O anti intelectualismo-entre_os_pentecostais

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  • Autor: Cristiano Santana [Copyright 2009] Todos os direitos reservados. Kryx Estudos Bblicos e Teolgicos Acesse: http://www.keryxestudosbiblicos.com.br

    O ANTI-INTELECTUALISMO ENTRE OS PENTECOSTAIS: AS SUAS ORIGENS

    surpreendente notar que, ainda no sculo XXI, h pastores, principalmente da ala pentecostal, bradando do alto do plpito palavras imprecatrias contra a Teologia, como se ela fosse a culpada do estado deplorvel em que se encontra a igreja atualmente. Tal atitude representa, simplesmente, o to conhecido anti-intelectualismo, um mal que tm assolado a igreja do Senhor Jesus h sculos, e cuja influncia ainda persiste.

    Meu objetivo tratar sobre o anti-intelectualismo. Essa posio advoga a superioridade das experincias espirituais em relao assimilao intelectual das verdades da Palavra de Deus. Seus proponentes costumam dizer que a verdadeira teologia est nos

    joelhos. Que se a igreja dependesse de teologia j estaria morta.

    Comecemos, portanto, com as origens do anti-intelectualismo evanglico:

    Segundo Leonildo Silveira Campos a grande efervescncia religiosa, que culminou no fenmeno da rua Azuza, aconteceu em meio a vrias agitaes: traumas da Guerra Civil, libertao dos escravos negros, tenses raciais; crise prolongada no mundo da agricultura no sul do pas; mobilidade populacional em direo s cidades do norte em processo de industrializao; chegada de milhes de imigrantes branco, que vinham refazer na Amrica laos rompidos pela pobreza e misria na Europa de ento.

    Na esfera eclesistica Nancy Pearcey nos apresenta a seguinte situao:

    O clero estabelecido vivia como membro da pequena nobreza (a classe que no trabalhava, que vivia de investimentos e aluguis), tendo bastante tempo para atividades de lazer. Por exemplo, na igreja estatal da Esccia, que era presbiteriana, Thomas Chalmers observou que depois de fazer os cultos de adorao, o ministro gozava de cinco dias da semana de lazer ininterrupto.

    Ela continua:

    Enquanto os Estados Unidos estava se tornando uma nao, a maioria dos pases europeus ainda tinha igrejas estatais, em que as autoridades eclesisticas exerciam considervel poder poltico e at ocupavam chancelaria do governo. Na Inglaterra, por exemplo, os bispos anglicanos tinham cadeira na Cmara dos Lords (e ainda tm). At na Amrica colonial, a autoridade clerical e a governamental estavam entrelaadas, visto que itens como dzimo e freqncia dominical eram quesitos de coero

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    legal. Tipicamente, os ministros eram as pessoas mais bem educadas da comunidade, fato que significava que recebiam deferncia como lderes.

    Foi nesse contexto de traumas sociais e de predominncia de uma nobreza clerical que os avivalistas surgiram. As suas mensagens tinham, ento dois benefcios: a) trazer algumas ilhas de certeza, algum norte seguro para os menos favorecidos; b) popularizar a religio.

    Quanto ao primeiro benefcio, diz-nos H. R. Niebuhr:

    Nesse pas as concesses s divises raciais e de classes sociais fizeram surgir denominaes acomodadas. Essa acomodao fez com que as seitas se tornassem um canal capaz de desaguar o descontentamento das classes pobres. Assim surgem as igrejas dos deserdados, que arregimentam os pobres, reforando a idia de que na histria protestante a seita tem sido sempre filha de minorias proscritas.

    Quanto ao segundo benefcio, diz-nos Nancy Pearcey:

    Este elitismo [religioso] era de todo detestvel aos reavivalistas, que se levantaram com a inteno de popularizar a religio. Instigados por profunda preocupao pelo povo comum, eles proclamavam o direito dos iletrados para investigar a religio por conta prpria. Tornaram o evangelho acessvel usando linguagem simples e pregao espontnea. Faziam sermes emotivos e improvisados, novidade animadora numa poca em que era habitual o clero simplesmente ler os sermes escritos de antemo. Nas palavras de Joo Wesley, os reavivalistas queriam pregar nada mais que a verdade simples a pessoas simples. - 'Os crentes comuns no eram mais considerados recebedores passivos, como ocorria no antigo modelo hierrquico, mas eram participantes ativos.

    As propostas de John Wesley, por exemplo, que fizeram tanto sucesso na Inglaterra nos difceis dias da Revoluo Industrial, tambm foram retomadas pelo povo, nas colnias inglesas da Amrica do Norte.

    No se pode negar os tremendos benefcios que os avivalistas trouxeram para as camadas pobres da populao norte-americana. Entretanto, esses movimentos espirituais resultaram em alguns efeitos

    colaterais:

    Diz-nos Nancy Pearcey:

    Em primeiro lugar, o foco na experincia de converso profunda foi altamente eficaz em levar as pessoas a aceitar o evangelho. Mas isso tambm tendia a redefinir a religio em termos de emoo, ao mesmo tempo em que contribua para negligenciar a teologia, a doutrina e o elemento cognitivo da crena. Esta tendncia causou enorme dano ao reforar a concepo do cristianismo como experincia no-cognitiva do pavimento de cima.

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    Em segundo lugar, o uso de linguagem simples do povo e msicas populares foi muito eficaz em alcanar as pessoas comuns. Entretanto, os reavivalistas foram muito longe, quase promovendo de forma aberta a ignorncia do povo, como se ser teologicamente instrudo fosse igual a estar espiritualmente morto. Um dos temas favoritos dos reavivalistas era ridicularizar o clero instrudo do leste.

    Em terceiro lugar, tratar os indivduos de maneira separada da famlia ou da igreja foi muito eficaz em forar uma crise de f. Mas tambm induziu a uma viso radicalmente individualista da igreja, que rejeitou as riquezas intelectuais desenvolvidas durante sculos pelos grandes pensadores ao longo da histria da igreja, inclusive as destilaes doutrinrias vigentes nas declaraes corporativas de f, como credos e confisses. Muitos evanglicos de modo indiscriminado absorveram o individualismo que estava em voga na vida poltica americana, e o transferiram igreja. Nasceu uma eclesiologia atomstica e voluntarista que no espelhava o ensino bblico tanto quanto a filosofia poltica da poca.

    De acordo com Bryan Wilson, a a f despertada era avessa ao intelectualismo, teologia e s instituies teolgicas formadoras de um clero esclarecido. Com isso a religio crist tornava-se prtica, colada aos problemas da vida cotidiana, aos quais procurava apresentar solues espirituais. O pentecostalismo herdaria esses e outros traos culturais norte-americanos..

    Charles F. Parham, considerado o pai do reavivamento pentecostal do sculo XX e William Seymour, o profeta negro da rua Azuza, surgiram como resultado do processo de pentecostalizao das igrejas protestantes norte-americanas. Eles no foram frutos do acaso. No se pode negar que tais homens receberam como herana o pentecostalismo que priorizava as experincias espirituais e desprezava uma reflexo crtica do significado de ser cristo.

    Daniel Berg e Gunnar Vingren vieram ao Brasil em 1910 como missionrios da Apostolic Faith Mission (Misso de F Apostlica), conduzida pelo Pastor William H. Durham, um grande admirador de Seymour. Essa Misso teve como origem igreja da rua Azuza.

    Quando esses dois missionrios desembarcaram no Par e no Nordeste, eles trouxeram, de certa forma, essa tendncia anti-intelectualista para o Brasil, fundando, assim, a Assemblia de Deus. Outro fator que intensificou a desconfiana contra os estudos teolgicos: durante dcadas, a membresia dessa denominao foi composta majoritariamente pela classe mais pobre e menos instruda da populao. O requisito indispensvel para que algum chegasse posio de pastor era ter uma vida moral reta e um notvel fervor espiritual. O conhecimento bblico era de importncia secundria. Reproduziu-se em nossos Brasil o mesmo fenmeno que j tinha ocorrido nos Estados Unidos: a desconfiana total em relao aos estudos teolgicos. Para muitos aquele que estudava Teologia estava dando lugar ao diabo; citar essa palavra era como dizer um palavro.

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    A missionria norte-americana Ruth Dorris Lemos junto como o seu esposo, o Rev. Joo Kolenda Lemos, implantaram o primeiro seminrio assembleiano no Brasil, O Instituto Bblico das Assemblias de Deus (IBAD) em outubro de 1958. Ela conta que eles (os pastores brasileiros) no tinham uma viso desse trabalho aqui no Brasil. E tambm missionrios de outros pases no tiveram esse sentimento.

    Ainda hoje se v a influncia do anti-intelectualismo nas igrejas pentecostais, inclusive nas Assemblias de Deus. Alguns dizem que a mudana do perfil scio-econmico-cultural dos membros das igrejas pentecostais ir determinar a morte do anti-intelectualismo, pois os crentes procuraro, cada vez mais, buscar uma fundamentao racional para a f. Outros dizem que isso nunca acabar, pois o ser humano sempre desprezar os critrios objetivos do conhecimento intelectual e procurar buscar segurana e conforto na dimenso exclusiva das experincias espirituais. O futuro dir quem est certo.