Novo Floco de Neve: A Avalanche Iminente do Brasil e da ... · assassinato, um golpe de estado ou a...

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Por Jim Rickards, “Eu fiz tudo certo e mesmo assim perdi dinheiro!” Diligência, pesquisa e paciência na seleção de ativos são necessários para a obtenção de lucros consistentes. Principalmente diante da forte volatilidade nos mercados na atualidade. Se você procurar um atalho, agir impulsivamente ou apostar sem considerar as probabilidades, provavelmente vai perder dinheiro. E quando você faz tudo certo, mas nada dá certo? Imagine tentar investir corretamente nos mercados emergentes. É arriscado, mas há formas de mitigar este risco. Então você procura países com posição de reserva forte, balanços comerciais positivos, estado democrático e algum tipo de vantagem comparativa. Você procura por um banco central conservador que tenta preservar o valor da moeda e evitar inflação e guerras cambiais. Depois de tudo isso, você faz seu investimento e então perde de 30% a 50% num piscar de olhos. Você fez tudo certo e mesmo assim saiu perdendo. Quando isso acontece, costuma ser por causa do surgimento de alguma “incerteza knightiana” (em homenagem ao economista Frank Knight, que fez a distinção entre risco, que pode ser medido, e incerteza, que não pode). Na Strategic Intelligence, dizemos que uma perda deste tipo ocorre por causa da “propriedade emergente” de um sistema dinâmico complexo. Tanto a incerteza knightiana quanto as propriedades emergentes entram na categoria do que descrevemos como “o floco de neve e a avalanche”. Você sabe quando foi enterrado na avalanche, mas nunca vê o floco de neve que a iniciou. É um evento que não se espera e que não se vê chegando. Há flocos de neve de todas as formas e tamanhos. Pode ser uma epidemia de uma doença mortal, como o Ebola. Pode ser uma catástrofe múltipla, como o combo terremoto-tsunami-reator nuclear que atingiu Fukushima, no Japão, em março de 2011. Pode ser um evento político, como um assassinato, um golpe de estado ou a Primavera Árabe. Independentemente das circunstâncias, uma avalanche financeira é sempre um choque, porque ninguém viu o floco de neve que a causou. Novo Floco de Neve: A Avalanche Iminente do Brasil e da Malásia WWW.EMPIRICUS.COM.BR Fevereiro

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Por Jim Rickards,

“Eu fiz tudo certo e mesmo assim perdi dinheiro!”

Diligência, pesquisa e paciência na seleção de ativos são necessários para a obtenção de lucros consistentes. Principalmente diante da forte volatilidade nos mercados na atualidade. Se você procurar um atalho, agir impulsivamente ou apostar sem considerar as probabilidades, provavelmente vai perder dinheiro.

E quando você faz tudo certo, mas nada dá certo?

Imagine tentar investir corretamente nos mercados emergentes. É arriscado, mas há formas de mitigar este risco. Então você procura países com posição de reserva forte, balanços comerciais positivos, estado democrático e algum tipo de vantagem comparativa. Você procura por um banco central conservador que tenta preservar o valor da moeda e evitar inflação e guerras cambiais.

Depois de tudo isso, você faz seu investimento e então perde de 30% a 50% num piscar de olhos. Você fez tudo certo e mesmo assim saiu perdendo.

Quando isso acontece, costuma ser por causa do surgimento de alguma “incerteza knightiana” (em homenagem ao economista Frank Knight, que fez a distinção entre risco, que pode ser medido, e incerteza, que não pode).

Na Strategic Intelligence, dizemos que uma perda deste tipo ocorre por causa da “propriedade emergente” de um sistema dinâmico complexo. Tanto a incerteza knightiana quanto as propriedades emergentes entram na categoria do que descrevemos como “o floco de neve e a avalanche”. Você sabe quando foi enterrado na avalanche, mas nunca vê o floco de neve que a iniciou. É um evento que não se espera e que não se vê chegando.

Há flocos de neve de todas as formas e tamanhos. Pode ser uma epidemia de uma doença mortal, como o Ebola. Pode ser uma catástrofe múltipla, como o combo terremoto-tsunami-reator nuclear que atingiu Fukushima, no Japão, em março de 2011. Pode ser um evento político, como um assassinato, um golpe de estado ou a Primavera Árabe.

Independentemente das circunstâncias, uma avalanche financeira é sempre um choque, porque ninguém viu o floco de neve que a causou.

Novo Floco de Neve: A Avalanche Iminente do Brasil e da Malásia

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RICKARD’S STRATEGIC INTELLIGENCE ���

Corrupção pode ser um floco de neve também. A corrupção é tão antiga quanto a civilização e existe em todas as sociedades.

Mas nem todas as corrupções são iguais. Em alguns países (nos EUA, no Canadá e em outros países desenvolvidos) a corrupção é persistente, mas não disseminada. É como uma febre leve – atrapalha, mas não debilita.

Em outros países, a corrupção é tão disseminada que nem vale a pena considerar investir ou fazer negócios a não ser que você seja um poder soberano ou uma empresa com soldados na folha de pagamento. Nigéria, Zimbábue, Venezuela e Angola são alguns dos que vêm à mente.

Há ainda uma terceira categoria em que a corrupção não costuma ser disseminada, mas, de repente e inesperadamente, surge devido à ascensão de um líder político venal. Essa é a corrupção do tipo floco de neve. É a corrupção que ninguém vê chegar porque atinge um país que estava bem e que, de repente, tem uma queda abrupta.

Os danos da avalanche de um floco de neve de corrupção não ficam limitados aos países que são vítimas dela. Fraude e corrupção em larga escala são impossíveis sem a ajuda dos bancos. Esses bancos facilitadores podem ou não enfrentar processo criminal. (Bancos não são apenas grandes demais para falhar, eles parecem ser grandes demais para ir presos).

As multas, penalidades e custos de cumplicidade para bancos pegos em redes de corrupção podem chegar aos bilhões de dólares. Esses custos prejudicam os preços das ações (porque são pagos pelas empresas, não pelos executivos) e são outra forma de os investidores serem prejudicados quando políticos corruptos decidem aceitar propinas ou roubar cidadãos.

No relatório deste mês descrevo o papel que grandes bancos, como Goldman Sachs, JPMorgan, entre outros, tiveram em alguns desses fiascos de corrupção.

Há o clássico exemplo da corrupção inesperada que descarrilhou o bom desenvolvimento da Argentina. Em 1913, a Argentina era o décimo país mais rico do mundo em renda per capita. De 1900 a 1930, o país superou a Austrália e o Canadá neste quesito.

No início do século XX, houve poucas histórias de crescimento maior que a da Argentina. Até que ascensão de Juan Perón – e sua ideologia de Peronismo – em 1946 desencadeou um grande declínio, que deixou o país em default na década de 1980 e totalmente quebrado em 2000.

Eventos do tipo floco de neve sempre são inesperados e podem ser bons ou ruins. Investidores têm motivos para temer uma avalanche financeira, mas eventos assim podem proporcionar grandes ganhos que parecem vir de lugar nenhum.

Da mesma forma que a Argentina foi do sucesso ao fracasso no final do século XX; talvez ela volte ao sucesso. Mauricio Macri foi o vencedor das últimas eleições presidenciais. Ele acabou com 12 anos de corrupção por parte de Nestor e Cristina Kirchner.

Até o momento, Macri tem implementado soluções de mercado livre. Ele já está sendo chamado de “Ronald Reagan argentino”. Este é um evento floco de neve positivo e nós observaremos de perto, à procura de oportunidades de investimento para você.

No entanto, neste relatório falaremos sobre dois casos de corrupção que custaram bilhões aos investidores. O primeiro caso é o do Brasil e o segundo, o da Malásia. ���2 ���

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Mas eles não são os únicos. Na próxima vez que seu corretor tentar vender um fundo de mercado emergente com uma história de “crescimento”, você pode usar esta análise para insistir que ele explique componentes específicos de cada país. Desta forma, se houver um floco de neve caindo, você saberá que precisa evitar o fundo.

Vamos mergulhar no Brasil e na Malásia para que possamos entender a dinâmica da corrupção e evitar perdas.

Apresentando Nossa Nova Colaboradora, Nomi Prins

Antes de fazermos isso, tenho a satisfação de apresentar Nomi Prins como nossa nova colaboradora na série.

Nomi é jornalista investigativa, autora de sucesso, banqueira experiente e intelectual respeitada. Ela tem uma combinação singular de habilidades que incluem Ph.D. em estatística, trabalho prático como banqueira de investimentos e um estilo de escrita altamente lúcido.

Nomi descobre o que acontece nos bastidores de Washington e de Wall Street e conta tudo em linguagem simples e sem jargões. Banqueiros a temem com razão, pois ela expõe todos os seus truques. Estamos muito felizes por Nomi ter se juntado à equipe da Strategic Intelligence.

Você será o beneficiário de seu olhar incisivo e atento às finanças globais do século XXI. Esperamos uma colaboração longa e frutífera com essa incrível analista e escritora.

Neste relatório, Nomi falará sobre a corrupção no mercado de energia brasileiro através da Petrobras, que teve consequências nefastas no país e é uma parte de nosso novo floco de neve.

A Ascensão e a Queda da Petrobras

O futuro já foi muito promissor para a Petrobras, a petrolífera estatal brasileira. Em julho de 2006, a descoberta de uma grande camada pré-sal, a 300 km da costa, tinha o potencial de transformar o Brasil em líder na produção de petróleo.

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Os danos da corrupção política em mercados emergentes não ficam limitados aos países afetados. Eles também podem ser custosos para bancos, como Goldman Sachs e JPMorgan, que facilitam transações envolvendo ilegalidade, lavagem de dinheiro ou saque de ativos de Estado. Investidores podem perder dinheiro nos investimentos em mercados emergentes e perder de novo nos investimentos em bancos envolvidos com esses mercados.

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A noção de “autonomia em petróleo” desempenhou um importante papel na campanha presidencial de 2010. Essa plataforma contribuiu para assegurar a vitória de Dilma Rousseff, protegida de Lula e presidente do conselho de administração da Petrobras entre 2003 e 2010.1 A Petrobras estava destinada a se tornar a maior empresa de petróleo do mundo.

Naturalmente, todos queriam um pedaço. Bancos multinacionais queriam financiá-la. Especuladores e administradores de fundos apostavam em seu sucesso. Dois anos após a crise financeira dos EUA ter danificado o sistema bancário global, essa luz no fim do túnel no setor de energia fornecia novas oportunidades aos megabancos. As oportunidades com as hipotecas tinham acabado. Mas o petróleo era promissor.

No dia 24 de setembro de 2010, a Petrobras arrecadou 120,36 bilhões de reais (na época 70 bilhões de dólares) na maior emissão global de ações da história.2 Três dos seis maiores bancos dos EUA, o Bank of America, o Citigroup e o Morgan Stanley, enfrentando processos de fraude nos EUA, eram os coordenadores da oferta. O banco brasileiro, Bradesco, foi quem – o Itaú era outro coordenador.

A Enron do Brasil: escândalo da Petrobras vem à tona

No setor de energia e de finanças, quanto maiores são as empresas, mais crimes elas cometem. A petrolífera Enron implodiu na fraude de 2001 e a Petrobras parece ter seguido seus passos. Em março de 2014, investigadores descobriram que alguns funcionários da estatal brasileira haviam recebido propina em troca de concessão de contratos lucrativos. A Petrobras lavou o dinheiro à moda antiga – manipulando as contas, superfaturando o pagamento de contratos e inflando artificialmente seus ativos. A suposta fraude totalizou 30 bilhões de dólares em um período de 15 anos e se tornou o foco de investigações nacionais e de processos no exterior.

Em 17 de março de 2014, a Polícia Federal prendeu dois homens durante a Operação Lava Jato, uma investigação federal de lavagem de dinheiro. Paulo Roberto Costa, ex-diretor de abastecimento da Petrobras e Alberto Youssef, infame doleiro, foram condenados e sentenciados a 12 e 8 anos de encarceramento, respectivamente, pelo planejamento da rede de corrupção. Eles também estavam supostamente envolvidos em operações de lavagem de dinheiro para o PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) e o partido de direita PP (Partido Progressivo).

O envolvimento de Paulo Roberto Costa na corrupção é antigo e internacional. Em 2006, sob sua direção, uma aquisição problemática aconteceu nos EUA. A Petrobras comprou a refinaria Pasadena, localizada em Houston, no Texas, por 1,2 bilhão de dólares, cerca de 30 vezes o que valia na época.3

Em 23 de junho 2014, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou que a Petrobras havia pago demais pela Pasadena. Curiosamente, Dilma havia aprovado a compra quando era Ministra de Minas e Energia e presidente do conselho de administração da companhia.4 Foi uma decisão desonesta ou tola, ou ambas.

1  h$p://www.reuters.com/ar3cle/us-­‐brazil-­‐petrobras-­‐agreement-­‐idUSKBN0L72M420150204  2Petrobras  Raises  $70  Billion  in  Share  Issue  (By  CHRIS  V.  NICHOLSON    -­‐SEPTEMBER  24,  2010),  h$p://dealbook.ny3mes.com/2010/09/24/petrobras-­‐raises-­‐70-­‐billion-­‐in-­‐share-­‐issue/?_r=0 3  Brazilian  scandal  centers  on  purchase  of  Pasadena  refinery,  Houston  Chronicle,  November  8,  2015,  h$p://www.houstonchronicle.com/news/houston-­‐texas/houston/ar3cle/Brazilian-­‐scandal-­‐centers-­‐on-­‐purchase-­‐of-­‐Pasadena-­‐6618757.php  4  h$p://poli3ca.estadao.com.br/no3cias/eleicoes,dilma-­‐apoiou-­‐compra-­‐de-­‐refinaria-­‐em-­‐2006-­‐agora-­‐culpa-­‐documentos-­‐falhos-­‐imp-­‐,1142397,  Estado  de  São  Paulo,  10  de  março  de  2014.  

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Três meses mais tarde, em 29 de outubro de 2014, a revista Veja publicou um depoimento de Youssef, vazado ilegalmente, acusando Dilma e Lula de terem conhecimento de detalhes sobre a corrupção na Petrobras 48 horas antes da eleição presidencial. Dilma Rousseff foi reeleita. Em 2014, o preço das ações da Petrobras caiu muito, 37,9% para as ordinárias e 37,6% para a preferenciais. Isso continuou em 2015 – novas quedas de 10,6% e 33,1%, respectivamente.

Mais descobertas e a ira internacional

No início de 2015, a Petrobras estava mergulhada em escândalos, e os investidores internacionais estavam irritados. Processos de bilhões de dólares em perdas se acumulavam.

Certos bancos americanos não estavam isentos de culpa. Eles dirão o contrário, mas a verdade é que contribuíram para inflar as dívidas da companhia sem a diligência adequada – eles simplesmente aconselhavam seus clientes a investir na Petrobras. Foi o mesmo com a Enron: grandes bancos ajudaram a empresa a se tornar o problema que foi, e os acionistas pagaram o preço.

Em Nova York, o magistrado Jed Rakoff reuniu os processos contra a Petrobras e seus bancos – Citigroup Global Markets, JP Morgan Securities e Morgan Stanley5 – em uma grande ação coletiva.6 Os nove maiores proprietários de American Depository Shares (ADS) da Petrobras reclamam perdas de mais de 50 milhões de dólares cada. Entre os reclamantes havia fundos de pensão já em processo contra bancos americanos por fraudes em hipotecas, como o Ohio Public Employees Retirement fund.7 A Fundação Bill e Melinda Gates também processou a Petrobras.8 Assim como a Pimco. A fila é grande.

Dívidas e processos

A Petrobras deve cerca de 135 bilhões de dólares para investidores internacionais em empréstimos e títulos (algumas estimativas são mais baixas). A China, o maior parceiro comercial do Brasil, veio ao resgate. No dia 1 de abril de 2015, a Petrobras assinou um contrato de financiamento de 3,5 bilhões de dólares com o Banco de Desenvolvimento da China, como parte de um acordo de cooperação petrolífera entre os países.9

A generosidade chinesa alimentou a competitividade entre bancos europeus e americanos. Há um motivo para a expressão “jogar dinheiro bom após o ruim”, principalmente quando é o dinheiro bom dos outros. No dia 1 de junho de 2015, a Petrobras emitiu 2,5 bilhões de dólares em um título de 100 anos com yield anual de 8,45%.

5  h$p://www.law360.com/ar3cles/656868/petrobras-­‐hit-­‐with-­‐another-­‐nyse-­‐stockholder-­‐suit-­‐over-­‐bribes  6  Judge  marks  the  first  hearing  of  the  class  ac3on  lawsuit  against  Petrobras  in  the  US  (by  John  Ozorio  de  Melo  and  Felipe  Luchete  -­‐  February  10,  2015)  h$p://www.conjur.com.br/2015-­‐fev-­‐10/juiz-­‐marca-­‐audiencia-­‐acao-­‐cole3va-­‐petrobras-­‐eua2  7  Em  21  de  dezembro  de  2015,  JPM Chase teve que pagar $150 milhões em um processo iniciado pelo Ohio Public Employees Retirement System (OPERS) e outros fundos de pensão pela perda de dinheiro na operação “Baleia de Londres” h t t p : / / w w w . c l e v e l a n d . c o m / o p e n / i n d e x . s s f / 2 0 1 5 / 1 2 /jpmorgan_chase_to_pay_150m_to.html#incart_related_stories.  8  Bill  &  Melinda  Gates  Founda3on  sues  Petrobras,  h$p://money.cnn.com/2015/09/25/inves3ng/bill-­‐gates-­‐founda3on-­‐sues-­‐petrobras/ 9  Brazil’s  Petrobras  Obtains  $3.5  Billion  in  Financing  From  China  Development  Bank  (By  Will  Connors  and  Luciana  Magalhaes  –  April  1,  2015)  h$p://www.wsj.com/ar3cles/brazils-­‐petrobras-­‐obtains-­‐3-­‐5-­‐billion-­‐financing-­‐from-­‐china-­‐development-­‐bank-­‐1427892756  

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O Deutsche Bank e J.P. Morgan coordenaram as operações do primeiro título secular emitido por uma empresa latino-americana desde 1997.10 A demanda de investimentos estrangeiros fez com que a emissão fosse excedida em 5 vezes. Mesmo assim, projeções em meio ao escândalo foram baseadas no preço de petróleo bruto a entre 60 e 70 dólares o barril para 2015 e 2016, quando o mesmo fechou perto de 35 dólares em 2015.

No dia 3 de junho de 2015, depois de ter sido chamada de “a empresa mais endividada do mundo” pelo Bank of America, a Petrobras o convidou para administrar uma venda de ativos de 5 bilhões de dólares.11 Duas semanas depois, a Petrobras selecionou cinco bancos para liderar a IPO da BR Distribuidora, sua distribuidora de combustível que controla a maior rede de postos de gasolina do Brasil. Os bancos eram Citigroup, Bradesco, Itaú, Banco do Brasil e BTG Pactual.12

Os três maiores bancos americanos participantes da emissão de ações de 2010 tiveram papéis muito lucrativos na destruição da Petrobras; Citigroup no spin-off dos IPOs, JP Morgan Chase na emissão do título secular e Bank of America na venda de ativos.

A principal ação judicial americana contra a Petrobras e contra os banqueiros ficará hostil. Em 6 de outubro de 2015, a estatal desafiou os reclamantes e tentou fazer com que o caso fosse encerrado.13

O juiz Rakoff disse “não.” A ação será julgada no mês que vem.14

A companhia nega todas as alegações e afirma ser vítima de uma conspiração por parte de prestadores de serviços e políticos corruptos. Em 20 de outubro de 2015, uma comissão pró-governo inocentou Dilma, mas essa história ainda não terminou.15 Tanto Dilma quanto Lula podem ser chamados para testemunhar conforme o processo americano se desenrola.

Os efeitos para o Brasil

Não houve presente de Natal para a Petrobras. Em vez disso, o recém-nomeado Ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, anunciou que a Petrobras não precisava de ajuda governamental – o suposto aumento do preço do petróleo seria suficiente.16 No dia seguinte, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) deu início à sua própria investigação dos contratos das 21 empresas e 59 executivos já sob investigação criminal.

10  Petrobras  Confirms  $2.5  Billion  Bond  Sale,  h$p://www.wsj.com/ar3cles/petrobras-­‐confirms-­‐2-­‐5-­‐billion-­‐bond-­‐sale-­‐1433242569  11  Petrobras  called  BofA  to  assist  in  the  sale  of  $  5  billion  in  assets,  said  source  (REUTERS  -­‐  June  3,  2015)  h$p://br.reuters.com/ar3cle/domes3cNews/idBRKBN0OJ2FJ20150603  12  Petrobras  hires  Ci3group,  Itaú  for  unit  IPO  -­‐Estado  newswire  (REUTERS  –  July  17,  2015)  h$p://www.reuters.com/ar3cle/brazil-­‐ipo-­‐br-­‐distribuidora-­‐idUSL2N0ZX21N20150717#vAt1JDWmgBMjis6g.99 13  h$p://www.law360.com/ar3cles/711307/petrobras-­‐insists-­‐98b-­‐kickbacks-­‐suit-­‐lacks-­‐jurisdic3on 14  h$p://en.mercopress.com/2015/07/13/petrobras-­‐faces-­‐major-­‐class-­‐ac3on-­‐lawsuit-­‐in-­‐us-­‐next-­‐february15  Brazilian  President  Dilma  Rousseff  Cleared  in  Petrobras  Corrup3on  Scandal,  BY  MICHELLE  MARK  @MICHELLEAMARK  ON  10/20/15  h$p://www.ib3mes.com/brazilian-­‐president-­‐dilma-­‐rousseff-­‐cleared-­‐petrobras-­‐corrup3on-­‐scandal-­‐214677316  h$ps://www.brasil247.com/pt/247/economia/210663/Barbosa-­‐'N%C3%A3o-­‐h%C3%A1-­‐necessidade-­‐de-­‐inje%C3%A7%C3%A3o-­‐de-­‐capital-­‐na-­‐Petrobras'.htm   ���6 ���

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Os problemas da Petrobras atrapalharão o Brasil de muitas formas além do escândalo e das perdas estimadas em 30 bilhões de dólares ao PIB.17 Devido às investigações em curso, a estatal cancelou o pagamento a outras empresas, inclusive as de perfuração. Isso fez com que algumas delas fossem à falência, o que fará com que o preço das ações caia ainda mais em 2016. Setores associados continuam em perigo, incluindo o setor de aço, de construção e o bancário.

A presidente Dilma ofereceu leniência às empresas sob investigação em troca de depoimentos contra as práticas criminais da Petrobras. São maus prenúncios para a corrupção brasileira.

Os fundos de pensão do Brasil estão em crise. Desemprego e inflação – acima dos 10% pela primeira vez em 12 anos – continuam aumentando, apesar das altas taxas de juros.18 As vendas de Natal tiveram queda de 15% no varejo em relação ao ano anterior.19

Dívidas, inadimplência, perda de empregos, processos e desvalorização da moeda não pintam um cenário promissor. Como a presidente se mostrou resistente, a instabilidade política no que diz respeito à sua relação com a Petrobras prejudicará o sistema político. O Carnaval começa no mês que vem e as Olimpíadas virão logo em seguida. Para a Petrobras e para o Brasil, porém, os espetáculos não serão suficientes para deter o colapso econômico em 2016.

Escândalo na Malásia - O Estranho Caso do 1MDB

[Nota do editor: No relatório a seguir, alguns nomes foram excluídos e outros foram alterados (conforme indicação) para proteger a vida e a liberdade daqueles ameaçados de prisão ou punição pelo corrupto regime de Najib na Malásia]

Por Jim Rickards,

No dia 1 de dezembro de 2015, recebi em um aplicativo de mensagens o seguinte texto:

A notícia foi um choque. Meu amigo, Jong Lee [nome fictício] tinha sido preso pelo repressivo regime Najib na Malásia. Eu o tinha visitado há apenas duas semanas e nós mantínhamos contato.

17  http://www.fazenda.gov.br/assuntos/destaques/nota-a-imprensa-2015-10-21-impacto-da-reducao-dos-investimentos-do-setor-de-oleo-e-gas-no-pib-1.pdf 18 http://www.wsj.com/articles/brazils-unemployment-rate-rose-sharply-1443530134 http://www.bloomberg.com/news/articles/2015-11-19/brazil-consumer-inflation-exceeds-10-for-first-time-in-12-years 19 http://www.reuters.com/article/brazil-economy-retail-idUSL1N14H0O520151228

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Rapidamente, providenciei um canal de comunicação criptografado para que pudéssemos continuar nosso diálogo. (É claro que todo o tráfego de mensagens é interceptado pelos serviços de inteligência dos EUA e da Malásia, mas com a multiplicidade de canais e a variedade de criptografias de nível militar disponíveis aos civis, é possível ter um pouco de privacidade. Um segredo é trocar de canal frequentemente para ficar “um passo à frente” dos interceptadores).

Felizmente, Jong Lee está seguro por enquanto, mas suas ações estão sob escrutínio constante dos capangas de Najib. Ele pode ser preso e interrogado novamente a qualquer momento.

Eu fiquei em Kuala Lumpur, a capital da Malásia, por várias semanas em minhas duas visitas em julho e agosto de 2015. Encontrei-me com a maioria dos mais importantes cidadãos do país, incluindo ex-ministros, acadêmicos, banqueiros centrais e bilionários de empresas de estanho, borracha e óleo de palma – os maiores produtos de exportação de lá. Foi nessas visitas que conheci Jong Lee.

O ponto mais alto de minha primeira passagem pelo país foi a celebração do aniversário de 90 anos de Tun Mahathir Mohamad, primeiro ministro da Malásia entre 1981 e 2003. Mahathir é a figura política mais importante do país desde sua independência do Reino Unido em 1957. Ele apresentava boa saúde e animadamente assoprou as velas de seu bolo.

Jong Lee estava conosco na festa. Ele foi jogado na prisão poucas semanas após a última vez em que o vi. Seu crime? Protestar pacífica e legalmente contra um dos regimes mais corruptos da Terra, administrado pelo atual primeiro ministro, Najib Razak.

Essa é a história de como a Malásia foi da democracia para uma quase-ditadura em apenas alguns anos. Até 2013, a Malásia era considerada um modelo de sucesso democrático, com um crescimento robusto, uma moeda estável, amplas reservas de moeda forte e um fluxo constante de investimento estrangeiro.

Agora, em 2016, a Malásia é pária. Pelo menos US$ 2,4 bilhões pertencentes ao povo foram saqueados de um fundo soberano chamado 1Malaysia Development Bhd (ou “1MDB”). Esse saque foi facilitado pelo Goldman Sachs, que levantou parte do dinheiro, o qual foi, subsequentemente, desviado.

A administração do primeiro ministro Najib é alvo de quatro investigações criminais conduzidas em Singapura, na Suíça, em Abu Dhabi e nos EUA. Pelo menos US$ 700 milhões em fundos saqueados foram depositados diretamente na conta pessoal de Najib.

O colapso na confiança fez com que o escândalo do saque do 1MDB contribuísse para uma queda catastrófica no valor da moeda do país, o ringgit (MYR). No dia 1 de setembro de 2014, a taxa de câmbio entre o MYR e o dólar americano era de 3,15 para 1. No dia 1 de outubro de 2015, tinha chegado a 4,43 para 1, uma queda de 30% em apenas treze meses.

De 1 de julho de 2014 a 1 de setembro de 2015, um período de quatorze meses, o principal índice de ações da Malásia (FTSE Kuala Lumpur Composite Index) caiu de 1885,91 pontos para 1589,16, uma queda de 15,7%.

A Malásia tem uma força de trabalho fluente em inglês com alto nível de escolaridade, recursos naturais em abundância, uma localização geográfica estratégica e aliados próximos na China, nos EUA e nos países árabes ricos em petróleo. Além disso, recentemente o país foi nomeado membro da área de comércio livre da Parceria Transpacífico pelo presidente dos EUA, Barack Obama. ���8 ���

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Mesmo assim, um investidor de dólares americanos em ações da Malásia em meados de 2014 teria perdido quase metade do dinheiro no final de 2015 – 15% no preço das ações e 30% em desvalorização da moeda – em uma economia que era bastante sólida.

Essa história de corrupção do regime Najib serve como alerta para investidores em mercados emergentes de modo geral e na Malásia em particular. Apesar de aspectos da história de crescimento dos mercados emergentes serem tentadores; ganância, corrupção e negligência nunca estão muito longes da superfície.

Escândalos podem surgir a qualquer momento e rapidamente se transformarem em arenas globais econômicas e políticas com consequências inesperadas. É difícil quantificar o risco da corrupção – é um evento de tipo cisne negro. Mesmo assim, cisnes negros nunca devem surpreender ninguém. Há sempre um voando em nossa direção.

Minha interação pessoal com o escândalo do 1MDB começou no fim de julho de 2015, quando visitei a Malásia a convite de Mahathir para dar uma palestra sobre o futuro do sistema monetário internacional. Eu fiquei muito honrado. Mahathir é famoso (ou infame) por confrontar George Soros durante a crise financeira asiática de 1997 e 1998. Havia sido a última vez que a Malásia havia sofrido o tipo de fuga de capital estrangeiro e de enfraquecimento da moeda que se vê no país nos dias de hoje.

No pico da acrimônia, em setembro de 1997, Mahathir chamou Soros de “idiota”, e Soros chamou Mahathir de “uma ameaça ao seu próprio país”. Deixando os insultos de lado, a história confirmou a visão de Mahathir de que especulação não regulada de moeda pode ser desestabilizadora e de que controle de capital deve ser feito em certas circunstâncias. Até mesmo o FMI acabou endossando opiniões dadas por Mahathir vinte anos atrás.

Mahathir foi o primeiro “guerreiro das moedas”, e eu estava animado para encontrá-lo e fornecer uma atualização sobre a situação das guerras cambiais em 2015.

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Jim Rickards visitou a Malásia duas vezes em 2015. Essa foto foi tirada durante a visita ao Templo Thean Hou em Kuala Lumpur. O templo tem elementos de taoísmo e de budismo e é dedicado à deusa Tian Hou, a “Mãe Celestial”.

Achei Mahathir muito são e em boa forma apesar de já estar na casa dos 90 anos. Ele tomou nota do que eu disse e fez diversas perguntas durante minha apresentação técnica que teve duração de cinco horas. Ele tinha mais estamina que muitos dos participantes mais jovens, na casa dos 50 ou 60 anos.De certa forma, minha palestra foi como muitas que já fiz antes, embora, nesse caso, ela tenha sido assistida por um grande número de funcionários do governo.

Mas um aspecto era muito diferente. Era a subjacência do medo. A repressão de Najib àqueles buscando a verdade em relação ao escândalo do 1MDB tinha começado. Algumas das pessoas com as quais eu me associei, estavam na linha de fogo. Como já disse, Jong Lee logo seria preso. O escândalo estava na mente de todos, e nós o discutíamos em intervalos, em visitas particulares e após as sessões formais.

Os detalhes do escândalo foram amplamente expostos no The Wall Street Journal, Bloomberg e em publicações locais, como o Sarawak Report. Apesar da complexidade alucinante, os fatos essenciais podem ser descritos de maneira clara.

Fundos soberanos são veículos com propósito especial criados por países para administrar suas posições de moeda forte. Eles diferem da administração normal feita pelos bancos centrais, pois têm permissão para investir em ações, títulos etc. Bancos centrais ficam limitados a equivalentes a dinheiro de curto prazo, como notas do tesouro americano. Fundos soberanos existem no mundo todo e controlam trilhões de dólares em investimentos.

A maioria dos fundos soberanos é bastante transparente, conservadora e bem-administrada. O fundo soberano da Noruega é considerado modelo no que tange a administração sólida e a práticas de qualidade.

O 1MDB foi estabelecido como o fundo soberano da Malásia em setembro de 2009, logo depois de Najib se tornar o primeiro ministro em abril. Najib não era apenas o primeiro ministro, ele também se nomeou ministro da Fazenda, controlando assim a política e as finanças da Malásia ao mesmo tempo. Najib completou seu controle assumindo como presidente do conselho do 1MDB. Isso deu a ele poder sobre as reservas de investimento da Malásia. Os conflitos eram óbvios e houve alguns protestos na época, mas nenhuma objeção séria ficou no caminho de Najib.

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Além do Goldman Sachs, um dos facilitadores da corrupção no 1MDB é uma figura suspeita chamada Jho Low, um jovem na casa dos 30 anos. Ele estudou em Londres antes de se infiltrar no círculo de Najib em 2008.

A familiaridade de Jho Low com finanças e transações facilitaram os esquemas de saque de Najib. Jho Low também age como um playboy internacional entretendo pessoas como Paris Hilton em festas extravagantes.

Com o controle de bilhões de dólares do 1MDB e com Jho Low a seu lado, Najib concentrou-se no negócio de saquear o povo malásio.

O Goldman Sachs foi crucial ao fornecer US$ 3 bilhões para o 1MDB s u b s c r e v e n d o u m a e m i s s ã o particular de títulos, os quais foram vendidos para investidores. Os lucros foram desviados e usados para subornos polí t icos durante as eleições de 2013. A comissão do Goldman foi de US$ 300 milhões, ou 10% do valor da emissão – uma comissão bastante alta para um fundo soberano.

Em 2009, o 1MDB investiu US$ 1 bilhão em um empreendimento conjunto com a PetroSaudi para lançar projetos de energia. No entanto, apenas US$ 300 milhões foram transferidos para a conta da PetroSaudi, sendo os outros US$ 700 milhões desviados para uma conta no exterior controlada por Jho Low. Auditores do 1MDB, da empresa Ernst & Young, foram demitidos por questionar as transações na PetroSaudi.

Em 2010, o 1MDB vendeu sua participação na PetroSaudi por US$ 2,32 bilhões e o valor foi desviado para um fundo nas Ilhas Cayman. No entanto, essa e outras transações da PetroSaudi consistiram em transações de papel entre entidades afiliadas, feitas para inflar os lucros quando, na verdade, não produziam nenhum dinheiro. Enquanto isso, os US$ 700 milhões de dinheiro real do primeiro investimento estão desaparecidos.

Em 2012, o Goldman Sachs vendeu US$ 1,75 bilhão em títulos emitidos pelas afiliadas do 1MDB para comprar plantas de energia. Uma entidade de Abu Dhabi chamada IPIC garantiu os títulos. O The Wall Street Journal reportou que a IPIC nunca recebeu o dinheiro, que agora está desaparecido. As plantas de energia tiveram seu valor reduzido posteriormente produzindo grandes perdas para o IMDB.

Najib abordou os banqueiros do Goldman no fórum econômico mundial em Davos, Suíça, em janeiro de 2013. Ele afirmou precisar de US$ 3 bilhões com urgência. O Goldman então subscreveu uma emissão de títulos nesse valor para o 1MDB em março de 2013, recebendo quase US$ 300 milhões em comissão, cerca de 10% do valor da emissão dos títulos. É uma comissão muito alta para uma emissão de títulos de uma entidade soberana. Dias após o término da emissão, US$ 681

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milhões foram transferidos diretamente para a conta pessoal de Najib. A origem dos fundos é desconhecida e Najib afirma ser um “presente” de um amigo árabe.

Alguns dos esquemas sonhados por Najib e Jho Low foram completamente amadores (mas ainda assim eficientes no saque dos fundos). Por exemplo, O Sarawak Report detalha como o dinheiro do 1MDB foi desviado para uma falsa empresa offshore nas Ilhas Virgens Britânicas chamada “Aabar Investments PJS Ltd.” O nome foi escolhido para lembrar o “Aabar Investments PJS” que é uma subsidiária legítima da IPIC de Abu Dhabi.

A trapaça continuou com várias empresas de fachada recebendo fundos, os quais eram mandados para outras empresas de fachada antes de se liquidarem, fazendo com que fosse mais difícil seguir o rastro do dinheiro.

Através desse labirinto de transações (há muitas outras que não temos espaço para explicar), o 1MDB conseguiu chegar a US$ 11 bilhões em dívidas enquanto perdia dinheiro em muitos de seus investimentos. Não está claro se o fundo é solvente hoje.

Ao discutir o 1MDB com Mahathir, ele perguntou se eu já tinha ouvido falar de um fundo soberano pegando dinheiro emprestado. Eu tinha feito pesquisas extensivas sobre fundos soberanos para a comunidade de inteligência americana ao longo dos anos por causa de possíveis ameaças à segurança nacional caso seus recursos fossem direcionados para ataques financeiros.

Minha resposta ao ex-primeiro ministro foi categórica. Eu nunca tinha visto um caso de fundo soberano pegando dinheiro emprestado. Pegar dinheiro emprestado vai contra a essência de um fundo soberano, que é administrar ativos e não criar dívidas.

A corrupção “oficial” na Malásia é generalizada. Uma antiga amante de Najib foi assassinada. A morte foi causada por explosivos militares. O rumor persistente que ouvi quando estava no país era de que o assassinato havia sido encomendado pela esposa de Najib, Rosmah Mansor.

Caso seja verdade, temos o cônjuge de um primeiro ministro intervindo em uma cadeia de comando militar para assassinar um civil inocente. Isso não acontece desde os dias de Ferdinand e Imelda Marcos, nas Filipinas (e, antes deles, de Juan e Evita Peron na Argentina).

Agora, todo o castelo de cartas construído por Najib e Jho Low está desmoronando. Jho Low despareceu (pressupõe-se que esteja escondido). Muitas contas bancárias ligadas ao 1MDB e a Najib foram congeladas por autoridades em Cingapura, Suíça e em diversos outros lugares.

Mas a resposta de Najib não foi esclarecer a esclarecer a situação e sim aumentar as ameaças, demissões e encobrimentos. Em rápida sucessão, Najib fechou os jornais locais, demitiu seu vice primeiro ministro e substituiu o ministro da justiça. Várias pessoas foram interrogadas pela polícia (inclusive o ex primeiro ministro Mahathir) e outras foram presas por buscar soluções jurídicas pacíficas aos abusos (inclusive meu amigo, Lee). Algumas pessoas com conhecimento direto de fatos relevantes estão desaparecidas e teme-se que estejam mortas. A independência das investigações foi comprometida com demissões e intimidação.

Por enquanto, há poucos recursos disponíveis para a sociedade civil na Malásia. Najib continua firmemente no controle e desfila por aí como anfitrião da ASEAN e de outras conferências regionais em Kuala Lumpur.

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Ele também lembra os nativos de seu relacionamento próximo com o presidente Obama (eles jogaram golfe no Havaí no último ano). A Malásia teve uma explosão por ser um dos membros fundadores da Parceria Transpacífico, uma importante zona de comércio livre que inclui os EUA, Japão, Canadá, Chile e outros países da Ásia (propositalmente excluindo a China). A Parceria Transpacífico é a peça central do legado de livre comércio de Obama e ele manteve um relacionamento cordial com Najib como parte de seus esforços para assegurar o negócio.

Todo esse desenrolar de eventos é triste. A Malásia é uma nação potencialmente rica. A curto prazo, ela está presa na famosa “armadilha da renda média”, na qual a renda per capita saiu da linha da pobreza, mas parece presa abaixo dos níveis das economias desenvolvidas. Ainda assim, o país é rico em recursos, com uma mão de obra qualificada e está posicionado para servir como canal de investimentos e comércio entre China e Arábia (a Malásia é predominantemente muçulmana, com uma grande minoria proveniente da China).

Os malásios que conheci são amigáveis e gentis. Eles têm ciência da corrupção, mas não têm poderes para mudar o governo a curto prazo (as próximas eleições são em 2018).

Najib não está completamente tranquilo. O FBI está investigando o caso de lavagem de dinheiro e tem jurisdição por causa da presença do Goldman Sachs e do uso do sistema de pagamentos em dólar para efetivar o saque. Transferências entre a Malásia, as Ilhas Virgens Britânicas e Abu Dhabi precisam passar por bancos americanos se forem feitas em dólares. Isso dá aos EUA jurisdição global em qualquer questão financeira que o FBI deseje investigar.

Os EUA mostraram sua vontade de investigar casos criminais de lavagem de dinheiro mesmo quando não há interesse americano envolvido. A acusação recente dos oficiais da FIFA, que ocorreu na Suíça e envolvia subornos e propinas, é um ótimo exemplo. Os EUA não são líderes quanto se trata de futebol (um esporte mundial, mas não muito popular no país). Mas são um líder natural quando se trata de ilegalidade e do dólar.

Para investidores, a lição é clara. A Malásia está proibida. Grandes perdas aconteceram lá em 2015, não porque os fundamentos de longo prazo são ruins (eles não são!), mas por causa dos políticos corruptos.

O pior inimigo de um investidor não é o risco, que pode ser medido e administrado, mas a incerteza, que não pode. A corrupção política e a ganância fora de controle surgindo em uma democracia aparentemente estável são um caso clássico de incerteza. Essa incerteza não vai embora logo.

Tudo de bom,

Jim RickardsEditor da Strategic Intelligence

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