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1 OFFSET: UMA OPORTUNIDADE PARA O DESENVOLVIMENTO DA INDUSTRIA NACIONAL DE DEFESA DO BRASIL E DA ÁFRICA LUSÓFONA? Sérgio Servilha de Oliveira, cel R/1, Ph.D; Antonio Daniel Miguel dos Santos; Eliane de Jesus Costa de Carvalho; Shakil Bonnet Jossub Ribeiro; Francisca Valdenuza Almeida Silva; e Delcio Aguiar José Barreto Estudo do panorama internacional dos grandes contratos de aquisição de produtos de defesa aplicados às relações comerciais do Brasil com as Nações Lusófonas Africanas e analisa a possibilidade de desenvolvimento de indústria nacional de defesa naqueles países. A partir das definições utilizadas em offset faz-se um histórico da aplicação desta técnica de negociação internacional e as vantagens da transferência de tecnologia e sua internalização nos sistemas produtivos locais. Estuda-se principalmente as experiências brasileiras, dando destaque ao aprendizado e às negociações exitosas de compra de materiais de alta tecnologia agregada conduzidas pela Força Aérea Brasileira. Conclui-se pela viabilidade e satisfatoriedade da concatenação das ações cooperativas que, neste caso, permitiria ao Brasil ampliar seus mercado de máquinas e equipamentos de alta tecnologia tendo como contrapartida, aos países africanos lusófonos, além da aquisição de produtos de defesa de alta qualidade, um contrato de offset para favorecer o desenvolvimento de sua indústria de defesa nacional ancorada nos eixos de preparo e qualificação da mão de obra, melhoria da infraestrutura industrial e de seus sistemas produtivos, da qualidade e de gerenciamento de projetos. Tal Cooperação sintetiza as premissas positivas da almejada uma Cooperação Sul-Sul. Palavras-chave: offset; países lusófonos; Cooperação Sul-Sul; indústria nacional de defesa.

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OFFSET: UMA OPORTUNIDADE PARA O DESENVOLVIMENTO DA

INDUSTRIA NACIONAL DE DEFESA DO BRASIL E DA ÁFRICA LUSÓFONA? Sérgio Servilha de Oliveira, cel R/1, Ph.D;

Antonio Daniel Miguel dos Santos;

Eliane de Jesus Costa de Carvalho;

Shakil Bonnet Jossub Ribeiro;

Francisca Valdenuza Almeida Silva; e

Delcio Aguiar José Barreto

Estudo do panorama internacional dos grandes contratos de aquisição de produtos de defesa

aplicados às relações comerciais do Brasil com as Nações Lusófonas Africanas e analisa a

possibilidade de desenvolvimento de indústria nacional de defesa naqueles países. A partir das

definições utilizadas em offset faz-se um histórico da aplicação desta técnica de negociação

internacional e as vantagens da transferência de tecnologia e sua internalização nos sistemas

produtivos locais. Estuda-se principalmente as experiências brasileiras, dando destaque ao

aprendizado e às negociações exitosas de compra de materiais de alta tecnologia agregada

conduzidas pela Força Aérea Brasileira. Conclui-se pela viabilidade e satisfatoriedade da

concatenação das ações cooperativas que, neste caso, permitiria ao Brasil ampliar seus mercado

de máquinas e equipamentos de alta tecnologia tendo como contrapartida, aos países africanos

lusófonos, além da aquisição de produtos de defesa de alta qualidade, um contrato de offset para

favorecer o desenvolvimento de sua indústria de defesa nacional ancorada nos eixos de preparo

e qualificação da mão de obra, melhoria da infraestrutura industrial e de seus sistemas

produtivos, da qualidade e de gerenciamento de projetos. Tal Cooperação sintetiza as premissas

positivas da almejada uma Cooperação Sul-Sul.

Palavras-chave: offset; países lusófonos; Cooperação Sul-Sul; indústria nacional de defesa.

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1. INTRODUÇÃO

Os espaços lusófonos são aqueles onde se fala predominantemente o idioma português.

Além de alguns países com importantes comunidades de falantes nativos da língua lusitana,

como Goa e Macau, são espaços lusófonos, os territórios nacionais dos países da Comunidade

dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) que tem o Português como idioma oficial,

notadamente: Portugal, Brasil, Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau, São Tomé e Príncipe,

Moçambique, Timor Leste e mais recentemente a Guiné Equatorial.

A descolonização tardia do Império. Colonial Português em África, no século XX, em

muito retardou o processo de independência e busca de soberania das ex-colônias. Este ainda

não passa de 50 (cinquenta) anos e as ex-colônias tiveram e ainda tem uma grande dificuldade,

em graus distintos, de estabilização política, social e econômica e de uma inserção autônoma

no conserto das nações.

Nesse contexto os Países Africanos Lusófonos: Angola, Moçambique, Cabo Verde, São

Tomé e Príncipe e Guiné Bissau têm um histórico recente da luta pela independência, seguida

de uma guerra civil entre frentes políticas via de regra apoiada por lados extremos das potências

da Guerra Fria,

Hoje estas jovens nações buscam a autodeterminação de seus povos por uma inserção

econômica autônoma, a estabilidade política que permita a democracia e o progresso social.

Entretanto suas mazelas socioeconômicas a inserem num ambiente com muitas ameaças à

estabilidade das estruturas de Nação, inclusive da própria sobrevivência do Estado.

As Forças Armadas, num regime democrático de direito, costumam ser um pilar sólido

que inibe a ação de aventureiros ou grupos que ameaçam a Soberania, a Lei e a Ordem visando

restringir a estabilidade ou a sobrevivência do Estado, por vetores externos ou internos.

Os países africanos lusófonos, passado o período de grande estabilidade inicial

encontram-se na busca do amadurecimento de suas instituições que permitam a soberania do

Estado e à autodeterminação de seus povos. Suas Forças Armadas têm graus diferentes de

organização, tamanho de contingente, adestramento, disciplina e materiais de uso militar para

fazer face às ameaças externas ou internas.

No cenário internacional, existem alguns modelos diferentes em que jovens nações se

apoiam neste de restrições orçamentarias, instabilidades institucionais e ameaças externas

crescentes, desde conflitos armados iminentes, atuação excessiva do narcotráfico, corrupção

endêmica entre outros.

Um modelo clássico é apoiar-se numa grande potência extra-regional que tem interesses

globais no papel estratégico do pais, seja por sua localização e uso de bases militares, seja por

uma troca desfavorável entre proteção ou equipamento militar por recursos naturais em preços

pouco competitivos ou ainda por interesses na sessão, mesmo que temporária, da soberania

numa conjuntura de ameaça aos interesses daquela superpotência.

Outro modelo, muito presente hodiernamente em África é a sessão temporária por um

país de parte de seu território, suas atividades econômicas, ou seus recursos naturais em troca

de um favor especifico de interesse nacional, tal como a construção de uma ferrovia, a

exploração mineral ou o desenvolvimento de uma infraestrutura necessária e específica. A

benfeitoria é paga com um recurso específico da nação, sem correlação com seu

desenvolvimento.

Há ainda uma terceira vis onde o chamado Softpower, também chamado poder brando,

poder de convencimento ou poder suave. Softpower é uma expressão usada na teoria das

relações internacionais para descrever a habilidade de um corpo político - um Estado, por

exemplo - para influenciar indiretamente o comportamento ou interesses de outros corpos

políticos por meios culturais ou ideológicos.

A política externa brasileira, seguindo seus preceitos constitucionais e os conceitos de

geopolítica, tem uma vocação importante para aproximação com os países africanos,

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especialmente aqueles de língua oficial portuguesa, na atualidade iniciativas no âmbito da

CPLP, da Cooperação Sul-Sul muito caracterizam isto.

Um modelo importante de para o desenvolvimento de qualidade de sua produção

industrial adotado pelo Brasil foi a aplicação nas grandes contratações internacionais, da

compensação financeira (offset) especialmente aquelas que tratam de produtos de defesa.

Este trabalho visa estudar a aplicabilidade do modelo brasileiro de desenvolvimento

tecnológico de benefício das políticas de compensação financeira (offset) em grandes

contratações internacionais, nas oportunidades dos Países Africanos Lusófonos desenvolverem

sua autonomia na base industrial, especialmente e a defesa pela interação comercial por grandes

contratos com o Brasil neste setor.

1.1 OBJETIVO

Estudar a aplicabilidade do modelo brasileiro de desenvolvimento tecnológico de

benefício das políticas de compensação financeira (offset) em grandes contratações

internacionais, nas oportunidades dos Países Africanos Lusófonos desenvolverem sua

autonomia na base industrial, especialmente e a defesa pela interação comercial por grandes

contratos com o Brasil neste setor.

2. METODOLOGIA

Para atingir o objetivo do trabalho é necessário entender o que é a política de offset e seu

histórico no mundo, posteriormente entender o histórico da aplicação compensação financeira

de offset pelo Brasil, entender a situação econômica e das forças de defesa nos países lusófonos

e verificar se há aplicabilidade do modelo brasileiro aos países africanos.

Assim, a Seção 3 versa sobre a definição de compensação financeira (offset), o histórico

de suas primeiras aplicações, a atual situação internacional da aplicação desta política de

compensação.

A Seção 4 estuda o modelo brasileiro de offset, sua evolução, estudos de caso e a política

atual de sua aplicação. A seção 5 estuda a situação da indústria de defesa em cada um dos

países africanos lusófonos (Angola, Moçambique, Guine-Bissau, São Tome e Príncipe e Cabo

Verde), e analisa a aplicabilidade do modelo brasileiro para cada um dos países lusófonos. A

seção 6 conclui e sintetiza o texto.

3. OFFSET: DEFINIÇÃO E EVOLUÇÃO

As relações comerciais evoluíram com as sociedades. Especialmente após a revolução

industrial, assiste-se à especialização do trabalho dos indivíduos o que tornou essencial a troca

da força de trabalho, manual ou intelectual, por valores monetários. O dinheiro é a grande

referência da valoração material da sociedade capitalista.

No concerto das nações passou a prevalecer a Divisão Internacional do Trabalho, pois o

processo de industrialização de alguns países centrais e a estagnação econômica e tecnológica

dos países periféricos levaram os países ricos a produzir bens industrializados de alto valor

agregado e a comprar, daqueles em desenvolvimento, seus insumos, os produtos primários.

Isso aumentou o hiato dos estágios de desenvolvimento entre as nações e é uma grande

barreira para os países subdesenvolvidos alcançarem estágios mais confortáveis de

desenvolvimento. Nesse contexto, as práticas comerciais de venda de produtos de alto valor

agregado tendo como contrapartida a compra de produtos primários, normalmente, acelera o

processo de ampliação dos desníveis de desenvolvimento.

A percepção do desequilíbrio consequente deste mecanismo comercial, deu espaço para

o surgimento, nas nações em desenvolvimento ou em situação econômica desfavorável nas

relações de compras, da percepção da necessidade de compensação financeira ou técnica nas

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suas transações comerciais de grande vulto, a fim de não perpetuar ou aumentar a desvantagem

comercial competitiva causada pelo desnível tecnológico.

Foi assim que, ao final da II Grande Guerra Mundial, os norte-americanos estabeleceram

acordos comerciais que propunham, às nações enormemente desgastadas pelo esforço de

guerra, relações comerciais de compensação onde era possível ao comprador de bens um

investimento em seu parque industrial. Isto propiciou, além do reaquecimento da economia,

desenvolvimento tecnológico e, posteriormente, diminuição da dependência externa.

Assistiu-se na segunda metade do século XX uma grande evolução nestas relações de

compensação. Passando desde contratos de trocas comerciais diretas, até aqueles que tratam de

inovações tecnológicas. Há ainda em curso uma mudança nas relações comerciais entre nações

onde se busca firmar, tanto nos contratos bilaterais, como nos organismos multilaterais globais,

regras que privilegiem e minimizem os hiatos de desenvolvimento industrial e tecnológicos.

Por tratar-se de relações econômicas entre entes estatais, estabelecimentos industriais

ou comerciais, instituições de amparo à pesquisa e outros parceiros diversos, os acordos de

compensação ou offset são um assunto multidisciplinar cuja evolução ocorre simultânea à veloz

marcha da transformação das relações comerciais e internacionais.

Aliando-se a isto o fato de serem tais acordos figura recente na história das na história

econômica do concerto das nações, justifica-se a ausência de vasta literatura consolidada a seu

respeito. Não obstante isso, há inúmeras iniciativas para sistematização de seu estudo, as quais

são referências bibliográficas desta pesquisa.

3.1 HISTÓRICO DO OFFSET NO MUNDO

Este histórico é baseado em (ANDRADE, 2011). A conferência de Brettom Woods, em

1944, nos Estados Unidos da América (EUA), ao final da II Grande Guerra Mundial,

envolvendo os principais países aliados, visava criar condições favoráveis ao crescimento das

economias europeias para que não se repetisse as condições comerciais desfavoráveis que

levaram a países como a Alemanha a armar tão potente máquina de guerra.

Algumas instituições internacionais surgiram nessa época, tais como: o Banco Mundial

(WORLD BANK), o Fundo Monetário Internacional (FMI), bem como o mecanismo do

OFFSET que significa compensação. Sua utilização objetivava viabilizar algumas aquisições

de fornecedores estrangeiros que deveriam ser compensadas por outros meios, em proveito de

setores definidos pelo país comprador.

O governo dos Estados Unidos da América criou o Commodity Credit Corporation Act,

em 1949, como um meio de apoiar à realização de countertrade. Na ocasião, foram trocados

produtos agrícolas por minerais estratégicos. Então, entre 1950 e 1973, os norte-americanos

trocaram cerca de US$ 6,65 bilhões de dólares em excedentes agrícolas por minerais

estratégicos necessários ao crescimento industrial norte-americano.

Nesses acordos do tipo offset direto havia pouca transferência de tecnologia e tratava da

fabricação de componentes metálicos e equipamentos mais simples.

A utilização do mecanismo do offset possibilitou aos EUA e aos países aliados a

ampliação das possibilidades de defesa, permitindo alavancar o potencial industrial de defesa

dos países aliados. Isso ocorreu pelo fato de as trocas comerciais acontecerem,

primordialmente, entre as mercadorias mais afetas à produção de cada país, sendo que, junto às

transações comerciais realizadas eram feitos acordos de transferência de tecnologia ou de outras

formas compensatórias de comércio.

Os EUA, na oportunidade, objetivavam, com a prática do offset, ampliar seu campo de

influência sobre os países do Leste Europeu e vislumbravam a possibilidade de fortalecer

alianças com os países ocidentais.

Durante a década de 1960, houve uma grande difusão da prática do offset, devido, entre

outras, às necessidades dos países compradores de formar uma base industrial de defesa, à

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importância da obtenção de tecnologias e de técnicas de gerenciamento modernas e,

principalmente, da estabilização das economias nacionais.

Nos anos 70 e 80, houve um grande aumento do número de acordos de offset, tanto na

área civil, como na área militar. Neste período, a indústria de defesa da Europa tornou-se forte

e tecnologicamente avançada, passando a oferecer offset aos países compradores, e, desta

forma, contribuindo ainda mais para a difusão desse mecanismo no comércio internacional.

Mecanismos de controle de expansão do offset tiveram que ser realizados visando a evitar

transferência indiscriminada de tecnologia. Neste sentido, insere-se o documento, denominado

Memorand of Understanding (MoU), elaborado pelo Departament of Defense (DoD) dos EUA

com os países da OTAN e outros países aliados, inclusive o Brasil.

Em complemento ao MoU, acordos de offset negociados no âmbito do programa Foreign

Military Sales (FMS) viabilizaram aos EUA oferecerem os produtos do DoD sem restrição de

mecanismos artificiais previstos pelo Defense Production Act 1950, que tinha o objetivo de

controlar os pedidos de exportação de materiais de defesa.

Os mecanismos de controle para redução da transferência indiscriminada de tecnologia

por intermédio de transações comerciais, ao longo dos anos 80 e 90, tiveram o objetivo de

resguardar o direito autoral de invenção de novas tecnologias, bem como estabelecer regras

específicas no contexto da Organização Mundial do Comércio (OMC).

A OMC tem, entre outros princípios, o Princípio da Concorrência Leal e o Princípio do

Tratamento Especial e Diferencial para os Países em Desenvolvimento.

Diante disso, em 1992, os EUA atualizaram a política de offset desencorajando empresas

norte-americanas a realizarem qualquer acordo de offset para empresas estrangeiras, o que

dificultaria o acesso à tecnologia de ponta dos produtos daquele país. Embora anterior à criação

da OMC, tal política já vislumbrava uma regulamentação na transferência de tecnologia por

intermédio do countertrade.

Ainda que tenham sido tomadas medidas visando regulamentar a prática do offset, a partir

da década de noventa do século passado, houve expansão da utilização desse mecanismo de

countertrade. Isso ocorreu, sobretudo, devido à realização de negociações de compensações

complexas, envolvendo offsets diretos e indiretos, em razão da redução do mercado de defesa,

o que gerou aumento da concorrência.

A redução do mercado de defesa está relacionada ao cenário político e militar decorrente

do final da Guerra Fria, em 1989. Atualmente, entretanto, a Guerra do Afeganistão e a Invasão

do Iraque são os conflitos armados considerados como os mais importantes no cenário do

mercado de defesa internacional.

Além desses conflitos, algumas guerras ocorrem na África e há uma reestruturação dos

organismos de defesa em alguns países da América Latina. Pode-se inferir que tais conflitos e

a reestruturação dos organismos de defesa da América Latina se constituem nos principais

mercados para uma provável utilização do mecanismo do offset.

3.2 NOMENCLATURA

Pode-se definir offset como toda e qualquer prática compensatória (ou compensação),

exigida por um comprador estrangeiro, como condição para a importação de bens e serviços,

com a intenção de gerar benefícios de natureza industrial, tecnológica e comercial, ou ainda,

refere-se ao conceito de que determinadas aquisições de fornecedores estrangeiros deverão ser

compensadas por diversos meios, em benefício de setores e áreas definidas pelo país

importador. (MODESTI, 2004, p.25).

Assim, o fator determinante da possibilidade da exigência de offset (compensação) é o

poder de compra do país importador. Nessa linha de raciocínio, quanto maior o valor total da

aquisição do sistema de defesa, e quanto maior o número de possíveis fornecedores

estrangeiros, maior o poder de exigir compensações que atendam ao interesse estratégico do

país importador.

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Ao se tratar desse assunto de compensação financeira – offset – que está em plena fase de

evolução e consolidação, apesar das divergências de aplicação de cláusulas comerciais, há uma

nomenclatura comum empregada nos contratos e acordos. A seguir, são apresentadas algumas

definições de termos, baseadas em (SILVA, 2001), aplicáveis à linguagem empregada na

bibliografia e em artigos científicos correntes.

ACORDO DE COMPENSAÇÃO é um instrumento que formaliza o compromisso de um

país fornecedor de bens ou serviços, em contrato de grande vulto, de compensar

financeiramente o país comprador, seja pela aquisição de outros bens daquele país, co-

produção, desenvolvimento de base industrial ou transferência de tecnologia.

COPRODUÇÃO - Refere-se à produção realizada no país comprador, baseada em um

acordo entre governos, que permita à empresa do país fornecedor garantir informações técnicas

para a produção, de todo ou em parte, de um produto desenvolvido no exterior.

CONTRAPARTIDA (“COUNTERTRADE”) - Refere-se aos acordos de comércio

compensatórios e recíprocos, envolvendo a compra de bens e serviços pelo vendedor ao

comprador dos seus produtos, como condição de exportação relativa à defesa.

CRÉDITOS DE “OFFSET” - Valor creditado ao fornecedor depois de serem aplicados os

fatores multiplicadores (quando for o caso) que deverá ser abatido da obrigação concordada no

acordo de compensação.

MEMORAND OF UNDERSTANDING” (MoU) - tradução do Inglês para Memorando

de Entendimento.

“OFFSET” - (COMPENSAÇÃO) - Refere-se a toda e qualquer prática compensatória

acordada entre as partes, como condição para importação de bens ou serviços, com a intenção

de gerar benefícios de natureza comercial, industrial e tecnológica.

“OFFSET” DIRETO - Refere-se a acordos de compensação que envolvem bens e

serviços diretamente relacionados com o objeto dos contratos de importação.

“OFFSET” INDIRETO - Refere-se a acordos de compensação que envolvem bens e

serviços não diretamente relacionados com o objeto dos contratos de importação.

PRODUÇÃO SOB SUBCONTRATO - Refere-se à produção, no país comprador, de

parte de um componente originado de um país fornecedor. O subcontrato não envolve,

necessariamente, a licença de informações técnicas e, usualmente, é um acordo comercial direto

entre o fornecedor e o fabricante no país comprador.

TRANSAÇÃO DE “OFFSET” - Refere-se a cada transação executada, dentro dos tipos

de compensação definidos, podendo ser atividade isolada ou um “milestone” de um Acordo de

Compensação.

TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA - Refere-se àquela que ocorre como o resultado

de um acordo de compensação e que pode ser na forma de: pesquisa e desenvolvimento,

assistência técnica, treinamento, ou outras atividades, fruto de acordos comerciais diretos com

os fornecedores estrangeiros, que represente um aumento qualitativo do nível tecnológico do

fabricante nacional.

4. EVOLUÇÃO DA POLÍTICA BRASILEIRA DE APLICAÇÃO DE OFFSET

4.1 HISTÓRICO DA APLICAÇÃO DE OFFSET NO BRASIL

O primeiro acordo compensação – offset - feitos pelo Brasil remonta à década de 1950,

pela Força Aérea Brasileira. A Grã-Bretanha firmou acordo com o Brasil, a troca de algodão

por caças Gloster Meteor.

Nos anos 70, a FAB realizou offset na compra de aeronaves F-5E, por meio da

transferência de tecnologia para a produção e montagem de estabilizadores verticais e de

pilones pela EMBRAER.

A Embraer acabou aprendendo a trabalhar com novos processos industriais como

usinagem com maquinário computadorizado e estruturas tipo “colmeia”. No final, a Embraer

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produziu sucessivos lotes de derivas verticais e cabides para armamentos de caças da família

F-5.

O offset está diretamente relacionado com a produção de artigos onde há um elevado

índice de tecnologia incorporada. No fim dos anos 90, o governo brasileiro conseguiu a

transferência da tecnologia completa de produção de vacinas humanas de última geração em

troca da garantia de compra das necessidades nacionais naquelas vacinas por um período de

cinco anos, ao longo dos quais se estaria efetivando a transferência do conhecimento e se

iniciando a produção nacional.

Desta forma, pode-se comprovar que a ferramenta do offset é um importante mecanismo

de desenvolvimento da indústria nacional, uma vez que os conhecimentos adquiridos por

intermédio daquela transação comercial contribuem para alavancar, inicialmente, a empresa

diretamente envolvida na negociação, na sequência, outros setores da economia e componentes

da cadeia logística de suprimentos, são, também, afetados pelo ciclo de desenvolvimento

iniciado com a assinatura do contrato de offset.

4.2 LEGISLAÇÃO

A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, prevê que o Estado promoverá

e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas. De certa

forma, está implícitos o estímulo à realização de offset e a utilização de outros mecanismos de

obtenção ou transferência de tecnologia.

Há dispositivos legais no arcabouço jurídico brasileiro que estimulam a busca por

evolução tecnológica, sendo que o offset é um mecanismo que vem ao encontro das

necessidades do país, uma vez que permite a aquisição de artigos de alta tecnologia com a

transferência do conhecimento de produção, fato que favorece o desenvolvimento da indústria

nacional, gerando produção, riqueza e distribuição de renda.

A Política de Defesa Nacional (PDN), de 1996, é um documento que dá orientação

estratégica ao esforço da pesquisa científica, do desenvolvimento tecnológico e da capacidade

de produção, de modo a minimizar a dependência externa do País no que se refere aos recursos

de natureza estratégica de interesse para a sua defesa.

São objetivos da PDN: entre outros, a promoção do crescimento dos níveis tecnológico e

qualitativo das indústrias de defesa, com a modernização dos métodos e processos de produção

e aquisição de novas tecnologias, visando ao estado da arte; o fomento e fortalecimento dos

setores de interesse do Ministério da Defesa, criando condições para o aperfeiçoamento das

indústrias de defesa e da sua base tecnológica, visando a aumentar suas cargas de trabalho e

também a permitir a competitividade no mercado internacional; a ampliação do mercado de

trabalho, mediante a criação de novas oportunidades de emprego de alto nível tecnológico,

através da especialização e do aperfeiçoamento dos recursos humanos dos setores de interesse;

a obtenção de recursos externos, de toda ordem, diretos e indiretos, para elevar a capacitação

industrial e tecnológica dos setores de interesse da área de defesa; e o incremento da

nacionalização e a progressiva independência do mercado externo, no que diz respeito a

produtos de defesa.

A Estratégia Nacional de Defesa (END) está prevista no Decreto nº. 6703, de 18 de

dezembro de 2008. Em consequência, a política do Ministério da Defesa no assunto estabelece

uma série de medidas que favoreceriam à indústria nacional de defesa, sendo que, entre essas

medidas, está a utilização do mecanismo do offset.

Portanto, pode-se inferir que o mecanismo do offset é previsto na legislação brasileira,

bem como que o poder de compra das Forças Armadas deve ser utilizado como argumento de

negociação. A possibilidade de transferência de tecnologia, geração de empregos e renda e

desenvolvimento da indústria nacional de defesa são outros fatores que devem ser considerados

quando da realização das aquisições por intermédio de offset.

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Em 2012, o Brasil deu um passo importante para consolidar um dos eixos fundamentais

de sua Estratégia Nacional de Defesa (END). Trata-se da Lei nº 12.598, que estabelece

mecanismos de fomento à defesa.que é um desdobramento do Plano Brasil Maior, criado para

aumentar a competitividade da indústria nacional, a partir do incentivo à inovação tecnológica.

A Lei nº 12.598/2012 é um marco no modo como o país trata o papel da indústria de

defesa , pois institui um regime especial de tributação para a indústria de defesa (RETID),

desonerando empresas de encargos diversos, a norma diminui o custo de produção de

companhias legalmente classificadas como estratégicas e estabelece incentivos ao

desenvolvimento de tecnologias indispensáveis ao Brasil.

4.3 A APLICAÇÃO DO OFFSET NA FORÇA AÉREA BRASILEIRA

A narrativa do histórico das práticas de offset no Brasil apresentadas na Seção 3

permitem-nos dizer que a Força Aérea Brasileira (FAB) tem vasta experiência no trato com

acordos de compensação negociados por ocasião da compra de frotas de aeronaves e

contratação de serviços e sistemas que mobíliam seus meios operacionais.

(AFFONSO, 2012) é a principal referência para uma comparação entre as práticas de

offset da FAB e as diretrizes emanada pela Estratégia Nacional de Defesa (END, 2008).

Aquele autor procurou identificar o grau de compatibilidade entre a Política de offset

praticada pela Aeronáutica e os objetivos estabelecidos na Estratégia Nacional de Defesa

(END), tendo por embasamento teórico de pesquisa documental, as normas internas da

Aeronáutica e as modificações em textos legais decorrentes da implantação da EM

Da análise de (AFFONSO, 2012), (IVO, 2004) e (SILVA, 2001), conclui-se que as

práticas de offset estão presentes nos grandes projetos da Força Aérea Brasileira, sejam de

aquisição ou de desenvolvimento de material de emprego militar.

(AFFONSO, 2012) pesquisou nove acordos de compensação, assinados no período de

2000 a 2010, contabilizando um total de 257 (duzentos e cinquenta e sete) projetos de

compensação. As informações foram acessadas por meio dos processos administrativos de

gestão, tanto das organizações contratantes, como do Instituto de Fomento e Coordenação

Industrial (IFI).

Todos os acordos foram negociados e executados, sob a ótica do Ciclo de Vida praticada

pela Aeronáutica, conforme a Política de Offset da Aeronáutica, e ainda atendendo sempre a

todas as disposições legais da Lei 8.666/93 (BRASIL,1993).

No período analisado, todos os grandes processos de aquisição da Força Aérea Brasileira

exigiram contrapartida comercial.

A Força Aérea possui estrutura orgânica que tem por finalidade melhor negociar, aprovar

e gerir os acordos de compensação. Há uma sequência de ações institucionais que visam obter

um resultado mais eficaz.

Essa sequência está consubstanciada na Diretriz do Comando da Aeronáutica - Ciclo de

Vida de Sistemas e Materiais da Aeronáutica – DCA 400-6 (BRASIL, 2007k). No modelo de

ciclo de vida adotado pela Força Aérea, são observadas as seguintes fases: Concepção;

Viabilidade; Definição; Desenvolvimento ou Aquisição; Produção; Implantação; Utilização;

Revitalização/Modernização; e Desativação.

Ao se detectar uma necessidade operacional, em qualquer nível organizacional da Força

Aérea, deve o Estado-Maior da Aeronáutica (EMAER) como o coordenador-geral do Ciclo de

Vida, definir os requisitos operacionais (Fase de Concepção) e determinar que seja feita uma

análise da viabilidade do projeto, quando serão analisadas as alternativas possíveis (a aquisição

no mercado interno ou externo, o desenvolvimento completo do sistema, a modernização de

sistema já existente, avaliados os riscos (tecnologias existentes, realidades orçamentárias,

capacidades, suporte logístico e outros), os prazos (urgência operacional versus prazos de

desenvolvimento/aquisição/modernização) e a relação custo-benefício, definindo-se ainda a

estratégia de realização das atividades que compõem o Ciclo de Vida.

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De posse da estratégia de realização das atividades é feito, nesta fase, um estudo detalhado

do Sistema necessário, incluindo estudos de engenharia, de modelagem e simulação, dos

objetivos de nacionalização, do plano de suporte logístico e dos planos preliminares de

desenvolvimento e de capacitação industrial. É nessa fase (Definição) que o Estado-Maior da

Aeronáutica (EMAER) ao se decidir pela melhor opção (aquisição, modernização,

desenvolvimento), determina que sejam exigidas ou não compensações comerciais, industriais

e tecnologias (offset), estabelecendo ainda as linhas gerais a serem seguidas pela Organização

contratante da Força Aérea.

A Força Aérea tem o Instituto de Fomento e Coordenação Industrial (IFI) como

organização militar responsável por valorar ou dar uma diretriz para adoção de fatores de

compensação nos acordos de offset. Normalmente, tais fatores foram decididos ou alterados,

caso a caso, nas negociações iniciais de offset, porém seguindo o assessoramento e as diretrizes

do IFI.

Da análise da pesquisa documental de referência de (AFFONSO, 2012), (IVO, 2004) e

(SILVA, 2001), estima-se que a Força Aérea Brasileira somando os recursos humanos do IFI,

do Estado-Maior da Aeronáutica (EMAER), da Coordenação do Projeto da Aeronave de

Combate (COPAC) e de seus Grupos de Assessoramento à Coordenação (GAC), possuiu, nos

últimos 22 (vinte e dois anos) em média, cerca de 77 (setenta e sete) militares e servidores

dedicados, em caráter permanente, prioritariamente ao trabalho de viabilizar, fiscalizar e

executar os acordos de compensação.

Sendo, em média, 47 (quarenta e sete) dedicados às atividades técnicas do contrato e 30

(trinta) às atividades administrativas. Perfazendo um total 1.074 (um mil e setenta e quatro)

homens-ano de trabalho técnico e 660 (seiscentos e sessenta) homens–ano de trabalho

administrativo. Considerando um homem-ano uma unidade de medida que representa o

trabalho principal de um militar ou servidor durante um ano de serviço, dedicado

prioritariamente à administração ou execução técnica do acordo de compensação.

Da soma dos valores contratuais obtém-se um total de USD 2.613.200.000 (dois bilhões

e seiscentos e treze milhões e duzentos mil dólares norte-americanos), dos quais se exigiu 100%

de compensação no acordo de contrapartida, sendo que 86,83% estavam relacionados à

transferência de tecnologia.

Esses montantes representam 69,14% do total de investimentos da Força Aérea em

atividades operativas, durante o período em análise, que foi de USD 3.779.578.000 (três bilhões

e setecentos e setenta e nove milhões e quinhentos e setenta e oito mil dólares norte-

americanos). Um imperativo prático é determinante na FAB: toda contratação acima de USD

5.000.000 obrigatoriamente requer acordo de compensação.

Da análise da literatura, depreende-se que a Força Aérea Brasileira tem sido

ortodoxamente fiel à sua política de apoio ao desenvolvimento nacional e coloca o offset, como

ferramenta complementar, para garantir ao parque industrial aeroespacial brasileiro o acesso à

capacitação tecnológica e industrial e principalmente às inovações tecnológicas que garantam

a desejada autonomia nacional no setor aeroespacial e o consequente pleno cumprimento das

suas atribuições constitucionais. Na literatura estudada, há um grande número de casos bem-

sucedidos de transferência de tecnologia advindas dos processos de offset.

À base industrial de dessa (BID) aeroespacial tem crescido e se aperfeiçoado

continuamente e rapidamente. Enumeram-se facilmente tecnologias agregadas que a

capacitaram em diversas áreas, tais como, satélites de comunicação, sensoriamento remoto,

mísseis, imagens térmicas, aerodinâmica, fabricação de componentes, sistemas entre outros

tantos.

Do exposto, pode-se sintetizar essa análise no Quadro 4.2 abaixo:

Quadro 4.2 PRÁTICA DE OFFSET NA FORÇA AÉREA APÓS 1990

Variável parâmetro análise

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10

Práticas de offset na FAB Presente nos maiores

projetos da FAB

-

Montante dos contratos USD 2.613.200.000 Processos de aquisição da

FAB DCA 400-6 Segue-se o rito institucional

Processos de controle de

offset

IFI, COPAC e seus GAC,

EMAER, Fiscal do Contrato

-

Montante de valores

contratuais

Totalizam 69.14% dos

investimentos da FAB no

período

Para todos os processo acima

de USD 5.000.000 houve

offset Fatores de compensação Diretrizes emanadas pelo IFI -

Eficácia dos benefícios do

offset

Beneficiários são

normalmente empresas da

BID aeroespacial

Capacitação tecnológica do

parque industrial, visando a

não-dependência externa

Diminuição dependência

tecnológica

Há uma progressiva

conquista da independência

tecnológica

-

Inovações tecnológicas

A carga, Às vezes baixa,

porém constante, permite

melhoria dos processos e

surgimento de inovações

-

Revitalização da indústria

de defesa

frequente revitalização das

empresas da BID

aeroespacial

Pequeno impacto na carga da

BID terrestre

Grau de conhecimento de

oficiais e engenheiros

660 homens-anos

experiência administrativa

1074 homens-anos;

experiência técnica

Cultura organizacional

apropriada para a consecução

das tarefas

Eficiência de transferência

de tecnologia

Obtenção de capacidades

tecnológicas segundo um

planejamento estratégico

Foco na transferência de

tecnologia

Fonte: OLIVEIRA, 2012

4.4 PRATICA DE OFFSET NO EXERCITO BRASILEIRO

Ampla narração e análise crítica dos processos de compensação da Força terrestre podem

ser encontradas nos registros de (ANDRADE, 2012), (RODRIGUES, 2003) e (SILVA, 2001)

sem, contudo, esgotar todos os dados sobre o assunto. Sendo (ANDRADE, 2011a) é a principal

referência para uma comparação entre as práticas de offset do Exército Brasileiro e as diretrizes

emanada pela Estratégia Nacional de Defesa (END, 2008).

Aquele autor procurou identificar o grau de compatibilidade entre a Política de offset

praticada pelo EB e os objetivos estabelecidos na Estratégia Nacional de Defesa (END), tendo

por embasamento teórico de pesquisa documental nos contratos de aquisição de helicópteros

do EB e seus respectivos acordos de compensação e o texto da END.

(ANDRADE, 2011a) confrontou os resultados práticos obtidos pelo EB e os resultados

almejados pela END e permitiu demonstrar algum atendimento, pela política de offset do EB,

aos objetivos preconizados pela Estratégia Nacional de Defesa, contribuindo, assim, para o

projeto de desenvolvimento de Defesa.

Algumas informações importantes conduziram esta pesquisa no sentido de realizar uma

análise crítica dos resultados apresentados por (RODRIGUES, 2003) e (ANDRADE, 2011a),

quais sejam: que a realização de aquisições com consignação de cláusulas contratuais de

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11

compensações comerciais (offset), resultou em importantes benefícios para o Exército

Brasileiro, para a Indústria Nacional, sobretudo a de Defesa, bem como para o País.

Inicialmente, a experiência profissional desse pesquisador por longos anos de trabalho

junto ao CTA/IFI e à Diretoria de Material de Aviação do Exército (DMAvEx), permitiu a

observação de maneiras distintas de condução da prática de offset no Exército Brasileiro

daquelas da Força Aérea Brasileira.

Isto permitiu a formulação da hipótese em estudo que visa verificar se a Força Aérea

Brasileira possui práticas significativamente mais eficazes que as do Exército Brasileiro

propiciando maior: revitalização do seu parque industrial de interesse, capacidade de absorção

de tecnologia estrangeira, possibilidade de surgimento de projetos de inovação, abrangência do

montante dos contratos da Força, conhecimento técnico difundido em seus oficiais,

organizações militares mais bem preparadas e regulamentação mais clara, difundida e praticada.

Além do mais, a análise de práticas e regulamentações de compensação de outras

instituições nacionais ou internacionais pode permitir o aperfeiçoamento das práticas de offset

no EB.

Para esta análise crítica, além do estudo das práticas de offset na FAB discutido no

Capítulo 4, uma revisão nos trabalhos de (RODRIGUES, 2003) e (ANDRADE, 2011a) foi

conduzida. Especialmente, uma nova abordagem sobre os resultados das pesquisas de campo

procedidas por aqueles autores permite uma interpretação diferente dos resultados.

OLIVEIRA, 2012 concluiu que as práticas de offset estão ausentes dos grandes projetos

da Força Terrestre, sejam de aquisição ou de desenvolvimento de material de emprego militar.

Apenas os seguintes projetos, todos relacionados à Aviação do Exército, foram

contemplados com acordo de compensação, tendo sido incluídos nas negociações comerciais:

a) aquisição da frota de 36 (trinta e seis) aeronaves SA 365 K –Pantera e 16 (dezesseis)

aeronaves AS 350 B – Esquilo, em 1988;

b) aquisição de 20 (vinte) aeronaves AS 550 L1 – Fennec, como aditivo ao contrato de

aquisição das aeronaves Pantera e Esquilo, em 1993;

c) aquisição de 04 (quatro) aeronaves S-60B Black-Hawk, utilizando o sistema de

Foreign Military Sales (FMS) junto ao governo dos Estados Unidos da América;

d) aquisição de 08 (oito) aeronaves AS 532 A2 – Cougar ,em 1998; e

e) aquisição de 16 (dezesseis) aeronaves EC-725 “Caracal” em contrato capitaneado pelo

Ministério da Defesa.

Para cada um desses processo de aquisição houve um contrato separado para a aquisição

e manutenção do grupo-motor.

Por tratarem de formas peculiares de negociação, a aquisição da frota “Black-Hawk”,

adquirida por FMS, e a frota “Caracal”, adquirida diretamente pelo Ministério da Defesa, serão

analisadas no Capítulo 7 – Prática de Offset em Outras Instituições.

Portanto, os únicos grandes processos de aquisição da Força Terrestre que exigiram

contrapartida comercial no período estudado foram a aquisição da frota Pantera e Esquilo, em

1988, sua posterior aditiva cão com aquisição da frota Fennec, 1993, e a aquisição da frota

Cougar, 1998.

Esses processos tiveram uma ampla negociação comercial, envolvendo diversas

autoridades militares do EB, assessoramento da FAB, participação do Ministério da Indústria e

Comércio (MDIC), Ministério das Relações Exteriores (MRE), entre outros.

Naquela ocasião, o Exército Brasileiro não dispunha de instrumentos próprios para

administração e execução das negociações, tais como estrutura de pessoal especializado,

histórico de processos de aquisição e pessoal dedicado ao trabalho.

Mesmo que as Instruções Gerais para o Modelo Administrativo do Ciclo de Vida dos

materiais de Emprego Militar (IG 20-12) dispuserem sobre algumas etapas do processo

decisório para aquisição e desenvolvimento de material de emprego militar, a sistemática

proposta por aquelas IG mostrou-se pouco eficiente perante a rápida dinâmica do mercado que

apresenta um ciclo decisório bem mais curto e rápido.

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12

Assim, o EB, diferentemente da FAB, não dispunha e ainda não dispõe de estrutura de

apoio para o planejamento e execução das tarefas de fiscalização da internalização de novas

práticas e tecnologia advindas dos acordos de compensação.

Por exemplo, o EB não tem um órgão responsável por valorar ou dar uma diretriz para

adoção de fatores de compensação. Normalmente, tais fatores foram decididos ou alterados em

reuniões de compensação pelo fiscal administrativo do contrato ou pela autoridade contratante

que muitas vezes não dispunha de assessoria técnica especializada para efetuar esta muito

importante valoração;

Da análise da pesquisa de campo e da documentação de referência de (RODRIGUES,

2003), especialmente das Atas de Reunião de Compensação, percebe-se que ao longo do

período de mais de 22 (vinte e dois) anos de vigência dos acordos de compensação que o número

de pessoas dedicadas a esse trabalho não ultrapassou 15 (quinze), incluindo aí as autoridades

responsáveis pela contratação e os fiscais de contrato.

A prática usual da Diretoria de Material de Aviação do Exército (DMAvEx) é dedicar um

militar por acordo de compensação – o fiscal do contrato. Considerando a rotatividade de

pessoal e o início não sincronizado dos acordos, pode-se estimar a partir das Atas de

Compensação que o Exército gastou cerca de 78 (setenta e oito) homens-ano de trabalho. Sendo

39 (trinta e nove) homens-ano de experiência administrativa e 39 (trinta e nove) de experiência

técnica. Considerando um homem-ano uma unidade de medida que representa o trabalho

principal de um militar ou servidor durante um ano de serviço, dedicado prioritariamente à

administração ou execução técnica do acordo de compensação.

Da soma dos valores contratuais obtém-se um total de USD 622.000.000 (seiscentos e

vinte e dois milhões de dólares norte-americanos), dos quais se exigiu 100% de compensação

no acordo de contrapartida.

Esses montantes representam 11,86% do total de investimentos da Força durante o

período em análise que foi de USD 5.244.520.000 (cinco bilhões e duzentos e quarenta e quatro

milhões e quinhentos e vinte mil dólares norte-americanos).

Da tabela contida em (RODRIGUES, 2004), p. 49, percebe-se que mais de 55% dos

créditos de compensação tiveram como beneficiária empresa pertencentes a grupo

estrangeiros. Certamente há benefícios para a Força Terrestre e para a aviação civil brasileira

da implantação de melhorias técnicas naquelas empresas. Porém deve-se ressaltar que tais

benefícios estão longe de alcançar os objetivos propostos pela END de busca da independência

tecnológica e incentivo à inovação na base industrial de defesa.

Os créditos incorporados à base industrial envolveram normalmente empresas de aviação,

apesar do benefício dual, não houve incremento significativo em empresas da BID terrestre e

está permanece muito carente em investimentos que atualizem seus know-how ou que

alavanquem seu sistema de ciência e tecnologia rumo à inovação, como preconiza a Estratégia

Nacional de Defesa.

Do exposto, pode-se sintetizar essa análise no Quadro 5.1 abaixo:

Quadro 5.1 PRÁTICA DE OFFSET NO EXÉRCITO BRASILEIRO APÓS 1990

Variável parâmetro análise

Práticas de offset no EB Presente nos maiores

projetos do EB

Ausente dos maiores projetos,

exceção AvEx.

Montante dos contratos USD 622.000.000

Processos de aquisiçãodo

EB

IG 20-12 não foi seguido em “strictus-

sensu” Processos de controle de

offset Fiscal do Contrato Fiscal do Acordo

Montante de valores

contratuais

Totalizam 11.86% dos

investimentos do EB no

período

Para a maioria dos processos

de grandes compras não houve

acordo de contrapartida.

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Fatores de compensação

Definido a cada negociação

contratual diretamente pela

autoridade contratante.

Não há sistemática definida.

Eficácia dos benefícios do

offset

Beneficiários normalmente

empresas vinculadas a

empresas estrangeiras e

ligadas à aviação

BID Terrestre incipiente

Diminuição dependência

tecnológica

Nos atuais processos de

aquisição há forte

dependência tecnológica

Não houve diminuição da

dependência tecnológica

Inovações tecnológicas

Pouca demanda no setor

gerou pouca melhoria dos

processos e poucas

inovações

Há grande carência de

inovações nacionais no setor

Revitalização da indústria

de defesa

Casos esporádicos,

revitalizando empresas de

origem estrangeira

Pequeno impacto na carga da

BID terrestre

Grau de conhecimento de

oficiais e engenheiros

30 homens*anos experiência

administrativa

30 homens*anos;

experiência técnica

Cultura organizacional baixa

para aconsecução das tarefas

Eficiência de transferência

de tecnologia

Maioria dos processos de

offset focam em melhoria de

processos industriais

Foco em melhoria de

processos

4.5 A PRÁTICA DO OFFSET EM OUTRAS INSTITUIÇÕES NACIONAIS

4.5.1 O Ministério da Defesa

O Ministério da Defesa por intermédio da Portaria nº 764 MD, de 27 de dezembro de

2002, aprovou sua Política e as Diretrizes de Compensação Comercial, Industrial e

Tecnológica. Porém, esta importante regulamentação não teve impactos práticos de imediato,

devido à baixa carga de demanda por grandes projetos das Forças Armadas.

Posteriormente, a Lei nº 12349, de 15 dezembro de 2010, alterou as Leis nos 8.666, de

21 de junho de 1993, 8.958, de 20 de dezembro de 1994, e 10.973, de 2 de dezembro de 2004

e revogou o § 1º do art. 2º da Lei no 11.273, de 6 de fevereiro de 2006 e tornou-se um importante

marco legal para a compensação ao inserir e privilegiar o conceito de negociação mais vantajosa

para o governo federal nas aquisições públicas de bens para a administração pública.

Em decorrência de acordo bilateral assinado em 2005 entre a República Federativa do

Brasil e a República Francesa, por decisão governamental, a nação brasileira decidiu pela

aquisição de helicópteros utilitários de médio porte EC-725, no programa chamado H-XBr.

A aquisição de frota de 50 (cinquenta) aeronaves para mobiliar as três Forças, sendo 16

(dezesseis) para cada uma e 02(dois) para a Presidência da República, exigiu da empresa

contratante a contrapartida da assinatura de um acordo de compensação comercial – offset-

referente ao valor de 100%. Estes dois contratos de aquisição de bens e de compensação

passaram para a gestão do Ministério da Defesa.

O órgão com melhor estrutura e maior experiência administrativa e técnica para a gestão

desse contrato nas forças era a Coordenação do Programa da Aeronave de Combate (COPAC).

Então, o MD. nomeou uma comissão mista de militares das três forças para, junto à COPAC,

fazer o acompanhamento do recebimento e entrada em operação dessa nova frota de aeronaves.

Dois contratos de offset – um referente à aquisição das aeronaves e outro referentes ao

grupo turbo-motor - foram assinados em decorrência da Portaria Ministerial nº 1068, de 21 de

julho de 2008, que, entre outras considerações, prevê a transferência de tecnologia na aquisição

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de helicópteros de porte médio, da seguinte forma: “Art. 1º Constituir, no âmbito do Ministério

da Defesa e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, um Grupo de

Trabalho para realizar estudos e identificar ou propor medidas de fomento para a ampliação da

capacidade da indústria nacional e para garantir a sua autonomia no fornecimento de produtos

às Forças Armadas, especialmente em relação às necessidades decorrentes da operação de

helicópteros de médio porte”. (BRASIL, 2008, p. 01)

Mais adiante, no Art. 2º, § 3º, o mesmo documento faz as seguintes considerações: §3º Os

estudos e a formulação de propostas referentes à transferência tecnológica e ampliação da

capacidade industrial bem como aos aspectos econômico-financeiros da iniciativa serão de

atribuição dos representantes do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio

Exterior. (BRASIL, 2008), p. 02).

4.5.2 Ministério das Relações Exteriores

O Ministério da Indústria e Comércio, no que tange aos acordos de compensação,

ampara-se em negociações conduzidas pelo Ministério das Relações Exteriores. O MRE, a seu

cargo define como princípios de cooperação técnica, que a política externa brasileira para os

países em desenvolvimento caracteriza-se por um compromisso de longo prazo.

Uma das formas que esse compromisso melhor se expressa é por meio da cooperação

técnica a cargo da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), que, em sua essência, visa semear

capacidade para o desenvolvimento autônomo.

A cooperação técnica caracteriza-se pela transferência de conhecimentos, pela ênfase

na capacitação de recursos humanos, pelo emprego de mão-de-obra local e pela concepção de

projetos que reconheçam as peculiaridades de cada país.

Essa política de cooperação técnica favorece o estabelecimento de acordos de

compensação comercial – offsets.

4.5.3 EMBRAER

(RZEZINSKI e SERRADOR, 2004) apresentam a experiência industrial brasileira de

receber e oferecer offset praticada pela Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer). A

Embraer tem experiência com o tema offset, tanto como beneficiária de esquemas de

compensação comercial, indústria e tecnológica negociados pelo governo brasileiro, como

empresa exportadora, à qual governos de outros países demandam compensações quando das

negociações para a venda de seus produtos.

Os autores discorrem sobre o posicionamento do Brasil no panorama mundial da prática

de offsets, apresentam a Embraer como receptora de offsets e a Embraer como ofertante de

offsets, O artigo conclui que, embora não haja dúvidas de que offsets podem ser um instrumento

relevante de política industrial e tecnológica na área de defesa, a experiência da Embraer sugere

algumas qualificações à tentação de considerar este instrumento como uma confusão.

Na condição de ofertante de offset a Embraer percebe os problemas da demanda

generalizada de compensações podem causar para a sua competitividade. Como esta é uma

regra do jogo, aquela empresa busca capacitar=se para atender a demanda, sem que isso onere

os custos de suas operações comerciais. Isso exige esforço de estruturação interna da empresa.

Na condição de beneficiária de offsets, a empresa tem interesse que o governo brasileiro

desenvolva instrumentos e mecanismos regulatórios que lhe permite, e seus fornecedores

operando no Brasil, desenvolver capacitação industrial e tecnológica.

5 A PRÁTICA DE OFFSET EM INSTITUIÇÕES ESTRANGEIRAS E AS

POSSIBILIDADE NA ÁFRICA

5.1 A PRÁTICA DO OFFSET EM INSTITUIÇÕES ESTRANGEIRAS

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15

(SHANSON, 2004), um dos mais importantes autores internacionais do assunto offset,

editor da publicação Countertrade & Offset (CTO), argumenta sobre as ações corretivas

necessárias para não cair na armadilha de uma aquisição inapropriada de material com

tecnologia obsoleta por intermédio do correto uso dos mecanismos de offset: treinar recursos

humanos para se tornarem força de trabalho qualificado, proporcionar a substituição da

importação em atividades comerciais não ligadas à defesa, fornece atividades de emprego em

áreas carentes. Tudo isso propicia ganho real em mais valia agregando valor aos produtos e

serviços produzidos.

(VERZARIU, 2004), então Diretor da Divisão de Serviços Financeiros e Contrapartida

da Administração de Comércio Internacional do Departamento Norte-Americano de Comércio,

apresenta as práticas e a visão norte-americana a respeito da compensação comercial – offset,

mostra um cenário prospectivo, tendências e perspectivas, financiamento da exportação de

defesa, diretrizes e respostas da política norte-americana e criação de valor em offset indiretos.

Aquele autor aponta cenário prospectivo em que os offsets relativos a armas

aeroespaciais continuarão a ser os responsáveis pela maioria das práticas de offset; permanecerá

em queda as exportações militares internacionais e em crescimento a exigência de

contrapartidas; diminuição progressivas dos valores multiplicadores de offset e aumento das

penalidades de não-cumprimento; aumento dos offset indiretos em relação aos diretos; maior

competição entre empresas norte-americana e europeias; crescimento vertiginoso de offset em

mercados emergentes; dificuldade de viabilização de offsets indiretos; crescimento da

importância relativa do acordo de offset como critério de seleção de grandes contratos de

aquisição e materiais militares.

(SALZMANN, 2004), Export Director da Associação dos Fabricantes de Defesa da

Grã-Bretanha (DMA), apresenta a importância e as possibilidades de parceria por offset e

contrapartida com a Grã-Bretanha, contrapõe as possibilidades de offset indireto com as de

coprodução, questiona sobre os benefícios e possíveis malefícios das contrapartidas comerciais,

os impactos na mão-de-obra produtiva gerados pelos offsets, fontes de ajuda e conselho, cenário

prospectivo.

SALZMANN conclui sobre o atual momento oportuno para se obterem benefícios

mútuos de forma coordenada e construtiva pelos acordos de compensação. Com o crescimento

da prática de offset no mundo, em volume e complexidade, existe uma necessidade crescente

de criação de redes por toda a cadeia de suprimento e a participação em novos mercados pode

ser ampliada ou retraída conforme a política de offset adotada.

(HADJIMINAS, 2004), especialista da European Finance Associates (EFA), fax uma

análise crítica da viabilidade e necessidade da prática de offset. Contraponto tendências

divergentes sobre a interpretação da atual legislação norte-americana mais restritiva aos

mecanismos de offset e algumas práticas ineficientes em uso com os casos de sucesso e a

crescente adoção do mecanismo no cenário internacional. O autor conclui que os offsets não

podem ser medidos e, portanto, nem avaliados em termos econômicos estritos, diretos, pois

seus benefícios são muitas vezes invisíveis e não mensuráveis.

(van DICK, 2004), General Manager of Countertrade Development da Denel, maior

empresa de defesa da África do Sul, apresenta o stor de defesa da África do Sul, Corporação de

Armamentos da África do Sul (Armscar), Programa Nacional de Participação Industrial (NIP):

seus atores, a política, o processo, acordos proativos estratégicos, a definição da demanda, o

RFI e a contratação e uma série de estudos de caso de aplicação do programa.

Aquele autor conclui que uma contrapartida, em quaisquer de suas modalidades,

utilizada de forma planejada e estruturada pode gerar benefícios mútuos pretendidos; uma boa

estratégia de offset requer um base industrial forte, processos econômicos e fiscais sadios, boa

política de comércio exterior, boa infraestrutura. Poucas vezes a prática de contrapartida

apresenta soluções práticas e rápidas. Os resultados dependem do ambiente de cada país e as

soluções não são aplicáveis equitativamente em regiões geográficas distintas.

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(FELIZARDO, 2004), presidente da Think tank Inteli, apresenta a atividade de Portugal

na área de offsets, a cooperação com os Estados Unidos e Europa, a Lei de programação Militar

Portuguesa e conclui sobre uma abordagem possível aos offsets e a oportunidade para Portugal.

Para Felizardo, o processo bem adotado de offset pode ter seu papel facilitado se a

indústria local se organiza no sentido de desenvolver iniciativas que possam ir ao encontro das

suas principais prioridades de curto, médio e longo prazo. Quanto ao acesso a novos mercados,

à transferência de tecnologia e ao acesso a capital, uma vez conjugados, conduzem à geração

de um efetivo valor acrescentado para a indústria local.

Na sequência, apresentam-se algumas características típica do Programa FMS. O

programa Foreign Military Sales (FMS) do Departamento de Defesa do governo norte-

americano facilita a venda de armamentos, equipamentos e serviços de defesa e treinamento

militar para governos estrangeiros. Nele, o comprador não negocia diretamente com a indústria

de defesa, mas a Defense Security Cooperation Agency (DSCA) que serve como intermediária

e normalmente manuseia os serviços burocráticos, legais, logísticos e de transporte. Por vezes,

a DSCA provê suporte logístico, treinamento e construção de infraestrutura. A DSCA negocia

equipamentos por FMS somente com autorização do governo norte-americano. O FMS é

fundamentado na autorização restrita de participação de países e é regulado por um fundo

monetário específico.

Finalizando, apresentam-se alguns dados referentes à Organização Mundial do

Comércio (OMC). Segundo (MDIC, 2012), para a vigilância do cumprimento das normas

contidas nos vários acordos que regem o sistema multilateral de comércio, a OMC conta com

um poderoso instrumento que é o Entendimento para Solução de Controvérsias e o Brasil

mesmo já obteve várias vitórias como no caso do painel da gasolina, contra os Estados Unidos.

Para atingir seus objetivos, os entes governamentais da OMC devem destinar recursos

públicos para a aquisição de bens, serviços e obras – são as chamadas compras governamentais,

ou compras públicas, que no Brasil são regulamentadas pela Lei no. 8.666, de 1993 (Lei de

Licitações).

No plano internacional, o Acordo sobre Compras Governamentais (GPA, na sigla em

inglês), acordo plurilateral mantido pela Organização Mundial do Comércio (OMC), estabelece

para os países signatários uma série de compromissos em matéria de transparência e acesso aos

mercados nacionais de compras públicas.

Justamente a OMC impõe diversas barreiras sobre a prática de offset pois este, em

muitas situações, pode ser considerado um mecanismo protecionista que se contrapõe ao livre-

comércio e acesso a mercados.

5.2 POSSIBILIDADES DO OFFSET EM AFRICA

Anteriormente neste texto já foram estabelecidas as condições para as boas práticas de

compensação financeira (offset) em grandes contratações internacionais.

O paradigma da transferência de tecnologia não é fácil de ser quebrado, há muito casos

históricos mal sucedidos, pois para uma justa e eficiente internalização da tecnologia adquirida

há necessidade de preparação estrutural: os recursos humanos devem estar bem preparados e

habituados com o ambiente de emprego da nova tecnologia, a infraestrutura industrial deve

estar bem preparada tendo as condições razoáveis de suportar os novos processos que envolvem

alteração de infraestrutura , aquisição, operação e manutenção de novas máquinas e

equipamentos, aquisição de hábitos propícios a boas práticas do uso da nova tecnologia, tais

como mudanças de paradigmas em sistemas da qualidade e no gerenciamento do projeto.

Os países africanos lusófonos, herdaram da descolonização tardia do império Português,

uma instabilidade política e econômica de suas instituições e sistemas produtivos. Sendo assim,

estão muito vulneráveis na negociação de grandes contratos envolvendo aquisição de produtos

de alta tecnologia e de alto valor econômico agregado, como os produtos de defesa.

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Sabe-se, por exemplo, que considerando a depreciação de máquinas e equipamento de

alta tecnologia a taxa de depreciação anual média é de 20%.

Em consequência, por exemplo, ao adquirir uma frota de 15 (quinze) aeronave que custa

cerca de USD 10.000.000,00 (dez milhões de dólares) /para cada aeronave, o gasto anual com

manutenção e reparo ultrapassa 30 milhões de dólares. Considerando uma vida útil de 40

(quarenta) anos de uma frota, o custo total de um projeto similar seria de certa de

1.200.000.000,00 (um bilhão e duzentos milhões de dólares), isto em tempos atuais sem contar

com renovações (retrofit) ou modernizações.

Ou seja, paga-se caríssimo por material de alta tecnologia, especialmente os produtos

de defesa.

Nesta situação, o comprador estará pagando ao exterior e mantendo empregos

qualificados com altos salários no pais detentor da tecnologia, ainda estará estimulando

pesquisas e desenvolvendo da indústria de defesa daquela nação detentora de tecnologia.

Esta pratica perversa, além de não diminuir o desnível econômico de ciência e

tecnologia, tende de aumentar esse desnível (gap), uma vez que no pais comprador do novo

produto haverá um desestimulo ao desenvolvimento tecnológico local.

Infelizmente os países africanos lusófonos têm poucos recursos financeiros para se

aventurar o raro capital disponível para investimentos no desenvolvimento de sua indústria

nacional de defesa.

Observa-se pelo muito baixo IDH desses países, ANGOLA, CABO VERDE,

GUINE-BISSAU, SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE E MOÇAMBIQUE, requerem investimentos

massivos em obras de infraestrutura. A inexistência de uma ameaça. Bélica imediata

desistimula o investimento no setor, dê defesa.

A situação da indústria de defesa nacional diferencia-se pelas condições econômicas e

geoestratégicas distintas dessas nações.

Nos países insulares, Cabo Verde e São Tome e Príncipe, há guarida para poucas

infraestrutura de controle de espaço aéreo, muito limitado número de aeronaves de patrulha e

busca e salvamento e muito poucas embarcações destinadas à fiscalização, e manutenção da

soberania de seus vastos mar territorial e zona economicamente exclusiva. Nesses países,

praticamente inexiste exército, tendo uma força policial militar exercido o papel de força

terrestre de manutenção da soberania territorial terrestre.

A Guine Bissau ainda sofre de forte instabilidade de sua política interna e economia.

Pouco consegue desenvolver ou melhorar seus padrões socioeconômicos. Suas forças militares

são equipadas com material de defesa adquirido diretamente do exterior, notadamente de Rússia

e China.

Moçambique e Angola distinguem-se nesse contexto, por possuírem territórios, e

recursos naturais bem mais vultosos que os outros países previamente analisados. Angola e

Moçambique possuem experiência militar recente de suas guerras civis internas e também não

prescindem no contexto internacional da aquisição, direta de equipamentos militares do

exterior. Ambos os países têm muitos equipamentos de guerra em capacidade de prontidão,

notadamente os de origem sino-soviética devido aos seus tradicionais alinhamentos, político

com aqueles países. Apenas Angola entre as nações africanas lusófonas, no atual estágio de

desenvolvimento da região, tem capacidade autóctone de desenvolver e fabricar alguns

materiais de emprego militar.

Apesar dessas limitações, entende-se que a prática de offset poderia beneficiar o

desenvolvimento de empresas no setor de defesa, que possam ser capazes de internalizar novas,

tecnologias, qualificar empregos e processos, produtivos. Diminuindo a dependência e externa

e limitando a fuga de capitais nacionais, com o desenvolvimento de tecnologia dual, tal qual os

modelos eficientes dos países centrais.

O Política Externa Brasileira de persuasão e cooperação, fundamentada n

autodeterminação dos povos e na defesa da soberania dos Estados, indica a possibilidade do

compartilhamento da experiência brasileira em offset.

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A atuação do Estado Brasileiro grandes contratações internacionais, especialmente

aqueles conduzidos pela Força Aérea Brasileira, podem servir de exemplo de planejamento e

execução de grandes programas de transferência de tecnologia que seja eficaz e funcionem

realmente.

Além disso, a incipiente indústria de defesa nacional do Brasil, busca mercados para a

expansão de seus negócios.

Aliar a postura da política externa calcadas em prática de persuasão (softpower) aos

interesses soberanos dos Países africanos pode ser uma grande saída e reforçar os laços de

cooperação previstos na cooperação Sul-Sul e no espirito da CPLP.

Grandes contratos tais como as aquisições de aeronave AL-X Super Tucano da Embraer

ou os poderoso Sistemas Astros 2020 desenvolvido pela Avibras podem ser concebidos e

negociados em um modelo de transferência de tecnologia para aqueles países, fundamentado

na qualificação de mão de obra, académica e industrial, melhoria do sistema produtivo, dos

sistemas da qualidade e do genericamente integrado de projetos.

6.CONCLUSÃO

A prática de compensação financeira nas grandes contratações internacionais surgiu no período

do Pós-Guerra e foi se aperfeiçoando até estar bem estruturada já a partir da década de 80 do

século passado.

O Brasil tem um longo histórico de aprendizado e prática de processos de transferência

de tecnologia. Destacadamente a Forca Aérea Brasileira (FAB) possui longo experiências na

área. Complementarmente, o Exército Brasileiro, a EMBAPA, a EMBRAER e algumas outras

empresas também têm experiências de êxito na área.

As nações lusófonas africanas estão entre os países com menores índices de

desenvolvimento humano (IDH) do planeta e suas jovens repúblicas priorizam seus parcos

recursos financeiros para investimento no desenvolvimento de infraestrutura sanitária ou socio

econômica

Em consequência, esses países têm baixa atividade industrial de defesa. A sistemática de

compra de equipamentos militares via de regra não possui um contrato de compensação

financeira (offset).

A não utilização desse mecanismo do comércio Internacional, não permite a

internalização de novas tecnologias e o desenvolvimento de indústria autóctone que poderia ser

um instrumento alavancador de desenvolvimento.

A política externa brasileira, alicerçado nos pilares constitucionais da autodeterminação

dos povos e reconhecimento de soberania dos Estados, aplica em geral política externa de

persuasão aos estados nacionais, propondo parcerias cooperativas para ações de comum acordo

visando objetivos de interesses comuns.

Posto, isso, a concatenação da postura brasileira da persuasão (softpower), aliada à grande

experiência brasileira de desenvolvimento de programa de offset pode abrir a oportunidade de

uma cooperação mais intensiva na área de defesa.

Esta cooperação permitiria ao Brasil ampliar seus mercado de maquinas e equipamentos

de alta tecnologia pela venda de seus modernos equipamentos de defesa (AL-X, KC-390,

ASTROS 2020) oferecendo, como contrapartida, aos países africanos lusófonos, além de

produtos de defesa de alta qualidade, um contrato de offset para favorecer o desenvolvimento

de sua indústria de defesa nacional ancorada nos eixos de preparo e qualificação da mão de

obra, melhoria da infraestrutura industrial e de seus sistemas produtivos, de seus sistemas da

qualidade e de seu gerenciamento de projetos. Tal Cooperação sintetiza as premissas positivas

da almejada uma Cooperação Sul-Sul.

7. REFERÊNCIAS

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