NUNCA PUSERAM DÚVIDA A MINHA - ClipQuick · Tinha 16 anos quando partiu ... go a ouvir as sirenes...

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'UÁ FUI PRESSIONADO, CLARO, MAS NUNCA PUSERAM EM DÚVIDA A MINHA HONESTIDADE Judeu e natural do Porto, Cymerman deixou-se influenciar pela história de Israel e pela da sua família. Tinha 16 anos quando partiu sozinho à descoberta da Terra Prometida. Hoje, éo mais premiado jornalista luso. Se em Portugal a sua vida é sinónimo de sucesso, em Israel o seu êxito anda de mãos dadas com o perigo. u Ana Filipe Silveira Desde que vive em Israel, 37 anos, que acompanhou vários conflitos armados no Médio Oriente. A operação "Pilar Defensi- vo", iniciada pelas forças militares do país no passado dia 14, é para si apenas mais um conflito ou tem algo de diferente em relação aos anteriores? É dferente. Esta é a primeira vez, depois de 1991, que vejo cair mísseis ao lado da minha casa. Passou-se reaLmente muito tempo des- de que isto tinha acontecido, durante a guerra do Golfo, e esta é uma grande diferença. A mi- nha casa está na zona de Telavive e era um lu- gar seguro. Eu ia à guerra e voltava, e via o meu apartamento no Norte de Telavive como o meu refúgio. Neste momento sinto que o invadiram. Invadiram a minha casa, os meus filhos, a mi- nha muLher, a minha mãe, que veio viver para Is- rael há ano e meio. Ela tem 87 anos e dá consi- go a ouvir as sirenes de aLerta de míssil. E a primeira vez que a sua mãe presencia um cenário assim? ELa viveu a Guerra Civil Espanhola. Na altura ti- nha 11 anos, era muito pequenina, e isso trau- matzou-a. aqui em Israel, a cúpula de ferro, equipamento que interceta os rockets Lançados pelo Hamas desde a Faixa de Gaza, está situa- da muito perto da casa deLa em TeLavive. ELa ouve as explosões e os estrondos ainda com mais força do que eu... Bom. são situações bas- tante desagradáveis. Como é hoje o dia a dia em Israel? O dia a dia? Éa rotina do medo. Dou-Lhe um exemplo concreto. Ainda no outro dia, antes de ir trabalhar, fui à rua passear a minha cadela - coitada, ela está o dia todo fechada, porque es- tamos a trabalhar de manhã à noite, por vezes 20 horas seguidas - e nessa aLtura começou a soar a sirene [que avisa o lançamento de um míssil] . Eu olhei para as pessoas à minha volta e vi impotência. A sensação de "o que faço agora? Para onde vou?". As pessoas sabem que têm 90 segundos para se recolher, que passa- do esse tempo vai acontecer uma grande ex- plosão. Vi que a cadela começou a correr e eu próprio corri atrás dela... Acho que bati o recor- de dos 100 metros (risos). Recolheu-se? Sim, consegui entrar nas escadas da minha casa que, aLém dos quartos completamente vedados que alguns prédios têm, são os locais mais seguros. estava a minha muLher [Yael Kehat] e, de repente, reparo num turista belga, que estava na rua e entrou nas escadas comigo, duas crianças que iam para a escola e uma adolescente, que entraram na primeira porta que se abriu. Tivemos 90 segundos com pessoas que não conhecíamos e que não nos conheciam a tentar explicar-Lhes o que se es- tava a passar e a acalmá-las. Ao final destes anos a viver em Israel, esses 90 segundos ainda lhe parecem Longos? Muito Longos mesmo. sabemos que acaba- ram quando ouvimos o estrondo [do míssil a cair] , mas não sabemos onde ele caiu. Pode ter sido na sala da nossa casa ou do outro Lado da cidade, ou a cinco ou dez quilómetros. Ninguém sabe o que vai encontrar quando sai para a rua. São situações difíceis, mas o que acho que é im- portante é que em Israel há uma população ci- vil que vive esta situação desde o ano 2000 con- tinuamente e isso é aLgo que a imprensa inter- nacional não refletiu com força suficiente. Fala de quem vive em Israel. E quem vive na Faixa de Gaza? Em Gaza vive-se também uma situação muito dura, a popuLação também sofre continua- mente, mas não é a mesma coisa. Durante épo- cas bastante longas, nos úLtimos quatro anos, eles não tiveram nenhum tipo de incidente no seu dia a dia, enquanto no Sul de Israel era con- tínuo. Os rockets cairão gota a gota. É verdade que não provocaram muitas vítimas, mas... te- nho um amigo que perdeu a filha porque um

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'UÁ FUI PRESSIONADO,CLARO, MASNUNCA PUSERAMEM DÚVIDA A MINHAHONESTIDADE

Judeu e natural do Porto,Cymerman deixou-seinfluenciar pela história deIsrael e pela da sua família.Tinha 16 anos quando partiusozinho à descoberta daTerra Prometida. Hoje, é o

mais premiado jornalistaluso. Se em Portugal a suavida é sinónimo de sucesso,em Israel o seu êxito andade mãos dadas com o perigo.

u Ana Filipe Silveira

Desde que vive em Israel, há 37 anos, queacompanhou vários conflitos armados noMédio Oriente. A operação "Pilar Defensi-vo", iniciada pelas forças militares do paísno passado dia 14, é para si apenas mais umconflito ou tem algo de diferente em relaçãoaos anteriores?É dferente. Esta é a primeira vez, depois de

1991, que vejo cair mísseis ao lado da minhacasa. Passou-se reaLmente muito tempo des-de que isto tinha acontecido, durante a guerrado Golfo, e esta é uma grande diferença. A mi-nha casa está na zona de Telavive e era um lu-

gar seguro. Eu ia à guerra e voltava, e via o meu

apartamento no Norte de Telavive como o meu

refúgio. Neste momento sinto que o invadiram.

Invadiram a minha casa, os meus filhos, a mi-nha muLher, a minha mãe, que veio viver para Is-

rael há ano e meio. Ela tem 87 anos e dá consi-

go a ouvir as sirenes de aLerta de míssil.E a primeira vez que a sua mãe presenciaum cenário assim?ELa viveu a Guerra Civil Espanhola. Na altura ti-nha 11 anos, era muito pequenina, e isso trau-matzou-a. Já aqui em Israel, a cúpula de ferro,

equipamento que interceta os rockets Lançados

pelo Hamas desde a Faixa de Gaza, está situa-da muito perto da casa deLa em TeLavive. ELa

ouve as explosões e os estrondos ainda commais força do que eu... Bom. são situações bas-tante desagradáveis.Como é hoje o dia a dia em Israel?O dia a dia? É a rotina do medo. Dou-Lhe um

exemplo concreto. Ainda no outro dia, antes deir trabalhar, fui à rua passear a minha cadela -coitada, ela está o dia todo fechada, porque es-tamos a trabalhar de manhã à noite, por vezes20 horas seguidas - e nessa aLtura começou a

soar a sirene [que avisa o lançamento de um

míssil] . Eu olhei para as pessoas à minha voltae só vi impotência. A sensação de "o que façoagora? Para onde vou?". As pessoas sabem quetêm 90 segundos para se recolher, que passa-do esse tempo vai acontecer uma grande ex-

plosão. Vi que a cadela começou a correr e eu

próprio corri atrás dela... Acho que bati o recor-de dos 100 metros (risos).Recolheu-se?Sim, consegui entrar nas escadas da minhacasa que, aLém dos quartos completamentevedados que alguns prédios têm, são os locais

mais seguros. Já Lá estava a minha muLher

[Yael Kehat] e, de repente, reparo num turista

belga, que estava na rua e entrou nas escadas

comigo, duas crianças que iam para a escola e

uma adolescente, que entraram na primeira

porta que se abriu. Tivemos 90 segundos com

pessoas que não conhecíamos e que não nosconheciam a tentar explicar-Lhes o que se es-tava a passar e a acalmá-las.Ao final destes anos a viver em Israel, esses90 segundos ainda lhe parecem Longos?Muito Longos mesmo. Só sabemos que acaba-ram quando ouvimos o estrondo [do míssil a

cair] ,mas não sabemos onde ele caiu. Pode ter

sido na sala da nossa casa ou do outro Lado da

cidade, ou a cinco ou dez quilómetros. Ninguémsabe o que vai encontrar quando sai para a rua.

São situações difíceis, mas o que acho que é im-

portante é que em Israel há uma população ci-

vil que vive esta situação desde o ano 2000 con-tinuamente e isso é aLgo que a imprensa inter-nacional não refletiu com força suficiente.

Fala de quem vive em Israel. E quem vive naFaixa de Gaza?Em Gaza vive-se também uma situação muitodura, a popuLação também sofre continua-

mente, mas não é a mesma coisa. Durante épo-cas bastante longas, nos úLtimos quatro anos,eles não tiveram nenhum tipo de incidente no

seu dia a dia, enquanto no Sul de Israel era con-tínuo. Os rockets cairão gota a gota. É verdade

que não provocaram muitas vítimas, mas... te-nho um amigo que perdeu a filha porque um

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roc/cetlhe caiu na cabeça. Era fiLha de um bra-sileiro, o Nathan. ELa estava cansada dos

rockets e foi viver com o namorado para umamoshav [comunidade rural] mais longe da

fronteira. Pensava que estaria mais segura e é

verdade que o LocaL para onde foi é uma zona pa-cífica... Chamava-se Dana... Ela saiu de casa pa-ra um jardim e, de repente, caiu-Lhe um míssil

em cima. Ao namorado, que estava a cinco me-tros, não lhe aconteceu nada (suspiro). É dramá-

tico, mas é assim a vida. 0 que espero é que o

resultado desta guerra seja uma trégua real,

que ponha fim a estes ataques. Nenhum país

pode suportar viver assim anos atrás de anos.E espero também que os palestinianos em Gaza

recuperem essa paz e que não haja mais ata-

ques israelitas de represália contra eles.

Porque diz que a imprensa internacionalnão refletiu com força suficiente a realida-de em Israel?

Acho que se considerava que os rockets envia-dos da Faixa de Gaza para Israel eram primiti-vos. Ao princípio eram construídos em Gaza, os

chamados Kasam, e faziam realmente parte de

uma indústria muito básica e rudimentar, mas

depois começaram a chegar do Irão. Mesmo

agora acho que há mísseis que continuam a en-trare há até suspeitas de que ultimamente pos-

sam ter passado mísseis químicos, o que pode-rá ser extremamente grave. Esses mísseis

eram primitivos, mas daíà imprensa não expli-car um fenómeno que paralisa a vida de todauma região é um erro. Não houve um númeromuito grande de vítimas, mas foi o suficiente pa-ra traumatizar uma geração de jovens que c res-

ce a pensar nos nomes dos mísseis e no seu aL-

cance, em vez pensar na música e nas coisas tí-

picas da adolescência. E faLo de uma geraçãodos dois lados da fronteira, que está a crescercom muitos traumas de guerra.São duas gerações que se cruzam? Não ha-vendo judeus na Faixa de Gaza, como é a re-lação entre as duas populações?Não há judeus em Gaza há desde 2D05. Nesse

ano, o governo de Israel decidiu retirar-se e des-mantelar os 21 coLonatos judaicos que aí havia

e onde vivam cerca de nove mil pessoas. Foi

uma decisão política muito importante e isso é

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< uma das coisas que os israelitas pensam serdas mais absurdas. ELes dizem: "Retirámo-nosde Gaza e a resposta que tivemos é a continua-

ção de mísseis, por isso, para que serviu a reti-rada?" Já os palestinianos dizem que Israelseretirou mas que continua a controlar as fron-teiras, o que também está certo. Isto é um cír-

cuLo vicioso, porque Israel controLa as fronteiras

p_ara que não entrem armas.É um círculo vicioso quebrável?Com um acordo que ponha fim ao bloqueio deIsraeL e que assegure que não entrem mísseis

dentro de Gaza. 0 Irão tenta permanentemen-te introduzir mísseis em Gaza e tenta compli-car a situação. Acho que neste momento, se

se conseguir a trégua nas próximas horas, co-mo penso que acontecerá - seja antes ou de-pois de uma invasão israelita -, e essa tréguafor anunciada peLo novo presidente do Egito[Mohammed Mursi], haverá uma mudançaestratégica importante: em vez da influênciado Irão dos últimos anos, vamos ver uma in-fluência maior do Egito, do Qatar e da Turquia,de aLguma maneira em coordenação como Presidente Barack Obama, o que mudará a

situação no terreno.Em relação a Barack Obama, ainda esta se-mana o comentador da SIC Miguel SousaTavares disse, e passo a citar: "Acho umacoincidência que assim que Barack Obamafoi reeleito, e não é segredo nenhum que Is-rael apostava tudo em Mitt Romney e nãonele, haja um conflito no Médio Oriente pa-ra testar até onde vai a vontade de proteçãode Israel por parte do Presidente norte--americano."O que aconteceu não foi IsraeL não apoiar Oba-ma, Quem não o apoiou foi o primeiro-mínistroBenjamín Netanyahu, que é um homem muito

próximo dos repubLicanos norte-americanos.Ele era amigo de Romney, trabalhou com elenos EUA, onde viveu durante muitos anos.

Apesar disso, Obama tem sido extremamentecorreto com Netanyahu e com IsraeL, ao reco-nhecer o direito do país à autodefesa. Nos úLti-

mos dias, disse várias vezes que Israel, como

qualquer país soberano, não pode permitir queo ataquem com mísseis e que é normal que rea-

ja. Mas também é normal que eLe esteja a ten-tar impedir uma invasão. Não o faz peLa força,não o faz pressionando, mas tentando umacordo que permita que IsraeL não invada Gaza.

ELe sabe que quando começa uma guerra des-te tipo nunca se sabe como vai acabar.Acredita que esse canto do mundo vai con-seguir ter paz um dia ou esta é uma guerraperdida?Acho que terá, mas há que resolver uma sériede probLemas. Em primeiro lugar, os próprios

palestinianos estão divididos em dois grupos. Eu

gosto de falar em duas Palestinas: a da Cisjor-dânia e a de Gaza. A primeira é a mais modera-da, a mais aberta, a mais ocidental, tenta criarum regime democrático. A segunda é teocráti-

ca, isLamita, de uma ditadura feroz, que perse-gue homossexuais e reLega as mulheres parasegundo plano. Esta é uma civiLização totaL-

mente diferente e que não está disposta, até

agora, a reconhecer o Estado de direito do povojudeu a sua soberania e à sua autodetermina-

ção. Enquanto isso for assim, esta zona estácondenada à guerra, porque IsraeL não vai re-nunciar à sua soberania e independência. Eu es-

pero que adotem uma política que lhes permi-ta chegar a algum tipo de acordo no futuro e

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que entendam que Israel está aqui para ficar,

que não é como os cruzados que viveram aqui190 anos e foram expulsos. Isto da mesma ma-neira que os palestinianos têm direito à sua au-

todeterminação.

"UM CONFLITO TEM SEMPRE DUAS VERDADES"

Foi para Israel em 1975, era então um jovemcom 16 anos. Passados estes anos, a suaperspetiva relativamente ao conflito israe-lo-árabe está diferente?

Agora vejo-o com os olhos de uma pessoa queo vive de perto, que conhece a realidade de umamaneira diferente. Hoje posso entender o bodyíanguage dos diferentes protagonistas. Perce-bi que posso entender não só o que se diz mastambém o que se pensa. Aqui toda a gente en-tende que uma câmara de televisão ou um

computador são armas tão letais como umFl5 ou um tanque. Às vezes, mais até. Por isso,é preciso ouvir o que se diz, mas não só. É pre-ciso também entender o que se diz.

Nos últimos tempos, a comunicação socialtem justificado com mais intensidade asações militares israelitas. Isto quer dizerque já há maior compreensão ou é uma ten-tativa forçada de imparcialidade?No que tem que ver com o Médio Oriente acho

que parte da imprensa, sobretudo a europeia,

cometeu graves erros éticos desde a segundaintífada [em 2000] . Houve uma cobertura mui-to parciaL do conf Lito e na maioria dos casos par-cial pró-PaLestina. Acho que isto tem que vercom a filosofia cristã, de existir uma identifica-

ção com David e não com Golías. Houve muitafalta de equilíbrio na forma de explicar as coi-

sas. É lógico que, quando há uma imagem de

uma criança em frente de um tanque e as pes-soas não sabem o que há por detrás desse tan-

que e dessa criança, se identificam automatica-mente sem fazer perguntas. Portugal nesse as-

peto errou menos. Mas Espanha, alguns paísesescandinavos e a Grécia fizeram uma cobertu-ra extremamente parciaLE hoje?Noto que há uma espécie de reflexão, uma ten-tativa de criar uma forma mais honesta - e nãofalo de objetividade porque isto não é matemá-

tica - de não misturar opinião e informação,de tentar verificar as coisas com os dois Lados.

Se estivéssemos a cobrir os problemas da

pesca na União Europeia, provavelmente po-deríamos falar apenas com um dos Lados. Mas

aqui é preciso lembrar que estamos a cobrirum confLíto, e este têm sempre duas verda-des. Não podemos deixar que um lado domi-no o outro. Digo isto também para aquela mi-noria de meios que faz isto pró-IsraeL, o queacontece mais nos EUA do que na Europa. Sehá algo que aprendi é que dos dois Lados há

pessoas que sofrem, há seres humanos e, pordetrás dos terroristas e dos militares mais du-ros, há pessoas que querem que as deixem

tranquilas e uma vida melhor.Essa consciência do que se passa dosdois lados da fronteira é o segredo do seusucesso? O nome Henrique Cymerman égeralmente associado a um jornalismoimparcial.Isso é uma luta contínua que tenho comigomesmo. É fácil ser dogmático na maneira de in-

formar, sobretudo quando se estão a ver ima-

gens dramáticas e que não deixam ninguém in-

diferente. Mas temos de levantar a cabeça e

olhar para o outro Lado.

É correspondente da SIC, do canal espa-nhol Antena 3 e do jornal La Vanguardia.Além disso, é comentador regular nas te-

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< Levisões israelita e palestiniana, na brasilei-ra e na norte-americana. Isto não é uma ver-dadeira confusão?

(risos) Nenhuma. 0 Médio Oriente é um dos Lo-

cais mais interessantes do mundo. É um verda-deiro laboratório humano. Encontramos detudo num país com as mesmas dimensões do

ALentejo, o que do ponto de vista jornalísticoé extremamente empolgante. No caso da SICe da Antena 3, o que faço é procurar temas

que passem pelo meu próprio filtro de utili-dade para os espectadores. As reportagenspara a SIC são mais Longas, mais profundas.Em Espanha, o jornalismo que se praticaé mais curto, mais imediato.

Desdobrar-se assim obriga-o não só afazer diferente jornalismo mas tambémjornalismo em quatro línguas.0 que não é um entrave, mas não lhe vou di-

zer que é fáciL 0 facto de fazer teLevisão emhebraico, português, inglês e espanhol faz

que não consiga falar nenhuma das Línguasna perfeição (risos). Mas sabe que perceberárabe já me salvou a vida. Uma vez estava a

trabalhar e percebi o que estavam a dizer, o

que me permitiu agir por antecipação e sa-far-me de uma situação que poderia sercomplicada.

Como consegue movimentar-se naqueleque é tido como um dos Locais mais proble-mático do mundo?0 essencial é seguir à risca uma série de proce-dimentos. Não os oficiais, mas os que a experiên-

cia de anos no Local nos ensinam. É preciso co-nhecer e ter relações. Quando precisamos de

nos mexer em zonas de conflito, recorremos fre-

quentemente ao que chamamos de fixers, pes-soas que contratamos para servirem de nossos

guias, de tradutores. Muitas vezes deslocamo--nos nos carros deles por causa das matrícuLas,

para não entrarmos em zona árabe com matrí-cuLa de Israel, No fundo, o fixeré a pessoa quezela pela nossa segurança.A segurança é a única limitação?Quase. Em Israel, a liberdade de imprensa temuma tradição muito forte. Mas a censura mili-tartambém é forte. Os meios de comunicaçãosão pluralistas, não têm cores. A Liberdade é

respeitada. Mas existem os segredos miLitares

que não podem ser revelados. Nestes anos, só

quando entrevistei o espião nucLear MordechaiVanunué que fui chamado. Perguntaram-me o

que me tinha dito e eu disse por aLto, e eles per-mitiram que eu avançasse com a entrevista.Não podemos reveLar o que quer que seja queponha em causa a segurança de Israel.

Apesar dessa liberdade de imprensa já ad-mitiu que sofre pressões de ambos os ladosdo conflito.Sim, eles ligam-me. Com a internet tudo é ra-pidamente difundido, traduzido, o que escrevo

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e o que diga em teLevisão. ELes sabem imedia-tamente o que faço. Encontro textos em hebrai-

co e em árabe nos escritórios dos ministros dos

Negócios Estrangeiros de um lado e do outro.

Seguem cada palavra e chamam-me a atençãoquando não estão de acordo com aLguma coi-

sa. Já fui pressionado, claro, mas há uma coisa

que nunca puseram em dúvida e isso é o meu

grande orgulho: a minha honestidade.Já se tentaram aproveitar do facto de terbons contactos e relações para passarmensagens de um Lado para o outro?Já me aconteceu dezenas de vezes.Como reage?Permita-me não responder a isso.

A honestidade na sua forma de fazer jorna-lismo tem ajudado a que haja em Portugale Espanha uma consciência maior em rela-ção ao Médio Oriente?{pausa) Há muita gente que me diz isso... Eu sei

que depois de tantos anos tenho influência nas

pessoas... Mas não penso nisso. Penso é em fa-zer o meu trabalho e explicar as coisas da for-

ma mais pedagógica possível, para que a situa-

ção se entenda e não se complique mais.Essa é uma atitude típica de um professor,como aliás o foi na Faculdade de Telavive,onde se especializou em Sociologia e Ciên-

cias Políticas. Como é que o jornalismo seatravessou na vida de um docente?Acho que o que mais me influenciou foi a revo-

lução do 25 de Abril de 1974 e o meu pai, queera viciado em jornais. Comprava três ou qua-tro por dia e lembro-me de ele comentar sem-

pre a importância que os jornalistas tinham e a

sua inf Luência na opinião pública e na democra-cia, que àquela data ainda não era cLara nem ga-rantida. Acho que esse vaLor que o meu pai dava

ao jornalismo me marcou, e devo ter pensado

que algum dia haveria de fazer isso também.

Começou pela imprensa e foi parar à teLe-visão. Lembra-se do seu primeiro direto?(risos) Lembro-me de que tinha medo de não

me recordar do texto. Pedi a um rapaz que ain-

da hoje trabalha comigo para o escrevermosnuma cartolina, que foi posta debaixo da câma-ra. Comecei a lê-lo e quando terminei estavatodo dobrado, parecia que estava a rezar, pcr-que a cartoLina era grande e o fim do texto já es-tava perto do chão (risos). Compreendi que ti-nha de saber de cor o que queria dizer.

Ou seja, não esmoreceu perante o desa-fio. É um homem que enfrenta todos osseus medos? Estou a Lembrar-me de quedisse, em tempos, que o medo é o seu se-guro devida.

0 medo... eu tento que eLe não me conquiste,não me paralise. Hoje, tenho medo de termedo. Tenho medo de voltar a ter medo. Acho

que nesta etapa da minha vida profissionaL é

esse o meu maior medo.Já não tem medo dos acontecimentos, masda sua reação a eles?Não quero deixar ninguém provocar-me medo.

Isso foi algo que pensei muito claramente há dias,

quando estive à espera do míssil que ia cair em Te-

lavive perto de mim. Pensei "não vou deixaro medo

apoderar-se de mim, vou continuar tranquilo pa-ra poder sossegar os que estão a minha voLta ain-

da mais nervosos e assustados". Com a experiên-

cia, a verdade é que tenho medo que consigam al-

gum dia, sobretudo os mais radicais, intimidar-me.

Eu não vou deixar que isso aconteça.O facto de ser pai de três jovens não incen-tiva também a deixar-se dominar por essemedo?Claro que ser pai torna tudo mais compLicado.Como é que se explica aos filhos que elestêm de fugir e esconder-se em escadas ebunters quando ouvem sirenes? Que há pe-rigo de vida?Eles nasceram aqui, nasceram com essa rea-lidade. Israel é a casa deles. Isto não quer dizer

que não tenham medo. A minha filha mais no-

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i va, a Noa, no dia seguinte ao seu 14. Q aniversá-

rio, tinha de apanhar um táxi de casa da mãedela para a minha casa. Estávamos numa

guerra, já não sei qual. E ela Ligou-me e disse-

-me que tinha medo da viagem, que, durante o

percurso, se a sirene tocasse não saberia o quefazer. Isto não é fácil de ouvir.

O que diz aos seus filhos nessas alturas?Tenta impedi-los de sair para os mantersempre em locais mais seguros?De maneira alguma. Tenho mais medo do prejuí-zo psicoLógico, das consequências de sentirem

medo do que do perigo real. É menos provávelacontecer algo terrível do que essa sensação de

crescer com medo. Por isso, tento dar-lhes liber-

dade, segurança neLes mesmos.

"NÃO GOSTO DE OLHAR PARA 0 RETROVISOR.

PREFIRO A JANELA DA FRENTE"

O seu irmão, Carlos Cymerman, também foi

correspondente em Israel, no caso da RTP.O apelido Cymerman não é um fardo pesa-do para ele?(risos) Eu sei Lá... isso era preciso perguntar ao

meu irmão (risos). Digamos que eu sou o irmãomais jovem dele, tenho menos oito anos. ELe

olha para mim com orguLho. 0 Carlos era um se-

gundo pai para mim quando eu era miúdo. Masnão sei... eu suponho que ele está contente. Ca-da um é o que é, com quaLidades e defeitos. Di-

zem que as comparações são odiosas (risos).Tem ideia de quantas horas de reportagemjá assinou?Não sei, mas devem ser muitas. Tenho todas as

reportagens guardadas, mas não tenho paciên-cia para as ver. Sou muito crítico comigo mesmoe prefiro não ver. 0 passado é importante, não

digo que não, mas não gosto de olhar para o re-trovisor. Prefiro a janela da frente. É importan-te pensar no próximo projeto. Isto foi uma coisa

que vi acontecer também com o cantor lírico

Plácido Domingo, que iniciou a carreira em Te-

lavive, onde viveu dois anos. Ele contou-me quequando termina uma ópera canta de imediato a

primeira Linha da próxima. De forma metafórica

é o que eu faço no meu trabalho. Até deixo as

pessoas à minha volta um pouco esgotadascom isto, com o terminar uma reportagem e

querer pensar logo na seguinte.Calculo que também não saiba quantos lí-deres políticos entrevistou?Também não. Nunca os contei, mas devem servárias dezenas.De todas as que fez, há uma que fica na his-tória: a última realizada a Isaac Rabin, emnovembro de 1995, 24 horas antes do pre-sidente israelita ter sido assassinado.

Sem dúvida. Por todo o seu significado. Mas alémdisso há uma personagem que para mim é fas-cinante. Vejo-o como o estadista mais brilhante

que encontrei até agora, que é Shimon Peres.

E possível, aliás, que eu escreva uma biografia so-bre ele. Acho queodrama deste presidente é eLe

estar à frente do seu tempo. É uma das pessoasmais profundas e um dos intelectuais mais bri-

Lhantes que já encontrei na minha vida.

Está a pensar escrever uma biografia ou jáestá a escrevê-la?Ele pediu-me e estamos a falar disso. Vamosver o que vai acontecer. Será uma biografia his-

tórica, aLgo um pouco diferente. Será provaveL-mente o úLtimo livro que sairá sobre o prémioNobel da Paz. ELe faz 90 anos em agosto e con-tinua a trabalhar 18 horas por dia com a maior

energia e com uma inteligência extraordinária.

No meio de tudo, acha que consegue ir a Es-panha no dia 4 de dezembro para receber aComenda da Ordem do Mérito Civil espa-nhola, que lhe foi recentemente atribuída?Ui... daqui até ao dia 4 ainda faltam muitos dias.

Vou primeiro passar o dia 2, o dia 3 (risos).

Qual a sua relação com os reis espanhóis?Conheço-os pessoaLmente e sei que eles Lêem

o que escrevo no La Vanguardiae assistem àsminhas peças na Antena 3 há muitos anos.Este prémio é mais um a juntar aos muitoscom que já foi distinguido ou tem um saborespecial por ser entregue pelo monarca es-panhol?De todos os que recebi há dois especiais: a Or-dem do Infante D. Henrique e o Prémio DanielPearl [jornalista norte-americano sequestradoe assassinado no Paquistão]. Este tem um si-

gnificado maior para a minha mãe. Ela é espa-nhola e toda a família, judeus sefarditas, foi ex-

puLsa de Espanha há 500 anos pelos monarcasde então. Agora, com os seus 87 anos, ela vê o

filho receber a maior condecoração do país en-tregue peLo rei. Acho que ela sente que foi fei-ta justiça.

Em 2011, Henrique Cymerman aceitou ser entrevistado pelo brasileiro Jô Soares no seu programa da TV Globo

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"TENHO UMA CASA EM PORTUGAL.

SE NÃO FÍSICA, PELO MENOS MENTAL"

Vir para Portugal e deixar Israel não lhe pas-sa pela cabeça?Neste momento não. Mas não sei. Todos muda-mose pode serque haja uma aLtura em que me

apeteça fazer outras coisas e ter outro ritmo. É

possível. Tenho uma casa em Portugal. Se nãofísica, peLo menos mental. De alguma maneira,

Portugal também é uma casa para mim. Em

Espanha não me sinto em casa, nunca me sen-ti. O único sítio, além de Israel, onde me sinto emcasa é mesmo Portugal. É bastante difícil de ex-

plicar o que sinto quando vou a PortugaL E é di-

fíciL falar do futuro. Aqui vi-

ve-se o dia a dia e e aqui

que tenho a minha famí-lia, a minha mulher... Ape-sar de ela ter nascido emLisboa, 0 pai dela era aídi-

plomata. ELa nasceu naclínica de Benfica e nós

costumamos rir muito

porque ela é alfacinha e

eu sou tripeiro. Andamos

sempre a brincar por cau-sa disso.É curioso como os vos-sos destinos, o do Hen-rique e de Yael [produ-tora televisiva], se cru-zaram.Agora até trabalhamos

juntos. Eu sempre disse

que nunca trabalharia com

a minha mulher; masacon-teceu de forma totalmen-te natural. Nada foi pla-neado, o que até é uma coi-

sa pouco comum na minha

vida. Ela está comigo o

tempo quase todo. É comominha chefe (risos).

Os seus filhos [do primeiro casamento comEsther Alcabes] pen-sam como o Henriquerelativamente a Portu-gal?Eles vão frequentemente a PortugaL, mas eu

penso que eles vão ficar em Israel A mais no-va ainda é pequena, não sei o que vai fazer davida dela, 0 meu filho tem amigos portuguesesque conheceu em viagens pelo mundo. ELe estámetido no mundo da televisão e gosta de fazerdocumentários...Influência do pai?Ah... o que é que se há de fazer? (risos) Ele es-teve no Vietname a filmar num orfanato, este-ve voluntariamente nesse orfanato. A minha fi-lha também esteve num orfanato, mas no

Gana... não sei o que é que eLes têm os dois comos orfanatos (risos). Bem, mas durante as via-

gens que fez, o Yaír encontrou portugueses esentiu uma enorme afinidade com eles. Nunca

pensei que isto acontecesse...

Portugal estás-lhes no sangue.Provavelmente. Apesar de eles terem estado aímenos do que eu gostaria, sentem quaLquercoisa. Eu vejo que eles olham para PortugaL de

uma forma diferente. Não é um país estrangei-ro qualquer.O que eles sentem é comparável ao que o

Henrique sentiu quando aos 16 anos deci-diu ir para Israel? O que o motivou nessaaltura?O que lhe vou contar parece uma novela, masnão é. O pai da minha muLher era o cônsul Mi-

chael Kehat e ele fez um discurso quando eutinha 11 anos. Tinha combatido na Guerra dos

Seis Dias Ounho de 1967] quatro anos antes,e eu lembro-me do impacte que as declara-ções dele tiveram em mim. Depois, a grandefrustração do meu avô era não ter vindo em jo-vem para Israel, Ele chegou a PortugaL vindoda PoLónia, em 1926, se não me engano no dia

da revoLução do marechal Carmona, e mete-ram-no na prisão porque acharam que ele era

um agente soviético comunista. Quando elesaiu depois de perceberem que era engano, o

meu avô apaíxonou-se por Lisboa e optou porfica aí

.ELe tinha um vínculo com IsraeL muito

forte e acho que tudo isso me foi transmitido.

Depois, li muito sobre a democracia israelita esobre o Médio Oriente. Quando vim, aos 16anos, para o kibutz disse aos meus pais quenão voLtava. Vinha passar cá o verão e, de re-pente, os meus colegas no Liceu Garcia de

Horta, no Porto, descobriram que eu não vol-tei para acabar o sétimo ano. Acabei por estu-dar cá e organizar cá a minha vida. De algumamaneira, fui um self made man. Ou um seífmade boy (risos).Conhecer o passado da sua família, que so-freu com o Holocausto, também influenciouessa decisão?Sem dúvida alguma. Aos 13 anos descobri quedezenas de pessoas da minha família tinham

sido exterminadas, todas no

mesmo dia, no princípio da

Segunda Guerra MundialOs meus avós tinham deci-

dido fazer uma espécie de

voto de silêncio porque o

meu avô não queria conta-minar-nos, não queria fa-lar-nos disso para não co-nhecermos o ódio. Foi a for-ma de ele viver os seus

anos depois do Holocausto,Mas o facto de eu ser mui-to curioso... Eu não o larga-va e eLe Lá me contou...

E o que é que lhe contou?Que os meus bisavós e os

tios-avós viviam em Tutsk,na atual Ucrânia, na altu-ra era PoLónia, que foramreunidos numa zona da ci-

dade e que foram fuzila-dos. Até hoje, eu não tive

coragem de ir a Tutsk.Este ano tenho planos de

lá ir com o meu filho pres-tar-Lhes uma pequena ho-

menagem. É muito duro

para mim pensar nisso e

evitei lá ir até agora. Nemnunca estive num campode concentração. Mas

penso que hoje já estou

preparado.Estar num país em permanente conflito aju-dou-o a ter coragem para enfrentar o seupassado familiar?Não se pode comparar o que se vive e se vê emIsraeL com os campos de concentração. Isto é

um conflito poLítico, militar, e pode ser muito

sangrento, mas é incomparável ao que aconte-ceu no Holocausto, que é a maior tragédia da

história da humanidade. Estou a lembrar-me,por ter falado no meu avô, que quando era miú-do ele não queria saber o que é que eu tinha fei-to na escola. Questionava-me antes que per-gunta tinha eu feito. O que o meu avô talvez não

imaginasse é que eu viria a ter isso mesmo co-mo profissão: perguntar. NTV

Page 9: NUNCA PUSERAM DÚVIDA A MINHA - ClipQuick · Tinha 16 anos quando partiu ... go a ouvir as sirenes de aLerta de míssil. ... Hoje posso entender o body íanguage dos diferentes protagonistas.