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IX Encontro Nacional da Associação Brasileira de Estudos de Defesa
Florianópolis, SC, 03 a 06 de julho de 2016
Área Temática 3: Estudos Estratégicos
A PARTICIPAÇÃO DAS FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS NAS OPERAÇÕES DE PAZ
NO CONTINENTE AFRICANO (1990-2015): UM ESTUDO DE CASO
Sylvio de Souza Ferreira
Escola de Comando e Estado-Maior do Exército
Instituto Meira Mattos
1
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo principal analisar, à luz das Ciências Militares, a
participação do Estado brasileiro nas operações de paz desenvolvidas no continente
africano (1990-2015), realizada por intermédio de suas Forças Armadas. Para tanto, foi
conduzida uma pesquisa histórica, bibliográfica e documental, que empregou abordagem
qualitativa, a análise de conteúdo e o estudo de caso como técnicas centrais para atingir seu
propósito. A África fora atingida como nenhuma outra pelas recentes transformações na
economia e política mundiais. Se até o final da Guerra Fria havia interesse político-
estratégico no continente, com seu fim, tal interesse decaiu e a África foi entregue à própria
sorte, sendo envolvida numa situação quase generalizada de insolvência. A questão da
segurança se tornou, pois, de primordial importância para o continente, que foi palco de
inúmeros conflitos e decorrentes Operações de Paz sob a égide das Nações Unidas,
conduzidas como respostas dos Estados-membros àquelas crises. Neste sentido, o Brasil
tem participado de forma ativa de grande parte dessas operações militares, de maneiras
diversas, o que constitui o cerne do presente artigo. Inicialmente, foram introduzidos
aspectos que visam a ambientar o leitor com tema, para o quê, em seguida, foram
realizados micro estudos de caso acerca da participação das Forças Armadas brasileiras
naquelas operações militares. Por fim, conclui-se sobre aspectos como a mudança nos
perfis de algumas operações, bem como as diferentes formas de participação do Brasil nas
missões de paz.
Palavras-chave: Forças Armadas brasileiras; Operações de Paz; Organização das Nações
Unidas; Relação Brasil-África; Política Externa Brasileira; Política de Defesa.
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1 INTRODUÇÃO
Num ambiente internacional multipolar, assimétrico e difuso, o Brasil vem
empreendendo esforços para ocupar espaços mais relevantes, ao passo que procura
participar de forma mais ativa na agenda de segurança global. O país, ainda, ocupa posição
relativa entre as dez maiores economias do mundo, possui população de aproximados
duzentos milhões de habitantes e conta com a quinta maior base territorial do mundo.
Em consonância com tais aspectos, o país toma iniciativas que visam projetá-lo de
diferentes formas, como as participações em Operações da Organização das Nações
Unidas (ONU) para imposição ou manutenção de paz, por intermédio de suas Forças
Armadas (FONTOURA, 2005, 2009; KENKEL; MORAES; PATRIOTA, 2012). Tais ações
constituem ferramentas da Política Externa Brasileira (PEB) para a inserção do país no
cenário internacional (BRASIL, 2008, 2012, 2013).
Nesse sentido, a África constitui bom espaço para análise do exposto. Segundo Penna
Filho (2004), a região fora atingida como nenhuma outra pelas recentes transformações na
economia e política mundiais. Até o final da Guerra Fria, havia interesse político-estratégico
no continente. Com seu fim, esse interesse decaiu e o continente foi entregue à própria
sorte, envolvido numa situação quase generalizada de insolvência, causada por recorrentes
conflitos regionais ou nacionais que possuíam razões raciais, religiosas, políticas,
econômicas ou tribais (SILVA, 2005). A questão da segurança se tornou, pois, de primordial
importância para o continente, que foi palco de inúmeras Operações de Paz sob a égide das
Nações Unidas.
Ainda, a África constitui parte do entorno estratégico brasileiro e, no decorrer da
história, passou por momentos de maior e menor intensidade de proximidade com o Brasil.
A partir da década de 1990, essa relação Brasil-África foi reaquecida, chegando a um ápice
a partir de 2003, quando foram tomadas ações mais enfáticas do governo brasileiro, no
sentido da aproximação dessas duas partes. Uma visão estratégica e uma perspectiva
coerente se tornaram as novas bases das relações entre o Brasil e a África, constituindo um
dos principais focos da chamada relação Sul-Sul (VISENTINI, 2013a, p. 93).
As operações de paz sob a égide da Organização das Nações Unidas (ONU) foram,
portanto, uma das ferramentas de mais destaque na ajuda a determinados países africanos
a resolver seus conflitos e reencontrar a paz, tendo o Brasil participado de forma
proeminente de várias delas. Tais operações apresentaram qualidades únicas, tais como a
legitimidade, a partilha dos encargos e uma capacidade de implantar e manter soldados e
policiais de todo o mundo, integrando-os com as forças de paz civis para cumprir mandatos
multidimensionais. As forças de paz da ONU proporcionaram, dessa forma, segurança e
apoio necessários à transição do conflito para a paz no continente africano.
3
Assim, o presente artigo tem como objetivo primordial analisar a participação das
Forças Armadas brasileiras em Operações de Paz no continente africano no período entre
1990 e 2015. Para tanto, será realizada breve exposição de aspectos metodológicos da
pesquisa em si, de aspectos das relações Brasil-África e, por fim, serão realizados os
estudos de caso em si.
2 CONSIDERAÇÕES EPISTEMOLÓGICAS E METODOLÓGICAS
A perspectiva científica utilizada no presente artigo foi a teoria da Complexidade
(MITCHELL, 2009; WALDROP, 1992). Por seu intermédio, pode-se afirmar que o objeto de
análise evidencia características de um “sistema complexo” (NEWMAN, 2009), ou seja,
retrata a realidade com múltiplos atores, que interagem e aperfeiçoam seus
comportamentos e decisões ao longo do tempo, tornando difícil estabelecer relações diretas
e determinísticas entre causas e efeitos. Mais do que uma teoria na área das ciências
naturais, cabe notar que as interpretações do paradigma que considera o todo maior do que
a soma de suas partes oferece oportunidades de uma nova visão de mundo às mais
diversas áreas científicas, em especial, no que de interesse do presente artigo
(BOUSQUET, 2009; BYRNE, 1998; RICHARDSON; CILLIERS, 2001; RICHARDSON;
MATHIESON; CILLIERS, 2000).
Em termos metodológicos, trata-se de pesquisa subjetivista e de abordagem
qualitativa, apoiada em revisão sistemática de fontes bibliográficas e documentais, as quais
foram objeto de análise qualitativa de conteúdo (BARDIN, 1977) e estudos de caso
(LÜDKE; ANDRÉ, 2008; TRIVIÑOS, 1987). Os marcos temporais foram estabelecidos
de formar rígida (1990 e 2015) e o espaço de análise foi delimitado como sendo os países
do continente africano que foram palcos de missões de paz, os quais contaram com a
participação brasileira no período. Complementarmente, foram realizadas algumas
entrevistas exploratórias.
3 AS RELAÇÕES BRASIL-ÁFRICA
As relações entre o Brasil e o continente africano guardam relevância para a Política
Externa Brasileira, assim como para a Política de Defesa (CORRÊA, 2014), ainda que,
ampliando-se o recorte temporal de observação, cabe notar que a aproximação Brasil-África
evidencia mais contornos de descontinuidade e alternância, do que de continuidade e
progressividade, conforme consta da na retrospectiva disponibilizada por Amorim Neto
(2011). Tais relações desfrutam de pontos em comum, como a antiga condição de colônia
das potências europeias, e destinos diferentes, como a ascensão brasileira a uma das
4
maiores economias do mundo e status de monster country1, em detrimento de condições
distintas, nos casos dos países africanos.
Não obstante esforços anteriores, no início da década de 1990, a ascensão do
neoliberalismo abriu uma fase de distanciamento em relação à África. À época, a visão
estratégica contida no Consenso de Washington que orientava a elite brasileira, relegava
maior importância às relações verticais Norte-Sul, em detrimento das relações Sul-Sul,
colocando a África em lugar secundário (SANTANA, 2003; VISENTINI, 2013b, p. 92). No
governo Itamar Franco (1992-1994), voltou a haver certa articulação com o continente
africano, por ação dos chanceleres Fernando Henrique Cardoso e Celso Amorim. Nessa
fase, houve a priorização de certos países para a concentração dos esforços diplomáticos,
como a África do Sul, a Angola e a Nigéria. Em 1993, a Zona de Paz e Cooperação do
Atlântico Sul (ZOPACAS) foi reativada e o apoio à reconstrução de alguns países do
continente foi prestado, por meio da participação em Operações de Paz (COUTINHO, 2014;
VAZ; MIGON, 2013). Surgiram, então, iniciativas mais concretas no sentido da cooperação
com a agenda de segurança do continente africano.
No governo seguinte, de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), ainda que forma
modesta, o lugar da África na pasta das Relações Exteriores brasileira contou com
iniciativas mais relevantes e de relativa inflexão no seu segundo mandato. A partir de 1995,
as Forças Armadas brasileiras participaram de forma mais robusta de missões de paz em
Angola e em Moçambique (FREITAS; ARAÚJO, 2014; LANNES, 1998; NASSER, 2012;
OLIVEIRA JUNIOR; GÓES, 2010).
Verificou-se, portanto, que o relacionamento entre o Brasil e a África passou por
momentos distintos. Pode-se considerar que a emergência da África na pasta das relações
exteriores do Brasil se deu na medida que o Brasil esteve focado em seus próprios
problemas internos e em suas condicionantes de desenvolvimento, em particular, até o final
do século passado. Até este período, observou-se a preponderância da aproximação com a
América do Sul e a valorização da vertente terrestre. Como consequência das estabilidades
econômicas e políticas, aliadas à visão de futuro do governo Lula, iniciou-se processo de
retomada dos laços com a África, sob o eixo do “diálogo Sul-Sul”. Tal aproximação se
estabeleceu sob incentivo da vertente política e da componente econômica, sendo esta
inicialmente mais voltada às trocas comerciais em si do que ao desenvolvimento econômico
dos parceiros africanos (MIGON; SANTOS, 2013; RIZZI et al., 2011).
Com os êxitos iniciais e o aumento do conhecimento recíproco, verificou-se a
extrapolação da dinâmica de aproximação para outros setores, a exemplo das parcerias nas
1 Ver LAFER (2004). Na construção dessa qualificação, são considerados dados geográficos, demográficos,
econômicos, políticos, bem, como a magnitude dos problemas e desafios que o país enfrenta (LAFER, 2004,
p.24).
5
áreas de saúde, educação, agricultura e da segurança e defesa. A proximidade territorial, a
convergência linguística e a maior semelhança cultural facilitaram essa opção pela África no
âmbito das relações exteriores do Brasil. Diversos aspectos presentes na África
despertaram, então, a atenção do governo brasileiro, em particular a partir do governo Lula,
que aprofundou as relações do país com o continente africano, segundo sua lógica do
Estado Logístico (CERVO; LESSA, 2010). Verificou-se significativo crescimento da
quantidade de ações governamentais, o que incluía ações da diplomacia presidencial,
estabelecimento de acordos e uma retomada na participação em Operações de Paz naquele
continente, as quais serão tratadas no presente trabalho.
4 A PARTICIPAÇÃO DO BRASIL EM OPERAÇÕES DE PAZ NO CONTINENTE
AFRICANO
4.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A partir dos anos 1990, o aporte brasileiro às Operações de Paz na África ganhou
novo impulso, visto que, além da cessão de militares, o país colocou à disposição da
Organização, militares, civis e policiais. Segundo Kenkel (2013b), para sinalizar interesse
nos assuntos atinentes às Nações Unidas e demonstrar credenciais de democracia e status,
o Brasil aumentou gradualmente seu envio de tropas para as Operações das Nações
Unidas, nas décadas de 1980 e 1990, incluindo os grandes contingentes em Moçambique e
Angola.
Atualmente, há nove intervenções da ONU no continente africano em curso, sendo
que o Brasil envia oficiais para seis: Sudão do Sul, Abyei, Libéria, Saara Ocidental, Costa do
Marfim e República Centro-Africana. As missões correntes ou encerradas, que contaram
com participação das Forças Armadas brasileiras, serão tratadas a seguir.
4.2 UNAVEM I, II e III (Missões das Nações Unidas de Verificação em Angola)
Em novembro de 1975, Angola se tornava um país independente de Portugal, após
uma longa guerra de libertação, que terminou com a assinatura do Acordo de Alvor2 entre os
três movimentos de libertação – o Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA),
a Frente Nacional para a Libertação de Angola (FNLA) e a União Nacional para a
Independência Total de Angola (UNITA) – e a antiga metrópole. No entanto, a
independência foi declarada por grupos distintos, sem uma transição formal de poder. De
um lado, figurava o MPLA, que declarou o país independente em Luanda e contava com
2 O Acordo de Alvor previa a existência de um governo de transição, o que não ocorreu. Esta ausência talvez
tenha sido um dos fatores que mais contribuíram para a guerra entre os grupos que aspiravam ao poder
(FONTOURA, 2009, p. 141).
6
apoio de Cuba e da União Soviética; e de outro, a FNLA e a UNITA, que fizeram o mesmo
em Huambo e contavam com apoio da África do Sul (FONTOURA, 2009, p. 141).
Começava, então, um conflito que ocasionou a criação da Missão de Verificação das
Nações Unidas em Angola I (UNAVEM I), em janeiro de 1989, e que tinha por tarefa
precípua a supervisão da repatriação de contingentes cubanos que lutavam naquele país e
a cessão das hostilidades. A contribuição brasileira para essa missão foi composta pelo
chefe da missão, o General de Brigada Péricles Ferreira Gomes, e 14 oficiais (12 do
Exército e 2 da Marinha), que foram empregados em duas levas de 7. A primeira leva foi
realizada em 1989-19903 e a segunda, em 1990-1991. A UNAVEM I foi encerrada em 25 de
maio de 1991, com a conclusão do processo de repatriação de militares cubanos e a
assinatura do acordo de Bicesse, que visava a reinstaurar a paz no país (DPKO, 2016;
FONTOURA, 2009).
Em maio de 1991, a ONU estabeleceu a UNAVEM II, que tinha em seu mandato
original a tarefa de supervisionar as atividades da comissão que deveria colocar em prática
os termos do acordo de Bicesse. Em um segundo momento, houve a ampliação desse
mandato para a fiscalização eleitoral, em 1992. O Brasil manteve a chefia do componente
militar, com o General Ferreira Gomes, de maio a setembro de 1991, 63 observadores
militares e uma equipe de saúde composta por 14 oficiais médicos e sargentos enfermeiros4.
Não obstante as eleições tivessem ocorrido de forma relativamente calma, a UNITA
contestou seu resultado e as hostilidades retornaram. Com o clima de insegurança, os
efetivos da UNAVEM II foram gradativamente reduzidos e a missão chegou ao fim em 1995
(FONTOURA, 2009).
A missão seguinte conduzida em Angola foi a UNAVEM III e contou com uma
significativa participação brasileira. Essa missão fora estabelecida com o objetivo promordial
de apoiar o Governo de Angola e a UNITA na restauração da paz e reconciliação nacional
com base nos Acordos de Paz, assinados em 31 de maio de 1991, o Protocolo de Lusaka,
assinado em 20 de novembro 1994, e as resoluções pertinentes do Conselho de Segurança.
Entre os principais aspectos do mandato da UNAVEM III podiam ser destacados:
proporcionar boas condições para a mediação entre as partes angolanas; monitorar e
verificar a extensão da administração do Estado em todo o país e o processo de
reconciliação nacional; supervisionar, controlar e verificar a retirada das forças e monitorar o
cessar-fogo; verificar as informações recebidas do Governo e da UNITA a respeito de suas
forças, bem como todos os movimentos de tropas; auxiliar no estabelecimento de áreas de
aquartelamento; verificar a retirada, aquartelamento e desmobilização das forças da UNITA;
3 Embora a missão tenha iniciado em 1989, esta foi a primeira participação brasileira no recorte temporal em
questão. 4 A mais, havia 39 policiais e 4 civis, observadores eleitorais (FONTOURA, 2009, p. 45).
7
supervisionar o recolhimento e o armazenamento de armamentos da UNITA; verificar o
movimento de forças do Governo para quartéis e a conclusão da formação das novas
Forças Armadas; verificar a livre circulação de pessoas e mercadorias; verificar e fiscalizar a
neutralidade da Polícia Nacional de Angola, o desarmamento de civis, o aquartelamento da
Polícia de Intervenção Rápida, e medidas de segurança para os líderes da UNITA;
coordenar, facilitar e apoiar as atividades humanitárias diretamente relacionadas com o
processo de paz, bem como participar em atividades de desminagem; declarar formalmente
que todos os requisitos essenciais para a realização das segundas eleições presidenciais
tenham sido cumpridas, e apoiar, verificar e fiscalizar o processo eleitoral correlato (UNITED
NATIONS, 2015).
O Brasil participou da UNAVEM III com um componente militar bastante robusto, que
compreendia um Batalhão de Infantaria (800 militares), uma Companhia de Engenharia (200
militares), dois Postos de Saúde Avançados (40 militares) e cerca de 40 oficiais no Estado-
Maior do contingente militar. Com todos os revezamentos realizados, entre agosto de 1995
e julho de 1997, chegou‑se a um efetivo total 4.174 militares empregados na missão
(AGUILAR, 2015; DPKO, 2016; FONTOURA, 2009).
4.3 MONUA, UNOA e UNMA
Em 1997, foi criada a Missão de Observação das Nações Unidas em Angola
(MONUA), como sucessora da UNAVEM III e motivada pelas recorrentes violações do
Acordo de Bicesse e do Protocolo de Lusaka praticadas pela UNITA. Essa missão possuía
mandato para acompanhar o cumprimento das tarefas remanescentes nos planos e acordos
de paz firmados em Angola. No entanto, o cessar-fogo sofria constantes violações e as
partes restringiam a liberdade de movimento dos contingentes da ONU, o que causou a
repatriação das tropas de paz até outubro de 1997, mantendo no terreno apenas
observadores e policiais, assim como uma força de proteção armada da MONUA
(FONTOURA, 2009, p. 161; UNITED NATIONS, 2016c).
A participação brasileira na MONUA se resumiu a 3 oficiais de Estado-Maior, 19
observadores militares e uma equipe médica de 45 militares de saúde5. Esse efetivo foi
empregado entre julho de 1997 e abril de 1999. Cabe destacar dentre esses militares a
posição de maior destaque ocupada por militar brasileiro nesta missão, o Comando
Regional do Nordeste, sob os encargos do Coronel Ubiratan Pillar, que desempenhava suas
funções em uma das regiões mais críticas da missão (FONTOURA, 2009).
A MONUA foi desativada em 1999, em virtude da deterioração do relacionamento
entre o governo angolano e as Nações Unidas, após o que, a ONU estabeleceu o Escritório
5 A mais, havia 14 observadores policiais brasileiros na MONUA (FONTOURA, 2009, p. 161).
8
das Nações Unidas em Angola (UNOA), ativo entre outubro de 1999 a agosto de 2002. Esse
escritório visava a explorar medidas no sentido de restaurar a paz no país e a prestar
assistência ao povo angolano. Após a criação da UNOA, a ONU criou a Missão das Nações
Unidas em Angola (UNMA), atuante entre agosto de 2002 e fevereiro de 2003. A
participação brasileira na UNOA e na UNMA foi de 3 oficiais do Exército Brasileiro, um dos
quais, assessor militar, e os outros dois, oficiais de ligação (FONTOURA, 2009).
A morte do líder da UNITA, Jonas Savimbi, ocorrida em 2002, fez com que o governo
e as lideranças do movimento se aproximassem e pudessem estabelecer um diálogo, o que
marcou o final do processo de pacificação de Angola.
4.4 ONUMOZ
Poucos anos depois de Moçambique conquistar a independência de Portugal em
1975, o país se encontrava mergulhado em uma longa guerra civil entre as forças legalistas
do Governo (FRELIMO6) e a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), que tinha
apoio do regime de apartheid da África do Sul. Em 4 de outubro de 1992, após dois anos de
negociações mediadas pela Igreja Católica, as duas partes assinaram um Acordo Geral de
Paz. Como parte deste acordo, o Conselho de Segurança estabeleceu a Operação das
Nações Unidas em Moçambique (ONUMOZ) para acompanhar e apoiar um cessar-fogo, a
desmobilização das forças e a realização de eleições nacionais (AGUILAR, 2015;
FONTOURA, 2009; SILVA, 2005) .
No início de 1993, cerca de 6.500 soldados e observadores militares, liderados pelo
Representante do Secretário-Geral, o Sr. Aldo Ajello, foram empregados. Para garantir a
aplicação do acordo e resolver os litígios, uma Comissão de Supervisão e Acompanhamento
foi estabelecida. Ela foi presidida pelas Nações Unidas, e composta pelo Governo, a
RENAMO, representantes da Itália (mediador do Estado), França, Alemanha, de Portugal,
do Reino Unido e dos Estados Unidos (Estados observadores nas conversações
preliminares), e da Organização de Unidade Africano (UA) (AGUILAR, 2015).
A participação das Forças Armadas brasileiras na ONUMOZ7 contou com o seu
primeiro comandante militar8, o General de Divisão Lélio Gonçalves Rodrigues da Silva, 47
observadores militares e uma Companhia de Fuzileiros da Brigada de Infantaria
Paraquedista (entre julho e dezembro de 1994), com um efetivo de 170 militares,
comandados pelo então Major Franklimberg Ribeiro de Freitas. Essa subunidade contava
6 Frente de Libertação de Moçambique. Tratou-se do grupo para o qual o poder fora entregue, em 1975, após a
independência e o período de transição (FONTOURA, 2009, p. 167) 7 À título de informação, das Forças Auxiliares, o Brasil enviou um componente de 66 policiais, provenientes do
Distrito Federal e 15 Estados (FONTOURA, 2009, p. 169). 8 Também chamado de Force Commander. Trata-se do oficial general, que comanda o componente militar de
um missão de paz da ONU (SILVA, 2005, p. 37).
9
com o apoio de veículos blindados de fabricação nacional (modelos Urutu e Cascavel) e
ficou instalada na localidade de Mocuba, no interior da província, de onde conduzia suas
atividades (AGUILAR, 2015; FONTOURA, 2009; SILVA, 2005).
Além de verificar a implementação dos aspectos militares do Acordo de Paz e
supervisionar o processo eleitoral, ONUMOZ lançou um programa de assistência
humanitária para ajudar os 3,7 milhões de pessoas deslocadas pela guerra para reassentar
nas comunidades. Por sua vez, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados
(ACNUR) iniciou, em 1993, a repatriação de 1,3 milhões de refugiados. Naquela época, a
operação de três anos foi a maior já realizada pelo ACNUR na África. Em meados de 1994,
cerca de 75 por cento das pessoas deslocadas internamente tinha sido reassentada e a
maioria dos refugiados tinha voltado para Moçambique. A desmobilização, iniciada em 1994,
eventualmente, envolveu mais de 76 mil soldados de ambos os lados, 10.000 dos quais
ajudaram a ONUMOZ integrar no novo exército nacional. ONUMOZ também recuperou
cerca de 155 mil armas (UNITED NATIONS, 2016e).
O desfecho da missão foi marcado pela condução das primeiras eleições
multipartidárias do país, realizadas em outubro de 1994, monitorado por 2.300 observadores
internacionais, civis adicionais, incluindo cerca de 900 das Nações Unidas. O partido do
Governo, FRELIMO, venceu as eleições parlamentares e presidenciais. O novo Parlamento
foi inaugurado em dezembro de 1994. Após sua tarefa ter sido cumprida com êxito, o
mandato da ONUMOZ chegou formalmente ao fim à meia-noite no dia 9 de dezembro. No
entanto, ONUMOZ continuou a desempenhar funções residuais até que a missão foi
totalmente liquidada no final de janeiro de 1995 (UNITED NATIONS, 2016e).
4.5 UNOMUR
A UNOMUR (Missão de Observação das Nações Unidas entre Uganda e Ruanda) foi
uma missão estabelecida entre junho de 1993 e setembro de 1994 (UNITED NATIONS,
2016l), para fiscalizar a execução do Acordo de Arusha, estabelecido entre tropas do
governo ruanês, de etnia predomeinante hutu, e militantes da Frente Patriótica Ruandesa
(FPR), de maioria tutsi, em 1993. Tal missão foi estabelecida, em conjunção com a UNAMIR
(Missão de Assistência das Nações Unidas em Ruanda) e, na prática, ficou subordinada
operacionalmente a ela. A região em questão – os Grandes Lagos africanos – foi palco de
inúmeros conflitos relacionados a disputas por riquezas naturais, território, poder e,
recorrentemente, questões étnicas (FONTOURA, 2009, p. 177; UNITED NATIONS, 2016l).
A UNOMUR contou com a participação, entre 1993 e 1994, de 13 militares brasileiros,
sendo 10 observadores militares (4 do Exército, 3 da Marinha e 3 da Aeronáutica) e 3
militares que compunham uma equipe médica (DPKO, 2016; FONTOURA, 2009).
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A missão foi desativada em 1994, após um processo de deterioração que foi causado
por diversas razões, como as dificuldades de se estabelecer no terreno e de manter as
operações, falta de apoio logístico e, em grande parte, o fato de a missão ter
desempenhado suas funções somente do lado ugandense da fronteira. Tal fato se deu, uma
vez que a FPR não permitia a presença de observadores militares do lado ruandês e
cobrava a informação sobre o deslocamento das patrulhas da ONU, o que influía no fator
surpresa da operação e na própria liberdade de movimento dos militares das Nações
Unidas. O fator determinante para o fim da missão foi o recrudescimento da violência em
1994, causado pela assunção do poder pela FPR, que promoveu uma limpeza étnica contra
ruandenses de origem tutsi, hutus moderados e a minoria Twa, os pigmeus (FONTOURA,
2009).
4.6 MINUCI e ONUCI
Uma tentativa mal sucedida de golpe de estado contra o presidente da Costa do
Marfim, Laurent Gbabo, ocorrida em 19 de setembro de 2002, deflagrou uma rebelião em
todo o país e grupos rebeldes, conhecidos como Forces Nouvelles, passaram a controlar as
regiões do centro e noroeste da Costa do Marfim. Não obstante, a principal causa do conflito
marfinense foi a legislação que tratava da nacionalidade dos cidadãos, que considerava
marfinenses somente filhos de pai ou mãe marfinense. Ocorre que um terço da população
era composto por descendentes de outras nacionalidades, como malienses, guineenses e
burquineses, o que os privava de uma série de direitos no país e causava antagonismos e
ressentimentos (FONTOURA, 2009; UNITED NATIONS, 2016a).
Em janeiro de 2003, foi assinado o acordo de paz de Linas-Marcoussis, e em maio do
mesmo ano, foi criada a MINUCI (Missão das Nações Unidas na Costa do Marfim), que era
de pequena expressão e possuía mandato apenas para realizar ligação entre tropas de
intervenção francesas e forças marfinenses (governo e rebeldes). A participação brasileira
na MINUCI foi de 4 militares, sendo 3 do Exército e 1 da Marinha, os quais desempenhavam
o papel de oficiais de ligação (DPKO, 2016; FONTOURA, 2009)
Com a finalidade de fortalecer o apoio internacional ao processo de paz na Costa do
Marfim, o Conselho de Segurança, através da sua resolução 1528, de 27 de fevereiro de
2004, estabeleceu a Missão das Nações Unidas na Costa do Marfim (UNOCI), que passou a
operar a partir de 04 de abril de 2004, com a missão de facilitar a implementação pelas
partes marfinenses do acordo de paz assinado por elas em janeiro de 2003 (FONTOURA,
2009, p. 188; UNITED NATIONS, 2016m).
Desde 2004, o Brasil participa da UNOCI com dois observadores militares e um oficial
de Estado-Maior da missão, em turnos de um ano (DPKO, 2016).
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Após a eleição presidencial de 2010 e da crise política que se seguiu na Costa do
Marfim, a UNOCI se desdobrou em campo para proteger civis, fornecer serviços essenciais
à população e apoiar o governo instituído da Costa do Marfim, no tocante à desarmamento,
desmobilização e reintegração (DDR) dos antigos combatentes, bem como à reforma do
setor da segurança e à promoção dos direitos humanos (UNITED NATIONS, 2016m)
4.8 UNOMIL e UNMIL
A Libéria foi palco de uma guerra civil entre 1989 e 2003, que causou milhares de
mortes, deteriorou a economia do país e provocou movimentos de refugiados e deslocados.
A ONU respodeu à crise na Libéria com diferentes missões de paz, duas das quais com
participações de brasileiros: a UNOMIL (Missão de Observação das Nações Unidas na
Libéria e a UNMIL (Missão das Nações Unidas na Libéria) (FONTOURA, 2009; UNITED
NATIONS, 2016h).
A UNOMIL foi estabelecida pela ONU em setembro de 1993 e seu mandato previa o
monitoramento de cessar-fogo, a desmobilização de ex-combatentes, dentre outras tarefas.
À época, 30 observadores militares foram empregados nessa missão, sendo a participação
brasileira resumida a 3 oficiais do Exército Brasileiro, que estavam anteriormente
desdobrados na UNAVEM II (FONTOURA, 2009, p. 195).
Já a Missão das Nações Unidas na Libéria (UNMIL) foi criada pela resolução do
Conselho de Segurança da ONU 1509, de 19 de setembro de 2003, para apoiar a aplicação
do acordo de cessar-fogo e do processo de paz. Além dessa missão, a UNMIL recebeu as
tarefas de proteger os funcionários das Nações Unidas, assim como instalações e civis,
apoiar as atividades humanitárias e de direitos humanos, e ajudar na reforma da segurança
nacional, incluindo a formação da polícia nacional e de uma nova força militar reestruturada
(UNITED NATIONS, 2016h).
O Brasil cedeu, a partir de 2003, 8 oficiais à missão, sendo 4 do Exército, 3 da Marinha
e 1 da Aeronáutica, os quais ficavam em Freetown, atuando como oficiais de ligação
(FONTOURA, 2009, p. 196). Hoje, o Brasil envia à UNMIL 2 observadores militares e 1
oficial de Estado-Maior, o qual ocupa um posto de Oficial de Operações dentro da célula
operacional da missão (AITA, 2015).
4.9 UNOGBIS
Em 1999, a ONU criou o Escritório das Nações Unidas de Apoio à Construção da Paz
na Guiná-Bissau (UNOGBIS), a pedido do Governo da Unidade Nacional, após o conflito
militar ocorrido nos anos de 1998 e 1999. O país vivia crise política-econômica desde sua
independência ocorrida em 1974, a qual deteriorava o estabelecimento da democracia e o
desenvolvimento do país. Com a criação do Escritório, a ONU procurou adotar iniciativas
12
direcionadas para a infraestrutura, a reconciliação nacional e as instituições (FONTOURA,
2009, p. 201; UNITED NATIONS, 2016f).
O Brasil enviou à UNOGBIS um conselheiro militar, a partir de 2004, o qual
permanecia nos primeiros quatro anos, o período de um biênio. Esse militar era,
normalmente, um Coronel do Exército Brasileiro, e integrava a equipe de conselheiros
militares, as quais desenvolviam programas de cooperação, em conjunto com os Ministérios
do país (DPKO, 2016; FONTOURA, 2009, p. 201).
4.10 UNMEE
Em junho de 2000, após dois anos de luta em uma disputa de fronteira, a Etiópia e a
Eritreia assinaram um acordo de cessação das hostilidades, após conversações lideradas
pela Argélia e pela Organização da União Africana. Em julho daquele ano, o Conselho de
Segurança criou a Missão das Nações Unidas na Etiópia e Eritréia (UNMEE), com a
finalidade de manter o contato entre as partes e estabelecer mecanismos eficazes para
verificar o cessar-fogo. Em setembro de 2000, o Conselho autorizou a UNMEE a monitorar o
cessar das hostilidades e garantir a observância dos compromissos de segurança (UNITED
NATIONS, 2016n).
A participação de militares brasileiros na UNMEE se resumiu ao envio de 6
observadores militares e 1 oficial de Estado-Maior, a partir de 2006, os quais foram trazidos
de volta ao país, pouco antes do deterioramento das condições de segurança da missão
(NOGUEIRA, 2015). Em 30 de Julho de 2008, o Conselho de Segurança decidiu encerrar o
mandato da UNMEE, com efeitos a partir do dia seguinte. A decisão do Conselho veio em
resposta a restrições incapacitantes impostos pela Eritreia à UNMEE, como o corte do
fornecimento de suprimentos, o que tornava impossível a operação continuar a desenvolver
suas tarefas impostas e que punham em risco a segurança do pessoal da ONU (UNITED
NATIONS, 2016n).
4.11 UNOWA
O Escritório das Nações Unidas para a África Ocidental (UNOWA) foi ativado em 2002
e tem sua sede em Dacar, no Senegal. Seu mandato compreende a contribuição para a paz
e seguranças regionais, por meio de uma gama variada de atividades em parceria com
membros da comunidade internacional. O foco da UNOWA é lidar com problemas
ocasionados por guerras civis na região, tais como refugiados, mercenários, soldados-
crianças, desarmamento, desmobilização e reintegração, dentre outros. O Brasil cedeu o
chefe do núcleo militar em 2007, o Coronel do Exército Luiz Augusto de Oliveira Santiago
(FONTOURA, 2009, p. 213; UNITED NATIONS, 2016o).
13
4.12 UNMIS, UNMISS, UNIFA
A Missão das Nações Unidas no Sudão (UNMIS), criada em 31 de março de 2005, foi
estabelecida para cumprir a tarefa principal de apoiar e fiscalizar o cumprimento do Acordo
Abrangente de Paz, firmado naquele ano, entre o Governo do Sudão e o principal grupo
rebelde em pauta, o SPLMA (Exército do Movimento de Libertação do Povo do Sudão)
(FONTOURA, 2009; UNITED NATIONS, 2016j). A participação brasileira nessa missão foi
uma das mais expressivas remessas de observadores militares e oficiais de Estado-Maior
das Forças Armadas brasileiras, após nova orientação da Política Externa brasileira para a
África. Entre altos e baixos, o efetivo do contingente de observadores e oficiais de Estado-
Maior chegou a 21 militares, em rodízios anuais. A missão foi transformada com a
independência do Sudão do Sul, em julho de 2011, o que deu origem a Missão das Nações
Unidas no Sudão do Sul (UNMISS) (UNITED NATIONS, 2016j).
Também em 2011, o Conselho de Segurança autorizou o envio de uma força de paz
para a área de Abyei, que fica entre o norte e o sul do Sudão, a qual fora reivindicada por
ambos os lados. A ação do Conselho veio em resposta a uma nova onda de violência, à
decorrente escalada das tensões e ao grande deslocamento da população da região. A
ONU criou, então, a Força Interina das Nações Unidas de Segurança para Abyei (UNISFA),
que é constituída por um efetivo aproximado de 4.200 militares, 50 policiais e componentes
civis. A nova operação atendeu repidamente à chamada do Conselho, na sequência do
acordo assinado entre o Governo sudanês e o Movimento de Libertação do Povo do Sudão
(SPLM). Por meio desse, ficava acordado que o SPLM deveria retirar suas forças da região
e permitir que as forças de paz da Etiópia em Abyei assumissem a administração e a
segurança da área de Abyei. Nos termos desse acordo, intermediado pelo ex-Presidente
sul-africano Thabo Mbeki, os dois lados concordaram sobre a necessidade de uma terceira
parte para monitorar a fronteira, ponto de litígio entre o norte e o sul.
Após a transformação da UNMIS, o Brasil passou a participar da Força Interina das
Nações Unidas de Segurança para Abyei (UNISFA) com 4 militares, sendo 3 do Exército
Brasileiro, 1 da Marinha do Brasil e 1 da Força Aérea, e da UNMISS com 8 militares, sendo
7 do Exército Brasileiro e 1 da Força Aérea (AGUILAR, 2015).
4.13 MINURSO
A Missão das Nações Unidas para o Referendo no Saara Ocidental (MINURSO) foi
criada pelo Conselho de Segurança da ONU, por intemédio da resolução 690, de 29 de Abril
de 1991, em conformidade com as propostas de implementação de um plano de paz, aceito
em 30 de agosto de 1988, pelo Marrocos e pela Frente Popular para la Libertação de Saguia
el-Hamra e do Río de Oro (Frente Polisário), componente político-militar da República
Árabe-Democrática do Saara Ocidental. O plano de regularização, conforme aprovado pelo
14
Conselho de Segurança, previa um período de transição para a preparação de um
referendo, no qual o povo do Saara Ocidental iria escolher entre a sua independência ou a
integração ao Marrocos, com certa autonomia no reino (UNITED NATIONS, 2016g).
A missão se trata de um caso bastante peculiar, uma vez que a MINURSO foi
instituída em 1991, ou seja, completou, no corrente ano, vinte e cinco anos de existência e
não apresentou grandes avanços nos seus propósitos basilares. No entanto, a estrutura da
missão é bastante consolidada e permite a aquisição de muito boas experiências em
peacekeeping para os participantes, em relativas condições de segurança.
O contingente brasileiro no Saara Ocidental é composto por 10 militares, sendo 6 do
Exército, 2 da Marinha do Brasil e 2 da Força Aérea Brasileira, em rodízios anuais. Todos
esses militares têm o status inicial de observador militar e, no decorrer da missão, conforme
a abertura de claros do staff do Quartel-general da missão, localizado em Laayoune, esses
podem ser preenchidos por brasileiros, após processo seletivo (DPKO, 2016)
4.14 MINURCAT
A partir de 2003, grande movimento de refugiados de outros países começou a
compor um quadro de tensões no Chade. Mais de 240.000 refugiados sudaneses e cerca de
45.000, oriundos da República Centro-africana fugiram para o Chade. Além desses,
aproximados 180.000 chadianos se tornaram deslocados internos, pela guerra civil no leste
do país, o que agravou uma crise entre as comunidades da região (UNITED NATIONS,
2016b).
Em resposta a essa situação e às atividades de grupos armados no leste do Chade e
em Darfur, que praticavam ataques transfronteiriços, o Conselho de Segurança
implementou, por meio da resolução 1778, em 25 de setembro de 2007, com a anuência
das autoridades do Chade e na República Centro-africana a Missão das Nações Unidas na
República Centro-africana e no Chade (MINURCAT), bem como uma força militar da União
Europeia (EUFOR), a fim de contribuir para a proteção dos civis, promover os direitos
humanos e a paz regional. O Conselho decidiu que a MINURCAT deve incluir um máximo
de 300 policiais e 50 oficiais de ligação militar e um número adequado de pessoal civil
(UNITED NATIONS, 2016b).
A MINURCAT contou coma a participação de 3 militares do Brasil, sendo 2 do Exército
Brasileiro e 1 da Marinha do Brasil, os quais retornaram após o encerramento da missão,
ocorrido em 15 de janeiro de 2010, ocasião na qual o Governo do Chade informou o
Secretário-Geral através de uma nota verbal que desejava retirar a missão do Chade
(FRANÇA, 2015; UNITED NATIONS, 2016b, i)
15
4.15 MINUSCA
Em virtude da crise de segurança, humanitária, de direitos humanos e política na
República Centro-Africana, bem como suas implicações regionais, o Conselho de
Segurança autorizou em 10 de abril de 2014 a implantação da Missão Multidimensional
Integrada das Nações Unidas para Estabilização da República Centro-africana (MINUSCA),
que tem a proteção de civis, como sua maior prioridade. Suas tarefas iniciais incluíram o
apoio ao processo de transição, a assistência humanitária, a promoção e proteção de
direitos humanos, o apoio à justiça e ao Estado de direito e processos de desarmamento,
desmobilização, reintegração, além de repatriação de nacionais. Assim, em 15 de setembro
de 2014, a missão liderada pela Suporte Africano Internacional na República Centro-africana
transferiu sua autoridade para a MINUSCA, em conformidade com a Resolução 2149
(UNITED NATIONS, 2016k).
As Forças Armadas brasileiras contribuem com seis oficiais, sendo 4 do Exército
Brasileiro e 2 da Marinha do Brasil, os quais desempenham as funções tradicionais de
observadores militares (FALCI JR, 2015).
4.16 MONUSCO
Uma das participações atuais mais significativas em Operações de Paz na África é a
liderança na missão no Congo por um oficial-general brasileiro. No entanto, essa
participação não data de hoje. Já em 2003, quando a ONU estabeleceu a Força
Multinacional Interina de Emergência para operar na província de Ituri, na República
Democrática do Congo, o Brasil enviou duas aeronaves C‑130 Hércules com suas
guarnições, incluindo pessoal de manutenção, comunicações e de saúde (AGUILAR, 2015).
A MONUSCO (Missão da Organização das Nações Unidas para a Estabilização da
República Democrática do Congo) foi instaurada a partir da antiga operação de manutenção
da paz das Nações Unidas naquele país - a Missão das Nações Unidas na República
Democrática do Congo (MONUC) - em 1º de julho de 2010. Assim, a nova missão foi
autorizada a utilizar todos os meios necessários para cumprir o seu mandato, que incluía,
dentre outras coisas, a proteção de civis, pessoal humanitário e defensores dos direitos
humanos contra a ameaça de violência física, além de apoiar o Governo na sua
estabilização e consolidação da paz (UNITED NATIONS, 2016d).
No início de 2013, o Conselho de Segurança da ONU aprovou a resolução 2098, a
qual estabeleceu a criação de uma Brigada de Intervenção da MONUSCO com mandato de
realizar, inclusive, operações ofensivas. Pela primeira vez na história das operações de paz
sob a bandeira desta organização, permitiu-se o uso da força para neutralizar grupos
armados. Neste contexto, o engajamento ativo da FIB possibilitou que os aspectos políticos,
militares e humanitários da MONUSCO fossem conjuntamente adaptados, influenciando a
16
operacionalização da proteção de civis. Para comandar a força militar da missão, o CSONU
nomeou o General-de-Divisão Carlos Alberto dos Santos Cruz, brasileiro, atribuindo uma
posição de significativo destaque do Brasil nas operações de paz sob a égide da ONU. Além
do Force Commander da missão, as Forças Armadas brasileiras contribuem com mais 5
oficiais de Estado-Maior (DPKO, 2016; UNITED NATIONS, 2016d) (DE SOUZA, 2015).
5 CONCLUSÃO
A Organização das Nações Unidas empregou uma série Operações de Paz para o
restabelecimento desta e para a reconstrução dos Estados-Nação. Neste contexto, o
continente africano e sua complexa agenda de segurança sofreu forte influência dos
acontecimentos mundiais, em particular, o fim da Guerra Fria (BUZAN e HANSEN, 2002). A
variada gama de colonizadores, o processo mal conduzido de descolonização e as
conjunturas típicas do fim da Guerra Fria trouxeram à África um quadro de agravamento e
surgimento de conflitos, com todos seus reflexos. Já o Brasil passou por momentos de maior
e menor proximidade com a África, conforme exposto anteriormente. Da estagnação dos
anos 1980, a ascensão da década de 1990 e o ápice durante o início do século XXI, o Brasil
sempre se fez presente no continente que, dentre outros aspectos, constitui nosso entorno
estratégico.
Assim, pode-se observar que o país empregou suas Forças Armadas em operações
daquela natureza de diversas formas, aproveitando a demanda de cada época e de acordo
com sua capacidade. No período inicial de estudo, houve participações de mais destaque
em Moçambique e Angola, com tropas, observadores e posições de liderança. Em um
período intermediário, entre 1995 e 2004, houve emprego esporádico e pontual em algumas
missões, e notou-se que, embora houvesse demanda, não havia interesse. Finalmente, num
terceiro período, a partir de 2004, houve um acréscimo de contribuição – não mais com
tropas, mas com observadores, oficiais de estado-maior e comandantes- e a sistematização
desse envio. Em grande parte, outros compromissos firmados no âmbito da Organização –
o Haiti e a MINUSTAH – versus a capacidade de o país contribuir com missões de paz fez
com que a participação na África fosse a descrita.
Dos fatos apresentados no trabalho, não há indícios que o Brasil mudará radicalmente
seu perfil de contribuição para as Operações de Paz no continente africano. No entanto,
ainda com uma redução da contribuição para a MINUSTAH e os atuais encargos na missão
no Líbano (UNFIL), não há perspectivas reais de contribuição com tropas nas operações na
África.
Não obstante, chamam a atenção a assunção da liderança da missão do Congo pelo
general brasileiro Santos Cruz e seu desempenho altamente reconhecido no comando de
17
uma missão com perfil absolutamente distinto das demais missões de paz instauradas até
hoje. Tal fato poderia abrir novas portas, que atribuíssem responsabilidades crescentes na
condução de outras missões no continente?
Por fim, ressalta-se que há mais janelas de oportunidade nas Operações de Paz sob a
égide da ONU, desenvolvidas na África, do que as pessoas podem imaginar. Constituem
exemplos os inúmeros programas de desminagem humanitária, num dos continentes mais
afetados pelas minas e explosivos remanescentes da guerra, e as oportunidades de
gerência e condução dos mesmos por militares brasileiros, experimentados nas mesmas
lides, nas Américas do Sul e Central. Ainda, o país desenvolve uma série de projetos
estratégicos e as operações na África podem servir de plataforma de lançamento e impulsão
a vendas dos mesmos, fomentando a Indústria Nacional de Defesa e gerando retornos
inesperados para o país. Mas o tempo irá ditar as regras e as tendências futuras. Cabe a
nós, só e somente só, acompanhar os fatos.
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