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História e Crítica MPB EM TEXTOS

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História e Crítica

M P B EM

TEXTOS

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Luiz Americo Lisboa Junior

Itabuna / Ilhéus - Bahia2008

História e Crítica

M P B EM

TEXTOS

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© 2008 por Luiz Americo Lisboa Junior

Todos os direitos desta edição reservados àVIA LITTERARUM EDITORA

Av. Francisco Ribeiro Júnior, nº 198Edifício Atlanta Center, sala 606

Centro - 45600-921 - Itabuna, Bahia, Brasilwww.vialitterarum.com.br www.quiosquecultural.com.br

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L681 Lisboa Junior, Luiz Americo. MPB em textos : história e crítica / Luiz Lisboa Junior. – Itabuna/Ilhéus : Via Litterarum, 2008. 456p.

ISBN: 978-85-98493-44-2

1.Música popular brasileira – História e crítica. 2.Músicos Baianos. 3. Música – Bahia. I. Título.

CDD – 780.420981

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ESCLARECIMENTO

Há sete anos, quando lancei meu segundo livro, 81 Temas da música popular brasileira, reuni uma série de artigos que havia publi-cado na imprensa. Esses textos tinham por objetivo serem diretos e informativos. Procurei, portanto, ser o mais didático possível, sem descuidar do rigor das fontes pesquisadas e da verdade histórica. Ape-sar de os textos seguirem ordem cronológica da publicação original em jornal, tive o cuidado de, no final, agrupar os assuntos por eixos temáticos para uma compreensão e visibilidade maior dos leitores.

Já este novo trabalho que apresento, resultado também de maté-rias publicadas na imprensa, segue um caminho textual onde a refle-xão critica esta ligada diretamente aos temas abordados. Os assuntos continuam a obedecer à seqüência original de publicação, contudo, achei melhor dividir o livro em três partes, onde cada capítulo tratará de matérias a ele diretamente ligadas e/ou correlatas.

A primeira parte denominada Homenagens, como o próprio nome diz, nos remete a uma seqüência de textos em que faço abor-dagens sobre diversos personagens da música popular brasileira, con-textualizando sua vida e obra. Nos casos de artistas já falecidos, mas que ainda eram vivos na ocasião da publicação das matérias, resolvi mantê-las do modo como foram escritas, pois representam o senti-mento do autor na ocasião. Porém, nestes casos, o leitor terá como nota de rodapé as informações sobre data e local de falecimento.

O segundo capítulo, Artistas baianos, tem como objetivo prin-cipal homenagear e traçar o perfil de compositores e intérpretes que foram fundamentais para o desenvolvimento da arte musical na Bahia, cujas obras merecem ser mais dimensionadas e avaliadas den-tro do processo de desenvolvimento cultural do estado. O capítulo também agrupa mais textos temáticos sobre a música na Bahia.

Por fim, em Comentários e textos críticos, desenvolvo aborda-

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gens reflexivas sobre o panorama geral da música popular brasi-leira, baseados em critérios próprios de observação, fundamenta-dos numa visão geral de quem a vivencia há mais de três décadas, sem omissões ou meias verdades, mas acima de tudo propondo caminhos para o seu crescimento e aprimoramento como uma das vertentes mais importantes de nossa formação cultural e im-prescindível para uma compreensão geral do Brasil e sua gente.

Mais uma vez coloco-me no banco de provas como um aluno que procura fazer o melhor para agradar seu mestre, representado aqui, de modo plural, pelos leitores que serão os responsáveis pela avaliação de mais este trabalho. Sem pretensões literárias ou acadê-micas tem por finalidade dar mais uma colaboração no sentido de preservar a memória musical brasileira e baiana, promovendo o de-bate em torno de um tema que faz parte do cotidiano de todos nós.

Luiz Americo Lisboa Junior.

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SEM AS AMARRAS DA ISENÇÃO Militante da pesquisa, que leva à imprensa, à sala de aula e aonde

mais for solicitado, o professor Luiz Américo Lisboa Junior entrega novo trabalho a seus muitos leitores: MPB em textos – história e crítica. A idéia de abrigar em livro análises publicadas em jornal (talvez o único remédio para evitar-lhes o desgaste precoce) já foi empregada antes pelo autor, mesmo assim ele consegue dar à atual coletânea de artigos uma muito saudável distância da repetição.

Dividido em três módulos, o livro nos remete (em sua primeira parte) à homenagem a artistas da Música Popular Brasileira (MPB), depois dedica merecido espaço aos artistas baianos (segundo capí-tulo) e, no terceiro módulo, com o subtítulo de Comentários e textos críticos, o autor aborda,”baseado em critérios próprios de avaliação” (conforme ele ressalta), o significado da MPB como vertente cultural capaz de nos guiar na senda do conhecimento de um país complexo chamado Brasil.

O livro é um passeio pelo riquíssimo acervo da canção brasilei-ra, a partir de autores e intérpretes como Tom Jobim, Agostinho dos Santos, Wilson Simonal, Juca Chaves, Torquato Neto, Maysa, Do-lores Duran, Baden Powell e Johnny Alf, além de muitos outros es-quecidos e afogados na avalancha da axé music e demais alternativas musicais (ou “musicais”) perniciosas. Tal passeio nos provoca uma irresistível vontade de correr para o mais próximo aparelho de som, diante da necessidade de recuperar o tempo perdido.

Recém-saído de um trabalho de vasto fôlego sobre a (boa) mú-sica popular na Bahia (Compositores e intérpretes baianos. Ilhéus -BA: Editus/Editora da Uesc / Itabuna - BA: Via Litterarum, 2006), Luiz Americo retoma o assunto neste MPB em textos – história e crítica, com a grata lembrança de nomes menos cultuados nestes dias em que, não raras vezes, o excesso de decibéis tenta disfarçar a ausência de afinação e conteúdo artístico: o seresteiro Oswaldo Fahel, o visceral

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Tião Motorista, o cantar doce, sagrado e único dos Tincoãs, os catin-gueiros Xangai e Elomar, Humberto Porto (aquele da A Jardineira), Fernando Lona (nascido ali em Ubaitaba e co-autor, com Geraldo Vandré, de Porta estandarte), Walter Levita (aquele mesmo do “Índio quer apito”), o revolucionário Tom Zé, o grande Edil Pacheco. Que o samba nasceu na Bahia, é regra sabida, mas não praticada: lembrar que aqui é o berço da MPB é tarefa que Luiz Américo sempre faz com prazer, e prazer que nos transfere, mais uma vez, neste seu mais recente título.

Abstraindo-se o aspecto puramente lúdico-histórico dos dois primeiros capítulos, MPB em textos... já se faria leitura necessária, pela sua terceira parte, quando Luiz Americo solta as amarras da isenção e exerce o direito de opinar sobre um tema que o apaixona há muitos anos, a MPB Aí, ele dá largas à sua santa intolerância com os que, a seu juízo (e da maioria de nós de sua geração), conspurcam um dos segmentos mais significativos da cultura brasileira, a nossa música popular.

A escolha de Luiz Americo, como seguindo as pegadas do mes-tre Gilberto Gil, é de louvar o que bem merece, deixando o que é ruim de lado. É a visão da MPB como componente fundamental de nossa formação, um povo que saiu das ocas e senzalas para construir um país que ainda está muito distante do seu acabamento. Triste-zas de jecas, mágoas de caboclos, esperanças de todos nós, registros passionais, indiferentes, críticos, líricos, épicos e trágicos, tudo isso constitui a geléia geral na nação brasileira, via música popular. E Luiz Americo Lisboa Júnior, cuja obra, no conjunto, o aproxima de José Ramos Tinhorão (sem repetir o lendário mau humor daquele) soli-difica mais ainda seu fazer de pesquisador/historiador com este MPB em textos – história e crítica.

Antonio Lopes.Jornalista, escritor,membro da Academia de Letras de Ilhéus

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SUMÁRIO

HOMENAGENS

CAPÍTULO I

WILSON SIMONAL - VÍTIMA DO PRECONCEITO .................................. 15

TAIGUARA, GERAÇÃO 70, HOJE........... .................................................... 20

DOLORES DURAN - O AMOR A DOR E A MÚSICA ........... ...................... 25

CLUBE DA ESQUINA - 30 ANOS DA REVOUÇÃO MINEIRA .................... 29

OS GENIAIS ORIGINAIS DO SAMBA ......................................................... 32

NARA LEÃO - A MUSA INESQUECÍVEL .................................................... 37

DALVA DE OLIVEIRA - A ESTRELA MAIOR .............................................. 41

ELIZETE CARDOSO - A DIVINA MULATA MAIOR ................................... 45

JOHNNY ALF - SENHOR BOSSA ............................................................... 49

BADEN POWELL - UM VIOLÃO BEM BRASILEIRO .................................. 54

PAULINHO DA VIOLA - O PRÍNCIPE DO SAMBA .................................... 58

TOM JOBIM - 8 ANOS DE SAUDADE ......................................................... 63

TORQUATO NETO - O POETA DA TROPICÁLIA ...................................... 68

NORA NEY - 80 ANOS ................................................................................. 73

JUCA CHAVES - O MENESTREL E A MODINHA....................................... 77

SIDNEY MILLER - TALENTO ESQUECIDO ............................................... 83

OS 30 ANOS DE SÁ E GUARABIRA ............................................................ 88

AGOSTINHO DOS SANTOS - 30 ANOS DE SAUDADE .............................. 94

MILTINHO .................................................................................................. 99

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DILÚ MELLO .............................................................................................. 104

EDNARDO - A VOZ DO CEARÁ ................................................................. 110

SECOS & MOLHADOS - 30 ANOS ............................................................. 115

PAULINHO NOGUEIRA ............................................................................. 119

CUSTÓDIO MESQUITA .............................................................................. 124

FRANCISCO CARLOS - EL BROTO ............................................................ 128

CLARA NUNES - 20 ANOS SEM A GUERREIRA ........................................ 132

ISAURA GARCIA - 10 ANOS SEM A PERSONALÍSSIMA ............................. 138

EMILINHA BORBA - 80 ANOS ................................................................... 143

SILAS DE OLIVEIRA ................................................................................... 148

CIRO MONTEIRO - 90 ANOS ..................................................................... 155

SERGIO RICARDO - UM ARTISTA MÚLTIPLO .......................................... 161

JOÃO DO VALE ........................................................................................... 172

MARIO REIS E A BOSSA NOVA NOS ANOS 30 ........................................... 180

O CANTO TRISTE DE MAYSA ................................................................... 189

MONSUETO MENEZES - UM MONUMENTO NO SAMBA ....................... 194

WALDEMAR HENRIQUE - O COMPOSITOR DA AMAZÔNIA ................. 200

PAULO DINIZ - SOUL BEM BRASILEIRO ................................................... 206

JAYME OVALLE - POETA, MÚSICO E BOÊMIO ........................................ 209

BAHIA, BERÇO E TRADIÇÃO DA MÚSICA

POPULAR BRASILEIRA ............................................................................. 215

ESCOLAS DE SAMBA DA BAHIA ................................................................ 220

OSVALDO FAHEL - A BAHIA NÃO DEVE ESQUECÊ-LO ......................... 241

NOVOS VELHOS BAIANOS ........................................................................ 245

ARTISTAS BAIANOS

CAPÍTULO II

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EDIL PACHECO - COMPOSITOR DA BAHIA ............................................ 249

ANTONIO CARLOS E JOCAFI .................................................................... 254

WALMIR LIMA - SAMBISTA PERFEITO ..................................................... 259

TOM ZÉ - DA BAHIA, DO BRASIL E DO MUNDO .................................... 266

WALTER QUEIROZ - O FILHO DA BAHIA ............................................... 270

FERNANDO LONA - O CIDADÃO DO MUNDO ....................................... 274

TIÃO MOTORISTA - QUEM SAMBA, FICA ................................................ 279

ALCYVANDO LUZ - FALA, MOÇO! ............................................................ 283

HUMBERTO PORTO - LEMBRANÇA NECESSÁRIA .................................. 288

MARIA CREUZA - A PREFERIDA DO POETA ........................................... 293

NELSON RUFINO - CRAQUE DO SAMBA .................................................. 297

CARLOS LACERDA - O PIANO DA BAHIA ................................................ 302

JOSUÉ DE BARROS - TRADIÇÃO E PIONEIRISMO ................................... 307

DUQUE - O DANÇARINO COMPOSITOR ................................................. 313

EDSON CONCEIÇÃO - O SAMBA NÃO MORREU ..................................... 318

ASTRUD GILBERTO - A BAIANA BOSSA NOVA ........................................ 323

QUARTETO EM CY - AS MENINAS DA BAHIA .......................................... 328

CLODOALDO BRITO - CODÓ, VIOLÃO DA BAHIA ................................. 333

O CANTO AFRO DOS TINCOÃS ................................................................ 338

ELOMAR - SERTANEJO BAIANO ............................................................... 342

O SERTÃO DE XANGAI .............................................................................. 348

GEREBA E O BENDEGÓ ............................................................................. 354

JOÃO SÓ - FILHO ADOTIVO ESQUECIDO DA BAHIA ............................. 358

RIACHÃO - SAMBISTA BISSEXTO ............................................................. 367

CARLOS COQUEIJO - JUIZ, POETA E MÚSICO......................................... 370

OSCAR BELANDI - UM BAIANO DESCONHECIDO .................................. 377

SÁ RÓRIS - UM BAIANO QUE PRECISA SER LEMBRADO ........................ 381

MANOEL DO ESPIRITO SANTO ................................................................ 388

ARMANDO SÁ ........................................................................................... 393

WALTER LEVITA ........................................................................................ 400

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A INFLUÊNCIA DA MÚSICA AMERICANA NA MÚSICA POPULAR

BRASILEIRA ................................................................................................ 407

A LUA E A CANÇÃO ................................................................................... 411

SALVE A FAVELA ........................................................................................ 415

MÚSICA POPULAR - É TEMPO DE MUDANÇA ........................................ 419

A MPB FAZ A NOSSA HISTÓRIA ............................................................... 424

MÚSICA BAIANA ATUAL - CORAGEM PARA SUPORTAR ........................ 432

A RESISTÊNCIA DO SAMBA ...................................................................... 436

O SAMBA VIVE ........................................................................................... 440

MÚSICA POPULAR - BBB e CONGÊNERES. UM ALERTA! ........................ 445

OS ANOS 70 ................................................................................................. 448

ANOS 80 E A GERAÇÃO PERDIDA ............................................................ 451

MPB NOVOS TEMPOS ................................................................................ 454

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................. 457

COMENTÁRIOS E TEXTOS CRÍTICOS

CAPÍTULO III

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HOMENAGENS

CAPÍTULO I

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HOMENAGENS 15

WILSON SIMONAL VÍTIMA DO PRECONCEITO

Quando Wilson Simonal morreu em São Paulo no hospital Sírio Libanês, às 10:45 do dia 25 de junho de 2000 com 62 anos de idade, o Brasil perdia assim um dos seus grandes nomes da música popular.

Nascido no Rio de Janeiro em 26 de fevereiro de 1939, já desde cedo apresentava inclinações musicais, participando como cantor dos grupos Dry Boys e Os Guaranis, apresentando-se em boates e clubes. Em 1961 foi descoberto por Carlos Imperial que o levou para seu programa Os Brotos Comandam, no antigo canal 9 no Rio de Janeiro. Nessa ocasião grava seu primeiro disco um compacto simples com a música Teresinha, de Carlos Imperial. Tornando-se conhecido, aos poucos, foi tomando contato com artistas, empresários e produtores, realizando ainda em 1961 um show no Beco das Garrafas, produzido por Luís Carlos Miéli e Ronaldo Bôscoli. Faltava, porém, o primeiro grande sucesso e este veio em 1963 com a música Balanço zona sul, de Tito Madi, lançada em seu primeiro disco, Wilson Simonal tem algo mais, gravado na Odeon.

Balança toda pra andarBalança até pra falarBalança tantoQue já balançou meu coraçãoBalance mesmo que é bomDo Leme até o LeblonE vai juntando um punhado de genteQue sofre com seu andarMas ande bem devagarQue é pra não se cansarVá caminhando

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16 HOMENAGENS

Balan-balançandoSem pararBalance os cabelos seusBalanceCai, mas não caiE se cair, vai caindo, caindoNos braços meus.

A partir de então Wilson Simonal torna-se um nome nacional-mente conhecido e realiza shows pelo Brasil e exterior com o con-junto Bossa Três, liderado por Luís Carlos Vinhas. A essa altura, os discos se sucedem e em 1964 surge o LP A nova dimensão do samba, onde se destaca a canção Nanã, de Moacir Santos. Em 1965 lança a música Garota moderna, de Evaldo Gouveia e Jair Amorim, que es-toura em todas as paradas do país. Entre 1966 e 1967 apresentou o programa Show em Si Monal, na TV Record. Wilson Simonal era, en-tão, o maior fenômeno musical brasileiro e a sua maneira suingada de cantar renovou o nosso canto popular que passou a ter nele seu maior intérprete. Os sucessos se multiplicavam de forma surpreen-dente. Em 1966, no LP Vou deixar cair, grava a canção tradicional Meu limão, meu limoeiro, e o Brasil todo canta. Em 1967, grava o LP Alegria, alegria!!! e aí temos reunido num só disco, Os escravos de Jó, feita em parceria com Antonio Luiz, Vesti azul, de Nonato Buzar e Nem vem que não tem, de Carlos Imperial. Em 1968, no disco Alegria, alegria Vol. 2, surge com seu maior sucesso, Sá Marina, de Antônio Adolfo e Tibério Gaspar:

Descendo a rua da ladeiraSó quem viu é que pode contarCheirando a flor de laranjeiraSá Marina vem pra dançarDe saia branca costumeiraGira ao sol que parou pra olharCom seu jeitinho tão faceira

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HOMENAGENS 17

Fez o povo inteiro cantarRoda pela vida aforaE põe pra fora toda esta alegriaDança que amanhece o diaPra se cantar

Gira que essa gente aflita se agitaE segue o seu passoMostra toda essa poesia do olharDeixando os versos na partida E só cantigas pra se cantarNaquela tarde de domingoFez o povo inteiro chorarE fez o povo inteiro chorar.

Em 1969, surge o LP Alegria, alegria Vol. 3 ou... cada um tem o dis-co que merece, incluindo outro grande êxito, Mustang cor de sangue, de Marcus Valle e Paulo Sérgio Valle, e também em 1969 grava o disco, Alegria! alegria! Vol. 4 ou homenagem à graça, à beleza, ao charme e ao veneno da mulher brasileira, estourando com a música País tropical, de Jorge Ben. Em 1970, viaja com a delegação brasileira de futebol para o México e faz diversos shows naquele país. É o auge de sua carrei-ra. Torna-se o cantor mais popular do Brasil, lota o Maracanãzinho, apresentando-se para um público recorde de 30.000 pessoas e con-solida-se como fenômeno musical. Wilson Simonal foi o primeiro negro a fazer uma propaganda no Brasil, assinando com a Shell uma campanha publicitária milionária. Mas tudo isso teve um preço...

Em 1971, foi acusado de seqüestrar e torturar seu contador, o caso invade as manchetes de jornais e é acusado pelo agente do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), órgão da ditadu-ra, de ser informante, ou seja, dedo-duro. Apesar das suas insistentes negativas, a opinião pública não o perdoa, e Wilson Simonal passa a ser então vítima de uma campanha difamatória que teve inclusive a participação e conivência de vários artistas, numa das maiores mani-

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18 HOMENAGENS

festações de aniquilamento musical que já houve no país. Com isso vê seu prestígio cair cada vez mais, e em novembro de 1974 é conde-nado a cinco anos e quatro meses de prisão por extorsão, cumprindo recluso apenas 12 dias e o resto da pena em liberdade. É o fim.

Daí por diante, se já era discriminado, passa a ser execrado por parte de artistas, empresários e produtores, e sua vida fica restrita à sua incansável defesa e aos sucessos do passado que pouco a pouco vão se esvaindo da memória do povo brasileiro, até chegar ao ostra-cismo total.

Wilson Simonal morreu jurando inocência e mesmo que fosse culpado pelos erros apontados (não cabe aqui um julgamento), sua arte jamais deveria ser afetada. Confundiu-se o artista com o homem e o Brasil registra em seus anais uma página de discriminação e pre-conceito cruéis para um dos maiores representantes de sua canção popular. Talvez se fosse branco e tivesse nascido na zona sul carioca, não tivesse sofrido tanto. Seu maior erro foi ser um artista negro, rico, talentoso, numa sociedade hipócrita, orgulhoso de sua cor e que lutava pelo direito de igualdade racial, como cantou em sua canção com Ronaldo Bôscoli, Tributo a Martin Luher King. Os tempos são ou-tros e esperamos que com o amadurecimento de nossas instituições e valores não surjam nunca mais vítimas do preconceito como foi o grande Wilson Simonal:

Sim, sou negro de corMeu irmão de minha corO que eu te peço é luta, simLuta mais, que a luta está no fim.

Cada negro que forMais um negro viráPara lutar com sangue ou nãoCom uma canção também se luta, irmão.Ouve minha voz, Oh! ié ié iéLutar por nós

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HOMENAGENS 19

Luta negra demaisÉ lutar pela pazLuta negra demaisPara sermos iguais.

Luiz Americo Lisboa JuniorItabuna, 31 de julho de 2002.

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20 HOMENAGENS

TAIGUARA GERAÇÃO 70 HOJE

Há muitos nomes na música popular brasileira que deveriam ser lembrados com mais freqüência devido à sua importância, prin-cipalmente quando foram artistas que representaram, com grande intensidade, a época em que viveram deixando marcas e um estilo que os confunde com o seu próprio tempo. Quem, por exemplo, po-derá rever a música brasileira dos anos 60 e início dos 70 do século passado, sem lembrar das baladas românticas e as canções de cunho social engajadas de Taiguara? Sem sentir a força de sua poesia que fez a cabeça de uma geração que começa já a embranquecer seus cabelos e sentir a nostalgia daqueles tempos heróicos? Pois Taiguara é isso, um legítimo representante da maioridade musical brasileira alcançada após a geração Bossa Nova.

Nascido Taiguara Chalar da Silva em 9 de outubro de 1945, no Uruguai, aos quatro anos veio para o Brasil com os pais, radicando-se no Rio de Janeiro, onde se tornou um brasileiro legítimo. Oriundo de família de músicos, o avô compositor popular de qualidade, o pai maestro e a mãe cantora, Taiguara dificilmente ficaria imune a seguir uma carreira artística.

Em 1960 foi morar em São Paulo onde continuou seus estudos, chegando a cursar a faculdade de direito na Universidade Mackenzie. Mas seu destino já estava traçado e na própria faculdade organizou o grupo vocal Os Aedos e participou de inúmeros festivais estudantis. Em 1964, abandonou o curso de Direito e decidiu seguir a carreira de músico, cantor e compositor. O Brasil perdeu um advogado e ganhou um dos seus mais talentosos artistas. Em 1965, gravou seu primeiro LP com arranjos de Luiz Chaves, onde se destacou a música Samba de copo na mão. Ainda em 1965 participou, com Claudete Soares e Jongo Trio, do Show Primeiro Tempo 5 x 0, que resultou no lançamento de um disco com os melhores momentos do espetáculo. Em 1966,

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HOMENAGENS 21

estreava como ator, participando do filme Crônica da cidade amada, que ainda contou em seu elenco com Billy Blanco, Blecaute e Gran-de Otelo. Continuando sua trajetória, participou de inúmeros festivais, sendo um dos mais requisitados intérpretes para diversos compositores, alcançando muito sucesso e chegando mesmo em 1968 a gravar um LP intitulado Taiguara vencedor de festivais. Em 1969, lança o LP Hoje, cuja música - título se torna um dos maiores êxitos de sua carreira:

Hoje trago em meu corpo as marcas do meu tempoMeu desespero a vida num momentoA fossa, a fome, a flor, o fim do mundo.

Hoje trago no olhar imagens distorcidasPois viagens, mãos desconhecidasTrazem a lua, a rua às minhas mãos.

Mas hoje, as minhas mãos enfraquecidas e vaziasProcuram nuas pelas luas, pelas ruasNa solidão das noites frias por você.

Hoje, homens sem medo aportam no futuroEu tenho medo, acordo e te procuroMeu quarto escuro é inerte como a morte.

Hoje, homens de aço esperam da ciênciaEu desespero e abraço a tua ausênciaQue é o que me resta, vivo em minha sorte.

Ah, sorte, eu não queria a juventude assim perdidaEu não queria andar morrendo pela vidaEu não queria amar assimComo eu te amei.

Em 1970, no V Festival Internacional da Canção, fez muito sucesso

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22 HOMENAGENS

com a música Universo no teu corpo, utilizando, com a mesma sutileza que continha em Hoje, a sua critica social romanceada:

Eu desisto,Não existe essa manhã que eu perseguiaUm lugar que me dê trégua e me sorriaUma gente que não viva só pra siSó encontro gente amarga mergulhada no passadoProcurando repartir seu mundo erradoNessa vida sem amor que eu aprendi.

Por uns velhos vãos motivosSomos cegos e cativosNo deserto do universo sem amorÉ por isso que eu precisoDe você como eu precisoNão me deixe um só minuto sem amor.

Vem comigo, meu pedaço de universo é no teu corpoEu te abraço, corpo imerso no teu corpoE em seus braços se unem versos à cançãoEm que eu digo, que estou morto pra este triste mundo antigoQue meu porto, meu destino, meu abrigoSão teu corpo, amante, amigo em minhas mãos.

Já considerado um dos grandes talentos de sua geração, Tai-guara lança, ainda no ano de 1970, o LP Viagem, que inclui, além de Universo no teu corpo, a canção que dá nome ao disco, consolidando-se assim como um dos mais importantes e talentosos artistas da época. Em 1972, surge com o disco Taiguara, piano e viola e outro mega-sucesso, a balada Teu sonho não acabou. Artista eclético e profunda-mente engajado nas questões sociais, grava em 1973 o LP Fotografias, incluindo a canção Que as crianças cantem livres. Nessa ocasião via-jou para Londres onde estudou regência e gravou um disco, esteve

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HOMENAGENS 23

também em Cuba, Paris, Tanzânia, Etiópia e Nova York, vivenciando diversas experiências que consolidaram sua maturidade intelectual e artística.

Em 1976, rompe com as tradições românticas de sua canção e grava o extraordinário disco Imira, Tayra, Ipy, que conta com a parti-cipação de Hermeto Pascoal, Toninho Horta, Novelli e Wagner Tiso. Perseguido pela censura, teve diversas de suas músicas proibidas, cre-ditando a autoria delas, a fim de serem gravadas, à sua esposa Ge Chalar da Silva. Em 1983, grava o disco Canção de amor e liberdade, seu trabalho mais politicamente engajado, onde se destaca a música Voz do leste, que, apesar do tempo histórico em que foi feita, continua com seus versos ainda bem atuais:

Sou voz operária do TatuapéCanto enquanto enfrento o batente com a mãoTrabalho no ritmo desse chamaméMeu pouco salário faz minha ilusão.

Sou voz operária do TatuapéVivo como posso e me deixa o patrãoEnquanto respira dessa chaminéMeu povo se vira e não vê solução.

No trato da vergonha aonde a verdade não se dizTem quem representa a massa, Quem ri da desgraça e quem banca o infeliz.

Tem até burguês que sonhaQue entra em cena e engana a atrizTem quem sustenta a trapaçaE depois que fracassa amordaça o país.

Já o meu drama é o da cegonhaQuase morre o meu guri

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Sobra pro leste a fumaçaE a peste ameaça o ar do Piqueri.Pior que a matança medonhaÉ o desemprego pra engolirSeja no peito ou na raçaEsse teatro devasso alguém tem que proibir

Seja no palco ou na praçaEssas peças sem graça vão ter que sair(sair de cartaz...).

Taiguara, em 1994, concretiza um antigo projeto com a grava-ção de seu último disco, Brasil afri, retomando sua linha tradicional de sambista do início da carreira e seu lado político, homenageando o líder comunista Luis Carlos Prestes com a música Cavaleiro da Es-perança.

A obra de Taiguara precisa ser resgatada para as novas gerações, para que todos possam conhecer o talento desse grande nome de nossa canção popular, dando o reconhecimento necessário a um ar-tista que foi um dos mais fieis intérpretes de sua época e que marcou profundamente os sonhos e os anseios de uma juventude que se via envolvida no romantismo explosivo de um período em que o Brasil ape-sar de toda repressão era ainda um país onde as pessoas, e os jovens prin-cipalmente, procuravam um caminho e descobriam, apesar de tudo, que éramos um povo criativo e inteligente o suficiente para construirmos uma nação madura que nortearia nossos passos no futuro.

Taiguara morreu em 14 de fevereiro de 1996, e sua arte, precisa ser revista e merecidamente eternizada, a fim de se fazer justiça a quem tanto brigou por ela.

Luiz Americo Lisboa Junior6 de agosto de 2002.

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DOLORES DURANO AMOR A DOR E A MÚSICA

O Brasil dos anos 50 do século XX, durante o governo Juscelino Kubistchek, vivia um período de luzes e esplendor em todas as áre-as e a música popular teve nessa época uma de suas mais brilhantes gerações de artistas, compositores e intérpretes, que modificaram de forma substancial o ritmo evolutivo de nossa canção, integrando-a à modernidade da época. Foi nessa ocasião que os programas de au-ditório lotavam os estúdios da Rádio Nacional do Rio de Janeiro onde se aplaudiam os novos astros como Ângela Maria, Cauby Peixoto, Emilinha Borba, Marlene, dentre outros. Nesse contexto histórico desencadeou-se também um movimento renovador de nossa música, a Bossa Nova, portanto, tínhamos um Brasil múlti-plo com os sambas abolerados e uma poesia litero-musical reno-vadora.

Nesse ambiente surge uma estrela que tinha por nome de batis-mo Adiléia Silva Rocha, nascida no Rio de Janeiro em 7 de junho de 1930 e rebatizada com o nome artístico de Dolores Duran. Em 1940, apresentou-se no programa Calouros em Desfile, de Ary Barroso, na Rádio Tupi, interpretando a canção latina Vereda tropical, alcançando precocimente o primeiro lugar como intérprete. Disposta a ganhar a vida como artista de rádio, participou de inúmeros programas como cantora e atriz e aos 16 anos foi contratada pela Boate Vogue já com o pseudônimo de Dolores Duran, sendo em seguida convidada por César de Alencar para se apresentar como atração permanen-te em seu programa na Rádio Nacional. Aos 22 anos, em 1952, gravou seu primeiro disco com as músicas Que bom será, de Alice Chaves, Salvador Miceli e Paulo Marques e Já não me interessa, de Domício Costa e Roberto Faissal. Continuou lançando discos e em 1954, já conceituada no meio artístico, gravou com muito su-cesso Canção da volta, de Antônio Maria e em 1955 apresentou-se

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em Punta Del Este, no Uruguai.O talento de Dolores Duran, porém, não ficaria direcionado

apenas para o campo da interpretação, e sim também para o de com-positora, onde mostrou todo o seu talento em músicas que se eterni-zaram pela sua beleza. Um dos seus parceiros mais constantes nessa sua fase inicial de compositora foi Tom Jobim, com quem compôs Se é por falta de adeus, Estrada do sol e Por causa de você, este um clássico de nosso cancioneiro:

Ah, você esta vendo sóDo jeito que eu fiquei e que tudo ficouNuma tristeza tão grandeNas coisas mais simples que você tocou.

A nossa casa, queridaJá estava acostumada guardando vocêAs flores na janela sorriam, cantavamPor causa de você.

Olhe, meu bem, nunca maisNos deixe, por favorSomos a vida e o sonhoNós somos o amor.

Entre, meu bem, por favorNão deixe o mundo mau lhe levar outra vezMe abrace simplesmente, não fale, não lembreNão chore, meu bem.

Em 1958, Dolores Duran apresentou-se em Moscou e Paris e de

volta ao Brasil, em parceria com o pianista José Ribamar, lançou as músicas Quem sou eu, Idéias erradas, Pela rua e Se eu tiver. Continuando a apresentar-se em boates e também em televisão compôs sem parceria algumas de suas canções mais famosas como Castigo, Fim

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de caso, Solidão e A noite de meu bem, sendo esta um dos maiores clássicos românticos da história de nossa música popular:

Hoje eu quero a rosa mais linda que houverE a primeira estrela que vierPara enfeitar a noite de meu bemHoje eu quero paz de criança dormindoE abandono de flores se abrindoPara enfeitar a noite de meu bem.

Quero a alegria de um barco voltandoQuero ternura de mãos se encontrandoPara enfeitar a noite de meu bem.

Ah! Eu quero amor, o amor mais profundoEu quero toda a beleza do mundoPara enfeitar a noite de meu bemAh! Como esse bem demorou a chegarEu já nem sei se terei no olharToda pureza que quero lhe dar.

Apesar do reconhecimento de público e crítica, Dolores Duran tinha uma vida pessoal difícil, mergulhando em depressões constan-tes. Foi justamente num desses momentos onde tudo parece irreme-diavelmente sem sentido que ela veio a falecer, depois de uma pro-funda crise depressiva, em sua residência, na madrugada do dia 24 de outubro de 1959, por ingestão excessiva de barbitúricos, com apenas 29 anos.

Dolores Duran tornou-se, com o passar dos anos, uma das mais conceituadas e importantes compositoras de nossa música popular, num país que não tem tradição de mulheres nesse campo de ativi-dade. Seu nome é referência obrigatória quando se quer conhecer e estudar a vida brasileira na década de 50, os chamados anos dourados em que ela, como uma estrela, brilhou com tanta luz e intensida-

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de, que até hoje seus raios iluminam todos os nossos caminhos embalados nas suas doces e suaves canções.

Luiz Americo Lisboa JuniorItabuna, 13 de agosto de 2002

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CLUBE DA ESQUINA 30 ANOS DA REVOUÇÃO MINEIRA

Corria o ano de 1963 e um jovem carioca criado em Minas Ge-rais sai da cidade onde residia, a bucólica Três Pontas, e vai morar em Belo Horizonte, a capital do estado, onde as pessoas iam buscar novas oportunidades e sonhos a conquistar. Foi com esse intuito que Milton Nascimento partiu para encontrar seu rumo. Ao chegar à ca-pital das alterosas foi morar numa pensão no edifício Levy, situada na Avenida Amazonas. Lá tomou contato com outros jovens da família Borges que, como ele, também buscavam seu caminho na estrada da vida. Nessa ocasião Milton já participava, com seu companheiro Wagner Tiso, de um conjunto denominado W’s Boys e ao enturmar-se com os irmãos Borges, principalmente com Márcio Borges, que também já faziam suas experiências sonoras no campo da compo-sição e da poesia, surgiria uma amizade que iria gerar, num futuro muito próximo, um dos mais belos movimentos musicais da canção brasileira.

A amizade com Márcio Borges trouxe ao convívio de Mil-ton Nascimento outros jovens mineiros como Tavinho Mou-ra, Fernando Brant, Ronaldo Bastos, Beto Guedes, além de Lô Borges, irmão de Márcio e que desde menino demonstrava muito talento.

A ambiência musical e política brasileira nos anos 60 era propí-cia ao surgimento de movimentos contestadores e renovadores, des-tacando-se entre eles a Tropicália liderada pelos baianos Caetano Ve-loso e Gilberto Gil. Nessa época os festivais de música popular eram a oportunidade que jovens artistas tinham para mostrar seu trabalho e conquistar espaço na música popular. E Milton Nascimento, com todo o seu talento, foi premiado com o 2o. lugar no III F.I.C. – Festi-val Internacional da Canção Popular, parte nacional, com Travessia, feita em parceria com Fernando Brant. Paralelo à sua atividade em

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outros palcos, continuou freqüentando um pequeno boteco situado na esquina da rua Divinópolis com a rua Paraisópolis, no bairro de Santa Tereza, em Belo Horizonte, onde, com os amigos de boemia e música fazia-se um novo som que o Brasil inteiro logo iria aplaudir, deixando marcas profundas na história da nossa canção popular. Essa confraria de amigos foi batizada de Clube da Esquina, em função do local e das constantes reuniões ali formadas que mais pareciam mes-mo um clube onde todos iam discutir temas de interesse mútuo.

Estávamos nos fins da década de 60 e alguns dos integrantes do Clube já davam demonstrações da sua força poético–musical, não só na capital mineira, mas também no cenário nacional, sendo o seu integrante mais ilustre Milton Nascimento. Mas o talento de Milton, por si só, não seria suficiente para renovar e impor um novo modelo no cenário musical, e seus parceiros já estavam prontos e o repertório também para dar uma renovada na música brasileira. Foi justamente entre os anos de 1970 e 1971 que eles prepararam um número de canções que pretendiam lançar num álbum duplo, uma façanha para a época. Esse lançamento ocorreu em 1972 com o disco Clube da Esquina, um marco da música popular brasileira, inaugurando, de forma definitiva, um movimento musical que trouxe à nossa canção popular renovação estética e melódica, onde se fundiam ritmos e tra-dições mineiras brasileiríssimas. Entre os destaques do álbum pode-mos citar as canções Tudo que você podia ser, de Lô Borges e Márcio Borges; San Vicente, de Milton Nascimento e Fernando Brant; Nuvem cigana, de Lô Borges e Ronaldo Bastos, além de Cais, Cravo e canela e Nada será como antes, todas de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, sendo que nesta última, de modo intencional ou não, a letra define bem a intenção de renovação que o grupo estava realizando:

Eu já estou com o pé nessa estradaQualquer dia a gente se vêSei que nada será como antes, amanhãQue notícias me dão dos amigos?Que notícias me dão de você?

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Alvoroço em meu coraçãoAmanhã ou depois de amanhãResistindo na boca da noite um gosto de sol.

Num domingo qualquerQualquer horaVentania em qualquer direçãoSei que nada será como antes, amanhãQue notícias me dão dos amigos?Que notícias me dão de você?Sei que nada será como estáAmanhã ou depois de amanhã Resistindo na boca da noite um gosto de sol.

Os frutos do Clube da Esquina se revelaram primorosos e uma geração de talentosos nomes se firmou em carreiras independentes, deixando para a nossa música popular um patrimônio dos mais signi-ficativos. Ouvir hoje os discos de Lô Borges, Beto Guedes, Toninho Horta, Wagner Tiso, Milton Nascimento, Flávio Venturini, os grupos O Terço, 14 Bis e Boca Livre, aliados aos poemas de Márcio Borges e Fernando Brant, dá a verdadeira dimensão da importância deles para a cultura brasileira.

Parabéns a esses jovens/maduros mineiros, nesses 30 anos, por tudo o que fizeram de belo pela nossa música popular. Assim se faz história, com qualidade e determinação.

Luiz Americo Lisboa JuniorItabuna, 28 de agosto de 2002.

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OS GENIAIS ORIGINAIS DO SAMBA

Há alguns anos o panorama musical brasileiro vem sofrendo profunda descaracterização, com a invasão de grupos que, pela sua péssima qualidade, vem destruindo uma de nossas mais au-tênticas manifestações artísticas. Falo desses terríveis conjuntos de “pagode”, verdadeiras monstruosidades musicais, que dissemi-nam incultura ao nosso povo, legando uma série de canções com letras e melodias que deixam qualquer pessoa de bom senso estar-recida. E, o que é pior, esses grupos vem gradativamente tentan-do, mas não vão conseguir, destruir de forma sistemática e expor ao ridículo nosso gênero musical mais puro, popular e autêntico, que é o samba. Felizmente, temos verificado que vem surgindo a cada dia resistências daqueles que primam pela qualidade e zelo de nosso panorama cultural e com isso vão minando aos poucos a tendência de popularização crescente desses detratores musicais, que são esses pagodeiros louros oxigenados.

Mas a música popular brasileira é riquíssima e consegue sempre se impor pela sua superioridade qualitativa, e o samba, em especial, que ao longo de sua gloriosa e triunfante história, nos trouxe gru-pos que verdadeiramente deixaram um legado que as gerações irão perpetuar lembrando de suas músicas. Entre esses heróis, temos o conjunto Os Originais do Samba.

Criado no início da década de 60 do século passado com o nome de Os Sete Modernos, sua formação original era a seguinte: Mussum (Antonio Carlos Bernardes – R.J.1941/S.P.1994), reco-reco; Rubão (Rubens Fernandes – R.J.1933/S.P.1977), surdo; Bigode (Arlindo Vaz Gemino –R.J. 1942), pandeiro; Bidi (Murilo da Penha Aparecida e Silva –R.J. 1932), cuíca; Chiquinho (Francisco de Souza Serra – R.J. 1943), ganzá e Lelei (Wanderley Duarte – R.J. 1946). Em 1961, passaram a atuar profissionalmente e mudaram o nome do grupo para Os Originais do Samba, sendo empresariados por Carlos Machado,

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apresentando-se em diversas casas noturnas e espetáculos no Rio de Ja-neiro, São Paulo e também em alguns países como México e Porto Rico. Em 1968, contratados por Miele & Bôscoli, acompanharam Elis Regina na apresentação da música Lapinha, de Baden Powel e Paulo César Pi-nheiro, vencedora da I Bienal do Samba, promovida pela TV Record.

Em 1969, contratados pela RCA Victor, gravaram seu primei-ro LP e estouraram nas paradas com a música Cadê Tereza, de Jorge Ben. No ano de 1971, fizeram o Brasil inteiro cantar com E lá se vão meus anéis, de Eduardo Gudin e Paulo César Pinheiro. Seus sucessos se somavam a cada nova gravação, tendo recebido entre os anos de 1970 e 1972 nada menos do que três discos de ouro, uma verdadeira façanha para a época.

Uma de suas interpretações mais conhecidas é o samba Esperan-ças perdidas, de Adeílton Alves e Delcio Carvalho, lançado no LP O samba é a corda, os Originais a caçamba, de 1972:

Quantas belezas deixadas nos cantos da vidaQue ninguém quer e nem mesmo procura encontrarE quando os sonhos se tornam esperanças perdidasQue alguém deixou morrer sem nem mesmo tentar.

Minha beleza encontro no samba que façoMinha tristeza se torna um alegre cantarÉ que carrego o samba bem dentro do peitoSem a cadência do samba não posso ficar.

Não posso ficar, eu juro que nãoNão posso ficar, eu tenho razãoJá fui batizado na roda de bambaO samba é a corda e eu sou a caçamba.

Quantas noites de tristeza ele me consolaTenho como testemunha a minha violaAi se me faltar o samba não sei o que seráSem a cadência do samba não posso ficar.

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Ainda em 1972, gravam, de Luis Carlos e Chiquinho, O lado di-reito da rua direita, e em 1974, no disco Pra que tristeza, lançam Tragé-dia no fundo do mar (Assassinato do camarão), de Zere e Ibrain, uma de suas mais populares criações:

Assassinaram o camarão Assim começou a tragédia no fundo do mar O caranguejo levou preso o tubarão Siri sequestrou a sardinha Tentando fazer confessar O guaiamum que não se apavora Disse, eu que vou investigar Vou dar um pau nas piranhas lá fora Vocês vão ver, elas vão ter que entregar. Logo ao saber da notícia Tainha tratou de se mandar Até o peixe-espada também foi se entocar Malandro foi o peixe-galo, bateu asas e voou Até hoje eu não sei como a briga terminou.

Os Originais do Samba continuaram fazendo muito sucesso e participaram da gravação de inúmeros artistas, como Martinho da Vila, Chico Buarque, Jair Rodrigues e da dupla Toquinho e Vinícius. Em shows apresentaram-se ao lado de nomes como Duke Ellington, Earl Grant e outros astros da música popular brasileira. Seu sucesso era tamanho que se tornaram o primeiro conjunto de samba a se apre-sentar no Olympia de Paris, na França.

A partir do final da década de 70, o grupo sofreu algumas modi-ficações, entre elas a saída de Mussum, que fez muito sucesso como comediante, integrando o quarteto Os Trapalhões, liderados por Re-nato Aragão. Continuaram se exibindo e gravando alguns discos nos anos 80 e em 1997, com sua formação bastante alterada, Os Originais do Samba lançaram um CD intitulado Os Originais de todos os sambas

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em comemoração aos trinta anos de carreira.Hoje ao revermos a história recente do samba podemos verifi-

car que, apesar dos vários grupos que ainda resistem realizando um trabalho voltado para a sua preservação, temos que considerar a im-portância dos Os Originais do Samba como o conjunto que elevou ao nível máximo o padrão musical de nosso gênero mais popular, sendo, inclusive, referência obrigatória para todos que queiram ouvir o que de melhor foi produzido em termos de samba no Brasil nos últimos 35 anos. Seus discos merecem ser reeditados em CD, pois são peças fundamentais para a compreensão do que de melhor nossa música popular produziu em um passado muito recente. E para terminar essa homenagem nada mais adequado do que os versos do samba Testamento de partideiro, de Candeia, imortalizado magistralmente pelo Os Originais do Samba:

Pra minha mulher deixo amor e sentimentoNa paz do SenhorE para meus filhos deixo bom exemploNa paz do senhorDeixo como herança força de vontadeNa paz do SenhorQuem semeia amor deixa sempre saudadeNa paz do SenhorPros meus amigos deixo meu pandeiroNa paz do SenhorHonrei os meus pais e amei meus irmãosNa paz do SenhorMas aos fariseus não deixarei dinheiroNa Paz do SenhorPros falsos amigos deixo meu perdãoNa paz do SenhorSe houver tristeza que seja bonitaNa paz do SenhorDe tristeza feia o poeta não gosta

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Na paz do SenhorUm surdo marcando um choro de cuícaNa paz do SenhorViola pergunta, mas não tem respostaNa paz do SenhorQuem rezar por mim que o faça sambandoNa paz do SenhorPorque um bom samba é uma forma de oraçãoNa paz do SenhorUm bom partideiro só chora versandoNa paz do SenhorTomando com amor batida de limãoNa paz do Senhor.

Porque um sambistaNão precisa ser membro de AcademiaAo ser natural com a sua poesiaO povo lhe faz imortal.

Luiz Americo Lisboa JuniorItabuna, 4 de setembro de 2002.

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NARA LEÃO A MUSA INESQUECÍVEL

A música popular brasileira, em sua longa trajetória, nos trou-xe grandes artistas que deixaram marcas profundas pelo talento que tinham e também por tudo que representaram para afirmação de nossa identidade cultural. Seja qual for a época em que surgiram, esses astros e estrelas foram importantes personagens que contribuí-ram de maneira decisiva para que possamos compreender as modifi-cações impulsionadas em determinado contexto histórico. Porém, e infelizmente, muitos quando envelhecem ou morrem tendem a cair no esquecimento, num imperdoável descaso à nossa memória e à sua perpetuação para as novas gerações.

Dentre esses grandes valores da nossa história musical des-tacamos a figura inesquecível de Nara Leão, nascida em Vitória capital do Espírito Santo em 19 de janeiro de 1942, indo residir no Rio de Janeiro com apenas um ano de idade. Desde cedo tomou gosto pela música, pois, aos doze anos, já era aluna de violão do cantor e violonista Patrício Teixeira. Oriunda de uma família de classe média, logo fez amizade com outros jovens que, como ela, buscavam um novo som para a música popular brasileira, e de 1957 a 1959 participou de alguns shows universitários com inte-grantes do movimento Bossa Nova, que dava seus primeiros pas-sos. Sua casa passou a ser ponto de encontro desses jovens artis-tas, dentre eles, Carlos Lyra, Roberto Menescal, Ronaldo Bôscoli, João Gilberto, dentre outros.

Em 1963 estreava como cantora profissional participando do espetáculo musical Pobre menina rica, de Vinícius de Moraes e Car-los Lyra. Reconhecida por seu talento pelo público e crítica, atuou no exterior, no Japão e na França, e, em 1964, gravou seu primeiro LP pela gravadora Elenco, de Aloysio de Oliveira, lançando músicas de grande sucesso como Consolação, de Baden Powell e Vinícius de