NOVAS ESTRATÉGIAS DE MARKETING DIGITAL NA...
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Práticas Interacionais em Rede Salvador - 10 e 11 de outubro de 2012
NOVAS ESTRATÉGIAS DE MARKETING DIGITAL NA MÚSICA: UMA
INVESTIGAÇÃO SOBRE O PAPEL DE DUAS FERRAMENTAS
João Renato de Souza Coelho Benazzi1
Leandro Donner2
Resumo: Este trabalho investigou as possibilidades que a internet oferece para a divulgação
do trabalho dos músicos. Foram estudados conceitos de tecnologia, marketing e estudos de
caso. O foco do estudo recaiu sobre ações nas redes sociais e, no campo, foram entrevistados
um representante do Myspace e outro do site de crowdfunding benfeitoria para entender o uso
que fazem das redes sociais e de estratégias de marketing se valendo da internet como
recurso.
Palavras-chave: Música na internet, Estratégias de comunicação, Estratégias de marketing.
Abstract: This paper examines the possibilities that the Internet provides for the
dissemination of the work of musicians. Concepts of the areas of technology, marketing and
case studies were examined. The study focused on social networking environment and, in its
field data collecting phase, two interviews were conducted one from Myspace anda another
from benfeitoria to understand their use of social networking and marketing strategies in
virtual environment.
Keywords: Music in the internet; Communication strategy; Marketing strategy.
Introdução
O universo da produção musical, no Brasil, sempre apresentou diversas questões
relativas ao espaço de atuação e de divulgação, e aos incentivos oferecidos ao trabalho da
grande massa de artistas aqui residentes. Neste contexto, a classe musical busca se apoiar nas
plataformas possíveis e existentes, realizando e divulgando seus trabalhos. O advento da
internet e a crescente e constante introdução de novas ferramentas e funcionalidades no
mundo virtual vêm trazendo significativa movimentação não somente por parte de empresas,
anunciantes e produtores de tecnologia, mas também por parte da classe artística e criativa,
que enxerga nestes novos mecanismos a possibilidade de se divulgar, de atingir nichos, de se
organizar e de se remunerar. O presente estudo pretende analisar as possibilidades que o
ambiente da internet oferece para a produção, divulgação e viabilização dos trabalhos por
parte da classe musical, através de diversas plataformas virtuais existentes, especializadas ou
não no ambiente cultural e criativo em questão. A dinâmica da indústria da música vem se
1 Professor da PUC-Rio e doutorando em Comunicação e Cultura pela ECO-UFRJ:
[email protected] 2 Graduado em Administração pela PUC-Rio.
alterando de forma constante, o que muitas vezes dificulta uma compreensão mais
aprofundada de sua cadeia produtiva, fazendo com que muitos músicos e agentes da indústria
de maneira geral, fiquem defasados e pautem suas ações sobre premissas erradas ou obsoletas.
A comercialização massiva de discos, baseados nos materiais e suportes disponíveis,
foi possível através da reprodução em larga escala que, ao permitir uma grande difusão de
música gravada, gerou alguns dos princípios da indústria fonográfica como se conhecia até a
década de 90, onde a vendagem dos discos significava a maior fonte da receita para as
gravadoras. Pouco mais de um século depois da invenção das primeiras formas de reprodução
musical não executada “ao vivo”, surgem os formatos digitais/virtuais de execução musical.
Estes vieram alterar profundamente os padrões da indústria fonográfica, já que a partir da
difusão maciça de arquivos como os MP3, o público passou a ter acesso gratuito e quase
irrestrito à música, constituindo uma transformação profunda e irreversível para este mercado
e indústria. Neste contexto, onde as grandes gravadoras precisam se reinventar para
sobreviver numa indústria profundamente alterada, cujos rumos ainda estão se desenhando,
como podem os músicos utilizar as tecnologias a seu favor, desenvolvendo interessantes
estratégias de promoção online? Como pode a indústria se adaptar às mudanças no consumo
de música nos dias de hoje e quais as implicações destas mudanças para os artistas? Como
trabalhar com conteúdo musical no ambiente virtual de forma rentável e/ou sustentável para
artistas e plataformas/ferramentas?
Neste ambiente turbulento, muitos tentaram e seguem tentando lutar contra as
tendências e realidades apresentadas. Entretanto, diante deste contexto, como os participantes
da feitura de conteúdo musical (compositores, intérpretes, produtores) podem utilizar as novas
(e também as não tão recentes) possibilidades oferecidas pelas tecnologias virtuais a seu
favor, construindo suas estratégias de marketing com base nas ferramentas disponíveis?
Novos modelos de negócios – colaboração na Indústria Fonográfica e de Tecnologia
Neste sentido, Netto (2008) propõe uma visão interessante e mais moderna sobre o
assunto, sugere que as indústrias tecnológica e fonográfica devem buscar caminhos
convergentes que resultem em novos modelos de negócios. Para o autor, as duas indústrias
vêm disputando o “controle de um campo que se torna conflituoso” (NETTO, 2008, p.142),
mas que com o tempo, zonas solidárias tendem a surgir, para que haja trabalho em conjunto.
As novas formas de negócio que podem surgir, segundo o autor, devem privilegiar a
legalidade e a transferência do financiamento do consumidor para patrocinadores. Acerca das
mudanças no cenário musica, Netto traz algumas novidades. Trata-se de uma abordagem que
alia a pirataria (física e virtual) à crescente importância das empresas de tecnologia
(informática, telefonia móvel, entre outras) como principais motivadores das mudanças da
última década no cenário musical. No entanto, esta idéia é considerada deveras simplista pelo
autor, pois desconsidera as mudanças pelas quais as gravadoras já vinham passando mesmo
antes do advento do MP3. Na década de 90, as gravadoras já vinham alterando seu modelo de
negócios, que passaria a focar mais na administração e na promoção das obras, ao invés da
gravação.
Netto, de maneira muito interessante para este estudo, apresenta números que
corroboram com a idéia de que a venda de música digital é viável e crescente no Brasil. Desde
o ano 2000, o mercado fonogr fico apresenta n meros sistematicamente menores. s vendas
naquele ano foram de , il es, mas em totali aram , il es. o
rasil, o decl nio foi ainda mais significativo. “ e em a ind stria fonogr fica vendeu
mil es em m sica, com mil es de unidades comerciali adas, em arrecadou
, mil es, com , mil es de unidades.” ( , , p.
ontudo, se uma queda geral, ao fragmentarmos os n meros por tipos de
atividades podemos notar que o decr scimo locali ado na venda tradicional de
m sica (ou se a, na venda f sica de discos . uando se analisam as vendas de m sica
digital (pela internet e pelo telefone celular , o serva-se um grande crescimento. e
em a ind stria fonogr fica mundial arrecadava mil es com vendas
digitais, em este n mero passou para , il es. sso significa que em
ela teve de seu faturamento apoiado nesse modo de venda. o rasil a
tendência se mant m. ntre e , o faturamento da ind stria com as vendas
digitais su iu , o que não a torna ainda relevante, dada a sua incipiência at
então, mas pode demonstrar que camin a pari passu com a tendência mundial.
(NETTO, 2008, p.144-145)
A indústria tecnológica, antes acessória à indústria fonográfica, passa a desempenhar
outros papéis, tornando-se também uma concorrente à indústria fonográfica.
Complementando a idéia de Netto, vale citar que o mesmo acontece com a indústria de
telefonia móvel, a exemplo da OI, que lançando o selo OI NOVO SOM, passa a atuar tal qual
uma gravadora, porém com um modelo atual e rentável, com downloads pagos, canais no
Youtube, casas de espetáculos, cast de artistas, distribuição de ringtones.
Miguel (2011) enumera uma série de eventos recentes ligados à música digital. O
Prêmio Música Digital revelou os artistas mais vendidos nos diversos gêneros. O prêmio é
uma tentativa de fortalecer o comércio de música digital e funciona como um termômetro
deste mercado. A Nielsen (empresa internacional especializada em auditoria), auditou quase
nove milhões de downloads comercializados legalmente na internet, nos últimos 12 meses de
2010, em terras brasileiras.
Como forma de exemplificar a relação descrita por Netto (2008), cabe citar os
participantes do evento, além dos artistas: representantes das gravadoras (multinacionais e
independentes), de editoras, de plataformas de comercialização de música no Brasil ( Oi, Tim,
Claro, Vivo, UOL, Sonora, iMusica e Nokia. Pode-se traçar uma ponte interessante entre os 3
autores: O primeiro explicita a idéia de que as gravadoras tentaram combater o MP3; o
segundo mostra como as gravadoras podem aliar-se às produtoras de tecnologia em busca de
novos modelos de negócio, e o terceiro ilustra isso com o exemplo de um evento que reuniu
as indústrias de tecnologia, de telefonia e fonográficas, demonstrando números milionários
sobre a venda de música online no Brasil, tema principal desta subseção.
Marketing Digital
Com o advento e crescimento de empresas como Google e Facebook, que vêm tendo
impacto sobre os hábitos das pessoas e sobre a forma como elas buscam seus serviços e se
comunicam, fica muito claro o papel preponderante que o Marketing Digital – as estratégias
de marketing que se valem de suportes digitais - ocupa nos dias atuais.
Miller (2011) introduz o capítulo relativo a mídias sociais de forma interessante:
“M dias ociais são asicamente ferramentas para se passar informaç es, em todas
as direções, entre amigos, familiares e companheiros de trabalho. Para os
profissionais do Marketing, isso faz delas o marketing boca-a- oca do s culo XX ”.
(MILLER, 2011, p. 359)
As mídias sociais permitem que o indivíduo troque com seus amigos virtuais ou reais
suas experiências pessoais como: o que estão fazendo, pensando, lendo, ouvindo, assistindo,
eventos a que estão indo, entre outros. Um dos aspectos fundamentais sobre mídias sociais é
que elas permitem uma relação de duas (ou mais) vias, enquanto as mídias tradicionais como
jornais, revistas, rádio e televisão, em seus formatos tradicionais, não oferecem muita
possibilidade de interação, sendo mídias de apenas uma via ativa (Miller, 2011). Ao entrar em
contato com as mídias tradicionais o público é apenas consumidor de conteúdo enquanto, ao
participar de mídias sociais, o público é ao mesmo tempo consumidor e criador de conteúdo,
participando muito mais ativamente do que nos meios tradicionais. Segundo o autor, este
aspecto é o que chama maior atenção dos profissionais de marketing.
Miller descreve, ainda, um pouco da história das mídias sociais. Ele atenta para o fato
de que, na verdade, o grande trunfo das mesmas foi congregar em único lugar ou plataforma,
diversas funcionalidades pré-existentes como serviços de mensagens instantâneas, email,
fóruns de debate e outros. Acerca do aspecto histórico das mídias sociais, que remonta ao
início do século XXI, é interessante observar os anos de criação das mesmas, bem como o ano
de popularização delas. No capítulo seguinte desta monografia, relacionado à pesquisa, o
pesquisador categorizou os músicos segundo critérios que se relacionam também com o
tempo de existência do trabalho dos mesmos, comparando-o ao nível de estruturação e
popularidade das mídias sociais em determinado período da década passada.
Segundo Miller, as mídias sociais tais como conhecemos nos dias de hoje iniciaram-se
em 2003, a partir do site Friendster. O Facebook, principal rede social dos dias de hoje em
número de usuários ao redor do mundo (em 5/10/11, o portal G1, da Globo, divulgou o
número de 800 milhões de usuários), foi criado em 2004, e somente em abril de 2008, tornou-
se a rede mais popular, ultrapassando o Myspace. Todas estas datas, muito recentes, estão
muito próximas ao nascimento das carreiras de alguns dos músicos entrevistados para este
trabalho. Miller (2011) categoriza as mídias sociais em diferentes tipos sendo os mais
importantes e que devem concentrar os esforços de marketing estratégico por parte dos
músicos: redes sociais (Facebook, Myspace, Linkedin); Blogs; Microblogs (Twitter);
Compartilhadores de Mídia (Youtube, Flickr). Mais diretamente ligado ao estudo deste
tra al o: “ a pr tica, redes sociais são a casa de todo tipo de usu rio, incluindo m sicos,
atores e celebridades, conectando-se com seus fãs”. (M LL ,
O autor faz uma nota muito interessante sobre as redes sociais, que em muito se
relaciona também a este trabalho.
“ uando se fala de redes sociais, f cil focar na l der Face ook e negligenciar todas
as outras, o que constitui um erro. Redes sociais de nicho representam oportunidades
nicas de atingir distintas comunidades de consumidores.” (M LL , , p.
A Melody Box foi escolhida pelo autor do presente trabalho para servir de exemplo de
rede social, e ela se encaixa exatamente no que Miller afirma acima. Trata-se de uma rede
social de nicho, voltada principalmente para aqueles que fazem, ouvem e trabalham com
música. Apesar de esta comunidade musical já ser por si só muito grande em termos de
pessoas, constitui um nicho se compararmos a mesma ao universo de internautas, composto
de pessoas de todas as idades, classes sociais, gêneros e interesses.
Segundo Miller (2011), um aspecto interessante das redes sociais é o que ele chama de
compartilhamento social: a circulação de fotos, filmes e músicas e outros, entre amigos
virtuais. As redes sociais Myspace e Facebook são citadas como redes que oferecem
compartilhamento de arquivos, embora existam redes especializadas, como Flickr (para
fotografias) e Youtube (para vídeos). Os sites de compartilhamento de mídia supracitados
geralmente oferecem possibilidades de interação, como facilidade de criação de links com
emails, blogs e outros sites. O autor explica por que as mídias sociais são importantes para os
profissionais de marketing. O primeiro motivo, segundo ele, é o tamanho da base de
consumidores participando destas mídias, um número na ordem da grandeza de centenas de
milhões, contando com pessoas de várias características: de pré-adolescentes a idosos, de
estudantes a aposentados. Segundo Miller, são mídias universais. A partir de dados obtidos no
site Insidefacebook.com, Miller descreve que 64% dos usuários do Facebook tem 26 anos ou
mais: pessoas com verdadeiro poder de compra, atraentes para qualquer estrategista de
mercado. É provável que consumidores de qualquer tipo, a exemplos de fãs de música, que
consomem shows, por exemplo, estejam falando sobre determinada empresa, produto, serviço
ou artista nas redes sociais. Cabe ponderar se vale a pena inserir-se nestas mídias,
monitorando, participando e interagindo. O autor considera esta hipótese vantajosa, sobretudo
no caso da relação entre fãs e artistas, quando o primeiro geralmente busca o maior contato
possível com o segundo.
Miller (2011) considera que atuar em redes sociais é uma das veículos de marketing
mais eficientes. A um custo relativamente baixo (para artistas, este custo pode ser apenas
dedicação e tempo), uma estratégia bem feita pode atingir um ótimo número de consumidores
extremamente segmentados. Um aspecto interessante é observar que o marketing através das
redes sociais não é tão custoso, o que permite maior equalização entre players menores e
maiores. Observa-se que pequenos players (ou artistas menores), através de atenção e
dedicação, podem atingir resultados muito interessantes sem grandes orçamentos. Mídias
sociais são uma forma de marketing boca-a-boca, que resulta numa campanha de extrema
qualidade. Caso pessoas queridas ou admiradas indiquem determinado artista para ser ouvido,
por exemplo, é muito mais provável que a rede de contatos desta pessoa se interesse do que
caso houvesse contato com uma simples propaganda ou publicação no perfil ou página de
alguém por parte do próprio artista. A rede de conexões que a empresa pode criar com sua
base de clientes (ou o artista com seus fãs) é algo muito vantajoso. Conversas podem ser
estabelecidas com clientes (ou fãs) mais ardorosos, trazendo um feedback de extrema
qualidade.
Miller (2011) descreve, ainda, formas de se desenvolver uma estratégia de marketing
em mídias sociais, algo totalmente aplicável a músicos. O primeiro passo é participar de fato
destas comunidades, criando páginas ou perfis nas mesmas. Isto pode ser utilizado para
comunicar lançamento de produtos (ou de músicas, vídeos) ou até mesmo para estabelecer
relações diretas, diálogos com os clientes (ou fãs). O importante é a participação ativa nas
redes, não apenas monitorando o que é dito sobre a empresa, produto ou artista, mas também
produzindo e publicando conteúdo. Os objetivos, segundo Miller (2011), podem ser
quantitativos ou subjetivos. Numericamente falando, determinado negócio (ou artista) pode
objetivar, por exemplo, obter determinado número de fãs em sua página. Objetivos subjetivos,
por sua vez, podem ser o simples estabelecimento de uma conversa com algum fã, cujo valor
é intangível. O engajamento e a interação de fãs ou clientes nas redes sociais pode ser de
extremo valor para a empresa ou artista.
Marketing Digital Musical
Uma vez estudados aspectos da revolução digital musical na primeira seção, bem
como analisados aspectos das teorias do marketing, sob a ótica do marketing digital e dos
grupos de referência, na segunda seção, esta terceira seção visa estudar a interseção entre
todos estes assuntos. O problema principal proposto pelo artigo de Lima (2011) “ omo os
m sicos rasileiros utili am as redes sociais?” autora aseia-se em dois estudos de caso, os
cantores e compositores Leoni e Mallu Magalhães, buscando extrair destes exemplos,
“inferências que permitam refletir so re a cultura musical contemporânea”. (L M ,
Acerca da utilização das redes sociais, exemplifica a autora:
A visibilidade obtida pela jovem compositora e intérprete brasileira Mallu
Magalhães, que disponibilizou quatro canções em um perfil musical na rede social
MySpace e obteve em sua página 1,9 milhão de visitas em menos de seis meses
(dados de 2007), é um exemplo dos trânsitos da música nas fronteiras entre o
consumo de nicho e massivo, mediante o uso de plataformas digitais. (LIMA, p.1,
2011)
Ainda sobre a utilização das redes sociais pelos músicos e da repercussão de seus
trabalhos na mesma, afirma a autora:
“ presença nas redes sociais não garante ao músico independente uma projeção
semelhante. São encontrados nas mesmas redes perfis de músicos independentes
e/ou estreantes e de estrelas do mainstream, com repercussão astante variada.”
(LIMA, p.2, 2011)
É importante ressaltar que a mudança no modelo de negócios da música ainda não
aboliu por completo os formatos anteriores. Sobre a convivência entre formatos antigos e
novos, diz a autora:
Mesmo com o êxito de audição em streaming e dos downloads gratuitos no
MySpace, a compositora também se valeu de um produto tradicional, o álbum em
CD, como suporte para circulação de sua produção. Isso demonstra que, no atual
panorama da cultura musical, novas possibilidades de circulação convivem com
modelos anteriores. (LIMA, p.3, 2011)
Sobre as diferenças entre o material disponibilizado na rede social Myspace e aquele
destinado a outros veículos de grande circulação, posteriormente, a autora infere que Mallu
Magalhães teve que investir em uma melhora de qualidade, destacando as diferenças entre os
tipos de gravação: aquele destinado somente à veiculação na internet, e aquele destinado a
outros formatos e veículos de massa. Investimento na qualidade do material é fundamental.
É interessante analisar a questão do público que se pretende atingir, se
diferentes nichos ou público de massa:
a poca da “reprodução digital”, das redes que se valem dela, e dos mercados de
nic o que se a rem a partir dela, question vel o uso da noção de “massa” (... . s
novas tecnologias afetaram a maneira como a m sica incide na organi ação social,
desde os tradicionais clubes de melômanos a blogs, chats e sites de Internet, nos
quais gostos musicais são um componente crucial nos perfis que atraem as pessoas a
se relacionarem com seus congêneres, os quais podem viver distancia de do rar
uma esquina ou a vinte mil quil metros, do outro lado do mundo. ( , 2006)
Os suportes digitais permitem que estas músicas atinjam seu público de forma mais
fácil do que nos tempos anteriores à circulação digital, que foi, segundo Lima (2011), o que
ocorreu com as canções de Mallu Magalhães disponibilizadas no Myspace. Os primeiros
ouvintes tornaram-se divulgadores, e a cantora atingiu grande popularidade no portal. Esta
popularidade conferiu a Mallu Magalhães a possibilidade de ingressar em mídias tradicionais,
ao estabelecer contato com a operadora de telefonia Vivo. A capacidade de uma adolescente
sem auxílio do aparato massivo de marketing fazer sucesso conferiu autenticidade ao trabalho
da jovem fazendo com que a marca buscasse associação ao seu trabalho. Entretanto, o
caminho de transição entre a popularidade virtual e a popularidade em outros meios não é
simples. O artista deve conseguir captar o interesse de um número significativo de ouvintes,
através de divulgação paralela ao da indústria musical, através de emails, blogs, listas de
discussão, chats, entre outros. Mallu Magalhães contou com banners no site do Myspace,
além de um grande boca-a-boca virtual. A popularidade virtual da cantora chamou a atenção
da mídia tradicional, o que trouxe ainda maior visibilidade à artista.
O cantor e compositor Leoni afirma que recebia, diariamente, dezenas de convites de
músicos para que ouvisse suas músicas. Para se conseguir um bom número de ouvintes
online, deve-se utilizar alguma estratégia de diferenciação, caso contrário, não existe
incentivo para que as pessoas escutem determinado artista online que favoreça a difusão do
conteúdo do mesmo na internet (LIMA, 2011). O músico utilizou, primeiramente, a rede
social Orkut, onde encontrou uma comunidade onde cerca de quarenta internautas
comentavam sobre sua obra. Ingressou nesta comunidade, dando novo fôlego à mesma, já que
os fãs passaram a interagir com seu ídolo. Com o boom do Orkut, rapidamente a comunidade
passou a ter centenas de membros, até atingir o número de 45.000 membros em 2010. Além
do Orkut, Leoni utiliza bastante as ferramentas Facebook e Twitter, destacando que, neste
último, envia a seus fãs diversas atualizações sobre seus shows e atividades recentes, além de
buscar informações sobre outras tendências do mercado. A utilização das mídias, segundo
atiana Lima, “incentivam o di logo entre m sico e consumidor”.
Leoni ressalta a importância de estar presente nas redes sociais, mas ao mesmo tempo
possuir um espaço que se a próprio do artista, como seu we site. egundo ele, “redes de
relacionamento devem ser usadas para trocas e para atrair pessoas para o seu site. São uma
passagem, não um destino”. O trabalho de um artista encontra respaldo e divulgação por parte
de seus próprios fãs, a exemplo da comunidade em torno de sua obra, que estava disponível
na rede social Orkut antes mesmo de sua participação na rede. Além disso, os perfis criados
nas redes costumam conter informações sobre gostos musicais das pessoas, gerando relações
a partir, também, de afinidades musicais explicitadas nas plataformas (LIMA, 2011).
Vale destacar, por último, dentro da obra de Lima (2011), citações a obra de Yochai
Benkler, que descreve ações dos músicos dentro das redes, a partir de maneiras pelas quais os
mesmos podem se colocar. É citada a comunicação com os fãs, a comunicação entre os fãs, a
colaboração dos fãs na obra ou em financiamentos, entre outros aspectos.
Métodos e procedimentos de coleta e de análise de dados do estudo
A respeito de responsáveis pelas plataformas, o autor buscou entrar em contato com os
fundadores da “ enfeitoria”, plataforma de rowdfunding, uma das ferramentas escol idas
para o estudo. Foi realizada, através de telefonema, uma entrevista, com roteiro semi-
estruturado, com profissional indicado pelos dois fundadores da mesma, que tinham um
conhecido em comum com o autor do trabalho. Dorly Neto, responsável pela parte de
polinização da dinâmica de Crowdfunding da plataforma foi o entrevistado. Objetivava-se
compreender como a plataforma enxerga as possibilidades que o Crowdfunding oferece para a
viabilização e a divulgação de projetos musicais, além das possibilidades de interação
público/artista. O autor buscou, ainda, contato com Isabela Damiano, que atua no setor
comercial da Melody Box, a rede social focada no universo musical que foi escolhida como
uma das ferramentas a serem analisadas em maior profundidade. A entrevistada era conhecida
do autor. Foi realizada entrevista, ao vivo, com a mesma, através de roteiro semi-estruturado,
visando entender melhor as funcionalidades do portal, dados de crescimento do mesmo,
participação dos artistas, integração entre meio físico e virtual, dentre outros aspectos.
O instrumento considerado ideal foi a entrevista, a ser realizada através de roteiro
semi-estruturado, que permitisse que outras questões e assuntos relevantes não previamente
pensados surgissem e viessem a complementar o trabalho. Para buscar a aplicação do
instrumento, o pesquisador utilizou-se de várias formas, variáveis de acordo com o nível de
contato pessoal com os indivíduos que eram as fontes de dados desejados. Quanto aos
responsáveis pelas plataformas, a estratégia se deu de formas diferentes. O contato com
Isabela Damiano, da Melody Box, se deu através de mensagem fechada no Facebook,
explicando o assunto da monografia, a importância que um encontro com alguém da
plataforma teria para a pesquisa, e já neste primeiro contato, tentando marcar uma entrevista
ao vivo que permitisse a coleta de dados da maneira considerada ideal pelo pesquisador.
Isabela mostrou-se disponível e enviou, ainda, seu trabalho acadêmico de conclusão de curso
de publicidade na PUC-Rio, que tratava de alguns assuntos semelhantes ao presente estudo, e
que serviram não somente como revisão de literatura, mas também como base para alguns
assuntos da entrevista. Não foram enviados previamente os dados do roteiro semi-estruturado.
Já com relação aos responsáveis pela plataforma de Crowdfunding Benfeitoria, o
contato foi realizado através de um terceiro. A via inicial foi mensagem fechada através do
Facebook, explicando o assunto da monografia e a importância que um encontro com alguém
da plataforma teria para a pesquisa. O terceiro em questão fez a o elo entre o pesquisador e o
entrevistado através de email. Buscou-se a marcação de um encontro ao vivo. Os responsáveis
pela plataforma, impossibilitados de responder pessoalmente à entrevista, indicaram um
indivíduo que se mostrou disponível para responder à pesquisa. A impossibilidade de
realização de encontro ao vivo com o mesmo fez com que a via de contato se desse através de
telefonema. Dorly Neto, o entrevistado, mostrou-se bastante desenvolto e fluente quando
discorreu sobre as idéias e possibilidades da plataforma de crowdfunding. O telefonema durou
aproximadamente meia-hora, durante a qual o entrevistador ouviu bastante o entrevistado e
realizou anotações em seu caderno, contendo inclusive exemplos dados pelo próprio
entrevistado. As idéias principais debatidas na conversa foram posteriormente organizadas e
melhor explicadas no capítulo seguinte.
As Empresas Melody Box e Benfeitoria
A produtora Melody Box foi fundada em 2008 pelos empresários Fernando Jardim e
Joana Carneiro. Tem como principal objetivo estudar modelos de negócios e buscar
oportunidades de investimentos no mercado da música, uma indústria em constante
transformação, que carece ainda de modelos duradouros e rentáveis. A MB (Melody Box)
busca congregar todos os players do mercado em um mesmo ambiente, formando uma rede de
troca de interesses, cuja velocidade é potencializada pela internet. Desta forma, pode-se
aumentar o volume de novos negócios, dos quais a empresa pode participar diretamente ou
como intermediária. A rede social da Melody Box é uma plataforma online que busca estreitar
a comunicação entre artistas, fãs e profissionais do mercado, criando uma comunidade
nacional centrada na música. Objetiva-se auxiliar novos artistas a conquistarem mais espaço
no mercado musical, bem como facilitar que os fãs encontrem novidades musicais, podendo
ainda ser recompensados por auxiliar na divulgação de seus músicos prediletos. A plataforma
conta ainda com uma área que visa a geração de novos negócios e de oportunidades para
artistas e profissionais de outros elos da cadeia.
O projeto busca, além disso, mostrar a empresas de variados setores as vantagens da
utilização da força da música como ferramenta de promoção e como estratégia de branding.
Estas empresas podem se beneficiar do tráfego gerado online, além de oferecer produtos e
serviços de maneira direta para fãs, artistas e outros profissionais do setor.
Portanto, pretende-se criar, no mundo virtual, um mercado análogo ao mundo real, que
prime pela interação entre fãs, artistas e profissionais do mercado musical, onde cada elo da
cadeia pode usufruir das vantagens que o universo cibernético oferece em termos de
conveniência, objetividade e rapidez. Os empresários estudaram novos modelos de negócio
para a indústria da música que já estavam em funcionamento nos EUA e na EUROPA, a
exemplo dos sites Sonicbids, Sellaband, Reverbnation e Stereofame. Joana e Fernando
buscaram combinar o que de melhor havia nestes modelos em única ferramenta, mais
adequada ao mercado nacional, enxergando grande potencial neste conceito. A rede social da
Melody ox pretende “filtrar” a m sica de qualidade que circula pela internet. s fãs, por sua
vez, podem opinar e promover artistas. Trata-se de uma mídia alternativa, já que a
inacessibilidade às mídias tradicionais mostra-se cada vez maior, devido à redução contínua
do faturamento da indústria fonográfica.
A Benfeitoria é uma plataforma online de realização colaborativa. Trata-se de um
lugar de encontro entre realizadores e colaboradores, que se unem para viabilizar idéias e
projetos que tenham impactos positivos. A plataforma baseia-se num site que mescla
crowdfunding a outras modalidades de crowdsourcing, sem cobrar comissão, o que é um
diferencial da empresa. Crowdfunding e Crowdsourcing são processos de arrecadação
coletiva. A dinâmica de arrecadação coletiva da Benfeitoria é descrita pela própria empresa
como uma “vaquin a mais sexy”. “vaquin a” como se con ece pressup e a participação de
várias pessoas em colaborar para viabilizar algo que não seria viável individualmente. A
Benfeitoria pretende que sua “vaquin a” se a mais envolvente e gere uma relação gan a-
ganha, através de quatro princípios: É online e em tempo real; Contribuições não-financeiras
são possíveis; São oferecidas recompensas criativas e diferenciadas de acordo com o nível de
contribuição; e a devolução do dinheiro é garantida, caso a quantia arrecadada não atinja a
meta de determinado projeto.
Descrição do perfil dos entrevistados
No caso das entrevistas realizadas com membros das plataformas escolhidas para
análise, foram selecionados, pelos critérios de tipicidade e acessibilidade, indivíduos que são
profissionais que trabalham para estas plataformas. A plataforma Melody Box foi
representada por Isabela Damiano, jovem de 24 anos, uma das responsáveis pelo setor
comercial da empresa. O pesquisador tinha contato prévio com a profissional, o que facilitou
a marcação de um encontro ao vivo para realização da entrevista.
A plataforma Benfeitoria foi representada por Dorly Neto, jovem, entre 20 e 30 anos,
responsável pela parte de polinização da dinâmica de crowdfunding da plataforma. O contato
foi realizado através de um intermediário. Dorly foi indicado pela criadora da plataforma,
Tatiana Leite, cujo contato se deu através de terceiro. Não foi possível realizar a entrevista
pessoalmente, tendo a mesma sido feita através de telefonema.
Descrição e análise dos resultados das entrevistas
A primeira entrevista foi com Isabela Damiano, representante comercial da Melody
Box e durou aproximadamente uma hora. Já a entrevista com Dorly Neto, da plataforma de
crowdfunding Benfeitoria, se deu através de telefonema durou cerca de 25 minutos. O
primeiro assunto foi a respeito das possibilidades que as plataformas poderiam oferecer aos
artistas; como seria possível auxiliar os músicos em suas estratégias de divulgação; que tipos
de serviços e vantagens a plataforma teria a oferecer a eles. A este respeito, a entrevistada
sa ela amiano, exp s o modelo “triangular” a que a rede se propõe, conectando músicos,
fãs e profissionais do segmento musical ou de áreas afins, interessadas nas possibilidades que
o mercado da música oferece para suas marcas em termos estratégicos e de branding. Existe a
intenção de auxiliar os artistas em sua árdua tarefa de promoção, ajudando-os a construir seu
espaço junto ao público. O portal espera gerar oportunidades reais de trabalho, através de
shows, festivais e coletâneas produzidas pela Melody Box e seus parceiros. Pretende-se,
ainda, inserir os artistas numa rede de serviços do segmento, através de parcerias com
estúdios de ensaio, de gravação, de fotografia.
Dorly Neto, da Benfeitoria, diz que além da divulgação que os músicos ganham por
estar buscando fundos para financiar projetos, a plataforma ainda pode funcionar como uma
espécie de pré-venda de produtos, já que o artista pode simultaneamente arrecadar fundos e
distribuir, posteriormente, o resultado do projeto em questão. Caso o artista esteja, por
exemplo, financiando a gravação de um CD, este pode ser distribuído depois na forma de
recompensa. A questão das recentes mudanças no mercado fonográfico foi bastante abordada
por orly, que di : “ ca ou o modelo de negócios que apenas explorava o m sico. le agora
não precisa mais da indústria fonográfica para criar e distri uir”. egundo ele, neste contexto,
há um empoderamento do músico, um aumento de sua autonomia.
Dorly cita casos de sucesso do crowdfunding para vários músicos, como por exemplo
o da banda Velhas Virgens, que financiou a gravação de seu mais recente DVD através deste
sistema. Além disso, os projetos de crowdfunding costumam fazer com que os artistas ativem
suas redes sociais, o que lhes é vantajoso, segundo Dorly. Sobre as possibilidades de alcance
dos projetos de crowdfunding, Dorly sugere que se am propostos pro etos menores. “ ão d
pra financiar uma turnê nacional, mas algo em car ter regional poss vel”. Percebe-se, a
partir das respostas dos responsáveis pelas plataformas, a preocupação em se estabelecer
possibilidades e conexões diversas para os músicos participantes das mesmas. Pretende-se
estreitar laços entre artistas e o consumidor final, bem como estabelecer parcerias entre os
músicos e outros elos da cadeia produtiva da música. Este estreitamento de laços vai de
encontro às considerações feitas por Tatiana Rodrigues Lima, na revisão de literatura, que
destaca o papel da utilização das redes sociais por parte dos músicos. A autora cita
recomendações de Yochai Benkler a respeito da necessidade de interação direta entre artistas
e seu público, algo que é facilitado pelas plataformas em questão.
O segundo assunto dizia respeito à relação das plataformas com o público. De que
forma as mesmas se relacionam com os fãs, e como promovem as relações entre artistas e eles
foram os assuntos abordados. Isabela Damiano, da Melody Box, diz que os fãs podem escutar
gratuitamente músicas de variados estilos e gêneros da nova geração da música popular
brasileira, em computadores ou smartphones. Os fãs que são usuários da plataforma podem
criar playlists (listas de execução), e acumular pontos que podem ser trocados por prêmios
como pods, pads, ingressos para s ows, ’s, entre outros. Além disso, por se tratar de
uma rede social, os fãs fazem contato com pessoas que também se interessam por música,
fazendo amigos virtuais com os quais possam ter afinidades. Os fãs podem, ainda, ajudar a
promover os artistas pelos quais tenham maior apreço, tornando-se agentes dos mesmos.
Tornar-se agente significa ajudar a promover seus artistas prediletos dentro e fora da internet.
Cada usuário pode agenciar até no máximo quatro artistas.
Dorly Neto reitera a importância do público já que é ele quem viabilizará ou não
determinado projeto. Sugere que o artista realize um levantamento de pessoas que ajudariam.
“ stas pessoas funcionariam como esp cies de l deres de torcida, e são muito importantes,
que a arrecadação para financiamento dos pro etos dura de um a três meses.” Ainda a respeito
do público, composto muitas vezes de pessoas próximas, Dorly afirma que 80% dos projetos
que dão certo iniciam-se com investimentos por parte das famílias. Segundo Dorly, muitas
vezes, o tipo de recompensa oferecido acaba favorecendo uma relação mais pessoal entre
artista e público. A este respeito, di : “personali a-se a relação, deixando-a mais umana”.
Como exemplo, cita uma das recompensas que a banda Velhas Virgens ofereceu em seu
projeto, que era entregar uma canção personalizada com o nome da pessoa que doou o
din eiro. “ uero ver agora a anda compor m sicas personali adas!”, rinca orly.
Pela nature a de o financiamento do pro eto ser ao estilo “tudo ou nada” (o montante
arrecadado só é repassado ao artista caso ele atinja toda a meta), Dorly diz que as pessoas
acabam se envolvendo mais e “se sentem parte da criação, mudando a relação umana de
como se produ arte”. Além disso, Dorly afirma que o crowdfunding trabalha muito com
nichos, citando o conceito de cauda longa, de Chris Anderson. Acredita que estas
comunidades, nichos, públicos mais focados costumam “se mo ili ar mais, sentem paixão”.
Muitas ve es, segundo ele, um pro eto aparenta não “estar fec ando”, e a comunidade se
mobiliza. Como exemplo disso, fora do universo musical, Dorly cita como exemplo um
projeto de leitor prisma para cegos que, faltando dois dias, ainda precisava de vinte mil reais
para acontecer. A comunidade cega se mobilizou e conseguiu gerar vinte e cinco mil reais
neste curto período de tempo. Sobre a relação público com a plataforma, Dorly menciona a
questão da faixa etária, dizendo que os mais velhos não sabem usar muito bem, tendo
dificuldades com o M P, “uma esp cie de PayPal rasileiro” (sistemas de pagamentos na
internet).
O segundo assunto mostra a importância dos fãs e do público na realização e na
sustentabilidade de projetos. Realmente, sem o público, o artista apresenta pouca relevância,
seja para ser ouvido, seja para ter seus projetos viabilizados financeiramente. As
considerações de Isabela a respeito das relações virtuais entre os fãs encontram respaldo
teórico no artigo de Tatiana Rodrigues Lima, que ressalta o papel da exposição dos gostos
musicais nas redes sociais, gerando afinidades que facilitam a relação entre os fãs e não
somente em relação ao estreitamento de laços entre fã e artista. Dorly cita diversas vezes a
questão dos nichos, que também é bastante abordada na obra de Tatiana Rodrigues Lima. A
autora debate, em diversos momentos de seu artigo, o caráter difuso que vem se estabelecendo
através das novas tecnologias, entre conteúdos de massa e de nicho, afirmando que estes
últimos são sustentáveis na atual dinâmica da rede.
O terceiro assunto abordava os serviços ou vantagens que a plataforma pode oferecer
para outros elos da cadeia da música, aspectos relativos a outros profissionais que estejam
envolvidos nesta cadeia. Isabela Damiano, da Melody Box, ressalta algumas das formas com
que outros profissionais do ramo musical e participantes de outros elos da cadeia produtiva da
música podem usufruir da plataforma. Pode ser feita, por exemplo, a divulgação de serviços.
O site apresenta uma área de negócios, onde os profissionais podem descrever seus serviços,
oferecer preços ou condições especiais, promovendo-se de forma inovadora. Além disso,
afirma sa ela, a plataforma a uda a colocar o profissional mais “por dentro do mercado”,
encontrando conteúdo musical de qualidade e selecionando, dentre diversos artistas e estilos
musicais, aqueles com os quais pretende trabalhar.
Ainda, segundo ela, existe a possibilidade de empresas associarem suas marcas à
artistas ou própria plataforma. Melody ox pode oferecer para estas empresas “leads e
views, totalmente mensur veis”, expondo a marca da empresa a um p lico qualificado de
consumidores de música. As empresas podem expor suas marcas em eventos reais que a
plataforma promove, patrocinando o evento, ou “comprando cotas” do mesmo. Isabela afirma
que a plataforma procura abordar o aspecto publicitário e de branding da forma mais
inteligente poss vel. “ ão colocamos banners publicitários à toa, apenas aqueles que tenham
alguma relação com nossa loja virtual, ou com artistas, ou seja, que estejam contextualizados
a outras seç es do site”. Por fim, a representante da plataforma relembra o exemplo recente
da empresa de camisetas que ofereceu a algum dos artistas que têm página no portal a
confecção de quarenta camisetas para que eles vendessem ou distribuíssem a seus fãs. Desta
forma, além dos já citados benefícios aos artistas e fãs, a marca se expõe, se divulga.
Dorly Neto, o entrevistado da plataforma de crowdfunding Benfeitoria, afirma que
outros tipos de investimentos podem ser realizados, além do investimento financeiro. Podem
ser fornecidos produtos ou serviços. Um estúdio, por exemplo, pode fornecer horas de
gravação para músicos que queiram gravar um álbum. Outra banda pode oferecer algum de
seus instrumentistas para fazer participação especial em gravações de outros artistas. Algum
amigo que seja designer, pode contribuir desenvolvendo a arte de um flyer. As possibilidades
parecem ser muito grandes para outros elos da cadeia. Profissionais podem encontrar
oportunidades de trabalho e marcas podem associar-se tanto a artistas, quanto às plataformas
em si, desenvolvendo estratégias de branding. Michael Miller foca seus estudos sobre as
relações e oportunidades que as empresas podem encontrar ao utilizar-se das diversas
ferramentas de marketing digital existentes. Um dos principais aspectos levantados pelo autor
é a grande relevância de estabelecer contatos diretos com o público-alvo.
Associar-se a algum artista ou plataforma pode trazer à marca um estreitamento das
relações com seu público, desde que mantenha-se em contato constante com o mesmo,
segundo Miller. Tatiana Rodrigues Lima destaca, em sua obra, a associação da operadora
telefônica Vivo com a artista Mallu Magalhães, já que a mesma apresentava características
em sua trajetória iniciada nas redes sociais que iam ao encontro da estratégia de marketing da
operadora. Este exemplo demonstra bem a relação que os artistas podem estabelecer com
outros elos da cadeia, a exemplo de empresas, através do uso consciente das ferramentas
digitais.
Conclusões e recomendações para novos estudos
O trabalho pretendeu investigar a utilização das ferramentas digitais por parte dos
músicos, buscando entender como estes realizam suas estratégias de marketing nas
plataformas disponíveis na internet. O objetivo principal era estudar com maior profundidade
duas plataformas: Melody Box e Benfeitoria. Para melhor contextualizar o problema de
estudo, buscou-se revisão de literatura sobre 3 assuntos principais: revolução digital na
música, aspectos de marketing e ferramentas de marketing digital em aplicação direta no
mundo musical. As entrevistas com os representantes das plataformas escolhidas auxiliaram o
entendimento das ferramentas, bem como tornaram mais claras as contribuições das
ferramentas para a interação entre músicos, artistas e outros elos da cadeia produtiva da
música, na tentativa de propor novos modelos de negócios no mutante mercado musical.
Acerca do crowdfunding, pôde-se perceber a importância deste sistema para a
viabilização de projetos de músicos independentes, sejam estes no formato de shows,
gravações de clipes, entre outras possibilidades. Sobre as redes sociais, percebeu-se que todos
os músicos as vem utilizando de forma intensa, de modo a divulgar seu trabalho e criar
interação mais direta com o público, fenômeno estudado por Tatiana Rodrigues Lima, e
continuado a partir deste estudo. Foi interessante perceber alguns tipos de preocupações por
parte dos músicos, no que tange a frequência de conteúdo publicado, a qualidade do mesmo, e
a pessoalidade contida nas relações, assuntos que em muito se relacionam com as mais novas
estratégias de marketing, abordadas por Michael Miller na revisão de literatura.
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