NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano...

12
Ano XXXI | ed. 347 | Fev | 2014 NÃO FOI POR FALTA DE AVISO Dívida do ISS pode fechar clínicas em SP pág. 5 Maria Cristina Amorim fala sobre economia e saúde págs. 8, 9 e 10 Saúde Mental vive grave crise no país; falta de leitos é apenas um dos problemas Páginas centrais

Transcript of NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano...

Page 1: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

Ano XXXI | ed. 347 | Fev | 20142014

NÃO FOI PORFALTA DE AVISO

Dívida do ISS pode fechar clínicas em SP

pág. 5

Maria Cristina Amorim fala sobre economia e saúde

págs. 8, 9 e 10

Saúde Mental vive grave crise no país; falta de leitos é apenas um dos problemas

Páginas centrais

Jornal SINDHOSP 347.indd 1 28/02/2014 18:30:18

Page 2: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

2

Editorial

| Jornal do SINDHOSP | Fev 2014

SINDHOSP - Sindicato dos Hospitais, Clínicas, Casas de Saúde, Laboratórios de Pesquisas e Análises Clínicas e Demais Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado de São Paulo • Diretoria

| Efetivos • Yussif Ali Mere Jr (presidente) • Luiz Fernando Ferrari Neto (1o vice-presidente) • George Schahin (2o vice-presidente) • José Carlos Barbério (1o tesoureiro) • Antonio Carlos de Carvalho (2o tesoureiro)

• Luiza Watanabe Dal Bem (1a secretária) • Ricardo Nascimento Teixeira Mendes (2o secretário) / Suplentes • Sergio Paes de Melo • Carlos Henrique Assef • Danilo Ther Vieira das Neves • Simão Raskin

• Marcelo Luis Gratão • Irineu Francisco Debastiani • Conselho Fiscal | Efetivos • Roberto Nascimento Teixeira Mendes • Gilberto Ulson Pizarro • Marina do Nascimento Teixeira Mendes / Suplentes

• Maria Jandira Loconto • Paulo Roberto Rogich • Lucinda do Rosário Trigo • Delegados representantes | Efetivos • Yussif Ali Mere Jr • Luiz Fernando Ferrari Neto | Suplentes • José Carlos Barbério

• Antonio Carlos de Carvalho • Escritórios regionais • BAURU (14) 3223-4747, [email protected] | CAMPINAS (19) 3233-2655, [email protected] | RIBEIRÃO PRETO (16) 3610-6529,

[email protected] | SANTO ANDRÉ (11) 4427-7047, [email protected] | SANTOS (13) 3233-3218, [email protected] | SÃO JOSÉ DO RIO PRETO (17) 3232-3030,

[email protected] | SÃO JOSÉ DOS CAMPOS (12) 3922-5777, [email protected] | SOROCABA (15) 3211-6660, [email protected] | BRASÍLIA (61) 3037-8919 /

JORNAL DO SINDHOSP | Editora – Ana Paula Barbulho (MTB 22170) | Reportagens – Ana Paula Barbulho • Aline Moura • Fabiane de Sá • Rebeca Salgado | Produção gráfica – Ergon Ediitora (11) 2676-3211

| Periodicidade Mensal | Tiragem 15.000 exemplares | Circulação entre diretores e administradores hospitalares, estabelecimentos de saúde, órgãos de imprensa e autoridades. Os artigos assinados não re-

fletem necessariamente a opinião do jornal | Correspondência para Assessoria de Imprensa SINDHOSP R. 24 de Maio, 208, 9o andar, São Paulo, SP, CEP 01041-000 • Fone (11) 3331-1555, ramais 245 e 255

• www.sindhosp.com.br • e-mail: [email protected]

O SINDHOSP completou, em fevereiro, 76 anos. E manteve, ao longo das décadas, o espírito que motivou sua criação: o engajamento em prol da saúde. Foram inúmeras as iniciativas que marcaram a atuação do Sindicato, sempre envolvido nos principais debates do país, levando informação, argumentação e posicionamento às principais demandas políticas que envolvem a atuação dos empresários do setor.

Uma dessas árduas lutas tem sido pela manutenção dos leitos em psiquiatria. Alertamos governo, sociedade e es-pecialistas, há dez anos, para as consequências nefastas que poderiam vir a reboque da extinção dos leitos voltados ao atendimento em saúde mental. Tocamos nesta ferida desde que a lei 10.216, de 2001, foi promulgada. Lei que era para ser um avanço, mas que foi distorcida pela ideologia dos que acreditam que a doença mental não existe e que, portanto, não precisa ser tratada. Desde então, a tática do governo tem sido desmontar os hospitais psiquiátricos, por meio de vil remuneração. A consequência deste descaso volta e meia frequenta as páginas dos jornais. O mais recente episódio chocou a nação, com o assassinato do cineasta Eduardo Coutinho, pelo próprio filho, esquizofrênico e usuário de dro-gas. Logo depois, o jornal Folha de S. Paulo expôs uma verdade que tanto já foi dita: vivemos um apagão na assistência em saúde mental. Não seria este um momento oportuno para que a política fosse revista?

A população, embora suscetível a ondas de otimismo, tem consciência de que as coisas não vão bem. Quase me-tade dos brasileiros (49%) afirmou que melhorar os serviços de saúde deve ser prioridade para o governo federal em 2014. A informação foi divulgada pela pesquisa retratos da Sociedade Brasileira – Problemas e Prioridades para 2014, feita pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), com o Ibope. Não é preciso ser um especialista para saber quais foram as duas outras preocupações dos pesquisados: segurança (31%) e educação (28%).

A meu ver, os três itens estão associados. Jamais teremos avanço sem saúde e bem-estar, educação e, consequentemente, segurança. Em relação à saúde e à educação, estamos dando o nosso melhor. Não apenas pela atuação enquanto entidade sindical, mas também pelo trabalho que somos capazes de desenvolver, no dia a dia de nossas funções, enquanto prestadores de serviços em saúde. No Estado de São Paulo estão os melhores hospitais do país, os mais renomados centros universitários de pesquisa e os maiores avanços na medici-na. Junto à FEHOESP, o SINDHOSP criou nos últimos dois anos o Instituto de Ensino e Pesquisa na Área da Saúde (IEPAS), que passou a capitanear todas as iniciativas voltadas ao aprimoramento profissional, e o Projeto Bússola, que bus-ca a acreditação para as clínicas. Queremos mais. E para os próximos 70 anos, nosso maior desejo é que a paz seja apenas uma consequência disso tudo.

presidenteYussif Ali Mere Jr

MUITO MAIS PARA A SAÚDE

Foto

: NEU

ZA N

AKAH

ARA

Jornal SINDHOSP 347.indd 2 28/02/2014 18:30:29

Page 3: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

3

Em dia

Fev 2014 | Jornal do SINDHOSP |

Foto

s: D

IVU

LGAÇ

ÃOFundado em 25 de janeiro de 1894 como primeira institui-ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange 19 andares, 316 leitos de internação e Unidade de Terapia Intensiva, além de um centro cirúrgico com 16 salas para a realização de procedimentos de alta complexidade.

No ano de 2013, o Samari-tano se destacou pela realização de procedimentos inéditos, com alta complexi-dade, tais como um implante de coração artificial definitivo, transplante renal com doador e receptor de tipos sanguíneos diferentes e cirurgia de bebê ainda na barriga da mãe, por via endoscópica (sem

Inaugurada em 2010, a nova sede do Sabará Hospital Infantil apresentou em fevereiro o pri-meiro balanço financeiro positivo. O faturamento de R$137 milhões, com resultado operacional de R$7,45 milhões em 2013, representa as estratégias de gestão organizacional que priorizaram a racio-nalização de custos, aumento de produtividade e qualidade dos serviços prestados.

O hospital ampliou em 28% seu número de leitos e abriu centros de excelência e treinamen-to para atualização profissional, em áreas como Obesidade Infantil e Cranioestenose e Hidroce-falia, voltados ao atendimento multidisciplinar. O quadro de colaboradores do hospital também cresceu 12%, de 520 para 585.

Para Eduardo de Almeida Carneiro, presiden-te do Sabará, o balanço é resultado dos investi-mentos. “Saltamos de um saldo negativo de R$ 9,75 milhões em 2012 para um saldo positivo de R$ 7,45 milhões em 2013. Para manter o processo de crescimento e o saldo da operação positivo, projetamos novas frentes de investimentos para

SAMARITANO COMPLETA 120 ANOS E COMEMORA PROCEDIMENTOS INÉDITOS

SABARÁ APRESENTA BALANÇO POSITIVO E BUSCA EXCELÊNCIA DO MS

cortes). No mesmo ano, foram realizados mais de 140 mil aten-dimentos de emergência nos prontos-socorros, 12 mil cirurgias e quase dois milhões de procedi-mentos diagnósticos.

O foco da instituição é se es-pecializar cada vez mais . Para tan-to, vem investindo desde 2012 em núcleos de Ortopedia, Car-diologia, Neurologia, Gastroen-terologia, Oncologia, Urologia e Ginecologia, Obstetrícia e Perina-tologia, para prestar atendimento

completo e integrado aos pacientes, com acompa-nhamento em todas as etapas do tratamento.

“O foco foi formar núcleos especializados nas áreas nas quais já somos referência, para prestar um atendimento global. Os pacientes podem realizar

os próximos anos, com tecnologia da informação, equipamentos cirúrgicos, estruturação de cargos e funções e outras mudanças”, afirma.

Em 2011 a diretoria contratou o Consórcio Bra-sileiro de Acreditação (CBA) para prestar consulto-ria de educação na metodologia da Joint Commission International (JCI). O selo foi outorgado em julho de 2013, quando o Sabará se tornou a única instituição exclusivamen-te pediátrica brasileira a receber o selo, e a quarta fora dos EUA. Mas a busca por qualidade não acabou. O hospital, através de pesquisas e de seu atendimento assistencial, busca ser incluso na rede de hospitais de excelência do Ministério da Saúde, grupo que inclui Oswaldo Cruz, Einstein e Sírio Libanês, entre outros.

“A acreditação é um instru-mento poderoso de alinhamen-to da estrutura e dos processos

diagnóstico, tratamento e acompanhamento dentro do Hospital Samaritano. Estamos investindo também em emergência especializada nas áreas de Ortopedia, Cardiologia, Neurologia e Trauma, além de centros que se complementam, como o de Mama, que une as especialidades de Oncologia e Ginecologia”, expli-ca o superintendente Corporativo Luiz De Luca.

O Samaritano ainda é reconhecido pelo Mi-nistério da Saúde pela qualidade na assistência e serviços prestados na área de responsabilidade social, destacando-se os programas voltados para o desenvolvimento do Sistema Único de Saúde (SUS). São 26 projetos no total, sendo cinco de as-sistência e 21 ligados ao Programa de Apoio ao De-senvolvimento Institucional do SUS (Proadi- SUS). O hospital também é, desde 2004, certificado pela Joint Commission International (JCI), um dos mais im-portantes órgãos certificadores de padrões de qua-lidade hospitalar no mundo.

às melhores práticas. Ela faz parte de um projeto ambicioso que busca alcançar o mesmo patamar de qualidade dos melhores hospitais do mundo”, explica o superintendente do Sabará, Wagner Ma-rujo. “Sempre estamos em busca da perfeição. E a perfeição é interminável”, conclui o presidente Almeida Carneiro.

JÁ ACREDITADO PELA JCI, HOSPITAL ESPERAVA FATURAMENTO DESDE 2010

Luiz de Luca, superintendente Corporativo

Jornal SINDHOSP 347.indd 3 28/02/2014 18:30:43

Page 4: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

4 | Jornal do SINDHOSP | Fev 2014

Artigo

Planejamento, aperfeiçoamento e sustentabilidade têm sido as bus-cas do Instituto de Ensino e Pesquisa na Área da Saúde (IEPAS), a fim de situá-lo como o agente capaz de contribuir para melhorar, cada vez mais, um contingente de trabalhadores de hospitais, clínicas e laborató-rios. Criado em 2011, ainda na gestão de Dante Ancona Montagnana, somente em 2012 iniciou suas atividades na área de cursos, já tradicio-nalmente ministrados pelo SINDHOSP.

Em 2013, tais cursos foram ampliados com novos títulos de inte-resse na área hospitalar, aperfeiçoando um processo de contínua im-portância, dado o crescente número de cargos e funções dentro dos hospitais. Ano passado, o IEPAS também realizou seu primeiro grande evento, um conjunto de congressos de gestão, paralelos à Feira Hospita-lar, que reuniu 500 participantes. Ali, atuou como agente capaz de con-tribuir para aprimorar conhecimento e troca de experiências. Durante os congressos, foram promovidas pesquisas de opinião interativas, cujos resultados eram computados em tempo real. Assim, foi possível conhecer melhor as necessidades do públi-co, suas angústias, seus anseios, de tal maneira que em uma das pesquisas, por exemplo, foi detectado que 35% dos participantes acreditam que, na área do diagnóstico laboratorial, o aperfeiçoamento profissional é cada vez mais necessário.

Com relação aos cursos realizados, tanto nos escritórios regionais do SINDHOSP quan-to nos sindicatos filiados à FEHOESP, o IEPAS reuniu cerca de 600 participantes nos mais variados temas de interesse, tais como atualização da NR-32, gestão em negociação, fatura-mento, glosas, motivação, contratos, desenvolvimento de lideranças, segurança do pacien-te, TISS/TUSS, erros de medicação, atualização em coleta de sangue e o bom atendimento ao cliente. Em novembro, o IEPAS ainda organizou e realizou evento de importância, relativo a catástrofes, abordando como hospitais devem agir em caso de incêndios, desabamentos, epidemias, entre outros eventos adversos. A iniciativa reuniu 120 pessoas, na capital paulista.

Em 2014, o Instituto estará voltado, além de seus cursos tradicionais, para outros pro-jetos, como o que está sendo formulado pela FEHOESP, o Bússola, no âmbito da certifica-ção de clínicas médicas concedida pela Organização Nacional de Acreditação (ONA). Em abril, o primeiro dos sete módulos de capacitação será iniciado, e a presença do IEPAS e a cooperação do Instituto Brasileiro para Excelência em Saúde (IBES) terão suas importâncias asseguradas na ministração dos mesmos.

Dentre outras preocupações, o IEPAS deverá considerar como importante a RDC/15 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que detalha os procedimentos, equi-pamentos e processos que deverão ser adotados pelas centrais de esterilização de hospi-tais e clínicas. Até março deste ano as instituições deveriam se adequar e isso tem exigido investimentos em tecnologia da informação, reforma de espaços e muito treinamento de pessoal. Rastreabilidade de produtos e processos é outro requisito, assim como a presença de responsável técnico. Outro ponto é com relação à segurança do paciente, no qual des-tacam-se os dez passos, entre eles a administração de medicamentos, principalmente os intravenosos. Dosagem e medicação erradas são os campeões de processos contra a enfer-magem e a saída para reverter este quadro está na integração entre as equipes. É o que se procura e pretende melhorar. O IEPAS estará a postos para treinar este pessoal, encarando a segurança do paciente como uma de suas prioridades.

A saúde alimentar nos hospitais também será um dos enfoques para este ano, come-çando por se destacar o fato de que 30% dos alimentos oferecidos são jogados no lixo, por conta de intolerância dos pacientes em relação ao sabor, textura, aparência e monotonia da comida. Um objetivo importante é humanizar a nutrição dentro dos hospitais, desde o pla-

no psicológico e motivacional. E isto pode se transformar em diferencial de atendimento, uma vez que entra em jogo o direito de escolha, o aces-so a informações sobre a dieta do paciente, preferências, aversões etc.

Sustentabilidade também é o assunto do momento. Se pararmos pra pensar, quais são as medidas sus-tentáveis que tomamos em nosso dia-a-dia? E em nossa empresa? O mundo caminha para a evolução de ideias saudáveis e muito em breve todos teremos que nos adequar aos

novos hábitos. Pretendemos debater assuntos como aproveitamento da água de chuva, uso de energia solar, ventilação natural, redução de riscos de infecção, segu-rança e conforto dos trabalhadores e profissionais. Para uma clínica ou para um hospital, ser sustentável custa caro, demanda tempo e pode comprometer o aten-dimento enquanto são feitas as adaptações, mas o in-vestimento traz benefícios inestimáveis. Outra questão fundamental, diretamente relacionada à sustentabilida-de de nossos negócios, é a falta de planejamento com relação ao envelhecimento populacional - na verdade um processo irreversível. Este tema propiciará ao IEPAS insistir nos cursos de capacitação das equipes e traba-lhadores dos hospitais.

Não podemos nos esquecer, ainda, que estamos entrando na era da nano-medicina, onde as partículas são milhares de vezes menores que um fio de cabelo, mas podem apresentar a resistência do aço. Mais uma vez relembrando, a tecnologia bate à porta da saúde. Os procedimentos mudam a cada dia. As normas de regulamentação buscam cada vez mais por procedi-mentos bem estruturados. A revolução na medicina acontece diariamente. Não somos máquinas que po-dem ser atualizadas com pequenos encaixes de novas peças. Precisamos estar preparados para o futuro e a atualização de informações, neste caso, é fundamental.

Evidentemente, não param por aí as atividades e os interesses do Instituto, uma vez que são inúmeros os cursos e as áreas que precisam de informações novas. Em 2014 são temas como esses que o IEPAS quer abor-dar. Buscamos a cooperação e a colaboração, o aperfei-çoamento, a capacitação e a educação continuada no âmbito das instituições. São esses valores que fazem a diferença no mercado. Se conseguirmos esses objeti-vos, nos daremos por satisfeitos.

IEPAS EM 2013/2014

Foto

: NEU

ZA K

AWAH

ARA

José Carlos BarbérioPresidente do IEPAS e diretor do SINDHOSP e da FEHOESP

Jornal SINDHOSP 347.indd 4 28/02/2014 18:31:12

Page 5: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

5Fev 2014 | Jornal do SINDHOSP |

Em dia

Foto

: OSM

AR B

UST

OS

Nos dias 18 e 19 de fevereiro, o presidente da FEHOESP e do SINDHOSP, Yussif Ali Mere Jr, este-ve reunido com representantes médicos na Câmara Municipal de São Paulo, e na Secretaria de Finanças do Município, com o secretário Marcos Cruz. O motivo dos encontros: obter perdão da dívida de várias clínicas paulistas que foram desenquadradas da categoria uniprofissional, nos anos de 2007 e 2008, e passaram a ter de recolher o Imposto Sobre Serviços (ISS) baseado em seus faturamentos – cor-respondente a 2% do total. As clínicas que sofreram o desenquadramento ainda têm de pagar multa retroativa a cinco anos.

As negociações já duram um ano e envolvem representantes das principais entidades médicas, como Associação Paulista de Medicina (APM), Cre-mesp e Sindicato dos Médicos. A categoria alertou os diretores de Fiscalização e Arrecadação da Pre-feitura que, por conta da cobrança, que envolve valores altíssimos em alguns casos, as condições financeiras e o atendimento dos consultórios fica-

Que a saúde tem importante representação na economia brasileira, todos já sabem. A percepção foi confirmada com o recente levantamento feito pela Confederação Nacional de Saúde (CNS), que divul-gou uma participação de 10,2% do setor no Produto Interno Bruto (PIB) nacional, colaborando de forma significativa para o crescimento da economia. O se-tor público contribuiu com 43% desse crescimento e o privado, com 57%. Em 2012, a parcela da saúde no PIB tinha sido de 9,5%. O cálculo leva em consi-deração toda a cadeia do segmento, incluindo a in-dústria médico-hospitalar e as operadoras de planos.

Os números revelam uma tendência de cresci-mento, levando o segmento a ser cada vez mais re-presentativo, ultrapassando sua função social, que é a assistência, e fomentando a geração de empregos, por exemplo. Para se ter ideia, a saúde fechou 2013 com 3,1 milhões de postos de trabalho. Segundo a CNS, desde 2010 o número de empregos criados pelo segmento cresceu 19,2%.

O setor, de acordo com a Confederação, atual-

ISS: FEHOESP, SINDHOSP E MÉDICOS NEGOCIAM COM PREFEITURA

SAÚDE: IMPORTÂNCIA ECONÔMICA CRESCE, MAS PERCEPÇÃO DE QUALIDADE NÃO

riam seriamente comprometidos. A pedido do se-cretário Marcos Cruz, o presidente do SINDHOSP, acompanhado da superintendente jurídica da FEHOESP e do SINDHOSP, Eriete Teixeira, compro-meteu-se a realizar um levantamento de quantas clínicas estão nesta situação. Uma enquete foi disparada à categoria, para saber a realida-de de cada clínica. Até o fechamento desta edição do Jornal do SINDHOSP, o resultado ainda não havia sido divulgado.

Na ocasião do encontro, a comissão que discute a dívida provocada pela mu-dança da cobrança entregou um projeto que pede a remissão da dívida retroativa a cinco anos, acrescida de juros e multa. O secretário se comprometeu a avaliar a situação.

O presidente da APM, Florisval Meinão, afirmou que muitas clínicas pode-rão fechar caso a dívida não seja revista. A diretora de Eventos da APM, Mara Edwir-

mente é um dos polos fundamentais para o desen-volvimento econômico e social do Brasil, além de atender cerca de 150,5 milhões usuários pelo Siste-ma Único de Saúde (SUS) e 50 milhões de pessoas por meio dos planos de saúde. “A evolução tecno-lógica do setor e o surgimento de tratamentos dife-renciados têm feito com que haja mais investimen-tos na saúde”, ponderou o presidente da CNS, José Carlos de Souza Abrahão.

Ao que tudo indica, boa parte deste bom de-sempenho deve ser creditado à iniciativa privada. Segundo informações do relatório preliminar da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), em 2013, as 1.274 operadoras de planos de saúde e odontológicas tiveram faturamento conjunto de R$ 80 bilhões no acumulado de janeiro a setembro, um avanço de 17,2% em relação ao mesmo perío-do de 2012. Esse fenômeno, segundo especialistas, pode ser explicado por alguns fatores, como a me-lhoria na renda do trabalhador e o maior número de pessoas empregadas com carteira assinada.

ges Gândara, destacou a importância de muitos desses estabelecimentos para o Sistema Único de Saúde (SUS), como as clínicas de terapia renal, responsáveis pelo atendimento de um número significativo de pacientes.

O crescimento da representação da saúde no PIB, no entanto, não reflete o grau de satisfação da população no que diz respeito à assistência. De acor-do com a pesquisa “Retratos da Sociedade Brasileira – Problemas e Prioridades para 2014”, feita pela Confe-deração Nacional da Indústria (CNI) em parceria com o Ibope, a saúde ainda é o principal problema do Brasil. O item foi assinalado por 58% dos entrevistados, de um universo de 15.414 entrevistas em 727 municípios.

A segurança pública e a violência aparecem em segundo lugar, citadas por 39%. Em seguida são lista-das as drogas (33%), a educação (31%) e a corrupção (27%) . Quando perguntados sobre quais deveriam ser as prioridades do governo federal em 2014, os entre-vistados mais uma vez colocaram a saúde em primeiro lugar: quase metade da população brasileira (49%) disse que melhorar os serviços de saúde deve ser prio-ridade. Na sequência, aparecem o combate à violência e à criminalidade (31%) e a melhora da qualidade da educação (28%) - a soma é maior que 100% porque era permitido escolher até três opções.

Yussif Ali Mere Jr, à esquerda, e Eriete Teixeira, à direita, com representantes dos médicos

Jornal SINDHOSP 347.indd 5 28/02/2014 18:31:40

Page 6: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

6

Manchete

| Jornal do SINDHOSP | Fev 2014

DESASSISTÊNCIA NO PAÍS É CONSEQUÊNCIA DOS RUMOS EQUIVOCADOS DA POLÍTICA DE SAÚDE MENTAL

Foto

: NEU

ZA N

AKAH

ARA

Foto

: LEA

ND

RO G

OD

OI

A falácia de que a abordagem médica é completamente dispensável para tratar e prevenir a doença mental, ou para promovê-la, disseminou-se pelo país. A atual política do governo federal, que nega a necessidade de assistência psiquiátrica, desmontou a já frágil rede de atenção em saúde mental, deixando à mercê dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e de um tratamento limi-tado os pacientes, sobretudo os de baixa renda. Este é o Brasil de hoje, de ontem e provavelmente do futuro, que lida com notícias do tipo “Cineasta morre assassinado pelo filho esquizofrênico”. O triste episódio de Eduardo Coutinho, em fevereiro, foi apenas mais um caso, que se tornou célebre por conta da fama mundial da vítima. Uma consequência do descaso e do desastre operado pelo governo neste setor. Um exemplo do “apagão” que vivemos em saúde mental. Palavras empregadas em manchete do jornal Folha de S. Paulo, de 10 de fevereiro, cuja reportagem abordou a questão de maneira precisa.

Segundo o próprio Ministério da Saúde, o número de leitos em hospitais psi-quiátricos caiu 44% nos últimos 11 anos. Restaram 27.766 leitos no país. Em com-pensação, a capacidade de atendimento nos CAPS aumentou, passando de 400 mil (2002) em 424 CAPS, para 40 milhões (2014) em 2.046 CAPS. O problema é que o equipamento não possui abordagem médica. Esta é a opinião de Antonio Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). Para ele, não existe uma política de saúde mental. “Não há prevenção nem promoção em saúde mental e muito menos uma estrutura de rede que conte com atendi-mento primário, secundário e terciário. O leito hospitalar é o atendimento terciário, e a falta dele é apenas uma parte do problema”, critica. “Os CAPS são um sistema necessário, mas de abordagem social. Um aparelho médico precisa contar com médico 24 horas, no caso, um psiquiatra. Assim como acontece em um equipamento voltado ao atendimento obstétrico, que tem ginecologistas e obstetras se responsabilizando pelo serviço, o mesmo em cardiologia, em ortopedia e com todas as outras especialidades médicas”.

Em 2011, quando o país possuía 1.560 CAPS, o secretário de Atenção à Saúde do Ministério, Helvécio Magalhães, chegou a se comprometer a rever a política de saúde mental, após encontro com representantes da ABP. Na ocasião, ele reconheceu que era preciso definir o que era serviço médico e serviço social. “Sem abrir mão dos nossos princípios e sem concor-dar com tudo, mas vamos fazer a política de saúde mental andar”, garantiu o secretário, na ocasião. Antonio Geraldo, que já liderava a ABP, chegou a alertar o secretário sobre a necessidade de criação de ambulatórios especializados em Esquizofrenia, TDAH, Transtorno de Humor Bipolar, ambulatórios de Neurolép-ticos de Ação Prolongada, entre outros. Também fez apelo para a questão das drogas, que ainda não batia à porta: “Vai começar uma onda de internação por ordem judicial em função desta nova epidemia de crack e óxi e a falta de leitos para o tratamento desses pacientes”, disse.

Para o presidente do SINDHOSP e da FEHOESP, Yussif Ali Mere Jr, a falta de leitos agrava todo o cenário, porque não permite que o paciente em crise, ou o crônico, tenha tratamento adequado quando necessário. “Pacientes em surto, que precisam de vaga, ficam nos corredores a espera de vagas. São enviados para casa, depois voltam ao serviço, em pior estado”, avalia. Pior ainda, em sua opinião, é a maneira vil como o governo trata a questão. “Como não pode fechar de vez as instituições porque sabe que precisa delas, paga uma diária aviltante. Vai matando por asfixia”.

Hoje, uma Residência Terapêutica, serviço admitido na rede proposta pelo governo e uma das principais bandeiras para desinstitucionalizar pacientes, é remunerada em média com uma diária de R$ 250,00 por morador. As exigências para que ela funcione, no entanto, não incluem equipe médi-ca, nem profissionais de saúde 24 horas. Em contrapartida, um hospital psiquiátrico, que obrigato-

riamente deve contar com uma equipe completa de saúde incluindo psiquiatra, recebe R$ 35,00/leito. Hospitais gerais que possuem leitos dedicados à saúde mental recebem re-muneração diferenciada, mas levando em conta o tempo de internação: até 7 dias de permanência, a diária é de R$ 300; entre 8 e 15 dias, a diária cai pra R$ 100; superior a 15 dias, a

diária despenca para R$ 57 (segundo Nota Técnica sobre Leitos em Saúde Mental, publicada pelo Ministério da Saúde, de 13 de dezembro de 2013).

O SINDHOSP vem alertando para o problema há tempos. Mantém um de-partamento de Saúde Mental, a fim de debater os entraves do setor. Por meio desta atuação, chegou a mostrar sua preo-cupação específica com a questão de So-rocaba, interior de São Paulo, em 2012. À época, mais de 600 leitos estavam sendo fechados naquela região, sob a alegação de que a qualidade dos serviços deixava a

desejar. Um dos hospitais que recebeu denúncias por parte do Ministério Público, e que sofreu intervenção, foi o Vera Cruz de Sorocaba. A Prefeitura local acabou assumindo a gestão, mas depois de um ano entregou-a para uma Organi-zação Social. Hoje o hospital conta com 333 pacientes.

Em fevereiro último, quando a Folha alertou para o que classificou de “apagão”, o Sindicato se manifestou por meio de nota, parabenizando a reportagem, e cobrando explica-ções do Ministério da Saúde. “A FEHOESP e o SINDHOSP,

que representam o segmento de hospitais psiquiátricos no Estado (aqueles particu-lares e que também atendem ao SUS), lamentam a postura ideológica do Minis-tério da Saúde (MS), que insiste em fechar leitos psiquiátricos, ao invés de adequá-los. Embora tenhamos todos a convicção de que o modelo dos manicômios tenha fi-cado para trás, não podemos aceitar, en-quanto representantes da sociedade civil organizada, que a população fique sem as-sistência. Hoje o MS investe apenas 2% de seu orçamento em saúde mental, e remu-nera mal os hospitais especializados, pro-

positadamente, para que morram à mingua. Parabenizamos a reportagem do dia 10/02, País vive apagão no tratamento de doentes com transtornos mentais, da jornalista Claudia Colucci, e ao ministro da Saúde perguntamos: quando passa-remos a nos preocupar com o bem-estar dos pacientes, dei-xando de lado a ideologia?”, escreveu o presidente, à época.

Yussif Ali Mere Jr, presidente do SINDHOSP e da FEHOESP

Antonio Geraldo da Silva, presidente da ABP

Jornal SINDHOSP 347.indd 6 28/02/2014 18:32:25

Page 7: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

7

Manchete

Fev 2014 | Jornal do SINDHOSP |

DESASSISTÊNCIA NO PAÍS É CONSEQUÊNCIA DOS RUMOS EQUIVOCADOS DA POLÍTICA DE SAÚDE MENTAL

Foto

: LEA

ND

RO G

OD

OI

Outra manifestação sobre a reportagem, publicada no Painel do Leitor da Folha, foi a de Wanderley Cintra Ferreira, presidente da Fundação Espírita Allan Kardec de Franca (SP). “Convivemos diariamente com pacientes com transtornos mentais e temos procurado mostrar às autoridades a im-portância dos hospitais psiquiátricos. Convidamos o ex-ministro da Saúde, Alexandre Padilha, para uma visita em nossa instituição, mas não tivemos sucesso. Somos consi-derados como hospital modelo, atendendo a 21 municípios da região de Franca (SP). Coerente e oportuna a afirmação do presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria na re-portagem, dizendo que o governo deveria qualificar e rea-dequar os hospitais psiquiátricos”.

Atualmente, São Paulo, o maior polo de saúde do país, conta com pouco mais de 13 mil leitos de internação para o tratamento de doentes mentais. Isso equivale a uma relação de 0,23 leito por mil habitantes, quando a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) é de um para mil. A média no país é de 0,18 para cada grupo de mil habitantes. O fechamento de leitos tornou-se ainda mais preocupante devido ao aumento da demanda de doentes mentais. Estimativas indicam que 20% da população do planeta têm algum distúrbio mental. Entre eles, o que mais preocupa a maioria dos municípios brasileiros é a ascensão do crack e de outras drogas, que necessitam de internação para tratamento.

Levantamento divulgado em 20 de fevereiro, pelo Instituto Nacional do Se-guro Social, aponta que o álcool também é um problema crescente entre a população. O alcoolis-mo, segundo o estudo, é a principal causa de afastamento do trabalho na lista de problemas por transtorno mental. O número de pessoas que precisaram parar de trabalhar e pediram o auxílio devido ao uso abusivo do álcool teve um aumento de 19% nos últimos quatro anos, ao passar de 12.055, em 2009, para 14.420, em 2013. Cocaína é a segunda droga responsável pelos auxílios concedidos (8.541), seguido de uso de maconha e haxixe (312) e alucinógenos (165). Inte-grante do Conselho Regional de Serviço Social de São Paulo (CRESS-SP), o assistente social Fábio Alexandre Gomes res-salta que o aumento é extremamente superficial, visto que boa parte da população não contribui para o INSS e por isso não tem direito a este benefício. “O impacto do álcool hoje na vida das pessoas é muito maior. Muitos casos inclusive de uso abusivo do álcool estão associados com a situação de desemprego. E a juventude tem iniciado experiências cada

vez mais cedo”, explica ele. “Tenho casos frequentes de crianças fazendo uso abusivo de álcool a partir dos oito anos. Estou acompanhando um menino que hoje, com dez anos de idade, usa crack, mas a porta de entrada foi o álcool”, conta o assistente social ao relatar que por ser uma substância socialmente permitida em casa, acaba sendo de fácil acesso.

Estabelecer uma política eficaz de prevenção e detecção de casos precoces de uso abusivo de álcool e outras drogas seria a chave para combater a disseminação deste problema. Para Ricardo Mendes, coordenador de departamento de Saúde Mental do SINDHOSP, o contato prematuro com drogas pode desencadear problemas mentais futuros, como esquizofrenia, ou até mesmo sé-rios distúrbios do comportamento, agressividade, intolerância e inúmeros problemas psicológicos associados. “A ausência do Estado, neste sentido, está criando um exército de problemáticos. De pessoas que, no futuro, não estarão preparadas para lidar de forma madura com a vida e que pre-cisarão de ajuda psicológica, social e até mesmo psiquiátrica. E então esbarrarão no acesso. Porque não há acesso para todos quando o assunto é saúde mental. Se na saúde em geral já existe fila e es-pera, que dirá na saúde mental. Não há leitos, nem psiquiatras suficientes na rede pública”, dispara.

O psiquiatra André Carvalho, que admite não haver médicos especializados na área para aten-der à demanda, defende que os clínicos gerais sejam capacitados para atender em emergências psiquiátricas. Carvalho, que falou à Agência Brasil sobre o tema, diz que, ao mesmo tempo em que as emergências dos hospitais gerais viraram porta de entrada para muitos doentes mentais, falta

treinamento adequado aos médicos generalistas para atender esses transtor-nos. “Estudos feitos na Europa e nos EUA demonstram que os médicos genera-listas se sentem desconfortáveis e também não têm capacitação adequada para lidar com esses pacientes. Eles temem pela própria segurança”, explica Carvalho. Segundo ele, existem dados que demonstram que o doente mental vai muito menos a consultas com clínicos gerais do que deveria, mesmo sendo o paciente portador de outras doenças que precisam de acompanhamento, como diabe-tes ou hipertensão. “O clínico, em geral, não está bem esclarecido sobre o que é o diagnóstico e as opções de tratamento. É muito importante lembrar que uma grande proporção das pessoas que se suicidam consulta um clínico geral seis meses antes de cometer o suicídio, mas os médicos não conseguem detectar isso. As famílias também precisam entender

que os pacientes não fazem determinadas coisas porque querem ou porque são agressivos deliberadamente. São alterações cerebrais, bioquímicas, biológicas que geram esses comportamentos”, explica.

Para Ricardo Mendes, o tratamento psiquiátrico adotado no passado, marcado pelas grandes institui-ções que viraram depósito de pessoas, deu força aque-les que clamam pela desospitalização pura e simples, como se todas as instituições ainda tratassem os pa-cientes daquela forma. “A psiquiatria evoluiu, os me-dicamentos também. Mas ainda há casos em que a internação é necessária, como na desintoxicação de viciados em drogas e álcool, nos surtos psicóticos, onde há riscos de suicídio, nas esquizofrenias para-noides, quando os pacientes estão incontroláveis e violentos e também em alguns casos de trans-torno obsessivo compulsivo”, conclui.

Ricardo Mendes, coordenador do departamento de Saúde Mental

Jornal SINDHOSP 347.indd 7 28/02/2014 18:32:31

Page 8: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

8 | Jornal do SINDHOSP | Fev 2014

Entrevista

A SAÚDE SOB UMA PERSPECTIVA ECONÔMICA

A macroeconomia afeta a vida cotidiana do setor de saúde mais do que podemos pensar. Segun-do a economista Maria Cristina Amorim, nosso Produto Interno Bruto (PIB) patina porque juros, tri-butos e uma burocracia parasitária inibem o investimento. Esta combinação faz com que os ganhos salariais e das empresas sejam corroídos pelos juros, sobrando pouco para investimentos em tecno-logia, saúde e bem-estar, por exemplo. Em entrevista exclusiva para o Jornal do SINDHOSP, a pro-fessora titular e coordenadora do curso de Economia e Comércio Internacional da PUC/SP fala sobre este e outros fenômenos, que impactam – e por vezes emperram – o crescimento do setor. Confira.

Jornal do SINDHOSP - A questão do financiamento da Saúde no Brasil é um problema que bate à porta

não somente do SUS. No âmbito privado também enfrentamos problemas, já que a capacidade da população

de financiar o sistema não acompanha a alta demanda por serviços médicos. Qual o grande desafio da saúde

suplementar na questão do financiamento?

Maria Cristina Amorim - O financiamento dos serviços de saúde no Brasil deve ser com-preendido em duas dimensões simultâneas, a macroeconômica e a política. Quanto à primeira dimensão, nossa economia é fundamentalmente rentista, isto é, paga juros elevados para rentis-tas (por meio dos bancos, corretoras etc.). Justamente para pagar essa conta, a carga tributária é elevada (cerca de 40% do PIB), o real valorizou-se demais relativamente ao dólar, os gastos sociais e os investimentos do governo são aquém da necessidade e, por isso mesmo, o crescimento eco-nômico empacou em torno de 2% ao ano. O sistema financeiro, por sua vez, em decorrência de várias distorções, repassa os recursos à economia a um preço tão caro que inibe o desenvolvimento.

O rentismo se estabeleceu como subproduto das medidas de combate à hiperinflação, há aproximadamente 30 anos e desde então, determina a dimensão política do Brasil. Não houve, até agora, acordo político entre os agentes que o supere. Desde 2009, há um perigoso pacto político que viabiliza juros elevados, para a felicidade do rentistas, e gastos governamentais elevados para acalmar o setor produtivo (indústria, principalmente). O Tesouro Nacional (os contribuintes) paga essa conta na forma do endividamento do Estado e suas consequências. Em 2011 houve uma ten-tativa de reduzir a taxa de juros e levar os bancos privados a reduzir suas taxas (juros e spreads), mas o governo não aguentou a pressão e os juros voltaram a subir.

Em 2012, o pagamento de juros foi R$195 bilhões; em 2013, R$ 213 bilhões (dados da FIESP). Vale lembrar que em 2012, o orçamento do Ministério da Saúde (os valores realizado são sempre menores) foi de R$ 72 bilhões, em 2013, 98,8 bilhões e, em 2014, é de R$ 106 bilhões. Nos EUA o taxa anual de juros dos títulos públicos é de 0,25%, no Japão, 0,10% ao ano; o custo total do dinheiro no mercado não é muito acima disso. No Brasil, a taxa Selic, dos títulos públicos, é de 10%; no mercado, em janeiro de 2014, os bancos estatais, que praticam as menores taxas, cobram em torno de 62,5% ao ano.

Há intermináveis conversas sobre as causas do crescimento baixo da economia brasileira, ora, a resposta é simples: o PIB patina porque juros, tributos e uma burocracia parasitária inibem o in-vestimento. Além disso, a crise internacional dos nossos principais importadores não permite a expansão das exportações. Por que os investimentos do governo federal não se transformam em crescimento econômico robusto? Problemas gerenciais sobram, mas o crescimento não se realiza principalmente por que os juros elevados drenam os acréscimos de renda, o consumo remunera o agente financeiro e os demais rentistas que vivem de aluguéis. Ao invés de, por exemplo, pagar um plano de saúde, o salário vai para o aluguel, para os tributos e para os juros das prestações ou das dívidas. Em cada R$ 100 de aumento de renda que pode ser transformado em consumo, quanto vai para os juros do crediário, cartões de crédito ou cheque especial? O crédito para consumo custa efetivamente mais de 200% ao ano (juros, taxas e tributos).

Dadas a estrutura macroeconômica e a teia política, su-giro cuidados ao coro do “mais recursos para a saúde”, pois querer, todos queremos, mas é pouco provável que a política econômica de 30 anos alivie a faca dos juros e tributos eleva-dos. Apertar o cerco ao rentismo, pressionar o governo por mais recursos é nosso dever, mas sem perder de vista as cau-sas da aludida escassez de recursos. Mais à mão, temos uma enormidade de problemas na gestão do sistema de saúde, e é claro que dá para fazer mais com os recursos disponíveis.

Jornal do SINDHOSP - 2014 começa com muitas expecta-

tivas, por ser ano de eleição e Copa do Mundo. Há quem diga que

o Brasil, depois deste período, entrará em recessão, já que onda de

investimentos irá cessar e a máquina pública ficará extremamente

endividada, além de inflada. Qual a sua perspectiva econômica, de

maneira global, para o país neste ano?

Maria Cristina Amorim - O significado econômico da Copa é muito menor do que a mídia quer nos fazer crer, não sabemos qual será o efeito multiplicador dos gastos para a economia brasileira. A construção civil, o turismo, a mídia e as fabriquetas de brindes terão benefícios, não resta dúvi-da; quanto dos gastos diretos desses setores alimentará os demais, não sabemos, o efeito depende, entre outros, da afluência de turistas, também desconhecida. Até por que, como já argumentei, os setores rentistas se apropriarão de parte considerável do dinheiro. Se, por exemplo, a crise in-ternacional acirrar, se as guerras do oriente médio fecharem aeroportos, a Copa poderá ser um fiasco - tomara que não, afinal, estamos pagando a festa.

O investimento de 2014 já está “contratado”, já está

Foto

: DIV

ULG

AÇÃO

Maria Cristina Amorim

Jornal SINDHOSP 347.indd 8 28/02/2014 18:32:35

Page 9: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

9Fev 2014 | Jornal do SINDHOSP |

Entrevista

decidido. O problema não é o quanto será investido, mas o quanto será transformado em consumo e finalmente, em lucro, o que interessa ao investidor. A Copa, por sorte, não tem porte para abalar a economia brasileira. Não há, para 2014, risco de recessão – variação negativa do PIB – mas de pequeno crescimento, pois o governo está anunciando redução de crédito via BNDES, e aumento do superávit primário (redução de gastos); o binômio letal para os inves-timentos continua operando: juros e tributos elevados. O Estado não está extremamente endividado, dívida pública é instrumento de política econômica, financia o investimento e o bem estar da sociedade. Claro está, a dívida pública não pode superar determinados limites relativamente à capaci-dade de pagamento, mas o Brasil não está sob risco de dar o calote. Se a taxa de juros baixar, a dívida cai rapidamente.

Difícil afirmar na generalidade que a máquina pública está inchada. Há setores nos quais faltam profissionais, por exemplo, médicos, professores de matemática, física e química, enge-nheiros para a prospecção de petróleo e construção civil, juízes.

No campo político está nosso principal problema, a so-lução dos problemas na saúde exige complexa articulação dos interesses dos agentes. A mídia especializada em econo-mia e negócios é fortemente controlada pelo setor finan-ceiro, que na defesa de seus interesses, atribui o baixo cres-cimento do PIB ao aumento dos gastos governamentais, à quebra de confiança entre investidores e governo, à falta de independência do Banco Central, e por aí vai. Os argumen-tos são verdadeiros, mas insignificantes diante do aumento contínuo (há 20 anos) da tributação acima da inflação e dos juros estratosféricos – qual empresário aguenta pagar mais de 180% de juros ao ano?

A proximidade das eleições federal e estaduais contami-na o debate sobre economia, os agentes defendem suas po-sições, em detrimento da análise equilibrada dos fatos. Acho difícil ler os jornais de economia, as opiniões são sempre as mesmas e dos mesmos, leio o primeiro parágrafo e já adivi-nho os argumentos e conclusões; as manchetes são torcidas relativamente aos conteúdos, o debate sobre o Brasil está ruim, oscila entre o posicionamento enrustido e a obvieda-de, uma agressão à inteligência do leitor.

Por tudo isso, as lideranças do setor saúde tem grande oportunidade de participação nos debates nacionais e de produzir informações alternativas às do setor financeiro. O segmento de operadoras de planos de saúde projeta cres-cimento de 4% em 2014 (fonte: ANS), que dependerá da economia. Ora, se venda de planos depende do nível de em-prego e de renda da população, portanto, interessa ao setor participar das discussões sobre reajuste do salário, tamanho do superávit, desenvolvimento regional etc. Os negócios dos prestadores de serviço, por sua vez, também depen-dem da política econômica – se o governo reduzir gastos e aumentar juros haverá menos dinheiro na praça. O risco de

aumento da inflação acima da meta de 6,5 ao ano não é o único problema, aliás, rigorosamente, não é o problema, mas o sintoma de um problema a discutir.

O crescimento da saúde suplementar depende das medidas tributárias vindouras, da renda disponível para consumo e do nível de emprego. Se por um azar as políticas de distribuição de renda forem interrompidas, haverá involução do mercado. Quem já tem acesso aos serviços não aumen-tará sua demanda, portanto, o desempenho do setor depende da entrada de novos consumidores.

No panorama internacional há certo consenso (e apenas isso) que os juros internacionais su-bam, dificultando ao Brasil reduzí-los internamente. A pergunta relevante quanto aos juros é: quan-do subirão? A China terá taxas menores do crescimento, arrastando o resto do mundo. De todo modo, há também a expectativa da retomada do crescimento nos EUA, que por sua vez, também arrastará o resto do mundo. No panorama nacional, para 2014, o nível de emprego alto resistirá até quando? É um emprego de baixa remuneração, típico do setor de serviços. O endividamento da população é elevado, e a ameaça de perder o emprego ronda perto. A expectativa de aumento do valor do dólar relativamente ao real, de uma forma nada indolor à sociedade, poderá revigorar as exportações e a produção nacional de industrializado.

Jornal do SINDHOSP - Em 2012 a saúde suplementar registrou aumento de 2,1% no número de usuários

de planos de saúde, o menor da história. O Brasil possui hoje 25% de sua população com planos de saúde. São

Paulo concentra os números, e registra 44,3% de usuários de planos, sendo que na capital são 60%. Os dados

mostram que o aumento no número de usuários está intimamente ligado à capacidade de financiamento da

população. Acredita que ultrapassaremos os 30% de usuários em todo o Brasil? Ou o sistema irá estagnar?

Maria Cristina Amorim - No segmento das operadoras de planos, as dificuldades dos clien-tes não são propriamente um “problema de saúde”, mas de direito do consumidor. Se e quanto pagar por um plano ou seguro de saúde é decisão individual de consumo, mas fazer valer os con-tratos é obrigação indiscutível do Estado. A defesa do consumidor tem que ser efetiva, rápida e barata, acessível de verdade.

Dois fatos me chamam a atenção: o descontentamento dos usuários de saúde, tanto na rede pública quanto na suplementar, e a distância entre as estratégias comerciais e o contexto macroe-conômico e político.

As operadoras estarem sempre entre as primeiras organizações no ranking de queixas nos ór-gãos de defesa do consumidor sugere algo errado na orientação de marketing, no mínimo. Ora, o descontentamento do consumidor se estabelece entre suas expectativas e o produto/serviço recebido – isso define qualidade. Há promessas demais e entregas de menos, há distorções entre a compreensão do público quanto a importância de acessórios (mimos de hotelaria, leds nos equipa-mentos, uniforme de recepcionistas etc.) e a eficácia do atendimento.

Jornal SINDHOSP 347.indd 9 28/02/2014 18:32:45

Page 10: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

10

Entrevista

| Jornal do SINDHOSP | Fev 2014

Gastar menos em atividades-meio e melhorar substancialmente o produto ou serviço traria benefícios para a população e maiores lucros para as empresas. Organizações que operam serviços de saúde não podem adotar tolamente as práticas de “diferenciação do cliente” e incentivar com-portamentos de exclusividade. Há muitos clichês de marketing determinando estratégias empre-sariais, o que é um absurdo. A humanização hospitalar e as ações de acolhimento conformam um movimento muito importante, pois a cultura do setor saúde é autoritária, potencialmente indutora de desmandos, mas daí a copiar ações de hotelaria cinco estrelas e seus questionários de satisfação do cliente, há muito para discutir antes de implantá-los.

Considero equivocada a tentativa de explorar diferenciais de renda na saúde, algo que batizei de “síndrome de Fasano”: fantasiar que há espaço para muitos restaurantes capazes de vender ma-carrão por 100 vezes o custo de produção. Geralmente, só o amadorismo tenta reposicionar hos-pitais para atender os segmentos mais elevados de renda e aumentar a margem de lucro. No meio do caminho de tal estratégia estão as operadoras, as agências reguladoras, a política econômica, a taxa de juros e aluguéis, o SUS.

Investir na exclusividade para capturar diferenciais de renda está na contramão da regulamenta-ção da ANS, que obriga o produto a se tornar homogêneo e do grande movimento de ampliação da oferta de serviços públicos de saúde. Há muito número mal feito solto por aí, há muito menos classe A/B e renda disponível para consumo que a mídia especializada e algumas consultorias divulgam (e muito menos C/D também), é uma bobagem acreditar que pessoas doentes pagarão por futilida-des e que ao “embalar” melhor um serviço de saúde, uma empresa obterá preços extraordinários.

A grande maioria das pessoas, compreensivelmente, não quer gastar dinheiro com interna-ções, dentistas e remédios, querem comprar o último tablet, viajar, ter sossego. Tenho calafrios quando escuto que a exemplo de um jantar em algum restaurante bacana, as pessoas deveriam ter boas experiências quando do uso de equipamentos de saúde. Os atributos mais valorizados pelo cidadão no atendimento as suas necessidades de saúde são a agilidade e o acolhimento. Gastar com o adoecimento – mesmo que em sua prevenção – não é sonho de consumo de pessoas normais. Sugiro às organizações as estratégias do bom, barato e eficiente e navegar nas ondas da responsabilidade social, do respeito às pessoas e da transparência.

Jornal do SINDHOSP - Hospitais reivindicam o direito de abrir capital ao investidor estrangeiro, o que hoje

lhes é vedado por lei. No entanto, em 2013 tivemos a United Health comprando a Amil, que possui cerca de 30%

de hospitais próprios em sua rede. Qual sua opinião sobre esta reivindicação e qual a perspectiva para o setor, caso

ela venha a ser atendida?

Maria Cristina Amorim - As objeções da teoria econômica ao capital estrangeiro são a remessa de lucros ao exterior (os bancos estrangeiros sediados no Brasil rasparam os lucros para socorrer suas matrizes) e a resistência na transferência de tecnologias e inovações. Estabelecidas as leis para regrar a atuação das multinacionais – como acontece em qualquer sociedade onde gos-taríamos de viver – o capital estrangeiro ampliaria as possibilidades de investimento e de concor-rência. Qualquer empresa sediada no Brasil, independentemente da origem do capital, é obrigada a obedecer às regras de controle da oferta de serviços de saúde. Sugiro discutir os pontos acima, a remessa de lucros e o desenvolvimento de inovação/tecnologias no segmento da saúde, a exem-plo do que acontece na China.

Jornal do SINDHOSP - Historicamente, o Brasil é o país das commodities, mas não investe em capacidade

produtiva nas áreas da saúde, da ciência, da inovação. Pelo menos não em grande escala, para estar entre os

melhores do mundo. Qual a sua avaliação do setor de saúde brasileiro como setor produtivo?

Maria Cristina Amorim - Nosso problema quanto ao investimento em inovação e nos setores de média/alta intensidade tecnológica é geral, afeta toda a economia – de todo modo, são aspectos dife-rentes, a intensidade tecnológica e a inovação. A inovação depende de políticas econômicas de incentivo e de muita, muita articulação entre as várias instituições públicas e entre estas e os agentes privados. Por exemplo, conseguir que Receita, MEC (que controla as universidades), INPI, BNDES acertem suas ações, sem que uma esterilize a outra é bem difícil. Desde 2005, a Lei 11.487 (Lei do Bem) promove a inovação

por meio de reduções fiscais, mas a Receita discorda, produzin-do riscos tributários para as empresas.

Quando a política econômica e a articulação entre os agentes dão certo, surge um ambiente propício à inovação, e só então, os empresários se animam a investir. O investi-mento em commodities não compete com a inovação, ao contrário, exportamos produtos de origem primária nessa magnitude por que há muito dinheiro público em pesquisa e inovação, principalmente na agricultura. O setor sucro-al-cooleiro, por exemplo, em franco processo de multinaciona-lização, só é o que é por causa da Embrapa.

O setor de saúde é potencialmente estratégico para a inovação e o adensamento tecnológico, que é muito dife-rente da incorporação tola de tecnologia. No Brasil, a utiliza-ção da pesquisa, fonte da inovação, está restrita à indústria de medicamentos e em menor escala, de materiais. Alguns poucos hospitais brasileiros investem em inovação, hospitais são os revendedores de inovações geradas na indústria de materiais e medicamentos, com raras exceções.

Sabemos pouco sobre inovação nos prestadores de serviço em saúde, há mais questões que respostas. Quais são as possibili-dades de negócios? Como aproveitar as potencialidades de edu-cação em saúde para ampliar o portfólio de produtos dos pres-tadores? O BNDES tem recursos subsidiados para a inovação na indústria farmacêutica, os prestadores não têm como participar, não tem projetos? Dá para reunir empresas em consórcios? Como estabelecer pontes entre as organizações e os centros de pesquisa? E a biotecnologia em medicamentos, como afetará os prestadores? Os biotecnológicos serão injetáveis? Hospitais po-deriam participar do mercado de pesquisas clínicas?

Jornal do SINDHOSP - Um dos maiores pleitos do setor para

2013 foi desoneração da folha de pagamento, que não aconteceu.

O Sindhosp apoiou exaustivamente esta e outras campanhas mais

amplas de desoneração tributária. Acredita que 2014, por ser ano de

eleição, pode trazer alguma boa notícia neste sentido para a saúde?

Maria Cristina Amorim - Na impossibilidade de alte-rar de fato a derrama dos tributos excessivos, o governo fe-deral vem utilizando reduções setoriais de tributos. O fim da guerra fiscal aguarda, empacada de um lado, pelos governa-dores, de outro, por que a União não pode gastar mais com as compensações financeiras aos estados “prejudicados”. Não é o melhor a fazer, mas é o possível, dada a correlação de forças políticas estabelecidas.

A função dos tributos é promover justiça social e desen-volvimento econômico. Tributos sobre consumo e trabalho provocam o inverso, injustiça social e redução do crescimento. A redução de tributos sobre salários é positiva, particularmen-te para o setor saúde, de mão de obra intensiva e regulamen-tada. Não dá para adivinhar a posição do governo quanto às futuras isenções, mas é altamente desejável que se reúna argumentos consistentes para convencer o governo a fazê-lo.

Jornal SINDHOSP 347.indd 10 28/02/2014 18:32:45

Page 11: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

11Fev 2014 | Jornal do SINDHOSP |

Em dia

“2014 vai ser um ano agita-do, em todos os sentidos.” Foi com essa afirmação que o con-sultor em Gestão Empresarial e coordenador do Grupo de RH do SINDHOSP (GRHosp), Nel-son Alvarez, começou o primeiro encontro do ano, realizado em 19 de fevereiro, no auditório do Sindicato, em São Paulo. “Tere-mos muitos feriados, Copa do Mundo, eleições para governo do Estado e presidente da República e o cenário econômico não vislumbra muitas mudanças e nem um crescimento considerável. As empresas e seus gestores terão que estar atentos, e isso também vale para o setor da saúde”, alertou.

O sinal amarelo já foi dado inclusive por economistas que afirmam que 2014 inspira cuida-dos. De acordo com dados divulgados no fim de janeiro, pela Tendências Consultoria, aumentou a apreensão em relação à dívida pública, que deve ficar em 62% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano contra os 53% de 2010; haverá crescimento, sim, mas as projeções vão desde 1,4% de expan-são até algo em torno de 2%, devido à desacele-ração de investimentos. Já a inflação deve oscilar entre 4%, para os mais otimistas, e 6,5% no ano. O investimento estrangeiro deve permanecer no patamar em que está e a balança comercial, devi-do aos efeitos do câmbio, não deve ter resultados consideráveis.

Para o gerente de Gestão de Pessoas do Hospital Cruz Azul de São Paulo, Marcos de Jesus Silveira, o cenário econômico brasileiro não acena para nenhuma tragédia, mas há uma incerteza muito grande em torno da economia nacional, que tem gerado estimativas pessimis-tas. “Com as novas limitações ex-ternas, principalmente da China e dos Estados Unidos, inibindo a entrada de capital estrangeiro, os ajustes terão que ser domésticos. Também chama a atenção o ‘gap’ que temos entre o que está sendo produzido e o consumo interno. Já temos um problema de oferta

CENÁRIO ECONÔMICO DEIXA RH EM ALERTAe o índice de endividamento da família brasileira está em 45%. O consumo interno precisa ser menor. Diante disso, o quadro ainda não é desastroso, mas as limitações para que o crescimen-to vigore são cada vez maiores”, disse ao comentar a pesquisa Cenário Brasil, feita pela Pezco Microanalysis, uma consultoria econômica interdisciplinar.

Isso mostra que o dever de casa precisa começar a ser feito. Com base na pesquisa, Silveira disse que o PIB lento, o comércio devagar, o fim do chamado tripé macroeconômico, composto pelo regime de metas fiscais e de infla-ção e pelo câmbio flutuante, introduziram novas incertezas na política econômica que enfraquecem a moeda. “É preciso mudança, novos acordos co-merciais, aumento da produtividade. Em todas es-sas frentes, nós estamos muito aquém.”

Um dos principais reflexos desse cenário deve ser sentido no mercado de trabalho. Silveira disse que houve uma desaceleração da geração de em-pregos, diminuição do índice de ajustes salariais e o desemprego está parando de cair, isso porque a economia ainda continua patinando e sem pers-pectiva de recuperação mais robusta daqui para frente. “O ritmo de contratação está em estagna-ção nas indústrias, na construção civil e começa a chegar ao comércio. Vai ser difícil manter o vigor do mercado de trabalho com os altos custos da mão de obra e o encarecimento das contratações frente

à dificuldade de recuperação da economia. Além disso, ainda há a falta de profissionais qualificados, inclusive na saúde. Há oferta, mas com pouca quali-ficação”, destacou.

Alvarez também considerou que a área de Recursos Humanos terá de se envolver mais na gestão do negócio em 2014. “Alinhar questões dos indicadores internos aos financeiros e de gestão, equalizando objetivos e buscando melhoria de produtividade, será muito importante. Será preciso que o RH esteja envolvido na gestão do negócio para contribuir na melhoria dos resultados”. Ele ainda lembrou que o cenário conturbado da eco-nomia deve refletir nas negociações coletivas. “Um ano pouco produtivo, com crescimento próximo de zero, vai ser complicado. O RH terá que sair da postura de reclamante e propor ações efetivas.”

A jornada de 12x36 horas para os profissionais de saúde voltou à pauta. O advogado do depar-tamento Jurídico do SINDHOSP, Durval Silvério de Andrade, comentou que súmula nO 444 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que trata da jornada especial, valida a carga horária e assegura o pagamento em dobro dos feriados trabalhados. Ele esclareceu que a Confederação Nacional da Saúde apresentou pedido de revisão da referida súmula ao presidente do TST e à Comissão de Jurisprudência do Tribunal, em nome de todas as federações do país, no segundo semestre de 2013, mas não houve resposta conclusiva. “Como não há nenhum outro posicionamento, a súmula 444 continua valendo e deve ser cumprida”, afirmou.

Outro assunto discutido no encontro e que vem tirando o sono dos adminis-tradores e gestores de estabele-cimentos de serviços de saúde é o projeto de lei 2.295/2000, que reduz a jornada de enfermeiros, técnicos e auxiliares de enferma-gem para 30 horas semanais. Ele está em tramitação no Congresso Nacional e existe a apreensão que seja votado na Câmara dos Depu-tados ainda este ano. “Há informa-ções de que o processo deve ca-minhar, mas com substitutivos ao seu conteúdo, propondo período de adaptação e ajustes”, alertou Nelson Alvarez.

Nelson Alvarez, que coordena o GRHosp

Primeira reunião do ano gerou muitos debates

Foto

s: D

IVU

LGAÇ

ÃO

Jornal SINDHOSP 347.indd 11 28/02/2014 18:33:04

Page 12: NÃO FOI POR FALTA DE AVISO - SINDHOSP · ção da cidade de São Paulo, o Hospital Samaritano completou 120 anos de atividades agora em 2014. Atualmente o complexo hospitalar abrange

12 | Jornal do SINDHOSP | Fev 2014

Em dia

ATENÇÃO DOMICILIAR É TEMA DE DEBATE EM SÃO PAULO

Não é de hoje que o tema atenção domiciliar é alvo de debates no setor da saúde. As indicações a pacientes e fami-liares, a capacitação de novos profissionais e a aceitação por parte dos já formados são alguns dos assuntos que clamam por atenção nas empresas de home care. Em 6 de feverei-ro, o Saúde Web, portal de notícias especializado na área da saúde e negócios, em parceria com a IT Mídia, realizou um encontro com especialistas e membros do setor para res-ponder à seguinte pergunta: como superar as dificuldades legais, assistenciais e regulatórias para desenvolver o setor e melhorar a qualidade de vida dos pacientes em atenção e internação domiciliar?

Segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suple-mentar (ANS), de 2012, as internações hospitalares soma-ram 7,4 milhões, enquanto as domiciliares contabilizaram 106 mil. A primeira necessidade é, portanto, desmistificar a modalidade. No Brasil ainda se acredita que o atendimento domiciliar equipara-se à internação, na qual o paciente utili-za-se de medicamentos e aparelhos vitais para a sobrevivên-

cia. Pelo contrário, como explicou o Núcleo Nacional das Empresas de Atenção Domiciliar (NEAD), durante o evento: “o atendimento domiciliar é a visita ou procedimento, isolado ou periódico, rea-lizado no domicílio do paciente por profissional habilitado na área da saúde, como alternativa ao atendimento ambulatorial, a paciente que não necessite de hospitalização”.

Para Luiza Dal Ben, diretora do SINDHOSP, o envelhecimento da população brasileira e a ne-cessidade de esclarecimento dos médicos para o assunto são as principais questões a serem abor-dadas. “O setor necessita de mais explicações dos médicos assistentes aos pacientes hospitalizados sobre o que é a atividade de home care, sua indicação e os critérios para tal indicação, pois somente assim serão feitas solicitações desse modelo de assistência de forma segura, com a qualidade que o paciente precisa. O que nós estimamos é que paciente, familiares e operadoras trabalhem de forma harmonizada. Quem ganha com esse equilíbrio é o próprio paciente”.

O diretor de comunicação da Unidas, Marcos Anacleto, endossou a afirmação. “A família tem que estar cem por centro clara do atendimento feito em casa, suas limitações e alcances, além da urgência desse procedimento. Sem isso, estaremos fadados ao fracasso e a problemas que são muito maiores que os gastos de um paciente internado em hospital”, afirmou. O professor da Universidade São Camilo, Marcelo Channes, destacou que o problema já começa na formação dos alunos em medicina. “Tentamos discutir a importância da assistência domiciliar para agregar valor, mas as pessoas desconhecem o tema na faculdade e em nenhum momento os alunos falam sobre perspectivas de carreira neste segmento”.

Jornal SINDHOSP 347.indd 12 28/02/2014 18:33:05