Na matem ática não posso achar deficiência, a não ser que...

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Func Funcç ões ões definidas por definidas por series series Na matem Na matemática não posso achar deficiência, tica não posso achar deficiência, a não ser que os homens não compreendem, a não ser que os homens não compreendem, suficientemente, o uso excelente da suficientemente, o uso excelente da matem matemática pura. tica pura. Francis Bacon Francis Bacon

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FuncFuncççõesões definidas por definidas por seriesseries

Na matemNa matemáática não posso achar deficiência, tica não posso achar deficiência,

a não ser que os homens não compreendem, a não ser que os homens não compreendem,

suficientemente, o uso excelente da suficientemente, o uso excelente da

matemmatemáática pura.tica pura.

Francis BaconFrancis Bacon

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Funcções definidas por series

440

7. Introdução ao capítulo

Para melhor enquadrar a análise do tema, que tratamos neste capítulo – Funcções

definidas por series. Singularidades das funcções – e por ser um conhecimento

fundamental para a sua compreensão, vamos começar por fazer um estudo prévio,

genérico, do desenvolvimento das séries numéricas, nas várias edições do Curso.

Como não é nosso objectivo uma análise aprofundada do desenvolvimento das

séries numéricas, adoptámos uma metodologia diferente da que temos vindo a utilizar.

Assim, fazemos um estudo comparado simultâneo das séries numéricas, nas quatro

edições do Curso, isto é, não analisamos, em separado, a 1.ª edição e as restantes.

Entrando no estudo do capítulo VII do Curso, vemos que, nas quatro edições, tem

como título genérico, Funcções definidas por series. Singularidades das funcções.

Em todas as edições do manual, Gomes Teixeira fez um desenvolvimento

sequencial semelhante destes temas. Porém, a linguagem adoptada na 1.ª edição é,

pontualmente, distinta da utilizada nas restantes edições. Estas diferenças de linguagem

não são significativas, reflectindo, essencialmente, as distintas formas de abordagem de

Gomes Teixeira, relativa aos conceitos de limite de uma sucessão e de limite e

continuidade de uma função. Contudo, como vamos ver, há uma diferença de extensão

de conhecimentos, entre a 1.ª edição e as posteriores. Mas, não fazia sentido seguirmos a

mesma metodologia dos capítulos anteriores, isto é, analisarmos as diferentes

abordagens daqueles temas, nas várias edições do Curso, separando a análise da 1.ª

edição da análise das restantes edições. Deste modo, por um lado, analisámos, em

simultâneo, os textos das várias edições do Curso; por outro, fizemos um estudo dos

trabalhos referenciados por Gomes Teixeira (Quadro 7.1) e de artigos, que ele publicou

sobre o assunto, comparando-os com o texto do manual.

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Funcções definidas por series

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Bibliografia referenciada no Curso de Analyse Infinitesimal – Calculo Differencial

Funcções definidas por series

Singularidades d’algumas funcções

Exemplo de uma funcção continua que não tem derivada

1.ª edição - 1887 2.ª edição - 1890 3.ª edição - 1896 4.ª edição - 1906

Hankel

“Untersuchungen uber die unendlish oft oscillirenden und unstetigen Functionen

Tubigen” 1870

Hankel

“Untersuchungen uber die unendlish oft oscillirenden und unstetigen Functionen

Tubigen” 1870

Hankel

“Untersuchungen uber die unendlish oft oscillirenden und unstetigen Functionen

Tubigen” 1870

Hankel

“Untersuchungen uber die unendlish oft oscillirenden und unstetigen Functionen

Tubigen” 1870

Ulisse Dini

Fondamenti per la teorica delle funzione di variabili reali

1878

Ulisse Dini

Fondamenti per la teorica delle funzione di variabili reali

1878

Ulisse Dini

Fondamenti per la teorica delle funzione di variabili reali

1878

Ulisse Dini

Fondamenti per la teorica delle funzione di variabili reali

1878

Weierstrass

Journal de Crelle

Tomo 79

1875

Weierstrass

Journal de Crelle

Tomo 79

1875

Weierstrass

Journal de Crelle

Tomo 79

1875

Weierstrass

Journal de Crelle

Tomo 79

1875

Darboux

“Mémoire sur les fonctions discontinues”

Annales Scientifiques de l’Ecole Normale Supérieure de Paris

1875

Darboux

“Mémoire sur les fonctions discontinues”

Annales Scientifiques de l’Ecole Normale Supérieure de Paris

1875

Darboux

“Mémoire sur les fonctions discontinues”

Annales Scientifiques de l’Ecole Normale Supérieure de Paris

1875

Riemann

Bibliografia referenciada no Curso de Analyse Infinitesimal – Calculo Differencial

Funcções definidas por series - Singularidades d’algumas funcções Exemplo de uma funcção continua que não tem derivada

Quadro 7.1

Terminamos o capítulo com a parte 7.4, “Súmula de ideias”, onde expomos

algumas reflexões, consequência do nosso estudo.

7.1 As séries numéricas reais e complexas nas várias edições do Curso

Nas quatro edições do Curso, as séries numéricas são tratadas na parte V, do

capítulo I, da Introducção, intitulada Series. Na 1.ª edição, este tema aparece

imediatamente a seguir a Operações sobre imaginarios e, nas restantes edições, segue-se

à Noção de limite (ver Anexo C, Estrutura do Curso). Esta diferença é devida ao facto da

introdução da noção de limite de uma sucessão ser feita de forma distinta, na 1.ª e nas

restantes edições, como tivemos ocasião de precisar anteriormente1.

1 Ver 6.1.1.

Capitulo I Introducção Parte V

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Funcções definidas por series

442

No desenvolvimento das séries numéricas, Gomes Teixeira tratou, primeiro, as

séries numéricas reais e, depois, as séries numéricas complexas, o que é bem evidente,

na 2.ª edição e posteriores, pois aparecem duas partes distintas intituladas Series de

termos reaes e Series de termos imaginarios (ver Anexo C, Estrutura do Curso).

Nas duas primeiras edições, Gomes Teixeira iniciou, do seguinte modo, a sua

exposição das séries de termos reais:

Depois de considerar expressões analyticas compostas de um numero finito de

operações é natural passar a considerar expressões analyticas compostas de um

Primeira página, parte V, Capitulo I, da Introducção, 4.ª edição do Curso Ilustração 7.1

Séries numéricas de termos reais

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Funcções definidas por series

443

numero infinito de operações, isto é, as series, os productos infinitos e as fracções

continuas.2

Como, na 1.ª edição, Gomes Teixeira não tinha dado, previamente, a noção de

sucessão convergente, antes do ponto em que iniciou o desenvolvimento das séries,

começou por dar uma noção intuitiva e, quanto a nós, pouco elucidativa de

convergência:

Todas estas expressões3 para poderem ser sujeitas ao calculo, devem ser

convergentes, isto é, devem tender para um limite determinado á medida que

augmenta o numero de sommas, multiplicações ou divisões. As expressões que não

estão n’este caso chamam-se divergentes.4

Como é natural, este texto deixa de ter significado, nas edições seguintes, por a

noção de limite de uma sucessão ter sido introduzido, antes das séries. Deste modo, o

texto é eliminado, nas edições posteriores, o que prova o sentido de auto-crítica de

Gomes Teixeira.

Nas quatro edições, Gomes Teixeira considerou nu o termo geral duma série e

representou-a por ∑∞

1

nu , dando a seguinte definição de série real:

As series são expressões da fórma

......321 +++++ nuuuu

em que o numero das parcellas é infinito.5

Em todas as edições, com algumas diferenças de linguagem, não significativas,

definiu, do seguinte modo, uma série convergente:

[…] a serie é convergente todas as vezes que a somma ns das n primeiras parcellas,

isto é, a somma

nn uuus ...21 ++=

tende para um limite determinado á medida que n augmenta. Este limite chama-se

somma da serie.6

Parece-nos que a definição de série convergente ficou correctamente inserida na 2.ª

edição e seguintes, pois, nestas, Gomes Teixeira passou a dar, com clareza, a noção de

limite de uma sucessão.

2 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 24; 1890, p. 29. 3 Gomes Teixeira está a referir-se às expressões compostas por um numero infinito de operações. 4 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 24. 5 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 24; 1890, p. 30; 1896, p. 32; 1906, p. 33. 6 Ibidem.

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Funcções definidas por series

444

Como seria de esperar, Gomes Teixeira foi coerente, nos desenvolvimentos, que

passou a dar, pois os enunciados dos teoremas relativos às séries, envolvendo a noção de

limite de uma sucessão, são diferentes, na 1.ª edição e nas edições posteriores.

Ainda que mediando apenas três anos, entre as duas primeiras publicações, pode

dizer-se que, da 1.ª edição para a 2.ª, Gomes Teixeira enriqueceu muito o seu manual,

com a introdução de novos teoremas, novas demonstrações, novos exemplos ilustrativos

da teoria, novas referências bibliográficas e históricas, que traduzem a sua actualização,

relativamente ao que se ia publicando. Mas tal não aconteceu, apenas, na 2.ª edição,

pois, de edição para edição, Gomes Teixeira, foi incorporando novos conceitos, novas

referências históricas e ainda alguns detalhes, que foram tornando os textos, cada vez,

mais completos, precisos e claros. É notório o extenso e profundo conhecimento sobre

séries e a sua evolução histórica, que Gomes Teixeira demonstra.

A título de exemplo, fazemos algumas transcrições, optando pela 1.ª edição e pela

4.ª, por ser a última.

Comecemos pela condição necessária e suficiente de convergência de uma série.

Na 1.ª edição

1.º – Se a serie é convergente póde sempre dar-se a n um valor tão grande que,

combinado com qualquer valor de p, satisfaça á desigualdade:

δ<+++=− ++++ pnnnnpn uuuss ...21 ,

por mais pequena que seja δ .

2.º – Reciprocamente, se houver sempre um valor de n que, combinado com

qualquer valor de p, satisfaça á desigualdade:

δ<−+ npn ss

por mais pequena que seja δ , a serie proposta será convergente.

Do que procede tira-se o corollario seguinte:

É condição necessaria, mas não sufficiente, para que a serie seja convergente, que

os seus termos decresçam em valor absoluto á medida que n augmenta. 7

Na 4.ª edição

1.º – Se a serie (1)8 é convergente, a cada valor dado á quantidade positiva δ , por

mais pequeno que seja, corresponde um numero 1n tal que a desegualdade

7 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 25-26. 8 Gomes Teixeira refere-se a ......321 +++++ nuuuu Em alguns dos enunciados seguintes, Gomes

Teixeira usa este “(1)” com o mesmo significado.

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Funcções definidas por series

445

δ<+++=− ++++ pnnnnpn uuuss ...21 ,

é satisfeita pelos valores de n superiores a 1n , qualquer que seja p.

2.º – Reciprocamente, se a cada valor dado á quantidade positiva δ , por mais

pequeno que seja, corresponde um numero 1n tal que a desegualdade

δ<−+ npn ss

é satisfeita pelos valores de n superiores a 1n , a serie (1) é convergente.

Destes princípios tira-se, pondo 1=p , o corollario seguinte:

É condição necessaria (mas não sufficiente) para que a serie (1) seja convergente,

que o valor dos seus termos tenda para zero, quando a ordem d’elles augmenta

indefinidamente.9

Sobre estes textos, poder-se-iam fazer comentários, em questões de linguagem,

semelhantes aos feitos no capítulo 6, parte 6.1.1. Contudo, este teorema, conhecido

usualmente pelo Critério de Cauchy para a convergência das séries numéricas, merece-

nos um comentário particular.

Segundo Victor Katz, Bolzano também enunciou este teorema10. Porém, muito

antes de Cauchy e de Bolzano, o mesmo enunciado aparece já nos Principios

Mathematicos do matemático português José Anastácio da Cunha. Este manual foi

publicado de 1782 a 1790, muito antes do Cours d’Analyse, de 1821. Victor Katz afirma

ainda que, apesar do manual de José Anastácio da Cunha ter sido traduzido para francês,

em 1811, teve pouca divulgação na época e, por isso, pouca influência11.

É interessante salientar que, no seu livro Princípios de Análise Matemática

Aplicada, Jaime Carvalho e Silva propõe que este teorema se designe por Teorema de

Cunha-Bolzano-Cauchy12, numa homenagem aos três matemáticos, que

independentemente o formularam.

9 Teixeira F. G., 1906, p. 36. 10 Katz V. J., 1993, p. 642-643. 11 Ibidem, p. 643. 12 Silva J. C., 1994, p. 352.

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Funcções definidas por series

446

A seguir, vamos transcrever alguns dos critérios de convergência, a que, de modo

geral, Gomes Teixeira chamou regras.

Na 1.ª edição

3.ª – Se a partir de um valor determinado p e n a razãon

n

u

u 1+ de dois termos

consecutivos é sempre menor do que uma quantidade L inferior á unidade, a serie é

convergente; se esta razão é maior do que a unidade, a serie é divergente.13

Na 4.ª edição

III. Se, para todos os valores de n a partir de um valor p, a razão n

n

u

u 1+ dos valores

absolutos de dous termos consecutivos da serie (1) é sempre menor do que uma

quantidade L inferior á unidade, a serie é convergente; se esta razão é maior do que

a unidade, a serie é divergente.14

13 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 27. 14 Teixeira F. G., 1890, p. 35; 1896, p. 37-38; 1906, p. 38.

Primeira página do Capítulo IX dos Principios Mathematicos, onde se encontra o Critério de Convergência das séries numéricas enunciado por José Anastácio da Cunha Ilustração 7.2

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Funcções definidas por series

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Só na 4.ª edição é que Gomes Teixeira atribuiu este enunciado a D’Alembert,

chamando-lhe Critério de D’Alembert15, não coincidindo com a denominação, que

usualmente se dá hoje.

Na 2.ª e restantes edições, Gomes Teixeira acrescentou, em nota de rodapé, a

seguinte observação:

Vejam-se os tomos VII e VIII16 do Jornal de Sciencias mathematicas algumas

observações interessantes de Lerch17, Cesàro18, Gützmer19 e Ed. Weyer20 a respeito

d’este theorema e dos dois seguintes.21

Nesta nota Gomes Teixeira empregou a palavra theorema, em vez de regra, que

utiliza no texto do manual; na mesma nota, os dois teoremas, a que ele se refere, dizem

respeito aos teoremas, que, em seguida, vamos analisar.

15 Teixeira F. G., 1906, p. 38. 16 O volume VII é de 1886 e o VIII é de 1887. 17 Era usual Gomes Teixeira receber cartas, com artigos para serem publicados, quer no JSMA, quer nos

Annaes (Ver Anexo A, Colectânea de cartas da correspondência de Gomes Teixeira). Por exemplo, no volume VII, o artigo de Lerch intitula-se “Remarque sur la théorie des séries (Extrait d’une lettre adressée à F. Gomes Teixeira)”.

18 Ver Anexo A, Colectânea de cartas da correspondência de Gomes Teixeira. 19 Ibidem. 20 Ibidem. 21 Teixeira F. G., 1890, p. 35; 1896, p. 38; 1906, p. 38.

Carta 449, de Lerch a Gomes Teixeira, tratando convergência de séries Gentileza do Arquivo da Universidade de Coimbra Ilustração 7.3

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Funcções definidas por series

448

Nas mesmas edições, 2.ª e posteriores, Gomes Teixeira acrescentou um corollario,

actualmente conhecido por Critério de D’Alembert, e ainda os dois teoremas, referidos

no parágrafo anterior, e que, a seguir, transcrevemos.

2.ª edição e restantes

COROLLARIO – Se a razão n

n

u

u 1+ tende para um limite determinado, quando n

augmenta indefinidamente, a serie é convergente se este limite é menor do que a

unidade, e é divergente se este limite é maior do que a unidade.22

V – Se existir um numero a, maior do que a unidade, tal que, para todos os valores

de n a partir de um numero determinado p, o producto na un seja menor do que

uma quantidade determinada K, a série (1) é convergente.23

Se existir um numero a, igual ou inferior á unidade, tal que, para todos os valores de

n, a partir de um numero determinado p, os termos da série (1) sejam positivos e o

producto naun seja maior do que K, a série (1) é divergente.24

VI – Seja L uma quantidade positiva e

,...,...,, 21 naaa

um grupo composto de um numero infinito de numeros positivos. Se a desigualdade

Lau

ua n

n

nn >− +

+1

1

fôr satisfeita pelos valores de n superiores a p, a série (1) é convergente.25

Na 4.ª edição, Gomes Teixeira atribuiu a Cauchy o teorema V transcrito,

remetendo para o Cours d’Analyse, capitulo VI, 182126.

Depois de dar a demonstração do teorema VI, transcrito, Gomes Teixeira atribuiu-

o a Jensen, apenas na 2.ª edição, 27 e remete para Comptes Rendus de l’Académie des

Sciences de Paris, 188828; Gomes Teixeira acrescentou que, deste teorema se tira, como

corolário, pondo na n = e 11 +=+ na n , etc., o teorema devido a Raabe:

Se a desegualdade

22 Teixeira F. G., 1890, p. 36; 1896, p. 38; 1906, p. 39. 23 Teixeira F. G., 1890, p. 37; 1896, p. 40; 1906, p. 40. 24 Teixeira F. G., 1890, p. 38; 1896, p. 40-41; 1906, p. 40-41. 25 Teixeira F. G., 1890, p. 38-39; 1896, p. 41; 1906, p. 41. 26 Cauchy A., 1989, p. 135. 27 Teixeira F. G., 1890, p. 39. 28 Ibidem, nota de rodapé, p. 39.

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Funcções definidas por series

449

Lu

un

n

n +>

+

111

fôr satisfeita por todos os valores de n superiores a um numero p, a série (1) é

convergente.29

Na 3.ª e 4.ª edições, Gomes Teixeira atribuiu este mesmo teorema não a Jensen,

mas a Kummer, deduzindo dele o mesmo teorema devido a Raabe.

Além disso, na 4.ª edição, em nota de rodapé30, Gomes Teixeira dá as referências

completas do texto de Kummer, Journal de Crelle, t. XIII, 1835, e do texto de Raabe,

Zeitschrift für Mathematik, t. X, 1832.

Na mesma edição, logo imediatamente a seguir aos exemplos, que deu de séries

convergentes, Gomes Teixeira fez uma exposição histórica, relativamente extensa, sobre

a evolução da noção de série e o seu uso, durante os séculos, desde os gregos até ao

século XIX, referindo Wallis, Mercator, Brounker, Newton, J. Gregory, Cauchy,

Leibniz, Abel, Dirichelet, Gauss e Riemann31. Nas edições posteriores à primeira, em

notas de rodapé ou inseridas no texto, Gomes Teixeira fez referências a Lerch, Cesàro32,

Gützmer33, Ed. Weyr34, Kummer, Raabe, Morgan, Bertrand, Gauss, Riemann e a

Cauchy.

Acabámos de assinalar, ainda que sucintamente, algumas diferenças, nos textos

das várias edições do Curso, relativamente à teoria das séries numéricas, que já indicam

ao leitor que Gomes Teixeira tratou o tema, de forma mais desenvolvida e mais rigorosa,

29 Teixeira F. G., 1890, p. 40; 1896, p. 42; 1906, p. 42. 30 Teixeira F. G., 1906, p. 42. 31 Ibidem, p. 35-36. 32 Ernesto Cesàro trocou correspondência com Gomes Teixeira, apresentou seis artigos nos volumes VI,

VII, VIII, IX e X do JSMA e enviou 79 trabalhos que se encontram em vários volumes da 1.ª e 2.ª séries das Separatas. Vilhena H., 1936, cartas 41, 48 a 51, 275, 278, 280, 1156 e 1157, p. 214, 215, 231, 232 e 273. Ver Anexo A, Colectânea de cartas da correspondência de Gomes Teixeira, cartas 49 e 52. Ver Anexo C, JSMA, Lista de colaboradores e Artigos do JSMA. Ver Anexo B, Colecção de Separatas.

33 Auguste Gützmer trocou correspondência com Gomes Teixeira, apresentou seis artigos nos volumes VIII, IX, X e XIII, do JSMA e enviou 24 trabalhos que se encontram em vários volumes da 1.ª e 2.ª séries das Separatas. Vilhena H., 1936, cartas 103 a 113, 193, 213, 243, 384, 386, 388-389, 500, p. 219 a 220, 226, 227, 229, 237, 238 e 245. Ver Anexo A, Colectânea de cartas da correspondência de Gomes Teixeira, cartas 385, 387 e 501. Ver Anexo C, JSMA, Lista de colaboradores e Artigos do JSMA. Ver Anexo B, Colecção de Separatas.

34 Ed. Weyr trocou correspondência com Gomes Teixeira, apresentou um artigo no volume VIII do JSMA e enviou 12 trabalhos que se encontram no volume XXXV da 2.ª série das Separatas. Vilhena H., 1936, cartas 479 a 488, p. 243 e 244. Ver Anexo C, JSMA, Lista de colaboradores e Artigos do JSMA. Ver Anexo B, Colecção de Separatas.

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Funcções definidas por series

450

nas edições posteriores à primeira. Do estudo feito, queremos assinalar, mais uma vez,

que nos ficou a impressão do extenso conhecimento de Gomes Teixeira, sobre séries

numéricas e sobre os autores, que as trataram, e ainda do aprofundamento desse estudo,

que se revela, ao longo das quatro edições do Curso. É de notar ainda que ele trata

alguns dos temas, com um aprofundamento e extensão, que não são usuais, num manual

do 1.º ano universitário.

Da análise das quatro edições, ressalta, em Gomes Teixeira, não só a sua faceta de

didacta, mas também de investigador e historiador, pois os diferentes temas foram sendo

tratados reflectindo o seu desenvolvimento histórico.

Voltando à análise do Curso, em todas as edições, a seguir às séries numéricas

reais, Gomes Teixeira desenvolveu a teoria das series de termos imaginarios.

Como seria de esperar, Gomes Teixeira desenvolveu a teoria das séries numéricas

de termos imaginários, tendo presente o seu tratamento das séries numéricas reais.

Assim, na primeira edição, para passar, das séries numéricas reais a séries numéricas

imaginárias, afirmou apenas Passemos ás series compostas de termos imaginarios35,

dando, de imediato, o Theorema 1.º, relativo à condição necessária e suficiente da

convergência destas séries36. Na 2.ª edição e posteriores, Gomes Teixeira deu as

seguintes definições de série imaginária e de série imaginária convergente:

Consideremos agora as series compostas de termos imaginários:

...)(...)()( 2211 +++++++ mm yixyixyix

ou

(4) ∑∑∞

=

=

=+

11

)(

m

m

m

mm uyix 37

Se as series

(5) ∑∞

=1m

mx , ∑∞

=1m

my

são convergentes, a serie (4) diz-se convergente. Neste caso a somma ns dos seus n

primeiros termos, isto é a somma

∑∑∑===

+=+=

n

m

m

n

m

m

n

m

mmn yixyixS

111

)(

35 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 29. 36 Ibidem. 37 Teixeira F. G., 1890, p. 41; 1896, p. 43-44; 1906, p. 43.

Séries numéricas de termos complexos

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Funcções definidas por series

451

tende para um limite determinado, que se chama somma da serie (4).38

Apesar de não ter introduzido a definição de série imaginária convergente, na 1.ª

edição, Gomes Teixeira enunciou, nesta mesma edição, dois teoremas, relativos à

convergência destas séries. Como aconteceu com as séries numéricas reais, também

aqui, os teoremas têm enunciados distintos, na 1.ª edição e nas restantes. Como exemplo,

comparem-se alguns enunciados do citado Theorema 1.º, nas quatro edições.

Comecemos pela condição necessária e suficiente de convergência.

1.ª edição:

Theorema 1.º – A condição necessaria e sufficiente para que uma serie de termos

imaginarios seja convergente, é que o sejam a serie formada pelos termos reaes, e a

serie formada pelos coefficientes de 1− .39

2.ª edição e restantes:

THEOREMA 1.º – É condição necessaria e sufficiente para que a série (4)40 seja

convergente que a cada valor que se dê á quantidade positiva δ , por mais pequeno

que seja, corresponda um numero 1n tal que a desigualdade

δ<+=− ∑∑+

+

+

+

+

pn

n

m

pn

n

mnpn yixss

11

seja satisfeita pelos valores de n superiores a 1n , qualquer que seja p .41

Parece-nos interessante salientar que este último enunciado de Gomes Teixeira é

análogo ao que José Sebastião e Silva propõe, nos seus Textos Didácticos, e que

denomina de Critério de convergência de Cauchy-Bolzano:

Critério de convergência de Cauchy-Bolzano. Condição necessária e suficiente para

que a série ∑ nz 42 convirja, é que a todo número 0>δ corresponda um número

natural v tal se tenha

δ<++=− +++ pnnnpn zzSS ...1

para todo o vn > e todo o número natural p .43

38 Ibidem. 39 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 29.

40 Gomes Teixeira está a referir-se à série ∑∑∞

=

=

=+

11

)(

m

m

m

mm uyix .

41 Teixeira F. G., 1890, p. 41-42; 1896, p. 44; 1906, p. 44.

42 Ao escrever ∑ nz , Sebastião e Silva está a referir-se à série ∑ ∑∑∞

=

=

=

+=

0 00 n n

nn

n

n yixz , que é

análoga à dada por Gomes Teixeira.

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Funcções definidas por series

452

Parece-nos que esta comparação com o texto de Sebastião e Silva e outras, que

faremos posteriormente, nos mostram a actualidade dos textos de Gomes Teixeira.

Voltando à análise do Curso, após este teorema, nas quatro edições, Gomes

Teixeira passou a desenvolver a teoria das séries absolutamente convergentes e as

operações sobre séries de termos complexos.

O enunciado do teorema relativo à comutatividade dos termos de uma série

absolutamente convergente:

Theorema 3.º – A somma de uma serie absolutamente convergente não se altera

quando se muda a ordem dos seus termos.44

é o mesmo, nas quatro edições. Contudo, as notas a este teorema vão-se enriquecendo, de

edição para edição. Na 2.ª edição e restantes, Gomes Teixeira atribuiu o teorema a

Dirichlet; também nas mesmas edições, acrescentou uma nota, sobre as séries, que não

gozam desta propriedade, e remeteu ainda o leitor para os autores, que trataram destas

séries, referindo: Ed. Weyr, “Deux remarques relatives aux séries”, Jornal de Sciencias

Mathematicas e Astronomicas, t. VIII45; Riemann, Oeuvres complètes, Paris, pág. 23446;

Longschamps, Algèbre, Paris, 1889, pág. 166. Note-se que esta obra de Longschamps é

de 1889, isto é, um ano antes da 2.ª edição do Curso, e o artigo de Ed. Weyr é de 1887,

ano da 1.ª edição.

Vamos continuar analisando o desenvolvimento, que Gomes Teixeira deu, nas

quatro edições, às séries ordenadas segundo as potências inteiras e positivas de z e às

séries ordenadas segundo as potências inteiras e positivas de az − .

Nas quatro edições, Gomes Teixeira começou por considerar as séries ordenadas

segundo as potências inteiras e positivas de z , isto é, da forma

(8) ∑∞=

=

+=

n

n

nn yixzzc

1

, 47,

enunciando e demonstrando, em seguida, o teorema, que ele atribuiu a Abel:

Theorema 7.º – Se existir um numero positivo α que, substituido em (8) no logar do

módulo de z, torne os módulos de todos os termos inferiores a uma quantidade finita

B, a serie (8) será convergente quando α<z .48

43 Silva J. S., 1999, vol. II, p. 137. 44 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 31; 1890, p. 43; 1896, p. 45; 1906, p. 45. 45 JSMA é de 1887, volume VIII, p. 97-100. 46 Esta obra é citada apenas na 4.ª edição. 47 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 33; 1890, p. 47; 1896, p. 49-50; 1906, p. 49. 48 Este teorema é o 7.º, na 4.ª edição, e o 6.º, nas restantes edições.

Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 33; 1890, p. 47; 1896, p. 50; 1906, p. 49.

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Funcções definidas por series

453

Sebastião e Silva afirmou que:

O estudo da convergência das séries de potências é dominado pelo seguinte teorema

fundamental, que resulta da REGRA DE CAUCHY atrás recordada49:

TEOREMA. Sendo nnaL lim= , a série n

n za∑ é absolutamente convergente

para todo o valor de z tal que L

z1

< , e divergente para todo o valor de z tal que

Lz /1> .50

Comparando os dois enunciados transcritos, podem-se assinalar as seguintes

diferenças: o número B, qualquer, finito, do enunciado de Gomes Teixeira corresponde,

no enunciado de Sebastião e Silva, ao número nnaL lim= , que vem da regra de

Cauchy para a série ∑ na ; o numero positivo α de Gomes Teixeira é, em Sebastião e

Silva, o número L1 ; Gomes Teixeira evocou, apenas, a condição de convergência

absoluta da série, deixando, para observação posterior, a condição da sua divergência,

enquanto que Sebastião e Silva engloba as duas condições, no mesmo enunciado.

Tanto Gomes Teixeira como Sebastião e Silva, após a demonstração dos teoremas,

acima transcritos, definiram círculo de convergência da série, acrescentando algumas

considerações, para a convergência da série. Vejamos como cada um destes matemáticos

desenvolveu este tema, começando pelo texto de Gomes Teixeira.

Nas quatro edições, a seguir à demonstração do teorema, atrás transcrito, Gomes

Teixeira inseriu uma NOTA, que, na 1.ª edição, tem uma redacção diferente das

restantes, embora com o mesmo conteúdo. Vamos começar por analisar o texto da 4.ª

edição, que é igual ao da 2.ª e 3.ª edições.

Como já assinalámos anteriormente, Gomes Teixeira não focou, no enunciado do

teorema transcrito, o caso da série ser divergente e, por esta razão, escreveu assim a sua

NOTA:

NOTA. – O theorema que vimos de considerar mostra que todos os valores de z

podem ser divididos em dois grupos, separados por um numero R, o primeiro

compostos [sic] dos valores de z para os quais a serie (8) é convergente, e o

49 Sebastião e Silva enunciou esta regra do seguinte modo:

REGRA DE CAUCHY. Sendo nnuL lim= , a série ∑ nu será absolutamente convergente se

1<L e será divergente se 1>L . Silva J. S., 1999, vol. II, p. 138.

50 Silva J. S., 1999, vol. II, p. 141-142.

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Funcções definidas por series

454

segundo composto dos valores de z para os quaes esta serie é divergente. Os

numeros do primeiro grupo são menores do que R e os números do segundo grupo

são maiores do que R. Como os valores de z, cujo módulo é menor do que R, são

representados (n.º 12)51 pelos pontos do interior de um círculo de raio R com o

centro na origem das coordenadas, vê-se que a serie (8) é convergente quando z

representa um ponto interior a este circulo, e divergente quando z representa um

ponto exterior. A este circulo, cuja consideração é devida a Cauchy, chama-se

circulo de convergência da serie (8).52

Sebastião e Silva começou por definir R, pondo L

R1

= , com nnaL lim= ,

afirmando:

[…] dá-se a R o nome de raio de convergência da série de potências nn za∑ .53

Em seguida, continuou:

Se 0≠R e +∞≠R o lugar geométrico dos valores de z tais que Rz < é, como

sabemos, o interior do círculo de centro na origem e raio R, chamado círculo de

convergência da série. Esta é, pois, absolutamente convergente no interior do círculo

de convergência e divergente no exterior do círculo.54

Ao compararmos os dois textos transcritos, verifica-se que eles traduzem as

mesmas noções, ainda que de modo distinto. Gomes Teixeira não deu a definição de raio

de convergência, como o fez Sebastião e Silva, mas refere um circulo de raio R. Como,

entre os dois textos, medeia mais de meio século, é natural que Sebastião e Silva

apresente um desenvolvimento do tema, mais pormenorizado do que o de Gomes

Teixeira, mas, no essencial, vê-se que este expunha, já, com bastante rigor, o tema. Esta

ideia é reforçada pelos textos, que um e outro escreveram, imediatamente a seguir aos

textos, que transcrevemos atrás. Gomes Teixeira escreveu:

O theorema precedente55 nada diz relativamente á convergencia ou divergencia da

serie (8), quando z representa pontos collocados sobre a circumferencia do circulo de

convergencia.

Deve-se observar que a serie (8) póde ser convergente sómente no ponto 0=z , e

n’este caso o raio do circulo de convergencia é nullo; e que póde ser convergente

51 Gomes Teixeira remete para a Representação geometrica dos imaginarios. 52 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 34; 1890, p. 48; 1896, p. 50-51; 1906, p. 50. 53 Silva J. S., 1999, p. 142. 54 Ibidem. 55 Gomes Teixeira está a referir-se ao theorema 7.º, por nós transcrito.

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Funcções definidas por series

455

qualquer que seja o valôr que se dê a z, e n’este caso diz-se que o raio do circulo de

convergencia é infinito.56

Com uma linguagem mais sintética e simbólica, Sebastião e Silva escreveu

praticamente o mesmo:

[…] sobre a circunferência Rz = , o comportamento da série varia de caso para

caso.

Se 0=R , a série é convergente só para 0=z ; o círculo de convergência degenera

num ponto (a origem).

Se +∞=R , a série é convergente para todo o valor complexo de z; o círculo de

convergência é substituído por todo o plano da variável complexa.57

Em seguida, nas quatro edições, Gomes Teixeira fez referência às séries ordenadas

segundo as potências inteiras e positivas de az − , afirmando:

O estudo das séries ordenadas segundo as potencias inteiras e positivas de az − ,

isto é o estudo das series da forma

∑ − nn azc )(

reduz-se ao precedente fazendo taz =− , pois vem a serie ∑ nn tc , que

acabamos de estudar.58

Queremos fazer notar que a expressão

∑ − nn azc )( ,

que aparece no teorema anterior, é escrita desta maneira, na 1.ª edição do Curso; na 2.ª e

4.ª edições já tem a forma

mm azc )(

1

−∑∞

e, na 3.ª aparece

m

m

m azc )(

1

−∑∞

=

.

Parece-nos que estas alterações se devem a uma preocupação de precisão e

clareza.

Vejamos qual o desenvolvimento, que Gomes Teixeira deu à convergência

uniforme das séries de funções de uma variável complexa, nas várias edições do Curso.

56 Teixeira F. G., 1890, p. 48; 1896, p. 51; 1906, p. 50. 57 Silva J. S., 1999, p. 142. 58 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 35; 1890, p. 48; 1896, p. 51; 1906, p. 50.

Séries de funções de uma variável complexa

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Funcções definidas por series

456

Na 1.ª edição, Gomes Teixeira apresentou o conceito de série uniformemente

convergente, através das seguintes considerações:

Voltemos á serie

(1) ∑∑∑∑ +=+= nnnnn yixyixu )( ,

e supponhamos que nu é funcção de zyix =+ , e portanto que nx e ny são

funcções de x e y .

Representando por nn sis '+ a somma dos n primeiros termos d’esta serie, isto é,

pondo

∑∞

=

1

nn xs , ∑∞

=

1

' nn ys ,

vimos […] que é necessario e sufficiente para que a serie (1) seja convergente que,

sendo δ e 'δ quantidades arbitrarias tão pequenas quanto se queira, exista sempre

um valor de n que combinado com qualquer valor de p , satisfaça ás desigualdades:

δ<−+ npn ss , ''' δ<−+ npn ss .

Suppondo que as condições precedentes são satisfeitas nos pontos '' yix + , '''' yix + ,

etc. por um valor a de n ; nos pontos 11 '' yix + , '''' 11 yix + , etc. por um valor b de

n ; etc., temos as desigualdades:

δ<−+ apa ss , ''' δ<−+ apa ss

δ<−+ bpb ss , ''' δ<−+ bpb ss

δ<−+ cpc ss , ''' δ<−+ cpc ss

………………………………..

Suppondo que a serie (1) é convergente quando a yix + se dá valores que

representam pontos de uma área dada, e que as desigualdades precedentes se referem

aos pontos d’esta área, se os valores de a , b , c , etc. tem um limite superior N , as

desigualdades:

δ<−+ NpN ss , ''' δ<−+ NpN ss

comprehendem todas as precedentes. Diz-se n’este caso que a serie proposta é

uniformemente convergente em toda a área considerada.59

Nas edições posteriores à 1.ª, Gomes Teixeira apresentou este mesmo conceito,

com algumas alterações de linguagem, tentando torná-lo, progressivamente, mais

rigoroso. Vejamos essas diferenças, nas três últimas edições. Na 2.ª, escreveu:

Voltemos a considerar a serie

59 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 35-36.

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Funcções definidas por series

457

(1) ∑∑∞∞

+=

11

)( mmm yixu

e supponhamos que os seus termos dependem de uma variavel yixz += , que toma

os valores 'z , ''z , etc.

Se esta série é convergente nos pontos 'z , ''z , etc., a cada valor da quantidade

positiva δ e a cada valor de z corresponde um valor 1n tal que é

δ<++=− +++ pnnnpn uuss ...1

quando 1nn > , qualquer que seja p

Sejam a , b , c , etc. os valores de 1n correspondentes aos valores 'z , ''z , etc., de

z . Se existe um numero l maior do que todos os números a , b , c , etc., a

desigualdade precedente é satisfeita pelos valores de n superiores a l , qualquer que

seja z . N’este caso diz-se que a série considerada é uniformemente convergente nos

pontos 'z , ''z , etc. 60

Comparando estas duas definições, na 1.ª edição e na 2.ª, verifica-se que, na

segunda edição, a linguagem é mais sintética, Gomes Teixeira utiliza o valor absoluto e

considera δ positivo. Mas, Gomes Teixeira vai ainda aperfeiçoar esta definição, na 3.ª

edição e na 4.ª, onde mantendo o texto inicial da definição anterior, substituiu o

parágrafo Sejam a , b , c , etc. os valores de 1n correspondentes aos valores 'z , ''z , etc.,

de z , por este outro:

Se a todos os valores de z considerados corresponde o mesmo valor de 1n , diz-se

que a série é uniformemente convergente nos pontos 'z , ''z , etc.61

Nas três últimas edições, Gomes Teixeira acrescentou ainda:

Se os valores de z considerados são representados geometricamente pelos pontos de

uma linha ou de uma área dada, diz-se que a serie é uniformemente convergente na

linha ou na área dada. Se é 0=y e os valores .,'',' etczz representam todos os

valores de z desde um numero A até um numero B, diz-se que a serie é

uniformemente convergente no intervallo de A a B.62

Na nossa opinião, no texto acima transcrito, Gomes Teixeira aponta para o

domínio das funções, que constituem os termos da série. Assim sendo, quando ele diz a

serie é uniformemente convergente nos pontos 'z , ''z , etc., quer significar a

convergência, no dito domínio.

60 Teixeira F. G., 1890, p. 48-49. 61 Teixeira F. G., 1896, p. 51-52; 1906, p. 48. 62 Teixeira F. G., 1890, p. 49; 1896, p. 52; 1906, p. 48.

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Funcções definidas por series

458

Nas duas primeiras edições, Gomes Teixeira enunciou e demonstrou o seguinte

teorema, relativo à convergência uniforme das séries ordenadas segundo as potências de

uma variável real ou imaginária:

Theorema 7.º – Toda a série ordenada segundo as potencias de uma variavel real ou

imaginaria, é uniformemente convergente em qualquer área comprehendida dentro

do circulo de convergencia.63

Na 3.ª e 4.ª edições, este enunciado aparece, com a seguinte forma:

THEOREMA 8.º – Toda a série ordenada segundo as potencias de uma variavel z,

que é convergente quando Rz < , é uniformemente convergente para todos os

valores de z que satisfazem á condição ρ<z sendo R<ρ .64

Após a demonstração deste teorema, nas quatro edições, Gomes Teixeira

apresentou dois exemplos de séries, que o verificam. Esta preocupação das aplicações da

teoria, mais uma vez nos mostra a sua faceta de didacta.

Na 3.ª e 4.ª edições, Gomes Teixeira acrescentou o teorema seguinte:

THEOREMA 6.º – Se os módulos (ou os valores absolutos) dos termos da serie

proposta forem, qualquer que seja z, inferiores aos termos correspondentes de uma

serie convergente, composta de termos positivos constantes, a serie proposta65 é

uniformemente convergente.66

Se neste enunciado, interpretarmos positivos constantes, como constantemente

positivos, este teorema é o Critério de Weierstrass, para convergência uniforme, faltando

contudo especificar o domínio das funções. Este critério é o único que aparece nos textos

elementares actuais, sobre a convergência uniforme.

Nas mesmas edições, Gomes Teixeira apresentou o seguinte exemplo de uma série

convergente, que não é uniformemente convergente:

Para se vêr um exemplo de uma serie que, sendo convergente, não é todavia

uniformemente convergente, consideremos a expressão

...)1(...)1()1( 2 +−++−+− mxxxxxx ,

onde suppomos que x é real e que varia desde 0 até 1. Neste intervallo esta serie é

convergente, mas não é uniformemente convergente, porque a desegualdade

63 Teixeira F. G., Introducção, 1887, p. 36; 1890, p. 49. 64 Teixeira F. G., 1896, p. 53; 1906, p. 51.

65 Gomes Teixeira está a referir-se à série ∑∞

=1m

mu , supondo que os seus valores dependem de uma

variável z, igual a yix + , que toma um número infinito de valores, .,''','',' etczzz 66 Este THEOREMA 6.º da 4.ª edição é o THEOREMA 7.º da 3.ª, pois Gomes Teixeira inverteu a ordem

de exposição, nesta parte. Teixeira F. G., 1896, p. 52; 1906, p. 49.

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Funcções definidas por series

459

δ<=+−+−= +++ 121 ...)1()1( nnnn xxxxxR

dá 111

<< +nx δ , quando 1<δ ; e portanto vê-se que não exista valor algum finito de

n tal que aquella desegualdade seja satisfeita por todos os valores de x

comprehendidos entre 0 e 1.67

Mais uma vez, Gomes Teixeira mostra a sua faceta de pedagogo, ao apresentar um

caso concreto, para melhor compreensão do leitor.

Em todas as edições, relativamente às séries de termos imaginários, tanto no corpo

de texto, como em notas de rodapé, Gomes Teixeira referenciou Ed. Weyr, Dirichelet,

Longchamps, Mertens, Riemann e Cauchy.

Salvo diferenças pouco significativas, na 3.ª e 4.ª edições, Gomes Teixeira

introduziu as séries duplas, definindo série dupla absolutamente convergente, soma da

série dupla e a condição de convergência absoluta da série dupla.

7.2 Funcções definidas por series

Conforme assinalámos na “Introdução” do capítulo, para o estudo das funções

definidas por séries, adoptámos a metodologia já referida, isto é, como Gomes Teixeira

tratou o tema de forma análoga, nas quatro edições, não separámos o estudo da 1.ª

edição, do estudo das restantes, e escolhemos, para as transcrições, o texto da 4.ª edição.

O Capítulo VII do Calculo Differencial tem o título Funcções definidas por series.

Singularidades das funcções e está dividido em duas partes: a parte I, que se intitula

Funcções definidas por series, e a parte II, que se denomina Singularidades d’algumas

funcções (ver Anexo C, Estrutura do Curso). Neste capítulo, Gomes Teixeira estabeleceu

as condições da continuidade das funções definidas por séries, tratou as suas derivadas e

desenvolveu o método da condensação das singularidades de Hankel, terminando com o

estudo do exemplo de uma função contínua, que não tem derivada, o qual, segundo ele

mesmo o diz, teria sido apresentado por Weierstrass, no Journal de Crelle.

67 Teixeira F. G., 1896, p. 54-55; 1906, p. 49.

Capitulo VII Parte I Funcções definidas por series. Parte II Singularidades das funcções

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Funcções definidas por series

460

Gomes Teixeira começou por estudar a continuidade das funções definidas por

séries, enunciando e demonstrando o teorema seguinte, notando-se algumas diferenças

de linguagem, pouco significativas, de umas edições para outras:

4.ª edição:

THEOREMA. – Se a serie

(1) ...)(...)()()( 21 ++++= xfxfxfxf n

fôr uniformemente convergente em um intervallo comprehendido entre dois numeros

dados, a funcção )(xf é continua nos pontos d’este intervallo em que as funcções

)(1 xf , )(2 xf , etc. são continuas.68

Historicamente, este teorema tem um certo interesse, por Cauchy o ter enunciado,

inicialmente, sem a condição de convergência uniforme:

1.er THÉORÈME. Lorsque les différens termes de la série (1) 69 sont des fonctions

d’une mème variable x, continues par rapport à cette variable dans le voisinage

68 Teixeira F. G., 1887, p. 201; 1890, p. 299; 1896, p. 323; 1906, p. 311. 69 Cauchy refere-se a ....,,,...,,, 1210 etcuuuuu nn + .

Primeira página, capitulo VII, 4.ª edição do Curso Ilustração 7.4

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Funcções definidas por series

461

d’une valeur particulière pour laquelle la série est convergente, la somme s de la

série est aussi, dans le voisinage de cette valeur particulière, fonction continue de

x.70

Segundo Grattan-Guinness, o interesse manifestado pela série de Fourier, por volta

de 1840, teria levado Cauchy a reconsiderar, de novo, o enunciado deste teorema,

introduzido, pela primeira vez, no seu Cours d’Analyse de 182171. Num artigo de 1853,

intitulado “Note sur les séries convergentes…”72, Cauchy acabaria por reformular tanto

o teorema, como as suas condições necessária e suficiente de convergência, que incluíam

o que, agora, corresponde à noção de convergência uniforme de uma série, num dado

intervalo73. Dugac afirma que, nesse artigo, introduziu Cauchy, pela primeira vez, a

noção de convergência uniforme, tal como a conhecemos hoje, mas sem a denominar de

uniforme74. Ainda segundo Dugac, naquele artigo de 1853, Cauchy teria escrito que o

teorema se verificava para as séries ordenadas segundo as potências crescentes de uma

variável, mas para outras séries não seria de admitir sem restrições75. Dugac considera

que, apesar de Cauchy ter enunciado um teorema, que não era exacto, teve o mérito de

ter sido o primeiro matemático a tentar demonstrá-lo, não se contentando com a sua

“evidência”, como aconteceu com matemáticos, antes dele e mesmo do seu tempo76.

Num artigo de 1841, intitulado “Zur Theorie der Potenzreihen”77, Weierstrass

tratou, de uma maneira informal, a convergência uniforme das séries de potências78.

Segundo, ainda, Grattan-Guinness, Weierstrass apenas tratou o conceito convergência

uniforme, com grande detalhe, nos seus cursos de Berlim e no seu artigo de 188079, que

aquele historiador diz intitular-se “Zur Functionenlehre”80.

Atendendo ao que foi exposto, Gomes Teixeira, em 1887, na 1.ª edição, já

introduziu correctamente o enunciado do teorema, de que estamos a tratar. Este facto

vem comprovar, mais uma vez, a actualização científica de Gomes Teixeira.

70 1.º TEOREMA. Quando os diferentes termos da série (1) são funções de uma mesma variável x,

contínuas em relação a esta variável na vizinhança de um valor particular para o qual a série é convergente, a soma s da série é também, na vizinhança deste valor particular, função contínua de x. Cauchy A., 1989, p. 131-132.

71 Grattan-Guinness I., 1984, p. 170. 72 Ibidem, p. 333. 73 Ibidem, p. 170. 74 Dugac P., 1978, p. 27. 75 Ibidem. 76 Ibidem, p. 16. 77 Grattan-Guinness I., 1984, p. 349. 78 Ibidem, p. 175. 79 Ibidem. 80 Ibidem, p. 349.

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Funcções definidas por series

462

No parágrafo seguinte, Gomes Teixeira tratou as derivadas das funções definidas

por séries, começando por assinalar que as séries, cujos termos são as derivadas dos

termos de uma série convergente, pode ser divergente. Deu o exemplo da série

∑ −nx n

n)1( , que é convergente, quando 1=x , enquanto que a série ∑ −− 1)1( nn x ,

formada pelas derivadas dos seus termos, é divergente. Em seguida, Gomes Teixeira

apresentou o seguinte teorema, relativo às condições de existência de derivada de

funções definidas por séries:

4.ª edição:

THEOREMA. – Se a serie (1)81 for convergente em um intervallo comprehendido

entre dois numeros dados, e se no mesmo intervallo fôr uniformemente convergente

a série ∑ )(' xf n , formada pelas derivadas dos termos da precedente, a funcção

)(xf admitte derivada e temos

...)('...)(')(')(' 21 ++++= xfxfxfxf n

no intervallo considerado.82

Os passos sequenciais da demonstração deste teorema são os mesmos, em todas as

edições, havendo algumas diferenças de linguagem e de escrita, pouco significativas, na

1.ª edição.

7.3 Singularidades de algumas funcções

Em todas as edições do Curso, a parte II do capítulo VII tem, como título genérico,

Singularidades de algumas funcções e está dividida em três parágrafos, sequencialmente

intitulados Funcções discontinuas em pontos isolados, Condensação das singularidades

e Exemplo de uma funcção continua que não tem derivada (ver Anexo C, Estrutura do

Curso).

Para uma melhor exposição do estudo, que realizámos, vamos estruturá-la com a

mesma sequência que Gomes Teixeira deu ao seu texto.

81 Gomes Teixeira refere-se à série ...)(...)()()( 21 ++++= xfxfxfxf n . 82 Teixeira F. G., 1887, p. 203; 1890, p. 301; 1896, p. 324-325; 1906, p. 312.

Singularidades d’algumas funcções

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Funcções definidas por series

463

7.3.1 Funcções discontinuas em pontos isolados

Nas quatro edições, Gomes Teixeira começou o parágrafo Funcções discontinuas

em pontos isolados, fazendo a distinção, entre as espécies de descontinuidade, que ele

classificou.

Na 1.ª edição, Gomes Teixeira considerou três espécies de descontinuidades,

escrevendo:

Uma funcção )(xf , é discontinua no ponto ax = , quando n’este ponto se torna

infinita, ou indetreminada ou passa de um valôr a outro que differe do primeiro

d’uma quantidade finita. Da primeira espécie de discontinuidade temos até aqui

encontrado muitos exemplos nas funcções racionaes, quando a é raiz do

denominador, na funcção tang x, quando é 2

)12( π+=

kx , etc. Temos um exemplo

simples da segunda especie da discontinuidade na funcção ax

sen−

1 que no ponto

ax = é indeterminada. Para exemplo da terceira especie de discontinuidade, da qual

Primeira página, parte II, Capitulo VII, 4.ª edição do Curso Ilustração 7.5

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Funcções definidas por series

464

não offerecem exemplo as funcções que até aqui temos estudado, apresentarei a

funcção definida pela série seguinte

...)1)(1(

)1(2...

)1)(1(

)1(211

1

1

2+

++

−++

++

−+

+

−−

kk

k

xx

xx

xx

xxxx .83

Nas restantes edições, considerou apenas descontinuidade de primeira espécie e

descontinuidade de segunda espécie, afirmando:

Uma funcção )(xf , definida na visinhança do ponto a, é discontinua no ponto

ax = , quando n’este ponto se torna infinita ou passa de um valor a outro. Da

primeira espécie de discontinuidade temos até aqui encontrado exemplos nas

funcções racionaes, quando a é raiz do denominador, na funcção tang x, quando é

π2

12 +=

kx , k representando um número inteiro, etc. De segunda especie de

discontinuidade, da qual não offerecem exemplo as funcções que até aqui temos

estudado, apresentarei a funcção definida pela serie seguinte

...)1)(1(

)1(2...

)1)(1(

)1(211

1

1

2+

++

−++

++

−+

+

−−

kk

k

xx

xx

xx

xxxx .84

Por outras palavras, nas edições posteriores à primeira, Gomes Teixeira considerou

que uma função, representada por )(xf , é descontínua de primeira espécie, se, no ponto

ax = , tem limite infinito, e é descontínua de segunda espécie, se, no ponto ax = , os

limites laterais são distintos.

Logo depois dos textos transcritos anteriormente, Gomes Teixeira demonstrou, nas

quatro edições, que a série

...)1)(1(

)1(2...

)1)(1(

)1(211

1

1

2+

++

−++

++

−+

+

−−

kk

k

xx

xx

xx

xxxx

,

se pode representar por m

m

x

x

+

1

1, concluindo que

∑++

−=

+

− ∞

=−

∞= 11

1

)1()1(

)1(2

1

1lim

kkk

k

m

m

m xx

xx

x

x.

Em todas as edições, Gomes Teixeira, a propósito da igualdade precedente,

escreveu:

83 Gomes Teixeira não especificou o domínio de k.

Teixeira F. G., 1887, p. 205. 84 Gomes Teixeira não especificou o domínio de k.

Teixeira F. G., 1890, p. 303; 1896, p. 327; 1906, p. 314.

Funcções discontinuas em pontos isolados

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Funcções definidas por series

465

4.ª edição85:

D’esta egualdade conclue-se que a funcção considerada é egual a +1, se o valor

absoluto de x é menor do que a unidade, que é egual a -1, se o valor absoluto de x é

maior do que a unidade, que é egual a zero, se 1=x , e que é egual ao infinito se

1−=x .86

Em vez da expressão que a funcção considerada é egual a, parece-nos que deveria

estar que o limite da funcção considerada é egual a. Ora, Gomes Teixeira acabou por

concluir:

A funcção é pois discontinua no ponto 1=x , onde passa de valor +1 ao valor -1, e

no ponto 1−=x onde é infinita.87

Na realidade, o exemplo apresentado contempla até os dois casos de

descontinuidade, considerados por Gomes Teixeira.

Gomes Teixeira retomou, mais tarde, este exemplo, quando deu o

desenvolvimento da condensação das singularidades, como veremos, a seguir.

7.3.2 Condensação das singularidades

A parte II do capítulo VII, como já vimos, tem por título Singularidades de

algumas funcções. Como nas quatro edições do Curso, Gomes Teixeira não deu, neste

capítulo, o conceito de singularidades de funcções, decidimos fazer uma análise dos

textos das quatro edições do manual, para verificar se ele tinha introduzido esse

conceito, num outro ponto do Curso. Para nos esclarecermos, consultámos ainda os

manuais, já referidos, de autores da época, Dini, Tannery, Hoüel e Camille Jordan e

actuais, o de Sebastião e Silva, Textos Didácticos, o de Campos Ferreira, Introdução à

Análise Matemática, e o de Santos Guerreiro, Curso de Análise. Consultámos ainda o

texto de Pierre Dugac, Sur les Fondements de l’Analyse de Cauchy à Baire (Tese de

doutoramento), e o livro de Grattan-Guinness, Del cálculo a la teoría de conjuntos.

Comecemos pela análise dos textos de Gomes Teixeira.

Na 4.ª edição, no capítulo VI, denominado Applicações geométricas da fórmula de

Taylor (ver Anexo C, Estrutura do Curso), na parte intitulada Pontos singulares das

curvas planas, Gomes Teixeira deu a noção de ponto ordinário e ponto singular de uma

curva:

85 Como os textos das quatro edições são todos iguais, transcrevemos o texto da 4.ª edição, por ser a

última. 86 Teixeira F. G., 1887, p. 206; 1890, p. 304; 1896, p. 328; 1906, p. 315. 87 Ibidem.

Ponto singular segundo Gomes Teixeira

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Funcções definidas por series

466

Chama-se ponto ordinario de uma curva plana o ponto M onde se reunem dois arcos

de curva, cujas secantes MN e 'MN tendem para direcções oppostas da mesma

tangente 'TT , quando N e 'N tendem para M […]. Os pontos que não estão

n’estas condições chamam-se pontos singulares.88

Esta definição, embora expressa numa linguagem intuitiva, pode considerar-se

bastante semelhante à que dá, actualmente, Campos Ferreira:

Consoante houver ou não tangente em P ao gráfico de f, assim P se dirá ponto

ordinário ou ponto singular do mesmo gráfico.89

Em Sebastião e Silva, encontrámos o conceito de singularidade isolada relativo a

função de variável complexa.

Seja ainda f uma função definida e holomorfa90 no domínio D que resulta de

suprimir um ponto a de outro domínio aberto D*. Então, existe um 0>δ tal que f é

holomorfa para δ<−< az0 , mas não definida em a. Diz-se, então, que a é um

ponto singular isolado (ou uma singularidade isolada) da função f. 91

Voltando à análise do Curso, no mesmo capítulo, somente na 4.ª edição, na parte

intitulada Pontos multiplos, Gomes Teixeira acrescentou aos textos das edições

anteriores:

Estendendo a significação das palavras, ponto singular, empregadas no número

anterior92 para designar certos pontos reaes, dizem-se singulares todos os pontos

88 Teixeira F. G., 1887, p. 184; 1890, p. 284-285; 1896, p. 304; 1906, p. 283. 89 Ferreira J. C., 1993, p. 352. 90 Sebastião e Silva definiu nos seus Textos Didácticos, p. 165, função holomorfa, escrevendo

Diz-se que a função f é diferenciável, num conjunto aberto A de números complexos, quando é diferenciável em todos os pontos de A. Também se diz, neste caso, que a função é holomorfa em A.

91 Silva J. S., 1999, p. 326. 92 Gomes Teixeira refere-se ao parágrafo referente a Pontos singulares das curvas planas.

Página 283, 4.ª edição do Curso Ilustração 7.6

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Funcções definidas por series

467

multiplos93 das curvas consideradas, devendo ainda notar-se que alguns auctores

abrangem n’esta designação tambem os pontos de inflexão94 e os de ondulação.95

Apenas na 4.ª edição, ainda neste mesmo capítulo, na parte intitulada Pontos

singulares das curvas enviezadas, quando tratou os planos tangentes a um curva no

espaço, considerou Gomes Teixeira o caso, em que os planos tangentes coincidem.

Sendo a curva representada pelas equações 0),,( =zyxf , 0),,( =zyxF e

),,( 000 zyx um ponto situado sobre ela, diz Gomes Teixeira, a esse propósito:

Se […] estes planos tangentes coincidem, […] os dois planos não determinam recta

alguma, e o ponto diz-se singular.96

Da pesquisa feita, talvez pudéssemos concluir que, no texto de Gomes Teixeira, as

singularidades de uma função estão relacionadas com a existência de pontos singulares.

Não encontrámos, nos textos de Tannery, Hoüel, Camille Jordan e Santos

Guerreiro, referências ao conceito de ponto isolado ou ponto singular.

Ao consultar os textos de Pierre Dugac e de Grattan-Guinness, já antes por nós

referidos, encontrámos a palavra singularidades. Vejamos, então, como cada um destes

historiadores empregou a expressão singularidades.

Segundo Grattan-Guinness97, os seguidores de Weierstrass abordaram a construção

de expressões analíticas, que definissem funções com infinitas oscilações e

descontinuidades, num intervalo finito. Hankel, na sua dissertação de 1870, intitulada

“Untersuchungen über die unendlich oft oscillierenden und unstetigen Functionen”98,

considerou funções )( yφ que tinham desenvolvimento em série de Taylor, convergente

no intervalo [ ]1,1 +− , excepto para 0=y , onde o limite, à esquerda, era 1− e o limite, à

direita, era +1. Segundo Grattan-Guinness99, ao ponto, nestas condições, Hankel chamou

93 Na página 185 da 1.ª edição, Gomes Teixeira definiu, do seguinte modo, Ponto multiplo:

VI – O ponto multiplo que é aquelle onde se reúnem dous ou mais pontos ordinarios ou singulares. Nas restantes edições (1890, p. 288-289; 1896, p. 310; 1906, p. 289) deu a seguinte definição: […] supponhamos que as derivadas parciaes da funcção ),( yxF até á ordem n são todas continuas no ponto

),( 00 yx . Se uma, pelo menos, das derivadas de ordem n não é nulla no ponto ),( 00 yx e se as derivadas de ordem

inferior a n são todas nullas n’este ponto, diz-se que ),( 00 yx é um ponto multiplo, cujo grau de multiplicidade é n. 94 Nas quatro edições, Gomes Teixeira deu a definição de ponto de inflexão, com o mesmo significado da

definição actual. 95 Apenas na 4.ª edição (p. 280), Gomes Teixeira deu a seguinte definição de ponto de ondulação:

Se as coordenadas ),( 00 yx satisfazem á condição 0'' =y e o ponto correspondente não é de inflexão, diz-se que é

um ponto de ondulação. Teixeira F. G., 1906, p. 291.

96 Ibidem, p. 309. 97 Grattan-Guinness I., 1984, p. 170. 98 Ibidem, p. 338. 99 Ibidem, p. 181.

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Funcções definidas por series

468

uma singularidade, afirmando que tais singularidades podiam apresentar-se, para

infinitos valores de x, numa função )(xf , assim definida:

∑∞

=

− >=1

3,))(()(r

s srxrsenxf πφ .

Ainda de acordo com Grattan-Guinness, a classificação das funções, segundo Hankel,

iria, pois, estar baseada, naquilo a que se chamou princípio da condensação de

singularidades100.

Pierre Dugac escreveu, também, que Hankel introduziu o princípio da

condensação das singularidades e afirmou:

[…] le principe de condensation des singularités qui consiste à construre [sic] des

fonctions admettant des singularités données (discontinuités, non dérivabilité, etc.)

dans tout sous-intervalle ouvert d’un intervalle [ ]ba, […].101

Assim, segundo Pierre Dugac, Hankel teria dado à palavra singularidade um

significado mais vasto do que o considerado por Grattan-Guinness.

Falta-nos referir o significado, que Dini deu à expressão singularidade, no seu

livro Fondamenti per la teorica delle funzioni di variabili reali (Quadro 7.1). A primeira

vez, que Dini empregou esta palavra, foi, no início da parte intitulada Principio della

condensazione delle singolarità102. Escreveu, aí:

[…] un principio che Hankel denominó principio della condensazione delle

singolarità, perchè con esso partendo da una funzione che presenta delle singolarità

relative alla continuità, o alla derivata o ai masimi e minimi in un punto soltanto di

un dato intervalo si giunge a costruire le espressioni analitiche di infinite funzioni

che presentano le stesse singolarità in un numero infinito di punti di qualunque

perzione dell’intervallo nel quale si consideramo.103

Dini referiu a palavra singularidade sem dar previamente o seu significado.

Contudo, parece-nos que o significado que lhe atribuiu se aproxima do significado que

Dugac considerou.

100 Ibidem. 101 […] o princípio de condensação das singularidades que consiste em construir funções que admitem

singularidades dadas (descontinuidades, não derivabilidade, etc.) em todo o sub-intervalo aberto dum intervalo [ ]ba, […]. Dugac P., 1978, p. 103.

102 Dini U., 1878, p. 117. 103 […] um princípio que Hankel denominou princípio da condensação das singularidades, pois com ele,

partindo da uma função que apresenta singularidades relativas à continuidade, ou à derivada ou aos máximos e mínimos num ponto único de um dado intervalo se chega a construir a expressão analítica de infinitas funções que apresentam a mesma singularidade num número infinito de pontos em qualquer porção do intervalo no qual se consideram. Dini U., 1878, p. 117.

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Funcções definidas por series

469

Voltando à análise do Curso, como dissemos anteriormente, tal como Dini, em

nenhuma das quatro edições, deu Gomes Teixeira o conceito de singularidade.

Do texto seguinte da 4.ª edição, que vamos transcrever, parece-nos que, aqui,

Gomes Teixeira adoptou a palavra singularidades com o significado mais restrito de

pontos de descontinuidade de uma função.

As funcções que até aqui temos encontrado apresentam em um intervallo finito um

numero finito de pontos em que são discontinuas. Ha porém funcções que, em um

intervallo finito, são discontinuas em um numero infinito de pontos, separados por

outros em que são continuas, e ha funcções que, em um intervallo finito, são

discontinuas em todos os pontos. Para formar funcções desta natureza, póde-se

Página referente à condensação das singularidades, 4.ª edição do Curso Ilustração 7.7

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Funcções definidas por series

470

seguir um methodo devido a Hankel(1)104 e por elle chamado methodo da

condensação das singularidades.105

Em seguida, Gomes Teixeira explicou em que consistia este método, dizendo:

[…] methodo da condensação das singularidades, por meio do qual, partindo de uma

funcção com um numero limitado de singularidades, se forma uma funcção com

infinitas singularidades.106

Dini já se tinha expresso de uma forma análoga, como se pode ver na transcrição

feita anteriormente.

De facto, Gomes Teixeira referenciou, explicitamente, o livro Fondamenti per la

teorica delle funzione di variabili reali, de Dini, de 1878 (Quadro 7.1), que temos vindo

a citar, como contendo o método, desenvolvidamente exposto107. Na verdade, Dini fez

uma exposição daquele método, muito mais pormenorizada do que a de Gomes Teixeira.

Enquanto que Gomes Teixeira fez apenas o estudo das singularidades, relativas à

continuidade, Dini tratou também o método da condensação das singularidades, relativas

à derivada e aos máximos e mínimos108.

Voltando ao método da condensação das singularidades, desenvolvido por Gomes

Teixeira, este considerou uma função, representada por )(yϕ , com as seguintes

condições109:

- em [-1,+1]\{ }0 , é contínua e menor do que uma quantidade M;

- no ponto 0=y , é nula;

- quando y tende para zero, por valores positivos e por valores negativos,

tende para um limite diferente de zero, ou para dois limites, um dos quais,

pelo menos, seja diferente de zero.

Concretamente, considerou a função representada por )( xpsen πϕ , com p inteiro,

a qual é nula e descontínua nos pontos onde p

mx = , com m inteiro, e é contínua nos

104 Esta nota remete para uma nota de rodapé, onde se lê:

(1) Hankel:– Untersuchungen über die unendlich oft oscillirenden und unstetigen Functionen – Tubingen, 1870. Este título é o mesmo, que transcrevemos no texto, referenciado por Grattan-Guinness, como tema da dissertação de Hankel, de 1870.

105 Teixeira F. G., 1887, p. 206; 1890, p. 304; 1896, p. 328; 1906, p. 315. Transcrevemos o texto da 4.ª edição por ser o último.

106 Teixeira F. G., 1887, p. 206; 1890, p. 304; 1896, p. 328; 1906, p. 315. 107 Teixeira F. G., 1887, p. 206; 1890, p. 304; 1896, p. 328; 1906, p. 315. 108 Dini U., 1878, p. 117-147. 109 Teixeira F. G., 1887, p. 207; 1890, p. 304; 1896, p. 328; 1906, p. 315.

Método da condensação das singularidades

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Funcções definidas por series

471

outros pontos. Em seguida, a partir da função )( xpsen πϕ , Gomes Teixeira formou

uma outra, )(xf , representada por uma série

)()(1

xnsenAxfn

n πϕ∑∞

=

=

e mostrou que esta função é também contínua, nos mesmos pontos, em que

)( xpsen πϕ é contínua, se etcAA ,, 21 ., representam quantidades positivas, para as

quais seja convergente a série ∑∞

=1n

nA . Logo a seguir, Gomes Teixeira concluiu:

[…] a função )(xf é continua nos pontos em que x é irracional, e é discontinua nos

pontos em que x é racional.110

Pela análise que fizemos dos textos de Dini e de Gomes Teixeira, podemos

concluir que Gomes Teixeira segue Dini, o que ele próprio reconhece, mas com uma

formulação própria. Parte de uma função mais geral, expõe o assunto de uma forma mais

sucinta e, até, mais clara, apesar da excelência do texto de Dini.

Deixemos o texto do manual, para analisarmos um trabalho de Gomes Teixeira,

relacionado com o tema, que estamos a desenvolver, embora ele não o refira, em

qualquer das edições do Curso.

O Bulletin des Sciences Mathématiques, de 1887, tomo XI, p. 193-194, contém um

artigo de Gomes Teixeira, intitulado “Extrait d’une lettre de M. Gomes Teixeira à M.

Jules Tannery” 111.

Neste artigo, Gomes Teixeira escreveu:

La quantité

m

m

x

x

+

1

1 ,

inverse de celle que vous avez considérée dans votre lettre à M. Weierstrass […]

donne lieu à l’observation suivante: L’identité

)1()1(

)1(2...

)1()1(

)1(2

)1(2

)1(2

1

11

1

2 mm

m

m

m

xx

xx

xx

xx

x

x

x

x

++

−++

++

−+

+

−=

+

−−

montre que la somme de la série

∑∞=

=

++

−m

m

mm

m

xx

xx

1

1

1

)1()1(

)1(2

110 Teixeira F. G., 1887, p. 210; 1890, p. 307; 1896, p. 331; 1906, p. 318. 111 Este artigo foi textualmente transcrito, no tomo II de Obras Sobre Mathematica, p. 395-396.

Trabalho de Gomes Teixeira publicado no Bulletin des Sciences Mathématiques, em 1887

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Funcções definidas por series

472

ést égale à +1 ou à –1 suivant que l’on a

1<x ou 1>x .112

112 A quantidade m

m

x

x

+

1

1, inversa da que considerou na sua carta ao Sr. Weierstrass […] dá

lugar à observação seguinte:

A identidade )1()1(

)1(2...

)1()1(

)1(2

)1(2

)1(2

1

11

1

2 mm

m

m

m

xx

xx

xx

xx

x

x

x

x

++

−++

++

−+

+

−=

+

−−

mostra que a soma

da série ∑∞=

=−

++

−m

mmm

m

xx

xx

11

1

)1()1(

)1(2 é igual a +1 ou a –1 conforme se tem 1<x ou 1>x .

Teixeira F. G., 1887c, p. 193.

Primeira página do artigo de Gomes Teixeira, publicado no Bulletin des Sciences Mathématiques, 1887 Ilustração 7.8

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Funcções definidas por series

473

Como vimos em 7.3.1, este exemplo é o que Gomes Teixeira deu, para ilustrar

funções descontínuas, em pontos isolados. Mas, esta série serviu ainda outra finalidade,

como Gomes Teixeira escreveu no artigo, que estamos a considerar:

[…] en sorte que cette série peut jouer le même rôle que celle que vous avez

considérée […]; mais on peut considérer cette série à un autre point de vue d’où elle

me paraît acquérir une importance propre.

Si l’on veut former une fonction d’une variable réelle qui soit ponctuellement

discontinue par la méthode de la condensation des singularités de Hankel, il faut

construire d’abord une fonction qui soit nulle pour 0=x , et qui tende vers deux

limites différentes quand x tend vers zéro par des valeurs positives ou des valeurs

négatives: or, sans recourir à la théorie des séries trigonométriques, on a une série

dont les termes sont des fonctions rationnelles de x et qui satisfait aux conditions

imposées: c’est précisément la série précédente dans laquelle on remplace x par

1+x ; la somme de cette série est égale, quelle que soit la variable réelle x supérieure

à 1− , à la limite, pour m infini, de

m

m

x

x

)1(1

)1(1

++

+−,

c’est-à-dire à +1 ,0 ou 1− suivant que x est négatif, nul ou positif.113

Como vimos em 7.3.1., Gomes Teixeira demonstrou que

∑∞

=

∞= ++

−=

+

1

1

1

)1()1(

)1(2

1

1lim

k

kk

k

m

m

m xx

xx

x

x.

Em todas as edições, Gomes Teixeira utilizou a série

∑∞

=

++

1

1

1

)1()1(

)1(2

k

kk

k

xx

xx,

que, por substituição de x por 1+y , conduz a esta outra

113 […] de modo que esta série pode ter o mesmo papel que aquela que vós considerastes […];

mas pode-se considerar esta série sob um outro ponto de vista segundo o qual ela me parece adquirir uma importância própria. Se pretendemos formar uma função duma variável real que seja pontualmente descontínua pelo método da condensação das singularidades de Hankel, é preciso construir primeiro uma função que seja nula para 0=x , e que tenda para dois limites diferentes quando x tenda para zero por valores positivos ou valores negativos: ora, sem recorrer à teoria das séries trigonométricas, tem-se uma série cujos termos são funções racionais de x e que satisfaz às condições impostas: é precisamente a série precedente na qual se substitui x por 1+x ; a soma desta série é igual, qualquer que seja a variável real x superior a 1− , ao limite, para m infinito,

de m

m

x

x

)1(1

)1(1

++

+−, isto é, +1 ,0 ou 1− conforme x é negativo nulo ou positivo.

Teixeira F. G., 1887c, p. 194.

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Funcções definidas por series

474

[ ] [ ]∑∞

=−

++++

+−=

11

1

1)1(1)1(

)1(2)(

kkk

k

yy

yyyϕ .

Do seu estudo, concluiu Gomes Teixeira que a função

[ ] [ ]∑

=−

++++

+−=

11

1

1)1(1)1(

)1(2)(

kkk

k

yy

yyyϕ

será igual a +1, 0 ou 1− , segundo é 0<y , 0=y ou 0>y .

Assim, a partir das funções

)()(1

xnsenAxfn

n πϕ∑∞

=

= , já escrita anteriormente,

e de

[ ] [ ]∑∞

=

++++

+−=

11

1

1)1(1)1(

)1(2)(

kkk

k

yy

yyyϕ .

Gomes Teixeira obteve esta outra

[ ] [ ]∑∑∞

=−

−∞

= ++++

+−=

11

1

1 1)1(1)1(

)1(2)(

kkk

k

nn

xnsenxnsen

xnsenxnsenAxf

ππ

ππ,

que mostrou ser contínua, nos pontos onde x é irracional, e descontínua, nos pontos

onde x é racional114.

Gomes Teixeira encontrou uma função, que é descontínua, num número infinito de

pontos, separados por outros, em que a função é contínua.

Apesar de mostrar conhecer bem o manual de Dini, parece-nos que Gomes

Teixeira deu um tratamento muito pessoal ao método da condensação das

singularidades, sintetizando-o e dando contributos pessoais inovadores, como é o caso

do exemplo apresentado para a função dada por

[ ] [ ]∑∞

=

++++

+−=

11

1

1)1(1)1(

)1(2)(

kkk

k

yy

yyyϕ ,

que não coincide com nenhum dos exemplos dados por Dini. O texto de Gomes Teixeira

é leve, sintético, focando o essencial, de forma acessível. A mão de mestre e de didacta,

mais uma vez, se evidencia.

Parece-nos interessante assinalar que, já no ano lectivo 1886-1887, Gomes

Teixeira tinha introduzido, nos Fragmentos, o Capitulo VII, Funcções definidas por

114 Teixeira F. G., 1887, p. 210; 1890, p. 307; 1896, p. 331; 1906, p. 318.

O método da condensação das singularidades nos Fragmentos

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Funcções definidas por series

475

séries – Singularidades das funções, com um desenvolvimento igual ao do manual, em

todas as edições. Assim, o conteúdo do artigo publicado no Bulletin des Sciences

Mathématiques fazia já parte integrante dos Fragmentos.

A terminar o tema da condensação das singularidades, Gomes Teixeira construiu

uma função totalmente discontinua em um intervalo finito115 – a função definida pela

série

[ ]∑

=12)(!

1

n xnsenn πϕ.

Mostrou que a soma desta série é igual a 1!

1

1

−=∑∞

=

en

n

, quando x é um número

irracional, e é infinita, quando x é racional, afirmando:

Porque no primeiro caso a funcção [ ]2)( xnsen πϕ é egual a +1, e no segundo caso é

nulla quando pn = e pm

x = . Logo a função

[ ]∑∞

−=

1

2)(!

1

1)(

xnsenn

exf

πϕ

é egual a zero, quando x é racional, e é egual a +1, quando x é irracional; e portanto é

totalmente discontinua em um intervallo qualquer.116

Dini tinha considerado, também, esta questão da construção de uma função com

infinitas singularidades a partir de uma função com um número limitado de

singularidades, apresentando o exemplo da função definida por117

[ ]∑

∑∞

=

1

2

1

)(

1

1

)(

xnsenn

nxf

s

s

πϕ

.

Façamos algumas considerações extraídas de Pierre Dugac e de Gaston Darboux,

sobre o método da condensação das singularidades, apresentado por Hermann Hankel.

115 Teixeira F. G., 1887, p. 211; 1890, p. 308; 1896, p. 332; 1906, p. 318. 116 Ibidem. 117 Dini U., 1878, p. 147.

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Funcções definidas por series

476

Segundo Pierre Dugac, Gilbert118, em 1872, numa sua memória apresentada à

Académie des Sciences de Belgique, em 4 de Maio, admitiu a existência geral de

derivada, em todas as funções contínuas, e pôs em causa o princípio da condensação das

singularidades de Hankel119. Contudo, no mesmo ano de 1872, a 18 de Julho,

Weierstrass leu, na Académie des Sciences de Berlin, uma sua memória, “Sur les

fonctions continues de variable réelle qui ne possèdent de dérivée pour aucune valeur de

la variable”, em que apresentou o seu célebre exemplo de uma função contínua sem

derivada, de que, posteriormente, nos ocuparemos. Note-se que Gilbert publicou, no

mesmo ano de 1872, uma rectificação à sua memória precedente, reconhecendo o seu

erro120.

118 Gilbert trocou correspondência com Gomes Teixeira e enviou-lhe 2 trabalhos que se encontram em

dois volumes da 2.ª série das Separatas. Vilhena H., 1936, carta 508, p. 245. Ver Anexo B, Colecção de Separatas.

119 Dugac P., 1978, p. 103. 120 Ibidem.

Primeira página da memória de Darboux “Mémoire sur les fonctions discontinues”, Annales Scientifiques de l’École Normale Supérieur de Paris, Tome quatrième, Paris, 1875, p. 57-112 Ilustração 7.9

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Funcções definidas por series

477

Gaston Darboux121, na sua memória “Mémoire sur les fonctions discontinues”122,

referindo-se aos trabalhos publicados, como consequência da Memória de Riemann,

sobre as séries trigonométricas, afirmou:

[…] M. Hankel, a publié en 1870 les résultas de ses études sur la Mémoire de

Riemann. Malheureusement les conclusions de son travail ne sont pas irréprochables,

et un géomètre distingué, M. Gilbert, a fait aux démonstrations de Hankel des

objections qui pourraient s’adresser aussi aux résultats. Le principe de la

condensation des singularités de Hankel est énoncé d’une manière trop absolue, et il

est regrettable que la mort n’ait pas laissé à cet excellent géomètre le temps de

reprendre les propositions qu’il avait données et de les limiter en les mettant à l’abri

de toute objection.123

Nas edições posteriores à 1.ª, Gomes Teixeira referenciou esta memória de

Darboux, o que nos leva a supor que ele tinha conhecimento das observações deste

matemático. Mas Gomes Teixeira adoptou o método da condensação das singularidades

de Hankel, via Dini, como ele explicitou. Sabendo nós do sentido de rigor e

actualização, que Gomes Teixeira sempre demonstrou, ao longo dos textos, que temos

vindo a analisar, interrogámo-nos por que razão seguiu ele um método, que Darboux

considerou não estar correctamente formulado. Mas, por um lado, sabemos da

excelência do manual de Dini, do qual não fizemos uma análise genérica detalhada,

limitando-nos a análises pontuais; por outro lado, não tivemos acesso à memória de

Hankel e, portanto, não podíamos fazer uma análise comparativa do método da

condensação das singularidades, adoptado por Hankel e por Dini. Foi Pierre Dugac que

nos clarificou, pois fez uma análise pormenorizada do manual de Dini, que resumiu, na

sua tese de doutoramento, já por nós citada, Sur les fondements de l’Analyse de Cauchy

à Baire124. Dugac escreveu:

121 Gaston Darboux trocou correspondência com Gomes Teixeira e enviou-lhe 9 trabalhos que se

encontram em vários volumes da 1.ª e 2.ª séries das Separatas. Vilhena H., 1936, cartas 27 e 139, p. 214 e 222. Ver Anexo B, Colecção de Separatas.

122 Memória sobre as funções descontínuas. Annales Scientifiques de l’École Normale Supérieur de Paris, Tome quatrième, Paris, 1875, p. 57-112.

123 […] Sr. Hankel, publicou em 1870 os resultados dos seus estudos sobre a Memória de Riemann. Infelizmente as conclusões do seu trabalho não são irrepreensíveis, e um geómetra distinto, Sr. Gilbert, fez às demonstrações de Hankel objecções que poderiam também dirigir-se aos resultados. O princípio da condensação das singularidades de Hankel foi enunciado duma maneira demasiado absoluta, e é pena que a morte não tenha deixado a este excelente geómetra o tempo de retomar as proposições que ele tinha dado e de as limitar, colocando-as ao abrigo de toda a objecção. Darboux G., 1875, p. 57-58.

124 Sobre os fundamentos de análise de Cauchy a Baire.

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Funcções definidas por series

478

Le chapitre 6, Fonction ayant une infinité de discontinuités, reprend et précise les

définitions données par Hankel dans son mémoire sur la condensation des

singularités, et développe d’une façon décisive la théorie des fonctions discontinues,

préparant la voie aux théories de Baire.125

Assim, compreende-se que Gomes Teixeira tenha optado por seguir o método da

condensação das singularidades, desenvolvido por Dini.

7.3.3 Exemplo de uma funcção continua que não tem derivada

Em todas as edições, Gomes Teixeira começou por afirmar que, pelo método de

Hankel, se podem construir funções contínuas, com um número infinito de pontos onde

não têm derivada. Porém, acrescentou, que não pretendia aplicar o método da

condensação das singularidades a estes casos, mas apenas apresentar um exemplo de

uma função contínua, que não tinha derivada em ponto algum.

Gomes Teixeira apresentou, então, um exemplo, por ele atribuído a Weierstrass,

afirmando seguir a mesma análise, feita por este matemático.

Gomes Teixeira referenciou este trabalho de Weierstrass, como tendo sido

publicado no Journal de Crelle, tomo 79. Quando consultámos este tomo, que é de 1875,

verificámos que, neste volume, não havia trabalhos de Weierstrass. Encontrámos, sim,

um trabalho de Paul du Bois-Reymond, intitulado “Versuch einer Classification der

willkürlichen Functionen reeller Argumente nach ihren Aenderungen in den kleinsten

Intervallen”126, p. 21-37, 1875.

De facto, Pierre Dugac afirma, na página 93 do vol. 10, nº 1/2 dos Archives for the

History of Exact Sciences, que Weierstrass tinha apresentado, em 1872, à Académie des

Sciences de Berlim, um exemplo de função contínua sem derivada e que este trabalho

tinha sido publicado, em 1875, por Du Bois-Reymond, no Journal de Crelle127. Ora, era

exactamente este trabalho, que tínhamos encontrado e que Gomes Teixeira referenciava,

como sendo de Weiertrass.

125 O capítulo 6, Função tendo uma infinidade de descontinuidades, retoma e precisa as definições dadas

por Hankel na sua memória sobre a condensação das singularidades, e desenvolve duma forma decisiva a teoria das funções descontínuas, preparando o caminho às teorias de Baire.

Dugac P., 1978, p. 109. 126 “Tentativa de uma Classificação das Funções Arbitrárias de Argumentos reais através das suas

Variações nos intervalos mais pequenos”. 127 Dugac P., 1973.

Exemplo de Weierstrass de função contínua sem derivada

O artigo de Paul du Bois- Reymond

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Funcções definidas por series

479

O exemplo, que Weierstrass apresentara à Academia, não fora publicado, como tal,

por Paul du Bois-Reymond. De facto, o artigo de Paul du Bois-Reymond é um longo

trabalho, estruturado em nove partes, onde, na parte III, inseriu o exemplo de

Weierstrass, referido por Gomes Teixeira, isto é,

( )π)(cos)(0

xabxf nnn∑

= ,

em que x é uma variável real, a, um número inteiro ímpar e b, uma constante positiva,

menor do que 1.

Segundo consta naquele artigo de Bois-Reymond, ele afirmou ter exposto,

textualmente, a teoria desenvolvida por Weierstrass, tal como se encontrava nos

apontamentos das aulas deste matemático.

Voltando ao texto do Curso, em todas as edições, Gomes Teixeira apresentou a

função estudada por Weierstrass

Frontispício do Journal de Crelle, tomo 79, 1875 Ilustração 7.10

Primeira página do artigo de Paul Bois-Reymond, publicado no Journal de Crelle, 1875 Ilustração 7.11

Função contínua sem derivada – desenvolvimento de Gomes Teixeira

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Funcções definidas por series

480

πxabxf n

n

n cos)(0∑

=

=

acima referida, seguindo, na generalidade, o caminho deste matemático, exposto na

memória de Paul de Bois-Reymond. Porém, na sua exposição, para provar que esta

função, sendo contínua, não tinha derivada, Gomes Teixeira fez uma redacção, de mais

fácil leitura do que a apresentada na memória de Bois-Reymond, tornando a

demonstração mais acessível aos leitores.

Por exemplo, na demonstração de Weierstrass, aparece

( )

.'

)(cos)'(cos

'

)(cos)'(cos)(

'

)(cos)'(cos

'

)()'(

0 0

0

1

0 0

0

0

0

00

0

∞ ++

+

−+

−=

−=

xx

xaxab

xxa

xaxaab

xx

xaxab

xx

xfxf

nmnm

nm

m

n

nn

n

nn

nn

ππ

ππ

ππ

Gomes Teixeira simplificou a escrita, dando a seguinte forma à expressão anterior

BAxx

xaxab

xx

xfxf

n

nn

n +=

−=

∑∞

=0 0

0

0

0

'

cos'cos

'

)()'( ππ,

pondo

∑−

=

−=

1

0 0

0

)'(

cos'cosm

n

n

nnnn

xxa

xaxabaA

ππ,

∑∞

=

+++

−=

0 0

0

'

cos'cos

n

nmnmnm

xx

xaxabB

ππ,

e, sempre que necessitava destas duas expressões, que são longas, escrevia A e B, em sua

substituição.

Gomes Teixeira referenciou, ainda, Darboux (Quadro 7.1), mostrando conhecer o

trabalho deste célebre matemático, sobre funções contínuas sem derivada, pois, a partir

da segunda edição do manual, fez a seguinte observação:

Vejam-se outros exemplos no importante trabalho de Darboux intitulado – Mémoire

sur les fonctions discontinues (Annalles scientifiques de l’École Normale Supérieur

de Paris, 1875).128

128 Teixeira F. G., 1890, p. 309; 1896, p. 333; nota de rodapé, 1906, p. 319.

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Funcções definidas por series

481

A referência ao trabalho de Darboux é enriquecedora, pois acrescentava

informação importante e actualizada, podendo suscitar a curiosidade do leitor.

Na quarta edição, Gomes Teixeira referenciou ainda Riemann (Quadro 7.1),

dizendo:

A memoria célebre que Riemann consagrou á theoria das series trigonometricas

inspirou uma grande parte dos exemplos das funcções sem derivada que têem sido

dadas.129

Não analisámos o trabalho de Riemann, relativo às séries trigonométricas, por

estar fora dos nossos objectivos, embora saibamos da sua importância histórica, como

sabia já Gomes Teixeira.

Achámos que é notável que, num manual de análise infinitesimal elementar, se

apresente o exemplo de Weierstrass.

7.4 Súmula de ideias

Gomes Teixeira mostra, já nos Fragmentos, ter um grande e actualizado

conhecimento, sobre séries numéricas. Posteriormente, foi enriquecendo as quatro

edições do Curso, acrescentando novos teoremas e fazendo novas referências históricas

e bibliográficas, que evidenciam que estava a par da evolução das teorias, sobre séries,

desenvolvidas pelos mais prestigiados matemáticos da sua época.

No desenvolvimento do método da condensação das singularidades, Gomes

Teixeira seguiu o método de Hankel, segundo a exposição de Dini. Como vimos, Gomes

Teixeira tinha conhecimento da memória de Darboux e, por conseguinte, sabia que

Darboux tinha criticado o método de Hankel. Gomes Teixeira mostrou ter um

conhecimento profundo do manual de Dini, pelo que não nos parece descabido pensar

que ele saberia que Dini fizera alterações ao método de Hankel. Assim se poderá

justificar que Gomes Teixeira, sempre preocupado com o rigor e a precisão, tenha

seguido Dini.

Apesar de assinalar que iria seguir o desenvolvimento de Dini, Gomes Teixeira

não se limitou a uma transcrição, ou a um resumo do tema, tratado por este matemático.

O manual de Dini é de grande qualidade científica, como já assinalámos, mas o texto

não é de leitura fácil. Ora, Gomes Teixeira conseguiu sintetizar, de forma rigorosa, o que

Dini desenvolvera, num grande número de páginas, dando um cunho muito pessoal à sua

129 Teixeira F. G., nota de rodapé, 1906, p. 319.

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Funcções definidas por series

482

exposição, tornando-a mais acessível ao leitor. Para além disto, Gomes Teixeira

apresentou exemplos de funções da sua autoria, dando assim um contributo pessoal.

Como vimos, um desses exemplos tinha sido já publicado, antes do aparecimento do

Curso, e tinha sido dado, numa carta dirigida a Tannery, como um acrescento a um

exemplo, que este teria enviado a Weierstrass. Estes factos reflectem que Gomes

Teixeira estava atento aos trabalhos, que se iam publicando em revistas internacionais, e

participava, activamente, na criação científica em curso.

Da análise das partes I e II do capítulo VII do Curso, corroborámos o que

afirmámos já, repetidas vezes. O perfil de didacta de Gomes Teixeira, mais uma vez, se

fez notar, preocupando-se com que os seus textos fossem acessíveis ao leitor, tentando

sintetizar as ideias, sem perda de rigor. O perfil de matemático é evidenciado pelos seus

contributos pessoais. O perfil de historiador é notório, nas referências históricas

sucessivas, que foi dando, relativamente a cada um dos temas, tratados nas quatro

edições do Curso.

Estes aspectos traduzem o conhecimento profundo de Gomes Teixeira, sobre a

evolução dos estudos, que foram aparecendo, relativamente a trabalhos, considerados de

grande qualidade científica e de grande actualidade para a época.

Podemos dizer que a relação matemático/professor/historiador, se tem reflectido

em todos os temas, que temos vindo a analisar. Possivelmente, não será de excluir que

esta relação se revele, ainda, no tratamento de outros assuntos, desenvolvidos por Gomes

Teixeira, seja no cálculo diferencial, seja no cálculo integral.

Neste capítulo não inserimos resumos de memórias, citadas por Gomes Teixeira,

Tal acontece porque os seus textos reflectem o conteúdo dos trabalhos que refere,

nomeadamente, os de Dini e Weierstrass (através de Paul du Bois-Reymond) e, por isso,

faria pouco sentido estar a resumi-las.