NEUROCIÊNCIA PEDAGÓGICA - A CIÊNCIA APLICADA À … · O conhecimento sobre o funcionamento do...
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
AVM FACULDADE INTEGRADA
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
NEUROCIÊNCIA PEDAGÓGICA - A CIÊNCIA APLICADA
À PRÁTICA EM SALA DE AULA
NO ENSINO FUNDAMENTAL
Por: Faní Russek Teruszkin
Orientador:
Professora Marta Pires Relvas
Rio de Janeiro
2011
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
AVM FACULDADE INTEGRADA
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
NEUROCIÊNCIA PEDAGÓGICA - A CIÊNCIA APLICADA
À PRÁTICA EM SALA DE AULA
NO ENSINO FUNDAMENTAL
Apresentação de monografia a AVM –
Faculdade Integrada, como requisito parcial
para obtenção do grau de especialista em
Neurociência Pedagógica.
Por: Fani Russek Teruszkin
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AGRADECIMENTOS
À professora Marta Pires Relvas que, desde o
seu primeiro livro, me despertou “para o
mundo das Neurociências”.
Aos meus alunos de todos os tempos, que
são a grande motivação da minha busca
incansável pelo conhecimento.
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DEDICATÓRIA
Aos meus pais que me deram todo o amor e
os cuidados necessários para que meu
cérebro se desenvolvesse saudável e feliz
como é hoje.
Às minhas irmãs Gladis, Beatriz, Regina e
Ester Lia, pelo nosso amor incondicional,
nossa amizade e nossa união e por serem o
meu maior presente.
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RESUMO
O professor de ensino fundamental tem enfrentado ao longo dos tempos,
grandes dificuldades na realização de seu trabalho em sala de aula, chegando
a sentir-se impossibilitado de conseguir que seu aluno supere as dificuldades
de aprendizagem e alcance êxito e sucesso em seu desenvolvimento integral.
O conhecimento sobre o funcionamento do sistema nervoso da criança, sobre
a influência dos distúrbios do neurodesenvolvimento no seu comportamento e
cognição e de que os danos no cérebro se refletem diretamente na sua
produtividade escolar, possibilita ao professor desenvolver um novo olhar para
muitas das questões da aprendizagem e principalmente, da não aprendizagem,
apontando técnicas, caminhos e estratégias para a resolução dos problemas
recorrentes nas salas de aula.
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METODOLOGIA
O presente estudo tem como base de produção a bibliografia de autores
nacionais e estrangeiros, que desenvolvem estudos atualizados das
Neurociências, com aprofundamento naqueles que enfatizam a sua
aplicabilidade na educação. Estes textos, junto aos trabalhos desenvolvidos no
decorrer do curso de Neurociência Pedagógica, proporcionaram a reflexão
necessária para a elaboração de um trabalho aprofundado e bem
fundamentado.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 7
CAPITULO I
OS DESAFIOS DO PROFESSOR DO ENSINO FUNDAMENTAL 9
CAPITULO II
A INCLUSÃO DA NEUROCIÊNCIA PEDAGÓGICA NO CURRÍCULO
DOS CURSOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES 15
CAPITULO III
AS DISFUNÇÕES DO NEURODESENVOLVIMENTO E A INSUFICIÊNCIA
DE RENDIMENTO 21
CAPITULO IV
A NEUROCIÊNCIA FACILITANDO E ACELERANDO A APRENDIZAGEM
EM SALA DE AULA 28
CONCLUSÃO 33
BIBLIOGRAFIA 36
7
INTRODUÇÃO
“Não é o conhecimento, mas o conhecimento do conhecimento que cria
o comprometimento.” (Maturana, Humberto. 2005)
A grande maioria dos professores de ensino fundamental desconhece as
razões que atrapalham o êxito de seus alunos, atribuindo suas dificuldades de
aprendizagem, invariavelmente, à falta de interesse, de atenção, e até mesmo
à preguiça. “Esse aluno não quer nada!” É uma frase que se escuta, várias
vezes ao dia, em grande parte das escolas de ensino fundamental, quando os
professores se referem àqueles alunos que apresentam baixo rendimento
escolar.
Essa expressão, que é quase um desabafo, vem acompanhada de um
sentimento de impotência e de um “não sei mais o que fazer” diante de um
problema recorrente e aparentemente insolúvel.
Pouca coisa, no entanto, esse mesmo professor busca conhecer sobre como o
cérebro de seu aluno processa as informações que recebe; quais estruturas
estão envolvidas nesse processo, quais fatores interferem na aquisição,
assimilação e acomodação das novas informações, quais as causas do seu
comportamento inadequado, da sua insatisfação visível em estar na sala de
aula, do seu olhar ausente, de seu desânimo, de sua desmotivação.
Pouco sabe o professor sobre o universo infantil, sobre suas experiências tão
marcantes vividas desde antes de nascer, sobre as influências de suas
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vivências nos primeiros anos de vida, sobre o quanto a criança sofre, também,
influência das experiências vividas por seus pais, influências perceptíveis
agora, não apenas na área psicológica, mas no desenvolvimento físico e
mental e o quanto tudo isso provoca um impacto significativo na sua formação
e consequentemente no seu rendimento dentro e fora da escola
A maioria dos educadores mantém seu foco de trabalho nos conteúdos a
serem disponibilizados ao aluno, oferecendo o “conteúdo pelo conteúdo”, sem
significação, sem contextualização e sem uma participação ativa do aluno na
apropriação destes.
Na sua visão tradicional, estes professores acreditam que é suficiente estar
bem informado sobre a sua matéria para “transmiti-la” ao aluno que, se “tiver
interesse”, “naturalmente” irá aprender.
Atualmente, sabe-se que o conhecimento não é adquirido, mas construído,
numa relação mediadora entre o professor e o aluno, em que sejam ofertados
experimentações, abertura à fala e participação da criança, numa relação de
respeito pelo outro, que começa pelo olhar do professor, pela qualidade da
mediação realizada, pela sua formação profissional e seu conhecimento
pedagógico atualizado.
Hoje, graças ao avanço tecnológico, é possível construir uma ponte entre as
incríveis descobertas da Neurociência e a ação efetiva de professores e alunos
na sala de aula.
Estudando o neurodesenvolvimento, o professor será capaz de apontar as
lacunas que podem estar associadas a dificuldades de aprendizagem
capacitando-se a manter, a partir desse conhecimento, uma nova postura
diante de seu aluno e de seu próprio exercício profissional.
Conhecendo e acreditando no fantástico potencial cerebral das crianças, torna-
se possível para o professor transformar sua sala de aula num lugar
impregnado de mundo e de vida, onde os alunos serão constantemente
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desafiados a usar a mente para pensar, criar, investigar, produzir o novo, rir, se
emocionar, realizar.
CAPÍTULO I: OS DESAFIOS DO PROFESSOR
DO ENSINO FUNDAMENTAL
Ao ingressar no importantíssimo ofício de educador do ensino fundamental o
professor encontra o desafio de encarar uma turma de alunos ansiosos e
curiosos diante de alguém que deverá ser, a partir daquele dia, a pessoa que
irá nortear sua aprendizagem, além de servir de “modelo” e até mesmo, muitas
vezes, de ídolo.
“Uma das grandes preocupações que o professor educador tem como alicerce
da sala de aula é: Como fazer o meu aluno aprender?” (Relvas, 2010)
Na maioria das vezes esse professor pouco ou nada sabe das crianças que
estão ali à sua frente, com aqueles olhinhos arregalados, aguardando o
surgimento daquele ser “misterioso” e “fantástico” que está entrando na sua
vida cercado de expectativas dele e da sua família.
“A professora, na maioria das vezes, não é
vista como uma uma pessoa que sabe o
que eles não sabem, que fala enquanto
eles têm que ficar quietos, que fala bonito e
diz que eles falam errado, que castiga
quando eles se comportam mal e que
reprova quando eles não conseguem
aprender o que tem que ser aprendido.”
(Ceccon, 1982)
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O professor, por sua vez, percebe aqueles olhares e se sente intimidado diante
de tanta responsabilidade. Indaga-se sobre estar realmente ou não, preparado
para desempenhar com maestria o tanto que é esperado dele. Reconhece que
é uma tarefa difícil, uma verdadeira “missão quase impossível”.
Ele já sabe que nos dias de hoje não basta conhecer os conteúdos que irá
trabalhar com as crianças; é preciso também acompanhar os avanços
tecnológicos, pois suas aulas não poderão ficar atrás de todo aquele aparato
que os meninos e meninas encontram dentro e fora de suas casas, qualquer
que seja o seu nível social, e que se transformaram nos maiores rivais da
escola.
Ele tem plena consciência que suas aulas devem ser interessantes, criativas,
estimulantes, participativas, terem todo um dinamismo que atraia a atenção da
criança e promova seu desenvolvimento integral.
Esse professor vai para a sala de aula, cheio de entusiasmo e até excitação;
seu “furor pedagógico” faz com que acredite que terá êxito total; suas aulas
serão brilhantes e todos os seus alunos terão um ótimo desempenho.
Terminará o ano letivo feliz e acreditará que escolheu a profissão certa e que
tem grande talento para o ofício.
“O professor acredita no mito da transferência do
conhecimento: o que ele sabe, não importa o nível
de abstração ou de formalização, pode ser
transferido ou transmitido para o aluno. Tudo o
que o aluno tem a fazer é submeter-se à fala do
professor: ficar em silêncio, prestar atenção, ficar
quieto e repetir tantas vezes quantas forem
necessárias, escrevendo, lendo, até aderir em sua
mente, o que o professor deu.” (Becker, 2001)
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Não são necessárias muitas aulas para seus sonhos despencarem. Em poucos
dias percebe que aquelas crianças, antes tão vibrantes e apaixonadas,
tornaram-se frias, distantes, desestimuladas, indisciplinadas. As aulas se
tornaram intermináveis, o “tempo não passa”, e, assim como seus alunos, ele
também perdeu o viço e o encantamento pela escola.
Sente-se enfraquecido e despreparado para dar um novo rumo para o seu
trabalho, uma vez que não tem conhecimentos suficientes para lidar com todas
as demandas que surgem na sala de aula: alunos que aparentam distúrbios
que ele não sabe identificar, alunos que agridem verbalmente e fisicamente os
colegas, alunos que não obedecem às regras, alunos agressivos com o próprio
professor, alunos que dormem durante toda a aula, alunos apáticos e
indiferentes a tudo que lhes é proposto e alunos que “simplesmente” não
aprendem.
“No dia-a-dia da sala de aula, o professor fica
surpreso em constatar que os alunos
desenvolveram uma série de condutas. Algumas
que nem parecem muito lógicas! Como
compreender o que o aluno faz ou quis fazer?
Como ajudá-lo mais diretamente em suas
aprendizagens? Como adaptar o ensino às
necessidades reais observadas?” (Perreaudeau,
2009)
O curso de Pedagogia ou de Normal Superior não lhe capacitou
suficientemente, mas ele só percebeu isso quando teve que enfrentar a prática
em sala de aula. Nesse momento ele tem duas opções: acomodar-se e se unir
ao coro dos inconformados pelos “baixos salários e péssimas condições de
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trabalho”, caindo no marasmo e permitindo que a bola de neve cresça cada vez
mais e a educação caia ainda mais profundamente no abismo, ou, ao contrário,
ampliar suas informações, superar as suas frustrações em busca de um
objetivo maior, além de buscar tudo o que desconhece e tentar recuperar o
tempo perdido.
“Vivemos em tempo de ressignificações, de
profundas mudanças, de contestações de toda
ordem, de descobertas da ciência e de crise da
sociedade moderna. Época marcada pela
transitoriedade, pela busca de novos sentidos e
de novas práticas. Práticas que sejam mais
próximas da contingência histórica da condição
humana e que contribuam para a reconstrução do
atual contexto.” (Silva, 2003)
É construindo uma ponte entre a sua prática e as incríveis descobertas da
Ciência e do Cérebro, que o professor tornará possível desenvolver um ensino
cuja proposta seja: montar ambientes escolares alegres, seguros, ricos de
estímulos, respeitando diferentes estilos de aprendizagem, reconhecendo e
valorizando as múltiplas habilidades de seus alunos, estabelecendo altas
expectativas de desempenho, promovendo uma aprendizagem ativa
contextualizada, a partir de experiências significativas, ao redor de temáticas e
projetos cuja resolução de problemas reais seja relevante para a vida.
“Quando compreendem que a aprendizagem
envolve cérebro, corpo e sentimentos, os
professores adotam uma ação mais competente,
levando em conta as influências das emoções
para o desenvolvimento na construção do
conhecimento.” (Relvas, 2009)
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Assim, entende-se que o estudo das Neurociências capacita os professores, e
a todo profissional que trabalha com a criança, a compreender a raiz das suas
defasagens, os processos através dos quais ela aprende, as formas de
estimulá-la e a maneira produtiva de intervir no seu desenvolvimento integral.
O desafio do professor, hoje, é se reinventar; voltar a ser aluno e aprender
junto com os seus alunos. Mas isso também não significa transferir para o
aluno toda a responsabilidade de construir, sozinho, seu conhecimento. As
idéias sobre construção do conhecimento têm sido defendidas há alguns anos
dentro da educação, principalmente nas séries iniciais, e compreendidas
erradamente por grande parte da comunidade educativa. O grande engano foi
que o “Construtivismo” não se trata de um método, como foi entendido, mas
sim de pressupostos embasados nas idéias de Piaget, que geraram a idéia
errônea de que o aluno já tem um saber que ele precisa apenas trazer à
consciência, organizar e ampliar, sendo o professor um mero “auxiliar” que
deve interferir o mínimo possível.
“Nesse modelo pedagógico, qualquer ação que o
aluno decida fazer é, a priori, boa, instrutiva. É no
regime do laisse-faire: deixar fazer, que ele
“encontrará o seu caminho”. O professor deve
“policiar-se” Ou ele aprende uma forma mais
“subliminar” de exercer o poder ou ele “sucumbe”.
(Becker, 2001)
É evidente que uma revisão criteriosa nessa forma de trabalho pedagógico é
indispensável e é necessário que seja imediata. Como sempre é preciso
aprofundamento e clareza para que não continuem acontecendo interpretações
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confusas que acabam por trazer danos muitas vezes irreversíveis ao
desenvolvimento cognitivo das crianças.
O professor precisa ter pensamento estratégico. Planejar, executar e obter
resultados. Fazer auto-avaliação constante. Desenvolver valores,
conhecimento e competências. Ter compromisso e consciência da excelência
do seu trabalho e aprender mais e mais, sempre. Acompanhar as
transformações na área educacional e tecnológica. E acima de tudo, conhecer
o cérebro de seu aluno, porque é nele que está guardado todo o segredo das
aprendizagens que ocorrem e das que não ocorrem.
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CAPÍTULO II – A INCLUSÃO DA NEUROCIÊNCIA
PEDAGÓGICA NO CURRÍCULO DOS CURSOS
DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Todo o professor de ensino fundamental necessita conhecer o caminho
fascinante do processo de formação do cérebro e da personalidade da criança,
para assim compreender melhor o seu aluno, as suas reações, onde se
localizam as raízes das suas dificuldades, não para medicalizar as situações de
não aprendizagem, mas, ao contrário, para tentar adotar atitudes e
metodologias que façam com que a criança supere ou minimize suas
defasagens.
Esse profissional necessita sentir-se produtivo em sua prática, para não agir de
forma leviana e impensada, o que pode causar traumas ainda maiores em seu
aluno.
“Quando o rendimento de alguém é muito
baixo, não devemos acusar ou culpar essa
pessoa. Ao contrário, devemos imaginar o
que pode estar atrapalhando seu
rendimento, obstruindo sua tendência
natural inata a produzir.” (Levine, 2003)
Uma mudança de postura só pode acontecer se o profissional estiver apto a
identificar as fraquezas específicas que frustram tantos alunos. Impossível agir
sobre aquilo que se desconhece.
Acredita-se que as pesquisas em andamento nas áreas das Neurociências
poderão oferecer cada vez mais subsídios para que os professores saibam
lidar com questões de dificuldades de aprendizagem de seus alunos, por isso,
torna-se indispensável que a Neurociência Pedagógica seja uma disciplina do
currículo dos cursos de Pedagogia e Normal Superior.
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Graças ao avanço da neurologia e áreas afins, aprendeu-se bastante e
continua-se a aprender sobre o funcionamento do cérebro, inclusive como,
onde e quando se dá sua atividade. Crianças que foram geradas em ambientes
fracos em estímulos, em ambientes hostis, com mães que ingerirem álcool e
drogas durante a gravidez, fatalmente terão seu desenvolvimento prejudicado o
que vai refletir no seu fraco desempenho social, emocional e intelectual. Tal
questão deve ser amplamente discutida e estudada por aquele que irá mediar o
processo de aprendizagem de crianças oriundas desses lares.
“O segredo da aprendizagem reside em nosso
cérebro, que armazena todas as nossas
experiências de vida, emoções, sensações; enfim;
tudo o que aprendemos na vida. Seu limite de
armazenagem é inesgotável e você pode
processar a informação através da linguagem,
além de colocar emoção e criar uma forma de
comunicação adequada ao seu estilo de viver,
pensar e interpretar a realidade”. (Mario Bonamici
- Sociedade Brasileira de Neurociências)
Muitos estudantes lutam com problemas de aprendizagem que são totalmente
transparentes, manifestam problemas óbvios de leitura, raciocínio matemático,
resolução de problemas, dificuldades na escrita, indisciplina. Mas há um
contingente considerável de alunos com problemas menos óbvios no circuito
cerebral, e seus problemas são negligenciados e incompreendidos. São
indivíduos que lutam contra a insuficiência de rendimento, fenômeno que pode
dizimar a sua produtividade na escola e levá-los ao fracasso no mercado de
trabalho quando adultos. Algumas situações que merecem ser estudadas com
mais afinco pelos profissionais de educação:
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Os possíveis obstáculos motores – Há vários meios diferentes através dos
quais as disfunções motoras podem atrapalhar o rendimento de um aluno. Três
deles merecem uma atenção mais minuciosa dos professores: Em primeiro
lugar, a coordenação motora grossa, que utiliza principalmente os grandes
músculos do tronco, dos braços e das pernas e que consiste na agilidade
muscular dos movimentos amplos. Em segundo lugar, a coordenação motora
fina, que recruta os dedos para realizar tarefas. Grande parte dessa
coordenação é estrategicamente acompanhada pelos olhos, a denominada
coordenação olho-mão. Em terceiro a coordenação grafo motora, o tipo de
capacidade para escrever e que não está, necessariamente, associada à
coordenação motora fina, embora os dedos façam o trabalho em ambos os
casos.
“A função grafo motora utiliza
caminhos neurológicos diferentes dos
responsáveis pela coordenação motora
fina. Muitas crianças têm problemas
motores porque não conseguem uma
resposta motora para um estímulo visual
ou verbal.” (Levine, 2003).
O professor que tem esse tipo de informação saberá que o seu aluno que tem
um desempenho ruim, por exemplo, cuja letra é ilegível, pode ter problemas
para formar as letras muitas vezes porque não as percebe com muita exatidão,
e, em alguns casos, consegue visualizar a letra vagamente, às vezes
aparecendo e desaparecendo, resultando numa escrita dolorosa, hesitante,
trabalhosa e inconsistente, demonstrando uma desorientação visual para a
formação das letras. Na maioria das vezes, esse aluno desiste de escrever,
diante de tamanha dificuldade e é visto como preguiçoso e desobediente, já
que não consegue explicar ao professor nem a si mesmo, sua dificuldade.
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“O seu olhar, professor, produz alterações
no corpo da criança... O olhar de um
professor tem o poder de fazer a
inteligência de uma criança florescer ou
murchar. Ela continua lá mas se recusa a
sair para a aventura de aprender.” (Alves,
2002)
Problemas de memória – Grande parte do rendimento escolar depende da
constante produção de conhecimento e habilidades, que emanam das
memórias de longo prazo. Os estudantes têm que arquivar e recuperar grandes
quantidades de informações. As atividades de escrita são as que mais
consomem os recursos de memória e algumas crianças não têm a capacidade
de memória para dar apoio à escrita; alguns têm problemas com os sons da
escrita, ou seja, não têm consciência fonológica. Sua ortografia revela essa
confusão, à medida que combinam letras e não conseguem representar sons
da linguagem com precisão. Alguns estudantes são muito mais preparados do
que outros para arcar com a carga de memória exigida na escola. Muitas
vezes, a imprecisão ortográfica é apenas a manifestação de um problema mais
básico de recordação de informações.
Problemas de controle de energia mental – Sabe-se hoje que, assim como os
trabalhos físicos, o trabalho mental também esgota nossa energia. Estudar,
redigir um texto, resolver um problema matemático ou memorizar regras, exige
um grande esforço. O fluxo de energia mental fica normalmente sob o rígido
controle da atenção, que administra muitas atividades e funções importantes do
cérebro, incluindo o controle de energia mental. Muitas crianças com baixo
nível de energia mental, tentam se manter atentas, substituindo a baixa energia
mental, pela energia física. Elas ficam irrequietas, contorcem o corpo, não
param no seu lugar, numa tentativa desesperada de conseguir um grau de
concentração que a escola exige. Os quatro principais controles básicos de
energia mental – atenção, esforço mental, despertar do sono e constância -
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estão situados no tronco cerebral, na base do cérebro. Quando o controle da
energia mental não funciona, a concentração é superficial, instável e fluída. O
estudante, então, não consegue sentar e ficar atento às explicações do
professor por mais de alguns minutos, adotando um comportamento de
aparente indisciplina, por mais que se esforcem para superar essa falta de
energia.
Fraca produção da linguagem – Existem inúmeras peças no quebra-cabeças
da produção da linguagem. Algumas pessoas com problemas de articulação
da fala, na infância, parecem ter grande dificuldade para acompanhar as
demandas de produção linguística ao longo da vida. Outro agravante é a falta
de vocabulário e a pouca capacidade de acessar prontamente na memória de
longo prazo as palavras certas necessárias à produção da fala e da escrita.
Algumas crianças sofrem de uma dificuldade crônica de pensar na palavra
certa com a rapidez correta durante o diálogo ou enquanto elaboram um
argumento ou uma explicação. Uma criança com lacunas na linguagem oral,
costumam passar desapercebidas, mas mesmo as mais simples desse tipo,
criam efeitos turbulentos no comportamento e na aprendizagem das crianças.
Fraca geração de idéias – A verdadeira criatividade envolve originalidade,
imaginação e novas abordagens. Ás vezes, as crianças não receberam,
durante seus primeiros anos de vida, a ajuda necessária com a ideação; não
foram estimulados a pensar criticamente, a expor suas idéias, a argumentar, a
participar de uma simples conversa, a opinar e acabaram por perder um
aspecto crucial da formação da sua educação. Essas condições afetam o modo
como a criança interpreta o mundo, influenciando não só o seu aproveitamento
escolar como até a sua conduta.
Problemas com a administração do tempo: Existem muitos estudantes com
fraco rendimento porque tem um diminuído sentido de tempo e sincronização.
Eles têm problemas em alocar a quantidade correta de tempo para acabar as
tarefas e em estimar quanto tempo irão levar para concluí-la e ainda saber se
estão dentro do prazo ou não. Problemas com administração do tempo,
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incluindo problemas com pontualidade, dificuldade crônica no cumprimento dos
prazos podem resistir aos esforços mais bem intencionados de melhora. A
cobrança por um resultado rápido desencadeia uma poderosa onda de es-
tresse. E aquele projeto complicado faz com que a ansiedade mande
constantes mensagens de alerta para o cérebro, ativando a produção de
neurotransmissores que podem acelerar ou enfraquecer ainda mais a
produtividade da criança.
Crianças privadas de condições de vida ideais e da nutrição adequada correm
o risco de ter todos os tipos de dificuldades de aprendizagem, principalmente
insuficiência de rendimento. Pressioná-las para serem produtivas em salas
super lotadas e com profissionais pouco preparados é tanto inútil quanto
violento para professores e alunos. Se, além disso, essas crianças carregam o
estresse de virem de lares desfeitos, viverem em bairros violentos e receberem
cuidados médicos preventivos inadequados, as chances contra o rendimento
produtivo são potencializadas.
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CAPÍTULO III – AS DISFUNÇÕES DO
NEURODESENVOLVIMENTO E A
INSUFICIÊNCIA DE RENDIMENTO
Todo o professor precisa saber que o desenvolvimento do cérebro humano tem
início na concepção e continua durante toda a idade adulta e que esse
desenvolvimento, além de depender de vários fatores, irá influenciar
profundamente o processo de aprendizagem de seu aluno.
“É absolutamente necessária a
conscientização, o conhecimento de que fatores
emocionais, fisiológicos, sociais e culturais, terão
reflexos estruturais, químicos e elétricos sobre um
cérebro altamente plástico e mutável,
características essas encontradas principalmente
na criança e no jovem. (Domingues, 2007)
Um breve resumo do processo de neurodesenvolvimento pode mostrar o
quanto o cérebro está sujeito a constantes modificações na sua estruturação e
fisiologia. Se, em qualquer ponto, esse desenvolvimento cerebral for
interrompido em seu processo contínuo de ativação, partes do cérebro poderão
não se desenvolver normalmente, causando alterações que serão
responsáveis por muitas dificuldades de aprendizagem.
a) A neurulação, que dará origem ao Sistema Nervoso: placa neural, tubo
neural, encéfalo primitivo, acontece na fase inicial da embriogênese, tem seu
início aos dezoito dias após a concepção.
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b) A neurogênese que é a formação dos neurônios com sua estruturação e
constituição completas: dendritos, corpo celular, axônio e botões sinápticos, se
inicia aos trinta dias com término aos cinco meses de vida intra-uterina.
c) A migração que é o caminho percorrido pelos neurônios após a sua
formação, sofrendo orientação para áreas que serão correspondentes à sua
função, por exemplo, neurônio auditivo para o córtex auditivo, neurônio olfativo
para o córtex olfativo, etc. O início se dá aproximadamente aos quarenta dias
de vida intra uterina até os quatro meses depois do nascimento. “Erros de
migração causam emaranhados de fios que levam a alterações de percepção”.
(Domingues, 2007).
d) A apoptose ou suicídio neural, é o processo de eliminação dos neurônios por
um mecanismo de autodestruição com o intuito de seleção e sobrevivência dos
neurônios mais aptos e saudáveis. Tem início aos dois meses de vida intra-
uterina e término com um ano e meio pós-natal.
e) A mielinização é o processo de formação da bainha de mielina que é o
envoltório do axônio e responsável por sua proteção, velocidade de
transmissão do impulso nervoso e maturação neural. A formação da bainha de
mielina tem grande influência nas diferentes fases maturativas do indivíduo e
consequentes manifestações motoras, comportamentais, cognitivas e
emocionais. A mielinização tem início aos três meses de vida intra uterina e e
permanece com menor intensidade ao longo da vida.
f) A sinaptogênese é o processo de comunicação que acontece entre os
neurônios e onde ocorre a neurotransmissão, promovendo a intercomunicação
e as inter-relações dos estímulos captados. Inicia nos cinco primeiros meses de
vida intra uterina, e se estende por toda a vida dependendo do uso, ou seja, da
estimulação dos neurônios.
g) A arborização dendrítica é a formação dos dendritos dos neurônios e de
seus colaterais, que da mesma forma, está diretamente ligada aos estímulos e
ao uso. Inicia aos cinco meses de vida intra uterina e permanece mais lenta, ou
não, por toda a vida.
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h) A eliminação competitiva ou reestruturação, que é o processo de poda das
ramificações não utilizadas, ou seja, é a eliminação pelo desuso, podendo ser
substituídas por outras. Inicia aos quatro meses após o nascimento,
permanecendo por toda a vida, estando diretamente ligada aos estímulos
provocados pela cultura e educação.
Durante a infância as regiões do cérebro tornam-se cada vez mais
especializadas e novas conexões formadas nessas áreas cooperam para que
se estabeleçam níveis superiores de pensamento, através de associações que
podem ser geradas. As crianças se tornam cada vez mais capazes de fazer
coisas que não faziam antes, graças ao processo contínuo de amadurecimento
cerebral. Por exemplo, os bebês aprendem a falar e a andar, porque as
conexões neurais necessárias são formadas entre um e dois anos de idade. E
em alguns anos o cérebro desenvolve-se a ponto de as crianças poderem
assumir desafios cada vez mais sofisticados, tal como a leitura que envolve a
atividade coordenada de quatorze áreas do córtex cerebral, incluindo as
envolvidas na visão, no processamento da linguagem, na fala e na audição.
“O século XX foi notável para o estudo do
cérebro. Verdadeira “caixa preta” para a
compreensão sobre seu funcionamento, o
cérebro pode afinal ser despido e visto
como podemos, através do raio X.”
(Relvas, 2008)
Com o uso de tecnologia por imagem, os cientistas identificaram três padrões
que ocorrem com particular frequência em pessoas com dificuldades
acadêmicas. Um desses padrões se refere ao fato de que o hemisfério
esquerdo se especializa nas funções da linguagem e as pessoas que
apresentam problemas nessa área do cérebro, têm fraco desempenho na
leitura, escrita e ocasionalmente, na fala. Esses alunos, normalmente, também
têm dificuldade nas tarefas que envolvem lógica e análise pois geralmente
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assumem uma abordagem “global” para os problemas, não conseguindo
distinguir as etapas que se seguem para chegar à sua solução ou a um produto
final.
O segundo padrão que ocorre em indivíduos com dificuldades de
aprendizagem, é que pessoas com deficiências no hemisfério direito, podem ter
problemas com o senso de tempo, consciência corporal, orientação espacial,
percepção e memória visual, já que o lado direito do cérebro geralmente
organiza e processa informações não-verbais. Os estudantes que exibem esse
padrão, lidam bem com detalhes, mas podem ficar tão presos a eles que não
percebem o ponto mais importante da lição.
O terceiro padrão se refere à hipoatividade que pode ocorrer nos lobos frontais.
Esses governam o comportamento motor e também incluem regiões envolvidas
no planejamento e no julgamento, no foco da atenção, na organização e na
avaliação de informações assim como na moderação das emoções. Quando
essas regiões não estão funcionando de maneira eficiente, as crianças
apresentam problemas de coordenação muscular, articulação, controle dos
impulsos, planejamento, organização e manutenção da atenção. Tais tipos de
problemas criam a impressão de imaturidade geral, mesmo quando as crianças
são capazes de funcionar em um alto nível intelectual.
Nem todos os problemas de desenvolvimento, no entanto, implicam em uma
anatomia irregular. Os especialistas acreditam que alguns indivíduos
desenvolvem dificuldades de aprendizagem porque partes de seus cérebros se
desenvolvem de forma mais lenta do que o normal. Alem disso, padrões
irregulares de desenvolvimento cerebral também podem ser geneticamente
determinados.
Esse fato aponta para a relevância e influência dos estímulos durante o
neurodesenvolvimento, que podem ser de qualidade ou, ao contrário,
altamente deficitários. Por exemplo, no primeiro trimestre do desenvolvimento
embrionário o feto é particularmente afetado por neurotoxinas como fumo,
chumbo, alumínio e mercúrio. A síndrome alcoólica fetal, entre outros danos,
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“queima” neurônios, e provoca déficits comportamentais e de função cognitiva.
Por sua vez, a subnutrição da gestante gera crianças com cérebro menor.
Especificamente a carência de ferro na alimentação produz profundos efeitos
nas funções motoras e cognitivas. Da mesma forma, a estimulação proveniente
de um lar violento, afetado pelo consumo excessivo de bebidas alcoólicas,
agressões e intimidações, gera sequelas profundas e até irreversíveis no
desenvolvimento das crianças
“Os experimentos mostram que o estresse
pré e pós natal, causado pela negação do
afeto materno influem notavelmente no
desenvolvimento do cérebro; têm em longo
prazo, efeitos concretos sobre o
desenvolvimento da estrutura periférica do
cérebro, do córtex e de algumas partes do
cerebelo.” (Domingues, 2007)
Existem inúmeras disfunções que privam muitos estudantes do sucesso.
Crianças que sofrem com dificuldades de aprendizagem são vítimas inocentes
de sua desorganização cerebral, com limitações específicas em áreas da
mente que controlam aspectos da memória, atenção, percepção, linguagem,
função motora, enfim, todos os processos necessários para o domínio da
aquisição das aprendizagens escolares. Algumas dessas lacunas, como foi
visto anteriormente, são inatas, outras se originam, principalmente, pelas
condições ambientais.
O baixo rendimento motor é um sério problema, enfrentado por alguns alunos,
e muitas vezes não identificável facilmente em sala de aula. A criança pode
apresentar dificuldades com a coordenação motora grossa, tendo prejudicada a
sua habilidade muscular; pode ter problemas com a coordenação motora fina,
causando dificuldades até em segurar o lápis e executar tarefas mais
delicadas, e ainda com a coordenação grafomotora, necessária para escrever,
26
e que utiliza caminhos neurológicos diferentes da coordenação motora fina.
Todas as ações motoras intencionais dependem de algumas funções que
levam à atividade muscular eficiente. São elas: estabelecimento de um objetivo
motor; o processamento das informações externas para ajudar a conduzir o ato
motor, lembrança e aplicação dos movimentos armazenados; ativação dos
músculos certos na ordem certa, com energia suficiente para realizar a
atividade proposta; monitoramento dos movimentos realizando os ajustes
necessários e o aprendizado com experiências motoras.
“O fluxo da energia mental normalmente
fica sob o rígido controle da atenção, que é
a administradora de muitas atividades e
funções importantes do cérebro, incluindo
o que se pode chamar de controle de
energia mental.” (Levine, 2003)
Quando o aluno tem dificuldade em uma dessas funções, a corrente é
interrompida e o resultado prejudicado, provocando muitas vezes falsas
interpretações e duras críticas por parte do professor que julga seu alunos
preguiçosos e desinteressados.
Vários estudantes apresentam problemas facilmente identificáveis: leitura,
raciocínio matemático, porém, há um contingente considerável de crianças com
problemas menos óbvios, que muitas vezes são negligenciados e
incompreendidos.
Grande parte do rendimento escolar depende da constante produção de
conhecimentos e capacidade de armazenamento, que provém das memória de
longo prazo. As exigências de memória impostas às crianças na escola são
enormes; diariamente um material novo e desconhecido deve ser classificado,
armazenado na memória e localizado instantaneamente quando solicitado e
nem sempre todos os alunos são, naturalmente, tão preparados para isso,
vindo a sofrer com o fracasso escolar.
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“Sabemos que algumas crianças vão para
a escola com sua capacidade de lembrar
as informações já firmemente
estabelecidas; outras não são tão
afortunadas.” (Sprenger, 2008)
Muitos fatores afetam a capacidade dos alunos de reter informações, mas, sem
dúvida, é a atenção o processo cognitivo que permite à criança controlar os
estímulos irrelevantes, perceber os importantes e passar de um estímulo para
outro. Sem que o aluno esteja consciente da informação que chega ao cérebro,
a aprendizagem não tem como acontecer.
A insuficiência de rendimento não é um transtorno em si, mas o resultado de
uma ou mais disfunções do neurodesenvolvimento. O baixo rendimento
acontece quando essas disfunções interferem na produtividade. Trata-se de um
fenômeno bastante comum, que causa, problemas de todo tipo de
aprendizagem, dos mais simples aos mais complexos. Estudantes que
manifestam insuficiência de rendimento têm uma bagagem misturada de
disfunções e pontos fortes de neurodesenvolvimento. Alguns têm sérios
problemas para se organizar; outros têm dificuldades para transformar
pensamentos em palavras; há os que não conseguem dispor seus músculos de
forma eficiente e coordenada; há os que não lembram daquilo que estudaram,
porém todos enfrentam fortes barreiras para superar aquilo que obstrui seu
acesso para a aprendizagem. Na maioria das vezes, sequer identificam ou
sabem lidar com suas verdadeiras barreiras e são injustamente acusados de
preguiçosos ou desinteressados, o que os leva frequentemente a desistir de
tentar superar-se já que passam a desacreditar de sua própria capacidade.
28
CAPÍTULO IV – A NEUROCIÊNCIA FACILITANDO
E ACELERANDO A APRENDIZAGEM
EM SALA DE AULA
“Agora que temos dados científicos sobre
como se desenvolve o cérebro da criança,
várias lições emergem. Uma delas é uma
advertência e outras sugerem maneiras
diferentes de ver o mundo e de estimular o
desenvolvimento do cérebro do seu aluno,
de forma mais natural”. (Eyer, 2006)
O professor deverá usar de cautela e não se deixar influenciar pela exagerada
exposição da mídia que promete “milagrosas” maneiras de explorar o cérebro
tanto daquela criança que apresenta um bom desenvolvimento intelectual e
que, segundo promessas duvidosas, poderá tornar-se uma criança super-
dotada, quanto daquele menino ou menina que apresenta um fraco e difícil
desempenho escolar. É preciso, por parte do educador consciente, um estudo
profundo e criterioso em bibliografias sérias e conceituadas para assegurar-se
de estar capacitando-se em fontes confiáveis e que merecem sua credulidade
e confiança.
Estando preparado e capacitado para trabalhar em sala de aula, não somente
dentro de sua disciplina, mas também expandindo conhecimentos e ampliando
saberes em todas as áreas, o professor irá promover um trabalho realmente
eficaz junto aos seus alunos, além de sentir-se seguro para refletir sobre
prováveis causas da insuficiência de rendimento: “Será um colapso motor?
Será uma limitação de memória de trabalho ou de longo prazo? Será um
29
problema de produção verbal? Haveria uma deficiência na geração de idéias,
por não estar conseguindo fazer associações? Haveria um fraco controle de
energia mental, portanto uma capacidade de trabalho reduzida? Haveria um
problema de controle de produção? Haveria uma insaciabilidade ou distração
social obstruindo o rendimento? Haveria um problema de desorganização
mental? Ou seria, ainda, uma combinação de alguns dos fenômenos citados?
Algumas dessas respostas caberiam para explicar o comportamento de muitos
daqueles alunos que parecem “preguiçosos” ou, como muitas vezes são vistos
pelos professores, como “aqueles alunos que não querem nada”.
Uma boa parte desses problemas pode ser detectada através do olhar mais
apurado de um professor que trabalha com sentimento e emoção. Seria
simplista demais, no entanto, presumir-se que as funções do
neurodesenvolvimento, como linguagem, coordenação motora, e memória
seriam os únicos motores do rendimento. Esses sistemas essenciais do
neurodesenvolvimento estão em contínua interação com uma série de
influências externas do dia a dia e com o ambiente imediato, assim como com
as características pessoais, sentimentos e insigth para determinar a qualidade
e a quantidade de rendimento.
Um perfil do neurodesenvolvimento sofre, diariamente, influências internas e
externas. Às vezes os alunos precisam ser testados por psicólogos,
fonoaudiólogos, pediatras ou até neurologistas, para detectar onde está
ocorrendo o colapso no rendimento. Entretanto, normalmente, um professor
pode realizar um trabalho nesse sentido, simplesmente observando a criança
durante o ato de escrever ou desenhar e analisando amostras de seus
trabalhos. Além disso, é indispensável que esse professor converse com seu
aluno e procure ouvir dele mesmo os motivos de seu bloqueio. A própria
criança é capaz de oferecer as dicas mais reveladoras que ajudarão a
desvendar e até resolver o mistério do baixo rendimento.
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“A eficácia emocional da criança se
relaciona com a percepção da própria
capacidade de lidar, monitorar, manejar e
mudar sentimentos adversos que inibem a
persistência da busca de objetivos. Ela
pode experimentar sentimentos e pedir
ajuda, o que torna um aprendiz eficiente”.
(Relvas, 2008)
Ajudar a criança a entender e a se perdoar desmistificando os motivos de sua
não aprendizagem, é um passo importante para evitar que ela se afunde ainda
mais em seus problemas. Conversar com ela, discutir seus pontos fortes e
fracos, clarear seus pensamentos, são formas de ajudá-la a perceber suas
necessidades específicas e tentar superá-las, já que é impossível correr atrás
do que se desconhece!
A prática de refletir sobre o que se sabe e o que não se sabe, e como melhor
aprender o que não se sabe, vai conduzir o indivíduo a processar informações
no nível apropriado. O objetivo deverá ser sempre solidificar memórias, para a
armazenagem de longo prazo e a transferência. Quando o aluno conhece seus
próprios processos de memória e seus pontos fortes, conseguirá perceber o
que precisa fazer em seguida.
Os estudantes com insuficiência de rendimento precisam saber claramente
quais são seus pontos fortes e fracos, especialmente para poder não valorizar
demais suas limitações e não se considerar absolutamente incompetentes.
Quando têm uma percepção clara de sua meta-cognição, os estudantes têm
mais chance de elaborar e aplicar táticas pessoais para facilitar a produção de
alta qualidade.
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“Aprender é um processo que envolve toda
a fisiologia cerebral. Pensamentos,
emoções, imaginações, desejos e tudo o
que chamamos aprender acontece dentro
da fisiologia neural”. (Domingues, 2007)
Os professores precisam conhecer e embasar sua prática em alguns princípios
básicos. Indispensável ter ciência que o cérebro está em constante troca com o
meio e através dessa troca surgem novas propriedades que constituem o
aprendizado. Essas novas propriedades acontecem em razão da plasticidade
cerebral e ocorrem com maior intensidade quando os neurônios são ativados
de maneira complexa e multifacetada, isto é, usando todos os sentidos e
realizando associações e inter-relações. Se a informação ou aprendizado não
for útil ou prazerosa ou não tiver algum sentido, o cérebro não capta e a
descarta.
O sentido emerge através da criação de parâmetros que servem como base
para o processo de aprendizagem e o grau de importância atribuído à mesma.
A criança irá buscar os valores que o meio lhe oferece e esses não podem ser
rigidamente impostos ou vazios de significado.
Outro princípio básico da aprendizagem aponta que as emoções são decisivas
na formação de memórias e do aprendizado. Nenhum estímulo passará da
memória de curto para a de longo prazo se não houver emoção. As emoções
podem ser positivas ou negativas, mas ambas interferem definitivamente na
aquisição e resgate de memórias.
O funcionamento cerebral é holístico, ou seja, funciona como um todo, mas
antes de atingir esse todo, o cérebro desmonta as informações e as remonta
ao concluir que somente juntas formam um todo com sentido. Aprender
envolve sempre processos conscientes e inconscientes. A percepção é
diferente para cada um, dependendo dos registros anteriores relacionados às
32
novas aprendizagens e das emoções despertadas pelas memórias desses
registros.
Trabalhar com alunos que vivenciam déficits de memória, qualquer que seja o
grau, é extremamente desafiador e pode ser frustrante para o professor. O
pensamento mais errôneo que a criança frequentemente expressa é que não
consegue aprender e nunca usou estratégias de memória. Fala isso por total
desconhecimento e muitas vezes o professor mal informado concorda com
essa informação.
Por isso, através de seu aprimoramento profissional e capacitação, o professor
deverá saber que todos os processos de sala de aula envolvidos no trabalho
com memória devem ser altamente intencionais. É imperativo ajudar o aluno a
entender que embora não perceba, todas as atividades de memória estão
ligadas a um tipo de estratégia.
Conforme o professor vai aprendendo sobre o sistema de aprendizado de seu
aluno, ele o vai instruindo na organização das informações, identificando
constantemente os processos utilizados, selecionando as partes do processo
que funcionam ou não, e ajudando-os a desenvolver estratégias
compensatórias.
“Talvez seja óbvio que os professores que
realizam melhor sua tarefa usem
estratégias de ensino mais eficientes.
Provavelmente também é verdade que os
professores eficientes têm mais estratégias
de ensino à sua disposição.” (Sprenger,
2008)
Na medida em que se desenvolve o uso intencional das estratégias, há o
surgimento de técnicas espontâneas e o seu uso automático naturalmente
33
começa a ocorrer. Esse deve ser o maior objetivo do professor, pois assim
ocorrem as aprendizagens.
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CONCLUSÃO
“Sejam quais forem as características do
professor: autoritário, licencioso, competente,
sério, incompetente, irresponsável, amoroso da
vida e das gentes, mal amado, raivoso do mundo
e das pessoas, frio, burocrático, racionalista, ele
sempre deixará marca, positiva ou negativa. Tudo
passa por seus afetos e por suas consequentes
atitudes. Ele é exemplo de lucidez e engajamento
ou é irresponsável e cúmplice de um sistema que
mantém os alunos na alienação.” (Freire, 1999).
Como descreve o grande mestre Paulo Freire, professores há de todos os tipos
e cada um mostra em sua prática, o reflexo de sua forma de encarar o ato de
educar e de formar indivíduos. Mais do que isso, sua prática profissional reflete
sua forma de encarar a vida e suas responsabilidades para com aqueles que
dependem de sua mediação para a eficácia de sua aprendizagem.
O professor comprometido e atualizado sabe que hoje tem, nas neurociências,
um grande aliado para o seu trabalho pedagógico.
Conhecer como o cérebro aprende e guarda as informações, saber quais as
estruturas neurais estão relacionadas a cada tipo de memória, conhecer a
importância de estimular todos os sentidos para que o aluno faça o maior
número possível de associações, saber que o neurodesenvolvimento do ser
humano tem inicio muito antes de seu nascimento e irá afetar profundamente
suas condições de aprendizagem, enfim, ter acesso a essas e muitas outras
informações já cientificamente comprovadas, poderá trazer ao professor uma
infinidade de possibilidades na mediação junto ao seu aluno, impedindo-o de
fazer julgamentos errôneos e realizar práticas ineficazes.
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“Sem emoção não há aprendizagem”, então como aprender sem sentir-se
emocionado com a arte de ensinar? E, sentindo-se emocionado, como deixar
de buscar superar-se cada vez mais? Como conformar-se com o fracasso
daquela criança que tenta desesperadamente aprender? Ou como desistir
diante daquela criança que, antes do professor, também já desistiu de si
mesma?
“Dessas luzes científicas segue-se a
conclusão altamente revolucionária de que
TODOS PODEM APRENDER, porque a
inteligência é um processo e não um dom.
Ela coloca a escola e a sociedade num
compromisso de democracia muito novo,
qual seja, o de assegurar o saber para
todos”. (Grossi, 2003)
Estudar Neurociências Pedagógicas, hoje, deve ser, para o professor, muito
mais do que uma satisfação à curiosidade ou uma busca para preencher
lacunas em seu processo de crescimento pessoal. Deve ser sim, um
compromisso ético para com ele mesmo, desde que se reconheça como um
cidadão consciente da amplitude da sua função junto ao seu aluno e à
sociedade como um todo.
Estudar Neurociências e aplicar os novos conhecimentos em sala de aula deve
representar para o professor, uma consequência natural diante da imensa
responsabilidade que tem em suas mãos.
Se já foram descobertos meios científicos para resolver ou pelo menos explicar
as mais difíceis questões que o professor enfrentava a até bem pouco tempo,
diante daquele aluno que não aprende; se a ciência oferece respostas e
esclarecimentos, não há mais razão para o fracasso, para o desânimo e para a
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desesperança dos professores. O tempo agora é de estudo, aprimoramento,
capacitação e valorização profissional.
As armas existem, as Neurociências estão aí para iluminar o difícil caminho da
arte de ensinar e de aprender. A vitória da educação, agora, se tornou possível.
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BIBLIOGRAFIA
Grossi, Esther Pillar. Por que ainda há quem não aprende? 2ª ed. Petrópolis,
RJ: Ed. Vozes, 2003, 204p.
Izquierdo, Ivan. A arte de esquecer. 3ª ed. Rio de Janeiro: Ed. Vieira e Lent,
2007. 114p.
Lent, Roberto. Cem bilhões de Neurônios? 2ª ed. São Paulo: Atheneu, 2010.
765p.
Oliveira, Rosiska Darcy. A vida na escola e a escola da vida. 32 ed.
Petrópolis: Vozes, 1982. 93p.
Relvas, Marta Pires. Fundamentos Biológicos da Educação. Despertando
inteligências e afetividade no processo de aprendizagem. 3ª ed. Rio de
Janeiro: Wak 2008. 120p.
Relvas, Marta Pires. Neurociências e Transtornos da Aprendizagem. As
Múltiplas Eficiências para uma Educação Inclusiva. 2ª ed. Rio de Janeiro:
Wak, 2008. 144p
Sprenger, Marilee. Memória. Como ensinar para o aluno lembrar. 1ª ed.
Porto Alegre: Artmed, 2008. 184p.
Silva, Janssen Felipe. Práticas avaliativas e aprendizagens significativas.
Porto Alegre: Editora Mediação, 2003. 107p.
Smith, Corine. Dificuldades de Aprendizagem de A a Z. Porto Alegre:
Artmed, 2001. 332p.