Modelos teóricos para a compreensão da estrutura da matéria

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6 Cadernos Temáticos de Química Nova na Escola N° 4 – Maio 2001 Modelos teóricos Wagner B. de Almeida e Hélio F. dos Santos A matéria é constituída de sub-partículas (prótons, elétrons e nêutrons) cujo comportamento deve ser descrito pela teoria quântica. No presente artigo apresentamos os principais aspectos relacionados ao conceito e ao formalismo da química quântica modelos teóricos, estrutura da matéria, química quântica Observações experimentais e modelos teóricos I nformações importantes a respeito da natureza de átomos e moléculas têm sido obtidas através do estudo da interação da radiação com a ma- téria. Muitas evidências experimentais, desde a metade do século XIX, suge- riam que a luz deveria ser descrita como um movimento ondulatório. Esta evidência incluía o fato de que a luz exi- be fenômenos de interferência e difra- ção. Naquela época, em 1864, a teo- ria eletromagnética ondulatória foi de- senvolvida em uma forma bastante satisfatória por J.C. Maxwell. Suas fa- mosas equações diferenciais en- volvendo os cam- pos elétricos e magnéticos des- crevem a radia- ção luminosa on- dulatória e suas propriedades, em uma forma similar na qual as equações do movimento são aplicáveis às ondas sonoras. Utilizando a teoria eletromag- nética ondulatória, podemos correla- cionar a inteira gama de comprimentos de onda, λ, desde raios X (λ 10 -10 m) até ondas de rádio ordinárias (λ 1 m). Todas estas superficialmente diferen- tes formas de radiação viajam no vácuo a mesma velocidade, c = 2,998 x 10 8 m.s -1 . Uma onda luminosa pode ser caracterizada por sua freqüência, ν, ou comprimento de onda, λ (ν = c/λ) como mostrado na Figura 1. A espectroscopia tem como funda- mento básico revelar o efeito da inte- ração da radiação com a matéria, es- tando esta no estado gasoso, líquido ou sólido. Desde o século XIX traba- lhos experimentais na área de espec- troscopia, mais especificamente espectroscopia atômica, proporciona- ram um conjunto de informações rele- vantes que levaram cien- tistas a buscarem mo- delos e teorias mais ade- quadas para a descrição da interação da radiação com a matéria. No caso do átomo de hidrogênio, várias equações empíricas foram propostas para descrever seu espec- tro atômico (Figura 2 e Tabela 1). O padrão de espaçamento entre as linhas do espectro pode ser reprodu- zido com o auxílio da equação empí- rica mostrada na Tabela 1, sendo R H a constante de Rydberg e m e n núme- ros inteiros que assumem valores ca- racterísticos nas diferentes regiões do espectro eletromagnético. Considerando as relações entre ra- diação, energia e matéria, pode-se observar que quando gases são ex- postos a uma descarga elétrica ou aquecidos a temperaturas altas, uma emissão característica de luz é obser- vada. Esta consiste de uma série de linhas distintas, chamadas bandas de radiação, distribuídas em várias fre- qüências, com pouca ou nenhuma ra- diação em freqüências intermediárias (Figura 2). Um sólido aquecido, por um outro lado, produz um espectro que parece ser uma função contínua do comprimento de onda. Um espectro como este é chamado de espectro de Figura 1: Espectro de radiação eletromag- nética. O comprimento de onda (λ) é defini- do como sendo a distância entre dois máxi- mos ou dois mínimos da onda. A espectroscopia tem como fundamento básico revelar o efeito da interação da radiação com a matéria

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Wagner B. de Almeida e Hélio F. dos Santos

A matéria é constituída de sub-partículas (prótons, elétrons e nêutrons) cujo comportamento deve ser descritopela teoria quântica. No presente artigo apresentamos os principais aspectos relacionados ao conceito e aoformalismo da química quântica

modelos teóricos, estrutura da matéria, química quântica

Observações experimentais e modelosteóricos

Informações importantes a respeitoda natureza de átomos e moléculastêm sido obtidas através do estudo

da interação da radiação com a ma-téria. Muitas evidências experimentais,desde a metade do século XIX, suge-riam que a luz deveria ser descritacomo um movimento ondulatório. Estaevidência incluía o fato de que a luz exi-be fenômenos de interferência e difra-ção. Naquela época, em 1864, a teo-ria eletromagnética ondulatória foi de-senvolvida em uma forma bastantesatisfatória por J.C. Maxwell. Suas fa-mosas equaçõesdiferenciais en-volvendo os cam-pos elétricos emagnéticos des-crevem a radia-ção luminosa on-dulatória e suas propriedades, em umaforma similar na qual as equações domovimento são aplicáveis às ondassonoras. Utilizando a teoria eletromag-nética ondulatória, podemos correla-cionar a inteira gama de comprimentosde onda, λ, desde raios X (λ ≈ 10-10 m)até ondas de rádio ordinárias (λ ≥ 1 m).

Todas estas superficialmente diferen-tes formas de radiação viajam novácuo a mesma velocidade, c = 2,998x 108 m.s-1. Uma onda luminosa podeser caracterizada por sua freqüência,ν, ou comprimento de onda, λ (ν = c/λ)como mostrado na Figura 1.

A espectroscopia tem como funda-mento básico revelar o efeito da inte-ração da radiação com a matéria, es-tando esta no estado gasoso, líquidoou sólido. Desde o século XIX traba-lhos experimentais na área de espec-troscopia, mais especificamenteespectroscopia atômica, proporciona-ram um conjunto de informações rele-

vantes que levaram cien-tistas a buscarem mo-delos e teorias mais ade-quadas para a descriçãoda interação da radiaçãocom a matéria. No casodo átomo de hidrogênio,

várias equações empíricas forampropostas para descrever seu espec-tro atômico (Figura 2 e Tabela 1).

O padrão de espaçamento entre aslinhas do espectro pode ser reprodu-zido com o auxílio da equação empí-rica mostrada na Tabela 1, sendo RH aconstante de Rydberg e m e n núme-

ros inteiros que assumem valores ca-racterísticos nas diferentes regiões doespectro eletromagnético.

Considerando as relações entre ra-diação, energia e matéria, pode-seobservar que quando gases são ex-postos a uma descarga elétrica ouaquecidos a temperaturas altas, umaemissão característica de luz é obser-vada. Esta consiste de uma série delinhas distintas, chamadas bandas deradiação, distribuídas em várias fre-qüências, com pouca ou nenhuma ra-diação em freqüências intermediárias(Figura 2). Um sólido aquecido, por umoutro lado, produz um espectro queparece ser uma função contínua docomprimento de onda. Um espectrocomo este é chamado de espectro de

Figura 1: Espectro de radiação eletromag-nética. O comprimento de onda (λ) é defini-do como sendo a distância entre dois máxi-mos ou dois mínimos da onda.

A espectroscopia temcomo fundamento básico

revelar o efeito dainteração da radiação

com a matéria

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corpo negro ideal ou espectro normal.O espectro obtido para um corpo ne-gro ideal não depende da natureza, ta-manho ou forma do sólido, mas so-mente da temperatura (Figura 3). Aradiação de corpo negro é a radiaçãoeletromagnética em equilíbrio térmicocom o corpo negro a uma temperaturaespecífica. Através da análise daradiação do corpo negro, foi estabele-cido experimentalmente que a densi-dade de energia total, ρ, é dada pelalei de Stefan-Boltzmann.

ρ = σ.T4 (1)

sendo σ uma constante, 7,56 x 10-16

J.m-3.K-4, e T a temperatura absoluta(em K). Se um detector de radiação eum espectroscópiosão usados para deter-minar a energia paravários comprimentosde onda, um gráficosuave de densidadede energia (ρ) vs. com-primento de onda (oufreqüência) é obtido,como mostrado na Figura 3. Estascurvas se constituem em uma família,com a forma de cada curva depen-

dendo da temperatura. Como pode servisto na Figura 3, a equação clássicapara a densidade de energia emfunção da freqüência da radiaçãoproposta por Rayleigh-Jeans em 1900,discordou dramaticamente da curvaexperimental. O desenvolvimento deuma equação para reproduzir a formaexperimental da dependência da ener-gia da radiação com o comprimentode onda (ou freqüência) da luz foi umdos problemas centrais dos físicos doséculo XIX. Planck apresentou no finalde 1900 uma solução, na qual foiintroduzida pela primeira vez a hipóteseda quantização da energia (E = n.h.ν,sendo h a constante de Planck, 6,62 x10-34 J.s, e n um número inteiro). A curvateórica construída utilizando a equaçãode Planck concorda perfeitamente coma curva experimental para a radiaçãodo corpo negro. Uma discussãodetalhada não será apresentada aqui,mas podemos dizer que este foi opasso inicial para o nascimento damecânica quântica.

Apesar da teoria desenvolvida porPlanck para explicar a radiação de cor-po negro ter sido compatível com asobservações experimentais, naquelaépoca Planck se questionava quantoao significado físico do formalismo ma-

temático introduzido.Com esta visão,Planck buscou du-rante um longo perío-do explicações físicaspara o que ele consi-derava como um“postulado limitadoproposto a partir de

um ato de desespero”.No final do século XIX Heinrich Hertz

realizou experiências e descobriu que

uma descarga elétrica entre dois ele-trodos ocorre mais facilmente quandose faz incidir sobre um deles luzultravioleta. Lenard, seguindo algunsexperimentos de Hallwachs, mostrouem seguida que a luz ultravioleta facilitaa descarga ao fazer com que elétronssejam emitidos da superfície do catodo(M, Figura 4a). A emissão de elétronsde uma superfície, devido à incidênciade luz sobre essa superfície, é cha-mada de Efeito Fotoelétrico (Figura 4).

Os principais aspectos observadosempiricamente do Efeito Fotoelétriconão podem ser explicados em termosda teoria ondulatória clássica daradiação. Em 1905 Albert Einstein ques-

Tabela 1: Diferentes séries propostas empiricamente para descrever o espectro de emissãoatômico do átomo de hidrogênio (Figura 2).

Nome da série Região do espectro eletromagnético m n

Lyman Ultravioleta 1 2, 3, 4...

Balmer Visível 2 3, 4, 5...

Paschen Infravermelho 3 4, 5, 6...

Brackett Infravermelho 4 5, 6, 7...

Pfund Infravermelho 5 6, 7, 8...

Figura 3: Espectro de radiação do corponegro.

Figura 4: Ilustração do efeito fotoelétrico

No final de 1900 Planckapresentou a hipótese daquantização da energia:

E = n.h.νEsse foi o passo inicial parao nascimento da mecânica

quântica

Figura 2: Espectro atômico do átomo dehidrogênio em diferentes regiões doespectro eletromagnético.

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tionou o formalismo clássico utilizado nadescrição da luz. Einstein propôs que aenergia radiante fosse quantizada empacotes concentrados, que mais tardevieram a ser chamados de fótons. Eins-tein supôs que a energia do pacote, oufóton, está relacio-nada à sua freqüênciaν pela equação E =h.ν; também foi su-posto que no efeitofotoelétrico um fóton éc o m p l e t a m e n t eabsorvido por um elé-tron no fotocatodo.Quando um elétron éemitido da superfíciedo metal, sua energia cinética é K = h.ν- w, sendo o primeiro termo da direita aenergia do fóton incidente e w o trabalhonecessário para remover os elétrons dometal. No caso de um elétron estar fra-camente ligado e não havendo perdasinternas, o fotoelétron vai emergir comenergia cinética máxima, Kmax. No efeitofotoelétrico os elétrons podem serdetectados sob a forma de uma correnteelétrica se forem atraídos para umcoletor metálico através de uma dife-rença de potencial V. Invertendo o sinaldo potencial e tornando-o suficien-temente grande, podemos fazer acorrente fotoelétrica cair a zero. Este é ochamado potencial de corte ou limite,V0. Einstein relacionou o potencial decorte com a energia do fóton incidentepela equação e.V0 = h.ν - w0, onde w0 échamada de função trabalho, a energiamínima necessária para um elétronatravessar a superfície do metal e esca-par às forças atrativas que ligam-no aometal. Utilizando as equações mencio-nadas anteriormente e a Figura 4,podemos observar que construindo umgráfico de eV0 em função da freqüênciaν obteremos uma linha reta cuja inclina-ção fornece a constante de Planck, h(Figura 4b).

Enquanto no efeito fotoelétrico a ra-diação ultravioleta é absorvida pelo elé-tron, Compton mostrou, em 1923, queum feixe de raios X de comprimento deonda λ era espalhado por elétrons quan-do incididos sobre uma amostra de grafi-te. Para interpretar as observaçõesexperimentais, Compton postulou queo feixe de raios X incidente não era umaonda de freqüência ν, mas um conjunto

de fótons, cada um com energiaE = h.ν, e que esses fótons colidiamcom os elétrons livres do alvo da mesmaforma que colidem duas bolas de bilhar.A natureza corpuscular da radiação foientão confirmada. Portanto foi consta-

tado que a radiação ele-tromagnética tem umcomportamento dual. Anecessidade da hipó-tese do fóton, ou partí-cula localizada, parainterpretar processosque envolvem a inte-ração com a matéria éclara, mas ao mesmotempo é necessária

uma teoria ondulatória da radiação pa-ra explicar os fenômenos de interferênciae difração. É importante considerar quea radiação não possui um compor-tamento puramente ondulatório nemmeramente se comporta como um fei-xe de partículas. A radiação se apresentacomo uma onda em certas circuns-tâncias e como umapartícula em outras. Adualidade evidente nanatureza onda-partí-cula da radiação éuma característica ge-ral de todos os entesfísicos. Veremos que elétrons, por exem-plo, têm a mesma natureza dual dos fó-tons. A conciliação da existência deaspectos ondulatórios com a de aspec-tos corpusculares, para qualquer entefísico, é conseguida com o auxílio damecânica quântica.

Em 1924, Louis De Broglie propôs aexistência de ondas de matéria. A hipó-tese de De Broglie era de que o compor-tamento dual onda-partícula da radiação

também se aplicava a matéria. Assimcomo um fóton tem associado a ele umaonda luminosa que governa seu movi-mento, também uma partícula material(por exemplo, um elétron) tem associa-da a ela uma onda de matéria quegoverna seu movimento. Foi propostoque os aspectos ondulatórios da maté-ria fossem relacionados com seus as-pectos corpusculares exatamente damesma forma quantitativa com que es-ses aspectos são relacionados para aradiação. Assim, tanto para a matériaquanto para a radiação, as seguintesrelações são válidas: E = h.ν e p = h/λ,onde E e p são respectivamente aenergia total e momento linear dapartícula. O comprimento de onda deDe Broglie é portanto definido como:

(2)

sendo m e v a massa e a velocidadeda partícula respectivamente.

Apesar da relaçãode De Broglie seraplicada a todas assubstâncias físicas, ocomprimento de ondaassociado a partículasmacroscópicas é mui-to pequeno, não sen-

do possível observar o comportamentoondulatório (difração, interferênciaetc.). Alguns exemplos são apre-sentados na Tabela 2.

Desenvolvimento da teoria atômicaEvidências experimentais foram

acumuladas no início do século pas-sado revelando que átomos contêmelétrons, e como normalmente átomossão neutros, eles devem conter umacarga positiva igual em módulo à carga

Modelos teóricos

Tabela 2: Exemplos da aplicação da relação de De Broglie.

1. Cálculo do comprimento de onda de De Broglie (λ = h/m.v) para um elétron de massa9,1 x 10-31 kg movendo-se a velocidade de 1,0 x 106 m.s-1.

2. Cálculo do comprimento de onda de De Broglie (λ = h/m.v) para um carro de massa1 x 103 kg movendo-se a 100 km.h-1 (27,8 m.s-1).

Compton postulou que umfeixe de raios X, incidindo

sobre uma amostra degrafite, não se compotra

como uma onda defreqüência ν mas como um

conjunto de fótons. Issoconfirmou a natureza

corpuscular da radiação

A dualidade evidente nanatureza onda-partícula da

radiação é umacaracterística geral detodos os entes físicos

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negativa de seus elétrons. Portanto umátomo neutro contendo Z elétrons temuma carga negativa -Ze, onde -e é a car-ga do elétron, e também uma cargapositiva de mesmo valor em módulo. Ofato de que a massa do elétron é muitopequena se compara-da com a de qualquerátomo, implica que amaior parte da massado átomo deve estarassociada à carga po-sitiva. Estas consi-derações levaram na-turalmente ao proble-ma de como seria adistribuição de cargaspositivas e negativasdentro do átomo.

Um dos primeirosmodelos para o átomo foi proposto porJ.J. Thomson em 1910, segundo o qualos elétrons carregados negativamenteestariam localizados no interior de umadistribuição esférica contínua de cargapositiva, com um raio da ordem degrandeza do raio de um átomo, 10-10 m.Este modelo é conhecido também como“pudim de ameixas”. O modelo deThomson não fornecia uma concor-dância quantitativa com os espectrosobservados experimentalmente. Ademonstração da inadequação do mo-delo de Thomson foi obtida em 1911 porErnest Rutherford, a partir da análise deexperiências sobre o espalhamento departículas α por átomos. Rutherfordmostrou que em vez de estar espalha-da por todo o átomo, a carga positivaestava concentrada em uma regiãomuito pequena, ou núcleo, no centro doátomo. Este foi um dos progressos maisimportantes da física atômica e foi abase da física nuclear.

A verificação experimental detalha-da das previsões do modelo nuclear deRutherford para o átomo deixou poucoespaço para dúvidas em relação àvalidade desse modelo. Contudo, sur-giram sérias questões a respeito da esta-bilidade de um átomo desse tipo. Oselétrons circulando em órbitas em tornodo núcleo, de acordo com a teoria elet-romagnética clássica, perderiam energiae mover-se-iam em espiral até atingir onúcleo. Teríamos um átomo que rapi-damente sofreria um colapso para di-mensões nucleares. Além disso, o

espectro contínuo da radiação que seriaemitido durante este processo não esta-va de acordo com o espectro atômicode natureza discreta, conforme já seconhecia na época.

Em 1913 Niels Bohr desenvolveu ummodelo atômico queapresentava concor-dância quantitativa comos dados espectros-cópicos obtidos para oátomo de hidrogênio.Um outro aspecto inte-ressante do modelo deBohr é que a matemá-tica envolvida era defácil compreensão. Omodelo de Bohr expli-cava a estabilidade doátomo postulando que

a energia total do elétron é constantequando este encontra-se em uma dasórbitas permitidas, caracterizadas pornúmeros inteiros denominados númerosquânticos (n = 1, 2, 3...). A freqüênciada radiação emitida durante uma tran-sição eletrônica entre dois níveis écalculada pela equação:

(3)

sendo Einicial e Efinal as energias dos dife-rentes estados eletrônicos, definidas, deacordo com o modelo de Bohr, como:

(4)

O raio das órbitas dos elétrons nosdiferentes estados eletrônicos é ex-presso como:

(5)

Nas Equações (4) e (5), m refere-se à massa do elétron, Z ao númeroatômico do átomo, e à carga do elétron(e = 1,602 x 10-19 C), h = h/2π e ε0 apermissividade do vácuo (ε0 = 8,85 x10-12 F.m-1).

As propriedades do espectro deabsorção dos átomos de um elétrontambém são facilmente compreensí-veis em termos do modelo de Bohr. Osucesso do modelo de Bohr, medidopor sua concordância com as experiên-

cias, foi impressionante. Mas feztambém acentuar a natureza misterio-sa dos postulados nos quais se ba-seava o modelo.

Em 1916 Sommerfeld propôs ummodelo no qual as órbitas permitidaspara o movimento dos elétrons no áto-mo de hidrogênio seriam elípticas. Issofoi feito na tentativa de explicar a estru-tura fina do espectro do átomo de hi-drogênio, a qual corresponde a umaseparação das linhas espectrais. A es-trutura fina pode ser observada so-mente se usarmos um equipamento dealta resolução, já que a separação, emtermos de número de onda (1/λ), en-tre as componentes adjacentes deuma única linha espectral é da ordemde 10-4 vezes a separação entre as li-nhas adjacentes. De acordo com omodelo de Bohr, isto deve significarque o que tínhamos pensado ser umúnico estado de energia do átomo dehidrogênio consiste na realidade emvários estados com energias muitopróximas.

A esta teoria desenvolvida até aquinós nos referimos como ‘teoria quân-tica antiga’. Esta teoria só é aplicável aátomos contendo um único elétron (H,He+, Li++ etc.) além de sofrer uma crí-tica subjetiva de que a teoria parecede alguma forma não ter coerência,sendo intelectualmente insatisfatória. Anova teoria quântica proposta porSchrödinger e independentemente porHeisenberg, denominada ‘mecânicaquântica’, nos fornecerá um procedi-mento mais geral para o tratamento departículas de qualquer sistema micros-cópico.

Fundamentos da mecânica quântica

Como descrito nas seções anterio-res, o final do séc. XIX foi marcado poruma série de experimentos envolvendoa interação da radiação eletromagné-

Modelos teóricos

O modelo de Thomson nãofornecia uma concordância

quantitativa com osespectros observados. A

demonstração dainadequação desse modelofoi obtida por Rutherford.Ele mostrou que uma cargapositiva estava concentrada

em uma região muitopequena (o núcleo) no

centro do átomo

O modelo de Bohrexplicava a estabilidade do

átomo postulando que aenergia total do elétron é

constante quando esteencontra-se em uma das

órbitas permitidas

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tica com a matéria. Dentre os maisimportantes, podem ser citados osestudos da radiação emitida por umcorpo negro, o efeito fotoelétrico e oespalhamento Compton. Estas inves-tigações experimentais levaram a umareformulação geral da teoria clássicado eletromagnetismo, introduzindoconceitos como a quantização da ener-gia e as propriedades corpuscularesda radiação. Os trabalhos de De Bro-glie, relacionados a dualidade partí-cula-onda, estabe-leceram um forma-lismo quantitativo docomportamento on-dulatório da matéria,sendo o comprimen-to de onda (λ) da ra-diação associada àpartícula de massa me velocidade v dadopela Equação (2). Aderivação da Equa-ção (2) pode ser as-sociada aos conceitos de energia efóton introduzidos por Einstein. Noefeito fotoelétrico, a radiação eletro-magnética é considerada como sen-do constituída de partículas movendo-se na velocidade da luz (c = 2,998 x 108

m.s-1), denominadas fótons, cujaenergia é E = h.ν (ν ≡ freqüência daradiação). Por outro lado, a teoria darelatividade estabelece que umapartícula nestas condições possuienergia E = m.c2, sendo m a massarelativística da partícula. Logo, as duasequações mencionadas anteriormentepodem ser combinadas, produzindo:

(6)

A Equação (6), valida para um fótonmovendo-se na velocidade c, é equi-valente a Equação (2) para uma partí-cula de massa m movendo-se comvelocidade v. O postulado de De Bro-glie (Equação 2) foi comprovado expe-rimentalmente através de estudos dedifração de elétrons.

A necessidade de introduzir concei-tos ondulatórios na descrição do com-portamento de partículas microscópi-cas levou a uma reformulação da me-cânica de Newton. Surge assim o con-

ceito de onda de matéria (ou funçãode onda) cuja interpretação foi dadapor Max Born em 1926. A análise deBorn tem como princípio os conceitosclássicos da radiação eletromagnéticae suas propriedades corpusculares. Aintensidade da luz é proporcional a A2

(A ≡ amplitude da onda), que por suavez é proporcional ao número de fó-tons (n) por unidade de volume. Por-tanto, a probabilidade de encontrar umfóton no elemento de volume dV pode

ser escrita como A2dV.De forma análoga,Born associou à proba-bilidade de encontraruma partícula no ele-mento de volume dV aquantidade Ψ2dV, ondeΨ representa a ampli-tude da função de on-da da matéria. A inter-pretação probabilísticade Max Born con-trapõe-se ao determi-

nismo da mecânica clássica e inicia odesenvolvimento de uma nova teoriapara estudar movimentos de partículas,onde as propriedades observáveis sãodescritas como valores esperados.Esta teoria recebeu o nome de mecâ-nica quântica.

Postulado fundamental da mecânicaquântica

Para qualquer sistema material,existe uma função de onda (Ψ) asso-ciada, a qual é função das coordena-das e tempo, que contém toda infor-mação que pode ser obtida sobre osistema, e satisfaz a equação abaixo:

ÔΨ = oΨ (7)

sendo o uma propriedade observáveldo sistema e Ô o operador correspon-dente. O conceito de operador podeparecer novo para alguns leitores, mascom certeza todos já fizerem uso dealgum tipo de operador em exercíciosde cálculo. Exemplos de operadoresclássicos são a raiz quadrada (√) e aderivada (d/dx), ou seja, operador é “al-go” que executa algum tipo de opera-ção sobre uma função matemática. Emmecânica quântica, o uso de operado-res constitui parte da teoria, comodescrito pelo teorema fundamental(Equação 7). Alguns exemplos especí-

ficos serão discutidos em maiores de-talhes, visando introduzir a forma dosprincipais operadores em mecânicaquântica.

Inicialmente, considere uma partí-cula movendo-se livre da ação de for-ças externas. A função de onda destapartícula pode ser representada como

Ψ(x, t) = cos(kx - ωt) +ik sen(kx - ωt) (8)

sendo

(9)

Derivando a expressão (8) em rela-ção a x, mantendo t constante, temos:

(10)

Reescrevendo a Equação (10),obtém-se:

(11)

Comparando a Equação (11) coma expressão que representa o postula-do fundamental da mecânica quântica(Equação 7), podemos escrever

Ψ = pΨ (12)

com p correspondendo ao momentolinear da partícula (observável) e

ao operador momento linear.

O resultado da análise anteriorpode ser utilizado em conjunção comos conceitos da mecânica clássicapara derivar um outro operador funda-mental em mecânica quântica, o ope-rador energia total ( ).

A energia total clássica pode serescrita como a soma da energiacinética (K) e potencial (V).

E = K + V (13)

A Equação (13) pode ser escrita emfunção do momento p como

(14)

Modelos teóricos

A necessidade deintroduzir conceitos

ondulatórios na descriçãodo comportamento departículas microscópicas

levou a uma reformulaçãoda mecânica de Newton.Surge assim o conceito de

onda de matéria (oufunção de onda)

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A soma K + V representa a energiatotal da partícula de massa m semovendo com velocidade v sob a açãode forças definidas pelo potencial V(F = -dV/dx). Associando o formalismoclássico (Equação 14) com o conceitode operadores da mecânica quântica(Equações 7 e 12) temos:

(15)

Utilizando (15), a Equação (14)pode ser escrita como:

(16)

Utilizamos o símbolo para repre-sentar o operador energia total do sis-tema (ao invés de Ê); este é chamadoo operador Hamiltoniano (ou operadorenergia total) do sistema. Assim,

(17)

Na Equação (17),

operador

energia cinética(18)

≡ operador energiapotencial (19)

(20)

Utilizando o postulado fundamen-tal da mecânica quântica (Equação 7)e a Equação (17) podemos escrever:

Ψ = EΨ (21)

A Equação (21) corresponde àEquação de Schrödinger independen-te do tempo. Esta é uma equação fun-damental em mecânica quântica.

A equação de Schrödinger, escritana forma (21), corresponde a um pro-blema de ‘autovalor’ e ‘autovetor’,sendo a energia total (E) o autovalor ea função de onda (Ψ) o autovetor. Deacordo com o postulado fundamentalda mecânica quântica (Equação 7), afunção de onda associada à partículacontém todas as informações neces-sárias para a determinação de suaspropriedades observáveis. O valor deE e a forma de Ψ dependem do ope-rador Hamiltoniano ( ), o qual possuicontribuições da energia cinética ( ) e

potencial ( ) da partícula. O operador possui sempre a mesma forma des-

crita na Equação (18), sendo m amassa da partícula. Portanto, o que di-ferencia a aplicação da equação deSchrödinger para diferentes sistemase processos em física e química é afunção potencial ( ). Em analogia coma mecânica clássica, pode ser dito queo comportamento de uma partícula édeterminado pelo campo de forças noqual ela se move.

As formas do operador paraalguns processos simples são apre-sentadas na Tabela 3 para partículasmovendo-se em uma dimensão. Em3a, é apresentado o exemplo maissimples da aplicação da equação deSchrödinger para uma partícula mo-vendo-se livre da ação de forças ex-ternas. Nesta situação, = 0 emqualquer posição x, sendo a energiatotal (E) puramente cinética. No exem-plo (b), a partícula move-se livremente;entretanto, a funçãopotencial possuivalores distintos emdiferentes regiõesde x. Nas regiões x< 0 e x > a, = 0 eo potencial possuium valor constanteigual a V0 na região 0 < x < a. Nestasituação a equação de Schrödingerdeve ser resolvida nas duas regiõesdistintas, com a solução geral determi-nada em cada região definida por

condições de contorno, as quais a fun-ção de onda deve satisfazer (Ψ deveser contínua, finita e unívoca em qual-quer ponto x). No exemplo (3c) o ope-rador Hamiltoniano para descrever omovimento harmônico é apresentado.Note que a função potencial não éconstante nesta situação, sendo fun-ção da coordenada x. O estudo do os-cilador harmônico é fundamental emfísica e química e constitui o princípiobásico da descrição teórica de vibra-ção de moléculas. Funções potenciaiscomo aquela representada em (3c) for-mam também a base da construçãode campos de força utilizados em estu-dos de mecânica molecular.

A Tabela 4 apresenta a forma dooperador Hamiltoniano para átomos emoléculas. Os sistemas consideradosnesta tabela envolvem um maior nú-mero de partículas movendo-se em umespaço de três dimensões, e portantosão mais complexos do que aqueles

representados na Tabela3. Antes de entrarmosem aspectos específicossobre as soluções daequação de Schrödingerpara os sistemas apre-sentados na Tabela 4, éimportante comentar so-bre a construção do ope-

rador Hamiltoniano. A energia total dosistema é o somatório de contribuiçõesdevido às energias cinética e potencial;logo, o operador Hamiltoniano deve serconstituído de operadores associados

Modelos teóricos

Tabela 3: Exemplos do operador Hamiltoniano para o movimento de uma partícula demassa m em diferentes campos de força definidos pela função (operador) potencial V.

Operador

(a) Partículalivre

(b) Barreirade potencial

(c) Osciladorharmônico

O estudo do osciladorharmônico é fundamental

em física e química econstitui o princípio básico

da descrição teórica devibração de moléculas

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Cadernos Temáticos de Química Nova na Escola N° 4 – Maio 2001

a todas as formas de energias cinéticae potencial do sistema. Para átomosde um elétron, a função potencial érepresentada somente pelo potencialde interação elétron-núcleo (Ven) . Emátomos de muitos elétrons, a funçãopotencial contém termos devido àatração elétron-núcleo (Ven) e repulsãoelétron-elétron (Vee). Em moléculas,considerando os núcleos fixos nasposições de equilíbrio, o operador querepresenta a energia potencial écomposto de termos que descrevema atração elétron-núcleo (Ven), repulsãoelétron-elétron (Vee) e repulsão núcleo-núcleo (Vnn). O operador energia ciné-tica descrito pela Equação (18) emuma dimensão é substituído pelo ope-rador correspondente em três dimen-sões (∇2) denominado operador Lapla-ciano.

(22)

Em todos os termos do operador aparecem somatórios (Σ) indicando acontribuição de cada partícula individual.

Para sistemas que não estão sobação de forças externas que sofram alte-rações em função do tempo, a energiapotencial (V) dependerá apenas dascoordenadas das partículas. Neste casoestaremos considerando a equação deSchrödinger independente do tempo,Equação (21). Uma grande parte dosproblemas de interesse para a químicapodem ser formulados em termos de

potenciais independentes do tempo.Portanto estamos interessados nasautofunções (Ψ) e autovalores (E) dooperador Hamiltoniano, , independentedo tempo. Chamaremos daqui pordiante a Equação (21) simplesmente deequação de Schrödinger.

A Equação de Schrödinger pode serresolvida exatamente apenas para áto-mos contendo um elétron, como porexemplo o átomo de hidrogênio. Nestecaso a função energia potencial possuiuma forma simples dependendo ape-nas da distância entre o próton e oelétron (V(r) = -e2/r). Para o caso de áto-mos multieletrônicos e moléculas temosde utilizar métodos matemáticos apro-ximados para a resolução da equaçãode Schrödinger, pois a complexidade dafunção energia potencial para a intera-ção de repulsão entre os elétrons impe-de a separação das variáveis na equa-ção de Schrödinger. Neste caso utiliza-mos métodos numéricos com o auxíliode computadores. Para o caso doátomo de hidrogênio, obtemos expres-sões analíticas (fórmulas matemáticas)para a função de onda e energia, cujosdetalhes serão omitidos aqui. Osnúmeros quânticos principal (n), secun-dário (l) e magnético (ml) surgem natu-ralmente durante o processo algébricode solução da equação de Schrödingerpara o átomo de hidrogênio. A energiatotal pode ser escrita como E = -13.6/n2

eV (n = 1, 2, 3…), isto é, a energia équantizada variando com o númeroquântico principal n. Temos então os

Modelos teóricos

níveis energéticos permitidos para oelétron no interior do átomo. A quanti-zação da energia não é um postuladona teoria de Schrödinger. Esta surgenaturalmente de requisitos matemáticospara que a equação tenha soluçõesaceitáveis (funções de onda ‘bem com-portadas’). Quando um elétron ocupaum desses níveis sua energia total éconstante, e ele não emite e nem absor-ve energia. Estes são chamados esta-dos estacionários. A função de onda pa-ra o átomo de hidrogênio depende detrês números quânticos (n, l e ml). Porsimplicidade inserimos estes rótulos nafunção de onda, Ψn,l,ml. Podemos entãoescrever a equação de Schrödinger parao átomo de hidrogênio na forma abaixo

Ψn,l,ml (x, y, z) = EnΨn,l,ml (z, y, z) (23)

As funções de onda Ψn,l,ml sãotambém chamadas orbitais atômicos,e os designamos por símbolos emfunção do valor do número quânticosecundário l: l = 0, orbital s; l = 1, or-bital p; l = 2, orbital d etc. Os orbitaisatômicos são na realidade as funçõesde onda que são soluções da equaçãode Schrödinger, Ψ1s, Ψ2s, Ψ2p, Ψ3s, …etc. Podemos ver que cada nívelenergético n pode ter várias funçõesde onda associadas, dependendo dosvalores dos números quânticos l e ml.A este fenômeno chamamos ‘degene-rescência’. Quando a degenerescên-cia é removida, temos energias distin-tas para os vários subníveis atômicos.Concluindo: quando resolvemos aequação de Schrödinger para o átomode hidrogênio, obtemos as energiaspara os níveis energéticos (En) e osorbitais atômicos (Ψn,l,ml). Temos entãoum diagrama de níveis energéticos nointerior do átomo, isto é, dizemos queum átomo se constitui de um sistemaenergético quantizado (somente al-guns valores de energia são possíveis),como mostrado na Figura 5. À medidaque n aumenta os níveis se aproximam,tendendo para um contínuo de ener-gia. Pelo diagrama energético repre-sentado na Figura 5, obtido da resolu-ção da equação de Schrödinger, temosuma compreensão clara das transiçõeseletrônicas que originam o espectroatômico de linhas do átomo de hi-drogênio (Figura 2).

Para o caso de átomos multiele-

Tabela 4: Exemplos do operador Hamiltoniano para átomos e moléculas. Na Equação (a) amassa do elétron, m, foi utilizada em substituição à massa reduzida.

Operador

(a) Átomosde um elétron

(b) Átomosde muitos elétrons

(c) Moléculas

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Cadernos Temáticos de Química Nova na Escola N° 4 – Maio 2001Modelos teóricos

Para saber maisATKINS, P.W. Físico-química, 6 ed. Rio

de Janeiro: Editora LTC, v. 2, 1999.BORN, M. Física atômica, 4 ed.

Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.EISBERG, R. e RESNICK, R. Física

quântica, átomos, moléculas, sólidos,núcleos e partículas 6 ed. Rio de Janeiro:Editora Campus, 1988.

FOCK, V.A. Princípios de mecânicaquântica. Moscou: Editora MIR, 1986.

LOPES, J.L. A Estrutura quântica damatéria, do átomo pré-Socrático às partí-culas elementares, 2 ed. Rio de Janeiro:Editora UFRJ, 1993.

TEIXEIRA DIAS, J.J.C. Química quân-tica, fundamentos e métodos. Lisboa:Fundação Calouste Gulbenkian.

trônicos e moléculas, a resolução daequação de Schrödinger utilizando mé-todos aproximados nos leva à obtençãode níveis de energia atômicos e molecu-lares e à determinação de configuraçõeseletrônicas. Para moléculas, a função deonda obtida como solução da equaçãode Schrödinger repre-senta os orbitais mole-culares, os quais permi-tem uma descrição deligações químicas emtermos de combina-ções de orbitais atô-micos.

É importante men-cionar que na Equação(23) a função de ondadepende também dascoordenadas de spin,sendo o estado eletrônico do sistemacaracterizado pelos números quânticosespaciais (n, l e ml) e pelo número quân-tico de spin (ms). A função de onda deve,portanto, ser representada com osímbolo Ψn,l,ml,ms.

Esforços têm sido continuamenteempreendidos na busca de soluçõesaproximadas da equação de Schrödin-ger para sistemas de muitos elétrons(átomos e moléculas) com acuracidadesatisfatória. O procedimento utilizado pa-ra a resolução da Equação (23) para umsistema contendo muitos elétronsconsiste em escrever a função de ondatotal do sistema para um dado nívelenergético, digamos o nível fundamen-tal (de mais baixa energia), como umproduto de funções dependendo dascoordenadas de somente um elétron,além de representar a energia potencialde interação como uma soma de ter-mos.

Neste procedimento supomos queos elétrons estão sob a ação de um

campo potencial efetivo devido aosnúcleos e aos outros elétrons(V = Vefetivo). Na resolução da equaçãode Schrödinger utilizamos um procedi-mento interativo, onde uma função deonda inicial dita ‘tentativa’ é fornecida,com a qual obtemos o potencial de

interação para os elé-trons, o qual é utilizadona resolução da equa-ção de Schrödinger,obtendo assim novasfunções de onda eenergias orbitais. Oprocedimento é repe-tido até que a auto-consistência seja atin-gida (não haja maisvariações nas funçõesde onda). Este méto-

do é conhecido como método deHartree-Fock do campo autoconsistente(HF-SCF). Várias sofisticações podemser incorporadas no método de Hartree-Fock para melhorar a qualidade dasfunções de onda e energias. Estesmétodos são denominados Pós-Hartree-Fock. Conhecida a função deonda total Ψ, várias propriedades podemser calculadas e posteriormente compa-radas com valores obtidos experimen-talmente.

Existe uma variedade de métodosteóricos para a resolução da Equaçãode Schrödinger tendo como base fun-damental o procedimento de Hartree-Fock para encontrar funções de ondasaproximadas. O método de Hartree-Fock é variacional, o que implica que aenergia total obtida é sempre um limitesuperior para a energia do sistema, istoé, está sempre acima (ou no máximoigual) a energia exata ou experimental.Os métodos podem ser classificadosem duas classes: ab initio e semiem-píricos. Nos métodos ab initio nenhumparâmetro experimental é utilizado, eque todas as integrais presentes sãoavaliadas. Já nos métodos semiempí-ricos vários parâmetros experimentaisajustáveis são utilizados, e o método temum custo computacional muito maisbaixo do que os métodos ab initio. Oleitor pode consultar a literatura dispo-nível para maiores detalhes sobre mé-todos quânticos.

Para o caso de moléculas, resolve-mos a equação de Schrödinger para os

elétrons separada dos núcleos, e a ener-gia molecular total é uma soma das con-tribuições eletrônicas e nucleares. Esteprocedimento baseia-se na aproxi-mação de Born-Oppenheimer, a qualconsiste em descorrelacionar os movi-mentos de núcleos e elétrons. Nesta si-tuação, a equação de Schrödinger podeser separada em duas equações quedescrevem os movimentos de núcleose elétrons. A matemática utilizada naresolução da equação de Schrödingeré complexa, envolvendo conhecimentosdas áreas de cálculo diferencial e inte-gral e álgebra matricial. Estes aspectosnão foram considerados no presenteartigo, podendo o leitor interessado re-correr à literatura específica fornecida.

Finalizando, é importante reforçarque a mecânica quântica é atualmentea teoria aceita e válida para descreverfenômenos relacionados à estrutura damatéria. Entretanto, devido à complexi-dade do formalismo matemático, torna-se necessária a utilização de apro-ximações teóricas. Neste contexto, abusca de novos métodos matemáticospara resolução da equação de Schrö-dinger tem sido um grande desafio paraos cientistas, objetivando aplicar a teoriaquântica para sistemas de interesse emfísica e química com a exatidão deseja-da.

Wagner B. de Almeida ([email protected]),doutor em química pela Universidade de Manchester,é professor adjunto no Departamento de Química daUniversidade Federal de Minas Gerais. Hélio F. dosSantos ([email protected]), doutor em química, éprofessor do Departamento de Química da Univer-sidade Federal de Juiz de Fora.

Figura 5: Diagrama de energia para o áto-mo de hidrogênio.

A mecânica quântica éatualmente a teoria aceita

e válida para descreverfenômenos relacionados à

estrutura da matéria.Entretanto, devido à

complexidade doformalismo matemático,

torna-se necessária autilização de aproximações

teóricas