MODELOS DE NEGÓCIO NO JORNALISMO INDEPENDENTE...

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CENTRO UNIVERSITÁRIO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA ERICK CALDEIRA DE FRANÇA MODELOS DE NEGÓCIO NO JORNALISMO INDEPENDENTE E DIGITAL BRASILEIRO Brasília 2016

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CENTRO UNIVERSITÁRIO

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA

ERICK CALDEIRA DE FRANÇA

MODELOS DE NEGÓCIO NO JORNALISMO INDEPENDENTE E DIG ITAL

BRASILEIRO

Brasília

2016

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ERICK CALDEIRA DE FRANÇA

MODELOS DE NEGÓCIO NO JORNALISMO INDEPENDENTE E DIG ITAL

BRASILEIRO

Monografia apresentada como pré-

requisito para obtenção do

certificado de conclusão da Pós-

Graduação em Jornalismo Digital e

Produção Multimídia do Instituto de

Educação Superior de Brasília –

IESB.

Professora: Dra. Luciane Agnez

Brasília

2016

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RESUMO

Esta produção analisa os principais aspectos da atuação do jornalismo

independente e alternativo na era digital, mapeando como o jornalista

independente tem buscado sobreviver financeiramente no atual cenário de

crise do setor comunicacional. O referencial teórico aborda as mudanças

ocorridas no jornalismo pós tecnologias da informação e da comunicação,

passando pelos conceitos de mídia alternativa, jornalismo independente,

empreendedorismo, modelo de negócio, colaborativismo e crowdfunding. Os

portais Jornalistas Livres, Mídia Ninja e Jota foram tomados como exemplos

empíricos, no intuito de ilustrar o tema central deste estudo. Objetivando

enriquecer o conteúdo, foram realizadas entrevistas com integrantes de cada

portal, focando a análise em suas formas de sustentação financeira.

Palavras-chave : Jornalismo Independente. Mídia alternativa. Jornalismo

Digital. Modelo de negócio. Entrevista em profundidade.

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ABSTRACT

This production looks at the major aspects of independent and alternative

journalism in the digital era, mapping how the independent journalist has been

pursuing to financially survive during the current crisis of the communicational

field. The theoretical background presents the changes occurred on journalism

after the information and communication technologies placement, also

considering the concepts of alternative media, independent journalism,

Entrepreneurship, Business Model, collaborative journalism and crowdfunding.

The websites Jornalistas Livres, Mídia Ninja and Jota were taken as empirical

examples to illustrate the central thesis of the present study. Aiming to enrich

the content, interviews were conducted with members of the websites

mentioned, focusing on their ways of financial survival.

Keywords: Independent journalism. Alternative media. Digital journalism.

Business Model. In-depth interview.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Vantagens e desvantagens do empreendedorismo ......................... 27

Figura 2 - Site Sebrae ...................................................................................... 28

Figura 3 - Exemplos de startups de jornalismo ................................................ 30

Figura 4 - O quadro de Modelo de Negócios ................................................... 35

Figura 5 - Modelo de Negócios da Apple para iPod e iTunes .......................... 36

Figura 6 - Print do Site Crowdfunding no Brasil ................................................ 39

Figura 7 - Campanha de crowdfunding do Jornalistas Livres ........................... 43

Figura 8 - Portal Jornalistas Livres ................................................................... 44

Figura 9 - Portal Mídia Ninja ............................................................................. 45

Figura 10 - Financie o NINJA ........................................................................... 46

Figura 11 - Portal Jota ...................................................................................... 47

Figura 12 - Planos de assinatura do portal Jota ............................................... 48

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Diferenças entre as entidades sem fins lucrativos das entidades com fins lucrativos .................................................................................................... 25

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................ 5

2. OJETIVOS .................................................................................................. 8

2.1. OBJETIVO GERAL ......................................................................................... 8

2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS ........................................................................... 8

3. JUSTIFICATIVA ......................................................................................... 9

4. METODOLOGIA DE PESQUISA ............................................................. 11

5. JORNALISMO PÓS TICS ........................................................................ 14

5.1. WEB 2.0, JORNALISMO ONLINE E WEBJORNALISMO ............................. 15

6. MÍDIA ALTERNATIVA ............................................................................. 18

7. JORNALISMO INDEPENDENTE ............................................................ 22

7.1. JORNALISMO SEM FINS LUCRATIVOS ..................................................... 24

8. EMPREENDEDORISMO .......................................................................... 26

9. MODELO DE NEGÓCIO .......................................................................... 31

9.1. OS COMPONENTES BÁSICOS DE UM MODELO DE NEGÓCIO ............... 33

10. CROWDFUNDING E COLABORATIVISMO ........................................ 37

10.1. CROWDFUNDING .................................................................................... 37

10.2. COLABORATIVISMO ................................................................................ 39

11. ANÁLISE DOS DADOS ........................................................................ 42

11.1. PORTAL JORNALISTAS LIVRES ............................................................. 42

11.2. PORTAL MÍDIA NINJA .............................................................................. 44

11.3. PORTAL JOTA.......................................................................................... 47

11.4. PERFIL DOS ENTREVISTADOS .............................................................. 49

11.5. INFORMAÇÕES DAS ENTREVISTAS PERTINENTES AOS PORTAIS ... 50

11.6. INFORMAÇÕES DAS ENTREVISTAS PERTINENTES A MODELOS DE NEGÓCIOS ............................................................................................................. 52

11.7. INFORMAÇÕES DAS ENTREVISTAS PERTINENTES À POSSÍVEL CONCORRÊNCIA ................................................................................................... 54

12. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................. 55

REFERÊNCIAS ............................................................................................... 57

APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTA ................................................. 61

APÊNDICE B – ENTREVISTA COM A JORNALISTA FLÁVIA MARTINELLI

DOS JORNALISTAS LIVRES ........................................................................ 62

APÊNDICE C - ENTREVISTA COM O JORNALISTA CLAYTON NOBRE DA

MÍDIA NINJA ................................................................................................... 65

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APÊNDICE D - ENTREVISTA COM O JORNALISTA FELIPE SELIGMAN

DO JOTA ......................................................................................................... 71

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5 1. INTRODUÇÃO

É possível fazer muitas reflexões acerca das mudanças ocorridas no

jornalismo após a inserção das Tecnologias da Informação e Comunicação –

TICs. Como tais mudanças ocorreram e ocorrem em vários contextos e áreas

do jornalismo, as perspectivas existentes e passíveis de serem abordadas e

aprofundadas também são muitas.

Segundo Dizard Jr. (2000, p. 22), a mídia tradicional ainda pode estar

presente por muitos anos, mas sendo diferente, pois “a mídia tem uma nova

agenda”. Ele sustenta que as transformações ocorridas na indústria midiática

trarão muitos vencedores e perdedores no meio do processo; os vencedores

serão “as organizações que se adaptarem às realidades tecnológicas e

econômicas em transformação” e os perdedores, todos aqueles que “não

podem ou não querem mudar”.

Jorge, Pereira e Adghirni (2009, p. 76) argumentam que a internet

revolucionou o jornalismo e a rotina dos jornalistas com a produção e

distribuição das notícias em rede. Jovens recém-formados na área deparam-se

com um mercado de trabalho sem linearidade devido aos processos de

modernização empresarial, como apontado por Kischinhevsky (2009, p. 60). E

não apenas os novos profissionais, como também os antigos têm sido pegos

de surpresa com a crise causada pela convergência das redações na pós-

inserção das TICs no meio jornalístico.

Jornalistas que trabalham em redações convergentes sofrem dificuldades de adaptação e tendem a resistir, mesmo que de forma dissimulada às mudanças. A demissão constitui uma ameaça palpável e constante, especialmente quando a integração envolve compartilhar um mesmo espaço físico, o que provoca frequentes choques entre culturas organizacionais. [...] A convergência molda não apenas as práticas jornalísticas contemporâneas, mas a própria autoimagem dos jornalistas, que precisam construir uma nova identidade profissional, multimídia (DEUZE, 2004 apud KISCHINHEVSKY, 2009, p. 71).

Diante desse cenário, meio às frequentes mudanças decorrentes da

presença das TICs e mais especificamente da internet, aparece com certo

destaque o termo “jornalismo independente”. Mas o que vem a ser jornalismo

independente e mídia alternativa? Por que outros “tipos” de jornalismo

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6 começaram a existir? Por que jornalistas ligados às mídias tradicionais têm

migrado para esses novos modelos? Seria apenas uma fuga da mídia

tradicional ou uma tentativa de adaptação ao cenário de crise no jornalismo?

Como os jornalistas que optaram por este modelo têm sobrevivido no mundo

capitalista e digital? Quais os modelos de negócio já existentes e possíveis de

serem utilizados pelo profissional jornalista?

Kischinhevsky (2009, p. 71) diz que “ter uma imprensa independente e

plural é ponto de partida para a construção e a consolidação da democracia no

mundo contemporâneo”. E sobre seguir um modelo de jornalismo

independente?

[...] uma série de fatores alteraram inclusive as perspectivas de um modelo de negócio não mais centrado para a comercialização de um único tipo de produto, ou a veiculação de notícias em um único tipo de formato. As perspectivas dos novos modelos abrem caminhos que apontam para uma integração entre plataformas e levam a fatores inexoráveis na profissão que incluem funções, processos e formas de trabalho antes não existentes no modus operandi de construção da notícia (MARANHÃO, 2014, p. 26).

O profissional jornalista foi conquistado pela sensação de fazer um

jornalismo mais ético e autônomo e mais livre das restrições impostas pelas

empresas de comunicação. Contudo, Lima (2015, p. 16) afirma que nem todos

eles têm a possibilidade de financiarem-se. Notou-se que o custo dessa

liberdade pode ser alto e formas de sobreviver a isso ainda precisam ser mais

exploradas.

O presente trabalho propõe responder as perguntas feitas acima e

colocar disponíveis informações que sirvam de consulta por aqueles que

tiverem interesse no assunto. Para tal, será necessário analisar um pouco da

história do jornalismo no Brasil e também no mundo, investigar como está o

cenário atual e pesquisar sobre as teorias e conceitos já publicados por

estudiosos da área a respeito da mídia alternativa e independente, bem como

sobre o empreendedorismo na comunicação. Em complemento, analisamos

modelos práticos e, para tal, foram escolhidos os portais Jornalistas Livres,

Mídia Ninja e Jota, para que a visualização de como a sobrevivência financeira

de tais meios se mostre mais clara para o leitor.

O fazer jornalístico na era da convergência ainda haverá de construir um novo lugar para o profissional de comunicação.

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Um lugar onde a reflexão crítica terá papel preponderante na capacidade de o jornalista se legitimar como mediador social (Kischinhevsky, 2009, p. 72).

Os meios Jornalistas Livres, Mídia Ninja e Jota seguem modelos

independentes de jornalismo – digital – e buscaram estruturarem-se de forma

que pudessem atender aos seus objetivos específicos, conseguindo sobreviver

financeiramente através de modelos de negócio que fogem do padrão em uso

pela mídia tradicional. Dessa forma, foram considerados exemplos práticos a

serem utilizados como estudo de caso, na tentativa de colocar em evidência

seus modelos de negócio, colaborando assim com o enriquecimento do

material reunido no presente trabalho.

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8 2. OJETIVOS

2.1. OBJETIVO GERAL

Analisar os modelos de negócio dos portais Jornalistas Livres, Mídia

Ninja e Jota e reunir conhecimento bibliográfico e empírico para colaborar com

os profissionais que pretendam seguir atuando de forma independente no

jornalismo ou demais interessados no assunto.

2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS

a) Identificar e abordar mudanças que ocorreram no jornalismo com o uso

das novas tecnologias da informação na era digital;

b) Identificar o conceito de jornalismo independente e mídia alternativa;

c) Pesquisar sobre empreendedorismo na comunicação e no jornalismo;

d) Entrevistar integrantes de cada portal escolhido, a fim de reunir mais

informações empíricas que colaborem com o presente estudo.

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9 3. JUSTIFICATIVA

A crise no jornalismo está presente de tal forma que é fácil encontrar um

jornalista que tenha sido demitido por estarem diminuindo o quadro de

funcionários das redações, por corte de gastos ou por qualquer outro motivo

advindo da inserção das TICs. É fácil também deparar-se com estudantes

recém-formados em jornalismo que estejam desempregados por um tempo

considerável ou que estejam procurando qualquer outro tipo de segmento

profissional onde possam exercer minimamente o conhecimento adquirido

durante a graduação. Em último caso, existem também os profissionais que

desistem do jornalismo e acabam buscando outros empregos.

O site Comunique-se1 realizou um levantamento mostrando que o ano

de 2015 encerrou-se com mais de 1.400 profissionais de comunicação

demitidos de redações pelo país e também em veículos da internet. O site A

conta dos Passaralhos2, que mantem uma base de dados sobre as demissões

no Brasil, mostra um panorama destas demissões de jornalistas nas redações

desde 2012. A mais recente informação publicada e atualizada pela última vez

no dia 21 de dezembro de 2015, informa que foram 5205 demissões totais por

custos em empresas de mídia desde 2012.

O mercado de trabalho jornalístico não é mais o mesmo e o boom

tecnológico impulsionou transformações no local de trabalho, na grade

curricular dos cursos de jornalismo e no perfil profissional do jornalista, como

será abordado no embasamento teórico deste trabalho.

“As mudanças em curso na mídia têm especial importância para os

jovens com pretensões a fazer carreira nesse campo. Os velhos estereótipos

da mídia estão desaparecendo. Entre eles, o repórter de jornal [...]” (DIZARD

JR., 2000, p. 20). Assim, é possível perceber a preocupação dos jornalistas em

adaptarem-se à nova realidade da era digital para não ficarem de fora do

mercado de trabalho.

Vivemos uma era de valorização do tempo e da informação, do pouco contato pessoal e extremo contato virtual; do controle e vigilância das mídias, do jornalismo cidadão, do leitor que não

1 Disponível em < http://portal.comunique-se.com.br/especiais/79757-2015-chega-ao-fim-com-mais-de-1-400-demissoes-na-area-de-comunicacao/>. Acesso em: 05 jul. 2016. 2 Disponível em < http://passaralhos.voltdata.info/>. Acesso em: 05 jul. 2016.

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tem medo de criticar e elogiar, do patrulhamento. Tempos complexos esses (LIMA, 2015, p. 16).

Diante dessa preocupação, surgiu a ideia de pesquisar sobre o universo

do jornalismo independente e da mídia alternativa. Acredita-se que o modelo

independente converteu-se em uma das formas mais plausíveis e

contemporâneas de sobrevivência da profissão e uma alternativa às demissões

em massa do setor.

A partir de análises empíricas, pretende-se compreender o

funcionamento do jornalismo independente, reunir conhecimento necessário

sobre o tema para, assim, contribuir com aqueles que pretendem investir num

modelo de negócio autônomo ou mesmo reinventar os modelos já existentes.

[...] o comércio eletrônico na internet chegou para ficar e as indústrias de mídia terão um importante papel em sua expansão. A transição está, em grande parte, nas mãos de uma nova geração de executivos da mídia. O futuro das suas companhias dependem muito da habilidade em se desenvolver estratégias de sucesso para a exploração dos recursos da rede (DIZARD JR., 2000, p. 32).

O momento de mudanças no setor também abre oportunidades para

romper as barreiras impostas pelos grupos hegemônicos nas áreas das mídias

que dominam os principais meio de comunicação, como tratou Lima (2015). É

possível, dessa forma, produzir notícias de maneira alternativa, com valor

social, pautadas pelo interesse público, contribuindo com a democracia e a

igualdade. Portanto, espera-se mostrar que o jornalismo independente e

alternativo permite que o jornalista seja mais pleno em suas atribuições e

contribua mais com o compartilhamento da informação e enriquecimento da

sociedade.

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11 4. METODOLOGIA DE PESQUISA

Na primeira parte do presente trabalho, optou-se por utilizar como

método de pesquisa o levantamento bibliográfico, revisando a literatura

disponível pertinente aos objetivos específicos para discutir, responder e

colaborar com a reflexão trazida pelos questionamentos que seguem abaixo:

a) O que é mídia alternativa?

b) O que é o jornalismo independente?

c) Por que o jornalismo independente começou a existir?

d) Por que jornalistas ligados às mídias tradicionais têm migrado para esse

novo modelo? Seria apenas uma fuga da mídia tradicional ou uma

tentativa de adaptação ao cenário de crise no jornalismo?

e) Como os jornalistas que optaram pelo modelo do jornalismo

independente e alternativo têm sobrevivido no mundo capitalista?

Conceituando pesquisa bibliográfica, Stumpf (2005, p. 51) diz que:

(...) é o planejamento global inicial de qualquer trabalho de pesquisa que vai desde a identificação, localização e obtenção da bibliografia pertinente sobre o assunto, até que a apresentação de um texto sistematizado, onde é apresentada toda a literatura que o aluno examinou, de forma a evidenciar o entendimento do pensamento dos autores acrescido de suas próprias ideias e opiniões.

Ainda por meio de levantamento bibliográfico e análise dos dados que

foram encontrados, foi realizado um aprofundamento acerca de modelos de

negócio aplicáveis ao jornalismo como, por exemplo, o colaborativismo e

crowdfunding. Tais conceitos são importantes para contribuir com a reflexão de

como o jornalista independente tem sobrevivido na era digital e também para

ajudar a guiar a busca de outros modos possíveis de subsistência (modelos de

negócio).

Na segunda parte desta produção, foi realizado um estudo de caso dos

meios Jornalistas Livres, Mídia Ninja e Jota, com a finalidade de obter dados

sobre como estes portais sobrevivem e sobre quais são os seus modelos de

negócio. Com a análise dos dados que foram encontrados, esperou-se reforçar

as informações reunidas durante a pesquisa bibliográfica.

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Yin (2011, p. 32 apud DUARTE, 2006, p. 216) define o estudo de caso

como “uma inquirição empírica que investiga um fenômeno contemporâneo

dentro de um contexto da vida real, quando a fronteira entre o fenômeno e o

contexto não é claramente evidente e onde múltiplas fontes de evidência são

utilizadas”. Ela afirma ainda que o estudo de caso é aceitável quando se

pretende responder questões do tipo “como” e “por que”.

Em geral, os estudos de caso são comumente vistos como de natureza “qualitativa” ou “naturalística”; aquele que “se desenvolve numa situação natural, é rico em dados descritivos, tem um plano aberto e flexível e focaliza a realidade de forma complexa e contextualizada” (LÜDKE; ANDRÉ, 1986 apud DUARTE, 2006, p. 218).

Em resumo, Duarte (2006, p. 234) afirma que o estudo de caso colabora

com a compreensão de fenômenos sociais complexos, independentemente se

estes são “individuais, organizacionais, sociais, ou políticos”.

Com a intenção de complementar os dados obtidos com o estudo de

caso realizado, decidiu-se realizar entrevista em profundidade com integrantes

de cada meio (Jornalistas Independentes, Mídia Ninja e Jota). O objetivos das

entrevistas foi colaborar qualitativamente com informações que ajudem

jornalistas a terem conhecimento para optar por um modelo de negócio que

atenda às suas necessidades.

Jorge (2006, p. 62) sustenta que a entrevista em profundidade é uma

“técnica qualitativa que explora um assunto a partir da busca de informações,

percepções e experiências dos informantes para analisá-las e apresentá-las de

forma estruturada”. É um método de pesquisa que visa obter intensidade nas

respostas, pois dá liberdade ao informante na hora de responder, ao mesmo

tempo em que dá espaço para que o entrevistador ajuste livremente suas

perguntas.

Como foi apontado por Jorge (2006, p. 65) sobre entrevista aberta:

É essencialmente exploratória e flexível, não havendo sequência predeterminada de questões ou parâmetros de respostas. Tem como ponto de partida um tema ou questão ampla e flui livremente, sendo aprofundada em determinado rumo de acordo com aspectos significativos identificados pelo entrevistador quando o entrevistado define a resposta segundo seus próprios termos, utilizando como referência seu conhecimento, percepção, linguagem, realidade, experiência (JORGE, 2006, p. 65).

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Para as entrevistas realizadas, foram utilizadas perguntas abertas

(entrevista aberta), possibilitando aos entrevistados que dissertassem

livremente sobre o que achassem relevante. Porém, para facilitar a condução

das conversas, foi utilizado um roteiro de perguntas no qual estava dividido nos

blocos “perfil o entrevistado”, “sobre o portal” e “possível concorrência”.

As entrevistas foram realizadas com jornalistas integrantes de cada

portal, conforme segue abaixo:

a) Portal: Jota; Entrevistado: Felipe Seligman; Data de realização: 04 out.

2016; Via mensagem de áudio do WhatsApp.

b) Portal: Jornalistas Livres. Entrevistada: Flávia Martinelli. Data de

realização: 07 out. 2016; Via mensagem de áudio do Telegram.

c) Portal: Mídia Ninja. Entrevistado: Clayton Nobre. Data de realização: 13

out. 2016. Via mensagem de áudio do Telegram.

O roteiro seguido e as entrevistas transcritas na íntegra se encontram

nos apêndices, ao final deste estudo.

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14 5. JORNALISMO PÓS TICS

As Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs) atingiram

sistematicamente vários setores da sociedade, mudando toda sua lógica

estrutural. As organizações, de uma maneira geral, tiveram que se adaptarem,

adequando os seus ambientes a essa nova realidade. E com as TICs e a

internet, o jornalismo nunca mais foi o mesmo.

A era virtual, além de reconfigurar de forma radical cada um dos meios e o conjunto da comunicação, revolucionou as formas de socialização do ser humano, as práticas políticas e o modo pelo qual as novas gerações se relacionam com o saber (KUCINSKI, 2012, p. 6).

Analisando o contexto da época, como foi apontado por Dizard Jr. (2000,

p. 20), as redações estavam repletas de terminais de bancos de dados,

aparelhos de fax, videocassetes e outros dispositivos computadorizados e que

tudo isso seria substituído em um futuro próximo por versões mais avançadas

ou tecnologias melhores que transformariam ainda mais o ambiente de

trabalho.

Nos anos 2000, os estudiosos do impacto tecnológico já teorizavam

sobre como estaria o jornalismo futuramente com a inserção das tecnologias

da informação. Com exceção dos videocassetes citados acima, dezesseis anos

depois, pode-se afirmar que a realidade jornalística está realmente próxima do

que foi previsto por Dizard Jr..

Foi nos anos 2000 que houve um amadurecimento da sociedade na

rede, com o surgimento dos blogs, microblogs, as redes sociais, dentre outros,

como ressalta Lima (2015, p. 77). E foi, a partir desse momento, que houve

uma generalização da globalização informacional onde “mudam os

relacionamentos virtuais, os jogos online, o jornalismo, a publicidade e o

marketing digitais, os governos [...]”.

Segundo Kucinski (2012 p. 8), estamos vivendo a transição entre o

antigo e o novo e mesmo que os jornais impressos tenham forte

representatividade, é iminente que definhem rapidamente. No geral, o jornal

impresso morre a cada dia, mas muitos acabam sobrevivendo devido a

subsídios e proteção do Estado, formando “um bloco ideologicamente

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15 homogêneo e reacionário de defesa dos interesses dominantes e do poder

econômico”.

As indústrias jornalísticas trataram de aperfeiçoar o quanto antes sua produção em um cenário de profundas alterações, em que os fluxos informativos multiplicam-se através de plataformas advindas essencialmente das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) (MARANHÃO, 2014, p. 23).

Baseada na percepção de jornalistas entrevistados durante estudo

realizado, Maranhão (2014, p. 27) afirma que “as TICs são vetores

catalisadores para um processo de mudança que leva em conta o exercício de

novas competências no cotidiano laboral”. Ou seja, tais mudanças influenciam

inclusive na forma de trabalho do profissional jornalista.

Este profissional adquiriu uma imagem de grande complexidade no

mercado de trabalho.

Hoje o jornalista tem que fazer de tudo um pouco. Não há mais diferenças entre um fotógrafo, um cinegrafista, um redator. Parece que a realidade obriga todos a incorporar novas ferramentas. O jornalista multimídia tem que entender de tudo, até desenho gráfico. Tem que ser capaz de editar uma foto, de editar um vídeo, um podcast. Creio que é também uma questão de custo para as empresas. Em vez de mandar uma equipe de quatro pessoas para cobrir uma guerra, agora mandam só uma (...) que vai cobrir a invasão do Iraque com uma câmera e um telefone via satélite. E produz quatro informes por dia (JORGE, 2007 apud JORGE; PEREIRA; ADGHIRNI, 2009, p. 85).

O jornalista, além de saber trabalhar com vários formatos, de acordo

com a visão de Jorge, Pereira e Adghirni (2009), ainda precisa ser competente

para construir a notícia no menor tempo possível, pois segundos são decisivos

para os portais de notícias online.

5.1. WEB 2.0, JORNALISMO ONLINE E WEBJORNALISMO

Contextualizando historicamente, Xavier (2015, p. 41) dispõe que o

aumento do acesso à internet deu-se enfaticamente na década de 1990 e

completa que:

Sua popularização ocorreu devido ao desenvolvimento de tecnologias que contribuíram para melhorar a interface da internet e o acesso aos usuários. Em 1989, nasceu a World Wide Web (referenciada apenas como web ou pela sigla WWW). Sua invenção contribuiu para a criação dos navegadores (browsers). O primeiro, denominado Mosaic, foi

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lançado em 22 de abril de 1993 (QUADROS, 2002, p. 1-2). No ano seguinte, em 1994, ocorreu o lançamento do site de buscas Yahoo. Os primeiros jornais a veicular versões digitais de suas publicações impressas foram The Nando Times e The San Jose Mercury Center, respectivamente em 1994 e 1995. Ambos os jornais se tornaram reconhecidos por oferecerem muito “mais que a simples transposição das informações do diário de papel para a Rede”, explorando as “vantagens da internet” (QUADROS, 2002, p. 3 apud XAVIER, p.41).

Criado por Tim O’Reilly, em 2003, o termo web 2.0 foi definido como “a

mudança para uma internet como plataforma, e um entendimento das regras

para obter sucesso nesta nova plataforma (DANTAS)”, tendo como regra

fundamental “o aproveitamento da inteligência coletiva”. O autor expõe a

afirmação de especialistas que dizem que ainda não existe um conceito

formado para a web 2.0, pois ainda está sendo desenvolvido e moldado; ao

mesmo tempo, ele diz que a web 2.0 se baseia no desenvolvimento de uma

rede de informações onde cada usuário pode não somente usufruir, mas sim,

contribuir com o conteúdo. Inclusive foi citada por ele como exemplo a

Wikipédia, onde todo o site é construído colaborativamente pelos seus

usuários.

O termo Web 2.0 é utilizado para descrever a segunda geração da World Wide Web --tendência que reforça o conceito de troca de informações e colaboração dos internautas com sites e serviços virtuais. A ideia é que o ambiente on-line se torne mais dinâmico e que os usuários colaborem para a organização de conteúdo (ENTENDA3, 2006).

Na web 2.0 encontram-se os termos jornalismo online e webjornalismo

(ou ciberjornalismo). Canavilhas (2001, p. 1) simplifica dizendo que o chamado

jornalismo online “não é nada mais do que uma simples transposição dos

velhos jornalismos escrito, radiofónico e televisivo para um novo meio”, não se

confundindo por completo com o termo webjornalismo, que tem um conceito

mais elaborado e que será abordado logo mais.

Em outro estudo, Canavilhas (2006, p. 2) complementa que o jornalismo

online é aquele que “mantém as características essenciais dos meios que lhe

deram origem”, apenas transferindo conteúdo para o meio online. Os jornais,

por exemplo, em suas versões online, mantêm uma atualização constante,

3 Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u20173.shtml>. Acesso em: 4 mai. 2016

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17 utilizando do hipertexto para conexão com outas notícias relacionadas e

permitem também a interação dos leitores por meio de comentários, contudo

sem fugir muito do modelo tradicional.

Acerca do jornalismo online, Rodrigues (2009, p. 30) discorre que, se

formos colocá-lo apenas como mais um tipo de jornalismo, estaríamos

restringindo-o a um modelo que fica fora do que é esperado no mercado de

trabalho. Dentro de sua análise, complementa-se que:

a perspectiva de pensar o jornalismo online como uma atividade que altera o exercício do jornalismo afetaria a lógica dos prefixos – (rádio) jornalismo, (tele) jornalismo, (web) jornalismo –, por trás da qual estaria o arraigado conceito de que há um jornalismo “puro”, do qual derivam subcategorias determinadas pela tecnologia. Por esse caminho, fronteiras que se pretendem muito bem demarcadas seriam eliminadas, abrindo espaço para repensar a prática profissional a partir do surgimento do jornalismo online (RODRIGUES, 2009, p. 30)

O webjornalismo, ou ciberjornalismo, por outro lado, possui mais riqueza

em seu conteúdo, como abordado por Canavilhas (2006, p. 2). Segundo ele,

nesse tipo do jornalismo “as notícias passam a serem produzidas com recurso

a uma linguagem constituída por palavras, sons, vídeos, infografias e

hiperligações, tudo combinado para que o utilizador possa escolher o seu

próprio percurso de leitura”. Nesse cenário, Canavilhas (2001, p. 6) afirmou que

o jornalista torna-se produtor de conteúdo multimídia e o leitor deixa de ser

apenas leitor, ouvinte ou telespectador, já que “a webnotícia integra elementos

multimídia, exigindo uma “leitura-multilinear””.

Optando por não aprofundar o debate acerca das nomenclaturas

jornalismo online, jornalismo digital, jornalismo multimídia, cibejornalismo,

webjornalismo, entre outras existentes, Xavier (2015, p. 42) centraliza seu

estudo com o termo jornalismo digital. Referenciando Kawamoto (2003), ela

desenvolve que as características típicas do jornalismo digital são “a

hipertextualidade, a não linearidade, a multimidialidade, a convergência e a

personalização”. Contudo, a autora aborda como principais as seguintes

características: hipertextualidade, multimidialidade, instantaneidade/atualização

e interatividade.

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18 6. MÍDIA ALTERNATIVA

Ao se falar comunicação alternativa, pelo nome, já é possível inferir que

se trata de uma comunicação que procura “ser uma opção como canal de

expressão e de conteúdos infocomunicativos em comparação à grande mídia

comercial e à mídia pública de tendência conservadora”, como apontado por

Peruzzo (2009, p. 2). Ela acrescenta que a comunicação alternativa simboliza

outra comunicação ou contracomunicação que segue os movimentos

populares, com a liberdade de expressão sendo praticada, democratizando

assim a informação e o acesso da população aos meios de comunicação,

contribuindo para a transformação social.

Entendemos por comunicação alternativa uma comunicação livre, ou seja, que se pauta pela desvinculação de aparatos governamentais e empresariais de interesse comercial e/ou político-conservador. Não se trata unicamente de jornais, mas de outros meios de comunicação, como rádio, vídeo, panfleto etc (PERUZZO, 2009, p. 3).

Peruzzo (2009, p. 3) enaltece que no Brasil esse tipo de comunicação

representa uma contestação à estrutura social e dá voz a “setores subalternos

da população” de maneira que eles possam cobrar atendimento às

necessidades causadas pelas desigualdades sociais. Ela também cita as lutas

para democratizar a política e a sociedade, a distribuição de renda, dentre

outros pontos, que se tornam mais visíveis graças à utilização de uma

comunicação alternativa.

Nos últimos tempos, mais precisamente no início deste século (XXI), observa-se uma retomada crescente de iniciativas de comunicação popular, alternativa e comunitária no Brasil, agora incorporando inovadores formatos e canais de difusão possibilitados pelas novas tecnologias de informações e comunicação (NTIC). São experiências ligadas a movimentos sociais, associações comunitárias e de vários outros tipos de organizações não governamentais, segmentos comunitários autônomos (infanto-juvenil, estudantil etc.), projetos de extensão (e de outros tipos) de universidades, iniciativas de rádio-escola que muitas vezes extrapolam o espaço escolar e estabelecem elos com a “comunidade” local e assim por diante (PERUZZO, 2009, p. 4).

Com a facilidade proporcionada pelo acesso às novas ferramentas de se

criar e manter uma página na internet, os jornalistas ganharam um adicional de

autonomia para investigar, publicar, divulgar seu material e ainda fazer com

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19 que suas ideias cheguem ao público e se tornem conhecidas, como estudado

por Xavier (2015). Para ela, isso diminui o vínculo do jornalista com um veículo

tradicional. “São diversas as iniciativas estritamente digitais, voltadas a

produção de conteúdo jornalístico em geral e de nicho, inclusive investigações

[...]” (XAVIER, 2015, p. 65).

As organizações jornalísticas sem fins lucrativos estão intimamente

relacionadas às denominadas iniciativas em jornalismo alternativo e, como

ditas por Xavier (2015, p. 67), “têm origem no desejo de expressão daqueles

que não têm suas ideias e perspectivas representadas pelos veículos de

comunicação públicos e comerciais”. O jornalismo alternativo estava presente

em vários momentos da história da mídia no Brasil e, remetendo-se à época da

ditadura militar no Brasil, ela lembra que

a nomenclatura imprensa alternativa, bem como nanica, de leitor, independente, underground, política e opinativa, são utilizadas em referência ao movimento de contestação ao regime e aos veículos da mídia tradicional que apoiaram o golpe e àqueles que estavam submetidos à censura. Durante o período ditatorial, a grande maioria dos jornais alternativos operavam com baixas receitas e pouca ou mesmo nenhuma organização administrativa. Os jornalistas geralmente não eram remunerados e mantinham outros empregos para garantirem seu sustento (CAPARELLI, 1980, p. 59-60 apud XAVIER, 2015, p. 68).

A imprensa alternativa desapareceu no Brasil após a época da ditadura,

de acordo com Peruzzo (2009), mas se revigorou incrivelmente no início do

século XXI, reeditando expressões no impresso e no audiovisual, criando

novos canais e se recriando em novos formatos digitais com o avanço das

tecnologias. Tudo isso, sem perder o caráter alternativo.

Nesse cenário, surgem novos jornais, vídeos, webradios, home pages, fotologs, videologs, podcasts, e-zines, revistas etc. Agências alternativas de notícias são criadas; produtos editoriais dessa natureza assumem formatos impresso, audiovisual e on-line; cresce o número de Observatórios de Mídia e da Comunicação que monitoram a mídia; surgem Coletivos de Comunicação como o Centro de Mídia Independente (CMI); novos canais de comunicação como os websites colaborativos e outras formas de redes sociais são criados e os weblogs se proliferam (PERUZZO, 2009, p. 7).

Imprensa alternativa foi conceituada por Peruzzo (2009, p. 140) como

uma “vertente que reúne processos de comunicação basicamente jornalísticos,

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20 que podem assumir feições mais amplas, de caráter autônomo” e que fogem

dos padrões convencionais dos meios de comunicação, da comunicação

governamental e de outras “classes dominantes”. Ela caracterizou

especificamente alguns de seus segmentos, colaborando veemente na

compreensão do que se pretende com a presente pesquisa, como veremos a

seguir.

Por jornalismo popular alternativo, ou de base popular, Peruzzo (2014, p.

142) classifica como um modelo participativo, ligado aos “movimentos

populares, associações, entidades ligadas a setores progressistas de igrejas,

ONGs etc.”.

Em relação ao jornalismo alternativo colaborativo, ela coloca como

aquele que apresenta outra visão do que está sendo discutido na mídia

tradicional ou que é omitido por ela. Podendo tratar também de assuntos mais

generalizados ou específicos como política, economia, questões locais,

questões juvenis, crítica aos meios de comunicação etc. E o colaborativismo

dentro desse segmento apresenta duas perspectivas:

A primeira, pelo senso de ajuda, partilha e colaboração instituído e praticado, em geral, por voluntários que levam adiante alguma proposta editorial diferenciada. Essa dimensão é característica da comunicação popular, comunitária e alternativa ao longo dos tempos e utiliza como suporte canais impressos, orais, audiovisuais e/ou digitais. Como exemplo, podemos citar a revista Viração e o jornal Trecheiro. A segunda perspectiva se refere a processos interativos nas mídias digitais, na lógica da Web 2.0, através de websites colaborativos, nos quais os membros e militantes usuários da internet podem contribuir com conteúdos produzidos por eles mesmos e inseridos no sistema on-line. Tais webespaços são majoritariamente preenchidos com conteúdos elaborados pelos próprios usuários. Exemplos: Centro de Mídia Independente (CMI), Overmundo, Canal Motoboy, Wikinews e YouTube.28 (PERUZZO, 2009, p. 141).

O jornalismo alternativo autônomo, outro segmento apontado pela

autora, equivale à “imprensa produzida por indivíduos isoladamente ou até por

microempresários. Pode ser de informação geral, literário, político etc.”.

Jornalismo político-partidário é aquele dirigido dentro do contexto

político, pelos “partidos, candidatos a cargos eletivos ou parte de “mandatos”

de vereadores, deputados e senadores no exercício da função pública”.

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21

Por fim, o jornalismo sindical corresponde ao que é produzido pelos

sindicatos de trabalhadores e organizações de categorias profissionais como a

de professores, metalúrgicos, etc.

Após segmentar a imprensa alternativa conforme acima, Peruzzo (2009,

p. 142) complementa que tais categorias servem apenas para facilitar a

compreensão acerca do tema, contudo,

não serve para classificar e explicar toda e qualquer experiência, pois as práticas comunicativas de base popular e alternativa tendem a conjugar mais de uma dimensão. Também não serve para demarcar fronteiras inflexíveis onde elas inexistem, ou seja, na realidade concreta (PERUZZO, 2009, p. 142).

A autora (2009, p. 143) cita o jornalismo cidadão como inovador dentro

do contexto da época de seu estudo em 2009 e diz que sua prática coloca de

lado a figura do gatekeeper4, incentivando que as pessoas participem

ativamente no fazer comunicacional.

A ideia em torno do conceito participação, na internet, se baseia em toda a produção de conteúdo feita por qualquer “interagente”, através de sites e blogs, comumente referenciada pelos termos jornalismo cidadão (citizen journalism), jornalismo participativo, jornalismo de base (grassroots jorunalism), e jornalismo de código ou fonte aberta (open source journalism) (XAVIER, 2015, p. 44-45).

O movimento open source, como abordado por Xavier (2015), veio da

proposta de incentivo a um modelo de negócio alternativo, com a “produção

intelectual colaborativa”. A autora compara o denominado jornalismo open

source com o conceito de software livre, que possui como ideia “permitir que

qualquer pessoa tenha acesso ao código fonte de modo a contribuir para

eliminação de falhas e para o aprimoramento das capacidades de determinado

software”. Para ela, o jornalismo open source “expande os moldes da dialética

entre o leitor e jornalista, para além dos típicos espaços de opinião (cartas dos

leitores, opinion makers, editoriais, críticas)” (XAVIER, 2015, p. 45). O leitor

deixa de ser apenas leitor, transformando-se em produtor de notícias e “torna-

se editor, ou coautor, crítico da informação”.

4 “Porteiro” (controlador) que seleciona o que entra ou não no meio de comunicação.

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22 7. JORNALISMO INDEPENDENTE

Ainda não é possível encontrar estudos que definam claramente um

conceito para o jornalismo independente. Xavier (2015, p.72) apresentou a

visão de que uma organização pode ser considerada “independente” quando é

legalmente reconhecida como sem fins lucrativos e é financeiramente

autossuficiente.

Administradas por equipes pequenas, formadas principalmente por profissionais de comunicação, que comumente estão mais preocupados em desenvolver produtos editorias inovadores e de qualidade, a percepção dessas organizações como um negócio é baixa ou até mesmo ausente. Fato compreensível considerada a motivação existencial das organizações em questão. Mas a ausência de profissionais qualificados em negócios, somado ao pouco tempo dedicado ao desenvolvimento de fontes alternativas de financiamento e ao baixo investimento nas áreas de marketing e de publicidade, contribuem diretamente para a contínua dependência de uma ou duas fontes principais de receitas, geralmente baseadas em patrocínios e doações (XAVIER, 2015, p. 72).

Ousamos dizer que o jornalismo independente é aquele praticado de

forma autônoma pelos profissionais jornalistas ou inclusive por não jornalistas,

sem estarem ligados a veículos da mídia tradicional, nem a organizações,

empresas ou partidos políticos. E que, além disso, é o jornalismo que busca

sobreviver financeiramente no mercado de trabalho, colocando em prática um

modelo de negócio próprio.

Como apontado por Lima (2015), não há mais a necessidade de estar

em um grupo de Comunicação para produzir conteúdo jornalístico, uma vez

que munidos de um computador e conexão com a internet é possível ser

jornalista de qualquer lugar.

O repórter independente Fausto Salvadori Filho foi citado no portal

Profissão Foca5 dando a seguinte opinião, colaborando com a reflexão do

termo jornalismo independente.

Acho que jornalistas vão ficar parecidos com outras profissões, como os atores, em que o desafio não é pensar em que veículo vai contratar você, mas como você pode pensar em trabalhos que deem dinheiro. Pode ser criando seus próprios veículos , entrando em editais, criando projetos ou mesmo atuando em

5 Disponível em: < http://profissaofoca.com.br/independencia-jornalistica-entra-em-pauta-na-ultima-noite-de-jornada/>. Acesso em 23 jul. 2016.

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áreas que não têm a ver diretamente com o jornalismo tradicional (DALAPOLA, 2016).

Xavier (2015, p. 73) reuniu alguns exemplos de como as organizações

norte-americanas têm buscado como fuga à dependência financeira; são eles:

diversificação das fontes de receita utilizando publicidade, cursos e

treinamentos, doações individuais, realizando eventos, etc.

A Open Society Foundations6, em um programa que incentiva o

jornalismo independente, diz que a prática desse tipo de jornalismo é

fundamental para criar e manter de forma saudável sociedades democráticas.

Ela afirma que a quantidade de informação hoje é enorme e que,

intencionalmente ou não, muitas delas não são verdadeiras e que, dessa

forma, o jornalista independente pode reforçar o papel do profissional que

verifica, explica e contextualiza. Como informações enganosas são

onipresentes na era digital, a Open Society Foundations afirma que o

jornalismo deve ser livre o suficiente para enfrentar o poder quando é abusivo

ou corrupto e servir para denunciar atividades que têm sido escondidas ou

distorcidas por governos ou corporações.

For journalism to be influential in the digital era, its information gathering, production, and distribution processes must be transparent. Openness earns trust and engagement, and allows journalists to moderate conversations—inside or outside a given medium—feeding those conversations with quality news and stories delivered in an appealing way on multiple platforms, anytime, anywhere. When journalism plays this new role in society, its impact can be phenomenal. Where diverse, independent media can engage the public and thrive, the quality of public debate is better, and the more open a society is likely to become (OPEN SOCIETY FOUNDATIONS).

Na citação acima, na qual traduzimos livremente, a Open Society

Foundations afirma que para o jornalismo ser influente na era digital, sua coleta

de informação, produção e processo de distribuição deve ser transparente. A

abertura ganha confiança e engajamento, e permite que os jornalistas possam

moderar conversas dentro ou fora de determinado meio, alimentando essas

conversas com notícias e histórias de qualidade entregues de uma forma

apelativa em múltiplas plataformas, a qualquer hora, em qualquer lugar.

6 Disponível em: < https://www.opensocietyfoundations.org/about/programs/independent-journalism>. Acesso em: 24 jul. 2016.

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24 Quando o jornalismo desempenha esse novo papel na sociedade, o impacto

pode ser fenomenal. E quando diversificada, a mídia independente pode

envolver o público e prosperar de forma que o debate público se torne melhor,

colaborando para que a sociedade se torne mais aberta.

7.1. JORNALISMO SEM FINS LUCRATIVOS

Quando “jornalismo independente” é pesquisado na internet, o termo

“sem fins lucrativos” vem atrelado a praticamente todos os resultados. Contudo,

o que é dizer que um jornalismo é independente e sem fins lucrativos? Para

explicarmos, partimos do conceito de organizações sem fins lucrativos.

O termo terceiro setor é utilizado para denominar as organizações sem fins lucrativos, de participação voluntária, em que o excedente é reinvestido na própria organização, compreendida pelo sistema econômico capitalista, e se adapta a novas alternativas de planejamento e desenvolvimento democrático e social (Araújo, 2006). Em geral, esse setor é conceituado como organizações da sociedade civil que objetivam a prestação de serviços ao público em diversas áreas nas quais o governo não atua de forma eficiente e dependem de doações de pessoas, empresas ou de ajuda do governo para existir. (...) As entidades que compõem o terceiro setor surgem dentro de um contexto de responsabilidade social (LIMA, 2014, p. 24-25).

No contexto da administração de empresas, dizer que uma organização

é sem fins lucrativos não significa exatamente dizer que ela não tem interesse

em gerar lucro. Como colocado por Lima (2014, p. 34), há certa controvérsia no

sentido empresarial, já que a intenção do lucro está presente na grande maioria

das atividades econômicas. Contudo, as entidades sem fins lucrativos “têm

como objetivo principal o bem-estar social e não o recebimento de

remuneração sobre as vendas ou serviços prestados”. Sabe-se que ter um

resultado positivo é algo fundamental para qualquer empresa e, diferentemente

das empresas que visam o lucro, as sem fins lucrativos, buscam um superávit

(excesso da receita sobre a despesa) que se incorpora ao patrimônio social.

Nas demais empresas – com fins lucrativos –, o lucro pode ser distribuído entre

acionistas.

A tabela a seguir resume as principais diferenças entre as entidades

sem e com fins lucrativos:

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25

Tabela 1 - Diferenças entre as entidades sem fins lucrativos das entidades com fins lucrativos

Entidades Objetivos-meio Objetivos-fim

Com fins lucrativos Satisfação da necessidade

dos consumidores

Lucro

Sem fins lucrativos Provocar mudanças sociais Indivíduos transformados

Fonte: OLAK; NASCIMENTO, 2010, p. 08 apud LIMA, 2014, p. 34.

Podemos assim colocar as organizações de jornalismo sem fins

lucrativos inseridas nesse contexto das organizações de modo geral.

Baseada em outra perspectiva, Cagé (2016)7 sugere que as empresas

jornalísticas deveriam preferir se organizar como fundação e não como

sociedades anônimas, uma vez que “os herdeiros não podem dispor como

quiserem do capital herdado. O investimento é irrevogável e, portanto,

permanente”.

As fundações são conceituadas como

Fundação é a instituição autônoma criada por liberalidade privada ou pelo Estado, com personalidade jurídica e patrimônio próprio, com fim altruístico, beneficent e ou de interesse ou de utilidade pública ou particular , administrada segundo as determinações de seus fundamentos (SEBRAE8, 2016. Grifo nosso).

De acordo com Cagé (2016), a reorganização das empresas jornalísticas

na forma de fundação permitiria doações permanentes de capital. Ela

acrescenta ainda que “as doações a fundações são irrevogáveis e o sistema de

investimentos irrevogáveis tornaria possível garantir a independência das

empresas jornalísticas no longo prazo”.

7 Trecho selecionado, pelo Nieman Reports, do livro Saving the Media: Capitalism, Crowdfunding, and Democracy, lançado pela Harvard University Press. Tradução por Jo Amado. Disponível em: <http://observatoriodaimprensa.com.br/imprensa-em-questao/livro-gera-polemica-ao-propor-imprensa-sem-fins-lucrativos/>. Acesso em: 18 ago. 2016. 8 Disponível em: <http://www.sebrae-sc.com.br/leis/default.asp?vcdtexto= 128&amp%3B/>. Acesso em: 22 set. 2016

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26 8. EMPREENDEDORISMO

De acordo com o dicionário online Michaelis9, empreender significa:

“1. Resolver-se a praticar (algo laborioso e difícil); tentar: Resolveram empreender aquela escalada perigosíssima. 2. Pôr em execução; fazer, realizar: Conseguiu finalmente empreender uma pesquisa acadêmica. Empreender uma viagem.”

Casaqui e Sinato (2015 apud GROHMANN; ROXO, 2015, p. 473)

sustentam que “o imaginário do empreendedorismo, tem sido associado, entre

outros aspectos, à mobilidade, à autonomia das atividades de trabalho, à

possibilidade de criar seu próprio negócio e “ser feliz””.

No prefácio do seu livro sobre empreendedorismo, Chiavenato (2012)

afirma que não basta apenas criar um empreendimento, mas que o

empreendedor também precisa gerir o negócio de acordo com o ciclo

administrativo de planejar, dirigir e controlar, de forma que sobreviva e traga

retorno financeiro. De maneira informal, ele diz que empreendedores

são pessoas de carne e osso como qualquer outra, mas com uma cabeça especial, arrojadora, inquieta, desejosa de autonomia, independência e fazer acontecer. São lutadoras que se engajam na conquista de um lugar no mundo dos negócios, um mundo repleto de desafios que não metem medo em nenhum deles. São pessoas que enfrentam a realidade com férrea determinação e coragem, não esmorecem e, mesmo quando passam por algum eventual revés, sabem que é uma questão de aprendizado e que o sucesso vai logo estar à frente (CHIAVENATO, 2012, prefácio).

Na história, existem várias pessoas que começaram a vida como

empreendedores, iniciando do zero, e que se tornaram bastante prósperas.

Como exemplo, Maximiano (2011, p. 2) cita Henry Ford e Bill Gates, que

conseguiram ir além da criação de suas empresas transformando a tecnologia,

o modo de fazer negócios e a própria sociedade, trazendo prosperidade para

muitas pessoas. Afirmamos assim que o desejo do empreendedor deve ser

basicamente o de destacar-se entre os demais e ir além da criação do seu

negócio, o que aparentemente não é algo fácil.

Para alcançar o sucesso, o modelo inicial do empreendimento e os

objetivos são coisas fundamentais e, como exposto por Chiavenato (2012, p.

9 Disponível em <http://www.dicio.com.br/>. Acesso em: 15 jun. 2016.

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27 1), o futuro do negócio irá depender de tudo que for realizado antes de sua

implementação.

Em uma comparação entre o empresário e o empreendedor, Maximiano

(2011, p. 3-4) coloca que o primeiro é aquele formalmente à frente de um

negócio, conduzindo-o diariamente, enquanto o segundo é o lado criativo,

prático e essencial que está à frente no nascimento, crescimento e na

sobrevivência do negócio. Conceitos válidos para reflexão.

A figura abaixo lista algumas vantagens e desvantagens em ser um

empreendedor, na visão de Maximiano (2011).

Figura 1 - Vantagens e desvantagens do empreendedorismo

Fonte: MAXIMIANO, 2015, p. 5.

Para ele, um empreendedor é seu próprio chefe e segue tomando as

decisões que desejar, é livre para inovar e experimentar quando achar

necessário e consegue ter “perspectivas de ganhos financeiros, se tiver êxito”,

ganhando reconhecimento no mercado. Como desvantagem, ele aponta a

inevitabilidade de conviver com as possíveis mudanças e influências do

ambiente externo, além das listadas na figura 1.

Peter Drucker (apud SERTEK 2012, p. 82), considerado por muitos o

guru da Administração, afirma que é um erro pensar que o lucro é a principal

finalidade de um negócio e acrescenta que

se a razão principal e forte não for a de atender às necessidades de clientes, razão-chave do negócio, não haverá nem lucro, nem empresa, nem negócio. (...) A lucratividade não é a finalidade, mas sim o fator limitante da empresa comercial e da atividade empresarial. Lucrar não é explanação, causa ou filosofia do comportamento empresarial e das decisões empresariais, mas é o teste de suas validades (DRUCKER, 2002, p. 34 apud SERTEK, 2012, p. 82).

Com dados de pesquisas realizadas, Maximiano (2015, p. 7) mostra que

no Brasil existem boas perspectivas sobre o empreendedorismo, ainda que o

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28 cenário não seja totalmente favorável devido a fatores como a falta de políticas

públicas, falta de linhas de crédito e de financiamento e os altos juros e o peso

dos tributos, por exemplo. Ele afirma que existem diversos órgãos e iniciativas

que apoiam os empreendedores, como o Sebrae, as fundações estaduais de

amparo à pesquisa, as incubadores de novos negócios e as escolas

superiores, que oferecem cursos e programas sobre empreendedorismo.

Na internet, há inúmeros sites que orientam o empreendedor e oferecem informações sobre novos negócios, bem como cursos sobre como iniciar e conduzir um novo negócio. A Academia de Empreendedores (<http://www.aemp.com.br/>) e o Instituto Empreendedor Endeavor (<http://www.endeavor.o rg.br/>) são duas instituições dedicadas a esse tipo de missão (MAXIMIANO, 2015, p. 7)

Visitamos o site do Sebrae10 e na página inicial já é possível encontrar

um botão destinado ao assunto empreendedorismo e ao clicar, encontra-se

vídeos, cursos, notícias e textos que servem de guia para quem deseja adquirir

conhecimento para investir na área.

Figura 2 - Site Sebrae

Fonte: SEBRAE

Com uma visão otimista, Sertek (2012) diz que “o empreendedor é uma

figura extremamente importante para o desenvolvimento de uma nação”, já

que, segundo ele, a maior parte dos empregos gerados vem de micro e

pequenas empresas. Ele afirma que existem muitas dificuldades para se iniciar

um negócio, contudo, o empreendedor deve ter uma definição clara de seu

negócio para assim conseguir minimizar tais dificuldades. Assim, “é necessário

10 Disponível em: <http://www.sebrae.com.br>. Acesso em: 30 ago. 2016.

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29 inovar, criar utilidades sem precedentes para os consumidores, de modo a

tornar a concorrência praticamente irrelevante. Para isso, o posicionamento do

produto/serviço no mercado deve ser muito claro (SERTEK, 2012, p. 225)”.

O empreendedor, para Sertek (2012, p. 228), tem a capacidade de

desenvolver suas próprias qualidades ao desenvolver um plano de ação para

seu crescimento. Para isso, deve querer sempre se atualizar, com outras

informações e conhecimentos, bem como estar aberto a descobrir as próprias

lacunas pessoais, aceitando-as. Além disso, deve adquirir conhecimentos e os

praticar sistematicamente para que dessa forma tenha a possibilidade de

verificar os resultados, corrigindo-os quando necessário, ao mesmo tempo em

que se ganha a competência de quem é constante nos seus propósitos.

E sobre ser empreendedor no jornalismo? Como colocado por Saad

(2003, p. 10),

ainda hoje as expectativas do consumidor da internet se aproximam daquelas do consumidor da mídia tradicional - a necessidade de um editor, seja homem ou máquina, para reduzir a complexidade e expor a essência da informação disponível.

Isso deixa espaço aberto para que a mídia continue se adaptando no

cenário digital. Apesar da crise do meio jornalístico mencionada anteriormente,

encontram-se muitos outros exemplos de modelos independentes, além dos

objetos de estudo presentes neste trabalho, nos quais os jornalistas têm sido

empreendedores. O portal Observatório da Imprensa, ao discorrer sobre

jornalismo empreendedor no Brasil11, citou alguns deles (o Jota, inclusive),

conforme figura a seguir:

11 Disponível em: < http://observatoriodaimprensa.com.br/interesse-publico/como-o-jornalismo-empreendedor-esta-decolando-no-brasil/>. Acesso em: 11 out. 2016.

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30

Figura 3 - Exemplos de startups de jornalismo

Fonte: FREELON, Karatiana. 2015. Disponível em: <http://observatório daimprensa.com.br/interesse-publico/como-o-jornalismo-empreendedor-esta-decolando-no-brasil/>. Acesso em: 11 out. 2016.

São os exemplos pioneiros dessa nova realidade e acreditamos que o

leitor possa utilizá-los também como base de pesquisa e análise para que se

inspirem com seus próprios empreendimentos.

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31 9. MODELO DE NEGÓCIO

O conceito de modelo de negócio é recente, segundo pesquisadores,

mas já vem se popularizando devido a necessidade de adaptação que muitas

empresas, antigas ou novas, vêm enfrentando desde a massificação do uso da

internet e o surgimento de negócios digitais. Buscar o termo no Google hoje, já

traz diversos portais tentando explicá-lo.

Ghaziani e Ventresca (2005 apud OROFINO, 2011, p. 4) dizem que o

termo business model foi citado pela primeira vez em 1975, mas com maior

destaque nos anos noventa, quando surgiram os negócios das empresas

chamadas de “ponto com”, o e-commerce e a economia do conhecimento.

Por outro lado, Orofino (2011) coloca que, apesar de ser um termo

citado há um tempo considerável, a discussão sobre seu significado ainda é

bastante superficial e, baseada no estudo de Keen e Qureshi (2006), ela afirma

que modelo de negócio era ausente em livros administrativos até meados do

ano de 2006.

Em maio de 2001, a NASDAQ sofreu um colapso e muitas pequenas empresas virtuais que iniciavam seus negócios, quebraram. De acordo com Magretta (2002, p.3), “tais empresas não precisavam de estratégia, nem de competências especiais e tampouco de clientes – bastava-lhes um modelo de negócio baseado na web com promessas de lucros fabulosos no futuro”. Decorrente deste movimento surgiu o conceito – “modelo de negócio” como uma síntese para caracterizar a forma de como as empresas “ponto com” atuavam nesse novo mercado. Da mesma forma em que a internet passou a ter um significativo papel para impulsionar outros tipos de negócios, a partir desse movimento, o conceito de modelo de negócio passou a abranger qualquer tipo de empresa (OROFINO, 2011, p. 1).

Todavia, como conceituar hoje o termo modelo de negócio? Trataremos

inicialmente de falar brevemente sobre o termo “plano de negócio”. Este não se

confunde com o primeiro, contudo é constantemente utilizado na linguagem

administrativa e pode trazer uma parcela de dúvidas àqueles que se propõem a

estudar o assunto.

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32

No site do Sebrae12 encontramos a frase “modelo de negócio antes,

plano de negócio depois”, na qual se adequa à reflexão proposta. Para o órgão,

planos de negócio são utilizados há tempos para detalhar de que maneira uma

empresa pretende atingir suas metas e criar valor. Eram também usados no

processo de obtenção de investimento. Dornelas (2013) aprofundou um pouco

mais a definição:

Para se concluir um plano de negócios, o empreendedor pode levar semanas ou até meses. Porém, quando concluído, o resultado nem sempre é considerado uma fotografia real do que é ou será o negócio. A ajuda principal do plano de negócios é proporcionar um norte ao empreendedor e com isso fazer com que a gestão de sua empresa tenha métricas para acompanhar adequadamente seu crescimento. O plano de negócios se justifica em casos onde o empreendedor tem um objetivo claro a atingir (DORNELAS, José. 2013).

Foi apenas no século XX, a partir do aumento das empresas de capital

aberto, conforme disponível no site do Sebrae, que a expressão “modelo de

negócio” começou a ser utilizada. A expressão era entendida pela forma que a

empresa convertia produto em valor, e assim era possível estudar como tornar

seu fluxo de capital mais eficiente.

Comparando plano de negócio e modelo de negócio, ainda na visão do

Sebrae, temos que

Para entender um plano de negócios, precisa-se de algumas horas lendo um documento de 20 a 40 páginas. Para entender um modelo de negócios, precisa-se de no máximo alguns minutos – e somente se ele for muito complexo (SEBRAE13, 2016).

Osterwalder e Pigneur (2010, p.14) dizem que um modelo de negócio é

usado para descrever “a lógica de criação, entrega e captura de valor por parte

de uma organização”. E segundo eles, pode ser melhor descrito pelos

seguintes componentes básicos, que mostram logicamente como uma

organização pretende gerar valor:

1. Segmentos de Clientes: Uma organização serve a um ou diversos segmentos de clientes;

12 Disponível em: < http://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/artigos/startup-entenda-o-que-e-modelo-de-negocios,5b3bb2a178c83410VgnVCM1000003b74010aRCRD>. Acesso em: 31 ago. 2016. 13 Disponível em: < http://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/artigos/startup-entenda-o-que-e-modelo-de-negocios,5b3bb2a178c83410VgnVCM1000003b74010aRCRD>. Acesso em: 31 ago. 2016.

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33

2. Proposta de Valor: Busca resolver os problemas do cliente e satisfazer suas necessidades, com propostas de valor;

3. Canais: As propostas de valor são levadas aos clientes por Canais de comunicação, distribuição e vendas.

4. Relacionamento com Clientes: O relacionamento com Clientes é estabelecido e mantido com cada Segmento de Clientes;

5. Fontes de Receita: As Fontes de Receita resultam de propostas de valor oferecidas com sucesso aos clientes;

6. Recursos Principais: Os Recursos Principais são os elementos ativos para oferecer e entregar os elementos previamente descritos (...);

7. Atividades-Chave: (...) ao executar uma série de Atividades-Chave;

8. Parcerias Principais: Algumas atividades são terceirizadas e alguns recursos são adquiridos fora da empresa;

9. Estrutura de Custo: Os elementos do Modelo de Negócios resultam na estrutura de custo

(OSTERWALDER; PIGNEUR, 2011, p.14).

Abaixo, segue um resumo com mais detalhes sobre os componentes

citados, na visão de Osterwalder e Pigneur (2010, p.20-41).

9.1. OS COMPONENTES BÁSICOS DE UM MODELO DE NEGÓCIO

O Modelo de Negócio pode definir um ou vários Segmentos de Clientes

e atender satisfatoriamente as necessidades de clientes específicos, de acordo

com as características de cada segmento. Por exemplo, clientes de

determinado segmento podem estar dispostos a pagar mais por aspectos

diferentes do que for oferecido ou são alcançados por canais de distribuição

diferentes.

A Proposta de Valor é a descrição de produtos e serviços adequados a

estes segmentos e o que faz com que clientes escolham uma empresa ou

outra. “A proposta de valor é uma agregação ou conjunto de benefícios que

uma empresa oferece aos clientes”.

Os canais de comunicação, distribuição e venda representam o ponto de

contato com o cliente, desempenhando um papel importante na experiência

como um todo. O componente Canais serve a diversas funções, como por

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34 exemplo, levar a proposta de valor aos clientes ou fornecer suporte após a

compra.

O Relacionamento com Clientes é um componente variável, com a

possibilidade de seguir uma linha pessoal ou mesmo automatizada, e pode ser

guiado pelas motivações de conquistar o cliente, reter o cliente ou ampliar as

vendas. Como reforçado pelos autores, “o relacionamento com clientes

utilizado pelo Modelo de Negócios de uma empresa influencia profundamente a

experiência geral de cada cliente”.

Fontes de Receita é o componente que representa o dinheiro gerado

pela empresa, de acordo com cada Segmento de Clientes. “Cada um pode ter

mecanismos de precificação diferentes, como uma lista fixa, promoções,

leilões, dependência de mercado, dependência de volume ou gerenciamento

de produção”. Os autores afirmam também que um Modelo de Negócio pode

englobar “transações de renda resultantes de pagamento único e renda

recorrente, resultante de pagamento constante, advindo da entrega de uma

Proposta de Valor aos clientes ou do suporte pós-compra”.

Os Recursos Principais é o componente que permite que uma

empresa “crie e ofereça sua Proposta de Valor, alcance mercados, mantenha

relacionamentos com os Segmentos dos clientes e obtenha receita”. Podem

ser físicos, financeiros, intelectuais e humanos, possuídos pela empresa ou

alugados. Dependendo do Modelo de Negócios de uma empresa diversos

Recursos Principais se fazem necessários. Como exemplo, “um fabricante de

microchip requer fábricas de capital intensivo, enquanto um projetista de

microchip se concentra mais nos recursos humanos”.

Para que todo Modelo de Negócio funcione e a empresa alcance o

desejado sucesso, é necessária a execução de várias ações importantes, isto

é, Atividades-Chave . “Elas também são necessárias para criar e oferecer a

Proposta de Valor, alcançar mercados, manter Relacionamentos com o Cliente

e gerar renda”. As Atividades-Chave também podem se diferenciar

dependendo do tipo de Modelo de Negócio.

Uma rede de fornecedores e parceiros compõem o Parcerias

Principais . “Empresas criam alianças para otimizar seus modelos, reduzir ou

adquirir recursos”. De acordo com os autores, as parcerias vêm se tornando

uma peça muito importante em muitos Modelos de Negócios.

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E finalmente o componente Estrutura de Custo descreve os custos

mais relevantes na operação de um Modelo de Negócios. “Tais custos podem

ser calculados com relativa facilidade depois de definidos os recursos

principais, atividades-chave e parcerias principais”. Contudo, há Modelos de

Negócio que seguem um direcionamento maior por custos que outros.

Osterwalder e Pigneur (2010, p.42) colocam que os nove componentes

de um Modelo de Negócios formam a base para a criação do Quadro de

Modelo de Negócios, que é uma ferramenta que facilita a elaboração de novos

Modelos de Negócio ou já existentes. Com esse quadro impresso em uma

grande superfície, várias pessoas podem usar de rascunho e discutir juntas

seus elementos, sendo uma ferramenta prática e útil.

Figura 4 - O quadro de Modelo de Negócios

Fonte: OSTERWALDER; PIGNEUR, 2011, p.44.

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Figura 5 - Modelo de Negócios da Apple para iPod e iTunes

Fonte: OSTERWALDER; PIGNEUR, 2011, p.46

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10. CROWDFUNDING E COLABORATIVISMO

A sobrevivência financeira do jornalismo no mundo digital tornou-se um

assunto em pauta após a inserção das TICs e o estudo de novas alternativas

tem sido um desafio para muitos profissionais. Nonato (2015, p. 46) afirma que

os jornalistas têm buscado no colaborativismo e no crowdfunding uma forma de

sobreviverem financeiramente, mas também buscam a prática de um

jornalismo autônomo e contra hegemônico, fora do controle das grandes

empresas de comunicação.

Em resumo, Nonato (2015, p. 44) caracteriza o colaborativismo como a

produção coletiva de reportagens e o crowdfunding, ou financiamento coletivo,

como uma maneira de arrecadar dinheiro pela internet. São, segundo ela,

formas de jornalismo baseadas no modelo sem fins lucrativos que buscam a

independência e o exercício da cidadania.

Diante dessas constatações, torna-se evidente a necessidade de uma maior pluralidade da mídia. A linha ideológica e editorial apresentada pela mídia hegemônica não representa a diversidade da população brasileira (NONATO, 2015, p. 13).

Esta busca por alternativas de sobrevivência do jornalismo, na visão de

Nonato (2015, p. 56) deu-se inicialmente pelos jornalistas blogueiros, que

foram os primeiros a se aventurar na rede, testando e modificando as próprias

estruturas e formas de escrever. Começaram com o jornalismo opinativo,

passando depois para o jornalismo investigativo, crítico, independente e contra

hegemônico. E foram os primeiros também a sofrer as dificuldades da censura

e represálias dos grandes grupos de comunicação e anunciantes.

Tentaremos facilitar o entendimento do leitor, fazendo uma análise dos

termos crowdfunding e colaborativismo separadamente.

10.1. CROWDFUNDING

Crowdfunding para Felinto (2012, p. 140) se refere ao processo de

arrecadação financeira vindo do próprio público interessado, destinado à

execução de determinado projeto. Por meio de portais como o Kickstarter14, o

14 Disponível em: https://www.kickstarter.com/. Acesso em: 09 set. 2016.

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38 Indie Go Go15 e o Catarse16 (mais conhecido no Brasil), por exemplo, os

produtores anunciam a deia do seu projeto, solicitando ajuda financeira dos

internautas para a produção de filmes, obras de arte, produtos de qualquer

espécie, etc.

Cada portal de crowdfunding adota a sua política de funcionamento em

relação à arrecadação e ao uso do dinheiro arrecadado, variando-se

amplamente no funcionamento do serviço prestado. Enquanto existem alguns

que exigem que o empreendedor devolva todo o dinheiro arrecadado caso não

atinja o valor máximo previamente proposto em determinado período de tempo,

existem outros nos quais permitem que o empreendedor fique com o dinheiro,

independentemente da quantia arrecadada. Quase todos os portais incentivam

o empreendedor a disponibilizar brindes variados aos doadores, que se

diferenciam dependendo do valor doado, dentro da estratégia de arrecadação.

Divulgação do nome do doador ou mesmo brindes em produtos diversos, por

exemplo.

Para os criadores, o crowdfunding abre todo um leque de novas possibilidades de financiamento de suas ideias. Para o público, oferece um sentido de participação antes impensável. O fã sente-se como um criador, autêntico colaborador do processo produtivo, capaz mesmo de ajudar a determinar os destinos das obras/produtos que admira (FELINTO, 2012, p. 141)

O site Crowdfunding no Brasil17, vinculado ao Kickante18, disponibilizou

uma lista dos principais prestadores de serviço nesse segmento, com o resumo

das diferenças entre eles, sem deixar de mencionar e enaltecer seu próprio

serviço. A figura a seguir mostra um pedaço da página inicial do portal

Crowdfuding no Brasil e segue como sugestão para o leitor que queria utilizar o

serviço de financiamento coletivo.

15 Disponível em: https://www.indiegogo.com/. Acesso em: 09 set. 2016. 16 Disponível em: https://www.catarse.me/. Acesso em: 09 set. 2016. 17 Disponível em: http://crowdfundingnobrasil.com.br/. Acesso em: 09 set. 2016. 18 Disponível em: http://www.kickante.com.br/. Acesso em: 09 set. 2016

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Figura 6 - Print do Site Crowdfunding no Brasil

Fonte: <http://crowdfundingnobrasil.com.br/>. Acesso em: 09 set. 2016.

10.2. COLABORATIVISMO

Esses novos arranjos econômicos, que colaboram para a existência de

outros modelos de jornalismo, como apontado por Nonato (2015), não são

novos e surgiram inspirados pela ideia de cooperativismo e no jornalismo

alternativo. Eles representam a busca por alternativas de sobrevivência do

jornalismo nos tempos de crise na profissão.

Blatt (2011) discorre que o modelo empresarial colaborativista vem do

trabalho em equipe, organizado na inteligência, onde os componentes do grupo

doam-se individualmente, mas buscam o resultado do todo, sem que esperem

por recompensas imediatas.

Na era digital, a sobrevivência das empresas jornalísticas, de maneira geral passou a depender de uma crescente simbiose, em proporções variáveis, entre publicações impressas e virtuais e a web. O público consumidor deu lugar às comunidades de leitores, cuja informação já não depende mais exclusivamente dos jornais impressos (CASTILHO; FIALHO, 2009, p. 119).

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A colaboração é uma prática antiga na mídia, na visão de Zanotti (2011),

pois informações sempre chegavam por meio de cartas, visitas pessoais às

redações, telefonemas, etc. Eram denúncias, reclamações e sugestões de

reportagens direcionadas aos jornalistas, que as reuniam e avaliavam se

seriam transformadas em textos noticiosos.

Castilho e Fialho (2009, p.138) complementam que “produção

colaborativa de notícias” passou a fazer parte da linguagem da comunicação

no ano de 1999 quando uma revista da época, chamada Jane’s, resolveu

suspender a publicação de um artigo sobre ciberterrorismo que havia sido

submetido aos leitores da revista online Slashdot e recebeu inúmeras críticas e

sugestões. Foi admitido que a soma dos conhecimentos dos leitores era maior

do que a dos especialistas de renome mundial da Jane’s, que sempre fora

considerada referência em armamentos bélicos por militares do mundo todo. O

artigo acabou sendo reescrito utilizando as observações feitas por 250

voluntários e de 35 cartas de outros especialistas.

Para Primo e Träsel (2006: 9), jornalismo participativo/colaborativo define-se por “práticas desenvolvidas em seções ou na totalidade de um periódico noticioso na web, onde a fronteira entre produção e leitura não pode ser claramente demarcada ou não existe”. Já para Holanda, Quadros, Palácios e Silva (2008), não haveria necessidade de um suporte específico (a rede de computadores) para existir participação no jornalismo, que pode ser caracterizada apenas pela criação e implementação de mecanismos que possibilitem envolver o público em diferentes etapas dos processos de coleta, criação, análise e distribuição de notícias (ZANOTTI, 2011, p. 31).

Com o jornalismo colaborativo, o público que antes era apenas fonte

passou a ser repórter, sem que o jornalista perdesse o seu papel de mediador

e editor do conteúdo compartilhado.

A troca de informação, dentro desse processo colaborativo gera

agregação de valor, enquanto as partes envolvidas além de reter o que já

tinham, acrescentavam o que lhes era disponibilizado por outros parceiros,

conforme apontado por Castilho e Fialho (2009, p. 138). Eles afirmam que o

ganho de tal ação é exponencial e infinito, sendo algo inédito na história das

relações humanas.

Portanto, a colaboração entre profissionais do jornalismo e membros da comunidade é inevitável e mutuamente interessante. Em vez de ficar discutindo quem pode ou não

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41

pode ser jornalista, deveríamos estar preocupados em como capturar a incalculável massa de conhecimento tácito, mais popularmente conhecido como sabedoria popular, existente em nossas comunidades urbanas e rurais. (...) Os equipamentos digitais e a internet colocaram nas mãos das pessoas sem formação acadêmica as ferramentas necessárias para também executar essa função (dos especialistas, entre eles os jornalistas), criando simultaneamente a necessidade da colaboração, quase uma alquimia, entre as multidões que conhecem pouco e os poucos que conhecem muito (CASTILHO; FIALHO, 2009, p. 142-143).

A Mídia Ninja e os Jornalistas Livres têm o colaborativismo como parte

de sua produção do conteúdo e são bons exemplos empíricos que podem

ajudar o leitor a compreender o termo e as atividades realizadas no processo

colaborativo.

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42 11. ANÁLISE DOS DADOS

As informações apresentadas a seguir se referem ao conteúdo

encontrado nos portais escolhidos para o estudo de caso, no qual o foco do

estudo se manteve acerca do surgimento de cada portal e suas formas de

financiamento. Após isso, é feita uma breve apresentação dos perfis dos

entrevistados, baseado no que eles mesmos falaram de suas experiências. E

finalmente, os dados obtidos em cada entrevista são comparados e discutidos.

11.1. PORTAL JORNALISTAS LIVRES

Disponibilizado no “Como Surgiu”19 do portal, os Jornalistas Livres se

intitulam como um “Jornalismo democrático, plural, em rede, pela diversidade e

em defesa implacável dos direitos humanos”.

No vídeo disponibilizado logo após esta pequena descrição, um grupo

de jornalistas inicia dizendo que o portal surgiu da iniciativa de fazer uma

cobertura das manifestações ocorridas nos dias 13 e 15 de março de 2015 que

fosse diferente da televisão, mostrando o que estava acontecendo através das

pessoas presentes no local. Os integrantes vão completando com mais

detalhes e dando a visão do todo. Em suma, entendemos que o nome

Jornalistas Livres surgiu durante as manifestações e que o coletivo é composto

por vários comunicadores, fotógrafos, jornalistas, video makers, ativistas,

pessoas de movimentos sociais diversos e que, no geral, estão todos distantes

da mídia tradicional. Segundo eles, “o objetivo principal do coletivo é restaurar

a confiança no jornalismo e na produção jornalística, com o compromisso ético

e profissional com a qualidade da informação”. O discurso de grande parte dos

integrantes no vídeo é o de informar sem as restrições impostas pelo

monopólio da comunicação brasileira, que informa, segundo eles, muitas vezes

com uma narrativa de ódio, antidemocrática e de permanente desrespeito aos

direitos humanos e sociais.

Em julho de 2015 foi realizada uma campanha de crowdfunding no site

Catarse20, para arrecadação de recursos para custear uma sede, um site,

19 Disponível em: <https://jornalistaslivres.org/como-surgiu/>. Acesso em: 25 set. 2009. 20 Disponível em: <https://www.catarse.me/jornalistaslivres>. Acesso em: 25 set. 2016.

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43 equipamentos básicos e expansão da rede por todo o Brasil. Como parte da

campanha, recompensas eram oferecidas aos doadores, diferenciadas pelo

valor que fosse doado. Como abordado no referencial teórico sobre o

crowdfunding, cada portal do serviço adota sua política de arrecadação e, no

caso dos Jornalistas Livres, a campanha seguia o modelo “tudo ou nada” do

site, ou seja, foi estipulada uma meta de arrecadação no valor de R$

100.000,00 (cem mil reais), por um determinado intervalo de tempo e o projeto

só receberia o valor se alcançasse a meta. A arrecadação superou as

expectativas e arrecadou 32% a mais, totalizando R$ 132.730,00 (cento e trinta

e dois, setecentos e trinta mil reais). Foi um sucesso.

Figura 7 - Campanha de crowdfunding do Jornalistas Livres

Disponível em: <https://www.catarse.me/jornalistaslivres>. Acesso em: 25 set. 2016.

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44

Figura 8 - Portal Jornalistas Livres

Disponível em: <https://jornalistaslivres.org/>. Acesso em: 25 set. 2016.

11.2. PORTAL MÍDIA NINJA

Surgiram em março de 2013, como um braço da rede Fora do Eixo21 que

é, como apresentado no Frequently Asked Questions – FAQ22 do site, uma

rede que desenvolve uma série de articulações e produções no campo da

cultura e da mídia livre há 10 anos. De acordo com o que foi encontrado,

entendeu-se que o embrião NINJA tornou-se possível por força do Fora do

Eixo, que foi determinante e fundamental para o desenvolvimento da rede,

servindo como incubador do seu processo, além de continuar sendo a principal

responsável por oferecer a estrutura e a condição de trabalho para parte dos

midiativistas e jornalistas Ninjas espalhados por todo Brasil.

“A partir de junho de 2013, vieram os protestos e a Mídia Ninja se

concentrou na cobertura e transmissão ao vivo desses protestos,

manifestações e ações dos movimentos sociais e culturais brasileiros. Ao fazer

isso, destacou-se como um olhar exclusivo desses acontecimentos que têm

21 Disponível em: <http://foradoeixo.org.br/>. Acesso em: 25 set. 2016. 22 Disponível em: <https://ninja.oximity.com/partner/ninja/faq>. Acesso em: 25 set. 2016.

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45 mudado a estrutura política e cultural do país, em conexão com experiências

semelhantes que ocorrem no restante do mundo.”

No “Quem somos23” do portal, a Mídia Ninja define-se como uma rede de

comunicadores que produzem e distribuem informação em movimento, agindo

e comunicando. Seu conteúdo segue a lógica colaborativa de criação e

compartilhamento de conteúdos, característica da sociedade em rede, para

realizar reportagens, documentários e investigações no Brasil e no mundo. E

eles afirmam também que sua pauta é baseada na luta social e na articulação

das transformações culturais, políticas, econômicas e ambientais.

Como se pode ver na figura abaixo, o portal tem um botão de

financiamento na barra superior. Ao clicarmos, abre a página da figura 2 que,

como observado, é um local onde é possível realizar doações em dinheiro. Na

mesma figura está a explicação do coletivo do por que colaborar.

Figura 9 - Portal Mídia Ninja

23 Disponível em: <https://ninja.oximity.com/partner/ninja/about>. Acesso em: 25 set. 2016.

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46

Figura 10 - Financie o NINJA

Disponível em: <https://ninja.oximity.com/partner/ninja/donate>. Acesso em: 25 set. 2016.

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47

11.3. PORTAL JOTA

Figura 11 - Portal Jota

Disponível em: <http://Jota.uol.com.br/>. Acesso em: 25 set. 2016.

O Jota é formado por uma equipe de jornalistas que cobriu o mundo

jurídico e o mercado do Direito por vários anos, trabalhando em veículos como

a Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo e a Veja.

No “Quem somos”24, é enfatizado o seu nicho de comunicação, que é a

informação jurídica, na qual, como afirmado por eles, não é encontrada em

outro lugar. A descrição principal disponível no local diz:

“Acreditamos no poder da informação e na informação sobre o poder. E

sabemos que a Justiça se faz com profissionais bem informados. Por isso

criamos o Jota, um serviço de informação indispensável. Das grandes decisões

às letras pequenas, do plenário aos bastidores, das vitórias nos tribunais à

concorrência entre escritórios. Com exclusividade e isenção. Porque Justiça se

escreve com Jota”.

24 Disponível em: <http://Jota.uol.com.br/conheca-o-Jota/quem-somos>. Acesso em: 25 set. 2016.

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Imediatamente ao acessar o site, aparece o link “Assine”, visível no

canto superior esquerdo da figura 11. Ao clicá-lo, são indicados planos de

assinatura para pessoas físicas ou jurídicas, como mostrado na figura seguinte.

Contudo, além do conteúdo pago ilimitado, existe o acesso gratuito a cinco

notícias ou artigos, que é liberado por usuário a cada mês.

Figura 12 - Planos de assinatura do portal Jota

Disponível em: <http://Jota.uol.com.br/assinatura>. Acesso em: 25 set. 2016

No primeiro acesso realizado para a coleta dos dados, em setembro de

2016, havia uma barra do UOL, como é visível na Figura 12. Contudo, em novo

acesso em 1 de novembro de 2016, a barra não estava mais disponível. Infere-

se com isso que a parceria com o site do UOL foi desfeita. Essa parceria foi

questionada na entrevista com o jornalista Felipe Seligman e as informações

fornecidas seguem nas próximas páginas.

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49

11.4. PERFIL DOS ENTREVISTADOS

a) Flávia Martinelli: Jornalista há 21 anos, mora em São Paulo, começou

sua vida profissional na Editora Abril, trabalhando na revista Trip e na

Editora Globo. Foi redatora-chefe da revista feminina Sou Mais Eu e da

Viva Mais, todas da Abril. Segundo ela, estava na estrada do jornalismo

tradicional até que se tornou integrante dos Jornalistas Livres.

b) Clayton Nobre: Manauara, graduado em Jornalismo pela Universidade

Federal do Amazonas e mestre em Comunicação e Sociabilidade

Contemporânea pela Universidade Federal de Minas Gerais. Fazia parte

do movimento chamado Coletivo de Fusão, fundado em Manaus e

vinculado à rede Fora do Eixo. E foi pela rede Fora do Eixo, que passou

a fazer parte da Mídia Ninja desde o início, em 2013. Hoje mora em

Brasília em casa compartilhada do coletivo.

c) Felipe Seligman: Formado em Jornalismo pelo IESB, em 2005. Estudou

filosofia na Universidade de Brasília por quatro anos, enquanto

trabalhava e estudava jornalismo, porém não concluiu o curso. Enquanto

estudante, trabalhou na agência de notícias internacionais chamada IPS

– Inter Press Service News Agency. A agência cobria notícias do antigo

terceiro mundo e desenvolvimento. Após formar-se, cobriu a

Organização das Nações Unidas em Nova Iorque, pela mesma agência.

Trabalhou na Folha de São Paulo por alguns anos, após retornar ao

Brasil. Participou da fundação do Jota e do Brio e hoje se dedica

integralmente ao Jota. Mora atualmente e em Boston, onde está

fazendo MBA na faculdade de Business do MIT - Massachusetts

Institute of Technology, com previsão de término para 2018.

No decorrer das próximas páginas, para facilitar o desenvolver das

ideias, os entrevistados serão tratados por seus respectivos sobrenomes:

Martinelli, Nobre e Seligman.

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11.5. INFORMAÇÕES DAS ENTREVISTAS PERTINENTES AOS

PORTAIS

A partir do agrupamento das informações fornecidas pelos entrevistados,

foi possível compreender como cada portal tem sobrevivido, ainda que não seja

em um modelo de negócio claro.

Os Jornalistas Livres e a Mídia Ninja correspondem a um jornalismo com

cunho social e ativista e surgiram e se estabeleceram durante manifestações

sociais ocorridas no Brasil. Essa informação foi mencionada tanto por Martinelli

quanto por Nobre, durante as entrevistas. Ambos os portais se encaixam ao

que foi conceituado por Peruzzo (2009) sobre a mídia alternativa, abordado

anteriormente no referencial teórico. Tais conceitos dizem que a comunicação

alternativa simboliza outra comunicação ou contracomunicação que segue os

movimentos populares, com a liberdade de expressão sendo praticada,

democratizando a informação e contribuindo para a transformação social,

chocando-se de certa forma com os blocos comunicacionais da mídia

tradicional e do governo. A Mídia Ninja, inclusive, usa o termo “midiativismo”,

que entendemos como o uso da mídia para sustentar as causas e interesses

das comunidades e que as suas histórias possam ser contadas de diferentes

maneiras.

O Jota, nas palavras de Seligman, nasceu do interesse e da

necessidade de informação da área jurídica, que era mal coberta e mal

explorada pelos serviços de informação no geral. Diferentemente dos outros

dois objetos de estudo, o Jota não se coloca como uma alternativa às grandes

mídias. Seu discurso e produção de conteúdo são direcionados a uma parcela

bem específica da população, o que torna o portal pioneiro no seu segmento de

atuação.

Os entrevistados foram questionados se os integrantes dos respectivos

portais seguiam com outros trabalhos e nas respostas os três tiveram suas

particularidades. Todavia, mais uma vez, houve proximidade entre os Livres e o

Ninja.

Martinelli respondeu que os Jornalistas Livres trabalham com

voluntariado e, sendo assim, boa parte dos integrantes seguem sim com outros

trabalhos. “Tem de tudo e o importante é a causa! As pessoas se dedicam o

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51 tempo que elas podem, do jeito que se voluntariam.” Contudo, muitos deles

estão desempregados, o que faz com se dediquem totalmente ao coletivo.

“Nós acreditamos que qualquer pessoa é jornalista, desde que se

disponha a ser e a relatar os fatos com as técnicas do jornalismo”. Ao afirmar

isso, Martinelli corrobora que foi estudado por Xavier (2015) a respeito da

participação do leitor na produção de notícias, tornando-se editor, ou coautor,

crítico da informação.

No caso da Mídia Ninja, Nobre citou o núcleo durável, de pessoas

chamadas “orgânicas”, classificação na qual ele faz parte, mas também a

existência de um corpo extenso de colaboradores de todos os tipos. Aqueles

que fazem parte do núcleo durável dedicam-se integralmente à rede Fora do

Eixo e, consequentemente, ao Ninja, e vivem em casas coletivas, em um

modelo colaborativo. Em suas palavras: “É onde nós moramos, trabalhamos e

onde nos formamos, porque é uma residência cultural que se movimento por

meio de suas vivências”. Mas existem, por exemplo, os colaborares que são os

correspondentes da rede, espalhados pelas cidades do Brasil e que enviam

informações sobre manifestações em tempo real, existem também os

jornalistas de renome que participam das reuniões de editoria e colaboram com

a rede, ainda que não sejam parte dela.

O Jota é o único que permite pagamentos aos integrantes por seus

serviços e, como informado por Seligman, “todos trabalhamos integralmente e

já conseguimos nos pagar”.

Martinelli diz que os Jornalistas Livres têm uma sede simples, alugada

com o dinheiro arrecadado com a campanha de crowdfuding, mas que todos do

coletivo, espalhados pelo Brasil, trabalham utilizando o aplicativo de

mensagens Telegram e cada um utiliza seus próprios equipamentos.

O dia-a-dia dos “Ninjas”, pelo o que foi exposto por Nobre, está

basicamente em seguir uma agenda de coberturas pelas cidades e das

manifestações ocorridas, no contexto territorial de cada casa coletiva,

participação de reuniões, busca por financiamentos, além da comunicação

virtual que é mantida com outros coletivos de outras cidades. Muitas pessoas

se integram à rede com seus próprios equipamentos, como foi citado, e eles

também utilizam o Telegram como ferramenta de trabalho e, por meio de chats

segmentados, alinham assuntos de editoria, design, redação, debatem o que

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52 entra e sai, etc. “Tem um chat só de design, tem um chat só de texto e

redação, tem os chats regionais e assim por diante. Então, a nossa redação se

movimenta pela comunicação pelos chats.” Tudo isso, aliado ao cronograma de

cuidados das residências.

O Jota pretende ter uma redação, como afirmado por Seligman, porém

até o momento ainda não sentiram tal necessidade. Eles já possuem alguns

escritórios trabalhando em co-working, em São Paulo e Brasília, e freelancers

espalhados por todo país. Contudo, como foi enfatizado, “nós temos com o

Jota uma atuação muito digital, ou seja, os profissionais vão muito para os

tribunais e para os lugares onde eles estão fazendo as pautas e de lá mesmo

escrevem”. Ele citou que usam a ferramenta de redação virtual chamada Slack,

que é uma plataforma de comunicação virtual, onde é possível criar times ou

conversas individuais, centralizando toda a troca de informação necessária em

um único lugar.

Com o apoio do que foi respondido pelos entrevistados, inferimos que o

modelo de redação dos três objetos está totalmente inserido na realidade do

jornalismo pós TICs, no contexto futurístico do ambiente de trabalho

vislumbrado por Dizard Jr. (2000) e com o exercício de novas competências no

cotidiano laboral, como estudado por Maranhão (2014). Além disso, não sofrem

influências ou represálias da mídia tradicional, podendo apresentar em seu

conteúdo outra visão do que é discutido ou omitido pelos veículos tradicionais.

11.6. INFORMAÇÕES DAS ENTREVISTAS PERTINENTES A

MODELOS DE NEGÓCIOS

Segundo Martinelli, os Jornalistas Livres ainda não possuem um modelo

de negócios definido. Desde 2015 eles vêm utilizando o dinheiro arrecadado

com a campanha de crowdfunding e que sempre é utilizado com extrema

cautela. “Eu, por exemplo, faço todo meu trabalho com grana do meu bolso,

inclusive viagens. Não tem publicidade, não tem patrocínio, não tem nem um

canal para receber doação nesse momento”. Ela reafirma o voluntarismo dos

colaboradores, a causa social do coletivo e exemplifica que, muitas vezes, eles

pegam carona nos ônibus dos movimentos sociais para que possam viajar e

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53 cobrir acontecimentos em outras cidades. “Se os Jornalistas Livres sobrevivem

sem nada? Sobrevivem. Sobreviveram até agora. O que pode acontecer é uma

constante renovação de quadros e a fomentação de novos núcleos, que é o

que sempre tentamos fazer”. Foram citados os núcleos locais, pelo Brasil, que

possuem gestão localizada e giram sozinhos, mas que estão conectados a

gestão geral.

Os recursos da Mídia Ninja são provenientes de diversas fontes, como

afirmado por Nobre. Questionado pelo botão de doação disponível no site do

coletivo, ele respondeu que há muitas pessoas que se dedicam a doar

mensalmente e grande parte dos seus recursos vem dessas doações. Mas

existem outras fontes, como ele exemplificou: “Aqui em Brasília, fazemos

muitos trabalhos de freelance; uma transmissão ao vivo de dois mil reais, uma

cobertura colaborativa de dez mil reais, um álbum fotográfico para um sindicato

por cinco mil reais.”. Ele citou também o patrocínio recebido de instituições

internacionais, e completou dizendo que o restante dos recursos depende da

criatividade de cada casa coletiva. A casa do Rio de Janeiro, por exemplo,

realiza festas para arrecadar dinheiro. Contudo, o mais importante de tudo, de

acordo com suas palavras, é que a lógica colaborativa de funcionamento

permite a sobrevivência da rede. “Todas as casas Fora do Eixo trabalham com

um caixa coletivo e, assim, todo recurso que entra vai para ele e todas as

despesas do mês são pagas a partir do que está ali”. Como eles não trabalham

com um modelo de pagamento de salário, suas horas de trabalho são

investimentos na empresa, como foi dito.

O modelo de assinaturas adotado pelo Jota permite que os integrantes

trabalhem de forma assalariada. Seligman explica: “O modelo que temos no

Jota hoje é o de assinaturas e não o de publicidade. Ganhamos dinheiro com

assinantes individuais e assinantes corporativos, que recebem as informações

tanto pelo site, quando por newsletters e até por WhatsApp”. Ele coloca que,

com o que entra em caixa, eles conseguem manter a estrutura que têm, porém

ainda não estão satisfeitos, pois visam o próprio crescimento. O objetivo deles

é construir uma empresa grande, que consiga empregar mais gente e consiga

ser mais relevante, então todo dinheiro acaba sendo reinvestido. Outras formas

citadas de arrecadação foram eventos que podem fazer a contratação de sua

participação em debates sobre o conteúdo do site. Ele foi questionado sobre a

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54 existência de uma parceria com o site do UOL e foi dito que ela serve para que

o seu conteúdo tente atingir o maior número de pessoas e fazer com que o

portal se torne mais conhecido, porém era algo que ainda estava sendo

analisado, em fase de teste.

As três empresas estão dentro do modelo de jornalismo independente

classificado por Xavier (2015), já que são financeiramente autossuficientes, não

possuem fins lucrativos e não estão ligadas à mídia tradicional.

11.7. INFORMAÇÕES DAS ENTREVISTAS PERTINENTES À

POSSÍVEL CONCORRÊNCIA

Questionados se existe concorrência no jornalismo digital independente,

Martinelli e Nobre responderam que não. Ambos disseram que existe

colaborativismo entre diversos coletivos independentes e que isso acontece

inclusive na cobertura das pautas. Nobre disse: “Nós temos essa necessidade

de estarmos todos juntos, porque todas essas mídias defendem a pauta da

democratização da comunicação.”. Martinelli completa: “Em vários momentos,

nós reunimos várias pessoas de diferentes coletivos, abrimos um chat para

troca de informações, às vezes em tempo real, e cada um pode dar a notícia à

sua maneira. Nós nos compartilhamos.”. Ela ainda afirma que a narrativa da

Mídia Ninja é bem diferente do seu coletivo e que isso vale também para outros

portais e mídias independentes.

Sobre a possível concorrência do Jota, Seligman aponta que há

“concorrentes entre os veículos tradicionais, sob certo aspecto, veículos

focados na área jurídica, como por exemplo, consultores jurídicos.” Todavia,

em termos de modelo de negócio, ele não vê concorrência, pois o serviço

prestado por eles tem o diferencial de ser muito mais aprofundado e com mais

qualidade do que o que é apresentado por outros veículos.

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55 12. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Baseado no que foi estudado neste trabalho, dizemos que a história do

jornalismo é marcada por adaptações e inovações e tais mudanças vêm

acontecendo há tempos. O jornalismo fez diversas apropriações desde o

surgimento da internet e o cenário atual de atuação profissional exige que o

jornalista esteja sempre online, acompanhando as atualizações a cada minuto.

As possibilidades técnicas são enormes e tornou-se essencial compreendê-las.

Na quinta edição do Censo Digital25 realizado pela Associação Brasileira

dos Agentes Digitais – ABRADi, realizada no ano de 2014, registrou-se

expansão dos negócios do segmento, mostrando a força desse mercado ainda

que a economia brasileira esteja em crise. A pesquisa mostra que o número de

agências digitais no Brasil subiu de 3.094, em 2012, para 3.388, em 2013.

Ainda que não seja especificamente dados ligados ao jornalismo digital, dá

para se ter uma noção de que o setor digital permanece próspero.

A produção deste estudo possibilitou duas visões distintas de atuação do

jornalismo digital: a do portal Jota, com sua produção de conteúdo ligada a um

nicho específico de interesse e a dos Jornalistas Livres e Mídia Ninja, com sua

pauta alternativa ligada ao ativismo de mídia e da democratização da

comunicação. Porém, todos atuando de forma independente no mundo digital.

O Jota, apesar de ser independente e empreendedor, possui metas

empresariais a serem cumpridas e visam obter lucro. Inferimos que, por ter um

conteúdo mais segmentado e exclusivo, consegue alcançar uma fidelização de

leitores com mais facilidade e que dessa fidelização surge a possibilidade de

monetização da prestação do seu serviço. Lima (2015, p. 16) afirmou que uma

das dificuldades de ser um jornalista independente é falta de possibilidades de

autofinanciamento. Já sabemos que ser empreendedor exige grande esforço e

estudo dos interessados, mas pudemos confirmar que ser empreendedor no

jornalismo é possível e que o Jota é um exemplo de empreendimento que está

funcionando.

O modelo dos Jornalistas Livres e da Mídia Ninja é sustentável e

colaborativo e isso impede que se fale primeiramente em lucro. Martinelli,

25 Disponível em: <http://www.abradi.com.br/projetos/censo-digital/>. Acesso em: 5 nov. 2016.

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56 durante a entrevista, pediu inclusive que a reflexão não fosse feita sobre um

modelo de negócio, mas sobre um modelo de sustentabilidade do voluntarismo.

Os profissionais têm grande possibilidade de exercer livremente o jornalismo

em sua essência trabalhando dentro dessa lógica de funcionamento

sustentável, sendo mediadores sociais e democratizando cada vez mais o

acesso à informação.

Diante de tudo o que foi exposto, arriscamos dizer que ter uma postura

empreendedora pode contribuir com a garantia da empregabilidade do

jornalista e que o crowdfunding é uma possibilidade bastante viável para se

começar um projeto de jornalismo independente. Como mencionado

anteriormente na visão de Felinto (2012, p.141), o serviço permite não somente

o financiamento da ideia, mas também o da participação e colaboração dos

interessados no conteúdo; no caso do jornalismo, os leitores. Mas há o desafio

de dar continuidade e manter financeiramente o negócio, após a sua

implementação.

Acreditamos que com a observação dos modelos apresentados e do

referencial teórico disponibilizado os leitores poderão refletir sobre qual

caminho seguir, seja o do jornalismo empreendedor direcionado a um nicho de

interesse ou o do jornalismo ativista sustentável. Ou ainda, ousamos afirmar

que o leitor poderá se basear nas características dos modelos existentes para

criar um modelo que atenda mais especificamente às suas expectativas.

Por conseguinte, ainda resta o questionamento: Seria de fato a falta de

modelos de negócio no mundo digital uma ameaça ao jornalista ou a

possibilidade clara de reinvenção?

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REFERÊNCIAS

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61

APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTA

Perfil do entrevistado

Fale um pouco de você, da sua formação e experiência profissional.

Sobre o portal

Como se deu o início do portal? (Perguntar no caso do Jota e Mídia Ninja)

Como funciona o modelo de redação de vocês? Existe um?

Vocês integrantes seguem com outros trabalhos?

Como o portal ___ tem conseguido se manter?

Existe alguma arrecadação com publicidade, ou alguma parceria?

Possível concorrência

Vocês consideram os outros portais independentes no jornalismo digital como

concorrentes? Existe concorrência com vocês?

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62 APÊNDICE B – ENTREVISTA COM A JORNALISTA FLÁVIA MARTINELLI

DOS JORNALISTAS LIVRES

Perfil Profissional

Fale um pouco de você, da sua formação e experiênci a profissional.

Meu nome é Flávia Martinelli, sou jornalista há 21 anos. Basicamente,

comecei na Editora Abril. Trabalhei na revista Trip, na Globo, fui redatora-chefe

da revista feminina Sou Mais Eu, da Viva Mais também, todas da Abril. Estou

na estrada do jornalismo tradicional até entrar para o Jornalistas Livres há sete

meses. Nós acreditamos que qualquer pessoa é jornalista, desde que se

disponha a ser e a relatar os fatos com as técnicas do jornalismo.

Sobre o portal

Como funciona o modelo de redação de vocês? Existe um?

Não sei o que você chama de “modelo de redação”, mas nós temos uma

sede simples, que é uma sala alugada. Nós trabalhamos por Telegram e temos

jornalistas espalhados por todo Brasil. Não tem computador e cada profissional

tem o seu próprio equipamento.

Vocês integrantes seguem com outros trabalhos?

Os Jornalistas Livres trabalha com voluntariado. Então os integrantes

têm outros empregos, outras atividades, porém, muita gente – e esse é o meu

caso – está desempregada e aí aproveita para se dedicar ao Jornalistas Livres.

Ou são jovens que estão em momentos de desemprego, ou gente mais velha

que é freelancer, que entre uma coisa e outra consegue pegar trabalhos. Tem

de tudo e o importante é causa! As pessoas se dedicam o tempo que elas

podem, do jeito que se voluntariam.

Como o Jornalistas Livres tem conseguido se manter?

Sobre modelo de negócios, não temos nenhum. (Risos) Ao menos por

enquanto. Todo o trabalho é voluntário, fizemos um crouwdfounding em

outubro de 2015 e usamos a verba para financiar o aluguel de nossa sede,

custos com algumas matérias e os outros detalhes citados no crowdfunding

que eu não me lembro, mas que são, mensalmente, apresentados em reuniões

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63 abertas no Jornalistas Livres. Ainda há dinheiro em caixa, que é sempre usado

com extrema cautela. Eu, por exemplo, faço todo meu trabalho com grana do

meu bolso, inclusive viagens. Não tem publicidade, não tem patrocínio, não tem

nem um canal para receber doação nesse momento. É trabalho voluntário

apenas. O máximo que fazemos, quando tem que viajar, é pegar carona nos

ônibus dos movimentos sociais e olhe lá.

Ainda não encontramos nenhum modelo de negócio possível. A

discussão ainda está bem recente. Nós sempre pensamos nessa contra partida

social, de oferecer algo em troca além da mera doação. Se os Jornalistas

Livres sobrevivem sem nada? Sobrevivem. Sobreviveram até agora. O que

pode acontecer é uma constante renovação de quadros e a fomentação de

novos núcleos, que é o que sempre tentamos fazer. Organizar núcleos locais

pelo Brasil afora, mas tenham a sua gestão localizada e girem sozinhos, mas

que participam de uma gestão maior.

Vocês sofrem alguma influência ou restrição imposta pela mídia

tradicional?

O conteúdo é livre, desde que as pessoas citem a fonte. Quanto a

represálias, não são bem claras. Nós fazemos a contra narrativa e

manifestamos a narrativa dos movimentos sociais. No “Quem somos” do nosso

site, está bem claro o que somos.

Possível concorrência

Vocês consideram os outros portais independentes no jornalismo digital

como concorrentes? Existe concorrência com vocês? P or exemplo, já vi

várias vezes o Jornalistas Livres compartilhando conteúdo da Mídia Ninja

e vice-versa.

Não nos vemos como concorrentes. Nós trabalhamos em um esquema

de colaborativismo e isso acontece inclusive na cobertura das pautas. Em

vários momentos, nós reunimos várias pessoas de diferentes coletivos,

abrimos um chat para troca de informações, às vezes em tempo real, e cada

um pode dar a notícia à sua maneira. Nós nos compartilhamos. Eu

particularmente não encaro como concorrente e até acho que a narrativa do

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64 Ninja é bem diferente da nossa e isso vale para os outros portais e as outras

mídias independentes.

Queria te sugerir pensar não em modelo de negócio, mas em modelo de

sustentabilidade do voluntarismo.

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65 APÊNDICE C - ENTREVISTA COM O JORNALISTA CLAYTON NOBRE DA

MÍDIA NINJA

Perfil do entrevistado

Fale um pouco de você, da sua formação e experiênci a profissional.

Meu nome é Clayton Nobre, estou na Mídia Ninja desde 2010. Sou de

Manaus, fiz a graduação em Jornalismo pela Federal do Amazonas e fiz

mestrado em Belo Horizonte, na UFMG. Apesar da rede não ter esse foco

acadêmico muito forte, eu fui uma das pessoas que tive essa experiência. A

Mídia Ninja é um dos braços de comunicação da rede Fora do Eixo. Ela é o

nosso núcleo de comunicação, na verdade. Como a maioria das pessoas que

fazem parte da rede Mídia Ninja desde o início, eu entrei pela rede Fora do

Eixo. Nós fundamos um coletivo em Manaus, chamado Coletivo de Fusão, que

já tem 10 anos, e desde 2009, mais ou menos, nos aliamos à rede Fora do

Eixo e nos tornamos um ponto de articulação no Amazonas. A Mídia Ninja

mesmo nasceu em 2013 e eu estou desde o começo, quando começamos a

pensar o que seria.

Sobre o portal

Como se deu o início do portal? O que é exatamente essa relação da

Mídia Ninja com o Fora do Eixo ?

O Fora do Eixo é uma rede de cultura e comunicação que conecta

coletivos em todo Brasil e começou especialmente com aqueles que tinham

movimento dentro do seu território. Era basicamente uma formação de

coletivos do interior e de algumas capitais do Brasil. Por isso o nome é Fora do

Eixo, porque eram coletivos que estavam querendo fazer suas atividades

dentro do seu território e não estavam dentro do eixo Rio, São Paulo, onde

estavam as grandes estruturas para a difusão da cultura. Eram formados por

universitários ou por amigos e que faziam festivais independentes, que moviam

certa cadeia produtiva dentro de seu município. O Fora do Eixo foi uma

oportunidade para que eles pudessem se conectar em rede. Na nossa última

contagem, vimos que temos quase trezentos coletivos conectados direta ou

indiretamente à rede. A partir do momento em que temos tantos coletivos

conectados, conseguimos ter uma potência muito grande. Tínhamos a missão

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66 da circulação, na qual permitia que bandas, artistas ou nós mesmos, que

estávamos nos coletivos, conseguíamos circular por outros coletivos em outras

cidades, com hospedagem incluída, com alguém apresentando o lugar,

apresentando outros festivais. Imagina essa circulação feita por bandas em

turnê? Isso deu uma sustentabilidade muito grande. Outra coisa era a missão

da distribuição, que permitia que bandas independentes, por exemplo,

distribuíssem seus produtos entre os coletivos, em banquinhas durante os

festivais. E o outro ponto, que é o que vai te interessar mais, é sobre a missão

voltada para a comunicação. A maioria das pessoas que fundaram e fazem

parte da rede Fora do Eixo, vieram da comunicação, seja porque eram

estudantes da área, seja porque tinham afeição pela área. Todos os coletivos

tinham seu núcleo de comunicação, fazendo sua comunicação independente.

Começamos assim, fazendo a comunicação com o viés da cultura.

Começamos com a música, mas várias outras vertentes da cultura vieram

dentro da rede e se apropriaram dessa tecnologia e desse circuito de vários

coletivos conectados, conseguindo a visibilidade que antes somente as

grandes estruturas comunicacionais permitiam. Os coletivos que tinham a

tecnologia de ponta nas mãos e uma expertise grande faziam transmissões ao

vivo dos festivais, transmissões pela web rádios, faziam newsletters online,

podcasts, etc, E o conhecimento dessas tecnologias eram compartilhados na

rede, por meio de vídeos, por oficinas e workshops, observatórios online e

outros meios.

De uns cinco anos pra cá, o Fora do Eixo começou a se enxergar como

uma rede política. Começamos a participar de fóruns políticos, muita gente que

fazia parte da rede começou a se integrar aos conselhos de cultura. Um

momento muito importante para nós foi quando a Ana de Holanda assumiu o

Ministério da Cultura e reconheceu os coletivos de cultura como fazedores

culturais. Isso fez com que nós nos mobilizássemos politicamente, indo para as

ruas para disputar a sociedade, abrindo o nosso leque para além da cultura. O

pessoal do ativismo alimentar, do meio ambiente, por exemplo, se aliaram ao

Fora do Eixo para poder aproveitar essa conexão de vários coletivos e se

especializar nesse lance do ativismo de rua. Em 2012, nos vimos como coletivo

ativista, quando decidimos ocupar o Rio+20, mas o momento mais épico

desses foi quando decidimos nos aliar ao pessoal da Marcha da Maconha e

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67 que fez a Marcha da Liberdade em São Paulo. Foi nossa primeira transmissão

ao vivo na rua e que não era de um festival independente de cultura, mas de

uma marcha com uma vertente política muito grande. Hoje é muito mais fácil,

mas na época foram feitas gambiarras, amarramos o computador na barriga,

roubamos um carrinho de supermercado para poder carregar os equipamentos

ir transmitindo ao vivo com os recursos que tínhamos. Fizemos uma

transmissão muito foda naquele momento e tudo foi difundido potentemente

entre os outros coletivos.

Você lembra como estava o Brasil em 2013, mais especificamente em

junho? Um pouco antes das jornadas junho de 2013, decidimos nos juntar para

poder aproveitar e formar uma rede paralela à rede Fora do Eixo que ficaria

muito focada nesse lance do ativismo de mídia. Então decidimos reunir todos

esses núcleos de comunicação do Fora do Eixo e formar a nossa rede de

comunicação e midiativismo. E foi aí que surgiu a Mídia Ninja, que significa

“Narrativas Independe de Jornalismo e Ação”. Tem que gente hoje que

conhece muito mais a Mídia Ninja do que a rede Fora do Eixo e quer ser um

ponto da rede mais por conta dela. Mas a Ninja é parte do Fora do Eixo.

Como funciona o modelo de redação de vocês? Existe um?

Antes de tudo, é importante alertar que redação é uma palavra que não

entra no nosso vocabulário, porque nossa estrutura do fazer jornalístico e

cultural é muito diferente das estruturas tradicionais de mídia e jornalismo. Nós

utilizamos tudo que o Fora do Eixo tem enquanto estrutura. Existem as

pessoas que chamamos de “orgânicas” que são aquelas que se dedicam

exclusivamente à rede, vivendo e atuando 24 horas o Fora do Eixo e moram

em casas coletivas. Essas casas são como as redações da Mídia Ninja. É onde

nós moramos, trabalhamos e onde nos formamos, porque é uma residência

cultural que se movimento por meio de suas vivências. O dia-a-dia de uma

pessoa que quer ser Mídia Ninja, é o dia-a-dia de alguém que acorda, tem uma

agenda de cobertura que, aqui em Brasília, por exemplo, é feita muita

cobertura do Congresso Nacional e das marchas que acontecem na cidade.

Tem as reuniões de movimentos sociais, de núcleos e redes nas quais

participamos. E em casa tem que lavar banheiro, limpar a casa, fazer almoço,

tem que estar no cronograma de residência, tem que participar das reuniões

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68 que todos participam, tem que buscar grana para poder nos financiar. Então

não é só uma redação que você vai e trabalha, de 8 às 18, por exemplo, e que

depois você volta para casa. Aqui é tudo misturado. Além das casas coletivas,

existe a nossa comunicação virtual na qual usamos para nos comunicar com

outros coletivos que não estão na cidade onde atuamos. Temos vários chats do

Telegram e um deles, por exemplo, é o chat de editoria, que tem inclusive

colaboradores jornalistas de renome que não fazem parte da Mídia Ninja, mas

fazem parte da nossa editoria. É por meio desse chat de editoria que

diariamente vamos decidindo o que entra e o que não, as notícias do dia,

vamos debatendo assuntos pertinentes. Tem um chat só de design, tem um

chat só de texto e redação, tem os chats regionais e assim por diante. Então, a

nossa redação se movimenta pela comunicação pelos chats e é muito mais

vivo que presencialmente, por conta da conexão com outras cidades.

Vocês integrantes seguem com outros trabalhos?

Nós temos um grupo formado por pouco mais de cinquenta pessoas que

fazem parte do que chamamos de núcleo durável da rede. São pessoas que

decidiram entrar e se dedicar inteiramente a ela, são as principais investidoras

da rede. Qualquer recurso que nós conseguimos angariar, é um recurso para a

rede, então entra para um caixa coletivo. Mas além delas, existe um corpo

imenso de colaboradores. Existem as pessoas que querem fazer uma vivência

por um período determinado, por exemplo, então nós abrimos editais de

vivência para que elas possam ter essa experiência. E existem também os

colaboradores que estão espalhados pelas cidades e querem participar como

se fossem correspondentes. A Mídia Ninja se alimenta dessa colaboração que

é a fonte de recursos e conteúdos hoje.

Nós não temos um salário. O nosso modelo de economia e

financiamento se baseia no colaborativismo e existem pessoas hoje dedicadas

a desenvolver tecnologias a partir dessa nossa experiência; o banco Fora do

Eixo é uma delas. Os coletivos foram formados por pessoas que queriam morar

juntos, trabalhar juntas e ganhar dinheiro de forma coletiva e colaborativa. Tem

meses que entra mil reais pelo trabalho feito e tem meses que entra dez mil,

então se você começa a trabalhar em uma lógica em que todos têm o seu

salário ou que o valor é dividido em uma quantia para cada, nós nos

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69 quebramos e não conseguimos nos sustentar. Começamos assim a adotar

uma lógica colaborativa. Vamos dizer que eu precise comprar uma calça,

então eu pego o valor ali do caixa, anoto no caderno que fazemos o controle e

compro minha calça. A partir do momento em que moramos juntos, um recurso

que passa a ser desnecessário, é convertido na compra de outra coisa que

consigamos aproveitar mais. Isso dá uma velocidade maior na nossa vida, nos

nossos projetos e conseguimos nos sustentar de forma mais adequada. Tem

meses que vai entrar pouco recurso e sabemos que tem contas que são

prioritárias e devem ser pagas ao invés de comprar aquela roupa que eu

queria, deixando-a para outro mês. Foi uma opção que decidimos quando

fomos viver juntos e todo mundo que faz parte da rede não sente falta disso,

porque já incorporamos na nossa dinâmica essa vida coletiva, para além do

dinheiro.

Como o portal Mídia Ninja tem conseguido se manter? Existe alguma

arrecadação com publicidade, ou alguma parceria?

Os recursos vêm das mais variadas formas. A principal é por meio de

doações. Tem gente que se dedica a doar mensalmente e grande parte dos

nossos recursos vem dessas doações. Aqui em Brasília, fazemos muitos

trabalhos de freelance; uma transmissão ao vivo de dois mil reais, uma

cobertura colaborativa de dez mil reais, um álbum fotográfico para um sindicato

por cinco mil reais. Já tivemos dois grandes parceiros que são e a Open

Society e a Fundação Ford, fundações internacionais. A iniciativa internacional

é muito mais fácil de fazer parcerias e se conectar por meio de patrocínio do

que brasileiras. O resto dos recursos depende também da criatividade de cada

casa. No Rio de Janeiro, por exemplo, são feitas muitas festas para arrecadar

dinheiro. É importante falar também que a Mídia Ninja tem um trabalho muito

sustentável e toda essa estrutura de funcionamento colabora para isso. Muita

gente que entra na Mídia Ninja já vem com o próprio equipamento e não

precisamos comprar. As nossas horas de trabalho são investimentos para a

empresa. É um modelo muito sustentável.

Vocês sofrem alguma influência ou restrição no cont eúdo publicado

imposta por esses parceiros?

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Nenhuma. Os dois parceiros que mencionei, por se tratarem de

fundações internacionais, não estão interessados diretamente na pauta da

Mídia Ninja. Além desses, tem os outros parceiros nos quais nos aliamos para

termos uma simbiose política, mas ao invés de ficarmos dependentes deles,

nós os trazemos para o meio do debate político. Pelo fato da Mídia Ninja

dialogar com muita gente da Esquerda, já que a Direita não quer diálogo, nós

fazemos essa mídia independente ser muito forte. Nós nos comunicamos com

o pessoal desde o MTST até grandes celebridades que querem conversar com

a Esquerda, como a Camila Pitanga, por exemplo. Então, pelo fato de

conversarmos com muita gente, é muito difícil ter alguém com poder de

persuasão, com poder de colocar a Mídia Ninja como se fosse dependente de

um projeto político.

Possível concorrência

Vocês consideram os outros portais independentes no jornalismo digital

como concorrentes? Existe concorrência com vocês? P or exemplo, já vi

várias vezes a Mídia Ninja compartilhando conteúdo dos Jornalistas

Livres e vice-versa.

O objetivo das mídias independentes é muito diferente da lógica das

mídias tradicionais. As grandes redações de jornal precisam de assinantes,

então sua própria lógica estrutural é baseada na concorrência. As mídias

independentes, sobretudo as que trabalham com redes sociais, têm o propósito

de difundir as narrativas, principalmente aquelas que não ganham espaço nas

mídias tradicionais. Então, quanto mais a rede de mídias independentes se

multiplique, quanto mais gente e coletivos surgirem com a intenção de formar

seus núcleos de mídia independente, melhor. Tanto que os diálogos entre os

ativistas de mídia são muito saudáveis. A Mídia Ninja estava inclusive bastante

atuante nos Jornalistas Livres durante a sua fundação; as reuniões iniciais

aconteciam em uma das casas Fora do Eixo em São Paulo. Nós temos essa

necessidade de estarmos todos juntos, porque todas essas mídias defendem a

pauta da democratização da comunicação. Quanto mais esses grupos

estiverem juntos, mais forte fica a atuação nessa luta.

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71

APÊNDICE D - ENTREVISTA COM O JORNALISTA FELIPE SELIGMAN

DO JOTA

Perfil do entrevistado

Fale um pouco de você, da sua formação e experiênci a profissional.

Meu nome é Felipe Seligman, tenho 32 anos. Eu me formei em

Jornalismo pelo IESB no fim de 2005. Estudei Filosofia na Unb durante 4 anos,

mas isso enquanto trabalhava e enquanto estudava jornalismo, então não

cheguei a me formar em Filosofia. Trabalhei, enquanto estudante, em uma

agência de notícias internacional chamada IPS – Interpress Service. A agência

cobria notícias do antigo terceiro mundo e desenvolvimento. Assim que me

formei, fui para Nova Ioque pela agência, onde cobri a ONU. Voltei para o

Brasil, entrei na Folha, onde fiquei por alguns anos. Participei da fundação do

Jota e do Brio e hoje me dedico integralmente ao Jota, porque é a startup que

acabou tendo sucesso em termos jornalísticos e em termos de negócio. Estou

morando atualmente em Boston, nos Estados Unidos, e estou fazendo MBA na

Faculdade de Business do MIT – Massachusetts Institute of Technology, e, se

tudo der certo, termino no meio de 2018. É um mestrado de dois anos, no qual

preciso trabalhar em conjunto com o curso, então vou aplicando o que aprendo

ao Jota.

Sobre o portal

Como se deu o início do portal? (Perguntar no caso do Jota e Mídia Ninja )

Em relação ao Jota, como cobrimos o Supremo Tribunal Federal,

percebemos nossos textos não eram lidos por boa parte dos leitores e das

pessoas que acompanhavam os nossos respectivos meios de comunicação,

porque não se interessavam pelos temas. E aqueles que tinham interesse, não

estavam satisfeitos, pois as matérias não supriam sua necessidade de

informação. Percebemos, portanto, que existia um interesse muito grande e

uma necessidade muito grande de informação da área jurídica, que era mal

coberta e mal explorada pelos serviços de informação no geral, ainda mais no

Brasil cujo impacto das decisões judiciais é muito relevante e sentido na vida

de todos. Foi por isso que decidimos criar o Jota. Eu me afastei um pouco da

operação do Brio, porque o Jota demanda mais de cem por cento do meu dia.

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72 A linha do Brio é a de possibilitar que repórteres publiquem a pauta de seus

sonhos, mas ajudá-los a encontrar os locais adequados e as ferramentas

necessárias, recebendo treinamentos específicos para que consigam fazer isso

da melhor forma possível.

Como funciona o modelo de redação de vocês? Existe um?

O Brio não tem uma redação, pois lidam com jornalistas independentes.

Eles escrevem, as pautas chegam, nós analisamos e fazemos uma triagem. No

caso do Jota, estamos montando uma redação sim. Ela tem algumas

características diferentes. Ainda não temos um espaço físico, porque não

sentimos a necessidade, mas isso deve acontecer. Já temos alguns escritórios

trabalhando em co-working, em São Paulo e Brasília e temos freelancers

espalhados por todo país. Contudo, nós temos com o Jota uma atuação muito

digital, ou seja, os profissionais vão muito para os tribunais e para os lugares

onde eles estão fazendo as pautas e de lá mesmo escrevem. Nós temos uma

redação virtual utilizando o Slack, que é uma plataforma de comunicação

virtual, onde é possível criar times ou conversas individuais para ter toda a sua

troca de informação em um único lugar. Isso reduz muito a quantidade de e-

mails, já que você consegue ordenar tarefas, recuperar o que estava sendo

discutido em canais temáticos, sobre pauta, sobre questões de gestão ou de

marketing, por exemplo. É como se fosse um grupo de whatsapp e e-mail no

meio lugar.

Vocês integrantes seguem com outros trabalhos?

No Jota, todos trabalhamos integralmente e já conseguimos nos pagar.

No Brio, quem está envolvido faz outras coisas sim.

Analisando o Jota , percebi que existe uma “parceria” com o UOL. Como

funciona isso? Existe alguma arrecadação com public idade, ou alguma

parceria?

O modelo que temos no Jota hoje é o de assinaturas e não o de

publicidade. Ganhamos dinheiro com assinantes individuais e assinantes

corporativos, que recebem as informações tanto pelo site, quando por

newsletters e até por WhatsApp. Temos listas de WhatsApp para envio de

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73 notícias em tempo real. Quanto a parceria com o UOL, nós a utilizamos para

tentar atingir o maior número de pessoas e tentar nos tornarmos cada vez mais

conhecidos. Contudo é algo que ainda está sendo analisado, pois o nosso

público não está necessariamente lá. O que ganhamos de publicidade que vem

do UOL e o que vendemos usando o UOL é dividido com eles. Logo, o nosso

foco não é publicidade e sim o dinheiro dos assinantes. A parceria com o UOL

é interessante, mas ainda está em fase de teste.

Vocês conseguem se manter com esse modelo de assina tura adotado?

Sim. Com a prestação dos serviços de informação descritos no site nós

conseguimos nos manter. Já conseguimos manter a estrutura que temos, mas

não estamos satisfeitos, queremos crescer. Então todo dinheiro que chega,

poderíamos ficar mais tranquilos, aumentar nossos salários, mas não é o que

queremos. Queremos construir uma empresa grande, que consiga empregar

mais gente, consiga ser mais relevante. Então, pegamos o dinheiro e

reinvestimos todo no Jota. Pode ser que no futuro venha algum outro tipo de

investimento, mas por enquanto nosso modelo é esse de produtos e serviços.

É o site, eventos que provavelmente vamos fazer, discussões do que está no

site, que acaba funcionando como um tipo de patrocínio. Por exemplo, alguém

interessado nos patrocina para discutirmos de maneira independente aquele

debate. Assim, essas são as nossas formas de entrada de recursos, não

possuindo um modelo de publicidade tradicional. Foi opção nossa não gastar

tempo e energia com um modelo que, na minha avaliação, é um pouco a razão

da crise no jornalismo.

Vocês sofrem alguma influência ou restrição imposta pela mídia

tradicional?

Nós não nos colocamos como uma alternativa às grandes mídias em

termos de discurso e escolhas. Nós nos colocamos como uma possibilidade de

encontrar uma informação na qual você não encontra em nenhum outro lugar.

Existimos, então, por um questionamento da qualidade dos veículos

tradicionais. Nossa essência vem da percepção que existe uma grande parcela

de profissionais no Brasil que precisa de informações públicas no seu dia-a-dia

e tem muita dificuldade de consegui-las pelas características do país.

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74

Possível concorrência

Vocês consideram os outros portais independentes no jornalismo digital

como concorrentes? Existe concorrência com vocês?

Digamos que temos “concorrentes” entre os veículos tradicionais, sob

certo aspecto, veículos focados na área jurídica, como por exemplo,

consultores jurídicos. Mas em termos de modelos de negócio da nossa área,

não vejo concorrentes muito claros, isto é, pessoas que estão fazendo a

mesma coisa que nós e com as quais temos que ficar lutando contra, não

consigo ver nenhum. Nós tendemos a entregar um serviço mais aprofundado,

mais focado e com qualidade, o que é um diferencial.