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EditorialArmazenamento de materiais ........................................ 3Por William Saad Hossne

Em diaA atuação da Conep ..................................................... 5Por Corina Bontempo de Freitas, Mirian de Oliveira Lobo e Geisha B. Gonçalves

DúvidasA CONEP responde .................................................... 12Por Daniel Romero Muñoz

DepoimentoA experiência do CEP da SMS/SP................................. 15Por Iara Coelho Zito Guerriero

OpiniãoRiscos ocultos em pesquisa clínica ................................ 20Por Cláudio Lorenzo

AconteceBioética e Saúde Pública ............................................. 26Por Daniela Brito e Marcus Santos

EntrevistaDra. Adela Cortina ..................................................... 28Por Andrea Doré

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Editorial

OConselho Nacional de Saú-de (CNS), por ocasião da

Armazenamento de materiais

nomeação do Grupo Executivo deTrabalho que veio a elaborar aResolução n.º 196/96 (Diretrizese Normas Regulamentadoras dePesquisas Envolvendo Seres Hu-manos), estabeleceu “alguns cam-pos temáticos de alta relevância”.São eles: a) reprodução humana;b) genética; c) biossegurança; d)pesquisas conduzidas do exterior,inclusive os estudos multicêntricos;e) pesquisas envolvendo popula-ções indígenas; f) equipamentos edispositivos odonto-médico-hospi-talares; g) fármacos e medicamen-tos (Resolução n.º 173/95). Asáreas temáticas foram, pois,estabelecidas antes mesmo da ela-boração da Resolução n.º 196/96.

O CNS, de maneira clarividen-te, definiu as áreas temáticas le-vando em conta a complexidadeque envolve os projetos de cadauma dessas áreas, bem como ofato de que a experiência no Paíscom projetos de pesquisa, em al-guns desses campos temáticos,ainda era pequena em termos deanálise de projetos. Deste modo,a Comissão Nacional de Ética emPesquisa (CONEP) ficou com aatribuição de analisar os projetosdessas áreas e de normatizar se-paradamente alguns campostemáticos de “alta relevância”.

Com os subsídios advindos davivência acumulada, resultante daanálise dos projetos, a CONEPteve condições de detectar e ana-

lisar as questões éticas mais rele-vantes de cada área para, assim,adquirir condições de propor re-soluções complementares (espe-cíficas) à Resolução n.º 196/96.Para que se tenha a idéia do quesignificou o processo de análisepela CONEP, em um ano a Co-missão examinou um total de pro-jetos de uma área temática quedemandaria 13 anos de trabalhodeste tipo no Comitê de Ética emPesquisa (CEP) que analisou omaior número de propostas domesmo campo.

Na elaboração de cada resoluçãocomplementar, a CONEP tevesempre presente a preocupação defazer uma reflexão crítica dos pro-blemas detectados, buscando o de-vido amadurecimento antes de qual-quer proposta, de modo a permitira maior flexibilização para o ade-quado exercício ético sem “amar-ras”. Sob essa ótica foram elabora-das as Resoluções n.º 251/97 (No-vos Fármacos, Medicamentos e Va-cinas), n.º 292/99 (Pesquisas comCooperação Estrangeira), n.º 303/00 (Pesquisas em Reprodução Hu-mana) e n.º 304/00 (Pesquisascom Povos Indígenas). No momen-to, está em fase final a minuta daresolução referente à pesquisa naárea de genética humana.

Por outro lado, a sistemáticaadotada vem permitindo, tam-bém, a identificação de algumasquestões emergentes, resultantesdo aumento e da diversificaçãodos projetos de pesquisa. São

Por William Saad Hossne

Cadernosde Ética em 3Pesquisa

William Saad Hossneé professor, médico,

pesquisador, membrodo Conselho Nacional

de Saúde (CNS) ecoordenador da

Comissão Nacional deÉtica em Pesquisa

(CONEP).

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questões de caráter mais abran-gente, não necessariamente vin-culadas a um único campo temá-tico. Num primeiro momento, taisquestões têm sido analisadas pon-tualmente pelos membros daCONEP, sempre em interaçãocom os pesquisadores e os CEPse, quando necessário, com asses-soria ad hoc especializada.

Não raramente, o equacio-namento pontual se consubstanciaem parecer emitido como respos-ta a uma consulta, publicado nos“Cadernos de Ética em Pesquisa”,da CONEP/CNS. Esse processode acúmulo de ponderações e dereflexões tem propiciado o devidoamadurecimento para eventuais re-gulamentações, além das resolu-ções. Assim, no âmbito dessa sis-

temática, foi elaborada a Regula-mentação da Resolução n.º 292/99 (Pesquisas com CooperaçãoEstrangeira), aprovada pelo CNSe publicada em agosto de 2002.

Uma questão que vem se tor-nando mais freqüente diz res-peito ao armazenamento (ouestocagem) de material biológi-co de pesquisa obtido a partirdo projeto de pesquisa. A Re-solução n.º 196/96 contém al-gumas disposições referentes aouso do material biológico, bemcomo algumas vinculaçõescorrelatas (Resolução n.º 196/96 – itens III.3.i,q,t – itensIV.1.g – IV.3.f – V.7 – VI.2.l,n – VI.3.c – VII.13), que têmorientado a resposta aosquestionamentos.

Com base na experiência acu-mulada, advinda do exame de pro-jetos de pesquisa, da análise dosmotivos de pendência, da reanálisede pareceres de relatores (inclusi-ve ad hoc), a CONEP vem tra-çando algumas diretrizes que, apósnova revisão, poderão vir a setransformar em proposta de Re-solução do CNS, específicapara a questão do armazenamentodo material biológico no âmbitode projetos de pesquisa. Por fim,deve-se ressaltar que cabe àCONEP a avaliação de projetosde pesquisa e não simplesmente aavaliação de meios para eventuaisou hipotéticos projetos de pesquisanão delineados e consubstanciadosem protocolo (capítulo VI da Re-solução n.º 196/96).

Cadernos4 de Ética em

Pesquisa

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CONEP tem como preocu-pação constante a transparên-

meio de um processo de avaliaçãoque permitiu a definição de critériospara classificação dos CEPs, algunscomitês tiveram seus registros can-celados pelo motivo de não terematingido os requisitos mínimos. Al-guns poucos tiveram o registrosuspenso após averiguação de situa-ções irregulares, como cobrança detaxas, composição sem conformida-de com a norma, entre outras. Olevantamento de junho passadocontabiliza a existência de 4.611membros de comitês locais de éticaem pesquisa, com uma média de 12por CEP, representantes de várioscampos profissionais e setores dasociedade (gráfico 2).

Rigor ético – A partir de 1998, aCONEP começou a receber proje-tos de pesquisa selecionados nosCEPs segundo critérios de risco(pertencentes a áreas de maiorprevalência de problemas éticos e demenor consenso sobre condutas éti-cas, definidas como áreas temáticasespeciais na Resolução n.º 196/96).

A estimativa é que, em média, 10%

Em dia

A atuação da CONEPPor Corina Bontempo de Freitas, Mirian de Oliveira Lobo e Geisha B. Gonçalves

Acia de suas ações no cumprimentodas atribuições da Resolução n.º 196/96. Esse princípio é percebido naapresentação periódica de planos detrabalho e nos relatórios de ativida-des. As informações públicas são re-metidas ao plenário do ConselhoNacional de Saúde. Nesta edição,publicamos uma síntese do relatoapresentado no mês de junho e quedemonstra o papel que a Comissão eos Comitês de Ética em Pesquisa(CEPs) têm exercido na proteção dosdireitos dos sujeitos de pesquisa.

A partir de 1997, as instituiçõescomeçaram a apresentar propostasde criação de comitês locais, que sãoanalisadas na CONEP e recebemaprovação e registro ou recomen-dações para adequação às normas.A tabela 1 mostra a evolução do re-gistro dos CEPs ano a ano, sendoque até o final de 2002 já haviamsido registrados 375. Até junho des-te ano, o número chegava a 384.Algumas instituições, principalmen-te do Norte e Nordeste, foram esti-muladas, por meio de uma articula-ção com um programa do Depar-tamento de Ciência e Tecnologia(DECIT) do Ministério da Saúde,a organizar seus comitês, fazendocom que hoje o sistema esteja pre-sente em todos os estados brasilei-ros (gráfico 1).

Têm sido também acompanhadasas modificações na composição e narenovação dos CEPs, após três anosde mandato. A partir de 2003, por

Evolução do registro de CEPs:de 1997 a 2002

Tabela 1

Fonte: CONEP/Janeiro-2003

ANO Nº DE CEPs Nº ACUMULADO DE

REGISTRADOS NO ANO CEPs REGISTRADOS

1997 112 112

1998 72 184

1999 58 242

2000 45 287

2001 46 333

2002 42 375

dos projetos analisados pelos comi-tês sejam encaminhados tambémpara a Comissão, em Brasília. Até2002, a CONEP recebeu e anali-sou 4.828 projetos de pesquisa deáreas temáticas especiais. No gráfi-co 3, é visível a evolução desse qua-dro. Com base nos dados de 2002,estima-se que cerca de 15 mil proto-colos circularam pelos comitês, en-volvendo 600 mil pessoas naquele ano(média de 40 pessoas por projeto).

Dentre as propostas submetidasao crivo da CONEP estão algumasreferentes às seguintes áreas: gené-tica humana; reprodução humana;fármacos, medicamentos, vacinas etestes diagnósticos novos; equipa-mentos, insumos e dispositivos paraa saúde novos ou não registrados noPaís; novos procedimentos ainda nãoconsagrados na literatura; popula-ções indígenas; projetos que envol-vam aspectos de biossegurança; pes-quisas coordenadas do exterior oucom participação estrangeira e pes-quisas que envolvam remessa dematerial biológico para o exterior;

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Cadernosde Ética em 5Pesquisa

Corina Bontempo deFreitas é médica,

especialista emBioética e Saúde

Pública e secretária-executiva da CONEP.

Mirian de OliveiraLobo (médica) e

Geisha B. Gonçalves(enfermeira) sãoespecialistas em

Bioética e assessorasda CONEP.

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e, por fim, projetos que, a critériodo CEP, devidamente justificado,sejam julgados merecedores de aná-lise pela CONEP.

Vale a pena ressaltar ainda que,antes do funcionamento do SistemaCEP/CONEP, a Agência Nacio-nal de Vigilância Sanitária (ANVISA)havia autorizado 30 projetos de pes-quisa de novos medicamentos, em1995, chegando a mais de 700 em2000. Esse aumento deve-se, emparte, ao estabelecimento da redepara apreciação ética e fluxo de apro-vação, finalizando na ANVISA.

Outro ponto que merece atençãodiz respeito ao processo de aprecia-ção ética na CONEP. No início, amaior parte dos projetos enviadosnão recebiam aprovação ao primei-ro parecer devido a inadequações àsnormas. Após a atuação da Comis-são, a situação se inverteu, demons-trando uma evolução na qualidadedos projetos e no trabalho dos CEPs.No gráfico 4, podemos observar amudança de comportamento, comcerca de 70% de pendências e 30%de aprovações, em 1997, para cer-ca de 30% de pendências e 70% deaprovações, em 2001. Isto signifi-ca qualificação das pesquisas!

Quanto aos motivos das pendên-cias, observou-se que inadequaçõesno TCLE são as razões mais fre-qüentes, dentre outras citadas (ta-bela 2).

O percentual de projetos não apro-vados não tem apresentado variaçãoimportante; no entanto, o númerorelativo acompanha o crescimento

Comitês de Ética em PesquisaInstitucionais

Gráfico 1

Fonte: SECONEP/MS - Outubro de 2003

REGIÕES QUANTID.

Centro-Oeste 20

Nordeste 53

Norte 15

Sudeste 219

Sul 63

TOTAL 370

Composição dos CEPs segundoprofissão dos membros: junho de 2003

Gráfico 2

Cadernos6 de Ética em

Pesquisa

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global do número de projetos,correspondendo a 34 protocolos, ouseja, 4%, em 2002. O levantamento(tabela 2) dos motivos demonstra arelevância dos problemas éticos iden-tificados e a capacidade resolutiva darede, com a proteção efetiva de11.058 pessoas que estariam envol-vidas nos projetos não aprovados.

Resta citar que, com a aprova-ção de resoluções complementares,a análise de parte dos projetos deáreas temáticas especiais tem sidodelegada aos comitês institucionais,como o descrito nas seguintes reso-luções do Conselho Nacional deSaude: n.º 251/97, para novosfármacos; n.º 303/00, para repro-dução humana; e regulamentação dan.º 292/99, aprovada em 2002, paraa área de cooperação estrangeira.Isso caracteriza uma tendência con-tínua de diminuição das situações emque se requer a apreciação daCONEP, conforme o acúmulo deexperiências e o amadurecimento dosistema. Atualmente estão sendopreparadas diretrizes para a área degenética humana, a serem apresen-tadas ao CNS.

Instância de recursos – Em meioa este processo, a CONEP tem fun-cionado como instância de recursos,a partir de solicitação de pesquisa-dores, coordenadores de CEPs e desujeitos de pesquisa. Recebe tambémdenúncias e acompanha publicaçõesna imprensa, quando necessário, de-sencadeando processos de averigua-ção de possíveis irregularidades. Onúmero de procedimentos desse tipo

tem aumentado consideravelmente,sem dúvida por decorrência do au-mento do número de pesquisas en-

volvendo seres humanos, do tempode funcionamento dos CEPs e dadivulgação das normas de bioética

Evolução de CEPs registrados e deprojetos encaminhados à CONEP:de 1997 a 2002

Gráfico 3

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Cadernosde Ética em 7Pesquisa

Classificação dos projetosapreciados na CONEP no primeiroparecer (%): 1998/2002

Gráfico 4

Fonte: CONEP/Janeiro-2003

Fonte: CONEP/Janeiro-2003

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no Brasil, levando à formação deuma consciência crítica entre os pro-fissionais de saúde, a comunidadecientífica e a população em geral.

Desde 1977, foram acompanha-dos 55 casos de denúncias, que in-cluíram a participação e a colabora-ção da ANVISA, do Conselho Fe-deral ou Regional de Medicina e doMinistério Público. Atualmente, oMP está acompanhando 12 casosdenunciados em reportagem doCorreio Braziliense em março de2002. O rigor do trabalho realizadopela CONEP e pelos CEPs levouao cancelamento de 78 projetos depesquisa, antes mesmo de serem ini-ciados, por motivos vários, inclusiveligados ao patrocinador e ao pesqui-sador. Outros 8 foram suspensos(após o início). Em 2002, dentre os1.566 projetos apreciados naCONEP, 12 (0,77%) foram cance-lados e 11 ( 0,7%) suspensos.

Sistema de informação – Preo-cupada em fazer cumprir a deter-minação de constituir um sistemade informação e acompanhamentodos aspectos éticos das pesquisas en-volvendo seres humanos em todoo território nacional, mantendoatualizados os bancos de dados, aCONEP tomou uma série de me-didas desde que foi criada. O pri-meiro passo foi a criação de umafolha de rosto para todos os proje-tos, com os dados principais de ca-racterização da pesquisa, incluindocritérios de risco de dilemas éticos,como áreas temáticas especiais,além da identificação dos respon-

sáveis. Isso tem facilitado as ativi-dades operacionais e permitido umavisão geral dos projetos de áreastemáticas especiais em todo o País.

Outra medida anda de braços da-dos com a tecnologia. Desde 2001vem sendo desenvolvido, em cola-boração com o Departamento deInformática do SUS (DATASUS),o SISNEP, um sistema mais amploque objetiva a cobertura universal daspesquisas envolvendo seres huma-nos. Com ele, todos os projetos apre-sentados aos CEPs e à CONEP pas-sarão a ser acompanhados. Os da-dos são alimentados via internet esão disponibilizados de forma dife-renciada para os pesquisadores, osCEPs, a CONEP e o público emgeral. O SISNEP é de grande utili-dade em todos os níveis, por ser umfacilitador do controle social. Alémdisso, constituirá fonte importante dedados para análises de interesse dopróprio MS e de outros órgãos rela-cionados às políticas de C&T.

De forma mais específica, pode-mos enumerar os seguintes objeti-vos do SISNEP: universalizar o re-gistro das pesquisas em seres hu-manos; certificar à sociedade que apesquisa foi apresentada para avali-ação ética; fornecer informaçõesseletivas para diversos grupos de in-teressados (público, pesquisadores,CEPs e CONEP); permitir que oConselho Nacional de Saúde e oMinistério da Saúde monitorem aavaliação ética das pesquisas; per-mitir que os editores dos periódi-cos de divulgação científica tenham

a garantia de que a pesquisa foi apre-sentada ao sistema de acompanha-mento ético; permitir o conheci-mento da situação e as tendênciasda ciência e da tecnologia na áreade pesquisas em seres humanos; e,por fim, conhecer o perfil de todasas pesquisas envolvendo seres hu-manos com dados essenciais paraanálise. Até o momento, ele está emfuncionamento experimental em 10instituições, devendo ser ampliadoa todos os CEPs.

A preocupação com a transparên-cia de suas ações e com a divulga-ção dos princípios de proteção dossujeitos de pesquisa levou a CONEPa tomar outras medidas. Com isso,pretende-se manter informadas to-das as instâncias do governo e dasociedade sobre o tema. Para isso, aSecretaria-Executiva da Comissãosupervisiona e alimenta um site vin-culado à página do CNS na internet(conselho.saude.gov.br), mantémcontatos permanentes com institui-ções de pesquisas, envia material paradistribuição em eventos e preparavárias publicações, que são distribuí-das gratuitamente, como os Cader-nos de Ética em Pesquisa, livros,manuais e fôlderes.

Uma das características do traba-lho realizado pela CONEP, com oobjetivo de proteger os direitos dosseres humanos que participam comovoluntários nas pesquisas científicas,é o estímulo ao fortalecimento dosistema CEP/CONEP, que seconstitui numa extensa rede de de-fesa da cidadania e da ética. O de-

Cadernos8 de Ética em

Pesquisa

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Motivos de pendência nosprojetos enviados à CONEP: 2002

Tabela 2

Fonte: CONEP/Janeiro-2003

INADEQUAÇÕES NO TCLE Nº %

DE PROJETOS

Linguagem 11 42

Restrição à indenização 09 35

Incompleto/muito sucinto 08 31

Sem formas de contato com o pesquisador 07 27

(nome, telefone)

Informações de risco ausentes/incompletas 04 15

Sem previsão de ressarcimento 04 15

PROTOCOLO INCOMPLETO/INADEQUADO Nº %

DE PROJETOS

Folha de rosto 07 44

Sem orçamento 06 38

Sucinto/confuso/incompleto 06 38

Cronograma ausente/incompatível 05 31

Falta documento de aprovação do país de origem 05 31

MOTIVOS Nº %

DE PROJETOS

TCLE inadequado 26 79

Protocolo incompleto/inadequado 16 48

Uso de material biológico para outros fins/ 09 27

estocagem injustificada

Sem retorno de benefícios: estudos epidemiológicos 08 24

sem tratamento, sem aconselhamento genético,

sem acesso a resultados dos exames

Ausência de informação de fases anteriores/ 04 12

informação incompleta

Metodologia inadequada 02 06

Sem análise risco/benefício 02 06

Ganhos financeiros indevidos (genoma) 02 06

Continuidade de tratamento não assegurada 02 06

Municipais de Saúde, o CTNBio, aSecretaria dos Direitos Humanos eo Ministério Público); a finalização

do processo de implantação doSISNEP; e o acompanhamento doprocesso de organização de novos

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Cadernosde Ética em 9Pesquisa

senvolvimento do sistema estácentrado no acúmulo de experiên-cias em todos os níveis, valorizandoo interrelacionamento na avaliaçãode casos mais complexos e no esta-belecimento de critérios e de lingua-gem comuns, papel essencial quevem sendo exercido pela Comissão.Isso acontece, sobretudo, por meiodo estudo e da emissão de parece-res de projetos referenciados a ela.Para o alcance de um sistema com-petente e ágil, ações prioritárias fo-ram definidas e estão em andamen-to, envolvendo parcerias com o Mi-nistério da Saúde e com instituiçõesde pesquisa (gráfico 5).

Dentre tais ações, podemos enu-merar a capacitação e a estruturaçãodos CEPs (em parceria com o De-partamento de Ciência e Tecnologiado MS, a UNESCO e os CEPsinstitucionais); a elaboração e a im-plantação do Manual Operacionalpara CEPs (com o apoio dos Co-mitês de Ética em Pesquisa e do Mi-nistério da Saúde); a organização ea revisão do fluxo de aprovação deprojetos; o desenvolvimento doSISNEP (com a colaboração doDATASUS); e o desenvolvimento doPrograma de Avaliação dos CEPs(também com a participação doDECIT).

Para o biênio 2003/2004, algu-mas prioridades foram relacionadas(tabela 3). Dentre elas, a busca dearticulação com órgãos do MS e ou-tros (como exemplos citamos aSCTIE/DECIT, o DATASUS, aANVISA, os Conselhos Estaduais e

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Comitês de Ética em Pesquisa, comênfases nas etapas educativas, na for-mação de membros, na avaliação ena delegação de competências.

Parcerias – Com relação aomaior contato com outros setoresdo Ministério, vale ressaltar que setrata de uma ação prevista na Re-solução n.º 251/97, que determi-na como missão da CONEP “co-municar às autoridades competen-tes, em particular à Secretária deVigilância Sanitária/MS, para asmedidas cabíveis, os casos de infra-ção ética apurados na execução dosprojetos de pesquisa e prestar as in-formações necessárias aos órgãosdo Ministério da Saúde, em parti-cular à Secretaria de Vigilância Sa-nitária, para o pleno exercício dassuas respectivas atribuições, no quese refere às pesquisas abrangidaspela presente Resolução”.

Essa preocupação fez com que aComissão começasse a manter umcanal de comunicação contínua comos órgãos de Vigilância Sanitária.Todos os pareceres para projetosde novos medicamentos, vacinas etestes diagnósticos, equipamentos eprodutos para a saúde são enviadospara a ANVISA. Também são en-viados os pareceres para protoco-los de cooperação estrangeira, queincluem recebimento ou remessa dematerial para o exterior, atividade aser ali autorizada. Casos de situa-ções irregulares são também comu-nicados, além de todas as notifica-ções de eventos adversos nos pro-tocolos em andamento. Apesar do

alto nível das relações, a CONEPconsidera que ainda há que seavançar quando são colocadas emcena situações novas, especial-mente quando envolvem a avalia-ção de eventos adversos, a sus-pensão de projetos de pesquisa, aremessa de material para o exte-rior, a aprovação de instituiçõesexclusivas de pesquisa clínica, osrequisitos de pesquisa clínica paracosméticos, dentre outras.

Outros órgãos do Ministério daSaúde são contatados pela CONEP,conforme necessidades específicas,para verificação da adequação do usode recursos do Sistema Único deSaúde (SUS) em determinadas pes-quisas. Setores ligados à alta com-plexidade e aos transplantes tambémsão convidados a se manifestar quan-to às normas relativas ao tema,

quando há pareceres que exigem estetipo de avaliação. As relações inclu-em ainda a solicitação de parece-res ad hoc para complementar de-cisões e a consultoria jurídica emcasos de acompanhamento peloMinistério Público ou de outrasimplicações jurídicas.

Avaliação – A Resolução n.º251/97 determina, ainda, que aCONEP atue na “organização desistema de avaliação e acompanha-mento das atividades dos CEPs. Talsistema, que deverá também servirpara o intercâmbio de informaçõese para a troca de experiências entreos CEPs, será disciplinado por nor-mas específicas da CONEP, ten-do, porém, a característica de atu-ação inter-pares, isto é, realizadopor membros dos diversos CEPs,com relatório à CONEP”.

Com esse objetivo, foi preparado

Gráfico 5

Desenvolvimento do Sistema CEPs– CONEP – MS

Cadernos10 de Ética em

Pesquisa

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o projeto de Acompanhamento eAvaliação dos Comitês, constandode coleta de dados por questionárioenviado a cada unidade cadastradaem novembro (parte fechada e par-te aberta, a serem respondidas pelocoordenador), levantamento da si-tuação dos CEPs quanto a dados jáexistentes na CONEP (registro, re-latórios de atividades, situação de pro-jetos de áreas temáticas enviados) evisita local por duplas escolhidas apartir de equipe formada de mem-bros indicados pelos CEPs e por ou-tros representantes de nível central(CONEP, MS).

A partir de uma primeira análiseda situação dos CEPs, a partir dasrespostas dadas aos questionáriose dos itens que compõem as reso-luções do CNS, construiu-se umarelação de critérios para classifica-ção dos Comitês. São levados emconsideração requisitos aprovadospela CONEP e pelo ConselhoNacional de Saúde para registro,renovação e funcionamento dosCEPs. Inicialmente, todos os cri-térios foram divulgados entre osCEPs, objetivando estimular umaauto-avaliação e as correções ne-

Prioridades da CONEP: 2003/2004

Tabela 3

Inserção/estruturação

Articulação: SCTI/MS e DECIT, DATASUS, ANVISA

CTNBio/MCT

Conselhos Estaduais e Municipais de Saúde

SE Direitos Humanos/PR

Ministério Público

Finalização e implantação do SISNEP

Coordenação dos CEPs – Processo educativo

Avaliação dos CEPs

Formação de membros

Delegação de competências

Diretrizes éticas para pesquisas em genética humana

Cadernosde Ética em 11Pesquisa

cessárias. Atualmente, a CONEPbusca a qualificação dos trabalhosdos CEPs, tanto por meio de apoioà capacitação quanto da exigênciade cumprimento dos requisitos dasresoluções e dos critérios mínimosde funcionamento.

Este trabalho resultou no cance-lamento de 23 Comitês de Ética emPesquisa a partir de abril deste ano,após terem sido identificados comounidades cadastradas mas sem con-tato com a CONEP. Estão sendocontatados os CEPs que, por meioda análise do questionário, não

atendem às condições mínimas paraseu funcionamento. Tais comitêsestão recebendo notificações de suasituação com prazo especificadopara atendimento dos requisitos ne-cessários à manutenção do regis-tro. Vale salientar que a classifica-ção também embasa a decisão dedelegação de competência para aná-lise final de projetos de cooperaçãoestrangeira aos CEPs. Ressalte-se,também, que a fase de visitas nãofoi ainda implementada por não te-rem sido disponibilizados os recur-sos previstos.

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Dúvidas

Cadernos12 de Ética em

Pesquisa

A CONEP responde

Daniel Romero Muñozé professor deMedicina Legal eBioética do Depto. deMedicina Legal, ÉticaMédica e MedicinaSocial e do Trabalhoda Faculdade deMedicina daUniversidade de SãoPaulo.

Por Daniel Romero Muñoz

Consulta sobre mutilação de ca-dáver humano – O requerentesolicita instruções sobre pesquisasque envolvem cadáveres submeti-dos a autópsia no que tange a cri-térios de possível mutilação acar-retados pela pesquisa.

Saliente-se, preambularmente,que seria de interesse saber-se otipo ou grau de mutilação a que serefere o consulente, bem como otipo de autópsia mencionada, istoé, se médico-legal ou de Serviçode Verificação de Óbito, fato quepoderá ser relevante, uma vez quena segunda (SVO) os corpos es-tão íntegros e na de casos forensesé comum já estarem mutilados,como ocorre nos acidentados.

Ademais, é conveniente ver-seo sentido em que está sendo apli-cado o termo mutilação. Enten-dendo-se mutilação como a reti-rada ou a supressão de partes docorpo, ou melhor, de qualquerparte do corpo, e analisando-seprimeiramente a doutrina jurídicado País referente ao tema, vemosque o Código Penal Brasileiro(CPB) trata do assunto no capí-tulo referente aos crimes contra osentimento religioso e contra orespeito aos mortos, mais especí-ficamente no artigo 211, que es-tabelece: - Destruir, subtrair ouocultar cadáver ou parte dele: -Pena: reclusão de um a três anos, emulta. Também referente aotema, porém de modo menos es-pecífico, é o artigo 212: - Vilipen-diar cadáver ou as suas cinzas: - Pena:

detenção de um a três anos, e multa.O legislador, em sua Exposição

de Motivos, explica que: - “Sãoclassificados como species do mes-mo genus os ‘crimes contra o sen-timento religioso’ e os ‘crimescontra o respeito aos mortos’. Éincontestável a afinidade entre unse outros. O sentimento religioso e orespeito aos mortos são valores éti-co-sociais que se assemelham. O tri-buto que se rende aos mortos temum fundo religioso. Idêntica, emambos os casos, é a ratio essendi datutela penal”. Vê-se, portanto, quea doutrina jurídica, no âmbito pe-nal, considera que os crimes de des-truição, subtração ou ocultação decadáver ou parte dele e de vilipên-dio a cadáver são desrespeito aosmortos, no sentido de ferir os sen-timentos que se tem em relação aeles, o qual é da mesma espécie dosentimento religioso. Em outraspalavras, a nossa sociedade consi-dera, em termos normativos, quetodos devem ter para com o cadá-ver o mesmo tipo de respeito que sedeve ter em relação à religião: res-peito ao sentimento das pessoas emrelação a ele.

O professor Hilário Veiga deCarvalho, ao escrever sobre a au-tópsia médico-legal, ensina que:“Terminada a necroscopia, pratica-se a recomposição do corpo; as víscerasdevem voltar para as respectivascavidades e, aproximadamente,para a posição que anteriormenteocupavam... Por vezes, é necessárioretirar alguma peça anatômica,

E spaço reservadoàs dúvidas de

pesquisadores emembros dos CEPs,esta seção apresenta,a cada edição,observações eencaminhamentosindicados pelaResolução n.º 196.

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Cadernosde Ética em 13Pesquisa

quer para estudo posterior, quercomo elemento de convicção, querainda para anexar ao museu. Deve-se fazer o possível para restituir aocorpo a sua forma habitual, disfar-çando a falta da referida peça; masde tudo se fará anotação no relató-rio e, quando for o caso, se avisará afamília do falecido... O cuidado es-tético em manter, tanto quanto pos-sível, a forma exterior primitiva docorpo, não deve exceder, é óbvio, cer-tos limites; assim, por exemplo, nãose deve substituir uma peça ana-tômica retirada, porque de interes-se, por outra de que acaso se possadispor... No arranjo do corpo no cai-xão, completem-se os cuidados esté-ticos, a fim de lhe restituir a formaque anteriormente apresentava, ouaté melhor, se possível, mormentequando se hajam retirado peçasanatômicas, como acima ficou dito.Mas repita-se, de maneira assaz fir-me e categórica que, aos motivos es-téticos, em hipótese alguma, se sa-crifiquem os imperativos dumanecroscopia completa, recolhendo-seo material que for mister conservarpara o bom serviço da justiça... Éevidente que, quanto mais altera-do estiver o corpo, maior será a difi-culdade em recompô-lo. Assim, umcadáver espostejado apresentará di-ficuldades de monta... Fora dessahipótese, e quando se trate apenasde um único cadáver, a sua recom-posição será feita no sentido desuturar entre si, de acordo com asnormas anatômicas, as suas diver-sas partes; claro está que esta opera-

ção depende exclusivamente do es-tado em que se encontrem essas par-tes, às vezes não se podendo obter umresultado final satisfatório. Empe-nhem-se os maiores esforços, eviden-temente, na recomposição da cabe-ça, por motivos estéticos fáceis decompreender”.

Por outro lado, os familiares são,de modo geral, considerados os“donos” do corpo; por isso elessão mencionados no texto acima,e o autor faz referência à necessi-dade de eles serem informados:“Deve-se fazer o possível para resti-tuir ao corpo a sua forma habitual,disfarçando a falta da referidapeça; mas de tudo se fará anotaçãono relatório e, quando for o caso, seavisará a família do falecido”.

Aos familiares também é solici-tada a autorização para a retiradade órgãos para transplante e paraas autópsias de interesse científi-co. Do mesmo modo, em termosde pesquisa, esta é consideradaética e legal se a retirada de órgãoou parte dele, durante o examenecroscópico, é precedida do Ter-mo de Consentimento Livre eEsclarecido (TCLE). Não se es-queça, também, que o procedi-mento de retirada de peças docadáver é normal nas autópsias,coletando-se, de rotina, tais pe-ças para a realização de examescomplementares (toxicológico,histopatológico etc.).

Acrescente-se, ainda, que a doa-ção de corpo para ensino e pes-quisa é considerada, e até reco-

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mendada, como uma prática le-gal e ética, desde que siga os trâ-mites burocráticos necessários aesse fim. Além do mais, tratan-do-se de cadáveres não reclama-dos, existe legislação dispondo-ospara o ensino e a pesquisa e, por-tanto, aceitando que eles possamser totalmente mutilados, comoocorre ao serem dissecados noslaboratórios de anatomia.

Desse modo, não vemos, apriori, ilegalidade ou antieticidadeem pesquisa que possa acarretarmutilação em cadáveres submeti-dos a autópsia, desde que os fami-liares (se é que existam, isto é, emcaso de cadáver reclamado) te-nham dado o seu consentimentolivre e esclarecido. Não havendofamiliares ou responsáveis legais re-lacionados com o falecido, o res-

ponsável legal passa a ser o diretorda instituição ou do serviço noqual se realiza a autópsia. Assim, aautorização deverá ser dada por eleou por pessoa que ele designar.

Esclareça-se, outrossim, que oentendimento dado neste parecerleva em conta o propósito humani-tário, filantrópico, que deve embasara pesquisa em seres humanos, nãose podendo confundi-la com o vili-pêndio de cadáver, pois, ao contrá-rio deste, a pesquisa é enobrecedorae, nesta, tanto ou mais que em ou-tros atos tanatológicos mutiladores,“a morte está a serviço da vida!”.

Faz-se necessário ressaltar, en-tretanto, que seria conveniente,nesses casos, uma avaliaçãoacurada do projeto de pesquisa, nosentido de se verificar o tipo e ograu da mutilação a ser causada

frente à relevância dos resultadosesperados, fazendo-se, assim, umparalelo com a análise que é feitanas pesquisas no ser humano vivoquanto aos riscos e benefícios.Exemplificando: tratando-se decadáver reclamado pelos familia-res e não doado para ensino e pes-quisa, se o projeto envolve a reti-rada da cabeça, os resultados es-perados dessa pesquisa terão queser bastante relevantes para justifi-car esse tipo de mutilação.

Estas eram as considerações quetínhamos a fazer a respeito dotema proposto. Sabemos que ou-tros pontos a respeito deste assun-to poderiam ter sido aqui trata-dos; porém, para uma abordagemmais específica, seriam necessáriasinformações mais precisas sobrea pesquisa a ser realizada.

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Pesquisa

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A

A experiência do CEP da SMS/SPPor Iara Coelho Zito Guerriero

cidade de São Paulo tinha,no ano de 2000, segundo

pesquisa envolvendo seres huma-nos, emitindo parecer consubs-tanciado; 2) manter a guardaconfidencial e o arquivamentodos protocolos de pesquisa, queficarão à disposição das autori-dades sanitárias; 3) acompanharo desenvolvimento das pesqui-sas; 4) desempenhar papel con-sultivo e educativo; 5) receberdenúncias sobre irregularidadeséticas durante a realização daspesquisas, requerendo instaura-ção de sindicância à direção dainstituição para que as denúnciassejam apuradas; 6) se houvercomprovação destas, informar ofato à CONEP e aos outros ór-gãos pertinentes; e 7) mantercontato estreito com a CONEP.

Neste relato, faremos uma des-crição sucinta sobre o trabalhoque o CEPSMS de São Paulovem desenvolvendo, enfatizandoas atividades educativas e de di-vulgação sobre ética em pesqui-sa com seres humanos.

Funcionamento do CEP – OCEPSMS é composto por 10membros titulares e 10 suplen-tes, sendo que dois titulares eseus respectivos suplentes sãorepresentantes dos usuários in-dicados pelo Conselho Munici-pal de Saúde. Desde o início dasatividades do CEPSMS, os mem-bros acordaram que tanto os ti-tulares quanto os suplentes de-vem participar de todas as reu-niões, objetivando com issoconstruir parâmetros para ava-

Iara Coelho ZitoGuerriero é psicóloga

e coordenadora deDesenvolvimento da

Gestão Descentraliza-da do CEPSMS de São

Paulo.

estimativa do Instituto Brasilei-ro de Geografia e Estatística(IBGE), 10.434.252 habitantes.A Secretaria Municipal de Saú-de de São Paulo tem, sob suagestão, 523 unidades de atençãoprimária e secundária e 13 hos-pitais1 , que realizaram, duranteo ano de 2002, 12.494.030 con-sultas. Cada um desses estabe-lecimentos pode-se constituirnum campo para pesquisas dediferentes áreas. O Comitê deÉtica em Pesquisa da SecretariaMunicipal de Saúde (CEPSMS)de São Paulo foi implantado pormeio da Portaria Municipal n.º1.268, de 17 de abril de 2002.

Em maio, a Comissão Na-cional de Ética em Pesquisa(CONEP) regulamentou a suaexistência e, a partir de junho,o CEPSMS de São Paulo co-meçou a receber os protocolosencaminhados pelos pesquisa-dores. Cabe ao CEPSMS ana-lisar todos os protocolos de pes-quisa a serem desenvolvidos nasunidades sob gestão de Secre-tarias Municipais de Saúde, àexceção das unidades que te-nham Comitês de Ética em Pes-quisa (CEP) regulamentadospela CONEP2 .

De acordo com o item VII. 13da Resolução n.º 196/96, doConselho Nacional de Saúde(CNS), as funções do CEP são:1) revisar todos os protocolos de

Depoimento▲▲

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Cadernos16 de Ética em

Pesquisa

liar os protocolos de pesquisaque sejam comuns ao grupo, es-tabelecendo consensos.

O comite reúne-se mensal-mente em datas estabelecidas naprimeira reunião do ano. Ocronograma de reuniões é divul-gado no site3 do CEPSMS e pormeio de cartazes afixados nopróprio CEPSMS. Juntamentecom as datas das reuniões estãoas datas limites para que o pes-quisador dê entrada e tenha seuprotocolo pautado na próximareunião. Para isso é necessárioque a documentação seja entre-gue até 15 dias úteis antes dapróxima reunião.

O CEPSMS agenda reuniõesextraordinárias sempre que fornecessário. Isso tem acontecido,em especial, quando não se tor-na possível discutir todos os pro-tocolos de pesquisa que estavampautados para a reunião ordiná-ria (que são os que deram en-trada no CEPSMS dentro doprazo previsto). Os membros doCEPSMS reúnem-se tambémpara aprofundar questões relati-vas ao seu trabalho no comitê.Recentemente foram realizadosdois alinhamentos conceituais: oprimeiro em maio de 2003,coordenado pelo prof. dr. PauloAntônio de Carvalho Fortes, eo segundo em junho do mesmoano, coordenado pela dra.Corina Bontempo. Este últimoincluiu uma discussão sobre umaficha piloto para monitoramento

dos projetos aprovados.Protocolos de pesquisa –

Após dar entrada no CEPSMS,o protocolo é arquivado em pas-ta própria, identificada por nú-mero. Uma cópia da documen-tação completa é enviada a doismembros do CEPSMS de cate-gorias profissionais diferentes. Nareunião mensal, esses doisrelatores apresentam seu pare-cer consubstanciado, com resu-mo do projeto e consideraçõeséticas sobre este. A discussão seprocessa com todo o grupo so-licitando mais detalhes do pro-jeto e tecendo suas considera-ções. As decisões têm sido to-madas de maneira consensual,evitando-se recorrer à votação.Todos os membros do CEPSMSsão relatores, inclusive os repre-sentantes de usuários.

O CEPSMS recebeu, no pe-ríodo de junho de 2002 a agostode 2003, 106 protocolos de pes-quisa, que são bastante diferen-tes entre si em diversos aspectos:quanto à complexidade (iniciaçãocientífica, trabalhos de conclusãode curso, especialização, mes-trado, doutorado e outros),quanto à formação do pesquisa-dor principal e quanto ao fato deter ou não vínculo empregatíciocom a Secretaria Municipal deSaúde, além da grande diversi-dade dos temas abordados.

Papel consultivo – A coor-denação do CEPSMS tem aten-dido às demandas dos pesquisa-

dores de maneira individual e co-letiva. Isso ocorre individual-mente quando o pesquisador re-corre ao CEPSMS. Coletiva-mente quando o CEPSMS é cha-mado a falar sobre ética em pes-quisa em cursos nos quais estáprevista a realização de mono-grafias, muitas das quais envol-verão seres humanos. O objeti-vo é fornecer ao pesquisadortodas as informações necessáriaspara a elaboração de um proje-to de pesquisa que respeite osaspectos éticos tal como descri-tos na Resolução n.º 196/96 enas demais resoluções correlatasaprovadas pelo Conselho Na-cional de Saúde.

Fóruns e seminários – OCEPSMS tem se preocupadocom a divulgação de sua implan-tação e de seu funcionamento,além das questões éticas nas pes-quisas com seres humanos. Paramarcar o início de suas ativida-des, foi realizado, em 17 de maiode 2002, o evento “Comitê deÉtica em Pesquisa da SecretariaMunicipal de Saúde: Implanta-ção e Propostas”. Esse encon-tro foi realizado na Faculdade deSaúde Pública da Universidadede São Paulo e contou com aparticipação de aproximada-mente 100 pessoas.

Em 3 de dezembro de 2002,o CEPSMS organizou, em par-ceria com o Conselho Municipalde Saúde de São Paulo, o CEPda Faculdade de Saúde Pública

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da Universidade de São Paulo,o CEP do Centro de Referên-cia e Treinamento em DST/Aids, a área temática DST/Aidsda cidade de São Paulo e a or-ganização não-governamentalGrupo de Incentivo à Vida(GIV), o “II Fórum de Repre-sentantes de Usuários dos CEPsda Cidade de São Paulo”. Estefórum se realizou na BibliotecaMunicipal Mário de Andrade,teve oito horas de duração e foirestrito à participação de repre-sentantes de usuários em CEPsda cidade de São Paulo e dosconselheiros de saúde.

Estiveram presentes 21 repre-sentantes de usuários de CEPs.Ao todo, participaram aproxima-damente 50 pessoas. Tal fórumtinha entre seus objetivos pro-mover um espaço de articulaçãoentre os usuários, o que segura-mente favorece a divulgação dosaspectos éticos nas pesquisascom seres humanos e sedimentao controle social relativo a essasquestões. Algumas propostasque foram elaboradas no fórumse transformaram posterior-mente num plano de trabalho4 .

No dia 4 de dezembro de 2002,realizou-se o “I Seminário: Éticaem Pesquisa e Controle Social naSecretaria Municipal de Saúde deSão Paulo”. No evento, além dasmesas temáticas, foram apresen-tadas as propostas levantadas no“II Fórum de Representantes deUsuários dos CEPs da Cidade

de São Paulo”. O CEPSMS tema intenção de colaborar com aorganização de outras atividadesdesse tipo na região. A proposta5 éque os fóruns tenham periodici-dade anual.

Discutindo a Bioética – Émuito importante discutir, comos profissionais de saúde, osaspectos éticos nas pesquisascom seres humanos. Assim, oCEPSMS organizou e coorde-na o curso “Direitos dos Usuá-rios e Ética em Pesquisa: Dis-cutindo Bioética com os Profis-sionais de SMS”, que conta comcarga horária de 24 horas e évoltado para os profissionaisuniversitários de SMS. Foramformadas três turmas, que tive-ram a participação de mais de200 profissionais.

O cronograma do curso in-clui a realização de mais umaturma ainda em 2003 e temcomo meta abranger aproxima-damente 300 profissionais nes-te ano. Para 2004, a previsão éatuar da mesma maneira, reali-zando o curso de maneira con-tínua. A avaliação dos alunostem sido bastante positiva, o quepode indicar que o curso possi-bilita discussões que há muitotempo eram necessárias paratais profissionais. Outro públi-co para o qual é urgente divul-gar as questões éticas em pes-quisas com seres humanos é odos conselheiros de saúde.

Controle social – Na cidade

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Pesquisa

de São Paulo estão em funcio-namento o Conselho Municipalde Saúde, assim como 39 Con-selhos Distritais, que serão reor-ganizados em 31 (um em cadasubprefeitura), e aproximada-mente 200 Conselhos Gestores(das unidades de saúde), insti-tuídos pela Lei Municipal n.º13.325, de 8 de fevereiro de2002. Estão em atividade, na ci-dade de São Paulo, 64 conse-lheiros municipais de saúde, 624conselheiros distritais e até o fi-nal de 2004 estima-se que se-rão aproximadamente 5.000conselheiros6 .

O Conselho Municipal de Saú-de atua na formulação e no con-trole da execução da PolíticaMunicipal de Saúde, inclusivenos aspectos econômicos e fi-nanceiros, constituindo-se numórgão normativo e deliberativo(Lei n.o 12.546, de 7 de janeirode 1998).

Os Conselhos Distritais eGestores têm caráter perma-nente e deliberativo, e suas atri-buições são o planejamento, aavaliação, a fiscalização e o con-trole da execução das políticase das ações de saúde, em suaárea de abrangência (Lei n.o

13.325). Os Conselhos Muni-cipais, Distritais e Gestores sãocompostos por 50% de represen-tantes de usuários das mais di-versas inserções, entre eles: mo-vimentos populares de saúde,movimentos sociais, sindicatos,

pessoas portadoras de deficiên-cia, fóruns de patologias e ou-tros; 25% de representantes doPoder Público e dos prestadoresde serviços de saúde; e 25% detrabalhadores da saúde. (Lei n.o

13.325, de 8 de fevereiro de2002, e Decreto n.o 38.576, de5 de novembro de 1999).

Consideramos que divulgar asquestões éticas nas pesquisascom seres humanos junto aosconselheiros é urgente e funda-mental. Eles desempenham umpapel central na elaboração daspolíticas públicas de saúde. Es-tão, portanto, em situação pri-vilegiada para divulgar tais in-formações e detectar a violaçãode princípios, encaminhandodenúncias ao comitê. Paraviabilizar a realização de semi-nários dirigidos aos conselhei-ros, o CEPSMS e o ConselhoMunicipal de Saúde estabele-ceram uma parceria com o Cen-tro Universitário São Camilo.

O primeiro seminário foi rea-lizado dia 9 de agosto de 2003.Na ocasião, foram discutidosassuntos como bioética e éticaem pesquisas com seres huma-nos. O público do evento foi com-posto basicamente de conselhei-ros de saúde da subprefeituraIpiranga. Apesar de ter ocorridonum sábado chuvoso, compare-ceram 70 conselheiros de saúde.A partir de tal experiência, preten-de-se organizar um cronogramapara a realização de eventos seme-

lhantes nas outras 30 subprefeiturasde São Paulo.

O CEPSMS tem participadoativamente das ConferênciasMunicipais de Saúde temáticas,tais como as de DST/Aids, as-sistência farmacêutica e popula-ção negra; e das ConferênciasMunicipais de Saúde. O objeti-vo é divulgar as questões éticasnas pesquisas com seres huma-nos, sugerindo que sejam incluí-das, nos documentos finais dasconferências, medidas que ga-rantam o respeito às dimensõeséticas nas pesquisas.

Usuários nos CEPs – Umadas propostas levantadas pelo “IIFórum de Representantes deUsuários dos CEPs da Cidade deSão Paulo” foi que o ConselhoMunicipal de Saúde agendassereuniões trimestrais para encon-tro dos usuários. O CEPSMS foiparceiro junto ao Conselho Mu-nicipal de Saúde na organizaçãodesta primeira reunião, que con-tou com a presença da dra.Corina Bontempo, secretária-executiva da CONEP. Ela apre-sentou o tema “O Papel dosUsuários no CEP”, enfocando ascaracterísticas desses represen-tantes. Em seguida, ocorreu umdebate entre os participantes.Estiveram presentes em torno de40 pessoas. Neste dia ficou defi-nido que os representantes deCEPs terão a possibilidade departicipar dos seminários dirigi-dos aos conselheiros de saúde e

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terão cinco vagas em cada cursodirigido aos profissionais da Se-cretaria Municipal de Saúde. Issovem ao encontro de um dos enca-minhamentos propostos no “IIFórum de Usuários”, realizadoem dezembro de 2002.

Considerações finais – Frenteao tamanho e à complexidade doSistema Único de Saúde (SUS) nacidade de São Paulo, suas unidadesse constituem em campos de pes-quisa muito ricos para diversas cate-gorias profissionais. Consideramosque, para a excelência de pesquisastão importantes quanto as relativasaos aspectos epistemológicos emetodológicos, é essencial o respeitoàs questões éticas. Para que taispesquisas respeitem a dignidade dosparticipantes do estudo, o trabalhodo CEPSMS é fundamental. Uma

das suas atribuições é proceder àanálise cuidadosa dos protocolos depesquisa, monitorando seu desen-volvimento. Outra atividade impor-tante é divulgar essas questões jun-to a diferentes públicos: pesquisa-dores, profissionais de saúde, conse-lheiros de saúde e a comunidade,de maneira geral. As estratégiasadotadas têm sido variadas: even-tos dirigidos a grupos específicos,eventos abertos, cursos, semi-nários, fóruns.

Por meio de atividades que oCEPSMS vem desenvolvendo,espera-se contribuir para a defe-sa dos interesses dos sujeitos dapesquisa em sua integridade e dig-nidade, bem como para o desen-volvimento da pesquisa conformeos aspectos éticos, realizando, as-sim, os propósitos de um comitê

1. A Secretaria Municipal de Saúdeacaba de assumir a Gestão Plena do Sis-tema de Saúde na cidade de São Paulo eterá, sob sua gestão, outros hospitaisalém desses treze.

2. Quando o CEPSMS foi implanta-do, existiam em funcionamento, com aSecretaria Municipal de Saúde (SMS) deSão Paulo, CEPs em três instituições: Hos-pital Municipal Vila Nova CachoeirinhaMário N. Silva, Hospital do ServidorPúblico Municipal e Hospital Municipalde Campo Limpo Fernando M. P. Rocha.

3. http://portal.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/saude/organizacao/cepsms/0001

4. Disponível no s ite http://portal.prefeitura.sp.gov.br/secretari-as/saude/organizacao/cepsms/0001

5. Propostas do II Fórum de Repre-sentantes de Usuários dos CEPs da Ci-dade de São Paulo.

6. Dados fornecidos pelo ConselhoMunicipal de Saúde de São Paulo.

de ética em pesquisa, tal como des-critos na Resolução n.º 196/96.

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Cadernos20 de Ética em

Pesquisa

Riscos ocultos em pesquisa clínicaPor Cláudio Lorenzo MD

Cláudio Lorenzo MDé doutorando emÉtica Aplicada àPesquisa pelaUniversidade deSherbrooke, Canadá.

Opinião

Introdução:Os riscos envolvidos em uma

CEPs a uma avaliação que ul-trapassa os limites das informa-ções contidas nos protocolos.

Procedimentos de minimi-zação de riscos:

Alguns autores vêm aprofun-dando e detalhando procedi-mentos de minimização de ris-cos, sobretudo em relação aosensaios clínicos com novosfármacos.i , ii, iii, iv Entre estes, des-tacamos aqui aqueles que nosparecem ter obtido o maior con-senso: 1) Cálculos metodológicosrigorosos para estimativa de riscos;2) Seleção adequada dos partici-pantes; 3) Seguimento clínico dosparticipantes com possibilidade deintervenção de emergência; 4)Rede de comunicação eficaz en-tre participantes e grupo de pes-quisa. Além deles, um outro ele-mento tem sido considerado degrande importância na minimizaçãodos riscos, trata-se da 5) Boa capa-cidade de controle social da pesquisapela comunidade onde a mesma serealiza. A partir destes cinco ele-mentos e tomando como exem-plo alguns dados da realidadesocioeconômica da cidade de Sal-vador (BA), propomos aos mem-bros dos CEPs uma reflexão so-bre a possibilidade da presençade riscos ocultos.

Breve caracterização socio-econômica de Salvador:v

Salvador caracteriza-se, comoa maioria das capitais brasileiras,

experimentação com seres hu-manos são de importância fun-damental na determinação desua validade ética. Tal afirmação,consensualmente aceita, torna aavaliação dos riscos apresenta-dos por um protocolo – ou de-duzidos a partir dele – um dosprincipais pontos do trabalho dosCEPs na sua missão de prote-ção aos indivíduos e às comuni-dades. Riscos ocultos, por seuturno, são inerentes à naturezamesma da experimentação cien-tífica. Existe sempre um grau derisco impossível de ser previstoem virtude dos limites de nossoscálculos do momento.

O que estamos chamando derisco oculto aqui não é esse.Trata-se, antes, de uma exacer-bação (oculta) dos riscos pré-estabelecidos pelo protocolo ou deuma geração de novos riscos nãoprevistos, em virtude da dada si-tuação socioeconômica de um in-divíduo ou de uma comunidadeenvolvida. O objetivo desteartigo é discutir de que maneiraalguns fatores comuns ao con-texto socioeconômico do Brasile à sua atual situação de assis-tência pública em saúde podemdeterminar riscos ocultos empesquisa clínica ou, ainda, difi-cultar a operacionalização deprocedimentos para minimi-zação dos riscos previstos, obri-gando conseqüentemente os

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Cadernosde Ética em 21Pesquisa

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por uma urbanização desor-denada, onde as classes sociaisinferiores vão sendo como queempurradas para as encostas, naperiferia da cidade, e onde osserviços urbanos, como sanea-mento, transportes e telefoniasão escassos ou ausentesvi . Doponto de vista econômico, 70%de sua população economica-mente ativa são representadospor indivíduos com mais de 18anos que recebem até cinco sa-lários mínimos por mês, dentreos quais 26% com um salário in-ferior ao mínimo. O nível de ins-trução do grupo mostra cerca de9,5% de indivíduos analfabetos e31% com menos de quatro anosde estudo regular.

Dito de outra maneira, 40,5%dos indivíduos considerados ju-ridicamente autônomos e, por-tanto, diretamente responsáveispor dizer “sim” ou “não” à suaparticipação em um ensaio clí-nico na Região Metropolitana deSalvador não têm sequer o cur-so primário completo e convi-vem com graves privações ma-teriais. Com relação à assistên-cia à saúde da população, a ci-dade vive como outras no Bra-sil: na escassez das verbas pú-blicas para garantir sua eficiên-cia. Os hospitais públicos estãodesequipados, e os serviços es-tão longe de oferecer uma assis-tência ao menos razoável à po-pulação. Em recente matéria emum jornal televisivo de grande

audiência, as péssimas condiçõesdo principal serviço de urgênciada cidade foram expostas ao Paísa partir de denúncia de um dosprofissionais do serviço.

Os procedimentos de mini-mização e a realidade social:

1 – Cálculos metodológicosrigorosos para estimativa deriscos:

A estimativa metodológica dosriscos de um ensaio clínico nãocostuma incluir nos seus cálcu-los fatores externos aos dados es-tritamente “científicos”, como asinfluências, por exemplo, da qua-lidade da assistência prestada aossujeitos nas intercorrênciasadvindas da pesquisa. É impor-tante que os membros dos CEPsestejam atentos a estas diferen-ças contextuais e observem nãosó a estimativa da probabilidadede eventos indesejáveis presen-tes nos cálculos metodológicosinformados pelo protocolo, mastambém a assistência propostano caso de sua ocorrência.

2 – Seleção adequada dosparticipantes:

Uma seleção adequada de su-jeitos para um ensaio clínico,além de depender de uma boaconcepção científica do projeto,depende de outros dois fatoresmais subjetivos: 1) a competên-cia ética e técnica do responsávelpela seleção e 2) a qualidade das

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Cadernos22 de Ética em

Pesquisa

informações prestadas pelos par-ticipantes. Com relação à com-petência ética do profissional, éposta de saída a delicada ques-tão sobre a autoridade dosCEPs para julgá-la, sobretudoporque não se encontra instala-do no País o procedimento deregistro do pesquisador em umdossiê central, em que casosconfirmados ou suspeitos de au-sência de compromisso ético naconduta de uma pesquisa po-dem ser inscritos. Assim sendo,esta avaliação torna-se vulnerá-vel aos conflitos interpessoais einterinstitucionais, gerandoqueixas pertinentes por partedos pesquisadores.

Alguns procedimentos, no en-tanto, como aquele que atrela opagamento do pesquisador aonúmero de indivíduos incluídospor ele no estudo, apesar de nãoclaramente interditados por nos-sa regulamentação, merecemuma crítica mais clara. Para H.Jonasvii, é fácil concluir que esteprocedimento pode facilmenteinduzi-lo consciente ou incons-cientemente a um menor rigorna seleção e, conseqüentemen-te, induzi-lo a maiores riscos.Quanto à competência técnica dopesquisador, é importante lem-brar que a tendência atual degrandes estudos multicêntricosenvolve, cada vez mais freqüen-temente, profissionais sem expe-riência em pesquisa, como osmédicos e as enfermeiras resi-

dentes. Assim sendo, situaçõesclínicas ou antecedentes que nãoestivessem incluídas no protocolocomo excludentes, mas que po-deriam ser identificadas por umprofissional experiente como ca-pazes de gerar complicações, po-dem deixar de ser percebidas,potencializando os riscos.

Se acrescentarmos a isso aquestão da crise do ensino uni-versitário no País, a crônica de-ficiência de formação no setorSaúde e a sobrecarga de traba-lho desses novos profissionais,poderemos compreender o ris-co oculto que pode estar impli-cado na seleção de indivíduosfeitos numa cidade como, porexemplo, Salvador. Finalmente,a qualidade da informação forne-cida pelo paciente sofre clarasinfluências do nível de instruçãodos indivíduos e do seu conhe-cimento sobre diagnósticos an-teriores. Se levarmos em contao baixo nível de escolaridade dapopulação de Salvador e a faltade uma eficiente assistência pú-blica à saúde, podemos antevera possibilidade de que grandeparte da população desconheçaalgumas informações que con-tra-indicassem sua participação.Além disso, a existência de umaremuneração para a participação– mesmo a título de ressarci-mento por tempo perdido e des-locamento ou auxílio alimenta-ção – pode funcionar como sé-rio fator de indução para indiví-

duos socioeconomicamentedesfavorecidos, levando-os a es-conder informações que pudes-sem excluí-los.

Este contexto social futuramenteexigirá normas mais claras no sen-tido de determinar algumas carac-terísticas socioeconômicas básicasdo grupo de pacientes que podemser aceitos como candidatos a en-saios clínicos com novos fármacos.É preciso haver uma considera-ção da vulnerabilidade social comoponto de partida para a proteção,na seleção de sujeitos. Populaçõesvítimas da pobreza ou abaixo dalinha da pobreza não deveriamparticipar de estudos deste tipo, amenos que a enfermidade inves-tigada fosse diretamente ligada àprópria situação social daquelaclasse, aliás uma das diretrizes járecomendadas pelo CIOMSviii .Assim, nos parece lícito que, paraos estudos que impliquem maio-res riscos, os CEPs solicitem aospesquisadores uma melhor defi-nição da situação sociocultural dospacientes envolvidos e peçam jus-tificativas para a inclusão de re-presentantes das camadas socio-economicamente desfavorecidas.

3 – Seguimento clínico dosparticipantes com possibilidadede intervenção de emergência:

Este importante procedimen-to de minimização objetiva ga-rantir menores e menos gravesconseqüências na ocorrência deum evento potencialmente ame-

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açador da integridade física doparticipante.

“O responsável pelo protocolodeve mostrar que a instituição temcondições de prestar assistência àsintercorrências que possam advirdo estudo”, assim regulamenta aResolução n.º 196/96. Mas aanálise da adequação da compe-tência da instituição, na assistên-cia dos possíveis eventos, serárealizada pelo CEP local. Daíadvêm alguns problemas: se oCEP de uma instituição que dis-põe de um serviço de urgênciadiz que o serviço não está quali-ficado para prestar assistênciaaos participantes de um ensaioclínico, pode-se considerar queele está dizendo, indiretamente,que o serviço não é qualificadopara a assistência geral de urgên-cia à população.

Isso sem dúvida seria o desen-cadear de uma crise interna nainstituição, com claros reflexosexternos que, por certo, nem to-dos os CEPs estariam dispostosa assumir. Em Salvador, porexemplo, se um estudo multi-cêntrico sobre um novo antiin-flamatório, ou sobre um vasodi-latador coronariano, fosse reali-zado nas enfermarias clínicas deum dos hospitais sede dos servi-ços de urgência já denunciadoscomo ineficazes, a ocorrência deum evento grave, como uma he-morragia digestiva ou umaarritmia ameaçadora, poderiaatingir sua magnitude máxima

(ou seja, o óbito) por falta dereais condições de assistência.Em uma importante revisão so-bre a exploração humana em pes-quisas biomédicasix , uma dasformas identificadas era a de sub-missão aos riscos desiguais emindivíduos participando de ummesmo estudo. Dessa forma,nos parece também uma medi-da acertada para afastar riscosadicionais uma comprovaçãomais detalhada de que o serviçoresponsável pela assistência aosparticipantes está em condiçõesde realmente minimizar os efei-tos graves que possam ser gera-dos pela pesquisa.

4 – Rede de comunicação efi-caz entre participantes e grupode pesquisa:

Uma boa rede de comunica-ção objetiva facilitar a troca deinformações e o deslocamentoentre os participantes e a equipede pesquisa. O rápido desloca-mento de um participante por-tando um evento grave para aunidade de atendimento de ur-gência e a comunicação com aequipe são decisivos para a mag-nitude das conseqüências. A rá-pida comunicação permite quemembros da equipe prestem in-formações importantes duranteo atendimento e propicia, ain-da, que os demais participantes,recebendo telefonemas, possamsuspender rapidamente o uso donovo medicamento, diminuindo

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Cadernos24 de Ética em

Pesquisa

a possibilidade de ocorrência deoutro evento grave.

Do ponto de vista prático,rede de comunicação significaacesso telefônico entre partici-pantes e equipe durante 24 ho-ras e facilidade de transportepara o atendimento médico dospacientes que participam da pes-quisa em domicílio. Se conside-rarmos agora a situação de mo-radia de indivíduos das camadasmenos favorecidas da populaçãode Salvador, veremos que umarede de comunicação eficaz édifícil de ser atingida e, às ve-zes, mesmo impossível. O aces-so à telefonia é difícil, e os meiosde transporte são escassos ouinexistentes nas encostas e nasperiferias. Isso para não falar nosaltos índices de violência urbana,que também dificultam o deslo-camento de membros dessascomunidades, sobretudo à noi-te. Também aqui um controle apartir da exclusão dessas cama-das sociais pode ajudar a excluireste tipo de risco oculto.

5 – Boa capacidade de controlesocial da pesquisa pela comuni-dade onde a mesma se realiza:

O controle social da pesquisa éapoiado sobre dois eixos. O pri-meiro eixo seria o dos dispositi-vos éticos desenvolvidos pela so-ciedade e sua plena aplicação, sejano plano governamental, pormeio de leis e regulamentações,seja no plano das instituições

subvencionadoras e das universi-dades, por meio de suas diretri-zes e de seus comitês de ética.

O Brasil vem fazendo um gran-de esforço para dar conta desteeixo do controle social. A Resolu-ção n.º 196/96 e suas comple-mentares, a criação da CONEPe o esforço desta de em poucotempo fazer proliferar os CEPspelo País cumprem um papel im-portante e nos deixam, semdúvida, em excelente posição emrelação ao restante do nosso con-tinente. No entanto, as dimensõesfísicas e populacionais do País, adiversidade das instituições e deseus processos para a formaçãodos CEPs, os conflitos de interes-ses que envolvem a formação e acoordenação de cada CEP local,dentre outros problemas, tornamdifíceis uma homogeneidade deprocedimentos e uma supervisãoética central.

Vale ressaltar que este não é umproblema exclusivo do Brasil, mastalvez de todos os países, sobre-tudo daqueles de maiores dimen-sões. Neste momento, o grupode Ética em Pesquisa da Univer-sidade de Sherbrooke (Canadá)está sendo subvencionado pelogoverno para a realização de umgrande estudo que objetiva trazermaior homogeneidade à avaliaçãodos riscos em pesquisa pelosCEPs e torná-los menos vulne-ráveis aos jogos políticos intra-institucionais e aos conflitos deinteresses socioeconômicos.

O segundo eixo do controlesocial é centrado sobre o sensocrítico da comunidade onde oestudo se realiza. Este, por suavez, dependerá do nível médiode instrução dos sujeitos da pes-quisa, do nível de organização ede atuação da sociedade civil edo desempenho dos represen-tantes do público nos CEPs. Osenso crítico tem importânciatanto na dimensão clínica da pes-quisa, pela percepção precoce dealterações e pela qualidade dosrelatos fornecidos, como na di-mensão ética, pela atitude napercepção, na compreensão e naexposição à opinião pública depossíveis abusos ou procedimen-tos inadequados.

É muito mais difícil, em umarealidade como a de Salvador,que um evento grave ocorrido nodecorrer de uma pesquisa che-gue ao conhecimento público.Procedimentos de avaliação éti-ca contínua, como a instalação deuma central telefônica para escla-recer dúvidas, ou receber denún-cias de participantes em pesquisaclínica, como têm sido propos-tos no Canadá, são exemplos deações que, para obterem respos-tas, precisam contar com a inici-ativa e o bom nível de informa-ção da comunidade.

Se tomarmos mais uma vez osníveis de instrução de uma cidadeonde mais de 40% dos indivíduosacima dos 18 anos não comple-taram o curso primário, e se con-

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Cadernosde Ética em 25Pesquisa

1. Este trabalho foi realizado com oapoio do Conselho Nacional para Pes-quisa e Desenvolvimento Tecnológico(CNPq).

Bibliografia:

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iii. Emanuel E. J., Wendler D., GradyC. What Makes Clinical ResearchEthical? JAMA, 283 (20): 2701-11,2000.

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v. IBGE. Pesquisa Nacional porAmostra de Domicílios, 1996.

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vii. Jonas H. Ética, medicina e técni-ca. 1.a ed. Passagens, Lisboa, 1996.

viii. International Guidelines forResearch Involving Human Subjects,

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ix. De Castro L. D. Exploitation in theuse of human subjects for medicalexperimentation: A re-examination of basicissues. Bioethics; 9 (3/4): 259-68, 1995.

siderarmos a fragilidade da so-ciedade civil organizada comumaos países com tão pouco tem-po de redemocratização, enten-deremos as dificuldades que estarealidade nos impõe. Isso paranão tocarmos no caso específi-co da indicação, da autenticida-de e da atitude dos representan-tes do público nos CEPs, temaque, segundo vemos, merecediscussão particularizada emoutra oportunidade.

Conclusão:Por meio da análise feita, pen-

samos ter demonstrado que aquestão dos riscos envolvidos emuma pesquisa clínica no Brasilnão pode ser tratada de maneiraexclusivamente ligada à avaliaçãoética dos riscos determinadospela metodologia científica doensaio propriamente dito. É pre-ciso que os CEPs estejam pre-parados para, no momento deavaliar os riscos envolvidos numensaio clínico, incluir os riscosgerados pela inter-relação entreo projeto a ser executado e os

contextos socioeconômicos dascomunidades onde a pesquisaserá realizada.

Dessa forma, as conseqüên-cias de uma análise de riscos empesquisas clínicas que leve emconsideração a influência socio-econômica recairiam sobre asduas extremidades do famosobalanço risco x benefício: na aná-lise do risco propriamente dito ede seus procedimentos de mini-mização, para exigir que os pro-tocolos os mostrem adaptados àrealidade dos contextos onde aspesquisas vão ter lugar e, na ou-tra extremidade, no que diz res-peito aos benefícios, para exigirque esteja claro que eles são di-retamente ligados àquele indiví-duo ou àquela comunidade es-pecíficos, vítimas de vulnera-bilidade social.

Este seria, ao nosso ver, a úni-ca justificativa ética para um es-tudo envolver comunidades jácercadas por tantos outros ris-cos cotidianos e já tão expostasàs mais diversas formas de ex-ploração humana.

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Cadernos26 de Ética em

Pesquisa

Bioética e Saúde Pública

pontar caminhos para rever-ter o quadro de desigualda-

implicações com a saúde, dentreoutros.

Um dos resultados mais expressi-vos do VII Congresso da Abrascofoi a aprovação da moção pelo esta-belecimento de um Grupo Temáticode Bioética junto à entidade. Du-rante o evento, uma oficina sobrebioética reuniu 40 pessoas e susci-tou o debate em torno de temas re-levantes para a pesquisa e a inter-venção na área feita no País. A pro-posta de organização do GT foi fei-ta pelos representantes do Institutode Bioética, Direitos Humanos eGênero (ANIS), uma organizaçãonão-governamental voltada para apesquisa, o assessoramento e acapacitação em bioética.

Uma das maiores lutas da Abrasco,atualmente, é pela manutenção doteor da Declaração de Helsinque, queassegura que, em pesquisas com se-res humanos, o bem-estar dos parti-cipantes deve prevalecer sobre os in-teresses da ciência e da sociedade. Adeclaração, considerada fundamen-tal pelos defensores da bioética, ga-rante também que, no campobiomédico, uma distinção fundamen-tal deve ser feita entre a pesquisamédica, na qual o objetivo é essenci-almente o diagnóstico ou o tera-pêutico, e a pesquisa científica.

Segundo o novo presidente daAbrasco, eleito em Brasília, MoisésGoldbaum, as discussões sobre a re-lação entre ciência e tecnologia emsaúde durante o Congresso mostra-ram, mais uma vez, a necessidadede se criar políticas para o setor. Uma

das preocupações, lembra ele, é es-tabelecer, dentre outros pontos,prioridades para a pesquisa em saú-de nos seus diferentes campos deatuação (biomédica, clínica e saú-de coletiva), bem como a necessi-dade de definição de recursos parao referido setor.

Falando sobre o trabalho já rea-lizado até o momento no Brasil,Goldbaum fez questão de ressal-tar a importância da Resolução n.º196/96, que trata das Diretrizese Normas Regulamentadoras dePesquisa Envolvendo Seres Hu-manos. Segundo ele, a resoluçãosignificou um grande avanço paranormatizar a ética nas pesquisasda área, além de ser a regra quedefiniu os critérios para a criaçãodos Comitês de Ética em Pesqui-sa (CEPs), responsáveis pela apre-ciação de toda a investigaçãoabrangendo seres humanos, den-tre outros aspectos.

Goldbaum, novo presidente –A nova diretoria da Abrasco, elei-ta em assembléia realizada duran-te o VII CBSC, em Brasília, játrabalha na organização dos pró-ximos eventos da associação. Sãoeles o II Encontro de CiênciasSociais em Saúde, previsto paramaio de 2004, no Rio de Janei-ro; o Congresso Brasileiro deEpidemiologia, agendado parajunho de 2004, em Recife; e oCongresso Brasileiro de SaúdeColetiva, em 2006, com data elocal a serem definidos.

Ades que assolam o País. Com esseobjetivo foi realizado o VII Con-gresso Brasileiro de Saúde Cole-tiva, na Universidade de Brasília(UnB), entre os dias 29 de julhoe 2 de agosto. Com o tema “Saú-de, Justiça, Cidadania”, o eventopromovido pela Associação Bra-sileira de Pós-Graduação em Saú-de Coletiva (Abrasco) registrou,neste ano, 6.380 trabalhos inscri-tos, cerca de 7 mil participantes e5 mil painéis.

Segundo o ex-presidente daAbrasco, José Carvalho de No-ronha, que deixou o cargo após oCongresso, “a Saúde Coletiva já éa segunda área da Saúde em nú-mero de pesquisas e pesquisado-res do CNPq (Conselho Nacionalde Desenvolvimento Científico eTecnológico), ficando atrás apenasda Medicina”. A produção cientí-fica na área passa pela reflexão nocampo das ciências sociais, pelassaúdes do trabalhador e da famí-lia, pelo controle social e até porpropostas alternativas de financia-mento do modelo assistencial.

Em meio aos debates, a bioéticatambém ocupou um lugar de des-taque. Ao todo, 33 trabalhos namodalidade pôster foram apre-sentados no Congresso, envol-vendo questões ligadas à bioética.Os temas englobavam a práticamédica, a biotecnologia, aespiritualidade, a clonagem, asmetamorfoses do corpo e suas

Acontece

Daniela Brito éjornalista do portal doMinistério da Saúde ecursa especializaçãoem Gestão de ONGsna Universidade deBrasília (UnB).

Marcus Santos éjornalista do portal doMinistério da Saúde.

Por Daniela Brito e Marcus Santos

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Não só as atividades própriasmovem as ações da entidade.Com vistas à 12ª ConferênciaNacional de Saúde, por exemplo,o esforço da Abrasco é no senti-do de criar subsídios consideran-do as teses elaboradas pelo Mi-nistério da Saúde.

Os novos dirigentes, que toma-ram posse no dia 1º de setembro de2003, em solenidade na Escola Na-cional de Saúde Pública (Rio de Ja-neiro), foram eleitos para um man-dato de três anos. O grupo respon-sável por coordenar as atividades daAbrasco neste período é coordena-do por Moisés Goldbaum (DMP/FM/USP). Os vice-presidentes sãoJúlio Müller Neto (ISC/UFMT),Madel Therezinha Luz (IMS/UERJ), Paulo Ernani GadelhaVieira (COC/Fiocruz), RômuloMaciel Filho (CPqAM/Fiocruz) eSoraya Maria Vargas Côrtes (DS/

UFRGS). O secretário-executivo éÁlvaro Hideyoshi Matida, e a secre-tária-executiva adjunta, MoniaMariani. O Conselho da Abrascopassou a ser composto por repre-sentantes do Instituto de Saúde Co-letiva/UFBA (Lígia Maria Vieira daSilva), do Departamento de Medi-cina Preventiva Social/FCM/UNICAMP (Djalma de CarvalhoMoreira Filho), da Faculdade deSaúde Pública/USP (AristidesAlmeida Rocha), do Núcleo de Es-tudos de Saúde Coletiva/UFRJ(Roberto de Andrade Medronho) edo Núcleo de Estudos em SaúdeColetiva NESCON/UFMG (Fran-cisco Eduardo de Campos).

A Abrasco pretende dar conti-nuidade ao trabalho que foi feitodurante o VII CBSC. Segundo onovo presidente da Associação,a proposta é atuar nos eixostemáticos que foram debatidos:

1) informação e comunicação emsaúde; 2) ciências sociais e saúde;3) modelos de atenção à saúde; 4)epidemiologia; 5) gestão do traba-lho em saúde; 6) ambiente, traba-lho e saúde; 7) controle social e di-reito à saúde; 8) ciência, tecnologia,inovação em saúde e insumos; 9)políticas, planejamento e gestão;10) gênero, etnia e saúde; 11) vi-gilância em saúde; e 12) progra-mas de saúde. O objetivo é de-senvolver esses temas em todas assuas perspectivas quanto à forma-ção de recursos humanos em saú-de, à produção, ao conhecimentoe à atuação política. Perspectivasestas sustentadas no tripé servi-ço/academia/política.

Mais informações sobre aAbrasco podem ser encontradasno site da associação, no endere-ço: www.abrasco.org.br.

Cadernosde Ética em 27Pesquisa

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Entrevista

Dra. Adela Cortina

Cadernos28 de Ética em

Pesquisa

Por Andrea Doré

Andrea Doré éjornalista, doutora emHistória e professorada UniversidadeFederal do Paraná(UFPR).

Cadernos de Ética em Pesquisa –A senhora defende que não sedeve desvincular a ética na pes-quisa da ética nas empresas,uma vez que aquela seria ren-tável também para as empresas.Isso se verificaria mais facil-mente nos países ricos, onde osinstrumentos de controle e aprópria cidadania estariammais consolidados. Mas comoestimular a ética nas empresasnos países em desenvolvimen-to e nos países pobres?

A ética é rentável nas empre-sas dos países desenvolvidos e nasempresas dos países em desen-volvimento. Claro que, nos últi-mos tempos, os exemplos maisimportantes de empresas que fra-cassaram por falta de ética estãonos Estados Unidos. Foram si-tuações nas quais se criou umaenorme desconfiança e umaenorme perda econômica para osenvolvidos. Mas, com a econo-mia globalizada, isso apenas de-monstra que a ética é rentável enão apenas nos países ricos. Nospaíses do Terceiro Mundo, umdos principais inconvenientes paraque não haja desenvolvimento éjustamente a corrupção, não sóno campo político, mas tambémna área econômica, nas relaçõesempresariais. A corrupção envol-ve sempre duas partes: as empre-sas e o poder político. Por isso, émuito importante que trabalhe-mos nesses países para conseguirque as empresas pequenas, mé-

dias e grandes atuem de acordocom normas éticas, porque, casocontrário, toda a população per-derá muito.

No caso das pesquisas pa-trocinadas e realizadas pelosgrandes conglomerados, nospaíses considerados ricos, per-cebe-se que a sociedade pres-siona para que tudo ocorraconforme os parâmetros éti-cos. Tal pressão não faria asempresas transferirem seus ex-perimentos mais polêmicospara países nos quais o poderde mobilização social é aindaincipiente e as comunidadescarentes, muitas vezes, estabe-lecem uma relação de depen-dência para com o setor davida econômica?

Dizer se é preciso pesquisar ouse é preciso alimentar me pareceum erro. Não se deve fazer umacoisa ou outra. Creio que as duasestão estreitamente ligadas. Evi-dentemente, nos países em viasde desenvolvimento, o mais ur-gente é conseguir que as pessoastenham educação, assistência sa-nitária, por exemplo. O impor-tante é capacitar os cidadãos,dar-lhes educação, saúde, paraque depois eles mesmos orientemsuas vidas como lhes parecermelhor. Eu creio, efetivamente,que isso é o básico. Um básicoque se consegue somente pormeio da democracia e da liber-dade, nunca pela imposição.

Atenta aosmovimentos

científicos, sociais epolíticos ora em cursono Brasil, especialmenteno que se referem aocampo da ética dasrelações e de seusvários componenteséticos, a professoraespanhola Adela Cortinaparticipou comoconferencista do VICongresso Mundial deBioética, realizado emBrasília (DF), emnovembro de 2002. Naoportunidade,apresentou seu trabalhoaos delegados erepresentantes dedezenas de países,conheceu um poucosobre o trabalhorealizado no nosso país –inclusive as ações daCONEP – e aindaconcedeu esta entrevistaexclusiva aos Cadernosde Ética em Pesquisa.

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Cadernosde Ética em 29Pesquisa

Creio também ser relevante queas empresas que decidam pes-quisar, que elas tenham capitalsuficiente para fazê-lo, que ten-tem levar adiante seus programascom base no respeito aos povose aos governos nacionais. Um as-pecto que sempre devemos levarem consideração, quando discu-timos temas como este, é que nomundo atual, infelizmente, há adependência das patentes. Issofaz com que os países pobres de-pendam dos países ricos, porquetêm de pagar pelas patentes deprodutos e tecnologias. E isso,claro, é uma injustiça radical. Nomeu entendimento, o que deve-ria ser feito é promover a pes-quisa em todos os países semprepriorizando aquilo que é mais im-portante para o ser humano. Omais importante não é promo-ver a investigação sobre a mani-pulação genética de seres huma-nos, mas a manipulação genéti-ca de plantas e animais buscan-do fortalecer a produção de ali-mentos. Desse modo, é funda-mental que haja a busca por es-ses tipos de pesquisa, para queos países em desenvolvimentonão tenham de depender das pa-tentes. Por outro lado, ao mes-mo tempo, há que se fazer umpacto global que consista em umponto básico: que as patentesnão sejam uma permissão que sepaga apenas economicamente,mas que também se possa pagarcom honras, distinções.

Em seu livro “A Ética doConsumidor”, lançado recen-temente e ainda não traduzi-do no Brasil, o poder do con-sumidor aparece como um as-pecto chave quando pensamosno que se pode classificar denecessidades criadas pela in-dústria. De maneira especial,nós nos referimos à indústriafarmacêutica. No entanto,novamente nos vemos diantede uma situação dicotômicaexistente em vários países:aquela que separa a popula-ção rica (com opção de con-sumir ou não consumir deter-minados produtos) da popu-lação desfavorecida economi-camente e ignorante de seupoder de escolha. Como ame-nizar esse impasse?

Essa é justamente uma partedo livro. Quando consumimos,não pensamos muito no porquêde consumirmos. E esta é a pri-meira questão: o consumo nãoé livre porque nós quase semprenão sabemos por que compra-mos isso ou aquilo. Então, umadas chaves fundamentais para en-tender o problema do consumoé enxergar neste processo o de-sejo consciente ou inconscientedo cidadão de, no ato da esco-lha e da compra, assumir o pa-pel do outro, de parecer o ou-tro. Podemos até dizer que, noafã de consumir, assumimos avontade de fazer parte da classesocial à qual gostaríamos de per-

tencer. Assim, muitas vezes osindivíduos preferem gastar seudinheiro com coisas considera-das supérfluas, fora de seusparâmetros reais de vida, do quecomer. Muitas vezes preferemconsumir coisas caras ao invésde pouparem para investir. Issoé o que ocorre em todos os paí-ses do mundo, inclusive naque-les em vias de desenvolvimento,onde tal fenômeno assume umaproporção terrível, atingindo ri-cos e pobres. O motivo dessedesequilíbrio é simples: as pes-soas são valorizadas pelo queconsomem, e todos nós quere-mos ter auto-estima em alta. Naminha opinião, eliminar isso éuma questão urgente e funda-mental. Para desativar esse pro-cesso, é necessário que nos de-mos conta de que as pessoas va-lem por si mesmas e não peloque consomem. A sociedade pre-cisa compreender que o maisimportante para ser feliz não épossuir, ter a posse, mas a ca-pacidade de manter relaçõeshumanas, estar com as pessoascom e pelo prazer. O mais im-portante, o que traz mais felici-dade, não se faz com bens deconsumo. Estamos absoluta-mente enganados e vivemosnuma correria por consumir,uma situação que também ocorrecom os medicamentos. NaEspanha, em muitas localidades,os hospitais têm pacientes queconsumiram remédios de que não

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Cadernos30 de Ética em

Pesquisa

precisavam, tomaram medica-mentos sem necessidade e, afi-nal, acabaram prejudicando aprópria saúde. Creio, então,que a grande revolução do sé-culo XXI será a revolução doconsumidor. O consumidor pre-cisa tomar consciência do querealmente quer consumir, doque é realmente valioso nas pes-soas, deixando de lado o quenão lhe interessa.

Que avaliação a senhora fariado papel do VI Congresso Mun-dial de Bioética para a efetivaçãode um projeto como esse, que éde longuíssimo prazo?

Para mim, as capacidades derefletir e pensar são fundamen-tais para se levar as utopias adi-ante. Pensar em voz alta. Nãodizer que alguma coisa é impos-sível. Quando não falamos dascoisas, porque já pensamos quesão impossíveis, não há solução.Acho que um congresso comoesse traz à luz tudo isso que, ago-ra, parece utópico. Nem tudo serealizará, mas é preciso dizer,deixar claro, o que é o justo. Equando algo é justo, é precisodizê-lo e torná-lo possível. Nãopodemos considerar o justo comouma utopia impossível, inatingí-vel. Lembremos que muito do

que parecia um sonho, anos atrás,hoje é uma realidade. Então, umencontro desse porte é fundamen-tal para suscitar o debate em tor-no de questões importantes, co-locando-as sobre a mesa. Nocaso do comportamento éticonas pesquisas envolvendo sereshumanos, há muito o que fazer.Não é possível que estejam ma-nipulando pessoas vulneráveis edesfavorecidas. É preciso legis-lar sobre isso. É preciso mudar amentalidade. Todos esses temasprecisam ser discutidos. E tudoisso vai fazer com que vejamos,daqui a algum tempo, mudançasque agora não sonhamos.