O Bandeirante -...

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244 244 244 244 244 MARÇO 2013 O Bandeirante Pulicação mensal da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores - Regional S.Paulo Cabeça de cachorro Prêmio Flersts Nebó “Mas então a caraminhola da cabeça já nem sabia que rumo tomar, pois vinha um gosto amargo subindo pela garganta e fazendo água azeda na boca. Saliva grossa que ele engolia, como fazia quase todo dia com tanto desaforo, tanta mal-querença e falta-de-jeito no trato, tamanha desavergonhice no procedimento, tanto fanatismo desmiolado, destramelice da boca, destemperança do juízo e falta de respeito, tudo coisa de engrossar saliva com gosto ruim. E era só desse tipo de coisa que um filho de ninguém tinha resolvido ocupar seu tempo, todo dia e toda hora.” Leia a prosa de MARCOS GIMENES SALUN na pg.3 O alisador de areia “Somos nós que montamos o cenário das vitórias instantâneas que não duram para sempre. Nós duramos muito mais. Somos daquela raça de sobreviventes que resistem mais que um recorde olímpico turbinado de anabolizantes e patroci- nado pela Nike. Ou pela Adidas. Não temos bandeira pendura- da nas costas. Nossa volta olímpica termina no depósito de limpeza dos estádios, embaixo das arquibancadas, com cheiro de pipoca e cachorro-quente, sem qualquer ovação ou aplauso. Temos apenas a chave do cadeado ” A crônica de SÉRGIO PERAZZO está na pg.5 Lua nova, quarto minguante, flauta doce “É ele quem toca a flauta quando a maré cheia de dengo sobe a beira do íngreme barranco, e arrasta a lua para debaixo do jirau da casa de palha onde ele mora com seus Sábados. Ele apanha a flauta do seu canto ou nem sei se é ela que vai sobre as notas agasalhar-se em sua boca moída e mascada como um pergaminho. Ou vice-versa. E ambos tentam apaixonar a lua que nova e cheia de caprichos.” O conto de LUIS JORGE FERREIRA você lê na pg. 6 Carlos Roberto Ferriani (pg.3), Jacyra da Costa Funfas (pg.4), José Alberto Vieira (pg.4) José Leopoldo Lopes de Oliveira (pg.6), Sonia Andruskevicius de Castro (3). E mais: FATOS & OLHARES e QUEM é QUEM (pg.8) INSCREVA-SE HOJE MESMO na XII Jornada Médico-Literária Paulista - pg.7

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244244244244244MARÇO

2013O BandeirantePulicação mensal da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores - Regional S.Paulo

Cabeça de cachorroPrêmio Flersts Nebó

“Mas então a caraminhola da cabeça já nem sabia querumo tomar, pois vinha um gosto amargo subindo pelagarganta e fazendo água azeda na boca. Saliva grossaque ele engolia, como fazia quase todo dia com tantodesaforo, tanta mal-querença e falta-de-jeito no trato,tamanha desavergonhice no procedimento, tantofanatismo desmiolado, destramelice da boca,destemperança do juízo e falta de respeito, tudo coisa deengrossar saliva com gosto ruim. E era só desse tipo decoisa que um filho de ninguém tinha resolvido ocupar seutempo, todo dia e toda hora.”

Leia a prosa de MARCOS GIMENES SALUN na pg.3

O alisador de areia“Somos nós que montamos o cenário das vitórias

instantâneas que não duram para sempre. Nós duramos muitomais. Somos daquela raça de sobreviventes que resistem mais

que um recorde olímpico turbinado de anabolizantes e patroci-nado pela Nike. Ou pela Adidas. Não temos bandeira pendura-

da nas costas. Nossa volta olímpica termina no depósito delimpeza dos estádios, embaixo das arquibancadas, com cheiro

de pipoca e cachorro-quente, sem qualquer ovação ouaplauso. Temos apenas a chave do cadeado ”

A crônica de SÉRGIO PERAZZO está na pg.5

Lua nova, quartominguante, flauta doce“É ele quem toca a flauta quando a maré cheia de dengo sobe abeira do íngreme barranco, e arrasta a lua para debaixo dojirau da casa de palha onde ele mora com seus Sábados. Eleapanha a flauta do seu canto ou nem sei se é ela que vai sobreas notas agasalhar-se em sua boca moída e mascada como umpergaminho. Ou vice-versa. E ambos tentam apaixonar a lua quenova e cheia de caprichos.”

O conto de LUIS JORGE FERREIRA você lê na pg.6

Carlos Roberto Ferriani (pg.3), Jacyra da Costa Funfas (pg.4), José Alberto Vieira (pg.4)José Leopoldo Lopes de Oliveira (pg.6), Sonia Andruskevicius de Castro (3).

E mais: FATOS & OLHARES e QUEM é QUEM (pg.8)

INSCREVA-SE HOJE MESMO na XII Jornada Médico-Literária Paulista - pg.7

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2 O Bandeirante - Março 2013

Jornal O Bandeirante

ANO XXII - nº. 244 -

Março 2013

Publicação mensal da SociedadeBrasileira de Médicos Escritores -

Regional do Estado de São Paulo

SOBRAMES-SP. Sede: Rua Alves

Guimarães, 251 - CEP 05410-000 - Pinheiros - São Paulo - SP

Telefax: (11) 3062-9887 / 3062-3604

Editores: Josyanne Rita de Arruda Franco e Marcos Gimenes

Salun (MTb 20.405-SP)

Jornalista Responsável e Revisora: Ligia Terezinha Pezzuto

(MTb 17.671-SP).

Redação e Correspondência: Rua Francisco Pereira

Coutinho, 290, ap. 121 A – V. Municipal – CEP 13201-100 –

Jundiaí – SP E-mail: [email protected] Tels.: (11) 4521-

6484 Celular (11) 99937-6342.

Colaboradores desta edição (textos literários): Carlos

Roberto Ferriani, Jacyra da Costa Funfas, José Alberto Vieira,

José Leopoldo Lopes de Oliveira, Luiz Jorge Ferreira, Marcos

Gimenes Salun, Sérgio Perazzo e Sonia Andruskevicius deCastro .

Tiragem desta edição: 300 exemplares (papel) e mais de

1.000 exemplares PDF enviados por e-mail.

Diretoria - Gestão 2013/2014 - Presidente: Josyanne Rita

de Arruda Franco. Vice-Presidente: Carlos Augusto Ferreira

Galvão. Primeiro-Secretário: Márcia Etelli Coelho. Segundo-Secretário: Maria do Céu Coutinho Louzã. Primeiro-Tesoureiro: José Alberto Vieira. Segundo-Tesoureiro: Aida

Lúcia Pullin Dal Sasso Begliomini. Conselho FiscalEfetivos:Hélio Begliomini, Luiz Jorge Ferreira e Marcos

Gimenes Salun. Conselho Fiscal Suplentes: José Jucovsky,

Rodolpho Civile e José Rodrigues Louzã.

.

Matérias assinadas são de responsabilidade de seusautores e não representam, necessariamente, a opinião

da Sobrames-SP

Editores de O BandeiranteFlerts Nebó - novembro a dezembro de 1992

Flerts Nebó e Walter Whitton Harris - 1993-1994

Carlos Luis Campana e Hélio Celso Ferraz Najar - 1995-1996

Flerts Nebó e Walter Whitton Harris - 1996-2000

Flerts Nebó e Marcos Gimenes Salun - 2001 a abril de 2009

Helio Begliomini - maio a dezembro de 2009

Roberto A.Aniche e Carlos Augusto F.Galvão - 2010

Josyanne R.A.Franco e Carlos Augusto F.Galvão - 2011-2012

Josyanne R.A.Franco e Marcos Gimenes Salun - janeiro 2013

Presidentes da Sobrames SP1º. Flerts Nebó (1988-1990)

2º. Flerts Nebó (1990-1992)3º. Helio Begliomini (1992-1994)

4º. Carlos Luiz Campana (1994-1996)

5º. Paulo Adolpho Leierer (1996-1998)

6º. Walter Whitton Harris (1999-2000)

7º. Carlos Augusto Ferreira Galvão (2001-2002)

8º. Luiz Giovani (2003-2004)

9º. Karin Schmidt Rodrigues Massaro (jan a out de 2005)

10º. Flerts Nebó (out/2005 a dez/2006)

11º. Helio Begliomini (2007-2008)

12º. Helio Begliomini (2009-2010)

13º.Josyanne Rita de Arruda Franco (2011-2012)

14º.Josyanne Rita de Arruda Franco (2013-2014)

Editores: Josyanne R.A.Franco e Marcos Gimenes Salun

Revisão: Ligia Terezinha Pezzuto

Diagramação Marcos Gimenes SalunImpressão e Acabamento: Expressão e Arte Gráfica

Expediente Editorial

NESTA DATA QUERIDA,NOSSOS PARABÉNS!

Maria da Glória Moreira Civile21/03

Helio Begliomini21/03

Março começa divulgando as “Entradas e Bandeiras” da Sobrames SP.

Em ritmo acelerado segue a preparação da XII Jornada Médico-Literá-

ria Paulista. Telefonemas, missivas convencionais, e-mails e uma série de

outros contatos têm ocupado grande parte dos assuntos da diretoria e

isso vai longe. Em contrapartida, restará aos confrades e confreiras

prestigiarem toda esta trabalheira com expressiva participação, afinal

nossa regional completará 25 anos de atividades, assinalando este marco

histórico na futura Jornada. Acompanhe este percurso nas Pizzas Literá-

rias, lendo O Bandeirante e acessando nosso Blog. Inscreva-se e parti-

cipe da história da Sobrames SP!

Josyanne Rita de Arruda FrancoMédica Pediatra Presidente da Sobrames-SP

Melhores prosas recebem prêmio

As Pizzas Literárias da SOBRAMES-SP acontecemna terceira quinta-feira de cada mês,a partir das 19h00.PIZZARIA BONDE PAULISTARua Oscar Freire, 1597Pinheiros - S.Paulo

Nesta edição você poderá leros textos em prosa premiadosna edição 2011/2012 doPrêmio Flerts Nebó. MarcosGimenes Salun (ao lado,recebendo seu prêmio),Sérgio Perazzo e Luiz JorgeFerreira foram os laureados.Veja mais informações nacoluna Fatos & Olhares naúltima página.

Blog chega perto de 12.000 visitasDesde que foi criado em meados de

2011 o Blog da Sobrames-SP járecebeu perto de 12.000 visitas.

Neste local você encontra, além detextos literários dos membros daSociedade, um grande acervo de

informações, constantementeatualizado e revisado. Você poderá

ver, dentre outras informações,biografias dos escritores, livros

publicados, prêmios e muito mais.Também estão disponíveis para

leitura ou para donwload em arquivos PDF, as edições do jornal “O Bandei-rante”, desde janeiro de 2008. Visite, conheça, participe e ajude a

divulgar este importante canal de comunicação da Sobrames-SP.http://sobramespaulista.blogspot.com.br/

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O Bandeirante - Março 2013 3

Marcos Gimenes Salun

VoarSonia Andruskevicius de Castro

Cabeça de cachorro

Tinha dias que eleficava olhando o horizontelá longe, um tempão.Cismava com o que haveriapra lá daquela fímbria quequase não se via. Imaginavagrandiosidades e porcarias,tudo ao mesmo tempo.Besteira... Quando cansavada pasmaceira de olhar olonge que mal enxergava,tocava o rumo do pensa-mento pra outro canto. Sem querer, esfregavaa palma de uma mão com o dedo indicadorda outra e sentia a textura dos anos saltando.Calos duros, rachados alguns. De queadiantou tanto muque, tanta “bateção” decabeça, tanto sofrimento? Mas não deixavamarejar os olhos, pois disso já se cansara emtantos dias iguais a este, de pensar nodistante. Então desviava o rumo dopensamento de novo, que era pranão embilolar o cucuruto com pensamentotão sem propósito.

Queria coisa melhor pra pensar. Coisade maior importância e serventia do que ficarnaquele terententém do dia inteiro e de tododia, de toda hora e de um dia depois dooutro, depois do outro e depois do outro.Muita coisa pra fazer, pra esquentar o juízo,pra responder sozinho, sem ninguém pradividir prosa ou trabalho. E uma porção degente pra dizer cadê isso, cadê aquilo, porque é que você não viu aquilo outro... Queriaera coisa melhor pra pensar e pra se ocupar.

Mas então a caraminhola da cabeça jánem sabia que rumo tomar, pois vinha umgosto amargo subindo pela garganta efazendo água azeda na boca. Saliva grossaque ele engolia, como fazia quase todo diacom tanto desaforo, tanta mal-querença efalta-de-jeito no trato, tamanhadesavergonhice no procedimento, tantofanatismo desmiolado, destramelice da boca,

destemperança do juízo e falta de respeito,tudo coisa de engrossar saliva com gosto ruim.

E era só desse tipo de coisaque um filho de ninguémtinha resolvido ocupar seutempo, todo dia e todahora.  

Mas daí então passavaa mão de calos e torturasna cabeça do cachorro quedormitava a seu lado. Faziaum carinho meio desa-jeitado, pois rudeza e

carinho às vezes combinam. O cão abria umolho agradecido e deixava o outro continuarsonhando com suas coisas de cachorro. Pensavaoutra vez no longe que seus olhos nãoalcançavam. Desviava o olhar. A fímbria dohorizonte continuava lá, na sua distância, e aoseu lado havia um cão que dormitava,indiferente à tarde. 

PREMIO FLERTS NEBÓMelhor Prosa de 2011/2012

Uma pequena mancha no céuEntre nuvens

E de repente duas asas abertasDescendo num voo rápidoSincronizando como avião.A velocidade diminuindo

Um pouso perfeitoUm olhar atento em todas as direções

O avistar de fruta maduraUm voo curto e rápido

A fome saciadaO retorno às alturas

Ao infinitamente grandeA busca da perfeiçãoO alimento da alma.

Os seres humanos não tem asasMas sabem rezar.

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4 O Bandeirante - Março 2013

Nós(s)... (a) (Nós)... sessentõesCarlos Roberto Ferriani

A responsabilidade de quem escreveJosé Alberto Vieira

Jacyra da Costa Funfas

Crepúsculo

Muitos escrevem para expressar um pensamento, umsentimento, outros por defenderem uma ideia, uma posição, outrospor puro devaneio. Desejamos que aqueles que nos leem percebam oque está diante de nossas palavras. Que eles sintam o que nós sentimos.Vejam o que nós vemos. Afinal escrever é em última análise nosdirigirmos aos outros. Podemos omitir. Podemos mentir, contar meiasverdades.

Fazer ficção de algo que é real ou o inverso. Criamos mitos,anjos e demônios.

Na hora em que escrevemos temos a onipotência das palavras.Entretanto, não controlamos a capacidade que o leitor tem de darvida às nossas palavras. O que o outro molda em sua mente, ossentimentos que ele desperta, isso não podemos determinar. Nossaescrita pode deflagrar reflexões, atos e atitudes e o que advém disso éimprevisível. Escrever é atirar uma flecha no vazio – nunca se sabeaonde vai atingir. Daí a importância e a responsabilidade dos queescrevem. Somos livres para escrevermos o que quisermos, mas temosque nos submeter às ideias que divulgamos.

Eu sou velho, mas não só sinto cheiro de flores e velasTenho uma dorzinha aqui ou acolá, mas que não me alimentaÀs vezes não escuto bem, outras sou surdo bem ouvindoDurmo tarde, enquanto o sono não vem ou de felicidade de mimSexo, uso-o para beijar o verdadeiro amor que me iluminaTrabalhei muito, mas foi minha maior diversão de vida aprendizChorei lágrimas que saíram, mas retornaram em forma de oraçãoAmei e amo, acima de mim, o dom da vida que me tem sido imortalCarrego lições de despertares com o sol ou a chuva, pois enxergo-osBebo um vinho bom, ou mesmo ruim quando resta o que é o únicoNunca acho que o amor é um engodo da natureza para a procriaçãoVejo em meus filhos a maior lição da Bondade do Deus supremoAtualizo meus neurônios quando oro sem perseguir a graçaEscancaro-me pelo presente, pois o meu sorriso ainda não mudouTenho amigos que choram, riem comigo e perdoam meus errosÀs vezes esqueço coisas, mas que não são as mais importantesParabenizo a felicidade de saber das minhas imperfeiçõesExtravagante, dou-me o direito de ouvir as músicas que me seduzemPela compaixão, perdôo as minhas intolerâncias aos sublimes delitosCombato meus vícios e paixões com a sabedoria de me saber tentandoEnfim, compro-me seguro e certo de que me tenho por inteiro,Embora um dia que me irei, nunca porém de mim.

No crepúsculo,

O Sol vaidoso

Admirava sua beleza

Espelhando-se no mar.

Mas, logo recolheu suas madeixas douradas

Para sair de cena

Dando lugar à Lua

Que já apontava sorridente,

Vestida com poucas nuvens esgarçadas,Abrilhantadas pelo pisca-pisca das estrelas.

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O Bandeirante - Março 2013 5O alisador de areia

Sérgio Perazzo

Sou aquele cara que aparece de costas,duas vezes, na transmissão pela tevê da seletivade atletismo da Jamaica, visando a classificaçãopara as Olimpíadas de Londres. Estouempunhando uma espécie de rodo comprido elargo, alisando a areia da caixa que recebe aaterrissagem final de pés juntos dos atletas daprova de salto triplo. Sem a minha intervençãodiscreta depois de cada salto, os juízes nãopodem medir a extensão das marcas e osrecordes não podem ser batidos com metragemprecisa.         Na pista ao lado, Usain Bolt, lenda viva,se prepara para a final dos 100 metros rasosonde, surpreendentemente, vai ser batido porYoyan Blake, o novo ídolo dos velocistas. Táticade Bolt, correndo o suficiente para se classificar,se guardando para a final de Londres? Ninguémsabe nem tem como saber.        Somos um batalhão de anônimosdesconhecidos: o juiz que muda o suporte dosarrafo do salto com vara; a moça de pretocom saia de faixas verde, amarela e vermelha,que carrega a bandeja de medalhas até o pódio;o funcionário que levanta o obstáculo demadeira plastificada que foi derrubado nos 110com barreiras; o garoto que enxuga o pisosintético da quadra de vôlei ou amarra a rededo aro da tabela de basquete; o gandula quevai pegar a bola que passou raspando a travedireita; o moço que abastece de pó de magnésioo recipiente em que os ginastas mergulham asmãos para não escorregarem dos aparelhos.        Somos nós que montamos o cenário dasvitórias instantâneas que não duram parasempre. Nós duramos muito mais. Somosdaquela raça de sobreviventes que resistem maisque um recorde olímpico turbinado deanabolizantes e patrocinado pela Nike. Ou pelaAdidas. Não temos bandeira pendurada nascostas. Nossa volta olímpica termina no depósitode limpeza dos estádios, embaixo das

arquibancadas, com cheiro de pipoca e cachorro-quente, sem qualquer ovação ou aplauso. Temosapenas a chave do cadeado. Nem chegamos a sertreinados para a vida, que dirá para a vitória, cujosabor desconhecemos. A prova de nossa especialidadeé o fracasso. Fracasso à distância. Porém, serflagrado pela tevê alisando a caixa de areia é meumomento de glória que campeão nenhum pode meroubar. Mais amplo que um salto triplo. Os 15segundos de fama a que todo ser humano tem direitono palco dessa vida, que seja com chavãomelodramático.        Esse mundo imerso em anonimato precisa deheróis, não é? Pois bem, eu sou o herói da vassoura,do rodo, do esfregão, do alisador de areia diante doaltar dos deuses olímpicos. O anti-herói dá sentidoàquilo que precisamos chamar de herói, de vencedor,de recordista. Faz jus à existência de medalhas. Auma coleção enferrujada de troféus.        A certeza que já ultrapassou a intuição me dizque minha vida será sempre difícil. Caminho semvolta. Largada queimada ao som da pistola do starter.Sim, o mundo é feito para poucos, esse mundoinflacionado de desejos deixa pouca margem àesperança. Ao brilho do cume das coisas.        Por isso sou perfeito alisando a areia. Quemsabe alguém está me filmando sem que eu saiba.Talvez eu vá parar no youtube que irá colorir o meutriste monólogo que já virou domínio da internetpontocom.        Sim, sou aquele cara da caixa de areia do saltotriplo, ao lado da raia do Usain Bolt quebrandorecordes olímpicos para os olhos anônimos daarquibancada, onde eu também me dissolvo edesapareço. Mais um grão de areia na caixa do saltotriplo. Vai ver, viemos do mesmo gueto. Do mesmoberço. Da mesma favela.        Mas o Usain Bolt, mesmo perdendo a final dos100 metros rasos, manteve a tradição de usar assapatilhas uma única vez, feitas sob medida paraseus pés de campeão, cores e desenho exclusivos.Em parte superstição, em parte solene desprezo pelasmultinacionais, tripudiando o patrocínio. Cruzou alinha de chegada e ficou descalço enrolado nabandeira da Jamaica. Passou por mim ao lado dapista e me deu as sapatilhas ainda novinhas que eucalcei imediatamente, sorriso de orelha a orelha.        Eu sou aquele cara que você viu na tevê, desapatilhas de campeão, dançando abraçado aoalisador de areia em plena pista de tartan, atrasandoa prova de salto triplo, os juízes sem poder cravaras marcas, no estádio superlotado.        Sim, eu sou aquele cara atropelado de repentepelo trem de uma felicidade única e gratuita quenão se repete na vida. A indescritível surpresa deum momento perfeito, calçando as sapatilhas velozescomo o vento que cada um de nós sonhava calçar.        Sim, eu sou aquele cara.                     

Primeira Menção HonrosaPREMIO FLERTS NEBÓ 2011/2012

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6 O Bandeirante - Março 2013

Lua nova, quarto minguante, flauta doce

Ele tinha uma flauta esquecida no canto da sala.Que ele apanhava para tocar sempre que a maré cheia trazia a lua para debaixo da casa.Ele tocava lundus e valsas em compassos apaixonados.Do outro lado do igarapé, as arraias, se espraiavam, atônitas.Pouco depois eram os sacis que pulavam na lama, e cuspiamcuspes, perfumados nos tralhotos, sempre no lado impar namargem esquerda.Sozinho na casa feita de trapos, e tempos. Ele começava seu dia lendo.Lendo Voltaire, e rindo com a boca, e os intestinos, assimentrava pela noite.Ele gostava mesmo era de descer o rio boiando de barrigapara cima alvejando com seus muitos assovios libélulas ebeija flores. Os mais vagabundos eram os que o seguiam a cata debeijos e acenos.Mas quando a maré subia pelos barrancos íngremes, e vinhase sujar no terreno seco debaixo dos cajueiros em flor, eali  punha-se a bulir com o ninho dos Pintassilgos. EraDomingo.E se era Domingo, então ele se despia, retirava do corpo dois pedaços puídos de pano agora quase pele, e corriapelo campo.Perseguindo borboletas, que ele acreditava azuis.Quando ele vivia em Madri o chamavam Catalão. Depois que andou pela Polinésia, e deu-se de corpo, e cor, parauma nativa altiva de porte exemplar e caminhar lânguido, cresceu seu amor por amanhãs, e lembranças.Um dia perseguindo a corrente de Gilbratar veio dar em Belém.Bubuiando com os tucunarés, e embriagando-se de vinhos e defumações. Virou boto.E ele quem toca a flauta quando a maré cheia de dengo sobe a beira do íngreme barranco, e arrasta a lua paradebaixo do jirau da casa de palha onde ele mora com seus Sábados.Ele apanha a flauta do seu canto ou nem sei se é ela que vai sobre as notas agasalhar-se em sua boca moída emascada como um pergaminho. Ou vice-versa.E ambos tentam apaixonar a lua que nova e cheia de caprichos.Não dá bola.E num quarto crescente de desafagos e lamentos, não se demora e mingua, mingua minguante entre Cobrasgrandes e murures.Um dia destes dias estranhos em que se chora rindo e se ri chorando, ele saiu em direção a mata, e a flauta ficousozinha, ainda lá no canto.Exatamente cada vez mais em silencio. A esperar. Como se esperar resolvesse a espera. Muda fez-se úmida.Úmida fez-se podre.Podre fez-se lânguida. Lânguida fez-se coisa nenhuma.Para o espanto da atônita lua.Agora ela é só um nada, um trôpego pedaço de madeira,

Luiz Jorge FerreiraSegunda Menção Honrosa

PREMIO FLERTS NEBÓ 2011/2012

Avenida Paulista, sábado noite. Íamos eu a mulher,seu primo, dono do carro, um Galaxie daqueles antigos ea mulher, quando no sinal somos chamados por Elza numcarro ao lado, querendo saber para onde estávamos indo.Cacalo, primo da mulher, engenheiro do IPT e muito

gozador disse a Elza que iríamos para uma suruba num barrecém inaugurado na Vila Madalena e ela prontamente fezquestão de acompanhar-nos..

Chegando ao bar perguntou ao Cacalo o que erasuruba e ele respondeu que era um prato típico donordeste, com frutos do mar e tempero especial, segredoe sucesso daquele boteco, já cheio àquela hora.

Bebemos caipirinhas sempre acompanhadas decamarões, siris, mariscos etc. e Elza questionando Cacalosobre a suruba e ele dizendo que era prato demoradoque exigia muita atenção para sair no ponto, até que Elza,após umas quatro batidas resolveu interpelar o garçom eem voz alta para todos ouvirem perguntou: “e essa surubavem ou não vem?”

Silêncio seguido de risos gerais. Cacalo explicou oque era suruba.

SurubaJosé Leopoldo Lopes Oliveira

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O Bandeirante - Março 2013 7

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XII JORNADA MÉDICO – LITERÁRIA DA SOBRAMES SP VII JORNADA NACIONAL DA SOBRAMES

DATA: 26 de setembro a 29 de setembro de 2013

LOCAL: PRIMAR PLAZA HOTEL

Rua Dr. José Freire Villas Boas, 468

Botucatu - SP

INSCRIÇÕES ABERTAS

Sua participação contempla:* Três diárias no Primar Plaza Hotel.

* Refeições durante a Jornada (bebidas a parte).

* Coffee Break

* Transporte dentro da cidade

* Passeio Eclusa Barra Bonita com almoço a bordo.

* Sessões Literárias dinâmicas com apresentação dos trabalhos

inscritos.

* Intercâmbio cultural com a Academia Botucatuense de Letras

e Faculdade de Medicina de Botucatu (UNESP).

* Um exemplar dos Anais da Jornada.

*Um exemplar da IX Antologia Paulista

* Certificado de participação

Passeios Opcionais:-Três Pedras: conjunto de elevações rochosas que, vistas de

longe, assemelham-se a um “Gigante Adormecido”

- Museu do Café: preserva a memória da cultura cafeeira.

- Fazenda Lajeado: remonta ao período dos coronéis e dos

escravos.

Custo do Pacote: R$1.200,00 por pessoa (cada acompanhante

deverá se inscrever com taxa de idêntico valor)

Forma de Pagamento: cinco parcelas de R$ 240,00 (cheques

pré-datados para 30/04, 30/05, 30/06, 30/07 e 30/08 de 2013).

REGULAMENTO DO CONCURSO LITERÁRIO

XII Jornada Médico-Literária Paulista - SOBRAMES SP

VII Jornada Nacional da SOBRAMES

I.CATEGORIAS: Sócio e Estudantes de Medicina

II.GÊNERO: Prosa e Poesia - Tema Livre.

Cada participante poderá se inscrever com dois textos, sendo

um de cada gênero ou os dois de mesma modalidade.

III.FORMATAÇÃO:Microsoft Word, digitados em folha A4, frente única, fonte

Times New Roman, tamanho 12, espaço simples. Margens de

2,5 cm.

Os textos deverão conter apenas título, categoria e pseudônimoe não deverão ultrapassar 80 linhas (cerca de uma página e

meia), salvos em .docNão colocar seu nome verdadeiro para garantir imparcialidade

de avaliação.

IV.NORMAS PARA ENTREGAO autor deverá enviar impreterivelmente até o dia 30 de junho:

a) Envelope A4 com seus textos em cinco cópias impressas (a

serem encaminhadas para a Comissão Julgadora)

b) Envelope menor com ficha de inscrição preenchida com os

dados do autor, lacrado, colocado dentro do envelope maior

que contém os trabalhos concorrentes.

c) cinco cheques pré-datados, nominais à SOBRAMES SP,

correspondentes à inscrição na Jornada.

d) Para enviarmos os trabalhos para a gráfica que confeccionará

os Anais, é necessário que os textos sejam gravados em CD e

remetidos com os itens acima ou, se houver preferência,

enviados via eletrônica para o e-mail da secretária da Sobrames

SP: [email protected].

V. ENDEREÇO PARA REMESSA CONVENCIONAL:Márcia Etelli Coelho (Secretária da SOBRAMES SP)

Rua Borges Lagoa, 1246, Apto 91, Vila Clementino,

São Paulo – SP, CEP: 04038-003

Atenção: A revisão rigorosa dos textos ficará a cargo do autor

e, uma vez enviadas as cópias, não será possível promover

alterações.

VI.CONFIRMAÇÃO:

A aceitação definitiva dos textos será confirmada

apócumprimento dessas formalidades e do pagamento da taxa

de inscrição.

Solicite hoje mesmo sua ficha de inscrição e participe.

Conforto e lazer nas instalaçõesdo Primar Plaza Hotel, quereceberá a XII Jornada Médico-Literária Paulista em setembro.

Page 8: O Bandeirante - static.recantodasletras.com.brstatic.recantodasletras.com.br/arquivos/4286674.pdf · 2 O Bandeirante - Março 2013 Jornal O Bandeirante ANO XXII - nº. 244 - Março

FATOS & OLHARESMárcia Etelli Coelho

“QUEM é QUEM”: novo desafio DIVULGUE SEUSTEXTOS

Para garantir que seus textos literários

apresentados nas reuniões das Pizzas Literárias

participem dos concursos de prosa e verso da

Sobrames-SP, facilitar a sua publicação nas

edições do jornal “O Bandeirante” e como

consequência ser selecionado para publicação

no livro bi-anual “Antologia Paulista”, não se

esqueça de enviá-los por e-mail para um destes

endereços:

[email protected]@uol.com.br

[email protected]

PRÊMIO FLERTS NEBÓUm dos destaques da Pizza Literária de 21 de março de 2013 foi a entrega do PrêmioFlerts Nebó: Primeiro Lugar: Marcos Gimenes Salun (“Cabeça de Cachorro”). PrimeiraMenção Honrosa: Sérgio Perazzo (“O Alisador de Areia”). Segunda Menção Honrosa:Luiz Jorge Ferreira (“Lua Nova, Quarto Minguante, Flauta Doce”).Os textos em prosa apresentados nas Pizzas Literárias durante o período de agosto de2011 a julho de 2012 receberam numerosos elogios dos avaliadores: Durce GonçalvesSanches (ACADIL – Academia de Letras de Itu), Lázaro José Piunti (membro fundador daAcademia de Letras de Iperó), Nelson Manzatto (Academia Jundiaiense de Letras) eLuiz Haroldo Gomes de Soutello, (membro da Academia Jundiaiense de Letras e daAcademia de Letras Jurídicas de Jundiaí). Parabéns a todos que, com seus textos dediversos estilos, fazem das Pizzas Literárias um encontro cada vez mais agradável.

NOVA SEDE DA SOBRAMES-SPDia 21 de março também marcou a realização da Assembleia Geral Extraordinária para a aprovação da nova sede daSobrames São Paulo. Em regime de comodato, uma sala na Associação Paulista de Medicina (APM) localizada na AvenidaBrigadeiro Luiz Antônio 278 sétimo andar sala 1 preservará o acervo histórico e literário de nossa Sociedade além depossibilitar maior divulgação dos nossos eventos perante à classe médica.

JORNADA LITERÁRIA EM BOTUCATUA XII Jornada Médico Literária Paulista se realizará no período de 26 a 29 de setembro

de 2013 em Botucatu. Anfitriã da VII Jornada Nacional da Sobrames, é notória adedicação da Sobrames SP em programar sessões literárias dinâmicas, oferecendo aos

participantes confraternização, passeios, excelente gastronomia e intercâmbiosregionais. Mas atenção: 30 de junho é a data limite para as inscrições dos textos

(Categoria Prosa e Poesia) que concorrem ao troféu “O Bandeirante” e que serãoavaliados por membros da Academia Botucatuense de Letras. Maiores informações

(incluindo Regulamento do Concurso Literário, Taxa e Ficha de Inscrição) podem sersolicitadas pelo e mail: [email protected]

De volta para o passadoNa foto ao lado uma foto escolar

de um associado, aos sete anos de

idade. Atualmente tem sido escritor

talentoso e bastante comprometido

com as atividades da Sobrames.

Você consegue adivinhar quem é

ele?

Resposta na edição de ABRIL.(Participe, enviando para nossa redaçãouma foto sua bem antiga).

*Prêmio Bernardo de Oliveira Martins:Entrega na Pizza Literária de Abril*Sabatina Literária: Realização em Maio*Homenagem a autores consagrados:Pizza Literária de Julho*Jubileu de Prata: “SOBRAMES-SP 25 ANOS”:Pizza Literária de Setembro*XII Jornada Médico-Literária Paulista eJornada Nacional da Sobrames:dias 26, 27, 28 e 29 de setembro, em Botucatu-SP.*Lançamento da 9a Antologia Paulista: Jornada de Botucatu.*Pizza Literária de Natal: dia 19 de dezembro.