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Revista da Escola Superior de Guerra nº 40 - 2001 188 I - INTRODUÇÃO 1 - As Idades do Mundo: A Antiguidade - 4000 a.C. até séc.V A Idade Média – séc. V ao séc. XV A Idade Moderna – séc. XV ao séc. XVIII A Idade Contemporânea – séc.XVIII aos nossos dias Os fatos históricos obedecem a uma ordem cronológica, que permite sua localização no tempo e no espaço, já que o presente de cada época será o passado do futuro da Era seguinte. Os homens sempre estudaram o passado para tentar explicar o presente e projetar o futuro. Assim, para focalizarmos as Grandes Navegações, período áureo da expansão européia, e chegarmos ao Descobrimento do Brasil, faremos um estudo inicial da Idade Média (séc.V até XV) e aprofundaremos nossas pesquisas no início da Idade Moderna (séc. XV e XVI). Dessa forma, poderemos destacar as causas, as conquistas e as conseqüências daqueles feitos heróicos. A Idade Média foi dividida em dois períodos: a Alta Idade Média (do séc. V até o séc. XI) e a Baixa Idade Média (do séc. XI até o séc. XV). “pois a coragem cresce com a ocasião” Shakespeare (1564-1616) Vida e Morte do Rei João – Ato II Ney Marino Monteiro*

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Revista da Escola Superior de Guerra nº 40 - 2001188

I - INTRODUÇÃO

1 - As Idades do Mundo:

A Antiguidade - 4000 a.C. até séc.V

A Idade Média – séc. V ao séc. XV

A Idade Moderna – séc. XV ao séc. XVIII

A Idade Contemporânea – séc.XVIII aos nossos dias

Os fatos históricos obedecem a uma ordem cronológica, que permite sualocalização no tempo e no espaço, já que o presente de cada época será opassado do futuro da Era seguinte. Os homens sempre estudaram o passadopara tentar explicar o presente e projetar o futuro.

Assim, para focalizarmos as Grandes Navegações, período áureo daexpansão européia, e chegarmos ao Descobrimento do Brasil, faremosum estudo inicial da Idade Média (séc.V até XV) e aprofundaremosnossas pesquisas no início da Idade Moderna (séc. XV e XVI). Dessaforma, poderemos destacar as causas, as conquistas e as conseqüênciasdaqueles feitos heróicos.

A Idade Média foi dividida em dois períodos: a Alta Idade Média (do séc.V até o séc. XI) e a Baixa Idade Média (do séc. XI até o séc. XV).

“pois a coragem cresce com a ocasião”Shakespeare (1564-1616)

Vida e Morte do Rei João – Ato II

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2 - A Alta Idade Média

A Alta Idade Média procedeu à queda do Império Romano no ano de395, quando aquele Império ficou dividido entre o Império do Oriente e oImpério do Ocidente. No século V o Império do Ocidente se dissolveu, emfunção da decadência econômica, da instabilidade política, da invasão dosbárbaros e dos povos vindos da Ásia. Partindo da Europa centro-oriental osbárbaros dominaram o ocidente europeu criando inúmeros reinos. Tambémno século VIII a Europa sofreu novas e catastróficas invasões realizadaspelos Árabes, Magiares e Normandos. Os Árabes invadiram a PenínsulaIbérica e dominaram o Mediterrâneo, os Magiares atacaram a Europa centrale os Normandos devastaram o litoral norte da Europa.

O Império do Oriente, também denominado Império Bizantino, superou acrise entre os séculos III e V continuando a existir até 1453, quando se deua queda de Constantinopla pelos Turcos. Durante a maior parte de suaexistência, este Império foi alvo de intensas atividades comerciais e possuiuuma brilhante civilização, herdeira da cultura greco-romana.

Na Alta Idade Média, a atividade econômica do ocidente da Europaregrediu a níveis baixíssimos. Contribuiu para isso a ausência de excedentesna produção agrária e a insegurança, que levaram ao desaparecimento docomércio e das moedas. As diversas regiões em que se dividiu a Europapassaram a produzir cada uma para o seu próprio consumo, só consumindoo que produziam, numa forte tendência à auto-suficiência. A Europa Ocidentalsofreu um grande processo de desurbanização. Dissolveram-se as cidade,só resistiram aquelas que eram sedes dos bispados. Houve a destruição dacultura greco-romana. Permaneceu uma forte influência da Igreja Cristã, oClero regular preservou a cultura dos mosteiros; destacando-se como a maiorexpressão da Igreja na época, Santo Agostinho, cuja teoria baseava-se nocaráter teocêntrico da cultura.

As modificações deste período começaram a ser sentidas com oenfraquecimento do feudalismo dominante que sofreu a substituição doescravismo pela servidão. O servo prestava serviço ao senhor (não era vendidonem trocado), mas continuava sujeito às obrigações de impostos como: atalha, que era o sistema de meiação da produção do escravo com o senhor;as banalidades, que eram os aluguéis pagos pelos servos dos equipamentosdo senhor; e as corvéias, que eram as prestações dos serviços ainda devidospelos servos aos senhores.

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Na Alta Idade Média prevaleceu uma Sociedade Estamental tripartite,constituída do Clero, da Nobreza e do Povo em geral.

3 - A Baixa Idade Média

A Baixa Idade Média se deu entre os séculos XI e XV. Entre os séculos XIe XIII se formaram as Cruzadas, que acabaram por libertar o Mediterrâneodo domínio Árabe. Esta época produziu um grande impulso na atividadecomercial, com o açúcar, as especiarias, perfumes e outros, que passaram aser consumidos pelos europeus. Para isso muito contribuiu o “Livro dasMaravilhas”, escrito no século XIII pelo célebre viajante veneziano MarcoPolo, onde ele narra suas aventuras entre os povos que conheceu na Mongólia,China, Sumatra e Pérsia. A divulgação do seu livro falando dos costumes edas riquezas daquela região muito influiu no desejo de viajar pelas terras dasdenominadas Índias, onde se encontravam tais maravilhas. Na verdade asÍndias, naquela época, era o nome pelo qual a Europa conhecia as terras daÍndia, Arábia, China, Japão e Ilhas de Sonda.

O comércio com o Oriente foi por muito tempo monopolizado pelas cidadesitalianas de Veneza e Gênova, que detinham a supremacia comercial, comointermediárias daqueles produtos com as demais regiões européias.

O século XIV foi marcado por uma intensa crise que se abateu sobre ascidades e o campo, provocando grandes cataclismas como: guerras, fome epeste. No campo as conseqüências da crise foram muito graves e resultaramnuma decadência acelerada da servidão. Em vários países ocorreram violentasrevoltas das massas camponesas para por fim às obrigações feudais. Otrabalho servil foi entrando em decadência; os próprios senhores feudaisestavam aderindo ao circuito da economia urbana e monetária, desejandocomprar e vender nos centros urbanos, optando pela melhor solução de pagarsalário aos trabalhadores de suas terras. As catástrofes do século XIV, namedida em que causaram a morte de alguns milhões de pessoas, acabarampor acelerar o processo de valorização da mão-de-obra.

Naquela época houve o ressurgimento das cidades com a formação doschamados burgos, emergindo então uma classe de comerciantes denominadosburgueses. A partir daí, na Europa do Ocidente surgiu o confronto da burguesiacom os senhores feudais. Havia uma séria intolerância dos comerciantesburgueses, que pagavam impostos (pedágios) aos senhores; as moedas, ospesos e as medidas variavam de acordo com os feudos. As cidades atraíam

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os servos, deu-se o êxodo do campo, as cidades se formaram e cresceramnos territórios dos grandes senhores, o que provocou o desejo de liberdade,ou pela luta armada ou por acordo com o nobre. Tal situação acabou porprovocar a aliança Reis-Burguesia, que determinou a criação das monarquiasnacionais. A burguesia pagava impostos, fazia empréstimos e doações aosreis, causando lutas até o século XV.

Neste período prevaleceu ainda uma forte influência da Religião Cristã,destacando-se as grandes obras das catedrais românicas e góticas. Opensamento cristão teve como núcleo fundamental da vida social a filosofiacriada por Santo Tomás de Aquino, A Escolástica. A Escolástica constituía-se na crença de que o conhecimento humano era proveniente da fé e darazão e resultava da graça de Deus e do esforço dos homens para conhecer.Junto com esta filosofia surgiu também uma cultura leiga preocupada com ascoisas do mundo e alimentada pela burguesia; criaram-se então asUniversidades nas cidades medievais.

Ao longo dos séculos XIV e XV o feudalismo foi chegando ao fim naEuropa centro-oriental, ao mesmo tempo que despontava a Idade Moderna,que destacou-se pelo desenvolvimento do comércio e das manufaturas, pelaascensão da classe burguesa e o aumento do poder dos reis. Os monarcasincentivaram e desenvolveram o chamado mercantilismo, uma prática defomento e controle da atividade mercantil. A partir daí, a crise das cidades foisuperada pela expansão européia por meio das Grandes Navegações.

4 - As Mudanças do Renascimento

Os séculos finais da Baixa Idade Média produziram profundas alteraçõesna sociedade européia; as mudanças ocorreram na economia, na política ena vida social. O processo da criação de uma nova cultura que modificou asformas de pensar, sentir e agir dos europeus, se denominou de Renascimento.O Renascimento foi o primeiro grande passo que originou a criação da culturaleiga e burguesa e caracterizou a Idade Moderna.

A cultura leiga preocupou-se basicamente com as coisas do mundo,com as coisas do homem, contrapondo-se à cultura voltada basicamentepara o domínio do sagrado. A cultura medieval era teocêntrica e a partirdo Renascimento teve como caraterística dominante o antropocentrismo,a crença no homem como o centro de todas as coisas. O caráter burguêsda cultura Renascentista foi resultante do processo de ascensão econômica

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e política da classe burguesa, capaz de refletir seus interesses, com umanova visão de mundo.

A Renascença foi uma época de intensa produtividade nos diversosaspectos da vida cultural, desenvolvida por artistas, filósofos e homensde ciência, que resultou em uma revolução das comunicações, evoluídaspelo aparecimento da imprensa em meados do século XV. Antes destefato, a troca de experiências culturais através de livros, copiados a mão ede custo elevado, era extremamente difícil. A imprensa com tiposmetálicos, criada por Gutemberg, diminuiu os custos e deu enorme impulsoàs comunicações e à difusão da cultura.

Esta cultura Renascentista notabilizou-se pela ascensão de um novo tipohumano na Europa centro-ocidental, o burguês, dotado de característicasbásicas, como o individualismo, o hedonismo e o naturalismo. O individualismose opôs ao coletivismo da sociedade medieval, reação motivada pelaconcorrência do capitalismo comercial. Esse individualismo deixou clarasmarcas na pintura, onde os retratos individuais eram muito numerosos,encomendados pelos burgueses que nele ostentavam belas roupas e ricosornamentos. O hedonismo é uma crença filosófica embasada na tese de queo prazer é a primeira finalidade na vida, em contraposição às idéias místicase contemplativas, chamadas ascéticas. O naturalismo é a aceitação da naturezaem geral e da natureza humana como algo bom, contrariando a crença medievalda natureza marcada pelo pecado original, tendendo fatalmente para o mal.

Os homens do Renascimento continuaram a inspirar-se no cristianismo,constatado nas manifestações artísticas, entretanto, o pensamento cristãofoi substituído pelo cultura greco-romana como fonte de inspiração. Aascensão dessa cultura clássica se explica, em parte, pela oposição daburguesia ao clero, que fazia parte da classe dominante e controlava acultura durante a Idade Média.

O Renascimento teve como uma de suas idéias básicas o ideal humanista,isto é, a afirmação do homem como a criatura mais importante do universo.As possibilidades do homem eram infinitas, mas elas deveriam cultivar-se nacultura procurando um constante aprimoramento do corpo e do espírito. Apalavra humanista designava também aqueles dedicados à cultura antiga,principalmente aqueles que se ocupavam do estudo e da tradução dos textosgregos e latinos.

Os principais fatores que geraram o Renascimento tiveram como fundamento

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o desenvolvimento do comércio, das cidades e da classe burguesa, cada vezmais evoluído a partir das Cruzadas. O comércio fez surgir um excedente deriqueza que patrocinou as mais variadas obras culturais. Surgiram na Itália eem outros países os chamados mecenas, burgueses ricos, grandes senhorese príncipes que financiavam o trabalho dos grandes artistas. O crescimentodas cidades ligadas à atividade comercial e manufatureira criou um novo estilode vida; os contatos dos países europeus com as civilizações Bizantinas eSarracenas, no Oriente, fizeram ressurgir os restos da cultura greco-romana,perdida nas invasões dos bárbaros no início da Idade Média, e firmaram osalicerces da Renascença.

Como o movimento Renascentista se desenvolveu mais na Itália, há quemo considere “um fenômeno tipicamente italiano”.

A Renascença abriu o caminho para a Idade Moderna, quando, nos séculosXV e XVI, se realizaram as Grandes Navegações.

II - AS GRANDES NAVEGAÇÕES

Os descobrimentos marítimos do início da Idade Moderna podem ser, emparte, comparados com os que hoje se desenvolvem pela conquista do espaço.Na verdade, as descobertas do caminho marítimo para as Índias e da Américaexigiram muito mais esforços e coragem dos navegadores da época do quedos astronautas de hoje. As dificuldades eram inúmeras, agravadas pelascrenças, superstições e fantasias que precisavam ser vencidas. A ciência erapobre e afetada pelas crendices e absurdos. Os que discordavam das verdadesoficiais corriam risco de serem punidos por heresia. Os recursos materiais daépoca para tais aventuras eram escassos e os que se aventuravam desafiavamtodas essas dificuldades para chegar aos mares desconhecidos “nunca d’antesnavegados”. Não obstante todas essas dificuldades, o espírito desafiador dohomem triunfou. Navegadores destemidos, primeiro portugueses e espanhóis,mais tarde ingleses, franceses e holandeses, foram, de forma pertinaz,vencendo o perigo dos mares e ampliando as terras conhecidas. Para isso,concorreram as grandes invenções: bússola, papel, imprensa e caravela, aslendas sobre os fabulosos tesouros do Oriente e o desejo de converter aocristianismo os povos pagãos que viviam em terras longínquas. Na verdade,o fator principal foi certamente o desejo de explorar o comércio das especiariasdas Índias, que alcançavam na Europa grandes lucros. Nessa época, o fabricode artigos de luxo para o vestuário e vários alimentos apreciados pelos

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europeus eram de exclusividade do Oriente e comercializados, também comexclusividade, pelas cidades italianas Gênova e Veneza, que tiveram grandeprosperidade até 1453, quando Constantinopla foi invadida pelos Turcos,que fecharam o caminho seguido pelas mercadorias procedentes das Índias.

Especiarias era um nome dado ao conjunto de mercadorias procedentesdas chamadas Índias (China, Arábia, Índia, Japão e Ilhas de Sonda) e seconstituíam de pimenta, cravo, canela, noz-moscada, gengibre, aloés, cânfora,incenso, sândalo e perfumes.

1 - A Expansão Européia dos Séculos XV e XVI

A Expansão Européia iniciada no século XV foi resultado de um conjuntode fatores que atuavam na Europa desde o início da Baixa Idade Média.Dentre eles podemos citar a expansão dos mercados, a formação dasmonarquias nacionais e da política, aliada aos progressos técnicos e científicos.

A partir do século XV, os comerciantes europeus, liderados pelosportugueses, procuraram alargar o seu mercado comercial, inicialmenterealizando contatos e trocas com a África negra, depois com a Ásia e,finalmente, com a América. Tal expansão foi motivada pela procura de metaispreciosos e dos produtos orientais que faziam a riqueza das invejadas cidadesitalianas. As grandes navegações dos séculos XV e XVI criaram um mercadomundial, isto é, os europeus passaram a realizar um grande comércio e aestabelecer colônias nos diversos continentes. Na sua totalidade, as viagenseram financiadas por capitais particulares (da burguesia) interessados naexpansão comercial. Esses capitais eram coordenados pelo poder real, quepossuía força armada e burocracia para proteger e administrar feitorias ecolônias, realizar tratados com outros governos e fazer a guerra. A expansãomarítima e a fundação dos impérios coloniais europeus basearam-se na forçados diversos Estados e obedeceram à política mercantilista.

Por outro lado, o final da Idade Média foi um momento de importantesprogressos técnicos e científicos, culminando com as chamadas“invenções” como a bússola, o astrolábio, a caravela, que muito ajudarama arte de navegar.

Boa parte desses conhecimentos técnicos e científicos foi recebida, naEuropa do ocidente, através dos Árabes e Chineses, pelo processo de difusãocultural e, gerados também pelas necessidades econômicas, que provocaramnos europeus nos fins da Idade Média, a inventividade, produto inexorável

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dos esforços dos homens para suprirem suas carências, a qual, segundoafirmava o filósofo Leucipo, “coisa alguma é produzida ao acaso, todas seproduzem a partir da razão sob o efeito da necessidade”.

2 - O Domínio Marítimo Português

Coube a Portugal uma importante posição no processo das grandesnavegações. Os navegadores portugueses constituíram a vanguarda daexpansão da Europa com os notáveis feitos do século XV e XVI, afrontandoo chamado Mar Tenebroso (o Atlântico), culminando com sua chegada aoExtremo Oriente e à América.

A luta dos cristãos pela reconquista da Península Ibérica fez surgir ochamado Condado Portucalense (como um feudo do Reino de Leão) quefoi doado a Henrique de Borgonha, um cavaleiro francês distinguido na lutacontra os mouros. Em 1139, o Condado, chefiado por Afonso Henriques,proclamou a sua independência de Leão. Uma vez independentes e lideradospela dinastia de Borgonha, os portugueses avançaram para o sul econquistaram a região do Algarve. Até a conquista da região do Algarve,as principais atividades econômicas eram a pesca e a agricultura. A partirdo século XIV, Portugal passou a servir de entreposto para as atividadescomerciais entre o Norte da Itália e as cidades do Flandres, constituindo-se em parada obrigatória. Nasceu daí um poderoso grupo mercantil queacabou por entrar em choque com a nobreza.

Em 1383, com o fim da dinastia de Borgonha, o grupo mercantil formadoliderou uma revolução, para manter a independência do país ameaçada porCastela, diminuir o poderio dos nobres, e levar ao trono o denominado Mestrede Avis, que inaugurou aquela dinastia, com o nome de D. João II. Com avitória de Avis, o Estado português voltou-se para os interesses comerciais,dando origem a uma política mercantilista de apoio ao crescente comérciocom o norte da África. Esta política de apoio ao comércio desenvolveu achamada Escola de Sagres, um centro de experiência na arte de navegar,liderado pela figura de D .Henrique, o Navegador.

O infante D. Henrique era um príncipe filho de D.João I, sagrou-se cavaleiroem 1415 com a vitória portuguesa (sobre os muçulmanos), na batalha deCeuta em Marrocos. No ano seguinte, o príncipe tornou-se comandante daOrdem de Cristo. Sem possibilidades de sucessão ao trono português, quecaberia a seu irmão mais velho D. Duarte, Henrique assumiu o cargo de

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governador do Algarve. D. Henrique, que era solteiro e casto, dividia seutempo entre o Convento de Cristo, em Tomar, que era sede da Ordem e avila de Lagos, no Algarve, cujo porto era uma Base Naval e uma Corteaberta. Em Tomar, ela cuidava das finanças, da diplomacia e da carreira dospilotos iniciados nos segredos dos empreendimentos cruzados. O Conventode Tomar era um cofre de recursos e informações secretas.

O cronista Gomes Eanes na crônica da “Tomada da Guiné”, falava umpouco do cosmopolitismo do Porto de Lagos, “havia gente das Canárias,caravaneiros do Saara, mercadores do Timbuctu (Mali), monges de Jerusalém,navegadores venezianos, alemães e dinamarqueses, cartógrafos italianos eastrônomos judeus”. Uma das disposições diplomáticas era presentear, oque permitiu ao Príncipe formar uma biblioteca preciosa. Entre as plantas,mapas e tabelas, havia um exemplar manuscrito das Viagens de Marco Polo.Talvez por isso, a primeira edição impressa desta obra tenha sido feita emportuguês (1534) e não em latim ou italiano.

A famosa Escola de Sagres parece Ter sido uma lenda criada pelos poetasromânticos portugueses do século XIX, pois, na realidade, foi o Porto deLagos que a Ordem de Cristo, liderada pelo infante D. Henrique, comandoua expansão marítima do século XV. Na verdade, a Escola era o nome peloqual se costumavam agrupar as idéias portuguesas sobre navegação,astronomia e geografia, na base dos descobrimentos; a Escola comoinstituição parece não ter existido, porém a idéia dominante naquelegrupamento era fundada na convicção da redondeza da Terra, razão pelaqual as Índias poderiam ser alcançadas contornando-se a África, isto é,navegando-se para o Oriente.

O Príncipe era um articulador discreto, raramente ia à Corte em Lisboa, oseu tempo se passava entre o Convento de Tomar e a Base Naval de Lagos.D. Henrique, o Navegador, foi o criador da citada Escola de Sagres, quandoreuniu navegantes, geógrafos, astrônomos, matemáticos, cartógrafos eoperários; graças ao seu trabalho, Portugal se adiantou às demais nações nafase dos descobrimentos marítimos.

A Ordem de Cristo derivou-se da Ordem dos Templários. Os Templáriosfranceses eram os mais poderosos da Europa, controlavam feudos econstruções no interior e em Paris. Entre essas posses, estava o Templo, umconjunto de igrejas e oficinas que foi reformado em 1319 e se tornou a prisãoda Bastilha, mais tarde destruída durante a Revolução Francesa. As derrotas

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no Oriente Médio alimentaram uma onda de calúnias, que atribuíam aos seuscavaleiros acordos com muçulmanos, fugindo dos campos de batalha e traindoos cristãos. Aproveitando este clima favorável, em 1307, Felipe IV, Rei daFrança, que devia dinheiro à Ordem, invadiu de surpresa as sedes templáriasem toda a França, fazendo prisioneiros, só em Paris, cerca de 500 cavaleiros,muitos deles degolados. Este fato originou a abertura de dois processos, umdirigido por Felipe contra os presos e outro, conduzido pelo Papa ClementeV, francês, aliado do rei, contra a Ordem. Procederam-se a torturas brutais econfissões arrancadas pela Inquisição que se tornaram peças difamatóriasescandalosas. O sigilo da Ordem foi usado contra ela e as etapas dos rituaisde iniciação se converteram em monstruosidades. Os santos guerreiros foramacusados de cuspir na cruz, adorar o diabo, manter práticas homossexuais,render culto a Maomé e queimar crianças. Tiveram todos os seus bensconfiscados; esperava-se uma fortuna, porém pouco foi efetivamenterecolhido, o que originou a lenda de que os seus tesouros teriam sidotransferidos, em segurança, para outro país.

Para muitos historiadores e investigadores, o país para o qual foramtransferidas as riquezas templárias, teria sido Portugal, graças ao rei D. Dinis(1261/1325), que decidiu garantir a permanência da Ordem em terrasportuguesas, apesar das ameaças francesas, ele reiterou que os templáriosnão tinham cometido crimes em Portugal. D. Dinis sugeriu uma doação formaldos bens da Ordem Templária à Coroa Portuguesa, mas nomeou umadministrador templário para cuidar deles. D. Dinis transferiu todo o patrimôniodos cruzados para uma nova organização recém fundada, A Ordem de Cristo.Dessa forma, Portugal tornou-se um refúgio para perseguidos de toda aEuropa; de vários países chegavam fugitivos trazendo o que podiam. OConvento de Tomar transformou-se na caixa forte dos segredos que aInquisição não conseguiu arrancar. Dois anos depois, em 1319, o Papa JoãoXXII reconheceu a Ordem de Cristo, iniciando uma nove era com novamissão para os cavaleiros.

Nas primeiras décadas da existência oficial da Ordem de Cristo, os ex-templários estabeleceram estaleiros em Lisboa, fizeram contratos demanutenção de navios e dedicaram-se à tecnologia náutica, aproveitando osconhecimentos adquiridos com o transporte de peregrinos entre a Europa eo Oriente Médio durante as Cruzadas. Também prepararam planos paravolta à ação, contornando a África por mar e, aliando-se aos cristãos orientais,expulsar os mouros do comércio das especiarias.

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Em 1416, D. Henrique assumiu o cargo de Grão-Mestre da Ordem deCristo e lançou-se à diplomacia. Fazia cem anos da condenação dostemplários nos processos de Paris e o Vaticano estava preocupado com apressão muçulmana sobre a Europa, aumentada no século XIV. Dessa forma,o Infante conseguiu do Papa um aval para o projeto expansionista. Daí emdiante, cada avanço para o sul e oeste era seguido pela negociação denovos direitos. Durante um século, os Papas emitiram 11 bulas privilegiandoa Ordem com monopólios da navegação para a África, posse de terras,isenção de impostos eclesiásticos e autonomia para organizar a ação daIgreja nos locais a descobrir.

Até meados do século XV, os cavaleiros tomavam iniciativas sem esperarpelo Estado português. Quando iniciada a colonização, eventualmentedoavam à família real o domínio material dos territórios, mantendo ocontrole espiritual. Cabia então à Corte, interessada em promover odesenvolvimento da exploração de riquezas e do comércio, consolidar aposse do que tinha sido descoberto.

Em Marrocos, os novos cruzados atacaram Tanger em 1437 e Alcácer-Ceguer em 1458. O ímpeto guerreiro preponderou sobre o mercantilismoreal até 1461, ano em que o cavaleiro Pedro Sintra encontrou ouro na Guiné,aumentando a pressão comercial da monarquia sobre a Ordem. Mesmo assim,ainda houve expedições contra os mouros marroquinos em 1471, mas àmedida que foi sendo consolidado o comércio na rota das Índias a partir desua descoberta em 1498, a Coroa portuguesa foi absorvendo gradualmenteos poderes da Ordem. Em 1550, o Rei D. João III induziu o Papa Júlio III afundir as duas instituições. Com isso o Grão-Mestre passava a ser sempre orei de Portugal e o seu filho tinha o direito de lhe suceder também no comandodos cruzados. Até então, seu antecessor D. João II (1481/1495) conseguiuestimular a atividade mercantil e a colonização dos territórios africanos,contendo o ímpeto guerreiro dos cruzados da Ordem de Cristo.

Os cavaleiros da Ordem de Cristo adotaram como emblema o distintivo daOrdem dos Templários, que foi derivado da Cruz de Copta, criada por umadissidência cristã, do mesmo nome, no século II. Enquanto detinha os tesourosdos dados marítimos sob a sua guarda, a estrutura secreta da Ordem garantiua exclusividade dos portugueses. Em Tomar e em Lagos, os navegadores sóprogrediam na hierarquia depois de sua lealdade Ter sido comprovada, sepossível, em batalha. Só então podiam ler os relatórios reservados dos pilotos

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que já tinham percorrido regiões desconhecidas e ver preciosidades como astábuas de declinação magnética, que permitiam calcular a diferença entre oPólo Norte verdadeiro e o magnético, que aparecia nas bússolas. À medidaque as conquistas avançavam no Atlântico, eram feitos novos mapas denavegação astronômica, que forneciam orientação pelas estrelas do hemisférioSul, a que também só os iniciados tinham acesso.

3 - As Conquistas Portuguesas

No período de 1415 a 1498, deu-se a chamada expansão quatrocentistade Portugal, que se iniciou em 1415 com a tomada de Ceuta no norte daÁfrica. Neste empreendimento, a nobreza e o grupo mercantil uniram-se,sob a liderança do poder real. Mas enquanto os mercadores viam em Ceutaum ponto para fazer comércio com o continente africano, os nobres tinham oobjetivo de combater os muçulmanos pela fé cristã e conquistar terras pelonorte da África, algo semelhante às Cruzadas. O tempo levou à predominânciados interesses comerciais.

Na década de 1420, os portugueses ocuparam as Ilhas da Madeira eAçores; na Madeira desenvolveu-se a produção de açúcar, que trouxeimportantes lucros ao grupo mercantil, investido em novas empresasexpansionistas. Em 1434, os portugueses navegando pela costa ocidental daÁfrica, chegaram à Guiné, onde descobriram ouro, fato que deu um novoimpulso à expansão. A partir daí, as expedições que eram financiadas peloEstado e mercadores portugueses passaram a receber investimentos demercadores italianos e holandeses.

Também em 1434, o navegador da Ordem de Cristo Gil Eanes passou oCabo Bojador, um pouco ao sul das Canárias, o que além de realizar umavanço náutico, desmontou uma mitologia milenar, pois acreditava-se quedepois do Cabo, localizado no que é hoje o Saara ocidental, começava oMar Tenebroso, lugar de grandes desventuras e sofrimento. O estrondo dasondas nos penhascos do litoral que era ouvido a quilômetros de distância, ascorrentes fortíssimas e as névoas de areia, reforçavam o pânico dos pilotos.Quando finalmente Eanes reuniu coragem e chegou ao outro lado, sem nadasofrer, abriu o caminho para o Sul. Novas descobertas sucederam-se atéque em 1487, Bartolomeu Dias chegava ao Cabo das Tormentas, praticamentedescobrindo a tão cobiçada passagem pelo extremo sul da África. Em 1498,a expansão atingiu o seu ponto culminante com a chegada de Vasco da Gama

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à Índia, abrindo o caminho para a Ásia. No início do século XVI, a expediçãode Cabral continuava o comércio com as Índias; a descoberta do Brasil em1500, não desviou os portugueses dos principais interesses que estavam nessecomércio. Afonso Albuquerque, na década de 1510, comandou umaexpedição que ocupou Ormuz, na entrada do Golfo Pérsico, Socotora eAden, na entrada do Mar Vermelho. Ocupando estes pontos estratégicos,Portugal pretendia criar um império na Ásia, impedindo o fluxo de produtosorientais para a bacia oriental do Mediterrâneo, colocando em crise o comérciodas cidades italianas com o Império Turco e com os árabes.

Tendo abocanhado mais do que podia digerir, Portugal, na década de 1530,em meio a uma grave crise econômica, começou a ceder aos holandeses,seus maiores credores, vários pontos que havia ocupado na Ásia, voltando-se então para a colonização do Brasil.

4 - As Navegações Espanholas

Depois de Portugal, foi a Espanha o país mais importante no processodas grandes navegações e da formação de impérios coloniais dosséculos XV e XVI.

Durante o século XV, a Espanha prosseguia a luta contra os árabes, queera chamada de Reconquista Cristã, iniciada no século XI. Desde esse século,os cristãos da Península Ibérica, que partiram da região das Astúrias, vinhamtomando território dos árabes, surgindo dessas conquistas uma série de ReinosCristãos: Leão, Castela, Navarra e Aragão. A Reconquista promoveu aimplantação do sistema feudal no território da atual Espanha, porque as terrastomadas aos árabes eram divididas entre os grandes senhores da nobrezadaqueles reinos. Por outro lado, ao mesmo tempo em que os nobres sefortaleciam, a luta contra os árabes exigia o fortalecimento de uma autoridadereal para concentrar os esforços dos exércitos cristãos particulares contraum inimigo comum. O fortalecimento da autoridade real culminou com ocasamento de Fernando de Aragão com Isabel de Castela, os célebres reiscatólicos, em 1476. A união de Castela e Aragão promoveu praticamente aformação da Espanha, que, no século XV, se apresentava como um paíspredominantemente agrícola, com algum desenvolvimento comercial naprovíncia de Aragão.

Os reis católicos deram prosseguimento à reconquista dos últimos redutosmuçulmanos no sul do país e passaram a se interessar também pelo

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desenvolvimento do comércio e da navegação, por influência dos sucessosexpansionistas do reino português.

5 - As Conquistas Espanholas

A Espanha não possuía grandes navegadores, geógrafos e construtores denavios, valeu-se então das experiências de elementos de outros paíseseuropeus, como Portugal e Itália, para participar das navegações.

Em 1490, o navegador genovês, de nome Cristóvão Colombo, apresentouaos rei católicos um plano para chegar às Índias, que empolgavam aimaginação dos europeus. Colombo acreditava na redondeza da Terra, epor isso, admitia chegar às Índias navegando sempre para o Ocidente. Oúnico evento não previsto no plano era o encontro da América no meio docaminho. Financiado pelos reis Fernando e Isabel, Colombo descobriu ocontinente americano em 1492, inaugurando de forma notável a participaçãoespanhola na expansão marítima européia.

O sucesso de Colombo provocou uma grande disputa entre espanhóis eportugueses pelas novas terras descobertas, razão por que os dois paísesfirmaram por acordo o Tratado de Tordesilhas, 7 de junho de 1494, que serámelhor estudado quando falarmos da descoberta do Brasil.

No início do século XVI, os espanhóis prosseguiram na exploração eocupação dos novos territórios americanos. Um navegador florentino chamadoAmérico Vespúcio, a serviço da Espanha, constatou em 1504, que as terrasdescobertas por Colombo formavam um novo continente. Um outronavegador, de nome Balboa, em 1513, passando pelas terras da AméricaCentral, chegou ao Pacífico. O português Fernão de Magalhães, também aserviço da Espanha, realizou a primeira viagem de circunavegação do globoem 1519. Partindo de Cádiz, navegou pelo Atlântico Sul, cruzou o estreitoque hoje tem o seu nome, e rumou para a Ásia, chegando às Filipinas em1521. Com esta viagem, foram descobertas novas rotas e ficou provada aesfericidade da Terra. A seguir, prosseguindo a ocupação do continenteamericano, os espanhóis organizaram várias expedições. A comandada pelofidalgo espanhol Fernão Cortez invadiu o México, derrotando a civilizaçãoAsteca. Na década de 1530, algo semelhante ocorreu no Peru, com adestruição da civilização Inca, por uma expedição de aventureiros espanhóis,chefiada por Francisco Pizarro. Como no México, o objetivo foi o saque dosminerais nas mãos dos indígenas. Os espanhóis conseguiram derrotar os

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Astecas e os Incas praticando inúmeras atrocidades que foram seguidaspelo saque de fabulosas quantidades de ouro e prata. Em 1545,descobriam-se na região de Potosi, na atual Bolívia, riquíssimas minas deprata, que atraíram milhares de aventureiros, explorando violentamente amão-de-obra indígena para remeterem quantidades fabulosos do metalprecioso à metrópole espanhola.

De repente, um país pobre com pequeno desenvolvimento manufatureiro,bancário e comercial experimentou o recebimento de imensas quantidadesde ouro e prata que enriqueceram o Estado, a nobreza e aumentaram ascondições aquisitivas do povo em geral. A Espanha viveu a febre do ouro.Dessa forma, os homens produtivos tenderam a abandonar a agricultura e oartesanato e partir para a América, buscando riqueza fácil.

No decorrer do século XVI, a Espanha converteu-se num grandeimportador de manufaturas dos diversos países europeus, compradas como ouro americano, que entrava no seu território e se espalhava pela Europaocidental, gerando desvalorização das diversas moedas e um sensívelaumento dos preços. O século XVI foi chamado pelos espanhóis de Siglode oro, época da hegemonia espanhola.

Nos fins do século XVI, a quantidade de ouro americano foi diminuindocada vez mais, o governo espanhol resolveu tomar medidas para conter asimportações, no entanto, tais providências chegaram tarde. Com a perda doouro americano, a Espanha entrou em uma séria decadência que se arrastoupelos séculos seguintes.

6 - A Expansão Francesa

Por inúmeros problemas internos, a França não participou das navegaçõesdo século XV, a Guerra dos Cem Anos durou até 1453 e também a lutaentre a monarquia e os senhores feudais continuou, até os fins do século XV,com a vitória de Luiz XI. No século XVI, motivados pelas notícias dasconquistas dos portugueses e espanhóis, e seduzidos pelas lendárias riquezasasiáticas e americanas, os franceses se lançaram às navegações, lideradospelo poder real.

Em 1520, o rei Francisco I fez um discurso no qual dizia: “eu não vi notestamento de Adão que só Portugal e Espanha têm direito ao NovoMundo”. O rei francês investiu contra o Tratado de Tordesilhas e osfranceses desencadearam a seguir uma série de ataques de pirataria,

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especialmente contra a América portuguesa. Os ataques contra osespanhóis foram menos freqüentes por causa dos bons negócios que osfranceses realizavam com a Espanha, seus principais compradores naEuropa. Depois de procurarem uma passagem para a Ásia pelo extremonorte do continente americano, os navegadores franceses lançaram ofundamento de um império colonial na América do Norte. No Brasil nãoobtiveram êxito na tentativa de se estabelecerem no Rio de Janeiro e noMaranhão. Na Índia ocuparam pontos da costa, juntamente com outrasnações européias.

7 - As Navegações Inglesas

Também empenhados com a Guerra dos Cem Anos e depois com a Guerrada Duas Rosas, os Ingleses só conseguiram participar das grandes navegaçõesno século XVI.

No reinado de Henrique XVIII, navegadores ingleses procuraram umapassagem para a Ásia pelo extremo norte da América. Mal sucedidos nestaprocura, começaram a percorrer a rota do Cabo para chegar à Índia, ondese estabeleceram em alguns pontos da costa.

No reinado de Elizabeth I, as navegações inglesas tiveram o seu apogeu;Francis Drake comandou uma expedição que realizou uma viagem decircunavegação do globo; diversas expedições reconheceram o litoral e riosna América do Norte.

A principal atividade dos marinheiros ingleses foi, sem dúvida, durantea Segunda metade do século XVI, na pirataria oficializada contra aEspanha. Nesse momento, a maior parte dos piratas inglesestransformou-se em corsários, piratas que possuíam a chamada Cartade Corso, um documento firmado pelo poder real que permitia ataquese pilhagem contra navios da nação inimiga, Espanha, que se tornou opaís mais atacado pelos corsários ingleses. O lucro dos ingleses com aprática da pirataria legalizada pode ser retratado pelo fato de que só aexpedição de Francis Drake deu um lucro de 700%, cabendo à Rainha,pela sua parte, 250 mil libras.

Além da pirataria, os ingleses durante o século XVI, iniciaram-se no rentávelnegócio do tráfico de escravos para a América, o que tornou extremamenteprósperas inúmeras cidade, no século XVII.

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8 - A Expansão Holandesa

A Holanda, situada na desembocadura do rio Reno, próxima do territóriode Flandres, teve um desenvolvimento comercial precoce. Na Baixa IdadeMédia, algumas cidades, com uma burguesia cada vez mais poderosa,cresceram em território holandês. Mas, apesar dessa prosperidade econômica,a Holanda, no século XVI, encontrava-se sob domínio político da Espanha.

Os holandeses foram grandes financiadores da expansão ultramarinaportuguesa. Quando Portugal abandonou os negócios na Ásia e voltou-separa o Brasil, os holandeses, além de substituírem os portugueses em váriospontos do continente asiático, passaram a financiar a indústria açucareira naBahia e no Nordeste. O açúcar produzido nessa área era recebido pelosholandeses na forma de rapadura para ser refinado e distribuído por toda aEuropa, gerando vultosos lucros. Além dos negócios com o açúcar, osholandeses foram pioneiros no tráfico de escravos africanos para a Américano século XVI. O grande investimento capitalista da exploração das riquezasdo Novo Mundo levou à restauração do escravismo, que parecia morto desdeo fim da Alta Idade Média. A experiência da utilização dos indígenas comoescravos na colonização da América foi de pouca valia, daí a utilização dosescravos africanos. Esta prática dos negócios de escravos foi extremamentelucrativa para os holandeses e outros povos europeus.

9 - Conseqüências dos Descobrimentos

Os descobrimentos provocados pelas Grandes Navegações tiveramconseqüências extremamente importantes para a Europa e o mundo conhecidona época. A descoberta de novas rotas navegáveis e de um outro continente,a América, denominado de Novo Mundo, produziu grandes conseqüênciascientíficas, políticas, econômicas, sociais e religiosas que passaremos aenumerar a seguir.

- Conseqüências Científicas:

a) ficou provada a esfericidade da Terra que era negada até então, pelossábios mais notáveis;

b) a Astronomia progrediu pela necessidade da determinação de segurospontos de referência para a navegação;

c) aumentaram os conhecimentos geográficos, corrigiram-se os mapas ecatalogaram-se novas terras;

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d) a Botânica e a Zoologia foram enriquecidas pelo conhecimento de milharesde novas plantas e animais; e

e) a técnica da construção naval e a arte da navegação foram bastanteaperfeiçoadas.

- Conseqüências Políticas:

a) Gênova, Veneza e outros portos mediterrâneos perderam importância,entrando em decadência; e

b) os países descobridores de novas terras projetaram sua importânciasobre os demais, formado impérios coloniais.

- Conseqüências Econômicas:

a) as rotas comerciais deslocaram-se do Mediterrâneo para o Atlântico;

b) os portos portugueses, espanhóis e, posteriormente, os ingleses,franceses e holandeses, passaram a se constituir nas principais praças decomércio do globo;

c) o preço das especiarias entro em queda na Europa;

d) produtos provenientes da América como: o algodão, o fumo, abatata, e certas madeiras (entre elas o pau-brasil) passaram a ser usadospelos europeus;

e) foram introduzidos na América produtos de fora, como a cana-de-açúcar,o café, a manga, o coco (da Bahia) e outros;

f) as ricas minas de ouro e prata da América (México, Peru e Bolívia),fizeram cair o valor desses metais; e

g) aumentou a circulação das moedas, cresceram os bancos e a burguesiase enriqueceu cada vez mais.

- Conseqüências Sociais:

a) o enriquecimento da burguesia, através do aumento do comércio e doacúmulo do ouro e prata nos bancos, fez subir sua influência social e política; e

b) o ressurgimento do escravismo nas terras da América.

- Conseqüências Religiosas:

a) deu-se a catequização dos habitantes das terras descobertas; e

b) aumentou a influência do cristianismo pela sua expansão geográfica e ocrescimento do número de fiéis.

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III- O DESCOBRIMENTO DO BRASIL

Oficialmente, o Brasil foi descoberto em 22 de Abril de 1500, noúltimo ano do século XV, sendo batizados inicialmente como MontePascoal, primeira elevação observada, devido à época da Páscoa nocalendário católico. Esta descoberta deveu-se ao navegador portuguêsPedro Álvares Cabral, que comandava uma esquadra de 13 navios etinha como principal destino, o porto de Calicutte, onde era realizada amaior feira de especiarias. Pela versão oficial portuguesa, o Brasil foradescoberto acidentalmente, mas, no decorrer dos anos, muitoshistoriadores contestaram esta versão, pois Vasco da Gama, que sedestinava ao rumo desconhecido da Índia, muito antes de Cabral, jáhavia declarado que no horizonte ocidental existiam terras, onde, norelato de marujos, aves pareciam ir rumando para terra. Há também,teses relacionadas ao nome do navegador Duarte Pacheco Coelho, que,possivelmente, estivera no Brasil em 1498.

Cabral prosseguiu até chegar a Calicutte, onde, após Ter sido recebidocom desconfiança pelos mercadores árabes (de religião muçulmana) láexistentes, acabou por entrar em luta com os mesmos, e após perder cercade cinqüenta homens, dentre eles, Pero Vaz e Caminha, escrivão de sua frotae o seu feitor Aires Correa, ordenou o bombardeio daquela cidade, matandomuita gente. Após intensos conflitos, Cabral decidiu zarpar para o norte,rumo à cidade de Cochim, onde o Rajá era rival do de Calicutte; lá conseguiuabastecer suas naus de pimenta, gengibre e canela, retornando a Lisboa comoum novo ídolo, para muitos sonhadores.

A expedição de Cabral foi realizada por D. Manuel, o Venturoso,após o retorno de Vasco da Gama das Índias e se constituía de 13navios e aproximadamente 1500 homens. A maior frota jamais reunidaaté então iniciou a sua viagem em 9 de Março de 1500, partindo deBelém (Lisboa). Alguns autores afiançam que o nome de Pedro ÁlvaresCabral teria sido indicado pelo próprio Vasco da Gama para comandaresta frota. A expedição rumou para o ocidente depois que passoupelas ilhas de Cabo Verde, o que suscitou indefinida questão: se odescobrimento do Brasil foi um mero acaso ou se os portuguesestinham realmente conhecimento das terras ao ocidente e quiseram tomarposse delas.

A reportagem do descobrimento do Brasil foi feita pelo escrivão da

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frota Pero Vaz e Caminha em uma carta de sete folhas a D. Manuel,que se constituiu no primeiro documento oficial da história do Brasil.Após relatar ao rei de Portugal a partida a 9 de março e o trajeto para asCanárias a 14 e a passagem pelo arquipélago de Cabo Verde a 22 domesmo mês, falou do descobrimento das novas terras, destacando suasbelezas, suas aves e sua gente estranha. Para a terra descoberta, Cabraldeu o nome de Vera Cruz. Fez ainda referência às tentativas dosportugueses de fazer amizade com os índios, através da troca de presentes,à missa rezada pelo Frei Henrique Soares (de Coimbra), falou sobre oclima, que ao seu ver era muito bom e temperado, como o de Entre-Douro e Minho, em Portugal, dizia que as águas eram sem fim e que tudoque se plantasse cresceria. Ao terminar, sugeria que o melhor que osportugueses poderiam fazer era salvar a gente local, que considerava muitoselvagem.

Como vemos, esse relato oficial não deixou claro se as terras forampropositadamente visitadas ou ocasionalmente alcançadas.

Pesquisando o Tratado de Tordesilhas, firmado entre Portugal e Espanhaem 1494, que teve como chefe da missão portuguesa, constituída dosmelhores cartógrafos e navegadores da Ordem de Cristo, o experienteDuarte Pacheco Pereira, tratado mediado pelo Vaticano, algumas dúvidassobre o conhecimento português das terras mais tarde descobertasparecem se dissipar.

Portugal saiu-se bem no acordo; pelas bulas Inter Caetera os espanhóistinham o direito as terras situadas a mais de cem léguas a oeste e ao suldas Ilhas dos Açores e Cabo Verde; pelo acordo de Tordesilhas a linhadivisória e imaginária, que ia do pólo Norte ao pólo Sul, foi esticadapara 370 léguas, destinando tudo que estivesse a Leste desse novolimite para os portugueses, incluindo o Brasil. Segundo o relato docronista espanhol das negociações no seu livro “A História de las Índias”,“os negociadores portugueses daquele tratado tinham mais perícia emais experiência daquelas artes, ao menos das coisas do mar do que asgentes espanholas”. Sem a menor dúvida, essa vantagem era dada pelaestrutura secreta da Ordem de Cristo. Graças à Ordem e a sua políticade sigilo, os portugueses sabiam da existência das terras onde hoje estáo Brasil, sete anos antes da viagem de Pedro Álvares Cabral. Também,30 anos antes da viagem de Colombo, todos os mapas nacionais

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portugueses mostravam ilhas com o nome de Antilias a oeste de CaboVerde. O mais famoso cartógrafo da época Paolo Toscanelli escreveu aum amigo português,em 1474, falando da “Ilha de Antília que vósconheceis”. Nesse ano também, há notícias de que o navegador cruzadoJoão Vaz da Corte Real, explorou as Caraíbas e foi até a Terra Nova(Canadá). Porém os documentos comprobatórios da viagem, comoquase tudo da Ordem nunca foram encontrados.

Outro ponto com várias versões é a origem do nome Brasil. Diz atradição que vem da existência do pau-brasil, madeira de cor rosa. Estatradição parece ser insuficiente para se firmar como o verdadeiro motivoda nomeação, pois se sabia, desde 1339, que o nome Brasil já apareciaem mapas daquela época. No século XIV, os planisférios dos cartógrafosMediceu, Silleri, Pinelli e Branco, mostravam uma ilha Brasil, sempre aoeste dos Açores.

A primeira carta geográfica onde aparecem referências seguras ao Brasilreal é o mapa encomendado pelo espião italiano Alberto Cantino em 1501, aum cartógrafo de Lisboa para o seu senhor, o Duque de Ferrara. Nele podemser vistos papagaios, florestas e o contorno do litoral a norte e a sueste.Como explicar a presença na carta do desenho do litoral se as únicas viagensconhecidas ao Brasil, até 1502, foram as de Vicente Pinzón ao estuário doAmazonas e de Pedro Álvares Cabral à Bahia.

Alguns historiadores portugueses modernos acham que Duarte PachecoPereira, o navegador que negociou Tordesilhas e autor do livro “Esmeraldode Situ Orbius”, sobre as navegações portuguesas, escrito em 1505, deixouindicações de que esteve no Brasil em visita à costa do Maranhão e à Foz doAmazonas em 1498, quatro anos depois daquele Tratado.

IV - Conclusão

Por tudo isso, ao que parece, os portugueses sabiam muito mais sobre asterras situadas a Oeste do que reconheciam publicamente, uma vez que onome Brasil aparecia, desde 1339, em mapas e planisférios. O continentesul-americano não foi descoberto por acaso, há evidências de quenavegadores da Ordem de Cristo já tinham estado na região antes de 1500.Em mapa de 1482, feito pelo cartógrafo Gracioso Benincasa, em Ancona,na Itália, havia indicações das seguintes regiões: 1-Costa portuguesa; 2-Costa africana; 3-Isola de Braçill; 4-Antília.

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Comemoramos, oficialmente, os 500 anos do descobrimento do nosso paísna firme hipótese de que as dúvidas pendentes sobre este fato, tiveram suasrespostas perdidas com o desaparecimento dos documentos secretos daOrdem de Cristo, que nunca foram encontrados.

*CMG Ref - Chefe da Divisão de Mobilização da ESG

BIBLIOGRAFIA

Campos Raymundo Carlos Bandeira – “Estudos de História Moderna eContemporânea”, Atual Editora Ltda, São Paulo, 1998.

Daehnhardt Rainer – “A Missão Templária nos Descobrimentos”, Nova Acrópole,Lisboa, 1993.

Távora Luiz de Lencastre – “Colombo, a Cabala e o Delírio”, Quentzal Editores,Lisboa, 1991.