Modelos climaticos globais
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320 Painel brasileiro de mudanas climticas
A v a l i a o d e M o d e l o s G l o b a i s e
R e g i o n a i s C l i m t i c o s
8
Autores Principais
Chou Sin-Chan INPE
Paulo Nobre INPE
Autores Revisores
Felipe Pimenta UFRN; Maria Valverde INPE
Colaborador Geral
Gabrielle Ferreira Pires - UFV
Autores Colaboradores
Aline Maia EMBRAPA; Chou Sin Chan INPE; Edmilson Freitas USP;
Gilvan Sampaio INPE; Iracema F. A. Cavalcanti INPE; Juan Ceballos INPE;
Marcos h. Costa UFV; Marcus J. Bottino INPE; Paulo Nobre INPE;
Ricardo Camargo - USP; Wagner Soares - INPE
-
322 Painel brasileiro de mudanas climticas
Neste captulo apresentada a capacidade dos modelos numricos em reproduzir o clima presente sobre a Amrica
do Sul. Caractersticas e desenvolvimentos do modelo global atmosfrico do CPTEC, do modelo global acoplado
oceano-atmosfera do CPTEC e modelos regionais climticos so descritos. No modo climtico, os modelos globais
utilizam resoluo de cerca de 200 km, enquanto os modelos regionais geralmente utilizam a resoluo de cerca de
50 km. Mtodos estatsticos de downscaling e resultados sobre o Brasil so apresentados. Processos de retroalimen-
tao oceano-atmosfera, radiao-nuvem, biosfera-atmosfera so discutidos e resultados de simulaes numricas
so apresentados. Avaliaes dos modelos globais atmosfrico e acoplado e regionais climticos em representar
alguns fenmenos meteorolgicos que atuam na regio: El Nio-Oscilao Sul, Zona de Convergncia do Atlntico
Sul, Zona de Convergncia Intertropical, Ciclones extratropicais, Modo Anular do hemisfrio Sul e jato de Baixos
Nveis, so apresentadas. Em geral, os modelos numricos simulam satisfatoriamente estes fenmenos. Alguns
erros sistemticos so identificados. Problemas de poluio atmosfrica e do efeito da ilha de calor so simulados
para a megacidade de So Paulo e consequncias para mudanas climticas so discutidas. A problemtica da el-
evao do nvel do mar discutida. Incertezas em simulaes do clima presente so exploradas a partir de variaes
de configurao de um mesmo modelo, o hadCM3, ou a partir de diferentes modelos que possuem diferentes
configuraes, sejam globais atmosfricos, globais acoplados oceano-atmosfera ou regionais climticos.
S u m r i o e x e c u t i v o
Avaliao de modelos globais e regionais climticos 323
-
Modelos climticos globais e regionais tm tido grandes avanos nos ltimos anos em termos da representao
de processos e fenmenos crticos para estudo das mudanas climticas globais, seus impactos sobre o Brasil e
aes de mitigao. O Brasil tem se destacado nesta rea, atravs do desenvolvimento de modelos atmosfricos
regionais e globais, a exemplo dos modelos atmosfricos regionais Eta e BRAMS e dos modelos globais atmos-
frico e acoplado oceano-atmosfera do CPTEC. Como fruto da maturidade em modelagem atmosfrica e ambiental
brasileira, surgiu e est em pleno desenvolvimento o Modelo Brasileiro do Sistema Climtico Global - MBSCG, coor-
denado pelo INPE, com participao de diversas Universidades e instituies de pesquisa no Brasil e no exterior. O
MBSCG baseado no modelo acoplado oceano-atmosfera global do CPTEC/INPE, ao qual esto sendo integrados
componentes de qumica atmosfrica e aerossis, vegetao dinmica, fogo e hidrologia continental, gelo e bio-
geoqumica marinha, alm da descarga fluvial nos oceanos. Caracterstica marcante do MBSCG sua ampla gama
de atuao, abrangendo escalas de tempo de dias paleoclimtica.
Este captulo sintetiza a produo do conhecimento no Brasil sobre a modelagem climtica global e regional,
pertinente s mudanas climticas globais e seus impactos sobre o Brasil.
8 .1 I n t r o d u o
Avaliao de modelos globais e regionais climticos 325
-
326 Painel brasileiro de mudanas climticas Avaliao de modelos globais e regionais climticos 327
8 . 1a h ierarquia dos modelos acoplados, globais e reg ionais, inclu indo mtodosde aninhamento e dowNSc aliNg
8 .1.1 MODE L AGE M ATMOSF R IC A GLOBAL
At o presente, o nico modelo de circulao geral da at-
mosfera global com resultados publicados sobre estudos
do clima, com desenvolvimentos na Amrica do Sul, o
modelo atmosfrico global (MCGA) do CPTEC/INPE (Cav-
alcanti et al., 2002; Marengo et al., 2003).
O MCGA do CPTEC/INPE, base do Modelo Brasileiro
do Sistema Climtico Global (MBSCG), tem sido desen-
volvido pelo CPTEC desde a sua verso inicial do Center for
Ocean-Land-Atmosphere Studies (COLA) de 1994. Os pro-
cessos dinmicos e fsicos desse modelo eram calculados
da mesma forma que no modelo do COLA, que utilizava
truncamento romboidal, enquanto o MCGA CPTEC/COLA
passou a usar truncamento triangular. As caractersticas at-
mosfricas climatolgicas globais representadas com essa
verso foram apresentadas em Cavalcanti et al. (2002a),
onde h uma descrio detalhada do desempenho do
modelo. A variao sazonal da precipitao, presso ao
nvel do mar, ventos em altos e baixos nveis, bem como a
estrutura vertical dos ventos e temperatura, so bem simu-
lados pelo MCGA CPTEC/COLA. Os principais centros as-
sociados a ondas estacionrias nos dois hemisfrios so ra-
zoavelmente bem reproduzidos. Entretanto, a precipitao
subestimada principalmente nas regies da Indonsia, da
Amaznia e centro-sul da Amrica do Sul e superestimada
no Nordeste do Brasil e nas regies de convergncia inter-
tropical (ZCIT) e da Amrica do Sul (ZCAS). Embora erros
sistemticos ocorram nas regies tropicais, as maiores cor-
relaes entre anomalias de precipitao do modelo e ob-
servadas ocorrem nessa regio, que inclui o extremo norte
do Nordeste do Brasil e leste da Amaznia. Anlises dos
fluxos de radiao solar que chegam superfcie, simula-
dos pelo MCGA CPTEC/COLA, indicaram valores maiores
que os observados, nas situaes com cu claro e com nu-
vens (Tarasova e Cavalcanti, 2002). O vis nos fluxos com
cu claro ocorria devido falta do efeito de aerossis no
cdigo de radiao de ondas curtas do modelo, enquanto
o vis nos fluxos quando as nuvens esto presentes era
associado s deficincias na simulao das nuvens.
O excesso de radiao de onda curta que chega
superfcie foi reduzido com a implementao de um
esquema de parametrizao de radiao de ondas cur-
tas CLIRAD em uma nova verso do modelo MCGA
CPTEC/INPE (Tarasova et al., 2007). A mudana de pa-
rametrizao, alm de aproximar os fluxos de radiao
simulados aos observados, apresentou impactos na pre-
cipitao, reduzindo o vis na Indonsia e na regio da
ZCAS (Barbosa e Tarasova, 2006; Barbosa et al., 2008).
Um outro esquema de radiao utilizado pelo modelo
unificado do UK Met Office, o qual inclui ondas curtas e
longas, foi tambm implementado como uma outra op-
o no MCGA (Chagas e Barbosa, 2006; Barbosa e Cha-
gas, 2008). Este esquema produziu fluxos mais prximos
aos observados, comparados aos esquemas anteriores,
com impactos tanto positivos quanto negativos na pre-
cipitao.
A comparao dos dois esquemas de conveco,
originalmente includos no MCGA, Relaxed Arakawa-
Schubert (RAS) e KUO, e uma verso ajustada no RAS
(com modificaes na base e no topo das nuvens e na
eficincia das nuvens em converter gua lquida das nu-
vens para precipitao) indicou menores erros para pre-
cipitao de vero sobre a Amrica do Sul com o esque-
8 .1.2 MODE L AGE M ACOP L ADA OC E ANO -ATMOSF E R A
8 .1.3 MODE L AGE M ATMOSF R IC A R EG IONAL
ma KUO (Pezzi et al., 2008). O esquema KUO apresenta
dficit de precipitao na regio da Amaznia e excesso
no setor sul da ZCAS, porm o esquema RAS apresenta
bandas com sinal alternado de erros da Amaznia ao
Nordeste. A implementao do esquema de conveco
GRELL no MCGA tem mostrado uma melhor aproxima-
o da precipitao de vero, principalmente sobre a
Amrica do Sul (Figueroa et al., 2006). A configurao
da precipitao sobre a Amaznia e ZCAS bem semel-
hante ao observado em resultados com esse esquema.
O Modelo Global Atmosfrico do CPTEC possui uma
verso para estudos do paleoclima (Melo e Marengo,
2008). Os resultados desta verso podem ser encontra-
dos no Captulo 3 deste relatrio.
Esta seo aborda os modelos regionais usados sobre a
Amrica do Sul para estudos de mudanas climticas e
seus erros sistemticos. Em outra seo so enfatizados
os resultados relacionados a fenmenos de grande escala,
tais como o ENSO, jato em Baixos Nveis, ZCIT, ZCAS, etc.
A vantagem do emprego de modelos regionais
climticos para o estudo das mudanas climticas so-
bre a Amrica do Sul est na possibilidade de detalhar
os cenrios climticos fornecidos pelos modelos globais,
que geralmente apresentam baixa resoluo espacial, a
Os campos de temperatura da superfcie do mar (TSM)
sobre os oceanos Atlntico Tropical (Nobre and Shukla,
1996) e Pacfico equatorial so dois importantes condi-
cionantes do estado mdio do clima e sua variabilidade
interanual sobre a Amrica do Sul. Estudos que utilizam
modelos acoplados oceano-atmosfera de complexidade
intermediria mostram evidncias de que a variabilidade
interanual das TSM sobre o Atlntico Tropical amorte-
cida localmente (Zebiak, 1993), sendo sua variabilidade
interanual mantida atravs de perturbaes atmosfricas
de origem remota, como sugerido no trabalho de Nobre et
al. (2003). Repelli e Nobre (2004) utilizaram a tcnica de
correlaes cannicas para estudar o papel do acoplamen-
to oceano-atmosfera para a previsibilidade de anomalias
de TSM sobre o Atlntico Tropical. Eles mostraram que o
evento ENOS explica poro significativa da varincia das
anomalias de TSM sobre o Atlntico Tropical Norte, mas
no sobre o Atlntico Tropical Sul, onde a previsibilidade
das anomalias de TSM era inferior simples persistncia
(Repelli and Nobre, 2004).
j o estudo de previsibilidade de anomalias de TSM
globais utilizando o modelo acoplado do INPE (Nobre et
al., 2012) mostrou destreza de previsibilidade das anoma-
lias de precipitao e TSM sobre o Atlntico Tropical Sul
acima da simples persistncia. Este foi o primeiro resultado
apontando para a importncia dos processos de acopla-
mento oceano-atmosfera sobre o Atlntico Sul, os quais
necessitam ser considerados para a modelagem do sistema
climtico global. Tal evidncia suportada pelos resultados
de investigao com modelo acoplado oceano-atmosfera
sobre o papel da Corrente das Agulhas no transporte me-
ridional de calor e modulao das TSM sobre o Atlntico
Sul (haarsma et al., 2008, 2011) e sobre a importncia em
corretamente simular os processos dinmicos no Atlntico
Tropical na modulao da Zona de Convergncia Intertropi-
cal (Rodrigues et al., 2011; Nobre et al., 2012). A capacidade
de modelagem do Oceano Austral pelo modelo acoplado
CCSM4 abordado por weijer et al. (2012) e os efeitos da
cobertura de gelo Antrtico no clima do hemisfrio Sul so
pesquisados por Raphael et al. (2010).
-
328 Painel brasileiro de mudanas climticas Avaliao de modelos globais e regionais climticos 329
menor custo computacional. Mesmo com aumento do
poder computacional e da resoluo dos modelos glo-
bais, continuar havendo a possibilidade e o interesse
em detalhar ainda mais a descrio dos processos atmos-
fricos, das caractersticas da superfcie, etc. As primeiras
tentativas de autores brasileiros em estender o prazo
de previso de modelo regional sobre a Amrica do Sul
(Chou et al., 2000; Nobre et al., 2001; Chou et al., 2002;
Chou et al., 2005; Fernandez et al., 2006) mostraram o
ganho da tcnica de downscaling dinmico em melhorar
a qualidade da previso de precipitao do modelo global
que foi utilizado como forante lateral.
O modelo espectral regional RSM (Regional Spectral
Model) (juang e Kanamitsu, 1994) tem sido empregado
em previses climticas no Nordeste do Brasil. Nobre et
al. (2001) aninharam o modelo RSM a 3 membros de
previses do EChAM3 para estao chuvosa do Nordeste
do Brasil, janeiro a abril de 1999. Eles mostraram que o
RSM melhorou a posio da ZCIT e consequentemente
melhorou a distribuio das chuvas na regio. Por outro
lado, no trabalho de Brabo et al. (2003), em que o mod-
elo RSM foi integrado por 3 meses, fevereiro a abril, de
um ano chuvoso e um ano seco, o modelo EChAM4.5,
que forneceu as condies de contorno, previu melhor o
padro espacial da ZCIT do que o RSM. Eles mostraram
pouca sensibilidade do modelo s mudanas na umidade
do solo. Sun et al. (2005) produziram integraes de seis
meses com RSM para um maior nmero de casos, de
1971 a 2000, e encontraram que o RSM corrigiu a posio
da ZCIT do EChAM4.5, mas apresentava subestimativa da
precipitao na regio.
Da Rocha et al. (2009) utilizaram o modelo RegCM3
forado com reanlises do NCEP-NCAR (Kalnay et al.,
1996) como condies de contorno e temperatura da su-
perfcie do mar observada para reproduzir o clima de vero
nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro sobre uma
rea que cobre grande parte do territrio brasileiro. Nestas
simulaes, mostrou-se que o modelo capaz de repro-
duzir as principais caractersticas de circulao de vero
como a banda de precipitao associada ZCAS e o ciclo
diurno da precipitao em diferentes reas do domnio. Di-
agnosticou-se como uma das principais falhas do modelo a
produo de precipitao particularmente sobre o Oceano
Atlntico, que foi em grande parte gerada pelo esquema de
precipitao explcita do modelo, havendo pouca produo
de precipitao pelo esquema de parametrizao de con-
veco, apesar da resoluo espacial em 50 km.
A gerao de cenrios de mudanas climticas em
maior resoluo sobre a Amrica do Sul foi iniciada a par-
tir do projeto CREAS (Regional Climate Change Scenarios
for South America) (Marengo e Ambrizzi, 2006; Ambrizzi
et al., 2007). Neste projeto foram utilizados trs mode-
los regionais climticos, RegCM3, hadRM3 e Eta-CCS, e
2 cenrios de mudanas climticas, A2 e B2, fornecidos
pelo modelo global atmosfrico do Centro Britnico, had-
AM3P. Os modelos foram rodados na resoluo horizon-
tal de 50 km para os perodos de 1961-1990, clima pre-
sente, e de 2070 a 2100, clima futuro. Os cenrios gerados
a partir de trs modelos regionais procuraram incluir al-
guma informao de incerteza de modelagem numrica
nas projees regionalizas (downscaling). A verso Eta-
CCS utilizada no projeto CREAS foi desenvolvida por
Pisnichenko e Tarasova (2009). Esta verso reproduzia
os padres de precipitao sobre o continente, apesar
da subestimativa durante o vero. Uma nova verso do
modelo, o Eta-CPTEC, foi desenvolvida, independente-
mente da verso Eta-CCS e sob encomenda do Minist-
rio da Cincia e Tecnologia, para apoiar a elaborao da
Segunda Comunicao Nacional (Brazil, 2010). A verso
Eta-CPTEC inclui o aumento dos nveis de concentrao
de CO2 segundo o cenrio de emisso e a variao diria
do estado da vegetao ao longo do ano, que so car-
actersticas importantes para estudo em integraes de
mudanas climticas e so algumas das caractersticas
que distinguem a verso Eta-CPTEC do Eta-CCS. O mod-
elo Eta-CPTEC foi utilizado para produzir a regionalizao
do cenrio A1B fornecido pelo modelo hadCM3, modelo
global acoplado oceano-atmosfera, em 4 verses de per-
turbao do modelo global. Neste projeto, foi includa a
incerteza das condies de contorno provenientes dos 4
membros do cenrio A1B. O modelo regional foi inte-
grado na resoluo horizontal de 40 km, para o perodo
de 1961 a 1990 (Chou et al., 2011) e os cenrios futuros
em 3 perodos de 30 anos, 2011-2040, 2041-2070 e 2071-
2100 (Marengo et al., 2011).
Em projeto financiado pelo programa europeu 7th
Framework Programme para estudo de impactos e vul-
nerabilidade em cenrio futuro de mudanas climticas
na Bacia do Rio da Prata, vrios modelos regionais par-
ticipam da regionalizao: MM5, RegCM3, RCA, REMO,
PROMES, Eta, e IPSL. Apesar do foco sobre a Bacia do
Rio da Prata, o domnio utilizado pelos modelos cobre
toda a Amrica do Sul. Os modelos climticos regionais
produziram simulaes do clima presente utilizando as
reanlises do Era-Interim (Dee et al., 2011) no perodo
de 1989 a 2008. Estas simulaes permitem identificar os
principais erros dos modelos regionais.
As principais caractersticas dos modelos regionais uti-
lizados por grupos brasileiros para gerao de cenrios de
mudanas climticas esto resumidas na Tabela 8.1.
RC M Instituio Referncia Res .Prazo
IntegraoConveco
cumulusMicrofsica de nuvens
R ad iaoEsquema de superf c i e
Cond io de contorno
C amada l im i te
p l anetr i a
Eta-CPTEC I N P E
Pesquero e t a l . 200 9 ;
Chou e t a l . , 2011 ; Marengo
e t a l . . 2011
40km/38L
1961-1990; 2011-2040; 2041-2070; 2071-2100
Be t t s and Mi l l e r , 19 8 6 ; j an j i c 19 9 4
Zhao scheme (Zhao , 19 97)
Lac i s and
hansen , 1974 ;
Fe l s and Schwar -zkop f , 1974
Chen and Dudh ia ,
2001 (NOAh)
Mes inger , 1977
Mel lo r Ya -mada 2 .5
Eta-CCS I N P E
P i s -n i chenko and Ta ra -
sova .
50km/38L1961-1990; 2071-2100
Be t t s and Mi l l e r , 19 8 6 ; jan j i c , 19 9 4
Fer r i e r s cheme (2002)
Lac i s and
hansen , 1974 ;
Fe l s and Schwar -zkop f , 1974
Chen and Dudh ia ,
2001 (NOAh)
Mes inger , 1977
Mel lo r Ya -mada 2 .5
haDRM3P U K MO
Col l ins e t a l . , 200 6 ;
A l ves e Marengo (200 9)
50km/L191961-1990; 2071-2100
Gregor y &Rownt ree ,
19 9 0 ; Gregor y& A l l en ,
19 91
Sen io r and
Mi t che l l (19 93) ,
S l ingo , 19 9 0
Cox e t a l . , 19 9 9 , 4 l y r s , (MOSE S I )
Dav ies , 1976Smi th , 19 9 0 .
RegCM3 IC TP
Giorg i and
Mearns , 19 9 9 ;
da Rocha e t a l . , 200 9
50 km / L30
1961-1990; 2071-2100
Gre l l , 19 93
Pa l e t a l . , 2000
K ieh l e t a l . ,
19 9 6
Dick inson e t a l . , 19 93
(BATS)
Dav ies , 1976 , 5 rows bu f fe r zone
ho l t s l ag e t a l . , 19 9 0
Tabela 8.1 Modelos regionais com integraes de cenrios de mudanas climticas sobre Amrica do Sul
-
330 Painel brasileiro de mudanas climticas Avaliao de modelos globais e regionais climticos 331
Alves e Marengo (2009) avaliaram o clima presente
reproduzido pelo modelo hadRM3P, aninhando dados
gerados pelo hadAM3P, e encontraram erros sistemticos
negativos na temperatura em reas tropicais. A precipita-
o, por sua vez, apresentou erros sistemticos negativos
durante a estao chuvosa, portanto subestimativa, na
parte central do continente, e erros de pequena magni-
tude na mesma regio durante a estao seca.
Pesquero et al. (2009) e Chou et al. (2011) utilizaram
o Modelo Eta para reproduzir o clima presente sobre a
Amrica do Sul. Enquanto no primeiro trabalho foi uti-
lizada a resoluo de 50 km e condies do modelo
hadAM3P no contorno lateral para o perodo de 1979 a
1989, no segundo trabalho foi utilizada a resoluo de 40
km, 4 membros de condies do hadCM3 no contorno
lateral, no perodo 1961-1990. Em ambos os trabalhos,
os resultados concordaram entre si, apresentando sub-
estimativa da precipitao sobre a Amaznia no perodo
chuvoso, apesar de este erro ter menor amplitude que
o erro dos modelos globais utilizados na condio de
contorno lateral. Os resultados concordaram tambm na
superestimativa da precipitao na regio central do pas
e sobre regies de montanhas, apesar de que a escassez
de observaes em regies de montanha limita a confi-
abilidade da estimativa do erro.
No uso de um conjunto perturbado de condies
de contorno, Chou et al. (2011) mostraram que o esp-
alhamento da precipitao e da temperatura entre os 4
membros das simulaes do Modelo Eta era menor que a
raiz do erro quadrtico mdio daquelas variveis no clima
presente. Comparando estes resultados com aqueles do
modelo global que forneceu as condies de contorno
lateral, mostrou-se que espalhamento e os erros eram
da mesma magnitude do hadCM3, o que indica que o
conjunto de modelos regionais herdou as mesmas carac-
tersticas do conjunto de modelos globais.
8 .1.4 M TODOS DE DOW NSC AL I NG E STAT ST ICO
Os modelos de circulao geral (modelos climticos glo-
bais), apresentam-se em escalas espaciais (240 a 600 km)
e temporais (mensal) geralmente incompatveis com as es-
calas requeridas para estudos de impactos. O refinamento
de escala (downscaling) das projees dos GCMs requer a
incorporao de informaes locais e particularmente im-
portante para reas de topografia complexa, ilhas e regies
costeiras ou ainda reas com cobertura do solo/uso da terra
extremamente heterogneos (Murphy, 1997; wilby et al.,
2004; Vrac et al., 2007). Os mtodos de downscaling podem
ser de natureza temporal ou espacial.
h dois tipos bsicos de abordagem utilizados para
downscaling: a abordagem dinmica e a emprica. A primeira
inclui o desenvolvimento de modelos (dinmicos) climti-
cos regionais (RCMs regional climate models) utilizando
condies iniciais e de contorno oriundas de GCMs desen-
volvidos via modelagem dinmica de processos nos oceanos
e/ou atmosfera. Tais modelos tm a capacidade de represen-
tar fenmenos meteorolgicos de escala global e, com o aco-
plamento de grades refinadas, conseguem tambm represen-
tar de forma mais acurada os fenmenos de escala local. Na
abordagem emprica, estatstica ou estocstica, so utilizados
mtodos estatsticos para estimar relaes quantitativas entre
preditores relacionados a fatores de larga escala e variveis
prognsticas dependentes de condies fisiogrficas locais.
So tambm conhecidos como mtodos de desagregao
ou refinamento estatstico; podem ser de natureza temporal,
como por exemplo em Mendes & Marengo (2010), espacial
(Ramos, 2000) ou ainda envolvendo os dois tipos de dimen-
ses (escalas) simultaneamente. Uma reviso detalhada so-
bre mtodos para downscaling estatstico apresentada em
Fowler et al., 2007.
A abordagem estocstica (downscaling estatstico) ba-
seia-se no princpio de que o clima local condicionado por
dois tipos de fatores: os fatores de larga escala que mensu-
ram aspectos da circulao global (ex., El Nio/Oscilao Sul,
ENOS) e caractersticas fisiogrficas locais, tais como topo-
grafia, alternncia terra/mar nas regies costeiras e uso da
terra (wilby et al., 2004).
No documento Guidelines for use of climate scenarios
developed from statistical downscaling methods (wilby et al.,
2004), os autores classificam os mtodos de downscaling es-
tatstico em trs categorias:
a) Mtodos baseados na classificao de padres de
tempo (weather classification ou weather typing schemes).
Nessa abordagem, variveis climticas locais so relacionadas
com classes de tempo. Essas classes so definidas de forma
sinptica, utilizando funes empricas ortogonais geradas a
partir de dados de presso, ndices de presso atmosfrica
na superfcie do mar ou ainda anlise de agrupamentos ou
regras de lgica nebulosa aplicadas aos campos de presso.
Probabilidades condicionais relacionadas a variveis locais,
como Fowler et al., 2007, por exemplo, sequncias de dias
secos ou chuvosos, so estimadas em funo de padres
dirios de tempo (weather types). Projees de mudanas
climticas para essas variveis locais so obtidas avaliando-se
a mudana de frequncia das classes de tempo simulada via
GCMs (Fowler et al., 2007).
b) Geradores de tempo (weather generators). So mod-
elos de sries temporais que descrevem o padro sintico
de uma srie diria observada. Geralmente utilizam cadeias
de Markov para modelar a probabilidade de sequncias de
dias secos e chuvosos e distribuies de probabilidade para
a varivel contnua de interesse em cada dia (ex., distribuio
Gama para chuva diria). Os parmetros do modelo de sri-
es temporais so alterados de forma a considerar forantes
climticas para o futuro.
c) Modelos de Regresso. Estimam relaes quantitativas
entre preditores oriundos de GCMs e variveis prognsticas
locais, utilizando modelos empricos. Incluem uma variedade
de mtodos, como regresso linear mltipla, regresso no
linear, regresso de componentes principais e redes neurais
artificiais (Fowler et al., 2007; Mendes et al., 2009).
Abordagens com mtodos de modelagem de distri-
buies de probabilidade, conhecidas como anlise de so-
brevivncia propostos por Maia & Meinke (2010) para pre-
viso probabilstica sazonal, podem tambm ser utilizadas
para downscaling estatstico. Projees probabilsticas (dis-
tribuies de probabilidade) para variveis climticas locais,
condicionadas a preditores de larga escala, so obtidas via
modelos de sobrevivncia, como por exemplo, o modelo
semiparamtrico de Cox (Cox, 1972). Modelos empricos
para gerar projees de incio de estao chuvosa em funo
de preditores derivados do fenmeno ENOS, por exemplo,
so apresentados em Maia et al. (2011).
No Brasil, h uma predominncia do uso de mtodos
dinmicos de reduo de escala via desenvolvimento de
modelos climticos regionais (RCMs). O Sistema PRECIS
(Providing Regional Climates for Impacts Studies; jones
et al., 2004) foi utilizado para gerar chuva, temperatura e
vento para todo o Brasil (Alves & Marengo, 2010) a partir de
condies iniciais e de contorno do hadCM3 (UK Met Office
Hadley Centre HadCM3 global model). Utilizando o modelo
regional Eta-CPTEC, acoplado ao hadCM3, o CPTEC/INPE
(Centro de Previso de Tempo e Estudos Climticos/Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais) gerou projees climticas
de fina escala (40 x 40 km) para a Amrica do Sul (Pesquero
et al., 2009; Chou et al., 2011; Marengo et al., 2011).
Algumas experincias de downscaling estatstico para
o Brasil esto sumarizadas na Tabela 8.2. A varivel prog-
nstica mais frequente a precipitao; entre os mtodos
utilizados, h uma predominncia de redes neurais artificiais
e anlise de regresso.
As vantagens e limitaes dos principais mtodos de
downscaling estatstico, de acordo com wilby et al. (2004),
esto resumidos na Tabela 8.3.
-
332 Painel brasileiro de mudanas climticas Avaliao de modelos globais e regionais climticos 333
Reg io Variveisprognsticas Mtodo Refrnc ia Principais resultados
Estado doCear
Prec ip i t ao d i r i a
Mode los de cade ias de
MarkovRobertson et al., 2004
As simulaes so capazes de capturar relativamente bem mudanas interanu-ais de precipitao e ocorrncia diria
de chuva em sequncias de 10 dias em algumas estaes individuais.
Bacia do Pianc,Paraba
Prec ip i t ao s azona l
Redes neura i s e reg resso
l inea r m l t ip l aRamos, 2000
O mtodo de redes neurais apresentou desempenho superior ao de regresso
linear. Ambos apresentaram boa performance para precipitao mensal
e sazonal.
Regies Sudeste e Nordeste
Ven to (10m)
Redes neura i s Gonalves et al., 2010Resultados preliminares indicam um
leve aumento da velocidade do vento de superfcie no Sudeste e Nordeste.
Regies sudestePrec ip i t ao
d i r i a
Redes neura i s e reg resso
l inea r m l t ip l a
Ramirez Valverde & Ferreira, 2006
O mtodo de redes neurais mostrou tendncia de predizer chuvas de mod-eradas a intensas com maior acurcia
durante o vero austral.
Bacia AmaznicaPrec ip i t ao
d i r i a
Redes neura i s e mode lo de au to -
cor re laesMendes & MArengo, 2009
O mtodo de redes neurais apresentou desempenho superior ao de
autocorrelaes.
Regio de So Paulo
Prec ip i t ao d i r i a
Redes neura i s e reg resso l inea r
m l t ip l aRamirez Valverde, et al., 2005
O mtodo de redes neurais apresentou desempenho superior ao de regresso
linear mltipla, que apresentou vis elevado para os dias sem ocorrncia
de chuva.
Tabela 8.2. Sumrio de trabalhos publicados sobre experincias de downscaling estatstico para o Brasil.
Ti po de mtodo Vantagens Limitaes
Mtodos baseados na classificao de padres de tempo (weather typing)
- resu l t am em re laes com in te r -p re tao f s i ca en t re os p red i to res de l a rga esca la e va r i ve i s c l im t i -
cas da super f c i e- so ve r s te i s , podendo se r
ap l i cados pa ra d i fe ren tes t ipos de es tudos (qua l idade de a r , e roso ,
enchen tes , e t c . )- uma compos i o desses mto -
dos t i l pa ra an l i se de even tos e x t remos
- requer a t a re fa ad i c iona l de c l a s -s i f i cao de padres de tempo
- esquemas baseados em padres de c i r cu lao podem se r insens ve i s a
fo ran tes c l im t i cas fu tu ras- t a l vez no cap tu rem va r i aes de tempo den t ro dos d i fe ren tes
padres de c l a s s i f i cao
Geradores de tempo (weather generators)
- h p roduo de in fo rmao pa ra an l i se de ince r tezas
- pe rmi tem in te rpo lao espac ia l de pa rmet ros do mode lo
- podem produz i r in fo rmao em esca la de horas
- h a jus tamento a rb i t r r io de pa rmet ros pa ra cond ies de c l ima
fu tu ro- d i ve r s as va r i ve i s so mode ladas
separadamente , sem que suas in te r -dependnc ias se jam cons ide radas
Mtodos de anlise de regresso
- de ap l i cao re la t i vamente f c i l- podem u t i l i za r todos os p red i -to res d i spon ve i s pa ra pos te r io r
se leo dos ma i s impor tan tes- so de fc i l en tend imento e h g rande d i spon ib i l idade de so f t -
wares pa ra an l i se
- a lguns mode los e xp l i cam apenas uma pequena f rao da va r i ab i l i -
dade obser vada- a lguns desses mtodos requerem re laes l inea res en t re respos tas e
p red i to res e norma l idade da va r i ve l respos ta
- de um modo gera l , no repre -sen tam adequadamente even tos
e x t remos
Tabela 8.3. Sumrio de vantagens e limitaes dos principais mtodos de statistical downscaling (adaptado de Wilby et al, 2004).
A principal vantagem do downscaling estatstico em
relao ao uso de modelos dinmicos quanto ao re-
querimento de recursos computacionais, o que facilita o
uso de preditores derivados de grande nmero de GCMs.
No entanto, alm de requerer a existncia de sries longas
de dados locais para as variveis de interesse, baseia-se
numa importante pressuposio para validade na gerao
de projees de cenrios climticos futuros: a relao entre
os preditores e a varivel-resposta de interesse de ter a
propriedade de invarincia temporal, ou seja, permanecer
vlida no futuro, mesmo para valores dos preditores fora
do intervalo de variao dos dados utilizados para derivar
as referidas relaes. Esse pressuposto questionvel para
cenrios de mudanas climticas de maior magnitude.
-
334 Painel brasileiro de mudanas climticas Avaliao de modelos globais e regionais climticos 335
8 .2representao de processos de retroalimentao nos modelos climticos
8 .2 .1 OC E ANO -ATMOSF E R A
Os oceanos representam o maior reservatrio de calor do
sistema climtico global, modulando processos atmosfri-
cos de escalas temporais que variam de horas a milhares
de anos. A base fsica de controle climtico pelos oceanos
reside na absoro de grande parte da energia solar na
regio equatorial do planeta e sua redistribuio atravs do
sistema de correntes ocenicas, de superfcie e profundas.
No entanto, o prprio sistema de correntes ocenicas
gerado pela interao com a atmosfera, atravs no so-
mente dos fluxos de calor, mas tambm de momento e
gua. Assim, a atmosfera e o oceano formam um sistema
complexo, acoplado com processos de retroalimentao
que contribuem para modular o clima do planeta. Modelos
acoplados oceano-atmosfera constituem, desta forma, um
conjunto de ferramentas imprescindveis para o estudo
do clima, sua variabilidade e mudana. Atravs do ciclo hi-
drolgico global, oceanos-continentes-atmosfera formam
um sistema complexo acoplado com inter-relaes mltip-
las. O trabalho de Nobre et al. (2009) exemplifica o proces-
so de retroalimentao oceano-atmosfera, a partir de uma
perturbao de cobertura vegetal na Amaznia. O trabalho
de De Almeida et al. (2007) utiliza um oscilador estocstico
no linear para mostrar que processos de retroalimentao
oceano-atmosfera explicam parte da variabilidade das TSM
e nebulosidade sobre o Atlntico Sudoeste, associados
ocorrncia de eventos de ZCAS durante o vero austral. O
processo descrito como uma perturbao de anomalia
de TSM positiva num tempo t-1, que excita uma pertur-
bao atmosfrica na formao de nebulosidade, a qual
diminui o fluxo de radiao de onda curta superfcie do
oceano, acarretando o resfriamento da superfcie do mar.
Utilizando dados de boias do Projeto PIRATA no Atlntico
Sudoeste e sadas de modelo acoplado global, Nobre et al.
(2011) agregaram evidncias observacionais e de modela-
gem numrica s hipteses de processos de retroalimenta-
o oceano-atmosfera levantados nos trabalhos de Chaves
e Nobre (2004) e De Almeida et al. (2007).
Estudos com modelos acoplados oceano-atmosfera
feitos no Brasil tambm avaliaram os impactos do des-
florestamento da Amaznia no clima global (Nobre et al.,
2009). Neste trabalho, os autores apresentam evidncias
de modelagem acoplada oceano-atmosfera de que a
substituio da Floresta Amaznica por vegetao de sa-
vana afeta o sistema climtico global atravs da alterao
nos padres globais de circulao atmosfrica e ocenica,
com aumento da frequncia de eventos El Nio-Oscila-
o Sul (ENOS) no Pacfico. Os autores sugerem que o
efeito acoplado da atmosfera e dos oceanos, num caso
de reduo da cobertura florestal amaznica, ampliaria a
reduo da precipitao mdia anual sobre a Amaznia,
dos 20% estimados por estudos de modelos atmosfri-
cos (e.g., Gash et al., 1996; Nobre et al., 1991; Shukla et
al., 1990) para uma reduo de aproximadamente 40%
nas simulaes com o modelo acoplado oceano-atmos-
fera do INPE (Nobre et al., 2009).
Pilotto et al. (2006) mostraram que o aninhamento
do modelo atmosfrico regional Eta nos campos de sada
dos modelos global atmosfrico do CPTEC e acoplado
oceano-atmosfera do INPE acarretam uma melhora sub-
stantiva nos fluxos de calor e momento superfcie e nos
campos de precipitao pluviomtrica, relativamente aos
resultados de ambos os modelos globais. Os resultados do
modelo Eta aninhado no modelo acoplado apresentaram
os menores erros quando comparados com observaes.
8 .2 .2 R AD IAO -N UVE M
O IPCC (2007) reporta que progressos substanciais
tm sido obtidos na compreenso das diferenas entre
modelos no que concerne sensibilidade do sistema
climtico frente a uma forante radiativa. Atualmente, a
mdia global da forante das nuvens negativa (elas
exercem um efeito de resfriamento no clima). Em res-
posta ao aquecimento global, o efeito de resfriamento
pode ser fortalecido ou enfraquecido e produzir uma ret-
roalimentao radiativa varivel no prprio aquecimento
do clima. Estudos recentes mostram que diferenas nos
processos de retroalimentao das nuvens permanecem
como a principal fonte de incerteza na sensibilidade
climtica dos modelos de circulao geral (e.g., Dufresne
and Bony, 2008). Zhang et al. (2010) observam que es-
tas questes esto relacionadas com vrios fatores: 1)
o sinal de retroalimentao das nuvens pequeno e
os transientes e a variabilidade espacial das nuvens so
tipicamente muito maiores; 2) as nuvens so altamente
interativas com a dinmica da circulao atmosfrica; 3)
em um MCGA, as nuvens so simuladas com uma trama
interativa de parametrizaes da estrutura da subgrade,
microfsica de nuvens, mistura turbulenta, conveco
cmulos, radiao e fluxos na superfcie, os quais so
pobremente resolvidos pela grade do modelo. Pesquisas
coordenadas no mbito da retroalimentao das nuvens
em mudanas climticas esto sendo realizadas por ini-
ciativas como o Cloud Feedback Model Intercompari-
son Project (CFMIP) (ver URL hTTP://cfmip.metoffice.
com/index.html). O projeto e anlise de experimentos
numricos idealizados pelo CFMIP propem o uso de
simuladores de dados de satlite e outros diagnsti-
cos, para compreender melhor os mecanismos fsicos
subjacentes s diferentes formas de retroalimentao
das nuvens nos modelos climticos. A parametrizao
da cobertura de nuvens nos MCGA atuais segue usual-
mente estratgias baseadas em mtodos diagnsticos,
usando relaes empricas ou funes de distribuio de
probabilidade das variveis estudadas, definidas pelas
condies da grande escala e, em mtodos prognsti-
cos, utilizando uma equao prognstica para cobertura
que contempla processos de adveco, fontes e sumi-
douros (jakob, 2001). Com o incremento da capacidade
de processamento, esto sendo realizados estudos com
modelos de nuvens aninhados nos modelos de circula-
o geral, conhecidos como superparametrizao de nu-
vens (e.g., wyant et al., 2009). As origens das diferenas
entre observao e simulao dos fluxos turbulentos por
modelos de previso numrica de tempo (PNT, no que
segue) podem dever-se parametrizao adequada de
propriedades microscpicas e macroscpicas de nuvens
e constituintes atmosfricos, mas tambm acurcia dos
cdigos radiativos utilizados. Simulaes efetuadas com
o modelo original CPTEC/COLA mostraram diferenas
com os obtidos pelo Earth Radiation Budget Experiment
(ERBE), que foram atribudas aos esquemas de parame-
trizao de ondas curtas e de parametrizao de nuvens
(Cavalcanti et al., 2002a). O uso de outros esquemas
de radiao conseguiu aprimoramentos nos fluxos radia-
tivos para cu claro e com nuvens, conservando erros
cujas causas seriam as deficincias na simulao das
nuvens (Barbosa et al., 2008; Chagas e Barbosa, 2008).
Nos modelos usuais de PNT, a propagao de radiao
de onda curta e longa na atmosfera descrita numa col-
una dentro de uma clula de grade (ponto de grade),
considerando camadas horizontais nessa coluna (multi-
layered atmosphere). Os cdigos radiativos associados
a esses modelos necessitam de informao sobre gases
e particulado em cada camada, alm de propriedades
microfsicas e macrofsicas das nuvens, tais como raio
efetivo de gotas e cristais, frao de fase lquida e slida,
coluna de gua lquida/slida associada (liquid water
path, LWP, e/ou ice water path, IWP) e frao de cober-
-
336 Painel brasileiro de mudanas climticas Avaliao de modelos globais e regionais climticos 337
tura na clula de grade. A propagao de radiao solar em
cada camada descrita por sistemas de equaes de dois
fluxos e a equao de propagao para radiao difusa de-
screve a radiao trmica. A partir das solues gerais des-
sas equaes, as irradincias que ingressam e emergem
em cada camada podem ser obtidas por diversos algorit-
mos associados economia de tempo de cmputo. Os
resultados permitem avaliar a divergncia vertical do fluxo
radiativo e a taxa de aquecimento associada, assim como
os saldos de radiao superfcie e a radiao emergente
no topo da atmosfera. Assim, estudar as relaes radiao/
nuvem/clima implica, stricto sensu, considerar os modelos
de propagao adequados e sua parametrizao para di-
versos esquemas microfsicos e macrofsicos na atmosfera.
Isto sugere a convenincia de estudos especficos que con-
templem, por exemplo, os cdigos radiativos adequados
para propagao em gases, o efeito intragrade e intergrade
da interao lateral entre nuvens, os efeitos de descrever
a cobertura parcial como uma nica nuvem equivalente
plana, e o efeito direto e indireto de aerossis em proprie-
dades radiativas de nuvens e atmosfera.
No Brasil, tais estudos especficos no so numerosos.
Sem esgotar a lista de resultados reportados, podem ser
mencionados trabalhos nos mbitos seguintes:
Radiao solar em atmosfera com aerossol de queima-
das. Tarasova et al. (1999) publicaram diversas descries
da atenuao de radiao solar durante o experimento
ABLE (Amazon Boundary Layer Experiment). Rotinas de-
senvolvidas na NASA para estimativa de espessura ptica
e outros parmetros de aerossol a partir de imagens MO-
DIS foram implementadas na DSA/CPTEC/INPE (ver URL
hTTP://satelite.cptec.inpe.br). Por um lado, os dados gera-
dos sobre o territrio brasileiro podem ser utilizados como
fonte de informao para estudos de impacto do aerossol
em forantes radiativas; por outro lado, o propsito inicial
foi desenvolver estudos das caractersticas fsicas do aeros-
sol sobre o Brasil, que impliquem em mudanas dessas
rotinas (Rosrio et al., 2011).
Acurcia das parametrizaes que avaliam trans-
mitncia do vapor dgua para radiao solar (Plana-
Fattori et al., 1997; Tarasova e Fomin, 2000).
Desenvolvimento de cdigos radiativos exatos param-
etrizando a integrao de transmitncias line-by-line so-
bre intervalos espectrais escolhidos. O cdigo FLISS (Fast
LIne-by-line satellite Signal Simulator; Fomin e Correa,
2005) um exemplo com relevncia potencial no aprimo-
ramento de rotinas nos modelos de PNT e na simulao de
radincia emergente na atmosfera (potencialmente impor-
tante em processos de assimilao de dados de satlites
em modelos).
Algoritmos de estimativa de perfis de absoro da
radiao solar em atmosfera multicamada tambm
foram desenvolvidos. Um modelo estocstico de dois
fluxos (Ceballos, 1989; Souza et al., 2008) tem potencial
de aprimoramento da eficincia de algoritmos utilizados
nos modelos de PNT.
Numa perspectiva lato sensu do estudo de relaes ra-
diao / nuvem / clima, nos modelos utilizados no Brasil,
foram introduzidos aprimoramentos de estimativas de
transmitncia ou foram implementados cdigos radiati-
vos j utilizados em outros modelos de circulao, anal-
isando-se o impacto decorrente. Exemplos:
Em 1996, o modelo COLA/CPTEC inclua o cdigo
radiativo de Lacis e hansen (1974, no que segue L&h)
para radiao solar, com parametrizao de Davies
(1982) para absortncia do h2O vapor, e o cdigo de
harshvardhan et al. (1987) para radiao trmica. Cha-
gas et al. (2004) comunicaram a substituio do cdigo
de absortncia pelo algoritmo de Ramaswamy e Fre-
idenreich (1992), observando uma pequena reduo
no vis do modelo ao comparar irradincia mdia solar
com os dados do SRB (NASA/GEwEx Surface Radia-
tion Budget: metodologia e aquisio de dados descri-
tos em http://eosweb.larc.nasa.gov/PRODOCS/srb/
table_srb.html).
No modelo COLA/CPTEC, alm do cdigo L&h, atual-
mente est disponvel o de Edwards & Slingo (1996, E&S
no que segue) para onda curta. Tambm foi implemen-
tado o cdigo de radiao trmica E&S. As propriedades de
nuvens nestes esquemas so definidas segundo o modelo
NCAR CCM3 (National Center for Atmospheric Research e
Community Climate Model CCM3). Referncias: ver URL
http://www.cgd.ucar.edu/cms/ccm3/.
O cdigo CLIRAD (Chou & Suarez, 1999) foi desen-
volvido na NASA GSFC. Sua verso para onda curta
(CLIRAD-Sw) com funes de transmitncia aprimora-
das por Tarasova e Fomin (2000) foi instalada no modelo
regional Eta (Tarasova et al., 2006) e no MCG do CPTEC
(Tarasova et al., 2006).
Duas novas implementaes foram realizadas: a substitu-
io do cdigo L&h pelo CLIRAD (Chou & Suarez, 1999) e
o aprimoramento das funes de transmitncia (Tarasova e
Fomin, 2000), descritas por Tarasova et al. (2007). O CLIRAD
solicita definir o raio efetivo de gotas de nuvem. Dentre os im-
pactos observados, pode-se mencionar um melhor ajuste dos
campos de radiao solar superfcie, entretanto um excesso
da radiao estimada permanece provavelmente associada
descrio das nuvens, alm de aumentar o dficit de pre-
cipitao quando comparado a dados do GPCP (Global Pre-
cipitation Climatology Project). Com relao superestimativa
de precipitao observada no MCG do CPTEC, Barbosa et al.
(2008) observaram que ela foi reduzida ao implementar este
cdigo radiativo.
Em geral, os aprimoramentos testados nos cdigos
de radiao tiveram impacto positivo sobre os modelos;
entretanto, uma modelagem explcita da relao mod-
elo de nuvem / radiao / impacto climtico foi escas-
samente abordada nos estudos realizados pela comu-
nidade brasileira. , podendo-se citar estudos numricos
considerando a interao da conveco rasa com os
fluxos superfcie (Souza et al. 2009).
Estudos recentes mostraram que as previses dos
modelos diferem mais e so menos realsticas em
regies de subsidncia, o que enfatiza a necessidade
de aprimorar a representao e avaliao dos proces-
sos de nuvens nos modelos climticos, especialmente
aquelas da camada limite (IPCC, 2007, seo 8.6.3.2).
Os processos de retroalimentao das nuvens baixas
tm sido discutidos em termos do efeito de duas
variveis de nuvens primrias: a quantidade de nu-
vens e a espessura ptica das nuvens (Stephens 2010).
Sobre os oceanos, os estratocmulos em regies de
intensa subsidncia tm forte impacto no balano radi-
ativo; por outro lado, a pequena espessura as faz sen-
sveis a mecanismos de retroalimentao como os pro-
cessos turbulentos da camada limite e resfriamento/
aquecimento radiativo. Estudos acerca destas nuvens
esto sendo elaborados, tais como o VAMOS Ocean-
Cloud-Atmosphere-Land Study Regional Experiment
(VOCALS-REx), um programa de mbito internacional
projetado para fazer observaes de componentes
do sistema climtico acoplado no sudeste do Pacfico
(wood et al. 2011) e, o CFMIP-GCSS (CFMIP-GEwEx
Cloud System Study) intercomparando modelos de
coluna e modelos de nuvens em condies climticas
idealizadas para estratocmulos prximo a costa da
Califrnia (Zhang et al. 2010).
Alguns esquemas baseados na estrutura ter-
modinmica de grande escala foram elaborados para
avaliar a cobertura das nuvens estratocmulos nos MCGA
(Slingo 1987; Klein e hartmann 1993, wood e Bretherton
2006). Esses esquemas apresentam sinais diferentes na
retroalimentao das nuvens, afetando sensivelmente as
previses climticas de um modelo acoplado.
-
338 Painel brasileiro de mudanas climticas Avaliao de modelos globais e regionais climticos 339
8 .2 .3 B IOSF E R A-ATMOSF E R A
Um dos assuntos cientficos de crescente interesse mundial
trata das interconexes entre a biosfera terrestre e a atmos-
fera. Uma das manifestaes mais claras das interaes da
atmosfera com a biosfera a relao entre o padro global
da cobertura vegetal e o clima. O clima o fator que mais
influencia na determinao da distribuio de vegetao e
suas caractersticas num contexto global (Prentice, 1990).
A localizao de desertos, florestas tropicais, entre outras,
ditada pelas caractersticas do clima e, portanto, mudan-
as no clima afetam a distribuio geogrfica da vegetao
global. Por outro lado, mudanas na distribuio e na es-
trutura da vegetao influenciam o clima. As caractersticas
fsicas da vegetao e dos solos tm grande influncia nas
trocas de energia, gua e momentum entre a superfcie
terrestre e a atmosfera. Mudanas na vegetao implicam
em mudanas das propriedades fsicas da superfcie, in-
cluindo o albedo superficial, a rugosidade da superfcie,
o ndice de rea foliar, a profundidade das razes e a dis-
ponibilidade de umidade do solo (Prentice et al., 1992).
Desde o final da dcada de 1980 diversos experimen-
tos com modelos de circulao geral da atmosfera (MCGA)
foram utilizados para avaliar os impactos dos desflores-
tamentos no clima global e regional (Nobre et al., 1991;
Shukla et al., 1990; werth and Avissar, 2002). Estudos de
sensibilidade com modelos climticos tm claramente
estabelecido a importncia das florestas tropicais em in-
fluenciar o clima da Terra. De forma geral, Foley et. al.
(2003) afirmam que as alteraes no uso e na cobertura
do solo podem alterar os fluxos biofsicos em superfcie de
vrias maneiras: a primeira seria modificar o albedo em
superfcie, modificando assim o balano de energia e a
temperatura em superfcie. Este, em troca, afetaria como a
superfcie se resfria, pela mudana no balano entre perda
de calor sensvel (o resfriamento de uma superfcie quente
pelo vento) e perda de calor latente (resfriamento atravs
da evapotranspirao). Finalmente, a altura e a densidade
da vegetao afetam a rugosidade da superfcie, que por
sua vez influencia na turbulncia prxima ao cho. Super-
fcies mais rugosas misturam o ar com mais eficincia,
melhorando o processo de resfriamento. Mudanas no
albedo, na rugosidade da superfcie e na razo entre perda
de calor sensvel e calor latente podem afetar, ento, os
fluxos entre a superfcie e a atmosfera e, como resultado,
modificar o clima.
Em MCGAs, a interao biosfera-atmosfera pode ser
representada de duas formas: unidirecional (ou desaco-
plada), na qual a vegetao mantida fixa e fora a at-
mosfera durante a integrao do modelo; e bidirecional
(ou acoplada), na qual a vegetao pode ser modificada
de acordo com as condies climticas simuladas durante
a integrao do modelo. Na interao biosfera-atmosfera
unidirecional, realizam-se estudos de sensibilidade do
clima mudana de biomas; na bidirecional, procura-se
determinar as situaes de equilbrio instvel ou estvel
do sistema biosfera-atmosfera. Utiliza-se a interao uni-
direcional para estudos de sensibilidade do clima mu-
dana de biomas, ou seja, procura-se responder seguinte
questo: se a vegetao de certa regio for alterada, por
ao antrpica ou natural e essa alterao for mantida,
quais seriam os impactos no clima? Na interao biosfera-
atmosfera bidirecional, ou acoplada, procura-se estudar a
existncia de situaes de equilbrio, estvel ou instvel, e
para isso preciso que a vegetao seja dinmica, ou seja,
que os biomas possam ser modificados de acordo com as
condies climticas simuladas (Sampaio, 2008).
Um grande nmero de modelos de superfcie hoje so
empregados em MCGA, tais como o SiB (Simple Biosphere
Model Sellers et al., 1986), o SSiB (Simplified Simple Bio-
sphere xue et al., 1991 utilizado no MCGA CPTEC),
o BATS (Biosphere-Atmosphere Transfer Scheme Dick-
inson et al., 1993), IBIS (Integrated Biosphere Simulator
Foley et al., 1996; Kucharik et al., 2000), entre outros.
Os modelos numricos do sistema climtico terrestre
devem considerar a atmosfera e a biosfera terrestre como
um sistema acoplado, com os processos biogeofsicos e bio-
geoqumicos que ocorrem numa certa escala de tempo. Na
escala de tempo de curto prazo, isto , segundos a horas,
o sistema acoplado dominado pelos rpidos processos
biofsicos e biogeoqumicos que trocam energia, gua, dix-
ido de carbono e momentum entre a atmosfera e a super-
fcie terrestre. Na escala de tempo intermediria, isto , dias
a meses, os processos incluem mudanas na quantidade
de umidade do solo, mudanas na alocao de carbono e
fenologia da vegetao. Em escalas de tempo mais longas,
isto , estaes, anos e dcadas, podem ser fundamentais as
mudanas na estrutura da vegetao, atravs de distrbios,
usos do solo, interrupo no crescimento, entre outros. Para
considerar todos os processos acoplados biosfera-atmosfera,
necessrio que os modelos climticos sejam capazes de
simular fenmenos ecolgicos intermedirios e de longo
prazo (Foley et al., 2000).
Recentes estudos tm confirmado que alteraes nos
ecossistemas terrestres afetam o clima regional, ou at
mesmo global. Os efeitos do desmatamento no clima tm
sido geralmente analisados atravs da utilizao de um
modelo climtico global acoplado a um modelo biofsico
de superfcie que representa explicitamente as caractersti-
cas da mudana de cobertura do solo (altura do dossel,
densidade de folhas e profundidade de raiz, por exemplo)
(Foley et al., 2003). De acordo com muitos destes mode-
los, os padres de desmatamento em larga escala causam
uma tendncia a um aumento considervel de tempera-
tura e um decrscimo de evapotranspirao, escoamento
superficial e precipitao anual mdia. j observaes de
mudanas climticas sobre reas desmatadas confirmam
o aumento na temperatura e a diminuio da evapotrans-
pirao, embora mudanas na precipitao tenham sido
mais difceis de detectar (Nobre e Borma, 2009).
O bioma brasileiro que concentra a maior parte desses
estudos (tanto observacionais quanto de modelagem) a
floresta Amaznica, que abriga aproximadamente um quar-
to de todas as espcies existentes no mundo (Dirzo e Ra-
ven, 2003) e responsvel por 15% de toda a fotossntese
terrestre (Field et al., 1998), configurando-se em um reser-
vatrio de carbono significativo. Com relao precipitao
da regio, muito importante na definio dos padres de
vegetao, as concluses mais comuns dentre os numero-
sos estudos de modelagem climtica so que o desmata-
mento moderado e localizado aumentam a conveco e a
precipitao, mas perdas de floresta em larga escala tendem
a reduzir significativamente a precipitao (Avissar et al.,
2002, 2004, 2006; Moore et al., 2007; Cohen et al., 2007; Ra-
mos da Silva et al., 2006, 2008; Costa et al., 2007; Sampaio
et al., 2007; Ramos da Silva et al., 2008; Mei e wang, 2009;
walker et al., 2009). Os mecanismos que levam diminu-
io da precipitao, segundo os mesmos autores, envolvem
o aumento do albedo da superfcie (que reduz o saldo de
radiao, resfriando a alta troposfera, provocando subsidn-
cia, que reduz a precipitao) e da Razo de Bowen (ou di-
minuio da evapotranspirao, diminuindo o fornecimento
de umidade atmosfera) e diminuio da rugosidade da
superfcie (que leva a uma diminuio do coeficiente de ar-
raste aerodinmico, o que contribui para uma diminuio na
evapotranspirao e a um aumento do vento). As redues
na precipitao so mais pronunciadas nos meses de tran-
sio entre a estao seca e a chuvosa na floresta, levando
a um prolongamento na durao da estao seca (Costa e
Pires, 2010). Alm do desmatamento da prpria floresta, o
desmatamento de regies vizinhas floresta, como o Cer-
rado, tambm contribui para uma estao seca mais longa
(Costa e Pires, 2010).
Com o avano dos modelos numricos de mesoescala
(ou rea limitada), simulaes climticas foram realizadas
para a Amaznia, considerando-se resolues espacial
maiores. Por exemplo, Gandu et al. (2004) realizaram um
dos primeiros estudos usando um modelo de mesoescala
de alta resoluo (50 km de tamanho de grade) para avaliar
o efeito do desmatamento completo na parte oriental da
Amaznia. Como resultado, os autores encontraram que
a presena de orografia, proximidade da costa litornea e
-
340 Painel brasileiro de mudanas climticas Avaliao de modelos globais e regionais climticos 341
distribuio de rios, alteravam os resultados encontrados
anteriormente nas simulaes de larga escala, no se ob-
servando, em particular, reduo da precipitao em toda
a Amaznia. importante lembrar que o modelo de me-
soescala pode fazer simulaes com toda a microfsica de
nuvens. Posteriormente, Correia et al. (2006) utilizaram um
modelo MCGA, acoplado a um modelo de transferncia
de energia com a superfcie unidimensional (SiB) e anal-
isaram o desmatamento completo da Amaznia em trs
cenrios futuros de ocupao da Amaznia. Em todos eles,
a troca de vegetao (de floresta para pastagem) reduziu a
rugosidade da superfcie, intensificou o vento e aumentou
a convergncia de umidade. De certo modo, isto minimiza
a reduo da evapotranspirao, em funo da menor ca-
pacidade de gramneas/culturas baixas em extrair gua do
solo. Este resultado reduz o impacto dos resultados obtidos
por Cox et al. (2004) para a morte da floresta Amaznia
(die-back). A questo da extenso do perodo de seca e da
possibilidade de fogo (natural e antropognico) tambm
investigada nesse trabalho. Ramos da Silva et al. (2008)
tambm utilizam um modelo atmosfrico de mesoescala
com alta resoluo (20 km de grade) para avaliar o impacto
dos elementos do balano hdrico para a estao chuvosa
pela ocupao da Amaznia em 2 cenrios de crescimento
socioeconmico e populacional, que levam em conta os
planos de construo e pavimentao de rodovias, melho-
ria de portos martimos/fluviais, expanso do setor energ-
tico para os anos de 2030 e 2050 (Soares-Filho et al., 2004
apud Ramos da Silva et al., 2008), bem como um cenrio
de desmatamento total. Os resultados mostram que a pre-
cipitao decresce conforme a rea desmatada aumen-
tada, porm existe uma grande variabilidade espacial. Em
particular, os autores analisam a diminuio da frequn-
cia de ocorrncia (e de propagao espacial tambm) de
linhas de instabilidade que se formam na costa litornea e
induzem a chuva nas partes leste e central da Amaznia.
A variabilidade da chuva tambm investigada atravs de
anlise do impacto de eventos de El Nio na regio. Em-
bora o desmatamento de floresta ocorra para formao de
pastagens agropecurias, nos ltimos anos a ocupao da
regio por culturas de soja tem aumentado significativa-
mente, principalmente na parte de transio entre floresta
tropical e vegetao de cerrado (arco do desmatamento).
Saad et al. (2010) analisam o impacto no clima local e
de mesoescala que rodovias podem provocar, utilizando o
caso da BR-163 (rodovia que liga Cuiab a Santarm, cor-
tando uma boa rea intacta da Amaznia) e que est sendo
pavimentada. Neste caso, haver extensa rea de floresta
tropical com reas desmatadas (na forma de linha) para
a construo da rodovia. A formao de precipitao foi
associada forma, rea e posicionamento das estradas em
relao ao vento predominante, sugerindo que a presena
da estrada pode aumentar (ou reduzir) a precipitao lo-
cal. A quantidade de gua no solo tambm se mostrou
importante em disparar os processos de conveco. Este
tipo de estudo importante, pois, com o desenvolvimento
econmico, ocorre abertura de novas estradas. Atualmente
tem-se a pavimentao da BR-163 e a reconstruo da
rodovia BR-369 (que liga Manaus a Porto Velho).
Betts e Silva Dias (2010) sintetizam o acoplamento dos
processos de superfcie e camada limite, baseados nos
resultados de pesquisas anteriores na Amaznia (projetos
ABRACOS e LBA ver item c). Claramente h uma liga-
o forte entre a quantidade de gua no solo (proveni-
ente da precipitao), a partio de energia na superfcie
(particularmente o fluxo de calor sensvel), o aquecimento
da atmosfera e a evoluo da espessura da camada limite,
a formao das nuvens (com a presena de aerossis
oriundos de queimadas) e a ocorrncia da precipitao,
fechando este ciclo (Figura 2 do artigo de Betts e Silva Dias,
2010). Estas inter-relaes possuem diferentes escalas de
tempo (diurnas, sazonal e mesmo decadal) que precisam
ser analisadas em qualquer modelo de previses do clima
da Amaznia.
As mudanas de uso do solo e o efeito que exercem
no clima possuem o potencial de fazer com que partes da
Amaznia atravessem os chamados pontos de desequil-
brio (tipping points Lenton et al., 2008). Estes pontos de
desequilbrio do sistema clima-vegetao se referem, em
termos quantitativos, probabilidade de um elemento do
sistema terrestre cruzar um limite crtico, que poderia fazer
com que o mesmo salte para outro estado de equilbrio
estvel. Estudos durante a ltima dcada (Sternberg, 2001;
higgins et al., 2002; Oyama e Nobre, 2003) fornecem evi-
dncias tericas da existncia de estados de equilbrio al-
ternativos entre o clima e a vegetao da floresta em geral,
e em particular na regio de transio entre a floresta e o
Cerrado. Oyama e Nobre (2003) sugerem que o sistema
acoplado clima-biosfera na Amaznia tem dois estados de
equilbrio estveis: um obviamente o estado presente de
clima e vegetao, com a floresta tropical cobrindo a maior
parte da bacia Amaznica, associada a elevada precipita-
o (e evapotranspirao) durante a estao seca; o se-
gundo estado de equilbrio estvel estaria associado a uma
savana tropical cobrindo parte da bacia (ou outro tipo de
vegetao adaptado seca e ao fogo), com baixa precipi-
tao durante a estao seca. A probabilidade de transpor
o ponto de desequilbrio do sistema clima-vegetao pode
ser causada pelo desmatamento, podendo ainda ser inten-
sificada pelas mudanas climticas causadas pela modifica-
o da composio atmosfrica.
Scheffer et al. (2001) fazem uma reviso sobre a ex-
istncia de mltiplos estados de equilbrio em ecossiste-
mas, como em lagos, corais, regies com arvoredos, de-
sertos e oceanos. Por exemplo, analisa-se uma regio que
passou por um processo de desertificao antropognica
e, por isso, teve reduo de precipitao. Essa reduo
poderia impedir o desenvolvimento da vegetao, o que
sustentaria o deserto. Quando h a perda de vegetao, h
aumento do escoamento superficial e a gua entra no solo
rapidamente, desaparecendo e indo para camadas profun-
das onde no h mais acesso de plantas. Portanto, o novo
clima no procuraria restituir o bioma original da regio,
ou seja, haveria uma irreversibilidade climtica ao processo
de desertificao, o que seria claramente catastrfico para
a regio. Na verdade, passou-se de um estado de equil-
brio para outro, mais seco.
Os modelos globais de vegetao dinmica (DGVMs -
em ingls, Dynamic Global Vegetation Model) consideram
a cobertura vegetal como sendo uma fronteira superficial
interativa, a qual pode mudar em resposta s mudanas no
clima. Tais modelos permitem projetar respostas transien-
tes dos ecossistemas terrestres, sob condies de mudan-
as climticas abruptas, e so capazes de representar pro-
cessos que contribuem para a dinmica da estrutura e da
composio da vegetao de uma forma mais detalhada, e
por isso com um maior nmero de variveis e parametri-
zaes de processos ecofisiolgicos e ecoclimticos, envol-
vendo maior complexidade (p. ex., modelo IBIS Foley et
al., 1996; modelo LPj haxeltine, Prentice, 1996b). Esfor-
os tm sido feitos para melhorar os parmetros destes
modelos para a Amrica do Sul, por exemplo, para a regio
Amaznica com o modelo IBIS (p. ex., Imbuzeiro, 2005),
mas ainda restam deficincias de ajuste para outros bio-
mas tropicais da Amrica do Sul.
Os ecossistemas terrestres afetam o clima alterando a
concentrao atmosfrica de CO2 atravs da fotossntese e
da respirao. Dessa forma, mudanas no ciclo do carbono
terrestre afetam diretamente a atmosfera. Por exemplo, a
floresta Amaznica intacta assimila aproximadamente 0,6
Pg-C.ano-1 (Baker et al., 2004). A simples remoo desta
floresta (desconsiderando os gases emitidos durante a
queima ou preparo de reas) implicaria em uma menor
quantidade de carbono sendo removido da atmosfera,
causando efeitos no clima. Essas alteraes no armaze-
namento de carbono terrestre podem afetar ainda mais o
montante de CO2 presente na atmosfera, intensificando o
efeito estufa.
Os ecossistemas podem resistir s intensas mudanas
do clima e de uso do solo se o efeito de fertilizao do CO2
cuja concentrao atmosfrica aumentou drasticamente
desde a Revoluo Industrial se confirmar. Neste caso, a
-
342 Painel brasileiro de mudanas climticas Avaliao de modelos globais e regionais climticos 343
eficincia do uso da luz e da gua aumentaria na maioria
das plantas, o que estimula a fotossntese lquida (Polley
et al., 1993; Field et al., 1995; Curtis, 1996; Sellers et al.,
1996) e poderia modificar a composio e estrutura dos
ecossistemas (Betts et al., 1997). Porm, este efeito pode
ser compensado por aumentos contnuos da temperatura,
alteraes na sazonalidade da precipitao e incndios
florestais (Nobre e Borma, 2009; Cardoso et al., 2009).
vlido lembrar que essas alteraes na vegetao, por sua
vez, tendem a exercer influncia sobre o clima, o que acar-
retaria em um processo de retroalimentao.
Enfim, os prximos anos representam uma oportuni-
dade nica de manter a resilincia e a biodiversidade dos
ecossistemas brasileiros, frente ameaa crescente das
mudanas climticas e da devastao humana. Dessa
forma, a perspectiva das mudanas climticas causadas
pela modificao antrpica da composio atmosfrica
no deve ser considerada de forma isolada. Deve-se
considerar tambm o fato de que a atmosfera afetada
pelos ecossistemas terrestres, e as retroalimentaes
que exercem no clima podem intensificar os efeitos do
aquecimento global.
8 .3s imulaes de fenmenos meteorolgicos
8 .3 .1. E N SO
Os padres de variabilidade sazonal, interanual e intrasa-
zonal so bem simulados pelo MCGA do CPTEC. Alguns
desses padres so associados variabilidade da Tempera-
tura da Superfcie do Mar (TSM), campo que introduzido
como condio de contorno para as integraes. Assim, o
ndice de Oscilao Sul, associado ao padro ENSO, bem
simulado pelo MCGA como mostrado em Cavalcanti et al.
(2002a). A variabilidade interanual das anomalias de precipi-
tao simuladas na regio Nordeste comparvel s obser-
vaes (Marengo et al., 2003) e, quando o sinal de ENSO
forte, ou seja, quando as anomalias de TSM so intensas
no Oceano Pacfico Equatorial, as anomalias de precipitao
simuladas tm o mesmo sinal que as observaes tambm
sobre a regio sul. O modelo reproduz o padro observado
de anomalias de precipitao sobre a Amrica do Sul as-
sociado ao ENSO, com excesso de precipitao no Sul do
Brasil e dficit no Nordeste (Cavalcanti e Marengo, 2005).
Experimentos com o MCGA realizados para analisar o im-
pacto da TSM do Pacifico (ENSO) e TSM no Atlntico (dipolo
norte-sul) na precipitao sobre a Amrica do Sul mostraram
as caractersticas dinmicas associadas s anomalias (Pezzi
e Cavalcanti, 2002). A confluncia dos ventos em baixos
nveis na regio do Atlntico Tropical associada Zona de
Convergncia Intertropical (ZCIT) mostrou comportamento
consistente com as anomalias de temperatura, deslocando-
se para sul quando a TSM do Atlntico Sul era mais quente e
para norte quando a TSM do Atlntico Norte era mais quente.
O efeito do Pacifico foi visto atravs das anomalias na clula
de walker, com movimento subsidente sobre a Amrica do
Sul tropical nos casos de El Nio. A ao conjunta do El Nio
e do dipolo do Atlntico mostra uma influncia do Atlntico
no extremo norte do Nordeste enquanto outras regies da
Amrica do Sul so afetadas pelas condies do Pacifico. No
caso La Nia, o dipolo Atlntico tem um efeito em todo o
Nordeste e tambm em outras regies da Amrica do Sul. O
deslocamento sazonal da ZCIT do Atlntico em simulaes
Nesta seo ser apresentado o desempenho dos diferen-
tes modelos, atmosfricos, acoplados oceano-atmosfera
e regionais, na simulao de alguns fenmenos meteo-
rolgicos que afetam a Amrica do Sul.
8 .3 .2 ZC AS E ZC IT
Um dos mais importantes componentes do Sistema de
Mono na Amrica do Sul (SMAS) durante o vero, no
hemisfrio Sul (hS), a formao da Zona de Convergn-
cia do Atlntico Sul (ZCAS). O interesse pelo estudo das
ZCAS cresceu nos ltimos anos devido a sua importn-
cia na distribuio de precipitao sobre a AS. O perodo
mdio de permanncia desta zona de convergncia de
cinco a dez dias, contribuindo, desta forma, com grande
precipitao na faixa central e sul da Regio SE do Bra-
sil. O padro da Zona de Convergncia do Atlntico Sul
(ZCAS), com um dipolo de precipitao ou de Radiao
de Onda Longa Emergente (ROL) observado entre o sud-
este e sul da Amrica do Sul, representado pelo MCGA
na escala de tempo interanual e intrasazonal (Cavalcanti e
Castro, 2003; Cavalcanti e Cunningham, 2006; Cavalcanti
e Vasconcellos, 2009; Meira e Cavalcanti, 2011). Anlises
de anomalias de radiao de onda longa emergente nos
resultados do MCGA, na banda intrasazonal indicaram que
as caractersticas dos campos climatolgicos e de varincia
foram semelhantes s observadas, porm com intensi-
dades diferentes (Meira e Cavalcanti, 2011). Entretanto, o
padro tpico da Oscilao de Madden e julian identificado
nas observaes na regio da Indonsia no reprodu-
zido. Os modos de precipitao no Sudeste do Brasil, que
incluem a ZCAS, foram razoavelmente reproduzidos em
um estudo de correlaes cannicas realizado por Cardoso
et al. (2004). O MCGA tambm simula as caractersticas
da Oscilao do Atlntico Norte, bem como os centros de
ao no Atlntico Norte identificados em Souza e Caval-
canti (2009), como mostrado em Souza (2008).
A variabilidade sazonal de precipitao sobre a Amrica
do Sul bem representada por Modelos Globais Atmosfri-
cos e acoplados, principalmente as grandes diferenas entre
vero e inverno. Contudo, a intensidade ou configurao
do campo de precipitao do vero no so bem repre-
sentados por alguns modelos. Vera et al. (2006) e Vera e
Silvestri (2009) analisaram 7 modelos do wCRP-CMIP3
para o sculo 20 e mostraram que alguns modelos repre-
sentam a variabilidade da precipitao, indicada pelo desvio
padro e um mximo de chuva associado ZCAS em jFM e
OND, mas com diferentes intensidades, comparando com
as observaes. Em Seth et al. (2010), a mdia de 9 mod-
elos do wRCP-CMIP3, para o sculo 20, em SON e DjF
tambm foi razoavelmente comparada com observaes,
embora algumas caractersticas especficas, como a intensi-
dade e posio da ZCIT e extenso da ZCAS sobre o oceano,
no tenham sido apropriadamente representadas. Outras
comparaes de resultados dos modelos CMIP3 com ob-
climticas com o MCGA corresponde bem ao observado,
como visto em Souza (2008). O deslocamento da ZCIT ao
norte ou ao sul do equador nos resultados do modelo
consistente com os campos de confluncia em baixos nveis
e anomalias da TSM (Souza, 2008).
Para avaliar a capacidade do modelo regional em repro-
duzir as anomalias de precipitao e temperatura na Amrica
do Sul associadas aos fenmenos El Nio e La Nia no clima
presente, no perodo 1961-1990, Chou et al. (2011) aplicaram
o critrio de Trenberth (1997) baseado nas anomalias de tem-
peraturas da superfcie do mar na regio Nio 3.4, geradas
pelo modelo acoplado hadCM3 para contabilizar os eventos.
Os autores encontraram que o modelo hadCM3 subestima
a frequncia de ocorrncia tanto dos eventos El Nio quanto
dos eventos de La Nia. As anomalias de precipitao e de
temperatura reproduzidas pela mdia do ensemble de 4
membros do modelo regional apresentaram padres tpicos
de eventos de El Nio e La Nia, mas com ligeiro desloca-
mento para o norte na posio das anomalias. Os quatro
membros gerados pelo Modelo Eta foram produzidos foran-
do as condies laterais por 4 membros do Modelo hadCM3
perturbados em parmetros da sua fsica.
-
344 Painel brasileiro de mudanas climticas Avaliao de modelos globais e regionais climticos 345
servaes, em Bombardi e Carvalho (2008), mostram que
alguns modelos usados no IPCC/2007 (ref.) capturam as
principais caractersticas do Sistema de Mono da Amrica
do Sul, como a banda Nw-SE da Amaznia para sudeste,
representando as ocorrncias da ZCAS e tambm a ZCIT.
Entretanto, as intensidades e posies das precipitaes
mximas no so bem representadas. O ciclo anual da pre-
cipitao tem uma boa representao no sul da Amaznia
e Brasil central pela maioria dos modelos, mas em outras
reas o ciclo no bem simulado. A durao da estao
chuvosa superestimada sobre o oeste da Amrica do Sul
e subestimada sobre o Brasil central nos modelos CMIP3,
segundo Bombardi e Carvalho (2008). Usando o modelo
global atmosfrico com alta resoluo MRI (japons), e
TSM de resultados do CMIP3, Kitoh et al. (2011) indicaram
uma melhor representao do campo de precipitao sobre
a Amrica do Sul do que a obtida com mais baixa resoluo.
Valverde e Marengo (2010) avaliaram cinco modelos do
IPCC AR4 sobre a Amrica do Sul, MIROC, hadCM3, GFDL,
GISS e CCCMA e notaram que em geral os modelos ti-
veram dificuldade em configurar a ZCAS, se estendendo da
Amaznia at o Sudeste do Brasil, e que todos subestimam
a precipitao sobre a Amaznia em propores maiores ou
menores. O modelo hadCM3 simulou melhor o padro da
banda da ZCAS, entretanto com mximo de chuvas sobre
Gois e a regio Sudeste.
A gnese e o comportamento da ZCAS tm sido estu-
dados atravs do uso de modelos acoplados oceano-atmos-
fera no Brasil, indicando de forma pioneira a importncia
do acoplamento oceano-atmosfera para a ocorrncia de
precipitao sobre guas mais frias, como no caso da ZCAS
(Chaves e Nobre, 2004; De Almeida et al., 2007; Nobre et
al., 2011). O processo de formao da ZCAS descrito nesses
estudos evidencia a natureza acoplada oceano-atmosfera
do fenmeno ZCAS, onde as anomalias de TSM resultam
da modulao da radiao solar pela presena/ausncia de
nebulosidade causada pela ZCAS. Assim, diversamente do
que ocorre com a ZCIT do Atlntico e Pacfico, as quais so
moduladas pelos gradientes meridionais de TSM, a ZCAS
modula as anomalias de TSM sobre o Atlntico Tropical.
Pilotto et al. (2011) aninharam o Modelo Eta ao mod-
elo global do CPTEC e ao modelo global acoplado oceano-
atmosfera do CPTEC e produziram previses de 3 membros
para a regio do Atlntico entre Amrica do Sul e frica,
para a estao dezembro-janeiro-fevereiro para o perodo
de 10 anos. Seus resultados mostraram que o aninhamento
produziu melhor distribuio espacial da precipitao asso-
ciada a ZCIT e a ZCAS, sendo que a configurao do modelo
Eta aninhado ao modelo global acoplado oceano-atmosfera
apresentou melhores resultados do que ao aninhamento a
componente atmosfrica do modelo global utilizando tem-
peratura da superfcie do mar persistida.
A partir de uma integrao contnua do Modelo Climti-
co Regional Eta forado pelo modelo hadCM3 para o
perodo 1961-1990, Pesquero (2009) encontrou a frequn-
cia simulada de ZCAS de aproximadamente 1,7 por ms
na Amrica do Sul. Comparando a frequncia detectada
a partir de reanlises ERA-40 para duas estaes chuvosas
consecutivas, o autor encontrou valores observados em
cerca de 1,5 eventos de ZCAS por ms, o que mostra boa
concordncia da simulao com os dados de reanlises. O
autor tambm avaliou os fluxos de umidade durante pero-
dos de ZCAS ativo, que foram comparveis aos valores esti-
mados por reanlises.
O trabalho de Pesquero et al. (2009) utilizou o modelo
Eta aninhado s condies de fronteira do hadAM3P. Os
autores verificaram a capacidade do modelo em reproduzir
a circulao de mono da Amrica do Sul e a frequncia de
eventos de ZCAS baseado no critrio de Gan et al. (2004).
Este critrio associa a precipitao e direo de ventos em
850 hPa na identificao de incio e final da estao chu-
vosa. O clima futuro (perodo 2070-2099) foi projetado
utilizando-se o cenrio A1B do IPCC-SRES.
Os resultados mostraram a importncia dos fluxos de
umidade vindos do Atlntico, como tambm a convergn-
cia dos fluxos de umidade em mdios e baixos nveis. Com-
paraes entre os fluxos de umidade em toda a estao
chuvosa com os das ZCAS sobre a Regio SE mostraram
praticamente no existir modificao do transporte de umi-
dade. Os resultados mostraram um aumento da magnitude
do fluxo durante o perodo das ZCAS, principalmente os
meridionais. O balano de umidade realizado apresentou
caractersticas de intensa precipitao durante o perodo de
ZCAS. Em relao a precipitaes intensas durante casos de
ZCAS, constataram-se 285 valores de precipitao entre 90
e 140 mm/dia. Destes casos a maior parte ficou entre 90-99
mm/dia de precipitao, com 143 casos. Na taxa de 100-109
mm/dia, o nmero tambm foi grande, com 100 casos.
8 .3 .3 C IC LON E S E x TR ATROP IC A I S
8 .3 .4 MODO AN U L AR DO h E M I SF R IO SU L
Matos et al. (2011) avaliaram a representao dos
ciclones extratropicais no membro controle das simula-
es do Eta forado pelo hadCM3 (Eta-hadCM3) (Chou
et al., 2011). Eles aplicaram o esquema CYCLOC (Murray
e Simmonds, 1991) de deteco de centros de presso
atmosfrico nas reanlises do NCEP (Kalnay et al., 1996)
e nas simulaes do Eta-hadCM3 no clima presente, de
1961 a 1990. Os resultados mostraram que a trajetria dos
ciclones, predominante para leste, foi bem simulada pelo
Eta-hadCM3. Enquanto as simulaes sugerem correta-
mente uma pequena tendncia de reduo de ocorrncia
de ciclones nas altas latitudes, as simulaes no captu-
raram a tendncia de aumento na frequncia de ciclones
nas baixas latitudes observadas nas reanlises do NCEP.
Reboita et al. (2010) apresentaram uma climatolo-
gia detalhada de ciclones no Oceano Atlntico Sul para
o perodo de 1990 at 1999 em simulaes do modelo
regional RegCM3 que utilizaram as condies iniciais e de
contorno das reanlises do NCEP (National Centers for
Environmental Prediction). Inicialmente validou-se a cli-
matologia simulada pelo RegCM3, que, de forma geral,
mostrou padro espacial sazonal das variveis similar s
anlises, porm com diferenas em intensidade. Neste
estudo, os autores identificaram os ciclones utilizando
um esquema automtico que identifica mnimos de vor-
ticidade relativa no campo de vento a 10 m. Assim, os
sistemas com vorticidade relativa -1.5 x 10-5 s-1 e com
tempo de durao maior que 24 horas foram considera-
dos na climatologia. Nos 10 anos analisados, os autores
detectaram 2,760 (dados do NCEP) e 2,787 (simulaes
do modelo regional) ciclogneses, com media anual de
276.0 11.2 e 278.7 11.1 no Oceano Atlntico Sul, assim
sugerindo que o modelo regional possui uma boa destre-
za na simulao da climatologia da ciclognese. Porm,
o estudo mostrou uma grande subestimao nos valores
da vorticidade ciclnica relativa simulados pelo modelo
(-9.8%) no incio dos sistemas, e foi observado que, sobre
o Oceano Atlntico Sul, o ciclo anual da ciclogneses
dependente da intensidade inicial. Considerando os siste-
mas que iniciaram com a vorticidade relativa -1.5 x 10-5
s-1, o ciclo anual no bem definido e a alta frequncia
ocorre no outono nos dados do NCEP e durante o vero
no RegCM3. j os sistemas mais intensos tm uma boa
caracterizao da alta frequncia das ciclogneses, que
ocorre durante o inverno tanto nos dados do NCEP quan-
to nas simulaes do modelo regional.
O modo anular do hemisfrio Sul (SAM) ou Oscilao
Antrtica (AAO), que o modo de variabilidade inter-
anual dominante no hemisfrio Sul, tambm repro-
duzido pelo MCGA. Outro modo de variabilidade que
ocorre na escala interanual e intrasazonal e que afeta a
Amrica do Sul o padro Pacific-South America (PSA),
-
346 Painel brasileiro de mudanas climticas Avaliao de modelos globais e regionais climticos 347
o qual bem simulado pelo MCGA (Cavalcanti e Cas-
tro, 2003; Cavalcanti e Cunningham, 2006; Cavalcanti e
Vasconcellos, 2009). As caractersticas atmosfricas asso-
ciadas ZCAS em casos extremos de precipitao no SE,
como o padro PSA e o modo anular do hemisfrio Sul
(SAM), obtidas em anlises observacionais (Vasconcellos
e Cavalcanti, 2010), foram reproduzidas nas anlises de
casos extremos selecionados em resultados de simula-
o climtica com o MCGA (Cavalcanti e Vasconcellos,
2009). Na escala temporal de processos que ocorrem
na escala diria em simulaes climticas, o modelo rep-
resenta bem os campos associados a sistemas frontais
(Cavalcanti e Coura Silva, 2003), caractersticas obser-
vadas de trens de onda de alta frequncia na banda de
2 a 8 dias (Cavalcanti e Kayano, 2000), caractersticas do
jato em Baixos Nveis a leste dos Andes (Cavalcanti et al.,
2002b). O nmero de frentes frias sobre a regio sud-
este do Brasil maior no outono e primavera nos resul-
tados do MCGA, diferentemente do observado quando
o maior nmero ocorre no inverno.
8 .3 .5 jATO DE BA I xOS NVE I S - j BN
8 .3 .6 M EGAC I DADE S
Em simulao produzida por da Rocha et al. (2009) utili-
zando o RegCM3, o jato de baixos nveis a leste dos Andes
se posicionou corretamente em relao s reanlises do
NCEP na mdia de 17 veres, apesar de ter subestimado a
magnitude do ncleo do jato.
Soares e Marengo (2009) utilizaram o modelo regional
hadRM3P com as condies de contorno dos modelos
globais hadCM3-hadAM3P, ambos do hadley Centre, e
dados de reanlises do NCEP, com o propsito de avaliar
os fluxos de umidade e o jato de Baixos Nveis da Amrica
do Sul (jBN da Amrica do Sul) em dois perodos: o pri-
meiro pode ser entendido como o clima atual e abrange o
perodo de 1980 at 1989; o segundo abrange o perodo
de 2080 at 2089 e projeta um possvel clima de aqueci-
mento global a partir do cenrio de altas emisses de
gases de efeito estufa SRES A2 do IPCC.
Para detectar e caracterizar eventos de jBN da AS, uti-
lizou-se o critrio 1 de Bonner (Bonner, 1968) modificado
por Saulo et al. (2000). Este critrio o mais utilizado
para detectar eventos de jBN da AS a partir de sadas de
modelo e especifica que: a magnitude do vento tem que
ser maior ou igual a 12 m.s-1 no nvel de 850 hPa; o cis-
alhamento vertical do vento tem que ser de pelo menos
6 m.s-1 entre os nveis de 850-700 hPa; a componente
meridional do vento tem que ser negativa e maior em
mdulo que a componente zonal.
No clima atual, a partir da aplicao do critrio 1 de Bon-
ner nos dados de reanlises do NCEP, foram detectados 28
casos de jBN da AS durante DjF, 18 para MAM, 5 para jjA e
9 para SON, com um total de 60 jatos desde 1980 at 1989.
j para o hadRM3P, 169 jatos foram detectados durante o
mesmo perodo. Isto indica que o modelo tende a superesti-
mar o nmero de eventos de jatos no clima atual em relao
s reanlises. Os resultados mostraram que o total de casos
de jatos detectados, utilizando o modelo hadRM3P, foi de
169 ocorrncias entre 1980 at 1989 e de 224 ocorrncias
entre 2080 at 2089, evidenciando o impacto do SRES A2
na frequncia de ocorrncia de jBN da AS.
a) Poluio atmosfrica
Alm dos efeitos trmicos e mecnicos observados em
Megacidades, reas urbanas desempenham um papel im-
portante na emisso de poluentes atmosfricos, incluindo
gases de efeito estufa (GEE). Conforme destacado por Frei-
tas (2008), a representao da estrutura fsica das cidades
e a incluso de todos os produtos gerados pelas mesmas,
tais como calor, umidade e poluentes, constitui um dos
maiores desafios para a modelagem numrica na atu-
alidade. Neste sentido, trabalhos importantes vm sendo
realizados no Brasil em diversas instituies de ensino e
pesquisa, com maior destaque para o CPTEC-INPE, IAG-
USP e UTFPR. Os trabalhos realizados nestas instituies
podem ser divididos em duas linhas principais: 1) aplica-
o de modelos de qualidade do ar j existentes, como
o CIT (Caltech Institute of Technology, McRae et al.,1982,
1992) e o wRF/Chem (weather Research and Forecasting/
Chemistry, Grell et al.