aplicada à saúde do trabalhador – PUC/MG; Fisioterapeuta docente do curso de Fisioterapia do Centro Universitário Jorge Amado. E-mail: [email protected]

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de coorte e revisões de literatura abordando a fraqueza muscular, impacto da diminuição da força muscular, efeitos da reabilitação e recursos fisioterapêuticos na Unidade de Terapia Intensiva. Poucos são os estudos publicados que utilizem um protocolo de exercícios para reabilitação, estudos mais uniformes devem ser realizados para melhor comparação dos resultados. Apesar da diversidade metodológica, a mobilização precoce foi descrita como recurso terapêutico importante na recuperação do doente crítico. Palavras- chaes: Polineuropatia. Mobilização precoce. UTI.

Abstract: Muscle weakness has been described as a common complication in the ICU. Bed rest is indicated as the main risk factor for development of this dysfunction. This condition brings the critically ill patient a series of complications such as atrophy, contractures, atelectasis and ulcers. The aim of this study is to review the literature on the importance of early mobilization in the ICU citing its benefits in various body systems and showing the techniques cited in scientific publications. The literature search was conducted in the electronic databases MEDLINE, SciELO, LILACS, COCHANRE, Google Scholar, PubMed from 2007 to 2010 using the keywords: intensive care unit, weakness, muscle, Bed-rest, immobility, physiotherapy, mode Physical Therapy, Intensive Care Unit, early ambulation. Of the forty-six articles considered only thirty-four met the inclusion criteria. We selected randomized controlled trials, observational, prospective cohort studies and literature reviews addressing muscle weakness, the impact of decreased muscle strength effects of rehabilitation and physical therapy resource in intensive care unit. There are few published studies using an exercise protocol for rehabilitation, more uniform studies should be performed to better compare the results. Despite the methodological diversity of early mobilization has been described as important therapeutic resource in the recovery of critically ill patients.Keywords: Polyneuropathy. Early mobilization. ICU.

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INTRODUÇÃO

O repouso no leito tem sido prescrito em uma ampla gama de condições em doentes críticos em unidade de terapia intensiva (UTI) (GOLDHILL et. al., 2008; NEEDHAM, 2008). Segundo Ali et. al. (2008), os doentes críticos apresentam comumente fraqueza muscular e, de acordo com Maramattom, Wijdicks (2006) apud Silva, Maynard, Cruz (2010), sua incidência chega de 30 a 60% dos pacientes internados na UTI. Para Kortebein et. al., (2007) os mecanismos pelos quais os doentes sofrem de fraqueza muscular são bastante complexos e envolvem diversos processos que se inter-relacionam. Fisiopatologicamente, mecanismos importantes, como imobilidade, inflamação local e sistêmica, utilização de fármacos como corticoides, relaxantes musculares e antibióticos, desnutrição e situações catabólicas, agem sinergicamente para promover a perda de massa muscular significativa no doente criticamente enfermo. O repouso prolongado associado ao doente crítico leva à diminuição da síntese de proteína muscular, aumento da urina, excreção de nitrogênio (catabolismo muscular) e diminuição da massa muscular, principalmente de membros inferiores. Para Burtin et. al. (2009), esses mecanismos contribuem para evolução desfavorável e piora do quadro clínico do doente.

A unidade de terapia intensiva (UTI) requer uma equipe multidisciplinar para o suporte adequado ao doente, sendo a fisioterapia parte integrante dessa equipe. Munido de conhecimentos, o fisioterapeuta interfere no processo de cronicidade e na perda da funcionalidade e, com isso, lança mão de procedimentos avaliativos e condutas terapêuticas como a mobilização precoce (FRANÇA et. al., 2009). Para Borges et. al. (2009), a área de mobilização precoce em pacientes de UTI é conceitualmente nova. Existem poucos estudos que fundamentem essa prática.

A força tarefa da European Respiratory Society and European Society of Intensive Care Medicine estabeleceu recentemente uma sequência de atividades de maneira hierárquica para mobilização na UTI, e baseia-se na intensidade de cada conduta: mudança de decúbitos e posicionamento funcional, mobilização passiva,

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exercícios ativo-assistidos e ativos, uso de cicloergômetros na cama; sentar na borda da cama; ortostatismo, caminhada estática, transferência da cama para poltrona, exercícios na poltrona e caminhada. A força tarefa ainda preconiza que essas condutas são de exclusividade do fisioterapeuta (GOSSELINK et. al., 2008). Em um estudo proposto por Morris et. al. (2008) demonstrou uma comparação entre mobilização precoce na UTI com cuidados comuns, composta por grupo controle e grupo protocolo, e observou que os pacientes que receberam mais sessões de fisioterapia tiveram menor tempo de internação hospitalar. Sendo assim e analisando que a fisioterapia motora tem escopo terapêutico na recuperação do paciente, nota-se a relevância de rever a literatura sobre a importância da mobilização precoce na UTI, citando seus benefícios nos vários sistemas do corpo e mostrando as técnicas mais citadas nas publicações científicas.

METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão de literatura do tipo síntese, realizada através de um levantamento bibliográfico, na Biblioteca do Centro Universitário Jorge Amado- Salvador – BA, e nas bases de dados eletrônicas MEDLINE, SCIELO, LILACS, COCHANRE, GOOGLE ACADÊMICO, PUBMED. Os artigos selecionados foram publicados nos últimos três anos. Foram encontradas quarenta e seis referências pesquisadas com a combinação de palavras - chave: intensive care unit, weakness, muscle, Bed-rest, immobility, physiotherapy, modalidade de Fisioterapia, Unidade de Terapia Intensiva, deambulação precoce. Os critérios de inclusão estabelecidos foram: artigos publicados de 2007 a 2010 nos idiomas inglês e português do tipo revisão literária, ensaios randomizados, estudos prospectivos, observacional e de coorte relevantes à área de estudo em questão. Para os critérios de exclusão foram considerados artigos publicados que não estavam nos idiomas português e inglês, que não tinham relevância com a área de estudo em questão, artigos apenas com indicação de tratamento médico, resumos de dissertação e teses acadêmicas. Foram analisadas quarenta e seis referências, sendo selecionadas trinta e quatro de acordo com os critérios acima referidos.

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RESULTADOS

O levantamento bibliográfico foi realizado no período de janeiro de 2010 a outubro de 2010. Foram analisadas quarenta e seis referências de artigos científicos, dos quais, após a leitura, foram utilizados trinta e quatro artigos, considerando os critérios de inclusão, sendo quatro em língua portuguesa e os demais em língua inglesa.

Vinte e cinco artigos tratavam de revisões de literatura, envolvendo efeitos da fisioterapia motora, impacto na força muscular, fraqueza muscular adquirida na UTI e recursos da fisioterapia nos pacientes críticos. Nove artigos tratavam de estudos observacionais, ensaios clínicos randomizados e controlados, estudos prospectivos, de coorte, estudos longitudinais, transversais e multicêntricos. O quadro abaixo mostra uma síntese dos objetivos desses artigos, seus autores e o tipo de estudo que realizaram.

Quadro 1: Comparação entre os estudos encontrado

AUTOR/ANO

TIPO DE ESTUDO

OBJETIVO

Ali NA et. al ( 2008)

Estudo de Coorte,

ulticêntrico, Prospectivo

Analisar a relação entre a paresia adquirida na UTI com a

mortalidade.

Goldhill et. al. (2008)

Estudo servacional, Prospectivo, Multicêntrico

Analisar a importância das mudanças de posicionamento no

doente crítico.

Morris et al. (2008)

Estudo Prospectivo de

Coorte

Avaliar a frequência da fisioterapia quando foi iniciada

e comparar um grupo com cuidados usuais e outro com um

protocolo de mobilização.

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Burtin et. al. (2009)

Ensaio andomizado e

Controlado

Investigar se uma sessão de exercício diário, utilizando um cicloergômetro de cabeceira, é uma intervenção segura e

eficaz em prevenir ou atenuar a diminuição da capacidade

funcional de exercício, estado funcional e força do quadríceps.

Van der Schaaf et. al. (2009)

Estudo transversal

Descrever as restrições nas atividades de vida diária e

identificar fatores prognósticos para o estado funcional após 1

ano de alta da UTI.

Wiles; Stiller (2009)

Estudo Prospectivo

Investigar a prática fisioterapêutica relacionada ao movimento passivo em adultos da Austrália, internados na UTI.

Weber-Carstens et. al. (2010

Estudo Prospectivo, bservacional

Investigar os fatores de risco predisponentes para o

desenvolvimento da miopatia em doentes críticos.

Soares et. al. (2010)

Estudo Longitudinal etrospectivo

Descrever a frequência de retirada do leito em pacientes

submetidos à ventilação mecânica e sua repercussão

na mortalidade e no tempo de permanência na unidade de

terapia intensiva.

Pohlman et. al. (2010)

Ensaio andomizado e

controlado

Avaliar, após interrupção de sedativos, o impacto da

mobilização precoce na UTI e as questões de segurança para

esta prática.

Fonte: Dados de pesquisa do próprio autor

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DISCUSSÃO

A fraqueza muscular adquirida na UTI é considerada uma complicação grave em doentes críticos. Tem sido reconhecida como patologia periférica neuromuscular adquirida na Unidade de Terapia Intensiva que lesa basicamente o axônio, gerando sinais de acometimento do 2° neurônio motor (DE JONGHE et. al., 2009). Para Stevens et. al. (2009), a fraqueza é caracterizada pela atrofia das fibras musculares tipo II e miopatia do filamento grosso e, segundo Ali et. al. (2008), o desenvolvimento da fraqueza muscular generalizada é uma complicação importante e frequente na UTI.

Além das condições prévias, alguns fatores contribuem para a fraqueza muscular, sendo eles inflamação sistêmica, uso de medicamentos como corticoides, relaxantes musculares, sedativos, hiperglicemia, sepse, desnutrição, nutrição parenteral, hiperosmolaridade, imobilidade prolongada e duração da ventilação mecânica (fig.1) (SCHWEICKERT, HALL 2007; TRUONG et. al. 2009; PUTHUCHEARY, HART, 2009). Todos esses fatores irão contribuir para maiores riscos de complicações, aumento nos índices de mortalidade e custos mais elevados (ALI NA et. al., 2008; GOSSELINK et. al. 2008; MORRIS et. al. 2008).

Figura 1: Mecanismos que levam o paciente crítico a fraqueza muscular.

Fonte: Truong A D, et. al. (2009). Bench-to-bedside review: Mobilizing patients in the intensive care unit – from pathophysiology to clinical trials. Critical Care 2009, 13:216.

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Para Brower (2009), o repouso no leito pode trazer complicações como atrofia muscular, contraturas articulares, doença tromboembólica, resistência à insulina, disfunção microvascular, atelectasias, inflamação sistêmica e úlceras de pressão. No estudo proposto por Soares et. al. (2010) com 91 pacientes, foi observada uma taxa de mortalidade equivalente a 29, 7 %, comparada ao grupo que não foi retirado do leito.

Um estudo com 22 pacientes mostrou excitabilidade anormal da membrana muscular durante a estimulação direta do músculo no prazo de 7 (5 a 9,25) dias após a internação na UTI (WEBER-CARSTENS et. al. 2010). Estudos experimentais com indivíduos saudáveis demonstraram uma perda de 4% a 5% da força muscular por semana (NEEDHAM, 2008). Segundo Bittner et. al., (2009), a perda de força muscular na idade adulta torna-se risco para aumento das deficiências e morbidade. Com isso, a força muscular é vista como preditor para retorno das atividades de vida diária, e o exercício físico é cada vez mais reconhecido para melhora desse quadro.

Para Stevens et. al. (2009), nas últimas décadas e com o aumento da sobrevida dos pacientes críticos, tem sido possível identificar e caracterizar a síndrome neuromuscular adquirida na ausência de fatores causais. Três distintos grupos de pacientes são descritos. Um grupo com miopatia, outro com polineuropatia e o último em uso prolongado de bloqueadores musculares. De acordo com Lighfoot, McArdle, Griffiths (2009), o quadro torna-se mais severo na presença de sepse, onde ocorre uma tempestade de processos inflamatórios, favorecendo a disfunção múltipla dos órgãos.

Após alta da UTI, os pacientes apresentam inabilidades, podendo perdurar por até um ano, o que interfere no retorno às atividades de trabalho devido à fadiga persistente, fraqueza e pobreza no status funcional (HERRIDGE et. al. 2003 Apud SILVA, MAYNARD, CRUZ, 2010). Para Van Der Schaff et. al. (2009), a medicina de reabilitação pode interferir nas restrições a longo prazo dos pacientes críticos. A reabilitação pode focar na funcionalidade tanto física quanto mental para, dessa forma, melhorar os resultados.

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Van Der Schaaf et. al. (2009), no seu estudo, investigou uma população após 1 ano de internamento na unidade de terapia intensiva, observando status funcional, qualidade de vida, ansiedade e depressão e transtornos pós- traumáticos. Pode-se concluir, neste estudo, que 54% dos pacientes tinham restrições de funcionalidade no quotidiano. Caminhar e realizar atividades sociais eram as funções mais restritas (30- 60 %); a qualidade de vida era menor quando comparado a população geral da Holanda; sintomas de ansiedade e depressão afetavam 14 %; e transtorno de estresse pós- traumático, em 18 %. O tempo de permanência na UTI foi apontado como fatores de prognóstico, explicando 10% do déficit funcional.

A literatura sugere que a mobilização precoce na UTI seja fator essencial para a recuperação desses pacientes. Um documento da European Respiratory Society e European Society of Intensive Care Medicine apud BURTIN et. al. (2009) afirma a importância de iniciar o mais precoce possível os exercícios ativos e passivos nos doentes criticamente enfermos. Para Morris et. al. (2008), os exercícios terapêuticos demonstram benefícios principalmente se iniciados precocemente, compondo uma variedade de abordagens. De acordo com Gosselink et. al. (2008), a cinesioterapia precoce na UTI é segura e viável e pode ser ativa ou passiva conforme o estado do paciente, sua estabilidade hemodinâmica, seu nível de suporte ventilatório, sua fração inspirada de oxigênio (FiO2) e sua resposta ao tratamento.

Segundo Truong et. al. (2009), os exercícios trazem benefícios físicos e psicológicos, reduzem o estresse oxidativo e inflamação devido ao aumento de citocinas anti-inflamatórias. Para Gosselink et. al. (2008), o posicionamento no leito também é benéfico, funcionando como fonte de estimulação sensório- motor, prevenindo também as complicações secundárias ao imobilismo; é utilizado, pois melhora a relação ventilação-perfusão, minimiza o trabalho respiratório, aumento de clearance mucociliar, além de otimizar o transporte de oxigênio. Para Gosselink et. al. (2008), os exercícios passivos, ativo-assistidos e resistidos mantêm a mobilidade articular, o comprimento do tecido muscular, a força, diminuindo o risco de tromboembolismo.

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No estudo de Burtin et. al., (2009), foi investigado se sessões diárias de exercício, utilizando o cilcoergometro de membros inferiores (MMII), no leito interferiram na performance do exercício, no status funcional e na força de quadríceps. Foi dividido em grupo de controle e de intervenção, composto por 45 pacientes cada. O protocolo utilizado era composto por mobilizações de extremidades superiores e inferiores, passivas ou ativas, dependendo do grau de sedação, as sessões eram realizadas cinco vezes na semana. A deambulação foi incluída quando esta era considerada segura e adequada. O grupo de intervenção recebeu, além do protocolo, sessões diárias de exercícios com cicloergômetro de MMII passivo ou ativo com seis níveis de resistência e tempo equivalente a 20 minutos. Foram avaliados o Teste de Caminhada de 6 minutos (TC6), o Questionário de Qualidade de Vida (SF-36), a preensão palmar, a força isométrica de quadríceps, status funcional (escala de Berg), tempo de desmame, tempo de internação UTI e hospitalar e mortalidade, 1 ano após a alta hospitalar. Foi relatada melhora significativa no grupo de tratamento das variáveis avaliadas. Verificou-se aumento da recuperação da funcionalidade, aumento na força de quadríceps e melhor status funcional. A deambulação independente foi maior nesse grupo.

Já no estudo proposto por Morris et. al. (2008), o objetivo foi comparar dois grupos, no quais o controle utilizava cuidados usuais descritos como mobilizações passivas no leito e mudanças de decúbito a cada duas horas; e o grupo protocolo utilizava, além desses exercícios, fortalecimento muscular, sedestação, atividades de equilíbrios dentre outros. Este grupo foi dividido em quatro níveis. No nível I, o paciente ainda estava inconsciente e eram realizadas mobilizações de todas as articulações. No nível II, o paciente atendia aos comandos verbais, e foram acrescentados exercícios ativo- assistido ou ativo-resistido e sedestação no leito. No nível III, as sessões eram compostas por fortalecimento de membros superiores (MMSS) em sedestação no leito. Não foram utilizados pesos, as evoluções baseavam-se em dificuldades funcionais. No nível IV, eram treinadas transferências no leito para a cadeira e vice-versa, atividades de equilíbrio sentado,

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descarga de peso em ortostase e deambulação. O principal resultado obtido foi a retirada precoce do leito em relação ao grupo controle (5 + 11,3 dias). O tempo de permanência na UTI foi de 6,9 dias no grupo de controle e 5,5 dias no grupo de intervenção. A permanência hospitalar foi de 14, 5 dias no grupo de controle e 11,2 dias no grupo de intervenção.

O estudo descrito por Needham, Truong, Fan (2009) aponta a eletroestimulação como conduta bem tolerada na doença crônica, sem muitos efeitos adversos. Os estudos não têm mostrado alteração na frequência cardíaca (FC) e na pressão arterial (PA), somente um artigo pouco relevante descreve uma discreta alteração na FC. A eletroestimulação em indivíduos saudáveis melhora a força de quadríceps, através da redução da atrofia por desuso e a falta de benefícios foi atribuída há uma curta duração do estímulo, do pulso e do número de sessões. No entanto, a eletroestimulação não foi estudada nos doentes críticos. Para a Sociedade Americana Torácica, Sociedade Européia Respiratória e Sociedade Européia de Medicina em Cuidados Intensivos, essa terapia é adjuvante ao tratamento daqueles pacientes que adquirem a fraqueza muscular na UTI. Ainda há uma escassez de estudos sobre esta prática, seus parâmetros e suas limitações, no doente crítico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observamos que há uma prevalência elevada de fraqueza muscular na UTI. Esta, por sua vez, leva a incapacidades funcionais durante o período de internação e também após alta hospitalar. A mobilização precoce como conduta terapêutica, exclusiva do fisioterapeuta, vem se mostrando segura e eficaz no cuidado ao doente crítico. Foram observados resultados significativos como retirada precoce do leito, melhora do status funcional, menor tempo de internação hospitalar e diminuição de custos (MORRIS et. al. 2008; FRANÇA et. al. 2009; BURTIN et.al. 2009).

A fisioterapia motora na UTI tem como alvo a independência funcional e melhora da qualidade de vida. São poucos os estudos publicados que utilizam um protocolo para a reabilitação.

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Casuísticas mais uniformes e escalas funcionais específicas devem ser utilizadas para comparação das intervenções, contribuindo assim na elaboração de condutas terapêuticas.

Novas pesquisas devem ser realizadas, descrevendo a intensidade, duração e frequência da cada exercício proposto em beneficio do doente crítico.

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