O Anfíbio - Edição Extra 2008

114

description

 

Transcript of O Anfíbio - Edição Extra 2008

Page 1: O Anfíbio - Edição Extra 2008
Page 2: O Anfíbio - Edição Extra 2008

Como órgão de divulgação do Corpo deFuzileiros Navais (CFN), a primeira revis-ta foi editada em setembro de 1939 com

o nome “O Naval”, circulando até 1943. Em mar-ço de 1954, surgia o primeiro jornal dos Fuzi-leiros “O Anfíbio”, publicado até 1977.

Aproveitando esta última denominação, apartir de 1961, iniciou-se a edição da Revistados Fuzileiros Navais, “O Anfíbio”, em circula-ção até hoje. Destina-se a divulgar a doutrinaanfíbia e o moderno emprego de Forças de Fu-zileiros Navais, difundir a história e tradiçõesdo CFN, e constituir-se em foro para debate deidéias que estimulem o aperfeiçoamento técni-co-profissional.

SumárioEditorial - Nossa Capa ............................................................................................................................................................... 02O Corpo de Fuzileiros Navais - Antecedentes Históricos ......................................................................................................... 051808 - O Histórico Desembarque .............................................................................................................................................. 07A Fortaleza de São José da Ilha das Cobras ........................................................................................................................... 09A Independência e sua Consolidação ..................................................................................................................................... 12A Guerra da Cisplatina ............................................................................................................................................................... 14A Noite das Garrafadas .............................................................................................................................................................. 16Campanha Contra Oribe e Rosas ............................................................................................................................................. 17A Guerra Contra Aguirre ............................................................................................................................................................ 18A Guerra do Paraguai ................................................................................................................................................................ 21Proclamada a República ........................................................................................................................................................... 24A Revolta da Armada ................................................................................................................................................................. 27Revolta dos Marinheiros e do Batalhão Naval .......................................................................................................................... 31Quando Terminava a Primeira República ................................................................................................................................. 32A Revolução de 1930 ................................................................................................................................................................. 34A Revolução Integralista ............................................................................................................................................................ 37A Segunda Guerra Mundial ........................................................................................................................................................ 40Etapas Decisivas ........................................................................................................................................................................ 42A Revolução de 1964 ................................................................................................................................................................. 44A Companhia de Reconhecimento Anfíbio .............................................................................................................................. 46A Participação da Marinha do Brasil na Força Interamericana de Paz .................................................................................... 6425 Anos de Operações Dragão ................................................................................................................................................. 78Quarta Estrela para o CFN ......................................................................................................................................................... 84Cem Anos do Gorro de Fita ....................................................................................................................................................... 88A Paz em Angola e a Participação do Corpo de Fuzileiros Navais ......................................................................................... 90O Grupamento Operativo de Fuzileiros Navais Haiti - O Pouso do Albatroz ........................................................................... 96ADSUMUS ................................................................................................................................................................................ 105Rachel de Queiroz - Madrinha do CFN ................................................................................................................................... 106O Corpo de Fuzileiros Navais .................................................................................................................................................. 108

O ANFÍBIO • no 26 • Ano XXVII • 2008

Comandante-Geral do Corpo de Fuzileiros NavaisAlmirante-de-Esquadra (FN)Alvaro Augusto Dias Monteiro

Editor ResponsávelCapitão-de-Mar-e-Guerra (FN)Rogério Lopes da Silva

CoordenaçãoCapitão-de-Fragata (FN)Pedro Luiz Gueiros Taulois

Projeto Gráfico e EditoraçãoCapitão-Tenente (T)Tonery W. Pernambucano Júnior

Assessoria de Relações Públicas do Comando-Geral do Corpo de Fuzileiros Navais.Fortaleza de São José, s/n - Ilha das Cobras – CentroRio de Janeiro – RJ – CEP: 20091-000 - Tel.: (21) 2126-5029

As opiniões emitidas nos artigos deste periódico são de inteira responsabilidade de seus autores, não refletindo, necessariamente, o pensamento ouatitude do Comando-Geral do Corpo de Fuzileiros Navais, a não ser que assim esteja expressamente declarado.Todos os trabalhos aqui publicados sãode caráter gratuito. É permitida a reprodução total ou parcial das matérias. Solicita-se a citação da fonte e a remessa de um exemplar da publicação.

Page 3: O Anfíbio - Edição Extra 2008

2 O ANFÍBIO • 2006

Editorial Nossa Capa

Fuzileiros Navais envergan-do o uniforme 1808, seme-lhante ao que era utiliza-

do pela Brigada Real da Marinhaquando desembarcou no Rio deJaneiro, em sete de março de1808, acompanhando a FamíliaReal Portuguesa em suatransmigração para o Brasil.

Este uniforme é o que, ain-da sob influência da RevoluçãoFrancesa, foi aprovado em 13 demaio de 1807, pelo Príncipe Re-gente D. João, tendo sido preservadas as cores encarna-do, azul e branco descritas na complementação do Alvaráde 28 de agosto de 1797.

No ano em que comemoramos o Bicentenário doCorpo de Fuzileiros Navais (CFN), acontecimentomarcante na história de nosso País, procuramos

traduzir nossa secular trajetória nos artigos da 26ª ediçãodeste “O Anfíbio”. Por conseguinte, sua capa e páginasforam reservadas para destacar aspectos que forjaram oCorpo de Fuzileiros Navais, tão expressivo na contribui-ção para a consecução das tarefas da Marinha do Brasil.

Dentro do propósito que norteou esta publicação -divulgar aspectos relevantes de nossa história e o moder-no emprego de Forças de Fuzileiros Navais - esta ediçãorelata, cronologicamente, fatos ocorridos, desde os ante-cedentes da criação do CFN até os dias atuais, assina-lando as destacadas participações na transmigração daFamília Real para o Rio de Janeiro e a consolidação daIndependência do Brasil, além de realçar os diversos con-flitos armados internos e externos de que participamos,como as Guerras da Cisplatina, contra Oribes e Rosas,contra Aguirre e a da Tríplice Aliança. Ressalta, também,nosso envolvimento na Proclamação da República e naRevolta da Armada, nas Revoluções de 1930 e Integralistae, já a partir da segunda metade do século XX, destacaas participações do Corpo de Fuzileiros Navais e da Ma-rinha do Brasil na Força Interamericana de Paz na Repú-blica Dominicana, na Missão de Paz em Angola e, atual-mente, na Missão de Paz no Haiti – MINUSTAH. O cha-mado da OEA e da ONU para estas missões pôde serprontamente atendido, o que comprova nossa capacida-de expedicionária.

Finalizando esta edição, o artigo “O Corpo de Fuzi-leiros Navais” discorre sobre nossa evolução e os signifi-cativos avanços tecnológicos que vivemos, além de anali-sar o poder dissuasório de uma força anfíbia sob a pers-pectiva de um cenário internacional incerto e globalizado.

Essa gama de artigos é o resultado das valiosascontribuições de diversos colaboradores, cujos esforços,aliados ao alto nível dos trabalhos apresentados, permiti-ram formar um compêndio homogêneo e de significativovalor histórico.

É, pois, com grande satisfação e orgulho que apre-sentamos a 26ª edição da revista “O Anfíbio”, no ano doBicentenário do Corpo de Fuzileiros Navais.

ADSUMUS.

FOTO DA CAPA: RENAN BARBIERI TOZZI

Page 4: O Anfíbio - Edição Extra 2008

O ANFÍBIO • 2006 3

FOTO

: REN

AN

BA

RB

IER

I TO

ZZI

Page 5: O Anfíbio - Edição Extra 2008

4 O ANFÍBIO • 200 ANOS

REP

RO

DU

ÇÃ

O

Page 6: O Anfíbio - Edição Extra 2008

O CORPO DE FUZILEIROS NAVAIS - ANTECEDENTES HISTÓRICOS 5

O Corpo deFuzileiros NavaisAntecedentes Históricos

Data de 1317 o surgimento da Marinha Portu-guesa.

O genovês Manuel Passagno foi contratado pelaCoroa, com o posto de Almirante, para organizar a Ar-mada Real. E teria sido, cumprindo determinação doInfante D. Henrique, o Navegador, que João GonçalvesZarco introduziu a Artilharia a bordo das galés, em-barcações utilizadas naquela época.

Cresceu a esquadra lusitana – empreenderam-seas Grandes Navegações. Portugal descobriu “novosmundos para o mundo”.

Já no século XVI, as funções marinheiras se defi-niam. Em 1618, D. Antônio de Ataíde, General Perpétuoda Armada Portuguesa, criou na Armada o “Terço da

Armada da Coroa de Portugal”, cuja finalidade era pro-teger a navegação contra os ataques dos piratas. O pri-meiro Mestre-de-Campo foi o Almirante D. Francisco deAlmeida. Não se sabe ao certo a composição primitivado Terço da Armada. Sabe-se, contudo, que ele foi orga-nizado como a infantaria espanhola, onde um “Terçotinha dez companhias”. Seu Comandante era denomi-nado “Mestre-de-Campo” e seu substituto eventual erao Sargento-Mor. A primeira ação do Terço da Armada noBrasil deu-se na famosa “Jornada dos Vassalos”, quandorealizaram desembarques e outras ações na restaura-ção da Bahia, na ocupação holandesa em 1625.

Durante quase meio século soldados do Terço ga-rantiram a navegação para o Brasil. Também influenci-

“Eu A Raynha: - Faço saber aos que este Alvará comforças de Ley virem que tendo me sido prezentes osgraves inconvenientes que se seguem ao meu realServiço e a Disciplina da Minha Armada Real e oaugmento de despeza, que se experimenta por havertrez corpos distintos a bordo das Naus, e outrasenbarcações de guerra da Minha Armada Real quaessão os Soldados-Artilheiros, os Soldados deInfantaria, e os Marinheiros;....”.

Page 7: O Anfíbio - Edição Extra 2008

6 O ANFÍBIO • 200 ANOS

aram outros países a aperfeiçoarem suas “Artilharias”,como tropa especializada para evitar e realizar abor-dagens e desembarques, quando necessário.

A 28 de julho de 1736, surgiu a Secretaria de Esta-do dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos.Neste mesmo ano, um Alvará datado de 1º de maio fa-zia nascer dois Regimentos da Armada, responsáveispor toda a Artilharia.

Os últimos anos daquele século marcaram a cri-ação da Companhia de Guardas-Marinha, o Corpo deOficiais da Marinha e o Conselho do Almirantado.

28 de agosto de 1797 – Alvará da Rainha D. Ma-ria I cria a Brigada Real da Marinha. No intróito destedocumento, as razões da providência:

“Eu, a Rainha, faço saber aos que este alvará comforça de lei virem, que, tendo-me sido presentes os gra-ves inconvenientes, que se seguem, ao meu Real Serviçoe à Disciplina da Minha Armada Real, e o aumento dedespesa que se experimenta por haver três Corpos dis-tintos a bordo das naus e outras embarcações de guer-ra da Minha Armada Real, quais são os soldados arti-lheiros, soldados de infantaria, e os marinheiros: sendoconseqüências necessárias desta organização, em pri-meiro lugar, a falta da disciplina que dificilmente se podeestabelecer entre Corpos pertencentes a diversas repar-tições; em segundo lugar, a falta de ordem, que nasce deserem os Serviços de Infantaria e de Artilharia muitodiferentes no mar do que são em terra; e ser necessárioque os Corpos novamente embarcados aprendam no-vos exercícios a que não estão acostumados. Sou servi-da mandar criar um Corpo de artilheiros marinheiros,de fuzileiros marinheiros e de artífices e lastradores,debaixo da denominação de Brigada Real da Marinha”...

O original do Alvará encontra-se, nos dias de hoje,arquivado na Torre do Tombo, em Lisboa.

A Brigada Real da Marinha, com um efetivo de

5.222 homens, era composta de três divisões. Seu pri-meiro Comandante foi o Inspetor Geral D. DomingosXavier de Lima.

A 1ª Divisão de Artilheiros-Marinheiros tinha comomissão guarnecer a artilharia de bordo, os fortes e arma-zéns de pólvora da Marinha. Além disso, realizava obraspeculiares à artilharia. O Chefe-de-Divisão Luiz da MotaFeo foi o primeiro Comandante dos 1.770 homens que aconstituíam, compondo dez companhias.

A 2ª Divisão de Fuzileiros-Marinheiros tinha oefetivo de 2.124 homens, distribuídos em doze compa-nhias. A ela incumbia efetuar desembarques, defenderos navios e o Arsenal da Marinha. O alvará detalhava,sugestivamente, que “ É inútil que tropas de embarquesejam exercitadas a grandes manobras e evoluções pró-prias dos Regimentos de Meu Exército de Terra, deven-do ser próprias para realizarem desembarques...” – aqui,claramente, há quase dois séculos, consagravam-se ocaráter sui generis de uma Força Anfíbia e a importânciado adestramento e instrução específicos desta tropa. Oprimeiro Comandante dos Fuzileiros-Marinheiros foi oChefe-de-Divisão Rodrigo Pinto Guedes.

Finalmente, a 3ª Divisão era integrada de noveCompanhias de Artífices-Marinheiros e uma deLastradores-Marinheiros, compondo um total de 1.328homens comandados pelo Chefe-de-Divisão Matheus Pe-reira de Campos. A bordo dos navios de guerra, equi-pando os Correios Marítimos, que seriam estabelecidospara a América e operando em Arsenais, a 3ª Divisãocumpria suas tarefas.

Em 1807, a 10 de setembro, o Príncipe Regente D.João reorganizava a Brigada Real da Marinha através deoutro alvará. Era, assim, criado o Estado-Maior da Briga-da. Também por força deste ato, a tropa passava a cons-tituir-se de três Batalhões a oito Companhias cada um.

Seus integrantes seriam chamados de artilheiros.

REPRODUÇÃO

A Família Real Portuguesa e a Brigada Real da Marinhapartem de Lisboa a caminho do Brasil

Page 8: O Anfíbio - Edição Extra 2008

1808 - O HISTÓRICO DESEMBARQUE 7

Eram os primeiros anos do século XIX. O mundo conhece ogênio militar de Napoleão Bonaparte, que faz desmoronar aestrutura política da Europa. A Inglaterra resiste à poderosa

ação das armas do Império de França. Napoleão resolvedesfechar um golpe decisivo na economia de seu maior

adversário, para quem o comércio marítimo é de vitalimportância – decreta o “Bloqueio Continental”.

D. João, que governava Portugal como Regente, nega-se ainterromper o comércio com o Império Britânico,

tradicional aliado da Coroa Portuguesa.

1808 O HISTÓRICODESEMBARQUE

Page 9: O Anfíbio - Edição Extra 2008

8 O ANFÍBIO • 200 ANOS

A represália de Napoleão não iria demorar. As-sim, o General Junot invade Portugal. O Príncipe Re-gente coloca em prática antigo plano, transferindo-secom a Corte para o Brasil. Os historiadores nem semprefizeram justiça a esta decisão de apreciável habilidadepolítica, mas é certo que, para o Brasil, estava começan-do um novo tempo.

Com a real expedição viajaram os homens da Bri-gada Real da Marinha.

1808 – 7 de março – chegou ao Rio de Janeiro aFamília Real. Esta é a data da histórica chegada dos an-cestrais da atual tropa anfíbia da Marinha do Brasil,sob o Comando do Almirante Rodrigo Pinto Guedes – omarco zero da História do Corpo de Fuzileiros Navais.

A 1º de maio de 1808, o Príncipe Regente assinoumanifesto declarando guerra à França e, a 10 de junho, odecreto: “e portanto Ordeno que por Mar, e por terra selhes fação todas as possíveis hostilidades, authorisandoo Corso, e Armamento, e que meus Vassallos queirãoporpor-se contra a Nação Francesa”.

O Governador do Pará Tenente-General JoséNarciso Magalhães de Menezes recebeu, a 22 de julho de1808, uma ordem régia para fazer marchar, o mais de-pressa possível, e “logo que recebesse de Pernambucoas tropas de infantaria e artilharia que lhe fossem reme-tidas”, forças de mar e terra e “tomasse posse solene eestabelecesse um destacamento à margem direita doOiapoque, realizando a reintegração dos justos limitesda Capitania do Pará”.

O Governador, com os parcos recursos dispo-níveis, organizou uma pequena Força Naval constituí-da de embarcações de pequeno porte e cujo comando foientregue ao Tenente-General Manuel Marques, do Cor-po de Artilharia. Diz-nos Pereira da Silva que a flotilhaera quase toda composta de brasileiros, “levando cercade 300 homens de desembarque”.

No dia 13 de dezembro, procedente do Rio deJaneiro, com escalas na Bahia, Maranhão, Belém e Pará,chegava próximo ao Cabo Norte uma esquadra coman-dada pelo Capitão-de-Mar-e-Guerra James Lucas Yéo,assim composta: fragata Confiance, com 26 peças; bri-gue Voador, comandado pelo CF José Antônio Salgadocom 18 peças; brigue Infante D. Pedro, Comandante Ca-pitão-Tenente Luís da Cunha Moreira, com 18 peças;escuna General Magalhães com 12 peças e os cúteresVingança e Leão todos comandados pelo 2º Tenente deArtilharia Manuel Luís de Melo. Sob o Comando do CTLuís da Cunha Moreira, Oficial brasileiro mais tardeVisconde de Cabo Frio e primeiro Ministro da Marinhado Brasil Independente, estavam os Fuzileiros-Mari-nheiros, conforme relatam Anthero José Marques e LucasAlexandre Boiteux.

No dia 15 de dezembro de 1808, o ComandanteYéo seguiu rumo ao Approuague ou Approak, rio quedeságua no Atlântico. Nas margens desse rio existiampequenos fortes que prejudicariam o prosseguimentoda missão. Por isso Yéo seguiu rio acima apenas com oscúteros Vingança e Leão e a lancha São Narciso, deixan-

do os barcos maiores na entrada do Approak.No ataque ao primeiro forte o “choque foi rápi-

do e formidável e, num instante, era o inimigo levado deroldão”; com o mesmo ímpeto atacou o forte “Colégio”,arrasando-o e fazendo com que seus defensores fugis-sem, embrenhando-se nas matas.

Os navios em Atalaia, na embocadura doApproak, apresaram duas escunas inimigas que rece-beram os nomes de Sidney Smith e Dom Carlos.

No dia 7 de janeiro de 1809, o Comandante Yéo,à frente de uma poderosa coluna naval, conquistava oForte Diamant, enquanto o Major Joaquim Manuel Pin-to tomava o Forte Degras des Cannes, ambos na ilha deCaiena, permitindo assim o desembarque do restanteda tropa que estava nos navios. Este foi o grande batis-mo de fogo dos nossos ancestrais.

No dia 8, tentaram ainda os franceses rechaçaras forças ocupantes, com suas baterias de defesa locali-zadas na propriedade do governador, sem alcançar re-sultados.

A 12 de janeiro, o Governador Victor Huguesassinou a paz em Bourda. João Severiano Maciel foi no-meado pelo Regente para o governo da Guiana.

Nesse mesmo ano, 1809, D. João Rodrigues Sá eMenezes, Conde de Anadia, então Ministro da Marinha,determinou que a Brigada Real ocupasse a Fortaleza deSão José, na Ilhas das Cobras.

Até hoje os Fuzileiros Navais têm naquele lu-gar seu Quartel-General.

Almirante Rodrigo Pinto Guedes,futuro Barão do Rio da Prata,

primeiro Comandante da BrigadaReal da Marinha no Brasil

Page 10: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A FORTALEZA DE SÃO JOSÉ DA ILHA DAS COBRAS 9

A Fortaleza de São Joséda Ilha das Cobras

A partir de dezembro de 1977, O Corpo de Fuzileiros Navais passou a dispor deum acervo apreciável de conhecimento sobre a Fortaleza de São José, local ondeestá situado o Quartel-General dos Combatentes Anfíbios da Marinha do Brasil.Nessa época, foram concluídos os trabalhos de pesquisa visando à reconstituiçãohistórica da Fortaleza, iniciados em agosto daquele ano, a cargo de uma equipedo Centro Brasileiro de Arqueologia, coordenada pelo eminente Prof. AffonsoCelso Villela de Carvalho. A reconstituição se fez à luz de pesquisas bibliográficase de prospecção arqueológica local, ilustradas por entrevistas com estudiosos damatéria e dados levantados originalmente em trabalhos da Assessoria de RelaçõesPúblicas do Comando-Geral do CFN. O texto a seguir é uma súmula dessetrabalho.

Page 11: O Anfíbio - Edição Extra 2008

10 O ANFÍBIO • 200 ANOS

O registro mais antigo de que se tem notícia sobre a Ilha das Cobras datade 6 de setembro de 1565 – é uma Carta de Sesmaria, pela qual Estácio deSá confere a posse da então denominada Ilha da Madeira a um certo

Pedro Rodrigues que, assim, terá sido o seu primeiro proprietário.Com o passar do tempo, sabe-se que João Guterres Valeiro tornou-se titu-

lar da Ilha, aqui instalando uma olaria. Endividado, perdeu sua posse na hastapública da Praça dos Ausentes. Foi do arrematante que os Beneditinos compra-ram a ilha por 15$300 réis.

Quando os holandeses invadiram a cidade de Salvador, o Governador doRio de Janeiro, Martim de Sá, filho de Salvador Correia de Sá, concluiu que eranecessário, preventivamente, fortificar a ilha, valorizando sua privilegiada lo-calização estratégica. A construção foi erigida na parte alta da ilha, ainda deforma rudimentar. Sua pedra fundamental, com as inscrições “Martin de Sá –1624”, seria encontrada em 1904, quando demoliu-se a antiga muralha da pri-mitiva fortaleza.

Em 1638, também pelo pânico que, desta feita, trouxeram ao Rio de Janeiroas notícias do ataque à Baía de Todos os Santos por Maurício de Nassau, Salva-dor Correia de Sá e Benevides, filho de Martim de Sá, resolveu remodelar a forta-leza construída em 1624. Escravos índios do Mosteiro de São Bento foram em-pregados na obra. A fortificação foi chamada de Santa Margarida da Ilha dasCobras, em homenagem à Soberana Regente D. Margarida de Sabóia, Governantede Portugal em nome de Felipe IV de Espanha. Hoje, na área originalmente ocu-pada pelo forte está situado o Hospital Central da Marinha. No período de 1643a 1668, aprimorou-se a proteção da Fortaleza e instalaram-se novas baterias naextremidade norte da ilha.

Com a necessidade de maior segurança para os carregamentos de ouro aserem embarcados com destino à Metrópole e, ante a ameaça de ataques porparte dos franceses, o Governador Álvaro de Siqueira e Albuquerque mandoureformar, em 1702, a Fortaleza de Santa Margarida. Um ano após, foi iniciada aconstrução de mais um forte, na ponta sul da Ilha das Cobras, junto à então Ilhados Ratos, hoje Ilha Fiscal. Foi chamado Baluarte de Santo Antônio, tendo a obrasido prontificada em 1709. Sua localização corresponde, atualmente, à do DiqueRio de Janeiro e à de parte das instalações do Quartel-General do CFN. Assim,configuravam-se três linhas de defesa contra investidas sobre o porto do Rio –

Planta da Cidadede São Sebastiãodo Rio de Janeirocom suasfortificações em1713. A letra Vcorresponde àFortaleza de SãoJosé da Ilha dasCobras

Page 12: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A FORTALEZA DE SÃO JOSÉ DA ILHA DAS COBRAS 11

Fortalezas de Santa Cruz e São João; Fortalezas de Villegagnon e Boa Viagem; e,finalmente, Fortaleza de Santa Margarida e Baluarte de Santo Antônio alinha-dos com o Forte Santiago, este na região da Ponta do Calabouço. As posições daartilharia do baluarte eram vantajosas em relação às de Santa Margarida.

Em 1710, Duclerc, e em 1711, Duguay-Trouin, invasores da Cidade do Riode Janeiro, se defrontaram com os fogos de artilharia da Ilha das Cobras. Duguay-Trouin chegou a apoderar-se da ilha, bombardeando a cidade com suas bocasde fogo.

O êxito obtido pelos franceses fez crescer a preocupação com a defesa dacidade. Em 1725, o Governador Luiz Vahia Monteiro mandou escarpar as pe-dras da ilha dificultando o acesso às fortificações. Um ano depois, obteve doGeneral José da Silva Paes, engenheiro militar português, um projeto de recons-trução das fortalezas apresentado pelo Conde de Bobadela ao Rei D. João V, queo aprovou. Além da mencionada reconstrução, edificou-se uma terceira fortale-za, que foi chamada de Pau de Bandeira, unindo as de Santa Margarida e SantoAntônio na área que hoje corresponde à localização do Presídio da Marinha. Asobras foram iniciadas em 1728 e concluídas em 1736. A fortificação da Ilha dasCobras foi denominada Fortaleza de São José.

Em 1767, o Arsenal de Marinha inicia o aproveitamento da parte norte dailha, ali instalando depósitos. Vitoriosos na Campanha da Guiana, os FuzileirosNavais da Brigada Real da Marinha são transferidos dos quartéis da Armadapara a Fortaleza de São José. Aqui estamos desde 21 de março de 1809.

Bombardeada duramente nas Revoltas da Armada e do Batalhão Naval,são até hoje visíveis, nas muralhas da Fortaleza, os sinais dos reparos de estru-tura.

A estrada de acesso ao alto da ilha, que contorna as muralhas ao Sul, foiconstruída em 1906, sob a direção do então Capitão-Tenente Amphilóquio Reis.Dois anos após, cortaram-se as muralhas para as obras do Dique Rio de Janeiro.

Data de 1910 a posse definitiva da Ilha das Cobras pela Fazenda Nacio-nal, lavrada então que foi a escritura de desistência dos direitos de posse porparte do Mosteiro de São Bento.

A Fortaleza deSão José da Ilha

das Cobras em1817. Óleo sobre

tela de ÁlvaroMartins

Page 13: O Anfíbio - Edição Extra 2008

12 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Quando D. João voltou a Portugal, seu Ministro daMarinha, Almirante Joaquim José MonteiroTôrres firmou Decreto, a 21 de abril de 1821,

determinando a permanência, no Rio de Janeiro, do Bata-lhão de Fuzileiros-Marinheiros da Brigada Real da Marinha.

Ficariam ainda no Brasil duas outras CorporaçõesMilitares: a Divisão Auxiliadora, também no Rio de Ja-neiro, e a Divisão de Voluntários Reais, na Cisplatina.

O Brasil, então Reino Unido ao de Portugal eAlgarves, já cumprira etapas decisivas no rumo da inde-pendência política. Mas as Cortes portuguesas a cada diamais pressionavam o Regente, forçando por todos os mei-os um retrocesso à antiga situação de Colônia. D. Pedroia sendo envolvido pelos acontecimentos.

E chegou o tempo em que o Príncipe passou decoadjuvante a protagonista naqueles acontecimentos. OTenente-General Jorge de Avilez, Comandante da Divi-são Auxiliadora, mostrava-se intransigente quanto aoexato cumprimento das determinações vindas da Me-trópole. D. Pedro decreta, então, o Recrutamento Geral,visando à formação de uma força composta de brasilei-ros.

A 9 de janeiro de 1822, o Príncipe decide não cum-prir as ordens de Lisboa que impunham sua volta imedi-ata a Portugal. É o “Dia do Fico”. Esta atitude, tomada

ostensivamente, sob aclamação popular, irritou os mili-tares portugueses. Daí terem planejado embarcar à forçao Príncipe na Fragata União, o que ficou previsto para odia 11, quando seria encenado um espetáculo teatral as-sistido por ele.

D. Pedro toma conhecimento dessa intenção e sedirige, acompanhado de uma guarda de honra, à Quintada Boa Vista. As tropas que lhe eram fiéis reúnem-se noCampo de Santana. O General Avilez concentrou parteda Divisão no Castelo, enquanto o restante de seus ho-mens atuava contra a população civil em vários pontosda cidade.

Os Fuzileiros-Marinheiros, sob o comando do Bri-gadeiro José Joaquim do Couto, abriram fogo com os ca-nhões da Fortaleza de São José sobre a tropa de Avilez,que , assim, ficou cercada. Mesmo a retirada para o marseria impraticável, pois lá estavam em posição dominanteas bocas de fogo da Ilha das Cobras.

Com isto, o General cedeu e teve ordem de retirar-se incontinenti com a Divisão Auxiliadora para Niterói,sob a vigilância da Esquadra e dos Fuzileiros Navais.

A 1° de agosto D. Pedro declara inimigas as ForçasArmadas de Portugal que tentassem desembarcar sem oseu consentimento. Sete de setembro de 1822 – é procla-mada a independência do Brasil.

A INDEPENDÊNCIA E A INDEPENDÊNCIA E

Page 14: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A INDEPENDÊNCIA E SUA CONSOLIDAÇÃO 13

O quadro “O Grito do Ipiranga” de Pedro Américo fazparte do acervo do Museu do Ipiranga em São Paulo

Decreto do Primeiro Imperador do Brasil, datadode 24 de outubro de 1822, reorganiza a Corporação dosFuzileiros-Marinheiros, que passaria, doravante, a cha-mar-se Batalhão de Artilharia da Marinha do Rio de Ja-neiro, com um efetivo de 54 oficiais, 74 sargentos, 71 ca-bos, 3.759 soldados artilheiros, além de 38 músicos e 36corneteiros. Nesta época, 993 homens do efetivo total en-contravam-se a bordo dos navios da Esquadra.

Em vários pontos do território nacional eclodiamreações de tropas portuguesas à independência recém-proclamada.

Na Bahia, o General português Madeira de Meloencabeçava a resistência. Passaria à História a invasãodo Convento da Lapa, onde foi morta a Abadessa SororJoana Angélica de Jesus. Partiu, então, do Rio de Janeirouma Esquadra sob o Comando do Almirante Rodrigo An-tonio de Lamare. A força naval bloqueia o porto e desem-barca o destacamento de Artilheiros Marinheiros. Apósprolongados combates, o General é derrotado a 2 de ju-lho de 1823.

D. Pedro dissolveu, em 12 de novembro de 1823, aAssembléia Constituinte que elaborava a primeira Car-ta Magna do Império. Em Pernambuco, ante a renúnciado Presidente da Junta Governativa, assumiu o cargoManoel de Carvalho Paes de Andrade. O Imperador, de

acordo com a Constituição, nomeia Francisco PaesBarreto. O povo reage contra o ato, considerando o mes-mo ilegal, já que fora dissolvida a Constituinte. D. Pedro Imanda para o Nordeste as fragatas Nichteroy e Ypiranga,constituindo uma força sob o comando do Capitão-de-Mar-e-Guerra inglês John Taylor, a fim de colocar PaesBarreto no Governo da Província.

Os Artilheiros-Marinheiros desembarcam à vivaforça e unem-se à tropa do Coronel Francisco de Lima eSilva no cerco a Recife. Transcorrera exatamente um anoda dissolução da Assembléia Constituinte, quando Paesde Andrade conclama as províncias do Nordeste, doPiauí às Alagoas, a unirem-se sob regime republicanoindependente, formando a Confederação de Equador li-berta do jugo de D. Pedro I.

Ao sítio do Recife seguiu-se outro desembarquede Artilheiros Marinheiros, este a comando do inglês Ca-pitão-de-Mar-e-Guerra James Northon. Foram assimocupadas as fortalezas do Brum e Buraco. Completou-seo cerco dos revoltosos em 17 de setembro de 1824. O avan-ço das tropas de terra, no dia seguinte, forçou a rendição.Estava sufocado o movimento.

SUA CONSOLIDAÇÃO SUA CONSOLIDAÇÃO

Page 15: O Anfíbio - Edição Extra 2008

14 O ANFÍBIO • 200 ANOS

A Guerrada Cisplatina

Em 19 de abril de 1825, o General uruguaio JuanAntonio Lavalleja desembarca à margem esquer-da do arroio Gutiérrez com 33 patriotas. Desapon-

tados por não encontrarem os auxílios que esperavam,puseram-se em marcha, ao conseguirem cavalos nas vi-zinhanças.

Imediatamente, promoveu o recrutamento de to-dos aqueles que quisessem lutar pela libertação de suapátria, e a 24 de abril ocupou Soriano. O General Lecor,encarregado de bater os sublevados, determinou ao bri-gadeiro Frutuoso Rivera que combatesse as forças uru-guaias em Soriano; surpreendentemente ele levou suatropa a ser aprisionada e aderiu à causa da Revolução.

Em pouco tempo já possuíam um pequeno exérci-

A atual República do Uruguai fora incorporada ao Brasil a 31 dejunho de 1821 com o nome de Província da Cisplatina. Asdiferenças de idioma, origem e tradições jamais permitiram umacompleta integração da Cisplatina ao Brasil. Por outro lado, osuruguaios que não concordavam com a anexação fugiam para aArgentina com o fito de fomentar uma revolução e mesmoemancipar o país.

to; a 25 de agosto reuniu-se em Florida uma assembléiacomposta das figuras mais representativas do Uruguaique proclamou: “nulos, dissolvidos e de nenhum valortodos os atos de incorporação, reconhecimento, aclama-ção e juramentos arrancados dos povos da ProvínciaOriental pelos poderes de Portugal e do Brasil...”. Ao mes-mo tempo declarou a Banda Oriental do Uruguai incor-porada às Províncias Unidas do Prata (Argentina).

Forças brasileiras, sob o comando de Bento ManoelRibeiro, tentaram sufocar o levante alcançando a vitóriade Aguila. Em 24 de setembro de 1825, em Rincón, e a 12de outubro, em Saramandi, os uruguaios alcançaram ex-pressivas vitórias.

A 4 de novembro de 1825, dirigiu o governo de

14 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Page 16: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A GUERRA DA CISPLATINA 15

Buenos Aires uma nota ao governo brasileiro comuni-cando oficialmente a incorporação da Banda Oriental àRepública Argentina. A resposta foi a declaração de guerraàs Províncias Unidas do Rio da Prata.

No Uruguai, achava-se a força de ocupação brasi-leira, sob o comando de Lecor, reduzida às cidades deMontevidéu e Colônia do Sacramento, enquanto que aforça naval brasileira, sob o comando do Vice-AlmiranteRodrigo José Ferreira Lobo, bloqueava o Rio da Prata.Realizaram-se desembarques nas margens dos RiosParaná, Paraguai e Uruguai. Cento e cinqüenta Artilhei-ros Marinheiros participaram dessas operações.

A Argentina preparou uma esquadra cujo coman-do foi entregue ao Almirante William George Brown, vin-do a obter vitórias em Juncal e Los Pozos.

As hostilidades prosseguiram. A 21 de janeiro de1826 os inimigos apresaram a corveta brasileiraAraçatuba, incorporando-a à Esquadra Argentina com onome de Rio de La Plata.

Tentaram os platinos atacar a Corveta Liberal,capitânia brasileira; não conseguindo seu intento, apro-ximaram-se da Fragata Imperatriz com a Corveta 25 deMayo. Após abrir fogo, tentaram abordá-la, travando-secombate corpo-a-corpo. Os Artilheiros Marinheiros, co-mandados pelo Tenente Lopes da Silva, lutaram brava-mente repelindo a tentativa.

Numerosos encontros navais tiveram lugar naságuas do Prata. O Almirante Brown tentou uma expedi-ção atacando Montevidéu, porém, sem sucesso.

A 12 de maio de 1826 o Almirante Rodrigo PintoGuedes, primeiro Comandante da Brigada Real da Mari-nha no Brasil e, posteriormente, Barão do Rio da Prata,assumia o Comando-em-Chefe das Forças do Prata. OAlmirante Rodrigo Lobo regressava ao Rio de Janeiropara responder a Conselho de Guerra, pelos erros come-tidos durante seu comando. Nada tendo sido provadoefetivamente, foi absolvido em fevereiro de 1827, cuja sen-

Plano da cidade deMontevidéu, no Uruguai,no início do século XIX,quando estava sobocupação brasileira.

tença foi confirmada pelo Conselho Supremo Militar, em21 de março de 1827.

Pinto Guedes escolheu oficiais mais experientespara os diversos comandos, e dividiu a esquadra em qua-tro divisões.

Seguiram-se vitórias brasileiras: Pozos, em julhode 1826, e a destruição e tomada do corsário ProfetaBandarra, em setembro de 1826.

Por terra a campanha era favorável às Provínciasdo Prata. Tropas argentino-uruguaias, sob o comando doGeneral Carlos Alvear, invadiram o Rio Grande do Sul.Sofremos a derrota de Ituzaingó, em Passo de Rosário.

A partir de 1827, começaram a surgir dificuldadespara a esquadra brasileira. Embora mais numerosos emelhor aparelhados, nossos navios prestavam-se à na-vegação em alto mar, sendo impróprios para manobrasnas águas rasas do Prata, sem contar a grande distânciade suas bases. A situação agravou-se com o fracasso deuma expedição enviada à Patagônia, sob as ordens doCapitão inglês Shepperd, a serviço do Brasil.

Em 7 de abril de 1827 travou-se o combate que foidecisivo: Monte Santiago. Os navios inimigos, Repúblicae Independência, sofreram fragorosa derrota, sendo abor-dados pelos escaleres brasileiros, e Brown, ferido na per-na, conseguiu fugir a bordo do Sarandi.

Por mediação da Inglaterra iniciaram-se demora-das negociações de paz. O Ministro Lord Ponsomby, emcontato com os governos de Buenos Aires e do Brasil,conseguiu que o Imperador consentisse em negociar apaz, possibilitando a assinatura, em 27 de agosto de 1828,de uma “Convenção Preliminar de Paz”. Através dela,ambos os países renunciaram às suas pretensões sobre aProvíncia Cisplatina, e nela criaram um Estado Indepen-dente, com o nome de República Oriental do Uruguai.

Vale lembrar que ainda o Brasil estava empenha-do nesse conflito quando, por Decreto de 21 de janeiro de1826, o Batalhão de Artilharia da Marinha do Rio de Ja-neiro passou a denominação de Imperial Brigada da Arti-lharia da Marinha, fixando o seu efetivo em 1173 homenslotados em dois Batalhões a seis Companhias cada.

Esse efetivo foi aumentado em novembro de 1827para 2.789 homens, ficando cada Batalhão com oito Com-panhias. O total de Fuzileiros Navais mortos em com-bate durante a Guerra da Cisplatina foi de 819 homens.

A INDEPENDÊNCIA E SUA CONSOLIDAÇÃO 15

Page 17: O Anfíbio - Edição Extra 2008

16 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Portugal vivia séria crise política após o falecimento de D. João VI. D.Pedro I renunciara ao trono em favor de sua filha, D. Maria da Glória.Até que a jovem princesa atingisse a maioridade, governaria como Re-

gente D. Miguel, o irmão de D. Pedro, que deveria desposá-la.Mas o Regente fez-se Rei a 15 de julho de 1828. Tais fatos exigiam do

Imperador do Brasil crescente preocupação, o que acentuava as desconfian-ças que os “nativistas” já nutriam contra ele.

D. Pedro, na tentativa de retomar o prestígio junto ao povo, viajou àsMinas Gerais.

Os meios políticos agitavam-se, inclusive com as notícias sobre arevolução liberal na França que destronara Carlos X.

Em 11 de março de 1831, os “adotivos” – portugueses optantes pelanacionalidade brasileira – e outros partidários do Imperador, planejavamuma recepção festiva quando de seu regresso das Minas.

Os “exaltados” – que se opunham a D. Pedro – decidiram tumultuar amanifestação.

As festividades se repetiram, sem alteração de ordem pública, du-rante duas noites. Porém na noite de 13, que se julgava ser a última das

festividades, os exaltados tiveram a imprudência de apagarvárias fogueiras, ofendendo os portugueses, os quais respon-

deram lançando aos brasileiros um chuveiro de pedras, fundosde garrafas e outros objetos. Seguiu-se um conflito generalizado que

durou três dias – a Noite das Garrafadas.Um contingente da Imperial Brigada de Artilharia da Mari-

nha foi empenhado para dissolver o conflito. Atuou no quarteirão delimitadopelas Ruas Direita (hoje Primeiro de Março), e dos Latoeiros (atual GonçalvesDias), abrangendo ainda as Ruas do Hospício, Alfândega, Pescador, Sabão, SãoJoaquim, Ourives, Candelária, Quitanda, Prainha, São Pedro, Violas e Vala. Naluta houve inúmeras baixas, inclusive o Tenente Eugênio Aprígio da Veiga,gravemente ferido, três Artilheiros-Marinheiros morreram no episódio.

Desses fatos resultou veemente manifesto político redigido porEvaristo da Veiga e endereçado ao Imperador. Ali, assinalava-se que “ ... ne-nhum povo tolera, sem resistir, que o estrangeiro venha impor-lhe, no pró-prio país, um jugo ignominioso”. D. Pedro I, para acalmar os ânimos, nomeouum novo ministério constituído somente de brasileiros. Foi em vão.

A seqüência dos acontecimentos levou o Imperador à abdicar, às trêse meia da manhã do dia 7 de abril de 1831. Era o fim do Primeiro Reinado.

A 29 de agosto de 1832, foi diminuído o efeti-vo do Corpo de Artilharia da Marinha para 600 ho-mens, e, quatro anos mais tarde, dobrado pela Lei nº42 de 15 de outubro.

Neste período, seus combatentes embarca-ram nos navios que policiavam a costa brasileira emrepressão ao tráfico de escravos.

Pelo Decreto nº 535, de 11 de setembro de1847, o Corpo de Artilharia da Marinha passou achamar-se Corpo de Fuzileiros Navais.

A NOITE DASGARRAFADAS

Três Artilheiros-Marinheiros

morreram nosconflitos da Noite

das Garrafadas

Page 18: O Anfíbio - Edição Extra 2008

CAMPANHA CONTRA ORIBE E ROSAS 17

CAMPANHA CONTRAORIBE E ROSAS

Passagem de Tonelero

Em 1851, a Região Platina ainda era palco de su-cessivas convulsões políticas que intranqüilizavam oImpério Brasileiro e, particularmente, a Província doRio Grande do Sul.

Na jovem República Oriental do Uruguaidigladiavam-se os partidos “Blanco” e “Colorado”.

Governava a Argentina, como ditador, Juan Ma-nuel Rosas. Seu sonho era fazer ressurgir o Vice-Reina-do do Prata, sob a forma de “confederação republica-na”. Para tanto, ele contava com o apoio de ManuelOribe, chefe do partido “Blanco” do Uruguai.

O Brasil decidiu apoiar Don Joaquim Suárez, Pre-sidente legal do Uruguai, aliando-se aos governadoresdas províncias argentinas de Corrientes e Entre Rios,então revoltadas contra a ditadura de Rosas.

As tropas brasileiras eram comandadas por Caxias,as argentinas, por Urquiza e as uruguaias, por Garzon. OAlmirante Grenfell chefiava as forças navais que conta-vam com efetivos de fuzileiros Navais embarcados.

Oribe capitulou, em Passo Del Molino, a 11 deoutubro de 1851.

Prosseguindo a campanha, desta feita contraRosas, a esquadra brasileira conduziu o contingentealiado pelo Rio Paraná até a Ponta do Diamante, ondedesembarcariam as tropas para reunir-se às deUrquiza. Os argentinos tentaram bloquear o movi-mento próximo ao Rio Acevedo, na célebre “Passa-gem de Tonelero”.

Após prolongada luta, rompeu-se a barragem defogo e foi vencida a resistência a 17 de dezembro.

A Batalha de Monte Caseros, em 3 de fevereiro de1852, marca a vitória final dos aliados.

Na guerra contra Oribe e Rosas, oito fuzileirosnavais perderam a vida e vinte e quatro foram grave-mente feridos.

Pelo Decreto nº 1.067, de 24 de novembro de 1852,o Corpo de Fuzileiros Navais passa à denominação deBatalhão Naval. Ainda este ato do Imperador aprova oRegulamento e fixa o efetivo da Corporação em 64 ofici-ais e 1.216 praças.

O Batalhão Naval fica então organizado em seisCompanhias de Infantaria e duas de Artilharia.

Page 19: O Anfíbio - Edição Extra 2008

18 O ANFÍBIO • 200 ANOS

A GuerraContra Aguirre

Adeposição de Oribe, em 1851, e a assunção do governo por BernardoPrudêncio Berro não trouxeram paz política à República Oriental doUruguai. Quando assumiu a presidência, Don Atanásio Aguirre recru-desceu a rivalidade entre “blancos” e “colorados” – o General VenâncioFlores revoltou-se, estabelecendo um “comitê revolucionário” do parti-

do colorado, em Buenos Aires.1864 – o Rio Grande do Sul sofria as conseqüências das agitações políticas uru-

guaias. A fronteira era constantemente invadida e propriedades particularessaqueadas. Não tardariam as represálias dos estrangeiros gaúchos. Em Montevidéu,corriam boatos de que o Império brasileiro tinha o objetivo de fazer o Uruguai retornarà condição de Província Cisplatina.

Era tal o clima de tensão quando foi mandado a Montevidéu o Conselheiro JoséAntônio Saraiva. O plenipotenciário chefiava uma missão diplomática brasileira quesolicitaria o ressarcimento dos prejuízos causados às propriedades invadidas, e tam-bém a punição dos responsáveis pelos ataques na fronteira.

Malogradas as gestões diplomáticas, retirou-se Saraiva para Buenos Aires, deonde encaminhou um “ultimatum” ao governo uruguaio. Aguirre devolveu o docu-mento“ para que não ficasse nos arquivos da República”.

A Força Naval brasileira, estacionada no Rio da Prata, estava sob o comando deJoaquim Marques Lisboa, então Barão de Tamandaré. Era constituída da fragata Ama-zonas, várias corvetas, canhoneiras e o vapor Recife. Agindo com a energia impostapelas circunstâncias, Tamandaré solicitou ao Governo uruguaio a imobilização dosvapores de guerra General Artigas, ancorado no porto de Montevidéu, e Villa DelSalto, que se achava em Paissandu. Assinou ainda um acordo secreto, em Santa Lúcia,com o Chefe revolucionário Venâncio Flores. Iniciaram-se, assim, as hostilidades.

Salto foi bloqueada por uma Divisão Naval, sob o comando do Chefe de DivisãoFrancisco Pereira Pinto, depois Barão de Ivinheima, enquanto o próprio General Floreschefiava o cerco por terra. Um destacamento de 100 praças do Batalhão Naval, coman-dado pelo Tenente Joaquim José Pinto, desembarcou em apoio às tropas de Flores. Nocombate travado, foram mortos cinco Fuzileiros Navais e feridos nove, inclusive o Ofi-cial Comandante. Assumiu o comando o Tenente Antônio Manuel Perdigão Fernandes.

A 28 de novembro rendeu-se a praça.O próximo objetivo seria Paissandu.O Coronel D. Leandro Gomez comandava a defesa desta localidade ribeirinha.

Dispunha de um efetivo aproximado de 1.254 homens, além de quinze peças de arti-lharia calibres 18 e 12, e cavalaria guarnecendo os flancos das posições ocupadas.

Tamandaré bloqueou o porto fluvial e desembarcou ao Sul, no dia 4 de dezem-bro, 700 homens das guarnições do vapor Recife, das canhoneiras Belmonte, Parnahyba,Araguaia e Ivahy. A força de desembarque dispunha de três peças de artilharia decampanha, calibre 12. O General Flores, que estava acampado no Arroyo Seco perto de

Page 20: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A GUERRA CONTRA AGUIRRE 19

Paissandu, fez marchar para o combate 600 homens de infantaria e de cavalaria a pé, e160 voluntários. Flores contava com sete peças de artilharia. Nesse mesmo dia, pelamadrugada, desembarcaram 100 marinheiros nacionais e 100 Fuzileiros Navais co-mandados pelo 1º Ten. Francisco José de Freitas; acompanhando esta força uma bateriacom três peças de calibre 12, comandada pelo 1º Ten. Antônio da Silva Teixeira deFreitas, unindo-se, em seguida, aos Fuzileiros do Tenente Perdigão. Composto o dispo-sitivo para o ataque, iniciou-se, em 5 de dezembro, a marcha de aproximação com osFuzileiros Navais na Vanguarda da tropa do General Flores. Desta feita, o objetivoteria que ser conquistado a qualquer preço.

O terreno era cheio de obstáculos e o sol escaldante.A tropa brasileira, fatigada pelo deslocamento, lutou duramente por oito horas

consecutivas: 22 mortos e 76 feridos foi o saldo desse ataque. Tamandaré, em ofíciodirigido ao Ministro da Marinha, Conselheiro Francisco Xavier Pinto Lima, datado de2 de fevereiro de 1865, reporta-se aos combates que se sucederam: “No dia 6, pelamadrugada, moveu-se nossa força com a do General Flores, para investir os postosavançados do inimigo e arrojou logo para o interior da praça todas as partidas e guer-rilhas que ainda permaneciam fora, tal foi o denodo na carga com que os acometeram.Nas partes em detalhe que junto remeto, por cópia, a V. Exª, estão mencionados os fatosocorridos em cada um dos pontos atacados, e, de sua linguagem sincera e franca,transluzem os esforços de valor e bizarria que foram praticados”.

A praça, constituída de vários “pontos de defesa”, era tão bem guarnecida e tãogrande a coragem, o denodo e a guerra de seus defensores que os brasileiros chegarama denominá-la de “Forte Sebastopol” – uma alusão à guerra da Criméia.

O contingente de Fuzileiros Navais foi reforçado às cinco horas da manhã do dia7 de dezembro – 2 oficiais, 100 praças e 3 peças de artilharia atenuaram a superiorida-de do efetivo inimigo. Quatro horas mais tarde, a esquadra e a artilharia de campanhainiciaram o bombardeio à Praça. A tropa de Fuzileiros Navais lançou-se ao ataquecontra os uruguaios que defendiam a gola da praça. Às três e meia da tarde, o TenenteFreitas comandou o assalto, mas o inimigo redobrou os fogos contra os atacantes,agora desprotegidos da fuzilaria.

Tomada deSebastopol na

Batalha dePaissandu.

Quadro de Álvaro Martins

Page 21: O Anfíbio - Edição Extra 2008

20 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Era de vital importância a conquista desse ponto de defesa por ser o mais alto eestar em localização privilegiada.

“Esta era a situação quando o Segundo Sargento Fuzileiro Naval Francisco Borgesde Souza avançou à frente do pelotão que comandava, conseguindo, apesar de ferido,penetrar no reduto inimigo. A bandeira uruguaia foi arriada. O restante do destaca-mento assaltou a posição. Vinte e um brasileiros perderam a vida nesse combate – umsargento, quatro cabos e dezesseis soldados e quarenta e três foram feridos, inclusive oSargento Borges”.

Esse episódio ficou conhecido entre os combatentes pelo nome de “Tomada doForte Sebastopol”, e foi relatado verbalmente pelo Comandante da Companhia doSargento Borges, Tenente Perdigão Fernandes ao Capitão-Tenente Anthero José Mar-ques. Este, por sua vez, fez constar o fato em seu livro publicado em 1942 intitulado“Histórico do Corpo de Fuzileiros Navais”.

Diz a publicação “Nossa Voga”, da Escola Naval, que hoje a tradição naval brasileirafaz evocar, diariamente, o feito do Sargento Borges no Cerimonial da Bandeira, concedendoa quatro sargentos de bom comportamento, o privilégio de arriar o Pavilhão Nacional.

Estavam assim abertas as portas de Paissandu; mas a luta continuava e ossitiados defendiam-se com pertinácia. A 31 de dezembro, Tamandaré, contando comajuda das tropas do Marechal Mena Barreto, desfechou violento ataque, chegando aconquistar novas posições. Finalmente, após 52 horas de combate, caiu a praça empoder dos aliados a 2 de janeiro de 1865.

É ainda o ofício de Tamandaré ao Ministro da Marinha que bem diz da impor-tância desta vitória: “A tomada de Paissandu, Senhor Ministro, não é só um brilhantefeito d’armas que veio ilustrar o nosso Exército e Armada. Politicamente encarado, estetriunfo é de um imenso alcance, porque arrebatou ao inimigo a sua posição mais fortee que ele reservava para centro de sua ação, como ponto de reunião dos paraguaios edos entrerrianos, com cujo pronunciamento a seu favor ainda hoje conta. Além disto,deve ser considerado como uma carta de aviso à República do Paraguai, que não estaráà hora em que escrevo a V. Exª muito tranqüila, vendo que os soldados e marinheirosbrasileiros não se detêm diante de muralhas e trincheiras, quando se trata de lavar aafronta à sua Nação, que cedo ou tarde vinga, triunfando de todos os obstáculos postosà sua marcha.”

Paissandu, abria, assim, as portas de Montevidéu. Aguirre foi assim derrotadoe substituído no governo por Tomaz Villalba, a 15 de fevereiro de 1865.

BIOGRAFIA DO SARGENTO FUZILEIROS NAVAL FRANCISCO BORGES DE SOUZA

Nasceu em Pernambuco, em 1832, filho de José Borges de Souza e Maria Guilhermina de Souza.A 3 de junho de 1852, alistou-se voluntariamente, no Corpo de Fuzileiros Navais. Naquela época, segundo

determinava a lei, deveria servir por um período de nove anos. Em 13 de setembro de 1856, foi promovido a Cabo deEsquadra.

A 4 de fevereiro de 1862 teve acesso à graduação de Segundo-Sargento.Embarcou, a 16 de novembro de 1863, na fragata Amazonas, a bordo da qual chegou a Montevidéu no dia 6

de maio do ano seguinte. A Amazonas, capitânia de Barroso na Batalha do Riachuelo em 1865, levava nestaviagem ao Uruguai o Conselheiro José Antônio Saraiva.

Durante a Campanha contra Aguirre, serviu a bordo dos seguintes navios da esquadra brasileira, em opera-ções de guerra naquele ano de 1864;

- Fragata Amazonas – até setembro;- Corveta Niterói – até novembro;- Vapor Recife, durante a Tomada de Paissandu.Foi citado nominalmente pelo Barão de Tamandaré por “Intrepidez admirável em combate”, tanto no Ofício

endereçado ao Ministro da Marinha, datado de 2 de fevereiro, quanto na Ordem-do-Dia nº 3, de 28 de fevereiro de1865.

Participou da Guerra do Paraguai, tomando parte do combate de Las Cuevas, no Rio Paraná, a 12 de agostode 1865, a bordo da canhoneira Ivahy, onde servia desde 26 de janeiro.

O Diário Oficial do Império do Brasil de nº 167, de 22 de junho de 1867, publica a reforma de FranciscoBorges de Souza, já oficial, por forças de resolução imperial, datada de 15 de junho daquele ano.

Page 22: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A GUERRA DO PARAGUAI 21

A Guerrado ParaguaiEm novembro de 1864, Francisco Solano Lopes, ditador do Paraguai, mandou

aprisionar o navio brasileiro Marquês de Olinda, a bordo do qual viajava o

Presidente da Província de Mato Grosso, Frederico Carneiro de Campos. O ato de

hostilidade não fora precedido de declaração de guerra ou mesmo de qualquer

aviso. Nesta época, o Império Brasileiro lutava no Uruguai contra as Forças de

Aguirre. Iniciou-se, assim, a Guerra do Paraguai.

Prisioneiros e feridos paraguaios em 1866

Page 23: O Anfíbio - Edição Extra 2008

22 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Lopez ordenou a invasão de Mato Grosso, porvia fluvial, ao comando do General Barrios, e fez orga-nizar uma coluna contra o Rio Grande do Sul, sob asordens do General Resquín. Como o governo argentinonegou permissão para que Resquín atravessasse seu ter-ritório na altura de Corrientes, sofreu também uma in-vasão armada pelo exército do General Robles. Estesfatos provocaram grande indignação popular emBuenos Aires, e permitiram que a aliança militar brasi-leira-uruguaia fosse transformada numa Tríplice Ali-ança compreendendo o Brasil, o Uruguai e a Argentina.O Presidente Mitre foi escolhido como Comandante-Geral das Forças Aliadas; as Forças brasileiras ficariamsob o comando do Marechal Manuel Luís Osório, Mar-quês de Herval.

No Rio Paraná dispunha Lopez de vários navioscom os quais planejava atacar a esquadra brasileira,comandada pelo Almirante Francisco Manuel Barroso,na altura de Riachuelo. Ali, a 11 de junho de 1865, iriadesferir a maior batalha naval do continente.

Das 1.846 praças que constituíam o efetivo doBatalhão Naval à época da Guerra do Paraguai, 1.428estavam embarcadas nas unidades navais em opera-ções no Prata, sendo 585 artilheiros e 843 fuzileiros.

Na Batalha do Riachuelo, as guarnições de bordoforam empenhadas em combates corpo-a-corpo e sus-tentaram cerrado fogo de artilharia. O Guarda-Mari-

nha João Guilherme Greenhalgh e o Marinheiro MarcílioDias lutaram e morreram no convés da corvetaParnayba. Como eles, muitos oficiais e praças perde-ram a vida ou foram gravemente feridos em combateaproximado. Os Fuzileiros Navais Zeferino Leite de Oli-veira, da canhoneira Belmonte, Hilário Pereira e JoséAlves, do vapor Beberibe, integram a lista de baixas dabatalha. O Comandante da canhoneira Mearim, Tenen-te Eliziário José Barbosa, em relatório de combate data-do de 16 de junho, cita o Sargento do Batalhão Naval,Augusto Pires Ferreira, assinalando que, por sua atua-ção na luta que se travou a bordo, “esteve acima de qual-quer elogio”.

Seguem as operações de guerra. A Armada Impe-rial conquista importantes vitórias. A 12 de agosto da-quele ano de 1865, ocorre o combate de Las Cuevas, noRio Paraná. A bordo da canhoneira Ivahy lutava o Sar-gento Francisco Borges de Souza, já conhecido veteranoda Batalha de Paissandu.

Contudo, os anos iniciais do conflito não foramvantajosos para as forças aliadas, com contínuas der-rotas frente às forças paraguaias. Após a tomada dabateria do Forte de Curuzu, as forças aliadas sofreramuma fragorosa derrota na tentativa de conquista do Fortede Curupaity, desencadeando uma mudança no coman-do da guerra, o que veio a propiciar uma segunda fasecom a troca de comando que levou a Trípice Aliança areverter a situação no conflito. Corre o ano de 1867, oterceiro da Guerra do Paraguai. A Esquadra brasileiraforça a passagem de Curupaity sem sofrer perdas, masé obrigada a deter-se frente aos poderosos canhões dafortaleza de Humaitá, devido às dificuldades naturais,aos torpedos, e às cadeias de ferro que atravessam o riode uma margem a outra. Decidiu-se construir uma es-trada de ferro no Chaco, da boca do riacho Quiá a Porto

22 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Page 24: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A GUERRA DO PARAGUAI 23

No Rio Paraná dispunha Lopez de vários navios com os quaisplanejava atacar a esquadra brasileira, comandada pelo Almirante

Francisco Manuel Barroso, na altura de Riachuelo. Ali a 11 dejunho de 1865 iria desferir a maior batalha naval do continente.

Elisiário, em uma extensão de aproximadamente cincomilhas, enquanto forças brasileiras e argentinas encar-regavam-se de ações de diversão frente à linha dePissiquiri (ver quadro). Um relatório do Tenente JaymeGomes de Argollo Ferrão, datado de 30 de dezembro de1867, e dirigido ao Conselheiro Dr. Afonso Celso de As-sis Figueiredo, Ministro da Marinha, explica os traba-lhos de construção da via férrea com a maior riqueza dedetalhes. É este documento que dá conta de ter sido oassentamento dos trilhos feito por fuzileiros navais eprisioneiros paraguaios, montando 400 pés de via fér-rea por dia “no clima abrasador do Chaco”. E assim,dez navios, com um total de 1.500 homens e 50 bocas defogo, foram abastecidos pela base de operações locali-zada em Curuzu – cinco navios bombardeando cons-tantemente as posições paraguaias de Humaitá, quatrono Porto Elisiário dominando Curupaity, e um servin-do como repetidor de sinais entre as duas divisões, naembocadura do riacho de Ouro. A importância destaobra está claramente enunciada na conclusão do rela-tório já mencionado: - “sem a via férrea do Chaco, aesquadra encouraçada teria, no fim de três meses, quan-do se acabassem os sobressalentes que levavam os na-vios quando forçaram as baterias de Curupaity, de aban-donar a posição importante que hoje ocupa, e que há dedecidir a sorte da guerra com o governo do Paraguai”.

A luta durou ainda um ano e oito meses. Em 1°de março de 1870 Solano Lopez foi ferido mortalmenteàs margens do riacho Aquidabannigui. – “Muero conmi pátria!....”. Terminava a guerra.

Este conflito deixou um saldo de 361 fuzileirosmortos em combate.

Ruínas de Humaitá após bombardeio

A GUERRA DO PARAGUAI 23

PISSIQUIRI (Chaco) – Se insere nos eventos que ante-cederam o que a historiografia denominou como“dezembrada” – a manobra de Pissiquiri foi considera-da a mais brilhante e ousada operação do conflito: Em23 dias construiu-se uma estrada de 11 km através doChaco pantanoso, que se estendia pela margem direitado rio Paraguai, enquanto forças brasileiras e argenti-nas encarregavam-se de ações de diversão frente àlinha do Piquissiri. Executou-se então a manobra: trêscorpos do Exército brasileiro, com 23.000 homens, fo-ram transportados pela esquadra imperial de Humaitápara a margem direita do rio. Percorreram a estrada doChaco em direção ao nordeste, reembarcaram em fren-te ao porto de Villeta, e desceram em terra no porto deSanto Antônio e Ipané, novamente na margem esquer-da, vinte quilômetros à retaguarda das linhasfortificadas paraguaias do Piquissiri. López foi inteira-mente surpreendido por esse movimento, tamanha erasua confiança na impossibilidade de grandes contingen-tes atravessarem o Chaco.

Page 25: O Anfíbio - Edição Extra 2008

24 O ANFÍBIO • 200 ANOS

É fato incontestável que a Guerra do Paraguai deraaos militares egressos da classe média grande for-ça social e política. O contato que tiveram com

países platinos, de regime republicano, tornou o ambi-ente militar sensível às idéias republicanas.

Conscientes de sua força, alguns militares nãoescondiam sua desconfiança e antipatia ao Governo, sur-gindo assim as “Questões Militares”. A primeira, em1884, foi provocada por um projeto do Marquês doParanaguá sobre a reforma do montepio militar; for-mou-se um Diretório na Escola Militar, que delegou po-deres ao Tenente-Coronel Sena Madureira para atacarpela imprensa o projeto. Conseqüência: o Ministro daGuerra proibiu aos oficiais discutir assuntos militaresna imprensa.

A segunda questão militar foi motivada pela re-cepção dada ao cearense Francisco do Nascimento, queconseguira obstar um embarque de escravos do Cearápara o Sul do Brasil. Sena Madureira, Comandante daEscola de Tiro de Campo Grande, onde se realizara ahomenagem, recebeu um pedido de informações, res-

pondendo em termos pouco disciplinados, o que lhevaleu uma repreensão e demissão do cargo.

A terceira questão militar, em 1886, originou-sedas acusações feitas na Câmara ao Coronel Cunha Ma-tos pelo deputado Simplício Coelho de Rezende. O mili-tar defendeu-se pela imprensa, contrariando a proibi-ção existente. Sua prisão acabou alcançando ampla re-percussão entre a oficialidade, notadamente no RioGrande do Sul, onde o Marechal-de-Campo Deodoro daFonseca não escondia sua simpatia pelo oficial conside-rado injustiçado. Em 14 de maio de 1887, Deodoro e oVisconde de Pelotas resolveram publicar um famosomanifesto, em defesa da honra militar, consideradaameaçada por atos do Governo. Por outro lado, a oficia-lidade mais jovem recebera na Escola Militar influênciade um professor republicano, Benjamim ConstantBotelho de Magalhães, que viria a ter destacada atuaçãona Proclamação da República.

Por esse tempo, visitava o Rio de Janeiro o coura-çado chileno Almirante Cochrane. A Escola Militar aco-lhera os chilenos e, pela palavra de Benjamim Constant,

PROCLAMADAA REPÚBLICAExatamente no ano em que terminava a Guerra doParaguai, fundou-se no Brasil um Partido Republicano.Idéias republicanas já existiam mesmo no tempo do Brasilcolônia, mas elas tomam vulto, assumem expressãopopular, empolgam a opinião pública após 1870.

Page 26: O Anfíbio - Edição Extra 2008

PROCLAMADA A REPÚBLICA 2525 O ANFÍBIO • 200 ANOS

falavam mal das instituições e dos desgostos da juven-tude brasileira.

O dia 9 de novembro de 1889 foi um dia dupla-mente histórico. Pelo baile na Ilha Fiscal que o Impera-dor ofereceu aos oficiais do Chile, com a adesão de todaa sociedade, procurando mostrar o apoio do povo àsinstituições; e pela sessão no Clube Militar, onde os jo-vens militares confiavam a Benjamim Constant a che-fia do movimento, prometendo segui-lo “até a morte”.A conspiração republicana era um fato irreversível.

Na madrugada de 15 de novembro, deslocaram-setropas para o campo da Aclamação, agitadas com os bo-atos que correram na cidade sobre uma ordem de prisãocontra o Marechal Deodoro da Fonseca e o MajorBenjamim Constant. Ambos chefiaram o movimento doscontingentes para aquele local, hoje Praça da República.

O Capitão-de-Fragata José Antônio de AlvarimCosta era o Comandante do Batalhão Naval, cargo parao qual fora nomeado a 19 de outubro, em substituição aoCapitão-de-Mar-e-Guerra Dionísio Manhães Barreto. Eledeterminou que uma força, com o efetivo de 400 homens,

O baile na Ilha Fiscal, que D. Pedro II ofereceu aos oficiais daMarinha do Chile, contou com a adesão de toda a sociedade

O Governo Provisório, chefiado porDeodoro da Fonseca (acima), decretouo banimento da Família Imperial.

Page 27: O Anfíbio - Edição Extra 2008

26 O ANFÍBIO • 200 ANOS

sob o comando do Capitão-Tenente Quintino Franciscoda Costa, se integrasse ao contingente do Exército noCampo da Aclamação. Eram seis horas da manhã.

No Quartel-General do Exército, estava reunidoo Gabinete, sob a direção do Visconde de Ouro Preto – oúltimo do Império. As imediações já estavam sendo ocu-padas pelos militares e pelo povo. Em frente ao QG, de-fensivamente havia posições de artilharia, batalhões deinfantaria dispostos em linha, policiais, marinheiros eum piquete de cavalaria. Com os elementos que guarne-ciam também o interior do prédio, o efetivo total era de2.000 homens protegendo o Governo. Com a evoluçãodos acontecimentos, todos eles dariam vivas à Repúbli-ca. Fuzileiros Navais, solidários à causa republicana, es-tavam incorporados à Primeira Brigada do GeneralAlmeida Barreto, sob o comando do próprio Comandan-te Alvarim Costa, que também se deslocara para aquelapraça, acompanhado pelo Capitão-Tenente Pestana.

José da Costa Azevedo, o Barão de Ladário, entãoMinistro da Marinha, vinha do Arsenal para tentarunir-se aos membros do Gabinete de Ouro Preto, quan-do foi detido pelo Tenente Adolfo Pena Filho. Tentou es-capar, mas um tiro disparado por um dos homens dopiquete de Deodoro atingiu-o levemente.

Enquanto isso, o Chefe do Gabinete do Impériotentava persuadir o Ajudante-General do Exército, Ge-neral Floriano Peixoto, a resistir: “V. Exª, já no Paraguai,era um valente e tomava bocas de fogo ao inimigo. Poisfaça agora o mesmo tomando as que lá estão...”. E a res-posta foi incisiva: “As bocas de fogo no Paraguai eraminimigas; aquelas que V. Exª vê são brasileiras. Saibamais V. Exª que os galões que trago nos punhos foramganhos nos campos de batalha e por serviços prestadosà Nação... Não a Ministros”.

Nada mais havia a fazer. O Gabinete demitiu-sepor telegrama ao Imperador que estava em Petrópolis.

D. Pedro II, de regresso ao Rio de Janeiro, tentouainda nomear novo gabinete chefiado pelo ConselheiroSaraiva, naquela mesma tarde. Foi em vão – a Repúbli-ca já estava sendo comemorada com entusiasmo nasruas e nos quartéis.

Tropas do Exército formaram alas na Rua Pri-meiro de Março e confraternizaram com o BatalhãoNaval, que desfilou no centro da cidade, regressando àFortaleza de São José.

Ao Arsenal de Marinha compareceu BenjamimConstant, agradecendo em nome do Marechal Deodoroo auxílio material e moral que as tropas navais presta-ram à causa republicana.

O Governo Provisório, chefiado por Deodoro daFonseca, decretou o banimento da Família Imperial.

“A vista da representação escrita que me foi en-

tregue hoje, às 3 horas da tarde, resolvo, cedendo aoimpério das circunstâncias, partir, com toda a minhafamília, para a Europa amanhã, deixando esta Pátria,de nós tão estremecida, à qual me esforcei por dar cons-tantes testemunhos de entranhado amor e dedicação,durante quase meio século em que desempenhei o cargode Chefe de Estado.

Ausentando-me, pois, com todas as pessoas daminha família, conservarei do Brasil a mais saudosalembrança, fazendo os mais ardentes votos por sua gran-deza e prosperidade.

Rio de Janeiro, 16 de novembro de 1889.D. Pedro de Alcântara.”Pelo Decreto n° 272, de 18 março de 1890, o Presi-

dente da República, Marechal Manoel Deodoro da Fon-seca dava nova organização ao Batalhão Naval.

“...de harmonia com a adotada nos Corpos doExército, sem, contudo, alterar os fins de sua criação...”.Passaria o Batalhão a ser integrado de quatro Compa-nhias de Infantaria, duas de Artilharia, um Estado-Mai-or, um Estado-Menor, com o efetivo global de 1.000 ho-mens, dos quais 34 Oficiais.

José da Costa Azevedo, o Barãode Ladário, último Ministro da

Marinha do Império

Page 28: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A REVOLTA DA ARMADA 27

Portão de entrada do Batalhão Naval naFortaleza de São José, Ilha das Cobras, em 1894.

A construção apresenta danos provenientes dobombardeio, durante a Revolta da Armada.

A Revoltada Armada

Page 29: O Anfíbio - Edição Extra 2008

28 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Através de eleição indireta, conforme preconiza-va uma disposição transitória da primeira Constituiçãorepublicana de 1891, ocupou a presidência o MarechalManoel Deodoro da Fonseca, até então o Chefe do Gover-no Provisório. Ele e o Vice-Presidente, Marechal FlorianoPeixoto, derrotaram, respectivamente, os candidatos Pru-dente de Moraes e o Almirante Eduardo Wandenkolk.Uma sucessão de crises políticas levou Deodoro a dissol-ver o Congresso Nacional, a 3 de novembro de 1891, edecretar o estado de sítio. O Almirante Custódio José deMello, vinte dias após, assumindo o controle de algunsnavios de guerra, envia um ultimatum ao Presidente,ameaçando bombardear a cidade. Deodoro resolve evi-tar derramamento de sangue e renuncia ao governo.

Assume o Marechal Floriano Peixoto. Surgem, en-tão, sérias controvérsias quanto à legitimidade da posse.A 19 de janeiro de 1892, o Segundo Sargento do ExércitoSilvino Honório Macedo liderou a Revolta da Fortalezade Santa Cruz. O Forte da Laje aderiu ao movimento.Floriano Peixoto havia deposto os Governadores que setinham manifestado favoráveis ao golpe de estado. Fo-ram embarcadas duas Companhias do Batalhão Navalnos Encouraçados Riachuelo e Aquidaban, destacadospara operar contra os revoltosos. A Rebelião foi logosufocada, tendo o Tenente José da Veiga Cabral, do Exér-cito, comandado o assalto à Fortaleza de Santa Cruz.

No Rio Grande do Sul as lutas partidárias trans-formaram-se numa sangrenta guerra civil. Dividia-se emdois partidos: Os “Castilhistas”, partidários de Júlio deCastilhos, Presidente do Estado e os “Federalistas”, chefi-ados por Silveira Martins, com o apoio de João Nunes daSilva Tavares, Barão de Itagui e de Gumercindo Saraiva.

Os “Federalistas” propunham-se a “libertar oRio Grande do Sul da tirania de Castilhos, defendiama adoção do sistema parlamentar que vigorava du-rante a monarquia e o fortalecimento do poder centralda República”.

Intensificava-se, por outro lado, a conspiração con-tra o Governo. Esses movimentos contavam com apoiodiscreto por parte da Marinha e de uma corrente do Exér-cito, liderada por Floriano.

O Almirante Wandenkolk, Presidente do ClubeNaval e que gozava de grande prestígio na Marinha, em

junho, aderiu à revolução auxiliando os “Federalistas”,no Rio Grande do Sul. Com alguns companheiros, entreeles o CC Duarte Huet de Bacellar, foi recebido a bordo dovapor Júpiter, sob o comando de Pereira da Cunha. Pla-nejavam um ataque ao Rio Grande em auxílio aos revo-lucionários federalistas. “No Rio Grande Sul, lançoumanifesto concitando à revolta contra Floriano eCastilhos. Faltando-lhe o apoio da guarnição da Mari-nha local e dos próprios federalistas, o Júpiter foi aprisi-onado na Barra de Canavieiras, Santa Catarina, pelo cru-zador República e conduzido para o Rio”.

A prisão do Almirante Wandenkolk irritou a Ma-rinha e grupos de oficiais passaram a conspirar no ClubeNaval. Tomando conhecimento desse fato, o Governo co-meçou a transferi-los para outros Estados.

O Almirante Custódio José de Mello decide reagire mobiliza seus companheiros da Marinha para se orga-nizar contra os atos do Governo.

Floriano determina a prisão dos conspiradores.Iniciava-se a Revolta da Armada.

Nesse ano era assinado o Decreto nº 144-B, quereduzia em 40% o efetivo do Batalhão Naval. Havia difi-culdade em recrutar voluntários e o Governo queria re-duzir as despesas dos Ministérios.

Custódio de Mello, simpatizante do movimentofederalista, demitira-se da Pasta da Marinha. A 6 de se-tembro de 1893, tomando os navios Aquidaban, Javari,Trajano e República, deu início à rebelião. No mesmo dia,solidário ao movimento, o Batalhão Naval embarcou co-mandado pelo Capitão-de-Mar-e-Guerra EliézerCoutinho Tavares. Por isto, já no posto de Capitão-de-Mar-e-Guerra, José Antônio de Alvarim Costa, novamen-te nomeado para o Comando do Batalhão Naval, por Avisode 2 de setembro, não chegou a tomar posse.

Floriano Peixoto decretou o estado de sítio e orga-nizou a defesa do Rio de Janeiro e Niterói com tropas doExército e batalhões de voluntários. Legalistas erevoltosos combatiam com fogos de artilharia das posi-ções de terra e dos navios.

O Capitão-de-Mar-e-Guerra Frederico Lorena con-seguiu romper o bloqueio da barra do Rio de Janeiro erumou com três navios para o Sul. Estabeleceu-se, assim,o contato entre a Revolta da Armada e a Revolução

Page 30: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A REVOLTA DA ARMADA 29

Federalista. Esta última já estava alastrada a SantaCatarina cuja capital, Desterro, hoje Florianópolis, caíraem poder dos revoltosos. Em outubro, a Fortaleza deVillegagnon aderiu à revolução.

Legações diplomáticas e comandantes de navios es-trangeiros, que se achavam no Rio, manifestavam formal-mente preocupação com a segurança de seus compatriotas.Indagou-se como o Governo receberia ajuda em armas parasufocar a Revolução: “A bala...” respondeu o Marechal.

Em dezembro, o Almirante Luiz Philippe Saldanhada Gama aderiu à Revolta. Tal fato trouxe ao movimentouma imagem desfavorável ante a opinião pública, já queSaldanha, então Diretor da Escola Naval, apesar de seugrande prestígio na Armada, era considerado fervorosodefensor da volta à monarquia. Também em dezembro, oAlmirante Custódio de Mello, a bordo do EncouraçadoAquidaban, então comandado pelo Capitão-de-Mar-e-Guerra Alexandrino Faria de Alencar, saiu barra afora,rumou para Santa Catarina e uniu-se aos federalistas.

Os revoltosos já não tinham víveres e a muniçãodos navios de Saldanha fundeados na Guanabara estavase esgotando. Eles obtinham o mínimo necessário à so-brevivência, quando possível, agindo contra navios mer-

cantes. A Fortaleza de São José tinha sido praticamentedestruída pelos fogos de artilharia dos legalistas. No de-sembarque, à viva força, na Ponta da Armação, em Niterói,a 9 de fevereiro de 1894, após sangrento combate, os Re-volucionários foram derrotados. Na Ilha do Governadortambém foram vencidos. O Governo havia adquirido no-vas unidades navais na Europa e nos Estados Unidos.Constitui-se uma esquadra e o comando é entregue aoAlmirante Jerônimo Gonçalves, veterano da Guerra doParaguai. A situação era insustentável para os revoltosos.A 13 de março, eles abandonaram os navios e a Fortaleza,e pediram asilo nas Corvetas portuguesas Mindelo e Afon-so de Albuquerque. O Almirante português Augusto deCastilho acolheu os revoltosos. Floriano Peixoto rompeurelações diplomáticas com Portugal. Saldanha e seus ho-mens foram conduzidos para o Sul, onde continuava aRevolução Federalista.

O Almirante Custódio de Mello se dirigia a Itajaí,para a pretendida junção com os federalistas ou“maragatos”. Nesse porto, forças de Gumercindo Sa-raiva embarcaram no República e no Aquidaban comdestino a Paranaguá. Em 4 de janeiro de 1894, osfederalistas haviam concluído seus planos de conquista

As muralhas da Fortaleza de São José apresentam osestragos provocados pelos bombardeios.

Page 31: O Anfíbio - Edição Extra 2008

30 O ANFÍBIO • 200 ANOS

do Paraná. A cidade de Lapa foi cercada e caiu em poderdos revoltosos, após quase um mês de resistência, sob ocomando do Coronel Gomes Carneiro, que morreu emcombate. As tropas do Governo então deslocavam-separa o Sul. Gumercindo é forçado a retirar-se e morreem combate, já no Rio Grande do Sul. A 16 de abril de1894, o encouraçado Aquidaban é torpedeado em SantaCatarina pelo navio Gustavo Sampaio, sob o comandodo Tenente Altino Flávio de Miranda Correia. Custódiode Mello rumou para o Rio Grande do Sul no CruzadorRepública, comandando uma força constituída de qua-tro mercantes armados e dois mil homens. Tentou o de-sembarque na cidade do Rio Grande, mas foi derrotadopelas tropas do Governo de Júlio de Castilhos.

Os revolucionários estavam vencidos. Custódiorefugiou-se na Argentina onde entregou os navios.Saldanha morreu lutando no Rio Grande do Sul. O Capi-tão-de-Mar-e-Guerra Frederico Lorena foi fuzilado emSanta Catarina. A rendição veio já no Governo do Presi-

dente Dr. Prudente José de Morais e Barros, empossado a15 de novembro de 1894.

Ainda em 1894, o Ministro da Marinha AlmiranteEliziário José Barbosa, declarava, em relatório ao Presi-dente, que “O Batalhão Naval aderiu à revolta de 6 desetembro (1893), ficando de fato extinto pela deserção detodo o seu pessoal...”. Vinte e quatro fuzileiros morre-ram em combate.

A 15 de fevereiro de 1895, era assinado o Decretonº 1.968: “O Presidente da República dos Estados Uni-dos do Brasil resolve criar o Corpo de Infantaria daMarinha em substituição ao Batalhão Naval, tendo amesma organização deste e o efetivo de 400 praças. OAlmirante Eliziário José Barbosa, Ministro dos Negóci-os da Marinha, assim o faça executar. (a) Prudente Joséde Morais e Barros.”

Tal denominação iria durar até 1908, quando peloDecreto nº 7.035, de 16 de julho, foi restabelecida a deBatalhão Naval, então com um efetivo de 600 praças.

Os bombardeios direcionados à Fortaleza de São Josécausaram diversos estragos em outras edificações da Ilha das Cobras.

Page 32: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A REVOLTA DOS MARINHEIROS E DO BATALHÃO NAVAL 31

Em junho de 1909, falecia o Presidente da Repúbli-ca Dr. Afonso Pena. Assumia em seu lugar o Vice-Presidente Dr. Nilo Peçanha, que governou até

completar-se o quadriênio a 15 de novembro de 1910.Dois foram os candidatos à sucessão: O Dr. Rui Barbosa eo Marechal Hermes Rodrigues da Fonseca.

A “Campanha Civilista”, de Rui Barbosa, cau-sou grande agitação, exaltando os ânimos em nosso País,tendo também dose de responsabilidade nas tristes ocor-rências de 1910, dividindo a Nação em pró e contra mili-tares, principalmente, após discurso, destacando a fala:“Extinguimos a escravidão sobre a raça negra; mante-mos, porém , a escravidão da raça branca no Exército ena Armada”. Mesmo assim, o Marechal Hermes ganhoua eleição, tendo como Vice-Presidente o Dr. VenceslauBrás Pereira Gomes.

A Marinha Brasileira contava à época com navi-os de guerra modernos, recentemente adquiridos no ex-terior, entre eles, os encouraçados Minas Gerais e SãoPaulo, cruzador Rio Grande do Sul e o cruzador Bahia. Orecrutamento de praças, contudo, não correspondia àsnecessidades navais, apontavam-se sérios problemas deinfra-estrutura e administrativos, trazendo graves in-convenientes à Marinha.

Na noite de 22 de novembro de 1910, uma sema-

na após a posse do Marechal Hermes, inicia-se motim noencouraçado Minas Gerais, alastrando-se ao São Paulo eFloriano e ao cruzador Bahia. Os ressentimentos gera-dos pela frustrada Campanha Civilista tiveram vazão,tanto nas folhas dos jornais, quanto na fala dos políticos.

Um decreto legislativo concedeu anistia, duran-te o período de Revolta dos Marinheiros, visando pou-par da destruição os dois novos navios encouraçados,ameaçados de torpedeamento pelas forças legais decontratorpedeiros; porém, a indisciplina persistia e a 9de dezembro, revoltou-se o Batalhão Naval; deslocando-se oficiais e grande parte da guarnição para o Arsenal deMarinha, de onde partiria o contra-ataque. Também abordo do cruzador Rio Grande do Sul houve um princí-pio de levante, movimento que não conseguiu adesões,sendo logo sufocado.

Na tarde de 10 de dezembro, à vista das avariasdo Quartel do Batalhão Naval e parte do Hospital, ossublevados içaram bandeira branca e procuravam mei-os de escapar, sendo aprisionados. As autoridades na-vais providenciaram para excluir da Marinha os elemen-tos que direta ou indiretamente tomaram parte dos acon-tecimentos.

Este epísódio deixou um saldo de 26 FuzileirosNavais mortos em combate.

REVOLTA DOS MARINHEIROSE DO BATALHÃO NAVAL

Batalhão Naval, 1910

Page 33: O Anfíbio - Edição Extra 2008

32 O ANFÍBIO • 200 ANOS

QUANDO TERMINAVA APRIMEIRA REPÚBLICA

Page 34: O Anfíbio - Edição Extra 2008

QUANDO TERMINAVA A PRIMEIRA REPÚBLICA 33

Em 1922, voltaram as agitações políticasquando das campanhas eleitorais para asucessão do Presidente Dr. Epitácio Pessoa.Eram candidatos Arthur Bernardes e NiloPeçanha. Mesmo depois de eleito Bernardes,a situação não voltou à calma.

OPresidente do Clube Militar, Marechal Hermesda Fonseca, ex-Presidente da República, tendoem vista ter-se pronunciado politicamente em

telegrama ao Comandante da Região Militar dePernambuco, foi preso. O Clube foi fechado pelo governo.

Na madrugada de 5 de julho, o Capitão EuclidesHermes da Fonseca iniciou a revolta do Forte deCopacabana, alastrada em seguida à Escola Militar e aoForte do Vigia. Os líderes do movimento contavam comoutras adesões, mas estas não aconteceram.

Uma Companhia do Batalhão Naval guarneceu,em defesa, o Palácio do Catete. Outra Companhia e umaBateria de Artilharia tomaram posições no Quartel-Ge-neral do Exército. Os revoltosos bombardearam o Palá-cio da Guerra, usando potente artilharia do Forte deCopacabana. Três praças do Batalhão Naval foram mor-tas nas posições que ocupavam. Uma outra salva foidisparada contra a Ilha das Cobras, explodindo na áreado Hospital.

O Marechal Hermes foi preso na Vila Militar, ondeos cadetes também foram forçados à rendição.

Estava perdida a causa. Os revoltosos abandona-ram o Forte de Copacabana, e um número até hoje nãodeterminado se rendeu ou debandou. Na altura do anti-go Hotel Londres, restavam dezoito militares revoltosos,aos quais se juntou o Engenheiro Civil Otávio Correia,amigo do Tenente Siqueira Campos. Após alguns tirotei-os, ao alcançarem a altura da antiga rua Barroso (atualSiqueira Campos), os dez homens restantes (nove milita-res e um civil), foram confrontados pela tropa legalista(integrada por cerca de três mil homens). No confrontofinal, num tiroteio que durou aproximadamente trintaminutos, foram capturados e feridos os Tenentes SiqueiraCampos, Eduardo Gomes e dois soldados, únicos sobre-viventes. Três Fuzileiros Navais foram mortos duranteo episódio.

Exatamente dois anos após a revolta do Forte deCopacabana, outra revolução ocorreu em São Paulo, li-derada pelo General Isidoro Dias Lopes. Dois destaca-mentos do Batalhão Naval, um de infantaria e outro deartilharia, deslocaram-se para São Paulo, cuja capitalesteve em poder dos revoltosos de 5 a 27 de julho de1924. Foi decretado o estado de sítio. Vencedoras as for-ças do governo, os revoltosos abandonaram São Paulo ereunidos aos rebeldes do Rio Grande do Sul formaram achamada “Coluna Prestes” que, em dois anos e meio demarcha, atravessou todo o Brasil de Sul a Norte, termi-nando por se internar na Bolívia.

O movimento só terminou no Governo do Presi-dente Washington Luís.

O Decreto nº 16.717, de 24 de dezembro de 1924,criou o Regimento Naval em substituição ao BatalhãoNaval, com o efetivo aumentado para 1.500 homens. Omesmo diploma legal autorizava o governo a comissionarOficiais, o que fez com que fossem promovidos a Segun-dos-Tenentes os Primeiros-Sargentos da Corporação.

Instrução de Ordem Unidano Batalhão Naval em 1922

Page 35: O Anfíbio - Edição Extra 2008

34 O ANFÍBIO • 200 ANOS

1930A REVOLUÇÃO DE

Chegava ao fim o Governo do Presidente WashingtonLuís Pereira de Sousa. No panorama político nacionalsurgira o “tenentismo”. A jovem oficialidade, que ad-quirira prestígio político crescente, apontava uma sé-rie de imperfeições e anacronismo no regime, insurgin-do-se principalmente contra a corrupção apontada àépoca como a principal causadora dos males que preo-cupavam Governo e povo brasileiros. Já na escolha doscandidatos à sucessão presidencial se fez sentir um au-mento nas tensões políticas existentes. Apresentaram-se como pretendentes os Governadores de São Paulo,Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Júlio Prestes contavacom o apoio do Governo, do qual fora líder na CâmaraFederal antes de assumir o executivo paulista. AntônioCarlos Ribeiro de Andrada representava as aspiraçõesde Minas Gerais. O gaúcho Getúlio Vargas, que tinhasido Ministro da Fazenda de Washington Luís, conse-guira, no Governo de seu Estado, a composição de uma“Frente Única”, harmonizando as principais facções po-líticas do Sul. O problema sucessório evoluiu mais tar-de com a formação da “Aliança Liberal”, aglutinandoem torno de Getúlio Vargas as correntes políticas deMinas e Rio Grande do Sul, e mais a da Paraíba, cujoGovernador, João Pessoa, era o candidato da “Aliança”à Vice-Presidência.

FuzileiroNaval, 1934

Page 36: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A REVOLUÇÃO DE 1930 35

Obtiveram a vitória nas eleições de 1º de marçode 1930 Júlio Prestes e Vital Soares, tendo o pleito sidoconsiderado fraudulento pela “Aliança Liberal”. Com aabertura do Congresso, a 3 de maio, a oposição passou aatacar o Governo exaltadamente. João Pessoa foi assas-sinado no Recife, a 26 de julho, o que provocou verda-deira comoção nacional – este o clima que antecedeuimediatamente a revolução.

A 3 de outubro, cinqüenta homens chefiados porOswaldo Aranha e Flores da Cunha tomaram o Quar-tel-General de Porto Alegre. Ao mesmo tempo, revolta-ram-se a Paraíba e Minas Gerais. O Norte e o Nordesteestavam sob o controle do Major Juarez Távora, quedominaria Recife, atravessaria Alagoas e Sergipe, indochegar à Bahia. Em Minas Gerais, o Governador OlegárioMaciel ficou senhor da situação, assumindo o comandorevolucionário. Do Rio Grande do Sul partiram as for-ças revoltosas rumo a São Paulo.

O Governo do Estado de Santa Catarina viu-sesem condições de fazer frente à coluna gaúcha e pediuauxílio imediato. Formou-se no Rio de Janeiro uma Di-visão Naval que recebeu ordens de seguir paraFlorianópolis. As cidades de Herval, Porto União e Mafracaíram em poder dos revolucionários, estando Lajesseriamente ameaçada. O comando da Divisão Navalrecebeu, a 6 de outubro, ordens de transportar duasCompanhias de Fuzileiros Navais que reforçariam emSanta Catarina as tropas legalistas do GeneralNepomuceno Costa. O Comando das Companhias foientregue aos Tenentes Comissionados Guilherme Borgese José Severino dos Santos. Os Fuzileiros Navais embar-caram no navio mercante João Alfredo.

Embora o desembarque estivesse previsto paraFlorianópolis, o navio fundeou em São Francisco do Sule os Fuzileiros Navais foram transportados paraJoinville em lanchas e rebocadores. Nesta cidade, asCompanhias foram aquarteladas nas instalações do 13ºBatalhão de Caçadores do Exército, cujo efetivo inteiroaderira à revolução. Um pelotão do 14º Batalhão de Ca-çadores, de Florianópolis, encontrava-se guardando oquartel. Os Fuzileiros Navais receberam a missão dereforçar a defesa da cidade e a segurança das instala-ções militares. Passaram então a guarnecer, em conjun-to com uma Companhia da Força Pública Estadual, asprincipais vias de acesso a Joinville. Um pelotão de me-tralhadoras pesadas do 14º BC defendia a ponte que ligaa cidade à rodovia de Blumenau; o restante desta Uni-dade também tinha aderido à revolução.

A 8 de outubro a coluna revolucionária chegavaàs portas de Joinville, travando imediatamente comba-te com as forças legalistas. Um Fuzileiro Naval – Solda-do Corrêa – iniciou o tiroteio, atingindo com uma raja-da de metralhadora a cabine da viatura que vinha àfrente da coluna motorizada. O caminhão projetou-seno acostamento da estrada. Horas depois, chegou a no-tícia de que era inútil resistir naquele setor, já que a tro-pa do 14º BC passara-se aos revoltosos, deixando livre oacesso à cidade pela ponte. Joinville já estava em poderdos revolucionários. Na frente batida pelos fogos dosFuzileiros Navais, a coluna sulista tinha retrocedidoapós algumas horas de luta. Neste intervalo, ante a su-perioridade numérica do inimigo, o Capitão da ForçaPública e os seus homens abandonaram as posições eretraíram. Os Tenentes Borges e Severino também de-

Revolucionários getulistasem frente ao obelisco,

no Rio de Janeiro

Page 37: O Anfíbio - Edição Extra 2008

36 O ANFÍBIO • 200 ANOS

sapareceram durante a luta. Soube-se, mais tarde, queambos foram aprisionados. Assumiram o controle dasituação os Sargentos Santino José de Queiroz, José Joa-quim de Araújo, Clemente Sabino Marques, José DonatoBarbosa, Odilon Soares e Bartholomeu VenturaCaracciolo. Decidiu-se que os Fuzileiros Navais tentari-am voltar à cidade nos caminhões, forçando passagematé o quartel do 13º BC que tinha ficado sob a guarda dedois pelotões de Fuzileiros Navais. Assim foi feito.

Ao atingirem os limites da cidade, na altura daRua Príncipe, os caminhões foram atacados com cerra-do tiroteio. Os Fuzileiros Navais desembarcaram e res-ponderam ao fogo. Em ambos os lados houve inúmerasbaixas. Posteriormente, a imprensa local responsabili-zaria o “ataque dos Fuzileiros” por várias mortesregistradas naquele dia entre os revolucionários. Semcondições de chegar ao quartel, formaram-se dois gru-pos que demandariam a cidade de São Francisco do Sul,um por mar e outro por terra. Na rua, os FuzileirosNavais feridos foram socorridos por civis.

O grupo constituído por cerca de trinta Fuzilei-ros Navais, tão logo conseguiu chegar ao porto, viu-sesob a mira de uma seção de metralhadoras guarnecidapor praças do Exército. Eles procuraram abrigo em umapilha de toros de madeira disposta no cais. O coman-dante da seção – Sargento Moisés – manifestou empe-nho em parlamentar com os graduados Fuzileiros Na-vais. Estabelecido o encontro, foi acertado que os ho-mens seriam encaminhados ao quartel do 13º BC. Quan-

do os Fuzileiros Navais deixavam a posição protegida,o Sargento Moisés decidiu desarmá-los e tentou tomara pistola do Sargento Santino José de Queiroz. Este, semvacilar, empunhou a arma e atirou, alvejando Moisésna boca. Imediatamente ouviu-se a voz de “fogo” e asmetralhadoras foram disparadas. Seis Fuzileiros Na-vais foram mortos, entre eles, o Sargento Santino, e ou-tros treze ficaram gravemente feridos. Alguns lança-ram-se na água tentando fugir, mas foram depois cap-turados. Os demais foram presos e encaminhados aoquartel do 13º BC, onde estavam detidos os remanes-centes do grupo que tentara chegar a São Francisco doSul por via terrestre, além dos integrantes dos pelotõesque tinham permanecido na Unidade.

Todos os prisioneiros foram transferidos paraCuritiba e comentava-se que seriam fuzilados. Os feri-dos permaneceram em hospitais de Joinville.

Entrementes, a Marinha aderiu à revolução. OsFuzileiros Navais que restaram das duas Companhiasforam libertados, sendo os Sargentos comissionados Te-nentes. Em seguida, distribuídos em diversas Unidadesdo Exército, foram incorporados aos “Voluntários doParaná” e marcharam com a revolução praticamentevitoriosa para São Paulo.

O encontro decisivo entre revolucionários elegalistas teria ocorrido no Rio Itararé, na fronteira en-tre Paraná e São Paulo, se o Presidente Washington Luísnão tivesse sido deposto. Afinal ante a iminência da vi-tória das forças revolucionárias, alguns Oficiais-Gene-

rais decidiram, no dia 24 de outubro, enca-minhar a Washington Luís, um documen-to em que o intimavam a renunciar. Ante anegativa do Presidente, determinaram ocerco do Palácio Guanabara e sua imedi-ata prisão. Formalizada a deposição,Washington Luís deixou o Palácio acom-panhado pelo Cardeal D. Sebastião Leme epelo General Fragoso, passando à condi-ção de preso político no Forte deCopacabana. A Junta Militar, constituídapelos Generais Mena Barreto e TassoFragoso, e pelo Almirante Isaías deNoronha, entregou o Governo ao Dr. Getú-lio Vargas, a 3 de novembro de 1930.

Cinco anos mais tarde, o então Coman-dante do Corpo de Fuzileiros Navais, Capi-tão-de-Mar-e-Guerra Milcíades PortelaFerreira Alves, inaugurou um mausoléu emSão Francisco do Sul, Santa Catarina, que atéhoje guarda os restos mortais dos Fuzileirosque tombaram combatendo naquele estado.

Um total de 19 Fuzileiros morreramneste conflito.

Artilharia do Corpode Fuzileiros Navaisem 1930

Page 38: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A REVOLUÇÃO INTEGRALISTA 37

A ação legalista do Corpo de Fuzileiros Navais foi alvo de elogioconsignado pessoalmente pelo Ministro da Marinha, e mereceuentusiásticas referências da imprensa brasileira. Os restos mortaisdas sete praças que tombaram na Revolução Integralistarepousam hoje em um mausoléu no Cemitério São João Batista.

Page 39: O Anfíbio - Edição Extra 2008

38 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Desde novembro de 1937, o Brasil vivia sob regi-me governamental que foi chamado EstadoNovo. Getúlio Vargas, com o apoio das Forças

Armadas, dissolveu o Congresso e promulgou uma novaConstituição, passando a legislar através de decretossobre as matérias de competência legislativa da União.Na “Proclamação ao Povo Brasileiro” que Vargas trans-mitiu na noite de 10 de novembro, além de reportar-se àcrise mundial, assinalou que a Constituição de 1934 “ex-punha as instituições por ela mesma criadas à investidade seus inimigos, com a agravante de enfraquecer eamenizar o poder público”.

Naqueles últimos anos da década dos trinta, omundo era bombardeado pela propaganda política ale-mã. Segundo apregoava, inexistiam posições ideológi-cas intermediárias – contra a escalada comunista, onazismo seria a única opção salvadora. No Brasil, a idéiaencontrou inúmeros adeptos, surgindo assim o PartidoIntegralista, presidido pelo Dr. Plínio Salgado. “Deus,Pátria e Família” era a divisa do movimento. Em seusruidosos comícios, os integralistas envergavam cami-sas verdes, ostentando na manga o símbolo do partido– a letra grega, maiúscula, “sigma”. Saudavam-se pro-nunciando um vigoroso “Ana-uê”. E como tinha ocorri-do no modelo alemão que adotavam, eles pretenderamtomar o poder.

A primeira tentativa revoltosa foi na Escola Na-val, na noite de 10 para 11 de março de 1938. Oficiaisintegralistas da Marinha ao receberem um comunicadode que havia sido marcada para essa noite o movimen-to, e sabedores de que quase a totalidade da turma deGuardas-Marinha iria tentar regressar à Escola Naval,a fim de apanhar algum armamento para um grupo decivis espalhados pelo Cais do Porto e adjacências, seofereceram para acompanhá-la. Ao chegarem, junta-mente com elementos do Curso de Educação Física, apri-sionaram os oficiais estranhos à causa, neutralizaram aação da guarda dos Fuzileiros Navais e recolheram 40

fuzis e quatro cunhetes de munição, embarcando-os nalancha.

Ao tomarem conhecimento de que essa ordem erafalsa, através de um telefonema do Primeiro-TenenteArnoldo Hasselmann Fairbairn, um dos cabeças daconspiração na Marinha, tiveram tempo de desfazertudo, mas os fatos foram trazidos à tona por parte doOficial de Serviço do Corpo de Fuzileiros Navais, que naocasião havia sido aprisionado. Os elementos envolvi-dos foram prontamente presos.

Nas primeiras horas da madrugada de 11 de maiofoi efetivado novo golpe, este com conseqüências maisgraves. A ação dos integralistas foi desencadeada, a umsó tempo, contra o Palácio Guanabara, onde morava oPresidente da República, Ministério da Marinha, resi-dências oficiais dos Chefes dos Estados-Maiores da Ar-mada e do Exército, e ainda do Chefe do Gabinete doMinistro da Guerra, Cruzador Bahia, Tender Ceará eIlha do Boqueirão. Ocorreram, também, atentadosrevoltosos na Escola de Aviação e Curso de EducaçãoFísica da Marinha. A pronta reação das forças fiéis aoGoverno anulou praticamente todas as tentativas dosintegralistas. Entretanto, no Palácio Guanabara e no

Capa da revista “Anauê” fontede difusão das idéias integralistas

Page 40: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A REVOLUÇÃO INTEGRALISTA 39

Ministério da Marinha houve maior dificuldade de con-trolar a situação.

Segundo o depoimento de um Soldado FuzileiroNaval que participou da ação contra o PalácioGuanabara, o grupo revoltoso era composto de vinte ecinco homens que lá chegaram embarcados em um ca-minhão. Todos vestiam fardas de Fuzileiros Navais eMarinheiros, usando, ainda, sob as túnicas, as camisasverdes. O choque inicial com a guarda foi favorável aosintegralistas, sendo morto o Fuzileiro Naval ManoelConstantino dos Santos, e feridos alguns outros que ten-taram reagir à ação de surpresa. Elementos fiéis reagi-ram de dentro do Palácio, inclusive o próprio Presiden-te Vargas e sua família, conseguindo mantê-los afasta-dos até a chegada de reforços. Ainda não tinha clareadoo dia quando acorreram ao Palácio os “choques” da Po-lícia Especial, tropa da confiança do Presidente da Re-pública. Foi, assim, após cerrado tiroteio com osintegralistas, já então espalhados pelas cercanias doPalácio, dominada a situação. O atentado pessoal diri-gido contra o Chefe do Governo e sua família era decer-to um passo decisivo no plano revolucionário. Frustra-da a tentativa, quaisquer outras ações estariam fada-das a fracassar.

A tomada do prédio do Ministério da Marinhatinha como propósito barrar o eventual deslocamentode tropas do Corpo de Fuzileiros Navais em defesa dogoverno, contra os integralistas. Na primeira hora damadrugada, deu-se o ataque à guarda, sendo morto oCabo Fuzileiro Naval Argemiro José de Noronha, nobeliche onde dormia. O edifício foi facilmente conquis-tado, e logo os revoltosos guarneceram as metralhado-ras pesadas do terraço. Fez-se, por telefone, um comu-nicado ao Quartel-General da Fortaleza de São José, se-gundo o qual seria inútil qualquer tentativa de trans-por a ponte de ligação entre a Ilha das Cobras e o conti-nente. O telefonema foi atendido pelo Capitão-de-Fra-gata Fuzileiro Naval Arthur de Freitas Seabra, que res-pondia pelo Comando da Corporação na ausência doCapitão-de-Mar-e-Guerra Fuzileiro Naval Milcíades

Portela Ferreira Alves. Este acompanhara a tropa emexercícios anfíbios na Ilha Grande. O ComandanteSeabra decidiu agir imediatamente.

O 2° Batalhão recebeu ordem de avançar até oMinistério e assaltar o prédio. O Comando da tropa coubeao Capitão-de-Corveta Fuzileiro Naval José AugustoVieira que contava, ainda, com o apoio de uma seção decanhões 75mm Armstrong. As peças passaram a alve-jar o edifício em poder dos integralistas, dando cober-tura à tropa que progredia, a duras penas, com inúme-ras baixas em seu efetivo causadas pelo fogo das metra-lhadoras assentadas no terraço. Por volta das quatro emeia da manhã, os Fuzileiros Navais lançaram-se aoassalto à baioneta. Durante o combate, perderam a vidaos Soldados Antonio Silva Filho e Severino Motta deSouza. O Ministério da Marinha foi reconquistado. Àsseis horas da manhã, o Ministro Vice-AlmiranteHenrique Aristides Guilhem, acompanhado dos Almi-rantes Castro e Silva e Graça Aranha, e do ComandanteSeabra, deu entrada no edifício cuja fachada foi pratica-mente destruída, a par de danos consideráveis em seuinterior.

Contra a escalada comunista osIntegralistas pregavam que o nazismo

seria a única opção salvadora

Page 41: O Anfíbio - Edição Extra 2008

40 O ANFÍBIO • 200 ANOS

A SEGUNDAGUERRA MUNDIALNa noite de 19 de julho de 1944, o navio-auxíliar Vital de Oliveira naufragoulevando para o fundo do Atlântico seis dos quatorze Fuzileiros Navaisque integravam sua guarnição.

40 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Page 42: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL 41

Como resultado das deliberações acordadas na IIIReunião de Consultas dos Ministros das Rela-ções Exteriores das Repúblicas Americanas, re-

alizada de 15 a 25 de janeiro de 1942, o Brasil rompeurelações diplomáticas e comerciais com a Alemanha, aItália e o Japão. A Esquadra americana fora atacada pe-los japoneses em Pearl Harbor, sem prévia declaraçãode guerra. O Chanceler Oswaldo Aranha, no discursode encerramento da reunião, proferido no PalácioTiradentes, assinalou que “a neutralidade do Brasil foisempre exemplar, mas nossa solidariedade com a Amé-rica é histórica e tradicional”.

Em fevereiro de 1942, começaram ostorpedeamentos dos navios brasileiros; entre

eles, o Olinda, o Cabedelo e o Coman-dante Lira. Por fim, deu-se um ataque

em massa, em agosto de 1942, no qual, emquatro dias, de 15 a 19, foram afundados os na-

vios de cabotagem Baependi, Araraquara, Aníbal Be-névolo, Itagibá, Arará e o iate Jacira, causando a mortede inúmeros civis e militares. A agressão agitou a opi-nião pública nacional. Incontinenti, foi encaminhadanota aos Governos das Potências do Eixo, cujo item nú-mero nove formalizava: “Não há como negar que a Ale-manha e a Itália praticaram contra o Brasil atos de guer-ra, criando uma situação de beligerância que somos for-çados a reconhecer, na defesa da nossa dignidade, danossa soberania, da nossa segurança e da América, e arepelir na medida das nossas forças”. Estava declarada

a guerra no dia 22 de agosto de 1942. Em 31 de agosto de1942, o governo criou os Comandos Navais do Norte,do Nordeste, de Leste, do Centro e do Sul, com amplajurisdição sobre as águas litorâneas de suas zonas res-pectivas.

A Força Naval do Nordeste era comandada peloContra-Almirante Alfredo Carlos Soares Dutra, e a doSul pelo Contra-Almirante Gustavo Goulart.

Realizando comboios de importância fundamen-tal para as Forças Aliadas, a Marinha Brasileira atuoudurante todo o conflito, merecendo, pela excelência deseu desempenho, a admiração e o respeito de todosquantos dele tiveram conhecimento.

Adotou-se, logo no início das hostilidades, umaprovidência de grande alcance – instalar um destaca-mento de Fuzileiros Navais na Ilha da Trindade, defen-dendo-a contra um possível estabelecimento de base desubmarinos inimigos. Ainda no período da guerra, fo-ram criadas a Terceira Companhia Regional do CFN emNatal, a Quarta em Salvador e a Quinta no Recife.

No rol de unidades navais brasileiras sacrificadasna campanha está o navio-auxiliar Vital de Oliveira.Torpedeado na noite de 19 de julho de 1944, naufragoulevando para o fundo do Atlântico seis dos quatorzeFuzileiros Navais que integravam sua guarnição: Sar-gento Otto Schramn Filho, Cabo Boaventura ZeferinoNeves e Soldados Benjamim Feitosa da Fonseca, ManoelCorreia Neto, José Barbosa Ribeiro e Afonso de OliveiraSantos. Todos foram promovidos post-mortem às gradua-

ções imediatamente superiores,pelo Decreto nº 1313-N, de 11 deagosto de 1944.

No dia 2 de julho, partirapara a Itália o primeiro escalãoda Força Expedicionária Brasi-leira. Quatro outros contingen-tes seguir-se-iam, perfazendoum total de 25.334 homens.Atuou também na guerra, comigual destaque, o Primeiro Gru-po de Caça da Força Aérea Bra-sileira.

A 8 de maio de 1945 ca-pitularam os nazistas – foi oDia da Vitória.

A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL 41

O navio-auxiliar Vital deOliveira, uma das unidadesnavais brasileirastorpedeadas na SegundaGuerra Mundial

Page 43: O Anfíbio - Edição Extra 2008

42 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Decreto nº 40.862 de 6/2/57“O Presidente da República, usando das atribui-ções que lhe confere o artigo 87, inciso I da Cons-tituição, decreta:Art. 1º - Fica criada a Força de Fuzileiros da Es-quadra.Art. 2º - A lotação das unidades da Força de Fu-

“A situação do Corpo de Fuzileiros Navais, no queconcerne a instrução, é precária. Não dispõe de terrenosonde exercitar a tropa e o deslocamento para lugaresdistantes – Gericinó, Barra da Tijuca, Ilha Grande – tor-na-se, além de altamente dispendioso, quase improdu-tivo em vista das canseiras e do desperdício de temponas longas viagens.

ETAPAS DECISIVAS

Torna-se imprescindível conseguir terrenos apro-priados, em lugares convenientes à Marinha, que nãofaltam notadamente na Ilha do Governador, onde já emcerta época o Corpo fazia seus exercícios.”

Aqui transcrito trecho de um relatório elabora-do, em 1943, pelo Chefe do Estado-Maior do CFN, Capi-tão-de-Mar-e-Guerra Fuzileiro Naval Sylvio de

zileiros da Esquadra será fixada pelo Ministro daMarinha, mediante proposta do Estado-Maior daArmada e obedecida a Lei de Fixação de Forças.Art. 3º - Este decreto entrará em vigor na data desua publicação, revogadas as disposições em con-trário.”JUSCELINO KUBITSCHEK

Page 44: O Anfíbio - Edição Extra 2008

ETAPAS DECISIVAS 43

A 29 de junho de 1948, o Ministro da Marinhafirmou o Aviso nº 1513, determinando que fosse consti-tuída uma comissão encarregada das providências deplanejamento das instalações do Campo de Instruçãoda Ilha do Governador. Integravam a referida comis-são: o Contra-Almirante Fuzileiro Naval Sylvio deCamargo, o Capitão-de-Mar-e-Guerra Fuzileiro NavalRubens Constant de Magalhães Serejo, o Capitão-de-Mar-e-Guerra Engenheiro Naval Oswaldo OsírisStorino, o Capitão-de-Corveta Fuzileiro Naval LeônidasTelles Ribeiro, o Capitão-Tenente Fuzileiro Naval Neyde Souza e Silva e o Engenheiro Philomeno VictorLeopoldo Polito. As “Instruções para o Planejamentodo Campo da Ilha do Governador” foram baixadas peloAviso nº 1515 daquele mesmo ano, em que se relaciona-vam as instalações a serem projetadas:- Quartéis para as Unidades de Infantaria e Grupo deArtilharia;- Centro de Instrução do Corpo de Fuzileiros Navais;- Prédios para o apoio administrativo, inclusive Parquede Motomecanização e Hospital;- Linha de Tiro e pistas de aplicação militar;- Vilas Residenciais; e- Prefeitura Militar.

O terreno abrangeria “a área constituída por ter-ras de propriedade do Ministério da Marinha, situadasa norte e a nordeste do alinhamento formado pelas prai-as do Bananal e das Pelônias”, prescrevendo, ainda, oAviso, a entrega do referido terreno ao CFN pelo DiretorGeral de Comunicações da Marinha. Constituiu-se umacomissão especial de arrolamento e, a 23 de novembrode 1948, foi efetivada a entrega definitiva da área. Fir-maram a Ata de Entrega de número 1 da Estação Cen-tral Rádio-Telegráfica da Marinha, pelo CFN o Capitão-Tenente Fuzileiro Naval Doris Greenhalgh de Oliveira,e pela Diretoria o Capitão-de-Corveta Carlos Duque Es-trada.

Em 10 de março de 1949, o Presidente da Comis-são Almirante Camargo, encaminhou à Diretoria de En-genharia da Marinha estudos circunstanciados, permi-tindo que fossem ultimadas as providências para o iní-cio das obras. O Centro de Instrução mereceu a maiorprioridade. Realizou-se um concurso para escolha doprojeto, sendo vencedores os Arquitetos Valdetaro eNadalute. A concorrência para construção foi vencidapela Companhia Moraes Rego S.A., que iniciou a obraem março de 1950.

A Linha de Tiro foi inaugurada a 10 de dezembrode 1952, e o Centro de Instrução a 28 de dezembro de1956.

E o Campo da Ilha do Governador receberia, como passar do tempo, os primeiros componentes da Forçade Fuzileiros da Esquadra, criada pelo Decreto nº 40.862,de 6 de fevereiro de 1957.

Foram lançados, assim, os sólidos alicerces sobreos quais seria estruturado o Moderno Corpo de Fuzilei-ros Navais.

Camargo, promovido a Contra-Almirante e empossadono cargo de Comandante-Geral do Corpo de FuzileirosNavais dois anos após. Camargo ouviu do então Minis-tro da Marinha, Almirante Sylvio de Noronha, as se-guintes palavras:

“A Marinha precisa de um Corpo de FuzileirosNavais capaz de desempenhar bem as suas funções noconjunto das Operações Navais.”

E assim ocorreram decisivas medidas no sentidode dotar o Corpo de Fuzileiros Navais de todos os meiosnecessários a uma Tropa Anfíbia, cuja importância fun-damental ficara consagrada definitivamente na II Guer-ra Mundial.

O Centro de Instrução do Corpo de FuzileirosNavais, atual Centro de Instrução Sylvio de

Camargo (CIASC), inaugurado em 1955, foium dos pilares para a estruturação do Corpo

de Fuzileiros Navais de hoje.

Page 45: O Anfíbio - Edição Extra 2008

44 O ANFÍBIO • 200 ANOS

A 25 de agosto de 1961, renunciou o Presi-dente Jânio Quadros. O Vice-PresidenteJoão Goulart encontrava-se no estrangei-ro, cabendo, portanto, ao Presidente daCâmara, Dr. Ranieri Mazzili, assumir o

Governo. A grave crise político-militar, então desencadeada,teve fim quando o Congresso Nacional aprovou a ins-tauração do regime parlamentarista de Governo, me-dida introduzida através de Ato Adicional à Constitui-

ção da República. A 7 de setembro, assumiu a Presidên-cia o Dr. João Goulart. Assim permaneceu até que foirealizado um plebiscito, em 6 de janeiro de 1963. O Go-verno utilizara, sistematicamente, todos os veículos decomunicação social, massificando a opinião pública fa-voravelmente ao retorno do sistema presidencialista. Opovo disse “não” ao parlamentarismo sendo, em conse-qüência, revogado, a 23 de janeiro, o Ato que criara esseregime.

A REVOLUÇÃO DE 1964

Page 46: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A REVOLUÇÃO DE 1964 45

O governo passou a apregoar a necessidade dedrásticas reformas sócio-econômicas, promovendo ainstalação de um verdadeiro “caos institucional”.

Nas Forças Armadas a ação esquerdista vinhasendo gradativamente estruturada. Em setembro de1963, Sargentos tomaram de assalto o edifício do Minis-tério da Marinha, em Brasília, protestando contra ainelegibilidade de um companheiro do Exército, even-tual candidato à Câmara dos Deputados. A agitação iaatingindo sua fase mais aguda.

No início de 1964, foi desencadeado um caudal deatos governamentais de inspiração comunista. A repe-tida paralisação de serviços públicos essenciais angus-tiava o povo perplexo ante a anarquia desenfreada. Nodia 13 de março de 1964, realizou-se, defronte ao edifícioda Central do Brasil, uma grande concentração promo-vida pela Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT),com apoio do Governo e presença do Presidente da Re-pública, que discursou em meio a cartazes e faixas cominscrições e símbolos comunistas. Ficou fora de dúvidasque os agitadores aceleravam a queda das instituições eiriam partir para os lances decisivos do processo.

No dia 26 de março, Praças da MB, pertencentes auma associação proscrita, reuniram-se em assembléiano prédio do Sindicato dos Metalúrgicos. O pretexto paratanto foi a prisão dos marinheiros dirigentes da entida-de ilegal. Somente no dia seguinte o edifício foi evacua-do e presos os manifestantes. Contudo, mais uma vezseria consagrada a indisciplina – todos os elementos fo-ram indultados em cumprimento à ordem expressa daPresidência da República. O Ministro da Marinha re-nunciou ao cargo, pois obtivera do próprio Presidente apromessa formal de que os implicados no movimentoseriam exemplarmente punidos.

A 30 de março, João Goulart compareceu à sededo Automóvel Clube do Brasil, onde foi homenageadopela Associação dos Subtenentes e Sargentos da PolíciaMilitar. Praças da Marinha, Exército e Aeronáutica tam-bém compareceram à ruidosa solenidade, a última da-quele Governo.

Mas, enquanto os manifestantes manipulavamaqueles indivíduos do Governo, escolhidos como ins-trumentos de sua iminente ascensão do poder, no cam-po oposto, povo e Forças Armadas estavam conscientesde que chegara o momento da ação em defesa da demo-cracia. Em São Paulo e no Rio de Janeiro milhares defamílias realizaram marchas cívicas “com Deus pela li-berdade”. Homens, mulheres e crianças uniram-se es-pontaneamente, empunhando rosários e crucifixos, emdecidido e consciente protesto contra a anarquia. Os mi-litares aguardavam a ordem do Chefe do Estado-Maiordo Exército, General Humberto de Alencar Castelo Bran-co, que coordenava secretamente os preparativos paraque fosse evitado o golpe comunista definitivo, planeja-do para o 1º de maio. E assim ocorreu no último dia domês de março de 1964.

O Governador do Estado de Minas Gerais, Maga-lhães Pinto, com o apoio dos Comandos Militares daregião, rompeu ostensivamente com o Governo da Re-pública. As tropas do Exército Brasileiro, sediadas emMinas, marcharam sob o Comando do General-de-Di-visão Olímpio Mourão Filho na direção do Rio de Janei-ro. João Goulart, utilizando uma rede de emissoras derádio rotulada como a “Cadeia da Legalidade”, decre-tou greve geral no país, e anunciou que o Primeiro e oSegundo Exércitos deslocavam-se para conter as forçasrevoltosas – era a tentativa desesperada de iludir o povo,a última tentativa. Os cadetes da Academia Militar dasAgulhas Negras, sob o Comando do General EmílioGarrastazu Médici, tomaram posições no eixo Rio - SãoPaulo, bloqueando qualquer tentativa armada contrá-ria ao movimento. Todos os Comandos de Exércitos es-tavam solidários com a revolução.

Centenas de oficiais da Marinha estavam reuni-dos no Clube Naval, desde os acontecimentos que tive-ram lugar no Sindicato dos Metalúrgicos. Oficiais dasForças Armadas, na maioria do Exército, liderados peloMarechal Augusto Magessi, deslocaram-se do ClubeMilitar pela Avenida Rio Branco, unindo-se aos compa-nheiros da Marinha no Clube Naval. Todos eles procla-maram-se contrários a João Goulart.

Já em 1963, oficiais Fuzileiros Navais assinaramdocumentos proclamando ostensivamente seu repúdioao Comandante-Geral do CFN, por acharem este oficialindigno de vestir a farda dos Combatentes Anfíbios daMarinha.

Na manhã de 31 de março de 1964, o Chefe doComando Revolucionário da Marinha, Vice-AlmiranteAugusto Hamann Rademaker Grunewald, designouverbalmente o Capitão-de-Mar-e-Guerra Fuzileiro Na-val Heitor Lopes de Sousa para o Comando-Geral doCFN, com plenos poderes. O Comandante Heitor imedi-atamente destituiu todos os Comandos na área do Riode Janeiro, e determinou aos Capitães-de-Mar-e-Guer-ra Edmundo Drummond Bittencourt, Doris Greenhalgde Oliveira, Haroldo do Prado Azambuja e RobervalPizarro Marques que assumissem, respectivamente, oComando da então Guarnição do Quartel Central, aChefia do Estado-Maior do CFN e os Comandos do Nú-cleo da Primeira Divisão de Fuzileiros Navais e do Cen-tro de Instrução do CFN.

No dia 4 de abril, João Goulart fugiu para o Uru-guai onde obteve asilo político.

O Alto Comando Revolucionário, que assumiu ocontrole na Nação, era integrado pelo General Arthurda Costa e Silva, Almirante Augusto HamannRademaker Grunewald e Brigadeiro Francisco de AssisCorreia de Mello.

A 15 de abril de 1964 tomou posse, em Brasília, oPresidente da República eleito pelos representantes dopovo no Congresso Nacional, Marechal Humberto deAlencar Castelo Branco.

Page 47: O Anfíbio - Edição Extra 2008

46 O ANFÍBIO • 2006

A Companhia deReconhecimento

Anfibio´“Cia Recon”

O PÁRA-QUEDISMO NO CFNCMG (FN-RM1) JAIME FLORENCIO DE ASSIS FILHO

A concepção inicial previa criar, no CFN, uma tropaque pudesse, dentro de um cenário de operação anfíbia,ser infiltrada em território hostil, seja pelo mar oupelo ar, para obtenção de informações de combate.

Page 48: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A COMPANHIA DE RECONHECIMENTO ANFÍBIO - “CIA RECON” - O PARA-QUEDISMO NO CFN 47

O Corpo de Fuzileiros Navais (CFN) do Brasil vivenciou, na déca-da dos anos cinqüenta do século XX, profundas mudanças quepermitiram transformá-lo em uma corporação no estado da arteda Guerra Anfíbia.

As vitórias dos Fuzileiros Navais americanos no Teatro de Operações(TO) do Pacífico, durante a 2ª Guerra Mundial (2ª GM), e a conseqüente con-solidação da doutrina de guerra anfíbia no âmbito do “United States MarinesCorps” (USMC); o Regulamento do CFN aprovado em 1950, que previa aexistência de uma Força de Fuzileiros da Esquadra (FFE); a lei de fixação deforças e efetivo de 1955, que aumentou o efetivo do CFN para 10.000 homens;a apresentação na tropa de oficiais oriundos da Escola Naval e FuzileirosNavais por opção, portanto, mais motivados com o CFN; a aquisição deNavios Transportes de Tropa de Assalto (NTrTA) no Japão; o Programa deAssistência Militar (MAP); a criação do Centro de Instrução do CFN – CICFN(hoje CIASC); e logo em seguida da FFE, são exemplos marcantes que propici-aram essas transformações.

Vivia-se, naquela década, uma fase empolgante no CFN com a perspec-tiva de criação de unidades operativas, o que viria a apagar, definitivamente,tanto do público interno quanto externo, a imagem de uma corporação militarvoltada apenas para atividades de bandas de música, escoltas, guardas dehonra e de segurança das instalações navais.

Dentro desse contexto, surgiu a Companhia de Reconhecimento Anfíbio– a Cia Recon, que deixou escrito, de forma indelével, nas páginas da história doCFN, momentos de glória e demonstração de muito profissionalismo. Entre-tanto, com o passar do tempo, o CFN precisou se adequar aos ditames da guerrae, por diversas vezes, teve que se reestruturar, resultando com isso no surgimentode novas unidades e a extinção de tantas outras.

A romântica Cia Recon dos anos 60 já não existe mais. Oficiais das novas gerações,dela, talvez nunca tenham ouvido falar. O berço dos nossos primeiros pára-quedistas emergulhadores é, hoje, apenas uma grata lembrança, eternizada pelas matérias publicadas

Pára-quedistas pioneiros do CFN

Turno 58/I

Oficiais01. CC (FN) Sebastião Gimenez02. CT (FN) Clinton Cavalcante de Queiroz Barros03. 1 º Ten. (FN) Claus Romo Von Glasenapp04. 1 º Ten. (FN) Alfredo de Souza Coutinho Filho05. 2 º Ten. (FN) José Milliauskas06. 2 º Ten. (FN) Jader de Jesus Coutinho

Praças01. 3º SG (FN-TL) Luiz Dantas Pimenta02. 3º SG (FN-AT) Dediel Ruy da Silva03. 3º SG (FN-IF) João Batista Ferreira04. 3º SG (FN-IF) Manoel Pereira da Silva05. 3º SG (FN-AT) Adão Cardoso Gomes06. 3º SG (FN-IF) Sebastião Marinho07. CB (FN-IF) Heli Nunes Gomes08. CB (FN-IF) Amaro de Souza Lima09. SD Severino Soares de Siqueira10. SD Aparecido Candido da Silva11. SD Armando Barreto da Cunha12. SD Manoel André da Silva13. SD Daniel da Silva Barros14. SD Apolônio Domingos dos Santos15. SD Francisco Alves Pereira16. SD Newton Freire17. SD Hedson Vieira Linhares18. SD Antonio de Farias Cavalcanti19. SD José Fernandes de Amorim20. SD Deilson Moreira de Santana21. SD Francisco Rodrigues Mendes22. SD Bernardino José da Silva Filho23. SD João Urbano Moreira24. SD Domingos Manoel de Sá25. SD José Clementino Neto26. SD Eduardo Almeida Improta27. SD Pedro Leiva28. SD Antonio Carlos Gastalho29. SD José Valdeci Pinto Nascimento30. SD Newton Guedes de Assis

Page 49: O Anfíbio - Edição Extra 2008

48 O ANFÍBIO • 2006

em periódicos famosos daquela década ou, algumas vezes, por crônicas e histórias deautoria de seus antigos integrantes.

A história dessa briosa unidade não pode ser perdida no tempo. É justo e de direitoque se faça um breve registro dos fatos que marcaram a sua existência. É o que nos propo-mos realizar neste trabalho, lembrando sempre que, datas e locais de fatos relatados quaseum lustro depois, com ênfase na história do pára-quedismo, o foram, algumas vezes, obti-dos à luz de depoimentos emocionados de militares que, um dia, envergaram a camisa daCia Recon, e que nem sempre coincidem com os registros que se fizeram na época.

Primórdios do Pára-quedismo no BrasilCom o desencadear da 2ª Guerra Mundial, as tropas pára-quedistas foram empre-

gadas no Teatro de Operações europeu em diversas oportunidades, e por vários doscontendores, passando a ser considerada uma tropa especial, haja vista as suas condiçõesde emprego e o papel desempenhado no contexto das manobras militares.

A necessidade de renovação e acompanhamento da arte da Guerra pelo ExércitoBrasileiro (EB), envolvido, também, no conflito, ensejou o envio de um oficial para “FortBenning”, uma grande base militar, considerada a “Home of Infantry” do Exército ameri-

cano, localizada no esta-do da Georgia, onde seformavam, também, osintegrantes dessa tropade elite.

Em 1944, o Capitãode Infantaria Roberto dePessoa foi enviado para a

referida unidade com o propósito de realizar o Curso Básico de Pára-quedista, com duraçãode quatro semanas, bem como, estudar as bases de organização de uma escola similar noBrasil. No ano seguinte, após ter realizado outros cursos relacionados, dentre os quais o deMestre de Salto, retornou a “Fort Benning”, chefiando as primeiras equipes (Oficiais e Sargen-tos), em um total de três, que se tornaram os pioneiros do pára-quedismo militar brasileiro.

No ano seguinte foi criada a Companhia Escola de Infantaria, “celula mater” daInfantaria Pára-quedista do EB, ficando aquartelada nas dependências do Regimento deArtilharia Antiaérea, na região da Colina Longa, em Deodoro - Rio de Janeiro. Ela eraorgânica do núcleo de formação de pára-quedista, e foi criada por Decreto-Lei nº 8.444, de26 de dezembro de 1945.

Em 15 de março de 1946 foi ativado o Núcleo de Formação e Treinamento dePára-quedista, cuja denominação foi alterada em 1949 para Escola de Pára-quedista. Em21 de novembro de 1951 deu-se a criação do Batalhão de Infantaria (BI) Aeroterrestre e,em 26 de outubro de 1956, em homenagem à Aeronáutica, na figura do seu patrono, o “Paida Aviação”, o BI Aeroterrestre recebeu a denominação de Batalhão Santos Dumont. Des-de a sua criação, e até meados do ano de 1957, o Batalhão Santos Dumont esteve aquarte-lado nas instalações do antigo 2º RI, atual 2º BIMtz (Es). Em 14 de maio o Batalhão mudou-se para a sua atual área nas proximidades do Campo dos Afonsos.

Levando-se em conta que, nos idos de 1956, oficiais Fuzileiros Navais (FN) já reali-zavam há algum tempo o curso de aperfeiçoamento na Escola de Aperfeiçoamento deOficiais – EsAO, é fácil compreender a assimilação da doutrina do EB pelos oficiais FN, ecomo o pára-quedismo foi trazido para a nossa corporação.

Origem da Companhia de Reconhecimento AnfíbioAté 23 de novembro de 1948, data de entrega definitiva do Campo da Ilha do Go-

vernador (CIG) ao CFN, excetuando-se as antigas Companhias Regionais2 , todas as suasunidades estavam instaladas na Fortaleza de São José, localizada na Ilha das Cobras.

O Regulamento do CFN de 1950 previa, conforme comentado, a existência de umaFFE, entretanto, até a sua criação, em 1957, ter uma tropa profissional para realizar opera-ções anfíbias, ainda não passava de um grande sonho para os Fuzileiros Navais do Brasil.Embora já tivesse sido criada em 1956 a Força de Transporte da Marinha (FTM), dotada denavios-transportes e embarcações de desembarque (EDVP e EDVM)3 , o CFN estava ape-nas nascendo, no cenário nacional, como uma tropa verdadeiramente anfíbia.

“Eram tempos muito bons, apesar de difíceis, e nãoposso deixar de me emocionar e lembrar da expressãoinglesa “the sweet bird of the patriots” quando merecordo de nosso ideal visando a criação de um CFNtão bom, ou melhor do que o famoso USMC.1...”

Page 50: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A COMPANHIA DE RECONHECIMENTO ANFÍBIO - “CIA RECON” - O PARA-QUEDISMO NO CFN 49

Em 1957, existia no CIG, em matéria de aquartelamento projetado e construído compropósito definido, apenas o CICFN, inaugurado em 28 de dezembro de 1955. Nos terre-nos restantes dessa área, existiam a antiga Companhia Escola4 , onde hoje fica o aquarte-lamento do Batalhão Humaitá, a Linha de Tiro do CFN, a lavanderia e umas pequenas,modestas e dispersas construções de alvenaria. No mais, o resto era só vegetação nativa.

A FFE foi criada pelo Decreto nº 40.862 de 6 de fevereiro de 1957, tendo como referên-cia a sua homóloga do USMC – a ”Fleet Marine Force” - FMF.

O Decreto nº 41.352 “A”, de 22 de abril de 1957, a estruturava da seguinte forma:· Núcleo da 1ª Divisão de Fuzileiros Navais (Nu 1ªDivFuzNav);· Tropa de Reforço (TrRef); e· Comando de Serviços.O artigo 2º do mesmo decreto previa: “O comando da FFE é exercido pelo Coman-

dante-Geral do CFN”.Em realidade, na época de sua criação não existia, ainda, nenhuma unidade ativa-

da. Uma barraca de comando foi armada na ponta do Bananal, junto à Companhia Escola,dando origem à Companhia de Comando do Núcleo da 1ª DivFuzNav, podendo assim serconsiderada como a “celula-mater” da FFE.

Ainda em 1957, o CF (FN) Roberto Mario de Abreu e Souza (“o Chico”), oficialidealista e muito entusiasmado, de acordo com um projeto discreto de criação de unida-des para a FFE, e considerando seus vastos conhecimentos sobre a 2ª GM, lançou a idéiade dotar o CFN de uma tropa de elite, como os Pára-quedistas, cujos feitos naquele conflitoainda eram bastante lembrados. Tal ato foi o estopim para o nascimento da Companhiade Reconhecimento Anfíbio (conhecida à época como a Recon), portanto, a segunda unida-de do Nu 1ª DivFuzNav.

A concepção inicial previa criar, no CFN, uma tropa que pudesse, dentro de umcenário de operação anfíbia, ser infiltrada em território hostil, seja pelo mar ou pelo ar,para obtenção de informações de combate. Assim procedia a “Force ReconaissanceCompany” do USMC, subordinada diretamente à sua “FMF”.

A Cia Recon foi ativada e, logo em seguida, abriram-se as inscrições para o Curso dePára-quedismo no EB. Um documento do Comandante-Geral do CFN impôs as condiçõesexigidas ao militar para ingressar na nova unidade. Em dezembro de 1957, oficiais epraças voluntários, aprovados nos exames preliminares de suficiência física realizados

EMBARQUE NO C-82Na fase final doTurno 58/I, essesmilitares foram,além de outrasexigências,submetidos ao testemais importante, arealização de saltossemi-automáticos,sendo lançados dasantigas aeronaves“Fairchild C-82Packet” que a ForçaAérea Brasileira(FAB) dispunha.

Page 51: O Anfíbio - Edição Extra 2008

50 O ANFÍBIO • 2006

no Centro de Esportes da Marinha, na época localizado na Ilha das Enxadas (atual aquar-telamento do Centro de Instrução Almirante Wandenkolk - CIAW), se reuniram visandoos preparativos que se faziam necessários para a apresentação ao EB; aonde iriam, maistarde, realizar o Curso de Pára-quedismo. Os candidatos eram matriculados no que o EBchamava de turno (Turno 58/I, 58/II etc). Este era dividido em duas partes: o Pré-básico (naépoca, com duração de duas semanas) e o Básico (de três semanas). A primeira preparavafisicamente o militar e, a segunda, um pouco mais técnica, preparava o militar para arealização dos saltos.

Recaiu sobre o CC (FN) Sebastião Gimenez, o Tião do time de basquete do Flamengo,a tarefa de liderar o grupo inicial de 40 militares selecionados pela 3ª Seção do Estado-Maiordo CFN (EMCFN), sob a responsabilidade do Comandante Abreu e Souza.

A concentração desse grupo foi realizada nas proximidades do Saco do Valente, emárea atualmente pertencente ao Batalhão Riachuelo, aonde a Cia de Engenharia5, maistarde, viria a montar algumas barracas para servir de seu aquartelamento. Ali seriaconduzido um treinamento, antes da apresentação ao EB. Estava constituída, extra-ofici-almente, ainda sem autonomia administrativa, a Cia Recon (os militares ficarammuniciados no Centro de Recrutas do CFN).

A equipe estava formada, porém, sem o condicionamento físico necessário para oPré-básico, onde o militar já devia chegar apto às cobranças físicas, características daprimeira fase. Sabia-se que a voga do curso era puxada e sendo a primeira turma acursar no EB, o CFN tomou as devidas precauções, contando com a colaboração do Capi-tão Sebastião, Oficial Pára-quedista do EB, que foi destacado para treiná-los psíquica efisicamente. Àqueles que se achavam devidamente preparados, por terem sido aprova-

C-82 LANÇANDO OSPÁRA-QUEDISTAS

Em sendo um fatoinusitado para a

Marinha, os jornaisda época divulgaram ofeito dos primeirosPára-quedistas da

Marinha, alguns commanchetes chamativas

como “A Marinhalança-se à primeira

vez no espaço”.

Page 52: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A COMPANHIA DE RECONHECIMENTO ANFÍBIO - “CIA RECON” - O PARA-QUEDISMO NO CFN 51

dos nos testes de seleção física e acostumados às sessões de ginástica até então praticadas,se decepcionaram logo no primeiro encontro com o Capitão Sebastião. Após uma hora deexercícios, reproduzindo na prática tudo aquilo que iriam encontrar na Área de Estágiodurante o Pré-básico, quase todos os militares estavam exaustos.

Após um extenuante período de treinamento físico, que durou aproximadamente 30dias, os candidatos a integrar a Cia Recon foram matriculados no Pré-básico e, logo emseguida, no Básico do Núcleo da Divisão Aeroterrestre, integrando o Turno 58/I. Durante oPré-básico, como era previsto, ocorreram algumas desistências, porém, devido a lesões.Entretanto, a maioria passou para a segunda fase do curso e seguiu rumo à conquista do“brevet” de Pára-quedista. É justo ressaltar que o grupo se destacou na execução dos exercí-cios, nas diversas pistas de treinamento, o que demonstrou ser acertado realizar essa pre-paração na Cia Recon, antes de enviar os candidatos aos futuros cursos no EB. Essa normafoi sempre cumprida com grande reflexo no resultado dos cursos seguintes.

No dia 11 de fevereiro de 1958, foi realizado o primeiro de uma série de cinco saltos,após o que, fazendo uso das palavras de um desses pioneiros, “estava aberto o caminhodos céus para os Navais do Brasil”.

A 13 de fevereiro foi realizado o quinto e último dos saltos para a conclusão do cursoe o recebimento do “brevet” de Pára-quedista militar. Essa data passou a ser consideradacomo o dia da efetivação da Cia Recon e, portanto, a de seu aniversário. A zona de lança-mento (ZL) utilizada no curso foi a do Campo de Gramacho, localizado à margem daestrada Rio-Petrópolis, uma enorme área com vegetação e áreas alagadas. Nesse local,após a conclusão do último salto, os componentes da turma foram qualificados Pára-quedistas militares, e foram dadas por encerradas as atividades do curso do Turno 58/I.Dos 40 combatentes anfíbios iniciais, lograram êxito 6 Oficiais e 30 Praças, que tiveram ahonra de constituir a primeira turma de Pára-quedistas do CFN (ver quadro na pág. 47) e,portanto, os pioneiros da Recon.

A cerimônia de diplomação e brevetação dessa turma se deu em 14 de fevereiro, às10:00 horas, no Campo de Gramacho6 . Além dos familiares, estiveram presentes os Minis-tros do Exército - General Teixeira Lott, da Aeronáutica (escolhido paraninfo) - BrigadeiroFrancisco Correia de Melo, e várias autoridades navais, dentre elas, o VAlte (FN) RubensConstant de Magalhães Serejo e o CAlte (FN) Décio Santos de Bustamante, respectivamente,

CASA VELHA DA PRAIAGRANDEDurante o período depermanência na PraiaGrande, a Cia Reconconstruiu uma Áreade Estágio (bastantesimples,naturalmente) einiciou,literalmente, tijolopor tijolo, aconstrução dasprimeirasinstalações de seuaquartelamento.Retornara, portanto,ao estágio dasvelhas barracas,numa área onde sóexistia uma velhacasa, já desocupadapela CompanhiaEscola, não haviaenergia elétrica e aágua era obtida emum velho poçoartesiano. O ranchoprovinha do PrimeiroBatalhão.

Page 53: O Anfíbio - Edição Extra 2008

52 O ANFÍBIO • 2006

Comandante-Geral do CFN e Comandante do Nu 1ª DivFuzNav. Ao final da cerimônia foirealizada uma demonstração, com o lançamento de material (Obuseiros 105mm, viaturase fardos) e de pessoal, num total de 600 militares do EB que, após a aterragem, entraram emposição e realizaram salvas de artilharia.

Ainda em 1958, outros militares FN se formaram Pára-quedistas, alguns dos quais,remanescentes do Turno 58/I, como por exemplo, o Sargento Damasceno. Dessa forma,gradativamente, o efetivo da nova unidade foi aumentando. O primeiro oficial nomeadopara o comando da Cia Recon foi o próprio Comandante Gimenez, selecionado para ocargo em vista dos seus atributos morais, de liderança e aptidão física.

Naquele mesmo ano, a FFE, dando continuidade a uma série de exercícios anfíbios,que se iniciou em abril com a Operação “Aragem”, planejou para novembro a realizaçãoda Operação “Badejo”7 , que contou com a participação da Cia Recon. O Almirante Serejoativou, para a realização desse exercício, o 1º Grupamento Operativo que, acampado naPraia Grande, deu origem, após o término do exercício, ao 1º Batalhão de Infantaria doNúcleo, hoje Batalhão Riachuelo. Posteriormente, o Batalhão recém criado mudou-se paraa área onde a Recon estava acampada. Essas unidades conviveram, no mesmo local, até ofinal do ano de 1959, quando a Cia Recon recebeu a ordem de ocupar outra região dentro doCIG. É importante lembrar que, inicialmente, não existiam quartéis, as unidades desempe-nhavam suas atividades acampadas, valendo-se, na maioria das vezes, do uso de barracasde lona para 10 homens8 .

Antes mesmo que o ano terminasse, os Oficiais Pára-quedistas concluíram o cursode Mestre de Salto, também realizado no EB, e ficaram, portanto, habilitados a comandarfuturos lançamentos.

O trabalho de formação de Oficiais e Praças Pára-quedistas continuou nos anosseguintes. Em 1959, por exemplo, concluíram o curso – o então CT (FN) Jeremias BezerraBrandão, o 2º Tenente (FN) Danilo Pinto Montenegro e o Terceiro-Sargento (FN) MarioFerreira Poeta. Em 1960, formaram-se também: Tenentes (FN) Ludovico Marques, UriburuLobo da Cruz, Cyro Ferreira Felizola Zucarino e Reynaldo Carceroni.

A Cia Recon, como vimos, foi inicialmente instalada em barracas montadas emárea hoje pertencente ao aquartelamento do Batalhão Riachuelo, que a ocupou logo emseguida à sua criação. Deu-se início, então, ao trabalho de construção das primeiras ins-talações9 , que contou com o concurso de pedreiros civis e militares, e de voluntários daCia Recon e do primeiro Batalhão de Infantaria, que até então só havia ativado a Compa-nhia de Comando e Serviços. Mais tarde, quando alguns alojamentos já haviam sidoconstruídos, ou seja, já existia um certo conforto, a Recon se deslocou para a área da PraiaGrande, onde atualmente está instalado o Batalhão Paissandu, permanecendo nesse localaté os idos de 1971, quando se transferiu, juntamente com o Comando da Tropa de Refor-ço, para as instalações da Ilha das Flores 10 – São Gonçalo, RJ, recentemente recebida doacervo do Ministério da Agricultura.

Diariamente os seus integrantes, ao regressarem para bordo, o faziam trazendo

O dia-a-dia dosmilitares da Reconera preenchido, na

parte da manhã, comuma corrida de 10Km, com calça e

“boot” (cantando erepetindo comandos),o que à época era umanovidade, ginástica

com toros oucalistênica, e

instrução em salasimprovisadas debaixo

das copas dasárvores, meio

instrucional aindautilizado por nossastropas. À tarde, os

militares, valendo-sede aptidões extra-Marinha, viravam

operários de obra,desempenhando tarefas

de carpinteiros,bombeiros

hidráulicos,eletricistas etc.Dessa maneira, os

pioneiros da Reconconstruíram com

sangue e suor asprimeiras instalaçõesde alvenaria do seu

aquartelamento.

Page 54: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A COMPANHIA DE RECONHECIMENTO ANFÍBIO - “CIA RECON” - O PARA-QUEDISMO NO CFN 53

um tijolo, um pedaço de madeira, um prego etc, encontrados ao longo dos caminhos quedemandavam o quartel. Estamos nos reportando ao início dos anos 60, época em que oíndice demográfico da Ilha do Governador era pequeno. É provável que as inúmeras cons-truções em andamento, ao longo dos caminhos, tenham servido de fontes parciais domaterial de construção da Recon.

O CICFN, o primo rico do CIG, contribuiu muito com a Recon, doando um velhogalpão de madeira, remanescente de sua construção. Com a madeira e as telhas dessegalpão foram construídas uma pequena cozinha, com fogão à lenha, e duas outras peque-nas construções, com meia parede, que serviram como refeitórios. Ainda com o resto damadeira e com o bambu, abundante no local, deu-se início à construção de um alojamentopara as Praças.

Foi nessa época que adotaram a prática, no uniforme interno, do uso da calça vinca-da, do boot espelhado, dos metais brilhando, da camiseta com o nome no peito e do gorrode pala. Esses detalhes de apresentação pessoal, cobrados por meio de duas inspeçõesdiárias, fizeram dos nossos Pára-quedistas, militares exemplares nesse aspecto, a despei-to da poeira e das confusões geradas pelas obras de seu aquartelamento, e do desconforto,de seus alojamentos em barracas.

Participação da Cia Recon em eventossignificativos na década de 60

No despertar da década de 60, o CFN, como vimos, só dispunha como unidade decombate o Batalhão Riachuelo e a Cia Recon. Com a aproximação da inauguração da novacapital Federal – Brasília – prevista para 21 de abril de 1960, a Marinha de Guerra se fariarepresentar nas comemorações com um contingente misto de Marinheiros e FuzileirosNavais, este último, composto, em sua maioria, por elementos da Cia Recon,complementados por militares do Batalhão Riachuelo. Essa representação não teria tido arepercussão que teve se, não fosse o fato dessa tropa ter se deslocado para Brasília emmarcha a pé, de duração de vinte e três dias.

O deslocamento para Brasília ensejou um minucioso planejamento11 a cargo, prin-cipalmente, do CC (FN) Clinton Cavalcante de Queiroz Barros, então comandante da CiaRecon, designado para o comando da Coluna de Marcha.

O evento em si teve o seu ápice no dia da inauguração de Brasília, com a entrega, emmãos, pelo Comandante da Coluna de Marcha, da mensagem de congratulações da Mari-nha de Guerra, redigida pelo então Ministro da Marinha – Almirante Jorge do Paço MatosoMaia –, ao Presidente Juscelino Kubitschek.

No ano seguinte, a Recon esteve, também, muito próxima de entrar em combate,em face de uma situação político-militar, criada pela renúncia do Presidente Jânio Qua-dros. Durante os acontecimentos que se sucederam a esse fato, ocorrido em 25 de agosto de1961, o CFN foi colocado na condição de prontidão e ficou aguardando ordens, prontopara intervir. A Marcha pela Legalidade, desencadeada pelo Governador do Rio Grande

A operação militar,batizada deAlvorada, cheia deestórias enarrativas acercadas dificuldadesenfrentadas ao longodaqueles dias, foisintetizada no livro“A pé paraBrasília”, deautoria do CF (FN-Refº) Alfredo deSouza CoutinhoFilho, um dospioneiros da Recon,e que retrata,dentre outros, oespírito de equipe,a determinação, opreparo físico, opatriotismo e oentusiasmo dessabrilhante unidade. Opercurso total de1221 km foipercorrido do dia 27de março a 20 deabril de 1960.

Page 55: O Anfíbio - Edição Extra 2008

54 O ANFÍBIO • 2006

do Sul – Leonel Brizola, com o propósito de garantir a posse do seu cunhado – o Vice-Presidente João Goulart, foi o motivo dessa mobilização. O comando do III Exército, sediadoem Porto Alegre - RS, já havia dado o apoio ao Governador Brizola.

Foi desencadeada a Operação “Abelha”, planejamento que tinha como tarefa prin-cipal o desembarque, que não se realizou, de tropas no litoral de Santa Catarina.

A Recon, em particular, recebeu a ordem de saltar na Área do Morro do Cavalo, nolitoral de Santa Catarina, entretanto, acabou desembarcando no aeroporto deFlorianópolis, até então dado como conquistado pelas forças egressas do Sul. Sua tarefaprincipal era, após o salto, estabelecer posições que permitissem retardar o movimentode outras tropas provenientes do Sul, a cavaleiro da atual BR-101, ganhando o temponecessário para a chegada e o posterior desembarque das tropas do Rio de Janeiro.

O Batalhão Riachuelo, por sua vez, embarcou e foi deslocado para o litoral sul dopaís. Ao chegar ao local previamente designado, a tropa se preparou para desembarcar eficou aguardando ordens. Entretanto, o desembarque não ocorreu, o impasse gerado en-tre contendores foi resolvido sem a necessidade de emprego militar.

Embora não seja o escopo deste trabalho, não é demais comentar que esta operação,ocorrida poucos anos depois da criação das primeiras unidades operativas do CFN, e quedela participaram, foi a primeira onde a tropa embarcou para realizar uma operaçãoanfíbia real, materializando uma das tarefas básicas do Poder Naval – Projetar podersobre terra –, e contribuindo para o aumento da capacidade da Marinha do Brasil deintervir na solução de problemas de natureza político-militar.

A crise foi resolvida com a emenda à Constituição Federal que alterou o sistema deGoverno para Parlamentarismo, e que garantiu a posse de João Goulart como Presidenteda República, e a do Sr. Tancredo de Almeida Neves como Primeiro Ministro.

Não menos importante, embora não tendo atuado como subunidade constituída,cabe mencionar a participação da Cia Recon na República Dominicana, nos anos de 1965e 1966, integrando, com um pelotão completo, o terceiro dos grupamentos de FN da ForçaInteramericana de Paz (FIP). Na oportunidade, realizaram, fora do contexto militar rei-nante, cursos e saltos com as unidades do Exército americano, lá estabelecidas.

No campo dos exercícios interaliados, a Cia Recon participou, ativamente, comunidades homólogas do USMC, das Operações VERITAS (1968 a 1975), CARIBREX (1977)e READEX (1978 e 1980), desenvolvidas na Ilha de Vieques, em Porto Rico. A famosa“penca de navais”, uma técnica de inserção e extração de militares, talingados em umúnico cabo, empregada em áreas onde não é possível o pouso de helicópteros, é um exem-plo da troca de experiências nesses exercícios.

EQUIPE DESALTO LIVRE

Os saltos da Reconeram realizados emdiversas áreas do

Rio de Janeiro poucourbanizadas como a

região de SãoGonçalo (onde

existia umaeroclube) e Xerém.

Com a criação, em1966, da Base

Aeronaval de SãoPedro D’Aldeia, o

local passou,também, a serutilizado para

salto.

Page 56: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A COMPANHIA DE RECONHECIMENTO ANFÍBIO - “CIA RECON” - O PARA-QUEDISMO NO CFN 55

O curso de Salto Livre - primórdiosDando continuidade aos trabalhos de aperfeiçoamento dos integrantes da Cia Recon,

no ano de 1961, foi criado o Curso Básico de Salto retardado no CFN, que logo passou a serchamado de Salto Livre, e que até então não havia sido realizado pelas Forças Armadas. Ocurso, por ocasião dos lançamentos, contou com o concurso dos helicópteros da nossaMarinha, muitos deles pilotados por aviadores navais oriundos do CFN, como os entãoCC (FN) Carlos de Albuquerque, Helson Lino da Costa, Nelson Louzada Maia e José Antô-nio Martins Alves. Isto porque já existia, nessa época, o impasse junto à Aeronáutica porcausa da aviação naval, o que passou a influir, sobremaneira, na restrição de aeronaves daForça Aérea para salto de nossos Pára-quedistas. Por diversas vezes, visando burlar asperseguições, por parte da FAB, ao pessoal da Marinha do Brasil, nossos Pára-quedistas seinscreveram nos manifestos de vôo como se fossem militares do EB. Necessário se torna,no entanto, esclarecer que esse artifício foi proposto pelo então Coronel Aviador DélioJardim de Matos, então Comandante do Grupo de Transporte Tático (GTT), unidade aérearesponsável pelos lançamentos da tropa pára-quedista.

Desavenças à parte, é interessante citar que, desde os primeiros saltos da nossaRecon, sempre existiu, no CFN, uma preocupação em diferenciar o emprego do Pára-quedista Fuzileiro Naval do seu homólogo no EB, haja vista a sua destinação militar. AoFN interessava realizar saltos, em áreas próximas à região de conflito, para obter, primor-dialmente, infor-mações, e nãopara combaterdiretamente como inimigo. Paraisso, era necessá-rio ser infiltradosem ser notado, o que não é adequado com o salto enganchado. Foi assim que surgiu anecessidade de realização do Salto Livre, atividade essa que nasceu com o CFN e maistarde foi utilizada, também, pelo EB. Entretanto, o emprego da Cia Recon, com este fim, sófoi implementado dentro de um contexto de operação anfíbia nos anos setenta.

A orientação técnica para a realização do curso de Salto Livre foi prestada por umsuíço, residente no Brasil, o Sr. Henry Auguste Cotting, o qual foi contratado mediantepagamento com recursos de caixa de economias. Cotting, além de se dizer um antigoparticipante da resistência francesa durante a 2ª GM, conseguiu conquistar a confiançados nossos grandes pioneiros.

Na realidade, essa contratação foi decorrente dos contatos havidos com o Sr. CharlesAstor (francês que havia sido membro da Legião Estrangeira e maquis na 2ª GM), instru-tor de Pára-quedismo na Escola de Aeronáutica, então sediada no Campo dos Afonsos.Naquela ocasião, o CT (FN) Souza Coutinho havia ajudado na instrução dos cadetes do 3ºano, a convite de Charles Astor.

A ousadia desses Pára-quedistas era realmente imensurável. Os equipamentos uti-lizados pelos primeiros componentes da Recon foram os antigos “T-7”, inicialmente fi-nanciados, em parte, pelos próprios Pára-quedistas. Eram pára-quedas descarregados12

do EB, que os substituíram pelos modelos “T-10”, mais modernos.O modelo “T-7” era um pára-quedas que tinha uma superfície vélica mais reduzida,

e sem nenhum orifício para a passagem do vento. Sua abertura produzia um tranco noPára-quedista, correspondente a uma pancada superior a 300 quilogramas, distribuídaem seis pontos do corpo humano, o que provocava, por alguns instantes, uma perda dossentidos no combatente. Com pequenas modificações de bandeja e punhos, além de umpára-quedas piloto, eles foram adaptados para a realização do Salto Livre e por issotiveram a sua nomenclatura oficial alterada para “B-8”. Essas adaptações foram realiza-das, também, com a assessoria técnica do Sr. “Cotting”.

O primeiro curso de Salto Livre, concluído em março de 1961, teve como partici-pantes concludentes os seguintes oficiais: Alfredo de Souza Coutinho Filho, LudovicoMarques, José Miliauskas, Danilo Pinto Montenegro e Uriburu Lobo da Cruz.

Desde então, a Cia Recon passou a ministrar o curso de Salto Livre para todos osPára-quedistas do CFN e, mais tarde, para os Mergulhadores de Combate (MEC).

A ousadia desses pára-quedistas era realmente imensurável.Os equipamentos utilizados pelos primeiros componentes daRecon foram os antigos “T-7”, inicialmente financiados, emparte, pelos próprios pára-quedistas.

Page 57: O Anfíbio - Edição Extra 2008

56 O ANFÍBIO • 2006

A história do “pé-preto”A participação da Cia Recon em eventos nacionais, como a Marcha para Brasília,

contribuiu para que ela viesse a ganhar notoriedade no seio do CFN e da Marinha deGuerra, tanto que, em 9 de setembro de 1960, o Ministro da Marinha, pelo Aviso nº 1.495,autorizou o uso dos uniformes, em caráter experimental, do coturno de Pára-quedista,para os Cabos e Soldados da Cia Recon. Pelo mesmo instrumento, determinou ao Coman-do-Geral, propor em 60 dias, modificações no Regulamento de Uniformes da Marinha doBrasil, para os Oficiais e Sargentos da Cia Recon.

Foi uma distinção para os componentes da Recon. Até então, embora todos osFuzileiros Navais da força operativa já usassem o coturno marrom (de fivela, e depois deoutro modelo), esse era de um tipo diferente ao do Pára-quedista (boot marca Corcoran deprocedência americana). Posteriormente, uma fábrica brasileira, a Santa Helena, desen-volveu um coturno semelhante ao americano, o qual era vendido na cantina do CICFN,embora não estivesse regulamentado o seu uso.

Por força de herança trazida do EB, onde militares não Pára-quedistas, ou em fasede formação desse curso, são jocosamente chamados de “pé-preto”, os elementos da Cia

Recon, passaram a cha-mar, também, os de-mais Fuzileiros Navaisdessa forma. Até a ca-dela “Tequila”, masco-te da Cia Recon, ataca-va os navais “pés-pre-tos” que se aventuras-

sem a ir à Praia Grande, embora estivessem com coturnos marrons. A regalia concedidaaos Pára-quedistas FN deu origem, naturalmente, a descontentamentos.

O uso do “boot” marrom diferenciado, só para o pessoal da Recon, teve vida curta.Evitamos, a tempo, a criação de uma tropa de elite dentro de outra – o CFN – o que geradesavenças e até indisciplina no trato com os colegas da corporação. A “inveja” causada nosoutros FN e as confusões, muitas vezes geradas pela crença de superioridade por não ser um“pé-preto”, cujas conseqüências chegaram aos anos 70, fizeram com que o “boot” marromdiferenciado passasse a ser utilizado por todos os Fuzileiros Navais.

Os “Para-rãs da Marinha”Embora tenhamos dado ênfase à atividade do Pára-quedismo, é importante men-

cionar que, paralelamente, parte dos componentes da Recon adestrava-se e aperfeiçoava-se nas tarefas de mergulho e demolições submarinas.

A segunda forma de inserção no campo de batalha era, também, essencial no em-prego operacional da unidade. Os ensinamentos básicos, visando o preparo dos militaresnessa atividade, foram adquiridos, inicialmente, de forma precária e na forma de está-gios, na própria Cia Recon. O então 1º Ten(FN) Francisco Sergio Bezerra Marinho, primei-ro Oficial FN a completar o Curso de Escafandria – EK 13 (mestre mergulhador – turma I/1959) da Marinha do Brasil e em seguida, o Curso de Mergulhador 1ª classe (turma I/60),conduziu esses estágios.

Posteriormente, os FN passaram a freqüentar o Curso de Mergulhador Autônomo(CMAut), ministrado nas instalações do atual Centro de Instrução e Adestramento Almi-rante Áttila Monteiro Aché (CIAMA), com o concurso dos profissionais do mergulho naMB. A partir de então, como Mergulhadores oficiais da Marinha, os militares da Reconpassaram a cumprir tarefas operativas de infiltração de elementos de reconhecimento apartir do mar. Recorrendo a documentos e relatórios passados, é possível encontrar foto-grafias de militares, dessa unidade, saltando equipado com “aqualung”, ora com o pára-quedas, ora a partir de helicópteros, este a 10 pés do nível do mar.

É importante citar que, até hoje, o CIAMA planeja e controla o cumprimento doPlano de Prova de mergulho para todo o pessoal da Marinha e de forma análoga, desdea sua criação, que a Companhia de Reconhecimento Anfíbio passou a ser o Centro deExcelência para o controle das atividades de Pára-quedismo no âmbito da MB, cabendo asi a responsabilidade do controle cerrado dos Planos de Provas de saltos14 .

O primeiro Oficial FN Pára-quedista a concluir o Curso de Mergulhador no atual

Para a complementação do curso Básico de Pára-quedista, foi imperiosa a utilização parcial daárea de estágio da Brigada Pára-quedista paraexercícios e adestramentos em outros tipos deequipamentos, da qual não dispúnhamos.

Page 58: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A COMPANHIA DE RECONHECIMENTO ANFÍBIO - “CIA RECON” - O PARA-QUEDISMO NO CFN 57

CIAMA, foi o então CT (FN) Ludovico Marques (1962 – 1º lugar). Nos anos seguintes, até oinício da década de 70, sem a obrigatoriedade de ser Pára-quedista e servir na Recon após ocurso, vários oficiais FN realizaram o CMAut. Dentre eles destacamos: CT (FN) Jayme CésarGerin Guimarães (1965); CT(FN) Ronald Cavalcanti Ledo (1965); 1º Ten(FN) Marcelo GayaCardoso Tosta (1968); 2º Ten (FN) Carlos Alberto Beda Campos (1969 - 1º lugar); 1º Ten HelioZeitune (1969); 1º Ten(FN) Nelson Luiz de Carvalho Souto Jorge (1970); e 2º Ten(FN) César daSilveira Couto (1970). Nos anos subseqüentes, tornou-se obrigatório ser Pára-quedista pararealizar o CMAut.

Durante muitos anos, até o surgimento dos MEC na Marinha, a Recon realizouinúmeras tarefas na área do mergulho, tanto operacionais quanto de cunho humanitário,que engrandeceram o nome da Marinha do Brasil e dos “Para-rãs” da Marinha, capazes derealizar tarefas como a escalada do Pão de Açúcar, salvamento e resgate em desastresaéreos na Baía de Guanabara e muitas outras, as quais faremos pequenas referênciasneste trabalho e que, com certeza, preencheriam mais um capítulo na história da CiaRecon.

Os cursos de Pára-quedismo na MBAté 1969, o CFN formou os seus Pára-quedistas com a colaboração do EB, inicial-

mente, no Núcleo da Divisão Aeroterrestre e, posteriormente, no Centro de InstruçãoAeroterrestre General Penha Brasil. O CFN enviava militares para o EB para realizar osseguintes cursos:

· Curso Básico de Pára-quedismo;· Curso de Mestre de Salto;· Curso de Dobragem e Manutenção e Suprimento de Pára-quedista (DOMPSA)15 ; e· Curso de Precursor Aeroterrestre. 16

Realizar o Curso Básico, ainda como Oficial Subalterno e, a partir daí, iniciar todo umprocesso de adestramento e de especialização no âmbito da tropa pára-quedista era o quepoderíamos denominar de “caminho natural” para se tornar um Oficial Pára-quedista noCFN. O mesmo procedimento era utilizado com as praças, a partir da graduação de 3º Sar-gento. Esse caminho incluía, também, o Curso de Mergulhador Autônomo da Marinha.

Entretanto, por questões administrativas, a partir de 1970 houve indisponibilidadede vagas para o Corpo de Fuzileiros Navais nos cursos da área de Paraquedismo no EB, oque perdurou até 1975.

Nesse intervalo de tempo, em 1971, alguns oficiais do CFN, que há muito tempocomungavam da idéia de criação de uma unidade operativa, voltada para a realização deoperações especiais, tiveram, em parte, os seus sonhos realizados. Em 9 de setembro17

desse ano foi criado o Batalhão de Operações Especiais (BtlOpEsp) – Batalhão Tonelero,que, entretanto, tinha a organização de um batalhão de infantaria. Chegou-se até a co-mentar que ele seria o quarto Batalhão de Infantaria do CFN, típico da organização dosRegimentos de Infantaria do USMC em um determinado período.

O BtlOpEsp foi instalado na área do Guandu do Sapê, em Campo Grande, ocupan-do, em 7 de março de 1972, as instalações do Centro de Recrutas do CFN, que havia sidotransferido para a Ilha da Marambaia.

Diante da necessidade de formação de Pára-quedistas e da possibilidade de realiza-ção desse tipo de curso na área do BtlOpEsp, o então Comandante-Geral do CFN, Vice-Almirante (FN) Roberval Pizarro Marques pleiteou, junto à administração naval, a reali-zação, nessa área, de cursos daquela natureza, visando suprir a lacuna de pessoal que seformava.

Assim, em 5 de fevereiro de 1973, o Ministro da Marinha, Almirante-de-EsquadraAdalberto de Barros Nunes criou os seguintes cursos:

· Mestre de Salto – oficializado pelo Aviso ministerial nº 0111; e.· Básico de Pára-quedista – oficializado pelo Aviso ministerial nº 0112.No curso de Mestre de Salto, podia-se notar, no seu propósito, habilitar os Pára-

quedistas de combate a executar tarefas como:· Comandar lançamento de equipes de Pára-quedistas, de aeronaves em vôo, em

proveito de uma Força de Desembarque; e,· Responsabilizar-se pelo embarque de pessoal, material, em aeronave, no cum-

primento das diversas missões necessárias a uma Operação Anfíbia (OpAnf).

Page 59: O Anfíbio - Edição Extra 2008

58 O ANFÍBIO • 2006

O Curso Básico de Pára-quedista habilitava o militar que o concluísse a executarsalto com pára-quedas de aeronaves em vôo, propiciando a aplicação da técnica do pára-quedismo às OpAnf. Integrado em equipes, o militar estaria apto a realizar, dentre outras,as seguintes tarefas:

· Executar reconhecimentos terrestres litorâneos em proveito de uma OpAnf;· Executar a escolha, preparação e balizamento das Zonas de Desembarque (ZD) e

ZL, bem como a orientação das aeronaves para essas áreas, na condução de envolvimentosverticais em uma OpAnf;

· Executar o suprimento aéreo leve para frações isoladas, ou atuando em profundi-dade em uma OpAnf; e

· Executar a dobragem e manutenção dos equipamentos de salto.A atribuição dessas tarefas buscava preparar o Pára-quedista FN para o cumpri-

mento de uma missão diferenciada daquela atribuída ao Pára-quedista do EB. A segundatarefa era típica de precursores de vagas helitransportadas, sendo uma parte do curso dePrecursor Aeroterrestre do EB. As duas últimas foram extraídas do curso DOMPSA, eincluídas para dar aos Pára-quedistas FN as noções básicas de suprimento aéreo, dedobragem e manutenção de pára-quedas, dentro do enfoque necessário ao nosso CFN.

Apesar da criação desses cursos em 1973, estes só vieram a ser realizados no anoseguinte, nas instalações do BtlOpEsp. Para isso, foi necessária a construção de uma áreade estágio no aquartelamento desse batalhão, que envolveu custos e um árduo trabalho.

A área de estágio construída não era completa. Nela podia-se encontrar a torre desalto e o falso avião. Faltavam ainda alguns itens necessários para a realização integraldo curso, que acabaram por não ser construídos (como o galpão de aparelhos e a pista decabos). A inauguração da área, embora incompleta, ficou marcada pela participação doAlmirante Roberval que, junto com o CF(FN) Pinheiro, realizou um salto da torre, um decada bordo da suposta aeronave.

Para a complementação do Curso Básico de Pára-quedista, foi imperiosa a utiliza-ção parcial da área de estágio da Brigada Pára-quedista para exercícios e adestramentosem outros tipos de equipamentos, os quais o BtlOpEsp não dispunha.

O primeiro e único Curso Básico de Pára-quedista realizado na Marinha chegou aoseu final com 4 oficiais e 8 praças. Dentre os oficiais e instrutores participantes do mesmo,destacamos:Diretor do Curso – CF (FN) Geraldo de Abreu Pinheiro, Comandante do BtlOpEsp;Instrutor-chefe – CC (FN) Cyro Ferreira Felizola Zucarino;

CURSO DE PQTD DEMARINHA

(esq. para a dir.)Em pé

CB Ramires,CB Armando,

Ten(FN) Beltrão,CT(FN) Monteiro,CB Guimarães e3ºSG Martins

AgachadosCB Achilles,

Ten(FN) Delfino,Ten(FN)Roberto de

Carvalho,CB Cardoso,

3ºSG Wilson e3ºSG Valdelar.

Page 60: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A COMPANHIA DE RECONHECIMENTO ANFÍBIO - “CIA RECON” - O PARA-QUEDISMO NO CFN 59

Instrutores – CT (FN) José da Silva Almeida, Tenentes Anderson de Oliveira e Silva eAntônio Paulo de Oliveira Coelho; eOficiais-Alunos concludentes – CT (FN) Alvaro Augusto Dias Monteiro, 1º Tenentes (FN)Reinaldo Duarte Delfino, Roberto Nunes de Carvalho e Pedro Luiz Beltrão Marques.

Em 1975 o EB voltou a ceder vagas e no ano seguinte retornamos ao modo antigo deformação de nossos Pára-quedistas, encerrando assim esta página na história do CFN.

Evolução da Cia Recon como tropa anfíbiaPassados os primeiros anos de vida da Cia Recon, reconhecida, nos meios militares

e civis, por seus feitos nos anos 60, a unidade entrou na década seguinte sem ter definida,ainda, a sua missão. Com a criação da Companhia de Reconhecimento Terrestre, passa-mos a chamá-la no dia-a-dia de Cia ReconAnf, ou abreviadamente, ReconAnf.

A ReconAnf, naquele momento, apesar de vir cumprindo de forma profissionalsuas tarefas no campo militar, ainda estava mais voltada para a realização de demonstra-ções de Pára-quedismo e de atividades que, embora não tivessem relacionamento com asoperações anfíbias, serviram para aumentar o seu prestígio a nível nacional. A título deexemplo, relacionamos abaixo algumas das suas participações:

1959 – Em apoio à Companhia Álcalis de Arraial do Cabo, na instalação das tubu-lações de tomada de água fria, a 20 m de profundidade, para refrigeração das máquinas. OCFN recebeu da empresa Álcalis equipamentos modernos de mergulho como forma dereconhecimento;

1973 – Em apoio ao Departamento de Estradas e Rodagem (DER)-RJ, na desobstruçãodo leito do rio Guandu, com destruição de obstáculos rochosos na altura da cidade deJaperi, RJ. Ressalte-se que tal tarefa foi realizada em troca do arruamento, asfaltamento eiluminação da Ilha das Flores pelo Governo do Estado;

1973 – No resgate de corpos no acidente aéreo ocorrido em Ubatuba, SP (queda deaeronave de ligação e observação L-42 Regente da FAB, por ocasião de exercício do BtlHumaitá) – aonde veio a falecer o 1ºTenente (FN) Aristides Carlos Viot Pinheiro;

1977 – Em apoio ao 2º Distrito Naval, no reconhecimento, busca e resgate em sítiosarqueológicos Baía de Todos os Santos, como, por exemplo, os objetos do galeão Sacramen-to (século XVII), naufragado nas águas do Estado da Bahia18 ; e

1980 – Em apoio ao Comando da Flotilha do Amazonas, nas demolições submari-nas e desobstrução de obstáculos rochosos no Paraná do Cujubim e corredeiras do BemQuerer no Rio Branco para permitir a navegação fluvial dos navios da Marinha do Brasil,desde Manaus até a cidade de Boa Vista.

Podemos verificar que, durante muito tempo, as atividades com o emprego dopára-quedas e dos equipamentos de mergulho realizadas pela ReconAnf, eram,precipuamente, atividades-fim e não atividades-meio.

A unidade carecia de se ajustar e acompanhar o desenvolvimento do CFN que,passo a passo, incrementava a compra de novos equipamentos e a execução de exercíciosdesenvolvidos em cenários anfíbios. A inclusão da ReconAnf nesse cenário, responsávelque era por tarefas muito peculiares, esbarrava na falta de consistência de bases doutri-nárias, necessárias ao seu bom desempenho, e que se havia de adquirir e consolidar.

Não existia uma doutrina de emprego para a subunidade. Os poucos manuais queversavam sobre reconhecimento foram editados para uso na Escola de Guerra Naval,basicamente traduções de manuais americanos de emprego de forças em altos escalões,não sendo, portanto, úteis. A fonte de referência tinha que ser o USMC.

Este, por sua vez, tinha em sua organização a “Force Reconaissance Company” –a Companhia de Reconhecimento da Força, unidade que, quando empregadaoperativamente, ficava subordinada diretamente ao comando da Força de Desembar-que, provendo-a com informações de combate referentes, basicamente, à situação daspraias de desembarque pré-dia D e ao inimigo fora da cabeça-de-praia, ou sejam, tarefastípicas do “reconhecimento distante”.

A Marinha americana – “US Navy”, por sua vez, tinha em sua organização umaequipe que também realizava tarefas de informações hidrográficas e de combate sobre asituação das praias de desembarque, porém, com áreas e tempos de atuação bem defini-dos em relação à “Force Reconaissance Company”. Chamava-se Equipe de DemoliçãoSubmarina, tradução de “Underwater Demolition Team” – UDT.

Page 61: O Anfíbio - Edição Extra 2008

60 O ANFÍBIO • 2006

Além dessas unidades, o USMC ainda tinha o Batalhão de Reconhecimento – “ReconBattalion”, que realizava as tarefas de “reconhecimento aproximado”, obtidas mais pró-ximas da linha de contato com o inimigo 19 .

Com a transferência da ReconAnf, da Ilha do Governador para a Ilha das Flores20 ,o controle de seu adestramento passou a ser realizado diretamente pela Seção de Opera-ções da TrRef, comando de Oficial-General. Administrativamente, ficou subordinada aoextinto Batalhão de Comando da Tropa de Reforço. Esta situação, embora atípica, contri-buiu em muito para acelerar o enquadramento da ReconAnf ao contexto anfíbio. Maistarde chegou-se à definição da Missão da subunidade, que passou, desde então, a ter asatividades de Pára-quedismo e Mergulho como atividade-meio. Um novo conceito deemprego mudava em cento e oitenta graus o adestramento da unidade.

Grande parte dessa mudança pode-se atribuir ao então comandante da ReconAnf,o CC(FN) Octavio Armando Lopes de Almeida e um de seus subordinados, na época o 1ºTenente (FN) César da Silveira Couto que, posteriormente, deu continuidade a esse traba-lho quando foi o comandante da ReconAnf. Com o empenho do Tenente Silveira Couto natradução e elaboração de manuais específicos para Reconhecimento, com base na doutri-na do USMC, e o incentivo e o suporte do Comandante Superior, a ReconAnf passoupaulatinamente a ter uma outra concepção de emprego.

Dizia o então Tenente Silveira Couto: “A questão maior era motivar a tropa para o cumprimento de uma missão específica

– trabalho este que exigia uma preparação física e mental extremamente difícil, sem oencanto e a natural motivação despertada pelo Pára-quedismo e o Mergulho autônomo”.

O novo tipo de adestramento passava, então, a ter como foco principal a realizaçãode patrulhas de reconhecimento de longo alcance, precedidas de diversos métodos e téc-nicas de inserção, para realização de tarefas noturnas sob condições extremas de sigilo erapidez. Para atender essas necessidades foram criados os Subprogramas de Adestra-mento de Reconhecimento (SPARECON), realizados em tempo integral na região da Ilhada Marambaia, São Pedro D’Aldeia e no Guandu do Sapê. O adestramento era difícil eexigia uma média mínima de 200 horas de patrulha anuais. Os SPARECON possibilita-vam a realização de patrulhas de longo alcance por até quatro dias e noites sem interrup-ção. Na ocasião, o enfoque mudou completamente e costumava-se dizer: “nos dêem bonsPára-quedistas e Mergulhadores, e nós veremos se eles podem ser bons elementos dereconhecimento anfíbio”.

Um SPARECON pioneiro exigiu o salto noturno operacional 21 de grande altitudecom abertura a baixa altitude. Ainda que sem o equipamento HALO (“High Altitude LowOpening”) adequado, em 1976, duas Equipes ReconAnf foram lançadas com sucesso noque seria o primeiro salto livre noturno operacional realizado por uma força militar noBrasil.

A integração da ReconAnf no contexto das operações anfíbias passou a ser primor-dial e, sobretudo, imprescindível. Ainda antes do surgimento dos MEC, atuando em pe-quenas equipes de até quatro militares, realizava tarefas de demolição pré-dia D e levan-tamento das condições de arrebentação (O SUROB – “Surf Report Observation”) naspraias de desembarque, e provia o Comando da Força Tarefa Anfíbia com informaçõessobre a movimentação, valor e posição do inimigo fora da Cabeça-de-Praia. Surgiram asmensagens padronizadas, as redes de comunicações específicas para reconhecimento etc.O pára-quedas e o equipamento de mergulho passaram a ser, como é fácil depreender,meros auxiliares na forma de inserção da tropa no TO.

Cursos no estrangeiro e emprego de novas técnicas eequipamentos

A Recon, como vimos ao longo desta narrativa, levou um certo tempo até seenquadrar nos cenários anfíbios. Para isso fez-se necessário, além do adestramento diá-rio, visando melhorar o seu desempenho operacional, a busca de novas técnicas e oacompanhamento do estado da arte nesse mister, aí incluído os pára-quedas, os equipa-mentos de comunicações (rádio e antenas), os equipamentos para saltos a grandes altitu-des (vestimentas e aparelhos de respiração), embarcações (casco rígido e pneumáticas),motores de popa, equipamentos de mergulho etc. É digno de nota registrar, pelo menos oemprego pela ReconAnf, de novas técnicas de ensino, como o uso de equipamentos de

Page 62: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A COMPANHIA DE RECONHECIMENTO ANFÍBIO - “CIA RECON” - O PARA-QUEDISMO NO CFN 61

vídeo, da realização de cursos no estrangeiro, e da uti-lização de modernos equipamentos militares de Pára-quedismo.

Na década dos anos 80, o Curso de Salto Livre,criado em 1961, continuava a ser conduzido pela CiaReconAnf. Entretanto, um pouco diferente, em termosde técnica de ensino, do que fora realizado no passado,onde os instrutores, com base na observação distante,comentavam os saltos dos alunos, corrigindo as even-tuais falhas. Em 1984, foi implementada a técnica defilmar os saltos em equipamentos VHS. A introduçãodo vídeo melhorou a condução do Curso de Salto Li-vre, isto porque o aluno passou a ver na tela os seuserros e, dessa forma, tinha condição mais favorável dese corrigir por meio de treinamentos em terra, aumen-tando a sua motivação e concorrendo para um melhoraprendizado.

No tocante a cursos, em 1988, o Capitão-Tenen-te (QC-FN) Borges, foi designado para realizar, nosEUA, o “Amphibious Reconnaissance Course”, cursoministrado pela “Amphibious Reconnaissance School”localizada em “ Fort History”, no estado da Virginia.

O curso foi de extrema valia para o CFN, poispermitiu constatar a utilização, por parte do USMC,de técnicas bastante semelhantes às usadas pela CiaReconAnf, além de trazer novos ensinamentos para asnossas unidades e cursos similares. Dentre os diver-sos assuntos ministrados, destacam-se instruções delevantamento hidrográfico, SUROB, reconhecimentode praia, patrulhas de reconhecimento e fotografia parao reconhecimento, dentre outros. Ao longo dos últi-mos anos, o CFN tem enviado oficiais aos EUA pararealizar esse curso.

No tocante ao pára-quedas, no que diz respeito ao emprego de novos equipamentose novidades no salto militar, vale a pena recordar o primeiro emprego da técnica denavegação com velame aberto utilizando o equipamento HAHO (“High Altitude HighOpening”). O pioneiro neste tipo de salto, realizado a 13.000 pés de altitude, foi, o então CT(QC-FN) Borges, em 24 de janeiro de 1985, durante o Curso de Salto Livre em Maxaranguape,uma Zona de Lançamento próxima à cidade de Natal - RN. Tudo aconteceu, mais por umaousadia desse militar da Recon, pois o evento não estava previsto. “Coisa de Pára-quedista”como eles mesmos dizem.

Ele acreditava que seria possível navegar com um velame do tipo colchão de ar(chamado de quadrado ou asa), abrindo o pára-quedas logo após sair da aeronave e nave-gar grandes distâncias. O relato abaixo é do próprio Comandante Borges.

“Eu já era um Pára-quedista experiente, com centenas de saltos, e defendia a tese deque nós poderíamos realizar esse tipo de salto. A Recon acabara de receber um equipa-mento de procedência americana, cuja nomenclatura é MT-1, o primeiro pára-quedas dotipo colchão de ar para emprego militar. Seu manual especificava que ele poderia serempregado tanto na condição de HALO quanto de HAHO. Em sendo uma novidade, énatural que houvesse reações de alguns Pára-quedistas e dúvidas de outros. Eu acredita-va que era possível.

Maxaranguape era uma área de exercícios da FAB, com espaço aéreo interditado,com proibição de vôo local de aeronaves civis e, além disso, o terreno plano e a vegetaçãode pequeno porte permitiam a aterragem de emergência quase que em qualquer lugar.Somavam-se as condições meteorológicas favoráveis do local, vento e nebulosidade.

Após os alunos e instrutores saltarem da aeronave, conforme planejado, o C-115 –Búfalo, da FAB, regressou para Natal. Eu já havia realizado os cálculos necessários epermaneci na aeronave em vôo por dez quilômetros, quando saltei e comandei o pára-

Comandantes da Cia ReconAnf

1º CT (FN) Sebastião Gimenez ..................................... 13/02/582º CT (FN) Clinton Cavalcante de Queiroz Barros ... N/C3º 1º Ten (FN) Jader de Jesus Coutinho ...................... N/C4º CT (FN) Claus Romo Von Glasenapp .................... N/C5º CT (FN) João Alves Grangeiro Filho ...................... N/C6º CT (FN) José Miliauskas .......................................... N/C7º CT (FN) Reynaldo Carceroni ................................... N/C8º CT (FN) Octávio Armando Lopes de Almeida ..... N/C9º CT (FN) Otto Carlos Brasil de Resende ................. N/C10º CT (FN) José da Silva Almeida ................................ N/C11º CT (FN) Alfredo Sinay .............................................. N/C12º CT (FN) Cesar da Silveira Couto ............................ N/C13º CC (FN) Alfredo Sinay ............................................. 09/03/7814º CT (FN) Alvaro Augusto Dias Monteiro ............... 02/08/7915º CC (FN) Reinaldo Duarte Delfino ........................... 04/02/8016º CC (FN) Roberto Nunes de Carvalho..................... 01/03/8317º CC (FN) Cezar Esperança Mattoso ........................ 21/05/8418º CC (FN) Celso Soares Lopes ................................... 31/01/8619º CT (FN) Frederico Ayres P. Correa da Silva ....... 05/04/8820º CC (FN) Wellington de Oliveira Cunha ................. 21/03/9021º CT (FN) Ricardo de Carvalho Borges ..................... 01/01/9122º CC (FN) Cleber Ribeiro Afonso ............................... 30/04/9123º CC (FN) Ricardo de Carvalho Borges .................... 09/03/9224º CT (FN) Fernando José A . Ferreira de Sousa ....... 18/02/9325º CT (FN) Elias Sampaio Freire .................................. 27/01/9426º CT (FN) Paulo Cesar Huttner Borges ..................... 30/06/9527º CC (QC- FN) Nelson Cangellar Junior .................. 18/04/9628º CC (FN) Fernando José A . Ferreira de Sousa ....... N/C29º CC (QC- FN) Nelson Cangellar Junior .................. N/CN/C – Não computado

Page 63: O Anfíbio - Edição Extra 2008

62 O ANFÍBIO • 2006

quedas. Naveguei com o velame aberto por cerca de 15 minutos e aterrei no alvo, parasurpresa de todos que estavam na ZL.”

A partir de então, iniciou-se o adestramento neste tipo de salto. Foi mais um marcona história da Recon, pois adquirimos uma capacitação operacional no emprego do equi-pamento HAHO nas técnicas de infiltração com velame aberto.

Ainda no tocante ao pára-quedas, apesar do equipamento HALO fazer parte doinventário da Recon desde a década dos anos 70, somente em 24 de outubro de 1986 é queesse equipamento foi empregado no salto livre operacional a grande altitude. O pioneironesse tipo de salto foi, também, o CT (QC-FN) Borges. O evento foi diurno e ocorreu na ZLde Itaguaí, RJ, em exercício conjunto com pessoal do EB e o “Special Team” da “UnitedStates Air Force” (USAF). Nessa ocasião, foi utilizado uma aeronave C-141 – “StarLifter”da USAF. O salto foi realizado pela rampa, empregando equipamentos de respiração deoxigênio do EB. Anos mais tarde, na década de 90, o CFN recebeu material moderno pararespiração a grande altitude, quando foi retomada a instrução neste tipo de salto, com osoficiais e praças da ReconAnf.

A extinção da Cia ReconAnfA ReconAnf, como vimos, ganhou força e reafirmou-se, doutrinariamente, depois

de seu emprego em cenários anfíbios, que tanto buscara o CFN. Entretanto, desde acriação do Batalhão de Operações Especiais, pairava no ar a idéia da sua incorporaçãoa esta unidade. Algumas vezes essa idéia minava no próprio batalhão, comandadodiversas vezes que fora, por Oficiais Pára-quedistas, outras, por influências de Oficiaisde Estado-Maior, que achavam adequado congregar, em uma mesma unidade, elemen-tos de reconhecimento anfíbio (no CFN tratado como uma operação especial) e de co-mandos anfíbios.

Durante a década dos 80, foram realizados vários estudos para avaliar as vanta-gens e desvantagens daquela incorporação. Entretanto, por alguns anos a decisão foiprotelada.

Enfim, por força da reestruturação promovida no âmbito do CFN, a Companhia deReconhecimento Anfíbio teve de abandonar o seu aquartelamento na Ilha das Flores epartir para o Guandu do Sapê. Ela foi transferida e incorporada ao BtlOpEsp no dia 1º dejaneiro de 1991, passando os seus integrantes, ao longo dos anos que se seguiram, a fazerparte de uma das Companhias de Operações Especiais 22 .

A reestruturação por que passou o CFN decretou, portanto, a extinção da CiaReconAnf. Seu espírito, entretanto, permanecerá vivo, pois a história e os feitos de bravoscombatentes anfíbios, muitos dos quais perderam a vida no cumprimento do dever, nãose apagam com atos administrativos. As modificações organizacionais são naturais e sefazem necessárias. É assim no dia-a-dia de forças militares que, diuturnamente, traba-lham para manter-se profissionais e atualizadas na arte da guerra.

Assim posto, e após esse breve retorno ao passado, conhecendo um pouco a históriados nossos Pára-quedistas e Mergulhadores, finalizamos rendendo nossas eternas home-nagens a todos os Militares da Marinha do Brasil, que contribuíram, direta ou indiretamen-te, para o sucesso da Recon e, principalmente, àqueles que um dia tiveram a honra de vestira camisa da saudosa Companhia de Reconhecimento Anfíbio do CFN.

Em qualquer lugar, em qualquer terreno, sob quaisquer condições.ADSUMUS

Referências Bibliográficas:1. ADORNO, Ly, Ser Pára-quedista – 50 anos de pára-quedismo no Brasil –1945/1995 – Rio

de Janeiro: Dez 1995.2. BRASIL, Batalhão de Engenharia, Livro Histórico da Unidade.3. _______, Batalhão de Operações Especiais, Livro Histórico da Unidade.4. _______, Ministério da Marinha, Boletim nº 11, de 11 de março de 1958, página 1629;5. _______, Centro de Instrução e Adestramento Almirante Áttila Monteiro Aché (CIAMA),

Livro de registro de notas dos cursos de Mergulho de 1954 a 1995;6. _______, Exército Brasileiro, 27º Batalhão de Infantaria Pára-quedista. Histórico. Dis-

ponível em http:exercito.gov.br/060Ms/Infantar/Batalhao/BI/27bi/indice.htm Acesso em04 ago.2005

Page 64: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A COMPANHIA DE RECONHECIMENTO ANFÍBIO - “CIA RECON” - O PARA-QUEDISMO NO CFN 63

7. _______, O Anfíbio nº 38, Jan/Fev 1961 (Divisão Aeroterrestre).8. _______, Tropa de Reforço da FFE, O Anfíbio, Jul/Out 1965;9. _______, Etapas decisivas, O Anfíbio – Edição Especial, Mar 1988. (pág 47 e 58).10. CANTÍDIO, Luiz Carlos da Silva, O Combatente Anfíbio, O Anfíbio nº 12, Ano XIII,

1992.11. CARCERONI, Reynaldo, Adestra-se a Tropa de Reforço, O Anfíbio Dez 1969.12. COUTINHO FILHO, Alfredo de Souza, Alocução proferida no primeiro aniversário da

Cia Recon, 1959.13. _______, Alfredo de Souza, A pé para Brasília: crônica de uma marcha – Rio de Janeiro:

Relume Dumará, 2004.14. Notícias do Exército. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 15 de fev. 1958.15. TELLES RIBEIRO, Leônidas, Palestra sobre a Força de Fuzileiros da Esquadra – Impren-

sa Naval, 1962.

Entrevistas:Vice-Almirante (FN) Alvaro Augusto Dias MONTEIRO em novembro de 2004CMG(FN-Refº) – CLINTON Cavalcante de Queiroz Barros – em abril de 2004CMG(FN-Refº) – JADER de Jesus Coutinho – 3 de dezembro de 2004CMG(FN-Refº) – Danilo Pinto MONTENEGRO – em 5 de agosto de 2005CMG(FN-Refº) – URIBURU Lobo da Cruz – 6 de outubro de 2004CMG(FN-Refº) – Ludovico MARQUES – 3 de dezembro de 2004CMG(FN-Refº) – José MILIAUSKAS – 3 de dezembro de 2004CMG(FN-RM1) – Cesar da SILVEIRA COUTO – em 11 de março de 2005CMG(FN-RM1) – Ricardo de Carvalho BORGES – em 2 de agosto de 2005CF(FN-Refº) – Alfredo de SOUZA COUTINHO Filho – 18 de maio de 2004CT(A-FN-Refº) – MANOEL Pereira da Silva – em março de 2005

1. CMG (FN-RM1) Silveira Couto durante entrevista.2. Transformadas mais tarde em Grupamentos de Fuzileiros Navais.3. Essas Embarcações de Desembarque ficaram, até 1963, concentradas no CICFN, sob a denominação de

Grupo Anfíbio (na realidade Divisão de embarcações, do Departamento de Manutenção), quando entãoforam transferidas para a Ilha de Mocanguê.

4. Mudou sua denominação, em 8 de março de 1957, para Centro de Recrutas (atual CIAMPA).5. A instalação dessa subunidade se deu em 12 de fevereiro, data da chegada da primeira turma de praças

cursadas no 1º Batalhão de Engenharia de Combate do EB, em Santa Cruz. Entretanto, a sua data de criaçãoé de 1º de abril de 1958. Mais tarde integrou o Batalhão de Pioneiros.

6. Publicado no Diário de Notícias do Rio de Janeiro, em 15 de fevereiro de 1958 no setor Notícias doExército.

7. Na seqüência vieram as Operações Brisa (out 59), Corvina (nov 59), Arfagem (set 60) , Abelha (ago 61)e a série Dragão.

8. Cedidas, inicialmente, pela Companhia Escola e pelo CICFN.9. Têm-se notícias que, em um dos finais de semana que o Ministro da Marinha passou na residência oficial,

chamada Casa Branca, localizada na praia próxima a área de aquartelamento, como lhe era de costume,resolveu fazer uma caminhada pelo local e transitou sorrateiramente pelo amontoado de barracas, consta-tando a pobreza das instalações da tropa. Comentava-se que, os recursos monetários recebidos para asprimeiras construções, tenham sido conseqüência dessa caminhada.

10. Além do velho prédio recebido para aquartelamento, a Recon recebeu um pavilhão (Baiúca), que aospoucos foi adquirindo condições adequadas para a realização dos serviços de dobragem e manutençãodos pára-quedas; e um paiol, que com o tempo foi se organizando para a guarda do material de mergulho.

11. Durante esse período a Cia ReconAnf adquiriu a sua autonomia administrativa.12. A expressão “descarregados” significa: Colocados fora de uso por atingirem cinco anos de uso ou o limite máxi-

mo de 200 a 250 saltos.13. Em 1966 e 1967, o 2º Tenente (FN) Celso Blanco Dominguez e o 1º Tenente (FN) Otto Carlos Brasil de Rezende

concluíram, respectivamente, o curso de EK, que logo após, passou a ser exclusivo do pessoal da Armada.14. Hoje essa tarefa é executada pelo Batalhão Tonelero, unidade que em 1991 incorporou a Cia ReconAnf.15. O primeiro FN a cursar o DOMPSA foi o 3º Sargento (FN-IF) Manoel Pereira da Silva, hoje CT (A-FN-Refº).16. O primeiro FN a cursar este curso foi o Tenente (FN) Reynaldo Carceroni.17. Data que passou a ser comemorada como aniversário do Batalhão Tonelero.18. Parte do material resgatado encontra-se exposto no Espaço Cultural da Marinha no Rio de Janeiro.19. Tarefas cumpridas, no âmbito do CFN, pela Companhia de Reconhecimento Terrestre, a Cia ReconTer.20. Na mesma oportunidade, o recém-criado 3º Batalhão de Infantaria – Batalhão Paissandu, deixou as suas

instalações na Ilha das Flores e ocupou a área da Praia Grande, onde estava a Cia ReconAnf.21. Entende-se como salto operacional àquele em que o pára-quedista o realiza com o seu armamento

individual, mochila e outros equipamentos.22. O mesmo se deu com a Cia ReconTer, com a sua incorporação no dia 26 de março de 1996.

Page 65: O Anfíbio - Edição Extra 2008

64 O ANFÍBIO • 200 ANOS

REPÚBLICA DOMINICANA (1965-1966)CMG (RM1 - FN) Jaime Florencio de Assis Filho

A PARTICIPAÇÃO DA MARINHADO BRASIL NA FORÇAINTERAMERICANA DE PAZ

Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo ficou polarizado em torno dos vencedores, os EstadosUnidos da América (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).

A maioria das nações alinhou-se a uma das concepções políticas dessas potências hegemônicas,iniciando a denominada Guerra Fria, que traria, ao longo do tempo, conseqüências de ordem bélica emgrande parte do planeta.

Em 1959, Fidel Castro, com sua revolução a partir da Sierra Maestra, conquistou o poder em Cuba,localizada praticamente no quintal dos EUA, instalando o comunismo na ilha, perfilando-se ao lado da URSS.

A crise dos mísseis de Cuba, em 1961, que, por pouco, não desencadeou uma guerra nuclear, trouxeao Governo do Presidente Kennedy a preocupação constante em monitorar, de forma efetiva, tudo o que sepassava nas repúblicas americanas. Em particular, ficaram em permanente observação àquelas localiza-das mais próximas dos EUA, de modo a impedir-se, a tempo e a contento, uma nova Cuba, ou seja, acomunização de outro país no continente americano. Cuba já era demais para a política americana.

O assassinato, em 1961, do ditador Trujillo, na frágil República Dominicana (RD), permitiu a ascen-são ao poder, segundo a inteligência americana, de líderes de esquerda, que, mais cedo ou mais tarde,implantariam no país a tão decantada ditadura do proletariado. Antes que isso se tornasse uma realidade,em abril de 1965, os EUA intervieram naquela República, sob a alegação de proteger e evacuar os seuscidadãos, antes mesmo que a Organização dos Estados Americanos (OEA) obtivesse parecer favorávelpara intervir, dentro dos preceitos que regem a sua carta.

A crise, uma vez instalada, não permitiu uma outra solução, a não ser a criação de uma Força dePaz que, sob a égide da OEA, desembarcaria na RD com a tarefa de criar as condições favoráveis parao retorno da ordem e o estabelecimento de um governo democrático, legalmente escolhido por meio deeleições gerais e livres. O Governo brasileiro, consoante a decisão da X Reunião de Consulta dos Minis-tros das Relações Exteriores das Repúblicas Americanas, decidiu enviar tropa para integrar a Força Ar-mada Interamericana (FAI). A participação do Brasil, em particular da sua Marinha, é o tema abordadoneste ensaio, que relata, também, a fase que antecedeu a chegada das tropas da OEA.

Cabe ainda consignar que, quase quarenta anos depois, as referências bibliográficas deixam dúvidasquanto à realidade de muitos fatos. Fontes americanas reportam uma intervenção com a finalidade de defen-der a democracia e a integridade dos cidadãos americanos que se encontravam na ilha na época dos conflitos.As dominicanas alegam que, mais uma vez, o imperialismo americano fez-se presente, violando o princípio danão-intervenção, simplesmente por conta dos seus interesses, como já houvera acontecido no passado.

Matéria publicada no “O Anfíbio” nº 23 (2004)

Page 66: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A PARTICIPAÇÃO DA MARINHA DO BRASIL NA FORÇA INTERAMERICANA DE PAZ 65

ANTECEDENTESNa pequena ilha “Hispaniola”, descoberta em 1492

pelo navegador Cristóvão Colombo, habitavam, tão-somen-te, os nativos que, depois da aproximação dos espanhóis,foram dizimados por conta de epidemias trazidas do velhocontinente.

Com a vinda de escravos e a natural miscigenaçãocom os espanhóis, a população começou a definir-se, sendohoje a maioria formada por mestiços. Com a chegada dosfranceses, parte da ilha passou a ser colonizada por eles e,ao longo do tempo, o poder na ilha alternou-se entre espa-nhóis e franceses, até que no ano de 1795, com o Tratado deBasilea, a Espanha cedeu Santo Domingo à França. A ilhaficou em poder dos franceses até 1809, quando foi resta-belecido o governo espanhol. Posteriormente, o setor fran-cês da ilha tornou-se o Haiti. Em 1822, o Presidente haitianoJean Pierre Boyer ocupou o setor espanhol, anexando-o aoHaiti. Em 1845, Santo Domingo declarou sua independên-cia, constituindo-se na RD.

Entre 1861 e 1863, foi restabelecido o governo espa-nhol, porém uma intervenção dos EUA anulou a anexação.Em 1865, foi proclamada a Segunda República Dominicana.

Em 1906, devido ao grande endividamento, o Gover-no dominicano assinou um tratado com os EUA, permitindoque eles assumissem a administração e as finanças domini-canas e, em troca, ajustariam as obrigações financeiras ex-ternas do país. Distúrbios internos culminaram com o esta-belecimento de um governo militar da Marinha norte-ame-ricana, que ocupou o país em 1916. Somente em 1924, umGoverno constitucional assumiu o poder, pondo fim à ocupa-ção, mantendo, entretanto, a administração e o controleaduaneiro até 1941.

Em 1930, Rafael Leonidas Trujillo Molina assumiu opoder, governando a República Dominicana por mais de 30anos com mãos de ferro, ora pessoalmente, ora por meio de

seus prepostos, cometendo verdadeiras atrocidades, fazen-do-se reeleger por diversas vezes e, por último, colocandono poder seu irmão Hector Trujillo, tendo como vice Joa-quim Ballaguer, que assumiu o Governo logo em seguida,ante a renúncia de Hector.

As críticas da OEA à ditadura culminaram, em 1960,com uma resolução que exigia a ruptura das relações diplo-máticas com a RD. As pressões externas junto com a cres-cente oposição interna acabaram por derrubar Hector.

Os acontecimentos dos últimos anos de ditaduraculminaram com o assassinato de Rafael Trujillo, em 30 demaio de 1961, orquestrado por um grupo de oficiais do regi-me, com a ajuda dos organismos de inteligência dos EUA.Com a morte do ditador, sua família tentou manter o poder,entretanto, o Presidente Kennedy colocou a sua Marinha deprontidão e disse: “É hora de se estabelecer uma democra-cia na República Dominicana”. A era da família Trujillo es-tava encerrada.

Joaquim Ballaguer governou o país até o final de 1962,sob constante pressão para realizar eleições livres. Elas vi-eram a ocorrer sob a supervisão da OEA, na qual saiu ven-cedor, com cerca de 58% dos votos, Juan Bosch, escritor elíder do Partido Revolucionário Dominicano (PRD), um ho-mem de esquerda, segundo os americanos. Participaramdessas eleições 29 partidos políticos.

Bosch assumiu a presidência em 27 de fevereiro de1963, pautando suas ações de governo em apoio à popula-ção. No seu governo, foi aprovada uma Constituição demo-crática que consignava a distribuição racional da terra nasmãos dos campesinos. Atitudes como essa foram de encon-tro aos interesses políticos e econômicos da oligarquia localque, aos poucos, passou a identificá-lo como comunista e aconspirar contra o seu governo. Seu mandato durou ape-nas sete meses, pois, na tentativa de demitir o Coronel Elias

Os elementos de comando do GptFN do Brasilforam empregados para estruturar o comando doBatalhão Fraternidade

Page 67: O Anfíbio - Edição Extra 2008

66 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Wessin y Wessin1 , foi deposto e preso por chefes militares,que criaram e empossaram uma Junta Civil (Triunvirato),prometendo eleições gerais e livres para 1965. A Junta eracomposta por Emilio de Los Santos (Chefe), Manuel EnriqueTavares Espaillat e Ramon Tapis Espinal. Essa instabilida-de frustrou os verdadeiros patriotas que esperavamreconstituir o país após a morte de Trujillo. A insatisfaçãodo povo crescia dia-a-dia. O ambiente era propício ao cres-cimento dos grupos de esquerda.

O ano de 1964 começou com os sinais das ações deguerrilha do “Movimiento 14 de Junio” (de linha castrista,era o mais bem organizado grupo de esquerda), provocan-do a renúncia, em 3 de janeiro, de Los Santos. Em julho foi avez de Espaillat, que foi substituído por Donald Reid Cabral,que passou a governar efetivamente o país.

Dos vários partidos políticos existentes, dois foramdiscordantes e seis aprovaram um plano de elaboração deuma nova constituinte e de eleições para 1965. Os integran-tes do PRD defenderam a volta de Bosch ao poder. Aos pou-cos Donald, que vinha governando o país sem conturbaçõese contava com o apoio do Brigadeiro-General Wessin yWessin, foi perdendo sua popularidade, até mesmo, entreos militares.

Em janeiro de 1965, uma conspiração em marcha,envolvendo civis e militares, e as constantes greves e desor-dens projetavam mais uma crise na capital dominicana.Posteriormente, sob a alegação de que Donald pretendia,por ambições pessoais, suspender as eleições marcadas parasetembro e tornar-se ditador; no dia 24 de abril, o povo,civis e militares2 , foi às ruas e instaurou uma insurreiçãoarmada. Militares rebeldes entregaram suas armas aos ci-vis e abriram os arsenais de Santo Domingo. O Palácio Na-cional e a estação de rádio do Governo foram cercados. Tro-pas do Governo retomaram a rádio dos rebeldes, auto-intitulados “constitucionalistas”, integrados, basicamen-te, por oficiais mais jovens, grupos políticos de oposição ebaderneiros. Muitos deles esperavam que o movimento oslevasse de volta à situação democrática de 1963, outros,entretanto, eram comunistas e queriam o poder.

No dia seguinte, Donald, sem condições de continuarno poder, renunciou, pediu intervenção dos EUA e deixou oPalácio, que foi invadido e saqueado pela multidão. Sempresidente, os rebeldes empossaram José Rafael MolinaUreña3, até que Juan Bosch, que se encontrava no exílio,retornasse ao país. As tropas leais ao antigo Governoretornaram para San Isidro (local onde se concentravam asunidades militares dominicanas, uma espécie de vila mili-tar, destacando-se a Base Aérea e o Centro de Entrenamiento delas Fuerzas Armadas – CEFA) com alguns feridos e algumasperdas materiais.

Os legalistas reagiram contra a revolução e a nomea-ção de Molina Ureña e instituíram uma Junta Militar de Go-verno, chefiada pelo Coronel-Aviador Pedro Benoit. O Gene-ral Wessin y Wessin, comandante do CEFA, apoiou aquelaJunta. Enquanto isso, os rebeldes instalaram o seu centro deatividades na Ciudad Nueva e na Zona Norte da Capital,tendo como sua maior preocupação o bloqueio da ponteDuarte, sobre o Rio Ozama, isolando San Isidro, onde a mai-oria apoiava a Junta Militar, da área em poder dos rebeldes.

O Exército, com a adesão da Marinha e da Força Aé-rea, bombardeou, no dia 26, as áreas de posse dos rebeldes(Palácio Nacional, ponte Duarte, a Rádio e Televisão de San-to Domingo). As tropas do CEFA tentaram liberar a ponteDuarte, mas encontraram forte resistência.

A situação agravara-se, entretanto, os embaixado-res resolveram esperar um pouco mais antes de solicitaremajuda. O Presidente dos EUA, Lindon Johnson, colocou a82nd Airborne Division e os marines em alerta, e enviou umafrota para bloquear a ilha. Enquanto isso, os comunistascontinuaram armando o povo nas ruas e mantendo o con-trole sobre a massa popular.

Em resumo, com a deposição da Junta Governativa,duas facções opunham-se: a primeira, que colocou no poderMolina Ureña; e uma segunda, favorável à manutenção daJunta Militar para dirigir os destinos daquele país, até quepudessem assegurar a realização de eleições.

O chefe da primeira facção era o Coronel FranciscoCaamaño Denó, rebelde atuante que, mais tarde, foi procla-mado Presidente Constitucional da RD, ocupando militar-mente o centro de Santo Domingo.

A outra facção, chamada de Governo de Reconstru-ção Nacional, era chefiada por uma Junta Militar de Gover-no, presidida inicialmente pelo Coronel-Aviador PedroBartolomé Benoit. Posteriormente, visando a angariar po-pularidade, a Junta foi reorganizada, passando a ser consti-tuída por três civis e dois militares, sob a presidência doGeneral Antonio Imbert Barrera. O General Wessin y Wessinpassou a controlar quase que totalmente o Exército, a Mari-nha e a Força Aérea, e a dar apoio ao Governo de Reconstru-ção Nacional.

Os choques armados entre as duas correntes conti-nuaram a causar baixas, incêndios e danos materiais. Cres-cia o estado de tensão a todo instante, principalmente devi-do à aproximação de comunistas no Governo do CoronelCaamaño e a atuação de civis armados com tendências ex-tremistas e criminosas, praticando terrorismo, ações deguerrilha, assaltos, intimidações, roubos e outras ativida-des subversivas.

Molina Ureña, instalado no Palácio Nacional, nãotinha o menor controle da situação, enquanto isso a OEAesforçava-se para negociar um cessar fogo.

A INTERVENÇÃO AMERICANA E O DESEMBAR-QUE DE TROPAS

Em razão da evolução e do agravamento dos aconte-cimentos na RD, os EUA decidiram estacionar nas costasdaquela república uma Força-Tarefa que incluía, dentreoutros navios, o USS BOXER (LPH-4), um antigo porta-avi-ões transformado em navio porta-helicópteros, com maisde 1.500 fuzileiros navais a bordo.

De 24 a 27 de abril, a situação só havia deteriorado.Prevendo o fim do seu Governo, Molina Ureña renunciouno dia 27, deixando no seu lugar os verdadeiros“constitucionalistas”. Nesse mesmo dia, navios america-nos, atracados no porto de Haina, receberam a bordo cente-nas de americanos que foram evacuados.

A situação, entretanto, continuava incerta. Oslegalistas lançaram-se em combate contra os rebeldes, e aler-

Page 68: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A PARTICIPAÇÃO DA MARINHA DO BRASIL NA FORÇA INTERAMERICANA DE PAZ 67

taram que, a partir daquele dia, não teriam mais condiçõesde garantir a integridade dos cidadãos estrangeiros no país.

A regra do Presidente Johnson era clara. Sua inten-ção era evitar uma outra Cuba nas Antilhas, pois, nos úl-timos seis anos, o comunismo tinha tentado, por duas ve-zes, tomar o poder na RD. A mais notável delas em 14 dejunho de 1959 (daí o nome do movimento de esquerda),quando uma pequena força de guerrilha castrista tentouliberar a ilha, mas foi rapidamente esmagada. Em 1963, eletinha visitado o país, por ocasião da posse de Bosch, e perce-bera que, mais cedo ou mais tarde, o país cairia no domíniocomunista, a não ser que algo fosse feito enquanto o movi-mento estivesse ainda fraco.

No dia 28, o corpo diplomático reunido pediu garan-tias. O Coronel Benoit, Chefe da Junta, em vista da situaçãoreinante e considerando-se incapaz de conter a desordemgeneralizada, escreveu uma carta ao Embaixador dos EUAna RD, Willian Tapley Bennett Jr, solicitando uma interven-ção temporária visando a restabelecer a ordem no país.Retransmitida ao Presidente Johnson e complementada pelainformação de que “havia vidas americanas em perigo”,resultou na decisão do governo norte-americano de inter-vir na RD. Na noite daquele dia, 400 marines deslocaram-se,por helicóptero, para a cidade de Santo Domingo com o pro-pósito de proteger os cidadãos americanos. Na manhã se-guinte, já estavam em terra cerca de 530 fuzileiros. Ainda àtarde, outros mil fuzileiros desembarcariam para reforçaro primeiro grupo, e outras unidades deslocariam-se para aregião.

Enquanto os marines estabeleciam uma zona de segu-rança entre a embaixada americana e o hotel Embassador,onde vários refugiados haviam-se concentrado, os helicóp-

teros iam, aos poucos, retirando, em segurança, os civis dasembaixadas para bordo do BOXER, mais tarde transferidospara outros navios na cidade de San Juan, em Porto Rico. Oembarque dos civis realizou-se no campo de golfe do hotelEmbassador, que serviu de Zona de Desembarque de heli-cópteros.

Enquanto essas ações eram executadas, os combatescontinuavam na cidade. Os rebeldes atiravam alea-toriamente nas vidraças do hotel Embassador. Os aviões P-51 dos legalistas faziam suas incursões silenciando a rádiorebelde, e a Marinha estabelecia barragens com fogos dosnavios. As Embaixadas dos EUA, de El Salvador e do Equa-dor passaram a ser alvos de snipers. Johnson autorizou odesembarque de mais fuzileiros navais. Isto ocorreu no dia29 quando os navios da Força-Tarefa Anfíbia aproxima-ram-se do porto de Haina (a 20 km a oeste da capital) edesembarcaram o restante dos fuzileiros navais da 6o Bri-gada de Fuzileiros com seus carros-de-combate, artilhariae outros materiais pesados. Naquele mesmo dia, à noite, aOEA reuniu-se e votou uma resolução propondo uma tré-gua e o estabelecimento de uma Zona Internacional de Se-gurança (ZIS).

No dia 30 de abril, os fuzileiros americanos ocupa-ram a ZIS na parte oeste da cidade, que incluía a maioriadas Embaixadas e o hotel Embassador. Mais tarde, algunsdiplomatas da OEA intitularam a atitude dos EUA como avolta da diplomacia imperialista, pois decidiram agir sema consulta dos líderes do hemisfério.

No dia 1o de maio, unidades de Pára-quedistas da“82nd Airborne Division” já tinham chegado à ilha pelo ae-roporto4 de San Isidro, desembarcando com uma Força decerca de 4.200 homens. Quando a ZIS estava estabelecida e

O contingente brasileiro era o maior entre os latino-americanos, e o que mais meios dispunha emoficiais e elementos de transporte

Page 69: O Anfíbio - Edição Extra 2008

68 O ANFÍBIO • 200 ANOS

uma área no litoral já tinha sido assegurada, os navios ame-ricanos retornaram ao porto de Haina e receberam a bordoos refugiados. Com a chegada das forças americanas, a pon-te Duarte foi liberada, os rebeldes recolheram-se em CiudadNueva, ficando isolados das forças legalistas.

No dia 2, mais de 1.415 civis já haviam sido trans-portados para San Juan, quantitativo que viria a chegar a 3mil nos dias seguintes. Em Santo Domingo, outros 5 milcidadãos (de mais de trinta nacionalidades) aguardavamuma chance e a vez de serem evacuados. Além do USS BOXER,o capitânia do Esquadrão Anfíbio-10, participaram da mai-or parte das ações de resgate os navios WOOD COUNTY (LST-1178), RUCHAMKIM (APD-89) e o YANCEY (AKA-93). No dia 8 demaio, as tropas americanas em Santo Domingo ultrapas-savam o total de 14 mil homens, aí incluídas as tropas Pára-quedistas e de Fuzileiros Navais.

O BRASIL PARTICIPA DA FORÇA DE PAZNa madrugada do dia 6 de maio, na reunião consul-

tiva ministerial da OEA, foi decidida, por 14 votos a favor,cinco contra (México, Uruguai, Chile, Equador e Peru) e umaabstenção (Venezuela), a criação de uma Força MilitarInteramericana. Segundo a deliberação, a tarefa dessa For-ça seria: colaborar “com espírito imparcial” e sob a autori-dade da organização regional, no restabelecimento da or-dem na RD.

No centro da capital Santo Domingo, os Fuzileirosamericanos continuavam em choque com as forças revolu-cionárias.

Naquele mesmo dia, o Presidente Castelo Branco re-cebeu no Palácio do Planalto o texto da resolução da OEA,que participava a constituição de uma força internacionalpara manutenção da paz na RD. Na resolução, a organiza-ção solicitava aos países membros, que tivessem condições,o envio de tropas para aquela República. A solicitação de-mandou a ida do Presidente para o Rio de Janeiro para sereunir com o Alto Comando Militar e debater o assunto. OMinistro da Justiça Milton Campos foi chamado para ela-borar o texto do documento que seria encaminhado ao Con-gresso Nacional, que solicitava a autorização para o em-prego das Forças Armadas.

Nessa época, a única unidade básica de combate deinfantaria que o Corpo de Fuzileiros Navais (CFN) dispunhaera o 1o Batalhão de Infantaria (Batalhão Riachuelo), entãocomandado pelo CF (FN) Clinton Cavalcante de QueirozBarros.

Enquanto se aguardava uma definição do Congres-so, o CFN planejava e adotava uma série de providênciasadministrativas, em especial de ordem logística, tendo emvista a possibilidade de integrar a Força Brasileira que seriaconstituída.

No dia 7 de maio, o Comando do Núcleo da 1a Divi-são de Fuzileiros (Nu1aDivFuzNav), comandado pelo CMG(FN) Haroldo do Prado Azambuja, expediu a Diretiva dePlanejamento para a Operação Dominique, endereçada aocomandante do Batalhão Riachuelo. Na diretiva, atribuiu amissão de “Iniciar os trabalhos de planejamento a fim deestar em condições de, em curto prazo, deslocar sua unida-de, no todo ou em parte, para a área de operação” e, adicio-

nalmente, as tarefas de planejar e iniciar o adestramentoreferente às ações de contraguerrilha e de Assuntos Civis eGoverno Militar – este só para os oficiais.

Em 15 de maio, o Conselho de Segurança Nacionalaprovou, por unanimidade, o envio de tropa. A mensagempresidencial tramitou com prioridade – “regime de urgên-cia” – e, uma vez aprovada, esperava-se que a tropa pudes-se seguir para a RD a partir do dia 21.

No dia seguinte, o Núcleo da 1a Divisão de Fuzileirosexpediu a Ordem Preparatória – Operação Renascimentoque, em síntese, relatava os acontecimentos na RD, deter-minava o início dos trabalhos, de modo a ficar em condi-ções de, no prazo de 24 horas, atender ao chamado da OEA.

Como ainda não se tinha definido o valor da tropa, aOrdem Preparatória apresentou três hipóteses de organi-zação e, por fim, alterou o nome-código para Renascimento,no lugar de Dominique. No dia 20, o Congresso Nacional,por meio do Decreto Legislativo nº 38, assinado pelo Presi-dente do Senado Federal, Auro de Moura Andrade, deu osinal verde para o envio de tropa para a RD.

No dia 21 de maio, o Presidente da República assinouo Decreto no 56.308, criando o Destacamento Brasileiro daForça Armada Interamericana – FAIBRAS 5 – para integrar aForça Interamericana na RD. Por meio da Instrução no 1FAIBRAS, determinou, dentre outros, a criação de uma Co-missão Especial FAIBRAS/Estado-Maior das Forças Armadas(EMFA)6 , composta por oficiais e praças das três Forças.

Naquele mesmo dia, o Comando-Geral do CFN ex-pediu a Carta de Instrução no 2-65, na qual atribuiu aoNu1aDivFuzNav a seguinte tarefa: “Organizar umGrupamento Operativo de Fuzileiros Navais (GptFuzNav)para integrar a Força Armada Interamericana Brasileira,FCD, MO, deslocar-se para a República Dominicana”.

No conceito da operação, o Comandante-Geral doCFN estabelecia três fases para a operação: o deslocamentode um destacamento precursor (Fase I); o deslocamento dogrupamento de FN (fase II); e por fim, o recompletamento(fase III). Atribuiu-se ao Comando-Geral a tarefa de forne-cer os meios necessários ao Grupamento. Na sua Carta deInstrução, fazia referência, também, de que todo o assuntorelativo à população civil seria da alçada do Comandanteda FAIBRAS, que baixaria as instruções pertinentes.

O Comandante do Btl Riachuelo assinou, no dia 17de maio, o Plano de Operação (Renascimento) e seus anexos.

No dia 22 de maio, às 8h, o destacamento precursordo GptFuzNav, constituído pelo Comandante do Grupo deApoio Logístico e mais seis praças, embarcou em um aviãoC-54 da FAB, saindo do aeroporto Santos Dumont com des-tino à cidade de Santo Domingo. Na mesma aeronave em-barcaram, também, 20 militares do Exército e um da Aero-náutica.

No dia 24, o Comandante Clinton recebeu, na Pra-ça D’Armas do Batalhão Riachuelo, a imprensa. Na opor-tunidade, deu a versão oficial do CFN a respeito da atua-ção de sua tropa na RD. Após a entrevista, presentes,também, o Vice-Almirante Arnoldo Toscano, Chefe doEstado-Maior da Armada, e o Vice-Almirante (FN) Hei-tor Lopes de Souza, Comandante-Geral do CFN, recebeua visita do Ministro da Marinha, Almirante Paulo Bosísio,

Page 70: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A PARTICIPAÇÃO DA MARINHA DO BRASIL NA FORÇA INTERAMERICANA DE PAZ 69

que passou em revista o contingente de FN que iria paraSanto Domingo.

No dia seguinte, em cerimônia realizada no pátio doentão Centro de Instrução do CFN, todas as unidades doCampo da Ilha do Governador reuniram-se para partici-par da cerimônia de Assunção de Comando do Grupamentoe da entrega do Estandarte do CFN ao Comandanteempossado.

Na sua Ordem do Dia 076/1965, o Comandante-Ge-ral ressaltou, aos componentes do Grupamento Expe-dicionário de Fuzileiros Navais, a necessidade de carrega-rem consigo o “Espírito de Corpo”, característico dos Fuzi-leiros Navais.

O CC (FN) Paulo de Oliveira Reis foi empossado (Por-taria 0798 de 20 de maio de 1965 do MM) como Comandantedo GptFuzNav, cujo efetivo era de 270 homens e estava or-ganizado da seguinte forma:!!!!! uma Companhia de Fuzileiros Navais – sob o comandodo CT (FN) Rubens Almeida Moreira Piedras;!!!!! um Pelotão de Polícia7 – sob o comando do 1o Ten (FN)Dante Manoel da Rocha Santos; e!!!!! um Grupo de Apoio Logístico (GAL) – sob o comando do1o Ten (FN) Artur Xavier Moreira.

DETALHES DE EXECUÇÃO DA OPERAÇÃORENASCIMENTO I

Em se tratando da primeira participação do CFN ememprego real de tropa, após a criação da Força de Fuzileirosda Esquadra, em 1957, não é difícil imaginar as dificuldadesencontradas para a constituição, em curto prazo, de umgrupamento para operar longe do país, por um tempo in-determinado. Problemas de dotação dos mais variados ti-pos, equipamentos gastos, dotação de munição, falta de pla-quetas de identificação, dentre outros, que podem ser rela-cionados.

A aptidão física do homem selecionado para comporo Grupamento tinha de satisfazer várias condições, princi-palmente as relativas ao estado médico e odontológico. Nãoera admissível que o homem viesse apresentar, no espaçode um mês, qualquer tipo de problema.

Visando a preservar a higidez durante o seu empre-go, toda a tropa foi submetida ao teste de abreugrafia (rea-lizado pelo Serviço Nacional de Tuberculose) e foi vacinadacontra varíola e febre amarela, no Rio de Janeiro. As vacinascontra o tifo foram encaminhadas posteriormente para aRD pelo Btl Riachuelo.

No tocante ao adestramento, em que pese as dificul-dades da época, ainda foi possível adestrar o grupamentoem combate em localidades, e fazer pequenas correções derumo.

Do ponto de vista logístico, a tropa embarcou levan-do os seguintes suprimentos e quantidades:

Classe I!!!!! quatro dias de ração R-2;!!!!! dez dias de gêneros de paiol; e!!!!! água para quatro dias, por homem (no local a cargo dasForças dos EUA).

Classe II!!!!! constante da dotação.

Classe III!!!!! quantidade necessária para operar um Posto de Supri-mento (PSup) Cl III, ficando o fornecimento local sob a res-ponsabilidade das Forças dos EUA.

Classe V!!!!! a dotação básica com os homens e três dias de supri-mentos na carga geral.! ! ! ! ! havia a previsão de reabastecimento no local, a serrealizado pelos navios-transportes da Marinha e pela FAB.

No dia 26 de maio, às 6h, o Grupamento foi concen-trado na Base Aérea do Galeão, para o embarque nas aero-naves C-130 da “United States Air Force” – USAF. Os aviõesdecolaram intercalados de dez minutos, tendo o primeiropartido às 9h30m.

Complementando o material do Grupamento, foramembarcados no Navio-Transporte Custódio de Mello três via-turas e seus respectivos Condutores Motoristas8, e váriosvolumes-padrão e material para montagem final do acam-pamento. O Custódio de Mello, comandado pelo CMG PauloTheophilo Gaspar de Oliveira, atracou no Sugar Quay noporto de Haina – RD, às 16h20m do dia 11 de junho de 1965 9 .

O armamento individual do FN era o fuzil FS 7,62mm,com depósito de capacidade para 10 cartuchos. Os outrosarmamentos eram o fuzil-metralhador FMB (carregadorpara 20 cartuchos), o morteiro 60mm (o 2o contingente jálevou o Mrt 81mm), lança-rojão (LR) 2.36 pol. (devido a pro-blemas de abastecimento, foi substituído pelo LR 3.5, cedi-do pelos americanos) e a metralhadora Browning .30 pol. Emcomplemento, uma peça AC 106mm foi colocada à dis-posição pelo I/Regimento Escola de Infantaria (REsI). Tam-bém foram empregadas a pistola .45 Colt e a submetralha-dora .45 INA.

O uniforme usado foi o caqui de brim com gandolade mangas compridas.

CONSTITUIÇÃO DA FORÇA INTERAMERICANA DEPAZ (FIP)

Conforme comentamos, a OEA, em sua resolução,estabelecia a constituição de uma Força que teria de colabo-rar, como único fim, dentro de um espírito de imparcialida-de democrática, na restauração da normalidade na RD, nagarantia da segurança de seus habitantes, na inviolabilidadedos direitos humanos, e no estabelecimento de um clima depaz e conciliação, que permitisse o funcionamento das ins-tituições democráticas naquela República.

Os primeiros contingentes chegaram a Santo Domin-go nos dias 14 e 15 de maio e foram os de Honduras, Ni-carágua e Costa Rica. A FAIBRAS chegou nos dias 23 (ele-mentos precursores) e 28 de maio.

Essa diversidade de tropas ensejou a criação de umcomando unificado que realizasse o emprego coordenado eeficiente da Força Armada Interamericana (mais tarde alte-rada para Força Interamericana de Paz), inicialmente cons-tituído como na figura 1.

Por solicitação da Secretaria da OEA, instalada nohotel Embassador, Brasil e EUA colocaram à sua disposiçãoum oficial-general para exercer, respectivamente, as fun-ções de Comandante e Subcomandante da FIP. Foram de-signados o General-de-Exército Hugo Panasco Alvim e o

Page 71: O Anfíbio - Edição Extra 2008

70 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Tenente-General (US Army) Bruce Palmer Junior.O comando unificado da FIP instalou, em 25 de maio,

o seu quartel-general no hotel Jaragua, localizado a umaquadra da linha de contato com as forças rebeldes emCiudad Nueva, e passou a exercer diretamente a sua açãosobre os cinco contingentes nacionais.

A organização estabelecida atendeu aos aspectosadministrativos, mas dificultou o emprego de elementos decombate, em vista da diversidade de organizações, efetivose material, que aumentavam os problemas de coordenaçãopara o comando da FIP.

No dia 29 de maio, o General Panasco Alvim assu-miu o comando e, imediatamente, buscou dar à FIP umaestrutura operacional adequada às ações em desenvolvi-mento. Ficou estabelecida a partir dessa data a organizaçãomostrada na figura 2.

por um pelotão de comunicações, que integrou o contingen-te do Btl Fraternidade, ficando a organização final como nafigura 3.

Independente da consolidação dessa estrutura, tan-to a Brigada LA quanto o Batalhão Fraternidade receberamtarefas operativas desde os primeiros dias de junho, con-forme comentaremos, a seguir, tratando, especificamente,daquelas atribuídas ao contingente de FN do Brasil.

Figura 1

Figura 2

A Brigada Latino-Americana era formada pelo 1o

Batalhão do REsI, unidade do EB, e um batalhão, que se de-nominou Fraternidade10 , constituído pela Companhia deFuzileiros Navais do Brasil, das Companhias de Fuzileirosde Honduras, Paraguai e Nicarágua, e do Pelotão da CostaRica 11 .

O contingente brasileiro era o maior entre os latino-americanos, e o que mais meios dispunha em oficiais eelementos de transporte. Esses recursos foram aproveita-dos para estruturar os dois comandos operacionaisindispensáveis ao melhor enquadramento dessas tropas.

O comando e o núcleo da Companhia de Comandoda Brigada Latino-Americana foram organizados com ele-mentos do Comando da tropa da FAIBRAS. O comando daBrigada LA foi atribuído ao Coronel Carlos de Meira Matos,que acumulou essa função com a de Comandante do con-tingente brasileiro, fato que se deu, também, com os seusoficiais que acumularam as funções da FAIBRAS e da Briga-da LA.

Os elementos de comando do GptFuzNav do Brasilforam empregados para estruturar o comando do BatalhãoFraternidade, assumido inicialmente pelo CC (FN) Reis.

Com a chegada, a 26 de maio, do contingenteparaguaio, constituído por uma Cia, completou-se a estru-tura do comando e do estado-maior da Brigada LA e doBatalhão Fraternidade. Em 20 de julho, chegou a Santo Do-mingo o 2o escalão do contingente paraguaio, constituído

PERÍODO PÓS-GUERRA CIVIL E AS AÇÕES DOSFUZILEIROS NAVAIS

Durante os dias que sucederam à chegada das tropasda FIP, muitos embates ocorreram nas ruas de Santo Do-mingo. A FIP estava ali para mediar a situação sem tomarpartido de nenhuma das facções. A tentativa de interven-ção da ONU (gerada por um conflito de competência legalpara a solução da crise), mal interpretada em alguns mo-mentos, em apoio a Caamaño, gerou um certo desconfortocom os representantes da OEA, que tentavam acalmar osânimos. Felizmente, a ONU retirou-se da área, deixandocom a OEA a tarefa de criar as condições necessárias para orestabelecimento da ordem.

Durante a chegada dos contingentes que integrari-am a Bda LA, as tropas americanas ocupavam a ZIS, limita-da a leste pela calle Pasteur (linha de contato com as forçasrebeldes), ao sul pelo Mar do Caribe e ao norte pela AvenidaFrancia. Essa tarefa estava sendo cumprida pela 6a Bda deFN americanos (setor norte da ZIS) e pela 3aBda da “82nd

Airborne Division” (setor sul da ZIS).A atuação da FAIBRAS na RD pode ser dividida em

três fases assim caracterizadas:1ª fase – da chegada da tropa até o dia 25 de outubro

(dia da integração da área rebelde à ZIS).Ao chegar em Santo Domingo no dia 28 de maio, todo

o contingente do GptFuzNav ficou estacionado na área lo-calizada a cavaleiro da Avenida Independência, a 500 m aoeste da Linha de Contato (LC) – calle Pasteur. As refregasdo combate podiam ser ouvidas pelo zunido dos projetisque passavam sobre a área durante a noite, período que osrebeldes atuavam.

No dia 1o de junho, um acordo assinado pelas facçõesde Imbert e Caamaño deu origem ao Status del Palacio, quepermitiu que toda a área em torno do mesmo fosse ocupadapor tropas da FIP. Foi a primeira missão do I/REsI, realizadae cumprida com sucesso no dia 2 de junho.

No dia seguinte, foi criada, oficialmente, a Bda LA,sob o comando do Cel Meira Mattos. Dentre as tarefas daBdaLA, coube ao GptFuzNav, em sua primeira participa-ção, no dia 7 de junho: substituir os elementos da 3aBda /

Figura 3

Page 72: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A PARTICIPAÇÃO DA MARINHA DO BRASIL NA FORÇA INTERAMERICANA DE PAZ 71

82nd Airborne Division; ocupar a área leste da ZIS, limitadaao norte pela calle Santiago (inclusive) e ao sul pela linha depraia; e bloquear as avenidas George Washington e In-dependência, ocupando, nesta última, um Posto de Contro-le de Trânsito (PCTran). Para o cumprimento dessa tarefa, ocomando do GptFuzNav emitiu a Ordem de Operação no 2/65, assinada pelo CC (FN) Reis.

A área de retaguarda era limitada pela avenidaMaximo Gomez. A ação foi iniciada às 4h30m com o deslo-camento da tropa para a LC, onde a substituição foi realiza-da com sucesso. O PCTran foi ocupado pelos elementos doPelPol do GptFuzNav, que passou a operá-lo no período de6h às 18h, exercendo o controle rigoroso de pessoal e de todotipo de viatura que por ali passasse. O Posto de Comandodo GptOp e do Batalhão Fraternidade foi instalado no Insti-tuto Domenico-Americano, localizado na esquina da Pasteurcom a Independência.

Os prédios mais altos, num total de três, foram utili-zados como Postos de Observação, fonte permanente deinformes, e como posições vantajosas de resistência. Emcada um deles, foi colocado um perito atirador, dotado degranadas e iluminativos.

As posições de resistências eram organizadas comsacos de areia, dispostos em uma, duas ou três linhas, con-forme a sua localização e o inimigo em potencial. Um ca-nhão anticarro 106mm SR foi posicionado a cavaleiro daavenida George Washington, a via de acesso mais impor-tante e próxima do QG da FIP no hotel Jaragua.

A tropa americana, de valor brigada, que compunhaa FIP, ocupou, também, uma área ao norte de CiudadNueva12 , limitando a atuação dos rebeldes, tão-somente,àquela área em Santo Domingo.

As ações da Bda LA e, portanto, dos FN do BtlFraternidade foram, durante vários meses, de ocupação emanutenção de posições defensivas em localidade urbana(cabe lembrar que existia um revezamento entre as tropasdo Btl Fraternidade, o que nos obrigou a assumir posiçõespor diversas vezes na LC) e de operação de PCTran – check-point. Tudo visava, basicamente, a impedir a passagem deelementos armados para a ZIS, manter as posições e impe-dir que integrantes dos dois lados políticos viessem aengajar-se.

As tarefas de check-point, em particular, eram fainasdemoradas de inspeção, basicamente, em busca de armas emunições que, de certa forma, irritava a população. Alémdisso, por esses mesmos postos, entravam e saíam todos osdias elementos rebeldes disfarçados de transeuntes, e quedurante o dia observavam atentamente nossas posições13 ede noite as atacavam com tiros de armas portáteis e auto-máticas. Do outro lado e durante um certo período, os rebel-des instalaram, também, os seus Punto de Cheque tornando asituação da população ainda mais caótica. Com a chegadado contingente paraguaio (valor Cia), os elementos em pri-meiro escalão passaram a revezar-se a cada 15 dias, o quede certa forma permitiu diminuir, em tese, o estresse datropa. O primeiro emprego dos FN na frente de combatedurou três semanas.

Redes de arame, concertinas, obstáculos de madeira(cavalos de frisa), armamentos instalados em edifícios, po-

sições de defesa instaladas nas ruas e protegidas por sacosde areia, cuidados com o armamento, com a higidez física eo moral constituíram, na frente de combate ou na reserva, abase dos trabalhos desenvolvidos na área.

Essa situação repetiu-se, diariamente, até o final desetembro. Entretanto, durante a noite, o estado de tensãoaumentava por conta dos choques armados e dos ataques,pelo fogo, das forças “constitucionalistas”14 às nossas posi-ções. Durante esse período, somente nos dias de 13 a 16 dejunho é que a situação se agravou motivada pelas ações datropa americana, atuando ao norte de Ciudad Nueva, au-mentando o corredor de segurança e diminuindo, cada vezmais, o espaço dos rebeldes naquela parte da cidade. Nessesdias, grande parte da população evadiu-se para outras áreasda cidade congestionando os check-points. O GptFuzNav divi-dia a frente da BdaLA com a Cia de Honduras. Houve gran-des trocas de tiro, principalmente na avenida George Wa-shington, esquina com a calle Pasteur, inclusive um disparode canhão 106mm SR para silenciar uma posição de metra-lhadora rebelde que há dias fustigava nossas posições.

No dia 23 de junho, o jornal “Tribuna da Imprensa”do Rio de Janeiro, publicou na íntegra o telegrama enviadopelo General Panasco Alvim que dizia: “É com muito orgu-lho que comunico a V.Exa. que nos graves e violentos episó-dios dos dias 15 e 16 aqui passados, o Corpo de FuzileirosNavais atuou de forma excepcional mantendo sempre altoo padrão moral e profissional de sua tropa. É uma tropa deelite, de grande confiança, respeitada e admirada por todos.É uma honra para mim ter, sob ordens, elementos de talvalor”.

Em agosto, boatos disseminados entre os rebeldesdavam conta de um ataque das Forças da FIP às suas tro-pas. Em verdade, tropas do CEFA, do General Wessin yWessin, faziam sua guerra particular atacando por meio demorteiros, que se movimentavam na faixa norte da cidadedurante a noite, atingindo as posições dos rebeldes que, porsua vez, deduziam que os tiros eram provenientes das tro-pas da FIP.

Em ambos os lados, os mais radicais agiam de formaa desmoralizar a FIP, classificando-a como tropa beligerante.Isso tudo por não concordar com os rumos tomados pelasnegociações promovidas pela Comissão Ad Hoc da OEA embusca da paz.

Na sucessão de tentativas de acordo entre as facçõesde Caamaño (os constitucionalistas) e de Imbert (oslegalistas), a Comissão Ad Hoc conseguiu superar o maiorobstáculo das negociações, a radicalização de ambas as par-tes e, no dia 3 de agosto, conseguiu dar publicidade a trêsdocumentos frutos dessas negociações:! ! ! ! ! o Ato Institucional;! ! ! ! ! a Ata de Reconciliação Dominicana; e! ! ! ! ! a Declaração ao Povo.

Os caamanistas discordaram do teor dos artigos 4o

(incorporação de Ciudad Nueva à ZIS), 5o (possibilidade deemprego da FIP para a manutenção da ordem) e 8o (sobre aforma de reintegração dos militares que combateram aolado de Caamaño) da Ata de Reconciliação, e pregaram anecessidade da criação de um Governo Provisório.

No tocante ao artigo 4o, Caamaño foi forçado, pelos

Page 73: O Anfíbio - Edição Extra 2008

72 O ANFÍBIO • 200 ANOS

partidos de tendências de esquerda, a declarar que: “As for-ças Interamericanas de Paz não pisarão nunca nesta zona”– referindo-se à Ciudad Nueva.

Nos dias que se seguiram (de 11 a 14 de agosto), aComissão Ad Hoc reuniu-se várias vezes com as facções,obtendo poucos, porém expressivos resultados, e acertou adata de 31 de agosto para a assinatura dos Atos. Nesse dia,Imbert renunciou para não assinar os Atos e, ao mesmotempo, protestar contra os EUA, que, no começo, havia lheprestado apoio e agora lutava para a criação de um Gover-no Provisório. A comissão obteve uma grande vitória aoconseguir a aceitação do nome de Hector Garcia Godoy paraa presidência do Governo Provisório.

Finalmente, no dia 3 de setembro, ante a renúncia deCaamaño e de todo o seu gabinete, com o povo nas ruas emvolta do Palácio Nacional, protegido por tropas do I/REsI ecom a participação das CiaFuz de Honduras nos check-points,Garcia Godoy assumiu a presidência do Governo Provisó-rio. Após 132 dias de ausência de um Governo legalmenteinstituído, a RD voltou momentaneamente à normalidade.

No dia seguinte, Brasil, EUA, Israel e El Salvador re-conheceram o novo Governo, seguidos mais tarde por ou-tras dez nações.

O Presidente Garcia Godoy assumiu, mas enfrentouvários problemas; dentre eles:! ! ! ! ! integração da zona rebelde! ! ! ! ! reincorporação de militares rebeldes! ! ! ! ! desarme dos revolucionários! ! ! ! ! constituição do Gabinete

Para impor suas ordens, dispunha da Ata de Recon-ciliação e do Ato Institucional assinados pelas partes, para

exigir o cumprimento dessas tarefas, tinha como meios:! ! ! ! ! as Forças Armadas Dominicanas – desacreditadas ecom os seus chefes sendo alvo de acusações. Wessin y Wessinera o mais atacado de todos, entretanto, além dele, os re-beldes exigiam, ainda, a retirada do país de outros chefesmilitares.! ! ! ! ! a FIP – acusada pelos revolucionários de ser elementode manobra dos EUA, atacada pelos adeptos de Imbert pornão os deixar terminar a revolução e antipatizada pelo povo,que a julgava a causa da demora na solução da situação daRD.! ! ! ! ! manobras políticas – o único instrumento que lhe resta-va para intervir até recuperar aqueles normais de um Po-der Nacional. Com a omissão dos políticos de direita e decentro na solução dos problemas, a composição política aca-bou tendendo para os elementos menos extremados da es-querda.

Vários problemas surgidos após a implantação doGoverno Provisório foram resolvidos com a intervençãoda Comissão Ad Hoc e da FIP, em face de uma nova ameaçade conflito armado. Para exemplificar, citamos o afastamentodo General Wessin y Wessin, a tentativa de Garcia Godoyde substituição do Ministro da Defesa Rivera Caminero (de-saprovada pelo Embaixador americano e pelo comando daFIP), a revolta dos universitários, que culminou com a mor-te de um deles, a integração ao Exército do CEFA – comanda-da por Wessin e considerada a mais arbitrária das unida-des para o povo etc.

Além desses problemas, o Presidente do GovernoProvisório teve de enfrentar ainda:! ! ! ! ! o ultimatum dos militares para anular a decisão de atos

General Hugo Panasco Alvim, acompanhadodo CC (FN) Fernando do Nascimento,

passa em revista o II GPTFN

Page 74: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A PARTICIPAÇÃO DA MARINHA DO BRASIL NA FORÇA INTERAMERICANA DE PAZ 73

relativos à classe, como a mudança de subordinação daspolícias militares;! ! ! ! ! a integração das zonas rebeldes;! ! ! ! ! a entrega das armas pelos rebeldes;! ! ! ! ! o regresso de Bosch ao país, que acentuou divergênciasentre Garcia Godoy e suas Forças Armadas; e! ! ! ! ! a forte propaganda comunista, que se sobrepunha àcapacidade dos órgãos de imprensa do Governo de anulá-la, propiciando uma enorme preparação das massas e cri-ando situações embaraçosas entre os próprios setores dogoverno.

No dia 24 de outubro, após reuniões entre militaresdominicanos e da FIP, da Comissão Ad Hoc e do PresidenteGarcia Godoy, foi decidida a ocupação da área “constitucio-nalista”, a qual se seguiriam a ocupação pela Polícia Na-cional e as comissões de desarme. Tal decisão foi conside-rada fundamental para a manutenção da ordem pública na“Ciudad Nueva”.

O início da operação deu-se às 4h30m do dia 25 deoutubro. A ação como um todo previa o emprego combina-do da BdaLA e da 1a Bda da “82nd Airborne Division”, ata-cando simultaneamente em direções convergentes. As tro-pas da BdaLA, reforçadas por três pelotões de carros-de-combate, dois do Exército dominicano (um dos quais ficouna reserva da Brigada) e um do Exército americano, deslo-caram-se para a zona rebelde, ficando os Fuzileiros Navaisdo Brasil com a responsabilidade do flanco sul, a cavaleirodas avenidas George Washington e Independência. Os re-beldes foram surpreendidos e, em pouco mais de uma horae meia de ação, todo o setor já estava integrado à BdaLA.Nossas tropas progrediram rapidamente, empregando oprincípio da surpresa, por ruas e avenidas, onde eram gran-des as possibilidades de ação dos snipers. As resistênciasesboçadas pelos “constitucionalistas” não impediram oavanço dos nossos soldados e fuzileiros de alcançar seusobjetivos. Participaram dessa ação, além dos FN do Brasil,o I/REsI e tropas de todos os outros países integrantes daFIP.

Cabe ressaltar que a Companhia de Fuzileiros, co-mandada pelo CT (FN) Caio Pompeu de Souza Brasil Filho,foi reforçada por um PelCC do Exército americano, por tersido a sua Zona de Ação considerada a mais provável deencontrar resistência.

As tentativas de agitação dos grupos extremistas nãoterminaram com a ocupação de Ciudad Nueva. As ações daBdaLA passaram, a partir desse momento, a contribuir para:! ! ! ! ! consolidação da autoridade do Governo Provisório e avolta da normalização da vida na RD, com a realização deeleições livres previstas para junho de 1966; e! ! ! ! ! favorecer, pela simples presença, a consolidação do Go-verno a ser eleito.

No dia seguinte à ocupação de Ciudad Nueva, as“Equipes de Inspeção de Armas” (constituída pela PolíciaNacional, Polícia Técnica e elementos civis) iniciaram ostrabalhos de busca, localização e apreensão de armas. Como tempo, foi-se verificando a ineficiência dos grupos paraessa tarefa. O máximo que conseguiram foi apreender ar-mas velhas e em mau estado. A população e os grupos co-munistas continuavam armados.

No final de outubro de 1965, portanto, continuavama existir duas forças que pesavam nas soluções políticas: asForças Armadas e o grupo Bosch-Caamaño, sendo que oprimeiro, em face das críticas e da não-cooperação, fez comque o Governo de Garcia Godoy tendesse a inclinar-se parao segundo, aproximando-se de uma solução imprevisívelagravada, também, pela dívida nacional.

Foi diante desse quadro que o contingente de substi-tuição dos Fuzileiros Navais e do I/REsI preparou-se paraenfrentar, quando de sua ida para Santo Domingo, no mêsde novembro.

A ocupação de Ciudad Nueva marcou o fim da 1a

fase, caracterizada, também, pela intensa “guerra psicoló-gica” com grande apelo ao patriotismo do povo dominicano,visando a torná-lo hostil à “ocupação estrangeira”.

OPERAÇÃO RENASCIMENTO IIEnquanto persistia a instabilidade política na RD; no

Brasil, o CFN iniciou, em setembro, o planejamento para asubstituição do 1o contigente – a Operação Renascimento II.

Em 13 de setembro de 1965, o Comandante-Geral doCFN expediu a Carta de Instrução no 3-65, endereçada aocomandante do Nu1aDivFuzNav. Nesse documento deter-minava: “Organizar e adestrar o II Grupamento de FN, oqual deverá FCD, MO, ser transportado para São Domin-gos, a fim de substituir o I Grupamento e integrar a FAIBRAS”.

Esse Grupamento foi organizado com uma estrutu-ra ligeiramente diferente do primeiro, porém, com o mesmoefetivo de 270 militares, e contou, basicamente, com volun-tários. Uma das poucas restrições impostas era que o mili-tar não poderia ser arrimo de família.

Em relação ao primeiro Grupamento, aumentou-seo efetivo de Oficiais Fuzileiros Navais; e foi indicado, tam-bém, um Oficial Intendente. Dentre os oficiais FN, algunsdeveriam possuir, obrigatoriamente, o Curso da Escola deAperfeiçoamento de Oficiais do Exército (EsAO), de modo amobiliar o EM do Batalhão Fraternidade. Foi criado e incor-porado um Pelotão de Comando, composto de uma seçãode comunicações, uma seção de AC 106mm e uma seção demorteiros 81mm.

O comando do Nu1ªDivFuzNav indicou o CC (FN)Fernando do Nascimento para o comando do II Grupamentode FN, tendo como imediato o CT (FN) Geraldo de AbreuPinheiro. A indicação foi aceita e mais uma vez o BatalhãoRiachuelo nucleou o Grupamento.

No dia 11 de outubro de 1965, o Comando-Geraldo CFN recebeu o exemplar no 11 do Plano de Operaçãono 1 do EMFA, regulamentando a substituição da tropada FAIBRAS.

O EMFA determinou que, no período de 6 de novem-bro a 10 de dezembro, fosse realizada a substituição dopessoal em São Domingos. A Marinha programou a substi-tuição integral, enquanto o EB a realizou parcialmente,mantendo na RD 50% dos quadros – oficiais, subtenentes esargentos.

A tropa que viria a substituir o 1o contingente rece-beu, no Rio de Janeiro, um adestramento específico de com-bate em localidades, estabelecimento e conduta em PCTrane de pequenas noções de guerrilha. Foi dada uma particular

Page 75: O Anfíbio - Edição Extra 2008

74 O ANFÍBIO • 200 ANOS

atenção à educação moral, que incluía, também, todo umentendimento sobre a missão e a responsabilidade daFAIBRAS na RD. O deslocamento da tropa foi realizado emaeronaves da FAB – os C-82 e C-119.

O segundo contingente de FN foi dividido em cincoescalões para efeito de deslocamento, tendo o primeiro de-les (somando duzentos FN) deixado a Base Aérea do Galeãonos dias 6 e 7 de novembro, fazendo escalas na cidade deBelém e na base de Piarco em Trinidad, com destino à BaseAérea de San Isidro. O último escalão dos FN chegou à RDno dia 6 de dezembro.

2a fase – de 26 de outubro até 23 de abril de 1966.Essa fase foi caracterizada por ações de limpeza e

redução de focos rebeldes, distribuídos por toda a CiudadNueva, e pela manutenção da segurança e ordem públicas.Nesse período, todo o contingente da FIP ficou vulnerávelpela inexistência de linhas-limites com os rebeldes, o quefavorecia a infiltração mais fácil de elementos hostis emárea ocupada pela tropa, exigindo, em contrapartida, redo-brada vigilância.

No final de outubro e início de novembro na RD, hou-ve um incremento de ações terroristas e agitações de rua.Ataques a edifícios, incêndios e saques e até mesmo atenta-dos contra as tropas da FIP e elementos não simpatizantestornaram-se freqüentes. As ruas e as praças de Ciudad Nue-va continuaram a ser alvos de choques e agitações. Enquan-to isso, aumentava a campanha contra os norte-america-nos e as tropas da FIP que mantiveram a ocupação dos pon-tos críticos na área, apesar da diminuição de seus efetivos.

No dia 21 de novembro, as ações chegaram ao interi-or do país, onde um grupo de direita tentou desencadearum golpe de estado em Santiago, mas logo dominado pelasForças Armadas dominicanas. As ações no interiorensejaram um programa de treinamento para as tropas daFIP, visando ao seu provável emprego no interior da RDcom ações de patrulha, o que efetivamente aconteceu semmaiores conseqüências.

As ações da FIP e, portanto, do segundo grupamentode FN foram ligeiramente diferentes das realizadas na 1a

fase. Elas ficaram voltadas para a ocupação de CiudadNueva e, conforme abordado, com tarefas de manutençãoda ordem pública15 . Essa ocupação foi realizada efetiva-mente pelo estabelecimento de pontos de controle nos cru-zamentos de ruas em pontos críticos, patrulhas motoriza-das e pela destruição de locais levantados como paióis dearmamento dos rebeldes. Devido às característicasarquitetônicas das casas (a maioria de dois andares comtelhados de laje, que permitia a passagem de um prédiopara o outro), os pontos de controle foram estabelecidos noalto dessas edificações.

Não houve emprego tático do armamento AC, en-tretanto, os morteiros foram bastante empregados para ilu-minar o “campo de batalha”16 nas ações noturnas, uma vezque toda a cidade permanecia às escuras durante a fase deocupação.

Os check-points foram desativados, liberando o pesso-al do Pelotão de Polícia (PelPol) para ações de segurança. OPelPol passou a ser empregado na segurança do PC daBdaLA e na segurança pessoal do Comandante da FIP, espe-

cialmente durante os seus deslocamentos, bem como, dascomitivas da OEA presentes na área. A segurança do QG daFIP, operando no hotel Jaragua, era provida pela 82nd AirborneDivision e pelos contingentes nacionais do Btl Fraternidade,em regime de rodízio.

O período de maior agitação, nessa fase, ocorreu entre13 e 17 de dezembro, por ocasião de uma greve, com a ocor-rência de tumultos em diversos pontos da cidade, onde osrebeldes ergueram barricadas incendiando pneumáticos. OsFN fizeram-se presentes controlando os tumultos. No interi-or, em Santiago, no dia 19, as Forças Armadas dominicanasenfrentaram os “constitucionalistas”, com saldo de 28 mor-tos e vários feridos, agravando, ainda mais, a crise. Até o finaldo ano de 1965, a situação acalmou-se, voltando a ficar tensano início de 1966 com algumas ações terroristas. Em 21 dejaneiro, os líderes “constitucionalistas” decidiram deixar opaís, sendo escoltados até o aeroporto pelos FN.

Durante toda a segunda fase, os FN do Brasil reveza-ram-se nas ações com as tropas paraguaias, nicaraguensese hondurenhas. Foi estabelecido um sistema de rodízio en-tre elas de modo a ter-se sempre, além daquela que estavaem ação, ocupando os pontos de controle, uma força de re-tém e outra de folga. Em caso de necessidade de reforço ouemprego imediato de força, a tropa de retém estava prontapara entrar em ação, enquanto que a de folga dedicava-semais à manutenção do moral, com a realização de com-petições internas, exercícios físicos, e, quando possível eoportuno, licenças para San Juan de Puerto Rico 17 (o pri-meiro contingente também gozou dessa condição) ou paraáreas em Santo Domingo afastadas de Ciudad Nueva.

Dos diversos ensinamentos trazidos de Santo Do-mingo, os de maiores repercussões, na tropa, até hoje são:!!!!! o emprego de vassouras amarradas à frente dos pneusdas viaturas, varrendo do chão os diversos grampos joga-dos propositalmente nas ruas da cidade, para conter o mo-vimento das viaturas nas suas tarefas de patrulhamento; e! ! ! ! ! a colocação de uma barra vertical na frente das Vtr ¼ton18 , batizadas de “trombas de elefante”, para evitar adegolação dos motoristas e outros acompanhantes, por con-ta de arames colocados, pelos rebeldes, transversalmentenas vias públicas, na altura das jugulares.

No final de abril, o Presidente Garcia Godoy, na pre-sença do Embaixador Bunker da Comissão Ad Hoc e do novoComandante da FIP, General do Exército Brasileiro ÁlvaroAlves da Silva Braga, propôs a substituição das tropas daFIP que ainda ocupavam pontos de segurança na antigazona rebelde (Ciudad Nueva) pelas Forças Armadas da RD.A ação de Garcia Godoy foi, na realidade, o primeiro passopara, sutilmente, negociar com a OEA a retirada total da FIP,antes da passagem do seu cargo de Presidente.

No dia 23, as tropas da FIP foram substituídas peloExército da República Dominicana nos pontos de controle eregressaram aos seus acampamentos, marcando o final dasegunda fase. A FIP tinha alcançado plenamente o seu obje-tivo, que era prover condições para a consolidação do Go-verno Provisório, e fazer retornar ao país a situação de nor-malidade, capaz de permitir a realização de eleições livres.

3a fase – de 24 de abril de 1966 até 16 de setembro(término da missão).

Page 76: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A PARTICIPAÇÃO DA MARINHA DO BRASIL NA FORÇA INTERAMERICANA DE PAZ 75

Com a rendição das tropas da FIP, essas mantive-ram-se em estado de prontidão, em condições de reassumiro controle militar da área, caso se configurasse um recru-descimento de ações rebeldes.

No período de 24 a 29 da abril, os FN guarneceram asinstalações da Embaixada brasileira, resguardando-a depossíveis manifestações contrárias aos países que integra-vam a FIP, por ocasião do primeiro aniversário da revolu-ção e da chegada dos marines.

A 28 de abril, os Embaixadores Bunker e Penna Mari-nho (da Comissão Ad Hoc), Generais Braga e Linvill, e o Coro-nel Meira Matos reuniram-se no hotel Embassador e estabe-leceram que o prazo mínimo para a retirada da FIP seria de30 dias, embora planejassem também de 60 e 90 dias.

Apesar disso, estava previsto, para maio de 1966, asubstituição do 2o contingente da FAIBRAS. A Marinha op-tou, mais uma vez, pela substituição completa do seu pes-soal, enquanto o EB manteve em São Domingos 20% de seusquadros. Iniciava-se a Operação Renascimento III.

OPERAÇÃO RENASCIMENTO IIIO 3o contingente de FN, nucleado no 2o Batalhão de

Infantaria – Batalhão Humaitá (ativado em março de 1965),teve o seu escalão avançado transportado por uma aerona-ve C-119 no dia 23 de abril. O restante do pessoal, seguiupara Santo Domingo em aeronaves C-130 da FAB, recém-adquiridas. Diariamente, de 2 a 15 de maio, saiu da BaseAérea do Galeão um C-130 conduzindo tropa da FAIBRAS.No dia 6 de maio, todo o GptFuzNav já havia sido substi-tuído. Esse contingente foi comandado pelo CC (FN) UmbertoBarbosa Lima Martins. Sua organização e efetivo eram iguaisa de seu predecessor.

Nessa fase, os FN depararam-se com uma situaçãode normalidade política e no ritmo de vida das pessoas. Atropa de FN ficou voltada para o cumprimento de um pro-grama de adestramento, mantida em condições de futuroemprego no caso de um retrocesso na situação local, o queacabou não acontecendo. O adestramento englobou opera-ções helitransportadas, e em áreas montanhosas e de selva,bem como ações de contraguerrilha19 e tiro de combate.

Procurou-se manter o preparo físico e o moral docombatente, evitando-se, ao máximo, o relaxamento. Reali-zou-se, também, um trabalho constante de inteligência àluz da situação no país e da sua evolução, e de muito traba-lho de Estado-Maior, atualizando, dia-a-dia, os planos pre-vistos para uma ocupação imediata. Nesse contexto, nossatropa deu provas de alto espírito de disciplina e preparopsicológico.

O planejamento da retirada da FIP iniciou-se na pri-meira quinzena de maio, com a divulgação da Ordem Pre-paratória do seu Comandante, estabelecendo, de imediato,que as tropas brasileiras e americanas seriam as últimas aretirarem-se, proporcionando segurança aos demais contin-gentes.

As Forças brasileiras não teriam condições de retira-rem-se em menos de 45 dias, tendo em vista o emprego dosnavios-transportes da Marinha de Guerra em outras mis-sões, os quais fariam parte do processo de retirada.

Ficou decidido, pelo Comandante da BdaLA, que a

retirada dos contingentes seria realizada por ordem cres-cente de seus efetivos, ou seja: Costa Rica, Nicarágua,Paraguai, Honduras e Brasil. Além disso, o prazo mínimoficou sendo o de 60 dias, sendo que o QG da BdaLA ficaria naRD até o último dia.

Enquanto a FIP planejava a sua retirada (previstamas ainda não solicitada oficialmente), o povo dominicanopreparava-se para as eleições para Presidente da República(cuja posse estava prevista para o dia 1o de julho). GarciaGodoy, por sua vez, esforçava-se para entregar o país devi-damente pacificado e sem problemas, tanto que em 29 demaio, durante entrevista à imprensa nacional e estrangei-ra, disse que, se as eleições transcorressem normalmente nodia 1º de junho, o seu governo oficiaria junto à Reunião deConsulta o pedido de retirada da FIP.

Joaquim Ballaguer20 venceu e tomou posse em climade total tranqüilidade. Na resolução de 24 de junho da Reu-nião de Consulta de Ministros Exteriores da OEA, ficou de-cidida a retirada da FIP a partir do dia 1º de julho, comprazo máximo de 90 dias até à retirada total, atendendo àsolicitação de Garcia Godoy. A população (cerca de 70% dosentrevistados), entretanto, conforme pesquisa realizadapelo jornal “El Caribe”, respondeu que ainda era cedo paraa saída da FIP.

De qualquer jeito, a FIP já havia planejado a sua reti-rada, com emprego de meios aéreos e marítimos, para asdiversas hipóteses de tempo (em 30, 60 e 90 dias),escalonando-a, segundo a natureza da tropa, alterando adecisão anterior que se baseava nos efetivos. Por fim, emfunção das várias mudanças no planejamento a retiradada Bda LA ficou como mostra a Tabela A.

No tocante às tropas do Brasil, a coordenação ficoucom o EMFA, que planejou o retorno do contingente brasi-leiro em quatro Grupamentos de Embarque21 , conformeTabela B.

Os deslocamentos aéreos foram realizados a partirda Base Aérea de San Isidro, com escalas previstas em Piarcoe Belém, e os deslocamentos marítimos, a partir do Porto deHaina.

Pelo Decreto nº 59.276, de 23 de setembro de 1966, oPresidente da República, considerando o parecer da Déci-

Page 77: O Anfíbio - Edição Extra 2008

76 O ANFÍBIO • 200 ANOS

ma Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteri-ores, que declarava terem sido alcançados os objetivos quemotivaram a criação da FIP, determinou a extinção, a partirde 30 de setembro, do destacamento brasileiro da ForçaArmada Interamericana – FAIBRAS.

A participação dos Fuzileiros Navais brasileiros nes-sa campanha resultou no emprego total de 810 militaresnos três contigentes, dos quais 40 oficiais e 770 praças, como registro de uma perda em ação22 .

Cumprida a missão, poderíamos aqui realçar, poroutros fatos de relevância, a atuação dos FN na RD. Contu-do, achamos que ela pode ser mais bem interpretada pormeio da leitura de uma mensagem, enviada em junho de1966 pelo Coronel Carlos de Meira Matos ao Comando-Ge-ral do Corpo de Fuzileiros Navais, e que aqui transcreve-mos:

É com indisfarçável orgulho que tenho sob meu comando,na FAIBRAS, o Grupamento de Fuzileiros Navais. Essa tropa deescol, vem confirmando integralmente no Caribe, o alto conceito deque desfruta no seio das Forças Armadas brasileiras. Empregadosem missões complexas, variadas e perigosas, no quadro de umaForça Interamericana e no ambiente tumultuado do conflitodominicano, os FUZILEIROS NAVAIS DO BRASIL, revelaramsempre espírito combativo e eficiência profissional. O padrão de seusquadros de oficiais e sargentos e o valor de sua tropa, patenteadosdiariamente perante os militares de todas as nações componentes daFIP, constituem-se em motivo de ufania para todos os brasileiros.

Santo Domingo (República Dominicana), junho de 1966.Com o retorno do 3o contingente de Fuzileiros Na-

vais da República Dominicana, encerra-se um dos prin-cipais capítulos da história moderna do Corpo de Fuzi-leiros Navais do Brasil. Embora o emprego dos Fuzilei-ros Navais não tenha sido em ações de natureza anfíbia,o CFN teve uma oportunidade ímpar de participar deações operativas, lado a lado, com contingentes de ou-tros países, adquirindo uma excelente experiência.

A presença na RD ensejou que os Fuzileiros Navaistivessem um extenso adestramento com recursos então es-cassos no Brasil, como foi o largo emprego de helicópterosnas ações táticas e logísticas.

Além disso, houve a oportunidade de trazer para oseu inventário, equipamentos e meios não existentes atéentão no Corpo de Fuzileiros Navais: as máscaras contra-gases americanas de última geração; as esteiras metálicasusadas, posteriormente, por um longo período, no DP; amáquina de confeccionar plaquetas de identificação; os shotguns; as viaturas ¼ Ton M-151 Ambulância; as barracas decampanha (de 14 homens, de emprego geral e de manuten-ção de viaturas); e o aprendizado das técnicas de prepara-ção de material para o transporte em paletas.

Assim foi, assim tem sido e assim sempre será. OCorpo de Fuzileiros Navais estará sempre pronto pararesponder aos chamados da nação, reafirmando o signifi-cado do lema dessa tropa de elite: Adsumus!

PARTICIPAÇÃO DE OFICIAIS DA MBForça Interamericana de Paz na República Dominicana(1965-1966 )Estado-Maior da Força Interamericana de Paz (FIP)CF Raphael de Azevedo BrancoCF João Baptista Torrents Gomes Pereira

Estado-Maior da Brigada Latino-Americana (BdaLA)CF Raphael de Azevedo Branco (S-1, S-4 e S-5)CF (FN) Clinton Cavalcante de Queiroz Barros (S-1, S-4 eS-5)CF (FN) Durval Pereira Buarque (S-3 e S-4)CC (FN) Paulo de Oliveira Reis (Comandante / Subcomandante)

Batalhão FraternidadeCC (FN) Fernando do Nascimento (Subcomandante / Co-mandante Interino)CT (FN) Sieberth Magno Diniz Cerqueira (S-2)CT (FN) Valdir Bastos Ponte (S-4)CC (FN) Umberto Barbosa Lima Martins (Subcomandante/ Comandante Interino)CT (FN) Cosme Nuñez (S-4)CT (FN) Fernando Maurício de Moraes Sarmento ( S-2 )1oTen (FN) Vicente Dias Costa Aroeira Neves (S-4)

Observações:(1) Os Comandantes dos GptFuzNav eram os Chefes deEM/Sub-comandantes do Btl Fraternidade e nos impe-dimentos dos Comandantes (Exército da Nicarágua) exer-ciam o cargo de Comandante, o que ocorria com freqüên-cia;(2) Os demais oficiais do Estado-Maior do BtlFraternidade eram dos Exércitos do Paraguai (S-3 eOCom/Comandante do PelCom) e Nicarágua (S-1).

Acampamento na Av. Independência: (da esquerda para adireita) CT(FN) Sieberth, CT(FN) Ponte, CC(FN) Fernando,CT(FN) Pinheiro

Page 78: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A PARTICIPAÇÃO DA MARINHA DO BRASIL NA FORÇA INTERAMERICANA DE PAZ 77

1 Wessin queria acabar com o Partido Comunista, o que ocorreusomente após a queda de Bosch.2 Importantes unidades do Exército, como os acampamentos 27 defevereiro e 16 de agosto, aderiram ao movimento.3 Presidente da Câmara dos Deputados durante o governo de Bosch,a quem caberia a chefia do Executivo pela ausência do titular que foradeposto.4 Estava planejada a chegada por pára-quedas, porém, em razão dasegurança provida em San Isidro, não o fizeram.5 O efetivo total da FAIBRAS era de 1150 homens.6 A Marinha de Guerra fez-se representar inicialmente pelo CF (FN)Durval Pereira de Buarque, CF Paulo de Bonoso Duarte Pinto e 4praças.7 Tropa fornecida pela Cia de Polícia estabelecida na Fortaleza de São José.8 Especialidade extinta e substituída pela de Motorista - MO.

9 Termo de Viagem no 81/1965 do Custódio de Mello.10 Solução encontrada para integrar elementos de nacionalidadesdistintas, dotando-os de capacidade de manobra, inicialmente sem umestado-maior constituído.11 Embora figurasse na estrutura do Batalhão Fraternidade, ficoudurante todo o período da Campanha destacado para cumprir tarefasde segurança no quartel-general da FIP.12 Ciudad Nueva tinha aproximadamente quarenta (40) quadras numtotal de 6 km2.

13 Tal situação ensejava uma constante alteração ao final das horas de

luz, dos locais das seteiras nos sacos de areia, desorientando os rebel-des quanto às informações obtidas durante o dia.14 Os rebeldes empregavam fuzis Mauser 1908, Metralhadoras .30pol., .50 pol. e granadas.15 Enquadram-se nessas tarefas, ações de dispersão de esquerdistas ebaderneiros com o intento de prejudicar o funcionamento normal dasatividades comerciais de Ciudad Nueva.16 O Campo de batalha era na realidade as ruas de Ciudad Nueva que,à noite, ficavam às escuras devido aos cortes de energia provocadospelos esquerdistas.17 A operacionalização de licenças para Porto Rico dava-se pela emis-são, pelo Comando Unificado da FIP, das “Ordenes de Viaje”, assina-das pelo Ajudante do C-1 da FIP.18 As Vtr ¼ ton circulavam, na maioria das vezes, com os pára-brisasrebatidos, para evitar acidentes provocados pelos estilhaços dos vi-dros, caso fossem atingidas por projetis.19 Existia uma suspeita de formação de uma guerrilha no interior daRD.20 Ballaguer foi reeleito por duas vezes (1966 e 1974) e governou até1978. Posteriormente, foi eleito em 1986 e reeleito (1990) e governouaté 1996.21 Dados de planejamento, que foram cumpridos com alterações depequena monta.22 A 3 de junho de 1966, do 3oSG-CN Paulo Barreto de Mendonça,vitimado por acidente de tiro.

GRUPAMENTOS DE FUZILEIROS NAVAIS

I – Grupamento de Fuzileiros Navais (25/05/1965 a 18/11/1965)Fonte: Ordem do dia 083/65, do CGCFN; e Boletim Interno 086/65, do Btl Riachuelo.

CC (FN) Paulo de Oliveira Reis (Comandante)CT (FN) Luiz Lopes dos Santos (Imediato)CT (FN) Rubens Almeida Moreira Piedras (Comandante daCiaFuz) - substituído interinamente, quando do seu regresso defini-tivo ao Brasil, pelo Imediato da CiaFuz e posteriormente, pelo CT(FN) Caio Pompeu de Souza Brasil Filho1oTen (FN) Sérgio de Almeida Vallim (Imediato da CiaFuz)1oTen (FN) Vicente Dias Costa Aroeira Neves (PelPtr)2oTen (FN) Erich Baumeier Filho (1oPelFuz)2oTen (FN) José da Silva Almeida (2oPelFuz)2oTen (FN) Amaro Vicente Teixeira Cantone (3oPelFuz)1oTen (FN) Dante Manoel da Rocha Santos (PelPol)1oTen (FN) Arthur Xavier Moreira (Comandante do GAL)

II – Grupamento de Fuzileiros Navais (18/11/1965 a 02/05/1966)Fonte: Ordem do dia 083/66, do CGCFN ( Parte Confidencial ).

CC (FN) Fernando do Nascimento (Comandante)CT (FN) Geraldo de Abreu Pinheiro (Imediato)CT (FN) Sieberth Magno Diniz Cerqueira (S-2 do BtlFraternidade)CT (FN) Valdir Bastos Ponte (S-4 do Btl Fraternidade)CT (IM) José Leonel Villa-Forte Machado (Of. de Intendência)CT (CN) Itamar Pereira Costa (Capelão da BrigLA)1oTen (FN) Carlos Augusto Costa (S-1 e OCom do Gpt)CT (FN) Octávio Armando Lopes de Almeida (Comandanteda CiaFuz)

1oTen (FN) João Baptista Cordeiro de Mello (Imediato daCiaFuz) - substituído, quando do seu regresso definitivo ao Brasil,pelo 1ºTen(FN) Carlos Alberto Gomes Couto1oTen (FN) Sylvio Luiz Verçosa Serôa da Motta (PelPtr)2oTen (FN) William Alves de Souza (3oPelFuz)2oTen (FN) Antonio Luiz de Oliveira Dantas (1oPelFuz)2oTen (FN) Fernando Mulé (2oPelFuz)1oTen (FN) Luiz Gonzaga Valle (PelPol)1oTen (QC-FN) Aloísio dos Santos Carneiro (Comandante doGAL)

III – Grupamento de Fuzileiros Navais (02/05/1966 a 01/08/1966)Fonte: Ordem do dia 146/66, do CGCFN (Parte Confidencial).

CC (FN) Umberto Barbosa Lima Martins (Comandante)CT (FN) Jayme César Gerin Guimarães (Imediato)CT (FN) Cosme Nuñez (S-4 do Btl Fraternidade)CT (FN) Fernando Maurício de Morais Sarmento (S-2 do BtlFraternidade)CT (IM) Jorge Luis Vargas Marques (Oficial de Intendência)CT (CN) Itamar Pereira Costa (Capelão da BrigLA)CT (FN) Rubens Feitoza de Carvalho (S-4/Comandante doGAL e OEmb do Gpt)1oTen (FN) Joseny Azarany Bezerra (S-1 e OCom do Gpt)CT (FN) Lyrio Bravin (Comandante da CiaFuz)1oTen (FN) Leonardo de Castro França (Imediato da CiaFuz)1oTen (FN) José Armando Carvalho de Carvalho (PelPtr)1oTen (FN) Sylvio Ferreira da Silva (1oPelFuz)2oTen (FN) Carlos Alberto Fonseca Dantas (2oPelFuz)2oTen (FN) Osny Câmara Fagundes (3oPelFuz)1oTen (QC-FN) Jair Baptista Lopes (PelPol)

Page 79: O Anfíbio - Edição Extra 2008

78 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Page 80: O Anfíbio - Edição Extra 2008

25 ANOS DE OPERAÇÕES DRAGÃO 79

25 ANOS DEOPERAÇÕESDRAGÃO

Matéria publicada no “O Anfíbio” (Edição Especial - 1990)

CMG (FN) José Roberto da Silva Costanza

Em janeiro de 1968, quando chegueicomo Guarda-Marinha ao recém-criadoBatalhão Humaitá, a conversa de Praça

D’Armas era uma só: Operação Dragão.Tenentes “quatis rabudos” contavam

vantagens. E nós, GM, ficávamos com umaponta de inveja daqueles companheiros, já“cobertos de glórias”. Assim, ansiávamos pelonosso regresso, após a viagem de instrução,quando também teríamos a oportunidade demostrar o nosso valor.

Vinte e um anos depois, já comoComandante do Batalhão, relembro aquelesdias com uma certa nostalgia e, foi, pois, commuita satisfação, que acedi ao convite deescrever algo sobre esse grande exercício, quemarcou, marca e continuará marcando a vidaprofissional de todos quantos têm a honra deser Fuzileiros Navais.

“A Complexidadeda OperaçãoDragão” desenhode Álvaro Martins

Page 81: O Anfíbio - Edição Extra 2008

80 O ANFÍBIO • 200 ANOS

Um Pouco de HistóriaApós a Segunda Guerra Mundial, um grupo de

Oficiais do Corpo de Fuzileiros Navais, liderados peloentão Comandante-Geral Almirante Sylvio deCamargo, e assessorado por Oficiais do Corpo deFuzileiros Navais dos Estados Unidos da Amé-rica (USMC), estudou e elaborou um programade modificações estruturais que deveria so-frer o Corpo de Fuzileiros Navais, a fim deque a Marinha brasileira pudesse contarcom uma Força de Fuzileiros pronta, equi-pada e aprestada para empenhá-la, acurto prazo, em qualquer ponto ou área,em que se fizesse necessária a projeçãoe emprego do Poder Naval em terra.

Tais estudos, aprovados pelaAlta Administração Naval de então,foram consubstanciados no Regulamentopara o Corpo de Fuzileiros Navais, de abril de 1950,onde se previa a criação de uma Força de Fuzileiros daEsquadra. A exigüidade dos quadros e efetivos de oficiais epraças, à época (menos de uma centena de oficiais e de4.500 praças), não permitia qualquer expansão do Corpode Fuzileiros Navais, já totalmente empenhado nas For-ças de Segurança.

Somente em 1957, depois da promulgação da “Leide Fixação de Forças”, que autorizava 10.000 homens parao Corpo de Fuzileiros Navais e de se tomarem medidasparalelas de incremento, tais como o aumento do númerode oficiais oriundos da Escola Naval, pôde o Corpo de Fu-zileiros Navais submeter ao Estado-Maior da Armada oprojeto de criação da Força de Fuzileiros da Esquadra (FFE).

Aprovado o projeto, foi ativada a célula-mater daFFE – O Núcleo da 1ª Divisão de Fuzileiros Navais, e foiarmada a barraca de comando na ponta do Bananal – Ilhado Governador, junto à antiga Companhia Escola, nascen-do, desse modo, a Companhia de Comando do Núcleo.

Entusiasmado com a nova tarefa, os Oficiais Fuzi-leiros puseram-se a planejar sua primeira Operação Anfí-bia, ainda no ano de 1957. Essa Operação recebeu o nomede Aragem e foi realizada na praia do Peró, em Cabo Frio.

A Força de Desembarque, comandada pelo entãoCapitão-de-Corveta Luiz Carlos Palhano Leal, era consti-tuída de um Grupamento Operativo, valor Companhiade Fuzileiros, formado por oficiais e praças de diversasunidades.

Os resultados alcançados na Operação Aragem,apesar da grande deficiência de material, tanto na ForDbqcomo na ForTarAnf, compensaram os esforços dispendidos.Muitos problemas, entretanto, tinham que ser corrigidos,demonstrando a necessidade da realização de, pelo me-nos, um exercício anfíbio anual.

Assim sendo, em 1958, nova operação foi realizadaem Cabo Frio, desta feita com o codinome Badejo. ComoForça de Desembarque, o Comando-Geral ativou o 1ºGrupamento Operativo, também nucleado em torno deuma Companhia de Fuzileiros, o qual, acampado na PraiaGrande, deu origem, após terminada a operação, ao atual

1º Batalhão de Infantaria, o Ba-talhão Riachuelo.

No ano seguinte, ainda em Cabo Frio, foirealizada a Operação Corvina. A Força de Desembar-que era constituída pelo Batalhão Riachuelo (a 2 compa-nhias) reforçado por elementos da recém-criada Compa-nhia de Reconhecimento Anfíbio da FFE, cujos integran-tes, no ano seguinte, realizaram marcha a pé até Brasília,levando uma mensagem da Marinha ao Presidente daRepública, e entregando-a ao Chefe de Governo, durante odesfile inaugural da Nova Capital.

Em 1960, o Batalhão Riachuelo nucleou a Força deDesembarque que realizou a Operação Arfagem no litoralde São Paulo: para tal, contou com o reforço de Batalhão dePioneiros, criado em 1959.

Em agosto de 1961, por ocasião dos episódios que seseguiram à renúncia do Presidente Jânio Quadros, foi rea-lizada a Operação Abelha, sem a concretização do assaltoanfíbio, no litoral de Santa Catarina. Para a Operação Abe-lha, que não visava ao adestramento, como as anteriores,foi ativada pela primeira vez uma Unidade Anfíbia deFuzileiros, comandada pelo então CMG (FN) Greenhalg.Outra novidade foi a requisição e utilização dos naviosmercantes Araranguá (um ITA) e Rio Mossoró. Finalmente,não poderíamos, em se tratando de história, deixar de as-sinalar a estréia da Artilharia do Corpo de Fuzileiros Na-vais, que se fez representar na Abelha por um destaca-mento da Escola de Artilharia do Centro de Instrução.

A exemplo do que já ocorria com a UNITAS, foi-lhecolocado um número em algarismos romanos, significan-do que ela seria realizada anualmente e representaria ocoroamento do adestramento para Força de Fuzileiros daEsquadra e, também, para as Forças Navais e Aeronavaisno que tange às Operações Anfíbias.

A Operação Corvina foi noticiadano “O Anfíbio” nº 33, de

dezembro de 1959

Page 82: O Anfíbio - Edição Extra 2008

25 ANOS DE OPERAÇÕES DRAGÃO 81

O NomeMuito se tem discutido a respeito do nome Dragão.

Inicialmente, pensou-se que, sendo a quarta grande Ope-ração Anfíbia, teria necessariamente que começar com aletra D - as três primeiras: Aragem, Badejo e Corvina. Osimples exame do histórico descarta essa hipótese, porqueentre Corvina e Dragão I houve a Operação Arfagem. Pa-rece-nos mais convincente a explicação apresentada peloCMG (FN) João Baptista Cordeiro de Mello. Segundo ele,Dragão foi oriundo de uma operação de grande vulto rea-lizada à época pelo USMC – The Operation Dragoon, quesignificava cavaleiro fortemente armado.

Os Primeiros PassosA primeira fase da Dragão ocorreu no ano de 64,

quando foram realizadas as Dragão I (janeiro) e II (dezem-bro), respectivamente em Vitória (ES) e Imbituba (SC).

A Dragão I se caracterizou por uma série de inova-ções e experimentações de práticas já consagradas noUSMC, dentre as quais destacamos o movimentohelitransportado. A Força de Desembarque era constituí-da apenas de 1 Grupamento de Desembarque de Batalhão(GDB) nucleado pelo Batalhão Riachuelo, formando o quehoje denominamos Unidade Anfíbia de Fuzileiros (UAnf).Pela primeira vez participaram de um Assalto Anfíbio osrecém-criados Grupo de Artilharia e Batalhão de Trans-porte Motorizado (BtlTrnpMtz). A Força Tarefa Anfíbia(ForTarAnf) era composta de 5 navios e 4 helicópteros, e aForça de Desembarque (ForDbq) tinha 980 homens. O

Apoio de Praia foi prestado pela própria Companhia deComando e Serviços do Batalhão Riachuelo. Quanto àscomunicações, foram utilizados os equipamentos forneci-dos pelo Acordo Militar com os EUA (MAP): AN/GRC-9(HF-AM), cujo gerador era popularmente conhecido como“Lambreta”, o mais potente equipamento, utilizado nonível Força; AN-PRC-10, para a Rede Tática do GDB; e ospequenos AN/PRC-6, para a Rede Tática das Companhiasde Fuzileiros (CiaFuz).

A Dragão I funcionou como uma espécie de labora-tório, onde foram testados e experimentados novos equi-pamentos e unidades recém-criadas. Os erros foram de-tectados e muita coisa corrigida para a operação subse-qüente, que ocorreu em dezembro do mesmo ano. Nessaoperação, foi criado um Comando da ForDbq independen-te do Comando do GDB. Houve, entretanto, um problemalogístico que concorreu para o esvaziamento da OperaçãoDragão II; só havia um Navio Transporte disponível, oBarroso Pereira.

Nos dois anos subseqüentes (65 e 66), por motivospolíticos e econômicos, não houve Dragão. Entretanto, em67, tivemos uma grande operação.

A InfânciaA Dragão III constituiu um marco das Operações

Anfíbias no Brasil. Realizada em Caraguatatuba (SP), teve,pela primeira vez, um Oficial General como Comandanteda ForDbq, o C Alte Roberval Pizarro Marques, então Co-mandante do Núcleo da 1º Divisão de Fuzileiros Navais.Foi constituída em Brigada Anfíbia de Fuzileiros, a 2 GDB,nucleados, respectivamente, pelo 1ºBtlInf Riachuelo e2ºBtlInf Humaitá, que fez o seu debut. Além do Assalto An-fíbio, foi também realizada uma Incursão Anfíbia. Quantoà logística, foi instituído um Grupamento de ApoioLogístico (GAL) nucleado pelo BtlTrnpMtz.

Para frustração dos tenentes, a “criança” ficou do-ente e nos anos seguintes, de 68 e 69, tendo por causa, res-pectivamente, o fechamento do Congresso e o derramesofrido pelo Presidente Costa e Silva, as Dragão IV e V nãosaíram das mesas dos planejadores.

Finalmente, em 1970, estreamos em grande estilo.O desembarque foi em São Sebastião (SP) e, pela primeiravez, os helicópteros SH-3 (Sea King) foram utilizados noMovimento Navio-Terra (MNT). Também, com muito su-cesso, foi realizado o primeiro desembarque com tropaproveniente dos submarinos, cujo MNT por superfície foifeito em embarcações pneumáticas (EDPn). Apesar de jáplanejado nas frustradas Dragão IV e V, desta vez foi acio-nado o Destacamento de Praia Divisionário (DPiv),nucleado pelo Batalhão de Serviços (BtlSv). Surge, no Pla-no da Dragão VI, um anexo de saúde completo, contendonormas para evacuação de feridos e hospitalização, e apa-rece também o “Conceito do Apoio Logístico”.

Em 1971, a área escolhida para a Dragão VII foi Macaé(RJ). Houve duas novidades, uma na ForDbq e outra naForTarAnf. A primeira, foi a participação da 1ª CiaFuz dorecém-criado 3ºBtlInf Paissandu, comandada pelo entãoCapitão-Tenente (FN) Nélio Achão, da qual tive a honra de

Matéria sobre Operação Aragem.“O Anfíbio” nº 28, de junho de 1959

Page 83: O Anfíbio - Edição Extra 2008

82 O ANFÍBIO • 200 ANOS

ser Imediato. A outra novidade, foi a participação do Na-vio de Desembarque de Carros de Combate (NDCC) GarciaD’Ávila. A inclusão deste navio veio dar uma nova dimen-são às OpAnf, posto que, até então, os Oficiais de Embar-que só contavam com os porões e o tombadilho (BarrosoPereira) dos navios-transporte para estivar toda a carga daForDbq.

Marataízes (ES), outubro de 1972. Voltamos à terracapixaba, esquecida desde 64. Com dois GDB e umGrupamento Operativo de Companhia (GptOpCia) – doBtl Paissandu – a ForDbq da Dragão VIII desembarcou,pela primeira vez, no segmento do litoral do Espírito San-to que viria a ser palco de vários outros exercícios. NoMNT, a novidade foi a participação dos Navios Varredoresda Classe Aratu, como navios de controle.

A Dragão IX realizou-se em Ilhéus (BA), em de-zembro de 73. Desta feita, o Btl Paissandu participou comoPeça de Manobra – o GDB-3 – que desembarcouhelitransportada. Dela também participaram, como es-treantes, a Companhia de Reconhecimento Terrestre(ReconTer) e as Viaturas Anfíbias Urutu. Foi ativado, pelaprimeira vez, um Grupo de Assuntos Civis e GovernoMilitar e, também, estabelecida uma Área de ApoioLogístico (AApLog), desdobrada em duas Unidades deApoio Logístico Divisionário (UALD). O Núcleo da 1ª Divi-são de Fuzileiros Navais passou à denominação de Divi-

são Anfíbia (DivAnf), marcando o fim da infância nas Ope-rações Anfíbias.

A JuventudeA participação do NDCC Duque de Caxias, recém-

incorporado à nossa Marinha, estabeleceu uma nova fase.Recentemente, ainda pertencendo à Esquadra Americana,havíamos nele embarcado, como participantes da Opera-ção Veritas, que, desde 1968, anualmente, era realizadaem Porto Rico.

Em razão da entrada em serviço do Duque de Caxias,os efetivos da Dragão X foram incrementados. Realizadaem outubro de 1974, em Itajaí (SC), marcou, também, aestréia em um novo cenário que, ao longo da história daOperação Dragão, outras vezes seria utilizado. Pela pri-meira vez, um Grupamento de Fuzileiros Navais partici-pou da operação como figurativo inimigo: o Grupamentode Santos. No Campo das comunicações, entraram em ati-vidade os equipamentos portáteis AN/PRC-77, daTelefunken, já com certo grau de nacionalização.

A Dragão XI foi também realizada em Itajaí (SC), econtou com a participação de aeronaves T-25 da ForçaAérea Brasileira (FAB).

Em novembro de 1976, em Guarapari (ES), foi reali-zada uma Dragão diferente, a XII. O desembarque foi con-cretizado apenas por um GDB, enquanto outros dois par-

Page 84: O Anfíbio - Edição Extra 2008

25 ANOS DE OPERAÇÕES DRAGÃO 83

ticipavam do exercício somente na carta. O Batalhão deOperações Especiais Tonelero participou como Força deIncursão. Marcou o emprego, pela primeira vez, de novosmeios do CFN e da Força Aérea: Carros de Combate LevesCascavel, Viaturas Blindadas M-113 e as Aeronaves T-16(Xavante). Houve uma grande participação da 9ª Brigadade Infantaria Motorizada (ES) do Exército (EB), marcandoo primeiro planejamento de desembarque administrativode forças do EB, com posterior operação de substituição ereembarque da ForDbq sob a proteção da tropa terrestre.

Em Santa Cruz de Cabrália/Porto Seguro (BA), foirealizada a Dragão XIII. Nessa área, a exemplo da Itaóca(ES) e Itajaí (SC), foram realizados, nos anos seguintes, comoveremos, outros exercícios. A inovação ficou por conta dolançamento, por pára-quedas, de elementos de reconheci-mento anfíbio, e pela formação de um grupo aéreo, consti-tuído por helicópteros da MB e aeronaves da FAB.

A participação das Embarcações de Desembarquede Carga Geral (EDCG), classe Tambaú, foi o ponto alto daDragão XIV (Itaóca/ES), dando nova vida ao MNT, emboraconsiderando fictícia a travessia em Navios de Desembar-que Doca (NDD).

As operações subseqüentes, Dragão XV e XVI, re-alizadas, respectivamente, em Itaóca (ES) e Cabrália (BA),não apresentaram novidades.

Em 1981, para a Dragão XVII (Itaóca/ES), foi organi-

zado um Grupo de Controle e Arbitragem, que possuía,subordinada a ele, uma Equipe de Arbitragem constituídapor elementos não pertencentes à ForDbq. Essa equipe,chefiada pelo CMG Pedro Paulo Braga Duarte, era consti-tuída de 6 árbitros.

A partir de 1982, o Comandante da FFE assumiu adireção do Exercício, que, até então, era realizado cumula-tivamente com o Comando da ForDbq. Essa nova posturamarca o término da juventude.

A MaturidadeNa Dragão XVIII (Itaóca/ES), em que pela primeira

vez se empregou a Bateria de Canhões Automáticos Anti-aéreos 40mm, a equipe de arbitragem foi aumentada para23 oficiais. Na operação seguinte (XIX), em Itaóca (ES), foiestabelecido que o exercício seria de dupla ação, e institu-ído um Grupo de Controle (GruCon) com 34 Oficiais.

Porto Seguro (BA), Itaóca (ES) e Itajaí (SC) foram oscenários das Operações Dragão do último lustro. A incor-poração de novos meios de comunicações, adquiridos re-centemente em Israel, passou a assegurar ao ComForDbqC3I compatível com as exigências da guerra moderna. Oscarros Lagarta Anfíbio LVTP-7, do tipo mais moderno, apartir da Dragão XXIII, em Itajaí (SC), abriram os horizon-tes do MNT, limitado a poucas praias, acessíveis às Embar-cações de Desembarque, em razão do gradiente e ds condi-ções de arrebentação. O recebimento dos helicópteros Super-Puma com capacidade de transporte de até 20 homens equi-pados, a partir, também, da Operação Dragão XXIII, trouxeà ForDbq uma flexibilidade nunca antes obtida. E, final-mente, o sistema Saku-Combat de direção de tiro, proporci-onou à artilharia da ForDbq rapidez e precisão.

PerspectivasA partir de 1990, passaremos a contar com navios

tipo Doca, que nos seus Well-Deck transportam as tão ne-cessárias EDCG.

A Defesa Antiaérea da cabeça de praia, com aoperacionalização do Sistema “BOFI” e o controle do es-pectro eletromagnético do campo de batalha, dentro embreve se tornarão realidade.

ConclusãoResumir 25 anos de Operação Dragão é uma tarefa

difícil, pois há o risco de omissão de fatos importantes queaconteceram ao longo desse 1/4 de século.

A Dragão “romântica” dos anos 60 e 70, deu lugar auma operação altamente técnica, em que forças em con-fronto, com grande liberdade de manobra, são avaliadassegundo parâmetros confiáveis, inclusive com o auxílio decomputadores.

Feliz Aniversário, Dragão. Que o seu jubileu de pra-ta seja um novo marco, um novo primeiro passo nesseinterminável processo evolutivo. ADSUMUS.

Nota de redação: A operação Dragão foi realiza-da durante 42 anos, de 1964 à 2005, sendo a última nacidade Marataízes, no Espírito Santo.

A Dragão “romântica”dos anos 60 e 70 deulugar a uma operaçãoaltamente técnica, emque forças em confronto,com grande liberdadede manobra, sãoavaliadas segundoparâmetros confiáveis.

Page 85: O Anfíbio - Edição Extra 2008

84 O ANFÍBIO • 200 ANOS84 O ANFÍBIO • 200 ANOS

QUARTAESTRELA PARA O CFN

UM DEPOIMENTO

DOMINGOS DE MATTOS CORTEZAlmirante-de-Esquadra (FN)

Comandante-Geral do Corpo de Fuzileiros Navaisde Dezembro de 1977 a Dezembro de 1984

Matéria publicada no “O Anfíbio” nº 16 (1996/97)

Page 86: O Anfíbio - Edição Extra 2008

QUARTA ESTRELA PARA O CFN - UM DEPOIMENTO 85

Deixei que o tempo passasse para que os fatos pu-dessem ser vistos em sua verdadeira perspectiva,e os acontecimentos mostrassem a sua face real.

Sentia que tinha um dívida para com aqueles que foramparticipantes, aqueles que deram sua contribuição e paracom as novas gerações. Apenas, aguardava o momentooportuno para dar um depoimento dos acontecimentoscomo eu os vivenciei.

O Corpo de Fuzileiros Navais (CFN), no início dadécada dos 80, havia alcançado credibilidade operativa comoresultado do esforço, pertinácia e competência profissio-nal de seu pessoal, e já possuía, naquela altura, uma ex-pressão numérica ponderável em relação ao todo da Ma-rinha do Brasil (MB).

A expressão combatente do Corpo de FuzileirosNavais – a Força de Fuzileiros da Esquadra (FFE) – se cons-tituía em uma Força de Pronto Emprego, versátil e flexível que,além de ser capaz de projetar poder em terra, podia ope-rar com eficiência em variados ambientes operacionais,tanto no litoral quanto nos ambientes ribeirinhos daAmazônia e do Pantanal. Além disso, a FFE era uma peçade excelência no panorama militar brasileiro, combinan-do eficácia operativa e racionalidade, muito embora seuselementos de Manobra e Apoio apenas correspondessemao mínimo indispensável para combinar Armas e Servi-ços. Em outras palavras, a MB dispunha de um instru-mento valioso, com mobilidade estratégia e aptidão paramissões de controle de crise, altamente adestrado, comrápida capacidade de resposta, e em condições de fazerfrente a amplo espectro de desafios no imenso cenário des-te nosso País-Continente. A existência das forças de Fuzilei-ros Navais conferia à Marinha a capacidade singular deatuar no mar, em terra e no ar, com seus meios orgânicos,com pessoal profissional e com experiência em operaçõesinternacionais.

“Difficulties is the name given tothings it is our business to overcome”

Adm Ernest King (USN)

O estágio de desenvolvimento e a consciência dacondição de Combatentes Anfíbios, acentuaram o desejo doreconhecimento da importância do CFN e a vontade demaior participação e integração no contexto da Marinha,sem prejuízo de tradições e peculiaridades que nos acom-panham desde os idos da Brigada Real da Marinha. Paraisso se fazia necessária a participação no processo decisóriode alto nível, por via de conseqüência, presença do seuComandante-Geral no Alto Comando da Marinha – o Al-mirantado. No caso não se tratava de ambição pessoal doChefe eventual – havia, além de uma aspiração coletiva, aimperiosa necessidade de fazer ouvir nossa voz no Órgãoresponsável pelos destinos da Marinha, face a peculiari-dades que não podiam ser adequadamente explicitadascom uma simples assessoria. Era necessário que tivésse-mos voz e voto para que pudéssemos ser ouvidos, em pri-meira mão, com a atenção que merecem nossa vivência econhecimentos nas áreas de pessoal, material e operativado CFN, no processo de tomada de decisões que influíramem nossos destinos. Desejávamos e merecíamos um pata-mar de igualdade de tratamento dispensado a todos aque-les voltados para a Atividade-Fim, nas diferentes Forças Sin-gulares.

Existe, porém, uma imensa distância entre merecere alcançar um determinado objetivo, tanto mais no meiomilitar, onde os necessários e rígidos condicionamentosda hierarquia e disciplina tornam eventuais reivindica-ções algo que pode ultrapassar, facilmente, a linha divisó-ria do que pode ser tolerado.

Desde a criação do posto de Almirante-de-Esqua-dra, o Alte Heitor Lopes de Souza e, depois dele, todos osque se seguiram no Cargo, deram sua parcela de esforçopara viabilizar a sua extensão ao CFN e tornou-se praxeencaminhar ao Ministro, ao fim do Período de Comando,um documento enfatizando a justiça da medida que tinha

Page 87: O Anfíbio - Edição Extra 2008

86 O ANFÍBIO • 200 ANOS

se tornado para nós – Fuzileiros Navais – um objetivoirrenunciável. Comigo não seria diferente e, no decorrerde 1980, me preparei para a passagem do Comando nofinal do ano, quando completaria o prazo limite de perma-nência na Ativa, sem imaginar as mudanças que estavampor vir em tão curto espaço de tempo.

Naquela altura, eu próprio, ainda não tinha alcan-çado a profundidade das mudanças que ocorriam na Ma-rinha e da capacidade de ousar do então Ministro – AlteMaximiano. Este Chefe Naval realizador e determinado,tinha vindo para impor a marca de suas idéias e do seudescortino e teve, em sua Administração, um período al-tamente fecundo de renovação, união e engrandecimentoda Marinha. Além do notável legado que deixou em im-portantes setores, e que fogem ao escopo deste trabalho,ele deve ter intuído que o melhor caminho para umaintegração completa do CFN ao conjunto da Marinha, se-ria através de um tratamento igualitário e da participa-ção de seus diversos Chefes nos vários níveis decisórios.Não tenho a menor dúvida, como Ator e Testemunha, do acertodo diagnóstico, e no final dos meus sete anos de Comando,o CFN estava solidamente integrado ao conjunto da Mari-nha, de uma forma participativa e solidária. Espero que otranscurso dos anos só tenha reforçado esses laços.

Os reformadores sempre encontraram resistênciados que receiam as mudanças, invocando razões de tradi-ção, inoportunidade e outras que o tempo, muitas vezes seencarregada de mostrar inconsistentes ou preconceituosas.Os Fuzileiros Navais, em particular, são vítimas freqüen-tes de preconceitos, e não apenas aqui. Em agosto de 1951,o então Presidente Truman, em carta ao DeputadoMcDonough dizia: “O Marine Corps é força policial da Marinhae enquanto eu for o Presidente será assim que eles permanecerão. Elestêm uma máquina de propaganda que é quase igual a do Stalin”1.Uma semana depois endereçava ao General C.B. Cates –Comandante dos Marines – carta com pedido de descul-pas.

Na década dos anos oitenta, em plena Guerra Fria,setores da Marinha, fortemente influenciados pela experi-ência da MB na Segunda Guerra Mundial, achavam que oemprego das Forças Navais na proteção do Tráfego Marí-timo e outras missões oceânicas correlatas, não davammargem a dispêndio de recursos escassos em setores quejulgavam menos prioritários. Além disso, consideravaminconveniente conferir ao CFN papel de maior relevo naEstrutura Naval por desnecessário e no pressuposto deuma atuação tida como capaz de influir, negativamente,no balanceamento das Forças Navais. Lembro-me de terlido ...que era indispensável inibir o Comandante-Geral de defenderos interesses do CFN no Almirantado, sem ser cerceado pela visão eresponsabilidade global do Comandante de Operações Navais e quea ...habilidade do CFN em perseguir seus objetivos, poderia levar auma situação em que a Marinha se transformaria em mera força detransporte e apoio do CFN. O texto é um elogio à tenacidadedos Fuzileiros, e demonstra muito pouca confiança na atu-ação dos Membros do Almirantado. São ingênuas eirrealistas as suposições, e lamentável que tenham encon-trado agasalho em colegas que vieram da mesma Escola.

Hoje, essas colocações parecem simplórias e inconsisten-tes e, felizmente, o tempo e os acontecimentos estão se en-carregando de desmentir as Cassandras da época. Na ver-dade, nunca o CFN foi obstáculo para que a MB obtivesseos meios que julgava adequados; ele existe para somar, égrande o retorno em termos de aumento do poder comba-tente da MB e os dispêndios para o seu reaparelhamentosão insignificantes, quando comparados aos necessáriospara a aquisição de navios e aeronaves. Por outro lado, asmudanças no quadro estratégico, e as novas grandesdifusas ameaças surgidas com o fim da guerra fria, só fa-zem acentuar a valia da existência do CFN e quanto elepoderá ser útil à Marinha. Quem viver verá.

Naquela ocasião o Alte Maximiano e outros ilustresChefes Navais aprovaram a criação do posto de Almiran-te-de-Esquadra no CFN. Quando tomei conhecimento doque ocorria, o assunto já havia obtido amplo respaldo noAlmirantado2, e o anteprojeto de Lei encaminhado à Pre-sidência. Na oportunidade, desejo recordar o gesto de gran-deza do Almirante Carneiro Ribeiro, que opinou favora-velmente no Almirantado, mesmo sabendo que assim pro-cedendo, seria atingido pela quota compulsória no final doano. Isso não ocorreria, caso a vaga a ser aberta, comochegou a ser cogitado, fosse destinada a criação de maisum Almirante-de-Esquadra no Corpo da Armada, paradesdobrar a Diretoria-Geral de Navegação do Comandode Operações Navais.

Para evitar natural constrangimento pela condi-ção de eventual favorecido, nunca havia tocado sobre esseassunto com os meus Chefes mas lembro que, por ocasiãoda recepção que ofereci ao Ministro Henning, na Fortalezade São José, em homenagem que recebeu quando se prepa-rava para a passagem de seu cargo de Ministro, o assuntoveio a baila. Ao final da reunião, quando já descia a esca-daria do nosso Quartel-General, o Ministro Henning che-gou a me confidenciar que lamentava deixar a Pasta sempropor a elevação do posto do Comandante-Geral, pôrnão ter encontrado uma solução satisfatória. Tenho aindapresente a resposta que então lhe dei, muito sintética, dadaa circunstância: “Sr. Ministro, uma solução seria confiar à Autori-dades diferentes o Preparo e o Emprego do Poder.” Em termos ge-rais, foi a solução que acabou prevalecendo na gestão se-guinte. Por oportuno, quero manifestar minha homena-gem à memória do Alte Henning. Chefe a quem fiquei adever pelo apoio que recebi, pelas medidas tomadas du-rante meu Comando e pela inúmeras provas de conside-ração com que me distinguiu.

Prosseguindo nosso relato, a Exposição de Motivosnº 0080, encaminhada ao Presidente, em 20 de agosto de1980, justifica e traça as linhas gerais das alterações que aMB julgava adequadas, conforme, a seguir, reproduzo nasua parte substantiva:

“Nos últimos anos, várias alterações foram introduzidas naEstrutura do Corpo de Fuzileiros Navais de modo a adaptá-la aomelhor desempenho de suas atribuições, como, também para atender àatualização de seus serviços e atividades. Assim, a reestruturação doComando-Geral e do Comando de Apoio do Corpo de Fuzileiros Na-vais, a reorganização da Força de Fuzileiros da Esquadra e o reforço

Page 88: O Anfíbio - Edição Extra 2008

QUARTA ESTRELA PARA O CFN - UM DEPOIMENTO 87

das Forças de Segurança Distritais são, entre outras, algumas dasalterações efetuadas, que se por um lado vieram a aumentar a eficiên-cia daquele Corpo, por outro, conduzem a necessidade de uma atuali-zação dos efetivos dos seus Oficiais. Além disso, o contingente doCFN, que hoje atinge a cerca de ¼ do contingente da Marinha, pelassuas peculiaridades administrativo-operativas requer tratamento es-pecífico, o que torna conveniente que o Comandante-Geral participediretamente nas decisões de cúpula da Marinha. Desta forma, estudoslevados a efeito revelaram a adequabilidade de que o cargo de Coman-dante-Geral do CFN, venha a ser exercido por um Almirante-de-Esquadra do referido Corpo, passando a integrar, como Membro Nato,o Almirantado. Convém comentar que tal medida, que visa proporci-onar ao CGCFN tomar parte ativa no processo decisório de alto nívelda Marinha, não alterará em nada a atual composição de Forças doCFN, tampouco as relações de subordinação ao CON que essas For-ças atualmente respeitam”.

O passo seguinte foi o envio do Aviso nº 399, de 24de setembro de 1980, do Ministro Chefe do Gabinete Civilda Presidência, Golbery do Couto e Silva, ao Primeiro Se-cretário do Senado Federal, Senador Alexandre Costa, en-caminhando a Mensagem Presidencial nº 400, da mesmadata, assinada pelo Presidente da República JoãoFigueiredo.

A Comissão Mista do Congresso Nacional, incum-bida de emitir parecer do já então Projeto de Lei nº 25,1980-CN, teve como Presidente o Deputado LeopoldoBessone, e Relator o Senador Jorge Kalume3, tendo conclu-ído seu trabalho em 9 de outubro, opinando unanime-mente pela aprovação do Projeto.

Com parecer favorável da Comissão Mista, o Proje-to de Lei foi colocado na Ordem do Dia, da 287ª SessãoConjunta, em 16 de outubro de 1980, e discutido em turnoúnico, presidido pelo Senador Jorge Kalume. Encaminhan-do a votação usaram da palavra os Deputados MarceloCerqueira, Walter Silva e, como líder, o Deputado DjalmaBessa. Com aprovação unânime e sem emendas o Projetofoi aprovado.

A Mensagem nº 439 do Presidente da República aoPresidente do Senado Federal, de 27 de outubro de 1980,comunica a sanção presidencial do Projeto, convertido naLei nº 6.836, da mesma data. Era a conquista de uma aspi-ração justa, materializada graças ao Presidente JoãoFigueiredo, a quem o CFN passou a dever um preito degratidão e reconhecimento, e ao Almirante MaximianoEduardo da Silva Fonseca – Ministro da Marinha,idealizador e condutor de todo o processo.

No dia 11 de novembro de 1980, contribuição indi-vidual dos Oficiais permitiu homenagear nosso Ministrocom uma placa alusiva ao evento. A ocasião me pareceuapropriada para prestar, também, uma homenagem maisdo que devida, a um dos nossos maiores e, para passá-la àsmãos do Ministro e proferir a saudação que o momentoexigia, convidei o eminente e estimado Chefe, o AlmiranteSylvio de Camargo, grande responsável pelo impulso quetinha levado o CFN ao ponto que chegara. Reproduzo al-guns trechos de sua saudação:

“Essa aspiração, que era de todos que servem e tinham servi-do, se desvanecia, quando chegou V.Excia à direção da Marinha.

Quis o destino dar a V.Excia um harmonioso conjunto de qualidadese circunstâncias. Conjunto excepcional. Primeiro dum profundo amora esta Marinha; segundo de uma capacidade de liderança, dum espíri-to de autoridade e de decisão que sua jovial modéstia nem sempreesconde: uma compreensão justa, humana, de aspiração de umaCorporação.

Sr. Ministro, esta medida que V.Excia nos deu, nesta primave-ra, será ponto vernal da história dos Fuzileiros Navais, porque foiuma medida para engrandecimento da Marinha, medida de justiça ede compreensão duma aspiração coletiva”.

Promovido no dia 25 de novembro de 1980, nessamesma data, expedi a Ordem-do-Dia nº 0002/80, que viriaa ser o primeiro documento assinado por um AlmiranteFN investido no novo Posto. Eu a reproduzo, parcialmen-te, por ter sido escrita na emoção de uma conquista e porrefletir os sentimentos que dominavam a todos os Fuzilei-ros Navais que viveram aqueles momentos:

“A decisão da alta Administração Naval, do Congresso e doChefe da Nação, conferindo aos Oficiais do CFN a honrosa distinçãode atingir o mais alto posto da hierarquia militar é um marco históricoa balizar uma esquina em nossa já longa caminhada. Estão, assim,premiados e reconhecidos todos aqueles que com o seu amor à Mari-nha, sua crença, sua aplicação ao dever, contribuíram para tornarpossível a magnífica realidade do presente. Retrata a aspiração con-cretizada e o justo prêmio a todo um esforço de gerações, do soldadomais moderno aos Comandantes-Gerais, que acreditaram no que fazi-am, que lutaram por um ideal maior e que souberam cultivar as virtu-des da perseverança e da determinação. A esse gesto de grandezatodos os Fuzileiros Navais, motivados pelo seu elevado significado,saberão responder com redobrado ânimo na tarefa grandiosa de forta-lecimento de nossa Marinha, integrados e participantes, confiantes ereconhecidos. Mesmo porque, o ser Fuzileiro Naval é um estado deespírito; encontramos motivação nas dificuldades e, nos desafios, aimpulsão para novas realizações.

O galardão que nos alegra encerra, assim, Fuzileiros Navais,acima de tudo a responsabilidade de preservar o legado que recebemose acrescentar a ele o que de melhor nossa dedicação, trabalho, consci-ência profissional e espírito de corpo puderem construir, dotando aMarinha de um instrumento Militar eficaz, fiel à sua destinação,motivado, disciplinado e coeso”.

Estava concluída mais uma etapa na longa histó-ria do Corpo de Fuzileiros Navais que começou no dia 7de março de 1808, com a chegada ao Rio de Janeiro daBrigada Real de Marinha, a quem o CFN deu continui-dade histórica.

1 Dictionary of Military and Naval Quotation-RobertDebs Heini, Jr. P.184

2 Além do Ministro, o Almirantado de então contavacom os seguintes Almirantes-de-Esquadra: Fernando ErnestoCarneiro Ribeiro, Roberto Andersen Cavalcante, GerardoAlbano de Aratanha, José Calvente Aranda e Newton Bragade Farias.

3 Além do Presidente e seu Vice, a Comissão Mista eracomposta dos Srs. Passos Porto, Almir Pinto, Adalberto Sena,Luiz Cavalcante, Lomanto Junior, Roberto Saturnino,Raimundo Parente e Deputados Marcelo Cerqueira, OdulfoDomingues, Juarez Furtado, Feu Rosa, Antonio Amaral e Pau-lo Studart.

Page 89: O Anfíbio - Edição Extra 2008

88 O ANFÍBIO • 200 ANOS

CEM ANOS GORRO DE

Matéria publicada no “O Anfíbio” nº 10 (1990)

Page 90: O Anfíbio - Edição Extra 2008

CEM ANOS DO GORRO DE FITA 89

O tradicional “gorro de fita” utilizado pelos Fu-zileiros Navais, foi criado pelo Decreto nº 193-B, de 30 de janeiro de 1890, quando exercia o

cargo de Comandante do Batalhão Naval o Capitão-de-Fragata Arthur de Azevedo Thompson.

Descrevendo a peça, assim reza o texto originalassinado pelo Marechal Deodoro da Fonseca, Chefe doGoverno Provisório, e pelo Almirante EduardoWandenkolk, Ministro da Marinha.

“Gorro (forma escoceza) de panno azul, tendoao lado direito o distinctivo do Batalhão Naval. A altu-ra do gorro será de 0m,07.

O distinctivo é uma estrela de metal branco de0m,020 de diâmetro, com uma âncora de metal amarello,inclinada, conforme o modelo”.

A fita que serve de fecho, à retaguarda, já era, àépoca, parte integrante de todos os gorros de origemescocesa.

A cruzeta de fita preta que se situa abaixo dodistintivo só surgiria em 1895, quando o Decreto nº 2.051de 22 de julho daquele ano mandava observar o Planode Uniformes para os Inferiores e Praças do Corpo deInfantaria de Marinha”, assinado por Prudente de Mo-rais, Presidente da República, e pelo Almirante EliziárioJosé Barbosa, Ministro da Marinha. A nova descriçãodo gorro, era:

“De pano azul ferrete, tendo do lado direito umlaço de fita preta com uma âncora de metal branco de0,05; na parte inferior terá uma fita de 0,025 de largura,sendo debruado de polimento preto de 0,050 tendo dealtura 0,11, e na parte superior um vivo de cadarço en-carnado”.

Os fuzis cruzados sob a âncora somente seriamadotados oficialmente pelo Aviso nº 3.467, de 12 de se-tembro de 1933, embora viessem sendo utilizados, emcaráter provisório, há cerca de um ano.

Para comemorar os cem anos de suaincorporação ao CFN, bem como para

marcar a existência de uma peça deuniforme tão característica e sin-gular, foi inaugurado no dia 29de outubro um monumento ao“gorro de fita” na Praça Bata-lhão Naval, em frente ao prédiodo Comando de Apoio.

O monumento foiinaugurado pelo Comandante-

Geral, AlteEsq (FN) Coaraciara,juntamente com o Comandante deApoio, VAlte (FN) Cantídio, que emsua alocução assim se expressou:

“... O hoje centenário Gorro deFita transformou-se em uma autêntica identificação dosFuzileiros Navais do Brasil. Autêntica por ser fruto douso continuado e altivo pelos Fuzileiros Navais da ati-va e por ser, também, uma lembrança espontânea, sau-dosa e agregadora vivida pelos companheiros que seencontram na reserva”.

DO FITA

Page 91: O Anfíbio - Edição Extra 2008

90 O ANFÍBIO • 200 ANOS

JOSÉ CARLOS RIBEIRO DA SILVAContra-Almirante (FN)

A PAZ EM ANGOLA E APARTICIPAÇÃO DO CORPO

DE FUZILEIROS NAVAIS

Page 92: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A PAZ EM ANGOLA E A PARTICIPAÇÃO DO CORPO DE FUZILEIROS NAVAIS 91

Matéria publicada no “O Anfíbio” nº 16 (1996/97)

Este artigo, procurará dentro de

um ordenamento cronológico,

discorrer sobre a atuação da

Força de Paz em Angola entre

1989 e 1992, e o que está

ocorrendo a partir de 1995,

buscando-se dentro do possível,

destacar os fatos vivenciados

pelos representantes do Corpo

de Fuzileiros Navais quer como

elemento isolado, quer como

fração de tropa constituída, ao

longo deste período.

Page 93: O Anfíbio - Edição Extra 2008

92 O ANFÍBIO • 200 ANOS

RETROSPECTIVA HISTÓRICAApós o enfraquecimento e a posterior fragmentação

do Bloco Soviético, com o conseqüente término da GuerraFria, pôde a Comunidade Internacional voltar, com maiorintensidade, a sua atenção para os problemas políticos ehumanitários que envolviam várias nações localizadas aosul do Equador em continente africano, na chamada ÁfricaNegra.

Detectados os problemas, tornou-se relevante a ne-cessidade de se buscar uma solução para a situação aflitivaexistente naquela área, onde se destacavam os problemasde Angola e Moçambique. Neste contexto não devem seresquecidas – por terem influenciado expressivamente asdiscussões e acordos firmados – as gestões para a obtençãoda independência da Namíbia, que estava atrelada ao tér-mino do problema racial sul-africano (queda do apartheid) ea presença de estrangeiros na guerra civil angolana.

Para a presente exposição, convém ressaltar a situa-ção de Angola, onde os conflitos surgiram em 1975, quandoo Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA),com o apoio das autoridades portuguesas, proclamou a in-dependência, assumindo o Governo do país, o que geroudescontentamentos – com a escalada para a luta armada –dos demais movimentos de libertação, particularmente porparte da União para a Libertação Total de Angola (UNITA),e da Frente Nacional para a Libertação de Angola (FNLA).

A Missão de Verificação das Nações Unidas em An-gola – United Nations Angola Verification Mission (UNAVEM) –foi instituída pelo Conselho de Segurança das Nações Uni-das, em dezembro de 1988, a pedido dos Governos de An-

gola e Cuba. Dois dias após, com a assinatura de dois acor-dos, um entre os Governos de Angola, Cuba e África do Sul(relativo a independência da Namíbia) e outro, bilateralentre Angola e Cuba (retirada das tropas cubanas de An-gola) foi ativada a UNAVEM que tinha como uma das suastarefas verificar a retirada total das tropas cubanas deAngola.

A UNAVEM IEm 3 de janeiro de 1989, quando o destacamento

avançado de observadores militares chegou a Luanda paraverificar o regresso do primeiro grupo de tropas cubanasem solo angolano, foi ativada a UNAVEM, então, assimdenominada. Com pleno êxito, em 25 de maio de 1991, ummês antes do prazo estipulado para expirar o Mandato dasNações Unidas, finalizou-se a retirada das tropas cubanas– cerca de 90 mil homens, com seus equipamentos e armasde apoio – caracterizando desta forma, o cumprimento damissão recebida. Desta Operação participaram apenas ob-servadores militares, e o efetivo empregado não excedeu auma centena de oficiais.

Já nesta operação de paz, o CFN esteve presente en-viando um observador militar o Capitão-de-Corveta Pau-lo Roberto Ribeiro da Silva.

A UNAVEM IINo primeiro dia de maio de 1991, após 12 meses de

intensas e difíceis negociações, o Governo de Angola (MPLA)e a UNITA, firmaram um acordo para suspender as hosti-lidades que perduravam a cerca de 15 anos. Passados quin-

Huambo - antiga Nova Lisboa

Page 94: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A PAZ EM ANGOLA E A PARTICIPAÇÃO DO CORPO DE FUZILEIROS NAVAIS 93

ze dias, o acordo foi ratificado, e em 31 de maio deste mesmoano, em Lisboa, foram assinados pelo Presidente de Angola,José Eduardo dos Santos e pelo Presidente da UNITA, JonasSavimbi, os acordos de paz definitivos – Acordos de Bicesse.Este fato histórico viria a alterar profundamente a situaçãoem Angola e a participação da Comunidade Internacionalnaquele país.

Em 17 de maio de 1991, decorrendo da ratificação doacordo, o governo angolano solicitou, ao Secretário Geraldas Nações Unidas, o prolongamento da presença daUNAVEM no país, com o novo propósito de verificar aimplementação dos Acordos de Bicesse, e na véspera da assi-natura formal daquele dispositivo legal, o Conselho de Se-gurança aprovou um novo mandato para a UNAVEM, pos-teriormente denominada UNAVEM II, para que, em umprazo de 17 meses, fossem verificadas as seguintes disposi-ções contidas nos acordos:# confinamento de todas as tropas angolanas em áreas deacantonamento;# desmobilização total;# formação de um novo Exército unificado, assim como ade uma Marinha e de uma Força Aérea;# recolhimento de todo armamento e munição;# fiscalização e verificação da neutralidade da polícia, e;# observação e verificação de todo processo eleitoral.

Para cumprir totalmente estas tarefas, o efetivo daForça de Paz foi ampliado para um máximo de 350 oficiais,que deveriam exercer as funções de observadores militares,e 90 policiais, com as funções de observadores policiais, numtotal de 440 observadores. Este contingente foi formado com

a participação de oficiais de 24 países, dentre eles o Brasil.No contingente brasileiro, mais uma vez, encontramos apresença de oficiais do Corpo de Fuzileiros Navais, destavez não somente um, mas agora um grupo que desempe-nhou todas as tarefas inerentes a função de observadormilitar das Nações Unidas.

A UNAVEM II, por problemas de dimensionamentode efetivo para se desencumbir de todos os seus encargos,e por razões de política interna angolana, não pôde levara bom termo o seu mandato, fundamentalmente por nãohaver colaboração dos signatários dos Acordos de Bicesse(MPLA e UNITA) para aquartelar seus militares e paraformar a nova Força Armada angolana. Utilizando-sede vários artifícios para burlar o que tinha sido acorda-do, principalmente quanto à entrega de armamento edesmobilização de suas estruturas de comando de con-trole, retardaram ao máximo a implementação destacláusula.

No campo político, apesar das reformas estruturaispromovidas pelo Governo alterando a organização políti-ca vigente de monopartidarismo para pluripartidarismo, eimplantando uma embrionária economia de mercado, en-tre outras, em termos práticos pouca coisa mudou, tendo oGoverno permanecido em sua linha centralizadora de regi-me autoritário.

Por estes motivos, associados a outros julgados demenor relevância, após as eleições ocorridas em 29 e 30 desetembro de 1992, a UNITA começou a contestar o resulta-do das urnas alegando fraude e, a partir de outubro destemesmo ano, retornou suas ações de combate.

Page 95: O Anfíbio - Edição Extra 2008

94 O ANFÍBIO • 200 ANOS

A SITUAÇÃO ATUAL

A UNAVEM IIIA nova guerra civil – desta vez muito mais intensa,

conduzindo a destruição quase completa do país – durouaté a assinatura de um novo acordo de cessar fogo em 1994:o Protocolo de Lusaka, assinado naquela cidade.

Devido a uma nova solicitação das partes, e com baseno que estava previsto no Protocolo de Lusaka, foi aprovadopelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, através daResolução nº 976, de 8 de fevereiro de 1995, um novo man-dato para implementar uma paz duradoura em Angoladenominado de UNAVEM III.

Com tarefas bastante semelhantes à da UNAVEM IIe com duração prevista para 24 meses, a UNAVEM III foireorganizada visando a alcançar melhor capacidadeoperacional para o desenvolvimento de suas tarefas. Comeste objetivo sofreu significativas alterações em sua estru-tura, tendo seu efetivo inicial, então de 440 observadores,evoluído para um total de 7.500 homens, passando a ter,assim, a mais complexa estrutura do tipo Força de Paz, abran-gendo observadores e tropas.

Foi a UNAVEM III assim dimensionada: células deobservadores com as mesmas dimensões das existentes naUNAVEM II: distribuídos por 66 postos de observação TeamSites, com a missão precípua de monitorar o acordo, e apu-rar as violações de cessar fogo porventura ocorridas.

Dentre todos os militares brasileiros componentes

da Missão, são aqueles empregados nos Team Sites os que,indiscutivelmente, tem a vida mais difícil e que mais se des-gastam, psicologicamente, durante a missão, pois estão obri-gados a conviver em pontos isolados, juntamente com ou-tros três ou quatro oficiais de nacionalidades, costumes, tra-dições, idiomas e religiões diversas, o que rotineiramentegera tensões. Acrescenta-se, ainda, o fato que são observa-dores os primeiros a serem enviados para verificar e apu-rar os incidentes denunciados, implicando em enorme des-gaste emocional.# Um corpo de tropa com seus apoios compostos de:# seis batalhões de infantaria com um efetivo de 800 ho-

mens cada, provenientes dos seguintes países: Brasil, Índia,Romênia, Uruguai, Zâmbia e Zimbábue, distribuídos porseis Comandos Regionais, tendo como tarefa precípua pro-ver segurança para a tropa, para o armamento e para a mu-nição da UNITA a serem desmobilizados, após sua concen-tração em 15 áreas de aquartelamento;# cinco Companhias (cia) de Engenharia/pontes com um

efetivo de 200 homens cada, provenientes dos seguintes paí-ses: Brasil, Bangladesh, Índia, Coréia e Ucrânia, distribuídospor todo território angolano, com as tarefas de reconstruirpontes, reparar e abrir estradas, contribuir com as ações dedesminagem do país, e outros;# dois postos de saúde avançados com um efetivo de 20

homens cada um, provenientes do Brasil, com tarefa de pro-ver apoio de saúde secundário ao efetivo da UNAVEM III;# um hospital de campanha, oriundo da Romênia, para

Desminagem de ponte em Muximba

Page 96: O Anfíbio - Edição Extra 2008

A PAZ EM ANGOLA E A PARTICIPAÇÃO DO CORPO DE FUZILEIROS NAVAIS 95

prover o apoio de saúde terciário ao efetivo da UNAVEM III;# uma Cia de Comunicações fornecida por Portugal;# uma Cia de Transportes fornecida por Portugal;#uma Cia de Transporte blindado fornecida pela Namíbia;# elementos de polícia militar para prover segurança das

autoridades fornecidos pelo Brasil, Romênia e Portugal; e# um Comando e Estado-Maior, integrado por militares

provenientes dos países contribuintes com a tropa, sendo aparticipação de cada país neste EM proporcional ao contin-gente de tropa cedido a missão.

O COBRAVEM E A PARTICIPAÇÃO DO CFNCom a finalidade de organizar e controlar o nosso

contingente em Angola, foi criado pelo Governo brasileiro,o COBRAVEM (acrônimo escolhido para designar de formagenérica todo o contingente brasileiro da UNAVEM). E, éintegrando esta parcela de mais de 1.100 brasileiros – amais de um ano operando em território africano – que en-contramos outra vez, soldados-marinheiros exercendo fun-ções de observador militar, membros do Estado-Maior daUNAVEM III, e compondo a tropa brasileira.

Os militares do CFN integrantes da UNAVEM IIIestão assim distribuídos:# Companhia de Fuzileiros Navais: embora,organizacionalmente, esteja enquadrada pelo Batalhão deInfantaria do Exército Brasileiro, esta subunidade operaisoladamente e está estacionada a mais de 200 km do seucomando enquadrante. Dentre outras tarefas, é responsá-vel pela Área de Aquartelamento localizada próximo a ci-dade de Chitembo, onde provê a segurança dos equipamen-tos, armamentos e munição recolhidos, além de prover se-gurança aos 5.000 membros das forças militares da UNITA,e seus familiares, o que pode alcançar um total de 15.000pessoas, na maioria mulheres e crianças. O Comandante daCia. é o Comandante da Área de Aquartelamento.# Pelotão de Engenharia de Fuzileiros Navais: é empregadode forma extremamente descentralizada e tem como res-ponsabilidade primeira garantir a total segurança quantoà presença de minas nos canteiros de obra e áreas de opera-ção da Companhia de Engenharia brasileira, e contribuirpara o esforço de desminagem do território angolano.# Membros dos postos de saúde: são empregados nas di-versas tarefas, executadas pelas exemplares instalações desaúde montadas pela Marinha do Brasil, em Angola.# Componentes o Estado-Maior da UNAVEM: coube ao Bra-sil, em face de ser o país com o maior contingente de tropaem Angola, uma cota de 39 funções no Estado-Maior daForça de Paz, das quais nove foram alocadas à Marinha.Destas, oito foram preenchidas por Fuzileiros Navais:# um Capitão-de-Mar-e-Guerra, como Chefe da Cé-

lula de Observadores Militares, sendo portanto o res-ponsável pela distribuição e controle de 350 oficiais oriun-dos de 36 países, bem como pela administração e apoiodos 66 postos de observação posicionados em todo terri-tório angolano;# um Capitão-de-Corveta, como Oficial Ajudante da

Seção de Logística do Comando da Força, responsável portodo o apoio logístico de um Comando Regional;# um Capitão-de-Corveta, como Oficial de Engenharia

de um Comando Regional, responsável por controlar to-das as atividades de engenharia em sua região (aberturade estradas, lançamento de pontes, demarcação de áreasminadas etc);# um Capitão-de-Corveta, como Oficial de Ligação jun-

to a UNITA, de um Comando Regional, responsável pormanter estreito contato com as autoridades políticas e mi-litares em sua região;# um Capitão-de-Corveta, como Oficial Ajudante da

Seção de Transporte de Carga e Pessoal do Comando daForça, responsável pelos manifestos de carga e listas de pas-sageiros das aeronaves utilizadas pela UNAVEM em Ango-la;# um Capitão-Tenente, como Oficial de Operações de

um Comando Regional responsável pelo planejamento doemprego das tropas em sua região;# um Suboficial, como Auxiliar da Seção Postal do Co-

mando da Força; e# um Suboficial, como Auxiliar do Oficial de Engenha-

ria de um Comando Regional.# Observadores Militares: dos 20 observadores militarescedidos pelo Brasil para a missão, seis são Oficiais da Ma-rinha do Brasil.

SÍNTESE CONCLUSIVADe forma bem resumida foi apresentada a contri-

buição da Marinha do Brasil (MB) e do CFN em prol da pazpara o povo angolano, desde a participação pioneira e iso-lada de um Oficial, em 1989, até os nossos dias, com oCOBRAVEM.

Grande tem sido o esforço da MB e do CFN, em ce-der recursos humanos e material, com todos os inconve-nientes e problemas decorrentes.

Entretanto, existe o aspecto positivo desta atitude,que é o reconhecimento do valor e da capacidade técnica eprofissional que a Comunidade Internacional, através doDepartamento de Operações de Paz da ONU, e os membrosdos demais contingentes participantes da missão nos con-ferem, além do respeito e deferência com que os FuzileirosNavais são tratados. A comprovação desta assertiva, estárefletida nos conceitos de término de Comissão recebidos.

Por dever de justiça, não posso deixar de fugir aotema proposto, e dar meu testemunho sobre a forma vi-brante e profissional com que os nossos companheiros doCorpo da Armada e do Corpo de Saúde da MB, tanto Ofi-ciais, quanto praças, vêm desempenhando suas funções.São excelentes. A todos meu BRAVO ZULU.

Ao encerrar, posso afirmar que é por nosso desempe-nho que continuaremos a ser requisitados para este tipo deOperação e, não tenho dúvidas que dentro do CFN, sempreencontraremos voluntários e responderemos: ADSUMUS.

Nota de redaçãoA Missão das Nações Unidas em Angola (UNAVEM III) ocorreu entre1995 e 1997.Em 19 de maio de 1997, no trecho entre as localidades de Vila Nova eHuambo, antiga Nova Lisboa, um comboio de viaturas foi embosca-do, provocando a morte do CB-FN-IF Aladarque Cândido dos Santos.

Page 97: O Anfíbio - Edição Extra 2008

96 O ANFÍBIO • 200 ANOS

CMG(FN) Marco Antonio Nepomuceno da CostaCMG(FN) Paulo Martino ZuccaroCF(FN) José Cícero de Lima FilhoCC(FN) Marcos Roberto Xavier Sanches

AForça de Fuzileiros da Esquadra (FFE) contribui, além de outroselementos, com uma Unidade Anfíbia (UAnf) para a constituição daForça de Emprego Rápido (FER) da Marinha do Brasil. Para tanto,semestralmente, designa as unidades e frações que integrarão a UAnfFER no período seguinte.

Antes de serem, formalmente, designadas para a FER, essas unidades e fraçõessão inspecionadas pelo Comandante da FFE, juntamente com o Comandante daTropa de Desembarque, oficial que comanda a UAnf FER em caso de emprego real.Para conferir maior realidade a essa inspeção, normalmente ela é realizada ao finalde um exercício de planejamento, dentro de um tema tático.

Vivia-se o final da primeira quinzena de fevereiro, e o 3o BtlInfFuzNav (Bata-lhão Paissandu), de regresso de sua férias, preparava-se para constituir o núcleo daUAnf FER, no primeiro semestre deste ano. No Comando da FFE, cogitava-se dotema que seria desenvolvido para avaliar o aprestamento das unidades e fraçõesque comporiam a FER.

Enquanto isso, num país amigo, desenhava-se um quadro de instabilidade po-lítica que desaguaria, mais tarde, na renúncia do seu Presidente e no emprego detropas internacionais sob a égide da ONU para recuperar sua estabilidade político-social. O Haiti e sua crise serviram, então, de inspiração para a montagem do temade inspeção da prontificação da FER da FFE. Sem dúvida alguma, a escolha dotema de emprego da FER naquele país reuniu desafios interessantes e estimulou acriatividade e a inteligência dos estados-maiores envolvidos.

O Grupamento Operativode Fuzileiros Navais HaitiO Pouso do Albatroz

Matéria publicada no O Anfíbio nº 23 (2004)

Page 98: O Anfíbio - Edição Extra 2008

O GRUPAMENTO OPERATIVO DE FUZILEIROS NAVAIS HAITI 97

Assim, nasceu a Operação Albatroz, nome do pás-saro de vôo alto, como elevados são os ideais dos Fuzilei-ros Navais, que do mar tira seu sustento e lá desenvolvesua arte.

A Albatroz visava testar o grau de prontificaçãodos meios da Força de Emprego Rápido (FER) da Força deFuzileiros da Esquadra, e aproveitar a oportunidade pararealizar o planejamento de um possível emprego real,fazendo uso de um tema atual.

O cenário fictício, projetado para emoldurar o pla-nejamento da operação, tinha tons fortes de realidade eatualidade. Era considerada uma Resolução do Conse-lho de Segurança da ONU “autorizando o envio de umaForça Internacional de Paz (FIP) com propósito de as-segurar a manutenção da ordem e da segurança no Haiti”.O Brasil aceitara o convite da ONU para integrar a FIP eenviar seu contingente precursor.

O processo decisório nacional teria indicado o em-prego imediato de um GptOpFuzNav, tipo UAnf, em-barcado numa Força Naval para ocupar e manter o por-

Vista aérea de BFNHARQ (2004)

to e o Aeroporto Internacional de Porto Príncipe, a partirde 25 março de 2004, até a chegada dos demais contin-gentes e manter a segurança nas demais áreas sensíveisdaquela cidade. A UAnf teria 950 militares e per-maneceria no Haiti integrando a FIP, assumindo respon-sabilidade sobre a porção do país que lhe fosse confiada edeveria, também, ser capaz de atuar em apoio a opera-ções de ajuda humanitária. Para essa decisão, foram fa-tores preponderantes: a prontidão operativa dos Fuzilei-ros Navais, sua capacidade expedicionária e a totalintegração à Força Naval.

Nesse cenário, a Força Naval (fictícia) contaria comos seguintes navios para o transporte da UAnf: NDCCMattoso Maia; NDD Ceará; e o NTrT Ary Parreiras.

No dia 9 de março de 2004, no campo de parada doBatalhão Paissandu (núcleo do Componente de CombateTerrestre), no Batalhão Logístico de Fuzileiros Navais(núcleo do Componente de Apoio de Serviços ao Comba-te), no Batalhão de Operações Especiais de Fuzileiros Na-vais e na Base de Fuzileiros Navais da Ilha das Flores

Page 99: O Anfíbio - Edição Extra 2008

98 O ANFÍBIO • 200 ANOS

foram inspecionados, simultaneamente, todos os meios eo pessoal da FER.

Ali, iniciava-se, verdadeiramente, a viagem doGrupamento de Fuzileiros Navais Haiti para Porto Prín-cipe, capital daquele país amigo, nas asas do Albatroz,embora, naquela altura, ninguém disso se desse conta.

DO ALBATROZ PARA A MINUSTAHA CONEXÃO ENTRE OS PLANEJAMENTOS

Muito pouco tempo passou-se entre a conclusão doexercício de ativação da FER e a constatação de que umGrupamento Operativo de Fuzileiros Navais (GptOpFuzNav)seria empregado em operação real no Haiti. Já na reunião deavaliação da Operação Albatroz, o Comandante da FFE deu anotícia de que o Brasil participaria da operação de paz que seestava preparando para execução em curto prazo.

Tendo recebido a tarefa de preparar um contingentebrasileiro para participar da estabilização do Haiti, neces-sária ante o quadro de convulsão político-social instalado,o Ministério da Defesa (MD) solicitou o concurso do Coman-do de Operações Terrestres (COTER) do Exército Brasileiro(EB) para a realização do planejamento, posto que o Estado-Maior de Defesa (EMD) daquele Ministério considerou maisapropriado delegar essa tarefa à Força a quem caberia lide-rar a operação e ceder a maioria dos meios necessários.

Inicialmente, com base nas informações disponíveis,o planejamento do COTER contemplava a inserção do con-tingente brasileiro na própria Força Multinacional Interina(MIF), liderada pelos Estados Unidos da América, e com asparticipações de Canadá, Chile e França, rapidamente cons-tituída e enviada para o Haiti a fim de controlar, dentro dopossível, a situação.

Com um efetivo de planejamento da ordem de 1.500a 2.000 homens, sendo aproximadamente 1.200 brasileiros,optou-se pela constituição de uma Brigada a duas peças demanobra, sendo uma unidade do EB, valor Batalhão, e umGrupamento Operativo de Fuzileiros Navais, tipo UAnf,contando com efetivos de Fuzileiros Navais e de outras na-ções amigas. O efetivo inicial de Fuzileiros Navais foi esti-pulado em 230 homens. Posteriormente, foi considerada,também, a possibilidade de ter-se um efetivo de 500 Fuzi-leiros Navais, hipótese que não se efetivou.

OS GptOpFuzNav NAS OPERAÇÕES DE PAZAs operações que, atualmente, conhecemos como

Operações de Paz começaram com a denominação de ope-

rações de manutenção da paz, não se contemplando, inici-almente, as ações adotadas para garantir a paz e a seguran-ça internacionais, e sim, como um mecanismo de ajuda que,pouco a pouco, foi-se impondo como um instrumento deintervenção das Nações Unidas nos conflitos e situações decrise.

Durante os últimos 40 anos, o conceito de operaçãode paz evoluiu até converter-se em um conceito geral queabarca uma ampla variedade de operações militares limi-tadas, autorizadas internacionalmente e acompanhadas deações diplomáticas com objetivos pacíficos que, em seu con-junto, definem todas as atuações que realiza a comunidadeinternacional para apoiar a paz e a estabilidade das nações.

Esta nova situação, junto com a decisão política in-ternacional de intervir nos conflitos entre países e nos con-flitos internos dos países, tem propiciado o elemento de cul-tivo para o extraordinário desenvolvimento das Operaçõesde Paz e de Ajuda Humanitária em todas as suas concepçõese modalidades.

Hoje, são aceitos os seguintes conceitos para defini-ção das Operações de Paz, que são divididas, segundo o“Manual de Operações de Paz – MD33-M-01”, em cinco ca-tegorias:a) Diplomacia Preventiva – compreende as atividades desti-nadas a prevenir o surgimento de disputas entre as partese a evitar que as disputas existentes se degenerem em con-flitos armados, e a impedir que esses, uma vez eclodidos, sealastrem;b) Promoção da Paz – designa as ações diplomáticas poste-riores ao início do conflito, para levar as partes litigantes asuspender as hostilidades e a negociarem;c) Manutenção da Paz – trata das atividades levadas a cabono terreno, com o consentimento das partes em conflito,por militares, policiais e civis, para implementar oumonitorar a execução de arranjos relativos ao controle deconflitos e sua solução, em complemento aos esforços polí-ticos realizados para encontrar uma solução pacífica e du-radoura para o conflito;d) Imposição da Paz – corresponde às ações adotadas aoabrigo do capítulo VII da Carta das Nações Unidas, incluin-do o uso da força armada para manter ou restaurar a paz ea segurança internacionais em situações nas quais o Conse-lho de Segurança das Nações Unidas tenha determinado aexistência de uma ameaça à paz, ruptura da paz ou ato deagressão. Nesses casos, o Conselho tem delegado a coali-zões de países, ou a organizações regionais e sub-regionais,

Page 100: O Anfíbio - Edição Extra 2008

O GRUPAMENTO OPERATIVO DE FUZILEIROS NAVAIS HAITI 99

a execução, mas não a condução política, do Mandato deIntervenção; ee) Consolidação da Paz – refere-se às iniciativas voltadaspara o tratamento dos efeitos do conflito, visando a fortale-cer o processo de reconciliação nacional por meio deimplementação de projetos destinados a recompor as es-truturas institucionais, a recuperar a infra-estrutura físicae a ajudar na retomada da atividade econômica.Os Fuzileiros Navais nunca tiveram dúvidas quanto às ca-pacidades operativas de um Grupamento Operativo deFuzileiros Navais: “Genericamente, uma organização-por-tarefas nucleada por tropa de Fuzileiros Navais, constituí-da para o cumprimento da missão específica e estruturadasegundo o conceito organizacional de componentes, queagrupa os elementos constitutivos de acordo com a nature-za de suas atividades” (Manual CGCFN-1000). Embora, con-cebidos, prioritariamente, para o combate, podem ser em-pregados em quaisquer cenários e, devido ao seu estado deprontidão operativa, aliado à mobilidade, à versatilidadede emprego, à flexibilidade, à capacidade de atuar indepen-dente e durar na ação, características que conferem às For-ças de Fuzileiros Navais a qualidade ímpar de expedi-cionárias, podem desempenhar importante papel na reali-zação de qualquer operação.

O que restou, mais uma vez, provado nesta oportu-nidade de emprego real.

A PREPARAÇÃO DO GptOpFuzNav HAITICingindo-se ao planejamento realizado com base no

efetivo de 230 Fuzileiros Navais, foi organizado umGptOpFuzNav, tipo Unidade Anfíbia (UAnf), capaz de en-quadrar, em seu Componente de Combate Terrestre, até duascompanhias de países amigos, segundo a organização preco-nizada em nossa doutrina, porém com algumas adapta-ções impostas pela situação.

Em primeiro lugar, o reduzido efetivo autorizado fezcom que diversas funções, normalmente encontradas emuma UAnf, não fossem implementadas e que muitas outrasfossem acumuladas, em todos os níveis, desde a função deChefe do Estado-Maior, acumulada com a de Oficial de Ope-rações, até outras mais específicas, como por exemplo, as debarbeiro e corneteiro.

Em segundo lugar, a possibilidade de operar comaeronaves condicionou a existência de um Componente deCombate Aéreo (CCA) com capacidade limitada à orienta-ção de aeronaves. Em face da limitação de efetivos, esse com-

ponente foi organizado segundo o conceito de “quando ati-vado” (QA), a ser constituído com elementos provenientesdo Componente de Apoio de Serviços ao Combate (CASC),qualificados para o desempenho das tarefas envolvidas naorientação de aeronaves.

Em terceiro lugar, a possibilidade do enquadramentode contingentes valor companhia provenientes de outrospaíses impôs a constituição de equipes de ligação com essescontingentes.

Quanto à constituição e preparo final doGptOpFuzNav, a maioria dos militares selecionados foi pro-veniente do 3o BtlInfFuzNav, na época designado como nú-cleo da Força de Emprego Rápido (FER), o mesmo que já haviaparticipado da Operação Albatroz. Os militares foram sub-metidos a um processo seletivo, o qual buscou identificar edispensar, dentre os inicialmente indicados, indivíduos cujascondicionantes familiares, sociais, sanitárias ou de carreiracontra-indicassem suas participações na operação de paz queestava por se confirmar. O processo iniciou-se com um efetivoda ordem de 30% superior ao necessário para compor o Gru-pamento, chegando-se ao final com o número exato mais umapequena reserva para cobrir eventuais contingências.

Os militares selecionados foram submetidos às va-cinações necessárias, as quais, por sinal, já haviam sidoidentificadas por ocasião da Operação Albatroz, à revisãomédico-odontológica e aos diversos procedimentos admi-nistrativos decorrentes. Tais precauções mostraram-se, pos-teriormente, bastante válidas, pois, o apoio médico doutri-nário adicional às capacidades orgânicas de saúde das tro-pas empregadas em operações de paz teve suaimplementação, no Haiti, completada com bastante atraso.

No que diz respeito à preparação material, é impor-tante explicitar que, já a partir de abril de 2004, a MB pas-sou a contar com representantes no planejamento que vi-nha sendo conduzido no MD e no COTER. Dentre as deci-sões imediatas mais importantes, destacam-se:

$ Como forma de favorecer o adestramento das for-ças, auferir uma capacidade logística adicional e atender aorequisito de segurança nos primeiros dias da missão, bemcomo demonstrar considerável capacidade militar, o deslo-camento do pessoal e dos meios da Brigada dar-se-ia, tantoquanto possível, por navios da MB e aeronaves da FAB, alémde vôos periódicos de reabastecimento;

$ O aprestamento dos componentes da Brigada dar-se-ia de forma descentralizada, cabendo a cada Força Sin-gular mobilizar seus meios e solicitar os recursos financei-

Page 101: O Anfíbio - Edição Extra 2008

100 O ANFÍBIO • 200 ANOS

ros necessários aos primeiros seis meses de operação; essesrecursos foram apresentados tanto em termos de neces-sidades para obtenção de material permanente como deconsumo, organizados segundo as dez classes de su-primentos preconizadas na doutrina de logística para ope-rações combinadas do MD, consubstanciada no manualMD34-M-01; e

$ A fim de obter flexibilidade logística, foi acordadoque a Brigada seria enviada à Área da Operação com 30dias de ração para todo o seu efetivo (36 mil raçõesoperacionais de 24 horas), sendo a MB a única Força a dis-por desse suprimento em seus estoques.

No que se refere às adaptações posteriores na estru-tura organizacional da Brigada como um todo, é digna denota a perda do destacamento de helicópteros, que haviasido, inicialmente, planejado, e dos elementos de operaçõesespeciais, julgados desnecessários para o tipo de operaçãoque seria realizada.

Quanto ao uso dos meios navais e aéreos brasileiros,ficou acordado que a FAB faria o transporte do DestacamentoPrecursor, dividido em dois grupos, além da maioria dosmilitares do GptOpFuzNav e de outros do EBcomissionados em OM da área do Rio de Janeiro (RJ) e Brasília(DF).

Já à Marinha do Brasil coube transportar a quasetotalidade das viaturas e dos equipamentos de engenharia,com seus respectivos motoristas e operadores, bem como atotalidade de containeres utilizados (79 unidades de 20 pés,sendo 28 destinados ao GptOpFuzNav), além de três ge-radores estacionários de grande porte e considerável quan-tidade de pallets de ração e água engarrafada. Também foitransportada uma parte do CASC, com o propósito de rea-lizar a manutenção, durante a travessia, dos meios embar-cados. Isto foi logrado mediante a constituição do GT 705.2,composto pela F Rademaker, NDD Ceará, NDCC MattosoMaia e NT Gastão Motta. O GT permaneceu em águashaitianas durante cinco dias, período em que ocorreu o de-sembarque administrativo dos navios anfíbios, diretamenteem Porto Príncipe, sendo que o NDCC Mattoso Maia per-maneceu num total de 30 dias na área, tendo-se afastadosomente por cinco dias para reabastecer-se na Jamaica.

É redundante ressaltar-se a importância da presen-ça de meios navais para projetar poder adequadamente,ainda que numa operação de paz.

Não só pela quantidade de meios que transportammas também, e sobretudo, pelo apoio nos dias iniciais daoperação, quando muitas agências logísticas, cuja monta-gem está a cargo de terceiros, não se encontramestabelecidas, a presença dos meios navais é imprescindí-vel ao sucesso da missão. Como exemplo, pode-se citar amédia de 20 toneladas diárias de água potável fornecidapelo NDCC à tropa, nos primeiros 20 dias de operação, atéque a ONU pudesse fazê-lo com seus próprios meios.

Quanto ao aprestamento do GptOpFuzNav, e maisespecificamente ao levantamento dos recursos necessáriospara tal, adotou-se uma abordagem bottom-up: os meios fo-ram levantados nos escalões mais baixos e consolidadosnos escalões superiores até o nível CmdoTrDbq. Foram fei-tas numerosas planilhas, a cargo do CASC, que possibilita-ram a obtenção de subsídios financeiros com razoável graude precisão, os quais foram decisivos para justificar, juntoao MD, os valores solicitados pela MB para a operação. Ébom lembrar que parcela ponderável das necessidades jáhavia sido vislumbrada na Operação Albatroz.

O curso das operações no Haiti tem demonstradoque o levantamento dos meios foi executado de forma cor-reta, com poucos lapsos, já que não foram observadas defi-ciências materiais de vulto.

Finalmente, quanto à quantidade de raçõesoperacionais estipulada, os fatos demonstraram que oestabelecimento de um valor expressivo para o primeirocontingente foi uma medida acertada, tendo em vista que:$ permitiram os trabalhos do Destacamento Precursor comtotal autonomia logística;$ possibilitaram o emprego de frações valor Pelotão e Gru-po em diversas partes do território haitiano, conforme asituação político-militar impunha;$ teriam grande valor no caso da ocorrência de um eventoclimático perigoso (ECP) que atingisse a área de operaçõesda Brigada Haiti, pois, certamente, o fluxo de alimentos acargo da ONU seria interrompido, já que dependem da infra-estrutura de transporte e abastecimento de empresas con-tratadas.

O Grupamento Operativo de Fuzileiros Navais Haitifoi ativado por meio de um memorando do Comandante daForça de Fuzileiros da Esquadra, e recebeu a seguinte mis-são: “Deslocar-se para o Haiti, integrar-se à Brigada Haiti, como partedo componente militar e realizar as operações de paz, em princípio, porum período de seis meses, a fim de contribuir para a consecução e esta-bilização daquele país, com base no Capítulo VII da Carta da ONU enos limites da legislação brasileira.”

Como a participação da Brigada Haiti e, conseqüen-temente, do GptOpFuzNav Haiti, parte integrante dessaBrigada, estava pautada no Capítulo VII da Carta das Na-ções Unidas, de acordo com a Resolução no 1542 (2004), de30 de abril de 2004, o qual, de acordo com as publicaçõesdoutrinárias da ONU, trata da imposição da paz, oGptOpFuzNav Haiti preparou-se para uma operação depaz em que seu emprego, num confronto, era uma alterna-tiva possível.

Intérprete haitiano em atividade

Page 102: O Anfíbio - Edição Extra 2008

O GRUPAMENTO OPERATIVO DE FUZILEIROS NAVAIS HAITI 101

Para tanto, foi estruturado conforme o organogramaacima.

Devendo ser capaz de, simultaneamente:a) instalar e operar até três Postos de Verificação (CheckPoints);b) prover a guarda de até três instalações;c) proteger propriedades e instalações das Nações Unidas epessoal sob sua custódia;d) prover a segurança de até três comboios;e) estabelecer uma área de segurança entre partidos opo-nentes;f) auxiliar na manutenção da lei e da ordem, apoiando asforças policiais na revista de pessoal e de veículo;g) verificar, monitorar, reportar e investigar violações decessar-fogo;h) dirigir negociações em sua área de responsabilidade; ei) prover segurança às organizações humanitárias e seuscentros de distribuição.

O CMG (FN) Marco Antonio Nepomuceno da Cos-ta, Comandante da Tropa de Desembarque, foi designadoComandante do GptOpFuzNav Haiti; o CF (FN) Pedro daSilva Moreira Filho, Comandante do 3o Batalhão de In-fantaria de Fuzileiros Navais, núcleo da Força de Empre-go Rápido, Comandante do Componente de Combate Ter-restre (CCT) e o CC (FN) Marcos Roberto Xavier Sanches,Comandante do Componente de Apoio de Serviços aoCombate (CASC).

Uma operação de paz exige a permanência de tropapor um período prolongado em terra com relativo conforto.Por conseguinte, diferentemente das operações anfíbias, asnecessidades de material de estacionamento, nesse tipo deoperação, são de grande vulto. Em condições orçamentári-as equilibradas, parte significativa desse material deve seradquirida regularmente e mantida em estoque para poste-rior distribuição, quando se configurar o emprego de umGptOpFuzNav em operação de paz. Contudo, na atual con-juntura orçamentária de fortes restrições, os escassos re-cursos destinados à obtenção de equipagens operativas ematerial de estacionamento são destinados, prioritaria-mente, às necessidades das operações anfíbias; o que im-possibilita a obtenção de material de estacionamento paraoperações de paz em níveis adequados, razão porque hou-ve necessidade de adquirir-se significativo volume dessematerial, tão logo se confirmou a participação de meios daFFE na Operação Haiti.

No que concerne à preparação do GptOpFuzNav,decorreu, exatamente, dessas aquisições, o único óbice derealce, uma vez que a demora na confirmação da missãoobrigou a que fossem realizadas em curtíssimo espaço detempo.

O POUSO DO ALBATROZO GptOpFuzNav Haiti começou a desembarcar no

Haiti em 29 de maio, com sete militares do destacamentoprecursor. Dois dias após, o 1o escalão aéreo com 27 mili-tares, ao qual se incorporou o destacamento precursor, ini-ciou as ações de reconhecimento de locais para estabeleci-mento de uma área de estacionamento.

A seguir, no dia 14 de junho, a bordo do NDCCMattoso Maia e do NDD Ceará, chegou o destacamento em-barcado, composto por 62 Fuzileiros Navais e a maior par-te do material do GptOpFuzNav. Em 19 de junho, chegou o2o escalão aéreo com 93 militares e, por último, em 20 dejunho, o 3o escalão aéreo com 46 militares.

O GptOpFuzNav Haiti estava completo, pronto parainiciar as atividades para as quais se preparou.

No dia 15 de junho, o Comandante da Brigada Haitidecidiu que o GptOpFuzNav Haiti estabeleceria sua basena área do Aeroporto Internacional de Porto Príncipe. Des-sa forma, nesse local, foi estabelecida a Base de FuzileirosNavais no Haiti Acadêmica Rachel de Queiroz (BFNHARQ).

No dia 25 de junho de 2004, foi realizada a transfe-rência de responsabilidade para a Brigada Haiti. AoGptOpFuzNav Haiti foi designada a Área de Responsabili-dade da região do aeroporto.

Além das atividades abrangidas pelo Capítulo VIIda Carta das Nações Unidas, o GptOpFuzNav, até meadosde outubro, realizou mais de 700 patrulhas, além de diver-sas escoltas de autoridades dentre as quais destacam-se:pessoal da MINUSTAH para as cidades de Jeremie, Le Cayese Mirebalais; do Ministro de Estado da Defesa do Brasil; doPresidente do Chile; do Prefeito de Nova York; e da Secretá-ria de Estado para Cooperação da Espanha.

Realizou-se, ainda, reconhecimentos para visita dacomitiva presidencial brasileira ao Haiti e da seleção brasi-leira de futebol, no mesmo dia. Por sinal, nesse grande e

Área de responsabilidade do GptOpFuzNav HAITI e ospontos de controle estabelecidos para o patrulhamento

Page 103: O Anfíbio - Edição Extra 2008

102 O ANFÍBIO • 200 ANOS

ímpar evento internacional, que foi o jogo da seleção brasi-leira, coube ao GptOpFuzNav, a segurança do aeroporto,inclusive do desembarque da comitiva presidencial, a es-colta do comboio dos jogadores e a segurança no interior doestádio.

Outro ponto alto da atuação do GptOpFuzNav, pelarelevância humanitária que teve, foi a constituição de umcomboio que transportou, para a cidade de Gonaíves, ositens de ajuda humanitária enviada pelo governo brasilei-ro para as vítimas do furacão Jeanne, que deixou milhares depessoas desabrigadas e centenas de mortos. Em decorrên-cia daquele furacão, as estradas que ligam a capital ao nortedo Haiti, que já se encontravam em precárias condições,tornaram-se intransitáveis, constituindo um extraordiná-rio teste para nossas viaturas UNIMOG, que nele passaramcom louvor.

Mais uma vez, o estado de prontidão operativa, alia-do à mobilidade, à versatilidade de emprego, à flexibilidade,à capacidade de atuar de forma independente e de durar naação permitiu que o Grupamento Operativo de FuzileirosNavais Haiti cumprisse todas essas tarefas em tempo míni-mo, desde o recebimento da ordem de execução até o desen-cadeamento das ações.

A BASE DE FUZILEIROS NAVAIS NO HAITI ACADÊMICARACHEL DE QUEIROZ (BFNHARQ)

A casa do Fuzileiro Naval, em Porto Príncipe, é aBFNHARQ. Nossa base de operações leva o nome daquelaque escreveu algumas das mais belas páginas sobre osFuzileiros Navais e, mais do que isto, pediu que: “Quandoacabarem os soldados no mundo”; ficássemos para guar-dar a PAZ.

Localizada no terreno do Aeroporto InternacionalToussaint Loverture, foi estruturada nos moldes das uni-dades de Fuzileiros Navais, tendo como Comandante o mes-mo oficial que comanda o Componente de Apoio de Servi-ços ao Combate. Ocupando uma área de 50 mil metros qua-drados, engloba dois galpões e uma construção menor quepassaram a ser, respectivamente, os alojamentos e o refei-tório dos 235 Fuzileiros Navais integrantes doGptOpFuzNav Haiti.

Na segunda quinzena de junho, paralelamente aosreconhecimentos visando à assunção das tarefas operativas,

foram desembarcados dos NDD Ceará e NDCC MattosoMaia as 43 viaturas e 28 containers pré-carregados com asequipagens e materiais. No dia 20, a tropa já estava alojadanos galpões, com beliches e armários montados, com consi-derável grau de conforto. A partir do dia 22, começaram aser servidas refeições quentes no recém-criado refeitório.Em 3 de julho, os containeres foram manobrados para suasposições definitivas, abrigando os escritórios e paióis. Em 9de julho, a sala de musculação “Pele e Osso” foi prontificada,permitindo que a higidez física dos nossos “CapacetesAzuis” continuasse sendo aprimorada. No dia 12, foi inau-gurado o Cine “Bon Bagay” (bom rapaz, no idioma local)com a apresentação do filme Swordfish, propiciando a tri-pulação um pouco de lazer. Em 20 de julho, o salão de re-creio foi aberto e passou a ser utilizado nos pequenos perí-odos de folgas. Em 25 de julho, o Pátio de Cerimônias foiconcluído, após ter recebido a última camada de brita.

No início de agosto, toda a área da Base já havia sidocercada e iluminada, melhorando a segurança.

Assim, a Base de Fuzileiros Navais no Haiti Acadê-mica Rachel de Queiroz foi tomando forma e trans-formando-se em um “porto seguro”.

O “BON BAGAY”A CONVIVÊNCIA COM O POVO HAITIANO

O Haiti é um país de contrastes. Foi o primeiro recan-to das Américas a abolir a escravidão, e é independentedesde 1804, porém é considerado o país mais miserável docontinente, com renda média diária inferior a um dólar paracerca de 50% de seus nove milhões de habitantes.

Dos 42 presidentes eleitos, somente cinco consegui-ram completar o mandato; os demais ou foram assassinadosou retirados do poder por golpes de estado. Tem uma popu-lação dita como 80% católica, mas o vodu é praticado porquase a totalidade dos habitantes. Os hougan, se homens, oumanbô, se mulheres, são os “sacerdotes” desta crença; pesso-as preparadas desde a infância em santuários. No interiordo país, ninguém toma uma decisão importante sem, antes,consultá-los e os procuram em caso de doenças. O maiorlíder religioso vodu está sediado em Gonaíves, no norte, em-bora existam hougan e manbô influentes também na capital.

A origem africana e algumas marcas da colonizaçãoeuropéia aproximam-nos, embora existam algumas dife-

Page 104: O Anfíbio - Edição Extra 2008

O GRUPAMENTO OPERATIVO DE FUZILEIROS NAVAIS HAITI 103

renças visíveis. O colonizador português misturou-se comescravos e índios e formou uma população miscigenada,mas com uma única língua falada de norte a sul. O francêsnão se uniu aos nativos ou aos escravos no Haiti, deixandoum país com dois idiomas, o francês e o creole, e com umapopulação de pouquíssimos mestiços. Os negros são 95 %do povo local, os brancos 3 % e os demais 2 %. Mas, naverdade, o que mais nos aproxima é o amor pelo futebolbrasileiro. Talvez não seja exagero dizer que dele gostammais do que os próprios brasileiros. Ronaldô bon bagay ou“Ronaldo boa gente”, em português, ouve-se a toda horaem qualquer beco da cidade. Se a seleção brasileira é para osbrasileiros quase um símbolo pátrio, a “pátria de chutei-ras”, para eles, é fervorosa religião, paixão absoluta; e nessareligião, Ronaldô, Roberto Carlos, Didá, Ronaldinho e Cafu sãosantos milagrosos.

Quer conquistar um haitiano? Além de falar dos nos-sos “magos” da bola, procure sempre cumprimentá-los aochegar : bonjour (bom dia), bonsoir (boa tarde) ou, simples-mente, ça va (tudo bem?) a qualquer hora. Se lhe estender amão, cumprimente-o com vigoroso aperto de mão; isto sig-nifica que você lhe dá importância. Tire a cobertura se aconversa prosseguir, caso contrário, será entendido comodesrespeito. Mantenha o olhar no seu interlocutor, olhe parasua face, assim ganhará sua confiança. Se for mulher, nãolhe faça elogios, poderá soar como assédio e não como umagentileza. Cuidado, também, com as fotografias; jamais tireuma foto de uma pessoa sem prévia autorização. Em al-guns lugares, guarda-se a crença em que as almas podemser roubadas pelas câmeras. Saiba, também, que a mulhertem grande influência na sociedade haitiana, sendo as prin-cipais conselheiras nas estruturas familiares, com grandepoder sobre os maridos. Não faça nunca, a não ser que quei-ra confusão, aquele gesto que usamos para dizer que al-guém está maluco. O gesto de girar o dedo ao lado da cabeçaé extremamente ofensivo, assim como unir os dedos da mão,fazendo aquele sinal que para nós pode significar juntar, éuma ofensa imperdoável.

Outro dado interessante sobre o povo haitiano é avaidade. Apesar da pobreza e da desorganização total doestado e da economia; a população, guardada as devidasproporções, veste-se bem. Procuram, mesmo, manter umpouco da auto-estima. De maneira geral, as pessoas não

pedem ajuda nas ruas. Quando nos procuram, normalmen-te, é para pedir trabalho, uma vez que a ONU contrata al-guns serviços na área. Mesmo quando fazemos ACISO,distribuindo água potável, bem valioso no Haiti, e comida,não menos importante, as pessoas, normalmente, mantém-se em filas e aguardam, pacientemente, sua vez, debaixodaquele sol de 40 graus. Terminados os itens doados reti-ram-se resignados, sem esboçar reclamação. É o momentotriste das ACISO.

Por fim, se quiser um pouco de aventura, vá a umafeira em Porto Príncipe. Leve um intérprete ou aprenda,antes, o creole. Aprecie o estilo comercial, a base de trocaspor outras mercadorias ou a cotação em dólar haitiano,uma moeda virtual, com paridade de cerca de 7 para cadadólar americano e, no caso do gourde, moeda oficial, 5,5gourdes para cada dólar haitiano.

AS EXPERIÊNCIAS ACUMULADAS NA OPERAÇÃOUma operação real, ainda que de paz, traz para o

campo prático a aplicação dos conceitos de emprego que seestudam nos cursos e se praticam nos exercícios de ades-tramento. Testa nossas capacidades, impõe sacrifícios, re-vela carências e expõe o despreparado. As lições são diárias,o aprendizado é contínuo, os fatores adversos saem daspáginas das análises para a zona de ação, lá, esperando-nos, inevitavelmente.

Logo de início, o GptOpFuzNav percebeu que suapreparação havia sido adequada, mas percebeu, também,que havia muito a aprender.

A primeira e grande lição é a da convivência comculturas, hábitos e idiomas distintos. Esta lição vale tantopara a vida no país hospedeiro, no caso o Haiti, quanto paraas operações em uma Força (MINUSTAH) composta portropas e funcionários de diversas nacionalidades. O idiomaé uma barreira e pode levar a erros na coordenação de açõesque envolvam forças de diferentes nacionalidades. Esta bar-reira impõe muito cuidado no planejamento, e exige quesejam revistos todos os procedimentos acordados entre asforças, visando à certeza do correto entendimento das par-tes. Em grau menor, mas também importante, é a convivên-cia dentro de uma brigada do EB. Temos muitas semelhan-ças, mas somos diferentes no material, na aplicação de pro-cedimentos e nas tradições. Desde o cerimonial, regula-

Page 105: O Anfíbio - Edição Extra 2008

104 O ANFÍBIO • 200 ANOS

mentos disciplinares, procedimentos operativos, até nosuniformes, convivemos numa força com sensíveis diferen-ças, mas coesa e movida pelas mesmas orientações e lide-rança. Respeitar costumes também é fundamental para amanutenção do relacionamento profissional adequado comtropas estrangeiras.

A segunda, mas não menos importante, é a do conhe-cimento da estrutura e regulamentação da ONU nas mis-sões de paz. A estrutura administrativa, responsável peloapoio logístico às tropas, é extremamente burocratizada e,em conseqüência, demasiado lenta. Chega, mesmo, a serineficiente. Conhecer como funciona a estrutura e saber exi-gir o cumprimento das responsabilidades da ONU, acor-dadas com o país participante da missão de paz, dentro dasnormas, pode fazer muita diferença nas condiçõesoperacionais da tropa.

As regras de engajamento e as normas de condutamodelam o uso da força nas missões de paz. Independenteda situação, não se admite o uso da força sem gradação,avultando a necessidade dos equipamentos deautoproteção. Coletes à prova de impactos, capacetes, em-prego de tropas em viaturas blindadas são medidas de gran-de valia, porque, além da proteção que conferem, dissua-dem os possíveis grupos adversos. A disponibilidade dearmamento não-letal também é altamente desejável paraque se evitem fatalidades desnecessárias.

Por outro lado, situações inesperadas obrigam aoemprego de diversos itens da extensa lista de regras, im-pondo a constante repetição de adestramentos sobre elasdurante as “folgas” na operação.

No campo do material houve diversos ensinamentos.No nosso EIBC, logo se sentiu que cantis e suspensórios cau-sam desconforto, particularmente quando usados com ocolete à prova de impactos, o qual, no Haiti, é de uso perma-nente quando em missão. Com o andamento das operações,os primeiros foram substituídos com enormes vantagenspelos cantis costais (CAMELBACK), e os porta-carregado-res fixados nos coletes. As viaturas 5 TON UNIMOG rece-beram equipamentos-rádio, dispensando as viaturas de co-municações. Receberam, também, um banco central, per-mitindo a observação das ruas pelas patrulhas nelasembarcadas. À noite, as viaturas trafegam, em patrulha,sem as capotas, empregando holofotes ou lanternas em al-gumas situações e equipamento de visão noturna em ou-tras, favorecendo a observação, uma vez que Porto Prínci-pe só tem 30% de suas ruas com iluminação funcionando,isto quando não há falta de energia, o que é freqüente. Nocaso da área de responsabilidade do Grupamento Operativode Fuzileiros Navais Haiti este índice é menor, por ser a áreamais pobre da cidade.

A capacidade de comunicações do GptOpFuzNavHaiti, em todos os níveis, é fundamental. Desde as co-municações por satélite com o Brasil, até as táticas, com asfrações do nível ET, por meio de equipamentos portáteis EP450 MOTOROLLA, tem sido possível coordenar as açõessempre. Neste tipo de operação o contato com as pequenasfrações é fundamental, posto que em muitas ocasiões atu-am isoladas, sem a possibilidade de contato visual.

As condições meteorológicas fazem parte das pre-

ocupações diárias nesta operação. A considerável pro-babilidade do país ser atingido por tempestades tropi-cais, ou por furacões, exige o acompanhamento cons-tante das mudanças de tempo. Estar preparado para asmudanças climáticas é essencial para poder prestar so-corro à população. Para tanto, foi criada a função co-lateral de Oficial Responsável pelo Acompanhamentode Eventos Climáticos Perigosos (OECP). Este oficial acom-panha, quotidianamente, as previsões expedidas pelaDiretoria de Hidrografia e Navegação, além de consultarcerca de dez diferentes sites na Internet; entre eles, o siteda NASA e um especializado no estudo e acompanha-mento de ECP, o Hurricane Weather Center. Ademais, o Pla-no de Segurança Orgânica (PSO) do GptOpFuzNav Haiticontém um anexo específico com ações a seremdesencadeadas no caso da ocorrência de eventos cli-máticos perigosos em Porto Príncipe, tratando da ocu-pação de abrigos, desmontagem e guarda de material eoutras providências que visam à preservação do pesso-al e do material. Esse anexo de ECP do PSO foi ativadoquando da passagem do furacão Ivan e, também, na emi-nência do furacão Jeanne que vitimou a cidade deGonaíves.

ADSUMUSA VOLTA PRA CASA

Em meados de setembro, foi divulgado o cronogramade substituição do 1o contingente, quando três meses demissão já haviam decorridos. Embora a saudade de casa jáseja grande e o desejo de rever o que deixamos não sejamenor, criamos vínculos novos. O Haiti não é mais, apenas,um país distante e pouco conhecido. Na verdade, ele já fazparte da nossa história pessoal e, até, das nossas preocupa-ções. De certa forma, sentimos que levaremos para casa algoalém da experiência profissional, do orgulho de represen-tar o Brasil no exterior e de termos contribuído para a paz.Levaremos conosco um pouco da dor que fomos aliviar. Opovo haitiano cativou-nos definitivamente; desde os intér-pretes com os quais trabalhamos, até as pessoas simples darua que acenam à nossa passagem em patrulhas.

Assim, já nos preparamos para passar a cana doleme para o segundo contingente, como quem entrega umbem precioso, do qual cuidamos com o profissionalismoque a missão impõe e com a amizade que nos conquistouPorto Príncipe.

Missão cumprida, voltaremos para a rotina dos quar-téis, preparando-nos para o próximo chamado, certamen-te, muito mais experientes e confiantes, na esperança de,sempre, confirmar o que um dia de nós escreveu Rachel deQueiroz: “O mote dos Fuzileiros é uma expressão latina quediz ADSUMUS – e se traduz por Aqui Estamos, sim estãosempre presentes, sempre impecáveis desfilando tão boni-to que dá vontade de chorar de emoção, e nos deixando atranqüila certeza de que, enquanto contarmos com a vigi-lância e o amor dos Fuzileiros, o Brasil estará em paz”.

Nota de redação: atualmente, o Grupamento Operativo deFuzileiros Navais - Haiti está em seu 9º contingente com um total de225 militares, sendo 25 oficiais e 200 praças.

Page 106: O Anfíbio - Edição Extra 2008

ADSUMUS 105

Em entrevista ao Notanf (jul/ago/set 2004) D. Viole-ta Telles Ribeiro relembrou que decorria o ano de1958, próximo às comemorações dos 150 anos de

aniversário do CFN quando seu marido, o Almirante-de-Esquadra (FN) Leônidas Telles Ribeiro, certa noite, co-mentou com ela que, por estarem às vésperas do aniver-sário do CFN, poderiam oferecer um presente para co-

Nesta hora de júbilo e de orgulho, em que o Corpo deFuzileiros Navais do Brasil comemora seu 150º aniversário, nãohá de faltar à gloriosa corporação o panegírico merecido de seusfeitos de honrosa tradição.

Tudo será feito, tudo será escrito, tudo será dito para que adata festiva se conserve para sempre gravada nos anais de suavalorosa história.

Nada, faltará, por certo, às comemorações programadas,desde a solene missa festiva, aos mais alegres festejos, às maisbrilhantes solenidades militares.

Mas é imprescindível que se dê ao glorioso homenageadoum presente, algo que marque de maneira expressiva esta data tãosignificativa.

O grande imperador Constantino foi o primeiro a compre-ender a importância de um sinal, de um lema, de uma divisa, para oêxito de suas campanhas. Mandou inscrever em seu estandarte“In hoc signo vinces” designando a cruz, sinal que conduziriaseus soldados a caminho da vitória.

O “Semper Fidelis” do “Marine Corps” dos Estados uni-dos, exprime a fidelidade permanente da heróica corporação a seusideais de ordem, justiça e liberdade.

O “Semper Parata” das bandeirantes, o “Semper Alerta”dos escoteiros, traduzem o espírito de obediência, solidariedade,colaboração daquelas eficientes entidades.

O “Ad Majorem Dei Gloriam” é o lema com que os solda-dos de Cristo seguem a disciplina de Inácio de Loyola.

E qual é a divisa do Corpo de Fuzileiros Navais do Brasil?Quando pela primeira vez os fuzileiros desembarcaram no

Brasil, cada coração proclamou ao se sentir recebido no seio danova mãe-pátria: - “aqui estamos!”.

No decorrer dos episódios históricos que se sucederam, aque-la mesma voz ecoou, sempre clara e sempre oportuna: “aquiestamos!”.

Nas lutas sangrentas do Prata, nas guerras da Indepen-dência, na consolidação da República, sempre os fuzileiros estive-ram presentes, prontos, unidos, “aqui estamos!”.

Na defesa da lei, na manutenção da ordem, na luta pelaliberdade, sempre o atendimento rápido, eficiente total... “aquiestamos!”.

Há 150 anos ecoa no peito de cada fuzileiro naval suadivisa... “aqui estamos!”.

Há 150 anos está gravado em cada coração fuzileiro seulema... “aqui estamos!”.

“AQUI ESTAMOS”...ADSUMUS!“Adsumus”... exprime a presença da força para salvaguar-

dar a liberdade.“Adsumus”... significa a ordem para manter a autoridade.“Adsumus”... simboliza o sacrifício para o bem comum.“Adsumus”... traduz o heroísmo no combate.“Adsumus”... é a resposta quando a pátria chama.“Adsumus”... é o dever cumprido.Fuzileiros! ADSUMUS... É este o vosso lema.Que presente mais expressivo poderia receber o Corpo de

Fuzileiros Navais do Brasil, do que a perpetuação daquilo que dehá muito está gravado em cada coração fuzileiro? Receberá suapalavra de ordem: ADSUMUS.

“Adsumus”...tudo pela pátria“Adsumus”...tudo pela ordem“Adsumus”...tudo pelo Corpo de Fuzileiros navaisParabéns ao Corpo de Fuzileiros Navais!

Violeta Ribeiro

memorar a data. O Almirante Telles Ribeiro tinha emmente dar ao Corpo um lema, uma divisa, como os Fuzi-leiros Navais norte-americanos usam. Pediu que D. Vio-leta sugerisse algo apropriado. Logo em seguida, o Almi-rante levantou-se da mesa e a convidou para acompanhá-lo em uma caminhada no quarteirão. Ela respondeu quenão iria e que aproveitaria para escrever alguma coisa.

Assim que o Almirante regressou, D. Violeta mos-trou-lhe o texto publicado abaixo.

D. Violeta revelou que “Adsum” é um verbo quefaz parte da Cerimônia de Ordenação Sacerdotal, duran-te a celebração da Santa Missa. A primeira parte da Or-denação é o chamado dos ordenandos, quando opresbítero assistente, representando o conselho seminá-rio, chama por cada um deles que, então respondem:“Adsum”, ou seja, “estou presente!”.

“Adsumus” vem do verbo latino intransitivo:“Adsum, Ades, Adesse, Adfui”. Em seu sentido própriosignifica: estar presente, estar perto, estar entre. Estarjunto, no sentido figurado exprime: tomar parte, favore-cer, defender, assistir, participar, ajudar.

ADSUMUS

Page 107: O Anfíbio - Edição Extra 2008

106 O ANFÍBIO • 200 ANOS

RACHEL DE QUEIROZMADRINHA DO CFN

A Acadêmica Rachel de Queiroz celebrava, constantemente, as qualidades dos Fuzileiros Navais, destacandoseus feitos, tradições e glórias.

Supõe-se que essa verdadeira idolatria pelos Fuzileiros Navais teve suas origens em 1917, quando assistiuao desfile do Dia da Independência, aos seis anos de idade, ocasião em que se encantou com as nossas Bandas deMúsica e Marcial. Acrescente-se, ainda, o fato de ter residido por quase quinze anos na Ilha do Governador, Rio deJaneiro, oportunidade em que teria feito amizade com os Fuzileiros Navais.

Além da famosa frase: “Quando se houverem acabado os soldados no mundo – quando reinar a paz absoluta– que fiquem pelo menos os fuzileiros, como exemplo de tudo de belo e fascinante que eles foram!”, ela igualmenteenalteceu os Fuzileiros Navais em diversas passagens de sua profícua existência.

Uma minuciosa pesquisa executada pelo CMG (FN-RM1) Ubiratan Barbosa Ribeiro dos Santos, com a partici-pação de integrantes do Museu do Corpo de Fuzileiros Navais, para a elaboração de três artigos sobre Rachel deQueiroz, revelou-nos, também, uma série de outras reflexões relacionadas aos Combatentes Anfíbios da Marinha doBrasil, de autoria da nobre escritora, dentre as quais se destacam:

Page 108: O Anfíbio - Edição Extra 2008

RACHEL DE QUEIROZ - MADRINHA DO CFN 107

“Não me esqueço de certo dia em que eu ia atravessando aRua do Ouvidor e um garboso fuzileiro naval cruzou comigo. Parasurpresa minha o militar, ao me ver, parou, fez continência, depoisarrancou o gorro de fitinhas, ergueu a mão no ar quase numa sauda-ção fascista e disse naquela voz cantada da minha terra, que só deouvi-la me aperta o coração de saudade: — Abença, madrinhaRachelzinha!” (In: O senhor São João – crônica – junho/1944).

“Sim, venho-me esquecendo de dizer a quem Rosa ama...Usa dólmã vermelho, casquete com fitas ...Senhor, é um fuzileironaval. Como poderia Rosa resistir àquele dólmã cor de sangue,àquela astúcia de homem corrido no mundo, àquele ar marcial”.(In: Rosa e o fuzileiro – crônica – fevereiro/1945).

“... a túnica cor de sangue, a calça branca engomada e ocasquete matador, posto de lado no cabelo partido, com as fitinhaspretas tremulando no ar, aos rodopios da valsa. E nem o par darainha, o presidente do clube, tinha um décimo sequer do airosoaprumo do par da princesa – tudo de acordo com a ordenança mili-tar: barriga pra dentro, peito saliente e olhar terrível”. (In: A princesae o pirata – crônica – novembro/1947).

“A mãe ficou vexada: “O que, filhinho, que bobagem éessa? Você não disse que queria ser Fuzileiro – não se lembra,com a farda vermelha, e o gorro de fitinhas?” (In: Conversa demenino – crônica – 1949).

“Se eu tivesse um filho fazia dele fuzileiro naval nem queobrigasse. Mas qual, não precisa obrigar: filho meu adoraria serfuzileiro”. (1957).

“É o corpo militar mais antigo do Brasil. Claro, e o maisbonito, e mais romântico, até o nome é belo e marcial, sem falarna farda: fuzileiro.” (1957).

“Os fuzileiros são o derradeiro recurso, a suprema salvaçãonas horas de perigo... A última palavra cabe sempre ao fuzileiro. Sea batalha parece perdida – apela-se para o fuzileiro. Se o desembar-que é impossível – calma, os fuzileiros desembarcam assim mesmo.Se é preciso uma coragem sobre-humana – os fuzileiros têm essacoragem. Arma de fogo ou arma branca, embarcado ou em terrafirme, fuzileiro briga. E o fuzileiro resolve.” (In: O eterno BatalhãoNaval. 1958).

“E sendo assim, mais um ponto se conta a favor dos fuzi-leiros: não serviram nunca como tropa colonial. Nunca foraminstrumento de tirania da Metrópole para esmagamento de bra-sileiros. Ao contrário, sempre lutaram foi contra o inimigo exter-no, começando muito cedo esse ofício de escudo da Pátria.” (In:O eterno Batalhão Naval. 1958).

“Distinguindo-se pela sua farda à velha moda, desdenhandoas cores neutras com que os soldados modernos se camuflam, – aalegre túnica vermelha, o gorro branco com o seu laço de fita preta,– o fuzileiro em dia de gala é mais bonito até que um general comtodos os seus bordados.” (In: O eterno Batalhão Naval. 1958).

“É a tropa mais conhecida, a mais celebrada do país. Nãohá guerra sem fuzileiro – mas sem fuzileiro não há festa, tam-bém. Pode-se imaginar uma parada de 7 de setembro sem odesfile dos navais e, acima de tudo, sem a música da banda dosfuzileiros, que é a mais famosa de todas as nossas bandas milita-res?” (In: O eterno Batalhão Naval. 1958).

“Aí, a tradição galante dos fuzileiros é tão antiga e arraigadaquanto a sua tradição guerreira. Que digam as gerações sucessivas

de corações feridos – brancas, morenas e cabrochas – que vêm pade-cendo ... de penas de amor por culpa desses tiranos de casaco verme-lho!”. (In: O eterno Batalhão Naval. 1958).

Não houve uma luta, nestes ... de Brasil, em que sanguedos fuzileiros não corresse – e na linha de frente.” (In: O eternoBatalhão Naval. 1958).

“Mas para que entrar em discriminações? Quem quiser sa-ber a história dos fuzileiros navais, não precisa consultar nenhumlivro especial. Basta ler a História do Brasil.” (In: O eterno BatalhãoNaval. 1958).

“Não foi à toa a minha velha amizade pelo outrora glorio-so Batalhão Naval. O que hoje vi neste Q.G. veio confirmar tudode bonito e empolgante que antes imaginava. Quando se houve-rem acabado os soldados no mundo – quando reinar a paz abso-luta – que fiquem pelo menos os fuzileiros como exemplo de tudoe belo e fascinante que eles foram!” (In: Livro de visitantes, doCGCFN, 15/01/1988).

“Ah, a gente tinha tanta vontade de comemorar belos even-tos, alegrias do povo. Será um castigo? Por que não nasceu um novoGarrincha? Por que não tem mais uma Elis Regina? Por que já nãodesfila pela rua a banda dos Fuzileiros Navais?...” (In: A imponderávelaflição de estar vivo – crônica – janeiro/1991).

“Nesta nova visita aos Fuzileiros, renovo minha amizadeespecial à corporação, que sempre teve a preferência das mu-lheres brasileiras (quando moças namoradas, quando idosasvelhas amigas)”. (In: Livro de visitantes, do CGCFN, 18/02/1997).

“Perguntando-se: o que é um corpo de elite? A resposta vemimediata: o Corpo de Fuzileiros Navais. Pela tradição, pela compro-vada bravura em campo de batalha, pelo garbo, pela farda bonita ediferente das demais (e, falando em farda, não esquecer o gorro defita, de modelo escocês, com o seu pequeno laço preto e seu brochede âncora).” (In: Carta ao CFN, 20/06/1997).

“... não se podem esquecer as famosas gaitas, doadas aosFuzileiros pela tripulação do Cruzador TAMANDARÉ. E hoje, quandovêm os Fuzileiros, já de longe, são anunciados pelo som das gaitasde sua Banda Naval”. (In: Carta ao CFN, 20/06/1997).

“Chegaram ao Brasil junto com a família Real. ... quemvinha, dando guarda à família Real, se destacando como corpo deelite na nova capital do reino? Claro, os Fuzileiros.” (In: Carta aoCFN, 20/06/1997).

“Contudo, o nome de Fuzileiros lhes cabe muito bem – eleem si, já é uma legenda. E, se faz suspirar as moças, deslumbra ameninada que sonha em um dia envergar aquela farda, botar ogorrinho na cabeça e sentir-se imediatamente um candidato aherói.” (In: Carta ao CFN, 20/06/1997).

“A gente tem a tendência de fazer ressaltar o superficial, quetoma o lugar do essencial. E, no caso, em se tratando dos Fuzileiros,o seu essencial não é seu charme, mas a bravura, a liderança emcombate.” (In: Carta ao CFN, 20/06/1997).

“O mote dos Fuzileiros é uma expressão latina que diz:ADSUMUS – e se traduz por “Aqui estamos!” Sim, estão semprepresentes, sempre impecáveis, desfilando tão bonito que dá vontadede chorar de emoção, e nos deixando a tranqüila certeza de que,enquanto contarmos com a vigilância e o amor dos Fuzileiros, o Brasilestará em paz.” (In: Carta ao CFN, 20/06/1997).

Page 109: O Anfíbio - Edição Extra 2008

108 O ANFÍBIO • 200 ANOS

O CORPO DEFUZILEIROSNAVAIS

AE(FN) Alvaro Augusto Dias MonteiroComandante-Geral do

Corpo de Fuzileiros Navais

Page 110: O Anfíbio - Edição Extra 2008

O CORPO DE FUZILEIROS NAVAIS 109

O Corpo de Fuzileiros Navais resulta de longo proces-so evolutivo ocorrido em seus 200 anos de dedicaçãoà Pátria. Todavia, sua vocação primordial – ser tropaanfíbia e expedicionária – explicitada desde o momen-to da concepção da Brigada Real da Marinha1, que nosdeu origem, permanece inalterada.

As transformações ocorridas nos dois séculos de nossa existên-cia fizeram do Corpo de Fuzileiros Navais a única tropa totalmenteprofissional e voluntária que o Brasil, atualmente, possui permanente-mente pronta para atuar na defesa da Pátria, em qualquer cenário,onde e quando se fizer necessário.

Por constituírem parcela intrínseca, portanto, inseparável doPoder Naval, os Fuzileiros Navais aliam sua prontidão operativa e suacapacidade expedicionária à mobilidade, flexibilidade, versatilidade epermanência, características imanentes do próprio Poder Naval, o quelhes atribui qualidade ímpar: ser tropa de pronto emprego por excelên-cia. Os Grupamentos Operativos de Fuzileiros Navais, por serem ca-pazes de atuar em todo o espectro das operações militares, desde com-bates de alta intensidade, como no caso das operações anfíbias, atéoperações de paz ou de assistência humanitária, como a que ocorreu naBolívia, no início deste ano, proporcionam soluções apropriadas e ba-lanceadas para vasta gama de crises que demandam emprego de forçamilitar nas suas diversas vertentes.

As últimas transformações que o CFN sofreu resultaram doSimpósio “CFN do 3º Milênio”, realizado em 2000, e que, considerandocenários prospectivos, em horizonte temporal de dez anos, procurou

privilegiar o conceito de empre-go por meio de GrupamentosOperativos de Fuzileiros Navais(GptOpFuzNav), hoje, plena-mente consolidado como a for-ma adequada de emprego dasForças de Fuzileiros Navais.

Tal Simpósio marcou,ainda, a última reestruturaçãoorganizacional do CFN, na qualadquiriu suas feições atuais.Com vistas a privilegiar a apli-cação do novo conceito de em-prego, importantes modifica-ções foram realizadas. Dentreelas, destacam-se: a criação doComando da Tropa de Desem-barque, que passou a nuclear ocomponente de comando dosGptOpFuzNav; o Batalhão deComando e Controle, que asse-gurou melhores condições parao funcionamento do componen-te de comando; o Batalhão deControle Aerotático e DefesaAntiaérea, que permitiu a ati-vação do componente de com-bate aéreo, proporcionandouma abordagem integrada douso da terceira dimensão docampo de batalha; o Batalhão deBlindados de Fuzileiros Navais,unificando o emprego de carros

Page 111: O Anfíbio - Edição Extra 2008

110 O ANFÍBIO • 200 ANOS

A Viatura Blindada deTransporte de Pessoal8 x 8 SR Piranha IIIA,

utilizada no Haiti, é umdos resultados do esforçoque a Marinha do Brasil

vem realizando para obternovos meios navais e de

Fuzileiros Navais.

de combate e viaturas blindadas; a Companhia de Apoio ao Desem-barque, que permitiu valorizar a atividade peculiar dos FuzileirosNavais e que representa a própria essência das operações anfíbias; ea transformação do Grupamento de Fuzileiros Navais de Manaus emBatalhão de Operações Ribeirinhas, possibilitando ampliar a pre-sença da Marinha na Amazônia e atingir inédito nível de adestra-mento nesse tipo de operação.

O atual cenário internacional tem levado as maiores e maistradicionais marinhas (EUA, Reino Unido, Espanha, Itália, França,Portugal, Holanda, dentre outras) a investir no desenvolvimento ena aquisição de novos meios que assegurem suas capacidades anfíbi-as e expedicionárias. A Marinha do Brasil, cônscia da importância dacapacidade de projetar poder para conferir credibilidade à presençade seu Poder Naval nos cenários de interesse, tem acompanhado taltendência, realizando extraordinário esforço para obter novos meiosnavais e de Fuzileiros Navais, visando a ampliar sua capacidade an-

Page 112: O Anfíbio - Edição Extra 2008

O CORPO DE FUZILEIROS NAVAIS 111

fíbia, mesmo em detrimento de outras necessidades igualmenteprioritárias.

O cenário internacional está, ainda, a nos ensinar que mesmoum força anfíbia do porte do United States Marine Corps (USMC), hámais de quatro anos engajada em combates, exclusivamente em ambi-ente terrestre, no Iraque, continua a visualizar e a pugnar que seu futu-ro está no mar e na preservação do seu caráter naval, conforme assegu-rou seu Comandante em entrevista recente. Assim como o CFN, o USMCfoi concebido e dimensionado para operar em ambientes marítimos e,portanto, não pode ser confundido com uma força terrestre, uma vezque seu maior valor reside, justamente, no seu caráter naval.

Na era contemporânea, as Forças Armadas passaram a desem-penhar, também, novos e importantes papéis na defesa global da paz.Assim, os Fuzileiros Navais do Brasil têm atuado nas mais variadas edistantes regiões do planeta, seja em missões tradicionais de observa-ção militar (Índia, Paquistão, Costa do Marfim, Ex-Iugoslávia, TimorLeste, Moçambique, Uganda, Nepal, Saara Ocidental, Ruanda, Sudão eLibéria), seja apoiando a remoção de minas e, portanto, salvando vidas(Costa Rica, Honduras, Nicarágua, Equador, Peru), ou integrando For-ças de Paz. Há 40 anos estivemos presentes na República Dominicana,contribuindo para promover a paz e a reconciliação naquele país, que éhoje um exemplo de sucesso no Caribe. Na década de 90, estivemos emAngola, que hoje começa a encontrar seu caminho. Desde 2004, estamospresentes no Haiti. Para lá já enviamos nove contingentes, totalizandomais de 2.000 Fuzileiros Navais que tiveram a oportunidade de apri-morar seus conhecimentos e seu preparo, ao participar de uma opera-ção real.

Acompanhando o crescimento da importância do Brasil no con-certo das nações, novas missões, provavelmente, surgirão. Assim, osFuzileiros Navais devem permanecer prontos para atuar na proteçãoda vida de cidadãos brasileiros e dos interesses nacionais no exterior,realizando, especialmente, operações de evacuação de não-combaten-tes e provendo segurança para nossas representações diplomáticas. Jáatuamos na defesa de nossas embaixadas na Nicarágua, durante o ter-remoto que assolou aquele país em 1972, e, posteriormente, na Argélia.Hoje, protegemos nossas representações no Paraguai, no Haiti e naBolívia, estando permanentemente prontos para atuar em qualqueroutro país, conforme necessidade identificada pelo governo, sendo ca-pazes de reagir com extrema rapidez para evacuar nacionais brasilei-ros em situações de risco. O tempo de reação inferior a 16 horas, ocor-rido nos casos dos deslocamentos para o Haiti e para a Bolívia, bemilustra esta capacidade.

Em um cenário internacional instável, no qual os interesses bra-sileiros crescem a cada instante, 90% do comércio é realizado por mar,a esmagadora maioria das populações encontra-se próxima aos lito-rais e rios e imensa parcela da nossa riqueza está concentrada no mar,na Amazônia Azul, subestimar o mar como fonte de conflitos é inacei-tável ingenuidade.

As incertezas do mundo globalizado e os crescentes interessesnacionais não permitem acomodação, demandando constante acom-panhamento e conseqüentes evoluções doutrinárias, de modo a garan-tir que os Fuzileiros Navais estejam sempre preparados para fazer faceaos novos desafios que, certamente, haveremos de enfrentar.

1 O Alvará de criação da Brigada Real da Marinha, assinado por D. Maria I edatado de 1797, já estabelecia como sendo “inútil que tropas de desembarque sejamexercitadas a grandes manobras e evoluções próprias dos regimentos de meu exérci-to de terra, e devendo ser próprias, particularmente, para defenderem as embarcaçõesde guerra e para fazerem algum desembarque, e tentar algum ataque”.

As incertezas do mundoglobalizado e os

crescentes interessesnacionais não permitem

acomodação,demandando constante

acompanhamento econseqüentes evoluçõesdoutrinárias, de modo a

garantir que osFuzileiros Navaisestejam sempre

preparados para fazerface aos novos desafios

que, certamente,haveremos de enfrentar.

Page 113: O Anfíbio - Edição Extra 2008

112 O ANFÍBIO • 200 ANOS

“Onde houver umFuzileiro Naval ali há dehaver: honra, dignidade eacendrado amor ao Brasil”

“Onde houver umFuzileiro Naval ali há dehaver: honra, dignidade eacendrado amor ao Brasil”

Page 114: O Anfíbio - Edição Extra 2008