MOREIRA, Benedito Dielcio. Jovens, Cotidiano e a Construção de Mundos Midiáticos

20
179 | Página Revista Eletrônica do Programa de Pós-Graduação em Mídia e Cotidiano Artigos Seção Livre Número 4. Junho 2014 © 2014 by UFF JOVENS, COTIDIANO E A CONSTRUÇÃO DE MUNDOS MIDIÁTICOS 1 YOUNG, DAILY LIVES AND CONSTRUCTION OF MEDIATIC WORLDS Benedito Dielcio MOREIRA 2 Resumo: Os jovens constroem e reconstroem cotidianamente mundos a partir de suas relações com o universo midiático. Independentemente, porém, do mundo privado criado por cada um, a questão está no fio condutor que orienta esse processo. Nas relações dos jovens com as mídias e com as tecnologias de informação, mundos são cotidianamente construídos e reconstruídos a partir de versões criadas pelos atores midiáticos, cada vez mais sem a participação dos adultos, familiares e professores, a quem a sociedade delega a responsabilidade para educar seus filhos. Diante da vastidão de informações, eles realizam escolhas, as quais julgam ter relação com os mundos que habitam. Estas reflexões resultam de um estudo realizado com 110 jovens, de quatro tipos diferentes de escolas. Palavras Chaves: Jovens; Mídias; Realidade; Educação . Abstract: The young build and rebuild worlds everyday from their relations with the mediatic universe. Regardless, however, of the private world created by each one, the question is in the thread that guides this process. In the relations of young with the media and information technologies, worlds are daily constructed and reconstructed from versions created by mediatic actors, increasingly without the participation of adults, relatives and teachers, to whom society entrusts the responsibility of educating their children. Given the vast wealth of information, they make choices, which they believe to be related to the worlds they inhabit. These reflections are the result of a study of 110 young people from four different schools. 1 Este texto contém novas discussões para semelhante temática apresentada na Universidade Federal do Paraná, em 2009, no II Seminário Internacional sobre Cultura, Imaginário e Memória da América Latina. 2 Jornalista, professor do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal de Mato Grosso UFMT. Mestre em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo USP e doutor em Educação pela Universität Siegen, Alemanha, coordena o Grupo de Pesquisa “Comunicação, Infância e Juventude”. Desenvolve pesquisas em Comunicação e Cultura Científica, Recepção e Educomunicação. É coordenador operacional do DINTER em Comunicação, UFMG/UFMT.

description

Jovens, Cotidiano e a Construção de Mundos Midiáticos

Transcript of MOREIRA, Benedito Dielcio. Jovens, Cotidiano e a Construção de Mundos Midiáticos

  • 179 | P g i n a

    Revista Eletrnica do Programa de Ps-Graduao em Mdia e Cotidiano

    Artigos Seo Livre

    Nmero 4. Junho 2014

    2014 by UFF

    JOVENS, COTIDIANO E A CONSTRUO DE MUNDOS MIDITICOS1

    YOUNG, DAILY LIVES AND CONSTRUCTION OF MEDIATIC WORLDS

    Benedito Dielcio MOREIRA2

    Resumo: Os jovens constroem e reconstroem cotidianamente mundos a partir de suas

    relaes com o universo miditico. Independentemente, porm, do mundo privado

    criado por cada um, a questo est no fio condutor que orienta esse processo. Nas

    relaes dos jovens com as mdias e com as tecnologias de informao, mundos so

    cotidianamente construdos e reconstrudos a partir de verses criadas pelos atores

    miditicos, cada vez mais sem a participao dos adultos, familiares e professores, a

    quem a sociedade delega a responsabilidade para educar seus filhos. Diante da vastido

    de informaes, eles realizam escolhas, as quais julgam ter relao com os mundos que

    habitam. Estas reflexes resultam de um estudo realizado com 110 jovens, de quatro

    tipos diferentes de escolas.

    Palavras Chaves: Jovens; Mdias; Realidade; Educao .

    Abstract: The young build and rebuild worlds everyday from their relations with the

    mediatic universe. Regardless, however, of the private world created by each one, the

    question is in the thread that guides this process. In the relations of young with the

    media and information technologies, worlds are daily constructed and reconstructed

    from versions created by mediatic actors, increasingly without the participation of

    adults, relatives and teachers, to whom society entrusts the responsibility of educating

    their children. Given the vast wealth of information, they make choices, which they

    believe to be related to the worlds they inhabit. These reflections are the result of a

    study of 110 young people from four different schools.

    1 Este texto contm novas discusses para semelhante temtica apresentada na Universidade Federal do

    Paran, em 2009, no II Seminrio Internacional sobre Cultura, Imaginrio e Memria da Amrica Latina. 2 Jornalista, professor do Departamento de Comunicao Social da Universidade Federal de Mato Grosso

    UFMT. Mestre em Cincias da Comunicao pela Universidade de So Paulo USP e doutor em Educao pela Universitt Siegen, Alemanha, coordena o Grupo de Pesquisa Comunicao, Infncia e Juventude. Desenvolve pesquisas em Comunicao e Cultura Cientfica, Recepo e Educomunicao. coordenador operacional do DINTER em Comunicao, UFMG/UFMT.

  • 180 | P g i n a

    Keywords: Youth; Media; Reality; Education.

    Introduo

    Este trabalho discute a relao do jovem, com idade entre 14 e 16 anos, com o universo

    miditico3, os mundos que ele constri e quem participa com ele neste processo:

    amigos, familiares, atores miditicos e professores. Trata-se de parte de um estudo

    realizado com 110 jovens de ambos os sexos, matriculados no primeiro ano do Ensino

    Mdio, em quatro diferentes escolas de trs cidades do pas4. O estudo completo

    compreendeu a aplicao de um questionrio com perguntas abertas e fechadas sobre

    hbitos de consumo de mdias, discusso com todos os respondentes de cada escola

    sobre as respostas recorrentes e divergentes do questionrio e o aprofundamento dos

    temas mais polmicos com um grupo de oito alunos em cada escola. Foram tambm

    ouvidos professores das respectivas turmas, diretores e coordenadores pedaggicos das

    quatro escolas.

    Alm da adeso de professores, pais e alunos, a escolha das escolas obedeceu a dois

    critrios centrais. Primeiro, situar-se na cidade So Paulo ou na regio de influncia da

    grande metrpole. Segundo, atender aos grupos sociais de consumo segundo a

    classificao do Critrio Brasil5. A deciso pelo Critrio Brasil para identificar os

    diferentes grupos de alunos se deve ao fato de que a escolha da escola, se privada, na

    maioria das vezes tem relao direta com o poder de compra dos pais. Observou-se

    tambm, ao longo de toda a pesquisa, que os quatro grupos so recorrentes em algumas

    3 Por relao com o universo miditico considero tanto o contato dos jovens com todos os artefatos

    tecnolgicos de armazenagem e transmisso de informaes, quanto com os contedos. Assim, quando

    falo em mdia, meios de comunicao e tecnologias de informao, conforme conceito atribudo por

    Castells (2001, p.49), me refiro a um conjunto de meios eletrnicos e impressos que cumprem uma

    funo mediadora da realidade. 4 Estudo completo foi defendido como tese de doutorado, na Alemanha. Texto disponvel no seguinte

    endereo: http://dokumentix.ub.uni-siegen.de/opus/volltexte/2008/375/ 5 A verso do Critrio Brasil utilizada no estudo a de 2008. Disponvel em http://www.abep.org/new/.

  • 181 | P g i n a

    questes relacionadas ao consumo miditico e no se diferenciam apenas na capacidade

    de consumo de suas famlias, mas, sobretudo, na interpretao do contedo das mdias e

    na expectativa que cada grupo tem da formao escolar.

    Assim, as escolas e seus pblicos esto articulados neste texto em quatro categorias de

    anlise: Na escola 1, os alunos e alunas pertencem majoritariamente ao grupo de

    consumo C1 e C26. So os trabalhadores que estudam. Para eles, a Universidade no

    existe enquanto perspectiva de estudo. Na escola 2 esto os estudantes que trabalham,

    pertencentes aos grupos de consumo C1 e B27, principalmente. Para eles, a

    Universidade se apresenta como uma possibilidade. Na escola 3 esto os estudantes

    que precisam estudar, pertencentes em sua maioria aos grupos de consumo B2, B18,

    para os quais a Universidade, especialmente a pblica, a melhor opo. Finalmente, na

    escola 4, esto os estudantes que s estudam. Formados majoritariamente pelo grupo

    de Consumo A9, para estes jovens a universidade, pblica ou privada, um caminho

    natural.

    Este texto tem como ponto central discutir as verses de mundo reconstrudas pelos

    alunos e alunas das quatro escolas, assim como debater a participao das mdias e das

    tecnologias de informao nesse processo. Partimos da constatao de que os meios de

    comunicao constroem e disseminam as suas verses particulares de mundo e

    encontram no campo da recepo jovens que permanecem mais tempo envolvidos com

    os diferentes meios (de segunda a domingo, em mdia cinco horas por dia) do que o

    tempo dedicado escola e s conversas com familiares. Aps a discusso terica sobre

    as mdias, a formao de realidades e a construo de mundos, alguns resultados

    6 Este grupo tem renda mdia familiar de R$ 933,00 (C2) e R$ 1.391,00 (C1).

    7 Na verso 2008 do Critrio Brasil, este grupo tem renda mdia familiar de R$ 1.391,00 (C1) e R$

    2.327,00 (B2). 8 Na escola trs, a renda mdia familiar dos alunos de R$ R$ 2.327,00 (B2) e R$ 4.558,00 (B1).

    9 O grupo de alunos identificados como pertencentes ao grupo A tem renda familiar superior a R$

    8.099,00.

  • 182 | P g i n a

    empricos so apresentados e identificados conforme as quatro categorias acima

    assinaladas.

    Construtores de Mundos

    Os jovens de hoje se deparam com um sistema miditico que insere a informao

    jornalstica em praticamente todos os fluxos miditicos que frequentam. A notcia, tal

    como hoje veiculada, um produto urbanizado, feito sob medida para atingir a todas

    as pessoas, independente do grau de escolaridade ou mesmo do nvel de

    desenvolvimento de um pas (MEDINA, 1988). Assim como as tecnologias disponveis

    no mercado realimentam o mito da igualdade social, o produto notcia, colocado

    venda, alimenta o mito de que a notcia o espelho da realidade. Em outros termos, os

    centros emissores de informao, ou os conectores, tal como os denomina Castells

    (2001), realizam filtros, escolhas, decidem o que noticivel, o que entretenimento.

    Em nome do desejo manifesto pela audincia, geralmente identificado por meio de

    pesquisas de sondagem de opinio, so produzidas e geradas informaes e escolhidas

    as que so veiculveis, segundo a orientao editorial de cada meio. J na recepo,

    quando aceitamos as tecnologias e as informaes, disponibilizadas em diferentes

    formatos, assim o fazemos porque julgamos serem elas relevantes: trata-se de uma

    relevncia que tem vnculos estreitos com a nossa cotidianidade.

    Este processo, portanto, no passivo. A relevncia percebida gera leituras, que so

    sempre dialgicas, no pensar de Bakhtin (2003 e 2004). Do dilogo com a informao

    decorre necessariamente a desconstruo da mensagem recebida e a imediata

    reconstruo de uma nova verso. A considerar, inclusive, que os meios de

    comunicao e as novas tecnologias de informao tm decisiva importncia na

    produo e na transmisso de informaes, e que este processo sempre a edio de

  • 183 | P g i n a

    uma verso da realidade, ento do contato com a informao surgir sempre uma

    reedio, outra verso, a verso compartilhada com os grupos sociais.

    Os sistemas de informao miditicos tm importncia vital nas realidades que

    edificamos em nosso cotidiano. O real, postula Certeau (1994, p.289), aquilo que,

    em cada lugar, a referncia a um outro faz acreditar. Ou seja, os mltiplos relatos,

    com a pretenso de se tornar parte da realidade, se multiplicam em citaes e

    recitao, buscam tornar a crena no real fundamentado naquilo que visvel.

    Conforme Berger e Luckmann (2002), o real aquilo que se conhece como realidade,

    ou seja, o que real um tipo de questionamento inexistente na vida cotidiana, salvo se

    a pessoa estiver diante de um problema que a obrigue a repensar o que ela julgava certo.

    Berger e Luckmann (2002, p.38) argumentam que no h apenas uma, mas mltiplas

    realidades que so experimentadas, construdas pela e na interpretao. Destas, porm,

    uma vital: a realidade da vida cotidiana. Sua posio privilegiada autoriza a dar-lhe

    a designao de realidade predominante. A realidade do cotidiano, para Schtz e

    Luckmann (1975) traz em sua estrutura de base a realidade da vida no mundo: o

    cotidiano do mundo vivido. A realidade do cotidiano a realidade imediata. Est

    fincada no aqui, enquanto corpo, e no agora enquanto tempo. Assim, o tempo presente

    a presena do indivduo no cotidiano, a comprovao de que a realidade existe

    (BERGER e LUCKMANN, 2002).

    O tempo presente tem, portanto, importncia vital tanto para as mdias centradas na

    informao quanto na existncia cotidiana. O pensamento acerca do nosso tempo

    presente tem, como tem o mar para o olhar inaugural de uma criana, a beleza e a

    vastido do novo: Pai, me ajuda a olhar!10. Portanto, postar a realidade diante dos

    10

    Para explicar a funo da arte, conta Eduardo Galeano (1995, p.15), um pai levou o seu filho para

    conhecer o mar. Diante do inimaginvel, o filho balbuciou: pai, me ajuda a olhar.

  • 184 | P g i n a

    olhos e olhar, e desta conjugao extrair um pensamento, um conhecimento que a

    traduza, uma tarefa descomunal, que no se faz sem a ajuda de outros olhares: suporte

    que hoje os jovens obtm, principalmente, do sistema miditico. Pelo sistema miditico

    tudo se converte em um eterno presente: O prazer que obtemos com a representao do

    presente deve-se no apenas beleza de que ele pode estar revestido, mas tambm sua

    qualidade essencial de presente (BAUDELAIRE, 1996, p.8). O tempo presente a

    qualidade essencial do universo miditico. Com toda a sua magnitude, fascinao e

    encantamento, os meios constroem, a todo o momento, estados simblicos e singulares

    de presente. Trs elementos so, portanto, vitais na composio das foras simblicas

    deste processo de construo e reconstruo: o social, a histria e a cultura. Neste

    sentido, o presente est submisso s foras que o compem e nele inferem, nele evocam

    o que sempre foram partes de sua composio: a correlao de foras, o tempo e o lugar.

    nesta arena, na qual coexistem o passado e o futuro atuando decisivamente na

    composio do presente, que a correlao de foras entre os sujeitos, inclusive os

    miditicos, se constitui. No desenvolvimento de uma pessoa so apreendidos signos que

    se transformam em representaes mentais da realidade. So as marcas internas do

    exterior, diz Tomasello (2003). a partir da operacionalizao desse sistema que o

    homem intervm, constri o seu mundo. O sistema simblico de interao surge e

    constitudo na cultura, segundo Tomasello. H, portanto, a ao externa sobre o

    indivduo, mas o sentido dessa realidade depende das necessidades daquele, de sua

    ideologia, de suas aspiraes, conformadas em seu prprio desenvolvimento histrico

    (GONZLEZ REY, 2003, p.94).

    Assim, o que se mostra, o que se constri, se d na conexo entre a realidade e a

    linguagem, entre o mundo e a palavra, no dizer de Freire (2002). Ao utilizar um acervo

    pessoal para interpretar a realidade realiza-se imediatamente uma interveno sobre ela

    (ADORNO, 2003). Os alunos e as alunas das quatro escolas com os quais trabalhei

  • 185 | P g i n a

    neste estudo esto em situaes sociais diferenciadas, herdaram habitus distintos, esto

    em contextos histricos e sociais tambm distintos. As interpretaes que eles do aos

    diferentes mundos que os circundam so referenciadas, como pensa Schtz (2003), em

    acervos de experincias, acumuladas pelos que antecederam, pela prpria experincia e

    pelo que nos transmitido por quem est ao nosso lado. o conhecimento mo

    (SCHTZ, 2003, p.198). Nesse sentido, a formao de nossos juzos decorre da

    complexidade e da singularidade de nossas experincias, aprendizado e interaes.

    As quatro escolas visitadas disponibilizam aos alunos contextos distintos. A escola dos

    trabalhadores que estudam noturna. Por conta dos constantes conflitos entre grupos, as

    salas de aula, as salas de direo e de secretarias e os ptios esto isolados por grades. A

    escola no dispe de equipamentos de apoio aprendizagem e um roubo deixou o

    laboratrio de informtica sem computadores. J a escola dos estudantes que trabalham,

    ou seja, daqueles que veem a universidade como uma possibilidade, tambm pblica,

    noturna, tem alguns instrumentos de apoio pedaggicos, tais como TV e aparelho de

    DVD, e no tem um laboratrio de informtica completamente montado. Por sua vez, a

    escola frequentada por alunos que lutam para ingressar em uma universidade,

    especialmente pblica, matutina, privada, vinculada a um sistema de ensino, e

    disponibiliza aos seus alunos todas as ferramentas tecnolgicas de apoio ao ensino e

    aprendizagem. A escola dos alunos que tm como certo seu ingresso em alguma

    universidade tambm privada e atende aos alunos nos perodos matutino e vespertino.

    Ali, o aluno tem todas as tecnologias de comunicao e informao disponveis e

    atendimento personalizado.

    As quatro escolas constituem, portanto, mundos distintos. E os mundos que os jovens

    destas escolas edificam no surgem do nada, uma vez que, recorrendo a Husserl (2006,

    1992) e Schtz (2003), a gerao de entendimentos delineada por um horizonte

    presente, assentado em um passado e esboado em direo ao futuro. De outro modo, e

  • 186 | P g i n a

    me beneficiando da anlise que Capalbo (1998, p.54) faz da fenomenologia de Schtz,

    os jovens (mas no somente eles) esto envolvidos em um sistema de relaes que os

    mantm atados aos seus projetos. Estes no esto isolados, mas orquestrados em um

    sistema de interesses. aqui, neste sistema de interesses, que as mdias ocupam

    preponderante funo: tanto construindo seus mundos, como fornecendo material

    simblico para a construo de mundos desejados.

    Para Goodman (1995, p.41), no se questiona a existncia de muitas verses de mundo.

    Importa que muitas verses diferentes de mundo tm importncia e interesses

    autnomos, sem qualquer exigncia ou presuno de redutibilidade a uma base nica.

    Para este autor (p.42), a existncia de uma nica verso, ou a reduo das verses em

    uma nica verso, exigiria uma verdade nica sobre o mundo: Exigir redutibilidade

    exclusiva e completa fsica ou a uma outra verso qualquer abrir mo de quase todas

    as outras verses. Em outros termos, as diferentes verses de uma mesma coisa

    indicam que a mesma coisa no de fato a mesma, porque a realidade no existe

    independente das verses que dela so traadas. Aqui, a preocupao central de

    Goodman (1995) no saber como os mundos particulares so feitos a partir dos outros

    mundos percebidos, mas a relao que h entre os diferentes mundos. Assim, como um

    sistema de smbolos no cai do espao sideral, decorrente das interaes

    sociocomunicativas historicamente constitudas (TOMASELLO, 2003, p.131),

    nenhum mundo edificado do nada. O mundo, como o edificamos, deriva de mundos

    que esto disponveis para ns. So deles, conforme Goodman, que extramos o mundo

    que construmos.

    No h, portanto, como no aceitar que a construo e a reconstruo cotidiana de

    mundos tm estreita relao com as tecnologias da informao e com os contedos

    miditicos. Nas relaes com as mdias e com as tecnologias de informao mundos so

    cotidianamente construdos e reconstrudos a partir de verses criadas pelos atores

  • 187 | P g i n a

    miditicos. E para evitar um questionamento moralista sobre o carter persuasivo e

    sedutor dos meios, seus efeitos sobre os jovens, e a pretensa omisso de educadores e

    pais, a questo que deve ser colocada no , por exemplo, a semelhana verificada entre

    a violncia contida nos programas miditicos e a violncia encontrada na realidade dos

    jovens. A questo, ao modo de Benjamin (2004), est nos processos que engendram tais

    semelhanas. Quando o jovem est diante de uma vastido de informaes ele realiza

    escolhas, as quais ele julga ter relao com os mundos que habita. Voltando a Goodman

    (1995, p.52), comum no cotidiano e amplamente confirmado pelos laboratrios de

    psicologia: Que encontramos o que estamos preparados para encontrar, ou seja,

    tanto o que se procura como aquilo que afronta as expectativas.

    Os modos de fazer mundos de Goodman, com a ressalva do autor de que no so os

    nicos, tampouco precisos ou imperativos, so construdos com a composio e

    decomposio, por meio da enfatizao, com o uso de sistemas de ordenao, por

    meio da supresso e complementao e pela deformao. Com essas ferramentas

    intelectuais combinatrias so estabelecidas as verdades no interior do mundo em que

    foram gestadas. Para Bruner (1997), a validade deste modo de pensar, qual seja, de que

    no h apenas um mundo, mas inmeros deles construdos com recursos simblicos,

    est na radicalidade da reflexo. Por essa via so aceitas tanto as realidades criadas

    pela histria de fico, assim como aquelas criadas pela cincia (BRUNER, 1997,

    p.111).

    Jovens Construtores de Mundos

    De fato, a realidade apreendida pelos jovens no est apenas no noticirio. Est tambm

    nas histrias de fico. E uma histria de fico to capaz de espelhar a realidade

    quanto um noticirio. Assim so as telenovelas para os estudantes que trabalham:

    mostram a vida como ela . As telenovelas, as minissries, so programas

    estruturados a partir de uma narrativa ficcional, mas feitos sob medida para o imaginrio

  • 188 | P g i n a

    do seu pblico-alvo: a realidade ganha forma nos dilogos dos personagens, nos enredos

    interpretados. Os programas jovens nas TVs, como Malhao, por exemplo, segundo os

    alunos das quatro escolas, dizem o que eles devem saber da vida. Ocorre que a vida

    vivida no igual para os quatro grupos. Os alunos e alunas das quatro escolas, como j

    dito, tm origens em grupos sociais distintos, vivem circunstncias completamente

    distintas com suas famlias e nas escolas que estudam. Apesar das distncias que os

    separam, dos grupos que os caracterizam e das lacunas culturais e econmicas que os

    diferenciam, eles so recorrentes quando elegem seus atores mediticos.

    Os depoimentos recorrentes nas quatro escolas demonstram como certos programas

    retratam os problemas da vida, como drogas, sexo etc. Por mostrar os problemas dos

    jovens, o programa Malhao ajuda o aluno a formar a sua opinio. Ocorre que quando

    h excessiva repetio das mesmas verses, a reconstruo que se processa

    imediatamente aps a desconstruo do discurso original se ergue a partir das pilastras

    fornecidas pelos discursos repetitivos. Como estes se apresentam como portadores da

    verdade, da face real do que a realidade, suas pilastras so tambm aquelas sob as

    quais os jovens das quatro escolas erguem as suas verses de mundo. Entretanto, no

    debate sobre os problemas e o modo de vida em Malhao, um jovem, aluno da

    escola frequentada por estudantes que trabalham, trouxe uma voz dissonante e conduziu

    seus colegas a uma outra reconstruo, divergente da verso que ganhava unanimidade.

    Ele disse: no concordo com vocs. Na Malhao ningum trabalha, ningum carrega

    marmita11. Aquilo no minha vida. Por este exemplo, os mundos so construdos e

    desconstrudos no processo dialtico.

    Para os alunos e alunas das quatro escolas, as mdias so portadoras da realidade. So

    suficientemente capazes de espelhar exatamente como o mundo, como o cotidiano.

    Os jovens compreendem e aceitam que aquilo que vem, escutam e lem aquilo que

    11

    Almoo pronto que trabalhadores levam de suas casas quando no dispem de recursos para o

    pagamento de restaurantes, ou mesmo quando o empregador no disponibiliza vale refeio.

  • 189 | P g i n a

    realmente aconteceu. E o que aconteceu, e foi mostrado, converteu-se em realidade.

    Para o grupo de jovens que persegue uma vaga na universidade pblica, o que

    veiculado, especialmente na televiso, o que eles precisam ver e saber para melhor

    compreender o mundo e explic-lo. J os estudantes que trabalham encaram as mdias

    com certo temor, um receio de que as situaes mostradas, principalmente nos

    programas policiais, aconteam com eles. Para os trabalhadores que estudam, o

    noticirio mostra o que est acontecendo no mundo e com as pessoas que lhe so

    familiares, ao mesmo tempo em que os ensina como viver em segurana. J no outro

    extremo, no grupo que vai estar sob quaisquer circunstncias na universidade, as

    notcias alertam e ensinam como ele deve agir para no ser o alvo da violncia.

    A importncia do sistema meditico para os jovens no est apenas em sua capacidade

    de mostrar o que aconteceu, mas, tambm, de gerar o que ser, para ns, convertido em

    realidade. H, at, uma inverso: para os estudantes que trabalham, a nossa vida roda,

    gira, assim, ao redor da mdia. Para esta reflexo, Lippmann (1972, p.151) contribui

    com uma provocante assertiva: Na maior parte das vezes, no vemos primeiro para

    depois definir, mas primeiro definimos e depois vemos. Em suma, controladores e

    propagadores de contedos miditicos disponibilizam audincia universos simblicos.

    J o jovem (e tambm todos ns), ao receber algo elaborado, vai recompor ou

    decompor, vai deformar ou complementar, vai enfatizar e ordenar, como pode at

    suprimir, mas, acima de tudo, far isso, em um primeiro momento, a partir dos

    universos simblicos encontrados nos ambientes miditicos que frequenta.

    Os jovens com os quais conversei referem-se aos aparelhos miditicos como sendo

    meu rdio, meu computador, minha televiso. J os programas radiofnicos,

    televisivos, ou sites na Internet, tm a minha cara, dizem eles. Em resumo, o contedo

    miditico se aloja e se torna parte do prprio cotidiano. Por essa mediao fluem

    tambm as relaes nas quais so construdos conhecimentos e esteretipos, por onde

  • 190 | P g i n a

    emaranhados de interesses, crenas, conceitos e pr-conceitos se expandem, se

    entrelaam e exigem, segundo Moises, Geraldi e Collares (2002, p.103) respostas

    imediatas. Entre as muitas possveis, esto a necessidade de dilogos mais frequentes

    das instituies de ensino, mdias e pais sobre os mundos que os jovens constroem.

    O ponto crucial para se aceitar a idia de que o jovem, e no somente ele, constri sua

    realidade com o suporte dos meios tecnolgicos e informativos que a realidade,

    lembram Berger e Luckmann (2002), tanto aquilo que se admite que seja como a

    prpria anlise que se faz dela. a interpretao com a coerncia que d sentido. Uma

    coerncia que se manifesta na organizao dos textos de jornais, de revistas e sites

    noticiosos, nas imagens que do veracidade ao que se fala: que reafirma que aquilo que

    se v , de fato, o que o outro tambm viu. O cotidiano dos jovens, no qual as mdias

    ocupam espaos de destaque, o tempo presente e a confirmao da existncia do

    jovem nele. no cotidiano que se tem prazer ou se sofre. Aqui e agora, diz Lefebvre

    (1991, p.27).

    A questo, considerando a condio do jovem, que as realidades velozmente

    construdas, como so as oferecidas pelas mdias, exigem igual velocidade e

    competncia para realizar escolhas. Com isso, diante no s da velocidade, mas,

    principalmente, da quantidade de contedo disponibilizado, relacionar no cotidiano o

    texto com contexto exige f e confiana: esses dois sentimentos ocupam mais

    espaos na cotidianidade, que sua funo mediadora torna-se necessria em maior

    nmero de situaes" (HELLER, 2000, p.33). impossibilidade de controlar e dominar

    o que o rodeia no cotidiano, a confiana transforma-se no mecanismo que torna possvel

    a interao com os sistemas mediticos, no entendimento de Giddens (2002, p.11): a

    confiana um meio de interao com sistemas abstratos que esvaziam a vida cotidiana

    de seu contedo tradicional, ao mesmo tempo em que constroem influncias

  • 191 | P g i n a

    globalizantes. A confiana gera aquele salto de f que o envolvimento prtico

    demanda.

    No universo das tecnologias de informao, uma das questes centrais est no poder de

    controlar os fluxos (CASTELLS, 2001). Essa uma tarefa que a sociedade delega e

    legitima aos centros produtores de informao, no apenas queles tradicionalmente

    assim reconhecidos, como agncias de notcias, emissoras de televiso, emissoras de

    rdios, jornais e revistas. H novos controladores de fluxos informacionais jornalsticos

    alojados em conexes frequentemente utilizadas pelos jovens, como, por exemplo, a

    pgina personalizada do Google, a pgina principal do MSN Messager, do Yahoo, as

    redes sociais, nos games, entre outros. Os prprios jovens, em suas redes, so tambm

    controladores de fluxos informativos. Essa crescente tendncia, Castells (2001) a

    explica a partir da evoluo histrica e da transformao tecnolgica, o que torna a

    informao noticiosa parte de um modelo cultural como base para a organizao social

    e para a interao entre as pessoas. A notcia um fator de equilbrio e de estabilidade,

    medida que h uma relao entre o que as mdias publicam e o que a populao julga

    importante (TUCHMAN, 1983, p.14).

    Os mundos so construdos pelos emissores quando eles realizam escolhas, quando

    compem, conforme a exigncia tcnica do meio utilizado, um roteiro que tenha como

    proposta mostrar um acontecimento ou uma fico. O receptor, independente do grupo

    social, tambm escolhe, decompe o composto, reconstri o que estava construdo e o

    faz dando nfase conforme o seu critrio de ordenamento de importncia. Os estudantes

    que trabalham assistem ao noticirio policial e este tema recorrente entre eles, pois

    temem que um dia sua famlia possa ser atacada, ainda que residam em locais onde a

    violncia urbana no recorrente. E isso ocorre, segundo eles, porque o mundo assim

    mesmo. J entre os trabalhadores que estudam, este tipo de programa tem uma funo

    pedaggica, pois alm de ensinar como viver em segurana, aponta para quem quem

  • 192 | P g i n a

    no seu mundo social. Para os alunos e alunas do grupo que tem como certa sua ida a

    uma universidade, o noticirio policial mostra o que de fato pode acontecer a eles, se

    no estudarem em escolas com segurana, se no forem levados pelos pais at a porta da

    escola.

    Ao priorizar os programas e as leituras, sejam quais forem, o jovem aluno, ou aluna,

    est elegendo o que ele, ou ela, julga ser mais importante para o seu atual momento da

    vida: Pessoal, assim, tipo, a gente. Eu acho que assim: de um modo geral a gente vai

    se interessar por uma coisa que est na nossa realidade, diz Selma, do grupo de alunos

    que deseja alcanar a universidade. O ato de priorizar exclui o no priorizado. Edifica-

    se, nesse procedimento, uma verso de mundo cujo suporte est nas pilastras

    sustentadas pela correspondncia entre o discurso miditico e a experincia cotidiana.

    O modelo de apresentao das informaes, em forma ficcional ou de noticirio, faz o

    jovem se sentir momentaneamente desarmado, dado o modo irresistvel de como o

    contedo apresentado. Os alunos e alunas sentem certa voracidade, s vezes

    incontrolvel, por alguns determinados temas. como se no pudessem ficar sem tomar

    conhecimento de um assunto, nunca alcanvel. As falas sugerem certa vulnerabilidade,

    como a existncia de algo que aciona o prazer, no dizer de Ktia, do grupo de estudantes

    que trabalham. Jurema, do grupo que luta para estar em uma universidade, acredita na

    existncia de um processo que atua em seu crebro, deixando-o momentaneamente sem

    ao, como se fosse uma pessoa viciada.

    A presena do ator miditico no cotidiano do jovem to intensa que no basta

    acompanh-lo em seu programa. Torna-se necessrio acompanhar tambm a vida dele

    fora da fico ou da televiso, uma tarefa a que muitas publicaes, sites e at outros

    programas televisivos se dedicam. Mas o interesse pela vida de pessoas miditicas

    extrapola a publicao especializada neste tema. A variedade de temas produzida por

  • 193 | P g i n a

    uma publicao de interesse geral, inclusive sobre a vida dos famosos, leva o jovem a

    ocupar o seu tempo com este tipo de leitura, em detrimento de outras: Assim, quando

    eu pego a Veja, ai tem aquela parte sintetizada, do que o fulano disse. Adoro ler aquilo.

    No sei porque. Sabe, assim, eu acho ruim isso. Ai que t, a coisa que eu no acho boa

    da mdia, sabe. Te prende, uma coisa que voc no tem explicao, assim, diz a

    Jurema do grupo que deseja chegar a uma universidade. Do mesmo grupo de Jurema,

    Carmem complementa: Ela mistura muito. (...) voc quer ler mais notcias mesmo

    sobre economia, poltica, no sei o que, voc vai folheando assim, voc v a cara da

    Xuxa. Voc vai parar ali e vai comear a ler. Ai, na hora que voc terminou de ler o

    negocinho da Xuxa, voc ficou cansado e no vai ler mais o resto.

    Os mundos construdos e reconstrudos podem conter maior ou menor grau de

    complexidade. A diretora da escola onde esto matriculados os estudantes que

    trabalham no compreende como um tema policial pode ocupar tanto tempo nas

    conversas de seus alunos. Para o coordenador da escola do grupo de trabalhadores que

    estudam, o noticirio policial e o cotidiano dos alunos e alunas so vizinhos um do

    outro. Para a diretora da escola do grupo de alunos que tem a universidade como um

    caminho certo, h um mundo perigoso fora da proteo da famlia e da escola, enquanto

    extenso da residncia e da herana cultural familiar. Heloisa, dessa escola, por

    exemplo, disse: ... eu nunca andei na rua sozinha.... Mas, no grupo de estudantes

    que trabalham que surgiu a reconstruo de uma verso que requer especial ateno.

    Moradora em uma regio que em nada lembra os tiroteios, as balas pedidas, os assaltos

    e assassinatos, as sirenes de viaturas policiais ligadas das grandes cidades, Maria faz do

    tema violncia uma obsesso. Acredita que qualquer pessoa pode ser a prxima vtima.

    Para ela, o noticirio policial presta um servio. Diz a aluna: s a gente ler para ver

    que isso, que, pode acontecer. Por exemplo: se minha me morre e eu no estava com

    ela, eu fico sabendo o que aconteceu. A gente tem que saber onde a gente est vivendo,

    porque se no tivesse a notcia, como que a gente ia saber....

  • 194 | P g i n a

    Consideraes Finais

    As mdias tem presena marcante na vida dos jovens das quatro escolas. No caso da

    jovem Maria, que frequenta a escola do grupo de estudantes que trabalham, o contedo

    miditico capaz de lev-la a recriar um universo que efetivamente est longe do lugar

    onde ela mora. No entanto, a questo aqui colocada est menos neste resultado e mais

    no processo que se forma e atua no contexto onde ela vive. Os assuntos policiais

    aparecem para este grupo como o tema preferido. A prioridade desta escola dar

    competncia para o aluno prestar concurso pblico e alcanar uma universidade. Para os

    alunos, isso se d na perspectiva de trabalhar durante o dia e estudar noite. Os atores

    dos programas preferidos, policiais ou marginais, so tratados pelos alunos, segundo a

    diretora, como heris. Neste grupo, no entendimento da diretora, os pais no

    comparecem escola e no cobram resultados.

    O problema do no comparecimento dos pais mais grave na escola frequentada por

    trabalhadores que estudam. A famlia, alm de ausente, como se no existisse: o aluno

    est por sua prpria conta, admite o diretor. Os programas policiais so tambm os mais

    assistidos e a escola, antes de ser um espao de aprendizagem, um campo de

    violncias: plantas so pisoteadas, paredes so pichadas e colegas e professores

    desrespeitados. Para o diretor desta escola, a prioridade a pedagogia da disciplina. O

    horizonte de expectativas profissionais se resume s atividades oferecidas no prprio

    bairro. E os alunos tratam o acesso s universidades no como uma oportunidade, mas

    como algo inalcanvel. Com isso, este assunto raramente est em pauta no seu

    cotidiano.

    Os pais, em sua maioria, tambm no esto presentes na escola do grupo de alunos que

    desejam alcanar uma universidade pblica. Os que comparecem so os pais de alunos

    mais bem sucedidos na escola. Porm, segundo a diretora, os pais protegem tanto seus

    filhos que tentam intervir nos procedimentos pedaggicos, especialmente se estes

  • 195 | P g i n a

    procedimentos prejudicam as notas. Cita como exemplo pais que levam filhos para

    passear em perodo de aulas e depois querem da escola reviso de notas, caso os alunos

    tenham perdido atividades avaliativas. Quanto s mdias, telenovelas, telejornais,

    emissoras de rdio e revistas nacionais, principalmente, so os programas e meios mais

    buscados por este grupo. Quanto aos temas miditicos recorrentes nas conversas entre

    as alunas, segundo a diretora, figuram principalmente a moda, o corpo, a esttica,

    economia e poltica. Estes dois ltimos, porque so temas presentes em todo vestibular.

    Entre os alunos, os temas de conversas esto relacionados com esportes e tambm com

    economia e poltica.

    Como nos trs grupos anteriores, os pais dos alunos que estaro sobre quaisquer

    circunstncias na universidade no comparecem na escola, mas entregam seus filhos na

    porta e no querem uma escola aberta, mas instituies que protejam os seus filhos. o

    medo, diz a diretora, medo da violncia, por isso mantm seus filhos isolados. O

    objetivo principal da escola e formar alunos para atender as necessidades da sociedade.

    Sero os futuros executivos de empresas e gestores do pas. Para uma das professoras

    com experincia tambm em outra escola, o professor geralmente visto como um

    profissional de segunda classe. Para ela, a valorizao do professor tem relao com o

    lugar onde ele atua. As mdias tambm tem presena marcante na vida deste grupo.

    Usurios de TVs por assinatura e Internet, viajam muito, inclusive para outros pases.

    Como apresentado, nos quatro grupos recorrente a ausncia dos pais nas escolas,

    assim como o dilogo com os filhos, segundo os diretores, coordenadores e professores

    ouvidos. No entanto, o acervo de conhecimento mo diferente nos quatro grupos,

    como tambm so distintos os contextos culturais, econmicos e sociais. Os jovens

    parecem estar mais por conta das interlocues com os atores miditicos e colegas do

    grupo. Assim, se a comunicao de fato ocorre no campo da recepo, isso no se d de

    forma verticalizada, dos meios para os seus pblicos. Diante da infinidade de opes

  • 196 | P g i n a

    miditicas, os quatro grupos buscam os contedos mais prximos de suas vidas.

    Aceitam que estes contedos se alojem em seus cotidianos, por sua vez convertidos

    cada um, a seu modo, em mundos miditicos. Discutir como so reconstrudos,

    compostos, decompostos, enfatizados e ordenados, suprimidos, complementados ou

    deformados, segundo as ferramentas de Goodman (1995), constituem tanto uma tarefa

    dos prprios meios, como da escola, dos pais e dos prprios jovens.

    Referncias Bibliogrficas

    ADORNO, Theodor Wiesengrund. A Atualidade da Filosofia. In: Educao On Line.

    http://www.educacaoonline.pro.br/index.php?option=com_content&view=article&id=1

    75:a-atualidade-da-filosofia&catid=11:sociologia&Itemid=22, 2003. ltimo acesso em

    30 de maio de 2012.

    BAKHTIN, Mikhail. Esttica da Criao Verbal. So Paulo: Martins Fontes, 2003.

    BAKHTIN, Mikhail. (Volochinov) Marxismo e Filosofia da Linguagem. So Paulo:

    Hucitec, 2004.

    BAUDELAIRE, Charles. Sobre a Modernidade. 4 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,

    1996.

    BENJAMIN, Walter. Obras Escolhidas I: Magia e Tcnica, Arte e Poltica, v. 1. 7 ed.

    So Paulo: Brasiliense, 2004.

    BERGER, Peter L. e LUCKMANN, Thomas. A Construo Social da Realidade:

    Tratado de Sociologia do Conhecimento. 21. ed. Trad: Floriano de Souza Fernandes.

    Petrpolis: Vozes, 2002.

    BRUNER, Jerome. Realidade Mental, Mundos Possveis. Porto Alegre: Artes

    Mdicas, 1997.

    CAPALBO, Creusa. Metodologia das Ciencias Sociais: a fenomenologia de Alfred

    Schtz. 2 ed. Londrina: Editora UEL, 1998.

    CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede. A era da informao: economia,

    sociedade e cultura, v. 1, 5 ed. So Paulo: Paz e Terra, 2001.

  • 197 | P g i n a

    CERTEAU, Michel de. A Inveno do Cotidiano: 1. Artes de Fazer. Petrpolis:

    Vozes, 1994.

    FREIRE, Paulo. A Importncia do Ato de Ler: em trs artigos que se completam. 43

    ed. So Paulo: Cortez, 2002.

    GALEANO, Eduardo. Livro dos Abraos. Porto Alegre: LPM, 1995.

    GIDDENS, Antony. Modernidade e Identidade. Trad: Plinio Dentzien. Rio de

    Janeiro: Jorge Zahar, 2002.

    GONZLEZ REY, Fernando Luiz. Sujeito e Subjetividade: uma aproximao

    histrico-cultural. Trad: Raquel Souza Lobo Guzzo. So Paulo: Pioneira Thomson,

    2003.

    GOODMAN. Nelson. Modos de Fazer Mundos. Trad. Antonio Duarte. Porto: Edies

    Asa, 1995.

    HELLER, Agnes. O Cotidiano e a Histria. 6 ed. Trad. Carlos Nelson Coutinho e

    Leandro Konder. So Paulo: Paz e Terra, 2000.

    HUSSERL, Edmund. Conferncias de Paris. Lisboa: Edies 70, 1992.

    HUSSERL, Edmund. Idias para uma Fenomenologia Pura e para uma Filosofia

    Fenomenolgica. Aparecida: Idias & Letras, 2006.

    LEFEBVRE, Henry. A Vida Cotidiana no Mundo Moderno. Trad: Alcides Joao de

    Barros. So Paulo: tica, 1991.

    LIPPMANN, Walter. Esteretipos. In: STEINBERG, Charles. (Org.) Meios de

    Comunicao de Massa. So Paulo: Cultrix, 1972, p. 149-159

    MOISES, Maria Aparecida Afonso; GERALDI, Joo Wanderley; COLLARES, Cecilia

    Azevedo Lima. As aventuras do Conhecer: da transmisso interlocuo. Revista

    Eletrnica: Educao & Sociedade, ano XXIII, n. 78, abril de 2002, p.91-116. Texto

    Disponvel no seguinte endereo: http://www.scielo.br/pdf/es/v23n78/a07v2378.pdf.

    ltimo acesso: 30 de janeiro de 2012.

    MEDINA, Cremilda. Notcia, um Produto Venda: jornalismo na sociedade urbana e

    industrial. 2 ed. So Paulo: Summus, 1988.

  • 198 | P g i n a

    SCHTZ, Alfred e LUCKMANN, Thomas. Strukturen der Lebenswelt. Neuwied:

    Luchterhand, 1975.

    SCHTZ; Alfred. El Problema de la Realidad Social. Buenos Aires: Amorrortur,

    2003.

    TOMASELLO, Michael. Origens Culturais da aquisio do conhecimento humano.

    So Paulo: Editora Martins Fontes, 2003

    TUCHMAN, Gaye. La Produccin de la Noticia: estudio sobre la construccin de la

    realidad. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 1983.