Notas 123 - Banco de Idéias nº 55

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  • 8/6/2019 Notas 123 - Banco de Idias n 55

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    N 123 - Ano 2011

    ISSN 0103-8109

    A V A L I A O D E P R O J E T O S D E L E I

    PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR N 306/08

    ste nmero de NOTAS exa-mina o Projeto de Lei Com-

    plementar n 306/08, aprovado emmaio de 2008 pelo Senado Federale encaminhado Cmara dosDeputados, onde em junho domesmo ano recebeu uma su-bemenda substitutiva na Comissode Finanas e Tributao de auto-ria do deputado Pepe Vargas, e ou- tra, na Comisso de SeguridadeSocial e Famlia, de autoria do de-putado Rafael Guerra. Ambas j dis-cutidas em plenrio. As modifica-es introduzidas pelo deputadoRafael Guerra so marginais e no

    alteram a substncia do PLC apro- vado pelo Senado. O mesmo nopode ser dito da subemenda dodeputado Pepe Vargas que propea instituio de um novo tributo,nos moldes da extinta CPMF. A an-lise de NOTAS est centrada no pro-jeto aprovado pelo Senado, embo-ra as novidades introduzidas pelosubstitutivo do deputado PepeVargas sejam tambm comentadas.

    O Projeto de Lei Complemen-

    tar n 306/08, do Senado, regula-menta a Emenda Constitucional 29que vinculou receitas da Unio, dosestados, dos municpios e do Dis-trito Federal a gastos na rea da sa-de. Mais especificamente, dispe so-bre os valores mnimos a serem apli-cados anualmente por Estados, Dis-trito Federal, Municpios e Unio emaes e servios pblicos de sade,os critrios de rateio dos recursos de

    Etransferncias para a sade e as nor-mas de fiscalizao, avaliao e con-trole das despesas com sade nastrs esferas de governo. Por issomesmo, os artigos 17, 18 e 19definem o que so despesas comaes e servios pblicos desade, assim como as despesasque no podem ser incorporadass exigncias dessa lei, de modoa evitar procedimentos quevenham a ampliar o conceito de gastos com sade.

    Nos cinco primeiros artigos soestabelecidos os porcentuais mni-

    mos das receitas correntes brutasa serem aplicadas em aes e ser-

    vios pblicos de sade pela Unio,pelos Estados e Distrito Federal epelos Municpios; so definidas asreceitas correntes brutas para aUnio e para cada uma das demaisunidades poltico-administrativas;fica determinado o prazo de qua-

    tro anos (at o final do exercciode 2011) para que todos os entesfederativos apliquem em sade pelomenos o mnimo exigido pela lei.

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    O artigo 2 estabelece que aUnio aplicar, anualmente, emaes e servios pblicos de sade,no mnimo o montante equivalente

    a dez por cento de suas receitas bru-tas correntes, as quais esto devi-damente caracterizadas no primei-ro pargrafo, enquanto que o se-gundo pargrafo veda a deduo ouexcluso de qualquer parcela de re-ceita vinculada finalidade especficaou transferida aos demais entes daFederao a qualquer ttulo. O pa-rgrafo terceiro estabelece o ajus-tamento da Unio a essa exignciaentre 2009, quando deveria aplicar

    8,5%, e a partir de ento, aumen-tar essa participao em 0,5 pontopercentual a cada ano para atingir10% em 2011.

    Segundo o art. 3, os Estadostero que aplicar, anualmente, emaes e servios pblicos de sa-de, montante igual ou superior a12% da arrecadao dos impostosmais os recursos que lhes forem transferidos pela Unio conformea Constituio, menos as parcelas

    que sejam transferidas para os res-pectivos Municpios. Os Estadosque em 2008 estivessem aplican-do um montante inferior ao mni-mo definido nessa lei deveriam seajustar at 2011, cobrindo a cadaano pelo menos 25% da diferena.

    As exigncias para os Munic-pios (art. 4) so semelhantes saplicadas aos Estados, inclusive operodo e a forma de ajustamentoao percentual mnimo de gastos em

    sade, gastos esses definidos nosmesmos termos usados para osEstados e que nesse caso corres-pondem a 15% da arrecadao deimpostos mais as transfernciasrecebidas. Para o Distrito Federal(art. 5) o montante mnimo a seraplicado em sade, gastos essesdefinidos nos mesmos termos usa-dos para os Estados, deve corres-

    ponder a 27% das receitas, isto ,a soma dos porcentuais exigidospara os Estados com o percentualexigido para os Municpios.

    Nos artigos 6 a 13 o projetocaracteriza, para todos os nveis daadministrao pblica, as receitassobre as quais incidiro as exign-cias, em termos percentuais, mni-mas de gastos com sade. Carac- teriza, tambm, o que pode sercontabilizado como gasto com

    dos recursos a serem transferidospela Unio aos Estados, ao Distri-

    to Federal e aos Municpios, assimcomo dos recursos dos Estados aserem transferidos aos Municpios,so genericamente definidos e de-pendem de aprovao do Conse-lho Nacional de Sade, no caso doFNS, e do respectivo ConselhoEstadual de Sade, no caso de

    transferncia do Estado para Muni-cpios. As metodologias de alo-cao dos recursos a serem trans-feridos, seja no caso do FNS,seja no caso dos Estados, seropactuadas entre os entes adminis-

    trativos envolvidos e sujeitas aprovao pelos correspondentesConselhos de Sade.

    Curiosamente, o projeto apre-senta uma preocupao com a ne-cessidade de reduzir as desigualda-des regionais no processo de dis-

    tribuio dos recursos do FNS.Assim que o primeiro pargrafodo art. 15 estabelece: A equali- zao dos recursos transferidos acada Estado e ao Distrito Federal ser

    atingida, progressivamente, at oexerccio financeiro de 2011. Ora,se conforme o prprio projeto orateio dos recursos transferidosser realizado segundo o critrio danecessidade de sade da populaoe levar em considerao as dimen-ses epidemiolgica, demogrfica,socioeconmica, espacial, a capaci-dade de oferta de aes e de servi-os de sade e a necessidade de re-duzir as desigualdades regionais,

    como ser possvel impor a equa-lizao de recursos a serem trans-feridos para os Estados e o DistritoFederal?

    Transparncia,por meio da maisampla divulgao, controle e fisca-lizao, por meio de sistema pr-prio de registros de receitas e des-pesas, assim como pela elaboraode plano de sade anual e relat-

    sade, procurando dessa formaevitar desvios decorrentes de pos-sveis interpretaes. Ao conside-rar os gastos com sade providosfinanceiramente por meio de em-

    prstimos, corretamente, dentrodo esprito do projeto, para efeitodo cumprimento das exignciasestabelecidas, somente os gastoscom juros e amortizaes devemser includos.

    As particularidades da adminis-trao dos recursos do Fundo Na-cional de Sade constam dos arti-gos 14 a 16. Os critrios de rateio

    A UNIOAPLICAR, ANUAL-MENTE, EMAESESERVI-

    OSPBLICOSDE SADE,NOMNIMO, OMONTANTEEQUIVALENTEADEZ PORCENTODESUASRECEITASBRUTAS CORRENTES, AS

    QUAIS ESTO DEVIDAMENTECARACTERIZADAS NO PRIMEI-RO PARGRAFO, ENQUANTO

    QUE O SEGUNDO PARGRAFOVEDAA DEDUO OU

    EXCLUSO DE QUALQUERPARCELA

    DE

    RECEITA

    VINCU

    -LADA FINALIDADE ESPE-CFICAOUTRANSFERIDAAOSDEMAIS ENTES DA FEDERA-OAQUALQUERTTULO.

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    rios de execuo oramentria, eavaliao, por meio de indicadoresde desempenho e relatrio de ges- to examinados a cada quadri-mestre pelo correspondente Con-selho de Sade, so consideradosnos artigos 20 a 29. O projeto pre-v a manuteno de registro contbilauxiliar relativo s despesas efe-tuadas com aes e servios pbli-cos de sade. Alm disso, o poderExecutivo manter um sistema deregistro eletrnico centralizado dasinformaes referentes aos ora-mentos pblicos de sade da Unio,dos Estados, do Distrito Federal e dos

    Municpios, garantido o acesso pbli-co s informaes. Os frequentesdesvios de conduta de administra-dores pblicos justificam a preocu-pao do legislador em introduziresses mecanismos, embora no garantam os resultados pretendi-dos. Entretanto, o desenvolvimen- to e a operao desses sistemasimplicaro em maiores custos quedevero ser contabilizados comogastos com sade, desviando esses

    recursos de seu objetivo final.Os artigos 30 e 31 estabelecemcomo os entes da Federao, emsituao de no cumprimento dopercentual mnimo, podero pro-mover o ajuste norma, assimcomo as punies s quais estarosujeitos.

    A subemenda substitutiva dodeputado Pepe Vargas, com 66 ar- tigos, tem os mesmos propsitosdo PLC 306 do Senado Federal,

    mas institui uma contribuio socialdestinada sade. Quanto aospercentuais mnimos de receita aserem aplicados h marcantes di-ferenas no que se refere Unio.Conforme o artigo 5, a Unio de- ver aplicaranualmente, em aese servios pblicos de sade, o mon-tante correspondente ao valor em-penhado no exerccio financeiro an-

    terior, apurado nos termos desta LeiComplementar acrescido de, no m-nimo, o percentual correspondente variao nominal do Produto Inter-

    no Bruto PIB, ocorrida no ano an-terior ao da lei oramentria anual.Ressalvado o caso do PIB nominalapurado apresentar uma variaonegativa, quando a despesa comsade deve ser mantida.

    primeira vista, o montante derecursos destinado, pela Unio, sade no seria muito diferente doprojeto original um crescimentono PIB nominal de 10% poderiaocorrer com um crescimento real

    de 6% e uma inflao de preosde 4%. Em primeiro lugar, a varia-o do produto se refere ao anoanterior ao da votao da lei ora-mentria e, portanto, correspon-der, no ano da execuo do ora-mento, a uma defasagem de doisanos. Isso pode implicar em maio-res gastos com sade em um anoem que a arrecadao tributriaseja menor devido ao desaque-cimento da economia. Segundo, as

    receitas provenientes da Contribui-o Social Sade, a nova versoda CPMF, no sero includas nadefinio de despesas empenhadas,o que significa que a CSS ser re-passada para o Fundo Nacional deSade. Isso abre a possibilidade doExecutivo usar tais recursos comodesejar, desde que mantenha em diaos registros no FNS. Uma formabvia de uso de tais recursos acompra, pelo FNS, de ttulos da d-

    vida pblica, possibilidade permi- tida pelo projeto.

    No caso dos Estados, a exign-cia a mesma, tanto em termospercentuais quanto na definio dereceita, apresentada no projetooriginal. J o Distrito Federal temum tratamento mais complexo;sobre as receitas similares s dosEstados deve destinar sade

    12% e para as receitas similaress dos Municpios deve destinaro mesmo percentual que estes,isto , 15%. Como esses contro-

    les devem ser feitos separada-mente, isso acarretar maiorescustos de administrao. Entre-

    tanto, por cinco anos a partir daentrada em vigor dessa lei com-plementar os recursos destina-dos pelos Estados e pelo Dis-

    trito Federal para compor oFundo de Valorizao dos Pro-fissionais da Educao Fundebsero excludos da base de cl-culo do percentual a ser aplica-

    do em sade.A Contribuio Social Sade imagem e semelhana da CPMF.Todas as organizaes e pessoasimunes tributao domstica es-

    to isentas dessa contribuio, as-sim como a Unio, os Estados, oDistrito Federal, os Municpios,suas autarquias, fundaes e os con-srcios e outras formas legais decooperativismo estabelecidos poresses entes federativos para a exe-

    cuo conjunta de aes e serviosde sade. A subemenda define emseu artigo 17 a alquota de 0,1%.Quinze alneas do artigo 18 defi-nem as situaes para as quais essaalquota ser zero. Em trs dessescasos sua caracterizao dependede normas a serem emitidas peloBanco Central. dado ao poderExecutivo o poder de estabelecerlimite do valor do lanamento paraque a alquota zero seja aplicada. A

    responsabilidade administrativa emrelao CSS, em todos os aspec-

    tos, atribuda Secretaria da Re-ceita Federal.

    A anlise desse PLC deixa claraa necessidade de uma reforma denosso sistema pblico de sade.

    Ainda que se desconsiderem asdeficincias dos servios de sadepromovidos pelo setor pblico por

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    meio do SUS, a cultura do remen-do institucional est tornando nos-sa Constituio incua em seu pa-pel fundamental de proteger o ci-dado contra a concentrao depoder pelo Estado. Como os ser- vios pblicos de sade no aten-dem minimamente o cidado, maise mais brasileiros so levados participao em planos de sadeprivados. Isso por si s no ruim.O mal est no evento que motivaessa escolha do cidado, a noconfiabilidade dos servios pblicosque ele sustenta pagando impostos.O seguro sade ou os planos desade tm uma importante contri-buio a dar no s satisfazendo asdemandas pelos servios de sade,mas tambm provendo maiortranquilidade s famlias brasileiras.Essas organizaes esto sufocadaspela regulamentao que as temimpedido de oferecer a reduo derisco desejada pelos clientes.Nesse contexto, o cidado queparticipa de um plano ou seguro de

    sade paga duas vezes para teracesso a esses servios, assimcomo ocorre com a educao.

    O artigo 6 de nossa Constitui-o garante ao cidado um conjun- to amplo de direitos sociais: Sodireitos sociais a educao, a sade,a alimentao, o trabalho, a mora-dia, o lazer, a segurana, a previdn-cia social, a proteo maternidadee infncia, a assistncia aos desam- parados, na forma desta Constitui-

    o. Na tentativa de garantir taisdireitos as autoridades pblicas tmfalhado. Felizmente, a alimentao em grande parte provida pelomercado, e onde o governo temagido, como no caso da merendaescolar, pululam os casos de des- vio de recursos e corrupo. Umsistema de sade fundado nos mes-mos princpios que permitem maioria dos brasileiros ter acesso

    a alimentos muito certamenteproduzir, no provimento de ser- vios de sade, melhores resulta-dos a menores custos. No con-fundir o sistema de mercado comas atuais parcerias pblico-privadasque dominam uma srie de servi-os de sade sob as bnos doapadrinhamento e trfego deinfluncia.

    O oramento da Unio impeao administrador pblico uma s-rie de exigncias que retiram dele

    sua funo principal, qual seja, a dealocar os recursos pblicos. Imporpercentuais mnimos de gastospara certas atividades s produzi-

    r mais restries ao do admi-nistrador pblico, alem de promo-ver situaes de desperdcio pelanecessidade de gastar para cumprirexigncias legais. Embora o argu-mento corrente seja o de que fal-tam recursos pblicos para o pro- vimento de servios de sade, opresente PLC no resolver o pro-blema. Recursos, por definio, soescassos. A convivncia com esse

    fato exige seu uso econmico. verdade que o projeto procura evi-tar burlas e estabelece todo um sis-tema de fiscalizao e controle. Po-rm, para o cliente os procedimen-

    tos sero os mesmos, uma vez queo sistema provedor dos serviosno ser afetado, ainda que sejaenriquecido com a contratao depessoal, construes e aquisio denovos equipamentos. Muito prova-

    velmente, construes e equipa-mentos sofisticados dominaro os

    gastos por duas razes: o interes-se especfico dos mdicos por cer-

    tas tecnologias e o interesse dospolticos na capitalizao de gastossob a forma de votos. precisodescentralizar o sistema pblico desade integrando sua administraoao ambiente de seu cliente.

    Embora no seja politicamentecorreto argumentar contra alo-cao de mais recursos para sadepblica, NOTAS recomenda que oPLC 306 no seja aprovado comoest por entendermos que sem uma

    reforma do sistema aumentar seusrecursos financeiros colocar di-nheiro bom em projeto ruim. En-

    tretanto, o caos no sistema talvezpudesse ser reduzido com algumaporte de recursos. Nesse senti-do, o PLC 306 deveria incorporarum artigo que determinasse sua

    validade por trs anos e que ao lon-go desse perodo fosse desenvol-vido um estudo para a reforma dosistema de sade pblica, o qual

    deveria ter como caractersticas: oprovimento dos servios de sadepelo mercado, amparado por umsistema de seguro sade e com aao do setor pblico centrada naUnio limitada ao provimento de

    vacinas e de um plano bsico desade para todos os cidados.

    Com relao ao substitutivo dodeputado Pepe Vargas, NOTAS re-comenda sua completa rejeio.

    MUITOPROVAVELMENTE,CONSTRUESEEQUIPA-MENTOSSOFISTICADOS

    DOMINAROOSGASTOSPORDUASRAZES: OINTERESSEESPECFICODOSMDICOS

    PORCERTASTECNOLOGIASEOINTERESSEDOSPOLTICOS

    NACAPITALIZAODEGASTOSSOBAFORMADEVOTOS.

    PRECISODESCENTRALIZAROSISTEMAPBLICODE

    SADEINTEGRANDOSUAADMINISTRAOAO

    AMBIENTEDESEUCLIENTE.