Modulo versão final 2016.2

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10 Projeto: Módulo 1I / 2016.2 PIBID-UEPB/ LETRAS Nome:____________________________________________________________________ _______Série:___ Endereço:________________________________________________________________ _________Nº:_____

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Projeto:

Módulo 1I / 2016.2

PIBID-UEPB/LETRAS

Nome:___________________________________________________________________________Série:___

Endereço:_________________________________________________________________________Nº:_____

E-

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Universidade Estadual da Paraíba-UEPB

Programa institucional de Bolsa de Iniciação à Docência-PIBID

Subprojeto Letras-Língua Portuguesa

Escola de Atuação: E.E.E.F.M Caic José Joffily

Coordenadora de Área: Magliana Rodrigues da Silva

Supervisora: Alessandra Magda de Miranda

Docentes: Benilde Cassandra

Fernanda Félix

Flávia Roberta

Joseilma Barros

Projeto:

Nas Trilhas da Língua Portuguesa: o texto em foco

Título: A CULTURA POPULAR NORDESTINA, NO FOLHETO SE ETERNIZA!

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UMA MENSAGEM PARA VOCÊ:

Caro (a)aluno(a),

O Projeto Nas Trilhas da Língua Portuguesa: o texto em foco tem a honra de recebê-lo(a) como integrante da nossa equipe. Hoje, você faz parte do projeto que a cada dia obtém melhores resultados do trabalho desenvolvido nas escolas selecionadas. Esperamos que aproveite ao máximo essa oportunidade que surgiu em sua vida.

Este módulo contém uma coletânea de textos e de informações relacionadas à Língua Portuguesa, cujo objetivo é servir de apoio para as discussões e análises a serem realizadas neste primeiro período. Iniciaremos refletindo um pouco sobre a importância da leitura e sobre a nossa cultura, que deve ser valorizada e enaltecida, pois foi e é berço e inspiração para vários nomes reconhecidos nacionalmente. Neste viés, buscaremos conhecer e estudar o gênero que é nosso símbolo regional, e que melhor retrata nosso povo e cultura, e qual melhor exemplo para isso, se não o folheto, vulgo, cordel?

Esperamos contar com a sua presença durante todo o ano, para podermos juntos desenvolver ainda mais os nossos conhecimentos, tanto a respeito do estado, quanto sobre a língua portuguesa. Sendo assim, organize sua bagagem, deixe um espaço para o conhecimento e vamos embarcar nessa viagem trilhando caminhos paraibanos!

Atenciosamente: As professoras

CONTATOS DO PROJETO:

Blog: http://nastrilhasdalinguaportuguesa.blogspot.com.br/

Página: https://www.facebook.com/nastrilhasdalinguaportuguesauepb?fref=ts

Perfil no Facebook: https://www.facebook.com/NasTrilhasdaLinguaPortuguesa?fref=ts

Grupo no Whatsapp: Alunos do Pibid. Administradores: Joseilma (83) 99190-1981;

Fernanda (83) 99193-4839; Benilde (83) 98737-6681; Flávia: (83) 99654-1437

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LEITURA, PRA QUE TE QUERO?

LER FAZ BEM – Juarês Alencar

Ler faz bem a todosamplia nossa visãodeve estar no dia-a-diade quem faz a educaçãoesse é maior recursofaça essa lição

Com a leitura viajamosalém da imaginaçãoabrimos novos horizontesvencendo a limitaçãotornando-se um grande farolque indica a direção

A leitura nos instruitambém é diversãoeleva a auto-estima

nos traz orientaçãodesenvolve o senso críticoe forma o cidadão

Você que não gosta de lervamos mudar essa históriadesenvolva a leituramelhore sua oratóriaesse é o meu conselhoarquive em sua memória

Vença esse desafioseja um grande leitoré uma missão do alunoe também do professorde todos que querem na vidaser um grande vencedor.

Disponível em: http://juaresdocordel.blogspot.com.br/2009/04/leitura-abre-as-portas-do-conhecimento.html

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PLURALIDADE CULTURAL – Juarês Alencar

O nosso país é exemploDa grande diversidadePor sua rica culturaSinal de brasilidadeCom todas as diferençasMostra a sua pluralidade.

Terra dos muitos sotaquesCores e manifestaçõesE com as várias etniasPreservando as tradiçõesAs diferenças existemEntre as várias regiões.

Nordestino fala oxenteQue é próprio da regiãoO mineiro fala uai...Com muita satisfaçãoO gaucho já fala thêE numa forte expressão.

Com todas as etniasQue presentes aqui estãoO negro, branco e índioFormaram esta naçãoOs brasileiros são frutosDesta miscigenação.

O Brasil é um grande palcoDe bela apresentação

Do frevo, samba e forróCarnaval e foliãoCiranda e Coco de rodaXote, xaxado e baião.

É o país do futebolDo ritmo e religiãoDo regue e bumba meu boiPresentes no MaranhãoDo alegre axé da BahiaCom toda a animação.

Tem a festa do divinoQue é muito popularTem a folia de reisMaracatu pra dançarAlém da bela catiraE o belo boi bumbá.

A nossa cultura é ricaPois tem forte tradiçãoNa música e na poesiaE também na religiãoCarnaval e futebolÉ verdadeira paixão.

A cultura religiosaDemonstra a fé popularRomarias a padre CíceroGrande Sírio no ParáProcissão do fogaréuFaz Goiás iluminar.

Terra das vaquejadasDas festas de apartaçãoFamosas pegas de boiQue existem no sertãoVaqueiros e repentistasFazem sua louvação.

As festas de boiadeirosDe cowboy e de peãoGrande festa de rodeio

CULTURA

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Que causa admiraçãoCom locutores famososQue falam com emoção.

Famosas festas juninasÉ uma grande tradiçãoNo nordeste brasileiroÉ a maior animaçãoFogueira e milho assadoQuadrilha, forró e quentão.

Lá pras banda da AmazôniaBem no meio da florestaCaprichoso e GarantidoFazem a maior festaOs turistas que lá vãoDiz não ter outra como esta.

Esse é o país da alegriaÉ cheio de sonoridadeTem rimo de todo jeitoForte musicalidadeSendo um misto de belezaÉ sua própria identidade.

Terra dos vários saboresCom culinária aprovadaPamonha e acarajéPé de moleque, feijoadaBaião de dois, tapiocaCarne de sol, galinhada.

Tem pato no tucupiE também no tacacáTem churrasco com farturaE o gostoso mungunzáO chimarrão lá no sulE na Bahia o vatapá.

Nossa cultura é marcada

Pelos afro-descendentesUm povo de muita garraE de coração valenteQue migraram lá da ÁfricaPara o nosso continente.

Os nativos do BrasilAmeríndios brasileirosForam quase exterminadosPelos brancos estrangeirosRelutaram e sobrevivemPovo forte e verdadeiro.

Amamos esse BrasilETA país arretadoExpresso em alta vozFalo pra todo ladoNão importa a regiãoNem tão pouco o Estado.

Pode ser aqui no NorteOu também lá no NordesteAté no longínquo SulOu lá no rico SudesteEm todo lugar é bomInclusive o Centro-oeste.

Em todo lugar é bomDá gosto aqui viverEsse país é tão grandeTem riquezas pra valerE pra ele ser melhorFalta à corrupção varrer.

Esse é um breve relatoDa nossa pluralidadeO Brasil é um paísQue tem sua identidadeMostra em todos os ritmosA sua originalidade.

Disponível em: http://juaresdocordel.blogspot.com.br/2014/04/pluralidade-cultural.html

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O CORDEL É ESTRANGEIRO, MAS O FOLHETO É BRASILEIRO!

REPORTAGENS SOBRE LEANDRO GOMES DE BARROS:

Conheça Leandro Gomes de Barros, o pai do cordel no Brasil - Globo Rural 02/01/2011 (2º Bloco) Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ukzY-qG5p2g 9:11 min Sesquicentenário do poeta Leandro Gomes de BarrosDisponível em: https://www.youtube.com/watch?v=CvHv005bNtw 7:00 min

A literatura de cordel

No Brasil cordel é sinônimo de poesia popular em verso. As histórias de batalhas, amores, sofrimentos, crimes, fatos políticos e sociais do país e do mundo, as famosas disputas entre cantadores, fazem parte de diversos tipos de texto em verso denominados literatura de cordel.

Os primeiros escritores de folhetos que saíram do campo em direção às cidades levavam consigo a esperança por melhores dias e as lembranças de contos e histórias de príncipes e princesas, reinos distantes, homens valentes e mocinhas indefesas, além das canções dos violeiros e repentistas que viajavam pelas fazendas animando festas e desafiando outros cantadores. Vivendo nas cidades os poetas começaram a transpor para o papel todo este universo de experiências. Além de contos e cantorias de viola, estavam guardados na memória o som dos maracatus, dos reisados, do coco e da embolada. É essa cultura, influenciada pelos ritmos afro-brasileiros, pela mistura entre rituais sagrados e profanos, que faz do cordel uma produção cultural distinta das outras.

O folheto vai para as ruas e praças e é vendido por homens que ora declamam os versos, ora cantam em toadas semelhantes às tocadas pelos repentistas. São nordestinos pobres e semialfabetizados que entram no mundo da escrita, das tipografias, da transmissão escrita e não apenas oral. A poesia popular, antes restrita ao universo familiar e a grupos sociais colocados à margem da sociedade (moradores pobres de vilas e fazendas, ex-escravos, pequenos comerciantes etc.), ultrapassa fronteiras, ocupa espaços outrora reservados aos escritores e homens de letras do país.

Da literatura de folheto à literatura de cordel

A expressão “literatura de cordel” foi inicialmente empregada pelos estudiosos da nossa cultura para designar os folhetos vendidos nas feiras, sobretudo em pequenas cidades do

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interior do Nordeste, em uma aproximação com o que acontecia em terras portuguesas. Em Portugal, eram chamados cordéis os livros impressos em papel barato, vendidos em feiras, praças e mercados.

Os cordéis portugueses, diferentemente dos folhetos brasileiros, eram escritos e lidos por pessoas que pertenciam às camadas médias da população: advogados, professores, militares, padres, médicos, funcionários públicos, entre outros. Em muitos casos, os cordéis eram comprados por uma pessoa letrada e lidos para um público não letrado, situação que se reproduz aqui no Brasil, onde os folhetos eram consumidos coletivamente.

DIA DE CINEMA!!!!!

As aventuras dos nordestinos João Grilo (Matheus Natchergaele), um sertanejo pobre e mentiroso, e Chicó (Selton Mello), o mais covarde dos homens. Ambos lutam pelo pão de cada dia e atravessam por vários episódios enganando a todos do pequeno vilarejo de Taperoá, no sertão da Paraíba. A salvação da dupla acontece com a aparição da Nossa Senhora (Fernanda Montenegro). Adaptação da obra homônima de Ariano Suassuna.

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CANTE LÁ QUE EU CANTO CÁ – PATATIVA DO ASSARÉ

Poeta, cantô de rua,Que na cidade nasceu,Cante a cidade que é sua,Que eu canto o sertão que é meu.

Se aí você teve estudo,Aqui, Deus me ensinou tudo,Sem de livro precisáPor favô, não mêxa aqui,Que eu também não mexo aí,Cante lá, que eu canto cá.

Você teve inducação,Aprendeu munta ciença,Mas das coisa do sertãoNão tem boa esperiença.Nunca fez uma paioça,Nunca trabaiou na roça,Não pode conhecê bem,Pois nesta penosa vida,Só quem provou da comidaSabe o gosto que ela tem.

Pra gente cantá o sertão,Precisa nele morá,Tê armoço de fejãoE a janta de mucunzá,Vivê pobre, sem dinhêro,Socado dentro do mato,De apragata currelepe,Pisando inriba do estrepe,Brocando a unha-de-gato.

Você é muito ditoso,Sabe lê, sabe escrevê,Pois vá cantando o seu gozo,Que eu canto meu padecê.Inquanto a felicidadeVocê canta na cidade,Cá no sertão eu infrentoA fome, a dô e a misera.Pra sê poeta divera,Precisa tê sofrimento.

Sua rima, inda que sejaBordada de prata e de ôro,Para a gente sertanejaÉ perdido este tesôro.Com o seu verso bem feito,Não canta o sertão dereito,Porque você não conheceNossa vida aperreada.E a dô só é bem cantada,Cantada por quem padece.

Só canta o sertão dereito,Com tudo quanto ele tem,Quem sempre correu estreito,Sem proteção de ninguém,Coberto de precisãoSuportando a privaçãoCom paciença de Jó,Puxando o cabo da inxada,Na quebrada e na chapada,Moiadinho de suó.

Amigo, não tenha quêxa,Veja que eu tenho razãoEm lhe dizê que não mêxaNas coisa do meu sertão.Pois, se não sabe o colegaDe quá manêra se pegaNum ferro pra trabaiá,Por favô, não mêxa aqui,Que eu também não mêxo aí,Cante lá que eu canto cá.

Repare que a minha vidaÉ deferente da sua.A sua rima pulidaNasceu no salão da rua.Já eu sou bem deferente,Meu verso é como a simenteQue nasce inriba do chão;Não tenho estudo nem arte,A minha rima faz parteDas obra da criação.

A LÍNGUA É NACIONAL, MAS O OXENTE É REGIONAL!

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Mas porém, eu não invejoO grande tesôro seu,Os livro do seu colejo,Onde você aprendeu.Pra gente aqui sê poetaE fazê rima compreta,Não precisa professô;Basta vê no mês de maio,Um poema em cada gaioE um verso em cada fulô.

Seu verso é uma mistura,É um tá sarapaté,Que quem tem pôca leituraLê, mais não sabe o que é.Tem tanta coisa incantada,Tanta deusa, tanta fada,Tanto mistéro e condãoE ôtros negoço impossive.Eu canto as coisa visiveDo meu querido sertão.

Canto as fulô e os abróioCom todas coisa daqui:Pra toda parte que eu óioVejo um verso se bulí.Se as vêz andando no valeAtrás de curá meus maleQuero repará pra serraAssim que eu óio pra cima,Vejo um divule de rimaCaindo inriba da terra.

Mas tudo é rima rastêraDe fruita de jatobá,De fôia de gamelêraE fulô de trapiá,De canto de passarinhoE da poêra do caminho,Quando a ventania vem,Pois você já tá ciente:Nossa vida é deferenteE nosso verso também.

Repare que deferençaIziste na vida nossa:Inquanto eu tô na sentença,Trabaiando em minha roça,Você lá no seu descanso,

Fuma o seu cigarro mando,Bem perfumado e sadio;Já eu, aqui tive a sorteDe fumá cigarro forteFeito de paia de mio.

Você, vaidoso e facêro,Toda vez que qué fumá,Tira do bôrso um isquêroDo mais bonito metá.Eu que não posso com isso,Puxo por meu artifiçoArranjado por aqui,Feito de chifre de gado,Cheio de argodão queimado,Boa pedra e bom fuzí.

Sua vida é divirtidaE a minha é grande pená.Só numa parte de vidaNóis dois samo bem iguá:É no dereito sagrado,Por Jesus abençoadoPra consolá nosso pranto,Conheço e não me confundoDa coisa mió do mundoNóis goza do mesmo tanto.

Eu não posso lhe invejáNem você invejá eu,O que Deus lhe deu por lá,Aqui Deus também me deu.Pois minha boa muié,Me estima com munta fé,Me abraça, beja e qué bemE ninguém pode negáQue das coisa naturáTem ela o que a sua tem.

Aqui findo esta verdadeToda cheia de razão:Fique na sua cidadeQue eu fico no meu sertão.Já lhe mostrei um ispeio,Já lhe dei grande conseioQue você deve tomá.Por favô, não mexa aqui,Que eu também não mêxo aí,Cante lá que eu canto cá.

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Disponível em: http://www.moisesneto.com.br/estudo66.pdf

O cavalo que defecava dinheiro – Leandro Gomes De Barros

Na cidade de MacaéAntigamente existiaUm duque velho invejosoQue nada o satisfaziaDesejava possuirTodo objeto que via

Esse duque era compadreDe um pobre muito atrasadoQue morava em sua terraNum rancho todo estragadoSustentava seus filhinhosNa vida de alugado.

Se vendo o compadre pobreNaquela vida privadaFoi trabalhar nos engenhosLonge da sua moradaNa volta trouxe um cavaloQue não servia pra nada

Disse o pobre à mulher:— Como havemos de passar?O cavalo é magro e velhoNão pode mais trabalharVamos inventar um "quengo"Pra ver se o querem comprar.

Foi na venda e de lá trouxeTrês moedas de cruzadoSem dizer nada a ninguémPara não ser censuradoNo fiofó do cavaloFoi o dinheiro guardado

Do fiofó do cavaloEle fez um mealheiroSaiu dizendo: — Sou rico!Inda mais que um fazendeiro,Porque possuo o cavaloQue só defeca dinheiro.

Quando o duque velho soubeQue ele tinha esse cavaloDisse pra velha duquesa:

—Amanhã vou visitá-loSe o animal for assimFaço o jeito de comprá-lo!

Saiu o duque vexadoFazendo que não sabia,Saiu percorrendo as terrasComo quem não conheciaFoi visitar a choupana,Onde o pobre residia.

Chegou salvando o compadreMuito desinteressado:— Compadre, Como lhe vai?Onde tanto tem andado?Há dias que lhe vejoParece está melhorado...

—É muito certo compadreAinda não melhoreiPorque andava por foraFaz três dias que chegueiMas breve farei fortunaCom um cavalo que comprei.

—Se for assim, meu compadreVocê está muito bem!É bom guardar o segredo,Não conte nada a ninguém.Me conte qual a vantagemQue este seu cavalo tem?

Disse o pobre: —Ele está magroSó o osso e o couro,Porém tratando-se deleMeu cavalo é um tesouroBasta dizer que defecaNíquel, prata, cobre e ouro!

Aí chamou o compadreE saiu muito vexado,Para o lugar onde tinhaO cavalo defecadoO duque ainda encontrouTrês moedas de cruzado.

Então exclamou o velho:— Só pude achar essas três!Disse o pobre: — Ontem à tardeEle botou dezesseis!Ele já tem defecado,Dez mil réis mais de uma vez.

—Enquanto ele está magroMe serve de mealheiro.Eu tenho tratado deleCom bagaço do terreiro,Porém depois dele gordoNão quem vença o dinheiro...

Disse o velho: — meu compadreVocê não pode tratá-lo,Se for trabalhar com eleÉ com certeza matá-loO melhor que você fazÉ vender-me este cavalo!

— Meu compadre, este cavaloEu posso negociar,Só se for por uma somaQue dê para eu passarCom toda minha família,E não precise trabalhar.

O velho disse ao compadre:— Assim não é que se fazNossa amizade é antigaDesde os tempo de seus paisDou-lhe seis contos de réisAcha pouco, inda quer mais?

— Compadre, o cavalo é seu!Eu nada mais lhe direi,Ele, por este dinheiroQue agora me sujeiteiPara mim não foi vendido,Faça de conta que te dei!

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O velho pela ambiçãoQue era descomunal,Deu-lhe seis contos de réisTodo em moeda legalDepois pegou no cabrestoE foi puxando o animal.

Quando ele chegou em casaFoi gritando no terreiro:— Eu sou o homem mais ricoQue habita o mundo inteiro!Porque possuo um cavaloQue só defeca dinheiro!

Pegou o dito cavaloBotou na estrebaria,Milho, farelo e alfaceEra o que ele comiaO velho duque ia lá,Dez, doze vezes por dia...

Aí o velho zangou-seComeçou loga a falar:—Como é que meu compadreSe atreve a me enganar?Eu quero ver amanhãO que ele vai me contar.

Porém o compadre pobre,(Bicho do quengo lixado)Fez depressa outro planoInda mais bem arranjadoEsperando o velho duqueQuando viesse zangado...

O pobre foi na farmáciaComprou uma borrachinhaDepois mandou encher elaCom sangue de uma galinhaE sempre olhando a estradaPré ver se o velho vinha.

Disse o pobre à mulher:— Faça o trabalho direitoPegue esta borrachinhaAmarre em cima do peitoPara o velho não saber,Como o trabalho foi feito!

Quando o velho aparecerNa volta daquela estrada,Você começa a falarEu grito: —Oh mulher

danada!Quando ele estiver bem perto,Eu lhe dou uma facada.

Porém eu dou-lhe a facadaEm cima da borrachinhaE você fica lavadaCom o sangue da galinhaEu grito: —Arre danada!Nunca mais comes farinha!

Quando ele ver você mortaParte para me prender,Então eu digo para ele:—Eu dou jeito ela viver,O remédio tenho aqui,Faço para o senhor ver!

—Eu vou buscar a rabecaComeço logo a tocarVocê então se remaxaComo quem vai melhorarCom pouco diz: —Estou boaJá posso me levantar.

Quando findou-se a conversaNa mesma ocasiãoO velho ia chegandoAí travou-se a questãoO pobre passou-lhe a faca,Botou a mulher no chão.

O velho gritou a eleQuando viu a mulher morta:Esteja preso, bandido!E tomou conta da portaDisse o pobre: —Vou curá-la!Pra que o senhor se importa?

—O senhor é um bandidoInfame de cara duraTodo mundo apreciavaEsta infeliz criaturaDepois dela assassinada,O senhor diz que tem cura?

Compadre, não admitoO senhor dizer mais nada,Não é crime se matarSendo a mulher malcriadaE mesmo com dez minutos,

Eu dou a mulher curada!

Correu foi ver a rabecaComeçou logo a tocarDe repente o velho viuA mulher se endireitarE depois disse: —Estou boa,Já posso me levantar...

O velho ficou suspensoDe ver a mulher curada,Porém como estava vendoEla muito ensanguentadaCorreu ela, mas não viu,Nem o sinal da facada.

O pobre entusiasmadoDisse-lhe: —Já conheceuQuando esta rabeca estavaNa mão de quem me vendeu,Tinha feito muitas curasDe gente que já morreu!

No lugar onde eu estiverNão deixo ninguém morrer,Como eu adquiri elaMuita gente quer saberMas ela me está tão caraQue não me convém dizer.

O velho que tinha vindoSomente propor questão,Por que o cavalo velhoNunca botou um tostãoQuando viu a tal rabecaQuase morre de ambição.

—Compadre, você desculpeDe eu ter tratado assimPorque agora estou certoEu mesmo fui o ruimPorém a sua rabecaSó serve bem para mim.

—Mas como eu sou um homemDe muito grande poderO senhor é um homem pobreNinguém quer o conhecerPerca o amor da rabeca...Responda se quer vender?

—Porque a minha mulher

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Também é muito estouvadaSe eu comprar esta rabecaDela não suporto nadaSe quiser teimar comigo,Eu dou-lhe uma facada.

—Ela se vê quase mortaJá conhece o castigo,Mas eu com esta rabecaSalvo ela do perigoEla daí por diante,Não quer mais teimar comigo!

Disse-lhe o compadre pobre:—O senhor faz muito bem,Quer me comprar a rabecaNão venderei a ninguémCusta seis contos de réis,Por menos nem um vintém.

O velho muito contenteTornou então repetir:—A rabeca já é minhaEu preciso a possuirEla para mim foi dada,Você não soube pedir.

Pagou a rabeca e disse:—Vou já mostrar a mulher!A velha zangou-se e disse:—Vá mostrar a quem quiser!Eu não quero ser culpadaDo prejuízo que houver.

—O senhor é mesmo um velhoAvarento e interesseiro,Que já fez do seu cavaloQue defecava dinheiro?—Meu velho, dê-se a respeito,Não seja tão embusteiro.

O velho que confiavaNa rabeca que comprouDisse a ela: —Cale a boca!O mundo agora virouDou-lhe quatro punhaladas,Já você sabe quem sou.

Ele findou as palavrasA velha ficou teimando,Disse ele: —Velha dos

diabosVocê ainda está falando?Deu-lhe quatro punhaladasEla caiu arquejando...

O velho muito ligeiroFoi buscar a rabequinha,Ele tocava e dizia:—Acorde, minha velhinha!Porém a pobre da velha,Nunca mais comeu farinha.

O duque estava pensandoQue sua mulher tornavaEla acabou de morrerPorém ele duvidavaDepois então conheceuQue a rabeca não prestava.

Quando ele ficou certoQue a velha tinha morridoBoto os joelhos no chãoE deu tão grande gemidoQue o povo daquela casaFicou todo comovido.

Ele dizia chorando:—Esse crime hei de vingá-loSeis contos desta rabecaCom outros seis do cavaloEu lá não mando ninguém,Porque pretendo matá-lo.

Mandou chamar dois capangas:—Me façam um surrão bem feitoFaçam isto com cuidadoQuero ele um pouco estreitoCom uma argola bem forte,Pra levar este sujeito!

Quando acabar de fazerMande este bandido entrar,Para dentro do surrãoE acabem de costurarO levem para o rochedo,Para sacudi-lo no mar.

Os homens eram dispostosFindaram no mesmo dia,O pobre entrou no surrãoPois era o jeito que haviaBotaram o surrão nas costas

E saíram numa folia.

Adiante disse um capanga:—Está muito alto o rojão,Eu estou muito cansado,Botemos isto no chão!Vamos tomar uma pinga,Deixe ficar o surrão.

&mdashEstá muito bem, companheiroVamos tomar a bicada!(Assim falou o capangaDizendo pro camarada)Seguiram ambos pra vendaFicando além da estrada...

Quando os capangas seguiramEle cá ficou dizendo:—Não caso porque não quero,Me acho aqui padecendo...A moça é milionáriaO resto eu bem compreendo!

Foi passando um boiadeiroQuando ele dizia assim,O boiadeiro pediu-lhe:—Arranje isto pra mimNão importa que a moçaSeja boa ou ruim!

O boiadeiro lhe disse:—Eu dou-lhe de mão beijada,Todos os meus possuídosVão aqui nessa boiada...Fica o senhor como dono,Pode seguir a jornada!

Ele condenado à morteNão fez questão, aceitou,Descoseu o tal surrãoO boiadeiro entrouO pobre morto de medoNum minuto costurou.

O pobre quando se viuLivre daquela enrascada,Montou-se num bom cavaloE tomou conta da boiada,Saiu por ali dizendo:—A mim não falta mais

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nada.

Os capangas nada viramPorque fizeram ligeiro,Pegaram o dito surrãoCom o pobre do boiadeiroVoaram de serra abaixoNão ficou um osso inteiro.

Fazia dois ou três mesesQue o pobre negociavaA boiada que lhe deramCada vez mais aumentavaFoi ele um dia passar,Onde o compadre morava...

Quando o compadre viu eleDe susto empalideceu;—Compadre, por onde andavaQue agora me apareceu?!Segundo o que me parece,Está mais rico do que eu...

—Aqueles seus dois capangasVoaram-me num lugarEu caí de serra abaixoAté na beira do marAí vi tanto dinheiro,Quanto pudesse apanhar!..

—Quando me faltar dinheiroEu prontamente vou ver.O que eu trouxe não é

pouco,Vai dando pra eu viverJunto com a minha família,Passar bem até morrer.

—Compadre, a sua riquezaDiga que fui eu quem dei!Pra você recompensar-meTudo quanto lhe arranjei,É preciso que me boteNo lugar que lhe botei!..

Disse-lhe o pobre: —Pois não,Estou pronto pra lhe mostrar!Eu junto com os capangasNós mesmo vamos levarE o surrão de serra abaixoSou eu quem quero empurrar!..

O velho no mesmo diaMandou fazer um surrão.Depressa meteu-se nele,Cego pela ambiçãoE disse: —Compadre eu estouÀ tua disposição.

O pobre foi procurarDois cabras de confiançaSe fingindo satisfeitoFazendo a coisa bem mansaSó assim ele podia,

Tomar a sua vingança.

Saíram com este velhoNa carreira, sem pararSubiram de serra acimaAté o último lugarDaí voaram o surrãoDeixaram o velho embolar...

O velho ia pensandoDe encontrar muito dinheiro,Porém secedeu com eleDo jeito do boiadeiro,Que quando chegou embaixoNão tinha um só osso inteiro.

Este livrinho nos mostraQue a ambição nada convémTodo homem ambiciosoNunca pode viver bem,Arriscando o que possuiEm cima do que já tem.

Cada um faça por si,Eu também farei por mim!É este um dos motivosQue o mundo está ruim,Porque estamos cercadosDos homens que pensam assim.

Disponível em: https://pt.wikisource.org/wiki/O_cavalo_que_defecava_dinheiro

Variação linguística

A linguagem é a característica que nos difere dos demais seres, permitindo-nos a oportunidade de expressar sentimentos, revelar conhecimentos, expor nossa opinião frente aos assuntos relacionados ao nosso cotidiano, e, sobretudo, promovendo nossa inserção ao convívio social.

E dentre os fatores que a ela se relacionam destacam-se os níveis da fala, que são basicamente dois: O nível de formalidade e o de informalidade. 

O padrão formal está diretamente ligado à linguagem escrita, restringindo-se às normas gramaticais de um modo geral. Razão pela qual nunca escrevemos da mesma maneira

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que falamos. Este fator foi determinante para a que a mesma pudesse exercer total soberania sobre as demais.

Quanto ao nível informal, este por sua vez representa a linguagem do dia a dia, das conversas informais que temos com amigos, familiares etc.

Compondo o quadro do padrão informal da linguagem, estão as chamadas variedades linguísticas, as quais representam as variações de acordo com as condições sociais, culturais, regionais e históricas em que é utilizada.

Disponível em: http://brasilescola.uol.com.br/gramatica/variacoes-linguisticas.htm

Variação regional

O Brasil é um país com um território amplo e mesmo assim ainda possui uma língua única. Além de contribuir para uma grande diversidade nos hábitos culturais, religiosos, políticos e artísticos, a influência de várias culturas deixou na língua portuguesa marcas que acentuam a riqueza de vocabulário e de pronúncia. É importante destacar que as diferenças na nossa língua não constituem erro, mas são consequências das marcas deixadas por outros idiomas que entraram na formação do português brasileiro. Entre esses idiomas estão os indígenas e africanos, além dos europeus, como o francês e o italiano. A influência desses elementos presentes em cada região do país, aliada ao desenvolvimento histórico de cada lugar, fez com que surgissem regionalismos, isto é, expressões típicas de determinada região. 

Regionalismo é, na língua, o emprego de palavras ou expressões peculiares a determinadas regiões. Em literatura, é a produção literária que focaliza especialmente usos, costumes, falares e tradições regionais.

Disponível em: http://letrasmarques2013.blogspot.com.br/2013/08/regionalismos.html

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A MOÇA QUE FOI ENTERRADA VIVA - João Martins de Athayde

Nos sertões de Teresina Habitava um fazendeiro, Era materialistaAlém disso interesseiro Só amava a duas coisasHomem valente e dinheiro

Era quase um analfabeto Ostentava o fanatismoMostrava grande afeiçãoPelo imperialismo Ele era um potentado Nos tempos do carrancismo

Como era muito rico Confiava em sua sorteEra o temor dos sertõesNaquela zona do NorteQue o que quisesse fazia,Ainda encarando a morte

Vivendo como casadoNa mais perfeita harmoniaTinha quatro filhos homensTodos em sua companhiaTinha uma filha moça,Por nome de Sofia

Esta moça era caçulaVinte e um anos contava, Os irmãos eram mais velhosMas nenhum se emancipava Só era dono de siNo dia que se casava

O velho não se importavaDe fazer revolução,Para sustentar o capricho Ou se vingar sua paixãoSeus filhos também seguiam Nessa mesma opinião

Quando ele conversavaNo meio de muita genteDizia: “Tenho uma filhaÉ uma moça decentePorém só casa com elaQuem for um bicho valente”

Com poucos dias depoisA noticia se espelhava, Qualquer um rapaz solteiroQue na estrada passavaJá ia com tanto medo,Pra fazenda nem olhava

Sofia se lastimava Dizendo: “Até onde vai,Este meu padecimentoSem se ver de onde saiEu hei de ficar solteira, Pra fazer gosto a meu pai?!”

Depois enxugou as lágrimasQue banhavam o lindo rostoDizia: “Eu encontrandoUm rapaz moço e dispostoEu farei com que meu paiPasse por esse desgosto”

Um rapaz sabendo distoSe condoeu da donzelaVendo que não encontravaOutra moça igual àquelaUm da determinou-se Dizendo: “Vou roubar ela”

Escreveu logo um bilheteDizendo: “Dona Sofia, Eu ontem fui sabedorDo que a senhora sofria

Fiquei muito indignadoPois lhe tenho simpatia

Conheço perfeitamenteQue vou entrar em perigoPorque seu pai conhecendoTorna-se meu inimigoBasta saber que a senhora, Pretende se casar comigo

Eu sou um rapaz solteiroNão tenho conta a quem darResponda esse bilhetePra eu me desenganarSe me aceita como esposo,O jeito eu vou procurar”

Sofia mandou o simPela manha muito cedo,Fazendo ver a seu noivo Que de nada tinha medoQueria falar com ele,No outro dia em segredo

O moço aí preveniu-seDe um punhal e um facão,Pistola boa na cintaCartucheira e muniçãoSeguiu para a casa do velho, Porém com boa intenção

Encontrou uma criadaCom um candeeiro na mãoPerguntou-lhe: “Onde é o quartoDa filha de seu patrão?”Diz ela: “Ao lado esquedoPela porta do oitão”

A noite era muito escura Por ali ninguém o viu,Ele tanto pelejou

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E tanto se retraiuQue entrou no quarto da moçaE o velho nem pressentiu

Foi entardecendo a noiteAcabaram de cear,Quando a moça entrou no quarto Para se agasalhar Foi avistando o rapaz, Ficou sem poder falar

O rapaz muito ligeiro Pegou ela pela mão,Porém com muito respeito Contou-lhe sua intençãoDizendo: “Eu arranjo tudo,Sem precisar de questão

Assim passaram a noiteA moça muito assustada Quando amanheceu o diaPor sua mãe foi chamadaPara cuidar dos trabalhos, Como era acostumada

O rapaz ficou no quartoDo povo se ocultou, Quando botaram o almoço Então a moça voltou De parelha com seu noivo Ao velho se apresentou

O rapaz saiu do quarto Seu rosto não demudava, Fincou o punhal na mesa Dizendo se aproximava:“É este o homem valente!...Que o senhor procurava?”

Sou eu, seu futuro genroQue amo a esta donzela, Tudo isso que já fizNão é criticando delaEmbora me custe a vida, Só me casarei com ela”...

O velho conheceu logoQue não tinha jeito a darCorreu a vista nos filhos Como quem quer avisarAí todos convidaram O moço para almoçar Ele aceitou o convitePorque não tinha precisãoDisse o velho mansamente:“Entre nós não há questãoPrecisamos fazer logo, Toda esta arrumação

O senhor vá para casaVeja que falta arrumar,Arrumação para a noivaEu também vou aprontarE o senhor no dia quinze,Venha para se casar”

Assim que o rapaz saiu O velho chamou Sofia,Dizendo: “Filha malditaQuem te deu tanta ousadia?Me obrigastes da fazerO que nunca pretendia!”

Aí gritou para os filhos, Dizendo de cara dura:“Agarrem esta malditaPrendam ela bem seguraE vão no quarto do meioCavem uma sepultura”

Naquele mesmo momentoSofia foi amarrada,Para o quarto que estavaA sepultura foi cavadaAonde a triste donzelaHavia de ser sepultada

Reuniu-se em roda delaToda aquela comitiva,O pai, a mãe, os irmãosPor infame tentativa

Condenaram a pobre moçaPara sepultarem-na viva

Naquela situaçãoQue estava a pobre Sofia, Pedindo ao pai, em soluços,E o velho não atendia:“Meu pai, não me mate hojeDeixe eu viver mais um dia!”

Sofia se lastimavaE o velho não dava ouvido,Depois disse para ela:“Nada vale o seu pedidoA senhora está passandoDa hora de ter morrido”

Sofia disse: “Meu paiTenha de mim compaixãoMande chamar o vigário Pra me ouvir em confissãoTalvez por este meioEu possa alcançar o perdão!”

“A senhora em parte algumaPodia ser perdoada, Não há sentença bastantePara filha excomungadaQuem fez o que você fezSó paga sendo queimada”

O velho zangou-se e disse:“Não quero mais discutirPalavras de sua bocaNão pretendo mais ouvirSiga; entre para a covaPara eu mandar entupir”

Aí botaram SofiaPra dentro da cova escura,O buraco foi cavado

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Com dez palmos de funduraQue sofrimento tiranoDesta infeliz criatura

O velho como uma feraMandou ela se deitarEla na ânsia da morteComeçou logo a gritarPedia aos outros: “Me acudamQue meu pai quer me matar!”

O velho era malvadoPior que o SatanásPegou Sofia dizendo:“Veja bem como se faz!”...Botou-lhe terra por cima, Até que não gritou mais

Aí seguiram para a salaEle, os filhos e a mulherDizendo: “Estou satisfeitoVou esperar o que houverSó fica mais perigoso, Se o noivo dela souber”

Logo preveniu-se tudoContra o noivo de SofiaNisto bateram à portaMandaram ver quem batiaEra o rapaz noivo dela, Porém de nada sabia

O velho disse para ele“O senhor de onde vem?Minha derrota está feitaAqui não me sai ninguém Matei sua noiva agora, E o senhor morre também”

Aí partiu para eleComo uma fera assanhada,O rapaz negou-lhe o corpoE deu-lhe uma punhalada

O velho caiu gritandoNão pode mais fazer nada

Reuniu-se contra eleOs quatro irmãos de Sofia,Atirando à queima-roupaMas nem um tiro atingiaE ele os poucos que dava, La um ou outro perdia

Com meia hora de lutaEstava tudo sem ação, Os quatro irmãos de SofiaDois morreram na questão Um correu espavoridoE o outro ficou no chão

O rapaz ficou sozinhoPorém já muito feridoQuando foi passando a portaOuviu um grande gemidoDiz ele: “Talvez SofiaInda não tenha morrido”

O rapaz muito feridoConhecendo que morria, Seguiu pela casa adentroProcurando quem gemiaAcertou logo no quarto Onde enterraram Sofia, No mesmo canto encontrou A alavanca e a enxada Os ferros que tinham sidoA dita cova cavadaCom eles tirou Sofia, Quase morta asfixiada

O leitor preste atenção Sofia foi arrancadaNão morreu por um motivoA cova não foi socadaSó fazia quatro horas, Que tinha sido enterrada

O rapaz muito doente

Ainda conduziu Sofia Pra casa de sua mãeQue nada disso sabia A velha quando viu eleQuase morre de agoniaNão fazia dez minutosQue o rapaz tinha chegado, Na casa de sua mãeQuando recebeu um recadoPelo irmão de SofiaIa ser assassinado

Disse o rapaz a Sofia:“Me acabo aqui mas não corroJá estou muito feridoDesta conheço que morroE também não me sujeitoGritar pedindo socorro”

Aí ele pediu à mãe:“Veja as armas que aí temO bacamarte, a espingardaE a pistola tambémE corra para bem longePorque o povo já vem”

A velha morta de medoTrouxe as armas e entregou Transpassada de agoniaChorando o abençoouTemendo a morte fugiuPorém Sofia ficou

O rapaz entrincheirou-se Bem na porta da entradaSofia estava por tudoNão se temia de nadaFoi botar o sei piquete Atrás pela retaguarda

Sofia triste pensando Tão depressa se acabarConhecendo que morriaTalvez antes de casarQuando levantou a vistaFoi vendo o grupo chegar

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O rapaz que estava pronto Com o seu revólver na mãoAmparou-se num portalEnfrentou o pelotãoCada tiro era um defuntoQue embolava no chão

Sofia na retaguardaInda emparelhou seisO bacamarte era bom Certa pontaria fezQuando puxou o gatilho,Caiu tudo de uma vez

Entrou um pela janelaSofia não pressentiu

O rapaz estava lutandoDe forma nenhuma o viu Atirou nele nas costasQue o pobre rapaz caiu

Aí pegaram SofiaQue não podia escapar, Cortaram todo o cabeloMandaram os olhos furarDepois dependuraram elaDizendo: “Vamos sangrar”

Sangraram devagarinhoPra ainda mais judiarAntes da moça morrerEles foram retalharEm pedaços tão pequenos

Que não puderam enterrar

Quem me contou essa históriaFoi um rapaz muito sério Foi testemunha de vistaDaquele caso funéreoOs corpos foram levadosNum cesto pro cemitério

O mundo está corrompidoO erro vem de atrásMuitos acontecimentosDe resultados fataisSó acontecem com as filhasQue vão de encontro aos pais

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A SORTE DE UMA MERETRIZ - João Martins de Athayde

Não se engane com o mundoQue o mundo não tem o que dar, Quem com ele se iludirIludido há de ficarPois temos visto exemplos,Que é feliz quem os tomar

Doze anos tinha AulinaSeu pai era fazendeiro, Casa que naquele tempoHavia tanto dinheiroMuitas joias de valor,Crédito no mundo inteiro

Aulina, eu creio, não tinhaOutra igual na perfeição, Parece que a naturezaCarregou mais nela a mãoPois nela via-se a força Do autor da criação

Os olhos dela fingiam Raios do sol da manhã,O rosto bem regularCorado como a romãParecia que as estrelas,Queriam chama-la irmão

Os dedos alvos e finos Qual teclados de piano, Quem a visse só diria Que não era corpo humano Parecia ser propósito, Do Divino Soberano

Também tinha tanto orgulho Que nem aos pais conhecia, Se julgava saliente A todo mundo que via Julgando que todo mundo A ela se curvaria

Quando inteirou vinte anos Por si se prostituiu O

pai quase enlouqueceu tanto desgosto sentiu Porque em toda família Um caso assim nunca viu

Logo que caiu no mundo Por todos foi abraçada, Por as mais altas pessoas Era sempre visitada Por fidalgos e militares, Por todos era adorada

Recebeu logo um presente De um palacete importante Com uma mobília sublime Dada pelo seu amante A obra de mais estima A quem se chama elegante

Para sala de visita Comprou um rico piano, Quatro consolos de mármore Um aparador de ébano Uma cômoda muito rica,Que só a de um soberano

Ricas cadeiras modernas Candeeiros importantes, Jarros de fino cristal Espelhos muito elegantes O retrato dela em um quadro Com quatro ou cinco brilhantes

Um grande damasco verde A sala toda cobria Toalha bordada a ouro Em qualquer quarto se via Era só de porcelana Toda a louça que existia

Nem é preciso falar

No quarto onde ela dormia, Porque já se viu na sala A riqueza que existia Agora na cama dela, Faça ideia o que havia

Durante cinco ou seis anos A vida dela era assim A casa era um céu de estrelas Rodeada de Marfim Vivia ela qual vive Um beija-flor no jardim

Adoeceu de repente Não cuidou logo em tratar-se Julgando que dos amantes Nenhum a desamparasse Devido à sua influência Qualquer médico curasse

Foi vice-verso o seu cálculo A si só chegaram dores, Foi perdendo a influência, Multiplicando os clamores Não foi mais em sua casa Nenhum dos adoradores

Pegou logo a empenhar As jóias que possuía, Por menos do seu valor Diversas coisas vendia E a moléstia no seu auge Crescendo de dia a dia

No período de dois anos Gastou o que possuía, Pegou logo pelas jóias De mais valor que existia Sofás, cadeiras e consolos, Vendeu tudo em um só dia

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Os quadros, os aparadores Pianos, relógios, espelhos Vendeu-os para curar Duas fístulas nos joelhos Já desejava encontrar Quem lhe desse alguns conselhos

Afinal vendeu a casa E a cama onde dormia Era o único objeto Que em seu poder existia Ainda um amante vendo Jamais a conheceria

"Meu Deus", exclamava ela Vai infeliz meu futuro Nasci em berço dourado Para morrer no monturo Quanta diferença existe, Da seda para o chão duro

Quantos lordes aos meus pés Se esqueciam de seus cargos, Me adoravam como santa Me mostrando mil afagos Hoje não vejo nenhum, Nesses dias tão amargos

Quede os grandes militares Que não podiam passar, Três dias numa semana Sem me virem visitar E faziam de mim santa, De meu divã um altar

Nada disso existe mais Tudo já se dissipou, As promessas e os presentes O vento veio e levou Em paga de tudo isso Na miséria me deixou

Essas dores que hoje sofro

É justo que sofra elas, Essas lágrimas que eu derramo Serão em pagas daquelas Que fiz gotejar dos olhosDas casadas e das donzelas

Sinto dores com excesso Ouço a voz da consciência Me dizer: "Filha maldita Tua desobediência Clamará perante Deus E pedirá providência"

Ela em soluços exclamava: "Meu Deus, tende compaixão, Nega-me tudo na vida Mas me alcançai o perdão Santíssima Virgem, rogai, Pela minha salvação"

Que cobertores tão caros Já forraram meu colchão, Que cortinas de seda De grande admiração Hoje não tenho uma estopa Que forre aqui esse chão

Ricos vestidos de seda Lancei muitos no monturo, Saias ainda em estado Camisa de linho puro Não pensava na desgraça Que vinha para o futuro

Minha mesa nesse tempo Tinha de tudo que havia, Só mesa de um personagem De alta categoria Hoje o resto de uma sopa Quando agora me servia

Peço esmola a quem passa

Esse nem me dá ouvido, Quem outrora me adorava Não ouve mais meu gemido Passa por mim torce a cara, Se finge desconhecido

Eu era como uma flor Ao despontar da manhã Representava outrora Aquela deusa louçã Meus amantes perguntavam, Se a lua era minha irmã

As majestades chegavam Antes da celebração, Humildes como um escravo Me faziam saudação Como se a render-me culto Seria uma obrigação

O exército e o comércio A arte e agricultura, Todos me ofereciam Seu afeto de ternura Tudo vinha admirar Minha grande formosura

Mas eu vivia enganada Com essas tristes carícias, Eu bem podia saber Que o mundo não tem delícias É um gozo provisório, É um cofre de malícias

Donzelas eis o exemplo para todos que estão vendo, Não me viram a poucos dias Como o sol que vem nascendo? Já estou aqui no chão, Os tapurus me comendo

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Ah! meu pai se tu me visse Nessa miséria prostrada, Embora que vossa face Foi por mim injuriada Talvez que ainda dissesse: "Deus te perdoe, desgraçada"

Ah! minha mãe carinhosa Se eu agora te abraçasse,

Inda com essa agonia Talvez que me consolasse E antes de partir do mundo, Essa sede saciasse

Sinto o soluço da morte Já é hora de partir, Peço ao meu anjo da guarda Para comigo assistir

Porque temo que o demônio, Não venha me perseguir"

Uma velha caridosa Trouxe água, ela bebeu, Matou a sede que tinha E graças a Jesus rendeu Erguendo os olhos ao céu, Nesse momento morreu.

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João Martins de Athayde (24/06/1880 – 07/08/1959)

O poeta popular e editor de folhetos João Martins de Athayde nasceu no povoado de Cachoeira de Cebolas, município de Ingá do Bacamarte, Paraíba, no dia 23 de junho de 1880.

Nunca freqüentou uma escola. Aprendeu a ler e escrever sozinho. Segundo seu próprio depoimento, aos oito anos, assistindo pela primeira vez a um desafio de Pedra Azul, um famoso cantador da região, começou a se interessar e fazer poesia popular. Fez sua primeira rima aos doze anos de idade. 

Em 1898, por causa da seca, migrou da sua cidade natal para Camaragibe, um município da Região Metropolitana do Recife, Pernambuco, mudando-se, posteriormente, para a capital, onde trabalhou como auxiliar de enfermagem no Hospital Português. 

Seu primeiro folheto de cordel, O preto e o branco apurando qualidade, que alcançou grande sucesso de vendas, foi escrito, em 1908, e impresso na Tipografia Moderna. A partir daí, começou a vender folhetos de sua autoria e de outros em feiras e mercados do Recife. 

Em 1909, conseguiu montar uma pequena tipografia na Rua do Rangel,bairro de São José, tornando-se um dos maiores editores de folhetos de cordel do País. Da sua oficina saíram, durante mais de quarenta anos, estórias fantásticas, recriações de estórias famosas, crítica de costumes, notícias de acontecimentos da época que divertiam, informavam e educavam o homem da cidade grande e das localidades mais distantes do  Nordest e  brasileiro. 

Os folhetos que tivessem a marca de João Martins de Athayde tinham sucesso garantido, independente da autoria. Com um próspero negócio no “ramo do poesia”, Athayde deu oportunidades de emprego a poetas, folheteiros, agentes e distribuidores, dando uma grande contribuição para o desenvolvimento da arte e da comercialização do folheto popular no Recife.  

João Martins de Athayde foi o desbravador da indústria do folheto de cordel no País. Industrializando e comercializando sua produção e a de outros artistas, criou uma grande rede de atividades lucrativas no Nordeste, que se espalhou para outras regiões brasileiras, possibilitando a diversos poetas populares se dedicarem exclusivamente à poesia como atividade profissional. Foi o responsável por profundas mudanças na edição de folhetos de cordel, no que se refere à relação entre os artistas e a tipografia, criando, inclusive, contratos de edição com o pagamento de direitos de propriedade intelectual, assim como na apresentação gráfica dos folhetos.

A VISÃO DA MULHER NO FOLHETO DEPENDE DO CONTEXTO!

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 Athayde foi aclamado na década de 1940 como o maior poeta popular do Nordeste,

sendo elogiado por Tristão de Athayde e Mário de Andrade. Tinha uma grande admiração por Leandro Gomes de Barros, escrevendo em sua homenagem, em 1918, o folheto A pranteada morte do grande poeta Leandro Gomes de Barros. 

Em 1921, comprou à viúva de Leandro, por seiscentos mil réis, os direitos de publicação de toda a obra do poeta paraibano. Foi acusado então de publicar como sua a obra de Leandro e de ter posto o seu nome em poemas de vários outros poetas populares de quem também comprou o direito de edição. No caso da obra de Leandro, no início ele se colocava como editor proprietário e, posteriormente, retirou a informação da autoria de Leandro, chegando até a modificar alguns acrósticos (última estrofe da poesia, cujas letras iniciais identificam o autor da obra). 

Em 1949, sofreu um acidente vascular cerebral, tendo que se afastar de suas atividades. 

Em 1950, vendeu a tipografia e os direitos de edição a José Bernardo da Silva, proprietário da Tipografia São Francisco, localizada em Juazerio de Norte, Ceará, que passou a ser o maior centro editorial de folhetos de cordel do Nordeste, posição ocupada até então pelo Recife. 

Para o pesquisador popular Liêdo Maranhão, os poetas Leandro Gomes de Barros e João Martins de Athayde deveriam ter um monumento na Praça do Mercado de São José, pelos relevantes serviços prestados à poesia e ao folclore nordestinos. 

João Martins de Athayde morreu no dia 7 de agosto de 1959, na cidade de Limoeiro, Pernambuco, onde viveu seus últimos anos de vida.

Disponível em: http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/index.php?

option=com_content&view=article&id=375&Itemid=189

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A PROPOSTA

De acordo com os estudos, leituras e discussões realizados nas aulas anteriores, redija um

texto que corresponda às normas do gênero Folheto. Lembre-se que ele deverá ser escrito

com base em uma das três temáticas em que você já foi contemplado nas aulas anteriores,

que são:

O cordel é estrangeiro, mas o folheto é brasileiro!

A língua é nacional, mas o oxente é regional!

A mulher no folheto, depende do contexto!

OFICINA DE FOLHETOS

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O que é um verso?

É cada uma das linhas constitutivas de um poema. (o mesmo que pé).

Versos brancos: versos não rimados; versos soltos.Verso de seis pés: sextilhasVerso de pé quebrado: Verso errado ou malfeito

O que é estrofe?É um grupo de versos que apresentam, comumente, sentido completo, o mesmo que estância. Existem vários tipos de estrofes, no cordel as mais usadas são: quadra (que caiu em desuso), sextilha, setilha e décima. Veja os exemplos abaixo:

Quadra (estrofes de quatro versos de sete sílabas)

O sabonete cheiroso,Bonitinho e perfumado;Ele ouviu alguns rumoresQue o deixou encabulado. (A briga do sabão com o sabonete, Izaías Gomes de Assis)

Sextilhas (estrofes de seis versos de sete sílabas)

A sujeira aqui em baixoJá está fazendo malE o Homem achando poucoLá no Espaço SideralContamina nossa órbitaCom o lixo espacial. (A Terra pede socorro, Izaías Gomes de Assis)

Setilhas (estrofes de sete versos de sete sílabas)

Bin Laden conectadoCom Nete ficou teclandoPassando noites no MessagenPor ela se declarando.Bom! Gosto não se discute,Mas não é que pelo OrkutUm romance foi rolando. (Férias que Bin Laden passou em Natal, Izaías Gomes de Assis)

Décimas

Se eu morrer neste lugarCessando aqui minha lidaLá do outro lado da vidaDo Sertão hei de lembrarE se Deus me castigarSerá branda a punição

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Pois ele dirá então:– Pior castigo foi serUm sertanejo e viverDistante lá do Sertão. (Saudades do meu sertão, Izaías Gomes de Assis)

O que é métrica?

Arte que ensina os elementos necessários à feitura de versos medidos.Sistema de versificação particular a um poeta: (Dicionário Aurélio)Uma sílaba poética é diferente de uma sílaba comum. É possível unir duas ou mais sílabas ou fonemas em apenas uma sílaba poética. Veja o verso abaixo:

Lá do_outro lado da vidaObserve que essa estrofe tem oito sílabas comuns, mas poeticamente só tem sete sílabas metrificadas.

1     2      3     4    5    6   7Lá do ou  tro   la   do da vi daA sílaba poética é pronunciada como ouvimos os versos, por isso a sonoridade é importante num verso metrificado (a essa contração dá-se o nome de crase ou elisão) e só se conta as sílabas até a sílaba tônica da última palavra.Veja outro exemplo:Em pleno século vinte,O colossal transatlânticoPartindo lá da_InglaterraE_atravessando o Atlântico,Chega à_América em cem horas.Feito digno de cântico. (Manuel Azevedo, A tragédia do Nyengurg)As sílabas em negrito são as sílabas tônicas das últimas palavras, onde termina a contagem das sílabas métricas, e as sílabas sublinhadas são as que se contraem formando uma única sílaba.

Observa-se que três vocais se contraindo no quinto verso e no sexto verso a consoante “g” forma uma sílaba.Na literatura de cordel geralmente usa-se os versos de sete sílabas (redondilhas maiores) e os versos de dez sílabas (decassílabos). Outro ex.:Vou narrar uma históriaDe_um pavão misteriosoQue levantou vôo da GréciaCom um rapaz corajosoRaptando_uma condessaFilha de_um conde_orgulhoso. (* Romance do Pavão Misterioso.)

O que é rima?

Identidade de som na terminação de duas ou mais palavras. Palavra que rima com outra.

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Rimas ricas

Rimas entre palavras de que só existem poucas, ou raríssimas, (chamadas também de rimas difíceis) com a mesma terminação, como novembro e dezembro; túmido e úmido, ou, segundo critério mais seguro, entre palavras de classes gramaticais distintas, como santo (adjetivo) e enquanto (conjunção), minha (pronome)e caminha(verbo).

Rimas pobres

Rimas entre palavras de que se encontra superabundância com a mesma terminação, (chamadas também de rimas fáceis) como agonia e sombria; caminhão e pão ou entre palavras antônimas, como fiel e infiel, simpático e antipático, ou, ainda, segundo critério preferível, entre vocábulos da mesma classe gramatical, como chorasse (verbo) e cantasse (verbo); meu (pronome) e seu (pronome).Rimas toantesAquelas em que só há identidade de sons nas vogais, a começar das vogais tônicas até a última letra ou fonema, ou algumas vezes, só nas vogais tônicas, ex.: fuso e veludo; cálida e lágrima. (essa forma não é aceita na cantoria nem na literatura de cordel).

Rimas consoantes

As que se conformam inteiramente no som desde a vogal tônica até a última letra ou fonema. Ex.: fecundo e mundo; amigo e contigo; doce e fosse; pálido e válido; moita e afoita.  (essa é a forma adotada nas cantorias e na literatura de cordel por ser uma rima perfeita).Palavras com grafia diferente, mas com fonemas (sons) iguais são consideradas rimas perfeitas, ex.: chorasse e face; princesa e riqueza; peça e pressa; seis e mês; faz e mais, PT e dendê.Temos que ter maior cuidado com palavras estrangeiras, porém podem ser usadas, ex.: discute e orkut; batuque e notebook; bauex e você; Internet e chevete, gay e rei. (Existe uma linha de poetas contemporâneos que não utilizam a rima com grafia diferente).

Rimas aparentes (em hipótese alguma se usa no cordel)

São palavras que enganam pelas suas sonoridades parecem que rimam com outras, porém não rimam, ex.: Ceará e cantar; café e chofer; doutor e cantou; desistir e aqui; preferido e amigo; esperto e concreto, pensamento e centro; menina e clima; métrica e genérica; pensamento e tempo vazio e sumiu;cururu e azul.Cuidado que tem palavras que praticamente não existem rimas para elas, ex.: pizza, tempo, cinza e lâmpada.

CUIDADO: Não se rima plural com singular.Devido um fato histórico-linguístico não se rima palavras terminadas em “l” com terminadas em “u”, ex.: Brasil e viu; Natal e bacurau Gabriel e chapéu não rimam.

Boas rimas!!!

Disponível em: http://cordeldobrasil.com.br/v1/aprenda-fazer-um-cordel/

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Literatura oral

Faz parte da literatura oral os mitos, lendas, contos e provérbios que são transmitidos oralmente de geração para geração. Geralmente, não se conhece os autores reais deste tipo de literatura e, acredita-se, que muitas destas estórias são modificadas

com o passar do tempo. Muitas vezes, encontramos o mesmo conto ou lenda com características diferentes em regiões diferentes do Brasil. A literatura oral é considerada uma importante fonte de memória popular e revela o imaginário do tempo e espaço onde foi criada.

Muitos historiadores e antropólogos estudam este tipo de literatura com o objetivo de buscarem informações preciosas sobre a cultura e a história de uma época. Em meio a ficção, resgata-se dados sobre vestimentas, crenças, comportamentos, objetos, linguagem, arquitetura etc.

Podemos considerar como sendo literatura oral os cantos, encenações e textos populares que são representados nos folguedos.

Exemplos de mitos, lendas e folclore brasileiro: saci-pererê, curupira, boto cor de rosa, caipora, Iara, boitatá, lobisomem, mula-sem-cabeça, negrinho do pastoreio.

Disponível em: http://www.suapesquisa.com/cordel/

É NO RAP, OU NO REPENTE – Caju e Castanha

É no rap ou no repente,é na batida do pandeiro,sou poeta brasileiro,e a minha vida é cantar.E na poesia que eu faço,eu nasci para improvisar. (bis)

Venha do jeito que queira,seja do jeito que for,eu também tenho meu valor,os meus versos são ligeiros.E na levada do pandeiro,Eu nasci para improvisar. (bis)

Paparaparapapa, 

TIPOS DE FOLHETOS

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tararaturututu,tapioca contra caju,manga, abacaju e caja.E no swing do pandeiro,eu nasci para improvisar. (bis)

Sou repente, sou tumada,minha rima tem história,cantador comigo choraquando eu começo a cantar.E na pancada do pandeiro,eu nasci para improvisar. (bis)

Rap:

Fala cantador,canta cantador,entre pra essa rima que tua história tem valor.

Quando você canta,encanta a multidão,na escola da vida vai cantando esse refrão.

Eu sou o castanha,você pode acreditar,no décimo repente eu também sei improvisar.

Eu sou o caju,faço filinha de fé,dança a mão no rádio como são todo repente.

Disponível em: https://www.vagalume.com.br/caju-castanha/no-rap-ou-no-repente.html

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Sobre o repente

O repente nordestino é uma das diversas formas que surgiu de interpretação de canto e poesia a partir da tradição medieval ibérica dos trovadores. Seus personagens, chamados de repentistas ou cantadores improvisam versos sobre os mais variados assuntos, e andando pelas feiras e espaços populares se apresentam sozinho ou trocam versos com outro cantador, o chamado desafio.

O estilo é característico da região nordeste do Brasil, e praticado em especial pelos habitantes da região do sertão paraibano e pernambucano, mais especificamente na região do Pajeú e Sertão do Moxotó (PE) e Serra do Teixeira e Cariri Ocidental (PB), onde estão as cidades de São José do Egito, Sertânia, Arcoverde (PE), Teixeira, Princesa e Monteiro (PB). 

Com a migração de muitos nordestinos para a cidade de São Paulo, a cantoria se tornou uma tradição conhecida em todo o Brasil, a partir da mídia massiva que a capital paulista dispõe. Também foi a partir de São Paulo que os cantadores começaram a adotar uma viola de dez cordas criada pelos fabricantes e comerciantes de instrumentos Del Vecchio, a chamada "viola dinâmica", com seus característicos bocais de metal, inspirada em modelos americanos das fábricas National e Dobro, diferentes apenas pelo corpo do instrumento, fabricado em metal. A viola dinâmica de dez cordas se tornou um símbolo dos cantadores, especialmente a partir da década de 70 do século XX.

Disponível em: http://www.infoescola.com/musica/repente/

O que é uma Peleja?

Nesse tipo de folheto, cada poeta mostra suas habilidades no verso e tenta depreciar o

oponente. As pelejas podem basear-se em desafios reais ou imaginários e geralmente são

escritas em versos de sete sílabas. Quando escrita, a descrição da luta é antecedida por uma

pequena introdução em que são apresentados os cantadores, o lugar da disputa, o público e os

antecedentes. Os folhetos possuem outras características formais que se assemelham aos

repentes, tais como o mote, tema em forma de verso, proposto por cantadores durante uma

disputa.

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O que é um folheto de circunstância?

Os folhetos de circunstância, outra modalidade da literatura de cordel, não podem ser

confundidos com o relato jornalístico dos acontecimentos. Nesses folhetos é possível

encontrar desde as últimas notícias sobre os acontecimentos do país e do mundo, até histórias

curiosas [...].

Os fatos eram narrados logo depois de acontecidos e por esta razão os folhetos de

circunstância, também chamado folhetos de época, têm um tempo limitado de venda, exceção

feita aos que se tornam clássicos.

O que é um ABC?

Além dos folhetos que narram fatos do dia a dia existem os ABCs, poemas narrativos

em que cada estrofe corresponde a uma letra do alfabeto. Os ABCs dão conta de um assunto

de A a Z e neles cabem vários tipos de histórias. Esse modelo de composição revela o poder

de inventividade do poeta, sendo comumente encontrado na literatura infantil.

O que é um romance?

Os romances são comumente escritos em sextilhas [...]. Nas primeiras estrofes ficamos conhecendo os heróis e heroínas, os vilões, o lugar onde se passa a história, o tipo de história (de luta, aventura, humor, amor, mistério...).

Em relação aos aspectos formais, pode-se ressaltar a presença de poucos personagens e a ausência de descrições detalhadas de paisagens e situações. Não existem restrições temáticas, mas os aspectos da vida no Nordeste possuem maior destaque. Também se encontram nos folhetos adaptações de romances e peças teatrais.

MARINHO, Ana Cristina. O cordel no cotidiano escolar. São Paulo: Cortez, 2012.

A PELEJA DO CEGO ADERALDO COM ZÉ PRETINHO – Firmino Teixeira do Amaral

Apreciem meus leitoresUma forte discussão

que tive com Zé PretinhoUm cantador do sertão

O qual no tanger do versoVencia qualquer questão

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Um dia determineiA sair do QuixadáUma das belas cidadesDo estado do CearáFui até ao PiauíVer os cantores de lá

Hospedei-me em PimenteiraDepois em AlagoinhaCantei em Campo MaiorNo Angico e na BaixinhaDe lá tive um convitePra cantar na Varzinha

Quando cheguei na VarzinhaFoi de manhã bem cedinhoEntão o dono da casaMe perguntou sem carinho:Cego, você não tem medoDa fama de Zé Pretinho?

Eu lhe disse: Não senhorMas da verdade eu não zomboMande chamar esse pretoQue eu quero dar-lhe um tomboEle vindo um de nós doisHoje há de arder o lombo

O dono da casa disse:Zé Preto pelo comumDá em dez ou vinte cegosQuanto mais sendo só um;Mandou ao MacumanzeiroChamar José do Tucum

Chamou um dos filhos e disseMeu filho, você vá jáDizer a José PretinhoQue desculpe eu não ir láE ele como sem faltaÀ noite venha por cá

Em casa do tal PretinhoFoi chegando o portadorFoi dizendo: Lá em casaTem um cego cantadorE meu pai manda dizerQue vá tirar-lhe o calor

Zé Pretinho respondeu:- Bom amigo é quem avisaMenino, dizei ao cegoQue vá tirando a camisaMande benzer logo o lombo

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Que eu vou dar-lhe uma pisa

Tudo zombava de mimEu ainda não sabiaQue o tal José PretinhoVinha para a cantoriaÀs cinco horas da tardeChegou a cavalaria

O preto vinha na frenteTodo vestido de brancoSeu cavalo encapotadoCom um passo muito francoRiscaram de uma só vezTodos no primeiro arranco

Saudaram o dono da casaTodos com muita alegriaO velho bem satisfeitoFolgava alegre e sorriaVou dar o nome do povoQue veio pra cantoria

Vieram o capitão DudaTonheiro Pedro GalvãoAugusto Antônio FeitosaFrancisco Manuel SimãoSenhor José CarpinteiroFrancisco e Pedro Aragão

O José da CabeceiraE seu Manuel CasadoChico Lopes, Pedro RosaE Manuel BronzeadoAntônio Lopes de AquinoE um tal de Pé Furado

José Antônio de AndradeSamuel e JeremiasSenhor Manuel TomásManduca João de AnaniasE veio o vigário velhoCura de três freguesias

Foi dona MeridianaDo grêmio das professorasEssa levou duas filhasBonitas e encantadorasEssas eram da igrejaAs mais exímias cantoras

Foi também Pedro MartinsAlfredo e José RaimundoSenhor Francisco PalmeiraJoão Sampaio Secundo

E um grupo de rapazesDo batalhão vagabundo

Levaram o negro pra salaE depois para a cozinhaLhe ofereceram um jantarDe doce, queijo e galinhaPara mim veio um caféCom uma magra bolachinha

Depois trouxeram o negroE colocaram no salãoAssentado num sofáCom a viola na mãoJunto a uma escarradeiraPara não cuspir no chão

Ele tirou a violaDum saco novo de chitaE cuja viola estavaToda enfeitada de fitaOuvi as moças dizendo:Grande viola bonita!

Então para me sentarBotaram um pobre caixãoJá velho desmanteladoDesses que vem com sabãoEu sentei, ele envergouE me deu um beliscão

Eu tirei a rabequinhaDum pobre saco de meiaUm pouco desconfiadoPor está em terra alheiaOuvi as moças dizendo:Meu Deus, que rabeca feia!

Um disse a Zé Pretinho:A roupa do cego é sujaBotem três guardas na portaPara que ele não fujaCego feio assim de óculosSó parece uma coruja

Dissera o capitão DudaComo homem mui sensatoVamos fazer uma bolsaBotem dinheiro no pratoQue é mesmo que botarManteiga em venta de gato

Disse mais: eu quero verPretinho espalhar os pésE para os dois cantores

Tirei setenta mil réisMas vou inteirar oitentaDa minha parte dou dez

Me disse o capitão Duda– Cego, você não estranhaEste dinheiro do pratoEu vou lhe dizer quem ganhaPertence ao vencedorNada leva quem apanha

Nisto as moças disseram:Já tem oitenta mil réisPorque o capitão DudaDa parte dele deu dezSe encostaram a Zé PretinhoE botaram mais três anéis

Então disse Zé Pretinho:De perder não tenho medoEste cego apanha logoFalo sem pedir segredoTendo isto como certoBotou os anéis no dedo

Afinemos os intrumentosEntremos em discussãoO meu guia disse a mim:O negro parece o cãoTenha cuidado com eleQuando entrar em questão

Eu lhe disse: seu JoséSei que o senhor tem ciênciaParece que és dotadoDa Divina ProvidênciaVamos saudar o povoCom a justa excelência

P- Sai daí, cego amareloCor de ouro de toucinhoUm cego da tua formaChama-se abusa vizinhoAonde eu botar os pésCego não bota o toucinho

C- Já vi que seu Zé PretinhoÉ um homem sem açãoComo se maltrata outroSem haver alteraçãoEu pensava que o senhorPossuísse educação

P- Esse cego bruto hojeApanha que fica roxo

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Cara de pão de cruzadoTesta de carneiro mochoCego, tu és um bichinhoQue quando come vira o cocho

C- Seu José, o seu cantarMerece ricos fulgoresMerece ganhar na salaRosas e trovas de amoresMais tarde as moças lhe dãoBonitas palmas de flores

P- Cego, creio que tu ésDa raça do sapo sungaCego não adora a DeusO Deus de cego é calungaAonde os homens conversamO cego chega e resmunga

C- Zé Preto não me aborreçaCom o teu cantar ruimO homem que canta bemNão trabalha em verso assimTirando as faltas que temBotando em cima de mim

P- Cala-te cego ruimCego aqui não faz figuraCego quando abre a bocaÉ uma mentira puraO cego quanto mais menteInda mais sustenta a jura

C- Esse negro foi escravoPor isso é tão positivoQuer ser na sala de brancoExagerado e ativoNegro da canela secaTodo ele foi cativo

P- Dou-te uma surraDe cipó de urtigaFuro-te a barrigaMais tarde tu urraHoje o cego esturraPedindo socorroSai dizendo: eu morroMeus Deus que fadigaPor uma intrigaEu de medo corro…

C- Se eu der um tapaNum negro de famaEle come lamaDizendo que é papa

Eu rompo-lhe o mapaLhe rasgo de esporaO negro hoje choraCom febre e com ínguaEu deixo-lhe a línguaCom um palmo de fora

P- No sertão eu pegueiUm cego malcriadoDanei-lhe o machadoCaiu eu sangreiO couro eu tireiEm regra de escalaEspichei numa salaPuxei para um becoE depois dele secoFiz mais de uma malha

C- Negro és monturoMolambo rasgadoCachimbo apagadoRecanto de muroNegro sem futuroPerna de tiçãoBoca de porãoBeiço de gamelaVenta de moelaMoleque ladrão

P- Vejo a cousa ruimO cego está danadoCante moderadoEu não quero assimOlhe pra mimQue sou verdadeiroSou bom companheiroCante sem maldadeEu quero a metadeCego, do dinheiro

C- Nem que o negro sequeA engolideiraPeça a noite inteiraQue eu não lhe abrequeMas este molequeHoje dá pinoteBoca de bispoteVenta de boieiroTu queres dinheiroEu dou-te chicote

P- Cante mais modernoPerfeito e bonitoComo tenho escritoCá no meu caderno

Sou seu subalternoEmbora estranhoCreio que apanhoE não dou um caldoTe peço, AderaldoReparta do ganho

C- Negro é raizQue apodreceuCasco de judeuMoleque infelizVai pra teu paísSenão eu te surroDou-te até de murroTiro-te o regaloCara de cavaloCabeça de burro

P- Fala doutro jeitoCom melhor agradoSeja delicadoCante mais perfeitoOlhe, eu não aceitoTanto desesperoCante mais maneiroCom versos capazFaçamos a pazReparta o dinheiro

C- Negro careteiroEu rasgo-te a gibaCara de guaribaPajé feiticeiroQueres dinheiroBarriga de anguBarba de quanduCamisa de saiaTe deixo na praiaEscovando urubu

P- Eu vou mudar de toadaPara uma que mete medoNunca achei um cantorQue desmanchasse esse enredoÉ um dedo é um dado é um diaÉ um dia é um dado é um dedo

C- Zé Preto este teu enredoTe serve de zombariaTu hoje cegas de raivaO diabo será teu guiaÉ um dia é um dado é um dedoÉ um dedo é um dado é um dia

P- Cego respondestes bem

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Como se estivesse estudadoEu também de minha parteCanto verso aprumadoÉ um dedo é um dado é um diaÉ um dia é um dedo é um dado

C- Vamos lá, José PretinhoQue eu já perdi o medoSou bravo como o leãoSou forte como o penedoÉ um dedo é um dado é um diaÉ um dia é um dado é um dedo

P- Cego agora puxa umaDas tuas belas toadasPara ver se essas moçasDão algumas gargalhadasQuase todo o povo riSó as moças estão caladas

C- Amigo José PretinhoEu não sei o que seráDe você no fim da lutaPorque vencido já está– Quem a paca cara compraA paca cara pagará

P- Cego, estou apertadoQue só um pinto no ovoEstás cantando aprumadoE satisfazendo ao povo

Este seu lema da pacaPor favor cante de novo

C- Digo uma e digo dezNo cantar não tenho pompaPresentemente não achoQuem o meu mapa rompaPaca cara pagaráQuem a paca cara compra

P- Cego, teu peito é de açoFoi bom ferreiro que fezPensei que o cego não tinhaNo verso tal rapidezCego, se não for massadaRepita a paca outra vez

C- Arre com tanta perguntadeste negro capivaraNão há quem cuspa pra cimaQue não lhe caia na cara– Quem a paca cara compraPagará a paca cara

P- Agora cego me ouçaCantarei a paca jáTema assim é um borregoNo bico de um carcaráQuem a cara cara compraCaca caca Cacará

Houve um trovão de risadasPelo verso do PretinhoO capitão Duda disse:Arrede, pra lá negrinhoVai descansar teu juízoO cego canta sozinho

Ficou vaiado o PretinhoAí eu lhe disse: me ouçaJosé, quem canta comigoPega devagar na louçaAgora o amigo entregueO anel de cada moça

Desculpe José PretinhoSe não cantei a seu gostoNegro não tem pé, tem ganchoNão tem cara tem é rostoNegro na sala de brancoSó serve pra dar desgosto

Quando eu fiz estes versosCom a minha rabequinhaProcurei o negro na salaJá estava na cozinhaDe volta queria entrarNa porta da camarinha

Disponível em: http://osrascunhos.blogspot.com.br/2011/07/poesia-peleja-do-cego-aderaldo-com-ze.html

Terror nas Torres Gêmeas – José João dos Santos (Mestre Azulão)

Como poeta repórterNordestino BrasileiroDescrevo neste cordelUm lamentável roteiroDo mais cruel fanatismoNum ato de terrorismoQue abalou o mundo inteiro

Uma môça americanaMuito educada e gentilVeio até a minha casaFez-me um convite febril

Para ir ao Cite LoreEntre cordel e folcloreRepresentar o Brasil

(…)

Foi no dia dez de AbrilDe noventa e nove o anoEu andando em Nova YorkIsento de qualquer danoSubi até o terraçoDaquele monstro de açoE orgulho americano

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Foi no World Trade CenterCom seus cento e dez andaresEu contemplando a alturaAvistei muitos lugaresDando a impressãoQue estava de aviãoOu flutuando nos ares

Do seu enorme terraçoOlhei a imensidãoEu vi que de Nova JerseyVindo em nossa direçãoum pouco se desviandoPassava de vez em quandoVelozmente um avião

Eu pensei naquela horaRefletindo em minha menteDeus defenda um aviãoSe chocar por acidenteNestes prédios e explodirAlém de se destruirPode matar muita gente

Pois, Azulão previu o acontecimento. Embora proposital, ao invés de acidental, aquelas duas torres eram um alvo e tanto. E comenta o atentado terrorista:

Dois anos e cinco mesesDepois da minha visitaTerroristas portadoresDe crueldade esquisitaEntre vinganças e tédiosExplodiram aqueles prédiosAção cruel e maldita

(…)

É covarde e desumanoQuem faz atos de terrorVingar-se de quem não fezMaldade ou crime de horrorUma ação injustamenteFazer que o inocentePague pelo traidor

Passados alguns versos, o poeta faz algumas críticas à política de “combate ao terror” do governo estadunidense:

George Bush e seu impérioQue quase o mundo governaCom seus mísseis bombardeirosMata, destrói e infernaPara Bin Laden encontrarE sem perdão lhe matarCom todos numa caverna

Mas só tem gastado armasHelicóptero e aviãoBombardeando cidadesMulher, criança, anciãoToda aquela pobre genteIndefesa e inocentePorém Bin Laden não

Assim, minha gente, Mestre Azulão narra mais esta barbárie que impulsiona muitas outras mais. Sem deixar de lado o humor, o Mestre apresenta suas críticas e nos brinda com mais um interessantíssimo cordel. Como de praxe, finaliza com um acróstico, isto é, com versos que são iniciados pelas letras que fazem seu nome:

Não sou a favor do terrorDa morte e destruiçãoMas quem fez ou faz maldadeRecebe a compensaçãoNão lembram os americanosQue há cinquenta anosBombardearam o Japão

Milhares perderam as vidasAli num ato tiranoZuada, grito e lamentoUm desastre desumanoLogo o fogo consumiuAgonizou e feriuO país americano

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Disponível em: https://lercordel.wordpress.com/2011/09/11/o-11-de-setembro-em-cordel/

ABC DO NORDESTE FLAGELADO - Patativa do Assaré

A — Ai, como é duro viver nos Estados do Nordeste quando o nosso Pai Celeste não manda a nuvem chover. É bem triste a gente ver findar o mês de janeiro depois findar fevereiro e março também passar, sem o inverno começar

B — Berra o gado impaciente reclamando o verde pasto, desfigurado e arrasto, com o olhar de penitente; o fazendeiro, descrente, um jeito não pode dar, o sol ardente a queimar e o vento forte soprando, a gente fica pensando que o mundo vai se acabar. C — Caminhando pelo espaço, como os trapos de um lençol, pras bandas do pôr do sol, as nuvens vão em fracasso: aqui e ali um pedaço vagando... sempre vagando, quem estiver reparando faz logo a comparação de umas pastas de algodão que o vento vai carregando. D — De manhã, bem de manhã, vem da montanha um agouro de gargalhada e de choro da feia e triste cauã: um bando de ribançã pelo espaço a se perder, pra de fome não morrer, vai atrás de outro lugar, 

e ali só há de voltar, um dia, quando chover. E — Em tudo se vê mudança quem repara vê até que o camaleão que é verde da cor da esperança, com o flagelo que avança, muda logo de feição. O verde camaleão perde a sua cor bonita fica de forma esquisita que causa admiração. F — Foge o prazer da floresta o bonito sabiá, quando flagelo não há cantando se manifesta. Durante o inverno faz festa gorjeando por esporte, mas não chovendo é sem sorte, fica sem graça e calado o cantor mais afamado dos passarinhos do norte. G — Geme de dor, se aquebranta e dali desaparece, o sabiá só parece que com a seca se encanta. Se outro pássaro canta, o coitado não responde; ele vai não sei pra onde, pois quando o inverno não vem com o desgosto que tem o pobrezinho se esconde. H — Horroroso, feio e mau de lá de dentro das grotas, manda suas feias notas o tristonho bacurau. Canta o João corta-pau o seu poema funério, 

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é muito triste o mistério de uma seca no sertão; a gente tem impressão que o mundo é um cemitério. I — Ilusão, prazer, amor, a gente sente fugir, tudo parece carpir tristeza, saudade e dor. Nas horas de mais calor, se escuta pra todo lado o toque desafinado da gaita da seriema acompanhando o cinema no Nordeste flagelado. J — Já falei sobre a desgraça dos animais do Nordeste; com a seca vem a peste e a vida fica sem graça. Quanto mais dia se passa mais a dor se multiplica; a mata que já foi rica, de tristeza geme e chora. Preciso dizer agora o povo como é que fica. L — Lamento desconsolado o coitado camponês porque tanto esforço fez, mas não lucrou seu roçado. Num banco velho, sentado, olhando o filho inocente e a mulher bem paciente, cozinha lá no fogão o derradeiro feijão que ele guardou pra semente. M — Minha boa companheira, diz ele, vamos embora, e depressa, sem demora vende a sua cartucheira. Vende a faca, a roçadeira, machado, foice e facão; vende a pobre habitação, galinha, cabra e suíno e viajam sem destino em cima de um caminhão. 

N — Naquele duro transporte sai aquela pobre gente, agüentando paciente o rigor da triste sorte. Levando a saudade forte de seu povo e seu lugar, sem um nem outro falar, vão pensando em sua vida, deixando a terra querida, para nunca mais voltar. O — Outro tem opinião de deixar mãe, deixar pai, porém para o Sul não vai, procura outra direção. Vai bater no Maranhão onde nunca falta inverno; outro com grande consterno deixa o casebre e a mobília e leva a sua família pra construção do governo. P - Porém lá na construção, o seu viver é grosseiro trabalhando o dia inteiro de picareta na mão. Pra sua manutenção chegando dia marcado em vez do seu ordenado dentro da repartição, recebe triste ração, farinha e feijão furado. Q — Quem quer ver o sofrimento, quando há seca no sertão, procura uma construção e entra no fornecimento. Pois, dentro dele o alimento que o pobre tem a comer, a barriga pode encher, porém falta a substância, e com esta circunstância, começa o povo a morrer. R — Raquítica, pálida e doente fica a pobre criatura e a boca da sepultura vai engolindo o inocente. Meu Jesus! Meu Pai Clemente, que da humanidade é dono, 

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desça de seu alto trono, da sua corte celeste e venha ver seu Nordeste como ele está no abandono. S — Sofre o casado e o solteiro sofre o velho, sofre o moço, não tem janta, nem almoço, não tem roupa nem dinheiro. Também sofre o fazendeiro que de rico perde o nome, o desgosto lhe consome, vendo o urubu esfomeado, puxando a pele do gado que morreu de sede e fome. T — Tudo sofre e não resiste este fardo tão pesado, no Nordeste flagelado em tudo a tristeza existe. Mas a tristeza mais triste que faz tudo entristecer, é a mãe chorosa, a gemer, lágrimas dos olhos correndo, vendo seu filho dizendo: mamãe, eu quero morrer! U — Um é ver, outro é contar quem for reparar de perto aquele mundo deserto, dá vontade de chorar. Ali só fica a teimar o juazeiro copado, o resto é tudo pelado da chapada ao tabuleiro onde o famoso vaqueiro cantava tangendo o gado. V — Vivendo em grande maltrato, a abelha zumbindo voa, 

sem direção, sempre à toa, por causa do desacato. À procura de um regato, de um jardim ou de um pomar sem um momento parar, vagando constantemente, sem encontrar, a inocente, uma flor para pousar. X — Xexéu, pássaro que mora na grande árvore copada, vendo a floresta arrasada, bate as asas, vai embora. Somente o saguim demora, pulando a fazer careta; na mata tingida e preta, tudo é aflição e pranto; só por milagre de um santo, se encontra uma borboleta. Z — Zangado contra o sertão dardeja o sol inclemente, cada dia mais ardente tostando a face do chão. E, mostrando compaixão lá do infinito estrelado, pura, limpa, sem pecado de noite a lua derrama um banho de luz no drama do Nordeste flagelado. Posso dizer que cantei aquilo que observei; tenho certeza que dei aprovada relação. Tudo é tristeza e amargura, indigência e desventura. — Veja, leitor, quanto é dura a seca no meu sertão.

Disponível em: http://vermelho.org.br/noticia/43510-11

AS PROEZAS DE JOÃO GRILO – João Ferreira de Lima

João Grilo foi um cristão que nasceu antes do dia

criou-se sem formosuramas tinha sabedoria

e morreu depois da horapelas artes que fazia.

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E nasceu de sete meseschorou no bucho da mãequando ela pegou um gatoele gritou: não me arranhenão jogue neste animalque talvez você não ganhe

Na noite que João nasceuhouve um eclipse na luae detonou um vulcãoque ainda continuanaquela noite correuum lobisomem na rua

Porem João Grilo criou-sepequeno, magro e sambudoas pernas tortas e finasboca grande e beiçudono sitio onde morava dava noticia de tudo

João perdeu o paicom sete anos de idademorava perto de um rioia pescar toda tardeum dia fez uma cenaque admirou a cidade.

O rio estava de nadovinha um vaqueiro de foraperguntou: dará passagem?João Grilo disse: inda agorao gadinho de meu paipassou com o lombo de fora.

O vaqueiro botou o cavalocom uma braça deu nadofoi sair já muito embaixoquase que morre afogadovoltou e disse ao menino:você é um desgraçado!

João Grilo foi ver o gadopara provar aquele atoveio trazendo na frenteum bom rebanho de patoos patos passaram n'aguaJoão provou que era exato

Um dia a mãe de João Grilo foi buscar água à tardinhadeixou João Grilo em casae quando deu fé lá vinhaum padre pedindo águanessa ocasião não tinha

João disse; só tem garapadisse o padre: donde é?João Grilo lhe respondeu:é do engenho Catolé!disse o padre: pois eu queroJoão levou uma coité

O padre bebeu e disse:oh! que garapa boa!João Grilo disse: quer mais?o padre disse; e a patroanão brigará com você?João disse: tem uma canoa

João trouxe outra coiténaquele mesmo momentodisse ao padre: bebe maisnão precisa acanhamentona garapa tinha um ratoestava podre o fedorento

O padre disse: meninotenha mais educaçãoe porque não me disseste?oh! natureza do cão!pegou a dita coitéarrebentou-a no chão

João Grilo disse; danou-se!misericórdia, S. Bento!com isto mamãe se daname pegue mil e quinhentosessa coité, seu vigárioé de mamãe mijar dentro!

O padre deu uma pôpadisse para o sacristão esse menino é o diaboem forma de cristão!meteu o dedo na goelaquase vomita o pulmão

João Grilo ficou sorrindopela cilada que fezdizendo: vou confessar-meno dia sete do mêsêle nunca confessou-sefoi essa a primeira vez

João Grilo tinha um costume para toda parte que iaera alegre e satisfeitono convivio da alegriaJoão Grilo fazia graça que todo mundo sorria

Num dia de sexta-feira

às cinco horas da tardeJoão Grilo disse: hoje a noiteeu assombro aquele padrese êle não perdoar-mena igreja há novidade

Pegou uma lagartixaamarrou-a pelo gogóbotou-a numa caixinhano bolso do palitófoi confessar-se João Grilocom paciência de Jó

As sete horas da noitefoi ao confissionáriofez logo pelo-sinalpôsto nos pés do vigário o padre disse: acuse-se;João disse o necessário

Eu sou aquele meninoda garapa e da coité;o padre disse: levante-se,eu já sei você quem é;João tirou a lagartixasoltou-a junto do pé

A lagartixa subiupor debaixo da batinaentrou na perna da calçatornou-se feia a buzinao padre meteu os pésarrebentou a cortina

Jogou a batina foranaquela grande fadigaa lagartixa cascudaarranhando na barriga;João Grilo de lá gritava;seu padre, Deus lhe castiga!

O padre impacientenaquele turututusaltava pra todo ladoque parecia um timbuterminou tirando as calçasficando o esqueleto nu

João disse: padre é homem?pensei que fosse mulheranda vestido de saianão casa porque não queristo é que é ser caviloso cara de mata bebé

O padre disse: João Grilo vai-te daqui infeliz!

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João Grilo disse: bravodo vigário da matrizé assim que ele me pagao benefício que fiz?

João Grilo foi embora o padre ficou zangadoJoão Grilo disse: ora sêboeu não aliso croadovou vingar-me duma raivaque tive o ano passado

No subúrbio da cidademorava um portuguêsvivia de vender ovosjustamente nesse mêsdenunciou de João Grilopelas artes que ele fez

João encontrou o portuguêscom a égua carregadacom duas caixas de ovosJoão lhe disse: oh! camaradadeixa eu dizer a tua éguauma pequena charada

O português disse: diga,João chegou bem no ouvidocom a ponta do cigarrosoltou-a dentro escondidoa égua meteu os pésfoi temeroso estampido

Derrubou o portuguêsfoi ovos pra todo ladoarrebentou a cangalhaficou o chão ensopadoo português levantou-setristonho e todo melado

O português perguntou:o que foi que tu dissesteque causou tanto desgostoa esse animal agreste?- Eu disse que a mãe morreuo português respondeu:oh égua besta da peste!

João Grilo foi a escola com sete anos de idadecom dez anos êle saiupor espontânea vontadetodos perdiam pra êleoutro Grilo como aqueleperdeu-se a propriedade

João Grilo em qualquer

escolachamava o povo atençãopassava quinau nos mestresnunca faltou com a liçãoera um tipo inteligente no futuro e no presenteJoão dava interpretação

Um dia pergunta ao mestre:O que é que Deus não vêo homem vê qualquer hora?diz ele: não pode serpois Deus vê tudo no mundoem menos de um segundode tudo pode saber

João Grilo disse: qual nadaquêde os elementos seus?abra os olhos, mestre velhoque vou lhe mostrar os meusseus estudos se consomemum homem ver outro homemsó Deus vão ver outro Deus

João Grilo disse: seu mestre,me diga como se chamaa mãe de todas as mães?tenha cuidado no dramao mestre coça a cabeçadisse: antes que me esqueçavou resolver o programa

- A mãe de todas as mãesé Maria ConcebidaJoão Grilo disse: eu protestoantes dela nascerjá esta mãe existianão foi a Virgem Mariaoh que resposta perdida!

João Grilo disse depoisnum bonito português:a mãe de todas as mãesjá disse e digo outra vezcomo a escritura ensinaé a natureza divinaque tudo criou e fez

- Me responda professorentre grandes e pequenosquero que fique notávelpor todos nossos terrenosresponda com rapidezcomo se chama o mêsque a mulher fala menos?

- Êste mês eu não conheço 

quem fez esta tabuada?João Grilo lhe respondeu:ora sêbo, camaradapra mim perdeu o valorter o nome de professormais não conhece de nada

- êste mês é fevereiropor todos bem conhecidosó tem vinte e oito diaso tempo mais resumidoentre grandes e pequenosé o que a mulher fala menosmestre, você está perdido

- Seu professor, me respondase algum tempo estudou quem serviu a Jesus Cristomorreu e não se salvouno dia que êle morreuseu corpo o urubu comeue ninguém o sepultou?

- Não conheço quem é esseporque nunca vi escrito;João Grilo lhe respondeu:foi um jumento está ditoque a Jesus Cristo serviana noite que êle fugia de Belém para o Egito

João Grilo olhou de um ladodisse para o diretor:fique sabendo o senhorsem dúvida exame não fezo aluno desta vezensinou ao professor

João Grilo foi para casaencontrou sua mãe chorandoêle então disse: mamãenão está ouvindo encantando?não chora, cante mais antespois o seu filho garantepra isso vive estudando

A mãe de João Grilo disse:choro por necessidadesou uma pobre viúvae tu de menor idadeaté da escola saíste;João lhe disse: ainda existeo mesmo Deus de bondade

— A senhora pensa em carnede vinte mil réis o quiloou talvez no meu destino 

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que a fôrça hei de segui-lo?não chore, fique bem certaa senhora só se apertaquando matarem João Grilo

João chegou no rioás cinco horas da tarde passou até nove horasporém tudo foi debalde na noite triste e sombriaJoão Grilo sem companhiavoltava sem novidade

Chegando dentro da mataouviu lá dentro um gemido os lobos devoradoreso caminho interrompidoe trepou-se num pinheirocomo era forasteiroficou calado escondido

Os lobos foram emborae João não quis descerdisse: eu dormirei aquisiceda o que sucedereu hoje imito araquansó vou embora amanhãquando o dia amanhecer

O Grilo ficou trepadotemendo lobos e leõespensando na fatal sortee recordando as liçõesque na escola estudou quando do súbito chegou uns quatro ou cinco ladrões

Eram uns ladrões de Mecaque roubavam no gritose ocultavam na matanaquele bosque esquisitopois cada um de persique vinha juntar-se alipara ver quem era perito

O capitão dos ladrõesdisse: não fala ninguém?um respondeu: não senhordisse ele: muito bemcuidado, não roubem vãvamos ajuntar-nos amanhãna capela de Belém

— Lá partiremos o dinheiropois aqui tudo é graúdotemos um roubo a fazer

desde ontem que estudomas já estou preparado;e o Grilo lá trepadocalado e escutando tudo.

Os ladrões foram emboradepois da conversaçãoJoão Grilo ficou cientedizendo em seu coração:se Deus ajudar a mim acabou-se tempo ruimsou eu quem ganho a questão

João Grilo desceu da árvorequando o dia amanheceumas quando chegou em casanão contou o que se deufurtou um roupão de malhavestiu fez uma mortalhalá no mato se escondeu

À noite foi pra capelapor detraz da sacristiavestiu-se com a mortalhapois a capela jaziasempre com a porta abertaJoão Grilo partiu na certacolhêr o que pretendia

Deitou-se lá num caixãoque enterrava defuntoJoão Grilo disse: hoje aquivou ganhar um bom presunto;os ladrões foram chegandoJoão Grilo observandosem pensar em outro assunto

Acenderam um farolpenduraram numa cruzforam contar o dinheirono claro de uma luzJoão Grilo de lá gritou:esperem por mim que vou com as ordens de Jesus!

Os ladrões dali fugiramquando viram a alma em péJoão Grilo ficou com tudodisse: já sei como énada no mundo me atrasaagora vou pra casatomar um rico café

Chegou e disse: mamãemorreu nossa precisãoo ladrão que rouba outrotem cem anos de perdão;

contou o que tinha feitodisse a velha: está direitovamos fazer refeição

Bartolomeu do Egitofoi um rei de opiniãomandou convidar João Grilopra uma adivinhaçãoJoão Grilo disse: eu vou,no outro dia embarcoupara saudar o sultão

João Grilo chegou na cortecumprimentou o sultãodisse: pronto, senhor rei(deu-lhe um aperto de mão)com calma e maneira doceo sultão admirou-seda sua disposição

O sultão pergunta ao Grilo:de onde você saiu?aonde você nasceu?João Grilo fitou ele e sorriu— Sou deste mundo d'agoranasci na ditosa hora que minha mãe me pariu

— João Grilo, tu adivinha?e Grilo respondeu, nãoeu digo algumas coisasconforme a ocasiãoquem canta de graça é galocangalha só pra cavaloe sêca só no sertão

— Eu tenho doze perguntaspra você me responderno prazo de quinze diasescute o que vou dizerveja lá como se arrumaè bastante faltar umaestá condenado a morrer

João Grilo disse: estou pronto pode dizer a primeirase acaso sair-me bemvenha a segunda e a terceiravenha a quarta e a quintatalvez o Grilo não mintadiga até a derradeira

Perguntou: qual o animalque mostra mais rapidezque anda de quatro pésde manhã por sua vez

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ao meio-dia com doispassando disto depoisa tarde anda com três?

O Grilo disse: é o homemque se arrasta pelo chão no tempo que engatinhadepois toma posiçãoanda em pé bem seguromas quando fica madurofaz três pés com o bastão

O sultão maravilhou-secom sua resposta lindaJoão disse: pergunte outravou ver se respondo ainda;a segunda o sultão fezJoão Grilo daquela vezcelebrizou sua vinda

— Grilo, você me respondaem termos bem divididosuma cova bem cavadadoze mortos estendidose todos mortos falandocinco vivos passeandotrabalham com três sentidos

— Esta cova é um violãocom prima, baixo e bordãomortas são as doze cordasquando canta um cidadãocanta, toca e faz versocinco vivos num progressoos cinco dedos da mão

Houve uma salva de palmacom vivas que retumbouo sultão ficou suspensoseu viva também bradoudepois pediu silencio com outro desejo imensoa terceira perguntou

João Grilo, qual é a coisaque eu mandei carregarprimeiro dia e segundono terceiro fui olharquase dá-me a tiriricase tirar mais grande ficanão mingua, faz aumentar?

— Senhor rei, sua perguntaparece me fazer guerraum Grilo não tem sabercriado dentro da serramas digo pra quem conhece

o que tirando mais cresceé um buraco na terra

— João Grilo, vou terminaras perguntas do tratadoe Grilo disse: perguntequero ficar descansado;disse o rei: é muito exatoo que é que vem do altocai em pé, corre deitado?

— Aquele que cai em pée sai correndo no chãoserá uma grande chuvanos barros de um sertão;o rei disse: muito bemno mundo todo não tem outro Grilo como João

— João Grilo, você bebe?João disse: bebo 1 pouquinhoe disse: eu não sou filhode Baco que fez o vinhoo meu pai morreu bebendoeu o que estou fazendo?de boca aberta em seu ninho

O rei disse: João Grilobeber è coisa ruime Grilo respondeu: qualo meu pai dizia assim:na casa de seu Henriquezelam bem um alambiquemelhor do que um jardim 

O rei disse: João Grilo tua fama é um estrondoJoão Grilo disse: eu sabendoo que perguntar respondodisse o rei enfurecido:o que tem o pé compridoe faz o rastro redondo?

Senhor rei, tenho lembrançade tempo da minha avóque ela tinha um compassona caixa do bororócomo êsse eu também andofazendo o rastro redondoandando com uma perna só

João qual é o bicho,que passa pela campinaa qualquer hora da noiteandando de lamparina?é um pequeno animaltem luz artificial;

veja o que determina

— Esse bicho eu já vipois eu tinha por costumede brincar sempre com êleminha mãe tinha ciúmeeu andava pelo campouns chamam pirilampoe outros de vagalume

O rei já tinha esgotado a sua imaginação não achou uma perguntaque interrompesse a Joãodisse: me responda agoraqual é o olho que chora sem haver consolação?

O Grilo então respondeu:lá muito perto da gentetem num oiteiro importanteum moço muito doentesuas lágrimas têm paladarquem não deixa de choraré ôlho d'água vertente

O rei inventou um truquedo jeito que lhe convinha— Vou arrumar uma ciladaver se João adivinhamandou vir um alçapãofez outra adivinhaçãoescondeu uma bacurinha

— João, o que é que temdentro deste alçapão?se não disser o que éé morto, não tem perdãoJoão Grilo lhe respondeu:quem mata um como eunão tem dó no coração

João lhe disse: esse objetonem é manso nem é brabonem é grande nem é pequeno nem é santo nem é diabobem que mamãe me diziaque eu ainda caíaonde a porca torce o rabo

Trouxeram uma bandejaornada de muitas floresdentro dela uma latinhacheia de muitos fulgoreso rei lhe disse: João Griloé este o último estriloque rebenta tuas dores

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João Grilo desta vezpassou na última esticaadivinhar uma coisanojenta que se praticafugir da sorte mesquinhapois dentro da lata tinhaum pouquinho de xinica

O rei disse: João Griloveja se escapa da morteo que tem nesta latinha?responda se tiver sortetoda aquela populaçaqueria ver a desgraçado Grilo franzino e forte

— Minha mãe profetizouque o futuro è minha perda— Dessas adivinhaçõesbrevemente você herdafaz de conta que já vi como esta hoje aquiparece que dá em merda

O rei achou muita graçanada teve o que fazerJoão Grilo ficou na cortecom regosijo e prazergozando um bom paladarfoi comer sem trabalhardesta data até morrer

E todas as questões do reino era João que deslindavaqualquer pergunta difícilele sempre decifravajulgamentos delicados problemas muito enrascadose João Grilo desmanchava

Certa vez chegou na corteem mendigo esfarrapadocom uma mochila nas costasdois guardas de cada ladoseu rosto cheio de mágoaos olhos vertendo águafazia pena o coitado

Junto dele estava um duqueque veio denunciardizendo que o mendigona prisão ia morarpor não pagar a despesaque fizera por afoitezasem ter como lhe pagar

João Grilo disse ao mendigo:e como é, pobretãoque se faz uma despesasem ter no bolso um tostãome conte todo passadodepois de eu ter-lhe escutadolhe darei razão ou não

Disse o mendigo: sou pobree fui pedir uma esmolana casa do senhor duquelevei a minha sacolaquando cheguei na cozinhavi cozinhando galinhanuma grande caçarola

Como a comida cheiravaeu tive apetite nelatirei um taco de pãoe marchei pro lado delae sem pensar na desgraçabotei o pão na fumaçaque saia da panela

O cozinheiro zangou-sechamou logo o seu senhordizendo que eu roubarada comida o seu saborsó por eu ter colocadoum taco de pão mirradoaproveitando o vapor

Por isso fui obrigadoa pagar essa quantiacomo não tive dinheiroo duque por tiraniamandou trazer-me escoltadopara depois de ser julgado ser posto na enxovia

João Grilo disse: está bem não precisa mais falar:então perguntou ao duque:quanto o homem vai pagar?- Cinco coroas de prataou paga ou vai pra chibatanão lhe deve perdoar

João Grilo tirou do bolso a importância cobradana mochila do mendigo deixou-a depositadae disse para o mendigo:balance a mochila, amigopro duque ouvir a zuada

O mendigo sem demora

fez como Grilo mandoupegou sua mochilinhasem compreender o truquebem no ouvido do duqueo dinheiro tilintou

Disse o duque enfurecido:mas não recebi o meu,diz João Grilo: sim senhor,isto foi o que valeudeixe de ser batoteiroo tinido do dinheiroo senhor já recebeu

- Você diz que o mendigopor ter provado o vaporfoi mesmo que ter comidoseu manjar e seu saborpois também é verdadeiroque o tinir do dinheirorepresenta o seu valor

Virou-se para o mendigoe disse: estás perdoadoleva o dinheiro que dei-tevai pra casa descansadoo duque olhou para o Grilodepois de dar um estrilosaiu por ali danado

A fama então de João Grilofoi de nação em nação por sua sabedoriae por seu bom coraçãosem ser por êle esperadoum dia foi convidadopara visitar um sultão

O rei daquele paísquis o reino embandeiradopra receber a visitado ilustre convidadoo castelo estava em florescheio de tantos fulgoresricamente engalanado

As damas da alta côrtetrajavam decentementetôda côrte imperialesperava impacienteou por isso ou por aquilopara conhecer João Grilofigura tão eminente

Afinal chegou João Grilono reinado do sultãoquando êle entrou na côrte

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que grande decepção!de palitó remendadosapato velho furadonas costas um matulão

O rei disse: não é elepois assim já é demais;João Grilo pediu licençamostrou-lhe as credenciaisembora o rei não gostassemandou que ele ocupasseos aposentos reais

Só se ouvia cochichos que vinham de todo ladoas damas então diziam:é esse o homem falado?duma pobreza tamanhae ele nem se acanhade ser nosso convidado?

Até os membros da côrtediziam num tom chocantepensava que o João Grilofôsse dum tipo elegantemas nos manda 1 remendadosem roupa, esfarrapadoum maltrapilho ambulante

E João Grilo ouvia tudomas sem dar demonstraçãoem toda a côrte realninguem lhe dava atençãopor mostrar-se esmolambadotinha sido desprezadonaquela rica nação

Afinal veio um criadoe disse sem o fitar:

já preparei o banheiropara o senhor se banharvista uma roupa minhae depois vá pra cozinhana hora de almoçar

João Grilo disse; está bom;mas disse com seu botão:roupas finas trouxe eudentro de meu matulãome apresentei rasgadopara ver neste reinadoqual era a minha impressão

João Grilo tomou um banho vestiu uma roupa de galaentão muito bem vestidoapresentou-se na salaao ver seu traje tão belo houve gente no casteloque quase perdia a fala

E então toda repulsatransformou-se de repenteo rei chamou-o pra mesacomo homem competenteconsigo, dizia João:na hora da refeiçãovez ensinar esta gente

O almoço foi servidoporém João não quis comerdespejou vinho na roupasó para vê-lo escorrerante a corte estarrecidaencheu os bolsos de comida para toda corte ver

O rei bastante zangado

perguntou pra João:por que motivo o senhornão come da refeição?respondeu João com maldade:tenha calma, majestadedigo já toda razão

Esta mesa tão repletade tanta comida boanão foi posta pra mim um ente vulgar a toadesde sobre-mesa a sopaforam postas à minha roupae não à minha pessoa

Os comensais se olharam o rei pergunta espantado:por que o senhor diz istoestando tão bem tratado?disse João: isso se explicapor está de roupa ricanão sou mais esmolambado

Eu estando esfarrapadoia comer na cozinhamas como troquei de roupacomo junto da rainhavejo nisto um grande ultrajehomenagem ao meu trajee não a pessoa minha

Toda corte imperialpediu desculpa a Joãoe muito tempo falou-senaquela dura liçãoe todo mundo diziaque sua sabedoriaera igual a Salomão.

Disponível em: http://poesianordestina.blogspot.com.br/2013/10/as-proezas-de-joao-grilo.html

A TERRA É NATURÁ – Patativa do Assaré

Sinhô dotô, meu ofiçoÉ servi ao meu patrão.Eu não sei fazê comiço,Nem discuço, nem sermão;Nem sei as letra onde mora,Mas porém, eu quero agoraDizê, com sua licença,Uma coisa bem singela,Que a gente pra dizê ela

Não percisa de sabença.

Se um pai de famia honrado,Morre, dexando a famia,Os seus fiinho adoradoPor dono da moradia,E aqueles irmão mais véio,Sem pensá nos Evangéio,Contro os novo a toda hora

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Lança da inveja o venenoInté botá os mais pequenoDaquela casa pra fora.

Disso tudo o resurtadoSeu dotô sabe a verdade,Pois, logo os prejudicadoRecorre às oturidade;E no chafurdo infelizDepressa vai o juizFazê. a paz dos irmãoE se ele fô justicêroParte a casa dos herdêroPra cada quá seu quinhão.

Seu dotô, que estudou muntoE tem boa inducação,Não ignore este assuntoDa minha comparação,Pois este pai de famiaÉ o Deus da Soberania,Pai do sinhô e pai meu,Que tudo cria e sustenta,E esta casa representaA terra que Ele nos deu.

O pai de famia honrado,A quem tô me referindo,É Deus nosso Pai AmadoQue lá do Céu tá me uvindo,O Deus justo que não erraE que pra nós fez a terra,Este praneta comum;Pois a terra com certezaÉ obra da naturezaQue pertence a cada um.

Esta terra é como o SóQue nace todos os diaBriando o grande, o menóE tudo que a terra cria.O só quilarêa os monte,Tombém as água das fonte,Com a sua luz amiga,

Potrege, no mesmo instante,Do grandaião elefanteA pequenina formiga.

Esta terra é como a chuva,Que vai da praia a campina,Móia a casada, a viúva,A véia, a moça, a menina.Quando sangra o nevuêro,Pra conquistá o aguacêroNinguém vai fazê fuxico,Pois a chuva tudo cobre,Móia a tapera do pobreE a grande casa do rico.

Esta terra é como a lua,Este foco prateadoQue é do campo até a rua,A lampa dos namorado;Mas, mesmo ao véio cacundo,Já com ar de moribundoSem amô, sem vaidade,Esta lua cô de prataNão lhe dêxa de sê grata;Lhe manda quilaridade.

Esta terra é como o vento,O vento que, por caprichoAssopra, as vez, um momento,Brando, fazendo cuchicho.Otras vez, vira o capêta,Vai fazendo piruêta,Roncando com desatino,Levando tudo de móioJogando arguêro nos óioDo grande e do pequenino.

Se o orguiôso podesseCom seu rancô desmedido,Tarvez até já tivesseEste vento repartido,Ficando com a viraçãoDando ao pobre o furacão;Pois sei que ele tem vontade

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E acha mesmo que percisaGozá de frescô da brisa,Dando ao pobre a tempestade.Pois o vento, o só, a lua,A chuva e a terra também,Tudo é coisa minha e sua,Seu dotô conhece bem.Pra se sabê disso tudoNinguém precisa de istudo;Eu, sem escrevê nem lê,Conheço desta verdade,Seu dotô, tenha bondadeDe uvi o que vô dizê.

Não invejo o seu tesoro,Sua mala de dinhêroA sua prata, o seu ôroo seu boi, o seu carnêro

Seu repôso, seu recreio,Seu bom carro de passeio,Sua casa de moráE a sua loja surtida,O que quero nesta vidaÉ terra pra trabaiá.

Iscute o que tô dizendo,Seu dotô, seu coroné:De fome tão padecendoMeus fio e minha muié.Sem briga, questão nem guerra,Meça desta grande terraUmas tarefa pra eu!Tenha pena do agregadoNão me dêxe deserdadoDaquilo que Deus me deu.

Disponível em: http://vermelho.org.br/noticia/43510-11

Como você vê a mulher sendo representada, nos diferentes gêneros textuais e/ou literários aos quais você já teve acesso?

O NORDESTE É A PERIFERIA DO BRASIL – Jarid Arraes

Já dizia PatativaGrande mestre professor:Pra falar da minha terraTem de ser conhecedorSó possui conhecimentoCom bastante

embasamentoQuem daqui é morador.

Nordestina é essa genteQue conhece a exclusãoO injusto esquecimentoTriste de desilusãoPois se vive condenadoInvisível e renegadoFeito fosse reclusão.

O nordeste é preteridoJá tem tempo até demaisE por causa dessa sinaJá de nossos ancestraisMuita gente foi simboraDesde antes té agoraVivendo nas capitais.

Só que na cidade grandeNordestino vira bichoHumilhado e exploradoSó tratado como lixoO trabalho e a labutaÉ o som que se escutaNessa vida de serviço.

Trabalhando feito escravoSem direito ou assistênciaNosso povo é oprimidoNum teste de resistênciaNo sol quente ou no frioPelos cantos do BrasilSem espaço pra clemência.

Esse prédio tão bonitoQue paulista tanto gosta

ATIVIDADE ORAL

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Só pode ser construídoCom o peso em nossas costaSem família pra cobrarSe morreu, pode enterrarFeito um pedaço de bosta.

Foi assim com os candangosQue fizeram essa BrasíliaE saíram de suas terrasPra viver na disbuliaAté hoje esse sumiçoFoi o pago do serviçoDuma constante vigília.

Trabalhar de sol a solÉ coisa de nordestinoQue batalha todo diaPra mudar o seu destinoNão tem tempo ociosoMuito menos preguiçosoSó vivendo o desatino.

As mulheres nordestinasDesde cedo exploradasNa cozinha ou no bordelSão ainda traficadasSer mulher não é molezaE falando com franquezaSó nos veem de empregada.

A batalha femininaÉ puxada e doloridaÉ na roça e na cidadeTrabalhando por comidaCom os filho abandonadaÉ de meretriz chamadaE com força reprimida.

Se virar uma empregadaPra limpar a casa alheiaO dinheiro é uma misériaQue não faz um pé de meiaE o patrão que assedia

Só demonstra a covardiaDessa elite brasileira.

Muitas dessas nordestinasQue acabam no sudesteNão arranjam um trabalhoNem um salário que presteE a prostituiçãoVira a única opçãoNesse mundo cafajeste.

Para além de tudo issoQue envolve o trabalharÉ notável e evidenteO desejo de apagarA cultura nordestinaDe riqueza que ensinaE só faz nos orgulhar.

Já começa do sotaqueEssa padronizaçãoQue imita nossa falaNessa vil televisãoE a gente é debochadoCom o riso escrachadoSem contextualização.

Para o povo nordestinoFica o resto do sobejoBota a gente de piadaNesse cultural despejoQue rejeita nossa arteFaz de nós a contraparteDum cruel e mau desejo.

Quem despreza nossa genteNão esconde o que almejaQue é a nossa extinçãoBem entregue de bandejaPedem a separaçãoDividindo essa naçãoNuma linha que traceja.

Mas pior é perceberO que dói é constatarQue nem mesmo a

esquerdaQue se diz politizarLembra do nosso nordestePois só olha pro sudesteSem querer mobilizar.

Só quem fala é sudestinoO lembrado maiorialConvidado em todo cantoPalestrante coisa e talO nordeste é invisívelNa política risívelSem conduta e imoral.

É por isso que eu digoFácil é ser miltanteE falar coisa bonitaDando uma de importanteMas na hora de provarE na prática atestarSó se mostra ignorante.

Pois o reconhecimentoPro sudeste é destinadoNão importa a correnteNem problema abordadoSe falar de feminismoDe favela, de racismoO nordeste é apagado.

Mas pra cá no PernambucoE no Rio Grande do NorteCeará ou ParaíbaTambém acontece morteNordestino é minoriaSem nenhuma regaliaE jogado à própria sorte.

No nordeste tem racismoE a mulher é espancadaTambém tem homofobiaE a travesti rejeitadaTambém vive nessa terraEnfrentando uma guerraOnde é silenciada.

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Nossa terra tem favelaE a polícia é militarAqui tem periferiaFalta só tu enxergarÉ por isso que eu gritoE nem vou falar bonitoPra paulista se agradar.

Já estamos saturadosDessa discriminaçãoPois a nossa inteligência

Não é para a servidãoA gente não é capachoDessa bando de diachoElitista fi do cão.

Eu não mudo meu sotaqueNem meu termo imponenteA riqueza da minha terraQue é falada pela genteComo disse o Suassuna

Minha língua é JaguarunaE não troco meu oxente.

Com orgulho falo altoEssa pátria me pariuComo filha nordestinaDessa força feminilMe calar não poderiaEu sou da periferiaDa perifa do Brasil.

Disponível em: http://www.revistaforum.com.br/questaodegenero/2015/04/25/cordel-o-nordeste-e-periferia-brasil/

Jarrid Arraes

Nascida e criada em Juazeiro do Norte, Jarid é íntima da literatura de cordel desde criança. Seu pai e avô são cordelistas e também fazem xilogravuras (técnica na qual se usa madeira como matriz e a reprodução da imagem é geralmente gravada sobre papel). "Cresci nesse contato direto com o cordel, que é uma manifestações da cultura popular nordestina. Eu era a primeira a ler os cordéis do meu pai e do meu avô, que tratam de assuntos mais politizados em suas obras - é o que chamamos de Cordel Engajado."

Quando começou a produzir os seus, Jarid não teve dúvida de eles também seriam politizados. "Escrevo sobre o que me deixa engasgada", diz. Mulher, negra e nordestina, Jarid transforma suas vivências em versos rimados. "Os temas foram surgindo a partir da minha própria experiência, dos preconceitos e assédios que sofro diariamente e assisto o outro sofrer", revela. 

Além de cordelista, Jarid é comprometida com projetos sobre direitos humanos e tem uma coluna semanal na revista Fórum, chamada Questão de Gênero. Por lá, ela publica textos de opinião e também cordéis. Um dos últimos, "Não me chame de mulata", viralizou e causou discussões na internet. "Recebi dezenas de comentários me xingando por causa do cordel ‘Não me chame de mulata’. Por outro lado - e esse, sim, vale a pena - já li pessoas afirmando que nunca mais usarão o termo", escreveu em sua timeline do Facebook.

Disponível em: http://revistatrip.uol.com.br/tpm/cordelista-e-feminista-conheca-jarid-arraes-uma-voz-de-protesto-contra-a-opressao

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MANOEL MONTEIRO E O NOVO CORDEL

Em ensaio que – há quatro dias – publiquei aqui (intitulado "O Reino Fecundo da Poesia Popular de Manoel Monteiro"), explanei detalhes do encontro que tivemos - eu e o poeta sonetista Fernando Cunha Lima - com o mais evidenciado bardo popular da atualidade e o maior representante do chamado Novo Cordel do nosso país: o poeta cordelista Manoel Monteiro, que – nascido, em 1937, na pacata cidade de Bezerros (PE) – está radicado, há décadas, em Campina Grande (PB), onde nos recebeu (em sua casa) na data de 26 de julho do corrente ano.

Na ocasião, finalizamos o nosso inesquecível encontro fraterno-cultural, documentando uma descontraída entrevista com o carismático e prolífero vate, que é autor de mais de uma centena de títulos de cordéis e membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Cariri Paraibano e da Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC).

RUBENIO MARCELO — Manoel, Inicialmente, eu gostaria de saber de você qual a importância do Novo Cordel na atualidade.

MANOEL MONTEIRO — Rubenio, o Novo Cordel de que eu falo é o cordel atual, o cordel do século XXI, este que está sendo utilizado, com eficiência, pelos professores nas salas de aula. O cordel, no momento, está em uma evidência muito maior do que nos seus ditos tempos áureos e pioneiros. Isto é verdade. Pode escrever. Eu conheço a história do cordel desde muito tempo, e convivendo com ele, nas feiras do Nordeste, desde 1951. Meu primeiro cordel foi publicado aqui em Campina Grande em 1953. Eu já vinha, há uns dois ou três anos, trabalhando com folhetos de feira em feira. Foi assim que eu saí de casa. As minhas asas para levantar vôo do ninho paterno foram os folhetos de cordel. E tão bem coladas foram estas asas, que ainda hoje eu continuo voando... Estas minhas asas foram e são, assim, muito mais firmes do que as (de penas) que puseram em Ícaro, pois quando este se aproximou do Sol, as suas asas caíram. Pois bem! Como afirmei, o cordel, hoje, está em evidência. Se o cordel de ontem era consumido (era absorvido) basicamente por gente simples e de pouca cultura, um público da periferia, das fazendas, das cidades pequenas do interior, dos mercados, das feiras livres (porque aonde ia o sertanejo, ia a sua mala repleta de saudades e de folhetos), hoje o cordel é consumido também nas escolas brasileiras; é valorizado nas instituições escolares de todos os graus, inclusive sendo enfocado por mestres e doutores nas suas teses acadêmicas. Então, o cordel hoje está em alta evidência e eu sei por que ele está com este prestígio...

RUBENIO MARCELO — Por que, então, Manoel, que o cordel está com este prestígio que você acaba de nos reportar?

MANOEL MONTEIRO — ... Porque os autores de hoje estão fazendo um trabalho diferenciado. Hoje, há cordelistas que possuem cursos superiores e especializações. Cordelistas que conhecem todo o Brasil e até países do exterior. Então, a vivência destes homens (que trazem na bagagem, antes da formação superior, uma cultura de massa, uma natural convivência com o povo), capacita-os a participar – por exemplo – de conferências, cursos e palestras para universitários em qualquer

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faculdade ou universidade brasileira. O que não acontecia ontem. Se o Novo Cordel está com toda esta evidência, é porque hoje os seus autores estão inserindo esta literatura nas escolas, nas salas de aula, e ministrando também interessantes palestras e conferências acerca do assunto... Atualmente, o campo, o auditório, o público do cordelista é diferente. E o cordelista também é diferente. Então, esta qualidade do novo cordelista faz o Novo Cordel; faz com que o texto do cordel seja estudado e utilizado, inclusive no aprendizado da nossa Língua Portuguesa. Neste sentido, nós temos trabalhos de alta classe, como – por exemplo – o de Moreira de Acopiara (em São Paulo), Klévisson Viana (no Ceará), Geraldo Amâncio (grande repentista cearense), Janduí Dantas (com a sua Gramática em Cordel, que é admirável), o José Maria de Fortaleza (que também trabalha muito bem com a literatura de cordel nas escolas), apenas pra citar alguns (claro que temos outros nomes). Todos são trabalhos simples, humildes na aparência, mas grandiosos na penetração, na originalidade, no convencimento, na maneira de transformar o difícil em fácil, porque a vantagem da informação feita através do cordel é que ela é compreensível, em virtude de esta poesia ser fecunda e sonora. E esta particularidade do texto poético faz com que qualquer informação, veiculada através dela, seja de fácil apreensão e de agradável consumo.

RUBENIO MARCELO — Quais as dificuldades e obstáculos que esta arte maravilhosa – o Cordel – está enfrentando nos nossos dias? E o que deve balizar a criação do Novo Cordel?

MANOEL MONTEIRO — Eu diria que os obstáculos são aqueles naturais a toda qualidade de impresso. Especialmente os livros. Ora, eu me lembro, e aproveito a ocasião para repetir, o que disse, certa vez na Feira de Remígio, o escritor Cristino Pimentel: — “Vender livros no Brasil é carregar a cruz de Cristo, vinte e quatro horas, durante toda a vida”. Isto sintetiza a dificuldade das pessoas que vivem das suas obras literárias. Aqui mesmo, nesta sala, onde estamos agora, um pessoal da imprensa me perguntou o seguinte:“... Se nós estávamos tendo ajuda governamental... Se nós tínhamos facilidade de publicar os nossos trabalhos... E como que o governo olha os nossos artistas...”. E eu respondi (e esta é a minha posição): — O artista precisa, mas não deve se submeter ao beneplácito dos governantes, ficar esperando por isto, porque isto pode implicar numa certa subserviência, mesmo que instintiva. A independência para o artista é fundamental. Eu dizia e digo que: – Se uma pessoa, um artista, fizer um bom trabalho, ele há de ser reconhecido. O que interessa é que este artista prime pela sua obra. Procure fazer um trabalho de classe. Para isto, ele às vezes necessita de proceder a uma busca, realizar uma pesquisa, para ilustrar o seu conhecimento. Quem está escrevendo, quem vive de escrever, como é o nosso caso, é preciso cuidar, analisar o que publica e buscar aprimorar sempre a sua criação. E eu sou partidário da condição de que o poeta tenha um pouco de trabalho (em prol do aperfeiçoamento) para compor a sua obra, visto que este material ficará registrado para sempre, passando – às vezes – por várias mãos (leitores diversificados). Digo isto porque fizeram comigo, um dia desses, uma dessas surpresas maravilhosas: eu estava aqui e chegou o professor Daniel Duarte (homem que gosta de publicações e livros raros), que é do Instituto Histórico e Geográfico do Cariri Paraibano, e me mostrou um monte de folhetos antigos que ele adquirira numa dessas feiras do interior. Então, eu passando alguns (uns eu conhecia e outros não...), e o que é que eu encontro... Eu encontrei um folheto que eu havia publicado aqui em Campina Grande em 1957. E deste folheto eu só me lembrava do título: “O Crime da Sombra Misteriosa”, e nem me lembrava mais de como eu tinha criado, inventado e conduzido a história, como havia desenvolvido o enredo. Mas onde eu iria encontrar aquilo? Então me chega aqui o Daniel com um exemplar deste folheto, que fora manuseado por mãos diversas, por mais de cinqüenta anos, passado certamente de pai para filho. Então eu pude perceber, mais uma vez, que quem escreve tem que pensar bem no que vai registrar, tem que analisar com cautela a formação do seu pensamento e da sua obra, para não documentar besteiras, que assim ficarão por muito tempo. Portanto, temos que pensar sempre em legar ao futuro alguma coisa consistente e efetivamente útil. Poesia são fragmentos de luz... São relances... São fagulhas de beleza e de graça... E o poeta tem a obrigação de procurar isto. Uns têm mais facilidade... São mais queridos pela musa. Outros possuem certas dificuldades... Eu, por mim, digo: a cada dia que passa, mais dificuldades eu encontro para escrever os meus textos, porque eu não quero me repetir; eu não quero dizer aquilo que eu já disse... E é muito difícil um homem de mais de setenta anos, como é o meu caso, ficar dizendo coisas novas... (risos)... Quase tudo que eu vou dizer alguém já disse, ou eu mesmo já expressei anteriormente. Mas esta busca é uma necessidade. Nós temos que buscar novas flores e

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fragrâncias. Num jardim por onde você anda todo dia, onde você já beijou todas as rosas, você tem que buscar uma de nuança diferente. Que tenha alguma graça diferenciada daquela que você contemplou no dia anterior. Esta é a dificuldade e o desafio do poeta. 

RUBENIO MARCELO — Manoel, você – que é membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel – poderia nos dizer se esta Entidade (a ABLC) tem realizado atividades voltadas para a valorização e para a divulgação da arte do cordel? 

MANOEL MONTEIRO — Sim. Digo, com sinceridade, que a Academia Brasileira de Literatura de Cordel, que tem a sua sede localizada no Rio de Janeiro (no bairro de Santa Teresa), é uma das chaves que têm aberto as portas de muitas instituições e entidades importantes no Brasil (e no mundo) para o cordel brasileiro, para este tipo de literatura impressa e expressa em versos. O cearense Gonçalo Ferreira da Silva – o presidente atual da ABLC – é um homem de cultura, possui curso superior, mas é, sobretudo, um poeta nato. Possui dom natural e sensibilidade. A Academia é muito importante. E muita gente tem me abordado sobre ela. Algumas pessoas até me questionam por que esta Academia não é estabelecida no Nordeste, uma vez que – segundo pensam – poesia popular é coisa de nordestino. E eu respondo: Poesia popular não é arte somente de nordestino. Poesia popular é arte do mundo e para o mundo. Os versos populares da literatura de cordel vêm – eu diria – das cavernas. Sim... Eu penso que a primeira poesia popular nasceu, lá numa primitiva caverna, com um troglodita, que – querendo conquistar uma formosa companheira – deixou de emitir aquele ruído agressivo e fez um ruído sonoro, flertou a trogloditazinha de uma maneira poética, agradável, musical, e aí nasceu a primeira poesia, o primeiro texto poético. A poesia é um sentimento especial; é a expressão de um assunto qualquer com a graça e a beleza e a ternura de um texto em versos. Então... Quando a poesia popular (na forma como estamos nos referindo: o cordel) vivia apenas de feira em feira, ela realmente tinha uma limitação de público, é verdade. Mas quando São Paulo e o Rio de Janeiro, por exemplo, começaram a absorver mão-de-obra dos outros estados, e também do Norte e do Nordeste, aí a poesia popular disseminou-se; o cordel ganhou as sendas do Brasil. O Ciclo da Borracha e a construção de Brasília também são eventos que colaboraram para esta universalização da poesia popular, que era, no princípio, um pouco restrita, realmente, ao Nordeste brasileiro. Cordel, literatura popular, hoje, é coisa do mundo. Poesia Popular é nada mais, nada menos, do que uma poesia bem escrita e que atinge a maioria das pessoas, porque ela é compreensível, ela é envolvente e boa de ser assimilada. Poesia popular é – por exemplo – o que encontramos nos versos de Leandro Gomes de Barros, versos escritos há cerca de cem anos e que compõem agora, por três anos seguidos, o programa do vestibular da Universidade Estadual da Paraíba. A Academia Brasileira de Literatura de Cordel tem estabelecido importantes contatos com entidades culturais e instituições do mundo, e esta abertura para os novos meios – mostrando a importância, o real valor da poesia popular – faz com que a literatura de cordel ganhe evidência e amplo destaque nos nossos dias.

RUBENIO MARCELO — E os meios de comunicação de massa, por exemplo, a TV, o rádio, o jornal e, principalmente, a Internet, têm contribuído de forma efetiva para o prestígio e esta evidência do cordel (que você se refere)?

MANOEL MONTEIRO — Estes meios de comunicação têm contribuído, e muito. O cordel, hoje, fala a linguagem do Século XXI. E a mídia, toda a imprensa que precisa de notícia, está vendo aí a importância e a influência do cordel, este expoente de arte que está sendo inclusive (como já afirmei) estudado e enfocado – com destaque – em teses e monografias de mestrado e doutorado. Então, quando as universidades estão interessadas em algo, a imprensa – que é inteligente – também está. E isto tem favorecido deveras a valorização merecida da nossa literatura de cordel. A poesia em geral, hoje, é para ser veiculada também pela Internet e por todos os meios mais modernos de comunicação.

RUBENIO MARCELO — Manoel Monteiro, o que é ser cordelista?

MANOEL MONTEIRO — Ser cordelista é sonhar... E sonhar vinte e quatro horas por dia, porque a poesia popular é um exercício mental maravilhoso e muito gratificante. O poeta olha o vôo de um pássaro, analisa seus movimentos, diferentemente de um físico, por exemplo. Ser poeta cordelista é brincar com o lúdico, é querer copiar estrelas (e isto é possível?)... Então, repito, ser poeta [para mim]

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é viver sonhando, e é muito bom viver assim, porque a realidade do cotidiano é muito ríspida, é muito vazia. A poesia, às vezes, faz chorar, mas choramos de uma maneira diferente, porque choramos com a fecundação da alma...

RUBENIO MARCELO — Eu gostaria que você nos explicasse como é que nasce a sua inspiração para escrever os seus trabalhos de cordel.

MANOEL MONTEIRO — Primeiro, vem da minha vivência. O meu grande livro é a vida. Os meus cordéis são compostos, principalmente, embasados nas minhas experiências de vida, mas também - quando necessito - realizo um pouco de pesquisa. Quando eu vou escrever sobre um determinado assunto, às vezes temas requisitados, eu procuro me inteirar o máximo possível sobre aquela matéria. Contudo, a criação, no meu ponto-de-vista, deve ser a mais solitária possível. Na gestação do texto, o poeta deve-se voltar para o interior, para o seu interior, para os seus sentimentos, suas lembranças mais recônditas. É preciso mergulhar no desconhecido em busca do belo. Isto parece tão subjetivo, este meu raciocínio, mas é assim que estou conseguindo dizer como é o meu processo de criação. Eu não tenho um folheto pronto. Eu não sei nem como ele terá fim. E eu não sei nem se ele vai terminar. Às vezes eu busco uma palavra, eu quero uma palavra de determinado tamanho, eu necessito de uma palavra de determinada cor ou aspecto e ela não me aparece. Não adianta fazer por fazer... Só rimar é fácil (quando o som não arranha o ouvido, temos a rima). Metrificar, outrossim, não é difícil: a métrica pode ser aperfeiçoada pelo costume e a prática. Mas isto é muito pouco para a elaboração um bom poema. Faltam os desígnios da oração, que é o sentido, e principalmente a essência, que é a beleza. Então, o meu processo de criação é uma busca (e é dolorida)... Por isso quando eu trabalho algum folheto de encomenda (e eu faço, principalmente se o assunto for um desafio), eu preciso me inteirar, conhecer, falar com especialistas daquele assunto... Mas eu digo para as pessoas que encomendam: – Em não garanto nada. Não garanto que vai prestar... O futuro é que vai dizer... Eu vou tentar fazer, mas se eu não conseguir, paciência... O que é certo é que, somente pelo fato de eu conhecer os aspectos da rima e da métrica, não terei jamais a garantia da criação de uma bom texto poético. Preciso de algo mais, preciso daquilo que transcende...

RUBENIO MARCELO — Para encerrarmos, eu gostaria que você expressasse algumas palavras dirigidas àquelas pessoas que estão se iniciando na arte do cordel, ou que estão se interessando, de alguma forma, pela poesia popular.

MANOEL MONTEIRO – Parabenizo os que estão iniciando. É preciso que as pessoas expressem o que sentem. E, para isto, o melhor canal, o veículo mais democrático é a poesia. É preciso escrever e divulgar o trabalho. Mas é preciso procurar escrever com responsabilidade e desvelo (e também com racional autocrítica). No momento, a poesia está ganhando muitos adeptos em todo o mundo. Mas escrever poesia não é para todo mundo: só faz poesia quem é poeta; e só concebe a boa poesia quem é bom poeta. A real inspiração é uma coisa deveras etérea; muito sublime; não fácil de ser alcançada. A busca eterna pelo belo é uma das missões do poeta, e eu felicito os que estão começando a escrever, e volto a repetir: - Escrevam tudo que lhe vier ao coração, passem para o papel e divulguem, porque é desse meio, é dessa produção que sairão as grandes obras. Contudo, quero repetir mais uma vez: é preciso ter cuidado ao escrever. O que for escrito agora, assume uma responsabilidade com os leitores do futuro.

Disponível em: http://www.overmundo.com.br/overblog/manoel-monteiro-e-o-novo-cordel-entrevista

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SOBRE A ENTREVISTA:

A entrevista é um tipo de texto que tem a utilidade de informar as pessoas sobre algum acontecimento social ou fazer com que o público conheça sobre as ideias e opiniões da pessoa que é entrevistada.

Desta maneira, tanto o entrevistado quanto o entrevistador devem se posicionar de maneira correta, procurando pronunciar as palavras de forma correta e mantendo uma boa aparência, para que possa causar uma boa impressão diante daqueles que irão assistir a uma entrevista ou lê-la. Mas não podemos nos esquecer de que tudo aquilo é planejado com antecedência, tem mais chances de obter um bom resultado. Dessa forma, é muito importante elaborar as perguntas de maneira clara e objetiva, procurando sempre facilitar o entendimento.

Estruturalmente, a entrevista compõe-se dos seguintes elementos:

 Manchete ou título – Essa é uma parte que deverá despertar interesse no interlocutor envolvido, podendo ser uma frase criativa ou pergunta interessante. 

 Apresentação – É o momento em que se apresentam os pontos de maior relevância da entrevista, como também se destaca o perfil do entrevistado, sua experiência profissional e seu domínio em relação ao assunto abordado. 

Perguntas e respostas – Basicamente, é a entrevista propriamente dita, na qual são retratadas as falas de cada um dos envolvidos. 

Disponível em: http://marista.edu.br/diocesano/genero-textual-a-entrevista-e-sua-funcao-informativa/