Modernização dos Portos, Carlos Tavares

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Carlos Tavares de Oliveira Jornalista e Assessor de Comrcio Exterior da Confederao Nacional do Comrcio

Edio Atualizada at 2011

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MODERNIZAO DOS

PortosSo Paulo 2011

Copyright 2011 Editora: Yone Silva Pontes Assistente editorial: Ana Lcia Grillo Diagramao: Nilza Ohe e Wagner J. N. Pereira Ilustrao de capa: Carlos Alberto da Silva Reviso: Alessandra Alves Denani Impresso e acabamento: Graphic Express

Dados

Internacionais de Catalogao na Publicao (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)Oliveira, Carlos Tavares de Modernizao dos portos / Carlos Tavares de Oliveira. -- 5. ed. -- So Paulo : Aduaneiras, 2011. Bibliografia. ISBN 978-85-7129-592-6 1. Brasil - Comrcio exterior 2. Portos Brasil I. Ttulo.

(CIP)

11-07535

CDD-387.10981 ndices para catlogo sistemtico: 1. Brasil : Portos : Modernizao 387.10981 2. Brasil : Questo porturia 387.10981 3. Brasil : Reforma porturia 387.10981

A ortograa desta obra est atualizada conforme o Acordo Ortogrco aprovado em 1990, promulgado pelo Decreto n 6.583, de 30/09/2008, vigente a partir de 01/01/2009.

2011Proibida a reproduo total ou parcial. Os infratores sero processados na forma da lei.

EDIES ADUANEIRAS LTDA.SO PAULO-SP 01301-000 Rua da Consolao, 77 Tel.: 11 2126 9000 Fax: 11 2126 9010 http://www.aduaneiras.com.br e-mail: [email protected]

Nota do Autor Quinta Edio

O crescente interesse despertado por este livro em particular no meio universitrio , esgotando as quatro edies anteriores, estimulou-me a publicar mais esta, com dados atualizados sobre a palpitante questo porturia. Como a histria registra, desde o descobrimento, os portos passaram a ter fundamental importncia para o Brasil e o seu desenvolvimento, decorrente do relacionamento cultural e comercial, desde as caravelas, com as outras naes. Nos novos Captulos (Parte VIII) so enfatizados os problemas dos gargalos, as reivindicaes dos usurios, exportadores e importadores, os donos da carga, reais mantenedores dos portos, bem como a prpria razo deles existirem. No entanto, desunidos e sem liderana, os usurios no conseguem impor o seu objetivo bsico, de maior produtividade nos servios, com menor custo. Ainda no obtiveram a extino das absurdas licitaes financeiras para arrendamento de reas porturias, nem a incluso das Federaes da Agricultura, do Comrcio e da Indstria no Bloco dos Usurios dos Conselhos de Autoridade Porturia. Entre outros temas, os Captulos acrescentados focalizam tambm a Frota Mercante Mundial; a permanente expanso de Roterd, modelo universal de administrao pblica, assim como com o devido destaque as medidas de melhoria que poderiam ser adotadas pela presidenta Dilma Rousseff. Inclusive as constantes da Proposta Empresarial, apresentada pela Comisso Portos, das entidades do setor. Por ltimo, quero registrar o meu profundo pesar pelo recente falecimento da minha querida esposa Lia, que, sempre me estimulando, participou das visitas aos portos estrangeiros aqui citados.

Prefcio

O jornalista Carlos Tavares um dos raros profissionais da imprensa que sempre tratou a conjuntura porturia brasileira com competncia analtica e pesquisa aprofundada. Seu livro Modernizao dos Portos, que chega a quinta edio, j traz no ttulo a questo que sempre preocupou o setor: a modernizao operacional e a legislao porturia no Brasil. A modernizao, que o autor vislumbrava desde o incio dos anos 90 e fez dele um militante apaixonado da causa, tem sido o objeto central da sua pauta de estudo. Essa dedicao se expressa neste livro. O escritor destaca pontos fundamentais para o processo de modernizao dos portos, como a dragagem, a importncia da utilizao dos contineres, a nova realidade das relaes de trabalho como a introduo de maquinrio de alta tecnologia na operao, a luta contra a burocracia alfandegria e a competitividade em relao aos grandes mercados internacionais. Estes so alguns dos temas que recheiam sete Captulos, numa sequncia que facilita a leitura at mesmo dos iniciados no assunto. Estou muito vontade para prefaciar o livro de Carlos Tavares porque, pelas idas e vindas das mars da vida, tive a honra de estruturar e ser o primeiro Ministro da Secretaria dos Portos, criada em 2007, pelo presidente Lula. A SEP , em sntese, a expresso governamental dos anseios do sistema porturio brasileiro e que o autor, de uma forma ou de outra, apontava h anos nas pginas do seu livro. A Secretaria dos Portos, na minha avaliao, chegou para ocupar o vazio institucional que tanto o poder pblico, a iniciativa privada e os trabalhadores ansiavam no sentido de ampliar os ho-

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rizontes da rea. Muitas das questes levantadas na obra, dou, como exemplo, a dragagem dos portos, foram enfrentadas de frente. O Brasil tem hoje os seus principais portos pblicos com a dragagem concluda ou em fase final. Fato impensvel h quatro anos. Mais do que atacar pontos estruturais, a dimenso que a economia gerada pelos portos alcanou neste perodo foi enfocar os portos como parte imprescindvel da cadeia logstica brasileira, instrumento prioritrio para o desenvolvimento do Pas. O livro Modernizao dos Portos tem lastro suficiente para conduzir o leitor a conhecer o histrico porturio, fazer comparaes, checar nmeros e d uma contribuio importante para o entendimento da nova fase que o setor passa no momento. Pedro Brito Diretor da Antaq e ex-Ministro dos Portos

Sumrio

Nota do Autor Quinta Edio ............................................. Prefcio .................................................................................... Parte I Debate da Questo Porturia 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. Carta ao Presidente Itamar.............................................. Opinies sobre a Questo Porturia ............................... Porto de Suape ................................................................ Contineres, o Futuro dos Portos.................................... Investimentos Base da Reforma .................................. Professor Gudin Tinha Razo ......................................... Competio, a Mola dos Portos ...................................... Terminais Privativos ....................................................... Cidades-Portos................................................................ Terminais e a Privatizao .............................................. Implantao da Lei dos Portos ....................................... Terminais Privativos e as ZPE ........................................ Efetiva-se a Privatizao ................................................ A Salutar Competio dos Portos ................................... A Lei Pegou .................................................................... Luta pela Modernizao ................................................. Desafio da Lei................................................................. Privatizao do Porto de Rio Grande .............................

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Parte II Difcil Implantao da Lei 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. Proposta de FHC............................................................. Santos e o Governo Covas.............................................. Dois Anos da Lei ............................................................ A Propsito da Greve...................................................... Fim das Greves ............................................................... Debate da Reforma ......................................................... Concorrncia................................................................... Vitria Lidera.................................................................. Deslancha a Reforma ...................................................... A Quem Interessa a Privatizao do Porto? ................... Recuperao de Santos ................................................... Sndrome do meu Caso................................................... Porto de Vitria na Rota da Privatizao ........................ Parte III Os Grandes Portos 1. 2. Sistema Porturio Mundial ............................................. Roterd ........................................................................... 2.1. EUA Redescobrem a Holanda................................ 2.2. Exemplo para Santos.............................................. 2.3. Qual o Melhor Porto do Mundo? ........................... 2.4. Regulamentao do Porto ...................................... Hong Kong ..................................................................... 3.1. Porto Modelo.......................................................... Cingapura ....................................................................... 4.1. Prspera Nao-Porto ............................................ 4.2. Privatizao do Porto ............................................. 4.3. Segundo do Mundo ................................................ Estrutura Porturia dos EUA .......................................... 5.1. Porto de Nova York ................................................ China............................................................................... 6.1. Canto, a Grande Cidade-Porto ............................. 6.2. Privatizao dos Portos .......................................... Eficientes Portos Alemes .............................................. 87 89 89 92 94 96 105 105 110 110 113 116 119 125 127 127 130 132 59 61 63 65 67 70 72 74 76 78 80 82 84

3. 4.

5. 6.

7.

Sumrio

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8. 9.

Reforma Francesa ........................................................... Batalha na Europa........................................................... Parte IV Marinha Mercante

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1. 2. 3. 4. 5. 6. 7.

Hidrovias e Cabotagem .................................................. Portos, Indstria Naval e Marinha Mercante .................. Recuperao da Cabotagem ........................................... Descaso ........................................................................... Mercosul Estimula .......................................................... Novos Rumos ................................................................. Reforma Necessria ........................................................ Parte V Sepetiba e a Era dos Terminais

141 143 145 148 150 152 154

1. 2. 3. 4. 5. 6. 1. 2. 3. 4.

Superporto ...................................................................... Sepetiba e a Lei .............................................................. Invivel sem a Lei .......................................................... Estadualizao ................................................................ Rumo Certo .................................................................... Projeto de Porto-Modelo ................................................ Terminais Privativos Modelo Internacional...................................................... Inviabilizao dos Terminais .......................................... Decreto Contraria Lei ..................................................... Contineres ..................................................................... Parte VI Resenha Mundial

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1. 2. 3. 4. 5. 6. 7.

Afinal, Luz no Tnel ...................................................... Ameaa Nova Carta Rgia........................................... Entrave Exportao ...................................................... A Importncia do Rio Sena............................................. Exportao, Transportes e Poltica ................................. Roterd/2000 .................................................................. O Rei dos Portos .............................................................

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Parte VII Novos Artigos 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. Havre O Estratgico Porto Francs ............................. Poltica Porturia ............................................................ Os Novos Lderes ........................................................... Reforma Possvel ............................................................ Xangai, o Maior Porto .................................................... Estados Unidos: Balana e Portos .................................. Privatizao Incompleta ................................................. A Frota Mundial ............................................................. Gesto, Dragagem e Licitao ........................................ Parte VIII Enfoque Atual 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. Sugesto aos Candidatos ................................................ Abertura e a Independncia ............................................ Frana: Transporte Fluvial.............................................. Hidrovia Europeia .......................................................... CAPs e os Usurios ........................................................ Reivindicaes Atuais .................................................... Hong Kong ..................................................................... Gargalos .......................................................................... Expanso da Frota .......................................................... Roberto Marinho ............................................................ Marinha Mercante .......................................................... Problemas e Solues ..................................................... Gesto Modelo................................................................ Usurios Devem se Associar .......................................... Crdito para Dilma ......................................................... Roterd em Expanso ..................................................... Falhas da Estrutura ......................................................... Proposta Empresarial ...................................................... 231 235 238 241 244 248 252 255 259 263 267 271 274 278 282 285 289 292 199 201 205 208 211 214 219 222 226

Apndice................................................................................... 297 ndice Remissivo...................................................................... 323

PARTE I

Debate da Questo Porturia

1.

Carta ao Presidente Itamar

No prximo dia 19/11/92 ter V. Exa. oportunidade nica de reunir-se com os exportadores brasileiros por ocasio do XII Encontro Nacional de Comrcio Exterior Enaex, a realizar-se no Hotel Glria, no Rio de Janeiro. Poder, assim, minorar a falta de seu companheiro de chapa, o presidente Collor, que deixou frustrados os empresrios desse crucial setor econmico ao no comparecer aos Enaex anteriores, de 1990 e 1991. Na realidade, Senhor Presidente, ressalvado o isolado e infrutfero esforo do ministro Marclio nos ltimos meses, a exportao tem sido marginalizada, sem que o governo lhe oferecesse a necessria e merecida ateno para o seu desenvolvimento. Jamais foi cumprida a promessa do programa Diretrizes e Bases de estimular o aumento efetivo das nossas vendas externas. At hoje esto os exportadores esperando a execuo da bela projeo ento anunciada: O comrcio exterior contar com regras estveis nas reas da poltica cambial, poltica tributria e poltica de financiamento, as quais devero estar em linha com as regras e padres internacionais vigentes. Efetivamente, desses trs suportes bsicos, apenas a parte cambial foi encaminhada, com a taxa administrada de forma razovel pelo Banco Central. Nos outros dois, o eterno impasse permanece insolvel: continua pesada a carga fiscal e no h verba para os financiamentos das vendas para o exterior. No temrio do XII Enaex esto delineados os principais problemas que afetam os exportadores, de resto quase idnticos aos existentes h 20 anos, quando da realizao do I Encontro. Assim,

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dada nociva persistncia dos antigos entraves s exportaes, no foi difcil para os dirigentes da Associao de Comrcio Exterior do Brasil AEB, organizar o programa do conclave. Como das vezes anteriores, estaro novamente em discusso os trs temas fundamentais: a carga tributria e seus efeitos sobre a competitividade das exportaes; financiamento e seguro de crdito exportao; e, a modernizao dos portos brasileiros. Alm desses, estaro em debate tambm o Mercosul; a promoo comercial no exterior, o novo cdigo de propriedade industrial e o sistema administrativo de comrcio exterior Siscomex. A mais antiga e a de maior relevncia entre as solicitaes dos exportadores , sem dvida, a reforma porturia. Recente pesquisa da Price Waterhouse apurou que, estrapolando mesmo os limites do setor, tornou-se a modernizao dos portos a principal reivindicao do empresariado nacional, com 93,5% das respostas. Como sabe V. Exa., dois anacrnicos monoplios estrangulam e encarecem os servios porturios. O primeiro, estatal, exercido pelas Cias. Docas, detm a exclusividade da movimentao e armazenagem da carga no cais. O outro, sindical, compreende as operaes de carga e descarga dos navios. H 20 meses em trmite no Congresso, o projeto da reforma porturia encontra-se agora em exame final no Senado. O substitutivo em discusso, do deputado Jos Carlos Aleluia, foi fruto de oportuno consenso conseguido entre as lideranas partidrias da Cmara, com o apoio dos empresrios e trabalhadores, que, claro, tiveram de fazer concesses. V. Exa., com o hbil e oportuno entendimento que mantm com o Congresso, dispe de condies mpares de oferecer aos exportadores e prpria Nao a aprovao dessa esperada reforma, marcando de forma indelvel a sua passagem pelo governo. Senhor presidente, ainda perplexos com os lamentveis acontecimentos que provocaram o impeachment, os brasileiros acompanham de perto a sua louvvel preocupao com a questo social, a pobreza, os baixos salrios e o crescente desemprego, tudo em decorrncia da avassaladora crise econmica. Muitos outros pases passaram por situaes semelhantes e reencontraram o caminho

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do desenvolvimento e da prosperidade atravs da opo pelo mercado externo. Na sia onde se registram os melhores ndices de expanso econmica aps o incontestvel xito dos tigres (Coria, Taiwan, Cingapura e Hong Kong), tambm a Malsia, Tailndia e Indonsia esto se valendo da exportao para sair da misria e do subdesenvolvimento. Porm, o melhor exemplo vem mesmo da Repblica Popular da China que, na trilha da abertura para o exterior, conquista espetaculares resultados na rea econmica. Nestes 12 anos da revolucionria reforma decretada por Deng Xiaoping, a RPC detm os recordes mundiais de crescimento econmico (mdia anual de 9%), das exportaes (mdia de 15%) e da recepo de capital externo (cerca de US$ 120 bilhes). Em 1980, enquanto as exportaes brasileiras somavam US$ 20 bilhes, as da China alcanavam apenas US$ 18 bilhes. No entanto, j em 1991, as vendas chinesas subiram vertiginosamente para US$ 72 bilhes e as brasileiras limitaram-se a menos da metade, US$ 31 bilhes. Como imediata conseqncia dessa ampla abertura para o mercado externo, melhorou consideravelmente o ndice de emprego e o nvel de vida do povo chins. O Enaex, no momento atual, de suma importncia para o Pas, uma vez que os empresrios ali reunidos podero apresentar as solues adequadas para a rpida recuperao da economia nacional. A presena de V. Exa. importante no s para ouvir o setor mas, principalmente, para estimular essa atividade que, apesar das dificuldades, continua a trabalhar a pleno vapor, criando empregos e atenuando a crise econmica. Nov./92 2. Opinies sobre a Questo Porturia

Graas intensa campanha promovida pela imprensa nos ltimos tempos, o grave problema porturio brasileiro passou a ser do conhecimento geral da sociedade. Trs ou quatro anos atrs, afora pequeno grupo de especialistas e empresrios ligados ao comrcio exterior, poucas pessoas avaliavam a importncia dos portos no comportamento global da economia do Pas. Atualmente, com a di-

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fuso do relevante assunto atravs desse amplo debate nacional, os principais blocos da sociedade, inclusive na rea universitria, esto cientes da necessidade urgente de modernizar os portos para que a economia possa se desenvolver no ritmo desejado. Elogiando essa campanha, em discurso na Cmara, o deputado Paes Landim declarou: H anos o jornal O Globo vem insistindo na necessidade de se alterar o modelo estatizante e monopolista dos portos brasileiros que tem sido responsvel por deficincias de alavancagem do comrcio exterior e, sobretudo, ocasionando prejuzos da ordem de bilhes de dlares em nossa economia. De outros segmentos da vida nacional tem surgido novos esclarecimentos opinio pblica, robustecendo a tese de que somente a iniciativa particular desfruta condies financeiras para melhorar o sistema porturio, mas, para isso, torna-se indispensvel a integral transferncia do controle dos respectivos servios para o setor privado. Recentemente, ao comentar o empenho de retirar o Estado das atividades econmicas, o ministro Marclio Marques Moreira afirmou que o projeto de modernizao dos portos o primeiro dos prximos passos a serem dados. J o ministro da Agricultura, Antonio Cabrera, depois de analisar as dificuldades nos Portos de Paranagu e Rio Grande, para embarcar a atual colheita de gros, assinalou que no adianta produzir no prximo ano 80 milhes de toneladas, porque a safra no tem como ser escoada. Revoltado com a demora da implantao da reforma porturia, declarou que se os trabalhadores da orla martima tentarem impedir a aprovao do projeto de lei levar ao Congresso nmero dez vezes maior de agricultores com os seus tratores. Da parte empresarial so originrias as mais veementes reclamaes contra o precrio sistema porturio e a sua arcaica regulamentao. Um dos mais ardorosos defensores da reforma, o presidente da Associao das Siderrgicas Privadas, Jorge Gerdau Johannpeter, logo aps a aprovao do projeto substitutivo na Cmara, declarou: O importante que agora vai haver concorrncia com a existncia de um instrumental de estmulo negociao entre o capital e o trabalho. J o presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Navegao Martima, Srgio Salomo, sublinhou: O que ns queremos o elementar direito de contratar

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os nossos prprios empregados, sem ter de nos submeter aos sindicatos dos trabalhadores avulsos. O dirigente da Associao Brasileira de Terminais Privativos, Wilen Manteli, embora fazendo restries ao substitutivo do deputado Jos Carlos Aleluia, ressaltou: Empresrios e trabalhadores no tiveram suas reivindicaes plenamente atendidas, mas esse projeto trar grande melhoria para os portos. Para Meton Soares Jr., presidente da Federao Nacional das Empresas de Navegao Martima, as mudanas so um incentivo s exportaes e o entendimento terminou por atender a todos. Aps a aprovao unnime do projeto na Cmara, o vice-lder do PT, deputado Alosio Mercadante, enfatizou: Agora todos tero de correr risco. No h mais caminho de volta. Porm, o tratamento dado pelo Senado decepcionou bastante, colocando a to esperada reforma em risco de ser mais uma vez adiada, caso aprovadas as emendas do senador Mansueto de Lavor (PMDB/PE), as quais at oficializam a anacrnica situao dos portos. As propostas de Lavor so absurdas. Evitam que seja estabelecida a competio entre os portos, alm de manter e ampliar o monoplio dos trabalhadores avulsos. Ele apenas atendeu a uma das partes, no ouvindo nem o governo nem os empresrios. Essa, em sntese, foi a apreciao do diretor-executivo da Ao Empresarial Integrada (que rene mais de 50 entidades de classe de todo o Pas), Marco Polo de Mello Lopes, sobre o substitutivo do senador pernambucano. Enquanto isso, na Argentina foram privatizados os servios porturios sem maiores problemas com os trabalhadores do cais e a situao de euforia. Em Decreto do presidente Menem, ficaram assegurados a liberdade de contratao, o ingresso de outros prestadores de servios, bem como a livre fixao de preos e tarifas. Segundo o Ministro da Economia, Domingo Cavallo, a nova regulamentao vai privilegiar a livre-concorrncia e a desmobilizao das atividades porturias. Acusando o imediato reflexo positivo das salutares medidas, em visita a So Paulo, o dirigente da Unio Industrial Argentina, Claudio Sebastiani, informou que a reduo dos custos porturios j comeava a favorecer as exportaes. Ago./92

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Outras Opinies A campanha pela modernizao dos portos cresceu de tal forma que se tornou tema bsico para qualquer programa de reativao da economia brasileira. Praticamente todos os principais segmentos de sociedade em particular empresrios, trabalhadores, polticos, tcnicos e autoridades envolveram-se na importante questo, trazendo novos enfoques e contribuies para o seu equacionamento. Iniciando outra rodada de opinies sobre o assunto, externadas em entrevistas, artigos e conferncias, deve ser registrado o ponto de vista do presidente da Comisso de Assuntos Econmicos (CAE) do Senado, Raimundo Lira: Sem que os portos funcionem com custos razoveis de administrao, a abertura do Pas para o mercado mundial estar irremediavelmente comprometida. Em entrevista durante o XII Encontro Nacional de Comrcio Exterior Enaex, o ministro Fernando Henrique Cardoso afirmou: Sou favorvel ao projeto de consenso partidrio elaborado na Cmara e penso que no haver problema para sua aprovao no plenrio do Senado. Sobre as alteraes processadas nas Comisses Tcnicas do Senado, declarou o presidente da Fiesp, Carlos Eduardo Moreira Ferreira, que essas emendas descaracterizam a proposta inicial do projeto de desregulamentao do sistema porturio e por isso precisam ser suprimidas. No Recife, o exportador Luis Felipe Brennand, do Movimento Empresarial Pr-Pernambuco Meppe, disse que, caso aprovadas as emendas do senador Mansueto de Lavor, estar sendo criado um Frankenstein na poltica porturia brasileira. Tecendo severas crticas emenda do senador Mrio Covas, que estende a estabilidade e as respectivas indenizaes aos trabalhadores porturios (das Docas), o professor da Universidade de So Paulo, Octvio Bueno Magano, escreveu: de se esperar, por isso, que no plenrio do Senado a emenda demaggica se rejeite no apenas pelos seus perversos efeitos econmicos, mas tambm pela manifesta inconstitucionalidade de que se ressente. Enquanto que o governador do Cear, Ciro Gomes, em artigo assinado, sublinhou: Nossos portos impedem hoje o sonho de competitividade dos produtos brasileiros pela ao do corporativismo sindical e pela ineficincia gerencial.

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Ao comentar a incluso de emendas ao substitutivo de consenso partidrio do deputado Jos Carlos Aleluia, o coordenador da Ao Empresarial Integrada AEI, Marco Polo de Mello Lopes, advertiu: O acordo no o ideal mas factvel. Qualquer alterao efetuada no Senado poder comprometer o projeto. Focalizando importante aspecto da questo, Dlio Urpia de Seixas, da Associao de Comrcio Exterior do Brasil AEB, esclareceu que a participao dos custos porturios no valor CIF das nossas exportaes atingiu ndice de 6%, considerado o mais elevado do mundo. Para o prprio presidente da AEB, ex-ministro Pratini de Morais, os custos porturios no Brasil hoje representam a perda de bilhes de dlares nas exportaes e de centenas de milhares de empregos. Reportando-se apreciao do projeto da reforma porturia pelo Senado, ressaltou o Ministro dos Transportes, Alberto Goldman, que a orientao do PMDB sobre o assunto, conforme votao havida na Cmara e deciso de suas lideranas, no sentido de respeitar o mesmo texto aprovado na Cmara dos Deputados. Porm, liderando no Congresso a resistncia reforma, dois parlamentares paulistas vm se destacando com posies contrrias macia opinio do setor privado. Para o senador Mrio Covas, o projeto de consenso da Cmara vai tirar o monoplio dos sindicatos e entreg-lo aos empresrios. Na mesma linha, defendendo ardorosamente o monoplio dos avulsos, em mensagem aos senadores, assinalou o deputado Gastone Righi que para a existncia desta categoria e sobrevivncia destes trabalhadores indispensvel a exclusividade dos servios. De regresso da Alemanha e aps relatar ao presidente Itamar Franco as declaraes dos importadores de Hamburgo sobre o fato dos produtos brasileiros serem prejudicados pelos altos custos porturios, o governador de So Paulo, Luiz Antonio Fleury Filho, referindo-se a Santos, enfatizou: No podemos continuar com cinco mil pessoas prejudicando todo o Brasil. Aps o encontro dos dirigentes da AEI com o presidente Itamar, o empresrio Jorge Gerdau declarou: Ficou claro que h um posicionamento do governo em torno do acordo que permitiu a apro-

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vao do projeto na Cmara. Tambm participante da reunio, Juan Llerena, da Associao Comercial do Rio, afianou: No adianta o ajuste fiscal se os portos no forem modernizados. J o presidente do PDS e prefeito de So Paulo, Paulo Maluf, principal defensor da reforma no encontro, foi enftico ao afirmar no ser admissvel que 18 mil trabalhadores porturios impeam a gerao de 300 mil empregos. Demonstrando surpresa com a rejeio do acordo partidrio da Cmara, o presidente do PT, Luiz Incio Lula da Silva, exclamou: No entendi o que aconteceu no Senado. Jan./93 3. Porto de Suape

Enquanto no Sul os portos seguem a sua triste rotina de tumulto e pssimos servios como ocorre com o embarque de soja de Rio Grande exatamente no Nordeste surge um dignificante exemplo para o setor. Percebendo a importncia de um porto bem organizado, claro para a economia do Estado, o atual governo de Pernambuco desde a posse, em 1990, passou a considerar o complexo de Suape como prioridade bsica de sua administrao. A verdade que o governador Joaquim Cavalcanti tinha a seu dispor as malogradas experincias dos grandes portos do Sul, notadamente Santos e Rio de Janeiro, onde os dois sistemas monopolistas vigorantes o estatal das Companhias Docas nas operaes do cais e o dos sindicatos dos avulsos nos servios de bordo mostravam de forma clara como no devia proceder. Astutamente resolveu adotar o modelo dos pases desenvolvidos o europeu, em particular entregando os servios, reas de operao e armazenagem a empresas privadas, ficando apenas com a responsabilidade da infra-estrutura. Concebido na dcada de 1970 e depois abandonado, o projeto do Complexo Industrial Porturio de Suape, a 40km de Recife, foi rapidamente revigorado pelo governo do Estado. O novo porto pernambucano dispe de trs invejveis condies naturais: guas profundas junto costa, quebramar natural formado por uma linha de arrecifes e extensa rea plana disponvel para instalaes. Propiciando ainda maior proteo foi construdo um molhe em forma de L de quase 3km que formou enorme bacia de

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guas plcidas, onde se ergueram os cais de acostagem dos navios. Divide-se o porto ainda pequeno e em fase de expanso em duas partes distintas: o Terminal para Granis Lquidos e o Cais para Mltiplos Usos. O primeiro, com cerca de 100m e profundidade natural de 13m, pode atender graneleiros de at 30 mil/t. e vem sendo operado basicamente pela Petrobras. J o Cais para Mltiplos Usos, com 350m de comprimento e profundidade de 15m, pode receber navios de at 80 mil/t. Adiantando-se ao projeto da reforma porturia ora em discusso no Congresso, Suape criou uma estrutura inovadora e realmente moderna. A administrao do Porto, com reduzido nmero de funcionrios, cuida apenas da infra-estrutura (movimentao de navios, segurana, manuteno etc.), cabendo s empresas privadas todas as operaes com as cargas. O folheto informativo, distribudo s empresas do Nordeste, ao explicar o sistema aplicado, pioneiro no Brasil, assegura a participao da iniciativa privada na atividade de execuo da operao nas instalaes porturias de uso pblico, cabendo Suape a gesto, o controle e o acompanhamento do processo. No existe portanto a figura do funcionrio pblico do cais encontrada nos portos brasileiros explorados pelas estatais Cias. Docas. Por seu turno, nascido sob a gide do setor privado, o relacionamento dos armadores, exportadores e importadores com os trabalhadores avulsos (estivadores, conferentes, arrumadores etc.), para contratao dos servios de bordo, transcorre normalmente, sem maiores atritos. As atividades privadas geraram 2,7 mil empregos, prevendo-se a criao de mais 3,2 mil com os projetos em implantao. Os frutos dessa auspiciosa experincia pernambucana no se fizeram esperar, e j em 1991 os resultados apresentados por Suape chegam a ser impressionantes, levando-se em conta essa fase recessiva da economia brasileira. A movimentao de carga alcanou 1,3 milho de toneladas registrando crescimento de 15%, recorde absoluto no Brasil transportada por 223 navios (aumento de 30%). Foi significativa tambm a expanso das operaes com contineres, superando 5 mil o total processado desses cofres de carga. Em face do acordo da Associao dos Exportadores do Vale do So Francisco, Valexport, com o poderoso consrcio de armadores Joint Con-

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tainer Service integrado pelo alemo Hamburg Sud, o francs Fes, o belga CMB, o brasileiro Aliana, entre outros Suape j possui 80 sofisticadas unidades de refrigerao (clipons) que so acopladas aos contineres transportadores de frutas. Alis, o Grupo Fischer (dono da Aliana) est construindo no porto moderno terminal frigorfico especializado na armazenagem de frutas para a exportao. Confirmando a tese de que um bom porto elemento de estmulo s exportaes, o bem organizado complexo vem propiciando o crescimento das plantaes de frutas no s no Vale do So Francisco (mangas, meles, uvas, mames e limes) como na rea do cerrado do oeste da Bahia e sul do Maranho e do Piau. Feito agora pelos onerosos caminhes, o transporte desses produtos ficar mais barato quando terminar a construo da Transnordestina, que ligar essa frtil regio ao novo porto pernambucano. Evidenciando a expressiva expanso verificada, em 1991, cerca de 30% dos US$ 120 milhes de frutas frescas exportados pelo Brasil foram embarcados pelo Suape. O resultado prtico dessa eficiente estrutura de servios privatizados que os custos porturios do Suape tornaram-se os mais baixos do Pas. Segundo o diretor de operaes da Valexport, Jos Medeiros da Costa, paga-se ali pela movimentao de um continer apenas US$ 92 (a mdia internacional), enquanto que em Santos a mesma operao no sai por menos de US$ 200. Essa notvel experincia porturia pernambucana sem alarde, lobbies, nem custosas promoes vem provar no s as vantagens da privatizao das operaes como tambm que o Nordeste tem condies econmicas de, pela via do mercado externo, tornar-se independente do Sul. Por este aspecto, a situao de Suape vai melhorar bastante com a prxima instalao da Zona de Processamento de Exportaes ZPE. Maio/92 4. Contineres, o Futuro dos Portos

Sem sombra de dvida, so os excelentes portos asiticos o suporte bsico para que a regio se torne o mais promissor centro de comrcio mundial da dcada de 1990, conforme apregoam os ob-

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servadores internacionais. Por todos os grandes complexos da rea Cingapura, Hong Kong, Kobe (Japo), Kaohsiung (Taiwan) e mesmo Xangai, na China observam-se obras de ampliao, ao mesmo tempo em que as estruturas so incessantemente modernizadas. Esses cinco portos j passaram a figurar entre os dez maiores do planeta e, evidentemente, lutam entre si pela conquista das crescentes operaes de exportao e importao. Conseqentemente, a meta geral diminuir custos, garantir segurana mercadoria e melhorar ainda mais a qualidade dos servios. O outro ponto comum o interesse que todos esses portos esto tendo pelos contineres, os enormes cofres de ao de 7 e 14m, aptos a abrigar at 50t. de carga e indiscutivelmente a melhor forma para transportar produtos de um pas para outro. Os dois primeiros da srie Cingapura e Hong Kong j so respectivamente o 2 e 9 do ranking, quanto tonelagem movimentada. Porm, com respeito aos contineres esto quase emparelhados na liderana, com ligeira vantagem para Cingapura, que em 1991 operou 6,3 milhes de unidades, enquanto o rival ficou com menos 200 mil. Muito atrs, aparece Roterd o maior porto do mundo e o principal da Europa em contineres pelo qual em 1991 transitaram 3,1 milhes de unidades. Para se ter uma idia de quanto o Brasil est atrasado em matria de portos, basta dizer que o processamento de contineres em Santos no chegou a 400 mil unidades e no Rio girou em torno de apenas 80 mil. A Port Singapore Authority PSA, embora j tenha automatizado todas as operaes com os contineres tanto os seus embarques e desembarques quanto a movimentao no cais est introduzindo novos equipamentos computadorizados ainda mais sofisticados. Ao todo tem em ao 52 gigantescas e modernas pontes rolantes que, separadamente controladas por um s homem, dispensam o trabalho de centenas de estivadores, diminuindo de forma drstica o custo dos servios. O resultado dessa automatizao que, durante as 24 horas de funcionamento dirio do porto, rarssimos so os trabalhadores vistos no cais. Possui Cingapura trs imensos terminais de contineres. O primeiro e mais antigo comeou a operar em 1972, o Tanjong Pagar Terminal, com 69 hectares e 26 pontes

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rolantes. Mais tarde foi inaugurado o Keppel Terminal, com 78 hectares e 22 pontes rolantes. Finalmente, o maior deles, o Brani Terminal, que iniciou atividades em 1991, quando ficar inteiramente pronto num projeto orado em US$ 1,1 bilho ter 80 hectares e 25 pontes rolantes. No modernssimo complexo de Hong Kong, o setor privado prova sobejamente o que capaz quando detm o controle das operaes e dos servios. Ali, as empresas particulares, locais e estrangeiras, ocupam todos os espaos que lhes so efetivamente pertinentes, limitando-se o Estado a cuidar apenas do trfego de navios, fiscalizao e sade. At mesmo as obras de infra-estrutura, inclusive dragagem, so feitas pelas empresas em pagamento do aluguel dos terrenos dos terminais. Relativamente pequeno, com 52km2 de ara e somente 5km de cais, HK em 1991 movimentou 88 milhes de toneladas, tornando-se, talvez, o porto de maior produtividade mundial. Enfim, um verdadeiro modelo de eficincia, em decorrncia do predomnio do setor privado e da salutar ausncia do governo. A exemplo dos outros grandes portos a includos Roterd, Anturpia, Bremen, Nova York, Xangai e o seu rival vizinho Cingapura HK tambm aposta fortemente nos contineres. Cerca de 90% do extraordinrio movimento de 6,1 milhes de unidades processadas em 1991 abrangendo a maioria da carga geral entrada no porto ficaram por conta de trs empresas. Possuindo imensos terminais particulares, que funcionam com seus prprios empregados, a HIT International, a Modern Terminal e a Asia Terminal disputam acirradamente o mercado, sem monoplios, cartis ou conchavos. Inexistindo questes com os trabalhadores uma vez que h permanente carncia de mo-de-obra o nico problema srio a falta de espao para atender crescente demanda. A, ento, surge a criatividade do setor privado, decorrente do natural desejo de aumentar o faturamento e os lucros. Extensos aterros esto sendo feitos por conta e risco das empresas para ampliar a capacidade dos seus terminais, que, ao todo, em 1997, podero processar 8,8 milhes de unidades. A Asia Terminal utiliza armazenamento vertical de contineres num edifcio de seis andares e est construindo outro com dez pavimentos e rea de 3 milhes de m2. A outra idia original para

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contornar a falta de espao para atracao de navios o embarque/ desembarque dos contineres ao largo, em grandes chatas com guindastes, capazes de conduzir dez unidades. Cerca de 25% do movimento de contineres de HK j feito dessa forma, que, alis, tem a significativa vantagem extra de oferecer custos inferiores aos das operaes normais, com o navio acostado. O substitutivo da reforma dos portos brasileiros, aprovado pela Cmara, representa realmente um avano. Com ele mantido o arcaico monoplio da mo-de-obra da dcada de 1930 talvez se possa chegar a 1970, antes da era dos contineres, ignorada no projeto. Jul./92 5. Investimentos Base da Reforma

Aspecto pouco explorado pelos que defendem a reforma do sistema porturio a questo dos elevados investimentos necessrios completa reestruturao do setor, a incluindo as obras nos canais, a recuperao dos poucos equipamentos aproveitveis, bem como a aquisio de outros mais modernos e eficazes. Somente uma ponte rolante para contineres, com mais de 90m de altura, controle remoto eletrnico e computadorizado (de fabricao alem ou francesa) custa mais de US$ 8 milhes. Desse tipo ainda inexistente no Brasil so encontradas s dezenas pelos grandes portos mundiais, sendo que os dois maiores complexos do planeta Roterd e Cingapura possuem, cada um, mais de 50 dessas sofisticadssimas unidades. Ao que tudo indica, as duas partes em desgastante confronto empresrios e trabalhadores ainda no se deram a devida conta da indissolvel ligao entre investimento e modernizao porturia. Pelo menos a grande maioria dos primeiros que defendem a inevitvel privatizao das operaes do cais ainda no avaliou quanto o setor empresarial ter de gastar para colocar em ordem e instalar terminais nos principais portos brasileiros. Por seu turno, os trabalhadores inclusive os avulsos responsveis pelas tarefas de bordo, estivadores, conferentes, arrumadores e vigias em particular

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os seus dirigentes, ainda no entenderam que o Estado no tem mais condies de fazer os macios investimentos necessrios modernizao dos portos. Os oramentos para obras e compra de equipamentos porturios so tradicionalmente elevados em qualquer pas do mundo, consolidando-se a tendncia de que tais despesas devem ser feitas pelo setor privado, surgindo da o principal argumento para a privatizao dos servios de carga e descarga. Na realidade, seria verdadeiro contra-senso querer que os empresrios apliquem US$ 8 milhes em uma ponte rolante para ser manobrada por trabalhador fora dos seus quadros, indicado pelo sindicato da categoria. Numa pequena amostragem dos bilionrios oramentos para ampliao, reforma e mesmo implantao de alguns portos em diversos pases pode se ter idia dos vultosos recursos necessrios a esses empreendimentos. Em Roterd o maior porto do mundo at 1996 ficar pronto o gigantesco terminal de contineres Delta-2000, com seus 2,4km2 de cais e capacidade para operar 3,5 milhes de unidades, construdo pelo poderoso grupo privado ECT/Sea-Land, com investimentos da ordem de US$ 1,2 bilho. Do outro lado do planeta, no ultraprivatizado Porto de Hong Kong, a empresa Asia Terminal Ltd. leva avante projeto da ordem de US$ 1,5 bilho para construir um impressionante edifcio de dez andares (que ser o maior do mundo em rea edificada) destinado a armazenar, verticalmente, cerca de um milho de contineres. No muito longe dali, na imensa Zona Econmica Especial da Ilha de Hainan, a Repblica Popular da China cedeu terreno de 30km2 a importante grupo de Hong Kong para construo de um porto inteiramente privado na regio de Yangpu, em projeto da ordem de US$ 2,3 bilhes. A iniciativa, que inaugura desdobramento da abertura econmica desencadeada pelo lder Deng Xiaoping, faz parte do novo programa de modernizao e privatizao dos portos chineses. Ainda na sia onde se desenvolve a maior exploso comercial do sculo Cingapura, outro dos tigres asiticos, procura melhorar ainda mais o seu sofisticado porto, que j o primeiro do mundo na movimentao de contineres, com o pro-

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cessamento de 6,2 milhes de unidades em 1992. Prestes a passar totalmente para o controle privado, o Porto de Cingapura executa obras no valor de US$ 1,4 bilho para ampliar os seus terminais de contineres que, j em 1994, devero ter capacidade para 10 milhes de unidades. Na Frana, o principal argumento para convencer os poderosos sindicatos dos doqueiros (filiados CGT comunista) em aceitar a privatizao dos servios particularmente em Marselha e no Havre foi o claro entendimento de que os portos franceses, para competir com seus concorrentes vizinhos, de Anturpia e Roterd, precisavam de vultosos e urgentes investimentos. Como o governo francs no dispunha desses recursos, a soluo bvia a exemplo do que ocorre nos demais portos europeus foi apelar para o setor privado que, em contrapartida, quer o total controle das operaes de carga e descarga. A situao dos portos no mundo inteiro evoluiu e modificou-se radicalmente aps a ltima guerra, a partir de 1945. No Brasil, no entanto, no s os equipamentos, guindastes, gruas etc. so obsoletos, mas a arcaica estrutura porturia, ainda da dcada de 1930, no est de forma alguma altura do desenvolvimento alcanado por outros segmentos da economia. Para comprovar atrasos, bem como a soluo agora universal da participao privada no setor, talvez seja o caso das prprias entidades sindicais enviarem um ou dois tcnicos de sua confiana para uma rpida pesquisa nos principais portos do mundo. Set./92 6. Professor Gudin Tinha Razo

H tempos falecido, em plena atividade apesar dos seus 90 anos, Eugnio Gudin foi, talvez, o maior jornalista econmico que o Brasil j possuiu. Mestre inigualvel, foi professor de trs geraes de economistas entre os quais Mrio Henrique Simonsen, Delfim Netto e Roberto Campos, e chegou a ser Ministro da Fazenda, em 1954. Independente, agressivo e com extraordinria viso, Gudin empreendeu, quase que de forma isolada, vrias campanhas de am-

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pla repercusso, muitas delas contrariando frontalmente o governo e os poderosos polticos da poca. Anlise isenta, feita agora, passadas essas duas ou trs dcadas, demonstra que, colocadas em prtica, algumas das idias do famoso economista, possivelmente a situao do Brasil seria bem melhor. Folheando a considervel coleo dos seus artigos, reunidos em livro, recorda-se que Gudin foi o mais veemente adversrio da transferncia da capital para Braslia, bem como da conseqente fuso da cidade com o Estado do Rio de Janeiro. Decorrido todo esse tempo, efetivadas e consolidadas essas medidas, verifica-se que tinham inteira procedncia as objees do aguerrido jornalista. A outra grande batalha perdida por Gudin, igualmente de transcendental importncia para a economia do Pas, foi a travada contra a estatizao da produo de petrleo. Defensor intransigente da economia de mercado, achava que o governo no deveria se intrometer na explorao do leo, ainda mais devido escassez de recursos oficiais para explorar as expressivas reservas j detectadas. Denunciava, em vibrante artigo (18/10/76), que as importaes do combustvel arrancaram economia brasileira nada menos do que Cr$ 3 bilhes por ano, isto , 3% ou mais do nosso PNB. Na mesma linha, assegurava que, desnecessariamente, esse gasto com as importaes de petrleo significava enorme subtrao de larga fatia do produto do trabalho e das exportaes do povo brasileiro. Gudin no s atacava mas, freqentemente, aplaudia a poltica do governo, como no caso da campanha de promoo das exportaes, na gesto do ministro Delfim Netto, em 1972. Dizia ento o professor com absoluta lucidez: O comrcio internacional um fator de prosperidade e de enriquecimento para os pases que dele participam. Primeiro, porque eleva o padro de vida; segundo, porque utiliza a capacidade ociosa da produo e, com o aumento do volume dessa produo, seus custos tendem a baixar; terceiro, porque incrementa o volume de emprego. Como se v, esses imutveis e universais preceitos servem, ainda hoje, como uma luva para a atual crise brasileira.

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J naquela poca propugnava Gudin, com a sua costumeira veemncia, pelas desestatizaes de alguns setores, considerando uma das mais importantes decises do governo. Em artigo de 07/05/76, como ordem de prioridade para desestatizao, apontava: a transferncia para o setor privado das subsidirias da Vale do Rio Doce, da Petrobras, da Siderrgica Nacional e da Rede Ferroviria; reservar para o setor privado a indstria de aos no planos; idem de fertilizantes. Com retardo de 16 anos, apenas agora comea-se a cumprir o roteiro do mestre. Outra rea que dedicava particular ateno era a da Marinha Mercante, incluindo a navegao costeira e os portos. Por muito tempo, foi Gudin batalhador incansvel da quebra da exclusividade das linhas internacionais, ento mantida pelo Lloyd Brasileiro, h mais de 70 anos. Ao consumar-se a medida, em artigo de 31/01/75, comemorou de forma contundente: Esta revoluo operada no setor da Marinha Mercante Nacional no deixa de contar, e ainda conta, com a oposio oriunda, de um lado, do nacionalismo bronco que sofrem tantos setores da vida nacional e, de outro, de interesses contrariados pela supresso do monoplio do Lloyd, empresa estatal que servia, alm do mais, como reserva para o empreguismo civil e militar. Freqentemente invocava a ateno do governo para o srio dano que causa economia do Pas o transporte de carga geral por caminho, em rodovias paralelas ao litoral, em vez de transport-la por via martima, a um custo vrias vezes menor. Argumentando sua tese, lgica e irretorquvel, esclarecia que o mesmo litro de leo diesel proporcionava o transporte, em navio, de 875 toneladas de carga por quilmetro, contra apenas 30t. por caminho. E conclua, afirmando que um navio mdio, operado por 60 homens (naquela poca, janeiro/76), podia transportar carga equivalente a 900 caminhes, conduzidos por 1.800 homens. Costumava citar uma passagem do discurso-programa de posse do presidente Geisel no observada pelo prprio em seu governo segundo a qual seria importante dar impulso cabotagem para substituir o uso irracional do sistema rodovirio, como ocorre ainda freqentemente entre ns.

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Sobre o antigo problema do monoplio sindical dos servios porturios, pensava o notvel economista, com absoluta coerncia (em 26/01/76) que os armadores deveriam ter os seus armazns e executar a estiva com o prprio pessoal ou com o de sua confiana e no com o pessoal indicado pelos sindicatos. Nov./92 7. Competio, a Mola dos Portos

Anlise panormica comparativa sobre o funcionamento dos grandes complexos porturios mundiais demonstra claramente que a competio a mola mestra do aprimoramento da qualidade e da reduo dos custos dos seus servios. Existe mesmo uma proporo direta indicando que quanto maior for a concorrncia, melhor ser a qualidade e menores os preos das operaes. Tanto nos portos da Europa quanto nos da Amrica e sia, sob formas diversas, o esprito de competio impera nos variados nveis em que se desenvolvem suas atividades. Primeiramente, existe a concorrncia entre pases diferentes pela disputa de cargas que envolvem bilhes de dlares e milhares de empregos. A mais acirrada batalha desse tipo trava-se na Europa, onde os Portos de Roterd (Holanda), Hamburgo (Alemanha) e Anturpia (Blgica) lutam entre si pelas cargas do comrcio internacional de seus vizinhos. Para desespero dos alemes particularmente das autoridades e empresrios de Hamburgo e Bremen parte do movimento de exportao e importao do centro do pas, em especial o das indstrias do Vale do Ruhr, realizada atravs de Roterd, situado na foz do fabuloso Rio Reno. Embora a qualidade dos servios seja semelhante, as distncias menores e o baixo custo do transporte pelo eficiente sistema de barcaas favorece o grande porto holands, de resto o maior do mundo (movimento de quase 300 milhes/t.). Cerca de 30% do intercmbio do Brasil com a Alemanha so processados por Roterd. Por seu turno, Hamburgo movimenta considervel parte do intercmbio das naes da Europa Central, sendo que a Tcheco e Eslovquia possui ali enorme terminal privativo por onde realiza suas operaes martimas de exportao e importao. Enquanto isso, o moderno Porto de Anturpia, com servios melhores e bem mais baratos do que os vizinhos Havre e Dun-

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querque, conquista para seus terminais privados expressiva parcela do comrcio exterior da Frana. Na sia, a principal disputa por esse mercado a que envolve Hong Kong e Cingapura. Os dois grandes portos desses pases, para aumentar o movimento e obter maiores lucros, procuram atrair cargas das naes vizinhas Malsia, Tailndia, Indonsia etc. que rapidamente se desenvolvem com base na exportao. Cingapura j o 2 porto mundial (movimenta 190 milhes/t.) e o 1 em contineres (6,3 milhes de unidades). Hong Kong, talvez o mais moderno e automatizado porto do planeta o 9 na escala mundial e o 2 em contineres. Notadamente na Europa, dentro dos prprios pases, existe crescente rivalidade entre os portos, procurando um tirar cargas e clientes do outro, sob alegao de oferecer servios melhores e custos menores. Na Holanda, o Porto de Amsterd tenta retirar cargas de Roterd e na Alemanha, Bremen faz o mesmo com Hamburgo. Na Blgica, o bem organizado e moderno Porto de Gent cada vez mais aprimora seus servios, reduzindo custos, na nsia de desviar parte das 100 milhes/t. processadas em Anturpia. O outro campo onde se desenrola essa interminvel batalha pela conquista de usurios dentro dos prprios portos, entre as diversas empresas prestadoras de servios. Em permanente competio, os inmeros terminais privados e as empresas que movimentam as cargas em Roterd, Amsterd, Hamburgo, Anturpia, Hong Kong e Cingapura esto sempre melhorando a qualidade e reduzindo os custos dos servios. Totalmente privatizado, o modernssimo Porto de Hong Kong subdivide o seu fabuloso movimento de contineres (6,1 milhes de unidades, 20 vezes mais do que Santos) entre trs importantes empresas privadas, que disputam o mercado e continuam a investir sem cessar, a despeito do pequeno pas retornar ao controle da China em 1997. Cingapura, receosa de perder a hegemonia para HK em particular no setor de contineres resolveu privatizar inteiramente o seu complexo porturio. A ltima escala dessa fascinante e mltipla competio que envolve os servios porturios diz respeito concorrncia entre

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os prprios trabalhadores avulsos (estivadores, guindasteiros, motoristas etc.). Melhorando as suas performances procuram eles ser os preferidos nas licitaes dirias que existem nos principais portos europeus. Em Anturpia, por exemplo, o entendimento entre o capital/trabalho transcorre em alto nvel, tornando o grande porto belga no mais produtivo da Europa. Na movimentao de carga processa 2,8t. por homem/hora; Roterd, 2,4t.; Hamburgo, 1,8t. e Londres apenas 700kg por homem/hora. Fundada em 1929, a Central de Empregadores do Porto de Anturpia Cepa, dirigida por competente executivo, possui o registro dos trabalhadores avulsos diariamente designados para as diferentes tarefas no cais e a bordo dos navios. Em Hong Kong, as empresas de armazenagem, estiva e processamento de contineres operam com alto contingente de mo-de-obra avulsa, escolhida apenas pelo critrio de competncia no prprio mercado local de trabalho, nas agncias e jornais especializados. No Brasil, a soluo pacfica da difcil questo porturia passa forosamente por amplo entendimento entre empresrios e trabalhadores. Os parmetros para esse necessrio acordo devero ser os exemplos internacionais e, sobretudo, o bom senso de ambas as partes. Nov./92 8. Terminais Privativos

No meio tcnico e empresarial unnime a opinio de que qualquer programa para desenvolver a economia brasileira fica na total dependncia da ampla renovao do sistema porturio, compreendendo no s os equipamentos como, em particular, a obsoleta regulamentao vigente. Assim, no momento em que o Congresso e o governo, com enorme dificuldade, procuram acertar o projeto de lei para o setor tentando conciliar os interesses do Pas com os dos empresrios e trabalhadores torna-se til a focalizao de um aspecto, motivo de controvrsia. Aproveitando uma das poucas brechas de luz da retrgrada legislao em vigor, criou-se no Brasil importante rede de terminais

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privativos que, apesar de alguns percalos, funcionam razoavelmente bem, salvando as operaes porturias do desastre total. Localizados por todo o litoral brasileiro, do Amazonas ao Rio Grande do Sul, inclusive nos rios, os 62 terminais existentes dividem-se em dois grupos: os estatais e os privados. Entre os primeiros e mais numerosos encontram-se os da Petrobras, que realizam as operaes de carga e descarga de petrleo e derivados, abrangendo inclusive a redistribuio de combustvel para os Estados. Nesse bloco situam-se tambm os terminais de minrios da Cia. Vale do Rio Doce, sendo o maior deles o da Ilha da Madeira, no Maranho, que processa a produo da Serra de Tucuru. Entre os terminais do setor privado os mais importantes so os da Cargill (para soja e pallets de polpa de frutas), Aracruz (celulose), Cutrale (suco de laranja), Dow (produtos qumicos), MBR (minrio de ferro), Adubos Trevo (fertilizantes), Incobrasa (soja). Existem muitas outras empresas com projetos de terminais aguardando apenas a lei da reforma porturia para ver se interessa ou no investir nesses empreendimentos. Embora precria, sem garantias, a vantagem desses terminais privativos, em particular os que se situam fora dos portos pblicos, permanecerem virtualmente afastados da influncia dos sindicatos. De resto, os terminais das estatais operam por sua conta e risco, com os prprios empregados, sem obedecer a rgida e onerosa regulamentao trabalhista vigorante nos portos pblicos. Segundo o presidente da Associao Brasileira de Terminais Privativos ABTP, Osmar Rebello de Oliveira, os trabalhadores desses terminais no esto submetidos ao lobby dos sindicatos que atuam nos portos pblicos e impedem a modernizao e o enxugamento dos custos. Dado o impasse criado o governo sem recursos para renovar os equipamentos e o setor privado s aplicando se tiver o controle dos servios os chamados portos pblicos, particularmente os maiores e antigos (como Santos e Rio) esto se tornando cada vez mais obsoletos e improdutivos, com guindastes fabricados em 1948. Forada pela circunstncia, independentemente da nova Lei, a prpria administrao dos portos j est convocando o setor privado para oferecer a concesso de servios especficos. Preocupada

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com a excessiva demora na descarga de fertilizantes, a superintendncia do Porto de Paranagu resolveu abrir concorrncia entre as empresas interessadas para construo e explorao de um moderno terminal especializado no produto. Anualmente, em decorrncia da falta de infra-estrutura adequada, cerca de 600 mil/t. de fertilizantes deixam de aportar em Paranagu. Por outro lado, os navios que trazem as 900 mil/t. recebidas ficam s vezes at 30 dias ao largo no porto (ao custo-mdio dirio de US$ 10 mil) a espera de vaga para descarregar. Em Santos, o grupo que adquiriu o controle acionrio da Fosfertil est disposto a investir num terminal de fertilizantes, visando concentrar naquele porto as 300 mil/t. de enxofre importadas anualmente. Em 1992, os terminais privativos, com servios de boa qualidade e custos mais baixos, processaram quase 80% (correspondendo a cerca de 300 milhes/t.) do volume total das exportaes brasileiras. Infelizmente, tratam-se de produtos primrios, muito pesados, em particular, minrio de ferro, soja e suco de laranja. Os 20% manipulados pelos portos pblicos, relativos carga geral, embora com peso bem menor, em torno de apenas 80 milhes/t., com muito maior valor agregado, constituem a parcela mais importante da pauta de exportao. Segundo o presidente da ABTP, as notrias dificuldades e deficincias dos portos pblicos, afetados pelos monoplios estatal (capatazia) e sindical (estiva), tm estimulado um nmero cada vez maior de empresas exportadoras a investirem na construo de terminais privativos. O incentivo expanso da rede de terminais privativos notadamente os do setor privado autorizando-os a processar carga de terceiros, compensar o gargalo dos portos pblicos, oferecendo vrias opes tanto para exportadores quanto para os importadores. Dez./92 9. Cidades-Portos

Algumas grandes metrpoles, inclusive capitais de pases e estados, possuem portos importantes que, no entanto, no so fun-

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damentais para a sua vida cotidiana. Nesse rol podem ser includas Nova York, Londres, Buenos Aires e Rio de Janeiro, entre outras. Porm, existem cidades que vivem quase exclusivamente em funo do porto, do ininterrupto movimento de carga, passageiros e dos seus mltiplos desdobramentos econmicos. Essas cidades-portos, criadas e desenvolvidas em privilegiados lugares margem de rios e mares, por certo inexistiriam ou seriam inexpressivas, caso no dispusessem das operaes do cais. O melhor exemplo desse modelo , sem dvida, Roterd, que, pela diligncia dos holandeses, tornou-se o maior e, possivelmente, o melhor porto do mundo. Na mesma srie de cidades-portos podem ser alinhadas Hamburgo, Anturpia, Havre, Hong Kong, Cingapura, Xangai e, no Brasil, Santos e Paranagu. Inicialmente, era um pequeno atracadouro de pescadores, localizado no Rio Rotter, que, no ano 1250, com a construo da represa (dam), foi comeando a tomar forma de porto, espraiando-se pelas margens do delta do Reno, a alguns quilmetros da sua foz. A partir do sculo XV, porm, a clebre Cia. das ndias Ocidentais resolveu fazer do porto o centro de suas operaes, crescendo ento o povoado, adquirindo contornos de cidade, sempre vinculada s atividades de exportao e importao. Passados cinco sculos, Roterd, conhecida como Porto da Europa, com seus 380 mil habitantes a mais moderna cidade da Holanda, melhor mesmo do que a capital, Amsterd (tambm dotada de porto). Ali existem agncias e representaes das grandes empresas internacionais, sendo que 500 multinacionais americanas decidiram fazer de Roterd sua base para atingir o mercado europeu. Quando o imperador Frederico Barba Roxa, em Decreto de 7 de maio de 1189, instituiu oficialmente o Porto de Hamburgo, j crescia a cidade juntamente com as intensas atividades de comrcio exterior. Situada s margens do Rio Elba, a 100km do Mar do Norte, Hamburgo tornou-se o maior porto da Alemanha como tambm da Tcheco e Eslovquia. Com a reunificao do pas e a desativao dos embarques pelo Mar Bltico, aumentou a importncia dessa modernssima cidade-porto, que passou a registrar expanso superior a de seus concorrentes europeus. Ainda no velho continente, disputando

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acirradamente com Roterd e Hamburgo o fabuloso movimento de carga martima da Comunidade Europia, surge a cidade-porto de Anturpia, que conseguiu transformar a pequena Blgica numa potncia do comrcio internacional. Na sia, singularmente, as duas grandes cidades-portos Hong Kong e Cingapura na realidade so pequenos pases independentes e sedes de seus governos, cuja base econmica o comrcio com o exterior. Como nos exemplos europeus, as duas cidades se desenvolveram e modernizaram, oferecendo elevada renda aos respectivos habitantes, em funo exclusiva dos seus sofisticados portos, os maiores do mundo no processamento de contineres, com cerca de 6 milhes de unidades cada, o dobro do movimento de Roterd e 20 vezes o de Santos. O ponto comum que motivou a expanso econmica dessas cidades-portos, propiciando inigualvel prosperidade a seus habitantes, foi sem dvida o regime da economia de mercado, com o imprio da livre-concorrncia em todos os sentidos, tanto para as empresas quanto para os trabalhadores. A plena liberdade de ao existente favorece sobremodo a entrada de capitais estrangeiros que investem no s nas atividades porturias propriamente ditas, como na indstria, no comrcio e nos servios, criando riquezas e novos postos de trabalho. Sente-se na populao dessas cidades o orgulho pela eficincia e prestgio de seus portos que, direta ou indiretamente, garantem o emprego de quase todos os habitantes. A cidade-porto de Santos, em visvel contraste com as congneres de todo o mundo, decadente e seus habitantes vivem sob a constante ameaa de desemprego e retrao do nvel de vida. Dadas as excepcionais condies do seu porto, que, apesar dos pesares ainda o maior do Pas, tem Santos todas as condies de seguir o caminho de Roterd, Anturpia e Hong Kong. A comparao entre Santos e as outras cidades-portos simples e est ao alcance de todos. Enquanto em Santos, o porto estatizado e com os servios sob monoplio sindical inibe completamente os investimentos privados, de qualquer origem, nos outros subsiste a ampla competio que estimula a livre-iniciativa.

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O fechado e anacrnico esquema imperante em Santos tem propiciado a expanso de outros portos como Paranagu, So Sebastio, Vitria e at o Rio de Janeiro tornando ainda mais precria a sua situao. Os polticos e lderes sindicais que pensam ajudar a histrica cidade mantendo o arcaico sistema vigorante no porto esto, ao contrrio, assegurando o seu declnio e o surgimento de outras alternativas para os exportadores e importadores. Jan./93 10. Terminais e a Privatizao

A autorizao dada aos terminais privativos para movimentarem cargas de terceiros foi uma das grandes conquistas da Lei n 8.630, que trata da modernizao dos portos nacionais. De repente, a partir de 25 de fevereiro de 1993, data da promulgao da Lei, o sistema porturio ficou acrescido dos 62 terminais privativos que podem pertencer ao setor privado ou a empresas estatais espalhados pelo extenso litoral brasileiro. Alguns deles, bem modernos como os que processam gros, minrios e lquidos operados pelos respectivos empregados, tm efetivas condies de agilizar e baratear os embarques, reduzindo assim os custos das exportaes. A histria dos terminais privativos iniciou-se em 1944, com o Decreto-Lei n 6.640, que pela primeira vez permitiu s empresas particulares construrem e operarem instalaes porturias rudimentares. Mais tarde, o Decreto-Lei n 5, de 1966, confirmava que qualquer pessoa ou empresa poderia ter seus terminais porturios privativos, desde que exclusivamente destinados a uso prprio, esta a diferena bsica com a regulamentao anterior. A partir de ento comearam a surgir por toda a costa os terminais, que se especializaram em certos produtos, particularmente os da Petrobras (petrleo e gasolina), Vale do Rio Doce (minrios) e Cosipa (produtos siderrgicos). Tambm o setor privado entrou firme no assunto, construindo terminais em Santos (Cargill, Dow, Cutrale etc.) no Rio de Janeiro (MBR), no Rio Grande (Incobrasa e Trevo), em Vitria (Portocel), entre outros.

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Modernizao dos Portos

Os empresrios, de modo geral, ainda no perceberam devidamente que, atravs desses terminais, j se est desencadeando o processo de privatizao do sistema porturio. Instalados dentro ou nas imediaes dos grandes portos, os terminais privativos tornaram-se, instantaneamente, a opo vlida para exportadores e importadores movimentarem suas cargas. Sem dvida, a qualidade (inclusive a velocidade) e os custos dos servios sero bem melhores do que na emperrada estrutura monopolstica em extino, Docas-sindicatos. A salutar competio agora instaurada nos portos entre os dois esquemas j est apresentando resultados, com a agilizao das operaes e a reduo dos seus custos. Algumas estatais, aproveitando a nova situao, com bons lucros, esto processando cargas de empresas privadas como a Cosipa, em Santos. Mais capacitada, a Cia. Vale do Rio Doce, em Vitria, associou-se Ceval e Richco para efetivar embarques de soja pelo seu terminal privativo do Porto de Tubaro, o que j est ocorrendo com absoluto xito. A empresa formada pretende conquistar para o seu terminal os embarques de carros da Fiat e de produtos siderrgicos da CSN realizados pelo Rio de Janeiro. Porm, a melhor notcia quanto real implementao da Lei n 8.630 vem do governo de So Paulo, que criou a Sociedade Privada para o Desenvolvimento do Complexo Porturio Paulista SPCPP. Para dar sentido prtico ampla abertura para economia de mercado ensejada pela Lei, o governo estadual constituiu a sociedade associada a importantes grupos empresariais nacionais e estrangeiros, visando promover e custear estudos para modernizao e expanso do complexo porturio de Santos, So Sebastio e Cubato. O documento de apresentao da SPCPP confere nfase especial ao projeto do novo Porto de So Sebastio que pode ser operado em condies viveis pela iniciativa privada. Por todo esse extenso sistema ser facilitada a instalao de terminais privativos dentro e fora dos portos pblicos existentes com vistas, em particular, a reduzir os custos dos embarques, inclusive com o melhor aproveitamento do transporte barato da rede ferroviria e da hidrovia Tiet-Paran. de fato inconcebvel que os custos do transporte/ embarque da soja brasileira atinjam mdia de US$ 69 por tonela-

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da, enquanto nos Estados Unidos onde a mo-de-obra bem mais cara o preo desses mesmos servios limita-se a apenas US$ 18/t. Nessas dispendiosas operaes perde-se a expressiva vantagem registrada na produo do cereal, aqui estimada em US$ 195/t. e nos EUA em US$ 215/t. Entusiasmado com o projeto paulista e as facilidades da nova legislao porturia, o superintendente do Grupo Votorantim, Antnio Ermrio de Morais, pensa em construir ou comprar um terminal para processar suas exportaes e importaes. Com a reduo prevista de 40% nos custos dos embarques do Grupo avaliados em US$ 400 milhes propiciada pelo terminal prprio ser aumentada a competitividade dos produtos exportados, notadamente o alumnio. Aps a sofrida conquista da Lei n 8.630 e a oportuna criao da Sociedade Paulista, resta agora ao setor privado responder ativamente no s facultando seus terminais privativos a outras empresas como tambm constituindo novas unidades. O estudo divulgado por ocasio do lanamento da SPCPP confirma dados anteriores, segundo os quais a modernizao porturia pemitiria que, com a atual capacidade instalada na indstria paulista, se produzissem, a mais, cerca de US$ 5 bilhes/ano. Mar./93 11. Implantao da Lei dos Portos

No resta dvida que a batalha pela modernizao dos portos brasileiros foi ganha pela opinio pblica, devidamente esclarecida pela memorvel campanha promovida pela imprensa. Admitindo implicitamente o fato, no expediente que encaminhou a Lei ao Senado, para julgamento dos seus quatro vetos (por sinal, sem maiores conseqncias), o presidente Itamar Franco afirmou: conhecida da sociedade a maneira como foi gerado e discutido no Congresso Nacional o projeto de Lei que ora sanciono parcialmente. A seguir, assinalava: Trata-se de profunda mudana nas condies de funcionamento dos portos. Medidas de ordem estrutural atingem profundamente as relaes de trabalho num setor regulado por prticas

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constitudas ainda no sculo passado e que criaram hbitos e normas transmitidas at de forma hereditria. Por esse pensamento, em que o presidente demonstra pleno entendimento do assunto, depreende-se as enormes dificuldades a serem vencidas, superando rotinas secularmente arraigadas, para a implantao da nova regulamentao. Na realidade, a importante Lei n 8.630, de 25/02/93, que finalmente libertou os portos brasileiros dos monoplios, longa e por demais abrangente, tornando-se difcil, pelo menos nessa fase inicial, saber o verdadeiro significado dos seus 73 artigos (excludos os trs vetados). Para se ter uma idia da extenso desse instrumento legal, de reunificao e renovao da legislao porturia, basta dizer que ele revoga sete outras Leis, cinco Decretos-Lei e sete Decretos, bem como as demais disposies em contrrio. Dada a complexidade das matrias tratadas na Lei cujo projeto inicial sofreu diversas modificaes e a verso final, at pelo seu tamanho, foi pouco divulgada so poucos os tcnicos, empresrios e sindicalistas que, no momento, podem interpret-la e visualizar a sua aplicao. Sabiamente, o Ministro dos Transportes, Alberto Goldman, no dia 02/02/93, bem antes portanto da promulgao da Lei, havia conseguido organizar uma Comisso Mista de empresrios e trabalhadores, para adiantar os critrios a serem adotados em inmeros pontos polmicos da nova legislao e examinar a possibilidade de assinatura de contrato, acordo ou conveno para os trabalhos no porto. De resto, a Lei estipula vrios prazos (sempre a partir de 26/02/93) para uma srie de medidas indispensveis sua efetiva implantao. Em 60 dias as administraes dos portos devero substituir as estruturas tarifrias. Em 90 dias, sero constitudos, em cada porto, os rgos de Gesto de Mo-de-Obra Ogmo, encarregados da administrao do trabalho das operaes de carga e descarga. Em 180 dias sero revogados os artigos 254 a 292 da Consolidao das Leis do Trabalho CLT. No mesmo prazo devero ser adaptados os atuais contratos para explorao de terminais privativos. Tambm em 180 dias, o Poder Executivo promover a adaptao nova Lei das concesses e autorizaes na rea porturia. Em um ano, os trabalhadores podero requerer aos Ogmo o cancelamento dos respec-

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tivos registros profissionais para efeito de indenizao. Em quatro anos (a partir do incio de 1994), vigorar o Adicional de Indenizao do Trabalhador Porturio Avulso AITP, que incidir sobre importaes e exportaes. Finalmente, em cinco anos ser implantada a multifuncionalidade de trabalho, abrangendo todas as categorias envolvidas no servio de carga e descarga. Em particular, as trs importantes cidades-portos brasileiras Santos, Paranagu e Rio Grande cujas atividades econmicas giram quase que exclusivamente em torno das operaes de exportao e importao, devem estar vivendo perodo de aguda ansiedade, aguardando a aplicao da esperada Lei. Da mesma maneira, os trabalhadores e usurios dos outros portos pblicos Rio, Vitria, Itaja, Recife, Belm, Suape, Manaus e outros para arrumar suas vidas e negcios precisam saber como se processaro os servios na orla martima. A Ao Empresarial Integrada AEI, que reuniu, de forma indita, mais de 50 entidades nacionais, constituiu, juntamente com a imprensa, a frente vitoriosa na batalha dos portos. Porm, o trabalho ainda est longe de terminar com a promulgao da Lei, que est tendo dificuldades para seu entendimento e implantao. Para essa dupla e relevante tarefa caberia ainda a esses segmentos setor privado e imprensa uma ao conjunta para o necessrio esclarecimento e divulgao da nova Lei, com vistas a atingir os principais centros e comunidades porturias brasileiras. Abr./93 12. Terminais Privativos e as ZPE

Esses dois modernos instrumentos de apoio s vendas para o mercado externo terminais porturios privativos e Zonas de Processamento de Exportao (ZPE) que agora comeam a ser estruturados, podero ter importante participao no reordenamento e recuperao da economia brasileira. Os terminais (cerca de 60 espalhados por todo o litoral), embora j existentes, com o recente advento da Lei n 8.630, da reforma porturia, tiveram as funes redefinidas e ampliadas. A exemplo do que ocorre nos pases indus-

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trializados, foram liberados para processar tambm cargas de terceiros, com o seu prprio pessoal. Essa simples e absolutamente natural medida, possibilitando a criao de uma rede paralela de portos privados e independentes longe dos habituais problemas de congestionamento e das greves abre novas e reais perspectivas para a expanso das exportaes. Quanto s ZPE, antigo projeto que caminha para se cristalizar, trata-se de meio tradicionalmente utilizado em outros pases para fomentar as vendas para o exterior. Como se sabe, os produtos fabricados ou montados nessas zonas, que abrangem extensas reas, perto ou dentro dos prprios portos, gozam de isenes tributrias de toda a sorte, incluindo os materiais importados ali manipulados e incorporados aos artigos destinados ao mercado externo. O sistema deve ser bom, pois os EUA, que lideram as exportaes mundiais, possuem o maior nmero dessas reas francas, l denominadas Foreign Trade Zones FTZ. So ao todo 370, distribudas por todo o imenso territrio americano, sendo o Texas, com 24, Nova York, 13, e Washington, 9, os Estados melhor aquinhoados. As FTZ dos Estados centrais so obrigatoriamente vinculadas s aduanas dos portos, fluviais ou martimos, por onde processam suas exportaes. Dado o xito que obtiveram, existem pedidos em anlise para instalao de mais 150 FTZ. Com a objetividade que lhes peculiar, criaram os americanos um engenhoso esquema, integrando a utilizao dos terminais privativos com as FTZ. Os EUA possuem tambm a maior rede de terminais do mundo, quase dois mil, atravs da qual, descentralizando os embarques, as empresas se livram dos crnicos problemas existentes nos portos pblicos. Instituindo a figura da subzona, como desdobramento das FTZ nos seus terminais prprios, as empresas exportadoras no s agilizam as operaes, reduzem seus custos, como tambm asseguram a continuidade dos embarques. O melhor exemplo da espcie o terminal privativo da Bethlehem Steel, em Sparrow Point, que se transformou em subzona da FTZ do Porto de Baltimore. A Repblica Popular da China, com a espetacular abertura deflagrada pelo lder Deng Xiaoping, a partir de 1980 criou

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cinco Zonas Econmicas Especiais ZEE, passando a utiliz-las como suporte bsico para o desenvolvimento do pas, captando investimentos e incentivando as vendas para o mercado externo. Em 1980, as exportaes chinesas somavam US$ 18 bilhes, enquanto as brasileiras chegavam a US$ 20 bilhes. Em 1992, 12 anos aps a criao das ZEE responsveis pela larga maioria dos embarques as exportaes da China, aumentando mais de quatro vezes, atingiram a US$ 85 bilhes, enquanto as do Brasil nem chegavam a dobrar, limitando-se a US$ 34 bilhes. Agora, tambm a China prepara-se para entrosar os estmulos fiscais dessas Zonas com as vantagens operacionais dos terminais, permitindo a construo, por um grupo de Hong Kong, de moderno porto privado em plena ZEE da Ilha de Hainan, em investimento da ordem de US$ 2,6 bilhes. Com a expedio quase simultnea da regulamentao das ZPE e da Lei de modernizao dos portos, surge a oportunidade de se juntar as duas iniciativas. Das 14 ZPE autorizadas, as que funcionaro junto aos Portos de Suape, em Pernambuco, e Imbituba, em Santa Catarina, tm todas as condies de experimentar com xito esse sistema integrado. So justamente nesses dois portos, de nvel mdio, em que o processo de privatizao se encontra em estgio mais avanado. Nada impede que desde j que os Estados de So Paulo e do Rio de Janeiro pleiteiem tambm concesso para instalao de ZPE nos Portos de So Sebastio e Sepetiba, para que as empresas ali construam seus terminais privativos. Ago./93PRINCIPAIS TERMINAIS Base: Estatstica Portobras 1988. Toneladas MACAP Terminal Minrio, da Icomi Brumasa SANTARM Trapiche Santarm Terminal Sabba Produtos

810.000t. Minrio de Ferro 37.000t. Madeira 196.000t. Diversos 79.000t. Der. Petrleo

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Toneladas MANAUS Terminal Refinaria Docas Caima Ceasa Jonasa Moageira T. So Raimundo T. Sabino BELM Trombetas Miramar II Munguba Doca Souza Franco Miramar I Icoracy Conceio Itaituba Barcarena Guama ITAQUI Carajs Alumar Tutia NATAL Term. Petrobras II Term. Inflamveis Term. Petrobras I RECIFE Suape MACEI T. Salgema Cais Acar Cais Melao 1.800.000t. 615.000t. 490.000t. 387.000t. 71.000t. 63.000t. 20.000t. 13.000t. 6.000.000t. 1.000.000t. 850.000t. 450.000t. 400.000t. 320.000t. 300.000t. 280.000t. 235.000t. 104.000t.

Produtos Petr. e Derivados Der. Petrleo Minrio Diversos Diversos Trigo Diversos Diversos Bauxita leo Comb. Bauxita/Celulose Diversos Gs/leo Diversos Diversos Calcrio Alum./Diversos Diversos

30.000.000t. Minrio 2.300.000t. Bauxita 30.000t. Sal 3.300.000t. Petrleo 80.000t. Der. Petrleo 20.000t. Ferro/Ao 1.000.000t. leo Diesel 800.000t. Soda Custica 670.000t. Acar 240.000t. Melao

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Toneladas ARACAJU Term. Petrobras ARATU Temadre Dow Qumica Osiba Base Naval Aratu VITRIA Tubaro Praia Mole Ponta Ubu Paul CVRD Regncia Barra do Riacho Paul Usiminas Esso Shell Flexibras RIO DE JANEIRO Torgu Manguinhos Ilhas SEPETIBA MRB Guaba Nuclep ANGRA DOS REIS Tegib Verolme SO SEBASTIO Per Sul 1 Petrobras Per Sul 2 Petrobras Per Norte 3 Petrobras Per Norte 4 Petrobras SANTOS Cosipa 5.300.000t. Petrleo 10.000.000t. 780.000t. 410.000t. 16.000t. 60.000.000t. 14.000.000t. 8.500.000t. 1.800.000t. 900.000t. 705.000t. 525.000t. 120.000t. 3.600t.

Produtos

Petrleo e Der. Soda Custica Minrio e Carvo Carvo Minrio Carvo/Placas Minrio/Pellets Gusa Petrleo Celulose Carvo Der. Petrleo Mangotes

13.700.000t. Der. Petrleo 600.000t. Petrleo 480.000t. Petrleo 14.500.000t. Minrio 1.900t. Diversos 24.500.000t. Petrleo 1.151t. Estal. 14.000.000t. 9.300.000t. 6.500.000t. 3.450.000t. Petrleo Petrleo Petrleo Der. Petrleo

6.820.000t. Carvo, Min. e Siderrgico

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Modernizao dos Portos

Cutrale Dow Qumica Ultrafrtil Cargill ITAJA Term. Petrleo Dow Qumica PORTO ALEGRE Term. Mar. Alm. Soares Dutra Copesul Incobrasa Canoas Trevo Bianchini Merlin Guaba Taquari PELOTAS Olvebra Term. Carvo Matarazzo RIO GRANDE Per Petroleiro Copesul Cotriju Trevo PORTO VELHO Term. Petrobras Sabba CHARQUEADAS Term. Copelmi CORUMB Term. Min. Corumbaense Barranco Miguis TOTAL

Toneladas 1.200.000t. 610.000t. 410.000t. 382.000t.

Produtos Soja Prod. Qumicos Fertilizantes Soja

535.000t. leo Diesel 89.000t. Soda Custica 4.700.000t. 920.000t. 560.000t. 460.000t. 385.000t. 350.000t. 175.000t. 135.000t. 100.000t. Petrleo Carvo e Prod. Qum. Soja Gs e leo Fertilizantes leo de Soja Soja e leo Celulose Soja

150.000t. Soja 52.000t. Carvo Met. 7.900t. Clinquer 630.000t. 500.000t. 750.000t. 920.000t. Petrleo Benzeno Trigo e Soja Fertilizantes

330.000t. Der. Petrleo 175.000t. Der. Petrleo 615.000t. Carvo 450.000t. Minrio 11.000t. Cimento 265.474.551t.

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PRINCIPAIS TERMINAIS PRIVATIVOS LOCALIZAORo

rai

1maAmap

2

3R.Gde. Cear Norte Paraba Piau Pernam buco Alagoas Sergipe Bahia

Amazonas

Par

Maranho

4 5

Acre

Ro

nd

n

ia

Toc

ns anti

Mato GrossoDF

6na Mi sG e raisEsprito Santo

Gois Mato Grosso do Sul So Paulo Paran Sta. Catarina R. Gde. do Sul

7

Rio de Janeiro

9 10

8

11 12

Obs.: No foram localizados os terminais da Petrobras. 1 Icomi 2 Rio do Norte Monte Dourado 3 CVRD Alumar 4 Suape IAA 5 IAA 6 Usiba Aratu 7 CST/Usiminas/Aominas Portocel CVRD Samarco 8 MBR 9 Cosipa Dow Qumica Ultrafrtil Cutrale Cargill 10 Cattalini 11 Dow Qumica 12 Incobrasa Trevo Copesul Cotriju

13.

Efetiva-se a Privatizao

Com a fixao da data para licitao de quatro pequenos portos pblicos, demonstra o governo Itamar Franco que est realmente

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empenhado em levar avante a necessria privatizao do importante setor. Assim, criando um fato consumado, com a imediata passagem para o controle privado dos Portos de Itaja e Laguna (em Santa Catarina), Cabedelo (na Paraba) e Porto Velho (em Rondnia), adianta o Ministrio dos Transportes a implantao da Lei n 8.630, abrindo outras perspectivas para a soluo do impasse verificado no estabelecimento da nova rotina que dever vigorar no relacionamento entre capital-trabalho nas operaes do cais. Foi oportuna a incluso de Itaja nessa lista preliminar, uma vez que o ativo porto catarinense vem prosperando celeremente com a aplicao da moderna orientao privatista. Contando com o indispensvel entendimento entre empresrios, trabalhadores e autoridades locais, melhoram os servios e diminuem os custos, aumentando o nmero de usurios, alguns at conquistados aos emperrados Portos de Rio Grande e Santos. Comprovando, na prtica, que a legislao atual estimula a ampliao do mercado de trabalho, Itaja poder servir de exemplo para outros portos brasileiros. Lamentavelmente, atrasou-se bastante o Brasil em pegar essa onda irreversvel de privatizaes que varre os portos mundiais. Na Europa, a criao da Comunidade Econmica obrigou os pases que ainda mantinham influncias estatais e sindicais em seus portos (Frana, Itlia, Espanha e Portugal) a rapidamente implantar a livre-concorrncia, deixando os servios do cais sob a inteira responsabilidade do setor empresarial. A crescente necessidade de agilizar as exportaes, reduzindo os seus custos alm de evitar maior concentrao de servios de comrcio exterior na Holanda est levando os portos europeus a adotarem o modelo altamente privatizado de Roterd, o maior e talvez o melhor porto mundial. Nessa estratgia, Anturpia e Hamburgo tm-se destacado, embora os dois portos juntos no cheguem a movimentar nem dois teros das quase 300 milhes/t. de carga processadas pelo grande complexo roterdams. Mesmo na Amrica Latina, o Brasil ficou para trs na crucial questo, depois que a Argentina, Chile, Peru e Venezuela privatizaram os seus servios porturios, de resto, sem maiores traumas. Em 1993, o presidente do Mxico, Carlos Salinas de Gortari atravs de licitaes que renderam US$ 183 milhes aos cofres pblicos concedeu autorizao para construo de 27 terminais privativos, nas costas do Atlntico e do Pacfico, para movimentao de todo o tipo

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de carga. Desse modo, com essa srie de novos e pequenos portos particulares, ter o Mxico condies de avantajar-se ainda mais na liderana das exportaes da Amrica Latina. Procura assim o Mxico seguir o eficiente modelo americano, descentralizando e privatizando o sistema porturio. Segundo o ministro Alberto Goldman, a privatizao da atividade porturia poder atingir os 84 portos brasileiros. Na realidade, uma vez instalado o sistema da livre empresa em algumas unidades como j ocorre no Sul, em Imbituba e Itaja os demais portos, em outros Estados, tero forosamente de seguir o mesmo esquema, dada a evidente disparidade da qualidade e preos dos servios. Essa providencial comparao ser acelerada quando os 22 terminais privativos (dos 62 existentes em todo o Pas), que solicitaram autorizao para processar cargas de terceiros, comearem a operar a pleno vapor. Em Vitria, o terminal da Vale do Rio Doce j funciona satisfatoriamente em consrcio com duas empresas particulares dedicadas exportao de soja. Em Santos, o moderno terminal da Cosipa, agora sob controle privado, certamente ir processar cargas de terceiros, servindo no s de opo como de termo de comparao com o arcaico e dispendioso sistema monopolista ainda imperante na parte pblica do maior porto do Pas. realmente uma pena ter dado entrada na Justia da ao contra a aplicao da Lei n 8.630, o que servir apenas para retardar ainda mais a indispensvel modernizao dos portos brasileiros. No bastassem os dados e exemplos j alinhados, acrescentou o ministro Goldman outro argumento irrespondvel ao dizer que o governo dispunha de apenas US$ 60 milhes para fazer face a obras inadiveis nos portos nacionais, avaliadas em US$ 1,2 bilho, importncia s disponvel no setor privado. Set./93 14. A Salutar Competio dos Portos

Na acirrada luta pelos mercados, que se trava em todos os continentes, cada vez mais cresce em sua importncia o item de servios porturios. As empresas de comrcio exterior, notadamente os exportadores, sabem que a colocao de seus produtos depende tam-

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bm da qualidade e dos custos das operaes de carga e descarga. No basta ser o artigo de primeira ordem, se o atraso no embarque retarda a entrega no mercado consumidor ou se o custo dos servios porturios retiram-lhe a margem de competitividade. As greves, as operaes padro e tartaruga, a ausncia de horrio corrido de 24 horas, a demora na atracao do navio so os principais fatores que concorrem para a m qualidade das operaes do porto. Nos custos, basicamente, so computados os diversos impostos e tarifas, bem como os salrios pagos aos porturios e estivadores. O intenso desenvolvimento do comrcio internacional nestas trs ltimas dcadas obrigou os portos a se modernizarem em toda linha no s quanto aos equipamentos, mas tambm quanto s estruturas e normas de trabalho. O ranking mundial do setor sofreu alteraes radicais com o surgimento de novos portos, bem como a rpida ascenso de outros, antigos e tradicionais, que se recuperaram e souberam se adaptar s dinmicas exigncias do mercado. Neste ltimo caso, o melhor exemplo o de Roterd que, em vertiginosa escalada, em 1962, ao movimentar 96 milhes de toneladas, arrebatou de Nova York o ttulo de maior porto do mundo, at hoje em seu poder (293 milhes/t. em 1992). Entre os novos portos que, nos ltimos tempos, passaram a figurar na relao dos dez maiores, destacam-se Cingapura e Kobe (Japo), segundo e terceiro na escala internacional, com processamento de 206 milhes/t. e 190 milhes/t., respectivamente. Os antigos Portos de Nova York (EUA), Hamburgo (Alemanha), Marselha (Frana), Barcelona (Espanha), Londres (Inglaterra) e Canto (China) que, por um ou outro motivo, no acompanharam a revoluo verificada no setor, tiveram reduzido o poder de competio, com reflexo negativo na evoluo do movimento de carga. Na Europa, agora sob as regras da Comunidade Econmica, intensa a concorrncia entre os portos, inclusive no mesmo pas. Lutam pelas cargas Roterd e Amsterd, na Holanda; Hamburgo e Bremen, na Alemanha; Anturpia e Gent, na Blgica; Marselha e Havre, na Frana, e assim por diante. No Brasil, o grande mrito da Lei n 8.630 foi estabelecer ampla e definitivamente o esprito de competio no sistema portu-

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